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3 MATERIAL E MÉTODOS

A pesquisa proposta é de caráter teórico-prático, de natureza qualitativa, alicerçada nas

técnicas de observação, entrevista (com base em história oral), análise de documentos e no

referencial teórico trabalhado e exposto no capítulo anterior. Cria-se, para este trabalho, uma

relação metodológica própria, aliando uma abordagem crítica. A postura teórica adotada é a

do interacionismo simbólico, uma vez que se coloca em primeiro plano o “ponto de vista do

sujeito” (FLICK, 2004, p.33). Quando necessário para a compreensão, adotam-se valores da

hermenêutica (SPOSITO, 2004). Tal referência se faz necessária, em virtude das categorias

trabalhadas, o que cria uma nova abordagem epistemológica. Tem-se como objeto de pesquisa

as representações da comunidade local quanto às transformações geradas pelo momento atual

(de patrimonialização) e o processo de visitação na vila ferroviária de Paranapiacaba, no

contexto da sustentabilidade.

O interacionismo simbólico, segundo Flick (2004, p.33), coloca em primeiro plano o ponto de

vista do sujeito. Nessa perspectiva, o ponto de partida empírico consiste nos significados

atribuídos pelos indivíduos a suas atividades e ambientes.

Bogdan e Biklen explicam que os significados são constituídos através das interações (1994,

p. 55). A reconstrução do ponto de vista do sujeito é encontrada na forma de trajetórias

biográficas reconstruídas a partir da perspectiva dos sujeitos. Porém, é importante, ressalta

Flick (2004), que estas permitam o acesso aos contextos temporais e locais, reconstruídos a

partir do ponto de vista do narrador. Minayo (2008) explica que, na abordagem interacionista,
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que tem Blumer1 como “autor seminal”, a vida social constitui uma “espécie de consenso que

propicia um processo de inter-relações e de interpretações de significados compartilhados por

um grupo ou comunidade que pode ao mesmo tempo, manipular, redefinir e modificar seus

sentidos” (MINAYO, 2008, p. 153).

A opção pela pesquisa qualitativa se justifica por suas características: os dados recolhidos são

ricos em pormenores descritivos relativamente a pessoas, locais e conversas; as questões a

investigar são formuladas com o objetivo de compreender os fenômenos em toda sua

complexidade e em contexto natural (ou seja, os dados são recolhidos nos locais em que se

verificam os fenômenos nos quais se está interessado e que são apreendidos nos

comportamentos das pessoas – conversar, observar etc.). Nela, privilegia-se a compreensão

dos comportamentos a partir da perspectiva dos sujeitos da investigação. Algumas das

estratégias mais representativas da investigação qualitativa são a observação participante e a

entrevista (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p.16; CHIZZOTI, 2005, p.89).

Cada indivíduo desempenha um papel na sociedade e tem influência sobre o meio ambiente

que o circunda. O entendimento do contexto total e seus significados é o que o pesquisador

qualitativo deseja obter (LOCKE et al., 1993).

Em pesquisas dessa natureza, busca-se compreender os fenômenos a partir da visão dos

participantes. Este tipo de estudo “ilumina”, esclarece o dinamismo interno das situações,

freqüentemente invisível para observadores externos (GODOY, 1980).

A pesquisa qualitativa fornece a possibilidade de obtenção de informações sobre as

experiências individuais e pessoais dos pesquisados. Permite, pois, o estudo em profundidade

e com alto grau de detalhamento, ampliando o entendimento dos casos e situações estudadas,

apesar de reduzir a possibilidade de generalização, pois, geralmente, abrange uma pequena

amostra do universo possível.

1
BLUMER, Herbert. Social Psychology. In: SCHMIDT, Emerson Peter (ed.) Man and Society: A Substantive
Introduction to the Social Science. New York: Prentice-Hall, 1937.
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Para Moreira (2001), pode-se partir do princípio de que a pesquisa qualitativa é aquela que

trabalha predominantemente com dados qualitativos, isto é, a transformação coletada pelo

pesquisador não é expressa em números, ou então os números e as conclusões neles baseadas

representam um papel menor na análise. Godoy (1980) infere a preocupação com o processo e

não simplesmente com os resultados ou produto.

Locke et al. (1993) apontam que a pesquisa qualitativa é uma estratégia sistemática e empírica

para responder questionamentos sobre os indivíduos em um contexto social abrangente. Dado

qualquer ambiente de interação, ela é um meio para descrever e procurar o entendimento

sobre regularidades observadas no que as pessoas dizem, fazem e relatam sobre suas

experiências. Neste tipo de pesquisa, o que importa é o que o pesquisado pensa sobre o

mundo. Como o foco é o que os indivíduos dizem, suas crenças, os sentimentos que eles

expressam, e essas informações são tratadas como realidades significativas, a pesquisa

qualitativa retrata uma visão relativa do mundo. Não se buscam verdades absolutas.

A realidade concreta de uma certa área não é apenas um conjunto de dados materiais ou de

fatos cuja existência, ou não, importa constatar, e sim esse conjunto de fatos e dados mais a

percepção que deles esteja tendo a população neles envolvida. Ela se constrói na relação

dialética entre objetividade e subjetividade (FREIRE, 1985).

Há contradição em toda formação social e pode, por isto, ser historicamente superada

(DEMO, 1995). Entende-se por formação social a realidade que se forma processualmente na

história:

[...] de um lado, apresenta nível discernível de organização social, sobretudo


captável pelas instituições que nela se coagulam, como seria, por exemplo, a
fase capitalista, a fase feudal [...] de outro, apresenta o aspecto formativo
histórico, sempre dinâmico, da unidade de contrários, ou seja, gesta dentro
de si as condições de aparecimento da nova fase. (DEMO, 1995, p.90).

A realidade social é, em sua essência, dinâmica.


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Nesta pesquisa, partilha-se dos preceitos de Borda (1983), para quem uma nova ciência social

deveria estar integrada com várias disciplinas, como economia, geografia, psicologia,

antropologia, ciência política e direito, entre outras.

Para King (1995), a pesquisa qualitativa é mais apropriada para os casos em que o foco de

estudo é o significado de um fenômeno particular para os participantes. Caso desta pesquisa,

que se constrói como um estudo de caso. Chizzoti (2005, p. 102) define que este se caracteriza

como “um marco de referência de complexas condições socioculturais que envolvem uma

situação e tanto retrata uma realidade quanto revela a multiplicidade de aspectos globais,

presentes em uma dada situação”. O caso deve ser uma referência significativa para merecer a

investigação, sendo uma estratégia muito utilizada quando se colocam:

Questões do tipo “como” e “por que”, quando o pesquisador tem pouco


controle sobre os eventos e quando o foco se encontra em fenômenos
contemporâneos inseridos em algum contexto da vida real. (YIN, 2001,
p.19).

Acredita-se que todo conhecimento está ‘situado’, é matizado pelos contextos, normas de

significação, parcialidades, experiências e desejos que envolvem sua elaboração

(COSGROVE, 1999, p.27). As teorias são temporal e espacialmente contextualizadas. Para

Feyerabend (1977, p.288), quando uma teoria ou idéia nova é desenvolvida, geralmente se

apresenta algo desarticulada, contém contradições, não é clara a relação em que se coloca para

com os fatos, e são abundantes as ambigüidades. Pode, não obstante, ser trabalhada e

aperfeiçoar-se.

O objeto das ciências sociais é histórico e essencialmente qualitativo, como defende Minayo

(2008). Assim sendo, os grupos sociais que as constituem são mutáveis e tudo, instituições,

leis, visões de mundo são provisórios, passageiros, estão em constante dinamismo e

potencialmente tudo está para ser transformado (MINAYO, 2008, p.20).

Quanto ao instrumental de obtenção das informações na localidade, apóia-se na observação

direta ou participante (CHIZZOTI, 2005, p.90), entendendo-a como aquela em que há contato
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direto do pesquisador com o fenômeno observado, visando recolher ações dos sujeitos no

contexto natural, levando em consideração sua perspectiva e pontos de vista.

Juntamente com as demais técnicas mencionadas, baseia-se, nesta tese, em entrevistas. Para

Bogdan e Biklen (1994, p. 134), as entrevistas, na investigação qualitativa, podem ser

utilizadas de duas maneiras – como estratégia dominante para a obtenção de dados ou em

conjunto com a observação, análise de documentos e outras técnicas. Este segundo caminho

foi o escolhido.

A escolha da entrevista se justifica por algumas qualidades inerentes a ela quando comparada

a outros modos de coleta de dados. São exemplos destas qualidades: a possibilidade do

encontro “face a face” com o informante; obtenção rápida de grande quantidade de dados

abrangentes; facilidade de cooperação do informante; grande utilidade para descobrir questões

subjetivas e da perspectiva individual sobre determinado assunto; útil para descobrir

interconexões complexas em relações sociais (MARSHALL, 1995).

A pesquisa contou com o uso do gravador como instrumento de armazenamento das

informações obtidas dos entrevistados. Sobre esta opção, Queiroz (1991) afirma que, através

dos séculos, o relato oral constituiu sempre a maior fonte humana de conservação e difusão do

saber, o que equivale a dizer a maior fonte de dados para as ciências em geral. O gravador,

também, parece um instrumento técnico próprio para anular ou, pelo menos, diminuir o

possível desvio trazido pela intermediação do pesquisador.

Strauss (1987) explica que, nesse tipo de pesquisa, nenhuma proposta deveria ser escrita sem

uma prévia recolha e análise de dados. De forma complementar, Chizzotti (2005) defende que

o problema decorre de um processo indutivo que se vai definindo e se delimitando a partir da

exploração dos contextos ecológico e social, onde se realiza a pesquisa; bem como da

observação reiterada e participante do objeto pesquisado e dos contatos com informantes que

conhecem o objeto e emitem juízos sobre ele.


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Sobretudo, deve-se considerar que, na pesquisa qualitativa, as questões iniciais

freqüentemente vêm da observação do mundo, seus dilemas e questionamentos e emergem da

experiência direta do pesquisador, das teorias com as quais está envolvido e de seus interesses

acadêmicos (MARSHALL, 1995). Yin (2001) comenta sobre a criação de oportunidade de

fazer observações diretas ao realizar uma visita de campo ao local escolhido para o estudo de

caso. Elas podem trazer uma nova dimensão às análises.

Dessa forma, as diversas visitas a campo contribuíram para verificar algumas dinâmicas que

se descortinam na vila de Paranapiacaba. Nessas ocasiões, ocorreram interações com

membros da comunidade local, observações e notas de campo foram feitas e fotografias foram

tiradas. Além disso, realizou-se saída de campo com alunos do Curso de Turismo da

Universidade Federal de São Carlos, a fim de, entre outras coisas, propiciar a análise de

situações vivenciadas pelo visitante na localidade.

Verificou-se o patrimônio edificado – em condições as mais variadas, alguns em processo de

degeneração, ou passando por restauro, outros em bom estado –; as relações com os recursos

naturais; os atores sociais em suas atividades cotidianas: crianças brincando na rua, adultos

conversando em frente a suas casas, pessoas trabalhando. Foi também vivenciada a relação

presente da intervenção do poder público no cotidiano dos moradores, agindo sobre os

critérios para se residir em uma casa e sobre regras de uso pelos prestadores de serviços.

Dessas observações, algumas inquietações surgiram, por exemplo: como é viver em um lugar

tão peculiar, tombado, recebendo turistas que passam à porta, utilizam os espaços públicos,

observam, fotografam; em que antigas residências se transformam em espaços de prestação de

serviços – alimentação, hospedagem, empresas de turismo receptivo, lojas de artesanato.

À medida que as incursões foram sendo realizadas no local, a exploração da literatura foi se

aprofundando, juntamente com a elaboração de fichamentos, a fim de subsidiar as reflexões

sobre a realidade analisada. Destaca-se que, dentre as principais bibliotecas que subsidiaram a
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pesquisa, estão as das Faculdades de Filosofia Letras e Ciências Humanas, de Saúde Pública,

da Escola de Comunicações e Artes e de Educação, da Universidade de São Paulo, bibliotecas

da Universidade Federal de São Carlos, campi São Carlos e Sorocaba e da Wageningen

University, além de arquivos particulares e de bibliotecas virtuais, como as bases Scielo e

periódicos CAPES, em que entradas como tourism, heritage, sustainability, community,

cultural landscape foram pesquisadas, assim como sua versão em português, nos periódicos

correspondentes à temática, disponíveis nas bases.

Inúmeros materiais produzidos pela Prefeitura de Santo André, abordando o turismo em

Paranapiacaba foram coletados. Alguns exemplos são: o “Plano Patrimônio”, o

“Desenvolvimento Econômico e Comunitário e turismo para Inclusão Social: projeto GEPAM

– a experiência de Santo André”, o “Plano de Desenvolvimento Sustentável da Vila de

Paranapiacaba” – elaborado em parceria com o LUME-FAU / USP –, o “Plano Diretor de

Santo André” e a “Lei da Zona Especial de Interesse do Patrimônio de Paranapiacaba

(ZEIPP)”. Esses materiais foram analisados, com maior detalhe os dois últimos, em busca de

se compreender a visão dos gestores públicos sobre as perspectivas para a vila com relação a

seus moradores, o patrimônio, a paisagem cultural e a atividade turística.

Inicialmente, realizou-se uma entrevista semi-estruturada com um morador que desempenha

um papel ativo na atividade turística receptiva na vila. O objetivo dessa entrevista era o que

Bogdan e Biklen (1994) defendem: que ela propiciasse uma compreensão geral das

perspectivas sobre o tópico. Estes autores explicam que, em um segundo momento, “pode

surgir a necessidade de estruturar mais as entrevistas de modo a obter dados comparáveis num

tipo de amostragem mais alargada” (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p.136). E assim se procedeu.

A primeira entrevista pode ser considerada o ponto zero (MEIHY, 2005, p.178). A partir dela,

as principais indagações foram organizadas, dando base para a formulação do roteiro das
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demais entrevistas realizadas, bem como para a determinação dos sujeitos e do problema

norteador da pesquisa e seus objetivos.

A construção de um projeto de pesquisa qualitativo, segundo Deslandes (1983), tem como

elementos metodológicos fundamentais, a definição da amostra, que não se baseia no critério

numérico para garantir sua representatividade, considerando, sim, quais são os indivíduos

sociais que têm uma vinculação mais significativa com o problema a ser investigado; a coleta

de dados e a organização e análise destes.

No desenvolvimento desta pesquisa, verificou-se que se trataria de assuntos que poderiam ser

melhor abordados pela história oral. Esta é uma história construída em torno de pessoas. Ela

lança a vida para dentro da própria história e isso alarga seu campo de ação. Propicia o

contato – e, pois, a compreensão – entre classes sociais e entre gerações (THOMPSON, 1992,

p.44).

Sobre a natureza intrínseca da história oral, diz Thompson: ela trata de vidas individuais – e

todas as vidas são interessantes. E baseia-se na fala, e não na habilidade da escrita, muito mais

exigente e restritiva. Além disso, o gravador não só permite que a história seja registrada em

palavras faladas, mas também que seja apresentada por meio delas. As palavras insuflam vida

na história (THOMPSON, 1992, p.41).

Para Thompson, ela não é necessariamente, por si só, um instrumento de mudança, depende

do espírito com que seja utilizada. No entanto, ela pode ser um meio de transformar tanto o

conteúdo quanto a finalidade da história. Pode devolver às pessoas, que fizeram e vivenciaram

a história, um lugar fundamental, mediante suas próprias palavras (THOMPSON, 1992, p.22).

Com abrangência multidisciplinar, a história oral tem sido amplamente utilizada por diversas

áreas das ciências humanas: história, sociologia, antropologia, psicologia, geografia humana,

lingüística ou jornalismo (THOMPSON, 1992; MEIHY, 2005; FREITAS, 2006). A história

oral tem ampla aceitação, pois “desmente a imperiosidade do formalismo disciplinar


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acadêmico, ainda que nas universidades haja movimentos querendo transformá-la em uma

prática sua” (MEIHY, 2005, p.25). Contudo, “todos eles podem estar escrevendo história; e,

sem dúvida, estão provendo à história” (THOMPSON, 1992, p.104).

Os usos da história oral são verificados em estudos com interesses diversos, tais como:

linguagem e modalidades orais urbanas, comunidades rurais e agricultura, música e canção

folclórica, métodos de trabalho, história operária, acontecimentos políticos muito recentes,

historia social de um período, o lazer na história da família etc. (THOMPSON, 1992).

Faz-se apelo aos testemunhos para fortalecer ou debilitar, mas também para completar, o que

se sabe de um evento do qual já se está informado de alguma forma, embora muitas

circunstâncias permaneçam obscuras (HALBWACHS, 1990, p.25). O mais das vezes, o papel

da evidência oral é menos sensacional, é complementar ou suplementar na reinterpretação de

documentos e no preenchimento de suas lacunas e fraquezas (THOMPSON, 1992, p.177).

Além disso, a capacidade de fazer conexões entre esferas distintas da vida constitui uma força

intrínseca da história oral no desenvolvimento da interpretação histórica (THOMPSON, 1992,

p.327).

História oral é uma história do “tempo presente”, também reconhecida como “história viva”.

(MEIHY, 2005, p.17). E é nessa perspectiva que se trabalha a possibilidade de se construir

“histórias” da comunidade de Paranapiacaba, através de um restabelecer da voz de pessoas do

local, tendo como base as suas narrativas.

A história oral pode ser feita a partir de: 1) uma pessoa; 2) um grupo definido de pessoas; ou

3) um conjunto grande de entrevistados. Qualquer uma das três opções implica que se

considerem as justificativas das escolhas (MEIHY, 2005, p.79).

Partiu-se, como primeiro passo da preparação do depoimento de história oral, para a escolha

de critérios para definição dos potenciais entrevistados. Tais critérios são múltiplos, referindo-

se à participação ativa no processo histórico pesquisado ou à condição de não participante no


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processo, mas de ser importante testemunha dele (DELGADO, 2006, p.25). Seguiu-se a

orientação de Delgado (2006, p.25): associar o plano de amostragem à imagem de um tronco

com múltiplos galhos. Ou seja, pessoas-chave foram nucleares e serviram como referência

para seleção dos demais entrevistados. Thompson (1992, p.173-4) orienta, sobre esse ponto,

que a questão não é de representatividade, mas de quem sabe mais, como comenta.

Assim sendo, dentre os membros da comunidade, a partir da entrevista do ponto zero, foram

identificados atores que pudessem contribuir com dados subsidiários às analises propostas.

Buscaram-se moradores ou pessoas que tivessem morado em Paranapiacaba, mas que ainda

mantêm vínculos, familiares ou de trabalho, na localidade. Além disso, procurou-se

compreender a visão dos que têm (ou tenham tido) relação de trabalho com a ferrovia, bem

como familiares dessas pessoas. Isso fez com que fosse possível incluir tanto homens (5)

quanto mulheres (4).

Após a realização de oito entrevistas (além da entrevista do ponto zero), verificou-se a

relevância de se entrevistar um morador relativamente novo (há cerca de oito anos em

Paranapiacaba). Isto se deu, pois ele foi indicado por vários entrevistados como sendo uma

fonte importante para o que esta pesquisa buscava compreender. Foi, então, coletado o relato

dessa pessoa, considerada “importante testemunha” do processo analisado2.

A aplicação do roteiro (ver Apêndice) nas entrevistas não foi feita de forma rígida, uma vez

que muitas questões surgiram naturalmente no discurso do depoente no transcurso da

entrevista e, essas às vezes, suscitaram outras. Cada entrevista teve a sua própria dinâmica, e

cada entrevistado mostrou diferentes visões na abordagem de determinadas questões. É

preciso esclarecer que o roteiro tinha caráter temático e não se restringia à trajetória de vida

dos entrevistados (FREITAS, 2006, p.89).

2
Conforme defendido por Delgado (2006, p.25).
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As histórias orais temáticas buscam responder a questões muito mais definidas, e, portanto, a

participação do interlocutor é mais objetiva (MEIHY, 2005, p.134-5). Com essa abordagem, a

entrevista é mais direcionada para um assunto específico, e é realizada com um grupo de

pessoas. Dessa maneira, os depoimentos podem ser mais numerosos, resultando em maiores

quantidades de informações, o que permite uma comparação entre eles, apontando

divergências, convergências e evidências de uma memória coletiva, por exemplo (FREITAS,

2006, p.22).

Ressalta-se que, durante a coleta dos relatos, em alguns momentos, o gravador foi desligado,

em consenso com o entrevistado. Ainda assim, trechos que pudessem causar algum tipo de

constrangimento para a pessoa, foram citados nesta tese sem a identificação da fonte. O total

das entrevistas gerou 96 páginas transcritas. Para a elaboração do texto final, foi feita uma

seleção dos trechos mais representativos desses relatos. Estes foram agrupados em quatro

categorias: A vida em Paranapiacaba; Trabalho; Lazer e cultura; Turismo.

Através da coletânea de narrativas, buscou-se construir uma história oral sobre a vida em

Paranapiacaba, tendo em especial foco as mudanças ocorridas com a inserção da atividade

turística na vila. Vícios de linguagem, erros de gramática, palavras repetidas foram, nas

narrativas apresentadas neste trabalho, corrigidos, conforme recomenda Meihy (2005, p.183).

A evidência oral foi tratada como fonte de informações a partir da qual se organizou um texto

expositivo. Isso exigiu o uso de citações curtas, comparando a evidência de uma entrevista

com a de outra, e associada à evidencia proveniente de outras fontes. Categorias de

codificação foram criadas, a fim de viabilizar o trabalho de análise e organização sistemática

do produto textual.

De forma a completar as apreciações realizadas sobre a localidade, desenvolveu-se uma

leitura ambiental, apoiada em Lynch, especialmente, e outros autores referenciais

apresentados no capítulo anterior, que pesquisam a paisagem.


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O capítulo seguinte traz os resultados do trabalho, abordando a vila ferroviária de

Paranapiacaba e suas especificidades. Nele, apresentam-se as entrevistas realizadas, a análise

da paisagem e a reflexão sobre os documentos (Plano Diretor e Lei da ZEIPP), balizadas pelas

categorias e propostas de análise definidas, bem como as reflexões que delas resultaram.

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