A Construção Do Feminino Na Literatura
A Construção Do Feminino Na Literatura
A Construção Do Feminino Na Literatura
DIFERENÇA
1
Doutoranda e Mestre pelo Programa de Pós- Graduação em Letras (PLE), pela Universidade
Estadual de Maringá (UEM), na linha de pesquisa Literatura e Construção de Identidades.
Integrante do grupo de pesquisa LAFEB – Literatura de Autoria Feminina Brasileira e do Grupo
de Estudos em Literatura Brasileira Contemporânea. E-mail:[email protected].
de classe alta. A marginalização, repressão e/ou exclusão de determinados grupos
sociais, étnicos e sexuais como mulheres, “não brancos” e “membros de segmentos
menos favorecidos da pirâmide social” (REIS, 1992, p.73) do universo da Literatura
encontra aí sua motivação.
Tradicionalmente, as mulheres foram consideradas como inferiores aos
indivíduos do sexo masculino, não só na esfera cultural, mas também na social,
histórica e política. Um estado de coisas gerado pela política do patriarcalismo, cuja
ênfase estava em questionar a capacidade intelectual da mulher, neutraliza-lhe a
cidadania e seu direito de se constituir como sujeito. No campo literário e cultural a
experiência feminina sempre vista de forma não valorativa justifica o surgimento, em
meados do século XX, de ações no sentido de conscientizar os indivíduos da
necessidade de desconstruir a opressão e a marginalização da mulher – construída ao
longo da história. Isto é o que se chama de feminismo, um movimento político, social e
filosófico que pregava a igualdade social entre os sexos, com o intento de eliminar
qualquer dominação sexista e de transformar a sociedade (BONNICI, 2007, p. 86).
Do mesmo modo, a crítica literária feminista, surgida nos Estados Unidos e na
Europa a partir dos anos 1960 e 1970, alavanca o processo de desconstrução dos
padrões literários existentes, calcados em ideologias de gênero. As mulheres, até então
silenciadas e marginalizadas, foram impulsionadas a emancipar-se no campo literário e
a lançar questionamentos sobre os discursos hegemônicos, desnudando-lhes o modo de
funcionamento, desmascarando os processos de naturalização das diferenças
hierarquizadas de gênero e, consequentemente, problematizando o cânone literário
estabelecido. Contudo, como aponta Lúcia Zolin (2007), essas conquistas obtidas por
meio do movimento feminista não garantem a igualdade almejada pelas mulheres entre
os sexos, mas, promovem um novo modo de se fazer literatura, a partir da perspectiva
da mulher, quase sempre, feminista.
2
Palestra Pouvoirs et limites de la notion de representation proferida pelo professor Roger
Chartier em 7 de maio de 2010 no Colloque franco-allemand “Representation/ Darstellung”,
realizado pelo Institut Historique Allemand de Paris. Posteriormente traduzida e publicada como
Defesa e ilustração da noção de representação, traduzida por André Dioney Fonseca e Eduardo
de Melo Salgueiro.
3
Questões devidamente levadas em conta na abordagem das teorias sobre cultura e ideologia
que serão tratadas no capitulo seguinte.
respondem e se reconfiguram diante dos discursos ideológicos de poder proferidos pela
sociedade.
Cabe salientar ainda que o poder e o discurso se relacionam intrinsecamente e
contribuem de modo significativo para os estudos voltados à representação do indivíduo
por meio da linguagem. Conforme Foucault (2009), pelo discurso proferido é que o
indivíduo terá sua identidade construída e representada. Deve-se ter em mente que,
como as práticas discursivas são permeadas por relações de poder, o discurso será
automaticamente tomado como um dos meios mais eficazes de dominação e,
consequentemente, tornar-se-á responsável pelas diretrizes de funcionamento da
sociedade. Neste sentido, é a partir do discurso proferido, imbuído de um sistema de
valores ideológicos de uma dada sociedade, que o indivíduo vitimado pelas amarras
sociais passará a agir, aceitar e, consequentemente, desempenhar a representação
lançada em sua identidade e em seu corpo. Entende-se, portanto, que através dos
modelos simbólicos engendrados pelos discursos ideológico-culturais se estabelecem
meios de controle e organização do comportamento do indivíduo na sociedade, os quais
se refletem automaticamente em sua representação social.
Sociologicamente, a teoria da representação se interessa justamente, como
ressalta Pierre Bourdieu (2007, p. 447), em compreender o modo como os indivíduos,
no interior de seus grupos sociais, interpretam, constroem e representam suas
experiências no mundo em que estão inseridos e, portanto, sua realidade social. Afirma
Chartier (1990, p.17) que o principal objetivo da história cultural é “identificar o modo
como em diferentes lugares e momentos uma determinada realidade social é construída,
pensada, dada a ler”, e é nestes contextos que as representações sociais se inserem.
É por meio da própria representação que são assinaladas e refletidas as relações
do indivíduo com o mundo social. As representações são consideradas variáveis e
determinadas pelos discursos dos grupos sociais que as instituem, nos quais relações de
poder e dominação estão constantemente presentes. Nesse sentido, Chartier (2011)
entende que a representação dos modelos simbólicos produzidos pelos discursos de
poder é lançada nas identidades por meio de práticas e signos, contribuindo para o
reconhecimento de uma identidade social, um status simbolicamente circunscrito, em
grande parte institucionalizado pelos indivíduos dentro de determinado contexto social.
Assim, observa-se que por intermédio da representação são promovidas divisões e
hierarquizações sociais em que se percebe, legitima e reproduz uma dada realidade.
1.2 A REPRESENTAÇÃO DA IMAGEM FEMININA NA LITERATURA
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
FOUCAULT, Michel. Isto não é um cachimbo. Trad. Jorge Coli. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 2002.
FOUCAULT, Michel. A arqueologia do saber. Trad. Luiz Felipe Baeta Neves. 7ª ed.
Rio
de Janeiro: Forense Universitária, 2009.
GINZBURG, Carlo. Olhos de Madeira. Nove Reflexões sobre a Distância. São Paulo:
Cia das Letras, 2001.
GONÇALVES, Ana Maria. Um defeito de cor. – 7 ed. – Rio de Janeiro: Record, 2011.
MACHADO, Ana Maria. A audácia dessa mulher. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
1999.
REIS, Roberto. Canôn. In: JOBIM, José Luis (Org.). Palavras de crítica: tendências e
conceitos no estudo da literatura. Rio de Janeiro: Imago, 1992. p. 65-92.