O Combate Ao Discurso de Odio Nas Redes Sociais
O Combate Ao Discurso de Odio Nas Redes Sociais
O Combate Ao Discurso de Odio Nas Redes Sociais
Araranguá
2018
José Adelmo Becker Nandi
Universidade Federal de Santa Catarina
Centro de Ciências, Tecnologia e Saúde
Tecnologias da Informação e Comunicação
José Adelmo Becker Nandi
Araranguá
2018
Dedico este trabalho a minha família, amigos e a todas as pessoas
que contribuíram de alguma forma para meu crescimento pessoal.
AGRADECIMENTOS
Figura 1: Domicílios com acesso à internet em regiões do mundo e no Brasil (2008 - 2016)...
.................................................................................................................................................. 29
Figura 2: Usuários de internet em países desenvolvidos e em desenvolvimento (2008 – 2016)
.................................................................................................................................................. 30
Figura 3: Usuários de internet, por área, região, sexo, grau de instrução e faixa etária (2016)
................................................................................................................................................. .31
Figura 4: Usuários de internet, por dispositivo utilizado de forma exclusiva ou simultânea
(2016) ....................................................................................................................................... 32
Figura 5: Usuários de internet, por atividades realizadas na internet (2015 – 2016) ............... 36
Figura 6: Intensidade do discurso ............................................................................................. 39
Figura 7: Alcance do discurso .................................................................................................. 39
Figura 8: Número de atendimentos para vítimas (Por ano 2007 - 2017) ................................. 40
Figura 9: Número de atendimentos por assunto (2017) ........................................................... 41
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AD - Análise do Discurso
ARPA - Advanced Research Projects Agency
CGI.br - Comitê Gestor da Internet no Brasil
IP - Internet Protocol
LGBTs - Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros
PIDCP - Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos
SDH - Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República
TCP - Transmission Control Protocol
UE - União Europeia
WWW - Word Wide Web
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 13
2 METODOLOGIA .................................................................................................... 16
REFERÊNCIAS .........................................................................................................54
13
1 INTRODUÇÃO
1.1 PROBLEMA
1.2 JUSTIFICATIVA
O discurso de ódio afeta de forma direta e indireta a vida das pessoas por sua
repercussão. Como as redes sociais fazem parte do cotidiano das pessoas e por serem
mobilizadoras de ideias, por vezes, originando movimentos políticos e sociais que modificam
a vida política do Estado e da sociedade. É necessário entender esse discurso em um amplo
contexto, pois é um assunto que engloba várias áreas do conhecimento como o direito, a
psicologia, as ciências sociais, a tecnologia entre outras. As redes sociais se tornaram um mural
público para a expressão e expansão desse tipo de discurso. Casos de extremismo e intolerância
estão cada vez mais em evidência e com apoio massivo nas redes com repercussões reais.
1.3 OBJETIVOS
Para atingir o objetivo geral é necessário passar por algumas etapas, que se expressam
nos seguintes objetivos específicos:
2 METODOLOGIA
Durante muito tempo os cientistas delimitaram seu objeto de estudo aos fenômenos da
natureza, tentando explicá-los. Entretanto a partir da metade do século XIX, homem e a
sociedade transformados por inovações nas áreas da tecnologia e da política, passaram a
necessitar de uma concepção científica no campo social, era preciso entender as relações entre
os homens (GIL, 2008).
Gil (2008) defende que as pesquisas nas áreas das ciências sociais têm diferenças
importantes quanto as da ciência da natureza e da biologia, principalmente quanto a:
objetividade, quantificação, experimentação, generalização. Os fatos sociais não podem ser
tratados como coisas absolutas, pois são produzidos por seres que estão em constante mudança
de comportamento e pensamento. A incapacidade de transformação dos fenômenos a serem
pesquisados tornam a experimentação difícil de aplicar, e por fim, enquanto as ciências naturais
porventura conduzem ao estabelecimento de leis, as das ciências sociais conduzem a
identificação de tendências.
A pesquisa busca satisfazer o desejo de ampliar o conhecimento acadêmico acerca dos
temas abordados na graduação e os fenômenos sociais. Através de uma pesquisa exploratória a
qual Gil (2008, p.17) define como:
Para apresentar um panorama global sobre os conceitos que estão envoltos no discurso
de ódio nas redes sociais e quais medidas estão sendo tomadas para combatê-lo, foi utilizado
como procedimento de exploração a pesquisa bibliográfica e documental, as quais segundo Gil
(2008) diferenciam-se por suas fontes, enquanto na primeira parte de materiais científicos já
publicados como artigos e livros, na segunda os materiais ainda não receberam um tratamento
analítico, são exemplos, reportagens de jornal, fotos, filmes, relatórios de empresas, entre
outros. Como vantagem a pesquisa bibliográfica apresenta ao investigador averiguar outros
fenômenos mais amplos relacionados ao tema central de seu estudo.
Assim, foi estruturada a pesquisa da seguinte maneira: Primeiro, fragmentando os
conceitos em “Discurso”, “Ódio”, “Discurso de Ódio” e “Redes Sociais”, permitindo criar uma
17
3.1 O DISCURSO
Como o intuito de expressar uma ideia, uma opinião ou até um sentimento, as pessoas
recorrem às formas de comunicação escrita, falada ou artística. Dentre as ferramentas de
comunicação que tem a capacidade de motivar e representar as pessoas pelo seu conteúdo e
forma está o discurso. Ele possui diferentes formatos e objetivos, pode ser um discurso
proferido através da dança, da música, de um texto, de uma palestra, pode ser um discurso
político, educacional, motivador ou até mesmo com propósitos maldosos como o de ódio.
Algumas definições para a palavra discurso: de forma geral “uma fala proferida para o
público”, para a filosofia “Exposição de raciocínio que se desenvolve de modo sequencial e que
vai de uma conceituação a outra, de acordo com uma concatenação lógica” e para a linguística
“Comunicação oral ou escrita que pressupõe um locutor e um interlocutor” (DISCURSO,
2018).
O discurso como ferramenta de comunicação converte-se em um agente modificador,
ele pode tanto modificar o ambiente em que está inserido, como também definir ou redefinir a
relação entre locutor e ouvinte. Conforme Fairclough (2001, p. 91) "Implica ser o discurso um
modo de ação, uma forma em que as pessoas podem agir sobre o mundo e especialmente sobre
os outros, como também um modo de representação".
Na história mundial discursos memoráveis que retrataram os pensamentos e
comportamentos da sociedade na época, mostram sua capacidade transformadora e inspiradora
para o bem ou para o mau, dentre alguns deles está o de Adolf Hitler em 1933 quando tomou
posse como Chanceler da Alemanha dando início a implementação dos ideais nazistas, o de
Mahatma Gandhi em 1942 sugerindo a desobediência civil sem violência para libertar a Índia
do controle britânico e o de Martin Luther King em 1963 intitulado “I Have a Dream” o qual
defende os direitos civis dos negros. Mais do que apenas palavras ou expressões artísticas que
projetam algum significado, o discurso possui uma carga de representatividade social-histórica
como defende Brasil (2011, p. 177) “O discurso implica uma exterioridade à língua, pois se
prontifica no social, inscreve-se na história”.
Segundo Orlandi (2007, p. 296):
[...] o fato de que a linguagem, com sua materialidade, funciona como uma
mediação necessária entre o sujeito e a realidade natural e social. A linguagem
19
é, nesse sentido, um trabalho, uma prática. O que ela tem de específico, é que
ela é um trabalho simbólico. E como tal, ela exerce sua ação transformadora
enquanto mediação entre o sujeito e a realidade.
Para entender o discurso além de sua estrutura linguística surgiu um novo campo de
estudo em formação: a Análise do Discurso (AD). No final dos anos 1960, Michel Pêcheux
(1938 - 1983) propôs a teoria da análise de discurso. Nos seus estudos Pêcheux trouxe uma
abordagem diferente para a Ciência da Linguagem, onde o estruturalismo - que negava o sujeito
e a situação - e a gramática eram o foco das discussões. Pêcheux com a AD surge como
contraponto ao formalismo complexo da linguagem, que assim deixa de ser vista apenas como
um conjunto de regras formais. Sobre a linguagem age o exterior, o simbólico (BRASIL, 2011).
A AD é uma corrente de estudo que está em vários campos, seja na linguística, na
sociologia, ou na filosofia. Propõe relacionar o campo da língua com o campo da ciência social.
Busca responder internamente, o que este texto diz? Como ele diz? E externamente, por que
este texto diz o que ele diz? (GREGOLIN, 1995).
Assim o discurso deixa de ser visto como uma construção de frase a frase, elas passam
a ser interpretadas em novo contexto onde as palavras não são fechadas em si mesmas, mas
carregam a ideologia do sujeito, o que está em seu inconsciente (BRASIL, 2011). Essa ideologia
define Gregolin (1995, p.17) como:
3.2 O ÓDIO
Nelson Mandela em sua autobiografia Long Walk to Freedom (1995, p. 493) escreveu
“Ninguém nasce odiando outro pela cor de sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião.
Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, elas podem ser ensinadas
a amar”. Para Mandela o ódio deriva de uma construção social, é como o ser humano é educado
a lidar com as diferenças do outro. Em uma visão menos romântica, em sua obra “O Discurso
do Ódio” André Glucksmann (2007, p.11) afirma:
[...] o ódio existe, todos nós já nos deparamos com ele, tanto na escala
microscópica dos indivíduos como no cerne de coletividades gigantescas. A
paixão por agredir e aniquilar não se deixa iludir pelas magias da palavra. As
razões atribuídas ao ódio nada mais são do que circunstâncias favoráveis,
simples ocasiões, raramente ausentes, de liberar a vontade de simplesmente
destruir.
Como seria bom para nós, se o ódio não nos habitasse, se não estivesse em
nós, se ele não nos tivesse construído. O que acontece é que ele nos concerne,
sim, eventualmente, na medida em que podemos ser objeto ou vítima dele;
que deveríamos reconhecer que ele existe, sim, e, infelizmente, que nós não
podemos impedi-lo de existir. E, se ele estivesse em outro lugar, no outro,
próximo ou muito longe, pouco importaria, mas não dentro das nossas
próprias muralhas, não na nossa própria cidade, não alojado em nosso próprio
corpo!
21
No campo da psicanálise, Freud defende que as enfermidades psíquicas têm relação com
as exigências civilizatórias. A sociedade é a origem do mal-estar. Esse mal-estar na nossa
civilização, é gerado pelos laços sociais entre os homens, é o maior empecilho a satisfação
individual (SILVA; MIRANDA, 2015). Mal-estar para Freud são tensões geradas pelo embate
de princípios que variam de acordo com a história e são inerentes ao campo social. O mal-estar
social atinge os laços sociais entre os homens motivando a agressividade sadicamente dirigida
ao outro ou a si mesmo (SILVA; MIRANDA, 2015). Ainda segundo Silva e Miranda (2015)
Freud considera que os laços sociais entre os homens são permeados e estruturados pelo o que
ele classifica como Eros - O Amor, Anankê - a necessidade e Tânatos - a agressividade.
O ódio pode ser um sentimento mutável de acordo com a situação, Peixoto Junior (1999)
apresenta duas classificações de ódio: o passional ou expressivo e o formal ou instrumental. O
ódio passional é uma mistura de sentimentos, de raiva, abandono, injustiça, e surge de uma
conjuntura que amplificam a repulsa ao outro, o alvo mesmo sem culpa, torna-se a origem do
mal. É uma forma de a pessoas extravasar seus sentimentos devido a sua situação de miséria
pessoal. Entretanto tende a diminuir caso consiga romper as barreiras que lhe afligem e tenha
suas demandas atendidas. O ódio instrumental por sua vez, é um ódio tomado de ideologia, ele
é estruturado e tem atuação política, busca exterminar de forma efetiva seus alvos, e perpetuar-
se na coletividade. Torna-se motor para ações cruéis, como exemplo, o nazismo que se tornou
uma ideologia de Estado posta em prática.
Desta forma o discurso pode ter a duas formas de prática, o ataque direto – insultar,
intimidar, ameaçar – ou a incitação a essas ações. O fato de incitar a ofensa às outras pessoas
pode ser tão prejudicial quanto um ato direto, pois cria um sentimento de “nós contra eles”, os
receptores desta mensagem que tem afinidade com o discurso odioso, podem sentirem-se
estimulados a perpetuar o discurso odioso e compartilhar a outras pessoas gerando uma cadeia
de informação de apoiadores e ao mesmo tempo de vítimas.
O simples pensar, mesmo que seja de algo imoral ou discriminatório não é crime e
condenável, é uma capacidade biológica do ser humano, e desde que as ideias fiquem apenas
na consciência, não há problemas. O discurso de ódio conforme Silva et al. (2011, p.447)
precisa ser externalizado pelo emissor para ser caracterizado como tal:
Os grupos alvos de discurso de ódio em sua maioria são os integrantes das minorias e
vulneráveis sociais e econômicos, como os negros, indígenas, homossexuais, mulheres e
23
minorias religiosas. Segundo Carmo (2016) as minorias podem ser definidas como a
fragmentação de um grupo majoritário por sua particularização que as afasta do suposto padrão
definido como normal. São geradas pela assimetria social, seja econômica, educacional, cultural
e etc. Sendo diferentes do "normal" as minorias estão expostas a violência, tanto física, quanto
simbólica, na forma de discriminação, rejeição, marginalização e indiferença.
O discurso de ódio também tem como objetivo frear a aspirações políticas e a busca de
direitos pelas minorias, através da sua ofensividade. Ele tenta cercear o público e o acesso das
minorias no compartilhamento de ideias que são a base na formação dos indivíduos, influindo
na personalidade e no comportamento do cidadão (CARCARÁ, 2017).
Contextua Baptista (1999, p. 46):
Quando um discurso de ódio é proferido ele tentar intimidar a vítima suprir algum
direito, o qual o emissor com toda sua superioridade acredita que a vítima não mereça ter os
mesmos direitos que possui. O supremacista não vê o outro como detentor de direitos iguais. O
discurso de ódio tem viés político. O objetivo é excluir da vida pública as vítimas.
A existência do ódio é algo real e a sua capacidade de transformar a sociedade depende
de como ele é divulgado. O discurso de ódio é uma forma especial de sua propagação e o meio
informacional tem relevância estrutural no atual contexto histórico (SANTOS; SILVA, 2013).
Toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui
a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e
transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de
fronteiras.
1
Foi um parlamentar, filósofo e economista britânico defensor dos debates políticos sem censura, e autor de livros
sobre a liberdade dos indivíduos.
25
“Na maioria dos sistemas constitucionais, tecer ideologias não constitui crime,
posto que as constituições garantem a liberdade de consciência e de ideologia.
[...] no entanto, alguns sistemas jurídicos criminalizam o discurso de ódio,
como o alemão e o francês, por entender que apesar de ele não levar
necessariamente ao cometimento de uma ação ilegal, de uma ação racista ou
xenofóbica, pode levar a uma preparação ou uma predisposição para que elas
venham a se consumar.”
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de
comunicação, independentemente de censura ou licença;
Após a redemocratização era necessário garantir este direito, visto que foi cerceado
devido a repressão pela Ditadura Militar (1964-1985). No mesmo artigo em que protege a
Liberdade de Expressão (5º) está posto nos seguintes incisos que:
Assim busca combater a quem pretenda proferir ataques contra os direitos e liberdades
26
dos integrantes da sociedade. Destaque para a prática de racismo, na Lei nº 7.716/1989, que
manifesta:
4 CONTEXTO ATUAL
4.1 A INTERNET
Agora havia uma interface gráfica para o uso da internet, onde um clique sobre um link2,
que poderia ser um texto, uma imagem, levava a outra página. As informações estavam
interconectadas.
Com a popularização da Internet, começou um processo de mudança na sociedade e na
economia. As relações sociais, o acesso à informação, o intercâmbio de culturas, a globalização
do conhecimento, praticamente todas as relações foram afetadas direta ou indiretamente. Agora
a rede é um mediador das relações.
Em sua última pesquisa intitulada “TIC Domicílios: Pesquisa Sobre o Uso das
Tecnologias da Informação e Comunicação nos Domicílios Brasileiros 2016” o Comitê Gestor
da Internet no Brasil (CGI.br) apresentou alguns dados interessantes.
Conforme a pesquisa no ano de 2016 54% dos domicílios brasileiros estava conectado
à internet, constituindo um total de 36,7 milhões de residências. Entretanto os domicílios com
acesso estão predominantemente em áreas urbanas (59%), e são pertencentes economicamente
pelas classes A (98%) e B (91%).
Revela a pesquisa que 93% dos usuários de Internet utilizaram o celular como
ferramenta de acesso e entre as atividades que mais foram efetuadas no período online foram
para a troca de mensagens (89%) e uso de redes sociais (78%).
A Figura 1 mostra que o os domicílios com acesso à internet vêm crescendo no mundo
todo. A Europa em 2008 apresentava 58% dos domicílios com internet, em 2016 82%, porém
nos últimos anos apresenta um acréscimo lento tendendo a se estabilizar. O Brasil cresce de
forma rápida, em 2008 apresentava apenas 18% em 2016 54%. Comparando os intervalos de
2008-2016 entre a Europa que possui o maior percentual e o Brasil, nesse período o Brasil teve
um crescimento superior contando com 36% contra 24%. De acordo com a Figura 1 é possível
também notar a discrepância entre as regiões analisadas e o continente africano onde os
domicílios com acesso à internet está abaixo de 20%.
2
LINK (2018): “INFORM: No contexto da hipermídia e do hipertexto, endereço que aparece em destaque
(geralmente sublinhado ou apresentado em uma cor diferente) e que, a um clique no mouse, permite a conexão
com outro site.”
29
Figura 1: Domicílios com acesso à internet em regiões do mundo e no Brasil (2008 - 2016)
Dentre os 61% de usuários da internet no Brasil, a Figura 3 identifica que 95% têm grau
de instrução superior. É formada majoritariamente por jovens. Está equilibrada entre os gêneros
e entre as regiões do país, menos de 10% de diferença, apresentando o Nordeste com o menor
percentual 50%.
31
Figura 3: Usuários de internet, por área, região, sexo, grau de instrução e faixa etária (2016)
Para acessar a internet existem vários dispositivos, pode ser o telefone celular, o
computador, a televisão ou até mesmo aparelho de videogame. A figura 4 mostra que a maior
parte dos usuários internet está acessando a internet com diversos aparelhos de forma
simultânea sendo o computador e o celular os principais. A classe D e E são as que mais utilizam
apenas o celular (76%) juntamente com os que têm graus de instrução mínimos ou analfabetos
(77%). A classe C apresenta resultados medianos, sendo que 46% utilizam computador e
celular, e outros 46% utilizam apenas o celular. Numa leitura geral do gráfico é possível
constatar que o acesso pelo celular é o mais crescente entre todas as definições de pesquisa.
32
Figura 4: Usuários de internet, por dispositivo utilizado de forma exclusiva ou simultânea (2016)
Novas expressões surgiram para categorizar esse novo arranjo social proporcionado
pelo advento de novas tecnologias na vida das pessoas, alguns autores falam em Sociedade da
Informação, outros em Sociedade em Rede, e outros falam do surgimento de um novo espaço
cultural, o Ciberespaço. Contudo todos têm o mesmo coeficiente em comum a internet e a
informação.
A expressão de Sociedade da Informação, veio para definir o novo paradigma técnico-
econômico pós-revolução industrial. Os insumos de energia que eram a chave na sociedade
industrial são substituídos pela informação. Informação essa que pelos avanços tecnológicos
como as novas formas de mídia, a evolução da comunicação com o surgimento da internet,
formam a base para essa nova sociedade (WERTHEIN, 2000).
Na sociedade da informação, os impactos da revolução tecnológica afetam as ações dos
indivíduos que buscam nas mídias modernas, alternativas para novas formas de expressão.
33
Assim, grupos em busca de espaço público para manifestar suas ideias passam a encontrar no
espaço virtual uma alternativa. (PITTA, 2008).
Lévy (1999) conceitua o ciberespaço como um o novo meio de comunicação, incluindo
toda a informação armazenada e toda infraestrutura material proporcionada pela rede mundial
de computadores. Englobando os seres humanos que alimentam este universo, assim como a as
atitudes e modos de pensamento que se desenvolvem em conjunto com o ciberespaço.
Castells (1999) defende que a sociedade em rede constitui um novo momento histórico
que é a base para todas as relações que se estabelecem a partir da informação e da sua
capacidade de processamento e geração de conhecimento. Para o autor, mesmo respeitando as
diferenças históricas, contextos e culturas dos diversos países, a sociedade em rede é uma
sociedade derivada do capitalismo.
A interação face a face não diminuiu devido a transformação da sociabilidade
proporcionada pelas redes, segundo Castells e Cardoso (2005) ela até mesmo aumentou. A
sociedade em rede é hipersocial, não de isolamento. As pessoas integraram as tecnologias as
suas vidas, a realidade virtual anda em conjunto com a vida real, as várias formas de
comunicação andam articuladas.
Castells e Cardoso (2005) defendem que a internet pode ser um meio de (re)construção
das estruturas sociais, através de projetos autônomos das pessoas, ou de grupos definidos.
Utilizando a internet como meio para diferenciação das mídias de massa, a internet passa a ser
uma ferramenta de construção de projetos que modificam a sociedade.
A interação seria a matéria prima das relações e dos laços sociais. Parsons e
Shill (1975) explicam que a interação compreende sempre o alter e o ego como
elementos fundamentais, onde um constitui-se em elemento de orientação para
o outro. A ação de um depende da reação do outro, e há orientação com relação
às expectativas. Essas ações podem ser coordenadas através, por exemplo, da
34
Conforme Lomnitz (2009) a rede social não é definida como grupos específicos e
limitados, mas sim um conjunto de relações complexas em um espaço social determinado. A
autora ainda afirma que “Cada pessoa é o centro de uma rede de solidariedade e, ao mesmo
tempo, é parte de outras redes” (LOMNISTZ, p. 18, 2009).
Lévy (1996) acrescenta que com a Internet e as novas comunicações há um processo de
virtualização das coisas, entretanto o virtual não é algo novo, ele acompanha a história da
humanidade. O virtual segundo Lévy (1996) é o que está no campo das significações, dos
sentidos, é aquilo que tem potencial de existir, faz contraponto ao atual, não ao real como
comumente posto. Virtualizar não é a desrealização, não há perca de sua realidade. Conforme
Lévy (1996), virtualizar uma entidade qualquer é modificar sua natureza atual, o modo que ela
se estabelece hoje, para uma nova problemática que é solucionada através da atualização. A
atualização é o oposto da virtualização, a primeira busca soluções, a segunda, cria novas
questões.
Nesse contexto as redes sociais virtuais são sistemas que através de meios reais tangíveis
como computadores, linhas de transmissão, e toda a infraestrutura física, formam um lugar
virtual de relações que estão em constante mudança de comportamento, levantando novas
questões, se atualizando. Apesar das redes sociais virtuais e as relações entre os nós, não se
encontrarem no plano físico, estarem no campo "virtual", não quer dizer que não são reais.
A partir da virtualização Lévy (1996) conceitua o “efeito Moebius” causado por ela, que
seria, além da perda de territorialidade do espaço físico - está em todo lugar e ao mesmo tempo
em lugar nenhum - há a perda de limite entre o público e privado, exterior e interior, objetivo e
subjetivo, e assim por diante. Nas redes sociais virtuais, o efeito Moebius pode ser visto como,
ter um perfil em que o manuseio se dá na privacidade do lar, entretanto podendo transformar o
espaço privado (lar) em espaço público (interação com a rede). O inverso também ocorre.
Os sites de redes sociais como Facebook, Twitter, Youtube, são alguns exemplos do tipo
de apresentação de rede social mais utilizada pelos usuários da internet atualmente. Entretanto
eles não podem ser classificados como uma rede social propriamente dita, eles são considerados
35
sistemas para que os atores sociais (usuários) possam gerar suas próprias redes. Podemos
compartilhar da ideia de Recuero (2009, p.102, apud BOYD e ELLISON, 2007):
sites de redes sociais foram definidos por Boyd & Ellison (2007) como aqueles
sistemas que permitem
i) a construção de uma persona através de um perfil ou
página pessoal;
ii) a interação através de comentários; e
iii) a exposição pública da rede social de cada ator.
Conforme Recuero (2009) os sites de redes sociais podem ser classificados em dois
tipos: aqueles apropriados e aqueles estruturados. Os sites de redes sociais apropriados são os
que não tiveram no seu desenvolvimento o objetivo de se tornar uma rede social, entretanto os
usuários ao utilizarem os sites converteram eles para esse objetivo através dos espaços pessoais
e perfis, como exemplo, Twitter, weblogs, Youtube. Os sites estruturados são os focados na
exibição dos perfis e publicações dos autores para o público das redes conectadas a eles, como
exemplo, Facebook e Linkedin.
Mesmo com essas classificações distintas fica claro os objetivos dos participantes que
independente da estrutura dos sites a serem utilizados eles querem mostrar a sua individualidade
de alguma forma, seja explicitando através dos sites estruturados, ou de forma personalizada
pelos sites apropriados. É interessante salientar como observa a Recuero (2009) que os sites de
redes sociais não necessariamente são estruturas independentes entre si, pois muitos usuários
têm conta de perfil em diversos sites ao mesmo tempo e com objetivos distintos muitas vezes.
Segundo Recuero (2009) as interações realizadas no ciberespaço têm certas
particularidades que as diferenciam de uma interação face a face devido a serem feitas por
mediação de um computador, então certas características como a expressão não verbal do
comunicante e interpretação do contexto da informação se perdem. Outra particularidade
destacada refere-se de ferramentas distintas que a comunicação mediada pelo computador
oferece para gerar a interação, como por exemplo, uma interação assíncrona, onde uma
mensagem é enviada para um receptor em determinado momento e ele pode não receber naquele
instante por estar offline ou optar por responder em outra hora.
36
As atividades as quais as pessoas mais dedicam parte de seu tempo online tem relação
com as redes sociais e suas ferramentas. Conforme a Figura 5 a troca de mensagens é o recurso
mais utilizado pelos usuários de internet, em seguida vem o uso das redes sociais, em quarto
compartilhar os conteúdos que são mostrados na internet. A interação social se apresenta como
parte do maior consumo de tempo online dos usuários.
As interações entre os atores nas redes sociais influenciam as relações da rede, benéfica
ou maleficamente. Recuero (2009) sustenta que nas redes sociais as maneiras como essas
relações podem aparecer são classificadas em cooperação, competição e conflito.
O processo de cooperação se dá ao criar as estruturas sociais da rede, é uma maneira de
agir de forma organizada, são ações coletivas do grupo que compõe a rede. A competição é
caracterizada pela disputa entre os atores, entretanto sem a presença de ódio ou relação violenta.
O conflito por sua vez, é um aprofundamento da competição saudável, é a ruptura da estrutura
social gerado pela hostilidade e com características violentas (RECUERO, 2009).
Recuero (2009) salienta:
O discurso de ódio é o conflito em si. Expor mensagens odiosas nas redes sociais contra
as minorias: LGBTs (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros),
mulheres, negros, índios entre outras socialmente reprimidas, cria uma ruptura na rede e nas
relações entre os atores.
Atualmente a internet e por consequência as redes sociais são os principais meios para
propagar o discurso de ódio. Os usuários através de seus perfis podem expor suas ideias,
sentimentos, criar informação ou compartilhar informações com os nós da sua rede. Ativistas
do ódio utilizam dessa ferramenta para compartilhar seu discurso.
Segundo Santos e Silva (2013, p.3):
Pelas considerações de Castells, é relevante perceber que o ser humano por si já tem um
padrão de individualidade, mas não de isolamento, a internet e as redes sociais apenas oferecem
o suporte e o aparato físico para reforçar esse padrão social.
Segundo Santos e Silva (2013) o preconceito exposto através do discurso proferido na
rede social é frequentemente visto como brincadeira, dificultando um posicionamento
contrário, pois a adesão é mais estimulada que o contraditório. São piadas estereotipadas sobre
as características físicas ou comportamentais das minorias que estão enraizados na sociedade,
exigindo um forte debate argumentativo e reflexão.
Nas redes sociais o anonimato amplia a sensação de que não haverá consequência para
as ações feitas na rede. Muitos perfis que buscam destilar o discurso de ódio são os chamados:
fakes3, eles são criados na rede com informações falsas, buscando não serem reconhecidos.
O anonimato nas redes permite ao usuário que compartilha o discurso de ódio ser um
“amolador de faca”, um agente que atua nas “sombras” perpetuando a violência cotidiana,
Baptista (1999, p. 46) em A Cidade dos Sábios contextualiza:
O fio da faca que esquarteja, ou o tiro certeiro nos olhos, possui alguns aliados,
agentes sem rostos que preparam o solo para esses sinistros atos. Sem cara ou
personalidade, podem ser encontrados em discursos, textos, falas, modos de
viver, modos de pensar que circulam entre famílias, jornalistas, prefeitos,
artistas, padres, psicanalistas etc. Destituídos de aparente crueldade, tais
aliados amolam a faca e enfraquecem a vítima, reduzindo-a a pobre coitado,
cúmplice do ato, carente de cuidado, fraco e estranho a nós, estranho a uma
condição humana plenamente viva. Os amoladores de facas, à semelhança dos
cortadores de membros, fragmentam a violência da cotidianidade, remetendo-
a a particularidades, casos individuais. Estranhamento e individualidades são
alguns dos produtos desses agentes. Onde estão os amoladores de facas?
O discurso de ódio na rede social tem certos tons que podem ir aumentando de acordo
com as palavras usadas para exprimir sua rejeição ao outro (KEEN; GEORGESCU, 2016).
Pode ser algo sutil sem aparente dano, até algo que choca pelo emprego de palavras que incitam
a violência física ou a prática de atos de ódio contra determinado grupo ou pessoa.
3
Palavra de origem inglesa, plural de fake, que significa “dar a aparência de algo real, mas que não é ou pode ser
a cópia de algo com a intenção de que as pessoas pensem que é real” (FAKE, 2018). Nas redes sociais um “perfil
fake” é o termo usado para denominar contas ou perfis usados na Internet para ocultar a identidade real de um
usuário. Para isso, são usadas identidades de famosos, cantores, personagens de filme ou até mesmo outras
pessoas anônimas.
39
O tom utilizado geralmente varia de acordo com a exposição do autor do discurso, caso
esteja usando um perfil anônimo ou fake, tende a ser mais agressivo.
O discurso de ódio torna-se extremamente perigoso quanto maior for sua audiência. A
internet como meio de propagação de informação com alto poder de alcance aos mais diferentes
públicos funciona como potencializador da disseminação e da continuidade deste tipo de
discurso. Grupos extremistas se valem das redes sociais para espalharem suas ideias para a
comunicação Mainstream4. Criando notícias falsas, misturando fatos verídicos com inverdades,
elas são divulgadas em fóruns e blogs que conforme geram repercussão são reproduzidas em
sites mais populares até atingirem as redes sociais e por fim geram uma discussão nacional. 5
4
“Aquilo considerado normal, que tem aceitação da maioria das pessoas” (MAINSTREAM, 2018).
5
KLEIN, Adam G.. Como o ódio online se infiltra nas redes sociais e na política. 2017. Disponível em:
<https://www.huffpostbrasil.com/2017/09/03/como-o-odio-online-se-infiltra-nas-redes-sociais-e-na-
politica_a_23159234/>. Acesso em: 31 mar. 2018.
40
Pelo conceito de vitimização difusa abordado por Silva, uma postagem de internet pode
afetar incontáveis vítimas que se identificam com o objeto alvo de ódio do discurso, mesmo
que elas não estejam diretamente relacionadas ao fato ou com a vítima direta.
No Brasil, assim como no mundo, o discurso de ódio vem aumentando conforme os
usuários começam a notificar e denunciar como mostra alguns indicadores da SaferNet (2018)
Através da Figura 8 é possível notar que os atendimentos aos internautas que pedem
ajuda vêm crescendo a partir de 2013.
41
O ambiente virtual das redes sociais propicia a sensação de que o que acontece na rede
não tem repercussão no mundo real, assim os seus usuários sentem-se livres para postar
qualquer informação ou ideia sem pensar. Entretanto não é bem assim que acontece, governos,
grupos civis, e políticos começaram a mobilizar-se para criar políticas de controle de postagens
de cunho ofensivo.
O discurso de ódio causador do efeito de perpetuação da discriminação contra minorias
é uma prática condenável socialmente. Nas redes sociais ele toma maior projeção pois é de
amplo alcance e pode ecoar através de apoiadores. Portanto seu combate deve ser feito para que
a rede seja um ambiente livre e democrático.
A União Europeia (UE) através de seus países membros e de sua representação tomou
a dianteira nesse combate. A Alemanha, por exemplo, através de seu parlamento aprovou em
30 de junho de 2017 uma lei para o combate das notícias falsas (fake news) e do discurso de
ódio. 6 É interessante lembrar que a Alemanha se tornou o principal destino dos refugiados do
oriente médio, devido ao Estado Islâmico e a Guerra na Síria. Recebendo milhares de pessoas
refugiadas, como consequência os comentários de ódio e xenófobos cresceram
exponencialmente nas redes sociais, o que atentou às autoridades. A lei ficou conhecida por lá
como a Lei do Facebook, ela determina que as empresas Facebook, Twitter e YouTube por
exemplo, tem um prazo de até 24 horas para a exclusão de um post denunciado na rede que fira
diretamente a lei alemã. Em caso de não cumprimento as empresas pagarão multas. A lei entrou
em vigor em 1 de janeiro de 2018.
A França que teve como lema na Revolução Francesa a “Liberdade, Igualdade e
Fraternidade” e que por consequência é considerada modelo em respeito e igualdade de direitos,
também sofre com as consequências do aumento do discurso de ódio nas redes. Visto como um
país democrático, que abriga diversos estrangeiros de diferentes culturas, etnias e religião, a
França é alvo de atos desestabilizadores, como atentados terroristas que buscam espalhar o
medo entre sua população e criar um ambiente nocivo onde o discurso de ódio encontra
ressonância para se propagar. Para fortalecer e manter o famoso lema da revolução, o primeiro
6
PARLAMENTO alemão aprova lei de combate ao discurso de ódio na internet. 2017. Disponível em:
<http://p.dw.com/p/2fhWZ>. Acesso em: 10 abr. 2018.
43
ministro da Francês, Edouard Philippe, anunciou que pretende apresentar medidas que auxiliam
no combate ao ódio nas redes. Entre algumas medidas estão: aumentar a responsabilidade das
operadoras de Internet, aumentar o efetivo operacional para realizar investigação e
monitoramento das redes sociais e em plano mais amplo fazer a capacitação de juízes e setores
da Educação para lidar com esses novos desafios.7
Constituída por 27 países, dentre eles, Alemanha, França e Espanha, a UE através da
sua secretaria administrativa - Comissão Europeia - formulou em 2016, um manual de código
de conduta para as empresas combaterem o discurso de ódio na rede. Dentre as empresas que
ratificaram esse documento, estão Facebook, Twitter, Microsoft e Youtube. Esse código prevê
dentre outras coisas: 8
7
FRANÇA anuncia medidas contra discurso de ódio nas redes sociais. 2018. Disponível em:
<http://operamundi.uol.com.br/conteudo/geral/49041/franca+anuncia+medidas+contra+discurso+de+odio+nas
+redes+sociais.shtml>. Acesso em: 10 abr. 2018.
8
G1. Facebook, Microsoft, Google e Twitter se unem para barrar discurso de ódio. 2016. Disponível em:
<http://g1.globo.com/tecnologia/noticia/2016/05/facebook-microsoft-google-e-twitter-se-unem-para-barrar-
discurso-de-odio.html>. Acesso em: 10 abr. 2018.
9
BOURBON, Maria João. Facebook, Twitter, Youtube e Microsoft baniram da internet 70% dos discursos
de ódio desde 2016. 2018. Disponível em: <http://expresso.sapo.pt/economia/2018-01-19-Facebook-Twitter-
Youtube-e-Microsoft-baniram-da-internet-70-dos-discursos-de-odio-desde-2016#gs.2UzECPE>. Acesso em:
20 abr. 2018.
44
6.1.1 No Brasil
Estabelece que os provedores de internet não são responsáveis por qualquer conduta
criminosa, incluindo o discurso de ódio, por parte de seus usuários. Ficando sujeitos a penas
cabíveis se não cumprirem decisões judiciais relativas a tal conteúdo. O que é classificado
10
Agência Senado. Publicadas duas leis para combate à violência contra a mulher. 2018. Disponível em:
<https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2018/04/04/publicadas-duas-leis-para-combate-a-violencia
contra-a-mulher>. Acesso em: 20 abr. 2018.
45
como impróprio ou não, cabe a justiça decidir. Entretanto o mesmo artigo não impede que o
provedor diante de situação adversa tome iniciativa própria e modere os conteúdos presentes
em seus serviços.
6.2.1 Facebook
Segundo o Facebook (2018) em seu site de ajuda, eles respondem à pergunta “O que o
Facebook considera discurso de ódio?”:
Conteúdos que ataquem pessoas com base em sua raça, etnia, nacionalidade,
religião, sexo, gênero ou identidade de gênero, orientação sexual, deficiência
ou doença, sejam elas reais ou presumidas, não são permitidos. No entanto,
permitimos tentativas claras de piadas ou sátiras que não tenham caráter de
ameaças ou ataques. Isso inclui conteúdo que muitas pessoas possam
considerar de mau gosto (por exemplo, piadas, comédia stand-up, certas letras
de músicas populares etc.).
Em sua resposta a empresa deixa claro que é passível de punição em seus serviços
apenas discursos que contenham uma ofensa direta, explícita. Dificultando assim a punição do
discurso que é feito nas entrelinhas, inserido dentro de uma piada, de uma charge ou em uma
música.
O Facebook trabalha com um método onde a própria comunidade faz as denúncias a
empresa, caso a pessoa veja algum conteúdo que ela ache ofensivo, que fira os “Padrões da
11
G1. Unilever ameaça cortar anúncios de Facebook e Google. 2018. Disponível em:
<https://g1.globo.com/economia/midia-e-marketing/noticia/unilever-ameaca-cortar-anuncios-de-facebook-e-
google.ghtml>. Acesso em: 15 mar. 2018.
46
Comunidade” definidos, a denúncia passa por uma avaliação e pode ser acolhida ou rejeitada.
Para promover o debate saudável entre diferentes ideias, o Facebook (2018) pede que
caso a pessoa compartilhe algum discurso de ódio para a conscientização que ela deixe claro
isso em sua postagem “indiquem claramente seus objetivos, o que nos ajuda a compreender
melhor por que compartilharam aquele conteúdo”.
Segundo o vice-presidente de política pública do Facebook Richard Allan “Para definir
um discurso de ódio, o Facebook leva em conta o contexto e a possível intenção por trás de
quem o profere“, sendo assim é analisado o contexto da mensagem, por exemplo, quem é o
emissor, quais são suas relações sociais, os aspectos culturais do indivíduo, a intenção que o
emissor busca atingir e qual o objetivo em desferir tal mensagem.12
Em uma palestra a diretora operacional da empresa, Sheryl Sandberg comentou que o
Facebook está investindo em inteligência artificial e na contratação de até 20.000 pessoas até o
fim do ano para identificar e remover conteúdo nocivo, incluindo discursos de ódio e promoção
do terrorismo.13
6.2.2 Twitter
O Twitter recebe muitas críticas por sua falta de ação em casos de discurso de ódio ou
posicionamentos extremos exaltando a violência. A plataforma tomou uma decisão polêmica
em 2017 ao tornar a conta do neonazista americano Jason Kessler como “verificada”. Esse
“atributo” a conta, permite que o perfil tenha um alcance maior aos usuários da comunidade,
tornando mais relevantes suas postagens. Jason Kessler foi o organizador da parada neonazista
em Charlottesville, na Virgínia, onde centenas de homens e mulheres brancos saíram às ruas
carregando tochas, declarando palavras de ordem contra negros, imigrantes, gays e judeus.14
As críticas a verificação da conta de Kessler foi tanta que o Twitter revisou suas políticas
de combate ao ódio na sua plataforma. Na sua política o Twitter (2018):
12
CIRIACO, Douglas. Facebook define o que é e como combater o discurso de ódio na rede social. 2017.
Disponível em: <https://www.tecmundo.com.br/facebook/118386-facebook-define-combate-discurso-
odio.htm>. Acesso em: 04 abr. 2018.
13
AGÊNCIA O GLOBO. Facebook vai ‘fazer mais’ para limitar abusos na internet. Disponível em:
<https://epocanegocios.globo.com/Empresa/noticia/2018/01/facebook-vai-fazer-mais-para-limitar-abusos-na-
internet.html>. Acesso em: 04 abr. 2018.
14
SENRA, Ricardo. 'Sou nazista, sim': o protesto da extrema-direita dos EUA contra negros, imigrantes,
gays e judeus. 2017. Disponível em: <http://www.bbc.com/portuguese/internacional-40910927>. Acesso em:
04 abr. 2018.
47
6.2.3 Instagram
É possível notar que ela possui uma forma mais branda de política contra o discurso de
ódio, não dando ênfase a proteção de grupos considerados minorias e permitindo que pessoas
da mídia possam emitir mensagens que possam ser consideradas mais agressivas.
48
6.2.4 YouTube
Fazer um vídeo sobre suas ideias, seu cotidiano, criar entretenimento e postar na internet
para que outras pessoas possam ver, compartilhar e comentar é o que proporciona o YouTube.
Na plataforma é possível criar um canal virtual para falar sobre qualquer coisa, seja o
socialmente aceito ou politicamente incorreto.
Nas suas políticas de uso da plataforma o YouTube (2018) caracteriza o discurso de
ódio como:
Para brecar a disseminação de discursos que não ferem explicitamente sua política
contra o discurso de ódio, o YouTube reduzirá os recursos de alguns vídeos classificados como
potencialmente nocivos, como bloquear a caixa de comentários, torná-los menos relevantes
diminuindo seu alcance e também retirar a monetização do vídeo, desestimulando o criador a
continuar essa temática.15
15
CIRIACO, Douglas. Google começa a fechar o cerco contra vídeos ofensivos no YouTube. 2017. Disponível
em: <https://www.tecmundo.com.br/internet/121305-google-comeca-fechar-cerco-videos-ofensivos-
youtube.htm?f&utm_source=facebook.com&utm_medium=referral&utm_campaign=thumb>. Acesso em: 04
abr. 2018.
49
O analista para inteligência artificial da revista MIT Technology Review16, Will Knight,
em seu artigo descreve três tópicos os quais IA encontra dificuldade na identificação do discurso
de ódio. Primeiro, a IA consegue identificar as estruturas gramaticais da escrita, entretanto
pecam em entender semântica das frases, os sistemas teriam que ter conhecimento de senso-
comum, algo que os humanos ainda não conseguem replicar em uma máquina. Segundo, o
avanço da tecnologia é para os dois lados, tanto para quem combate o discurso de ódio, como
para quem quer propagar, portanto haverá tentativas de burlar a IA. Terceiro, os vídeos, que são
feitos de forma manipulada tornam ainda mais difíceis de a IA capturar a mensagem de ódio
embutida neles. 17
Pesquisas aplicando a IA para identificar o discurso de ódio como, por exemplo, a
elaborada por Davidson et al. (2017), tiveram resultados insatisfatórios. Para a elaboração da
pesquisa foram coletadas mensagens com palavras-chave de ódio, e classificadas em três
categorias: discurso de ódio, linguagem ofensiva, e nenhum do dois. Foi então criado um
sistema, que treinado deveria fazer a distinção entre essas três categorias. Conforme os
resultados apresentados a inteligência artificial têm dificuldade em entender a complexidade
léxica da linguagem, entender as nuances e ambiguidades das palavras e diferenciá-las de outros
discursos.
Em um outro estudo Saleem et al. (2016), em vez de palavras chaves, foram coletados
os termos em fóruns voltados ao discurso de ódio, com o objetivo de a inteligência artificial
aprender como o discurso de ódio era construído e estruturado nas frases. Nesse sentido os
resultados apresentados foram mais promissores do que pesquisas com palavras-chave, contudo
ainda demonstrando a dificuldade da IA em identificar e classificar as frases de acordo com seu
conteúdo.
16
Fundada pelo Massachusetts Institute of Technology em 1899.
17
KNIGHT, Will. Three problems with Facebook’s plan to kill hate speech using AI. 2018. Disponível em:
<https://www.technologyreview.com/s/610860/three-problems-with-facebooks-plan-to-kill-hate-speech-
using-ai/>. Acesso em: 10 maio 2018.
50
- Sensibilizar os jovens a respeito dos discursos de ódio e dos riscos que deles
decorrem.
- Promover a educação sobre os meios de comunicação e a internet.
- Apoiar os jovens que defendam o respeito pelos direitos humanos online e
offline.
- Reduzir a aceitação dos discursos de ódio online.
- Mobilizar e formar jovens ativistas pelos direitos humanos.
- Monitorizar os discursos de ódio online e desenvolver ferramentas para
respostas construtivas.
- Apoiar e demonstrar solidariedade a pessoas e/ou grupos que são alvo de
discursos de ódio online.
- Desenvolver campanhas para que haja consenso nas políticas europeias sobre
o combate aos discursos de ódio.
- Estimular a participação dos jovens e a cidadania online.
É formado por voluntários que tem interesse na campanha e são de diversos países, não
necessariamente delimitados a Europa. Dentre suas atividades está a de publicar materiais
educativos como o “REFERÊNCIAS: Manual para o combate contra o discurso de ódio online
através da Educação para os Direitos Humanos”, com conteúdo de atividades preparados para
estudantes de 13 a 18 anos que por ventura podem se deparar com o discurso de ódio online.
No Brasil a SaferNet Brasil é a maior representante na análise e monitoramento de
crimes cibernéticos no país. É uma associação civil de direito privado, sem fins lucrativos,
fundada em 2005, com o intuito de tornar a Internet em um ambiente ético e responsável onde
as pessoas possam exercer plena cidadania com segurança e liberdade. A SaferNet conta
também com um sistema de recebimento de denúncias anônimas sobre crimes e violações
contra os Direitos Humanos na Internet através Central Nacional de Denúncias de Crimes
Cibernéticos operada em parceria com os Ministérios Públicos e a Secretaria de Direitos
Humanos da Presidência da República (SDH)19.
Além de receber denúncias a SaferNet possui um canal de comunicação em seu site
chamado “helpline” onde vítimas de crimes cibernéticos ou internautas que se sentem atingidos
por eventual crime podem contar com apoio de profissionais para buscar orientações acerca dos
problemas que os atingem através de chat ou e-mail. Essa ajuda converte-se em números que
18
OBJETIVOS DA CAMPANHA. Disponível em: <http://www.odionao.com.pt/>. Acesso em: 25 abr. 2018.
19
SAFERNET. O que fazemos. Disponível em: <http://new.safernet.org.br/content/o-que-fazemos>. Acesso em:
10 maio 2018.
51
transformados em estatísticas mostram como está a situação da rede, exemplos das Figuras 8 e
9.20
Contra o discurso de ódio a SaferNet lançou o projeto SaferLab, uma espécie de
concurso de projetos feitos por jovens que querem tornar a internet um lugar melhor para todos
através da produção de contra narrativas. Essa forma de argumentação visa desconstruir o
discurso odiento de forma a debater argumentos de forma saudável e sempre buscando não
censurar a outra parte, mas trazer a busca de igualdade a todos. 21
Empresas como o Facebook também tem grande interesse em campanhas educativas
que estimulem a rede ser um lugar sem ódio. Através de projetos de financiamentos eles dão
suporte a organizações não-governamentais que combatem publicações de cunho racista e
xenófobo acreditando na conscientização sobre essa prática.22
20
SAFERNET. Helpline. Disponível em: <http://new.safernet.org.br/helpline>. Acesso em: 10 maio 2018.
21
SAFERNET. Saferlab. Disponível em: <http://saferlab.org.br/>. Acesso em: 10 maio 2018.
22
PAUL CARREL. Sandberg: Hate speech 'has no place in our society' — Facebook cracks down on
extremist posts in Europe. 2018. Disponível em: <http://www.businessinsider.com/r-facebook-begins-
europe-wide-campaign-against-extremist-posts-2016-1>. Acesso em: 31 maio 2018.
52
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Através da pesquisa foi possível entender que o discurso de ódio proferido nas redes
sociais ultrapassa as fronteiras da rede de computadores tanto na sua origem quanto na sua
finalidade.
O ódio é algo que faz parte do ser humano, seja de forma consciente ou não. Ter
pensamento odioso ou sentimento repulsivo a determinado indivíduo ou grupo social, por si,
não constitui um discurso de ódio, pois não é tangível, o que só ocorre mediante a externalidade
desses sentimentos ou pensamentos em formas de ação, seja física, verbal, escrita ou qualquer
outra forma de linguagem explícita. É aí que entra o discurso. Sendo um método de expressão
o discurso é uma via para a externalidade do ódio. Por ele, modifica-se a sociedade, o mundo
real.
O discurso de ódio tem o objetivo de atingir minorias sociais para que não sejam vistas
com os mesmos direitos garantidos à maioria dominante do poder. Essas minorias tornam-se
vítimas de preconceito, discriminação, exclusão e, em alguns casos extremos, de violência
física. O discurso funciona como um vetor para essa violência, estimulando e replicando a
mensagem contra seus alvos para que abandonem o espaço do debate público, cerceando sua
representatividade.
Na internet através das redes sociais as ações de ódio estão alcançando uma visibilidade
cada vez maior. Que por um lado pode ser boa, pois amplia o debate de ideias, mas, por outro
lado, pode capitanear adeptos a compartilhar e apoiar esses ideais. Pessoas que muitas vezes
não tinham coragem de expor seu pensamento, começam a se reconhecer e formar grupos,
justamente com o propósito de compartilhar o ódio. Muitas coisas que acontecem nas redes
sociais são replicadas do mundo real e vice-versa. Um dos perigos do discurso de ódio é seus
reflexos no mundo real, principalmente em ideologias políticas e atos violentos. O discurso de
ódio deve ser combatido, porém ainda é difícil fazer isso de forma eficiente.
Os governos estão aprovando leis, mas elas têm resistência da sociedade, de alguns
setores políticos e empresariais, pois devem ser muito bem embasadas para que não reprima o
direito à liberdade de expressão. Também são muito mutáveis, dependo de diversos fatores
como contexto histórico e político, podendo em determinadas épocas avançar nas garantias
contra o discurso de ódio, como também a possibilidade de regredir essas garantias.
As empresas têm suas políticas contra o discurso de ódio, entretanto ainda ineficientes,
pois dependem dos usuários para fazer as denúncias e de moderadores para avaliar o conteúdo,
53
sendo caras e lentas para resolução dos casos. Além disso muitas vezes as empresas fazem vista
grossa para casos de ódio aplicando alguma medida apenas quando ganham grande repercussão
midiática.
A inteligência artificial que poderia ajudar, ainda apresenta dificuldades na identificação
do discurso por causa da complexa semântica linguística do ser humano, seria uma medida de
“longo-curto” prazo, pois a pesquisa para torná-la eficiente pode ser longa, porém quando a
tecnologia fazer-se aplicável promete apresentar resultados em curto prazo.
E por fim, a educação para o uso da rede apresenta-se como o melhor caminho no médio
e longo prazo, pois prepara as pessoas para reconhecer este tipo de situação e ajuda aos usuários
a treinar a empatia para que saibam respeitar o outro. Sempre com o objetivo de tornar as redes
um lugar livre e democrático respeitando a diversidade.
54
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grandes cidades. São Paulo: Summus, 1999. 129 p.
______. Lei nº 13642, de 03 de abril de 2018. Altera a Lei nº 10.446, de 8 de maio de 2002,
para acrescentar atribuição à Polícia Federal no que concerne à investigação de crimes
praticados por meio da rede mundial de computadores que difundam conteúdo
misógino, definidos como aqueles que propagam o ódio ou a aversão às mulheres.
Brasília, DF
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