Trabalho de Conclusão
Trabalho de Conclusão
Trabalho de Conclusão
ASPECTOS ANALÍTICO-INTERPRETATIVOS
E A ESTÉTICA ARMORIAL NO CONCERTINO EM LÁ
MAIOR PARA VIOLINO E ORQUESTRA DE CORDAS,
DE CLÓVIS PEREIRA
João Pessoa – PB
2010
1
ASPECTOS ANALÍTICO-INTERPRETATIVOS
E A ESTÉTICA ARMORIAL NO CONCERTINO EM LÁ
MAIOR PARA VIOLINO E ORQUESTRA DE CORDAS,
DE CLÓVIS PEREIRA
João Pessoa – PB
2010
2
AGRADECIMENTOS
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo abordar os aspectos históricos, estéticos e interpretativos do
Concertino em Lá Maior para Violino e Orquestra de Cordas (1996-2001), de Clóvis Pereira,
única obra armorial concertante para esse instrumento, bem como criar critérios
interpretativos através da análise da obra, dentro da perspectiva violinística. A estratégia
metodológica empregada consistiu na pesquisa documental e bibliográfica na Fundação
Joaquim Nabuco, na Biblioteca da Universidade Federal de Pernambuco e no acervo
particular do compositor, bem como entrevistas não diretivas e dirigidas a intérpretes e outros
pesquisadores. A análise da obra consistiu na observação dos processos técnico-
composicionais, no uso dos instrumentos e no correlacionamento dos argumentos e das
referências folclórico-populares como agentes do discurso musical do Concertino. As
hipóteses foram confirmadas e avaliadas empiricamente e os resultados demonstraram a
importância do estudo teórico em música e da consciência interpretativa para uma melhor
performance.
ABSTRACT
This research intends to study the historical, aesthetic, and interpretative aspects of Clóvis
Pereira’s Concertino in A Major for Violin and String Orchestra (1996-2001) – a unique
concertante work written for the violin in the armorial style. Thus, the main goal of this
dissertation is to offer interpretative ideas based on the analysis of the most important aspects
of this aesthetics. For this intent, we have done personal interviews with the composer,
performers and scholars. We have also done extensive research in the composer personal files
and archives, as well as at the Joaquim Nabuco’s Foundation and the Federal University of
Pernambuco libraries. The analysis of the piece was focused mainly on the observation of the
compositional process, besides the idiomatic use of the instrument and its relationships with
popular and folkloric references as agents of the musical style. The hypotheses were evaluated
and confirmed empirically, demonstrating the significance of theoretical study, and its relation
to interpretative issues, in the search for a better performance.
LISTA DE FIGURAS
Figura 3.48 Material cadencial (cadência, comp. 135 a 142) ................................................. 106
Figura 3.49 Reutilização do material cadencial (Terceiro Movimento, comp. 144)............. 107
Figura 3.50 Cadência tonal 1 (Primeiro Movimento, comp. 134 a 135) ................................ 108
Figura 3.51 Cadência tonal 2 (Primeiro Movimento, comp. 213 a 214) ............................... 109
Figura 3.52 Cadência tonal 3 (Primeiro Movimento, comp. 250 a 251) V-I (cadência
autêntica perfeita) ............................................................................................... 109
Figura 3.53 Cadência tonal 4 (Terceiro Movimento, comp. 95 e 96) .................................... 110
Figura 3.54 Cadência tonal 5 (Terceiro Movimento, comp. 142 e 143), V-I (cadência
autêntica perfeita) ............................................................................................... 110
Figura 3.55 Intervenção modal 1 (Primeiro Movimento, violinos I e II em Lá
nordestino, paralelismo, comp. 7 e 8) ................................................................ 110
Figura 3.56 Intervenção modal 2 (progressão dos bassi em Ré eólio, Primeiro
Movimento, comp. 45 e 46) ............................................................................... 111
Figura 3.57 Intervenção modal 3 (Primeiro Movimento, comp. 51 e 52, violas e
bassi em Si lócrio) .............................................................................................. 111
Figura 3.58 Intervenção modal 4 (Primeiro Movimento, comp. 75 a 77, solista em Dó
nordestino) .......................................................................................................... 111
Figura 3.59 Intervenção modal 5 (Primeiro Movimento, comp. 123 a 125, solista em
Fá sustenido mixolídio) ...................................................................................... 111
Figura 3.60 Intervenção modal 6 (Segundo Movimento, comp. 4 e 5, solista em Ré
mixolídio) ........................................................................................................... 112
Figura 3.61 Intervenção modal 7 (Segundo Movimento, comp. 27 e 28, solista e
primeiro violino em Ré lídio) ............................................................................. 112
Figura 3.62 Intervenção modal 8 (Segundo Movimento, comp. 37 a 40, solista
em Si dórico) ...................................................................................................... 112
Figura 3.63 Intervenção modal 9 (Terceiro Movimento, comp. 77, solista em
Ré nordestino) .................................................................................................... 112
Figura 3.64 Intervenção modal 10 (Terceiro Movimento, comp. 88, primeiros e segundos
violinos em Mi nordestino). ............................................................................... 112
Figura B.7 Capa do Programa do Concerto realizado pelo Conjunto Armorial de Câmera
de Pernambuco na Universidade Federal do Rio Grande do Sul em 5 de
junho de 1971, com a regência do compositor Clóvis Pereira..........................................137
LISTA DE TABELAS
abr. abril
AL Estado de Alagoas
BC Biblioteca Central
Cb. Contrabaixo
comp. compasso(s)
Coord. Coordenador
ed. edição
Ed. Editor(a)
f. folha(s)
il. ilustrações
jan. janeiro
jun. junho
mar. março
Mov. Movimento
n. nascido; número(s)
nov. novembro
Org. Organizador
out. outubro
p. página(s)
19
PB Estado da Paraíba
PE Estado de Pernambuco
Pno. piano
SE Estado de Sergipe
séc. século
set. setembro
s.n. Abreviação da locução latina sine nomine [= sem nome (do editor)]
v. veja; volume
V. Veja
Vc. Violoncelo
Vla. Viola
Vln. Violino
Vol. Volume
21
LISTA DE SÍMBOLOS
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 24
CONCLUSÃO........................................................................................................................ 121
INTRODUÇÃO
para o Programa de Pós-Graduação em Música da UFPB, pois foi com essa Universidade que,
na década de 1970, o Movimento Armorial estabeleceu parceria e recebeu, entre outros, o
compositor Clóvis Pereira como professor. Pretende-se, portanto, com esta pesquisa
contribuir com a área das práticas interpretativas, no intuito de
[...] buscar o ponto de equilíbrio entre produção artística e produção bibliográfica,
uma vez que devemos estabelecer níveis de excelência em execução instrumental e,
ao mesmo tempo, oferecer os fundamentos teóricos, técnicos e interpretativos
necessários para o desenvolvimento desta atividade. (AQUINO, 2003, p. 105).
Esta pesquisa tem como objetivo geral abordar aspectos históricos, estéticos e
interpretativos do Concertino para Violino e Orquestra de Cordas, de Clóvis Pereira, e como
objetivo específico criar critérios interpretativos através da análise da obra, dentro da
perspectiva violinística, esperando-se, dessa forma, oferecer estudos que contemplem a
música de um importante compositor brasileiro atuante na região Nordeste.
Foram adotadas as seguintes estratégias metodológicas: a fase inicial, exploratória, se
deu a partir da pesquisa documental e bibliográfica na Fundação Joaquim Nabuco (FUNDAJ),
na Biblioteca da Universidade Federal de Pernambuco e no acervo particular do compositor
Clóvis Pereira. Já a segunda fase, empírica, foi realizada através de entrevistas não diretivas,
dirigidas pessoalmente e via correio eletrônico. As informações colhidas foram cotejadas com
o material resultante da pesquisa bibliográfica e documental, viabilizando a análise acurada da
obra objeto desta pesquisa. A análise consistiu na observação dos processos composicionais,
dos aspectos técnicos envolvidos e dos instrumentos utilizados, e no correlacionamento dos
argumentos e das referências folclórico-populares como agentes do discurso musical do
Concertino. A etapa final consistiu em obter conclusões dentro de uma perspectiva analítica,
procurando contribuir com a prática interpretativa. Nessa etapa, procurou-se demonstrar a
importância do estudo teórico em música e da consciência interpretativa para uma melhor
performance, seja confirmando as hipóteses, seja avaliando empiricamente os resultados.
Dessa forma, o trabalho dividiu-se em três partes, nas quais os aspectos históricos, estéticos,
composicionais e técnico-interpretativos foram dispostos num único sentido: a busca por uma
melhor interpretação. No Capítulo 1, procurou-se situar o contexto sociocultural que
propiciou a criação do Movimento Armorial, bem como identificar suas fases históricas no
período de 1946 a 1976. No Capítulo 2, abordaram-se o processo da produção musical do
Movimento, os compositores fundadores, os artistas, as características das composições
armoriais e seus intérpretes. O Capítulo 3 apresenta a gênese composicional da obra, sua
27
CAPÍTULO 1
O MOVIMENTO ARMORIAL
A explicação do nome armorial foi legada ao público, pela primeira vez, quando do
lançamento oficial do Movimento, através do texto ‘Arte Armorial’. Suassuna
justifica a escolha do nome através de dois motivos. O primeiro é estético – a beleza
da própria palavra. O segundo liga-se à sua visão de que a heráldica, no Brasil, é
uma arte eminentemente popular, presente desde os ferros de marcar boi do sertão
nordestino, dos estandartes das mais diversas agremiações populares, até as
bandeiras e camisas dos clubes de futebol das grandes cidades brasileiras.
Aproximar-se dessa heráldica seria, então, aproximar-se de um espírito popular
brasileiro. (NEWTON JÚNIOR, 1999, p. 87).
Suassuna identifica a presença da heráldica nas bandeiras das cavalhadas, nas cores
vermelha e azul dos pastoris da zona rural e até nos estandartes das agremiações culturais
populares, como os maracatus, os cabocolinhos, os reisados e o bumba-meu-boi.
No programa de lançamento oficial do Movimento Armorial, em 1970, Suassuna
destaca como as diversas artes compartilhavam elementos de identificação entre o popular e o
erudito, constituindo a ideia de uma unidade que ele conceituou de Armorial.
Era a ligação com tudo isso que dava unidade ao meu trabalho de escritor, à pintura
de Francisco Brennand, ao romance de Maximiano Campos, à poesia de Deborah
Brennand, Janice Japiassu, Ângelo Monteiro e Marcus Accioly, à gravura de Gilvan
Samico, ao desenho de Fernando José Torres Barbosa, ao filme ‘A Compadecida’ de
George Jonas, à escultura de Fernando Lopes da Paz, a certas preocupações de
arquitetos como Reginaldo Esteves, José Luiz Menezes e Arthur Lima Cavalcanti,
todos nós procurando fincar os pés nas raízes barrocas e populares do sangue
nacional brasileiro. Nos quadros do grande Francisco Brennand certos frutos e
folhagens aparecem como selos ou brasões pintados no centro da tela, como se esta
fosse um enorme escudo de armas: o Caju vermelho ou amarelo é o fruto brasileiro
por excelência e é, portanto, a nossa insígnia vegetal brasileira, assim como a Onça é
o nosso animal heráldico mais característico. Foi assim, também, que nasceu a
Música armorial de Capiba, Clóvis Pereira, Jarbas Maciel, Guerra-Peixe, Cussy de
Almeida, Sebastião Vila-Nova e Generino Luna. Pronto! Já estava feito e está,
agora, explicado. A Arte Armorial-Popular Brasileira está na rua, à disposição dos
inimigos para os ataques e dos amigos para os incentivos e elogios. (SUASSUNA,
1970, p. 2).
1.2 Histórico
Em 1970, lançamos o movimento que tinha dois objetivos: o primeiro era dinamizar
as atividades do Departamento de Extensão Cultural, o segundo era de lutar contra o
processo de vulgarização e descaracterização da cultura brasileira. Processo esse que
estava recebendo um impulso muito grande nessa época por dois motivos: primeiro,
a desconfiança que o regime militar tinha em relação à cultura popular, e em
segundo lugar, o movimento tropicalista, que pretendia aproximar a cultura
brasileira, principalmente a música, das formas da música americana, massificada.
(SUASSUNA apud A MÚSICA..., 2004).
A integração da arte popular com a arte erudita, para Suassuna, não se dá na relação
de superioridade ou inferioridade, mas de respeito às diferenças, uma vez que ele considera a
arte popular como uma expressão do que o povo vê e sente. Em sua opinião, “a base da
cultura erudita vem das nossas tradições ibéricas. ‘E, ao ser reinterpretada por negros, índios e
mestiços, deu origem à cultura popular.’” (SUASSUNA apud VICTOR; LINS, 2007, p. 83).
A arte popular, desta forma, não é inferior ou superior à arte erudita; são categorias
diferentes, cada uma com seu valor próprio. Não é uma questão, também, deste ou
31
daquele artista querer ser popular ou erudito; é, como foi dito, uma questão de
formação. Um determinado artista que tenha formação erudita não poderá, mesmo
que queira, fazer arte popular. O que ele pode fazer é ligar-se de alguma maneira ao
popular, em busca de uma unidade nacional. Somente assim estará realizando uma
arte erudita brasileira, calcada nas raízes populares da nossa cultura. Para Suassuna,
a arte universal é aquela que se universaliza pela boa qualidade, e toda arte universal
é, acima de tudo, nacional. (NEWTON JÚNIOR, 1999, p. 103-104).
A Escola do Recife, por onde passaram intelectuais como Sílvio Romero, foi o
primeiro movimento saído de Pernambuco a defender ideais que podem ser
identificados com o romantismo, como a valorização da cultura popular e
_______________
1
“Primeiro movimento saído de Pernambuco a defender ideais que podem ser identificados com o romantismo,
como a valorização da cultura popular e preocupação com os elementos formadores de uma identidade
nacional”. (BRITO, 2005, p. 13).
2
“O Movimento de Cultura Popular do Recife compreendia a cultura popular como guardiã das tradições
brasileiras. Acreditavam que para a formação de uma cultura nacional era preciso um intercâmbio entre os
intelectuais (com a ciência e a técnica) e o povo (com o sentido autêntico do sentimento e das raízes
brasileiras).” (MORAES, 2000, p. 92).
3
Suassuna não concordava com as ideias do regionalismo defendidas pelas elites canavieiras, representadas, por
exemplo, pelo sociólogo Gilberto Freyre.
4
Atores sociais são pessoas, grupos ou instituições que exercem um papel histórico num determinado contexto.
“Um determinado indivíduo é um ator social quando ele representa algo para a sociedade (para o grupo, a classe,
o país), encarna uma ideia, uma reivindicação, um projeto, uma promessa, uma denúncia”. (SOUZA, 1993, p.
12).
33
A perda de poder econômico das elites pernambucanas foi crucial para o surgimento
de focos de aversão à modernidade, ressaltada pela valorização da cultura regional e
popular localizada no passado. Isto fica evidente em 1926 com o lançamento do
Manifesto Regionalista durante o Primeiro Congresso Regionalista no qual Gilberto
Freyre, seu idealizador, buscava se contrapor ao vanguardismo modernista da
Semana de 22 do Centro-Sul, defendendo veemente a cultura popular e as tradições.
Nesse Manifesto ele deixa explícito que o regionalismo seria o único caminho para
consolidar a unidade nacional e enfatiza o que ele considera como responsabilidade
histórica de Pernambuco, pela sua tradição, na condução deste processo.
(REZENDE apud BRITO, 2005, p. 86).
Era minha intenção fundar no Recife um amplo movimento cultural que resultasse
numa expressão cultural brasileira, corrigindo as falhas do Movimento Modernista
que ficara só na elite. Deflagrar um amplo movimento de Educação e Cultura com
raízes na grande massa brasileira e em todos os setores como Artes Plásticas, Teatro,
Música, Canto e Dança, congregando artistas, intelectuais, Governo e povo,
independentemente de cor política ou religiosa, interessados e animados na elevação
do nível cultural do povo e na educação do povo para a vida e para o trabalho. Para
isso, era preciso promover o ensino democratizado, pesquisar toda a criação popular
e suas manifestações, os costumes, os tipos, as reações, os hábitos, a maneira de ser
enfim, que caracteriza a gente brasileira, para desse intercâmbio surgir uma cultura
eminentemente brasileira. (HORA apud SANTOS, 1999, p. 196).
_______________
5
Disponível em: <http://www.arq.ufsc.br/arq5625/modulo2modernidade/manifestos/manifestoregionalista.htm>.
Acesso em: 11 jan. 2010.
34
Para desenvolver um laço mais estreito com o povo, o MCP realizou alguns eventos
como: plano de educação e cultura popular, programa de educação para adultos, com o
método Paulo Freire, realização institucionalizada de festas tradicionais, promoção de praças
de cultura, espetáculos teatrais e festivais. Mais tarde, Ariano Suassuna desliga-se do MCP,
pois não concordava com a forma de conceber e utilizar a elaboração artística condicionada a
uma forma política, criando posteriormente, mais especificamente na década de 1970, o
processo cultural que resultou no Movimento Armorial. (MORAES, 2000).
35
_______________
6
Foi também integrante da Orquestra Armorial e professor de Violino, Música de Câmara e Estética Musical na
Universidade Federal de Pernambuco. (SOLER, 1978, p. 17).
36
Ariano defendia na música uma ligação mais profunda com a música do povo,
visando uma recriação elaborada sem que ela levasse à perda ou o desconhecimento
das nossas raízes populares. Tal recriação, que transformasse os temas musicais
populares em música de câmara, música de concerto. O mestre Ariano, não sendo
um músico de formação, nos orientava com base na estética de outras áreas do
conhecimento universal que ele sabia e conhece profundamente. A recriação
admitida por Suassuna deveria basear a obra em alguma coisa de nossa região, do
nosso país. Desde rapaz, o pensamento de Ariano foi sempre marcado pela
incessante preocupação de fazer com que a música do povo brasileiro pudesse ser
recriada por nós, afastando do nosso trabalho as atuais influências externas, bastante
propagadas pela mídia radiofônica e televisada. Ariano sempre acreditou que os
grandes artistas e pensadores da humanidade tiveram suas obras universalizadas por
enfocarem as culturas de seus respectivos países e suas regiões.
_______________
10
A cultura de massa surge com os primeiros jornais. Outros exigem, para caracterizar essa cultura, além dos
jornais, a presença de produtos como o romance de folhetim – que destilava em episódios, e para amplo público,
uma arte fácil que servia de esquemas simplificadores para traçar um quadro da vida na época (mesma acusação
hoje feita às novelas de TV). (COELHO, 1980, p. 9). Theodor Adorno conheceu as primitivas expressões da
chamada cultura de massa ainda na Europa (UFA estúdios, Hugenberg Konzern, a febre jazzística). Durante as
primeiras décadas do século XX, houve um formidável avanço nas tecnologias de reprodução audiovisual. O
cinema, o rádio, os discos e outros meios começaram a modificar a relação dos homens com a cultura. O contato
com as obras de arte pouco a pouco foi se tornando motivo de prática cotidiana. Os costumes por sua vez
passavam por uma mudança, com o surgimento de uma vigorosa indústria da diversão. A leitura de revistas
tornara-se hábito corrente, e a veiculação de anúncios por toda a parte criava as bases de onde surgiria a futura
cultura de consumo. (RÜDIGER, 2004, p. 64-65).
39
Sobre essa época que antecedeu o Movimento, Clóvis Pereira11 declara que, em
1970, recebeu um telefonema de Jarbas Maciel convidando-o para participar de uma reunião
que iria ser realizada na casa de Cussy de Almeida (1936-2010). Nessa reunião, Suassuna
exporia um projeto musical já pensado há algum tempo, mas que pretendia discutir com todos
a melhor maneira de realizá-lo. Por não poder comprometer-se com os colegas devido aos
trabalhos artísticos que estava exercendo, Pereira agradeceu o convite e lamentou não
contribuir, naquele momento, com o importante projeto de Ariano Suassuna. Mas, nesse
mesmo ano de 1970, no mês de junho, o compositor Clóvis Pereira estava de férias da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, e o violinista Cussy de Almeida aproveitou-se
desse momento para convidá-lo novamente, o que o levou a trabalhar e participar dessas
reuniões até o lançamento oficial do Movimento. Esses encontros foram de grande relevância
para o surgimento da arte armorial, como declara o próprio Suassuna: “[...] foram as obras, as
criações artísticas e literárias, os encontros e as amizades entre os artistas que permitiram
definir a arte armorial.” (SANTOS, 1999, p. 21).
Ainda sobre a Arte Armorial, Newton Júnior, em seu ensaio apresentado ao
Departamento de Teoria da Arte e Expressão Artística, da Universidade Federal de
Pernambuco, para a conclusão de sua Pós-Graduação, com o título de Os Quixotes do Brasil –
O Real e o Sonho no Movimento Armorial, faz uma referência ao jornal Correio da Manhã,
do Rio de Janeiro, no dia 8 de setembro de 1971, onde Suassuna comenta:
A Arte Armorial Brasileira é aquela que tem como traço comum principal a ligação
com o espírito mágico dos ‘folhetos’ do Romanceiro Popular do Nordeste
(Literatura de Cordel), com a Música de viola, rabeca ou pífano que acompanha seus
‘cantares’, e com a Xilogravura que ilustra suas capas, assim como o espírito e a
forma das Artes e espetáculos populares com esse mesmo Romanceiro relacionados.
(SUASSUNA, 1974, p. 7).
_______________
11
Entrevista concedida à autora em 28 jun. 2008.
40
Idelette dos Santos (1999), ao relatar a origem dos artistas que participaram
efetivamente do Movimento, declara que todos eram nordestinos, ou, como dizia Suassuna,
nasceram quase todos no “coração do Nordeste”, expressão com que ele denominava os
estados vizinhos de Pernambuco, como Paraíba e Alagoas.
Nesse contexto, os artistas que tiveram maior relevância foram: Francisco Brennand
(n. 1927), Miguel dos Santos (n. 1944), Gilvan Samico (n. 1928), Ariano Suassuna (n. 1927),
Marcus Accioly (n. 1943), Jarbas Maciel, Cussy de Almeida, Clóvis Pereira, Capiba
[Lourenço da Fonseca Barbosa] (1904-1997), todos eles armorialistas, além do apoio de
_______________
12
Literatura de cordel é uma denominação dada em Portugal e difundida no Brasil, referente aos folhetos
impressos, compostos em todo o Nordeste e depois divulgados pelo Brasil. [...]. “No Brasil diz-se sempre
folhetos referindo-se a estas brochurinhas em versos. Em Portugal dizem ‘literatura de cordel’ porque os
livrinhos eram expostos à venda cavalgando um barbante, como ainda acontece em certos pontos do Brasil”.
Para Luís da Câmara Cascudo, “a característica da literatura de cordel é sua destinação gráfica, circulando em
opúsculos impressos, desde a segunda metade do século XIX”, não se conhecendo nada publicado anteriormente
a 1870. (CASCUDO, 2002, p. 332).
13
São muitos os poetas populares que escrevem e ilustram suas obras pela técnica da xilogravura, hoje
considerada, segundo José M. Luyten, “a verdadeira representação do espírito de cordel”. [...] Os gravadores
populares iam ilustrando os acontecimentos do cotidiano, os fatos do momento, as estórias relatadas nos
folhetos, com as personagens mais difundidas do ideário popular, como o Boi, o Demônio, Deus, os Anjos, o
Cangaço, atraindo as populações do Norte e Nordeste para a poesia de cordel. São muitos os poetas populares
que utilizam a xilogravura, técnica que da China passou a Inglaterra e Holanda, espalhando-se por toda a Europa,
inspirando artistas eruditos como Honoré Daumier, Gustave Doré, William Blake, Matisse, Picasso e muitos
pintores contemporâneos. (Ibid., p. 752).
41
Guerra-Peixe, que fora “o primeiro compositor brasileiro que teve preocupação com a música
nordestina, realizando várias pesquisas durante o período que passou em Recife.”
(NÓBREGA, 2000, p. 85).
Lancei mão de músicos como Jarbas Maciel e Clóvis Pereira, pedi apoio a dois
músicos mais antigos, mas que eu sabia que tinham [...] preocupações parecidas com
as minhas: Capiba e Guerra-Peixe. Então dentro dessa linha começamos as primeiras
composições partindo daquelas músicas que nós tínhamos gravado. (SUASSUNA,
[s.d.], p. 3).
Segundo Nóbrega (2000), outros dois músicos que aderiram ao Movimento foram
Marlos Nobre (n. 1939) e Camargo Guarnieri (1907-1993), embora não haja evidências
concretas de que eles tenham aderido efetivamente ao Movimento Armorial. Não se pode
dizer que eles aderiram, pois isso significaria dizer que defendiam um pressuposto ideológico
que nunca chegou a ser esboçado em registro publicado de ambos. A adesão é uma posição
mais efetiva que implica trabalhar com a estética de forma mais concreta, usando-a como
recurso idiomático. Sobre essa questão, Clóvis Pereira14 esclarece que “Camargo Guarnieri e
Marlos Nobre participaram do Movimento à distância, ou seja, a pedido de Suassuna, esses
dois compositores escreveram obras sob encomenda, obras específicas para um concerto ou
outro”.
No campo das artes, a música foi a que conseguiu maior repercussão no Movimento
Armorial, através da valorização de instrumentos musicais populares como, por exemplo, a
rabeca, a viola sertaneja e o pífano. Além da música, o Movimento também envolveu outros
campos das artes, já citados anteriormente, como expressão de um processo de resistência
cultural. A Música Armorial será abordada com mais detalhes no capítulo seguinte.
O Movimento Armorial abrangeu um período de cerca de trinta e cinco anos que
pode ser dividido em três fases, segundo Santos (1999):
• Fase Preparatória (1946 a 1969);
• Fase Experimental (1970 a 1975);
• Fase ‘Romançal’ (a partir de 1976).
a 1964, apareceram os movimentos nacionalistas pela cultura através dos centros populares de
cultura da União Nacional dos Estudantes (1954-1964) e dos movimentos de cultura popular.
A respeito dessa fase de preparação ou antecipação do Movimento Armorial, Carlos
Newton Júnior (1990) nos relata uma entrevista dada por Ariano Suassuna no Jornal do
Commercio (Recife) em 1975, em que declara:
Sem pretender, como alguns dos seus detratores, que Ariano Suassuna é o
movimento Armorial, deve-se reconhecer que o movimento só existe por ele e
graças a ele: não por se tornar um mestre ditatorial que comanda a criação dos
artistas, mas porque, ao identificar pontos comuns e tendências paralelas em artistas
e escritores, permitiu a sua reunião em torno de um centro, o movimento, e deu-lhes
os meios de realizar seus projetos e seus sonhos. Proporcionar aos artistas meios de
expressão transformou-se, a partir de 1969, numa preocupação constante de
Suassuna, o que o levou a aceitar cargos na administração universitária, mais tarde
na municipal, onde podia desempenhar esse papel de promotor e provocador – no
sentido positivo – da criação artística (SANTOS, 1999, p. 28).
_______________
15
Fundado em 1946 por Ariano Suassuna, Hermilo Borba Filho, Capiba, Aloísio Magalhães, entre outros, foi
transformado num lugar de experiências, descobertas e criações artísticas, onde o compromisso seria selado com
a cultura popular nordestina. (SANTOS, 1999).
44
perfeição a síntese do popular e do erudito. E toda obra teatral precisa ser popular.
(ANTUNES FILHO, 2006, p. 19).
Antunes Filho (2006) fala da importância da obra O Romance d’A Pedra do Reino,
de Suassuna, para a literatura brasileira. Ele também comenta sobre Quaderna, que é o herói
desse romance, comparando-o com Macunaíma e Policarpo Quaresma, além de ter sido o
responsável por adaptar essa obra aos palcos. Suassuna lançou o Romance d’A Pedra do
Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta em 1971, obra que estava sendo escrita desde
1958 e que esgotou em três edições sucessivas. Sobre essa obra, Bráulio Tavares (2007)
comenta que “é provavelmente o romance de toda a literatura brasileira que possui o maior
número de pontos de exclamação”. Na nota de apresentação do Romance, Rachel de Queiroz
declara:
Sobre a palavra escolhida por Suassuna para definir a terceira fase do Movimento,
Santos (1999) declara:
Após essa fase, o Movimento Armorial silenciou. Alguns autores como, por
exemplo, Adriana Victor e Juliana Lins (2007) afirmam que foi no dia 9 de agosto de 1981 a
provável data do fim do Movimento Armorial. É publicada no Diário de Pernambuco uma
carta intitulada de “Despedida”, feita por Ariano Suassuna, com a qual interrompe
temporariamente sua vida literária, transformando o Movimento em uma referência.
Estou até tentando conseguir um local que nem minha família saiba onde é, um
lugar que eu possa me defender, assim, contra cartas, livros, telefones, revistas e
televisões. A decisão está me custando muito, de modo que tenho o direito de pedir
que ela seja respeitada. Com a exceção da Universidade, o que eu tinha de dizer,
escrever ou fazer em público, já fiz. Basta de tanta grandeza. O resto é segredo, um
segredo entre mim e Deus. (SUASSUNA apud VICTOR; LINS, 2007, p. 111-112).
_______________
16
Site oficial de Ariano Suassuna. Disponível em: <http://www.arianosuassuna.com.br>. Acesso em: 02 out.
2009
47
2004 um documentário com depoimentos de diversos artistas a respeito dos trinta anos da
Música Armorial, intitulado “A Música Armorial: Do Experimental à Fase Arraial”,17 no qual
Suassuna aborda algumas dificuldades e resistências enfrentadas pelo Movimento Armorial:
_______________
17
O lançamento do documentário ocorreu no Recife em 18 out. 2004 no evento Armorial – movimento
preliminar dos 35 anos, que contou com a participação do próprio Ariano Suassuna. O vídeo foi 1.o lugar no
XII Festival de Vídeo de Teresina (2004) e foi também premiado no Cine PE 2005 como Melhor Vídeo Arte e
como Melhor Vídeo pelo Júri Popular. Disponível em: <http://curtadodia.blogspot.com/2009/11/musica-
armorial-do-experimental-fase.html>. Acesso em: 28 mar. 2010.
49
CAPÍTULO 2
A MÚSICA ARMORIAL
Com o propósito de elaborar uma música que utilizasse elementos da cultura popular
brasileira, encontra-se como representante principal o Movimento Nacionalista, que teve
Mário de Andrade como seu mais eminente mentor. Com proposta semelhante, porém de
abrangência mais regionalista, houve o Movimento Armorial no Nordeste brasileiro. Esse
Movimento, concebido por Ariano Suassuna em 1970, tinha como propósito a valorização da
cultura popular nordestina através dos vários campos das artes, como a pintura, o teatro, a
literatura, as artes plásticas e a música. Apesar de cada um desses Movimentos ter suas
características particulares, entende-se aqui que existem algumas semelhanças entre eles. Com
o propósito de demonstrar tais características, far-se-á aqui uma abordagem a partir da
primeira metade do século XX, mais precisamente a partir da Semana de Arte Moderna de
1922. A utilização de elementos da cultura popular musical foi provavelmente o ponto de
maior convergência dessas duas correntes. Santos (1999) oferece uma clara explanação da
importância da cultura popular na formação da identidade nacional:
Essa raiz, que serviria de base à pesquisa da expressão artística brasileira, deveria ser
cuidadosamente separada da “influência deletéria do urbanismo”, com sua tendência
à degradação popularesca e à influência estrangeira. (ANDRADE apud SQUEFF;
WISNIK, 2004, p. 131).
Em alguns círculos a música popular é tida como uma atividade artística de menor
valor. A esse respeito, Suassuna diz que “esta não é inferior ou superior à erudita, pois são
categorias diferentes e cada uma possui o seu valor”. Segundo Clóvis Pereira18, “Suassuna
defendia na música uma ligação mais profunda com a música do povo visando uma recriação
elaborada sem que a mesma levasse à perda ou o desconhecimento das nossas raízes
populares”. Complementando, Clóvis Pereira ainda declara:
O Movimento Armorial foi criado pelo escritor Ariano Suassuna e por ele era
capitaneado. Nós que trabalhávamos com ele, tomávamos parte em reuniões
semanais, patrocinadas pelo Departamento de Extensão da Universidade Federal de
Parnambuco – UFPE, a fim de discutirmos como melhor aproveitarmos os temas
musicais recolhidos da música-folk, que chegavam às nossas mãos através de
gravações em fitas magnéticas, ou em outras ocasiões, trabalhando ao vivo com
artistas do povo, do interior, quero dizer da Zona da Mata.
Segundo Nóbrega (2007), os artistas populares que contribuíram com essas pesquisas
realizadas pelos armorialistas eram os rabequeiros, violeiros e ternos de pífanos que Suassuna
trazia do interior, através do DEC, e que apresentavam temas nordestinos que eram gravados
e depois selecionados pelos pesquisadores. Em uma matéria de jornal citada pela mesma
pesquisadora, nessas reuniões realizadas pelos armorialistas, cada um teria um papel
importante na transcrição e recriação do material pesquisado:
_______________
18
Entrevista concedida à autora em 02 mar. 2010.
19
“No Brasil, é um somatório do romance português e do espanhol, a que os brasileiros acrescentaram suas
interpretações, resultando num romanceiro vasto, com características próprias”, comenta Hélio Galvão. [...]. O
romanceiro popular nordestino é um universo de poemas e canções que inclui desde a poesia improvisada dos
cantadores até a literatura de cordel e de tradição oral memorizada. (CASCUDO, 2002, p. 602).
51
_______________
20
Entrevista concedida à autora em 28 jun. 2008.
21
Cabocolinhos são grupos fantasiados de índios, que percorrem as ruas das cidades do Nordeste do Brasil nos
dias de carnaval, tocando pequenas flautas e pífanos. Com danças dramatizadas eles representam as lutas entre
caboclinhos e brancos, ao som do Tambor, Ganzá e Pife. É um folguedo popular que ainda se apresenta pelas
ruas da Paraíba e do Ceará. Embora pareçam danças de origem ou aculturação ameríndia, na realidade são de
influência africana, correspondendo ao Auto dos Congos, verdadeiros Reisados, que, juntamente com o Auto dos
Cabocolinhos, deram origem ao Guerreiro. Mas diferem nas personagens e nos trajes. (CASCUDO, 2002, p. 89).
22
Trata-se de uma marcha de ritmo sincopado, obsedante, violento e frenético, que é sua característica principal.
[...] O frevo é uma marcha, com divisão em binário e andamento semelhante ao da marchinha carioca, mais
pesada e barulhenta e com uma execução vigorosa e estridente de fanfarra. Nele o ritmo é tudo, a sua própria
essência, ao passo que na marchinha a predominância é melódica. (Ibid., p. 251).
23
Grupo carnavalesco pernambucano, com pequena orquestra de percussão, tambores, chocalhos, gonguê (agogô
dos candomblés baianos e das macumbas cariocas), que percorre as ruas cantando e dançando sem coreografia
especial. [...]. Diz-se sempre nação, sinônimo popular de grande grupo homogêneo, e os títulos têm sabor
primitivo: Nação de Porto Rico, Nação de Cambinda Velha, Nação do Elefante, Nação do Leão Coroado. (Ibid.,
p. 361).
24
Pife, pífano, pífaro, gaita, flautim: nomes que indicam instrumento de sopro, flauta vertical ou transversal de
bambu (ou de metal). Sem chaves, geralmente com seis orifícios. Os pifes são instrumentos coadjuvantes das
zabumbas (ou terno de zabumba) ou terno de pifes – típicos conjuntos instrumentais do Nordeste; dois ou três
pífanos e zabumba, podendo ter (ou não) caixas e pratos [...]. (DOS PIFES..., 2009).
25
Incelência é uma oração cantada nos velórios. Canto entoado à cabeça dos moribundos ou dos mortos,
cerimonial de velório, ainda existente na Paraíba, no Rio Grande do Norte e em Pernambuco, na Bahia e,
possivelmente, em outros estados. Cantam sem acompanhamento instrumental, em uníssono, em série de doze
versos ritualmente. (CASCUDO, 2002, p. 218).
53
Entre as várias observações agudas que ele alinha nesse trabalho, encontra-se a
suposição de que o caminho através do qual a Música árabe veio roçar com sua asa
de fogo os cantares do nosso Romanceiro, assim como os toques das nossas violas
e rabecas, teriam sido os judeus cristãos-novos que para cá vieram, trazendo nas
_______________
26
[...] o dionisíaco é trazido a nós, o mais perto possível pela experiência da embriaguez. Seja por experiência
da beberagem narcótica, da qual todos os povos e homens primitivos falam em seus hinos, ou com a poderosa
aproximação da primavera a impregnar toda a natureza de alegria, despertam aqueles transportes dionisíacos, por
cuja intensificação o subjetivo se esvanece em completo autoesquecimento. (NIETZSCHE, 2001, p. 30). Já a
Música dionisíaca corresponde à linhagem pictórica que estudamos no campo da Pintura. É Música de contrastes
violentos que chegam à dissonância; dramática, vibrante, mais harmônica do que contrapontística, violenta,
“impura” pela presença quase “literária” de sentimentos e expressões estranhas ao campo da Música; nela, a
harmonia é conseguida como uma vitória sobre a desordem, como uma união de contrário, para usar a expressão
de Santo Agostinho. Assim, podemos comparar a música de Beethoven, que pertence a esta linhagem, como a
pintura de Goya, Miguelângelo [sic] ou El Greco. (SUASSUNA, 2007, p. 321-322).
54
Soler (1978) ainda comenta sobre a influência dos árabes em terras ibéricas, aqui
trazida pelos colonizadores, mais precisamente ao sertão brasileiro, onde foi preservada e,
assim, não destruída pelos modismos.
[...] era uma ligação mais profunda com o povo o que Suassuna defendia para a
música Armorial. Uma recriação elaborada, sem perder a essência de nossas raízes
populares, transformando dessa forma numa música de concerto ou música de
câmara. A grande preocupação de Suassuna era que os participantes do Movimento,
ao fazer essa recriação, conseguissem afastar toda e qualquer influência externa, ou
seja, propagada pela mídia radiofônica e televisada.
_______________
27
Segundo o dicionário de Domingos Vieira, ladino é romance, seguidilha, que se canta acompanhado de viola
em som alegre [...]. Não se popularizou no Brasil e aparece no uso literário, nos estudos sobre a poesia
tradicional portuguesa no Brasil. Xácara será, evidentemente, a canção narrativa, daí sua fácil confusão com o
romance. (VIEIRA apud CASCUDO, 2002, p. 747).
28
Segundo o próprio Suassuna, são comunidades que ainda falam em espanhol-judaico do século XVI [...]. São
cantos ásperos, belos, fortes, meio salmodiados e monocórdicos, como um aboio ou um canto árabe.
(SUASSUNA apud SOLER, 1978, p. 11).
29
Entrevista concedida à autora em 28 jun. 2008.
55
_______________
30
Acerca da origem deste instrumento, foram verificadas várias definições, comprovando a falta de estudos mais
aprofundados a esse respeito. Para Suassuna (1974, p. 61), o marimbau foi introduzido na música armorial com a
intenção de privilegiar um instrumento usado pelo povo nordestino (berimbau-de-lata). Já Santos (1999, p. 186-
187) diz que esse é o instrumento musical mais original utilizado pelos armorialistas. Foi um instrumento
recriado (a partir do berimbau-de-lata) pelo artesão nordestino João Batista de Lima, feito de madeira, com duas
cordas, colocado entre os joelhos do instrumentista, sempre na posição horizontal. Aloan (2008, p. 19-22)
esclarece que o marimbau armorial “possui duas cordas afinadas em oitavas, apoiadas sobre cavaletes numa
estrutura de madeira em forma de caixa de ressonância com abertura”. Esse autor ainda esclarece que o
instrumento é tocado com uma vareta, sendo, portanto, um instrumento percutido.
56
2.1 Características
_______________
31
Não se entrará em detalhe acerca da instrumentação por não fazer parte do foco desta pesquisa.
32
Nota rebatida é expressão que, até o presente momento, não se encontra explanada em nenhum trabalho
musicológico ou de cunho analítico. Mário de Andrade (2006, p. 37) relaciona-a com a frase executada pelo
pistão no sublime “Rasga Coração” de Choros n.º 10, de Villa-Lobos, e que, na escuta, se pode compreender
como repetição de notas. A hipótese mais provável para essa terminologia é que seja, de fato, um jargão popular
para um fenômeno musical, não original da Música Armorial, e há muito tempo utilizado em diversos gêneros e
estilos ao longo da história da música. Essa especificidade, explicada por Antônio Madureira, carece de um
estudo musicológico, focalizado no repertório armorial com fins de comprovação, pois essa peculiaridade rítmica
não se restringe à música popular. No entanto, pode-se admitir aqui a ideia de uma inflexão específica, uma
agógica própria da música regional ao abordar esses agrupamentos rítmicos. Para Clóvis Pereira (2010), essa
expressão deve fazer parte da linguagem violonística, já que fora definida pelo violonista Madureira.
57
rebatidas “são notas ligadas de duas em duas em grupos de semicolcheias, tendo sempre uma
que se repete para ligar à seguinte.” (NÓBREGA, 2000, p. 63). (V. figura 3.22, p. 84).
Também será comum o uso de cordas duplas, uso de cordas soltas e ainda poucas mudanças
de posição, ou seja, utilizando as posições mais básicas dos instrumentos de cordas – herança
dos rabequeiros –, como dissera o compositor Clóvis Pereira àquela pesquisadora. O uso de
cordas soltas e duplas nada mais é do que outro indício da herança medieval na música
nordestina, pois os instrumentos medievais possuíam, em sua maioria, cordas de ressonância
denominadas de “bordões”,33 afinados na tônica (finalis) do modo sobre o qual as músicas
eram construídas.
Quanto à concepção formal das músicas armoriais, afirma Nóbrega (2000): “Muitas
vezes, o material melódico surge em superposição de terças paralelas, técnica essa frequente
na música popular e na polifonia europeia (falso-bordão)34 e acompanhada de nota-pedal.”
Já a exploração timbrística dos instrumentos na Música Armorial se dava, antes de
qualquer coisa, na relação dos instrumentos eruditos e populares. Seria um som áspero,
cortante, como dissera Suassuna. O uso de cordas soltas e o non vibrato iriam contribuir, de
forma significativa, na conquista dessa sonoridade rústica, relacionada ao rabequeiro. Além
dessas características, Nóbrega (2000) ainda diz que o pizzicato e outros efeitos percussivos
também seriam utilizados pela Música Armorial.
Quanto ao ritmo explorado pelos compositores armoriais, há uma predominância de
anacruses, acentuações em tempos fracos e a utilização constante das síncopas. Estas, na
opinião do compositor Clóvis Pereira, não são bem executadas pelos instrumentistas de
formação conservatorial e acadêmica, que estudam quase que exclusivamente a música
ocidental europeia. Esse fato, para ele, se refletirá na execução das obras sincopadas,
demonstrando uma falta de “balanço”, ou seja, falta da ginga brasileira35. (NÓBREGA, 2000).
A esse respeito, é interessante dizer que, no início desta pesquisa, a partitura cedida pelo
compositor foi uma edição da qual ele havia tirado algumas síncopas presentes no Concertino
para violino, justificando que não seriam bem interpretadas. Depois de algumas discussões a
_______________
33
Bordão é termo usado para indicar uma corda ou tubo que emite um som prolongado, habitualmente grave,
que pode ser mantido continuadamente ao longo de um trecho musical, como num registro de pedal dos órgãos.
(GROVE, 1994, p. 122).
34
Em italiano, falsobordone é um estilo de recitativo em acordes, baseado em tríades na posição fundamental,
com a forma e a melodia de uma salmodia gregoriana. É usado para os salmos das vésperas e o estilo aparece em
muitas composições, do séc. XV ao séc. XVIII. O nome está relacionado (mas o estilo não) ao fauxbourdon
francês. (Ibid., p. 310-311).
35
Ginga brasileira é expressão comumente usada na obra para piano de Chiquinha Gonzaga (1847-1935) e
Ernesto Nazareth (1863-1934).
58
esse respeito, decidiu-se que a partitura que tinha as síncopas, feita no ano de 2003, seria a
melhor opção para o presente estudo.
Quanto à harmonia seguida pela Música Armorial, Ariana Nóbrega comenta:
2.2 Intérpretes
Segundo Nóbrega (2000), o Quinteto Armorial foi, para Suassuna, o grupo mais
importante na área musical do Movimento Armorial, por privilegiar os instrumentos
populares. Esse grupo alcançou grande repercussão, como se comprovará a seguir:
O Quinteto teve uma excelente repercussão pelo país recebendo vários prêmios,
como: prêmios de melhor disco do ano em 1974 (pela revista Veja e o Jornal do
Brasil) e em 1976 (pelo Jornal do Brasil), bem como o de melhor conjunto
instrumental de 1974, pela APCA, Associação [Paulista] de Críticos de Arte. O
Quinteto participou de vários festivais, apresentando-se em diversas cidades do país.
Entre elas: Fortaleza, Mossoró, Natal, João Pessoa, Recife, Garanhuns, Arcoverde,
no Festival de Verão de Marechal Deodoro (AL), Festival de Verão de São
Cristóvão (SE), Brasília, Belo Horizonte, Festival de Inverno de Ouro Preto (MG),
Sabará, São Paulo, Rio de Janeiro. No exterior, participaram de tournée da Alliance
Française em 1975, Festival de Cosquin, Córdoba, Argentina em 1976, tournée em
Buenos Aires e Rosário, nos Estados Unidos em 1977 e em vários países da
América Latina (Venezuela, Colômbia, Bolívia, Peru e Paraguai) em 1978.
(NÓBREGA, 2000, p. 101-102, interpolação nossa).
Dois anos mais tarde, após a estreia, alguns músicos do Quinteto Armorial são
contratados pela Universidade Federal da Paraíba, e vão morar na cidade de Campina Grande,
localizada no interior do Estado, tendo a oportunidade de conviverem mais próximos com
músicos populares dessa região. (NÓBREGA, 2000).
Na década de 1980, com o fim do Quinteto Armorial, alguns dos seus integrantes
seguem outro caminho, como o violinista/rabequeiro Antônio Carlos Nóbrega (n. 1952), que
foi para São Paulo, e Antônio José [“Zoca”] Madureira, violonista e compositor que fundou o
Quarteto Romançal na década de 1990, ambos dando continuidade ao trabalho desenvolvido
anteriormente de contribuição para com a música brasileira.
Mesmo com o sucesso musical alcançado através do Quinteto Armorial, Suassuna
cria um novo grupo para realizar a música erudita nordestina. Surge, então, no dia 18 de
61
Existem alguns grupos que produzem novidades, que, ao meu ver, são legítimas. O
Mestre Ambrósio, por exemplo, com a rabeca de Siba, que eu gosto muito. Existe
agora um grupo no Recife muito bom chamado Cordel do Fogo Encantado. Esses
não imitam Luiz Gonzaga e nem era para imitar. Eles fazem o trabalho deles e
partiram para uma recriação. É uma novidade, mas feita muito de acordo com a
verdade brasileira. Eu não poderia deixar de fazer referência ao Quarteto Romançal,
dirigido por Antônio Madureira – que esse é um primor de composição e execução.
Daqui, da Paraíba, existe o Quinteto da Paraíba, que, numa formação tradicional,
toca a música brasileira de uma maneira muito bonita. (SUASSUNA, 2001, p. 14).
Para se ter uma noção da quantidade de discos lançados por esses artistas, citados
anteriormente, no CD-ROM “Movimento Armorial regional e universal”, lançado por
Arlindo Teles no ano de 2007, constatou-se a produção de vinte trabalhos artísticos que
contribuíram para o reconhecimento da música armorial no contexto regional, nacional e
internacional. A esse respeito, Suassuna declara no Jornal A União do dia 18 de março de
2001:
Então, na música eu acho que o Movimento Armorial chamou a atenção das pessoas
para certas músicas e, em especial, para um tipo de música feita pelo povo e com
determinados instrumentos que são usados nesse tipo de música. Você me perdoe
novamente a imodéstia, mas no Brasil inteiro você encontra músicos de
primeiríssima ordem eruditos, como José Eduardo Gramani, que era um grande
instrumentista de São Paulo e veio para o Nordeste especificamente para comprar
uma rabeca. Essa valorização da rabeca e da viola de cantador foi feita pelo
Movimento Armorial, através do Quinteto Armorial. Acho que essa foi a grande
contribuição do Movimento Armorial no campo da música. (SUASSUNA apud
JORNAL A UNIÃO, 2001, p. 14).
_______________
36
O romanceiro é um gênero poético de origem medieval, composto por uma coleção de romances, obras
narrativas que podem ser escritas em versos ou em prosa. Uma das cantigas do romanceiro ibérico aprendida e
cantada em Taperoá por Ariano Suassuna durante a infância é “O romance da bela infanta”, da tradição
portuguesa. A letra muda de país para país, de região para região, mas permanece a ideia central, o enredo e,
quase sempre, a melodia. (VICTOR; LINS, 2007, p. 24).
62
Ao nosso ver, basta que algum dia as escolas de ensino do primeiro e segundo grau
comecem a adotar métodos de ensino e pesquisa acerca do Movimento Armorial,
sua história, seus artistas. Como, por exemplo, o Colégio Exponente que, por dois
anos seguidos, realizou trabalhos de pesquisa com os seus alunos, além de pintarem
aquarelas em estilo armorial. Em todas as oportunidades, convidaram artistas do
Movimento Armorial para serem entrevistados.38
_______________
37
Entrevista concedida à autora em 28 jan. 2010.
38
Ibidem.
63
CAPÍTULO 3
_______________
39
Entrevista dirigida concedida à autora em 19 mar. 2010.
40
Entrevista concedida à autora em 28 jun. 2008.
64
_______________
41
Ao longo de toda a pesquisa, a harmonia em quartas será denominada “harmonia quartal”.
65
_______________
42
Entrevista dirigida concedida à autora em 19 mar. 2010.
66
da versão de 2003 se deu por ser a mais recente e por ter uma maior aproximação com a
versão gravada em CD.
As afirmações aqui transcritas se fazem presentes com o intuito de colaborar na
elucidação do processo compositivo da obra, das relações extramusicais e/ou referenciais que,
porventura, a obra possua, dado o seu caráter pioneiro. Não se pretende aqui, no entanto,
buscar justificativas e correlações que exemplifiquem cada afirmação, mas, antes, apenas
provocar pesquisas futuras de quaisquer áreas do saber musical.
_______________
43
Entrevista concedida à autora em 28 jan. 2010.
67
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44
Entrevista dirigida concedida à autora em 19 mar. 2010.
69
Figura 3.3 Cantiga de Cego recolhida por Lionel Silva. (ANDRADE, 2006, p. 122).
Figura 3.4 Detalhe do maracatu “baque das ondas”, de mestre Shacon Viana. (SANTOS; RESENDE,
2005, p. 47).
autônoma: ela vem associada às duas primeiras)”. A dimensão melódica considerada por
Guigue é, no Concertino, primordialmente modal. Muito embora seja a explicação válida
aqui, Clóvis Pereira, de maneira nenhuma, é ortodoxo no trato tonal em seu discurso; ele é,
antes, um compositor que tem a estrutura homofônica tonal clara em sua concepção enquanto
esquema formal, ou seja, dentro da dimensão harmônico-rítmica, enquanto que a dimensão
melódica incrementa a articulação tonal, promovendo simultaneamente um resultado sonoro
modal/tonal.
O compositor Clóvis Pereira adota uma quadratura clássica, assim como pode ser
encontrada nos estudos de fraseologia folclóricos populares: rimas simétricas, metrificação
regular. Veja-se uma sequência comparativa da quadratura clássica entre exemplos da música
clássica, folclórica brasileira e do Concertino (v. figuras 3.5, 3.6 e 3.7).
Figura 3.5 Frase clássica haydniana. [Fonte: melodia de “O Servo do Senhor” (ROCHA, 1861-1947)].
_______________
45
Por essa razão, não caberá aqui um gráfico com a divisão periódica e frasal, considerando a contagem de
compassos. Prefere-se, mais adiante, apresentar uma ideia interpretativa do metro interno, a despeito da
organização gráfica dos compassos.
73
Figura 3.9 Métrica binária implícita (referente ao Primeiro Movimento, comp. 70 a 75).
Galamian (1998) ainda fala sobre a importância de o intérprete, para realizar uma
execução mais condizente, escutar outras obras do compositor, descobrindo, assim, seu estilo
e personalidade composicional, embasando, dessa forma, sua execução. Bronstein (1981), por
sua vez, também entende que, para se conseguir realizar uma boa interpretação e uma boa
expressão da música, é necessário que o artista tenha uma visão geral da obra.
O som que ouvimos cria movimento, e movimento ajusta o som. Ouvimos sons
mentalmente e visualizamos os movimentos – isso é coreografia. Sem esses dois
elementos, não pode haver interpretação. [...]. Nós trabalhamos, paradoxalmente,
com movimentos contraditórios, o arco criando sons horizontalmente, tocando
através da ação da mão esquerda, que é vertical. Essa ação coreografada, esse ajuste
do som, torna mais claro e potencializa nossa visão do drama – como se a mão se
moldasse à mente, tornando-se um instrumento de visão e abrindo a porta da
realização do nosso próprio amor à obra, nossa interpretação. (BRONSTEIN, 1981,
p. 30, tradução nossa).
Um dos aspectos fundamentais da prática orquestral se refere aos naipes das cordas e
suas especificidades de execução. Os instrumentos de cordas constituem um grupo
essencial na execução do repertório orquestral de qualquer época, e as
particularidades técnicas são um foco de preocupação constante por parte de
instrumentistas, professores e regentes. A direção, a distribuição, a velocidade, o
ponto de contato e o peso do arco, além do golpe de arco empregado, são fatores
determinantes na performance musical desse conjunto de instrumentos. Esses
aspectos são os que influenciam na sonoridade, na articulação, na dinâmica, na
intensidade e no andamento de uma obra musical. (FERREIRA; RAY, 2006, p.
658).
Cabe ressaltar mais uma vez que o planejamento de arco deve ser feito de forma
minuciosa, tendo sempre como referência os aspectos já citados anteriormente: nível
técnico e musical dos executantes por parte, andamento, dinâmica, estilo, além das
indicações do compositor. A opção por um determinado plano de arco nunca deve
ser tomada como verdade absoluta. (FERREIRA; RAY, 2006, p. 662).
76
Todos esses aspectos citados serão levados em consideração neste trabalho, para a
marcação de uma arcada coerente, sem pretender, com isso, considerá-los como verdade
absoluta.
Eis agora cinco destaques de sugestão de arcadas (v. figuras 3.10 a 3.14).
Figura 3.10 Proposta de arcada 1 (primeiro tema da obra, Primeiro Movimento, comp. 40 a 45).
Figura 3.14 Proposta de arcada 5 (cadência do Terceiro Movimento, comp. 133 a 135).
Recomenda-se que essa interpretação tenha como base a referência sonora da rabeca, não para
que o violino simplesmente “imite” aquele som, mas que busque identidade nas relações
intervalares e na maneira peculiar da articulação sonora da rabeca. Ressalte-se que não se
trata aqui de equivalências técnicas de execução. Entende-se que a ideia deverá ser elaborada
quanto à plenitude sonora do instrumento violino; no entanto, o fato de a escrita para a rabeca
utilizar-se de bordões-pedais, sob a construção de melodias, e a agógica peculiar na execução
desse instrumento são pano de fundo para a interpretação proposta. Ou seja, um referencial
indispensável na construção de uma proposta interpretativa que não fecha seus olhos para o
meio popular, do qual o Concertino emerge.
Vejam-se agora o exemplo da figura 3.15, em que o tratamento sonoro no violino,
quanto à utilização do arco, deve ser próximo ao espelho com o objetivo de alcançar um som
mais “velado”, e o da figura 3.16, no qual se deve primar por uma execução mais incisiva,
utilizando-se da região inferior do arco. A escolha desses exemplos dá-se pela disparidade
entre as possibilidades técnicas do arco.
Figura 3.16 Destaque sonoro 2 (finalização da obra, Terceiro Movimento, comp. 255 a 258).
79
A forma sonata não será considerada de forma estrita neste movimento, por duas
razões: primeira, porque o compositor Clóvis Pereira, ao ser indagado a respeito, afirma não
ter preestabelecido um plano rigoroso formal quanto à observância dos detalhes da forma
sonata; segunda, porque, a partir das afirmações do compositor, foi realizada uma
investigação que levou à conclusão da inexistência da forma sonata tal qual o procedimento
concebido no século XVIII.
A tabela 3.4 mostra mais detalhadamente uma visão analítica da estrutura da
exposição do Primeiro Movimento.
80
justificando a síncopa, que é ainda ratificada pela harmonia quartal e pela acentuação (>),
destacando-se do uníssono orquestral. O 3.º tempo do segundo compasso se constitui na
quebra métrica que contém o enxerto do modo lídio (Ré sustenido), que funciona como
apojatura para o Dó sustenido, ou ainda como sensível não resolvida de Mi. Essa quebra
métrica não pode ser considerada como um “capricho” composicional. Antes, porém, o
intérprete deverá, ao compreender esse detalhe, dar o devido valor na execução. Conduzir o
Ré sustenido, com essa dupla funcionalidade, e ainda destacá-lo conjuntamente com o Dó
para valorizar essa quebra métrica é fundamental, pois trata-se aí da apresentação do primeiro
tema. Nesse sentido, a recomendação da autora não se aplica somente para a execução
individual do solista, mas, em primeiro lugar, para uma interpretação ampla das características
desse tema, seja para os músicos, seja para o regente. Esse é um dos exemplos claros do
critério que deve existir por trás de uma ideia interpretativa. Verifica-se ainda a inexistência
da sensível, Sol sustenido, provando, dessa forma, que a 1.ª frase e, por conseguinte, todo o
movimento não podem ser considerados como tonais, desmoronando, assim, o conceito de Lá
maior. Sobre esse ponto de discussão, linguagem e discurso (modalismo x tonalismo) serão
tratados oportunamente na subseção 3.4.5.
Outro aspecto a ser ressaltado é a progressão métrica dos compassos 18, 19 e 20,
numa espécie de alargando que prenuncia a nova exposição do primeiro tema, agora sobre a
região da dominante, ou seja, a partir do compasso 21. Veja-se esse aspecto numa redução
para duas claves na figura 3.18.
Consideram-se os oito compassos finais desta subseção (A”) como uma ponte que
apresenta sequências cromáticas descendentes, cadenciando a entrada do solista na 2.ª
Exposição.
82
Figura 3.19 Tema na forma original sobre a tônica (Primeiro Movimento, comp. 1 a 4).
Figura 3.20 Primeira transposição sobre a subdominante (Primeiro Movimento, comp. 11 a 14).
Figura 3.21 Segunda transposição sobre a dominante (Primeiro Movimento, comp. 21 a 24).
Não cabe aqui entrar em detalhes sobre essa macroestrutura contida nos outros
movimentos. Contudo, é bom frisar que eles seguem, mais sutil ou explicitamente, o mesmo
arcabouço, pois, sem este, não haveria a possibilidade com o sistema tonal.
A textura do Concertino inicia-se de maneira homorrítmica (4 primeiros compassos)
e homófona (não tem contraponto) (v. figura 3.17). Mas, após a apresentação da primeira
ideia temática, a textura apresenta-se em duas camadas, com bassi em uma e cordas agudas
noutra, mas a viola funciona como um elemento versátil, unindo as tessituras dos
instrumentos graves e agudos (v. figuras 3.22 e 3.23).
Figura 3.23 A viola e os instrumentos graves (Primeiro Movimento, comp. 106 a 108).
84
Figura 3.24 Entrada do solista na “segunda exposição” (Primeiro Movimento, comp. 40 a 45).
Veja-se na figura 3.26 como essa fórmula rítmica funciona no contexto harmônico.
DESENVOLVIMENTO
A B C
Comp. 52 ao 93 Comp. 94 a 122 Comp. 123 a 146
(total de 42 compassos) (total de 29 compassos) (total de 24 compassos)
I I VI
(Lá dórico) (Lá menor) (Fá# mixolídio)
(comp. 52 a 59) (comp. 94 a 101) (comp. 123 a 130)
V III II
(Mi “nordestino) (Dó nordestino) (Si menor com sétima)
(comp. 60 a 62) (comp. 102 a 105) (comp. 131 a 137)
I I I
(Lá nordestino) (Lá mixolídio) (Lá mixolídio)
(comp. 69) (comp. 106 a 108) (comp. 138 a 141)
IV VI
(Ré mixolídio) (Fá# menor)
(comp. 109 ao 114) (comp. 142 ao fim da seção C)*
* O final da seção C é marcado por uma cadência do modo frígio (notas Sol e Fá sustenidos, nos compassos 145
e 146). A chamada cadência frígia é usada comumente no jazz e é também encontrada em obras de Camargo
Guarnieri e de Villa-Lobos (1887-1959).
86
A seção C é precedida por uma ponte de textura homorrítmica que tem a função de
não somente preparar uma nova entrada, nova apresentação temática, mas primordialmente
conduzir a percepção de uma sonoridade eminentemente modal para uma construção tonal.
Dentro da seção C, entre os compassos 130 e 137, há um novo oásis tonal em meio à
sonoridade modal. O andamento Tranquilo (v. figura 3.29) reporta a um caráter nostálgico
ligado ao cancioneiro popular brasileiro. A melodia é tão somente o tema principal variado
por aumentação.
_______________
46
Também conhecido como maracatu nação, abundante na capital pernambucana, possui essa denominação para
diferenciá-lo do maracatu de baque-solto. A expressão se refere ao ritmo tocado pelos maracatus, e virar o baque
significa dobrar as batidas de vários instrumentos tocados ao mesmo tempo. Sua formação inclui voz e
percussão, esta, formada pelos seguintes instrumentos: gonguê, tarol, caixa de guerra, alfaia, mineiro e o apito do
mestre. (SANTOS; RESENDE, 2005).
87
Figura 3.29 Variação do tema por aumentação (Primeiro Movimento, comp. 123 a 129).
auditivamente para uma mudança de textura, e possui uma característica harmônica peculiar.
Pode-se dizer que esta é construída por uma sequência de acordes não modais, mas que não
progridem, por outro lado, no sentido tonal estrito. O acorde de Fá sustenido maior com
sétima maior do compasso 120 – início do cedendo – destoa completamente da sonoridade
modal e se aproxima do tonalismo, mas há, aí, uma cadência que prepara a entrada da seção
C, esta, por sua vez, construída sobre o modo de Fá sustenido mixolídio. No entanto, a função
primordial da ponte é mantida, a despeito deste fato: uma instabilidade que se põe entre
contextos estáveis.
Figura 3.30 Ponte para a segunda exposição (Primeiro Movimento, comp. 116 a 122).
parte do solista do compasso 130 não parece uma mera indicação de articulação. Na verdade,
sua função é de separação das sonoridades (modal/tonal), e isso deve ser interpretado de tal
maneira que, ao surgir uma tonalidade, ou seja, o oásis de que se falou, o intérprete deverá ser
capaz de imprimir aqui um novo caráter, através da intensificação do vibrato e da busca de
uma “cor” diferente relacionada à dinâmica.
Figura 3.31 Do modal para o tonal (Primeiro Movimento, comp. 127 a 138).
Se nos modos utilizados nessa obra há apenas a presença de subtônicas, aqui esse
trecho se faz duplamente especial, devido a uma das características mais fortes do sistema
tonal: a presença da sensível (Lá sustenido e Mi sustenido). Para o intérprete, isso não pode
passar despercebido, pois se constitui numa mudança de caráter que a construção melódica
impõe.
90
Reexposição
A B C D E F
Compasso Compasso Compasso Compasso Compasso Compasso 242
147 a 158 159 a 168 169 a 179 180 a 213 214 a 241 ao fim
Material de Material da
Material do Material de
Material da A” da Material de Coda
início do A do
II Exposição da Exposição e do A, B e D da e do
Desenvolvi- Desenvolvi-
Exposição Desenvolvi- Reexposição Desenvolvi-
mento mento
mento mento
I e IV V III
I III
Lá e Ré Mi nordestino Dó
Lá dórico Dó nordestino
nordestino e Mi menor nordestino
A escala modal é um dos elementos principais dos cantos de cegos pedintes, uma
característica essencial da música na cantoria nordestina. A presença e constância
destas escalas nos cantos da tradição oral nordestina não indicam, nestes, por sua
vez, a presença religiosa. A cantoria nordestina tem suas origens no movimento
trovadoresco francês que, através de Portugal, contribuiu decisivamente para a
formação de uma arte profana. Esta, por sua vez, adaptou-se às condições do
nordeste brasileiro. A música trazida pelos portugueses, embora tenha sido mais
decisiva na base da formação da nacionalidade musical brasileira, incorporou-se a
outras tradições, principalmente a ameríndia e negra. [...]. Além das escalas modais,
é comum, nos cantos da tradição oral nordestina, a recorrência de determinados
intervalos, como, por exemplo, formações em graus conjuntos, notas repetidas,
terças menores e maiores e quartas justas. (CAMACHO, 2004, p. 72-73).
concretiza no Segundo Movimento de forma estrita. Presume-se que seja lento por uma
apreciação geral desse movimento, donde se deduz que, ao retornar essa ideia inicial no
compasso 68, aparece a indicação Lentamente.
É importante ressaltar que não existe ligação direta entre Recitativo e Lento. A
indicação de Recitativo, no início do movimento, liga-se mais à parte desacompanhada do
solo do que ao andamento desse trecho (comp. 1 a 9). Recitativo pressupõe uma ideia
articulada, em termos de palavra. Para aprofundar mais sobre o sentido do recitativo em
conexão com este movimento do Concertino, convém lembrar que recitativo pode ser
definido como um “tipo de escrita vocal, normalmente para uma única voz, que segue os
ritmos e acentuações naturais do discurso, e também seus contornos em termos de altura.”
(GROVE, 1994, p. 769, grifo nosso). Ressalte-se ainda que o “‘stile recitativo’ esteve ligado
ao desenvolvimento promovido pela Camerata florentina no final do séc. XVI, de um estilo
com notação precisa, apoio harmônico, largo âmbito melódico e um tratamento afetivo
(emocionalmente significativo) do texto.” (Ibidem, p. 769.).
O peso do gênero concerto e suas características primordiais são importantes para
Clóvis Pereira, que segue religiosamente a ideia de Tempi do gênero concerto, preservando as
divisões de andamento e de pulsações básicas desse gênero (rápido-lento-rápido). Conclui-se
que é lento, não pela palavra Recitativo colocada no início do movimento, mas pela
articulação das notas, pois, se a parte do solista for executada de maneira vibrante, ver-se-á
que, no compasso 68, a mesma ideia retornará com o detalhe da palavra Lentamente. Aí está a
resposta para a dúvida em relação ao andamento do Segundo Movimento. Estruturalmente, o
Recitativo funciona como o primeiro tema, constituído, em grande parte, por acordes triplos
com sextas paralelas. A partir da entrada da orquestra (comp. 9), o tema do solista é
simplificado e marcado com a sonoridade da quarta corda (corda sol). Esse tema remete a
cantigas de roda e canções infantis, dada a sua quadratura e simplicidade, muito embora o
compositor não tenha confirmado essa informação.
Com relação à cantiga de cego desse Movimento, é oportuna uma comparação com a
da figura 3.3 (p. 69). Ambas têm início anacrústico, e a cantiga de cego original ainda possui a
indicação Lento, recitado. A quadratura de ambas é clássica, e a cantiga de cego original está
em Dó lídio, com armadura apropriada de apenas um sustenido. Já no Concertino se vê o Dó
sustenido desnecessário na armadura de clave, enquanto o trecho inicial se encontra em Ré
mixolídio. Tanto o modo lídio quanto o modo mixolídio são comuns nos lamentos de cego.
95
Figura 3.37 Conjunto das notas do tema (Segundo Movimento, comp. 21 a 25).
Observe-se na figura 3.38 a simetria da voz inferior do solista (compasso 28) que
define a bidirecionalidade simultânea entre os primeiros violinos e o solista (na voz inferior).
Observa-se que essa relação de terças entre o tema inicial e sua variação alude
claramente à organização tonal. Ainda que o material escalar de ambos os trechos seja
notadamente modal, percebe-se que uma diretriz tonal, subjacente, se faz presente quando se
observam as progressões em cada seção. Esse fato pode ser igualmente observado nos outros
movimentos. Esse aspecto será tratado mais profundamente na subseção 3.4.5. Aqui, como
em outros trechos do Concertino, observa-se uma “falsa” relação tonal, em que o primeiro
tema representa “Ré maior” na figura 3.36, e o segundo, “Si menor” na figura 3.39.
A partir da estrutura esboçada na tabela 3.8, verifica-se que a forma do Segundo
Movimento é ternária (A-B-A’), forma comum das canções. A cantoria de cego é um dos
exemplos comuns dessa forma. A textura e a densidade da construção desse movimento são
materializadas pela intervenção orquestral que se faz presente de maneira sistemática na seção
central.
comparável ao estudo consciente, pois o compositor, mesmo não tendo teorizado sobre essas
questões formais, internalizou auditivamente através de suas experiências ao longo de sua
carreira. Esse pressuposto não se aplica somente a esse movimento, mas, de um modo
abrangente, a segunda hipótese, para a qual o julgamento desta autora se inclina, poderá ser a
base da interpretação analítica para todo o Concertino. A escolha da segunda hipótese se
correlaciona com conversas e questionários realizados, formal e informalmente, com o
próprio compositor, cujas respostas direcionam para uma espontaneidade e fluência no trato
composicional que dificilmente estariam ligadas a uma arquitetura previamente planejada.
Isso ocorre não somente nessa obra, o que demonstra uma atitude criativa que reflete o
pensamento compositivo de Clóvis Pereira como um todo.
a 1 a 24
A b 25 a 56
76
c 57 a 76
a’ 143 a 168
A’ b’ 169 a 199
77
c’ 200 a 219
w 77 a 84
x 85 a 91
B
y 92 a 105 36
z 106 a 112
w’ 220 a 225
x’ 226 a 232
B’ 39
y’ 233 a 250
z’ 251 a 258 (fim)
Se estamos falando aqui de acordes por quartas, de maneira alguma isto significa
uma proposta de substituir o antigo sistema de construção por terças por um que se
estruture por quartas. O sistema de quartas, sendo idêntico a um sistema de quintas,
invocaria também, e talvez não menos que o de terças, a natureza, e estaria em
condições de apresentar todos os acordes imagináveis com mais unidade do que o
sistema de terças. Porém, não se deve esquecer que a contradição com a realidade da
música atual não seria pequena: no antigo sistema uma tríade maior é uma
configuração simples, todavia mais complexa no novo [...]. Embora em nenhum
outro lugar como nos acordes por quartas, cumpra-se o desejo do som de modo que
a resolução em um som situado uma quinta abaixo surge francamente como símbolo
102
da unidade de toda sonoridade simultânea, ainda assim o sistema por quartas vê-se
constrangido a buscar algumas explicações fora da natureza, mas sem que por isso
seja inferior ao velho sistema, o qual muito menos pode dispensar auxílios
artificiais. Apesar disso, creio que complementa transitoriamente o sistema por
terças, donde uma semelhante tentativa teria que revelar ao teórico determinadas
perspectivas novas [...]. Porque a forma exterior da qual esses acordes derivam o
justifica, pois, que eu saiba, na literatura musical aparecem, sobre tudo, como
quartas superpostas. (SCHOENBERG, 2001, p. 549-550).
Figura 3.42 Harmonia Quartal 3 (Terceiro Movimento, comp. 38, violinos e violas).
Figura 3.43 Harmonia Quartal 4 (Terceiro Movimento, comp. 39 nos cellos e baixos).
3.4.4 Cadência
(più mosso)
= 100 quaternário simples 4/4 132
Figura 3.44 Primeiro gesto da Cadência (Terceiro Movimento, comp. 113 a 116).
Figura 3.45 Segundo gesto da Cadência (Terceiro Movimento, comp. 117 e 118).
106
Cabe aqui apresentar uma comparação entre o segundo gesto e exemplos da literatura
violinística (v. figuras 3.46 e 3.47).
Figura 3.46 Gesto vivaldiano (Quatro Estações, “Outono”, Terceiro Movimento, comp. 59).
Figura 3.47 Gesto paganiniano (Capricho n.º 1, de Nicolò Paganini, comp. 32).
Este ponto torna-se importante, pois, após uma descrição geral das especificidades
interpretativas em função de uma perspectiva analítica, desde o título, será necessário
_______________
47
Significa o final de uma estrutura, que não é acentuada.
108
questionar a abordagem tonal dentro de uma obra cujo modalismo é não somente expressivo,
mas dominante na sonoridade geral.
A dicotomia encontrada na organização harmônica do Concertino é materializada
com o uso concomitante dos sistemas tonal e modal. Como dito anteriormente, há um
arcabouço tonal que sustenta a estrutura da obra, entremeada abundantemente por coleções
modais (em sua maioria mixolídio ou nordestino).
Para Clóvis Pereira, o Concertino está alicerçado sobre um pensamento tonal, pois o
próprio título indica isso, e, ao ser indagado sobre a impertinência do Lá maior, ele decidiu-se
por defendê-la, conduzindo esta autora a advogar aqui uma estrutura harmônica que não seja
eminentemente tonal nem exclusivamente modal, mas, antes, uma simbiose de sistemas. Será
visto em alguns exemplos como cada movimento é articulado estruturalmente (tonalismo,
vertical) e como o uso modal (horizontal) se interpõe no discurso cloviniano.
Cadências tonais:
Figura 3.52 Cadência tonal 3 (Primeiro Movimento, comp. 250 a 251) V-I (cadência autêntica
perfeita).
110
Figura 3.54 Cadência tonal 5 (Terceiro Movimento, comp. 142 e 143), V-I (cadência
autêntica perfeita).
Intervenções modais:
Figura 3.56 Intervenção modal 2 (progressão dos bassi em Ré eólio, Primeiro Movimento,
comp. 45 e 46).
Figura 3.57 Intervenção modal 3 (Primeiro Movimento, comp. 51 e 52, violas e bassi em Si lócrio).
Figura 3.58 Intervenção modal 4 (Primeiro Movimento, comp. 75 a 77, solista em Dó nordestino).
Figura 3.59 Intervenção modal 5 (Primeiro Movimento, comp. 123 a 125, solista em Fá sustenido
mixolídio).
112
Figura 3.61 Intervenção modal 7 (Segundo Movimento, comp. 27 e 28, solista e primeiro violino em
Ré lídio).
Figura 3.62 Intervenção modal 8 (Segundo Movimento, comp. 37 a 40, solista em Si dórico).
Figura 3.63 Intervenção modal 9 (Terceiro Movimento, comp. 77, solista em Ré nordestino).
Figura 3.64 Intervenção modal 10 (Terceiro Movimento, comp. 88, primeiros e segundos violinos em
Mi nordestino).
113
O segundo trecho está localizado do compasso 123 até o compasso 146. Corresponde
à seção lenta do Primeiro Movimento. Em termos de construção melódica, pode-se dizer que
é o desenvolvimento do primeiro tema com relações de valores de tempo aumentados, ou seja,
é o recurso composicional de desenvolvimento por aumentação. Nesse momento, a tonalidade
apresenta um ambiente harmônico nostálgico; o centro tonal aí está sobre o acorde de Fá#
menor e o fim desta seção é concluído com o acorde de Fá# menor com nona maior e sexta
maior, um acorde dissonante, se comparado à sonoridade geral desse trecho, e, assim como a
harmonia quartal, uma característica recorrente na escrita de Clóvis Pereira. O terceiro trecho
nada mais é que a repetição do primeiro trecho, com a única modificação do acompanhamento
115
das cordas que, no compasso 179, solidifica a ideia da escala de Mi menor, reforçando em
uníssono o solista num crescendo em direção ao forte do compasso seguinte. O primeiro e o
terceiro trechos, um trecho único, dão uma impressão auditiva de uma colagem. Daí, ter-se
usado a palavra enxerto, pois não somente é destoante da rítmica sincopada apresentada no
decorrer do discurso, como também em termos harmônicos, por tratar-se de um “oásis tonal”
em meio a uma sonoridade eminentemente modal. Isso ainda se dá de modo brusco, e o
acompanhamento da orquestra é apenas acórdico, demarcando o pulso desse trecho. Como
direcionamento tonal, não se observa aqui, no entanto, um cadenciamento que justifique a
entrada do Mi maior e o direcione para uma nova tonalidade no fim dessa seção, pois o
acorde anterior ao início dessa seção é, na verdade, uma sequência quartal (Si-Mi-Lá-Ré) que
não funciona como uma dominante de Mi menor, por não possuir uma sensível, e, ao final do
trecho, a escala de Mi menor não representa uma ponte para o acorde que se segue de Dó
maior (compasso 180). Ainda para reforçar essa ideia, o acorde de Dó maior é, logo em
seguida, desmoronado de sua função, pois, com o aparecimento do Si bemol no solista, já não
mais se perceberá o acorde de Dó maior, mas, agora, a escala de Dó nordestino, retomando,
assim, a sonoridade modal, majoritária do Concertino.
Diante dessas justificativas, o intérprete precisa ter claras em seu estudo as escalas de
cada modo utilizado e de cada eventual tonalidade apresentada. Uma das estratégias
recomendada aqui para a compreensão dessas escalas é que, antes de iniciar o estudo do
Concertino, o intérprete deverá praticar as escalas de Lá, Ré e Mi, mixolídio e nordestino,
para que solidifique auditivamente os conjuntos de notas da obra e, ao mesmo tempo, se
acostume com as distâncias dos tons e semitons dessas escalas modais. Ainda em relação ao
estudo preliminar do Concertino, é importante salientar que a escala de Lá maior não é inútil
no decorrer do estudo, mas ineficiente para a aquisição auditiva da consciência da subtônica
em detrimento da sensível, e também ineficiente em relação ao centro tonal, pois, apesar de
haver um eixo sobre a nota Lá, esta não se desenvolve tonalmente nos sentidos melódico e
harmônico.
Outro aspecto da linguagem cloviniana é o fator rítmico como um dos agentes do
discurso. Percebe-se que o Maracatu não somente predomina, mas é o argumento rítmico
primordial ao longo da obra, promovendo a construção temporal de motivos e temas. Sobre
esse gênero, tradicionalmente pernambucano, arraigado na cultura recifense, pode-se dizer
que é uma das motivações mais instigantes devido a sua riqueza e variedade rítmica. Como
dança e gênero popular, serviu de inspiração não somente a compositores ditos armoriais,
mas, antes, a compositores nacionalistas, como Francisco Mignone (1897-1986), que escreveu
116
um Balé para coro e grande orquestra, intitulado “Maracatu do Chico Rei”48 ou ainda a
compositores contemporâneos, como é o caso de Eli-Eri Moura, cuja peça “A noite dos
tambores silenciosos”,49 para grande orquestra, é uma espécie de cerimônia popular em que o
maracatu de baque-virado é usado como argumento para a construção de uma obra
extremamente complexa do ponto de vista estrutural. Outro dado relevante a ser ressaltado
sobre esse compositor é que ele é autor da primeira, e única, ópera em estilo armorial,
composta em 2009, cujo título é “Dulcineia e Trancoso”, a qual, segundo o próprio Eli-Eri
Moura, une elementos da cultura ibérica e do Nordeste brasileiro. É uma ópera neotonal,
adentrando em diversos universos sonoros, incluindo manifestações populares do Nordeste e
alusões à música ibérica da Renascença, com texto de W. J. Solha (n. 1941).
Ainda sobre o Maracatu de Pernambuco, Climério Santos e Tarcísio Resende (2005)
realizaram um importante trabalho a esse respeito, ao apresentarem amostras musicais de seis
maracatus, três de “baque-virado” e três de “baque-solto”. Segundo esses autores:
_______________
48
Denominado bailado afro-brasileiro, sobre libreto de Mário de Andrade e estreado com coreografia de Maria
Olenewa. Segundo Mário Tavares, este bailado é constituído de sete partes: Chegada do Maracatu, Dança das
Mucambas, O Príncipe da Dança, Dança dos Seis Escravos, Dança dos Príncipes Brancos, Dança Geral e
Dança Final. (TAVARES, 1997, p. 85).
49
Resultado de uma pesquisa de doutorado na McGill University, em Montreal, Canadá. É uma obra constituída
de três partes interligadas, duas das quais pelo maracatu de baque-virado e maracatu rural, manifestações
populares de Pernambuco. A terceira peça é livre de referências folclóricas, seguindo um processo de
transformação construído de acordo com a técnica de “Palimpsesto”. (MOURA, 2003, p. 2).
117
Na orquestra:
No solista:
compasso 220 até o 250, aqui denominada de B’, que está sobre a base de Mi nordestino, ou
seja, vê-se, aí, uma modulação em um tom de uma seção para a outra.
Na Cadência, o maracatu se faz presente como parte constituinte da dicotomia entre
os dois gestos apresentados, ou seja, o gesto maracatu e o gesto virtuosístico. No Segundo
Movimento, não foi encontrada nenhuma evidência da utilização do maracatu, seja na
construção de motivos e temas, seja na estruturação dos períodos e seções. Ver-se-á, logo a
seguir, como o maracatu é utilizado no Primeiro e Terceiro Movimentos.
Vê-se, então, que é fato, seja por causa do argumento Maracatu, seja por causa da
concepção neoclássica de Clóvis Pereira, que o Concertino possui uma forma baseada na
recorrência. Sobre esse assunto, o musicólogo Didier Guigue assim comenta, enfatizando as
condições da percepção das estruturas musicais:
120
Sendo a música uma arte que necessita do tempo para se concretizar a percepção, ela
terá que ser concebida em função da memória de quem a ouve. Isto significa que, ao
escutarmos uma obra musical, construímos a nossa percepção a partir do material
sonoro que aparece no princípio, o qual vai passar a servir de referência essencial
para tudo o que vamos ouvir consequentemente. Repetindo este material inicial, de
forma clara ou sutil, em lugares estrategicamente escolhidos, e intercalando-o com
outro, ou bem diferenciado, o compositor desperta o nosso interesse e permite que
acompanhemos a estrutura temporal da obra, a sua dinâmica, a sua história.
Ademais, a repetição do material de referência consolida a percepção da obra como
um todo unitário, homogêneo, enquanto a inserção de elementos contrastantes dá
consistência qualitativa ao tempo que a obra ocupa. (GUIGUE, 2003).
Entende-se que perceber o maracatu posto na obra desde o seu início é uma das
condições, como explica Guigue (2003), para a percepção da estrutura do Concertino como
um todo. Reconhece-se aqui o maracatu como elemento usado na construção de motivos,
frases, temas e seções que se repetem, mas que compõem um “todo unitário”, e todo o
material além desse promove o contraste qualitativo sobre o qual a obra se constrói.
(GUIGUE, 2003).
121
CONCLUSÃO
Ao final do trabalho, tais vicissitudes podem até ser consideradas naturais, ou mesmo
previsíveis, dado o caráter humano e pessoal de cada abordagem, seja no trato com o próprio
compositor, seja nos procedimentos de entrevistas com intérpretes e figuras importantes
relacionadas ao tema aqui abordado. A permanente modificação das partituras, a existência de
versões distintas, e ainda o acesso a uma gravação que não corresponde de todo às versões
cedidas pelo compositor, tornaram-se uma barreira ou um desafio em alguns momentos de
difícil transposição. A maior vicissitude citável aqui foi a de que, já em fase final do trabalho,
o compositor Clóvis Pereira desautorizou a inclusão em anexo das partituras cedidas, por
tratar-se de obra ainda não editada. Em respeito ao desejo do compositor, tais partituras
lamentavelmente não constam dos anexos.
Diante do exposto, espera-se que esta pesquisa contribua efetivamente para um
melhor conhecimento da música armorial, bem como da prática interpretativa violinística
relacionada ao Concertino em Lá Maior para Violino e Orquestra de Cordas, do compositor
Clóvis Pereira.
123
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ROCHA, João G. da. Salmos e hinos com músicas sacras. 5. ed. Compiladas e adaptadas
por João G. da Rocha. Rio de Janeiro: Sociedade Religiosa Edições Vida Nova, 1861-1947.
1149 p. (Melodia: Franz Joseph Haydn; harmonia: Arthur Seymour Sullivan).
SANTOS, Idelette Muzart Fonseca dos. Em demanda da poética popular: Ariano Suassuna
e o movimento armorial. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1999. 421 p.
SOLER, Luís. Origens árabes no folclore do sertão brasileiro. Florianópolis: UFSC, 1995.
120 p. Este livro é uma versão, corrigida e ampliada, do que foi publicado pela UFPE, em
1981, sob o título “As raízes árabes na tradição poético-musical do sertão nordestino”.
SQUEFF, Enio; WISNIK, José Miguel. Música: o nacional e o popular na cultura brasileira.
São Paulo: Brasiliense, 2004. 190 p.
TAVARES, Bráulio. ABC de Ariano Suassuna. 2. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2007.
236 p.
VICTOR, Adriana; LINS, Juliana. Ariano Suassuna: um perfil biográfico. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar, 2007. 135 p.
ANEXO A
As fotos aqui apresentadas (v. figuras A.1, A.2, A.3 e A.4) foram tiradas do livro original de
Ariano Suassuna “O Movimento Armorial”, de 1974, consultado pela autora na Fundação
Joaquim Nabuco.
ANEXO B
Figura B.3 Capa do Programa Inaugural do Movimento Armorial, ocorrido na Igreja de São Pedro dos Clérigos, em 18 de outubro de 1970,
durante o evento “Três Séculos de Música Nordestina: do Barroco ao Armorial”, cujo regente foi o compositor Clóvis Pereira.
134
Figura B.4 Contracapa do Programa Inaugural do Movimento Armorial, com texto introdutório – Arte Armorial – assinado por Ariano
Suassuna.
135
Figura B.5 Capa do Programa do Concerto da Orquestra Armorial de Câmara do Conservatório Pernambucano de Música, ocorrido na
Igreja Catedral, Recife-PE, em 6 de janeiro de 1971.
136
Figura B.6 Contracapa do Programa do Concerto da Orquestra Armorial de Câmara do Conservatório Pernambucano de
Música, com texto introdutório de Ariano Suassuna (Arte Armorial), realizado no dia 6 de janeiro de 1971.
137
Figura B.7 Capa do Programa do Concerto realizado pelo Conjunto Armorial de Câmera de Pernambuco na Universidade Federal do Rio
Grande do Sul em 5 de junho de 1971, com a regência do compositor Clóvis Pereira.
138
Figura B.8 Continuação do Programa de Concerto do Conjunto Armorial de Câmera de Pernambuco, sob a regência de Clóvis
Pereira (Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em 5 de junho de 1971).
139
Figura B.10 Continuação do Programa de Concerto do Coral Universitário da UFPB e da Orquestra Armorial de Câmara (Auditório
da Reitoria da UFPB, em 9 de agosto de 1971).
141
Figura B.11 Programa de Concerto da Orquestra Armorial de Câmara do Estado de Pernambuco e Universidade Federal da Paraíba na
Temporada de 1972 da Pro Arte em Porto Alegre, no dia 17 de março.
142
Figura B.12 Continuação do Programa de Concerto da Orquestra Armorial de Câmara do Estado de Pernambuco e Universidade
Federal da Paraíba na Temporada de 1972 da Pro Arte em Porto Alegre, além de outros grupos musicais, no dia 17 de março.
143
Figura B.13 Continuação do Programa de Concerto da Orquestra Armorial de Câmara do Estado de Pernambuco e
Universidade Federal da Paraíba na Temporada de 1972 da Pro Arte em Porto Alegre, no dia 17 de março. Entre as
obras executadas na II parte do Programa estava “A Onça, os Guinés e os Cachorros”, de Clóvis Pereira, Cussy de
Almeida e Ariano Suassuna.
144
Figura B.14 Continuação do Programa de Concerto da Orquestra Armorial de Câmara do Estado de Pernambuco e
Universidade Federal da Paraíba na Temporada de 1972 da Pro Arte em Porto Alegre, no dia 17 de março. Relação dos
componentes da Orquestra Armorial de Câmara.
145
Figura B.15 Capa do Programa de Concerto da Orquestra Armorial de Câmara na Sala Martins Pena em Brasília, no dia 7 de
maio de 1973.
146
Figura B.16 Contracapa do Programa de Concerto da Orquestra Armorial de Câmara na Sala Martins Pena em
Brasília, no dia 7 de maio de 1973. A peça “Cavalo Marinho”, de Cussy de Almeida, Clóvis Pereira e Jarbas
Maciel, encerrou o Programa.
147
Figura B.18 Contracapa do Programa do 21.º Concerto Extraordinário da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre da Temporada de
1975, realizado no dia 20 de setembro no Auditório do Palácio Farroupilha. Entre as obras executadas constou “Lamento e Dança
Brasileira”, de Clóvis Pereira.
149
Figura B.22 Contracapa do Programa de Concerto Oficial da Orquestra Sinfônica do Recife, no Centro de Convenções da
Universidade Federal de Pernambuco, em 03 de julho de 1996. A primeira obra executada foi “Lamento e Dança Brasileira”,
de Clóvis Pereira.
153
Figura B.23 Capa do Programa de Concerto do Mauritsstadt Ensemble, no dia 20 de novembro de 1998, no Auditório
do Conservatório Pernambucano de Música, Recife-PE.
154
Figura B.24 Contracapa do Programa de Concerto do Mauritsstadt Ensemble, no dia 20 de novembro de 1998, no
Auditório do Conservatório Pernambucano de Música, Recife-PE.
155
Figura B.25 Capa do Programa de Concerto do Festival 70 anos do Conservatório Pernambucano de Música, no dia 25 de agosto
de 2000. A obra executada foi “Terra Brasilis”, do compositor Clóvis Pereira.
156
Figura B.26 Capa do Programa de Concerto em Homenagem aos 70 anos de vida e 55 de carreira do Maestro Clóvis
Pereira, no dia 15 de maio de 2002, no Auditório do Conservatório Pernambucano de Música.
157
Figura B.27 Contracapa do Programa de Concerto em Homenagem aos 70 anos de vida e 55 de carreira do
Maestro Clóvis Pereira. Entre as obras executadas estavam “Valsa Risomar”, com a solista Jussiara Albuquerque;
“Terno de Pifes”, com o Grupo As Grama; “Três Peças Nordestinas”, primeira audição brasileira com a Orquestra
de Câmara de Pernambuco; “Príncipe Alumioso”; “Cantiga”; além de “Mourão”, de Clóvis Pereira e Guerra-Peixe.
158
Figura B.31 Capa do Programa de Concerto da Camerata Armorial, sob a regência do maestro Rafael Garcia, na
Aula-Espetáculo O Reino da Pedra Verde (Sagração n.o 1), realizada no Teatro de Santa Isabel, Recife-PE, em 16
de março de 2007.
162
Figura B.32 Contracapa do Programa de Concerto da Camerata Armorial na Aula-Espetáculo O Reino da Pedra
Verde (Sagração n.o 1). Entre as obras do compositor Clóvis Pereira que foram executadas, estavam “No Reino da
Pedra Verde”, “Mourão” (variações sobre um tema de Guerra-Peixe) e, em parceria com Ariano Suassuna, “A Onça,
os Guinés e os Cachorros”.
163
Figura B.33 Capa do Programa de Concerto da Orquestra Armorial durante o Projeto Circuito de
Espetáculos patrocinado pelo SESC Pernambuco, Recife (Santo Amaro), em 11 de outubro de 1999.
164
Figura B.35 Capa do Programa de Concerto da Orquestra Sinfônica do Recife, Teatro de Santa Isabel, Recife-PE, 09
set. [entre 1972 e 1974].
166
Figura B.36 Contracapa do Programa de Concerto da Orquestra Sinfônica do Recife. Entre as obras do compositor Clóvis
Pereira, constou “Lamento e Dança Brasileira”, em primeira audição mundial, com regência do próprio compositor.
167
ANEXO C
ÍNDICE ONOMÁSTICO
A CALVINO, João, 37
CAMACHO, Vânia Cláudia da Gama, 92; 93
ACCIOLY, Marcus Moraes, 29; 40; 46
CAMPOS, Ana Paula, 47
ADORNO, Theodor, 38
CAMPOS, Maximiano, 29
AGOSTINHO (Santo), 53
CAPIBA (dito) [Lourenço da Fonseca Barbosa], 29;
AGUIAR, Lúcio, 51 35; 41; 43; 51; 52; 59; 63; 67
AGUIAR, Josefina Barros de, 24
CARRERO [DE BARROS FILHO], Raimundo, 46
AIRES, Lula Cardoso, 33
CASCUDO, Luís da Câmara, 36; 40
ALBUQUERQUE, Irapuan de, 42; 43
CAVALCANTI, Arthur Lima, 29
ALMEIDA, Antônio Carlos Nóbrega de, 46; 60
CAVALCANTI [DE ALBUQUERQUE], Lynaldo,
ALMEIDA, Cussy de, 29; 35; 39; 41; 45; 50; 56; 47
58; 59; 143; 146 COELHO, Germano, 34
ALMEIDA, Marlos Nobre de, 41
COLOMBO, Cristóvão, 36
ALOAN, Rafael Borges, 55
ALVES, Guilardo Martins, 139 D
AMORIM, José Tavares de, 60 DAUMIER, Honoré-Victorien, 40
ANDRADE, Mário Raul de Moraes, 30; 49; 50; DORÉ, Paul Gustave, 40
51; 52; 55; 68
DUDA (dito) [José Ursicino da Silva], 63
ANNES, Henrique José Pedrosa, 58
ANTUNES FILHO, José Alves, 43; 44 E
AZEVEDO, Fernando de, 37 ESTEVES, Reginaldo, 29
B F
BARBOSA, Fernando José Torres, 29 FARIAS, Antônio Arruda de, 45
BARRETO [DE MENESES], Tobias, 32 FÁVERO, Osmar, 34
BARROS FILHO, Teófilo de, 51 FERREIRA, Eliseu, 75
BARROS, Frederico Machado de, 37 FONSECA, Reinaldo, 33
BEETHOVEN, Ludwig van, 53 FREIRE, Paulo Reglus Neves, 34
BLAKE, William, 40 FREYRE, Gilberto, 32; 33; 35; 37
BORBA FILHO, Hermilo, 33; 34; 42; 43 G
BRENNAND, Deborah, 29
GALAMIAN, Ivan, 27; 74; 75
BRENNAND, Francisco de Paula Coimbra de
Almeida, 29; 33; 40; 42; 43 GALVÃO, Hélio, 50
SILVA, Lionel, 69
SQUEFF, Enio, 31
SUASSUNA, Ariano Vilar, 24; 27; 28; 29; 30; 31;
32; 34; 35; 36; 39; 39; 40; 41; 42; 44; 45;
46; 47; 48; 49; 50; 51; 52; 53; 54; 55; 56;
57; 58; 59; 60; 61; 113; 128; 134; 136;
143; 162
SUASSUNA, João Urbano Pessoa de Vasconcelos,
28
SUASSUNA, Rita de Cássia Dantas Vilar, 28