Afinal - O Que É Massa (José Maria Filardo Bassalo)
Afinal - O Que É Massa (José Maria Filardo Bassalo)
Afinal - O Que É Massa (José Maria Filardo Bassalo)
2016v33n2p433
Resumo
Abstract
In this article, we will discuss the concept of mass, by analysing its tem-
poral evolucion since the Ancient Age until its present situation.
I. Introdução
+
At last: What´s Mass?
* Recebido: fevereiro de 2016.
Aceito: abril de 2016.
1 E-mail: [email protected]
Na Idade Antiga (IA) (época antes do nascimento de Jesus Cristo, denominada por
a.C. e representada, aqui, por datas que vão do valor maior para o menor e C. representa cerca
de), os chamados filósofos tomavam a massa (do latim: moles) e o peso (do latim: pondus) de
um corpo como sendo sinônimos, pois ainda não existia uma teoria de gravitação bem estabe-
lecida. Havia, é claro, por parte de alguns deles, uma desconfiança de que existiria alguma
diferença entre eles. Assim, eles usavam também o termo grave (que vem da palavra latina:
gravitas) para representar a propriedade de um corpo ter “peso”, manifestada quando em mo-
vimento. Eles, de um modo geral, tinham também a preocupação de saber os elementos primor-
diais da Natureza e como eles apresentavam “peso”, ou seja, como se movimentavam no hoje
campo gravitacional terrestre.
Inicialmente, vejamos os elementos primordiais. A procura da substância primordial,
do elemento comum, da matéria prima, enfim, do – princípio (do grego: arché) –, que compõe
o Universo, começou há mais de 25 séculos com os gregos jônicos, os chamados pré-socráticos,
isto é, aqueles que antecederam ao filósofo grego Sócrates de Atenas (c.470-399). Alguns deles
apresentavam concepções unitárias (monistas) para a arché, enquanto outros, pluristas. Assim,
o filósofo grego Tales de Mileto (624-546) afirmava que o elemento primordial do Universo
era a água: - Sobre a qual a Terra flutua e é o começo de todas as coisas. Contudo, para o
filósofo grego Anaximandro de Mileto (610-c.547) tal elemento era mais indefinido do que a
água de Tales, pois considerava ser o infinito (do grego: apeíron). Já para o filósofo grego
Anaxímenes de Mileto (c.570-c.500) seria o ar o tal elemento primordial de vez que o mesmo
se reduziria à água por simples compressão. No entanto, para o filósofo grego Xenófones de
Jônia (Colofonte) (c.570-c.460) era a terra a matéria prima do Universo. Por fim, o filósofo
grego Heráclito de Éfeso (c.540-c.480) propôs ser o fogo essa matéria universal. Note-se que,
para o filósofo grego Empédocles de Akragas (atual Agrigento) (c.490-c.430) os elementos
fundamentais da natureza eram em número de quatro: água, ar, fogo, terra, que se combinavam
de várias maneiras para formar as substâncias.
Com a tomada da Jônia (atual Turquia) pelos persas, iniciada pelo Rei Ciro II, O
Grande (?-526 a.C.), em 546 a.C., surge um novo movimento filosófico que tenta explicar a
arché não como um elemento único, em certo sentido “macroscópico” (água, ar, fogo, terra)
mas como uma porção também única, porém subdividida “microscopicamente” da matéria. As-
sim é que, para o filósofo grego Anaxágoras de Clazômenas (c.500-c.428), o Universo decorria
da razão de uma ação abstrata sobre as sementes (do grego: spermata) que seriam as matérias
primas constituintes de todas as espécies imagináveis. Contudo, elas se comportariam como
partículas [do grego: homoioméreiai (homeomerias)] diferentes, em número infinito que, do
mesmo modo, continham outras “sementes”, e assim por diante ad infinitum. Em contraposição
a essa visão “panteísta” do Universo proposta por Anaxágoras, os filósofos gregos Leucipo de
Mileto (c.460-c.γ70) e seu discípulo Demócrito de Abdera apresentaram uma visão “monote-
ísta” segundo a qual todas as coisas do Universo são formadas por um único tipo de partícula –
434 Bassalo, J. M. F.
o indivisível (do grego: atomos) –, eterno e imperecível, que se movimentava no vazio. Entre-
tanto, para explicar as diversas propriedades das substâncias, eles admitiam que os átomos se
diferissem geometricamente por sua forma e posição, e que, por serem infinitamente pequenos,
só poderiam ser percebidos pela razão.
A formulação da concepção material do Universo quer monista, quer plurista, conti-
nuou ainda na Antiguidade. Com efeito, a concepção quaternária foi retomada pelo filósofo
grego Aristóteles de Estagira (384-322)2, porém seus elementos fundamentais – os essenciais -
eram: frio (do grego: tò psychrón), quente (do grego: tò thermón), úmido (do grego: tò hygrón)
e seco (do grego: tò xerón) que, grupados, dois a dois, reproduziam os elementos de Empédo-
cles da seguinte maneira: seco + frio = água, seco + quente = fogo, úmido + frio = água, e
úmido + quente = ar. Porém, tais elementos comporiam apenas as coisas “terrenas” e “lunares”,
sendo o espaço celeste formado pela quinta essência – o éter (em grego: ar puro).
Visto os elementos primordiais (que se apresentavam em três estados: sólido, líquido
e gasoso), tratemos do movimento deles. Para Aristóteles, o movimento representava: - O ato
do que está em potência enquanto potência. Assim, ele usava pondus para um “corpo parado”
(potência) e grave para um “corpo em movimento”, indicando que ele apresentava a proprie-
dade de “peso” (ato). Com relação aos atributos (categorias) dos seres que são afetados pelo
movimento, Aristóteles distinguia quatro espécies de movimento: o movimento segundo a es-
sência do ser é geração e corrupção; segundo a qualidade, é alteração; segundo a quantidade,
é crescimento e decrescimento; segundo o lugar, o movimento de um corpo pode ser natural se
ele se dirige para o seu lugar natural (por exemplo, para o alto como o fogo e o ar, e para baixo,
como a água e a terra); e forçado ou violento, se afastar-se de seu lugar natural (por exemplo,
o caso de uma pedra lançada para o alto).
Na continuação de seus estudos [apresentados em seu livro Physica (op. cit.)] sobre o
movimento, Aristóteles afirmou que existe um princípio dinâmico no movimento: - Todo mo-
vido é movido por um motor. Desse modo, no movimento natural um corpo se move devido a
sua apetência (do grego: apetitus) (já na Era Cristã, ela foi conceituada como inércia), isto é,
segundo a sua natureza, que é um motor interior. Já um corpo sob um movimento forçado o faz
por intermédio de um motor que lhe é estranho e contíguo. Este, dizia Aristóteles, é o caso do
movimento de uma pedra ou de uma flexa no ar e devia-se a uma força exercida pelo próprio
ar ao ser empurrado para trás pela pedra ou pela flexa, força essa que impulsionava esses corpos
em seus movimentos. Portanto, concluiu, só há movimento forçado se houver ar, conclusão que
levou ao célebre apotegma: - A Natureza tem horror ao vácuo. Ele também afirmava que: -
DEUS é o motor do Universo.
Usando esses princípios, Aristóteles obteve os seguintes resultados: 1) Sempre que
uma força ou potência é exercida sobre um móvel, a relação das distâncias percorridas é igual
à relação dos tempos de percurso; 2) A relação das forças exercidas sobre um móvel é igual à
2 Great Books of the Western World, v. 7 (Aristotle I); v. 8 (Aristotle II), Encyclopaedia Britannica Incorpora-
tion. University of Chicago, 1993.
III. Impetus
3Great Books of the Western World, v. 10, Encyclopaedia Britannica Incorporation. University of Chicago,
1993.
436 Bassalo, J. M. F.
como sendo devido a “causas finais”, ao admitir que a proximidade do lugar “natural” aumen-
tava o apetitus do movido.
Por sua vez, o filósofo e teólogo inglês William of Ockham (Guilherme de Occam)
(c.1285-c.1349) – fundador da Escola Nominalista – rejeitou ao mesmo tempo a concepção
aristotélica e o impetus sobre o movimento. Assim, ao usar seu Princípio da Economia (Parci-
mônia) – a famosa Navalha de Occam: – As entidades não devem ser multiplicadas sem neces-
sidade –, afirmou que ... o movimento como um conceito não tem realidade fora dos corpos em
movimento. Ao se referir ao movimento de um projétil disse: ... a coisa que se move num tal
movimento depois que o corpo movido se separou do primeiro propulsor, é a própria coisa
movida, não porque haveria nela uma força qualquer, pois essa coisa que se move e a coisa
movida não podem ser distinguidas.
O conceito de impetus foi mais elaborado pelo filósofo francês Jean Buridan (1395-
1358), ao discutir as seguintes questões:
1) Por que razão o ar, no caso do movimento de um projétil, teria ele sozinho a facul-
dade de continuar a mover-se, para, por sua vez, mover o projétil?
2) Por que o projétil não possuiria essa mesma faculdade?
Ao responder a essas questões, Buridan desenvolveu a sua “teoria do impetus”, se-
gundo a qual, o impulsor cede ao impulsionado uma potência proporcional à velocidade e ao
peso deste último, necessária a mantê-lo em movimento. E mais ainda, que o ar progressiva-
mente reduz a impulsão, e que o peso pode aumentar ou diminuir a velocidade. Assim, usando
esse conceito de impulsão, Buridan então afirmou que durante a queda de um corpo este é
movido pela ação conjunta da gravidade e do ímpeto adquirido, ação essa que resulta ser o
movimento do grave mais rápido a cada instante. Buridan, também, chegou a usar essa doutrina
do ímpeto para explicar os movimentos perenes dos planetas observados no céu, ao admitir que
DEUS talvez tenha, originalmente, saturado os planetas com ímpeto. Ele ainda fez o estudo
geométrico das configurações dos crescimentos e decrescimentos das qualidades cinemáticas
do movimento.
Nos Séculos 15 e 16, o impetus voltou a ser usado. Com efeito, o Cardeal alemão
Nicolau de Cusa (1401-1464) afirmou que a sua “impressão” em um móvel é como a criação
da alma em um corpo, assim como DEUS fez para iniciar o movimento das esferas celestes. O
conceito de impetus foi também usado pelo artista, inventor e cientista italiano Leonardo da
Vinci (1452-1519), como se pode ver dessas suas afirmações:
1) O ímpeto (impetus) brota tanto do peso quanto da força;
2) Todo o ímpeto tende a permanecer, como mostra o modelo do movimento impresso
a um móvel;
3) Nenhuma coisa se move por si mesma, mas seu movimento é produzido por outros;
4) Todo movimento espera ser mantido, ou seja, todo corpo em movimento move-se enquanto
conserva a impressão da potência de seu motor.
IV. Inércia
Muito embora da Vinci tenha intuído o conceito de inércia, este só foi se construindo
no decorrer do Século 17. Vejamos como. O astrônomo, físico e matemático italiano Galileu
Galilei (1564-1642) foi, provavelmente, o primeiro a observar, em 1583, que as oscilações pen-
dulares de um candelabro da Catedral (Duomo) de Pisa, se tornavam cada vez menores à medida
que o mesmo diminuía seu ritmo de movimento. A partir daí, começou seus estudos sistemáti-
cos sobre o movimento dos corpos. Assim, entre 1589 e 1592, na Universidade de Pisa, Galileu
começou seus estudos sobre o movimento dos corpos, os quais foram descritos no livro De
Motu (“O Movimento”), no qual examinou a possibilidade de haver outro tipo de movimento
que não fossem os movimentos – natural e violento – propostos por Aristóteles, o qual chamou
de neutro (origem, em nosso entendimento, do conceito de inércia, muito embora ele ainda
438 Bassalo, J. M. F.
tenha usado o vocábulo impetus). Assim, para Galileu, dois tipos de movimento não se enqua-
dravam nessa classificação aristotélica: o de rotação de um corpo em um plano vertical, já que
o mesmo ora se encontra acima e ora abaixo do horizonte; e o movimento uniforme de um corpo
em um plano horizontal liso, o qual nunca está abaixo ou acima desse mesmo horizonte. Esse
novo tipo de movimento neutro foi por ele abordado, em 1613, no livro intitulado Istoria e
Dimostrazione Intorno alle Machie Solare (“História e Demonstração Sobre as Manchas Sola-
res”) no qual afirmouμ - Se todos os impedimentos internos são removidos, um corpo pesado
sobre uma superfície esférica concêntrica com a Terra será indiferente ao repouso ou ao mo-
vimento para qualquer parte do horizonte. E ele permanecerá no estado em que pela primeira
vez for colocado: isto é, se for colocado em movimento para oeste, por exemplo, ele se manterá
nesse movimento. É interessante observar que, antes, em 29 de novembro de 1602, Galileu es-
creveu uma carta para o Marquês Guidobaldo del Monte5 (1545-1607) relatando suas experi-
ências com pêndulos, usando para isso, uma esfera atada à extremidade de um barbante. Nestas
experiências, descobriu que, independentemente do peso da esfera, o período de oscilação seria
o mesmo desde que fosse mantido o comprimento do barbante. E mais ainda, que o tempo de
oscilação (período) do pêndulo independia de sua amplitude6.
Ainda em seus estudos sobre o movimento, Galileu não fazia distinção clara entre peso
(pondus) e massa (moles), conforme se pode ver em seu célebre livro Discorsi e Dimostrazione
Mathematiche Intorno a Due Nuove Scienze Attenenti alla Mechanica ed i Movimenti Locali
(“Discursos e Demonstração em torno de Duas Novas Ciências Atinentes à Mecânica e aos
Movimentos Locais”), publicado em 16γ8. Aliás, neste livro, Galileu trabalha com grandezas
cinemáticas: a velocidade (espaço/tempo) e a aceleração (velocidade/tempo). Esta, no entanto,
era relacionada apenas com o movimento dos corpos no campo gravitacional terrestre e, por-
tanto, seria a aceleração da gravidade (g), chegando inclusive a calcular o seu valor. Merece
ainda destaque o fato de que, em 1659, o físico holandês Christian Huygens (1629-1695) de-
monstrou que o período (T) de um pêndulo de comprimento (ℓ), valeμ T = π √(ℓ/g). Assim,
tomando um pêndulo de comprimento ℓ ~ 15,7 cm e com 4.λ64 oscilações duplas por hora,
encontrouμ g ≈ λ,806 m/s2
Registre-se que a distinção acima referida foi apresentada pelo discípulo de Galileu, o
físico italiano Giovanni Battista Baliani (1582-1666) no prefácio de seu livro De Motu Gravium
(“Sobre o Movimento dos Graves”), também publicado em 16γ8, no qual falava de peso como
agente (agens) e a massa como paciente (patiens), usando categorias aristotélicas.
Ainda na primeira metade do Século 17, a ação de uma força (conceito ainda não bem
entendido, pois era confundido com o peso, como fazia da Vinci, por exemplo) sobre um corpo
foi investigada pelo matemático e filósofo francês René du Perron Descartes (1596-1650) em
seu livro Principia Philosophiae (“Princípios de Filosofia”), publicado em 1644, no qual apre-
sentou suas pesquisas sobre o movimento dos corpos, principalmente o efeito de uma força
atuando em um corpo, considerando-o como a sua quantidade de movimento. Como resultado
dessas pesquisas, afirmou que: 1) Cada coisa persevera no estado em que está, enquanto nada
muda; 2) Nenhuma coisa muda senão pelo encontro de outras; 3) Deus criou a quantidade de
movimento inicial do Universo e, a partir de então, ela permanece sempre conservada, gerando
dessa maneira, as leis da natureza. Cremos que as duas primeiras afirmações cartesianas rela-
cionam-se com a inércia galileana.
Os conceitos de quantidade de matéria e de quantidade de movimento foram apresen-
tados pelo físico inglês Sir Isaac Newton (1642-1727) em seu célebre tratado intitulado Philo-
sophiae Naturalis Principia Mathematica (“Princípios Matemáticos da Filosofia Natural”)7, pu-
blicado em 1687 e composto de três livros. Ele inicia seu tratado (Livro I) com duas primeiras
definições:
1) Quantidade de Matéria: - É a medida da mesma, obtida de sua densidade e volume
conjuntamente;
2) Quantidade de Movimento: – É a medida do mesmo, obtida conjuntamente a partir
da velocidade e da quantidade de matéria.
Depois de escrever essas definições, Newton apresenta ainda no Livro I suas três Leis
do Movimento: 1) Primeira Lei da Mecânica (hoje, Lei da Inércia): Todo corpo continua em
seu estado de repouso ou de movimento uniforme em uma linha reta, a menos que ele seja
forçado a mudar aquele estado por forças imprimidas sobre ele; 2) Segunda Lei da Mecânica
(hoje, Lei da Força): A mudança de movimento é proporcional à força motora imprimida, e é
produzida na direção da linha reta na qual aquela força é imprimida; e 3) Terceira Lei da
Mecânica (hoje, Lei da Ação e Reação): A toda ação há sempre oposta uma reação igual, ou,
as ações mútuas de dois corpos um sobre o outro são sempre iguais e dirigidas a partes opos-
tas.
É interessante registrar que no Livro III, Newton propõe sua famosa Lei da Gravitação
Universal: A Gravidade opera proporcionalmente à quantidade de matéria e propaga sua vir-
tude para todos os lados a distâncias imensas, decrescendo sempre como o inverso do qua-
drado da distância. Essa Lei é hoje dada por: P = G m1 m2/d2, onde G é a chamada constante
7 Great Books of the Western World 32. Encyclopaedia Britannica, Inc., 1993. Tradução em português: Nova
Stella/EDUSP, 1990.
440 Bassalo, J. M. F.
de gravitação universal e calculada pela primeira vez pelo físico e químico inglês Lord Henry
Cavendish (1731-1810), em 17988.
Por sua vez, o conceito de quantidade de movimento também aparece no trabalho do
matemático e filósofo alemão Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-1716), em 16869, quando afir-
mou que a mesma era calculada pelo produto da quantidade de matéria pelo quadrado de sua
velocidade (v2), denominando-o de vis viva (“força-viva”) (hoje se sabe que ele errou, pois a
“força-viva” nada mais é do que o dobro da energia cinética). Destaque-se que Huygens cha-
mava a quantidade de matéria de quantitates solidas (“quantidades sólidas”), por ocasião em
que definiu a força centrífuga (relação entre a vis viva e a distância), conforme aparece em seu
livro póstumo Opuscula Posthuma, publicado em 1703.
Até aqui, vimos que o termo massa não aparece explicitamente em nenhum texto e
nem em expressões analíticas a ela relacionadas. Isso só aconteceu quando os conceitos de
quantidade de matéria e quantidade de movimento foram retomados pelo matemático suíço
Leonhard Euler (1707-1783), na primeira metade do Século 18. Com efeito, em seu livro inti-
tulado Mechanica, sive Motus Scientia Analytice Exposita (“Mecânica, ou Ciência do Movi-
mento Estudada Analiticamente”) publicado em 17γ6, as Leis do Movimento de Newton come-
çam a ser desenvolvidas pela primeira vez na forma analítica. Neste livro, Euler apresentou de
maneira clara e precisa os conceitos de ponto material (que é caracterizado por uma massa) e
de aceleração (variação temporal da velocidade). Lembrar que esse conceito já havia sido tra-
tado por Galileu apenas como aceleração da gravidade. Por sua vez, a quantidade de movi-
mento, foi tratada por Euler em trabalho publicado em 1750, porém com o nome de momento
linear, e no qual enunciou o Princípio do Balanço do Momento Linear (que já havia sido con-
siderado por Descartes e hoje conhecido como A Conservação do Momento Linear: p = mv)
como uma extensão da Segunda Lei de Newton, e segundo o qual a aceleração de cada parte
infinitesimal de qualquer corpo é igual à força (F) por unidade de massa que atua no mesmo.
Tal princípio, ainda segundo Euler, deve aplicar-se a sistemas mecânicos contínuos e discretos,
uma vez que sua formulação em termos de equações diferenciais em coordenadas cartesianas
retangulares permite sua aplicação a qualquer configuração de corpos no espaço tridimensional.
Em vista disso, Euler apresentou a forma analítica daquela lei da seguinte maneira (em notação
atual)μ F = m a = m dv/dt → F = m a = d(m v)/dt = dp/dt, sendo a o vetor aceleração e v o vetor
velocidade. Note-se que a segunda equação foi a que Newton se referiu, não como uma igual-
dade e sim como uma proporcionalidade.
Aliás, é oportuno salientar que, usando a expressão F = m a e aplicando-a ao campo
gravitacional, resulta que o peso de um corpo, vale: P = mG g, com g representando a aceleração
442 Bassalo, J. M. F.
porém de sentido contrário à aceleração a. Considerando a massa de um desses corpos como
padrão, a do corpo A (mA), por exemplo, aquelas leis de Newton mostram que essas massas se
relacionam do seguinte modo: mB = mA (a/a´). Desta maneira, concluiu Mach, sua definição de
massa não precisa da “quantidade de matéria” envolvida na mesma10.
beta ( ) [que passaram a ser conhecido como elétrons, depois de sua descoberta realizada por
em suas experiências no sentido de medir a massa do elétron (me), usando o desvio de raios
10 SYMON, K.R. Mechanics. Addison-Wesley Publishing Company, Inc., 1961; MACH, op. cit.
11 Philosophical Magazine, v. 11, p. 229, 1881.
12 Physikalische Zeitschrift, v. 1, p. 39, 1899.
13WHITTAKER, E. T. A History of the Theories of Aether and Electricity: The Classical Theories. Thomas
Nelson and Sons, Ltd., 1951; OKUN, L. B. Physics Today, p. 11, June, 1979; PAIS, A. ‘Subtle is the Lord…’.
The Science and the Life of Albert Einstein. Oxford University Press, 1982.
14 Nachrichten von der Gesellschaft der Wissenschaften zu Göttingen, p. 143, 1901.
15 Physikalische Zeitschrift, v. 4, p. 54, 1902.
16 Nachrichten von der Gesellschaft der Wissenschaften zu Göttingen, p. 90, 1903.
21 Science, v. 76, p. 238; Proceedings of the Royal Society of London, A41, p. 405, 1932.
22 Proceedings of the Royal Society of London, A139, p. 699, 1933.
23 American Journal of Physics, v. 20, p. 479, 1952.
24 Proceedings of the Royal Society of London, A72, p. 132, 1903.
25 Philosophical Transactions of the Royal Society of London, A202, p. 165, 1904.
26CHERMAN, A.; MENDONÇA, B. R. Por que as coisas caem? Uma breve história da gravidade. Zahar,
2009.
446 Bassalo, J. M. F.
VIII. Massa Gravitacional/Inercial Einsteiniana
Depois de formular a TRR, Einstein percebeu que havia duas grandes dificuldades
nela. Primeira, ela se baseava em referenciais inerciais, aqueles que se movimentam sem ace-
leração, ou seja, com velocidade constante, e que não existem no mundo real. A segunda era a
de que sua teoria não incluía a Teoria da Gravitação de Newton (TGN). Desse modo, seu pró-
ximo passo foi o de representar a gravitação newtoniana dentro da estrutura da TRR. Registre
que ao comentar com seu amigo, o físico alemão Max Karl Ernest Planck (1858-1947; PNF,
1918) [o formulador da Teoria Quântica, em 190031, segundo a qual a energia varia discreta-
mente] sobre seu ambicioso projeto, Planck o advertiu: - Como um amigo mais velho, devo
aconselhá-lo negativamente, pois, primeiro, você não terá sucesso, e, ainda que tenha, ninguém
acreditará em você. ... Porém, se você conseguir, será considerado um novo Copérnico. Apesar
dessa advertência, Einstein começou a pensar no ajuste da TGN com a TRR32.
O pensamento básico do ajuste da TGN com a TRR ocorreu a Einstein, em 1907,
quando ele estava ainda trabalhando no Escritório de Patentes, em Berna, na Suíça. Segundo
suas próprias palavras: Eu estava sentado numa cadeira no escritório de patentes de Berna,
quando, de repente, um pensamento me ocorreu: uma pessoa em queda livre não sentirá seu
próprio peso. Fiquei surpreso. Esse pensamento simples impressionou-me profundamente. Im-
peliu-me para uma teoria da gravitação. Note que o próprio Einstein afirmou que esse foi “o
pensamento mais feliz da vida dele”33.
Naquele mesmo ano de 190734, Einstein publicou um artigo no qual discutiu, pela pri-
meira vez, a equivalência entre a massa inercial (mI) e a massa gravitacional (mG) [mI ≡ mG:
Princípio da Equivalência (PE)]. Como vimos antes, em 1905, na formulação da TRR, Einstein
demonstrou que a massa de um corpo cresce com a sua velocidade, razão pela qual a interpretou
como mI. Aliás, essa interpretação ele já a havia considerado quando, ainda em 1905, e um
pouco antes de apresentar a TRR, partindo da Teoria Quântica de Planck (1900), Einstein ex-
plicou o efeito fotoelétrico (emissão de elétron de um átomo pela incidência de luz), conside-
rando que a luz (de frequência ) era um pacote de energia quântica (h ) dotado de massa. Com
essa interpretação da luz, Einstein questionou se a gravidade influenciava a propagação da luz,
tendo em vista de seu PE (mI ≡ mG). Em 191135, Einstein voltou a estudar a influência da gra-
vidade newtoniana sobre a luz, ocasião em que fez as seguintes afirmações: 1) Um raio de luz
passando próximo de um campo gravitacional potente, tal como o Sol, deve se encurvar; 2) A
velocidade da luz deve depender do campo gravitacional. A partir dessas afirmações, Einstein
usou a TGN para calcular o encurvamento (bending) (α) de um raio luminoso ao tangenciar o
448 Bassalo, J. M. F.
newtonianos, e sim dada pela curvatura do espaço-tempo riemanniano [traduzido pelo tensor
geométrico de Ricci (R ), que é o tensor de Riemann (R τ) contraído], provocado pela pre-
sença do tensor energia-matéria (T ). Desse modo, quando um corpo “cai” em qualquer pla-
neta (Terra, por exemplo), ele não é puxado pela “força de atração gravitacional do planeta” e
sim, ele se desloca na curva do espaço-tempo produzida pela presença da massa planetária, isto
é, ele se movimenta na geodésica da geometria riemaniana (g = g = tensor métrico) induzida
por essa massa. Para comprovar essa sua TRG, Einstein afirmou que existiam três testes cruci-
ais:
1) Precessão dos periélios dos planetas;
2) Curvatura (bending) de raios luminosos próximos a campos gravitacionais;
3) Deslocamento para o vermelho (red shift).
Essa sua TRG (hoje, Teoria da Gravitação de Einstein – TGE) era baseada em uma
equação, a hoje célebre Equação de Einstein (EE): R - (1/2) g R = - K T , onde R =
g R , K = 8πG/c4 é a constante gravitacional de Einstein. Note-se que, em 191743, Einstein
adicionou outro termo no primeiro membro de sua equação (Λ g ) – o hoje conhecido termo
cosmológico - para tornar estáticas a solução que encontrara para a sua equação; esse termo
funcionava como uma repulsão cósmica. Desse modo, sua equação passou para: R - (1/2) g
R - Λ g = - K T , na qual Λ g tendo um significado “geométrico”.
Observe-se que, usando sua TRG, Einstein calculou o encurvamento (bending) da luz
ao passar pelo disco solar, encontrando o valor de 1”,74, cerca do dobro do valor que ele havia
calculado em 1911, usando a TGN. Esse valor foi praticamente confirmado pelas observações
do eclipse total solar que ocorreu em 29 de maio de 1919, visível em Sobral (Ceará, Brasil) e
na Ilha de Príncipe (Golfo Guiné, África). Para observar esse eclipse foram organizadas duas
expedições de astrônomos ingleses: Andrew Commelin (1865-1939) comandou a de Sobral, e
Sir Arthur Stanley Eddington (1882-1944) a da Ilha de Príncipe. A análise dessas duas obser-
vações só foi concluída em 06 de novembro de 1919, em uma reunião conjunta da Royal Society
of London e da Royal Astronomical Society, presidida por Sir Joseph John Thomson, com os
seguintes resultados44μ Sobralμ 1”,λ8 0”,16 e Ilha de Príncipeμ 1”,61 0”,40. Esse resultado
confirmou o que se denomina de Massa Gravitacional/Inercial Einsteiniana.
450 Bassalo, J. M. F.
de plasmon [cunhado, inicialmente, pelos físicos norte-americanos David Pines (n.1924) e Da-
vid Joseph Bohm (1917-1λλβ), em 1λ5β]. Os “fótons” plasmons, contudo, são longitudinais e
tem spin = 0 e, para explicar sua passagem no plasma foi-lhe atribuída uma massa efetiva, pois
sendo sua velocidade um pouco menor do que c, ele precisa dessa “massa” para se movimentar,
funcionando como uma “vestimenta” para esse tipo de “fóton” (plasmon), chamado então de
“fóton vestido”. É interessante destacar que o plasmon existe também em materiais condutores
e em semicondutores, que são considerados gases de “elétrons livres” (naturais e decorrentes
de “dopagem”), respectivamente47.
X. Massa Higgsiana
Para os antigos filósofos gregos, existiam quatro tipos de forças: as que atuam nos
corpos nas proximidades de nosso planeta Terra; as que atuam nos corpos celestes; as exercidas
pela magnetita ou ímã natural (hoje conhecida quimicamente como o óxido de ferro: Fe3O4); e
as exercidas pelo âmbar, quando este é atritado com um pedaço de lã. Estas duas últimas foram
mencionadas por Tales de Mileto. Durante muito tempo os fenômenos elétricos e magnéticos,
por se apresentarem bastantes semelhantes, foram confundidos, até serem, pela primeira vez,
diferenciados pelo matemático italiano Girolano Cardano (1501-1576). Observação semelhante
foi realizada pelo médico e físico inglês William Gilbert (1544-1603), que a registrou em seu
famoso tratado De Magnete, publicado em 1600. Aliás, foi ele quem, nesse livro, cunhou o
termo elétrico para os corpos que se comportavam como o âmbar (“elektron”, em grego)
quando atritado com a lã.
As duas primeiras forças relacionadas acima, terrestres e celestes, discutidas por Aris-
tóteles em seus Livros V-VIII48, teve sua primeira ideia de unificação considerada por al-Biruni
ao afirmar que os fenômenos físicos no Sol, na Terra e na Lua obedecem às mesmas leis49. Mais
tarde, em 1602, Galileu afirmou que as leis que regem o movimento das forças terrestres e
celestes são universais50. Contudo, como vimos no item 4, foi Newton quem formalizou essa
unificação por intermédio de sua célebre Lei da Gravitação Universal.
Por sua vez, as primeiras experiências que indicavam a unificação entre as forças elé-
trica e magnética foram realizadas pelo farmacêutico e físico dinamarquês Hans Christiaan
Oersted (1777-1851). Vejamos como. Em 1807, Oersted procurou, sem êxito, encontrar uma
relação entre aquelas forças. Ela só foi encontrada no inverno de 1819-1820, quando ministrou,
na Universidade de Copenhague, um curso sobre Eletricidade, Galvanismo e Magnetismo. Du-
rante esse curso, Oersted realizou uma série de experiências. Por exemplo, em fevereiro de
1820, observou que um condutor se esquentava quando era percorrido por uma corrente elétrica.
47 KITTEL, op. cit.; MENDONÇA, J. T. Uma biografia da luz. Livraria da Física, 2015.
48 Física. Les Belles Lettres, 1996.
49 SALAM, A. Em Busca da Unificação. Gradiva, 1991.
50 Lopes, J. L. Albert Einstein e a imagem física do mundo. CBPF-CS-011/1997.
51Martins, R. de A. Cadernos de História e Filosofia da Ciência, v. 10, UNICAMP, 1986. p. 87; WHIT-
TAKER, op. cit., 1951.
52 MISNER, C. W.; THORNE, K. S.; WHEELER, J. A. Gravitation. W. H. Freeman and Company, 1973.
53 BASSALO, J. M. F.; CARUSO, F. Einstein. Livraria da Física, 2013.
452 Bassalo, J. M. F.
a fraca e a forte. A primeira, formulada pelo físico italiano Enrico Fermi (1901-1954; PNF,
1938), em 1934, para explicar o decaimento [o nêutron (n) transforma-se em um próton (p),
com a emissão de um elétron (a partícula ≡ e-) e do neutrino do elétron ( e) (hoje se sabe que
é o antineutrino e )54. Note-se que, antes, em 1932, a descoberta do nêutron pelo físico inglês
Sir James Chadwick (1891-1974; PNF, 1935), em 193255, como uma das partículas constituin-
tes do núcleo atômico rutherfordiano, juntamente com o próton, provocou uma grande dificul-
dade para os físicos, qual seja, a de explicar a razão de os prótons não se repelirem pela força
coulombiana (eletromagnética) no interior do núcleo. Essa dificuldade foi resolvida pelo físico
japonês Hideaki Yukawa (1907-1981; PNF, 1949), em 193556, ao propor que, no interior do
núcleo atômico, existia uma nova força na Natureza, a força nuclear (mais tarde chamada de
força forte) que era de curto alcance e mediada por uma partícula de massa intermediária entre
a massa do elétron (me) e a massa do próton (mp), razão pela qual a mesma ficou conhecida,
inicialmente, como yukon, mesotron e, hoje, méson μ (múon). Note-se que a existência dessa
partícula foi confirmada nas experiências realizadas, em 1947 (Nature 159, p. 694), pelos físi-
cos, o brasileiro Cesare (César) Mansueto Giulio Lattes (1924-2005), os ingleses Hugh
Muirhead (1925-2007) e Sir Cecil Frank Powell (1903-1969; PNF, 1950), e o italiano Guiseppe
Paolo Stanislao Occhialini (1907-1993), nas quais observaram que a incidência de raios cósmi-
cos em emulsões nucleares colocadas nos Alpes (Suíça) e em Chacaltaya (Bolívia) produzia
dois tipos de mésons: primários (hoje, píons) e secundários (múons). Observe-se que, a desco-
berta de mais duas forças (interações) na Natureza, a fraca e a forte, elevava para quatro (4) o
número das forças naturais: gravitacional, eletromagnética, fraca e forte e que são bem distin-
tas, dada pela seguinte relação: 1 (forte), 10-2 (eletromagnética); 10-6 (fraca); e 10-39 (gravita-
cional).
Durante mais de 20 anos, essas quatro forças (interações) permaneceram independen-
tes, pois, conforme vimos anteriormente, a tentativa de unificar (via geometrização) as duas
primeiras (gravitacional e eletromagnética), foi malograda. Diferentemente dessa via geomé-
trica, a tentativa de unificar aquelas forças começou a ser viabilizada graças ao desenvolvimento
das Teorias de “Gauge” (“Calibre”). Vejamos como isso ocorreu. Em 195457, os físicos, o
sino-norte-americano Chen Ning Yang (n.1925; PNF, 1957) e o norte-americano Robert Lau-
rence Mills (n.1927), propuseram uma Teoria de “Gauge” não-Abeliana para estudar a intera-
ção forte. [Registre-se que, em 1955, o físico inglês Ronald Shaw (n.1929) defendeu sua Tese
de Doutoramento, sob a orientação do físico paquistanês Abdus Salam (1926-1996; PNF,
1979), na qual havia uma proposta semelhante à de Yang-Mills]. No entanto, por não ser renor-
malizável para bósons [partículas que têm spin zero ou inteiro, e que obedecem à Estatística de
454 Bassalo, J. M. F.
A TSW voltou a ser objeto de pesquisa por parte do físico japonês Yoichiro Nambu
(n.1921; PNF, 2008) ao descobrir, em 196065, a quebra de espontânea de simetria naquela te-
oria, usando uma analogia com a supercondutividade [descoberta em 1911 (Communications
from the Physical Laboratory of Leiden 122B e 124C), pelo físico holandês Heike Kamerlingh
Onnes (1853-1926; PNF, 1913), em que os condutores apresentam resistência elétrica quase
nula]. A descoberta de Nambu foi confirmada, em 1961, pelo físico inglês Jeffrey Goldstone
(n. 1933)66 e, também, por Nambu e G. Jona-Lasínio67. Esses trabalhos mostravam que essa
quebra de simetria era acompanhada de partículas não-massivas, logo denominadas de bósons
de Nambu-Goldstone (bN-G) ou, simplesmente, bósons de Goldstone (bG), também conhecido
como Teorema de Goldstone (TG). Logo em seguida, em 196268, Goldstone, Salam e Weinberg
mostraram que a existência desses bósons era um resultado geral da Teoria Quântica de Cam-
pos. Em 1964, em trabalhos independentes, os físicos, o inglês Peter Ware Higgs (n.1929; PNF,
2013)69, os belgas François Englert (n.1932; PNF, 2013) e Robert Brout (1928-2011)70, os
norte-americanos Gerald Stanford Guralnik (n.1936) e Carl Richard Hagen (n.1937) e o indiano
Thomas Walter Bannerman Kibble (n.1932)71, encontraram um mecanismo que tornava massi-
vos os bN-G. Esse mecanismo ficou conhecido como mecanismo de Higgs, do qual participam
o dubleto Higgs (H+, H0) e seu respectivo antidubleto ( H- , H0 ), e que apresentam a quebra
espontânea da referida simetria, ocasião em que o fóton ( ) permanece com massa nula, porém
W± os adquirem massas por incorporação dos bósons carregados ( H ), ao passo que Z0 adquire
massa de uma parte dos bósons neutros ( H0 + H0 ), ficando a outra parte ( H0 - H0 ) como uma
nova partícula bosônica escalar (spin 0), o referido bóson de Higgs (bH) [ou simplesmente,
partícula Higgs (H)] cuja massa (mbH) era dada por: mbH = 166 Gev/c2 (vide Salam, op. cit.).
Essa H é a que gera a massa higgsiana de todas as partículas elementares até então conhecidas
(mas não gera sua própria massa), e que foi detectada em β01β, com a massa de ≈ 1β6 GeV/c2
72
.
456 Bassalo, J. M. F.
Primack (n.1945) e E. Regös desenvolveram um modelo, segundo o qual 70% da ME são com-
postas de partículas que interagem fracamente (WIMP – “Weak Iteracting Massive Particles”,
com massa de ~ 50 mp) e os 30% restantes consistem de uma espécie de “neutrinos estéreis
massivos”. Observe-se que, esse modelo envolvendo “neutrinos estéreis” foi confirmado, em
199480, por Y. P. Jing, H. J. Mo, G. Börner e L. Z. Fang e, em 1995 81, Primack, Holtzmann,
Klypin e D. O. Caldwell admitiram que esses neutrinos têm massa de ≈ β,4 eV/c2. [Lembrar
que na Teoria do Modelo Padrão das Partículas Elementares (TMPPE), o neutrino não tem
massa, e são de três tipos: eletrônico ( e), muônico ( ) e tauônico ( τ). Sobre a TMPPE, ver:
Martinus Veltman, Facts and Mysteries in Elementary Particles (World Scientific, 2003); Maria
Cristina Batoni Abdalla, O Discreto Charme das Partículas Elementares (EdUNESP/FAPESP,
2006].
Sobre a massa dos neutrinos, é oportuno destacar que o Prêmio Nobel de Física de
2015 (PNF/2015) foi concedido aos físicos: o japonês Takaaki Kajita (n.1959) e o canadense
Arthur (“Art”) Bruce McDonald (n.1λ4γ) pela descoberta da oscilação dos neutrinos, por in-
termédio de experiências, envolvendo, respectivamente, os neutrinos atmosféricos e os neutri-
nos solares, experiências essas que indicam serem os neutrinos possuidores de massa. [Neutrino
Oscillations (Scientific Background on the Nobel Prize in Physics 2015, The Royal Swedish
Academy of Sciences)].
Nova evidência da ME foi encontrada em 1995, por J. Frieman, C. T. Hill, A. Stebbins
e Ioav Waga82 e, independentemente, por Patrick Petijean, Jan Mucket e Ronald Kates83. Tam-
bém em 199584, Adam Guy Riess (n.1967), W. H. Press e Robert P. Kirshner (n.1949) estu-
daram o movimento de um grupo de estrelas, o chamado grupo local, usando as formas das
curvas de luz (lente gravitacional, que provoca o desvio da luz que passa próximo de uma
determinada massa gravitacional) da supernova do tipo Ia (SN-Ia) (esta é resultante de uma
violenta explosão de uma estrela anã-branca, estrela essa que resulta do resíduo de uma estrela
que completou o ciclo de vida normal e, portanto, acabou a fusão nuclear que a alimentava).
Em 199685, Reinhard Genzel, N. Thatte, A. Krabbe, H. Kroker e L. E. Tacconi-Garman estu-
daram uma possível concentração de ME no centro de nossa galáxia, a Via Láctea.
Em 199886, Riess, Alexei V. Filippenko, Peter Challis, Alejandro Clocchiatti, Alan
Diercks, Peter M. Garnavich, Ron L. Gilliland, Craig J. Hogan, Saurabh Jha, Kirshner, B. Lei-
458 Bassalo, J. M. F.
anos. O resultado final dessa colisão deu origem ao aglomerado conhecido como projétil (bul-
let) – 1E0657-556, considerado como uma prova empírica direta da existência da matéria es-
cura92.
A busca da explicação da ME continua conforme indicam os astrofísicos norte-amer-
icanos Bogdan A. Dobrescu (n.1968) (de origem romena) e Don Lincoln (n.1964), em recente
artigo intitulado: Mistérios Ocultos do Cosmos93. Segundo esses cientistas, a ME pode se
apresentar de formas variadas e estranhas, podendo ser constituída de uma única partícula (p.e.:
WIMP) ou de uma infinidade delas, e com propriedades estranhas ao mundo físico em que
vivemos. Além do mais, ela(s) estaria(m) sujeita(s) a uma variedade de forças de interação entre
elas, porém interagindo muito fracamente com a matéria comum que conhecemos [basi-
camente: prótons (p), nêutrons (n) e elétrons (e)], daí ainda não existir nenhuma comprovação
experimental definitiva de sua existência. Como essa comprovação acontece em detectores de
carga elétrica, então os estudiosos da ME admitem que ela possa transportar uma “carga es-
cura” [positiva e negativa, porém, segundo os astrofísicos Lotty Ackerman, Mathew R. Buck-
ley, Sean M. Carroll e Marc Kamionkowski mostraram, em 2009 94, essa “carga” era muito
pequena, cerca de 1% da carga do elétron] capaz de atraí-las ou repeli-las [como acontece com
a carga elétrica que conhecemos [p (+) e o e (-)]. Assim, se elas agirem como fazem as cargas
elétricas comuns, haveria então a possibilidade de criar uma QEDD (Quantum Electrodynamics
Dark) cuja partícula responsável pela interação entre elas seria um “fóton escuro” (dark pho-
ton). Assim, quando a “matéria escura” encontrasse a “antimatéria escura”, haveria a formação
de “fótons escuros”, devido ao “aniquilamento escuro”, processo semelhante ao
“aniquilamento claro” {e- (elétron) + e+ [anti-elétron (pósitron)] → } da QED.
Antes de conjecturarmos uma resposta para a pergunta acima, faremos três comentá-
rios: 1) Massa Quântica; 2) Massa do nucleón (próton/nêutron); 3) Padrão da massa. O primeiro
comentário decorre da aplicação da Mecânica Quântica de de Broglie (1926)-Bohm (1952), por
exemplo, ao movimento de um pacote de onda gaussiano em um campo elétrico ou gravitacio-
nal, e o de um elétron estendido (com dimensões maiores do que o raio clássico do elétron: ~
0,5 10-10 m). Tais aplicações mostram que o atributo da massa pode ser visto como um efeito
quântico derivado do potencial quântico de Bohm (VQB) [Peter R. Holland, The Quantum The-
ory of Motion: An Account of the de Broglie-Bohm Causal Interpretation of Quantum Mecha-
nics (Cambridge University Press, 1993)]. É interessante ressaltar que uma possível relação
92 Para maiores detalhes dessa descoberta, ver: SPACE.com (23 de agosto de 2006) e Ciência Hoje, v. 39, p.
231, outubro 2006.
93 Scientific American Brasil, v. 159, p. 35, Agosto 2015.
94 Physical Review, D79, a.n. 023519, 2009.
460 Bassalo, J. M. F.
Por fim, vejamos o padrão da massa. Em recente entrevista97, esse físico alemão, nas-
cido em 1943 e Prêmio Nobel de Física de 1985, afirmou que, embora os dois padrões do
Sistema Internacional (SI) [metro(m)/qui(ki)lograma(kg)/segundo(s)], ou seja, o metro e o se-
gundo, já sejam conhecidos em função de grandezas quânticas envolvendo a constante de
Planck (h), o terceiro padrão, o quilograma [massa de um cilindro equilátero, de 39 mm de
altura e 39 mm de diâmetro, construído de uma liga de 90% de platina (Pt) e 10% de irídio
(Ir), depositado no Museu Internacional de Pesos e Medidas (MIPM), localizado em Sèvres,
próximo de Paris], é um protótipo universal, com reproduções espalhadas no mundo e, que, de
vez em quando, são comparadas e reajustadas. Contudo, como não se sabe a razão dessas vari-
ações: aumento ou diminuição do valor do padrão e suas cópias, segundo von Klitzing, o padrão
francês está sendo usado para obter o valor de h e, desse modo, por meio desse valor e usando
uma balança de grande precisão (balança de Watt, que compara medidas de potências: elétrica
e mecânica), o quilograma padrão poderá ser escrito em termos de h98.
Em vista do que foi exposto neste artigo, cremos que a resposta para a sua pergunta,
é:
Ninguém sabe!
Será que o leitor concorda com essa resposta?
97 Everton Lopes, Marco Moriconi e Cássio Leite Vieira, Klaus von Klitzing: O Físico Constante, Ciência Hoje,
v. 55, p. 328, Agosto 2015.
98 Para detalhes sobre essa expectativa (que inclui o Efeito Hall Quantizado Inteiro, descoberto por von Klitzing,
em 1980), ver os seguintes artigos: José Maria Filardo Bassalo, Revisitando o Sistema MKS/SI: Metro (m), Qui-
lograma (kg) e Segundo (s) e Efeito Hall: Clássico e Quântico e os Prêmios Nobel de Física de 1985 e 1998, que
podem ser consultados no seguinte site: www.searadaciencia.ufc.br.