História Urbana e Movimentos Sociais: Essa Tal de Reforma Urbana (1950-1990)
História Urbana e Movimentos Sociais: Essa Tal de Reforma Urbana (1950-1990)
História Urbana e Movimentos Sociais: Essa Tal de Reforma Urbana (1950-1990)
URBANA E
MOVIMENTOS SOCIAIS:
O Movimento de Reforma Urbana
(1950-1990)
Introdução 15
8
extraordinária contribuição à área de estudos dos movimentos sociais. Um dos
Dias Coelho, num processo tenso de superação das armadilhas que costumam
interromper o caminho daqueles que, ao enfrentarem a temática dos
explicam, pelo menos em parte, o fato de que esta seja uma experiência em
9
Trata-se, realmente, de um processo histórico extremamente complexo,
Dias Coelho explica-se, desta maneira, por toda uma vida dedicada à
10
própria memória coletiva - abertos pela ditadura militar, responsável pela
explica, ao nosso ver, a secundarização da temática das lutas urbanas nos anos
90. Se os atores não estão em cena, para que estudá-los? por que valorizar as
11
demonstra, com clareza, que o ideário da Reforma Urbana possui raízes
Franklin Dias Coelho também ousa ao trazer o tema das lutas urbanas para
12
encontro, entre tantos outros propostos pelo livro, significa resistir ao
características únicas das lutas urbanas, inscritas no conjunto mais amplo dos
13
A leitura do livro demonstra, neste sentido, que a valorização analítica
culturais profundos. Assim, Franklin Dias Coelho nos monstra que a inovação
sim, de pessoas comprometidas com a luta por uma vida melhor, pela
cidadania e pela justiça social na cidade.
14
Introdução
econômica e social.
15
símbolos que nos permitissem pensar elementos mais
1
FHOBSBAWN,Eric J. História Operária e Ideologia, in: Mundos do
Trabalho. Novos Estudos sobre História Ope rária . Paz e Terra, Rio de
Janeiro, 1984.
16
em um discurso descompromissado e sem paixões, pois não foi
ventos teóricos.
17
reprodução das estruturas, o jogo das lógicas formais, com
Lefebvre.
18
mas que estivesse mais enraizada com os caminhos vivenciados
urbano.
19
urbanos. Debatia - se a existência de um paradigma dos novos
20
cientistas sociais de diversas correntes teóricas buscam uma
a 64.
autoritarismo.
21
história da cidade e da urbanização. P rocurei trabalhar a
território.
22
Não existe um território sem sujeito, e pode existir um espaço
23
sociedade, da cultura e da ação governamental. A dimensão
investigaç ão empírica.
reforma urbana.
24
1. História urbana, sujeitos sociais e a
construção de identidades territoriais
25
Nestor Goulart 1 , a partir da rede urbana e do sistema de cidades,
de urbanização.
1
Para Nestor Goulart a análise da urbanização como um processo social pressupõe a
existência de todos os elementos indicados por Weber - a divisão de trabalho, o mercado
urban o, a autocefalia política e a organização militar - não apenas em escala local, mas em
qualquer nível organizatório, o que permite superar aquela limitação do seu esquema da
cidade como comunidade. O processo de urbanização em escala nacional, corresponde não
ao centro urbano, mais a um nível organizatório mais complexo que é a rede urbana. REIS
FILHO, Nestor Goulart. Contribuição ao estudo da evolução urbana no Brasil , São Paulo,
Pioneira Editora, 1968, p. 21.
2
Paul Singer, em seu estudo sobre desenvolvim ento econômico em cinco cidades
brasileiras, se refere à necessidade de análise do hinterland de um núcleo urbano, ou seja,
aquelas áreas agrícolas que cedem para a cidade parte de seu excedente, consomem bens e
serviços e, em alguma medida, fornecem maté ria - prima para a indústria. Deste modo,
afirma que a colocação da economia citadina como objeto de investigação pressupõe o
exame de uma área mais ampla, da qual a cidade constitui um pólo. SINGER, Paul.
Desenvolvimento econômico e evolução urbana , São Pau lo, Companhia Editora Nacional,
1977.
26
como produto da política urbanizadora da metrópole, concluindo
proprietários 3 .
3
GOULART, Nestor. op. cit., p. 184.
4
Procurando caracterizar a especificidade de nossa evolução urbana, SINGER, Paul
(op.cit., p. 8) se refere à economia colonial segmentada em uma série de regiões, cada uma
delas p olarizada por um núcleo urbano que constituía a cabeça de uma região. CASTRO,
Antônio de Barros, em Sete Ensaios sobre a Economia Brasileira, (Rio de Janeiro,
Forense - Universitária, p. 8) utilizou a imagem da formação nacional como um arquipélago
com suas ilhas para caracterizar esta formação nacional fragmentada. Seguindo esta linha
de raciocínio, OLIVEIRA, Francisco de reforça esta imagem afirmando que “noção de
arquipélago revela, em primeiro lugar, a subordinação variada de cada região da Colônia,
e, em seguida, do país, independente dos vários centros do capitalismo industrial”. Elegia
para uma Re(li)gião , Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1977, p.123.
27
existência de espaços regionais sem integração e identidade
nac ional.
28
linha de pesquisa histórica que buscou ver nas cidades a
novo conteúdo.
5
Em sua análise sobre a herança regional do desenvolvimento brasileiro, Antônio Barros
de Castro afirma qu e nossa passagem de ilha em ilha no arquipélago regional brasileiro
constitui um dos mecanismos básicos de nossa formação espacial e contrasta fortemente
com o avanço da mancha de óleo característico da evolução dos Estados Unidos. CASTRO,
Antônio Barros d e. A Herança Regional do Desenvolvimento Brasileiro, in: 7 ensaios sobre
a economia brasileira , 2a ed., Rio de Janeiro, Forense Universitária, 1975, 2v, 1a ed. de
1971, 2 volume, p.11.
29
cidades, com a história evolutiva da forma urbana. O objeto de
6
Trabalhando com as categorias de análise desenvolvidas por Foucault, na qual procurava
caracterizar um novo método (arqueologia) e um novo objeto (saber), também denominada
genealogia do poder, pesquisadores brasileiros recuperaram na história urbana um tipo
específico de poder que Foucault chamou de poder disciplinar. Trab alhando dispositivos
disciplinares como uma forma de produção de comportamentos que fabrica o tipo de
homem necessário à manutenção da sociedade industrial capitalista, analisam a formação
do espaço urbano e da rua como espaço público a partir de uma disci plina imposta,
fundamentalmente, pela organização e dominação espacial.
7
A esse respeito ver o trabalho de MACHADO, Roberto, LOUREIRO, Angela, LUZ,
Rogério e MURICY, Katia. Danação da Norma: Medicina Social e a Constituição da
Psiquiatria no Brasil , Rio d e Janeiro, Edições Graal, 1978, ao qual se seguiram outros
estudos como o de COSTA, Jurandir Freire. Ordem Médica e Norma Familiar , Rio de
Janeiro, Edições Graal, 1979.
30
configura então como objeto privilegiado, ou mesmo exclusivo,
doença da população.
8
O pensamento ecológico clássico nasce quando inúmeros problemas causados pela
industr ialização e pelo desenvolvimento do capitalismo, em fins do século XIX e início do
século XX, começam a ameaçar a própria ordem capitalista. A problemática social -
subabitação, marginalismo, criminalidade, superpopulação, delinqüência, saneamento e
outros - foi entendida como uma anormalidade, ou mesmo como uma patologia,
estabelecendo uma analogia com as ciências biológicas que lhe permitisse compreender o
social à imagem dos demais organismos vivos. É dentro deste campo de análise que surge,
em 1916, o p rimeiro estudo, publicado pela Escola de Chicago, cujo autor, Robert E. Park,
inicia toda uma linha teórica que se constituirá na escola clássica da sociologia urbana.
31
e olhavam o ambiente urbano pela ótica da competição e luta
industrialização.
32
As habitações populares do centro comerci al da cidade dão lugar
industrial.
10
A chamada nova sociologia urbana francesa surge, nos anos 60, marcada pelo
colaboração de alguns sociólogos com as administrações públicas, seguindo impulso desse
períod o, de um gestão tecnocrática de desenvolvimento. Esta colaboração, que significava
uma inovação, já que não é esta a tradição acadêmica francesa, deu origem a um conjunto
33
Estes estudos constituem um movimento de urbanistas em
de pesquisas urbanas, nas quais se destacaram Cristhian Topalov, Jean Lojkine, Edmond
Preteicelle, entre outros.
11
Em comentário inspirado em trabalhos sobre representações da modernidade e o
pensamento urbanístico, Francisco Foot Hardman fala deste movimento dos urbanistas em
direção à História. Esta historização do discurso urbanístico, segundo Hardman, assinala a
crise profunda da ideologia do progresso no interior das práticas institucionais em
arquitetura e urbanismo. HARDMAN, Francisco Foot. Construtores de Ruínas: a
Modernidade Submersa , in: FERNANDES, Ana & GOMES, Marco Aurélio A. d e Figueiras.
Cidade & História. Modernização das Cidades Brasileiras nos Séculos XIX e XX. Salvador:
UFBA/Faculdade de Arquitetura, Mestrado em Arquitetura e Urbanismo; ANPUR, 1992.
34
esquadrinhava e disseminava micropoderes, como processos sem
moradia.
Mas que fio é este que tece estes estudos construindo uma
35
lugar, percorrendo a questão da transformação e do movimento
36
fundamentalmente, a história do urbano é a história da
37
parcelarização das tarefas, a autonomização de plantas industriais
QUADRO 1.1
Produção
38
M anufatura – pelo mercado e pelo espaço
- a concentração espacial das manufaturas se transforma em uma condição
Grande
do aumento da produtividade de cada um do conjunto
Indústria - localização da produção próxima aos grandes mercados de consumo
- c riação de uma rede mundial de transporte e especialização do capital
comercial
- surgimento da máquina - ferramenta e do trabalhador parcelado
Grande
- desqualificação massiva da mão - de - obra,, aumento do papel de técnicos e
Indústria engenheiros na concepçã o das máquinas, na organização dos sistemas
- divisão de trabalho entre o momento da concepção e da fabricação,
criando a possibilidade de autonomia de um em relação ao outro no espaço
- certas etapas da fabricação não exigem mão - de - obra especializada,
pod endo ser produzidas em pequenas cidades ou fora das metrópoles
- grande indústria constitui a base para o desenvolvimento do capital
financeiro. Cidades inteiras vão se desenvolver com base na gestão
financeira dos impérios industriais
- exigências de ener gia e transporte em uma escala inteiramente nova
- o trabalhador perde o contato com o produto para se transformar em
Da Grande
vigilante do autômato
Indústria à - as tarefas especializadas ligadas à máquina ferramenta tendem a
desaparecer, o me smo ocorrendo com as tarefas desqualificadas de serviço
Automação
direto da máquina, o trabalho em cadeia
- acelera - se a autonomização espacial da concepção e da fabricação,
acelerando o abandono das localizações industriais tradicionais
- surge uma nova divisão inte rnacional do trabalho que, sem dúvida, é um
dos motores da atual crise capitalista
39
é também o campo no qual as relações de classe se constituem, e
12
LIPIETZ, Alain, reafirma sua noção de um espaço - reflexo com a crítica às concepções
espaciais no interior da economia neoclássica em seu livro O Capital e seu Espaço ,
tradução de Manoel Fernando Gonçalves Seabra, São Paulo, Nobel, 1988.
13
Ibidem, p.24.
40
através de movimentos de superposição e confronto de uma
acumulação capitalista.
14
CASTELLS, Manuel, analisa o processo de espacialização a partir de uma v isão
sistêmica em seu livro La Question Urbana ; tradução de Irene C. Oliván, Madri, 5ª edição,
Siglo Veintiuno editores, 1978; 1ª edição, Paris, 1972.
15
CASTELLS, op. cit., p. 280 - 283
41
econômica, política e ideológica, Castells cunhou as cidades
16
Em The Glassroots and the City, Castells procura relativizar sua afi rmações sobre a
relação espaço/sociedade afirmando que o espaço não é reflexo da sociedade. CASTELLS,
Manuel. The Glassroots and the city, Califórnia, University Press, Berkelley, 1983.
17
ANDERSON, Perry, em A Crise da Crise do Marxismo , tradução de Denise Bottmann,
São Paulo, Editora Brasiliense, 2ª edição, 1984, p. 35, nos fala da exceção no interior de
autores marxistas: - Henry Lefebvre - produzindo um trabalho original sobre temas
tipicamente ignorados por boa parte da esquerda.
42
transformou - se num dos principais opositores às visões
estruturalistas 18 .
sociais de produção.
18
Lefebvre, como marxis ta crítico, segundo Dosse, defendeu o pensamento dialético contra
as diversas formas de estruturalismo: a de Bourdieu que ele considerava um sociólogo
positivista; a de Foucault que elimina do pensamento os elementos críticos; e a de
Althusser que tornava o marxismo rígido e roubava à dialética toda sua flexibilidade.
DOSSE, François. História do Estruturalismo , tradução de Álvaro Cabral - São Paulo,
Campinas, Universidade Estadual de Campinas, 1994. Obra em 2 v, 2º volume, p.133.
19
Lefebvre, em seu texto que analisa o caminho histórico da cidade à sociedade urbana,
pergunta: cabe definir a realidade urbana como superestrutura, que emerge da estrutura
econômica capitalista ou socialista? Ou ainda como resultado do crescimento das forças
produtivas? Ou como modesta realidade marginal em relação à produção? Não! A realidade
urbana modifica as relações de produção, sem, por outro lado, chegar a transformá - las. Se
converte em força produtiva, como ocorre com a ciência. O espaço e a política do espaço
expressam a s relações sociais, ao mesmo tempo que incidem sobre elas” LEFEBVRE,
Henry. La Revolución Urbana , Madrid, Alianza Editorial, 4ª edição, 1983, p. 21.
43
assim, a expressão material de relações sociais. Estas relações
homogeneíza e hierarquiza.
Geografia.
20
SOJA, Edward W . Geografias Pós - modernas. A Reafirmação do Espaço na Teoria Social
Crítica , tradução de Ve ra Ribeiro, revisão técnica de Bertha Becker e Lia Machado; Rio de
Janeiro, Jorge Zahar Ed., 1993, p. 159.
44
perceber melhor a especificidade urbana em nossa formação
social.
forma urbana.
21
BRESCIANI, Maria Stella, em seu texto Permanência e Ruptura no Estudo das Cidades
(FERNANDEZ & GOMES, 1990, pp.11 - 27), nos fala das sete portas con ceituais para o
45
imagem de modernidade. São estas cidades que se constituem
estudo do urbano: técnica, social, novas identidades sociais, uma nova sensibilidade, o
lugar da História, a cultura popular e a relação território e subjetividade.
46
como o Rio de Janeiro ou São Paulo se transformaram no
47
manufaturas e indústrias ganham maior mobilidade em relação
espaciais.
48
QUADRO 1.2
Concentração de trabalhadores no
Cidades pólo na economia
mesmo espaço
agroexportadora
Não há ainda u ma especialização
espacial
moradia
cidade
subúrbios
49
urbana, é a abertura de fronteiras agrícolas, é a afirmação de um
produção.
litorânea.
50
formação social e que territorializa classes sociais e suas
relações de poder.
51
elementos de sua cotidianidade com os processos sociais mais
amplos.
sociais
no território
estudos urbanos.
52
de suas condições institucionais 22 e também do próprio objeto de
centralização 24 .
22
PRETECEILLE, Edmond. Políticas Urbanas e Serviços Coletivos: Um Balanço d as
Pesquisas , tradução de Regina Sílvia Pacheco, Revista Espaço e Debates nº 18, 1986.
23
TOPALOV, Cristian. Fazer a História da Pesquisa Urbana. A experiência francesa
desde 1965 , tradução de Regina Sílvia Pacheco, Revista Espaço e Debates, nº 23, 1988.
24
Estas são conclusões de uma pesquisa desenvolvida pela ANPUR e apresentada no
encontro anual da ANPUR em 1986. A esse respeito ver: RANDOLPH, R. et alli. Balanço
Quantitativo da Produção Técnico - Científica em Planejamento Regional, Urbano e
Habitacional (1980/1986). ANPUR, 1986.
53
estudos sobre o urbano referenciados na esfe ra do consumo e da
do trabalho.
54
construção da realidade social pela subjetividade, como parte
Foucault.
25
RIBEIRO, Ana Clara Torres. Movimentos Sociais. Caminhos para a defesa de uma
temática ou os desafios dos anos 90 . ANPOCS. Caxambu. 1990.
26
Em prefácio ao livro de Margareth Rago, Edgar Salvadori de Decca nos remete às
potenciali dades e dificuldades de uma abordagem histórica que integre Thompson e
Foucault. O tema da cultura operária e da disciplina industrial, presente em ambos,
expressa uma dupla abordagem que ganha singularidade pela própria trama tecida e
combinada. De um lad o, a ênfase dada à questão da experiência de classe; de outro,
55
Por outro lado, há os estudos que pensam as transformações
56
reconstrução analítica desses movimentosem n ossa formação
57
1.5 Ressurgimento dos sujeitos e da produção social
do espaço
estruturalist as 29 .
29
Ao falarmos na retomada do ator social no caminho de uma crítica ao estruturalismo, é
necessário lembrar que Alain Touraine foi um dos precursores deste renascimento ao
enunciar teses valorizando as dinâmicas e proce ssos sociais ao contrário do estatismo e dos
fenômenos de reprodução valorizados pelo estruturalismo, que triunfava teoricamente
então. TOURAINE, Alain. Production de la Societé. Le Seuil. Paris, 1973.
58
autonomia a partidos e ao Estado, opondo - se a uma concepção
30
Alain Touraine, situando - se mais no campo de análise de rupturas presentes numa
sociedade pós - industrial, procura inter - relacionar os termos indivíduo, sujeito e ator.
Reafirmando a impossibilidade de separar o indivíduo de sua situação social, fala do
sujeito como construção do indivíduo como ator. Esta de finição está mais ligada à
introdução do tema do sujeito pessoal e da subjetivação, no qual Touraine afirma ser o
movimento social um ator coletivo cuja orientação maior é a defesa do sujeito, a luta pelos
direitos e a dignidade do trabalhador. TOURAINE, A lain. Crítica da Modernidade ,
tradução de Elia Ferreira Edel, Petrópolis, Vozes, 1994, p. 254.
31
Eder Sader ressalta o cuidado necessário que a utilização da noção de sujeito exige, quer
pela crítica às suas conotações racionalistas, quer pela alusão à noç ão clássica de sujeito
dotado de unidade e homogeneidade. SADER, Eder . Quando os novos personagens entram
em cena. São Paulo, Paz e Terra, 1988, p. 54.
59
partir de uma vivência do conflito social e da ação coletiva de
32
Segundo Dosse, a abordagem do poder de Foucault rompe com a concepção
instrumentalista do marxismo - le ninismo, não ficando atribuível a uma classe que o deteria.
Circulando a partir de uma rede entre os indivíduos, funciona em cadeias, transita por cada
um, antes de reunir - se num todo. Se não existe lugar nodal do poder, tampouco pode haver
lugar de resist ência a esse poder. Onipresente, não pode oscilar nem cair, está em cada um,
tudo é poder, por toda parte. A resistência do exercício de tal poder deixa de ter, por
conseguinte, um objeto. A análise de Foucault tem o mérito de convidar a não se confundir
n uma mesma realidade o poder e o Estado, mas, freqüentemente, à custa da negação da
existência de um Estado, em proveito de um olhar exclusivo que se fixa no corpo. DOSSE,
François. História do Estruturalismo , op. cit., vol. 2, p. 285.
60
poder d istintas do Estado e de classes sociais. O poder se
33
A esse respeito ver o trabalho de M ACHADO, Roberto, LOUREIRO, Angela, LUZ,
Rogério e MURICY, Katia. Danação da Norma: Medicina Social e a Constituição da
Psiquiatria no Brasil , Rio de Janeiro, Edições Graal, 1978, ao qual se seguiram outros
estudos como o de COSTA, Jurandir Freire. Ordem Médica e Norma Familiar , Rio de
Janeiro, Edições Graal, 1979.
61
constitutiva da identidade. O reconhecimento do conflito, a
cultural do sujeito.
34
HELLER, Agnes. O Cotidiano e a História. Paz e Terra, 1985.
35
BOURDIEU, Pierre. "Campo de Poder, Campo Intelectual e Habitus de Classe". In: A
Economia das Trocas Simbólicas , tra dução de Sergio M iceli, Silvia de Almeida Prado,
Sonia M iceli e W ilson Campos Vieira, São Paulo, Perspectiva, 1987.
Miceli
62
As práticas culturais são constitutivas da história das
nossa cotidianidade.
63
Em resumo, como afirma Bourdieu 36 , o mercado de bens
servem.
36
BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico , tradução de Fernando Tomaz, Rio de Janeiro,
Editora Bertrand Brasil, 1989, p. 121.
37
BOURDIEU, ibidem , loc cit.
64
do lugar. Lugar que determina e define as f ronteiras dos diversos
65
impõe 38 . Mas a história da reforma urbana não é apenas a das
urbana.
38
Milton Santos afirma em seu texto que cada localização é um momento do imenso
movimento do mundo, compreendido em um ponto geográfico, um lugar. SANTOS, M.
Espaço e Método , São Paulo, Nobel,1985, p. 2.
66
Nesta representação do urbano torna - se necessário restituir
identificarem.
67
sujeitos sociais, o movimento da reforma urbana percorreu
urbana desejada.
identidade.
68
contribuiu para a conformação da esfera pública no país. Esta
seguintes.
69
2. A reforma urbana e os movimentos sociais:
história sem rupturas ou ruptura sem história
1
Em 1963, foi realizado, no hotel Quitandinha, na cidade de Petrópolis, um seminário
sobre a reforma urbana com a presença de arquitetos (119), assistentes sociais (7),
economistas (7), urbanista (1), sociólogos (4), químico (1) , professores (3), pesquisadora
(1), médicos (4), líderes sindicais (2), estudantes (6), industriário (1), funcionário público
(1), engenheiros (18), general (1), deputados federais (8), entre eles os deputados Neiva
Moreira e Rubem Paiva. Não consta a par ticipação de nenhum historiador ou geógrafo.
2
Sobre este urbano que marca o processo de intensificação de substituição de importações,
Francisco de Oliveira procura contrapor a imagem do urbano como síntese de um momento
do desenvolvimento capitalista no Brasil a uma visão apenas localizada de problemas de
crescimento das cidades. Para o autor, “o urbano é principalmente movimento de migração
campo/cidade e a desarticulação das economias regionais; o urbano é uma poderosa
acumulação do capital, fundado sim ultaneamente no confisco da mais valia em expansão,
na abertura das fronteiras agrícolas que propiciavam a alimentação das cidades sem por em
xeque a estrutura fundiária, isto é, na manutenção do <M>status quo no campo, e no
confisco de parte da riqueza da s antigas classes latifundiárias oligárquicas que será
passada à burguesia industrial. O urbano neste período é a afirmação da sede urbana
70
incapazes de acompanhar o outro lado deste processo que se
71
renovava, de tempos em tempos, pela prorrogação da Lei do
habitacional no país.
3
Lei do Inquilinato. Lei nº 1300, vigorando desde 1942 e sendo constantemente renovada.
Em 28 de dezembro de 1950 é novame nte promulgada com alterações, definindo o
congelamento dos aluguéis. De dois em dois anos era renovada, produzindo grande
polêmica entre movimentos sociais e os setores empresariais imobiliários.
4
A proposta de Reforma Urbana nasce, por um lado, do cres cimento das lutas sociais da
cidade, e, por outro, pelo crescente debate sobre a necessidade de planejamento urbano e
regulação do uso do solo, inspirada no debate sobre planos diretores e na construção de
Brasília. O primeiro aspecto acaba sendo incorpor ado na cena política como uma força
auxiliar dos movimentos sindicais e partidos, realimentando a visão instrumental das lutas
72
O regime militar, após 1964, impôs limites à ação política e
73
Os caminhos de democratização do país fizeram ressurgir a
Constituinte de 1988 6
6
A proposta popular de Re forma Urbana foi encaminhada à Assembléia Constituinte com
cerca de 150 mil assinaturas. A elaboração e a construção política desta proposta estão
detalhadas no capítulo 5.
7
A bibliografia deste debate acadêmico é muito vasta; será percorrida ao longo des ta tese
e, com maiores detalhes, neste capítulo.
74
quem eram considerados novos? Quai s eram as rupturas e
mulheres.
75
teórica e a prática política afirma as rupturas epistemológicas,
de rupturas sociai s.
sociais.
76
no camp o dos conflitos políticos, de outro a sua articulação com
profundamente 8 ”.
8
Habermas se refere à perda da força persuasiva da sociedade do trabalho, acompanhando
a reflexão de Clauss Offe sobre as indicações atuais da decrescente força de fatores como
trabalho, produção e lucro na determinação da constituição e do desenvolvimento da
sociedade em geral. HABERMAS, Juergen “A nova intransparência”. In: Novos Estudos
CEBRAP nº 18, São Paulo, set. de 1987, p.103 - 114.
77
matizes no esf orço de construção de novas bases de reflexão da
que:
9
Giorgio Napolitano, em artigo publicado na Revista Lua Nova em 1990, na época
dirigente do então Partido Comunista Italiano, afirmava que “se reconhecemos que o
mercado tem um papel não marginal também em relação à utilização possível de
instrumentos de planejamento, torna - se difícil definir e prefigurar uma sociedade soci alista
como sistema econômico e social que funcione em mecanismos totalmente antitéticos aos
do sistema capitalista. NAPOLITANO, Giorgio.“O Socialismo do Futuro”. In: Revista Lua
Nova , nº 22, São Paulo, dezembro de 1990, p.5.
78
sistema capitalista. As conquistas socialistas se materializam de
marx ismo.
sociedades capitalistas.
referências.
capitalista.
79
Significou também o repensar de uma nova organização do
econômico.
ao homem e à natureza.
80
Entende - se os caminhos dos novos movimentos sociais como
do "comunismo histórico" 10 .
época:
10
Norberto Bobbio entende o fr acasso da utopia comunista, como ele próprio afirma, a
primeira utopia que fez parte da história, como o surgimento de um novo desafio que expõe
no final de seu artigo: “A democracia venceu o desafio do comunismo histórico. M as que
meios e ideais ela tem p ara enfrentar aqueles muitos problemas a partir dos quais nasceu o
desafio comunista?. BOBBIO, Norberto. “A Utopia”. In Revista Lua Nova nº 21, São
Paulo, setembro de 1990, p.144.
81
inaugura um horizonte onde o pensamento utópico funde - se com o
pensamento histórico” 11 .
11
HABERMAS, Juergen. A Nova Intransparência , op. cit, p. 103.
12
HABERMAS, o p. cit, p.103.
82
reflexão a reconstrução do tecido social e o projeto que trabalhe
vida cotidiana.
83
expressão de conflitos e não de contradições. Esta noção
dominante” 13 .
hierarquizada 15 .
13
Touraine definirá os novos movimentos sociais como a “a ação conflitante de agente de
classes sociais lutando pelo controle do sistema histórico”. TOURAINE, Alan. Movimentos
Sociais "Les mouvements sociaux", in Production de la sociéte , Le Seuil, Paris, 1973, p
347.
14
Ilse Sherer - W arren, em seu texto O Caráter dos novos movimentos sociais, se refere ao
fato cultural como um campo específico de ação, que marca e onde se encontra a maior
identidade entre os novos movimentos sociais urbanos, a firmando que é isso que dá o
caráter de novo ao que se denomina “novo”nesses movimentos. Sherer - W ARREN, Ilse. “O
Caráter dos Novos Movimentos Sociais”. In Uma Revolução no Cotidiano? Os novos
movimentos sociais na América Latina, Brasiliense, São Paulo, 19 87, p.40.
15
Hartmut Kärner, na crítica à noção tradicional de vanguarda e à estrutura militarizada
das organizações políticas tradicionais de esquerda, opõe os novos movimentos sociais aos
84
Os novos movimentos sociais constituíram - se em um marco e
85
realidade não se fez sem mediações ainda que se debatesse entre
interagem e se complementam.
conflitos modernos.
86
dos movimentos sociais urbanos e da constituição do projeto de
18
Touraine se refere a projeto no sentido relacional em que as possibilidades do ator de dar
sentido às suas próprias condutas permanecem sempre abertas em relação a um sistema
social já dado. TOURAINE, Alain. Os movimentos sociais , p. 344 - 346.
87
conceitual entre o desejo e a escolha. O desejo é definido por
da história 19 .
19
Bobbio procura marcar esta diferença entre a cidade imaginada por Platão, uma utopia
que não fez parte da história e única utopia que fez parte da história: o comunismo
histórico. BOBBIO, Norberto. A Utopia , op.cit., p.142.
20
Françoise Choay recupera a história do urbanismo a partir de dois modelos básicos: o
progres sista e o culturalista. Como ponto comum destes modelos a idéia de uma cidade
ideal, a cidade do futuro. A cidade não é pensada como processo. Extraída sua
temporalidade concreta torna - se, no sentido etimológico utópica, quer dizer de lugar
nenhum. CHOAY, Françoise. O Urbanismo: Utopias e Realidades. Uma Antologia , Editora
Perspectiva, São Paulo,1979, p.14.
88
problemas colo cados pela relação dos homens com o meio e entre
si.
humano.
21
O pensamento ecológico clássico tem sua referência maior na Escola de Chicago e como
referência inicial os estudos de Robert Park que, em 1916, public a seu trabalho – Ecologia
Humana – ao qual se seguiram outros autores como Mc Kenzie e Burguess. A maioria
destes textos está publicada em uma coletânea – Estudos de Ecologia Humana – organizada
por Theodorson. THEODORSON,G.A. (coord.) Estudos de Ecologia Humana. Editorial
Labor, Barcelona, 1974.
89
assegurado pela comunicação e consenso. As relações de
90
A concepção da ecologia humana conduziu forçosamente à
que não deve ser alterada, mas sim legitimada. O modelo urbano
transformação do uso.
91
funcionalidade urbanas. Como princípio básico de intervenção
22
As transformações urbanas em Paris, desenvolvidas por Haussman, naquela época ainda
sob o impacto da Comuna de Paris, tiveram tanto o sentido político - militar – abrir grandes
avenidas para que os trabalhadores n ão tivessem condições de resistir com barricadas ao
avanço do exército – como também criavam a imagem da cidade industrial moderna.
Haussman constituiu - se em referência para outras cirurgias urbanas, como a de Pereira
Passos, no início do século no Rio de Janeiro. A esse respeito duas teses foram exaustivas
na análise dessas transformações urbanas: BENCHIM OL Jaime. Pereira Passos, um
Haussman Tropical, a Renovação Urbana da Cidade do Rio de Janeiro no início do século
XX, Secretaria de Cultura, Turismo e Es portes da Prefeitura do M unicípio do Rio de
Janeiro, 1990, 330 p; e ROCHA, Oswaldo Porto. A Era das Demolições, Cidade do Rio de
Janeiro 1870 – 1920 , Rio de Janeiro, Departamento de Documentação e Informação
Cultural, 1986, 190 p.
23
Em interessante livro sobre as correntes urbanísticas na então União Soviética, em
particular o desurbanismo, Jacinto Rodrigues registra a formação do movimento de
desurbanistas mostrando que a crítica à incorporação do fordismo e do taylorismo na União
92
dirigentes da Rússia pós - revolucionária eram necessárias duas
tecnocracia.
Soviética, e seus rebati mentos espaciais, datam dos anos 20. RODRIGUES, A. Jacinto.
Urbanismo e Revolução, Porto, Edições Afrontamento,1973, p. 87 - 98.
93
sua essência representava um modelo estratégico de
presente.
24
Os desurbanistas opunham - se completamente à visão determinística e meramente
econômica, presente tanto no pensamento de Stalin como de Trotsky, segundo o qual o
fator principal de modificação social era um crescimento econômico rápido, qualquer que
fosse a sua natureza. Constituindo - se como uma linha de reflexão não urbanística, mas no
campo da teoria do desenvolvimento, aglutinav am - se principalmente em torno da Revista
Arquitetura Contemporânea, RODRIGUES, A. Jacinto. Urbanismo e Revolução, op. cit. ,
p. 15.
94
dialética entre lugar e não/lugar 25 . Lefebvre trabalha a utopia não
obra:
25
Lefebvre, em Lógica Formal e Lógica Dialética , descreve esta relação lógica, utópica,
dialética: “No começo era o topos. E o topos indicava o mundo, pois era lugar; não estava
em Deus, não era Deus, pois não tem lugar e jamais teve. E o Topos era Logos, mas o
Logos não era Deus, pois era o que tem lugar. E o Topos, na verdade, era pouca coisa: a
marca e a re - marca. Para mar car, houve traços, dos animais e de seus percursos depois,
sinais: um seixo, uma árvore, um galho quebrado, um Caim. As primeiras inscrições, os
primeiros escritos. Por pouco que fosse, o Topos já era o homem. Assim como o silex
seguro pela mão, como a var a erguida com boa ou má intenção. Ouça a primeira palavra: o
Topos era o verbo; e algo mais: a ação, Am Anfang war die Tat. E algo a menos: o lugar,
dito e marcado, fixado. Assim o verbo não se fez carne, mas lugar e não lugar.”
LEFEBVRE, H. Lógica Formal. Lógica Dialética, tradução de Carlos Nelson Coutinho, Rio
de Janeiro, Civilização Brasileira, 1993, p.34.
26
Lefebvre - La Production de L'espace – critica o pouco rigor na utilização da palavra
espaço. Na França, a palavra espaço passou a incluir uma ampl a variedade de termos que
em inglês poderiam se referir à “área”, “zona”, ou ainda “território”. Por não
problematizarem o deslocamento sofrido no termo espaço, do nível epistemológico ao uso
comum, eliminam o sujeito coletivo. LEFEBVRE, Henry, La producti on de l'espace, Paris,
éditions anthropos, 3ª edição, 1986 (1ª edição de 1974).
95
reprodução de seres humanos por seres humanos, mais que
27
LEFEBVRE, Henry. O Direito à Cidade. In “ O Direito à Cidade ”. São Paulo, tradução
de T. C. Netto, Editora Documentos, 1969, p.48.
28
LEFEBVRE, Henry. "A industrialização e a urbanização: noções preliminares", in: O
Direito à Cidade, op. cit., p.23.
29
Esta ruptura com o sistema urbano é entendida por Lefebvre como uma ruptura da cidade
tradicional. Mas não há caminho de volta.”A satisfação de necessidades elementares não
con segue matar a insatisfação dos desejos fundamentais. Ao mesmo tempo que lugar de
encontro, convergência das comunicações e informações, o urbano se torna aquilo que
sempre foi: lugar do desejo, desequilíbrio permanente, sede da dissolução das
96
urbano, corroí dos, roídos, perderam os traços da obra e da
97
O urbano, esta totalidade que não pode ser anunciada, que
não se traduz numa fuga para o futuro, exige um projeto para que
enquanto obra.
interior da cidade.
31
LEFEBVRE , H. “ O Direito à Cidade” , in: O Direito à Cidade, op. cit., p 104.
98
2.4 Movimentos sociais urbanos: a valorização
dos processos
diversos autores 33 :
32
Influenciados pela noção de Capitalismo Monopolista de Estado, Manuel Castells e Jean
Loojkine se transformaram nas duas referências principais deste paradigma. A partir deles
outros aut ores, ampliaram concepções ou se transformaram em opositores. Jordi Borja
(1975) aprofundou a noção de Movimentos Sociais Urbanos e Pickvance (1978)
desenvolveu uma linha crítica à noção de movimentos sociais urbanos, debatendo a base
social dos conflitos urbanos e a necessidade de transformação em força social. No mesmo
período que Castells publica a Questão Urbana em francês (1972), David Harvey publica
A Social Justice in the City (1973), constituindo um campo de análise marxista nos estudos
urbanos.
33
São inúmeros os trabalhos em que os autores valorizaram ou criticaram estas
concepções. No espaço acadêmico, constituiu - se na ANPOCS um grupo de trabalho –
Lutas Urbanas, Estado e Cidadania – que tinha este paradigma como referência de debate,
levando Mac hado e Ribeiro a escreverem o texto “Paradigma e M ovimento Social. Por onde
andam as nossas idéias?”(1984). Por outro lado, a Revista Espaço e Debates, publicada
pelo Núcleo de Estudos Urbanos (NERU), em São Paulo, acompanhará esta reflexão sobre
a teoria urbana.
99
• valorização política das contradições urbanas a partir da
capital monopolista;
100
Essa é a matriz teórica sobre a qual se desenvolveu o debate
aprofundamento.
34
Refiro - me aqui ao que poderíamos chamar do “primeiro” Castells: Movimentos Sociais
Urbanos e a Questão Urbana. Mais recentemente, Castells afirmará que os movimentos
sociais não são agentes de transformação social, possuindo limites profundos, pe la lógica
política clientelista que os move. Entretanto, os movimentos urbanos são fundamentais
para uma gestão democrática da cidade, porque são os verdadeiros diagnosticadores das
101
transformação estrutural do sistema urbano, ou uma modificação
burocratismo na administração.
102
urbanística, déficit constante de habitação e serviços urbanos e
36
LOOJKINE, Jean. O Estado Capitalista e a Questão Urbana . 2 a ed., São Paulo Martins
Fontes, 1 981 (Edição original: 1977).
103
através dos processos de consumo coletivo, e a incapacidade do
consumo.
104
movimento com capacidade de sustentação autônoma e distinta
do movimento sindical.
historicamente prevista 38 .
37
PICKVANCE, C. “From Social Base to Social Force: some analytical issues in the study
of urban protest.” In: Harloe, M (ed.) Captive Cities, John W iley and Sons, Chichester,
1978, p. 177. Castells (1983) reconheceu a importânc ia das observações de Pickvance
sobre determinadas inconsistências na noção de movimentos sociais urbanos, ajudando a
quebrar o excessivo formalismo teórico
38
Segundo Castells, para a teoria marxista, existem lutas sociais e organizações de massa
que se r ebelam em defesa de seus interesses, mas não pode haver atores coletivos
conscientes capazes de se libertar. CASTELLS, Manuel. The City and the Glassroots .
Edward Arnold, London, 1983., 177.
105
Esta autocrítica de Castells, negando a incapacidade da
39
No Brasil, os estudos nesta área, nos anos 70 e princípio dos 80, ainda se baseavam nos
principais autores deste paradigma Entre outros, os trabalhos de ZICCARDI,A. &
MACHADO da Silva, L.A. "Notas para uma discussão sobre Movimentos Sociais Urbanos",
in: Movimentos Urbanos, Minorias étnicas e outros estudos , ANPOCS, Brasília, 1983;
CASTRO, Pedro. Sobre Movimentos Sociais Urbanos , Revista Chão, Ano II., nº 6, 1979;
RIBEIRO, Ana Clara Torres, Movimentos Sociais Urbanos. Registros Brasileiros, trabalho
apresentado no V Encontro da ANPOCS. Friburgo , 1982; MACHADO da Silv a, L.A.&
RIBEIRO, A.C.T. Paradigma e Movimento Social. Por onde andam as nossas idéias?, VII
Encontro Anual da ANPOCS, 1984; JACOB, Pedro & NUNES, Edson. Movimentos Sociais
Urbanos a década de 80: mudanças na teoria e a prática , in: Espaço e Debates nº 10,
Cortez Editora, 1983; JACOB, Pedro. Movimentos Sociais Urbanos no Brasil. Reflexão
sobre a literatura nos Anos 70 e 80, BIB nº23, Editora Vértice, 1987; CARDOSO, Ruth.
"Movimentos Sociais Urbanos. Balanço Crítico", in: SORJ, B. & ALMEIDA, M.H.T.(org.),
So ciedade e Política no Brasil pós - 64, São Paulo, Brasiliense, 1984; CARDOSO, Ruth.,
Movimentos Sociais na América Latina, Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol. 1, nº 3,
1987; KOWARICK, Lúcio." Movimentos Urbanos no Brasil Contemporâneo", Revista
Bra sileira de Ciências Sociais , São Paulo (3): 38;50, fevereiro, 1987; entre tantos outros,
estabeleceram um debate teórico contendo as especificidades da aplicação destas
concepções no contexto brasileiro.
106
institucionalização ou respeito à dinâmica do movimento,
o popu lismo 40 .
40
A referência ao peleguismo, cupulismo e populismo não está colocada aqui em termos do
debate sobre a caracterização do período anterior a 64, mas enquanto visões críticas da
relação sindicato - Estado - base social ou sindicato - partido - base social. Estas visões
críticas, assumidas por partidos de esquerda e por lideranças sindicais, se transformaram
em pólos negativos sobre os quais se definiria uma nova concepção de autonomia em
relação ao Estado e partidos, bem como a necessidade de enraizamento e formação de bases
na classe trabalhadora. De algum modo, es tas três visões críticas incorporavam tanto a
107
O quadro de análise dos movimentos sociais urbanos nas
108
esbarraram nas dificuldades de disseminar a bandeira da reforma
urbana.
se enumera a seguir:
sociais;
41
Entre estes ba lanços se destacam: CARDOSO, Ruth. “Movimentos Sociais na América
Latina”. Revista Brasileira de Ciências Sociais , vol 1, nº 3,1987, São Paulo; KOWARICK,
Lúcio. “Movimentos Sociais Urbanos. Uma Análise da Literatura”. Revista Brasileira de
Ciências Sociais , vol.1, nº 3, 1987, São Paulo; Lungo, Mario. “Movimentos Urbanos e
Regionais na América Latina na década de 80”. Espaço e Debates , nº 26, 1989, São Paulo.
42
A esse respeito ver: PRETECEILLE, Edmond. “Políticas Urbanas e Serviços Coletivos:
Um balanço das Pesquisas ”. Espaço e Debates nº 18, 1986, São Paulo; TOPALOV,
Cristian. “Fazer a História da Pesquisa Urbana. A experiência francesa desde 1965”
Revista Espaço e Debates , nº 23, 1988, São Paulo.
109
2. a crítica à visão do Estado como único interlocutor e
sua cooptação;
110
Para alguns analistas o que se encontra em crise é a própria
movimento social.
43
O “que se encontra fundamentalmente em crise nos dias de ho je é a construção teórica e
política elaborada sobre os movimentos sociais e que não correspondeu à prática concreta
destes atores” SILVA, Marcelo Kunrath. Estratégias Urbanas e Movimentos Populares ,
FASE/Porto Alegre, março de 1995(mimeo) p.2 .
44
PAOLI, M a ria Célia. “As Ciências Sociais, os Movimentos Sociais e a Questão de
Gênero”, p.107 - 120; in: Novos Estudos CEBRAP , nº 31, outubro de 1991, São Paulo.
111
Referindo - se às questões de gênero, Paoli nos estimula a
urbana.
112
O esgotamento do debate teórico dos movimentos sociais
mundo.
ação.
45
Aproveito aqui o caminho sugerido por Maria Lúcia Refinetti Martins, em
Contextualização dos Moviment os Populares Urbanos na Cidade de São Paulo, FASE,
março de 1995 (mimeo).
113
construção de identidades sociais, de reconhecimento de sua
socie dade" 46 .
46
ABREU, Haroldo. Contribuição à elaboração do PAT. FASE, setembro de 1992, p.32
(mimeo).
114
“a ênfase na participação direta, através das assembléias,
comunidade” 47 .
47
BOSCHI, R.R. A Arte da Associação: política de base e democracia no Brasil. São
Paulo, R io de Janeiro, Vértice/IUPERJ, 1987.
115
demandas sociais, nos leva a nos interrogar sobre alguns
e partidos políticos
48
OFFE, C. The attribution of public status interest groups: observations on the West
German Case In: Berger, S (ed) Organizing Interests in Western Europe, Cambridge,
Cambridge Univ.Press, 1981.
49
Ana Clara T. RIBEIRO , em texto recente à FASE procura valorizar o fato de que os
movimentos sociais possuem uma dupla natureza, calcada no social – como demonstra a
ação referida a papéis, valores e identidades – e na política, como manifesta a sua face
pública, reivindicativ a de protesto e mobilização. Para a autora, os movimentos sociais
podem ser definidos como elos ativos posicionados entre a sociedade e a política.
116
nacional. Esta construção de identidade apresentou - se tanto na
pública.
117
A noção de esfera pública incorpora a reflexão sobre a
políticos.
118
é interessante recuperar duas visões que, apesar d e incorporarem
do mundo do trabalho.
trabalhadores.
50
HOBSBAWN, Eric J. Estratégias para uma Esquerda Racional . Rio de Janeiro, Paz e
Terra, 1991.
51
OFFE, Claus. Capitalismo Desorganizado . Rio de Janeiro, Brasiliense, 1989.
119
articulando - se em torno de objetivos concretos. Os movimentos
52
HOBSBAWM, E. As Perdas do Trabalhismo. In: Estratégias para uma Esquerda
Racional , Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1991, p.79 - 93.
120
trabalhadores. Offe amplia este debate ao colocar, de forma
luta sindical.
53
OFFE, Claus, op. cit.
121
movimento sindical pensar a cidade. Há uma cultura de
122
noção de novos movimentos sociais como autônomos dos
década de 50 e depois a partir dos anos 80, seja pelos milita ntes
políticos.
urbano
54
LEFEBVRE, Henri. O Direito à Cidade . São Paulo, Editora Documentos, 1969.
123
espacialidade que seria, assim, a expressão material de relações
sociais.
populares urbanos.
124
território e dos conflitos existentes entre forças sociais que se
125
intelectuais, técnicos e militantes dos movimentos populares na
que não pode ser exclusivamente local, que não pode ser um
disciplinas urbanas.
55
SILVA, Ana Amelia da. Reforma Urbana e Direito à Cidade . PÓLIS, São Paulo, 1991 .
126
no interior das sociedades e os processos locais e nacionais se
56
A análise do período militar, principalmente, a década de 70, ficou muito marcada pelas
análises de exilados, que traziam muito o tom de uma vivência pessoal da derrota. Ao lado
deste olhar mais intimista, há um processo social a ser resgatado que incorpor a a
reconstrução política que se deu no interior do país, da qual os movimentos de Carestia, as
oposições sindicais, os movimentos de bairros e as greves do ABC são a imagem mais
visível.
127
3. A esfera pública se confunde com o Estado:
A reforma urbana na década de 50
e manutenção do fenômeno1.
1LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, Enxada e Voto. O Município e o Regime Representativo no Brasil.
Editora Alfa-Omega, São Paulo, 1975, p. 253-254.
128
técnico burocrático com ideário municipalista se forma no interior de novos
República.
educacionais aliado ao
2
Esta conferência foi publicada no primeiro número da Revista Brasileira dos Municípios, editada pelo
IBGE e pela Associação Brasileira dos Municípios, que se formou a partir deste movimento municipalista.
FREITAS, A. Teixeira de. "O Problema do Município no Brasil Atual". Revista Brasileira dos Municípios.
Ano I, janeiro-junho de 1948, nº 1.2, p. 85-100.
3
Teixeira de Freitas, expressando uma visão crítica do processo de dominação que o urbano exerce sobre o
campo, afirma que os centros urbanísticos tendem em todo o mundo a formas tentaculares de vampirismo
das coletividades que as contingências sociais, econômicas ou políticas os chamaram a liderar. Op. cit., p.
86.
129
"lema que, que aquela nova mentalidade deve invocar há de ser este –
país urbano.
nos anos 50
4
Op. cit., p. 90.
130
pulverização de pequenos povoados e vilas. Urbanização significava a
determinado lugar.
5
Rosa Ester Rossini descreve este fenômeno, mostrando como e porque a sociedade brasileira conhece este
fenômeno de explosão demográfica. Entre 1940 e 1950, a uma taxa bruta de mortalidade de 20,6%,
correspondia uma taxa de natalidade de 44%. Entre 1950 e 1960, esses índices já eram de 13,4% e 43,3%.
ROSSINI, Rosa Ester. La baisse récente de la fecondité au Brésil, Espace, Populations, Societés, 1985, III,
p. 597-614.
131
TABELA 1
TAXAS DE CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO URBANA, EM CIDADES DE MAIS
* Estes dados mostram a grande diferença entre a taxa de crescimento geométrico da população total, que no período
entre 1950 e 1960 ficou em 2,99, e o crescimento da população urbana em cidades acima de 20 mil habitantes, que
apresenta em média o dobro deste crescimento. Neste mesmo período podemos notar a homogeneidade no crescimento
das cidades médias e grandes, padrão que não se manteve nos períodos subseqüentes.
132
outro lado, da inclusão de núcleos populacionais que não possuíam aquele
- 1991)
6
O estudo se refere também ao incremento das 78 maiores cidades do Brasil, que possuíam em 1940 mais
de 25 mil habitantes. As que apresentaram maior crescimento são: Londrina, no Estado do Paraná, com
220,07%; Goiânia com 178,28%, Jaboatão, em Pernambuco, com 166,37%; Mogi das Cruzes e São
Vicente, em São Paulo, com 121,24% e 120,14%, respectivamente, Campina Grande, na Paraíba, com
118,3%; Presidente Prudente, em São Paulo, com 116,13%. As outras aglomerações com mais de 25 mil
habitantes tiveram aumentos de população inferior a 100%. Entre as aglomerações com menos de 25 mil
habitantes registrou-se o expressivo crescimento de Governador Valadares, em Minas Gerais, com índice
de 263,86%; e da Vila de Volta Redonda que, com um crescimento excepcionalmente rápido, aumentou em
3.161,57% sua população.Revista Brasileira de Administração Municipal. Rio de Janeiro, Ano I, setembro
de 1954, nº 4, p. 80.
133
O surgimento de cidades novas7 neste período se confunde com o
Entre 1940 e 1950 são criados 315 novos municípios, 877 na década de 50 e
1.186 nos anos 60.
explosão demográfica urbana dos anos 50, constituiu a base sobre a qual
autonomia municipal.
134
caráter meramente constitucional servirá apenas para prolongar os males
ABM apontava para o mal que afligia o país – a indústria artificial11, o seu
desequilíbrio com a produção agrícola, a concentração demográfica em
9
MEDEIROS, Océlio de. O Governo Municipal Brasileiro. Rio de Janeiro, IBGE, 1947.
10
A Associação Brasileira de Municípios teve seu estatuto provisório aprovado em assembléia geral
realizada em 15 de maio de 1946. Formada como entidade eminentemente técnica com o objetivo de
estudar e difundir sugestões sobre assuntos de administração municipal, incorporou em seu Conselho
Diretor e em sua Comissão Executiva figuras intelectuais e políticas ligadas à UDN, como Aliomar
Baleeiro, Gal. Juarez Távora, Café Filho e João Cleofas, entre outros. Revista Brasileira dos Municípios,
Ano 1, nº 1-2, p. 121.
11
O conceito de indústria natural e artificial surge no complexo quadro de substituição de importação em
que as novas indústrias despertam a hostilidade.s de grupos de renda média e representantes da agricultura
de exportação. Fazendo uma distinção entre as indústrias naturais, processadoras de produtos locais, ou
seja, aquelas que criavam mercado para as matérias-primas agrícolas, e as artificiais, que seriam aquelas
abastecidas por matérias-primas importadas, desenvolvia-se um discurso crítico ao surgimento de novas
indústrias em regiões onde não havia produção de matéria-prima agrícola.
12
MELO, op.cit, p. 90.
13
A visão de democratização e de construção de nação estava vinculada, segundo o movimento
municipalista, a uma ação modernizadora e autônoma dos municípios do interior. Em discurso
pronunciado na Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais, Jason Albergaria, falando em nome do
Movimento Municipalista Brasileiro, afirmava: " inútil a reforma eleitoral num Brasil ainda dominado nas
suas imensas áreas rurais por aquela instituição auxiliar da escravidão: o monopólio territorial. Urge, pois,
estruturar racionalmente o município do interior, como primeiro passo da valorização do homem na
hinterlândia. Sem essa recuperação humana, as instituições não têm sentido. São forma sem substância.
135
novos municípios, principalmente no interior, fez com que o tema da
homem, estreito espaço para o uso livre de seu direito político, o voto. Aqui
não é o voto função pública, ou expressão de valor de personalidade,
Estrutura em que não palpita o hálito vital O Município é o solo em que a árvore democrática mergulha as
raízes, entestando com o horizonte sua fronde imensa, para abrigo de uma humanidade livre".
ALBERGARIA, Jason. "A Autonomia Municipal e a Democratização da Hinterlândia". Revista Brasileira
dos Municípios, Ano II, nª 6, abril-junho de 1949, p.271-272.
136
e o “local boss” e o “precint captain”, isto é, o cabo eleitoral e sua milícia
organizada”14.
urbanismo.
14
ALBERGARIA, Jason. "A Autonomia Municipal e a Democratização da Hinterlândia". Revista
Brasileira dos Municípios, op. cit., p.271.
15
XAVIER, Rafael. "Municipalismo Versus Urbanismo", Revista Brasileira de Municípios, Ano III, nª 12,
outubro-dezembro de 1950, p.277.
16
A Revista Brasileira dos Municípios de julho/dezembro de 1948, publica o Manifesto do Movimento
Popular Municipalista, fundado em Araçatuba, São Paulo, em 31 de maio de 1948. Revista Brasileira dos
Municípios, Ano I, nº 3-4, julho, dezembro de 1948, p. 413.
137
O tom antiurbano e antiindustrial no discurso municipalista se reverteu
17
O esforço de adaptação do espaço urbano às transformações econômicas e sociais do desenvolvimento
capitalista no país produziu reformas nos centros de grandes cidades brasileiras, significando cirurgias da
cidade capitalistas. Alguns autores têm chamado estas cirurgias de reformas urbanas e estes cirurgiões de
urbanistas.
138
município. O urbanismo assume o papel de recuperação do espírito público
que não se pode nos tempos que correm conceber que os negócios públicos
municipais possam ser dirigidos sem auxílio dessa ciência. O dilema é este:
18
Em editorial do O Estado de São Paulo, em 5 de dezembro de 1954, o jornal afirma que "não é de hoje
que a legislação pátria reconhece ao legislativo e ao executivo municipal a faculdade de estabelecerem
limitações ao gozo da propriedade particular".Reforçando a necessidade do poder de polícia das
municipalidades, o jornal retoma o dilema público-privado que a cidade coloca como uma discussão da
cotidianeidade. "O direito de propriedade, pois, só será assegurado em toda a sua plenitude quando não
ofender o interesse público, da comunidade".
19
MEDEIROS, op. cit. , p.115.
20
Em palestra sobre "Urbanismo Preventivo e Curativo", o arquiteto Eduardo Kneese de Melo, ex-
presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil, seção São Paulo, fala da importância de utilizar as
recomendações da Carta de Atenas na ação municipal. Revista de Administração Municipal. IBAM, Rio de
Janeiro, ano II, volume II, nº 8 a 13, p. 20.
139
Inaugurando uma cultura urbana organizacional, o processo de
cidades. O urbano se estende como uma questão nacional tendo por base não
só o crescimento das grandes cidades como também um processo de
organizacional do Estado.
21
Fernando Henrique Cardoso, ao destacar a importância do livro Raízes do Brasil de Sérgio Buarque de
Holanda, ressalta que certos condicionantes da vida cultural brasileira não têm afinidades eletivas com o
espírito do capitalismo, com a modernidade. Ainda que se remetendo ao período colonial, Cardoso analisa
estas contribuições para a realidade brasileira. Segundo o autor, não existe na nossa formação cultural essa
propensão ao abstrato, ou ao racional, nem amor às hierarquias. Entre nós, a inexistência da racionalidade
abstrata e do gosto pela disciplina levou ao personalismo”. CARDOSO, Fernando Henrique. “Livros que
inventaram o Brasil”, in: Novos Estudos, CEBRAP, São Paulo, nª 37, novembro de 1993, p. 28.
140
organizar22. Este caminho de construção de nação constituía uma propensão
politicamente.
22
O estamento técnico que emulava este movimento municipalista teve como ponto de aglutinação a
Sociedade de Amigos de Alberto Torres, trabalhando com as noções desenvolvidas por Alberto Torres
sobre o descolamento entre Estado e Sociedade.
23
Esta dimensão do state-building entendido enquanto um processo histórico contínuo e não como um
evento delimitado no tempo, é ressaltada por Elisa Reis. Rebatida para a nossa formação social, Reis crítica
as concepções de construção do Estado como tarefa e realização histórica do Império e a negligência desta
formação em períodos subsequentes. Referindo-se, em particular, à primeira República a autora postula que
a presença de oligarquias no poder não encolhera o espaço reservado ao poder público, mas significava
tornar o estoque de capacidade infra-estrutural mais acessível aos interesses sociais dominantes do período.
REIS, Elisa P. "Poder privado e Construção de Estado sob a Primeira República", in: BOSCHI, Renato R
(org.), Corporativismo e Desigualdade. A construção do Espaço Público no Brasil, Rio de Janeiro, Rio
Fundo Ed., IUPERJ, 1991, p.44-45.
141
O discurso deste estamento técnico municipalista se realiza como um
24
A Revista do Serviço Público, editada pelo DASP, traz vários artigos em que os autores se referem à
necessidade de uma organização científica do serviço público através do treinamento e aperfeiçoamento
dos funcionários a partir de doutrinas de Taylor e de Henry Fayol.
142
governo, longe dos grandes centros, pudesse melhor multiplicá-los,
143
O urbano se transforma numa questão de política nacional e enquanto
Arquitetura Contemporânea:
da parte mais alta dos edifícios, o livrinho que chega de Salvador lembra
144
cidade. O que aos olhos de uns é um empecilho, deve ser considerado
início do século, propõe-se uma ação mais ampla para combater os males
26
Correio da Manhã, 25 de agosto de 1955, p. 3.
27
Em O Urbanismo, Françoise Choay, afirma que um contra-senso foi cometido e continua a ser, sobre a
natureza e verdadeira dimensão do urbanismo. Apesar das pretensões dos teóricos, o planejamento das
cidades não é objeto de uma ciência rigorosa. Muito mais: a idéia de um urbanismo científico é um dos
mitos da sociedade industrial. Na raiz de qualquer proposta de planejamento, por trás das racionalizações
ou do conhecimento que pretendem fundá-la, em verdade, escondem-se tendências e sistemas de valores.
Construído no imaginário, o modelo da forçosamente acesso ao arbitrário. CHOAY, Françoise. O
Urbanismo. Utopias e Realidades. Uma Antologia. Editora Perspectiva, São Paulo, 1979, p 49-50.
28
"O Estado de São Paulo", 29 de maio de 1955, in Revista de Administração Municipal, IBAM, Rio de
Janeiro, maio-junho de 1955, Ano II, nº 10, p. 76.
145
de Anhaia Melo29, em palestra sobre o panorama urbano da cidade, criticava
outra conferência proferida por Luiz Anhaia Mello, na qual ele enuncia a
cidades pré-industriais:
29
Luiz da Anhaia de Mello destacou-se como presidente da Comissão Orientadora do Plano para a Cidade
de São Paulo criado em 1949. Em sua visão mais humanista do Urbanismo desenvolveu críticas às
reformas urbanas do início do século, na qual certamente se inclui o plano de Avenidas de Prestes Maia.
30
Revista de Administração Municipal, IBAM, Rio de Janeiro, julho-agosto de 1955, Ano II, nº 11, p. 11.
146
favor do restabelecimento das relações humanas, da vida comunitária, das
velho”31.
Após afirmar que a cidade é uma catedral e não uma usina e que é
utopia de criar condições para que um homem cada vez mais racional possa
criador. Isso não acontece – nas grandes cidades mas nas pequenas. As
cidades são assim como seres superiores, cuja força não está em serem
31
Revista de Administração Municipal, IBAM, Rio de Janeiro, novembro-dezembro de 1955, Ano II, nº 13
p. 167.
32
Mello aborda a influência das metrópoles sobre a formação psíquica do homem: “vivemos, porém uma
época de desarmonia generalizada, até mesmo na estrutura psíquica do homem. O homem de sempre, de
sensibilidade mais impregnada de intuição do que de reflexão foi substituído pelo homem, racional, mas de
noções apressadas, organizadas em sistemas simplistas, que a experiência não autoriza nem credencia”.
147
Mas, como contraponto a este discurso humanizador da cidade e de
latino-americanas.
urbano, surgisse uma visão das disfunções, fruto desta dualidade tradicional/
Revista de Administração Municipal, IBAM, Rio de Janeiro, novembro-dezembro de 1955, Ano II, nº 13,
p. 170.
33
CEPAL, El Desarrollo Social de América Latina en La Postguerra. Sollar/Hachette, Buenos Aires, 2a
ed., agosto de 1966, (Edição original: 1963).
148
espacialização do caráter crescentemente restritivo do mercado urbano.
34
QUIJANO, Aníbal. “Dependência, Mudança Social e Urbanização na América Latina”. In ALMEIDA,
Fernando Lopes A questão Urbana na América Latina. Rio de Janeiro, Forense, 1978, p. 48.
35
HARDOY, Jorge E. & MORENO, Oscar “Tendências e Alternativas da Reforma Urbana”. In:
ALMEIDA, Fernando Lopes. A questão Urbana na América Latina. Rio de Janeiro, Forense, 1978, p.167.
149
Esta noção de urbano colocava o conflito em termos de fixação desta
dominação na cidade37.
36
HARDOY, Jorge E. & MORENO, op. cit. p. 180.
37
Hardoy afirma que o conceito de reforma urbana tem sido amiúde deformado teórica e legislativamente,
confundindo-se intencionalmente com planos de moradias de interesse social, seja com normas legislativas
que instrumentam controles dos preços da terra urbana, seja como um mecanismo para absorver a mais-
valia criada pelas obras públicas. Essa confusão é produto da apropriação ideológica do conceito por
aqueles que desejam instrumentar políticas que superem os conflitos conjunturais mantendo intactas as
causas estruturais. HARDOY, Jorge E. & MORENO, op. cit. p. 186-187.
150
impossibilidade de a cidade absorver população migrante se reproduzia em
imagem da exclusão.
38
Em pesquisa realizada em três favelas no Rio de Janeiro, Janice Perlman indica como surge e permanece
este mito da não integração econômica dos favelados à cidade. “Constatei que o conjunto de estereótipos a
que eu denomino o mito da marginalidade são tão generalizados e arraigados que constituem uma ideologia
– de fato um instrumento político – para justificar as políticas das classes dominantes, das quais dependem
as próprias vidas dos migrantes e favelados”. PERLMAN, Janice. O Mito da Marginalidade: favelas e
política no Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1977, p. 17.
39
A ideologia higienista acompanhou as transformações das grandes cidades brasileiras no final do século
XIX e início do século XX, consituindo-se em um dos primeiros instrumentos coercitivos, normatizadores
e de disciplinarização da vida urbana. Trata-se de medicalizar a cidade para o bom funcionamento do
corpo social, de organizar o espaço urbano e adequá-lo às necessidades das forças produtivas. A medicina
social se desenvolveu enquanto medicina urbana. A ideologia higienista ganha uma materialidade com o
saneamento ambiental. Grandes avenidas e espaços abertos compõem a imagem da cidade industrial
emergente. COELHO, Franklin Dias. Cooperação Urbana e Saneamento Básico: das grandes cidades à
rede urbana. Rio de Janeiro, monografia defendida no PUR/UFRJ, setembro de 1985, p. 70-77.
151
O crescimento das favelas mostrava-se vertiginoso nesses anos e dados
de censos do IBGE constatam que a população crescia a uma taxa três vezes
maior do que a da população total do município do Rio de Janeiro40. A
de 1937: proibição de novas casas nas favelas, controle severo para impedir
40
Dados dos censos do IBGE indicam que entre 1950 e 1960 a população urbana aumentou em 38,9
enquanto a populaçào favelada apresentava um incremento de 97,9%. Na década seguinte este diferencial
se mantém alto, com a populaçào urbana crescendo 32,9% e a favelada 67,6%.
152
Ao lado dessa política explícita de controle social, criou-se a Fundação
urbanização.
153
medidas legislativas e administrativas; unir o povo entre si e este ao
42
A Batalha do Rio de Janeiro, artigo de Carlos Lacerda, Correio da Manhã, 19 de maio de 1948., p. 2.
43
Em A Sociologia do Brasil Urbano, Anthony e Elizabeth Leeds recuperam a afirmação de Lacerda de
que a batalha do Rio foi uma atitude retórica e que não pretendeu produzir mudanças significativas. Valla,
em Educação e Favela, observa que as proposições de Lacerda coincidem exatamente com aquelas que
inspiraram a atuação da Fundação Leão XIII. LEEDS, A. & LEEDS, E., A Sociologia do Brasil Urbano.
Zahar Editores. Rio de Janeiro, 1978.p.203. VALLA, Victor V. Educação e Favela, Petrópolis,Vozes,
1986, p. 56.
154
com a questão social das favelas e, ao mesmo tempo, enfrentava o Partido
44
A afirmação soa como uma ironia da história, já que alguns anos mais tarde, como Governador do Estado
da Guanabara, Lacerda promoverá o maior programa de remoção já desenvolvido no país. Correio da
Manhã, "O PC e a Batalha do Rio de Janeiro". Coluna do Lacerda, 21 de maio de 1948.
45
O Estado de São Paulo, 16 de outubro de 1945, p.5.
46
Marcus André de Mello refere-se ao período de 1946 a 1948 como o da não-política da casa popular, o
que creio pode ser estendido para o período até 1964. MELLO, Marcus André B. C. de, “Interesses, Atores
e Ação Estratégica na Formação de Políticas Sociais: A Não Política da Casa Popular:1946/1948”, Revista
Brasileira de Ciências Sociais, Publicação quadrimestral da ANPOCS, São Paulo, fevereiro de 1991, ano 6,
nº 15, p. 64-75.
155
A experiência da Fundação da Casa Popular, assim como a do
47
Santos sugere que o período de 1945 a 1964 representaria uma situação em que teríamos uma baixa
renovação das elites políticas e uma alta autonomia do aparelho de Estado. Esta dinâmica de cooperação e
conflito entre elite política e burocracia pública se realiza num quadro de cidadania regulada. Segundo o
autor, este é o conceito que permite entender a política econômica e social pós-30, assim como fazer a
passagem da esfera da acumulação para a esfera da eqüidade. “Por cidadania regulada entendo o conceito
de cidadania cujas raízes encontram-se, não em um código de valores políticos, mas em um sistema de
estratificação ocupacional, e que ademais, tal sistema de estratificação ocupacional é definido por norma
legal. SANTOS, Wanderley Guilherme dos. Cidadania e Justiça A Política Social na Ordem Brasileira,
Editora Campus, Rio de Janeiro, 1979, p.68.
156
3.3 A democratização pós-guerra: cidadania regulada e
o laissez-faire urbano
populares e nacionalistas”.
48
Ao lado da ação anarco-sindicalista no final do século XIX e início do século XX, outras formas de
organizações mais ligadas ao cotidiano da população surgem nas grandes cidades. Em meio a grêmios e
associações beneficentes é fundada a Liga de Inquilinos e Consumidores. Em Recife, surgem em 1929
organizações populares, predecessoras dos conselhos e associações de moradoras, denominadas “Sociedade
a bem da nossa defesa”.
157
Em 1945, no Rio de Janeiro, foi realizado o primeiro comício no Brasil
existência de democracia.
158
diversas fases de organização, de direção provisória à de “estrutura
(...).”
49
CAVALCANTI, Wagner. Tribuna Popular, 21/07/1945, p.4.
50
PRESTES, L.C.” Os Comunistas na luta pela democracia”. In. CARONE, Edgard. O PCB (1943-1964),
São Paulo, Difel, 1982, p. 56.
159
articuladas nacionalmente na área urbana51. Como uma ação desencadeada
51
Kowarick e Bonduki ressaltam esta presença do Partido Comunista Brasileiro como núcleo pioneiro de
organização local, sendo um dos primeiros partidos a trabalhar os loteamentos periféricos como base de
apoio político. KOWARICK, L & BONDUKI, Nabil, “Espaço Urbano e Espaço Político: do Populismo à
Redemocratização”, in KOWARICK, L. (org.), As Lutas Sociais e a Cidade, São Paulo: Passado e
Presente, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1988, p.144.
160
QUADRO 3.1
FORMAS DE ORGANIZAÇÕES NO INÍCIO DA DÉCADA DE 5052
1947 Comitês Femininos Em Recife proliferaram por toda a cidade organizações de mulheres tais
Pró-democracia e como a Liga das Donas-de-Casa de Santo Amaro, União das Mulheres do
Uniões Femininas Cordeiro, criada para “lutar contra a carestia e a inflação”, No Rio de
Janeiro, com o desaparecimento dos comitês populares, em 1947, as
Uniões Femininas encamparam as reivindicações dos bairros.
1951-53 Movimento contra a Em junho de 1951, paralelamente aos movimentos grevistas, é formada
Carestia uma comissão provisória de luta contra a carestia e publicado um
manifesto com um programa de luta.
1954-64 Movimentos de No Rio de Janeiro surgem as Uniões Pró-melhoramentos de bairros da
Associações de Central e Leopoldina. Em Recife são criadas inúmeras associações,
Moradores culminando com a formação da Federação das Associações de Bairro do
Estado de Pernambuco (FABEP), em 1963. Em São Paulo surgem na
década de 40 as Sociedades Amigos de Bairros.
1954 Luta dos Inquilinos Associação Nacional de Inquilinos
pela Manutenção do
Congelamento dos
Aluguéis
52
Quadro montado a partir de textos de pesquisa nacional da FASE: CEZAR, Maria do Céu.
Contextualização dos Movimentos Populares Urbanos do Recife, FASE, Recife, dezembro de 1994,
mimeo; ABELEM, Auriléa Gomes & OTTERLOO, Matheus. Contextualização mpus da região
metropolitana de Belém, FASE, Belém, junho de l995, mimeo; MARTINS, Maria Lúcia Refinetti.
Contextualização dos movimentos populares urbanos da cidade de São Paulo. FASE, São Paulo, dezembro
de 1995, mimeo.
53
SOARES, José Arlindo. A Frente do Recife e o Governo do Arraes, Rio de Janeiro, 1982, p. 33
161
A presença de organizações populares, ligadas ao Partido Comunista
voltadas para as áreas sociais. Ainda que não tivessem uma maior
visibilidade em termos de mobilizações que pressionassem os governos
54
A presença política e mobilizações dos comitês democráticos e populares são diferenciadas em função
das especificidades de cada região no país. Bonduki observa que, em São Paulo, os comitês democráticos e
populares assumiram as reivindicações locais mas jamais caminharam no sentido de gerar e priorizar
movimentos de massa que reunissem moradores de diversos bairros para pressionar o governo a adotar
uma medida que concretamente pudesse melhorar suas condições de vida urbana quando isso não conviesse
a uma estratégia geral do Partido Comunista Brasileiro. Contudo, em algumas cidades como Belém,
Abelem e Otterloo relatam que os comitês democráticos populares da periferia da cidade, num curto espaço
de tempo da sua existência, conseguem se colocar com força no cenário da cidade através de ações
reivindicatórias, petições e outras formas de participação. Embora principalmente centrados na solução de
problemas localizados como saneamento, luz, água, transporte (extensão da linha de bondes), luta contra
desapropriação pela Aeronáutica (São Braz), limpeza, isenção de impostos, conseguem atingir o nível geral
da gestão da cidade, como indica o encontro em janeiro de 1946, em Belém, com o Diretor do Serviço
Nacional de Alimentação da Previdência Social (SAPS). Nesse encontro foi discutida a implantação do
restaurante popular e o controle de preços através das bancas de queixas e a instalação da Comissão de
preços (formada pelo prefeito, um exportador, um agricultor, um retalhista, um importador, um jornalista,
um militar e um representante da UAP- União Acadêmica Paraense) e a luta pela moradia que, além de
exigir a isenção do imposto predial, lutava pela aquisição de casa, obtendo uma importante vitória com a
assinatura no dia 5 de julho de 1946 na sede da "Organização das Casas Populares", no Distrito Federal, do
Contrato para a construção de 5.050 casas populares no Pará, das quais 1.500 seriam construídas em
Belém. BONDUKI, N., "Crise na habitação e a luta pela moradia no pós-guerra", in KOWARICK, L,
op.cit, p.124; ABELEM, Auriléa Gomes & OTTERLOO, Matheus, op. cit, p.8.
162
significavam uma reação a esta presença do PCB55. A sempre referida
movimento municipalista.
163
Espaços de produção regulados e de reprodução excluídos da regulação.
e identidades distintas60.
58
Os projetos modernizadores marcam a transformação das grandes cidades brasileiras no início do século.
Estas transformações urbanas procuravam adequar a imagem da cidade às necessidades do capitalismo
industrial, com suas grandes avenidas, seus centros de negócios, grandes espaços onde não comportavam
habitações populares. Denominados por alguns de reforma urbana, as demolições de Pereira Passos no Rio
de Janeiro, o plano de avenidas em São Paulo, o plano de saneamento da cidade de Recife, marcam estas
mudanças que destruíam as formas autônomas de trabalho presentes no centro das cidades comerciais.
59
Preteicelle trabalha com esta separação entre espaços produtivos para desenvolver o conceito de trabalho
de consumo. Para o autor, “a ideologia dominante, refletindo a sua maneira, a oposição real entre produção
e consumo, apresenta este último como essencialmente passivo. Na realidade, o consumo não se reduz de
nenhuma maneira ao momento de compra de mercadorias. Ao contrário, o ato de compra só faz iniciar
pelo homem um processo de apropriação de mercadorias, no qual ao transformar e destruir certos objetos,
ele reproduz a si mesmo”. O consumo é uma atividade, um trabalho, processo de reprodução humana,.
Com base nesta definição pode-se pensar os trabalhos privados e socializados que ocorrem no espaço de
moradia como trabalho de consumo. PRETECEILLE, Edmond. “Besoins sociaux et capitalism monopoliste
164
Trabalhando uma distinção entre espaços produtivos e de moradia,
Casas de Santo Amaro, União das Mulheres do Cordeiro, criada para “lutar
d'Etat”, in: DECAILLOT, M.; PRETECEILLE, E y TERRAL, J.P., Besoins et mode de producion, Paris,
Ed. Sociales, 1977, p.177.
60
A diferenciação entre espaços e trabalhos de produção e de consumo levou Angela Fontes a ressaltar a
importância do trabalho feminino na produção do espaço urbano. Estas práticas sociais de consumo e o
papel do trabalho feminino levam a uma posição ambígua em que a identidade feminina do bairro, que
permite a legitimação de mulheres reivindicando a frente do poder público, é ao mesmo tempo uma
reiteração de um papel social de subordinação. A esse respeito ver: FONTES, Angela.<%0> Gardênia
Azul: o trabalho feminino na produção do espaço urbano, Rio de Janeiro, tese defendida no PUR/COPPE,
março de 1984.>.
61
Com maior grau de organização no Rio de Janeiro, surgiram Uniões de Bairros na zona da Central,–
União Feminina do Riachuelo, Engenho de Dentro, Madureira, Jacarepaguá, Cascadura, Rocha, Méier e
Marechal Hermes –; na zona da Leopoldina – Parada de Lucas, Penha, Cordovil, Pedro Ernesto, Ramos,
Irajá e Vila da Penha –; zona norte – Tijuca, Vila Isabel e Andaraí –, zona sul – Gávea, Copacabana,
Botafogo, Flamengo, Catete e Glória; e no Centro, a Associação de Senhoras de Santa Teresa.
165
contra a carestia e a inflação”, a Sociedade Feminina Protetora Virgem dos
62
Segundo Maria do Céu Cézar, tendo como fonte a Folha do Povo, os comitês Femininos Pró-democracia
lutavam pelo aterro dos alagados, chafarizes, escolas, creches, e outras reivindicações dos bairros. CEZAR,
Maria do Céu. Histórico dos Movimentos de Bairro do Recife, Recife, FASE, 1995, p. 3 (mimeo).
166
chegava, a gente metia o pé de cabra nos caixotes, abria, já ia pesando e
depois vendendo....”63.
Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. A partir
63
Entrevista com Lourdes Guedes, presidente da União Feminina da Vila da Penha e ex-militante do
Partido Comunista do Brasil na década de 50, Entrevistada por Franklin Coelho e Silzane de Almeida
Carneiro em 9 de setembro de 1987, lado 1, p.3.
64
Lourdes Guedes fala em sua entrevista das uniões femininas e masculinas: “as masculinas eram um tipo
de associação mais política (...) já as uniões femininas eram reivindicatórias, e de educaçào porque nós
dávamos muitos cursos para as mulheres, ensinava-se muito trabalho, muitas ganhavam dinheiro até para a
sobrevivência com o que aprendiam no movimento....Os homens não eram chamados. Era exclusivamente
feminina, não tinha masculino não, E era exatamente para evitar problema de marido.( ..) A gente é que
descarregava caminhão, abria caixote, fazia tudo”, op. cit. p.6.
167
destas associações estaduais se organizou a Federação de Mulheres do
1300"68;
65
Entrevista com Nieta Campos da Paz, organizadora e dirigente da Associação de Mulheres do Distrito
Federal, ex-militante do Partido Comunista.. Entrevista realizada por Franklin Coelho e Silzane de Almeida
Carneiro em 31 de agosto de 1987, lado 1, p.2.
66
Imprensa Popular, 30 de janeiro de 1952, p.5.
67
Imprensa Popular, 11 de março de 1952, p.1.
68
Imprensa Popular, 24 de outubro de 1954, p.2.
168
memorial reiterando a urgência de medidas contra a carestia e
•tabelar os hortigranjeiros;
aumento"69.
.... e não sei porque no Governo Juscelino foi fechada. Disseram que
foi fechada, aí nós reabrimos outra, a Liga, em vez de associação ficou liga,
69
Imprensa Popular, 17 de janeiro de 1956, p.6.
70
Entrevista com Nieta Campos da Paz, p.2.
169
de apoio para grandes mobilizações, seja nas grandes greves seja nas
...o partido orientava como fazer o trabalho, mas era muito pouco.
Muito pouco. Para essas coisas não tinha muita guarida dentro do Partido
Comunista...71
71
Entrevista com Nieta Campos da Paz, p.7.
170
e pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB), este informalmente, pois estava
cidade.
72
Segundo Maria do Céu Cézar, com a eleição do prefeito Pelópidas da Silveira, coloca-se a importância
da participação popular principalmente para pressionar a Câmara na qual o prefeito não tinha maioria.
Inspirados nas Sociedades Amigos de Bairros (SAB's) de São Paulo, segundo o próprio prefeito, as
associações se expandiram através de audiências populares com a presença de lideranças e moradores dos
diversos bairros. Deste movimento surgem a Federação de Associações de Bairro de Pernambuco, criada
em 1963, e a União de Bairros de Recife, organizada em 21 de abril de 1962 sob a influência de Cid
Sampaio que havia rompido com a frente popular. CEZAR, Maria do Céu. Histórico dos Movimentos de
Bairro do Recife, op. cit., p.7-12.
171
3.5 As lutas sociais na cidade e o movimento sindical: o
movimento contra a carestia
próprios problemas"73.
história, que tem seu início nos anos 50, desembocará em 64 com uma
74
GOMES, Angela de Castro, “Trabalhismo e Democracia: o PTB sem Vargas”, in: GOMES. Angela de
Castro (org.), Rio de Janeiro, Relume-Dumará, 1994, p. 160.
172
programa de luta. Os pontos principais do programa são:
autolotações. Redução de 20% nos preços dos aluguéis. Suspensão das ações
comerciante;
carestia75.
173
começado a se reestruturar após enfrentar grandes dificuldades com a
manifestantes.
forma de organização.
76
Segundo a imprensa popular esta comissão era composta pela Associação Feminina.
174
padeiros, marceneiros, têxteis, sapateiros, rodoviários, fumageiros,
afirmava:
77
Imprensa Popular, 20 de fevereiro de 1954, p.1.
78
Novos Rumos, 7 a 13 de agosto de 1959, p.7.
175
João de Meriti, Nilópolis e Nova Iguaçu, onde "massas enfurecidas tudo
se disponha a socorrê-los"80.
Desse modo, as lutas pelo congelamento dos aluguéis, dos preços dos
gêneros de primeira necessidade, e pela redução das tarifas de ônibus, contra
79
Última Hora, 6 de julho de 1962, p. 1.
80
Última Hora, 6 de julho de 1962 , p. 2 e 8.
176
as taxas escolares e aumento de impostos municipais se caracterizam, nesse
surpreendente que um novo estilo surgirá seja pela esquerda, com Arraes, e
espaço urbano
deve ser entendido por dois aspectos. O primeiro, como uma manifestação
das condições concretas nas quais se reproduz a força de trabalho no
177
trabalhadores que constituíam o mercado mais ampliado e sua força de
81
A caracterização da década de 50 apresenta alguns dilemas, frutos de olhares distintos. A caracterização
do populismo como uma etapa de relações de classes sociais no Brasil, como definiu Octavio Ianni,
apresenta um sentido da entradas das massas na estrutura do poder via uma política nacionalista de aliança
de classes. O debate sobre o trabalhismo reacende esta necessidade de contextualização histórica. Angela
Castro fala da invenção do trabalhismo no primeiro governo Vargas, tendo o PTB nascido no bojo de
articulações políticas cujo berço foi o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio e toda a estrutura do
movimento sindical montada sob uma estrutura corporativista. Segue, assim, uma reflexão próxima a Luiz
Werneck Vianna (ver nota 40 no capítulo II) em sua crítica a pensar o populismo apenas como uma
estratégia de controle das massas trabalhadoras. A cerca deste debate ver, de um lado, os textos de Otavio
Ianni e Francisco Weffort e, na ánalise do trabalhismo, as publicações de Ângela Castro, Maria Celina
Soares D'Araújo, Maria Vitória Benevides e Lucília Neves Delgado.
82
O Partido Comunista Brasileiro, após ser colocado na ilegalidade, radicaliza sua posição em relação aos
sindicatos oficiais e procura desenvolver sindicatos paralelos. O fracasso desta política promove o retorno
aos sindicatos oficiais.
178
ambigüidade de uma política de classes que oscila entre o controle ea
independência.
179
Assim, além da imposição da mobilidade aos trabalhadores migrantes
Por essa razão, teremos como principais lideranças, nos primeiros anos da
Por outro lado, toda política populista paga um preço pela adesão
180
A ausência de política urbana voltada para os equipamentos coletivos
83
O termo cidadania regulada para caracterizar a ação estatal neste período permite pensar também numa
cidadania desregulada no campo da reprodução. Por esta razão, fica mais precisa quando utilizada sobre o
enfoque de uma regulação a partir do emprego formal e da existência do documento cívico, a carteira de
181
à demanda por habitação. A imagem da cidade como cidade dos inquilinos
TABELA 3.3
Domicílios particulares por condição de ocupação (%)
A luta dos inquilinos no Rio de Janeiro tem sua origem nas primeiras
trabalho. Por outro lado, fica distante da realidade, quando trabalha-se esta desregulação no campo da
reprodução da força de trabalho, a existência de um Estado do Bem-Estar Social antes de 1964.
182
destruição dos cortiços e a crise de moradia na cidade, esboça-se o
constituída, pois "as leis não foram feitas para o povo". Falam em greve
aconselham a todos que levem seus móveis para a praça pública. Diante da
pressão do movimento, tramitam no Senado projetos sobre o inquilinato.
requerido", o inquilino pode habitar a casa pelo "dobro do tempo que lhe
84
CARONE, Edgar. A República Velha. (Instituições e Classes Sociais), São Paulo, Difusão Européia do
Livro, 1972, p. 183.
183
indispensáveis" não podiam ser penhorados e o inquilino tinha seis meses
ou ascendentes;
85
Imprensa Popular, 24 de outubro de 1954.
184
Os aluguéis que não haviam sido fixados deveriam ser arbitrados, pelo
análogas.
1952 ela foi prorrogada, ainda que no seu interior estivesse incluído um
período entre 1950 e 1954 em 48,4%, passando de 6.028 ações para 9.30286.
86
Imprensa Popular, 21 de janeiro de 1954, p.2 .
185
outubro de 1954 é entregue ao governo o memorial com um milhão de
assinaturas.
87
Novos Rumos, 29 de junho a 5 de julho de 1962, p.2.
88
“O Problema Nacional de Habitação e os Arquitetos”. Revista Arquitetura, nº 5, Rio de Janeiro,
março/abril de 1962, p.12.
186
Na análise do urbano predomina a visão de uma urbanização
89
Revista de Arquitetura 1963, nº18, pp. 3-9.
90
CARONE, Edgar. Movimento Operário no Brasil (1945-1964). Difel, São Paulo, 1981, p.275.
187
organizam, em duas etapas, no Quitandinha e em São Paulo, um seminário
Petrópolis. A segunda etapa foi realizada em São Paulo, nos dias 29, 30 e 31
Lei de Reforma Urbana. Este visava uma política habitacional que ficasse a
91
Com a chamada “Teve início o Seminário de Habitação e Reforma Urbana”, O Globo registra a
programação para a abertura do seminário. O Globo. 24 de julho de 1963, p.6.
92
Além de delegações de estados e das representações das instituições que coordenavam o seminário, o
jornal O Globo se refere à representação política que contou com a presença de Franco Montoro (PDC de
São Paulo), Manuel Waissman e Artur Lima Cavalcânti (PTB de Pernambuco), Florisceno Paixão (PTB do
Rio Grande do SUL) e Milton Cabral. Apesar de O Globo não citar, a lista de presença do IAB (ver nota 1
do capítulo 2) registra a presença de Neiva Moreira e Rubens Paiva. O Globo, 23 de julho de 1963, p.4.
93
O Globo. 24 de julho de 1963, ibiden, loc. cit.
188
cargo de uma entidade a ser criada sob a denominação de superintendência
94
O Globo, Seminário estuda a criação de uma superintendência para o Plano Nacional de Habitação, 25 de
julho de 1963, p. 4.
95
Cada um dos temas a serem debatidos tinha subtemas. O grupo I – A situação habitacional do país –
incorporava o déficit habitacional no campo e na cidade, a subabitação, a superlotação, as habitações
desprovidas de serviço público, a projeção do déficit, a ação governamental e a iniciativa privada. No
segundo tema – a habitação e o aglomeração humana – observam-se os seguintes subtemas: o fenômeno
da urbanização no Brasil, o planejamento urbano, a moradia como parte de um complexo, o equipamento
comunitário e os serviços públicos. No grupo III – reforma urbana – debatia-se a terra urbana, seu uso e sua
posse, a posse da habitação e sua regulamentação, objetivos da legislação, a definição de reforma urbana
como base de uma política habitacional, o planejamento nacional territorial e demográfico e o plano
nacional de habitação. No último grupo – a execução dos programas de planejamento urbano e habitação –
estava programado o debate sobre o órgão executor da política, o financiamento dos planos urbanos, o
investimento estatal, a participação do capital privado e a indústria de materiais de construção. Correio da
Manhã, “Habitação debatida em Seminário”, 23 de julho de 1963, p.9.
189
uso do solo, se consubstancia numa reforma urbana, considerada como o
Mas o que é essa tal de reforma urbana? Para Jorge Wilhelm, um dos
relatores do Seminário,
96
Seminário de Habitação e Reforma Urbana. Revista Arquitetura, Rio de Janeiro, setembro de 1963, nº 15,
p. 18.
190
fundo para construções e transformar inquilinos em proprietários, pondo
97
Jorge Wilhelm, “Esta tal de Reforma Urbana”. Revista de Arquitetura, março de 1994, nº 21, p.14.
191
4. A construção democrática e os movimentos
populares urbanos
1
Esta vivência traz marcas p essoais que não são objeto desta tese. É importante, contudo,
registrar a herança de uma cultura de resistência democrática das centenas de pessoas que
não se intimidaram diante do poder militar. E esta cultura está presente em cada relato da
vivência des te período. Um deles, um diário de um padre italiano, posteriormente expulso
do país, relata a visita de um dia aos presídios de Romão Gomes e Carandiru em São Paulo.
Em um dos trechos ele comenta a experiência de Janaína que aos cinco anos de idade viu
se u pais serem torturados e relata: Janaína guardará a lembrança destes terríveis momentos
e, três anos depois, num momento de verdadeira inspiração poética, a pequena, de apenas
oito anos, escreverá sua celebre poesia, trágico e comovente testemunho da sua infantil
sensibilidade. Janaína revive num sonho aquela terrível hora e gritará com o seu coração
apaixonado e magoado ....”dói gostar dos outros”. Eis na íntegra a poesia de Janaína: “dói
o peito chorar, dói nós chorar, dói os meus olhos chorarem, dói nós viver, dói ver os outros
chorar, dói a natureza chorar, dói gostar dos outros, dói falar tchau, amigos ”. Um dia no
cárcere , 1976, mimeo, p.1.
192
O regime militar criou uma descontinuidade em termos da
193
modernização conservadora e autoritária que se desenvolve pós -
64.
institucional
e a questão urbana
2
Lamounier, B. "Comportamento Eleitoral em São Paulo", in LAMOUNIER, B. (org), Os
partidos e as eleições no Bras il . Rio de Janeiro, Ed. Paz e Terra, CEBRAP, 1975.
194
golpe, principalmente após suas derrotas eleitorais em Minas
saneamento básico 4 .
3
A esmagadora vitória do MDB nas capitais e regiões metropolitanas, em 1974,
influenciou o quadro político e constitui - se num dado novo que produziu impactos no
interior do regime militar.
4
A esse respe ito ver - COELHO, Franklin Dias . Cooperação e Saneamento Básico: das
grandes cidades à rede urbana , Rio de Janeiro, dissertação de mestrado, PUR/UFRJ,
setembro de 1985. - onde está debatida a idéia de que é a ampliação da escala de
195
Mas é a partir dos governos militares que se consolida um
Tavares:
196
empresas. Para impulsionar esse mercado, imaginou - se a
imobiliário” 5 .
saneamento básico.
5
Maria da Conceição Tavares. “O Sistema Financeiro Brasileiro”. In: Cadernos de
Opinião, Rio de Janeiro, Editora Inúbia, agosto e setembro de 1979, nº 13, p. 58 - 59.
6
A contrové rsia sobre a existência ou não de um projeto político e de uma racionalidade
empresarial na criação do BNH, tem se situado muito no plano da participação dos
militares. Entretanto, se olhássemos a plataforma do movimento de reforma urbana anterior
a 64, en contraríamos uma plataforma de racionalização da ação do Estado. Neste sentido, o
diagnóstico coincidia a direita e a esquerda. A respeito desta controvérsia ver: M ELLO,
Marcus André B. C. de. “Interesses, Atores e Ação Estratégica na Formação de Políticas
Sociais: A Não Política da Casa Popular: 1946/1948”, Revista Brasileira de Ciências
Sociais , Publicação quadrimestral da ANPOCS, São Paulo, fevereiro de 1991, ano 6, nº 15,
p.64 - 75; ANDRADE, Luís Aureliano G de . Habitação e Poder. Da Fundação da Casa
Pop ular ao BNH , Rio de Janeiro, Zahar, Editores, 1982.
197
Mas ao lado de uma racionalidade no campo de reprodução
modo que vamos ter que nos esforçar para devolver a elas uma
Estado.
7
Apud Berenice Vasconcelos de SOUZA. O BNH e a Política do Governo, dissertação de
mestrado submetida ao Departamento de Ciência Política da UFMG, 1974, p.157.
198
4.2 O bairro como l ocus de resistência
do movimento sindical.
8
A expressão “organização paralela” é util izada por estudiosos do sindicalismo brasileiro
para designar organizações sindicais que procuravam fugir ao controle do M inistério do
Trabalho e das organizações oficiais, como foram o Pacto de Unidade e Ação e O Pacto de
Unidade Intersindical antes de 19 64.
199
populacional, com uma clara predominância da indústria pesada,
9
W effort analisa os dois movimentos de Osasco e Contagem como uma indicação
aproximada do tipo de resposta a que tenderiam os setores de ponta da classe operária
diante de suas novas condições de existência. Ver: W EFFORT, Francisco. “Participação e
Co nflito Industrial: Contagem e Osasco, 1968”. São Paulo, Cadernos CEBRAP nº 5, 1972.
200
Inicialmente, s em uma estrutura formal, as oposições
do governo.
10
Ainda que não se pudessem falar de campanhas com grande número de sindicalizados
participando nas assembléias dos sindicatos, era o único momento de possibilidades de uma
maior convocação nas fábricas e de debate mais aberto sobre questões econômicas no
interior do sindicato.
11
Estas informações sobre o movimento sindical neste período são extraídas do Jornal
Nova Luta, editado por um grupo de militantes de esquerda oriund o de várias organizações
que em 1966 iriam se autodenominar “M ovimento pela Emancipação do Proletariado” e
201
A c omposição da chapa num primeiro momento chegou a
concretizou:
gentilmente cedido para tese por Nilson Penoni, um dos organizadores deste movimento.
No arquivo pessoal de Nilson Penoni se encontra a coleção do nº 7 de setembro de 1973 ao
nº 28 de out/nov. de 1982.
202
atividade de propaganda ou uma mais avançada, apostando mais
oposição.
oposição sindical.
12
“Eleição do Sindicato dos Metalúrgicos”. Jornal Nova Luta nº 7 de setembro de 1973.
In: Coletânea de artigos publicados no Jornal Nova Luta, de setembro de 1973 a janeiro de
1975, mimeo., p.5.
13
Divers os artigos em jornais e revistas de grupos de esquerda neste período indicavam
esta necessidade de trabalhar no bairro com forma de fugir dos olhos da repressão política
que se concentrava no movimento sindical. A Revista Brasil Socialista , em seu númer o 3,
publicou um documento assinado por P. Torres, em que fala da sua experiência em
organizações de grupos em fábrica, afirmando que “o bairro é a continuidade da fábrica.
Deve se dar uma certa importância ao trabalho de bairro articulando com o trabalho de
203
organizadas nos bairros populares, se constituiriam no espaço de
brasileira 14 .
fábrica. E isto foi feito da seguinte maneira: procurávamos ver onde se concentravam os
operários das diversas fábricas onde estava havendo trabalho político; nestes bairros
começávamos a fazer os primeiros contatos. Fazia - se também um levantamento do q ue
existia no bairro, como Sociedade Amigos de Bairros, Igreja, Clube esportivo, etc ... Por
que trabalhar no Bairro: (1) porque perdendo o trabalho na fábrica por repressão, expulsão
de companheiros, poderíamos contactá - lo através do bairro,(2) necessidad e de desenvolver
a solidariedade à luta da fábrica. Em caso de greve, quando vem a repressão podemos estar
organizados e mobilizados em grupos nos bairros. A repressão não conseguirá atingir toda
a massa e não desmobilizaremos, o que impedirá a volta ao tr abalho antes do prazo; (3)
maiores possibilidades para fazer contatos, reuniões e ampliar o trabalho político da
fábrica a partir do bairro; (4) importância da participação da mulher na luta.” O texto é de
1972 e foi republicado em 1975. Torres, P. “Uma ex periência junto ao proletariado”. In:
Revista Brasil Socialista , Ano I, nº 3, julho de 1975. Editor legal no exterior: Nouvelles
Editions Populaires, Lausanne, Suíça, p.70,71.
14
A ação das oposições sindicais, já no ano de 1973, não aparecerá só no Rio de Janeiro e
em São Paulo.
204
questão dos sindicatos, como uma ação política independente
terror político.
15
Apesar das divergências explicitadas pelo que era denominada “nova esquerda”,
publicadas em Revista Brasil Socialista, editada no exterior pela Ação Popular - e número
especial da Revista Teoria Prática - Debate sobre o Democrati smo e Liberdades
Democráticas, nº 4 de junho de 1976, editada no Brasil pelo Movimento de Emancipação
do Proletariado, estes grupos se constituíram em uma referência de ação política no
período da ditadura militar e desenvolveram perspectivas de reconstruç ão orgânica da
esquerda brasileira. As divergências situadas no campo de uma ação tática eleitoral e
diante do papel do M DB, não impediram uma ação conjunta de reorganização do
movimento estudantil e de construção das oposições sindicais.
16
A Revista Brasi l Socialista editou vários artigos sobre análise das ações políticas
principais naquele período, entre eles: “Notas Sobre a Questão da Tática” de Raul Villa,
Brasil Socialista, julho de 1975, nº 3, p:5 - 25; “Sobre a Proposta de Frente Patriótica
Antifascist a” de Fábio de Almeida, Brasil Socialista, janeiro de 1975 nº 1; p. 35 - 45,
“Nossas Tarefas Atuais no Movimento Operário”, documento do MR8, Brasil Socialista , nº
15 - 34.
205
de oposição ao regime militar e luta por liberdades políticas. O
17
MOISÉS, J. A. & MARTINEZ - ALIER. “A Revolta dos Suburbanos ou Patrão o Trem
Atrasou”, in: MOISÉS, J. A. et alii, Contradições Urbanas e Movimentos Sociais , Rio de
Janeiro, CEDEC/Ed. Paz e Terra, 1977.
206
dimensão de reação, como um ator supostamente com vontade
18
Edson Nunes descreve este fenômeno de quebra - quebras de ônibus em São Paulo e no
Rio de Janeiro advertindo que a hipótese negativa, isto é , aquela que procura explicar os
protestos pela ausência de serviços urbanos e de canais institucionais, não explica o caráter
conjuntural do fenômeno. Por outro lado, critica também, o estudo de MOISÉS &
MARTINEZ - ALIER, op. cit., em que o protesto não exp ressaria uma vontade própria nas
massas urbanas fundadas nas novas necessidades postas pelo desenvolvimento das forças
produtivas. NUNES, Edson. Movimentos Reivindicativos e Abertura Política: uma
hipótese . Trabalho apresentado ao XII Encontro Anual da ANP OCS. Águas de São Pedro,
São Paulo, 1988, p.26.
19
. MOISÉS & MARTINEZ - ALIER, op. cit. p.43.
207
4.3 A voz horizontal e a construção da
resistência
democratização.
208
traba lhistas, comunistas ou socialistas. A cultura política
20
Angela Fontes, em sua dissertação de Mestrado nos fala de como está presente no
movimento de bairro a identidade feminina, seja pelos métodos, seja pela relação com a
casa e capacidade de falar dos problemas cotidianos ou ainda pela legitimidade na
representação deste espaço de moradia. FONTES, Angela M. Mesquita. Gardênia Azul . O
trabalho feminino na produção do espaço urbano. PUR/UFRJ, 1984, Dissertação de
Mest rado.
21
Em Recife, Dom Helder criou, em 1969, o Movimento de Evangelização Encontro de
Irmãos, versão local das CEB's (Comunidades Eclesiais de Base) atuando em diversas
localidades de modo similar aos conselhos de moradores. Cezar, Maria do Céu. “Históric o
dos M ovimentos de Bairro do Recife”. FASE, Recife, 1995 (Texto da Inserção da
Movimentos
209
Será no ano de 1973, ainda num clima social de medo, que
210
agosto de 1977, 700 delegados de comunidade se encontram e
211
de resistência, ressurge pelas reivindicações em torno da
negação da institucionalidade
23
Fernando Henrique Cardoso, recupe rando esta relação entre o MDB e os movimentos
sociais naquele período, afirma que este entrosamento não era uma questão simples: as
modernas sociedades de massa parecem privilegiar as reivindicações que partem da
“sociedade civil”(direitos humanos, ecolog ia, feminismo, movimentos de grupos
minoritários e jovens etc.), sem que sua ligação com os condutos políticos que
desembocam no Estado (como os partidos políticos) encontre solução razoável. CARDOSO,
Fernando Henrique Partidos Políticos, in: SINGER, P. & BRANT, Vinícius Caldeira São
Paulo: O povo em movimento, Petrópolis, 2 a Ed. Vozes, 1981, 1980, p.197 - 198.
212
produção de instrumentos jurídicos cujos destinatários seriam os
segmentos populares.
histórico de instituições.
do leste europeu.
24
Norberto Bobbio procura fazer uma diferença entre a falência do comunismo histórico e
a permanência da utopia socialista. Norberto Bobbio, "A Uto pia", Revista Lua Nova ,
outubro de 1990, nº 21, São Paulo, p .144.
213
invasão da Checoslováquia, da ebulição política a partir de
25
É claro que não me refiro aqui à resistência armada e seus sobreviventes, sobre os quais
recaíram toda violência institucionalizada e o ódio dos militares. Alguns deles, como
Nelson Rodr igues Filho, Jesse Jane, Colombo Vieira, Alex Polari, Noma Sá Correa,Gilney
Amorim Viana, Perly Cipriano e tantos outros assistiram de dentro dos presídios este
processo de mudanças. M as grande parte daqueles que foram para as ruas em 68 colocar o
pé na es trada, o que levou Gilberto Gil a cantar, em determinado momento: o sonho
acabou/ o sonho acabou,/ quem não dormiu no sleepbag/ nem sequer sonhou/.
214
concepções alimentaram um crescimento de formas associativas
nos bairros, refo rçaram também uma visão basista que produzirá
Estado.
215
respectivamente, o Movimento de Terra e Habitação na Zona
o voto nulo.
216
A participação de Lyzâneas Maciel marcará este período por
comp atriotas” 26 .
26
A cassação do Deputado Lysâneas Maciel, Jornal Nova Luta, nº 16, abril de 1976, p.13 -
14.
217
“Não concederei apartes a torturadores, a defensores do
trabalhadores” 27 .
afastados .”
urbanos.
27
O p.cit, p.14.
218
chamados novos movimentos sociais no Brasil. Eram movimentos
reestruturavam.
28
Uso aqui um termo muito comum na década de 70 para caracterizar os inúmeros grupos
oriundos dos antigos partidos Socialistas e Trabalhistas, além daqueles que saíram do
Partido Comunista Brasileiro e que compunham um cenário de fragmentação da esquerda .
29
Segundo afirma Fernando Henrique Cardoso, “o M DB, enquanto partido, ficou em geral
à margem destes movimentos”. CARDOSO, Fernando Henrique. “Partidos Políticos”, in:
SINGER, P. & BRANT, Vinícius Caldeira São Paulo: O povo em movimento , op. cit, p.
19 7.
21 9
QUADRO 4.1
Coordenação
Recife
clandestinidade, aliado à
igreja
MEP
30
31
220
1978 Rio de Janeiro Criação da FAMERJ. Com forte presença do
Centros Comunitários da
Casa Amarela (FEACA)
de esquerda
presença do PCB ocorria pela própria história anterior a 1964, mas muita das
32
221
reorganiza a esquerda, que mais tarde consolidará presenças de grupos como
cumpram com suas obrigações de equipar seus locais de moradia com infra-
estrutura urbana.
33
Segundo pesquisa coordenada por Estrella Bohadana, em 1975, 2 mil moradores da Barra da Tijuca se
reuniram para defender aquilo que julgavam “direitos adquiridos mas não usufruídos”. No mesmo ano,
moradores de Copacabana lançavam a campanha “Por um Rio mais Humano”. Denunciavam o alto grau de
poluição, que tornava as condições de vida no bairro cada vez mais insuportáveis. Em 1976, a Sociedade
dos Defensores do Alto Leblon denuncia a construção de arranha céus nas encostas de algumas ruas do
bairro. Apesar da mobilização, que incluiu carta ao chefe de gabinete civil da Presidência da República e
audiência com o próprio Presidente, os 62 espigões foram erguidos em ruas estreitas e nas encostas.
BOHADANA, Estrella (coord.), O Movimento dos Moradores e a FAMERJ no Rio de Janeiro, Rio de
Janeiro, Instituto Metodista Bennett, 1984, 13,14.
222
construção de nove edifícios de 16 andares, reunirá profissionais de diversas
34
CEF negocia com prefeito a área do forte, Jornal do Brasil, 21 de abril de 1977, p.21.
35
BOHADANA, Estrella (coord.), O Movimento dos Moradores e a FAMERJ no Rio de Janeiro, op. cit, p.
15.
36
Esta entidade reunia pessoas que apoiavam as candidaturas, vitoriosas em 1976, dos deputados José
Frejat, Délio dos Santos e Alves de Brito, e segundo Grazia de Grazia, era influenciada pelo partido
Comunista Brasileiro. GRAZIA, Grazia de. Desafios e Limites em Formatos Institucionais das Lutas
Urbanas: o caso da FAMERJ, op. cit.
223
sindicatos. Entre os objetivos do encontro estava o de debater a possibilidade
37
GONÇALVES, Douglas Cerqueira. Reivindicação Urbana, Estratégia Política e Movimento Social das
Associações de Moradores.Rio de Janeiro, PUR/UFRJ. 1983. Dissertação de Mestrado.
38
Palavra utilizada pelo Jornalista Carlos Castello Branco em sua coluna do Jornal do Brasil. Como
sistema referia-se ao setor ligado aos órgãos de segurança - principalmente os Centros de Informação do
Exército (CIEX) e aqueles responsáveis pelos departamentos de operações internas (DOI-CODI). Deste
modo, procurava burlar a censura prévia imposta aos meios de comunicação da época.
224
institucionalização. E a primeira reação a esse processo de
federativo.
39
Participaram da construção da FAMERJ, além das associações de moradores da zona sul, o movimento
Terra Habitação e o Conselho de União de Bairros de Campo Grande. No mesmo período, desenvolvia-se
em Nova Iguaçu, região metropolitana do Rio de Janeiro, o Movimento Amigo de Bairros (MUB). Em
1976, a diocese daquele município abriu espaço para um grupo de médicos atuar em conjunto com as
comunidades de base em um trabalho educativo sobre saúde e saneamento. A partir deste trabalho se
organizam grupos de bairros para o encaminhamento de reivindicações à Prefeitura. BERNARDES, Júlia.
Adão Espaço e Movimentos Reivindicatórios: o Caso de Nova Iguaçu. Rio de Janeiro, Edição do autor,
1983.
225
sociais numa luta Estado versus moradores. Esta perspectiva esteve mais
40
A Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (SABESP) foi criada em 1973, fazendo
parte de um processo de organização de companhias estaduais integradas ao Plano Nacional de Saneamento
Básico (PLANASA). Este plano, implantado nos anos 70, impôs a centralização de recursos aos
municípios, tornando inviáveis os serviços autônomos de água e esgoto. A respeito do PLANASA, ver:
COELHO, Franklin Dias. Estado e Equipamentos Coletivos: o Plano Nacional de Saneamento Básico.
Relatório de Pesquisa PUR/ABEP, 1984.
41
MARTINS, Maria Lucia Refinetti. Contextualização dos Movimentos Populares Urbanos da Cidade de
São Paulo.
226
Ao se fazer visível enquanto movimento por moradia, irá se
42
Castells situa sua concepção de movimento citadino no interior da crítica ao que ele chamou o duplo
beco sem saída na estratégia da esquerda, ou seja, de um lado o doutrinarismo leninista, e de outro, a gestão
leal das relações sociais capitalistas em troca de uma melhoria das condições de vida das classes populares.
Como já afirmei no capítulo 1, Castells fará uma revisão destas suas posições, o que não impede que ela
permaneça ainda hoje como referência de militantes de partidos políticos e de dirigentes de associações de
moradores. CASTELLS, Manuel. Cidade, Democracia e Socialismo, tradução de Glória Rodriguez, Rio de
Janeiro, Paz e Terra, 1980, p.26.
227
De modo distinto do Rio de Janeiro, o movimentos de bairro em São
social43.
americanos.
43
Esta definição se assemelha à visão de Jordi Borja em seu texto, que define uma tipologia para os
movimentos sociais urbanos, identificando aqueles de bairros populares com maior potencial de
transformação social e de integração com o movimento sindical. BORJA, Jordi. Os Movimentos Sociales
Urbanos. Buenos Aires, Ed. SIAP, 1975, p. 18 .
228
conquista do poder político como o movimento operário, mas com uma
identificar uma base social mais ampla que o movimento operário e uma
fato de que o Estado seja o interlocutor dos movimentos sociais não lhes
44
Estes dois autores foram dos primeiros a identificar limites no paradigma de Movimentos Sociais,
principalmente na noção que via no Estado o único interlocutor dos movimentos sociais urbanos.
ZICCARDI, A. & MACHADO da Silva, L. A. "Notas para uma discussão sobre Movimentos Sociais
Urbanos". In: Movimentos Urbanos, Minorias Étnicas e Outros Estudos, Brasília, Ciências Sociais Hoje
nº2, ANPOCS. Brasília, 1983, p. 9-24.
229
confere especificidade, ainda que não seja o único interlocutor possível
230
Esta visão de Francisco de Oliveira foi apresentada como comunicação
231
gestão urbana, a valorização do solo, as rendas fundiárias, o espaço de
as organizações.
47
A ANAMPOS foi organizada no final de 1979 e início dos anos 80, no encontro de João Monlevade no
qual, segundo Pedro Pontual, “companheiros do movimento popular, do movimento sindical, do campo e
232
oposições sindicais com os movimentos populares. Esta simbiose já vinha
Trabalhadores (CUT).
da cidade se reuniram para discutir quais seriam os princípios, as linhas de atuação e trocar experiências
dos movimentos sindical e popular combativos, que se diferenciavam de um tipo de prática vanguardista de
algumas organizações de esquerda”. PONTUAL, Pedro. “Rumo a Central de Movimentos Populares”,
entrevista concedida a revista Movimento Popular, São Paulo, POLIS,/CPV, nº 1, 1989, p.7.
48
PONTUAL, Pedro, “Rumo a Central de Movimentos Populares”, entrevista concedida a revista
Movimento Popular, op. cit., p. 11.
233
de Bairros de Belém (CBB), Federação de Associações de Bairros de
234
ANAMPOS para os movimentos populares urbanos, privilegiava o caminho
CONAM em 198250.
populismo.
50
Congregando Federações Estaduais, depoimento de João Bosco, presidente da CONAM na época, à
revista Movimento Popular, op. cit, p.17-18.
235
em debate a necessidade de sustentar uma cultura institucional de
51
Entrevista com Jorge Eduardo Saavedra Durão, presidente da FASE, concedida a Franklin Dias Coelho
em 18 de maio de 1996.
52
Surgida de um encontro da Comissão Pastoral da Terra da Igreja Católica em 1984, realizado em São
Paulo, sobre as ocupações de terra urbana, a ANSUR nasce de uma demanda de agentes das comunidades
eclesiais de base, que procuravam apoio para as ocupações de terra. A Comissão Pastoral da Terra,
entendendo que não era este seu campo de atuação, promoveu um encontro nacional para construir este
apoio técnico e político. “Uma avalanche de Ocupações de Terra”, Depoimento de Luis Paulo Teixeira
Ferreira à revista Movimento Popular, op. cit., p. 46.
236
serviços urbanos, mas introduzindo uma luta pela disputa de hegemonia na
urbana. Com esta bandeira, assumida de forma mais nítida a partir do projeto
de iniciativa popular de Reforma Urbana apresentado na Constituinte,
territorial da cidade.
53
Pastrana e Threlfall descrevem - em Pan, Techo y Poder, el movimiento de pobladores en Chile - como a
democracia cristã, em sua estratégia organizativa de recrutar bases sociais para seu projeto, formou Comitês
Sin Casa e, após a vitória da Unidade Popular, estimulou a ocupações de casas e apartamentos.
PASTRANA, Ernesto & THRELFALL, Mônica. Pan, techo y poder, el movimiento de pobladores en Chile
(1970- 1973), Buenos Aires, Ediciones Siap-Planteos, 1974, p.60.
237
atores, reintroduziu o debate sobre o papel dos partidos políticos e resgatou a
movimento sindical, marcou a década de 70. Este período foi sintetizado por
54
Haroldo de Abreu, Revista Proposta, nº 36, Rio de Janeiro, FASE, p.36.
238
Nesta conjuntura, que marcou o momento culminante das demandas
por direitos nas grandes cidades brasileiras, não pode ser considerado um
fato insólito o crescimento das lutas populares no espaço urbano.
55
Haroldo de Abreu, op. cit.
239
..."ganhavam visibilidade política na medida em que colocavam à luz
56
KOWARICK, L (org). As Lutas Sociais e a Cidade. 2a ed. São Paulo, Paz e Terra, 1988, 1994. p.315.
240
5. Democratização do Estado e a
construção de representações institucionais:
o movimento de reforma urbana
oposição ao regime militar assume sua real dimensão política através das
identidade social.
241
diálogos, negociações e respostas em termos de política pública e cultura
institucional.
reflexão tanto sobre uma teoria ou modelo explicativo como também por
determinada direção.
1
O debate sobre o paradigma de movimentos sociais urbanos será intenso no início da década de 80,
refletindo o seu próprio dinamismo e importância no cenário político brasileiro. No interior da Associação
Nacional de Pós-graduação em Ciências Sociais (ANPOCS), organizou-se um grupo de estudiosos que se
constituíram num pólo de referência deste debate. Entre eles se encontravam Ana Clara Torres Ribeiro,
Luiz Antônio Machado da Silva, Maria da Glória Gohn, Edson Nunes, Pedro Jacob, Vera da Silva Telles,
Ilsen-Sherre, Lúcio Kovarick, Paulo Krischke, entre outros.
242
expressava apenas dilemas práticos, mas articulava as diversas
do Estado capitalista2.
olhássemos para esta realidade como se fosse pela primeira vez3, não parece
2
Ana Maria Doimo sugere que longe de pensarmos em “novos sujeitos”, em “novas identidades”, deve-se
olhar estes novos impulsos participativos como um processo de constituição de novos formatos políticos
que incorporem uma ação-direta. Adverte a autora que, ao reabilitar este termo para a reflexão da
participação do tipo movimentalista, não está se reportando à experiência anarquista. Contudo, parece-me
que, apesar de seus esforços, é inevitável que esta relação se estabeleça por seu uma noção definidora do
movimento anarquista. DOIMO, Ana Maria. A Vez e a Voz do Popular. Movimentos Sociais e Participação
no Brasil pós-70. Rio de Janeiro, Relume-Dumará, ANPOCS, 1995, p.50.
3
O desejo de olhar estes movimentos como se olhássemos pela primeira vez parece querer resolver o
dilema dos movimentos sociais da década de 70 fugindo da dimensão de novos, não comparando-os com
os velhos, mas pensando-os de forma distinta em um novo campo político e social. Apresenta-se como um
caminho metodológico que, levado às últimas conseqüências perde de vista a história, as continuidades e
descontinuidades, as rupturas sociopolíticas. Historicamente, penso que há que se pensar como estes
movimentos sociais se inscrevem, prescrevem e reescrevem o processo socioespacial.
243
ser distinta, ainda que a autora faça a ressalva da distinção de como os
244
do processo de democratização. A partir de 1980, com o surgimento do PT e
245
constitui a maioria das federações estaduais que desenvolvem processos de
político, reproduzindo, quer através da ação direta dos movimentos quer nas
6
A influência de Gramsci junto aos intelectuais e assessores de movimentos sociais brasileiros encontrou
terreno fértil pela releitura que se fez do populismo, negando a visão instrumental e incorporando a noção
de hegemonia no campo político institucional. Com a emergência das classes populares no cenário político
pós-70, o conceito de hegemonia se mescla com a negação de uma institucionalidade e ações políticas que
a longo prazo visavam a ruptura institucional. A proposta de conselhos populares refletia esta dubiedade
presente na apreensão de Gramsci pela chamada nova esquerda que iria formar o PT.
7
Carlos Nelson Coutinho, que traduziu a grande maioria de livros de Gramsci no Brasil e que ao lado de
Leandro Konder procurou debater as concepções deste autor nos meios acadêmicos e políticos, afirma
que Grasmci, em sua obra de maturidade, os Cadernos do Cárcere, jamais se refere à noção de dualidades
de poderes. Reproduzindo o debate de autores gramscinianos que incorporam ou não esta noção, todos o
246
sociais urbanos, influenciados em sua prática por intencionalidades de
de ruptura institucional.
sociais mais específicos com forte influência daqueles gestados nos países
movimentos, não poderiam ficar esperando uma revolução social para que
247
não traziam uma visão negativa das grandes cidades do ponto de vista
lado do debate conceitual, que muitas das vezes não marcava estas
9
À medida que se constituíam movimentos específicos, como os ecológicos ou de mulheres, as estratégias
se mostravam mais diferenciadas. Estes novos movimentos sociais, categoria muito mais identificada com
uma luta político-cultural européia, onde as novas identidades e mudanças específicas haviam de ser feitas
por um processo de transformação cotidiana, dos hábitos e costumes da população, uma utopia possível
assumida pelos próprios movimentos, já que se desfaziam as expectativas em relação ao Estado do Bem
Estar ou no socialismo estatal do leste europeu. Estes movimentos desenvolviam começavam a construir
formas de participação na definição de políticas específicas. De modo distinto, os movimentos populares
urbanos, assumiam uma postura mais reivindicativa e de confronto.
248
sempre trabalhou no sentido de uma verticalização, tanto em termos de
utilizadas.
249
identificar pela diversidade de reivindicações por bairros que caracterizam o
Fonte: Jornal do Brasil de 1978 a julho de 1983, in: BOHADANA, Estrella et alii, O
Fazendo uma classificação por serviços urbanos, a pesquisa indica as diferenças de perfil
de reivindicações por área da cidade. Os dados quantitativos indicam que o número de eventos
10
Pesquisa realizada no período de julho de 1983 a fevereiro de 1984, com a participação de professores e
alunos do Curso de Pós-Graduação do Instituto Metodista Bennett. Participaram da equipe como
coordenadores a prof. Estrella Bohadana e o prof. Carlos Henrique Guanziroli. Como pesquisadores os
alunos: Alcides José de Carvalho Carneiro, Marcia Barbosa da Fonseca, Marcia Lacerda Teixeira Gentil,
Maria Regina de Araújo Pereira, Marilene Metran Pinto de Carvalho e Sonia Hauser. BOHADANA,
Estrella et alii, O Movimento de Moradores de Bairros e a FAMERJ no Rio de Janeiro, Instituto Metodista
Bennett, 1984, mimeo, p.87.
250
O ano de 1982, com a vitória da oposição em vários estados, marcou a
habitacional do BNH”,...
população
comunidades.
251
... Amplo debate entre executivo, legislativo e associação de moradores
11
Como em todo movimento social com forte presença político-partidária, as reivindicações procuram
articular questões nacionais com específicas. No caso de movimentos sociais urbanos, esta articulação local
– nacional aparece como um dilema já que a luta tem uma dinâmica basicamente local. Este dilema
aparecerá também na discussão do próprio projeto de reforma urbana. Um outro aspecto é a presença de
reivindicações ainda de enfrentamento ao regime militar como o fim do interventor das zonas de segurança
nacional, que englobava os prefeitos de capitais e de municípios com atividades consideradas como de
segurança nacional Jornal do Brasil, 29 de novembro de 1982, p.21.
252
governador, Leonel Brizola, foi convocado para um encontro com as
(mesa do povo, mãe crecheira, entre outros) que gerou o debate sobre
cooptação e clientelismo13.
253
parcela da oposição14. O movimento se ressente com o afastamento de vários
discurso então assumido pelo Estado soa o mesmo que a população estava
acostumada a ouvir do lado do movimento. Isto confunde o movimento. Por
14
Segundo Maria da Glória Gohn, a nova conjuntura política dos anos 80 foi quebrando aqueles
denominadores comuns. As diferenças foram se explicitando. GOHN, Maria da Glória. Os movimentos
sociais e a luta pela moradia. São Paulo, Edições Loyola, 1991, p.13.
254
através de seus técnicos, de seus assessores, das organizações por ele
fomentadas.
são diluídas por bairro, deixando, inclusive, de ser noticiadas pela imprensa
255
organizações que permanecem ligadas à CBB são aquelas cujas lideranças
pelo Estado.
256
Para as lideranças da CBB, a Federação e suas organizações filiadas são
congressos, entre outros. São seus membros indicados para fazer parte dos
para seus bairros representados várias vantagens. Com isso tem a adesão de
15
Entrevistas com lideranças da FMCCAM realizada por assessores da FASE em Belém. Texto Base de
Contextualização - MPUs da Região Metropolitana de Belém. Julho de 1994, Belém, mimeo, p. 22.
257
outros bairros, esvaziando o movimento liderado pela CBB que vê, no
QUADRO 5.2
258
isoladas.
Cortiços • Com o apoio da Igreja Católica, em fins de 81 e início de 82, esse segmento passa a
mobilizar-se. Trabalho dificílimo, na medida em que não há tradição de luta
organizada no meio e muitos de seus moradores deslocam-se constantemente de uma
área para outra, inclusive mudando-se para favelas.
• Em todo esse período o alcance da luta não ultrapassou a esfera de pequenas ações
isoladas de conjuntos, em torno de demandas bem específicas. Atualmente, forma
com o MUF e os moradores dos Conjunto Pró-Morar um único movimento.
Mutirão • Coordenação dos Movimentos e Associações de Moradia, Ajuda Mútua e
Autogestão.
• Começam com ocupações organizadas de terrenos, passam por amplo processo de
enfrentamento e negociações com os poderes públicos e desdobram-se, quase sempre
por longos períodos, no empenho pela obtenção dos direitos de posse coletiva, na
própria construção das casas com todos seus detalhes técnico-políticos, no pagamento
de prestações e, por fim, na gestão administrativa dos "novos bairros".
Movimentos dos • À semelhança dos mutirões, caracterizam-se por serem ocupações organizadas do
Sem-terra solo urbano.
• Tratam-se de operações laboradas coletiva e conscientemente. A população decide
por um lugar – de preferência nas áreas mais equipadas e próximas de ofertas de
emprego – e ocupa-o. Nesse sentido, já distinguem-se das favelas que são, em geral,
constituídas por invasões individuais e desorganizadas.
16
O discurso sobre planejamento participativo teve como referência inicial os programas e projetos de
prefeituras com participação da comunidade. A primeira delas, ou a mais divulgada no final década de 70,
foi a experiência de Lajes, em Santa Catarina, com a eleição, em 1976 de Dirceu Carneiro do Movimento
Democrático Brasileiro (MDB). Com a experiência de hortas comunitárias, participação das associações de
moradores nas ações da prefeitura e programas de habitação e economia popular, valorizava-se a volta do
povo ao cenário político. A auto-organização popular é o fundamento desta prática. Ela reverte o centro de
decisões: não são burocratas mordômicos que decidem sem o povo o que é melhor para ele, é o povo
organizado que toma a palavra através do trabalho e de suas associações de moradores de bairros urbanos,
de núcleos agrícolas e de distritos. Lajes desenvolve uma democracia participativa e uma economia
ecológica.”. Prefácio de Maurício Tragtemberg no livro: ALVES, Moreira Alves. A Força do Povo,
democracia participativa em Lajes. São Paulo, Brasiliense, 1980, p.8.
259
reorganizando o território municipal a partir de centros comunitários17,
Brasil.
17
Uma outra experiência, também bastante divulgada, foi a de Boa Esperança no Espírito Santo, na qual o
Prefeito Amaro Covre, do Partido Democrático Social (PDS), influenciado pelas comunidades eclesiais de
base, reorganizou a administração municipal a partir de nucleação e participação da população em centros
educacionais.
18
A respeito deste seminário de reforma urbana, em 1963, ver Capítulo 3.
260
A posição do IAB-RJ expressa uma visão da organização do espaço
população19.
urbanas são entendidas não apenas como demanda dos moradores, mas
como um direito da população que exige inversões de prioridade da
19
“Gestão Democrática da Cidade”. Posição do IAB-RJ. Revista de Administração Municipal, Rio de
Janeiro, ano XXIX, volume 32, nº 165, outubro/dezembro de 1982, p.50-53.
20
A afirmação de que cidadão tinha o dever de exercer o direito de eleger os seus representantes e o dever
de participar da gestão democrática traz uma distinção entre direito representativo e dever participativo.
Estas questões estarão relacionadas também com a proposta de conselho consultivo sugerido pelo IAB-RJ.
Gestão Democrática da Cidade.Posição do IAB-RJ, op. cit, p. 21.
261
administração pública baseada não apenas em uma definição política
públicos. A partir de sua própria prática, ainda que com a forte visão
262
trazia a herança da oposição e a negação da institucionalidade, contando
realidade.
21
Este seminário, publicado em suplemento especial da Revista Proposta, realizado em março de 1981 no
Rio de Janeiro, contou com a participação de 31 pessoas oriundas de 10 capitais de Estados: Belém, São
Luís, Fortaleza, Recife, Salvador, Vitória, São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Porto Alegre. "A questão
urbana", Revista Proposta (suplemento), Rio de Janeiro, FASE, dezembro de 1981.
22
É interessante notar que as noções de ação política de esquerda, todas relativas a organizações e
estratégias militares – como vanguarda, centros táticos, guerra de movimento e guerra de posição – perdem
força, tanto pela desgaste do leninismo no campo internacional como pela não adequação a um processo
democrático de disputa de hegemonia.
263
debate interno que travavam militantes e assessores e como um movimento
23
A Gestão Democrática da Cidade. Posição do IAB-RJ, op. cit., p. 51.
264
indústrias de elevada densidade de capital ou tecnologia24, voltam-se para o
24
Em 1974, já eram visíveis os sintomas de esgotamento das possibilidades de crescimento acelerado da
economia, característico do período Médici. O choque do petróleo de outubro de 1973 agravou mais essas
perspectivas. O general Ernesto Geisel, ao assumir, se propõe a promover mudanças estruturais de
adequação à crise do petróleo e no sentido de transformar o Brasil numa potência emergente: era o II Plano
Nacional de Desenvolvimento (II PND). Ao se propor a instituir um novo padrão de industrialização
baseado na implantação e expansão de bens de capital e de insumos básicos, o chamado “Projeto Brasil-
Potência” privilegiou a indústria pesada da construção civil, em detrimento de setores que trabalhavam
com a produção imobiliária. II PND, Brasília, 1974.
25
O Jornal do Brasil publicou em março de 1976 artigo no qual se refere a um conjunto de instrumentos
tributários defendidos pelas empresas da construção civil para combater a especulação imobiliária. O que
se apreende do discurso desse setor é que se considerava especulação imobiliária o processo de expansão
horizontal da periferia das regiões metropolitanas, do qual pesquisas indicavam que cerca da metade da
área urbanizada está desocupada. Considerando justa uma taxação diferenciada, estes setores se defendem
das acusações de especulação, fazendo um distinção clara entre eles e proprietários de terra. Segundo o
presidente da Associação Paulista dos Empresários do Plano Nacional de Habitação, Sr. Luiz Gonzaga
Mascarenhas – diretor financeiro da Construtora Guarantã – “os construtores não podem ser acusados de
especuladores, pois o terreno, para nós é matéria que deve ser usada com a maior rapidez”. "Indústria
Imobiliária diz como corrigir uso do solo", Jornal do Brasil, 14/3/76, 1º caderno, p. 35.
26
Com o título – A Reforma do Brasil – o Jornal da Tarde faz, através do seu editor Júlio Moreno, uma
introdução à publicação do anteprojeto da Lei de Desenvolvimento Urbano, elaborado pelo CNDU e
entregue ao ministro do planejamento Reis Veloso para análise. Segundo o jornal, publica-se com
265
Esta proposta oficial de Reforma Urbana, desenvolvida por setores
social27.
que:
exclusividade um documento confidencial (sic) que significou mais de dois anos de trabalho, consultando
autoridades, urbanistas e juristas de várias partes do país. Júlio Moreno, “A Reforma do Brasil”, Jornal da
Tarde, terça-feira, 24 de maio de 1977, p.5.
27
"O Anteprojeto", Jornal da Tarde, op. cit., p 5-6.
28
O Jornal do Brasil publica o debate realizado no Fórum sobre A Sobrevivência da Cidade no qual os
expositores falam que a comunidade deve ser ouvida (Rafael de Almeida Magalhães e Saturnino Braga),
que o planejamento urbano não pode ser visto separado da Reforma Agrária (arquiteto Sérgio Bernades),
qualificando a proposta oficial como um projeto elitista. Jornal do Brasil, 5 de maio de 1978.
29
Declaração de João Fortes, Presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Rio de Janeiro,
em depoimento na CPI da Câmara dos Deputados. “Fortes Quer Política Urbana que preserve a
propriedade”. Jornal do Brasil, 17 de maio de 1978, p.21.
266
Diante de pressões para não se ampliar controle social à propriedade
30
A presença da Lei do Desenvolvimento Urbano no debate político só retornará no momento em que o
ministro do interior Mário Andreazza tenta promover sua candidatura ao colégio eleitoral do regime militar
e retoma o debate urbano. Em 1982, é o próprio Mário Andreazza que traz a público o projeto, reelaborado
pelo CNDU. Carlos Chagas, “Definido o plano da Reforma Urbana, Estado de São Paulo, 27 de janeiro de
1982, p.34.
31
Há outras modificações no projeto, como a inclusão do direito de superfície no qual o proprietário urbano
pode ceder a outrem o direito de construir. O solo criado, instrumento que permite que a prefeitura cobre
um imposto sobre a produtividade do terreno e que gerou as maiores polêmicas no primeiro projeto, foi
suprimido.
32
Item IX do artigo 2º do anteprojeto de lei de desenvolvimento urbano. O Anteprojeto, op. cit., p.5.
33
Artigo 46 da Lei de desenvolvimento urbano de 1982. A Lei do solo Urbano, O Globo, 4 de maio de
1983, p.6.
267
1976, têm sua voz abafada por um ator que atuava diretamente na compra e
34
ADEMI denuncia recurso só usado em caso de guerra. Jornal do Brasil, 14 de fevereiro de 1982, p18.
35
Um projeto sem os pés no chão, artigo de Marcelo Torgnozzi, Revista ADEMI, Rio de Janeiro, ano IX, nº
88, p.18-23.
36
As entidades mais progressistas também faziam algumas críticas ao projeto. As principais ressalvas se
referiam ao excesso de centralismo embutido na proposta e à ausência de um proposta de descentralização
de recursos que enfrentasse a fragilidade financeira dos municípios. Na 22ª Assembléia-geral da CNBB,
realizada em fevereiro de 1982, em Itaici, o Bispo de Santo André, Dom Cláudio Humme, apoiou a
proposta do Governo porque ela coincidia com vários pontos defendidos pela CNBB. "Anteprojeto de
Reforma Urbana provoca controvérsias", op. cit.
268
lógica empresarial, de potencialização dos investimentos na cidade, e o
37
O documento foi aprovado na 22ª Assembléia da CNBB por todos os participantes, com o voto dissidente
de Dom Eugênio Sales, Cardeal Arcebispo do Rio de Janeiro. "Solo Urbano, Direito de Propriedade e
Direito de Moradia", Jornal do Brasil, Caderno especial, domingo , 21 de fevereiro de 1982.
38
Em artigo na Folha de São Paulo, José Álvaro Moisés ressalta a importância deste olhar político para a
questão urbana, lamentando apenas que o documento não avance em direção a uma melhor especificação
do que deve se entender por uma verdadeira solução política dos problemas urbanos. "A Questão Urbana e
a participação popular", artigo assinado por José Álvaro MOISÉS e publicado na Folha de São Paulo, terça
feira, 23 de fevereiro de 1982,p.3.
269
“uma larga experiência pastoral nos leva à convicção de que os
... o direito natural à moradia tem primazia sobre a lei positiva que
39
“Solo Urbano. Direito de Propriedade e Direito de Moradia”, Jornal do Brasil, op. cit., p.1.
40
Ibiden, p.2.
41
“Solo Urbano. Direito de Propriedade e Direito de Moradia”, Jornal do Brasil, op. cit., p.1-2.
270
Compreendido no âmbito das necessidades humanas vitais, o direito à
homens43, o que significa dizer que ela deve ser um espaço de convivência
42
O Estado de Necessidade é um conceito de aplicação jurídica, tanto no campo do direito penal, como no
campo do direito civil, que garante a posse ou ocupação por necessidade efetivamente comprovada.
Apoiado neste conceito, o jurista Miguel Baldez sugeriu que ele fosse estendido à posse, quando o uso e
ocupação ocorressem por necessidade efetivamente comprovada. BALDEZ, Miguel Lanzelotti, Solo
Urbano – Propostas para a Constituinte, Apoio Jurídico Popular/FASE, Rio de Janeiro, 1986, p.17.
43
A cidade como criação dos homens, como obra, nos remete às noções centrais do pensamento de
Lefebvre. Lefebvre trabalhou centralmente a idéia de que a cidade é uma obra de agentes históricos e
sociais, como vimos no capítulo 2 desta tese.
44
Solo Urbano. Direito de Propriedade e Direito de Moradia, op. cit., p.1-2.
271
Urbano (ANSUR) no interior da Comissão Pastoral da Terra (CPT), para dar
apoio às ocupações.
territorial da cidade.
45
Com a mobilização em torno da Assembléia Constituinte, organizou-se o Fórum Nacional de Reforma
Urbana, que elaborou uma emenda popular. Esta proposta é detalhada ainda neste capítulo.
272
intensa reflexão acadêmica onde predominava a crítica ao paradigma inicial
habitações populares.
46
O debate em torno deste paradigma foi percorrido no Capítulo 2. É importante registrar que ao lado do
debate conceitual que acompanhou toda a década de 80, a riqueza deste momento de transição permitiu um
deslocamento de questões conceituais para uma percepção do conteúdo de nosso processo histórico.
47
A experiência pioneira de cooperativas habitacionais por ajuda mútua surgiu no Uruguai, impulsionada
pelo Centro Cooperativo Uruguai (CCU). Esta experiência se expandiu em grande escala ao ser incluída na
Lei de Habitação aprovada em 1968. Estas cooperativas se integraram à Federação Unificadora de
Cooperativas de Habitação por Ajuda Mútua (FUCVAM), que se constituíram num dos mais importantes
movimentos de base urbana do Uruguai. CHAVEZ, Daniel. FUCVAM. A história Viva. depoimentos de
organização de luta: o cooperativismo habitacional por ajuda mútua no Uruguai, São Paulo,FASE, 1993,
p.5.
273
Pressionados por este quadro de desgaste da política habitacional,
48
O PROFILURB apresentará um desempenho modesto e reproduzirá vícios autoritários. Voltado
basicamente para áreas populares insalubres ou sem regularização fundiária, não se destinou às remoções.
Inexistia a perspectiva de participação popular e do usuário na formulação do programa e a não utilização
de recursos a fundo perdido. Além de seu fraco desempenho, este programa esbarrava na inexistência de
facilidades para compra de materiais e assistência técnica para a construção de moradia.
49
O PROMORAR foi instituído em 1979 como uma forma de legitimação social frente às críticas ao BNH
e se propunha, segundo o discurso oficial, à erradicação das favelas, mocambos e palafitas, com a
permanência da população no seu espaço de moradia. Retomavam a política de não remoção depois da
ineficácia dos conjuntos habitacionais. Segundo Maria Ozanira Silva & Silva, “não custou muito para o
PROMORAR mostrar sua face autoritária ao selecionar áreas e impor-se às populações, derrubando
barracos sem oferecer nenhuma indenização ...”. Silva & Silva, Maria Ozanira, Política Habitacional
Brasileira. Verso e Reverso, São Paulo, Cortez editora, p. 76-77.
50
AZEVEDO, Sérgio de "A trajetória dos Programas Alternativos de Habitação Popular no Brasil". Revista
de Administração Municipal, Rio de Janeiro, 37 (195); abr./jun.1990. p.15.
274
Ao final do governo militar implantou-se o programa João de Barro51.
pensados – tanto por assessores dos movimentos sociais como por técnicos
51
O Projeto João de Barro, com o subtítulo Programa Nacional de Autoconstrução, instituído em abril de
1984, tinha o objetivo de desenvolver um programa de autoconstrução em larga escala e se distinguia de
outros programas por se destinar a núcleos urbanos de pequeno e médio portes. Seu desempenho, segundo
Marcus André de Mello, foi bastante tímido.
275
arquitetônico e urbanístico que evite as soluções uniformizadas e
52
A valorização da autoconstrução, como forma alternativa construtiva e de melhoria de condições de
vida para a população de baixa renda, data da década de 70 com a divulgação da experiência de John
Thurner no Peru. Questionando o mito da autoconstrução, vários autores situam-na no campo da
sobrevivência e das condições precárias de reprodução da força de trabalho, mostrando que evidências
empíricas confirmam uma habitação de pior qualidade em função de recursos disponíveis, o que não
elimina a criatividade de algumas soluções. Sérgio Azevedo, ao ressaltar este debate, critica o outro lado da
moeda, em que se rejeita de forma absoluta a autoconstrução por legitimar a teoria da marginalidade e
caracterizar uma forma de cooptação da população através de programas governamentais. AZEVEDO,
Sérgio de, Política de habitação Popular: equívocos e mitos sobre a autoconstrução, Revista de
Administração Municipal, Rio de Janeiro, Ano XXXVI, nº 192, julho/setembro de 1989, p.28-39.
276
o esforço, a luta e o sofrimento do que denominaram as iniciativas
populares, perguntam:
53
Solo Urbano. Direito de Propriedade e Direito de Moradia, Jornal do Brasil, op. cit., p.1-2.
54
Diante do quadro de desgaste do BNH, a Nova República procurou reformular o sistema financeiro de
habitação. Como uma das medidas dessa reformulação, foi criado o MDU, ao qual se incorporou o BNH. O
texto citado foi publicado como uma proposta preliminar de reforma urbana desenvolvida no âmbito da
Associação dos Servidores do BNH e como contribuição para ampliação do debate sobre as medida que
o MDU iria propor para reformulação do SFH. Plano de Ação para o MDU: a reforma urbana, Revista de
Administração Municipal, Rio de Janeiro, Ano XXXIII, nº 180, julho e setembro de 1996, p. 28-41.
277
Instituto de Arquitetos do Brasil, realizando 24 seminários no Distrito
Federal e capitais55.
reforma urbana. Para esta política o documento afirma ser essencial que a
elaboração e a conclusão do plano nacional de desenvolvimento urbano e o
55
O MDU já havia criado em 1985, em função do crescimento da inadimplência dos mutuários e das
reações políticas pelos reajustes da prestação da casa própria, o Governo constituiu um grupo de trabalho
(GTR/SFH), pelo Decreto nº 91.531 de 15-08-85, composto por representantes de diversos segmentos
interessados na política habitacional . O objetivo do grupo de trabalho era proceder medidas para
realizações mais amplas e mais efetivas no campo de desenvolvimento urbano e especificamente da política
habitacional com priorização nítida no social. O documento debatido nacionalmente foi preparado por este
grupo de trabalho. SILVA, Maria Ozanira da Silva e , Política Habitacional Brasileira, Verso e Reverso,
São Paulo,Cortez Editora, 1989, p.143-144.
56
O debate nacional promovido pelo IAB ocorreu em todo o país nos dias 10 e 11 de maio. A síntese deste
debate é objeto de discussão no período de 30 de maio a 1 de junho , em Vitória, no Espírito Santo, durante
a 74º reunião do conselho superior do IAB. Entregando-o em 2 de julho de 1986, o IAB do Distrito Federal
concluía o convênio firmado com o MDU. “Documento do debate nacional amplia espaço do IAB”,
Projeto, Revista Brasileira de Arquitetura, Planejamento, Desenho Industrial e Construção, Rio de Janeiro,
nº 88, p.88-89.
278
aprovação do projeto de lei 775/8357, retomando a proposta oficial de
57
A proposta oficial de reforma urbana apresentada pelo governo em 1982 (ver o início deste capítulo)
transformou-se no projeto de lei 775/83. Projeto de Lei de Desenvolvimento Urbano, Ministério do Interior,
1983.
58
Projeto, Revista Brasileira de Arquitetura, Planejamento, Desenho Industrial e Construção, Rio de
Janeiro, nº 88, p.104.
279
A retomada do debate sobre o projeto de reforma urbana ocorrerá com
institucional59.
(FAMERJ)60.
59
Conforme Ana Amélia Silva, A. A., "o grande salto qualitativo para a participação popular, fruto do
trabalho dos comitês, plenárias e movimentos, apareceu em março de 1987, quando o regimento interno da
Constituinte abriu a possibilidade, através do mecanismo da "iniciativa popular" legislativa, da elaboração e
defesa de emendas populares ao projeto da Constituição. SILVA, Ana Amélia da. Reforma Urbana e o
Direito à Cidade. São Paulo, PÓLIS, 1991, p.5.
60
As entidades no Rio de Janeiro já vinham de um acúmulo de experiências de ações integradas e
construindo uma reflexão conjunta sobre a questão urbana. Em 1983, foi formada a comissão Consultiva
para Legislação e Uso do Solo, da qual participaram as entidades envolvidas mais diretamente com o
planejamento da cidade. No mesmo período, tem inicio o trabalho realizado pelo Núcleo de Regularização
de Loteamentos realizado na Procuradoria do Estado – com a participação ativa dos movimentos de
loteamentos clandestinos e irregulares e assessoria de técnicos da prefeitura – e a discussão da Lei
Municipal de Desenvolvimento Urbano, proposta pela Prefeitura do Rio de Janeiro em 1986.
280
discussão presente na área de serviços urbanos, com a participação da
político seja ocupado principalmente por força sociais que tinham sua
democratização da cidade.
281
do solo, e de outro, a institucionalização de sujeitos sociais que questionam
as ocupações de terra62.
61
O documento da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, debatido e divulgado em 1982, teve como
principal efeito a politização do debate urbano, como registrei na seção 5.3 – O documento da CNBB e a
politização do debate urbano.
62
BALDEZ, Miguel Lanzelotti, Solo Urbano – Propostas para a Constituinte, Apoio Jurídico
Popular/FASE, op. cit, loc. cit.
282
Os conflitos na elaboração do projeto refletiram o choque de cultura
Quadro 5.3
Entidades que assinam a emenda popular63
Tipo Instituições
Federações de Moradores FAMERJ, FRACAB, Federação de Entidades de Bairros e Favelas
de Fortaleza, União de Associação de Moradores de Porto Alegre
Associações de Moradores Porto Alegre(3), Ceará (3)
Associação de Moradores de MUF/SP, MDF/SP, Associação de Favelas de Diadema/SP
Favelas
63
Documento do Movimento Nacional de Reforma Urbana apresentado à subcomissão de habitação e
transporte da Assembléia Nacional Constituinte, Brasília, 1988, mimeo,p.2-3.
283
Associação de Mutuários Ceará, Viçosa/MG, Minas Gerais, João Pessoa/PB, Campina
Grande/PB, Alagoas, Espírito Santo, Rio Grande do Norte,
Associação de Mutuários em Luta de Salvador/BA, Federação
Estadual de Mutuário/SP,
Associação de Inquilinos Movimentos dos Inquilinos Intranqüilos,
Federações de Profissionais Arquitetos, Engenheiros, AGB
Liberais
Associações Nacionais OAB e IAB
OABs Regionais RJ, SP.
IABs Regionais RS
Sindicatos Arquitetos (RJ, SP, RS), Engenheiro/RJ, MG) Metroviários/SP,
Associação de Sociólogos/RS, Associação dos Engenheiros
Agrônomos/BA.
ONGs ANSUR, FASE. Centro Pastoral Vergueiro/SP
Universidades Coordenação da Sociologia Urbana da UERJ, PUR/UFRJ,
Laboratório Habitat, PUC-Campinas/SP
Comissão de Defesa de Direitos Arquidiocese de SP, Volta Redonda/RJ, Petrópolis/RJ
Humanos
Plenário Pró-participação RJ, SP, S. José dos Campos/SP. Santo André/SP, S. Matheus/SP
Popular na Constituinte
Movimento dos Sem-casa SP
284
Constituinte. Esta rede de instituições e entidades configurará o Movimento
pela:
285
habitação é entendida enquanto referência de vida, significando que
da de propriedade;
64
O texto da emenda popular de reforma urbana, contém 28 artigos, divididos em cinco títulos, a saber: dos
Direitos Urbanos;da Propriedade Imobiliária Urbana;da Política Habitacional; dos Transportes e Serviços
Públicos; da Gestão Democrática da Cidade. Documento do Movimento Nacional de Reforma Urbana
apresentada à subcomissão de habitação e transporte da Assembléia Nacional Constituinte, Brasília, 1988,
mimeo.
286
inicial para formulação do projeto envolveu também temas de organização
referente à política urbana e por estar presente nele uma noção de direito
65
Alguns aspectos que não eram sugestões apenas deste projeto de reforma urbana, mas já estavam
contidos na proposta oficial de reforma urbana apresentada em 1982, como desvinculação do direito de
propriedade do direito de construir, não foram incorporados ao texto constitucional. Outros foram
neutralizados, como a desapropriação por interesse social e as penalidades previstas para a propriedade
urbana ociosa.
66
Em sua análise sobre os resultados da Constituinte para as cidades brasileiras, Ana Amélia da SILVA
chama a atenção para o fato de que a introdução do conceito função social da cidade poderia, ainda que
modestamente, contribuir para a extensão de uma série de direitos aos cidadãos, diminuindo as
desigualdades sociais no espaço urbano. SILVA, Ana Amélia da. Reforma Urbana e o Direito à Cidade.
São Paulo, PÓLIS, 1991, p.17.
67
Esta visão municipalista se consolida pela defesa da descentralização política, não tendo nenhuma
relação com a aprovação do plano diretor para as cidades de mais de 20 mil habitantes. A proposta dos
planos diretores, aparecendo no texto constitucional como sendo um instrumento que viabiliza a função
social da cidade, não aparece em nenhum momento no debate do movimento nacional de reforma urbana.
287
constitucional através dos planos diretores para cidades acima de 20 mil
urbana, que não era apenas fruto daquelas entidades que assinavam a
68
Pode-se acrescentar a este cenário a política habitacional da Nova República.
288
regionais que assinavam a emenda popular69. Este caminho de
urbanística com forte presença de teorias que lêem a cidade por uma ótica
intra-urbana, resgatando velhos debates sobre a cidade ideal que tanto os
urbanistas perseguem.
universidades.
289
concepção de Plano de Desenvolvimento Local Integrado, no qual
objetos geográficos71.
cidadania.
71
“II Fórum Nacional sobre Reforma Urbana: Carta de Princípios Sobre o Plano Diretor”, in GRAZIA,
Grazia de (org.) Plano Diretor. Instrumento de Reforma Urbana, Rio de Janeiro, FASE, 1990, p.89-93.
290
e da gestão. Por esta razão, ganharam força as experiências de gestão urbana,
político.
291
6. Essa tal de reforma urbana e a construção de uma
esfera pública democrática
reforma urbana como uma bandeira de luta1. Possivelmente porque ela não
Mas o que é essa tal de Reforma Urbana? Pergunta que Jorge Wilhelm,
um dos coordenadores do seminário de Reforma Urbana de 19633, já fazia
292
proposta de planejamento das cidades. Ao retomar esta proposta no interior
4
Maria Adélia A. de Souza, em debate promovido pela revista Espaço e Debates, recupera sua história de
vida profissional , como responsável pelo Programa de Cidades Médias e vários outros trabalhos realizados
no âmbito de política urbana do governo federal, e registra que “acreditava que o planejamento se
constituía num veio de resistência a tudo aquilo que acontecia no país (depois de 64). E achava também
que, muito embora não me confundindo jamais com o sistema vigente, eu podia fazer do planejamento este
tipo de cunha, de abertura. E eu só poderia fazê-lo estando dentro do sistema, do governo”. Debate:
Planejamento em Crise, com Maria Adélia A. de Souza, Cândido Malta Campos, Regis de Castro Andrade
e Ida Jancso, Revista Espaço e Debates, São Paulo, ano 1, nº1, janeiro de 1981, p.105.
5
Há que se diferenciar os estamentos técnico-burocráticos, de uma elite política estatal criada pelo regime
militar e elites políticas empresariais.
6
Com o General Golbery na posição de ideólogo, o General Ernesto Geisel herdara um país sem condições
de reproduzir “milagres” econômicos, fadado a enfrentar uma profunda crise social e com a oposição
crescendo nos grandes centros urbanos. Procurando evitar os erros do Marechal Castelo Branco, que
tentara pôr fim ao ciclo revolucionário sem preparar a transição, Geisel adotou um movimento pendular de
abertura política, alternou medidas de distensão e de controle da ação de órgãos repressivos com medidas
de força e antidemocráticas como o fechamento do Congresso e a cassação de direitos políticos. A este
movimento pendular, o General Geisel chamou de distensão lenta, gradual e segura.
293
politicamente pelo ministro Mário Andreaza que se candidatara à sucessão
Este projeto, que para Luiz Paulo Ferreira, militante de base dos
7
Solo Urbano. Direito de Propriedade e Direito à Moradia, op. cit., p. 1-2.
8
Ana Amélia da Silva, ao perguntar o que é a reforma urbana, reproduz definições de assessores, juristas e
professores, iniciando por esta de Haroldo de Abreu. Estas definições traduzem esta visão ético-social
através da negação da não-cidade, cidade dos ricos, do apartheid urbano e a afirmação do direito à cidade.
SILVA, Ana Amélia da. Reforma Urbana e o Direito à Cidade, São Paulo, PÓLIS, 1991, p. 7.
9
Luiz Paulo Ferreira é militante de base do movimento de moradia de São Paulo e posteriormente assessor
da ANSUR. SILVA, Ana Amélia da, Reforma Urbana e o Direito à Cidade, São Paulo, PÓLIS, 1991, p. 9.
294
integra com as reivindicações das carências presentes no cotidiano dos
295
conjunto dos moradores. Por esta razão, a história dos movimentos
Esta luta pela apropriação pública dos benefícios na cidade tem uma
corporativas10.
alguns bairros na cidade a luta é por mostrar que "nem tudo que é sólido se
10
Renato Raul Boschi, em sua análise sobre o movimento de associação de moradores no início dos anos
80, afirma que:”as identidades são constituídas no contexto geográfico de áreas específicas do
conglomerado urbano e enquanto tais se apresentam na arena política, em busca da aquisição de um
monopólio legítimo da representação de alguns atributos particulares”. BOSCHI, Renato Raul. A arte da
associação. Política de Base e Democracia no Brasil. São Paulo, Vértice, 1987, p. 164.
296
O conflito urbano está colocado para os movimentos populares como
um projeto para a cidade. Não apenas para parte dos moradores. Envolve
circulação, lazer, serviços, produção e consumo, sustentados por este capital
urbana parecia haver esta contraposição entre a luta pela apropriação dos
11
Maria Lucia Refinetti Martins identifica na contraposição entre “enfrentar a lógica capitalista do espaço”
e “disputar a apropriação dos benefícios”, os princípios da reforma urbana que necessitam ser debatidos.
Para Maria Lucia, ao veicular a justa distribuição de ônus e benefícios ou as sanções à propriedade
subutilizada, está operando com elementos que fazem parte da lógica capitalista. No entanto, ao formular-
se como defendendo “formas específicas de construção de identidades na cidade” opera no nível do valor
de uso, o que é antagônico à formulação anterior e de certo modo trava sua aplicação. MARTINS, Maria
Lucia Refinetti, “Movimentos Populares Urbanos Face à Desregulamentação no Tocante à Cidade”, Rio de
Janeiro, Revista Proposta, FASE, ano 23, nº 67, dezembro de 1995, p.58.
12
Lipietz faz uma reflexão sobre a existência ou não de uma teoria do valor no espaço, concluindo que na
medida em que existem condições territoriais herdadas do passado e que as relações sociais estruturam e
reestruturam o tecido social, redefinindo lugares, o capital vai necessitar da ação do Estado para a
realização espacial da mais valia. A ressalva à visão de espaço reflexo de Lipietz não impede que
possamos observar este tipo de ação do Estado no desenvolvimento urbano em nosso país. LIPIETZ Alain.
O Capital e seu Espaço, tradução de Manoel Fernando Gonçalves Seabra, São Paulo, Nobel, 1988.
297
Este papel instrumental do Estado, principalmente na intensificação da
13
Com a vitória de partidos socialistas nas eleições de 1988, constituindo o que se denominou prefeituras
democráticas e populares, desenvolvem-se experiências inovadoras de gestão urbana, como veremos neste
mesmo capítulo.
14
Esta afirmativa transparece de forma mais clara no debate sobre Moradia e Cidadania, promovido pelo
Polis, no qual a proposta de reforma urbana só se apresenta como referência no discurso de técnicos e
assessores do movimento popular.
298
A produção social do espaço urbano significa a sua conformação a
299
A regulamentação baseada na liberação da terra urbana, como eram
300
não repensar a pólis como o não-lugar de um moderno ainda inexistente,
capazes de unir estes dois pólos. Este foi o ponto forte do Fórum de Reforma
Urbana.
16
HARDMAN, Francisco Foot. “Os Construtores de Ruínas: a modernidade submersa”, in Cidade &
História, Modernização das Cidades Brasileiras nos Séculos XIX e XX, op. cit. p.103.
301
Assim como a reforma sanitária17, a reforma urbana estabeleceu-se como um
17
É instigante esta analogia com a reforma sanitária pela sua estratégia trabalhada inicialmente na Itália.
Naquele país, a proposta de reforma sanitária surge como uma estratégia de contra-hegemonia, uma guerra
de posições como designava Gramsci, na perspectiva de avanço progressivo da democracia. Surgia de
baixo para cima. Segundo Jaime de Oliveira, no Brasil ela se deu de dentro para fora e de cima para baixo.
No caso da reforma urbana, ela nasce no Brasil de fora para dentro, como uma articulação técnico-política
e, sendo definida como reforma de base, transforma-se numa luta de dentro para fora com o a proposta do
CNDU e, por fim, retomada como bandeira dos movimentos sociais. OLIVEIRA, Jaime. Reforma e
reformismo: para uma teoria política da Reforma Sanitária (ou reflexões de uma Reforma Sanitária numa
perspectiva popular), in: COSTA, Nilson Rosário, et alii, Demandas Populares, Políticas Públicas e Saúde,
Petrópolis, Vozes/ABRASCO, 1989, v. I, p. 19-20.
18
Em 1985 ocorreram as primeiras eleições diretas para as prefeituras das capitais depois de 20 anos.
Destas eleições nascem experiências que se constituíram em referências para o debate de gestão
democrática, como foi o caso da gestão Jarbas Vasconcelos do PMDB, em Recife, a eleição de Saturnino
Braga do PDT, no Rio de Janeiro, ou mesmo a experiência do Partido dos Trabalhadores em Vila Velha ,
302
com a ampliação do número de experiências de prefeituras democráticas e
reforma urbana
uma cultura técnico-administrativa para além das grandes cidades. Mas este
no Espírito Santo, e Fortaleza. Com as eleições de 1988, este campo de prefeituras democráticas e
populares, assim chamadas por terem como critério de decisão a incorporação da participação popular, se
ampliou.
303
centralidade se consolida na malha urbana concentrada que conectava Rio
de Janeiro, São Paulo, e uma grande área industrial que incorpora Minas
Gerais e que projeta um vetor em direção a Brasília, essencialmente um
centro de gestão.
19
As eleições de 1988 marcam este processo de crescimento das chamadas prefeituras democráticas e
populares. Além dos prefeitos que militavam em movimento sindical, como Olívio Dutra, são inúmeros os
304
A proposta dos conselhos populares, surgindo a partir de experiências
exemplos de prefeitos que eram assessores dos movimentos populares urbanos, como a própria Luiza
Erundina, em São Paulo, e Celso Daniel, em Santo André. Secretários municipais e coordenadores de
projetos eram militantes do movimento nacional de reforma urbana; como Ermínia Maricato e Raquel
Rolnik, respectivamente secretária de habitação e coordenadora do plano diretor de São Paulo; Sérgio
Andréia, de desenvolvimento social no Rio de Janeiro; Nazareno Stanislau Affonso, de transporte em Santo
André.
20
É importante registrar a visão de Luís Dulci, membro da Executiva Nacional dos Partidos dos
Trabalhadores e responsável por acompanhar o trabalho das prefeituras do partido. Referindo-se à disputa
pelo fundo público coloca em xeque, de todas as formas possíveis, a modalidade e o caráter de gestão do
aparelho de Estado. Para que este confronto ocorra, afirma ”a radicalização de mecanismos democráticos
me parece imprescindível. Só ela pode materializar aqueles elementos de ruptura político-cultural que, em
última análise, justificam a própria ocupação de espaços estatais numa sociedade classista. Sem ela, nos
arriscaríamos a uma falaz contraposição de competências: a competência da esquerda versus a
competência da direita etc., como se a questão não fosse de poder mas de organização e métodos. O que
nos remete, embora não exclusivamente, ao tema dos conselhos populares. Sem mistificá-los, nem atribuir-
lhes capacidade miraculosa, creio que podem e devem tornar-se o sujeito subversivo, inaugural, que
permita ao povo trabalhador, sem alienar sua independência política, relacionar-se de modo ativo,
ofensivo ( e não meramente autoprotetor) com o Estado e suas instituições, disputando palmo a palmo o
sentido social de suas escolhas (...)”. DULCI, Luis. “Conselho Popular; o sujeito subversivo”, São Paulo,
Revista Teoria e Debate, ano II, nº 6, abril/maio/junho/1989, p.56
305
A experiência concreta no interior das prefeituras indicava que as
QUADRO 6.1
Tipologia Características
institucionalização
equipamentos/serviços
localizados
21
As experiências de conselhos se desenvolveram em várias áreas da administração municipal e com
diferentes papéis. A prefeitura de Santo André publicou texto que mostra a diversidade destas formas de
participação popular. Utilizamos aqui uma classificação para montar este quadro. Santo André:
Participação Popular. PMSA/Fundação Santo André, 1992.
306
Escala de planejamento Elaboração de políticas Planejamento global
setoriais
ou coletivo
espaço municipal que não reproduzia uma relação dialógica presente nas
relações capital e trabalho. Os diversos sujeitos sociais, com seus distintos
307
progressiva do sistema de saúde, promoção do uso social da terra urbana,
estratégicos22.
22
O discurso neoliberal colocou duas armadilhas nas quais invariavelmente se tem caído. A primeira delas
ao vulgarizar o debate sobre reformas estruturais, reduziu-o a uma polêmica sobre tamanho do Estado. A
segunda, estabeleceu um falso dilema entre estatal e privado, não aprofundando a noção de esfera pública.
Procurando fugir a estes falsos dilemas, as administrações populares trabalharam numa concepção de
controle pelo poder público sobre a exploração de serviços, indicando que tornar público não significa
necessariamente estatizar e que a estatização não é um fim em si mesmo.
308
contém elementos de uma ruptura política e cultural, contribuindo para se
sociedade;
urbana.
23
Esta visão deste projeto de reforma social e gestão democrática desenvolvida por estas prefeituras está
descrita no texto: COELHO, Franklin & BITTAR, Jorge. "Gestão Democrática, inversão de prioridades e
os caminhos da administração pública municipal", in: RIBEIRO, L.C.de Queiroz & JUNIOR, O. A. dos
Santos. Globalização, Fragmentação e Reforma Urbana, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1994, p.
332.
309
Esta era a equação que a reforma urbana procurou resolver. Mas à
310
publicização significava tornar público os benefícios que eram apropriados
descentralizadora e democrática;
24
Em estudo sobre municipalização de transporte, Fontes analisa os vários arranjos dos órgãos
institucionais e relaciona as diferentes responsabilidades assumidas pela administração direta, indireta e
empresas privadas. Estes arranjos institucionais revelam que a municipalização dos serviços de transporte
coletivo, muito mais que a transferência de responsabilidades de outras esferas de governo para o
município, tem significado uma redefinição das relações público-privado, com o objetivo da retomada do
controle do serviço por parte do órgão público. Estes arranjos institucionais configuram modelos com
maior ou menor envolvimento da administração direta, com combinações de responsabilidade de gestão
financeira e controle da receita, com controle social na parceria entre setores estatal e privado. A
emergência de novas relações entre setor público e privado, com o município como autoridade
organizadora dos serviços de transporte, expressa a tendência de publicização dos serviços. FONTES,
Angela M.M. Municipalização dos Serviços de Transporte Coletivo. Apresentado no Seminário
"Municipalização das Políticas Públicas". Brasília, IPEA/ENAP/IBAM/PNUD, setembro de 1993.
311
• na construção de parceria público-privado, estabelecida a partir
deixa de ser pensada a partir da lógica imediata, que gerava o dilema entre
312
O Estado ampliado tornou-se locus privilegiado da luta entre diferentes
globais.
313
Tema recorrente no final da década de 70 e início dos anos 80, os
314
Este quadro, caracterizado por alguns como de crise, tem produzido
popular26;
25
Para Götz Ottmann, o que existe é um pessimismo acadêmico que está enraizado por predominar, na
escolha dos analistas, um eixo temporal irrealisticamente curto. A adoção de uma moldura temporal mais
longa permite entender o enfraquecimento dos movimentos durante os anos 80 como um fenômeno cíclico,
e revela que as identidades dos movimentos sociais são fluídas e dependentes do contexto. OTTMANN,
Götz. Movimentos Sociais Urbanos e Democracia no Brasil: uma abordagem cognitiva. São Paulo, Novos
Estudos, CEBRAP, março de 1995, p. 186-207.
26
COELHO, F.D. Estratégias Urbanas e Movimentos Populares - texto de referência para o diagnóstico de
movimentos populares urbanos. Rio de Janeiro, FASE, 1993.
315
• a sua negação, ou seja, o não reconhecimento de uma crise e a
de mobilização e organização27.
econômica.
27
Para Marcelo Kunrath Silva, o “que se encontra fundamentalmente em crise nos dias de hoje é a
construção teórica e política elaborada sobre os movimentos sociais e que não correspondeu à prática
concreta destes atores”. SILVA, Marcelo Kunrath. Estratégias Urbanas e Movimentos Populares.
FASE/Porto Alegre, março de 1995 (mimeo).
28
A proposta do Fundo Nacional de Moradia foi criada a partir da experiência da União de Movimentos de
Moradia na gestão de Luiza Erundina em São Paulo. A experiência do fundo comunitário para a
316
imediatas de resposta à degradação das condições de vida,
construção de habitações em regime de mutirão, transferindo para associações recursos para a compra da
terra e o financiamento das casas, mostrou que havia limites numa política municipal apenas com recursos
orçamentários municipais. Procurando divulgar e legitimar esta experiência no plano nacional a União de
Movimentos de Moradia em São Paulo elabora um projeto de Fundo Nacional de Moradia. Entrevista com
Benedito Roberto Barbosa, Vice-coordenador da União dos Movimentos de Moradia de São Paulo
realizada por Ana Amélia Silva , in: SILVA, Ana Amélia (org.), Moradia e Cidadania, um debate em
movimento, São Paulo, Pólis, 1994,p.71.
29
Tem sua referência principal no documento do Movimento Nacional de Reforma Urbana encaminhado à
Assembléia Nacional Constituinte, a Carta de Princípio aprovada no II Fórum Nacional de Reforma Urbana
e em textos deste fórum que procuram definir conteúdos a estes projetos.
30
Proposta elaborada no âmbito da Articulação Nacional dos Movimentos Populares e Sindicais
(ANAMPOS), constituída em 1980, que teve participação decisiva na criação da Central Única dos
Trabalhadores (CUT). Diante de um diagnóstico de que era necessária uma articulação para enfrentar as
táticas de desmobilização, de pulverização e cooptação dos movimentos populares, trabalharam no sentido
de criar a Central de Movimentos Populares. Entrevista de Pedro Pontual da ANAMPOS, in: Movimento
Popular, São Paulo, nº 1, Polis, p7.
317
permitindo a construção de um espaço de diálogo, no sentido
31
Movimento criado a partir do Movimento Ética na Política, liderado por Herbert de Souza. O
movimento parte de uma leitura crítica das necessidades sociais no país, em especial nas camadas
populares, nas quais a grande maioria vive num quadro de miséria e escassez de elementos básicos da vida
humana.
32
Estes formatos estariam mais próximos daquilo que Ilse Sherer-Warren chamou de rede de movimentos
sociais,entendida como práticas políticas articulatórias das ações localizadas. SCHERER-WARREN, Ilse.
Redes de Movimentos Sociais, São Paulo, Edições Loyola, 1993.
318
público, no âmbito do governo federal, que pudesse ser descentralizado
trabalho.
33
Texto de apresentação assinado pela executiva nacional do fórum nacional de reforma urbana, in:
GRAZIA, Grazia de (org.); Direito à cidade e meio ambiente, Rio de Janeiro, Co-edição do Fórum
Brasileiro de Reforma Urbana e Ayuntamento de Barcelona - Espanha,1993,p. 7.
319
Segundo este enfoque, afirmou José Luis Coraggio na ECO 92:
Isto se faz ainda mais conflitivo dado o desgaste político adicional derivado
das contradições intrapopulares que geraria um processo de reforma
integração entre economia popular e reforma urbana não era uma equação
320
estímulo a projetos públicos privados de geração de renda. Contudo, o
aspecto essencial para pensar sua estratégia de ação, hoje esta questão
321
atores sociais ligados diretamente à formação de redes que acompanham este
322
De um lado, alguns representantes destas novas redes as têm
35
FRANCO, Augusto de. A Ação Cidadã Nova Realidade Política Brasileira. Subsídio, Brasília,
36
JIMENEZ, Beatriz. Las Organizaciones no Governamentales en el Processo de Descentralización de la
Política Social. In: Política Social en los Centros Urbanos de America Latina. GTZ/FESCOL, Colômbia,
1994.
323
são dirigidos principalmente a conquistar espaços dentro do Estado, senão a
horizontal na sociedade;
econômica;
políticas sociais.
324
pactuadas, para enfrentar necessidades e problemas individuais e coletivos
população envolvida.
Populares.
produtivas na economia37.
37
Na área de capacitação desenvolve-se metodologias vivenciais – das quais o método CEFE (
Competência Econômica via Formação de Empresários) é o dos melhores exemplos, que trabalham a
325
Ao lado da capacidade de iniciativa e uma ação voltada para a
326
experiências de bancos populares surgidas em vários locais do país. Um
39
RÖESLER, Ulrike. Geração de renda e promoção de pequenos empreendimentos, destacando a
concessão de empréstimos. As experiências dos parceiros do SACTES no Brasil. SACTES, 1993 (mimeo).
327
microempresas, empresas domésticas, auto-emprego, microunidades
econômicas.
no favor e na dependência;
328
diversidade de formas de organizações empreendedoras em bairros
40
Relatório de Pesquisa : Grupos de Geração de Renda sob a Perspectiva de Gênero, CACES /FES, Rio
de Janeiro, 1994 (mimeo).
329
Esta ação não se constitui em ações emergenciais frente à pobreza ou
330
expressado, segundo alguns estudos, a intensificação de políticas públicas
porte.
331
integradoras. E como afirmava Coraggio, "a reforma urbana não pode ser
41
CORAGGIO, Luis José, "Sobre el sentido de proponer una reforma urbana en los 90". In: GRAZIA,
Grazia de (org.); Direito à cidade e meio ambiente, op. cit, p. 50.
332
Neste sentido, muito mais que uma crise de movimentos populares, que
Congresso, entre tantos outros que poderiam ser citados, compõem esta nova
333
uma dinâmica local, tanto pela ação de ONGs como pelas próprias
334
coletividades espaciais, partes ativas e reativas de construção de identidades
no território.
são apenas algo pensado em termoa macro, mas se tornam possíveis a partir
335
produção se reintegram numa nova territorialidade e na constituição de um
sugere que a representação do urbano com que se tem trabalhado pode estar
336
Considerações finais
337
mobilizações populares, uniões femininas, greves de transportes,
338
amanhã nos devora, como bem disse o poeta, continuará sendo
339
Na crítica ao laisser - faire no espaço urbano, este primeiro
de ação estatal ?
340
ser um dos primeiros alvos de mov imentos sociais, mesmo nos
341
guardado n a memória daqueles que pensavam este país como uma
revolução social.
342
Contudo, esta integração entre recuperação de nosso proc esso
faire urbano.
343
sindicatos estavam sobre controle político. Multip licaram - se as
da CONCLAT.
344
demandas sociais diferenciadas. Legalizações de loteamentos
345
acumulado que se retomou o debate de um projeto de Reforma
urbano.
346
sociais, ela expressa um caminho de continuidade e
democrática.
347
sociedade organizada, há uma construção de um esfera pública.
348
este novo cenário, encontrará dinâmicas distintas nos anos 90.
de geração de renda.
349
pensar sua estratégia de ação, hoje esta questão territorial se
350
constitui - se em articulações sociais que diferem daquelas que
351
Glossário de siglas
Secundaristas
e Sindicais
Inquilinos
352
CNH : Caixa Nacional da Habitação
Política Urbana
Distrito Fedral
do
Rio de Janeiro
Educacional
Moradores e
Comunitários e
Associações de Moradores
353
IAB : Instituto dos Arquitetos do Brasil
Estado
do Rio de Janeiro
PC : Partido Comunista
354
PORFILURB : Programa de Financiamento de Lotes
Urbanizados
Janeiro
355
Fontes e bibliografia
1. Periódicos:
Jornais:
Documentos Oficiais
Entrevistas:
356
Revistas e Boletins
Boletins das Classes Dirigentes, publicado pelo IBOPE (Arquivo Edgar Leuenroth -
Univer sidade de Campinas), com artigos e pesquisas publicados trimestralmente desde
1950.
A Questão Urbana - São Paulo, Pró - Central de Movimentos Populares 1992, 8 p. - Texto
preparatório da Conferência Internacional de Vitória/92 sobre o tema: "Condições de vida
nas cidades"
Caderno nº 6 . Relação Partido/Movimento Popular/Movimento Sindical e Estado -
Cajamar, INCA, 12 p. - Caderno nº 6
CENTRAL DE MOVIMENTOS POPULARES fascículo 2. Curitiba, Centro de Formação
Irma Araújo, 1990, 49 p. (Cadernos de Text os Nº 3)
CIDADE/FASE - Movimento Populares Urbanos - Projetos políticos. Porto Alegre,
CIDADE/FASE, 1993 - 22 p.
Dossiê da União dos Movimentos de Moradia. São Paulo, FASE - SP/UM M , 1993. 135 p
E Agora ? São Paulo, FASE - SP/CPV/SOF/POLIS, Novembro,1990. C entral de Movimentos
Populares - por um amplo debate nacional.
E Agora ? São Paulo, FASE - SP/CPV/SOF/POLIS, Novembro,1990. Central de M ovimentos
Populares - por um amplo debate nacional.
E Agora? São Paulo, FASE - SP/CPV/SOF/POLIS, Novembro 1989. O canal institucional
atrala? (entrevista Saúde Z.L.)
E Agora? São Paulo, FASE - SP/CPV/SOF/POLIS. (6): novembro 1991. O que é assessoria
aos movimentos populares?
E Agora? S.Paulo, FASE - SP/CPV/SOF/POLIS/ , junho 1991. Enfrentando problemas
concretos
E Agora? São Paulo, FASE - SP/CPV/SOF/POLIS, Novembro 1992, De olho no M andato
Popular
Fórum de Participação Popular. Participação Popular: um sonho possível. São Paulo,
INAPP/INCA, 1991, 12 p.
Caderno - A participação popular na construção de uma política habitacional
Histórico da Plenária Estadual de Entidades e Movimentos de Saúde - Coordenação da
Plenária, mímeo, dezembro 91
IPPUR/FASE. Questão Urbana, desigualdades sociais e políticas públicas: avaliação do
programa nacional de reforma urbana. Ri o de Janeiro, IPPUR/FASE, 1994; mímeo 266 p.
e anexos
MOVIMENTO POPULAR E MEIOS DE COMUNICAÇÃO DE MASSA. Recife -
Etapas/SOS Corpo - 1992 - 48 p. caderno - Relatório final do Seminário de Olinda PE -
dezembro 1991.
MOVIMENTO POPULAR. POLIS/CPV nº 01, ab ril 1989.
PARTICIPAÇÃO E SAÚDE - Experiência da Participação Popular na Gestão da Saúde -
São Paulo, CEDEC, dezembro 92 p.01 - 09
Plenária Estadual de Entidades e M ovimentos de Saúde de São Paulo - informativo do I
Encontro Paulista de Conselheir os e M ovimentos de Saúde.
357
PROPOSTA - Rio de Janeiro, FASE fevereiro 90. Limites e Dilemas da participação
popular; Articulação das Lutas Urbanas
PROPOSTA, (35): 1987 Da casa à cidadania - mutirões habitacionais.
PROPOSTA. Rio de Janeiro, FASE (54), agosto 1992. Democratizando a cidade
PT NACIONAL - Secr. M ovimentos Populares - Papel Estratégico do M ovimento Popular
na década de 90 - 1992, 17 p.
PT NACIONAL - O PT e os Movimentos Populares - Cadernos do 1º Congresso - São Paulo
julho de 1991 - 16 p . Jornal.
Revista ee Cultura Vozes - Rio de Janeiro, ed. Vozes - 11, nov. 91. Por uma Central dos
Movimentos Populares, p.645 - 765
Revista de Administração Municipal, IBAM. Rio de Janeiro, do nº 1 quando ainda se
chamava notícias municipais ao ano XLI , nº211, 1984
Revista Brasileira dos Municípios, publicado pelo IBGE e a Associação Brasileira de
Municípios
SOLO URBANO (10): dezembro 91 - III Fórum Nacional de Reforma Urbana. São Paulo,
ANSUR
TRABALHO E SAÚDE - São Paulo, DIESAT - janeiro 90 p.3 - População Protesta contra
o caos na saúde - Plenária da Saúde.
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