Publicacao Livro Huni Meka Huni Kuin
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Papo de Índio
Txai Terri Valle de Aquino & Marcelo Piedrafita Iglesias
A
Dedê Maia tiu viajar por todo o rio Yuraiá!
As atividades aconteceram na
cabo de retornar aldeia São Joaquim, a primeira
de uma linda via- da TI Kaxinawá do Baixo Rio
gem ao rio Yuraiá, Jordão, cuja comunidade tem
como os Kaxina- como liderança nosso querido
wá chamam o rio amigo Agostinho Manduca Ma-
Jordão no hatxa kui, sua “lín- teus Muru, nosso principal anfi-
gua verdadeira”. Aproveito este trião Huni Kui.
Papo para enviar aos leitores Já fazia um tempo que não
desta coluna algumas notícias visitava essas famílias. Foi em
da referida viagem. 1997 que fiz minha última via-
Como professora indigenista gem entre elas, junto com a fo-
da Comissão Pró-Índio do Acre tógrafa, nossa parceira e aliada
(CPI-Acre), foi um privilégio ser dos índios, Cristiane Cotrim, ca-
convidada para assessorar uma rioca, com o intuito de também
equipe de professores/pesquisa- apoiar as pesquisas dos profes-
dores das três terras Kaxinawá sores. Naquele então, trabalha-
do Município de Jordão durante mos com o registro fotográfico
a primeira etapa das atividades da Arte dos Kene, grafismos que
do “Projeto de Registro das Tra- adornam as pinturas corporais, a
dições Musicais Kaxinawá”. tecelagem, a cestaria e a cerâmi-
Inicialmente, é importan- ca Huni Kui, outra de suas finas
te ressaltar que esses trabalhos ciências. Este material, que de-
de pesquisa, desenvolvidos há pois compôs exposições sobre a
vários anos nas aldeias, fazem Arte Huni Kui, apresentadas em
parte da formação e das práticas vários estados do Brasil e outros
profissionais desses professores países, hoje integra o acervo do
Kaxinawá, e são incentivados Centro de Documentação e Pes-
nos cursos promovidos anual- Professores Kaxinawá do rio Jordão comemoram mais um registro de suas tradições culturais quisa Indígena da CPI-Acre.
mente pela Setor de Educação Não faz tanto tempo assim dessa
da CPI-Acre. da minha assessoria. Contou, Nesta etapa do Projeto, ti- tão especial dos Huni Kui, “gen- viagem anterior, apenas nove anos.
Idealizado pelos próprios ainda, com apoio do adminis- vemos como objetivo principal te verdadeira”, como os Kaxi- No entanto, percebi, durante os 16
professores/pesquisadores, o trador da Funai de Rio Branco, realizar gravações de cantos re- nawá se autodenominam. Nesse dias que passamos no rio Jordão,
projeto foi encaminhado pela Antônio Ferreira da Silva Apu- lacionados às finas ciências do contexto, fui, de novo, aluna e as profundas mudanças territoriais,
Organização dos Professores rinã, que gentilmente colocou à Nixi Pae, como os Kaxinawá os Huni Kui os professores. políticas e culturais ocorridas desde
Indígenas do Acre (OPIAC). disposição da equipe um barco chamam o cipó, e registrar visu- Foi maravilhoso também então. Permanece, todavia, o mes-
Recebeu financiamento do Ins- de três toneladas e um motoris- almente esse evento. rever amigos, afilhados, com- mo jeito atencioso, dedicado, gen-
tituto do Patrimônio Histórico ta, Francisco Botosa Kaxinawá, Foi um privilégio essa opor- padres, comadres... Sem dúvida til, e a fina educação com os quais
e Artístico Nacional (IPHAN) que nos acompanhou durante a tunidade de aprender mais um um lindo presente! Pena que o as famílias Huni Kui recebem seus
e apoio da CPI-Acre, por meio viagem. bocadinho sobre esse universo tempo tão curto não nos permi- visitantes.
Papo de Índio
Os velhos txanas e a nova geração
Como convidados especiais
dos professores, realizaram as
gravações os principais txanas
(cantadores) do povo Huni Kui
do Jordão: Romão Sales Tui (84
anos), Miguel Macário Maru
(87) e Agostinho Manduca Ma-
teus Muru (61). Agostinho, con-
siderado da segunda geração,
contou ter adquirido seus conhe-
cimentos sobre o Nixi Pae com
esses dois velhos txanas e com
outros que já partiram para um
outro mundo desse universo.
Com os txanas, desfrutamos
momentos muito prazerosos e
de muito aprendizado, ouvindo
suas histórias de vida e suas ex-
plicações sobre os significados
dos cantos. Gravando com eles,
aprendemos que na cerimônia do
Nixi Pae existe uma seqüência
que é muito importante respeitar,
pois cada cantoria está relaciona-
da a um momento específico do
ritual: o Pae Txanima, cantos de
abertura, para “chamar a força”
do Nixi Pae; o Dawa Tibuya, refe-
rentes às mirações; e o Kaya Tibu,
entoados para diminuir a força e
fechar o ritual.
Uma outra participação impor-
tante, que vale a pena registrar, foi
a do “Grupo Juventude Indígena”.
Representantes da quarta geração,
são jovens alunos, alguns dos quais
já exercem a função de “professo-
res auxiliares”. Nesse processo de
revitalização dos conhecimentos Txanás Romão Sales e Miguel Macário ouvem gravações de suas cantorias de cipó, sob o olhar atento do professor Francisco das Chagas
tradicionais, eles vêm se apro-
priando de instrumentos musicais, da no início de seu estudo e dessa com umas boas dicas musicais, formas de cantar e atualizar e harmonia, regidos pelas ener-
como o violão, flautas e maracás, apropriação, não dominam ple- o “Grupo Juventude Indígena” os saberes milenares de seu gias do Nixi Pae e da lua cheia,
que tradicionalmente não faziam namente todas as afinações dos ainda vai longe. É a tradição se povo. que nos acolheu, iluminando os
parte de sua cultura, e usando-os instrumentos e sua harmonização renovando, percorrendo novos Foram 16 dias de muito tra- terreiros e os altares das forças
para acompanhar os cantos. Ain- com as cantorias. No entanto, caminhos, descobrindo outras balho, vividos com muita alegria da mata.