Ensino de Português Como Língua Não Materna
Ensino de Português Como Língua Não Materna
Ensino de Português Como Língua Não Materna
O português está entre as dez línguas mais faladas no mundo. No entanto, ainda há desafios no
ensino do idioma para estrangeiros. Saiba mais no texto de José Carlos de Almeida Filho.
Índice
Todas as sociedades, ricas ou pobres, oralizadas ou letramentadas, todas elas reconhecem o valor
educacional, cultural, psicológico, prático e profissional de aprender uma nova língua. Nos países
escolarizados e tecnologizados, esse valor é mais conscientemente brandido e reconhecível pela
inclusão da disciplina Língua Estrangeira (muitas vezes com oferta de mais de um idioma) no
currículo escolar.
1
Um degrau ainda mais elevado de civilização começa a ser galgado quando uma sociedade através
de suas instituições começa a se preparar para pesquisar e ensinar como língua estrangeira (LE)
e/ou segunda língua (L2) a sua própria língua primeira, materna, escolar e, muitas vezes, nacional
ou pátria. Isso nos leva a indagar, de imediato, qual o grau de prontidão do Brasil para oferecer o
ensino da língua portuguesa como uma nova língua a falantes de outros idiomas. Essa área tem
sido designada pela sigla PLE*, ou seja, “Português como Língua Estrangeira”.
Uma possível resposta a essa pergunta já está ensaiada no meu capítulo “Índices de
Desenvolvimento da Área de Ensino e Pesquisa de PLE”, constante do livro Projetos Iniciais no
Ensino de Português a Falantes de Outras Línguas, de Almeida Filho e Cunha (2006), em
preparação. Avalio nessa publicação que o nosso desenvolvimento é apenas mediano com várias
lacunas importantes como, por exemplo, a ausência de uma política explícita para o ensino de
PLE. O mesmo conjunto de critérios de avaliação serve, obviamente, para aquilatarmos o grau de
avanço do ensino de outras línguas no país.
Temos tentado, nos últimos 20 anos de forma mais consciente e concertada, entender melhor e
com as dificuldades previsíveis, no Brasil, o que significa ensinar Português a já falantes desse
idioma como primeira língua (L1). Sobre isso, leia neste mesmo Portal os textos de Rodolfo Ilari,
“Como se tem ensinado o Português como língua materna?” e de Raquel Salek Fiad “O que se
tem pesquisado sobre o ensino do Português como língua materna?”. Mas enfrentamos mais
dificuldades ainda para interpretar o processo de ensinar o Português como língua estrangeira
(LE) de escolha ou como língua não-materna adicional. Além disso, ainda temos de interpretar
com quem se candidata a ensinar profissionalmente o Português a não nativos desse idioma o que
significa a perspectiva de ensino do Português como L2 e língua oficial, como nos casos mais
flagrantes das comunidades indígenas no Brasil e de africanas, comunicando-se através do
Português nos países lusófonos do continente africano e no Timor Leste.
Ao abordar o ensino de Português como LE ou como nova língua para afastarmos um significado
contraproducente da estrangeiridade estável que pode se instalar com prejuízos aos processos que
engendramos com os nossos alunos, nossos colegas, superiores hierárquicos e autores de materiais
didáticos adotados, ainda não estamos tratando da imensa dimensão da aprendizagem/aquisição
que deve acompanhar (ou, quem sabe, até preceder) a complexa tarefa do ensino e da
aprendizagem de uma outra língua.
Quanto ao ensino, estamos nos referindo à prática profissional de intervenção (e não somente
espontânea baseada na tradição) para auxiliar o aprender. Esse ensinar vamos representar
teoricamente como uma grande operação de quatro estações/fases ou dimensões: o planejamento
curricular e de cursos, a produção/avaliação de materiais, o ensino propriamente dito
consubstanciado num método (procedimental) com experiências na nova língua, e a avaliação de
rendimento e proficiência na língua-alvo. Todas as estações mutuamente se influenciam e todas se
orientam pela abordagem ou filosofia maior de ensino a que estão atreladas.
Aqui reside um grande ponto para a história do que somos nós os profissionais ensinantes e
profissionais pesquisadores da área de EPLE e das línguas em geral. A área teórica maior que nos
abriga tradicionalmente no Brasil é a da Lingüística Aplicada, que não necessariamente deve ser
tomada como a da Lingüística (Geral, Descritiva, da Frase ou do Discurso) em aplicações dessa
Lingüística conforme pode sugerir superficialmente o nome. Em alguns países, principalmente da
Europa, mas também na América ibérica, essa área se reconheceu e se reconhece ainda em
instituições mais tradicionais, na especificidade de tom
classicista da Didática das Línguas ou Glotodidática, ou se fazer caber em parte na tradição
filológica européia.
No Brasil, tem sido ampliado o número de pesquisadores e estudiosos que se reconhecem como da
Lingüística Aplicada, entendida não apenas como atividade de aplicação, como Didática ou como
parte específica da formação para o ensino de quem estudou basicamente Filologia, mas mais
centralmente hoje como produtora e intérprete de corpos teóricos de conhecimentos oriundos de
investigação de natureza aplicada no âmbito da linguagem em subáreas como Teoria de Ensino de
Línguas, Tradução, Lexicografia e Relações Sociais Mediadas pela Linguagem (vide Almeida
Filho, 2005 para uma exposição mais argumentada da redifinição epistemológica por que vem
passando o ramo aplicado das ciências da linguagem). Por pesquisa aplicada entende-se aquele
esforço organizado por expandir o conhecimento sobre questões de uso da linguagem colocados
na prática social não com o propósito precípuo de descrever a estrutura e o funcionamento da
linguagem mas com o de teorizar sobre os processos linguajeiros e seus problemas quando se
focalizam o ensino- aprendizagem de línguas, a tradução exercida, a produção e uso de produtos
lexicográficos, a construção de sentido nas relações de afeto ou de trabalho via linguagem.
O ensino de PLE, PL2, PL1 e das outras línguas, na verdade os processos interconectados
de se ensinar e aprender o Português ou outras línguas nesses contextos, beneficia-se
particularmente da investigação de natureza aplicada através da teoria que ela vai gerando e que
nós podemos ajudar a costurar e condensar para os alunos e colegas de gerações posteriores em
livros, artigos e ensaios teoricamente embasados.
Uma língua tem alta relevância no processo de escolarização e a escolarização de um povo pode
não alavancar ou até comprometer o seu futuro (social, político e econômico) se persistirem nela
problemas graves como a:
A dimensão da linguagem é basilar por servir a todas as outras áreas de estudos do currículo. Ela
constrói a experiência de (re) conhecer os fenômenos da natureza, os fenômenos sociais e bastante
da experiência com as dimensões, formas, quantificações e cômputos numéricos. Nesse sentido
ela é macrocurricular. É através da ação das representações que articula que
ela permite aos escolarizandos a grande (re) construção do conhecimento nas áreas curriculares (e
eventualmente nas disciplinas), no âmbito da cultura geral, portanto, e no âmbito do
autoconhecimento (dando conta de quem se é, do que se deve ou não fazer para a felicidade
pessoal e o bem-estar coletivo).
Trabalhar para desenvolver capacidades da linguagem, seja esse trabalho no contexto que for,
significa contribuir fundamentalmente para o sucesso da escolarização.
3. Os Contextos cotejados
Os contextos de ensino e o uso das línguas, a rigor, podem ser infinitos na sua variabilidade. Mas
eles podem também ser enfeixados por semelhanças que guardam entre si. A isso chamaremos de
tipificação de contextos que se estabelecem historicamente.
Na Fig. 1 reproduzida na página a seguir, podemos ver uma proposição gráfica de como se
apresentam os três grandes contextos de ensino e uso das línguas que demarcamos neste trabalho.
Em seguida, veremos como se comparam e contrastam os mesmos três contextos típicos.
As várias manifestações L2 têm em comum o contato estreito entre duas línguas num mesmo
espaço e numa dada relação de poder mantida temporaria ou perenemente. Já uma LE não conta
tradicionalmente com o contato social próximo, interativo e generalizado com uma L1
predominante. As variantes de ensino e aprendizagem de uma L1 encerram em si grande parte do
espectro de contextos que vai da L1 à LE passando pelas instâncias de L2. Essa parte do espectro
é a que contempla o ensino de L1 como língua escolar de prestígio. Para crianças de dialetos
desprestigiados, muitos primariamente oralizados, que chegam à escola confrontadas com o
dialeto-padrão, o Português da escola se parece com uma L2 (externa). No caso de crianças
aprendendo via PL2 numa comunidade minoritária encravada no Português ou como língua
oficial num país africano lusófono, a L2 pode
representar tanto uma LE (não circulante comunicacionalmente) quanto uma L1 (tendo ocorrido a
perda da L1) no ambiente familiar.
Os meios de comunicação de hoje através das novas tecnologias e da acessibilidade das viagens
internacionais tendem a modificar paulatinamente essas condições do contexto. Assim, surge o
contato, a inserção ou o circundamento, em microcosmo, abrindo a possibilidade de que a LE-alvo
se torne uma língua de interação de fato.
ENSINO DE LÍNGUA
L1 LO/LN
LM LP BDL
Uma língua 1 (L1) serve para comunicação ampla desde a casa, passando pela rua até a escola e
os meios culturais. É a língua em que se constitui a identidade pessoal, regional, étnica e cultural
de uma pessoa. Toda L1 se manifesta por meio de um dialeto (uma variante regional, muitas vezes
combinada com traços étnicos e de classe social). Ensinar L1 não será tomado no seu sentido
cristalizado de dar, passar, transmitir conhecimentos mas como bem mais do que isso, na acepção
de construir experiências válidas, (re)afirmadoras de auto- estima, envolventes e motivadoras para
e com os alunos no sentido de apoiar a aprendizagem (já desencadeada num esforço dos próprios
aprendentes) de aspectos da língua ou a expansão dos recursos lingüísticos dos alunos.
Não se trata, na verdade, de ensinar uma língua a quem não a possui. Por isso, é preciso fazer/ter
experiências que aprofundem a percepção da língua e permitam o aperfeiçoamento dos aprendizes
enquanto cidadãos na linguagem. Para “ensinar” Português (= aperfeiçoar nos alunos sua
percepção e comando da L) será preciso pensar um método de como fazê-lo. Por exemplo, ensinar
L1 poderá ser concebido como ensinar a reconhecer-se numa variante (valorizando-a) e, se
possível, incentivar e apoiar que o aluno transite por mais variantes e, principalmente, que
desenvolva suas capacidades na variante em que se expressa incorporando nela traços de uma
variante padrão de prestígio que eleja em estilos e níveis de formalidade diversos.
Vamos tomar método como as experiências propiciadas e vividas na L-alvo em sala de aula e nas
suas extensões e vamos nos perguntar ainda o que faz a diferença metodológica hoje? Para
responder essas questões trarei, a seguir, um conjunto de características distintivas reconhecíveis
no ensino contemporâneo de línguas.
não ter preocupação com o método acima de tudo, com aprender métodos prontos, mas
com compreender o que permitem ou não os vários procedimentos e recursos
saber que há uma pessoa em processo de humanização antes do ensinar e que precisa
estar posicionada para aprender (queira fazer esforço para tal)
ensinar L não mais se resume no ensinar o seu sistema gramatical e a nomenclatura
correspondente (ensinar sobre)
entender o quadro afetivo com que os participantes chegam e vão se desenvolvendo ao
longo dos cursos
saber avaliar quais interações e processos produzem quais resultados
ensinar envolvendo por meio de atividades que pareçam relevantes/interessantes, que se
pareçam com a vida, que permitam usar conhecimentos e talentos já desenvolvidos
(mesmo que parcialmente), que façam pensar e permitam influir no estado de coisas
circundante.
(a) indivíduos de uma dada língua residindo temporariamente num outro país falante de
outra língua;
(b) comunidades falantes de culturas e línguas transplantadas num país falante de outra L e
que lá vivem perenemente mantendo seus atributos lingüístico-culturais vivos;
(c) grupos étnicos falantes de línguas nativas circundadas por uma língua nacional
amplamente majoritária;
(d) um ou vários grupos de línguas autóctones que desenvolveram um crioulo* tornado
língua normalizada e em muitos contextos, língua franca* de ampla circulação;
(e) um ou vários grupos lingüísticos que herdaram uma L externa hegemônica no país,
geralmente superposta às línguas autóctones como resultado de colonização;
(f) grupos falantes de uma L nova dominante (de um Crioulo) que herdaram língua
hegemônica de colonização;
(g) indivíduos de grupo étnico com uma língua própria que precisam aprender a língua
(franca em muitos casos) de outro grupo étnico minoritário de um mesmo país;
(h) jovens falantes de uma língua nativa majoritária ou nacional em seu próprio país para
quem seus pais escolhem uma educação escolar mediada por outra língua de prestígio.
L Natva x
L Natva y L Natva n
Fig. Representação das relações entre línguas em contextos de PL2
Ensinar uma língua segunda é propiciar o desenvolvimento de uma L não-materna que os alunos
não dominam ou que dominam com lacunas. Quando a ensinamos, estamos a facilitar
compreensões (simultaneamente de conteúdos e do próprio sistema da L-alvo). Por contraste com
L1, o ensino de L2/L oficial não pode apenas tomar a L-alvo como dada, como ponto pacífico,
focalizando suas formas e regras no sistema lingüístico. Por contraste com o ensino convencional
de LE, o ensino de uma L2 não pode se demorar na construção do sistema primeiro e nem
repousar sobre o ensino vinculado na própria L1 dos alunos como mediação para aprender uma L
de fora do país.
Língua estrangeira é uma outra língua em outra cultura de um outro país pela qual se desenvolve
um interesse autônomo (particular) ou institucionalizado (escolar) em conhecê-la ou em aprender
a usá-la.
Produzir o ensino de uma língua estrangeira é viabilizar o conhecimento sobre (ou estudo de)
uma outra língua e/ou sua aquisição num ambiente formal institucional, mediante uma operação
com dimensões distintas orientada por uma abordagem/filosofia vigente que pode ser espontâneo-
tradicional, formalmente explicitada e calcada em pressupostos teóricos, ou em combinações
intermediárias dessas duas posições polares. Ao longo da história tem sido forte a tendência de
promover o “estudo” formal de aspectos sistêmicos da língua-alvo vestido com roupagem
situacional em diálogos e reconhecíveis em pequenos textos.
Para ensinar profissionalmente PLE a exigência primeira e mais abrangente é a de uma formação
integral na área da linguagem tradicionalmente chamada de Letras* no Brasil. Essa exigência
básica não é suficiente quando os licenciados não obtêm uma formação específica no ensino de
uma LE. Ela é menos suficiente ainda quando os formandos não contam com a inclusão em seus
currículos de disciplina específica preparatória para o ensino de PLE/PL2. Essa condição está
sendo crescentemente atendida na reforma dos currículos de Letras ora em processo de
implantação no país. Agrega-se ao benefício de cursar Letras, ao iniciar-se no ensino de uma LE
e ao de estudar a questão do EPLE na graduação, uma
introdução à Lingüística Aplicada como área teórica relevante de produção do conhecimento
sobre o ensino e aprendizagem de línguas, usos da tradução e da lexicografia, além das relações
sociais mediadas pela linguagem possivelmente com ênfase na primeira.
Nos quinhentos anos de história do Brasil, o Português Europeu que aqui aportou, recém-
transformado no português luso que entendemos como moderno ganhou nesses cinco séculos de
vida americana complexa traços muito próprios para converter-se hoje, de longe, no maior grupo
varietal da cepa portuguesa no mundo. Na América do Sul, o Português evoluiu de língua
estrangeira (alguns poderiam dizer de língua invasora) que aqui aportava com os colonizadores
aos poucos em naus de incerta chegada até alcançar o status de língua nacional de amplo uso no
período imperial após 1808.
Embora os jesuítas, importantes agentes educacionais ativos até a sua expulsão por ato do
Marquês de Pombal em 1755, cultivassem o interesse pela aprendizagem do Tupi em bases
informais e quase incentivassem a língua geral conhecida como Tupinambá, língua essa de ampla
circulação na Colônia, o Português em sua variante brasileira foi a criação lingüística vencedora
nesta parte da América. O Português Brasileiro ruma para os 200 milhões de
falantes na próxima década, garantindo para a língua portuguesa a marca de sexto idioma mais
falado do planeta num universo estimado de três mil línguas vivas hoje.
Nesse patamar imensamente significativo dos dez idiomas mais falados do globo, o Português se
firmou no século 20 como língua de presença disseminada por quatro continentes (são agora 8
países unidos numa comunidade, a CPLP-Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) e como
língua de cultura elaborada e língua de produção científica.
Na condição de maior país de língua portuguesa e com maior contingente de falantes nativos (são
180 milhões comparados aos aproximados 14 e 10 milhões das colocações seguintes de países
lusófonos) o esforço educacional, cultural e político de apoio ao idioma empreendido no país,
ainda em bases pré-organizatórias de política lingüística, terá grande peso para o destino da
lusofonia. A década de 50 no século 20 marcou especialmente um ciclo de desenvolvimento
econômico e cultural do país contaminado por grande otimismo com relação ao futuro, por forte
aceleração da vida urbana e pela explosão de certa imagem mundializada e certamente projetada a
partir dos Estados Unidos da América nas estilizições tropicalistas pioneiras da artista
performática luso-brasileira Carmen Miranda. O Brasil passa, então, a alimentar um imaginário
mundial de alegria cantante e dançante, de lugares belos e exóticos, de gente criativa e feliz que se
oferece como alternativa de viver nos outros lugares do mundo.
As manifestações pelo ensino de base direta são modernas mas não estruturalistas. Nessa última
vertente ainda fortemente embasadora dos métodos atuais reconhece-se o estruturalismo
audiolingual com salientes tons behavioristas típicos dos anos 60 e 70 ou mais cognitivistas no
sentido de explicitarem regras para o aprendiz e bem menos repetições de modelos características
dos anos 80 e 90. Enquanto nos métodos diretos parte-se de textos e menos freqüentemente do
diálogo, nos métodos de extração estrutural a partida é fortemente o diálogo breve situacionado
para coincidir com padrões lingüísticos que se retomarão depois de conhecido o conteúdo do
diálogo.
Os dois primeiros livros didáticos de amplo uso no Brasil e exterior mencionados anteriormente
pertencem ambos ao segundo momento metodológico descrito. Marchant (1954) pertence a uma
geração estruturalista pioneira na qual a sistematização gramatical pode ser explicitada em
paradigmas de uma forma ainda parecida com o ensino tradicional (pré-estruturalista) precursor
calcado na tradução e gramática. Biazioli & Gomes de Matos (1978) se inscrevem com seu livro
Português do Brasil para Estrangeiros na segunda e efervescente fase de extração metodológica
áudio-lingual do movimento estruturalista para o ensino de línguas.
Se os anos 80 foram a década da expansão da oferta das séries didáticas, os anos 90 aliam mais
séries publicadas a uma nova consciência profissional no âmbito do ensino de PLE. Essa
consciência profissional se revela numa nova oferta de livros teóricos sobre o PLE dirigida a
professores em exercício ou a alunos de Letras em formação geral na graduação ou mais
especializada na pós-graduação (vide relação dessas obras no Apêndice). Os programas de Letras
começam a ofertar ainda como disciplina eletiva disciplinas sobre EPLE. Na nova safra de
Programas de Lingüística Aplicada que começam a surgir no país
nos anos 90, a disciplina de Introdução à Pesquisa e Ensino em PLE também encontra lugar no
currículo nessa década e no final da anterior. No exterior, abre-se um período de grande vibração
no governo Itamar Franco sucedendo o ex-presidente Fernando Collor após seu impedimento em
1991. Os presidentes são referências históricas periodizantes, mas não se pode atribuir a eles
mesmos a consciência da e as ações empreendidas em favor da questão estratégica do EPLE, e sim
às políticas contingentes ocasionais e circunstanciais de personalidades em cargos de confiança
nos ministérios de relações exteriores, da cultura e da Educação, nessa ordem. Não há nessa
década e nem nesta em que vivemos a formulação de uma política oficial deliberada e abrangente
para a língua portuguesa seja no âmbito interno do país, seja no âmbito externo, para apoiar a
oferta de EPLE que leve em conta (1) a formação de novos professores em bases contemporâneas,
(2) a formação continuada coordenada dos professores nos postos ao redor do mundo, e (3) o
estabelecimento de balizas para novos currículos, programas, materiais e exames de proficiência.
Pode parecer contraditório não se reconhecer política para um ensino instalado de PLE em todo o
mundo e no Brasil. Mas a instalação do EPLE foi se dando aos poucos em atendimento a pleitos
ou à demanda espontânea desde os anos 50 e muitas vezes por iniciativa de indivíduos com visão
estratégica, mesmo à revelia de uma política deliberada oficial do governo brasileiro e das
instituições.
Ocorreu um inegável incremento da oferta nesses anos de ensino do PLE e da cultura brasileira
mas formas de apoio a essa enorme rede que vai se formando não tem ocorrido a não ser em
surtos como no período de 91 a 95 ou iniciativas isoladas, de grande mérito, mas que não se dão a
conhecer, não possuem coordenação sustentada, não se abrem à investigação, e não se difundem.
Nessa mesma década de 90 aparece uma rara iniciativa oficial de instalar um Exame Nacional de
Proficiência, o Exame Celpe-Bras, criado no bojo do MEC, em 1993, a partir de um protótipo de
extração comunicacional criado e utilizado na Universidade Estadual de Campinas ao abrigo do
Projeto Português Língua Estrangeira que dirigi nessa instituição entre 1989 e 1995. Conforme
podemos deduzir, a primeira metade dessa década de 90 produziu intensa vibração e alguns
concretos sinais de incremento do ensino de PLE. A promessa do MERCOSUL certamente foi
uma alavanca dessa onda de ofertas e institucionalizações reconhecidamente de avanço (cf.
Almeida Filho, 1995).
5. Concluindo
A produção de séries didáticas cresceu espontaneamente. Isso é salutar, mas faz falta a crítica
sistemática dessas iniciativas para orientar novas produções e apoiar novas tendências
metodológicas no ensino de PLE. Livros teóricos sobre o ensino de PLE estão disponíveis mas
precisarão crescer em escopo para, com maior abrangência e especialização dos aspectos do
processo de ensino-aprendizagem-formação continuada, poder melhor orientar novos profissionais
ou a legião desassistida de professores já em serviço, desconfiada de que é preciso avançar
profissionalmente.
A própria inclusão da área de ensino de PLE no Projeto Estação da Luz da Língua Portuguesa
reacende nossa esperança de que a abertura profissional e científica nessa direção possa despertar
iniciativas e apoios institucionais para uma verdadeira e estratégica política para a Português
brasileiro e o seu oferecimento como língua estrangeira e língua segunda nos novos tempos que se
avizinham para as comunidades de países com projetos pactuados.
6. Referências
7. Apêndice
7.1 Bibliografia sobre o ensino de Português L2/LE
ALMEIDA FILHO, J.C.P. & LOMBELLO, L.C. (Orgs.) O Ensino de Português para
Estrangeiros: Pressupostos para o planejamento de cursos e elaboração de
materiais. Campinas: Pontes Editores, 1989.
Identidade e Caminhos no Ensino de Português para Estrangeiros.
Campinas, UNICAMP: Pontes Editores, 1992.
ALMEIDA FILHO, J.C.P. (Org.) Português para Estrangeiros: Interface com o
Espanhol. Campinas: Pontes Editores, 1995.
Parâmetros Atuais para o Ensino de Português Língua Estrangeira.
Campinas: Pontes Editores, 1997.
& SCHMITZ, J.R. Glossário de Lingüística Aplicada. Português Inglês/
Inglês Português. Campinas: Pontes Editores, 1998.
CUNHA, M.J. & SANTOS, P.(Org.) Ensino e pesquisa em Português para Estrangeiros.
Brasília: Editora da UnB, 1999.
Tópicos em Português Língua Estrangeira. Textos Universitários.
Brasília: Editora da UnB, 2000.
JÚDICE, N. M. (Org.) Ensino de Português para Estrangeiros: ciclo de palestras.
Niterói: Eduff, 1996.
Português/língua estrangeira: leitura, produção e avaliação de textos.
Niterói: Intertexto, 2000.
Português para estrangeiros: perspectivas de quem ensina. Niterói:
Intertexto, 2002.
SILVEIRA, R.C.P. (Org.) Português-Língua Estrangeira: Perspectivas. São Paulo:
Cortez, 1998.
BIZON, A.C. & FONTÃO, E. Estação Brasil/ Português para Estrangeiros. Campinas:
Editora Átomo, 2005.
CELI, R. Passagens. Campinas: Pontes Editores, 2002.
COUDRY, P. & FONTÃO, E. Fala Brasil. Campinas: Pontes Editores, 1989.
Entre Amigos. Campinas: Pontes Editores, 2000.
HENRIQUES, E. R. & RODRIGUES, D.M.G. Interagindo em Português. Brasília:
Editora Thesaurus, 2001.
LAROCA, M.N.C.; BARA, N. & PEREIRA, S.M.C. Aprendendo Português do Brasil.
Campinas: Pontes Editores, 1992.
LIMA, E.E. & IUNES, S.A. Falando... Lendo... Escrevendo... Português. São Paulo:
EPU, 1981.
Via Brasil. Português. São Paulo, SP: EPU, 1990.
LOMBELLO, L.C. & BALEEIRO, M.A. Português para Falantes de Espanhol.
Campinas: Unicamp/MEC, 1983 (esgotado).
BURIM, S.R.B.A.; OTUKI DE PONCE, M.H.;. & FLORISSI, S. Bem-Vindo! A
Língua Portuguesa no Mundo da Comunicação. São Paulo: SBS, 1999.
Tudo Bem? Português para a Nova Geração. São Paulo: SBS, 2001.
RAMALHETE, R. Tudo Bem. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1984.
8. Glossário
Crioulo - Adaptações de uma língua européia por falantes de outras línguas, em geral africanas e
contacto por interesse mercantil.
O mesmo que uma nova língua, híbrida de uma língua autóctone e outra externa e geralmente heg
ou conquista.
Depois de um código simplificado num primeiro momento após o encontro ter se instalado, o pidg
crioula regular que pode se tornar uma língua de prestígio ou língua nacional (o holandês e o indo
comunicação ampla/língua franca mas sem prestígio suficiente para se estabelecer como língua gr
exemplo).
Língua franca - Língua de uso corrente em toda uma região de países com núcleos de
falantes nativos espalhados geograficamente e falantes desse idioma como língua
segunda adquirida e/ou aprendida por falantes de outras línguas de contato da região.
São exemplos de línguas francas os idiomas Swahili e Mandinga nas costas africanas
oriental e ocidental, respectivamente.
Texto: Consciência da língua e iniciativas livres para a sua consolidação como idioma de
escolha por falantes de outras línguas (Link6)
Para o Estruturalismo, a língua não se confunde com as frases que as pessoas usam,
nem com o comportamento verbal que observamos no dia-a-dia. A língua é, ao
contrário, uma abstração, um conhecimento socializado que todos os falantes de uma
comunidade compartilham, uma espécie de código que os habilita a se comunicarem
entre si.