Caderno Clisertao
Caderno Clisertao
Caderno Clisertao
Governador
Paulo Câmara
SECRETARIA DE CULTURA
Secretário
Marcelino Granja
Coordenador de Literatura
Wellington de Melo
Assessores de Literatura
José Jaime Junior
Gilvanedja Mendes
FUNDARPE
Presidente
Márcia Souto
Gerente de Produção
Luiz Cleodon Valença
Universidade de Pernambuco
Reitor
Pedro Falcão
Pró-Reitor de Extensão e Cultura
Renato Moraes
UPE/Campus Petrolina
Diretor
Moisés Diniz de Almeida
Coordenadora do Colegiado de Letras
Maria de Fátima Rolim C. dos Santos
Coordenador de Pós-Graduação e Pesquisa
Paulo Adriano Schwingel
Coordenadora de Extensão
Lidiane Régia Pereira Braga
Coordenadora de Graduação
Maria Gleide Macedo de Souza Santos Pereira
COMISSÃO ORGANIZADORA
Dr. Iran Ferreira de Melo
Dra. Clarissa Loureiro
Ms. Francisco de Assis Silva Panta
Ms. Genivaldo do Nascimento
Ms. Maria Aparecida Ventura Brandão
Ms. Maria de Fátima Rolim Cavalvanti
Ms. Vlader Nobre Leite
Esp. Yolanda Almeida
Drª. Rossana Ramos Henz
Ms. Maria Gleide Macedo de Souza Santos Pereira
Esp. Maria Silu Caldeira
COMISSÃO CIENTÍFICA
Prof. Dr. Cosme Batista dos Santos
Universidade do Estado da Bahia – UNEB/Campus III-DCH
Profa. Dra. Geida Maria Cavalcanti de Sousa
Universidade Federal do Vale do São Francisco
Prof. Dr. Iêdo de Oliveira Paes
Universidade Federal Rural de Pernambuco
Profa. Ms. Ana Patrícia Frederico Silveira
Instituto Federal do Sertão de Pernambuco
Profa. Dra. Lívia Suassuna
Universidade Federal de Pernambuco
Prof. Dr. Iran Ferreira de Melo
Universidade Federal de Pernambuco
Profa. Dra. Rossana Ramos Henz
Universidade de Pernambuco
Profa. Dra. Clarissa Loureiro
Universidade de Pernambuco
Profa. Dra. Dinani Gomes Amorim
Universidade do Estado da Bahia / Faculdade de Ciências Aplicadas e Sociais
Prof. Dr. Ricardo José Rocha Amorim
Universidade do Estado da Bahia / Faculdade de Ciências Aplicadas e Sociais
Prof. Dr. Josenilton Nunes Vieira
Universidade do Estado da Bahia / Faculdade de Ciências Aplicadas e Sociais
Prof. Dr. Luiz Adolfo Andrade
Universidade do Estado da Bahia / Faculdade de Ciências Aplicadas e Sociais de Petrolina
Prof. Ms. Francisco de Assis Silva Panta
Universidade de Pernambuco / Faculdade de Ciências Aplicadas e Sociais de Petrolina
Prof. Ms. Genivaldo do Nascimento
Universidade de Pernambuco/ Faculdade de Ciências Aplicadas e Sociais de Petrolina
Profa. Ms. Maria Aparecida Ventura Brandão
Universidade de Pernambuco
Profa. Ms. Maria de Fátima Rolim C. dos Santos
Universidade de Pernambuco
Prof. Ms. Vlader Nobre Leite
Universidade de Pernambuco
Profa. Esp. Yolanda Almeida
Universidade de Pernambuco
GráficaFranciscana, 2015.
548p.
Disponível em http://www.upe.br/petrolina/
ISBN 978-85-60849-56-7
CDD807
Realização
Apoio
Tema do II CLISERTÃO
“Há décadas Jota Borges tem viajado quase que ininterruptamente dentro e fora do Brasil,
onde é muito conhecido. Suíça, Estados Unidos, Venezuela, França, Alemanha, Portugal,
Cuba são países para onde viajou, além dos lugares aonde tem ido a obra do artista, como
Itália, Espanha, Holanda, Bélgica, México, Argentina. Para Caracas, foi em 1995. A Cuba, foi
em 1997, num avião russo dos anos 50. Permaneceu doze dias lá, ministrando oficina numa
casa de cultura caribenha. Graças ao talento, sobretudo ao talento, e à amizade que cultiva há
anos com importantes galeristas, artistas plásticos, jornalistas e pesquisadores, Borges tem
obras no acervo da Biblioteca Nacional de Washington e no Museu de Arte Popular do Novo
México (em Santa Fé, EUA), já saiu no New York Times, participou da revista suíça Xilon em
número especial (1980) dedicado aos xilógrafos nordestinos, ilustrou o livro "As palavras
andantes", do uruguaio Eduardo Galeano (1993), figurou no calendário da ONU de 2002,
com a gravura "A vida na floresta", dentre outras notáveis aparições internacionais no mundo
da arte” (Drª Maria Alice Amorim)
“Amostras de vários gêneros de suas obras podem ser lidas e analisadas na antologia
Poética Ribeirinha, (Edupe,1998). Sua obra de maior envergadura é seguramente o
romance Pedro e Lina, leitmotif para justificar ficcionalmente o nome de Petrolina. De
Antônio Padilha, historiador, há sempre de se lhe dar o mérito de ter escrito a primeira
história de Petrolina, entremeada de pequenos causos, sobretudo a crônica do cotidiano, com
seus tipos exóticos e bizarros, muito mais revelador historicamente do que a menção fria e
factual de dados. Seus poucos textos, com características de reflexões sobre a Arte e
arredores, revelam, à maneira de Victor Hugo, uma visão romântica da vida e do destino, que
vai aparecer em muitos textos criativos, quase um contraponto com o homem de espírito,
sagaz e irônico que se sobressai em suas crônicas” (Elisabet Gonçalves Moreira- Mestre em Teoria
Literária e Literatura Comparada pela USP. Professora aposentada da UPE e IF Sertão – Petrolina)
“O sertão não tem janelas, nem portas. E a regra é
assim: ou o senhor bendito governa o sertão, ou o sertão
maldito vos governa”
Apresentação..........................................................................................................10
Grade de Programação............................................................................................11
Ensaios
O sertão é um punhado de saudades: literatura e história de um espaço, de um
sentimento(Durval Muniz de Albuquerque Júnior)....................................................28
Inscribir el sertón en el mapamundi: discursos científicos y ficcionales: os
sertões de euclides da cunha, veredicto em canudos de sándor márai y la guerra
del fin del mundo de mario vargas llosa ( Horst Nitschack).........................................37
Aleitura, o letramento e a formação do professor (Angela Kleiman )......................47
Discurso e literatura(Sírio Possenti )..............................................................................................52
Literatura e História:a cerimônia das palavras e das narrativas( Antonio Paulo
Rezende)....................................................................................................................................................56
Resenhas................................................................................................................60
Entrevistas.............................................................................................................74
Artigos...................................................................................................................80
Resumos...............................................................................................................426
APRESENTAÇÃO
OCLISERTÃO – CONGRESSO INTERNACIONAL DO LIVRO, LEITURA E LITERATURA
NO SERTÃO- acontece em uma das mais belas paisagens do Brasil: o Sertão do São
Francisco, banhado pelo rio homônimo, que cruza quatro estados e deságua no Oceano
Atlântico. Grande metáfora deste Brasil interior que se mostra ao mundo, o Sertão do São
Francisco é uma das regiões com ritmoacelerado de desenvolvimento econômico, graças à
grande produção de agricultura irrigada.
A imagem que se apresenta do Sertão do São Francisco contrasta com o imaginário popular
sobre Sertão e a literatura do século XX ajudou a fixar as tintas ocres desse quadro. Discutir a
literatura enquanto marca identitária de um povo e resultado de sua cultura é um dos
desafios lançados pelo CLISERTÃO, realizado pelo Governo do Estado de Pernambuco, em
uma parceria entre a Secretaria de Cultura e a Secretaria de Ciência e Tecnologia, através da
Fundarpe – Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco e Universidade de
Pernambuco, Campus Petrolina, com o apoio da Prefeitura de Petrolina e da Facepe.
Diferentemente de outros eventos literários, o CLISERTÃOestabelece uma relação afetiva,
multicultural e de intercâmbio entre os convidados nacionais, internacionais e locais como
parte das ações, indo além das apresentações literárias ou das palestras, penetrando no Brasil
profundo, no Brasil dos Sertões, através de intervenções descentralizadas em espaços
urbanos, comunidades rurais e tradicionais da região, além das discussões acadêmicas em
torno do livro, leitura e literatura, coordenadas pela Universidade de Pernambuco.
Ao mesmo tempo, a partir do CLISERTÃO, a Secretaria de Cultura do Estado de Pernambuco
e a Universidade de Pernambuco/Campus Petrolina (Colegiado de Letras Português)
fomentama criação de uma Rede do Livro, Leitura e Literatura na Região, envolvendo os três
eixos do setor nas discussões em torno da produção e de políticas públicas para o livro.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Grade de Programação
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
PALCO CENTRAL
Debates e conferências em torno de temas relativos ao Livro, Leitura e Literatura
5/5 (SEGUNDA-FEIRA)
LOCAL: Auditório UPE – Petrolina
15h – 18h: Credenciamento
18h40: Abertura oficial – Representações da Secretaria de Cultura de Pernambuco,
Secretaria de Ciência e Tecnologia, Reitoria da Universidade de Pernambuco, Presidência da
Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco, Diretoria do Campus
Petrolina e Prefeitura de Petrolina.
19h30: Os Sertões Inventados – Conferência com o prof. Dr. Durval Muniz de Albuquerque Júnior
(UFRN). Mediação profa. Dra. Janaína Guimarães (UPE Petrolina).
20h30-22h – Vozes dos Sertões - Recital e Show com Maciel Melo, Maviael Melo e Marcone Melo.
6/5 (TERÇA-FEIRA)
LOCAL: Auditório UPE – Petrolina
15h15 às 16h40 – O tempo e o lugar no conto — o lugar e o tempo do conto – Nivaldo Tenório
conversa com Sidney Rocha e Bruno Liberal
16h40 às 18h – Lusofonia: mito e paradoxo – Andreia Joana Silva (Portugal) conversa com Alexandre
Furtado (UPE – Nazaré da Mata/ Gabinete Português de Leitura), Abreu Paxe (Angola) e Luís Serguilha
(Portugal).
19h-20h20 Discurso e Literatura – Conferência com o prof. Dr. Sírio Possenti (Unicamp). Mediação
prof. Dr. Iran Melo (UPE Petrolina).
20h30-21h30 – Cordel Cantado – Leitura com o homenageado J. Borges e Bacaro (Bezerros-PE), Abraão
Batista e Amurabi (Juazeiro do Norte-CE). Mediação prof. Ms. Genivaldo Nascimento (UPE Petrolina).
7/05 (QUARTA-FEIRA)
LOCAL: Auditório UPE – Petrolina
15h15-16h40 – Produção de literatura no Sertão: perspectivas e olhar crítico – Socorro Lacerda
conversa com Cátia Cardoso e Virgílio Siqueira.
16h40 – 18h – Eu, Leitor: como, quando e o que leio? – Darcília Simões (UERJ/CnPq) conversa com
o escritor Rogério Pereira (Jornal Rascunho) e escritor José Castello.
19h-20h20 – Diários do exílio: Distância no processo de composição de Nosso grão mais
fino e O sonâmbulo amador – Schneider Carpeggiani conversa com José Luiz Passos.
20h30-22h: Poesia eletrônica. Recital e pocket show com José Paes Lira, Lirinha.
8/05 (QUINTA-FEIRA)
LOCAL: Auditório UPE – Petrolina
15h15 -16h: A Leitura, o Letramento e a Formação de Professores – Conferência com a prof. Drª
Ângela Kleiman (Unicamp). Mediação prof. Dr. Benedito Bezerra (UPE Garanhuns).
16h-18h: Comunicações Orais.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
16h40-18h: Vozes do Mato: ecologias da identidade sertaneja – Com o prof. Dr. Cosme Batista dos
Santos (Uneb), prof. Dr. Josemar dos Santos (Uneb), Profa. Dra. Maria Rita do Amaral Assy (Maita) –
UNEB, Prof. Dr. Víctor Rodríguez (Espanha).
15h15-16h40: Sertão, Literatura e História: relações e incongruências – Profª Ms. Elisabet
Moreira conversa com o prof. Dr. Antônio Paulo de Morais Rezende (UFPE) e o prof. Dr. Anco Márcio
Tenório (UFPE).
19h-20h: Para Inscrever o Sertão no mapa-múndi: discursos científicos e ficcionais: Euclides
da Cunha (Os Sertões), Guimarães Rosa (Grande Sertão: Veredas) e Vargas Llosa (La
Guerra del fin del mundo) – Conferência com o prof. Dr. Horst Nitschack (Universidade do Chile),
Mediação: Pedro Américo de Farias.
20h-21h30: Pé de Parede: Cantoria de Viola – Com Adiel Luna e Damião Enésio, Francinaldo Oliveira
e José Oliveira. Abertura com recital poético de Chico Pedrosa.
CLISERTÃO AMANHÃ
Planejamento de ações estruturadoras para o Livro, a Leitura e a Literatura no Sertão.
LOCAL: Salas do Prédio de Educação – Campus UPE – Petrolina
Público Alvo: gestores educacionais, professores, integrantes de conselhos municipais de cultura e de
educação, escritores, livreiros, alunos de Letras e de Pedagogia e demais interessados.
6/5 (terça-feira)
9h às 11h: Palestra sobre Elaboração de Planos Municipais do Livro e Leitura (PMLL), com
Roberto Azoubel (Regional Nordeste do Ministério da Cultura). Local: Sala A
10h: Conferência O papel das Tecnologias de Informação na circulação do livro. Prof. Dr.
Víctor Amar Rodríguez -Universidade de Cádiz-Espanha). Local: Sala B
7/5 (quarta-feira)
9h-11h: Instruções para circular: alternativas para a produção literária local. José Barbosa
conversa com Uberdan Oliveira (UBE – Petrolina) e Alexandre Melo (produtor do Nós Pós/ Mostra
PE). Local: Sala A
8/5 (quinta-feira)
9h-11h: Alternativas de editoração: da auto-publicação ao movimento cartonero. Wellington de
Melo (Secult-PE) conversa com Andreia Joana Silva (Cephisa Cartonera/ Universidade Blaise Pascal –
França), Nivaldo Tenório (u-Carbureto) e Patrícia Vasconcellos (Caleidoscópio Editora) e designer editorial
Patrícia Cruz Lima. Local: Sala A
9/5 (sexta-feira)
Poema em crise na escola. Roda de conversa com a participação do prof. Dr. Horst Nitschack
(Universidade do Chile), prof. Ms. Carmen Moguel (Espanha) e o prof. Dr. Antenor Rita (Uneb). Local:
Sala A
7/5 (quarta-feira)
10h: Inauguração da Biblioteca Itinerante no Bairro Cosme e Damião. Distribuição gratuita de livros,
revistas e gibis.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Local: em frente ao Posto de Saúde.
LITERPRAÇA
8/5 (quinta-feira)
9h às 19h – Recital, música e diversas atividades voltadas para o universo do livro e da literatura.
VERSO SE BULINDO
LIVROS LIVRES
10/5 (sábado)
Atividade baseada no conceito de bookcrossing, que consiste em “esquecer” livros em espaços públicos com
selos identificativos da ação que convidam as pessoas a lerem os livros e deixarem em outro lugar público
após a leitura.
Local: Praça do Coreto (atrás da Prefeitura de Petrolina).
ECOLEITURA
10/5 (sábado)
12h: Visita à Ilha do Massangano, com apresentação do Samba de Véio e recital poético às margens do São
Francisco, com participação de Chico Pedrosa e Pedro Américo de Farias.
FORRÓ-LIVRO
10/5 (sábado)
19h: Encerramento do II CLISERTÃO, com Nilton Freitas e Orquestra Sanfônica de Petrolina.
AÇÕES INTEGRADAS
EXPOSIÇÕES
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Programação do Cineclube Cine Raiz em Maio/2014
- Todo sábado às 18h – Entrada Franca – antes de toda sessão teremos a exibição de um curta-metragem.
Onde?! – No Espaço Cultural Janela 353, Rua Antônio Santana Filho, 353, 1º andar do Café de Bule,
Centro, Petrolina/PE, ao lado do Colégio Maria Auxiliadora.
Dia 03/05: Vidas Secas. Baseado na Obra de Graciliano Ramos. Direção: Nelson Pereira dos Santos.
Dia 10/05: Capitães de Areia. Baseado na Obra de Jorge Amado. Direção: Cecília Amado
Dia 17/05: Benjamim. Baseado na Obra de Chico Buarque. Direção: Monique Gardenberg.
Dia 24/05: A Hora da Estrela. Baseado na Obra de Clarice Lispector. Direção: Suzana Amaral.
Dia 31/05: Palavra Cantada. Baseado na Obra de diversos Poetas da Música Popular Brasileira. Direção:
Helena Solderg
O Clisertãozinho tem como objetivo oferecer atividades lúdico-literárias dentro do evento: contação de
histórias, dramatizações, jogos e brincadeiras populares para o público infantil.
Minicursos
1-FICÇÃO EM PERNAMBUCO – BREVE HISTÓRIA (poeta Pedro Américo de Farias)
2-CONSIDERAÇÕES SOBRE LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA INGLESA (Dr. Eduardo Barbuio –
UFRPE)
3-A EXPERIÊNCIA AMOROSA DAS CRIAÇÕES FEMININAS DE MARILIA ARNAUD: ENTRE
A TRADIÇÃO E A PÓS-MODERNIDADE(Ms. Ana Patrícia da Silveira- IFSertão PE/Ouricuri)
4-A POÉTICA DAS ÁGUAS EM EDUCAÇÃO PELA PEDRA EO DISCURSO DO POEMA “O
RIO”, DE JOÃO CABRAL DE MELO NETO(Profa. Dra. Maria de Fátima Gonçalves Lima-PUC-GO)
5-LITERATURA CONTEMPORÂNEA DE AUTORIA FEMININA BRASILEIRA: POR ENTRE
MUSAS, FIOS E TEIAS – LYA LUFT, MARTHA MEDEIROS, ELISA LUCINDA, CIDA
SEPULVEDA E LÊDA SELMA (Prof. Dr. Iêdo de Oliveira Paes-UFRPE)
6-A NATUREZA DA ARTE LITERÁRIA: O IMPOSSÍVEL QUE CONVENCE (Prof Dr. Arturo
Gouveia-UFPB)
7-MOÇAMBIQUE NO FEMININO: A NARRATIVA DE PAULINA CHIZIANE (Prof.Dr. Sávio
Roberto Fonseca de Freitas-UFRPE)
08-INTERSEMIOSE E LITERATURA (Poeta e Prof. Ms. Abreu Paxe- Angola)
09-A EXPERIÊNCIA DE TRABALHO COM OS PAIS DE ALUNOS EM UMA BIBLIOTECA NA
ESPANHA (Ms. Carmen Moguel-Espanha)
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
10-O SERTÃO EM FOTOGRAFIAS: PERSPECTIVAS PARA USO EM SALA DE AULA (Prof. Dr.
Antenor Rita-Uneb)
11-A PRESENÇA DO BARROCO EM GRANDE SERTÃO: VEREDAS(Doutoranda Rejane de Souza)
12- TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E EDUCAÇÃO: RELATO DE EXPERIÊNCIAS COM
PROJETOS NA ESPANHA (Prof. Dr. Victor Amar Rodríguez – Universidade de Cádiz-Espanha)
13- INTRODUÇÃO À LEXICOGRAFIA CULTURAL (Prof. Dr. Cosme Batista dos Santos/UNEB, Profa.
Dra. Norma Almeida/UEFS e Profa. Dra. Marcia Guena/UNEB)
14- JOSUÉ DE CASTRO: DA FOME À TRANSUBSTANCIAÇÃO DO MANGUE EM HOMENS E
CARANGUEJOS (Prof Dr. Mário Medeiros-UPE/Garanhuns)
15-LEITURA NA ESCOLA: LETRAMENTOS MÚLTIPLOS NO ENSINO FUNDAMENTAL E
MÉDIO (Profª. Drª Jaciara Josefa Gomes-UPE/Garanhuns, Prof. Dr. Benedito Bezerra-UPE/Garanhuns e
Profª.DrªRossana Ramos Henz-UPE/Petrolina)
16-AS MUDANÇAS DO CORDEL: UMA COMPARAÇÃO ENTRE A PRODUÇÃO DE PORTUGAL
E A DO BRASIL (Drª Maria Alice Amorim)
17-ENSINO CONTEXTUALIZADO DE GRAMÁTICA (Prof. Esp. Yolanda Almeida e prof. Ms.
Francisco de Assis Silva Panta-UPE/Petrolina)
18- ICONICIDADE DO LÉXICO (Prfª Drª Darcília Simões (Uerj/Procientista Cnpq)
19- CELESTINO GOMES: LEITURA, PINTURA E IMAGEM (Pollyana Ramos Mattana –
Coordenadora de Artes do Sesc Triunfo e Uriel de Souza Bezerra –Univasf).
20- LITERATURA SEM PALAVRAS: REFLEXÃO SOBRE NARRATIVAS ORAIS (Prof. Dr. Juracy
Marques-Facape e Uneb)
21-TÉCNICAS PARA A REDAÇÃO DE CONTOS (Escritor e prof. Dr. José Luiz Passos- Universidade
da Califórnia-Estados Unidos)
22-LEITURA E PRODUÇÃO TEXTUAL NO ENSINO FUNDAMENTAL – TEORIA E PRÁTICA
NUMA PERSPECTIVA DIALÓGICA (Profª Ms. Gláucia Rejane-Facape).
23-O LÚDICO NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA E LÍNGUA INGLESA (Profª Ms. Antônia
Aparecida Barros Alencar Correia e Profª Ms. Roberta Guimarães de Godoy e Vasconcelos-IFSertão PE-
Salgueiro).
24-LITERATURA DE CORDEL PARA A SALA DE AULA: DIÁLOGOS COM O QUE SE
CONVENCIONOU CHAMAR DE LITERATURA ERUDITA (Prof. Dr. José Hélder Pinheiro Alves-
UFCG)
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
APRESENTAÇÃO DE TRABALHOS CIENTÍFICOS
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
COMUNICAÇÃO ORAL
01. LETRAMENTO, VISUALIDADES E PRÁTICAS SOCIAIS: EDUCAÇÃO
CONTEXTUALIZADA PARA CONVIVÊNCIA COM O SEMIÁRIDO (Núbia Oliveira da Silva –
UNEB, DCH III. Mestranda em Educação, Cultura e Território Semiárido - PPGESA.)
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
14- I MOSTRA DE LITERATURA - VANGUARDAS EUROPEIASLêuda Fernandes Ferreira -
Professora Especialista
19- CARTA DO LEITOR: A ESCRITA PARA ALÉM DA SALA DE AULA Autora: Maria
Alcione Gonçalves da Costa. UPE – Mestranda do PROFLETRAS na UPE – Garanhuns
41. E AS VOZES DO SERTÃO, O QUE ELAS TÊM A DIZER? (ERICK NALDIMAR DOS
SANTOS)
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
88. UMA ANÁLISE COMPARATIVA SOBRE O SERTANEJO: ASA BRANCA E CIDADÃO
COMUM – CISLANE BRITO (UFCG)
PÔSTER
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
03- OS RECURSOS SONOROS DOS TEXTOS COMO ESTRATÉGIA PARA A
CONSTRUÇÃO DE HABILIDADES METAFONOLÓGICAS
Maria Rivaldízia do Nascimento e Daniella Cavalcante Silva - Mestrandas do PROFLETRAS - UPE –
Campus Garanhuns.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
19. ANÁLISE DISCURSIVA DO TEXTO “HERMENGARDA , MINHA FRÔ” , UMA
REPRESENTAÇÃO IDENTITARIA DOS FALARES DIALETAIS DO SERTÃO (NÉLIO LIMA
DE OLIVEIRA)
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
36. PRODUÇÃO DE KEFIR NO SERTÃO NORDESTINO: UM INSTRUMENTO NO
PROCESSO DE ENSINO/APRENDIZAGEM (GEISIELE DE SOUZA TEOTONIO, GEAZI ROSA
OLIVEIRA TEOTÔNIO)
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Ensaios
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O SERTÃO É UM PUNHADO DE SAUDADES: LITERATURA E HISTÓRIA DE UM
ESPAÇO, DE UM SENTIMENTO
Prof. Dr. Durval Muniz de Albuquerque Júnior
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Ele e ela chegam no último momento, no último movimento do texto. Ela e ele chegam
pouco antes de se anunciar e se enunciar que é o fim. Vêm constituir uma das bordas de um
texto sobre cidades, sobre uma cidade, sobre o Recife, ou melhor, sobre o Rasif. * Ele e ela
chegam para além da cidade ou das cidades, pois a presença de São Paulo, a cidade das
cidades brasileiras, vem atravessar o textoe delinear um outro espaço para a fala, vem ser o
lugar de onde se fala. Ela e ele aparecem como margem, como fronteira que, ao mesmo
tempo, que clausuram o texto e as cidades, abrem-nas para o passado e para o futuro. Ele e
ela chegam como recuo no tempo, como saída de um presente urbano, citadino, cosmopolita,
globalizado, marcado pela violência, pela miséria, pelas guerras imperialistas, pela fome, pela
dor, pelo ódio, pelo ressentimento. Ela e ele chegam como uma lufada de ar fresco, de
esperança, como contraponto a um presente pavimentado com lajes, verdadeira estrada
constituída de rochedos, de pedras que cortam, que abalroam, que fazem naufragar e perecer
vidas, aos montes, aos magotes. Ela e ele chegam para refazer tempos, espaços, rituais,
objetos e pessoas,sons, cores e sabores, paisagens e passagens de vida, vêm para restabelecer
e reconstituir muitas das coisas que foram cortadas, esfaceladas, esquecidas, perdidas,
abandonadas, destroçadas por aquele mar que arrebenta, que se arrebenta. Ele, o sertão, e
ela, a saudade, surgem neste último instante do livro de Marcelino Freire, instaurando um
tempo equívoco, um tempo dobrado, plissado, tempo em que o passado torna-se o futuro que
se espera, o passado torna-se a única espera diante do presente que acabou de ser desenhado
nos dezesseis contos anteriores. Marcelino Freire sonha com um futuro passado ou com um
passado futuro, sonha com o sertão do passado e no futuro, lançando mão para realizar esta
conexão temporal do sentimento da saudade, aquele que permite que os tempos se toquem,
se interpenetrem, que a linearidade da cronologia com que comumente se escreve a história,
as histórias, seja rompida, permitindo que o antes venha habitar o depois, que o amanhã
conte com a presença do ontem, que na espera e na esperança possam vir a se alojar a
ausência, o ausente, venha se achar o perdido, venha se reencontrar o desencontrado, venha
tornar o detonado, venha aparecer o desaparecido, trazendo a possibilidade que ressurjam à
flor da água ilhotas de tempo que submergiram, restos e dejetos de tempos que como cristais
nascidos de um processo de decantação, de lenta sedimentação afloram à superfície da
memória, varando o silêncio que os corroía, traços e trastes de uma vida, de muitas vidas,
boiando no tempo, arrastadas pelas vagas que atravessam a história, que resolvem ancorar,
encostar-se, costear, habitar a beira de um texto, lá onde uma pequena mosca deixa a marca
de sua caca como um ponto final. †
O sertão e a saudade aparecem arrinconados num canto do livro, lá onde o movimento do
texto se arrebenta. Lugar distante contra o qual a onda do presente vem se quebrar, onde a
agitação da vida presente, seu bulício, suas correntes, seus turbilhões e tsunamis, suas
espumas de sangue, suor e saliva vêm esbarrar. O sertão e a saudade habitam um lugar
recôndito no ser do livro e no ser do autor, estão atirados num canto muito mais do que num
conto. Este texto que se pretende conto é muito mais um canto, uma elegia,uma ode ao sertão
modulados nos acordes da saudade. Ele canta muito mais do que conta. Ao contrário do que
ocorre nos dezesseis outros contos que compõem o livro, nenhuma história aí é narrada,
embora muitas histórias estejam aí agarradas e amarradas. Poderíamos dizer com Barthes
*
O texto tem como objeto de análise o livro de: FREIRE, Marcelino. Rasif: mar que arrebenta. São Paulo:
Record, 2008.
†
Referências ao conto intitulado “O futuro que me espera”. In: FREIRE, Marcelino. Op. Cit., p. 120-123. e à
gravura de Manu Maltez, que ilustra a página 127 do livro, onde se lê “É o fim”.
28
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
que são fragmentos de um discurso amoroso, e saudoso. ‡ São estilhaços de memórias, de
vivências, de experiências, os destroços que sobraram do passado do autor e dos atores que
traz para seu texto, após o encontro e a quebra do encanto com o litoral, com os arrecifes que
constituem a paisagem física, social, politica, moral e cultural do Rasif. Memória
estraçalhada, em filigranas, em flashes, dilacerada pela própria velocidade do tempo em que
foram produzidas. Se o sertão é o lugar da memória e da saudade, é porque dá tempo, há
tempo para isso: pra que pressa, pra quê? §Na cidade, na temporalidade urbana, apressada,
em que eventos se sucedem sem que dê tempo de serem fixados, guardados na mala da
lembrança, onde os acontecimentos logo viram fumaça, as memórias são farrapos, são ditos
em fiapos. Nela, mesmo a saudade chega apressada, as lembranças do sertão chegam
elípticas, pequenos clarões de luz a atravessar o breu do esquecimento, pontadas de dor a
varar uma alma entorpecida por tanto horror e desamor cotidianos. Como tecer uma
narrativa, um conto, se não colando, agrupando os restos e os rastros que estes eventos
deixaram, registrando as pequenas marcas, as manchas, os cheiros, os ritos e os rictos
passageiros em que tomaram corpo, em que se efetivaram. Mas, no último instante, naquele
canto do livro havia lugar, mesmo apressado, dito aos pedaços, entredentes, entrementes,
para um contracanto, ou seria para um contraconto, para uma espécie de ritornelo que ao
invés de indicar o retorno à sinfonia que até então se desenrolava, ao invés de ser o momento
de retorno de todos os instrumentos até então utilizados pelo autor em sua narrativa, figura
como um momento de abertura do texto para outros arranjos possíveis da realidade, da
cidade que acabara de figurar. Ao mesmo tempo último suspiro de um texto e lufada de ar
fresco que abre o tempo e a vida para outros futuros, mesmo que seja figurado pelo passado,
por um dado passado. O ser tão precário do presente encontra no canto, e não no conto, na
literatura e não na história, a pequena brasa de esperança para lhe aquecer, para dizer que há
futuro, que nos espera e que se espera.
Mas como falar dele e dela como dois entes separados. No livro de Marcelino Freire o sertão é
a saudade, o sertão é constituído de fragmentos de distintas saudades, o sertão é um punhado
ou um molho de saudades. O que dá o ser ao sertão é as saudades que dele se sente. Ele é a
colagem dos fragmentos de um passadoque chega através desse sentimento. O sertão é
presentificado como perda, como ausência, como uma fieira de lembranças penduradas no
precário cordel de uma narrativa, que parece ter sido feita aos soluços, aos solavancos na
estrada da memória. O sertão parece sempre ser uma saudade de quem o deixou, de quem foi
esbarrar no litoral, de quem saiu dele em busca da cidade, do sonho feliz de cidade, de quem
saiu em busca do Sul, de quem procurou se encontrar em outro lugar, de quem procurou ser
alguém fora dele, indo para bem longe dele, parece ser saudade de quem fez a partida para
São Paulo ou Rio de Janeiro, para quem colocou as pernas no mundo em busca de dias
melhores, para quem dele queria muito sair ou para muitos que dele foram saídos, expulsos,
tocados como rebanhos de gado. O sertão é a saudade de desterrados, de desterritorializados,
de gente sem terra, é território construído com a memória, com os retalhos de lembrança que
restaram após a triste ou a alegre partida. O sertão é descoberto com sendo a terra de cada
um após, muitas vezes, o retirante ter sacudido a última poeira que cobria seus pés para
poder estar conforme ao entrar na cidade. Decorridosanos, ele descobre que nunca
verdadeiramente entrou na cidade, e a cidade nunca entrou nele, quem se tornou cada vez
maior dentro dele foi o sertão, mesmo que mereça apenas um pequeno lugar em seu texto,
todo ele feito de denegação da cidade, de vômito dos dissabores que ela lhe trouxe, de
exposição de suas mazelas e de seus furores. Era preciso extrair de si mesmo as marcas e as
mágoas do Recife e de São Paulo, era preciso abortar os filhos bastardos que a vida de cidades
e em cidades gerou em sua subjetividade, era preciso contar, expor, matar em si mesmo as
inúmeras presenças da morte com que conviveu e vieramnele habitar, era preciso aplacar
num texto sua sede de vingança, seu ódio contra o muito que significou para ele sua
experiência de cidades, para poder voltar, num último ato, limpo, despojado, reconciliado
consigo mesmo e com a vida, ao sertão. Após o escarro na cara da cidade de todos os males
que ela fez, que ela lhe fez, que ela faz, que ela lhe faz, ele pode finalmente costurar a mala,
levantar as paredes de caixa, espiar com desprezo para os prédios e a fumaça de São Paulo e
‡
Ver BARTHES, Roland. Fragmentos de um discurso amoroso. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
§
Ver FREIRE, Marcelino. Op. Cit., p. 123.
29
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
dizer que vai embora, naquele instante, porque ali nunca foi a sua terra, para outra terra da
qual já sente saudade num futuro que ainda vai viver, que ainda oespera. ** O sertão é
saudade, mas também é espera e esperança. Mas a saudade é sempre isso mesmo, lembrança
e esperança, ausência e espera de reencontro, experiência e expectativa, morte e vida, mesmo
que Severina. †† Se o sertão é saudade, o sertão é sonho, sonho com o que passou, sonho que o
que passou vai voltar. Se o sertão é saudade, o sertão é desejo, desejo de retorno do que se foi,
é o desejar que o que foi não tenha ido, é desejar que o que vem seja o que já foi.
Não há um tom conservador em tudo isso? Fazer do futuro uma espera de volta ao passado
não é temer a abertura do tempo para outros possíveis? A recusa do presente, do ser
presente, do estar presente, que é a marca de todo discurso saudosista, não inviabiliza buscar
no presente os devires, as linhas defuturo que prometem um tempo outro, diferente, diverso,
divergente? A revolta com o presente que apresenta a volta ao passado como saída, a volta
para a terra que se deixou para trás, que se pressupõe permaneceu infensa ao tempo,
realidade estática, não histórica, à sua espera, não é uma maneira de se fechar à possibilidade
de outros futuros, distintos tanto do presente, quanto do passado? A vontade de atirar no
presente, de matar o presente e depois arrumar as malas e rumar para o sertão da saudade,
de sair da cidade para entrar na saudade, não é uma proposta política conservadora? Quebrar
a cidade em cacos, estilhaçá-la a socos literários, atingir o presente no coração, ser um perigo
para quem se aproxima, para o próximo, para depois rumar para um sertão idílico, distinto e
distante, onde parece não haver cidade, violência, crimes, tiros, prostituição, drogas, meninos
pobres e abandonados, sujeiras e degradações físicas e morais, parece um consolo, mas me
parece tão perigoso, tão letal quanto o presente figurado em cada conto. Esta espera e esta
esperança saudosista podemarrebentar com a busca de outros fins, de outras saídas, de
outros finais, mesmo que nunca sejam finais em que todos vivam felizes para sempre, outras
finalidades que não se resumam em exclamar: Isso é o fim!, ‡‡pois nós historiadores sabemos
que todo fim é um começo, todo começo passa longe da harmonia e da idealização de quem
busca origens e volta às origens, todo começo é habitado pela dispersão e o disparate. Não é
só o presente, não é só a cidade que são disparatados, que são atravessados por disparos. Não
é apenas o presente, não é somente o Recife ou São Paulo que são dispersos, violentos,
conflitivos;o sertão também é assim, atravessou a história sendo assim, se constituiu na
história por processos onde o desastre, o sofrimento, a dor, o descaminho se fizeram
presentes. O sertão é mortal e mortífero tanto quanto a cidade. Este último momento do livro
o torna maniqueísta, uma quebra se faz, uma descontinuidade se instaura, para, no entanto,
enunciar a possibilidade de uma soldagem dos cacos do tempo, do passado, para com eles
figurar um tempo contínuo, que àscustas de negativar o presente reinstala um passado mítico
como possibilidade de futuro, do qual também sentirá saudade, pois sabe a volta impossível,
embora desejada, e desejo também é acontecimento, faz história e produz realidades.
De que saudades é feito o sertão de Marcelino Freire? De que material saudoso é feito sua
sertania?Antes de tudo é feito da saudade de sua terra natal, do lugar que o viu nascer, das
ribeiras do rio Moxotó, um sertão com saudades de Sertânia. §§ Sim, seu sertão começa com as
saudades de sua cidade. Mas também pelas saudades do Cariri e do Sertão do Pajeú. Um
sertão feito de muitos outros lugares, pois o sertão é diverso e pasmem é feito de muitos
outros centros urbanos, uns maiores outros menores: Catolé, Canindé, Paulo Afonso. Mas, o
que também não é surpreendente, seu sertão se espalha por todo Nordeste. Seu sertão
começa em Sertânia mas por deambulância e assonância vai se espalhando até abarcar outras
áreas do Nordeste. Estando em São Paulo, sendo escrito de lá, tal como costuma lá se pensar
e dizer,o Nordeste é o sertão, o sertão é todo o Nordeste, por isso suas saudades do sertão
transformam-se em saudade do Nordeste. As saudades de Sertânia se conectam e fazem
enredo com as saudades de Sairé, Nazaré da Mata, Caruaru, Quixeramobim e até da ilha de
Itamaracá. *** Sertão e Nordeste que vão sendo figurados por cidades, mas não propriamente
**
Referência a passagens do conto “O futuro que me espera”. In: FREIRE, Marcelino. Op. Cit., p. 123.
††
Para uma discussão filosófica sobre o sentimento da saudade, ver: TEIXEIRA, António Braz; PINHO, Arnaldo;
NATÁRIO, Maria Celeste e EPIFÂNIO, Renato (orgs.). Sobre a saudade. Sintra: Zéfiro, 2012.
‡‡
Referência ao enunciado presente em: FREIRE, Marcelino. Op. Cit., p. 127.
§§
Ver: http://www.tirodeletra.com.br/biografia/MarcelinoFreire.htm. Acesso em 09/05/2014.
***
Ver o conto “O futuro que me espera”. In: FREIRE, Marcelino. Op. Cit., p. 121-122.
30
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
pelo urbano, pois o que se vai lembrar saudosamente dessas cidades não são seus aspectos
modernos, contemporâneos, urbanísticos, suas práticas e relações sociais em dias com o
presente, mas o que há nelas de artesanal, de folclórico, daquilo que lá no início do século XX
se inventou como sendo a cultura nordestina, pelas práticas e relações que remetem ao
passado, a uma pretensa tradição, afinal sertão e Nordeste só podem ser ditos na saudade e
no passado, daí este corpo estranho, esta postema, este cancro, esta anomalia que é o Rasif,
esta ferida que sangra e escorre pus, na carne do corpo regional. ††† Essa chaga que supura
modernidade desde o início do século XX. Foi nela e na recusa dela que se inventou a região e
o sertão, o sertão como região, a região como sertão, foi vivendo nela que se inventou a região
e o sertão como saudades, como espaços, como paisagens no passado e do passado. Das suas
entranhas saíram estes dois filhos bastardos, estes dois filhos ingratos, que só fazem dela
desdizer ou dizer dela os desditos.
O sertão e o Nordeste de Marcelino Freire também são feitos, como muitos, infindos,
infindáveis, intermináveis, de saudades das noites de festas, dos folguedos, dos instrumentos
musicais, das danças e ritmosditos tradicionais ou folclóricos, de seus personagens e
brincantes: das saudades do batucajé, dos papangus, do carnaval, do maracatu de lança, do
fandango e da ciranda, dos malungos, da maionga, do jurupari, de Mateus e Catirina, das
lutas entre o azul e o encarnado, da bernúncia, da zabumba, do reco-reco, do Zé Pereira, do
violão e da viola, da procissão que se foi. ‡‡‡ Como sempre este é o tempo da cultura
nordestina, aquela que se foi, que ficou no passado, que está morto ou prestes a morrer, a
cultura nordestina, este eterno defunto sem enterro. Mas o sertão, o Nordeste inteiro que ele
veio a se tornar, também é feito de saudades das iguarias, das comidas ditas tradicionais,
aquelas mesmas que os intelectuais e militantes regionalistas tradicionalistas, inventores da
região, diziam ser o cerne da regionalidade, aquelas mesmas que sociólogo glutão de
Apipucos não parava de comer e servir em seus banquetes regionalistas, enquanto a maioria
dos ditos sertanejos e nordestinos não tinham nada de decomer. §§§ Assim como a saudade
daqueles inventores da região vê-se que as saudades do escritor foram muito bem
alimentadas: afinal o sertão tem para ele gosto e lembrança de acarajé (talvez pela
necessidade de rimar mais do que por fome), de tumbança, de macaxeira-pacaré, de lelê ou
lelelé, do goiamum, do ponche de caju, do queijo de coalho, da tapioca, da rapadura, da
meladura, da moqueca, da pitomba, da canjica, da cocada, da graviola, da pitanga, do umbu,
do cajá e do maracujá. **** A dita cultura nordestina parece ser uma feira de mangaio, porque
ainda podemos encontrar entre as saudades que compõemo Nordeste e o sertão de Marcelino
Freire objetos os mais disparatados, todos juntos, formando uma pretensa unidade,
identidade, que aparece sarapintada, brega, chinfrim, parecendo um balaio de gatos: podem-
se encontrar o pacaia e o cobogó, o canário e o galo-de-campina. †††† Região que seria marcada
por crenças populares e tradicionais de origem africana e indígena vindas do quilombo e da
maloca, infundindo saudades da macumba, da jurema, da quimbanda. ‡‡‡‡ Região que é toda
uma paisagem clichê, beleza pura, não profanada pela feiura urbana, pela lama, o urubu e o
catador de caranguejos, feita de macambira, de luares, de açudes e cachoeiras, de tardinhas e
penderes do sol, feita de amanheceres, de barracas de folhas e carros de boi. §§§§ Sertão,
Nordeste composto de saudades de pessoas queridas, de personagens populares, de gente de
outros tempos, de outros costumes e outros modos: Mãe Valéria, dona Carminha, seu
Antônio, de Zé do Vale e até de Lia de Itamaracá, de muitas, de várias Marias-vai-com-as-
outras, um pouco como é a historiografia e a literatura quando querem figurar o sertão,
figurar a região Nordeste, termina tudo indo de enfiada na mesma direção de uma dada
maneira de ver, de uma dada maneira de dizer o que seria o regional. ***** E haja saudades!
†††
Ver: ALBUQUERQUE JR, Durval Muniz de. A feira dos mitos: a fabricação do folclore e da cultura popular
(Nordeste, 1920-1950). São Paulo: Intermeios, 2013.
‡‡‡
Ver o conto “O futuro que me espera”. In: FREIRE, Marcelino. Op. Cit., p. 121-122.
§§§
Ver: FREYRE, Gilberto. Manifesto regionalista de 1926. Recife: FUNDAJ, 1976.
****
Ver o conto “O futuro que me espera”. In: FREIRE, Marcelino. Op. Cit., p. 121-123.
††††
Idem.
‡‡‡‡
Idem.
§§§§
Idem.
*****
Idem.
31
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A região Nordeste e o sertão são construções da e na linguagem, foram os discursos que
foram dando significados e instituindo signos e símbolos para estes recortes espaciais. ††††† As
saudades precisam das palavras, nem que seja esta tão própria palavra da língua portuguesa,
para ser expressa, para ser dita e até sentida. Por isso há uma certa forma de narrar e de
escrever a região, há uma dizibilidade regional que se impõea quem quer ela figurar. Quão
distinto é o vocabulário, as palavras que aparecem para narrar a cidade nos dezesseis
primeiros contos. Recife, ou Rasif se deixa narrar com dadas palavras que não são as mesmas
que servem para dizer o sertão. Aí “we speak English”. ‡‡‡‡‡ Quando se vai narrar o sertão, o
Nordeste, vem à tona as saudade de uma outra língua portuguesa, vem àtona a língua de
antanho, a linguagem saída das páginas da história da Princesa Magalona, das visagens,
miragens, impropérios e impertinências do poeta Zé Limeira, das modas de viola, das
histórias do boi-barroso. A escrita literária contemporânea para dizer o sertão, para dizer o
Nordeste, precisa abriro baú e de lá retirar palavras safadas pelo tempo, palavras que foram
esquecidas, que também são motivo de saudades. Palavras que circularam num dado tempo,
numa dada cultura e que se pretende preservar como sendo o tempo e a cultura do regional.
O sertão seria o espaço de uma língua cheia de exotismos e bizarrias, de palavras que
encantam e trazem saudade pelo inolvidável, pelo sabor de sua prosódia, de sua fonética,
mais do que por sua semântica, uma língua dos avós e dos canfundós: o sertão, o Nordeste é
onde se ouvia e ainda podiam se encontrar palavras como macauã, cramondongue,
piriprioca, bodega, trepeça, bagalafumenga, banguela, pirraia, bruguelo, cobogó e tipóia. §§§§§
À primeira vista este último capítulo é forjado com a mesma estrutura dos anteriores. Ele se
organiza como um quadro, como uma cena teatral, como um pequeno bloco formado por
frases curtas, onde se percebe o cuidado com o uso de cada palavra, o gosto pela própria
sonoridade particular que cada uma carrega. Mas ao invés de semelhança temos instaurada
no interior do livro a diferença. Nos dezesseis primeiros contos, cada frase, cada palavra
surgem como explosões, como cortes no tecido da cidade, que deixam a descoberto as suas
entranhas. Cada cena, cada conto, surgem como incisões, que expõema putrefação do corpo
grangrenado da cidade, do mundo contemporâneo. Nestes primeiros contos há personagens,
há histórias, há acontecimentos. Acontecimentos retirados da banalidade da vida cotidiana
mas que fazem mexer, fazem tremular, desfocam as imagens costumeiras da história oficial e
triunfal. Nestes relatos a cidade de Rasifé o mundo todo, mundo vivendo um tempo doente, o
presente. Um presente e uma cidade, uma contemporaneidade feita de entulhos, de lixo, de
sobras, de restos, de monturos, onde toda a sacralidade se perdeu, onde a deusa das águas
tem que conviver com todos os dejetos materiais e humanos de uma sociedade da mercadoria
e do consumo, em que o mar que arrebenta pode trazer uma maré de merda. Um presente
vivido como oceano de medo, onde a esperança é grão de sal, espuma de sabão, nenhuma
terra à vista. ****** Presente onde o desejo de paz se transformou em hipocrisia de classe média
e de político demagogo, pois a realidade da maioria dos pedaços da cidade é a violência física,
simbólica, econômica, social, política, moral. As passeatas com lenço branco de gente que
nunca soube o que é perder um filho perfurado por uma bala da polícia, vitimado pela
violência da miséria é acinte diante da guerra geral. †††††† Um tempo presente, um mundo feito
de personagens-bomba, de gente prestes a explodir, gente com vontade de matar todo
mundo, revolta contida ou incontida que pode voltar-se contra si mesmo, que impede as
relações afetivas, que faz do amor um sentimento retorcido, impróprio, improvável. ‡‡‡‡‡‡ Um
tempo em que ninguém mais se entende, em que ninguém fala a mesma língua, apesar de
todos falarem inglês, tempo babélico, do desentendimento, da falta de comunicação e
†††††
Ver: ALBUQUERQUE JR, Durval Muniz de. A invenção do Nordeste e outras artes. 5 ed. São Paulo/Recife:
Cortez/Massangana, 2011; MULINACCI, Roberto. Um deserto cheio de lugares: topografias literárias do sertão.
In: RAVETTI, Graciela; CURY, Maria Zilda; ÁVILA, Myriam (orgs.). Topografias da cultura: representação, espaço
e memória. Belo Horizonte: UFMG, 2009, p. 11-31.
‡‡‡‡‡
Referência ao conto intitulado “We speak English”. In: FREIRE, Marcelino. Op. Cit., p. 36-38.
§§§§§
Ver o conto “O futuro que me espera”. In: FREIRE, Marcelino. Op. Cit., p. 121-123.
******
Referência ao conto intitulado “Para Iemanjá”. In: FREIRE, Marcelino. Op. Cit., p. 21-22.
††††††
Referência ao conto intitulado “Da paz”. In: FREIRE, Marcelino. Op. Cit., p. 24-28.
‡‡‡‡‡‡
Referência ao conto intitulado “O meu homem-bomba”. In: FREIRE, Marcelino. Op. Cit., p. 30-34.
32
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
comunhão apesar da proliferação dos meios. §§§§§§ Tempo em que as crianças sonham com um
revolver de presente de Papai Noel, em que até o bom velhinho pode ser vitima de uma
emboscada infantil, crianças que têm como ídolos o traficante ou o justiceiro do pedaço. *******
Tempos estranhos em que o papai traz o travesti para casa e lhe oferece café com leite,
pãezinhos e biscoito, travesti tristonho e acabrunhado que pode acabar se transformando na
mamãezinha para a criança abandonada da casa. ††††††† Cada conto é marcado pelo choque,
pela derrisão, pela entrada em cena de personagens inusitados, de eventos que na sua
pequenez e na sua banalidade questionam a ordem, as estruturas sociais e culturais; o que
dizem e fazem se chocamcontra os pretensos códigos e regras que dirigem a normalidade do
mundo e da vida. Como cintilações ou marteladas, cada cena, cada evento, cada frase furam,
quebram as máscaras das aparências e deixam entrever outras faces, as arestas desse tempo e
dessa realidade.
No entanto, na última cena, no que seria, segundo o apresentador do livro, um conto-canto
da uma bicha nostálgica, ‡‡‡‡‡‡‡ onde ela se encontra ou pretende se reencontrar com o sertão
através da saudade, com um dado Nordeste através da saudade de um morador de cidade, de
um migrante em São Paulo, a cena formada pelas frases curtas e estilhaçadas não produz o
mesmo efeito estético e político que os demais capítulos. O clima não é de revolta,mas de
nostalgia.Aí não há explosões, estilhaçamento;há evocações, apaziguamento. Aí não há
personagens, a não ser o próprio narrador que lembra e algumas pessoas que são lembradas.
Aí não há ação, não há acontecimento, não há história. As frases curtas, incisivas,
desaparecem, os fragmentos não furam ou cortam, eles são apenas pedaços coagulados de
um dado tempo, são águas paradas, águas chocas, são fragmentos de experiências que boiam
para além do seu tempo de vivência, são sombras do passado, nódoas que tingem a memória,
são um punhado de saudades. O tom do texto é idílico, lírico, poético, embora haja nos contos
anteriores momentos em que a lírica e a poética também comparecem, mas neles predomina
o tragicômico, o sarcástico, o irônico, o nonsense. Neste conto o tom niilista, desesperado e
desesperançadodos contos anteriores desaparece, aí há reconciliação com o tempo, com a
história, com a sociedade, com a vida, mas isso às custas de negar a passagem do tempo, de
negar a historia através do recurso àmemória, de fazer desaparecer o próprio social, reduzido
a uma disparatada coleção de saudades.
Até quando a literatura e a historiografia continuarão presas a esta forma de dizer e ver o
sertão e o Nordeste? Quando será que o sertão deixará de ser uma saudade, um passado, para
ser o presente? Quando o sertão e o Nordeste deixarão de ser a fronteira, o limite, o exterior
da cidade, do urbano? Quando a literatura e a historiografia descobrirão que existem cidades
no sertão? Que o sertão está na cidade, porque os sertanejos nelas estão e com eles o levam, e
a cidade está no sertão, já que a maior parte da população sertaneja hoje vive em cidades?
Quando será que o sertão deixará de ter só sertania e passará a ter cidadania? Pois é disso
que se trata, esta imagem de um sertão, de um Nordeste coagulado no passado, estático, sem
história, sem acontecimentos é também a história de um espaço sem cidadania, em que sua
população não tinha acesso a direitos. Embora o sertão de Marcelino Freire seja um espaço
sem conflito, sem violência, sem pobreza, sem relações de poder discricionárias, sem
exploração do trabalho, sem fome, sem dor, sem sofrimento, bem ao contrário da maneira
como desenhou a cidade e o mundo contemporâneo - o que o exclui de saída desse espaço e
dessa realidade -, sabemos que os sertões, porque eles são muitos, foram marcados e são
caracterizados hoje, - pois o sertão tem existência presente, é realidade presente e não só
passada -, padecem das mesmas contradições, conflitos, dramas que o autor faz aparecer em
seu Rasif. Sim, há lixo, monturo, há restos, sobras morais e materiais no sertão, nele há rios
de merda na falta das marés, há merda pura, inclusive em forma de gente, muitas adoradas e
sacralizadas como Iemanjá, notadamente por fazerem pequenas oferendas em épocas
eleitorais, não tão expressivas como as oferendas que recebem dentro e fora das cidades. No
sertão sempre houve guerra, nunca foi o lugar da paz. Matar pobre ou mesmo gente de
§§§§§§
Referência ao conto intitulado “We speak English”. In: FREIRE, Marcelino. Op. Cit., p. 36-38.
*******
Referência aos contos intitulados “Maracabul” e “Meu último Natal”. In: FREIRE, Marcelino. Op. Cit., p.
40-43 e 44-49.
†††††††
Referência ao conto intitulado “Júnior”. In: FREIRE, Marcelino. Op. Cit., p. 50-53.
‡‡‡‡‡‡‡
Ver: NAZARIAN, Santiago. Explosões. In: FREIRE, Marcelino. Op. Cit., p. 15.
33
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
família nunca foide admirar e fazer drama, muito menos melodrama. Sim, no sertão, hoje se
fala inglês, se fala muitas línguas, sempre se falou muitas línguas, afinal foi para o sertão que
fugiram indígenas e africanos com seus diferentes falares, o sertão sempre foi babel, nunca
foi apenas este baú de ossos linguísticos, nunca foi apenas este lugar de palavras-fósseis, aí a
língua sempre correu léguas. No sertão também há criança que quer matar não apenas Papai
Noel, mas qualquer papai, sua revolta, abandono e miséria são tão grandes quanto as da
capital. No sertão há travestis, nostálgicas, tristes, sorumbáticas, mas também sempre foi
lugar de veados alegres e fagueiros, sim a viadagem sempre habitou o sertão, não é apenas
coisa de cidade grande e hoje no sertão há cidades do tamanho do sonho de mulher de muitos
deles. No sertão sempre houve comedores de criancinha. Pelo menos essa é uma famosa
lenda que, desde o século XIX, alimentou o discurso da seca e carreou para o bolso das elites
sertanejas recursos e investimentos. §§§§§§§
Chega, portanto, dessa literatura e dessa historiografia que só veemno sertão e no Nordeste
sua dita cultura popular, festiva, colorida, pretensamente inocente, moral e politicamente.
Chega desse sertão adocicado feito de iguarias, acepipes, manjares, ponches e frutas
sumarentas. No sertão come-se hoje a mesma comida fast-food que se come em Nova York,
bebe-se a mesma Coca-Cola que brilha nos outdoores de Tóquio. Chega desse sertão de luares
e ocasos, de causos e contos tradicionais. Chega desse sertão brega, chinfrim, sem sonhos de
coisa grande, conformista e conformado com o pouco, com o menos, com o simples. Chega
desse sertão de pureza, de beleza. Cadê o sertão de todas as safadezas, de múltiplas e
inoxidáveis tristezas?Cadê o sertão das ruas engarrafadas,de carros importados, da compra
de todos os enlatados, da farra em postos de gasolina, assim como as meninas?! Cadê o sertão
do forró de banda, das calcinhas pretas e aviões, sertão dos pancadões e
RobertaMiranda?Cadê o sertão do ApoCalypso? Cadê o sertão do tráfego e do tráfico, dos
craques e do crack, de homens querendo ir morar no cabaré e mulheres gritando alto: “- eu
sou cachorra”?,uma zorra. Cadê o sertão dos shopping centers, dos smartphones, do facebook
e do twitter, das suítes e piscinas, do amor de rapariga, de gente que pega e não se apega, do
doidão e da abestalhada? Cadê o sertão da motocicleta irregular, onde só quem tem placa são
as cisternas?Cadê o sertão da maionese e do iogurte, do colchão box e do desfrute, da novela
das nove e do BBB, do gordinho gostoso e do mercado religioso vendendo a salvação, em
suaves prestações e prostrações? Cadê o sertão do GPS, do Bolsa Família, do sobe e desce?
Cadê o sertão da parabólica e da Sky, dos sem terra, da academia e do suplemento, onde já
não existe mais jumento? Cadê o sertão do Minha Casa, Minha Vida, da dívida com ocartão,
com o banco, com o patrão, do empréstimo consignado do aposentado?Cadê o sertão do
babado, da luz elétrica, do supermercado, da roupa de grife, do partido irrigado, da
vinicultura, da contracultura e do boy chapado, piradão? Isto é sertão, sertões diversificados.
Tudo isso pode ser tema de literatura e de historiografia, desde que aposentemos o retirante,
a seca, o coronel, o beato e o cangaceiro, desde que aposentemos a nostalgia e prestemos
atenção em nossos dias. O sertão está globalizado, urbanizado, moderno, contemporâneo.
Vive-se no sertão os mesmos dramas existenciais de qualquer parte do mundo, embora, como
em todo lugar, nele convivammúltiplas temporalidades. Sem deixar de ter em cada um dos
espaços que o conforma suas singularidades, o sertão e o Nordeste podem ser objeto de um
tratamento estético e historiográfico que se coaduna com a contemporaneidade. Assim como
cantava o músico que nasceu na cidade bem aqui do lado, quando se tratar não apenas de
música, mas de literatura e historiografia: Chega de Saudade! ********
§§§§§§§
Esta história já aparece narrada no primeiro romance que tomou a seca e a retirada como temas, livro
publicado em 1879: PATROCÍNIO, José do. Os retirantes. São Paulo: Editora Três, 1973.
********
Referência a João Gilberto, nascido na cidade de Juazeiro, vizinha a cidade de Petrolina, e à canção
Chega de Saudade de autoria de Vinícius de Morais e Antônio Carlos Jobim, por ele gravada em disco Odeon,
de 1958.
34
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
INSCRIBIR EL SERTÓN EN EL MAPAMUNDI: DISCURSOS CIENTÍFICOS Y
FICCIONALES: OS SERTÕES DE EUCLIDES DA CUNHA, VEREDICTO EM
CANUDOS DE SÁNDOR MÁRAI Y LA GUERRA DEL FIN DEL MUNDO DE
MARIO VARGAS LLOSA ††††††††.
Prof. Dr. Horst Nitschack
Universidade do Chile
El título de este ensayo consta de tres partes, en las que se adelantan varias hipótesis: 1)
inscribir el Sertón en el mapamundi, 2) discursos científicos y ficcionales y 3) los nombres de
los autores: Euclides da Cunha (Os Sertões), Vargas Llosa (La guerra del fin del mundo) y
Sándor Márai (Veredicto em Canudos).
La primera parte del título (inscribir el Sertón en el mapamundi) se refiere a la relación entre
lo local y lo global, es decir, entre una región particular, con su historia, su gente y sus
manifestaciones culturales, y el mundo en su totalidad histórica y geográfica. El verbo
“inscribir” en el título omite el sujeto. ¿Quién inscribe? ¿Es el Sertón, son los sujetos
provenientes del Sertón los que se inscriben, o es el “mapamundi” el que inscribe el Sertón?
Obviamente se dan ambas direcciones: la región geográfica y cultural que por sus propias
fuerzas, cuyos propios sujetos se inscriben en el mapa del mundo, pero también, por otro
lado, los sujetos que desde su identificación con el mapa del mundo y desde una mirada
globalizante realizan esta inscripción, como es el caso de los científicos, investigadores o
también los viajeros.
Se trata de dos movimientos muy distintos, que tendrán como resultado representaciones
muy diversas también de lo local. Idealmente, deberían ser complementarias, pero sabemos
que existe una asimetría que, en el fondo, refleja la asimetría de los poderes involucrados en
el proceso: si las metrópolis representan lo global, lo universal, ellas definen lo que entra en
la historia y definen el mapa del mundo usando los conocimientos producidos a escala
regional y local. Los sujetos que habitan lo local, sin embargo, a pesar de su conocimiento
preciso y detallado de su mundo, son siempre dependientes de los medios, los conceptos y los
paradigmas provistos por las instituciones y entidades que operan en la escala global para
inscribirse en el mapamundi.
Existe entonces una fuerte interdependencia entre ambos: las metrópolis requieren de las
informaciones locales para diseñar su mapa y, por otro lado, lo local requiere de las
coordenadas que le ofrece la metrópolis para inscribirse.
La segunda parte del título se refiere a los dos discursos, el científico y el ficcional, que
pueden ser considerados como discursos privilegiados en este proceso de inscripción. No
obstante, al comparar ambos discursos se hace evidente que el discurso científico es
claramente dominado por las metrópolis y las ciencias que allí se han desarrollado. En el caso
del discurso ficcional, la “desventaja” de lo local no es tan evidente, a pesar de que los medios
de distribución internacional y –otro hecho de gran importancia– las lenguas
internacionalizadas (antiguamente el francés, hoy en día el inglés, con mucho menos
importancia el español) son las de las metrópolis. Pero incluso así: los discursos ficcionales
que incluyen narraciones orales son el medio privilegiado para la representación de lo local.
Si consideramos los discursos ficcionales en comparación con los científicos, se puede
constatar que estos discursos ficcionales permiten una cierta autonomía de lo local, una
expresión regida por sus propios criterios, que los discursos científicos excluyen.
La tercera parte de mi título son tres nombres, el primero brasileño, Euclides da Cunha, el
segundo de un autor de la literatura mundial, aunque no tan conocido en América Latina:
††††††††
Este trabajo es resultado las investigaciones en el contexto del proyecto FONDECYT 1120116: Rebeldes,
malandros, delincuentes y locos: resistencias, transgresiones y expectativas utópicas en la literatura brasileña
del siglo XX. Se incorporan partes de una versión revisada del artículo: Horst Nitschack: “Mario Vargas Llosa: ‘La
ficcionalización de la historia en La Guerra del Fin del Mundo’”. En: Revista Chilena de Literatura. N° 80, Nov.
2011, pp. 117-133.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Sándor Márai; y el tercero es el de uno de los autores latinoamericanos más destacados de la
literatura contemporánea, Mario Vargas Llosa. No hay duda de que el primero y el último son
dos nombres que han contribuido de forma decisiva a que el Sertón, con su historia y su
complejidad social y cultural, fuera inscrito en el mapamundi. Pero también la novela de
Sándor es una contribución importante: la inscripción del Sertón en una cultura y una lengua
donde esta región brasileña es poco conocida: el húngaro. Si Euclides da Cunha escribe desde
Rio de Janeiro, con un cierto conocimiento del Sertón –a pesar, como se sabe, de que no era
sertanejo– Vargas Llosa escribe desde fuera, aunque desde el mismo continente, desde una
cultura similar, mientras que Sándor Márai escribe desde muy lejos y desde una cultura
completamente distinta.
Para los tres, el tema de su escritura es uno de los eventos más dramáticos de la joven
República, la Guerra de Canudos. Sus motivaciones, sin embargo, son muy distintas, lo que
tiene que ver evidentemente con la perspectiva desde la cual observan esta Guerra,
consecuencia de su situación histórica y de sus convicciones políticas e ideológicas. Para
Euclides era importante encontrar no solo una explicación para este acontecimiento trágico,
apoyándose en una multiplicidad de discursos científicos, muchos provenientes de las
metrópolis, sino también mostrar que la Guerra de Canudos no era un evento local
cualquiera en lo profundo del Sertón nordestino, sino una tragedia de alcance nacional, en la
que el concepto mismo de civilización estaba en juego.
Sándor Márai vuelve sobre el tema casi setenta años más tarde, en condiciones muy distintas.
Escribe desde el exilio italiano, expulsado de Hungría alrededor de veinte años antes por la
política cultural del Partido Comunista, cuando este asumió el poder. Sándor Márai escribe,
como cuenta en el comentario a su novela, bajo la impresión de los eventos políticos de los
últimos años de la década de los sesenta.
Comenta Sándor Márai:“[…] a aventura selvagem de Canudos se repetiu meio século depois
em outras paragens – sim, de repente a anarquia ‘entrou na moda’ novamente. Em nações
civilizadas, nos guetos e nas universidades dos Estados Unidos, a seguir na Franca, na Itália e
em outros lugares, despertaram os sintomas da anarquia” (152).
Las luchas contra el apartheid en 1967 en los Estados Unidos, Mayo del 68 en Paris y las
Brigadas Rojas en la Italia de fines de los años sesenta, son movimientos políticos que Sándor
Márai asocia con Canudos. Canudos es para él el sueño, la utopía anarquista de libertad,
igualdad y fraternidad, un sueño anarquista –en su interpretación– que para algunos se
convierte en realidad, mientras que para otros es solo un peligroso fanatismo que debe ser
destruido por todos los medios.
Cerca de 15 años más tarde, Vargas Llosa retoma el caso de Canudos en un contexto bien
distinto: el interés y la intención de Euclides da Cunha de revelar las condiciones objetivas de
la tragedia brasileña se opone a la intención ficcional de Mario Vargas Llosa, con su interés,
en cambio, por las disposiciones subjetivas que hicieron posible esta barbarie
sadomasoquista. Es decir, con Euclides de un lado y Sándor Márai y Vargas Llosa del otro, se
oponen o entran en disputa dos tipos de escritura literaria: la referencial, que pretende
revelar la realidad objetiva, y la ficcional, que pretende reconstruir la dimensión subjetiva de
los acontecimientos objetivos e históricos. Esta última toma el mundo objetivo, con sus
acontecimientos históricos, como material de base para la construcción de un mundo
subjetivo, y se atreve a realizar interpretaciones que no se justifican con respecto a esa
realidad objetiva, sino con el propósito de influenciar –o formar– el imaginario de los
lectores. Un objetivo que el autor húngaro y el peruano persiguen con intenciones muy
diferentes.
‡‡‡‡‡‡‡‡
La novela Veredicto em Canudos fue traducida al portugués en 2002. Sin embargo, fue originalmente
escrita en 1969 y publicada en 1970, más de diez años antes de La guerra del fin del mundo, de Vargas Llosa.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
celebrar su éxito definitivo. El narrador ficticio de la novela, ya con setenta años, es el
veterano del ejército brasileño, cabo Oliver O’Conel, que se propone narrar los hechos
ocurridos entre las cinco de la tarde y las nueve de la noche del día del fin oficial de la Guerra
de Canudos. Para el lector no hay duda de que el narrador y la historia que va a contar son
una invención del autor, Sándor Márai, con la intención de enriquecer o profundizar el
ensayo de Euclides da Cunha. En palabras de Sándor Márai:
Um dia comecei a escrever sobre o que acreditava ter ficado “de fora” do livro de
Euclides da Cunha –ficara de fora, mas ‘poderia ter sido assim’. (...) Da obra de
Euclides da Cunha não emprestei mais que os dados topográficos e as datas. E os
nomes de alguns personagens. Todo o resto é invenção (151-152).
§§§§§§§§En la tradición filosófica alemana se hace desde Kant la diferencia entre “cultura” (Kultur) que incluye
valorizaciones éticas y “civilización” (Zivilisation), que se define principalmente para la dominación de técnicas
tanto en las relaciones inter-humanas como en la relación entre el hombre y la naturaleza.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A maior parte dos sobreviventes, a nós enviados do covil de Canudos pelos
combatentes que morriam de fome e sede, eram biologicamente do sexo femenino.
Havia também crianças e anciãos... Mas a maioria eram mulheres: seres repugnantes,
bruxas da mata, megeras de cabeleiras brancas, emaranhadas, que como animais
selvagens olhavam em redor e apertavam contra o peito murcho os lactentes, vermes
humanos prematuros que lembravam embriões. Entre eles havia algumas –mestiças,
mulatas ou resultados de cruzamento de índio com portugués– que mesmo na
matilha dos perseguidos que abandonavam Canudos caminhavam de queixo erguido.
Postura ereta, como a retaguarda de uma tropa rebelde derrotada que não implorava
clemência nem se entregava, apenas desfilava diante dos soldados –passavam caladas
de uma luta fracassada, sem sentido, a uma morte sem porquê. Meia hora antes
aquela mulher também chegara assim (97).
Incluso si estamos conscientes de que quien habla en este pasaje es el narrador, no el autor,
quien inventa ese narrador es el autor. En el texto no encontramos ninguna señal de ironía,
ningún indicio de que el autor se distancie del narrador. Cierto, el lector puede albergar
dudas respecto a la capacidad del narrador para recordar con tanto detalle la escena, a 50
años del evento. Surge la sospecha de que todo no sea más que una fantasía del narrador,
fantasía de un hombre viejo que construye en su memoria una escena tan particular, de la
que él es el único testigo sobreviviente. Pero en este caso, si trasladamos el acto de
ficcionalizar solo del autor al narrador nuestra pregunta permanece: ¿cuál es el motivo de
esta ficcionalización, de la invención de esta escena y de esta mujer? El narrador nos presenta
como verdadero lo que autor nos presenta como ficción.
Entre los seres deshumanizados de Canudos había algunos excepcionales, que no eran como
los otros: no eran brujas, arpías completamente deshumanizadas. A pesar de todo,
preservaban su dignidad. Una dignidad, según veo, como es descrito en el caso de la
prisionera inglesa, de un núcleo profundamente humano que ellas tenían la fuerza y la
voluntad de preservar. El narrador no nos da ninguna pista de por qué en algunos este
núcleo, la humanidad pura, no fue destruido. Por única respuesta tenemos: o por casualidad,
por coincidencia, o por la fuerza de su propia voluntad *********. Una voluntad que, el narrador
lo enfatiza, no tiene nada que ver con la raza –al contrario, menciona explícitamente a las
mujeres mulatas y mestizas. Es la aparición de ese núcleo, de esa sustancia, la que provoca la
metamorfosis a la que todos los presentes asisten.
También en su novela Mario Vargas Llosa sitúa un evento completamente ficcional en el
centro de la hecatombe de Canudos, en este caso el encuentro amoroso entre una mujer del
Sertón, Jurema, y un periodista de Rio de Janeiro. Pero, como veremos, su significación es
profundamente distinta. Contra la utopía fundamentalista de los fanáticos, Veredicto em
Canudos deja aparecer otra utopía, la utopía de lo auténticamente humano, cuyos sujetos son
individuos, no la colectividad. En este encuentro entre la mujer y el Ministro de Guerra se
escenifica un sueño utópico en que lo profundamente humano puede producirse en cualquier
momento y lugar, que en cualquier momento esta metamorfosis sería posible.
El deseo de la mujer de tomar un baño y el acto de bañarse hace desaparecer por momentos
toda la barbarie de esta guerra y provoca la metamorfosis que, en seguida, continúa en una
larga conversación entre la mujer y el Mariscal y Ministro de Guerra Bittencourt, en la que
ambos se respetan mutuamente como representantes de la humanidad. Una conversación –
otra manifestación de esta utopía– en la que las relaciones de poder desaparecen, aunque no
desaparecen las posiciones y convicciones opuestas entre la mujer y Bittencourt. Ella no
desistirá de su creencia de que en Canudos, bajo la bandera de lo humano, se realizó una
verdadera convivencia, destruida ahora por las fuerzas armadas de una República ansiosa de
imponerse, a fin de eliminar todo lo que era diferente.
La escena cambia abruptamente de nuevo cuando, de repente, se escucha el toque de la
campaña de los rebeldes de Canudos. El sonido le recuerda la guerra a Bittencourt,
transformándolo de nuevo en Mariscal y Ministro de Guerra, que dará ahora las órdenes para
el ataque final y la destrucción completa de la comunidad: “É possível que em Canudos
tenham sobrado alguns barbudos. Não precisamos de homens barbudos [...] Duas
companhias da 9ª brigada vão ficar. De manha a guarda varrerá o terreno [...] Não
precisamos de prisioneiros” (144).
*********
Lo que recuerda la famosa frase de Hemingway en The old man and the sea: “A man can be destroyed, but
he can’t be defeated”.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Contra la orden del Mariscal que garantizó el retorno de la mujer y sus dos compañeros a
Canudos –claramente, solo para matarlos al otro día– los guardias quieren obligarlos a
saludar a la República con los gritos: Libertad, Igualdad, Fraternidad. Los tres se rehúsan con
vehemencia y pagan este acto con la muerte.
Mario Vargas Llosa escribe La Guerra del Fin del Mundo desde un contexto político e
histórico bien diferente. Es sabido que su biografía está marcada por una ruptura ideológica
en los inicios de los años setenta. El socialista convencido se transforma en un liberal y
después en un neoliberal militante. Esta ruptura ideológica, sin embargo, también puede ser
interpretada desde otra perspectiva, como continuación y como defensa de una misma idea
con medios diferentes, en el sentido de que sólo quien cambia sigue fiel a sí mismo. La idea y
la convicción fundamental de Vargas Llosa sería, vista desde esta perspectiva, la de la
necesidad de la modernización de América Latina. Hasta el inicio de los años setenta la
ideología y los métodos económicos y científicos del socialismo se presentaron como una
opción que podía competir con el proyecto capitalista de modernización. Sin embargo, a
partir de esta época las deficiencias económicas y políticas del socialismo real se vuelven cada
vez más evidentes †††††††††. En este sentido, el famoso ‘caso Padilla’ parece un pretexto
apropiado para el cambio político de Vargas Llosa hacia la ideología de un capitalismo
liberal ‡‡‡‡‡‡‡‡‡. La razón más profunda es el hecho de que cada vez se hace más obvio que el
sistema capitalista ofrece mejores condiciones que el sistema socialista para la modernización
necesaria de las sociedades latinoamericanas. Sin dudas, este cambio ideológico tiene
consecuencias en la poética de Mario Vargas Llosa. Si echamos una mirada a sus
publicaciones literarias se muestra claramente lo siguiente: las tres grandes novelas totales,
es decir, las novelas que pretenden presentar una visión total de la sociedad peruana (La
ciudad y los perros (1963), La Casa verde, (1966) y Conversación en la Catedral (1969))
fueron escritas antes de 1971. Las novelas de los años setenta Pantaleón y las visitadoras
(1973) y La tía Julia y el escribidor (1977) frustraron a muchos lectores de la época que
esperaron de Vargas Llosa la continuación de su realismo totalizante. En La guerra del fin
del mundo, de 1981, el escritor peruano aparentemente presenta de nuevo una novela
realista, totalizante. Sin embargo, esta vez no faltan críticos que le reprochan la insuficiencia
de su realismo que “se muestra incapaz de aprehender racionalmente la realidad
extraliteraria y representarla” (Schlickers 186).
Pero, ¿y si mostrar una realidad extraliteraria, en este caso la realidad de la Guerra de
Canudos, tema del gran libro de Euclides da Cunha, no fuera el objetivo primordial de Vargas
Llosa en esta novela? ¿Y si el compromiso con el lector no fuera un compromiso referencial,
es decir, representar la realidad factual, sino un compromiso ficcional, es decir, referirse e
influenciar el imaginario del lector?
Una reorientación estética como ésta correspondería completamente a la reorientación
política de Vargas Llosa: la mudanza desde una convicción socialista a una convicción
(neo)liberal implica estéticamente la reevaluación de lo individual y de la subjetividad con
respecto a lo social, la que supone, al menos, una independencia relativa del mundo de las
ideas con respecto al mundo social e histórico, y la posibilidad del primero de influenciar al
segundo. En otras palabras, y contra Marx y su tesis sobre Feuerbach: cambiar el mundo a
través de su interpretación ejerciendo un impacto sobre el imaginario de los lectores §§§§§§§§§.
††††††††† El espectáculo simbólico en esta contienda entre los dos sistemas, es decir, de la competencia entre la
URSS y los Estados Unidos, fue la corrida por la conquista del espacio que terminó en 1969 con el alunizaje y el
triunfo estadounidense.
‡‡‡‡‡‡‡‡‡ El “Caso Padilla”: “El poeta Heberto Padilla había criticado en 1971 en su libro Fuera del juego el devenir
de la Cuba postrevolucionaria. Tras su detención se sometió a una autocrítica pública, en la que se inculpó a sí
mismo de actividades contrarrevolucionarias para obtener la liberación. Este caso fue el disparador de que una
gran parte de los escritores latinoamericanos, para los cuales la Cuba socialista era hasta poco antes una
esperanza histórica, se distanciaran de ella.” (Nitschack, Mario Vargas Llosa: Potencia e impotencia de la ficción
491).
§§§§§§§§§ La referencia filosófica para esta reorientación ideológica de Vargas Llosa era Karl Popper y su obra La
sociedad abierta y sus enemigos (primera edición en inglés en 1945). El autor peruano descubrió este filósofo a
finales de los años setenta, “luego de haber perdido el entusiasmo por la utopía revolucionaria”y cuando
comenzaba “una revalorización de la cultura democrática”(Vargas Llosa, Mi deuda con Karl Popper 224).
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Pues, si aceptamos La Guerra del fin del mundo como un texto ficcional, entonces debemos
asumir también que los elementos históricos y sociales que sirven como material narrativo de
la novela no están en función de una reivindicación de la referencialidad, como en el caso de
Os Sertões de Euclides da Cunha, sino que su intención es la de influenciar al lector al nivel
de su imaginario y de sus conceptos ideológicos.
Para Vargas Llosa, Canudos no es un evento singular, sino un fenómeno que puede surgir en
cualquier parte. No es solamente, como en el texto de Euclides da Cunha, una región en el
Brasil donde se decide el destino de la joven República, tampoco solamente una guerra
contra un fanático religioso, Antônio Conselheiro, y sus seguidores milenaristas. La
apropiación del texto de Euclides da Cunha ********** en La guerra del fin del mundo convierte
a Canudos en materia prima de una novela de la literatura universal (Weltliteratur). Por
medio de la ficcionalidad, Vargas Llosa consigue transformar Canudos en un lugar como lo es
Macondo, de Cien Años de Soledad (Gabriel García Márquez) o Comala, de Pedro Páramo
(Juan Rulfo) donde el lugar no pierde su sustrato geográfico e histórico, a pesar de que el
interés principal del autor no es el de representar ese sitio geográfico, sino tomarlo como
espacio de acción para una narración que trata de la condición humana. En consecuencia, el
interés que se despierta en el lector no es histórico, sino que radica en la fascinación por la
propia narración que presenta ejemplos (ficticios) de esta ‘condición humana’. Canudos,
pues, se transforma de esta manera en un paradigmático lugar latinoamericano, en un
espacio donde los valores éticos de la modernidad están puestos en cuestión †††††††††† tanto por
un movimiento popular herético y retrógrado como por un Estado que abusa de su poder y su
aparato técnico más moderno (el ejército) ‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡.
La novela logra esta ‘universalización’, resultado de la ficcionalización del material entregado
por Euclides da Cunha, esencialmente mediante las siguientes operaciones literarias:
1. La introducción de personajes ficcionales (el anarquista Galileo Gall, el periodista
miope, el guía Rufino, su esposa Jurema, el enano y el grupo del circo y el Barón de
Cañabrava§§§§§§§§§§, principalmente) y la interacción entre estos personajes ficcionales
y los personajes históricos ficcionalizados *********** (Antônio Conselheiro, Moreira
César, comandante de la tercera campaña contra Canudos, General Arturo Guimarães
comandante de la cuarta campaña, Carlos Machado de Bittencourt, Ministro de
Guerra en estos años, quien organizó personalmente la última campaña). De esta
combinación de personajes históricos ficcionalizados y personajes ficcionales resulta
un multiperspectivismo narrativo que permite la descripción de los eventos históricos
desde posiciones políticas e ideológicas contrarias: no solamente el contraste entre el
fanatismo milenarista de Antônio Conselheiro y sus seguidores por un lado y la
misión civilizadora del gobierno representado por los generales y el ministro de
guerra por otro, sino también la visión anarquista de Galileo Gall, la observación
distanciada e imparcial del ‘periodista miope’, las reflexiones basadas en un canon
valórico conservador-ilustrado del Barón de Cañabrava. Debido a este panorama
diversificado de personajes y posiciones ideológicas, el narrador parece dejar al lector
la tarea de formar su propia opinión y realizar un juicio personal de los
acontecimientos, sirviéndose de una razón que tiene valor universal. La
responsabilidad individual del juicio y de la acción que –según el narrador– en el
fondo tienen que asumir todos los personajes de la novela, se repite así también al
nivel del lector. No hay duda de que la posibilidad de asumir tal responsabilidad
********** No se trata únicamente de este texto, pero es el intertexto principal. Ver el estudio de Leopoldo Bernucci,
donde se analiza en detalles cuales son los intertextos de Vargas Llosa
†††††††††† Con respecto a esta problemática existen paralelos significativos entre Civilización y Barbarie de
administrador seco, sin entusiasmo militar y sin sentido de heroísmo, el Mariscal y Ministro de Guerra Carlos
Machado de Bittencourt.
§§§§§§§§§§ Esta figura fue obviamente inspirada por el Barão de Jeremoabo, el hacendado más poderoso del
nordeste de Brasil en las últimas décadas del siglo XIX. Pero como en el caso del ‘periodista miope’ (que se
queda sin nombre en toda la novela) y que algunos críticos proponen identificar con el propio Euclides da Cunha,
predomina claramente la parte ficcional sobre la referencial.
*********** Llamamos figuras ‘ficcionalizadas’ a aquellas que tienen su modelo en personajes reales, históricos, y
†††††††††††
Henry Maudsley (1835-1918): psiquiatra inglés que desarrolla una teoría sobre las relaciones entre la
locura y el crimen.
‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡
Mario Vargas Llosa habla en varias oportunidades de “la verdad de la mentira” (Vargas Llosa, La
verdad de las mentiras) (Nitschack, Mario Vargas Llosa: Potencia e impotencia de la ficción).
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
potencialidad no radica en la representación de la Historia, cuyo final está determinado y es
conocido (por ejemplo la hecatombe de Canudos), sino en su interpretación, sirviéndose de
historias inventadas (en el caso de La guerra del fin del mundo, los personajes ficcionales y
la historia de amor entre Jurema y el periodista, en Veredicto en Canudos, el diálogo entre el
ministro de Guerra Bittencourt y la extranjera desconocida) dándole un aspecto plástico y
concreto. Si el ‘engaño’ del discurso referencial consiste en su promesa de hacer desaparecer
la brecha entre discurso y ‘realidad’, el discurso ficcional realista asume esta brecha, la supera
con la ficción y juega con el ‘engaño’, entregando la responsabilidad al propio lector, si está
dispuesto a tomar la narración como ‘realidad’ y, con ello, como verdad.
En el caso de Sándor Márai, el escenario de Canudos, que debe completamente a Euclides, le
sirve para narrar una historia que le permite tratar la disposición al fanatismo en el ser
humano más civilizado, así como de su convicción utópica de un deseo humano profundo
presente, si no en todos, por lo menos en algunos. La ficcionalización de Vargas Llosa, a su
vez, es el intento de conseguir lo que el propio autor brasileño tenía que admitir que le era
imposible lograr: dar una explicación de cómo esta erupción de la violencia, tanto del lado de
la población del Sertón como del lado de las tropas oficiales, había sido posible. Los dos
autores ficcionalizan la Guerra de Canudos con convicciones valóricas e ideológicas bien
distintas. En su novela, Sándor Márai se muestra convencido de que hombres y mujeres
como representantes de una humanidad auténtica e indestructible se encuentran en todas
partes, entre todos los seres humanos, incluso en el fin del mundo. Este núcleo, esta
substancia, podría ser la base de una verdadera civilización, que no tendría que ser
forzosamente la civilización descrita y criticada por Euclides, civilización que fatalmente se
transforma en barbarie y que es meramente un arma más sofisticada de control y
disciplinamiento.
No hay duda de que la posición de Sándor Márai también debe ser descrita como
conservadora –“burguesa reaccionaria”, como le habían calificado el Partido Socialista y los
críticos literarios de su propio país (incluyendo a Georg Lukács) a fines de los años 40;
motivo para remover sus novelas del canon literario húngaro y para su exilio. Sin embargo, se
notan diferencias fundamentales entre su tendencia ideológica y valórica y la de M. Vargas
Llosa, comenzando por el hecho de que una posición liberal bajo un régimen estalinista (la
Hungría de la época) tiene una significación distinta en una época marcada por el
neoliberalismo, durante la década de los 80.
La guerra del fin del mundo tampoco termina con la sola hecatombe de Canudos; en medio
de la catástrofe Vargas Llosa narra la historia de amor entre el ‘periodista miope’ y Jurema.
No obstante, a diferencia de la escena de Sándor Márai en la tienda de campaña de
Bittencourt frente al Canudos destruido, en el acto de amor en un Canudos bajo el fuego de
los fusiles y el bombardeo de los cañones de las tropas republicanas, Vargas Llosa inventa
una pareja cuyo amor hace desaparecer las diferencias, mientras que en el interrogatorio de
la mujer de Sándor Márai las diferencias entre la mujer y el Ministro Bittencourt se
mantienen. La conversación entre sujetos “civilizados” de Veredicto contrasta con la unidad
erótica en La guerra del fin del mundo. Mientras la novela del autor húngaro termina con
una referencia cínica al “outro mundo (no el del Sertón y de Canudos, HN), belo, onde havia
liberdade, igualdade e fraternidade” (Márai 149), las últimas frases de la novela de Mario
Vargas Llosa son las palabras de una viejita, sobreviviente de Canudos, que insiste en que
João Abade, uno de los yagunços más terribles, no ha muerto, sino que los ángeles lo llevaron
al cielo: “Yo los vi” (Vargas Llosa, La guerradel fin del mundo 531). Sándor Márai trata de las
locuras y las contradicciones que produce el mundo civilizado y que ponen esta civilización
en peligro; Mario Vargas Llosa focaliza las locuras de los fanáticos dogmáticos de Canudos.
La guerra del fin del mundo de Mario Vargas Llosa enriquece Os Sertões con figuras de
ficción y, al final, con un acto de amor en que, como en el caso de Veredicto, puede
interpretarse que lo humano aún es posible, incluso en las condiciones más terribles. No
obstante, para Mario Vargas Llosa, Canudos es el lugar del fanatismo puro, que tiene su
origen en las biografías individuales y en la intervención de un Estado que, bajo la amenaza
que representan para él los pocos fanáticos, se convierte en una máquina de guerra con
características totalitarias. El fundamentalismo ideológico, como aparece en los seguidores
del Conselheiro, y el Estado autoritario, tales son las amenazas que Vargas Llosa detecta para
la América Latina en la década de los 80. Ambos son criticados en su novela –tomando
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Canudos como ejemplo y escenario. En comparación, la novela de Sándor Márai parece
menos política, aunque también haya sido inspirada por movimientos y conflictos políticos al
momento de su redacción. En la figura de la mujer (y de su marido, que no consideramos en
estas reflexiones) Márai tematiza la fascinación que un movimiento anárquico como el de
Canudos puede provocar en individuos bien instalados en la ‘Civilización’ –y no solo para los
subalternos y marginalizados. El narrador (y con él, el autor) respeta la convicción subjetiva
de la mujer de que Canudos era el lugar de lo ‘otro’, de una alternativa a la civilización, y
admite para el Mariscal Bittencourt la posibilidad de una ‘metamorfosis’ en que él está
dispuesto a una conversación auténtica con la mujer. Pero al mismo tiempo la novela no deja
dudas de que, en las condiciones de la realidad concreta (las campanadas le recuerdan al
Ministro esta realidad) esa metamorfosis, que hizo posible un diálogo entre iguales, no puede
ser sostenida.
En La guerra del fin del mundo Vargas Llosa integra a Canudos al imaginario occidental.
Canudos, este lugar ‘al fin del mundo’ ofrece el escenario para representar una de las grandes
amenazas del mundo civilizado moderno: la erupción de la violencia irracional y la recaída en
la barbarie, consecuencia –en la interpretación propuesta en esta novela– del entusiasmo
fanático provocado por un fundamentalismo religioso de un lado y político del otro. Esta
confrontación entre un fundamentalismo religioso y un Estado que con los medios técnicos
más avanzados se impone implacablemente, es el escenario que hacia el final del siglo XX y al
inicio del siglo XXI se ha convertido en una amenaza a escala global. “Guerra del fin del
mundo”, no obstante, también en el sentido de un milenarismo apocalíptico: la idea del ‘fin
del mundo’ como la fuente de un dogmatismo absurdo y altamente destructivo que encuentra
su razón de ser en una disposición del inconsciente humano, que Freud identificó como
‘pulsión de muerte’ (ver Freud: Más allá del principio de placer, 1920) –otro ‘leitmotiv’ de la
novela. Contrastan en las escenas en Canudos la disposición a la muerte de los fanáticos,
motivada por su vida en otro mundo mejor con el deseo de sobrevivir y el amor de Jurema y
del periodista miope.
Euclides da Cunha escribió Os Sertões –desde la perspectiva de los vencedores, claro está,
aunque con mucha simpatía por los vencidos– como la comprobación de sus convicciones
positivistas y de su teoría racial: para la formación de una futura gran nación brasileña se
necesita una raza homogénea formada de las tres razas principales que constituyen su
población: los indígenas, los negros y los blancos. Esta nueva raza, una raza de ‘titanes’, se
formó en el Sertón. Su valentía, su valor, su resistencia se demostró en la guerra de Canudos:
“Ademais entalhava-se o cerne de uma nacionalidade. Atacava-se a fundo a rocha viva da
nossa raça” (Cunha 766). La novela de Sándor Marai Veredicto em Canudos usa el escenario
nefasto del último día de Canudos para insistir en el potencial utópico de la humanidad, la
posibilidad de una metamorfosis que se produce en la situación más improbable, sin dejar
ninguna duda en el potencial destructor de la civilización. Vargas Llosa transforma Os
Sertões en una novela ficcional que alerta al lector de los peligros del dogmatismo político y
religioso, fuente de un fanatismo destructor y de la disposición a la violencia más bárbara.
Con estas reescrituras, las apropiaciones y transformaciones ficcionales los dos autores –
como hemos sostenido al inicio– entran en un diálogo con acontecimientos históricos y con
las discusiones ideológicas y valóricas de su propio tiempo. Sándor Márai buscando una
posibilidad de no renunciar – a pesar de todo– a la emergencia de las fuerzas de lo
humanitario en el ser humano y Mario Vargas Llosa con una ardua advertencia contra
cualquier tipo de fundamentalismo.
REFERÊNCIAS
CUNHA, Euclides da.Os Sertões. Editado por Leopoldo M. Bernucci. São Paulo: Ateliê editorial, 2001.
BERNUCCI, Leopoldo, M. Historia de un Malentendido. Un Estudio Transtextual de La Guerra del Fin del
Mundo de Mario Vargas Llosa. New York, Bern, Franfurt am Main, París: Peter Lang, 1989.
MARAI, Sándor. Verdicto em Canudos. Traducción del húngaro por Paulo Schiller. São Paulo: Companhia das
Letras, 2002.
NITSCHACK, Horst. “Mario Vargas Llosa: Potencia e impotencia de la ficción frente a la realidad”. Texto social.
Estudios pragmáticos sobre literatura y cine. Eds. Paatz Annette y Pohl Burkhard. Berlín: Edition tranvia, Verlag
Walter Frey, 2003. 489-501.
________________. “Mario Vargas Llosa: La ficcionalización de la historia en ‘La Guerra del Fin del Mundo’”.
En: Revista Chilena de Literatura. N° 80, Nov. 2011, pp 117-133.
45
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
SCHLICKERS, Sabine. “Conversación en la Catedral y La Guerra del Fin del Mundo de Mario Vargas Llosa:
Novela totalizadora y novela total”. Revista de Crítica literaria latinoamericana, 48 (1998): 185-211.
VARGAS LLOSA, Mario. La guerra del fin del mundo. Barcelona: Ed. Seix Barral, 1981.
___________________. "Mi deuda con Karl Popper". Encuentro con Popper. Madrid: Alianza,
1993.
46
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A LEITURA, O LETRAMENTO E A FORMAÇÃO DO PROFESSOR
Profª. Drª. Angela B. Kleiman
Unicamp
O meu objetivo, nesta palestra, é discutir a leitura, problematizando seu ensino na escola a
partir da perspectiva dos estudos de letramento — que advogam que a formação do
alfabetizador e do professor de língua portuguesa não pode estar baseada em uma concepção
sobre o uso da língua escrita que não leve em conta fatores sociais — e da concepção dialógica
da linguagem do Círculo de Bakhtin, que defende que quando há compreensão da linguagem
há simultaneamente uma atitude responsiva ativa à expressividade do enunciado,
envolvendo réplica com apreciação valorativa (BAKHTIN, 1979).
Levar em conta aspectos sociais da situação implica levar em conta, entre outros, fatores
situacionais. E, em uma perspectiva situacional, uma atitude responsiva envolve responder a
aspectos da situação imediata com base em outras situações já vivenciadas. Em outras
palavras, estabelecer comparações. O ensino de leitura, nessa perspectiva, consiste em
ensinar o aluno a fazer uma comparação avaliativa, portanto, crítica. Toda definição de
leitura crítica inclui uma valoração: o leitor compara e avalia objetivos, metas, imparcialidade
(aliás, efeito de imparcialidade) veracidade (aliás, verossimilhança) e modos de tratar um
determinado assunto expressos no texto (cf. SMITH, 1968). A essa atitude do leitor diante do
texto lido dá-se o nome de apreciação valorativa.
Essa apreciação valorativa da palavra — “uma atitude subjetiva e avaliadora do ponto de vista
emocional do falante com respeito ao conteúdo semântico de seu próprio enunciado”
(BAKHTIN, 1979, p. 289), parte inextricável da compreensão do enunciado — é realizada
segundo parâmetros da comunidade à qual o leitor pertence e na qual o texto circula:
científica, religiosa, literária, por exemplo. No caso do aluno, particularmente daquele que
está começando seu percurso escolar, os parâmetros são fornecidos pelos textos da vida
cotidiana. A todo momento, em toda situação e em relação a todo texto. À medida que o
aluno avança na escola, esses parâmetros serão fornecidos por outros textos escritos e, à
medida que ele aprende os controles que a comunidade que produziu o texto exerce sobre
este, a leitura será crítica desde que esses parâmetros sejam levados em conta.
Contrasta essa perspectiva com a dos Parâmetros Nacionais Curriculares (PCN), documento
que até este ano (2014) forneceu orientações e rumos a currículos, materiais didáticos,
formação do professor. Os PCN afirmam a importância do ensino da leitura crítica, ao
afirmar que a escola deve ensinar um “conjunto de práticas planejadas com o propósito de
contribuir para que os alunos se apropriem dos conteúdos de maneira crítica e construtiva”
(BRASIL, 1997, p.34). Também no documento publicado um ano mais tarde, afirma-se que
um dos objetivos da leitura consiste em tornar o aluno capaz de “desenvolver a capacidade de
avaliação do texto para ‘posicionar-se criticamente diante dele’ ” (BRASIL, 1998, p. 95).
Entretanto, ao considerar os objetos a serem usados, o documento faz uma distinção entre
textos que promovem a reflexão e textos supostamente mais pragmáticos que promoveriam a
ação não reflexiva. Embora reconheça a importância dos textos “que respondem a exigências
práticas da vida diária”, ocupa lugar privilegiado no referido documento outro tipo de textos,
aqueles “que favorecem a reflexão crítica e imaginativa, o exercício de formas de pensamento
mais elaboradas e abstratas /...../ os mais vitais para a plena participação numa sociedade
letrada” (BRASIL, 1997, p. 26).
A classificação de textos em pelo menos duas categorias, aqueles que “favorecem a reflexão
crítica e imaginativa” e aqueles que não o fazem vai de encontro às concepções acima
discutidas, relativas à linguagem e ao letramento. Se a situação assim o exige, todo e qualquer
texto pode favorecer a reflexão crítica e imaginativa: um manual para montar uma mesa que
deixa de fora uma instrução crucial para o sucesso da empreitada pode ser objeto de uma
avaliação emocionalmente carregada — raiva ao perceber o erro do fabricante — e de uma
resposta crítica e imaginativa — a procura de uma solução para poder usar o móvel
comprado.
A disposição natural da criança, de questionar o mundo ao seu redor, merece fomento na
escola. O envolvimento da criança com a palavra do outro deve ir além do engajamento
cognitivo, aspecto geralmente testado em provas e provinhas padronizadas. O engajamento
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
emocional deve ser encorajado: aluno triste, alegre, surpreso, indignado, indiferente revela
engajamento emocional próprio de uma compreensão crítica, porque valorativa. E tal atitude,
como afirmado em trabalho anterior (KLEIMAN, 2006), pode ser desenvolvida desde os
primeiros momentos na escola, de modo contínuo, com todo e qualquer texto, pois não é o
texto, mas a situação, que determina as possibilidades de desenvolvimento de uma atitude
crítica. Como defendido no trabalho anterior, a introdução tardia de perguntas e atividades
para o desenvolvimento do leitor crítico, na espera de ele ter a capacidade ou maturidade
para ler textos de esferas mais elaboradas, sobre assuntos mais abstratos, pode impedir esse
desenvolvimento, porque nunca requisitado.
O pressuposto da existência de textos cuja forma ou assunto favoreceria o desenvolvimento
do leitor crítico, a despeito de outros que não teriam essa característica, está baseado em uma
ideologia sobre a língua escrita também questionada pelos estudos de letramento e por
historiadores da leitura. Trata-se de uma ideologia que sacraliza o livro e o investe com
grande poder desde suas origens mágicas:
Da mesma forma, em toda a cristandade, o livro de magia se encontrou investido
dessa carga de sacralidade, que dá saber e poder a quem o lê, mas, ao mesmo tempo,
dele se apodera. Tal captura foi enunciada em duas linguagens: primeiro, a da
possessão diabólica, depois, a da loucura provocada pelo excesso de leitura. O perigo
do livro de magia não demora a se estender a todo livro e toda leitura, qualquer que
seja, na medida em que ler absorve o leitor, afasta-o dos outros, enclausura-o num
mundo de quimeras (CHARTIER, 2010, p. 24).
É com esses poderes mágicos, voltados para o bem, que o livro passa a ocupar destaque no
imaginário brasileiro. A publicidade da Fig. 1, a seguir, baseia-se no poder simbólico
atribuído ao livro (ele é do bem, como as asas reminiscentes de asas angelicais e a simbólica
cor branca das vestes sugerem) e no valor que ele adquire em praticamente todas as camadas
sociais.
Imagens como essa se repetem ao longo da história, como mostram as representações nas
Figuras 2 e 3, a seguir: retratos de pessoas sensíveis, capazes de reflexão, ensimesmadas,
desligadas das preocupações do mundo, voltadas para pensamentos, orações §§§§§§§§§§§ e
sentimentos íntimos, porém necessariamente bons.
Fig. 2. Pierre Subleyras (1699-1749) Fig. 3. David Alison (1882-1955)
Retrato de homem (prov. Giuseppe Mulher lendo perto da janela.
Baretti). Museu do Louvre The Fleming Collection
§§§§§§§§§§§
A tela Retrato de homem evoca uma leitura religiosa do homem retratado, que parece estar ajoelhado
lendo a Bíblia, ou outro livro sagrado, com a mão direita posicionada para fazer o sinal da cruz.
48
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Essas imagens reproduzem, em outra linguagem, frases,ideias e ‘mensagens’ sobre o livro e
sobre a leitura que afirmam os benefícios do livro ao longo da história: na antiguidade, por
exemplo, o sentimento é reproduzido na frase de Sêneca (4 a.C. – 65 d.C.) O lazer sem as
belas-letras ************é como a morte e a sepultura do homem vivo ††††††††††††; na modernidade,
nas citações de Joseph Addison (1672-1719), Os livros são heranças de gênios para a
humanidade, passadas de geração em geração como presentes para a posteridade de
aqueles que ainda não nasceram, ou de Voltaire (1694-1778), na sua conhecida frase A
informação que encontramos nos livros é como o fogo. Nós trazemos dos nossos vizinhos,
acendemos no lar, passamos para outros e ele se torna propriedade de todos ‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡; na
contemporaneidade, quando, por exemplo, Ítalo Calvino (1923-1985) declara que Um
clássico é um livro que nunca terminou de dizer aquilo que tinha para dizer §§§§§§§§§§§§.
Quando a leitura do brasileiro é investigada em pesquisas quantitativas, em geral avalia-se
somente a leitura do livro, não de jornais, avisos, cartas, panfletos, folhetos, manuais ou
quadrinhos. Segundo o documento do Programa Nacional do Livro e Leitura (PNLL), uma
política pública instituída em 2006, voltada para fomentar a leitura de livros no Brasil, a
pesquisa Retratos da Leitura no Brasil ************* revela índices muito baixos — críticos
segundo o documento — em relação ao número médio de livros por ano lidos pelobrasileiro:
apenas 1,8 livro por ano versus, por exemplo, 7,0 livros por ano da França. De acordo com a
avaliação no referido documento sobre a pesquisa feita em 2001 †††††††††††††, a pesquisa é “ainda
precária e insuficiente, mas a maior investigação já feita no Brasil sobre leitura fora de uma
perspectiva prioritariamente ‘escolar’ ” (BRASIL, 2006, p. 18).
Os estudos de letramento problematizam a determinação do perfil de leitura do brasileiro
sobre a base de apenas um objeto de leitura, que é caro e inacessível para uma grande
maioria de brasileiros que vive em regiões remotas do país. O próprio documento do PNLL já
referido aponta a escassa penetração do livro e o acesso restrito a esse bem cultural quando
afirma que: “o mercado comprador de livros [concentra-se] nas mãos de 20% da população
alfabetizada com 14 anos ou mais, na Região Sudeste, nas grandes cidades e metrópoles, nos
estratos de renda mais elevada (classe A) e com instrução superior” (BRASIL, 2006, p. 18).
Os estudos do letramento focalizam a prática social de leitura, que, dependendo da situação,
dos objetivos dos participantes, da instituição que determina as formas de aceder ao texto
************
Uma variante comum desta frase é: O lazer sem livros é como a morte e a sepultura do homem vivo.
††††††††††††
Esta e as demais frases ou “mensagens” citadas foram consultadas em abril de 2014 no site
https://www.goodreads.com/author/quotes/4918776
‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡
Em Lettres philosophiques.
§§§§§§§§§§§§
Em Por que ler os clássicos.
*************
Realizada por um consórcio de associações, comoCâmara Brasileira do Livro (CBL), Sindicato
Nacional dos Editores de Livros (Snel) e Associação Brasileira dos Editores de Livros (Abrelivros).
†††††††††††††
A pesquisa já teve uma terceira edição, em março de 2012. Resultados podem ser consultados no
site http://www.prolivro.org.br/ipl/publier4.0/dados/anexos/2834_10.pdf
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
escrito e dos valores que são atribuídos aos objetos escritos, será realizada com textos de
gêneros e suportes variados aos quais não é atribuído, a priori, um valor independente desse
contexto. Sendo uma prática situada, o que determina o valor do objeto de leitura é sua
função no percurso dos objetivos de leitura dos participantes de uma situação específica. E,
em decorrência, nessa perspectiva, não há gêneros mais legitimados do que outros para
definir alguém como leitor ou não leitor, pelo fato de serem produzidos e controlados por
instituições de poder.
Essa perspectiva fortalece os grupos que têm acesso restrito ao livro ou a alguns gêneros
usualmente publicados em livros (como romances, coletâneas, compêndios) e que, mesmo
lendo cotidianamente — encartes, páginas na internet, folhetos, revistas — não se
consideram, nem são considerados, leitores. Isso não é pouco para grupos que são
constantemente catalogados como não leitores, como estudantes da periferia, professores de
ensino básico, trabalhadores manuais (cf. KLEIMAN, 2005). Estudos em que estão implícitos
parâmetros do que é legítimo ler fazem sentido hoje somente na medida em que seus
resultados são utilizados para deixar disponíveis, em bibliotecas públicas, livros que sejam
realmente atraentes, com histórias cativantes e tão bem produzidos como os textos
multimodais disponíveis na Internet ou veiculados na televisão, ou seja com combinações
harmoniosas de muitas linguagens: sonora, visual – imagética, verbal. Enfim, que sejam
atraentes para aqueles que, tendo pouquíssimos momentos para o lazer, ainda não
conseguem ver a leitura como um dos meios para atingir momentos de prazer.
Da perspectiva da História da Leitura, Chartier faz uma crítica semelhante à concepção de
que somente é leitor quem lê livro. Numa entrevista publicada na terceira edição da revista
eletrônica Linguasagem, o historiador afirma que
Por vezes ouvimos um diagnóstico que consiste em dizer que lemos cada vez menos.
Isso é absolutamente falso: jamais nenhuma sociedade leu tanto, jamais se publicou
tanto livro (ainda que as tiragens tenham uma tendência a se reduzir), jamais houve
tanto material escrito disponível nas bancas, nas livrarias, e nunca lemos tanto
devido às telas. Portanto é falso dizer que a leitura declinou. Ao contrário, o que está
em jogo nesse tipo de observação é o fato de que freqüentemente quem pesquisa isso
não considera dignas de leitura as mesmas coisas que quem é pesquisado considera
(CHARTIER, 2008).
Segundo Chartier, a discrepância entre a realidade (por exemplo, os adolescentes leem
constantemente na escola, na tela do computador ) e as suas declarações de não leitores
(porque não querem passar uma imagem de leitor, no caso dos adolescentes franceses; no
caso brasileiro, porque não leem livros e portanto se autoavaliam como não leitores) seria
sinal da existência da tensão entre os discursos legitimados (na escola, por exemplo) “e as
infinitas práticas, disseminadas e variadas, que têm a ver com os mais diversos materiais
impressos e escritos que lemos ao longo de todo um dia ou de toda uma existência”
(CHARTIER, 2008).
São essas infinitas práticas, variadas e disseminadas, as que devem ser articuladas com as
práticas de leitura de livros na escola. Os estudos de letramento (assim como os estudos
históricos) trazem uma renovação salutar para a prática de ensino da leitura, ao mostrar, com
suas investigações, que toda prática de leitura pode ser crítica e pode ser avaliada
positivamente como prática de qualidade se permite atingir as metas específicas dos leitores
em uma determinada situação comunicativa.
A legitimidade na situação de leitura começa e termina pela reflexão crítica. Recentemente
um colega, também pesquisador da área de letramento, comentou que quando ele era
criança, já em idade escolar, agia como escriba e leitor de cartas no seu lar, no meio do
agreste nordestino, a fim de que a mãe, analfabeta, pudesse se comunicar com o pai, ausente,
trabalhando em São Paulo. Frisou que nunca tinha percebido como sua atividade
efetivamente mudava o gênero carta, tornando um gênero da intimidade entre casais em um
gênero público familiar, assim como não percebera as táticas ou artes de fazer do cotidiano
(CERTEAU, 1994) inventadas por sua mãe nessa situação comunicativa tão diferente
daquelas consideradas legítimas.
Talvez se a escola adotasse a concepção crítica e legitimadora de práticas locais, não
dominantes (vernáculas, na terminologia de Barton e Hamilton, 1998) como a descrita — as
quais, evidentemente, é preciso conhecer para poder legitimar —, então, o uso tranquilo, sem
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
sobressaltos da língua escrita não seria mais um fator de divisão dos grupos sociais, e as
enormes distâncias entre os grupos sociais brasileiros seriam, algum dia, menores.
REFERÊNCIAS
BAKHTIN, M. M.1979). Os gêneros do discurso. In: BAKHTIN, M. M. Estética da criação verbal. 3ª ed. São
Paulo: Martins Fontes.
BARTON, David; HAMILTON, Mary. Local literacies: reading and writing in one community. London:
Routledge, 1998.
BRASIL. Ministério de Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais 1º. e
2º. Ciclos: Língua Portuguesa. Brasília: MEC:SEF, 1997..
BRASIL. Ministério de Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais 3º.
e 4º. Ciclos: Língua Portuguesa. Brasília: MEC:SEF, 1998.
BRASIL. Ministério de Educação; Ministério de Cultura. Plano Nacional do Livro e Leitura, 2006Consultado no
site https://www.pnll.gov.br/ em abril de 2014.
CHARTIER, Roger. Entrevista com Roger Chartier. Linguasagem, Revista Eletrônica de Popularização Científica
em Ciências da Linguagem, 3ª. edição,São Carlos: UFSCar, 2008. Entrevistado por Ivan Jablonka; tradução
Luciana S. Salgado, entrevista originalmente concedida para La Vie des Idées em setembro de 2008. Consultado
no site http://www.letras.ufscar.br/linguasagem/edicao03/entrevista_chartier.php em abril de 2014
CHARTIER, Roger. Escutar os mortos com os olhos, Estudos Avançados 24 (69), USP, São Paulo, 2010, p. 7-30.
Traduzido por Jean Briant.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
DISCURSO E LITERATURA
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
acontecimentos (os feitos) aos escravos (trabalhadores), aos soldados etc. Ou seja, aos que
nunca são mencionados nas narrativas dominantes.
Vê-se esta diferença, de certa forma, em escolas e gêneros literários. As tragédias ocorrem,
tipicamente, aos grandes, aos nobres, aos semideuses. Os enredos românticos envolvem
personagens que, a rigor, estão acima das pessoas comuns, seja por sua ousadia, seja por
ações extraordinárias em que se envolvem (D´Artagnan, Peri). Já as personagens dos
realistas estão mais próximas das pessoas comuns, quando não o são: esposas infiéis ou
suspeitas (Bovary, Capitu), homens banais (Brás Cubas), moradores das periferias de cada
época (como em O cortiço).
Ler literatura
Para encerrar, algumas palavras sobre leitura. Trata-se de uma questão que também merece
ser vista à luz das características dos campos. Não é a mesma coisa ler ciência, com seus
textos praticamente unívocos e, por exemplo, literatura. O que significa, em primeiro lugar,
que os enredos, que podem ser lidos objetivamente (quem morre no final etc.) embora
importantes, não são a questão mais relevante. Se fosse, literatura seria jornalismo. O
“sentido” das personagens não equivale ao das pessoas (políticos, generais etc.). O mesmo se
pode dizer dos textos religiosos. Vale a pena anotar que os campos literário e religioso são
tais que, quando mais seus textos são interpretados, mais opacos se tornam, o que,
evidentemente, não ocorre com textos jornalísticos e científicos.
Não se pode, isto é, não vale a pena, ler um poema como se lê uma bula. Neste caso, a
informação é o mais relevante (composição do medicamento, posologia etc.). Mas ler assim
um verso é o mesmo que desconhecer o que significa um texto literário, isto é, desconhecer o
papel que a literatura desempenhou nas sociedades nas quais ela teve um papel relevante.
Trata-se de um tipo de experiência que não tem equivalente nos discursos ideológicos e
científicos, para citar alguns. O texto literário é, por outro lado, semelhante à música e à
pintura, pelo tipo de experiência que propõe e, considerando seu viés discursivo, pela
quantidade e pelo tipo de interpretações (de tentativas de atribuição de sentido, portanto) de
que foi objeto. Ler literatura supõe considerar de alguma forma este tipo de experiência
histórica.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
LITERATURA E HISTÓRIA:A CERIMÔNIA DAS PALAVRAS E DAS
NARRATIVAS
Inventar os mundos e flutuar sobre suas questões é um desafio. Temos que cuidar das
palavras, não esquecer a argila e a incompletude. Sempre há lacunas. Nada se esgota. O
absoluto é uma utopia que provoca humor nos deuses mais irônicos. Quem não se lembra de
Gabriel García no início dos Cem anos de solidão? Seus registros sobre a magia das
palavras são definitivos. Vivemos entre o desejo e a necessidade. A ambiguidade convive com
os nossos cotidianos de forma instigante. Talvez seja esse o maior drama e não a maior
tragédia. O drama tem relação com a nossa capacidade de mover a existência, o que Freud
chamaria de compulsão à repetição. Ele é indispensável para constituição do sujeito e
articular suas identidades fugidias. Como pensar a vida sem a presença do passado, muitas
vezes insistente e melancólica, nos amarrando a lembranças insones? Nossa maior tragédia é
a teimosia de não aceitar que somos finitos, dominados pela incompletude. Temos uma
dificuldade imensa de partir, queremos sempre construir ninhos, não escapamos de
estimular ousadias, apesar das fragilidades e contradições, reconfiguramos fronteiras e
turbulências.
A cultura é o nosso maior ninho. Somos criadores da cultura, mas também suas criaturas. Por
isso somos raízes e pássaros. Não podemos viver só na profundidade e na escuridão. Temos
que voar, sair das cavernas e dos abismos. Invadir o azul e sua luz. Ter asas e não ficarmos
adormecidos nas esquinas dos labirintos. A cultura é a ponte, é parte fundante principal da
história, onde alimentamos todos os sonhos e desejos. A sua geometria é desenhada por
pontos e contrapontos, com se dialogasse com a Sagração da primavera de Stravinsky.
Nela encontramos a barbárie da bomba atômica e o sonho de um adágio de Mahler, a
estupidez do totalitarismo e a beleza de um poema de Neruda. A cultura se institui como
aventura, travessia, sentimento, nostalgia. É preciso narrá-la, significá-la. A linguagem torna
visível sua permanência e sua socialização.
Duas palavras resumem, então, a linguagem, e traduzem todas as metáforas possíveis de
serem inventadas: raízes e asas. Não somos os quatros elementos, mas apenas dois: terra e
ar. Temos que levitar. Quem não levita não sobrevive. Morre do vírus guardado no
cartesianismo do penso logo existo. Talvez coubesse, aqui, outras afirmações mais ousadas,
mais contemporâneas: olho logo existo ou mesmo voo logo existo. O pensamento não diz
tudo e tem um poder enorme de ocultação, se envolve com as perguntas e vacilações de cada
época. Para cada tempo deve haver uma ordem que vai se diferenciando da que passou.
Descartes foi um dos filósofos emblemáticos dos primórdios da modernidade. Desafiou
tradições seculares. Hoje, o mergulho é outro. Tudo parece muito confuso, mas como pensar
a ausência de crise na construção de história? Vivemos das fusões, das impurezas, do
indistinguível, em buscas ansiosas da existência de um elemento único, divinamente
constituído.
Entretanto o poder das palavras que rimam, das transformações das palavras, não pode ser de modo
‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡
algum desprezado. A sensação de magia perdura, mesmo que não possa ser ligada a uma busca de verdade, e
essa magia, essas mesmas correspondência entre palavras, estão presentes em todas as línguas, embora as
combinações sejam diferentes .Auster, Paul. A Invenção da Solidão. São Paulo: Cia. das Letras. 1999, p.179.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
impenetráveis, sem lugar para a fantasia, mas apenas para o fato, para a lei e o progresso,
quem pensa que o historiador somente é aquele que é escravo da poeira dos arquivos. Ele
vive das fontes, mas é também fonte, não vê o passado como túmulo, o tempo como
exclusivamente linear. Há a simultaneidade que contagia cada momento de invenção da
história. Não se pode perder de vista que a história é uma reflexão sobre o vivido, articulada
com as experiências que estão sendo arquitetadas. Estamos sempre diante de um grande
espelho, com imagens mutantes de traços rascunhadose o passado é um espelho que tem
vida. A verdade é produto de relações de poder, não um cristal transparente.
II
A literatura mantém um pacto com a solidão, mas não é o fechamento para o outro. Paul
Auster afirma que:
Todo livro é uma imagem da solidão. É um objeto tangível, que se pode
levantar, baixar, abrir, fechar, e suas palavras representam muitos
meses, quando não muitos anos, da solidão de um homem, de tal modo
que, para cada palavra que lemos em um livro, podemos dizer a nós
mesmos que estamos diante daquela partícula de solidão. §§§§§§§§§§§§§
A solidão é uma forma de estar no mundo, mas não de negar o conviver como fundamental
para afirmação da cultura. No seu silêncio, a linguagem também abraça e envolve seus
sujeitos. A literatura testemunha a multiplicidade que marca esse conviver, onde o real e o
imaginário se confundem. Não há porque dissociar a arte da ciência. Por que abolir do
conhecimento científico sua dimensão estética? Quem pode esquecer a beleza da astronomia,
das descobertas da física? A cultura flui porque se refaz e o mundo é o espaço da
multiplicidade. Renegamos a sedução porque herdamos preconceitos mesquinhos. Trazemos
censuras introjetadas na nossa subjetividade. É preciso estar atento, senão terminamos como
Big Brothersacadêmicos, fechados em nossos gabinetes, certos que temos verdades
inquestionáveis, quando só temos amarguras e armaduras, praticando uma violência
simbólica e sofisticada, deseducando mentes e corações, evitando que ousem ou que
transgridam. Sacralizando sempre a mesma ordem, mudamos o nome da grife do saber, sem
entender que para sempre é sempre por um triz. Não esqueçamos que o hábito é um grande
entorpecente, como dizia Becket.
A literatura combate as cartografias que escondem vaidades solitárias, corações mal amados,
torturados pela necessidade de eliminar o outro, como garantia de sobrevivência. A literatura
denuncia o mau gosto. A literatura é uma prática radical de levitação. Claro que estamos
falando de uma literatura que é efetivamente uma tradutora da vida, e não aquela que se
resume aos anúncios de classificados de jornais. A literatura que encanta, que não precisa de
adjetivos para qualificá-la. Ela estica nossas almas, é desnorteadora da preguiça de quem não
sabe o que é uma fantasia, de quem desconsidera que existe o invisível. Ela tece os cordões
mais sutis e significativos da vida.
§§§§§§§§§§§§§
Idem, ibidem, 153.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
São tantos os cavaleiros, os quixotes, os jagunços, os trabalhadores da literatura. Cada um
tem suas preferências: Calvino, Octavio Paz, Drummond, Paul Auster, Garcia Márquez,
Guimarães Rosa, Neruda, Machado de Assis, Todorov, Carlos Fuentes, Graciliano, José
Eduardo Agualusa, Hemingway, John Fante, Euclides, Joyce... tantas escrituras sagradas ou
não, testemunhas que a história é a grande aventura humana, é a construção cotidiana da
possibilidade e não há como dispensá-la de uma narrativa. Somos todos contadores de
histórias. A narrativa é nossa matéria-prima, o ponto de exclamação da nossa complexa
existência. Através dela recuperamos e inventamos sentidos, mas podemos concluir
perplexos que no final todas as vidas não passam de uma soma de fatos contingentes, uma
crônica de interseções fortuitas, lances de sorte, causalidades que nada revelam senão sua
própria falta de propósito. **************
III
No exercício da narrativa, a história amplia os voos dos seus trapézios. Para que eleger uma
narrativa única? Ela deve comunicar, atrair, encantar. Jamais se ausentar da questão do
instável. A narrativa não é a morada única da estética, porém um dos seus lugares mais ricos
de criação. Na narrativa nos conhecemos, ou melhor, nos reconhecemos. Não é uma
fotografia estática do passado. É uma travessia. Uma imensa e surpreendente travessia onde
a palavra se alarga e se dimensiona, com os seus mais incríveis desenhos. Palavras,
recordações, sentimentos, ritmos, negações, provisoriedades. Como diria o poeta, Vinícius, a
vida ( a narrativa) vem em ondas comoo mar. Dialoga com o mundo, incessantemente. Por
que não encontrá-la?
Há lugares que estão repletos de incontáveis significados. Por que não observá-los? Por que
não balançar as subjetividades e distraí-las com as possibilidades de transcendências, de
flutuar nas fantasias do tapete mágico? Quem ousa desprezar os significados e riscar as
aventuras fabulosas das 1001 noites de Scherezade? †††††††††††††† O sertão traz geometrias e
gramáticas que se estendem. É sempre bom registrar que a história conversa com o visível e o
invisível. Nossos diálogos internos são decisivos quando não se retraem e buscam negar a
naturalização dos sentidos. Sentir o outro ou sentir os outros. O sertão tem inúmeras
representações históricas. Não basta pensar Guimarães. Não deve ser resumido a um
contexto territorial, ao flagelo das secas, às opressões políticas.
O sertão está em toda parte dependendo dos significados e das interpretações. É uma
nomeação poderosa e persistente. Carregamos a cultura dentro dos nossos sentimentos,
procuramos esconderijos. Falar de sertão é desenhar um esconderijo, um labirinto de
arquiteturas inesperadas. Se a história é a construção da possibilidade, é fundamental
inaugurar diversidades e não ser sepultado pelas mesmices. Contudo o que na história não é
vestígio, não mistura palavras e retoma tradições? Estamos no leito dos significados, das
coisas que correm e adormecem, a sombra e a luz vestem a nudez que nos acompanha
desenhando o tempo e reafirmando as dúvidas.
**************
Idem. O Quarto Fechado in A Trilogia de Nova York. São Paulo:Cia das Letras. 1999, p.237
††††††††††††††
Parte das reflexões sobre os sertões estão no artigo que publiquei (14.05.2014) no Blog
www.astuciadeulisses.com.br,
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
inquietudes visitem as histórias e se encontrem com as complexidades dos seus lugares. A
morte da narrativa é morte do movimento do inesperado, é a impossibilidade de fluir mesmo
que as dores incomodem e perturbem. Há no mínimo do encanto uma ruptura que impede
que o ponto final do texto decrete o fim da vida numa cerimônia muda e silenciosa, afastada
dos ruídos das contradições. O sertão tem permanências. Entretanto suas imagens não
afirmam uma única cor, mostram um bordado que abraça mundos e inquieta os discursos
dos planejamentos pragmáticos.
As cerimônias das palavras não se esgotam. Fazem parte cotidiana das invenções e das
andanças de quem escreve e reconhece magias. O historiador que se fecha na sistematização
dos arquivos diminui a profundidade instigante do seu texto. As verdades flutuam e, não se
cansam de interpretar o mundo dos acontecimentos e das possibilidades. Os tempos estão
sempre entrelaçados e não dispensam a imaginação. A literatura está próxima da história,
convive com suas questões, anima suas tramas. O ninho da cultura festeja quem abre as
fronteiras e acende as gramáticas. O mundo évasto, como dizia o poeta Drummond, nele
cabem suspenses e ousadias, celebrações inesperadas que reinagurem paraísos distantes de
qualquer pecado.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
RESENHAS
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
CORDEL NA BOCA DA NOITE
Fim de tarde, boca da noite. O cenário, rural. A imaginação, solta. Um pai narrava
tradicionais enredos de cordel. Na cabeça de um menino naturalmente floresciam histórias
fantásticas, maravilhosas, sem que ele soubesse que, um dia, isso tudo seria decisivo para
angariar fama, algum dinheiro e notoriedade no mundo das artes da poesia e da xilogravura.
Imerso num ambiente agrário, a vida dura de trabalho no eito não poupava nem as crianças.
Assim é que das lembranças mais antigas lembra-se José Francisco Borges de quando
auxiliava o pai na agricultura familiar, aos oito anos, mesmo tempo em que se deleitava com
certos costumes: ouvir narrativas de folheto, assistir a espetáculos de mamulengo, dançar um
forrozinho danado de bom, vibrar com o improviso dos violeiros, apreciar culinária à base de
milho, mandioca, carne de bode.
Uma das gravuras mais famosas é inventada em 1976: "A chegada da prostituta no céu".
Outro tema recorrente, o cangaço, flui da cabeça do criador para a madeira e o papel. A vida
do sertanejo, o imaginário nordestino, os contos populares, tudo ganha ares de novidade na
obra de J. Borges, que passa a ilustrar inúmeras capas de livros e discos, a expor e a dar
cursos. Na mesma década, uma exposição percorre vinte países. “Entrei na gravura como a
gente diz, entrei a cão, entrei no escuro. Hoje em dia, não. A gente faz, a televisão mostra,
explica, menino já vê. As pessoas chamavam de xilogravura e eu achava tão estranho. Tinha
um dicionário velho, fui, olhei, aí fiquei sabendo.” Isto, nos anos 1970, em plena ditatura
militar. Após contatos com Marchetti e Ariano, Borges passa a receber inúmeros e ilustres
visitantes, sobretudo do Rio de Janeiro. Muita gente comprava gravura, e pairava grande
receio quanto a olheiros da repressão por conta de gravuras encomendadas para telenovela
posteriormente censurada: “a primeira viagem de avião que eu fiz foi em 1964, quando eu
ilustrei a novela Roque Santeiro, da TV Globo, numa primeira versão. Fizemos a pré-estréia
na Galeria Ranulpho. Depois fui para o Rio e Belo Horizonte”.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Enredado num emaranhado de inquietações, políticas e artísticas, logo descobriu que estava
incluído na categoria de arte naïf ou primitiva e, conta ele, o alívio foi grande “pra um matuto
desconfiado que nem eu” quando entendeu o que isso, de fato, significava e que conquistas
profissionais poderia garantir com o talento. “Comecei a trabalhar em plena ditadura. Gente
do Rio de Janeiro comprava, levava pra lá e eu pensava que ia terminar sendo preso, como
subversivo. Mas, pensava, não tenho do que viver, vou vivendo assim. Ranulpho chamou
para eu trabalhar na galeria, trabalhei três anos. Fazia duas matrizes por mês e entregava em
madeira branca, sem imprimir. Ele lá que tirava a cópia. Imprimiu, vendeu muitas, fez
exposição pelo Brasil, por todo canto. Acho que ele ainda tem muitas matrizes. Carlos Scliar
disse a Ranulpho: você está com uma equipe de artista primitivo muito boa, Borges, Dila.
Artista popular muito bom. É só traços bons. Aí eu entendi, ah, eu tô é socado nesse meio aí,
de primitivo. Não é nada de contravenção, não, eles admiram o trabalho do cara que não
estudou, que não sabe desenhar nada, não sabe fazer nada.”
O embrião da fama vai, portanto, ganhando corpo desde que, envolvido com o universo da
literatura de cordel, escreve o primeiro folheto, em 1964, intitulado "O encontro de dois
vaqueiros no sertão de Petrolina", com capa ilustrada pelo xilógrafo Dila. No ano seguinte,
1965, resolve fazer a gravura para um folheto que havia acabado de escrever: "O verdadeiro
aviso de Frei Damião". Uma igreja de duas torres, esculpida em madeira de jenipapo. O
motivo para fazer a xilo foi simples. O amigo cordelista Olegário Fernandes incentivou-o,
alegando que, com tantas habilidades manuais, e depois de tantos objetos feitos em madeira,
certamente seria fácil. E foi tarefa fácil. Primeiramente pela familiaridade em lidar com as
mãos, a tábua, as ferramentas. Entretanto, muito mais do que a habilidade manual, decisivo
foi o vigor das engenhosas narrativas visuais desentranhadas das vivências de menino, do
imaginário de cordel e de todo um mundo de oralidade real e ficcional. No cordel, o talento
de poeta sobressai de forma ainda mais evidente nos enredos que no rigor de formas fixas. Na
xilogravura, sobretudo, inventividade e técnica estão bem afinadas, e é bem mais por causa
dela que o artista vem sendo sempre divulgado mundo afora.
Há décadas Jota Borges tem viajado quase que ininterruptamente dentro e fora do Brasil,
onde é muito conhecido. Suíça, Estados Unidos, Venezuela, França, Alemanha, Portugal,
Cuba são países para onde viajou, além dos lugares aonde tem ido a obra do artista, como
Itália, Espanha, Holanda, Bélgica, México, Argentina. Para Caracas, foi em 1995. A Cuba, foi
em 1997, num avião russo dos anos 50. Permaneceu doze dias lá, ministrando oficina numa
casa de cultura caribenha. Graças ao talento, sobretudo ao talento, e à amizade que cultiva há
anos com importantes galeristas, artistas plásticos, jornalistas e pesquisadores, Borges tem
obras no acervo da Biblioteca Nacional de Washington e no Museu de Arte Popular do Novo
México (em Santa Fé, EUA), já saiu no New York Times, participou da revista suíça Xilon em
número especial (1980) dedicado aos xilógrafos nordestinos, ilustrou o livro "As palavras
andantes", do uruguaio Eduardo Galeano (1993), figurou no calendário da ONU de 2002,
com a gravura "A vida na floresta", dentre outras notáveis aparições internacionais no mundo
da arte. A propósito de Galeano, faz questão de ressaltar: “Além de um grande artista, é um
grande cidadão, sensível, fiel. Gastou 14 mil dólares com as minhas ilustrações. Ele me
marcou muito, e deu repercussão boa para o meu trabalho.” Em 2005, Borges comemorou os
quatrocentos anos do Dom Quixote, de Miguel de Cervantes, com uma versão em cordel. No
mesmo ano foi para a França, participar da exposição "O universo da literatura de cordel",
como principal homenageado. Fez gravura para ilustrar trabalho sobre o Rio São Francisco,
tema do carnaval de 2006 da escola de samba da Mangueira, e para o qual escreveu, ainda,
cinquenta estrofes.
Sob regime de trabalho em ateliê coletivo, familiar, o patriarca J. Borges montou uma gráfica,
da qual uma das máquinas, de tipos móveis, pertenceu ao Diario de Pernambuco. Usou
durante quatro décadas tipografia e prensa manual. Mesmo com a participação dos filhos, é
ele quem cuida de todas as etapas da produção de folhetos e gravuras. Acrescente-se a isso
que os dotes artísticos para a xilogravura sempre foram partilhados em família: com os filhos
Baccaro, Pablo, J. Miguel, Ivan, Manassés, Pádua, Jerônimo; o neto Williams, filho de Ivan;
irmãos, cunhada, sobrinhos, como Amaro Francisco, Severino Borges, Nena, Joel, Lourenço,
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Givanildo. Dedicando-se há mais de cinco décadas à xilogravura popular, Borges
especializou-se na riqueza de temáticas tão caras ao imaginário nordestino, o que é
francamente observável nos artistas da família Borges, que, mesmo cada um exibindo traço
próprio, compartilham características da narrativa e da composição visual. “Cícero também
faz, mas não faz pra ele, não. Se eu mandar ele cortar uma xilogravura, ele corta. Ele me
ajuda aqui, mas não faz direto para ele. George faz também, mas parou a xilo, vive com
serigrafia, Ariano é gráfico, montou uma gráfica e está até bem. Agora tem os dois mais
novos". Ao todo, foram 18 filhos, o primeiro nascido em 1960 e só uma filha mulher, mais
cinco enteados, entre eles J. Miguel, xilógrafo cujas obras são primorosas no detalhe e
visualmente sofisticadas.
“Tenho duas coisas que é fora de muita gente que faz gravura: uma é a barra, eu comecei a
fazer a gravurinha para o cordel, é a barrinha pra botar o nome, e outra é que eu não numero,
vou fazendo avulso, lá vai, lá vai. Eu numero quando é uma gravura que alguém pede,
encomenda para dar de presente, e diz: eu quero tantas cópias numeradas. Então eu numero
porque é um trabalho exclusivo. Se fosse numerar tinha que encarecer. Minha gravura é sem
número, porque quero atingir um público muito maior. O meu trabalho é muito bem
divulgado e é barato. Não vendo caro, eu não quero riqueza. Quero dinheiro para comer,
vestir, cumprir com os meus deveres e morar bem. E ir no forró.” Ah, e manter, vizinho à
própria casa, o museu, loja e ateliê, nomeados por ele de Memorial J. Borges, na Rodovia
Luiz Gonzaga, Bezerros. Pode parecer fácil falar de um artista de currículo tão vasto e de
imaginação tão rica, desde 2005 eleito Patrimônio Vivo de Pernambuco. Não é. No panteão
da gravura em madeira, Jota Borges é um dos grandes xilógrafos do Brasil. No ramo dos
editores populares, a Gráfica Borges por ele liderada vem escrevendo parte desta história, a
da literatura de cordel brasileira. O poeta é autor de narrativas já colocadas entre os clássicos.
Constituiu aprendizes, disseminou saberes. Maneja memórias seculares e, com alegria e
vitalidade, concede-nos a cada dia intenso legado de invenção artística e tradições.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
ANTÔNIO DE SANTANA PADILHA:PRINCIPAIS DADOS BIOGRÁFICOS E
COMENTÁRIOS ACERCA DAESTRUTURA DO PROCEDIMENTO NARRATIVO
NO ROMANCE “PEDRO E LINA”
Seu Padilha foi casado com Regina de Souza Padilha e teve quatro filhos: Humberto,
Elizabeth, Evanira e Hélio. Contabilista de profissão, autodidata, cursou formalmente
somente o ensino primário. Estudou também inglês e escrituração contábil.
Antônio de Santana Padilha foi também jornalista, correspondente dos jornais A Noite (do
Rio de Janeiro), A Tarde (de Salvador), Folha da Manhã (Recife) e
JornaldoCommercio (Recife). Sobretudo foi o fundador, em Petrolina, dos jornais O
Alicate, O Folgazão (satíricos) e Petrolina-Chic, colaborador de O Farol, O Sertão,
Cristo Rei, A Tribuna e o Escrínio, todos jornais que existiam em Petrolina, além de A
Notícia, A Tribuna do Povo e a Voz do São Francisco, de Juazeiro, BA, Cidade de
Teresina (Piauí), O Imperial (Salvador). Participou com textos nas revistas Revista do
Sertão, Revista do Congresso, ambas de Petrolina, A Luva, Única e Pesquisa de
Salvador, Evolução de Recife. Também de Petrolina, colaborou, mais tarde, com a revista
Drummoniana, números 1 e 2, do ClubeDrummonianodePoesia, do qual foi sócio-
fundador.
Amostras de vários gêneros de suas obras podem ser lidas e analisadas na antologia Poética
Ribeirinha, (Edupe,1998). Sua obra de maior envergadura é seguramente o romance
Pedro e Lina, leitmotif para justificar ficcionalmente o nome de Petrolina. De Antônio
Padilha, historiador, há sempre de se lhe dar o mérito de ter escrito a primeira história de
Petrolina, entremeada de pequenos causos, sobretudo a crônica do cotidiano, com seus tipos
exóticos e bizarros, muito mais revelador historicamente do que a menção fria e factual de
dados. Seus poucos textos, com características de reflexões sobre a Arte e arredores, revelam,
à maneira de Victor Hugo, uma visão romântica da vida e do destino, que vai aparecer em
muitos textos criativos, quase um contraponto com o homem de espírito, sagaz e irônico que
se sobressai em suas crônicas.
O romance de seu Toinho Padilha, antes de tudo, precisa ser lido. Lido pela sua cidade, pela
cidade que ele homenageia no romance, através do trocadilho Pedro e Lina – Petrolina.
Sendo lido, melhor se poderá entender qualquer postura crítica. Aliás, condição primordial à
crítica imanente, a que sai da obra e não o inverso, trazendo opiniões de fora, em geral
preconcebidas.
Faço minha análise considerando-a como uma possibilidade dentre muitas, não só pela
ocasião do lançamento do livro, mas dedicando-a, sobretudo, a meus alunos do curso de
Letras, que aprenderam a conviver com questões desta natureza. Porém, numa linguagem
que possa interessar a todos, na medida em que mostra como uma obra literária interage
sistemicamente em sua estrutura.
Na linha do formalismo russo da primeira metade do século XX, desnudando o processo
narrativo, o teórico de literatura apreende de maneira in profundis os procedimentos de que
se vale o autor para dar a conhecer a obra ao leitor. Assim é que Pedro e Lina me chamou a
atenção justamente por utilizar como procedimento duas narrativas em tempo e espaço
diferentes, que correm paralelas, para somente no final se encaixarem, esclarecendo-se o
suspense criado. Suspense esse que funciona exatamente para manter a atenção do leitor
presa à composição da obra.
Esclareça-se que esse não é um procedimento original, já utilizado em outras narrativas, até
mesmo clássicas. No caso de Pedro e Lina temos uma primeira narrativa, a que chamarei
de narrativa Alfa (α). Ela se inicia no primeiro capítulo tendo como leitmotiv uma fuga
constante de um personagem solitário. Uma fuga que não é medrosa, porque tem uma
intenção, carregada do inevitável. Um personagem não nomeado, nem lugar e tempo são
determinados, apenas o cenário é descrito. Tudo aqui é ambíguo e nessa fuga, cercada de
perigos, o jovem (essa condição é facilmente percebida) os vai vencendo com destreza, força e
inteligência. Ganha as simpatias sem mesmo sabermos quem é e qual sua relação com a outra
narrativa.
Alta madrugada, guiando-se pela luz das estrelas, caminhando cautelosamente por
dentro do mato, vencendo a galharia agressiva das ramadas espinhentas, a
macambira rasteira lhe mordendo os calcanhares e as fitas verdes de caroá lhe
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
abarcando as pernas, (queriam retê-lo?) alguém percorre vereda estreita e sinuosa da
caatinga sertaneja, por onde transitam somente animais. (p. 21)
A outra narrativa, designada nesta análise por Beta (β), se inicia no capítulo III. Ali tudo é
nomeado, datado e localizado, exatamente ao contrário da primeira narrativa. Seria a
“narrativa moldura” (termo usado por Todorov em sua “Análise Estrutural da Narrativa”) em
que a sucessão linear ou causal dos fatos se presta ao esclarecimento da trama.
Ainda estava escuro quando terminou de tirar o leite das vacas, no curral; enxotou os
bezerros para a manga, soltou as vacas para o mato e levou as vasilhas do leite para
casa. Chegado de pouco, vaqueiro novo na Tiririca, adaptando-se às coisas e aos
serviços, Norberto acordara muito cedo, como era seu costume. (p. 27)
O início das duas narrativas pode me fornecer alguns dados essenciais para uma comparação:
α β
→ noite →manhã
→atitudes suspeitas →atitudes cotidianas
→ “alguém” →Norberto
→lugar ignorado →Fazenda Tiririca
→ “(queriam retê-lo?)” → “Chegado de pouco”
Pedro? Palmira
(filha adotiva)
Pedro Lina
“Petrolina”
As setas pontilhadas referem-se à filiação indireta. No caso de Palmira mais Jacinto está a
grande incógnita da segunda narrativa, tormento e suspense para o capitão. Seria Pedro
irmão de Lina?
y – a descrição dos costumes da terra, local onde se passa a maior parte da ação: a Fazenda
Tiririca.
z – o tempo da narrativa no pretérito perfeito: tudo passou, as ações definitivamente
acabadas há muito tempo, em relação à primeira narrativa.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
x y z
Narrativa β
“moldura”
2
y
0
}
2 – espaço da temporalidade
SUSPENSE
1 – espaço das causalidades
0 – CLÍMAX – ponto em que as narrativas se encaixam para dar, não em uma terceira
narrativa, mas ao segmento final onde tudo fica esclarecido, a história de “Pedro e
Lina”/Petrolina.
É verdade que um projeto desta natureza pode ser ampliado, ficando em aberto
inúmeras outras perspectivas de análise. Quem bem leu sabe o quanto isto é possível e
fascinante. Mas nessa amostra fica um pouco da complexidade desse romance que reflete a
formação de um autodidata consciente dos domínios de composição de sua obra. Da maneira
artisticamente manipulada que ele nos deu a conhecer seu texto.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
BREVES COMENTÁRIOS SOBRE A IDENTIDADE SERTANEJA NA OBRA
“VOZES DO MATO” , DO ESCRITOR ESMERALDO LOPES"
Profª. Drª Maria Rita do Amaral Assy
Universidade do Estado da Bahia
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
CARTA EN PRIMERA PERSONA A ESMERALDO LOPES
El acercarse a una realidad precisa en primer lugar de un pretexto, luego de una motivación
para, más tarde, convertirse en un incentivo. No vale con una aproximación vaga que se
diluye, tal vez, eso sea fascinación. Lo que me sucedió al leer la obra de Esmeraldo Lopes,
sobre todos sus cuentos, fue la aproximación afectiva de dos realidades que me fascinan. En
este sentido, me considero muy machadiano, la de amar los territorios y no tienen porque ser
exclusivamente geográficos, también, los considero en el ámbito de la existencia literaria.
Pues bien, las imágenes que proyecta en su literatura tiene un hábitat: el Sertão, la caantinga,
el nordeste. Tal vez, dé igual… pero una vez que estuve en su tierra comencé a comprender
que existen variantes sobre aquella existencia territorial. El Sertão es un espacio, la Caantinga
un sentir y el Nordeste una distribución geopolítica. Pero se aglutinan, se complementan
irreversiblemente.
Yo nací en el sur de España, usted en el seno del Sertão. Yo muy cerquita de África, usted en
un lugar muy cerquita al río San Francisco. Yo me crié en una península (algo que no es una
isla ni es territorio continental pues una lengua estrecha la une), usted cerca de islas fluviales
que son sumamente hermosas. Yo tengo una gran predilección por el flamenco y usted creció
rodeado del forro. Yo nunca he ocultado mi predilección por Federico García Lorca, me
imagino que usted leyó las obras maestras de Graciliano Ramos. Yo soy andaluz, del sur de la
península ibérica. Y usted del nordeste brasileño. Yo fui creciendo en un habla muy
particular, lleno de cubanismo y de palabras locales, usted con su propia “fala” de la región
(que reconozco hay algunas que me constaron entender en sus textos).
Pero además, nosotros tenemos fiestas religiosas de gran seguimiento popular, como el
Rocío, y ustedes tienen, por ejemplo, la romería del Padre Cícero. Nosotros tenemos la
emigración a Barcelona, y ustedes a São Paulo. Nosotros tenemos nuestro particular río Nilo,
aquí los romanos cuando nos invadieron le llamaron Betis y luego los árabes lo renombraron
como Guadalquivir o río grande. Ustedes tienen su arteria sarteneja, es decir, el río San
Francisco. Nosotros tenemos la cultura del toro, con plazas para espectáculos como la
maestranza de Sevilla, ustedes cuentan con las vaquejadas, como por ejemplo las de Surubim.
Nuestra región, Andalucía, contó con un gran pedagogo, en tiempos atrás, él se llamó Gines
de los Ríos, ustedes en el vecino Pernambuco tuvieron a Paulo Freire. Nosotros tenemos un
tipo de sombrero muy particular, de ala ancha para, me supongo, cuidarnos del sol y ustedes
el chapeu sertanejo de cuero de fácil identificación regional.
Asimismo, nosotros tenemos nuestro particular urubú, le llamamos buitre, también tenemos
una especie de gallina, llamada andaluza y ustedes la caipira, además de una especie de
ganado con sabrosas carnes, que conocemos como retinta. Nosotros tenemos un símbolo a
manera de árbol, que podría ser el pino piñonero y, curiosamente, ustedes la caantinga;
ambas con sus olores tan particulares. Ustedes a lo que nosotros le llamamos cortijo, le
llaman fazenda, y al señorito propietario de las tierras ustedes se refieren a él como el
fazendeiro; el vaqueiro es el vaquero y nuestro bandolero es para ustedes el cangaceiro.
Pero ahí no acaban las similitudes entre su tierra y la mía. He pensado en los mitos
universales que compartimos. Usted recordará al de Carmen; yo el de María Bonita; y si le
pongo nombre en masculino seguro que sería en mi contexto el de un supuesto Curro
Jiménez y el suyo lo llamaríamos Lampião. Le suena de algo un tal Paco de Lucía, tal vez,
igual que a mí un músico llamado Gilberto Gil. Y que me dice del buzo; me imagino que sabes
que en la provincia de Cádiz, en plena sierra, en un pueblo pequeño, hay algo muy parecido
que se llama la gaita gastoreña.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Solo he podido acercarme a usted desde la similitud de los entornos donde hemos nacido.
Quizás, sea interpretado como un juego de acercamientos, es decir, por aproximación.
Recuerdo que una de las primeras palabras que mis hijos aprendieron en português del Basil
fue “brincar”. Y, casualmente, la aprendieron a muy pocos kilómetros de donde usted es. Y de
brincar hacemos una “brincadeira” evocativa y visual, además de literaria y narrativa a partir
de sus cuentos. Lógicamente, de algunos de ellos y se los pasaré a decir; estos son: “Urubú
encomendado”, “O canto”, “Desencanto”, “O rei sem trono”, “A mulher que virou alma”, “O
canto do emigrante”… Y sobre todo: “Imagens e problemáticas da caatinga”.
Parte de lo que aprendí sobre la Caantiga, lo aprendí en blanco y negro. Es decir, a través de
las películas; pero fundamentalmente dos: “Mandacaru vermelho” (1961) del paulista Nelson
Pereira dos Santos y “Deus e o diabo na terra do sol” (1964) de bahiano Glauber Rocha. Y,
más tarde, le tuve que poner color a mi imaginación con las lecturas de autores como
Graciliano Ramos o Jorge Amado. La realidad del Sertão me acompañaba y para
comprenderla un poco mejor, de nuevo, la comparo. Dicen que las comparaciones son
odiosas… pero en mi caso, me son útiles.
Pongamos el caso del cine de temática sertaneja y póngale imágenes a partir de estas palabras
de un catedrático de literatura de la Universidad de Sevilla, Jorge Urrutia en 1980 y seguro
que volvemos a coincidir en las muchas similitudes de ustedes y nosotros.
«Se crea un género cinematográfico que nunca llegó a dar un film de calidad: la
andaluzada. (…) determinada visión de Andalucía se convierte en símbolo de España
toda. Es la Andalucía de pandereta y castañuela, del baile y del cante, del señorito
calavera y bonachón y el bracero respetuoso, alegre y resignado, de la señora distante
pero caritativa y la joven humilde pero encantadora. También la Andalucía divertida
y religiosa, locuaz y sensitiva. La Andalucía que es modelo de un mundo que se
supone bien y cristianamente hecho. Esta Andalucía es la que se quiere para toda
España y ésta será la imagen exportable»
Estoy seguro que se ha sentido identificado. Que ha sentido lo mismo que nosotros sentimos
cuando vemos estas películas. Probablemente pues hablamos en clave de los perdedores. No
perdedor en el sentido de carente sino de aquel que sabe que aún perteneciéndole algo no se
ha hecho justicia. Nosotros los andaluces somos más que simples o bonachones, risueños o
ingenuos. Tenemos nuestro carácter e identidad. Y, por ello, no dudo pasar por ser diferente
de que nos miden o etiquetan. Somos más que eso y ustedes seguro que también,
refiriéndome a lo otros que quieren que pensemos determinadas cuestiones sobre los
nordestinos, de la gente del Sertão. ¿O no es verdad?
Siempre digo que en mi tierra, Cádiz, está en una encrucijada de caminos. Voy explicarme: A
menos de tres horas en coche está Portugal, que mucho tiene que ver con ustedes. A una hora
está Marruecos, la puerta más occidental al mundo árabe. También a una hora se encuentra
Gibraltar, un territorio que pertenece a Reino Unido, bandera que allí ondea. Frente a Cádiz
en el corazón de la bahía está la base militar norteamericana de Rota y por todos lados
España. Nosotros somos los bahianos de España. Somos concretamente los bahianos de
Cádiz (en nuestra habla Cai o Cadi).
Pero no se olvide, don Esmeraldo, que vivo en una España que mira a América, a nuestra
América. De Cádiz salían los barcos cargados de emigrantes para el Caribe y también para
Sudamérica. Por ejemplo, el Cabo de San Vicente, tenía su primera parada en Recife, para
luego continuar para Salvador, Río de Janeiro, Santos, Montevideo y, por fin, Buenos Aires.
No quisiera cansarle con mis muchas anécdotas, tan solo concluir diciéndole que el Sertão no
solo está en sus corazones, también en el de los andaluces. Debe ser algo invisible que se
arraiga en los más desfavorecidos. No es un Estado (con mayúscula) sino con minúscula. Lo
que la Real Academia de la Lengua Española identifica como una “Situación en que se
encuentra alguien o algo, y en especial cada uno de sus sucesivos modos de ser o estar”
(http://lema.rae.es/drae/?val=estado). Es decir, lo interpreto como un estado anímico, de
ser, de entender y de dar a comprender la vida. Y eso nos hace diferente a los demás, a los que
nos juzgan sin conocernos ni valorarnos. Pertenecemos a un territorio con un patrimonio
único, de suma singularidad, pues contamos con una importantísima pluralidad. Veamos:
histórica (desde fenicios a cartagineses, desde romanos a griegos, desde visigodos a árabes),
patrimonial (el conjunto de la Alhambra y el Albaicín), literaria (de Federico García Lorca a
los hermanos Machado), gastronómica (la chebaquia árabe que se come en el ramadán, aquí
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
se llama pestiño), religiosa (con la mezquita catedral de Córdoba) y personal (con rasgos
raciales del al-andalus) y yo que sé cuántas cuestiones más (es la tierra del pintor Picasso o
del músico Manuel de Falla, del escritor Rafael Alberti o del político Felipe González).
Imagino que estará pensando lo mismo que yo… en la similitud a un lado y otro del Atlántico.
No es nada nuevo… pero si al estrecho de Gibraltar entre Andalucía y el Magreb se le conoce
como la calle de agua; porque no pensar que entre Andalucía y el Nordeste nos separa una
larga avenida también de agua salada, lo que otros llaman el océano.
No tengo interés en cansarle, por ello, aprovecho para despedirme y decirle que debe existir
una especie de tranSertão, uno donde usted reside y otro en el que yo estoy. Y me gustaría
acabar con unas líneas de un profesor nordestino, Erenildo João Carlos, de João Pessoa,
cuando dice en su blog “em uma cultura do sectarismo não há lugar para o diálogo”
(http://paedagogiumejc.blogspot.com.br/); no permitamos el silencio, la omisión, el soslayo;
pues peligra nuestras identidades, que los otros nos etiqueten malintencionadamente. No
permitamos que las personas nos conozcan y reconozcan exclusivamente por las cosas que
nos separan y reivindiquemos aquellas que tenemos en común. Pues como dijo en sus versos
el poeta andaluz, Antonio Machado: “lo que se ignora, se desprecia”. No lo permitamos
jamás. Vayamos siempre a conocernos.
Atentamente.
Victor Amar
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Entrevistas
Por LeonardoVila Nova
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
José Luiz Passos
Há 18 anos vivendo fora do Brasil, o escritor pernambucano José Luiz Passos é, atualmente, professor de
Literatura na Universidade da Califórnia, e seu nome foi alçado recentemente à condição de um dos mais
consistentes romancistas da atualidade. Seu livro “O sonâmbulo amador” foi o grande vencedor do Portugal
Telecom, mais importante prêmio literário exclusivamente dedicado às produções em língua portuguesa, no
final de 2013.
E é com esta língua portuguesa que ele lida cotidianamente, apesar da distância geográfica de seu país. Seus
livros são escritos em português e seus romances – o primeiro se chama “O grãos mais fino” – se passam em
sua terra natal, Pernambuco. Como se processou essa sua criação, a partir da experiência de estar morando
fora há um considerável tempo,foi um dos questionamentos do debate que ele travou com o jornalista
Schneider Carpegianni, no II Clisertão.
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necessariamente os países de fala portuguesa. Ensino Machado, Eça, Lobo Antunes, Pepetela etc. Às vezes,
estar longe nos aproxima de “outros” que são nossos iguais.
Clisertão – “O grão mais fino”, seu primeiro romance, se passa numa usina de açúcar, no século passado; e
“O sonâmbulo amador”, num sanatório em Olinda, nos anos de 1960. Ambos, em cenários com uma
identificação local bem evidente, mas escritos quando você já se encontrava fora do Brasil. Há algo
deliberado em, mesmo morando fora, escrever em sua língua natal e com referências geográficas tão claras?
José Luiz Passos – Procuro escrever sobre relações e cenários que trago sempre comigo, mesmo que
removidos no tempo. Teria dificuldade em imaginar histórias sobre países, culturas ou grupos que eu pouco
ou nada tenha conhecido. Mas o Pernambuco em meus romances também é imaginado e sonhado. São
modos de destacar dramas ou questões que quero explorar através da imaginação da vida de outros. É um
cenário que escolho lembrar, mesmo que eu ali não tenha vivido ou sequer concorde com os valores em
questão. Essas referências geográficas me ajudam a imaginar mais densamente vidas diferentes da minha.
Clisertão – Há 18 anos você tem uma vida estabelecida em um país anglo-saxão, mas escrevendo em
língua portuguesa e lidando cotidianamente com ela. E, ao ganhar o prêmio Portugal Telecom, entre as
dedicatórias, você lembrou dos emigrantes, que mantêm sua língua viva, mesmo morando em outro país.
Em que medida essa “desterritorialização” desperta em você um novo olhar a respeito de si mesmo e do seu
país e de que forma isso se repercute na sua obra como romancista? Há algum conflito nisso?
José Luiz Passos – Não há conflito, há ganho. Como disse acima, a consciência da língua portuguesa
como língua estrangeira é modo de reconhecer a ligação entre os vários espaços, culturas e grupos que
compartilham a mesma língua. Sou imigrante. Falo como imigrante. Não só o espaço lusófono me interessa,
mas também a relação entre ser brasileiro e ser latino-americano, ou mesmo hispânico, em pais de língua
inglesa. Isso influencia a minha escrita, mesmo que eu não tenha escrito, até agora, pelo menos nos
romances, sobre o tema da “minha” situação migratória.
Clisertão – Na Universidade da Califórnia, em Los Angeles, você leciona sobre Literatura Brasileira. Como
a experiência acadêmica influencia e lhe dá subsídios para o seu trabalho de escritor?
José Luiz Passos – Aprendo com os autores que ensino. E passo muito tempo lendo e discutindo textos
que admiro, tentando mostrar aos alunos como eles funcionam ou como vieram a ser o que são, ou qual seu
lugar na cultura brasileira. Acho que isso só pode ajudar. Desde que, é claro, eu não me deixe intimidar pelo
contato intensivo com o texto dos outros autores. Depois de tanto admirar, dá vontade de tentar fazer igual,
ou pelo menos parecido…
Clisertão – Sobre o mercado internacional e o consumo de literatura: como tem sido a visibilidade e
difusão da sua obra e da literatura brasileira, de uma forma geral, nos Estados Unidos? Há entraves – não
necessariamente a língua – para que essa literatura seja mais propagada?
José Luiz Passos – A visibilidade é pequena. Mesmo os livros de Machado, Jorge Amado e Clarice
circulam relativamente pouco. Pelo menos, no circuito comercial. Houve uma pequena ampliação recente
na difusão de autores contemporâneos, mas nada tão significativo assim. O mercado americano é o mais
fechado do mundo. Apenas 3% dos livros publicados são livros em tradução ou livros escritos em outras
línguas. Dentro desse pequeno nicho, o livro brasileiro precisa competir com todas as outras línguas e
países, inclusive Portugal. Há uma maior circulação dentro do meio acadêmico, onde o Brasil tem grande
prestígio. Mas trata-se, também, de outro nicho. Os entraves são o baixo interesse do público leitor pela
ficção estrangeira, a resistência a traduções de autores desconhecidos, a ausência de políticas de fomento
(que só começaram há pouco tempo) e a questão do filtro nacional. Ou seja, o próprio Brasil exporta autores
bem específicos, de editoras ou grupos editoriais bem específicos. Não é um mercado fácil, nem tampouco
justo.
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Andreia Joana Silva
Portuguesa radicada na França, Andreia Joana Silva é uma “militante” do movimento cartonero, que tem
ganhado força nos últimos anos. Mas, muito antes disso, ela compartilha, com tantos outros escritores – dos
continentes africano, europeu e americano, neste último caso, o Brasil – o fato de falar em língua
portuguesa, num mercado em que essas distâncias territoriais (assim como algumas questões editoriais)
acabam provocando entraves na circulação da literatura entre esses países.
Ela participou, às 16h40, do debate “Lusofonia: mito e paradoxo”, junto ao escritor angolano Abreu Paxe, ao
poeta português Luís Serguilha e ao professor Alexandre Furtado, da UPE. Em entrevista para o Clisertão. O
encontroproblematizou a questão de língua portuguesa na literatura de países lusófonos tão diferentes, e
como ela os aproxima e os difere. Em entrevista para o Clisertão, ela fala sobresobre o assunto do debate.
Clisertão – Participam do debate “lusofonia: mito e paradoxo” você, Alexandre Furtado (professor da
UPE), o poeta Luís Serguilha e o escrito Abreu Paxe. Um brasileiro, dois portugueses e um angolano.
Onde/como essas culturas (e suas literaturas) se encontram, além da língua?
Andreia Joana Silva – O ponto comum é a língua, não o podemos negar. Se pensarmos em países como
São Tomé e Príncipe, Cabo-Verde, Angola, Moçambique e Guiné Bissau, o que há de comum entre eles é
uma das línguas oficiais (o português), o passado colonial comum e o fato de serem nações jovens (devido a
este passado comum). O Brasil é um caso diferente. Creio ser forçado tentar encontrar pontos comuns
atuais nas literaturas de língua portuguesa, para além das perspectivas pós-coloniais partilhadas. A meu ver
é na língua, e na diversidade e riqueza que daí advém, que estes países se encontram.
Clisertão – Apesar de falarem a mesma língua – guardadas as devidas peculiaridades regionais – pouco se
conhece, no Brasil, da literatura portuguesa e de outros países lusófonos. Quais os principais entraves que
você acredita existirem na difusão e circulação de literatura entre países de língua portuguesa?
Andreia Joana Silva – Creio que são questões puramente editoriais. A publicação e circulação do livro
em alguns países é ainda deficiente. Eu, por exemplo, tive imensas dificuldades em diversos momentos da
minha vida, em encontrar livros cabo-verdianos, são tomenses, etc. Encontrei-os em países “alheios”
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à língua portuguesa (como na Alemanha, na Holanda, etc.), onde eram publicados em língua portuguesa.
Contudo, não eram distribuídos nem em Portugal nem no Brasil. Em situações destas, tomamos consciência
que os mercados editoriais (e as políticas culturais também) são diretamente responsáveis por estas
questões.
Clisertão – Quais as estratégias que podem ser adotadas para estimular um intercâmbio mais intenso
dentro do mercado literário lusófono no que diz respeito ao público consumidor?
Andreia Joana Silva – Para começar, introduzir nas escolas e nos manuais escolares textos em
português de todos os países lusófonos. Ensinar às crianças, e aos adultos, que o território da língua
portuguesa é vastíssimo e riquíssimo (em vocabulário, sintaxe, imaginários-simbólicos, etc.) e que há ainda
muito a ser explorado, lido e estudado. Recentemente, tem havido nos meios acadêmicos uma grande
profusão de estudos sobre o pós-colonialismo nas literaturas africanas lusófonas, dando-nos a descobrir
variados autores e autoras e abordando perspectivas até aqui postas à parte. Infelizmente, esse tipo de
estudo, essas abordagens ficam na Academia e nunca chegam ao grande público. O que chega ao grande
público é, mais uma vez, decidido pelos grandes grupos “editorial-econômicos”!
Clisertão – No caso do Brasil e de Angola (além de outros países africanos), há uma profusão de outras
línguas e dialetos que se amalgamaram à língua portuguesa e que fizeram com que cada
país desenvolvesse um vernáculo muito próprio. Você acredita que o Acordo Ortográfico da Língua
Portuguesa realmente tem uma eficácia no sentido de unificar uma linguagem para todos esses países ou ele
ainda se mostra ineficiente, dadas as diferenças regionais, bastante arraigadas?
Andreia Joana Silva – As “diferenças regionais” como você lhe chama, sendo tantas e tão variadas,
existirão sempre dado ao vastíssimo território no qual se fala a língua portuguesa. Um dos estandartes do
acordo era a unificação e a manutenção de uma ortografia única em todos os países de língua oficial
portuguesa. Contudo, foi um acordo condenado à nascença, pois os seus propósitos estavam muito para
além da simples unificação (aliás, basta ler o texto do acordo ortográfico, para constatarmos a manutenção
de duas grafias em variadíssimos vocábulos, sem qualquer sustentação linguística e tendo por base decisões
arbitrárias, a meu ver).
Clisertão – Além dessa questão linguística, você acredita que exista alguma semelhança no discurso
literário e na estética que aproxime esses países, localizados em continentes diferentes (América, África,
Brasil)?
Andreia Joana Silva – Seria extremamente triste e redutor atribuir um discurso literário comum ou uma
estética comum a todos os países de língua portuguesa (quando isso nem sequer se verifica nem num
mesmo continente, nem num mesmo país). Quanto mais variantes dialetais uma língua tem, mais rica ela é.
Clisertão – Quanto à questão territorial, há uma sensação de que Brasil e Portugal desenvolveram, em
suas literaturas, um tipo de abordagem aberto a questões mais amplas e universais, enquanto os países
africanos tem uma tendência maior a abordagens mais locais. Você enxerga diferença na forma como esses
países vivenciam e relatam suas identidades em suas literaturas?
Andreia Joana Silva – Sem dúvida. Justamente pelo que já referi anteriormente as identidades culturais
nestes países são muito marcadas. A forma de ver e sentir o mundo é forçosamente diferente, mesmo
havendo uma língua comum. As identidades literárias foram forjadas ao longo de anos e séculos (no caso
brasileiro e português) evoluindo em sentidos diferentes e comuns, dependendo do caso.
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Artigos
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REPRESENTAÇÕES E IMAGENS DOS SERTÕES REAIS E DOS SERTÕES
IMAGINÁRIOS
Maria Aparecida Ventura Brandão
Mestre em Educação.
Este estudo, ainda em andamento, é fruto dos resultados parciais obtidos da experiência
temática O sertão nas obras literárias, vivenciada no Programa de Bolsas de Iniciação à
Docência – PIBID – em desenvolvimento na Universidade de Pernambuco – Campus
Petrolina- durante o ano de 2014 e das reflexões plantadas durante a realização do 2º
CLISERTÃO – Congresso de Livro, da Leitura e da Literatura e fórum de intercâmbios entre
os vários conceitos de sertão: uma realização bienal promovida, também, pela UPE –
Petrolina.
Mas... o que é o sertão para os que estão distantes ou dentro dele? São questões que se
espraiam pelos diversos contextos sociais, políticos , históricos, geográficos, étnicos e
econômicos, entre outros. Assim posto,iniciamos pela reflexão dos conceitos que evocam
sentidos e significados da categoria sertão: primeiro momento de buscas, pesquisas e estudos
do PIBID. Nesse sentido, muitas visões foram expostas nos grupos de estudo com
graduandos e alunos da escola pública.
A partir da pergunta que insistia em nos provocar sobre o que vem a ser o sertão ou os
Sertões, passamos a investir em pesquisas, leituras e estudos sobre a referida proposição.
Fomos encontrando muitas possibilidades de conceitos de sertão, já que estávamos na trilha
da interdisciplinaridade. Essa multiplicidade de conceitos encontra-se na literatura deixada
por viajantes, cronistas, cientistas, exploradores ou aventureiros em geral. Desde a noção de
região inóspita e pastoril sempre a espera de um Messias, como quis Euclides da Cunha, até a
visão bucólica de Guimarães Rosa (2001; p. 134), encontramos um vasto cenário de
conceitos, ou melhor, de sensações. Assim, Rosa admite ser o sertão:
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Já em Graciliano Ramos, ao escrever, utilizando o sertão como mote de suas obras, passeia-
se por um sertão hostil e denso. Assim nos perguntamos: Que território ou pátria é essa?
Uma terra que para manter-se viva carece de uma boa dose de conformismo ante as suas
adversidades? Isso, possivelmente, convergiu ao longo do tempo para estereotipia de seus
elementos fundadores: a paisagem árida da obra de Graciliano Ramos e os elementos
formadores de um imaginário delirante: latifúndios, cangaceiros, jagunços, tropeiros,
benzeduras, retirantes, supertições, assombramentos, coronéis, moleques de pé no chão
correndo nos engenhos ou nas casas de farinha – elementos que constituem simbolicamente
seus espaços com uma profunda dose de subjetividade e invenção e reinvenção, servindo para
alimentar o imaginário romântico de camadas socioterritoriais privilegiadas. Nesse
sentido,Barbosa (2000, p. 33) observa que a “palavra sertão guarda um enorme poder de
evocação de imagens, sentimentos, raciocínios e sentidos que em torno dela foram sendo
construídos ao longo da experiência histórica brasileira.”
Ao que nos parece, pouco a pouco essas ideias foram sendo rompidas com a passagem de um
sertão medieval para um sertão onde tecnologias despontam para rasgar o véu que sucumbiu
cabeças e olhares por séculos e séculos de história.
Contudo, o que vem a ser o sertão numa visão geral da historia e da sociedade? Para
entendermos os valores que grassam num universo controverso, todavia, pesquisado e
povoado pela imaginação, partiremos de uma primeira pista que nos é dada pelo crítico
Gilberto Teles: a etimologia da palavra. Sertum, supino de desere, significa o que sai da
fileira, passando a compor, também, uma linguagem própria do setor militar, que significa o
que deserta, o que sai da ordem, resultando na formação do substantivo desertanum –
indicação de um lugar desconhecido para o qual se dirigia o desertor; portanto, lugar
impenetrável. Conclui, então, Gilberto M. Teles, que a palavra sertão é uma dessas acepções
que portam, interiormente e exteriormente, “aonde quer que se vá, a marca do colonizado e
sua dependência ao colonizador.
Essa relação deve ter sido constituída já na época do imperialismo português em sua largada
náutica ao ganhar as costas da África, cujo interior, avistado do litoral era concebido como
sertão ou certão. Seguindo a mesma lógica, a palavra sertão aporta pelas mesmas razões, com
os portugueses no Brasil de 1500, referência encontrada na carta de Caminha ao El Rei Dom
Manuel, onde descrevia-se: “de pomta a pomta He toda a praya Parma mujto chãa e mujto
fremosa. Pelo sartão nos pareceu do mar mujto grande.”
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Com efeito, torna-se clara que a visão e as intenções de interiorização do País decorreram a
partir do processo de colonização e de suas atividades, principalmente, agrárias e pecuárias,
marcadas pelo deslocamento da criação de gado do litoral para o sertão nos séculos XVI e
XVII. Nesse aspecto vai sendo maturada uma cultura de formação de uma região selvagem e
inóspita, revelada pela literatura das secas de Graciliano Ramos e Rachel de Queirós, distante
das riquezas de tradições e costumes edo processo de modernização dos centros urbanos.
Com efeito, o sertão e as diversas visões que a palavra arrebanhou durante o passar do tempo
constitui-se como um lócus da diversidade cultural, que entra na modernidade rompendo
com o rótulo de lugar inóspito e sem vida para torna-se prenhe de outros sentidos e
significados: irrigação, semeadura e colheita, como provam as regiões abastecidas pelas
vontades políticas e que aprendeu a romper, também, com o esvaziado imaginário criado em
torno do fenômeno das secas. O sertão assim vai se fazendo “dentro ou fora da gente” , pois,
segundo Rosa passarinho que debruça, o voo já está pronto.
REFERÊNCIAS
BARBOSA, Ivone Cordeiro. Sertão: um lugar incomum: o sertão do Ceará na literatura do
século XIX. Rio de Janeiro: Relume Dumará/ Fortaleza: Secretaria de Cultura e Educação.
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UMA ANÁLISE COMPARATIVA SOBRE O SERTANEJO: ASA BRANCA E
CIDADÃO COMUM
Clislane Ramos de Brito*
Thayse Kelly Barbosa da Silva*
ABSTRACT: This paper analyse comparatively the songs “Asa Branca” by Luiz Gonzaga and
“Cidadão Comum” by Flávio José. The main objective of this analysis is recognize
characteristics which describe ways to act and think of the country people in Brazil
contemporary and traditional in the situation of the northeast's drought which is the main
subject for the composition of these songs. We established points and disagreements, in an
attempt to explain the reasons of migration of the persona, either by obligation or option.
This work is based on the theoretical contributions of Alfredo Bosi (1994), Joaquim Aguiar
(1996), Massaud Moisés (1936), Holland, Freitas e Gonçalves (1979). The analysis result
shows us many reasons for the migration of the country citizen for bigger comercial cities,
however, also show us the optimism and evolution now found in the country people of
Brazilian Northeast, putting in question their free will as the only reason for migrating for
bigger cities, once nowadays, the tough life is not anymore a problem faced by these people in
the Northeast.
Keywords: Country people. Brazilian Northeas.Drought. Contemporary and traditional.
INTRODUÇÃO
Nos últimos anos, o campo da musicologia popular vem sendo cada vez mais
delimitado, sem desconsiderar a sua natureza interdisciplinar e
interprofissional, levando-se em conta o lugar da música popular nas
sociedades contemporâneas, a partir de uma reflexão crítica em torno da
natureza fonográfica e comercial deste tipo de música. (p. 77).
Essa afirmação nos faz pensar o papel que a música está assumindo ao longo do tempo na
sociedade. Não apenas a partir de um viés profissional, mas um papel crítico e pensante,
nesse sentido, é fundamental a articulação entre a música, o sujeito e o discurso presente em
cada composição.
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segundo Albuquerque Jr. (2007), se deve às elites políticas dessa região, que se valeram do
discurso da seca para atrair investimentos federais, a partir da falência da economia
açucareira no final do século XIX.
Um segundo grupo criador dessa identidade nordestina é constituído pelos emigrantes dessa
região, que se estabeleceram no Sul e Sudeste ao longo do século XX, muitas vezes privados
de seus direitos mais fundamentais, homogeneizados em sua diversidade, em razão do olhar
de estranheza e da força da opressão, e encarnam em sua cultura e em seu modo de ser o
mito do “nordestino cabra-da-peste”, valente, honrado, destemido e religioso, mas também
agregado, vassalo, submisso e acrítico em relação à sua própria condição. É o Nordeste
emoldurado pelo Mito da Necessidade (ALBUQUERQUE JR., 2007, p. 123).
Pensamos na seca como um espaço que não pertence à maioria dos brasileiros, que se localiza
fora da compreensão dos que vivem além da condição de sertanejo. “A localização sertaneja
não se refere a um espaço imediato de vivência, a um lugar familiar e sempre visitado, ao
contrário, qualifica localidades tidas como fora dos circuitos cotidianos”. (MORAES, 2002 –
2003, p. 17)
O sertão explorado, pouco conhecido, que ali está para ser desvendado, faz com que os que o
vêem exteriormente criem uma imagem de lugar distante e isolado. E esta localidade
começou a ser vista como um espaço ocupado por povos diferentes, exóticos, culturalmente
ou racialmente distintos. Seus habitantes, ainda são definidos como arcaicos dotados ou não
de alguma positividade. (MORAES, 2002 – 2003).
Segundo Bosi (1992) a quebra destas barreiras deveria ser efetivada por todos que
desconhecem a condição do popular em nosso país, afinal, são obras extremamente
importantes que abrem caminho para reflexões novas e produtivas.
Os intelectuais puramente acadêmicos assim como os profissionais tecnicistas estão,
em geral, satisfeitos com suas conquistas. (...) Por isso, podem passar a vida sem
conhecer a cultura popular (...) além do mais, pela própria barreira de classe ou de
cor. Quando muito, vendo-a transportada para a televisão, ou no intervalo de suas
excursões turísticas, recebem uma imagem que (...) só acentua o desprezo ou a pena
pelo atraso do povo brasileiro (BOSI, 1992, p. 334 – 335).
Assumindo que o espaço geográfico é ele mesmo um discurso que manifesta as escolhas feitas
pela sociedade em um dado tempo e em um dado espaço, o pensamento geográfico é aqui,
nesse mesmo sentido, entendido também como um conjunto discursivo.
Quando falamos em música, pensamos principalmente no que ela pode nos oferecer, o
discurso que está sobre ela, ou “por trás”. Portanto, nesse trabalho focaremos na comparação
entre dois sujeitos sertanejos apresentados em épocas diferentes, mas que são atingidos pela
seca. Primeiramente, teremos o sertanejo da música “Asa Branca”, de Flávio José, composta
em 1947, e “Cidadão Comum”, composta em 1997.
A canção Asa Branca possui um destaque especial porque, de autoria da dupla Luiz Gonzaga
e Humberto Teixeira, composta em 3 de março de 1947, foi cantada pelo próprio Luiz
Gonzaga e, posteriormente, por vários artistas, como Lulu Santos, Fagner, Caetano Veloso,
Elis Regina, Eduardo Araújo, Agnaldo Rayol, Paulo Diniz, Tom Zé, Chitãozinho e Xororó e
Ney Matogrosso, Badi Assad, Maria Bethânia, Gilberto Gil, Luiz Bordon, Demis Roussos e
Raul Seixas, entre outros. Essa música foi eleita pela Academia Brasileira de Letras em 1997
como a segunda canção brasileira mais marcante do século XX, estando empatada com
Carinhoso, o choro que Pixinguinha compôs em 1917, e antecedida apenas de Aquarela do
Brasil, composta por Ari Barroso em 1939.
A perfeição estética e a popularidade de Asa Branca são incontestes e, ainda hoje, estão vivas
na memória cultural do povo brasileiro. Ela é, incomparavelmente, a canção histórica e
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culturalmente mais representativa do Nordeste brasileiro e da trajetória artística de Luiz
Gonzaga.
É idiossincrático nesse cantor/autor que ele não apenas interpretou artisticamente o universo
cultural nordestino, uma vez que muitos outros o fizeram, mas também que assumiu a
linguagem estigmatizada do nordestino, transformando o estereótipo em emblema, em
bandeira de identidade, orgulho de ser nordestino e de falar “nordestinês”.
Asa Branca
Luiz Gonzaga
Quando olhei a terra ardendo
Qual a fogueira de São João
Eu perguntei a Deus do céu, ai
Por que tamanha judiação
Eu perguntei a Deus do céu, ai
Por que tamanha judiação
Que braseiro, que fornalha
Nem um pé de prantação
Por falta d'água perdi meu gado
Morreu de sede meu alazão
Por farta d'água perdi meu gado
Morreu de sede meu alazão
Inté mesmo a asa branca
Bateu asas do sertão
Então eu disse, adeus Rosinha
Guarda contigo meu coração
Então eu disse, adeus Rosinha
Guarda contigo meu coração
Hoje longe, muitas léguas
Numa triste solidão
Espero a chuva cair de novo
Pra mim voltar pro meu sertão
Espero a chuva cair de novo
Pra mim voltar pro meu sertão
Quando o verde dos teus olhos
Se espalhar na prantação
Eu te asseguro não chore não, viu
Que eu voltarei, viu
Meu coração
Eu te asseguro não chore não, viu
Que eu voltarei, viu
Meu coração
Link: http://letras.mus.br/luiz-gonzaga/47081/
Os autores desse forró romântico Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira têm uma visão
romântica poética e realista do cenário do Nordeste brasileiro. A música fala da Seca no
Nordeste brasileiro, que por ser muito intensa, obrigando o seu povo a migrar, assim como as
aves também, a exemplo da asa branca que é um tipo de um pombo (columba picazuno) que
quando bate asa do sertão anuncia a seca. Migração essa que é feita por homens (hoje, por
homens e mulheres, mas na época da música era feita só por homens) que deixam sua cidade,
sua região, procurando melhorias de vida e sustento da família, saindo deixa para trás
mulher e filhos.
Assim, está explícita a divisão de papéis sociais do homem como o provedor e da mulher que
fica para cuidar dos filhos e do lar. Essa música foi composta em 1947, a seca castigava o
Sertão, fazendo aflorar o êxodo rural, conhecido também como retirantes ruralistas, passam-
se os anos e a seca continua assolando o Sertão, trazendo com ela o inchaço das cidades
grandes, começando também a discriminação contra os nordestinos. Pois, muitos acreditam
que são eles que sujam e enfeiam a cidade, tudo isso porque na maioria das vezes não
conseguem empregos e viram mendigos, pedintes, não tendo condições de voltar a sua terra,
poucos são os que alcançam êxito.
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A seca continua e o Estado negligencia o sertão, pois não há políticas para acabar com os
efeitos da seca e o sofrimento do nordestino. Acabar com esse problema grave, para quê? Se é
justamente esse problema a solução para alguns políticos corruptos colocar em sua
plataforma política, sendo um dos motivos de promessa das campanhas eleitorais, a chamada
“política da indústria”, prometendo melhorias, mais como sempre não cumprindo.
A seca mostrada na música obriga um rapaz a mudar da região, assim, como a ave Asa-
Branca. Prometendo ao seu amor, que um dia irá voltar para seus braços e verá a terra verde
igual aos seus olhos. Portanto o engendramento dos símbolos das linguagens são fortes nessa
canção, pois ela e poeticamente cantada, o romantismo por seu amor a Rosinha,
a realidade nua e crua da seca no Sertão e o mais forte para os nordestinos a esperança o
verde espalhado no Sertão.
Cidadão Comum
Flávio José
Sou um sujeito
Pacato nordestino
Acredito até mesmo no destino
Posso até ser chamado sonhador
Acredito em tudo que eu quero
Apostei tudo em mim e considero
Que o opositor é um perdedor
E assim vou seguindo a minha sina
Sou um forte de alma nordestina
Obrigado a sair lá do sertão
Acredito em tudo que eu faço
Se deixei minha terra
É porque acho que não sou
Só um simples cidadão
E você me vem
Com esse preconceito
Pode despistar
Que eu não aceito
Pois eu nasci lá
E não sou mais um
Sem ter importância
Cidadão Comum
Se não fosse
Essa seca que atormenta
Expulsando de lá
Toda essa gente
Nos tornando um povo sofredor
Como é que vivia o paulistano
Sem contar com a força do baiano
Que sem dúvida
É um bom trabalhador
Se o nordestino tivesse cuidado
E escolhesse um governante arretado
Que investisse um pouquinho no sertão
Queria ver se o Rio e São Paulo
Sem contar com os maus remunerados
Se não iriam cair na depressão.
Link: http://letras.mus.br/flavio-jose/306910/
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Essa música entra em contraste com a música “Asa Branca”, no momento em que o eu-lírico,
apesar de estar sofrendo também com a seca do Nordeste, mostra uma valorização pela sua
terra, entendendo que alguns danos sofridos pelos sertanejos se dá pela não valorização dos
próprios nordestinos, que prefere valorizar aquilo que não é seu, como exemplo, ele cita Rio
de Janeiro e São Paulo, duas grandes cidades no Brasil que serve também como exemplo para
pensarmos nas migrações dos nordestinos quando a seca chegava. Esse sertanejo mostra a
força de viver no Sertão, não há muita melancolia, o tom da composição é mais “forte”. O eu
lírico fala também dos preconceitos sofridos pelos nordestinos pelas pessoas de outras
regiões.
É no momento de partida para outas cidades que as canções assumem um tom ao mesmo
tempo lírico e épico e se desenvolve numa conjunção de três elementos: terra, família e
trabalho. Perceba-se como a noção de terra enquanto “lugar” confunde-se com o conceito de
“casa”, donde advém a ideia de um Nordeste como casa, lugar familiar, espaço primordial de
existência e de identidade, que não somente dá nome aos nordestinos, mas, sobretudo,
representa o carinho familiar e vicinal, o Nordeste como um espaço de ser e de sentir.
Continua a identificação do nordestino com a natureza, que deixa de ser uma natureza
distante e terrível – aquela que lhe fornece a certeza do destino em termos de seca e fartura –
para tornar-se uma natureza doméstica: o galo, a flor, o gato, o cachorro... Tudo ganha
colorido e brilho, afetivamente marcado no imaginário, que irá constituir a memória comum
do Nordeste.
O povo nordestino foi um grande responsável pelo preconceito de que é alvo. No entanto,
trata-se de uma responsabilidade histórico-causal, não de uma responsabilidade moral.
Destituído do protagonismo histórico e de sua força produtiva, vulnerável à hostilidade da
natureza e à violência da sociedade, o nordestino tornou-se refém de seus próprios passos, tal
como foi difícil decidir entre morrer de fome no sertão, ou penar nas “bandas do Sul”:
assumir o preconceito, e mesmo produzi-lo, é mera imperatividade das condições
existenciais. A própria acriticidade do nordestino a que nos reportamos anteriormente não é
imputável a ele mesmo, por ser fruto de seu analfabetismo cultural e político.
CONSIDERAÇÕE FINAIS
As músicas “Asa Branca” e “Cidadão Comum” tornam-se, portanto, uma bandeira que acena
para a direção de um Nordeste eternamente curvado sobre si mesmo e de um nordestino que,
apesar da distância e da dificuldade do retorno à sua “terra ideal”, encontra no sertão tudo
aquilo que renova as veias da vida.
Dada a intencionalidade de sua linguagem, a natureza estilística, esse uso é motivado pela
própria defesa do universo nordestino. Isso significa que a linguagem de Luiz Gonzaga e
Flávio José não apenas reforça a identidade por ele incorporada, veiculada e defendida, mas,
sobretudo, é construída de modo a deixá-la transparecer.
Essa linguagem compõe um quadro de riquíssima imagética, da qual participa “Asa Branca” e
“Cidadão Comum”, que nos fala de um Nordeste, que dá unidade a uma região tão
diversificada quanto os sofrimentos de seu povo.
Luiz Gonzaga canta como alguém que deixou sua terra natal, que, de fato, realizou uma triste
partida, imaginada e poetizada, e vivenciou a dor e o sofrimento da desterritorialização. A
intencionalidade estético-política de Luiz Gonzaga parte da experiência do estrangeiro em
busca da identidade perdida. O enredo entoado é, também, a narrativa da história pessoal do
cantador. E Flávio José canta como alguém que tem orgulho de viver no nordeste apesar da
seca apresentada, e não admite que sua terra sofra preconceitos.
O estilo deles tem por fundamento e forma a identidade que ele idealizou e solidificou no
cenário político-ideológico nacional; ele comunica o “estatuto da nordestinidade” sócio
historicamente inventado, ao mesmo tempo em que se torna sua principal testemunha: não
fala de algo distante, mas de sua terra, de seu povo, da cultura de que participa e da história
que ajuda a construir.
As imagens por ele veiculadas são aquelas que fazem do Nordeste um mosaico, recomposto
quando a terra natal torna-se distante e o outro, o outro sofredor tão diferente de mim, torna-
se igual, conterrâneo, nordestino. O Nordeste de que nos fala
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
é o nordeste da necessidade, recomposto como uma tentativa de resgate da própria história e
da dignidade, uma reinvenção do lugar de origem daqueles para os quais sua nova situação
histórico-social é fatalmente ininteligível.
REFERÊNCIAS
ALBUQUERQUE JR., Durval Muniz. Preconceito de origem geográfica e de lugar: as fronteiras da discórdia. São
Paulo: Cortez, 2007.
BEAUGRANDE, Robert de & DRESSLER, Wolfgang U. Introduction to text linguistics.Londres, New York:
Longman, 1981.
BENTES, Anna Cristina. Introdução à linguística 1. 3 ed. São Paulo: Cortez, 2003.
KOCH, Ingedore G. Villaça e TRAVAGLIA, Luiz Carlos. Texto e coerência. 9 ed. São Paulo: Cortez, 2003.
MORAES, Antonio Carlos Robert. O sertão: um “outro” geográfico. Terra Brasilis. Anos III-IV, N. 4 e 5 –
Território, 2002-2003 Rio de Janeiro, RJ.
NAPOLITANO, Marcos. História & música – história cultural da música popular. Belo Horizonte: Autêntica,
2005.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O PROCESSO DE DESTERRITORIALIZAÇÃO E O DE RETERRIORIZAÇÃO NO
LIVRO OITEIRO: MEMÓRIAS DE UMA SINHÁ-MOÇA
Desterritorialização.
ABSTRACT: This study aims to discuss the proposition found in the book, Oiteiro:
memórias de uma sinhá-moça, by Magdalena Antunes. The book, published in 1958, deals
with the discourse varieties found in the work. We understand that even when the author's
literature is marked by reminiscences, still it lies involved by historical, social and cultural
aspects contained in the society that engendered it. Thus, we observed the presence of the
deterritorialization's theory, which, according to Deleuze and Guattari, advocates the no
more existence of a territory without an output vector for the existence of the same. That is,
there is no deterritorialization without, at the same time, be an effort for the retorization
somewhere else. Because it contains aspects of memory and autobiographical narratives, the
work presents striking society features from the period. The author shows the potiguar's mil
ls golden age, presenting the aspects related to slavery and freeing slaves, as well as the story
tellings told by black slavers Tonha and Patica. Finally, the work is characterized by a mix of
social reality and personal experiences, which contributes to the society memorial formation
in which the work is situated, while recriates and means a place that was no longer the same.
∗ Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal-RN. Especialista em Língua Portuguesa: Gramática,
texto e discurso, Especialista em Literatura e Cultura do Rio Grande do Norte e mestranda em Literatura
Comparada. E-mail: [email protected].
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
1INTRODUÇÃO
Ainda para esses estudiosos com o ato do pensamento estamos entrando em um processo de
desterritorialização, pois pensando criamos algo novo, ou seja, novas concepções acerca de
algo que já existia uma ressignificação e reinvenção do que já estava concebido.
Dessa forma este trabalho busca uma oportunidade de dialogar com diferentes horizontes.
Publicou o seu primeiro e único livro em 1958, pouco antes da sua morte, em 1959, Oiteiro:
Memórias de uma Sinhá-Moça, em um período em que poucas mulheres participavam da
vida literária brasileira.
Nele, a autora descreve com detalhes aspectos da infância de forma peculiar e não esquece a
árvore do oitizeiro que existia na frente da Casa Grande da família, lugar esse que guarda
grandes recordações e não por menos o nome do seu livro ser Oiteiro.
Na sua obra, é possível encontrar narrativas que descrevem desde a infância da autora e as
contações de histórias das amadas escravas Patica e Tonha, até a libertação dos escravos em
Ceará-Mirim, no ano de 1887, antes da lei Áurea em 1888. Dessa maneira a obra é
desenvolvida de forma a contemplar desde aspectos pessoais até fatos que marcaram a
história do Rio Grande do Norte.
2. A VOZ DA MEMÓRIA
Em sua obra Magdalena Antunes mostra aspectos sociais bastante significativos que mesmo
se tratando de uma narrativa autobiográfica acredita-se que seja uma fonte segura, pois
aborda problematizações acerca do espaço na qual a obra foi gerada.
Não podemos esquecer que com o decorrer dos anos, a história se tornou de certa forma
independente dos parâmetros que a guiavam anos atrás, pois, de acordo com Burker (2011),
hoje em dia não existe mais uma história fechada.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Um novo termo foi incorporado para falarmos de história, surgiu na França de uma coleção
de ensaio de Jacques Le Goff que foi intitulada de nova história. Na realidade, o que se
espera com essa “nova história” é ter a liberdade de buscar em várias fontes os aspectos
memoriais de uma civilização. A intenção são as múltiplas possibilidades que poderemos
utilizar para realizar as pesquisas, sejam elas histórias e/ou memorialística, podendo ser
investigadas através de uma narrativa dos acontecimentos ou se analisarmos a estrutura de
forma mais ampla.
A história tradicional oferece uma visão de cima, no sentido de que tem sempre se
concentrado nos grandes homens, estadistas, generais ou ocasionalmente
eclesiásticos. Ao resto da humanidade foi destinado um papel secundário no drama
da história. [...] Por outro lado (como mostra Jim Sharpe, p. 39), vários novos
historiadores estão preocupados com a história vista de baixo, em outras palavras,
com as opiniões das pessoas comuns e com sua experiência da mudança social.
(BURKER, 2011, p.13)
Essa nova visão da história muda a abordagem dos estudos historiográficos, pois antes eles
eram feitos apenas baseados em documentos, registros oficiais que estavam guardados em
arquivos. Porém, percebeu-se que a memória das sociedades se perdia com essas limitações
metodológicas. Ainda de acordo com Burker (2011), os historiadores hoje em dia buscam
outras formas de pesquisas desde evidências visuais, orais fazendo com que o estudo
histórico deixe de ser apenas quantitativo.
O livro a História da escrita: novas perspectivas (BURKER, 2011, p.15) mostra que o modelo
tradicional da História é objetivo e que “a tarefa do historiador é apresentar aos leitores os
fatos como aconteceram”.
Com essas mudanças sobre a perspectiva do estudo histórico, abre-se um precedente para
buscarmos como referencial teórico as contribuições de Brandão (2008) com o livro
Labirintos da memória: Quem sou?. Nele, encontramos um leque de informações sobre o
conceito de memória, rememorar, reminiscências e lembranças. Desse modo, faz-se
necessário uma compreensão maior sobre esses aspectos devido à obra Oiteiro tratar sobre as
memórias de uma sinhá-moça, porém com contribuições muito relevantes para a formação
memorialística da sociedade do Rio Grande do Norte.
As narrativas presentes em Oiteiro são memórias autobiográficas, porém não podemos negar
a contribuição cultural e social que, ao escrever o livro, a autora deixa de herança. Claro que
deveremos fazer algumas ressalvas.
Nos estudos que têm como base as narrativas individuais, é preciso ficar atento às
várias camadas de recordações, que se acumulam ao longo do tempo, e à pluralidades
“de versões sobre o passado [...]a postura de atenção sensível à narrativa torna clara a
relação entre reminiscências pessoais e memória coletiva, entre memória e
identidade, e entre memória e história. (BRANDÃO, 2008, p. 39)
Essas reflexões são necessárias devido às múltiplas lembranças que são contadas ao decorrer
do livro. Percebe-se um processo de rememoração ao longo de toda a obra e, de acordo com
Brandão (2008), essas lembranças só retornam porque elas já passaram pelos passos
necessários para se tornarem aprendizagem. Brandão (2008, p.9) expõe: “Tudo o que afeta
nossos sentidos é reelaborado e pode ser transformado em aprendizagem e, posteriormente,
em memórias”.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Ele ainda cita três passos para esse processo acontecer com sucesso: o primeiro está no
campo do recebimento das informações; segundo, esses elementos são armazenados,
codificados, estruturados em diferentes áreas e, por fim, a recuperação dessas informações
em lembranças permanentes e passíveis de recuperação. O motivo de essas memórias
voltarem a todo instante se deve ao valor emocional atribuído a elas. Pois, como podemos
perceber na citação abaixo, os sentimentos são extremamente importantes para lembramos
ou esquecermos.
Compreende-se que, na obra Oiteiro, fica claro essa variedade de sentimentos, porque são
encontradas diversas emoções entrelaçados na obra. Entretanto, essa mistura de sensações
não chega a atrapalhar a narrativa memorialística. Ao contrário exerce uma certa magia a
respeito dos acontecimentos desse período, uma vez que Magdalena Antunes sabe envolver o
leitor com as suas memórias, e somos presenteados com uma leitura rica tanto em aspectos
literários como históricos e memorialísticos.
Não poderíamos, apenas com as memórias de Magdalena Antunes, esboçar um relato oficial
do que realmente aconteceu no século XIX no Vale do Ceará-Mirim, porque, junto com essas
memórias, estão vinculadas as emoções vivenciadas em suas narrativas. Entretanto, podemos
mostrar alguns fatos com outra visão, porque, segundo Burker, hoje em dia não existe mais
uma história fechada como visto no capítulo anterior e a todo momento estamos vivenciando
processos de reterritorialização.
Já no primeiro capítulo intitulado de Reminiscências, a autora narra o seu primeiro dia de
escola que coincide com seu o aniversário de sete anos de idade:
Percebe-se uma certa nostalgia nas palavras escolhidas pela autora: “recordar a infância é
abrir pontos de luz na estrada abandonada do passado”, confirmando o quanto o processo de
ida à escola marcou a sua trajetória de vida, aspecto esse que a escritora continua a relatar em
uma boa parte do seu livro, pois, já no segundo capítulo, O estudo, ela desabafa:
Por muito tempo ainda, fui a maior preocupação de meus pais, por não ter amor ao
estudo. Em casa diziam que, se quisessem esconder uma coisa de mim, guardassem
dentro dos meus livros...
Quando à noite, meu pai chegava do engenho e pedia as lições, todos se saíam bem,
menos eu, a mais velha da “escola”, que era composta por mim e de meus irmãos.
(ANTUNES, 2003, p. 37.)
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
É interessante destacar que, por ser a mais velha, Magdalena Antunes foi a primeira a sair de
casa para estudar e morar fora do seio da família, e seus irmãos mais jovens só iriam pouco
tempo depois. Mas todos tiveram oportunidade de estudar em escolas de referência, porque a
família da autora acreditava que as pessoas se tornavam melhores com uma boa educação.
A narradora relata um dos primeiros exames que ela faz no colégio e nomeia como As aulas:
“Após um ligeiro exame da mestra de Português, fui classificada na quinta classe, devido ao
meu atraso. Naquela aula só havia meninas de sete ou oito anos. A minha vergonha só não foi
maior porque o meu físico não aparentava mais de nove anos.” ( p. 63). Percebe-se que este
foi um dos primeiros entre muitos momentos que a autora se arrepende de não ter estudado
como deveria, porque as situações desconfortáveis por falta dos estudos estavam apenas no
começo.
A minha “via crucis” começou logo aos primeiros dias de aula. A estreia foi
desastrosa!
Convidaram-me a ler um trecho da História Sagrada, e gaguejei do princípio ao fim.
Chamaram-me ao quadro negro e errei a conta de somar.
Ao voltar à minha carteira, derramei o tinteiro.
A companheira do lado, vendo os seus cadernos salpicados de tinha, crivou-me de
beliscões, dizendo: “Papa-jerimum desastrada!!”.
Quis perguntar a significação de “papa-jerimum”, mas não tive coragem. Um
complexo de inferioridade tolhia os meus movimentos e o direito de defender-me.
Lembrei-me, então do que mamãe me dizia constantemente: “Estuda, minha filha,
para não passares mais tarde por muitas aflições...” ao que meu pai acrescentava:
“sem instrução, não passarás de uma ceguinha, guiada pelas mãos dos outros”.
Quanto tempo perdido! (ANTUNES, 2003, p. 65)
Ao ler o capítulo dedicado à sua ama e a sua amiga inseparável de brincadeiras, Tonha e
Patica, a autora demostra o afeto que sentia por elas já no início do capítulo narrando de
forma poética como as conheceu:
Como conheci a Patica? No alvorecer da minha primeira infância, guiando-me os
incertos passos com entranhada dedicação.
Penteava-me os cabelos, vestia-me com esmero, zelava pelo meu asseio corporal,
cuidava da higiene alimentar e foram sem contar as noites passadas em claro, quando
eu, doente, embalando-me o punho da rede, sonolenta, cantarolava, maviosa:
“Dorme, filhinha,
Que eu tenho que fazer
Vou engomar, vou consturar
Camisinha pra você
Ah!... Ah!... Ah!... É... É... É...”
(ANTUNES, 2003. p. 75)
Essa canção faz parte das várias manifestações culturais que a autora vivenciou com suas
amas. Fica claro a importância para a formação literária da Sinhá, a presença delas, porque
Patica sempre contava diversas histórias de Trancoso como a da “Moura Torta”, do “Príncipe
encantado” e a da “Maria Borralheira”.
No mesmo capítulo, a autora narra o dia que a negra Tonha decide ir à “Olindra” e, não
obtendo sucesso na fuga, é encontrada e punida. É importante ressaltar que mesmo sendo
um período onde a escravidão predominava fortemente, a Sinhá tinha um zelo pela negra
fujona e não queria vê-la sofrendo, pois sentia um apego muito forte a ela.As “escapulidas”
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
que os escravos costumavam fazer das fazendas eram penalizadas pelo atrevimento
cometido.
Acordei mais tarde com um ruído no quintal, a cancela batendo, tropel de cavalos, e
logo após gritos partindo da cozinha. [...] Não durmo, Patiquinha! Parece-me que
ouvi gritos da Tonha. [...] A Patica alarmou-se e debruçando-se sobre mim disse com
voz trêmula: - É a negrinha apanhando pancada para não ser cavilosa...Pois não é que
a pegaram já perto de Santa Cruz dos Gois? (ANTUNES, 2003, p. 86)
Observa-se que, mesmo sendo uma obra memorialística e autobiográfica, podemos notar
traços marcantes no que se refere à história da sociedade daquele período.Então, o livro não
se trata apenas de confissões de uma sinhá-moça, mas, acima de tudo, é um retrato do
momento em que a sociedade estava vivendo. No capítulo intitulado A libertação,
encontramos as memórias de uma Sinhá-moça que narra dois acontecimentos, “dois
documentos de valor inestimável”.
Percebe-se que não era apenas Magdalena que tinha apreço pelos escravos da fazenda, pois o
seu pai decide libertar um dos seus escravos no dia do aniversário da sua mãe. Nesse mesmo
capítulo, Magdalena Antunes narra a ansiedade dos escravos ao ouvir falar sobre a Abolição
dos Escravos, pois os rumores aumentavam, e com a aproximação do 13 de maio, eles
enchiam o peito de esperança:
Os negros mostravam-se nas senzalas vizinhas com semblantes alegres, refletindo o
que confusamente ouviam pelos cafés, no mercado da cidade [...] Repetiam
decorados trechos dos jornais e panfletos espalhados pela cidade. Falavam de homem
chamados José do Patrocínio, Joaquim Nabuco e principalmente um poeta, Castro
Alves, todos falando e escrevendo a favor dos escravos! (ANTUNES, 2003, p.96)
Outro fato é que, mesmo os negros não sabendo exatamente quem eram José do Patrocínio,
Joaquim Nabuco e Castro Alves, eles ficavam esperançosos com o que essas personalidades
andavam dizendo pelos lugares em defesa da libertação dos escravos.
Em alguns momentos a narradora sentia-se inferior pelo fato de ser apelidada de papa-
jerimum. Porém, com o passar do tempo, e com um pouco mais de conhecimento e visão
crítica, temos, em uma das suas narrativas, uma aula de história:
Quando cheguei à idade exata de compreender o que lia, certificada, não somente da
existência de Frei Miguelino, que me causou admiração, como de que houve grandes
heróis na revolução de 24 e 48, assinaladamente Frei Caneca, Pedro Mossoró, Pais de
Carvalho, Natividade Saldanha, Nunes Machado, todos genuinamente nortistas!
E que diria da epopeia dos jangadeiros cearenses? E onde mais brilhante a campanha
da Abolição e da República?
Como me orgulho de ser nortista! (ANTUNES, 2003, p. 149-150)
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Nesse fragmento, percebemos a importância da história social de um povo, pois o
conhecimento das conquistas do seu povo faz Magdalena mais confiante perante as outras
pessoas e descobre com orgulho de pertencer ao norte. E a partir do momento que essas
informações são descritas em um romance como Oiteiro, fica mais evidente que não é apenas
um simples relato de experiência individual, mas de transformações sociais.
Parece não existir dúvida sobre o processo pelo qual o pai de Magdalena vinha passando nos
últimos tempos, com as dificuldades encontradas na lavoura e com a cana- de-açúcar que,
durante um longo tempo, foi uma das maiores fontes de renda do vale do Ceará-Mirim, agora
não estava mais conseguindo sustentar os quatro filhos longe de casa e a própria fazenda
“Tudo aqui vai de mal a pior...”.
Existia um lugar em Ceará-Mirim onde as pessoas não podiam deixar de ir, pois era visto
quase como um dia santo.
O dia de feira era tão significativo para o cearamirinense de qualquer categoria, como
os domingos e dias santos ou feriados.
Não havia ocupação por mais forçada que fizesse o senhor de engenho ou lavrador
deixar de comparecer à feira. A ausência indicava obrigação maior ou moléstia. As
estradas enchiam-se de cavaleiros, mostrando cada qual o seu ginete, rumo à cidade.
No mercado é que todos combinavam os encontros, entabulavam-se negócios e fazia-
se a provisão da semana. (ANTUNES, 2003, p.199)
Essa tradição, que vem de muitos séculos atrás, ainda continua até hoje, porém não com a
mesma função social que era antigamente. A feira é um dos poucos lugares onde as pessoas,
independente da classe social, podem se cruzar:
Mulheres do povo, sentadas ao relente, saias sungadas à cintura, seios balouçantes no
rendilhado barato, das camisas de morim, cabelos e, salinho, comprimidos em
rodinhas de pano velho, baforavam toscos cachimbos de barro, pernas cruzadas,
tendo o filho de peito ao colo [...].
Cegos cantarolavam acocorados nos recantos das paredes, tendo entre as mãos a cuia
dos níqueis, fazendo-a tilintar, como pandeiro de infelicidade, despertando no
coração dos transeuntes ritmos de piedades. (ANTUNES, 2003, p. 202-203)
Existe uma nostalgia quando a autora fala sobre o seu espaço materno. A representatividade
da feira faz com que Magdalena sinta no ar o que é realmente estar sem seu lar, pois é um
lugar com vida e movimentos próprios.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Não podemos negar o fascínio que o Vale do Ceará-Mirim causava na Sinhá. Em um dos seus
contos, ela pega emprestado de Nilo Pereira uma descrição:
Ceará-Mirim, escreveu Nilo Pereira, não era apenas uma cidade à margem de uma
estrada de ferro, como se diz na simplificação niveladora dos compêndios. E ela é
sobretudo uma cidade à margem de um vale; e nesse vale surgiu com o ciclo da cana
de açúcar a aristocracia rural, a família única dos senhores de engenho – única pelos
sentimentos, pela afeição à terra, pela grandeza do trabalho, pelas raízes morais e
emocionais. (ANTUNES, 2003, p. 248-249).
Logo em seguida a esse depoimento, teremos um conto que narra o Retorno definitivo ao lar,
onde perceberemos que a menina que tinha ido morar em outro território volta com uma
visão diferenciada da que partira:
Parece incrível que uma pequena cidade, que mais parecia “um burgo da Idade
Média”, pudesse exercer tanta sedução no meu espírito!
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Alguns escritores discorreram sobre essa obra como: Câmara Cascudo no prefácio do próprio
livro da autora, Constância Lima Duarte e Diva Cunha como também Tarcísio Gurgel.
Elencamos alguns pontos que acreditamos serem marcantes para o momento neste artigo,
porém é uma obra que ainda tem muito a nos enriquecer acerca não apenas no aspecto local,
como também a nível nacional.
REFERÊNCIAS
ANTUNES, Magdalena. Oiteiro: memórias de uma sinhá-moça. 2. ed. Natal: A. S. Editores, 2003. (Col. Letras
Potiguares).
BRANDÃO, Vera Maria Antonieta Tordino. Labirintos da memória: quem sou?. São Paulo, 2008. – (Coleção
questões fundamentais do ser humano 7.)
DELEUZE, G. ; GUATTARI, F. Mil Platôs. Capitalismo e esquizofrenia.V.1. Trad.
Aurélio Guerra neto e Celia Pinto Costa. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1995.DUARTE, Constância Lima. e MACEDO,
Diva Cunha P. (Org.). Literatura do Rio Grande do Norte - Antologia. 2. ed. Natal: Fundação José Augusto -
Governo do Estado do RN - SET, 2000.
BUERKER, Peter; Lopes, Magda. A escrita da história: novas perspectivas. São Paulo: Editora Unesp, 2011.
LEJEUNE, Philippe. O pacto autobiográfico. Belo Horizonte: Editora UFRMG, 2008.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O ESPAÇO DO PAI EM UMA ILUMINOGRAVURA DE ARIANO SUASSUNA
∗
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte/MG. Doutoranda no Programa de Pós-
Graduação em Letras da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. [email protected].
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O neologismo iluminogravura foi composto por Ariano Suassuna nas décadas de 1970
ou 1980 pela justaposição do radical da palavra iluminura (ilumin-), a arte medieval
de ilustração de manuscritos que “[...] aliava a ilustração e a ornamentação, por meio da
pintura a cores vivas, ocupando parte do espaço comumente reservado ao texto, na folha de
pergaminho”, e gravura – “arte que, por incisões, entalhes, ou meios químicos, grava,
em madeira, metal ou pedra, não só desenhos e letras, mas também ornamentos vários”
–, remetendo a uma arte em que as técnicas de gravar juntam-se à criação literária (LEÃO,
2003: 14). Assim, fundem-se elementos da cultura medieval e da arte nordestina da
xilogravura.
O título do poema “A Acahuan - A Malhada da Onça” remete aos nomes das duas fazendas
localizadas no município de Souza, no Estado da Paraíba, da família de Ariano Suassuna,
Acahuan e Malhada da Onça.
O tema do poema é a figura do pai, um pai ideal inventado pela literatura. O título introduz
o reino desse rei que vivia “aqui”. Nesse espaço idealizado são fundidas as imagens das
duas fazendas onde o autor morou na infância. Na Acauhan, o menino conviveu com o pai
até os 3 anos de idade. A Malhada da Onça foi o destino final após a morte do pai e as
perseguições políticas sofridas pela família (NEWTON JÚNIOR, 1999: 206). A palavra
“acauhan” preserva a grafia original, uma indicação de que o reino tem algo de eternidade.
Quanto a esse espaço criado no poema, Ariano Suassuna também é um ‘fazendeiro do ar’
conforme conceitua Idelette Muzart Fonseca dos Santos, ao analisar a obra dos participantes
do Movimento Armorial, criado pelo poeta:
A expressão ‘fazendeiro do ar’, criada por Carlos Drummond de Andrade, evoca estes
escritores, tão numerosos no Brasil que, após uma infância rural e, geralmente,
privilegiada, procuram em sua obra inventar e recriar terras e reinos imaginários. Tal
relação com a terra, com a região, ancora-se, em primeiro lugar, na lembrança de
uma infância livre e feliz, numa abolição ou suspensão do tempo, mas fixa-se
também graças ao exílio, à ruptura com o espaço, ao país da infância. Os escritores
armorialistas são todos, de algum modo, fazendeiros do ar, e manifestam assim sua
mais íntima relação com o Nordeste (SANTOS, 1999: 97).
O primeiro verso do soneto apresenta o Rei, escrito com maiúscula, e o menino. O pai
aparece com sinais de nobreza e mestiçagem, vestido de “ouro e Castanho”. As marcas
espaçotemporais são o uso dos verbos no passado enquanto o uso das palavras “Castanho” e
“gibão” alude ao espaço do sertão:
100
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
João Suassuna era um grande admirador de poetas populares e cantadores. Entre 1924 e
1928, ao governar a Paraíba, promovia cantorias no próprio palácio do governo (NEWTON
JÚNIOR, 1999: 43-44). Como o coração do pai determinava o destino do filho, no poema,
pode-se supor que esse destino ou herança do pai seria também ser cantador:
A tragédia anunciada na segunda estrofe torna-se explícita a partir do primeiro terceto. Como
escreve Ângela Vaz Leão (2003: 18), o primeiro terceto em um soneto “[...] pode
corresponder a uma mudança de direção no desenvolvimento do tema”. É realmente o que
acontece no poema aqui interpretado:
O verso “Mas mataram meu Pai” divide o soneto em duas partes e em dois tempos, o passado
e o presente. Além da guinada em relação ao tema, a estrofe também registra uma
modificação temporal da figura principal do poema: o “Rei” e ser divino que estabelecia qual
deveria ser o destino do filho, é nomeado como “Pai”. Sua morte dá a sensação, ao filho, de
estar perdido no mundo. Enquanto o pai é transformado no sol, um símbolo masculino, o eu
lírico se apequena, perde justamente a capacidade de perceber a luz. No final do poema,
resta a “efígie”, a representação da divindade:
O espaço atual é o “Pasto ensanguentado”, o mundo marcado pela tragédia. O poema redime
esse espaço destruído enquanto vislumbra um espaço futuro, local de atuação do eu lírico.
A efígie é representação da presença do pai que provoca o filho, ou sua presa. A tragédia
transformou o menino em uma “Espada de ouro” acesa. Como o filho não se liberta da
imagem do pai, o compromisso de atuar, de ser “Espada” tão nobre e tão másculo quanto o
pai, transforma-se em sua herança. O primeiro terceto fala da queda enquanto no segundo,
em contraponto, o filho percebe que é a continuação de seu pai.
Seu pai foi assassinado quando Ariano Suassuna tinha 3 anos e a família foi obrigada a
constantes mudanças de residência devido às perseguições políticas. Esses acontecimentos
marcaram sua obra e contribuíram para a existência de um ‘sentimento trágico da vida’, nas
palavras de Carlos Newton Júnior (2000), citando Miguel de Unamuno.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A obra de Ariano Suassuna mostra um homem com desejo de “[...] unir-se ao divino, mas a
todo instante é chamado, pela consciência, à dura realidade, ao enfrentamento da sua
condição de ser-ao-sol exposto, sujeito à decadência, à passagem do tempo e à ruína”
(NEWTON JÚNIOR, 2000: 136).
Esse sentimento trágico é ainda intensificado pelo sentimento de exílio, tanto existencial –
“o mundo visto como um lugar de sofrimento, privações, dificuldades de todas ordem” –,
como uma sensação de ser um estranho ao mundo, como o físico, acontecido na mudança do
menino sertanejo para a cidade grande do Recife, situada à beira-mar. Outros fatos da
biografia de Ariano Suassuna que contribuíram para esse sentimento foram o contágio pela
tuberculose na década de 1950 e a repressão política advinda do golpe de 1964 (NEWTON
JÚNIOR, 2000: 139-140).
Um artifício gráfico faz emergir a importância do pai no poema. É usada a inicial maiúscula,
sinal do simbolismo barroco e da poesia de cordel (SUASSUNA, 2000: 33), em um adjetivo e
sete substantivos para qualificar o gibão e nomear o pai: “Rei”, “Castanho”, “Coração”,
“Cantar”, “Viola”, “Pai”, “Guia”, “Sol”.
A figura central do homem olha para o espectador. Tem um bigode, como o pai do poeta, e
segura com a mão esquerda um estandarte em que existe uma figura de onça, frequente nos
textos de Ariano Suassuna e identificada com uma morte violenta (MACHADO, 2005:
190). Essa bandeira com onça é também uma ilustração de Ariano Suassuna retirada
do Romance d’A pedra do Reino. A onça está em posição de ataque, com a cauda erguida
e a língua e os dentes à mostra. Sua imagem combina com parte do título do poema. Além de
compor o nome da fazenda, “malhada” é a toca ou ninho de animais selvagens.
O homem monta um cavalo, símbolo de pode viril. A sela do cavalo é azul como a lembrar um
trono real. O aspecto de reino, dado tanto ao espaço do poema como ao da gravura, remete a
uma idealização do real, que o poeta opera em sua poesia. Carlos Newton Júnior escreve que
o mesmo acontece nos cordéis onde:
[...] as fazendas são quase sempre reinos, os fazendeiros são reis, duques ou barões,
enquanto suas filhas são princesas, e os vaqueiros e cangaceiros são quase sempre os
cavaleiros que incursionam por esses reinos sertanejos, disputando belas mulheres e
vestidos de armadura de couro (NEWTON JÚNIOR, 2000: 140).
102
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Figura 1: Iluminogravura
Fonte: NEWTON JÚNIOR, 2008.
Embora a figura trágica não corresponda a essas figuras ingênuas, pode-se perceber no
soneto e na ilustração uma influência da poesia popular nordestina.
Sobre o cavaleiro, o ar está cheio de uma chuva de gotas de sangue. O vermelho também está
no gibão e na marca a ferro na anca do cavalo. O uso da cor reforça a tragédia do momento da
103
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
morte e a paixão do eu lírico. Acima do cavaleiro, há um sol laranja. Observa-se que o cavalo
é o que sustenta o cavaleiro, o conduz e o cria literariamente.
O cavalo é identificado, na anca, pelo ferro de marcar gado dos Suassunas, ferro do bisavô
paterno de Ariano Suassuna, usado depois por seu avô e seu pai. Portanto, é propriedade do
cavaleiro. Esse é um símbolo muito forte no conjunto da iluminogravura, pois é realizado
pelo fogo além de ser a “assinatura” de Ariano Suassuna em suas obras (NEWTON JÚNIOR,
1999: 128). O animal representa o próprio filho, queimado ou marcado pela “brasa” da
presença do pai, e com um sinal de fogo, de paixão, no coração. É um sinal do tempo presente
a pintura, feita em vermelho com detalhes pretos, do gibão encharcado de sangue e não mais
“ouro e Castanho”.
O pássaro remete à imagem da acauã, ave de rapina, de mau agouro, pois no Nordeste canta
“Durante o tempo do verão / No silêncio das tardes agourando / Chamando a seca pro
sertão” como está na música de Luiz Gonzaga. A imagem do pássaro em posição de
ataque está duplicada em cada lado da iluminogravura, posta em cima da imagem de
um cervo, igualmente duplicada. O cervo representa a imagem do filho e está também em
vermelho.
As figuras desse pássaro e da onça remetem ao título do poema. A escolha do título não
apenas resgata os nomes do “reino” do pai. O título já vaticina um destino ruim, ao citar a
acauã, pássaro de mau agouro. Esse destino também é marcado pela violência e morte no
momento em que o título alude à “malhada”, a toca da onça.
Abaixo das figuras de cervo, há uma figura também duplicada, composta por três desenhos
feitos na pedra do Ingá, sítio arqueológico situado na região do Cariri, na Paraíba. Essa
figura parece ter relação com a arte rupestre das itaquatiaras do sertão nordestino. A
reprodução desses grafismos pode ser observada em outras iluminogravuras de Ariano
Suassuna.
Por fim, no centro e embaixo, há duas luas crescentes que funcionam como dois olhos do sol
que está entre elas. Esses olhos do sol observam e conduzem o filho. Há ainda doze estrelas
espalhadas em pares por entre as figuras da acauã, do cervo e da que remete às insculturas
na pedra do Ingá. Esses signos estelares sugerem a sina eterna que acompanha o filho em
todos os lugares e da qual não pode fugir.
O poema também aponta para o futuro. Continuamente, por meio da linguagem, será
possível ao poeta atender ao desafio imposto por seu pai e dar testemunho de que o que o
filho se tornou é a herança do pai.
REFERÊNCIAS
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MACHADO, Irley. As imagens da morte na epístola do adeus. Línguas & Letras. v. 6, n. 11, p. 183-194, 2005.
Disponível em: <http://erevista.unioeste.br/index.php/linguaseletras/article/view/879>. Acesso em: 19 abr.
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SUASSUNA, Ariano. Ao som da prosa brasiliana. Cadernos de Literatura Brasileira, São Paulo, n. 10, p. 23-51,
nov. 2000. Entrevista.
105
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
LITERATURA E POLÍTICAS PÚBLICAS EM ALAGOINHAS: DESAFIOS E
PERSPECTIVAS NA CONTEMPORANEIDADE
RESUMO: Trata-se de uma abordagem reflexiva sobre a possível relação entre o ofício
literário e as atuais políticas públicas culturais. Nesse sentido, serão discutidos os resultados
obtidos no projeto de Mestrado intitulado Literatura e políticas públicas emAlagoinhas/BA
que investigou os modos de produção/circulação da literatura no município, assim como o
posicionamento político-cultural dos escritores frente ao Estado baiano, considerando o atual
momento de efervescência das políticas públicas de cultura e institucionalização da malha
cultural no Brasil. Sob a perspectiva da crítica cultural, fundamentada em estudos pós-
estruturalistas, abordaremos a noção de cultura literária que vem norteando a prática
cultural no país, seus reflexos e desdobramentos, traduzidos pelas políticas voltadas para o
livro, a leitura e a literatura. Para tanto, evidenciamos o método de pesquisa qualitativa
desdobrando-se em um conjunto de diferentes técnicas. Esta abordagem está pautada na
análise de resultados obtidos junto ao grupo focal e seus modos de produção. Como
resultados, além da constatação da existência de um rico acervo de escritores que não cessam
em produzir tornou-se visível a construção de um possível roteiro rizomático e suas
interconexões literárias, que se acionados, abrem possibilidades de a literatura ativar uma
máquina de guerra contra certa concepção excludente de fazer cultura.
Uma comissão formada por escritores compôs o Movimento Literatura Urgente e fez chegar, em
‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡
novembro de 2004, às mãos do então Ministro da Cultura, Gilberto Gil, e ao coordenador Nacional do
LivroGaleano Amorim, o manifesto “Temos fome de literatura”. A eclosão do movimento se deu a partir da
iniciativa de escritores que, diante da inexistência de discussões em torno das políticas públicas de fomento à
literatura, resolveram, de forma organizada, mobilizar um número significativo de assinaturas e reivindicar a
inclusão de políticas consistentes para o setor.
107
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
-, por outro, permite-nos visualizar indicadores culturais que demonstram que a construção
de uma cultura literária ativa é possível e urgente, demandando para isso a emergência de
um novo comportamento ou cultura política nova à qual se refere a filósofa Marilena Chauí:
O que é uma relação nova com a cultura, na qual a consideramos como processo de
criação? É entendê-la como trabalho. Tratá-la como trabalho da inteligência, da
sensibilidade, da imaginação, da reflexão, da experiência e do debate e trabalho no
interior do tempo é pensá-la como instituição social, portanto, determinada pelas
condições materiais e históricas de sua realização. (CHAUÍ, 2007, p. 41).
Para a autora a concepção de cidadania deve ser entendida a partir do exercício de uma
cultura política que possibilite a tomada de consciência do cidadão e sua interferência no
espaço público fazendo valer seus direitos frente a um Estado que também é um produto
cultural.
Nesta dimensão mais ampla e reconhecendo a efervescência atual em que se encontra o
capitalismo tardio, o entendimento das questões levantadas por Chauí (2007) e pelo grupo de
escritores (as) do MLU, é fundamental, para que possivelmente estejamos reelaborando
significados, abrindo outras formas de viver e sobreviver.
§§§§§§§§§§§§§§ A exemplo dos projetos de pesquisa sob coordenação do profº Osmar Moreira, profª Jailma Pedreira,
profª Eliana Brandão e profª Maria José Oliveira.
*************** Iraci da Gama Santa Luzia é também professora do curso de Letras da Universidade do Estado da
Bahia, Mestra em Educação, foi também vereadora da cidade, incansável militante e ativista em defesa da
cultura local é hoje também responsável pela FIGAM – Fundação Iraci Gama de Cultura – junto com Litho Silva e
Fátima Sales. Além da preocupação com o patrimônio arquitetônico e material, a Fundação também tem um
trabalho voltado para o patrimônio imaterial e natural, como, por exemplo, os recursos hídricos que estão sendo
desrespeitados.
†††††††††††††††
Nestas quatro coletâneas, estão reunidos textos/poemas de 355 autores com as mais diversas
temáticas.
‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡
Livro organizado pelo profº Osmar Moreira e pelo mestrando em Crítica Cultural Wilton Oliveira e
publicado pela Universidade do Estado da Bahia através do projeto Fábrica de Letras/usina de produção do
crítica cultural.
108
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
documentos de correspondências trocadas entre os escritores §§§§§§§§§§§§§§§ - podemos flagrar na
fulguração desse rico acervo profusões de imagens e desdobramentos múltiplos que emergem
dos seus textos revelando ao leitor traços culturais particulares. Tudo isso vem sendo
produzido de forma material precária, devido ao modo como tais escritores (as) produzem,
sem apoio sistemático e investindo dinheiro próprio, muitas vezes sem obter retorno do
capital investido.
Como possível alternativa de fazer circular suas obras, alguns possuem páginas virtuais e
comercializam como podem, vendendo com a ajuda de amigos e familiares, bem como
através da participação em eventos promovidos por programas das Universidades,
divulgação em rádios locais, jornais e revistas.
Não raro encontramos também alguns destes artistas em transe, movimentando-se pelos
diversos espaços da cidade e exercendo as mais variadas atividades no mercado de trabalho
capitalista para sobreviverem. Alguns divulgando e comercializando a preço de custo, outros
ainda absorvidos pelo próprio Estado produzindo e vendendo sua força de trabalho para
enaltecer feitos de gestões político-partidárias.
Dentre os equipamentos culturais do município, podemos destacar além de uma Secretaria
de Cultura e Centro de Cultura, instituições ligadas à literatura como bibliotecas (pública
municipal, escolares e comunitárias), Fundação Iraci Gama de Cultura (Figam), escolas,
universidades, associações de artistas como a Casa do Poeta (Caspal) – que inclusive é a
única associação literária existente no Território - e a Academia de Letras e Artes de
Alagoinhas (Alada), que atualmente encontra-se desativada. Verificamos que problemas de
gerenciamento de espaço e dispersão dos membros dessas associações são fortes indicadores
que agravam as dificuldades de seu funcionamento. Atualmente não há nenhum registro de
projeto elaborado coletivamente pelos membros da Caspal para concorrer aos editais
lançados pelo Estado.
Outra iniciativa mapeada diz respeito a revistas e jornais independentes que circulam no
município e oportunizam a divulgação da produção literária local, a exemplo do Jornal
Expresso 18, Jornal e revista da ACIA (Associação Comercial e Industrial de Alagoinhas) e
rádios locais, eventos promovidos pela universidade que oportunizam o fortalecimento da
cultura literária.
Apesar de todo este equipamento cultural, são visíveis alguns sérios e preocupantes entraves
neste campo, como: a ausência de políticas via Secretaria de cultura municipal que contemple
e potencialize este segmento artístico - este setor no município apresenta problemas em sua
própria estrutura interna -, dificuldade dos escritores em encontrar editoras no Estado para
lançar seus livros, dificuldade dos escritores em participar dos editais lançados pelo Estado,
problemas estruturais de funcionamento da Caspal e Alada - dado o estado de precariedade
em que se encontram -, ausência de ações de incentivo à criação literária para além da
política de editais, ausência de grande número de exemplares da literatura local em
bibliotecas e livrarias locais, dificuldades de financiamento do poder público e iniciativa
privada para publicação.
Em se tratando de gestão cultural, alguns problemas institucionais provenientes ainda das
marcas de uma herança antidemocrática podem ser facilmente flagrados. São problemas, que
além de gerarem obstáculos, vem dificultando o processo de descentralização a que se propõe
a política pública vigente. Este fato comumente “aparece” nos rastros deixados e percebidos
nos discursos e nas ações que nos propomos investigar.
A esse respeito, é interessante ressaltarmos a importante reflexão trazida por Teixeira Coelho
(2008) em seu estudo sobre as atuais políticas culturais. O referido autor recorrendo ao texto
do antropólogo francês Pierre Clastres, nos lembra da pertinência em percebermos o
obstáculo epistemológico mais difícil de enfrentar na busca de um entendimento
contemporâneo entre o Estado e a sociedade. E afirma:
§§§§§§§§§§§§§§§
Estes títulos e correspondências aos quais nos referimos, podem ser encontrados nos arquivos da
Caspal ou nas residências dos próprios escritores (as) em que alguns constituíram um acervo particular com suas
publicações e preferências literárias.
109
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
o obstáculo cimentado no pensamento e no comportamento de cada um, a ideologia
mais incorporada que se pode imaginar, aquela que arma esse obstáculo
epistemológico. (COELHO, 2008, p.70).
Esta questão vem por em evidência um dos aspectos relevantes - senão o principal - deste
estudo, para o qual nos empenhamos, ao tempo que entendemos que já está mais do que na
hora de problematizarmos e verificarmos, num momento em que há a convocação da
sociedade civil para em consonância com o Estado construir estas políticas, como está se
dando este obstáculo epistemológico em uma sociedade em constante processo de (re)
avaliação de si num cenário de intensas trocas culturais e possibilidades de florescimento dos
direitos de um sujeito plural.
Verificando essa trajetória, é pertinente refletirmos: que subjetividade estaria emergindo no
interior deste sistema capitalístico aos quais estão submetidos os profissionais da palavra, em
tempos de política pública cultural? Qual seria o perigo em potencializar estas escritas locais
como um produto cultural a ser consumido e valorizado?
Para além das diferenças que flagramos entre o coletivo de escritores e o poder público local
nos diversos momentos da pesquisa, o desejo de que haja a quebra de certa continuidade de
determinadas linhas de orientação de alguns gestores culturais é evidente. Neste caso,
percebemos que uma boa parcela de escritores (as) anseia por inovações no campo da
literatura e do livro e acreditam que as políticas públicas culturais podem gerar também um
possível caminho para alcançá-las. Isto se torna visível quando este coletivo aposta numa
dinamização da produção vislumbrando uma política de circulação e democratização do
acesso não só das obras da literatura nacionalmente reconhecidas como também de
escritores ditos ‘marginais’.
Contemporaneamente, vemos que o desenvolvimento de uma cultura – e aqui me refiro
especialmente à literária – que se percebe também em constante processo de reflexão, do seu
potencial criativo, dentro de uma cadeia global, pode questionar a manifestação dessa
também conhecida ‘alta cultura’ no cotidiano, considerando os seus contornos políticos.
Sendo assim é oportuno perguntarmos: como pensar globalmente e agir localmente para que
a cultura da cidadania referida por Chuí (2007) garanta o pleno exercício da democracia em
literatura?
É importante percebermos assim que as implicações culturais inerentes ao processo literário
vão muito além do que se pode imaginar. A literatura assim como as demais artes, se
desenvolve em universos semióticos que não são separados, ou seja, a sua produção expressa,
mesmo que sem perceber, modos de representação da subjetividade. Nessa perspectiva,
acrescentamos aqui a percepção do artista/escritor e seu caráter eminentemente político –
em que pese a importância da sua produção - no atual cenário cultural em que vivemos.
Para tanto, é válido ressaltarmos as relações de força que circundam o fazer literário, bem
como o discurso que atravessa a “imagem” do escritor (a), esta figura “central” e sujeito
atuante que se encontra envolvido num contexto de cultura do dinheiro, mercado,
mercadoria, bens simbólicos e indústria cultural que tentamos descrever e que influenciam
também nas suas modelizações subjetivas, refletindo no seu fazer cotidiano. Este vem a ser
um terreno fecundo já que este tipo de modelização está disseminada por toda a malha social
- e Alagoinhas não escapa a essa realidade.
No contexto atual, esse artista da palavra é ‘convidado’ a interferir e opinar nas decisões para
o campo literário e são ‘deslocados’ do seu ‘lugar’ de escritor para reivindicar seu espaço de
cidadão de direitos, próximos e com o espectador. Sobre este aspecto é conveniente
lembrarmos as importantes contribuições do Walter Benjamin **************** (1994) quando este
nos revela o processo de construção do conceito de aura e seus prováveis impactos sobre o
papel do artista e difusão da obra de arte.
3 POSSÍVEIS AGENCIAMENTOS
****************
Aqui nos referimos ao texto intitulado “A obra de arte na era da reprodutibilidade técnica”. Ensaio
traduzido em português por José Lino Grunnewald e publicado em A ideia do cinema (Rio de Janeiro,
Civilização Brasileira, 1969) e na coleção “Os Pensadores”, da Abril Cultural, é a segunda versão alemã, que
Benjamin começou a escrever em 1936 e foi publicado em 1955.
110
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Diante da transversalidade de fatores inerentes à literatura local e a convergência de
discussões provocadas pelos estudos em Crítica Cultural, podemos afirmar que é notável a
importância da superação de alguns problemas de ordem socioeconômica e sociocultural
mais geral, apontadas também pelo manifesto do MLU em 2004, dentre as quais estão a
centralidade de algumas políticas existentes para o livro no Estado direcionadas às escolas e
bibliotecas públicas - via Secretaria Estadual de Educação - que ainda não contemplam a
literatura local e não reconhece ofício do escritor (a) como um trabalho, a escassez de
editoras habilitadas para atuar neste mercado no Estado.
Algumas iniciativas que existem, como os projetos de incentivo a leitura, os Pontos deLeitura
do Governo Federal, o Proler do Governo Estadual da Bahia, o Programa Nacional para
Biblioteca Escolar-(PNBE), o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), a construção de
Plano Nacional do Livro e da Literatura, Programa do Livro Popular lançado na no Ano
passado, dentre outras implementações, devido à própria dinâmica socioculturalaqui
mencionada aponta para a necessidade de revisão dessas políticas.Projetos intersetoriais
também vem sendo realizados desde 2008 como as políticas culturais voltadas para a
juventude estudantil baiana, o Tempo de Arte Literária (TAL), as Artes Visuais Estudantis
(AVE) e o Festival Anual da Canção Estudantil (FACE), idealizados pelo Governo do Estado
através da Secretaria Estadual de Educação (SEC).
Sem dúvida, percebendo a amplitude dos fatores implicados ao processo literário, alguns
complicadores precisam ser visualizados, a saber: a superação de uma política editorial
hegemônica que opera junto a uma indústria capitalística neoliberal, a dificuldade de alguns
escritores em operarem junto à política pública cultural, a noção de que somente à escola
cabeo papel de formação de leitores em potenciale a superação de determinada ideologia no
que se refere ao modo como é concebido o ofício cultural do (a) escritor (a).
Diante desta recente proposição do Estado em instituir o Sistema Nacional de Cultura e com
isso, formular políticas públicas voltadas também para o campo da literatura e leitura,
somando-se a isso a instituição de políticas de Estado que contemplam este segmento
cultural, percebemos que apesar de algumas dificuldades dos escritores (as) e instituições em
lidar com as recentes políticas públicas, notamos que a participação e o interesse dos
escritores e representantes de instituições culturais nos debates vem se dando - ainda que
timidamente - de forma gradativa, sendo constante e recorrente a sua presença nos espaços
de discussão e eventos promovidos inclusive pela Universidade.
Considerando a realidade até aqui exposta, podemos afirmar que há um movimento subjetivo
latente de escritores (as) anônimos que desejam engendrar uma outra dinâmica ao seu ofício
cultural. Surge assim através da identificação destes problemas a necessidade de refletirmos
e repensarmos as políticas públicas culturais; que o empreendimento e discussão no campo
da pesquisa literária abram possibilidades de operarmos localmente em diálogo com o global
no sentido de nos mobilizarmos de fato e construirmos uma cultura literária que afirme a
vida e solidifique as noções de cultura como bem simbólico, econômico e cidadão, se opondo
à reprodução de práticas capitalistas hierarquizantes e violentas.
CONCLUSÃO
É coerente afirmar que diante do contexto sociocultural que aqui descrevemos - imerso na
cultura do dinheiro, mercado, bens simbólicos, indústria cultural acrescida de seus interesses
e fetiches -, a literatura assim como as demais artes entra como forte possibilidade na
contemporaneidade para repensarmos e reelaborarmos outras formas de vida, numa
perspectiva mais humana, em que pese os espaços sociais de subjetivação e sua luta pelo
exercício dos direitos culturais.
Nesse sentido, acreditamos que um dos pontos relevantes diante da atual perspectiva de
transformação cultural em sua multiplicidade, diz da figura do artista e seu caráter
eminentemente político no cenário atual – perpassando pelas modelizações subjetivas e seus
desdobramentos e fantasmas que transversalizam o ofício da escrita – quando vivenciamos
um momento em que o artista é convidado a formular junto ao Estado diretrizes que
subsidiarão os planos decenais de cultura e consequentemente alicerçam o Sistema Nacional
de Cultura.
111
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
No espaço-tempo desta pesquisa, percebemos que alguns equipamentos culturais se mostram
imprescindíveis e valiosos no sentido de figurar junto com o coletivo cultural de escritores
um possível movimento estético-político organizado em favor de uma arte literária aberta a
outras experimentações, e nessa empreitada estabelecer múltiplas conexões, em tempos de
institucionalização da malha cultural no país. Dentre estes equipamentos temos bibliotecas
públicas e comunitárias da cidade/território/estado, associações de moradores nos bairros,
Universidades públicas e particulares, agências de fomento à cultura, escolas, centros de
cultura.
Se, podemos afirmar que há um movimento subjetivo latente de escritores (as) anônimos que
desejam uma outra dinâmica ao seu ofício cultural, surge daí a possibilidade de operarmos
localmente em diálogo com o global no sentido de percebemos que apesar de haver certa
abertura gerada pelos mecanismos de política pública com alguns ainda tímidos avanços no
campo literário, a existência de problemas no funcionamento destas políticas apontam para a
necessidade de sua revisão, já que na base do seu funcionamento notamos sérios problemas
que vão da desarticulação provocada pelos interesses particulares de quem está gerindo a
cultura no município, a problemas estruturais de funcionamento interno da própria Secult
(Secretaria de Cultura do Estado).
Acreditamos que muito pode ser articulado principalmente quando partimos de reflexões
como nos mostra Singer (2008), em que é possível articular um cenário alternativo sempre
aberto a outras perspectivas construindo assim outras narrativas em que a produção literária
se transforme no signo enquanto forma de representação de uma realidade diferencial e
libertária. No entanto, esta articulação não deve prescindir de uma autocrítica do
escritor/trabalhador e seu engajamento diante da realidade em que vivemos, a fim de
solidificar a cultura como um bem simbólico, econômico e cidadão.
Sendo assim, a iminência do debate e abertura a que se propõe este estudo está aliada à
construção de roteiros e redes alternativas que invistam contra um modelo hegemônico e
excludente de fazer cultura, vislumbrando uma política de organização das artes e seu
potencial criativo. Cremos que atribuir e relegar todas as responsabilidades somente ao
Estado seja um grande equívoco. São necessárias políticas que garantam além da valorização
e democratização do acesso aos bens culturais, proporcione o eco de vozes historicamente
recalcadas, numa perspectiva de acesso aos modos de produção e geração de renda.
REFERÊNCIAS
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112
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WILLIAMS, Raymond. Cultura. Trad. Lólio Lourenço de Oliveira. 2. Ed. São Paulo: Paz e Terra, 2000.
113
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
JOÃO GRILO E A PROBLEMÁTICA SOCIAL BRASILEIRA
João Evangelista do Nascimento Neto ††††††††††††††††
ABSTRACT: Of uncertain origin and multiple nationality, Joã Griloohn. character of popular
culture, his actions in terminating all concerns of subaltern classes . In Brazil Grilo finds
fertile ground for their actions and the cordel text is ideal to proliferate their thoughts and
attitudes towards a better life environment. Thus, to verify the construction of the character
and his actions as a protest to a policy that promotes exclusion and social differences, in this
paper, we discuss the composition of the character from João Grilo through the brochure
Proezas de João Grilo, assigned to João Ferreira de Lima and its relation to the arid
environment in which they live. The character leaves the popular imagination, the mouth of
the singers to inhabit the cordel texts, being the spokesman of the suffering people of the
northeast. How that is picaresque, dribbles the difficulties of life, breaks an established status
quo and question the existing political and social neglect in the Northeast. His adventures
refer to a subversion of the social norms, when the people, represented by Grilo, dare
denounce the evils that prevail in the forgotten world of the arid region. For this study, we
use Haurélio (2010), Zumthor (2007), Abreu (1999), Araujo (1992), among others.
INTRODUÇÃO
A palavra é semente, o fruto vem da sua interação com o ouvinte-leitor. Por isso, elas, as
palavras, podem ser semeadas em qualquer solo, frutos brotarão deles. Nem sempre é aquele
que se espera, mas ainda assim é fruto. Sejam em solos rochosos, vulcânicos, argilosos ou
áridos, os frutos nascem. No sertão de chão duro e quase impermeável à chuva, a palavra-
performance fez sua morada, fincou suas raízes, fez dele sair seus brotos, que se
transformaram em galhos firmes de uma árvore frondosa que é a cultura nordestina. Um
desses galhos, que dá boa sombra aos que por essa árvore passam, é a literatura de cordel
(HAURÉLIO, 2010).
A literatura de cordel não pode ser confundida com a literatura popular, já que nem todos os
autores, públicos e temas fazem parte das camadas populares. Contudo, é comumente
atribuída às camadas mais próximas da base da pirâmide social. Se há cordelistas com pouca
Universitário Professor Gedival Sousa Andrade, DCHT XXIV, Xique-Xique-BA. Doutorando em Letras pela
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). E-mail: [email protected].
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
instrução, não se pode negar a existência de autores acadêmicos que escrevem textos de
cordel de qualidade e contribuem para a manutenção da prática cordelista no Brasil.
Abreu (1999) defende o termo “literatura de folhetos” para diferenciar dos textos de cordel
vindos da Europa, mais especificamente do solo português. Em seu estudo acerca dos textos
de cordel lusitanos e a pretensa influência dessas obras em solo brasileiro, a autora percebeu
que, em Portugal,
Todas as histórias passam-se entre os nobres, havendo poucas referências à vida, aos
problemas ou às dificuldades dos pobres. Quando os súditos aparecem, nota-se que
eles vivem em perfeita harmonia com seus senhores. [...] Os pobres são capazes de se
alimentar e proteger os nobres, portanto ambos estão em igualdade de condições. [...]
Pobres e ricos vivem em simbiose, numa comunhão perfeita de interesses e
sentimentos (ABREU, 1999, p. 65).
No Brasil, a literatura de folhetos possui um forte e recorrente caráter social. Escrita sob
normas rígidas de rima, métrica e estruturação do texto, o texto dos folhetos são elaborados
pelos poetas “como se estivessem contando uma história em voz alta” (ABREU, 1999, p. 118).
Exemplo sonoramente vivo e vibrante da palavra-performance.
A palavra-força é tomada por João Grilo, quando da sua chegada em solo brasileiro. Assim
como um dia os homens roubaram o fogo dos deuses, Grilo, detentor da fala das camadas
populares, apropria-se do discurso dos poderosos a fim de que, fundidos os dois, surja um
texto intenso, imbuído de críticas sociais, permeado de escárnio e desejo de sobrevivência.
Esse capítulo da vida do personagem em solo brasileiro deu-se em terras nordestinas, mais
especificamente no ano de 1932, com “a publicação de Palhaçadas de João Grilo, de João
Ferreira de Lima, na tipografia Athayde, no Recife” (HAURÉLIO, 2010, p. 67).
No período em que o cordel foi lançado, era comum, nas capas dos folhetos, o nome do autor
ser substituído pelo do editor, que detinha os direitos da obra. Por isso, não raramente, vê-se
o folheto Proezas de João Grilo ser atribuído a João Martins de Athayde. Há, modernamente,
no entanto, um consenso de que o texto fora escrito por João Ferreira de Lima.
É no sertão nordestino que Grilo encontra acolhida. Sob o forte sol do sertão, renasce com
outras características díspares da sua representação portuguesa. Em 1948, João Ferreira de
Lima relança o cordel, batizado agora como Proezas de João Grilo. No texto, o personagem
ganha nascimento, infância e adultez. A morte? Essa não é contada, pois simplesmente
inexiste. Personagens, como João Grilo, não morrem jamais, pois renascem na memória dos
ouvintes e leitores e nas obras produzidas sobre eles. Daí sua vida ser um eterno re-
nascimento:
João Grilo é um ser especial, um ente único. Antes mesmo de nascer, eventos sobrenaturais
prenunciavam que estava por vir uma criatura que transformaria o mundo. Desprovido de
beleza física, superabundava em inteligência. A primeira sextilha apresenta o Amarelo em
tom profético, anunciando nascimento e morte. A voz narrativa, ao fundir ao discurso solene
um ar jocoso, sugere que transformações são essas que o personagem faria vir à tona: sua
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
presença seria incômoda onde estivesse e sua inteligência confundiria os sábios. No fim da
primeira sextilha, o prognóstico de que teria condições, pela sua sabedoria, de enganar até
mesmo a morte, fato que será narrado por Ariano Suassuna em seu Auto da Compadecida.
O título de cristão que recebe remete à religiosidade do povo do sertão, local onde o
catolicismo popular encontrou espaço para fincar seus pilares. Mentiroso, trapaceiro,
enganador. Diante de todas essas adjetivações, Grilo é cristão justificado, já que a maioria de
suas atitudes revela o forte desejo de um nordestino em sobreviver em meio à seca da região e
à aridez de ações do governo e das demais instituições oficiais.
Antes de nascer, já fazia prodígios, como falar no ventre da mãe. Parecia saber, o ardiloso,
que nessa vida, o pobre não pode contar com a sorte para enriquecer, nem mesmo apostando
no jogo do bicho. Resta-lhe, portanto, a astúcia para driblar a fome e a morte todos os dias.
Mas isso não o intimida. Grilo, ansioso para vir enfrentar a vida e dar trabalho a ela, nasce
dois meses antes do previsto. A noite de sua chegada foi marcada por estranhos eventos:
O nascimento de João Grilo apresenta traços que se assemelham ao de Jesus. Assim como,
durante o nascimento de Cristo, a natureza se manifesta, estranhos eventos marcam a vinda
do personagem nordestino: um eclipse lunar, um vulcão em erupção e um lobisomem são
evidências que aquele dia é especial e que, da mesma maneira que o mundo seria
transformado pela vinda do Filho de Deus, o sertão seria revirado pelas ações de Grilo. Não
há pretensão em transformar o personagem em divindade, nem de aproximá-lo da figura de
Jesus, mas em ser seu contraponto. Se de um lado, tem-se Emanuel e seu sério discurso de
salvação da humanidade, do outro, aparece João Grilo e seu discurso chistoso de salvação de
si mesmo: a seriedade do discurso da religião versus a pilhéria da linguagem popular. Mas é
na hora da necessidade que o pícaro reconhece sua pequenez diante do Salvador. Aí utiliza de
suas artimanhas para garantir a benevolência do Manuel do catolicismo popular, que
também se diverte com as palhaçadas do pícaro e percebe que a vida é muito mais fácil de ser
vivida com doses de humor.
As características físicas de João Grilo afastam-no de qualquer previsão de vida longa ou de
êxito: sem beleza física, era de baixa estatura, franzino e barrigudo, enfim, representava o
menino que, desnutrido, não conseguira crescer adequadamente. Sua vida é, como de tantos
sertanejos, um milagre desses que só existem no Nordeste. A barriga grande é causada pela
esquistossomose, o que dá um ar risível, já que sua descrição aponta para uma criança magra
que carrega o peso de uma barriga repleta de vermes conseguidos por ingerir alimentos mal
lavados e água de cacimbas, sem tratamento. Daí a alcunha de Amarelo, como muitos outros
pequenos nordestinos. Contra todas as previsões, João Grilo cresce irrequieto. Na região
onde morava, cresceu, fazendo-se conhecido pelas suas intromissões nos mais diversos
assuntos. É desde pequeno que Grilo constrói sua fama de pícaro:
Em João Grilo, a picardia ganha ares requintados. Se o pícaro clássico age tão-somente para
garantir o direito à vida, João Grilo alia tal necessidade com o mais puro prazer de burlar os
outros. Desde a infância, aprendera a rir dos outros. Nascera para tal. Suas aventuras
parecem não ter fim: o quase afogamento de um vaqueiro na cheia do rio, a garapa com rato
morto oferecida ao padre, o penico da mãe oferecido como cuia de água ao vigário, a pretensa
confissão que gerou a nudez do cura e a vingança contra o português vendedor de ovos são
algumas de suas peripécias registradas no cordel.
Como perdera o pai aos sete anos, a sua mãe era a única referência familiar que possuía.
Transformara-se, desde cedo, no homem da casa com a morte do pai. Era preciso cuidar da
sua genitora. É desse modo que a escola torna-se um elemento secundário na vida de João
Grilo, tendo frequentado o ambiente educacional dos sete aos dez anos somente. Sua
sabedoria, portanto, é advinda de lugares não formais de saber. Por isso, também, a escola
não o atraiu. Em três anos, percebeu que o seu saber não cabia nas quatro paredes daquele
prédio que guardava o conhecimento oficial. Ao questionar o professor dos saberes práticos,
não obteve resposta:
Ele já detinha o conhecimento necessário para sobreviver, o saber da vida. É das ruas, dos
campos e do contato com as pessoas que nasce o saber do Amarelo, uma ciência do riso, um
conhecimento da alegria mesmo em face dos obstáculos. Quer seja enfrentando ladrões, ou
mesmo os desafios de um sultão, João, em cada ato, torna-se exemplo e imagem de uma
camada social abandonada à própria sorte. Cada vingança de Grilo é uma vingança do povo
que representa contra os poderosos e representantes do governo. Rir das ações do pícaro não
é somente aprender a rir da sua própria situação, mas também crer que é possível vencer o
nobre, sendo plebeu, subjugar o forte, sendo fraco, dominar o rico, sendo pobre:
Humilhando, pelo riso, os seus algozes, o anti-herói realiza uma catarsis reveladora
do caráter e disposição de luta e resistência do povo de que é símbolo. Justamente
por representar a gente simples e, em consequência os sofrimentos e mágoas das
populações oprimidas é que o herói se identifica como o flagelo do Poder. Por isso
todas as formas de poder no Nordeste são atingidas [...] (ARAÚJO, 1992, p. 7-8).
Grilo não completa os doze trabalhos, pois somente dez questões lhe são apresentadas pelo
Sultão. Isso é o bastante para que ele consiga a confiança do rei e tenha a sua vida
transformada. Passa de pobre a rico e realiza o sonho de todo pobre sertanejo, não precisar
ganhar o sustento pelo suor do seu trabalho. A septilha supracitada atesta que do palácio o
Amarelo não saiu mais, aproveitando a boa vida conseguida até a sua morte. É claro que o
narrador não fala, no entanto, na segunda vida do farsesco, outra peculiaridade do
personagem a ser tratada por Suassuna em sua obra. Até a morte, a primeira, Grilo
contentou-se em ficar na corte, regalando-se com as mordomias recebidas, mas é certo que
depois ele pulou, como grilo que é, por outros caminhos, conhecendo outras realidades,
experimentando outras aventuras.
Diferente das versões lusitanas aqui apresentadas, o João Grilo brasileiro assume a função de
legislador do Egito. Utiliza a sagacidade que possui para “adivinhar” as pendências a ele
trazidas. Com exceção do conto compilado por Teófilo Braga, em todas as outras variantes,
Doutor Grilo sai às pressas do castelo, temendo o fim de sua sorte e, consequentemente, a sua
sentença de morte. Nas Proezas de João Grilo, o personagem decide residir no palácio e
mais, assume importante cargo de legislador. Semelhante ao patriarca José, no Egito, que
passou de escravo condenado a governador, por ordem do Sultão, e também em terras
egípcias,
Todas as proezas do reino
Era João que deslindava.
Qualquer pergunta difícil
Ele sempre decifrava.
Julgamentos delicados,
Problemas muito enroscados,
O João Grilo desmanchava
(LIMA, 1979, p. 25).
Se, no mundo prático, está difícil visibilizar direitos iguais para todos, no cordel sobre João
Grilo ela se faz presente com a atuação do pícaro que, mesmo rico, continua a agir conforme
seu pensamento de justiça. Mas a justiça de um pícaro não transita pelos mesmos vieses que
a oficial. Ela se dá da forma como o personagem aprendeu nas suas lutas diárias, passando
por cima de códigos de conduta, esquecendo-se de leis morais, regras sociais e práticas
jurídicas. Para o anti-herói, não basta lograr êxito em suas ações, elas precisam gerar o
próprio riso, o riso de outros personagens e o riso dos seus admiradores, sejam os ouvintes
das versões orais da história de Grilo, sejam os leitores, nos cordéis que ele protagoniza ou os
espectadores, da peça de Suassuna e das adaptações fílmicas:
A última aventura “grilesca” se passa em um reino de outro sultão. Por sua fama ter-se
espalhado, é convidado, com honras de Estado, a fazer-se presente para ser aclamado por sua
sabedoria e senso de justiça. Toda a corte se prepara para receber o grande João Grilo que se
apresenta simplório, com as vestes remendadas e os sapatos furados. Para decepção do paço,
aquele era o renomado juiz. Nesse enredo, a supervalorização das aparências é o mote
utilizado para questionar os valores de uma sociedade baseada em futilidades, como roupas,
calçados e acessórios. A moda, vista como vazia, é a simbologia de uma sociedade também
oca. Por mais que os atributos de Grilo fossem cantados em prosa e em verso, era a sua
aparência o que toda a corte aguardava. Em um mundo onde as vestes valem mais do que
quem as usa, não pode haver justiça social. Em um lugar onde a preocupação central é o
exterior, não sobrará tempo para o requinte das virtudes, o esmerilhamento dos valores
pessoais ou o aperfeiçoamento do bem coletivo. Essa é a prova da história, mas desta vez, é
João Grilo quem a propõe a todo o reino que está visitando.
Quando estava maltrapilho, fora maltratado, levado para alimentar-se na cozinha, longe dos
membros da corte, separado do convívio com os nobres, sofreu injúrias e toda sorte de
preconceitos. Então, veste-se com as roupas finas, que havia trazido em sua bolsa, e exibe-se
diante do público no castelo. Para comoção geral, todos se regozijam com o João Grilo bem
trajado, e reconhecem nele, agora, o grande juiz. O banquete, feito para ele, pode ser servido
com todas as pompas, mas o Grilo legislador precisa, enquanto defensor da essência do ser
humano sobre a sua aparência, levar as pessoas à reflexão. Assim,
Como em uma fábula, o Grilo encerra sua estada na corte com uma lição de moral a ser
seguida: não se pode medir a capacidade intelectual humana por aquilo que se veste, mas os
atributos a serem venerados são a sabedoria e a caridade. A homenagem recebida não lhe
dizia respeito, mas era para seus ricos trajes. Desse modo, a estes ele o repassava. O outrora
pícaro, agora se estabelece como um homem sapiente que, na maturidade, depois de ter
passado privações e obtido riquezas, não mudou. Em seu cerne, havia o mesmo morador do
sertão nordestino, que aprendera a ver o sofrimento alheio com o seu próprio sofrimento.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O pícaro só existe onde existe a privação, onde habita a necessidade. Rico, João Grilo
distancia-se dessa sua faceta e parece perder parte do seu veio cômico. O folheto Proezas de
João Grilo, escrito originalmente em sextilhas. As 31 primeiras estrofes fazem parte desse
primeiro texto publicado. A esse material, foram acrescidas 95 estrofes em septilhas. Há,
claramente, dois Joões Grilos no cordel de João Ferreira de Lima. O primeiro, cantado em
estrofes de seis versos, é o pícaro brasileiro, o anti-herói nordestino que, sagazmente, cria
suas artimanhas, gera o riso fácil, mesmo moralizador em vários momentos. A alegria pessoal
está acima de qualquer outro motivo para esse Grilo dos trópicos:
A vingança é arma que usa como reparação dos males cometidos pelos poderosos contra ele,
para tal utiliza a inteligência, pois é destituído de força física. Cada ação premeditada possui a
intenção de gerar o cômico. Não basta a vingança, ela precisa ridicularizar o algoz aos seus
olhos, aos olhos do inimigo e, principalmente, às vistas do público-leitor, dos ouvintes e dos
espectadores. Esse João Grilo nordestino carece de plateia, ele gosta de ouvir seus feitos
serem repetidos mundo a fora.
Com o excerto dos versos de sete sílabas, vê-se surgir outro João Grilo, à imagem do
personagem lusitano, que dependia muito mais da sorte que da própria sabedoria para
enriquecer. O Doutor Grilo é bem mais moralista que sua versão tupiniquim. E, embora
acrescido de um discurso social, a abastança tira-lhe o ânimo para criar suas artimanhas.
Rico, o personagem perde todos os oponentes que tinha. Com a fome aplacada e sem a
urgência diária de lutar pela sobrevivência, passa de réu dos próprios malfeitos para juiz das
tiranias alheias.
Sem fome não há pícaro, sem disparidades sociais inexistem os ardis do personagem.
Paradoxalmente, sem essas privações também rareia o riso, cessa a alegria. Por isso, a verve
picaresca desse herói nordestino prevalece sobre a outra, vinda de além-mar. Os textos
posteriores que falam de João Grilo conservam o caráter folgazão do personagem, ou seria
sua falta de caráter, ou um caráter móvel, moldado a seu bel prazer? De qualquer forma, isto
não é visto como demérito, pelo contrário, nas suas peripécias, João Grilo encarna centenas
de milhares de pessoas que se sentem reparados pela sua justiça enviesada.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
REFERÊNCIAS
ABREU, Márcia. Histórias de folhetos e cordéis. Campinas, São Paulo: Mercado de letras, 1999.
ARAÚJO, José Anchieta Dantas. As proezas de João Grilo e o capitão do navio. Fortaleza: Publicação do autor,
2010.
ARAÚJO, Jorge de Souza. João Grilo: síntese e transparência do anti-herói popular. Em: Sitientibus. Feira de
Santana: Universidade Estadual de Feira de Santana, v.6, n. 9, jan./jun. 1992. pp 5-19.
HAURÉLIO, Marco. Breve história da literatura de cordel. São Paulo: Claridade, 2010.
LIMA, João Ferreira de. Proezas de João Grilo. São Paulo: Luzeiro, 1979.
NASCIMENTO NETO, João Evangelista do. Um passeio pelo reino da picardia: as peripécias de Lázaro e João
Grilo no diálogo entre O Lazarillo de Tormes e o Auto da Compadecida. 2011, Inédito.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
ENCONTRO COM EUCLIDES DA CUNHA, EM OS SERTÕES, SOB A LUZ
DA HERMENÊUTICA DE GADAMER: UMA TENTATIVA DE DIÁLOGO
Abstract:
Hermeneutics, resized by Hans - Georg Gadamer, is our approach to analysis of some points
of the book Rebellion in the Backlands, Euclides da Cunha. Making use of one of the
fundamental elements, prejudice, divided into true and false, made scansion of several points
in the book under review. We have seen that the true prejudices focused on the knowledge of
the place, the earth, while the false, upon man, the people and about the war, the
phenomenon. We will use a few moments of the text, highlighting excerpts of the three parts
that make up the work to enable us her ample frame. Divided according to the naturalistic
nature that underlies the work, Euclides da Cunha divided his work in the following
sequence: I - THE EARTH II - MAN, III - THE FIGHT. It should be noted also, another
aspect of the Euclidean thought, the work examined here, is that in which we are confronted,
within the colonized land, with those considered non-Modern and Modern. Belonging to the
first group, the inhabitants of the coast, and the second, sertanejos provincials. The
achievement of Euclid did arise in the country, which held that knowledge literate, the logos,
feeling that Brazil was more of a coastline. And what made the literary monument never seen
before, which remains to this day as a source of discussions on a possible classification of the
text, a thesis, an essay, a novel, etc.
INTRODUÇÃO
A Modernidade e seus reflexos na vida comum da humanidade transformaram-se em
cláusula pétrea, mesmo dentro daquele ambiente, daquele modo de operar o pensamento, a
intelectualidade. Em outras palavras, ser Moderno consolidou-se como sinônimo de
Humano, dono do curso natural das coisas, domador, manipulador do curso da natureza.
___________
*Secretaria de Educação do Estado da Bahia, Fátima-Bahia, Mestre em Educação, professor.
[email protected]
No Brasil, periferia do globo, tivemos como em toda a América Latina, tomou-se emprestado,
inclusive, uma frase também sinônimo de Modernidade, “estamos condenados à civilização”,
usado com frequência por um ícone da chamada modernidade brasileira, Euclides da Cunha,
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
militar republicano, que teve seu auge na intelectualidade nacional no final do século XIX e
primeira década do século seguinte. Entre outras profissões, o dr. Euclides também foi
engenheiro, geógrafo, jornalista e escritor. Foi a partir deste último papel social que seu
nome ganhou projeção nacional e, posteriormente, internacional.
O seu livro, OS SERTÕES, publicado em 1902, maior obra da sua produção e considerado o
livro a obra prima nacional, foi considerado por uma das maiores intelectualidades
brasileiras da época, o abolicionista Joaquim Nabuco, a bíblia da nacionalidade. Pensado,
elaborado, organizado e construído sob o pensamento positivista e naturalista, vigentes à
época na hegemonia do pensamento europeu e, por extensão, pelo resto da humanidade
intelectual também hegemônica, o livro será aqui analisado a partir da hermenêutica de
Hans-Georg Gadamer, quando utilizaremos a categoria preconceito, tanto em sua origem
filosófica, quanto em seu uso popular.
Há que se observar também, outro aspecto do pensamento euclidiano, na obra aqui
analisada, é aquela em que nos defrontamos, dentro das terras colonizadas, com os
considerados Moderno e não-Moderno. Pertencendo ao primeiro grupo, os moradores do
litoral e, ao segundo, os sertanejos, interioranos. Desta forma vemos ser reproduzida a
mesma relação do europeu, o colonizador, Moderno, para com os latino americanos, os
colonizados, os não-Modernos. É o pensamento, o logos, europeu, em terras não europeias,
fenômeno que consolidou ainda mais a noção de dependência destas terras, o novo mundo,
para com o velho mundo, a Europa.
Neste sentido, o percurso científico-literário e o objeto de estudo de Os sertões compreendem
e inserem-se, na visão de Nestor Canclini, na tentativa de compreensão via hibridização,
posto que mesmo sendo um país aspirante a nação, havia claramente dois Brasis, o menor,
que copiava (ou tentava copiar) o modelo de vida europeu, em particular o francês e outro,
muito maior, que não havia atingido a Modernidade, que estava na pré-história da
civilização.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
2 UM DIÁLOGO COM GADAMER PARA A BUSCA DA COMPREENSÃO DOS
TRAÇOS FUNDAMENTAIS DE UMA EXPERIÊNCIA HERMENÊUTICA
Assim, o empreendimento hermenêutico ganha um solo firme sob seus pés. Aquele
que quer compreender não pode se entregar de antemão ao arbítrio de suas próprias
opiniões prévias, ignorando a opinião do texto da maneira mais obstinada e
consequente possível – até que este acabe por não poder ser ignorado e derrube a
suposta compreensão. (GADAMER; p. 358)
124
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Com os sugestivos questionamentos “Como se começa o trabalho hermenêutico? Que
consequências tem para a compreensão a condição hermenêutica de pertencer a uma
tradição?” (p. 385), Gadamer vai delineando o modus operandi hermenêutico e a fim de nos
assentar quando/onde a compreensão ganha corpo, toma forma.
Termos e expressões como tempo e distância temporal são elementos-chave para a
tentativa de compreensão. Para maiores esclarecimentos, Gadamer usa a obra de arte e sua
relação com o intérprete, o qual afirma, buscando em Heidegger que aquilo que sabemos,
inferimos, não é uma ação individual, do ego, mas aquilo que a nossa convivência determina.
É um continum ir e vir (GADAMER; p.388)
Diferentemente do que se supõe, o tempo e a distância temporal entre o intérprete e a obra
não constituem obstáculos para a manutenção do diálogo, da busca da compreensão, da
possibilidade de avaliações, de inferências. Muito pelo contrário, esse intervalo cronológico
gera uma riqueza de informações A CONCEPÇÃO PRÉVIA DE INFORMAÇÕES, construindo,
dessa forma, um círculo produtivo. Conforme salienta Gadamer (p.395):
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
3.1 O(OS) PRECONCEITO(S) EM OS SERTÕES
Para escrever a bíblia da nacionalidade, conforme o contemporâneo Joaquim Nabuco se
reportou ao livro do chamado dr. Euclides, o autor, como salientamos no início desse
trabalho, valeu-se de diversas informações, dentre as mais importantes podemos destacar os
estudos realizados pelo engenheiro Teodoro Sampaio, um dos poucos homens negros com
atividade intelectual no século XIX neste país de mestiços. Mas as fontes foram além,
inclusive com pesquisas do tipo entrevistas com soldados e sertanejos vindos do campo de
batalha, na estação de trem do bairro da Calçada, na capital baiana, Salvador.
Fazendo uma analogia com a noção de preconceito exposto por Gadamer, nosso interlocutor
maior nesse trabalho, podemos considerar que Euclides da Cunha fez uso dos preconceitos
falsos e dos preconceitos verdadeiros.
Para o primeiro tipo, os falsos, podemos destacar dois dos mais conhecidos deles: o primeiro
diz respeito ao moto propulsor do que acontecia no interior da Bahia. Para tal, faremos uso
de dois exemplos retirados de dois artigos publicados por Euclides da Cunha, no jornal O
Estado de São Paulo, o mesmo que o contratou para fazer a cobertura da guerra. Os textos
receberam o mesmo nome e foram publicados respectivamente, nos dias 14 de março e 17 de
julho de 1897, constando, posteriormente o Canudos; Diario de uma expedição.
...a horda dos fanatizados sequazes de Antônio Conselheiro, o mais
sério inimigo das forças republicanas.(p. 121)
Identificados à própria aspereza do solo em que nasceram, educados numa rude es
cola de dificuldades e perigos, esses nossos patrícios do ser tão, de tipo et no
logicamente indefinido ainda, refletem naturalmente toda a inconstância e toda a
rudeza do meio em que se agitam.(...)
Como na Vendéia o fanatismo religioso que domina as suas almas ingênuas e simples
é habilmente aproveitado pelos propagandistas do Império. (p. 124)
Vestido de couro curtido, das alparcatas sólidas ao desgracioso chapéu de abas largas
e afeiçoado aos arriscados lances da vida pastoril, o jagunço, traiçoeiro e ousado,...(p.
127)
Nesse trecho temos uma das muitas confusões tipológicas quando identifica o homem
sertanejo com um tipo do lugar, o homem que vive para proteger uma propriedade ou um
serviço a mando de uma autoridade – política ou econômica – de um determinado lugar.
E quanto ao segundo exemplo, aquele que incide sobre o habitante do lugar, o sertanejo.
O sertanejo é, antes de tudo, um forte. Não tem o raquitismo exaustivo dos mestiços
neurastênicos do litoral.
A sua aparência, entretanto, ao primeiro lance de vista, revela o contrário. Falta-
lhe a plástica impecável, o desempeno, a estrutura corretíssima das organizações
atléticas.
É o homem permanentemente fatigado.
Reflete a preguiça invencível, a atonia muscular perene, em tudo: na palavra
remorada, no gesto contrafeito, no andar desaprumado, na cadência langorosa das
modinhas, na tendência constante à imobilidade e à quietude.
Entretanto, toda esta aparência de cansaço ilude.(p. 77 – grifo nosso)
Apesar de extensa, a citação é uma das descrições mais usadas dentre tantas que Euclides usa
em Os Sertões. Nela temos um misto de ideias preconcebidas, o que entendemos aqui como
preconceitos falsos, mas o mesmo autor “ressalva” seu ideário ao concluir de modo
“compensador”.
Para o segundo tipo, os verdadeiros, destacaremos alguns vistos nos mesmos textos em que
vimos os falsos preconceitos:
As aves que tinham emigrado para as margens e lugares próximos dos rios e
mananciais voltam a suas habitações. Foi ali que compreendemos quanto é bem dado
aos papagaios o nome específico de festivus. Com efeito, quando chegam os bandos
destas aves a gritarem alegremente, acompanhadas de um sem-número de outras,
começam logo a se animar aquelas paragens e como que a natureza desperta. “Então,
o sertanejo é feliz e não inveja nem mesmo os reis da Terra! Como se vê naquela
região, intermitentemente, a natureza parece oscilar entre os dois extremos – da
maravilhosa exuberância à completa esterilidade. Este último aspecto, porém,
infelizmente, parece predominar.(p. 122)
126
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
É pública e notória a pesquisa de campo e bibliográfica realizada por Euclides para conhecer
o lugar onde ocorria o conflito e aqui temos um exemplo no qual o escritor revela seu
conhecimento.
Ao se referir à ação do Exército no campo de batalha assim se expressa o nosso interlocutor
nesse momento deste trabalho:
Prolongando-se para o norte, ao atingir o morro da Favela, eixo das operações do
nosso Exército, os grandes acidentes de terreno derivam para leste e depois para o
norte e subseqüentemente para noroeste, como que estabelecendo em torno de
Canudos um círculo de cumeadas, cortado pelo Vaza-Barris em Cocorobó. A marcha
do Exército republicano opera-se nesse labirinto de montanhas. Não é difícil
aquilatar-se a imensa série de obstáculos que a perturba.(p. 127)
O sol poente desatava, longa, a sua sombra pelo chão, e protegido por ela – braços
largamente abertos, face volvida para os céus, - um soldado descansava.
Descansava... havia três meses.” (...) “O destino que o removera do lar desprotegido
fizera-lhe afinal uma concessão: livrara-o da promiscuidade lúgubre de um fuso
repugnante; e deixara-o ali há três meses – braços largamente abertos, rosto voltado
para os céus, para os sóis ardentes, para os luares claros, para as estrelas fulgurantes
(p.28 – grifo nosso)
Somos desafiados no encerramento deste item com um quadro da paisagem sob a ótica do
invasor, de um viajante, ao se deparar com um oásis.
O narrador define a seca e o sertão de Canudos como sendo o local que resume todo o
semiárido, ao tempo em que expõe um quadro do calendário daquele fenômeno natural, o
qual é denominado de “...vicissitudes climáticas...” (p.32). Indica-nos também preocupações
de parlamentares acerca do fenômeno, inclusive a divulgação de uma tese sobre a
periodicidade dela, a seca. Segundo Euclides o que motiva a existência da seca é a falta de
ventos favoráveis ao surgimento de chuvas, bem como a disposição de serras que
proporcionem a presença desses, os ventos.
127
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A caatinga é apresentada como grande adversário dos que nela nunca entraram ou nunca
viram. A sequência a seguir, além da situação indicada, expõe o uso do verbo numa tentativa
de ampliar a condição de tamanho entre o homem e a natureza.
Ao passo que a caatinga o afoga; abrevia-lhe o olhar; agride-o e estonteia-o; enlaça-o
na trama espinescente e não o atrai; repulsa-o com as folhas urticantes, com o
espinho, com os gravetos estalados em lança; e desdobra-se-lhe na frente léguas e
léguas, imutável no aspecto desolado: árvores sem folhas, de galhos estorcidos e
secos, revoltos, entrecruzados, apontando rijamente no espaço ou estirando-se
flexuosos pelo solo, lembrando um bracejar imenso, de tortura, da flora agonizante...
(p.35 – grifo nosso)
Uma breve viagem sobre variados aspectos climatológicos brasileiros, proporciona ao leitor a
visão que Euclides tem sobre a relação intrínseca entre o tipo humano e o clima dos lugares,
dos Brasis. É importante destacar que o autor entende que o português “povo” precisa de
“mistura” a fim de poder resisti às variações climáticas que o país possui, entretanto salienta
que a capacidade intelectual diminui. Esta era a teoria predominante à época. “É natural que
estas camadas profundas da nossa estratificação étnica se sublevassem numa anticlinal
extraordinária — Antônio Conselheiro... A imagem é corretíssima.” (p. 96)
Recorrendo à riqueza da metáfora, Euclides apresenta Antonio Conselheiro, um ser oriundo
do âmago de um núcleo gerador de potencialidades. Contrapondo a postura científica do
geólogo, ante a do historiador, sendo para o 1º a montanha, para o segundo, o homem – o
Conselheiro, Euclides destaca 03(três) características de situação, a saber: isolado, incluído e
em função do meio. Segue o autor, ora delineando o desenvolvimento psíquico do
Conselheiro, ora relacionando a barbárie ou fetichismo, ora enaltecendo seu atavismo,
considerada esta como o que dá forças ao andarilho, em busca dos seus princípios como
humano.
Euclides apresenta o novo Antonio Vicente, o Conselheiro, figura-parte do cenário, da
paisagem natural, mística dos sertões (vê-se que o autor nos informa a quem recorreu para
traçar a rota e o comportamento do futuro líder: “um velho caboclo, preso nos últimos dias de
campanha...”(p. 103)
O narrador enfatiza sobre o “surgimento” do Conselheiro, o papel fundamental do povo, da
multidão na criação do mito: “A multidão (...). Criava-o. Ampliava-lhe, desmesuradamente, a
vida, lançando-lhe os erros de dois mil anos”(ibidem).
A fama do Conselheiro começa a se espalhar pelo Brasil e, como para confirmar essa situação,
Euclides apresenta um trecho de notícia sobre o andarilho na qual se vê a intenção de quem o
escreveu. Euclides identifica o primeiro percurso do religioso sendo Itabaiana, Conde,
Itapicuru o primeiro trecho que se tem notícia (não necessariamente nessa ordem), mas a
passagem por Sergipe fora registrada no jornal O Rabudo, de Estância.
O episódio da prisão do Conselheiro, acusado de assassinar a esposa e a própria mãe, serve
como reforço a imagem do milagreiro, pois retorna exatamente no dia em que diz que voltará
128
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
à Itapicuru de cima, onde fora detido. Sua peregrinação e força religiosa ganham mais ânimo
e os seguidores aumentam. Assim reina absoluto sobre nossa região.
Em toda esta área não há, talvez, uma cidade ou povoado onde não tenha aparecido.
Alagoinhas, Inhambupe, Bom Conselho, Jeremoabo, Cumbe, Mucambo, Maçacará,
Pombal, Monte Santo, Tucano e outros viram-no chegar, acompanhado da farândola
de fiéis. Em quase todas deixava um traço da passagem: aqui um cemitério arruinado,
de muros reconstruídos; além uma igreja renovada; adiante uma capela que se
erguia, elegante sempre. (p. 106)
III A LUTA - Considerada por muitos, como a principal parte, visto que é nela que consiste a
necessidade da presença de Euclides da Cunha em terras baianas. É a mais longa do livro e
tenta corresponder às investidas do exército brasileiro contra o povo do lugar, Canudos. Com
um título bastante sugestivo, Causas próximas da luta e Uauá, e um parágrafo inicial ainda
mais provocativo, “Determinou-a incidente desvalioso”, Euclides nos informa que o motivo
do início das investidas do governo da Bahia e, por conseguinte, do Brasil, contra o
Conselheiro e sua gente, deveu-se ao juiz Arlindo Leone, que criou uma situação, a qual
exigia a presença das tropas naquela cidade. Note que houve uma querela entre este e o
Conselheiro em Bom Conselho, mas que anteriormente Euclides não cita, fazendo uso do
recurso narrativo.
Antônio Conselheiro adquirira em Juazeiro certa quantidade de madeiras, que não
podiam fornecer-lhe as caatingas paupérrimas de Canudos. Contratara o negócio com
um dos representantes da autoridade daquela cidade. Mas ao terminar o prazo
ajustado para o recebimento do material, que se aplicaria no remate da igreja nova,
não lho entregaram. Tudo denuncia que o distrato foi adrede feito, visando o
rompimento anelado.(p. 131 – grifo nosso)
Para tal, o autor faz uso de correspondências oficiais, trocadas entre o governador da Bahia,
Luiz Viana e o presidente da República, Prudente de Morais.
Segundo Euclides, o governo baiano não deu importância necessária ao episódio; a partir
disso, o autor refaz a saga do Conselheiro pela Bahia ao relatar as construções de igrejas,
cemitérios, bem como a reforma e/ou ampliações desses mesmos prédios. Outro destaque é
dado à cronologia do evento cujas datas vão dando aos leitores a dimensão exata do episódio,
inclusive a dificuldade por qual passava a soldadesca.
Novamente fazendo referência ao ambiente físico da guerra, o autor reforça a situação de
cansaço provocada pelo sol escaldante do sertão, a inexistência de árvores frondosas que
permitam o sombreamento e, o mais grave, o período de estiagem daquele momento, em um
ambiente em que a escassez de água é uma triste realidade.
As dificuldades encontradas na aquisição de elementos essenciais à marcha ali
retiveram a força até ao dia 12 em que partiu, ao anoitecer, quando, certo, já chegara
a Canudos a nova da investida . Partiu sem os recursos indispensáveis a uma
travessia de duzentos quilômetros, em terreno agro e despovoado, orientada por dois
guias contratados em Juazeiro.(...) (p. 133)
Quando chegam à primeira povoação, antes do Belo Monte, a pequena Uauá, a tropa é
recebida com espanto. Euclides nos informa acerca da sua formação atual, a presença
129
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
naquele ermo, para aqueles que viviam na caatinga tratava-se de uma grande cidade. Ali a
tropa descansa, o que sugere a derrota iminente, pois também tinha, naquele lugarejo,
adeptos do Conselheiro.
Enquanto os soldados descansavam da penosíssima travessia, os conselheiristas invadiam o
povoado, entretanto não entoavam gritos de guerra, mas rezas; alguns munidos de objetos,
símbolos do catolicismo, outros de armamentos rudimentares. Entretanto, o modo de ação
foi tão assustador e repentino, que os soldados entraram em desespero e não tiveram tempo
de se organizarem taticamente (se é que existia essa tática). E, mesmo com muito menos
baixas, abandonaram o lugar. “Este movimento foi instantâneo e foi, afinal, a única
manobra percebida pelos que testemunhavam a ação. Dali por diante não a descrevem os
próprios protagonistas. Foi uma desordem de feira turbulenta.” (p. 136)
Note-se que Euclides afirma que o médico da expedição enlouqueceu, tamanho o susto e as
dificuldades de curar os enfermos; e os soldados retornaram a Juazeiro aos frangalhos, como
se tivessem perdido a batalha – em relação à quantidade de baixas, a tropa venceu, mas como
sabemos... –
A população alarmou-se, reatando o êxodo. Ficaram de fogos acesos na estação da
via-férrea todas as locomotivas. Arregimentaram-se todos os habitantes válidos,
dispostos ao combate. E as linhas do telégrafo transmitiram ao país inteiro o
prelúdio da guerra sertaneja... (p. 137 – grifo nosso)
Este último momento, a seguir e pertencente à 3ª expedição, demonstra que ambos os lados
perderam nesta batalha. Destacamos a “engenhosidade” do poeta Euclides ao pintar esta
paisagem bela e ao mesmo tempo fúnebre, sobre o modo como os conselheiristas recolhem
seus cadáveres, moribundos e feridos. Atentemos ainda para o uso dos verbos no gerúndio,
proporcionando assim uma dinâmica à ação.
À tarde ultimava-se a missão piedosa.
Faltavam poucos, os que a tropa queimara.
O fúnebre cortejo seguia agora para Canudos...
Muito baixo no horizonte, o sol descia vagarosamente, tangenciando com o limbo
rutilante o extremo das chapadas remotas, e o seu último clarão, a cavaleiro das
sombras, que já se adunavam nas baixadas, caía sobre o dorso da montanha...
Aclarou-o por momentos.
Iluminou, fugaz, o préstito, que seguia à cadência das rezas. Deslizou,
insensivelmente, subindo, à medida que lentamente ascendiam as sombras, até ao
alto, onde os seus últimos raios cintilaram nos píncaros altaneiros. Estes fulguravam
por instantes, como enormes círios, prestes acesos, prestes apagados, bruxuleando na
meia luz do crepúsculo.
Brilharam as primeiras estrelas. Rutilando na altura, a cruz resplandescente de Órion
alevantava-se sobre os sertões . . .(p. 168 – grifo nosso)
130
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
CONCLUSÃO A feitura de Os Sertões equivaleu à construção de um monumento, desses
vistos em diversas praças de diversos lugares, entretanto, diferentemente daqueles de
concreto, somente duas mãos foram utilizadas para o seu erguimento. A despeito das
pesquisas feitas anteriormente as quais constituíram a estrutura prévia do conhecimento do
escritor, mas foi ele o escultor, o operário, o ouvinte, o construtor, de fato e de direito.
Munido de um daqueles elementos caros à hermenêutica, o escritor valeu-se dos
preconceitos, tantos os preconceitos verdadeiros, quanto os preconceitos falsos. Vimos que
para os primeiros, o autor incidiu sobre os conhecimentos do MEIO – o lugar onde ocorreu o
fenômeno, e para os segundos, os falsos, O HOMEM, sujeito principal dos eventos, o
sertanejo e A LUTA, o fenômeno em si, que “exigiu” a presença do republicano, positivista e
civilizado Euclides da Cunha.
Entendemos que os preconceitos falsos recaíram sobre esses dois momentos do texto em face
tanto o sertanejo, homem do lugar, e a luta, modo de defesa do povo do lugar,
transformaram-se em elementos-surpresa para o Brasil civilizado, o Brasil que ignorava os
sertões do país, o Brasil que de fato desconhecia o outro Brasil. Desconhecimento no sentido
de desrespeito, não no sentido de não saber da presença daquele outro país dentro deste país.
O feito de Euclides fez surgir no país, daquele que detinha o saber letrado, o logos, o
sentimento de que o Brasil era muito mais que o litoral. E o fez com o monumento literário
nunca visto antes, o qual permanece até os dias atuais como fonte de debates sobre uma
possível classificação para o texto, se uma tese, um ensaio, um romance, etc.
REFERÊNCIAS
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CANCLINI, N. G. “Entrada” in Culturas híbridas:estratégias para.entrar e sair da Modernidade. 4 ed. São
Paulo:EDUSP. Trad. Heloísa P. Cintrão e Ana Regina Lessa. Trad. da introd. Gênese Andrade. 2013.
CUNHA, E. da. Os Sertões. São Paulo:Nova cultural. 2003.
__________.Canudos; diário de uma expedição. São Paulo:Martin Claret. 2006.
GADAMER, H.-G. “Os traços fundamentais de uma teoria da experiência hermenêutica inVerdade e método
I:traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica. 13 ed. Petropólis, RJ:Vozes e Bragança
Paulista,SP:Editora Universitária São Francisco. Trad. Flavio P. Meurer. 2013.
PAULA. A. C. de. A teia dialógica da teoria literária:uma proposição hermenêutica. 2008. Disponível em
http://www.ufvjm.edu.br/site/moebius/files/2011/03. Acessado em 22.12.2013, às 18:35h.
QUADROS, T. R. de. Hermenêutica e ensino de literatura. Disponível em http://w3.ufsm.br/senafe/Anais/Eixo.
3. Acessado em 22.12.2013, às 18:55h.
UNGER, N. M. “A desertificação do mundo contemporâneo” e “Da foz à nascente”, in Da foz à nascente:o recado
do rio. São Paulo:Cortez e Campinas:EDUNICAMP. 2001.
131
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
CARTOGRAFIA DO NOVO: O REGIONALISMO NA FICÇÃO DE BARTOLOMEU
CORREIA DE MELO
ABSTRACT: The fiction of Bartolomeu Correia de Melo was released to the public in the
second half of the 1990s, focusing mainly on storybooks. Under the title Lugar de estórias,
his first book was published in 1998. Short stories succeeded the last one, such as Estórias
quase cruas (2002) and Tempo de estórias (2009). The narratives of the three works are
backgrounded by the hinterland of Rio Grande do Norte, where the elements of tradition
clash with modernity. In addition to the plot – which absorbs the tension of this dispute – the
language incorporates the social relations of the peasant man, either by approaching the
orality or being supported by the lexical and syntactic regionalisms. By this arrangement, we
can say that the Melo’s fiction is the result of a literary use of a regional lexicon, although not
resulting in the breaking of ties with the historical moment to which it belongs. That being
said, this article aims to identify the representative elements of the literary tradition which
pinnacle is to add value to the community – in the specific case of the work of Melo, the
countryside of Rio Grande do Norte – highlighting those elements that have undergone
significant transformations and contribute for composing a new image of the northeastern
hinterlands and regional literature.
Keywords: Literature. Regionalism. Fiction. Tradition. Modernity.
‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡‡
Universidade Federal do Rio Grande do norte, Natal-RN. Especialista em Literatura Brasileira e
mestranda em Literatura Comparada. E-mail: [email protected].
132
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
INTRODUÇÃO
O sertão do nordeste, nunca em outro tempo e espaço, ganhou tanto relevo quanto na
literatura feita pelos escritores brasileiros durante os anos que compreendem a década de
1930. O sertão ali representado era o do sol que castigava o solo, o gado, o homem. O da
pobreza, do êxodo, da falta de esperança, apontando para um projeto ideológico literário, que
João Luiz Lafetá compreende como parte do movimento modernista, sendo dele, a sua
segunda parte.
Lafetá faz a distinção dos projetos do Modernismo (2000, p. 21) afirmando que o projeto
estético preocupava-se com a renovação dos meios e a ruptura da linguagem tradicional; e o
projeto ideológico, com a consciência do país, com o desejo e busca de uma expressão
artística nacional e com o caráter de classe de suas atitudes de produção.
É o que faz, por exemplo, no conto Transa de Gado, quando conta a história de uma mulher
sem nome, mas com marido, que se vê enredada nas artimanhas de um marchante bem
apresentado. À mulher é dado o papel de esposa, dona de casa e lhe é roubado o direito à voz;
e ao homem, o papel principal: de chefe. Mas é a mulher que, mesmo tendo seu lugar negado,
toma as rédeas dos acontecimentos e comanda o desfecho da situação.
133
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Transa de Gado é um dos dez contos do livro Tempo de estórias, publicado pela primeira vez
em 2009. Além deste, Bartolomeu Correia de Melo publicou em vida os livros Lugar de
estórias, vencedor do Prêmio Joaquim Cardozo, concedido pela União Brasileira de
Escritores em 1997 e Estórias quase cruas (2002). Além dos livros de contos, publicou dois
destinados às crianças: O fantasma bufão, (2004) e A roupa da carimbamba (2009). Após a
sua morte foram publicados dois novos livros: o infanto-juvenil A onça braba e o cachorro
velho (2012); e o de poesia, Musa cafuza (2013).
Nos livros de contos, Melo narra com minúcia a paisagem de suas histórias. Os cenários do
seu lugar e de sua gente – já deslocados no tempo – são construtos de uma linguagem
entalhada com poesia e marcada pela oralidade e cultura de seu povo. Sobre a linguagem
utilizada por Melo, Lourival Holanda (2012) diz ser o resultado de uma reelaboração de
formas de expressões correntes no Nordeste de hoje, capaz de perenizar a cultura de uma
região. Holanda (2012, p. 52) destaca o mérito incomum da narrativa de Melo ao dizer que
“reencontra a poética da fala popular, sem, no entanto, cair, por veleidades de fideísmos, no
risco de repetir a dicção do povo”. Sintetiza suas impressões acerca do modo de dizer de
Bartolomeu, afirmando que “dá canto e plumagem às palavras populares.” (HOLANDA,
2012, p. 50).
1. A MULHER
O lugar da mulher na literatura foi discutido por Luís Bueno em seu livro Uma História do
Romance de 30(2006). Fazendo uma análise mais demorada de romances que apresentaram
a mulher como personagem em transição – como procedeu com O Quinze, de Rachel de
Queiroz; e Maria Luizae Em Surdina, de Lúcia Miguel Pereira –, Bueno expõe a tese de que
havia dois lugares para a mulher, fixados no romance de 30: o da namorada e o da prostituta.
As mulheres de O Quinze, Maria Luizae Em Surdina não eram nem de um, nem de outro
tipo, por isso personagens de transição.
134
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
narradora, que ainda era “verde e destraquejada” (MELO, 2009, p. 79) 64. A observação que
faz sobre si mesma destaca a falta de maturidade que possuía quando se casou, bem como a
falta de malícia para os eventos do mundo, sendo ela a do tipo esposa e não prostituta, como
difere Bueno.
A narradora situa a sua falta de traquejo, o seu papel social e a paisagem sertaneja já no início
do conto, ao descrever a chegada do forasteiro. Personagem sem nome, mas que a narradora
lhe atribui inúmeros adjetivos. Ela percebe a chegada do homem no momento em que
tomava conta das panelas na cozinha, enquanto refletia sobre uma gravidez
malsucedida.Referindo-se ao marido ora como “Zé”, ora como “Zé-Meu”, conta que recebeu o
visitante com uma foice amolada nas mãos, debaixo de um pé de Juazeiro grande. A primeira
imagem do marido, a de homem bruto e de pouca conversa é reforçada logo em seguida, ao
reproduzir a postura dele diante do visitante: “Zé-meu, naquele jeito trancado dele, cubava o
cujo a meio-olho, respostando em bom-tom quase resmungando” (p. 79).
O visitante dizia-se interessado nos gados de Zé, e a convite do chefe da casa, entra para
tratar de negócio. O alpendre deixa de ser parte do ambiente privado do casal, passando
agora a pertencer aos dois homens. À mulher, apenas o “direito” de permanecer na cozinha
trabalhando. Mas, apesar do lugar que lhe é destinado, ela se aproxima da conversa,
esticando o pescoço para dar conta do andamento do encontro. A mulher conclui, ainda
longe, que as vestimentas de boa qualidade e a voz grave do visitante só podem ser de um
marchante.
Ao ser apresentada ao homem, a mulher parece dar um passo adiante em relação à sua
imaturidade e à falta de traquejo pois, de certo modo, encanta-se com a presença daquele que
não se sabe o nome, mas não se deixa levar por sua aparência:
O comprador, tipão de homem alvo, bem mais novo que Zé, sendo também mais
cheio, corado e afilado. Mostrava modos sertanejos, embora que menos ronceiros,
dizendo d’alguma fidalguia. Não nego que fosse tirado a bonito, vistoso mesmo (vige,
que Zé nem sonhe assim achando!...). Senti demora no aperto de mão e, bem
confesso, quase me encandeio no alumiar do sorriso, respeitoso, porém tinhoso (p.
80).
Depois do café tomado, a negociação do gado continua, a mulher temendo o pavio curto do
marido, que já não suportava o preço baixo colocado pelo marchante, interfere na conversa:
“Dei voto que os bichinhos fossem vistoriados, gavando-lhes o bom estado. Zé-Meu careteou
suspiroso, rejeitando meu pitaco” (p. 81). A mulher participa da conversa sem ser convidada,
e sob o olhar reprovador do marido, ainda percebe que está sendo admirada pelo homem,
como se fosse mercadoria. Diferente de Zé, o marchante concorda que é preciso ver o gado
antes de fechar a venda. O marido sai para buscar o gado sozinho, mas antes, encara a
mulher, como que a acusando de astúcia.
64
Deste ponto em diante serão fornecidas o número de páginas nas citações feitas do conto Transa de Gado, do
livro Tempo de estórias (2009).
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Nesta altura do conto, a mulher não é mais aquela descrita no início da narrativa: “verde e
destraquejada” (p. 82), a que poderia ser chamada de esposa. Está muito mais próxima da
prostituta. Isto porque o visitante lança olhares de interesse sobre ela e o marido lhe culpa
por estes olhares, como se fossem frutos do desejo dela.
É tão intensa a influência do romance de 30 na obra de Bartolomeu Correia de Melo, que nela
também é tratada a queda da mulher: a passagem de esposa a prostituta. Uma passagem
rápida, marcada pela perda da inocência. Bueno comenta sobre a transição de um para outro
status do papel feminino no romance de 30, dizendo que “nunca se viu tanta mulher caindo
na vida como no romance de 30” (BUENO, 2006, p. 303).
Depois que Zé parte para recolher o gado, deixando o homem e a mulher sozinhos em casa, é
iniciada uma sequência de diálogos, em que o visitante, já não precisando disfarçar seu
desejo, deixa explícito o seu interesse pela mulher. Após algumas investidas, compõe versos:
– A menina se desgosta
ou já entende, de início,
se lhe faço uma proposta?
Chegar onde a gente gosta,
pode ser ou tá difícil?... (p. 84)
As frases rimadas não encorajam a mulher, de outro modo, ela reage: “Vôtes, que moda mais
troncha!”. A esposa procura o marido, olhando pela janela. O marchante para disfarçar, faz
proposta de compra, mas a mulher recusa, dizendo que o acerto deve ser feito com Zé.
Mesmo a mulher rejeitando as investidas do homem, resolve colocar um ponto final na
história sem descartá-lo definitivamente: “Pra rejeitar sem maltratar, logo inventei desculpas
pelas grossuras de José, explicando que sofreres tidos na prisão – por morte, por roubo, não
– lhe renderam lunduns e malestouros” (p. 84).
O lugar de comando, conquistado após sua queda, fica evidente no desfecho do conto,
quando a sua palavra e a sua astúcia impedem que o marido seja enganado pelo marchante.
O homem, já bem à vontade na residência do casal sertanejo, oferece um baixo valor para o
gado e ainda diz que entregará o dinheiro depois. A mulher entra na conversa e pergunta ao
homem pela proposta feita há pouco. O homem fica pálido, gagueja e pergunta ao que está se
referindo. A mulher responde, dizendo que se trata da proposta de um valor bem acima do
136
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
falado para o marido. O homem trapaceado pela mulher, conclui: “Ah, sim! Sustento e pago
no dinheiro vivo!”.
A narrativa termina com a vitória da mulher sobre os dois personagens homens. Um deles o
marido, que não lhe dava o direito de atuar nas decisões da casa e lhe condenava pelo desejo
que o outro poderia sentir pela esposa; e o homem, que subestimara a capacidade da mulher
em compreender a intenção por trás do assédio explícito, fazendo com ele, o que certamente
teria feito com o seu marido: trapacear.
2. O NARRADOR
A ficção de Melo aproxima-se das narrativas da tradição oral, descritas por Benjamin (1993)
como aquelas em que o narrador formula sua fala a partir do substrato extraído da
experiência vivida e este narrador, segundo Benjamin, está em vias de extinção. Estaria
assumindo o seu lugar, um narrador fabulado pelo escritor que investe menos em produzir
conselhos do que em conduzir o leitor às venturas e desventuras de seus personagens.
A morte do narrador da tradição oral foi anunciada por Benjamin no ensaio O narrador:
considerações sobre a obra de Nikolai Leskov, escrito em 1936 – década que engendrou a
Segunda Guerra Mundial. Assim, não se trata apenas da morte do narrador, também da
morte do trabalho realizado com as mãos, da troca de olhares, da escuta, da experiência como
fonte de sabedoria. Para Benjamin, era justamente este, o lugar das narrativas tradicionais,
que, segundo o crítico, pressupõe modos de vida pré-capitalistas, antes mesmo de o homem
ser guiado pela técnica científica e viver sob a égide do capital.
A alma, o olho e a mão estão assim inscritos no mesmo campo. Interagindo, eles
definem uma prática. Essa prática deixou de nos ser familiar. O papel da mão no
trabalho produtivo tornou-se mais modesto, e o lugar que ela ocupava durante a
narração está agora vazio. (Pois a narração, em seu aspecto sensível, não é de modo
algum o produto exclusivo da voz. Na verdadeira narração, a mão intervém
decisivamente, com seus gestos, apreendidos na experiência do trabalho, que
sustentam de cem maneiras o fluxo do que é dito.) A antiga coordenação da alma, do
olhar e da mão (...) é típica do artesão, e é ela que encontramos sempre, onde quer
que a arte de narrar seja praticada. Podemos ir mais longe e perguntar se a relação
entre o narrador e sua matéria – a vida humana – não seria ela própria uma relação
artesanal. Não seria sua tarefa trabalhar a matéria-prima da experiência – a sua e a
dos outros – transformando-a num produto sólido. (BENJAMIN, 1993, p. 220).
Trata-se, então, de saber que a relação humana aventada pelo trabalho artesanal é deixada
para trás, uma vez que a ordem, no contexto da vida moderna, assume o lugar. Esvaziam-se
as relações diante da nova forma produtiva: aquela que paulatinamente substitui mãos por
máquinas, o homem pela função que exerce. O narrador é abalado por este novo modelo de
produção e passa a ser guia de um leitor solitário. Um leitor que abandona a escuta conjunta
– processada em conluio com as mãos e os afazeres – para ficar apartado da coletividade
diante de um livro. Diz Benjamin (1993, p. 201) que a origem do romance tradicional é o
indivíduo isolado, que não pode mais falar exemplarmente sobre suas preocupações mais
importantes e que não recebe conselhos nem sabe dá-los.
A conversa entre as mulheres se passa na casa onde ocorreu o fato. Inicialmente elas estão na
cozinha: “Daqui mesmo da cozinha, espichei pescoço pela janela do oitão”. Em seguida a
narradora se refere à cozinha como se estivesse distante dela: “escapuli pra cozinha, dizendo
ser mode o café” (p. 80). A mudança de local é confirmada quando a mulher fala do alpendre
como se ele estivesse próximo: “Saída aí neste alpendrinho, aguardei curiosa” (p. 80). A
aproximação e o distanciamento dos ambientes da casa em relação ao fato narrado apontam
para a tradição de contar histórias, descrita por Benjamin, onde a experiência da voz se
aproxima da experiência do corpo. Percebe-se que, paralelo à narrativa, alguma ação está
sendo executada por quem conta a história – provavelmente relacionada com atividades
domésticas – e acompanhada por quem a ouve.
Outro elemento que contribui para a composição de uma narrativa oral é a utilização de
expressões faladas no sertão do conto de Melo: “destraquejada”, “derna de agosto”, “espichei
o pescoço”, “o baque da porteira”, “arribou sem largar”, “cubava o cujo a meio-olho”, “tirando
a bonito”, “dizendo ser mode o café”, “negoceio deles”, “a coisa gorasse”, “a frevura do
tempo”, “coçando o quengo”, “findou convidando”, “mistura gozosa de arrupio e arreceio”,
“dava uns tuncos”, “aquele frichilim”, “tibes”, “fhum”, “oiças”, “malensaiada”, dentre outras.
Outro grupo de expressões que permanece com a força de representar uma narrativa oral,
por se aproximar da fala, é o utilizado para descrever o marchante. Apesar de não ter seu
nome revelado, ele é substituído por várias palavras e expressões qualificadoras: “o homem”,
“forasteiro”, “o tal”, “o cujo”, “aquele um”, “marchante ou boiadeiro”, “o comprador”, “tipão
de homem”, “tinhoso”, “sujeito”, “avesso safado”, “o malino”, “o diacho”, “malfazejo”, “aquele
chiste”, “o cara-lisa”, “o azucrim”, “salafrário”, “sem-vergonha”, “enganoso”, “come-quieto”,
“desgranido”, “galo-cego”.
Além de o conto trazer uma narradora que fala se dirigindo a uma interlocutora personagem,
como que a passar para ela uma experiência vivida; e fazer uso de palavras e expressões que
são reconhecidamente orais, o conto ainda pode se aproximar das narrativas tradicionais,
descritas por Benjamim, por trazer em seu interior a estrutura dos contos de uma tradição
anterior à propagação da escrita.
138
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O marchante se assemelha a figura do diabo, quando bem vestido e com boa aparência se
aproxima da propriedade do casal, ou mesmo ao lobo se postando no caminho da pequena
vítima. O homem é o anúncio de algo ruim que está para acontecer. Naquele período de seca
e da escassez progressiva do gado, o marchante é a personificação da morte, ou daquele que
rouba a inocência das crianças. É seu papel arrebanhar o gado franzino para matá-lo ou
simplesmente possuí-lo. Por outro lado, a vítima percorre um caminho que a leva ao
amadurecimento. Adquire malícia, percebe a ameaça e em seguida, sendo mais rápida que o
malfazejo, o sobrepuja.
3. A PAISAGEM
A paisagem natural que se configura no conto é a do sertão do sol intenso e da falta de chuva.
Do gado faminto. Dos pés de juazeiros e das sombras requisitadas. Uma paisagem que aponta
para escassez de trabalho e de alimento, mas que não chega a ameaçar a permanência de
homens e mulheres. A relação dos personagens com o meio ambiente é uma relação de
resignação. A paisagem vai sendo composta no decorrer da narrativa, entre um e outro
acontecimento.
A paisagem apresentada em Transa de Gado não serve apenas para descrever fisicamente
uma parte do território brasileiro. Não é uma visão ingênua do sertão. A tese número nove de
Chiappini (1995, p. 160) mostra que o espaço da ficção regionalista atua como “portador de
símbolos”. É preciso perceber que os valores veiculados nesta representação do regional estão
entrelaçados nas paisagens e, ao passo em que representam um local específico, também
representam o mundo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A mulher do sertão representada em Melo ainda ocupa o lugar da cozinha, ainda teme dar
sugestões sobre negócio e ainda é punida pela possibilidade de sentir desejo. Estes são dados
de permanência de um valor do passado.
No entanto, esta mulher não é a mesma, pois já não é a mesma a própria sociedade. A
história está sendo contada a uma amiga, mas a narradora não teme ser punida por ela e faz
confissões sobre como ficou tocada com a beleza do marchante. Também é a mulher que sai
de um lugar mais baixo, de inocência, e ascende para outro mais elevado, conquistado com
maturidade e esperteza.
Os homens da trama quando não caem em conceito, como o marchante que chega como
astuto e sai como “galo-cego”, permanece numa linha reta, como o marido. Ou seja, há dentro
da permanência sinais de avanço na representação da mulher no sertão.
O mesmo pode ser dito da representação da paisagem. Melo fala no presente utilizando
dados da memória. Para compor o cenário do conto, lança mão da sua vivência, ainda
quando criança, no sertão norte-rio-grandense. O que importa desta paisagem não é a sua
representação enquanto paisagem natural, mas as relações estabelecidas entre ela e os
demais elementos da ficção.
Assim, a paisagem natural é um dado de permanência, mas a sua relação com outros
elementos da ficção, não. Pois já não se trata de atribuir ao cenário árido a razão de destinos
malsucedidos. O que se destaca é uma relação pacífica entre a aridez e os personagens, muito
embora façam questão de comunicar o calor e a morte dos animais. O que não está mais em
foco é o êxodo decorrente da falta de meios de subsistência. Não se trata de afirmar que a
resignação dos personagens seja entendida como avanço, mas de destacar que há presença de
movimento de um tipo para outro de representação.
Outro elemento que se destaca é o narrador. Ele se posta como um narrador da tradição oral,
que conta sua história a partir da experiência vivida, como que a aconselhar ou alertar o seu
interlocutor. A visão que tem dos fatos está associada aos próprios fatos, não penetrando na
consciência de nenhum outro personagem e não reproduzindo fluxos de consciência típicos
de uma postura intimista. Este narrador, mesmo sendo um elemento de permanência, é o
facilitador de todos os avanços.
REFERÊNCIAS
BENJAMIN, Walter. O Narrador. In Obras escolhidas vol. I: magia e técnica, arte e política. São Paulo:
Brasiliense,1993 a, p.197-121.
BUENO, Luís. Uma História do Romance de 30. São Paulo: Editora da Unicamp, 2006.
CANDIDO, Antonio. Prefácio. In: LAFETÁ, João Luiz. 1930: a crítica e o Modernismo. Duas Cidades: Ed. 34,
2000.
CHIAPPINI, Ligia. Do beco ao belo: dez teses sobre o regionalismo na literatura. In: Estudos Históricos, Rio de
Janeiro, vol. 8, n. 15, 1995, p. 153 – 159. Disponível em:
http://virtualbib.fgv.br/ojs/index.php/reh/article/view/1989/1128 Acesso em: 10/02/2014.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
HOLANDA, L. A irradiação das sementes. In: PATRIOTA, N.; MARQUES, M. (Org.). Louvor de Bartolomeu
Correia de Melo. Recife: Bagaço, 2012. p. 49-54.
LAFETÁ, João Luiz. 1930: a crítica e o Modernismo. Duas Cidades: Ed. 34, 2000.
MELO, Bartolomeu Correia de. Tempo de estórias.Recife: Editora Bagaço, 2009.
141
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A RELAÇÃO ENTRE O LOCAL E GLOBAL NA RECONSTITUIÇÃO DE MANGUE
SECO COMO REPRESENTAÇÃO INDENTITÁRIA NORDESTINA NO ROMANCE
“TIETA DO AGRETE” DE JORGE AMANDO
RESUMO: Este trabalho trata de uma pesquisa bibliográfica que pretende estudar a
representação do cenário no romance “Tieta de Agreste” de Jorge Amado. Analisando a
relação entre o local e global na reconstituição de Mangue Seco como representação
indenitária nordestina, constatou-se que esse é um traço folhetinesco de idealização na
constituição do local como um paraíso perdido que se mantem como representação
indenitária de um local por manter-se afastado da zona urbana e do progresso. Observa-se
que os fatores que possam transformar o local e urbanizá-lo são tidos como vilões. No
enredo, a fábrica Brastânio traz a promessa de progresso e sob o ponto de vista estético e
folhetinesco. Representa o vilão, o mal associado ao progresso. Este trabalho também analisa
o uso da xilogravura como artificio estético de uma literatura popular que vem reforçar a
busca de Jorge Amado de constituição de uma literatura moderna comprometida com uma
reinvenção do ethos nordestino. Como resultado da pesquisa, percebe-se como a análise das
xilogravuras demostra a forte ligação do progresso com o mal. A xilogravura analisada
simboliza o medo dos habitantes com relação à urbanização de um local paradisíaco e intacto,
revelando assim, a forte ligação entre local e identidade expressa no romance.
Palavras-chave: Romance. Dialogismo. Xilogravura. Identidade.
ABSTRACT: This paper is a literature review which aims to study the representation of the
scene in the novel " Tieta do Agreste " by Jorge Amado. Analyzing the relationship between
the local and global reconstruction of the Mangue Seco as Northeastern indenitária
representation , it was found that this is a trait folhetinesco of idealization in the constitution
of the place as a lost paradise that keeps indenitária representation as a place for keeping
away from the urban area and progress . It is observed that the factors that can transform
local urbanization and it is taken as villains . In the plot, the Brastanio factory brings the
promise of progress and under the aesthetic point of view and folhetinesco . Is the villain , the
evil associated with progress. This paper also examines the use of the woodcut as an aesthetic
artifice of a popular literature that reinforces the search for Jorge Amado constitution of a
modern literature committed to reinventing the northeastern ethos . As a result of the
research , we find the analysis of woodcuts demonstrates the strong link with the progress of
the evil. The woodcut analyzed symbolizes fear of the inhabitants regarding urbanization in a
paradisiacal place and intact , thus revealing the strong link between place and identity
expressed in the novel .
Keywords : Novel. Dialogism . Woodcut . Identity.
INTRODUÇÃO
O romance “Tieta do Agreste” narra a trajetória de uma mulher que na adolescência foi
expulsa de sua cidade natal por viver aventuras amorosas que escandalizaram a população.
Denunciada pela irmã mais velha, Perpétua, Tieta foi expulsa de casa e humilhada pelo povo
da sua cidade. Tieta retornou anos depois para se reencontrar, pois, só naquelas terras
encontra-se a verdadeira Tieta. A população esperava ansiosamente por sua “Filha Prodiga”,
pois ela voltou uma mulher rica e poderosa que trazia consigo a esperança.
A relação de Tieta com Agreste se assemelha com a retirante- nordeste. Assim como Tieta, o
retirante é expulso de sua terra, por conta da seca, e depois retorna para sua cidade por ter
deixado naquelas terras parte de si. O nordeste é para o retirante o que Mangue Seco é para
Tieta: uma parte do seu ethos que compõe sua identidade, pois segundo Hall (2000)
identidades “culturais são aqueles aspectos de nossas identidades que surgem de nosso
pertencimento a culturas étnicas, raciais, lingüísticas, religiosas e, acima de tudo, nacionais.”
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Percebe-se em vários trechos da obra e na leitura do enredo geral a forte relação de Tieta com
seu espaço de origem. Mangue Seco se mantém como paraíso que proporciona felicidade, paz
e bem-estar acima de tudo. Mesmo tendo sofrido no passado com o preconceito típico de
cidades pequenas e de uma população que é influenciada pelo pensamento patriarcal, Tieta
não pensa duas vezes em retornar para seu lugar no mundo. Pois ali se encontra sua
identidade e é somente em Agreste que se encontra a paz e a felicidade interior, como é
observado abaixo
[...] Nem por isso Tieta a desejou e previu menos grata e exaltante. Após os dias de
tormenta, o sol iluminou o esplendor de Mangue Seco, jamais esteve tão bela a
paisagem, o ar tão puro, a paz tão completa. Durante todos aqueles anos de exilio,
Tieta sonhara possuir nas dunas de Mangue Seco pequeno chão de casa, nele erguer
cabana onde repousar. [...] Viera aflita em busca de seus começos, ao reencontro da
pastora de cabras da adolescente árdega e feliz [...] (AMADO, 1977, p. 479).
[...] Deixei a Marinha e voltei para Agreste porque desejo viver em paz o resto da
minha vida, tranquilo ao lado da minha mulher neste pedaço de paraíso [...]
(AMADO, 1977, p. 516).
Há, então, a forte idealização do local como um lugar divino e paradisíaco que
independentemente de qualquer acontecimento carrega em suas terras um poder capaz de
trazer felicidade aos moradores. A descrição do local Mangue Seco se confunde com a
descrição de um paraíso e difere-se da descrição de uma metrópole que tem características
globais e que nunca traria paz à Tieta, sendo que a metrópole São Paulo era para Tieta como
um exílio. Os trechos acima expressam o sentimento dos personagens de paz encontrado em
Mangue Seco, mostrando que a felicidade só é possível naquele pedaço de chão afastado do
progresso e da zona urbana. As falas dos personagens mostraram a necessidade que eles
sentiram em sair do seu local para prosperarem e a necessidade ainda mais forte sentida de
voltar para só assim serem felizes. Ao fazer essa relação, Jorge Amado traz à tona valores e
memórias típicas dos nordestinos, principalmente sertanejos, criando uma identificação do
enredo com a história do Nordeste. Essa relação é indispensável para construção de uma
literatura que recria a memória de seu povo. Sobre as memórias,Ortiz (1985, p.133) nos diz
que
A memória coletiva deve necessariamente estar vinculada a um grupo social
determinado. É o grupo que celebra a sua revivificação, e o mecanismo de
conservação de um grupo está associado à preservação da memória. A dispersão de
atores têm consequências drásticas e culmina com o esquecimento das expressões
culturais. Por outro lado, a memória coletiva, só pode existir enquanto prática que se
manifesta no cotidiano das pessoas.
Neste sentido, constata-se que a obra analisada faz uma complementação da memória
individual e da memória coletiva (HALBWACHS, 1990). Ao utilizar fatores de retomam à
memória coletiva nordestina (como: costumes, crenças, hábitos, valores e expressões
culturais) Jorge Amado contribui para a identificação da identidade cultural do leitor
nordestino e principalmente para a recriação e preservação da memória nordestina.
2.0 A REPRESENTAÇÃO SIMBÓLICA DA FABRICA BRÂSTANIO COMO VALORES
GLOBAIS URBANOS DE DESTRUIÇÃO DO UNIVERSO LOCAL NORDESTINO
ASSOCIADO A MANGUE SECO.
No romance, há uma especulação da vinda da indústria Brastânio para Agreste. Essa
possibilidade causa um grande tumulto e provoca medo nos personagens, pois a indústria
traria destruição à cidade. Mangue Seco o local intocável, o paraíso perdido com valores que
diferem de valores globais, corre “o risco do progresso” “o risco da mudança". Segundo Hall
(2000) o global quando chega ao local tem poder de gerar mudanças no sentido de
uniformizar os valores locais com os globais. A fábrica além de destruir a natureza, traria
agitação e mudança de hábitos dos habitantes, Agreste não mais seria um lugar “bom para
esperar a morte” (AMADO, 1977, p. 300). A vinda da fábrica acarretaria na perca da
identidade do Agreste e consecutivamente na perca da identidade cultural de seus moradores
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
que perderiam suas raízes, seu paraíso, o lugar no mundo que representa uma parte da
essência dos moradores daquele local. Para Hall (2000), “a globalização tem, sim, o efeito de
contestar e deslocar as identidades centradas e "fechadas" de uma cultura nacional”. O
enredo narra o medo dos personagens em perder esse local. Nota-se isso claramente no
trecho em que se narra o medo contido em um sonho de Tieta em relação aos
acontecimentos. “Onde existira antes o esplendor paradisíaco da praia de Mangue Seco,
crescera uma paisagem paulista de fábricas, cortiços de concreto, ferro aço, fumaça e morte”.
(AMADO, 1977,p. 300).
O que nos chama atenção é a descrição dos ambientes. O Agreste não só na descrição do
trecho acima como também em outras, representa um lugar ameno, feliz com paisagens
naturais, um lugar cheio de vida que faz bem para o povo que ali habita. O universo urbano,
representado por São Paulo, significa destruição e em sua descrição nãoexalta-se nada de
bom. A narração leva o leitor a imaginar um lugar triste que não traz paz aos seus habitantes,
um lugar que ninguém quer viver. Com esse discurso, Jorge amado trazà tonaa memória
coletiva do Nordeste para adentrar na memória individual do leitor e assim emite um sentido
ao enredo que contempla a identidade cultural do nordestino (HALBWACHS, 1990). O
trecho acima analisado faz concluir-se que se instalada em Agreste a fábrica traria valores
globais urbanos de destruição que acabaria com aquele local. As mudanças negativas
ultrapassariam as mudanças no ambiente. O progresso traz transformações nos hábitos e no
caráter do povo como foi exposto na chamada do Epílogo: “Quando se sabe da ambição
humana, da sede de poder e de como o poder corrompe, com referências a corrupção
reinante” (AMADO, 1977, p. 300). O medo da transformação do espaço está associado com o
medo da perca de identidade, uma vez que a mudança que Agreste poderia vir a sofrer
resultaria em mudanças no caráter do seu povo. Ao abordar isso no romance, Jorge Amado
traz à tona o conceito de Hall (2000) que diz que umas das consequências possíveis da
globalização seriam a produção de novas identidades. Portanto, aqueles costumes e valores
estão enraizados com o local. São costumes e valores daquele cenário especifico, não sendo
possível ser a mesma pessoa em um lugar diferente. Os trechos abaixo expressam o medo da
população em relação a essas mudanças
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Seco que se configura como representação indenitária nordestina o que nos mostra a forte
ligação entre local e identidade expressa no romance.
REFERÊNCIAS
AMADO, JORGE. Tieta do Agreste, pastora de cabras ou A volta da filha pródiga, melodramático
folhetim em cinco sensacionais e empolgantes episódios: emoção e suspense. Rio de Janeiro: Record,
1977.
BAKHTIN, Mikhail. Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
CANDIDO, Antônio. Crítica e sociologia. In: Literatura e sociedade: estudos de teoria e história da literatura.
São Paulo: Nacional, 1976.
________________. Iniciação à Literatura Brasileira. 4 ed. Rio de Janeiro: Ouro Sobre Azul, 2004.
ORTIZ, Renato. Cultura brasileira e identidade nacional. São Paulo: editora brasiliense, 1985.
148
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A REINVENÇÃO DO SERTÃO SERIDOENSE NAS MEMÓRIAS LITERÁRIAS
DE DONA COTA
RESUMO: No gênero Memórias literárias o autor escreve suas lembranças pela via da
criação estética, ou seja, o autor de memórias fala de suas experiências ofertando a cada uma
nuances de criatividade, emoção e devaneio, o que confere a estas o caráter universal. O livro
Minha infância minha vida: livro de memórias, foi escrito por Maria Raquel de Medeiros
dos Santos (in memoriam), mais conhecida como Dona Cota, uma seridoense nascida em
1921, no interior do RN, onde viveu até os seus 92 anos de idade. O livro reúne trinta Textos/
Ilustrações (T/I) que guardam e contam suas histórias da meninice e juventude. Ler e
observar os T/I de Dona Cota é aventurar-se em uma viagem feita de cores, palavras e
lembranças. Suas memórias são contadas e desenhadas pelo caminho da realidade e da
imaginação. Diversas são as imagens em que o belo e o apelo às cores sinalizam para um
sertão colorido, florido, também vivido pelo sonho, pela fantasia. Trazer à análise essas
memórias é possibilitar a indivíduos seridoenses ou não, desse ou de outros tempos, a
experiência da leitura estética, a [re]significação do sertão seridoense, da identidade
sertaneja.
ABSTRACT: In genre literary memories the author writes his memories by way of aesthetic
creation, ie, the author speaks of memories of their experiences offering to each nuance of
creativity, emotion and reverie, which gives these universal character, since the reader tends
to identify each of these memories. The book My childhood my life: memoir, was written by
Maria Raquel Medeiros dos Santos ( in memoriam) , better known as Dona Cota, a Seridó
born in 1921 , in RN , where she lived until her 92 years old. The book brings together thirty
Texts / Illustrations (T/ I) which save and share her stories of childhood and youth. To read
and to follow Dona Cota's verbal texts and graphics is venturing on a journey made of colors,
words, shapes and souvenirs. Her memoirs are told and drawn by way of reality and
imagination. There are several images in which the beautiful and the colors appeal to point to
a colorful, flowery wilderness, also lived the dream, the fantasy. Bring those memories to the
analysis is to enable seridoenses (people who live in Serido region) or not, from this or other
times , The experience of aesthetic reading , the [ re] significance of Seridó backcountry,
backwoods identity of individuals.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A memória, como capacidade de conservar certas informações, recorre, em primeiro
lugar, a um conjunto de funções psíquicas, graças às quais o homem pode atualizar
impressões ou informações passadas, que ele representa como passadas. [...] Os
fenômenos da memória, seja nos seus aspectos biológicos ou psicológicos, mais não
são do que os resultados dos sistemas dinâmicos de organização, e apenas existem
enquanto a organização os mantem ou os reconstitui. (LE GOFF, 1982, p. 9)
Dessa forma, é possível compreender o gênero memórias literárias como um espaço de fuga e
encontro do eu, considerando que a literatura corresponde à necessidade intrínseca do ser
humano de sonhar, (CANDIDO 2004, p: 174), ao escrever suas memórias o autor envereda-se
no caminho da fuga do real, porque a realidade não satisfaz a sua necessidade de plenitude e,
ao mesmo tempo em que foge dessa insatisfação, encontra-se na lembrança do que foi e no
desejo do que podia ter sido – lembrar é, assim, viver novamente.
Nesse gênero, o autor escreve suas memórias pela via da criação estética, ou seja, o autor de
memórias fala de suas experiências ofertando a cada uma nuances de criatividade, emoção,
devaneio e novidade, o que confere a estas memórias o caráter universal, uma vez que o leitor
tende a se identificar com cada uma delas pelas inúmeras possibilidades de interpretação e
identificação sugeridas por toda essa intersubjetividade.
Portanto, o gênero memórias literárias configura-se como uma tentativa de busca da
identidade pessoal, e por tratar-se de memórias compartilhadas com outros indivíduos,
direta ou indiretamente, ultrapassa os limites da identidade pessoal e abarca a identidade de
grupo, correspondendo a necessidade inerente do ser humano de permanência.
Ler e observar os textos verbais e as ilustrações de Dona Cota é aventurar-se em uma viagem
feita de cores, palavras, formas e lembranças. Suas memórias de meninice e juventude são
contadas e desenhadas pelo caminho da realidade e da imaginação. Muitos são os fatos em
que visivelmente a emoção é flagrada entrecortando a narrativa. Diversas são as imagens em
que o belo, o apelo às cores, sinalizam para um sertão colorido, florido, também vivido pelo
sonho, pela fantasia.
Assim, mesmo sendo Dona Cota e suas memórias “singulares”, visto que se trata da
experiência de vida de uma pessoa em particular, trazer à análise e à discussão suas
memórias é possibilitar a indivíduos, seridoenses ou não, desse ou de outros tempos, a
experiência da leitura estética, a recriação, [re]significação de suas próprias lembranças,
enfim, a [re]significação de sua identidade.
Dona Cota é o apelido carinhoso de Maria Raquel de Medeiros dos Santos (in memoriam),
uma seridoense nascida em 24 de fevereiro de 1921, no sítio Várzea, município de Acari-RN,
onde morou até o seu casamento em 1942. Nesse momento, mudou-se para Jardim do
Seridó-RN, cidade onde viveu até os seus 92 anos de idade.
Cota teve uma infância alegre. Gostava de brincar de boneca, pular corda, de jogo de pedras,
correr pelo terreiro e brincar embaixo das catingueiras com suas primas. Já na infância
ajudava sua mãe cuidando da casa e dos irmãos menores.
Aprendeu a ler cantando, segundo a própria Cota, quando na escola, ela e suas amigas
soletravam as sílabas cantando e balançando as pernas.
Casou-se com Hermes Conegones numa cerimônia simples, mas repleta de convidados e
carnes diversas; a festa denominada “pagode” durou dois dias.
Dona Cota teve 19 filhos, porém apenas 12 sobreviveram. Além de bastante dedicada à família
e à fé católica, sempre dedicou parte de seu tempo à cozinha no preparo de pratos típicos do
Seridó como canjica, pamonha, galinha caipira, e arroz doce.
Vaidosa e delicada, quando precisava de roupas novas e os seus muitos ofícios não mais a
permitiam costurar, dona Cota costumava desenhar suas próprias roupas antes de ir à
costureira.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Aos 90 anos, comprou um caderno e uma coleção de lápis de cor e decidiu escrever/ ilustrar
suas lembranças de infância e juventude como um exercício de pura descontração. Como
resultado dessa atividade, existem em torno de 30 Textos/ Ilustrações (T/ I) que guardam e,
ao mesmo tempo, contam suas histórias da meninice e juventude cercadas de primos, bois,
pássaros, rios e flores.
Em 2013, aos 92 anos de idade, publicou suas memórias no livro Minha infância minha
vida: livro de memórias. Faleceu no mesmo ano deixando um legado de cores e lembranças.
O Seridó é o nome de uma das microrregiões que integram o sertão do Rio Grande do Norte.
Está situado na porção centro-meridional do estado e, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística) compreende atualmente um universo de dezessete municípios.
O clima predominante no Seridó é o semiárido, caracterizado por chuvas irregulares e longos
períodos de seca; a vegetação é a caatinga, facilmente adaptada à falta de água, e a bacia
hidrográfica que banha a região é a Seridó (rio Seridó). Sobre algumas particularidades da
geografia física do Seridó, Faria acrescenta:
As chuvas são esparsas e mal distribuídas; 4 meses de molhado para 8 secos – é o que
Deus dá nos anos normais de inverno. Mas, tão cedo caem as primeiras chuvas, a
vegetação estoura em verde nos arbustos – a rama – e o chão se atapeta de ervas e
capins – a babugem. (1980, p. 174)
Por muito tempo, a cultura do algodão e a extração mineral foram as principais atividades
econômicas do Seridó. Hoje, a economia da região sustenta-se de atividades ainda no campo
da agricultura, além da fruticultura e do comércio, segundo dados apresentados no Atlas do
Rio Grande do Norte.
A experiência da religiosidade é vivida com bastante fé e força pelo povo seridoense. Grandes
são as festas de padroeiras das cidades do Seridó. São festas religiosas que também agregam
manifestações do profano, como as festas de clube, bailes, entre outros, que atraem a
população local, das cidades vizinhas e antigos moradores que fazem da festa um espaço de
reencontro.
No que se refere às manifestações artísticas e culturais, o Seridó sempre foi, e continua
sendo, um verdadeiro celeiro de artistas e ativistas culturais de tempos passados e da
atualidade.
Falar do Seridó é, portanto, falar de um povo feito de simplicidade, fé e tradição. É falar de
uma gente que escreveu e escreve sua história em pedras e cactos, extraindo da dureza dos
dias o sentimento de pertencimento e atualidade.
3. METODOLOGIA
Essa é uma pesquisa de abordagem qualitativa, tendo em vista o objeto que se pretende
estudar e dos objetivos que irão orientar os estudos (OLIVEIRA, 2008, p: 66).
Essa pesquisa procederá a uma investigação dos elementos representativos do sertão e da
memória do povo seridoense em três T/ I de Dona Cota, identificando-os e analisando-os.
O enfoque dessa abordagem será dado aos seguintes elementos: religiosidade, costumes, casa
e família. A escolha desses elementos segue a própria natureza da maioria dos T/I que
compõem a obra em estudo, além de fazerem parte do universo de significações
representativas da região Seridó e seu povo, conforme outras leituras apontaram.
Cada T/I analisado nesse artigo, assim como todos os outros que integram as memórias
literárias de Dona Cota, apresentam textos verbais e não verbais que, juntos, contam os fatos,
descrevem a cena e os personagens, construindo assim o sentido do texto em sua totalidade.
Os T/I foram analisados a partir do que está expresso em palavras e imagens, mas também
daquilo que aparece como sugestões de sentidos e impressões.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
4. ANALISANDO AS MEMÓRIAS LITERÁRIAS DE DONA COTA
Se as mulheres não se dedicavam tanto às tarefas da roça é porque em casa a luta era
árdua. Todos os trabalhos caseiros exigiam tempo e dedicação, já que também eram
realizados de forma um tanto primitiva se comparados aos dias de hoje. (MACEDO,
et all, 1997, p. 16).
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Portanto, a tradição está enraizada em cada um como algo pertencente a natureza individual,
mas que por vezes se confunde com o coletivo, visto que as interações sociais se completam
na troca de experiências.
Um outro aspecto interessante de observar no T/I em estudo é a prática da religiosidade
atrelada à Igreja Católica. Isso é visível nas orações que o pai ensina às crianças como o
Credo, o Pai-Nosso, a Ave-maria e a Salve rainha, todas essas orações pertencentes à crença
católica.
Essa adesão ao Catolicismo advém do período colonial, quando o Brasil esteve sob o poder de
Portugal e todas as suas práticas no que se refere à língua, religião, trabalho, etc., foram
impostas ao povo brasileiro como uma norma. Nesse sentido, a religião atuou no sentido de
unificar crenças, servindo também como um instrumento de adestramento e de
homogeneização cultural. E toda essa prática somente foi possível pela imposição da língua,
certamente um dos elementos de maior poder quanto à identidade de um povo.
O Seridó sempre se destacou, e provavelmente ainda mantém esse destaque, como uma
região em que a expressão da fé é fortemente difundida e preservada, em especial pelos mais
velhos. É claro que em tempos mais antigos essa religiosidade era vivida de maneira mais
alienada, tendo em vista que muitas são as histórias contadas pelas pessoas mais velhas de
fatos curiosos a respeito de promessas e crenças, como por exemplo a devoção aos padres,
como o Padre Cícero, considerado por muitos sertanejos como um ser superior, dotado de
dom divino (MACEDO, et all, 1997, p: 19).
Em outros T/I de Dona Cota é possível identificar manifestações da religiosidade seridoense
(p.24,25 e 41).
Outro elemento representativo de uma determinada comunidade bastante percebido nos
textos de memórias são os costumes. Observe o T/I abaixo que apresenta alguns costumes
típicos do Seridó.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
No T/I em análise, alguns costumes bem seridoenses são ressaltados. A ida à missa de Natal
na Matriz de Nossa Senhora da Conceição, localizada no município de Jardim do Seridó, é
além de uma manifestação de profunda religiosidade e apego às tradições, um grande evento
social. Por essa razão, todos vão com suas melhores roupas, sapatos novos guardados por
seus tios para serem usados somente na chegada à cidade. A respeito desse costume Macedo
descreve no capítulo dedicado às festas profanas:
Na vinda para as festas, as pessoas do campo que não possuíam casas na rua, traziam
as roupas e os sapatos novos debaixo do braço. Ao chegar perto da cidade, trocavam
de roupa e de calçados, deixando os velhos escondidos no mato. Na volta para casa
mudavam de roupa, chegando a casa com a mesma que haviam saído. (MACEDO, et
all, p:20)
Esse costume sugere em sua simplicidade, nuanças da relação do homem do campo com a
cidade. A cidade compreendida como espaço da modernidade, da vida em movimento, onde
tudo acontece dentro de uma dinâmica bastante intensa. O vestir-se bem, escolher a melhor
roupa e o melhor sapato para ir à cidade, denuncia a ideia da cidade como o lugar da norma
estabelecida, dos modelos esperados.
Nesse T/I, um outro fato também chama a atenção - a menção ao que as crianças iriam
comprar com o dinheiro que o pai deu a elas: “Papai dava dinheiro para nós comprar rodela
de abacaxi, cocada e doce seco, era o melhor da festa. A gente trazia também para nossas
mães” (Medeiros dos Santos, 2012, p: 16). Esse fato é mais uma representação da
simplicidade do povo seridoense, em especial as crianças, pois é o que a menina Cota
evidencia como “o melhor da festa”, a compra de rodela de abacaxi, cocada e doce seco, que
denuncia esse aspecto de singeleza.
A religiosidade é também um aspecto bem nítido no T/I em análise. Além de se tratar de um
relato sobre a ida à missa de Natal na Matriz de Nossa Senhora da Conceição, o T/I traz a
devoção das crianças envolvidas na cena quando, ao avistar a igreja, iniciam uma oração
“Deus salve casa santa/ Onde Deus fez a morada/ Lá está o cálice bento/ E a hóstia
consagrada” (MEDEIROS DOS SANTOS, 2012, p: 16)
Atenta-se também na leitura deste T/I para um outro fato: os apelidos usados por algumas
das personagens que compõem esse T/I. Tia Nega, Mulata, Preta, além de Cota, são apelidos
que revelam além da simplicidade, a cumplicidade nas relações.
De fato, quem por aqui morava em tempos um pouco mais antigos, sabe da predominância
dos apelidos entre todos os moradores de uma cidade pequena, ou pelo menos entre os mais
conhecidos. Era comum, e mesmo hoje ainda é, embora não com tanta frequência, nominar
alguém de um apelido, ou mesmo referenciá-lo sempre a uma outra pessoa, sendo esta o pai
ou a mãe, ou mesmo o esposo. Confirma esse costume a literatura da época.
No livro Os Brutos, do autor José Bezerra Gomes, muitos são os apelidos ofertados às suas
personagens como Zé do Cego, João Bolo, Linda do Dr. João (GOMES, 1938, p: 18). O
próprio escritor citado também tinha seus apelidos. Conhecido como “Seu Gomes” pelos que
sabiam da sua importância e sua competência na arte da literatura, e como “o doido de Dona
Venera” (sua mãe), sendo este apelido usado pelas pessoas da cidade que apenas o viam
como um indivíduo de comportamento diferente dos demais devido sua sensibilidade e
também porque José Bezerra Gomes apresentava alguns problemas mentais, segundo SILVA
(2005, p:15).
Assim, todos esses costumes atestam para o que a tradição é em sua natureza: “o conjunto
dos valores dentro dos quais estamos estabelecidos” (BORNHEIM, p: 20). Ou seja, é por
meio de todos esses traços de semelhança na forma de estar, pertencer e atuar no mundo
entre uma determinada comunidade, ou entre um determinado povo, que faz da tradição um
elemento que converge para a afirmação da identidade.
Caminhando pelas memórias literárias de Dona Cota, o leitor é, inúmeras vezes, convidado a
compartilhar da alegria de estar em casa com a família e com os amigos.
As casas ilustradas em seus T/I’s são sempre coloridas, agradáveis, acolhedoras. Espaço onde
a família se reúne, no início e no fim do dia, sobretudo em momentos de refeição, é a casa
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
para o seridoense um lugar sagrado, pois é o canto de morada, mas também de encontro, de
confraternização.
Observe o T/I a seguir em que a casa ocupa um espaço de destaque na construção dessa
memória.
Para falar desse T/I, toma-se como norte o pensamento de Bachelard em seu livro A Poética
do Espaço, quando afirma que a memória constitui-se de lembranças e de imaginação, isto é,
parte do que conservamos de memória é constituída de sonhos, devaneios, desejos de
concretude e “é exatamente porque as lembranças das antigas moradas são revividas como
devaneios que as moradas do passado são imperecíveis dentro de nós” (BACHELARD, 2008,
p: 46).
A casa apresentada nesse T/I quase que arrebata o olhar de quem passa a página, tudo em
razão da luminosidade e do jogo de cores que pintam essa casa de amparo e aconchego. Aliás,
as cores pintam a casa e seus arredores, pois que o “terreiro” (expressão bastante usada pelo
seridoense para referir-se a parte externa da casa, as suas cercanias) também carrega essas
nuanças de afago, proteção e aconchego.
Imaginar uma casa antiga, que abrigou um dia um ser ainda pequeno, que foi leito para os
seus primeiros dias, chão para os seus primeiros passos, parede para os seus primeiros
limites, é pensar uma casa-mãe, protetora, guardadora da memória de seus melhores dias.
Por isso, para caminhar pelos vãos da memória é necessário, muitas vezes, abrir a porta da
antiga casa, da casa primeira.
A casa no T/I é apresentada sob dois aspectos: a casa enquanto espaço físico, abrigo, morada,
e a casa enquanto espaço metafísico, circundado de sonhos e lembranças.
É essa casa que abriga a menina Cota. Uma casa que guarda por entre paredes, chão, teto e
cantos as experiências vividas na infância e tantas vezes confundidas com as lembranças de
outros nas imagens projetadas em histórias contadas pelos mais velhos, por exemplo.
Essa importância de compreender o estudo das obras literárias como norte para a real
compreensão do indivíduo é evidenciada por Antonio Candido (2010, p: 175) quando afirma
que “cada sociedade cria as suas manifestações ficcionais, poéticas e dramáticas de acordo
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
com os seus impulsos, as suas crenças, os seus sentimentos, as suas normas, a fim de
fortalecer em cada um a presença e atuação deles”.
É essa memória que se configura como espaço de lembranças e nostalgia porque, por diversas
vezes, é evocação daquilo que se foi em razão de uma profunda insatisfação com o atual, que
se apresenta no T/I 3 de Dona Cota.
A casa do T/I em análise traz uma das principais marcas das moradias do sertanejo: o
alpendre. Era no alpendre que os mais velhos reuniam-se para contar causos, recitar versos
(literatura de cordel), conversar, muitas vezes deitados em redes.
É fato que o referido T/I não apresenta a memória de um fato em particular, mas de uma
prática comum à menina Cota - varrer o terreiro com o claro da lua. Talvez a experiência de
subverter o medo da noite e dos mistérios que ela carrega, medo comum a toda criança, essa
atividade provocasse na menina uma espécie de magia, de encantamento. É possível assim
deduzir ao observar a ternura com a qual Dona Cota representou tão delicadamente essas
lembranças coloridas.
Outros elementos próprios de nossa cultura e do nosso cenário também são explorados no
T/I como a porteira, a carroça e os pássaros, representados no T/I pelo canário e pelo galo-
de-campina. A luz que predomina no T/I é em função da lua e seu clarão, essa lua tão cantada
e ecoada em versos da literatura de cordel ou nas canções populares.
Falar das casas do Seridó, casas grandes e altas, cheias de tornos de madeira para o balanço
da rede, cercadas de alpendre para o aconchego do fim das tardes é falar de um tempo que
perpassa a existência de cada um do Seridó. Mesmo os que nunca viveram essa realidade das
casas de sítio, das casas mais antigas, trazem essa vivência, na memória compartilhada com
todos aqueles que o antecedem.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Caminhar por entre as lembranças de Dona Cota é ouvir os chocalhos das vacas, o chiado da
vassoura varrendo o terreiro, meninos brincando e cantando de roda, homens e mulheres
rezando, pedindo por novos tempos, tempos de chuva e fartura.
Em seus Textos/ Ilustrações o tempo do seridoense é recontado e[re]significado, uma vez que
a Cota que relata esses fatos, que traz para o presente essas lembranças, não é mais a Cota
menina.
Cota é a protagonista e também a narradora de suas histórias, e a estas dedica nuanças de
alegria e saudade.
Pensada assim, lançar-se para o passado não significa estabelecer-se fixo nos
tempos idos, mas dá sentido ao que se foi movendo-o para o espaço do
agora; a memória ativa e reconstrói o passado, de modo que a substância que
aí se interpõe é o tempo social. (SANTOS, 2010, p: 112 - 113)
Suas memórias, incontestavelmente tão suas, são quase que na mesma proporção de todos os
seridoenses, pois compartilham dos mesmos traços, cenários e vozes.
Em muitos dos T/I que integram sua obra, a tradição é apresentada como um elemento ao
mesmo tempo constituinte e constituído da identidade do Seridó. As manifestações de fé,
brincadeiras, festividades, a relação com a família, a casa e a natureza são algumas das
representações da tradição seridoense tão bem ilustradas, descritas e relatadas por Dona
Cota.
Pensar na relevância de um registro dessa natureza é saber do caráter humanizador da
literatura defendido por Antonio Candido, pois nesse caso as memórias impressas/ expressas
no papel, embora estejam diretamente relacionadas à experiência de vida de um indivíduo
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
em particular, concretizam aquilo que para muitos se faz vivo apenas na emoção, na
imaginação e na lembrança e assim, garantem a permanência, pois “a literatura desenvolve
em nós a quota de humanidade na medida em que nos torna mais compreensivos e abertos
para a natureza, a sociedade, o semelhante (CANDIDO, 2004, p: 180)”.
REFERÊNCIAS
BACHELARD, Gaston de. A Poética do Espaço. Martins Fontes, São Paulo, 2008.
BORNHEIM, Gerd. O conceito de tradição. In: _____. Tradição/ Contradição. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,
1987.
CANDIDO, Antonio. O direito à literatura. In: ______. Vários escritos. 4 ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul/
São Paulo: Duas cidades, 2004, p. 169 – 191.
FARIA, Oswaldo Lamartine de. Sertões do Seridó. Brasília, 1980.
MACEDO, Adriana Medeiros de, et all. Como se vivia nos sertões do Seridó (século XIX e meados do século XX.
In: ______ Livro Seridó Antigo: história e cotidiano. Maria das Dores Medeiros (Org). Revista. Natal-RN.
EDUFRN – Editora da UFRN. 1997 - 2ª edição.
MORAIS, Grinaura Medeiros de e DANTAS, Eugênia. Livro de Memórias. João Pessoa: Ideia, 2006.
MEDEIROS DOS SANTOS, Maria Raquel de. Minha Infância Minha Vida: Livro de Memórias. Natal: Unigráfica
Natal, 2012.
MEDEIROS NETA, Olívia Morais de. Configurações espaciais do Seridó Potiguar. In: ______ Seridó Potiguar:
tempos, espaços, movimentos. Helder Alexandre Medeiros de Macedo (Org). João Pessoa: Ideia, 2011.
OLIVEIRA, Maria Marly de. Como fazer pesquisa qualitativa. 2ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.
SANTOS, Derivaldo dos. Memória, exercício de humildade na poesia de José Gomes. In: ______ Trama de um
cego labirinto: ensaios de literatura e sociedade. João Pessoa: Ideia editora, 2010. p. 105 – 114.
SILVA, Vilma Nunes da. Os Brutos: tradição literária e a memória cultural do Seridó. UFRN, 2005. Dissertação
(Mestrado em Estudos da Linguagem).
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A REDENÇÃO PELA ARTE: UMA ANÁLISE DA ILUMINOGRAVURA “DOM”, DE
ARIANO SUASSUNA
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
finalmente uma via musical que, através dos cantos e das músicas que acompanham
a leitura-recitação do texto, reencontra a tradição da poesia oral, improvisada ou não
(SUASSUNA apud DOS SANTOS, 1999, p. 36).
É importante salientar que a estética armorial sobrevive ao movimento e que Ariano
Suassuna é o seu maior expoente. As iluminogravuras, bem como toda a sua obra escrita a
partir de 1946 65, inserem-se nessa estética que possui, como característica marcante,
conforme Idelette dos Santos (1999, p. 37), o intertexto de obras e temáticas desenvolvidas
por artistas no interior do movimento armorial ou buscadas no Romanceiro Popular
Nordestino e em autores da tradição poética ocidental. É comum nas iluminogravuras de
Suassuna a referência a temas desenvolvidos por outros autores armoriais ou a temas e
autores de outras estéticas. Augusto dos Anjos, por exemplo, é uma referência muito
frequente. Suassuna usa temas, imagens e expressões do imaginário popular como fonte de
sua arte, trabalhando-os com domínio técnico, em estilo rebuscado e estruturas consagradas
da poesia erudita, tais como o soneto. Ele se desloca com facilidade extrema da tradição
poética nordestina à tradição poética ocidental, facilidade explicada por Ângela Vaz Leão
(2003, p. 15) ao afirmar que:
só um conhecimento profundo da dicotomia cultura popular e cultura erudita torna
possível a opção por um dos dois polos. Suassuna opta por formas da cultura popular,
mas dá-lhes um tratamento de alta categoria, solidamente enraizado na história da
cultura erudita ocidental.
Ousamos falar em visão-síntese, ao propor a nossa análise sobre o poema “Dom”, porque
consideramos, como já aqui manifestamos, que toda a obra de Suassuna está intimamente
interligada. Nesse sentido, Jarbas Maciel apud Newton Júnior (1999, p. 16) defende que não
pode faltar uma visão de sistema, uma visão que considere toda a sua obra, para que seja
possível uma compreensão mais profunda da obra de Suassuna. Isso porque cada produção
dialoga com o conjunto da obra.
O poema “Dom” desenvolve uma temática presente no projeto artístico de uma vida inteira.
Nele está presente o cruzamento entre biografia e arte, celebrando uma concepção de que a
arte está entrelaçada à vida. Nesse sentido, a ideia da morte do pai, que marca a vida do autor
desde sua infância, marcará também toda a sua produção artístico-literária. Acreditamos que
em toda a obra de Suassuna pode ser encontrado o princípio de aceitação da morte e de
redenção por meio da arte.
Newton Júnior (1999, p. 126-127) afirma que as iluminogravuras de Suassuna compõem a
sua autobiografia poética. Corroborando com essa definição, pensamos que seja interessante
registrar algumas considerações da Professora Ângela Vaz Leão (2013, informação verbal)**
sobre o processo de composição do título do álbum de iluminogravuras Sonetos de Albano
Cervonegro. Leão (2013) explana que Albano Cervonegro corresponde etimologicamente,
no Latim e no Tupi, respectivamente, ao nome Ariano Suassuna. Albano deriva de albus, -a, -
um, significando alvo/alva, branco/branca. Ariano provém de arya, indivíduo dos árias, os
mais antigos antepassados dos indo-europeus. Ariano seria, então, sinônimo de Albano.
Suaçu significa veado, cervo; una, negro. Suassuna denota cervo negro. Chegamos à
conclusão que o título Sonetos de Albano Cervonegro equivale, portanto, a Sonetos de Ariano
Suassuna.
Antes de procedermos à leitura do poema, convém que façamos breves reflexões sobre alguns
estranhamentos que pautaram a nossa leitura individual: o mote e as palavras iniciadas por
maiúsculas no meio do verso.
Como é frequente na estética armorial, o poeta afirma ter desenvolvido o texto a partir de um
tema ou mote “deixado” por outro autor. Assim também acontece na poesia popular
nordestina, com os cordelistas, violeiros, emboladores e aboiadores. No poema “Dom”,
Suassuna declara ter partido de um tema do poeta armorial Ângelo Monteiro.
Ao longo de todo o texto, há palavras iniciadas por letra maiúscula, como forma de valorizar
palavras simbólicas. Essas palavras perdem o seu sentido comum e assumem o status de
entidades e de símbolos. Algumas delas, como “Dom”, “Morte”, “Sangue”, “Fonte”,
“Mundo”,“Marca”, “Sono”, “Vida”, “Sol” e “Reino”, aparecem em toda a obra de Suassuna.
160
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Parece-nos essencial notar que as palavras simbólicas se associam ou ao campo semântico da
ideia de Morte (Garra, Sangue, Nefasto, Amarga, Mundo, Marca, Sono, Sol) ou ao da
redenção pela arte (Dom, Fonte-sagrada, Voz, Veio, Tesouro, Vida, Bocais-de-ouro, Reino).
Devemos salientar que a análise aqui apresentada, tanto do soneto quanto das gravuras que o
ilustram, é uma leitura entre muitas outras possíveis.
Dom
Com Tema de Ângelo Monteiro
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
mulher em que também se faz presente a imagem de um gavião: “Ela virá-Mulher-aflando as
asas,/ com o mosto da Romã, o sono, a Casa,/ e há de sagrar-me a vista o Gavião”. A imagem
da morte é transfigurada na imagem de um predador, com a qual a voz poética sugere que ela
é a predadora universal, a que vitimiza todos o seres, da qual não se escapa, não se pode
fugir.
O segundo verso, “para sempre meu Sangue penetrou”, apresenta duas compreensões que se
complementam: uma que sugere a referência à morte do pai, como fato que marca a biografia
do eu poético, tendo na palavra “Sangue” a sinonímia do laço familiar; e uma segunda
compreensão, indicando que esse fato biográfico pulsará eternamente em suas veias,
assinalando a sua existência. Notemos que “Sangue” é uma palavra que denota o princípio da
vida. A palavra adotada para a ação frasal é o verbo “penetrar”, com o qual, percebemos a
ideia construída pelo eu poético de que “a visagem da Morte” está entranhada em seu íntimo
e permanecerá durante toda a sua vida.
Na sequência, a voz poética evidencia uma aceitação da ideia da morte, que é feita de modo
afirmativo, ausente de pessimismo. A morte é deslocada para a condição de matéria do fazer
artístico. É a “Fonte-sagrada”, o estado de poesia, o impulso criador. A arte revela-se ao
homem como a melhor vingança sobre a morte, a sua vitória, ou, numa interpretação
nietzschiana, o seu consolo metafísico. A “Fonte-sagrada” é o âmago de onde emana todo o
repertório, que, livre, sem imposições ou limites, torna-se “Voz”, ao transfigurar a dor, o
horrível, a inquietação que atravessa a sua existência, na beleza de seu canto. Essa fonte está
necessariamente marcada pela dualidade: o horrível que almeja tornar-se belo, enquanto
arte. Tal imagem poética evocada por Suassuna converge com a compreensão nietzschiana
dos impulsos artísticos apolíneo e dionisíaco. Sob essa possível linha interpretativa, a
primeira estrofe nos remeteria à necessidade de o dionisíaco (a dor, o sofrimento, o trauma
da morte, a contradição e o tormento do mundo) ser liberto por meio do apolíneo (a
aparência, a arte). Para Nietzsche, o artista está liberto de sua vontade individual, tornando-
se um medium entre o impulso criador (a fonte) e a obra (a aparência). Em sua obra, o artista
celebra a sua redenção.
Compreendemos que, já a partir dessa primeira estrofe, é possível identificarmos algumas
noções do trágico, apontadas por Nietzsche. Consideramos que a nossa interpretação
converge com a caraterização feita por Newton Júnior (1999), que aponta a visão trágica do
mundo ou sentimento trágico da vida, na obra de Suassuna.
Para Nietzsche, a vida possui uma destinação trágica. Citando Schopenhauer, ele considera
que o mundo, a vida em si, não faz sentido, e que essa constatação nos conduz à resignação. A
arte seria o mecanismo necessário para se viver, para se suportar a existência. Segundo o
filósofo, o homem é “salvo pela arte, e através da arte salva-se nele – a vida.” (1999, p. 55). No
trabalho incessante de criação das belas formas, o homem se redime do sofrimento, sem
precisar negar a vida. De acordo com Nietzsche, a existência e o mundo só podem justificar-
se eternamente como fenômeno estético. Desse modo, Suassuna seria o homem trágico
proposto pelo filósofo, aquele ser que é capaz de justificar a sua existência na transfiguração
do sofrimento.
Nietzsche, a partir do estudo da tragédia grega, considera que a arte conta, em sua origem,
com os deuses Apolo e Dionísio unidos conjugalmente, após prolongada luta prévia. Esses
deuses são pensados como universos ou impulsos artísticos perceptíveis na natureza. Apolo,
deus da luz, imagem divina da ordem, da medida e da harmonia. Dionísio, o deus da
escuridão, do caos, da desmesura. Apolo seria o responsável por dar forma, em bela
aparência, aos impulsos dionisíacos. Na visão grega, todo sujeito experimenta o sofrimento, o
horror, e tem o seu íntimo marcado por imagens sombrias, tristes e escuras, da mesma forma
que também experimenta de imagens agradáveis e amistosas. Na aparência da beleza
apolínea reverbera a eterna dor primordial. Vejamos o que o filósofo nos diz sobre a
necessidade de existência mútua desses deuses, união fundamental à atividade criadora:
quanto mais percebo na natureza aqueles onipotentes impulsos artísticos e neles um
poderoso anelo pela aparência [Schein], pela redenção através da aparência, tanto
mais me sinto impelido à suposição metafísica de que o verdadeiramente-existente
[Wahrhaft-Seiende] e Uno-primordial, enquanto o eternopadecente e pleno de
contradição necessita, para a sua constante redenção, também da visão extasiante, da
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
aparência prazerosa, aparência esta que nós, inteiramente envolvidos nela e dela
consistentes, somos obrigados a sentir como o verdadeiramente não existente
[Nichtseiende], isto é, como um ininterrupto vir-a-ser no tempo, espaço e
causalidade, em outros termos, como realidade empírica. (NIETZSCHE, 1999, p. 39).
A obra de Suassuna nos coloca exatamente diante dessa visão dialética, da inseparabilidade e
inescapabilidade dos opostos. O eu poético em “Dom” tem ciência de que não é possível a
correção da existência e, diante disso, aceita o seu destino, sabendo, ao mesmo tempo, que é
detentor de mecanismos para transfigurá-lo. Tal percepção nos conduz ao conceito do
apolíneo sugerido por Barbosa (2011, p. 14-15), em sua interpretação da obra nietzschiana.
Para esse estudioso, o apolíneo é a “forma encontrada para a aceitação daquele lado da
existência considerado escuro, insuportável, aterrador”, o impulso responsável por
transfigurar o “aspecto ameaçador em algo suportável a todo vivente. […] a disposição formal
do informe, a ordenação do caos.”
Ainda, quando apontamos a presença da vida de Suassuna em sua obra, estamos diante de
uma concepção de arte trágica dos gregos de que vida e arte estão intimamente ligadas, em
conflito e equilíbrio constantes. A perspectiva de Reino literário, construída em toda a obra
do autor, aproxima-se do “consolo metafísico”, essencial à tragédia grega, definido
magistralmente por Nietzsche (1999, p. 101-102) nas seguintes considerações: “a alegria
metafísica com o trágico é uma transposição da sabedoria dionisíaca instintivamente
inconsciente para linguagem das imagens”.
Agora que fizemos uma aproximação entre a perspectiva de redenção na arte de Suassuna e
as considerações nietzschianas sobre essa mesma temática, podemos retomar a nossa análise
do soneto.
No segundo quarteto, observamos que o eu poético encena não só o seu infortúnio, mas
também a destinação trágica de todo o mundo: a consciência da mortalidade. Temos, nos
dois primeiros versos do quarteto, a representação da queda do homem do paraíso e, por sua
vez, a perda da inocência e a tomada de conhecimento de que é um ser que nasce para
morrer. A marca da morte faz parte da existência humana desde a sua concepção original. A
queda do paraíso é, portanto, a peripécia original da humanidade. Não é aleatório o emprego
do verbo “envenenar”. Pensamos tratar-se de uma clara referência ao veneno da serpente,
símbolo do conhecimento e representação alegórica do demônio que tentou Adão e Eva no
Éden. O veneno é uma substância que penetra na circulação sanguínea e altera a composição
química do ser. Assim como o chamado “pecado original”, esse veneno também vai deixar a
sua marca nos descendentes de Adão, ou, como sugerido no poema, em toda a humanidade.
O terceiro e o quarto versos do segundo quarteto se referem à peripécia pessoal. O eu poético
é expulso de seu paraíso: o universo da infância. A consciência da mortalidade humana lhe
vem da maneira mais dolorosa: o brutal assassinato de seu pai. Toda a trajetória de felicidade
é transformada no seu contrário. Nesse quarteto há um diálogo muito intenso com os poemas
“Infância” e “Abertura 'sob pele de ovelha'”, dos quais destacamos, em especial, o primeiro
terceto e o segundo quarteto, respectivamente: “E veio o Sonho: e foi despedaçado./ E veio o
Sangue: o Marco iluminado,/ a luta extraviada e a minha Grei.” e “Eu, forçado a ascender, eu,
Mutilado,/ busco a Estrela que chama, inapelável./ E a Pulsação do Ser, Fera indomável,/
arde ao sol do meu Pasto — incendiado.”. A peripécia, característica essencial da tragédia, é o
mais forte laço entre os trechos e torna-se mais um exemplo da manifestação do trágico na
obra do autor. Essa ponte pode ser observada com muita clareza nos seguintes exemplos: em
“Dom”, o eu poético é apontado “ao sol cruel do Sono”; em “Infância”, o sonho, ou paraíso, é
despedaçado; em “Abertura 'sob pele de ovelha'” o eu poético se vê como “mutilado”; e, de
acordo com a leitura de Newton Júnior (1999), o pasto, que era verde, incendeia-se.
Percebamos que a vida do autor é marcada pela peripécia, mas, assim como esta é essencial à
tragédia grega, ela se torna fonte da poesia de Suassuna, condição primordial para sua
existência. Há um movimento de busca pela inversão, o desejo de vingança contra a desgraça;
algo que só é alcançável ao ser humano por meio da arte. Se da fortuna bruscamente veio o
infortúnio, há o desejo de, na arte, reconstruir-se o reino destruído na vida empírica. Leitura
que se faz clara nos seguintes versos: “E veio o Sangue: o Marco iluminado”, em que a morte
é percebida com a possibilidade de ser transfigurada, ou a ação apolínea de dar uma bela
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
aparência ao horrível; e “Eu, forçado a ascender […]”, no qual observamos a admissão da
queda e a necessidade de superação.
O primeiro terceto do poema “Dom” se inicia com a conjunção adversativa “mas”. Essa
marca gramatical evidencia uma mudança de sentido em relação à estrofe imediatamente
anterior. Como expusemos acima, a temática da “queda” predomina na segunda estrofe. A
terceira estrofe, então, opõe-se a ela para retomar a temática da compensação da morte por
meio da arte, desenvolvida na primeira estofe.
Na existência marcada pela morte, o eu poético encontra a base, a causa primeira de sua
literatura, o tesouro de seu Reino, sugerido nos seguintes versos: “Mas, se fui para sempre
assinalado,/ achei o Veio, a chama do Tesouro,”. No verso que fecha o primeiro terceto, “que
a Morte é sonho, a Vida é fogo e treino.”, pensamos estar diante de uma imagem basilar ao
universo suassuniano. Sugerimos que a imagem evocada em “a Morte é sonho” remete ao
sonho de Quaderna, em “A Visagem da Onça Caetana”, capítulo d'A Pedra do Reino.
Quaderna, esperando o interrogatório do Corregedor, adormece numa espreguiçadeira e
sonha com a Moça Caetana passando o dedo na parede, de onde ia surgindo um texto. Esse
texto é entendido por Suassuna como a origem de todo o romance d'A Pedra do Reino.
Por aproximação, acreditamos que o sonho é uma referência à passagem bíblica, no Livro do
Profeta Daniel, capítulo 5, no qual o rei dos caldeus, Belsazar, vê uma mão escrevendo
palavras enigmáticas na caiadura do palácio real. O rei mandou chamar o Profeta Daniel,
cativo do reino e conhecido por sua inteligência e sabedoria, para decifrar o enigma. Daniel
revela que o enigma foi escrito pelas mãos de Deus e que se trata da mensagem que anuncia o
final do reino dos caldeus com a morte de seu rei. Além disso, a imagem de Daniel, enquanto
profeta e decifrador de enigmas, pode estar associada a um espelhamento do autor. Também
“A Visagem da Onça Caetana” é um anúncio da morte do rei, no caso, o pai de Suassuna, e a
consequente destruição de seu reino. O final do verso “A Vida é fogo e treino” refere-se à
expressão latina fiat lux, que, aliada ao trabalho intenso, é condição indispensável à atividade
criadora, que dá sentido à vida.
Na última estrofe, “E, se o selo do Sol me tem, marcado,/ me deu o Dom de, em três Bocais-
de-ouro,/ fazer ouvir as trompas do meu Reino”, o eu poético se vale de uma construção
metafórica, “três Bocais-de-ouro”, para evidenciar o dom de escrever com maestria nos três
grandes gêneros literários (épico, lírico e dramático). A literatura de Suassuna é, ao mesmo
tempo que marcada pela morte de seu pai, a pedra com a qual ele reergue o Reino destruído e
assume o trono deixado vago. O soar das trompas de seu Reino representam a vitória de sua
arte contra a morte.
Antes de passarmos à leitura das imagens, cabe salientar que o texto pictórico é formado por
imagens que compõem o universo armorial suassuniano, de modo que nos foi necessário
realizar uma incursão em outras obras para melhor o compreendermos. Tal constatação nos
faz considerar que o desconhecimento do conjunto das iluminogravuras instalará no leitor,
inicialmente, o sentimento de que está diante de vários enigmas. Foi justo com o propósito de
atribuir interpretações a estes “enigmas” que realizamos a leitura que se segue.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
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Percebamos, inicialmente, que há uma referência clara às insculturas pré-históricas da Pedra
do Ingá, no “D” do título e nas ilustrações dos quadros centrais.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
eixo, informação que transcende o texto verbal e que remete à temática do amor, muito
presente no universo suassuniano.
Sol e lua entram no quadro, marcando também o movimento temporal da existência. Como o
sentido de leitura no Ocidente, tanto para textos quanto para imagens, é o da esquerda para a
direita, podemos considerar que a imagem do Sol na esquerda representa um nascer, um
princípio. A onça castanha corre em direção ao Sol enquanto é perseguida pelo centauro.
Essa cena acontece na fase da lua crescente, assim como os rituais de iniciação, que
tradicionalmente aconteciam nesse período, ao qual os antigos atribuíam características
favoráveis ao desenvolvimento da espiritualidade, por termos uma lua que aparece cada vez
maior no céu, o que representa um processo de “amadurecimento”.
O plano horizontal do meio se divide em três quadros verticais. É como se tivéssemos uma
porta, aberta em duas abas, que dá para o interior de um castelo.
Nas abas da porta, temos quatro gravuras inspiradas em insculturas pré-históricas. Essa
informação nos é esclarecida a partir da análise feita por Newton Júnior (1999, p.139) sobre
as figuras que integram a iluminogravura “Lápide”. Compostas, aparentemente, pela junção
das duas gravuras que figuram no eixo vertical central das iluminogravuras “Abertura 'sob
pele de ovelha'” e “Lápide”, pensamos que a interpretação das imagens demanda a nossa
atenção sobre essas outras iluminogravuras.
Primeiro, essas imagens só aparecem nessas três iluminogravuras e justo elas apresentam de
maneira mais explícita a autobiografia poética de seu autor. “Abertura sob pele de ovelha” é o
primeiro poema do álbum, representando o início de seu destino, e “Lápide”, o último poema,
encena o seu final. Sugerimos que as imagens convergem com o ideal de Reino construído
por Suassuna e representariam o seu brasão. No 3.º verso do 1.º terceto de “Abertura sob pele
de ovelha”, encontramos a seguinte descrição: “transforma o sangue em Candelabro e Veiro”.
A palavra “Veiro” é, para nós, a chave para a interpretação das imagens como o escudo, a
identidade do Reino, o Reino da literatura e da arte. Por isso, as gravuras estão nas portas.
São os escudos que defendem o Reino. Nossa interpretação é reforçada pelas palavras de
Newton Júnior (1999, p. 106), ao afirmar que é “como se cada poema de Suassuna fizesse as
vezes de um escudo de armas”.
No quadro vertical do meio, o interior do castelo, encontramos o soneto manuscrito, que está
dividido em três partes: dois blocos com os quartetos e um bloco com os dois tercetos.
Pensamos que os blocos do soneto correspondem a tábuas escritas. Como também o título
estaria inscrito em uma tábua. Cada tábua é intercalada por um quadro de imagens.
No primeiro quadro de imagens, temos um rei coroado, em seu trono, ao lado de sua espada.
Aqui, mais uma vez, visualizamos o correspondente imagético do eu lírico. No segundo
quadro, uma figura humana com um livro na mão, simbolizando o Reino literário, ou o
patrimônio literário como tesouro do Reino. A figura humana está ladeada de tochas, que
representam a luz, a chama do tesouro, a vida literária como fogo e treino. À luz do fogo das
tochas, temos o exercício de leitura e escrita. No terceiro quadro, acreditamos que a figura
animalesca é um camaleão, pintado em três cores, representando a transfiguração, própria da
arte. Os três desenhos iguais abaixo do camaleão representam os três “Bocais-de-ouro”, que
são os três gêneros literários, que já expusemos anteriormente.
No quadro inferior da prancha, observamos que um sol divide dois gaviões-reais, um em
pouso, à direita da iluminogravura, e o outro em voo, à esquerda. Ambos detêm sob suas asas
duas figuras humanas, que representam o pai e o filho separados pelo sol da morte.
A imagem do gavião não foi escolhida de forma gratuita pelo autor. Por sua capacidade de
voar muito alto, em civilizações antigas, como a egípcia e a greco-romana, o gavião
simbolizava o Sol, o Céu, a morada dos deuses, sendo também associado à nobreza e à
elevação espiritual. Na mitologia romana, por exemplo, o voo do gavião simbolizava a
elevação do espírito de um soberano após a morte física; entre os gregos, representava a força
e a espiritualidade. O pai estaria sob a asa do gavião em pouso, no final da jornada. O filho
estaria sob a asa direita do gavião em voo e, sob a asa esquerda, o seu cavalo alazão. Embora
os traços não marquem com precisão a anatomia da figura, pensamos que se trata de um
cavalo, uma vez que podemos visualizar quatro patas e uma cauda, uma elevação superior
traseira que sugere a forma de uma garupa e, na extremidade dianteira, a forma de orelhas,
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
de onde desceriam traços para formar a fronte da cabeça, e, a partir desta, esses traços
seguem até confundir-se com a pata dianteira. A presença do sol e do gavião também pode
sugerir a representação do masculino e do feminino, uma vez que o gavião também é símbolo
do poder feminino, pelo fato de a fêmea ser maior e mais forte que o macho.
Nesta análise, pudemos constatar que o texto pictórico também está fundamentado na
encenação da vida e da morte, na jornada poética e espiritual e na perspectiva do Reino, e
que, portanto, corresponde tematicamente ao texto verbal.
Procuramos, ao trazer as considerações de Nietzsche para analisarmos a iluminogravura de
Suassuna, mostrar que a temática trabalhada pelo poeta, a redenção por meio da arte, pauta
as inquietações humanas pelo menos desde a antiguidade grega. Essas considerações nos
permitiram caracterizar o autor como um “homem trágico” e a temática de sua obra como
“universal”.
REFERÊNCIAS
BARBOSA, Ildenilson Meireles. Arte trágica, pessimismo e redenção em O nascimento da tragédia. Trilhas
Filosóficas, Caicó/ RN, ano IV, n. 2, p. 9-19, 2. sem. 2011.
LEÃO, Ângela Vaz. A tigre negra: uma iluminogravura de Ariano Suassuna. Scripta, Belo Horizonte, v. 7, n. 13, p.
13-24, 2. sem. 2003.
NEWTON JÚNIOR, Carlos (Org.). Ariano Suassuna 80, memória: catálogo e guia de fontes. Rio de Janeiro:
Sarau, 2008.
NEWTON JÚNIOR, Carlos. O pai, o exílio e o reino: a poesia armorial de Ariano Suassuna. Recife: Ed.
Universitária da UFPE, 1999.
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A INSUFICIÊNCIA DA SUBJETIVIDADE: INSPIRAÇÃO, DISTORÇÃO E
OPORTUNISMO NA POÉTICA DE GREGÓRIO DUVIVIER
RESUMO
Este trabalho analisa como um discurso artístico pode fundamentar-se em argumentos distorcidos e
oportunistas; descreve instrumentos reflexivos sobre tais argumentos para contribuir a professores e
estudantes uma reflexão sobre a insuficiência da subjetividade. Estuda os conceitos de “virtual”, de
Pierre Levy, e “discurso”, de Dominique Maingueneau. Descreve uma pesquisa qualitativa por meio do
método dialético, escolha necessária para análise textual com referências históricas. Iniciamos a
pesquisa observando a existência de uma arte que se fundamenta distorcendo a obra impactante de
Duchamp (“Mictório”) na sociedade e contexto da época em que foi produzida. Hoje muitas artes
fomentam a sociedade do espetáculo ou lucram com editais. Problematizamos a questão ao
escolhermos o poema: “Receita para um dálmata (ou Soneto branco com bolinhas pretas)”, de
Gregório Duvivier. No texto, há uma manipulação do discurso dadaísta que gera uma fusão entre
argumento distorcido (por ridicularizar, primazias do meio/modo) e o oportunista (a arte
contemporânea, primazias da finalidade). Revela-se na análise que entendemos por virtual: a potência
de um texto está sempre se transformando, seja pela atualização da forma e conteúdo que são
preenchidos pela leitura, seja pelo meio social em que o texto é construído. Diferentemente seria a
análise se não tivéssemos a primazia do interdiscurso, o poema só poderia ser aceito na instância
subjetiva. Compreendemos que a subjetividade está para além do emocionar, está no persuadir
também. Instrumentalizar-se das primazias do discurso e ter em mente o conceito do virtual é
recepcionar a arte feita e assumida por uma pessoa, mas também a serviço de algo e justificada por
algo. Quando os fins justificam os meios, é preciso cautela para que o meio vazio não venha a encher
os olhos a uma finalidade de embuste. Subjetividade não é condescendência e permissividade, somos
nós mesmos.
PALAVRAS-CHAVE: Arte. Literatura. Crítica. Discurso. Subjetividade.
ABSTRACT
We analyze how an artistic speech can be based on distorted arguments and opportunistic;
We seek reflective instruments on such arguments to contribute to teachers and students a
reflection on the lack of subjectivity. We studied the concepts of "virtual" by Pierre Levy, and
"speech" by Dominique Maingueneau. We conducted a qualitative research through the
dialectical method, choose necessary for textual analysis with historical references. We
started the research noting the existence of an art that is distorting the work impact of
Duchamp ("Urinal") in society and context of the time in which it was produced. Today many
arts nurture the society of the spectacle or profit from edicts. We problematize the issue to
choose the poem: "recipe for a Dalmatian (or white black polka Sonnet)" by Gregorio
Duvivier. In the text, there is a manipulation of the Dadaist speech that generates a fusion
between Fuzzy argument (by ridicule, primacies the Middle/mode) and the opportunist
(contemporary art, primacies of purpose). The analysis reveals what we mean by virtual: the
power of a text is always turning, either by updating the form and content which are filled by
reading, either by the social environment in which the text is constructed. Unlike analysis
would be if we didn't have the primacy of INTERDISCOURSE, the poem could only be
accepted on subjective instance. We understand that subjectivity is beyond thrilled, in
persuading too. Instrumentalize the primacies of speech and keep in mind the concept of the
virtual is approve the art made and assumed by a person, but also in the service of something
and justified for something. When the ends justify the means, we must caution that the half
empty will not fill your eyes to a purpose of hoax. Subjectivity is not condescension and
permissiveness, ourselves.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
No nosso curso de Letras, muito se tem discutido sobre o que seria poesia, o que seria
literatura. Frequentemente, o professor aponta inúmeros textos estonteantemente
diversificados, invariavelmente ele se apodera do método socrático e faz perguntas sobre
como poderíamos ser tão inocentes em classificar as formas clássico-tradicionais
prontamente em arte, literatura, poesia e outras formas sem estrutura, rima ou qualquer
elemento facilmente perceptível como não-arte. Gera-se aí uma predisposição, um
condicionamento a desarmar o olhar dos critérios convencionais de literatura (aqui
definitivamente leia-se também como arte e poesia).
O estudante, depois do fuzilamento de questionamentos, da implosão do que ele pensava ser,
desconstrói todo um conhecimento “inútil, antiquado” de compreender o fenômeno literário.
Uma das conclusões mais ontológicas é a de que “se isso mexe comigo, se isso me toca, é arte,
é poesia, pois é subjetivo”. Tal conclusão é resultante da famigerada desconstrução que os
professores universitários consolidam (e sentem-se deuses com isso, senhores que iluminam
a mente de gente ignorante). Na escola e no colégio, Carlos Drummond de Andrade e Manuel
Bandeira agradam a alguns, intrigam outros, confunde uns tantos. A arte deixa de ser coisa
arraigada/enraizada para condição de fenômeno.
Uma vez que as convenções na arte já foram abolidas e é difícil reconhecer brilhantismo ou
imanente personalidade poética ao recriar o cotidiano, optamos por investigar o
comportamento da nossa subjetividade na recepção da obra. Com Receita para um Dálmata
(ou Soneto branco com bolinhas pretas) Gregório Duvivier, jovem poeta escritor, que não
participou do tempo histórico de um Ferreira Gular ou de um Décio Pignatari, de um Paulo
Leminski ou de uma Ana Cristina César, se expõe a um arsenal de leitores multiplicados por
suas subjetividades. Leitores dos mais variados saberes: céticos sobre o destino da arte,
entusiastas da constante renovação de uma linguagem, tradicionalistas (para não dizer,
estruturalistas) e tantos outros.
Queremos dizer o que já foi dito e mais um pouco: um jovem escritor que não foi laureado
pelo tempo nem pelos números de exemplares vendidos e muito menos pela influência
política dos seus leitores que constrói uma obra simples (simplista, singela e superficial) seria
ou não seria digno de uma interpretação mais que aparente? A pesquisa, ao procurar
compreender a performance literária atualagrega em si estudos da área da linguística, no que
diz respeito a discurso, e literatura, mas estritamente a crítica literária. Com um enfoque
interdisciplinar, podemos evitar o que Sírio Possenti (1993, p.153) alega como defeito em
qualquer teoria científica: “a iluminação de um aspecto coloca outro na sombra. O privilégio a
uma abordagem acaba sendo a exclusividade de um aspecto”. Em seguida, Possenti menciona
as três principais vertentes que na crítica literária que se aproximam dos compromissos da
análise do discurso, são elas: a psicologizante, sociologizante e formalista.
A partir desta vertente teórica, este trabalho se estrutura da seguinte forma: Os impasse da
subjetividade em trânsito na contemporaneidade e A busca de critérios para a
interpretação da mensagem poética. Ambos os tópicos são focados na leitura dos discurso
simplista dos poetas contemporâneos. O impasse da subjetividade em trânsito na
contemporaneidade busca mapear a crise da significação contemporânea produzida pelo
olhar do leitor no que se refere a uma arte que rompe com a linguagem clássica como
referente. Já o tópico A busca de critérios para a interpretação da mensagem poética
centra-se na análise do poema Receita para um Dálmata (ou Soneto branco com bolinhas
pretas) com o propósito de desenvolver ferramentas que proporcionem um olhar crítico-
estético do leitor debruçado sobre a poesia contemporânea.
1 .0 Os impasses da subjetividade em trânsito na contemporaneidade
A prática da reprodução do cotidiano nas obras de arte é uma característica marcante do
modernismo enquanto rompimento com uma tradição que por si só não se define). Tais
tradições estavam saturadas de inúmeras convenções em várias esferas da sociedade. Na arte,
em específico, a convenção da beleza e da verdade vivenciou uma situação limite de que não
se podia mais resguardar-se a salas da elite, enclausurar-se a museus e a outros lugares
inacessíveis à nova burguesia. A beleza e a verdade alçam voos a uma realidade do povo. A
globalização muito contribuiu para o acontecimento. Segundo Gilles Lipovetsky e Jean
Serroy (2001, p.31)“a desorientação contemporânea não resulta mais apenas da depreciação
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
dos valores e da ruína dos fundamentos metafísicos do saber, da lei e do poder, mas da
desintegração dos pontos de referência sociais mais comuns”.
No entanto, apesar das convenções já terem sido ultrapassadas pelo próprio contexto cultural
da sociedade que a engendrou propiciando expressões artísticas que contrariavam as
referências consagradas seja pela religião, pela ciência ou pela arte, ainda hoje persistem
poetas em criar poesias que continuam retratando o cotidiano a uma linguagem
extremamente coloquial, inteiramente despropositada. E podemos falar também
descompromissada. O poema de um desses poetas é ponto de partida e chegada da nossa
busca sobre a questão da subjeti vidade perante as performances literárias mais
contemporâneas após o segundo milênio da era cristã.
Mas para problematizarmos ainda mais a questão ao compasso que inserimos os conceitos
que serão utilizadas, tecemos um paralelo entre a obra de Marcel Duchamp e objeto de nossa
pesquisa. A obra A fonte, popularmente conhecida como O Mictório, pasmou muita gente na
época em que foi apresentada. No início do século XX, estávamos a beira de uma guerra, o
mundo parecia entrar em colapso. O repouso das formas nos quadros eram substituídos pela
instantaneidade da fotografia. O teatro enquanto arte dramática estava cada vez mais
dividindo lugar com a velocidade da sobreposição de imagens do cinema, ou seja, as formas
esculturais, a inspiração do gênio romântico de antigamente certamente não passariam
intactas às mudanças econômicas, políticas e tecnológicas.
A produção da arte de Duchamp está sociologicamente e psicologicamente de acordo com o
um discurso fundamentado ao seu momento histórico que, ao contextualizá-lo, inferimos a
autenticidade e a força criativa do artista, pois, conforme Dominique Maingueneau (2001,
p.55) “não se pode atribuir um sentido a um enunciado fora de contexto; e o mesmo
enunciado em dois lugares distintos corresponde a dois discursos distintos”. Não obstante,
como foi dito, inúmeros outras expressões artísticas estavam a transformar-se, é preciso
considerar o discurso do “mictório” no universo de outros discursos para que tenhamos um
sentido representativo, tal pensamento alude ao que seria interdiscurso sendo uma interface
com o universo de discursos produzidos no mesmo tempo-espaço.
Releituras diversas foram feitas em torno de Duchamp, e talvez tenha sido esse uma das
intenções: chocar, desestabilizar, escandalizar. Tamanha foi a repercussão de sua obra que
ele chamou por “A Fonte” que a obra deslocou-se do tempo de produção e está associada ao
imaginário como uma revolução da arte ou o cúmulo da arte. É um novo jeito da arte pela
arte, da arte conceitual. A compreensão desse fenômeno cede espaço para a contemplação
inerte que muitas vezes, a depender do sujeito que o examina, o retransforma em coisa e sai
de uma exposição atônito, calado, emudecido. Percebamos que no primeiro caso, ao situar o
discurso artístico contextualizado e no bojo de um interdiscurso obtemos mais êxito do que
reler indiscriminadamente a partir de uma subjetividade sem filtros.
Não seria muito arriscado mencionar que a crise da significação da linguagem desde o
modernismo fez fértil o terreno acadêmico para que a evolução da linguística englobando o
avanço da pragmática, bem como o da semântica. Contudo, a Escola de Constância registra
uma mudança da maneira de conceber a interpretação que até então se pautava em texto-
autor, agora a “abordagem alemã” enfatiza a relação texto-leitor. Disso resulta um sem
números de teorias sobre leitura, entre tantas, a estética da recepção de Hans Robert Jauss, a
teoria do leitor implícito de W. Iser A multiplicidade de pontos de vista é também
identificada por Antonio Costella: factual, expressional, técnico, convencional, estilístico,
atualizado, institucional, comercial, neofactual e estético. A necessidade de ler demanda a
sociedade teorias de como se ler, e a sociedade, como foi dito, responde à altura do pedido e
fornece ferramentas, filtros, critérios para que o leitor consiga reconhecer a complexidade
das linguagens.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Os engajados senhores apreciadores e consumidores de arte travam uma luta sobre a real
situação dos limites da arte contemporânea. A arte plástica é a mais evidente tensão entre os
estudiosos: a disposição da pintura, a textura, os recursos utilizados podem ser facilmente
questionados sobre o status de arte. Mediante a fulminação de informações e produtos
artísticos, faz-se necessário o uso de critérios interpretativos para que possamos dialogar com
base em argumentos os elementos poéticos de uma obra. Segundo Antonio Costella (1997,
p.15) para “apreender bem a mensagem contida em uma obra de arte, o espectador deve
esforçar-se por aprimorar sua capacidade de percepção”. Outrossim, com quantos mais
critérios interpretativos tivermos, maior será o alcance da nossa subjetividade em filtrar as
mensagens chegadas. Assim, possivelmente, seremos mais transformados pela relação
sujeito-obra, uma vez que a essência e algo mais poderá nos tocar.
2.0 Inspiração, distorção ou oportunismo: A busca de critérios para a interpretação da
mensagem poética
Pegue um papel, ou uma parede, ou algo/ que seja quase branco e bem vazio/
Amasse-o até que tome forma/ de um animal: focinho, corpo, patas/ Em cada
pata ponha muitas unhas/ e em sua boca muitos dentes. (Caso/ queira, pinte o
focinho de qualquer/ cor que pareça rosa). Atrás, na bunda/ ponha um fiapo
nervoso: será seu/ rabo. Pronto. Ou quase: deixe-o lá/ fora e espere chover
nanquim/ dê grama ao bicho. Se ele rejeitar,/ é dálmata. Se comer (e mugir) é
uma vaca que tens. Tente outra vez. (DUVIVIER, p. 21)
Como trata Vicent Jouve(apud Catherine Kerbrat-Orecchoni, 2002, p.25): “ler não é se deixar
levar pelos caprichos de seu próprio desejo/delírio interpretativo, se se pode ler qualquer
coisa atrás de qualquer texto... então todos os textos se tornam sinônimos”. A leitura
enquanto processo afetivo é o que frequentemente ativa a nossa subjetividade, isso se
manifesta no resultado estético primeiro do poema, pois ele nos causa o que causa um
poema-piada, ainda que tenha um sentimentalismo debochado de si mesmo. No entanto,
muitas vezes paramos no processo afetivo como se o texto se esgotasse nisso, porém, existem
ainda a leitura como processo neurofisológico, cognitivo, argumentativo e simbólico (JOUVE,
2002) e é preciso reforçar tais categorias ao analisarmos a produção atual, possibilitamos,
concomitantemente, após a leitura tendenciosa, uma releitura plural.
Se quisermos ir além do entretenimento e vasculhar o real propósito do texto podendo retirar
dele o mais proveitoso ao nosso desenvolvimento pessoal e ensaiar para que tenhamos outros
posicionamentos na rotina da vida, admitir-nos-emos que o texto não nasceu pronto. É uma
forma de ação que pode ser assumida ou não pelo sujeito que o criou. Retomando, algumas
características da análise do discurso, Maingueneau (2003) “falar é uma forma de ação sobre
o outro e não apenas uma representação do mundo”. Tal posicionamento do locutor terá por
consequência algo que dialoga com Michel Picard, em La lecture comme jeu (A leitura como
jogo) quando é abordado o descobrimento de três instância no leitor: o ledor (a
circunstâncias externas que o rodeiam), o lido (o inconsciente que responde as formas e
conteúdos fantasmagóricos do texto) e o leitante (uma secundaridade crítica que se
compromete com uma perspectiva crítica da obra).
Atentaremos ao passeio por entre as instâncias identificadas por Picard. Na instância do lido,
em evidências por um ponto de vista factual, estamos diante de um poema intitulado como
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
receita, e como sabemos o gênero-título implicitamente visa a concretização de algo e cumpre
ao descrever minuciosamente o passo a passo de como fazer um dálmata. O último trecho
serve de arremate para quem não conhece o autor, pois, serve de conclusão por seu caráter de
desfecho-piada: “Agora dê grama ao bicho / Se ele rejeitar, é dálmata / Se comer (e mugir),
é uma vaca que tens/ Tente outra vez”. Se partirmos mesmo para uma perspectiva textualista
entre o leitor e mensagem, observaremos o quão “cara de pau” é o sujeito assume a ação. Ele
colocou em versos uma linguagem simples, de não muita elaboração, sortida de verbos no
modo imperativo ao indicar a facilidade e banalidade de se fazer um animal (que pode ser um
origami) e desprezando o material de trabalho: “ou algo que seja quase branco e bem vazio”.
O tema da distorção do sentido da arte facilmente é ativada num leitor mediano, cujas
circunstâncias do ledor faz com que surja um meio riso ao deparar-se com a simplicidade da
poesia moderna ou mesmo com a frivolidade de lidar com coisas outrora muito estilizada,
rebuscada, repleta de figuras de linguagem, pontuação e imagens. Ainda temos tudo isso,
mas de outra maneira, pois o sujeito da ação que utiliza as informações e sensações do
mundo, aplica sua cosmovisão somada aos questionamentos do seu tempo:
Apontamos aqui uma fusão das principais vertentes já mencionadas da crítica literária em
proveito da intertextualidade. Segundo Maingueneau (2003), isso acontece, pontualmente ,
nos anos 60 quando a morte do autor após atingir o ápice, cede espaço para uma
compreensão menos singular como unidade fundamental a uma integridade onde a obra
analisada é descoberta como latente de uma multiplicidade de outras. Assim também é o
poema e para que cheguemos na instância leitante preconizada por Picard é preciso ir em
busca desses implícitos que na aparente superficialidade do poema nos deixa inerte, ou
melhor, sem motivações a um aprofundamento. Contudo, tenhamos em mente que o texto
não nasceu pronto.
Quem nasceu antes do texto, e aqui a essência precede a existência, foi o Gregório Duvivier.
Em seu primeiro livro, o jovem já tem um currículo considerável: é roteirista, ator, formado
em letras pela PUC-Rio desde 2008 e é também um dos diretores/realizadores de um canal
de vídeo no site do YouTube. Ao sabermos disso, ativaremos que é comum na vida do artista
a releitura, muitas vezes original, de situações históricas. Mas também o provável
conhecimento da história da literatura. Um aspecto marcante na poética de Gregório
Duvivier é o fascínio demonstrado na suas composições pelo aspecto lúdico da linguagem
onde ele consegue brincar, inclusive de ser poeta.
Toda essa possibilidade de riqueza textual é defendida pelo filósofo Pierre Levy que
caracteriza o texto como uma instância virtual que está sempre se atualizando e adquirindo
potência em cada ato de leitura (LEVY, 1997). O próprio conceito de virtual faz menção ao
conjunto dos estudos que ele realiza, entre elas a de conceber formas de tecnologias da
inteligência, grosso modo, livrar de modos antigos de pensar: tal qual a lógica aristotélica de
verdadeiro e falso, pois o próprio virtual é um ser e não ser ao mesmo tempo (LEVY, 1993).
Portanto, ao refletir sobre a criação do contemporâneo nada melhor do que direcionar a
nossa subjetividade a um pensar também contemporâneo.
O pensamento do filósofo explica a inserção do leitor num ponto de vista mais crítico,
instância leitante, esse “como se viu, sempre se lembra de que o texto é antes de mais nada
uma construção, se toda construção supõe um arquiteto, o ‘leitante’ tem, consequentemente,
como perspectiva, uma imagem do autor que o guia em sua relação com o texto” Jouve
(2002, p. 51) Se nos atentarmos a tudo isso, mais uma vez ratificaremos a primazia de que o
discurso é assumido por um sujeito, “um EU, que se coloca como fonte de referências
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
pessoais, temporais, espaciais e, ao mesmo tempo, indica que atitude está tomando em
relação a seu coenunciador” MAINGUENEAU(2001).
Ao considerarmos que as condições do dizer e de quem diz atravessam o dito, teríamos um
conhecer mais favorável a uma leitura crítica. Temos um poeta lúdico, inserido em esferas do
humor na sociedade e que tem na bagagem um curso universitário de letras. Podemos até
cogitar que o poema é uma releitura da ideologia dadaísta e assemelha-se muito com o
modos operandis da concretização do poema Receita dadaísta, de Tristan Tzara, compilado
por Teles (1986, p. 81):
Pegue num jornal / Pegue numa tesoura / Escolha no jornal um artigo que
tenha tamanho que pensa dar ao seu poema Recorte o artigo / Recorte
seguidamente com cuidado as palavras que formam o artigo e meta-as num
saco / Agite com cuidado / Seguidamente, retire os recortes um por um /
Copie conscienciosamente segundo a ordem pela qual foram saindo do saco o
poema parecer-se-á consigo / E você tornou-se um escritor infinitamente
original / e de uma sensibilidade encantadora / ainda que incompreendida
pelo vulgo.
Usufruir melhor da nossa subjetividade sem com isso cair na cilada das ideias preconcebidas
e arraigadas de um pensamento delimitado pela lógica e razão, de tal modo, estaria
diretamente relacionado a construir possíveis cogitações ao que é extrínseco e intrínseco no
texto. Assim, ao buscarmos tais elementos de produção textual, a partir do momento em que
consideramos as faces positivas e negativas de do enunciador do discurso, estaremos mais
aptos a preservar-nos de um iminente epidêmico charlatanismo na arte contemporânea.
Gregório Duvivier, a primeira vista, com tal poema poderia ser muito bem um charlatão. Mas
considerando todas as primazias do discurso, observamos um poeta que se inspira num
movimento vanguardista e perfaz o discurso ideológico que deixa uma sugestão de distorção
exacerbada. A graça nisso está também na inteligência do poeta em sacar a oportunidade que
o momento atual proporciona e fazer ambíguo o seu poema. Se, por um lado, pode ser apenas
um poema piada dessacralizador até mesmo do gênero soneto; por outro, pode refletir sobre
o aspecto dadaísta da poesia em todas as artes.
Tome nota: a arte contemporânea ao se aproximar da vida quis também se confundir com
ela. Muito provavelmente por estar a vida ontem e hoje escassa de significados, ora ela
exacerba a mimesis num modo nonsense, ora ela representa pelo absurdo, ora ela se
banaliza, como que para se igualar a um escândalo para que a vida a enxergue e possa
reverenciá-la. Seja pelo humor, seja pela dor, seja pelo amor, seja plural e raramente unívoca.
Gregório Duvivier, ao reapresentar o cotidiano no poema estudado, faz percebermos que ser
subjetivo é insuficiente na poética dele. Rir do que ele diz sem mais implicações atende a um
dos efeitos de sentido, mas também nos coloca no papel de um idiota se descobrirmos que
podemos ir além.
A nossa subjetividade, a grosso modo, tem filtros conceituais, parâmetros sobre os valores da
arte. Hoje, cada vez mais, e muito frequentemente no âmbito educacional, os filtros são
desprezados. Poemas que podem não dizer nada, poetas que podem simular uma dor, que
diferente, deveras não sentira, mas dizem sentir para passar num edital ou agradar um
público e respeitar o mercado do marketing. O embuste na arte existe, é fato. Hoje, mais que
nunca, a lei Rouanet favorece isso. Empresas financiam qualquer coisa desde que a
companhia de teatro, o escritor, os músicos estejam devidamente com o Certificado de
Regularidade Fiscal, registrado na Junta Comercial ou tenham um Alvará. Não estamos
falando de uma epidemia, mas do presente potencial para a realização de um futuro
desastroso. O estudo aqui não visou encaixotar, algemar ou solidificar a nossa subjetividade,
mas pretendeu pensar critérios de como deixá-la senhora de si, pensante, e não paralisante,
não estanque, não imóvel. Até porque a subjetividade não é uma coisa insignificante, uma
coisa qualquer. É o nosso processo afetivo que está em jogo. Quando estamos na condição de
subjetivos, somos nós, em princípios, em humanidade. Isso, evidentemente, não
desconsidera como complexo o uso da subjetividade na recepção da arte.
Referências
174
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
COSTELLA, Antonio F. Para apreciar a arte: roteiro didático. São Paulo: Editora SENAC São Paulo;
Campos do Jordão, SP: Editora Mantiqueira, 1997.
DUVIVIER, Gregório. A Partir de amanhã eu juro que a vida vai ser agora. Rio de Janeiro: 7Letras, 2008
FARIAS, Agnaldo. Arte Brasileira Hoje. São Paulo: Publifolha (Folha Explica), 2002.
JOUVE, Vincent. A leitura. Vicent Jouve; tradução Brigitte Hervor. São Paulo: Editora Uniesp, 2002.
LIPOVETSKY, Gilles; SERROY, Jean. A cultura-mundo: resposta a uma sociedade desorientada/ Gilles
Lipovetsky e Jean Serroy; tradução Maria Lucia Machado. – São Paulo : Companhia das Letras, 2011.
POSSENTI, Sírio. Discurso, estilo e subjetividade. São Paulo: Martins Fontes, 1993.
TELES, Gilberto Medonça. Vanguarda europeia e modernismo brasileiro. 9. Ed. Petrópolis: Editora
Vozes, 1986.
175
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A CONTRIBUIÇÃO DA LEITURA DO TEXTO LITERÁRIO PARA A FORMAÇÃO
DOS ALUNOS DO ENSINO MÉDIO
*
Docente Mestre da Escola Técnica de Saúde de Cajazeiras do Centro de Formação de Professores da Universidade Federal
de Campina Grande – ETSC/CFP/UFCG – Campus de Cajazeiras, Paraíba.
E-mail: [email protected]
Este Projeto foi aprovado pelo PIBIC/CNPq/UFCG, e desenvolvido por Islânea Blenda Rolim de Sousa, aluna do 2º ano do
Ensino Médio da Escola Técnica de Saúde de Cajazeiras do Centro de Formação dos Professores da Universidade Federal de
Campina Grande – ETSC/ CFP/UFCG – Campus de Cajazeiras – Paraíba, com Bolsa do CNPQ – PIBIC-EM (2012), sob minha
coordenação e orientação.
176
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Quando fazemos um retorno aos primórdios da humanidade em relação à sua formação
cultural, constatamos que o seu universo imaginário – da oralidade à escrita – exerceu papel
preponderante na disseminação e perpetuação do nosso legado histórico-cultural. A
transmissão desse legado nos coloca diante de algumas reflexões sobre o modo com que ele
nos é passado e recebido até nossos dias, quando, por diversas razões, nem sempre se tem
acesso a isso. Neste sentido, vale ressaltar o que observa Candido (1995, p. 175 diz que:
Candido (1995, p. 176) acrescenta que: “No âmbito da instrução escolar o livro chega a gerar
conflitos, porque o seu efeito transcende as normas estabelecidas”.
Convém levar em consideração, aqui, a defesa da literatura feita por Antonio Candido,
quando este a compreende como um direito que deve se estender a todos, por ser “uma
necessidade universal”, um bem incompressível a ser satisfeito, tendo em vista a
impossibilidade do ser humano sobreviver “sem mergulhar no universo da ficção e da poesia,
visto que, em “uma sociedade, em todos os tipos de cultura”:
Na esteira desse raciocínio, que compreende a literatura como forma de arte humanizadora,
remetemos ao texto “O que pode a literatura?”, de Tzvetan Todorov (2000, p. 76), quando
este autor afirma que
A literatura pode muito. Ela pode estender a mão quando estamos profundamente
deprimidos, nos tornar ainda mais próximos dos outros seres humanos que nos
cercam, nos fazer compreender melhor o mundo e nos ajudar a viver. [...] revelação
do mundo, ela pode também, em seu percurso, nos transformar a cada um de nós a
partir de dentro.
Assim, por entender que imaginar é poder, acreditamos que, “através do fictício e da
fantasia”, a literatura propicia ao jovem o poder de autonomia de pensamento, e a aquisição
de “um saber sobre o mundo” (CADEMARTORI, 1986, p. 23).
Dessa forma, partimos de uma investigação sobre a contribuição da leitura de textos
literários para a formação educacional do aluno do Ensino Médio, no intuito de descobrir de
que modo esse tipo de leitura colabora com o desenvolvimento do seu potencial intelectivo.
Nesse sentido, buscamos verificar em que medida a leitura de textos fictícios possibilita o
crescimento intelectual e a consciência de cidadania a partir da inserção desse aluno em um
universo que lhe propicie aprendizagem e prática de reflexão, despertando o seu senso crítico
para a realidade que o envolve.
Destarte, intentamos conhecer, através de relato escrito de suas experiências vivenciadas, o
que esse aluno sente, pensa e deseja expressar a respeito de sua história de leitura literária,
bem como sobre a contribuição destes textos para a sua formação escolar, visto que, para
Paulo Freire (1995, p. 11), “a compreensão crítica da importância do ato de ler” constituiu-se
177
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
a partir da releitura dos momentos fundamentais de sua “prática, guardados na memória,
desde as experiências mais remotas de sua “infância”, “adolescência” e “mocidade”.
Em seu depoimento sobre sua experiência de leitura como professor de língua portuguesa,
em A importância do ato de ler: em três artigos que se completam, Paulo Freire (1995, p.
18) ressalta a “necessidade que temos, educadores e educandos, de ler, sempre seriamente, os
clássicos neste ou naquele campo do saber, de nos adentrarmos nos textos, de criar uma
disciplina intelectual, sem a qual inviabilizamos a nossa prática enquanto professores e
estudantes”. Freire (1995, p 18) destaca ainda:
As lembranças referidas por Freire, sobre as “vezes em que demorava na análise de textos”
dos escritores acima mencionados, nos permite um diálogo com o entendimento de José
Edilson Amorim, ao nos apresentar “Idéias para um estudo interpretativo da poesia”, quando
ele remete ao seu texto “Leitura, análise e interpretação,” cujas ideias defendem
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Ainda na perspectiva do estudo comparativo de textos, faremos a leitura e análise da obra O
quinze, de Raquel de Queiroz, estabelecendo uma relação com “A trágica seca de 1915”,
relatada em Memórias do Zé do Norte, por Alfredo Ricardo do Nascimento. Nesta análise
serão destacados os aspectos pertinentes à temática da seca na região, de acordo com a
narrativa de cada um dos autores, ressaltando os pontos comuns ou peculiares dos dramas
experimentados pelos personagens dessas obras.
Desse modo, tomamos como referências a leitura do texto “O direito à literatura”, de Antônio
Candido; numa perspectiva dialógica, remetemos também ao texto “O que pode a
literatura?”, de Tzvetan Todorov;A importância do ato de ler: em três artigos que se
completam,de Paulo Freire, cuja compreensão de leitura da palavra pressupõe um
conhecimento prévio do mundo para que o sujeito interaja com o mundo, ou seja, a leitura
engloba três aspectos básicos: percepção crítica, interpretação e “re-escrita” do lido; a
Leitura e construção do real: o lugar da poesia e da ficção, livro organizado por
Guaraciaba Micheletti, Letícia Paula de Freitas Peres e Ana Elvira Luciano Gebara. Em seu
texto “A leitura como construção do texto e construção do real”, Guaraciaba Micheletti
dialoga diretamente com a concepção freiriana sobre leitura, ao considerar que é da leitura
processada em vários níveis que “brota a construção do real” e conduz o leitor a inferir e
atribuir sentidos ao texto para a interpretação do mundo, e destacar que compartilha da
“idéia de que ‘a leitura é um ato interativo e de compreensão de mundo’”. (MICHELETTI,
2006, p. 16).
Remeteremos ainda à obra Literatura: da crítica à sala de aula, organizada por Hélder
Pinheiro e Marta Nóbrega; também à Poesia na sala de aula, de Hélder Pinheiro,
especialmente o texto “Poesia para jovens”, cujo tópico final ressalta “O poder da poesia”.
Dentre esses autores e obras, tomamos como suporte teórico para fundamentar este projeto o
pensamento de autores versados na problemática brasileira da leitura e da abordagem
literária, cuja discussão e alternativas para os problemas da nossa realidade, correspondem
as nossas expectativas. Assim, recorreremos à obra A literatura infantil: História. Teoria.
Análise: das origens orientais ao Brasil de hoje, de Nelly Novaes Coelho; à Literatura infanto-
juvenil. Revista Tempo brasileiro, que contém artigos de Nelly Novaes Coelho e de outros
autores.
Faremos recurso também a Alfredo Bosi, em suas obras História concisa da literatura
brasileira e O ser e o tempo da poesia. Ainda recorreremos aos textos: O que é
leiturae “Leitura: enigmas e possibilidades”, de, Maria Helena Martins; Leitura em crise
na escola: as alternativas do professor, organizado por Regina Zilberman, e à sua obra O
que é literatura.
Como exemplo elucidativo e prático para a compreensão da leitura literária, assim como
sugestão de ideias e experiências, recorreremos às obrasLiteratura infantil & juvenil:
relatos de experiência na escola eLiteratura infantil & juvenil: vivências de leitura e
expressão criadora, ambas de Vânia MariaResende, entre outros.
Outra referência a ser tomada para o desenvolvimento deste Projeto é Nelly Novaes Coelho,
visto que, sua contribuição é muito significativa, conforme atestamos na Revista Tempo
Brasileiro – Literatura infanto-juvenil –, na qual Nelly inicia o seu texto intitulado
“Literatura infantil, abertura para a formação de uma nova mentalidade” (Comunicação
apresentada no 1º Encontro de Professores Universitários de Literatura Infantil e Juvenil,
promovido pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil e pela Faculdade de Educação
da UFRJ, de 30/6 a 4/7/80):
Partindo do dado básico de que é através de sua consciência cultural que os seres
humanos se desenvolvem de maneira integral, é fácil compreendermos a importância
do papel que a Literatura pode desempenhar para todos os seres em formação. É ela,
dentre as diferentes manifestações da Arte, a que atua de maneira mais profunda e
essencial, no sentido de dar forma e de divulgar os valores culturais que dinamizam
uma sociedade ou uma civilização. (COELHO, 1980, p. 3).
179
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Estes termos de Nelly Novaes Coelho são fundamentais para nos orientar na execução do
projeto que aqui empreendemos, visto que é nessa linha de pensamento que pretendemos
realizar, observando através do uso prático da literatura, na manifestação da linguagem
expressa pelo sujeito, uma abertura para várias possibilidades de crescimento e
amadurecimento de si, rumo à elevação de sua autoestima, bem como de sua autoafirmação.
É da mesma autora a obra A literatura infantil: história, teoria, análise: das origens
orientais ao Brasil de hoje, que faremos também recurso.
Não poderia faltar à nossa fundamentação, a obra A literatura infantil na escola,escrita
por Regina Zilberman, como também as obras: Um Brasil para crianças: para conhecer a
literatura infantil brasileira: histórias, autores e textos; e, Literatura infantil brasileira:
história & histórias; ambas de sua autoria em parceria com Marisa Lajolo, entre outras obras
organizadas pela referida autora, na mesma área de interesse, a exemplo de Leitura e crise
na escola: as alternativas do professor.
A obra intitulada O texto na sala de aula: leitura & produção, organizado por João
Wanderley Geraldi, nos fornece respaldo significativo, haja vista as sugestões apresentadas
por este autor no seu texto “Unidades Básicas do Ensino de Português”, cujo conteúdo
fornece uma metodologia para a aplicabilidade dos textos a serem lidos e discutidos nesta
pesquisa.
O objetivo geral foi empreender a busca sobre a contribuição da literatura para a formação
do/a aluno/a do Ensino Médio, a partir da leitura de textos literários da língua portuguesa.
Quanto aos objetivos específicos, foram elencadas as seguintes ações:
Nos últimos tempos, os avanços tecnológicos e científicos têm se destacado com sua
contribuição para o desenvolvimento do nosso mundo. Contudo, são frequentes e notórias as
contradições entre os modelos de comportamento humano atuais e os anteriores. Neste
paradoxo, o homem não pode prescindir da cultura, visto que ela o acompanha porque lhe é
inerente. Dela depende a sua formação, posto que ela sintetiza passado, presente e futuro do
ser humano, o qual pode selecionar o que lhe servirá ou não aos seus anseios.
180
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
ostenta, seja em mínima ou em larga proporção. Não obstante essa evolução, percebemos, a
partir de uma observação no campo da criatividade humana, nos últimos tempos, que a falta
ou presença de leitura na vida do indivíduo tem interferido consideravelmente no
desempenho de sua condição de ser-cidadão. Com vistas nisso, cientes do poder de
criatividade do jovem que, no entanto, muitas vezes é/está contido por razões inaceitáveis
que não o justificam, pensamos, com este projeto, viabilizar e/ou ampliar o acesso à leitura
de textos literários ao aluno do Ensino Médio, no intuito de expandir sua capacidade de
compreensão e seu poder de critica em relação a esse e a outros tipos de texto do seu
cotidiano.
Desse modo, acreditamos que a leitura do texto literário permite que esse indivíduo se firme
como ser crítico e autônomo e busque a cidadania em suas ações, uma vez que esse tipo de
atividade proporciona reflexão sobre atitudes que interferem direta ou indiretamente na
conduta ética do ser humano, melhorando sua postura no mundo.
Partindo desse entendimento, na defesa de uma formação plena do indivíduo com mais
possibilidades de vida digna, de acesso às condições imediatas das necessidades humanas, na
perspectiva de que ele transcenda seus horizontes, acreditamos, com esse projeto, contribuir
efetivamente com um mundo melhor, por meio da leitura literária, visto que esta permite ao
ser humano, especialmente ao indivíduo em formação, não apenas um novo olhar e uma nova
compreensão sobre os fatos da realidade do mundo atual, mas também uma condição
também de expressar o seu pensamento, de forma autônoma, e assim contribuir também
com elaboração de um mundo humanizado, mediado pela arte literária.
METODOLOGIA E MATERIAIS
181
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
adaptação cinematográfica produzida em 1964, pela Companhia Herbert Hichers, com base
no livro.
Nessa perspectiva de abordagem dialógica da leitura e compreensão do texto literário,
relacionaremos os aspectos similares entre poemas, a exemplo de “Ao desconcerto do
mundo”, de Camões, e “Desenganos da vida humana metaforicamente”, de Gregório de
Matos. O primeiro, poeta exponencial do Classicismo português; o segundo, do Barroco
brasileiro. Ambos os textos expressam o sentimento universal do homem em relação ao
desencantamento da vida, não obstante a peculiaridade do estilo, da Escola Literária, da
época e do lugar de origem de cada poeta.
A partir das leituras, reflexões e comentário escrito sobre estas obras, pelo/a aluno/a,
empreenderemos nossa busca da contribuição da criação poética de outrora para os nossos
dias, destacando os aspectos da arte literária que interferiram na transformação ou na
permanência da cultura humana, a exemplo dos problemas e da crítica que a literatura
suscita ao leitor.
Ainda na perspectiva do estudo comparativo de textos, faremos a leitura e análise e
compreensão por escrito sobre O quinze, de Raquel de Queiroz, estabelecendo uma relação
com “A trágica seca de 1915”, relatada em Memórias do Zé do Norte, por Alfredo Ricardo
do Nascimento. Nesta análise serão destacados os aspectos pertinentes à temática da seca na
região, de acordo com a narrativa de cada um dos autores, ressaltando os pontos comuns ou
peculiares dos dramas experimentados pelos personagens dessas obras.
Nesse sentido, a aplicabilidade dos textos visa desenvolver a capacidade intelectual do/a
aluno/a do Ensino Médio e ampliar o seu conhecimento cultural, tanto no âmbito da
oralidade quanto da escrita, através de leitura, reflexão e produção textual, contribuindo
assim para a formação integral do/a estudante.
Oportunamente poderemos lançar mão de autores e obras da literatura que venham elucidar
e enriquecer possíveis discussões, uma vez que uma história poderá remeter a outra. Ou, de
outro modo, que possam fundamentar a nossa discussão nesta pesquisa.
REFERÊNCIAS
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crítica à sala de aula. Campina Grande: Bagagem, 2006.
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182
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
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PINHEIRO, Hélder e NÓBREGA, Marta. (Orgs.). Literatura: da crítica à sala de aula. Campina Grande:
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ZILBERMAN, Regina (Org.). Leitura e crise na escola: as alternativas do professor. 7. ed. Porto Alegre:
Mercado Aberto, 1986. (Série Novas Perspectivas/Educação;1).
183
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
UMA BREVE ANÁLISE DO LETRAMENTO NAS COMUNIDADES ECLESIAIS DE
BASE
RESUMO:Os estudos acerca das práticas e eventos de letramento nos contextos sociais
formais como a escola e a universidade têm sido alvo de muitas pesquisas, porém quando se
trata das práticas que se desenvolvem em ambientes alternativos ou considerados informais,
poucos estudos são encontrados. Por esta razão, o presente trabalho buscou analisar os
eventos de letramento desenvolvidos pelas Comunidades Eclesiais de Base, já que elas
primam pela formação de seus membros tanto no âmbito religioso, quanto no social. Nosso
referencial teórico baseou-se nos estudos sobre práticas e eventos de letramento
desenvolvidos por Street (1984), Kleiman (2007), Lêdo (2013), entre outros. Ainda fazem
parte da nossa base teórica os estudos sobre gêneros desenvolvidos pelos pesquisadores
Marcuschi (2008), Miller (2012), Bazerman (2005), Bawarshi e Reiff (2013), visto que
tomamos gêneros como mediadores dos eventos de letramento. Para o cumprimento dos
nossos objetivos observamos os encontros de formação promovidos pelas Comunidades
Eclesiais de Base durante o segundo semestre de 2013 e o primeiro semestre de 2014 com a
finalidade de observar que práticas de letramento orientam os eventos de letramento
desenvolvidos com o letramento escolar.
Palavras-chave: Letramentos.Gêneros textuais. Comunidades Eclesiais de Base.
ABSTRACT:Studies on the practices and literacy events in formal social contexts such as
schools and universities have been the target of much research, but when it comes to
practices that develop in alternative environments or considered informal, few studies are
found. For this reason, the present study aimed to examine literacy events developed by the
Basic Ecclesial Communities, as they excel in training its members both in the religious
sphere, as in the social. Our theoretical framework was based on studies on literacy events
and practices developed by Street (1984), Kleiman (2007), Ledo (2013), among others. Still
part of our theoretical studies based on genres developed by researchers Marcuschi (2008),
Miller (2012), Bazerman (2005), Bawarshi and Reiff (2013), since we genres as mediators of
literacy events. To accomplish our goals we observe the formation meetings promoted by the
Basic Ecclesial Communities in the second half of 2013 and the first half of 2014 with the
purpose of observing literacy practices that guide the literacy events developed with school
literacy.
Keywords: Literacies. Textual genres. Basic Ecclesial Communities.
INTRODUÇÃO
Ultimamente muitos estudos têm sido feitos acerca do letramento. Atualmente esse tema é
abordado como práticas que vão além da leitura e da escrita. Essas novas concepções
relacionam o letramento aos contextos sociais e históricos, sendo esses uma realidade
complexa que envolve relações de poder. De acordo com essa perspectiva, não existe apenas
um tipo de letramento, mas múltiplos letramentos desde aqueles que são utilizados pelas
pessoas no cotidiano até os mais complexos que estão no ambiente acadêmico, por exemplo.
As diferentes estratégias de letramento tornaram-se essenciais na vida de todos os seres
humanos. Estes, geralmente, o adquirem por meio das práticas sociais que realizam
individualmente ou em grupos nos quais estão inseridos. Sabe-se que cada comunidade
possui práticas de letramento diversificadas, as quais são desenvolvidas de forma particular
por cada um desses grupos. Dessa forma, os objetivos que as comunidades pretendem
alcançar são realizados por meio dessas práticas. Por isso, a presente pesquisa objetiva
compreender como os membros das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) constituem-se
sujeitos letrados dentro da realidade em que vivem.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Nos dias atuais, uma pessoa letrada não se restringe apenas àquela que possui a habilidade
de ler e escrever, mas sim a todas que conseguem desenvolver práticas sociais necessárias à
sobrevivência em sociedade. No entanto, apesar de existirem muitos estudos acerca das
estratégias de letramento, ainda são poucas as pesquisas que analisam essas práticas, quando
vinculadas e desenvolvidas por comunidades discursivas que não pertencem ao âmbito
escolar ou acadêmico. Com base nessa observação, a presente pesquisa pretende contribuir
para o preenchimento dessa lacuna.
Este artigo está estruturado da seguinte modo: no primeiro tópico, discutiremos o conceito
de práticas e eventos de letramento. No segundo tópico, será apresentada uma breve reflexão
sobre o letramento na escola. No terceiro tópico, trataremos dos gêneros nas atividades
humanas. No quarto tópico, serão expostas algumas considerações sobre as CEBs e o seu
papel na sociedade. No quinto tópico, daremos destaque à análise dos eventos de letramento
promovidos pelas CEBs de Garanhuns. Por fim, nas considerações finais apresentaremos as
conclusões da nossa pesquisa.
185
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Mais um aspecto relevante é o conhecimento das relações de poder entre os grupos sociais no
que diz respeito às decisões sobre como, quando e a quem fazer um pedido. Por fim, outro
conhecimento é o que se refere aos valores e hábitos do próprio grupo. Todas essas atividades
realizadas e esses conhecimentos adquiridos pelos membros quando atuam em grupos
constituem as práticas, que podem ser desenvolvidas em outros grupos que não possuem
ligações com o contexto escolar. Porém, não podemos negar que esses letramentos sofrem
influência um do outro. Barton & Hamilton (2005) afirmam que:
Todas as práticas de letramento são permeadas por relações de poder e refletem as ideologias
de cada grupo. Em maior ou menor grau há diferenças entre algumas práticas, em alguns
casos umas possuem status mais valorizado do que outras. Para expor de forma mais simples
as diferenças e semelhanças entre as práticas e eventos de letramento podemos observar
neste quadro:
187
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
É por meio da análise dos gêneros produzidos por comunidadesou grupos que os conhecemos
mais profundamente, pois eles possibilitam a observação dos objetivos, como também das
intenções particulares dessas comunidades. Recordamos, assim, a concepção de Bazerman, o
qual afirma que:
Os gêneros são formas de vida, modos de ser. Eles são enquadres para ação social.
São ambientes para aprendizagem [...] Os gêneros são lugares familiares a que
recorremos para realizar uma ação comunicativa inteligível e as placas de sinalização
que usamos para explorar um ambiente desconhecido. (2011, p. 23)
A produção de gêneros não deve ser algo superficial, somente para um determinado fim, ou
aprendizagem de estruturas, porque os gêneros estão além das formas, fazem parte da vida
das pessoas revelando modos de ser e de agir das mesmas no ambiente social.Nesse caso, são
dois modos diferentes de compreender os gêneros, sendo necessário entender que as funções
deles variam em contextos diferentes, pois elas dependem da realidade vivenciada pela
pessoa ou grupo que os utiliza. Para alguns, eles são ferramentas utilizadas para conhecer
melhor padrões culturais, enquanto que para outros são uma forma de inserção em
determinadas comunidades. Como percebemos, é essencial que as pessoas que desejam
participar efetivamente de uma comunidade aprendam a produzir os gêneros próprios desse
ambiente. Para compreendermos melhor nosso estudo serão apresentadas a seguir algumas
considerações sobre as CEBs.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Os responsáveis ou animadores, como são chamados àqueles que recebem formação para
atuar nas comunidades, assumem o compromisso de partilhar com os grupos que estão na
base os conhecimentos adquiridos nos encontros de formação. O encontro é sempre o lugar
de rezar, mas também de discutir questões sociais que têm repercussão na sociedade, bem
como problemas que afetam as comunidades tanto no campo quanto na cidade.
As CEBs revelam-se como um jeito de ser Igreja que leva seus membros a comprometer-se
com as causas sociais, iluminados pela Palavra de Deus, ligando a fé à vida. Desse modo, o
desejo de construir um mundo onde haja justiça e fraternidade vem modificando a sociedade.
Para muitas pessoas, isso parece ser apenas uma utopia, enquanto para as CEBs isso pode ser
uma realidade.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Quanto às Ampliadas, elas seguem a mesma organização acima apresentada, sofrendo
modificações apenas nas temáticas. Entretanto, na Ampliada de novembrode que
participamos a temática continuou a mesma, visto que estava no período de preparação para
o 13º Intereclesial das CEBs. A discussão em grupo foi feita a partir dessa cartilha:
Esse material foi trabalhado na Assembleia com o objetivo de preparar alguns integrantes do
grupo para participar desse encontro. Esse roteiro de reflexão divide-se em várias partes,
cada qual com uma temática diferente, as quais foram discutidas em grupo para, em
seguida,serapresentada na plenária.Essa atividade configura-se em um evento de letramento
incluso no encontro de formação.
Na outra Ampliada que ocorreu em fevereiro do ano em curso, os participantes do 13º
Intereclesial relataram oralmente as impressões que tiveram desse encontro. Observa-se,
através desse relato, que os eventos de letramento são praticamente os mesmos, mantendo
uma forma de organização e metodologias unificadas para as comunidades em diversos
lugares. O tema abordado nessa Ampliada foi “O tráfico humano”, o qual foi trabalhado em
grupo a partir desse roteiro de encontros.
O trabalho com esse roteiro seguiu a mesma metodologia citada acima, a qual se repete nas
comunidades de base que são coordenadas pelos animadores. Todas as cartilhas ou roteiros
como são nomeados pelos membros das CEBs são levados pelos animadores às comunidades
com o compromisso de refletir o que foi vivenciado nos encontros de formação. Desse modo,
eles se tornam os formadores nas comunidades de base.
As CEBs, nos momentos de formação de seus membros, seguem a metodologia da Educação
Popular, a qual parte do conhecimento prévio dos interlocutores. Quanto aos métodos, os
passos são os seguintes:
Ver, queconsiste na observação da realidade à sua volta feita durante a
exposição oral;
Julgar, que analisa a situação procurando perceber se está certa ou errada, essa
ação é desenvolvida nos trabalhos em grupos;
Agir,que geralmente iluminado pela Palavra bíblica, sendo nesse momento que
surgem as propostas para serem colocadas em prática.
190
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Celebrar, momento de agradecimento pelas conquistas ou pela resolução de
um problema que afeta a comunidade.
Ao observarmos os gêneros que circulam nas CEBs foi possível perceber que eles são de
grande relevância para que as pessoas participem de modo organizado dos eventos de
letramento e possam inserir-se nas práticas letradas. Os gêneros mais recorrentes durante os
eventos de letramentos promovidos pelas CEBs são os que elencamos no quadro a seguir:
Nas CEBs, uma pessoa mesmo não sendo alfabetizada participa ativamente dos eventos de
letramento, uma vez que a maioria dos gêneros produzidos no decorrer dos encontros são
orais e as atividades são realizadas de forma coletiva. O assunto é abordado por uma ou mais
pessoas, as quais utilizam recursos semióticos, sonoros, apresentações em slides, entre
outros. Mas nem sempre essas tecnologias estiveram presentes, o que mostra que os eventos
vão se modificando ao longo do tempo para se adequar às novas realidades.
A presença da escrita como em outros eventos de letramento é evidenciada, todavia a
oralidade assume um papel relevante, já que nem todos os membros do grupo são
alfabetizados. Aos poucos os novatos vão se apropriando do discurso desse grupo. Nesses
eventos o estudo do texto não está atrelado aos padrões linguísticos formais, uma vez que a
maior preocupação das CEBs é a compreensão do texto de modo aprofundado, tentando
entender a mensagem principal, considerando o contexto e a função social do mesmo.
Os integrantes das CEBs produzem textos orais em vários gêneros a partir de textos escritos,
sem maiores preocupações com a classificação ou a identificação. Eles usam os gêneros de
texto para alcançar seus objetivos, não como objeto de ensino-aprendizagem, mas como
mediadores. Nesse ambiente, os gêneros são realmente formas de vida e modos de ser como
afirma Bazerman (2005).
Com base nos estudos realizados por Lêdo (2013), a qual se ancorou nos estudos
desenvolvidos por Hamilton (2000) e Dantas (2005), pode-se dizer que os elementos visíveis
e não visíveis possibilitam o reconhecimento das noções de práticas e eventos de letramentos.
Sendo assim, essas noções são fundamentais para utilizarmos de modo adequado os
conceitos de letramento no que se refere às análises e as descrições com o objetivo de
entender o letramento dos grupos de letramentos promovidos pelas CEBs são: os animadores
que têm como principal função partilhar com a comunidade as temáticas refletidas nos
encontros; os assessores,pessoas responsáveis pelas exposições e discussão de temas nos
encontros e os coordenadores que articulam, organizam, comunicam e acompanham as
comunidades por meio de visitas. O ambiente em que acontecem é o Recanto Franciscano,
casa de encontro que reúne grupos religiosos para encontros de formação. Os artefatos:
equipamento de som, Datashow, papéis, quadro e os textos que sempre mediam as
interações, podendo ser cantos, orações, textos bíblicos e outros que abordam temáticas que
envolvem questõessociais. As atividades que são desenvolvidas como: trabalho em grupo,
dinâmicas, plenárias, momentos de orações, entre outros.
Os elementos invisíveis que constituem as práticas de letramento nas CEBs são: o discurso
religioso em consonância com o discurso político que busca a transformação da sociedade
por meios de ações que garantam a dignidade humana, uma espiritualidade libertadora
fundamentada na opção preferencial pelos pobres e o caráter hierárquico que organiza as
relações de poder em que cada membro tem um papel definido, cada qual exercendo funções
específicas. Essa mesclagem que envolve o discurso religioso e o político não é aceita por
alguns membros da Igreja Católica, os quais argumentam que religião não deve ter nenhum
envolvimento com a política. Na realidade essas pessoas parecem não compreender que a
191
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
política não está limitada apenas à partidária e que as CEBs orientam suas ações a partir da
política do bem comum.
No que se refere à regulação das ações que envolvem as práticas, o assessoramento de um
encontro só é permitido àqueles que estão há mais tempo no grupo.Esse critério também
serve para a escolha dos membros para exercer funções na coordenação. Aos coordenadores
compete a organização dos encontros, a comunicação com o grupo que articula as CEBs no
Regional, a escolha de temáticas para discussão nos encontros que atendam às necessidades
do grupo e as visitasque devem ser feitas durante o ano às comunidades. Quanto aos
animadores, suas principais funçõessão: a participação nas atividades durante os encontros e
a realização das reuniões sugeridas pelos coordenadores nas comunidades de base.
Dando continuidade apresentaremos as considerações finais deste estudo, embora a pesquisa
ainda possa ser aprofundada em estudos futuros.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste estudo buscamos compreender as práticas e eventos de letramentos promovidos pelas
Comunidades Eclesiais de Base. A análise foi feita a partir dos gêneros que organizam esses
eventos, por reconhecermos que a maioria das práticas sociais, incluem os gêneros, que por
sua vez, permitem a realização das atividades de vários grupos e a inserção de indivíduos nos
eventos de letramento desses grupos. Tais eventos são mediados por gêneros (LÊDO, 2013).
A exposiçãooral,gênero mais evidenciado nesses eventos, tem grande relevância para o
desenvolvimento do letramento, porque permite que a discussão de temas amplie o senso
crítico dos participantes, para que estes saibam defender seus ideais. Pode-se dizer que os
membros das CEBs são letrados dentro da realidade em que vivem, visto que eles
compreendem e proferem o discurso do grupo, participando ativamente dos eventos desse
grupo.
As estratégias de letramentos evidenciadas no decorrer da observação participante, feita no
período dos eventos, demonstraram que a formação oferecida pelas Comunidades Eclesiais
de Base possibilita aos seus membros a aquisição do letramento crítico, de modo que essas
pessoas poderão analisar, como também desafiar as forças opressoras presentes na
sociedade.
Nos eventos de letramento das CEBs, os gêneros orais são os mais evidenciados, enquanto
outras instâncias de letramento, principalmente a escola, centralizam suas práticas nos
gêneros da modalidade escrita. Como foi percebido, os eventos de letramento das CEBs
assemelham-se de certa forma às da escola, no que se refere à utilização dos gêneros para
facilitar a aprendizagem. As CEBs objetivam fazer com que seus membros possam discutir
acerca das temáticas tratadas nesses gêneros, na tentativa de reconhecer sua função social,
bem como realizar ações por meio deles.
REFERÊNCIAS
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em linguística), Universidade Federal de Pernambuco. Recife, 2006.
BAZERMAN, Charles. Gênero, Agência e Escrita. São Paulo: Cortez, 2011.
COUTINHO, Sérgio Ricardo. Comunidades Eclesiais de Base: presente, passado e futuro. Interações: cultura e
sociedade. v.4 n.6 jul/dez. 2009. Minas Gerais. Disponível em:
<http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=313028473011> Acesso em: 02 jan. 2014 pp. 173-185.
DANTAS, D. Blogs como eventos de letramento. Anais eletrônicos do 15º Congresso de Leitura do Brasil,
05 a 08 de julho de 2005, UNICAMP. Disponível em: <http://alb.com .br/arquivo-
morto/edicoes_anteriores/anais15/index.htm>. Acesso em: 23 jun. 2012.
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____________. Letramento e suas implicações para o ensino de língua materna. Signo. v. 32 n. 53 dez. Santa
Cruz do Sul, 2007 Disponível em: <http://online.unisc.br/seer/index.php/signo/article/view/242> Acesso em:
05 jan. 2014 p.1-25
____________. Preciso ensinar o letramento? Não basta ensinar a ler e escrever? São Paulo: Unicamp,
2005. Disponível em: <http://www.iel.unicamp.br/cefiel/alfaletras/biblioteca_ professor/arquivos5710.pdf
Acesso em: 11 nov. 2013.
192
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
LÊDO, Amanda Cavalcante de Oliveira. Letramentos acadêmicos: práticas e eventos de letramentos na
educação à distância. 2013. 155 f. Dissertação (Mestrado em Linguística), Universidade Federal de Pernambuco.
Recife, 2013
MARCUSCHI, Luiz Antônio. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São Paulo: Parábola
Editorial, 2008. 295 p.
__________________. Oralidade e Letramento. In: MARCUSCHI, L. A. (Org.) Da fala para a escrita:
atividades de retextualização. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2004.
MILLER, Carolyn R. Gênero textual, agência e tecnologia. São Paulo: Parábola, 2012. 191 p.
MAUÉS, Raymundo Heraldo. Comunidades “no sentido social da evangelização”. CEBs, camponeses e
quilombolas na Amazônia Oriental brasileira. Rev. Religião e sociedade. V.10 n. 2 Rio de Janeiro: 2010
Disponível em:<http://www.scielo.br.php?pid=S0100-85872010000200002&script=sci_arttex&tlng=es> Acesso
em: 05 jan. 2014.
OLIVEIRA, Maria do Socorro. Gêneros textuais e letramento. Universidade do Rio Grande do Norte. RBLA, Belo
Horizonte, v. 10, n. 2, p. 325-345, 2010. Disponível em: <http://wac.colostate.edu/siget/rbla/socorro.pdf>Acesso
em 20 fev. 2013
193
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
SÍNTESE BRASILEIRA DE GÊNEROS TEXTUAIS: O QUE REVELAM OS
ESTUDOS PIONEIROS EM LIVROS E NOS ANAIS DO SIGET
RESUMO: Atualmente, o estudo sobre gêneros tem se tornado comum e cada vez mais
conhecido e reconhecido por meio dos inúmeros estudos e pesquisas, não só desenvolvidas,
mas também publicadas na área. As questões que orientam este projeto apresentam
interesse não apenas teórico para o campo de estudo de gêneros, pois consideram a
centralidade do conceito de gêneros e sua repercussão no ensino de língua no país
contribuindo para que se perceba a complexidade do tema e a variedade de abordagens que
podem ser utilizadas para tratá-lo. Além de compreender o rumo dos estudos e da pesquisa
de gêneros no Brasil também pode contribuir para se colocar ao alcance dos docentes de
língua portuguesa diversas outras concepções teóricas e metodológicas para o ensino,
evitando que se tomem os PCN como uma espécie de caminho único para o tratamento do
assunto. Além disso, tivemos como objetivo, fazer um mapeamento dos estudos de gêneros
textuais no Brasil conforme apresentados em livros que foram publicados entre os anos de
2000 e 2010 e em artigos de pesquisadores vinculados à Universidade Federal de Santa
Maria-RS (UFSM), Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e Universidade Federal de
Santa Catarina (UFSC).
Palavras-chave: Gêneros. Síntese Brasileira. Livros. Anais SIGET.
ABSTRACT: Currently genre studies have become commonplace and increasingly known
and recognized through numerous studies and research not only developed , but also
published in the area .The questions that guide this project are of interest not only to the field
of theoretical study of genre as it considers the centrality of the concept of genre and its
impact on language teaching in the country contributing to realize the complexity of the topic
and the selection of approaches that can be used to treat it in addition to understanding the
course of genre studies and research in Brazil can also help to put within the reach of
language teachers several other theoretical and methodological concepts for teaching
preventing to take the PCN as a kind of one way to treat the subject. Moreover , our objective
is mapping studies of textual genres in Brazil as presented in books that were published
between the years 2000 and 2010 and in articles by researchers from Federal University of
Santa Maria - RS ( UFSM ) , University Federal de Pernambuco (UFPE) and Federal
University of Santa Catarina ( UFSC) .
Keywords : Genres . Brazilian synthesis. Books .SIGET Proceedings.
INTRODUÇÃO
A pesquisa brasileira sobre gêneros textuais, divulgada mundialmente através dos livros que
abordam o tema, e do Simpósio Internacional de Estudos de Gêneros Textuais (SIGET) e
publicações deles derivadas, levou estudiosos norte-americanos a postularem, recentemente,
a existência de uma “síntese brasileira de gêneros”, configurada como uma espécie de nova
abordagem teórica, capaz de conciliar aportes de diferentes teorias estrangeiras com a ênfase
nacional no ensino de gêneros integrado ao ensino de língua portuguesa.
Os primeiros estudiosos a fazer isso foram Anis Bawarshi e Mary Jo Reiff em sua obra
Gênero: História, Teoria, Pesquisa e Ensino (2010). 68 De acordo com os autores, o modelo
66
Graduanda em Letras, bolsista do PIBIC/CNPq
Universidade de Pernambuco (UPE).
Campus Garanhuns.
[email protected]
² Graduanda em Letras, bolsista do PIBIC/CNPq
Universidade de Pernambuco (UPE).
Campus Garanhuns.
[email protected]
194
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
educacional brasileiro, no que diz respeito aos gêneros textuais, pode ser definido como “uma
abordagem pedagógica embasada na teoria do interacionismo sociodiscursivo na tradição
suíça de gêneros”. Ainda segundo Bawarshi & Reiff, “o modelo brasileiro combina um foco na
consciência de gênero, na análise de convenções linguísticas e na atenção ao contexto social”
(2010, p. 210).Entretanto, se, como Bawarshi & Reiff afirmam, “a síntese brasileira foi
dinamizada pelos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ministério da Educação” (2010, p.
5), não nos parece pertinente reduzir os estudos de gêneros realizados no Brasil à
preocupação com o ensino na educação básica nem com a abordagem teórica do
interacionismo sociodiscursivo. O ensino de gêneros, sobre gêneros ou através de gêneros
pode ser e é realizado com base nas diversas abordagens teóricas e visando a diferentes níveis
de ensino, inclusive o ensino superior e de pós-graduação.De modo que a ideia de uma
síntese brasileira nos estudos de gêneros textuais levanta algumas questões importantes:
existe realmente uma síntese brasileira? Se existe, de que natureza é essa síntese? Qual é o
papel do ensino na orientação dessa síntese? Que tipo de abordagem de estudos de gêneros
serve de base para a pesquisa no Brasil? Existe uma escola de gêneros predominante na
formulação de uma síntese brasileira? Quais são as principais contribuições dos estudos
brasileiros para uma teoria de gêneros mais abrangente?As questões que orientam este
projeto apresentam interesse não apenas teórico para o campo de estudo de gêneros.
Considerando a centralidade do conceito de gêneros e sua repercussão no ensino de língua no
país, trata-se de contribuir também para que se perceba a complexidade do tema e a
variedade de abordagens que podem ser utilizadas para tratá-lo. E, além disso, compreender
o rumo dos estudos e da pesquisa de gêneros no Brasil também pode contribuir para se
colocar ao alcance dos docentes de língua portuguesa diversas outras concepções teóricas e
metodológicas para o ensino, evitando que se tomem os PCN's como uma espécie de caminho
único para o tratamento do assunto. O artigo tem início com os procedimentos
metodológicos usados para a realização da pesquisa, logo depois traz as teorias relacionadas à
Linguística Sistêmico Funcional, Inglês para fins específicos e gêneros nas tradições retóricas
e sociológicas, além da análise dos artigos e livros selecionados e por fim as considerações
finais.
1. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
68 Esse livro, citado aqui a partir do original,foi traduzido pelo Prof. Dr. Benedito Gomes Bezerra, orientador deste projeto, e
Esses estudos são atualmente aplicados tanto nas análises textuais, como também nos
estudos que dizem respeito aos ensinos de língua. Os estudiosos que fazem parte dessa
corrente teórica são Gunther Kress, Bill Cope, J. R. Martin, entre outros. Foram esses
teóricos citados anteriormente que aplicaram tais teorias ao estudo dos gêneros que,
influenciados, basearam grande partede seus estudos nas obras pioneiras de Michael
Halliday 69 da Universidade de Sidney, por isso, o fato, dessa corrente teórica também ser
conhecida como Escola de Sidney.Quando os estudos de Halliday se voltam para o propósito
social, é necessário observar tanto o "campo" onde a situação acontece, considerando dessa
forma o contexto, a "relação" entre os participantes no momento da interação, como também
o "modo" usado por tais participantes para realização das ações, levando-nos a observação
das "metafunções" da linguagem. São elas: ideacional, interpessoal e textual, se referindo,
respectivamente à representação linguística de ( quem está fazendo o quê, a quem, quando e
onde), (p. 26), a interação desses participantes e à relação dos mesmos.Já quando a teoria se
volta para a linguística histórica de corpus, vem contribuir mais especificamente tanto com o
ensino, quanto à pesquisa de gêneros, pois Hans-Jurgen Diller ampliou as análises das frases
para os textos, levando os mesmos a uma categorização mais abrangente nos estudos, sendo
estes dessa forma definidos por Longacre como:
Além de estabelecer uma relação intrínseca de aspectos linguísticos e retóricos, essa teoria
está inserida em uma categoria mais abrangente das línguas para fins específicos, focando
seus estudos nas variedade de um inglês que se volta para falantes não nativos do idioma, e
que usam contextos avançados, incluindo dessa forma estudos mais especializados em suas
análises. Podemos citar como exemplo o Inglês para Fins Acadêmicos, Inglês para fins
Profissionais e Inglês para fins Médicos.
No entanto, o foco desses estudos se dá tanto no inglês acadêmico e de pesquisa, como o uso
da análise desses gêneros para fins aplicados, fazendo com que as mesmas se aprofundem
também nos propósitos e efeitos comunicativos da língua em questão.
É interessante que a teoria do Inglês para fins Específicos em muito conversa com a
Linguística Sistêmico Funcional, pois
69
" A obra de Halliday não se concentra especificamente nos gêneros. Quando Halliday posiciona o gênero como
um modo ou conduto de comunicação, um dos meios textuais ou linguísticos disponíveis no registro, que ajuda
os participantes da comunicação a perceber o tipo de situação..." (1978, p. 113)
196
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
tornar visível para estudantes desfavorecidos as conexões entre língua e função social
incorporadas pelos gêneros ( BAWARSHI; REIFF, 2013, p.62).
A preocupação dessa teoria é saber como os gêneros capacitam os usuários da língua a fazer
estudos retóricos desempenhando e se relacionando nas ações e relações sócias. Da mesma
forma, se emprega para saber de que maneira os gêneros ajudam a reproduzir práticas e
realidades sociais, tendo em seu objetivo maior a compreensão dos contextos e o seu
desempenho. Assim afirma Bazerman, “O foco da análise de gêneros nos Estudos Retóricos
de Gêneros (ERG), dessa forma foi dirigido para a compreensão de como os gêneros
medeiam práticas, interações e realidades simbólicas situadas e “significados congruentes”
([2003] 2006, p. 117).Os Estudos Retóricos de Gêneros deram ênfase com a obra da nova
retórica quando estudou jeitos retóricos tipificados de agir em modos sociais, e como estes se
situavam socialmente. Em seu artigo “Gênero como ação social” ([1984] 2012),Carolyn Miller
fez relações entre as concepções retóricas da Retórica como ação simbólica e sociológica que
focava a tipificação retórica e social. Edwin Black e Lloyd Bitzer, no ano de 1960,
identificavam os gêneros como entidades conectadas a tipos de situação. As tradições
recorrentes é um reconhecimento que permite os retóricos investigar as estratégias habituais
que vêm a delinear amaneira de agir em situações semelhantes.
Para David Fleming (1998, p. 176) a retórica é: “a condição de nossa existência como um
modo de estar, conhecer, organizar e interagir no mundo”.
5. ANÁLISES
70
Tradução realizada pela aluna Ivanadyja Dafyni de Lima, orientanda deste projeto.
71
Tradução realizada pela aluna Ivanadyja Dafyni de Lima, orientanda deste projeto.
198
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
a leitura desta análise para busca de informações, foram selecionados em um primeiro
momento artigos de pesquisadores da UFSM no IV SIGET, da UFSC no V SIGET e da UFPE
no VI SIGET respectivamente, os quais possuem indícios claros de que tratam de tais teorias
citadas anteriormente. Nas figuras 1 é possível observar um diálogo de teorias entre os
estudos retóricos, sociológicos e a LSF, focalizando nos aspectos da linguagem para a análise
de gêneros textuais, onde sabe-se que é por intermédio da linguagem que se organiza a
maioria das ações humanas, uma vez que são identificáveis as falas os autores que se filiam
em uma mesma perspectiva.
Exemplo 1: Recortes do artigo: Acusação e defesa: A função ideacional da linguagem no
gênero alegações finais. 72
Nas figuras 2, apresenta–se uma combinação entre os teoricos Marcuschi e Bazerman para a
definição de gêneros textuais no ensino de línguas em funcionamento nas comunidades de
fala e em seus falantes pela grande variedade e diversidade linguística .
Exemplo 2 : Recortes do artigo: Livro didático de português para estrangeiros: Um gênero
textual. 73
72
Produzido por Cristiane FUZER e Nina Célia BARROS, UFSM.
73
Produzido por Fabrícia CAVICHIOLI, Cândida Martins PINTO e Marcos Gustavo RICHTER, UFSM.
199
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Disponível em:
http://linguagem.unisul.br/paginas/ensino/pos/linguagem/eventos/cd/index1.htm
Na figura que segue, mostra-se uma fala de Bakhtin por Rodrigues (2005) sobre a noção de tipificação
denominando os gêneros do discurso para situar os estudos que se relacionam com os gêneros textuais.
Exemplo 3: recortes do artigo: A elaboração didática em uma abordagem de gêneros: Análise
de planejamentos de ensino de língua portuguesa74
As figuras abaixo se referem a uma noção sobre gênero textual e sua importância dentro da
comunidade em que circulam e como ele foi identificado por Swales, em seguida apresenta-se
uma ampliação da mesma teoria por Bhatia, destacando a realização dos propósitos
atentando como não são pertencentes ao gênero.
Exemplo 4: Recortes do artigo: Produção e recepção de gêneros acadêmicos: Dificuldades
encontradas por alunos de EAD 75
74
Produzido por Simone Lesnhak KRUGER, UFSC
75
Produzido por Amanda C. de O. Lêdo, UFPE.
200
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por se tratar de um recorte de uma pesquisa maior, a análise se deteve em apenas 15 artigos,
e a análise referente às publicações dos três livros selecionados, foi possível serem expostas
as observações feitas apenas de quatro dos artigos selecionados, como também de apenas
quatro dos capítulos dos livros anteriormente citados. Para essa escolha, observamos por
exemplo as teorias que mais conversavam entre si, assim como as possíveis formações que
indicassem as filiações, assim como as combinações entre as teorias. Concluindo, foi
plausível observar uma tentativa de síntese entre os diálogos e combinações das teorias
abordadas pelas correspondentes escolas, sobre os mais variados gêneros.
REFERÊNCIAS
BAWARSHI, A. S. ; REIFF, M. J. Gênero História, Teoria, Pesquisa, Ensino. São Paulo: Parábola, 2013.
CAVICHIOLI, Fabricia; PINTO, Cândida Martins; RICHTER, Marcos Gustavo. Livro didático de português para
estrangeiros: Um gênero textual. Disponível
em:http://linguagem.unisul.br/paginas/ensino/pos/linguagem/eventos/cd/index1.htm Acesso em: 02 des. 2013.
DIONISIO, Angela Paiva; MACHADO, Anna Rachel; BEZERRA, Maria Auxiliadora. Gêneros textuais e ensino.
Rio de Janeiro: Lucerna, 2002.
FUZER, Cristiane. Acusação e defesa: A função ideacional da linguagem no gênero alegações finais.Disponível em:
http://linguagem.unisul.br/paginas/ensino/pos/linguagem/eventos/cd/index1.htm. Acesso em: 02 des. 2013.
KRUGER, Simone Lesnhak. A elaboração didática em uma abordagem de gêneros: Análise de planejamentos de
ensino de língua portuguesa. Disponível em:
http://www.ucs.br/ucs/extensao/agenda/eventos/vsiget/portugues/anais/textos_autor Acesso em: 02 des. 2013.
LÊDO, Amanda C. de O. Produção e recepção de gêneros acadêmicos: Dificuldades encontradas por alunos de
EAD. Disponível em: http://www.cchla.ufrn.br/visiget/ Acesso em: 02 des. 2013.
MARCUSCHI, L. A.; XAVIER, A. C. (Org.). Hipertexto e gêneros digitais: novas formas de construção de sentido.
Rio de Janeiro: Lucerna, 2004.
MEURER, J. L.; BONINI, A.; MOTTA-ROTH, D. (Org.). Gêneros teorias, métodos, debates. Rio de Janeiro:
Parábola, 2005.
201
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
REFLETINDO SOBRE A ABORDAGEM DO POEMA DE CORDEL EM UM
MANUAL DO 6º ANO
RESUMO: A poesia popular, enquanto literatura oral já existe há mais de 3.500 anos. No Brasil o
cordel chegou, trazido de Portugal, onde era vendido como "folhas soltas", mas foi com o poeta
Leandro Gomes de Barros que ele ganhou celebridade e passou a ser comercializado em folheto na
forma como conhecemos hoje. A literatura de cordel é um Patrimônio do Povo paraibano, nordestino e
brasileiro que só se transformará em uma cultura conhecida e divulgada a partir do momento em que
as escolas passarem a estimular o seu uso, adotando o hábito da leitura e conscientizando a todos da
real necessidade de se preservar o cordel enquanto saber cultural. Acreditamos que estas devem
incentivar e promover o trabalho com cordéis em sala de aula, mas sabemos que isto não é uma tarefa
fácil tendo em vista que os livros didáticos têm assumido certa importância dentro da prática de
ensino, sendo este instrumento de ensino-aprendizagem quem determina conteúdos e condiciona
estratégias. Partindo deste pressuposto nossa pesquisa consistirá em analisar um livro didático do 6°
ano do ensino fundamental, a fim de investigar qual o lugar dedicado à poesia popular neste manual,
verificando as propostas de atividades e como estão sendo desenvolvidos os conteúdos referentes à
abordagem do cordel no contexto escolar. Verificaremos ainda se o manual está em consonância com
as propostas dos PCNs de Língua portuguesa (1997). Fundamentaremos nossas discursões acerca da
tipologia de perguntas em Marcuschi (1998) e o ensino de poemas em sala de aula em Pinheiro
(2003,2007).
ABSTRACT: The popular poetry as oral literature has existed for over 3,500 years . In Brazil the line
came , brought from Portugal , where it was sold as " loose leaf " , but it was with the poet Leandro
Gomes de Barros he gained celebrity and has been marketed in the brochure as
we know it today. The Cordel literature is a Heritage People of Paraíba , northeastern Brazil , and that
just turns into a culture known and publicized from the moment that the schools spend to stimulate its
use , adopting the habit of reading and aware of all real need to preserve the line as cultural knowledge
. We believe these should encourage and promote the
work with strings in the classroom , but we know that this is not an easy task considering that the
textbooks have assumed some importance in the practice of teaching , which is a teaching - learning
who determines content and determines strategies. Under this assumption our research is to examine
a textbook of 6th grade of elementary school , to investigate what place dedicated to folk poetry in this
manual , checking the proposed activities and how the contents are being developed regarding the
approach of the twine in the school context . Also verify if the manual is in line with the proposals of
the PCNs Portuguese Language (1997 ) . Will base our discursões about the typology of questions in
Marcuschi (1998) and the teaching of poetry in the classroom in Pinheiro (2003,2007).
INTRODUÇÃO
Ensinar é uma arte. Hoje, o professor precisa dominar muito bem seu ofício, desenvolver
determinadas habilidades. A sociedade atual oferece uma diversidade de ferramentas ou
recursos didáticos audiovisuais aos educadores, uma variedade de linguagens como o cinema,
202
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
a TV, a fotografia, a música, por exemplo. Ademais, oferece outros tipos de linguagens como
o jornal (impresso), revistas e todo tipo de literatura, em prosa e verso. Dentre os tipos de
linguagem literária, destacamos a literatura de cordel, objeto de análise do presente artigo,
que, a nosso ver, é muito pouco utilizada na sala de aula, mesmo no Nordeste, apesar de
possuir uma riqueza imensa, tanto poética quanto documental.
A literatura de cordel é um Patrimônio do povo paraibano, nordestino e brasileiro que só se
transformará em uma cultura conhecida e divulgada a partir do momento em que as escolas
passarem a estimular o seu uso, adotando o hábito da leitura e conscientizando a todos da
real necessidade de se preservar o cordel enquanto saber cultural. Acreditamos que estas
devem incentivar e promover o trabalho com cordéis em sala de aula, mas sabemos que isto
não é uma tarefa fácil tendo em vista que os livros didáticos têm assumido certa importância
dentro da prática de ensino, sendo este instrumento de ensino-aprendizagem quem
determina conteúdos e condiciona estratégias. Partindo deste pressuposto nossa pesquisa
consistirá em analisar um livro didático do 6° ano do ensino fundamental Intitulado
Universos: Língua Portuguesa, a fim de investigar qual o lugar dedicado à poesia popular
neste manual, verificando as propostas de atividades e como estão sendo desenvolvidos os
conteúdos referentes à abordagem do cordel no contexto escolar.
Sabemos que são antigas as reclamações sobre a utilização de poemas em manuais escolares
no Brasil. As razões destas reclamações ontem e hoje são bem diferentes, se por um lado, hoje
os manuais não ostentam um número significativo de poemas de caráter moralista, presos a
ensinamentos de boas condutas, por outro, os poemas ainda não foram vistos como um valor
em si. Enquanto não se compreender que a poesia tem um valor, que não se trata apenas de
um joguinho de palavras, ela continuará a ser tratada como gênero menor e, pior ainda,
continuará a ser um dos gêneros literários menos apreciados no espaço escolar. Logo, é de
grande relevância analisamos manuais escolares, uma vez que proporcionará constatamos se
existe ou não mudança no modo como os poemas, neste trabalho especificamente os poemas
de cordéis, são explorados em manuais escolares.
Para as discursões sobre o ensino de poemas em sala de aula recorreremos aos pressupostos
teóricos de Pinheiro (2003,2007), entre outros e sobre as tipologias de perguntas nos
basearemos nos estudos de Marcuschi (2008).
Este trabalho está organizado em cinco partes, além desta introdução. Inicialmente
apresentaremos uma breve contextualização do surgimento da literatura de cordel,
principalmente no Brasil. Na sequência abordaremos alguns aspectos da abordagem da
literatura de cordel em sala de aula. Logo após será exposto as tipologias de perguntas de
compreensão textual. Dando continuidade apesentaremos a análise do LDP no que se refere
ao trabalho com poemas de cordéis. Por último, faremos nossas considerações finais sobre
tudo o que foi exposto no presente trabalho.
Não há precisão da data em que se iniciou a Literatura de Cordel, em buscas feitas encontrou-
se uma grande disparidade entre as datas, uns adotam o século XII, como relata a
reportagem do jornal Mundo Lusíadas, por Costa Filho de 02/Abril/2007.
A literatura de cordel, narrativa poética construída em versos tem sua origem na oralidade,
uma vez que é através das narrativas orais, contos e cantorias que surgiram os primeiro
folhetos de cordéis, tendo a métrica, o ritmo e a rima como seus elementos formais e
essencialmente marcantes dessa literatura.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A literatura de cordel foi trazida para o Brasil pelos portugueses, no século XVII. Em terras
brasileiras, desenvolveu se na região Nordeste, onde surgiram as primeiras tipografias no
final do século XIX. Os pioneiros nesse tipo de expressão poética foram Leandro Gomes de
Barros, Francisco das Chagas e João Martins de Athayde, principais nomes da primeira
metade do século XX. No entanto, é bom lembrar que a produção da literatura popular
brasileira no foi denominada de literatura de cordel, e sim, de folhetos. Esse tipo de poesia
denominada pelos próprios poetas como folhetos também era chamada de “romance” ou
“livrinho”. É só a partir da década de 70 que alguns estudiosos começaram a chama-la de
Literatura de Cordel.
Pinheiro (2006, p.106-107) também chama a atenção para o fato dos livros didáticos de
português apresentarem poucas quantidades de textos literários, principalmente ao que se
refere ao gênero lírico. Muita fragmentação e sempre relacionam o texto literário a um estilo
de época (livros do ensino médio), engessando a obra, poucas referências bibliográficas e uso
das figuras de linguagens. Ainda segundo o autor (op.cit., p.107) é importante destaca:
(...) como os livros didáticos são, em sua totalidade, escritos no eixo Rio-São Paulo, os
autores não priorizam autores contemporâneos de outras regiões do país. Não
conheço nenhum livro didático do ensino médio que trabalhe com literatura de
cordel, para ficarmos num dos gêneros da literatura popular. Autor como Leandro
Gomes de Barros, por exemplo, é um ilustre desconhecidos dos alunos e professores,
uma vez que não está no cânon.
No ensino fundamental a história não é diferente, pois no seu currículo não há unidades
especificas sobre a leitura literária e, mais particularmente, sobre o trabalho com o poema.
Nos LDP destinados ao terceiro e quarto circulo do ensino fundamental, a presença de
poemas é uma constante, mas o modo como são utilizados apresenta problemas sérios. Há
problemas relativos à qualidade estética dos textos, à adequação ao leitor a que se destina e,
sobretudo, ao modo de abordagem. O problema de escolha dos poemas, no plano geral das
obras, está ligado aos núcleos temáticos, à possibilidade de maior exploração de aspectos
gramaticais, interpretação textual e sugestões de criação. Portanto, a seleção dos poemas
muitas vezes obedece a critérios que passam longe do valor estético. O ludismo sonoro, por
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
exemplo, um atrativo para leitores mais jovens (e para qualquer leitor), quase nunca preside
estas escolhas.
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Danada Levado, esperto
Peraltice Esperteza, molecagem
Peripécias Aventuras
Trapaceiro Individuo que faz trapaças, que engana
Zombateiro/Zombeteira Individuo que zomba, que faz gozação
Cambio de mocotó Perna fina
Cabeça de Sarapó Cabeça pequena
Tranquinairo Individuo que faz trambiques, malandro
Contar lorota Falar mentira
Mofino Medroso, covarde
Matreiro Esperto, astuto, experiente
Engambelar/engabelar Enganar individuo que não tem vergonha
Cara de pau Indivíduo que não tem vergonha
Cara de janota Aparência de bom moço, de pessoa
inofensiva
(3)
Preparação de conteúdos
Você e usa dupla devem fazer um levantamento de informações sobre a vida da
personalidade que escolheram.
1.Vá biblioteca da escola para pesquisar informações em livros e revistas especializados. Por
exemplo, se a personalidade escolhida é um piloto de corrida, procure por revista de
automobilismo ou de prática esportivas.
(...)
3.Selecione as informações mais importantes. Veja alguns exemplos.
a) Onde e quando nasceu o homenageado.
b) Como foi a trajetória dele para alcançar o reconhecimento público e quais foram as
dificuldades enfrentadas nesse percurso.
...
e) Acontecimentos marcantes na vida da personalidade.
f) Se for escrito ou cantor, nome ou trechos de textos ou músicas importantes.
g) Se já faleceu, quando e como morreu.
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A primeira produção
Escreva, com o colega, a primeira versão do seu cordel. Utilize as informações que você
pesquisou, mas sem copia-las. Não esqueça de que o texto deve ser escrito em versos.
(RAMOS, 2012, p. 53)
Neste exemplo retirado do LDP analisado podemos constatar a presença do gênero poema
como pretexto para produção escrita, no entanto não é oferecida aos alunos nenhuma
informação de como deve ser a escrita de um poema de cordel, uma vez que o questionário
permitirá aos alunos apenas obter informações sobre o personagem que ira ser homenageado
no texto.
Sobre a utilização de poemas para o estudo gramatical não encontramos exercícios que
explorar a gramática “pura”, mas sim exercícios que são aplicados com o pretexto de
intensificar a reconstrução dos sentidos do texto a partir da gramática, como por exemplo no
tópico “A gramática na reconstrução dos sentidos do texto” que é acompanhado de um
questionário do qual transcrevo a seguir algumas questões:
(4)
1. Segundo o texto, Malasartes “passava todos para trás”.
a) Se você pedisse ao colega sentado à sua frente para “passar a borracha para trás”, qual
seria o significado dessa expressão?
b) Se você dissesse que foi passado para trás ao comprar um produto com defeito, qual seria o
significado da expressão?
c) Qual dos dois sentidos da expressão você acha que seria mais difícil de traduzir para outra
língua? Por quê?
3. Por que o texto tem muitas expressões idiomáticas?
(RAMOS, 2012, p. 50)
Não acredito que esse modelo de questão consiga intensificar o encantamento pelo poema,
que deveria ser o objeto do roteiro de aproveitamento, entretanto só pelo fato de não
trabalhar com poemas questões de ordem puramente gramatical, mas o sentido de
expressões no texto os autores do LDP já estão de parabéns. Com relação a classificação das
perguntas segundo a tipologia de Marcuschi (2008) podemos classificar as letras a e b da
primeira questão como perguntas “Vale tudo”, uma vez que admite qualquer resposta, já a
questão três é uma pergunta “inferencial”, pois tem a ver com o texto apenas de modo
superficial, sendo que a resposta fica por conta do aluno.
Por último é apresentado um projeto, “Um sarau na escola” (Ramos, 2012, p.62), o qual
sugere a produção de um sarau na escola. Os autores trazem um trecho do romance “A
moreninha” de Joaquim Manoel de Macedo para que os alunos descobrissem como seria um
sarau. Logo após, as três etapas em que o projeto deve ser organizado: “Sensibilidade –
Atividade 1” – orientações para uma pesquisa que os alunos deveram desenvolver sobre
poemas e histórias que chamam a atenção do aluno; “Sensibilidade – Atividade 2” – são
apresentados os elementos que contribuem para uma boa leitura de um poema, tais como:
ritmo e pausa, entonação, pronúncia, expressão corporal, no entanto, embora estes
elementos sejam expostos não temos nenhuma explicação a respeito deles neste tópico. Após
a apresentação destes elementos inicia-se um pequeno exercício com cinco questões que irão
ajudar os alunos a declamar no sarau o poema escolhido de maneira expressiva intitulado
“Preparação” que é uma subdivisão onde os autores descrevem algumas decisões que devem
ser tomada para a realização de um sarau, como por exemplo: tema, data e local; decoração
do espaço onde vai acontecer o sarau etc; Na subdivisão “Produção” são apresentados
algumas dicas de como os alunos devem proceder no dia do sarau.
Consideramos muito interessante a proposta de produção de um sarau na escola, tanto do
ponto de vista metodológico, no sentido de apresentar estratégias para o trabalho com os
poemas de cordel, quanto por tornar o poema de cordel mais acessível aos alunos. Não
podemos deixar de considerar que se deve ter bastante cuidado com esse tipo de proposta por
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se tratar de um público alvo recém-saído do ensino fundamental I, Por tanto, o professor
deve estar preparado para elaborar, planejar e principalmente executar esse trabalho.
Por fim, queremos ressaltar que o LDP analisado apresenta problemas no modo como
explora o poema de cordel principalmente por não apreciar o poema no seu lado lúdico,
entretanto devemos reconhecer que o LDP traz muitos apontamentos relevantes sobre o
cordel especialmente no que diz respeito à leitura oral do poema e o desenvolvimento de um
sarau na escola.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
MARCUSCHI, Antônio Luiz. Produção Textual, Análise de Gêneros e Compreensão. São Paulo: Parábola, 2008.
PINHEIRO, Hélder. Reflexões sobre o livro didático de literatura. In: BUNZEN, Clecio e MENDONÇA, Márcia.
(Orgs.) Português no ensino médio e formação de professor. São Paulo: Parábola Editoria, 2006, p.103-116.
_____________.Teoria da literatura, crítica literária e ensino. In PINHEIRO, Hélder e NÓBREGA, Marta.
(orgs.) Literatura: da crítica à sala de aula. Campina Grande: Bagagem, 2006, p.111-126.
______________. Abordagem do poema: Roteiro de um desencontro. In DIONÍSIO, A. P. e BEZERRA, M. A. O
livro didático de português: Múltiplos olhares. Rio de Janeiro: Lucerna,2003.
_____________.Poesia na sala de aula. 2. Ed. João Pessoa: Ideia, 2002.
PINHEIRO, Hélder e LÚCIO, Ana Cristina Marinho. Cordel na sala de aula. São Paulo: Duas Cidades, 2001.
UNIVERSOS: Língua Portuguesa, 6° ano/ Obra coletiva concebida, desenvolvida e produzida por edições SM;
editor responsável Rogério de Araújo Ramos. – 1. Ed. São Paulo: Edições SM, 2012.
Disponível em: <http://www.mundolusiada.com.br/COLUNAS/ml_coluna_023.htm>. Acesso em: 17 de março
de 2014.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
PRÁTICAS DE ESCRITA NO POVO INDÍGENA TRUKÁ –PE
ABSTRACT: The work aims to socialize writing practices of indigenous teachers Truká, the
island of Assumption in Cabrobó-PE, in the region of the São Francisco River San Francisco
535 km from Recife. This work is guided by social and ethnographic perspective of literacy
(STREET, 2010); the prospect of autonomy present (FREIRE, 2011); but also by the bias of
the concept of autonomy/authorship from the study by (CESAR, 2011), once to the author
this construct actually is an attempt to understand how the subject historically first manage
to increase and if authorize as producers of his speeches. Thus, as an object of study focuses
on the writing of the book "Indians in the vision of the Truká Indians," collective authoring of
indigenous teachers. The analysis considers the practices of writing that, by encouraging a
contextualized teaching materials and promote the strengthening of identity Truká, allow the
insertion of these teachers/researchers in authoring practices in written production-a social
and cultural practice still exclusive writers of major centres – arguing, from their knowledge,
few themes explored in traditional school curricula, both in own indigenous schoolthe non-
Indian's school.
KEYWORDS: Writing practices. Statement of identity. Teachers Truká.
INTRODUÇÃO
Este estudo faz parte da experiência de vida das professoras indígenas Truká da Ilha da
Assunção em Cabrobó na região do submédio São Francisco a 535 km de Refice-PE, as quais
registraram pela primeira vez a versão da história de sua gente numa caminhada de busca
pelo fortalecimento de sua identidade indígena. Atualmente o povo Truká tem uma
população aproximada de 6 mil índios que habitam os 6.200 hectares da Ilha da Assunção e
os 970 hectares do arquipélago, que abrangem 84 ilhas menores.
Na narrativa do livro “Índios na visão dos índios Truká” é possível perceber a tentativa de
mostrar o quanto esse povo é e está ativo pelo reconhecimento de sua história. Essas
profissionais não deixam de lado a busca pelas mudanças sociais que lhes favorecem, não
desprezam as “velhas tradições”, mas também não estão fechadas aos novos padrões e
adaptações da realidade social. As professoras fazem uso das práticas de letramento para
apresentar seus registros históricos com base, principalmente, no “acervo de histórias orais
76
Mestre em Crítica Cultural, Linha 2 – UNEB- Campus II; professora de Língua Portuguesa; email:
[email protected]
211
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
guardado pelos sábios e sábias do Reino da Assunção”; utilizam, como diz Street (2010),
outras formas de se chegar ao significado.
Para dar conta dessa abordagem, este trabalho está organizado da seguinte forma: na
primeira seção, apresento os Aspectos gerais da obra: com a descrição do que pode ser
apreciado pelo leitor ao manusear esse livro; na segunda seção, trago mais detalhadamente a
apresentação do livro acima citado na seção intitulada A produção escrita: “Índios na visão
dos índios Truká” na tentativa de revelar os processos de autoria/autonomia implicados na
produção das obras.; e finalizo este artigo com as considerações acerca dos Significados das
práticas de escrita para as professoras Truká;
Capa do livro Índios na visão dos índios Truká, com publicação em2002.
Este livro é fruto do Projeto Educativo Sociocultural: Índios na visão dos índios sob a coordenação de Sebastián
Gerlic e a colaboração de Gabi de Melo através da ONG Thydêwá 77 e o apoio institucional da UNESCO 78.
77
Organização não-governamental criada em 2002 com a visão de promover a Consciência Planetária, valendo-
se do diálogo intercultural da valorização da diversidade e das culturas e conhecimentos tradicionais e visa um
desenvolvimento integral em nome da paz; com sede em Ilhéus-BA. Disponível
emhttp://www.thydewa.org/historico/ Acesso em 30/01/2014
212
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Relevante ressaltar que a partir das Oficinas de Identidade e Expressão Criativa promovidas
pelo projeto, cada povo indígena teve a sua história contada em um livro exclusivo, isto é,
neste trabalho não estavam reunidas as histórias dos povos indígenas de Pernambuco em
uma única obra. Dessa vez, o povo Truká teve o seu livro com exclusividade. Assim, as
professoras, lideranças e comunidade historiaram, fotografaram e organizaram seu próprio
material em 62 páginas que retrataram sua identidade étnica. Logo, muitas fotografias
compõem esta obra, a começar pela capa que traz a imagem da Ilha da Assunção, localizada
em Cabrobó-PE, do rio São Francisco e de Seu Antonio Emiliano, conhecido por Toinho –
grande liderança da ciência Truká - sob a imensidão de um céu azul, como pode ser
visualizado na imagem acima. Em 2003, a coleção já possuía sete livros de povos diversos e
21.000 exemplares.
Assim, surgiram nas aldeias as entrevistas, os depoimentos e as vivências do povo. A
comunidade participou ativamente no trabalho de campo. O povo Truká viveu com
autonomia esse momento de registro em suas aldeias:
Foto do povo Truká tirada por eles mesmos na elaboração do material para o livro Índios na visão
dos índios Truká, 2002, p.60
78
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura.
79
Colaborador e editor do livro “Índios na visão dos índios Truká”.
213
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Foto do povo Truká tirada por eles mesmos na elaboração do material para o livro Índios na visão
dos índios Truká. 2002, p.60.
Dessa forma, fazendo jus ao título da obra: “Índios na visão dos índios Truká”, seus autores e
autoras contam as histórias dos Encantados, falam do tempo de escravidão, das lutas durante
o período das retomadas da terra, dos saberes dos mais velhos, da religião, dos rituais, da
agricultura, dos remédios retirados da natureza, da luta coletiva do/a índio/a Truká contra o
preconceito do não-índio:
214
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Poema: Jacaré sobre a imagem que aponta a relação do indígena com o meio
ambiente na aldeia. COMUNIDADE TRUKÁ, 2002, p .51.
215
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Com este livro, as índias e os índios Truká ressignificam suas especificidades e são os
verdadeiros autores das narrativas que compõem esta obra, tratando aqui a autoria como
aborda América Cesar (2011), sob a perspectiva da ação do sujeito enquanto construtor
social, já que este trabalho escrito é resultado dos textos, entrevistas e fotografias realizados
durante as oficinas na própria aldeia.
Essas professoras estão engajadas na “aquisição de um conjunto particular de práticas de
letramento, [...], pode de fato ser um foco para transformação e desafio” (STREET, 2007,
p.471) como sujeitos sociais na sua realidade, tanto em casa, na vila, na cidade, na escola
quanto em movimentos fora da aldeia. Assim, o letramento é visto nessa pesquisa como "uma
prática social, não simplesmente uma habilidade técnica e neutra. Trata-se de uma prática
sustentada por princípios epistemológicos socialmente construídos.", (MARINHO, 2010,
p.78).
Nessa direção, Kleiman (1995, p.41) aponta os níveis de letramento como decorrentes da
familiaridade de falantes com usos, funções e organizações textuais da escrita que irão refletir
diretamente no fazer desses sujeitos. Além da escola, são trabalhos onde o sujeito está
sempre em contato com a escrita. Assim quando as professoras se organizam em grupos e
saem visitando casa a casa os moradores mais antigos da aldeia em busca das histórias por
eles vividas, para registrá-las por escrito, ocorre uma organização daquelas narrativas em
forma de textos escritos e mais tarde a publicação de livros.
Nesse sentido, Santos (2011, p.27) coloca que “o letramento não é apenas o efeito da escrita
nas representações dos grupos, mas também as mudanças que as pessoas são capazes de
fazer e que de fato fazem com a escrita, quando a usam em práticas sociais específicas”. Logo,
quando essas professoras utilizam suas práticas de escrita no intuito de que“essas produções,
elas estejam na sala de aula e que os alunos tenham contato com elas e que a gente consiga a
partir da oralidade e dessa forma escrita e do professor em sala de aula, poder tá fortalecendo
essa educação escolar indígena dentro do território [...] 80”, as mudanças com o modo de se
utilizar a escrita estão acontecendo, é uma nova forma de marcar o registro escrito dentro do
povo Truká.
É a autonomia do fazer das professoras fazendo valer seus saberes, costumes e a tradição
Truká, relacionada com o fazer da terra, e para que isso aconteça é importante que haja “uma
pedagogia da autonomia [...] centrada em experiências estimuladoras da decisão e da
responsabilidade, vale dizer, em experiências respeitosas da liberdade”, (FREIRE, 2011,
p.105).
Neste sentido, as/os educadoras/es Truká usam esta obra escrita para denunciar o
preconceito contra o indígena. A fala do Cacique Issor Truká 81, no livro acima citado,
confirma a tal observação quando argumenta que:
Trecho da fala da professora Claudete (Cláudia Truká) na Mesa redonda sobre a Educação Escolar Indígena,
80
na Escola Manoel Deodato, na aldeia Caatiguinha, Ilha da Assunção- Cabrobó-PE, em 16 de fevereiro de 2014.
81
Cacique dos Truká na Aldeia Tapera em Orocó-PE.
82
Grifo do autor.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Tem coisas que se resolvem com telefone [...] Nós precisamos ser
respeitados 83.
Em outra ocasião, o depoimento do índio Rodrigo ainda no livro supracitado indica mais uma
vez a discriminação, o preconceito que o índio tem enfrentado na sua luta cotidiana:
Tu não é indio!
Ainda nesse sentido, afirma seu Zé Carinhanha em seu depoimento para o livro Índios
na visão dos índios Truká:
Sim, e muito. Até hoje somos criticados. Quando eu era criança da sua idade,
11 anos, estava no primário, já recebíamos críticas. As pessoas diziam que o
povo Truká não existia e perguntavam quem éramos, já que os livros não
falavam nada da gente. Eu sempre lutando, brigando, segui na luta.
83
Grifo do autor.Texto escrito pelo Cacique Issor Truká para o livro Índios na visão dos índios Truká, 2002, p. 45
85
Conferência realizada no concurso para professor-titular da disciplina Etnologia. 1997. Museu Nacional/UFRJ.
Rio de Janeiro. Uma etnologia dos “índios misturados”? Situação colonial, territorialização e fluxos culturais.
Acessível em http://www.scielo.br/pdf/mana/v4n1/2426.pdf acesso em 10/01/2014
86
Grifo do autor.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Até mesmo na Câmara era difícil. Para dizer que nós existíamos tivemos que
fazer muita zoada, muito Toré. Nosso Povo teve que ficar unido para dizer que
nós existíamos. Eu me sinto uma pessoa abençoada pelos Encantos por ser a
pessoa que estava à frente, pela primeira vez no Legislativo, na Câmara dos
Vereadores, onde levava o nome Truká. (COMUNIDADE TRUKÁ, 2002, p.
59).
Em relação aos rituais, o Toré é destacado na fala de Tonho de Chiquinho (Mestre) como
afirmação da identidade Truká, quando diz:
Assim, esta obra finaliza com a imagem de dois jovens índios Truká e o seguinte texto: “Sou
índio Truká e espero que todos aqueles que tenham oportunidade de ler este livro conheçam
um pouco de nossa cultura e de nossos costumes. Espero que os brancos tenham consciência
e que colaborem com todas as nações indígenas do mundo”. (Jorge Truká).
Foto do povo Truká tirada por eles mesmos na elaboração do material para o livro “Índios na
visão dos índios Truká”
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Dessa forma, estas profissionais sentem que a partir dos registros escritos da sua história
estarão firmando-se com mais propriedade diante de um sistema que já possui muitas leis
que favorecem aos povos indígenas, entretanto com uma grande problemática na hora de
serem efetivadas no dia a dia dentro das comunidades indígenas, como elas mesmas colocam,
“difícil é na hora de se tirar do papel” 87.
Diante disso, observo a autonomia das professoras enquanto sujeito que pesquisa, escreve,
autoriza, registra e que conta sua história sob o viés da autoria indígena, fora dos modelos
canônicos, já colocados na sociedade. Trago a autoria do sujeito que interage em suas
práticas sociais e amplia sua compreensão na construção política e coletiva, numa
convivência de oralidade e escrita, opondo-se ao silenciamento que lhe fora imposto no
decorrer da sua história, e que agora se autoriza a falar por si e sobre si mesmo, produzindo,
assim, “deslocamentos nas posições subalternas”. (CESAR, 2011).
REFERÊNCIAS
CESAR, America Lúcia Silva. Lições de Abril: construções da autoria entre os pataxó de Coroa Vermelha. Salvador: EDUFBA,
2011.
COMUNIDADE TRUKÁ. Índios na visão dos índios Truká. Salvador: Thydêwá. 2002.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra. 2011.
KLEIMAN,B. Angela. Modelos de Letramento e as Práticas de Alfabetização na Escola. In: KLEIMAN, A. B. (org.). Os
significados do letramento: uma nova perspectiva sobre a prática social da escrita. Campinas, SP: Mercado Aberto, 1995.
MARINHO, Marildes. Letramento: a criação de um neologismo e a construção de um conceito. In: MARINHO, Marildes;
CARVALHO, Gilcinei Teodoro (orgs).Cultura escrita e letramento. Belo Horizonte: UFMG, 2010.
Mesa Redonda sobre a Educação Escolar Indígena, na Universidade Federal do Vale do São Francisco-Univasf, em
Petrolina-PE, em 30 de agosto de 2013.
OLIVEIRA, João Pacheco de. Conferência realizada no concurso para professor-titular da disciplina Etnologia. 1997. Museu
Nacional/UFRJ. Rio de Janeiro. Uma etnologia dos “índios misturados”? Situação colonial, territorialização e
fluxos culturais. Acessível em http://www.scielo.br/pdf/mana/v4n1/2426.pdf Acesso em 10/01/2014
SANTOS, Cosme Batista dos. Letramento e senso comum: a popularização da linguística na formação do professor.
Campinas, SP: Mercado de Letras, 2011.
STREET, Brian. Os novos estudos sobre o letramento: histórico e perspectivas. In: Cultura Escrita e Letramento. Org.
Marildes Martinho. São Paulo, 2010.
87
Pretinha Truká, in: Mesa Redonda sobre A Escola Indígena, na Universidade Federal do Vale do São Francisco-
Univasf, em Petrolna-PE, em 30 de agosto de 2013.
88
Idem.
219
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O USO DE IMAGENS EM PRÁTICAS PEDAGÓGICAS
Palavras Chaves: Texto Imagético. Leitura e Escrita. Cultura Visual. Formação de leitor.
ABSTRACT: This work intends to make a report on the experience of the subproject Pibid :
Education for Image : cultural education , reading and writing , created the Colegio Modelo
Luis Eduardo Magalhaes in the city of Jacobina and the Colegio Estadual Normal Arnaldo de
Oliveira in the city of Caem . The proposal by the Education Image seeks to provide high
school students to a related general education subjects and content of cultural training
courses, through interventions in the classroom and themed workshops. The work is
developed around reading, reflection and production of language imagery associated with the
practice of reading and writing texts of verbal language, from the perspective of
interdisciplinaridade. In this sense, the proposal is presented as a possibility for innovation
in teaching practices through the actions and activities of the Fellows of Initiation, as well as
the appropriation by high school students of contemporary languages around the issues
underlying reading and producing texts visual culture. For this, it is based on authors such as
MANGUEL, 2002; OLIVEIRA , 2006; HERNANDEZ , 2000; SARDELICH,2006;VOLPATO
2003 , among others, discuss the use of imagery text as essential for the formation of
proficient readers in different contexts , consistent with the demands of today's society that is
surrounded by deriving see productions of visual culture object.
Keys words: Imagistic Text. Reading and Writing . Visual Culture. Formation reader .
Introdução
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Nessa perspectiva, torna-se necessário que os espectadores passem a serem leitores dessas
representações visuais, indo além da mera decodificação, do perceber apenas o que está posto
num primeiro plano da imagem. É salutar que os sentidos sensoriais se juntem também com
as experiências vividas de cada um e seus conhecimentos de mundo, a fim de que outro
processo de apreensão seja inaugurado. Aquele em que os sentidos culturais, ideológicos,
sociais que constituem a imagem, desde o processo de sua criação até os mais diferentes usos,
nos mais diferentes espaços, sejam identificados numa leitura critica reflexiva, fazendo com
que este espectador-leitor seja capaz de gerar outras (res) significações e sentidos. Dando
margem a possibilidades de produção do conhecimento, como bem aponta (CATANHO 2007,
p.85),
Não existe uma única forma de “ler” uma imagem. Sua recepção é um processo
idiossincrático, depende essencialmente do “saber do mundo” de cada pessoa, sempre
individual e, portanto, distinto. Não existe nas imagens uma única forma de
interpretação, uma única realidade expressa. Elas podem proporcionar múltiplas
leituras. Isso vai depender de como os indivíduos e grupos sociais as utilizam dentro
de uma determinada cultura. Da mesma forma que o texto verbal pode não expressar
para todas as pessoas os mesmos sentidos, as imagens também não são reproduções
absolutas e passivas da realidade.
Vale ressaltar ainda, que este caráter de ser plural e significativo, que é peculiar a linguagem
imagética, suscita a ideia de que o processo interpretativo frente às imagens é algo inacabado,
pois muitas histórias podem ser contadas a partir de uma mesma representação visual, em
diferentes perspectivas. Conforme assinala Manguel (2001,p.26), quando menciona que,
nenhuma narrativa criada a partir de uma imagem é definitiva, exclusiva, pois o que se ver é
sempre uma leitura que parte das emoções do leitor: ou seja, de como as emoções do leitor
afetam e são afetadas pela leitura das imagens.
A partir desse ponto, surge outro aspecto que diz respeito à leitura de imagens, é o
pedagógico, embora, seu uso neste sentido já tenha sido usado desde a antiguidade, hoje com
proliferação do visual é iminente que sejamos suficientemente formados para a compreensão
e efeitos de toda a produção advinda desse novo campo, o da cultura visual.
É nesse interim que a Escola, espaço sócio e culturalmente determinado como sendo
responsável pela transmissão e confecção de saberes, deve trazer para o centro de suas
práticas o texto imagético, que pulula o cotidiano dos sujeitos ai implicados (alunos,
professores). Esse imagético já faz parte da rotina diária desses sujeitos, seja com o uso dos
celulares digitais e todos os seus aplicativos, das redes sociais, da televisão, internet, enfim
dos mais diversos recursos. Em conformidade com Hernandez (2007) que defende a ideia de
que a sociedade está em plena elaboração de sentidos múltiplos, embutidos nas imagens que
produz, logo, a educação para a imagem, para os mass media é tarefa crucial na formação do
aluno. Portanto, o uso da imagem como conteúdo das aulas, e não somente ilustração ou
decoração representa a adequação aos novos paradigmas educacionais contemporâneos.
221
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Para Hernández isso seria dizer que o estudo sistemático da cultura visual pode proporcionar
aos docentes e alunos uma compreensão critica do seu papel e suas funções sociais, como
também de suas relações de poder, indo além da apreciação ou do prazer que as imagens
proporcionam. Ou seja, é sai do lugar comum de práticas comuns que usam as
representações visuais como acessório, ilustração ou recursos que apenas continuam
evidenciando o sistema tradicional de ensino.
Para tanto, um dos caminhos apontados pela Cultural Visual como forma de superar esse
modelo de ensino tradicional, fragmentado em disciplinas seria o da aplicação de práticas
onde a transdisciplinaridade e transversalidade sejam de fato responsáveis por criar
possibilidades de produção de saberes, a partir de um processo dialógico, associativo e
dialético entre as mais diversas áreas do conhecimento, tanto aqueles exigidos pela escola
como aqueles advindos de outros espaços.
1. Leitor de imagens
“Uma imagem fala mais do que mil palavras”, essa é uma frase que se tornou comum. As
pessoas costumam repeti-las quando querem se referir ao poder de alcance e potencial de
sentidos que as imagens representam na contemporaneidade. A cada instante as pessoas são
bombardeadas por centenas de imagens à sua volta, que chegam através dos meios de
comunicação, especialmente pela internet. E essas imagens são carregadas de sentidos, que
aguçam e potencializam o senso criativo dos expectadores.
Neste sentido, a imagem pode ser considerada, tal como a linguagem verbal, um texto
simbólico, isto é, em determinada cultura, socialmente se define o significado de um
elemento ou forma, como por exemplo: uma cor, como o vermelho, um conjunto de
linhas como cruz e, todos que comungam do conhecimento da significação a eles
atribuída, fazem sua leitura. (VOLPATO, 2003)
Assim, seguindo a lógica da teoria da leitura critica onde o ato de ler um texto (verbal)
pressupõe compreender o processo de produção: quem escreveu, de que lugar, para quem,
qual a intencionalidade; destacando esses fatores como de suma importância para o
entendimento dos significados textuais e produção de novos sentidos, deixando de lado a
ideia de que ler é decodificar o código. Ler é ir além. Da mesma forma ocorre com o texto
imagético, embora outros mecanismos sejam usados na apropriação deste.
Para que o leitor tenha compreensão dos significados e condição de produzir novos, é preciso
que o mesmo utilize estratégias que o possibilite dialogar com a imagem, tais como rever seu
repertorio de conhecimentos, fazendo associações do texto com as suas memórias. E ainda,
fazer do ato de olhar a imagem, uma ação sensibilizadora apurando todos os sentidos, ou
seja, ver não é somente decodificar, mas é também sentir, percebendo inclusive, o que não
pode ser dito. Só assim, esse processo de leitura ganhará o aspecto reflexivo. Comungando
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
com Ferrara quando afirma que: “o objetivo da leitura não verbal vai muito além
dadecodificação” (FERRARA.2007. Leitura sem Palavras. P.28).
O texto imagético representa a linguagem quando se associa e produz ideias novas a partir de
inferências que mostra a proximidade e a comparação entre objetos e situações distantes.
Nesse sentido, a visão apresentada aqui, é de que esse processo de “ler imagem” ganha
aspectos pedagógicos, ou seja, a imagem agora pode e deve ser utilizada como texto em sala
de aula, repleto de significados em si só, ou relacionados com outros. Não é possível utilizar,
pois, a imagem apenas como ilustração do texto verbal ou um pretexto, para o texto escrito. É
necessário, concordando com Hernández, construir uma dinâmica de leitura imagética sob a
perspectiva de interpretação, relacionando todos os elementos que formam o texto: da
produção pelo autor à recepção do leitor (espectador), a fim de identificar significados e
possibilidades de empregar ou criar novos sentidos.
223
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Dessa forma, a utilização dos textos imagéticos nas práticas docentes traz a possibilidade de
ampliar o universo de conhecimento do aluno. Pois, ver e observar as mais diversas imagens,
já é algo comum para todos, e ainda mais para os adolescentes e jovens que vivem em meio
aos dispositivos midiáticos, com conexão em tempo real, cheios de aplicativos e imagens. Mas
do que nunca é necessário que os professores lancem mão dessa linguagem imagética, a fim
de efetivamente formar alunos que sejam leitores críticos tanto de textos verbal ou não.
O subprojeto “Educação pela Imagem: formação cultural, leitura e escrita” que faz parte do
Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID), é desenvolvido noColégio
Modelo Luís Eduardo Magalhães na cidade Jacobina, e no Colégio Estadual Normal Arnaldo
de Oliveira na cidade de Caém no interior da Bahia, e traz como finalidades primordiais, 1)
proporcionar aos bolsistas de iniciação (alunos dos cursos de Letras e Inglês DCH-Campus
IV) a vivência efetiva do cotidiano escolar, através do desenvolvimento de intervenções, de
caráter interdisciplinar, com a utilização de textos imagéticos. e, 2) através da abordagem de
textos da cultura visual como tema de estudo transversal oferecer aos estudantes do Ensino
Médio uma formação cultural relacionada à formação geral dos sujeitos e ao conteúdo das
disciplinas, colaborando assim para a formação de leitores e produtores proficientes.
Dessa forma, os alunos do Ensino Médio e também seus professores, se veem em meio a
essas novas práticas pedagógicas, que visa através da apropriação de linguagens
contemporâneas, ajudar na sua formação cultural em torno das questões subjacentes a
produção do texto da cultura visual e das práticas de leitura e escrita em diferentes áreas do
conhecimento.
Além dessas atividades destacadas acima, ainda podemos elencar outras ações tais como:
com a promoção de palestras para discussão a cerca dos trabalhos desenvolvidos pelo PIBID,
bem como os seus resultados; realização de aulas de campo em parceria com os professores;
desenvolvimento de projetos de leitura e escrita oferecidos aos alunos das escolas
participantes; além de oficinas de redação, vídeo e apoio efetivo aos projetos estruturantes da
rede Estadual aderidos pelas escolas parceiras, tais como Festival da Canção Estudantil
(FACE), Tempos de Artes Literária (TAL), Artes Visuais Estudantis (AVE), Educação
Patrimonial Artística (EPA). Acrescenta-se ainda, de organização de exposição e sessão de
filmes.
Vale salientar, que a realização desse subprojeto além de instigar e contribuir para a
formação leitora do aluno do ensino médio, oportunizou também aos bolsistas de iniciação
(alunos da graduação) vivenciar de modo mais completo, pelo menos se comparado aos
estágios supervisionados, à vivência de fato, ou mais aproximada da docência, pois os
mesmos participaram como observadores e colaboradores de reuniões pedagógicas,
atividades complementares, projetos e eventos desenvolvidos nas Unidades Escolares. E
ainda, de modo colaborativo, professor regente e bolsista fazendo planejamento e execução
de intervenções nas mais diversas disciplinas do Ensino Médio, interligadas a temática do
projeto, a serem desenvolvidas na sala de aula. Por isso, os bolsistas se envolviam nas
atividades desenvolvidas de modo efetivo. E de fato, criando e experimentando práticas
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
leitoras de textos imagéticos. Ao mesmo tempo em que contribuíam para formação de
leitores críticos de imagens, também se tornavam leitores, mais críticos e produtores mais
conscientes e reflexivos de significados e sentidos a partir de representações visuais.
Considerações finais
Considerando que o texto imagético, no subprojeto em questão, é o propulsor para produções
de novas formas, práticas (estratégia) de lidar com essa linguagem (imagética) em sala de
aula, percebe-se que a utilização da imagem na sala, como texto colabora e muito para
formação dos alunos como leitores. Essas práticas levam os alunos a criarem uma consciência
leitora crítica diante do texto observado. Onde os sentidos impressos pelo produtor, e que
não estão de modo explicito, como elementos culturais, ideológicos, políticos, pessoais, serão
identificados e colaborarão no processo de significação e produção de novos sentidos e outros
textos.
É notória a necessidade de que os futuros professores, bem como os que já atuam possam
perceber a importância da imagem na sala de aula, não só como ilustração, mas como textos
carregados de sentidos, que devem fazer parte da aulas, pois já são partes do mundo.
Portando, é preciso que haja mais pesquisas e experimentações metodológicas sobre o uso da
imagem, para que se torne mais simples sua utilização pedagógica.
Nesse sentido é que o papel da escola atualmente, através de práticas docentes implicadas em
novos saberes, a exemplo das práticas visuais, torna-se fundamental para a formação de
cidadãos que possam ler e interpretar as imagens do mundo que os cerca de forma
consciente, crítica e proveitosa. A fim de que esses cidadãos leitores saibam intervir de modo
produtivo em suas comunidades.
Referências
BARBOSA, E. Leitura e Midia: Entre Ler, ano 1, nº 3jun|jul. PROLER. Casa da Leitura, Rio de Janeiro, 1995.
FAGUNDES, André Luís de Oliveira. O Poder Formativo Das Imagens E Suas Implicações Pedagógicas.
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). 2009
FERRARA, Lucrecia D’Alésio. Leitura sem palavras. São Paulo: Ática, 2007.
HERNÁNDEZ, Fernando. Catadores da cultura visual: transformando fragmentos em nova narrativa educacional.
Trad.: Ana Duarte. Porto alegre: Mediação, 2007.
MANGUEL, Alberto. Lendo Imagens: uma historia de amor e ódio.São Paulo: Companhia das Letras, 2001.
OLIVEIRA, Sandra Regina. Leitura de Imagens para a Educação. – São Paulo: s.n.,1998. Tese (Doutorado) –
Pontifícia UniversidadeCatólica de São Paulo. Área de Concentração: Comunicação e Semiótica
PEREIRA, Maria Cristina C. L. Uma arqueologia da história das imagens. In: GOLINO, William (org).
Seminário: A importância da teoria para a produção artística e cultural. Vitória, UFES, maio, 2004. Site:
http://www.tempodecritica.com/
SARDELICH, Maria Emília. Leitura de imagens, cultura visual e prática educativa. Cadernos de Pesquisa,
volume 36, número 128, páginas 451-472. Agosto 2006.
226
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
PUBLICAÇÕES NA BAHIA: MAPEAMENTO E DIAGNÓSTICO DAS EDITORAS
BAIANAS
89* Universidade Estadual de Feira de Santana, Feira de Santana/BA, Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Estudos
Literários, Bolsista do CNPq, [email protected].
90** Universidade Estadual de Feira de Santana, Feira de Santana/BA, Mestranda do Programa de Pós-Graduação em
Estudos Literários da Universidade Estadual de Feira de Santana e Coordenador da pesquisa “Publicações na Bahia:
mapeamento e diagnóstico das Editoras Baianas”, [email protected].
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Introdução
A pesquisa "Publicações na Bahia: mapeamento e diagnóstico das editoras baianas", que está
ligada ao Programa de Pós-Graduação em Estudos Literários da Universidade Estadual de
Feira de Santana (UEFS), tem como objetivo principal realizar um mapeamento detalhado
das editoras atualmente existentes na Bahia em suas diversas regiões, englobando tanto as
que funcionam na formalidade com um apelo comercial, quanto as que operam de forma
alternativa ou não-tradicional. No que diz respeito ao segmento dito alternativo, há que se
destacar que “o Brasil está assistindo, nos últimos anos, a um movimento cultural vindo da
periferia, englobando literatura, música, entre outras manifestações”, sendo que tal
tendência, conforme a expressão pública do próprio Sindicato Nacional dos Editores de
Livros (SNEL), sinaliza para a “importância de se ter um padrão de qualidade no que se
refere à literatura marginal, ou de periferia, [...] para que ela saia desse nicho e possa atingir
o mercado como um todo” (GANDRA, 2013, online).
Devido à extensão territorial e a quantidade de municípios da Bahia (417 municípios), está
sendo adotada para o mapeamento a referência às sete mesorregiões do estado. Trabalhar
com o conceito de mesorregião significa levar em consideração aspectos mais vastos que
apenas o histórico ou o econômico, de forma a ampliar as determinações no âmbito
conjuntural, observando-se como elementos: “o processo social como determinante, o quadro
natural como condicionante e a rede de comunicação e de lugares como elemento da
articulação espacial” (IBGE, 2013, online).
Segundo o professor e pesquisador do Centro de Estudos Multidisciplinares em Cultura
(Cult) da Universidade Federal da Bahia, Paulo Miguez (MIGUEZ, 2011, p.99): “é bastante
plausível a expectativa de que a realização de estudos e pesquisas voltados para responder às indagações próprias
de toda a novidade venha garantir a densidade teórico-metodológica necessária ao enfrentamento do desafio de
pensar o conceito de economia criativa em chave brasileira”.
Ao pensar o universo editorial, sabe-se que o número de editoras no Brasil até meados da
década de 90 era muito inferior ao quadro que se tem hoje. Havia o domínio daquelas de
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
grande porte, localizadas em grandes centros urbanos. Foi a partir da expansão e ampliação
das novas tecnologias da informação, da possibilidade da compra de maquinário,
computadores, e softwares, que houve a mudança desse quadro.
No recorte da Bahia, sabe-se da existência de inúmeras editoras e de políticas culturais
voltadas para elas. A cunho de exemplo, a Fundação Pedro Calmon, principal órgão
governamental ligado ao setor de livros na Bahia, conta com uma Diretoria do Livro e da
Leitura que promove políticas para o setor de publicações. A Fundação é a responsável pelos
editais específicos para a publicação de livros por editoras baianas. No ano de 2012, tais
editais tinham como objetivo:
Pensar a Bahia na sua diversidade territorial — portanto, sem focar apenas a capital e região
metropolitana — é uma tarefa importante, uma oportunidade de possibilitar a voz e a vez aos
demais territórios com diferentes e diversas características sócio-político-culturais,
características estas que não os coloca imunes à dinâmica de atividades artísticas e partícipes
da área de Economia da Cultura. Em termos de abordagens acadêmicas (dissertações de
mestrado), cita-se o exemplo de duas pesquisas recentes que deram conta da dinâmica
cultural de escritores de duas diferentes regiões do interior da Bahia 92, ambas apontando que
há em regiões tão distintas entre si e distantes espacialmente dos centros, tanto uma
intelectualidade que escreve e publica, quanto um público leitor que demanda obras, sejam
elas literárias, sejam não literárias.
92
Trata-se das pesquisas de Alves (2011) e Lopes (2013). A primeira fez pesquisa de campo com a geração de
escritores que se espelhou na carreira do escritor Antonio Torres (natural da microrregião Agreste e Litoral
Norte da Bahia), os quais tanto publicam em editoras alternativas quanto naquelas ditas comerciais. Já a
segunda pesquisa dá conta da microrregião do Médio São Francisco, igualmente constando a existência de
autores, publicações e público leitor.
229
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Dessa forma, as microrregiões selecionadas para o início da pesquisa, que envolverá
levantamentos locais, foram as seguintes: Mesorregião Metropolitana de Salvador
(Microrregião de Salvador e de Santo Antônio de Jesus), Extremo Oeste Baiano
(Microrregião de Barreiras e de Santa Maria da Vitória), Vale São-Franciscano Baiano
(Microrregião de Juazeiro e de Bom Jesus da Lapa), Centro-Sul Baiano (Microrregião de
Vitória da Conquista e de Seabra), Sul Baiano (Microrregião de Porto Seguro e de Ilhéus-
Itabuna), Centro-Norte Baiano (Microrregião de Feira de Santana e de Irecê) e Nordeste
Baiano (Microrregião de Alagoinhas e de Euclides da Cunha).
Diante do desafio de realizar um levantamento sobre informações e dados da economia
criativa, uma lacuna ainda em aberto, a pesquisa visa investigar experiências do setor criativo
de Livro, envolvendo uma articulação dos setores de Livro e Publicações de Mídias
Impressas. Dessa forma, a pesquisa ancora no primeiro dos três eixos colocados pela
Secretaria da Economia Criativa como sendo fundamentais para o desenvolvimento e/ou
incremento da economia criativa no Brasil, quais sejam: a) mapeamento da informação das
cadeias produtivas, com diagnóstico de territórios criativos, de vocações regionais, para
formulação de políticas públicas; b) capacitação técnica para gestão de negócios criativos,
com formação de gestores, do artesanato à cultura digital; c) promoção e difusão desses
empreendimentos em feiras, rodadas de negócios, etc. (cf fala da secretária Claudia Leitão,
apud Economia Criativa, Notícias do MinC, 27 mar. 2013, online).
Para o professor e escritor baiano Mayrant Gallo (que já foi titular da Diretoria do Livro e da
Leitura da Fundação Pedro Calmon), a produção editorial baiana atual não fica a dever, em
qualidade gráfica, a quase nenhuma editora das regiões Sudeste e Sul:
Posso estar enganado — e não são poucos os homens que se enganam —, mas,
ao que parece, uma nova era no meio editorial baiano começou. Já temos
editoras — e editoras criteriosas —, em quantidade que nem sei se a constelação
de leitores baianos a justifica. Não faltam livros, portanto. Falta talvez que
leiamos mais, que frequentemos mais as livrarias e aos lançamentos de livros.
Que nos “aculturemos” tanto para a mente quanto para o corpo (GALLO, 2013,
online).
Em uma de suas ações, a Fundação Pedro Calmon realizou uma chamada pública para
selecionar editoras baianas para compor o estande da instituição na XI Bienal do Livro da
Bahia, demonstrando um interesse por par das políticas públicas em fomentar o setor.
Contudo, deve-se considerar que existem ainda editoras desconhecidas pelos mapeamentos
até então realizados, muitas atuando de forma alternativa, como as editoras de cordeis,
quadrinhos e gráficas que funcionam como editoras. Para envolvê-las e criar linhas de apoio
para o financiamento de livros, como costa no plano de ações do Plano Estadual do Livro e da
Leitura, é necessário conhecê-las, em mapeamento e diagnóstico. Ter em mãos informações
sobre quais são as editoras baianas em atuação, investigando a sua cadeia produtiva — que
inclui criação, produção e distribuição — já é um passo importante para divulgação e
facilitação do trabalho delas em rede. Só a partir dessas informações será possível estimular
capacitação e fomento a empreendimentos criativos em toda a Bahia.
REFERÊNCIAS
ALVES, Cristiana da Cruz. O Junco: lugar-personagem na obra dos escritores d'Essa terra. Dissertação (Crítica
Cultural). Universidade do Estado da Bahia, Campus II. Alagoinhas, 2011.
BAHIA, SECULT. Edital 08/2012. [Apoio à edição de livros]. Salvador: Fundação Pedro Calmon, 2012. Disponível
em: http://www.cultura.ba.gov.br/edital/edital-n%C2%BA-08-2012/. Acesso em: 30 out. 2013.
BAHIA. SECULT. Plano estadual do livro e da leitura. Salvador, 2013. Disponível em
http://www.cultura.ba.gov.br/wp-content/uploads/2013/03/Plano-Estadual-do-Livro-e-Leitura- do-Estado-da-
Bahia00.pdf. Acesso em: 30 out. 2013.
BRASIL. MinC. Plano nacional do livro e da leitura. Brasília, 2010. Disponível em:
http://www2.cultura.gov.br/cnpc/wp-content/uploads/2011/07/plano-nacional-do-livro-e- leitura1.pdf. Acesso
em: 30 out. 2012.
BRASIL. MinC. Plano da secretaria da economia criativa: políticas, diretrizes e ações: 2011-2014. Brasília, 2011.
CÂMARA dos Deputados. Legislação sobre livro e leitura. Brasília: Edições Câmara, 2011. Série Legislação, 78.
Disponível em: http://bd.camara.gov.br/bd/bitstream/
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ECONOMIA criativa, Notícias do MinC, 27 mar. 2013. Disponível em:
http://www2.cultura.gov.br/site/2013/03/27/economia-criativa-26/. Acesso em: 30 out. 2013.
GALLO, Mayrant. Não faltam editoras. Revista Verbo 21: Cultura e Literatura. Disponível em:
http://www.verbo21.com.br/v5/index.php?option
= com_content&view = article& = id 457:nao-faltam-
editoras&catid=42:seara-do-gallo&Itemid=126. Acesso em: 4 nov. 2013.
GANDRA, Alana. Literatura da periferia começa a chamar a atenção do mercado, diz sindicato das editoras. Portal
EBC, Brasília, 9 set. 2013. Disponível em: http://www.ebc.com.br/cultura/2013/09/literatura-da-periferia-
comeca-a-chamar-a-atencao- do-mercado-diz-sindicato-de. Acesso em: 7 nov. 2013.
IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas). Definição de mesorregião. Disponível em:
http://www.ibge.gov.br/home/geociencias/geografia/default_div_int.shtm. Acesso em: 30 out. 2013.
LEITÃO, Claudia. Cultura e municipalização. Salvador, Secretaria de Cultura, Fundação Pedro Calmon, 2009.
LOPES, Carlos. Competências criativas para fortalecer a economia criativa no Brasil. Ministério da Cultura. In:
Plano da secretaria da economia criativa: políticas, diretrizes e ações: 2011-2014. Brasília, Ministério da Cultura,
2011.
LOPES, Eduardo Pereira. A revolução dos tomates: literatura de comunidade e engajamento intelectual na prosa
de Enoch Carneiro. Dissertação (Literatura e Diversidade Cultural). Universidade Estadual de Feira de Santana.
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MIGUEZ, Paulo. A economia da cultura como campo de estudos e a novidade da economia criativa. In:Plano da
secretaria da economia criativa: políticas, diretrizes e ações: 2011-2014. Brasília, Ministério da Cultura, 2011.
ONU. Relatório de economia criativa 2010: economia criativa: uma opção de desenvolvimento viável. Nações
Unidas.
231
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
LETRAMENTO, VISUALIDADES E PRÁTICAS SOCIAIS:
EDUCAÇÃO CONTEXTUALIZADA PARA CONVIVÊNCIA COM O SEMIÁRIDO¹
RESUMO: Este trabalho discute sobre as visualidades e a confluência das culturas do sertão
na Festa do Licuri na perspectiva de análise das formas de letramentos e formação para a
convivência com o semiárido. Embasado pelos ideais de Santos (2011) e Kleiman (2008),
compreende o letramento como múltiplas habilidades em práticas sociais; e as visualidades,
tomadas pelos estudos de Gomes (2012) como uma proposta de produção de sentidos e
aprendizagens a partir das redes transversais; de maneira que os elementos visuais
emprestam condições aos fenômenos de letramento e referentes suficientes aos processos
comunicativos contextualizados, visto que essas ocupam, nesses processos-fenômenos, um
lugar central. Assim, se configura nossos interesses para pesquisar e defender a questão dos
letramentos plurais a partir do visual e todas as questões habitadas no contexto e nos
conceitos estudados.
INTRODUÇÃO
Reis (2011), em seu artigo “Educação para a convivência com o Semiárido: desafios e
possibilidades”, nos diz que o “contexto do Semiárido é uma construção humana, e assim
como o contexto, também aquilo que se fez historicamente é uma construção humana, e,
portanto, possível de ser revertida, a depender da nossa vontade política de modificar as
coisas”. Essa vontade de mudança conclamada pelo autor deve ser vista como o mote das
práticas educativas contextualizadas para a convivência integrada do homem com o
semiárido, região que devido suas peculiaridades climáticas, favoreceu a criação de imagens
artificializadas como representações do sertão. Ainda para o autor, “é essa uma das
construções humanas que precisa ser desconstruída, pois esse ranço cultural reacionário
contribui para a fabricação de ‘uma identidade de inclinação despótica”’. Reis, no mesmo
artigo, defende que o clima seco da região
permitiu se criar a ideia de calamidade pública que até hoje vigora na ideia e no
imaginário social da população do nordeste e do Brasil como um todo que vai
compreender o Semiárido apenas pela representação idealizada da fome, da miséria,
quando na verdade existem muitas outras coisas nessa região, que precisariam de
maior visibilidade (REIS, 2011, p.2).
93Mestranda em Educação, Cultura e Territórios Semiáridos – Linha Letramento e Comunicação Intercultural, Universidade
do Estado da Bahia – DCH III. E-mail: [email protected]
232
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Considerando essas questões em torno das representações, das imagens, das visualidades e
visibilidades, da construção dos significados e dos sentidos como fundamentais para
instrumentalizar os processos de comunicação e práticas discursivas, portanto, fundamentais
para os processos de letramento, tomamos um evento, nomeadamente, a Festa do Licuri,
como uma prática social promotora destes entrecruzamentos implicados nos processos
formativos contextualizados e emancipatórios.
A razão pela qual escolhemos esse objeto de estudo foi motivada por diversos fatores. De
antemão, consideramos nossos vínculos pessoais com os assuntos que nela se encontram
engendrados sob a perspectiva de identidade com os sujeitos que participam dos festejos;
com os elementos que a festa traz como representações do sertão e, consequentemente, com
a relevância da valorização do contexto cultural e social do sujeito para os processos
formativos contextualizados.
Com o surgimento da Festa do Licuri, muitos sertanejos vêm despertando para a preservação
do bioma da Caatinga e a readaptação integradora do homem ao seu contexto agora com
novos olhares para o lugar, para suas representações e para os seus reflexos sobre a
identidade da pessoa humana. Assim sendo, a pesquisa buscará responder como a festa do
Licuri, enquanto espaço produtor de visualidades, se constitui como lugar de confluência das
culturas do sertão e oportunidade de letramento/formação dos sujeitos na convivência com o
semiárido? Para isto, buscar-se-á relacionar as simbologias da comunicação visual aí
presentes às múltiplas formas de letramento; identificar formas de integração das diversas
culturas do sertão, suas relações com o contexto e com as formas plurais de letramentos;
identificar temas geradores (sociais e culturais) e alternativas interdiscursivas pautadas na
comunicação visual e nos processos de letramento, por intermédio das múltiplas formas de
linguagens, aspectos cognitivos e formativos da identidade do povo sertanejo.
Isso porque o olhar nos convida a produzir subjetividades para apreender e criar condições
cognitivas necessárias ao desenvolvimento de competências para apropriação social, cultural
e simbólica dos contextos de integração dos indivíduos. Dessa forma, destaca-se a questão do
letramento e da interdiscursividade instauradas a partir das visualidades que se efetivam em
práticas reais e situadas num campo de ação e produção de saberes, focalizando os
fenômenos sociais, culturais e ideológicos, que diretamente, se correlacionam com o
ecossistema discursivo da comunicação, constituindo-se num lugar de compartilhar
conhecimento de forma autônoma e autorizante.
1 CULTURA VISUAL, LETRAMENTO E IMPLICAÇÕES PARA A EDUCAÇÃO
CONTEXTUALIZADA.
À luz dessa reflexão, aportamos nas visualidades da Festa do Licuri como caracterização de
um evento de letramento e como um espaço integrador do homem à comunidade, para isso,
fica definido que esse evento é constituído em sentidos políticos, sociais, culturais e
identitários. Assim, aos nossos olhares, trata-se de um espaço que combina o encontro com
as culturas sertanejas mais formação para convivência com o semiárido mais possibilidades
de letramentos.
Além disso, Santos (2011) nos auxilia, ao trazer à luz, as representações sociais deslocadas
para a atividade social. Segundo o autor, em consonância com Jodelet (2001), as
representações são formas de conhecimento, socialmente elaboradas e partilhadas, que
podem contribuir para a construção de uma realidade comum a um grupo social e se
constituem num saber prático, ligando o sujeito representador ao objeto representado.
234
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
esse caminho, o entendimento de que o discurso é uma ação sobre o mundo, um modo de
representação da realidade, sobretudo, um modo de constituição e construção de significado.
Essa compreensão incide na organização de novas formas e novos contextos de
aprendizagens abertos à interculturalidade, à intuição, à criatividade e ao diálogo propulsor
de sentidos. Assim, é perceptível que a Festa do Licuri, no sentido de prática social de
letramento a partir da identidade social e cultural dos sertanejos em interação e “por
envolver o engajamento do indivíduo em projetos coletivos que transcendem os dados da
experiência concreta individual, favorece o desenvolvimento de uma perspectiva cognitiva,
isto é, que se debruça sobre o real como objeto de reflexão e não apenas de ação” (OLIVEIRA,
2012, p.158).
Santos (2008) conclama a favor de práticas discursivas (de letramento) a partir de uma
significação local ou orientada a partir dos modos de saber e de dizer localmente situados.
Assim, as diversas formas de linguagem devem ser a conexão entre as diversas formas de
saber, de conhecer, de compreender e de interpretar com autonomia os enunciados da
comunidade.
Ademais, investimos na questão das visualidades por compreendermos que estas ocupam,
desde os primórdios da humanidade, um lugar central nos processos de comunicação e nas
diversas formas de propagação e produção do conhecimento. Aliás, as visualidades são
entendidas aqui, em consonâncias com os pressupostos de Gomes (2012), como formas de o
indivíduo ver o mundo e enxergar a si próprio como sujeito potencial construtor de seus
conhecimentos. Hernández (2012) por seu turno, alega que a cultura visual é uma condição
cultural que, especialmente na época atual, está marcada por nossa relação com as
tecnologias da aprendizagem e comunicação que afeta como nós vemos a nós mesmos e ao
mundo. Assim sendo, portanto, um fenômeno relevante e implicado aos processos de
letramento.
Somadamente, saber contemplar o mundo e dele criar uma representação, possibilita a
criação de um ethos significativo do qual se produz as políticas de sentidos, que são
atravessadas por determinantes e conexões emanados dos diversos contextos dos
interactantes. As aprendizagens a partir do visual estão fortemente ligadas à condição
humana de interar com o próprio homem e o meio em que vive, compartilhando saberes e
vivências, construindo aprendizagens e compreensões e, por assim dizer, formas de
letramentos. Trata-se, de uma racionalidade sensível, como sugere Gomes (2012), que faz
com que o processo de produção de sentido seja localizado, complexo e híbrido. Ainda
segundo o autor, trata-se de um processo que assume as abordagens transversais, ancorado
pelo paradigma rizomático, deleuziano, e não aquele da fragmentação ou mapeamento dos
territórios do conhecimento.
Com efeito, ao pensarmos sobre as visualidades como forma de letramento, estamos
inferindo sobre a produção de sentidos e sobre ela elucidar leituras de mundo, uma vez que
estas precedem a leitura da palavra. Pensamos nestas leituras e compreensão a partir da
transversalidade do visual como possibilidades de o indivíduo criar significados e
desenvolver a consciência crítica e transformadora, pois à medida que o conhecimento é
produzido a partir desses ideais, aprende-se a agir sobre o mundo. Por isso, Gomes (2012, p.
235
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
138) nos diz que “la comprensión que nos llega por la mirada es una de las más importantes
formas de dar sentido a nuestro mundo. Em muchas circunstancias, para su mejor
comprension, es necessário ver, es preciso mirar”.
À luz dessas reflexões, Santos (2008) nos avisa que as práticas sócias ou as interações sociais
são mediadas por gêneros específicos de discursos também específicos. E são nestas
especificidades, conclamadas pelo autor, que as visualidades atendem aos propósitos de
problematização entre os saberes que são negociados socialmente e efetivados em redes
transversais de política de sentido, significados e representações. O visual se configura, pois,
como um hipertexto, que potencializa as leituras de mundo de forma cidadã, crítica e
autônoma. Por essa razão, para Gomes (2004), toda prática social humana se constitui de
sentidos, e todo sentido é atravessado por práticas discursivas. Estas por sua vez, constituídas
de uma multiplicidade de vozes que fazem do sentido uma configuração híbrida de
complexas relações e fortes interferências políticos/sociais. Assim, quando o mesmo autor
traz à luz as questões voltadas para o campo das visualidades, é perceptível que há algumas
condições indissociáveis com a noção de letramento do ponto de vista ideológico, visto sua
intrínseca conexão com as linguagens contemporâneas, os discursos, a produção de sentido e
as formas de interpretação. De maneira que as visualidades emprestam aos fenômenos de
letramento condições e referentes suficientes aos processos comunicativos contemporâneos,
visto que essas ocupam, nesses processos-fenômenos, um lugar central. Gomes, completa
essa reflexão, inferindo que
3 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
236
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Dessa maneira, a ambientação da Festa do Licuri coloca em relevo a valorização dos eventos
de letramentos, das visualidades e a integração das práticas culturais ao alcance dos sujeitos
para sua formação para convivência com o semiárido. Assim, buscaremos desenhar por meio
da pesquisa aqui anunciada, um caminho que se desvele em desafios e possibilidades para
abarcar a imensidão discursiva dos elementos encontrados ou não no contexto daquele
evento, ressignificando-a dentro de uma cadeia maior de conceitos para os processos do
letramento em conexões fortemente ligadas ao discurso, ao evento e aos sentidos que
transitam pelos entornos do visual.
REFRÊNCIAS
GOMES, A. R. Ver e aprender: Proposições Pedagógicas sobre Educação e Cultura Visual. Salvador:
Eduneb, 2012.
KLEIMAN, A. B. Preciso “ensinar” o letramento? Não basta ensinar a ler e escrever? disponível in:
www.iel.unicamp.br/cefiel/alfaletras/biblioteca_professor/arquivos/5710.pdf
MORIN, E. Os sete saberes necessários à educação do futuro. São Paulo: Cortez, 2001.
STREET, B. Perspectivas interculturais sobre o letramento, filol. linguist. Port, nº8, p. 451-464, 2006.
Disponível in http://www.revistas.usp.br/flp/article/download/59767/62876
SOARES, M. Letramento: um tema em três gêneros. 4 ed. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2010.
237
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
LETRAMENTO EM LÍNGUA INGLESA COMO PROPOSTA DE FORMAÇÃO
CONTINUADA PARA PROFESSORES DA REDE PÚBLICA
ABSTRACT: The Literacy in English language is an important tool for the formation of
critical individuals, able to communicate and interact with others in different social contexts,
enabling their inclusion in the world and cultural diversity through language. Given this
reality the teacher needs to be aware of the demands of teaching and learning so that,
through their professional progress they can actuate efficiently. From this perspective, the
pedagogical approach in which continuing education is based aims through literacy in
English Language, expansion of skills: linguistic-communicative, applied (theoretical) and
practical. Thus, our work aimed to provide teacher of English Public schools the
improvement of their practices, through the intensive study of the skills such as reading,
writing, speaking and listening. Therefore, in the project took part forty-five teachers from
the state and municipal public schools, aged from twenty-five to sixty-five years. Then, we
achieved as a result the development of language skills of the involved subjects, which reflects
on the teaching and learning English as public schools, as well as a reflection on the practices
and management of teachers in the classroom. In this sense, the project could contribute to a
new perspective on the continuing education of teachers as an important resource.
1 Introdução
94 Graduada do curso de Licenciatura em Letras - Língua Inglesa e suas Literaturas da Universidade de Pernambuco – UPE/
Campus Petrolina.
95 Professora auxiliar do curso de Licenciatura em Letras – Língua Inglesa e suas Literaturas da Universidade de Pernambuco
No ponto de vista de Walesko e Procailo (2011), antes de falarmos sobre formação continuada
de professores e seus reflexos no ensino de Língua Inglesa nas escolas públicas, é importante
conhecer os conceitos dados a este termo. De acordo com o dicionário Houaiss de Língua
Portuguesa (2008, p. 356), podemos definir a palavra formação como sendo: 1. criação,
constituição; 2. posicionamento, ordenamento; 3. conjunto de cursos concluídos e graus
obtidos por uma pessoa; 4. maneira como uma pessoa é criada, educação. Relacionado o
último conceito ao contexto educacional, podemos afirmar que, para exercer a função de um
professor, é preciso que o indivíduo forme-se ou tenha sido formado por outros, isso significa
que este, tenha se desenvolvido suas competências em um processo longo, a partir do
ingresso em um curso universitário e da permanência durante toda sua carreira profissional.
Acerca da formação profissional, Almeida Filho (1997) apud Walesko e Procailo (2011, p.207)
assegura que:
É a competência profissional do professor credenciado pela universidade que terá de
se fortalecer a partir de então no reconhecimento do valor de ser professor, das
necessidades de movimento constante, de aperfeiçoamento em cursos, congressos,
projetos, seminários, viagens de participação em eventos organizados por associações
de docentes e pesquisadores.
Almeida Filho (1997) apud Walesko e Procailo (2011, p.2008) diz que, a formação continuada
ou permanente: refere-se ao engajamento do professor em serviço pela busca do
aperfeiçoamento profissional, seja em curso de formação de professores presenciais ou à
distância ou de forma independente, a partir da reflexão sobre o próprio trabalho.
Ainda, nas palavras de Walesko e Procailo (2011), grande parte dos cursos de graduação em
licenciaturas em Letras no Brasil não consegue atingir plenamente os objetivos necessários
para uma formação profissional sólida, ou seja, o domínio dos aspectos linguísticos, tanto na
habilidade oral quanto na escrita, o que representa a falta de uma base pedagógica e de
conhecimentos em Linguística Aplicada consistentes. A boa formação desse profissional é,
muitas vezes, resultado do empenho individual, uma vez que os cursos de licenciatura
ensinam sobre a língua sem propor aprofundamento na área específica de aprendizagem de
Língua estrangeira.
239
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Lima (2011) também assegura que, o descaso com que o ensino de língua estrangeira sempre
foi tratado nas escolas brasileiras, apesar de leis, resoluções e diretrizes publicadas no intuito
de reverter esse contexto, tornou-se um tema constante no campo da Linguística Aplicada.
Nas palavras de Paiva (1997) apud Walesko e Procailo (2011, p. 201),a deficiência na
formação inicial do docente de línguas gera a necessidade de criação de ambientes de
Formação Continuada, uma vez que, diante do grande número de professores que concluíram
o curso de licenciatura há muitos anos, precisam reavaliar a validade das metodologias de
ensino adotadas, assim como desenvolver suas habilidades cognitivas, o aprimoramento
profissional e a motivação para continuar o caminho que escolheram seguir.
Compreendemos que, a falta de um bom nível de conhecimentos na língua constitui um
obstáculo no desempenho pedagógico do professor e, tal dificuldade apresenta-se nas crenças
do mesmo, quando escutamos frases como a seguinte “como posso ensinar aquilo que não
domino?”. Perguntas como essa nos conduzem à reflexão quanto ao que se tem feito para
modificar a realidade da formação inicial do professor e os seus reflexos no processo de
ensino de Língua Inglesa nas escolas públicas, nas quais, muitos professores, não apresentam
aos alunos o uso da língua como prática social, mas, como um componente curricular
obrigatório desconexo de uma utilização significativa na vida dos estudantes. Entendemos
que, o professor, em sua posição de mediador deve conscientizar-se e conscientizar seus
alunos do ponto de vista de um falante da língua e detentor de um instrumento de conexão,
de intercâmbio de culturas, de conhecimento e ideologias.
Nesse sentido, limitar a concepção de ensino de Língua Inglesa à ideia de disciplina
obrigatória, tendo como pressupostos teóricos métodos que não atinjam as demandas dos
aprendizes, significa impedi-los de ingressar no mundo contemporâneo e em suas inúmeras
oportunidades.
Ademais, acerca dessa problemática, Leffa (2011) apud Almeida Filho (advoga que, “é óbvio
que não basta saber a língua estrangeira para ser bom professor, mas nem mesmo a língua
muitos deles sabem, principalmente fora dos grandes centros”. Assim sendo, diante do
despreparo do professor que ensina ao aluno algo que ele mesmo não conhece, há uma
questão histórica e complexa. Em virtude disso, se faz necessária a aplicação de ações que
contribuam para o aperfeiçoamento pedagógico do professor de Língua Inglesa. Em resposta
a esses “velhos desafios”, muitas universidades do país têm pesquisado e proposto projetos
de intervenção.
Dentre as várias concepções dadas ao termo letramento, destacamos aquela que o define
comosendo o uso efetivo das práticas de leitura e escrita e suas implicações no meio social.
Sendo assim, do ponto de vista de Soares (2004) os sujeitos que dominam as práticas de
leitura e escrita estão aptos a integrar e atuar nas diferentes atividades sociais, podendo,
então, estabelecer, por meio da interação com o outro, da produção discursiva e de
conhecimento a condição ou estado de indivíduo participante de uma sociedade letrada.
Dessa forma, o letramento torna-se um meio de relacionar as formas de linguagem escritas,
como fio condutor à reflexão crítica, usando a língua como prática social e ferramenta de
interação com o outro, estabelecendo e (re) negociando os sentidos e visões de mundo através
da leitura e escrita. Logo, o letramento em Língua Inglesa permite ao aprendiz realizar
inferências, novos olhares e interpretações irrestritas dos discursos produzidos nas relações
sociais.
Com base na leitura das recomendações dos Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua
Estrangeira (PCN, 1997) percebemos que, as habilidades de leitura e escrita são privilegiadas
no processo de ensino-aprendizagem de Língua Inglesa, haja vista que, tais habilidades são
consideradas mais acessíveis aos estudantes em relação às práticas da oralidade e fala. É
partindo dessa premissa que o ensino da língua norteado pelo letramento, propõe a
expansão, desenvolvimento da competência crítica, aquisição de conhecimentos linguísticos,
bem como o enriquecimento de cultural nas diversas formas em que a linguagem escrita se
apresenta ao aprendiz. Ademais, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB n°
9394/96, no artigo 205 diz que, a educação “será promovida e incentivada, com a
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o
exercício da cidadania”, reafirmando assim, a importância da abordagem do letramento no
ensino-aprendizagem de Língua Inglesa como recurso relevante para a constituição de
cidadãos crítico-reflexivo.
4 METODOLOGIA
CONSIDERAÇÕES FINAIS
ALMEIDA FILHO, J.C.P de. O professor de inglês em formação. (org). 3ed, Campinas, SP: Pontes, 2009.
241
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
BRASIL, Ministério da Educação. Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio. Secretaria de
Educação Média e Tecnológica. Brasília, 1997.
_______________________________________. Ministério da Educação. Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional – LDB.Lei n° 9394/96. Brasília, 1996.
FORMAÇÃO. In: HOUAISS, A.; VILLAR, M.S. Minidicionário Houaiss da língua portuguesa – 3ª Ed.
Ver. E aum., Rio de Janeiro: Objetiva, 2008.
JORDÃO, Clarissa Menezes; MARTINEZ, Juliana Zeggio; HALU, Regina Célia. (orgs). Formação
“Desformatada” Práticas com professores de Língua Inglesa. Campinas: Pontes, 2011.
LIMA, D.C de. Inglês em escolas públicas não funciona?. Campinas, SP: Pontes, 2011.
WALESKO, A; PROCAILO, L. Espaços para a formação continuada de professores de língua inglesa. In:
Formação “Desformatada” Práticas com professores de Língua Inglesa. Campinas: Pontes, 2011.
SOARES, M. Alfabetização e letramentos: caminhos e descaminhos. Revista Pátio, n. 29. fev/abr 2004.
Disponível em: <http: http://www.acervodigital.unesp.br/bitstream/123456789/40142/1/01d16t07.pdf. Acesso
em abril de 2014.
242
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
JOVENS E ADULTOS LENDO, ESCREVENDO E APRENDENDO INGLÊS POR
MEIO DE GÊNEROS TEXTUAIS
Kelliane Coêlho de Carvalho 96
Maria Aparecida Amador Cavalcante 97
Relma Lúcia Passos de Castro Mudo 98
96Graduanda do curso de Licenciatura em Letras - Língua Inglesa e suas Literaturas da Universidade de Pernambuco – UPE /
Campus Petrolina. [email protected]
97Graduada do curso de Licenciatura em Letras - Língua Inglesa e suas Literaturas da Universidade de Pernambuco – UPE /
Campus Petrolina. [email protected]
98Professora Assistente do curso de Licenciatura em Letras – Língua Inglesa e suas Literaturas da Universidade de
Pernambuco – UPE / Campus Petrolina. [email protected]
243
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
INTRODUÇÃO
Conforme dito acima, o presente artigo foi realizado a partir de experiência de um projeto de
extensão em uma escola estadual da cidade de Petrolina - PE, na modalidade de ensino de
Educação de Jovens e Adultos (EJA), durante os meses de maio e novembro de 2013. O
mesmo teve como objetivo oportunizar, para o aluno da EJA, o desenvolvimento de
competências de leitura, habilidades de compreensão textual em Língua Inglesa a partir do
uso de métodos e abordagens de ensino bem como dos gêneros textuais.
Vale destacar que, a opção por essa escola deu-se pelo fato de uma das participantes desse
estudo já ter realizado estágios anteriormente na instituição e, assim, possuir conhecimento
a respeito da dinâmica escolar e aproximação com os profissionais atuantes na mesma.
Consideramos, também, importante ressaltar que a comunidade atendida pela escola é, em
sua maioria, composta de famílias com formações diferenciadas, pessoas carentes e de renda
baixa. Ressaltamos ainda que, as participantes desse projeto foram bem acolhidas pela gestão
escolar e pelo professor regente da disciplina.
Antes de aplicar o projeto, as participantes passaram por meio um período de observação de
aulas, onde ficou perceptível que o ensino da Língua Inglesa ainda estava distante da sua
função comunicativa, realidade esta que vem sendo amplamente discutida na literatura
científica e nos documentos do Ministério da Educação (MEC). Partindo dessa premissa,
serão discorridos, ao longo do nosso artigo, uma breve análise teórica sobre a EJA e o ensino
da Língua Inglesa, os gêneros textuais no contexto escolar, os procedimentos didáticos
utilizados para a aplicação do projeto, bem como os resultados obtidos.
Com base nas informações adquiridas, a análise dos dados foi feita de forma qualitativa e
descritiva tendo como referência os objetivos deste estudo, visto que a mesma recai sobre a
compreensão de dados reais, levando em conta não só o contexto social no qual estão
inseridos, mas as subjetividades e as opiniões dos sujeitos envolvidos.
Assim sendo, esperamos que esse estudo possa contribuir com as pesquisas voltadas para o
ensino de Língua Inglesa, assim como, possa lançar um novo olhar sobre a valorização dos
sujeitos enquanto aprendizes de Língua Inglesa na modalidade de ensino EJA, levando em
consideração os saberes construídos em suas trajetórias de vida, uma vez que a educação
escolar atua historicamente na vida do indivíduo, constituindo-se não só como necessária
para sua sobrevivência, mas também como base de informação e cultura para enfrentar o
mercado de trabalho e, principalmente, como formadora de agente criador e transformador
da sociedade.
244
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Para que o processo de construção de significados de natureza sociointeracional seja
possível, as pessoas utilizam três tipos de conhecimento: conhecimento sistêmico,
conhecimento de mundo e conhecimento da organização dos textos. Esses
conhecimentos compõem a competência comunicativa do aluno e o preparam para o
engajamento discursivo (BRASIL, 1998, p.29-30).
246
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Portanto, envolver esses alunos em aulas voltadas para o uso e a função comunicativa da
Língua Inglesa de forma crítica e reflexiva pode tornar o processo de ensino-aprendizado
mais significativo.
O presente estudo teve como sujeitos 48 alunos distribuídos em duas turmas da EJA, com
faixa etária entre 20 a 69 anos, sendo a maioria destes casados e do sexo feminino. Assim que
foi apresentado o projeto de extensão à escola, os professores de língua inglesa nos
informaram a respeito das dificuldades que os alunos da EJA tinham com a disciplina. Isso
foi bastante válido, pois direcionou na adaptação das aulas à realidade dos alunos, com a
inserção de aspectos gramaticais nas atividades envolvendo textos.
Seguindo as orientações de Donnini (2010), o planejamento das aulas/atividades foram
utilizadas sequências didáticas inseridas em ciclos de tarefas. Com isso, o projeto de extensão
buscou desenvolver conhecimentos, competências e habilidades por meio de atividades
práticas, debates, leitura e compreensão de textos, bem como de aulas expositivas dialogadas.
As ações realizadas encontram-se descritas abaixo:
1. Seleção e organização de materiais que envolvessem gêneros textuais diversificados;
englobando textos autênticos e textos pedagógicos, onde foram abordados o reconhecimento
da tipologia textual e as suas principais características.
2. Planejamento das aulas envolvendo atividades sequenciadas em torno de um ciclo de
tarefas organizado em três fases: pré-leitura, leitura e pós-leitura. Na fase de pré-leitura
foram mobilizados os conhecimentos prévios dos alunos a cerca do tema que foi abordado e
da tipologia textual, por meio de atividades que contemplassem a estratégia de antecipação
(predicting/anticipating), tais como: identificação do formato (layout), dos recursos
tipográficos (título, subtítulo, o uso do negrito/itálico, imagens), tempestade de ideias
(brainstorming) e sequência de imagens (Picture Books). Na fase de leitura foram utilizadas
as estratégias de leitura (skimming, scanning, detailed reading, palavras cognatas, palavras-
chave e informação não-verbal). Já na fase de pós-leitura foram desenvolvidas as habilidades
de pensamento crítico e de compreensão de texto, utilizando de atividades que levaram o
aluno a fazer inferências, a posicionar-se criticamente individual e coletivamente, bem como
rever as suas opiniões, propiciando, assim, os alunos a serem leitores ativos e construtores de
seus conhecimentos, o que poderá levá-los a um bom desempenho nas provas de vestibular e
ENEM.
3. As aulas foram ministradas com duração de uma hora e vinte minutos, previamente
planejadas e adaptadas à realidade dos alunos, com temas previamente conhecidos e de
interesse deles. Devido os alunos da modalidade EJA, na sua maioria, trabalharem durante a
semana e aos sábados, foi acordado com a gestão escolar juntamente com o professor regente
a possibilidade das aulas acontecerem no turno normal de aula, duas vezes por mês em cada
turma. Felizmente os assuntos organizados pelo presente projeto – gêneros textuais e
estratégias de leitura – também se encontravam no conteúdo programático que o professor
de Língua Inglesa precisava cumprir durante o ano letivo.
4. Foram aplicados questionários de avaliação e de auto avaliação com os alunos a fim de
saber a satisfação destes com os métodos e abordagens utilizados em sala de aula e com o
envolvimento da turma.
Gráfico 1 – Satisfação dos alunos da EJA de uma escola estadual da cidade de Petrolina/PE.
5% 0%
Completamente Satisfeito
Insatisfeito
248
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Gráfico 2 – Auto avaliação dos alunos da EJA de uma escola estadual da cidade
dePetrolina/PE.
35
30
25
20 SIM
15 RAZOAVELMENTE
10
NÃO
5
0
Aquisição do Compromisso e Integração com os
conteúdo participação demais alunos
Fonte: Questionário aplicado aos alunos (12 e 14/11/2013).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e Filosofia da Linguagem. 12 ed., São Paulo: Hucitec, 2006.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental.Secretaria de Educação Fundamental.
Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: língua estrangeira.
Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998.
CALIXTO, Benedito José. Leitura: Compreensão e Interpretação. Revista Expectativa, América do Sul. Volume 3.
Agosto de 2007.
COLFERAI, Luzia. Gênero Textual: relevância e aplicação no ensino de língua estrangeira. XV EPLE - Encontro
de Professores de Línguas Estrangeiras do Paraná Línguas: culturas, diversidade, integração. 2009.
DONINI, Lívia et al. Ensino de Língua Inglesa. São Paulo: Cengage Learning, 2010.
GOVEA PIÑA, Lidia. La lectura en la producción de textos argumentativos en inglés como lengua
extranjera.Revista Revicyhluz/omnia año 15, No. 3 (2009) p.117-129. Disponível em:
http://revistas.luz.edu.ve/index.php/omnia/article/viewFile/8728/8701. Acesso em 10 de abril 2014.
KLEIMAN, Ângela B. Preciso “ensinar” o letramento? Não basta ensinar a ler e a escrever? Brasília: Unicamp.
2005.
LIMA, Luciano Rodrigues. Texto e discurso no ensino de inglês como língua estrangeira. In: Diógenes Cândido
de Lima (org). Ensino e aprendizagem de língua inglesa: conversas com especialistas. São Paulo: Parábola
Editorial, 2009.
MARCUSCHI, L.A. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In: DIONISIO,A.P. ; MACHADO, A.R.;
BEZERRA, M.A. (org.) Gêneros textuais e ensino. São Paulo: Parábola Editora, 2010.
PAIVA, V.L.M.O. O lugar da leitura na aula de língua estrangeira Vertentes. n. 16 – julho/dezembro 2000. p.24-
29. Disponível em: http://www.veramenezes.com/leitura.htm . Acesso em 3 de abril de 2014.
250
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
GRUPO DE ESTUDO EM POLÍTICAS DE LETRAMENTO – GPOL E AS PRÁTICAS
DE INVENÇÃO DOCENTE.
RESUMO: Este trabalho trata um grupo de estudo que inclui discussões sobre leitura de
professoras de Língua Portuguesa que trabalham na Educação Básica de Escolas Públicas do
Vale do São Francisco e, que participam de uma pesquisa de mestrado em andamento. O
GPOL discute questões voltadas para as politicas de letramento, com contornos particulares
na reflexão da formação e as práticas de leitura de professores e professoras que desenvolvem
seus trabalhos nas Escolas Públicas Estaduais e Municipais. Docentes que se preocupam com
a própria formação. A fundamentação teórica partiu da concepção de invenção e apropriação
cunhada por (CERTEAU, 2012); também de (FREIRE, 1996) na perspectiva da autonomia
docente; (STREET, 2010) com os novos estudos do letramento E (KLEIMAN, 1995/2001)
com as práticas sociais de leitura e o letramento docente e (SANTOS, 2013) que contribui
para dar uma noção de pesquisa em formação. O objetivo desse trabalho é socializar uma
experiência de um grupo de estudo (GPOL) pelo prisma da pesquisa-formação. O enfoque
ancora-se em discussões voltadas para as práticas de invenção docente que possibilitam a
fomentação nas práticas de leitura desenvolvida nas salas de aulas. Nesse sentido, o grupo
possibilita uma aproximação dos espaços acadêmicos com as práticas desenvolvidas na
Educação Básica, em especial sobre as práticas de leitura.
ABSTRACT: This work deals with a study group that includes discussions about reading of
Portuguese language teachers who work in basic education public schools do Vale do São
Francisco, and participating in a Masters research in progress. The GPOL discusses issues
facing literacy policies, with particular contours on reflection training and reading practices
of teachers and teachers who develop their work in the State and municipal public schools.
Teachers who care about the training itself. The theoretical foundation of conception of
invention and appropriation coined by (CERTEAU, 2012); also (FREIRE, 1996) in the
perspective of teaching autonomy; (STREET, 2010) with the new literacy studies and
(KLEIMAN, 1995/2001) with the social practices of reading and teaching literacy and
(SAINTS, 2013) which contributes to give a notion of training research. The objective of this
work is to socialize an experiment of a study group (GPOL) through the prism of research
training. The focus ancora in discussions aimed at teaching invention practices which allow
the fomentation reading practices developed in the classrooms. Accordingly, the group allows
an approximation of the academic spaces with the practices developed in basic education, in
particular on the practices of reading.
INTRODUÇÃO
Este estudo reflete sobre práticas de invenção docente voltada para o trabalho com leitura em
sala de aula da Escola Pública, especial da inserção uma das professoras de Língua
Portuguesa do Grupo de pesquisa e estudo voltado para Politicas de Letramento – GPOL.
Neste artigo trataremos de discussões como: praticas de leitura; formação docente; Práticas
de invenção e GPOL – Grupo de Estudo sobre Políticas de Letramento.
Nessa perspectiva oferece uma reflexão sobre o processo de invenção e diálogos como apoio
formativo para as docentes através do GPOL, pois acredita-se não ser suficiente apenas
99O artigo foi produzido a partir de parte de dados da fase final da dissertação Mestrado em Crítica Cultural pela UNEB
Campus II – Alagoinhas- BA. [email protected]
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investigar sobre o que pensam as professoras participantes, é preciso saber suas práticas e
suas apropriações.
Para direcionar este estudo serão abordados conceitos tratados na pesquisa de mestrado 100
que investiga as práticas de invenção docente que durante o processo de pesquisa resultou
em um grupo de estudo voltado para Políticas de Letramento – GPOL, por sua vez,
proporcionou a inserção de professoras de Língua Portuguesa no debate voltado aos teóricos
que compõem a discussão da referida pesquisa, inclusive que as mesmas são participantes.
Para tanto, nos valemos de Certeau (2012) na perspectiva de invenção e apropriação; Street
(2010) e Kleiman (1995/2001) com as práticas sociais de leitura com as práticas sociais de
leitura e o letramento docente e (SANTOS, 2013) que contribui para dar uma noção de
pesquisa em formação.
O texto é organizado em tópicos seguindo a seguinte ordem: Uma espiada em questões sobre
formação e práticas docentes, situando o leitor sobre uma breve reflexão da formação
docente; as práticas de invenção docente, para tanto, será escolhida apenas uma das
participantes da investigação, Sayonara101 e as práticas de Leitura e a subjetividade
desenvolvidas com estudantes da Modalidade de Ensino Fundamental. A inserção da
participante da pesquisa ao Grupo de Estudo de Políticas de Letramento - GPOL levou a
apontar uma noção de método, a pesquisa-formação, por fim, os possíveis impactos do GPOL
e as considerações sobre este estudo.
Mesmo com o impulso democrático e demográfico, mesmo com a gratuidade e/ou sistema de
cotas em algumas universidades, ainda há uma ideia de uma cultura sem a devida
consideração à diversidade trazida por essa nova situação. NOVÓA (2007) nos lembra de que
“muitas vezes os discursos sobre a profissionalização dos professores são uma estratégia dos
especialistas e investigadores em educação para melhorar o seu estatuto e o seu prestígio no
seio da universidade.”
Considerando as discussões de Nóvoa e André, percebe-se que a formação é uma invenção
recente no meio educacional e nas discussões sobre a profissão docente, seja nos discursos de
teóricos renomados, seja nas discussões nos interiores das Unidades Escolares. Mas sempre
foi assim? O que mudou? Vale lembrar que falar de formação é inevitavelmente falar sobre
professores e não apenas pronunciar ou escrever uma palavra, mas sim um signo que nos
remete a vários significados que vão da influência às práxis docentes (teorias e práticas) até
as políticas públicas presentes no cenário educacional.
Parafraseando as palavras de Nóvoa, a formação docente deve funcionar como um aspecto
primordial nesse enorme desafio de legitimar as práticas de professores nos diversos espaços
que a escola dispõe, em especial de profissionais que criam situações diversas para
desenvolver suas práticas, uma vez que estes fazem parte de um grupo de profissionais com
qualificações e potencia cultural que não podem ser relegados ao anonimato das discussões
acadêmicas, pois, “Não podemos continuar a desprezar e a minorizar as capacidades de
desenvolvimento dos professores” (NÓVOA, 2006, 31)
Nóvoa nos leva a refletir sobre algumas questões em torno desse debate, uma vez que se fala
consideravelmente que o professor precisa ser reflexivo, entretanto pode ter chances
consideráveis de esse professor reflexivo já existir mesmo antes dos discursos acadêmicos
terem tornados recorrentes nos debates sobre formação docente e ação reflexiva. Ainda
segundo NÓVOA (2007), muitas vezes os discursos sobre a profissionalização dos professores
são uma estratégia dos especialistas e investigadores em educação para melhorar o seu
estatuto e o seu prestígio no seio da universidade.
100 A discussão deste artigo faz parte de dados inseridos na pesquisa de mestrado com título “Professoras Inventoras: um
estudo sobre as práticas inventivas nas Escolas Públicas do Vale do São Francisco que está em fase final de conclusão. Sob a
orientação do Prof. Dr. Cosme Batista dos Santos.
101 Adotamos o nome da professora, pois a pesquisa foi submetida ao comitê de ética da UNIVASF.
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Certeau, filosofo e historiador Frances, nos coloca que “a escola poderia ser um dos lugares
onde seja possível reaprender” (CERTEAU 1995, 129), uma vez que ela constitui um
laboratório adequado para desenvolver diversas experimentações, inclusive para trabalhar a
formação continuada do professor in Lócus, como apontam Kleiman (2001) iii e Santos e Orge
(2010) iv, a formação e o letramento do professor no e pelo local de trabalho.
Este processo de formação que considera os significados do letramento (KLEIMAN, 1995),
também possibilita o professor refletir inicialmente sua própria prática, isto é, o letramento
pessoal do professor, para em seguida refletir suas ações nas práticas docentes e
consequentemente as ações formativas direcionadas à sua profissão docente. A formação
continuada teve ter esse caráter, pois os estudos e reflexões em serviços devem partir do
interesse do educador que tem anseios singulares, uma vez que algumas políticas de
formação não dão conta das demandas exigidas no cotidiano escolar.
Nesse sentido, é preciso pensar em formatos de formações que possam considerar de fato a
realidade vivida pelos docentes em sala de aulas: suas identidades, inquietações, seus
conhecimentos e, por conseguinte suas invenções. Pois precisamos pensar uma escola
dialogada com os espaços interdependentes.
Nas Escolas Públicas de Petrolina-PE, tal como deve ocorrer em outras realidades da
Educação Básica, há prática docente envolvendo a leitura que vai além do currículo imposto
pela Rede de Ensino. Isso se configura a partir de táticas astuciosas de criação docente como,
por exemplo: Professoras que desenvolvem micropolíticas 102 para chamar atenção de seus
estudantes como a subjetividade poética e contação de histórias da professora Sayonara para
estimular a prática em sala de aula.
Mesmo presas a determinadas regras voltadas para resultados quantitativos, as professoras
da Educação Básica criam situações inusitadas para o desenvolvimento de prática de
invenção voltada para a leitura desapropriando e (re)apropriando os mais variados
ambientes, muitas vezes sem apoio até mesmo para ter acesso ao material didático que
possibilite desenvolver situações que contribuam com suas atividades para e na formação de
leitores e escritores críticos.
Vale lembrar que existem situações no cotidiano escolar que não consideram os diversos
contextos daqueles que poderiam ser os usuários de leitura da biblioteca. Com isso, Street
(1984) afirma que as práticas de letramento [...] são social e culturalmente determinadas, e,
como tal, os significados específicos que a escrita assume para um grupo social dependem
dos contextos e instituições em que ela foi adquirida.
Sabemos que a leitura é tão importante quanto à escrita, inclusive porque a escola uniu estes
dois eixos, apesar de muitas vezes deixar de lado o ouvir e o falar, enfim as tradições orais tão
importantes para o desenvolvimento do ato de ler. Neste sentido, Chartier coloca a leitura
como,
Prática de invenção de sentido, uma produção de sentido. A partir de tal fato, devemos
compreender que essa invenção não é aleatória , mas está sempre inscrita dentro de
coações, restrições e limitações compartilhadas; e por outro lado que, como invenção,
sempre desloca ou supera estas limitações que a restringem. É algo parecido com a
ideia de uma história das liberdades limitadas ou das restrições superadas, que seria o
coro de uma história da leitura. (CHARTIER, 2001, 43)
Esse aspecto nos faz refletir que a escola por muito tempo também compartilhou a leitura
com restrições onde os aprendizes tinham que peregrinar por este sistema sem muitos
questionamentos.
102Talvez essas práticas sejam vistas como micropolíticas pelo olhar do outro, pelo olhar de quem as subalternizam, pois no
interior da escola funcionam como práticas com possibilidades de grandes resultados.
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contações de histórias:Contar histórias, estórias, assuntos, causos, enredos, prosas,
entre outros rótulos dados para contar uma narrativa, faz com que a imaginação do
homem invente, e com seu jeito único, transforme assuntos singulares, dos afazeres
domésticos, das pescarias, das brincadeiras, em fantásticas. Contações de histórias que
não se sabe se emergem de um dom ou de influências arraigadas na família, essas
influenciam no espaço escolar. (SAYONARA)
Trazer para as discussões centrais, relatos de pessoas anônimas, é também trazer a tona
fazeres anônimos, que estão às margens, imbuídos à cultura do fazer comum do cotidiano das
pessoas que trabalham, andam, leem, consomem, enfim, das pessoas que fazem o dia a dia
acontecer. Estes fazeres é parte que realçam as práticas vividas por professoras que trazem
nas suas histórias de vida dados que são acontecimentos históricos relegados ao anonimato,
em detrimento aos grandes acontecimentos que movimentam as questões centrais. Assim, é o
fazer inventivo de professora como Sayonara 103 que faz de sua subjetividade poética astucia
para empoderar seus estudantes com as práticas de leitura.
A poesia e a contação de história da professora Sayonara foram pensadas para trabalhar com
turmas do 9º (nono) ano do Ensino Fundamental da Escola Eneida Paixão Coelho localizada
em outro bairro periférico da cidade de Petrolina-PE. A subjetividade presente em sala de
aula chama a atenção dos alunos do 9º (nono) ano. São as poesias que Sayonara produz para
introduzir um tema, conteúdo ou para a leitura deleite. Ela cria em suas aulas situações
subjetivas para envolver seus estudantes, inclusive boa parte dos seus depoimentos para este
estudo foram em versos.
Foi trabalhando significados diversos que encontramos a professora Sayonara com outras
práticas de leituras distintas da convencional, envolvendo seus aprendizes na subjetividade
poética e nas contações de história.
Esta professora evidencia sua subjetividade nas suas falas e nos seus fazeres, pois mesmo
com tantas dificuldades cria possibilidades de mudanças perceptíveis em prol de uma causa
que considera maior; o letramento dos seus estudantes. Implicando outras possibilidades de
construção do ser e do fazer.
Conta que seu gosto pela leitura adquiriu com a relação que sua mãe tinha com a leitura e das
histórias que seu pai contava e povoava seu imaginário de menina moleca. Nas várias
conversas 104 ela relata, “Minha mãe lia muito e meu pai contava histórias fantásticas para
mim, e para meus irmãos. Adoro ler, adoro contar histórias.”
Como uma andarilha anônima 105, Sayonara sai em busca do seu espaço, ressurge de suas
ruínas 106 historicamente construídas pelo outro. Inventando pelas margens de um sistema
fechado e excludente. Para tanto recorremos à contribuição de Nóvoa (2007,10) que interpela
dizendo, “é preciso dar passos concretos, apoiar iniciativas, construir redes, partilhar
experiências, avaliar o que se fez o que ficou por fazer. É preciso começar.”
103 Sayonara Nogueira é uma das professoras participantes do grupo de estudo em politicas de letramento (GPOL), bem
como da pesquisa de mestrado sobre as práticas de invenção docente com foque na práticas de leitura.
104 As informações obtidas foram através de questionários, rodas de conversas, entrevistas abertas e gravadas, além de
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Que esse começar seja iniciado pela valorização de oportunidades que as docentes criam em
favor de práticas de leitura em sala aula, pois acredita ser um fator determinante no
aprendizado do seu alunado.
A professora Sayionara diz que quando trabalhava com as séries iniciais, levava sempre uma
mala personalizada para suas aulas “para estimular a leitura, eu levava essas malas para
eles (alunos e alunas) escolherem os livros. Aquela mesma sequência de escolher livros...”
cada um levava um livro, ela diz que muitos livros não voltaram nesse processo de emprestar,
mas não se incomoda em ter perdido alguns, pois aqueles que devolviam sempre tinham
histórias para contar sobre as leituras lidas e, os que não voltavam, eram porque estavam
servindo para outras leituras.
Além do seu acervo particular, ela também cria poesias para trabalhar as práticas de leituras
com seus estudantes, a mesma conta história com uma peculiaridade dos poetas, e
contadoras de histórias. Às vezes, didatiza suas poesias para trabalhar outros aspectos da
língua, mas sempre com a preocupação de ler os livros que planeja para atividades com os
alunos. A maioria das suas poesias e histórias narradas é de cabeça, dificilmente Sayonra as
transpõem para o papel. Ela Envolve seus alunos nessa teia de contações poéticas de
histórias.
Práticas como essas possibilitam que seus estudantes se soltem de amarras da segregação e
da ignorância às vezes proporcionadas pela própria escola e possibilite uma prática de
reflexão como nos presenteia o mestre Paulo Freire (2011, 71), com seu pensamento em
defesa aos oprimidos, “Ninguém liberta ninguém, ninguém se liberta sozinho: os homens se
libertam em comunhão.” É nessa perspectiva que observamos o trabalho de Sayonara, à
medida que ensina, aprende e nessa troca ela também se liberta das arramas impostas por
uma escola que indicava o que ela não poderia ser 107!
Este tópico trata de uma abordagem sobre a participação das professoras no GPOL- Grupo de
Estudos em Políticas de Letramento, além de discutir questões voltadas para as politicas de
letramento, ganhou um contorno particular de refletir à formação e auto formação de
professores/as, que desenvolvem seus trabalhos nas Escolas Públicas Estaduais e Municipais.
Docentes que se preocupam com a própria formação, que querem seguir estudando
pesquisando e inventando.
Quando passamos a investigar a vida e as práticas docentes encontramos professoras
envolvidas com suas práticas, fazendo a diferença em sala de aula, porém encontramos uma
professora desmotivada que sentia desvalorizada, estudando para fazer concurso em outras
áreas e sair da educação, tudo pela falta de valorização e incentivo em continuar na
docência108.
Como uma das intenções da pesquisa era envolver as participantes em discussões a partir do
quadro teórico escolhido à pesquisa, intensificamos a constituição do GPOL – Grupo de
Estudo em Politicas de Letramentos como proposta de dá um retorno durante a pesquisa.
Um processo de formação que considere os significados do letramento (KLEIMAN, 1995),
possibilita o professor refletir inicialmente sua própria prática, para em seguida refletir suas
ações nas práticas docentes e consequentemente as ações formativas direcionadas à sua
profissão docente.
É preciso enfatizar a necessidade de criação de novos instrumentos que mudem de alguma
forma as práticas docentes e consequentemente possam adquirir novos conhecimentos em
conjunto com o discente. Reflexões como essas só são pertinentes pelo fato de as professoras
107 Uma professora disse para Sayonara que ela era “burra” e que não iria ter futuro. Esse episódio aconteceu quando fazia
5ª série do Ensino Fundamental.
108 Sayonara inventava em suas aulas práticas que chamavam a atenção dos seus aprendizes, segundo ela a desvalorização
Com a dimensão que o grupo ganhou como uma politica de formação durante a pesquisa
sentiu-se uma necessidade de uma aproximação entre as discussões acadêmicas da
universidade e da docência na Educação Básica. Apontamos assim, a pesquisa-formação
docente, ou simplesmente, pesquisa-formação. E assim pensou uma possível noção de
método.
Neste sentido, o processo formativo que se desenvolveu nesta pesquisa visou fortalecer as
práticas de docentes como Sayonara e empoderando suas reflexões sobre as suas práticas e,
se configurou através de estudos dos referenciais básicos, explorando temas ligados como a
“formação”, “invenção” e “letramento”. Estes encontros do grupo de estudo GPOL, podem
servir de fendas para constituir a ação que possibilite o empoderamento de micropolíticas
desenvolvidas pela professora inventora que é também, mulher, mãe, militante, dona de casa
e vários outros atributos femininos – muitos deles impostos por práticas historicamente
construídas.
Sayonara complementa, dizendo: “O momento do encontro neste grupo é um momento
deleite, pois essas discussões desses teóricos nos levam a reflexão sobre a teoria articulada
em nossas práticas, a gente tá atrás da facilidade que o grupo proporciona, mas quando a
gente volta para a escola não tem ninguém para discutir ou refletir” (SAYONARA, GPOL)
Nessa fala evidencia a solidão que as professoras vivem em suas escolas, talvez pela não
inserção de uma cultura que valorize também o ordinário e o singular agregado no coletivo
docente, pois muitas situações postas na escola não consideram os fazeres das professoras
que pensam suas práxis.
Assim definimos que a pesquisa-formação109 é uma pesquisa qualitativa que reflete as ações
direcionadas para a formação do professor, como parte do benefício social e cultural de uma
pesquisa na escola, que demanda ou que resulta em formação em serviço ou de uma
formação continuada ou universitária, que visa ou que resulta em um trabalho de pesquisa.
Vale lembrar que a nossa participação no grupo enquanto pesquisadora/orientador, não foi
para delimitar as questões apenas teóricas ou acadêmicas, mas para que haja uma
reciprocidade com as participantes, nos propusemos a colaborar, desempenhando um papel
ativo nas reflexões construídas nos encontros de estudos, inclusive na realidade das práticas
investigadas.
109Um método pensado durante o processo de investigação e análise dos dados da pesquisa de mestrado, uma parceria
entre a pesquisadora e autora da pesquisa dissertação de mestrado Nazarete Mariano e o orientador Prof. Dr. Cosme dos
Santos.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
3.2 POSSÍVEIS IMPACTOS NO GPOL.
O grupo além de refletir sobre discussões teóricas relacionando com a prática desenvolvida
por professora na Educação Básica. Mas, o impacto maior foi exatamente em relação às
perspectivas de Sayonara que ao iniciar nossa investigação queria mudar definitivamente de
profissão e com o envolvimento dessa professora em nossos estudos e encontros com outras
pessoas que discutem práticas de invenção e de formação para trabalhar as práxis sociais de
leitura suas expectativas foram modificadas.
Por esse prisma, durante a pesquisa o GPOL já gerava resultados, pois a professora Sayonara
que estava disposta a sair da educação, se envolve com as discussões teóricas, passa a
trabalhar em formações e mais, não só passou em seleção de mestrado acadêmico e público
como ficou em segundo lugar na seleção do projeto, cuja temática é exatamente sobre
contações de histórias.
Acredita-se que o GPOL criou outras condições para o desenvolvimento de (auto) formação,
para que professora como Sayonara, mesmo no anonimato, estude, discuta, reflita e crie
possibilidades de um novo olhar à profissão, mapeando as necessidades vitais nas suas
práticas de invenção docentes.
Portanto, que as políticas de formações quebrem as barreiras e vão ao encontro dos
professores dentro das escolas para concretizar sua presença na vida profissional dos
professores da Educação Básica, assegurando as diversidades presentes no ensino e, que
estejam de fato fazendo parte dessas discussões que o professor precisa se apropriar,
considerando o lugar de fala dos professores e das professoras nos contextos em que são
inseridos/as.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
KLEIMAN,B. Angela. Modelos de Letramento e as Práticas de Alfabetização na Escola. In: KLEIMAN, A. B. (org.).
Os significados do letramento: uma nova perspectiva sobre a prática social da escrita. Campinas,
SP: Mercado Aberto, 1995.
____________________ Formação do professor: retrospectiva na pesquisa. In.A formação do
professor: perspectiva da linguística aplicada. Org. Ângela B. Kleiman. – Campinas-SP: Mercado das Letras, 2001.
NÓVOA, António. O passado e o presente dos professores. In Profissão Professor. Org. António Nóvoa.
Porto – Portugal: porto editora, 2008.
___________________ O regresso dos professores. Livro da conferência desenvolvimento profissional
de professores para a qualidade e para a equidade da aprendizagem ao longo da vida. Lisboa: Ministério da
Educação, 2008.
SANTOS, Cosme B. e ORGE, Lívia. Letramento do alfabetizador no local de trabalho: o efeito da Revista
Nova Escola. In. Claudia Vóvio, Luanda Sito e Paula de Grande (Orgs.). Campinas (SP): Mercado de Letras, 2010.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
GÊNERO E MOVIMENTO SOCIAL: LEITURAS E VIVÊNCIAS NO SERTÃO
DA BAHIA
RESUMO: O mundo contemporâneo será profundamente marcado pela velocidade com que
os fatos ocorrem. No atual modelo de sociedade nada está posto como pronto, somos seres
em processo, sendo assim, poderíamos dizer que as relações com o meio social são
construídas e estabelecidas de acordo as necessidades/interesses políticos, sociais, culturais,
econômicos e geográficos, concepções que podem ser ampliada ou reduzidas a partir das
leituras que tecemos no mundo e com o mundo. Intensifica-se o debate e a reflexão em torno
de questões tidas e consideradas tabus pela sociedade, como: sexualidade, orientação sexual,
preconceito racial e étnico, além da garantia de direitos de categorias como mulheres,
crianças e adolescentes, e idosos/as. Gênero é outra categoria, que nas últimas décadas saiu
do anonimato, e passou a ser pensada e discutida. Vale salientar a importante contribuição
dos movimentos sociais, inicialmente o movimento feminista e posterior outros movimentos
em defesa dos direitos humanos, das organizações não governamentais, das Pastorais Sociais,
dentre outros setores que se debruçaram sobre essa temática. A metodologia utilizada nessa
pesquisa foi a etnográfica com método qualitativo. A pesquisa foi desenvolvida no Projeto de
Assentamento Nova Canaã – Pindobaçu – Bahia. A partir das analises dos dados constata-se
que há por parte dos assentados e assentadas uma legitimação sobre a importância da
discussão da temática, relações sociais de gênero, contudo, no cotidiano a vivência dessas
relações acontecem na sua maioria de acordo o modelo patriarcal.
Palavras-Chaves: Relações Gênero. Movimentos Sociais. Formação. Semiárido
ABSTRACT: The contemporary world is deeply marked by the speed inwhich events occur.
In the current model of society nothing is posited as something ready, we are beings in
progress, so we could say that the relationship with the social environment are constructed
and established in accordance with the political, social, cultural, economic and geographic
needs/interests, conceptions that can be enlarged or reduced from the readings we weave in
the world and with the world. The debate and reflection are intensified around issues taken
and considered taboo by society, such as sexuality, sexual orientation, racial and ethnic
prejudice, as well as ensuring rights of categories such as women, children and teenagers, and
the elderly. Gender is another category, which in recent decades has left anonymity, and
came to be considered and discussed. It is worth emphasizing the important contribution of
social movements, initially the feminist movement and further other movements in defense
of human rights, non-governmental organizations, the Social Pastoral, among other sectors
that have studied this issue. The methodology used in this research was the ethnographic one
with qualitative method. The research was conducted at Projeto de Assentamento Nova
Canaã – Pindobaçu – Bahia. Based on the analyzes of the data it appears that there is, on the
part of the settlers, a legitimation about the importance of the discussion of the theme, social
relations of gender, however, in daily life, the experiencing of these relationships happens
mostly according to patriarchal model .
Key – words: Gender Relations. Social Movements. Training. Semiarid
Um olhar mais atento é o suficiente para constatarmos que os relatos, literaturas e imagens
relacionadas ao Semiárido Brasileiro, desde o período colônia, até os dias atuais, em sua
maioria, dão ênfase a paisagens naturais desoladoras, tais como açudes secos e solo rachado,
110 Mestrando em Educação, Cultura e Territórios Semiáridos – PPGESA, Universidade do Estado da Bahia, Juazeiro –
Campus III. Email: [email protected]
111 Mestrando em Ensino, Filosofia e História das Ciências – PPEnFHC – UFBA/UEFS. E-mail: [email protected]
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
ou, ainda, as situações de miséria da população sertaneja nos períodos de seca. O perfil do
homem e da mulher nordestina também aparece intimamente ligado a essa imagem, sendo
retratado quase sempre pela sua condição de miserabilidade. Podemos encontrar nas mais
diferentes manifestações artísticas e literárias a figura da mulher rodeada de crianças,
geralmente com expressão que nos remetem à imagem da fome e da seca, enquanto seus
companheiros engrossavam a fileira dos retirantes. E por essa ótica o Semiárido foi
produzido, reproduzido e perpetuado durante intensas décadas. Nossos olhos foram
acostumados apenas a essas imagens tão bem representadas nos jornais, na música, na
poesia, na literatura e principalmente por meio do livro didático difundido de norte a sul do
país.
Nesse processo era desconsiderado o povo, a cultura, a arte, a religiosidade e a identidade do
ser homem e do ser mulher no Sertão, prevalecendo a figura patriarcal do coronel, contudo,
novos olhares em torno dessa realidade começam a surgir a partir da primeira metade do
século XX, quando pesquisadores/as das mais diferentes áreas do conhecimento, com
predominância das ciências humanas, fazem uma releitura, agora com mais criticidade sobre
a complexidade que permeiam as relações estruturantes presentes no Semiárido. Nesse
período o Brasil atravessava o momento pós-ditadura, onde as lutas sociais, tanto urbanas
quanto rurais, ocorrem num contexto de grandes transformações. A desigualdade econômica,
social, étnica e política de gênero é uma das preocupações com a qual nos deparamos nesse
contexto histórico.
A década 1980 se configura como o estopim para a discussão e consolidação de grupos sociais
organizados e articulados em defesa das mais diferentes causas, dentre elas uma parcela
significativa da população que foi excluída de todo processo politico, cultural e econômico.
Para exemplificar o que estamos dizendo podemos citar o Movimento Muda Nordeste, que
desponta denunciando a situação de miséria em que o Nordeste estava submetido (FAVERO,
2002) e o Movimento Feminista com a reflexão em torno das questões de gênero. Vale
ressaltar que a pesquisa em torno das questões de gênero não nasce necessariamente nesse
período, mas é nesse momento que se dá o grande passo.
Podemos perceber a organização das mulheres também no Semiárido Brasileiro. Conforme
Carvalho (2011) houve contribuição do movimento de mulheres na configuração desse novo
momento. Dessa maneira, entendemos que não há como pensar em novas formas de
convivência com o Semiárido sem considerar as questões pertinentes às relações de gênero e
a importância dessa temática na configuração desse novo momento.
O mundo contemporâneo será profundamente marcado pela velocidade com que os fatos
ocorrem. Acontecimentos que demoravam dias para serem noticiados, com o advento da
tecnologia viram notícias em fração de segundos. A tecnologia nas suas mais variadas formas,
cores, cheiros e odores adentram nossas casas nos deixando reféns de recursos tecnológicos
que há bem pouco tempo eram inconcebíveis. No atual modelo de sociedade nada está posto
como pronto e acabado, somos seres em processo, sendo assim, poderíamos dizer que as
relações com o meio social são construídas e estabelecidas a partir das
necessidades/interesses políticos, sociais, culturais, econômicos e geográficos.
Um ligeiro olhar sobre a realidade brasileira nos permite identificar a velocidade com que as
mudanças vêm ocorrendo nos últimos tempos. Podemos identificar a intensificação do
debate e da reflexão em torno de questões tidas e consideradas tabus pela sociedade, como:
sexualidade, orientação sexual, preconceito racial e étnico, além da garantia de direitos de
categorias como mulheres, crianças e adolescentes, e idosos/as. Gênero é outra categoria, que
nas últimas décadas saiu do anonimato, e passou a ser pensada e discutida. Nos últimos anos
já podemos constatar um novo cenário no que se refere às relações sociais de gênero no
mundo e consequentemente no Brasil. A eleição de Dilma Rousseff, a primeira mulher eleita
para o cargo político mais importante da nação serve bem para ilustrar o que estamos
dizendo.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
As abordagens de gênero proporcionam uma nova perspectiva que nos permite vislumbrar
novos significados e almejar novos horizontes ao tempo em nos ajuda a compreender de que
maneira a contínua construção das relações sociais tem sido fértil em criar estratégias que
permitam transformá-las em experiências equitativas entre homens e mulheres e entre estes
e estas e o seu meio. Pesquisas realizadas em várias partes do mundo, sobre a temática de
gênero, ressaltam que esta categoria por si só não consegue fornecer elementos que garantam
uma interpretação condizente e coerente da realidade, sendo necessário para isso é
estabelecer mediações com outras categorias, como: raça e etnia, orientação sexual, classe
social, conflito geracional dentre outros possibilitando assim, uma leitura complexa e ampla
da realidade.
A discussão e reflexão sobre gênero passou a ser uma tendência na difusão das abordagens
dessa temática dentro da academia. As vozes que antes eram silenciadas ou de pouca
expressão passam a serem escutadas e respeitadas. Nesse sentido, não podemos deixar de
salientar a importante contribuição dos movimentos sociais, inicialmente o movimento
feminista e posterior outros movimentos em defesa dos direitos humanos, das organizações
não governamentais, das Pastorais Sociais dentre outros setores que se debruçaram sobre
essa temática.
Ao pesquisarmos a temática gênero, muitas vezes nos deparamos com uma diversidade de
abordagens que nem sempre conseguem atingir o cerne da questão, já que muitas dessas
abordagens limitam-se muitas vezes a contemplar a realidade das mulheres, sem, no entanto
considerar o aspecto relacional do gênero, no que diz respeito às relações sociais de poder,
como os conflitos geracionais, as lutas de classes, étnicas, a diversidade sexual dentre outras.
Sendo assim, a concepção de gênero acaba por ser contrária ao conceito de diferença sexual
que é fundamentada meramente nas questões de ordem biológica, não considerando as
relações de poder estabelecida entre os sexos. De acordo com o conceito de diferença sexual a
consideração da mulher e do feminino precede a relação com o sexo oposto e o caminho para
a libertação da mulher reside dentro dela e entre elas, desconsiderando ou secundarizando a
dimensão cultural e relacional proposta na categoria gênero.
Devemos ainda estabelecer uma relação entre os discursos de convivência com o Semiárido e
a valorização do local, da diversidade cultural, da recomposição e afirmação de identidades
de gênero e territórios. Sendo essa uma perspectiva importante na compreensão de
convivência, considerando que as questões devam ser pensadas e formuladas, no próprio
lugar, valorizando e resgatando os conhecimentos locais, como propõe Zaoual (2003), com o
conceito de espaço simbólico de pertencimento: “Um espaço de crenças e práticas ajustado às
circunstâncias locais. Sua transversalidade articula a cultura dos atores da situação, com a
sociedade e o meio ambiente. Contrariamente à exclusiva visão de mercado que subtrai o
homem do seu ambiente social, o sítio o inclui e o vincula a suas raízes” (ZAOUAL, 2003, p.
95).
Nessa perspectiva, valorizar o espaço territorial para convivência requer maneiras novas de
pensar, sentir e agir no ambiente no qual se está inserido. Sendo assim, a convivência é um
reaprendizado constante entre os sujeitos e a realidade do Semiárido por meio de
experiências e vivências concretas. A mudança de percepção sobre essa realidade e a
experimentação de alternativas de produção apropriada pela população passa a ser a
principal garantia da convivência. Segundo Pimentel (2002, p, 19) uma: “coexistência regida
pelos princípios da reciprocidade, da aceitação e do cuidado com o outro reconhecido em sua
263
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
legitimidade enquanto outro da partilha, aquele com quem cada uma das partes da
convivência estabelece laços de complementaridade e interdependência”.
Gênero é uma categoria historicamente determinada, ainda que não seja construída apenas
sobre a diferença de sexos, mas, sobretudo, uma categoria que serve para dar sentido a esta
diferença, sendo assim, gênero serve para determinar tudo que é social, cultural e
historicamente determinado, conforme afirma SCOTT (1995).
A experiência dos movimentos feministas no mundo, e de maneira particular no Brasil ao
longo dos séculos XIX e XX, se apresenta a partir de perspectivas contraditórias ao provocar
uma ruptura no modelo de pensamento que é legitimado por princípios meramente
biológicos para justificar as desigualdades entre homens e mulheres. Além de expressarem a
forte resistência das mulheres, o movimento feminista, também tece veementemente uma
crítica à lógica patriarcal em que foram fundadas as sociedades ocidentais.
Para Bandeira “o feminismo constitui-se no movimento social que mais profundamente
interferiu no pensamento social e político ocidental, da forma como este se estruturava desde
o século XVI”. (2000, 15). Ainda segunda a autora o movimento feminista foi o portador de
vozes silenciadas desde o período grego até a modernidade, o que o movimento fez foi
resgatar a mulher da condição de inferioridade à qual ela foi submetida, e não apenas como
categoria, mas principalmente enquanto ser sócio histórico.
Foi nesse contexto de luta e resistência em todas as partes do mundo que as mulheres se
organizaram politica e socialmente articulando os movimentos de mulheres e os movimentos
feministas. Ao longo da história esses movimentos continuam sendo cenário de lutas,
conquistas, resistências e avanços contribuindo significativamente na construção de modelos
sociais e culturais mais igualitários tanto na esfera pública quanto privada.
264
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
3.3 LEITURA VIVA: VIVÊNCIAS NO ASSENTAMENTO
Dessa maneira constata-se que nos primeiros sinais de organização do Assentamento já havia
uma preocupação com a questão de gênero. De acordo com Claudinei “A gente (assentados e
assentadas) já vem trabalhando ha muito tempo, desde do inicio da fundação do
265
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
assentamento, a gente vem trabalhando essa questão de gênero para que o homem tenha
consciência”.
O Art. 38º do Estatuto diz respeito às atribuições da comissão de gênero, sendo elas:
I - Compor e participar da coordenação colegiada; II - Procurar resolver os problemas
das companheiras em Assembleia das mesmas; III - Organizar as companheiras nos
trabalhos coletivos; IV - Buscar autonomia financeira; V - Conscientizar as
companheiras da necessidade e importância de se associarem na Associação do
Projeto de Assentamento; VI - Participar das Assembleias ou outras atividades do
Assentamento e do Movimento, bem como motivar as demais companheiras assim
fazerem; VII - Levar sempre a questão de gênero em pauta de discussão da área.
É curioso notar que todo o texto diz respeito apenas às mulheres, referindo-se apenas às
companheiras. Em momento algum se contempla a participação dos homens, tanto na
comissão quanto nas assembleias do coletivo, como se o assunto fosse algo pertinente apenas
às mulheres. Mesmo considerando e sabendo da importância da temática nos espaços
formativos do Assentamento. Podendo ser confirmado na fala de Jucileide: “É importante
sim, por que a gente sabe que aqui na comunidade se a gente deixasse, por exemplo, só para
os homens tocarem a situação ficaria complicada, porque a mulher é importante tem o seu
papel aqui na comunidade, eu acho importante sim essa discursão porque, vem trazer a
mulher para a luta”.
Em alguns momentos fica evidente que não há uma participação efetiva das mulheres nas
decisões do Assentamento, competindo a ela a esfera do privado e aos homens a esfera do
público. As mulheres, em sua maioria, ficam em casa, cuidando dos afazeres domésticos e do
cuidado dos filhos, atividades que dizem respeito ao universo do privado. Aos homens
compete participar das assembleias e dos momentos de tomadas de decisão. De acordo com
Tonis “Nem todas participam, não sei por que, são poucas que tem mais interesse, no início
quando começou mesmo, era muitas mulheres que participou, mas hoje tem muitas
mulheres que pensam no interesse particular e não pensa no todo.”
Verificamos que nas assembleias no Assentamento, atividade que acontece sempre na
primeira terça-feira de cada mês, que no período da manhã a participação maior era dos
homens, já no período da tarde esse cenário era invertido. Essa constatação me faz pensar
que na primeira metade do dia as mulheres ficam em casa executando as atividades do lar,
tais como: fazer comida, lavar roupa, cuidar da casa, enquanto seus maridos as representam,
já no período da tarde, esses vão para a roça ou desenvolver outra atividade enquanto suas
esposas participam da assembleia. Vale ressaltar que as decisões mais importantes são
sempre encaminhadas no período da manhã, no período da tarde a pauta se limita aos
informes e encaminhamentos.
É unanime entre os posseiros e as posseiras a importância dessa temática para que aja uma
convivência baseada no respeito ao diferente, mas também reconhecem que na prática as
coisas acontecem de maneira bem diferente, mesmo reconhecendo seu valor. De acordo com
José Cintra na coordenação do Assentamento sempre há participação de mulheres, vale
esclarecer que a coordenação é constituída pelo coordenador ou coordenadora de cada
comissão eleito/a nas assembleias das próprias comissões e validada pela assembleia geral:
“Porque sempre que se elege uma coordenação, sempre tem mulheres. Normalmente é
educação e gênero”. Mesmo com a participação das mulheres podemos perceber que a elas
competem apenas algumas funções na coordenação, legitimadas pelo coletivo de gênero,
espaço considerado feminino e pelo coletivo de educação, que podemos classificar também
como uma atividade feminilizada.
CONCLUSÃO
Podemos dizer então que novas relações de gênero se apresentam como um ideal, já
legitimado pelo Movimento em seus documentos, e isso é um bom começo, no cotidiano o
que se percebe é um desejo enorme por equidade, mas essa não acontece da noite por dia, se
dá por meio de um processo de construção diária. Construção requer novas leituras e
interpretações, requer ainda, tempo, planejamento e organização, é construir na ação, no
fazer, no arregaçar as mangas e colocar a mão na massa. Constatou-se que as relações
266
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
estabelecidas até então não correspondem às reais necessidades dos homens mulheres
contemporâneos. Que caminhos percorrer? Essa é tarefa a ser feita por homens e mulheres
que vislumbram relações que tenham por base a equidade entre os seres humanos
independentes do sexo, etnia, classe social, orientação sexual dentre outras diferenças.
REFERÊNCIAS
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Cortez, 1999.
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267
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
GÊNERO CORDEL: UM RECURSO NO PROCESSO DE LETRAMENTO
INTERDISCIPLINAR
112 Aluna do mestrado de Língua e Cultura da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Salvador.
([email protected])
268
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
INTRODUÇÃO
Os gêneros discursivos são inúmeros, visto que as ações humanas são específicas, em
contextos e funções diferentes. Por conta dessas características, Bakhtin (2003) cita que para
cada momento comunicativo o enunciador utiliza de algum gênero. O gênero conforme o
autor tem a capacidade de organizar a interação social. Ressalta-se que a utilização dos
gêneros é um fato particular a cada sociedade e cultura. Para Bazerman (2011) não se pode
considerar que eles sejam iguais ou utilizados da mesma forma em todos os lugares, já que se
têm culturas tão ímpares. Por essa grandeza funcional e linguística, os gêneros são
mediadores importantes no ensino-aprendizagem da língua, dando contribuições
importantes para o ensino de produção e recepção textual, maneira pela qual entendemos a
língua como prática social. São destas contribuições que nasce este artigo. Logo, o objetivo
central é refletir sobre os processos de aprendizagens de leitura e escrita mediadas pelos
gêneros, sejam eles orais ou escritos.
Nesse processo de contribuições dos gêneros no ensino e aprendizagem é destacado que a
variedade de gêneros colabora decisivamente na competência comunicativa. Dentro desta
variedade está o cordel. Conforme Bazerman (2011, p. 16) “os alunos precisam de habilidade
e flexibilidade para se adaptar às situações da escrita”. Analisar os diferentes gêneros na sala
de aula é criar oportunidades para que o aluno veja o uso da língua como algo dinâmico, a
linguagem que se concretiza no dia a dia para atender aos objetivos das situações
comunicativas. No entanto, salienta-se que, por muitas vezes, os alunos já possuem contato
com muitos gêneros. Cabe ao professor criar situações em que estes gêneros são utilizados e
assim o aluno perceber a sua função social.
1 OS DIFERENTES GÊNEROS
Fazemos parte de uma realidade em que a escrita é o centro. Marcuschi (2003, p.17) afirma
que “a escrita chegou a um status de simbolizar educação, desenvolvimento e poder, ou seja,
[...] a apropriação da escrita é um fenômeno ideologizável [...]” (MARCUSCHI, 2003, p.24).
Por outro lado, Bazerman (2011) chama atenção que a grande necessidade da nossa
sociedade é ensinar aos alunos que escrever bem requer muito mais do que a produção de
sentenças, envolve a comunicação bem sucedida de mensagens significativas para o outro.
Dessa forma, não basta ensinar o código, mas conduzir o aluno a entender a situação
comunicativa e entender que tipo de linguagem ele deve empregar naquele contexto
específico.
Sobre os diferentes gêneros, além do contexto social, deve-se se levar em consideração
também o suporte, Marcuschi (2008, p.182) o define como: “... um lócus físico ou virtual com
formato específico que serve de base ou ambiente de fixação do gênero materializado como
texto...” Pode-se dizer sobre o suporte de um gênero:
269
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
a) Suporte é um lugar (físico ou virtual);
b) Suporte tem formato específico;
c) Suporte serve para fixar e mostrar o texto;
Assim, telefone, o jornal, o rádio, o papel etc. são suportes que influenciam nas características
dos gêneros. Uma mensagem exposta através dos ambientes virtuais, ganha estilo diferente
daquela que é exposta usando a fala. São recursos diferentes que não mudam o conteúdo,
mas que facilita a identificação do gênero. Dessa forma, no processo de estudo sobre um
gênero, o suporte é um elemento importante, já que este, de acordo com Marcuschi (2008)
não é neutro e nem fica indiferente a ele, pois para o autor, o suporte é meio para que o
gênero circule na sociedade.
Entendo a variedade dos gêneros, a sua relação intrínseca com a situação comunicativa,
percebe-se o quanto estes são exímios mediadores no processo da leitura, especificamente a
leitura interdisciplinar, pois eles contemplam na sua estrutura, conteúdo e estilo aspectos
importantes para o leitor como dinamicidade, intertextualidade, competência comunicativa
etc. Ler um gráfico, por exemplo, é um exercício interessante e que não deve ser restrito às
aulas de matemática. O gráfico exige do leitor uma relação de sentidos com os números e com
o objetivo deste gênero. Ler qualquer gênero é ir além da decodificação, ler nas entrelinhas e
perceber qual a função daquele gênero na sociedade.
O cordel faz parte da literatura popular nordestina no Brasil, sendo um gênero vendido nas
feiras livres ou praças. Esta herança européia chegou ao Brasil por meio dos colonizadores
portugueses, Batista (1997, p. 3), “é uma das heranças que devemos, o Brasil a Portugal, os
outros países americanos à Espanha”. O cordel, no entanto, só veio se firmar no nordeste
brasileiro no final do século XIX.
Devido a este enfoque regionalista, a literatura de cordel achou refúgio nas mãos do povo
nordestino, que soube cultivar e aprimorar essa riqueza cultural, explorando nas narrativas a
história e a cultura local. Narrando histórias de vaqueiros, o cordel conquistou seu espaço,
pois retrata com fidelidade a realidade, seja através das personagens ou da linguagem do
povo nordestino. O gênero cordel se transformou ao longo do tempo (comparando a
estrutura e a temática desde a Europa até o Brasil), ratificando que o gênero não pode ser
visto como formas estanques, mas conforme Marcuschi (2008, p.151) entidades dinâmicas,
cujos limites são fluidos.
Utilizando de vários temas como seca, tradição religiosa, figuras atuais, pelejas, sofrimento,
adultério, corrupção, o cordel tornar-se um bom recurso no processo de letramento. Vale
ressaltar que por essas características o cordel não é um gênero exclusivo para as aulas de
Língua Portuguesa, podendo ser interdisciplinar, qualquer educador ao utilizar um cordel,
explorando seu tema, proporcionará uma leitura interdisciplinar, ou seja, o diálogo das
disciplinas, das vozes que ecoam no texto bem como utilizar a língua escrita em situações
diferentes. Estamos, assim, destacando um processo de letramento que deve ocorrer em
todas as disciplinas. Entender o funcionamento da língua falada e escrita não é restrito aos
professores de Língua Portuguesa. Os cordéis de Patativa do Assaré, por exemplo, retratam a
realidade dura de muitos sertanejos que sofrem com a seca. O uso desses cordéis possibilita
uma leitura critica e interdisciplinar, já que o educador pode estabelecer pontes com outras
270
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
leituras (geografia, história, literatura, física, biologia). A partir da leitura o aluno pode ser
motivado a escrever textos argumentativos e opinativos, explorando a leitura crítica.
Meu Deus, meu Deus. . .
Setembro passou
Outubro e Novembro
Já tamo em Dezembro
Meu Deus, que é de nós,
Meu Deus, meu Deus
Assim fala o pobre
Do seco Nordeste
Com medo da peste
Da fome feroz [...]
(Patativa do Assaré, 2014)
O seguinte trecho do cordel “Triste Partida” possibilita uma leitura atenciosa de um eu lírico
que clama a Deus por tanto sofrimento, do medo de viver com a fome, que para o sertanejo é
considerado uma peste. Compreende-se, dessa forma, que o cordel abre um leque para o
estudo semântico, sintático bem como para a realização de leituras dialógicas, ou seja, ler um
texto associando a outros. A partir deste cordel, o professor pode explorar a leitura de outros
gêneros como o romance Vidas Secas de Graciliano Ramos, as letras de Luiz Gonzaga ou Os
Sertões de Euclides da Cunha a depender da turma em que o cordel está sendo estudado.
Vale neste momento o olhar atento do professor, aquele que deve ter no centro de suas
atividades uma prática flexível e interativa.
Amazônia é equação
Que temos que resolver
Se será fácil ou difícil
O tempo é quem vai dizer
É nosso dever de casa
E vamos ter que fazer
(Marcus Lucenna, 2014)
271
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
letramento se constituem conforme o contexto. No entanto, ela ainda critica que a escola
mantém alguns modelos de letramento, sustentando ideologias discriminatórias.
O uso dos gêneros, especificamente os gêneros orais são importantes na sala de aula, pois
desmistificam que o letramento se restringe à escrita. Rojo (1995) considera que a partir da
oralidade pode se desenvolver práticas de letramento nos ambientes em que a criança, por
exemplo, esteja inserida, ou seja, desenvolver com as crianças desde a idade pré-escolar
práticas discursivas, para que, por conseguinte a escrita seja desenvolvida.
Nesse sentido, vale ressaltar a importância de inserir no ensino de leitura o cordel, já que é
um gênero que além da forma impressa retoma a forma oral, ou seja, o cordel cantado ou
recitado e que tem um valor importante. A utilização do cordel em uma prática dialógica, isto
é, entender que enunciado ali cantado dialoga com outros enunciados, possibilita que o
educando compreenda que a oralidade é tão importante quanto à escrita. Ouvir ou ler um
cordel condiciona um olhar mais sensível aos fatos do mundo, contribuindo para a produção
de textos, seja o próprio cordel outro gênero textual.
A presença dos gêneros nas escolas como um recurso de aprendizagem deve-se também às
reflexões dos PCN. Os Parâmetros Curriculares Nacionais apresentam os gêneros como
mediadores no processo de aprendizagem da escrita, o desenvolvimento e incentivo à leitura.
Qualquer gênero conforme Dolz e Schneuwly (2004) são (mega) instrumentos tanto de
ensino quanto no saber agir em situações de linguagem.
Schneuwly & Dozl (2004) propõem uma sistematização do uso dos gêneros textuais. A ideia é
que se crie uma sequência a fim de que se depreendam tudo que o gênero possa oferecer,
principalmente a questão da flexibilidade da linguagem diante das diversas situações de
comunicação. Os autores defendem que os gêneros devem fazer parte do cotidiano escolar,
pois eles usados de maneira correta colaboram no desenvolvimento da linguagem, chamam
atenção também que o ensino não pode se restringir aos gêneros “cânones” 113, mas buscar no
próprio escolar, gêneros que são utilizados entre alunos, professores, direção, ratificando que
a mesma é um espaço comunicativo, que o texto é utilizado para representar os objetivos dos
interlocutores.
Para as escolas em que o cordel faz parte da realidade, ele segue como esse mega recurso que
pode ser sistematizado através das sequências didáticas, propondo aos alunos uma reflexão
de sua própria realidade, constitui-se neste momento a formação de um cidadão que não só
analisa a realidade alheia, mas que entende os processos históricos, políticos, culturais que
envolvem sua comunidade e como pode transformá-la. Kleiman (1995, p.20) também
destaca que a escola a partir das suas escolhas restringe o conceito de letramento “[...] Pode-
se afirmar que a escola, a mais importante das agências de letramento, preocupa-se, não
como o letramento, prática social, mas apenas como um tipo de prática de letramento, a
alfabetização, o processo de aquisição de códigos [...]”, isto é, se uma escola nega o valor de
um cordel, ela nega ao aluno a oportunidade de valorizar sua cultura ou de conhecer o novo.
O recorte a seguir do cordel a “Importância do Cordel” de Mundi do Vale representa um
pouco disso.
“[...] O cordel tem seu valor
Por ser de fácil leitura.
Tem muita arte na capa
Feita em xilogravura.
A métrica faz a grandeza,
A rima gera beleza
Para elevar a cultura.
O cordel noticiou
Para o povo nordestino,
O suicídio de Vargas
E a prisão de Antônio Silvino.
Deu notícia da chacina,
No Largo da Catarina
Quando morreu Virgulino.[...]” (Vale, 2014)
Essa proposta faz uma reflexão pertinente do uso dos gêneros e consequentemente do ensino
de língua. A postura do educador, mais do que nunca, será de um mediador que deverá
conhecer os limites da sua turma e como o texto pode ser aprendido na sala de aula. No final
o trabalho com o texto será um processo e não uma ação descontextualizada. A turma, dessa
forma, vai compreender o gênero como um mediador linguístico das interações social.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Valorizar o estudo do texto a partir do contexto é amadurecer nos educandos uma leitura
crítica do mundo, da sua sociedade. O gênero desse ponto de vista é um recurso valioso para
aquisição de saberes interdisciplinares, tanto pelos textos escritos como orais. Os gêneros
contribuem, dessa forma, na formação cidadã, pois são produções textuais que refletem a
cultura, a ideologia, etc.
O uso do gênero na sala de aula, especificamente o cordel, parte inicialmente de uma visão
sociointeracionista da língua. Fazer com que os educandos entendam o funcionamento da
língua não se dar só por meio de regras gramaticais, mas pela situação comunicativa. É
preciso estimular outras competências como a discursiva, sociolinguística. Além disso, Dolz
& Schneuwly (2004) ratificam que o gênero na escola requer uma reorganização didática, ou
seja, procurar adequar o gênero a realidade dos educandos, criando uma sequência didática
pertinente à turma, a fim de alcançar os objetivos traçados.
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274
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA NO IF SERTÃO PE: O DESAFIO DE ARTICULAR
MÚLTIPLAS LINGUAGENS MEDIADAS PELA TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO
INTRODUÇÃO
A modalidade de Educação à Distância não pode ser considerada um grande feito da
sociedade contemporânea que preza pelo pragmatismo das mais variadas situações de
convivência humana. Após o advento da escrita, muitos foram instrumentos organizados
para possibilitar que a informação chegasse o mais longe possível cumprindo na íntegra a
função comunicativa. No início do Século XX o ensino à distância acontecia pela utilização do
rádio de materiais impressos sobre os mais diversos temas enviados através dos serviços de
correio. Desses mecanismos e com o surgimento de estruturas de comunicação remota, como
a internet e suas ferramentas de uso coletivo ou individual as linguagens se aprimoram em
função das novas exigências sociais.
Essas formas de linguagem presentes nos materiais didáticos, destinados a educação à
distância, devem ser clara, sucinta (sem ser resumida demais), com precisão inerente ao
114 IF SERTÃO PE, Campus Petrolina, Professora do Curso de Licenciatura em Química, Coordenadora de Tutoria nos Cursos
de Educação à Distância, Mestranda em Ciências da Educação. Email: [email protected]
2IF SERTÃO PE, Campus Salgueiro, Técnico de Laboratório de Química, Tutor nos Cursos de Educação à Distância,
275
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
assunto, acessível e adaptada ao aluno que se destina, considerando níveis de escolaridades
exigidos para a modalidade do curso. Todo material deve ter em seu bojo linguagem auto
instrucional que possibilite certa independência ao aluno.
Os espaços configurados como sala de aula desse novo segmento seguem um padrão
específico como, com linguagem peculiarque se apresenta como um espaço virtual de
aprendizagem com procedimentos de abordagens pedagógicas que viabilizam o estudo de
conteúdos através de pressupostos didáticos definidos a partir do padrão “à distância”. Esse
padrão prioriza mecanismos de interação, colaboração, mediação e linguagem articuladora.
No IF SERTÃO PE são vivenciados atualmente cursos de Manutenção e Suporte em
Informática nos cinco Polos que o compõem com um público oriundo das zonas urbanas e
rurais das cidadãs onde estão implantados seus Campi. Essa realidade está posta no
Referencial Metodológico de EaD do IF SERTÃO PE (2014) quando evidencia que, amparado
pela legislação, vem concentrando esforços para levar a educação onde for necessário.
O desafio de apresentar formas de linguagens eficientes é constante, pois nem sempre o que
foi planejado chega de forma clara ao aluno que não está cotidianamente na sala de aula
convencional (com professor, quadro, alunos enfileirados) mas diante de um equipamento
eletrônico que funciona como canal de comunicação e apresenta uma aula. Para a elaboração
desse estudo foram delineados objetivos que possibilitassem descrever as experiências com
formas de linguagem, de leitura e interpretação de textos nos ambientes virtuais de
aprendizagens nas disciplinas dos cursos estudados. Os alunos alvo do estudo, matriculados
no CEAD4115Polo Salgueiro– IF SERTÃO PE cursam Manutenção e Suporte em Informática.
Caracterizada como uma pesquisa descritiva utilizou-se de questionários de perguntas
fechadas pautadas na moda estatística observando maioria de um conjunto de dados. Nesses
termos, justifica-se essa escolha, pela moda estatística, considerando o valor que detém o
maior número de observações, ou seja, valores ocorrem com maior freqüência num conjunto
de dados, sendo assim, aponta-se o valor mais comum.
Além da aplicação de questionários foi feita observação direta em sala de aula do polo
pesquisado. Os resultados desse estudo interessam diretamente a todos que buscam entender
os potenciais oferecidos pelas tecnologias da informação e da comunicação no desempenho
de habilidades de leitura, escrita e interpretação de textos.
Harasim (2005, p. 31) observa que "a interação através das redes ajuda a romper barreiras de
comunicação e inibições que frequentemente asfixiam a troca aberta de ideias nas salas de
aula tradicionais". Os personagens que interagem nos Ambientes Virtuais de Aprendizagem
dispõem de informações necessárias disponíveis para o bom andamento das atividades. Em
outras situações também podem enriquecer suas ideias partindo de maiores informações,
também disponíveis de outros ambientes similares. Em decorrência dessa forma interativa de
linguagem há a possibilidade de transformar suas experiências, as quais ficarão disponíveis
aos demais participantes do mesmo ambiente, propiciando um repensar das formas de
conhecer o mundo.
As páginas virtuais presentes nos citados ambientes, variam entre textos, hipertextos, mídias
diversas, que organizam os espaços específicos, considerando todas as ações comunicativas,
constantes no evento, sejam síncronas ou assíncronas. O principal ponto a considerar diz
respeito às estratégias destinadas à garantia da compreensão na interlocução e posterior êxito
na conclusão da atividade proposta principalmente em relação à interpretação dos escritos e
capacidades de síntese.
Portanto, uma forma de linguagem oferece a seus usuários diferentes formas “de falar e
escrever”, e, segundo os princípios que regem a linguística, não existe uma forma melhor ou
pior de empregá-las. As diversas formas de linguagem configuram uma realidade diversa,
extremamente variável e vinculada à realidade da sociedade, da econômica, de aspectos
culturais e regionais em que está inserida. As ações de comunicação têm finalidades das mais
variadas e realizam-se nas mais diferentes circunstâncias de tempo e história, por isso são
também muito variados os elementos contextuais que influem na maneira como a linguagem
deve ser ajustada à situação ou finalidades da comunicação pretendida. A linguagem no AVA
277
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
é basicamente escrita, bem como a apresentação dos diferentes níveis de linguagem, assim
como a função de cada um e seus diferentes usos e características.
2 DISCUSSÃO DE RESULTADOS
Como anteriormente citado a coleta de dados em busca de respostas ao tema proposto foi
baseada, na aplicação de questionários de perguntas fechadas seguindo os parâmetros da
moda estatística. Ou seja, "no valor que ocorre com maior frequência num conjunto de dados,
isto é, o valor mais comum" (SPIEGEL, 1976, p. 74). Vale salientar que a palavra "moda”
nesse contexto, significa no cotidiano, ser "muito usado" e segundo Clegg (1995) expressa
com propriedade o significado da moda estatística. Esta é o valor que se repete o maior
número de vezes, num conjunto de valores, isto é, o mais frequente. Destaca-se que a
expressão “a maioria” num conjunto de dados, nem sempre representa a moda estatística
(HUOT, 2009). Considerou-se no questionário valores de 1 a 5 onde 1 representa menor valor
e 5 maior valor seja em sentido negativo ou positivo disposto na pergunta.
É um parâmetro fácil de calcular e não é afetada pelos valores extremos. Segundo Bunchaft e
Kellner (1997, p.119): "A moda tem como característica importante a sua aplicabilidade a
todos os níveis de medida - nominal, ordinal e intervalar - sendo seu emprego desejável em se
tratando de dados em categorias, ou seja, distribuições de variáveis qualitativas".
5
4
3
2
1
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Certamente a partir do disposto será necessário um repensar constante das atividades a fim
de evitar problemas típicos das formas de educação presencial, como a evasão ou retenção
por falta de aproveitamento nos componentes curriculares. Adaptar novas formas de
linguagem nas atividades dispostas nos Ambientes Virtuais de Aprendizagem é mais um
desafio para a articulação das múltiplas linguagens imbricadas no processo. As demais
situações certamente terão seus êxitos interligados a essas ações.
5
4
3
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1
5
4
3
2
1
Outros estudos nessa perspectiva poderão evidenciar elementos, que agregados a este, darão
uma dimensão maior a estudo do tema e delinearão um cenário mais definido para
fundamentar os planejamentos dos próximos módulos e as ações necessárias para o
desempenho satisfatório dos cursos de EaD no IF SERTÃO PE.
Ler e escrever não é passear por cima das palavras, dizia Paulo Freire5, ler é ter a convicção
profunda e estética do lido. E, se este 116país não levasse a sério o exercício da leitura, da
palavra, associada à leitura do mundo com todas as suas implicações estéticas, de beleza
("boniteza") e de liberdade de criação, ensinar a ler e a escrever, numa perspectiva como essa,
faria parte da pedagogia, da democracia.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A linguagem humana, com o passar dos tempos, dos usos cotidianos, e das muitas
intervenções evoluiu, ficou mais leve, mais solta, mais funcional e mais dinâmica.
Ultrapassou o limite dos gestos e falas toscas e chegou a complexidade a comunicação remota
que está pautada das velocidades, sejam dos próprios meio utilizados para sua propagação,
como da urgência de renovação constante.
Essa mesma linguagem deixou as paredes da norma culta e ganhou ares de informalidade,
inclusive nos ambientes escolares. O uso coloquial da língua extrapolou o convívio das
relações familiares e de encontros de amigos e evolui sem respeitar domínios, donos ou
formas aprisionantes.
E suas mais variadas nuances, as formas de linguagem se apropriaram do amplo espaço
oferecido pelas redes sociais, que assumiram o papel de interlocutor no ambiente de convívio
social, dos mais formais aos mais íntimos e chegou até os ambientes virtuais escolares, ou
5
Cf. FREIRE, Paulo. À sombra desta mangueira. São Paulo: Olho d’Água, 1995, p. 101
280
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
melhor, aos ambientes virtuais de aprendizagem. O desafio está diante de nós: fazer a
necessária articulação entre os pressupostos escolares, o desejo dos estudantes, as urgências
sociais e as linguagens inerentes a essa realidade.
REFERÊNCIAS
BUNCHAFT, Guenia; KELLNER, Sheilah R. Oliveira. Estatística sem mistérios. V. I. 2.ed. Petrópolis: Vozes,
1997.
CLEGG, Frances. Estatística para todos. Lisboa: Gradiva, 1995.
GOMES, P.V. Eureka na PUC/PR: um ambiente para aprendizagem colaborativa baseado na www. Curitiba:
Champagnat, 2001.
HUOT, Réjean. Métos quantitativos para ciências humana. Lisboa: Piaget, 1999.
HARASIM, L. Redes de aprendizagem: um guia para ensino e aprendizagem online. Trad. Ibraíma Dafonte
Tavares. São Paulo: Senac, 2005
SANTOS, E. O. Educação online, cibercultura e pesquisa: formação na prática docente. Tese, Salavandor:UFBA,
2005.
281
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A VARIAÇÃO ESTILÍSTICA NOS JORNAIS POPULARES: HÁ DIFERENÇAS DE
REGISTRO ENTRE JORNAIS DE PERNAMBUCO E DA PARAÍBA?
1. INTRODUÇÃO
O artigo ora apresentado está embasado na Sociolinguística, área da Linguística em que seus
estudiosos versam sobre as variações da língua, afinal a língua é um construto social e, como
tal, fica difícil dizer que a língua não muda de acordo com o social e, semelhantemente, não
há como dizer que haja atividades linguísticas bem sucedidas que não se deem pelo e no
social (BAGNO, 2008; LABOV, 2008)
Tendo esse conceito por base, este trabalho tem como objetivo analisar como se dá os
registros em jornais populares de Pernambuco para sabermos se há discrepâncias com
relação aos usos da linguagem nos dois jornais.
Por se tratar de uma pesquisa de cunho comparativo, cruzaremos os dados obtidos da análise
dos dois jornais para pesarmos as diferenças entre um e outro veículo de comunicação e.
O estudo aqui realizado justifica-se no fato de que a variação linguística existe em todos os
lugares e cada pessoa está situada em um contexto que pode ser diferente dentro de um
contexto ainda maior. Por exemplo, o Brasil é um só país, mas tem, dentro de seu território,
diversas variedades linguística, diversos falares e escreveres. Outro exemplo é que, dentro de
um mesmo estado, varia a linguagem e isso é motivo para descrevermos e estudarmos os usos
de linguagem dentro dessas comunidades. Para comprovar isso, mesmo sendo em outro meio
- o livro didático e o ensino - as palavras de Bagno quando cita os PCN no que diz respeito a
variedades dialetais (2008: 27). Ou seja, diversas variedades existem e precisam ser lvadas
em consideração nos nossos estudos.
Sabemos que o caminho é longo, mas acreditamos estar começando aqui a trilhar este
caminho e nos próximo itens apresentaremos os pressupostos em que nos baseamos para
analisarmos os jornais populares e as análises de cada um dos jornais e dos dois adotados
como corpus entre si.
282
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
É interessante ver como a língua é mutante mesmo em gêneros iguais. Estamos falando dos
jornais impressos. Ainda que estejamos falando sobre jornais impressos de nuances
diferentes – os de maior circulação no ambiente mais rico e os de maior circulação no âmbito
menos abastado – usa-se ilustrações diferentes e, principalmente, linguagem diferente para
transmitir uma mesma coisa.
Pensando nisso, este trabalho visa a estudar como os jornais impressos mais
prestigiados e menos prestigiados utilizam a mesma língua em locais diferentes. É o que
chamamos de variação estilística, ou variação de registro. Camacho (2005: 60) conceitua a
variação de registro como sendo “o resultado da adequação da expressão às finalidades
específicas do processo de interação verbal com base no grau de reflexão sobre as formas que
seleciona para compor seu enunciado”. Trocando em miúdos, o usuário da língua reflete no
que vai usar em cada contexto específico, utilizando o registro mais conveniente com a
situação, ou seja, o usuário alterna entre os registros em cada contexto de uso.
Ainda conceituando a variação de registro (doravante VR), Alkmin (2005: 38)
apresenta essas como a variação que decorre do contexto em que os falantes diversificam a
sua maneira de empregar a fala nas suas interações verbais. Essa conceituação de VR que traz
Alkmin pode suscitar um desconforto, pois, se somente na fala é que ocorre diversificação,
voltamos à discussão que se formou com relação à dicotomia fala/escrita, em que a fala está
para o caos (ainda que organizado, como alguns teóricos afirmam) e a escrita para a
normalidade. Já Bagno (2007: 45) crítico ferrenho da noção de que fala é um caos e escrita é
uniformidade e normalidade, conceitua a variação estilística da seguinte forma:
Quando se fala em alternância entre registros, estamos falando de trocas entre dois
tipos de registros: o formal e o informal. Quanto a isso, Camacho (op. cit.) aponta que,
quando se fala em registro formal, fala-se em um maior grau de reflexão acerca da linguagem,
enquanto que o registro informal caracteriza-se pelo baixo grau de reflexão das expressões
que são utilizadas pelo usuário.
Apesar de Bagno falar em variação apenas na fala, a variação estilística também se dá na
escrita, mas não de maneira tão exacerbada como na fala. Consideramos interessante citar
Ilari e Basso (2006: 181) no que diz respeito à variação entre fala e escrita. Apesar de os
autores discorrerem sobre a variação diamésica (a variação que se dá pelo meio), o discurso
destes exemplifica bem a diferença de uso da linguagem nos dois meios:
A variação diamésica compreende, antes de mais nada, as profundas diferenças que
se observam entre a língua falada e a língua escrita. [...] Na fala, as pessoas dizem
coisas como "né", "ocêis", "disséro", "téquinico", pensando que dizem "não é",
"vocês", "disseram", "técnico". Mas a diferença entre o escrito e o falado vai muito
além dos fenômenos que dizem respeito à forma das palavras. (ILARI E BASSO,
2006: 181)
A título de comentário, é evidente que na fala dizemos uma coisa e na escrita, outra, o que
não quer dizer que uma seja considerada errada e a outra correta, mas que diferem por causa
da situação em que estão sendo utilizadas.
Obviamente, a escrita é mais monitorada do que a fala, ainda mais quando se fala em
contextos específicos, ou comunidades de fala específicas, o que podemos chamar de normas.
Uma norma é a variedade linguística utilizada dentro de uma comunidade de fala, onde seus
componentes compartilham do mesmo registro e esta variedade pode diferir das variedades
adotadas por outras comunidades (FARACO, 2008: 33). Sendo assim, os jornais populares
adotam normas ou alguns tipos de normas que são acessíveis a comunidades de fala diversas.
283
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Alguns trabalhos utilizando os jornais tendo como objeto os jornais (não apenas os
populares) já foram escritos antes deste artigo. Um dos trabalhos fala justamente da variação
linguística nos jornais, tendo como base de análise a variação diamésica em jornais de
Piracicaba e de Curitiba, escrito por Linamaria Moraes e Daniela de Moraes (2012). Ainda
que não sirva de referência teórica para este artigo, é importante citá-lo pelo fato de já estar
em evidência a questão da análise da variação linguística em jornais. Outro trabalho
interessante na área de variação linguística em jornais é o de Osias (2010), em que a autora
discorre acerca do preconceito linguístico nos jornais populares, com relação à mídia e como
esta propaga o "falar bem".
Adiante passaremos à análise do registro nos jornais impressos, em que apresentaremos os
jornais e partes destes que demonstram como a linguagem é empregada e um comparativo
entre estes tipos de linguagem.
3.1. O JORNAL JÁ
O Jornal Já Paraíba surgiu no Sistema Correio de Comunicação no ano de 2009. Circula no
Estado da Paraíba sendo vendido ao preço de R$ 0,50 (cinquenta centavos). Pelo valor, já se
percebe que ele aponta para um público de menor poder aquisitivo, pertencente a classes
sociais menos favorecidas. A própria linguagem configura outro indício claro da proposta do
jornal: ser acessível a um público menos favorecido, levando informações numa linguagem
que faz parte do universo linguístico desse público, ou seja, sem dependência de uma norma
culta exigida, exigente, imposta e excludente. A existência de um jornal como o Já Paraíba
mostra-nos que modalidades linguísticas diversas podem coexistir, sem que isso represente a
morte da língua portuguesa. Assim apresenta o jornal Já o Sistema Correio de Comunicação,
seu criador:
Composto de matérias que falam dos acontecimentos do nosso estado e do mundo,
destaca notícias sobre esporte, bem-estar, matérias que falam dos acontecimentos do
nosso estado e do mundo, destacando também a vida dos famoso, horóscopo entre
outros, tudo isso em um formato mais enxuto e preço popular. [...] O Jornal Já
alcançou uma ótima aceitação no mercado, colaborando para aumentar o hábito da
leitura das classes C, D e E, conquistando espaço no dia a dia da população, tornando
seus leitores, clientes fiéis da informação mais acessível da Paraíba (Site: Portal
Correio)
Esse tipo de mídia tem tido aumento de circulação, o que nos leva a constatar que mais
pessoas de classes menos favorecidas estão tendo acesso à leitura, à informação, não
importando se a linguagem utilizada neles é culta ou não, mas importando a funcionalidade
dessa leitura. O Jornal Já Paraíba foge desse padrão e aponta para uma prioridade: a
eficiência da comunicação verbal frente ao público-alvo em questão, e não a observância
rígida a um padrão linguístico pouco (ou nada) frequente no contexto social desse público.
A mídia é uma das responsáveis por essa sedimentação, muitas vezes, sistematizando um
comportamento de verdadeira patrulha em nome do “bom” uso da língua. O Jornal Já
Paraíba, periódico de circulação no Estado da Paraíba, é um exemplo contrário a essa
patrulha e uma confirmação de que há público para todas as modalidades da língua – oral
formal, oral informal, escrita com influência de oralidade, escrita formal, escrita com
presença de gírias, oral com presença de gírias, entre outras possibilidades. Ele chega ao
público usando uma linguagem condizente com a condição social, com a classe social e com a
realidade linguística do leitor – um leitor que escolhe essa leitura porque se identifica com
ela. Nessa identificação que está a funcionalidade dessa leitura, a eficiência comunicativa – é
isso que interessa. Nenhuma modalidade da língua está morrendo ou sendo desrespeitada –
apenas há modalidades diversas e geradas por diversos contextos e situações, e todas podem
coexistir. Sem preconceito, sem restrições e levando-se em consideração que elas existem e
não podem, simplesmente, ser ignoradas, ou condenadas, ou relegadas à condição de chulas
ou grosseiras, quando são, na verdade, formas eficientes de comunicação.
Uma das particularidades já mencionadas na apresentação do jornal Já é a linguagem
acessível, o que faz com que o jornal seja bastante aceito. Abaixo está a capa do Jornal Já:
284
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Algo que chama bastante a atenção dos leitores não é só a linguagem de fácil entendimento,
mas as imagens de cunho apelativo que fazem com que o público (principalmente) masculino
seja atraído a comprar o jornal. A linguagem também é abordada de maneira leve, de fácil
compreensão por parte do leitor das camadas sociais a que o jornal se presta a atingir, ou
seja, um registro menos monitorado, mais adequado ao leitor das camadas mais
desfavorecidas.
Um outro fator que particulariza, no que tange à linguagem, o jornal Já são as notícias e a
forma como são abordadas tais notícias. Abaixo um exemplo de manchete e notícia que
comprovam a particularidade de tal meio:
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
3.2. O JORNAL AQUI – PE
Logo no início da capa do jornal Aqui PE o jornal já traz uma imagem apelativa que funciona
como atrativo para que o leitor (principalmente masculino) compre e leia o jornal. Em sua
manchete principal com uma linguagem apelativa e chamativa pela sua diferença dos outros
jornais que circulam nas camadas mais favorecidas da sociedade. Aí encontramos o nosso
primeiro registro de diversidade dos estilos que podem surgir e que estão associados às
comunidades diversas, tomando como base o fato de que o jornal é voltado para certos tipos
de camadas sociais, de acordo com o site do Diários Associados.
O jornal Aqui PE, diferentemente do seu “coirmão” paraibano, o Jornal Já, quando se fala em
linguagem, adota um estilo mais informal, ou seja, monitora menos o seu uso da linguagem,
visando, principalmente, a atingir os leitores. O jornal popular pernambucano utiliza de
expressões que são quase que totalmente próprias do falar popular, mas que são trazidas para
a escrita. Abaixo um recorte de uma notícia que ilustra como se dá a veiculação da notícia no
jornal:
286
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Algumas palavras e/ou expressões podem ser levadas em consideração quando se fala em
registro, como o uso da palavra “bufa” e da expressão “detonasse a flatulência”. A palavra
"bufa", de acordo com o dicionário online Priberam, significa "ventosidade expelida pelo
ânus", "flautlência". A linguagem utilizada revela não somente um recurso lexical que
exprime uma situação engraçada, mas revela o baixíssimo monitoramento da linguagem
utilizada ainda que o gênero geralmente requeira uma linguagem mais monitorada, em que o
vocábulo "bufa" poderia facilmente ser modificado e, em seu lugar, utilizado "flatulência" ou
ainda, "flato", entretanto o recurso é utilizado devido à pessoa que lê e sua camada social. A
outra ocorrência, a expressão "detonasse a flatulência", revela dois fatores: 1) sintaxe normal
- não provoca nenhuma mudança quanto à sintaxe o fato de a linguagem ser pouco
monitorada; 2) o pouco monitoramento não afeta o movimento anafórico (flatulência/bufa) e
nem afeta o cunho engraçado que o escritor imprimiu ao usar tais palavras/expressões.
4. ANÁLISE CRUZADA ENTRE OS DOIS JORNAIS
Depois de analisados separadamente, consideramos importante cruzá-los para que possamos
ter um panorama da variação estilística entre um estado e outro no tangente aos jornais
populares.
De acordo com as análises feitas, o que pudemos depreender é que, mesmo que Pernambuco
e Paraíba sejam estados próximos, algumas diferenças no registro podem ser notadas, no que
diz respeito ao uso no meios de comunicação anteriormente citados e no arranjo das notícias
também. A análise também nos mostrou que não é necessário estar em duas regiões
diferentes ou, neste caso, dois estados diferentes para que tenhamos dois estilos diferentes,
mesmo que estejamos falando em estilos menos monitorados. Nesse sentido, o Já
demonstrou utilizar linguagem um pouco mais monitorada do que o Aqui PE¸ pois, como
vimos, o jornal paraibano ainda emprega certo monitoramento na veiculação da informação,
enquanto o pernambucano emprega uma linguagem ainda menos monitorada que o seu
"coirmão" paraibano.
5. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES FINAIS
Algumas coisas podem ser pontuadas aqui como considerações finais. A primeira delas é que
o trabalho com variação linguística é mais extenso do que podemos ter em mente e ainda está
só no começo. Seja nos jornais de grande circulação, nos jornais populares ou em outros
veículos de comunicação, podemos estudar variação linguística em todo tipos de objeto.
Em segundo lugar, os jornais são território onde circulam diversos tipos de linguagem, seja
verbal ou não-verbal e, dependendo do tipo de jornal em seu meio de comunicação (televisão
ou impresso), escrita ou falada, os jornais são fontes inesgotáveis para análise linguística, seja
de variação, seja semiótica ou qualquer outra.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Em terceiro lugar, os jornais são também fontes de objetos de análise em variação linguística
em todas as suas vertentes, principalmente que foi desenvolvida neste trabalho e na variação
diamésica, aquela que se dá pelo meio em que se propaga (ILARI e BASSO, op. cit.), o que
pode ser um estudo muito interessante.Mas o principal é que temos muito o que fazer ainda
em variação e não podemos parar de estudá-la, pois falamos de diversidade de linguagens, ou
seja, a língua: é "intrinsecamente heterogênea, múltipla, variável, instável e está sempre em
desconstrução e em reconstrução. ao contrário de um produto pronto e acabado, um
monumento histórico feito de pedra e cimento, a língua é um processo, um fazer-se
permanente e nunca concluído. A língua é um trabalho social [...]" (BAGNO, 2007: 36)
REFERÊNCIAS
ALKMIN, T. Sociolinguística: Parte I. In: MUSSALIM, F.; BENTES, A. C. (orgs.) Introdução à Linguística:
domínios e fronteiras, vol. 1. São Paulo: Cortez, 2001.
BAGNO, M. Nada na língua é por acaso: por uma pedagogia da variação linguística. São Paulo: Parábola
Editorial, 2007.
CAMACHO, R. G. Sociolinguística: Parte II. In: MUSSALIM, F.; BENTES, A. C. (orgs.). Introdução à Linguística:
domínios e fronteiras, vol 1. São Paulo: Cortez, 2001.
DIÁRIOS ASSOCIADOS. Aqui PE. Disponível em:
<http://www.diariosassociados.com.br/home/veiculos.php?co_veiculo=32>. Acessado em 24/04/2014.
FARACO, C. A. Norma culta brasileira: desatando alguns nós. São Paulo: Parábola Editorial. 2008. p. 33 - 107.
ILARI, R.; BASSO, R. O português da gente: a língua que estudamos a língua que falamos. São Paulo: Contexto.
2006.
LABOV, W. Padrões Sociolinguísticos. São Paulo: Parábola Editorial. 2008.
OSIAS, J. P. A. Jornal Já Paraíba: quebrando paradigmas no ciclo midiático do preconceito linguístico. Revista
Eletrônia Temática. João Pessoa - UFPB, no. 9, ano VI, Set/2010.
<http://www.insite.pro.br/2010/Setembro/preconceito_linguistico_jornaljaparaiba.pdf> Acessado em
24/04/2014.
PINELLI, D. M. P.; MORAIS, L. S. R.; OLVEIRA, D. F. Variação Linguística em Jornais. 10ªMostra Acadêmica
Unimep. Piracicaba. < http://www.unimep.br/phpg/mostraacademica/anais/10mostra/4/297.pdf> Acessado em:
24/04/2014
SISTEMA CORREIO DE COMUNICAÇÃO. Jornal Já Paraíba. Disponível em:
<http://www2.portalcorreio.com.br/sites/jornalja/>. Acessado em 24/04/2014.
288
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
TOPA – TODOS PELA ALFABETIZAÇÃO: DESAFIOS À CONTEXTUALIZAÇÃO E
AO LETRAMENTO - RELATOS DE ALFABETIZANDOS DO PROGRAMA NO
SEMIÁRIDO JUAZEIRENSE
INTRODUÇÂO
O desejo de se fazer um estudo focado no ensino da Educação de Jovens e Adultos se deu a
partir da experiência enquanto coordenadora do Programa Todos pela Alfabetização (TOPA),
buscando através dessa pesquisa, desenvolver uma investigação sistemática das práticas
educativas dos educadores que atuam nesse segmento, com vistas a provocar uma discussão
analisando os aspectos relacionados à contextualização e ao letramento na perspectiva da
Convivência como o Semiárido, uma vez que os educandos que fazem parte dessa pesquisa
estão inseridos nesse contexto inventado como região-problema.
Pensar na alfabetização de Jovens e Adultos pressupõe compreender esse segmento na
concepção de que esses sujeitos aprendentes trazem consigo uma história de vida e, portanto,
são portadores de conhecimentos variados sejam eles adquiridos de sua experiência pessoal,
profissional ou escolar, que precisam ser respeitados e valorizados nas entrelinhas das
práticas alfabetizadoras, que possibilitem fazer desses sujeitos críticos e pensantes na
formação de pretensos agentes sociais. Entretanto, de acordo com Di Pierro et al (2001, p.01)
“o lugar da Educação de Jovens e Adultos pode ser entendido como marginal ou secundário,
sem maior interesse do ponto de vista da formulação política e da reflexão pedagógica”.
O estudo ora proposto tem como campo empírico seis turmas de alfabetização do Programa
TOPA, localizadas no Semiárido Juazeirense e é nesse ambiente de investigação que teremos
como foco a prática educacional dos educadores da EJA analisando os aspectos relacionados
à contextualização e ao letramento como pressupostos imprescindíveis na perspectiva da
Convivência como o Semiárido.
Nesse sentido a pesquisa é de caráter qualitativo por ser, sem dúvida o melhor caminho,
tendo em vista que se pretende fazer uma análise reflexiva e perceptiva, pressupondo assim,
estar mais próximo dos sujeitos pesquisados, educadores e alunos, contexto escolar.
289
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Para tanto a construção do texto foi dividido em partes: a primeira trata de fazer um breve
recorte dos princípios que fundamentam o Programa de alfabetização TOPA, num segundo
momento farar-se-á uma relação entre os relatos desses senhores e senhoras como forma de
compreender como se deu o processo histórico de constituição do analfabetismo nessa região
estigmatizada que é o semiárido e na terceira e última parte será feita uma análise e uma
problematização das práticas educativas dos alfabetizadores na perspectiva da
contextualização e do letramento nas salas de aula do Programa.
O Programa TOPA - Todos pela Alfabetização foi implantado pelo Governador do Estado da
Bahia Jacques Wagner, no ano de 2007, como um desdobramento do Programa Brasil
Alfabetizado idealizado pelo então ministro da educação Fernando Haddad. O programa tem
como objetivo alfabetizar jovens e adultos baianos que tiveram seu direito a educação na
idade certa, negado.
O TOPA de acordo com a Secretaria de Educação da Bahia intenciona “elevar o nível de
alfabetismo de pessoas jovens, adultas e adultos idosos, a fim de garantir-lhes as
oportunidades necessárias à apropriação da leitura, da escrita e da numeralização,
propiciando-lhes às condições objetivas para intervir na sua realidade” ( PPAlfa, SEC-BA,
2007). Através de parcerias estabelecidas com empresas públicas e privadas, movimentos
sociais, Universidades e Prefeituras Municipais por todo o estado da Bahia.
De acordo com o último censo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE) em 2012, “os estados do Nordeste têm os piores índices de analfabetismo do Brasil, e
foi constatado que 15,86% da população baiana é analfabeta”.
Tabela 1:
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
descontinuadas, tão antigas quanto ineficientes, que apareceram para erradicar o
analfabetismo desde o primeiro programa oficial criado em 1947.
Assim, os desafios da EJA estão para além de considerarmos os sujeitos aprendentes das
salas de alfabetização de jovens e adultos como vítimas, coitadinhos, dignos de piedade.
Requer sim, um olhar diferente sobre as questões que se consolidaram e caracterizaram a
trajetória escolar desses sujeitos que habitam o Brasil e principalmente o Semiárido
Brasileiro (SAB).
A trajetória escolar desses homens e mulheres que vivem no SAB se confunde com a história
da maioria dos adultos e jovens que hoje frequentam uma sala de EJA no restante do país.
Devido às dificuldades econômicas de suas famílias, esses sujeitos ao invés de irem à escola
291
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
enquanto crianças foram obrigadas a trabalhar desde cedo para ajudar os pais nos roçados
onde nasceram.
A tragédia inerente às secas é pintada com cores fortes, explorando ao extremo seu
cenário e conteúdo trágico. Os discursos e as imagens – construtores do regionalismo
– que falam e mostram o Nordeste estão repletos de subjetivações que
depreciam/estereotipam a região e os seus habitantes. Um imaginário social
composto por “flagelados”, “retirantes”, “mortos de fome”, “figuras esqueléticas”,
habitantes de uma região “inócua, de vegetação cinza e solo pedregoso”, que tem na
figura do vaqueiro e do agricultor o baluarte da resistência.
Esse paradigma clássico ressalta o autor, nos deixou uma educação alienadora e
domesticadora, que ignora a diversidade, as especificidades, os símbolos e o modo de se viver
nessa regiãosubjetividade. Uma educação alheia à realidade na qual os sujeitos estão
inseridos, descontextualizada em relação à cultura e a história construída por este povo, que
historicamente foram estereotipados e marginalizados, reféns da dicotomia superior-inferior,
civilizados-primitivos, desenvolvidos-subdesenvolvidos. (SILVA, 2010, p.3)
Desse modo, a história da educação escolar no semiárido não difere muito de outros
contextos marginalizados de outras regiões do Brasil, apresentando os mesmos problemas
encontrados na educação pública no restante do país: falta de estrutura, de políticas, de
conteúdos, de professores formados e qualificados.
Essas limitações legitimaram ao longo dos tempos fatores que implicavam no não
desenvolvimento da região
Nordeste como um todo, dificultando ações e intervenções que fossem capazes de criar
sustentabilidade socioeconômica por parte da população rural. (CARVALHO, 2011)
O relato de um alfabetizando confirma essa afirmativa:
“Nasci em 1976 e em 1978 meu pai morreu. Dai em diante eu não me lembro
da minha infância, eu só sei que foi de muita dificuldade, tive que trabalhar
para ajudar meus irmãos e não tive como ir para escola. (A.A.S., entrevista,
Setembro/2013, Juazeiro-BA”.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A aceitação das condições sociais e históricas cristaliza um discurso que reproduz a imagem
equivocada do Semiárido, o que nos permite entender como as relações de força, de poder e
os lugares sociais de onde se fala irão perpetuar, historicamente, suas marcas.
Neste sentido, Ferreira (2004), afirma que homens e mulheres são fazedores de histórias e,
portanto responsáveis pelo processo histórico, no meio em que vivem pelas gerações que
virão e pelos efeitos deste processo em torno da vida de todos, os seres.
Esse pensamento é abordado também por Nora (1993, p.09): “A memória é vida, sempre
carregada por grupos vivos e, nesse sentido, a está em permanente evolução, aberta à
dialética da lembrança e do esquecimento, inconsciente de suas deformações sucessivas,
vulnerável a todos os usos e manipulações, susceptível de longas latências e de repentinas
revitalizações”.
Dessa forma, é necessária e urgente uma educação que transcenda os moldes estruturais que
fundamentam os atuais programas de alfabetização de jovens e adultos que apontam para a
necessidade de mudanças paradigmáticas principalmente no aspecto relacionado ao ensino-
aprendizagem, na preocupação de alfabetizar para a vida, ou seja, “letrar” esses sujeitos
293
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
partindo do contexto no qual esses sujeitos estão inseridos, de forma que possam
problematizar, se indignar e transformar sua realidade.
Quando abordamos o tema educação de jovens e adultos, não nos limitamos apenas a
especificidade etária dessa modalidade de ensino da educação básica. Mas, principalmente
consideramos esses sujeitos aprendentes com especificidade cultural próprio. Oliveira (2001,
p. 15) ressalta que “apesar do corte por idade (jovens e adultos são, basicamente, “não-
crianças”).
A autora complementa enfatizando que:
O adulto – para a educação de jovens e adultos – não é o estudante universitário, o
profissional qualificado que frequenta cursos de formação continuada ou de
especialização [...]. Ele é geralmente o migrante que chega às grandes metrópoles
proveniente de áreas rurais empobrecidas, filho de trabalhadores rurais não-
qualificados e com baixo nível de instrução escolar (muitos frequentemente
analfabetos), [...] que busca a escola tardiamente para alfabetizar-se ou cursar
algumas séries do ensino supletivo (OLIVEIRA, 2001, p.16)
De acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais para EJA, essa modalidade de educação
desempenha as funções “reparadora, equalizadora e qualificadora” no processo educacional
(SOEK, 2009, p. 43). Isso significa reconhecer que:
A Educação de Jovens e Adultos representa uma dívida social não reparada para com
os que não tiveram acesso e nem domínio da escrita e leitura como bens sociais, na
escola ou fora dela, e tenham sido a força de trabalho empregada na constituição de
riquezas e na elevação de obras públicas. Ser privado desse acesso é de fato a perda de
um instrumento imprescindível para uma presença significativa na convivência social
contemporânea.
“Por não ter frequentado a escola na idade certa, e não saber ler e
escrever dificultava arranjar bons empregos. Por isso, resolvi voltar a
estudar, para ter acesso às novas tecnologias e uma melhoria na
qualidade de vida, pois sem educação o homem não é nada. (G.A.O,
entrevista, Setembro/2013, Juazeiro-BA)”.
Dessa forma, esses sujeitos não são apenas simples trabalhadores subempregados, oprimidos
e excluídos por políticas públicas elitistas, caracterizadas pelo coronelismo, onde a figura
tradicional do “coronel” além de deter o poder econômico e político da região, também
detinha o poder de usar a força para amedrontar aqueles que ousavam ser contrários as suas
ordens. Eles são acima de tudo gentes que compartilham o mesmo sonho de aprender a ler e
escrever.
Surgem as discussões e os desafios em torno das práticas educativas dos educadores da EJA,
uma vez que estes indivíduos sentem-se envergonhados de voltar à sala de aula depois de
atingiram a idade adulta, pois no imaginário deles a escola é um espaço de aprendizagem
para as crianças, se consideram cansados, “ruins da vista”, com sono. A maioria acredita que
o fato de não ter estudado, é culpa deles mesmos, desconhecendo eles que é direito
constitucional e assegurado o seu acesso à escolarização.
Esses e outros fatores podem interferir na motivação desses alfabetizandos em sala de aula o
desafio é portanto, romper com a postura fatalista e criar possibilidades, caminhos para uma
prática escolar que minimize as dificuldades de cada um, respeitando a autonomia, as
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
diversidades e as especificidades individuais, de forma a promover a permanência desses
homens e mulheres no processo educacional.
Freire em seus escritos também faz duras críticas aos métodos de alfabetização utilizados nas
turmas de jovens e adultos, argumentando que o uso de velhas cartilhas, cujos conteúdos
pautavam-se na repetição: “Ivo viu a uva”, é totalmente descontextualizada com a realidade e
o universo dos adultos.
...as palavras com que organizar o programa de alfabetização deveriam vir do
universo vocabular dos grupos populares, expressando a sua real linguagem, os seus
anseios, as suas inquietações, as suas reinvindicações, os seus sonhos. Deveriam vir
carregadas de significação de sua experiência existencial, e não da experiência do
educador. (FREIRE, 1996, p.20)
Uma alfabetização que construa significados para esses sujeitos, capaz de promover a
“intervenção no mundo” (FREIRE, 1996), rompendo com a ideologia dominante, excludente
que predomina há séculos no território nordestino. Valorizando os aspectos culturais e
sociais do lugar onde vivemos. Bem como a simbologia, a cultura e a história desse povo,
tornando-os capazes de promover uma transformação na constante busca de uma melhor
qualidade de vida, respeitando suas diversidades e seu ecossistema.
Os desafios dos alfabetizadores do TOPA no contexto do Semiárido estão em provocar uma
visão holística a cerca das questões que se consolidaram e caracterizaram a trajetória escolar
desses sujeitos que habitam esse lugar.
Oliveira (2001, p.16) acrescenta assegurando que: “Refletir sobre como esses jovens e adultos
pensam e aprendem envolve, portanto, transitar pelo menos por três campos que contribuem
para a definição de seu lugar social: a condição de “não-crianças”, a condição de excluídos da
escola e a condição de membros de determinados grupos culturais”.
Freire (1996, p.92) demonstra sempre uma preocupação com a prática educativa dos
alfabetizadores da EJA, por acreditar que a mesma não pode estar alheia as condições
concretas do tempo-espaço em que se dá o processo de ensino e aprendizagem,
fundamentada nos sujeitos e na sua relação com a história e a cultura no contexto no qual
está inserido.
Sobre a contextualização Silva (2011, p.24) postula que:
É um processo facilitador da compreensão do sentido das coisas, dos fenômenos e da
vida, enfatizando informações que o estudante tem e, encorajando a busca de novas
informações a partir dessas. Enfim, contextualizar implica em problematizar o objeto
em estudo a partir dos conteúdos, dos componentes curriculares, fazendo a
vinculação com a realidade, situando-os no contexto e retornando com um novo
olhar.
Isto significa dizer que para conseguir o sucesso com os alfabetizandos da EJA as práticas
“educativo-críticas” (FREIRE, 1996, p.110) devem estar pautadas na contextualização e no
letramento, uma vez que esses são pressupostos que embasam um processo de
ensino/aprendizagem capaz de promover a construção da cidadania bem como a capacidade
de intervenção desses indivíduos na realidade e no seu contexto, compreendendo e buscando
alternativas de desenvolvimento que promovam uma melhoria na qualidade de vida de suas
gentes e de seu ambiente natural. (FREIRE, 1996, p.110)
Soares (2003, p. 18) diferencia letramento de alfabetização:
[...] um indivíduo alfabetizado não é necessariamente um indivíduo letrado:
alfabetizado é aquele indivíduo que sabe ler e escrever; já o indivíduo letrado, o
indivíduo que vive em estado de letramento, é não só aquele que sabe ler e escrever,
mas aquele que usa socialmente a leitura e a escrita, pratica a leitura e a escrita,
responde adequadamente às demandas sociais de leitura e de escrita.
Dessa forma, letramento está para além da simples decodificação da escrita. Ou seja, o sujeito
aprendente deve ser capaz de aplicar a leitura e a escrita nas suas práticas sociais do dia-a-dia
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
como: ler livros, jornais e revistas, redigir uma carta, conseguir interpretar informações
numa conta de luz, ou numa bula de remédio, dentre outras.
No caso específico dos alfabetizandos da EJA do Semiárido Brasileiro, a alfabetização, os
temas abordados devem ser efetivados de forma que possam trazer significados para
cotidiano desses agentes, “e que sejam capazes de aplicá-los, por exemplo, ao estudo de
fenômenos da realidade e à vida”. (SILVA, 2011, p.27)
Nessa perspectiva alfabetizar a partir de práticas fundamentadas no letramento e na
contextualização, significa alfabetizar significativamente de modo que o sujeito aprendente
possa ampliar e reconfigurar seus saberes já existentes na sua bagagem histórica e com isso
ser capaz de relacionar e acessar novos conhecimentos associando com elementos da
realidade, e assim problematizar e compreender o contexto que o cerca.
Freire (1996, p.77) compactua desse pensamento quando diz que:
Mulheres e homens, somos os únicos seres que, social e historicamente, nos
tornamos capazes de apreender. Por isso, somos os únicos em quem aprender é uma
aventura criadora, algo, por isso mesmo, muito mais rico do que meramente repetir a
lição dada. Aprender para nós é construir, reconstruir, constatar para mudar, o que
não se faz sem abertura ao risco e à aventura do espírito.
Considerações finais
A realização deste estudo proporcionou uma maior proximidade com a cultura da
alfabetização de Jovens e Adultos, a partir de programas padronizados que não respeitam as
diversidades culturais, sociais e econômicas dos aprendentes que habitam o Semiárido
Brasileiro, um território permeado de complexidades histórico-geográficas e socioculturais
concebidas ao longo dos anos pelo estigma de “região problema”, imagem que reproduziu a
lógica excludente da educação formal capitalista.
O caminho percorrido durante a investigação foi importante na compreensão e na percepção
de que não há uma exigência com relação a formação do alfabetizador, o que vai na
contramão do que indicado na Lei de Diretrizes e Bases da Educação, Lei nº 9394/96, uma
vez que exigido apenas do alfabetizador, o ensino médio:
Art. 62º. A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível
superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos
superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do
magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental,
a oferecida em nível médio, na modalidade Normal.
Abordagem desse tempo também possibilitou uma análise mais íntriseca das estruturas
pedagógica, política e social que fundamentam a concepção teórica do Programa que tem em
sua bandeira o respeito ao direto à cidadania, ao aprendizado buscando assegurar uma
educação de qualidade.
Entretanto, como assegurar uma alfabetização de qualidade quando a exigência mínima para
ser um alfabetizador popular, basta ter formação no ensino médio. Ou seja, se ele não é
habilitado para exercer o magistério quais são os paradigmas que fundamentam sua prática
enquanto alfabetizador?
Diante disso, pode-se concluir que o nível de escolaridade dos alfabetizadores precisa ser
revisto, uma vez que se esse alfabetizador precisa estar habilitado e ter os conhecimentos
mínimos sobre os processos de alfabetização e letramento. Devendo o alfabetizador
fundamentar sua prática educativa na perspectiva de esses sujeitos aprendentes necessitam
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
para além do aprendizado da escrita e da leitura, precisam sim reconstruir seus saberes e
possibilitar uma aprendizagem que qualifiquem o alfabetizando a pensar criticamente esse
lugar “inventado”.
Os relatos dos sujeitos entrevistados contribuíram na investigação indicando que a história
desse povo sertanejo é recorrente, no qual a negação indenitária de homens e mulheres, seres
histórico-sociais contribuíram no formato desse triste retrato do analfabetismo fortemente
existente no Semiárido.
Dessa forma é necessário e urgente uma ressignificação holística das práticas alfabetizadoras,
especialmente na EJA, é necessário uma busca constante por metodologias e estratégias de
ensino que facilitem o aprendizado crítico-reflexivo, imbuído na promoção de melhorias na
qualidade de vida dessas pessoas que vivem e convivem com as peculiaridades desta região
demasiadamente singular.
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297
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
LIVRARIAS E LUGARES LIVRES: UMA LEITURA DO SER HUMANO
Ingrid Rodrigues 117
Vinicius Pascoal 118
RESUMO: As livrarias, durante muitos anos, foram espaço de encontros intelectuais, onde
grandes ideias eram debatidas e grandes pensadores encontravam-se num entrelugar de
boemia, para discutir não só literatura, mas política e todo o tipo de questão social. Esses
espaços físicos abriam suas portas para o saber e para a fomentação de novos ideais políticos.
Segundo Morin (2007), Adorno (2002) e Sardar (2010), as livrarias eram mais do que um
local da indústria cultural: era um espaço cultural. Contudo, nos últimos anos com o aumento
da tecnologia e dos meios de comunicação em massa, o acesso aos livros vem sendo facilitado
por mecanismos inovadores: desde as fontes institucionais de consulta online (Internet
Archive, JSTOR, OpenLibrary, etc) até os caminhos livres (P2P, 4Shared, Scribd,
Megaupload, entre outros). As campanhas publicitárias direcionadas pelo greencommerce
também posicionam um duelo do papel impresso versus E-Ink. Tudo pelo bem da natureza
ou do habitat mercadológico? As livrarias estão mudando seu espaço, diminuindo
fisicamente enquanto ampliam a logística dos longínquos destinos através da internet, redes
sociais e correios. Em tempos atuais, restaria ao livro, e às suas catedrais chamadas livrarias,
o destino apocalíptico que fora denunciado por Ray Bradbury em Fahrenheit 451 (1951),
George Orwell, em 1984 (1949) ou Huxley, em Brave New World (1932)? Esta
comunicação visa discutir que espaço sobra às livrarias, e também debater as atuais formas
de acesso aos livros.
PALAVRAS- CHAVE: Formação de Leitores. Indústria cultural. Literatura de massa.
Literatura online. Locais de Cultura
ABSTRACT: Bookstores during many years have been a place to intellectual meeting and
great ideas debates. A place to hobnob not only about literature but also about new political
ideals.
As Morin (2007), Adorno (2002) and Sardar (2010) think, bookstores were more than a
cultural industry’s place it is a cultural place. Nowadays technological culture brings easier
mechanisms to book diffusion (Internet Archive, JSTOR, OpenLibrary, etc) and non-
licensed options (P2P, 4Shared, Scribd, Megaupload, entre outros) while publicitary
campaigns known as greencommerce posit a duel against paper and E-ink and physical
bookstores migrate their stores through virtual web space to achieve more and more
consumers around the world. This article proposes a critical review about bookstores in our
society alluding to Ray Bradbury in Fahrenheit 451 (1951), George Orwell, in 1984 (1949)
and Adous Huxley, in Brave New World (1932).
KEYWORDS: Reader’s formation; cultural industry; mass literature; internet literature; local
of culture;
Introdução
Da invenção do Papiro à era digital, o livro passou por profundas transformações,
conseguintemente, sua forma de reprodução e circulação sofreu os ajustes necessários do
tempo e das novas estruturas sociais que surgem e mesclam-se continuamente. O livro, tal
qual conhecemos hoje impresso, foi possível graças à invenção da imprensa por Johannes
Gutemberg no século XV. De lá pra cá, a metodologia para impressão de escritos evoluiu, a
tipografia deu subsídio para modernas impressões e melhorias gráficas. Os livros foram
subindo de qualidade e variedade e seus locais de circulação também foram ampliados.
O domínio da palavra escrita durante muito tempo esteve restrita ao clero, nos mosteiros
haviam enormes bibliotecas e aquele acervo esteve ligado à pratica religiosa. A população não
tinha acesso aos livros. Os poucos livros que circulavam eram enviados sob encomenda. Não
117Discente do mestrado em Teoria da literatura pela UFPE-PPGL. Professora de Literatura, graduada em Letras pela UPE. É
pesquisadora do NELI-UFPE. Residente na cidade do Recife - PE. ([email protected])
118É discente do mestrado em Teoria da literatura pela UFPE-PPGL. É tradutor e professor em língua inglesa, graduado em
letras pela UPE, especialista em tradução pela FAFIRE. É membro do NELI-UFPE. Residente na cidade do Recife- PE.
([email protected])
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
havia um espaço fixo para esse tipo de comercialização. Buscar datas sobre qual foi de fato a
primeira livraria da história é uma tarefa infindável. Entretanto, o Guiness Book adotou a
Livraria Bertrand, localizada em Lisboa Portugal, como a livraria mais antiga em
funcionamento no mundo. Aberta desde o ano de 1732, ela nunca cessou o seu
funcionamento. Sendo um dos lugares mais frequentados no Chiado, contando com um
acervo que se renova continuamente. Há também em Portugal, a Livraria Lelo e Irmão,
localizada na freguesia Vitória, em Porto. Que está em funcionamento desde 1864 e ainda
preserva a estrutura original, considerada por muitos intelectuais uma das mais belas do
mundo, é ponto de encontro dos estudantes da Universidade do Porto, que utilizam de seus
corredores para discutir arte, filosofia, política entre outros assuntos. Fazendo da livraria
mais que local de consumo, mas um local para troca de ideias.
No Brasil, a história das livrarias se mescla com a história da formação intelectual do próprio
país. Inicialmente os jovens estudantes precisavam fazer encomendas de livros da Europa.
Segundo MACHADO (2009), o Colégio dos Jesuítas foi o primeiro ponto de venda dos livros
no Rio de Janeiro. Com a vinda da família real portuguesa para o Brasil, no ano de 1808, o
comércio de livreiros começou a se espalhar, contribuindo para a formação de um público
leitor e a implantação das primeiras livrarias. Também no Rio de Janeiro, está localizada a
livraria Ao Livro Verde, em funcionamento desde 1844 e considerada a livraria mais antiga e
ainda em funcionamento de todo o país. Tendo passado por duas guerras mundiais, e
acontecimentos políticos importantes no Brasil como a abolição da escravatura, proclamação
da república e ditadura. Interessante entender esse processo, que tem haver com a própria
formação do publico leitor no Brasil.
O idioma falado no Brasil, tal como conhecemos hoje, foi o processo de várias mudanças
significativas no português de Portugal, mais a fusão dos diversos dialetos indígenas, a
influência dos idiomas trazidos pelos imigrantes de todas as partes do mundo que aqui se
instalaram, além é claro, dos dialetos trazidos pelos escravos dos diversos países do
continente africano. Podemos dizer que o português brasileiro, ou simplesmente “brasileiro”,
não é uma língua única. Ele é diversificado em sua própria raiz e através de seus próprios
falantes. Com um país numa extensão tão grande, é impossível não ter variações linguísticas
tão difusas. De norte a sul, a língua é o reflexo da transculturalidade119 do nosso país. Essa
variação na língua falada pelo país, durante muitos anos foi “esquecida” durante o estudo da
língua escrita, criando-se um mito de univocidade da língua. Não existe forma legítima de
falar “brasileiro” o que existem são variações que foram utilizadas como padrão pela
gramática normativa. Essa padronização mais tem haver com interesses econômicos, que
linguísticos, sendo chamado até de língua “culta”.
A reflexão sobre a linguagem não é um assunto novo, na Grécia antiga muitos pensadores já
buscavam as formas de estudar a língua, bem como seus mecanismos de funcionamento,
entretanto, só a partir do século XX, com os estudos de Saussure, que a linguística passa a ser
adotada como ciência e vem se estruturar como o estudo da linguagem, propriamente dito,
nos seus usos e costumes dentro de uma sociedade.
Competência linguística é o que se diz quando o falante sabe se adequar em diferentes
situações que requerem diferentes usos da língua. A linguística ajuda a entender a estrutura e
a especificidade de cada língua e o surgimento desta ciência foi um divisor de águas dentro da
sociedade e tem sido um agente modificador nesta forma de pensar, encontrando conceitos
linguísticos universais que se apliquem, mesmo que de forma abstrata, a todos os usuários de
todos os tipos de linguagem humana.
Língua e poder estão diretamente ligados, na sociedade brasileira só quem tem direito à fala é
uma minoria. A norma culta está canonizada nos livros e na gramática, nas situações
cotidianas as variantes se mesclam e nos dão um panorama social do país. A língua(gem) do
motorista de ônibus, não é a mesma do médico; que por sua vez, não é a mesma língua(gem)
de um político. Um pedreiro não fala a língua(gem) do bancário, mas dentre todas essas
119 Bhaba, Homi. O Local da Cultura. Belo Horizonte: Editora UFMG, 1998
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
profissões citadas, há uma relação de necessidade e poder. A língua(gem) é o distanciamento
e a aproximação. Como se fala determinará quem você é, infelizmente é o nosso retrato
social. Quando aparecem na televisão entrevistas de pessoas mais simples, que não tiveram
acesso à educação, o discurso do indivíduo muitas vezes é satirizado, ou pior, usado para
diminuição do mesmo. As diferenças linguísticas são diferenças sociais. O direito à fala é
dado aos mais competentes, mas essa competência é distribuída de maneira muito injusta. O
competente é tido como aquele que sabe se comportar e relacionar nas mais diversas
variações da língua. O que o torna capaz de comunicar-se com qualquer pessoa. É uma
democratização da fala, um “intérprete” dos mundos, das classes, das tribos, das regiões. A
competência linguística gera poder de persuasão. Mas essa tal competência, deveria
teoricamente ser distribuída para todos durante a escolarização. Mas o direito à expressão
ainda não é de interesse político. Uma possível explicação para o baixo investimento
financeiro, por parte dos governantes, numa educação de qualidade para todo o povo. Um
sujeito competente é aquele que seria capaz de raciocinar e interferir efetivamente no país, na
política, no consumo. Não há espaço para mais “pensantes” neste país que cresce vendo o joio
e o trigo se fortalecendo na mesma proporção. Uma mistura de desenvolvimento econômico e
escândalos de corrupção. A realidade é que uma população ignorante é passível de ser
controlada.
Os processos de ensino da língua brasileira influenciam transversalmente na competência
linguística dos brasileiros. A língua brasileira, cheia de ambiguidades e beleza, não é
ministrada de maneira diligente nas escolas. O ensino é muito mais normativo que descritivo.
A grande maioria dos brasileiros tem contato com a literatura apenas como disciplina escolar,
e não como uma brecha de libertação de mente, ou uma forma de manifestação da arte. Os
brasileiros aprendem texto não com o objetivo de interferir e compreender as entrelinhas,
mas de aprender a responder questões. Não estimulam os jovens a pensarem, talvez para que
isso não se torne um problema no futuro. A implantação de um pensamento crítico na
infância poderia levar um país ou ao desenvolvimento, ou a loucura, ou ao caos. Segundo
Bakhtin (2000) os mecanismos signicos que tangem os processos da linguagem, tanto os
linguísticos como os extralinguísticos, são essenciais para compreensão da fala. Isso ocorre
pelo fato que cada um compreende a vida, a língua e os discursos, ponderando de acordo com
o conhecimento de mundo que carrega em si mesmo.
Diante de tudo isso, fica difícil obter uma diagnose de um público leitor no Brasil, dos anos
que se iniciou a alfabetização do país, até os dias de hoje, o público leitor do Brasil cresceu na
mesma proporção das livrarias. Não pode-se afirmar que eram tipos leitores conscientes mas
durante um momento histórico muito importante no país, esses frequentadores de livrarias,
foram de importância fundamental para as transformações políticas que aconteciam de foras
das portas desses redutos literários.
O Brasil é um país jovem, quinhentos anos de história, não conseguem dar conta de tanta
informação e da formação intelectual que alcance a todos. Quinhentos anos também não dão
conta de uma literatura, e ainda mais: Não fecham esse déficit de informações que foram
negadas durante muito tempo aos brasileiros. O direito a fala, e o direito a escrita.
Após mais de trezentos anos de “descoberto” é que o país conquistou sua primeira livraria. E
o que isso representa, uma possibilidade de mudança social. Um espaço dedicado não só à
literatura e leitura, mas espaços de conversas. Esses espaços de cultura, propriamente, darão
suporte para o que viria no Brasil no século XX.
Para Lajolo (2012, p. 123) a literatura e a leitura tem um valor positivo por um status que ela
concede aos seus “dominadores”. É a marca no imaginário que o conhecimento era restrito a
determinados grupos sociais.
300
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Como vimos, durante largo tempo, em vários locais, leitura e escrita foram privilégio
dos sacerdotes. Depois o privilégio foi se estendendo a outros grupos sociais. Depois,
finalmente, leitura e escrita democratizaram-se. Democratizaram-se em teoria, ao
menos. O que já é alguma coisa! Por aí. E é nesse momento de democratização da
leitura e da escrita que se pode inscrever a reinvindicação do acesso amplo, geral e
irrestrito, à literatura. A toda e qualquer literatura. À popular e a erudita. À tida como
excelente e À tida como não tão excelente. Não é?
O pensamento de Lajolo é coerente com a busca de igualdade que procuramos para o nosso
país, infelizmente, não faz parte da nossa realidade essa democratização da leitura, pelo
menos, ainda há um caminho muito longo a ser caminhado até esse suposto acesso irrestrito.
Os caminhos até as livrarias já são mais democráticos, elas fazem parte do círculo social de
muitas pessoas, o passeio à livraria já é muito praticado. Livros para ter livros, não para ler
livros. Apenas reflexo da indústria de consumo. Um produto da Indústria Cultural. Mas nem
sempre foi assim. O local sagrado da livraria já foi usado para o oposto de tudo isso.
Ao longo deste século, assistimos mutações no modo de viver dos brasileiros, juntamente
com as transformações sociais, vieram transformações nas esferas culturais que foram de
extrema importância para a solidificação intelectual do nosso país. A história se constrói com
o sacrifício de muitos, a fomentação de ideias e o desejo de melhorar. A história do Brasil foi
rabiscada dentro de inúmeras livrarias espalhadas pelo Brasil, que reunia intelectuais de
diversas áreas, que discutiam sobre política, literatura, poesia, filosofia, entre outros
assuntos.
As livrarias eram ponto de encontro, e por vezes pontos de resistência. Durante a ditadura
militar no Brasil, mascarados pela Boemia (ou não) muitos intelectuais, usavam esses
espaços de cultura para lutar contra o regime que estavam vivendo. Há um exemplo muito
bom para esse assunto. No Recife, a livraria Livro Sete, foi fundada na década de 70. E foi um
berço onde nasceram vários escritores, na realidade ele é considerada como grande quartel
general da geração de poetas pernambucanos de 65.
[...] A Livro 7 transcendeu a carismática figura de Tarcísio Pereira, a hegemonia de um
bloco de esquerda, e tornou-se orgulho de todo o pernambucano. [...] passou a ser uma
espécie de Academia Pernambucana de Letras, na qual ter o seu retrato acima das
estantes significava um reconhecimento e uma certa imortalidade para a sociedade
literária pernambucana. Não foram poucos os intelectuais, escritores e poetas que
doaram os seus retratos para ali ficarem expostos: Gilberto Freyre, Ariano
Suassuna, César Leal, João Cabral de Mello Neto [...] (D’MORAIS, 2008).
A Livro 7, ilustra o papel social e cultural das livrarias naquela época. Pouco depois, durante
a ditadura, o seu proprietário, Tarcísio Pereira, ignorou todas as regras e repressão e
continuou importando todos os tipos de livros. E continuou abrindo suas portas para as
reuniões que aconteciam continuamente. Esta livraria por cinco anos foi a maior do Brasil,
referência da intelectualidade Pernambucana e um ponto Turístico. A Livro 7 foi pioneira em
abrir seu espaço e deixar os livros a mostra, para que os leitores pudesses folheá-los. Era
quase como uma grande biblioteca. Com grandes poltronas, espaço amplo e ambiente
aconchegante. Também promovia lançamentos de livros, noites de autógrafos entre outras
atrações para promover a livraria. Hoje, várias livrarias utilizam desse conceito para atrair
mais clientes-leitores.
É embaraçoso ver como o papel social das livrarias mudou, ainda é um ponto de encontro.
Mas o espaço da intelectualidade foi sufocado pela indústria cultural. E as livrarias hoje são
Megastores que não estão preocupadas com a propagação da leitura, tampouco no auxílio da
divulgação de novos escritores, o que nos resta nas grandes livrarias são grandes cafés para
“pseudo intelectuais” e um afogamento nos chamados Best sellers escolhidos pelas grandes
editoras. Toda essa “calmaria” política esfriou a chama reacionária dos frequentadores de
livraria, ou simplesmente as pessoas mudaram. Não somos contra a democratização das
livrarias, longe disso. Somos militantes no que se refere à qualidade da leitura que será
oferecida a esses novos leitores. Lajolo (2012) fala de qualquer literatura. Pensamos sobre
isso com um pouco mais de responsabilidade. Como já foi supracitado, a aumento de pessoas
alfabetizadas não significa o aumento de leitores, pelo menos não proporcionalmente,
também é preciso se pensar, que o aumento de leitores, não implica na qualidade das
301
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
leituras, sem utilizar de um olhar elitista. Apenas com um olhar mais crítico. Se a função
principal da literatura é estimular o leitor a pensar, ao engolir esses livros expelidos pela
indústria cultural o leitor (com toda boa vontade de se iniciar leitor) não estará sendo
contemplado por essa função principal. Evidente, deve-se começar por algum ponto. E não
condenamos ficções nem tampouco desmerecemos todos os livros na lista “dos mais
vendidos”. Apenas entendemos que todo o sistema mudou e que infelizmente, livros e
livrarias não cumprem como deveriam seu papel essencial. Será preciso uma reformulação
nas estruturas das livrarias? A morte do livro está eminente? Ou a livraria de fato, já é uma
instituição falida? Essas grandes lojas não passam de mais um local para bens de consumo?
Veremos adiante esses conceitos e como as novas tecnologias mudaram as estruturas das
livrarias.
LUGARES LIVRES
Muito foi dito e problematizado, neste ensaio principalmente, sobre o espaço estrutural e
físico onde habita o livro. Se levado em consideração a dual campanha de opositores feita por
Eco (2008), em Apocalípticos e Integrados, o diagnóstico de nosso sistema de aquisição e
difusão de livros em locais físicos estará entre assumir uma posição apocalíptica ou
integrada. A opinião do crítico, aqui, sendo estendida não apenas aos objetos da cultura de
massa, mas às livrarias também. Contudo, se for possível ampliar a compreensão do mundo
daqueles que se dizem leitores críticos o resultado desta leitura do ser humano não tenderá
nem ao apocalipse nem à integração em totalidade. Temos aqui uma posição influenciada
tanto por Baudrillard (2004), em Às sombras das maiorias silenciosas, Morin (2007), em A
Cultura de Massas, e do canadense Marshall Mcluhan (2008), em The Medium is the
Massage.
No atual estado dito pós-contemporâneo de nosso mundo a livraria, definitivamente, não
carrega mais o status de espaço cultural. Ela é antes de tudo um símbolo social e cultural.
Símbolo esse que em nossa sociedade atribui qualidade valorativa aos seus frequentadores.
Assim, vista aquele espaço o erudito, o intelectual, o cidadão diferenciado. Embora, todos
esses estejam naquele ambiente apenas de passagem. Passagem para o café do final de
semana. Para a foto selfie, para o encontro corriqueiro com os amigos, que em seguida vão ao
show, ou ao museu, espaço cultural, bar da esquina, circuito de barco e afins. A livraria se
torna um local aurático múltiplo de uma sociedade mercadologicamente serva do
capitalismo. A livraria, na sua condição atual de Megastore seriam objetos de desejo (e
prazer) analítico aos bons críticos da amável semiótica da cultura, aos militantes dos estudos
culturais e também ao Bourdieu, Barthes e Baumman.
A livraria é um local para se passar o dia. E na condição de Megastore também serve para
salvar o planeta, seja com bolsas ecológicas a preços [nada]módicos ou mensagens positivas
em marcadores de texto. É um espaço que substitui sacolas plásticas quando o cliente já
dispõe de bolsa, mochila ou acessório semelhante. É onde o Pocket Show gratuito vende cd’s
e dvd’s enquanto divulga novos artistas e lançamentos das mais diversas expressões
artísticas. É a livraria que acolhe os artistas de hoje e os intelectuais em formação de amanhã.
Toda livraria é templo simbólico que marca o fim da (longínqua) torre de marfim.
O poeta, o escritor, o artista e o pensador da (pós)modernidade pode, e deve, se assim quiser
de fato assumir sua condição pop estar, ou ser, vislumbrável em horários comerciais pela
livraria, de preferência nos ambientes destinados aos comestíveis. O pop é tudo aquilo que é
popular. A livraria é um lugar popular. Popular é tudo aquilo que seja usado, comum, do
agrado ou pertencente ao povo. O comerciante, a doméstica, o motorista, o cobrador, a
atendente de telemarketing, o médico, o juiz e o doutor. Tudo listado é povo. E assim como
todo empreendimento previsto por Marx em O capital (1867), a livraria também estará de
braços, melhor: portas, abertas a receber o capital do povo.
Em Bradbury Fahrenheit 451 (1951), George Orwell, em 1984 (1949) ou Huxley, em Brave
New World (1932), anunciavam-se mundos em que o povo era alvo de tamanha opressão
intelectual que não conseguia mais pensar o espaço livre das livrarias. Em Fahrenheit (451) o
livro se torna objeto aurático, espaço limite em que a imaginação humana não pode mais
acessar. Em 1984 (1949), o ser humano entra em embate com o sistema que domina e molda
302
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
suas práticas culturais, enquanto que em Brave New World (1932) a sociedade dividida em
castas já indica o modus operandi de cada ser humano naquela sociedade e que práticas
culturais ele estará disposto a estabelecer. Nas três obras supramencionadas encontra-se
semelhanças e diferenças quando comparadas ao nosso mundo empírico do século XXI.
Essas questões de acessibilidade e difusão da cultura inquietam filósofos, sociólogos, críticos
literários e demais conjunto de pensadores do tempo atual. Contudo, não nos resta solução
de intervenção direta. Não há mais espaço para uma resolução teleológica como propunham
as grandes narrativas que nos antecedem. E é interessante lembrar que nas três obras ditas
“ficcionais” acima nenhuma resolução favorece a humanidade oprimida. Nenhum dos
personagens protagonistas, seja Montag, Winston Smith ou John, consegue a libertação
heroica de seu povo. O desespero humano em busca de um lugar livre é aquilo que move
essas três personagens. O desespero e a inquietação. O desassossego que estimula a repensar
o sentido de liberdade das práticas humanas, seja a de leitura ou a de pensamento. A que vale
levantar um debate sobre as livrarias quando se vive numa sociedade em que o cidadão
precisa escolher entre os itens da cesta básica ao invés da cultura e da informação? Onde o
letramento não é conclusivo e efetivo. Onde os índices de analfabetismo funcional continuam
ganhando espaço em pesquisas e levantamentos. A literatura é a grande arma, o grande
tesouro dos locais livres. A livraria também se vale de morada da literatura. Mas embora hoje
a literatura esteja disponível em demasiados lugares livres, a internet e os aplicativos de
celulares, por exemplo, ela ainda é um espaço pouco procurado, pouco visitado pela geração
atual. É preciso trabalho e ações, sejam públicas ou privadas, em busca de uma nova cultura
da educação, informação. Uma disposição que esteja além dos papéis. Para mesurar o
desconforto das livrarias e dos lugares livres, eis um resultado de pesquisa recente que foi
desenvolvido pelo SESC SP, entre 31 de Agosto e 8 de Setembro de 2013, em 25 estados, 139
municípios e 2.400 entrevistados:
Referências
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BAGNO, Marcos. Preconceito Lingüístico: o que é, como se faz. São Paulo: Ed. Loyola, 2001.
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Editora Brasiliense. 1.ed., 2004.
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BRADBURY, Ray. Fahrenheit 451. HarperVoyager, 2008.
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<http://interpoetica.com/site/index.php?option=com_content&view=article&id=703&catid=0>. Acesso em:
04.Abril de 2014
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HUXLEY, Aldous. Brave New World. Vintage Books, December 2007.
MACHADO, Ubiratan. Pequeno Guia Histórico das livrarias brasileiras. São Paulo: Ateliê Editorial, 2009
MCLUHAN, Marshall. The Medium is the massage. An inventory of effects. UK: Penguin, 2008.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
MORIN, Edgar. Cultura de Massas no Século XX, V1: Neurose. Coleção Espírito do tempo. São Paulo: Forsense
Universitária, 2007.
ORWELL, George. Nineteen Eighty-four. Penguin Books Ltd, October, 2008.
PEREIRA, Tarcísio. A livraria Livro 7 e a Geração 65. In: BEZERRA, Jaci (Org.). Geração 65: o livro dos trinta
anos. Recife: Fundarpe, 1997. p. 140-1454.
SARDAR, Ziauddin. VAN LOON, Borin. Introducing Cultural Studies: A graphic guide. Icon Books, September
2010.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
[ENTRE] LAÇOS DE MEMÓRIAS: COMPARTILHANDO AS LEMBRANÇAS DA
INFÂNCIA
NA PERSPECTIVA DO LETRAMENTO LITERÁRIO
RESUMO: A leitura é uma atividade naturalmente interativa, pois o leitor interage com o
autor e todas as vozes que dali emergem por meio do texto. Quando se trata da leitura
literária, são muitos os desencontros na sala de aula. Por essa razão, a escola precisa
conscientizar-se do seu papel fundamental na formação do leitor literário. A pesquisa aqui
apresentada configura-se como um relato de experiência na perspectiva do letramento
literário, vivenciada no segundo semestre do ano de dois mil e treze, junto a uma turma do 9º
Ano do Ensino Fundamental da Escola Estadual Tristão de Barros (Currais Novos-RN).
Apresenta uma abordagem qualitativa e segue a orientação das quatro categorias defendidas
por Hamilton. A atividade que foi intermediada por textos/ ilustrações produzidos por uma
senhora de 92 anos, foi avaliada como bastante significativa, considerando a dinâmica de
interação dos alunos e demais participantes e também porque promoveu a reflexão e a
[re]significação da leitura, sobretudo a leitura literária, e das concepções de memória e
velhice.
ABSTRACT: Reading is a naturally interactive activity, as the reader interacts with the
author and all the voices that emerge from there through the text. When it comes to literary
reading, there are many disagreements in the classroom. For this reason, the school needs to
become aware of its key role in the formation of the literary reader. The research presented
here appears as an experience report from the perspective of literary literacy , experienced in
the second half of the year two thousand and thirteen along to a class of 9th grade Basic
Education State School Tristão de Barros (Currais Novos-RN). It presents a qualitative
approach and follows the guidance of the four categories advocated by Hamilton. The activity
that was mediated by texts / graphics produced by a lady of 92 years was assessed as very
significant, considering the dynamics of interaction between students and other participants
and also because it promoted reflection and [ re] significance of reading, especially reading
literary, and conceptions of memory and aging.
INTRODUÇÃO
A leitura é uma atividade naturalmente interativa, pois o leitor interage com o autor e todas
as vozes que dali emergem por meio do texto.
Entretanto, quando pensamos na leitura dentro do espaço escolar, muitas vezes seu
encaminhamento segue uma abordagem fechada, utilitarista e homogênea, provocando
assim a perda significativa de sua função social, pois não transcende aos limites da
decodificação.
Quando se trata da leitura literária, os desencontros na sala de aula são ainda maiores e mais
graves. Certamente pela subjetividade que o texto literário apresenta, ou pela dificuldade de
se atribuir a este sentidos homogêneos, o texto literário ainda se encontre em segundo plano
no ambiente escolar, ou mesmo marginalizado.
A escola, a agência institucionalmente reconhecida como promotora do letramento, é o
espaço que precisa conscientizar-se do seu papel fundamental na formação do leitor. Dessa
forma, é o professor um dos principais personagens responsável pela difusão da leitura.
120Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) – Mestranda do PROFLETRAS – Campus de Currais Novos – RN.
Professora de Língua Portuguesa e Literatura da Escola Estadual Tristão de Barros – Currais Novos –RN (Ensino Fundamental
e Ensino Médio Inovador) E-mail: [email protected].
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Nesse sentido, a pesquisa aqui apresentada configura-se como um relato de experiência na
perspectiva do letramento literário, vivenciada no segundo semestre do ano de dois mil e
treze, junto a uma turma do 9º Ano do Ensino Fundamental da Escola Estadual Tristão de
Barros.
Trata-se de um evento de letramento em que os alunos foram instigados a reavivar as suas
memórias de infância, para enfim, pensar na dimensão dessas memórias quando a idade é
outra, ou seja, pensar no significado dessas memórias sob a perspectiva do olhar de alguém
mais velho.
Para isso, os alunos leram, observaram e interpretaram alguns Textos/Ilustrações (T/I) que
compõem as memórias literárias de Dona Cota.
A pesquisa apresenta uma abordagem qualitativa e segue a orientação das quatro categorias
defendidas por Hamilton.
A atividade foi avaliada como bastante significativa, considerando a dinâmica de interação
dos alunos e demais participantes e também porque promoveu a reflexão e a [re]significação
da leitura, sobretudo a leitura literária, e das concepções de memória e velhice.
A Escola Estadual Tristão de Barros está localizada na zona urbana do município de Currais
Novos – RN.A escola atua na cidade há trinta e cinco anos e contempla o Ensino
Fundamental durante o turno matutino, e o Ensino Médio, na nova configuração de Ensino
Médio Inovador, nos turnos vespertino e noturno.
Os professores que compõem o corpo docente da escola são todos formados em suas áreas de
atuação, o que possibilita uma maior credibilidade ao trabalho realizado por toda a equipe.
Dentre as inúmeras proposições que integram a concepção pedagógica da escola está a
necessidade de difundir e potencializar as atividades de leitura, como forma de promover a
aquisição das competências necessárias ao aluno para que este possa interagir com textos
orais e escritos, nas mais diversas esferas sociais, de forma proficiente. Assim, os professores
são constantemente estimulados e provocados a propor aos alunos a leitura de textos dos
mais diversos gêneros, inclusive os literários.
Nesse gênero, o autor escreve suas memórias não pelo simples ato de relatar fatos
acontecidos em um determinado tempo e espaço, mas escreve-as pela via da criação estética,
ou seja, o autor de memórias fala de suas experiências com adornos de criatividade,
inventividade, emoção e devaneio. Dessa forma, estas memórias ultrapassam os limites da
individualidade e adquirem o caráter universal, considerando que o leitor tende a se
identificar com cada uma delas pelas inúmeras possibilidades de interpretação e identificação
sugeridas.
306
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
3. MAS, QUEM É DONA COTA?
Maria Raquel de Medeiros dos Santos (in memoriam), mais conhecida como Dona Cota,
nasceu em 24 de fevereiro de 1921, no sítio Várzea, município de Acari-RN, cidade em que
morou até 1942, quando se casou e, em seguida, mudou-se para Jardim do Seridó, cidade
onde viveu até os seus 92 anos de idade.
Na infância gostava de brincar com seus primos embaixo dos cajueiros e de correr pelo
terreiro. Ajudava sua mãe a cuidar da casa e dos irmãos menores.
Dona Cota teve 19 filhos, entretanto apenas 12 destes sobreviveram. Sempre dedicada à
família e à fé católica, dedicou parte de seu tempo à cozinha no preparo de pratos típicos do
Seridó como canjica, pamonha, galinha caipira, e arroz doce.
Aos 90 anos, decidiu comprar um caderno de desenho e uma coleção de lápis de cor para
registrar suas lembranças da infância e juventude como um exercício de pura descontração.
Produziu 30 Textos/ Ilustrações (T/ I) que foram publicados e lançados em 2013, no livro
Minha infância minha vida: livro de memórias. Faleceu no mesmo ano, aos 92 anos de
idade, deixando um legado de cores e lembranças.
4. METODOLOGIA
A referida pesquisa segue uma abordagem qualitativa considerando o objeto estudado, pois
não há a possibilidade de uma mensuração quantitativa dos dados coletados.Além disso,
configura-se como uma pesquisa-ação, pois implica na realização de um estudo junto a
grupos sociais (OLIVEIRA, M 2008, p: 74), no caso específico desse estudo, uma turma de
Ensino Fundamental da Escola Estadual Tristão de Barros.
A atividade é, inicialmente, uma proposta de leitura literária de alguns Textos/Ilustrações
que integram o livro Minha infância minha vida: livro de memórias de Dona Cota, para
enfim tornar-se uma entrevista junto a pessoas mais velhas da família a respeito das
memórias resguardadas por cada um, além do registro em forma de ilustrações das memórias
relatadas.
Ao considerar a leitura e escrita como práticas sociais que têm o poder de legitimar papeis
sociais, potencializar a cidadania e [re]significar a inserção e atuação do indivíduo na
sociedade por meio da reflexão, a literatura, que é um projeto discursivo permeado de
singularidades e sentidos, em que interlocutores interagem em um processo constante de
construção e desconstrução de sentidos, precisa assumir um papel de importância na escola.
Ou seja, são necessárias e urgentes muitas discussões voltadas para o letramento literário no
âmbito escolar, na tentativa de avaliar e propor novos caminhos mais adequados para sua
escolarização.
É sim o letramento literário um grande desafio, pois, a princípio, não é possível e nem
mesmo desejado, evitar que a literatura passe por esse processo de escolarização. É
imprescindível que a escola se aproprie da função de promover a inserção e a valorização da
literatura em seus espaços de construção de saber. No entanto, segundo Soares, é necessário
estar atento para uma escolarização da literatura pautada em propostas errôneas,
inadequadas, que comprometem, corrompem o literário quando o transforma em escolar.
(2001, Apud COSSON, 2006, p: 19)
Pensar a literatura enquanto projeto estético, discursivo, é pensar na sua natureza particular
de pensar e dizer o que muitos pensam e dizem; a literatura pensa e diz de maneira única,
complexa e compreensível a todos, porque organiza seus sentidos pelo viés da fruição, por
isso humaniza, porque amplia, multiplica, [re]significa o sentido da vida.
Humanização é o processo que confirma no homem aqueles traços que reputamos
essenciais, como o exercício da reflexão, a aquisição do saber, a boa disposição para
com o próximo, o afinamento das emoções, a capacidade de penetrar nos problemas
da vida, o senso da beleza, a percepção da complexidade do mundo e dos seres, o
cultivo do humor. A literatura desenvolve em nós a quota de humanidade na medida
em que nos torna mais compreensivos e abertos para a natureza, a sociedade, o
semelhante. (CANDIDO, 2004, p. 180)
Cuidando das Memórias é o nome da atividade aqui apresentada. Para compreender sua
dinâmica aqui estudada parte-se das considerações de Hamilton acerca do conjunto de
elementos que integram a cena de todo e qualquer evento de letramento.
A presença desses elementos aponta para a complexidade do letramento em uso. Para
entendê-lo, devemos levar em consideração não apenas as evidências empíricas observáveis
nos eventos de letramento – quem faz uso de textos, onde e como – mas também os
elementos invisíveis, tais como sentimentos, conhecimentos, propósitos, relações de poder,
valores e ideologias, nem sempre inferíveis de dados documentais, conforme chamam
atenção Barton, Hamilton e Ivanic (2000 Apud OLIVEIRA, S. 2007, p: 103).Portanto, é
necessária a compreensão de cada um dos elementos que perpassam todo evento e prática de
letramentos – participantes, ambiente, artefatos e atividades - para uma ampla compreensão
da complexidade do letramento em questão.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
6.1. PARTICIPANTES
Os alunos situam-se na faixa etária dos catorze aos quinze anos de idade e são todos
residentes na zona urbana do município de Currais Novos, moradores dos mais diversos
bairros da cidade, inclusive alguns bastante afastados da escola.
A turma apresenta algumas dificuldades no que diz respeito à aprendizagem, mas nada muito
significativo, o que possivelmente é consequência da indisciplina que a caracteriza.
É essa turma constantemente comentada em reuniões e conselhos escolares como
necessitada de novos encaminhamentos, novas estratégias, pois é composta de alunos
consideravelmente inquietos, dispersos, entretanto, bastante participativos.
No que se refere à professora de Língua Portuguesa, orientadora dessa atividade, realiza suas
atividades junto a essa turma desde o início do ano de dois mil e treze.
A professora, que mantem um relacionamento bastante agradável com a turma,
constantemente aborda o texto literário na sala de aula e, na maioria das vezes, as suas
singularidades enquanto textos literários são respeitadas e exploradas.
Os familiares que participaram de maneira indireta na atividade, mas não menos
significativa, são em sua maioria mulheres, muitas destas mães dos alunos envolvidos.
6.2. AMBIENTE
A escola adota o sistema de salas-ambiente, ou seja, há uma sala de aula específica para cada
disciplina e o professor de cada turno é o responsável pela organização da sala. Entretanto,
no ano de dois mil e treze a escola abarcou para o Ensino Fundamental mais um professor de
Língua Portuguesa, somando assim três professores, o que inviabilizou o número adequado
de salas-ambientes referentes à disciplina de Língua Portuguesa para o referido turno.
Assim, a professora personagem dessa pesquisa trabalha suas aulas junto aos alunos do
Ensino Fundamental na sala doze, referente à disciplina de Química, já que a mesma não é
utilizada durante as aulas da manhã. A professora também costuma realizar suas atividades
na biblioteca, na tentativa de dinamizar o espaço e promover a familiarização do aluno com a
biblioteca e sua real função no espaço escolar.
A sala de aula é razoavelmente ampla, bem iluminada, principalmente durante o turno
matutino e bastante arejada, pois possui janelas grandes, além de ventiladores.
A biblioteca da Escola Estadual Tristão de Barros que recebe o nome de Monteiro Lobato
como forma de homenagear esse escritor tão importante em nossa literatura, dispõe de um
acervo bibliográfico bastante interessante, como livros de literatura brasileira e estrangeira –
romances, contos, poesias, etc – revistas de circulação nacional, jornais, periódicos, entre
309
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
outros. É um espaço não muito grande, em virtude do acervo que se espalha em algumas
estantes, entretanto é bastante iluminada e arejada.
Os alunos do Ensino Fundamental apresentam uma frequência razoável à biblioteca. Alguns
destes são instigados pelos professores a frequentar o espaço, outros já têm o hábito da
leitura e, independente de orientações, ou mesmo solicitações de algum professor, costumam
frequentar o espaço com bastante autonomia e interesse.
6.3. ARTEFATOS
Um dos T/ I entregue aos alunos para a leitura da imagem e do texto verbal tratava das noites
de São João: a preparação da fogueira, as comidas típicas, etc.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Figura 5 Noite de São João na casa de papai (MEDEIROS DOS SANTOS p: 18)
O Terceiro T/I entregue aos alunos para a apreciação apresentava elementos relacionados aos
costumes e a manifestação da fé seridoense.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Figura 7 Papai ensinando-nos a rezar (MEDEIROS DOS SANTOS p. 25)
O quarto T/I trazia uma cena em que a menina Cota, mesmo bem pequena, ajudava a mãe
nos afazeres domésticos.
Figura 8 Torrando café (Cota com 08 anos) (MEDEIROS DOS SANTOS p. 10)
312
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
6.4. ATIVIDADE
A atividade aqui apresentada recebe o nome de Cuidando das Memórias e foi realizada
durante cinco aulas dentro de uma mesma semana, iniciando no dia vinte e um de outubro de
dois mil e treze e encerrando no dia vinte e três do mesmo mês.No primeiro dia de atividade
os alunos receberam para leitura e discussão os T/I de Dona Cota. Para esse momento, os
alunos dividiram-se em grupos de quatro componentes e para cada um foi entregue um T/I
diferente para apreciação.Em seguida, os alunos apresentavam seus T/I, apresentavam suas
impressões acerca do texto, as possíveis memórias reavivadas, entre outras observações.
A terceira aula foi iniciada com a canção Epitáfio dos Titãs. Os alunos receberam a letra
impressa e, dessa forma, foram incentivados a cantar juntos.Depois de ouvir a canção duas
vezes, a professora levantou algumas questões sobre a temática abordada na letra da música,
as impressões apontadas sobre o tempo passado e o presente, entre outros aspectos.Em
seguida, a professora apresentou uma proposta de produção textual: a produção de uma
pequena entrevista junto a algum membro da família com mais idade, preferencialmente
alguém com no mínimo 30 anos; o entrevistado também poderia ser um vizinho ou alguém
da escolha do entrevistador.Para essa produção, a professora abordou um pouco das
313
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
características que delineiam o gênero entrevista, apontando, inclusive as diferenças entre a
entrevista gravada e a escrita.
Os alunos também foram orientados a como se comportar diante do entrevistado; o uso da
linguagem mais adequada, o modo de tratamento, a fidelidade à resposta do entrevistado,
etc.A professora pediu para que os alunos levassem os T/I de Dona Cota para mostrar aos
entrevistados e, assim, estimulá-los para também produzir seus T/I como forma de ilustrar
as memórias relatadas na entrevista. Essa proposta de produção de texto acompanhada de
todas as orientações foi realizada em duas aulas.
Na quinta e última aula dessa proposta de atividade, os alunos apresentaram para os outros
colegas o material produzido em casa - a entrevista e as ilustrações.
“Minha mãe me contou histórias de quando era criança. Eu gostei de
conversar sobre isso com ela. A vida dela foi bem diferente da minha.”
(Aluno 4)
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Figura 12 Cuidando das Memórias Parte 2 (Memórias da mãe de uma aluna)
A avaliação que a professora fez da atividade depois de toda a dinâmica e a interação, em sala
de aula e com os familiares, foi bastante positiva, pois apresentou-se como uma proposta
inovadora de construção/ desconstrução das concepções de velhice, juventude e memória
pautada nas concepções do letramento literário.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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São Paulo: Duas cidades, 2004, p. 169 – 191.
COSSON, Rildo. Letramento literário: teoria e prática. São Paulo: Contexto, 2006.
KLEIMAN, Angela B. Os significados do letramento: uma nova perspectiva sobre a prática social da escrita
(Org.) Campinas, São Paulo: Mercado de letras, 1995. Coleção Letramento, Educação e Sociedade.
OLIVEIRA, Maria Marly de. Como fazer pesquisa qualitativa. 2ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.
OLIVEIRA, Maria do Socorro. Projetos: uma prática de letramento no cotidiano do professor de língua materna.
Pesquisa de pós-doutorado – IEL/ UNICAMP. 2004 A 2006. Orientação Profª. Dra. Angela B. Kleiman
SANTOS, Maria Raquel Medeiros dos. Minha Infância Minha Vida: Livro de Memórias. Natal: Unigráfica Natal,
2012
315
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
CARTA DO LEITOR: UMA ESCRITA PARA ALÉM DA SALA DE AULA
INTRODUÇÃO
O ensino da produção oral e escrita dos gêneros textuais tem despertado o interesse de
estudiosos e de professores de Língua Portuguesa. Isso se deve ao fato de haver um consenso
de que só nos comunicamos por meio dos gêneros (Bakhtin, 2011), assim como ao fato do
processo de ensino/aprendizagem, ainda, apresentar dificuldades que urgem ser superadas.
No que se refere ao terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental, percebemos que as
dificuldades do aluno acentuam-se, especialmente, nas práticas de produção escrita de textos
argumentativos. Por isso o foco da pesquisa será o ensino da produção do gênero “Carta do
leitor” com alunos do 6º ano de uma escola pública do município de Caruaru.
Sabemos que os estudos atuais sobre os gêneros textuais são vários e têm ampliado as
discussões sobre o ensino da Língua Portuguesa, porém, diante das dificuldades encontradas
em sala de aula, percebemos que ainda são necessários novos olhares sobre o ensino do
121Mestranda do Profletras da UPE (Campus Garanhuns). Especialista no ensino de Língua Portuguesa. É professora na
Faculdade Maurício de Nassau e na Secretaria de Educação de Caruaru. Email: [email protected]
122Doutora em Letras/Linguística pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), onde também cursou o mestrado em
Linguística. É professora na UPE (Campus Garanhuns) atuando na graduação e no PROFLETRAS (Mestrado Profissional em
Letras/Capes). Também é professora no Programa de Pós-graduação em Direitos Humanos na Universidade Federal de
Pernambuco. Email: [email protected]
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
gênero. Assim sendo, a presente pesquisa pretende estabelecer um elo entre teoria e prática,
apresentando estratégias de ensino da “carta do leitor” a partir da perspectiva dos gêneros
como formas “relativamente estáveis” de enunciados (Bakhtin, 2011) através das quais
participamos das práticas de leitura e escrita com vistas à transformação social. Assim sendo,
dialogamos também com os estudos retóricos de gêneros de Bazerman (2011) e com a
perspectiva do letramento em Soares (2001) como um conjunto de práticas sociais de leitura
e escrita a partir das quais o trabalho pedagógico precisa ser organizado e direcionado, com o
intuito de levar o indivíduo a ampliar o seu grau de letramento. A respeito do ensino dos
gêneros, baseamo-nos na proposta de Dolz e Shneuwly (2011) a qual tem como base o
trabalho com “sequências didáticas”.
Com isso, esperamos apresentar contribuições relevantes para que os professores
possam ressignificar o ensino de produção escrita e os alunos possam produzir
significativamente. Como o gênero Carta do Leitor tem uma essência explicitamente
dialógica, pois estabelece a interação entre sujeitos (leitor-editor) dentro de contextos bem
definidos, buscamos garantir as condições de produção propostas por Geraldi (2013)
necessárias para que o ato de produzir fosse, de fato, uma atividade de produção de sentidos
por sujeitos conscientes de seu papel dentro do processo de interação, assim como incluímos
o contexto de uso do gênero na proposta didática, enviando as cartas para os responsáveis da
revista Ciência Hoje das Crianças a fim de tornar a atividade de escrita efetiva.
Dessa forma, percebemos que, ao ensinarmos um gênero, precisamos criar estratégias que
motivem o aluno a se disporem a aprendê-lo. Sendo que tais estratégias devem levar em
consideração a relevância do gênero para a vida do aluno seja em relação a suas experiências
prévias ou em relação a situações com as quais eles poderão se deparar. Portanto, não só é
possível ensinar os gêneros textuais, como se faz necessário que o aluno esteja inserido em
situações reais de comunicação que lhe revelem as possibilidades de produção de sentidos.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
2. O ENSINO SISTEMÁTICO DO GÊNERO CARTA DO LEITOR: UMA ANÁLISE
DO PROCESSO DE PRODUÇÃO ESCRITA
A nossa pesquisa, que se caracteriza como qualitativa por fazer uma descrição e compreensão
do processo de ensino-aprendizagem do gênero “carta do leitor” desenvolvido com um grupo
de seis alunos do 6º ano da Escola Municipal Professor Luiz Pessoa em Caruaru, tem como
corpus um conjunto de atividades (sequência didática) elaborado e aplicado com os referidos
alunos, através do qual se apresentam os avanços e as dificuldades apresentadas durante as
etapas do processo de ensino do gênero proposto, assim como as intervenções realizadas.
Para o desenvolvimento do trabalho, escolhemos a revista Ciência Hoje das Crianças (CHC)
como referencial para a leitura e escrita do gênero textual “carta do leitor”. Essa escolha deve-
se ao fato de que a escola tem a assinatura da revista, CHC, além do mais a revista atende ao
público alvo de nossa pesquisa.
No desenvolvimento das atividades de ensino da produção do gênero carta do leitor,
seguimos as etapas propostas por Dolz e Schnewuly
Após uma apresentação da situação na qual é descrita de maneira detalhada a tarefa
de expressão oral e escrita que os alunos deverão realizar, estes elaboram um
primeiro texto inicial, oral ou escrito, que corresponde ao gênero trabalhado, é a
primeira produção. Essa etapa permite ao professor avaliar as capacidades já
adquiridas e ajustar as atividades e os exercícios previstos na sequência às
possibilidades e dificuldades reais de uma turma. Além disso, ela define o significado
de uma sequência para o aluno, isto é, as capacidades que deve dominar para melhor
dominar o gênero de texto em questão. Os módulos, constituídos por várias
atividades ou exercícios, dão-lhe os instrumentos necessários para este domínio [...].
No momento da produção final, o aluno pode pôr em prática os conhecimentos
adquiridos e, com o professor, medir os progressos alcançados. (2011, p. 84)
319
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Ao analisar a primeira produção, pudemos perceber que a representação textual do gênero
carta do leitor dos alunos era pouca e bem mais próxima da representação do gênero “carta
pessoal” (quatro alunos começaram o texto, colocando na margem direita o local e a data),
sendo importante ressaltar que o fato dos alunos não estarem familiarizados com a revista,
nem com o gênero dificultou a produção discursiva. Assim sendo, três alunos fizeram um
resumo geral do artigo lido sem se posicionar diante do tema, ou seja, não assumiram a voz
de sujeitos do ato de dizer, ou melhor, do ato de avaliar o artigo lido de forma argumentativa,
nem estabeleceram diálogo com os editores da CHC.
Texto 2
Ao analisar os dois textos acima, percebemos que propósito comunicativo não corresponde
ao propósito do gênero carta do leitor, visto que os autores não estabeleceram uma
comunicação explícita com o leitor (editores). O texto 1, embora apresente a marca formal de
local e data é, na verdade, um resumo das principais ideias do artigo lido, no qual a aluna
seleciona informações sobre os benefícios do leite materno e conclui afirmando que “o leite
materno é muito importante para o bebê”. O texto 2 não é muito diferente, pois o aluno já
inicia dizendo que vai falar sobre o que entendeu da leitura do artigo, revelando assim que a
sua compreensão não corresponde ao que foi solicitado – estabelecer comunicação com os
editores, avaliando o artigo lido. Sendo importante ressaltar que ele apresenta as informações
em sequências, predominantemente, expositivas.
No segundo encontro, levamos exemplares da revista CHC e solicitamos que os alunos a
folheassem, lendo os textos que achassem interessantes. Esse momento foi essencial para que
320
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
os alunos pudessem conhecer melhor o suporte. Após o contato inicial com a revista,
direcionamos a análise do gênero carta do leitor a partir dos textos presentes na sessão das
cartas. Cada aluno foi convidado a escolher a carta que mais despertou sua atenção e realizar
a leitura coletivamente. Em seguida, entregamos a primeira produção realizada por eles para
que pudessem compará-la com a carta escolhida, analisando as diferenças e semelhanças
encontradas entre elas. Durante a execução da atividade, os próprios alunos perceberam
detalhes da organização composicional do gênero carta do leitor, tais como: o título e a
identificação do autor da carta. As partes da carta que os alunos não identificaram (saudação,
vocativo, assunto/finalidade, despedida) foram problematizadas em sala, possibilitando,
pois, a representação completa do gênero. Ainda nesse encontro, os alunos fizeram a
reescrita da carta, buscando atender à modalidade do gênero. O resultado foi muito
satisfatório, pois os alunos revelaram ter construído uma nova representação do gênero.
Assim, percebemos que a leitura do gênero deve ser uma atividade anterior à sua produção,
porém esse contato inicial não é suficiente para a aprendizagem do gênero, ou seja, ler cartas
de leitor não garante que o aluno seja capaz de produzi-las; é preciso que o professor conheça
bem o gênero para, de forma consciente, direcionar o seu ensino, levando o aluno a perceber
sua organização composicional e seu propósito comunicativo, conhecimentos fundamentais
para que possam assumir-se como sujeitos do discurso e desenvolvê-lo a partir de modelos
representativos já conhecidos.
No terceiro encontro, buscamos desenvolver a competência argumentativa dos alunos a
respeito do artigo lido, por isso fizemos a releitura do texto e cada aluno foi levado a dizer o
que achou do artigo, argumentando. Em seguida, eles fizeram uma atividade escrita de
leitura e interpretação do artigo na qual retomamos informações relevantes sobre o assunto
“a importância do leite materno”.
No quarto encontro, foi feita uma reflexão sobre o uso do S e do SS em contextos regulares,
tais como a desinência verbal de subjuntivo “sse” “ssem” e a representação fonética das letras
S e SS entre vogais. Sendo a primeira representada por [Z] e a segunda por [S]. Essa análise
foi motivada pelos erros ortográficos cometidos pelas crianças na primeira produção e na
reescrita tais como “necesarios”, “colocace”, “puplicasem”. É importante ressaltar que o
trabalho com a produção escrita de gêneros textuais torna-se importante instrumento para o
professor levar os alunos a refletirem sobre regularidades ortográficas de nosso sistema de
escrita, sobre a pontuação, sobre a sintaxe, enfim, sobre a gramática de nossa língua, pois na
produção escrita os alunos revelam desvios do padrão da língua diversos que podem ser
analisados de forma crítico-reflexiva.
No quinto e último encontro solicitamos que os alunos reescrevessem a carta, fazendo as
adequações necessárias para isso fizemos um cartaz no qual enumeramos os pontos a serem
observados por eles (organização composicional do gênero, argumentação e o uso das letras S
e SS) os quais foram foco das atividades realizadas em sala.
Vejamos as duas produções de uma das alunas:
Primeira produção
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Produção final
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práticas reais de leitura e escrita de um gênero “novo” a partir do contato com o
suporte/revista, ampliando, assim, o grau de letramento deles.
CONCLUSÃO
A partir do trabalho desenvolvido, percebemos que as práticas de leitura e escrita realizadas
na escola, especialmente, nas aulas de Língua Portuguesa, quando bem fundamentadas e
direcionadas, podem contribuir para a ampliação do grau de letramento de nossos alunos,
pois à medida que introduzimos um gênero novo nas práticas escolares de leitura e escrita,
estamos, na verdade, possibilitando ao aluno a participação efetiva em práticas sociais de
leitura e escrita. Além do mais, estamos contribuindo para a formação de sujeitos críticos e
atuantes, pois como afirma Soares “[...] fazer uso da leitura e da escrita transformam o
indivíduo, levam o indivíduo a um outro estado ou condição sob vários aspectos: social,
cultural, cognitivo, linguístico, entre outros” (2001, p. 38). Assim, reafirmamos a ideia de que
a escola é um importante espaço de ampliação do grau de letramento de nossos alunos, pois
através de práticas de ensino de leitura e escrita, o professor poderá inserir o aluno em novos
contextos de comunicação, além de contribuir para a sua (trans)formação.
No entanto, para que isso possa de fato acontecer, não se pode desvencilhar o ensino da
leitura e da escrita da perspectiva dos gêneros, pois como afirma Marcuschi, “os textos
sempre se realizam em algum gênero textual [...] E cada gênero tem maneiras especiais de ser
entendido [...]” (2008, p. 243). Dessa forma, evidencia-se que o ensino dos gêneros é
imprescindível, visto que é por meio deles que interagimos com o outro e mais, cada gênero
possui especificidades próprias que precisam ser conhecidas pelos usuários da língua, para
que eles possam, de fato, produzir sentidos seja na leitura seja na escrita. Sem falar que uma
prática pedagógica verdadeiramente significativa precisa superar as práticas tradicionais e
fracassadas de ensino da escrita, nas quais os alunos não conseguem se envolver por diversos
motivos: o leitor dos textos, muitas vezes, é apenas o professor; o ato de escrever perde sua
essência dialógica e passa a ser meramente uma tarefa escolar; o gênero não é ensinado de
maneira contextual, ou seja, não se (re)cria situações comunicativas próximas às situações de
uso. Com isso, afirmamos que as práticas de leitura e escrita realizadas na escola precisam
ultrapassar os muros da sala de aula e alcançar as práticas sociais para que, assim, o aprender
seja uma prática estimulante e, especialmente, significativa para aos alunos.
REFERÊNCIAS
BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. 6. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2011.
BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. 12 ed. São Paulo: Hucitec, 2006.
BAZERMAN, Charles. Gênero, agência e escrita. 2. Ed. São Paulo: Cortez, 2011.
CHAPARRO, Manuel Carlos. Pragmática do jornalismo. São Paulo: Summus, 1992.
CHARAUDEAU, Patrick. Um modelo sócio-comunicacional do discurso: entre situação
de comunicação e estratégias de individualização. In. STAFUZZA, Grenissa; PAULA, Luciana de (org.). Da
análise do discurso no Brasil à análise do discurso do Brasil. Uberlândia: Edufu, 2010.
DOLZ, J, NOVERRAZ, N. e SCHNEUWLY, B. Sequências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um
procedimento. In. DOLZ, J. e SCHNEUWLY, B. Gêneros orais e escritos na escola. 3. ed. Campinas, SP:
Mercado das Letras, 2011, pp. 81-108.
GERALDI, J. Wanderley. Portos de passagem. 5. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes: 2013.
MELO, José Marques de. Jornalismo opinativo. São Paulo: Mantiqueira, 2003.
MARCUSCHI, Luiz Antônio. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São Paulo, SP:
Parábola, 2008.
SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 2001.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A REPRESENTAÇÃO DOS BICHOS NA POESIA POPULAR DESTINADA ÀS
CRIANÇAS
ABSTRACT: The genuinely popular literature explains the spirit of a people and their way of
living. Many topics can be addressed by this literary aspect, among them, those that are
geared to children. From these assertions, enter to popular poetry, representing infancy
through animals, faeries, among others. Examine how the theme of animals is covered in the
anthology of children's poetry "Birds and animals in the voice of popular poets," noting
aspects that make up the world of those writings.
INTRODUÇÃO
Quem esteve inserido, há muitos anos, no âmbito rural ou em pequenas cidades e povoados
do interior do Nordeste, provavelmente teve acesso a uma belíssima experiência com a poesia
popular oral, essa que, como o próprio nome já diz, emana do povo, da vivência diária dessas
pessoas com os diversos elementos que compõem suas vidas. Normalmente, vendedores de
folhetos, repentistas, emboladores de coco, entre outros artistas, estão sempre enaltecendo
essa cultura de gente simples e pobre, mas que não deixa a desejar em relação às outras
quanto à emoção que é capaz de provocar em diferentes povos.
Se nos voltarmos para o lado das crianças, também encontraremos escritos populares de
muita qualidade para os pequenos, sobretudo poesias. A poesia popular destinada a meninos
e meninas representa de forma muito bonita os bichos que fazem parte da nossa fauna.
Frequentemente, na obra poética para as crianças, encontramos estrofes compostas por seis
versos (sextilhas). Esses poemas revelam aspectos como sonoridade, fantasia poética, humor,
inventabilidade e a originalidade inerente aos nossos poetas.
Lamentavelmente, com o passar dos anos, a escola apagou essa vivência com a literatura
popular, já que a mesma não é tida por muitos, até hoje, como uma leitura de valor. Assuntos
relacionados à estética são transformados em preconceito, este que leva as obras de muitos
autores para a margem da literatura brasileira. Essas experiências artísticas são deixadas de
lado, já que a literatura erudita é considerada como uma produção superior, esteticamente
falando. Muitos estudiosos e professores deixam a vertente popular longe do ensino de
literatura.
123Estudante concluinte da graduação de Letras, vinculada à Universidade Federal de Campina Grande, campus I - situado
nesta mesma cidade - com habilitação em Língua Portuguesa. Monitora da disciplina Introdução à Linguística pelo segundo
semestre consecutivo – 2013.1/2013.2. Desenvolve pesquisas relacionadas à área de Literatura Infanto-juvenil. E-mail:
[email protected]
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Levando em consideração os fatos discorridos, essa pesquisa tem por intenção mostrar uma
parte dessa vertente de escritos populares – a poesia popular destinada às crianças -, com
ênfase na forma como os bichos são mostrados ao público infantil. Aproveitando o ensejo,
podemos afirmar o quanto essa literatura é bonita e que ela poderia ser trabalhada nas
escolas ou em qualquer outro segmento, a fim de torná-la acessível a todos, pois ao contrário
do que muitos pensam, esses escritos alcançam um nível estético de construção muito
superior.
A obra que será analisada denomina-se “Pássaros e bichos na voz de poetas populares”, uma
antologia que contém poesias de variados escritores como Manoel Xudu, Manoel Filó,
Antônio Lucena, Pedro Costa, Zé Vicente e muitos outros, organizada pelo professor da
Universidade Federal de Campina Grande, Hélder Pinheiro. De acordo com os objetivos
encontrados nessa antologia, o livro foi idealizado com o intuito de partilhar da alegria que
acompanha os admiradores da poesia popular, sempre que leem esses poemas. Sendo assim,
as famílias podem viajar junto com suas crianças pelas belas criações dos nossos poetas.
Com essa análise, que é de cunho bibliográfico, tendemos, entre outras coisas, a fazer uma
ligação entre os bichos que encontraremos no decorrer da obra e a fantasia, esta que é de
suma importância para a construção do imaginário infantil. Veremos, então, que o
imaginário é um forte impulsionador do real e, deste modo, leva a criança ao progresso, ao
desenvolvimento, pois, assim, ela cultiva a sua inteligência, a sua sensibilidade, sentimentos
que frequentemente estão em falta no mundo em que nos encontramos. Ao se trabalhar a
fantasia com responsabilidade, os pequenos não serão alienados, mas aprenderão a driblar –
brincando – as verdadeiras dificuldades do seu cotidiano.
Quando nos deparamos, no território brasileiro, com algumas obras relacionadas à poesia
para crianças, percebemos que muitos dos poetas que compõem essas obras têm como
parâmetros os escritos da literatura popular. A linguagem utilizada nessas produções, seus
temas, sua sonoridade, chama a atenção do público infantil, que se adapta pouco a pouco ao
que lê/ouve. Para Bordini (1986:42)“Trata-se da poesia infantil de origem popular, cuja
autoria desapareceu da memória popular coletiva e que se transmite (ou se produz) nas
classes sociais dominadas, espelhando seus interesses postergados”.
Segundo Alves (2008: 35) “Adivinhas, parlendas, provérbios, ditos populares são, muitas
vezes, pontos de partida de importantes poetas para a criação de seuspoemas”.Porém,
paradoxalmente, alguns pedagogos sustentaram a opinião de que as crianças não estavam
aptas a compreenderem a poesia, portanto, ela devia ser limitada no âmbito escolar. Os
exemplos elencados pelo autor citado acima são provas cabais de que a poesia sempre fez
parte do nosso cotidiano, embora não fosse com essa denominação específica. Quem nunca
ouviu um “causo” contado em versos por algum familiar geralmente proveniente da zona
rural? São situações como essas que aproximam as pessoas da poesia sem sequer elas
sentirem.
É errôneo pensar que a capacidade de entendimento das crianças não é tão evoluída, pelo
contrário, muitas delas são capazes, inclusive, de criarem seus próprios poemas. Sosa (1978:
179) nos esclarece que
A poesia, devido às rimas que possui, pode ser facilmente memorizada. O ouvido das crianças
é agradavelmente embalado pelo compasso dos versos, pela sua harmonia e pela própria
qualidade dos sons.
É do conhecimento de muitos que a poesia foi banida da escola porque a julgaram através de
um critério utilitarista que se perpetuou por muitos anos no ensino. O conteúdo que não
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
possuísse um viés que pudesse “preparar o aluno para a vida”, não faria parte do currículo
escolar. Atualmente, mesmo que não haja mais esse pensamento, há diferenças entre as
finalidades propostas por quem ensina e os objetivos dos alunos em relação ao tema. É bom
que o professor possa aproximar a criança da arte.
As crianças, sabendo que a imagem que traziam com ela e que a escola consegue
verter em linguagem trivial adulterada é moeda com grande valor de troca, afirmam-
se nela e procuram animar o que as cerca, hierarquizando formas, fatos e coisas de
maneira admirável. Porque – e antes de tudo – a criança tem uma alma poética. E é
essencialmente criadora. (SOSA, 1978: 182).
O valor educacional que a poesia possui é intrínseco. Elementos como o ritmo e a forma dos
versos, recorrem à imaginação, mas também a outros meios psíquicos que tornam a
sensibilidade infantil uma constante. Por esses fatos elencados, a poesia destinada às crianças
não deve possuir um cunho moral ou especulativo, mas deve ser generosa, de linguagem
bonita, que seja capaz de emocionar autenticamente as almas desses pequenos seres. Desse
modo, pode-se criar na fria classe escolar, uma atmosfera poética, esta que se projetará nos
alunos sem penas ou angústias.
II – O POPULAR E O INFANTIL
Se formos partir para uma investigação relacionada à literatura popular, sobre o que é ou a
quem é destinada, uma boa ideia seria começar analisando a sua própria denominação. O que
é popular? Utilizando-se de um significado simples, podemos dizer que é aquilo que diz
respeito ao povo. Desse modo, a literatura popular, de forma espontânea, exprime o espírito
de muitos povos, como suas crenças, seus valores tradicionais, seu viver histórico, entre
outras coisas.
Nesse sentido, a literatura popular assume uma relação muito próxima com a literatura oral,
já que muitos dos autores que compõem essa modalidade literária, também se expressam
através de repentes, de rimas e outros. Essa literatura é composta pelo povo e para o povo, e
se opõem, portanto, à literatura erudita, que é fruto de uma cultura letrada. Por esse fato, os
escritos formados através desse viés popular, foram, por muito tempo, relegados à
marginalização, pois se acreditava que eram de pouca qualidade e, portanto, eram deixados
de lado, talvez por ser produzida por pessoas simples, humildes, sem alto grau de estudo.
Partindo de um conceito geográfico, vemos que a literatura popular é mais valorizada na
região Nordeste, onde se encontram com mais frequência pessoas que são possuidoras de um
espírito que representa a cultura viva de um povo. Só que, mesmo nessa região, os estudos
relacionados ao popular ainda são tratados com descaso, não é dado a eles o devido valor.
Muitos estudiosos renegam a literatura popular como uma representação da cultura de um
povo. Esse fato pouco a pouco vai sendo desconstruído, pois, com todo o preconceito que
ainda existe por parte de muitos que compõem e admiram a cultura erudita, a cultura
popular está sendo inserida no âmbito das universidades, das escolas e, dessa forma, se
chagará a um ponto comum: a sua valorização.
Ao levarmos em consideração o percurso histórico da literatura desde as suas abordagens no
passado, veremos que não havia uma literatura destinada às crianças, elas observavam a arte
do mundo adulto. Com o passar do tempo, foi criado um caminho dentro daquilo que era
destinado aos adultos e, nesse caminho, figurava a literatura infantil, que nasceu através dos
contos populares para crianças.
Dentre os fatores que podem ser apontados como comuns às obras adultas que
falaram (ou falam) às crianças, estão os da popularidade e os da exemplaridade.
Todas as que se haviam transformado em clássicos da literatura infantil nasceram no
meio popular (ou em meio culto e depois se popularizaram em adaptações). Portanto,
antes de se perpetuarem como literatura infantil, foram literatura popular.
(COELHO, 2000: 41).
Sua mente, ainda indiferenciada para a generalidade dos processos psíquicos, mais
ou menos complexos, do entendimento, prende-se, no entanto, ao som produzido
pelas palavras cantadas, encadeadas aos clássicos estribilhos onomatopaicos, e assim
ela sente o gozo puro mais da música, do que das palavras. (SOUSA, 1978: 184).
A partir desse contato com a sonoridade, as crianças podem, se direcionadas a isso, ser
admiradoras da poesia. Assim, elas passam por um constante aprendizado e uma longa
experiência poética. O poema cantado ou o canto em forma de poema, num brincadeira de
roda, ou em outro momento, pode ser transmitido de geração para geração.
Desse modo, se aproximarmos as crianças da literatura infantil, ela estará próxima também
da literatura popular, já que uma linha muito tênue separa essas duas produções. É
importante que os nossos meninos e meninas tenham esse contato com a leitura sem
pararem para pensar naquilo que é mais difundido, como uma literatura de maior qualidade,
o que é o caso da literatura clássica, dos contos de fadas. O viés popular também tem muito a
mostrar, é possuidor de muitas qualidades, inclusive estéticas e, também por esse fato, não
deve ser esquecido.
Chegamos ao ápice, ao ponto proposto por este trabalho, que é ver como os bichos são
abordados na obra Pássaros e bichos na voz de poetas populares. Começamos fazendo
alguns questionamentos: porque pensarmos na presença dos bichos nas poesias populares
para crianças? Ora, há algo que chame mais a atenção dos nossos pequenos do que a vida
animal? Quem nunca se deparou com uma criança imitando bichos ou até dizendo que é um
deles? Pois é, esses são fatos recorrentes na infância. Ademais, nós possuímos uma fauna
bastante diversificada, logo, há muitos bichos a serem imitados e admirados, cada um com
sua peculiaridade.
Gostaríamos de ressaltar que as poesias que serão demonstradas são sextilhas, todas falando
sobre os animais. Também poderemos notar que todos os versos são compostos por
redondilhas maiores, ou seja, são de sete sílabas poéticas, algo que lhes atribui uma
musicalidade bastante agradável. Para Alves (2008: 39) “O esquema rítmico é quase sempre
o mesmo: versos de sete sílabas com a primeira acentuação variando entre a segunda e a
quinta tônica, e a última sempre na sétima sílaba. Quanto às rimas, predomina o esquema:
ABCBDB 3. Ou seja, rimam os versos 2, 4 e 6”.
Analisando as vontades infantis, poderíamos afirmar que esses pequenos seres projetam suas
vontades nos animais. Que criança nunca imitou um porco, por exemplo? Será que a imitação
é somente pelo animal, por ele muitas vezes ser mostrado como fofinho? Um porco não
escova os dentes, não tem hora para tomar banho, não obedece às ordens da mamãe. Isso
seria uma boa para qualquer criança, não? Concordando com Held (1980: 105), podemos
afirmar que “Se o animismo infantil personifica a pedra, a planta, o astro, o objeto inerte
fabricado pelo próprio homem, sua predileção – isso foi dito muitas vezes – é pelo animal:
sonho longínquo, sonho ancestral de fundir-se com ele (...)”.
Os animais alados: pássaro e insetos
Voltando agora as nossas atenções para a obra supracitada, analisaremos algumas poesias e a
representação dos bichos nelas inseridas. A primeira delas é atribuída ao poeta Jô Patriota e
denomina-se “O ninho da rolinha”.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
No Moxotó, a rolinha
Voa sem saber pra onde,
Não pode fazer seu ninho,
As árvores têm mais fronde
E às vezes busca refúgio
Onde o gavião se esconde. (p. 11).
Nessa poesia, podemos ver a presença de um pássaro bem comum e facilmente encontrável
na região Nordeste: a rolinha. Podemos perceber que o passarinho está buscando um lugar
para fazer seu ninho nos ramos das árvores e, já que se vê sem rumo, busca abrigo onde o
gavião se esconde.
Os pássaros, assim como outros animais alados, chamam a atenção dos pequenos devido a
sua capacidade de voar, esta que lhes atribui uma forte ideia de liberdade. Segundo Held
(1980: 114), “Para a criança, a ave também está próxima. Está carregada de sonhos. Encarna
a nostalgia de voar. A partir do momento em que a criança se expressa, aparecem numerosos
textos que testemunham familiaridade, desejo de projeção, de assimilação a esse mundo
alado”.
A própria figura do passarinho, um bicho pequeno, bonitinho, fofo, é uma imagem delicada,
bonita de se ver ou ser imaginada. Na poesia, vemos esse bichinho buscando um lugar para
construir sua casa. No segundo verso “Voa sem saber pra onde”, reafirmamos a ideia de
liberdade passada às crianças através do que podem fazer esses animais com as suas asas. Ir
sem querer saber para onde está indo, sem precisar dar satisfações é um desejo que muitos
adultos, inclusive, desejam realizar. O poeta popular narra o que acontece com a rolinha
como se estivesse perto dela, vendo o que lhe ocorre.
Para Alves (2008: 39) “Um aspecto curioso, ligado às relações, diríamos familiares entre os
animais, e que comparece em muitas sextilhas populares, são os cuidados dos bichos para
com suas crias”. Pensando por essa perspectiva, mostraremos outra poesia de Manuel Xudu,
que fala das galinhas:
A GALINHA
A poesia em questão mostra a galinha de uma forma muito bonita: no momento em que
auxilia os seus filhotes a virem ao mundo. O autor aborda o fato do animal, mesmo sendo
pequeno, conseguir ser forte quando solicitado. Essa sextilha demonstra a percepção do
poeta diante do caráter protetor dos animais, da atenção que eles destinam às suas crias.
Através da leitura, essa percepção relacionada ao cuidado é aguçada, implica em uma
observação detida da natureza. As crianças apreciam muito o que diz respeito a esse meio
natural.
Levando em consideração o aspecto sonoro do poema, destacamos três versos: o segundo, o
quarto e o sexto. As palavras que os encerram são sempre terminadas em “ovo”: comovo, ovo
e novo. Em termos de sonoridade, vemos que há uma ênfase no plano temático da poesia,
que é o cuidado da galinha com o ovo no momento em que nasce o seu pintinho. O poeta está
sempre falando nisso, mesmo que indiretamente, com a palavra inserida em outras.
Concluindo essa parte destinada às aves, mostraremos uma poesia que fala de um passarinho
muito bonito, comum na América do Sul e, portanto, no Brasil e nas terras do Nordeste.
Estamos falando do sabiá, ave de um canto muito bonito. O poeta Biu Gomes retrata
lindamente o cotidiano dessa ave.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O SABIÁ
O sabiá do sertão
Faz coisa que me comove:
Passa três meses cantando
E sem cantar passa nove
Como que se preparando
Pra só cantar quando chove. (p. 12).
Novamente, temos a impressão de que o autor está próximo da natureza, observando o que se
sucede com a vida cotidiana dos animais. Nós temos uma imagem perfeita desse pássaro
através da poesia acima, pois vemos a sensibilidade inserida nela. A felicidade do passarinho
quando a chuva se aproxima é tão forte, que ele canta. Quando passa esse momento, ele se vê
calado. São acontecimentos da natureza que inspiram beleza por todos os lados.
Alves (2008: 42) afirma que “Neste cordel o poeta popular revela toda sua fantasia poética,
além de dialogar com poemas importantes de nossa tradição cultural, como “Canção do
exílio”, de Gonçalves Dias”. Aqui, o poeta popular é comparado a um autor consagrado
nacionalmente, e nós podemos inferir disso que a qualidade dos seus escritos não deixam
mesmo a desejar em termos temáticos ou estruturais.
Ainda acompanhando os animais que voam, dessa vez os insetos, podemos elencar mais dois
poemas dessa antologia: o primeiro do poeta Manuel Xudu e o segundo do poeta Odilo Nunes
de Sá.
BORBOLETAS
As borboletas azuis
Que vivem na capoeira
Têm as vestes parecidas
Com as das misses trigueiras,
Sem comprar nada na loja
Nem pagar à costureira. (p. 14).
De acordo com um pensamento de Alves (2008: 40) “A contemplação da beleza dos animais
comparece também em diversos poemas. Neles parece haver embutido um desejo de viver
fora dos ditames do mundo do consumo e das aparências, num estado que poderíamos
denominar contemplativo”.
Poucas coisas com as quais temos contato em nossas vidas possuem a sutileza de uma
borboleta. Essa beleza inerente a essa espécie deve mesmo ser mostrada e, como bem falou o
autor citado acima, contemplada. As crianças precisam, desde pequenas, ter contato com o
que há de bonito no mundo. Essa poesia é muito delicada, rica de significados. As borboletas
são comparadas às misses, pois possuem igual formosura.
Na segunda poesia, outros bichos diferentes das rolinhas e das borboletas, também possuem
igual encantamento quando são observados de perto. Estamos, dessa vez, falando da espécie
dos insetos. Vejamos o poema:
PIRILAMPOS
Centenas de pirilampos
Que se espalham na amplidão,
Parecem bando de loucos
Com lanterninhas da mão
Iluminando os caminhos,
Sem saber aonde vão. (p. 24).
Nessa sextilha que fala dos pirilampos, há, igualmente, belos detalhes a serem vistos. Nós
também conhecemos esses insetos como vagalumes e sabemos que eles emitem uma linda luz
fluorescente.
Quão bonito pode ser um animal tão pequeno que carrega em seu corpo uma luz parecida
com aquela que as crianças possuem em casa? É algo de se encantar. Como deve dar uma
sensação boa o fato de podermos nos espalhar pela amplidão, assim como vemos no segundo
329
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
verso. A metáfora que descreve a luz dos pirilampos, no quarto verso, “Com lanterninhas na
mão”, não poderia ser mais esplêndida e sutil. Para Alves (2008: 40) “ a atitude
predominante dos poetas quando tratam dos animais é conferir um caráter de fábula aos seus
poemas. Esta atitude consiste em atribuir profissões aos bichos, em descrever seus costumes,
suas rixas, seu lado malandro, entre outras caracterizações. São muitos os poemas que
retratam os animais nestas circunstâncias”
Essa questão do tema do trabalho, das profissões que os poetas atribuem aos bichos, pode ser
vista no quinto verso, quando lemos “Iluminando os caminhos”. Podemos perceber que os
pirilampos prestam um serviço, clareiam as estradas para que as pessoas possam passar.
Vendo por esse lado fantástico, mágico, no meio da escuridão, os vagalumes podem ser de
muita serventia para as pessoas, já que possuem sua luzinha tão gentil e tão formosa.
Chegamos à parcela dos bichos que mais faz parte do nosso cotidiano: os nossos amigos
peludos. Qual criança não teve contato com um cavalo, um macaco, um gato e, em especial,
com aquele que recebeu o título de melhor amigo do homem: o cachorro? Muitas são as
oportunidades em que esse contato pode acontecer, sem falar nas réplicas que podemos
encontrar facilmente nos comércios: os bichinhos de pelúcia. Para iniciarmos as falas sobre
essa classe, nada mais justo do que darmos a vez aos cãezinhos. A poesia abaixo é do autor
Adauto Ferreira e intitula-se “Dois cachorros”:
A poesia fala sobre dois cachorros diferentes. O autor, a cada verso, faz questão de
demonstrar essa diferença. Podemos perceber a inteligência da sonoridade presente na
sextilha e o jogo de palavras que denota um ar engraçado. Exemplificando o que foi dito,
como seria um cachorro frio e um cachorro quente? Poderíamos levar esse joguete pelo lado
do sanduíche que possui essa segunda denominação. Cachorro que morde, nós conhecemos,
mas a gente também morde os cachorros? Mais uma vez, vemos aí a imagem do alimento, já
que nenhuma pessoa consciente morderia um cachorro real. O autor brinca com o leitor e o
faz pensar a respeito do que lê.
Comecemos, agora, nossas reflexões a respeito da importância dos cachorros para a infância.
A figura desse animal já nos inspira afeto devido ao seu companheirismo e ao fato de estar
sempre a postos, pronto para nos fazer felizes. Eles podem ser, além de melhores amigos do
homem, como foi citado acima, melhores amigos das crianças. Que pai nunca viu o seu filho
pequeno imitando um cachorro? Pois é, os animais do cotidiano dos garotos são os mais
imitados por eles, devido ao contato que há entre ambos, e neles são depositadas todas as
suas incompreensões.
Utilizando-nos das palavras de Held (1980: 106) para fazer referência ao animal citado,
chegamos à seguinte constatação: “O animal doméstico e familiar, principalmente o que vive
em apartamento, se revela infinitamente presente quando os pais estão ocupados, sempre
disponível, pelo menos nos sonhos, os quais não contradiz, para conversar”. Ainda sobre a
relação criança/cachorro, a autora faz mais uma consideração de bastante relevância e que
deveria ser do conhecimento de todos os pais: “na vida cotidiana moderna, o bebê passará
muitas vezes do urso sedoso e pacífico para o animal vivo, o animal doméstico a quem confia
suas tristezas e que o consola quando os adultos são severos, injustos, incompreensivos, ou
simplesmente indiferentes”. (HELD, 1980: 107).
330
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Como vimos, esse animal de estimação pode contribuir muito com o desenvolvimento social e
afetivo de qualquer criança. Por vezes, a presença de um cachorrinho de estimação é
indispensável pela sua companhia tão fiel. A poesia que citamos brinca com esse animal
através da linguagem e, por se tratar dele, é de se esperar que meninos e meninas se sintam
atraídos pela leitura da mesma, já que o tema é algo tão presente em suas vidas.
A próxima poesia tem como protagonista um “amigo” muito conhecido nosso, que aparece
em vários desenhos animados, programas infantis e obras escritas. Estamos falando do
porco, um animal considerado fofinho, mesmo que seja visto por muitos como sujo. Vejamos
como o autor Apolônio Alves retrata a vida desse animal:
OLHA O PORCO
No quarto verso do poema, podemos confirmar o que foi dito acima a respeito do animal: que
ele é sujo. Mesmo assim, o porquinho também é querido pelas crianças. Analisando a poesia
como um todo, notamos, novamente, a graça inserida no mesmo, o caráter da fantasia é
predominante, pois a ideia do animal tomar um porre, se embriagar, invadir uma festa e ser
expulso do salão por ordem de uma autoridade, é algo surreal, que só poderia acontecer com
um ser humano. É nesse aspecto que os bichos ganham a atenção dos leitores infantis, pois
podem fazer tudo o que desejam. Nesse sentido, as crianças se projetam nesses animais.
Em mais uma reflexão, Held (1980) compara o porco ao hipopótamo. Vejamos como se dá
essa comparação: “O hipopótamo, inicialmente, parece apresentar, por muitas razões, o
mesmo gênero de atração que o porco. Diante das recomendações intempestivas e fatigantes
do pais: “lave as mãos antes de comer!”, “não se arraste no chão”, etc., encarna a deliciosa
liberdade de se sujar”. (p. 113).
Nesse sentido, a criança projeta no porco a sua vontade de ser como ele, de não ter hora, nem
porque para fazer sua limpeza pessoal, de poder brincar na areia, se sujar, não escovar os
dentes, não tomar banho, etc. Quem dos pequenos não gostaria de ter essa liberdade tão
prazerosa? É a partir dessas reflexões que muitas vezes deixamos de lado, que podemos
constatar o quanto é importante a presença dos bichos na infância, bem como na literatura
infantil.
Alves (2008: 43) também tem algumas considerações a fazer à respeito da linguagem: “O
humor não é exatamente um tema; trata-se, antes, de uma atitude. A poesia oral, como um
todo ostenta esta atitude. Os emboladores me parecem os que mais exploram este viés,
sobretudo nos momentos de desafio, de contenda”.
Findamos a parte das análises destinadas aos amigos peludos com uma poesia que fala do
mais esperto dos animais, aquele cheio de graça, que não mede esforços para colocar em
prática as suas brincadeiras. Sim, nós estamos falando do macaco. A próxima poesia é do
autor Clodomiro Paes.
MACACO
CONCLUSÃO
A poesia que nasce da experiência do povo demonstra o cotidiano dessas pessoas, seus modos
de pensar, de enfrentar o mundo. Mostra-se, por vezes, a vivência na zona rural,
normalmente entre nordestinos. Os animais são muito presentes nessa cultura e os escritos
voltados às crianças são muito bem recebidos por elas. Como vimos, esse viés da literatura
não deixa nada a dever à literatura erudita, pois também possui qualidades muito notáveis.
Os povos mais simples, sem escolaridade ou convivência no mundo globalizado, conseguem
expressar suas experiências de forma muito simbólica e peculiar. No campo da literatura
popular, inúmeros artistas se sentem inspirados por esse modo de vida e expressam isso
através de músicas, poemas, romances e outras produções. Muitos deles colheram na cultura
popular os reais motivos que permeiam sua produção.
Tendo em vista a riqueza temática da poesia popular para crianças, bem como a literatura
popular em geral, afirmamos que há um valor nato nessas produções. A qualidade dessa
literatura não necessita de ser nivelada por baixo, pois se trata de uma produção artística que
também conta com muitos autores consagrados, que têm muito a mostrar aos seus leitores.
Os escritos populares devem ser lidos, apreciados e, portanto, vistos através do devido valor
que possuem.
Na obra em questão, pudemos observar com riqueza de detalhes, as diversas imagens dos
bichos, os ritmos, os temas e as percepções próprias do mundo que lhes confere valor. A
literatura para crianças, que tem os animais como temática, é algo que dialoga
constantemente com a fantasia, com o maravilhoso, pois os bichos, nesse âmbito, são capazes
de desempenhar papéis que qualquer ser humano desempenha, algo que pode provocar
verdadeiro encantamento nos pequenos.
Concluímos esse trabalho reafirmando a importância que há na literatura popular para
crianças, bem como no campo da poesia. É indispensável que nossos meninos e meninas
tenham conhecimento dessas produções tão ricas e provocadoras da imaginação. As crianças
necessitam de contato direto com a leitura, com a beleza da poesia e, assim, podem
desenvolver diversas formas de sensibilidade, como é o caso do sentimento de cuidado com
os animais, com o que diz respeito à natureza. O que vem do povo não deve ser deixado de
lado, pois as pessoas mais simples também têm muito a nos ensinar.
Se começarmos a inserir a literatura popular nas séries iniciais da educação infantil, os
pequenos não serão encaminhados ao preconceito a que parte da população letrada os
submete. Com isso, não queremos dizer que as produções eruditas não devam ser
contempladas – de forma nenhuma – propomos a inclusão da cultura popular no âmbito
educacional, bem como a conferência da importância com a qual ela merece ser tratada:
como uma produção de valor estético, temático e estrutural consideráveis.
REFERÊNCIAS
ALVES, J. H. P. Tesouros da poesia popular para crianças e jovens. Boitatá, v. 05, p. 34-45, 2008.
HELD, Jacqueline. O imaginário no poder. As crianças e a literatura fantástica. São Paulo: Summus, 1980.
SOSA, Jesualdo. A literatura infantil: ensaio sobre a ética, a estética e a psicopedagogia da literatura infantil.
São Paulo: Cultrix, 1978.
333
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A PRODUÇÃO TEXTUAL ESCRITA NO ENSINO FUNDAMENTAL II
*Isadora Cristiana Alves da Silva – Graduanda em Letras e suas Literaturas – UPE/ Campus Garanhuns. E-mail:
[email protected]
* Profª.Drª. Jaciara Josefa Gomes – Orientadora – UPE/ Campus Garanhuns.
334
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
INTRODUÇÃO
Para o estudo, foram escolhidos três gêneros textuais: diário (pode ser o blog que substituiu
o diário no suporte digital), notícia e carta do leitor. A princípio o foco estava nas aulas de
Língua Portuguesa na 5ª série do Ensino Fundamental II,como uma das atividades de
monitoramento do componente, durante os meses de março, abril e maio, para verificarmos
qual a noção de língua e de texto empregada pelo professor, se ele parte da concepção de
escrita como prática social e de linguagem em funcionamento sociocomunicativos, como
prática produtora de letramento(s) em várias instâncias sociais,políticas e culturais.Ou
observar se o direcionamento é exclusivamente voltado para a escrita como apropriação e
representação do código linguístico como sistema autônomo, desarticulando toda e qualquer
relação que há entre a língua e sociedade.
Seria feita também a análise do livro didático, durante o decorrer dos meses de abril e maio,
atentando para a noção de texto abordada no material e se esses gêneros, com base nas OTM,
são considerados pelo Livro Didático de Língua Portuguesa. Busca-se observar se o ensino de
língua esta partindo do texto concebido como menor unidade para o ensino de LP (SOARES,
1998), ou os conteúdos são abordados sem a menor contextualização, partindo apenas do
nível da frase.
O que impulsionou a escolha desses textos foi o fato de que neles é possível perceber
claramente uma elaboração convergente no processo de formação de um sujeito-autor, posto
que o diário representa uma produção de caráter mais pessoal, enquanto a notícia se mostra
com traços mais sociais e públicos, ambos não são ficcionais, e a carta do leitor que requer do
produtor uma análise crítica em relação a algo, o que por efeito possibilita o desenvolvimento
da capacidade argumentativa dos alunos. Partindo desses pressupostos é importante
salientar, que nesse trabalho que apresenta parcialmente a monitoria, são analisadas apenas
propostas de produção escrita dos três textos, para intervir na reescrita de um deles ao passo
do que for observado no decorrer das aulas.
Ao analisar o Livro Português: Dialogando com textos¹, como elemento fundamental para
auxiliar a prática do professor e direcionar a metodologia utilizada por ele, é preciso destacar
a importante noção de que a prática de ensino não deve estar delimitada apenas ao livro
didático, mesmo que ele se apresente como elemento suficiente, pois existem outras
possibilidades de abordagem dos conteúdos que também devem ser contempladas.
Nesta coleção didática, verifica-seque a proposta não consiste em impor apenas o
conhecimento de língua determinada pelo escopo gramatical, apoiado por um mecanismo de
ensino direcionado para a análise das frases fora de contexto, embora também não
desvalorize a importância que a norma padrão tem para determinadas situações, outrossim,
apresenta a língua como funcional e passível a transformações relacionadas ao contexto
histórico, social e cultural.
A obra orienta-se na articulação de três competências para o ensino de língua, a competência
comunicativa que abrange aspectos relacionados a uma visão mais geral e prática da
habilidade de comunicação oral e escrita nas mais diversas esferas sociais, considerando o
contexto social em que cada aluno esta envolvido, gerando um diálogo entre o professor,
aluno e conteúdo, estimulando um raciocínio critico e argumentativo diante das atividades. A
habilidade gramatical que tenciona-se a proporcionar o conhecimento da estrutura e regras
responsável por uma produção enunciativa própria dos alunos, mas que seja reconhecida no
domínio da linguagem, e por fim a capacidade textual que é firmada na visão de trabalhar o
texto como ponto de partida para o ensino de língua materna, promovendo a produção e
interpretação textual além da prática da leitura dos mais diversos gêneros orais e escritos.
No livro as atividades são elencadas a partir de sete seções-Motivações, Descobertas,
Reinvenção, Papo-firme, Lendo mais, Realimentação e Roda de leitura, dispostas em cada
uma das sete unidades, nas quais se evidencia com maior ou menor intensidade as
337
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
competências, comunicativas, gramaticais e textuais.A seção Descobertas subdivide-se em
mais três seções, a primeira, Dialogando com o texto, ressalta mais a competência textual e
menos a comunicativa, favorecendo a interpretação e compreensão do texto, e as noções de
estrutura e estilo textual.
Em seguida a Extrapolando que salienta mais a comunicativa e menos a textual, construindo
uma possível identificação com a leitura por parte do aluno, impulsionando uma conexão
entre a leitura e a realidade que resulta em não permitir que o aluno fique à margem do texto
e sim se apodere dele para compor seu conhecimento representativo. E por fim Indo e vindo
que destaca a aptidão gramatical em ausência da comunicativa e textual, atestando a
importância das regras gramaticais para a sistematização do conhecimento linguístico.
No seguimento Descobertas, busca-se enfatizar a utilização dos gêneros textuais, a partir do
tema que baseia as unidades. Os principais gêneros explorados são Poema, Reportagem,
Conto e Roteiro de cinema.
Na segunda unidade, o assunto discutido é criatividade e imaginação e o gênero selecionado
para subsidiar a abordagem foi o Poema Muros de Murilo Mendes, que contempla questões
ligadas ao imaginário. A terceira unidade exibe uma matéria relacionada às sensações
geradas pelas primeiras experiências, a primeira vez, Reportagem de Xico Sá intitulada Aos
54, avô festeja 1ª aventura no mar. No quarto item, o Conto de susto Gaspar, eu caio, de
Ricardo Azevedo traça um paralelo entre questões relacionadas à Cultura popular, tradições
e folclore. Na sétima unidade, o Roteiro do Central do Brasil escrito por João Emanuel
Carneiro e Marcos Bernstein estabelece um diálogo com o conteúdo que versa sobre o futuro
e as expectativas do Brasil.
É importante pontuar alguns gêneros que também são explorados na seção Reinvenção que
focaliza aspectos direcionados à comunicação e textualidade, norteando o professor no
desenvolvimento de atividades de produção de texto. Os gêneros destacados são Carta com
relato de experiência Receita e Relato.
O exemplar, embora se apresente com propostas inovadoras, voltadas para a noção de que é
preciso implementar a diversidade de gêneros em livros didáticos, mostra-se contraditório
em alguns aspectos, pois é possível percebera tentativa de evidenciar os gêneros literários.
Nesse sentido, outros gêneros presentes na vida cotidiana, em situações concretas de uso não
são explorados, reafirmando o ensino pautado na tradição. A melhor alternativa para
trabalhar o ensino de gêneros textuais é envolver os alunos em situações concretas de uso da
língua, de modo que eles consigam desenvolver de forma significativa o domínio das
produções textuais presentes nas diversas esferas da comunicação humana. É necessário ter
a consciência de que a escola é um “autêntico lugar de comunicação” e as situações escolares
“são ocasiões de produção e recepção de textos” (SCHNEUWLY e DOLZ, 2004).
Verifica-se também que dos gêneros selecionados para análise, Diário, Notícia e Carta do
leitor, com embasamento nas propostas de orientações teórico-metodológicas de
Pernambuco (OTM, 2008) para o ensino de Língua Portuguesa na 5ª série, não foram
contemplados pelo livro em análise.
Outra lacuna foi identificada na seção Descobertas, onde observou-se que nas unidades I, V,
VI, respectivamente, a narrativa intimista, O nome das vacas, de Vivina de Assis Viana, a
narrativa de aventura, Quadribol, de Joanne K. Rowling, e a narrativa de costumes, Keiko, de
Cristina Von foram classificadas como gênero textual. Dessa forma, observa-se que a noção
de gênero textual e tipo textual não está sendo trabalhada de forma clara.
Os tipos textuais se caracterizam linguisticamente pelos aspectos lexicais, sintáticos, tempos
verbais, como a narração, exposição, descrição, argumentação e injunção. Visto que os
gêneros textuais são textos com funções comunicativas de organização e interação que se
constituem sócio-histórica e culturalmente. Os gêneros podem compreender diversos tipos
textuais, fenômeno chamado de heterogeneidade tipológica. Em todos os gêneros também se
estão realizando tipos textuais, podendo ocorrer que o mesmo gênero realize dois ou mais
tipos. Assim, um texto é em geral tipologicamente variado (heterogêneo). (MARCUSCHI,
2002).
338
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
BRASIL. SEF/MEC. Parâmetros curriculares nacionais; língua portuguesa – 5ª. a 8ª. Série. Brasília.SEF/MEC,
1998.
BEAUGRANDE R. de. New fundations for science of text and discurse: cognition, communication, and the
freedom of Access to knowledge and society. Norwood, Ablex, 1997.
BRONCKART, Jean-Paul. Atividade de linguagem, textos e discursos. Por um interacionismo sócio-discursivo.
São Paulo, EDUC, 1999.
FELÍCIO, Rosane P. et al. Projet(o) arte. In: MOURA, Eduardo; ROJO, Roxane. (Orgs.). Multiletramentos na
escola. São Paulo: Parábola Editorial, 2012. p. 123- 146.
HELENE, Maria Beatriz Marcondes; LAURIA, Maria Paula Parisi; BUSCATO, Lenira Aparecida. Português:
Dialogando com textos: 5ª série. Curitiba: Positivo, 2006. (coleção Português: dialogando com textos, v.5).
KLEIMAN, Angela B. Modelos de letramento e as práticas de alfabetização na escola. In: KLEIMAN, A. (org.). Os
significados do letramento: uma nova perspectiva sobre a prática social da escrita. São Paulo, Mercado de Letras,
1995, p. 15-61.
MARCUSCHI, Luiz Antônio. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São Paulo: Parábola Editorial,
2008.
_____. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In: DIONÍSIO, Angela Paiva; MACHADO, Anna Rachel;
BEZERRA, Maria Auxiliadora (Orgs.). Gêneros textuais e ensino. Rio de Janeiro: Lucerna, 2002, p. 19-36.
Secretaria de Educação. ORIENTAÇÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS: Ensino fundamental; Língua Portuguesa.
- 1º ao 9º Ano. Pernambuco, 2008.
SCHENEUWLY, B; DOLZ, J. Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e org. Roxane Rojo e Gláis Sales Cordeiro.
Campinas, SP: Mercado das Letras, 2004
SOARES, Magda B. Concepções de linguagem e o ensino de língua portuguesa. In: BASTOS, N. B. (org.). Língua
portuguesa: história, perspectivas, ensino. São Paulo, Educ, 1998, p. 53-60.
339
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A CIRCULAÇÃO DO CONHECIMENTO PROMOVIDA PELAS BIBLIOTECAS
124
Mestrando em Tecnologia Ambiental – ITEP; Auxiliar de Biblioteca do Instituto Federal do Sertão Pernambucano,
Campus Salgueiro; E-mail: [email protected]
125 Graduanda em Gestão Ambiental – UNOPAR; Auxiliar de Biblioteca do Instituto Federal do Sertão Pernambucano,
Especialização em Educação Contextualizada para Convivência com o Semiárido Brasileiro – UNEB; Professor da Rede
Pública Municipal de Ensino – Juazeiro-BA. [email protected]
340
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
knowledge promoted by libraries, gained more prominence and priority according to the
reading needs, increasingly growing humanity. Thus, libraries fulfill their role materializes in
the dissemination of recorded knowledge.
INTRODUÇÃO
Partindo da temática abordada neste artigo e que versa sobre “A circulação do conhecimento
promovida pelas bibliotecas”, é válido realizar uma breve abordagem acerca do contexto
histórico da biblioteca e do bibliotecário no mundo e no Brasil. Desse modo, deve-se destacar
que ao desenvolver um estudo acerca da história das bibliotecas no mundo foi possível
observar que esse é um fato que está de modo direto relacionado ao próprio contexto
histórico acerca da escrita, bem como das maneiras de registro do conhecimento humano.
Segundo Pinho e Machado (2011, p.1) ressaltam que,
341
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Biblioteca (do grego βιβλιοϑήκη, composto de βιβλίον, "livro", e ϑήκη "depósito"), na
definição tradicional do termo, é um espaço físico em que se guardam livros. De
maneira mais abrangente, biblioteca é todo espaço (concreto, virtual ou híbrido)
destinado a uma coleção de informações de quaisquer tipos, sejam escritas em folhas
de papel (monografias, enciclopédias, dicionários, manuais, etc) ou ainda
digitalizadas e armazenadas em outros tipos de materiais, tais como CD, fitas, VHS,
DVD e bancos de dados. Revistas e jornais também são colecionados e armazenados
especialmente em uma hemeroteca. (PINHO; MACHADO, 2011, p.1)
A realidade é que durante o período da Antiguidade, bem como da Idade Média as bibliotecas
não possuíam como objetivo central dar acesso ao grande público, ou seja, ao homem. Muito
pelo contrário, esses espaços se configuravam como símbolos de poder e acúmulo de saber
para os poucos privilegiados que podiam ter acesso as bibliotecas, uma vez que em meio ao
contexto de grandes invasões e guerras às bibliotecas tornavam-se um dos principais alvos
342
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
em decorrência da sua importância simbólica em torno da disseminação do saber. De acordo
com Martins (1998, p. 72),
A biblioteca foi assim, desde os seus primeiros dias até aos fins da Idade Média, o que
o seu nome indica etimologicamente, isto é, um depósito de livros, e mais o lugar
onde se esconde o livro do que o lugar de onde se procura fazê-lo circular ou
perpetuá-lo. A própria disposição arquitetônica dos edifícios demonstra-o melhor do
que qualquer outro índice: na grande biblioteca de Nínive, o depósito de livros não
tem saída para o exterior – a sua única porta parece dar, ao contrário, para o interior
do edifício, para o lugar onde viviam ou onde permaneciam os grandes sacerdotes. Da
mesma forma, as bibliotecas medievais se situam no interior dos conventos, lugares
dificilmente acessíveis ao profano, ao leitor comum. (p. 72).
O contexto histórico ressaltar que até a Idade Moderna as bibliotecas, bem como os arquivos
e os museus eram apenas considerados entidades cuja função era guardar todos os tipos de
documentos. Foi apenas com a criação, ou seja, surgimento dos livros impressos que a
biblioteca passou a ganhar uma existência própria. Frente a esse fato, é válido enfatizar que a
partir do Século XVII foram criadas as primeiras bibliotecas públicas que vieram a ser
patrocinadas por mecenas, sendo que esse foi um dos motivos que fizeram com que museus e
bibliotecas viessem a ser abertas para o grande público. Tudo isso ocorreu em decorrência
também da Revolução Francesa que defendia os ideais do oferecimento para a sociedade
como um todo de uma educação pública laica e gratuita.
Neste contexto, é importante destacar que nesse período o bibliotecário ganhou
destaque social e a biblioteca não mais era o local de disseminação do saber e do
conhecimento restrito, mas o espaço que deveria possibilitar ao homem adquirir novos
conhecimentos e que pudessem ter acesso aos diversos saberes que a própria biblioteca
disponibilizasse. Em meados do Século XIX, ocorreu a necessidade das bibliotecas contarem
com os serviços de um profissional especializado e com formação técnica para trabalharem
nesses espaços, uma vez que foi nesse período que surgiram e foram desenvolvidas práticas e
técnicas bibliotecárias cuja meta era sistematizar as informações, bem como os acervos. De
acordo com Santos (2013, p.3),
Sobre a profissão de bibliotecário, ela foi regulamentada no Brasil pela Lei nº 804 de
30 de junho de 1962 (BRASIL, 1962). Na contemporaneidade, tem-se que o objeto de
trabalho do bibliotecário é a informação apresentada nas mais variados suportes, isto
é, impressa e eletrônica e formas, ou seja, textual, imagética, sonora, botânica, entre
outras (CRB-3ª Região, 2011). (SANTOS, 2013, p.3).
No que se refere à formação do bibliotecário, pode-se destacar que a partir do Século XIX
desenvolveram-se dois métodos diferentes de ensino e formação em biblioteconomia, ou seja,
o método francês e o norte-americano. Desse modo, deve-se ressaltar que nas últimas
décadas do Século XX a Biblioteconomia enquanto área de estudo ganhou mais cursos de
bacharelado e de especialização no Mundo e cujo caráter em comparação ao início dessa
profissão foi modificado, uma vez que o bibliotecário ao longo da sua formação, hoje, aprende
343
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
questões interdisciplinares á exemplo da Análise Documentária, Linguística, Lógica
Terminologia, bem como Organização do Conhecimento. (ORTEGA, 2004).
Levando em consideração esse fato, bem como o modo como os acervos eram organizados,
constata-se através de relatos históricos que desde a Antiguidade o homem buscou
desenvolver maneiras de classificar as mais diversas áreas do conhecimento humano
existentes na esfera de uma biblioteca, sendo que foi a partir desse instante que se pensou em
criar sistemas de classificação bibliográfica universal. Contudo, foi apenas em 1876 que
Melvil Dewey apresentou para o Mundo a sua Classificação Decimal-CDD, que vem a ser o
primeiro sistema utilizado para classificar assuntos adotados nas bibliotecas e que é usado
até hoje. Segundo Damy (2010, p.1),
Tanto a Classificação Decimal de Dewey como a Classificação Decimal Universal
constituem um sistema hierárquico, no qual idéias e conceitos são representados em
suas múltiplas relações de coordenação, subordinação e superordenação. Adota-se
como princípio fundamental a divisibilidade do todo, que é o conhecimento, em dez
partes divididas em disciplinas e subdisciplinas. (DAMY, 2010, p.1).
Com o seu papel definido desde o seu surgimento, as bibliotecas preservam o saber
registrado e promovem a sua circulação e disseminação na sociedade através do apoio à
educação, ciência e tecnologia, ao desenvolvimento cultural e ao estímulo intelectual. Assim,
com a circulação do conhecimento promovida pelas bibliotecas, a relação intrínseca entre
345
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
informação e leitura favorece a cidadania nos mais variados aspectos da sociedade, com uma
função extremamente importante na formação cidadã e cultural das pessoas.
Nesse sentido, a circulação do conhecimento é fator de grande importância na sociedade, na
comunicação e na linguagem, fundamental para tornar os leitores mais conscientes da prática
em que estão envolvidos. Assim, com os livros, com a circulação do conhecimento, podemos
ampliar nosso entendimento a respeito das informações que nos cercam, obter autonomia de
pensamento e decisão, encontrar respostas para os problemas enfrentados e conquistar
consciência diante de nossos direitos e deveres, pois o contato com o livro enriquece
culturalmente e socialmente.
Ao promover a circulação do conhecimento, assumindo esse papel na comunidade, a
biblioteca reconhecerá sua função social e conforme Bernardino e Suaiden (2011),
(...) incorporará, além do seu objetivo primordial, que é preservar e difundir o
conhecimento, fazendo isto, principalmente no que se refere à cultura local, mas,
incorporará, também, a própria comunidade do seu entorno, as suas funções e
atribuições, sendo reconhecida e legitimada pela sociedade (BERNARDINO;
SUAIDEN, 2011, p. 32).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
ANDRADE, Rosane Maria Nunes. O livro dos livros da Real Biblioteca: tesouros na Biblioteca Nacional.
2009. Disponível em: http://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2009/resumos/R4-3933-1.pdf Acesso em:
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BAPTISTA, S. G.; BRANDT, M. B. Do manuscrito ao digital: a longa sobrevivência das bibliotecas e dos
profissionais envolvidos. Revista Digital de Biblioteconomia e Ciência da Informação. Campinas, v. 4, n.
esp., 2006, p. 21-40.
BERNARDINO, M. C. R.; SUAIDEN, E. J. O papel social da biblioteca pública na interação entre informação e
conhecimento no contexto da ciência da informação. Revista Perspectivas em Ciência da Informação, v.
16, n. 4, p. 29-41, out./dez. 2011.
346
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
DAMY, Antônio Sérgio Azevedo. Classificação decimal de Dewey e classificação decimal universal.
2010. Disponível em: http://www.damy.site90.net/web_documents/classificacao.pdf Acesso em: 04 de Mar. de
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MARTINS, Wilson. A Palavra Escrita. São Paulo. Ática, 3. ed. 1998. 512p.
SOARES, Francisco Sérgio Mota. A Biblioteca Pública da Bahia: dois séculos de história/ Francisco Sérgio
Mota Soares... [et al.] − Salvador: Fundação Pedro Calmon, 2011. 204p.
347
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
SITUAÇÃO DE PRODUÇÃO E LEIS DO DISCURSO EM ARTIGOS DE OPINIÃO
DE ALUNOS DE 9º ANO: UMA PROPOSTA DE INTERVENÇÃO
Maria Rivaldízia do Nascimento
Rede Estadual de Ensino de Pernambuco
Mestranda do Profletras-UPE Garanhuns
Resumo: discutir o ensino e a aprendizagem de elementos da análise do discurso, com base nos
pressupostos da AD francesa a partir da produção do gênero artigo de opinião no 9º ano do Ensino
Fundamental, torna-se indispensável para repensar a escrita enquanto possibilidade de manifestar-se
em práticas sociais reais de interação. Sendo assim, O presente trabalho visa refletir sobre como os
elementos da AD, a exemplo de contexto de produção e leis do discurso, podem auxiliar os alunos de
9º ano de uma escola pública na construção eficiente da argumentação no gênero artigo de opinião e
propor uma sequência didática como possibilidade de intervenção. Para tanto, realizamos pesquisa
bibliográfica com base teórica nos estudos de Maingueneau (2001), Orlandi (2001) e Dolz e Schneuwly
(2004) e adaptamos uma sequência didática direcionada para o 9º ano. As reflexões realizadas e a
proposta de intervenção elaborada contribuem significativamente para o ensino e a aprendizagem de
elementos da análise do discurso a partir do gênero textual artigo de opinião, considerando que o
estudante precisa produzir discursos através do uso significativo da linguagem.
Abstract:
Discuss the teaching and learning the elements of analysis of discourse, based on the assumptions of
the French AD from the production of the genre opinion article in the 9th grade of the Elementary
Teaching, becomes indispensable for rethinking the possibility of writing as manifest in real social
practices of interaction. Thus, the present study aims to reflect on how the elements of AD, like the
context of production and laws of speech, can help students of 9th grade in a public school in the
efficient construction of argumentation in the genre opinion article and propose an instructional
sequence as the possibility of intervention. Thus, we performed bibliographic search with theoretical
basis on the studies of Maingueneau (2001), Orlandi (2001) and Dolz and Schneuwly (2004) and
adapted a didactic sequence directed to the 9th grade. Our reflections and elaborate intervention
proposal contribute significantly to the teaching and learning the elements of analysis of discourse
from the genre opinion article, considering that the student needs to produce discourses through
meaningful use of language.
INTRODUÇÃO
O ensino e a aprendizagem de gêneros textuais da esfera argumentativa no Ensino
Fundamental podem facilitar a compreensão, pelo estudante, da complexa e dinâmica
natureza da linguagem, bem como, habilitá-lo a dominar estratégias argumentativas para que
(re) construa valores e posturas, sobretudo mobilizando os recursos da língua e do discurso
para persuadir, concluir, refutar. Conforme preveem os PCN (EM, 1998, p. 64) o estudante
deve assumir “posicionamento crítico diante de textos, de modo a reconhecer a pertinência
dos argumentos utilizados, posições ideológicas subjacentes e possíveis conteúdos
discriminatórios neles veiculados”, o que pode ser decisivo à formação do sujeito que atua
para uma sociedade mais solidária em sua pluralidade. Entretanto, segundo Kleiman (2007 p
9) muitos professores trabalham com gêneros textuais na escola priorizando a
metalinguagem, estimulando o estudante a “analisar os textos do gênero para aprender como
está formado ou para aprender a escrever textos segundo o modelo”, o que nos leva a crer que
tal visão é reducionista, uma vez que para a compreensão de um texto é preciso realizar
outros níveis de análise como, por exemplo, a discursiva.
É a partir de premissas como as citadas acima que defendemos um ensino de língua materna
delineado a partir do estudo e produção de gêneros textuais, uma vez que entendemos que a
enunciação toma corpo e forma via gêneros textuais e a escola é o lugar para aprimorar as
competências do sujeito como responsivo do ato enunciativo e, portanto capaz de aderir,
rejeitar, deleitar-se com e pelo texto. Enquanto produtor, ele assume posicionamentos e
espera do interlocutor, uma reação, já que, como postula Geraldi (1997 p 102):
[...] é para o outro que se produz o texto. E o outro não se inscreve no texto apenas no
seu processo de produção de sentidos na leitura. O outro insere-se já na produção,
como condição necessária para que o texto exista. É porque se sabe do outro que um
texto acabado não é fechado em si mesmo. Seu sentido, por maior precisão que lhe
queira dar seu autor, e ele o sabe, é já na produção um sentido construído a dois.
Ao produzir um texto o enunciador assume a posição de sujeito responsivo ativo em relação a
outros e espera estabelecer um diálogo com seu interlocutor que, por sua vez, ao demonstrar
que compreendeu, porta-se como respondente ativo.
Nessa perspectiva, a produção de textos escritos como atividade de interação através do texto
deve ser foco em todas as atividades educativas da escola e, sobretudo, das aulas de língua
materna, uma vez que assim, o sujeito transforma e pode ser transformado em sua trajetória
sócio histórica. Segundo Kleiman (2005 p.57):
O sujeito letrado passa a ter não um, mas pelo menos, dois sistemas para se comunicar:
o falado e o escrito. Mas usará o escrito somente se for tão fluente nele como é na fala e,
para tal, é preciso trabalhar abordagens, estratégias e recursos de desvendamento do
texto, ensinar o processo sócio cognitivo que está por trás da compreensão da palavra
escrita. é preciso fazer isso entendendo bem como funcionam os textos.
Dessa forma, cabe ao educador ensinar o estudante a ler e produzir textos orais e escritos que
atendam a determinadas necessidades de interlocução.
A prática pedagógica voltada para a ampliação de competências e habilidades concernentes
ao sujeito letrado, é enriquecida quando o educador concebe a argumentação como
importante recurso para que o educando construa o discurso em situações reais de uso,
compreendendo-o como uma possibilidade de agir, interagir e perceber as intenções
presentes nos mais variados enunciados. Segundo Ducrot (1990 apud Ortmann, 2009 p. 2),
“a argumentação é intrínseca a própria língua”. Já para Souza (2008 p. 72): “a argumentação
no discurso é uma das principais formas para entendermos melhor os processos de
construção de sentido, para entendermos como a sociedade se constrói discursivamente e
como interagimos socialmente e influenciamos uns aos outros”. Ou seja, ao perceber e
compreender as vozes, os discursos e os aspectos histórico-ideológicos que compõem a
argumentação, o estudante constrói sentidos para o dizer de outros ao tempo em que assume
uma posição e constrói o próprio dizer.
Para Amossy (2007 p 133), a argumentação está intrinsecamente ligada a Análise de
Discurso, uma vez que “o projeto de persuasão fundamenta-se também em procedimentos
linguageiros que ultrapassam a esquematização”. Ou seja, na perspectiva da AD, produzir um
texto argumentativo é muito mais que seguir esquemas, uma vez que isso não dá conta da
“densidade e da complexidade da argumentação”. Para a pesquisadora (2007 p 134):
A argumentação deve ser analisada em situações de discurso variadas, uma vez que ela
depende das possibilidades da língua e das condições sociais e institucionais que
determinam parcialmente o sujeito, fora dos quais a orientação ou a dimensão
argumentativa do discurso não pode ser apreendida com discernimento.
Nessa perspectiva, o artigo de opinião, gênero a ser analisado neste trabalho, mostra-se como
ideal às nossas propostas, por ser um texto no qual o escritor tem a possibilidade de
mobilizar os recursos da língua com o fim específico de persuadir. Segundo Dolz e Schneuwly
(2004), o artigo de opinião está inserido na esfera de comunicação jornalística e, como tal,
350
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
presta-se à discussão social de assuntos polêmicos, expressando uma opinião sobre estes,
visando persuadir o leitor.
O gênero artigo de opinião costuma circular em meios impressos e virtuais, voltado para a
elite leitora do país, é uma forma de divulgar ideologias e valores com o objetivo de persuadir
seu público-alvo a respeito de temas controversos que a este interessa. Para isso, o articulista
recorre a discursos de outros, dando-lhes determinado tratamento conforme seus objetivos.
Conforme Maingueneau (1997 p 85), essa “forma de relatar a mesma enunciação” atribui ao
gênero um caráter heterogêneo e pode ocorrer na forma de citação direta ou indireta através
da qual o articulista demonstra sua adesão ou refutamento.
Por outro lado, ao produzir o artigo de opinião – ou qualquer outro gênero textual - o sujeito
só pode ter sucesso na ação de interação que pretende realizar a partir de considerações a
respeito de aspectos referentes ao conteúdo, à forma, ao estilo do texto e aos discursos que o
atravessam, o que interfere na construção de sentidos.
Os teóricos e estudiosos da Análise do Discurso de linha francesa acrescentam alguns
aspectos a essa concepção de produção textual, ao defenderem que para se produzir um texto
– forma de materializar o discurso – é preciso considerar suas condições de produção que
envolvem além de aspectos linguísticos, crenças, princípios, aspectos políticos, históricos e
até as relações de poder existentes entre os participantes da interlocução.
Para Orlandi (2001) a linguagem se realiza entre interlocutores situados em determinados
espaços sociais e, portanto, deve ser considerada a partir de uma situação efetiva de
produção. A pesquisadora denomina o contexto de situação de produção e defende que seu
funcionamento ocorre segundo fatores como: relações de sentidos, relações de força e
antecipação. Segundo Orlandi (2001 p 39), “todo discurso é visto como um estado de um
processo discursivo mais amplo”, ou seja, os discursos mantêm relações entre si e um está
sempre se relacionando com outro que o precede, sustenta ou com outro que o sucederá.
Considerando o recurso da antecipação, Orlandi (2001 p 39) preconiza que com tal
mecanismo “o sujeito se antecipa a seu interlocutor quanto ao sentido que suas palavras
produzem”. Sendo assim, o sujeito coloca-se no lugar do seu interlocutor e faz escolhas para
seu dizer a partir de considerações sobre o efeito que deseja produzir no outro com o qual
pretende interagir.
Maingueneau (2001) por sua vez, refletindo acerca de enunciado e contexto, nos conduz a
observar as Leis do Discurso e seu importante papel na construção de interpretações.
Segundo o pesquisador, isso ocorre, a partir do respeito a determinadas regras de cooperação
instituídas, por vezes, tacitamente pelos participantes da troca verbal. Dentre essas leis nos
deteremos em três: lei da pertinência, lei da sinceridade, e lei da preservação das faces - que
partem do princípio de que a comunicação verbal é também uma relação social - para
analisar os textos produzidos por alunos, em uma turma de 9º ano do Ensino Fundamental.
Considerando que algumas convenções devem ser aceitas, ainda que tacitamente, pelos
coenunciadores as Leis do discurso são percebidas como um relevante referencial na
constituição do entendimento e da interação a partir do discurso produzido. Assim, durante
a interação, o respeito a tais leis leva a manutenção das relações sociais e da comunicação,
351
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
pois, segundo Maingueneau (2001 p 41): “O domínio das Leis do discurso [...] é componente
essencial de nossa competência comunicativa, ou seja, de nossa aptidão para produzir e
interpretar os enunciados de maneira adequada às múltiplas situações de nossa experiência.
[...] ao aprendê-la, aprendemos a nos conduzir na sociedade”.
Maingueneau (2001 p. 34) explica que a lei da pertinência “estipula que uma enunciação deve
ser maximamente adequada ao contexto em que acontece; deve interessar ao destinatário,
fornecendo-lhe informações que modifiquem a situação.” Sendo assim, o locutor deve
priorizar em sua produção, dados que sejam relevantes ao interlocutor e fazer isso
observando o contexto e o cotidiano.
A lei da sinceridade, por sua vez, “diz respeito ao engajamento do enunciador no ato de fala
que realiza”, nesse caso, ainda conforme Maingueneau (2001 p 35), o enunciador não pode
afirmar algo no qual não acredita ou que não pode ter sua veracidade comprovada. Dessa
forma, o locutor “para afirmar algo, deve estar em condições de garantir a sua veracidade” o
que fatidicamente elimina a possibilidade de o enunciador enunciar algo que não deseja ver
realizado.
De acordo, ainda, com Maingueneau (2001 p 41), as leis do discurso devem ser adaptadas
conforme as especificidades de cada gênero textual e, geralmente, são usadas pelos
participantes do discurso de maneira intuitiva. Por exemplo, em uma peça teatral pode-se
insultar o público, mas isso não se faz em uma palestra, pois isso não seria adequado a esta
situação comunicativa.
Para a produção de um artigo de opinião no 9º ano, consideramos relevante o respeito às leis
acima citadas e o conhecimento e domínio sobre a situação de produção, na medida em que
estas contribuem significativamente para a construção do sentido e estabelecimento da
interlocução. Para tanto, propomos a sequência didática a seguir:
Na apresentação da situação inicial, os alunos são estimulados a perceberem a relevância dos
conteúdos e das atividades de que irão participar, ao tempo em que o projeto do trabalho é
apresentado, em linhas gerais. Como esse momento visa possibilitar à turma a construção de
uma ideia sobre a atividade linguística a ser trabalhada e, ainda, o contexto situacional que
norteará a produção final, é necessário fornecer-lhes informações a respeito do conjunto de
módulos e, de modo geral, sobre a linguagem geralmente utilizada no gênero a ser
trabalhado. Segundo os idealizadores dessa metodologia, esse momento é muito importante
para que o aluno possa refletir sobre a necessidade da interação verbal, percebendo, por
exemplo, a quem ela será direcionada.
Para isso, apresentar um anúncio publicitário de TV de telefone celular para que a turma faça
a leitura e se observe seu conhecimento de mundo e a construção de sentidos realizada. Os
estudantes devem ser estimulados a falar sobre aspectos composicionais e a função do texto,
bem como, a respeito do uso do aparelho na sociedade moderna. Apresentar uma notícia
sobre a utilização do celular por pessoas que caminham pelas ruas do país enquanto falam ao
telefone e estimular uma discussão sobre a conveniência e a necessidade do uso em
determinados locais e momentos Após as discussões, a turma deve ser informada, em linhas
gerais, sobre a temática, os módulos da sequência, e a produção final – um artigo de opinião -
, cuja publicação será no mural e no blog da escola.
352
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Para diagnosticar os conhecimentos prévios da turma sobre o gênero artigo de opinião e
sobre contexto e leis do discurso, apresentar uma charge, um cartaz, um artigo de opinião
que tratem sobre o uso do celular e o regimento da escola destacando os artigos a respeito da
utilização do aparelho nas dependências da escola. A discussão deve ser conduzida para que a
turma fale sobre os discursos que atravessam cada texto, a presença de opiniões, a posição
dos interlocutores nos discursos, com quais outros discursos se relacionam, preservação das
faces, pertinência. Quanto ao gênero artigo de opinião, é importante observar se a turma tem
conhecimentos acerca da finalidade do gênero, das situações sociais em que é produzido, em
que suportes circula, quem são seus leitores, quem os produz, e ainda, seus aspectos
linguísticos. Aqui, o professor precisa ter muita habilidade para dividir a apresentação dos
textos em aulas ou momentos, conforme o interesse, a participação da turma e o tempo
disponível; bem como, conduzir as discussões, pois, não se trata de ensinar os tópicos aos
estudantes, e sim, de conhecer o que eles sabem para facilitar a realização dos módulos da
sequência didática.
As atividades do 1º módulo podem ser sobre o gênero artigo de opinião, caso a turma
demonstre dificuldades quanto aos aspectos linguísticos e composicionais do texto. Formar
duplas para responderem a questionamentos sobre a construção do título, nível de
formalidade da língua, tempo verbal predominante, se o texto remete principalmente a fatos
ou a opiniões e argumentos, presença ou não de trechos que reflitam declarações de terceiros
sobre um fato, marcas linguísticas que indicam autoria. As conclusões, anotadas no caderno,
socializadas com os colegas e sistematizadas conjuntamente com o professor servirão para
propiciar ao aluno, em etapa posterior, avaliar a própria produção, identificando possíveis
problemas na escrita e algumas possibilidades de reescrita. Dando continuidade, os alunos
são estimulados a refletirem sobre as diversas formas de construir e selecionar argumentos.
Para isso, o professor seleciona trechos argumentativos em textos disponíveis no livro do
aluno e apresenta-os, em Datashow – destacando alguns elementos para exemplificar
recursos linguísticos que podem ser utilizados para representar a posição do locutor e do
interlocutor, conforme os efeitos de sentido pretendidos. O próximo passo é a realização de
um debate a respeito dos diversos discursos sobre o uso do celular. A turma pode pesquisar,
por exemplo, o que diz a mídia, o jovem, o adulto, etc. e, durante o debate, cada grupo
assumir uma posição e defende-la com argumentos pertinentes, fundamentados.
O segundo módulo trata de leis do discurso e situação de produção. Iniciando, o professor
aborda a questão dos implícitos e sua relação com o contrato de cooperação e as leis do
discurso lendo com a turma anúncios publicitários nos quais o uso de imagens e textos
verbais mantêm relação com o público alvo consumidor do produto através de discursos e
informações implícitos; até que ponto isso ameaça a face do consumidor; qual verdade está
sendo divulgada. Também é importante refletir sobre o modo como são construídos os
implícitos e a implicação disso para a persuasão do público alvo. Além disso, levantar
questões a respeito da situação de produção e do jogo de imagens entre os interlocutores,
como: “Quem é o locutor para falar assim? Quem é seu interlocutor para que o locutor fale
assim? De que o locutor fala?", entre outras. O professor sistematiza por escrito as discussões
e propõe atividade semelhante com textos de outros gêneros, inclusive, artigo de opinião.
353
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Para que os estudantes ponham em prática o que aprenderam sobre elementos de análise do
discurso e o gênero artigo de opinião, propor a reescrita coletiva de um dos textos produzidos
no início da sequência. Um guia com questões pode ser elaborado e apresentado nesse
momento para que o aluno avalie e perceba possibilidades de reescrita e o texto coletivo pode
ser publicado no blog da escola. Para a auto avaliação e a reescrita individual, cada estudante
receberá seu primeiro texto escrito com observações do professor a respeito dos aspectos
trabalhados na sequência. Os textos podem ser publicados no mural da escola e no blog da
turma conforme se acordar.
Sem a pretensão de ter esgotado o assunto, o presente trabalho contribui de maneira
significativa para reafirmar a certeza de que a compreensão e a produção de textos na escola
exigem muito mais que o ensino e a aprendizagem de aspectos linguístico-textuais, uma vez
que o estudante precisa perceber o discurso como revelador de ideologias, interesses e
comprometimentos com determinados projetos sociais que pressupõem, por um lado,
reprodução e dominação, e por outro, transformação e desejo de mudança. Nessa
perspectiva, a sequência didática aqui proposta apresenta-se como uma proposta viável de
abordar os elementos da análise do discurso a partir da produção do gênero artigo de opinião
no Ensino Fundamental, considerando que essas são premissas relevantes para a formação
de leitores proficientes.
REFERÊNCIAS
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Tradução: Adriana Zavaglia. Revista Filologia e linguística portuguesa, n 9, p 121-146. 2007.
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Escrita e interação: produção de textos de opinião na sala de aula. In: CELLI – COLÓQUIO DE ESTUDOS
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________. Parâmetros Curriculares Nacionais- Ensino Médio. Brasília: MEC/SEF, 1998.
DOLZ, J.; NOVERRAZ, M.; SCHNEUWLY, B. Sequências didáticas para uso oral e a escrita: apresentação de
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Cruz do Sul. Dez 2007
354
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
UM NOVO OLHAR SOBRE AS “COISAS DO SERTÃO”: DESMISTIFICANDO
ESTEREÓTIPOS EXISTENTES SOBRE O SEMIÁRIDO.
RESUMO: Este trabalho tem como propósito apresentar o conteúdo produzido pelo “Coisas
do Sertão”, programa do site WebTv Uneb -Núcleo Juazeiro-BA. O projeto é desenvolvido por
alunos do curso de Jornalismo em Multimeios sob a coordenação da professora Fabíola
Moura. As reportagens produzidas pelo “Coisas do Sertão” buscam mostrar as
potencialidades do Semiárido Brasileiro, seguindo uma ótica que muitas vezes não é
retratada pelos veículos de comunicação comercial e pela grande mídia. O programa faz uma
abordagem regional sobre diversos aspectos e características locais como a cultura, sociedade
e ciência, com o intuito de desmistificar os estereótipos construídos em torno da imagem do
sertanejo e do semiárido. O “Coisas do Sertão” apresenta pautas sobre assuntos de interesse
social, mas que muitas vezes, não são abordadas pela mídia local. O programa também
permite aos estudantes que integram o projeto, refletirem e debaterem os discursos
produzidos pela mídia, que descaracterizam a imagem do sertão, levando-os a repensar
matérias que valorizem as riquezas encontradas no semiárido brasileiro.
ABSTRACT:This work aims to present the content produced by the " things of the Wild "
program WebTv UNEB - Core Juazeiro - BA website. The project is developed by students of
Multimedia Journalism under the coordination of Professor Fabíola Moura . The reports
produced by the " things of the Wild " seek to show the potential of the Brazilian semiarid
region , following a perspective that is not often portrayed by heavy commercial
communications and the mass media . The program makes a regional approach on various
aspects and local characteristics such as culture, society and science, aiming to demystify the
stereotypes built around the image of the frontiersman and semiarid . The " Things of the
Wild " presents guidelines on matters of social interest , but which are often not covered by
local media . The program also allows students to participate in the project , reflect and
discuss the discourses produced by the media , which mischaracterize the image of the
interior, causing them to rethink materials highlighting the riches found in the Brazilian
semiarid region.
INTRODUÇÃO
[email protected].
355
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
de personalidades, como também sobre o comportamento de um grupo de pessoas”
(PEREIRA, 2002 apud MORONI, 2008).
Por exercer fácil assimilação, algumas produções telejornalísticas criam estereótipos sobre a
imagem do Nordeste. Os veículos da grande mídia, em suas reportagens, abordam o
Semiárido Brasileiro de forma pejorativa, retratando muitas vezes, apenas as mazelas
existentes no local.
Na busca por uma alternativa que revelasse um novo olhar sobre o Semiárido, surgiu o
“Coisas do Sertão” da Web TV UNEB- Núcleo de Juazeiro. O produto faz parte do projeto de
extensão Programas Experimentais de Televisão, da Universidade do Estado da Bahia
(UNEB). O programa é produzido pelos alunos do Curso Jornalismo em Multimeios, sob a
coordenação da professora Fabíola Moura.
‘Coisas do Sertão’ busca abordar em suas reportagens, conteúdos regionais que valorizam a
identidade do sertanejo. O programa procura pautar o meio ambiente, cultura, ciência e
educação que ajudam a desmistificar o cenário até então construído pela mídia. O programa
foi um dos primeiros produtos da programação da WebTV UNEB Núcleo de Juazeiro e nele
estudantes tem a oportunidade de fugir das representações criadas pelos veículos de
comunicação de massa, tendo a liberdade de lançar um novo olhar crítico sobre as “coisas do
sertão”.
O programa ‘Coisas do Sertão’ é um dos 10 links do site WebTV UNEB Núcleo de Juazeiro,
primeira TV educativa do Vale do São Francisco. Por ser uma ferramenta presente na
internet, o site se destaca como um importante meio de interação entre os públicos, não só da
região como também de todo o Brasil. Para Ribeiro (2009), a TV na WEB trás a possibilidade
de alterar o contexto e a forma como as informações são distribuídas na sociedade, além de
transformar o receptor das mensagens em um possível produtor e emissor de informações.
É importante ressaltar que as reportagens produzidas pelo ‘Coisas do Sertão’ não visam criar
uma imagem do que seja o Semiárido Brasileiro e sim destacar aspectos culturais, naturais e
sociais típicos da região, ou seja, mostrar uma realidade que não é retratada nos veículos de
mídia.
O caráter educativo dos programas veiculados no site Web TV UNEB Núcleo de Juazeiro, em
especial o ‘Coisas do Sertão’, busca também levar a informação para transformação do
conhecimento, em uma prática educomunicativa. Para Martins(2008), um produto que
relaciona comunicação e educação, tem por finalidade procurar meios que possam intervir
socialmente.
Dessa forma, o programa ‘Coisas do Sertão’ leva a informação para seu público, transmitindo
para o webespectador um conhecimento diferenciado sobre o Semiárido Brasileiro,
mostrando que é possível conviver com as diferenças existentes no sertão, utilizando,
segundo IRPAA (2012), tecnologias e procedimentos apropriados ao contexto ambiental e
climático da região. Analisando o grau de aceitabilidade do programa, foram contabilizadas
16.500 acessos até o dia 17 de março de 2014.
Para a escritora Rachel de Queiroz apud Albuquerque Jr. (1999), “a mídia tem o olho torto
quando se trata de mostrar o ‘nordeste’” e insiste na repetição de discursos estereotipados
sobre o sertão, abordagens pejorativas que acabam desfragmentando a identidade do povo
sertanejo, tratando o Nordeste de forma inferior, quando comparada com outras regiões.
Por se tratar de uma produção de uma WEBTV educativa, o ‘Coisas do Sertão’ procura
produzir um formato de programa diferente do padronizado pelas TVs comerciais. O
programa educa na medida em que informa, levando a população o conhecimento sobre as
características e diferenças existentes no Semiárido, apresentando o que é produzido na
região nas áreas de ciências, tecnologia e cultura. O programa possui um enfoque
educomunicativo, que segundo Schaun, (2002) apud Santana (2010) consiste em um
Também justifica-se que a WebTV UNEB Núcleo de Juazeiro é um importante espaço para a
prática laboratorial em jornalismo, que proporciona aos estudantes/ repórteres que atuam no
projeto Programas Experimentais para Televisão, experiência prática, além de agregar
formação no currículo ao ingressar no mercado de trabalho. A preocupação com a formação
do estudante/repórter é constante e por isso, faz-se necessário que esse aluno passe por todo
o processo de produção da notícia. O público também tem espaço próprio para opinar e
sugerir pautas para o programa. Por meio da parceria entre o Instituto Regional da Pequena
Agropecuária Apropriada (IRPAA) e a WebTV UNEB Núcleo de Juazeiro, com o programa ‘
Coisas do Sertão’, os estudantes tem a oportunidade de participar de cursos anuais sobre
comunicação e Semiárido e conhecem práticas que facilitam a convivência nesses territórios.
357
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
MÉTODO E TÉCNICAS UTILIZADAS
Para a realização desse trabalho, foram utilizados dois métodos de pesquisa: análise do
discurso transmitido pela grande mídia sobre o Nordeste e análise do enquadramento
jornalístico, observando o tratamento que é dado as notícias sobre o Semiárido no programa
‘Coisas do Sertão’ da WebTV Núcleo de Juazeiro.
O enquadramento jornalístico segundo Carvalho (2011) consiste nos modos como os veículos
jornalísticos apresentam as notícias ao seu público, tendo como foco as formas como os
indivíduos identificam situações das quais presenciam. As noticias produzidas sobre o
Nordeste pelos veículos de comunicação insistem em mostrar um ambiente pobre, onde a
‘seca’ é apresentada como principal problema da região. Para Soares (2006) apud Franco
(2013) o enquadramento jornalístico:
De acordo com Robert Entman (1993), o enquadramento realizado pelos telejornais, procura
chamar a atenção para aspectos da realidade então descrita, o que significa dizer que é tirada
a atenção de alguns assuntos em prol de outros, que produz audiência. Segundo Wolf (2008),
“os campos da audiência tendem a se expor as informações que correspondam a suas
opiniões e evitam as mensagens que são inversamente diferentes”. Nesse sentido, o chão
rachado, a mulher com a lata de água na cabeça, a caatinga seca sempre serão abordados pela
mídia como um local de extrema miséria, em nome da audiência, obedecendo assim uma
lógica capitalista de mercado. O programa ‘Coisas do Sertão’ busca justamente fazer uma
abordagem diferenciada sobre o Semiárido, mostrando as suas inúmeras potencialidades e
desmistificando os estereótipos impostos pela mídia.
Por estar presente no inconsciente humano e social e ser resultado do processo cultural e
histórico, os estereótipo acabam trazendo consigo generalizações equivocadas sobre um
determinado local (MORONI, 2008). Os discursos defendidos pelos veículos de comunicação
dramatizam o cenário sertanejo, colocando em cheque a identidade local. Não há como negar
que as imagens apresentadas pela TV sobre o nordeste causam impacto e a repetição delas,
formam um elemento que estrutura o discurso midiático (SODRÈ, 1997 apud MORONI,
2008).
358
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Segundo Albuquerque Jr (1999), o estereótipo criado em torno do sertão está relacionado à
tradição histórica do cangaço e o messianismo e essa consciência discursiva e imagética
dificulta hoje a criação de novos produtos que retratem um novo olhar sobre o Semiárido.
Ainda de acordo com o escritor, as figuras e signos exibidos sobre o sertão são impostos para
o público como “verdades” devido a insistente repetição e faz com que esses arquivos de texto
e imagens componham discursos que desfragmentam o retrato do nordeste.
No programa são pautados temas relacionados a educação, ciência, cultura, tecnologia e meio
ambiente, buscando ressaltar toda produção de conhecimento que é realizada no sertão.
Desmitificar os estereótipos sobre o Semiárido de forma educativa, este é um dos objetivos do
‘Coisas do Sertão’. Por ser uma ferramenta que funciona via web, proporciona uma maior
interação entre o seu público, que pode opinar e sugerir pautas no espaço reservado aos
comentários no site ou por meio do e-mail da WebTV.
Para a execução das reportagens exibidas no ‘Coisas do Sertão’ , é sempre realizada a cada
quinze dias uma reunião de pauta. Nesse espaço, os estudantes podem dar sugestões de
pautas e reforçarem o conhecimento crítico a respeito do conteúdo que é produzido
diariamente sobre o sertão, tanto pela grande mídia, quanto pelos veículos de comunicação
local. Após as reuniões, os estudantes são designados a trabalharem em equipes, ação que
auxilia na condução das atividades e do aprendizado, além de preparar os estudantes a
desenvolver trabalhos em grupo, uma prática constante dentro de uma redação de TV. “A
produção de reportagem para o telejornalismo requer muita atenção, pesquisa, checagem,
além de muito profissionalismo da parte de todos os envolvidos no processo”.(SQUIRRA,
1993 apud XAVIER, 2013).
O conhecimento acerca do sertão também é reforçado nos encontros anuais realizados pelo
‘Coisas do Sertão’, em parceria com o Instituto Regional da Pequena Agropecuária
Apropriada (IRPAA), desenvolvidos para os estudantes do curso de jornalismo em
Multimeios da UNEB. Durante os cursos, a comunidade acadêmica conhece as práticas de
convivência com o Semiárido que são desenvolvidas em comunidades rurais da região, além
de discutir sobre o tipo de abordagem realizada sobre o Nordeste e como ela pode ser feita, a
partir dos aprendizados adquiridos no curso.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nas páginas de jornais, no rádio, sites e nas imagens televisivas, as reportagens que tratam
do nordeste sempre impactam devido a abordagem dramática e pejorativa que é dada ao
local. Nelas, o Semiárido é mostrado como retrato da fome, miséria sendo a seca a causa de
todos os problemas existentes na região. O objetivo do programa ‘Coisas do Sertão’ da
WebTV Núcleo de Juazeiro é realizar uma produção que valorize a identidade do sertanejo,
buscando desmistificar os estereótipos construídos sobre o sertão, se contrapondo ao que é
produzido pelas emissoras locais e nacionais sobre o nordeste.
‘Coisas do Sertão’ além de ser uma ferramenta que possibilita uma nova abordagem sobre o
Semiárido Brasileiro, também contribui para o aprendizado prático dos alunos em
jornalismo. No programa, os estudantes tem a oportunidade de colocarem em prática o
aprendizado adquirido em sala de aula, ação que contribui para o desenvolvimento
profissional do aluno e facilita o ingresso no mercado de trabalho.
REFERÊNCIAS
ALBUQUERQUE JR., Durval Muniz de. A invenção do Nordeste e ouras artes. São Paulo, Cortez, 1999.
LAGE, Nilson. A reportagem: teoria e prática de entrevista e pesquisa jornalística. 5ª Ed., Rio de Janeiro,
Record, 2005.
MCLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação como extensões do homem. São Paulo, Cultrix,
2003. ORLANDI, Eni, Puccinelli. Discurso, Imaginário Social e Conhecimento. Em Aberto, Brasília, Ano
14, nº 61, 1994.
PATERNOSTRO. Vera Ìris. O texto na TV: Manual de Telejornalismo. 2ª Ed., Rio de Janeiro, Elsevier, 2006.
FRANCO, Amanda Pinto. SANTOS, Fabiola Moura Reis. (Reconstruindo as “Coisas do Sertão”: um
semiárido em foco. Disponível em:
http://www.intercom.org.br/papers/regionais/nordeste2012/expocom/EX32-0035-1.pdf
360
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
IRPAA. Convivência com o Semiárido. Disponível em http://www.irpaa.org/modulo/convivencia-com-o-
semiarido
MENDES, Marcília Luzia Gomes da Costa. COSTA, Maria Ivanúcia Lopes. O Discurso Midiático e a
Construção da Notícia: relações entre infraestrutura e superestrutura da teoria bakhtiniana. Disponível
em: http://www.bocc.ubi.pt/pag/mendes-costa-o-discurso-midiatico-e-a-construcao-da-noticia.pdf
PINTO, Edilene Barbosa. LIMA, Maria José de Araújo. O programa de convivência com o semiárido
Brasileiro e sua influência na mudança de hábitos e valores. Disponível
em: http://www.yumpu.com/pt/document/view/12827880/o-programa-de-convivencia-com-o-semi-arido-
fundacao-joaquim-
RIBEIRO, Daniela Costa. WebTV: Perspectivas para Construções Sociais Coletivas. Disponível
em: http://www.bocc.ubi.pt/pag/ribeiro-daniela-web-tv-perspectivas-para-construcoes-sociais-coletivas.pdf
SANTOS, Cícero Félix, SCHISTEK, Haroldo, OBERHOFER, Maria. No Semiárido- Viver é aprender a
Conviver. Acesso em: 13 de março de 2014. Disponível em http://www.irpaa.org/publicacoes/cartilhas/no-
semiarido-viver-e-aprender-a-conviver.pdf
361
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
PROCESSOS DE NOMEAÇÃO E CATEGORIZAÇÃO DE IDENTIDADES
FEMININAS NO FUNK-BREGA PERNAMBUCANO
RESUMO: O discurso é uma prática social pela qual o ser humano constrói seu
conhecimento e exerce sua cidadania (FAIRCLOUGH, 2001). Diante da ideia de que o
indivíduo possui múltiplas identidades que se moldam ao longo de uma vida através de
influências de diversas formas socioculturais. Considerando que é através do discurso que as
pessoas constroem suas identidades sociais e se posicionam no mundo (HAL, 2006), este
artigo discute os resultados parciais do projeto de iniciação científica que tem como objeto de
estudo o discurso veiculado em letras de músicas (Funk-brega 129, Sertanejo universitário e
Arrocha) que circulam na sociedade pernambucana, entre outras, e exploram como foco a
mulher, seja nomeando-a ou categorizando-a. Para tanto, identificamos e classificamos
formas de nomeação e categorização (VAN LEEUWEN, 1997) mais recorrentes nas letras
selecionadas e investigamos os aspectos intertextuais de (des)valorização no funk-brega. Se a
construção de significados depende não só do que está explícito em um texto, mas também
do que está implícito – o que está presumido (RESENDE e RAMALHO, 2006, p. 80) e as
identidades resultam de construtos social, político, cultural que são diversos. Contudo,
destacamos que há uma construção identitária múltipla e em fluxo, corroborando com a
literatura estudada.
ABSTRACT: The discourse is a social practice in which humans construct their knowledge
and exercise their citizenship (Fairclough, 2001). Given the idea that the individual has
multiple identities that shape the course of a lifetime through influences from various
sociocultural forms. Whereas it is through discourse that people construct their social
identities and position themselves in the world (HAL, 2006), this article discusses the partial
results of the scientific research project that has as its object of study the discourse conveyed
in lyrics (Funk-tacky 130, Sertanejo university and Arrocha) circulating in society Pernambuco,
among others, explore and focus on the woman, either by naming or categorizing it. For this,
we identify and classify forms of naming and categorization (van Leeuwen, 1997) recurrent in
selected letters and investigated the intertextual aspects of (un) recovery in the funk - tacky.
If the construction of meaning depends not only on what is explicit in the text, but also of
what is implied - that is presumed (Resende and Ramalho, 2006, p 80.) And identities result
from, political, social, cultural constructs that are diverse. However, we emphasize that there
is a flow and multiple identity construction, corroborating the literature studied.
INTRODUÇÃO
O processo de construção de identidades pode ser compreendido como uma ação contínua
que ocorre nas práticas sociais (FAIRCLOUGH, 2001). Nessas práticas, são construídos
sujeitos que se caracterizam por não ter uma identidade fixa nem permanente. Cada
indivíduo possui múltiplas identidades que se moldam ao longo de uma vida por influências
de diversas formas socioculturais. Considerando a ideia de que é através do discurso que as
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
pessoas constroem suas identidades sociais e se posicionam no mundo (HALL, 2006), este
artigo tem como objeto de estudo o discurso veiculado em letras de músicas (funk-brega e
Arrocha) que circulam na sociedade, em variados contextos e exploram como foco a mulher,
seja nomeando-a ou estereotipando-a.
No Brasil, o estilo funk teve origem na Zona Sul do Rio de Janeiro, mas foi nas comunidades
periféricas da cidade que se desenvolveu de maneira bem particular, revestindo-se de
características tipicamente brasileiras, mostradas em uma nacionalidade também única
(GOMES, 2013). O Funk desde o surgimento se caracteriza como uma hibridização muito
diversa e aparenta não ter preconceitos temáticos, pois une além de diferenças regionais, o
mundano e o venerável. Essinger (2005 apud GOMES, 2013). Tais músicas representam
possíveis construções de identidades distintas, identidades que não são fixas (MOITA
LOPES, 2003; 2002), as quais podem ser direta ou indiretamente aceitas por mulheres que
consomem tais estilos musicais. É sabido que a figura feminina é, comumente, alvo de
diversas formas de discriminação, sendo colocada como mulher objeto para satisfazer os
desejos masculinos.
Vivemos em uma sociedade construída em bases patriarcais, na qual vigora o “poder”. Van
Dijk (2008, apud GOMES, 2013, p. 71) defende a importância de qualificar culturalmente a
reprodução do poder, uma vez que os discursos, as cognições sociais e as maneiras de
reprodução do poder vão variar não apenas numa perspectiva histórica, como também de
uma cultura para outra. Sabemos que nesta reprodução do poder, a mulher ainda possui
pouco espaço, por exemplo, em suas relações sociais trabalhistas, amorosas, entre outras,
além de muitas vezes esse espaço ser desvalorizado. É evidente que esse fato vem se
modificando com os avanços da humanidade, mas a mulher com frequência é vinculada a
estereótipos que a inferioriza em relação ao gênero masculino, na sociedade de modo geral.
Em letras desses estilos musicais, tais estereótipos costumam ser bastanteexplorados. Ainda
são representadas imagens femininas que colocam a mulher como submissa e também como
produto que satisfaz os desejos sexuais dos homens. Diante dessa problemática, surge a
inquietação de compreender como essas diversas identidades são construídas.
Os materiais necessários à realização desse estudo são os CDs dos artistas escolhidos para a
investigação, são eles: o MC Leozinho do Recife, o MC Sheldon e os MCs Metal e Cego, todos
do chamado funk-brega 131 e Pablo do Arrocha. Realizamos a escuta das músicas dos CDs
produzidos pelos artistas no período de 2008 a 2013, como corpus ampliado. Em seguida,
com base no sucesso das letras (sucesso verificado a partir da aceitação popular),
selecionamos aquelas que compõem o corpus restrito. Essas letras, quando não disponíveis
na internet,foram transcritas. O processo de transcrição foi com base no que propõe
Marcuschi (2005). A partir dessas transcrições é que pudemos realizar a identificação e
posterior classificação das formas de nomeação e de categorização (VAN LEEUWEN, 1997).
Como as letras são de domínio público e amplamente divulgadas, não identificamos
problemas de natureza ética em apresentar os artistas nominalmente na pesquisa.
131
O estudo maior é composto ainda pelo gênero: Sertanejo universitário, dos quais selecionamos como representantes os
artistas Gusttavo Lima.
363
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
2. DISCURSO E PRÁTICA SOCIAL: CONCEITO DE IDEOLOGIA, CATEGORIZAÇÃO E
NOMEAÇÃO
Embasamo-nos na teoria Crítica do Discurso, proposta por Fairclough (2001), que ao usar o
termo ‘discurso’ considera o uso da linguagem como prática social e não como exercício
puro/individual ou reflexo de variáveis situacionais. Para entender como os atores sociais
constroem suas identidades e situam a si e ao outro no mundo através do discurso, esse
discurso é compreendido como ação, em que as pessoas são agentes no mundo e agem sobre
os outros através de representações. Em razão disso, Fairclough (2001, p. 91) argumenta que
“o discurso é uma prática, não apenas de representação do mundo, mas de significação do
mundo, constituindo e construindo o mundo em significado.”
O construto significativo do mundo é carregado de ideologias que por meio de discursos são
expressadas pelos grupos, comunidades, instituições, etc. Segundo Fairclough (2001), a
ideologia é entendida como significações/construções da realidade, o mundo físico, as
relações sociais de modo geral e as identidades sociais que são construídas em instâncias dos
modo de práticas discursivas, contribuindo na produção, reprodução ou transformação das
relações de dominação. Neste estudo, observamos formas ideológicas embutidas em práticas
discursivas aparentemente eficazes por se tornarem naturalizadas atingindo o status de senso
comum, e com essa pesquisa mostraremos como essas ideologias camufladas ocorrem de
modo a possibilitar uma possível transformação, um outro olhar ideológico, quando
pensamos na relação texto-leitor. “A ideologia está localizada tanto nas estruturas (isso é,
ordens de discurso) que constituem o resultado de eventos passados como nas condições
para os eventos atuais e nos próprios eventos quando reproduzem e transformam as
estruturas condicionadoras” (FAIRCLOUGH, 2001, p. 119).
Diante do contexto amplo que a música de modo geral, não só o gênero funk, engloba, torna-
se relevante percebermos como a figura feminina está sendo vista e também como é aceita,
como ganha voz nesse mundo musical. O quadro abaixo mostra quais são as formas de
representação social mais recorrentes no discurso de funkeiros, a partir das letras
selecionadas. Vejamos:
364
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Personalização
Nomeação Categorização Generalização
garota Assanhada Ela
novinha 132
QUADRO 1: Representações das figuras femininas personalizadas nas letras selecionadas
A seguir, analisamos as letras da canções “Chama ela”, gravada pelo funkeiro Mc Leozinho do
Recife e “Malhado e Gostoso”, gravada pelo Cantor Pablo do Arrocha “A voz romântica”:
Exemplo 1
CHAMA ELA 133 – 2012 E se nós tá bebendo whisky
Mc Leozinho do Recife Chama ela que ela vem
Se é pra andar na lancha
Chama ela ai Chama ela que ela vem
Ei chama ela em É pra andar na mil e cem
Ei Chama ela que ela vem
Ô chama ela Pra andar na minha nave
Chama ela que ela vem Chama ela que ela vem
Chama ela Se ela tá na tua mesa quer beber e nada
Chama ela que ela vem tem
Chama ela Chama ela aqui pra minha que nós faz
Chama ela que ela vem chuva de cem
Chama ela Quando ela escuta o ronco da orna de
Chama ela que ela vem mil e cem
Cavazaque tem bandit RR ela tem
Ôááá
Acertei de novo pai Chama chama ele em (2x)
Voltei apavorando tudo Vem vem vem
Exemplo 2
MALHADO E GOSTOSO134 Perto da minha Ferrari seu camaro é
fichinha
Pablo As mulheres que eram suas agora estão na
minha
Perto da minha Ferrari seu Camaro é
fichinha Tô nas praias do nordeste e você no frio
As mulheres que eram suas agora estão na do sul
minha E além da lamborghini tenho uma pajero
full
Tô nas praias do nordeste e você no frio
do sul Tenho uma amarok, um jet sky
132
Esse uso também pode ser analisado como categorização, já que não necessariamente individualiza um ser no
mundo.
133
O processo de transcrição foi com base no que propõe Marcuschi (2005), para a canção “Chama ela”. Já a
letra da canção “Malhado e Gostoso” está disponível na internet.
134 Disponível em http://letras.mus.br/pablo/malhado-e-gostoso/. Acesso 10/04/14.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
E além da lamborghini tenho uma pajero Uma harley, uma lancha, muita grana pra
full curtir
Tenho uma amarok, um jet sky
Uma harley, uma lancha, muita grana pra Uma casa em nova york e além da
curtir cobertura
Uma fazenda em goiás, quero ver quem
Uma casa em nova york e além da me segura
cobertura
Uma fazenda em goiás, quero ver quem Tô de bem com a vida, eu tô bem
me segura arrumado
Se você se acha doce eu já tô açucarado
Tô de bem com a vida, eu tô bem
arrumado Tô do jeito que elas gostam tô chamando
Se você se acha doce eu já tô açucarado a atenção
Tô malhado, tô gostoso sem ninguém no
Tô do jeito que elas gostam tô chamando coração
a atenção
Tô malhado, tô gostoso sem ninguém no Tô de bem com a vida, eu tô bem
coração arrumado
Se você se acha doce eu já tô açucarado
Tô de bem com a vida, eu tô bem
arrumado Tô do jeito que elas gostam tô chamando
Se você se acha doce eu já tô açucarado a atenção
Tô malhado, tô gostoso sem ninguém no
Tô do jeito que elas gostam tô chamando coração
a atenção
Tô malhado, tô gostoso sem ninguém no
coração
No exemplo 1, a expressão “chama ela”, presente desde o título, permite-nos pensar “a quem”
se refere a generalização “ela”, podemos a princípio afirmar que a todas as pessoas do gênero
feminino. Entretanto, parece mais adequado considerar a generalização utilizada pelo
compositor, quando faz uso do pronome pessoal do caso reto “ela” flexionado em número e
gênero (singular/feminino) sendo construída como uma especificação do ser, já que o
enunciador, ao longo da canção, atribui ações ao pronome “ela” que o particularizam no
mundo, ou melhor, o identifica no mundo. Logo, refletimos esse processo de nomeação e
categorização a partir do questionamento de se é generalização ou não, para entender como a
figura feminina é identificada nesse contexto e como consequência dessa identificação como
são geradas as múltiplas identidades empregadas ao gênero feminino.
Podemos observar que os processos ideológicos que contribuem para a construção de uma
identidade feminina neste contexto são aliados a ideias do mundo capitalista. Isto porque é a
mulher categorizada como “interesseira 135”, já que só se aproxima do rapaz por causa dos
bens e serviços cobiçados no âmbito do poder, do “mundo rico”, no mundo funkeiros esses
bens e serviços são almejado de modo mais expressivo, notado através da ostentação 136 e do
135 Esta é uma interpretação que o contexto da música permite, e não a letra.
136Ostentação é o ato ou efeito de ostentar, quer dizer “apresentar” ou “mostrar” num sentido exibicionista, estando ligado
ao orgulho, à presunção ou simplesmente à vaidade. É o ato de alguém que exibe as suas riquezas ou as suas próprias
qualidades, sublinhando a importância de algo que tem, que fez ou que é. Ostentação é uma palavra que tem origem no
termo em latim ostentatio, que significa exibição vã ou inútil. Uma pessoa que recorre à ostentação é muitas vezes
conhecida como afetada ou fútil. Esta é uma palavra bastante usada no contexto do funk, mais concretamente em músicas
da autoria do MC Daleste (Ostentação Fora do Normal) e da MC Pocahontas (Mulher do Poder). Disponível em
http://www.significados.com.br/ostentacao/. Acesso 10/03/14.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
poder aquisitivo. No exemplo 2, encontramos trechos que conduzem a uma compreensão que
também categoriza a figura feminina como “interesseira137” (Perto da minha Ferrari seu
Camaro é fichinha/As mulheres que eram suas agora estão na minha), E esse poder
aquisitivo se torna um atrativo que serve à conquista, quanto maior for a ostentação, maior
será o número de “novinhas” conquistado, pois “Se é pra andar na lancha/chama ela que ela
vem” “É pra andar na 1100 138/chama ela que ela vem” 139. A figura feminina constrói suas
relações interpessoais por interesse e não por valores como a amizade/companheirismo que
são “prezados”: “Se é pra andar na minha nave/chama ela que ela vem”. Nave é uma palavra
que nos faz inferir sentidos como: céu, nuvens, o voo nesse mundo do consumo tão sonhado.
Nave também nos faz pensar em uma supermáquina, uma máquina espacial, fora do
terrestre, ou além deste.
No trecho, “Se ela tá na tua mesa quer beber e nada tem” “chama ela aqui pra minha que nos
chuva de cem” “quando ela escuta o ronco da orna de mil e sem Cavazaque, tem Bandit, RR
ela tem”, observamos as ideologias veiculadas, ou melhor, construídas discursivamente,
discutimos anteriormente, ideologias do mundo do consumo/capitalista, onde a aquisição de
bens materiais tornou-se acelerada e voraz, quando o ter bens materiais passa a ser um pré-
requisito nas relações interpessoais, o “eu” e o “outro” são bem vistos quando mostram o que
“possuem”. No exemplo 2, o discurso do enunciador enfatiza a ideia de que as relações
interpessoais (amizade, amorosa) são conquistadas por meio dos bens e consumo/voraz, (Tô
do jeito que elas gostam tô chamando a atenção) (Tenho uma amarok, um jet sky
uma harley, uma lancha, muita grana pra curtir). Esse mundo é colocado de modo expressivo
nesses contextos musicais, é notável quando os enunciadores utilizam variados modelos de
motocicletas/automóveis entre outros meios de transporte (aquático) que são
comercializadas no mercado com um alto valor, esbanjando assim a “chuva de cem 140”,
metáfora utilizada para intensificar o lugar que tal indivíduo ocupa num determinado espaço
ou que almeja ocupar, o lugar de poder, lugar onde há “muita grana pra curtir 141”.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O universo aqui estudado nos permite identificar ideologias que abrangem o âmbito
discursivo do poder social aquisitivo. Essas ideologias são base na construção de identidades
e nesse recorte objetivamos identificar como as identidades femininas são construídas
através dos processos de nomeação e categorização observando os aspectos intertextuais de
(des)valorização da mulher empregados nas letras das músicas funk-brega e arrocha
analisada.
Percebemos que, através das formas de representação de atores sociais, a figura feminina
pode carregar e/ou ser identificada por múltiplas identidades como, por exemplo, assanhada,
“interesseira”, novinha. Nas letras analisadas, observamos que “ela” foi categorizada
implicitamente como interesseira, pois quando o enunciador pronuncia “se é pra andar na
minha nave/chama ela que ela vem”, observamos que o contexto criado pelo discurso é
preenchido por objetos que fazem parte do “mundo do poder/aquisitivo”, colocando a ideia
de que “ela” vai por tais motivos, sem estes motivos, “ela” talvez não fizesse parte do contexto
se “ele” não estivesse: “Tô do jeito que elas gostam tô chamando a atenção”.
O discurso é a própria ostentação “...nós faz chuva de cem” / “muita grana pra curtir”.
Contudo, observamos que as construções identitárias em meio a ideologias diversas
(capitalistas, implantadas muitas vezes pelo mundo midiático) torna o ator social plural, sem
uma identidade definida, se apropriando de múltiplos valores fragmentados, que o
posicionam no mundo de modos diversos e não estável.
137 Nas letras das músicas analisadas não há a palavra interesseira de fato escrita/ “explicitamente”, mas a contextualização
musical abre caminhos(implícito) nessa perspectiva.
138 A letra é contextualizada através (não só) de modelos de motocicleta que estão disponíveis no mercado.
139 Exemplo 1.
140 Exemplo 1.
141 Exemplo 2.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
REFERÊNCIAS
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
PRÁTICA DE ANÁLISE LINGUÍSTICA: UMA ABORDAGEM ANALISADA EM
SALA DE AULA
ABSTRACT: The Linguistic Analysis (LA) is presented as an axis of teaching Portuguese and
is approached with a conservative and innovative perspective. Therefore, the present study
aims to discuss the practice of Linguistic Analysis in the classroom. So reports of Portuguese
language classes in a public school in the city of Campina Grande- PB, through curricular
component Stage Portuguese Language in Junior High School and is made descriptions of
how the Linguistic Analysis is approached and dealt with through the planning and execution
the didactic sequence. Underlie the reported theoretical contributions Bezerra and Reinaldo
(2011), Franchi (2006 ) , Marscuschi (2008 ) , Mendonça (2002), the National Curricular
Parameters for Language Portuguese 3rd and 4th level of Elementary School (1998) , Pereira
( S / A ) , Pimenta and Lima (2004) and Schneuwly and Dolz (2004 ). The results of the
analysis show that the developed approach to Linguistic Analysis is presented as an
alternative or complement to the traditional teaching of grammar and reflection as related to
other strands of the Portuguese language: reading and writing.
KEYWORDS: Linguistic Analysis. Practice. Reading and writing.
INTRODUÇÃO
142 Estudante da graduação de Letras Língua Portuguesa – Universidade Federal de Capina Grande – [email protected]
143 Estudante da graduação de Letras Língua Portuguesa – Universidade Federal de Capina Grande – mayaracarvalho-
@hotmail.com
144 Professora Doutora da Universidade Federal de Campina Grande – Campina Grande –[email protected]
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O exercício de qualquer profissão é prático, no sentido de que se trata de aprender a
fazer ‘algo’ ou ‘ação’. A profissão de professor também é prática. E o modo de
aprender a profissão, conforme a perspectiva da imitação será a partir da observação,
imitação, reprodução e, às vezes, da re-elaboração dos modelos existentes na prática,
consagrados como bons. ( p. 7)
Esta experiência teve como objetivo oferecer situações de nos assumirmos como sujeitos
ativos do processo de ensino-aprendizagem, preparar-nos para o trabalho docente utilizando
métodos de aplicação e avaliação das aulas e promover reflexões sobre a aplicação dos
conhecimentos e habilidades relacionadas ao processo de ensino-aprendizagem de língua
materna.
Essa disciplina foi realizada em uma escola pública da cidade de Campina Grande, escolhida
pela professora, na qual tivemos um período de duas semanas para observar as aulas de
língua portuguesa dos alunos do 8º B, posteriormente, atuamos em sala de aula durante
quatro semanas, sendo duas para cada estagiária. A nossa Sequência Didática (SD) deu
continuidade ao trabalho que o professor vinha realizando na turma, foi constituída por oito
módulos, teve como conteúdo conjunções, coordenação e orações coordenadas e trabalhou
com vários gêneros textuais dentre eles: anúncio, artigo de opinião, tirinha, propaganda
televisiva, editorial etc.
A realidade escolar que observamos mostra que ainda há dúvidas e contradições a respeito do
ensino da gramática. O professor continua a usar a metalinguagem com o objetivo de induzir
os alunos a dominar conceitos que talvez não os ajudem no desenvolvimento das habilidades
linguísticas. Ou seja, nas observações das aulas, vimos que elas tinham uma abordagem
muito tradicional, na qual o professor escrevia conceitos no quadro e explicava exemplos
descontextualizados, o que dificultava a compreensão dos alunos.
Diante do exposto, nosso relato será norteado pela Análise Linguística (AL), um dos eixos de
ensino da Língua Portuguesa. Estudar essas práticas como um eixo de ensino, exige que
esclareçamos sobre essa própria expressão, sendo assim análise linguística seria, de acordo
com Mendonça (2006, p. 205) “uma nova perspectiva de reflexão sobre o sistema linguístico
e sobre os usos da língua, com vistas ao tratamento escolar de fenômenos gramaticais,
textuais e discursivos”.
A escolha desse eixo de ensino deve-se ao fato de que esta perspectiva mostra que através das
atividades da análise linguística, o professor poderá promover a compreensão dos aspectos
sistemáticos da língua através de um pensamento crítico e reflexivo sobre ela.
Diante disso, nosso trabalho tem como principal objetivo relatar como nossas aulas
abordaram o tratamento da Análise Linguística através do planejamento e execução da
sequência didática (SD). Sendo assim, os específicos seriam discutir sobre a abordagem do
ensino de gramática nas aulas observadas; analisar fragmentos da SD que comprovam o
tratamento de AL; discutir as escolhas metodológicas no planejamento da SD; analisar
algumas atividades propostas e discutir se nossas aulas contribuíram para a compreensão do
conteúdo através da AL.
Fundamentam nosso relato as contribuições teóricas de Bezerra e Reinaldo (2011), Franchi
(2006), Marscuschi (2008), Mendonça (2002), os Parâmetros Curriculares Nacionais de
Língua portuguesa do 3º e 4º ciclo do Ensino Fundamental (1998), Pereira (S/A), Pimenta e
Lima (2004) e Schneuwly e Dolz (2004).
Este trabalho será divido em três seções: esta referente à introdução; o desenvolvimento do
texto e as considerações finais, a seção destinada ao desenvolvimento do texto será
subdividida em três tópicos: 1.1. Período de observação em sala de aula, 1.2. Planejamento
da Sequência Didática e práticas de Análise Linguística 1.3. Análise das atividades
propostas e desempenho dos alunos.
Vejamos agora o conceito de aposto formulado por Mauro Ferreira em sua gramática
Aprender e praticar (2007, p. 396):
Analisando comparativamente esses conceitos, vemos que o conceito dado pelo professor
(Termo que especifica algo dito anteriormente) não é completo e não condiz com os
exemplos mostrados por ele (o Exemplo 1, trata de um aposto que enumera os vários bairros
da zona leste e o Exemplo 2 trata de um aposto que explica o termo dito anteriormente –
shopping Boulevard.), pois como sabemos e assim como afirma Ferreira (2007) o aposto não
apenas especifica um termo, mas explica, resume e enumera.
Essa confusão do conceito explicado pelo professor pôde ainda ser percebida em sua fala na
explicação do Exemplo 2:
“Vocês estão vendo? Antigo Iguatemi acrescenta uma informação nova a Boulevard”
A explicação do professor não possibilitou a compreensão de boa parte dos alunos, pois ele,
segundo o Behaviorismo, foi apenas um transmissor de conhecimentos, e os alunos foram
apenas receptores. Então, a metodologia foi transmissiva, baseada na exposição dedutiva –
do geral para o particular isto é, do conceito para o exemplo. Essa metodologia pode
impossibilitar o aluno a produzir efeitos de sentido e a refletir sobre os usos da língua.
Não queremos dizer com essa análise, que o trabalho com conceitos da gramática seja
desnecessário, mas sim, o trabalho apenas com eles. Então, o que deve ser feito são práticas
de leitura e produção de textos, que apresentem usos legítimos da linguagem, ou seja,
práticas de AL, pois como afirma Mendonça (2006):
AL é parte das práticas de letramento escolar, consistindo numa reflexão explicita e
sistemática sobre a constituição e o funcionamento da linguagem nas dimensões
sistêmica (ou gramatical), textual, discursiva e também normativa, com o objetivo de
contribuir para o desenvolvimento de habilidades de leitura/escuta, de produção de
textos orais e escritos e de análises e sistematização dos fenômenos linguísticos
(p.208).
Diante deste fato, vimos que havia uma necessidade de se trabalhar com AL nas aulas de
língua portuguesa da turma do 8º B, uma vez que esta tinha grande dificuldade de
compreensão, pois a abordagem metodológica feita pelo professor não possibilitou que os
alunos fizessem suas descobertas, expusessem seus conhecimentos e construíssem novos
saberes sobre gramática.
371
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Segundo Schneuwly e Dolz (2004, p. 97) “uma sequência didática é um conjunto de
atividades escolares organizadas, de maneira sistemática, em torno de um gênero textual,
oral ou escrito”.
Nesse contexto, o planejamento da nossa SD aconteceu a partir de elaborações de módulos –
tendo em vista que estes são um conjunto de atividades organizadas de maneira sistemática –
bem como pela necessidade de se trabalhar com AL. Sendo assim, neste tópico iremos
analisar fragmentos da nossa SD que comprovam o tratamento dessa abordagem, pois, o
trabalho de AL na SD
surge como alternativa complementar às práticas de leitura e produção de texto, dado
que possibilitaria a reflexão consciente sobre fenômenos gramaticais e textual-
discursivos que perpassam os usos linguísticos, seja no momento de ler/executar, de
produzir textos ou de refletir sobre esses mesmo usos da língua (MENDONÇA, 2006.
p. 204).
Analisando o fragmento do Módulo I (Em anexo) da nossa SD a seguir, vemos que alguns dos
objetivos esperados foram essenciais para a construção de uma reflexão dos alunos acerca do
conteúdo trabalhado, conjunções:
• Discutir sobre o conteúdo semântico presente nas conjunções;
• (Re)conhecer as conjunções e seus respectivos valores semânticos no gênero textual
anúncio.
Além disso, a estagiária utilizou a prática de AL para conceituar conjunção, pois ela, através
de anúncios que foram exibidos e discutidos – proporcionando aos alunos um bom contato
com o texto – deu a noção desse termo sintático, ou seja, utilizou o texto como um pretexto.
Vejamos o conceito apresentado por ela:
Conjunção é a palavra de liga: “Duas orações.Duas palavras de mesma função
sintática em uma oração”.(FERREIRA, 2007. p. 311)
Outra prática de análise linguística presente na nossa SD ocorreu no momento em que foi
dada a noção de coordenação. A estagiária colocou no quadro o seguinte exemplo:
Uma frente fria chegará amanhã.
A temperatura diminuirá bastante.
O sol aparecerá pouco.
Depois, ela induziu os alunos a ligarem as frases através das conjunções, atentando para o
fato que as frases além de terem sentido sozinhas, podem ter outros sentidos se forem ligadas
por conjunções.
É importante considerar que para compreensão das classificações desse termo sintático –
conjunção coordenativa – o aluno teve que compreender as relações de sentido estabelecidas
por elas, pois a noção de sintaxe relacionada à semântica, assim como afirma Franchi (2006):
“nos permite ver que as considerações semânticas, em que estamos interessados na
construção de uma teoria gramatical, exigem, como pressuposto, um trabalho cuidadoso de
descrição das estruturas sintáticas envolvidas” (p. 107)
Esta afirmação de Franchi (2006) também pôde ser considerada no conceito de conjunção,
como vimos mais acima, explicado pela estagiária.
A prática de AL também se fez presente nesse objetivo esperado para Módulo VI (Em anexo),
pois ele condiz com a abordagem de prática de AL proposta pelos PCN (BRASIL, 1998. p. 59):
reconhecimento das características dos diferentes gêneros de texto, quanto ao conteúdo
temático, construção composicional e ao estilo. Vejamos:
• (Re)conhecer a temática, a estrutura composicional e o meio de circulação do
gênero textual artigo de opinião;
Vale ressaltar que além da estagiária ter trabalhado com aspectos característicos do Artigo de
opinião, utilizou esse gênero para explicar o conteúdo gramatical: termos essenciais da
oração, pois segundo Marcuschi (2008, p.51) o texto tem várias alternativas de conduzir o
372
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
trabalho com a língua e uma dessas alternativas é trabalhar com o texto visando o
funcionamento e a definição de categorias gramaticais.
Esse trabalho demonstrou prática de AL, pois como afirma Bezerra e Reinaldo (2013)
em seu livro Análise Linguística a que se refere? no tópico Análise Linguística na sala de
aula:
Para sustentar a análise de algumas atividades propostas em nossa SD, iremos analisar, de
inicio, uma atividade abordada pelo professor da turma durante o nosso período de
observação, vejamos:
Nesta atividade, percebemos que a abordagem utilizada na questão 1) pode não promover
uma boa reflexão sobre a função desse uso na língua, pois ela pede que o aluno apenas repita
usos de aposto em termos (Recife, Renato, vida, rio). Na questão 2) a abordagem utilizada é
mecanizada, pois pede que o aluno retire os termos sintáticos – aposto e vocativo – existentes
nas frases. Além disso, percebemos também que essas questões não são contextualizadas, ou
seja, não norteia o aluno do que a atividade irá tratar.
Sendo assim, buscamos uma nova abordagem nos exercícios a serem propostos para o 8º B,
elaborando em nossos módulos atividades que tentaram promover uma maior reflexão sobre
os usos de termos sintáticos da língua. Exemplo disso é a Atividade 5 que está no Módulo IV ,
vejamos abaixo um recorte dessa atividade:
b) Sabemos que uma conjunção tem a função de ligar duas palavras de mesma ordem
sintática ou duas orações. Na tirinha acima, Mafalda faz o uso de uma mesma
conjunção, porém em períodos distintos. Diga que conjunção é essa e explique os
diferentes usos dela.
Na questão 4), abordamos o mesmo conteúdo através de uma tirinha, ou seja, para responder
as questões o aluno teve que ler e interpretar o gênero dado, e através dele identificar o uso
de conjunções – a)Na tirinha acima há a ocorrência de algumas conjunções, quais são elas?
Além disso, a letra a) ainda requereu que o aluno percebesse a relação de sentido que essas
conjunções provocam – Reescreva a frase em que elas aparecem e os sentidos que elas
estabelecem.
A letra b) requereu que o aluno soubesse as funções das conjunções, bem como as diferentes
funções dela no contexto da tirinha (Ligar duas orações: Está preocupada porque amanhã
vou começar o jardim de infância e ela tem medo que eu não goste; Ligar duas palavras de
mesma função sintática: Mais tarde não vou ser uma mulher frustrada e medíocre como
você).
Através desse nosso critério utilizado no Módulo IV: Verificar, através da atividade, se os
alunos reconhecem e identificam o valor semântico de uma conjunção, chegamos à
conclusão de que parte dos alunos entendeu o conteúdo explorado na atividade.
Levando em consideração este método avaliativo, torna-se relevante descrever o desempenho
dos alunos quanto todas as atividades realizadas e a compreensão de todo o conteúdo
abordado durante as aulas, tendo em vista que chegamos a esses apontamentos através dos
critérios avaliativos usados nos módulos da nossa SD.
Sendo assim, percebemos que eles conseguiram atingir boa parte dos objetivos esperados por
toda a SD, como por exemplo: (Re)conhecer as características gerais do gênero textual
Anúncio; Diferenciar anúncio de ideia de anúncio de produto;(Re)conhecer as conjunções
como classe morfológica; (Re)conhecer as conjunções no seu âmbito semântico, assim como
sua função de coerência e coesão no texto;Identificar a temática e a estrutura de um Artigo de
Opinião etc.
374
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
BEZERRA, M. A e REINALDO, M. A. Análise Linguística: afinal a que se refere? São Paulo: Cortez, 2013.
BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: língua
portuguesa. Brasília: MEC/SEF, 1998.
DOLZ, J.; SCHNEUWLY, B. Gêneros orais e escritos na escola. Campinas. SP: Mercado das Letras. 2004.
FERREIRA, Mauro. Aprender e praticar gramática. Ed. Renovada.- São Paulo: FTD, 2007.
FRANCHI, Carlos. Mas o que é mesmo gramática? [com] Esmeralda Vailati Negrão e Ana Lúcia Muller. São
Paulo: Parábola, 2006.
MARCUSCHI, Luiz Antônio. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São Paulo: Parábola Editorial,
2008.
MENDONÇA, Márcia. Análise linguística no ensino médio: um novo olhar, um outro objeto. In: BUNZEN, Clécio;
MENDONÇA, Márcia (org.). Português no ensino médio e formação do professor. São Paulo: Parábola Editorial,
2006. p.199-226.
PEREIRA, Regina Celi. Didática no ensino de língua portuguesa. (Sem/Ano)
PIMENTA, Selma G. & LIMA, Maria Socorro L. Estágio e Docência. São Paulo. Cortez Editora. 2004.
375
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O CONFRONTO DE IDENTIDADES NO FUNK-BREGA PERNAMBUCANO
ABSTRACT: The construction of identity is a result of discursive practices and all the
human actions contribute to this construction. Therewith, we understand, from Resende and
Ramalho (2006), that the discourse is related in other social life elements and it is a way of
people act in the world. In addition, this scientific initiation research investigates as the
production of cheesy funk, as the consumption in this musical style, because it’s fairly heard,
besides it is an exclusive beat in proms and parties in the whole country. We hope with this
study reflect about the identities construction, once it is fundamental understand the
language functionality in discursive practices in order the social practices changes
(FAIRCLOUGH, 2001). We aim inspecting the interdiscursive relations in songs letters of
Pernambuco cheesy funk; notice the insertion of different voices in the funk discourse, as
well compare the identities framed in letters of cheesy funk with what the university students
think about this representations. For this, after a previously selection, listening and
transcription of letters which the most popular acceptance, record by MC Leozinho from
Recife, MC Sheldon and MCs Metal e Cego, we compared snippets more “significatives” with
answers given by university students. At the beginner, we verified that the women don’t
questioned the songs letters and consume without a critical evaluation of the cultural
product. Therefore, the results indicate fluid identity constructions, according as the
interviewees reveal surprise when they reflecting about the real meaning produced in the
songs.
Garanhuns. [email protected]
376
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
INTRODUÇÃO
377
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
1. CONSTRUINDO A PESQUISA: ASPECTOS METODOLÓGICOS
O funk é um gênero musical que se originou nos Estados Unidos, derivando da soul music,
um ritmo dançanteque atrai muitos jovens principalmente por ter letras chamativas e batidas
repetidas, mas só nos anos 1960 foi considerado um gênero distinto. No Brasil, o funk surgiu
em meados dos anos 1970, nas favelas do Rio de Janeiro, e a partir dai foi se popularizando e
ganhando espaço em demais regiões, em lugares que habitam as camadas mais pobres.
De início, as letras do funk relatavam de maneira acontecimentos favoráveis às facções
criminosas, porém aos poucos foram mudando seus repertórios e começaram a contar
acontecimentos do cotidiano das comunidades, pobreza e violência. Mas esse estilo musical
não foi bem aceito e começaram a surgir preconceitos diante dessa situação, os funkeiros
passaram a construir letras mais românticas com a intenção de ganhar território. O estilo
enfrentou grandes desafios, mas o reconhecimento iniciou-se quando a apresentadora Xuxa
levou em seu programa o DJ Marlboro.
Ao logo do tempo, o funk foi adquirindo espaço, mudando suas letras e fazendo com que cada
vez mais os sujeitos ficassem adeptos ao gênero. Muitas letras passaram a ser eróticas com
duplo sentido, mostrando a mulher como objeto sexual desvalorizando assim o gênero
feminino.
Em Pernambuco, não foi diferente além dele está sendo bastate ouvido e tocado adquiriu
outra nomeclatura funk-brega por ser acompanhado por uma melodia romântica contando o
amor vivido por homens e mulheres, sexsualidade etc. Mas vale ressaltar que mesmo
contendo características do “brega”, que é um estilo romântico pelo qual os cantores
mostram a maneira que enchergam o mundo, esse estilo ‘brega’, ainda não foi classificado
378
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
como gênero musical e é estigmatizado por ser consumido normalmente pela classe social
baixa, como podemos notarem Gomes (2013, p. 96):
Se o estilo brega não se estabeleceu como um gênero musical em si, fica difícil definir
claramente o que seja o tecnobrega. Segundo Amaral (2009), trata-se de uma versão
tecno (eletrônica) do brega cuja estética não é de “bom gosto”, ou de um brega pop.
Desse modo, nós vamos apresentar generalizações sobre o que é esse estilo musical.
O “ultra-romantismo” das letras associado a uma base sonora bem marcada de
guitarra elétrica compõe o estilo. Fontanella (2005), em seu estudo sobre a estética
brega nas periferias pernambucanas, já apontava que o consumo crescente do
gênero³ indicava a busca de grupos menos privilegiados economicamente para se
inserirem na cultura de consumo.
Foi com a união entre o funk e o brega que surgiu uma nova hibridização denominada funk-
brega pernambucano. Isso mostra que o funk pode elaborar e se enquadrar em diversas
situações construindo diferentes discursos e contribuindo para construção de identidades.
Os consumidores do funk conheceram uma nova maneira/forma de se construir as letras do
gênero. Mesmo utilizando termos do “brega”, o estilo não deixou de divulgar letras
pejorativas expondo as mulheres, como podemos perceber na canção de Mc Sheldon (com
Boco) “Nois Gosta e de Novinha”: Só quer carro do ano/E homem bombado/No final da
noite/Ela quer quarto espelhado/Ela não te quer/Ela não te ama/Só ta com interesse/Do
ouro, fama e grana (2x). Nesse fragmento, percebemos explicitamente a exposição do gênero
feminino, pois como bem diz o enunciador: Só ta com interesse/Do ouro, fama e grana.
Dessa maneira, ele faz uma generalização mostrando que as mulheres, quando em
relacionamento com alguém, não se interessam por amor e sim pelo dinheiro do homem.
Percebemos certo machismo, pois enquanto sujeito praticante e participante da sociedade,
grande parte das mulheres estão trabalhando e construindo sua autonomia. Ainda sobre a
fusão do funk com o brega, Gomes (2013, p. 97) salienta que tal procedimento,
O discurso e constituído em relações sociais, uma vez que os indivíduos constroem o mesmo
de acordo com sua vivência, tendo assim reflexo do meio, ou seja, é observando à cultura,
religião, crenças, valores, escolaridade, status, que os sujeitos elaboram seus discursos. Com
isso, podemos dizer que ele é constituído/carregado de ideologias. Como bem ressalta
Fairclough (apud RESENDE e RAMALHO, 2006), define discurso como forma de prática
social, modo de ação sobre o mundo e a sociedade, um elemento da vida social
interconectado a outros elementos.
No discurso funkeiro é comum observarmos a presença de acontecimentos vividos ou
observados pelos MCs. Isso faz com que algumas comunidades apreciem o estilo por se
identificarem ou por gostarem do ritmo o mesmo ainda encontra-se estigmatizado por parte
da população, principalmente pela classe social média que preferem não ouvir o gênero, por
ter suas origens nas favelas ou por trazerem em muitas de suas letras termos ligados à
violência, sexualidade, exposição do corpo da mulher, vivências nas favelas/morros. Mesmo
já tendo conquistado um grande público e estando frequentemente sendo divulgado em
programas de TV e rádios o funk ainda passa por muitos preconceitos.
É importante perceber que encontramos diferentes discursos que estão interligados e que são
constituídos nas relações com a família, comunidade, escola, trabalho etc. É essa diversidade
de discursos que nos permite fazer um estudo crítico, pois é através da linguagem que os
seres humanos se identificam e identificam o outro promovendo mudanças sociais e
contribuindo para a construção/formação da própria identidade.Vejamos o que afirma
Harvey (apud RESENDE e RAMALHO, 2006, p.35) sobre a noção de discurso: “o discurso é
379
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
um momento de práticas sociais dentre outros – relações sociais, poder, práticas materiais,
crenças/valores/desejos e instituições/rituais – que, assim como os demais momentos,
internaliza os outros sem ser redutível a nenhum deles”.
Dessa forma, o discurso tanto se constitui quanto é influenciado pelas práticas sociais. Só os
sujeitos praticantes e inseridos nas práticas discursivas podem contribuir para uma
transformação social. Buscamos ainda compreender o funk como uma prática social
carregada de ideologias, uma vez que suas composições não são construídas aletoriamente,
mas trazem/proporcionam reflexões acerca do que está acontecendo ou repercutindo na
atualidade. Músicas que expõem as mulheres como objeto sexual e que merecem uma
reflexão para observarmos o porquê e desde quando que isso vem acontecendo. Vejamos o
que aponta Fairclough (apud RESENDE e RAMALHO, 2006, p. 47) sobre ideologia: “As
ideologias são significações/construções da realidade (o mundo físico, as relações sociais, as
identidades sociais) que são constituídas em várias dimensões das formas/sentidos das
práticas discursivas e que contribuem para a produção, a reprodução ou transformação das
relações de dominação”.
Desde a antiguidade que a mulher vem tentando ganhar seu espaço em uma sociedade que
está em constantes transformações, pois sabemos que há muito tempo que as mulheres
sofrem com preconceito e que não foram educadas da mesma maneira que os homens como
exemplo. Podemos retomar Alves e Pitanguy (2003, p. 12) que citam Xenofonte no século IV
A.C, quando já afirmava que ““os Deuses” criaram a mulher para funções domésticas, e o
homem para todas as outras”. Dessa forma, mostramos que é não de hoje que as mulheres
sofrem com preconceitos e pré-conceitos concebidos desde a antiguidade. Podemos perceber
isto também na fala de Platão (apud ALVES e PITANGUY, 2003, p. 11) quando ressalta que
“se a natureza não tivesse criado a mulher e os escravos, teria dado ao tear a propriedade de
fiar sozinho”.
Para construir uma identidade feminina, não é fácil. É preciso antes de qualquer coisa que a
mulher conquiste seu lugar no espaço, para sentir-se integrante e atuante em uma sociedade
que se transforma constantemente. Vale lembrar que as mulheres não apagam as situações
vivenciadas, mas procuram superá-las. Para Hall (2006, p. 38) a identidade: “É realmente
algo formado, ao longo do tempo, através de processos inconscientes, e não algo inato,
existente na consciência no momento do nascimento. Existe sempre algo “imaginário” ou
fantasiado sobre sua unidade. Ela permanece sempre incompleta, está sempre “em processo”,
sempre “sendo formada”.
380
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Com isso, observamos que a identidade é uma construção reflexiva em que os indivíduos
operam suas escolhas, diferente da sociedade tradicional em que as escolhas eram impostas
ou pré-determinadas tradicionalmente. Desse modo, o conceito de reflexividade refere-se à
possibilidade de os sujeitos construírem ativamente suas autoidentidades, em construções de
sua atividade na vida social, conforme esclarecem Resende e Ramalho (2006). Todavia, o
gênero funk se constitui como uma ação social, pois foi neste gênero que os MCs
encontraram subsídios para relatar/contar suas reflexões sobre a sociedade e percebemos
que o mesmo contribui para a construção identitária feminina, pois nas festas, baladas “volta
e meia” estão tocando esse ritmo e, mesmo “agredindo” a mulher, as participantes desses
eventos dançam, cantam sem ao menos refletir a letra.
A construção da identidade ocorre nas interações sociais, interações essas que podem ou não
contribuir para a construção identitária. Com isso, queremos dizer que quando o indivíduo se
posiciona sobre determinado assunto é porque ele já ouviu falar ou conhece o mesmo. Dessa
forma, os discursos vão carregados de ideologias cabendo ao outro deixar-se ou não ser
influenciado, pois todo ser humano independente de cultura, religião, condições sociais, é
integrante de uma sociedade e tem consigo valores/crenças adquiridas no seu contexto.
Como bem mostra Fairclough (apud RESENDE e RAMALHO, 2011, p.23), a linguagem
constitui-se socialmente, mas também tem “consequências e efeitos sociais, políticos,
cognitivos, morais e materiais”.
Para iniciarmos nosso estudo sobre a construção da identidade feminina no funk-brega
pernambucano, começamos descrevendo algumas questões percebidas a partir das respostas
do questionário. No primeiro momento, foi perguntado que estilos de músicas as
entrevistadas gostavam de ouvir e de um total de quinze entrevistadas só duas responderam
que ouvem funk, as demais alegaram não gostar do ritmo, mas ressaltaram que já ouviram o
gênero em rádios, TV ou festas. Diante disto, percebemos que o gênero funk não é um ritmo
ouvindo pelas universitárias pesquisadas e que as mesmas procuram selecionar seus estilos
musicais. Em outro momento, perguntamos o seguinte: Em sua opinião por que o funk atrai
tantos ouvintes?
R: M.L. Por trazer uma linguagem mais simples oriunda de comunidades marginalizadas e
de classe social baixa.
R: M.B. Atrai os ouvintes por se tratar de uma música descontraída em que o linguajar da
letra envolve o público jovem, sem contar que a batida forte envolve os ouvintes.
R: J.M. Por se tratar de uma realidade que algumas pessoas se identificam.
Percebemos que um dos motivos pelo qual o funk chama a atenção dos ouvintes é por suas
letras trazerem/relatarem fatos do cotidiano das comunidades. É através do discurso que os
MCs procuram chegar até as camadas populares. Com isso, eles estão agindo, interagindo e
representando o mundo do qual fazem parte. Nas repostas, em momento algum, as
entrevistadas falam do “eu” sempre do outro mantendo um distanciamento entre elas e o
funk.
Em outra questão foi colocada uma postagem para observação e leitura. As estudantes
responderam e avaliaram a afirmação de Regina Casé em uma postagem no facebook?
381
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
R: J.M. Sabemos que existe uma massificação com relação a música brasileira nesse caso,
Regina considera a maioria das pessoas, a grande massa, e acaba generalizando o gosto
musical de todos.
R: L.V. Avalio da seguinte forma: na primeira postagem ela diz que todo brasileiro ama funk,
carnaval, pagode e samba. Eu mesma curto e gosto só de pagode, sou brasileira, ela anda mal
informada mesmo. Não é todo brasileiro não.
R: L.L. A afirmação de Regina não condiz com a realidade, não é todo os brasileiros que
gostam desses estilos de música.
R: J.B. Não pode generalizar, pois no Brasil a diversidade cultural é grande! Nem todas as
pessoas gostam de funk, assim serve para os outros ritmos musicais.
R: M.B. A fala de Regina engloba a maioria dos brasileiros, raça envolvente que gosta de
mistura, e diversidade, porém como a segunda fala mostra, nem todos está nesse grupo, há
uma minoria que está exclusa desse grupo.
Observamos que nas repostas das universitárias fica evidente que elas têm um foco e suas
preferências musicais já estão definidas não sofrendo influências do funk como bem mostra a
reposta de J.B. Não pode generalizar, pois no Brasil a diversidade cultural é grande! Nem
todas as pessoas gostam de funk, assim serve para os outros ritmos musicais. Então,
mesmo o funk-brega chegando a muitos lugares percebeu-se que as estudantes universitárias
não consomem este gênero tendo uma identidade definida, como mostra a estudante J.B. ao
ressaltar que nem todos os brasileiros gostam de funk. Percebemos ainda que embora sejam
conduzidas a partir das relações sociais, elas não foram influenciadas pelo estilo.
A seguir apresentaremos as três últimas perguntas do questionário em que consta um
fragmento /recorte das canções de Mc Sheldon, Mc Leozinho e MCs Metal e Cego junto com
algumas respostas das discentes.
P: Observe fragmentos da música de Mc Sheldon “Nois Gosta e de Novinha” (com Boco). Só quer
carro do ano/E homem bombado/No final da noite/Ela quer quarto espelhado/Ela não te
quer/Ela não te ama/Só ta com interesse/Do ouro, fama e grana (2x). Você se identifica
com essa música ou outras do artista? Justifique.
R: L.P. Não me identifico. A música só refere a mulher como uma interesseira, alguem que só
fica ou se relaciona com um homem pelo dinheiro e a fama que ele tem.
R: M.B. Não porque, primeiramente a letra da música retrata as mulheres no homem o
dinheiro, aquele que oferece a elas poder acima de tudo. Eu, praticamente não tenho esses
interesses.
R: M.R. Não, são letra que desvalorizam a figura feminina, relacionando-a à ostentação, ao
interesse, à banalização.
R: J.F. Não. Não costumo ouvir esse tipo de música e tenho ideologias que são diferentes as
que estão expressas na música.
P:Mc Leozinho do Recifeem um fragmento da música “Vem que vem não para não” diz: Porque
quando meu funk toca as mulheres ficam louca/Descendo ate em baixo com o dedinho na
boca/Com cara de safada e um jeito excitante/Mexendo e rebolando ao som da batida funk.
Você se identifica com essa canção ou outras do artista? Explique.
R: T.V. Não. Porque apesar de gostar de dançar funk eu não me “identifico” com a letra.
382
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
R: L.L. Não, a letra a todo momento só fala em sexo.
R: M.R. Não, mais uma vez a letra da música desvalorisa, de maneira extremamente vulgar, a
mulher.
R: M.B. mais uma vez, não me identifico, pois a letra da música mostra mulheres que usam a
dança para conquistar, abusam da sensualidade.
R: L.G. Não. Porém já escultei outras e gostei.
P: Mc’s Metal e Cego na canção “Novinha Tá Querendo o Que? dizem: Cego tá desandado, tá com
Peru sem freio/As novinhas tá doida querendo ficar no meio/Só camarote vip e área
reservada/Mulher é nacional e a bebida é importada. Você ouviu essa música ou outras do
gênero? Por quê?
R: J.B. Não, porque não gosto do gênero.
R: L.P. Não ouvi essa música. Já ouvi “chama ela” do MC Leozinho, são músicas que falam da
ostentaçõ, de mulheres que so namoram por interesse e apologia ao sexo em quase todas as
letras.
R: T.V. Não ouvi esta música especifica, mas já ouvi outras bem parecidas. Porque quando
estou em uma festa ouço todos os tipos de música incluseve músicas neste estilo.
São perguntas distintas, mas as respostam foram interligadas umas com as outras, já que a
temática é bem semelhante. Mesmo sendo de estudantes diferentes, seus posicionamentos
permaneceram desde a primeira pergunta até a última, ressaltando entre quinze
entrevistadas duas afirmaram ouvir funk-brega pernambucano. Percebemos que o funk-
brega traz a mulher como objeto sexual que serve apenas para fazer as satisfacões ou os
desejos masculinos como mostra a canção do MC Leozinho “Vem que vem não para não” De
maneira implícita, ele trata da sexualidade feminina como algo fácil e sem importância, que
apenas com a batida do funk elas enlouquecem. Mas uma entrevistada (M.B) contraria essa
afirmação dizendo que não se identifica, pois existem mulheres que se valorizam.
Temos uma prática social pela qual os MCs dialogam com a sociedade de maneira que a
mulher é desvalorizada, uma vez que seus desejos não saõ importantes, mas sim os desejos
do homem que devem ser satisfeitos a todo custo. Entretanto, há quem consuma esses
produtos culturais, como pudemos observar na resposta de T.V. R: Não ouvi esta música
específica, mas já ouvi outras bem parecidas. Porque quando estou em uma festa ouço todos
os tipos de música incluseve músicas neste estilo. Com esssa resposta, percebemos que
algumas pessoas não ovem funk-brega costumeiramente, mas ao estarem em festas/baladas
ouvem e chegam a dançar, mostrando assim que a identidade não é algo fixo, mas que é
moldada e construída a partir as situações e contextos sociais.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com isso podemos dizer que há posicionamentos diferentes acerca do funk-brega, mas
seguindo em uma mesma perspectiva, ou seja, grande parte das estudantes universitárias
entrevistadas não consomem o funk e as que chegam a ouvir esse estilo escutam apenas
quando em festa mostrando que a identificação com as letras não podem ser determinadas a
priori, uma vez que as preferências das entrevistadas podem ser modificadas, adequadas aos
diferentes contextos, assim como também seus discursos.
Nossas análises ainda que breves nos permitam dizer que parece haver contradições nos
posicionamentos femininos em relação ao estilo funk, já que as letras são questionadas
quando analisadas de modo frio, mais distante de contextos reais em que costumam ser
ouvidas. Entretanto, considerando o sujeito pós-moderno pensado por Hall (2006),
percebemos que se trata na verdade de um movimento identitário totalmente possível e
coerente com uma sociedade complexa e também em fluxo, onde as preferências precisam
ser investigadas à luz das situações a que se referem.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
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384
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
AS MÚLTIPLAS VOZES NOS CARTAZES DE PROTESTO
RESUMO: Esta pesquisa tem como objeto de estudo o gênero textual “cartaz de protesto” no
site de redes sociais Facebook, cuja utilização em nível mundial intensificou novas formas de
comunicação, representando hoje, além de um artefato tecnológico, um fenômeno social,
cultural e comunicacional. Analisar as principais estratégias de persuasão utilizadas no
discurso dos cartazes, e suscitar reflexões acerca do papel do professor de língua portuguesa
frente às novas exigências educacionais e sociais constitui o objetivo desse trabalho. A
pesquisa se deu a partir de uma abordagem qualitativa através da qual foi coletado um
corpus de oito textos, retirados do facebbok e analisados à luz da perspectiva da análise
crítica do discurso, (FAIRCLOUGH 2001) e da sociorretórica de gênero, (SWALES 1990). Ao
analisarmos os textos pudemos constatar que seus autores se utilizaram de intertextualidade,
multimodalidade, interdiscursividade e figuras retóricas como metáforas, metonímias,
antíteses, hipérboles e ironias como formas de persuasão. Ao iniciarmos nossa pesquisa
percebemos que existem muitas lacunas no meio acadêmico no tocante ao gênero em análise,
que com as recentes manifestações, mostrou o quanto necessário se faz tirá-lo apenas do
papel de suporte pelas escolas, para conferir-lhe um lugar de destaque nas aulas de língua
portuguesa.
ABSTRACT: This research has as object of study the textual genre “protest sign” in the site
of social networks Facebook, whose utilization in global level intensified new ways of
communication, accounting for beyond a technological artifact a social, cultural and
communicational phenomenon. To analyze the main strategies of persuasion used in the
speech of the signs and stimulate reflections on Portuguese teacher’s role in light of the new
educational and social requirements constitutes the aim of this work. We carried out the
research from a qualitative approach through which we collected a corpus of eight texts,
taken from the Facebook and analyzed under the perspective of critical analysis of speech
(FAIRCLOGH 2001) and of socio-rhetoric genre (SWALES 1990). When we analyzed the
texts, we could conclude that their authors used intertextuality, multi-modality,
interdiscursivity and rhetoric figures such as metaphors, metonyms, antithesis, hyperboles
and ironies as a way of persuasion. By the time we started off our work we realized that there
are many gaps in the academic field as regard the genre in analyzes that with the recent
manifestations, presented how important is to take it from the role of school support, in
order to give it a prominence in the Portuguese language classes.
Key words: genre; speech; intertextuality.
INTRODUÇÃO
As ruas de diferentes cidades brasileiras foram palcos de inúmeras manifestações ocorridas
no mês de junho de 2013, manifestações essas veiculadas exaustivamente pela mídia,
principalmente pelas redes sociais digitais, lugar que deu origem àsdiscussões e organizações
desses eventos. Não nos interessa aqui analisar o discurso político por trás dos protestos, e se
eles são positivos ou não para a sociedade, mas perceber, à luz da análise crítica do discurso,
os mecanismos de persuasão utilizados por milhares de vozes que se materializaram em
cartazes de protestos irreverentes, criativos e dialógicos. Para isso, constitui-se como foco
dessa pesquisa analisar as estratégias de persuasão utilizadas no discurso dos cartazes,
explicar que funções sociodiscursivas essas estratégias desempenham e que efeitos produzem
1. OS CARTAZES NO TEMPO
A história dos cartazes de acordo com Abreu (2011) coincide com a evolução do
conhecimento, da tecnologia, do comércio, da política, da arte, da vida urbana e do progresso
das cidades. Sabemos,por exemplo, que os primeiros exemplares de cartazes da história
tiveram a pedra e a madeira como suporte em cujas superfícies eram esculpidos os textos,
depois com o aparecimento do pergaminho e do papiro efetivou-se a sua portabilidade, e só
mais tarde o papel, inventado pelos chineses, lhe possibilitou uma maior propagação. Com a
chegada dos computadores, o gênero ganhou nova roupagem, as combinações entre
fotografias, ilustrações, cores, tamanhos e tipos de letras conferiram aos cartazes um lugar de
destaque, seja no ambiente escolar, na mídia, nas empresas publicitárias, e nas ruas.
Apesar das mudanças ocorridas no gênero, percebemos que ele manteve seu propósito
comunicativo de informar, divulgar e propagar idéias. De acordo com Marcuschi (2002:30),
isso acontece porque “os gêneros não são entidades naturais como as borboletas, as pedras,
os rios e as estrelas, mas são artefatos culturais construídos historicamente pelo ser humano.
Assim, um gênero pode não ter uma determinada propriedade e ainda continuar sendo
aquele gênero.”
Embora existam muitos estudos no Brasil e no exterior sobre gêneros, conceituá-los não é
uma tarefa fácil, assim como também não é fácil perceber quais aspectos considerar em sua
caracterização ou ainda separar o conceito de gênero e suporte quando estes aparecem
imbricados, quase numa relação de interdependência. Das tradições literárias às tradições
retóricas muitas concepções foram formuladas e muitas discussões geradas no intuito de
compreender esse fenômeno. Segundo Meurer, Bonini e Motta-Roth (2005:8-9):
Tanto no Brasil, principalmente após a publicação dos PCN (BRASIL, 1998), quanto
no estrangeiro (BHATIA, 1997, HYLAND, 2002), é notável o número de campos
científicos e profissionais interessados nesse tema. Pode-se dizer hoje, que estão
inclinados a discutir questões relacionadas aos gêneros, entre outros, críticos
literários, retóricos, sociólogos, jornalistas, cientistas cognitivistas [...]. O gênero
passou a ser uma noção central na definição da própria linguagem. É um fenômeno
que se localiza entre a língua, o discurso e as estruturas sociais, possibilitando
diálogos entre teóricos e pesquisadores de diferentes campos e, ao mesmo tempo,
trazendo elementos conceituais vibializadores de uma ampla revisão de todo o
aparato teórico da Lingüística. [...] Ao tomar o conceito de gênero como categoria do
discurso, a LA amplia o horizonte de explicações para a linguagem.
Como já foi citado anteriormente, são muitos os estudos e concepções de gêneros nas
diferentes áreas em que é tomado como objeto de estudo. Nesta pesquisa filiamo-nos à
abordagem sociorretórica do estudo do gênero, considerando o postulado de Swales
(1990:45) que conceitua o gênero como uma “classe de eventos comunicativos vinculada a
uma comunidade discursiva específica que faz uso de um gênero específico para atingir seus
objetivos”. Nesse sentido,Bazerman (2011:23) afirma que os “gêneros não são apenas formas.
Gêneros são formas de vida, modos de ser, são enquadres para a ação social. São ambientes
para aprendizagem. São os lugares onde o sentido é construído”.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Ao definirmos o termo ‘cartaz de protesto’ como gênero textual, temos consciência de que
esta escolha gera um embate teórico, pois noções sobre suporte e gênero textual não são
consensuais e há ainda muito o que se discutir, principalmente no tocante aos gêneros em
suporte eletrônico. Marcuschi (2002:21) observa que “em muitos casos são as formas que
determinam o gênero e, em outros tantos serão as funções. Contudo, haverá casos em que
será o próprio suporte ou o ambiente em que os textos aparecem que determinam o gênero
presente”. Com o objeto em estudo, a discussão se constitui por ser o cartaz, antes de tudo,
um portador de gêneros. Realmente, o cartaz é um meio de comunicação de uso constante em
vários domínios discursivos, prestando-se especialmente às atividades pedagógicas, de
divulgação, publicidade e propaganda. No entanto, com base em reflexões apoiadas em vários
estudiosos, a exemplo de Swales (1990) e Bhatia (1993), utilizamos como um dos critérios
definidores do gênero em tela o propósito comunicativo, que confere ao cartaz de protesto
uma identidade que lhe dá condições de aceitação e de funcionalidade reconhecida nas
esferas sociais em que circula, pois de acordo com Marcuschi (2002:19) os gêneros “surgem
emparelhados a necessidades e atividades sócio-culturais, bem como na relação com
inovações tecnológicas, o que é facilmente perceptível ao se considerar a quantidade de
gêneros textuais hoje existentes em relação a sociedades anteriores à comunicação escrita”
O cartaz de protesto constitui, portanto, um gênero complexo em que se verifica, inclusive, o
desdobramento dos seus propósitos comunicativos como no caso dos cartazes produzidos em
ambiente escolar com o intuito de informar, em campanhas publicitárias cujo objetivo
principal é vender, e em ações de manifesto cujos propósitos são criticar e reivindicar.
Bazerman (2005:31) defende a ideia de que os “gêneros emergem nos processos sociais em
que pessoas tentam compreender umas às outras suficientemente bem para coordenar
atividades e compartilhar significados com vistas a seus propósitos práticos”.
Ao optarmos pela análise do gênero em tela percebemos que seria de extrema importância
observar como se dá a relação entre texto, prática social e prática discursiva na construção do
discurso nos cartazes de protesto. Para tanto utilizaremos os estudos de Norman
(FAIRCLOUGH, 2001) e (VAN DIJK, 2001) como aportes teóricos para uma análise crítica
do discurso a fim de percebemos as estratégias persuasivas utilizadas por esses locutores e os
efeitos produzidos nos interlocutores.
Para a Análise Crítica do Discurso (ACD), o discurso é tido como uma forma de prática social,
realizada por intermédio de gêneros textuais. E isto tem as seguintes implicações
(FAIRCLOUGH, 2001):
387
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
(a) os indivíduos realizam ações por meio da linguagem;
(b) há uma relação bidirecional entre o discurso e as estruturas sociais, na exata
medida em que o discurso é simultaneamente influenciado pelas estruturas sociais e
as influencia;
(c) há uma preocupação com os recursos empregados na produção, distribuição e
consumo dos textos, recursos sociocomunicativos, porquanto perpassados por
discursos e ideologias.
Nossa opção pelos teóricos da ACD em detrimento de outras abordagens justifica-se por
compactuarmos com eles da ideia de sujeito como produtor e transformador de suas práticas
discursivas e não como ser assujeitado.
Para Van Dijk (2012:17) “produzir e compreender o texto envolve aquilo que tradicional e
informalmente costuma se chamar de ‘contexto’ dessas falas, abrangendo categorias tais
como as identidades e os papéis dos participantes, o lugar, o tempo, a instituição, as ações
políticas.” Ainda segundo o mesmo autor (Van Dijk, 1997 apud Koch 2013:173), contexto
“representa o conjunto de todas as propriedades da situação social que são sistematicamente
relevantes para a produção, compreensão ou funcionamento do discurso e de suas
estruturas”. Nesse sentido, compreendemos como o entendimento do contexto sócio/político
do Brasil, com denúncias de corrupção em todos os níveis, deficiência nos sistemas de saúde,
educação, segurança e transporte, altas taxas de impostos e baixa qualidade de vida, se faz
imprescindível para a compreensão do discurso dos cartazes, pois sem a compreensão dos
problemas sociais evidenciados pela massa nas ruas, perde-se o sentido das reivindicações e
do próprio discurso.
Ao selecionarmos os cartazes partimos de um pressuposto de que existe entre eles uma
mesma intencionalidade: persuadir os brasileiros a aderirem ao movimento e irem para as
ruas como forma de protesto contra a situação social e política do país. Para conseguirem
seus propósitos os manifestantes se apoiaram nos mais variados fatores de persuasão, o que
nos levou, depois de pesquisa, a organizamos um corpus de oito cartazes coletados no site
Facebook e agrupá-los a partir da relação de interdiscursividade estabelecida entre eles. A
escolha pelo suporte se justifica por ser esse, primeiramente, o espaço de produção,
reprodução, distribuição e recepção desse discurso.
388
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
uma reforma política no Brasil e o ato de formatação de uma máquina e, nesse caso, o país
passa a ser pensado enquanto máquina e não mais como nação. Nesse sentido, percebemos
que, ao diluir os limites entre dois elementos, “sistema político e sistema operacional” ela
aproxima os membros da comunidade discursiva através do uso eficiente da linguagem,
garantindo uma relação de interdependência entre o sujeito usuário da rede e o sujeito
inconformado com a situação política e social do país.
Quando analisamos o discurso utilizado nas figuras 1, 2, e 3, percebemos como as três
funções da linguagem discutidas por Fairclough (2001) função identitária, função relacional e
função ideacional se efetivam de modo a garantir que o objetivo persuasivo seja alcançado,
pois como fica claro na leitura dos textos as identidades sociais são estabelecidas no
discurso; as relações sociais entre os participantes do discurso são representadas e
negociadas; e os modos pelos quais os textos significam o mundo e seus processos, entidades
e relações são explicitados através do código linguístico e das imagens. As figuras 1 e 3
evidenciam claramente a necessidade das imagens na construção da coerência textual, isso
porque, além da linguagem verbal, os textos necessitam cada vez mais de cores, imagens,
movimentos, para que novos sentidos possam ser construídos. Dessa forma, concordamos
com Kress (1989) em que os gêneros textuais não devem ser analisados isoladamente dos
elementos não verbais. A forma como a linguagem verbal e os elementos não verbais
articulam-se deve ser considerada na construção do sentido.
Figura 4 (cartaz de protesto - 2013)Figura 5 (cartaz de protesto - 1932) Figura 6 ( cartaz da 1ª guerra - 1917 )
Como é vísivel, os produtores dos discursos nos cartazes de 2013 se valeram de outros textos
e discursos historicamente construídos como estratégias persuasivas a fim de atingir o
propósito comunicativo. Segundo Charles Bazerman (2006), o gênero é apenas a realização
visível de dinâmicas sociais e psicológicas. Ao compreendermos o que acontece com o gênero,
porque o gênero é o que é, percebemos os múltiplos fatores sociais e psicológicos com os
quais nossos enunciados precisam dialogar para serem mais eficazes. Ao observamos os
cartazes utilizados em momentos e lugares distintos,percebemos o quão necessária se faz a
compreensão da intertextualidade como fator persuasivo, pois ao trazer à tona textos que
ficaram conhecidos mundialmente em revoluções que saíram vencedoras, os
locutores/autores implicitamente resgatam no interlocutor/leitor, através da emoção, o
desejo de luta e de mudança. Para Fairclough (2001) é pelo recurso da intertextualidade que
se busca garantir a legitimidade e aprovação do discurso. A interdiscursividade é outro fator
instigante nos textos, segundo Maingueneau (2001) interdiscurso corresponde aos diversos
389
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
discursos no interior do discurso, e é a partir dos vários outros falares que se constituem os
enunciados nos cartazes de protesto. Para Bakhtin (1986:89 apud Fairclough, 2001:134)
Nossa fala... é preenchida com palavras de outros, variáveis graus de alteridade e
variáveis graus do que é de nós próprios, variáveis graus de afastamento. Essas
palavras de outros carregam com elas suas próprias palavras expressões, seu próprio
tom avaliativo, o qual nós assimilamos, retrabalhamos e reacentuamos.
Nas figuras, os textos verbais, apesar de diferentes, trazem uma mesma estratégia
comunicativa: o uso do pronome “você” dirigido diretamente a um leitor de forma imperativa
e contundente, o dêitico usado, embora no singular, refere-se diretamente a uma massa,
interpela os sujeitos a participarem dos movimentos nas ruas, ou no caso da figura 6, da 1ª
guerra mundial como soldado americano.
Outro elemento que se sobressai nas figuras é a imagem. Nos cartazes 4 e 5 a imagem do
soldado é a mesma, que com o dedo indicativo e o olhar de autoridade dá uma ordem,
enquanto no cartaz 6 tem-se a presença do Tio Sam, personagem conhecido durante a guerra
anglo-americana em 1812 e que parece persuadir melhor os americanos. Embora texto e
imagem sejam diferentes, no todo da composição dos cartazes é pelas marcas reiteradas em
cada um deles que percebemos como a multimodalidade se faz presente também como fator
de persuasão. Segundo Kress e Van Leeuwen (2001: 46),
Na era da multimodalidade os modos semióticos além da língua são vistos como
completamente capazes para servir de representação e comunicação. Na verdade, a
língua, seja falada ou escrita, pode agora, com mais frequência ser vista como ‘apoio’
aos outros modos semióticos: ao visual, por exemplo. A língua pode agora ser
‘extravisual’.
Nos protestos de junho de 2013, muitos foram os cartazes que fizeram alusão ao tema da
ditadura. Ideologicamente, é como se os jovens de hoje pudessem fazer o mesmo que os
jovens de outros manifestos fizeram, e por isso a persuasão pela emoção e memória se
justifica. Nos cartazes abaixo vemos como essa ideia é explicitamente trabalhada.
Figura 7 Figura 8
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Figura 9 Figura 10
Um dos cartazes mais comentados na rede corresponde ao da figura 9, o discurso
"Desculpem o transtorno, estamos mudando o Brasil" remete a avisos análogos ("Desculpe o
transtorno") comuns em lugares nos quais obras em execução atrapalham os usuários. Esse
discurso é claramente retórico, pois o produtor não pretende se desculpar, mas persuadir o
interlocutor/leitor, através do recurso da ironia a também se sentir responsável por essa
mudança. É importante lembrar que de acordo com Faiclough (2001:159) “a ironia depende
de os intérpretes serem capazes de reconhecer que o significado de um texto ecoado, não é o
significado do produtor do texto”.
Na figura 10 o discurso latino “pão e circo” assume um outro significado. Se no passado
entendia-se que o provimento de comida e diversão para o povo eram suficientes para
diminuir a insatisfação popular contra governantes, nesse cartaz já não se aceita mais o
discurso populista, pelo menos não totalmente. Claro está que ao utilizar o termo “pão”
metonimicamente como comida, o autor acentua o contexto social do país em que muitos
brasileiros ainda passam fome, e essa figura de estilo constitui no discurso um elemento
persuasivo de autoridade, é a voz das ruas, é a voz da massa. O termo “circo” como metáfora
para copa é utilizado negativamente pelo autor, não mais entendido como diversão, mas
assumindo um papel de responsável pela falta de “pão”.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Segundo Possenti (2013) as manifestações de rua têm oferecido aos professores interessantes
materiais para que a prática de leitura na escola seja efetivada a partir de análises mais
explícitas e não apenas como identificação de conteúdo. Analisar com os estudantes as
produções desses discursos a partir de seus contextos globais, da observação do cartaz
enquanto gênero e como esse gênero ganha um outro significado quando colocado a serviço
das práticas sociais pode suscitar no aluno uma maior reflexão a cerca de como os discursos
se estabelecem e como as relações de poder e dominação são manifestadas pelos usos
linguísticos que se faz no texto. O estudo do gênero em tela, além de fornecer elementos
importantíssimos para a análise linguística, propicia também um trabalho interdisciplinar,
visto que dialoga com outras disciplinas como a sociologia, história, filosofia, em fim, as
ciências humanas, fomentando assim um painel mais rico e diversificado de saberes.
Analisar as estratégias persuasivas utilizadas nos cartazes de protesto e possibilitarreflexões
acerca do papel do professor de língua portuguesa frente às novas exigências educacionais e
sociais constituíram o objetivo dessa pesquisa. No gênero analisado, percebemos que os
locutores usaram os recursos da intertextualidade e interdiscursividade como fatores de
persuasão, ora assumindo a fala alheia, ora negando o discurso de outrem. Além disso, a
metáfora, considerada tradicionalmente como aspecto da linguagem literária, especialmente
da poesia, foi fortemente utilizada e teve, na constituição dos discursos, importante papel
persuasivo.
Ao optarmos pelo gênero em suporte eletrônico, objetivamos mostrar como as redes sociais
digitais podem funcionar como importante ferramenta pedagógica e como o professor, ao
fazer uso de outros suportes textuais, pode transformar suas aulas em momentos mais
significativos para os estudantes. Longe de ter a pretensão de fornecer dicas, receitas ou
produzir manuais de como se trabalhar com o gênero em sala de aula ou como abordar a
análise do discurso no ensino fundamental, pretendemos apenas possibilitar discussões
acerca do papel do professor de língua portuguesa frentes às novas exigências educacionais,
391
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
pois entendemos que só compreendendo o discurso de diferentes formas de ação em
sociedade, é possível construir nas escolas espaços criativos e dinâmicos de aprendizagem,
assim como é possível também utilizar outros suportes como as redes sociais para efetivar
leituras e discussões críticas.
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392
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A REFIGURAÇÃO IDEOLÓGICA DO SERTÃO A PARTIR DA CONSTRUÇÃO DE
IDENTIDADE MEDIANTE ASPECTOS PÓS-MODERNOS.
RESUMO: Este artigo propõe a discussão acerca do romance Galileia (2008), de Ronaldo
Correia de Brito, partindo de princípios que regem questões culturais, bem como estudos
voltados à identidade do indivíduo e a forma como esses temas perpassam o que diz respeito
aos efeitos do processo de globalização. O modo utilizado pelo autor na construção e na
constituição do romance apresenta um novo olhar sobre o Sertão brasileiro, opondo-se aos
discursos imagético-discursivos idealizados pelos regionalistas e tradicionalistas referentes à
região. O romance apresenta-se como palco para rememorações de um passado arcaico em
contraste com as novas mudanças ocorridas devido à sociabilidade moderna, ele ultrapassa
os limites das estagnações culturais do local e transcende o tradicional e o antimoderno. As
formas cristalizadas pela perpetuação de costumes, hábitos e concepções construídos são
rompidas, não mais refletindo estereótipos imagéticos de caráter moral para a preservação
histórico-cultural da região. A nova configuração introduz produtos dos trânsitos culturais
provenientes do processo de globalização, substituindo as temáticas clássicas, que se
encontram presentes em diversas obras do passado que construíam o Nordeste, como a seca,
o cangaço, os retirantes, beatos, profetas, santos, coronéis, escravos etc. A partir disso, o
presente trabalho concentra-se na análise do processo pelo qual Ronaldo Correia de Brito
reinventa o Sertão dentro da obra, inovando ao inserir aspectos característicos da pós-
modernidade.
Palavras-chave: Pós-modernidade. Globalização. Identidade. Sertão. Galileia.
ABSTRACT: This article submits discussion about Ronaldo Correia de Brito’s romance
Galille (2008),starting from principles governing cultural issues, as well as studies related to
the identity of the individual and how these themes found what concerns the effects of the
globalization process. The manner used by the author in the construction and constitution of
romance presents a new look at the Brazilian hinterland, as opposed to the idealized image-
discursive discourses by Regionalist and traditionalists refer to the region. The Romance
presents itself as a stage to recollections of an ancient past in contrast with the new changes
due to modern sociability, he goes beyond the limits of cultural stagnation of local and
transcends the traditional and anti-modern. Crystallized forms perpetuation of customs,
habits and conceptions are built broken, no longer reflecting imagistic stereotypes of moral
character for the preservation of historical and cultural region. The new configuration
introduces cultural influences from the globalization process, replacing the classic themes
that are present in several works of the past who built the Northeast, such as drought,
banditry, retreatants, Blesseds, prophets, saints, colonels, slaves etc. From this it the present
study focuses on the analysis of the process by which Ronaldo Correia de Brito reinvents the
Hinterland within the work, innovating to insert characteristic features of postmodernity.
INTRODUÇÃO
O assunto a ser discorrido no artigo é abordado sob o ponto de vista de teorias culturais,
sociais e antropológicas baseado nos seguintes livros: A invenção do Nordeste e outras artes
do Durval Muniz de Albuquerque Júnior (2009), o qual aborda a questão do recorte espacial
de um local real e imaginário inventado à base de mitos e estereótipos; o livro A identidade
cultural na pós-modernidade (1998) e Da diáspora: identidades e mediações culturais
(2003), do Stuart Hall, que discutem sobre o comportamento do homem na sociedade
moderna e a relação das identidades múltiplas, edificadas sob as diásporas e o livro O local da
cultura (1998), de Homi K. Bhabha, voltado para as questões da identidade, do hibridismo,
da tradução, no qual possui enorme relevância para a realização da pesquisa em questão.
O discurso literário se baseia no espaço natural nordestino, apresentando-se com mais força
no romance de trinta, com o intuito de autenticar, artisticamente, uma identidade regional e
O cangaço, por sua vez, era o estereótipo da violência, valentia. “Existia na região, toda uma
tradição literária de origem medieval de narrar crimes feitos em nome da honra, em defesa
da família e de seus protetores” (ALBUQUERQUE JÚNIOR, 2001, p.124). Acreditava-se que
os cangaceiros agiam por ordem divina, rebelados contra as injustiças acometidas e contra o
processo de modernização ameaçadora da essência da região “[...] ao lutarem contra os
correios, arrancarem fios de telégrafo e trilhos de trem, sequestrarem ‘gringos’, enfrentarem
os agentes do Estado” (2001, p, 127). Em resultados das catástrofes naturais, surgem os
beatos e profetas, defensores de um mundo sagrado, perambulantes das terras sertanejas em
busca de converter pecadores e anunciadores de castigos para os que desrespeitassem as
normas tradicionais. “O misticismo e a visão sacralizada da natureza e da sociedade faziam
parte deste mundo tradicional” (2001, p.127). Região de crenças primitiva em contraste com
a racionalidade característica da modernidade. Diversos são os temas estagnados na
memória dessas terras, que serviram de base para a figuração do local e percorrem inúmeras
obras:
O romance Galileia (2008) 149, do autor Ronaldo Correia de Brito 150, trata dos embates
insolúveis entre cidade e campo com sua escrita exata e rápida, considerada cinematográfica.
A obra é narrada pelo protagonista Adonias, que atravessa o Sertão do Ceará junto com seus
primos Ismael e Davi em destino à fazenda da Galileia, devido à doença de seu avô Raimundo
Caetano. O retorno a esse lugar traz uma série de rememorações a cerca dos costumes e
princípios da região sertaneja em contraste com a situação real e presente no qual eles se
deparam. Raimundo Caetano é dono da fazenda Galileia e pertence a uma grande família. O
Nordeste era tema das “Famílias extensas que se espalhavam em muitos concubinatos”
(ALBUQUERQUE JÚNIOR, 2001, p.116). Contrapondo-se a isso, por exemplo, dos seus nove
filhos (exceto Benjamim que falecera), encontram-se somente três que moram em torno da
fazenda: Natan, Josafá e Salomão, o restante foi morar na cidade, “Os filhos, netos, bisnetos,
parentes e agregados retornavam apenas nas festas do padroeiro, aniversários e férias.”
(BRITO, 2008, p.60). Os romances de trinta possuíam um olhar negativo em relação à
cidade. A oposição existente entre litoral e Sertão permanece no passado – um novo tempo se
institui.
Partindo da controvérsia das regiões Norte e Sul, causada pelas “grandes distâncias, a
deficiência nos meios de transporte e comunicação [...] tornavam estes espaços
completamente desconhecidos entre si, verdadeiros mundos separados e diferentes.”
(ALBUQUERQUE JÚNIOR, 2001, p.41), observa-se o rompimento dessa divisão existente
sob a perspectiva “racial, psicológica e moral” (2001, p.57), uma vez que Marina, socióloga
estudiosa da Família Rego Castro, foi para Galileia em busca de informações para sua
pesquisa e se casa com Natan, quebrando, assim, a dicotomia existente entre essas duas
regiões. A sociedade moderna, em meio as suas relações culturais, está provocando
modificações nas suas estruturas: “[...] à medida em que áreas diferentes do globo são postas
em interconexão umas com as outras, ondas de transformação social atingem virtualmente
toda a superfície da terra” (GIDDENS, 1990 apud HALL, 1998, p.15). É relevante destacar a
ajuda de Salomão para os estudos da sulista por meio de pesquisas e estudos realizados por
ele, grande estudioso da região, o que também deixa de lado a idéia estereotipada da
ignorância regional.
O romance é iniciado com a volta dos primos Ismael, Davi e Adonias para a fazenda – o
êxodo. Diferentemente dos retirantes, caracteres clássicos do mundo sertanejo, no qual saíam
do local em busca de sobrevivência, devido ao flagelo das secas. Não era frequente a imagem
396
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
de pessoas voltando para a terra das secas. Os fatores que levaram as saídas dos primos do
Sertão não consistem em questões de necessidade, pois nunca houve miséria na fazenda. Eles
caracterizam “[...] a geração que largou o campo pra nunca mais voltar” (BRITO, 2008, p.
114). (2008, p.23). Davi saiu em busca da aprendizagem e aperfeiçoamento dos estudos
musicais fora do país; Adonias estudou medicina na Europa e Ismael viveu como imigrante
na Noruega: “Três vaqueiros desgarrados, cowboys voltando das planícies lunares.” (2008,
p.135).
[...] é importante ver essa perspectiva diaspórica da cultura como uma subversão dos
modelos culturais tradicionais orientados para a nação. Como outros processos
globalizantes, a globalização cultural é desterritorializante em seus efeitos. Suas
compressões espaco-temporais, impulsionadas pelas novas tecnologias, afrouxam os lagos
entre a cultura e o "lugar". (HALL, 2003, p.36)
Ismael, Davi e Adonias retornam numa camioneta importada “No êxtase do som do carro,
rasgamos os Sertões em alta velocidade: maravilha o mundo lá fora, atenuado por um vidro
fumê e pelo controle de temperatura” (BRITO, 2008, p.10). Pelas janelas observam
modificações ocorridas no local durante o tempo em que passaram fora. A paisagem ao lado
do sócio-histórico concerne na imagem sob as influências de produtos urbanizados,
características da pós-modernidade, pano de fundo da narrativa. Essa descrição durante o
percurso da viagem ocupa quase um terço do romance.
Adonias traz inúmeras lembranças, como, por exemplo, o nome de todos os pássaros e
árvores que era obrigado a decorar quando criança: “Meu pai exigia que eu memorizasse as
plantas da caatinga, por mais insignificantes que me parecessem [...] lembro de muitos, mas
sou incapaz de reconhecer uma plumagem, um canto, um ninho. É outra memória inútil,
guardada não sei para quê.” (BRITO, 2008, p.12-16). O personagem sempre se lembra e
reclama desse episódio de sua infância reforçando a inutilidade do hábito, praticado
fielmente pelos regionalistas: “A necessidade de reterritorialização leva a um exaustivo
levantamento da natureza” (ALBUQUERQUE JÚNIOR, 2001, p.67). Dessa forma, é passada
a ideia crítica da perpetuação dessas memórias normativas desnecessárias, regionalistas.
Em meio a tantos estranhamentos diante dos seus olhos, Adonias destaca: “Imagino a casa
dos meus avós derrubada por tratores, dando lugar a uma rodovia. O barulho forte das
máquinas e as luzes dos faróis me deixam a impressão de que estou noutro planeta. Mas não
estou. (BRITO, 2008, p.8). Durante a viagem rumo à fazenda, Adonias verifica a decadência
da identidade cultural fixada pela memória, como, por exemplo, a imagem da mulher, antes
vista como frágil e destinada aos cuidados da casa e da família, agora ganha o mundo: “O
poder masculino cede lugar ao feminino [...] Com certeza já não se escondem na cozinha e
nos quartos da casa, atravessam as salas, ganham os terreiros, as ruas, as cidades.” (2008, p.
227). Imagens ancoradas na tradição decaem, Adonias observa mulheres tangendo vacas em
cima de motocicletas: “Dois mitos se desfazem diante dos meus olhos, num só instante: o
vaqueiro macho, encourado, e o cavalo das histórias de heróis, quando se puxavam bois pelo
rabo.” (2008, p.8). Outro destaque feminista consiste no trabalho das mulheres da fazenda,
“na manufatura de punhos, cordões, varandas de crochê e bordados” (2008, p.60), principal
sustento da fazenda – um fabrico de redes:
Os quartos de dormir, as salas de estar e os terraços da casa foram ocupados por máquinas
de costura e fiação. As mulheres romperam as prisões simbólicas, saíram para o mundo,
quebraram as paredes do gineceu e as portas que as isolavam no claustro sombrio. Os
tempos eram outros, homens e mulheres se ocupavam dos mesmos afazeres, invertia-se a
antiga ordem patriarcal. (2008, p. 60)
Elias, neto de Raimundo Caetano, é uma das provas de que a “agricultura e a pecuária faliram
no Nordeste” (2008, 112), como ele mesmo diz, sendo trabalhador no ramo da construção
civil. O solo onde se plantavam algodão endureceu, o que, no passado, saiam caminhões
cheios para as fábricas de tecido. Uma praga de besouros destruiu os algodoais, Salomão é
convicto da armação dos americanos para com as plantações, pois temiam a concorrência do
Nordeste. Essa possível inserção destruidora dos americanos nessas plantações está
fortemente ligada à idéia da invasão estrangeira nas terras nordestinas, ação
descaracterizadora da identidade regional, “[...] a moldagem e a remodelagem de relações
espaço-tempo no interior de diferentes sistemas de representação têm efeitos profundos
sobre a forma como as identidades são localizadas e representadas. (HALL, 1998, p.71).
As imagens do romance de trinta foram ancoradas em torno da seca, assunto central das
narrativas. Em contrapartida, em Galileia, na maioria das vezes, quando o céu não se
encontra com prenúncios de chuva, está chovendo. A seca perde lugar, ela não se constitui
mais o problema central. O Sertão de antigamente vivia sob uma sociabilidade rotineira, onde
apenas a irrupção da natureza quebrava essa rotina, como a seca, as enchentes, as mortes
etc., mas o Sertão de Ronaldo Correia de Brito está impregnado por outras problemáticas
desestabilizadoras da rotina, tal como a pedofilia, a prostituição infantil, entre outros;
questões de ordem social. Observa-se esse cenário representado na fala de Adonias: “antes, o
único flagelo era a seca.” (BRITO, 2008, p.82).
A modernização está espalhada pela região, as lan houses estão por toda parte; Davi há quase
todo momento representa essa vivência tecnológica, ele não desgruda do brinquedo
eletrônico durante toda a viagem. Observa-se fortemente este fenômeno por meio da cena na
qual Natan narra histórias em meio a vibrações sonoras provindas dos aparelhos tecnológicos
e Adonias examina, em meio a cenas rápidas, provenientes da modernidade: “a claque da
televisão ri, vozes se agitam, gritam, choram. As vibrações sonoras disputam o espaço [...]
Tento abstrair a televisão. Escuto os teclados dos computadores.” (2008, p.205). Não se tem
mais a imagem dos jagunços ‘torando’ as estradas e a caatinga tampouco cangaceiros, como
relembra o dono do bar no qual Adonias, Davi e Ismael visitaram: “Antigamente não existiam
computadores. No máximo, um bando de cangaceiros aparecia e estuprava as mulheres da
casa, roubava, matava e dançava até o dia amanhecer.” (2008, p. 34-35), nessa fala observa-
se a concepção estática do passado sertanejo, tida apenas na memória.
Quanto mais a vida social se torna medida pelo mercado global de estilos, lugares e imagens,
pelas viagens internacionais, pelas imagens da mídia e pelos sistemas de comunicação
globalmente interligados, mais as identidades se tornam desvinculadas – desalojadas – de
tempos, lugares, histórias e tradições específicos e parecem “flutuar livremente”. (1998, p.75)
O passado tradicional possuía o tema dos avôs patriarcais, “generosos, brandos, de muita
força e poder” (ALBUQUERQUE JÚNIOR, 2001, p.116). O romance é voltado para a doença
do avô, ele é o motivo pelo qual Adonias, Davi e Ismael retornam a fazenda. Raimundo
Caetano representa o passado no presente, “[...] era o último da sua espécie.” (BRITO, 2008,
p.59). Ele simboliza a degradação do espaço arcaico, que está morrendo. A decadência do avô
patriarca, a queda de seu poder sobre a fazenda, corresponde com a degeneração da fazenda:
“A Galileia reflete a doença do avô. A mesma infecção que destrói sua carne parece arruinar a
terra.” (2008, p.111).
2.1 GLOBALIZAÇÃO: COMBINAÇÕES LABIRÍNTICAS DE IDENTIDADE.
399
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Os comportamentos dos personagens são regidos pela desestabilização de suas identidades,
como se observa nessa fala de Adonias: “Quem me garante que os pensamentos cessarão de
remoer dentro de mim?” (BRITO, 2008, p.86). Eles estão inseridos na concepção de “sujeitos
pós-modernos” de Stuart Hall, resultados de processos modernos de globalização. O
sentimento de estrangeirismo é recorrente, principalmente, na fala do personagem Adonias:
“Vago numa terra de ninguém, um espaço mal definido entre campo e cidade. Possuo
referências do sertão, mas não sobreviveria muito tempo por aqui. Criei-me na cidade, mas
também não aprendi nem a ginga nem o sotaque urbanos. Aqui ou lá me sinto estrangeiro”.
(2008, p.160)
Salomão afirma que a família Rego Castro é um povo inacabado, em constante mobilidade,
“[...] adaptando-se aos lugares distantes, às culturas exóticas. [...] pertencemos a todos os
recantos e a nenhum.” (2008, p.25). Adonias nega-se frequentemente, ele encontra-se
sempre em desacordo consigo e com o mundo, o narrador sente “fascínio e repulsa por esse
mundo sertanejo”, a ambiguidade está enraizada nas ações dos personagens, diferentemente
dos personagens típicos presentes no romance de trinta: “tipos fixos que mesmo diante de
todos os conflitos internos e dos dissabores externos que enfrentam ao longo da trama, nunca
chegam a se negar a si mesmo, eles tem garantia da continuidade de “um modo de ser”, de
“um modo de pensar”, de “um modo de agir” regional. (CHAMIE, 1976 apud
ALBUQUERQUE JÚNIOR, 2001, p.110)
Não há uma ordem cronológica para os acontecimentos, a aparição dos fatos que se passam
no romance, o que reforça a idéia da contradição interior dos personagens, segundo Yves
Reuter “Os jogos com a ordem podem também ‘imitar’ as atribulações de um percurso
psíquico” (1995, p. 93). Na construção do romance, várias lacunas são existente, tal como
segredos, traições, assassinatos etc. São dadas informações necessárias para se “compreender
tudo”, um pouco mais tarde, num flashe-back explicativo. (1995, p.92).
As várias viagens dos personagens consistem numa busca incansável por um lugar onde
possam se encaixar, se encontrar. Esses lugares, como diz Yves Reuter, simbolizam “[...] tal
status ou tal desejo” (1995, p. 61). Dessa forma, as diásporas realizadas são movidas por uma
necessidade existencial em meio ao transito cultural existente que está cada vez mais
“desfragmentando” as identidades dos indivíduos: “Em condições diaspóricas, as pessoas
geralmente são obrigadas a adotar posições de identificação deslocadas, múltiplas e
hifenizadas.” (HALL, 2003, p.76). O conflito de identidade acompanha Adonias na volta de
Inhamuns para o Recife:
À medida que me afasto desse Sertão dos Inhamuns sem nunca virar-me, igualzinho fez Ló
quando fugia de Sodoma, ele me transmite um apelo. Tapo os ouvidos com cera de carnaúba
e fico surdo aos seus chamados [...] Não quero o Recife. Ao lado do avô e dos parentes só
pensava em voltar para casa. Agora prefiro um espaço neutro, um caminho que me leve a
lugar nenhum. (BRITO, 2008, p. 225-228)
Durante a volta, perdido numa cidadezinha, em meio a Festa de São Gonçalo: uma procissão
de motos onde dançarinos canta e bebe. Adonias embriaga-se, roubam seu celular. Perde a
400
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
comunicação com o mundo. Num instante ele celebra, segura o santo em meio à dança e a
embriaguez, alegria que de repente cessa: “Sem a chance de partir tudo parece sombrio e feio;
o coração se tranca, a boca amarga. [...] Até bem pouco tempo, o mundo em volta de mim era
compreensível e amável. Agora, seu significado me foge por completo. (2008, p.236).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
ALBUQUERQUE JR, Durval Muniz de. A invenção do Nordeste e outras artes. São Paulo: Cortez, 2001.
BHABHA, Homi K. O local da cultura. UFMG, 1998.
BRITO, Ronaldo Correia de. Galiléia. Rio de janeiro: Alfaguara, 2008.
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 1999.
__________. Da diáspora: identidades e mediações culturais. Belo Horizonte: UFMG, 2003.
REUTER, Yves. Introdução à análise do Romance. São Paulo: Martins Fontes, 1995.
401
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A CONSTRUÇÃO IMAGÉTICO-DISCURSIVA DO SERTÃO NORDESTINO E A
SUA PERMANÊNCIA, OU NÃO, NA CONTEMPORANEIDADE
ABSTRACT: In this paper, we discuss the imagetical and discursive construction of the
Northeast and its Hinterland, for, in this context, we seek to view the permanence, or not, of
such Hinterland nowadays. Therefore, we use studies of Laraia (2006), about culture, and
particularly of the Albuquerque Junior (2001), about the speeches designed to identify what
would be the Northeast and its Hinterland. This author makes us travel the famous Drough
Speech of the nineteenth century, naturalists discourses purposes of this same century, the
attempts to understanding and lettering made by modernists of São Paulo, as well as those
made by Gilberto Freyre and Ariano Suassuna, understanding the latter two as the greatest
exponents of the stabilization of the northeastern and hinterlands identity. Finally, based on
studies of postmodern identity made by Hall (2006) and on the work done by Albuquerque
Junior (2013) about the myth of purity about popular culture of the northeastern hinterlands,
we seek to understand if the Hinterland which was built in the late nineteenth and twentieth
century is still alive.
152Graduanda do 7º período do bacharelado em Letras com ênfase em estudos literários, pela Universidade Federal de
Pernambuco. Bolsista de Iniciação Científica pela FACEPE. Residente na cidade de Recife-PE. E-mail:
[email protected].
153 Entendendo por identidade os particularismos grupais que nos diferenciam de outros povos de outros lugares.
402
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
homem vê o mundo através de sua cultura tem como consequência a propensão em
considerar o seu modo de vida como o mais correto e o mais natural” (LARAIA, 2006:72). Foi
a partir de erros assim – não analisando aqui se conscientemente ou não – que o Nordeste foi
construído, ou melhor, inventado, nos termos de Albuquerque Junior (2001), tanto por
interesses particularistas sulistas 154 quanto por interesses nortistas².
De início, já criticamos o etnocentrista, concordando com Laraia (2006) na afirmação do
caráter dinâmico das culturas de uma forma geral. Sendo assim, não há como definir de
forma simplista nem rápida o que seja tal ou qual cultura, o que a representa, o que a
delimita, pois as paredes internas e fronteiriças estão sempre mudando de lugar, sendo
derrubadas ou expandidas. Percebemos, então, que tal posturatende a ser simplista e
generalista com as demais culturas, bem como extremamente particularista em relação às
suas, nos termos de Rouanet (1993) ao abordar os comportamentos universalistas e
particularistas de cada cultura. Nessa forma de agir, as culturas utilizam seus binóculos para
enxergar e criticar a outras diferentes de si, sem entender que “a coerência de um hábito
cultural somente pode ser analisada a partir do sistema a que pertence”, pois “todo sistema
cultural tem a sua própria lógica e não passa de um ato primário de etnocentrismo tentar
transferir a lógica de um sistema para outro” (LARAIA, 2006:87).
Entendamos, no entanto, que essa miopia foi fruto de tentativas de se delinear – ou criar –
identidades, não só regionais, mas nacionais; uma busca iniciada desde fins do século XIX,
com os discursos naturalistas de teóricos como Silvio Romero, Nina Rodrigues, Graça
Aranha, etc, que fazem uma descrição pormenorizada dos diferentes meios e tipos regionais,
estes condicionados aos meios. Esse pensamento só passa a mudar de figura com a
intervenção dos modernistas do Sul e do movimento Regionalista iniciado por Gilberto
Freyre.
Assim,
o Brasil era apenas uma coleção de paisagens sem síntese ou estrutura imagético-
discursiva que dessem unidade. O modernismo vai tomar os elementos regionais como
signos a serem arquivados para poder posteriormente rearrumá-los numa nova imagem,
em um novo texto para o país. Uma centralização de sentidos. (ALBUQUERQUE JUNIOR,
2001:56).
Porém, os modernistas acabam por serem simplistas com essa postura de unificação da
cultura brasileira, determinando, como dados regionais, características vistas somente em
alguns lugares do Nordeste e colocando de forma atemporal e não localizada signos que, em
realidade, são ambientados num certo tempo e espaço. Sem contexto bem delineado, tudo
pode ser qualquer coisa. E foi o que aconteceu com o Nordeste, se tornou vários, com várias
faces e facetas, sem, na verdade, significar nada, uma vez que tudo estava poluído de
verdades isoladas e deslocadas.
Antes dos modernistas, a situação não era tão melhor, como dissemos. Os intelectuais
regionalistas-naturalistas, por sua vez, viam o regional como “um desfilar de elementos
culturais raros, pinçados como relíquias em via de extinção do progresso [...] elemento do
folclore e da cultura popular, notadamente rural, abordando-os com indisfarçável postura de
superioridade, com um olhar distante” (ALBUQUERQUE JUNIOR, 2001:52). O Nordeste,
sob esta ótica, assemelhava-se a um catálogo cultural, e, o Brasil a um somatório de
catálogos, facilmente acessáveis por meio de uma literatura que pretendia “revelar” – ou
prescrever – a Nação, tão ricamente construída por suas regiões.
Essa construção naturalista do Nordeste, em fins do século XIX, era tanto influenciada pelo
discurso da Seca quanto o influenciava. Esse discurso foi instituído a partir de 1877, o qual,
segundo Albuquerque Junior (2001), foi um ano marcante no registro de secas da região,
uma vez que significou a dependência da ajuda sulista, bem como a assumida derrota frente
às regiões sulistas, o que fez o Nordeste admitir – ou permitir –, com todo o discurso da seca,
grande inferioridade em relação ao Sul. Esse discurso foi acionado por interesses políticos
tanto nortistas quanto sulistas: daqueles, em conseguir verbas, rápida e facilmente,
utilizando-se da miséria deixada pelas secas; e destes, por estarem em posição de
controlar/manobrar os estados nortistas.
154 Usamos esses termos por simplificação, sabendo que eles são, por demais, generalistas.
403
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A partir desse discurso político da Seca, certas características são levantadas como
tipicamente nordestinas, sendo de tal forma fortalecidas que, até hoje, os próprios
nordestinos têm tal visão. Segundo nos mostra Albuquerque Junior (2001), são dados
regionais buscados na história da região e pensados como atemporais e imemoriais, tentando
mostrar que a identidade regional sempre esteve lá. Aqui, não são mais os fatos naturais que
definem a região, mas os históricos, que levam a idealizar as tradições do povo, as quais, para
serem resgatadas, são procuradas via memória coletiva. Esse regionalismo “ativista”, iniciado
com o discurso da Seca, utilizou-se do regionalismo freyreano para ganhar vitalidade e poder
de ação, o qual consistia, primordialmente, em valorizar as tradições do povo nordestino,
buscadas na memória coletiva.
Configura-se, então, como “um discurso que opera por analogias” (ibidem:76), aliando-se a
elas certas modernizações necessárias, as quais nunca retirariam a essência das tradições,
visto que existiriam em função delas. É por tudo isso que Albuquerque Junior (op cit) afirma
ser o Nordeste “um lugar de lirismo e saudade. Retrato fantasioso de um lugar que não existe
mais, uma fábula espacial” (ibidem:77) criada a partir da crise identitária de uma região
desacreditada de si mesma e frente aos outros estados brasileiros, visto não conseguir vencer
seus empecilhos naturais – os quais não precisavam ser encarados como determinantes.
Dos dados regionais impressos como verdade absoluta, são três os mais expressivos: o
cangaço (ou, para alguns particularistas, banditismo), o messianismo (ou beatismo) e o
coronelismo. Isso quer dizer que o imaginário acionado será o do poder nas mãos dos que
possuem terras, que conseguem, pelo direito que lhe instituem suas posses, dominar e
controlar a vida dos seus familiares e dos seus trabalhadores (escravos); será o do beato que,
com grande dose de fanatismo, levanta seguidores incontestes sobre seus atos, seus mandos e
desmandos; e o do herói bandido que luta contra a lei a favor dos pobres e oprimidos. É tudo
muito fantasioso e extremista, não se encontra um equilíbrio de realidade, mas uma distorção
de fitos da vida real. Assim, seja pelos modernistas sulistas, seja pelos regionalistas-
naturalistas, seja pelos próprios regionalistas nortistas – mesmo que, por estes, sem intenção
direta –, o Nordeste tenderá a ser visto como uma área inferior do País, condenado pelas
questões naturais a uma eterna deficiência e dependência – características as quais os
próprios governos nordestinos não tiveram interesse em consertar ou desmentir, uma vez
que a miséria da região os rendia-lhes bons ganhos e privilégios estatais.
A reelaboração dessa visão deplorável de Nordeste é ajudada pelo discurso nacionalista
modernista, que valoriza as idiossincrasias regionais, por constituírem o Brasil. No entanto,
como vimos, ao valorizar os regionais em prol do nacional, o regional não será o foco e o
Nordeste não será visto com apuro satisfatório para alguns intelectuais e pesquisadores,
como Gilberto Freyre.
Com Freyre, o discurso vai ser menos naturalista e mais cultural, segundo nos explica
Andrade (apud FREYRE, 2004), já que pensa a ação do homem como determinante no
processo de formação, transformação e definição de um regional. Levou em consideração a
existência de classes, de dominadores e de dominados, de senhores de engenhos e de
escravos, retratando a sociedade açucareira para pensar seu Nordeste – sua obra e a região –,
admitindo, contudo, saber da existência de vários nordestes. Ao salientar essa sociedade, o
sociólogo salientava a importância de certos aspectos culturais, marcando-os muito
especificamente, criando, assim, identidades regionais e locais. Essa identidade foi pensada a
partir de Pernambuco, cujo ponto central foi atribuído a Recife, de onde partiriam as
características regionais, que se disseminaram e se alojaram em lugares específicos,
mudando a si e a outros dados culturais. Escolhe este estado não aleatoriamente, para Freyre
(2004:194): “dentro da civilização do açúcar – que por algum tempo constituiu quase toda a
civilização brasileira – o pernambucano foi a especialização mais intensa das qualidades e
dos defeitos dessa organização monocultora, monossexual, e principalmente aristocrática e
escravocrata”.
Segundo Andrade (apud FREYRE, 2004), Gilberto Freyre tenta projetar as raízes nordestinas
a partir de manifestações culturais populares da região, das raízes indígenas, das africanas e
das ibéricas de tradição cristã, dentro de um contramovimento ao simplismo dos
modernistas, que não enxergavam o nordeste com apuro e clareza suficientes, segundo o
antropólogo. Ele recorre ao popular como um depositário das reais raízes nordestinas,
404
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
capazes de fornecer a identidade nordestina por excelência, pois via a cultura popular como a
que menos tinha se maculado pelas perigosas – para ele – influências estrangeiras e
modernizantes. (FREYRE, 2004).
Esse movimento procurava aliar as modificações modernas e as tradições regionais,
aceitando aquelas de forma muito moderada, para não obscurecer ou retirar a essência das
tradições. Essas, por sua vez, remetiam ao passado patriarcal dos engenhos de açúcar da
região, às relações sociais ali criadas, aos costumes e manifestações culturais ali gestadas. Ao
ler com olhar crítico seu Nordeste (2004), observamos que, defendendo essa sociedade,
Gilberto a retratou de forma muito panfletária, imiscuindo nela, então, os equívocos, como o
abuso do poder e os excessos da escravidão – se é que se pode falar em excesso na escravidão,
a qual já é em si um absurdo. O senhor de engenho, por exemplo, era visto como um uma
espécie de pai dos escravos, um verdadeiro cuidador destes, romantizando – muitas vezes
indigerivelmente – essa relação, bem como todas as outras (a relação sexual senhor-escrava,
o maternalismo sinhás-escravos, etc.), nesse cenário imortalizado do engenho de açúcar.
Decerto, Freyre vê pontos negativos nessa sociedade: “organização cheia de contrastes.
Inimiga do indígena. Opressora do negro [...]. Opressora do menino e da mulher [...]”
(2004:194). Mas, não se focou – ou não quis se focar – nesses pontos, enaltecendo que,
mesmo com toda a “patologia” dessa sociedade, destacadamente o seu extrato
pernambucano, foi ela a responsável por enriquecer de elementos mais característicos a
cultura brasileira, tanto politicamente quanto esteticamente e intelectualmente. Nesse ponto,
Gilberto faz uma comparação – um tanto esdrúxula – entre a sociedade açucareira
nordestina e a ateniense dos tempos clássicos, que mesmo com toda “morbidez”, foi mais
criadora de valores que civilizações mais “saudáveis”.
A esta sociedade, como pudemos entender na sua obra (2004), o sociólogo opunha à
sociedade usineira, fruto das transformações modernas. As usinas, para ele, ao intensificar a
monocultura, a destruição ambiental e afrouxar as relações senhor-trabalhador,
desumanizaram a cultura nordestina e as relações patriarcais – as quais, como discutimos
acima, não eram exatamente humanas –, constituindo verdadeira ameaça de contaminação e
dizimação dos reais dados regionais. Segundo ele, com as usinas, houve uma diminuição não
só das fontes naturais e da “dignidade e beleza da paisagem”, mas também a diminuição da
saúde, da “sensibilidade, ou da emoção da gente do Nordeste, que hoje quando se manifesta é
quase sempre em atitudes de crispação, de ressentimento e de revolta” (FREYRE, 2004:178).
Historicamente, é mais recente a sociedade usineira que a dos engenhos de açúcar, deixando
inúmeros albuquerques, cavalcantis, lins, rego barros, etc, ainda nesta geração. Somos filhos
das usinas, nós nordestinos. Somos, então, sem saúde, insensíveis e incapazes de emoção,
crispados, revoltados e ressentidos? Bem, é algo que só a identidade individual de cada um, e
não aquela regional, é que pode filtrar e determinar.
Paremos, agora, nesta parte, para tentar esclarecer um conflito ideológico-político. Embora o
Modernismo tenha tido posturas que acabaram por não dar um enfoque satisfatório ao
Nordeste, ele tinha algo de positivo em relação a esse Regionalismo Tradicionalista, ele foi
mais engajado em pesquisar raízes verdadeiras, não a partir de um ponto de vista só, mas
tentou estudar a região como um todo. O Modernismo tentou descobrir as tradições, não
embalsamá-las, como um artefato museológico que não muda nem se dinamiza, tal como
toda cultura, conforme Laraia (2006). Esse processo é importante de ser ressaltado, mesmo
que o Modernismo tenha caído nas armadilhas da visão particularista sulista.
Dentro desse discurso modernista, havia vozes que pregavam o além da descoberta das raízes
do nosso Povo Brasileiro e, ainda, com uma voz mais alta e violenta, como Joaquim Inojosa,
que criticava frontalmente o Regionalismo Tradicionalista de Freyre, dizendo da
“necessidade de se criar um Brasil preocupado com o contemporâneo e não se deter na
contemplação das glórias passadas” (apud ALBUQUERUQE JUNIOR, 2001:92).
A parte esses combates, no Regionalismo Tradicionalista – oficializado em 1926 no
Congresso Regionalista do Recife e consagrado, em 1937, com a publicação de sua obra
Nordeste – muito beberá a literatura regionalista de 30, a qual contribuirá para fixar esse
nordeste freyreano no imaginário nordestino e no sulista, se configurando, nos termos de
Albuquerque Junior (op cit:123), como “romances formadores”. Formadores, segundo
pudemos perceber, de opinião, imaginário e identidade.
405
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Segundo Dacanal (1986), esses romances terão, geralmente, uma narrativa verossímil, linear,
de foco narrativo em terceira pessoa, se proporão a ter uma linguagem dentro do código culto
urbano – e nisso vemos refletido “o fracionamento sócio-econômico cultural do país”, nas
palavras do referido autor. Ainda segundo ele, esses romances fixam narrativas
perfeitamente identificáveis historicamente, a cujas estruturas os personagens estão
submetidos ou lutando por mudá-las; essas estruturas históricas são, em maioria, agrárias ou
trazem o meio rural de alguma forma. Seus romancistas, por fim, têm um objetivo crítico,
mais ou menos panfletário, em relação à realidade política e socioeconômica – e isso porque
buscam o retrato identitário de suas regiões, sem, contudo, fechar os olhos – pelo menos de
todo – para a contemporaneidade desordenada em que se contextualiza essa busca.
Dissemos “pelo menos de todo”, porque, por estarem em busca de uma identidade e de
fotografias de suas regiões, esses autores serão, conforme Dacanal (1986), em geral
otimistas, querendo fazer crer – e, quase sempre, realmente crendo – que o mundo, embora
esteja desordenado, é compreensível e pode ser reordenado e até melhorado, uma vez que se
valorizem as tradições populares e os valores tradicionais, segundo nos faz ver Albuquerque
Junior (2001:123). Esse autor nos mostra, então, que os regionalistas de 30 tentaram
defender a permanência dos “territórios-refúgio”, dos “territórios sagrados”.
Anos depois, por volta da década de 40, é a vez de Ariano Suassuna se destacar entre os
projetos de romancistas que tentam construir um nordeste, uma vez que ele próprio cria e
encabeça um movimento, que foi idealizado e guiado inteiramente por sua supervisão, de tal
forma que o Nordeste de Ariano conseguiu prosperar na memória coletiva nacional muito
mais que os outros.
Seu Nordeste popular, medievalizado [...] entra nos projetos de invenção, reinvenção e
atualização da série de temas, conceitos, imagens, enunciados e estratégias que instituem o
Nordeste como espaço oposto ao moderno, ao burguês, ao urbano, ao industrial. Nordeste
sem espaço público, sem dessacralização da natureza, sem separação radical entre homens
e coisas. (ibidem:172).
Um Nordeste que, aliás, não vê as distinções de classes, entendendo como designíos divinos
níveis sociais e injustiças que os seres humanos não podiam compreender. É o Movimento
Armorial, que nasce da observação de uma série de tendências artísticas e do apuro e
ajustamento dessas tendências, por Ariano, a certa lógica idealizada por ele.
Essa arte ligará a essência dos folhetos do Romanceiro Popular do Nordeste (literatura de
cordel), com a música popular feita com instrumentos regionais (viola, rabeca, pífano), com a
xilogravura, com os espetáculos populares regionais, de tradição fortemente ibérica e, ainda
mais, com o que ele chama de a “Heráldica popular brasileira”. Com essas influências, o
movimento Armorial pretendia “realizar uma Arte brasileira erudita a partir das raízes
populares da nossa Cultura” (SUASSUNA, 1977:40).
Ariano pretendia não imprimir retratos do nordeste, como os romancistas de 30, nem
tampouco inventar um imaginário mágico, criando algo não percebível, em certa medida, em
realidade. Ele queria, sim, trabalhar com o espírito mágico e a essência mitológica que havia,
de fato, nas sociedades nordestinas, especificamente, no Sertão. E nisso contrapõe o
Nordeste de Freyre, para o qual, como vimos, a regionalidade é vista a partir dos valores
tradicionais da “civilização do couro” e não da “civilização do açúcar”, nos termos de Ariano
(apud ALBQUERQUE JUNIOR, 2001:168), visto que, para ele, estaria no Sertão a identidade
também brasileira, as raízes da personalidade brasileiras.
A partir desse ponto localizado no Brasil, d’onde se extrairia a Verdade regional e nacional, o
Armorialismo, segundo Albuquerque Junior (op cit), buscará também a expressão da Beleza,
a qual teria sido negligenciada, segundo Ariano, pela produção sociológica e literária
anterior, preocupada com as belezas da sociedade açucareira e os defeitos culturais e sociais,
advindos de problemas naturais – lembremos aqui o discurso da Seca – do Sertão, no
objetivo de expor os problemas do capitalismo para a região. Ariano descobrirá – ou criará –
um Sertão épico, cujo povo era guerreiro e lutava em nome da honra e da vingança, tinha
heróis dignos como os cavaleiros medievais, donzelas idôneas e belas quanto a dama de bon
parecer do trovadorismo ibérico, enigmas e maravilhas que precisavam ser decifradas, a fim
de se encontrar a raiz nordestina e brasileira por excelência.
Ariano rejeitou todo tipo de estrangeirismo e modernismo para seu movimento, mas
podemos identificá-lo como modernista na medida em que busca, pelo primitivismo da sua
406
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
região, uma identidade regional e, a partir desta, uma identidade brasileira, que partiria do
recorte do essencial das regiões. E, mesmo que recorra aos primitivismos ibéricos – ou seja,
cultura não brasileira, o que o modernismo não quis abraçar –, ainda o vemos como
modernista, porque busca, nesses, raízes para o popular regional, vendo neles a origem do
Sertão e, por consequência – para ele –, do Nordeste.
Vale dizer que, mesmo o modernismo, buscou em outras culturas raízes ou formas de
expressão de uma identidade que eles pretendiam ser genuinamente brasileira, um desejo de
ambos, de Suassuna e do Modernismo, pelo próprio apelo nacional em busca de raízes e faces
que o significassem. Muitos movimentos, como estamos vendo neste estudo, tentaram
fornecer essas faces, mesmo que de formas particularistas e até muito erradas – hoje
entende-se que são erradas –, como os naturalistas.
Continuando a discussão armorial, é importante ressaltar que, no movimento de Ariano, todo
lugar do mundo, toda cultura, tinha algo que lhe podia emprestar, influenciar, inspirar, já
que “o Sertão é o Mundo” (SUASSUNA, 1977:46). Isso significava que o movimento via
unidade cultural em toda a América Latina e parentesco cultural com esta e outras culturas,
cujos imaginários, igualmente maravilhosos de suas culturas populares, estavam impressos
em nosso sangue.
Ariano firmou pactos com a ilusão e a ficção ao criticar Bertolt Brecht em sua fórmula de
distanciamento ator-personagem, ator-público, personagem-público, fragmentando a cena e
chamando o público para interferir na cena ideologicamente, pedindo, assim, uma plateia
ativa e pensante, não passiva, a qual se deleita e recebe as emoções trazidas pelo teatro.
Ariano, ao contrário, defende “a ilusão e o encantamento do Teatro”, ele se afirma
herdeiro é do Tetro antigo, assim como, principalmente, dos espetáculos nordestinos [...]
não me interessam nem o Drama psicológico e burguês, nem o Drama politizado do Teatro
sectário. Sempre preferi a Tragédia e a Comédia, formas mais preferidas pelo Povo, mais
próximas do espírito do nosso Romanceiro [...] uma dramaturgia de caráter nordestino e
ligada à Literatura de Cordel e aos espetáculos populares nordestinos [...] trabalho de
recriação e de amor ao espetáculo popular nordestino. Baseados em meus textos, deveriam
partir deles um espetáculo mágico, festivo, com músicas, danças, máscaras, bichos e
demônios. (SUASSUNA, 1977:48).
Por tudo isso, percebe-se que Ariano, por sua vez, também se empenhou em criar um
Nordeste, que tinha, sim, características da real região nordestina, mas tinha também muito
de discurso de invenção, orientado para determinados interesses e influências que ele definiu
como importantes e legítimas, tal como os outros modelos de Nordeste que vimos até aqui.
Até aqui, pudemos perceber, então, que o Nordeste e a sua identidade regional tem muito de
discursos de invenção e de interesses a cada momento orientados para uma lógica um tanto
individual e não regional:
Quando da emergência da ideia de região Nordeste, nos anos 10 do século passado, dois
aspectos foram considerados elementos privilegiados de singularização deste espaço, de
definição de sua particularidade, de conformação de sua identidade: a sua natureza,
marcada pela ocorrência das secas periódicas e pela rusticidade da formação da caatinga,
pela paisagem sertaneja, árida e rústica; e a sua cultura, diferenciada em relação a outras
áreas do país, cultura que teria preservado sua autenticidade, que representaria as próprias
raízes da cultura brasileira, por não ter sofrido os influxos deletérios da imigração
estrangeira. [...] Cultura que teria sua melhor expressão nas matérias e formas de
expressão populares, nas manifestações culturais das populações rurais ou sertanejas, nos
rituais, lendas, contos, poesias, danças, manifestações religiosas, festas, tradições,
superstições, na literatura oral, presentes um passado que estava ficando para trás, na
sociedade patriarcal que vinha desaparecendo sob o impacto da modernidade, da
sociedade urbana, do mundo da técnica e do dinheiro, da sociedade burguesa e da
economia capitalista” (ALBUQUERQUE JUNIOR, 2013:39)
Vimos até aqui um trajeto da formação imagético-discursiva do Nordeste e seu Sertão não só
enquanto região mas também enquanto identidade. Essa construção, no entanto, se deu em
fins do século XIX até meados do século XX. A partir de meados do século passado, então, até
hoje, o mundo mudou muito como um todo, o que desencadeou mudanças, passo a passo, de
maiores proporções a menores, continentais a regionais. Para buscar entender como se
encontra a questão a visão sobre o Sertão nordestino contemporaneamente e as identidades
que ele desencadeia é relevante compreender a questão da identidade pós-moderna como um
todo, o que ocorre nos ânimos atuais a esse campo do ser.
Atualmente, na teoria social, a questão da identidade é assunto constante. O argumento para
tanto é de que houve um declínio das velhas identidades há tanto tempo estáveis, por abalo
das antigas referências ideológicas e estruturais da sociedade, desestabilizando-a. Com tal
realidade fragmentada, o indivíduo moderno viu-se também fragmentado, sem a ancoragem
identitária que sempre costumou ter, o que resultou na construção natural de novas
identidades. No entanto, esse processo não tem sido tranquilo, por isso fala-se na pós-
modernidade de “crise de identidade”, nas palavras de Hall (2006).
A mudança estrutural do século XX vem fragmentando paisagens culturais antes bem
estabelecidas: a noção de classe, gênero, sexualidade, etnia, raça, nacionalidade, etc. Dessa
forma, as identidades pessoais são embaralhadas e constantemente mudadas, bem como a
ideia de sujeitos integrados, o que acarreta, assim, a perda do sentido de si estável. Hall
(2006) chama a isso de “deslocamento ou descentralização do sujeito”, é o que caracterizaria,
em palavras curtas, a crise de identidade.
Para entender melhor a noção de identidade, o autor nos leva a observar três conceitos de
identidade: o sujeito do iluminismo, o sujeito sociológico e o sujeito pós-moderno. O
primeiro seria aquele indivíduo centrado, unificado, pertencente a um tempo e uma
sociedade fundamentada na razão, na consciência do agir e do ser, e, por isso, possuiria um
núcleo interior bem coordenado pela lucidez do seu tempo, uma identidade pessoal. Trata-se
de uma concepção individualista de sujeito.
A segunda concepção é de um indivíduo consciente do mundo social, seu núcleo interior não
é auto-suficente como o anterior, ele é formado em relação com o outro, mediando os valores
e símbolos (a cultura). Essa é uma concepção interativa de sujeito, já que a identidade é
formada na interação do indivíduo e da sociedade, num diálogo contínuo, em que a
identidade é costurada à estrutura social. No entanto, ao longo do tempo, essa estrutura foi e
está mudando, num processo contínuo de fragmentação de identidades, as quais foram se
tornando várias e contraditórias.
Foi esse processo que gestou o sujeito pós-moderno, a terceira concepção de identidade que
nos apresenta Stuart Hall nessa obra. Nela, o indivíduo não tem uma identidade fixa, sua
identidade é a própria “celebração móvel”, nas palavras do autor, a qual está sendo
constantemente transformada e formada, já que na atualidade são várias as representações
(ou sistemas) culturais que nos rodeiam. Assim, o sujeito pós-moderno é aquele que tem uma
identidade diferente para cada momento, tem várias identidades possíveis.
Essas mudanças estruturais e, consequentemente, ideológicas e identitárias, foram
desencadeadas por um processo de um nome só mas com inúmeras e inesgotáveis
consequências: a Globalização. Este é o caráter de mudança na modernidade tardia, o
produto da modernidade e o definidor da mesma. Em contraposição com essa mudança
408
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
constante, rápida e permanente das sociedades modernas, numa reestruturação contínua,
uma perpétua “descontinuidade”, na palavra de David Harvey (1990 apud Hall, 2006), há a
veneração do passado, a valorização dos símbolos e a perpetuação da experiência de gerações
(tradição) das sociedades tradicionais.
Hall (op cit), que vem nos guiando até aqui, nos faz refletir mais acuradamente sobre o que
está realmente em jogo na questão das identidades. Para responder a tal pergunta é
importante perceber que as paisagens políticas do mundo moderno são fraturadas, erodindo
assim a identidade mestra da classe política vigente, o que ocasiona identidades deslocantes e
rivais, pertencentes a novas bases políticas definidas pelos novos movimentos sociais, como o
feminismo, a luta negra, os movimentos antinucleares, etc. Mudando a forma como o sujeito
é representado, mudam-se as identidades, pelo que a identificação pode ou não ser ganhada
rapidamente. Por essa intensa mudança, percebemos que o que está em jogo na questão das
identidades é um processo político: a política é definida hoje em dia através da diferença (de
classes representacionais) e não mais política da identidade.
No segundo capítulo de sua obra, Hall reforça o nascimento do sujeito moderno a partir das
três concepções do sujeito humano, essa figura discursiva sempre em mutação.
Historicamente, foi o Iluminismo (resultado da Reforma Protestante, do Humanismo
renascentista e das revoluções científicas) que propiciou o nascimento do indivíduo soberano
da natureza, que não dependia mais do fluxo natural das coisas para se guiar e interpretar a
vida, ele passou a duvidar das respostas metafísicas para tudo, passando a dominar a
natureza materialmente. O individualismo surgia com força e com ele o sujeito cartesiano se
impunha na sociedade, o qual se mostrava racional e autônomo. Esse é considerado o motor
histórico da modernidade em movimento, a partir da lógica de que, se formas tão bem
estabelecidas de pensamento ruíram-se, fazendo, assim, ruir a estabilidade e centralidade do
sujeito, é porque este nunca foi estável e unificado como se pensava.
Dessa concepção nasce o sujeito moderno, em um mundo onde se afirmava, paralela a essas
mudanças ideológicas, uma grande mudança estrutural: o capitalismo ocidental. Assim,
sociedades modernas complexas nasciam, nas quais o cidadão individual tornou-se
engendrado nas maquinarias administrativas e burocráticas do mundo moderno,
consolidava-se o sujeito social (a segunda concepção de identidade colocada por Hall no
capítulo anterior).
Entretanto, na 1ª metade do século XX, houve um choque entre o individualismo do sujeito
do Iluminismo e a teoria da socialização do sujeito sociológico. Surgia o Modernismo, um
movimento estético e cultural que mostrava um indivíduo exilado em si, em meio à multidão
da metrópole, paradoxalmente anônima e impessoal, um sujeito flanêur, que observava e não
se achava pertencente ao que via. Ele queira instaurar uma nova forma de ver e viver no
mundo. Tal postura influenciará o sujeito deslocado da modernidade tardia, o qual nascia
oficialmente na 2ª metade do século XX, caracterizando o descentramento final do sujeito
cartesiano e a morte do sujeito social.
A primeira descentração importante se deu a partir das tradições do pensamento marxista,
pertencente ao século XIX. Marx foi reinterpretado no século XX a partir da afirmação de que
o homem não tem agência individual, já que faz história somente a partir da sua cultura e
contextos histórico-sociais. O segundo dos grandes descentramentos do século XX se dá com
a descoberta do inconsciente por Freud e sua leitura por Lacan, o qual afirmaria não haver
um sujeito racional provido de uma identidade fixa e unificada (como defendia Descartes
com seu sujeito cartesiano). Ele explicava que o eu inteiro é aprendido gradualmente e com
certa dificuldade, a partir do outro e das negociações psíquicas inconscientes, e não a partir
de si próprio. Assim, o eu seria inacabado e dividido, mas vivenciaria sua individualidade
como sendo unificada, já que nutre uma fantasia de si em relação com o outro, externo a si.
Desse ponto de vista, fala-se não em identidade, mas em identificação, uma identidade em
andamento, sendo construída a partir da falta de inteireza e pelas impressões dos outros
sobre nós.
Uma terceira descentração está associada aos trabalhos do linguista Saussure, o qual nos
afirmava que não somos autores dos significados que expressamos pela língua, já que ela é
um sistema social, que preexiste ao indivíduo. Os significados são, portanto, instáveis,
409
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
surgem de analogias feitas no mundo social a todo instante. Por esse ponto de vista, as
identidades surgem de relações de analogia com o outro, na diferenciação com o outro.
Observa-se que nós (indivíduos) estamos sempre buscando significados fechados, assim
como identidades cada vez mais fechadas, mas somos sempre surpreendidos pela diferença.
A quarta descentração principal referida por Hall (2006) ocorre a partir do trabalho do
filósofo e historiador Foucault, o qual destaca algo que chama de “poder disciplinar”, regimes
administrativos e políticos que, do século XIX ao início do XX, regulam e governam a espécie
humana, a população e os indivíduos. Paradoxalmente, tal controle social, existente somente
devido à noção de coletividade e organização das instituições sociais da modernidade tardia,
aumenta o isolamento.
O quinto e último descentramento se dá com o movimento feminista, o qual faz parte dos
“novos movimentos sociais” emergentes na década de 60, o período de grande marco da
modernidade tardia. O Feminismo faz parte da “política das identidades” – de que falamos
mais acima ao explicar que a identidade é definida por um jogo político -, isto é, ela se
enquadra na defesa de uma identidade única para seu grupo social, é a política da
diferenciação. Esse último descentramento foi o único que teve relação direta com o processo
de dissolução do sujeito cartesiano e sociológico e o estabelecimento do sujeito pós-moderno,
altamente plural e contraditório, como vimos, fragmentado e permanentemente em
construção.
Nessa sua obra, Hall (2006) nos leva a compreender que as culturas nacionais, as fronteiras
de Nação, são estabelecimentos imaginários no atual caráter de mudança que a Globalização
impõe. As identidades culturais, entre elas a identidade nacional, não são inatas, elas são
aprendidas e passam, com o tempo, a constituir o sujeito, inclusive aquele, fragmentado, da
modernidade tardia (pós anos 60 até fins do século XIX) e da pós-modernidade (século XX).
Essas identidades nascem no interior de um sistema de representação cheio de significados,
que acabam por criar, no caso, uma ideia de Nação, uma comunidade simbólica que inspira
no indivíduo a sensação de pertencimento e na qual há padrões de alfabetização, uma única
língua vernácula e uma cultura homogênea. Trata-se da criação de discursos culturais criados
a partir dos símbolos que compõem as diversas culturas ao redor do globo. Esses discursos
constroem sentidos e influenciam as ações individuais e a concepção que um indivíduo tem
de si mesmo, sua identidade.
Assim, nota-se que a identidade nacional é um conjunto de sentidos e símbolos presentes
numa cultura, a qual não é para sempre estável, mas consegue se mostrar numa
representação homogênea devido à memória coletiva, às histórias que passam de geração em
geração dentro de uma cultura e às imagens constituídas no imaginário coletivo de uma dada
comunidade. É desse ponto de vista que Benedict Anderson (1983) afirma que a identidade
nacional é uma “comunidade imaginada”, gerando diferenças de Nação para Nação.
Fortalecendo tal ideia, Hall (2006) observa que a identidade nacional é como uma narrativa,
perde suas origens reais ao longo do tempo com os mitos da comunidade e se efetiva nas
mentes, é, pois, imaginada e constantemente reconstruída.
O autor nos leva a compreender que a narrativa da cultura nacional é contada a partir de
cinco diferentes discursos. O primeiro é a narrativa contada pela mídia e pela cultura
popular, ela cria um foco de identificação representando as experiências partilhadas pela
comunidade, as vitórias, os desastres, as perdas, histórias comuns que dão sentido à ideia
unificada de Nação. A segunda narrativa é a da continuidade, a da tradição, o fenômeno da
intemporalidade. Desse ângulo, a identidade é algo que está “lá”, é exata natureza das coisas,
o natural fluir do tempo, numa indestrutível existência eterna, mesmo ao longo de mudanças
estruturais. A terceira narrativa é a da “invenção da tradição”, na voz de Hobsbawn e Ranger,
que se define por um conjunto de práticas e rituais que buscam incutir valores e normas de
comportamento numa comunidade por meio da repetição dos mesmos. A quarta narrativa da
cultura nacional é o mito fundacional, uma estória que conta a origem da Nação e explicita o
caráter nacional, num tempo não real, mas mítico, apresentando a partir da desordem de
estórias a comunidade. Esta forma de discurso nacional ajuda povos desprivilegiados a
entenderem seu sofrimento e aceitarem sua história. Por último, a quinta narrativa é a do
povo ou folk puro original, contando a história ancestral de um povo homogêneo que dera
410
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
origem ao povo da Nação, mas dificilmente é esse povo que exerce o poder, eles servem de
estória de localização de origem, mas não de autoridade, muitas vezes tendo sido já extinto.
Dessa forma, percebemos que o discurso nacional constitui a soma de estórias de glórias
passadas anacronicamente, inventadas ou não, com o impulso da modernidade. Isso dá a
uma Nação a autoridade de existência, por ter uma origem, e a autoridade de permanência,
por ainda se localizar nos tempos modernos. Contudo, Hall nos mostra que esses discursos
podem levar uma Nação à xenofobia, com a tese de que se deve expulsar os “outros” para se
preservar e, com isso, fortalecer a identidade, que podemos perceber ser forjada na maioria
das vezes
Aqui, Hall (2006) nos chama atenção para um interessante paradoxo do mundo moderno:
que vive imerso pela assimilação do universal - por conta da Globalização -, mas não deixa de
estabelecer seus nacionalismos, o que representa uma adesão ao particular. Assim, vemos um
universalismo através do particularismo e um particularismo através do universalismo, ou
seja, um impulso de intercâmbio (de pessoas, de informações, de culturas e serviços, etc),
fortemente constituído com os anos, dentro de fronteiras nacionais e com o selo nacional
muito bem firmado através de marcas, tributos, burocracias e posturas ideológicas.
Encaminhando-nos para o fim dessa contenda com Hall, desenvolvemos agora o pensamento
de que a identidade nacional, no entanto, não é nem um pouco homogênea quanto se pensa.
Vimos que a cultura nacional é um sistema de representação, ou seja, uma fonte de
significados que dão sentido à Nação e ao “ser” de uma Nação, isto é, identidade. Essa cultura
constitui-se de memórias coletivas comuns, do desejo de comunidade (que percebemos mais
como uma necessidade íntima de pertencimento, que não iremos discutir a partir desta obra),
e a vontade (ou necessidade também) de perpetuar a herança da comunidade, a tradição de
um povo. Essas três coisas somadas ao estado-nação político é o que se entende por
identidade nacional, a qual busca unificar a identidade de vários povos dentro de uma mesma
Nação, colocando a noção de família nacional.
Entretanto, essa aparente harmonia é produzida, como vimos, por um emaranhado de jogos
de poderes e pelo próprio povo numa necessidade íntima de pertencimento, mas não se
apresenta assim homogênea. Uma cultura nacional nunca foi simples e unificada como se
pretende, pois ela não tem um único ponto de identificação. Percebe-se que ela é uma
estrutura de poder convincente, não uma realidade ancestral bem organizada. Essa
maquinaria discursiva de poder age – e agiu ao longo do tempo – suprimindo forçosamente a
diferença, para exercer a hegemonia cultural e política, principalmente, de um povo/cultura
dominante dentro daquela Nação; há também o apagamento e destituição da divisão social
natural de toda Nação: os grupos étnicos, os gêneros e as classes; e mais localizadamente há o
eurocentrismo, numa força de dominação sobre os outros povos, que se propaga
imaculadamente.
Por essas tentativas de expulsão da diferença, constatamos que uma cultura nacional não é
unificada, ela é um dispositivo discursivo, que insiste em colocar a diferença como unidade,
numa identidade una, o que é aparente e forjado. Uma identidade nacional tem em uma só
etnia, que são as características culturais (língua, religião, tradições, costumes) partilhadas
por um povo, sua suposta origem e fundação. Mas isso é um mito no mundo moderno, pois
as nações modernas são híbridas, o resultado de várias etnias e, com isso, de várias culturas
diferentes. Portanto, é assim que a identidade se constitui, na verdade, da diferença. Na
identidade estão os discursos de diferença, os jogos de poder, as divisões e contradições
internas das várias culturas possíveis dentro dela.
3. O Sertão nordestino na contemporaneidade
411
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A identidade regional é uma versão menor da nacional. Esta, como discutimos na parte
anterior, é um sistema de representação, ou seja, uma fonte de significados que dão sentido à
Nação e àquele que a ela pertence. Essa cultura constitui-se de memórias coletivas comuns,
do desejo de comunidade e da vontade de perpetuar a herança da comunidade, a tradição de
um povo. Essas três instâncias somadas ao estado-nação político é o que se entende por
identidade nacional, sendo a regional o mesmo reduzidamente. A partir de Albuquerque
Junior (2001) pudemos perceber a formação dessa identidade regional no Nordeste: as
memórias coletivas que foram instituídas a partir da cultura popular, a noção de comunidade
criada também a partir dessa cultura, e as tradições criadas no ato de autoafirmação em
relação ao emaranhando de outras vozes e manifestações que se insurgem na cultura
nacional como um todo.
Atualmente, como aponta Hall (2006), encontrando-se o globo em estado permanente de
mudança, as sociedades estão sendo avaliadas e reavaliadas por si mesmas e por outras, num
processo mais ou menos inconsciente que se manifesta nos pequenos como nos grandes
fenômenos. Albuquerque Junior, decerto compreendendo bem esse novo ímpeto social de
questionamento e fragmentação, em Feira dos Mitos (2013) – obra que dialoga com sua
Invenção do Nordeste (2001) – nos instiga a descontruir os discursos cristalizados no senso
comum – dos quais acompanhamos a construção na primeira parte deste trabalho – e
duvidar deles. Reforçando esta ideia, Hall (op cit) nos mostra que a aparente harmonia sobre
uma identidade é produzida, “inventada”, nos termos de nosso Albuquerque Junior, por um
emaranhado de jogos de poder e pelo próprio povo, numa necessidade íntima de
pertencimento e autoafirmação; ela nunca será homogênea, pois uma cultura nacional nunca
foi e nunca será simples e unificada como se pretende, uma vez que ela não tem um único
ponto de identificação. As diferenças e pontos imprecisos são mais naturais e comuns do que
parecem ser. O historiador do Nordeste nos mostra que diversos níveis de poder com um
objetivo comum de não perderem seu espaço foi o que ajudou por demais na construção de
mitos de origem; mostra que a homogeneidade da identidade nordestina pautada no berço da
cultura popular e sertaneja não foi homogênea nem natural, assim:
Apartados por ambientes naturais e sociais diversos, os homens do campo e os da cidade,
os homens do povo e das novas elites sociais vinham desenvolvendo formas de vida
completamente à parte e quase incompreensíveis entre si, o que talvez estivesse gerando
esta curiosidade crescente por conhecer um povo que se tornava cada vez mais
desconhecido e distinto” (ALBUQUERUQE JUNIOR, 2013:44)
Isso desencadeou, como nos coloca Albuquerque Junior (2013), uma formação ideológica do
Nordeste etnográfica, de cima para baixo, pois o ponto de vista não foi do povo para consigo
mesmo, mas de outros, apartados a ele, para eles. Além disso, foi não natural, pois não foram
os rurais ou sertanejos que criaram uma versão identitária para si, mas outros, antigos
patriarcas, que se espelharam na não contaminação dessa parte do Nordeste pelo litoral
capitalista para levantar a identidade regional e se afirmarem politicamente à custa dessa
forjada aliança cultural com o povo. Assim, observa-se que a construção imagético-discursiva
que temos do Sertão é frágil e suscetível de questionamentos, ainda mais num momento
histórico-social em que as construções dos sistemas de representação, segundo Hall (2006),
estão sendo desconstruídos, haja vista a fragmentação identitária que neles se flagra.
Cabe ressaltar ainda que tal construção se deu na época do Modernismo, quando a velha
ordem social da aristocracia rural nordestina temia a perca total de privilégios e espaço para
a nova ordem social burguesa que se instaurava, pois “[...] com o surgimento de uma
sociedade de classes, em que o próprio âmbito do que se define como cultura se segmenta em
diferentes universos simbólicos [...]” (ALBUQUERQUE JUNIOR, 2013:45) cresce o medo de
se perder nesse todo tão segmentado e diversificado, já não mais dominado pela simplória
hierarquia de outros tempos. Dessa forma, percebe-se que já na modernidade a fragmentação
mostrava suas ameaças às hegemonias e supostas harmonias, o que culmina, na
contemporaneidade, na extrema fragmentação dos sistemas de representação cultural,
deixando em crise as identidades pós-modernas, a exemplo – no caso do nosso enfoque – das
identificações em torno do Sertão nordestino.
Após termos traçado como se deu a construção imagético-discursiva da região nordestina e
suas identidades culturais, buscamos entender como se encontra a identidade cultural, de
forma geral, na contemporaneidade, para, a partir daí, tentar desvendar se essa “crise de
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
identidade” abala também os discursos identitários em torno do Nordeste e seu Sertão,
percebendo que não só abala como também já era esperado que um discurso não natural
como este fosse semelhantemente questionado.
Até aqui estudamos historicistas, sociólogos e também literatos. É relevante a esta altura do
nosso trabalho observar a literatura nordestina produzida na contemporaneidade para tentar
flagrar como se encontra, nela, a figura do Sertão; entendendo que a literatura é uma das
manifestações culturais que mais fala – com sua linguagem particular – do contexto social e
do homem neste. Nossa escolha por também nos pautar pela literatura é para observar as
atuais visões sobre o Sertão nordestino de forma também tocante ao ser humano e não só à
sociedade em que ele se insere e com que ele se identifica. Tomamos como breve exemplo
nesse percurso final Galileia (2006), do escritor nordestino Ronaldo Correa de Brito. Mesmo
sendo uma obra apenas, se o Sertão tiver colocado em estado de degradação podemos flagrar
como um valioso indício da crise pós-moderna geral apontada por Hall (2006).
Nessa obra percebemos um Sertão vazio, oco! Vazio das figuras folclóricas, dos ritos alegres e
imemoriais, da tradição vibrante e ativa que vimos, a partir dos estudos de Albuquerque
Junior (2001; 2013), levantada com o produzido orgulho na construção dos discursos em
torno do Nordeste. Na obra de Ronaldo o passado não tem o mesmo valor de autoridade na
formação do ser; o passado não se recupera pela memória coletiva incontaminada do povo,
pois, nas tramas da narrativa, as histórias antigas nunca conseguem vir à luz do presente com
a clareza e a certeza de outrora, elas se perdem no “fio da meada”, se fragmentam e, com isso,
quando chegam à contemporaneidade dos personagens mais perturba e confunde do que
acalma os ânimos; e as poucas que chegam não significam mais quase nada, como um dia
significaram.
Percebe-se também que não há lições passadas de geração em geração, não há reais honras a
serem defendidas; há, ao contrário, decepções e desonras, as quais são propagadas como as
únicas heranças e marcas que se levam da família Rego Castro. A realidade das tradições e
mitos de origem já perderam o sentido, sequer aparecem na obra. O que cresce, em
contrapartida, é a sensação de loucura e perturbação interior dos personagens. Chamamos a
atenção para o fato de esta ser uma tendência da literatura dos “00”, segundo Sch∅llhammer
(2011:153) “a leitura é capturada na mecânica da perda de realidade e numa loucura in
crescendo.”.
Dessa forma, o Sertão não é delineado externamente, não se encontra lá fora, nas cercas e no
horizonte, não está no sol que raia ou nas pessoas que passam. Ele desaparecera há muito! O
Sertão na obra é interior aos personagens, esta no ser, não é delimitado espaço-
geograficamente; não é um lugar com um universo mítico tradicional, “inventado”, como
diria nosso Albuquerque Junior; é inabarcável, está no mínimo de cada parte que compõe o
todo sertanejo – sendo esta concepção aqui deslocada do seu lugar comum e distendida ao
máximo universal do ser.
Nas palavras de Prioste (2013:291), ao falar do sertão de Grande Sertão Veredas – que neste
comentário vemos como similar ao de Galileia –, o Sertão “em sua particularidade específica
representa um aspecto da totalidade que conforma o modo de ser humano, daí sua
universalidade além do regional”. Dessa forma, ele se instaura na condição humana e, por
isso, é mutável, é universal e não condicionado a contornos particularistas instituídos por
discursos (também) políticos, como vimos em Albuquerque Junior (2001; 2013).
Além dessa característica de que o Sertão não há, o que há é o sertanejar da vida, percebemos
também uma adaptação do que antes era Sertão à nova realidade da época moderna. Vemos
um Sertão conectado à internet, cheio de mulheres mais independentes graças ao trabalho na
confecção de redes, e a substituição de cavalos por motocicletas. O velho Sertão mudara, se
metamorfoseara na sua versão contemporânea e atualizada aos novos ditames da sociedade
globalizada.
Por fim, sem poder e nem querer afirmar que o Sertão como foi construído em fins do século
XIX até meados do século XX permanece, optamos, neste trabalho, por refletir sobre a
formação imagético-discursiva do Nordeste e seu Sertão, a identidade e as identificações que
giram em torno dessas noções, e fazer um percurso teórico de forma a observar se tais noções
ainda se encontram intactas ou não.
413
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Constatamos que a sociedade se encontra muito mudado no tocante às identidades, de forma
geral, na contemporaneidade, e o sistema de representação em torno do Sertão nordestino
não se encontra excluído, pois, desse processo. Além disso, o discurso de “invenção” dessa
identificação nordestina purista sobre o Sertão foi construído no contexto socio-historico da
Modernidade, quando a segmentação da sociedade já ameaçava destruir paradigmas há
muito estabelecidos. Hoje, portanto, o clima de instabilidade é maior e o questionamento no
sentido da desconstrução é naturalmente maior.
O Sertão, sob um ponto de vista mais intrínseco ao ser, encontra-se também problematizado
e possivelmente oco da significação estável que costumada ter nas literaturas ditas regionais.
Se no romance de 30 o cenário sertanejo já se apontava de “fogo morto” ou “vidas secas”, e a
questão econômica e social ao redor dele era problematizada, hoje, na contemporaneidade, o
cenário é ainda mais oco, mas de um novo prisma, pois não vemos esse tipo de discussão
material. Não parece ser esse o interesse em trabalhar com o Sertão na literatura atual, pois
ele não aparece muito bem delimitado espaço-geograficamente, seu espaço físico é mero
pano de fundo para discussões mais profundas e pertinentes ao ser: a busca de sentido por si
ou pela vida; sendo o Sertão o “em si”, o mundo a partir do personagem e, assim, muito mais
universal do que nunca foi, visto se identificar diretamente com o ser humano e suas
problemáticas.
Por esse trajeto feito neste trabalho, podemos (talvez), com esses pontos de vista, dizer que o
Sertão não há. Aquele como costumava haver em fins do século XIX até meados do século
XX, no imaginário coletivo, nos discursos sociológicos e políticos e nas literaturas
produzidas, que era aparentemente imutável e de contornos bem definíveis se encontra,
agora, mais fragmentado e problematizado pelas novas circunstâncias do ser humano na
atual sociedade pós-moderna.
REFERÊNCIAS
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São Paulo: Cortez, 2001.
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sobre a vida e a paisagem do Nordeste do Brasil. 7 ed. São Paulo: Global, 2004.
DACANAL, J. H. O Romance de 30. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1986.
FREYRE, G. Nordeste: aspectos da influência da cana sobre a vida e a paisagem do Nordeste do Brasil. 7 ed. São
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HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Tradução Tomaz Tadeu da Silva, Guaraeira Lopes
Louro. 11 ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2006.
LARAIA, R. de B. Cultura: um conceito antropológico. 19 ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor: 2006.
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ROUANET, S. P. Mal-estar na Modernidade. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.
SCH∅LLHAMMER, K. E. Ficção brasileira contemporânea. 2 ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011.
SUASSUNA, A. O Movimento armorial. Recife: CONDEPE, 1977. Separata da Revista Pernambucana de
Desenvolvimento, Recife, 4(1):39-64, jan/jun, 1977.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
“ARMARIA NÃM”: O DISCURSO, A MEMÓRIA E A FORMAÇÃO DISCURSIVA
NAS TIRAS DO BODE GAIATO
RESUMO: A Análise do Discurso de Linha Francesa, oriunda das relações existentes entre a
linguagem e as ciências sociais, é o aporte teórico utilizado para se analisar o discurso, a
memória e as formações discursivas que representam a linguagem e a cultura do sertanejo a
partir das tiras do Bode Gaiato155, publicadas em uma página no Facebook. Nesse contexto,
os sentidos não existem isolados das posições ideológicas que constituem o processo sócio
histórico em que os discursos são enunciados. A formação discursiva é exatamente o que
permite o que se pode ou não ser dito, por isso constitui o pensamento do autor. A memória
discursiva é o que possibilita acessar os sentidos construídos historicamente, tanto no âmbito
da textualidade, quanto na história, e assim, ao dizer algo podemos recuperar um enunciado
já dito e consequentemente melhor compreender o que se enuncia em novos espaços-tempos.
Toda palavra dialoga com outras palavras, que fazem parte de um discurso, assim como o
discurso se constitui a partir de outros e é na memória que estes se acomodam até serem
acionados em novos contextos. Assim, a partir desses fundamentos busca-se analisar a que
formação discursiva pertencem o autor da tira Bode Gaiato e seus seguidores e ainda que
sentidos são recuperados pela memória dos discursos enunciados que nem sempre são
contemporâneos e que exigem do leitor a memória de termos e situações - às vezes em desuso
na atualidade - para que finalmente se alcance o humor, característico deste gênero. Para
tanto utilizaremos o referencial teórico postulado por Pêcheux (1997); Maldidier (2003);
Charaudeau & Maingueneau (2004); Orlandi (2006); entre outros.
ABSTRACT: The discourse analysis of the French Line, arising out of the relationship
between language and social science, theoretical contribution is used to parse the speech,
memory and the discursive formations that represent the language and the culture of the
northeast from the Meme Goat Kid, posted on a Facebook page. In this context, the
directions do not exist isolated from ideological positions that comprise the process historical
partner in the speeches are listed. The discursive formation is exactly what allows or not
being told, so is the thought of the author. The discursive memory is what makes it possible
to access the directions built historically, both within the framework of textuality, as in
history, and so, in saying something we can retrieve a statement already said and
consequently better understand what sets out in new spacetimes. It is considered that every
word converses with other words, which are part of a speech, and the speech is from others
and is in memory that they accommodate until being fired in new contexts. Thus, from these
fundamentals, the aim is to analyse the discursive formation belong to the author of the Strip
Goat Kid and his followers and senses are recovered by memory of speeches set out we don't
always are contemporary and that require the reader to memory of terms and situations-
sometimes in disuse today-to finally reach the humor characteristic of this genus. For this
purpose we use basically the theoretical framework postulated by Michel Pêcheux and Eni
Orlandi.
155Tira criada por Breno Melo – estudante universitário, nordestino - em Janeiro de 2013 nas redes
sociais que atinge cento e cinquenta mil acessos diários. É composta por personagens metade
humano e metade bode e por meio da linguagem popular e humor apresenta cenas da vida no sertão.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
verdadeiramente dialogar com os registros desse conceito, é necessário ampliar a discussão
para que se alcance o (re) significado do termo.
Para Ferdinand Saussure, escola de Praga e o estruturalismo americano a língua é um
sistema concreto de relações ou um conjunto de sistemas ligados uns aos outros, cujos
elementos não têm nenhum valor independente das relações de equivalência e de oposição
que os unem. Cada língua representa um sistema implícito, característico aos falantes dessa
língua; o que depende das variações individuais constitui para estes a fala.
A língua não é função de quem fala, mas sim produto que o individuo externaliza
passivamente; não há premeditação, e a reflexão existe somente para classificação. Enquanto
a fala é um “componente individual da linguagem”, “um ato de vontade e inteligência” é a
forma de materialidade da língua, já que segundo Saussure (2006): “Existe, pois,
interdependência da língua e da fala; aquela é ao mesmo tempo instrumento e o produto
desta. Tudo isso, porém, não impede que sejam duas coisas absolutamente distintas”.
Nessa teoria a língua é um produto social enquanto a fala individual, é um contrato coletivo,
ao qual todos os membros devem submeter-se em blocos para se comunicar, é a partir das
marcas depositadas em cada cérebro que - concretizados em atos de fala - o código permite a
comunicação entre emissor e receptor da mensagem.
Não há dúvidas quanto ao avanço que os estudos saussurianos simbolizaram, ressonância em
diversos outros estudos e novas teorias originaram-se a partir desses paradigmas, mas para
Pêcheux (1997), a língua: “Deixa de ser compreendida como tendo a função de exprimir
sentido; ela se torna um objeto cujo funcionamento uma ciência pode descrever”.
De fato não é possível considerar a língua como um depósito de signos com suas
propriedades exclusivamente gramaticais, um repositório de regras não garante o sucesso do
jogo, o uso cotidiano da língua transcende a forma, o estático e somente se consolida no
discurso, materialização da linguagem e ideologia.
No cenário da intelectualidade francesa, na década de 60, segundo Robin (1977) “houve uma
passagem no final da década de 60 de uma “linguística da frase” para uma “linguística do
discurso”, já que antes era explorada a língua saussuriana”. Isso foi possível a partir da
ruptura ideológica no campo das Ciências Sociais provocada pelo postulado de Pêcheux que
inaugurava a Análise do Discurso Francesa entendida como a intersecção entre o
materialismo histórico, a teoria das ideologias, a linguística e a teoria do discurso que visa
compreender a determinação histórica dos processos semânticos.
A complexidade do discurso tornou a A.D. Francesa necessariamente interdisciplinar, por
relacionar a linguística, o materialismo histórico e a psicanalise, através da releitura marxista
de Althusser, dos estudos sobre a formação discursiva de Foucault, dos pressupostos sobre o
inconsciente difundidos por Lacan e ainda o dialogismo em Bakhtin que se traduz em
heterogeneidade do discurso, justificam o porquê da A.D. sustentar-se no entremeio
interdisciplinar para realizar investigações sobre a linguagem.
É na segunda fase da Análise do Discurso Francesa que se difunde o conceito de formação
discursiva, postula-se que não existe discurso desprovido de ideologia, é a formação
discursiva que autoriza o que se deve e também o que não se deve dizer, para Orlandi (1998):
É na formação discursiva que se constitui o domínio do saber, o que funciona como
um princípio de aceitabilidade para um conjunto de formulações e, ao mesmo tempo,
como um conjunto de exclusão do “não-formulável”. (ORLANDI, 1998)
E assim, percebe-se que para cada formação discursiva, há uma dada formação ideológica,
desse modo os discursos mudam de sentido, segundo a posição de quem os enuncia.
Outro conceito intimamente ligado à formação discursiva é a formação ideológica, para
Pêcheux (1999) trata-se de “um conjunto complexo de atitudes e de representações que não
são nem individuais, nem universais e que se referem, mais ou menos diretamente a posições
de classes em conflito, umas com as outras”. Para a A.D. a ideologia é condição para a
constituição dos sujeitos e dos sentidos. Como afirma Orlandi (2010):
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O sentido é assim uma relação determinada pelo sujeito - afetado pela língua - com a
história. É o gesto de interpretação que realiza essa relação do sujeito com a língua,
com a história, com os sentidos. Esta é a marca de subjetivação e, ao mesmo tempo, o
traço da relação da língua com a exterioridade: não há discurso sem sujeito. E não há
sujeito sem ideologia. (ORLANDI, 2010)
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Essas considerações metodológicas formam o arcabouço teórico que norteou a análise do
corpus a seguir:
O termo grego Meme156significa imitação. E Meme de Internet é uma expressão utilizada
para identificar uma ideia ou conceito que se difundi por meio da web rapidamente. Frase,
imagem, vídeo, música, entre outros, podem ser Memes da Internet, por espalhar-se
rapidamente em diversas fontes de informação. Resumidamente Meme é tudo aquilo que é
imitado e que se espalha com rapidez entre as pessoas, como a Internet tem a capacidade de
atingir um número muito significativo de usuários em poucos segundos, diz-se que os Memes
de Internet são virais.
Neste texto iremos explorar o Meme “Bode Gaiato” criado em janeiro de 2013 por Breno de
Melo, estudante de engenharia de 19 anos, pernambucano, que numa brincadeira de férias
resolve criar uma página no Facebook com imagens de situações tipicamente nordestinas,
figuradas por personagens humanas com cabeças de bode. O que não se previa era a absurda
adesão dos internautas a uma imagem simples, tosca, frases reduzidas, que rapidamente
provocou o resgate do discurso e da cultura nordestina viva, arquivada na memória, não só
dos nordestinos, mas de todos que já viveram algumas das situações ali apresentadas. Hoje
são 3.582.053 pessoas que já visitaram a página e 935.781 pessoas que comentaram sobre o
assunto.
O humor sem apelo e preconceito é representado por Junin, o bode que vive situações
recorrentes a vida de uma criança como: a repreensão da mãe (dona Zefinha) uma
brincadeira de rua, uma situação na escola, a preguiça do filho, a relação de Junin com o
irmão mais velho Ciço, o pai Biu e outras que contam a história do povo do nordeste, com
humor, respeito e criatividade. O autor recebe diariamente inúmeras sugestões do público em
geral para compor novos textos, inclusive contemporâneos a situações diversas do cotidiano,
como notícias e datas comemorativas por exemplo.
Figura - 01
Disponível em: https://www.facebook.com/ObodeGaiato
O conceito de "Meme" foi criado pelo zoólogo e escritor Richard Dawkins, em 1976, quando
156
escreveu no livro "The Selfish Gene" (O Gene Egoísta) que tal como o gene, o Meme é uma unidade
de informação com capacidade de se multiplicar, através das ideias e informações que se propagam
de indivíduo para indivíduo. Os Memes constituem um vasto campo de estudo da Memética.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Conforme se vê, o Meme do “Bode Gaiato” destaca-se no que se refere à alusão a cultura
nordestina. Não é comum o humor e o riso serem provocados por situações em que o
rompimento da coerência valoriza o contexto, a linguagem e a história dos sujeitos, o mais
comum em textos humorísticos é provocar riso sem preocupar-se com o respeito aos valores
humanos e a diversidade cultural. O discurso aqui reproduzido é representado por animais
“humanizados”, variedade não padrão, cultura equivocadamente identificada como de menor
prestígio e ainda assim, tem aceitação absoluta dos leitores, porque estes se identificam com
os discursos que são enunciados.
Expressões como “... e foi assim que eu fui dormir de couro quente” e “armaria mainha ñan”
se repetem, a primeira caracteriza o apanhar, como recurso para a educação do filho e Ave
Maria mainha não, como reação de negação que também vitima o sujeito que a utiliza, numa
relação de subordinação. Como bem diz Henry (1997) “o sujeito é sempre e ao mesmo tempo,
sujeito da ideologia e sujeito do desejo do inconsciente e isso tem a ver com o fato de nossos
corpos serem atravessados pela linguagem antes de qualquer cogitação”
Figura - 02
Segundo Fernanda Guerra, no Jornal Diário de Pernambuco (2013), esta tira foi campeã em
acessos. Foram 1.000.000 de compartilhamento da imagem na página do Facebook. Nela, se
vê no discurso de Zefinha, ao afirmar “Que dirmantelo é esse Junio? Essas caça réa lá em
baixo mostrando a cueca feito malandro” que este representa uma posição ideológica
ocupada pelo discurso de uma mãe que, deste lugar, orienta que o filho não mostre a cueca
como malandro, mas que componha-se “pareceno um rapaizin”. Toda formação discursiva
está vinculada a certa formação ideológica, assim é fácil compreender que a ideologia
materializada no discurso da mãe de Junin se inscreve, inconscientemente, num lugar em
que o modo como se veste é determinante no conceito de malandro ou rapazinho.
Na A.D. o contexto não está fora do discurso, este é elemento essencialmente constitutivo,
por isso relaciona-se às condições de produção, lugar de significação historicamente
construído. Nas tiras abaixo, pode-se verificar que os enunciados descrevem o contexto, a
linguagem, o comportamento, enfim a cultura do povo nordestino, isso também porque é o
discurso de um nordestino que vive o nordeste, por isso descreve de modo que outros se
identifiquem como disse Breno, autor do Meme: "Eu não saberia fazer muitas piadas
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
comgírias de outros estados, porque sou daqui, nasci no Recife, mas moro há oito anos em
Caruaru, no Agreste do estado”.
Figura - 03 Figura – 04
Figura - 05 Figura – 06
O Meme “Bode Gaiato” aborda diversos temas, respeitando o universo da formação
discursiva e ideológica em que se inscreve. Especialmente por ativar a memória discursiva, o
interdiscurso enfatizado por Pêcheux, possibilita que as tiras criadas façam sentido e ainda
provoquem humor. A memória está relacionada à formação discursiva (F.D.) do enunciador.
Há uma relação de paráfrase entre os “já ditos” e assim se constrói o ressignificado dos
sentidos. Sobre a relação entre a formação discursiva e a memória, Indursky (2009) diz:
FD é regulada por uma memória discursiva que faz aí ressoar os ecos de uma
memória coletiva, social. Por outro lado, nem tudo pode ser dito no interior de uma
FD, de modo que a memória discursiva não é plena, não é saturada, pois nem todos
os sentidos estão autorizados ideologicamente a ressoar em uma FD. Dessa forma,
percebe-se que, assim como a FD é de natureza lacunar, a memória discursiva
também o é. (INDURSKY, 2009)
Os elementos abaixo apresentados são a representação da memória discursiva no Meme
“Bode Gaiato”, podemos compreender que o discurso produzido por um sujeito (o autor) é
representado em outro discurso (das personagens) e este ecoa na construção de novos
discursos a partir do “já dito” e também constituirá a memória discursiva dos interlocutores,
que será importante no momento de uma nova produção do discurso, como ocorre em:
• Dona Zefinha como mãe brava que prima pela educação dos filhos:
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Figura - 07 Figura – 08
Disponível em: https://www.facebook.com/ObodeGaiato
Disponível em:
Figura - 09 Figura – 10
• Junin, criança sapeca que é punido, mas sempre que pode responde:
Figura - 11 Figura – 12
Disponível em: https://www.facebook.com/ObodeGaiatoDisponível em: https://www.facebook.com/ObodeGaiato
• Discurso característico ao sujeito que o enuncia:
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Figura - 13 Figura – 14
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Figura - 15 Figura – 16
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Produção sócio histórica do discurso
Figura - 17 Figura – 18
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Figura - 19
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Figura - 20 Figura – 21
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• O discurso do Meme “Bode Gaiato” reproduzido em outros discursos:
Conforme postula a A. D. Francesa, não há discurso que não se relacione com outros. O
discurso é o efeito de sentido, conforme Orlandi (1998) “a palavra discurso,
etimologicamente, tem em si uma ideia de curso, de percurso, de correr por, de movimento”.
Os discursos são vivos, concretos e o tempo todo se movem em direção a outros, está sempre
atravessado por vozes que o constituíram e conforme demonstrado a partir da análise do
corpus explorado, o discurso, a memória e a formação discursiva no Meme “Bode Gaiato”,
ilustrou concretamente esses fundamentos da A. D. em textos que circulam
contemporaneamente.
REFERÊNCIAS
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O significado do termo Meme. Disponível em: http://www.significados.com.br/meme/.Acessado em
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Resumos
426
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
LEITURA NA ESCOLA: LETRAMENTOS MÚLTIPLOS NO ENSINO
FUNDAMENTAL E MÉDIO
A leitura é uma prática social que se amplia desenfreadamente desde seu aparecimento com a
invenção da escrita. Com o intuito de dominar seus mecanismos e efeitos é que vem se
buscando compreendê-la, não apenas como um meio de comunicação humana, mas também
como uma prática que caracteriza uma sociedade como letrada. Nessa perspectiva que
envolve questões de natureza cognitiva e social, é que se desenvolvem estudos sobre o
fenômeno leitura. O ato de ler implica mudanças individuais e coletivas à medida que ao se
alfabetizar o indivíduo passa a fazer parte de um mundo ligado por ideias, formas e saberes
constituídos pela sociedade em que vive. Para que ocorra a leitura, são necessários textos,
leitores e agentes que produzam e difundam os textos. Nessa perspectiva, é que se encontra a
escola. Como veículo de ensino e divulgação da leitura, a escola tem papel importante e
definitivo nas mudanças sociais. Para que isso de fato ocorra, cabe a esse agente determinar e
aplicar planos e estratégias de ensino/aprendizagem adequados. Ainda na fase inicial da
escolarização – no Ensino Fundamental I –, a leitura deve ser realizada com vistas para uma
prática social e não apenas como um saber mecanizado que contemple somente o
funcionamento do código linguístico. Na etapa posterior – no Ensino Fundamental II –, a
prática de leitura implica o desenvolvimento da capacidade metalinguística e metatextual,
quando o leitor torna-se capaz de observar, refletir e inferenciar sobre o texto lido. Na etapa
final da escolarização básica – no Ensino Médio –, a tarefa da escola é complementar as
etapas anteriores desenvolvendo a capacidade leitora com vistas para uma visão histórico-
social dos textos produzidos ao longo do tempo, na perspectiva dos múltiplos letramentos.
Palavras-chaves: leitura, escola, múltiplos letramentos.
427
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O GÊNERO TEXTUAL CONTO COMO FERRAMENTA FACILITADORA
PARA PRÁTICA DO LETRAMENTO EM SALA DE AULA
RESUMO: O presente estudo faz uma abordagem sobre a importância do trabalho com os
gêneros textuais, especificamente o conto, apresentando-o como ferramenta didática e
facilitadora para prática de letramento em sala de aula. O estudo faz parte do subprojeto
Retextualização e Reescrita a partir dos Gêneros Textuais para a Prática Pedagógica no
Ensino de Língua Portuguesa. O subprojeto referido está sendo desenvolvido em escolas da
esfera pública estadual da cidade de Palmeira dos Índios Alagoas. Vincula-se esse subprojeto
ao Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência - PIBID\CAPES- O estudo tem
como aporte teórico os pressupostos dos autores: Freire(1987; 1997) ;Marcuschi (2008);
Bakhtim(2010); (2002); PCN,(2000); Soares (2009); dentre outros. Ultimamente nas aulas
de língua portuguesa, ainda não se privilegia a produção de leitura e escrita, o que tem
apresentado resultados não satisfatórios aos alunos. Assim, o aluno conclui o ensino médio,
com dificuldades de ler e produzir textos, os mais simples que sejam. A escola tem deixado a
desejar no seu papel de formar leitores e desenvolver a competência discursiva para o uso da
língua. À escola, enquanto instituição de ensino, é responsável para desenvolver no aluno, as
competências devidas para o exercício da cidadania, independente do grau de ensino. Para
tanto, precisa reconhecer na produção de leitura e escrita sua finalidade precípua.
428
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O "PORTUGUÊS POPULAR": INTERFACE ENTRE A VARIAÇÃO LINGUÍSTICA E
A LITERATURA DE CORDEL EM SALA DE AULA
Resumo:
O presente trabalho é o desenvolvimento de uma pesquisa em andamento, financiada pelo
PIBIC/FAPEAL/UNEAL, que objetiva criar um espaço aberto para reflexões sobre as
variedades linguísticas em sala de aula, a partir da interface com a Literatura de Cordel, com
alunos do ensino fundamental da rede pública de Palmeira dos Índios - Alagoas. A inserção
da variação linguística em sala de aula será feita a partir da Literatura de Cordel, pois os
alunos poderão conhecer um pouco mais da rica cultura nordestina na qual estão inseridos,
enfatizando sempre que mesmo aqueles que fazem uso da língua não-padrão são também
produtores de cultura, de saber e de literatura. Ao lidar com este tipo de tradição cultural
peculiar, a partir de oficinas lúdicas que vão desde a origem do cordel perpassando pelo
processo de produção até chegar à interface com a linguística, mais precisamente com a
Variação Linguística (estudos de variantes linguísticas), espera-se que os alunos utilizem a
linguagem empregada nesse tipo de criação cultural para aperfeiçoar o conhecimento acerca
das variantes linguísticas e, com isso, perceber que a norma padrão é também uma forma de
expressão além da que eles já conhecem. Além do mais, o trabalho com o cordel busca
reavivar uma tradição cultural que, com o decorrer dos séculos, principalmente com o
advento da tecnologia e da implantação de novas formas de cultura foi praticamente perdida.
429
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
PRÁTICAS DE LETRAMENTO E GÊNEROS TEXTUAIS: UM DIÁLOGO
POSSÍVEL NAS AULAS DE LÍNGUA MATERNA
Este artigo visa analisar as práticas de letramento em sala de aula na perspectiva dos gêneros
textuais. Segundo Soares (2003), para que o aluno se aproprie da leitura e da escrita
efetivamente, faz-se necessário a sua inserção no mundo letrado, envolvendo-se nas mais
diversas atividades que se constituem em práticas de letramento. Para Marcuschi (2001), os
gêneros textuais estão vinculados à realidade sócio histórica dos indivíduos, é fruto de
trabalho coletivo e contribuem para ordenar e estabilizar as atividades comunicativas do dia-
a-dia, logo, o professor de língua materna deve explorar os diversos gêneros textuais
inseridos na realidade dos educandos, para que, a partir do trabalho pedagógico possa
contribuir significativamente para que estes, por sua vez, desenvolvam suas competências
comunicativas tanto na modalidade escrita quanto na modalidade oral.Desta forma, à
proporção que os educandos dialogam, interpretam e “reconstroem realidades” a partir dos
gêneros textuais, o professor contribuirá para a inserção dos alunos nas práticas de
letramento, conforme Kleiman (2001) na sua obra Formação do professor-perspectiva da
linguística aplicada, com uma diversidade de gêneros textuais, contribuindo para a formação
de indivíduos leitores e escritores capazes de agir em sociedade e de refletirem sobre a língua
em uso.
430
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O CORDEL COMO ARTEFATO (INTER)CULTURAL PARA A AQUISIÇÃO DO
LETRAMENTO - A ESCRITA DE ORALIDADES.
Ao tomar o cordel como objeto deste trabalho, por ser uma espécie de produto proveniente
de saberes ancestral/oral e que dialoga com outras culturas ao longo do tempo, interessa
conhecera dimensão do cordel como elemento potencializador do letramento, por preservar
na palavra escrita a sonoridade e a gestualidade, facilitando, assim, o entendimento da
narrativa, bem como a leitura que ele faz sobre cada cultura ao evocar em suas rimas a
memória e a tradição de um povo. Assim, o trabalho objetiva compreender como o Cordel,
sendo artefato formado por diversos elementos interculturais, carrega em si potencial
suficiente para oportunizar ao sujeito aprendiz pleno espaço para o letramento. Para tanto, o
cordel será pensado/discutido como conteúdo didático pedagógico a ser utilizado em sala de
aula por permitir que o indivíduo em vias de letramento faça uso desse tipo de leitura para
apreensão dos fatos ocorridos em seu contexto, já que ele é um elemento da
interculturalidade, a qual forma um sabe que vai servir como uma espécie de arsenal
pedagógico. Trata-se de uma pesquisa qualitativa que vem se utilizar de um aporte teórico
direcionado a entender o conceito de alfabetização, letramento e literatura de cordel, como
AngelaKleimam (2005) Os significados do letramento; Magda Soares (2009) Letramento:
um tema em três gêneros; Luiz Marcushi (2000) Da fala para a escrita; Paul Zumthor
(1993) A letra e a voz: a “literatura” medieval e Performance; Vilma Quintela (2006), O
cordel no fogo morto da cultura; Galvão (2001), O cordel: leitores e ouvintes, entre outros.
431
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
ROSA E KIERKEGAARD: DO CÁLIDO SERTÃO À GÉLIDA DINAMARCA
432
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
LEITURA E CONHECIMENTO DE MUNDO: INTERDISCIPLINARIDADE NA
AULA DE LÍNGUA PORTUGUESA.
Fellype Lima Alves da Costa
Universidade Estadual de Alagoas
Bolsista PIBIC/FAPEAL
Resumo:
Este artigo tem como objetivo discutir a interdisciplinaridade na aula de língua portuguesa
(LP), partindo do pressuposto de que a leitura está ligada ao conhecimento de mundo do
leitor. Para tal, parte de teóricos como Antunes (2010), com sua visão sobre a aula de língua
portuguesa, Cagliari (2009), que ressalta o compromisso da escola em formar bons leitores,
Koch (2003, 2012), com seus estudos sobre contextos e os gêneros discursivos, e Marcuschi
(2008), no que diz respeito às concepções de texto, língua e sujeito adotados pela escola,
dentre outros. A partir desses autores, entende-se que a aula de LP só é interativa à medida
em que adota a perspectiva sociointeracional da linguagem. No entanto, adotar essa
perspectiva implica que o professor instigue o aluno a considerar, no ato da leitura, a relação
do texto com outros textos (intertextualidade), o qual é o princípio fundamental do próprio
texto. Assim, não se pode desvincular a aula de LP das outras disciplinas presentes na escola,
pois no processo de leitura o aluno faz uso de diversos conhecimentos arquivados em sua
memória, o que envolve também o conhecimento intuitivo dos gêneros do discurso, e não
apenas do conhecimento gramatical da língua.
433
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A IMPORTÂNCIA DAS SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS NO ESTUDO DE GÊNEROS
RESUMO:
No cenário educacional a formação docente tem sido objeto de pesquisas há anos, no entanto,
ainda carece de estudos contínuos para o melhoramento da prática docente no contexto
escolar. Assim, este trabalho tem como objeto de estudo as sequências didáticas como forma
de letramento tanto para os professores quanto para os alunos, o qual questiona-se: por que
as sequencias didáticas são importante no desenvolvimento e trabalho do professor em sua
pratica docente? Assim, tem-se como hipótese que é pressuposto de base dos conhecimentos
do professor, uma vez que o trabalho docente se sustenta de saberes distintos desde a
elaboração dos planos de ensino até a sua aplicação, tendo, pois o planejamento de
sequências didáticas no ensino de gênero como um caminho de base teórica/pratica de
motivação e controle de aspectos necessários ao ensino aprendizagem de língua inglesa. A
partir deste exposto objetiva-se discutir a importância do planejamento de ensino através das
sequências didáticas; identificar os aspectos positivos da pratica docente como instrumento
de motivação; descrever as sequências didáticas em suas etapas de desenvolvimento; e
apontar as sequências didáticas como fatores importantes para o letramento de língua
inglesa. Desse modo, para a elaboração deste trabalho tomou-se como princípio os estudos de
Bakhtin (2011); Dolz; Noverraz; Schneuwly (2011); Ferreira (2007); Silveira (2003); Pimenta
(1997), dentre outros. Nessa perspectiva, conclui-se que o dispositivo sequências didáticas é
um suporte de grande relevâncias para a prática docente e de importância considerável no
ensino aprendizagem de gêneros em língua inglesa, uma vez que as etapas de ensino faz do
aluno não apenas um conhecedor do assunto, mas capaz de dominá-lo com mais
desenvoltura.
434
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
ANÁLISE LINGUÍSTICA E LETRAMENTO CRÍTICO NO ENSINO
APRENDIZAGEM DE LINGUA INGLESA
435
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
OS PAPÉIS E FUNÇOES DA POESIA ORAL E SUA VOZ POÉTICA
Resumo:
436
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
PROVÉRBIOS E FRASES DO COTIDIANO: UM ESTUDO SINTÁTICO E
SEMÂNTICO DESTAS CONSTRUÇÕES LINGUÍSTICAS
Este trabalho pretende apresentar os ditos que eram e são frequentemente usados no
cotidiano das pessoas, os provérbios, para então decodificá-las semântica e sintaticamente,
fazendo, portanto, um estudo tanto do significado das palavras quanto da função destas em
uma oração. Como pretendemos pensar a língua em uma situação de uso, o estudo dos
provérbios contribui para que, na análise das orações, levemos em conta não só os aspectos
formais, mas também os semânticos, já que os provérbios estão intimamente relacionados à
cultura popular. A fundamentação que assegurou a pesquisa partiu das observações de
Bechara (2005), Cereja e Magalhães (2003), Cunha e Cintra (1985) e Borgatto, Bertin e
Marchezi (2011). A metodologia adotada caracterizou-se como sendo qualitativa e do tipo
bibliográfico. A coleta de dados se deu a partir de redes sociais, (Facebook e Twitter), livros e
pára-choques de caminhões. A partir destes suportes, foram escolhidos 20 provérbios para
então decodificá-los conforme o objetivo geral apresentado neste trabalho. Estudar os termos
constituintes de uma frase e o efeito de sentido que elas remetem trouxe-nos várias
possibilidades de interpretação de um mesmo provérbio, levando em consideração a situação
em que o sujeito a qual está fazendo o uso destes se encontra.
437
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
AS LEIS DO DISCURSO NAS ESTRATÉGIAS ARGUMENTATIVAS EM ARTIGOS
DE OPINIÃO DE ALUNOS DE 9º ANO
Resumo
438
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
RETEXTUALIZAÇÃO E REESCRITA, A PARTIR DOS GÊNEROS TEXTUAIS,
COMO FERRAMENTA FACILITADORA NO PROCESSO DE LETRAMENTO EM
SALA DE AULA
RESUMO: Este estudo faz parte do projeto: Retextualização e Reescrita, a partir dos
gêneros textuais, como ferramenta facilitadora no processo de letramento em sala de aula. Ao
propor a reescrita e a retextualização como estratégias para o desenvolvimento das
habilidades nas práticas discursivas, tem-se como objetivo despertar no aluno a consciência
de que para se produzir um texto é preciso ter o que dizer. Um texto não é algo acabado, e
que o aluno deverá empenhar-se na atividade como próprio produtor de sentidos. Este
projeto está sendo desenvolvido com alunos ingressantes no primeiro período do curso de
Letras da Universidade Estadual de Alagoas, Campus III Palmeira dos Índios Alagoas. A
pesquisa tem como aporte teórico os pressupostos dos autores: KOCH, (1990; 1997; 2004;
2012); MARCUSCHI, (2008); MATÊNCIO, (2002); BAKHTIN, (1981 e 2010), dentre outros.
Promover a aprendizagem, construir um conhecimento pautado em sua amplitude, quer no
âmbito educacional, pessoal
ou social do aluno, constitui papel da educação. As IES (Instituições de Ensino
Superior) precisam investir na formação de professores-leitores, não apenas no sentido de
atualização do conhecimento, mas essencialmente pela construção/elaboração de saberes que
contribuam para a preparação dos profissionais docentes.
439
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
JOVENS E ADULTOS LENDO, ESCREVENDO E APRENDENDO INGLÊS POR
MEIO DE GÊNEROS TEXTUAIS
Kelliane Coêlho de Carvalho1
Maria Aparecida Amador Cavalcante2
Relma Lúcia Passos de Castro Mudo3
1 Graduanda do curso de Licenciatura em Letras - Língua
Inglesa e suas Literaturas da Universidade de Pernambuco –
UPE / Campus Petrolina.
2 Graduada do curso de Licenciatura em Letras - Língua
440
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
OS JOVENS EM CÍRCULOS DE LEITURA LITERÁRIA: UMA PROPOSTA PARA
ESPAÇOS ALTERNATIVOS
Luciana Sacramento Moreno Gonçalves
Universidade do estado da Bahia, UNEB
Professora Assistente
441
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A REDENÇÃO PELA ARTE: UMA ANÁLISE DA ILUMINOGRAVURA “DOM”, DE
ARIANO SUASSUNA
442
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A LINGUAGEM REGIONAL/POPULAR: “UMA CANOA FURADA” EM
ALEXANDRE E OUTROS HERÓIS,DE GRACILIANO RAMOS
RESUMO
Trata-se de um estudo sobre a linguagem regional/popular circunscrita ao texto literário
“Uma canoa furada”, da obra Alexandre e outros heróis, de Graciliano Ramos. Partimos do
pressuposto de que a linguagem humana manifesta-se de diversas formas, no âmbito de uma
língua, levando em consideração as possibilidades de expressão pelo indivíduo, usuário dessa
língua. Neste sentido, tendo em vista a contribuição que a produção literária tem propiciado
à linguística, quer no seu objeto propriamente dito, a fala, quer na escrita, percebemos que os
aspectos da oralidade e/ou da escrita aparecerão, de alguma forma, imbricados, recusando-se
à dicotomia que frequentemente observamos nas análises que acompanhamos, sejam estas
linguísticas ou literárias, sem desejarmos, aqui, estabelecer relações estanques. Desse modo,
abordamos a questão da linguagem no estudo do texto literário, pautados em teorias tanto da
Literatura quanto da Linguística, haja vista as questões de ordem social, política, econômica e
cultural que confluem para a identidade de um povo e de sua língua. Nessa perspectiva,
tomamos o exemplo do léxico rural do interior de Alagoas, por entender que o estudo deste
recorte da língua portuguesa contribui para a disseminação da cultura nordestina, uma vez
que, o estudo sobre o falar regional/popular registrado na obra e autor supramencionados
merece ser reputado, enquanto valor sociocultural da gente dessa região.
443
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
“ARMARIA NÃM”: O DISCURSO, A MEMÓRIA E A FORMAÇÃO DISCURSIVA
NAS TIRAS DO BODE GAIATO
RESUMO: A Análise do Discurso de Linha Francesa, oriunda das relações existentes entre a
linguagem e as ciências sociais, é o aporte teórico utilizado para se analisar o discurso, a
memória e as formações discursivas que representam a linguagem e a cultura do sertanejo a
partir das tiras do Bode Gaiato157, publicadas em uma página no Facebook. Nesse contexto,
os sentidos não existem isolados das posições ideológicas que constituem o processo sócio
histórico em que os discursos são enunciados. A formação discursiva é exatamente o que
permite o que se pode ou não ser dito, por isso constitui o pensamento do autor. A memória
discursiva é o que possibilita acessar os sentidos construídos historicamente, tanto no âmbito
da textualidade, quanto na história, e assim, ao dizer algo podemos recuperar um enunciado
já dito e consequentemente melhor compreender o que se enuncia em novos espaços-tempos.
Toda palavra dialoga com outras palavras, que fazem parte de um discurso, assim como o
discurso se constitui a partir de outros e é na memória que estes se acomodam até serem
acionados em novos contextos. Assim, a partir desses fundamentos busca-se analisar a que
formação discursiva pertencem o autor da tira Bode Gaiato e seus seguidores e ainda que
sentidos são recuperados pela memória dos discursos enunciados que nem sempre são
contemporâneos e que exigem do leitor a memória de termos e situações - às vezes em desuso
na atualidade - para que finalmente se alcance o humor, característico deste gênero. Para
tanto utilizaremos o referencial teórico postulado por Pêcheux (1997); Maldidier (2003);
Charaudeau & Maingueneau (2004); Orlandi (2006); entre outros.
157Tira criada por Breno Melo – estudante universitário, nordestino - em Janeiro de 2013 nas redes
sociais que atinge cento e cinquenta mil acessos diários. É composta por personagens metade
humano e metade bode e por meio da linguagem popular e humor apresenta cenas da vida no sertão.
444
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A CONSTRUÇÃO IMAGÉTICO DISCURSIVA DO SERTÃO E A SUA
PERMANÊNCIA, OU NÃO, NA CONTEMPORANEIDADE
Graduanda do 7º período do bacharelado em Letras com ênfase em estudos literários, pela Universidade
158
Federal de Pernambuco. Bolsista de Iniciação Científica pela FACEPE. Residente na cidade de Recife-PE. E-mail:
[email protected].
445
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A RECONFIGURAÇÃO IDEOLÓGICA DO SERTÃO A PARTIR DA CONSTRUÇÃO
DE IDENTIDADE MEDIANTE ASPECTOS PÓS-MODERNOS
RESUMO: Este artigo propõe a discussão acerca do romance Galileia (2008), de Ronaldo
Correia de Brito, partindo de princípios que regem questões culturais, bem como estudos
voltados à identidade do indivíduo e a forma como esses temas perpassam o que diz respeito
aos efeitos do processo de globalização. O modo utilizado pelo autor na construção e na
constituição do romance apresenta um novo olhar sobre o Sertão brasileiro, opondo-se aos
discursos imagético-discursivos idealizados pelos regionalistas e tradicionalistas referentes à
região. O romance apresenta-se como palco para rememorações de um passado arcaico em
contraste com as novas mudanças ocorridas devido à sociabilidade moderna, ele ultrapassa
os limites das estagnações culturais do local e transcende o tradicional e o antimoderno. As
formas cristalizadas pela perpetuação de costumes, hábitos e concepções construídos são
rompidas, não mais refletindo estereótipos imagéticos de caráter moral para a preservação
histórico-cultural da região. A nova configuração introduz produtos dos trânsitos culturais
provenientes do processo de globalização, substituindo as temáticas clássicas, que se
encontram presentes em diversas obras do passado que construíam o Nordeste, como a seca,
o cangaço, os retirantes, beatos, profetas, santos, coronéis, escravos etc. A partir disso, o
presente trabalho concentra-se na análise do processo pelo qual Ronaldo Correia de Brito
reinventa o Sertão dentro da obra, inovando ao inserir aspectos característicos da pós-
modernidade.
_____________________
* Graduanda em Letras da Universidade Federal de Pernambuco. E-mail: [email protected]
** Graduanda em Letras da Universidade Federal de Pernambuco. E-mail: [email protected]
446
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
AS MÚLTIPLAS VOZES NOS CARTAZES DE PROTESTO
RESUMO: Esta pesquisa tem como objeto de estudo o gênero textual “cartaz de protesto” no
site de redes sociais Facebook, cuja utilização em nível mundial intensificou novas formas de
comunicação, representando hoje, além de um artefato tecnológico, um fenômeno social,
cultural e comunicacional. Analisar as principais estratégias de persuasão utilizadas no
discurso dos cartazes, e suscitar reflexões acerca do papel do professor de língua portuguesa
frente às novas exigências educacionais e sociais constitui o objetivo desse trabalho. A
pesquisa se deu a partir de uma abordagem qualitativa através da qual foi coletado um
corpus de oito textos, retirados do facebbok e analisados à luz da perspectiva da análise
crítica do discurso, (FAIRCLOUGH 2001) e da sociorretórica de gênero, (SWALES 1990). Ao
analisarmos os textos pudemos constatar que seus autores se utilizaram de intertextualidade,
multimodalidade, interdiscursividade e figuras retóricas como metáforas, metonímias,
antíteses, hipérboles e ironias como formas de persuasão. Ao iniciarmos nossa pesquisa
percebemos que existem muitas lacunas no meio acadêmico no tocante ao gênero em análise,
que com as recentes manifestações, mostrou o quanto necessário se faz tirá-lo apenas do
papel de suporte pelas escolas, para conferir-lhe um lugar de destaque nas aulas de língua
portuguesa.
447
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O CONFRONTO DE IDENTIDADES NO FUNK-BREGA PERNAMBUCANO
160
Graduanda em Letras e suas Literaturas pela Universidade de Pernambuco-Campos-Garanhuns
(Bolsista PIBIC). [email protected]
161
Doutora em Letras/Linguística pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE, 2013) e docente na
UPE/Campus Garanhuns. [email protected]
448
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
PRÁTICA DE ANÁLISE LINGUÍSTICA: UMA ABORDAGEM ANALISADA EM
SALA DE AULA
Resumo:
A análise Linguística (AL) é apresentada como um eixo do ensino de Língua Portuguesa e é
abordada com uma perspectiva conservadora, inovadora e conciliadora, neste sentido, no
presente relato de experiência objetivamos discutir a prática de AL em sala de aula. Sendo
assim, relatamos aulas de língua portuguesa lecionadas em uma escola pública da cidade de
Campina Grande-PB, por meio do componente curricular Estágio de Língua Portuguesa no
Ensino Fundamental (segunda etapa) e detalhamos como a Análise Linguística é abordada e
tratada através do planejamento e execução de sequência didática. Fundamentam nosso
relato as contribuições teóricas de Bezerra e Reinaldo (2011), Franchi (2006), Marscuschi
(2008), Mendonça (2002), os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua portuguesa do
3º e 4º ciclo do Ensino Fundamental (1998), Pereira (S/A), Pimenta e Lima (2004) e
Schneuwly e Dolz (2004). Os resultados das análises desenvolvidas demonstram que a
abordagem de AL se apresenta como alternativa ou complementação ao ensino de gramática
tradicional e como reflexão relacionada aos demais eixos da língua portuguesa: leitura e
escrita.
162
Estudante da graduação de Letras Língua Portuguesa – Universidade Federal de Capina Grande –
[email protected]
163
Estudante da graduação de Letras Língua Portuguesa – Universidade Federal de Capina Grande –
[email protected]
164
Professora Doutora da Universidade Federal de Campina Grande – Campina Grande –
[email protected]
449
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
PROCESSOS DE NOMEAÇÃO E CATEGORIZAÇÃO DE IDENTIDADES
FEMININAS NO FUNK-BREGA PERNAMBUCANO
RESUMO: O discurso é uma prática social pela qual o ser humano constrói seu
conhecimento e exerce sua cidadania (FAIRCLOUGH, 2001). Diante da ideia de que o
indivíduo possui múltiplas identidades que se moldam ao longo de uma vida através de
influências de diversas formas socioculturais. Considerando que é através do discurso que as
pessoas constroem suas identidades sociais e se posicionam no mundo (HAL, 2006), este
artigo discute os resultados parciais do projeto de iniciação científica que tem como objeto de
estudo o discurso veiculado em letras de músicas (Funk-brega 165, Sertanejo universitário e
Arrocha) que circulam na sociedade pernambucana, entre outras, e exploram como foco a
mulher, seja nomeando-a ou categorizando-a. Para tanto, identificamos e classificamos
formas de nomeação e categorização (VAN LEEUWEN, 1997) mais recorrentes nas letras
selecionadas e investigamos os aspectos intertextuais de (des)valorização no funk-brega. Se a
construção de significados depende não só do que está explícito em um texto, mas também
do que está implícito – o que está presumido (RESENDE e RAMALHO, 2006, p. 80) e as
identidades resultam de construtos social, político, cultural que são diversos. Contudo,
destacamos que há uma construção identitária múltipla e em fluxo, corroborando com a
literatura estudada.
∗
Universidade de Pernambuco-Campos-Garanhuns/Graduanda (Bolsista PIBIC), [email protected].
∗∗
Universidade Pernambuco/UPE-Campus-Garanhuns. Doutora em Letras/Linguística pela (UFPE, 2013)
, [email protected].
165
Neste artigo, traremos uma análise focalizada nas letras de músicas do gênero funk-brega e Arrocha.
450
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
UM NOVO OLHAR SOBRE AS “COISAS DO SERTÃO”: DESMISTIFICANDO
ESTEREÓTIPOS EXISTENTES SOBRE O SEMIÁRIDO
RESUMO:
Este trabalho tem como propósito apresentar o conteúdo produzido pelo “Coisas do
Sertão”, programa do site WebTv Uneb -Núcleo Juazeiro-BA. O projeto é desenvolvido por
alunos do curso de Jornalismo em Multimeios sob a coordenação da professora Fabíola
Moura. As reportagens produzidas pelo “Coisas do Sertão” buscam mostrar as
potencialidades do Semiárido Brasileiro, seguindo uma ótica que muitas vezes não é
retratada pelos veículos de comunicação comercial e pela grande mídia. O programa faz uma
abordagem regional sobre diversos aspectos e características locais como a cultura, sociedade
e ciência, com o intuito de desmistificar os estereótipos construídos em torno da imagem do
sertanejo e do semiárido. O “Coisas do Sertão” apresenta pautas sobre assuntos de interesse
social, mas que muitas vezes, não são abordadas pela mídia local. O programa também
permite aos estudantes que integram o projeto, refletirem e debaterem os discursos
produzidos pela mídia, que descaracterizam a imagem do sertão, levando-os a repensar
matérias que valorizem as riquezas encontradas no semiárido brasileiro.
166
Universidade do Estada da Bahia (UNEB), Campus III, Juazeiro - BA.
Graduada em Comunicação Social- Jornalismo em Multimeios e-mail:. [email protected].
167
Orientador do trabalho. Professor do Curso Comunicação Social- Jornalismo em Multimeios. e-mail:
[email protected].
451
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A CIRCULAÇÃO DO CONHECIMENTO PROMOVIDA PELAS BIBLIOTECAS
RESUMO:
168
Mestrando em Tecnologia Ambiental – ITEP; Auxiliar de Biblioteca do Instituto Federal do Sertão
Pernambucano, Campus Salgueiro; E-mail: [email protected]
169
Graduanda em Gestão Ambiental – UNOPAR; Auxiliar de Biblioteca do Instituto Federal do Sertão
Pernambucano, Campus Salgueiro; [email protected]
170
Especialista em Metodologia do Ensino da Matemática – Faculdades Montenegro; Graduando do Curso de
Especialização em Educação Contextualizada para Convivência com o Semiárido Brasileiro – UNEB; Professor da
Rede Pública Municipal de Ensino – Juazeiro-BA. [email protected]
452
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A PRODUÇÃO TEXTUAL ESCRITA NO ENSINO FUNDAMENTAL II
RESUMO:
Considerando o processo de desenvolvimento do ensino de Língua Portuguesa desde os anos
60 que se pautava numa visão estruturalista e formalista acerca da língua, bem como as
transformações que ocorreram a partir da década de 80 em que a noção de língua fechada em
si mesma passa a não ser mais suficiente para dar respaldo às discussões e conflitos que
envolvem a aprendizagem dos alunos, discutimos a produção textual no Ensino Fundamental
II, mais especificamente, no sexto ano, sobre a escrita enquanto processo de inserção social
de estudantes (BRONCKART, 1999), como parte de nossas atividades de monitoria em
Linguística Textual. Nesse sentido, a ideia de que língua e sociedade estão intimamente
relacionadas e que não se definem separadamente, revalidando a concepção de linguagem
como forma de ação e evento social, cultural e histórico, além de cognitivo e interacional
(MARCUSCHI, 2008) ganha força e orienta o estudo da língua/linguagem pautado no estudo
do texto, elemento básico para o ensino de Língua Portuguesa. A relevância de nosso estudo
está em mudanças necessárias à prática que tem apresentado algumas carências em relação à
aplicação dessas teorias no contexto de ensino de LP, uma vez que muitos docentes não estão
trabalhando o texto como fenômeno comunicativo e estão enfocando apenas os aspectos
linguísticos. Além disso, os livros didáticos podem não favorecer essa aplicação, pois
costumam influenciar a utilização dos mesmos gêneros textuais, deixando de explorar outras
possibilidades de textos que estejam presentes em contextos mais gerais, deixando de
possibilitar uma produção textual de forma significativa e a identificação com situações
concretas de uso. São essas situações concretas que favorecemos nesse estudo.
*Isadora Cristiana Alves da Silva – Graduanda em Letras e suas Literaturas – UPE/ Campus Garanhuns. E-mail:
[email protected]
* Profª.Drª. Jaciara Josefa Gomes – Orientadora – UPE/ Campus Garanhuns.
453
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A REPRESENTAÇÃO DOS BICHOS NA POESIA POPULAR DESTINADA ÀS
CRIANÇAS
171
Estudante concluinte da graduação de Letras, vinculada à Universidade Federal de Campina Grande, campus
I - situado nesta mesma cidade - com habilitação em Língua Portuguesa. Monitora da disciplina Introdução à
Linguística pelo segundo semestre consecutivo – 2013.1/2013.2. Desenvolve pesquisas relacionadas à área de
Literatura Infanto-juvenil. E-mail: [email protected]
454
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A UTILIZAÇÃO DA TECNOLOGIA PARA AUXÍLIO DO ESTUDO DA
LITERATURA BRASILEIRA
RESUMO:
O presente trabalho traz informações sobre a execução de um projeto elaborado a partir das
necessidades de uma escola da rede pública de ensino de Petrolina-PE pela bolsista do
Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência – PIBID – do Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano – Campus industrial, executado em
parceira com a professora de língua portuguesa e literatura do ensino médio do turno
matutino. Durante dois meses, os alunos foram orientados a pesquisar sobre as escolas
literárias para a confecção de um livreto que auxiliasse no estudo da literatura brasileira,
assunto geralmente encarado como “chato” pelos mesmos. Para que tal projeto pudesse ser
concretizado, disponibilizaram-se oficinas de fotografia e edição de textos e imagens (todas
acompanhadas de materiais obtidos com ajuda da própria escola e da coordenação do PIBID)
para que o conteúdo do trabalho fosse inteiramente creditado aos estudantes que estavam
envolvidos. Após análise do questionário de avaliação das atividades propostas pelo projeto,
constatou-se que os alunos classificaram a metodologia utilizada como muito satisfatório,
principalmente por ser algo diferente do que eles estavam acostumados a vivenciar em sala
de aula. As críticas foram tanto positivas, quanto negativas; o que só enriqueceu mais o
aprendizado.
455
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
CARTA DO LEITOR: UMA ESCRITA PARA ALÉM DA SALA DE AULA
172
Mestranda do Profletras da UPE (Campus Garanhuns). Especialista no ensino de Língua Portuguesa. É
professora na Faculdade Maurício de Nassau e na Secretaria de Educação de Caruaru. Email:
[email protected]
Doutora em Letras/Linguística pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), onde também cursou o
173
456
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
[ENTRE] LAÇOS DE MEMÓRIAS: COMPARTILHANDO AS LEMBRANÇAS DA
INFÂNCIA
NA PERSPECTIVA DO LETRAMENTO LITERÁRIO
RESUMO: A leitura é uma atividade naturalmente interativa, pois o leitor interage com o
autor e todas as vozes que dali emergem por meio do texto. Quando se trata da leitura
literária, são muitos os desencontros na sala de aula. Por essa razão, a escola precisa
conscientizar-se do seu papel fundamental na formação do leitor literário. A pesquisa aqui
apresentada configura-se como um relato de experiência na perspectiva do letramento
literário, vivenciada no segundo semestre do ano de dois mil e treze, junto a uma turma do 9º
Ano do Ensino Fundamental da Escola Estadual Tristão de Barros (Currais Novos-RN).
Apresenta uma abordagem qualitativa e segue a orientação das quatro categorias defendidas
por Hamilton. A atividade que foi intermediada por textos/ ilustrações produzidos por uma
senhora de 92 anos, foi avaliada como bastante significativa, considerando a dinâmica de
interação dos alunos e demais participantes e também porque promoveu a reflexão e a
[re]significação da leitura, sobretudo a leitura literária, e das concepções de memória e
velhice.
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) – Mestranda do PROFLETRAS – Campus de Currais
174
Novos – RN. Professora de Língua Portuguesa e Literatura da Escola Estadual Tristão de Barros – Currais Novos
–RN (Ensino Fundamental e Ensino Médio Inovador) E-mail: [email protected].
457
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
TOPA – TODOS PELA ALFABETIZAÇÃO: DESAFIOS À CONTEXTUALIZAÇÃO E
AO LETRAMENTO - RELATOS DE ALFABETIZANDOS DO PROGRAMA NO
SEMIÁRIDO JUAZEIRENSE
Resumo
A ideia da construção deste trabalho é fruto de algumas reflexões concebidas a partir de
observações nas turmas de alfabetização do TOPA – Todos pela Alfabetização, no qual sou
coordenadora de turma no município de Juazeiro-BA, região do Semiárido Brasileiro. O
estudo objetiva fazer um recorte retratando homens e mulheres sertanejos e sua trajetória
educacional, num contexto histórico de políticas públicas assistencialistas de combate às
secas. A partir dos relatos desses senhores e senhoras é possível compreender como se deu o
processo histórico de constituição dessa região estigmatizada, invisível aos olhos do Poder
Público que não promovia políticas educacionais que de fato promovessem a permanência
desse povo em seus territórios e o desenvolvimento da região. Analisar e problematizar as
práticas educativas na perspectiva da contextualização e do letramento nas salas de aula do
Programa também faz parte da pesquisa, uma vez que vivemos um período de mudanças
paradigmáticas focadas no rompimento com o colonialismo científico, que durante muitos
anos traçou os contornos desse Semiárido retratado de forma distorcida nos livros didáticos e
que de certa forma subjugou a capacidade desse povo de viver e conviver nesse território.
Com a pretensão de provocar uma discussão acerca das práticas educativas, tendo em vista
que a contextualização e o letramento são pressupostos fundamentais na desconstrução dessa
imagem de Semiárido “seco”, “feio”, “pobre” e a ressignificação de um território habitado por
gentes, que pensam que sentem e que desejam ser ouvidas. Dessa forma, é possível
compreender a necessidade de uma política educacional fundamentada em práticas
educativas na perspectiva da construção identitária desses sujeitos.
458
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A VARIAÇÃO ESTILÍSTICA NOS JORNAIS POPULARES: HÁ DIFERENÇAS DE
REGISTRO ENTRE JORNAIS DE PERNAMBUCO E DA PARAÍBA?
RESUMO
Todo veículo de comunicação tem seu lugar de atuação e um modo de empregar a linguagem,
seja na fala, seja na escrita. Os jornais impressos, como veículos de comunicação de massa,
fazem uso de diversos tipos de uso da língua, dependendo do assunto que eles veiculam, para
quem eles veiculam e onde estão veiculando a informação. É o que se chama de variação
estilística, ou de registro, é a variação dentro de um contexto específico. Os usuários
“adéquam” o uso da língua dependendo das circunstâncias de utilização dela. Diante disso, o
objeto de estudo deste artigo são os jornais populares que circulam no estado de Pernambuco
e na Paraíba e seus correspondentes mais tradicionais. São considerados populares por
atenderem a um público específico, situado em classes sociais menos privilegiadas, por
custarem mais barato que os jornais mais tradicionais e por usarem a língua num registro
mais informal como forma de alcançarem esse público, fazendo com que tenham acesso à
informação. Para subsidiar a pesquisa, seguimos como fundamentação teórica os trabalhos
em Sociolinguística de autores como Alkmin (2005), Camacho (2005), Scherre (2008),
dentre outros, que trabalham com a questão da variação linguística, especificamente os
registros linguísticos, em vários contextos. O corpus da pesquisa é constituído de exemplares
de jornais populares e tradicionais de Pernambuco (o chamado Aqui PE) e da Paraíba (que
tem o nome de Já). A análise será realizada comparando o registro de um e de outro jornal
para detectar se a linguagem difere ou não nestes jornais, chegando assim a saber se, de fato,
há discrepâncias entre o uso da língua nos veículos de Pernambuco e da Paraíba.
459
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA NO IF SERTÃO PE: O DESAFIO DE ARTICULAR
MÚLTIPLAS LINGUAGENS MEDIADAS PELA TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO
RESUMO:
A linguagem, como poderosa instituição social na sociedade da informação e do
conhecimento, requer constantemente melhorias em seus instrumentos, posto que necessita
viabilizar a comunicação eficiente e consequentemente a transmissão de informações que
atendam ás demandas geradas pelos sujeitos dessa sociedade. A educação é distância não é
uma inovação dessa sociedade, mas suas ações foram potencializadas nela a partir do uso de
ferramentas que possibilitam o acesso mais rápido as diversas formas de interagir com o
conhecimento acumulado pela humanidade. Garantir, através das dinâmicas de educação à
distância, o acesso à diversidade textual seja acadêmica ou não, utilizando-se da
multiplicidade de e tecnologias da informação e da comunicação promovendo articulações
nessas linguagens é o primeiro grande desafio dos cursos na modalidade à distância
vivenciados no IF SERTÃO – Campus Petrolina. Para a elaboração desse estudo foram
traçados objetivos que possibilitassem descrever as experiências com formas de linguagem,
de leitura e interpretação de textos nos ambientes virtuais de aprendizagens nas disciplinas
dos cursos estudados.
175
IF SERTÃO PE, Campus Petrolina, Professora do Curso de Licenciatura em Química, Coordenadora de Tutoria
nos Cursos de Educação à Distância, Mestranda em Ciências da Educação. Email: socorro.tavares@ifsertao-
pe.edu.br
2
IF SERTÃO PE, Campus Salgueiro, Técnico de Laboratório de Química, Tutor nos Cursos de Educação à
Distância, Mestrando em Ciências dos Materiais. Email: geraldo.vieira@ ifsertao-pe.edu.br
3
IF SERTÃO PE, Campus Petrolina, Professor do Curso de Eletrotécnica, Coordenador Geral dos Cursos de
Educação à Distância, Mestrando em Engenharia de Software. Email: hommel.almeida@ ifsertao-pe.edu.br
460
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
GÊNERO CORDEL: UM RECURSO NO PROCESSO DE LETRAMENTO
INTERDISCIPLINAR
RESUMO
176
Aluna do mestrado de Língua e Cultura da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Salvador.
([email protected])
461
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
GÊNERO E MOVIMENTO SOCIAL: LEITURAS E VIVÊNCIAS NO SERTÃO
DA BAHIA
RESUMO: O mundo contemporâneo será profundamente marcado pela velocidade com que
os fatos ocorrem. No atual modelo de sociedade nada está posto como pronto, somos seres
em processo, sendo assim, poderíamos dizer que as relações com o meio social são
construídas e estabelecidas de acordo as necessidades/interesses políticos, sociais, culturais,
econômicos e geográficos, concepções que podem ser ampliada ou reduzidas a partir das
leituras que tecemos no mundo e com o mundo. Intensifica-se o debate e a reflexão em torno
de questões tidas e consideradas tabus pela sociedade, como: sexualidade, orientação sexual,
preconceito racial e étnico, além da garantia de direitos de categorias como mulheres,
crianças e adolescentes, e idosos/as. Gênero é outra categoria, que nas últimas décadas saiu
do anonimato, e passou a ser pensada e discutida. Vale salientar a importante contribuição
dos movimentos sociais, inicialmente o movimento feminista e posterior outros movimentos
em defesa dos direitos humanos, das organizações não governamentais, das Pastorais Sociais,
dentre outros setores que se debruçaram sobre essa temática. A metodologia utilizada nessa
pesquisa foi a etnográfica com método qualitativo. A pesquisa foi desenvolvida no Projeto de
Assentamento Nova Canaã – Pindobaçu – Bahia. A partir das analises dos dados constata-se
que há por parte dos assentados e assentadas uma legitimação sobre a importância da
discussão da temática, relações sociais de gênero, contudo, no cotidiano a vivência dessas
relações acontecem na sua maioria de acordo o modelo patriarcal.
177
Mestrando em Educação, Cultura e Territórios Semiáridos – PPGESA, Universidade do Estado da Bahia,
Juazeiro – Campus III. Email: [email protected]
178
Mestrando em Ensino, Filosofia e História das Ciências – PPEnFHC – UFBA/UEFS. E-mail:
[email protected]
462
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
GRUPO DE ESTUDO EM POLÍTICAS DE LETRAMENTO – GPOL E AS PRÁTICAS
DE INVENÇÃO DOCENTE.
RESUMO: Este trabalho trata um grupo de estudo que inclui discussões sobre leitura de
professoras de Língua Portuguesa que trabalham na Educação Básica de Escolas Públicas do
Vale do São Francisco e, que participam de uma pesquisa de mestrado em andamento. O
GPOL discute questões voltadas para as politicas de letramento, com contornos particulares
na reflexão da formação e as práticas de leitura de professores e professoras que desenvolvem
seus trabalhos nas Escolas Públicas Estaduais e Municipais. Docentes que se preocupam com
a própria formação. A fundamentação teórica partiu da concepção de invenção e apropriação
cunhada por (CERTEAU, 2012); também de (FREIRE, 1996) na perspectiva da autonomia
docente; (STREET, 2010) com os novos estudos do letramento E (KLEIMAN, 1995/2001)
com as práticas sociais de leitura e o letramento docente e (SANTOS, 2013) que contribui
para dar uma noção de pesquisa em formação. O objetivo desse trabalho é socializar uma
experiência de um grupo de estudo (GPOL) pelo prisma da pesquisa-formação. O enfoque
ancora-se em discussões voltadas para as práticas de invenção docente que possibilitam a
fomentação nas práticas de leitura desenvolvida nas salas de aulas. Nesse sentido, o grupo
possibilita uma aproximação dos espaços acadêmicos com as práticas desenvolvidas na
Educação Básica, em especial sobre as práticas de leitura.
179
O artigo foi produzido a partir de parte de dados da fase final da dissertação Mestrado em Crítica Cultural
pela UNEB Campus II – Alagoinhas- BA. [email protected]
463
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
LETRAMENTO EM LÍNGUA INGLESA COMO PROPOSTA DE FORMAÇÃO
CONTINUADA PARA PROFESSORES DA REDE PÚBLICA
180Ló Ruama Patrícia da Silva Lima
181Zaira Dantas de Miranda Cavalcanti
180
Graduada do curso de Licenciatura em Letras - Língua Inglesa e suas Literaturas da Universidade de
Pernambuco – UPE/ Campus Petrolina.
181
Professora auxiliar do curso de Licenciatura em Letras – Língua Inglesa e suas Literaturas da Universidade de
Pernambuco - UPE/ Campus Petrolina.
464
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
LETRAMENTO, VISUALIDADES E PRÁTICAS SOCIAIS:
EDUCAÇÃO CONTEXTUALIZADA PARA CONVIVÊNCIA COM O SEMIÁRIDO¹
RESUMO: Este trabalho discute sobre as visualidades e a confluência das culturas do sertão
na Festa do Licuri na perspectiva de análise das formas de letramentos e formação para a
convivência com o semiárido. Embasado pelos ideais de Santos (2011) e Kleiman (2008),
compreende o letramento como múltiplas habilidades em práticas sociais; e as visualidades,
tomadas pelos estudos de Gomes (2012) como uma proposta de produção de sentidos e
aprendizagens a partir das redes transversais; de maneira que os elementos visuais
emprestam condições aos fenômenos de letramento e referentes suficientes aos processos
comunicativos contextualizados, visto que essas ocupam, nesses processos-fenômenos, um
lugar central. Assim, se configura nossos interesses para pesquisar e defender a questão dos
letramentos plurais a partir do visual e todas as questões habitadas no contexto e nos
conceitos estudados.
182
Mestranda em Educação, Cultura e Territórios Semiáridos – Linha Letramento e Comunicação Intercultural,
Universidade do Estado da Bahia – DCH III. E-mail: [email protected]
465
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O USO DE IMAGENS EM PRÁTICAS PEDAGÓGICAS
Palavras Chaves: Texto Imagético. Leitura e Escrita. Cultura Visual. Formação de leitor.
466
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
PRÁTICAS DE ESCRITA NO POVO INDÍGENA TRUKÁ –PE
183
Mestre em Crítica Cultural, Linha 2 – UNEB- Campus II; professora de Língua Portuguesa; email:
[email protected]
467
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
REFLETINDO SOBRE A ABORDAGEM DO POEMA DE CORDEL EM UM
MANUAL DO 6º ANO
RESUMO: A poesia popular, enquanto literatura oral já existe há mais de 3.500 anos. No
Brasil o cordel chegou, trazido de Portugal, onde era vendido como "folhas soltas", mas foi
com o poeta Leandro Gomes de Barros que ele ganhou celebridade e passou a ser
comercializado em folheto na forma como conhecemos hoje. A literatura de cordel é um
Patrimônio do Povo paraibano, nordestino e brasileiro que só se transformará em uma
cultura conhecida e divulgada a partir do momento em que as escolas passarem a estimular o
seu uso, adotando o hábito da leitura e conscientizando a todos da real necessidade de se
preservar o cordel enquanto saber cultural. Acreditamos que estas devem incentivar e
promover o trabalho com cordéis em sala de aula, mas sabemos que isto não é uma tarefa
fácil tendo em vista que os livros didáticos têm assumido certa importância dentro da prática
de ensino, sendo este instrumento de ensino-aprendizagem quem determina conteúdos e
condiciona estratégias. Partindo deste pressuposto nossa pesquisa consistirá em analisar um
livro didático do 6° ano do ensino fundamental, a fim de investigar qual o lugar dedicado à
poesia popular neste manual, verificando as propostas de atividades e como estão sendo
desenvolvidos os conteúdos referentes à abordagem do cordel no contexto escolar.
Verificaremos ainda se o manual está em consonância com as propostas dos PCNs de Língua
portuguesa (1997). Fundamentaremos nossas discursões acerca da tipologia de perguntas
em Marcuschi (1998) e o ensino de poemas em sala de aula em Pinheiro (2003,2007).
468
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
SÍNTESE BRASILEIRA DE GÊNEROS TEXTUAIS: O QUE REVELAM OS
ESTUDOS PIONEIROS EM LIVROS E NOS ANAIS DO SIGET
RESUMO: Atualmente, o estudo sobre gêneros tem se tornado comum e cada vez mais
conhecido e reconhecido por meio dos inúmeros estudos e pesquisas, não só desenvolvidas,
mas também publicadas na área. As questões que orientam este projeto apresentam
interesse não apenas teórico para o campo de estudo de gêneros, pois consideram a
centralidade do conceito de gêneros e sua repercussão no ensino de língua no país
contribuindo para que se perceba a complexidade do tema e a variedade de abordagens que
podem ser utilizadas para tratá-lo. Além de compreender o rumo dos estudos e da pesquisa
de gêneros no Brasil também pode contribuir para se colocar ao alcance dos docentes de
língua portuguesa diversas outras concepções teóricas e metodológicas para o ensino,
evitando que se tomem os PCN como uma espécie de caminho único para o tratamento do
assunto. Além disso, tivemos como objetivo, fazer um mapeamento dos estudos de gêneros
textuais no Brasil conforme apresentados em livros que foram publicados entre os anos de
2000 e 2010 e em artigos de pesquisadores vinculados à Universidade Federal de Santa
Maria-RS (UFSM), Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e Universidade Federal de
Santa Catarina (UFSC).
184
Graduanda em Letras, bolsista do PIBIC/CNPq
Universidade de Pernambuco (UPE).
Campus Garanhuns.
[email protected]
469
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
UMA BREVE ANÁLISE DO LETRAMENTO NAS COMUNIDADES ECLESIAIS DE
BASE
RESUMO:
Os estudos acerca das práticas e eventos de letramento nos contextos sociais formais como a
escola e a universidade têm sido alvo de muitas pesquisas, porém quando se trata das
práticas que se desenvolvem em ambientes alternativos ou considerados informais, poucos
estudos são encontrados. Por esta razão, o presente trabalho buscou analisar os eventos de
letramento desenvolvidos pelas Comunidades Eclesiais de Base, já que elas primam pela
formação de seus membros tanto no âmbito religioso, quanto no social. Nosso referencial
teórico baseou-se nos estudos sobre práticas e eventos de letramento desenvolvidos por
Street (1984), Kleiman (2007), Lêdo (2013), entre outros. Ainda fazem parte da nossa base
teórica os estudos sobre gêneros desenvolvidos pelos pesquisadores Marcuschi (2008), Miller
(2012), Bazerman (2005), Bawarshi e Reiff (2013), visto que tomamos gêneros como
mediadores dos eventos de letramento. Para o cumprimento dos nossos objetivos
observamos os encontros de formação promovidos pelas Comunidades Eclesiais de Base
durante o segundo semestre de 2013 e o primeiro semestre de 2014 com a finalidade de
observar que práticas de letramento orientam os eventos de letramento desenvolvidos com o
letramento escolar.
470
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A CONTRIBUIÇÃO DA LEITURA DO TEXTO LITERÁRIO PARA A FORMAÇÃO
DOS ALUNOS DO ENSINO MÉDIO
*
Docente Mestre da Escola Técnica de Saúde de Cajazeiras do Centro de Formação de Professores da
Universidade Federal de Campina Grande – ETSC/CFP/UFCG – Campus de Cajazeiras, Paraíba.
E-mail: [email protected]
Este Projeto foi aprovado pelo PIBIC/CNPq/UFCG, e desenvolvido por Islânea Blenda Rolim de Sousa, aluna do
2º ano do Ensino Médio da Escola Técnica de Saúde de Cajazeiras do Centro de Formação dos Professores da
Universidade Federal de Campina Grande – ETSC/ CFP/UFCG – Campus de Cajazeiras – Paraíba, com Bolsa do
CNPQ – PIBIC-EM (2012), sob minha coordenação e orientação.
471
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A INSUFICIÊNCIA DA SUBJETIVIDADE: INSPIRAÇÃO, DISTORÇÃO E
OPORTUNISMO NA POÉTICA DE GREGÓRIO DUVIVIER
RESUMO
Analisamos como um discurso artístico pode fundamentar-se em argumentos distorcidos e
oportunistas; buscamos instrumentos reflexivos sobre tais argumentos para contribuir a
professores e estudantes uma reflexão sobre a insuficiência da subjetividade. Estudamos os
conceitos de “virtual”, de Pierre Levy, e “discurso”, de Dominique Maingueneau. Realizamos
uma pesquisa qualitativa por meio do método dialético, escolha necessária para análise
textual com referências históricas. Iniciamos a pesquisa observando a existência de uma arte
que se fundamenta distorcendo a obra impactante de Duchamp (“Mictório”) na sociedade e
contexto da época em que foi produzida. Hoje muitas artes fomentam a sociedade do
espetáculo ou lucram com editais. Problematizamos a questão ao escolhermos o poema:
“Receita para um dálmata (ou Soneto branco com bolinhas pretas)” de Gregório Duvivier. No
texto, há uma manipulação do discurso dadaísta que gera uma fusão entre argumento
distorcido (por ridicularizar, primazias do meio/modo) e o oportunista (a arte
contemporânea, primazias da finalidade). Revela-se na análise que entendemos por virtual: a
potência de um texto está sempre se transformando, seja pela atualização da forma e
conteúdo que são preenchidos pela leitura, seja pelo meio social em que o texto é construído.
Diferentemente seria a análise se não tivéssemos a primazia do interdiscurso, o poema só
poderia ser aceito na instância subjetiva. Compreendemos que a subjetividade está para além
do emocionar, está no persuadir também. Instrumentalizar-se das primazias do discurso e ter
em mente o conceito do virtual é recepcionar a arte feita e assumida por uma pessoa, mas
também a serviço de algo e justificada por algo. Quando os fins justificam os meios, é preciso
cautela para que o meio vazio não venha a encher os olhos a uma finalidade de embuste.
Subjetividade não é condescendência e permissividade, somos nós mesmos.
472
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A REINVENÇÃO DO SERTÃO SERIDOENSE NAS MEMÓRIAS LITERÁRIAS
DE DONA COTA
RESUMO: No gênero Memórias literárias o autor escreve suas lembranças pela via da
criação estética, ou seja, o autor de memórias fala de suas experiências ofertando a cada uma
nuances de criatividade, emoção e devaneio, o que confere a estas o caráter universal. O livro
Minha infância minha vida: livro de memórias, foi escrito por Maria Raquel de Medeiros
dos Santos (in memoriam), mais conhecida como Dona Cota, uma seridoense nascida em
1921, no interior do RN, onde viveu até os seus 92 anos de idade. O livro reúne trinta Textos/
Ilustrações (T/I) que guardam e contam suas histórias da meninice e juventude. Ler e
observar os T/I de Dona Cota é aventurar-se em uma viagem feita de cores, palavras e
lembranças. Suas memórias são contadas e desenhadas pelo caminho da realidade e da
imaginação. Diversas são as imagens em que o belo e o apelo às cores sinalizam para um
sertão colorido, florido, também vivido pelo sonho, pela fantasia. Trazer à análise essas
memórias é possibilitar a indivíduos seridoenses ou não, desse ou de outros tempos, a
experiência da leitura estética, a [re]significação do sertão seridoense, da identidade
sertaneja.
186
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) - Mestranda do PROFLETRAS – Campus de Currais
Novos-RN. Professora de Língua Portuguesa e Literatura da Escola Estadual Tristão de Barros – Currais Novos-
RN (Ensino Fundamental e Ensino Médio). E-mail: [email protected].
473
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A RELAÇÃO ENTRE O LOCAL E GLOBAL NA RECONSTITUIÇÃO DE MANGUE
SECO COMO REPRESENTAÇÃO INDENTITÁRIA NORDESTINA NO ROMANCE
“TIETA DO AGRETE” DE JORGE AMANDO
RESUMO: Este trabalho é uma pesquisa bibliográfica que pretende estudar a representação
do cenário no romance “Tieta de Agreste” de Jorge Amado. Analisando a relação entre o local
e global na reconstituição de Mangue Seco como representação indenitária nordestina,
constatou-se que esse é um traço folhetinesco de idealização na constituição do local como
um paraíso perdido que se mantem como representação indenitária de um local por manter-
se afastado da zona urbana e do progresso. Observa-se que os fatores que possam
transformar o local e urbaniza-lo são tidos como vilões. No enredo, a fábrica Brastânio traz a
promessa de progresso e sob o ponto de vista estético e folhetinesco. Representa o vilão, o
mal associado ao progresso. Este trabalho também analisa o uso da xilogravura como artificio
estético de uma literatura popular que vem reforçar a busca de Jorge Amado de constituição
de uma literatura moderna comprometida com uma reinvenção do ethos nordestino. Como
resultado da pesquisa, percebe-se como a análise das xilogravuras demostra a forte ligação do
progresso com o mal. A xilogravura analisada simboliza o medo dos habitantes com relação à
urbanização de um local paradisíaco e intacto, revelando assim, a forte ligação entre local e
identidade expressa no romance.
474
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
CARTOGRAFIA DO NOVO: O REGIONALISMO NA FICÇÃO DE BARTOLOMEU
CORREIA DE MELO
Universidade Federal do Rio Grande do norte, Natal-RN. Especialista em Literatura Brasileira e mestranda
187
Resumo:
A hermenêutica, redimensionada por Hans-Georg Gadamer, é nossa orientação para a
análise de alguns pontos do livro Os Sertões, de Euclides da Cunha. Valendo-nos de um dos
elementos fundamentais, o preconceito, divididos em verdadeiros e falsos, fizemos uma
escansão de diversos pontos do livro em análise. Vimos que os preconceitos verdadeiros
incidiram sobre o conhecimento do lugar, a terra, enquanto que os falsos, sobre o homem, o
povo e sobre o a guerra, o fenômeno. Faremos uso de alguns momentos do texto, destacando
trechos das três partes que constituem a obra a fim de possibilitar-nos um quadro amplo
dela. Dividido conforme o cunho naturalista que subjaz a obra, Euclides da Cunha dividiu seu
trabalho na sequência seguinte: I - A TERRA, II - O HOMEM, III - A LUTA. Há que se
observar também, outro aspecto do pensamento euclidiano, na obra aqui analisada, é aquela
em que nos defrontamos, dentro das terras colonizadas, com os considerados Moderno e
não-Moderno. Pertencendo ao primeiro grupo, os moradores do litoral e, ao segundo, os
sertanejos, interioranos. O feito de Euclides fez surgir no país, daquele que detinha o saber
letrado, o logos, o sentimento de que o Brasil era muito mais que o litoral. E o fez com o
monumento literário nunca visto antes, o qual permanece até os dias atuais como fonte de
debates sobre uma possível classificação para o texto, se uma tese, um ensaio, um romance,
etc.
476
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
JOÃO GRILO E A PROBLEMÁTICA SOCIAL BRASILEIRA
RESUMO:
De origem incerta e de nacionalidade múltipla, João Grilo, personagem da cultura popular,
encerra em suas ações todos os anseios das classes subalternizadas. No Brasil, Grilo encontra
terreno fértil para as suas picardias e o texto de cordel é o ambiente ideal para proliferar seus
pensamentos e atitudes em prol de uma melhor condição de vida. Desse modo, ao verificar a
construção da personagem e seus atos como forma de protesto a uma política que promove a
exclusão e as diferenças sociais, neste trabalho, discute-se a composição da personagem João
Grilo a partir do folheto Proezas de João Grilo, atribuído a João Ferreira de Lima e sua
relação com o ambiente agreste em que vive. A personagem, pois, sai do imaginário popular,
da boca dos cantadores para habitar os textos de cordel, sendo o porta-voz do povo sofrido do
sertão. Como pícaro que é, dribla as dificuldades da vida, rompe com um status quo
estabelecido e questiona o descaso político-social existente no Nordeste. Suas aventuras,
pois, remetem a uma subversão das normas sociais vigentes, quando, o povo, representado
por Grilo, ousa denunciar as mazelas que reinam no mundo esquecido do sertão. Para tal
estudo, utilizam-se os pressupostos de Haurélio (2010), Zumthor (2007), Abreu (1999),
Araújo (1992), dentre outros.
Professor Assistente da área de Literatura da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Campus Universitário
188
Professor Gedival Sousa Andrade, DCHT XXIV, Xique-Xique-Ba, doutorando em Letras pela Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). E-mail: [email protected].
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
LITERATURA E POLÍTICAS PÚBLICAS EM ALAGOINHAS: DESAFIOS E
PERSPECTIVAS NA CONTEMPORANEIDADE
RESUMO: Trata-se de uma abordagem reflexiva sobre a possível relação entre o ofício
literário e as atuais políticas públicas culturais. Nesse sentido, serão discutidos os resultados
obtidos no projeto de Mestrado intitulado Literatura e políticas públicas emAlagoinhas/BA
que investigou os modos de produção/circulação da literatura no município, assim como o
posicionamento político-cultural dos escritores frente ao Estado baiano, considerando o atual
momento de efervescência das políticas públicas de cultura e institucionalização da malha
cultural no Brasil. Sob a perspectiva da crítica cultural, fundamentada em estudos pós-
estruturalistas, abordaremos a noção de cultura literária que vem norteando a prática
cultural no país, seus reflexos e desdobramentos, traduzidos pelas políticas voltadas para o
livro, a leitura e a literatura. Para tanto, evidenciamos o método de pesquisa qualitativa
desdobrando-se em um conjunto de diferentes técnicas. Esta abordagem está pautada na
análise de resultados obtidos junto ao grupo focal e seus modos de produção. Como
resultados, além da constatação da existência de um rico acervo de escritores que não cessam
em produzir tornou-se visível a construção de um possível roteiro rizomático e suas
interconexões literárias, que se acionados, abrem possibilidades de a literatura ativar uma
máquina de guerra contra certa concepção excludente de fazer cultura.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O ESPAÇO DO PAI EM UMA ILUMINOGRAVURA DE ARIANO SUASSUNA
RESUMO: Ariano Suassuna promove uma criativa integração entre poesia e pintura em
suas obras chamadas iluminogravuras. Essas iluminogravuras são pranchas, na dimensão
de 70 cm x 50 cm, constituídas de um soneto e ilustrações, organizados em dois conjuntos
denominados “Sonetos com mote alheio”, de 1980, e “Sonetos de Albano Cervonegro”, de
1985. Neste artigo interpreta-se o texto de um poema com as gravuras criadas pelo autor:
“A Acahuan - A Malhada da Onça”. Esse tipo de obra feito de escritura e imagem reúne
elementos da cultura medieval e da cultura nordestina. O poema trata da figura do pai
registrada na memória do filho e recriada pelo texto e pela gravura. Essa figura transita por
um espaço especial na obra de Ariano Suassuna: o sertão onde o autor morou nas
fazendas Acahuan e Malhada da Onça citadas no título do poema. As transformações
espaçotemporais dizem respeito tanto à imagem paterna quanto à filial no poema. A partir
de uma tragédia e, também, levado por um sentimento trágico da vida além da percepção
de ser um exilado, o poeta reflete a respeito de sua posição em dois papéis: o de filho e o de
herdeiro que recebe a herança do pai e a leva para diante. As imagens pictóricas reforçam as
imagens verbais em um conjunto que oferece ao leitor uma experiência dupla. Cada elemento
desenhado remete ao poeta ou à natureza e à cultura do sertão, como em outras
iluminogravuras do autor. Especialmente, nesta iluminogravura, é dado um destaque muito
grande à figura do pai – nomeado como rei, guia ou sol. O poema está entre as várias obras
de Ariano Suassuna que criam esse pai ideal.
∗
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte/MG. Doutoranda no Programa de Pós-
Graduação em Letras da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, [email protected].
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O PROCESSO DE DESTERRITORIALIZAÇÃO E O DE RETERRIORIZAÇÃO NO
LIVRO OITEIRO: MEMÓRIAS DE UMA SINHÁ-MOÇA
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
UMA ANÁLISE COMPARATIVA SOBRE O SERTANEJO: ASA BRANCA E
CIDADÃO COMUM
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
EDUCAÇÃO INCLUSIVA – UM OLHAR DENTRO DO SERTÃO PERNAMBUCANO
Resumo:
Esse trabalho apresenta os resultados da pesquisa intitulada “A analise da inclusão dos
alunos com necessidades especiais dentro do IF Sertão-PE e em algumas escolas públicas do
município de Petrolina dentro do espaço geográfico conhecido como Sertão Pernambucano”
que traz as condições dos discentes com necessidades especifica que chegam ao Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano - IF Sertão PE - Campus
Petrolina; relatando as falas dos responsáveis pelo atendimento de alunos com necessidades
educacionais especificas em suas experiências de inclusão escolar dentre a visão do cotidiano
de escolas públicas do município de Petrolina – desde o pensamento formado dos cidadãos
em relação à educação inclusiva – e a visão de fato das particularidades das pessoas com
necessidades educativas especificas no município. Foi feito acompanhamento dos envolvidos
podendo-se perceber varias peculiaridades, principalmente do trajeto percorrido necessário
para formar visões distintas de uma mesma cena. Depois de identificadas, procurou-se fazer
comparações das informações dentro da região, vendo que, após obtenção dos resultados,
foram encontradas grandes diferenças de discursos e realidades. Apesar de este estudo ter
um caráter preliminar investigativo, essa coleta de informações demonstra mudanças sobre
como são contados os discursos, tendo assim abordagens precisas sobre o sertão dentro do
mesmo, julgando outras abordagens comparativas, principalmente em relação à de discursos
globais.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
AS CONTRIBUIÇÕES DE ALBERTO PASSOS GUIMARÃES PARA A
HISTORIOGRAFIA AGRÁRIA BRASILEIRA: UMA LEITURA DA
SEMIFEUDALIDADE NO BRASIL
Resumo: Um intelectual autodidata, como sendo bem a marca de sua época, produziu um
legado de obras guiado pelo materialismo histórico dialético, interpretando as diversas
relações e transformações em decurso a partir de análises em aspectos econômicos, sociais e
humanos, dando grande contribuição para a nossa historiografia agrária. Guimarães
percebeu a questão agrária brasileira de maneira histórica e contextual, partindo a princípio
da estrutura colonial instaurada no nosso território. Apontou o Brasil, característico aos
demais países Latino-americanos no seu desenvolvimento capitalista, com uma
predominante concentração territorial, herança das estruturas coloniais, sendo o latifúndio
uma marca de poderio e dominação perpetuada pelos séculos posteriores ao período da
colônia. Contudo, a não solução do problema agrário e camponês em decorrência da desigual
distribuição da propriedade da terra, em consequência à contradição latifúndio-minifúndio e
as diversas relações pré-capitalistas com permanências de estruturas semiservis no campo.
No contexto da questão agrária, na década de 1960, Guimarães desenvolveu uma tese em
defesa das características permanentes na estrutura agrária de um “feudalismo colonial”. Sua
análise reflete, de maneira histórica, a um cenário territorial marcado por uma forte essência
feudal em diversas relações de produção e de propriedade da terra, mas longe de se
caracterizar o sistema feudal europeu propriamente dito, mas também longe de se considerar
o capitalismo totalmente desenvolvido, isso porque tais relações apresentam-se como pré-
capitalistas, e com isso, características mais à renda feudal do que à renda capitalista. E, por
fim, Guimarães aponta que a penetração capitalista no território brasileiro, percorreu uma
via atrasada de desenvolvimento, sobretudo, nas relações de produção, sobrevivendo à
subjacência semifeudal, e, no histórico regime latifundiário de propriedade da terra, que
perduram séculos.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
DO ROMANCE À CRÔNICA NARRATIVA: LEITURAS DA OBRA AMADIANA
RESUMO
Este trabalho se constitui em dois vieses, a saber: um relato de uma prática pedagógica, a
partir do livro Capitães da Areia, de Jorge Amado e uma proposta para o ensino de produção
textual, para o oitavo ano do Ensino Fundamental. Seu objetivo é fomentar uma prática de
leitura que suscite um pensamento crítico e criativo entre os leitores, visando o
desenvolvimento de produções textuais coerentes. Para isso, fomentamos o conhecimento
sobre um autor da cidade de origem dos alunos e identificamos nela aspectos humanos e
geográficos da obra. O percurso metodológico compreendeu ações como: a leitura do livro,
seguida de sua interpretação; a visitação de espaços da cidade como o Museu de Arte
Moderna e o Pelourinho, a fim de ampliar a compreensão textual; a realização de um
seminário, para trabalharmos com a oralidade e aprofundarmos a análise do texto, através da
perspectiva dos alunos em torno de subtemas abordados no referido livro. Por fim,
estudamos o conceito de crônica narrativa, lemos diversas crônicas e as produzimos em
grupo, dupla, e individualmente, com assuntos encontrados na obra literária. As crônicas
foram publicadas no jornal da escola durante a culminância do projeto, tendo como público
leitor pais, professores e outros alunos. Para isso, utilizamos como referencial teórico Ana
Maria Machado (2002), Costa Val (1991), Cereja (2006). Desta forma, buscamos inserir no
ensino de produção textual, uma ação pedagógica cuja abordagem dialoga com a diversidade
tanto da linguagem quanto dos gêneros textuais.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
ANÁLISE DAS PRÁTICAS E EVENTOS DE LETRAMENTO EM UM CURSO DE
LETRAS À DISTÂNCIA
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A ESCRITA AUTOBIOGRÁFICA EM INFÂNCIA
Liliam Fernades
Universidade Federal dos Vales dos Jequitinhonha e Mucuri- Aluna de Graduação –Bolsista PIBIC-
CNPq.
Resumo:
O objetivo deste resumo é apresentar uma análise do livro Infância, de Graciliano Ramos,
texto autobiográfico, publicado em 1945. Nessa obra, Ramos relembra fatos de sua infância e
adolescência e os analisa de acordo com as experiências do presente. Sua escrita é pautada
em sua infância passada no Nordeste. Cada capítulo de Infância apresenta um episódio,
podendo ser lido separadamente. Graciliano escreve o livro após os seus cinquenta anos, seu
processo de aprendizagem influencia na redação do texto. O autor fala de si, mas também das
pessoas que passaram por sua vida, ele não escreve sobre o momento em que ele vive e, sim,
sobre sua experiência passada. No texto há interferências do momento da escrita que são
marcadas por suas reflexões no decorrer da narrativa. A escrita autobiografia, assim, é
complexa; ela não pode ser tratada simplesmente como a escrita das experiências passadas,
pois engloba o outro com os quais autor conviveu e a influência do presente nas lembranças
do passado.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
MARCAS DE VARIAÇÃO LINGUÍSTICA NA LITERATURA DE CORDEL:
ANÁLISE DOS TEXTOS “AI SE SÊSSE”, DE ZÉ DA LUZ E “AOS POETAS
CLÁSSICOS”, DE PATATIVA DO ASSARÉ
RESUMO
O presente trabalho avaliará, de forma dinâmica, a variação linguística dentro dos textos “Ai
se sêsse” do cordelista Zé da Luz e “Aos poetas clássicos”, de Patativa do Assaré, na literatura
de cordel. A literatura de cordel é o gênero textual que representa a cultura do povo
nordestino, do caipira, da linguagem coloquial do brasileiro. Nela percebemos a grandeza da
linguagem regional em função da arte literária. O cordel é tido como uma das formas de
educação linguística mais eficientes, pois contempla os aspectos mais relevantes da nossa
língua. Muitos educadores utilizam esse gênero para o ensino da língua portuguesa, pois a
presença de variações da língua, nesse tipo de texto, é mais comum e também carrega um
caráter cômico, por conta das histórias populares levantadas por esse gênero. A nossa
pesquisa avalia as marcas de variação linguística nos dois textos: o primeiro, trata do cordel
“Ai se sêsse”, de Zé da Luz; o segundo caso, do cordel “Aos poetas clássicos”, do poeta
Patativa do Assaré. Em ambos, foi avaliada a variação verbal, isto é, como a marca do uso do
verbo na linguagem coloquial é representada na escrita pelos poetas citados acima. Ao
percebermos essas diferenças, passamos a avaliar outros tipos de cordéis e observamos que
se trata de uma marca muito peculiar ao gênero ‘literatura de cordel’. Ao mesmo tempo,
podemos constatar que nesse universo de variação linguística e no cordel, existem
significados que são de grande serventia para o aprendizadoda língua, na abordagem da
diferença da modalidade oral para a modalidade escrita. Assim, percebemos que o uso dessas
duas modalidades vai depender diretamente da formalidade da situação. Com isso,
conscientizamos os usuários da língua portuguesa, das propriedades da língua e de suas
diferenças quanto ao uso de ambas as modalidades, através do estudos das suas marcas e
peculiaridades.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
I MOSTRA DE LITERATURA - VANGUARDAS EUROPEIAS
Resumo:
“Trabalhar a literatura em sala de aula é mergulhar num mundo de subjetividade e
encantamento, um lugar mágico onde o aluno encontra a possibilidade de se descobrir, se
reconhecer, se encontrar. Neste sentido, a literatura passa a ser um convite à liberdade de
expressão, onde os alunos podem exteriorizar seus sentimentos, descobrir e compreender as
próprias emoções”. (CASSIANE SCHMIDT). Pensando sobre esse ponto de vista, é que está
proposta de trabalho foi elaborada. Procuramos através da I Mostra de Literatura –
Vanguardas Europeias despertar nos discentes o gosto pelo DESCOBRIR, RECONHECER e
SE ENCONTRAR. Para isso, partimos de uma prática que evidenciou a contribuição das
manifestações artísticas – literárias das vanguardas europeias para a literatura brasileira.
Objetivamos estabelecer relações entre o texto literário e o contexto social e político de sua
produção, bem com, utilizar os conhecimentos sobre as estéticas literárias para refinar a
compreensão dos textos e reconhecer elementos de continuidade e ruptura na formação da
literatura brasileira. Visto que essas manifestações influenciaram decisivamente o
pensamento dos escritores brasileiros na Semana de Arte Moderna e a literatura brasileira
produzida naquele período. A mostra foi realizada na Escola Estadual Núcleo de Moradores
06, Petrolina – PE com as terceiras séries do Ensino Médio focalizando os movimentos
culturais: expressionismo, cubismo, futurismo, dadaísmo e o surrealismo. Sendo
desenvolvida numa perspectiva abrangente, que envolveu a realidade do aluno, procurando
fazer a articulação entre o conhecimento formal e informal.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
MARGINAL E INSÓLITA: RECORTE E REPRESENTAÇÃO DA LITERATURA DE
CORDEL EM FEIRA DE SANTANA/BA
Resumo:
A terra natal, o lugar de origem é um dos temas de destaque nas obras do autor
transformando cultura, saudosismo, personagens, valor afetivo em matéria poética. Sua obra
divide-se em três momentos. No primeiro, o poeta observa o mundo à sua volta e passa a
registrá-lo de um modo não convencional, assemelhando-se a um ser que se vê diferente
nomeado como gauche. Os objetivos do presente trabalho são investigar a lusofonia na obra
do poeta. Descrevendo Itabira (Minas Gerais) lugar de origem do poeta, em uma cidade cuja
memória viria a permear parte de sua obra. A identidade cultural está presente na poesia de
Drummond e tem uma relevância social e política para a sociedade; A partir de alguns
poemas de Carlos Drummond de Andrade dedicados aos desdobramentos da extração
mineral ele critica a destruição da natureza pela ambição. A terra natal é empregada de um
forte valor afetivo nas poesias do autor através memória social. A região de Minas Gerais é
um cenário de destaque na vida e obra do poeta que eternizou através das palavras o
sentimento e as denúncias através dos seus textos, os personagens de Itabira que se tornaram
fonte de inspiração para o autor, destacando a literatura brasileira.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
HERBERTO HELDER, LUIS SERGUILHA E ROBERTO PIVA: NO LIMIAR DOS
DEVANEIOS LÍQUIDOS E AÉREOS
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A SAGA CAROLÍNGEA E O CORDEL NORDESTINO: OS MESMOS FIOS EM
MUITAS AMARRAS
Resumo:
O propósito desse estudo é desenvolver uma leitura comparativa a partir de algumas
traduções brasileiras de A canção de Rolando e de poemas pertencentes à literatura de cordel
nordestina (A batalha de Oliveiros com Ferrabrás, A prisão de Oliveiros, de Leandro Gomes
de Barros; Traições de Galalão e a morte dos Doze Pares de França, de Marcos Sampaio,
entre outros). Através deste, conta-se destacar, à luz das relações transtextuais, que a
modernidade também reservou, principalmente no Nordeste brasileiro através da Literatura
de Cordel, o seu lugar de destaque para o fascínio que a gesta carolíngea exerceu e exerce
sobre o público através dos séculos. Muitos são os aspectos que aproximam e que distanciam
as traduções de A canção de Rolando e os folhetos de cordel que desenvolvem seus versos
acerca da heroicidade de Rolando, da lendária dor do rei Carlos Magno e de batalhas
apocalípticas em nome da honra. Esses cordéis são produtos de uma nova leitura que apenas
revela algumas permanências pontuais. A vitalidade desse tema francês do século XII reflete
uma permanência da épica européia trazida pelo elemento colonizador que foi assimilada e
recontextualizada pelos poetas da literatura de cordel no Nordeste brasileiro.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
CULTURA POPULAR: CONCEITOS E CARÊNCIAS EDUCACIONAIS
Resumo:
O presente trabalho tem como objetivo inserir na sala de aula a discussão sobre o conceito de
cultura e mais especificamente o conceito de cultura popular. Sabendo que para a
compreensão da nossa sociedade e do meio social no qual vivemos é indispensável entender
como foram criados os modelos culturais no Brasil. Ciente de que o povo brasileiro recebeu
ao longo dos tempos influências de diversos países sendo eles: Espanha, França, Portugal,
como também dos povos africanos entre outros. Busca ainda expor a necessidade vigente de
um arcabouço cultural por parte dos que são responsáveis pela mediação e a transmissão do
conhecimento na educação formal. Salientando que sem essa gama de conhecimento o
educador negligencia os saberes próprios dos educandos, como também dos seus. A definição
de cultura popular desde seus primeiros usos até o momento atual passou por diversas
transformações e modificações. Muitos estudiosos e estudiosas do tema criaram conceitos
adequados ao seu tempo, sendo posteriormente remodelados a partir de novas necessidades
sociais. A exemplo do samba que primeiramente foi marginalizado para em seguida se
transformar em gênero musical representativo de cultura popular.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
LITERATURA INFANTIL AFROBRASILEIRA PARA UMA FORMAÇÃO LEITORA
E IDENTITÁRIA
RESUMO: A literatura apresenta uma função essencial, atuar sobre as mentes e os espíritos.
O encontro com essa arte permite que os leitores tenham oportunidade de ampliar,
transformar ou enriquecer sua própria experiência de vida (COELHO, 1991). Neste sentido,
esta pesquisa tem por objetivo refletir sobre a formação leitora e identitária advinda da
Literatura Infantil. Para isso o estudo pautar-se-á na obra literária “Pretinho, meu boneco
querido” de autoria de Maria Cristina Furtado, 2008. Entendendo que a criança negra
precisa de representações positivas no espaço escolar e, a literatura pode contribuir para a
sua formação leitora e identitária, além de fomentar discussões sobre temas étnicorraciais, os
quais parecem “adormecidos” nessa instituição.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
VARIANTES LEXICAIS NAS CARTAS 87 E 92 DOS ATLAS LINGUÍSTICOS DA
BAHIA E SERGIPE
Lidiane Ferreira Silva
Mestranda em Língua e Cultura (UFBA)
Thamires Santana Coelho
Mestranda em Língua e Cultura (UFBA/FAPESB)
Resumo:
A literatura popular, o falar de um povo e seus costumes estão intrinsicamente ligados à sua
cultura. Dentro dos aspectos que envolvem a cultura de um povo está a língua, um dos
instrumentos de interação social, através da qual a cultura é difundida; logo não se pode
dissociar língua, linguagem e cultura. A escola possui um papel de suma importância quando
se fala em promover e defender as manifestações populares, porém parece haver um
equívoco por parte da mesma quanto ao ensino de língua, por vezes, ser dissociado da cultura
do povo que a fala. Nesse sentido, propõe-se que o ensino de língua se aproxime mais da
cultura popular a fim de mostrar o verdadeiro espelho da sociedade. Diante do exposto, este
trabalho analisa como as várias denominações da palavra menstruação podem ser
trabalhadas pela educação formal, ou seja, fazer uma relação entre ensino e cultura popular.
Para tanto, utilizou-se as cartas 87 e 92 do Atlas Prévio dos Falares Baianos (APFB) e o Atlas
Lingüístico de Sergipe (ALS), respectivamente, que registram as denominações para o
sangue que as mulheres perdem todos os meses. Foram encontradas diversas formas para
designar o ciclo menstrual da mulher no interior de Sergipe e no interior da Bahia. Foram
utilizados os pressupostos teórico-metodológicos da Dialetologia e da Geolinguística,
explorando-se a perspectiva diatópica – variação espacial – e os veios sociolinguísticos para
que, segundo Cardoso (2010), se verifique a adequação de dicionários, livros didáticos etc.
aos diversos falares, dando suporte aos professores para o melhor conhecimento da realidade
linguística do Português do Brasil, levando os estudantes a dominarem a variante culta da
língua sem desprestigiar a variante popular nem seus dialetos de origem.
496
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
LIVRARIAS E LUGARES LIVRES: UMA LEITURA DO SER HUMANO.
Ingrid Rodrigues
( UFPE- PPGL- Mestranda em Teoria da Literatura.)
Vinicius Pascoal
(UFPE-PPGL - Mestrando em Teoria da Literatura. UPE- PROLINFO-Coordenador de Interiorização)
Thiago Pininga (UFPE-PPGL - Mestrando em Teoria da Literatura.)
Resumo:
As livrarias, durante muitos anos, foram espaço de encontros intelectuais, onde grandes
ideias eram debatidas e grandes pensadores encontravam-se num entrelugar de boemia, para
discutir não só literatura, mas política e todo o tipo de questão social. Esses espaços físicos
abriam suas portas para o saber e para a fomentação de novos ideias políticos. Segundo
Morin (2007), Adorno e Horkheimer (2002) e Van Loon (2010), a livraria era mais do que
um local da indústria cultural: era um espaço cultural. Contudo, nos últimos anos com o
aumento da tecnologia e dos meios de comunicação em massa, o acesso aos livros vem sendo
facilitado por mecanismos inovadores: desde as fontes institucionais de consulta online
(Internet Archive, JSTOR, OpenLibrary, etc) até os caminhos livres (P2P, 4Shared, Scribd,
Megaupload, entre outros).
As campanhas publicitárias direcionadas pelo greencommerce também posicionam um duelo
do papel impresso versus E-Ink, tudo pelo bem da natureza ou do habitat mercadológico? As
livrarias estão mudando seu espaço, diminuindo fisicamente enquanto ampliam a logística
dos longínquos destinos através da internet, redes sociais e correios. Em tempos atuais,
restaria ao livro, e às suas catedrais chamadas livrarias, o destino apocalíptico que fora
denunciado por Ray Bradbury em Fahrenheit 451 (1951), George Orwell, em 1984 (1949)
ou Huxley, em Brave New World (1932)? Esta comunicação visa discutir que espaço sobra
às livrarias, e também debater as atuais formas de acesso aos livros.
497
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O TEXTO E A LEITURA EM SALA DE AULA: UMA PERSPECTIVA DISCURSIVA
Resumo:
A leitura e a escrita são objetos de constante discussão entre os diversos teóricos da Educação
e áreas afins. Sabe-se que a escrita não foi o primeiro dos mecanismos utilizados pela
humanidade, embora seja dos mais antigos. Mas, desde que foi criada, assumiu um caráter
distintivo, conferindo aos que a dominavam um lugar de destaque na sociedade. Essa
distinção remonta à sua origem e prevalece nos dias atuais. A leitura, enquanto prática, desde
seu aparecimento, está associada à difusão da escrita, à fixação do texto na matéria livro, à
alfabetização do indivíduo, conforme discutem Ezequiel Teodoro e Regina Zilberman
(1995).De acordo com Soares (1995, p. 19), “em nossa cultura grafocêntrica, o acesso à leitura
é considerado como intrinsecamente bom”. Entretanto, existem diferenças no que diz
respeito às condições sociais de acesso à leitura. Logo, sendo a leitura um “processo político”,
a autora chama a atenção daqueles que formam leitores para que haja um cuidado na hora de
executá-lo, uma vez que estes desempenham um papel político que poderá estar ou não
comprometido com a transformação social, mesmo estando ou não de acordo com a
“reprodução” e a “contradição” que estão presentes nas condições sociais da leitura.Este
trabalho, por sua vez, pretende fazer algumas considerações sobre as atividades de leitura e o
trabalho com o texto em aulas de Língua Portuguesa, bem como apresentar algumas
reflexões sobre a leitura, com enfoque na perspectiva da Análise de Discurso pecheutiana, e
de como seria o trabalho realizado a partir desse viés. Para tanto, utilizar-se-á como aporte
teórico, mais precisamente, os estudos de Eni Orlandi.
498
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
CRENÇAS DE ESCRITA NO PNLD – LÍNGUA PORTUGUESA
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
ECOCANÇÕES GERALDIANAS E AS RELAÇÕES ENTRE HUMANOS E MEIO
AMBIENTE – UM ESTUDO ECOCRÍTICO
RESUMO
A Ecologia Humana, fortemente trabalhada pelos sociólogos da Escola de Chicago, entre 1910
e 1940 - com um viés sociobiológico –, possui, ainda hoje, diversas formulações conceituais,
por vezes, discordantes e complementares. Porém, sobretudo nos últimos tempos, em virtude
das discussões sobre o novo paradigma científico, reconhecem-se o seu holismo, caráter
sistêmico e transdisciplinar, envolvendo as imbricações entre os seres humanos e a Terra, nos
seus aspectos natural e social. O objetivo deste trabalho, pois, é analisar as relações entre
humanos e meio ambiente, expressas em composições musicais do artista pernambucano
Geraldo Azevedo. A análise das letras das composições pautou-se na ecocrítica, que permite a
transdisciplinaridade, o que permitiu envolver conhecimentos da área literária,
fenomenológica, ecológica – nas suas diferentes ramificações - e da geografia humanista. No
total, foram 25 canções, distribuídas em 11 álbuns, selecionadas a partir dos critérios: serem
de autoria de Geraldo Azevedo – individual ou em parceria - e apresentarem relações
ecológicas, entre humanos, demais seres vivos, elementos e recursos naturais. Os resultados
mostram que as composições de Geraldo Azevedo são ecocanções, as quais apresentam uma
aproximação com a ecologia profunda de Arne Naess, do mesmo modo que com a ecosofia de
Félix Guattari e a ecologia integral de Leonardo Boff, que inclui as ecologias ambiental,
política e social e mental. As músicas também apresentam uma relação de topofilia com o
lugar onde o “eu poético” habita, embora revelem uma noção de “cidadão do mundo”. Isso
mostrou, igualmente, a pertinência das composições para a ecopedagogia e contribuiu,
significativamente, para a discussão em torno das aproximações epistemológicas envolvendo
ecocrítica e ecologia humana.
500
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
“QUASE DE VERDADE”: LITERATURA INFANTIL E DITADURA MILITAR NO
CONTEXTO BRASILEIRO
RESUMO
O presente trabalho objetiva identificar o engajamento presente na literatura infantil
produzida durante a Ditadura Militar brasileira, mais especificamente, na década de 70,
quando o Ato Institucional nº 5 (AI-5) cerceava as produções culturais que veiculavam
ideologias e protestos contra o regime instaurado, assim como discutir as razões que levaram
duas escritoras a escreverem para o gênero nesse período ditatorial. Os corpus de análise
foram O Reizinho Mandão (1978), da escritora Ruth Rocha (1931 - ), e Quase de Verdade
(1978), da modernista Clarice Lispector (1920-1977). Uma sempre escreveu para o gênero
literatura infantil, e a outra possui apenas produções esporádicas, iniciadas durante o regime.
Visando fundamentar, teoricamente, este estudo, ancoramo-nos em postulados da teoria
literária, no que diz respeito ao engajamento na obra de arte, da literatura infantil, bem como
da história política e social. A metodologia analítica, por sua vez, foi a Análise do Discurso
(AD), a qual nos possibilitou constatar que a literatura infantil, durante o regime, possuía
elevado teor crítico e de protesto, diante da realidade social em que o país se encontrava.
Além disso, comprovamos que as escritoras a utilizaram como “rota de fuga” para
continuarem escrevendo sem, contudo, serem vítimas da censura, já que os militares
consideravam o gênero de pouca relevância.
501
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
CULTURA POPULAR: A TRADIÇÃO NOS TRILHOS DA “PÓS MODERNIDADE”
RESUMO: Embora seja um termo bastante comum, o termo cultura popular, apresenta
contradições quanto sua definição. Se por um lado a cultura popular equivale ao folclore,
compreendido como o conjunto das tradições culturais de um país ou região; por outro,
inversamente, o popular sucumbiu na pressão da cultura de massa. Diante de tantas
definições e contextualizações epistemológicas, pretende-se levar em consideração o lugar da
cultura popular diante desta sociedade pós-moderna em face de suas heterogeneidades e
fragmentações culturais. Neste caminho poderemos destacar um mundo pautado pelas
diferenças e seus espaços construídos por identidades mutáveis, descartáveis e provisórias
neste ambiente pós-moderno. (...) Tanto não marxistas quanto marxistas chegaram ao
sentimento geral de que, em algum ponto, após a segunda guerra mundial, uma nova
sociedade começou a emergir (Jameson, 1983, 113 e 117). Conseguimos compreender, então,
que as culturas não estão isoladas, dissociadas de seu contexto, mas compartilham pontos de
contato que as enriquecem e que permitem aos seres humanos construírem a formação de
diversas identidades. A cultura popular deve ser vista como algo diversificado, plural e
heterogêneo. Acreditamos desta forma, que o universo em que a cultura popular sobrevive,
revigora-se, amplia-se e se torna um produto histórico-social.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
E AS VOZES DO SERTÃO,O QUE ELAS TÊM A DIZER?
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
COLETIVO POÉTICO OGUM’S TOQUES NEGROS: FORMAÇÃO DE LEITOR DE
LITERATURA NEGRA NA REDE SOCIAL FACEBOOK
Hildalia Fernandes
Magnaldo Oliveira dos Santos
Faculdade Dom Pedro II (Docentes)
Resumo:
A escola na função de seduzir os (as) educandos (as) para a leitura literária tem falhado. As
novas formas de leitura e escrita pouco são incorporadas pelas práticas escolares. Estas
últimas continuam tendo o livro como suporte e os títulos que fazem parte do canon literário
brasileiro não são bem aceitos por boa parte dos estudantes. Na contramão dessa corrente de
rejeição ao que secularmente vem sendo imposto a tal segmento, nota-se que cada vez mais a
juventude brasileira, de diferentes classes sociais, tem acesso a uma grande quantidade de
informações e a internet tem sido o alvo preferencial escolhido por essa mesma juventude.
Diante de tal contexto, deseja-se com essa comunicação i) apresentar um projeto poético
intitulado de Coletivo Literário Ogum’s Toques Negros existente na rede social Facebook
desde 2012; ii) explicitar o trabalho de formação de leitor em literatura negra realizado por
essa página; iii) apresentar seções que compõem a fanpage e iv) partilhar algumas postagens
pautadas, quase sempre, na noção de escrevivência defendida por Evaristo (2006) e que
Pereira (s/d) denominará, mais especificamente, de afrovivência. Inicialmente a página
serviu para que o administrador da fanpage, Guellwaar Adún, poeta, contista, educador e
compositor, publicizasse, predominantemente, mas sem exclusividade, as suas poesias
eletrônicas (e-poetry) fazendo uso da multimodalidade (KRESS; LEEUWEM, 1996). Hoje o
projeto poético torna-se Editora Negra de Livros da Bahia e lança a sua Primeira Antologia
Poética em março de 2014, promove lançamentos de livros de autores negros e realiza alguns
eventos de cunho educativo sobre tais temáticas, além de divulgar, também, textos de autores
africanos, africano-americanos e negro-latino-americanos.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
LOCALIZAÇÃO E NARRATIVA: COMO CONTAR HISTÓRIAS ATRAVÉS DAS
MÍDIAS LOCATIVAS
Tchiang Fong
Graduando em Ciências da Computação
Faculdade de Ciências Sociais e Aplicadas de Petrolina
Resumo:
A fase da computação pessoal, iniciada no em meados dos anos 80, somada à evolução dos
sistemas operacionais e das interfaces gráficas de ambientes web, habilitou alternativas para
apropriação criativa do meio digital. O computador, antes considerado uma gigantesca
máquina cuja função principal era realizar cálculos numéricos de amaneira automatizada,
passou a ser utilizado desde então como uma poderosa ferramenta para contar histórias. Este
potencial narrativo do meio digital foi ampliado na fase da computação ubíqua, iniciada por
volta de 2005. As mídias locativas, consideradas expoentes da computação ubíqua, são
configuradas a partir de formas criativas de uso de tecnologias e serviços baseados em
localização, agregando informação digital à um local específico. O presente trabalho discute
formas de leituras proporcionadas pelas novas tecnologias de informação e comunicação,
especialmente as mídias locativas. O objetivo consiste em analisar o potencial narrativo
oferecido por tecnologias e serviços baseados em localização, como mapas, etiquetas geo-
referenciadas, GPS, redes sem fio, smartphones, dentre outras. A hipótese sustenta que as
mídias locativas articulam tecnologia, localização e mobilidade para produzir sentido,
criando um lugar. Para desenvolver nosso argumento, realizamos um estudo de caso de um
jogo de realidade alternativa chamado CodeRunner (2012), um dos indicados ao prêmio de
melhor jogo no festival Golden Joystick Awards. Jogos de realidade alternativa (ARG)
utilizam as novas tecnologias de informação para criar uma forte impressão de realidade
paralela ao mundo real, borrando fronteiras entre mundo real e ficção. Buscamos evidenciar,
através deste estudo de caso, como o jogo desenvolve sua narrativas utilizando o potencial
das mídias locativas.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O TEOR SATÍRICO NA OBRA DE LEANDRO GOMES DE BARROS: UM ESTUDO
SÓCIO-HISTÓRICA DO FOLHETO “O SOLDADO JOGADOR”
Resumo:
A representação dos acontecimentos históricos e condição social de determinados grupos é
uma das temáticas mais importantes da Literatura de Cordel. O poeta popular possui a
capacidade de representar o povo e as classes mais humildes. O poeta Leandro Gomes de
Barros se apresenta como um dos nomes mais conhecidos no tocante à Literatura Popular e é
também pioneiro em representar em sua poesia os problemas e queixas do povo, bem como a
esperteza que o pobre tem para conseguir se sobressair a essa condição. Dessa forma, nesta
pesquisa, fizemos uma apresentação sucinta da vida e obra do poeta, buscando destacar os
temas que se fazem mais presente em seu acervo e, a seguir, nos voltamos para uma análise
mais detida do seu folheto “O soldado jogador”. Nosso trabalho está embasado nas
concepções de Abreu (1999) sobre narrativas de folheto, de Severo (2013), quanto ao poeta e
seu contexto, e Curran (1986), quanto a sátira e crítica social, presente na Literatura de
Cordel, também Norma (1994) sobre os níveis de análise técnica do poema. Serão analisados
a condição social retratada no folheto e o contexto histórico em que se passa a narrativa. Os
procedimentos metodológicos de análise seguiram o seguinte percurso: seleção de recortes
textuais que referenciam o personagem central do folheto na sociedade. Concluímos que
Leandro Gomes de Barros utiliza-se de uma linguagem simples, e num tom crítico, satiriza o
vínculo da Igreja com o Estado. Outro aspecto a ser destacado é a astúcia do pobre em criar
saídas para se livrar de situações sociais adversas.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A LUDICIDADE NO ENSINO DE LÍNGUAS
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DOS GRIMM A MANOEL MONTEIRO: NARRATIVAS INFANTIS EM CORDEL
Resumo:
A literatura e a cultura popular dialogam em vários aspectos de suas estruturas sejam essas
orais, escritas ou visuais. A heterogeneidade característica desta última migra para o texto
literário em prosa ou poético. Assim, a literatura oral cuja vitalidade está no seio popular
perpetua-se até nossos dias por meio da memória e do registro da palavra oral pela escrita.
Entre os textos que percorrem esta trajetória estão os contos de fadas e as fábulas, populares
entre os povos dos pequenos vilarejos medievais, servindo tanto como instrumento
pedagógico infantil quanto distração e entretenimento dos adultos. Os irmãos Grimm foram
pioneiros na coleta destas estórias tradicionais no contato direto com os campônios,
destacando-se ainda Perrault, Andersen, Silvio Romero, Câmara Cascudo, Monteiro Lobato,
entre outros. Tais narrativas foram (re)contadas com o tempo e receberam versões que se
adequavam ao público infantil, em especial, as versões veiculadas pelo estúdio
cinematográfico Disney. Tomando por base tais afirmações nosso trabalho se propõe a
estudar os contos infantis “Chapeuzinho Vermelho versão versejada” e “A dança das 12
princesas” pertencentes a obra Contos e outras narrativas em cordel (2012) de Manoel
Monteiro na qual estão reunidas versões cordelisadas de contos e fábulas infantis. Nosso
intuito é perceber como o poeta dialoga com os textos originais dos irmãos Grimm
“Chapeuzinho Vermelho” e “Os sapatos gastos de tanto dançar ou A dança das doze
princesas”, encontrados na obra Contos maravilhosos infantis e domésticos (2012), bem
como o poeta percorre o caminho inverso, trazendo os textos de volta ao universo da
oralidade que é o cordel, (re)contando-os e (re)adaptando-os ao público infantil do seu
tempo, dialogando, assim, com o leitor. Nossas análises estarão embasadas nos estudos de
Pinheiro (2000), Ayala (2011), Pinheiro e Lúcio (2001), Catenacci (2001), Cascudo (1978),
Pondé (1990), Bamberger (2008), Bordini (1991), Todorov (2009), Jauss (1994) e Colomer
(2007).
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O GRANDE PASSEIO: FRED E SEUS AMIGOS CONHECENDO OS
MONUMENTOS DE JUAZEIRO – BA
Marília Nunes (UNEB)
Resumo:
Este estudo apresenta resultados de uma pesquisa com a finalidade de elaboração do
trabalho de conclusão do curso de graduação em Pedagogia, tendo como objeto central da
investigação a construção de conhecimento a respeito dos monumentos histórico-culturais
existentes na cidade de Juazeiro/BA. A questão sensibilizadora da pesquisa centra-se em
aprender sobre a história da cidade revelada no significado de seus monumentos. O objetivo
é produzir recursos didáticos pedagógicos que possibilitem às crianças de quatro a seis anos
aprender de forma lúdica os elementos constituintes da memória cultural do contexto onde
vivem. O patrimônio cultural de uma cidade expresso em seus monumentos revela a história
de uma determinada época e constituem-se verdadeiros museus a céu aberto, entretanto, são
muitas vezes ignorados pelo grande público que passa todos os dias por esses sem
compreender o sentido e significados de sua presença ali. O intinerário metodológico baseou-
se em uma abordagem qualitativa cuja dinâmica da pesquisa consistiu em entrevistar uma
memorialista, analisar documentos, passeio com crianças na faixa etária estabelecida nos
objetivos para recriar na linguagem destas as histórias das obras de arte espalhadas pela
cidade. Os resultados do estudo estão sistematizados no formato de literatura infantil no livro
O grande passeio: Fred e seus amigos conhecendo os monumentos de Juazeiro/BA o qual
apresenta uma linguagem apropriada ao público ao qual se destina a história. O livro se
constitui um material didático que poderá ser utilizado nas escolas para que desde os
primeiros anos escolares as crianças estudem e conheçam a história da cidade, despertando a
criticidade e a valorização do patrimônio cultural.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
PROFESSORES DO ENSINO FUNDAMENTAL, DISCURSOS E FORMAÇÕES
IMAGINÁRIAS SOBRE A PRÓPRIA FORMAÇÃO INICIAL – A LEITURA DE UM
PERCURSO ACADÊMICO
Resumo:
Este trabalho investiga as formações imaginárias dos professores do ensino fundamental do
Vale do São Francisco sobre a própria formação inicial. Tem, portanto, como objetivo uma
análise dos discursos dos referidos educadores, atentando para as condições de produção em
que ocorrem e as formações discursivas das quais os sujeitos enunciam. Fundamenta-se na
Análise do Discurso Francesa, apoiado nas postulações de Pêcheux(1997) e Orlandi(2009).
Quanto à metodologia, optou-se pela qualitativa, considerando a natureza do objeto
estudado. O corpus analisado constitui-se de um recorte de memorial no qual os sujeitos da
pesquisa relatam o seu percurso acadêmico e profissional. Utiliza-se do dispositivo analítico
da AD francesa, tomando como categorias o sujeito, o discurso e as suas condições de
produção, as formações discursivas (FDs) e as formações imaginárias. Verificou-se que os
sujeitos classificam deficitária a sua formação inicial pela frágil relação estabelecida entre a
teoria e a prática, carga horária insuficiente de Língua Portuguesa e Psicologia, preparação
precária para a educação inclusiva, ausência de projetos de pesquisa e extensão e por
negligenciar o estudo dos Parâmetros Curriculares Nacionais, enquanto documento
norteador das práticas educativas no Brasil. Concluiu-se que os discursos se apresentam
marcados pela FDs da academia ao se revelarem identificados com o discurso dos teóricos
defensores da formação continuada, enquanto recurso indispensável aos avanços na
qualidade do ensino no Brasil.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
TV CAATINGA, A VERDADEIRA IMAGEM DO SERTÃO
Resumo:
Uma plataforma virtual educativa que visa desconstruir os estereótipos atribuídos ao
nordeste e principalmente a região semiárida, através de programas e reportagens. O
presente trabalho destaca o papel da TV Caatinga, implantada via internet em 2012 pela
Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf). A programação atual da WebTv,
que presta serviços nas áreas de comunicação, educação e cultura, compreende 7 programas
educativos com temáticas diversificadas, como ciência, saúde e meio ambiente. Através de
parcerias e convênios, o site também realiza um intercâmbio de conteúdos com instituições
de ensino e pesquisa. O trabalho aborda ainda o papel social da TV Caatinga como uma
difusora de conteúdos que contribuem para o desenvolvimento do país, em especial do
Semiárido, e como um meio de aproximação entre o sertanejo e sua realidade local. Para
isso, a equipe desenvolve trabalhos como produção de entrevistas com personalidades
sertanejas, reportagens sobre a fauna e a flora nativa da Caatinga, programas que resgatam a
memória e a cultura do povo sertanejo, coberturas jornalísticas, entre outros produtos
audiovisuais.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
VIVA CAATINGA!, INTERPROGRAMAS COMO FERRAMENTA PEDAGÓGICA
Resumo:
O Viva Caatinga é um programa educativo, informativo e científico da Tv Caatinga,
plataforma virtual da Universidade Federal do Vale do São Francisco, que apresenta a fauna e
a flora do único bioma exclusivamente brasileiro, divulgando as espécies a partir de seu nome
popular e científico, localização, hábitos alimentares e de vida, além de curiosidades. O
programa também apresenta os costumes e atividades do homem sertanejo. São 63 edições já
realizadas, que seguem uma linguagem coloquial, próxima da comunidade, das suas falas e
cotidiano. Além da divulgação via internet, os programas Viva Caatinga vão ser distribuídos
nas escolas públicas do estado de Pernambuco, graças a uma parceria entre a TV Caatinga e o
governo estadual. Essa divulgação contribui para fomentar a difusão cultural e científica do
Semiárido, uma vez que apesar da Caatinga possuir uma grande diversidade de espécies na
sua fauna e flora, a riqueza natural proveniente desse bioma ainda é desconhecida. Além
disso, muitos animais e plantas estão ameaçados pela falta de consciência ambiental e o
programa contribui para a preservação, que começa em cada escola e nos lares dos sertanejo,
se expandindo para todo o país.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
MARIEN E POMMOT: O SERTÃO MATO-GROSSENSE NA VISÃO DE DOIS
FRANCESES
Suze S. Oliveira
Universidade Federal de Mato Grosso-UFMT
Professora de Literatura Francesa
Resumo:
Este trabalho se inscreve no contexto da pesquisa intitulada “O romance adentra o sertão:
produção e critica em Mato Grosso na 1ª metade do século XX”, do grupo de pesquisa em
Literatura sob a coordenação da professora Dra. Franceli Aparecida Silva Mello. De caráter
documental, a partir de um diálogo e contribuições de Lucien Goldman, Walnice Nogueira
Galvão, Georg Lukács, busca-se investigar as obras produzidas em e sobre Mato Grosso no
século XX e, neste caso especificamente, a caracterização do sertão e do ‘homem’ mato-
grossense a partir da ótica de dois escritos franceses: Alfredo Marien, em “Era um poaieiro”,
divulgado a partir da publicação da coleção “Obras Raras da Literatura Mato-Grossense” e
George Pommot, em “Tout l’or de l’Eldorado”, cuja cópia do romance foi disponibilizada por
uma pessoa da família Pommot. Poucas são as informações disponíveis sobre os dois autores,
contudo, elas nos levam a crer que seus romances trazem elementos de vivências e passagens
em Mato Grosso, sendo, portanto, em parte, autobiográficos. Por se tratar de um projeto
iniciado em março de 2012, está, portanto, em fase inicial de estudos e levantamento de
registros documentais sobre a produção romanesca em Mato Grosso, os resultados ainda são
preliminares.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
PRÁTICAS DE LEITURA E ESCRITA NO PROCESSO DE RESSOCIALIZAÇÃO
RESUMO
Sabe-se que, tradicionalmente, o ensino de língua portuguesa é muito voltado para o estudo
da nomenclatura gramatical, já a relação entre leitura, compreensão e produção escrita, nas
escolas, de modo geral, está muito aquém do que se espera, visto que há uma necessidade
imensa de se obter bons resultados nas três. Então, o que poderia contribuir efetivamente
para a melhoria desses resultados, seria relacionar diretamente as atividades de leitura,
compreensão e produção escrita, e não considerá-las como etapas distintas do processo de
ensino-aprendizagem da língua portuguesa. Assim, o objetivo da pesquisa foi analisar os
efeitos da leitura e compreensão para a produção escrita, com enfoque no aperfeiçoamento
da escrita argumentativa. Entende-se, então, que o envolvimento amplo com a leitura
aprimora a compreensão e, dessa forma, o processo de reconstrução através da produção
escrita apresentar-se-á de modo mais fácil. E, esta pesquisa, justificadamente, busca indicar a
importância de inter-relacionar as propostas de leitura, compreensão e produção escrita. A
pesquisa converge com a linha de estudos semelhantes aos de Smith (1999), Marcuschi
(2008), e Geraldi (2002), em que se prevalece a ideia de que na produção textual é necessário
colocar em prática e aperfeiçoar a leitura e a compreensão.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
LEXICOGRAFIA E INTERCULTURALIDADE NA PALAVRA CABOCLO
Alexandre Borges Cavalcante
Anna Charlotte Coelho Reis de Souza
Lauana Sento Sé
Alunos de Graduação
Universidade do Estado da Bahia
Resumo:
O universo lexical do semiárido baiano é bastante diversificado, incluindo o acervo linguístico
de diferentes comunidades, entre elas: indígena, quilombola e sertaneja. Essa pesquisa
pretende desconstruir as definições estereotipadas que muitas vezes são trazidas nos
dicionários de língua portuguesa. Em especifico, o presente trabalho traz como recorte a
palavra caboclo, que transita entre os três universos lexicais apresentados, mas com sentidos
diferentes. Para isso, foi adotado o pressuposto teórico da abordagem intercultural do Lexiss
(grupo de lexicografia da UNEB e UEFS). Além dos referenciais teóricos de lexicultura
(GALISSON, 2000), etnografia ( PEREZ, 2002) e comunidades linguísticas (CALVET, 2002).
A pesquisa é qualitativa e realiza análises intertextuais do verbete caboclo inserido em cada
um dos contextos em que faz parte e por fim faz uma comparação com o verbete no
dicionário Aurélio, que refletiu em inúmeras observações no que diz respeito a ausência de
sentidos aliados a aspectos culturais de cada comunidade onde a palavra é utilizada. Para o
corpus de estudo indígena, caboclo é uma referência particular, feitas dos próprios para com
os próprios. Para as comunidades quilombolas, caboclo diz respeito a um espírito que
possuía corpos de humanos e animais. Já para o sertanejo, os dois significados estão
presentes: Caboclo é usado para se referir tanto ao índio e ao próprio sertanejo, quanto para
o espírito referendado nas comunidades de quilombo. Os resultados esperados da pesquisa
estão voltados para a produção de um dicionário intercultural, onde o verbete em questão,
assim como outros, possam ser apresentados de forma diferente, contextualizada e que
valorize o meio e as pessoas que os falam.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
CORDEL: LITERATURA, MÍDIA E ENSINO
Resumo:
O desenvolvimento de novos suportes e a sua utilização para o cordel em ambientes
diferentes parece ser uma discussão interessante, uma vez que permite refletir sobre as
adaptações do cordel na sociedade. Nessa perspectiva, observa que surgem novos modos de
produção, bem como de circulação dessa manifestação popular e, como consequência, novos
leitores. Se observar os dias atuais, constata-se que os leitores de folheto encontram-se nas
mais diversas esferas sociais, com presença em espaços que vão desde a feira e bancas de
revistas, até a escola e os meios midiáticos. Logo, o presente artigo tem necessidade de
contemplar dois dos assuntos que mais ganham destaque entre pesquisadores, poetas e
apreciadores do folheto de cordel: o uso do espaço virtual por poetas e a utilização do cordel
na sala de aula. Assim, este estudo tem como objetivo investigar, através de folhetos e
suportes midiáticos de dois poetas, a presença de novos leitores no suporte da internet. Além
disso, faz parte do nosso objetivo, discutir como o cordel apresenta-se atualmente inserido no
âmbito da sala de aula. Desta forma, as contribuições do trabalho apresentam-se quando se
discute sobre a importância da inserção da literatura de cordel no espaço escolar, sugerindo
novas abordagens desse texto literário e a observação do papel que suportes midiáticos têm
dados aos cordelistas para uma possível contribuição dessa produção cultural. Com relação
aos fundamentos basilares que sustentam o trabalho, têm-se, entre outros: Abreu (1999), que
discute a historiografia e as particularidades existentes entre a literatura de cordel
portuguesa com o cordel brasileiro; Galvão (2001), que faz um traçado sobre o perfil do leitor
de cordel brasileiros das primeiras décadas do século passado; Marinho; Pinheiro (2012), que
intensificam as discussões sobre o cordel no espaço escolar.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A PERSONALIDADE AUTORITÁRIA EM SARGENTO GETÚLIO, DE JOÃO
UBALDO RIBEIRO
Resumo:
Neste trabalho pretendemos identificar, na leitura de mundo do protagonista do romance
Sargento Getúlio, de João Ubaldo Ribeiro, as tendências de uma personalidade de conduta
autoritária que tende a aceitar uma ordem abstrata opaca, advinda do exterior, como certeza
moral de harmonia consigo mesmo. As ideias do personagem sertanejo Getúlio revelam a
ausência de mediação entre o mundo administrado e a entronização do sujeito, um dos
principais fundamentos da crítica negativa de Adorno. No transporte de um preso político, do
interior da Bahia até a capital de Alagoas, várias são as nuanças da prontidão de Getúlio para
a violência brutal, arbitrária e racionalizada. Encontramos no protagonista uma satisfação
individual em suas atitudes totalitárias, de modo que, na exposição dos seus aspectos
psicológicos, é possível perceber uma seleção de necessidades, muitas vezes ilógicas, que
alimentam o orgulho de uma pretensa individualidade e independência de valores
excludentes de qualquer aproximação com o que lhe é diferente. Assim, sob as proposições
adornianas, nossa interpretação é a de que Getúlio apresenta o falso apartheid integral do
sujeito com o objeto, pois este personagem, por um lado, hipostasia o meio de forma
irrevogável, ou seja, nada pode ser mais além do que já é dado, um mundo inteiramente
positivado. Por outro, ele representa a desagregação do indivíduo, de consciência reificada no
embaralhado de seus valores idiossincráticos.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
JÁQUITUVAILÁPRÁFÊRA, MEU AMIGO TRAIS UMA COISINHA PARA MIM
Darcilia M. P. Simões
Procientista UERJ
Rossane Nascimento
Fundação Casa dos Carneiros
Resumo:
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A CANTIGAS AFRO DESCENDENTES COMO FERRAMENTA DE (RE)LEITURA
DA HISTÓRIA NA POESIA DE BRUNO DE MENEZES
Resumo:
520
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
III PROJETO DE LEITURA: A ARTE DE PROTAGONIZAR AS LINGUAGENS
Resumo:
O III Projeto de Leitura: A Arte de Protagonizar as Linguagens, realizado pelas professoras de
Língua Portuguesa do Ensino Fundamental e Médio da Escola Estadual Senador Paulo
Guerra, teve como objetivo incentivar a leitura de clássicos universais e da literatura
brasileira. Sua metodologia consistiu na distribuição de um título previamente selecionado
pelas professoras para ser lido pela turma. Em seguida, foram lançadas as seguintes provas
nas diversas linguagens: Representando, na qual os estudantes protagonizaram um trecho
do livro, caracterizando o ambiente e os personagens; na prova Musicando, os alunos foram
instruídos a procurar uma música atual que representasse a temática da obra; Recriando foi
a prova que requereu dos estudantes a transposição dos romances para o gênero história em
quadrinhos; a prova Escrevendo consistiu na produção de carta pessoal fictícia para um
personagem de destaque do livro questionando suas atitudes e outra carta na qual o
personagem exerceu o seu direito de resposta; na prova Divulgando, os estudantes
produziram uma campanha publicitária que foi postada em página criada pela equipe de
professoras com o objetivo de incentivar a leitura dos livros e convencer os internautas a
curtirem-nas; em Noticiando, foram elaboradas capas de jornal contendo manchetes
relacionadas aos fatos relatados na obras; Foram construídas maquetes representando
cenários e personagens principais, utilizando material reciclado, na prova Reciclando; em
Desfilando, os estudantes caracterizaram-se dos personagens principais dos livros e
realizaram um desfile, durante o qual foram narradas as suas características.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
CONTADORES DE HISTÓRIAS: SEUS CAUSOS E ENREDOS COMO FONTES DE
LETRAMENTOS NA COMUNIDADE DE MANIÇOBA-JUAZEIRO/BA.
Resumo:
Este trabalho trata de um Antiprojeto de Pesquisa aprovado na seleção de Mestradodo
Programa de Pós-graduação em Educação, Cultura e Territórios Semiáridos da Universidade
do Estado da Bahia – UNEB, Campus III. Que visa investigar as práticas de contação de
história da comunidade de Maniçoba - BA considerando os pressupostos culturais e de
letramentos presentes nos relatos dos contadores de histórias. Percebe-se que há
possibilidades de se pensar em um recorte entre a cultura popular com seus diferentes
saberes e a leitura da escola com outros saberes, e nesse sentido permitir uma educação
contextualizada, reconhecendo que as contações de histórias podem implicar em toda a
ambiência cultural, escolar e comunitária, fortalecimento o empoderamento de pertença
singular dos contadores de histórias. A fundamentação teórica está sendo embasada nos
Novos Estudos de Letramentos (STREET, 2010); com as práticas sociais de
leitura(KLEIMAN, 2007) bem como (VANCINA,1982) interagindo com a tradição oral; e a
metodologia de uma postura qualitativa de natureza da pesquisa-ação (THIOLLENT, 2009).
A discussão vai permear pelo mapeamento das práticas de contação de história dos
contadores da Comunidade de Maniçoba em Juazeiro – BA;observação dos pressupostos
apresentados nas contações de histórias se são inventadas ou se são criadas a partir de
situações reais; identificação de práticas pedagógicas no espaço escolar que fomentam a
cultura local;ecompreensão como as narrativas orais se mantêm vivas através do tempo.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
UM PONTO DE CULTURA PARA LITERATURA NEGRO-BRASILEIRA– BLOG:
“NOSSA ESCREVIVÊNCIA”
Magnaldo Oliveira dos Santos
Hildalia Fernandes Cunha Cordeiro
Faculdade Dom Pedro II
RESUMO
Elevados índices de desigualdades sociais, principalmente, os indicadores étnico e racial, a
falta de políticas de amplos investimentos, por parte do Estado, no campo da educação, as
dificuldades de se transcender práticas pedagógicas que não atendem aos anseios e
necessidade dos discentes, entre outros aspectos, fazem também do Brasil um país sem
tradição de leitura. Esta situação se agrava para a população negra que, não por coincidência,
ocupa os mais baixos patamares econômicos do país e, quase sempre, tem que subtrair o
tempo que deveria ser para estudar, com o trabalho precoce, no que diz respeito às crianças, e
trabalho informal, na maioria das vezes, quando que se refere aos jovens e adultos.
Acrescenta-se a isso, o processo histórico de coisificação, discriminação e exclusão que o povo
negro tem sofrido ao longo dos séculos, além das representações deformadas e negativas nas
áreas das ciências e das artes e, na literatura, em especial, o corpo da mulher negra, foi alvo
preferencial. Apesar das enormes barreiras históricas, o povo negro vem transcendendo,
demonstrando tenaz capacidade de produzir conhecimentos, saberes e artes em geral. Na
literatura, a mulher negra tem se insurgido e vem “assenhorando-se da pena” (EVARISTO,
2005) para (re) escrever e dignificar a si e ao seu corpo, fazendo-se sujeito protagonista de
suas e outras histórias, revelando outras representações possíveis. O blog “Nossa
escrevivência”, de Conceição Evaristo (2012), foco desta comunicação, entre tantos outros
canais virtuais da internet, se inscreve como um ponto de cultura que produz, fomenta,
divulga e projeta a literatura negro-brasileira (CUTI, 2010) para o Brasil e para o mundo,
alcançando um significativo número de pessoas de diferentes raças, classes, gêneros e idades.
Desse modo, mulheres e homens negros vêm revolucionando e transformando o modo de se
conceber e produzir literatura na contemporaneidade, fazendo nossas escrevivências
(EVARISTO, 2006).
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
HISTÓRIA DE UM BODE, CONVERSA FIADA: PROSAS DE GRACILIANO
RAMOS
RESUMO
Trata-se de um estudo sobre as narrativas “História de um bode” e “Conversa fiada”, de Graciliano
Ramos, tendo em vista que, as duas narrativas desse autor apresentam diferentes perspectivas em sua
estrutura, o que é sugestivo para provocar reações diversas na recepção do público juvenil, conforme
nossa proposta de investigação desses gêneros literários. No sentido de contribuir com a formação
integral desse público, instigando a manifestação do seu ponto de vista sobre as temáticas suscitadas
pelos referidos textos, inserimos os alunos da 2ª série do Ensino Médio da Escola Técnica de Saúde de
Cajazeiras do Centro de Formação de Professores da Universidade Federal de Campina Grande – Alto
Sertão Paraibano –na dinâmica da execução das atividades de leitura e debate em sala de aula,
considerando sua condição de atores sociais que compõem, efetivamente, a história de nossa
sociedade. Partindo desses princípios, através da leitura de textos literários, propiciamos o
desenvolvimento do senso crítico desse público, preparando-o para o acesso ao mercado de trabalho,
mas, acima de tudo, formando sujeitos críticos – indivíduos habilitados para compreenderem
problemas da realidade social, e exercerem uma postura ética adequada na vida.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
FACEBOOK: INTERAÇAO PARTICIPATIVA COMO CONTRIBUTO PARA
MATERIALIZAÇAO DA LEITURA
RESUMO
O Facebook, site que potencializa a formação de redes sociais, é constituído por indivíduos e
pelas conexões estabelecidas entre eles, permitindo-lhes a interação, marcado por diferentes
práticas de linguagem que atendem a variados propósitos comunicativos, comportando,
inclusive, diversas formas de materialização da leitura. Nessa perspectiva, este trabalho
discute as páginas desse ambiente virtual, enquanto alternativa para promoção de
campanhas políticas partidárias, administradas e mantidas para fins eleitorais, nas quais
coexistem múltiplas semioses: audiovisuais, verbais e icônicas (inclusive fotos de eventos),
revestidas de um discurso persuasivo e ideológico, que podem ser lidos e interatuados por
qualquer pessoa que disponha uma conta no ambiente, de modo rápido e ilimitado
geograficamente. A ênfase do trabalho consiste em discutir que características são mais
recorrentes nas páginas oficiais dos candidatos partidários no ambiente Facebook e que
papel é atribuído ao leitor-autor dos hipertextos que circulam nas mesmas, os quais
interagem de forma participativa. Serão analisadas quatro páginas oficiais partidárias,
recolhidos no mural da pesquisadora no Facebook, sendo que, para a orientação da coleta,
seleção e análise do corpus a pesquisa ancora-se na proposta teórico-metodológica de Bathia
(2009) concernente à investigação profunda de um gênero. Para discussão dos resultados
encontramos respaldo nas prescrições de Maingueneau (2013) e Miller (2012). Pode-se
concluir que as páginas analisadas trazem a literatura da campanha, ações realizadas,
capacidade interativa, entre outros aspectos, de modo que os leitores, em virtude da
participação interativa, estabelecem relações textuais e discursivas entre os textos
disponibilizados em rede, mantendo um diálogo por meio da interatividade e dos recursos
disponibilizados pelo próprio aparato tecnológico, materializando, portanto, a leitura.
525
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
PRODUÇÃO TEXTUAL: ORGANIZAÇÃO E SENTIDO A PARTIR DO GÊNERO
“CONTO DE ENIGMA”
Resumo:
Um dos principais problemas enfrentados na escola é a falta de domínio que os estudantes
apresentam em relação à produção de textos. Neste sentido, esta pesquisa teve por objetivo
investigar a capacidade dos estudantes de produzirem um “conto de enigma”, baseada na
perspectiva do ensino através de gêneros textuais por Marchuschi (2008) e Bazerman (2011),
do letramento literário por Cosson (2009) e do letramento como uma prática social, em que
os indivíduos usam a escrita como forma de inserção na sociedade grafocêntrica por Soares
(2008). Para tanto, foi proposto a produção de um conto de enigma em uma turma do 8° ano
do Ensino Fundamental da Escola Professora Elisa Coelho, da rede estadual de Garanhuns.
Em seguida, procedeu-se a análise de dez textos para a construção do corpus. Nos resultados,
evidenciou-se práticas de letramento literário e social nas produções, mas também
dificuldades quanto aos aspectos estruturais do gênero e sistêmicos da língua. Ressalta-se a
importância dessa pesquisa, tendo em vista sua contribuição para a compreensão do nível de
produção textual dos estudantes, bem como de levar a escola a repensar práticas que
viabilizem a produção de textos eficientes.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
RESSIGNIFICAÇÃO DO PAPEL DA LEITURA EM PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DE
LÍNGUA PORTUGUESA NA SALA DE INFORMÁTICA
RESUMO
A inserção das novas tecnologias da informação e da comunicação nas escolas, sobretudo do
computador, através de espaços denominados Sala de Informática, resultantes da adesão das
escolas ao (ProInfo), Programa Nacional de Tecnologia Educacional criado pela Portaria nº
522/MEC, de 9 de abril de 1997, evoca a necessidade de discussão acerca da funcionalidade
de tais ambientes e ferramentas tecnológicas no desenvolvimento de atividades didático-
pedagógicas que favoreçam a ressignificação do processo de leitura, principalmente em aulas
de Língua Portuguesa. Neste cenário, compreende-se que o ato de ensinar torna-se
indissociável da necessidade do reaprender, do reaprender, inclusive, a ensinar, da constante
busca do envolvimento do humano com o tecnológico e da reflexão acerca das possibilidades
do uso da Sala de Informática em práticas significativas de leitura. Assim, o presente trabalho
parte de uma pesquisa que objetiva analisar usos da Sala de informática em atividades que
contribuem para a ressignificação da leitura em meios digitais. Ancora-se na análise de
práticas pedagógicas em sala de informática e de resultados de questionários aplicados com
nove professores do ensino fundamental I em duas escolas municipais de Garanhuns (PE)
que dispõe de SI. O referido questionário compreende questões relativas à identificação da
realização de atividades através de ferramentas digitais, em aulas de Língua Portuguesa, com
enfoque em práticas de leitura de variados gêneros. Foram tomadas as contribuições teóricas
de Chartier (1999) acerca da trajetória da leitura e da escrita, de Freitas (2005) sobre
educação e informática e os computadores na escola, Braga (2013) sobre ambientes digitais e
Zilbermam (2009) sobre leitura e escrita em meios digitais.
527
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
OS RECURSOS SONOROS DOS TEXTOS COMO ESTRATÉGIA PARA A
CONSTRUÇÃO DE HABILIDADES METAFONOLÓGICAS
RESUMO
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
MULTILETRAMENTO INTERSEMIÓTICO:
ANÁLISE DOS GÊNEROS MULTIMODAIS LITERÁRIOS NOS LIVROS
DIDÁTICOS E NA PROVA BRASIL
RESUMO
Esta pesquisa tem como foco a multissemiose estudada por Kress e Van Leeuwen (1996) bem
como estudos no Brasil feito por Dionísio (2013) que enfatiza ser os recursos
multissemióticos cruciais para apreensão de sentidos. O intuito é analisar se as práticas de
leitura e escrita dos gêneros multimodais consideram as categorias analíticas preceituadas
na “gramática do design visual” (Kress, 1996) e se nas sequenciais didáticas há reflexão
acerca dos fatores de textualidade estudados por Beagrande e Dressler (1983). A análise dos
dados está sendo feita com base em teóricos sociointeracionistas, a exemplo de Bakhtin
(1979), Marcuschi (2003), Schneuwly e Dozl (1997), sendo a noção de texto a partir desta
visão definido como a manifestação concreta do discurso, numa perspectiva sociosemiótica,
na qual os significados são entendidos a partir de escolhas de unidades significativas,
estruturalmente organizadas, disponíveis no sistema linguístico e motivadas socialmente. O
corpus da pesquisa está sendo composta por gêneros multimodais, extraídos dos livros
didáticos de 6° ao 9° ano de Magda Soares visando identificar se a autora parte de uma
perspectiva dialógico-discursiva na abordagem dos gêneros, bem como a análise destes na
“Prova Brasil” destinada a alunos do 9° ano, ou seja, se as questões propostas no exame
levam em conta a informatividade, situacionalidade, intertextualidade, intencionalidade, o
hipertexto e se os alunos interpretam de forma adequada tais gêneros com recursos
multissemióticos considerando dados nacionais e locais. Esta pesquisa encontra-se em
andamento e constitui parte do trabalho de conclusão de curso do programa nacional de
mestrado PROFLETRAS, na UPE em Garanhuns-Pe.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
ENTRE O REAL E O IMAGINÁRIO: (DES)CONSTRUÇÃO DA IMAGEM DE
SERTÃO A PARTIR DAS EXPERIÊNCIAS DE ESTÁGIO SUPERVISIONADO NO
CETEP
Laiane Fraga da Silva
Graduanda em História
UNEB –Campus VI
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O ENSINO DA ORTOGRAFIA: O QUE DIZEM OS CONHECIMENTOS TEÓRICOS
E O QUE MOSTRA A PRÁTICA DOCENTE
Resumo:
Partindo do pressuposto de que a escrita exerce uma função significativa nas práticas sociais,
faz-se necessário que a escola, enquanto instituição de ensino, que sistematiza o
conhecimento, busque estratégias didático-pedagógicas que contribuam para que os
educandos desenvolvam sua competência comunicativa, tanto na leitura quanto na escrita,
tornando-se assim aptos para agirem de forma critica e reflexiva na sociedade
contemporânea. Nessa perspectiva, os educadores, devem proporcionar aos alunos
oportunidades de leitura através da diversidade de gêneros textuais, visando ao
desenvolvimento da capacidade de interpretar e escrever textos de forma proficiente. Logo,
os gêneros textuais são relevantes na formação do leitor-escritor, pois, estes, estão
intimamente ligados a realidade sócio-histórica e cultural dos indivíduos, conforme
Marcuschi(2001). Infelizmente, o sistema educacional brasileiro ainda esta distante da
principal função social da escola, que é tornar os indivíduos capazes de atuarem na sociedade
de forma consciente e dialógica, tomando decisões nos contextos em que estão inseridos,
buscando assim a melhoria na qualidade de suas vidas. Conforme Kleiman(2001) as
deficiências do sistema educacional na formação de sujeitos plenamente letrados não
decorrem apenas do fato de o professor não ser um representante pleno da cultura letrada
tampouco das falhas na grade curricular das escolas. Na realidade, essas falhas são
decorrentes do próprios pressupostos que subjazem ao modelo de letramento escolar.
Portanto, urge que o professor explore uma diversidade de textos orais e escritos em sala de
aula para que os educandos ampliem suas habilidades de escrever e falar com proficiência,
tanto em textos formais quanto informais, conforme sugerem Lemos(1988), Kato(1993) e
Antunes(2007).
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
ANÁLISE DISCURSIVA DO TEXTO “HERMENGARDA , MINHA FRÔ” , UMA
REPRESENTAÇÃO IDENTITÁRIA DOS FALARES DIALETAIS DO SERTÃO
Resumo:
Este artigo visa analisar o gênero textual carta, intitulada “Hermengarda, minha frô”, visando
perceber as ideologias por trás do discurso do caipira apaixonado, com sua linguagem
vernáculo própria do sertão, tentando desmistificar a ideia “da língua perfeita e correta”
determinada pelas gramáticas normativas do português brasileiro. Nesse sentido, será
discutida a ideia de norma linguística, que segundo Lucchesi(1993, 2001, 2003), existe uma
polarização linguística que separa a elite letrada dos menos favorecidos sócio-
economicamente, tornando a realidade brasileira dividida entre os que possuem prestigio no
falar e, a grande maioria, utilizando uma linguagem estigmatizada, o que os tornam à
margem da sociedade. Partindo desses pressupostos, este estudo analisará os argumentos do
escritor da carta na perspectiva da visão tridimensional do discurso, segundo
Fairclough(2001), tentando identificar os aspectos da ideologia e da hegemonia presentes no
texto. Portanto, serão analisadas as questões que envolvem norma linguística, ideal
linguístico e o fato de que a língua portuguesa é heterogênea, multifacetada, polarizada, se se
considerar o todo do português brasileiro, e não apenas a idealizada norma padrão, conforme
Mattos e Silva(1993). Desse modo, este trabalho tem por objetivo combater o preconceito
linguístico, uma vez que, para a Linguistica, não há o “certo e o errado” no que concerne à
linguagem falada, pois o importante na comunicação é a adequação da fala aos contextos
específicos e a compreensão do que esta sendo dito entre os interlocutores do discurso.
533
2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
ESTUDO DE CASO: A ESCOLA NILTON OLIVEIRA SANTOS DE SANTA LUZ
BAHIA E SUA RELAÇÃO COM O LEITOR ATRAVÉS DA BIBLIOTECA.
Este artigo objetiva analisar a frequência com a qual os educandos da Escola Nilton Oliveira
Santos visitam a biblioteca e leem livros didáticos e paradidáticos. Foi distribuído um
questionário para os alunos responderem acerca dos seus hábitos de leitura, sua frequência
na biblioteca e a quantidade de livros que eles leem por semestre. Foram entrevistados
também os professores da mesma instituição de ensino para verificar se esses educadores
estimulam, leem e frequentam a biblioteca com seus educandos. Essas fichas de entrevistas,
juntamente com as fotografias retiradas da biblioteca escolar deste município, subsidiarão as
análises acerca da representação e da importância do ato de ler desta comunidade. Tomou-se
por base os teóricos que tratam da relevância da leitura na formação do cidadão critico, tais
como Kleiman (1991), Antunes (1997), Bagno (1998), além de autores que tratam da
biblioteca, tais como Silva (2009) e Bortolin (2010). Portanto, este trabalho visa conhecer a
realidade da prática leitora desta comunidade localizada no sertão baiano, visando
redimensionar as práticas de leituras nas bibliotecas publicas do município.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
LITERATURA CONTEMPORÂNEA DE AUTORIA FEMININA BRASILEIRA: POR
ENTRE MUSAS, FIOS E TEIAS – LYA LUFT, MARTHA MEDEIROS, ELISA
LUCINDA, CIDA SEPULVEDA E LÊDA SELMA
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
IMAGENS DO SERTÃO E AS PRÁTICAS DE EDUCAÇÃO CONTEXTUALIZADA
Antenor Rita Gomes – UNEB
Doutor em Educação
Resumo:
O minicurso tomou como ponto de partida a necessidade de desenvolver estratégias e
atividades didáticas que favoreçam as práticas de educação contextualizada no sertão
semiárido do Nordeste brasileiro, como forma de combate às visões estereotipadas da
realidade local. Inspirado nos princípios da transversalidade e da educação contextualizada o
curso apresentou estratégias de construção de aprendizagens a partir de fotografias do sertão
semiárido do nordeste brasileiro. Tomando como matéria de análise um conjunto de 39
fotografias do Projeto “Cores do Sertão” do Núcleo de Cultura Visual, Educação e Linguagem
da (UNEB – Campus IV) que fotografa o cotidiano sertanejo, o minicurso possibilitou a
abordagem pedagógica das fotografias com vistas ao exercício integrado de ensinar e
aprender para a cidadania. O minicurso que se desenvolveu a partir de exposições dialogadas
e atividades de grupo possibilitou o desenvolvimento de debates em torno da temática e,
sobretudo, na proposição de práticas educativas, colocando a comunidade como espaço
educativo, o alunado como agente produtor de conhecimento, e o professorado como
mediador ou gerenciador de alternativas metodológicas.
Palavras-chave: fotografia, sertão e educação contextualizada.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
INTERSEMIOSE E LITERATURA
Abreu Paxe
Doutorando de Comunicação e Semiótica da PUC-SP
RESUMO
O curso a que nos oferecemos a dar aborda a relação da intersemiose e da literatura, visa
oferecer reflexões teóricas sobre os processos criativos que se dão nesses territórios
interligados pelo signo como meio de comunicação nas criaçãos mediáticas, para que esses
percursos possam ser compreendidos em sua complexidade e diversidade de manifestação.
Aqui, dá-se enfoque aos processos criativos, como redes complexas em criação, serão
discutidos entre os pensadores de comunicação, da filosofia e da arte e os própios produtores
(Cordelistas, xelografos, poetas visuais, poetas concretos, prosadores ...), serão desenvolvidos
debates sobre a relevância e as implicações de abordar os diferentes modos de comunicação
sob o ponto de vista processual. Esse enfoque mostra-se necessário para a abordagem de
importantes questões das mideas contemporanea que envolvem relações entre presente e
processos culturais que abrigam um número maior e crescente de culturas, muitas delas
ainda não descritas (ou mal descritas) têm de ser examinadas a partir de categorias da
tradução, que expõe os processos de imbricação, bricolagens e mestiçagem entre códigos,
textos, séries e géneros, põe à mostra as sintaxes combinatórias e a complexidade dos
sistemas. O mutuo pertencimento entre o externo e o interno implica um conceito de
estrutura como conjunto não autonómo, em que se priviligie a continuidade relacional e não
as molduras unitárias. Não se podem pensar os objectos mediáticos, como a literatura, fora
das interações cotidianas e históricas entre natureza e cultura.
Palavras-chave: Semiose. Literatura. Tradução. Poesia de Cordel. Vanguardas Artísticas.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
FICÇÃO EM PERNAMBUCO – BREVE HISTÓRIA
Resumo:
O curso Ficção em Pernambuco – breve história, oferecido por mim durante o CLISERTÃO
2014, e em outros momentos e espaços do Estado, tem como objetivo apresentar uma
realidade bastante desconhecida, não apenas do leitor médio, mas – de forma especial – do
leitor vinculado à vida acadêmica ou, genericamente, escolar. Trata-se da produção literária
do gênero prosa de ficção, aqui compreendida como romance, novela e conto. O fato de
Pernambuco ser, no conjunto da literatura brasileira, bastante festejado como terra da
poesia, lato sensu, gerou o que podemos chamar de uma má consciência ou um desinteresse
pelo estudo e registro da nossa prosa de ficção. Pouco se escreveu, enquanto ensaio histórico,
ao longo de 160 anos, sobre essa produção. Refletindo sobre este fato, resolvi fazer leituras e
reunir dados para publicação de um texto, que resultou na edição de um encarte inserido
numa edição do Jornal do Commercio, do Recife, em 2001. Revisto este material, em 2010,
convidei Cristhiano Aguiar, contista, crítico literário e doutorando na Universidade
Mackenzie/SP, para fazer uma atualização do meu texto, de forma a abranger a última
geração de escritores do gênero ficção, no Estado. Da conjunção resultou o livro homônimo
deste minicurso, que veio e vem ampliar a discussão sobre o tema do livro, ao mesmo tempo
em que o divulga junto a mais leitores, contribuindo para o preenchimento dessa lacuna no
universo da nossa história literária.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
TECNOLOGÍAS DA INFORMAÇÃO E EDUCAÇÃO: RELATO DE EXPERIÊNCIAS
COM PROJETOS NA ESPANHA
Victor Amar
Professor da Univesidade de Cádiz-Espanha
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
Esta experiencia a modo de taller (minicurso) ha sido un pretexto para compartir ideas,
pensar en voz alta y escuchar lo que otros pensaban, además de hacer pensar y admitir que
los tiempos han cambiado… Pero ¿y nosotros? Con todo, hemos intentado contribuir a leer la
vida (en la línea de Paulo Ferire). Hemos querido mostrar unas nuevas gafas para leer y
escribir en el siglo XXI y quitarles las únicas y obsoletas por las cuales leían… para mostrarles
una nuevas con las cuales puedan comprender y entender la vida.
No es un ejercicio para una mirada esnobista; se trata de un quehacer contemporáneo. No es
decir lo que viene, es hablar de lo que ya existe y no debemos quedarnos en el pretérito. Son
nuevos tiempos, nuevas herramientas y nuevos lecto-escritores. La era Gutemberg,
posiblemente, se esté diluyendo en pro de la digital. La exclusividad está dejando paso a otros
formatos y maneras de escribir y leer y, además, de difundir los contenidos narrativos.
Desde la educación no podemos quedar ajenos a estos envites. Hemos de ser sabedores.
Hemos de aprender de ello para poder enseñar; pues de lo contrario qué puede enseñar una
persona que dejó de aprender (siguiendo el pensamiento de Armand Mattelart). Si lo están
haciendo, o lo han hecho, desde la publicidad o la misma cirugía… por qué no hemos de
hacerlo también desde la educación para el siglo XXI.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O SERTÃO É DO TAMANHO DO MUNDO: O SERTÃO É O SOZINHO
Rejane de Souza
Doutoranda em Literatura Comparada-UFRN
Professora da Rede Estadual de Ensino do Rio Grande
do Norte
Resumo:
O minicurso buscou evidenciar pontos de convergências da natureza barroca do sertão
presente no repertório das canções de Luiz Gonzaga e o sertãoque representa o fio das
veredas e travessias do romance: Grande Sertão: Veredas de Guimarães Rosa. Nesse
caminho, sabe-se que a palavra sertão está presente na música, na poesia e no romance
brasileiro, sendo revestida pelos mais diversos sentidos. A natureza aberta dessa expressão
serviu de inspiração para o sertão de travessias e nonadas de Guimarães Rosa. Na música,
para expressar a saudade da partida, os sofrimentos do sertanejo, a infertilidade da terra e
tantos sentimentos telúricos interpretado pelo o rei do Baião, Luiz Gonzaga. Ele recriou um
novo mapa do Brasil através de imagens do sertão. Imagens brotadas da vida, da infância, da
memória, das plantas, dos pássaros, dos sentimentos de sua gente. Para Rosa, a palavra que
se chama sertão conduz Riobaldo a encruzilhadas que o leva às forças do bem e do mal; ao
amor carnal e espiritual. E, também, para a luta mais insólita: a de Riobaldo com ele mesmo.
Não é uma travessia fácil, pois o sertão se revela pela duplicidade, pelo antagonismo, pelo sim
e pelo não. Enquanto a visão do artista barroco clássico era alimentada pelo conflito entre o
profano e o sagrado. No caso de Guimarães Rosa e Gonzaga, o mundo se verte em dúvida
sobre a compreensão do ser e não ser, da partida e da chegada.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
ICONICIDADE DO LÉXICO
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
O PROBLEMA DA LIBERDADE NA OBRA O ESPÍRITO DAS LEIS, NA
CONCEPÇÃO DE CHARLES DE MONTESQUIEU, NO PERÍODO DA IDADE
MODERNA
RESUMO
Trata-se de pesquisa acerca do problema da liberdade dentro da obra de Charles de
Montesquieu de titulo O Espírito das Leis como também a mesma sendo abordada pela
perspectiva da Filosofia do Direito. A temática da liberdade é analisada pela visão dos
principais filósofos da época e principalmente dos filósofos do período do iluminismo. Para a
pesquisa ser desenvolvida foi necessário um estudo aprofundado de obras relativas aos
estudos filosóficos dentro da perspectiva do direito. A abordagem se dá de forma simples
porem embasada unicamente em teorias já estudadas anteriormente por filósofos renomados
sobre como o homem enxerga sua liberdade e como ela é manifestada, desse modo é possível
notar que o mesmo durante muito tempo apenas considerara esse fenômeno como um
aspecto físico, só após os estudos dos filósofos é que foi possível dar uma conotação
psicologia e conceitual ao tema. Assim a pesquisa se foca na questão de como a obra de
Charles de Montesquieu O Espírito das Leis vê a questão da liberdade do homem e como a
mesma se manifesta dentro das formações de governos abordados na obra, por fim observa-
se que a liberdade é regulada e administrada pelas leis que regem as diversas formas de
governo evitando assim o caos e conflitos gerados por excessos.
Palavras-Chave: Liberdade. Filosofia. Filosofia do Direito. Espírito das Leis. Homem. Leis.
Governo.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
A LUDICIDADE NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA E LÍNGUA INGLESA
Antônia Aparecida Barros Alencar Correia (IFSertão PE – Salgueiro
Roberta Guimaraes de Godoy e Vasconcelos (IFSertão PE –Petrolina
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão
AS MUDANÇAS DO CORDEL: UMA COMPARAÇÃO ENTRE A PRODUÇÃO DE
PORTUGAL E A DO BRASIL
Maria Alice Amorim
Doutora em Comunicação e Semiótica / PUC-SP
RESUMO
Quando se compara a literatura de cordel portuguesa com a literatura de cordel brasileira,
percebe-se claramente não apenas um repertório nordestino e nacional, produzido por
autores do Brasil, como também a presença de temas tradicionais, que já circulavam entre as
recorrências da narrativa popular portuguesa medieval, a exemplo do que registra Luís da
Câmara Cascudo, em Cinco Livros do Povo, ou seja, as narrativas referentes à Donzela
Teodora, Princesa Magalona e Imperatriz Porcina, a Roberto do Diabo e João de Calais. De
modo evidente relacionada a poéticas tradicionais procedentes da cultura portuguesa, o
cordel nordestino se assemelha à poesia do cordel português, não apenas em temática,
também na estrutura formal. Claro permanece o parentesco. No entanto, a partir dos
primórdios desta poesia de tradição em terras brasileiras, a dinâmica da cultura se encarrega
da afirmação identitária do bem cultural enquanto forma de expressão regional. São
aglutinados gêneros poéticos inventados por autores nossos, os temas da cultura local se
consolidam e adquirem status de tradição. As características gráficas, sobretudo ilustrações
de capa, igualmente conjugam, exprimem aspectos do universo cultural nordestino. Assim, o
heróico, o satírico, o religioso, as histórias de trancoso, as novelas de cavalaria, os contos
pastoris, o fantástico, o maravilhoso revelam persistências ao mesmo tempo em que
permitem vislumbrar a consolidação do espírito criador de artistas que vêm esculpindo há
mais de um século este importante pilar do patrimônio cultural brasileiro
Palavras-Chave: Poesia. Literatura de Cordel Portuguesa. Literatura de Cordel Brasileira.
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2º CLISERTÃO - Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura no Sertão