Contrato Investimento Coletivo 1
Contrato Investimento Coletivo 1
Contrato Investimento Coletivo 1
Condo-Hotéis
Rômulo Landim
Advogado Comercialista em São Paulo. [email protected]
1 Introdução
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Como já visto anteriormente, em nosso ordenamento jurídico não há a definição de
valor mobiliário. Na doutrina, este conceito aparece intimamente ligado e dentro do
âmbito dos títulos de crédito. Em tal classificação, os valores mobiliários ora são parte
dos títulos de crédito propriamente ditos, ora são classificados como títulos de crédito
impropriamente ditos. Assim por exemplo, as ações seriam títulos de crédito impróprios
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e as notas promissórias ou comercial papers títulos próprios.
Sendo atribuídos, ora então, a títulos de massa, ficando possível a alteração da relação
obrigacional original, por meio de deliberação majoritária em assembleia geral de
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acionistas ou de debenturistas. Portanto, a relação cartular não é literal e a relação
obrigacional pode ser alterada sem a vontade do próprio credor. Passando assim, a
inexistir a literalidade do título.
Uma oferta pública depende de uma empresa que queira captar recursos no mercado
para o uso de forma direta ou indireta, por meio da viabilização de um empreendimento
ou atividade de terceiros. Tais empresas serão chamadas de emissoras de valores
mobiliários e, para fins deste estudo, serão consideradas as ofertantes também.
Como dito, as empresas emissoras podem emitir tais valores mobiliários, apenas, para
captação própria (como, por exemplo, o caso de uma grande companhia que oferta suas
ações ao mercado para continuar ou ampliar suas atividades), ou, podem ser empresas
criadas especificamente para emissão de valores mobiliários para fomentar o Sistema de
Financiamento Imobiliário (SFI), como no caso das companhias securitizadoras. Além
disso, os fundos de investimentos também podem ser considerados emissores, os quais
emitem suas cotas para serem ofertadas publicamente. No caso dos fundos de
investimento, devem ter um administrador que pode ser uma instituição financeira ou
uma pessoa jurídica não financeira, desde que autorizada pela CVM para exercer
atividade de gestão, conforme o tipo de fundo sendo que, no caso dos FII, somente
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poderá ser administrador as pessoas descritas no art. 28 da Instrução CVM 472 .
Após a emissão dos valores mobiliários, a emissora deve contratar uma instituição
intermediária, a qual deve ser uma instituição financeira integrante do sistema de
distribuição de valores mobiliários, para realizar a distribuição dos valores mobiliários no
mercado. Essa instituição é a responsável por procurar os investidores interessados na
aquisição dos valores mobiliários ofertados em cada emissão, observando as regras
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específicas estabelecidas nas instruções da CVM . Caberá a instituição intermediária,
dentre as demais obrigações estabelecidas na Instrução CVM 400, avaliar, em conjunto
com a ofertante, a viabilidade da distribuição, solicitar, juntamente com o ofertante, o
registro de distribuição devidamente instruído, assessorando-o em todas as etapas da
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distribuição .
Para fins deste estudo pensando na oferta pública que acabamos de descrever, são
considerados investidores comuns todas as pessoas em geral – naturais ou jurídicas –
que adquiram valores mobiliários no âmbito de uma oferta pública e que não tenham
alto conhecimento sobre o mercado financeiro para entender e ponderar os riscos
financeiros relacionados à aplicação de recursos nesses valores mobiliários;
excetuando-se, ainda, nos termos do § 1º do art. 3º da Instrução CVM n. 400, aqueles
que tenham prévia relação comercial, creditícia, societária ou trabalhista, estreita e
habitual, com a Emissora.
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Segundo o inciso II do art. 9º-B da Instrução CVM 539, são considerados investidores
qualificados, dentre outras, as pessoas que, no entendimento da própria CVM, possuem
conhecimento sobre o mercado financeiro suficiente para que não sejam aplicáveis um
conjunto de proteções legais e regulamentares conferidas aos investidores que não
sejam qualificados, uma vez que são capazes de entender e ponderar os riscos
financeiros relacionados à aplicação de seus recursos em valores mobiliários, que só
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podem ser adquiridos por investidores qualificados , exigindo que tais investidores
atestem sua condição por escrito.
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O registro de distribuição pública de valor mobiliário é previsto no art. 19, caput, da Lei
6.385/76 e no art. 4º, § 2º, da Lei 6.404/76. Além disso, esse registro é disciplinado
pela Instrução CVM 400/2003.
Cabe destacar no presente trabalho, que o papel da CVM não é fazer juízo de mérito
sobre os valores mobiliários que serão colocados à disposição do público, e muito menos
sobre a expectativa de rendimento o qual está atrelado ao sucesso do empreendimento.
Esta análise cabe aos investidores, que, diante das informações prestadas, farão sua
escolha por adquirir os títulos ofertados. Portanto, o papel da CVM é o de garantir o
disclosure e assegurar o tratamento equitativo entre os emissores e os aceitantes da
oferta, com o objetivo de protegê-los.
Segundo a definição adotada pela Suprema Corte no caso citado acima, o conceito de
security deve abranger “qualquer contrato, negócio ou arranjo por meio do qual uma
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Foi ainda oferecido a cada Adquirente das Unidades Imobiliárias Hoteleiras, uma garantia
mínima de rentabilidade, assegurado pela Incorporadora, com valor estimado de acordo
com o tamanho da respectiva Unidade Imobiliária Hoteleira, conforme estabelece o
Termo de Garantia de Rentabilidade (“Termo de Garantia de Rentabilidade”).
Assim constitui contrato de investimento coletivo objeto da Oferta (“CIC”): (i) o Contrato
de Compra e Venda; (ii) o Contrato de Constituição de SCP, (iii) o Contrato de Locação,
(iv) o Termo de Adesão, (v) o Termo de Garantia de Rentabilidade; e (vi) a Convenção
de Condomínio.
A seguir, a fim de entender as ofertas de Condo-Hotel como valor mobiliário, nos termos
do art. 2º da Lei 6.385/76 que, conforme já explicado no item XXX do presente trabalho,
os contratos de investimento coletivo são definido como sendo: “todo título ou contrato
que gere ao investidor um direito de rendimento ou participação sem que o mesmo
empregue seus esforços para tanto, ou seja, mediante esforços de terceiros e, desde
que, ofertado publicamente”.
Da mesma forma, estes são os requisitos para que certo contrato seja definido no
conceito de contrato de investimento coletivo, de acordo com o Howey definition: (i)
investimento em dinheiro; (ii) empreendimento comum; (iii) expectativa de lucro; e (iv)
proveniente esforços de terceiro.
4.1 Investimento em dinheiro
Este elemento é verificado tendo em vista que a Unidade Imobiliária adquirida pelo
investidor será necessariamente colocada no pool hoteleiro de locação, assim sendo, a
exploração do negócio se dará de forma conjunta, como um único empreendimento.
Caberá exclusivamente à Operadora Hoteleira o desenvolvimento do empreendimento e
os Adquirentes não terão nenhuma gerência sobre a sua execução.
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Para viabilizar o pool hoteleiro, e alinhar os interesses das partes, foi constituído uma
Sociedade em Conta de Participação, onde cada adquirente
4.3 Expectativa de lucro
Neste passo, resta analisar uma decisão do Colegiado da CVM (“Colegiado”) – Processo
RJ2008/10302, onde a Superintendência de Registro de Valores Mobiliários – SRE,
propôs ao Colegiado, determinar a suspensão imediata de qualquer esforço que possa
caracterizar a oferta pública irregular de títulos ou contratos de investimento coletivo por
parte da Pothencia Tecnologia Ambiental Ltda.
Através do Memorial emitido pela SRE, foi constatado que as propostas de investimento
ofertadas pela Pothencia, são valores mobiliários da modalidade de contrato de
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O colegiado aplicou o conceito de security e o caso Howey para analisar se tal oferta
consistia em oferta irregular de contrato de investimento coletivo:
(ii) Esse investimento foi formalizado por um título, ou por um contrato? Sim, pelo
"Contrato de Arrendamento Rural" e pelo "Contrato de Plantio, Manuseio, Colheita,
Administração e Comercialização", aqui chamado de "Contrato de Prestação de
Serviços", obtidos na inspeção em versões padrão e assinadas.
Assim, o lucro líquido devido ao contratante será obtido pelo desconto efetuado sobre
esta produtividade média, da percentagem devida à Pothencia, bem como das despesas
de corte, colheita de sementes, beneficiamento da madeira e comercialização dos
produtos", o que enaltece o caráter coletivo do investimento contratado (grifos nossos).
(iv) Alguma forma de remuneração foi oferecida aos investidores? Sim. Consta das
cláusulas 6.6 e 7.9 do "Contrato de Prestação de Serviços", respectivamente, que "o
contratante receberá as receitas obtidas com a comercialização dos produtos produzidos
de sua terra, do seguinte modo: como a Pothencia administra e negocia a venda da
madeira e semente de vários contratantes, para se obter o lucro bruto da produção será
calculada a produtividade média de todos os lotes de terras que compõem a Fazenda
Santa Clara. Assim, o lucro líquido devido ao contratante será obtido pelo desconto
efetuado sobre esta produtividade média, da percentagem devida à Pothencia, bem
como das despesas de corte, colheita de sementes, beneficiamento da madeira e
comercialização dos produtos" e que, "após descontar a comissão, as despesas e a parte
que lhe cabe nas vendas dos créditos de carbono, a POTHENCIA fica obrigada a repassar
o montante devido ao contratante".
Após a análise do que consta o caso SEC v. W. J. Howey Company, juntamente com a
doutrina, o Colegiado decidiu por considerar que o investimento oferecido pela Pothencia
atende aos requisitos para a caracterização de CIC, nos termos do que estabelece o art.
2º da Lei 6.385/76, determinando a suspensão imediata de qualquer esforço que possa
caracterizar a oferta pública irregular de títulos ou contratos de investimento coletivo por
parte da Pothencia Tecnologia Ambiental Ltda.
6 Conclusão
Como se viu, tais elementos estão contidos nas atuais ofertas de Condo-Hotel,
concluindo-se que as ofertas públicas desses contratos constituem ofertas públicas de
contratos de investimento coletivo, e que, portanto, estão sujeitos às regras da Lei
6.385/76 e à fiscalização da CVM, e, tendo em vista que o século XXI é o século da
securitização e os recebíveis do setor hoteleiro são intensos em épocas de férias,
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feriados, temporadas, eventos etc., a governança corporativa desse setor deverá ser
incrementada de molde a subsumir os emissores de CIC(s) de Condo-Hotéis aos padrões
de governança impostos pelo mercado de capitais.
7 Bibliografia
BRASIL. Lei 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Dispõe sobre as Sociedades por Ações.
BRASIL. Instrução CVM 476, de 16 de janeiro de 2009. Dispõe sobre as ofertas públicas
de valores mobiliários distribuídas com esforços restritos e a negociação desses valores
mobiliários nos mercados regulamentados.
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. Vol. III. 10 ed. São Paulo: Saraiva,
2009.
EIZIRIK, Nelson. Os Valores Mobiliários na Nova Lei das S/A. Revista de Direito Mercantil
, v. 124, ano XL, Out.-dez. 2001.
GORGA, Érica; SICA, Ligia Paula Pinto (coords.). Estudos avançados de direito
empresarial: títulos de crédito. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013.
FORTUNA, Eduardo. Mercado financeiro: produtos e serviços. 16. ed. Rio de Janeiro:
Qualitymark, 2005.
MATTOS FILHO, Ary Oswaldo. Direito dos valores mobiliários. Rio de Janeiro: FGV,
2015.MODESTO, Carvalhosa; EIZIRIK, Nelson. A nova Lei das Sociedades Anônimas. São
Paulo: Saraiva, 2002.
2 MATTOS FILHO, Ary Oswaldo. Direito dos valores mobiliários. Rio de Janeiro: FGV,
2015, p. 174-175.
3 MATTOS FILHO, Ary Oswaldo. Direito dos valores mobiliários. Rio de Janeiro: FGV,
2015, p. 174 e 175
4 GORGA, Érica; SICA, Lígia Paula Pinto (coords.). Estudos avançados de direito
empresarial: títulos de crédito.– Rio de Janeiro: Elsevier, 2013, p. 259.
5 “Art. 3º São atos de distribuição pública a venda, promessa de venda, oferta à venda
ou subscrição, assim como a aceitação de pedido de venda ou subscrição de valores
mobiliários, de que conste qualquer um dos seguintes elementos:
I – a utilização de listas ou boletins de venda ou subscrição, folhetos, prospectos ou
anúncios, destinados ao público, por qualquer meio ou forma;
VIII – divulgar, quando exigido por esta Instrução, os avisos nela previstos;
XIII – guardar, por 5 (cinco) anos, à disposição da CVM, toda a documentação relativa
ao processo de registro de distribuição pública e de elaboração do Prospecto.”
III – as pessoas naturais que tenham sido aprovadas em exames de qualificação técnica
ou possuam certificações aprovadas pela CVM como requisitos para o registro de
agentes autônomos de investimento, administradores de carteira, analistas e consultores
de valores mobiliários, em relação a seus recursos próprios; e
V – fundos de investimento;
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