Coletânea de Poemas Eróticos - Vários Autores
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Índice
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Introdução
LITERATURA ERÓTICA
Gênero literário que inclui toda a literatura licenciosa, dirigida para a libertação
do desejo sexual ou do amor sensual, independentemente do grau de licenciosidade,
o que levaria, como alguns entendem, a uma distinção entre literatura erótica (menos
licenciosa) e literatura pornográfica (abertamente licenciosa). Esta distinção está
longe de ser válida para toda a literatura que descreve experiências do desejo sexual e
do amor explícito. Se atendermos ao fato de que até ao final do século XIX, por força
da moral estabelecida canonicamente, toda a literatura que ofendesse os bons
costumes, excitasse claramente o apetite sexual ou cuja linguagem incluísse termos
licenciosos ou obscenos era considerada “erótica”, com uma forte carga pejorativa,
então não devemos ser nunca capazes de estabelecer um critério rigoroso para
distinguir o que é erotismo do que é pornografia. Por exemplo, uma busca na Internet
sobre literatura erótica levar-nos-á hoje a toda a espécie de sítios de pornografia
comercial, o que pode ajudar a compreender como é fácil confundir erotismo com
pornografia.
Por outro lado, a literatura erótica remete para as descrições estéticas do amor
sensual, rejeitando a exclusividade da procura do prazer explícito que resulta da
exibição pública ou privada desse amor. O nível de representação do amor sensual
tem servido também, com muitos riscos, para distinguir o erotismo (softcore, menos
explícito, menos descritivo, menos visual) da pornografia (hardcore, mais explícita,
mais descritiva, mais visual). Obviamente, encontraremos nas literaturas de todo o
mundo inúmeros exemplos que podem contrariar esta distinção. Uma outra distinção
tem a ver com o tipo de censura que o erotismo (menos censurável) e a pornografia
(mais censurável) podem veicular.
Como esta distinção depende do tipo de formação cultural e moral de cada
indivíduo, não vemos como pode funcionar como critério independente para avaliar
as diferenças entre os dois tipos de representação literária do amor sensual.
Finalmente, as mais recentes tentativas da crítica feminista para distinguir entre uma
arte menos opressora da figura da mulher enquanto objeto do desejo sexual
(erotismo) e uma arte que repugna por reduzir a mulher a um mero objeto sexual,
simbólico ou real (pornografia), encalham no fato de muitas representações literárias
não separarem os papéis sexuais de forma tão clara, colocando até a figura masculina
em funções pouco edificantes ou em posições de perda de poder.
Por estas razões, e porque a base de todo o desejo sexual é a relação amorosa (o
elogio de eros) e não necessariamente a relação pornográfica (do grego porné,
“cortesã, prostituta”, logo o elogio da prostituição), optamos por consagrar a entrada
deste verbete a partir da designação mais universal de literatura erótica, ficando
implícita a inclusão da literatura que se considere pornográfica, mas também
obscena, indecente, libidinosa, licenciosa, ultrajante, etc., adjetivos com os quais tem
convivido sinonimamente. Aceitemos que “a pornografia é o erotismo dos outros”
(pensamento atribuído a Chris Marker) ou que estamos a falar de “duas palavras que
designam as mesmas coisas como é evidente, conforme o olhar que incida sobre elas”
(Jean-Jacques Pauvert, A Literatura Erótica, Teorema, Lisboa, 2001, p. 9).
Prevalecendo a expressão literatura erótica, aceitemos ainda que ela represente uma
conquista da literatura decadentista do século XIX, tendo até aí sido dominante a
expressão literatura sotádica (do grego Sotadès, autor obsceno do séc.III, a.C.).
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o putanheiro: / Passou a vida folgada, e milagrosa: / Comeu, bebeu, fodeu sem ter
dinheiro.’”. Pela mesma altura, o inglês John Cleland publica Fanny Hill: Memoirs of
a Woman of Pleasure, publicado em dois volumes em 1748 e 1749, o que lhe valeu de
imediato a prisão sob a acusação de ter publicado um livro pornográfico, ofensivo
para os bons costumes. O romantismo alemão também nos legou obras como a
coleção de poemas eróticos com que Goethe contribuiu para a revista dirigida por
Schiller, Die Horen, onde se incluem as Römische Elegien (1795; Elegias Romanas,
1876), poemas inspirados na relação amorosa de Goethe com Christiane Vulpius. Mas
neste século XVIII poucos ganharam lugar de maior destaque na história da literatura
erótica do que o exemplo do Marquês de Sade (1740-1814) escritor francês cuja obra
foi amaldiçoada publicamente enquanto viveu.
Os constantes atentados ao pudor, a prática quase selvagem de relações
sexuais que não conheceram limites, e as ofensas à moral levaram-no à prisão várias
vezes, onde escreveu a maior parte das suas obras, sob rigorosa censura. De salientar
os romances Cent vingt journées de Sodome (Cento e Vinte Dias de Sodoma, 1782-
1785) e Justine ou les malheurs de la vertue (Justina ou as Infelicidades da Virtude,
6 volumes, 1791-97). Cento e Vinte Dias de Sodoma, obra de esgotamento criativo,
onde Sade julgava ter alcançado o seu próprio limite, perdeu-se na Bastilha, onde
tinha estado preso durante dois anos. As mais de 300 páginas do livro foram
recuperadas mais tarde por um carcereiro, que as encontrou. Sade também soube
descrever, com rigor filosófico, as suas próprias experiências sexuais, bizarras,
agressivas, obscenas, pouco ortodoxas e sempre a roçar os limites do desejo
libidinoso. Tais práticas incluem a sodomia (sexo anal) a pedofilia e a macrofilia (sexo
com crianças e velhos) e a coprofilia (sexo com fezes).
À lista das suas reflexões teremos que juntar Le Philosophie dans le boudoir
(1795). Esta personalidade fortemente inclinada para o excesso da vida sexual, com
recurso a todo o tipo de perversão, fez com que o seu nome se consagrasse para
designar um tipo de neurose ou pulsão agressiva a que os psiquiatras chamam
sadismo. No lado oposto, o elogio do amor sensual pelo triunfo do poder único da
sedução, temos ainda Les Liaisons dangereuses (1782), de Pierre Choderlos de
Laclos. Como bem comenta um dos mais conhecidos teóricos do erotismo, Francesco
Alberoni, “Há uma estreita ligação entre a raiz coletiva do erotismo feminino e a
sedução como manipulação e intriga. Tudo o que é coletivo está inextricavelmente
ligado ao poder e à luta pelo poder. Nas cortes, nas sociedades aristocráticas como a
França do século XVIII, a sedução era um potente meio de afirmação social, de
prestígio, por último, de revolta.” (O Erotismo, 8ª ed., Bertrand, Venda Nova, 1995,
p.229).
A procura do prazer pela dor não é um exclusivo do sadismo. O austríaco
Leopold Franz Johann Ferdinand Maria Sacher-Masoch (1836-1895) ficou conhecido
por um outro tipo de perversão sexual, o prazer obtido pela dor física e pelo
sofrimento corporal, pulsão que foi imortalizada com o nome de masoquismo.
Masoch foi um aristocrata letrado, escritor de qualidade, tendo-nos legado histórias
eróticas de indivíduos que só alcançavam o prazer sexual se fossem chicoteados, por
exemplo: Eine Galizische Geschichte (Uma História Galega, 1846); Der Don Juan
von Kolomea (O Don Juan de Kolomea, 1866); Das Vermächtnis Kains (O Legado
de Caim, 1870-1877), que inclui o famoso romance erótico Venus im Pelz (A Vénus
das Peles, 1874).
Em França, o ano de 1857 é particularmente importante para a literatura
erótica: Gustave Flaubert publica o romance Madame Bovary, imediatamente
classificado como pornográfico por tomar como tema as experiências de adultério de
uma jovem provinciana casada com um viúvo medíocre, mas que há-de marcar o
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ponto de partida da época de ouro do romance realista. 1857 é ainda o ano de Les
Fleurs du mal, de Baudelaire, também acusado de imediato de imoralidade, pelo
satanismo, pela preocupação com o macabro e com as perversões sexuais. Este livro
de poemas tornar-se-ia no manifesto do decadentismo e persistirá nessa condição até
ao século XX. Em Portugal, será Eça de Queirós quem interpretará de forma mais
justa e à letra a tese naturalista com O Crime do Padre Amaro, onde concentrou a sua
atenção na descrição dos ambientes sociais, particularmente nas deficiências e nas
imperfeições da natureza humana, incapaz de ceder ao desejo carnal mais primitivo.
Um outro tipo de erotismo pode ser encontrado na poesia de Cesário Verde, como
exemplo de sublimação do amor sensual, sempre fingido ou sempre adiado.
No primeiro volume da História da Sexualidade, A Vontade de Saber, Michel
Foucault conclui na história do sentimento ocidental dois procedimentos
fundamentais para a realização da verdade do sexo: por um lado, as numerosas
sociedades (Roma, China, Índia, Japão, e sociedades arábico-muçulmanas) que
desenvolveram uma ars erotica, que extraiu a verdade do prazer em si mesmo, se
compreendido como uma prática, acumulável como experiência, onde não existe
lugar para as proibições, e prazer medido na sua intensidade pelos reflexos que
produz no corpo e no espírito. Há nesta arte erótica um segredo a perseverar, um
conhecimento que perderá a sua essência se se divulgar, por isso exige a instituição
de um mestre que detém esse segredo de vitalidade e só ele pode transmitir a sua
arte, de forma esotérica.
Pelo contrário, a civilização ocidental não possui qualquer ars erotica. É a única
civilização a praticar uma scientia sexualis, isto é, a única civilização a desenvolver
durante séculos as regras de procedimento que nos hão-de garantir a verdade do
sexo. Para isso, desenvolve-se o primado da confissão, em estreito contraste com a
arte da iniciação e do segredo esotérico. Foucault acaba por declarar que o homem
ocidental se tornou um animal confessor. A sexualidade é o resultado da prática
discursiva dessa atividade confessional e constitui-se em scientia sexualis, que o
cristianismo ocidental instituiu para produzir a verdade sobre o sexo. A poesia
feminina (isto é, virada para o objeto feminino) de Cesário Verde é a expressão
subjetiva da coita amorosa masculina, quase sempre determinada por um amor sem
possibilidades de realização libidinosa - uma poesia de mimos e nunca de jouissance
plena.
A coita do português arcaico vem do latim cogitare, que significa "ficar a
cismar", daí que ao trovador fique bem o atributo de coitado, isto é, aquele que está
pré-ocupado por alguma paixão. Veremos, como este estado se ajusta na perfeição ao
caso de Cesário, cuja poesia é bastante fixa, codificada num número restrito de
atitudes/posições sexuais, pouco inovadoras, a exemplo das cantigas de amor
medievais. A vassalagem sentimental, a mesura ou submissão do amante, o louvor
patético (relativo ao sofrimento e ao amor) da mulher divinizada e confundida num
panteísmo mal explicado, a saudade da "mia senhor" - entre todos estes temas do
amor cortês do lirismo provençal, encontramos exemplos na poesia para a mulher de
Cesário Verde.
Com mais insistência, vamos encontrar aquela atitude que se perde nos tempos
de talhar preito e menagem, que mais do que a promessa do namorado ser presente
na entrevista amorosa é uma promessa de submissão à mulher. Para mais, no sentido
de alcançar o favor supremo de quantas donas invoca na sua poesia, Cesário se
mostra um fraco amante não indo além do estádio do fenhedor que se consome em
suspiros. Nunca ousa pedir, nunca chega a corresponder-se ou a ser correspondido, e
muito menos ensaia os prazeres da jouissance feminina a que os trovadores
provençais aspiravam ao atingirem a maturidade do drut (amante). As convenções da
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Não admira a preferência de Amaro por estes cânticos, pois eles traduzem, sem
levantar suspeita, a linguagem do desejo libidinoso. Amaro conclui: "É beato e
excitante" — precisamente, essa é também a conclusão de todo o romance. Este passo
do romance contém, aliás, todos os termos da jouissance. "Concupiscência", ou
apetite sexual ou desejo intenso de gozo, é o termo de Eça que corresponderá à
jouissance. As palavras que Eça destaca — "gozo, delícia, delírio, êxtase" — são
significantes da jouissance e determinam não só toda a dialéctica do desejo n'O
Crime do Padre Amaro como pode ilustrar o léxico privilegiado do discurso amoroso
da literatura erótica.
O modernismo que inaugura o século XX teve nos seus poetas de vanguarda os
melhores intérpretes do erotismo, bem representado no grito "Rezai a Luxúria." —
exortação às gerações portuguesas do século XX pronunciado pelo pintor,
desenhador, poeta, romancista, declamador, dramaturgo, ensaísta, conferencista e
crítico de arte Almada Negreiros. Aquele grito de vanguarda pertence ao "Ultimatum"
que escreveu para o número único do Portugal Futurista, revista porta-voz do
futurismo literário português publicada em Lisboa, em 1917.
Ao texto de Almada seguia-se um «Manifesto Futurista da Luxúria» de
Madame Valentine de Saint-Point. Aqui podemos ler as coordenadas da sexualidade
da poesia de vanguarda de Almada Negreiros: “A Luxúria é a tentativa carnal do
desconhecido (...) A arte e a guerra são as grandes manifestações da sensualidade; a
luxúria é a sua flor. (...) A Luxúria estimula as energias e desencadeia as forças. É
preciso ser consciente na Luxúria. É preciso dispor da Luxúria como um ser
inteligente e raffiné dispõe de si próprio e da sua vida; é preciso fazer da Luxúria
uma obra de arte.” (Portugal Futurista, edição fac-similada, Contexto, Lisboa, 1990).
O poema de vanguarda de Almada Negreiros "A Cena do Ódio" (escrito em
1915, aos 22 anos, publicado em parte na revista Contemporânea, nº7), realiza uma
subversão daqueles que eram, no princípio do século XX, os valores morais, naturais
e sociais, sobretudo pelo recurso a imagens de pedofilia, bestialidade, prostituição,
adultério, sodomia e pela instituição de condições perversas de realização sexual,
como fetichismo, travestismo, voyeurismo e sadomasoquismo. A léxis da Luxúria no
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http://www.fcsh.unl.pt/edtl/verbetes/L/literatura_erotica.htm
http://www.uolsinectis.com.ar/biblioteca/especiales/literatura_erotica/
http://www.literatura.org/Steimberg/asTexto2.html
http://www.sagepub.co.uk/frame.html?
http://www.sagepub.co.uk/journals/details/j0065.html
http://www.fitzroydearborn.com/london/eros/intro.htm
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I. LITERATURA FRANCESA
1. GUILLAUME APPOLINAIRE
La Vaseline
A vaselina
2. RIMBAUD
3. CHARLES BAUDELAIRE
As promessas de um rosto
4. LA FONTAINE
Épigramme
Epigrama
5. FRANÇOIS DE MALHERBE
Sonnet
Soneto
6. PIERRE DE RONSARD
Sonnet
Soneto
7. ÉTIENNE JODELLE
16
1. PABLO NERUDA
Cuerpo de mujer...