Ensino de Arte para Crianças PDF
Ensino de Arte para Crianças PDF
Ensino de Arte para Crianças PDF
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
SECRETARIA DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
Ministério da Educação
Secretaria de Educação a Distância
Programa de Formação Inicial para Professores em Exercício na Educação Infantil
COLEÇÃO PROINFANTIL
MÓDULO IV
unidade 5
livro de estudo - vol. 2
Karina Rizek Lopes (Org.)
Roseana Pereira Mendes (Org.)
Vitória Líbia Barreto de Faria (Org.)
Brasília 2006
O uso das imagens da pintora Tarsila do Amaral, contidas nesse livro, foram autorizadas pelo Sr.
Guilherme Augusto do Amaral e demais herdeiros da pintora.
Ficha Catalográfica
Livro de estudo: Módulo IV / Karina Rizek Lopes, Roseana Pereira Mendes, Vitória
L788 Líbia Barreto de Faria, organizadoras. – Brasília: MEC. Secretaria de Educação
Básica. Secretaria de Educação a Distância, 2006.
76p. (Coleção PROINFANTIL; Unidade 5)
CDD: 372.2
CDU: 372.4
MÓDULO IV
unidade 5
livro de estudo - vol. 2
SUMÁRIO
B - ESTUDO DE TEMAS
ESPECÍFICOS 8
FUNDAMENTOS DA EDUCAÇÃO
AS MÚLTIPLAS LINGUAGENS DAS CRIANÇAS E AS INTERAÇÕES
COM A NATUREZA E A CULTURA (II): ARTES VISUAIS....................... 9
Seção 1 – Arte: o singular que abrange o plural............................... 11
Seção 2 – A construção do olhar, da escuta e dos movimentos
sensíveis: processos de apropriação artístico-cultural....... 20
Seção 3 – Pensando a arte nas creches, pré-escolas e escolas:
para além do simples fazer................................................ 27
Seção 4 – A diversidade expressiva das crianças nas artes visuais:
desenhos, pinturas, colagens, fotografias, cinema,
expressões tridimensionais etc.......................................... 30
c – ATIVIDADES INTEGRADORAS 72
b - ESTUDO DE TEMAS ESPECÍFICOS
8
FUNDAMENTOS DA EDUCAÇÃo
AS MÚLTIPLAS LINGUAGENS DAS CRIANÇAS E AS
INTERAÇÕES COM A NATUREZA E A CULTURA (II):
ARTES VISUAIS
Mário Quintana1
1
Você já foi apresentado ao poeta Mário Quintana em outras unidades do PROINFANTIL.
O poema que abre este texto, entre outros, pode ser encontrado no site http://marioquin-
tana.blogspot.com/
9
- ABRINDO NOSSO DIÁLOGO
Prezado(a) professor(a),
Nesta Unidade 5, vamos discutir um pouco sobre a Arte, situando-a como um movi-
mento histórico, social e cultural, de grande importância para a formação de todos
os sujeitos. Ao longo deste texto, sinalizaremos a importância de valorizarmos o
processo criador das crianças e cuidarmos da qualidade daquilo que oferecemos a
elas nas creches, pré-escolas e escolas onde funcionam turmas de Educação Infantil,
destacando nosso papel diante da formação artístico-cultural dos pequeninos.
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4. Conhecer diferentes propostas que constituem a interface da Arte com a
educação e compreender o papel das creches, pré-escolas e escolas como
espaços privilegiados de desenvolvimento da imaginação, de apropriação e
produção culturais de crianças e adultos.
Este texto está dividido em quatro seções: a Seção 1 discute um pouco a Arte
em geral, situando-a como um movimento histórico, social e cultural; a Seção 2
sublinha a importância da Arte na formação de todos; a Seção 3 detém-se mais
na importância de valorizarmos o processo criador e autoral das crianças; e a
Seção 4 destaca o papel das creches, pré-escolas e escolas onde funcionam turmas
de Educação Infantil na formação artístico-cultural das crianças pequenas.
O que é Arte? Essa pergunta pode parecer tão fácil de ser respondida, mas é bom
pensarmos um pouco sobre ela. O conceito de Arte tem se modificado ao longo da
história da humanidade, dependendo dos instrumentos de que o homem dispõe
e, ainda, da maneira como se organiza socialmente, produz cultura e se expressa.
Vários pesquisadores e estudiosos vêm se debruçando sobre este conceito e as
respostas a que têm chegado ao longo do tempo são as mais variadas.
Por muitos séculos, a palavra “arte” esteve diretamente ligada à beleza, aos
objetos que buscavam o belo. No campo das artes visuais, isso era traduzido pelas
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esculturas, pinturas e arquitetura. Num tempo mais recente, a busca do belo vai
sendo substituída pela comunicação de sensações, emoções e sentimentos – é
atribuído valor estético à obra, despregado do critério de beleza.
Nos quadros abaixo, você pode ver duas esculturas de épocas diversas. A pri-
meira é a escultura “O Beijo”, de Auguste Rodin, feita em 1886. A segunda é
a escultura “Mulher”, de Hans Arp. Você percebe a diferença entre a forma de
representar o corpo humano em ambas as esculturas? Na primeira, o artista
busca tornar a obra o mais próxima possível das figuras reais. É uma escultura
figurativa. Na segunda, o artista representa o corpo da mulher como ele o
percebe. É uma escultura abstrata.
Você já ouviu falar do francês Marcel Duchamp (1887-1968), que expôs um mictório
numa exposição de arte? Imagine a polêmica que isso gerou! Essa possibilidade de
desacomodar nossas percepções e retirar-nos do senso comum parece ser a essência
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da Arte atual. No Brasil, Lygia Clark e Helio Oiticica tam-
bém ficaram famosos por suas transgressões nesta área.
O exemplo do Vincent Van Gogh serve bem aqui: durante toda a sua vida este pintor
holandês (1853-1890) foi sustentado pelo irmão e vendeu apenas um quadro – para
este mesmo irmão. Hoje é, indiscutivelmente, reconhecido como um dos grandes
artistas do século passado. No Brasil também temos muitos casos assim.
Abaixo você pode ver um retrato de Van Gogh feito por ele mesmo (auto-
retrato) e um de seus quadros mais conhecidos: “Os Girassóis”.
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Bem, mesmo que não tenhamos atualmente uma definição única e fechada para
Arte, lidamos com alguns parâmetros e conceitos que nos amparam quando fa-
lamos dessa forma de expressão. Entre as várias possibilidades, optamos, neste
texto, pelo entendimento de Arte como uma linguagem expressa de diferentes
formas – artes visuais, dança, música e teatro –, que exige a inteireza do homem.
O que seria isso? O fato de estarmos diante de uma expressão artística pode nos
levar a sensações boas (alegria, arrepios, emoção, encantamento) e ruins (des-
gosto, tristeza, repulsa, angústia etc.). Portanto, a Arte não é sempre bela como
se pregou um dia; pode até chocar! Vamos ver se conseguimos clarear isso.
ATIVIDADE 1
Observe cada uma das obras de Arte retratadas a seguir. Tente descrever em
seu caderno, em poucas palavras, o que cada uma delas provoca em você. Que
sensações cada uma delas desperta em você?
Diante de uma obra de arte, entramos num movimento que chamamos de es-
tranhamento – um movimento de entrega, de tentar mergulhar naquilo que
estamos vendo ou ouvindo para tentar entender. Mas entender o quê? Entender
o que o artista quis dizer com o que fotografou, construiu ou imprimiu? Não,
o artista não “quis dizer”: ele simplesmente pintou, dançou ou esculpiu. São
linguagens complementares, mas diferentes! A fala é uma coisa, o desenho é
outra, a música é outra... Mas então há só um jeito de entender as peças de
teatro, os filmes, ou as gravuras? De jeito nenhum! Cada um de nós, diante
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de uma obra de arte, terá um entendimento pessoal, particular; vai entender
do seu jeito!
O que nos faz entender aquilo que vemos, lemos ou ouvimos? O mecanismo é o
seguinte: cada um de nós tem um acervo de imagens, de sons, de movimentos,
de palavras, cores etc. guardados, de alguma forma, em nossas memórias. A esse
acervo também podemos chamar de repertório. Cada uma dessas imagens, sons
ou movimentos está marcada com uma espécie de “sinal identificador”, para
que, quando necessário ou desejado, possamos nos lembrar delas. São essas
imagens, sons, palavras ou cores que nos fazem entender as novas imagens,
sons, palavras ou cores que nos chegam. No caso deste texto, por exemplo,
o que faz com que você entenda o que está lendo é o fato de você conhecer
palavras em português e, ao ler o texto, colocar as informações que o texto
lhe transmite em contato com outras informações que já possuía antes e, as-
sim, compreender ou não o que está escrito. E se o texto estivesse escrito em
japonês ou russo? Você conseguiria entender? Certamente só compreenderia
se tivesse algum conhecimento desses idiomas. Pois bem: como cada um de nós
tem memórias de imagens, palavras, movimentos ou sons diferentes, cada um
de nós entende de uma forma diferente os novos sons, imagens, palavras ou
movimentos que nos chegam! Por isso dissemos anteriormente que cada um,
diante de uma obra, a entende de seu jeito.
O que fazemos, então, para poder compreender “do nosso jeito”, pessoal,
autêntico? É o estranhamento, a que já nos referimos anteriormente, o movi-
mento que permite que possamos entender a obra, dialogar com ela. Quando
estamos diante de uma obra, acionamos nossos repertórios, buscamos diferen-
tes ângulos de visão: ver de novo, de perto, de longe, aos pedaços, no todo.
Vemos e lembramos de outras coisas que já vimos antes e que estão guardadas
na nossa memória, comparamos, sentimos a diferença. O que a obra faz sentir?
Em que ela faz pensar? O que ela lembra? Quanto mais obras vemos, ouvimos,
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assistimos, mais imagens, sons, movimentos, palavras, sensações teremos em
nosso acervo e, portanto, mais facilmente, com o estranhamento, poderemos
compreender outras obras que conhecermos depois. É esse movimento que
permitirá que nossas experiências com a Arte se ampliem a cada dia.
“Experimente ver pela primeira vez o que você vê todo dia, sem ver. (...)
O hábito suja os olhos e lhes baixa a voltagem. Mas há sempre o que ver.
Gente, coisas e bichos. E vemos? Não, não vemos. (...) Nossos olhos se gas-
tam no dia-a-dia, opacos”.
É bem assim que as coisas acontecem: a gente tem que estranhar para ver a vida
de outra forma. E a Arte nos possibilita isso, já que a obra de arte nos fala não
apenas sobre ela, mas também de nós mesmos, da sociedade, do mundo. A apre-
ciação de uma obra de Arte faz com que nos percebamos cidadãos do mundo,
do cosmos, ligados e responsáveis por essa relação homem-cultura-natureza. Daí
termos escrito, anteriormente, que a Arte reclama a inteireza do homem. Ela nos
leva para outros mundos, outras sensações, outros sentimentos. Ela mexe, não
só com nossa cognição, mas com nossos afetos e, por isso, nos afeta.
ATIVIDADE 2
O movimento de ir e vir em direção à obra e acionar nossos repertórios de
imagens, sons, cores etc. é o que chamamos de estranhamento. Ao longo das
diferentes unidades do PROINFANTIL, você tem sido incentivado(a) a fazer esse
movimento de estranhamento ao apreciar diferentes obras de arte de poetas,
pintores e escultores. Escolha, entre os livros do PROINFANTIL, uma dessas obras
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que tenha chamado sua atenção de modo especial e procure relacionar-se de
maneira autônoma e pessoal com ela. Olhe para ela de perto, de longe, aos
pedaços, como um todo. Procure pensar onde ela foi feita, a forma como foi
feita. Alguma lembrança lhe vem à cabeça quando olha para ela? Você já viu
alguma parecida? Ela lhe lembra alguma música? Que cheiro teria? Se pudesse
imaginar seu sabor, qual seria? Por que você a escolheu? Que sentimentos essa
obra desperta em você? Que perguntas você se faz diante dela? Anote suas
conclusões em seu caderno e, na próxima reunião quinzenal, compartilhe com
seus(suas) colegas as suas anotações.
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Como vimos, é importante que todo ser humano possa ter contato direto com
a Arte. Mas, quando pensamos na criança, comumente nos vemos diante do
desafio de pensar numa “arte infantil”. Pensar na relação da criança com a
Arte tendo como parâmetro uma “arte infantil” é uma forma preconceituosa
de compreender o papel que a Arte pode ter na vida da criança. Neste texto,
discutiremos a universalidade da Arte e a necessidade de desconstruirmos alguns
preceitos e pré-conceitos que engessam nossas práticas para, então, podermos
pensar a Arte de outra forma.
Fernando Pessoa
(disponível no site www.fpessoa.com.br)
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Para você enriquecer seu repertório sobre poesia
ATIVIDADE 3
Você tem explorado alguma forma de Arte com as crianças? Quais são as formas
de Arte que você tem levado às crianças com as quais você trabalha? Como elas
reagem a essas manifestações artísticas? O que elas parecem mais apreciar?
ATIVIDADE 4
Sabemos da importância de oferecer propostas significativas de trabalho com
a Arte às crianças. Que tal, então, você fazer um levantamento na sua sala: tem
algum pai, avó, tio ou mãe que toca instrumento, canta, dança, pinta, esculpe
ou borda? Escreva o que você conseguiu descobrir. Seria muito bom que você,
após fazer esse levantamento, pudesse convidar familiares das crianças com as
quais você trabalha e de outros grupos da instituição para apresentarem seus
trabalhos de expressões artísticas para as crianças. Essa é uma bela forma de es-
treitar laços com as famílias, de valorizar e preservar a cultura local e, sobretudo,
ampliar e qualificar o repertório das crianças. Isso é especialmente importante
numa sociedade como a nossa, em que, muitas vezes, as crianças ficam expostas
por um longo período à TV, que veicula manifestações culturais muitas vezes de
qualidade duvidosa e que nem sempre valorizam a cultura do meio de origem
da criança. Daí a importância do espaço na escola para outros tipos de manifes-
tações culturais diferentes daquelas veiculadas pela mídia.
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Seção 2 – A construção do olhar, da escuta e dos movimentos sensíveis:
processos de apropriação artístico-cultural
No decorrer da Seção 1, destacamos que, cada vez que nos relacionamos direta-
mente com uma obra de arte, seja ela um espetáculo de dança, uma peça teatral,
uma expressão bi ou tridimensional ou, ainda, uma música, aguçamos o olhar,
a escuta e movimentos sensíveis e ampliamos nossos acervos de imagens, sons,
cores e movimentos. Discutimos ainda que, ao buscarmos ampliar os acervos das
crianças com relação à Arte, o fato de serem trabalhos destinados às crianças não
exige que sejam, necessariamente, “repertórios infantis”, no sentido de serem
empobrecidos ou de menor qualidade estética. Mas qual é a importância dessa
ampliação de acervos? Aí temos vários pontos para destacar sobre os quais procu-
raremos discorrer ao longo desta seção, a saber: formação cultural, possibilidade
de autonomia na trajetória de apropriação artístico-cultural e processo criador.
Priscilla Silva Nogueira
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O que nos interessa neste texto é falar dos conhecimentos no âmbito artístico-
cultural, que poderíamos traduzir em conhecimentos estáticos e poéticos. Eles são,
certamente, diferentes daqueles conhecimentos científicos, como os que você tem
conhecido ao longo de sua formação acadêmica. São, também, diferentes daqueles
conhecimentos espontâneos ou cotidianos que você constrói permanentemente
em sua vida diária, na rua, com colegas, no mercado, com a família. Vale frisar,
entretanto, que não há conhecimentos mais importantes do que outros – são todos
diferentes, mas igualmente fundamentais em nossa formação.
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Você se lembra de já ter visto uma imagem ou ouvido determinada música
ou mesmo assistido a um filme que tenha realmente lhe marcado, que você
guarde de forma especial na memória e no coração? Então, isso é fruto da
experiência estética vivida por você. É interessante perceber que a nossa rela-
ção com a natureza também pode deflagrar experiências deste tipo. Afinal, a
natureza também nos oferece seus encantos, seus sons, suas imagens, odores,
sabores. Você já ouviu falar em Pier Paolo Pasolini, um grande cineasta italiano
(1922-1975)? Certa vez, num livro chamado “Jovens infelizes – antologia de
ensaios corsários” (1990), esse cineasta escreveu sobre esta experiência “com
as coisas” e disse o seguinte:
“Eu, quando falo com você, posso até esquecer, ou querer esquecer, o que
me foi ensinado com as palavras. Mas não posso jamais esquecer o que me
foi ensinado com as coisas.” (p. 131)
É bem por aí: viver intensamente aquilo que estamos vendo/ouvindo de for-
ma a nos entregarmos à experiência,deixarmos que a emoção, a memória, a
atenção e a desatenção, a tensão e a distensão possam apossar-se de nós, e
fazermos com que a experiência reverbere e se expanda como em ondas dentro
de cada um, proporcionando o que chamamos de experiência estética.
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muda diante daquela grandiosidade de beleza! Um pequeno texto de um poeta
uruguaio ao qual você já foi apresentado em outras unidades do PROINFANTIL,
Eduardo Galeano (1940), que escreveu sobre o impacto de um menino que avistou
o mar pela primeira vez, exemplifica bem a experiência estética que o contato com
a natureza pode proporcionar:
A função da arte/1
Diego não conhecia o mar. O seu pai, Santiago Kavadloff, levou-o para que
descobrisse o mar. Ele, o mar, estava do outro lado das dunas altas, esperan-
do. Quando o menino e o pai, enfim, alcançaram aquelas alturas de areia,
depois de muito caminhar, o mar estava na frente de seus olhos. E foi tanta
a imensidão do mar, e tanto o seu fulgor, que o menino ficou mudo de be-
leza. E quando finalmente conseguiu falar, tremendo, gaguejando, pediu
ao pai: – Me ajuda a olhar!
Assim como o menino que pede ao pai que o ajude a olhar a beleza do mar,
as crianças com as quais trabalhamos esperam de nós que possamos ajudá-las
a viver experiências de apreciação do que há de belo na natureza e também
nas produções humanas. Nossa responsabilidade neste processo de “ajudar a
olhar” é grande. Ajudar a ver, ouvir, mexer, sentir; o que não é o mesmo de ver
pelo outro, ouvir pelo outro, sentir pelo outro.
Assim, uma das razões pelas quais devemos nos relacionar cada vez mais com
obras de arte variadas é porque elas são a base de nossa formação cultural.
Mas há outras razões para fazermos isso, como, por exemplo, a autonomia na
trajetória de apropriação artístico-cultural.
Creio que você já deve ter ouvido muita gente falando que não gosta de cine-
ma ou de museu porque não entende nada de Arte. Isso acontece, em parte,
porque durante anos e anos as pessoas ditas cultas eram minoria e não queriam
compartilhar seus conhecimentos com os demais. Então, faziam tudo para que
a maioria da população acreditasse que o conhecimento era algo intangível,
feito para uns poucos privilegiados.
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Até mesmo a construção dos museus mais antigos, como o Museu Nacional de
Belas Artes do Rio de Janeiro, era de tal forma solene que transmitia a idéia
de opulência e afastava o povo de seu interior.
Essa idéia de que o conhecimento só seria acessível a uns poucos privilegiados fez
com que se chegasse a pensar que algumas pessoas não tinham, sequer, capacidade
de aprender. Os estudos que você vem desenvolvendo ao longo das unidades do
PROINFANTIL mostram que as coisas não são assim. Somos diferentes uns dos ou-
tros e cada um tem um ritmo próprio e uma forma singular de se relacionar com o
mundo; cada um viveu experiências únicas e, conseqüentemente, vem construindo
seus conhecimentos de determinada forma. Todos têm não apenas vários potenciais
e capacidades, mas ainda inúmeros conhecimentos de natureza cotidiana.
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assim como nossa formação cultural. Em Arte, assim como em outros campos
do conhecimento humano, há sempre algo mais para se saber: qual a técnica
utilizada pelo artista? A que movimento esta pintura pertence? Quem foi este
pintor? De início, o importante é que a pessoa tenha autonomia na trajetória
de apropriação artístico-cultural, que é a possibilidade de exercitar um olhar e
uma escuta pessoais diante da obra vista/ouvida. No processo de apropriação
ocorre a construção de olhares, escutas e movimentos sensíveis que você expe-
rimentou e acumulou ao longo de sua vida. Quanto mais experiências estéticas,
maiores as possibilidades de apropriação artístico-cultural.
Por fim, devemos estar diante de obras de arte também para ampliarmos
nossa capacidade criadora. Para que você compreenda isso, temos que dis-
cutir, mesmo brevemente, o processo criador. Por mais singela e simples que
pareça a criação, ela deve ser valorizada, pois é um movimento fundamental-
mente humano. O psicólogo e pesquisador russo Lev Semenovich Vygostsky
(1896-1934), que você já conheceu em outros módulos do PROINFANTIL, em
especial no Módulo II, muito se dedicou ao processo criador. Ele tem um livro
que foi traduzido para o espanhol em 1987 (“La imaginación y el arte en la
infáncia” – Hyspánicas SA – México), que já mencionamos na apresentação
do Módulo II. Nesse livro, Vygotsky escreve o seguinte: “existe criação não
só na origem dos acontecimentos históricos, mas também onde o ser hu-
mano imagina, combina, modifica e cria algo novo, por mais insignificante
que esta novidade pareça ao comparar-se com as realizações dos grandes
gênios” (p.11).
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As crianças com as quais trabalhamos são, assim como nós, sujeitos em formação
cultural permanente, consumidores críticos e produtores de cultura. Portanto,
o papel do(a) professor(a) é favorecer a autonomia destas crianças diante das
obras, para que possam dar respostas singulares àquilo que vêem ou ouvem,
que possam assim adquirir uma formação cultural bem ampla e qualificada
e, ainda, produzir suas expressões teatrais, corporais, musicais ou visuais.
ATIVIDADE 5
Descreva uma atividade que você tenha desenvolvido com as crianças com as
quais trabalha na qual você considera que houve autonomia da criança ao exer-
citar sua apropriação cultural, interpretando “do seu jeito” as coisas, opinando,
falando e comentando. Você acredita que essa atividade tenha contribuído
para o desenvolvimento das crianças? Por quê?
Quando todos cantam a mesma música com os mesmos gestos ensinados pelo(a)
professor(a), não podemos afirmar que as crianças estejam exercendo sua au-
tonomia interpretativa. Quando colorem papéis mimeografados com desenhos
feitos pelo adulto, as crianças certamente não têm a possibilidade de exercitar sua
criatividade. Muitas vezes o(a) professor(a) julga estar contribuindo para a forma-
ção estética das crianças oferecendo a elas desenhos para colorir, por exemplo.
Entretanto, essa prática impede que a criança exercite sua própria criatividade,
uma vez que a imagem já está previamente construída, sem que ela tenha uma
participação mais ativa nesse processo. Assim como para a criança, a atividade
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artística precisa ter significado para o(a) professor(a), afinal, se este(a) também
não estiver exercitando sua autonomia, não terá meios para incentivar a autono-
mia das crianças. Quando o(a) professor(a) se interessa por experiências estéticas
e amplia seus próprios repertórios, realizando pesquisas para ter mais a oferecer
às crianças, ele(a) contribui para a ampliação do repertório dos pequeninos.
Há ainda mais um desafio que tem reflexo direto em nossas práticas: a su-
peração das práticas de expressão artística desenvolvidas com as crianças e
que são baseadas na reprodução de programas de TV, shows estereotipados,
danças reduzidas a movimentos mecânicos e sem significação e músicas com os
mesmos arranjos empobrecidos. Essas práticas ampliam a “cultura enlatada”,
padronizada e impedem a manifestação dos elementos da cultura popular,
diferente em cada região. Portanto, quando a proposta pedagógica da creche,
pré-escola ou escola que possui turma de Educação Infantil tem como foco a
valorização da cultura da comunidade na qual está inserida, tendo também o
compromisso de valorizar e incentivar as manifestações culturais dessa comu-
nidade, as práticas que incentivam a reprodução dos padrões veiculados pela
mídia devem ser substituídas por práticas que valorizem a cultura local.
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Apesar deste impulso para a expressividade, não houve uma mudança estrutural
no ensino da arte, que continuou marcado pela valorização das técnicas e habi-
lidades manuais com padrões estéticos ligados à cópia de modelos, alicerçados
numa visão bastante utilitária e instrumental, típica de um estilo que havia sido
introduzido no Brasil no início do século XIX, por D. João VI.
Uma ruptura maior com este modo de conceber o trabalho com Artes na escola
só passou a fazer parte das propostas institucionais nas décadas de 60 e 70. Uma
vez que a criança passou a ser o foco do processo de ensino-aprendizagem nas
escolas, o ensino da Arte acompanhou timidamente esta tendência, passando a
valorizar mais a expressão, mais o processo do que o produto. Entretanto, ainda
hoje este aspecto é ponto de tensão, pois este movimento, denominado arte-
educação, ganha diferentes contornos e acabou, muitas vezes, criando uma ter-
ceira esfera, que nem é mais a da Arte, tampouco a da educação. A Arte, então,
acabou confinada, nas instituições educativas, a um espaço secundário, a serviço
de outras disciplinas ou conteúdos de caráter mais cognitivo. Os espaços educati-
vos institucionais têm, historicamente, valorizado um único saber – o científico – e
acolhido uma única linguagem – a escrita. Isso ainda é muito presente hoje.
Assim, o desafio é não diminuir a Arte e não transformá-la numa outra coisa,
mas trazê-la para dialogar com as creches, pré-escolas e escolas, contribuindo
para torná-las espaços mais humanizados, plenos de autoria e expressividade.
A Arte, afinal, não pertence às creches, pré-escolas e escolas e não deve ser
subserviente ou ficar a serviço de outros interesses. Ela vem abrir as portas e
janelas das instituições educacionais para mostrar a vida de outra forma – es-
tética e poética – e favorecer o transbordamento das múltiplas linguagens da
criança, favorecendo o acesso e estimulando as diferentes formas de expressão
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artística, aqui, mais especificamente, visual.
Tudo o que temos discutido neste texto tem levantado a questão de que as
creches, pré-escolas e escolas devem ser espaços privilegiados de apropriação
e de produção visual das crianças. Elas devem ter acesso a livros, imagens,
filmes, fotografias, cenários naturais, pinturas, colagens, esculturas, formas ar-
quitetônicas e desenhos diversos. De outra feita, devemos, também, estimular
que desenhem, pintem, colem, recortem, modelem, fotografem, construam
com sucata, sempre experimentando materiais diversos, tentando, tentando,
tentando novamente, transformando, destruindo, criando objetos, começando
de novo, transformando mais uma vez a qualquer hora que tenham neces-
sidade e desejo, tendo respeitados seu tempo de criação e, especialmente,
seu produto como uma linguagem visual autoral e singular.
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Seção 4 – A diversidade expressiva das crianças nas artes visuais: de-
senhos, pinturas, colagens, fotografias, cinema, expressões tridimen-
sionais etc.
- Realismo fortuito: a criança risca o papel como uma forma de exercício motor,
sem a preocupação de coordenar seus movimentos.
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- Realismo visual: a criança já não desenha as partes ocultas dos objetos quando
vistos a partir de determinado ponto de vista.
Caso você deseje conhecer mais sobre essas fases, você pode encontrar
mais informações no livro cuja referência apresentamos a seguir:
O desenho da criança, suas pinturas, colagens etc. são narrativas visuais. En-
quanto desenha, a criança canta, se mexe, rebola, anda, ri, fala. Cada desenho
contém uma história e uma dinâmica próprias ali retratadas. Se cada criança
tem uma história de vida que é única, se cada uma vive experiências estéticas
diferentes, se cada uma se relaciona de forma autônoma com as obras que vê e,
assim, constrói acervos diversos em sua memória, portanto, cada uma tem coisas
diferentes a narrar; não podemos esperar que seus desenhos sejam iguais. O
desenho da criança é fruto de suas memórias, sensações, vivências, em diálogo
permanente com sua imaginação. É um transbordamento, um jogo expressivo
de meninos e meninas. Por isso é tão importante que ofereçamos às crianças
oportunidades para se expressarem livremente, expondo as produções infantis
nos espaços da instituição.
É importante lembrar que, quanto mais amplo e qualificado for o repertório das
crianças, maior e melhor será sua base para criação. Quando apresentamos às
crianças obras de arte de diferentes pintores, esculturas, fotos etc., oferecemos
a elas elementos para enriquecerem suas próprias produções.
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Quando pensamos nas condições oferecidas às crianças para sua produ-
ção expressiva, a variedade e qualidade também contam. Nas creches,
pré-escolas e escolas, há diferentes formatos, cores, texturas e tamanhos
de papéis? Os instrumentos (lápis preto, giz de cera, caneta, lápis de cor,
hidrocor, giz, carvão) estão em condições adequadas de uso? As crianças
têm tempo disponível e desejo de desenhar? O suporte utilizado para o
desenho (mesas, cadeiras, cavaletes etc.) está adequado ao tamanho das
crianças e oferece comodidade de execução? Sabemos que, muitas vezes,
não dispomos de condições consideradas ideais, mas é importante que,
mesmo com limitações, tenhamos a preocupação de criar as melhores con-
dições possíveis em termos de comodidade e opções de materiais para que
as crianças se expressem através do desenho. Além da preocupação com as
condições materiais para a realização do desenho, devemos nos preocupar
também com as situações em que as crianças desenham. Como é feita a
proposta para que elas desenhem? Há uma preocupação em incentivar as
crianças a desenharem o que desejam? Os ritmos e interesses de cada uma
das crianças são respeitados? É importante lembrar que só podemos falar
de autoria, de deixar marcas, se todos tiverem liberdade para fazer suas
opções e trabalhar em seu próprio ritmo.
32
produções. Como o(a) professor(a) pode contribuir para que isso aconteça?
Primeiro, é preciso lembrar que não se pode esperar que as crianças sim-
plesmente sigam um modelo. Além disso, é importante evitar comparações
entre as produções das crianças, valorizando algumas mais que outras.
Também é um desafio escaparmos da cobrança de resultados diretamente
ligados às etapas de desenvolvimento gráfico. Por exemplo, se a criança já
faz bonecos e formas reconhecíveis e, um dia, resolve apenas rabiscar, isso
não significa que ela tenha regredido em seu desenvolvimento. Assim como
muitos artistas têm “fases” diferentes em suas pinturas – que vão e voltam
do figurativo ao abstrato, por exemplo –, as crianças também experimentam
formas diversas para se expressarem.
ATIVIDADE 6
Já que estamos conversando sobre as linguagens visuais e as possibilidades ex-
pressivas das crianças, que tal você listar, para depois debater em seu grupo, o
que você costuma propor em termos do trabalho com artes visuais aos meninos
e meninas com os quais trabalha? Ao construir esta lista, é importante pensar:
temos proporcionado às crianças a expressão em linguagens variadas ou há
uma delas que tem predominado? As atividades propostas estão ressaltando o
caráter autoral das produções das crianças ou baseiam-se, privilegiadamente,
na cópia e na reprodução?
Sabemos que há certos hábitos que estão muito enraizados em nossas práticas,
mas também sabemos que, quando temos a oportunidade de refletir sobre essas
práticas, a qualidade de nosso trabalho melhora significativamente.
O poeta chileno Pablo Neruda (1904-1973) escreveu um lindo poema que pode
nos ajudar a pensar melhor nessas questões:
33
“Morre lentamente quem não viaja, quem não lê, quem não ouve música,
quem não encontra graça em si mesmo. (...) Morre lentamente quem se trans-
forma em escravo do hábito, repetindo todos os dias o mesmo trajeto (...).
Morre lentamente quem abandona um projeto antes de iniciá-lo, não pergunta
sobre um assunto que desconhece ou não responde quando lhe indagam algo
que sabe. Evitemos a morte em doses suaves, recordando que estar vivo exige
um esforço muito maior do que o simples fato de respirar (...).”
(www.fabiorocha.com.br/neruda.html)
Quando vai desenhar, pintar, esculpir etc. a criança enfrenta, sim, o desafio
motor. A melhor forma de enfrentar esse desafio é desenhando, pintando,
esculpindo etc., isto é, não é necessário criar exercícios motores sem significa-
ção, reduzindo o desenho e a pintura aos seus aspectos puramente motores.
Na medida em que desenha mais e mais, a criança aprimora seus movimentos
e pode fazê-lo sem perder a dimensão criadora e autoral. Todo o movimento
que ela faz ao trabalhar com a argila, com a massinha, com sucatas, desenhos,
pinturas, colagens etc. estará favorecendo a qualidade de seus movimentos,
inclusive para a escrita. Quando a criança tem oportunidades de desenhar, escul-
pir e modelar, não há a menor
necessidade de que ela faça
exercícios psicomotores espe-
cíficos. Esse tipo de exercício
esvazia o caráter autoral da
expressão gráfica dos meninos
e meninas com os quais traba
lhamos e incentivam a repro
dução de estereótipos.
34
Quando pensamos na relação entre o desenvolvimento do desenho infantil
e o desenvolvimento de habilidades para a escrita, uma preocupação que
muitas vezes já aparece na Educação Infantil, é importante lembrar que
desenho e escrita são linguagens gráficas, portanto, próximas e até com-
plementares, mas não são a mesma coisa. A escrita é alicerçada em códigos
decifradores convencionados e o desenho lida com símbolos não conven-
cionados, o que lhe dá um caráter mais autoral e livre, como a pintura, a
colagem, a escultura. Mais uma vez, o que estará em destaque aqui para
nós é a possibilidade autoral da criança em seus desenhos e não sua análise
para servir de base para a avaliação deles.
Uma idéia que muitas vezes impede que os desenhos das crianças sejam
apreciados em sua singularidade é a de que a criança, ao desenhar, mos-
tra-nos tudo sobre ela e, assim, observando seus desenhos seria possível
conhecê-las, analisando aspectos de seu comportamento a partir deles. O(a)
professor(a) não é um(a) profissional com uma formação em Psicologia Clí-
nica, portanto não tem habilidades para utilizar a expressão gráfica como
fonte de análise psicológica dos pequeninos. A diferença pode parecer
sutil, mas existe: olhando desenhos de crianças conhecerei cada vez mais
e melhor seus desenhos, o que será sempre maravilhoso! Saber que deter-
minada criança tem uma cor favorita, um tipo de traço que lhe é peculiar,
um jeito próprio de ocupação da folha etc. Mas se o(a) professor(a) quer
(e deve) conhecer mais as crianças com as quais convive, suas histórias,
medos, alegrias, tem de estar com elas! Ouvir, ver, observar, brincar junto,
afagar, abraçar, prestar atenção... é possível conhecer as crianças estando
com elas, sendo parceiro(a), companheiro(a) e disponibilizando o olhar e
escuta sensíveis para vê-las e ouvi-las.
Conversar com a criança sobre o que ela fez, prestar atenção, dialogar,
perguntar sobre o que ela registrou, incentivar a conversa na roda entre
os(as) colegas sobre as produções do grupo, não para julgá-las, mas para
que todos opinem e percebam o percurso criador de cada um, deixar que
a própria criança comente suas produções e tire conclusões sobre elas são
formas de favorecer que as crianças sejam produtoras e consumidoras críticas
da cultura do meio social no qual estão inseridas, respeitando e tendo sua
diversidade expressiva respeitada e a sua autoria resguardada.
35
PARA RELEMBRAR
- O conceito que temos de Arte muda ao longo da história da humanida-
de. Neste texto, abordamos a Arte como uma linguagem expressa de
diferentes formas – artes visuais, dança, música e teatro –, que exige a
inteireza do homem. Para compreendê-la de maneira singular, entramos
num movimento de estranhamento diante da obra, tentando mergulhar
naquilo que estamos vendo ou ouvindo a partir de nossos acervos de
imagens, palavras, movimentos, sensações ou sons diferentes. Ao dia-
logarmos com a Arte, nos percebemos cidadãos do mundo, do cosmos,
ligados e responsáveis por essa relação homem-cultura-natureza.
36
- O papel da Arte nas instituições educacionais se situa no tempo e no
espaço. A tensão se faz permanente por ser a Arte alicerçada na auto-
ria e, conseqüentemente, na quebra de modelos (transgressão). O que
se defende hoje é que as instituições educativas possam ser espaços
de participação, respeito, troca, socialização e aprendizagens diversas
que contribuam para a formação de sujeitos inteiros, críticos, autores
e autônomos. Espaços de múltiplas linguagens e expressões, espaços
privilegiados de apropriação de diferentes códigos estéticos, de dife-
rentes culturas, espaço de produção significativa e autoral, ampliando,
assim, as diversas formas de relação homem-cultura-natureza.
37
Glossário
Autonomia na trajetória de apropriação artístico-cultural: a possibilidade
de exercitar um olhar e uma escuta pessoais diante da obra vista/ouvida, sem
seguir modelos ou “formas corretas” e únicas de interpretação das mesmas.
Poder tentar, buscar, experimentar, procurar caminhos, recuar, voltar, refazer.
O processo de apropriação é o processo de construção de olhares, escutas e
movimentos sensíveis que você experimentou e acumulou ao longo de sua
vida. Seus olhares, escutas e movimentos se modificam, como você, ao longo
de toda a sua vida. Quanto mais experiências estéticas, maior a apropriação
artístico-cultural.
38
Formação cultural: possibilidade de construção de conhecimentos no âmbito
artístico-cultural, que podemos traduzir em conhecimentos estéticos e poéti-
cos, ligados à Arte em suas expressões visuais, teatrais, musicais ou corporais,
disponíveis hoje e construídos ao longo da história da humanidade. Deriva do
que chamamos experiência estética.
Narrativa visual: uma história e uma dinâmica próprias retratadas nas expres-
sões visuais das crianças enquanto produzem, por meio de canto, gesto, dança,
deslocamento no espaço, risos, fala. Resulta da conjunção entre a história de
vida única de cada criança, de suas experiências estéticas, de seus acervos de
sons, imagens, movimentos, cores, palavras, sensações, em diálogo permanente
com sua imaginação.
39
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Ministério da Educação. Referencial Curricular Nacional para a Educação
Infantil. MEC/DPE/COEDI, 1999.
HADDAD, D. A., MORBIN, D. G. A arte de fazer Arte. São Paulo: Saraiva, 2004.
p. 16.
40
41
42
organização do trabalho pedagógico
O TRABALHO COM ARTES VISUAIS
História da arte
Eduardo Galeano1
1
GALEANO, E. Bocas do tempo. Porto Alegre: L&PM, 2004.
43
- ABRINDO NOSSO DIÁLOGO
Como o(a) professor(a) pode promover situações nas quais as crianças tenham
a possibilidade de apreciar diferentes manifestações artísticas? Que tipos de
atividade podem ajudar a promover a cultura local nas creches, pré-escolas
e escolas que possuem turmas de Educação Infantil? Como o(a) professor(a)
pode mediar o contato das crianças com diferentes materiais e técnicas de
trabalho? Que atividades podem contribuir para o desenvolvimento do senso
estético por crianças e professores(as)? Essas e outras questões certamente es-
tão presentes no cotidiano dos(as) professores(as) que trabalham nas creches,
pré-escolas e escolas que possuem turmas de Educação Infantil.
44
2. Identificar a importância de favorecer situações adequadas à experimentação
e ao conhecimento de cores, formas e texturas, em ambiente lúdico e na
interação da criança com a natureza e a cultura.
Mais importante do que “ensinar” Arte e suas muitas técnicas nas creches, pré-
escolas e escolas é pensar as formas de organização do espaço, as propostas, as
oportunidades de apropriação e ampliação de repertório oferecidas às crianças,
assim como as condições de produção existentes nas instituições. Vale lembrar que
os momentos nos quais as crianças podem refletir sobre suas produções e, assim
desenvolver seu pensamento crítico acerca delas mesmas e do mundo são impor-
tantes. Nosso papel, como professores(as), é dar suporte às experiências estéticas
significativas, de forma a incentivar autonomia de pensamento, sem subestimar
as crianças, oferecendo oportunidades para ampliação de acervo e estimulando
a expressão de respostas pessoais, apreciando e respeitando suas produções.
45
“Pinturas rupestres”, Parque Nacional da Serra da Capivara (PI)
46
Por ser uma história, a expressão bidimensional é chamada narrativa visual. No
texto de Fundamentos da Educação deste mesmo módulo, já tivemos a opor-
tunidade de discutir o que são as narrativas visuais. Você pode, inclusive, reler
aquele texto para recordar este conceito.
Para narrar visualmente uma história, a criança fala, ri, gesticula, dança,
desloca-se, contrai-se etc. Portanto, quando pára de colar, desenhar ou pintar,
é como se ela congelasse a história ali presente. Nesse processo criador, o que
interessa mais fortemente é o percurso, o processo da criança na realização
da atividade. Uma das formas de a criança perceber que damos importância
à sua expressão é conversarmos com ela acerca da história que ela narra em
sua produção. Mas isso não é o mesmo que perguntar “o que você desenhou
aqui”. Primeiro, porque não se trata de valorizarmos os elementos isolados
ali presentes – casa, sol, árvore, pai, carro, mãe, cachorro – mas o todo ali
presentificado em traços e cores, isto é, a história narrada visualmente. Em
segundo lugar, vale ressaltar que a Arte expressa em diferentes linguagens
aquilo que, muitas vezes, as palavras não dão conta de dizer. Assim, nem
sempre será possível a criança verbalizar o que desenhou. Nesse sentido,
não podemos afirmar que através do desenho a criança “quis dizer” alguma
coisa – ela simplesmente desenhou.
Da mesma forma que faz ao brincar, cada vez que se expressa bidimen-
sionalmente, a criança está reorganizando o mundo em que vive. Revive
situações, muda percursos, age de forma diferente, reinterpreta histórias.
Por isso é tão importante desenhar, colar ou pintar, da mesma maneira que
é importante brincar.
As produções das crianças serão tão mais expressivas e autorais quanto mais
variados os tamanhos, as formas e os tipos de suporte (papéis, papelão, o
próprio corpo, jornal, folhas, areia, madeira, tecidos etc.) que lhe forem ofe-
recidos, assim como os diferentes instrumentos a serem usados (lápis, carvão,
toco de madeira, hidrocor, giz, tintas, caneta, pincéis, goma de farinha de
trigo, esponjas etc.). É importante que a criança perceba que seu trabalho
é respeitado e valorizado.
47
- dispondo de suportes diversos;
- escrevendo, em algum outro suporte separado, as histórias que elas nos contam;
- fixando as produções das crianças pelas portas, janelas e paredes das creches,
pré-escolas e escolas, mostrando a todos o quanto as achamos interessantes
e importantes. É importante lembrar que as crianças são pequeninas, seus
trabalhos devem estar à altura de seus próprios olhos;
O desenho, a pintura e a colagem das crianças são marcas que elas deixam a
partir de sua relação com o mundo, em diálogo permanente com seu imaginá-
rio. São marcas pessoais. Portanto, é muito importante percebermos que cada
criança tem um jeito próprio de se expressar: traços com mais vigor ou mais leves,
ocupando o espaço todo ou apenas um cantinho, usando muitas cores ou esco-
lhendo apenas uma etc. Nós, professores(as), que lidamos dia-a-dia com meninos
e meninas e suas produções culturais, seremos capazes de reconhecer a produção
de cada criança mesmo que esta não tenha nome escrito se possibilitarmos que
os pequenos se expressem com autoria.
48
Atividade 1
Se você separar os trabalhos de pintura, desenho ou colagem que tem feito junto
com seu grupo, poderá observar estas produções e perceber se estão mais volta-
das para a criação ou para a reprodução e a cópia. Discutindo a partir dessa sua
experiência concreta com seus(suas) colegas de trabalho, procure pensar de que
forma você poderia favorecer mais ainda a autoria de suas crianças. Escreva, em
seu caderno, suas reflexões e as compartilhe com seu grupo do PROINFANTIL.
É possível que a maioria das crianças com as quais você trabalha sigam um
percurso bem semelhante na evolução de seus desenhos: comecem rabiscando
indiscriminadamente; depois controlem mais os rabiscos e esbocem espirais;
adiante façam bolinhas (chamamos de células); a seguir, estiquem braços e
pernas, formando figuras humanas (chamamos de badamecos). Aos poucos,
começam a estabelecer uma nova organização no espaço do suporte (comu-
mente fazem uma linha divisória entre o céu e a terra ou o mar); e assim por
diante, colocando, progressivamente, mais detalhes em seus desenhos. Entre-
tanto, também é possível que algumas crianças não sigam esse caminho. O(a)
professor(a) não deve se preocupar com esses padrões, nem tampouco associar
diretamente o tipo de desenho com o nível de desenvolvimento global da
criança. É possível encontrar crianças com dificuldades de aprendizagem e com-
preensão, ou dificuldades emocionais, desenhando de forma bastante expres-
siva, assim como podemos ter crianças que se destaquem em sua facilidade de
responder e resolver problemas e que se expressem mais livremente em outras
linguagens que não a do desenho, tais como a música, a dança ou o teatro.
Portanto, não há uma relação direta entre o tipo de desenho e a possibilidade
de aprendizagem da criança.
49
É sempre bom lembrar que o desenho, a pintura e a colagem da criança
se tornam mais elaborados e trabalhados quanto mais oportunidades ela
tiver para desenhar, colar ou pintar – aprende-se a fazer, fazendo! –, tendo
sempre sua produção valorizada e sua autoria assegurada.
Atividade 2
Que tal você pensar numa atividade envolvendo o trabalho com Artes num
suporte que você ainda não tenha esperimentado com seu grupo? Seria inte-
ressante desenvolver essa atividade com as crianças e anotar em seu caderno
os resultados que obteve para discuti-los com seu grupo do PROINFANTIL. Essa
discussão, inclusive, pode proporcionar um troca-troca de idéias entre vocês e,
assim, cada um vai ter mais e mais formas diferentes de trabalhar as expressões
bidimensionais com as crianças.
50
Seção 2 – Cores, formas e texturas
Em algum lugar do tempo, mais além do tempo, o mundo era cor de cinza.
Graças aos índios ishir, que roubaram as cores dos deuses, agora o mundo
resplandece; e as cores do mundo ardem nos olhos que as olham. (...)
51
O mundo é multicolorido, e quanto mais observarmos isso, mais detalhes
perceberemos. Os esquimós, por exemplo, que moram lá no gelo, todo branco,
são capazes de distinguir diversos tons de branco que nós não enxergaríamos.
Assim como crianças que moram em locais mais florestais e arborizados dife-
renciam tons de verde; crianças da área rural podem reconhecer pássaros pelos
detalhes de suas cores, por exemplo; crianças que vivem junto ao mar podem
saber, por exemplo, a partir da observação de suas cores, se o tempo vai mudar
ou não e assim por diante. Incentivar que crianças fiquem mais atentas para as
cores do mundo – tanto da natureza, quanto dos bens culturais – é um grande
estímulo para que elas aprendam sobre o ambiente onde vivem e uma opor-
tunidade de sensibilizar seu olhar e ampliar seu repertório.
Atividade 3
Misture duas a duas as cores primárias (azul, vermelho e amarelo) e faça suas
descobertas. Que cor você achou misturando azul com amarelo? E o amarelo
com o vermelho? E o vermelho com o azul? Escreva em seu caderno as desco-
bertas que você fez.
52
Quando temos uma mesma cor com um aspecto mais claro ou mais escuro, nós as
chamamos tons. Nas experiências com misturas de cores, o(a) professor(a) pode
incentivar as crianças a misturarem o branco ou o preto para clarear ou escure-
cer as cores que criam ou a criarem outros tons usando mais cores primárias, por
exemplo: escureço o verde colocando mais azul ou clareio com o amarelo.
Atividade 4
Agora pegue as cores secundárias que você criou na atividade anterior e faça mais
descobertas: procure criar diferentes tons e anote embaixo o que você usou.
Atividade 5
Pesquise, com as crianças, as cores que podem ser obtidas com materiais que
existem na comunidade onde você trabalha. Em seguida, faça uma lista dos
materiais e das cores que podem ser obtidas com eles. O exemplo do quadro
abaixo pode ajudá-lo(a). Depois de fazer suas anotações, seria interessante
compartilhar com seus(suas) colegas do PROINFANTIL o processo de pesquisa
de cores que você fez com as crianças. Mais uma vez, a troca entre vocês, nos
encontros de formação, servirá como base de idéias interessantes para você
criar novas experiências com as crianças com as quais trabalha.
53
Tipo de material Cor(es) que produz
É importante lembrar que cada cultura tem seus próprios códigos, formas
de ser, agir, interpretar e expressar o mundo. Assim, cada cultura terá dife-
rentes padrões de moradia, de transporte, de vestimenta, por exemplo.
China Índia
54
Itália França
Rússia Inglaterra
atividade 6
Faça um passeio com as crianças e observe o tipo de moradia que existe nos
arredores da creche, pré-escola ou escola onde você trabalha. Ao voltarem
para a instituição, ofereça a elas papéis e lápis coloridos para que todos pos-
sam registrar aquilo que viram durante o passeio. Depois, discuta as diferenças
encontradas. É bom que desde pequenos, elas possam sensibilizar o olhar para
as diferenças do mundo em que se inserem.
55
Tarsila do Amaral , “O mamoeiro” – 1925
Atividade 7
Aprecie a obra “Verão”, de Giuseppe Arcimboldo, que apresentamos a seguir.
Escreva em seu caderno qual a sua opinião sobre ela. Gostou? Não gostou? Por
quê? Quando houver possibilidade, leve esta gravura e mostre-a às crianças com
as quais você trabalha. Peça que elas dêem sua opinião sobre a obra. Anote essas
opiniões numa folha. Você pode, posteriormente, escrever essas opiniões com
letras grandes numa folha de papel pardo e deixá-las expostas na sala de ativi-
dades onde você trabalha com as crianças. Pode, ainda, sugerir que as crianças
façam uma releitura dessa obra, ou seja, pedir que cada criança desenhe a obra
do jeito que quiser. Finalmente, compare sua opinião com as opiniões das crianças
e, no próximo encontro quinzenal do PROINFANTIL, discuta com seu grupo as
diferentes perspectivas que você e as crianças tiveram ao apreciar a obra.
56
A natureza é nossa grande aliada, também,
na exploração das formas. Veja como o
pintor explorou as formas das frutas, dos
legumes, das verduras e dos grãos no qua-
dro que apresentamos ao lado.
57
Além das cores e formas, também as texturas podem ser uma fonte de explora-
ção e experimentação pelas crianças. A natureza, grandiosa, nos oferece uma
grande variedade de texturas: desde o pelo fofinho de coelhos ou gatos aos
espinhos de uma paineira (árvore que dá paina) ou de um porco-espinho; as
cascas rugosas de algumas árvores e os caules lisos de outras; a aspereza das
pedras do litoral e da montanha e a sensação lisa e escorregadia dos seixos de
rio ou daquelas pedras cobertas de limo. As possibilidades são infindáveis.
58
Fazer uma massa de pintura a dedo (uma goma de farinha de trigo e água,
mexendo no fogo para dar o ponto) e, depois de fria, brincar de espalhar por
diferentes suportes (inclusive o próprio corpo) é uma experiência sensorial muito
rica para todos! O tato é um sentido que nos dá não apenas a possibilidade de
experimentar e identificar a textura, mas também a temperatura: quente, frio,
morno. A mesma forma de exploração pode ser extrapolada para as obras de
arte – suas cores, texturas e formas particulares.
Além das cores, formas, texturas, também os sabores podem oferecer experi-
ências interessantes com as crianças. A culinária é a arte de transformar ele-
mentos isolados num todo diferenciado. Quando nos propomos a fazer uma
atividade de culinária com as crianças, além de podermos provar cada um dos
ingredientes que usaremos na receita (certifique-se apenas se há crianças com
alergia a algum deles na turma), poder misturá-los mostra-nos cores e texturas
se transformando. Quando cozido, por exemplo, muda ainda sua forma, sua
temperatura e, além disso, exala diferentes odores. Cozinhar com as crianças
é uma oportunidade ímpar de explorar os sentidos, começando pela visão e
terminando pelo paladar.
Atividade 8
Seria interessante se você, com a colaboração das crianças, escolhesse uma re-
ceita para fazerem na creche, pré-escola ou escola. É interessante pensar numa
receita que possa ser feita com a participação ativa das crianças. Você pode co-
meçar pelo planejamento da atividade: que ingredientes serão necessários? Qual
a quantidade de cada um deles? Como serão obtidos esses ingredientes?
Após realizar essa atividade, registre em seu caderno seus comentários sobre
ela e troque suas impressões com os(as) colegas do PROINFANTIL.
59
O livro que sugerimos a seguir traz reflexões interessantes sobre o trabalho
com pintura.
60
desejo de produzir das crianças.
Uma vez que você já tenha uma sala para trabalhar com as crianças, depen-
dendo do tamanho, uma das idéias interessantes é dividi-la em “cantinhos”
– um canto para livros (alguns podem ser confeccionados pelas crianças); um
canto com material de teatro (podem fazer fantasias com roupas usadas,
criar enfeites com contas e cerâmicas, fantoches, bonecos etc.); um canto com
som e instrumentos (que podem também ser confeccionados pelas crianças
com paus, latas, sementes, arames etc.); um canto para os trabalhos em artes
61
visuais que contenha uma parte para atividades tridimensionais (com argila,
pequenos objetos, sementes, pauzinhos etc. e sucatas para construção) e outra
para atividades bidimensionais – o que abordamos mais especificamente nes-
te texto –, com suportes variados (papel, papelão, tecido, madeira, plástico),
instrumentos diversos (pincel, hidrocor, lápis coloridos, giz), além de tintas,
colas e uma infinidade de coisas a serem coladas (pedaços de papel, tampas,
chapinhas, pétalas, folhas, penas, pedras etc.). É importante lembrar que os
materiais não devem oferecer perigo às crianças. Não podem ser tóxicos. Quan-
do se tratar de crianças pequenas, não pode haver objetos muito pequenos
como grãos ou tampinhas de refrigerante. Sucatas devem ser higienizadas com
cuidado antes de serem usadas. É preciso verificar se os objetos, como latas
de alumínio, recipientes plásticos ou pedaços de madeira, não apresentam
pontas cortantes ou lascas que possam ferir as crianças etc.
Atividade 9
Seria interessante fazer com as crianças uma oficina de reaproveitamento de
sucata. O primeiro passo seria recolher objetos de papelão, plástico e papel e
disponibilizá-los para que as crianças criem outros objetos com eles.
Além do baixo custo desses materiais, o planeta agradece, pois hoje temos de
ter consciência da necessidade de preservar nossos recursos naturais, de rea-
proveitar tudo o que pudermos e, por fim, de reciclar aquilo que for possível.
Faça, então, um brinquedo para sua turma a partir de material reciclável ou
reaproveitável e descreva, em seu caderno, como foi esse processo. Se puder,
junte uma foto do processo de realização do trabalho ou faça um desenho para
que o registro fique mais completo. Em seu grupo do PROINFANTIL, cada um
dos(as) professores(as) levará uma coisa diferente e vocês aprenderão, assim,
a construir uma série de brinquedos.
62
ferro pontiagudo, objetos que cortem, coisas enferrujadas etc.), organizado
(não adianta ter tudo bagunçado, misturado, amassado, pois na hora que
for precisar você não vai conseguir encontrar o que procura) e, principal-
mente, os materiais devem estar ao alcance das crianças. Se elas ajudarem a
organizar a sala, certamente saberão onde cada coisa está guardada e isso
facilitará sua autonomia. A construção da autonomia pela criança é, sem
dúvida, um dos principais objetivos da Educação Infantil, e todas as nossas
ações devem colaborar com este objetivo. Além disso, a sala fica com a “cara”
das crianças. Elas podem pintar ou forrar os potes ou caixas para guardar
os materiais, forrar prateleiras “do seu jeito” usando revistas ou folhas etc.
Quanto maior a participação dos meninos e meninas, mais interessantes os
resultados e mais autoras e autônomas vão se tornando as crianças.
Se o espaço for fechado, tiver paredes, elas podem ser usadas para colo-
car trabalhos feitos pelas crianças. Evite fazer você mesmo(a) os murais,
desenhos e enfeites. Cada vez que você coloca uma coisa feita por você
ou por outro adulto (como personagens de histórias etc.) para as crianças
apreciarem e enfeitar a parede, você está lhes passando a mensagem de
que o que elas fazem não é tão bom, tão “bacana”, tão “legal”. É muito
importante valorizarmos as pinturas, desenhos e colagens das crianças, sem
promover competições entre elas para ver quem faz melhor. Cada um faz
do seu jeito e todos devem ser valorizados à sua maneira.
Além dos trabalhos das crianças, é muito bom poder colocar fotografias variadas
ou reproduções de obras de arte. No caso das obras de arte, apesar de serem
feitas por adultos, elas têm o papel de ampliação de repertório imagético e
cultural, e isso, como vimos no texto de Fundamentos da Educação, é impor-
tante no processo de criação das crianças.
63
Observando a imagem desta mulher, que vive na África Ocidental, na região
do Saara, percebemos que o corpo também pode ser uma obra de arte e
que o conceito de belo varia de cultura para cultura.
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Que oportunidades proporcionamos às nossas crianças para a educação do olhar
sensível? Que experiências do olhar elas têm tido? Comecemos pelo próprio
corpo e a maneira de se arrumarem: pintam o corpo? Cobrem o corpo? Vestem-
se de quê? Enfeitam-se?
Podemos ver imagens de vários povos que pintam seus corpos ou vestem-se de
forma diferente e discutirmos com as crianças, apontando a riqueza de detalhes
e a beleza das cores e formas de cada lugar. Depois de discutidas essas questões
na turma, vale lembrar que, em cada canto deste país, pessoas têm culturas
diferentes e, portanto, vestem-se e enfeitam-se de forma diversa.
Não é possível gostar de algo que não conhecemos. Só podemos dizer que
gostamos ou não gostamos de determinada comida se podemos prová-la. O
mesmo acontece quando falamos de músicas, pintores, tipo de roupa, animais
de estimação, locais diferentes. A responsabilidade dos(as) professores(as) é
grande, pois são um dos principais sujeitos responsáveis por mostrar às crianças
as diversas coisas que existem nesse mundo. Mas só podemos mostrar aquilo que
conhecemos. Por isso, este texto é, ao mesmo tempo, um desafio e um convite
para que você também, professor(a), possa sentir-se convidado(a) a ampliar seu
olhar sensível para a vida e, então, desafiar as crianças a fazê-lo.
Quanto mais coisas conhecemos, mais ampliamos nosso repertório e mais chances
temos de “mudar” de gosto, de ampliar nosso gosto musical, alimentar, estético,
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isto é, passamos a gostar de outras coisas que não conhecíamos antes: atores de
cinema e teatro novos, dançarinos e tipos de dança diferentes, pintores que não
conhecíamos, esculturas que nunca tínhamos visto antes, músicas anteriormente
desconhecidas e assim por diante. Quanto mais ousarmos conhecer coisas novas
e ampliar sua nossa experiência estética, apropriando-nos das diferentes lingua-
gens, maior será o acervo que poderemos levar para as crianças.
Uma idéia bem legal é criar espaços de apreciação, uma espécie de “museu”
nas creches, pré-escolas e escolas. Guardar imagens de obras de arte, guardar
objetos, fotografias. Você pode organizar um tipo de biblioteca se conseguir
livros, pode ainda fazer um acervo para as músicas que conseguir. Se cada um
contribuir com algo, todos podem trocar, todos podem ter aquela experiência
significativa. Passa a fazer parte da rotina das crianças a convivência regular com
objetos estéticos, com os bens culturais e, assim, a ampliação e o aprendizado
do “gosto”. Também é importante, sempre que possível, promover visitas das
crianças aos museus, teatros, cinemas e bibliotecas existentes na cidade.
66
Da mesma maneira que a experiência estética se faz a partir da apropriação das
diferentes linguagens artístico-culturais, ela se reflete nos processo de criação,
nos processos de produção artístico-cultural de todos, tanto no seu quanto no
das crianças.
PARA RELEMBRAR
- O desenho, a pintura, a colagem, a fotografia e as diferentes formas de
gravura são expressões bidimensionais, linguagens que a criança pode
usar para expressar-se, reorganizando o mundo em que vive em um diá-
logo permanente com seu imaginário. Por ser uma história, a expressão
bidimensional é chamada narrativa visual e, se cada um tem “o seu jeito”
de expressar-se, significa que não há apenas um meio de fazê-lo.
67
- A forma como você e sua turma de crianças vão organizar o espaço e
os materiais vai depender, antes de tudo, de sua realidade, propician-
do um espaço aconchegante, prazeroso e desafiador, que instigue a
curiosidade e o desejo de produzir das crianças, propicie relações em
grandes e pequenos grupos, que viabilize a expressão bi e tridimensio-
nal tanto vertical quanto horizontalmente, colorido e convidativo às
suas expressões pessoais. A partir de sua realidade e da disponibilidade
de sua comunidade, você pode montar uma espécie de “espaço de
criação” que será arrumado de uma forma, ou de outra, dependendo
do tamanho. Entretanto, o material deve ser limpo, seguro, organizado
e, principalmente, estar ao alcance das crianças, pois isso facilitará sua
autonomia. As paredes são usadas para colocar sempre trabalhos feitos
pelas crianças, fotografias variadas e reproduções de obra de arte.
68
- ABRINDO NOSSOS HORIZONTES
No livro que sugerimos a seguir, você poderá encontrar mais subsídios para
orientar seu trabalho com as crianças.
A experiência requer sujeitos observadores. Para tal, não podemos ser imedia-
tistas e, assim, não podemos ter pressa. A experiência estética requer tempo.
Temos de aprender o desapego, a paciência. Por isso, finalizamos este texto
reforçando o convite e desafio anteriormente postos: comece hoje, se possível,
com cinema, museu, teatro, música, dança, pintura ou literatura. O importante
é que comecemos a abrir os olhos e nos autorizemos a experimentar estetica-
mente o mundo ao nosso redor, compartilhando essa novidade com as crianças.
Lendo romances e poesias, vendo filmes, contemplando imagens, assistindo
danças e ouvindo músicas, reorganizamos nossas relações com o mundo através
de linguagens estéticas e poéticas e, à medida em que abrimos nosso próprio
69
repertório visual, poético, teatral e musical, podemos abrir este universo aos
meninos e meninas com os quais trabalhamos. O fundamental nesse processo são
as marcas que queremos deixar mais a certeza do encontro do que modelos a
serem seguidos e, sobretudo, o desejo da busca, da autoria e da autonomia.
GLOSSÁRIO
Bens culturais: aqueles construídos pelo homem; datados historicamente. Dizem
do modo de ser, agir, pensar e simbolizar de um povo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
GALEANO, E. Bocas do tempo. Porto Alegre: L&PM, 2004.
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C - Atividades integradoras
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O trabalho com artes visuais na Educação Infantil e seu papel no desenvol-
vimento da criança foi o tema da Unidade 5 do Módulo IV. A atividade que
propomos a seguir tem o objetivo de proporcionar a você uma experiência de
trabalho com artes visuais que pode enriquecer seu repertório cultural e, ao
mesmo tempo, oferecer subsídios para seu trabalho com as crianças.
- Leve ao seu tutor a idéia de fazer uma exposição desse material no encerra-
mento do PROINFANTIL, juntando-o ao material produzido por outros grupos.
Essa seria uma forma muito interessante de celebrar o trabalho realizado ao
longo do curso e, ao mesmo tempo, uma forma de trocar experiências entre
professores(as).
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Depois do encontro quinzenal
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