A Gramática Racionalista em Portugal No Século XVIII
A Gramática Racionalista em Portugal No Século XVIII
A Gramática Racionalista em Portugal No Século XVIII
A GRAMÁTICA RACIONALISTA EM
PORTUGAL NO SÉCULO XVIII
1. INTRODUÇÃO
A breve lista que se segue é o resultado de um simples inquérito bibliográfico
que levámos a cabo com o auxílio de catálogos informatizados, com a intenção
de responder à seguinte dúvida: quantas são e quais são as gramáticas que
se apresentam como filosóficas? Dum ponto de vista puramente formal, isto
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é, de superfície, os requisitos mais evidentes para esta consideração são o
de tais gramáticas conterem o termo racional ou filosófico e/ou o de terem
sido publicadas entre os séculos XVIII e XIX. Apesar de não se tratar de
um arco temporal muito vasto, registamos uma frequência mais elevada de
publicações do que aquela que estaríamos à espera, e as mesmas ocorrem num
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Ceará, Typografia social, 1861;
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afastam deste último e sobretudo que o afastam da corrente especulativa
que só surgirá em Portugal no século XVIII. Roboredo adota, do modelo do
Brocense, a distinção entre universal e particular, mas, para ele, a distinção
entre um nível abstrato e um nível concreto não é relevante. Ele atribui a
caraterística universal da língua à gramática mas, enquanto Sánchez de
1
Uma interessante síntese da polémica e do seu enquadramento sociocultural e histórico encontra-se
em Pires 2001: 135-155, onde a autora não se limita a salientar as ideias linguísticas elucidadas por Verney
no Verdadeiro Método, mas insere pormenorizadamente a sua política linguística dentro dos moldes da
reforma pombalina.
2
Veja-se a este propósito Lupetti 2010 e Lupetti & Tocco 2010.
3
Reporto-me ao texto da conferência que Barbara Shäfer-Prieß proferiu no CLUP a 28 de novembro de
2008. O artigo é publicado neste mesmo volume.
o primeiro a falar de aprendizagem e conhecimento minucioso da língua
materna como requisito prévio para a aprendizagem de uma segunda
língua4). Contudo, ele aparece ainda muito ligado à tradição clássica, à ideia
do bom uso linguístico, e os seus compêndios registam aqui e ali uma série
de normas que o aproximam mais das gramáticas normativas do que das
filosóficas. Schäfer-Prieß diz-nos o seguinte:
4
O autor reitera este conceito em varias ocasiões nos capítulos preambulares do Methodo Grammati-
cal e da Porta das Linguas e fá-lo apresentando sistematicamente as razões que o levam a conceber essa
metodologia.
língua, e por outro, a perceber o funcionamento não só da língua materna,
mas também o das línguas estrangeiras, com base nos princípios universais
enunciados na Grammaire Générale e Raisonnée (1660) e na Logique de
Port-Royal (1662). A gramática da língua materna deve funcionar como
suporte para a aprendizagem de qualquer outra língua, ideia já defendida,
como dissemos anteriormente, por Amaro de Roboredo, no Método
Gramatical para Todas as Línguas (1619) e na Porta (1623). A recente
corrente da gramática contrastiva serve-se, de resto, do mesmo princípio.
Nas últimas décadas de Novecentos, os estudiosos da didática das línguas
movem-se nesta direção. A comparação sistemática de uma estrutura
linguística da mesma categoria, mas pertencente a línguas diferentes,
permitiu individualizar aspetos gramaticais que podem apresentar graus
diferentes de dificuldade no momento em que o aluno os estuda. Decorre,
então, que a dificuldade de aprendizagem pode variar de acordo com a
afinidade existente entre língua e objeto.
É na gramática de Lobato que podemos ler de forma evidente a exigência
de criar escolas onde o português se aprenda e se ensine, independentemente
do latim. Não podemos esquecer que o texto de Lobato é uma gramática
escolástica que dá forma a um programa político de reforma do ensino que
queria afirmar-se como racional.
Referindo-se ainda a Roboredo, Lobato trata novamente do problema
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da formação dos docentes de língua, que não só muitas das vezes eram
incompetentes – como já Barros tinha denunciado no seu Diálogo em Louvor
da Nossa Linguagem (1540)5– como ainda, guiados pelo desprezo da língua
vulgar e de tudo aquilo que não pertencesse à esfera dita clássica, teriam
sido os primeiros a considerar supérfluo o ensino do português.
5
Leia-se Lupetti 2005: 19-24.
Para além do interesse que revela do ponto de vista pedagógico – em
certo sentido obrigatório, se considerarmos que a adoção escolástica da obra
de Lobato, imposta pelo governo pombalino como único texto6, limitava
consideravelmente a circulação de outras obras da mesma natureza – cabe
dizer que ela também se distingue por abrir as portas ao racionalismo
lusitano propriamente dito.
Nas suas páginas, encontra-se ainda o conceito de gramática como arte
que prescreve regras para formar corretamente frases, mas Lobato coloca-
se de forma central no meio daquela que Costa Assunção define como
bipolarização da gramática como ciência e como arte (Assunção 1997). Se,
por um lado, chama à atenção o facto de Reis Lobato recusar a classificação
tripartida do discurso e adotar aquela em oito partes, preferida pelo mundo
clássico, a subdivisão da sua obra em quatro e o equilíbrio interno no
desenvolvimento de cada uma delas, aproximam-no das gramáticas do
Brocense e de Petrus Ramus.
6
Continuam a ser, a este respeito, duas referências imprescindíveis, Andrade 1981 e 1982. Mas veja-se
também Costa 1979.
7
Esta tendência é anunciada pelo gramático espanhol Francisco Sánchez de las Brozas, que, na sua
Minerva Seu de Linguae Latinae Causis et Elegantia (1562), se propunha destruir algumas ideias radicadas
entre os gramáticos que o precediam oferecendo ele propostas originais. Por exemplo, a propósito das áreas
que constituíam a gramática, ele mesmo nega a repartição clássica em quatro partes. A sua obra teve grande
sucesso aquando da sua publicação e a sua influência fez-se sentir, continuando a ser citada por grandes gra-
máticos – não só portugueses – nos séculos que se seguiram.
É a tendência racionalista daqueles anos que faz com que o texto de
Port-Royal, para perceber os fundamentos da gramática, apele ao espírito,
desenvolvendo principalmente três operações: conceber, ajuizar e raciocinar.
Estes pressupostos filosóficos, propostos já pela corrente modista medieval,
farão nascer uma teoria gramatical complexa e inovadora que se desenvolve
em torno do conceito fundamental de signo, ao qual cabe a função de
exemplificar o pensamento. Assim, o signo será estudado sob dois aspetos:
em primeiro lugar como som e carácter e, sucessivamente, enquanto portador
de significado8.
A propósito das partes do discurso é introduzida uma novidade, ou seja,
uma distinção entre as palavras que designam um objeto do pensamento
e aquelas que identificam a forma do pensamento humano. Ao primeiro
conjunto pertencem o nome, o artigo, o pronome, o particípio, a preposição e o
advérbio; no segundo podemos encontrar o verbo, a conjunção e a interjeição.
À sintaxe, identificada mais uma vez em Port-Royal como construção, é
dedicado apenas o último capítulo do volume, onde encontramos a clássica
subdivisão em concordância e regência. A primeira é considerada idêntica
para todas as línguas, enquanto que a segunda se realiza sempre de maneira
diferente. A explicação para esta variedade é clara se considerarmos que
em algumas línguas a regência dá-se por meio dos casos, e noutras através
de partículas (preposições, conjunções) que desempenham o mesmo papel.
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Usando a lógica, a gramática atribui ao sistema da razão pura um espaço
específico na disciplina filosófica: falar de gramática filosófica significa
elevar a lógica à categoria de arte de pensar. Na tradição clássica, sendo
uma das partes da filosofia, a lógica tem o dever de analisar a veridicidade
ou a falsidade dos juízos de valor, concatenar os juízos e o próprio método
8
Esta é a mesma dicotomia que levará Ferdinand de Saussure (1857-1913) a falar de significante e
significado.
com eloquência nos preliminares, correspondem, na verdade, conteúdos
conservadores e, além do mais, repetitivos.
Existem, no entanto, três obras na lista proposta que merecem uma
reflexão mais atenta até por terem sido objeto, nestes anos, de discussões
por parte de críticos e estudiosos, a propósito da dívida que estas têm com o
racionalismo europeu.
Refiro-me, nomeadamente, à Grammatica Philosophica e Orthografia
Racional da Lingua Portugueza (1783), de Bernardo de Lima e Melo Bacelar,
à Grammatica Filosófica da Linguagem Portuguesa de João Crisóstomo, de
1818 – um caso, curiosamente, até hoje quase desconhecido – e a Jerónimo
Soares Barbosa, com a sua Grammatica Philosophica da Lingua Portugueza
ou Principios da Grammatica Geral applicados à Nossa Linguagem (1822).
Estes textos, ainda pouco conhecidos e estudados, podem ser reconhecidos
como “monumentos” do racionalismo que imperava no panorama intelectual
da época.
A Grammatica Filosofica e Ortográfica Racional da Língua Portuguesa
(1783) de Melo Bacelar9 permanece até hoje para muitos estudiosos de
interesse questionável; há quem, como Amadeu Torres10, tenha defendido
que esta devia ser resgatada do esquecimento e reclamado a necessidade de
um estudo monográfico sobre a mesma. Não nos interessando a polémica,
aquilo que é importante perceber é a ligação deste texto às gramáticas que o
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9
Sabemos muito pouco sobre a biografia deste autor. Nasceu presumivelmente em Chaves, por volta
de 1736, e entrou na ordem franciscana onde foi rebatizado com o nome de Frei Bernardo de Jesus Maria.
Viveu no Alentejo, e de 1769 a 1777 foi preso por aderir ao movimento reformista da Jacobeia. Influenciado
pelos ideais iluministas, publicou em 1783, além da Gramática, um Dicionário da Língua Portuguesa. No
mesmo ano saiu também a Arte e Dicionário do Comércio e Economia Portuguesa. A partir desta data, dele
sabe-se muito pouco, apenas que em 1786 trabalhava na Biblioteca Real de Paris.
10
Veja-se a introdução do estudioso na edição ao cuidado do próprio da Gramática Filosófica da
Língua Portuguesa de Bernardo de Lima e Melo Bacelar, Lisboa, Academia da História. Em bibliografia,
veja-se Bacelar 1996.
suas intenções terminavam aqui. Melo Bacelar, atento seguidor de Port-
Royal, vai além disto: confere aos sons uma função mais difícil, ou seja,
“tornar concreto” o pensamento do homem para transmiti-lo a quem o ouve.
A gramática é então uma coleção de leis com as quais produzimos e
dispomos os próprios sons. Afastando-se da tetra-partição clássica da
gramática, Melo Bacelar apresenta-nos uma subdivisão sui generis. A
subdivisão é feita em três secções: “Grammatica do Agente ou Nominativo”,
“Grammatica da Acção ou Verbo” e “Grammatica do Accionado, Paciente
ou Caso”, onde as listadas são, então, as partes essenciais da Grammatica.
Tal como Barros, também ele defende que as categorias principais do
discurso são as do nome e do verbo11. A propósito do nome, apresentam-se
duas subdivisões: a primeira faz uma distinção entre substantivos concretos
e abstratos; a segunda entre nomes próprios e comuns (ou apelativos)12.
Até neste caso a classificação adotada é muito semelhante àquela de Port-
Royal. Os verbos analisados dividem-se, por sua vez, em: ativos, passivos,
neutros, recíprocos, regulares, irregulares e defetivos. Tratando-se de uma
das partes mais importantes do discurso, o verbo – tal como acontecia com
o nome – pode apresentar adjuntos; estes, por sua vez, podem ser anteriores,
concomitantes ou posteriores. Por fim, e no que se refere ao adjetivo, são
apresentadas várias tipologias: de duas formas, de uma forma, positivo
ou absoluto, comparativo, superlativo, numeral, universal, particular,
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demonstrativo. Dentro da categoria adjetival encontramos os pronomes
possessivo, relativo e interrogativo, e o particípio ativo e passivo, que tem a
função de determinar o nome.
Apesar de não se negar a originalidade de Melo Bacelar ao apresentar
uma gramática tripartida, muitos estudiosos continuam a exprimir as suas
11
As outras partes do discurso (pronome, preposição, advérbio, conjugação e interjeição) são consi-
deradas, de acordo com o Brocense, como meros adjuntos ou sincategoremas.
12
Os adjuntos do nome podem ser de dois tipos: intrínsecos (número e género) e extrínsecos (artigo,
adjetivo, preposição, advérbio, conjugação e interjeição).
explícitas a Garat, Descartes, D’Alembert, Beauzée, Girard, Condillac e muitos
outros. Partindo da consideração de que os nossos sentidos são os veículos da
consciência do mundo, é fundamental para o gramático definir os conceitos de
ideia, cor, cheiro, juízo, substância, sujeito, atributo, frase, sintaxe e linguagem.
Para pensar corretamente, para falar e escrever com exatidão, é fundamental
conhecer as operações do nosso entendimento, conhecer e dominar a nossa
faculdade linguística, desenvolver a capacidade de raciocínio.
Se as gramáticas apresentadas até aqui se caracterizam de forma unívoca
como artes de pensar, aquela de Soares Barbosa, à qual nos dedicaremos
brevemente, caracteriza-se pelo confluir dos termos gramática e filosofia,
ou seja ciência que, tendo várias declinações possíveis ao longo da obra,
deixa transparecer um substrato cultural superior àquele das duas gramáticas
referidas anteriormente.
Jerónimo Soares Barbosa13 foi um pedagogo incansável que se dedicou seja
à didática seja à investigação. São da sua autoria as reformas mais importantes
levadas a cabo no ensino primário durante o período que nos interessa.
A partir da obra Escola Popular das Primeiras Letras (1796) reparamos
numa tónica claramente pedagógica: trata-se de uma gramática elementar do
português, onde cada capítulo contém estratégias metodológicas dirigidas
ao professor. No volume As Duas Linguas (1807) compara, por sua vez,
o português e o latim, com a intenção de sabotar o obsoleto costume
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13
Jerónimo Soares Barbosa nasce em Ansião, em 1737, e morre provavelmente em 1816. Estuda no seminá-
rio em Coimbra, onde é ordenado presbítero em 1762. Naquela mesma cidade frequentou a universidade onde,
em 1768, obteve o grau de bacharel em direito canónico. De 1766 a 1790 foi professor de retórica e poética no
Colégio das Artes de Coimbra. Em 1789 foi eleito sócio da Academia Real das Ciências de Lisboa e em 1799
membro da Junta da Direção Geral dos Estudos da Universidade de Coimbra.
14
Segundo Malaca Casteleiro (1979: 203) a obra é ainda hoje “um dos melhores modelos de descrição
gramatical existentes sobre o português”.
universal e filosófica de Port-Royal e que, ao seguir os princípios racionalistas
da linguística cartesiana, revelou um conhecimento aprofundado, por parte
do autor, das gramáticas racionalistas anteriores, mas também a leitura dos
franceses Beauzée e Du Marsais15.
A organização da obra de Barbosa segue o modelo da maioria das
gramáticas filosóficas: trata primeiramente da parte mecânica da língua
composta pela Ortoépia (= fonética) e pela Ortografia; e sucessivamente da
parte lógica, ou seja da Etimologia (= morfologia) e da Sintaxe.
Sustentando, de acordo com Port-Royal, que as línguas se distinguem
umas das outras apenas na forma que cada uma escolhe para combinar e
indicar as mesmas ideias, o gramático enuncia, em primeira instância, os
princípios gerais e depois, a partir destes, formula as regras gerais que aplica
primeiro ao português e depois ao latim.
Cada regra vem seguida de exemplos que demonstram as categorias
comuns das duas línguas. Quando isto não ocorre segue-se o procedimento
inverso: dá-se primeiro o exemplo latino e depois a tradução portuguesa
acompanhada da explicação da divergência.
Barbosa define as línguas como instrumentos analíticos do pensamento:
o sistema morfológico de cada língua baseia-se, portanto, no sistema lógico
das ideias do homem. Como consequência, se todos os homens pensam
segundo as suas próprias leis, todas as línguas devem ser governadas
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pelos mesmos princípios universais. À gramática filosófica cabe o dever de
descrever cientificamente os eventos linguísticos descobrindo as estruturas
linguísticas profundas que lhes subjazem. Assim argumenta:
A Grammatica […] tem naturalmente duas partes principaes; huma Mechanica, que
considera as palavras como meros vocabulos e sons articulados, ja pronunciados, ja
15
Nicolas Beauzée (1717-1789), gramático e tradutor francês simpatizante da Revolução, é recordado
por ter participado, com César Chesnau du Marsais (1676-1756), na redação da Encyclopédie Méthodi-
que (1786-1789) – obra duramente criticada pela Igreja – nascida como complemento à Encyclopédie
ou Dictionnaire Raisonnée des Sciences, des Artes et des Métiers, par une Société de Gens de Lettres
(1751-1752).
Uns parágrafos depois, ao refletir sobre a ligação entre a língua e o
desenvolvimento das ideias16, conclui: “Porêm deixada pelos Philosophos nas
mãos de homens, ou ignorantes, ou pouco habeis, [a gramática] se reduziu
a hum systema informe e minucioso de exemplos e regras, fundadas mais
sobre analogias apparentes, que sobre a razão, a quem só pertence inquirir
e assignar as verdadeiras causas da Linguagem, e segundo ellas ordenar a
Grammatica de qualquer Lingua particular” (Barbosa 1822: X).
Se os juízos sobre a obra de Melo Bacelar foram unânimes, já sobre Soares
Barbosa a crítica expressa-se de maneira não homogénea. Muitos estudiosos,
sobretudo brasileiros, defendem que as suas definições são cerebrinas. Para
Leonor Lopes Fávero esta obra é pioneira porque “o seu autor vê a língua
como um cientista: pressente, discerne, apresenta posicionamentos que a
linguística vem privilegiando em nossos dias” (1996: 258). Encontram-se, na
verdade, assuntos como o infinitivo pessoal e a subdivisão e classificação das
preposições trabalhadas a partir dos conceitos de espaço e tempo, movimento
e repouso (= situação) que denotam uma modernidade extraordinária, tanto
que serviram de modelo ainda ao longo do século XIX. Voltando, pela última
vez, ao diálogo entre gramática e pedagogia linguística, podemos assinalar
os traços deixados por esta obra na análise sintática, durante muito tempo
inflacionada nas aulas de português.
Muitas das ideias de Barbosa são ainda percetíveis dois séculos mais
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5. CONCLUSÕES
Apesar de termos traçado um percurso lógico ao longo deste trabalho é
evidente que faltam as provas substanciais para podermos afirmar a existência
16
“[…] sendo a Grammatica de qualquer Lingua a primeira theoria, que principia a desenvolver o em-
brião das ideias confusas da idade pueril; e dependendo da exatidão de seus principios e bom progresso
nos mais estudos: ella deve ser huma verdadeira Logica que, ensinando-se a falar, ensine ao mesmo tem-
po a discorrer. Que por isso a Grammatica foi sempre reputada como huma parte da Logica, pela intima
connexão, que as operações do nosso espirito tem com os signaes, que as exprimem” (Barbosa 1822: X).
17
Testemunho da fertilidade desta gramática e do facto de ela ter sido apreciada fora de Portugal
é, por exemplo, a sua tradução/adaptação italiana (de cuja realização e circulação estamos a tratar por-
menorizadamente em outro trabalho): Grammatica della lingua portoghese ad uso degli italiani sulle
tracce della grammatica filosofi ca della lingua portoghese dell’Illustre Signor Jerónimo Soares Barbo-
za, socio dell’Accademia Reale delle Scienze di Portogallo, ec. ec., com vari esercizi nelle due lingue,
compilata da Antonio Bernardini, cancelliere del Consolato Generale dell’impero del Brasile negl’II.
RR. Stati Austriaci e giurato traduttore e interprete della lingua portoghese, Trieste, 1858 – Milano,
Tipografia Borroni, 1859.
da continuidade efetiva de uma corrente racionalista em Portugal. Para que
isto seja possível, deve-se tentar uma análise detalhada e comparativa dos
títulos da nossa lista inicial que, apesar de tudo, são apenas uma amostra. Só
assim será possível ter um quadro completo do racionalismo português em
termos de micro e macroestruturas (imitações estruturais, reformulações,
reutilizações de exemplos, mas também os contextos políticos e sociais da
produção das gramáticas).
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