Campesinato Negro No Pós Abolição
Campesinato Negro No Pós Abolição
Campesinato Negro No Pós Abolição
Rio de Janeiro
2008
ii
Rio de Janeiro
Abril/2008
iii
Aprovada por:
Suplentes
Abril/2008
v
AGRADECIMENTOS
minha pesquisa.
FAPERJ, que sem seu incentivo financeiro, atravs da Bolsa FAPERJ nota 10, esta
Ana Rios, que durante esses dois anos de curso fez muito mais do que a sua
obrigao de orientadora. Ela soube me acalmar nas horas mais tensas e soube me pressionar,
Florentino e Mnica Grin que ao longo desses dois anos, a partir de seus exemplos de vida,
as aulas. Muito do que aqui foi escrito deve-se aos cursos ministrados por Manolo Florentino,
Maria Paula Arajo, Samantha VizQuadrat, Antonio Carlos Juc, Ana Rios e Mnica Grin.
As professoras Hebe Mattos e Martha Abreu que fizeram parte da minha formao na
Agradeo a todos os amigos que fiz no Ofcio do Registro Civil das Pessoas Naturais
da 1 Circunscrio de Nova Iguau, em especial a Dona Dylza, pois sem a boa vontade e o
Aos meus pais, Jos Hamilton e Maria Lcia que me apoiaram e, em boa parte do
tempo, financiaram-me para que pudesse realizar o desejo de fazer o que mais gosto: estudar.
vi
minha irm Wiviane, que nos momentos mais difceis e desanimadores deu-me
minha namorada Cristiane Britto, que, durante todos esses anos juntos, soube
principalmente, pela ajuda na leitura dos primeiros textos e na correo destes. Hoje sei que
Thomaz, Igor dos Reis e Tatiane Bracho, pois muito do meu carter e da minha dedicao aos
Agradeo, por fim, a todos os amigos que fiz na UFRJ, funcionrios, alunos, colegas, e
professores.
Cada uma dessas pessoas contribuiu de forma decisiva na minha formao acadmica
RESUMO
foram utilizadas entrevistas produzidas por Ana Rios, Hebe Mattos, Robson Martins e Carlos
Eduardo Costa no Vale do Paraba e na Baixada. Somado a isto, coletou-se os registros civis
como o gado e o eucalipto, houve um processo de sada dos libertos e de seus descendentes
dessas antigas reas. Esse foi o mesmo momento no qual a Baixada ganhava destaque
dissertao, percebeu-se que muitos dos trabalhadores no Municpio de Nova Iguau eram de
foram somente os integrantes de famlias nucleares que buscaram legitimar seus familiares, no
ps-abolio. Com as leis incentivadoras para o registro civil tardio, durante o Governo
ABSTRACT
LISTA DE FIGURAS
Figura 2.3 Total de crianas registradas em ano de seu nascimento por cor e ano.
Municpio de Nova Iguau. ........................................................................................................................98
Figura 3.1 Ano dos nascimentos por cor nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e
adultos declarados por outrem em 1939. Municpio de Nova Iguau. ....................................................144
Figura 3.2 Faixa etria por sexo nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos
declarados por outrem declarados como pretos e pardos por outrem em 1939.
Municpio de Nova Iguau. ......................................................................................................................145
Figura 3.3 Faixa etria por regio de nascimento nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens
e adultos declarados como pretos e pardos por outrem em 1939.
Municpio de Nova Iguau. ......................................................................................................................147
Figura 3.4 Faixa etria por localizao das pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de
nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem, em 1939.
Municpio de Nova Iguau. .....................................................................................................................148
Figura 3.5 Ano de nascimento por regio de nascimento das pessoas que se auto-declararam no ano 1934.
Municpio de Nova Iguau. .....................................................................................................................156
Figura 3.6 - Ano de nascimento por regio de nascimento das pessoas que se auto-declararam no ano 1939.
Municpio de Nova Iguau. .....................................................................................................................157
Figura 3.7 Faixa etria por sexo de pretos e pardos nos registros civis de nascimentos tardios de auto-
declarantes, 1934. Municpio de Nova Iguau.........................................................................................158
Figura 3.8 - Faixa etria por sexo de pretos e pardos nos registros civis de nascimentos tardios de auto-
declarantes, 1939. Municpio de Nova Iguau. ......................................................................................158
xi
Figura 3.9 - Faixa etria por regio de nascimento nos registros civis de nascimentos tardios auto-declarantes
pretos e pardos, em 1934. Municpio de Nova Iguau. ..........................................................................160
Figura 3.10 - Faixa etria por regio de nascimento nos registros civis de nascimentos tardios auto-declarantes
pretos e pardos, em 1939. Municpio de Nova Iguau. ............................................................................161
Figura 3.11 Registros realizados no ano de nascimento da criana por cor e ano.
Municpio de Nova Iguau.........................................................................................................................169
Figura 3.12 Registros tardios por cor e ano. Municpio de Nova Iguau. .............................................170
xii
LISTA DE TABELAS
Tabela 1.2 Porcentagem da populao classificada como preta e parda nos censos.
Paraba do Sul, Valena e Baixada. ............................................................................................................42
Tabela 2.2 Total por tamanho das propriedades segundo o censo de 1940.
Municpio de Iguass. .................................................................................................................................81
Tabela 2.6 Total e Porcentagem dos registros civis de nascimentos em 1889 por cor.
Municpio de Nova Iguau..........................................................................................................................99
Tabela 2.7 - Situao conjugal dos pais nos registros civis de nascimentos.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................100
Tabela 2.8 Legitimidade nos registros civis de nascimentos registradas por cor.
Municpio de Nova Iguau. ......................................................................................................................102
Tabela 2.9 Total de registros civis de nascimentos por regio de nascimento e cor.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................103
Tabela 2.10 Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas. Municpio de
Nova Iguau...............................................................................................................................................104
Tabela 2.12 Presena de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de nascimentos.
Municpio de Nova Iguau.........................................................................................................................108
Tabela 2.13 Situao conjugal por cor nos registros civis de nascimentos.
Municpio de Nova Iguau.........................................................................................................................109
Tabela 2.14 Profisso do pai de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de nascimentos.
Municpio de Nova Iguau.........................................................................................................................109
Tabela 2.15 - Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas. Municpio de
Nova Iguau...............................................................................................................................................110
xiii
Tabela 2.17 Naturalidade do pai nos registros civis de nascimentos por cor.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................112
Tabela 2.18 Regio de origem do pai por ano de pessoas declaradas como pardas e pretas.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................113
Tabela 2.19 - Situao conjugal dos pais por cor de crianas registradas.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................115
Tabela 2.20 Total e porcentagem da legitimidade de pessoas registradas como pretas e pardas.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................115
Tabela 2.21 Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas.
Municpio de Nova Iguau. ......................................................................................................................116
Tabela 2.22 - Naturalidade do pai nos registros civis de nascimentos por cor.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................117
Tabela 2.23 Regio do nascimento nos registros civis de nascimentos por cor.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................120
Tabela 3.1 - Situao conjugal por cor nos registros civis de nascimentos.
Municpio Nova Iguau.............................................................................................................................124
Tabela 3.2 - Legitimidade nos registros civis de nascimentos registradas por cor.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................124
Tabela 3.4 Profisso do pai por cor nos registros civis de nascimentos, 1939.
Municpio de Nova Iguau............................................................................................................188 Anexo
Tabela 3.5 - Profisso do pai de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de nascimentos por
situao conjugal. Municpio de Nova Iguau..........................................................................................127
Tabela 3.7 Profisso da me de pessoas registradas como pretas e pardas por situao conjugal.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................128
Tabela 3.8 - Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas. Municpio de
Nova Iguau...............................................................................................................................................129
Tabela 3.9 Presena de avs paternos e maternos de mes solteiras nos registros civis de nascimentos onde as
pessoas foram registradas como pretas e pardas. Municpio de Nova Iguau. ........................................129
Tabela 3.10 - Regio do nascimento nos registros civis de nascimentos por cor.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................130
Tabela 3.11 Localizao populacional por Distrito de acordo com o censo de 1940.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................131
xiv
Tabela 3.12 Porcentagem e Total de registros civis de nascimentos tardios por ano.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................133
Tabela 3.13 - Total de registros civis de nascimentos tardios por cor e ano.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................136
Tabela 3.14 - Total de registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem
por cor e ano. Municpio de Nova Iguau.................................................................................................137
Tabela 3.15 - Situao conjugal por cor nos registros civis de nascimentos de nascimentos tardios de crianas,
jovens e adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau. ......................................................137
Tabela 3.16 - Declarantes nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por
outrem por cor. Municpio de Nova Iguau................................................................................................138
Tabela 3.17 - Legitimidade nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados
por outrem por cor. Municpio de Nova Iguau.........................................................................................139
Tabela 3.18 Profisso do Pai por cor nos registros civis de nascimento tardios de crianas, jovens e adultos
declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau......................................................................... 190 anexo
Tabela 3.19 - Profisso do pai de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de nascimentos
tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau. ......................140
Tabela 3.20 - Profisso da me por cor nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos
declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau..................................................................................141
Tabela 3.21 - Profisso da me de pessoas registradas como pretas e pardas por situao conjugal nos registros
civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem. Municpio de Nova
Iguau.........................................................................................................................................................141
Tabela 3.22 Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros
civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem. Municpio de Nova
Iguau........................................................................................................................................................142
Tabela 3.23 Presena de avs paternos e maternos de mes solteiras nos registros civis de nascimentos tardios
de crianas, jovens e adultos declarados por outrem, nos quais as pessoas foram registradas como pretas e
pardas. Municpio de Nova Iguau............................................................................................................143
Tabela 3.24 - Regio do nascimento por cor nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e
adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau......................................................................146
Tabela 3.25 Regio da residncia por cor nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e
adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau......................................................................150
Tabela 3.26 Regio do nascimento por ano das pessoas declaradas como pretas e pardas nos registros civis de
nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem.
Municpio de Nova Iguau.........................................................................................................................151
Tabela 3.27 - Total de registros civis de nascimentos tardios de auto-declarantes por cor e ano.
Municpio de Nova Iguau.........................................................................................................................152
Tabela 3.28 - Situao conjugal por cor nos registros civis de nascimentos de nascimentos tardios de auto-
declarantes. Municpio de Nova Iguau....................................................................................................153
Tabela 3.29 - Legitimidade por cor nos registros civis de nascimentos tardios de auto-declarantes.
Municpio de Nova Iguau.........................................................................................................................153
xv
Tabela 3.30 - Profisso do pai por cor nos registros civis de nascimentos tardios de auto-declarantes.
Municpio de Nova Iguau.........................................................................................................................154
Tabela 3.31 - Profisso da me por cor nos registros civis de nascimentos tardios auto-declarantes.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................154
Tabela 3.32 - Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros
civis de nascimentos tardios de auto-declarantes. Municpio de Nova Iguau. .......................................155
Tabela 3.33 Profisso por sexo de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de nascimentos
tardios de auto-declarantes. Municpio de Nova Iguau...........................................................................159
Tabela 3.34 - Regio do nascimento por cor nos registros civis de nascimentos de auto-declarantes. Municpio
de Nova Iguau.........................................................................................................................................162
Tabela 3.35 Locais de Nascimento no Vale do Paraba nos registros civis de nascimentos dos auto-
declarantes.Municpio de Nova Iguau......................................................................................... 191 anexo
Tabela 3.37 - Regio de nascimento das crianas registradas no ano de seu nascimento por cor. Municpio de
Nova Iguau..............................................................................................................................................171
Tabela 3.38 - Regio de nascimento por cor das pessoas registradas fora do ano de seu nascimento (tardios).
Municpio de Nova Iguau.......................................................................................................................172
Tabela A.1 Propriedades por distrito, 1927. Municpio de Nova Iguau. ...........................................186
Tabela A.2 Profisso do pai de crianas registradas tardiamente como pretas e pardas.
Municpio de Nova Iguau. .....................................................................................................................187
xvi
SIGLAS
RCPNNI Ofcio do Registro Civil das Pessoas Naturais 1 Circunscrio de Nova Iguau
AP Arquivo Pessoal
SUMRIO
Introduo
Tema .................................................................................................................................19
Campesinato......................................................................................................................20
Campesinato Negro no Perodo do Ps-Abolio.............................................................23
A pesquisa, metodologia e fontes.......................................................................................28
Concluso ........................................................................................................................175
Bibliografia.......................................................................................................................180
Anexos...............................................................................................................................185
I Tabelas..........................................................................................................................186
II O reencontro de Izaquiel ............................................................................................193
III Registro Base.............................................................................................................197
IV Lista dos Entrevistados..............................................................................................198
xix
Introduo
Tema
Fluminense, entre os anos de 1888 a 1940. Seu objetivo mostrar que, a estratgia de migrar
dificultou, para muitos, o acesso ao trabalho e a terra. Diante deste quadro, a famlia ex-
escrava no conseguiu reproduzir o seu modo de vida, uma vez que, a pequena roa e o
emprego tornaram-se insuficientes para manter esse grupo estvel. Dito isto, os filhos da
primeira gerao de libertos, nascidos posteriormente abolio, adotaram como uma das
Fluminense.
xx
4 Aps a dcada de 1930, durante o Governo Vargas, foram promulgadas leis que
permitiram a populao de pretos e pardos ter maior acesso ao registro civil de nascimentos,
na Baixada Fluminense. Neste sentido, as leis e decretos sobre o registro civil tardio, entre as
relaes familiares.
Campesinato
capitalista, e o ponto de partida deveria ser a anlise do clculo das unidades produtivas. Isto
analisando as categorias que lhe so prprias e tentar apreender atravs destas, suas leis
1
GODELIER, M. Rationalit et Irrationalit em Economie. Paris: Franois Maspero, 1968 e BETTELHEIM,
C. Calcul conomique et Formes de Propriet. Paris: Franois Maspero, 1970 apud GARCIA JR., Afrnio
Raul. Terra de Trabalho: Trabalho Familiar de Pequenos Produtores. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1983.
xxi
lucro sobre o capital investido, mas a procura de um equilbrio timo entre exigncias de
2
consumo da famlia e fora de trabalho disponvel. De acordo com seu argumento, o
trabalho familiar era o ponto central na economia camponesa, uma vez que, dela dependiam
Preocupao, semelhante, foi a de Afrnio Garcia, ao informar que esta oposio sempre
afirmava que s haveria leis econmicas havendo mercado. De acordo com o autor, o
mercado tornou-se uma categoria com contedo dado e que podia definir qualquer sistema
econmico. Desse modo, as crticas a este etnocentrismo terico podem ser encontradas nas
anlises de Polanyi. Toma-se, aqui, por agricultura de subsistncia, tudo aquilo que
3
socialmente necessrio para a reproduo fsica e social do trabalhador e sua famlia.
lavouras de subsistncia, uma vez que, este campesinato familiar comercializava os produtos
nesse tipo de produo. De acordo com Witold Kula, devido ao fato de a unidade da produo
e a do consumo ser regido por regras familiares, a diviso do trabalho, internamente, era uma
pelo equilbrio entre consumidores e produtores, que por vezes, encontra-se arriscado de se
2
ESPADA, H. L. A Micro-Histria Italiana: escalas, indcios e singularidades. Ed. Civilizao Brasileira, Rio
de Janeiro, 2006. p. 239.
3
GARCIA, A. op. cit., p. 15-16.
xxii
Esse modelo baseado na hiptese de uma famlia conjugal que, segundo o tempo
transcorrido desde o matrimonio, deve primeiro manter os filhos que nascem, em mdia a cada trs
anos, como exclusivamente consumidores, at a partir desta data, progressivamente a relao
consumidores/produtores melhora at chegar a quando, sendo a me mais fecunda, todos os filhos
so ao mesmo tempo consumidores e trabalhadores.
Essa relao consumidores/trabalhadores de fato a regra fundamental que nos permite
avaliar as escolhas de cada famlia: escolhas de agregao e desagregao, de contratao de
servos ou de agregao de parentes, de expulso, temporria ou definitiva, de membros. E podemos
alarg-la para alm do esquema da famlia conjugal para fazer dela uma lei explicativa geral: a
famlia em cada uma de suas fases corre o risco de sobrecarga de consumidores e pode escolher uma
poltica corretiva; e isso se verifica, em condies normais, particularmente depois de 12-14 anos de
matrimonio de cada famlia conjugal que a compe. 4
Nesse horizonte, Levi constri a anlise sobre a mobilidade populacional, em sociedades pr-
industriais. Para ele, a migrao sazonal uma das estratgias familiares utilizadas para
definitiva. Ainda de acordo com este autor, a migrao poderia ser pensada de duas formas: a
migrao normal, feita por rapazes na fase adolescente para adulta; e aquela praticada, pelos
embargo, nessa dissertao, pensa-se a migrao do ponto de vista da origem, no como uma
conservao. 5
As formas de lidar com a crise dependiam, em grande parte, das caractersticas das
famlias. De acordo com Levi, ao analisar os grupos domsticos, por meio de suas estratgias
compostas por mais de um ncleo familiar eram o modo de organizao que melhor
4
ESPADA, H. L. op. cit., p. 242.
5
Idem.
6
Ibidem.
xxiii
relao de parentesco que importante, mas sim o seu significado social. De sociedade para
outra este significado muda. Dito isso, atravs de seu estudo que se torna possvel
compreender: como a famlia se reproduz, o que a afeta e porque se modifica.7 Parte-se aqui
do mesmo princpio de Ana Rios, na qual a famlia um grupo social ativo, capaz de interferir
socialmente. 8
Nesse trabalho, optou-se por utilizar as mesmas trs nomenclaturas de Rios para
pela relao me e/ou pai e filhos solteiros ou sem famlia formada. Na segunda categoria,
encontra-se a famlia ampliada, que agrega os filhos com famlias prprias e outros parentes
de mesmo sangue; como os avs, tios, primos, entre outros. Por ltimo, est a famlia
estendida, que no grupo familiar considerado, inclui pessoas que no possuem vnculo
consangneo. 9
Nesta parte, sero levantadas questes relevantes, de trabalhos acadmicos, que tratam
Amricas, o foco central. Nesse sentido, Rebecca Scott, Thomas Holt e Eric Foner vm
discutindo essa questo, utilizando como base de pesquisa Cuba, Jamaica e Sul dos Estados
Unidos, respectivamente.
7
RIOS, A. L. Famlia e Transio: Famlias negras em Paraba do Sul, 1872-1920. Dissertao. (Mestrado
em Histria) Instituto de Cincias Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niteri, 1990. p. 7.
8
Idem.
9
JOHNSON, Ann Hagerman. The impact of market agriculture on family and household structure in
nineteenth century Chili. Hispanic American Historical Review 58 (4): 625-48. 1978 e KUZNESOF, Elizabeth.
Household Economy and Urban Development, So Paulo, 1765 to 1836. Boulder, Colo., Westview Pres,
1986 apud RIOS, A. op. cit., p. 7.
xxiv
Esse perodo, ainda hoje, muito caracterizado como o momento da transio da mo-de-
obra escrava para a livre assalariada. No obstante, esse termo est ligado a uma posio
evolucionista, uma vez que afirma haver uma substituio automtica de um sistema por
trabalhadores assalariados. Ao focalizar apenas neste termo, perde-se na anlise toda uma
em muitos locais, agiram de forma a tentar mudar a sociedade em que viviam. Esse parece ter
terras que eles achavam ter direito. Diante destes acontecimentos, pode-se exemplificar, as
medidas tomadas pelo Colonial Office, como a implantao de reformas e a abolio gradual.
10
vida poltica de seu pas. Com o fim da escravido, aps a Guerra Civil americana, Foner
aponta que os libertos buscaram reconstruir igrejas, construram escolas para negros e
participaram das eleies como votantes. Assim como em 1887, no perodo da Reconstruo,
quando este grupo realizou uma grande greve que mobilizou milhares de cortadores de cana
11
da Lousiania, desafiando os grandes proprietrios. De forma semelhante, os cubanos de
10
HOLT, Thomas. The Problem of Freedom: Race, Labor, and Politics in Jamaica and Britain, 1832-1938
Baltimore and London: Johns Hopkins University Press, 1992.
11
FONER, Eric. A Short History of Reconstruction, 1863-1877. New York: Harper & Row, 1990.
xxv
terra. Na Jamaica, eles juntaram dinheiro, durante anos, para poder comprar o seu pequeno
pedao de roa. Acreditava-se, que esses tenderiam a comprar terras mais baratas,
improdutivas, para subsistncia e mais distantes das grandes propriedades que tinham sua
produo direcionada para o mercado externo. Contudo, o que se pde perceber, na Jamaica,
foi um movimento quase que contrrio. De acordo com Holt, os libertos e seus descendentes
prximo as parquias, nos centros urbanos e principalmente perto das plantations. Em suas
roas tentavam aliar uma produo de subsistncia com produtos para a venda em mercados
locais. 13
dois fatores: terra e trabalho. Ao comprar a pequena propriedade, em boa parte, as mulheres
saram do eito das grandes lavouras e, aparentemente, viraram-se tanto para dentro de casa
quanto no trabalho familiar da roa. Na Jamaica, em virtude das terras compradas estarem
localizadas prximas aos grandes exportadores, pode ter permitido, aos ex-escravos, misturar
14
trabalho assalariado com produo familiar independente. A diversificao das formas de
trabalho e de renda pode ter possibilitado, aos libertos, uma maior independncia em relao
12
SCOTT, R.J. Alm da Escravido: Investigaes sobre raa, trabalho e cidadania em sociedades ps-
emancipao. RJ: Ed. Civilizao Brasileira, 2005.
13
HOLT, T. op. cit., principalmente captulo 5.
14
Idem.
xxvi
poltica, sendo votantes ou mesmo rebeldes. Procuraram obter a pequena propriedade, para
dela retirar seu sustento e renda. Assim, como a mulher e as crianas deixaram o trabalho
coletivo, optando por cuidar do lar e, consequentemente, o trabalho familiar na roa. Todavia,
aparentemente, ao no conseguir obter os seus desejos, uma das estratgias adotadas pelos
liberdade. De acordo com Foner, com a emancipao aps a Guerra Civil americana, parecia
que metade da populao do sul havia sado pelas estradas. Para este autor, uma das maiores
fontes de orgulho da populao negra, nos Estados Unidos, seria a de usufruir o direito de ir e
vir. 15
pareceu aos brancos como uma migrao sem destino. Para eles, isso era uma prova de que os
vagabundagem. Este autor aponta que, a maior parte dos libertos, no saiu das suas
estratgicos, onde acreditavam conseguir mais liberdade. Foner explica que, as cidades e os
municpios sulistas incharam aps a Guerra Civil americana, visto que nesses locais era
possvel encontrar instituies sociais negras, como escolas, igrejas, sociedades de ajuda
mtua, o exrcito (formado por soldados negros) e a agncia dos libertos. Esses ofereciam
proteo contra a violncia, que se tornou to comum, no Sul dos Estados Unidos. 17
15
FONER, Eric O Significado da Liberdade. Revista Brasileira de Histria, 8, 1988. p. 14-17.
16
FONER, E. op. cit., p. 14.
17
FONER, E. op. cit., p. 15.
xxvii
visavam encontrar uma alternativa econmica ao trabalho coletivo e rural. Dessa forma, foi
onde podiam diversificar as fontes de renda, com trabalho familiar e assalariado nas
18
plantations. De forma um pouco semelhante, no Sul dos Estados Unidos, muitos libertos
migraram para a cidade em busca de melhores condies de trabalho. Para Foner, esse fluxo
aos empregos menos valorizados. As conseqncias desse processo foram intensas para boa
parte da populao de negros, que tiveram de viver em condies indignas nas favelas
A busca pelos parentes motivou boa parte dos migrados nos Estados Unidos. Nada
parece ter motivado mais a imigrao no Sul do que o empenho em reunir as famlias,
incompleta, para os libertos, at a reunio dos familiares vendidos como cativos. Em parte dos
casos, as buscas eram fracassadas, pois muitas vezes ao se reencontrar parceiros antigos, esses
No obstante, a abolio permitiu a boa parte dos migrados reunir novamente seus
familiares, assim como, reafirmar e solidificar os seus laos. Foner apontou que, no perodo
do ps-abolio, foram muitos os libertos que procuraram legalizar e legitimar suas relaes e
o registro e a celebrao da unio dos escravos, houve uma busca intensa, pelos libertos, para
18
HOLT, T. op. cit.
19
FONER, E. op. cit., p.15-16.
20
FONER, E. op. cit., p. 16.
xxviii
como pessoas que agem e tentam mudar a sua situao, no perodo do ps-abolio. Dentre
estudada e a que mais apresenta concluses precipitadas. Aqui, procurar-se atingir uma
experincia nica de migrao, de uma regio que concentrou uma grande populao de
escravos aps 1850, O vale do Paraba, para uma regio at ento no incio do sculo XX
2004 e 2006, sob orientao da Professora Hebe Mattos. Nesse perodo, durante o contato
com as entrevistas depositadas no Acervo Memrias do Cativeiro - feitas por Ana Rios,
Robson Martins e Hebe Mattos - foi possvel constatar a existncia de muitos relatos sobre a
migrao de parentes dos entrevistados. O que mais surpreendeu foram os depoimentos, que
em sua maioria, mencionavam a regio da Baixada Fluminense como destino final dos
Federal do Rio de Janeiro, sob orientao da Professora Ana Rios, tentou-se cruzar as
demogrficos, de 1872, 1890, 1920 e 1940. Apesar, da presente pesquisa, comear a tratar dos
anos posteriores a 1888, a anlise do censo de 1872 torna-se importante, visto que permite
chegar populao de pretos e pardos antes da abolio. Esse foi o ltimo censo, antes do fim
censo posterior s seria realizado trinta anos depois, e esse no informava a cor dos
consenso de que esses apresentam problemas. No entanto, essas so uma das poucas fontes
existentes, para o perodo; apesar disto, nelas possvel encontrar tendncias importantes para
aps 50 anos sem qualquer meno a ela. Desse modo, na presente dissertao, selecionou-se
o ano de 1940 como o limite de nossa pesquisa, pois atravs dos dados, obtidos de outras
Atravs das fontes orais, procurou-se construir chaves temticas de forma a obter
21
coincidncias narrativas e atingir o processo da migrao. Nessa dissertao sero
21
H toda uma bibliografia sobre a problemtica do uso das fontes orais e de como elas podem ajudar na
obteno de dados sobre experincias e trajetrias pessoais que no foram documentadas por escrito. Neste
sentido ver as principais referncias: FERREIRA, M. e AMADO, J. Usos e Abusos da Histria Oral. Rio de
Janeiro: FGV, 1996; HALBWACHS, Maurice. A Memria Coletiva. SP: Vrtice, 1990; POLLACK, Michael.
Memria e Identidade Social. in: Estudos Histricos. RJ, vol. 5, n.10, 1992; PRINS, Gwyn Histria Oral in:
BURKE, P. (org.). A Escrita da Histria: novas perspectivas. SP: UNESP, 1992.
22
As entrevistas do projeto Memrias do Cativeiro e as do Projeto Petrobrs Cultural podem ser lidas na ntegra
nos seguintes stios www.historia.uff.br/labhoi e www.historia.uff.br/jongos/acervo .
xxx
paroquiais de batismo, tanto no Vale do Paraba como na Baixada. Infelizmente, nos anos
posteriores a abolio, esses assentos se tornaram muito pobres de informaes, assim como
no mencionam a cor. A falta desta categoria foi percebida tambm em outras fontes de
pesquisas. Hebe Mattos, ao trabalhar com uma documentao judiciria, percebeu que, em
boa parte dos casos, a cor s era mencionada nos documentos quando havia necessidade de
qualificar a testemunha. De acordo com a autora, o termo preto ou negro, em sua grande
maioria, era usado para fazer referncia a condio de ex-escravo da pessoa citada na
documentao. 23
O registro civil comeou a existir em um ano crucial para o nosso objeto de pesquisa:
em janeiro de 1889. Pode-se apontar como um dos primeiros estudos o de Ana Rios, que
seus dados, a quantidade de registros de casamentos de pessoas negras, ao longo dos anos,
quase inexistiram, dessa forma, ela buscou utilizar como fonte os nascimentos e os bitos.
Nesses, a categoria cor aparece frequentemente, porm, com o passar dos anos, a sua meno
diminui consideravelmente.
apresentam a categoria cor. Em virtude da anlise do objeto de estudo, desta dissertao, estar
de bitos de cinco em cinco anos. Sendo assim, foram selecionados os anos de 1889, 1894,
1899, 1904, 1909, 1914, 1919, 1924, 1929, 1934 e 1939; que resultou em um total de quase
23
MATTOS, H. Das Cores do Silncio: Significados da liberdade no Brasil escravista. Rio de Janeiro: Arquivo
Nacional, 1995/ Nova Fronteira, 1997. p. 104.
xxxi
12 mil fotos. No entanto, por causa do curto tempo de durao do Mestrado, optou-se por
dado no Access. Nesse banco h 6774 registros de nascimentos de crianas, jovens e adultos,
podem ser considerados extremamente confiveis, como ser visto no captulo 1. Ao analisar
alta de subregistro. Ana Rios fez este clculo para Paraba do Sul e encontrou, entre a
populao de pretos e pardos, um subregistro ainda maior em relao aos censos. Apesar de
toda a problemtica inerente a utilizao destas fontes, elas podem demonstrar tendncias
primeira parte, desse captulo, ser feita uma anlise bibliogrfica do tema, enfatizando as
Iguau, de modo a comparar com os registros encontrados por Ana Rios, em Paraba do Sul.
quadro econmico e poltico, de forma a tentar levantar o que pde ter atrado populao de
pretos e pardos, para essa regio. Na segunda parte deste captulo, sero analisadas as
experincias e trajetrias pessoais dos filhos e netos de libertos, que migraram do Vale do
xxxii
Paraba, e se instalaram, mesmo que de forma precria, na Baixada Fluminense, entre os anos
30 e 40. Por ltimo, ser construdo um panorama dos primeiros anos do ps-abolio no
Municpio de Nova Iguau; para tanto, sero utilizados os registros civis de nascimentos de
arranjos familiares e/ou na busca de identidade civil para si e para seus filhos. Na primeira
parte do texto ser feito um panorama da presena de pretos e pardos, em 1939, ltimo ano de
coleta dos registros civis. Em seguida, sero analisados todos os registros tardios. Esses se
dividem em dois: os registros de crianas, jovens e adultos que foram registrados por outrem;
Atravs desses registros, sero construdas tipologias dos grupos que buscaram legitimar a sua
entre 1930 e 1940, durante o Governo de Vargas, que, aparentemente, permitiram a um grupo
anos de 1872 e 1930. Para tanto, o mesmo ser dividido em trs partes:
Na primeira parte do texto, ser feita uma discusso da bibliografia sobre a passagem
para a liberdade no Vale do Paraba, utilizando os trabalhos de Stanley Stein, Warren Dean,
Hebe Mattos, Joo Luis Fragoso e de Ana Rios. Na segunda parte, o texto tratar sobre os
seguindo as trajetrias pessoais dos avs dos entrevistados que tiveram na famlia as
atingir esse objetivo, sero usados dois tipos de fontes: os censos de 1890, 1920 e 1940 com
fonte de pesquisa neste trabalho. O objetivo ser o de comparar os dados gerais obtidos por
Ana Rios, em sua dissertao sobre Paraba do Sul, com os dados coletados no Registro Civil
24
Os dois acervos podem ser consultados no seguinte stio: www.historia.uff.br/labhoi .
25
RIOS, A. L. Famlia e Transio: Famlias negras em Paraba do Sul, 1872-1920. Dissertao. (Mestrado
em Histria) Instituto de Cincias Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niteri, 1990.
xxxiv
O caf
da regio. Na segunda metade do sculo XIX embora a economia cafeeira estivesse no auge,
Para alm das pragas que assolaram as fazendas de caf no final do sculo XIX, a
diminuio da oferta de mo-de-obra contribuiu para o incio da crise. Com o fim do trfico
intercontinental de escravos, houve um aumento nos gastos dentro das fazendas, uma vez que
podiam ser amortizados. A compra de maquinarias, para tentar substituir essa mo-de-obra
deficitria, ampliou ainda mais as dvidas adquiridas, pois se mostraram muito mais onerosas
do que era previsto. Para Stein, esses eventos contriburam para que, na dcada de 1870, com
causas que levaram ao fim a poca urea da economia cafeeira no Vale do Paraba.
***
26
STEIN, S. J. Vassouras: Um municpio brasileiro do caf, 1850-1900. RJ, Ed: Nova Fronteira, 1990. p. 253.
xxxv
divisa estadual entre Rio de Janeiro e Minas Gerais. Essa regio caracterizada pela presena
virtude do clima ameno e da presena de um solo frtil, utilizou-se essas pequenas encostas
encontradas na prpria estrutura de montagem das fazendas de caf. A repetio das tcnicas
ervas daninhas, ferrugem e gafanhotos passaram a ser mais facilmente encontradas em reas
devastadas. A tentativa de elimin-las quase sempre era intil, por conta de inseticidas, na
mesmas encostas, as quais ajudaram no incio da plantao do caf, foram as piores inimigas
desse tipo de plantao. O sistema empregado pelos fazendeiros previa a derrubada de matas
promovidos pela falta de cuidado, fizeram com que houvesse mudanas climticas
riqueza mineral e o hmus do solo das encostas para os rios da regio. Portanto, as
da regio. 28
27
FRAGOSO, J. L. Sistemas Agrrios em Paraba do Sul (1850-1920) Um estudo de relaes no-
capitalistas de produo. Dissertao. (Mestrado em Histria Social) Instituto de Filosofia e Cincias Sociais,
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1983. p. 113 e STEIN, S. op. cit., p. 257.
28
FRAGOSO, J. op. cit., p. 113 & STEIN, S. op. cit., p. 257.
xxxvi
longevidade do caf, pouco se fez para cuidar da terra. De acordo com Fragoso, a baixa
quantidade de mata virgem que ainda existia na regio, os proprietrios no empregaram mo-
de-obra suficiente para sua recuperao. Em vista disso, o dinheiro porventura a ser gasto com
aproveitado. 30 No entanto, ao passar dos anos e com a falta de mata virgem, pde-se notar no
Vale do Paraba, a presena de fazendas com cafezais de mais de 20 anos. Com o aumento
prejudicados foram os pequenos proprietrios, uma vez que os custos exigidos para se manter
a produo tinham aumentado. Desse modo, na tal regio, houve uma crescente concentrao
No sistema agrrio em questo nada foi mais marcante do que a diminuio da oferta
de trabalho. Desde 1850, com a proibio do trfico interprovincial, a mo-de-obra cativa teve
29
FRAGOSO, J. op. cit., p. 8.
30
STEIN, S. op. cit., p. 260.
31
Ibid., p. 263.
xxxvii
manter suas propriedades. De acordo com Stanley Stein, nesse perodo, eram poucos os que
ainda acreditavam que o pagamento em salrio fora de trabalho livre manteria os lucros. 32
Pde-se perceber nas fazendas de caf, aps a dcada de 1870, o aumento gradativo
das dvidas e a diminuio dos emprstimos. Enquanto os valores dos bens da fazenda, da
uma rpida desvalorizao do preo dos cativos. De certa maneira, lograr novos emprstimos
tornou-se difcil para os fazendeiros, visto que sua concesso dependia, em primeiro lugar, da
Entrementes, tais emprstimos no eram acessveis a todos, visto que para obter essa
maiores dificuldades dos proprietrios nos ltimos anos da escravido. A maquinaria tornou-
se dispendiosa, uma vez que os operadores eram escravos despreparados e o sistema agrrio
exigia muitos braos, seno todos, para ampliar a plantao e para colher a enorme quantidade
de caf. O resultado de todo esse fenmeno foi a inutilizao das mquinas graas s dvidas
sculo XX, o gado passou a ganhar cada vez mais espao e os pastos tomaram conta dos
32
Ibid., p. 324.
33
STEIN, S. op. cit., p. 276.
xxxviii
fazendeiros.
Do caf ao pasto
Entre os anos de 1920 e 1930, a crise do caf, a qual se alongara desde a segunda
metade do sculo XIX, chegou ao auge. Enquanto a regio do Oeste Paulista vivenciava o
produziam o suficiente para manter o lucro, as terras virgens foram praticamente devastadas e
a quantidade de mo-de-obra se mostrava cada vez mais insuficiente para suprir as fazendas.
a renovao das antigas. Apesar das dificuldades acima citadas, houve tentativas de introduzir
novas prticas econmicas na regio. No final do sculo XIX, foram vrias as experincias
aponta Stein: incentivadas pela paralisao da produo na regio do sul dos Estados Unidos,
por causa do fim da Guerra de Secesso, o governo provincial distribuiu sementes de algodo
34
FRAGOSO, J. L. op. cit., p. 109.
35
STEIN, S. op. cit. p. 274.
xxxix
Mesmo procurando ampliar a produo para comercializao no mercado local, pouco foi
espao ao longo do sculo XX. Com a dificuldade de reter a mo-de-obra, nas fazendas, e de
atrair novos trabalhadores, culturas que necessitavam cada vez menos de trabalhadores foram
ganhando espao. Nesse prisma, pde-se apontar a plantao de eucalipto e a criao de gado
No final do sculo XIX e incio do XX, a criao de gado despontou como nova
prtica econmica na regio do Vale do Paraba. Com a diminuio do cafezal nas fazendas, a
terra a ser valorizada, ou seja, os pastos passaram a ter uma participao maior na valorizao
Ora, o processo pelo qual o caf era feito, foi devastador no que tange ao solo.
Portanto, o que provavelmente restaria a fazer era criar gado. De acordo com Fragoso, como
na regio. 38 Dessa forma, o gado se desenvolveu sobre o que sobrou do sistema agrrio de
exportao. 39
Algumas dvidas ainda no foram esclarecidas sobre esse perodo. Seria o pasto
realmente a nica alternativa para aqueles fazendeiros? Sendo o gado uma criao de forma
36
Ibid., p. 275.
37
FRAGOSO, J. op. cit., p. 147.
38
Ibid., p. 152.
39
STEIN, S. op. cit. p. 333.
xl
estrangeira; ento, por que pouco contingente foi direcionado para a regio do Vale do
Paraba? Os trabalhadores no conseguiram se fixar na regio por falta de trabalho e/ou por
Questionamentos parte, entre os anos de 1920 e 1940, diante desse processo de crise
Janeiro. No perodo ps-abolio, quando o sistema econmico do caf ainda tentava ser
ordenado, muitos libertos se deslocaram tanto para So Paulo quanto para o leste do Rio de
Janeiro. Nesses locais, de acordo com Stein, parte dos fazendeiros conseguiu arcar com altos
Ao olhar tais reas, durante as primeiras dcadas do sculo XX, pouco se atentou para
o que efetivamente aconteceu com os libertos e seus descendentes sados do Vale do Paraba.
A maior parte dos estudos, j datados, privilegiou a pesquisa sobre a importncia da mo-de-
trabalhos mais atuais tendem a focar o perodo que vai somente at a dcada de 20, buscando
do gado na regio do Vale do Paraba e seu desenvolvimento, mas tambm sobre as outras
40
STEIN, S. op. cit. p. 304.
41
Um dos estudos mais significativos, neste sentido, foi: COSTA, Emlia Viotti Da Monarquia Republica:
Momentos decisivos. So Paulo: Livraria e Editora Cincias Humanas, 1979.
42
As seguintes produes tratam especificamente deste tema: RIOS, A. L. Famlia e Transio: Famlias
negras em Paraba do Sul, 1872-1920. Dissertao. (Mestrado em Histria) Instituto de Cincias Humanas e
Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niteri, 1990; RIOS, A. My Mother Was a Slave, But Not Me:
Black Peasantry and Local Politics in Southeast Brazil, c. 1870-c. 1940. Doutorado. (Doutorado em Histria da
Amrica) University of Minnesota, 2001; MATTOS, H. Marcas da escravido: Biografia, Racializao e
Memria do Cativeiro na Historia do Brasil. Tese para professor Titular no Departamento de Historia da UFF.
Niteri, 2004 e RIOS, A. & MATTOS, H. Memrias do Cativeiro: Famlia, Trabalho e Cidadania no Ps-
Abolio. RJ: Ed. Civilizao Brasileira, 2005;
xli
fora de trabalho dos libertos e de seus descendentes nas economias prsperas no Estado do
Rio de Janeiro.
1.1.2 Populao
Censos
ao incio do sculo XX, esteve intimamente ligada ao perodo da escravido, crise do caf e
Janeiro, sero utilizadas trs regies de importncia econmica do Vale do Paraba como
Tabela 1.1 Populao total recenseada. Paraba do Sul, Entre Rios, Valena, Vassouras, Iguass e Estrella.
43
Em 1940 foi somado o Municpio de Entre Rios.
44
Em 1872 foi somado o Municpio de Estrella com o de Iguass.
xlii
Nos ltimos anos de escravido no Brasil, a presena de pretos e pardos era muito
censo contabilizou a existncia de 47.131 pessoas das quais 60% eram escravos. Somando
escravos e populao livre de pretos e pardos, chega-se ao total de 35.898 pessoas, ou seja,
composta por pretos e mestios, essa regio contabilizou 22.898 pessoas, ou seja, 68,1% da
populao. Desse modo, a partir de tais dados, pode-se retirar duas concluses sobre a
Tabela 1.2 Porcentagem da populao classificada como preta e parda nos censos. Paraba do Sul, Valena e
Baixada.
1872 e de 1890 aparentemente diminui, indicando que, alm da presena contundente de uma
conturbados. Esse fato pode ser observado a partir do Quadro demonstrativo da populao
45
Na presente dissertao optou-se por utilizar a terminologia de poca existente nos registros e nos censos.
Grosso modo sero utilizados para essa populao: pretos e pardos.
46
RIOS, A. op. cit., 1990, p. 22.
xliii
censo de 1872 em Paraba do Sul, o equilbrio entre os sexos pde ser encontrado nas faixas
A esse fato, mister salientar que, a partir de 1871, no nasceriam mais cativos; dessa
forma, o ltimo escravo nascido antes da lei teria 17 anos em 1888. De acordo com Rios, seria
municpio de Paraba do Sul possua entre 17 e 46 anos, uma vez que, em 1872, na faixa etria
entre 1 e 30 anos est compreendido 62,9% dos escravos. 48 Isso significa que, uma vez livre,
que a populao negra, ao longo dos anos, deixou de ser maioria. Se, em 1872, os pretos e
pardos representavam 76,1% da populao, em 1940, este nmero reduziu para 48%. Deveras,
1940. Entre as discusses atuais, muito se critica sobre o emprego dos recenseamentos de
1890 e de 1920 nas pesquisas demogrficas. O primeiro sofreu grandes problemas em sua
47
Ibid, p. 21.
48
Idem.
49
RIOS, A. op. cit., 1990, p. 23.
xliv
50
necessrios para a realizao do censo. Em razo da falta do retorno de informaes das
1890, os estudiosos tomam os seus dados como subestimados. Entretanto, no que concerne
aos dados do recenseamento de 1920, estes parecem estar superestimados em relao queles.
Desse modo, torna-se difcil utilizar tais dados, como indicativos de uma movimentao
populacional, em virtude das grandes disparidades. Todavia, nesses censos, grosso modo,
Fluminense.
1890 e 1920 (figura 1.1), esse perodo caracterizou-se pela introduo do gado na regio.
Praticado em moldes extensivos, necessitando cada vez mais de pastos e sem cuidados
de-obra. Aliada crise da cafeicultura e s novas formas de produo, entre 1920 e 1940,
Figura 1.1 Populao por ano segundo os censos. Paraba do Sul, Valena e Vassouras.
50
SENRA, Nelson de Castro Histria das Estatsticas Brasileiras. Rio de Janeiro: IBGE, Centro de
Documentao e Disseminao de Informaes, 2006.
51
No censo de 1940, Entre Rios aparece como um Municpio autnomo de Paraba do Sul. Aqui, optou-se por
somar a populao dos dois municpios.
xlv
160000
140000
120000
100000
Paraba do Sul
80000 Valena
Vassouras
60000
40000
20000
0
1872 1890 1920 1940
1940 (figura 1.2). Entre esses dois anos, a populao saltou de 33.396 pessoas para 140.606 -
Figura 1.2 Populao por ano segundo os censos. Paraba do Sul, Valena, Vassouras e Iguass.
52
Os aspectos econmicos e sociais da Baixada Fluminense, nessas dcadas, que podem ter atrado a populao,
sero discutidas amplamente no captulo 2.
xlvi
160000
140000
120000
100000
Iguass
Paraba do Sul
80000
Valena
Vassouras
60000
40000
20000
0
1872 1890 1920 1940
ao longo do tempo, o mesmo no pde ser dito em relao Baixada Fluminense. De acordo
com os censos, em 1872, no Municpio de Iguass e Estrella, os pretos e pardos eram 8.285
pessoas, ou seja, 26,1% da populao (tabela 1.2). Todavia, em 1890, a presena da populao
de pretos e mestios passou a corresponder 65,3% da populao. 53 Enfim, para 1940, o censo
informava que dentre as 140.606 pessoas recenseadas, 68.482 (48,7%) so pretos e pardos.
Ao exame desses censos, lcito supor alguns dados gerais sobre a regio do Vale do
abolio, na regio do Vale do Paraba. Da mesma forma, a partir da dcada de 20, percebe-se
53
Apesar deste salto, deve-se relembrar o problema levantado anteriormente do censo de 1890.
xlvii
populao para a mesma. Todavia, ao longo desta dissertao, pretende-se demonstrar que tal
Paraba e as primeiras dcadas do sculo XX, respaldado nas trajetrias de vida de ex-
famlias que tiveram, pelo menos, uma migrao em seu meio. Para alcanar tal objetivo,
Fluminense.
e/ou pais que passaram pela experincia do cativeiro. Os entrevistados tiveram algum contato,
mesmo que na infncia, com os ex-escravos e/ou familiares, que possuam memria sobre o
tempo do cativeiro. 55
54
Aqui, deseja-se diferenciar os termos estabelecimento de estabilizao que sero empregados durante a
dissertao. O termo estabelecimento, aqui, possuiu a caracterstica de representar as famlias que
permaneceram, mesmo que precariamente, em seus locais de origem durante curto espao ou longo espao de
tempo, antes de migrarem. Para estabilizao, considera-se as famlias que, aps um perodo conturbado de
mudanas constantes, conquistaram a estabilidade definitiva em uma regio diferente da de origem.
55
Recentemente, Ana Rios procurou demonstrar como foi possvel, na dcada de 1990, colher depoimentos de
netos e filhos de ex-escravos, os quais possuam uma memria familiar sobre seus ascendentes africanos: RIOS,
A. No se esquece um elefante: nota sobre os ltimos africanos e a memria dfrica no Vale do Paraba. In:
FRAGOSO, Joo; FLORENTINO, Manolo; JUC, Antnio Carlos; CAMPOS, Adriana. Nas Rotas do
Imprio: eixos mercantis, trfico e relaes sociais no mundo portugus. Vitria: Edufes; Lisboa: IICT, 2006.
xlviii
Os ltimos anos
do senhor. E isso foi sentido, em parte, pelos fazendeiros que buscavam de alguma forma,
manter os escravos em suas propriedades, visto que as fugas em massa se tornaram uma
constante.
Entrando nos ltimos anos da escravido no Vale do Paraba, pode-se perceber como
familiares. Em 1869, foi aprovada a Lei que garantia aos escravos a permanncia das relaes
Efetivamente, nenhuma lei fortaleceu tanto a comunidade escrava como a Lei do Ventre-
56
Livre; ora, pela primeira vez havia um sinal claro para os cativos de que a escravido
Com a intromisso, cada vez maior do Estado, na relao senhor - escravo e com a
criao de Leis que impediam um controle maior da escravaria, a vida dos fazendeiros ficou
mais difcil. Para os escravos, os direitos, considerados costumeiros, passaram a ser positivo.
Tais leis abalaram o poder moral dos escravistas, no Vale do Paraba, consideravelmente nos
56
Para uma discusso ampliada sobre o impacto da Lei Rio Branco, ver: RIOS, A. & MATTOS, H. Op. Cit. p.
89 e CHALHOUB, S. Vises de liberdade: uma histria das ltimas dcadas da escravido na Corte. So Paulo:
Companhia das Letras, 1990.
xlix
anos anteriores abolio, e pde-se constatar diversos conflitos que acabavam em revoltas e
fazendeiros, de que a escravido estava prestes a findar, no foi possvel conter os diversos
procuraram controlar os trabalhadores livres atravs de laos de gratido, aliando uma idia
corriqueiras em algumas regies. Entre 1885 e 1887, Dean calculou que, aproximadamente,
10% da populao cativa se deslocou do Municpio de Rio Claro em direo aos centros
generalizada. Pela primeira vez, os escravos conduziam armas de fogo e, ao invs de fugir
policial foi acionada durante tal perodo para amenizar os nimos e manter tranqilos os
provncia que designasse uma guarnio militar permanente no Municpio, com a finalidade
57
MACHADO, Maria Helena. O Plano e o Pnico: Os movimentos sociais na dcada da abolio. Rio de
Janeiro: EDUFRJ, 1994.
58
MATTOS, H. Das Cores do Silncio. Significados da liberdade no Brasil escravista. Rio de Janeiro, Arquivo
Nacional, 1995/ Nova Fronteira, 1997. p. 268.
59
Idem, principalmente captulo IV.
60
DEAN, W. Rio Claro: Um Sistema Brasileiro de Grande Lavoura (1820-1920). Rio de Janeiro, Ed.: Paz e
Terra, 1977. cap.: 4 e 5.
l
escravido foi compartilhada entre escravos e senhores. Com o fim do trfico atlntico e com
escrava dentro dos grandes plantis, alm da construo de uma determinada viso de
liberdade. 63
Cresceu junto a seus pais na fazenda So Jos, mesmo local onde nasceram seus filhos e netos
(figura 1.3). Eles tiveram, nessa fazenda, mais cinco filhos. Ainda no perodo da escravido,
nasceu o primeiro irmo de Dionsio, Geraldo Preto, registrado na Igreja de Santa Isabel do
65
Rio Preto no dia 3 de abril de 1870. Os outros cinco irmos nasceram aps a Lei do
sobre as suas vidas, foi retirada dos depoimentos coletados na Fazenda So Jos. A famlia de
mesma fazenda.
61
Idem, p. 125.
62
MACHADO, Maria Helena op. cit.
63
Para uma discusso melhor sobre as Vises de Liberdade, ver a introduo desta dissertao.
64
Livro II de Batismo, fl. 13, termo 29 20/05/1866, AESIRP.
65
Livro II de Batismo, fl. 41, termo 40 03/04/1870, AESIRP.
66
Livro III de Batismo, fl. 98v., termo 27 17/04/1881 e Livro III , fl. 145, termo 7 10/01/1886, AESIRP.
li
Figura 1.3 Genealogia da Famlia de Dionsio Antonio Fernandes - Santa Isabel do Rio Preto, Valena, RJ.
Fonte: Arquivo Eclesistico da Igreja de Santa Isabel do Rio Preto, RJ. Parcialmente publicada em MATTOS,
H. op. cit. 2004.
escravido e como elas foram construdas. A finalidade dessas pesquisas era a de perceber
quais eram os benefcios que uma comunidade ampla nas senzalas trazia para senhores e
67
escravos. Dentre os diversos temas de famlia escrava, optou-se, aqui, por discutir a
relao dentro das fazendas entre as naes africanas era de extrema instabilidade. Parte disso
feminino. Essa tenso permanente fez com que os africanos e escravos percebessem a
senzalas.
67
Para uma melhor e extensa discusso sobre as relaes parentais e no-parentais nas propriedades escravistas
ver: FLORENTINO, M. e GES, J. R. A paz nas senzalas: Famlias escravas e trfico atlntico, Rio de Janeiro,
c. 1790 - c. 1850. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira. 1997 e SLENES, Robert. Na Senzala Uma Flor:
Esperanas e recordaes na Formao da Famlia Escrava. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.
lii
de 1835, era escrava do Senhor Antenor Souza Vieira, proprietrio da Fazenda Carioca em
Vassouras no Vale do Paraba. No cativeiro, casou-se, pela primeira vez, com o tambm
escravo Sebastio, que lhe deu seis filhos: Maria, Pedro, Horcio, Celina, Marcelino e Joana.
Aparentemente, o relacionamento desses durou pouco tempo, tanto que, na memria familiar,
pouco se fala sobre o av Sebastio, apenas lembrado pela sua cor e condio de escravo. 68
Ainda durante o perodo da escravido, Dona Umbelina casou-se, pela segunda vez,
agora com o sinhozinho, proprietrio da Fazenda Carioca. Antenor era filho de franceses,
proprietrios de fazendas de caf em Vassouras. Nesse casamento, Dona Umbelina teve mais
Para alm dos laos parentais, uma outra forma de constituir redes de sociabilidade foi
aumentar as redes sociais, muitos escravos escolhiam, para padrinhos de seus filhos,
companheiros mais velhos que possuam maior influncia nas senzalas e/ou livres e libertos.69
populao de pretos e pardos no Vale do Paraba. Nessa regio houve pouca imigrao
estrangeira, e a falta de mo-de-obra j era sentida desde a poca na escravido. Para manter
em suas propriedades essa mo-de-obra nacional, na qual boa parte era provinda da
escravido, uma das estratgias adotadas, nesse perodo, pelos proprietrios foi a doao de
68
Poucos familiares sabiam do nome do primeiro av. Aps entrevistas com outros familiares de Dona Yvone,
chegamos ao seu nome: Sebastio.
69
Para uma melhor discusso sobre compadrio ver: RIOS, A. L. Famlia e Transio: Famlias negras em
Paraba do Sul, 1872-1920. Dissertao. (Mestrado em Histria) Instituto de Cincias Humanas e Filosofia,
Universidade Federal Fluminense, Niteri, 1990.
liii
70
terras. Antenor, esposo de Dona Umbelina, diante da crise do caf e da economia no Vale
do Paraba, doou boa parte de suas terras para seus escravos. Em menos de cinco anos aps a
abolio, ele faleceu e as suas terras foram divididas entre os filhos do primeiro e do segundo
casamento de Dona Umbelina. At os dias de hoje parte da famlia ainda vive nas terras em
Vassouras.
acesso terra prpria. Na maior parte dos casos, este grupo no procurou possuir pequenas
roas para apenas viver da subsistncia. De acordo com Rebecca Scott, os ex-escravos e seus
descendentes buscaram maximizar os seus ganhos a partir da propriedade e/ou posse da terra,
71
porm de uma forma bem diferente da teoria do liberalismo. No caso da Jamaica, os
libertos trabalharam durante anos para comprar pequenos pedaos de terra, buscando, assim,
adquirir terras mais baratas, produtivas e perto dos grandes centros exportadores. 72
Decerto, comprar e/ou adquirir o pequeno pedao de terra no invalidava a busca pelo
roa, para subsistncia e para venda nos mercados locais, com o emprego pblico e/ou nas
73
grandes propriedades exportadoras. Ora, os ex-escravos e seus descendentes optaram,
uma dentre as vrias estratgias para tentar diminuir as incertezas diante do novo contexto de
ps-abolio.
70
Sobre estratgias senhorias para estabilizar a mo-de-obra na passagem da escravido para a abolio ver:
MACHADO, Maria Helena op. cit. e SLENES, Robert; FRY, Peter e VOGT, Carlos. Cafund: A frica no
Brasil. So Paulo: Companhia das Letras, 1996.
71
SCOTT, Rebecca. Emancipao Escrava em Cuba: a Transio para o Trabalho Livre, 1860-1899. Rio de
Janeiro/Campinas: Paz e Terra/Ed. da Unicamp, 1991.
72
HOLT, Thomas. The Problem of Freedom: Race, Labor, and Politics in Jamaica and Britain, 1832-1938
Baltimore and London: Johns Hopkins University Press, 1992. p. 160.
73
SCOTT, R. op. cit., 1991, p. 34.
liv
Pondo em questo o caso brasileiro, a necessidade de colher o caf, em 1888, fez com
74
que diversos fazendeiros improvisassem turmas de trabalho. Conforme Stein, nesse ano
seria feita uma das maiores colheitas j vistas no Vale do Paraba; 75 para isso, os fazendeiros
empregariam vrios meios, inclusive judiciais, para manter a mo-de-obra dentro das
propriedades. Muitos ex-cativos foram presos por vadiagem, outros disputados entre
76
proprietrios. Contudo, ao passar dos anos, parece acertado que a maior parte dos libertos
processo de transio para o trabalho livre. lcito supor que a maior parte dos
trabalhadores no Vale do Paraba, aps 1888, era composta por ex-escravos e seus
descendentes. Em muitos casos, esse grupo buscou, atravs de negociao com o patro, aliar
subsistncia e para venda em mercados locais. Esse foi o caso dos filhos de Umbelina e de
Antenor que durante as primeiras dcadas do sculo XX, usufruram das terras doadas,
Ao longo dos anos, diante da crise do caf, ao que tudo indica, no foi possvel mais
obter trabalho nas propriedades prximas aos locais de moradia. Diante das dificuldades,
Dona Amlia, filha de Umbelina, deu sua terra a uma pessoa que tambm pudesse tomar
conta dos seus filhos, para que ela pudesse procurar emprego nas cidades prximas. O mesmo
aconteceu com seu outro filho, que trocou seu lote por uma criao de porco de seu vizinho. 78
74
Neste sentido falam: MATTOS, H. op. cit., 1997; DEAN, W. op. cit. e STEIN, S. op. cit.
75
STEIN, S. op. cit., p. 303.
76
MATTOS, H, op. cit., 1997.
77
No captulo 3 de seu Livro, Ana Rios discute a lgica dos contratos entre proprietrios e trabalhadores Rurais.
Ela levantou as diversas formas de trabalho empregados no incio do sculo, como o trabalho de turma, a
empreitada, parceria, arrendamento, entre outras. Eram em sua maioria contratos verbais que os tornavam por
vezes muito instveis. RIOS, A. e MATTOS, H. op. cit., captulo 3.
78
Entrevista concedida por Dona Yvone Reis em Mesquita, 2006.
lv
obter pastos, ganhou mais fora. Diante da extrema pobreza, a primeira gerao de filhos
nascidos no ps-abolio no encontrou as mesmas oportunidades que seus pais, isso pode ter
Para o perodo do ps-abolio, Rios deparou-se com trs tipos de trajetrias nos
depoimentos por ela coletados. No primeiro, ela encontrou, na regio do Vale do Paraba,
comunidades negras que, de alguma forma, conseguiram se manter nas mesmas fazendas
onde seus pais e avs foram colonos e, em alguns casos, at mesmo escravos. No segundo, ela
estabilizar. J no terceiro, nas entrevistas coletadas, ela encontrou famlias que foram privadas
do o direito de trabalhar e de ter a prpria roa. Nesse ltimo caso, h relatos de duas formas
relatadas possuram motivaes e naturezas mltiplas; pode-se afirmar, inicialmente, que elas
foram geradas, desde a abolio, pelo desmantelamento das fazendas de caf, com a entrada
79
Para uma melhor explorao sobre essas categorias ver: RIOS, A. & MATTOS, H. op. cit., 2005. p. 215-222.
80
Ibid, captulo II.
lvi
Manoel relembra muito bem a poca em que os moradores antigos da Comunidade So Jos
da Serra foram transferidos pelo fazendeiro para as outras terras em So Paulo e para o
Rios explorou as motivaes que podem ter levado a essa movimentao constante de
tal grupo. Em um primeiro momento, ela citou que essas mudanas ocorriam desde a poca da
colnia e possuam diversas motivaes. 81 Por causa da natureza do tipo de trabalho, em sua
maioria de parceria e empreitada, e da forma da plantao das mudas de caf, que utilizava a
queimada como forma de preparar a terra, esses trabalhadores tendiam a mudar quase sempre
de trabalho e de moradia. 82
As novas produes, que entravam no lugar dos cafezais, podem ter motivado a sada
antes dominada por cafezais envelhecidos no Vale do Paraba, e os arranjos de trabalhos, pois
tal tipo de plantao necessitava de muito menos braos do que a plantao de caf. Pode-se
usar como exemplo o caso da famlia de Dona Sebastiana, moradora de Paraba do Sul, que se
mudou da fazenda onde, residia graas expanso da plantao de eucalipto sobre suas roas.
83
Para alm do eucalipto, nada transformou mais vida do campesinato negro do que a
criao de gado. No caso de Dona Umbelina, boa parte dos seus 12 filhos no conseguiu se
terras, para aumentar a rea de pasto de suas propriedades, e avanaram sobre os pequenos
lotes. Mesmo proibidos pela escritura de vender, muitos dos filhos de Dona Umbelina
81
Ibid, p. 227, ver, principalmente, nota 30.
82
Ibid, p. 228.
83
Entrevista: Dona Sebastiana, 1995, MC.
lvii
abdicaram de suas terras em prol de uma pequena quantia de dinheiro; por exemplo, o caso da
Tia Adlia que vendeu seu ltimo lote para comprar um pequeno terreno em Anchieta, na
Iguass. 84
Porm, a maior parte dos relatos sobre a sada do campo versa sobre a violncia. Esse
foi o caso do pai de Cornlio Cansino que, por ter deixado de trabalhar um dia na turma da
fazenda, o proprietrio mandou derrubar as cercas da roa e lanou o gado para acabar com a
pequena lavoura. Histria muito semelhante aconteceu com os pais de Manoel Seabra que
Atravs das entrevistas, possvel perceber que uma das maiores motivaes para a
migrao foi a privao do acesso roa prpria. Uma das entrevistas mais sintomticas nesse
sentido foi a realizada com Dona Leontina e concedida a Ana Rios, em Cachoeiras de
Porque os fazendeiros parou de dar terra. S que nessas terrinhas agora trabalha com boi,
n? Trabalhar com os colonos, com os empregados, no. Pra trabalhar com boi, pra plantar
capim, ento no d mais. Agente vai fazer o que? Na roa ganhar um salrio l n, pra
plantar capim, sem direito a plantar uma comida, sem direito a plantar nada. [grifo meu]
Ento, acharam... Meu pai n... As mulheres trabalharam como empregada e meu pai,
chegaram pra rua tambm. Da comprou esse terreninho aqui e fez um barraquinho pra
gente. Ns estamos trabalhando de empregada de famlia. E meu pai foi trabalhar de
86
padeiro.
a de que apenas o trabalho no era suficiente para sobreviver na regio. Alm de possurem
uma roa de subsistncia, aparentemente, era necessrio complementar a renda com a venda
84
Entrevista: D. Yvone, 2006, AP.
85
Para uma melhor compreenso sobre a relao patro-empregado no ps-abolio ver: captulo 3 de RIOS,
Ana e MATTOS, H. op. cit.
86
Entrevista: Dona Leontina, sem data, MC.
lviii
de seus excedentes. Em segundo lugar, lcito supor que um dos precursores para o xodo no
Vale do Paraba pode ter sido a extino e/ou proibio da roa prpria.
Sem embargo, esse tipo de hiptese ainda precisa de muito mais estudos concernentes
Muito se discutiu sobre a necessidade de pouca mo-de-obra nesse tipo de cultivo, mas pouco
sobre a existncia e a importncia da mo-de-obra nacional nessa regio. Ainda hoje faltam
trabalhos sobre a relao entre o pasto e a mo-de-obra, em como ela realmente interferiu na
relao fazendeiro-trabalhador livre e se realmente foi a responsvel pela expulso de tal mo-
de-obra.
Migrar
Nesta ltima parte, sero acompanhadas as trajetrias pessoais dos libertos e de seus
pretende-se construir um perfil das famlias e dos migrados, evidenciando suas experincias e
trajetrias.
Um dos principais marcos nas entrevistas so as divises familiares. Se, no exato ps-
abolio foi possvel construir relaes familiares nucleares e estendidas, nos anos posteriores
V Dionsio saiu da Comunidade e fez uma rocinha na Fazenda da Empreitada, onde criou e
casou boa parte dos seus filhos. Entretanto, ao longo dos anos 1920, viu seus filhos homens,
87
Manoel: Livro IV, fl. 181, termo 8 novembro de 1898, AESIRP; Jos: Livro V, fl. 37, termo 4 23 de
setembro de 1903, AESIRP e Joaquim: Livro V, fl. 89, termo 73 - 3 de maro de 1908, AESIRP.
lix
Com a diminuio dos empregos na lavoura, houve uma busca por novos arranjos de
emprego na empresa de energia eltrica do Rio de Janeiro, a Light. Com os dois trabalhos,
teve a primeira oportunidade de sair do Vale do Paraba, morando uma parte da vida no
Fluminense. 88
Os novos arranjos de trabalho, que surgiam com o avano urbano no Vale do Paraba e
no Rio de Janeiro, podem ter ajudado a transferir boa parte dos libertos e de seus descendentes
para outras reas do Estado. Esse foi o caso de Antonio Silva, filho de Dona Umbelina,
nascido em 1912: trabalhou alguns anos na Estrada de Ferro Central do Brasil at que, em
1936, foi transferido para Morro Agudo, no Municpio de Iguass. Nesse local, conheceu sua
esposa e ganhou do emprego uma pequena casa junto ao local de trabalho, na linha frrea.
arquivadas, no Acervo Memrias do Cativeiro, Rios percebeu que a maior parte dos
membros da famlia que no permaneceram na mesma regio onde seus pais cresceram, so
89
os filhos da primeira gerao de libertos, nascidos no ps-abolio. De certo, entre as
famlias entrevistadas foram poucos os filhos da primeira gerao que trabalharam na roa no
Vale do Paraba. O primeiro argumento seria, como j fora mencionado neste captulo, a falta
na roa.
88
Entrevista: Cornlio Cansino, 1995, MC.
89
RIOS, A. Histria Oral e Migrao um debate metodolgico. (mmeo)
lx
nasceram entre os anos de 1890 e 1920. Esses ao chegarem fase do trabalho, ou seja, entre
fim da escravido. Isso significa que, para eles houve certo impedimento ao acesso roa
pode ter avanado sobre as terras livres e a pequena roa, sobrevivente de seus pais, no era
suficiente para suprir todos os familiares. Uma das solues encontradas por esse grupo pode
ter sido a migrao para outras reas, em busca de novos arranjos de trabalho.
Nas entrevistas coletadas, possvel perceber que, nas primeiras dcadas do sculo
XX, ocorreram s primeiras migraes, na maior parte com destinos incertos. O pai de Dona
Esperana, Seu Simo, ao ser proibido pelo proprietrio da fazenda de construir sua casa na
proprietrios ainda estavam mandando seu empregados embora, deixou a cidade e foi para
Santa Cruz onde, pela primeira vez, comprou uma casa. Veio a falecer em So Gonalo, na
Entre os anos de 1910 e 1930, a partir das entrevistas coletadas, identifica-se uma
migrao ainda no definitiva. Apesar da possvel negao do trabalho na roa e a busca por
novos arranjos de trabalho, nesse perodo a migrao foi caracterizada pelo trabalho sazonal
em outras regies fora do Vale do Paraba, contando sempre com o retorno para a casa dos
pais ou da comunidade de origem. 91 Nas primeiras dcadas do sculo XX, o primeiro filho de
90
Entrevista: Dona esperana, 1993, MC.
91
ESPADA, H. L. A Micro-Histria Italiana: escalas, indcios e singularidades. Rio de Janeiro: Ed. Civilizao
Brasileira, 2006. p. 242.
lxi
laranja. Aos poucos ele levou os outros irmos para ajudar no novo trabalho; porm, todos
Neste ponto, importante salientar a figura da primeira pessoa que se estabiliza fora
do Vale do Paraba. Ao longo dos anos, principalmente entre os anos 30 e 40, essa migrao
arrecadado nos novos arranjos de trabalho, das novas oportunidades de emprego e com o
estabilizar definitivamente em diversas regies. Na dcada de 30, Seu Ormindo comprou uma
casa em Belford Roxo e para l levou seus irmos e seu pai. A sua casa se tornou um ponto
central, onde os parentes que desejavam sair do Vale procuravam em primeiro lugar.
se estabilizar na Baixada Fluminense, suas casas se tornaram ponto de encontro dos familiares
que buscavam alternativas de sobrevivncia. At os dias de hoje, praticamente uma rua inteira
de forma contundente, as memrias familiares. Para os que ficavam, quase sempre avs ou
pais que no conseguiram ou no quiseram sair da lavoura, o medo do sumio dos familiares
forma: No sei se morto ou se vivo. Uma histria bem emocionante aconteceu com
Izaquiel Incio, que havia perdido contato com uma irm ainda muito jovem. Sua irm foi
para o Rio de Janeiro buscar trabalho em casa de famlia e nunca mais deu notcia sobre seu
paradeiro. Seus pais, preocupados, escreveram cartas para ela, colocaram anncios no jornal,
tudo em vo. Todos os dias, sua me chorava sentindo falta da filha e, infelizmente, os dois
92
Entrevista: Izaquiel Incio, 1994, MC.
93
Entrevista: Florentina Seabra do Nascimento, 2006, AP.
lxii
morreram sem saber notcias dela. Em um dia, o filho dessa irm foi at Paraba do Sul tirar
um documento que ela precisava e, chegando ao cartrio, a escriv, que era muito amiga de
seu Izaquiel, disse ao rapaz que ele tinha parentes ali na regio e perguntou se ele os conhecia.
Obtendo uma resposta negativa, ela indicou o local onde ele morava. Chegando residncia
de Izaquiel e conversando sobre a irm, ele se emocionou muito ao relembrar todos os dias
nos quais a me chorava por falta da filha. A partir desse dia, eles voltaram a se comunicar e a
referncia a parentes prximos e distantes que saram do Vale do Paraba e tiveram como
encontrar essa estabilizao, comeando na dcada de 20 e finalizando nos anos 40. Dessa
94
Vide esta passagem na ntegra em anexo.
lxiii
Nesta ltima parte, ser discutida a pertinncia das fontes de registro civil de
nascimento para o estudo das famlias de ex-escravos e de seus descendentes. Aqui, optou-se
por dividir o texto em trs partes. Na primeira parte, sero apontados os desejos e o meio
pelos quais essa populao buscou legitimar suas relaes familiares, no perodo do ps-
abolio. No arquivo eclesistico, quase sempre utilizado para realizar essa legitimao, os
registros no apresentam a categoria cor aps 1888. Efetivamente, uns dos poucos registros,
relevncia para o estudo das famlias de ex-escravos e libertos. Na terceira parte, sero feitas
de Nova Iguau com os obtidos por Ana Rios, em Paraba do Sul. Trata-se de levantar as
libertos na dissertao.
***
Preto, que em 1889, j com o nome de Geraldo Fernandes, casou-se com Apolinria da
95
Zeferina nasceu no dia 15 de outubro de 1870, filha natural de Paulina, escrava de Francisco Antonio Martins.
Livro II de Batismo fl.35. termo 66, AESIRP.
96
Livro II de Matrimnio fl. 31, termo 59 25 de Maio de 1889, AESIRP.
97
Livro II de Matrimnio fl. 34, termo 100 28 de setembro de 1889, AESIRP.
lxiv
peridicos aps 1888. Atravs do Dirio de Minas, de 25 de setembro, pde-se perceber tais
nmeros:
registrar toda a sua famlia. No ano de 1893 V Dionsio e Dona Zeferina batizaram sua
100
segunda filha, no Distrito de Santa Isabel, Sebastiana. Seus filhos nasceram aps a
abolio, e so: Manoel, Jos e Joaquim. 101 Brandina Maria, sua primeira filha, como nasceu
no Distrito de Ipiabas, o nico registro que menciona o seu parentesco com Dionsio foi o de
seu matrimonio. Nesse assento possvel ver que ela casou aos 14 anos, em 1903, com o
grande amigo de seu pai, Manoel Pereira do Nascimento, ex-morador da Fazenda So Jos. 102
Nas informaes coletadas no Arquivo Eclesistico de Santa Isabel do Rio Preto, foi
98
SOUZA, Snia Maria de. Terra, famlia, solidariedade: Estratgias de sobrevivncia camponesa no perodo
de transio Juiz de Fora (1870-1920). Doutorado. (Doutorado em Histria) Instituto de Cincias Humanas e
Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niteri, 2003. Apud RIOS, A. & MATTOS, H. O ps-abolio
como problema histrico: balanos e perspectivas. In: Topoi, v. 5, n. 8, 2004. p. 186.
99
Idem.
100
Livro IV de Batismo, fl. 93, termo 75 20 de janeiro de 1893, AESIRP.
101
Manoel: Livro IV, fl. 181, termo 8 novembro de 1898, AESIRP; Jos: Livro V, fl. 37, termo 4 23 de
setembro de 1903, AESIRP e Joaquim: Livro V, fl. 89, termo 73 - 3 de maro de 1908, AESIRP.
102
Livro II de Matrimnio, fl. 81, termo 6 23 de Maio de 1903, AESIRP.
103
De acordo com Walter Fraga os nomes como evidncias histricas reveladoras das experincias pessoais,
acontecimentos importantes, vises de mundo, idias e valores culturais, so destacados por vrios autores.
FRAGA, Walter Filho, Encruzilhadas da liberdade: histrias de escravos e libertos na Bahia (1870-1910),
lxv
104
descrito como inocente e escravo de Jos Gonalves Roxo, no entanto, pela primeira vez,
no assento de seu casamento em 1889, aparecia o sobrenome crioulo para ele e sua esposa
1899, ambos batizaram seu segundo filho Manoel na Igreja, adotando os seguintes nomes:
105
Dionsio Antonio Fernandes e Zeferina Maria Antonia. Em 1903, no casamento de seu
grande amigo Manoel com sua filha Brandina, Dionsio manteve o nome, porm Zeferina
mudou mais uma vez o seu sobrenome chamando-se Zeferina Maria da Conceio. 106
as suas relaes familiares. Aps 1888, com a abolio da escravido, tornou-se difcil
eclesistica, mais usada para o sculo XIX, no possua mais a categoria cor. Por outro lado,
Neste sentido, de acordo com Rios, libertos buscaram [tambm] regularizar suas vidas
Sendo assim, optou-se, aqui, por utilizar os registros civis de nascimento para
Campinas, Editora da UNICAMP, 2006. p. 295. Na nota 12 este autor aponta toda uma bibliografia sobre a
discusso das escolhas dos nomes pela populao ex-escravos.
104
Livro II de Batismo, fl. 13, termo 29 20 de maio de 1886, AESIRP.
105
Livro IV de Batismo, fl.181, assento 8 20 de janeiro de 1899, AESIRP.
106
Livro II de Matrimnio, fl.81, termo 6 23 de maio de 1903, AESIRP.
107
RIOS, A. RIOS, A. No se esquece um elefante: notas sobre os ltimos africanos e a memria dfrica no
Vale do Paraba. In: FRAGOSO, Joo; FLORENTINO, Manolo; JUC, Antnio Carlos; CAMPOS, Adriana.
Nas Rotas do Imprio: eixos mercantis, trfico e relaes sociais no mundo portugus. Vitria: Edufes; Lisboa:
IICT, 2006. p. 668.
lxvi
sero analisadas, no texto a seguir, sua estrutura de funcionamento, as leis que o regiram, e as
Legislao
estatsticas oficias sobre a quantidade de imigrantes aportados e da populao do pas por ano.
O registro civil seria uma forma de substituir os censos, uma vez que os mesmos eram
posteriormente, mais dois decretos foram feitos para tentar, de todas as formas, regulamentar
os registros de nascimento, casamento e bito. 109 O ltimo seguiu para a Assemblia Geral, e
por l ficou por muito tempo at ser aprovado. Contudo, o decreto que colocou em prtica o
imps regras para o registro. De acordo com o Art. 6, os empregados do registro civil no
deveriam inserir, nos assentos, seno aquilo que os interessados declarassem. As partes
108
Decreto n. 798 de 18 de junho de 1851. SENRA, N. C. Histria das Estatsticas Brasileiras. Rio de
Janeiro: IBGE, Centro de Documentao e Disseminao de Informaes, 2006. p. 88.
109
So eles: o decreto n. 907 de 29 de janeiro de 1852 e o decreto n. 5.604 de 25 de abril de 1874.
110
Todos os decretos e leis mencionados na presente dissertao foram consultados em SENRA, N. C. op. cit.
lxvii
residncia fosse longe do local de registro, esse prazo poderia ser estendido para at 60 dias
(Art. 53). O declarante deveria ser, em primeiro lugar, o pai da criana, se esse estivesse
parente prximo deveria se apresentar ao cartrio (Art. 57). Somando a essas condies, os
livros deveriam ter, no mximo, 200 folhas e deveriam ser fornecidos pelos poderes estaduais.
no decreto. De acordo com o Art. 58, os registros de nascimento deveriam conter os seguintes
ou exposto; 5)O nome e sobrenomes que forem ou houverem de ser postos na criana; 6) A
declarao de que nasceu morta, ou morreu no ato ou logo depois do parto; 7) A ordem de
filiao de outros irmos do mesmo nome, que existam ou tenham existido; 8) Os nomes,
seus avs paternos e maternos; 10) Os nomes sobrenomes, apelidos, domiclio ou residncia
atual do padrinho, da madrinha e de duas testemunhas, pelo menos, assim como a profisso
Mesmo as diretrizes sendo bem especficas, a maior parte dos escrives interpretou a
lei como lhes aprouvessem. Diante das dificuldades encontradas pelo DGE Diretrio Geral
o qual visava reformular alguns pontos objetivos do registro civil. Porm, uma vez colocado
aos cartrios pela demora do envio do resumo anual do registro. Todavia, pela primeira vez,
houve meno incluso da categoria cor nos registros. Mesmo sendo uma novidade, em
questo de decreto, esta prtica j vinha sendo realizada por diversos cartrios. Conclu-se da
que o governo federal parecia muito mais preocupado em receber as estatsticas e os valores
no eram todas as pessoas que procuravam o registro. Apesar do baixo custo do registros,
entre 5$000 a 20$000, em um pas, que, no incio do sculo XX ainda era tipicamente rural,
Sendo assim, mesmo com todos os problemas inerentes ao estudo do registro civil,
esse pode ajudar a chegar s famlias de ex-escravos e de seus descendentes. Apesar de toda a
problemtica sobre a construo temporal da categoria cor nos registros, ela permite, de
certa forma, atingir, atravs das crianas pretas e pardas, essa parte da populao no Estado do
Rio de Janeiro.
Para o estudo do ps-abolio, Ana Rios lanou mo em sua dissertao, dos registros
pretos e pardos no Vale do Paraba. Da mesma forma, pretende-se nessa ltima parte,
111
SENRA, N. C. p. 371.
112
O decreto n. 18.542 de 24 de dezembro de 1928.
lxix
comparar os dados gerais, obtidos no Registro Civil de Nascimento de Nova Iguau, com os
esperar que os dados assentados fossem mudando de cartrio para cartrio. Rios encontrou
dificuldades no trabalho com os registros de casamento, uma vez que a maior parte no
apresentava a categoria cor. Eliminada a possibilidade de usar tais registros, concentrou sua
1889, a populao recorreu de forma contundente aos registros, porm, desse ano em diante,
subregistro, Rios descartou qualquer tentativa de estudo demogrfico com base no registro
civil. 115
em Paraba do Sul. Mesmo com os problemas inerentes natureza dos registros civis, estes
de Janeiro.
Janeiro, entre os anos de 1888 e 1940. Com o propsito de obter um resultado estatstico
113
RIOS, A. op. cit., 1990, p. 15-16.
114
Ibid., p. 16.
115
Idem.
lxx
civis de nascimentos encontrados no arquivo do Ofcio do Registro Civil das Pessoas Naturais
da 1 Circunscrio de Nova Iguau, de cinco em cinco anos. Dessa forma, os anos escolhidos
foram: 1889, 1894, 1899, 1904, 1909, 1914, 1919, 1924, 1929, 1934 e 1939. Ao total, foram
Rios encontrou para Paraba do Sul, a quantidade de registros por ano no municpio de
Iguass cresceu ao longo dos anos. Como se pode ver na figura 1.4, na comparao com os
mais ainda intrigante foi o aumento vertiginoso da busca pelo registro civil aps a dcada de
30, perodo do Governo Vargas. No to surpreendentes foram os ltimos anos dos registros
que, graas s leis incentivadoras, as quais coibiam as multas por atraso no registro, houve a
todos os nossos registros. No primeiro ano do registro, durante os primeiros nove meses, tal
categoria no informada. Apesar disso, ela est presente em 38% dos registros. Todavia,
essa caracterstica muda drasticamente ao longo dos anos. Em 1919, por exemplo, ano em que
116
Em anexo h um assento transcrito que serviu de base para a construo do banco de dados.
117
Sobre a importncia do registro civil no governo Vargas, ver captulo 3 da presente dissertao.
lxxi
o censo foi realizado para ser publicado em 1920, somente 1,47% dos registros no possuem a
cor informada.
Figura 1.4 Total de registros civis de nascimentos por ano. Municpio de Nova Iguau, RJ.
2500
2000
1500
1000
500
0
1889 1894 1899 1904 1909 1914 1919 1924 1929 1934 1939
Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau.
Livros nmero 1, 3, 4, 6, 7, 9, 11, 12, 14, 15, 19, 24, 25, 34, 35, 36, 47, 48, 39, 50, 58, 59, 60 e 61. Nos
seguintes anos: 1889, 1894, 1899, 1904, 1909, 1914, 1919, 1924, 1929, 1934 e 1939.
Ao olhar atentamente para figura 1.5, percebe-se uma presena significativa do grupo
de pretos e pardos nos censos, principalmente aps 1914. Se no Vale do Paraba, essa
populao decresceu entre os censos de 1890 e 1940, na Baixada, a sua presena cresceu
cor dos recenseados, j que, aps 1890, somente no censo de 1940 tal categoria retornou.
lxxii
Figura 1.5 Total da populao recenseada como pretos e pardos. Paraba do Sul, Valena e Iguass.
80000
70000
60000
50000
Paraba do Sul
40000 Valena
Iguass
30000
20000
10000
0
1872 1890 1940
acompanhado pelo aumento da procura dos registros no Municpio de Iguass (figura 1.6). Na
regio da atual Baixada Fluminense quando, se soma todos os registros, ao longo dos anos
selecionados, pode-se concluir que: em primeiro lugar, em 1894, logo aps a presena da cor
pardas era maioria; em segundo lugar, a partir da dcada de 20, pode-se perceber o
crescimento dos registros de crianas pretas e pardas. Logo, nada foi mais surpreendente do
que a grande presena dos pais registrando os filhos pardos e negros e de pessoas se
dissertao. Aqui, basta perceber que, mesmo diante das dificuldades apresentadas pelas
fontes, consegue-se chegar a algumas tendncias: primeiro, o Vale do Paraba, nos censos e
no registro civil de Paraba Sul, aparentemente perdeu populao de pretos e pardos, ao longo
lxxiii
Figura 1.6 Total dos registros civis de nascimentos por cor. Municpio de Nova Iguau.
1200
1000
800
Branca
Outras Cores
600
No Informada
Pretos e Pardos
400
200
0
1889 1894 1899 1904 1909 1914 1919 1924 1929 1934 1939
filhos na Baixada Fluminense licito supor que essa populao procurou se incluir
socialmente. Portanto, nessa regio possvel encontrar uma populao de pretos e pardos
Fluminense.
polticas, econmicas e sociais da regio at os anos 40; na segunda parte, baseado nas
regio; na terceira parte, sero analisados os registros civis coletados no Oficio de Registro
Fluminense. Optou-se por dividir o texto em dois subitens. No primeiro, ser apresentado o
essas regies eram compostas pelas freguesias de Nossa Senhora da Piedade do Inhomirim,
Marapic, Nossa Senhora do Pilar, Nossa Senhora da Piedade do Iguass e Nossa Senhora da
municpios de: Nova Iguau, Queimados, Japeri, Nilpolis, Mesquita, So Joo de Meriti,
municpio de Iguass tornou-se um dos mais importantes entrepostos comerciais entre o Vale
do Paraba e o porto do Rio de Janeiro. Era uma regio rica em quantidade de rios navegveis
e, ao longo dos principais rios, como Inhomirim e Estrela, havia portos por onde a produo
do caf era levada em pequenos barcos at a Baa de Guanabara, para ser exportada.
pequeno, com apenas 14,5 Km. Contudo, a grande mudana econmica na regio viria em
1858, quando a Estrada de Ferro Central do Brasil passou a cortar a regio de Iguass,
Mendes, da Sacra Famlia e de Pira. Em 1865, o trem havia chegado a Barra do Pira,
Ipiranga, Vassouras, Desengano, Concrdia, Paraba do Sul e Entre Rios. Naquela poca, o
118
PEREIRA, Waldick. Cana, Caf e Laranja: Histria econmica de Nova Iguau. Rio de Janeiro:
FGV/SEEC, 1977. p. 53.
lxxvi
ento separada politicamente de Iguass, perdeu importncia na regio. Nesse nterim, o rio
Inhomirim era o responsvel pelo transporte de passageiros e de caf nessa regio; porm com
Janeiro. De acordo com Pereira, o fim econmico da regio veio quando a linha frrea Gro-
Par chegou a Petrpolis e se estendeu at Areal. Em 1896, a freguesia de Estrella foi extinta
Paralelamente construo das estradas de ferro por toda a Baixada, dois outros
problemas contriburam para crise econmica do final do sculo XIX. Aquela era uma regio
proliferao rpida de doenas, o que foi o caso da antiga sede de Iguass, Vila de Cava. Na
virada do sculo, essa regio sofreu um surto de clera-morbus e de malria, que impediu,
Maxambomba.
por causa da linha frrea que cortava o distrito e, segundo, pela produo de laranjas. Em
119
PEREIRA, W. op. cit., p. 53.
120
No perodo estudado, entre 1888 a 1940, o nome do Municpio muda pelo menos trs vezes. Para impedir
futuras confuses entre termos, optou-se por utilizar, durante esta dissertao, apenas o nome atual, Municpio de
Nova Iguau, para simbolizar a regio da Baixada Fluminense, antes da diviso em pequenos municpios,
ocorrido aps a dcada de 50.
lxxvii
A crise do caf
do caf. Ao mesmo tempo em que o caf ganhava importncia econmica no Vale do Paraba
na dcada de 1870, alguns fazendeiros davam incio a essa plantao na Baixada Fluminense.
De acordo com Pereira, a produo de caf no seguiu os moldes das reas economicamente
Iguau desde o sculo XVIII. Aliada a outros fatores como as doenas, a plantao de cana-
de-acar dessa regio nunca ganhou grande destaque no Estado do Rio de Janeiro. Afinal, a
de ser um entreposto comercial, alm da venda de caf, os escravos tambm eram levados,
estatsticas que contabilizem ou que faam projees sobre a quantidade de escravos que
ficaram na regio. De fato, aps a cesso do trfico em 1850, tanto o Vale como a Baixada
em geral. No Municpio de Valena, o nmero de escravos era de 28.496, ou seja, 60,4% das
escravos em comparao a Valena, ainda assim a sua presena bem expressiva nessa
regio.
no Rio de Janeiro, em 1873, apenas 6.964 escravos foram arrolados, ou seja, um decrscimo
121
de 30% na populao cativa. J a regio de Valena teve sua quantidade de escravos
diminuda em apenas 5%. Essa diferena aumenta drasticamente, em 1883, tanto para a
Baixada quanto para Valena; nesta foram contabilizados 5.296 cativos, enquanto naquela
foram 24.811. Ora, em relao ao censo de 1872, a populao escrava decaiu 48,4% e 13%
respectivamente nestas duas regies. A partir desses dados, ao contrrio das regies
imobilirio de pequenas propriedades nunca antes visto. De acordo com Jorge Lus Rocha, no
perodo entre 1875 a 1899, a maior parte das transaes de terras correspondia a propriedades
de at 150 hectares, ou seja, para a regio de Nova Iguau, eram imveis considerados
121
PEREIRA, W. op. cit., p. 104.
122
ROCHA, Jorge Lus De quando dar os Anis A estrutura fundiria da Baixada Fluminense e suas
transformaes. Hidra de Igoass, n3, Abril/Maio/Junho de 2000. p. 30.
lxxix
Nova Iguau, nos primeiro anos do sculo XX, impulsionou investimentos de novas
produes em pequena escala. Neste nterim crescia como nova oportunidade econmica na
A laranja
De acordo com Pereira, a laranja era uma fruta plantada h muito tempo, no Rio de
XIX, era vendida apenas para o mercado interno. Nesse perodo, So Gonalo, ainda unido ao
mercados vizinhos ao municpio. J no final do sculo, Tal produo ganhou fora e teve a
sua primeira exportao, em 1886, chegando, primeiramente, aos mercados argentinos e, dois
fazendas que haviam entrado em crise econmica, por causa das produes em larga escala do
caf e da cana-de-acar, estavam abandonadas e/ou foram loteadas. Esse era um cenrio
tpico para o tipo de produo que a laranja exigia, ou seja, a de pequenas propriedades. As
foram: So Gonalo, Campo Grande, Bangu, Santa Cruz e Nova Iguau. Para alm do Rio de
Janeiro, So Paulo tambm investiu na produo, obtendo uma maior produtividade por p de
Estado do Rio de Janeiro e, especificamente, em Nova Iguau ganhou mais fora com entrada
123
PEREIRA, W. op. cit., p. 114.
lxxx
Entrementes, conforme Marieta Ferreira, ele deixou de ser uma liderana representativa
poltica de setores advindos de outras regies, principalmente das reas cafeeiras do Vale do
agricultura como a principal sada para a crise pela qual passava o Estado. 124
aduaneiros sobre as frutas comercializadas entre Brasil e Argentina. Dessa forma, ampliava o
Baixada Fluminense.
na regio metropolitana do Rio de Janeiro. Embora da busca por solues para tal questo ter
comeado em 1894, o governo de Peanha foi o que mais colaborou para o desenvolvimento
125
da regio. Seus esforos se concentraram nos locais tipicamente pantanosos da Baixada,
126
principalmente beira dos rios Iguass, Sarapu, Inhomirim e Pilar. Ainda que tivesse
governado o pas por apenas um ano e meio, incentivou, de forma contundente, o crescimento
econmico dessa regio. O dessecamento dessas reas e o fim de vrias doenas provenientes
124
FERREIRA, M. Em busca da Idade do Ouro: as elites fluminense na Primeira Repblica (1889-1930). Rio
de Janeiro: Ed. UFRJ, 1994. p. 21 e 22.
125
O decreto n. 128 de 10 de outubro de 1894 previa estudos para resolver o problema do saneamento.
126
VIANA, M. T. Nova Iguau: absoro de uma clula urbana pelo grande Rio de Janeiro. Nova Iguau,
IBGE, 1962, p. 205, Apud PEREIRA, W. op. cit. p. 115.
lxxxi
pequenos stios. Desse modo, em 1920 a laranja comeou a ser produzida em larga escala em
De acordo com o censo de 1920, Nova Iguau possua uma extenso de terra
equivalente a 144.700 hectares dos quais 117.937 eram em estabelecimentos rurais, ou seja,
81,5% da extenso de terra estavam localizadas no meio rural. Eram, ao total, 280
propriedades, das quais 161 estavam sob controle dos proprietrios, 18 em mos de
hectares somavam 213, porm a maior parte das terras ainda estava sob controle de uma
pequena parcela de proprietrios (tabela 2.1). Ao analisar o tamanho das propriedades nota-se
que, nesse perodo, a expanso da pequena propriedade ajudou no impulso inicial da produo
de laranja. Proprietrios antigos e novos investiram ou arrendaram suas terras para a produo
de laranja.
Tabela 2.1 Total por tamanho das propriedades segundo o censo de 1920. Municpio de Nova Iguau.
propriedades rurais que, dentre elas, 704 estavam sob controle dos proprietrios, 302 sob os
lxxxii
administradores e 523 sob arrendatrios (Tabela 2.2). Nesse perodo, as propriedades com
Tabela 2.2 Total por tamanho das propriedades segundo o censo de 1940. Municpio de Nova Iguau.
de Nova Iguau. Na tabela A.1 (anexo), possvel acompanhar a diviso territorial das
propriedades por distritos. Em 1932, a sede da regio reuniu 83% dos laranjais. De acordo
com a Diretoria de Agricultura do Estado do Rio de Janeiro, de 1927, eram, ao total, 104
9.753.300$000. 127
propriedades na regio. Deveras, pouco se sabe sobre o mercado imobilirio, o valor das
propriedades e qual o perfil dos proprietrios. Pode-se supor apenas que, com o crescimento
acessvel a todos, uma vez que somente pessoas que possuam dinheiro suficiente poderiam
128
investir. Dessa forma, possivelmente, ao longo desses anos, os fazendeiros mais ricos e
127
Diretoria de agricultura do Estado do Rio de Janeiro, 1927, apud PEREIRA, W. op. cit., p. 125.
128
PEREIRA, W. op. cit., p. 125.
lxxxiii
de 20 e 40, atingir nmeros expressivos na exportao. De acordo com a tabela 2.4, pelo porto
do Rio de Janeiro, no perodo de 27 a 34, foram exportadas 10.674.135 caixas de laranjas que
129
somavam um valor no total de 218.590.586$800. Em 1928, o Estado de So Paulo
Brasil como um todo exportou 2.631.827 caixas e dois anos mais tarde chegou ao nmero de
5.487.043. 130
a dcada 30, ganhou mais destaque em relao a outras regies. Em 1931, a exportao pelo
porto do Rio de Janeiro chegou a um total de 1.236.453 caixas de laranjas, das quais Nova
Iguau colaborou com 687.900.131 Em 1938, somente este municpio exportou 2.111.618
Em 1940, a produo havia chegado ao seu auge. De acordo com o censo do mesmo
de 1.398, em um total de 1529 propriedades. Iso significa dizer que 92% das propriedades
houve uma necessidade cada vez maior de mo-de-obra. Os trabalhadores eram empregados
129
PEREIRA, W. op. cit., p. 123.
130
Ibid., p. 123.
131
Idem.
132
SOUZA, Sonali Maria Da Laranja Ao Lote: Transformaes sociais em Nova Iguau. Dissertao.
(Mestrado em Antropologia Social) Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro,
1992. p. 58-59.
lxxxiv
produo de laranjas no estava acessvel a todos. O plantio era feito em pequenas e mdias
propriedades, chamadas chcaras, e, na maior parte dos casos, o acesso a elas se dava pelo
arrendamento. Esse foi o momento em que a figura do Chacreiro surgiu; na maior parte,
esta era formada por imigrantes europeus, com destaque para os portugueses. H que se
diferenciar dois tipos de chacreiros: o primeiro, era de grande porte, ou seja, controlava uma
havia os pequenos chacreiros que contavam apenas com o trabalho domstico para
produzir. 133
trabalhos assalariados, temporrios e permanentes. De acordo com Sonali Maria Souza, entre
fluminenses. Contudo, essa no era a forma de trabalho mais largamente utilizada. Parece
de casas e/ou pequenas plantaes na propriedade. Eram convocados duas vezes por ano, para
133
SOUZA, S. op. cit., p. 61.
134
Idem.
135
Ibid., p. 66.
lxxxv
Porm, com o passar dos anos, o beneficiamento da laranja trouxe uma diversificao
dos arranjos de trabalho, ampliando sua oferta. Sob o controle do presidente da Repblica,
houses, divididas em: cinco na sede, cinco em Morro Agudo, trs em Austin e Cabu. 136
para serem comercializados. Durante esse processo, era feita a lavagem, brunimento,
137
embrulho em papel de seda e encaixotamento. Nessas caixas, podia-se alocar at 250
De 1931 a 1935, o nmero de packing houses em Nova Iguau passou de 13 para 24.
138
Nesses barraces empregavam-se cerca de 100 pessoas, entre homens e mulheres. Para
trabalhadores. Como exemplo de locais onde havia uma diversificao de arranjos de trabalho
O objetivo desta parte ser o de traar as experincias de migrao que tiveram por
136
PEREIRA, W. op. cit., p. 140.
137
SOUZA, S. op. cit., p. 58.
138
PEREIRA, W. op. cit., p. 141.
lxxxvi
recenseamentos do IBGE de 1920 e 1940, como fontes de pesquisa. Esta parte est divida nos
***
foi possvel perceber menes a passagens de familiares pela Baixada Fluminense. Para
com seus netos: Manoel Seabra, Zeferina do Nascimento e Florentina Seabra. A partir delas,
A quebra da unidade familiar, durante esse perodo, foi presente na memria de quem
fica. Nos depoimentos dos netos de V Dionsio, moradores da Fazenda So Jos da Serra em
Valena, ficou marcada a sada dos tios e do av ainda quando os entrevistados eram muito
jovens, com cerca de dez a doze anos. De acordo com uma primeira anlise dessas entrevistas
lcito supor que, na dcada de 1920, foram em direo regio da Baixada Fluminense
buscar trabalho, visto que, no Vale do Paraba a entrada do gado e de outras produes, que
exigiam uma menor quantidade de trabalhadores, havia ganhado espao. Nos primeiros anos,
os filhos migrados de V Dionsio retornavam casa dos pais. Passavam distantes, por um
perodo, mas posteriormente, voltavam com dinheiro para continuar ajudando na economia
Apesar das idas e vindas, possivelmente essas famlias mantiveram contatos com seus
familiares, porm, com a estabilizao ao longo dos anos, houve uma quebra familiar
lxxxvii
definitiva. Zeferina conta que o Tio Manoel, filho mais velho de V Dionsio, aos poucos
levou seus irmos mais velhos, Joventino, Sebastio e Hermenegildo para Nova Iguau.
Manoel havia comprado um terreno grande em Cabu, onde conseguiu alocar todos os
familiares que decidiram sair da Fazenda So Jos da Serra. Os irmos homens e mais velhos
comearam a deixar o Vale para morar com os tios na Baixada e ali trabalhar.
Paraba do Sul, entrevistado por Ana Rios. Seu irmo, Ormindo, filho de ex-escravo, entre as
139
dcadas de 20 e 30, conseguiu um trabalho na empresa de energia eltrica, a Light. De
acordo com a entrevista, Ormindo foi transferido por volta de 1935 para Queimados, onde
trabalhou at se aposentar. Nesse local, comprou um terreno e construiu uma casa de bom
tamanho. Ali passou a receber os parentes que tambm desejavam sair do Vale do Paraba,
tanto que, em 1938, Seu Izaquiel morou com o irmo nessa casa, porm desistiu e voltou para
o Vale.
Nas entrevistas, notou-se que essa migrao iniciou-se ainda nas primeiras dcadas do
sculo XX e, atravs dos censos, possvel supor a existncia desse movimento. Apesar dos
problemas inerentes aos censos, citados no captulo anterior, grosso modo, entre os censos de
140
1872 e de 1920 a populao da Baixada Fluminense variou muito pouco. No primeiro
segundo, que j contabilizava 33.396 pessoas (tabela 1.1). Esse foi o perodo caracterizado
pela crise econmica da regio promovida pelo colapso da produo de caf e da cana-de-
139
Entrevista: Izaquiel Incio, 1994, MC.
140
Em 1872 optou-se por somar o municpio de Estrela com o Municpio de Iguass, que anos mais tarde, ao
juntar-se, se tornariam o municpio de Nova Iguau.
lxxxviii
pessoas recenseadas, em 1920, esse nmero salta para 140.606 no censo de 1940, ou seja, um
Figura 2.1 Crescimento populacional da Baixada Fluminense de acordo com os censos. Municpio de Nova
Iguau.
160000
140000
120000
100000
80000
60000
40000
20000
0
1872 1890 1920 1940
censos demonstram tendncias que sero utilizadas na argumentao. No que concerne faixa
censo, ao fazer clculos para chegar populao jovem, que estava na idade prxima a do
trabalho, chega-se aos seguintes nmeros: entre 10 e 29 anos, h 13.099 pessoas do total de
33.396, ou seja, 38% da populao; j no censo de 1940, essa faixa etria da populao
141
Para o municpio de Nova Iguau no h, nesse perodo, qualquer estatstica referente taxa de natalidade, de
mortalidade e de crescimento vegetativo.
lxxxix
Tabela 2.3 - Faixa etria da populao recenseada residente na Baixada. Municpio de Iguass e de Estrella.
2.4). Dentre as 33.396 pessoas neste censo, 17.707 so homens, ou seja, 53% da populao.
Por outro lado, em 1940, essa diferena aparenta estar mais equilibrada, constando quase 50%
de cada lado. Analisando a faixa etria por sexo, chega-se a outros nmeros. Em 1920, os
homens entre 10 e 29 anos so 6.809; logo, 38% da populao masculina de Nova Iguau est
nesta faixa etria. Nmero semelhante encontra-se em 1940, visto que entre as 53.513 pessoas
1920 1940
Porcentagem Total Porcentagem Total
Homens 53% 17707 51% 71855
Mulheres 47% 15689 49% 68751
Total 33396 140606
XX, essa regio comeou a concentrar uma populao que, provavelmente, estava em busca
xc
anos, pode demonstrar a presena de trabalhadores nesta regio. Por ser um perodo de
obra. Ora, por conta dos problemas inerentes aos censos demogrficos, no se sabe onde os
longo dos anos. Na dcada de 40, aparentemente, houve um maior equilbrio entre os sexos. A
partir disso, pode-se supor que essa mo-de-obra migrada, entre os anos de 1920 e 1930,
secundrios ligados a ela, o que conseqentemente elevou ainda mais o seu crescimento,
Fluminense. Esse foi o caso dos filhos de V Dionsio. Dona Zeferina conta que seus tios
saram da fazenda Empreitada, quando ela ainda era criana, e foram em direo s plantaes
de laranja em Nova Iguau. Aps alguns anos de idas e vindas, os tios de Zeferina buscaram
todos os sobrinhos para trabalhar na Baixada. Em sua entrevista, conta que todos trabalharam
A primeira hiptese deste projeto de pesquisa versava sobre a atrao que a produo
nesse mesmo perodo, o Vale do Paraba intensificou a produo de gado e de outros produtos
que dispensavam trabalhadores. Durante a pesquisa partiu-se da premissa de que uma boa
migrao para o municpio de Nova Iguau, que no citavam a laranja como atrativo. Como j
mencionado no captulo anterior, Seu Ormindo, irmo de Izaquiel Incio e morador de Paraba
moradora de Mesquita - ele foi empregado da Estrada de Ferro Central do Brasil em Valena
e tambm foi transferido para o Municpio de Nova Iguau, mais precisamente para o distrito
Essas duas histrias possuem uma relao muito prxima, visto que a criao de
populao mais pobre nessa regio. Para se ter um parmetro, nos distritos mais distantes
como So Joo de Meriti, Nilpolis e Duque de Caxias no houve essa valorizao. Essas
regies apresentaram um loteamento precoce, j que suas terras no valorizaram com as reas
de laranjais. Com propriedades mais baratas, supostamente, uma parte da populao pde se
propores significativas.
142
Entrevista: Izaquiel Incio, 1994, MC.
143
Entrevista: Dona Nilza, 2008, AP.
xcii
acelerou, at ento, no desmembrado em vrios municpios. Para ele, isso foi impulsionado
pelos seguintes fatos: construo de 14 novas estradas, ligando as reas produtoras de laranja
Hospital; instalao dos primeiros bancos; e instalao das primeiras indstrias, ao total de 19
em 1930.
regies onde a terra era mais barata, ou seja, nos distritos ao derredor de onde era produzida a
saneamento bsico, na dcada de 30, as quais extinguiram boa parte dos brejos,
144
transformando-os em propriedades. Da mesma forma, a populao comeou a se
145
concentrar perto das estaes de trem que, a partir de 1935, foram eletrificadas. No trecho
da entrevista abaixo, possvel perceber que os irmos de Senhor Cornlio Cansino, nascidos
Ah, todos eles casaram, aquele negcio muito sacrifcio, depois que eles foram para o Rio que
melhorou. , eu tenho um irmo que mora l em Nova Iguau. Dois, tem a Teteca, Teteca l em So
Jos, mas a filha dele mora l no Rio de Janeiro, na casa dela, em Nova Iguau, num lugar
chamado K-11. O Tininho tambm. O Antnio mora l numa casa prpria no Rio, em Nova Iguau.
Esse ngelo que morreu tem uma casa l tambm, l em Engenheiro Pedreira, onde aconteceu esse
desastre poucos dias a, n. Tinha uma casa muito boa. Ele trabalhava de pedreiro. E o Sebastio,
esse morava em Nova Iguau tambm, pegado ao meu irmo mesmo. Esse Sebastio que morreu. E
a Alice, a Nice trovoada era filha da falecida tia Eullia, essa que tambm morou pegada ao meu
irmo, casou em So Jos e depois foi embora. Depois que acabou as fazendas, depois de 1900 e
146
poucos pra c, as fazendas acabou, veio todo mundo embora.
Assim como os irmos de Seu Cornlio, o cunhado de Dona Jlia, moradora de Paraba do
Sul, comprou um pequeno terreno em Japeri e para l levou sua irm e seus sobrinhos. Nessa
144
SOUZA, S. op. cit., p. 67.
145
ABREU, Maurcio O espao em Movimento: do urbano ao metropolitano. In: Evoluo Urbana do Rio de
Janeiro. Rio de Janeiro: IPLAN/Jorge Zahar, 1987, p. 107 apud SOUZA, S. op. cit., p. 67.
146
Entrevista: Cornlio Cansino, 1995, MC
xciii
propriedade, ele plantava e vendia os produtos nas feiras prximas. 147 Caso semelhante foi o
do tio de Dona Yvone, moradora de Mesquita. Seu Horcio vendeu seu lote em Vassouras
que a crise da laranja. Pereira apontou que o declnio da produo, no Municpio de Nova
Iguau iniciou-se por volta de 1926. Assinalou a praga da mosca do mediterrneo como
uma das causas da extino da lavoura. Uma vez que as tentativas para elimin-la foram em
vo, esta persistiu at os ltimos dias da produo de ctricos. Para alm das pragas, o incio
paralisao das navegaes de comrcio, em 1939, as laranjas ficaram estocadas nos portos
loteamento das terras. De acordo com Pereira, entre 1926 e 1945, foi registrado um total de 21
A partir dos dados apresentados, possvel supor que, na dcada 1920, foram poucas
sazonal, ou seja, os trabalhadores retornavam aos seus locais de origem. Isso significa que,
priori, a sada dos filhos do Vale do Paraba, nas primeiras dcadas do sculo XX, em busca
de trabalho, pode ter reforado e/ou mantido, mesmo que precariamente, a comunidade de
origem.
147
Entrevista: Dona Julia, 1994, MC.
148
Entrevista: Dona Yvone, 2006, AP.
149
PEREIRA, W. op. cit., p. 144.
150
Ibid., p. 146.
xciv
Na dcada de 30, a partir dos relatos, parece acertado que esse foi o momento de incio
por Thomas Holt para a Jamaica, no qual os libertos e seus descendentes buscaram comprar
propriedades produtivas que pudessem aliar roa de subsistncia com venda de produtos nos
mercados locais, e trabalho assalariado nas grandes fazendas. 151 Essas pequenas propriedades
Ora, em nenhuma das entrevistas pesquisadas houve menes sobre a compra ou posse
de propriedades, por parte dos descendentes de libertos, onde existia plantao de laranja.
Pelo contrrio, quando nos depoimentos, aqui citados, h aluses sobre a compra e/ou posse
Deveras, somente nos casos dos netos de V Dionsio h meno da migrao por
causa da laranja. Nas outras entrevistas, como no caso de Seu Cornlio e de Dona Nilza, seus
expanso urbana, por exemplo, a Empresa de energia eltrica e a Estrada de Ferro Central do
Brasil.
Sendo assim, lcito supor que, atravs das entrevistas e dos censos, possvel
ao que parece, finalizando a migrao, na dcada de 40. Ainda assim, poucas questes foram
Fluminense. Para tanto, buscou-se utilizar os registros civis de nascimentos de Nova Iguau,
151
Uma melhor discusso sobre a estabilizao ser feita, a partir dos registros civis, na parte 3 deste captulo.
xcv
libertos.
escravos e de seus descendentes no Municpio de Nova Iguau. Para tanto, sero utilizados os
municpio.
Circunscrio de Nova Iguau, 1889, mais dois cartrios de registro civil passaram a
funcionar neste municpio, nos distritos de So Joo de Meriti e de Vila de Cava. Aqui, optou-
se por focalizar o cartrio de Nova Iguau, pois, como visto na segunda parte deste captulo,
essa regio concentrou a maior parte da populao, entre os anos de 1920 e 1940, e se tornou
um importante centro econmico no Estado. Alm disso, tal cartrio abrangia os distritos que
Buscou-se analisar o perodo que vai de 1888 a 1940, ou seja, os anos que vo da
anos de cinco de cinco, so eles: 1889, 1894, 1899, 1904, 1909, 1914, 1919, 1924, 1929, 1934
152
e 1939. Esses registros pouco mudaram, ao longo do tempo, o que possibilitou o uso de
usados somente os assentos de crianas nascidas no ano de seu registro. Isso porque, nos
152
Como j explicado no captulo anterior, os registros efetivamente s passaram a ser feitos a partir de 1889.
xcvi
anos que vo de 1889 a 1919; e, neste perodo, sero encontradas basicamente as famlias de
ex-escravos das antigas fazendas do Municpio de Nova Iguau. Apesar de no ser o tema
famlias para poder comparar e diferenciar das que migraram aps 1920. Alm disso, esta
parte poder trazer subsdios para pesquisas posteriores sobre as famlias de ex-escravos das
No segundo corte, sero analisados os anos entre 1924 e 1939. Tal perodo de suma
importncia para a pesquisa, visto que, como j estudado na parte 1 deste captulo, entre esses
sistemtica para a regio. Portanto, busca-se mostrar de que forma foi constituda a
estabilizao das crianas registradas como pretas e pardas, nascidas fora da Baixada, em
todo o perodo pesquisado surpreende. Nos anos selecionados, entre 1889 e 1939, no registro
civil de Nova Iguau, contabiliza-se um total de 5.897 nascimentos de crianas (tabela 2.5).
Dentre estes registros, 2.908 (49%) so de crianas brancas, 2.631 (45%) de pretas e pardas e
153
Os registros tardios ser o tema de nosso captulo 3.
xcvii
142 (2%) de crianas de outras cores. 154 Dentre todos esses anos, a cor no foi informada em
Tabela 2.5 - Total de registros civis de nascimentos por cor e ano. Municpio de Nova Iguau.
Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau. Livros
nmero 1, 3, 4, 6, 7, 9, 11, 12, 14, 15, 19, 24, 25, 34, 35, 36, 47, 48, 39, 50, 58, 59, 60 e 61. Anos: 1889, 1894,
1899, 1904, 1909, 1914, 1919, 1924, 1929, 1934 e 1939.
cartrio. Nos anos de 1889 e de 1894, aparentemente, houve um crescimento pela busca do
registro de nascimento, em Nova Iguau, no total de 560 registros. Isso evidencia que as
155
famlias procuraram legitimar sua situao logo aps a abolio. Deveras, entre as
crianas, nesses dois anos 251 (45%), foram registradas como pardas e pretas, diferentemente
Entre 1889 e 1914, a mdia de registros por ano manteve-se praticamente a mesma.
Tal nmero s seria superado aps o 1914. A partir do mencionado ano, a quantidade de
154
Nesta categoria, encontram-se as seguintes cores: morena, fula e clara. Em virtude da pequena quantidade de
registros por ano com essas cores, optou-se por agreg-las em apenas uma categoria: outras cores.
155
Este argumento ser mais bem discutido no decorrer do texto.
156
Para uma maior apreenso desta discusso, ver captulo 1 da presente dissertao.
xcviii
Figura 2.2 Total de crianas registradas no ano de seu nascimento. Municpio de Nova Iguau.
1800
1600
1400
1200
1000
800
600
400
200
0
1889 1894 1899 1904 1909 1914 1919 1924 1929 1934 1939
Dividindo esses registros na categoria cor, v-se uma grande presena dos pardos e
pretos no registro civil (figura 2.3). Nos trs primeiros anos selecionados, eles representam a
maioria dos registros; j no ano de 1914, a quantidade de registros de crianas pretas e pardas
1939, a totalizar 50,5% dos registros. Baseado nesse dado, vlida a hiptese de que pode ter
aumentado a quantidade de pretos e pardos, na populao em geral, ou esse grupo passou a ter
sua pesquisa, que abarcou os anos de 1889 a 1920, apenas no primeiro ano do registro civil de
Inconfidncia, em Paraba do Sul, havia informaes completas. Dessa forma, ela restringiu
157
RIOS, A. op. cit., 1990.
xcix
traar uma comparao entre os registros civis de nascimento de Paraba do Sul e de Nova
Figura 2.3 Total de crianas registradas em ano de seu nascimento por cor e ano. Municpio de Nova Iguau.
900
800
700
600
500 Branca
Outras Cores
No Informada
400 Pretos e Pardos
300
200
100
0
1889 1894 1899 1904 1909 1914 1919 1924 1929 1934 1939
Nova Iguau, foram registradas 237 crianas. Desse total, foram encontrados 171 registros
sem meno a cor. Diferentemente dos registros dos anos posteriores, no mencionado ano, a
158
categoria cor s passou a ser registrada do dia 18 de setembro em diante. Assim foi
158
Em virtude da autorizao para digitalizao do arquivo, o Desembargador Dr. Murilo exigiu que no fossem
publicados os nomes e sobrenomes dos registros. Aqui irar-se identificar pelas iniciais.
c
[...] compareceu neste cartrio J.L.G. na presena das testemunhas abaixo nomeadas e
assinadas e declarou que ontem na Rua de Madureira, nesta Freguesia nasceu uma
criana do sexo masculino de cor preta filho legtimo dele declarante e de sua mulher
M.C.O. naturais desta Parquia e de moradia nesta freguesia [...]. 159
Logo, aps a inscrio da categoria cor, as crianas pretas e pardas puderam ser
apenas 19 (8%) (tabela 2.6). Apesar das crianas pretas e pardas estarem em um nmero
significativo, no primeiro ano do registro, ainda sim era um nmero muito pequeno em
relao ao total de nascimentos do ano de 1889. Apesar dos poucos registros que indicavam
cor, tentar-se-, a partir deles, demonstrar algumas caractersticas, do mencionado grupo, logo
aps a abolio.
Tabela 2.6 Total e Porcentagem dos registros civis de nascimentos em 1889 por cor. Municpio de Nova
Iguau.
Porcentagem Total
Branca 8% 19
No Informada 72% 171
Pardos e Pretos 19% 47
Total geral 237
Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau, 1889.
159
Livro 1, registro 159, 1889. Ofcio do Registro Civil das Pessoas Naturais 1 Circunscrio de Nova Iguau.
160
Optou-se por utilizar as seguintes terminologias para o estudo das famlias: Famlia nuclear, extensa e
ampliada. Por famlia nuclear, entende-se toda aquela formada somente por pai, me e filhos. A famlia extensa
composta por familiares fora do ncleo, como avs, tios, primos, entre outros. Famlia ampliada toda aquela
que est circunscrita em uma comunidade que agrega pessoas do convvio social, sem qualquer relao parental.
ci
Tabela 2.7 - Situao conjugal dos pais nos registros civis de nascimentos. Municpio de Nova Iguau.
Ao contrrio dos dados obtidos na presente pesquisa, Rios encontrou, para o Vale do
pardas. Dentre as 230 crianas registradas nessa cor, 41% eram filhas de pais casados, 29%
161
tinham a inteno de casar e somente em 21% o pai esteve ausente. Deveras, a partir dos
dados obtidos em Nova Iguau em 1889, deve-se repensar sobre a existncia de outras
Baixada.
nmeros tendem a continuar a afastar-se dos de Ana Rios. Para o ano de 1889, no registro
diante da ausncia paterna nas unidades familiares, pode-se concluir que os mesmos
161
RIOS, A. op. cit., p. 82.
162
Idem.
cii
Com a falta da figura do pai nos registros, chamou ateno a profisso das mes
casadas e quantidade de mes solteiras, ambas na lavoura. Dentre os onze casamentos, nos
quais o registro do pai estava completo, em 10, h informaes sobre as mes. Cruzando tais
profisso domstica, e entre as solteiras sete classificaram-se como tal. Efetivamente, entre as
so de mes solteiras de crianas pretas e pardas que foram registradas como atuando nessa
Aos catorze dias do ms de dezembro do ano de nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil
oitocentos e oitenta e nove, neste Distrito de Paz, Parquia de Santo Antonio da Jacutinga,
Municpio de Iguass, Estado do Rio de Janeiro, comparecer neste cartrio, J. N. em presena das
testemunhas abaixo denominadas e assinaladas, declarou que ontem pelas nove horas da manh no
lugar Riacho, nasceu uma criana do sexo feminino, de cor parda, filha natural de L.N. natural e
residente nesta freguesia, profisso lavoura, a criana neta materna de E. N a qual ser chamada de
163
L. M. S. [...].
No que concerne legitimidade da criana, parece acertado que, entre as famlias sem
pai, as crianas pretas e pardas fazem parte da maioria (tabela 2.8). No ano de 1889, ocorreu
categoria s vai aparecer nos anos de 1919 e 1924, e todos os casos so de crianas pretas e
registros de pais e mes casados. Somente em 11 casos, a criana foi declarada como legtima.
No entanto, a ausncia do pai foi notada, mais uma vez nos registros civis, visto que, em 36
163
Livro 1, registro 226, 1889, RCPNNI.
ciii
Tabela 2.8 Legitimidade nos registros civis de nascimentos registradas por cor. Municpio de Nova Iguau.
Em 1889, a figura que se tornou mais importante, aparentemente, foi a dos parentes
prximos e/ou amigos da famlia da me. Dentre os 36 casos de crianas registradas como
naturais, nenhum deles a me foi a declarante. Nos registros, no foi possvel perceber a
eram pessoas prximas como irmos, vizinhos ou padrinhos da criana. No entanto, embora
no primeiro ano de registro tenha existido a categoria padrinhos, aps o incio da inscrio
No que tange regio de nascimento das crianas, nota-se que, em 1889, as crianas
pretas e pardas eram de origem da prpria Baixada. Ao total, os registros estavam bem
caso, a criana nasceu fora do Municpio, para ser mais preciso, em Minas Gerais.
registro pode mostrar uma presena significativa deste grupo na regio. No final do sculo
XIX, a Fazenda Cachoeira fazia parte do distrito de Mesquita e era de propriedade do Baro
seu inventrio foi aberto em 1878, e ele veio a falecer, em 1888; logo, sua propriedade passou
164
para seu filho, Jernimo Roberto Mesquita. Efetivamente no possvel afirmar, todavia
um forte indcio mostra que os filhos dos escravos do Baro de Mesquita podem ter sido
164
Inventrio de Baro de Mesquita, 1866 e de Jernimo Jose de Mesquita, 1878. Museu da Justia do Estado do
Rio De Janeiro.
civ
registrados nos anos posteriores abolio. Somente no ano de 1889, foram registradas 5
Tabela 2.9 Total de registros civis de nascimentos por regio de nascimento e cor. Municpio de Nova Iguau.
Apesar da maior parte das crianas pretas e pardas terem nascido na Baixada, o que
civil de Paraba do Sul, aparentemente, foram poucas as crianas que tiveram contato com os
avs. De forma dessemelhante aos dados obtidos por Ana Rios, onde, em 15% dos casos, as
crianas tiveram a oportunidade de conhecer todos os seus avs, mesmo que apenas
nominalmente, em Nova Iguau, essa porcentagem caiu para 12%. Contudo, tais nmeros
tornam-se ainda mais dspares, no que tange presena dos avs: para Paraba do Sul, Rios
mostrou que 83% das crianas conviveram com pelo menos um av, enquanto na Baixada
esse nmero caiu para 43%. Em Paraba do Sul, em apenas 8% dos registros as crianas pretas
e pardas no poderiam sequer saber o nome dos seus avs, no municpio de Nova Iguau, em
165
RIOS, A. op. cit., p. 86.
cv
Comparando os valores da presena dos avs, ainda assim possvel perceber que, na
Baixada, houve menos contato com os avs. Se os avs paternos e maternos, em Paraba do
Baixada, que totaliza 12% e 38% (tabela 2.10). Porm, a presena da av materna bem
significativa nos dois registros. Em Paraba do Sul, as avs maternas somavam 87%, nmero
Tabela 2.10 Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas. Municpio de
Nova Iguau.
Porcentagem Total
Av Paterno 12% 6
Av Paterna 17% 8
Av Materno 38% 18
Av Materna 82% 39
Todos os avs 12% 6
Nenhum dos avs 15% 7
Pelo menos um av 43% 20
Total de registros 47
comunitrios nos registros de crianas pretas e pardas em Nova Iguau. Isso porque o maior
indcio, que esses dados fornecem, exatamente a inexistncia de tais laos. No h qualquer
indicao de relao dos padrinhos e dos declarantes, nos registros, com as mes.
pesquisa. Analisando apenas no ano de 1889, lcito supor que os registros indicam que os
completas com pai, me e filhos. No entanto, a presena significativa de mes solteiras, que
cvi
tem seus filhos registrados, aparentemente, demonstra que a busca pelo registro no era
exclusivo de famlias nucleares completas. Deveras, esse ano pode ter sido de extrema
confuso; todavia, para chegar a melhores concluses, deve-se atentar para os anos
posteriores abolio.
incompletas, tendo a me solteira e os avs maternos como eixo principal. Este fato pode estar
com o Municpio de Nova Iguau, de acordo com Rios, no primeiro caso, uma parte dos
passaram a ser loteadas. Todavia, ainda no h estudos sobre o valor e o tamanho desses
Deveras, outros elementos, para alm do acesso terra, podem ter contribudo para a
formao das famlias, ao longo das primeiras dcadas do sculo XX na Baixada Fluminense.
A busca pela estabilidade, pela autonomia e pela possibilidade de ampliao familiar estava
166
RIOS, A e MATTOS, H. op. cit., 2005, principalmente no captulo 3.
cvii
ligada s condies de trabalho e forma como a terra era utilizada. No que se refere aos anos
posteriores abolio, de 1888 a 1920, no Municpio de Nova Iguau, pouco se sabe sobre as
Aqui, nesta parte, ser possvel aprofundar a investigao sobre a formao dessas
famlias. Aps o ano de 1889, ao contrrio dos registros encontrados por Rios, em Paraba do
Sul, no cartrio de Nova Iguau os registros tornam-se mais completos. Decerto, algumas
categorias alusivas aos registros paroquiais de batismo deixam de ser declaradas, por
Com o passar dos anos, a presena de registros de crianas pretas e pardas cresceu.
Nova Iguau.
1889 a 1919
concernentes ao acesso pequena roa. Os indcios apenas mostram que tal perodo foi
fazendas comearam a ser desmembradas lotes, dos quais nada se sabe sobre o valor das
colhidos no Municpio de Nova Iguau, de cinco em cinco anos a partir de 1889 at 1919.
1889 a participao de pretos e pardos baixa (19%), nos anos seguintes a quantidade de
sempre ficava acima dos 38%. Em 1894, surpreendentemente 63% dos registros foram de
cviii
crianas pardas e pretas, porm o nmero caiu para 48% em 1899. Nos trs anos seguintes,
ficou entorno dos 39%, para, em 1919, voltar a crescer, chegando a 46%.
Tabela 2.11 Total de registros civis de nascimentos por cor e ano. Municpio de Nova Iguau.
Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau. Anos
1889, 1894, 1899, 1904, 1909, 1914 e 1919.
pardas, os anos em que esse nmero caiu, merecem alguns comentrios. No censo de 1890,
esse grupo correspondia a 63% da populao dos Municpios de Estrella e de Iguass. Mesmo
diante dos problemas inerentes aos censos, era de se esperar que, em 1894, a presena de
pretos e pardos fosse expressiva nos registros civis. Apesar da quantidade significativa de
subregistro, nos dois primeiros anos selecionados, pode-se perceber que essa parte da
do registro civil, por Rios, em Paraba do Sul, aqui se supe que tal interesse em tornar
regular a situao das crianas (...) reflete uma vontade de integrao e no de excluso.
Pode ter sido um sinal de que as famlias tinham, ou esperavam ter, alguma estabilidade nas
entretanto, no permite concluir que houve uma diminuio de nascimentos (figura 2.3). Em
1894, foram, ao total, 204 registros de crianas pretas e pardas, enquanto, em 1904, exatos dez
anos aps, esse nmero caiu para 48. De uma forma um tanto quanto interessante, os registros
167
RIOS, A. op. cit., 1990, p. 107.
cix
desse grupo decaram de forma significativa, todavia, nos anos posteriores a 1899, tenderam a
se equilibrar com a quantidade de brancos. Se, no ano de 1899, eram 48% de crianas pretas e
pardas e 37% de registros de crianas brancas, em 1914, esse nmero praticamente se igualou,
Tabela 2.12 Presena de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de nascimentos.
Municpio de Nova Iguau.
acessvel ou no era uma prtica generalizada, no perodo. Nos anos de 1889 e 1894, em sua
maioria, o pai de crianas pretas e pardas estava concentrado no trabalho com a lavoura.
Efetivamente, a reduo de registros pode estar ligada a mudanas nesse grupo que recorria
aos cartrios. Para Rios, em Paraba do Sul, o nmero de crianas pretas e pardas tambm
diminuiu nesse perodo. Para ela isso pode estar ligado no s ao decrscimo de nascimento
est atrelada falta de famlias nucleares completas. No que tange situao conjugal dos
pais, de crianas registradas como pretas e pardas, a maior parte dos registros so de mes
solteiras totalizando, 58,5% (tabela 2.13). Entre os casados, os pais so nomeados em 39%
dos registros. Dos 296 casos de pais casados, em 141 (48%) no h qualquer informao
sobre eles. Apesar disso, dentre os registros que apresentam a profisso dos pais casados de
168
RIOS, A. op. cit., 1990, p. 88.
cx
crianas pretas e pardas, 64% estavam ligados lavoura; o restante deles estava espalhado em
Tabela 2.13 Situao conjugal por cor nos registros civis de nascimentos. Nova Iguau.
Tabela 2.14 Profisso do pai de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de nascimentos.
Municpio de Nova Iguau.
Total
Artista 4
Cozinheiro 1
Empregado 1
Empregado ou funcionrio pblico 18
Estrada de ferro Rio do Ouro 1
Guarda Armazm Estrada de Ferro 2
Jornaleiro 7
Lavrador 99
Militar 2
No declarada 141
Negociante 1
Operrio 14
Padeiro 1
Pedreiro 2
Sapateiro 1
Trabalhador 1
Total geral 296
legtimas, a figura dos avs paternos e maternos est bem abaixo dos encontrados em Paraba
do Sul. Aqui, optou-se por colocar todos os avs nomeados, uma vez que as referncias sobre
a condio de vivo ou falecido ficam raras nos registros. Aps 1889, Rios apontou que a
figura do av materna tende a ser nomeada de forma mais intensa em Paraba do Sul. Em seus
cxi
dados eram, no total, 66% avs paternos, 80% de avs paternas, 65% de avs maternos e 96%
169
das avs maternas, nos quais 48% das crianas tiveram todos os seus avs nomeados. De
forma bem diferente, no Municpio de Nova Iguau, at o ano de 1919, foram nomeados 43%
dos avs paternos, 50,5% de avs paternas, 55% de avs maternos e 89% de avs Maternas
(tabela 2.15). Desse total, 34% das crianas conheceram ou, pelo menos, ouviram falar de
todos os seus avs, no entanto, 38% apenas um av. Deveras, nos dois casos, Paraba do Sul e
de Nova Iguau, a figura das avs eram bem presentes nas famlias de pretos e pardos,
Tabela 2.15 - Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas. Municpio de
Nova Iguau.
Porcentagem Total
Av Paterno 43% 328
Av Paterna 50,5% 386
Av Materno 55% 418
Av Materna 89% 682
Todos os avs 34% 256
Nenhum av 7% 56
Pelo menos um av 38% 293
Total de Registros 764
incentivado uma procura maior pelo registro civil. Dentre as 764 crianas pretas e pardas
nascidas entre 1889 e 1919, apenas 166 (21%) foram registradas pelos pais (tabela 2.16).
Alm dos avs, que registraram 3 crianas, 595 tiveram como declarantes outras pessoas.
Provavelmente, nesse grupo estavam includos: os irmos, tios, despachantes e outras pessoas
como naturais, nas quais somente os nomes da me e dos avs maternos aparecem. Essas
169
RIOS, A. op. cit., p. 109.
cxii
Tabela 2.16 Declarantes nos registros civis de nascimentos por cor. Municpio de Nova Iguau.
registradas como pretas e pardas. Ao estudar a situao das famlias negras, Raymond Smith,
de semelhante modo, detectou uma ausncia de homens no Caribe. Para ele, tal fato derivava
dos valores das comunidades negras com relao aos papis assumidos por mulheres e
forma, Rios apontou em sua dissertao que a famlia nuclear incompleta, entre os negros
Paraba do Sul, a famlia nuclear completa e extensa existiu entre pretos e pardos. Se no Vale
170
SMITH, Raymond T. The Family and the Modern World System: Some Observation From The Caribbean.
In: Journal of Family History, 3: 4, 1978 apud RIOS, A. op. cit., 1990, p. 112 113.
cxiii
171
XIX, o mesmo no pde ser dito sobre a Baixada. Indubitavelmente, o caso do Vale do
final do sculo XIX, na Baixada, que discutam: as quantidades de cativos por propriedade, a
outras. No entanto, lcito supor que a falta de uma comunidade estvel nos ltimos anos da
escravido, pode demonstrar a existncia de poucos cativos e pretos livres homens, o que,
Os dados apontam que a maior parte dos homens que registraram seus filhos, entre os
anos de 1894 e 1919, era de fora da Baixada. Dentre os 275 registros, que mostram a
naturalidade do pai, somente 51 casos (18%) so do Municpio de Nova Iguau (tabela 2.17).
Dessa forma, 184 (66%) dos pais vieram de fora do Municpio, destes, 159 (57%) de dentro
do Estado do Rio de Janeiro, 18 (7%) de outros estados do Brasil e 2 (1%) de outros pases.
Tabela 2.17 Naturalidade do pai nos registros civis de nascimentos por cor. Municpio de Nova Iguau.
171
Os nmeros encontram-se no captulo 1 da presente dissertao.
cxiv
mo-de-obra. Desse modo, no ano de 1919, dentre os 366 registros onde o pai foi nomeado,
321 (87%) eram de fora do Municpio de Nova Iguau (tabela 2.18). Inseridos neste nmero,
o pai de crianas pretas e pardas, estava presente em 156 registros, dos quais 141 (90%) eram
de fora da Baixada.
Tabela 2.18 Regio de origem do pai por ano de pessoas declaradas como pardas e pretas. Municpio de Nova
Iguau.
Como j visto, na parte 2 deste captulo, este o perodo da migrao para a Baixada
maior parte, para o Municpio de Nova Iguau, visto que no recenseamento havia 17.707
(53%) homens e 15.689 (47%) mulheres (tabela 2.4). Sem embargo, provavelmente, nessa
dcada houve incio a grande migrao. Atravs dos registros civis de nascimentos, entre os
1920-1940
Entre os anos de 1920 e 1940, atravs dos censos, aparentemente, foi possvel
Nova Iguau. Atravs dos dados obtidos, no registro civil de nascimento dessa regio, nesta
parte busca-se apresentar as caractersticas da populao que migrou, nesse perodo. Trata-se
de tentar identificar qual o perfil das famlias, os locais de origem e quais foram os tipos de
trabalho que essa populao encontrou aps 1920. Em um segundo momento, ser analisado
esperar que a procura pelos registros civis seja, de forma semelhante, alta (grfico 2.2).
Colhendo os dados em Nova Iguau, nos anos de 1924, 1929, 1934 e 1939, soma-se um total
Apesar de haver uma boa quantidade de crianas brancas nesses quatro anos, o que
mais surpreendeu foi o crescimento dos registros de crianas pardas e pretas, ao longo dos
anos selecionados (tabela 2.5). No total dos registros, tais crianas eram 1.867 (45%). Ao
separar por ano, v-se que, em 1924, elas somavam 274 (43%); na mesma proporo, em
1929, foram 342 (42%) registros; em 1934, tal nmero passou para 435 (40%), para, em 1939,
No que tange situao conjugal dos pais, percebe-se que, no perodo de 1924 a 1929,
h uma presena maior dos casados (tabela 2.19). Dentre os 1.867 registros de crianas pretas
e pardas, h 1.107 (59%) pais que declararam serem casados, e as crianas de pais solteiros
Tabela 2.19 - Situao conjugal dos pais por cor de crianas registradas. Municpio de Nova Iguau.
Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau. 1924,
1929, 1934 e 1939.
da legitimidade das crianas tambm fosse procurado por essa populao. Em comparao aos
primeiros anos do registro civil, nos quais havia mais registros de crianas naturais, nos
anos aqui analisados o nmero de crianas legitimadas muito maior. Entre as crianas pretas
e pardas, nesse perodo, foram encontrados 1.172 (63%) registros de crianas legtimas (tabela
2.20).
Tabela 2.20 Total e porcentagem da legitimidade de pessoas registradas como pretas e pardas. Municpio de
Nova Iguau.
Porcentagem Total
Ilegtimo 0,70% 13
Legtimo 63% 1172
No informado 1% 35
Natural 35% 647
Total geral 1867
que foram nomeados nos registros, visto que no possvel detalhar, devido escassez de
informaes, por exemplo, se eram vivos ou no no dia do registro, entre outras (tabela 2.21).
Ao longo dos quatros anos, selecionados para a pesquisa, foram nomeados 79,5% dos avs
paternos, 81% das avs paternas, 89% dos avs maternos e 95% das avs maternas. Apesar da
figura da av materna ainda ser a mais popular, possvel perceber que a maioria das crianas
cxvii
pretas e pardas tambm conheceu seus avs paternos. Ao contrrio do corte anterior, de 1889
a 1919, nos sete anos selecionados, nessa parte, 79,5% todos os avs foram denominados e
Tabela 2.21 Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas. Municpio de
Nova Iguau.
Porcentagem Total
Av Paterno 79,5 % 1484
Av Paterna 81 % 1509
Av Materno 89 % 1669
Av Materna 95 % 1772
Todos os avs 79,5 % 1484
Nenhum dos avs 5% 95
Apenas um av 5,5 % 103
Total 1867
No Municpio de Nova Iguau, entre os anos de 1920 e 1940, o nmero de casados maior do
significativamente. Se, no perodo entre 1889 e 1920, Rios encontrou famlias nucleares
completas e extensas, possivelmente estveis, entre as crianas pretas e pardas, os dados desta
dissertao sugerem que somente no perodo aps 1920, no Municpio de Nova Iguau, foi
Conforme o que fora mencionado, foi possvel identificar muito mais informaes
sobre o pai que registrou seus filhos como pretos e pardos. Nos 1.867 registros deste grupo de
crescimento da sua participao ao longo dos anos. Em 1924, 151 crianas tiveram o pai
como declarante; em 1929, aumentou para 215; em 1934, chegou a 300, e, em 1939,
172
RIOS, A. op. cit. captulo 4.
cxviii
percebe-se que, a maior parte veio de fora da Baixada (tabela 2.22). Em 1924, dos 274
registros, em 190 (70%) o pai no natural da Baixada Fluminense. Desse, 53% veio de
pai sendo natural do Municpio de Nova Iguau. Infelizmente, ao contrrio dos anos
tornou-se viciada. A partir de 1934, a maior parte dos registros s apontam se os pais so
brasileiros ou no. Entretanto, nos registros realizados na fase adulta, onde h auto-
Tabela 2.22 - Naturalidade do pai nos registros civis de nascimentos por cor. Municpio de Nova Iguau.
Entre os pais que migraram para o Municpio de Nova Iguau, nesse perodo, muitos
j vieram casados. Este foi o caso de S. S. R., lavrador que, no dia 13 de abril de 1939,
173
Estes registros so tema do captulo 3.
cxix
[...] residente em Tingu, neste, distrito declarou que [...] em casa de sua moradia nasceu uma
criana do sexo masculino, cor parda, que ter o nome de E. S. R. filho legitimo dele declarante e de
sua mulher M. F. S., brasileira, domstica, casados em Vassouras [grifo meu]. 174
Assim como este, outros declarantes j haviam procurado legitimar nos cartrios sua famlia
J. M. natural deste Estado, casado civilmente no Distrito de Mendes [grifo meu], neste Estado,
militar, residente em Mesquita, neste distrito e declarou que [...] em casa de sua moradia nasceu uma
175
criana do sexo masculino de cor parda que ter o nome de M. M. [...].
Se j migraram casados, seus filhos tambm poderiam ter nascido ainda fora da
T. S., brasileiro, operrio, residente em Mesquita, nos termos do Decreto Federal numero 19.710
de 18 de fevereiro de 1931 declarou que [...] em Pira, neste Estado, nasceu uma criana do sexo
176
masculina de cor parda [...].
Nos registros civis, entre os anos de 1924 e 1939, foram, ao total, registradas 176 crianas
nascidas fora do municpio. Desse total, 106 nasceram no Vale do Paraba, ou seja, 60% das
Como fora dito na parte 2 deste captulo, entre 1920 e 1940, houve crescimento
maior diversificao dos tipos de trabalho, o que permitiu ao pai migrado, das crianas pretas
e pardas, se estabilizarem na regio. Deveras, ele estava no trabalho com lavoura, uma vez
que dos 1.206 registros que aparecem a profisso do pai, 498 (41%) so de lavradores (tabela
A.2 - anexo).
174
Livro 59, registro 14140, de 1939, RCPNNI.
175
Livro 35, registro 242, de 1929, RCPNNI.
176
Livro 58, registro 14039, de 1939, RCPNNI.
cxx
formas de trabalho. Apesar do perodo, entre 1920 e 1940, ser considerado o de maior
onde aparece a profisso do pai de crianas pretas e pardas, 58% no trabalhava na lavoura ou
em qualquer profisso ligada agricultura. Se, entre 1889 e 1919, nos registros civis, os pais
estavam divididos em apenas 21 categorias, no perodo seguinte pula, para 53, mostrando uma
grande diversificao nos arranjos de trabalho nessa regio. Deste modo, o pai de crianas
pretas e pardas estava presente nos seguintes ofcios: operrios 245 (20%), empregados
percebe-se que a concentrao dessas famlias se deu ao redor dos grandes centros produtores
de laranja. Das 1.867 crianas pretas e pardas registradas no cartrio de Nova Iguau, apenas
522 (28%) nasceram na sede do municpio, enquanto 1.132 (61%) foram registrados como
para diversas reas da colnia. Para este autor, essa migrao teve uma caracterstica bem
especfica. A procura por terra foi um dos significados de liberdade empreendidos por essa
populao, aps o fim da escravido. Era de se esperar que buscassem qualquer propriedade
para dela retirar a sua subsistncia. Todavia, na Jamaica, os libertos e seus descendentes
optavam por comprar terras prximas aos grandes centros produtores de acar e no
cxxi
propriedades distantes e improdutivas. Sendo assim, almejaram locais onde podiam aliar a
pequena produo direcionada para os pequenos locais e para a subsistncia, com trabalho
Tabela 2.23 Regio do nascimento nos registros civis de nascimentos por cor. Municpio de Nova Iguau.
Retornando ao caso da Baixada, nessa ltima parte do captulo, pde-se perceber que o
pai de crianas pretas e pardas conseguiu, de alguma maneira, estabilidade. Deveras, ainda h
necessidade de estudos sobre a forma de acesso a essas propriedades. No entanto, atravs dos
dados obtidos nos registros civis de nascimentos, parece acertado que este se estabilizou ao
migrados pretos e pardos buscaram legitimar suas famlias e regularizar sua situao. Desse
modo, nos anos selecionados, de 1934 e 1939, foi surpreendente ver a quantidade de pessoas
se auto-declarando, seguidos pelos registros de nascimentos dos filhos. Tanto que, na soma de
o de brancos. Para entender, um pouco melhor, quem eram os migrados e o que permitiu seu
maior acesso ao registro civil de nascimento deve-se analisar, qualitativamente, tais registros
Municpio de Nova Iguau, entre os anos de 1920 e 1940. Trata-se de identificar, atravs
dessas fontes, quais as caractersticas dos grupos que buscaram o registro civil, nesse perodo.
Ao longo dos anos, as leis que versavam sobre o registro civil foram se modificando.
Possivelmente, a inteno do governo era a de popularizar a busca pelo registro civil, visto
que produzir estatsticas, a partir dos dados obtidos nos cartrios, era muito mais barato do
que promover novos censos. Dessa forma, nenhum outro perodo, aparentemente, ampliou
Nova Iguau, entre 1920 e 1940. Pode-se identificar o primeiro tipo como o das crianas
registradas no ano de seu nascimento, no tempo correto da Lei. Estes assentos foram
feitos tardiamente, ou seja, em outro ano que no o do nascimento da criana. Nestes podem
177
ser encontrados o bebs com um dia de vida, crianas, jovens e adultos que foram
registradas por alguma pessoa pai, me, avs ou outra pessoa. No terceiro tipo de registro,
esto todos aqueles que recorreram ao cartrio para registrar o seu nascimento. Neste caso,
ltimo ano de registros coletado, comparando-o com o censo de 1940. Nesta primeira parte,
os trs tipos de registros no sero divididos para a anlise. Na segunda parte sero analisados
todos os registros tardios. Para uma melhor compreenso optou-se por subdividir esta segunda
177
Optou-se por colocar, nessa categoria, todos os registros onde so mencionados as Leis e os Decretos que
permitiram a populao registrarem, aps o ano de nascimento de seus filhos, sem nus monetrio. Dessa forma,
uma criana nascida no dia 31 de dezembro, provavelmente, se fosse registrada no dia 2 de janeiro poderia
utilizar essas Leis e Decretos.
cxxiv
parte em dois subitens: no primeiro, sero discutidos os registros feitos posteriores ao ano de
nascimento, declarados por uma outra pessoa que no o registrado. Trata-se de destacar, entre
os registrados como pretos e pardos, o perfil das famlias, quais foram as regies de
grupo: se possuem famlia, onde nasceram, qual o tipo de trabalho que exercem, qual o local
Na terceira e ltima parte, a partir de uma discusso bibliogrfica e dos registros civis
novas leis e decretos para o aumento da busca pelo registro civil de nascimentos, entre os
1930 e 1939.
adultos que foram declarados ou se declararam pretos e pardos no ano de 1939. Trata-se, na
de Nova Iguau. Atravs desses dados, pretende-se apresentar os traos que permitem
Nesse ltimo ano coletado foram registrados 2.100 nascimentos. Destes, 1.130 (54%)
foram de crianas, jovens e adultos registrados como pretos e pardos. No mencionado ano, as
informaes so muito mais completas do que nos anos anteriores; e, com isso, possvel
cxxv
obter resultados mais significativos no que tange populao de pretos e pardos no Municpio
de Nova Iguau.
conjugal dos pais, que registraram seus filhos, com os pais dos auto-declarantes, tm-se um
quadro interessante (tabela 3.1). Em 454 (40%) dos registros de pardos e pretos, o pai aparece
na tabela 3.2, o quadro torna-se diferenciado. Em 728 (64%) casos, os registrados foram
Tabela 3.1 - Situao conjugal por cor nos registros civis de nascimentos. Nova Iguau.
Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau, 1939.
Tabela 3.2 - Legitimidade nos registros civis de nascimentos registradas por cor. Municpio de Nova Iguau.
interessante sobre tais registros, no ano de 1939. Em primeiro lugar, dentre os 2.100 registros
desse ano, 492 (23%) so de auto-declarantes. Ao analisar a cor, percebe-se que, entre o
cxxvi
nmero total de pessoas deste tipo de registro, os que se declararam pretos e pardos somam
Ao tomar os outros registros, nota-se que o pai registrou uma boa parcela das crianas,
dos jovens e dos adultos pretos e pardos, ou seja, ele foi o declarante em 540 (48%) registros
(tabela 3.3). Apesar de o nmero ser relativamente pequeno, mister salientar a presena das
mes como declarantes em 198 (17,5%). Dentre os 1.130 registros, em apenas 77 (7%), outra
pessoa, que no do ncleo familiar, a saber, pai, me e avs, fez a declarao do registro. Em
1939, houve uma busca intensa, por essa parcela da populao, em legitimar a si e a seus
familiares. 178
Tabela 3.3 - Declarantes nos registros civis de nascimentos por cor. Municpio de Nova Iguau.
Para entender um pouco melhor o papel do pai nomeado nos registros, deve-se
trabalho existentes em 1939. Na tabela 3.4 (em anexo), ao analisar a profisso por cor,
possvel perceber que, para o pai de pessoas registradas como brancas houve uma maior
dentre as 63 categorias de trabalhos encontradas nos registros, o pai dos declarados, nos
registros, como pretos e pardos est empregado em 26. Em tais registros, boa parte est
178
Os auto-declarantes sero analisados na segunda parte deste captulo.
cxxvii
pblico.
como pardas e pretas, um quadro interessante apresentado (tabela 3.5). Dentre os 454
registros de pai casado, 124 (27%) eram de lavradores, 88 (19%) eram de operrios e, no
estveis no Municpio de Nova Iguau, em 1939. Todavia, em 96 casos o pai foi nomeado e
declarado solteiro o que provavelmente demonstra que a busca pelo registro no foi apenas de
Iguau. Ao olhar para a localizao profissional das mes, de pessoas registradas como pretas
e pardas, v-se que 672 (59%) foram declaradas como tendo profisso domstica. (tabela
3.6). Cruzando a situao conjugal com a profisso, nota-se que, entre casadas e solteiras,
quase todas as mes registradas esto localizadas nos afazeres domsticos (tabela 3.7).
quantidade de mes solteiras, nomeadas nos registros, pode evidenciar que a busca pelo
registro civil no se restringiu apenas a famlias nucleares completas. De certa maneira, o ato
declarantes e solteiras, os avs maternos aparentam ser o eixo central desse tipo de famlia.
cxxviii
Tabela 3.5 - Profisso do pai de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de nascimentos por
situao conjugal. Municpio de Nova Iguau.
Tabela 3.6 - Profisso da me nos registros civis de nascimentos por cor. Municpio de Nova Iguau.
Tabela 3.7 Profisso da me de pessoas registradas como pretas e pardas por situao conjugal. Municpio de
Nova Iguau.
Entre os registros de pardos e pretos no ano de 1939, a presena dos avs foi
significativa. Isso possvel perceber na tabela 3.8. Em 73% dos casos as pessoas registradas
conheceram, ou pelo menos ouviram falar, todos os seus avs e apenas 13% no sabiam
sequer cit-los. O av paterno est presente em 73% dos registros, assim como a av paterna,
a qual tambm est em 73%. Efetivamente, mesmo o nmero sendo igual, no correto
afirmar que, em todos os 73% dos registros, os avs paternos esto presentes, ou seja, podem
nos registros foi a dos avs maternos, uma vez que, foram nomeados 82% dos avs, enquanto
na formao de famlias que no so nucleares (tabela 3.9). Dentre os 275 registros, onde
aparecem s mes solteiras, 52% das pessoas registradas conheceram todos os seus avs e
apenas 3% no saberiam sequer nomear nem um. O av paterno foi citado em 52% registros,
assim como a av paterna que est presente tambm em 52%. A figura dos avs maternos
muito significativa entre as mes solteiras, visto que o av materno foi nomeado em 90,5% e
tiveram contato ou no com seus avs, uma vez que boa parte desta populao migrou para a
Baixada entre as dcadas de 1920 e 1930. Entretanto, a partir dos presentes dados, se o ato de
registrar requer uma estabilidade, mesmo que precria, na regio, vlido supor que os pais
cxxx
mesmo no ncleo me/av materna/av materno e, desse modo, buscaram o registro civil de
nascimentos.
Tabela 3.8 - Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas. Municpio de
Nova Iguau.
Porcentagem Total
Av Paterno 73% 822
Av Paterna 73% 824
Av Materno 82% 929
Av Materna 87% 984
Todos os avs 73% 822
Nenhum dos avs 13% 145
Apenas um av 5% 54
Total de registros 1130
Tabela 3.9 Presena de avs paternos e maternos de mes solteiras nos registros civis de nascimentos onde as
pessoas foram registradas como pretas e pardas. Municpio de Nova Iguau.
Porcentagem Total
Av Paterno 52% 143
Av Paterna 52% 143
Av Materno 90,5% 249
Av Materna 96% 265
Todos os avs 52% 143
Nenhum dos Avs 3% 9
Pelo menos um av 5% 15
Total 275
3.10). Nesses, a categoria da naturalidade dos pais aparece em quase todos os registros, porm
e infelizmente, no ano de 1939, tal categoria apenas aponta se os pais so brasileiros ou no.
Decerto, ao atentar para os locais de nascimento das pessoas registradas, possvel se ter uma
registros onde o nascimento ocorreu fora da Baixada, 500 (44%). Desse total, 220 registros
Tabela 3.10 - Regio do nascimento nos registros civis de nascimentos por cor. Municpio de Nova Iguau.
significativo. De acordo com tal censo, havia, no municpio todo, 140.606 pessoas; destas,
8.962 (6%) estavam ligadas a atividades de agricultura, enquanto 11.928 (8%) trabalhavam
agricultura deixou de ser a atividade principal. Isso pode ser visto no municpio como um
179
Deveras, somente ao dividir os trs registros os registros de crianas nascidas e registradas no ano de 1939,
os registrados posteriores ao ano de nascimento e os auto-declarantes - que se poder construir a trajetria de
cada grupo no ano de 1939. Isto ser feito de forma mais elaborada no seguir do texto. Entretanto, a preocupao
nesta parte de demonstrar a estabilizao dos libertos e de seus descendentes atravs dos registros civis no ano
de 1939.
cxxxii
todo, uma vez que 39% das pessoas recenseadas se concentravam no quadro urbano, outros
Tabela 3.11 Localizao populacional por Distrito de acordo com o censo de 1940. Municpio de Nova
Iguau.
Nova Iguau 140606 100% 55186 39% 55493 39% 29927 21%
Ao dividir tais propores nos distritos do municpio, possvel perceber a forma, pela
qual a populao estava distribuda pelo Municpio. Se as pessoas estavam, em sua totalidade,
na rea urbana, ao olhar para cada distrito, separadamente, pode-se perceber que esse
processo de urbanizao foi muito mais presente em alguns bairros. Na rea correspondente
ao distrito sede de Nova Iguau estava 25% da populao total do municpio. Destes, 41%
entre a estabilizao de pessoas no centro urbano e na rea rural do distrito. Contudo, nos
total do municpio; destes, 25% e 72% estavam concentrados nos quadros urbanos e
180
Deve-se, aqui, fazer uma ressalva quanto s categorias utilizadas nestes dois pargrafos. No censo de 1940,
aparecem apenas estas categorias: quadro urbano, quadro suburbano e rural. As categorias urbano e suburbano
foram utilizados, nesse censo, para a populao aglomerada em centros dotados de um mnimo de servios
coletivos, cujos habitantes se dediquem, em maioria, a atividades alheias vida rural. p. xiv, IBGE, censo
demogrfico de 1940.
cxxxiii
concentrava 16% da populao e desse total, 66% estava no quadro urbano, no entanto, no
No que tange s regies do nascimento das crianas pretas e pardas, era de se esperar
que tal populao se concentrasse nas reas urbanas. Na tabela 3.10, dentre os 726 registros
de crianas pretas e pardas, somente 249 (34%) foram declarados como nascidas no distrito
sede de Nova Iguau. Houve uma presena marcante desse grupo nos distritos ao redor da
registrou-se 138. Somando estes nmeros aos dos registros de crianas nascidas fora do centro
de Nova Iguau, chega-se ao total de 66%. Seria lcito dizer que, dentre os registros coletados,
em 1939, os pretos e pardos esto estabilizados nos arredores do distrito sede, locais, estes,
Aparentemente, esse ano foi estratgico, no que concerne s definies dos libertos e
de seus descendentes, que migraram para essa regio. Se, nos anos anteriores, a migrao foi
parte integrante das experincias de ps-abolio, no ano de 1939, a estabilizao das famlias
como: o avano urbano, o acesso terra, graas aos loteamentos, e os novos arranjos de
trabalho.
mesmo que tardiamente (tabela 3.12). Dentre os 2.100 registros, no ano de 1939, 1.205 (57%)
se, em dois tipos, os registros tardios de crianas, jovens e adultos, que foram declarados por
alguma pessoa e os auto-declarantes. Para se ter uma maior amplitude do que significou os
ltimos anos do registro civil de nascimento, para essa populao de pretos e pardos que teve
cxxxiv
cuidadosamente.
Tabela 3.12 Porcentagem e Total de registros civis de nascimentos tardios por ano. Municpio de Nova
Iguau.
Porcentagem Total
1919 0,20% 4
1924 0,80% 15
1929 3,40% 63
1934 30% 545
1939 66% 1205
Total geral 1832
Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau, 1919,
1924, 1929, 1934, 1939.
Nova Iguau, os quais no foram feitos no ano de nascimento do registrado. Este registro
tardio pode ser dividido em duas categorias: na primeira, esto bebs de um dia de vida,
crianas, jovens e adultos que foram registrados por algum, na maioria das vezes, pais e
declaram seu nascimento, no cartrio. Sendo assim, a anlise ser dividida em trs momentos.
registros tardios de crianas, jovens e adultos registrados pelos pais, mes, entre outros. Por
***
cxxxv
Ao longo dos anos, principalmente entre as dcadas de 1930 e 1940, houve uma
presena sistemtica dos registros tardios no 1 Ofcio de Registro Civil de Pessoas Naturais
do Municpio de Nova Iguau (tabela 3.12). Ao total, foram 1.832 registros declarados nesta
Este nmero tambm surpreende ao ser dividido pelos anos. De todos os anos
coletados, somente aps 1919 os registros tardios comearam a aparecer. Na tabela 3.12, j
registros; em 1924, esse nmero aumenta para 15 (0,80%); em 1929, sobe para 63 (3,4%), e,
em 1934, chega a 545 (30%) registros. No ano de 1939, estavam concentrados em 1.205
provavelmente, permitiam a uma parcela da populao acesso a eles, anos aps o nascimento
de seus filhos. Durante os primeiros anos de exerccio do Registro Civil, no Brasil, qualquer
registro de nascimento de crianas, aps o perodo dado por Lei, seria cobrado uma multa de
10 mil ris. Efetivamente, mesmo no sendo um valor alto, para a poca, no era qualquer
pessoa que desembolsaria esse valor para registrar seu filho. Entre os dados coletados, em
apenas 15 casos houve registros mediante pagamento de multa. Somado a este fato,
fazer campanhas para divulgar a sua importncia. Em virtude desses fatos, parece acertado
afirmar que o subregistro foi altssimo nos mencionados primeiros anos de registros tardios.
de leis que, priori, incentivaram sua prtica. As primeiras leis, neste sentido, foram as Leis
sua efetivao. A segunda, apenas prorrogou o prazo para o registro sem multa. Na realidade,
cxxxvi
mesmo aps esses primeiros incentivos, nos registros coletados, em Nova Iguau, no h
qualquer registro tardio, no ano de 1914 e 1919, que mencione tais leis.
Todavia, somente aps 1919 foi que as leis, provavelmente, tomaram fora e/ou
incentivaram as pessoas a registrar seus familiares. Nos presentes dados, dentre os 4 registros
tardios desse ano, em 3 h pagamento de multa e, apenas em um, mencionada a Lei 3.764 de
despachos do juiz togado e duas testemunhas, as quais deveriam assinar o requerimento. Era
de se esperar que, nos anos seguintes, fosse possvel ver essa lei novamente sendo utilizada
pelas pessoas que requeriam o registro. No obstante, nos anos de 1924 e 1929, s h meno
Efetivamente, essas primeiras leis de incentivo aos registros parecem no ter atingido
Iguau. Porm, a partir de 1931, as leis e os decretos seguintes levaram aos registros civis um
de qualquer justificativa para o registro tardio. Nos anos de 1934 e 1939, foram coletados 540
registros que mencionavam esse decreto. No entanto, nada parece ter incentivado mais a
procura pelo registro civil do que o Decreto 1.116 de 24 de fevereiro de 1939. Somente no
ano do funcionamento dessa lei foram feitos 1.187 registros tardios. 181
que, entre os grupos existentes no Municpio de Nova Iguau, todos buscariam o registro
tardio de nascimento (tabela 3.13). Dentre os 1.832 registros tardios, as pessoas registradas
como pretas e pardas esto presentes em 1.001 (55%) registros. princpio, tais leis parecem
ter incentivado um grupo especfico na busca pela legitimao prpria e de seus familiares.
181
A anlise da importncia, destes decretos e leis, para aumentar a acessibilidade da populao, no registro civil
de nascimento, est na terceira parte deste captulo.
cxxxvii
Tabela 3.13 - Total de registros civis de nascimentos tardios por cor e ano. Municpio de Nova Iguau.
Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau, 1919,
1924, 1929, 1934, 1939.
Para se ter uma melhor visualizao das caractersticas entre os registros de pretos e
adultos que foram registrados por pais, mes, avs ou outras pessoas nos anos posteriores
ao seu nascimento. Trata-se de analisar as famlias de pretos e pardos que buscaram o registro
civil, utilizando as leis e os decretos de incentivo, nos ltimos anos coletados de 1934 e 1939,
parte 1.3. Em virtude disso, foi produzido um novo banco de dados, o qual incorporou as
seguintes categorias: a idade que a pessoa foi registrada, o local de residncia, a regio da
residncia do registrado, o ano de nascimento, e o tipo de registro - se foi por multa, decreto,
por outrem e dos auto-declarantes, chega-se a uma concluso interessante: os dois tipos de
registros somados chegam a 1.832, dentre os quais 965 (53%) so de crianas, jovens e
adultos registrados por outrem. O acesso ao registro, entre os anos de 1919 a 1939,
cxxxviii
aparentemente, foi de igual proporo para ambas as parcelas da populao. Na tabela 3.14,
v-se que a quantidade de registros por cor de quase 50% (488) para pretos e pardos e 50%
(474) para brancos. Todavia, ainda assim, possvel constatar a grande presena de pessoas
Tabela 3.14 - Total de registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem
por cor e ano. Municpio de Nova Iguau.
Entre os anos de 1919 e 1939, como se pde observar, a populao de pretos e pardos
buscou ainda mais o registro civil. Ao analisar essa parcela da populao, percebe-se que boa
parte dela, que buscou legitimar seus filhos, eram em sua maioria de casados. Na tabela 3.15,
pai e me casados superior, porm, a quantidade de solteiros chama a ateno. A partir desse
detalhe, lcito supor que as famlias, que buscaram os registros tardios, no eram somente
Tabela 3.15 - Situao conjugal por cor nos registros civis de nascimentos de nascimentos tardios de crianas,
jovens e adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau.
situao conjugal se apresenta. Na tabela 3.16, no que concerne presena do pai, sendo
nomeado e declarante, ele est em 284 (58%) dos registros. No entanto, entre as crianas
declaradas como provindas de uma relao legtima somam-se 295 (60%), dos registros
(tabela 3.17). A quantidade de registros, nos quais o pai nomeado e o nmero de relaes
legtimas declaradas pode indicar que a maior parte das pessoas, que procuraram tardiamente
Iguau.
que tange a busca pelos registros civis de nascimentos. Em 165 (33%) registros tardios de
pessoas pretas e pardas, a me procurou registrar sua prole. Ao atentar para a quantidade de
pessoas registradas como sendo filhos de pai e me solteiros, tal nmero cresceu para 188
(38,5%). Embora seja, um nmero menor em relao ao pai como declarante, nos registros
Tabela 3.16 - Declarantes nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por
outrem por cor. Municpio de Nova Iguau.
Tabela 3.17 - Legitimidade nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados
por outrem por cor. Municpio de Nova Iguau.
registrou seus filhos tardiamente percebe-se a diversificao dos arranjos de trabalho (tabela
3.18 - anexo). Dentre os 488 registros, os quais so de pai das pessoas registradas como pretos
e pardos, a profisso s aparece em apenas 217 registros. Destes, a maior parcela, 86 (40%)
est ligada ao trabalho com lavoura. Para alm deste tipo de trabalho, o pai de tais pessoas
estava alocado em outras profisses ligadas ao avano urbano, 59 (27%) eram operrios,
prprio.
pardas, com as profisses, percebe-se que os casados esto presentes em 76% dessas
categorias (tabela 3.19). Apesar da maior quantidade dos solteiros no informarem sua
pretendiam ser estveis, visto que a busca pelo registro pressupe a existncia de certa
Tabela 3.19 - Profisso do pai de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de nascimentos
tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau.
quanto alta, so 109 (22%); ora, isso faz com que restem apenas 379 para serem analisados
(tabela 3.21). Dentre os 379 casos de pessoas registradas como pretas e pardas as mes so
apontadas, em 377 (99%), como ligadas ao trabalho domstico (tabela 3.20). Ao examinar a
situao conjugal das mes, as quais exercem a profisso domstica, as casadas so 198
(52%) enquanto as solteiras somam 149 (39%). A presena marcante de mes neste tipo de
trabalho sendo casadas ou no, pode informar a existncia de famlias que no so apenas
nucleares.
As mes solteiras esto presentes em boa parte da documentao. Dentre os 488 casos
de pessoas registradas como pretas e pardas, as mes solteiras esto em 183 (37,5%). Destes,
em 101 registros elas foram as declarantes. Aparentemente, por enquanto, lcito supor que as
cxlii
mes solteiras podem ter morado sozinhas, ou com seus pais, e provavelmente, participaram
Tabela 3.20 - Profisso da me por cor nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos
declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau.
Tabela 3.21 - Profisso da me de pessoas registradas como pretas e pardas por situao conjugal nos registros
civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau.
Nos registros tardios de pretos e pardos, a presena dos avs tambm expressiva.
sua nomeao muito significativa. Dentre os 488 registros selecionados em 359 (74%),
todos os avs estavam presentes (tabela 3.22). Em contrapartida, 26 (5%) dos registros so de
pessoas que s tiveram contato com apenas um av. E, somente em apenas 14 (3%) casos, no
poderia sequer nomear um deles. Ao dividir entre avs paternos e maternos, percebe-se que os
nos registros. O av materno est presente 446 (91%) dos registros, enquanto a av materna,
cxliii
como figura central na formao das famlias negras no Municpio de Nova Iguau.
figura central das pessoas registradas como pretas e pardas (tabela 3.23). Dentre os 183
presena dos avs maternos bem forte nos registros de mes solteiras. O av materno foi
avs maternos das pessoas registradas j eram estveis na regio. Portanto, provavelmente,
famlias que eram e/ou se pretendiam estveis, independente de sua tipologia, buscaram muito
Tabela 3.22 Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros
civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau.
Porcentagem Total
Av Paterno 74% 359
Av Paterna 75% 365
Av Materno 91% 446
Av Materna 97% 473
Todos os avs 74% 359
Nenhum dos avs 3% 14
Apenas um av 5% 26
Total de registros 488
Tabela 3.23 Presena de avs paternos e maternos de mes solteiras nos registros civis de nascimentos tardios
de crianas, jovens e adultos declarados por outrem, nos quais as pessoas foram registradas como pretas e
pardas. Municpio de Nova Iguau.
Porcentagem Total
Av Paterno 39% 72
Av Paterna 41,5% 76
Av Materno 92% 169
Av Materna 99% 181
Todos os avs 39% 72
Nenhum dos avs 1% 2
Apenas um av 6% 11
Total de registros 183
pretas e pardas, assemelham-se em boa parte ao do captulo 2. Isso significa dizer que no ato
Iguau. Desse modo, a anlise que segue evidencia caractersticas especficas dos grupos que
no que tange migrao e a estabilizao das pessoas registradas como pretas e pardas. Em
tais registros encontram-se categorias muito interessantes que colaboram para a anlise dos
Nova Iguau, entre a dcada de 20 e 30, do sculo XX. Essas categorias so: ano de
registro civil tardiamente, aparentemente, est ligada idade do registrado. Na figura 3.1,
foram colocados os 718 registros tardios, por ano de nascimento da pessoa, encontrados no
ano de 1939. Tal ano foi escolhido por ter concentrado a maior parte de registro de crianas,
cxlv
processos muito interessantes. Dentre as pessoas nascidas, entre 1917 e 1922, e registradas no
nmero menor, a presena de pessoas pretas e pardas significativa. O interessante foi notar
que a quantidade de pessoas registradas como pretas e pardas, nascidas aps 1924, foi acima
dos brancos at 1938. Portanto, a maior parte das pessoas registradas, no ano de 1939, era de
Figura 3.1 Ano dos nascimentos por nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos
declarados por outrem declarados em 1939. Municpio de Nova Iguau.
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
1911 1917 1918 1919 1920 1921 1922 1923 1924 1925 1926 1927 1928 1929 1930 1931 1932 1933 1934 1935 1936 1937 1938
Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau, 1939.
pardos na Baixada que foram registrados tardiamente. Como j visto na tabela 3.14, a maior
parte de todos os registros foram feitos no ano de 1939. Ao analisar a faixa etria por sexo,
182
Nos registros tardios declarados por outrem, no caso limite, trabalha-se com bebs que possivelmente podem
ter nascido no dia 31 de Dezembro e sido registrado no dia 2 de Janeiro. Logo, usa-se o ano zero para simbolizar
esses casos limites.
cxlvi
das pessoas registradas como pretas e pardas, um quadro interessante apresentado (figura
3.2). Em 1939, a maior parte dos registros foi de crianas entre 0 e 5 anos e, aparentemente,
houve um equilbrio dos sexos nesses registros. No entanto, ao se olhar a faixa etria entre os
16 e 20 anos, nota-se uma maior presena de homens, neste grupo, em relao s duas faixas
Figura 3.2 Faixa etria por sexo nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos
declarados por outrem declarados como pretos e pardos em 1939. Municpio de Nova Iguau.
26 - 30
21 - 25
16 - 20
Masculino
Feminino
11 - 15
6 - 10
0-5
Um exemplo bem claro, deste tipo de registro de nascimento, foi o de um rapaz de 16 anos,
Aos vinte e sete dias do ms de novembro de mil novecentos e trinta e nove, nesta cidade, em
cartrio compareceu J. P. V., brasileiro, operrio, residente em Mesquita, neste distrito,
declarou que as cinco horas do dia 5 de agosto de mil novecentos e vinte e trs, em Municpio
de Vassouras, neste Estado, nasceu uma criana do sexo masculino, de cor parda que tomou
183
o nome de S.P. filho legtimo dele declarante e de sua mulher A. P. P. , falecida.
183
Livro 61, registro 15454, de 1939, RCPNNI.
cxlvii
jovens e adultos. Na tabela 3.24, dentre os 488 registros, 173 (25%) indicam, como locais de
nascimento, regies fora da Baixada Fluminense. Apesar de ser um nmero baixo, em relao
registrados como nascidos fora do Municpio de Nova Iguau, 97 (56%) foram somente da
Tabela 3.24 - Regio do nascimento por cor nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e
adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau.
Nova Iguau. Na figura 3.3, colocou-se os locais de origem por faixa etria, e ao examinar
Figura 3.3 Faixa etria por regio de nascimento nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens
e adultos declarados como pretos e pardos por outrem em 1939. Municpio de Nova Iguau.
50
45
40
35
30
25
20
15
10
0
iro
e)
r)
iti
il
a
al
iro
o
os
ita
bi
lis
as
rio
b
ad
ad
ai
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ad
st
er
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m
po
ne
ad
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Br
M
de
te
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R
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ap
io
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Ig
Va
Ig
C
o
o
Es
a
ad
S
ov
ov
st
N
E
0-5 6 - 10 11 - 15 16 - 20 21 - 25 26 - 30
Na figura 3.4, foram colocados todos os registros de 1939, conforme a faixa etria e a
figura mencionada, percebe-se que a maior parte dos registrados so crianas, entre 0 e 5
anos, que nasceram na Baixada Fluminense. No entanto, ao examinar a faixa etria entre 11 e
Figura 3.4 Faixa etria por localizao das pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de
nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem, em 1939. Municpio de Nova Iguau.
140
120
100
80
Dentro Baixada
Fora Baixada
60
40
20
0
0-5 6 - 10 11 - 15 16 - 20 21 - 25 26 - 30
1930, as crianas, jovens e adultos registrados, possivelmente, nasceram nos locais de origem
dos pais, os quais migraram no mesmo perodo. Esse foi o caso de S.P. acima mencionado:
nascido em 1923, deduz-se que, seu pai fez parte da primeira gerao de filhos nascidos aps
a abolio; migrou poucos anos aps o nascimento do seu filho, prximo a dcada de 30;
pode ter migrado sem a famlia, arranjado emprego como operrio e se estabilizado em
Mesquita; e, por fim, uma vez ali instalado, provavelmente, legitimou sua relao conjugal e,
fora da Baixada. Provavelmente, a migrao, com famlia formada, foi muito mais uma
No que tange faixa etria das pessoas, registradas por regio de origem, possvel
diferena entre homens e mulheres praticamente nfima, ou seja, havia um equilbrio entre
os sexos nos registros tardios. De certa forma, os pais e mes buscaram legitimar ambos os
filhos. Em segundo lugar, na faixa etria entre 0 e 5 anos a quantidade de registros realmente
registradas tardiamente podem indicar uma estabilizao dessa populao de pretos e pardos,
A busca pelo registro e pela legitimao de todos os seus familiares foi muito
filhos de pretos e pardos sendo registrados todos no mesmo dia. Esse foi o caso de J.G.D. que
registrou cinco filhos no mesmo dia sendo brasileiro, residente neste distrito. No primeiro
No dia 4 de agosto de mil novecentos e trinta e quatro em Paraba do Sul, neste Estado, nasceu uma
criana do sexo masculino, de cor parda que tomou o nome de J.D. filho natural dele declarante e de
184
sua mulher Dona I.C.S. brasileira e domstica.
O seu segundo filho nasceu no ano de 1930, o terceiro em 1931, o quarto em 1934 e o quinto
em 1935, todos nascidos no Municpio de Paraba do Sul. Caso semelhante aconteceu com
L.M.C, em 1939 registrou 3 filhos no mesmo dia. No primeiro filho, o assento mostrou que:
Aos trinta dias do ms de dezembro de mil novecentos e trinta e nove, compareceu L.M.C., brasileiro,
lavrador, residente neste distrito, declarou que as quatorze horas do dia oito de fevereiro de mil
novecentos e vinte nove, em Queimados, neste Municpio, nasceu uma criana do sexo feminino de
184
Livro 61, registro 15759, de 1939, RCPNNI.
cli
cor parda, que tomou o nome de T.J.M filha legitima dele declarante e de sua mulher L.A.M.
185
falecida.
pessoas, sero usadas duas tabelas, as quais cruzam a categoria cor com os locais de
residncia dos registrados. Dentre os 488 registros, somente em 90 h meno clara sobre o
local de residncia (tabela 3.25). Nestes, em 75 (83%) casos, tal populao est basicamente
3.26. Em 1939, dentre os 245 registros de crianas nascidas, dentro do Municpio de Nova
Iguau, em 165 (67%), essa populao est fora da sede. Eles esto presentes nos distritos
Mesquita.
Tabela 3.25 Regio da residncia por cor nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e
adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau.
185
Livro 61, registro 15741, de 1939, RCPNNI.
clii
Tabela 3.26 Regio do nascimento por ano das pessoas declaradas como pretas e pardas nos registros civis de
nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau.
nascimentos, aparentemente, a parcela da populao que mais buscou legitimar seus filhos
foram os pais de pessoas registradas como pretas e pardas, sendo estes casados ou no.
Deveras, a partir dessas leis e decretos, foi possvel perceber a formao de famlias de pretos
186
HOLT, Thomas. The Problem of Freedom: Race, Labor, and Politics in Jamaica and Britain, 1832-1938
Baltimore and London: Johns Hopkins University Press, 1992, captulo 5.
cliii
Os auto-declarantes
Nova Iguau. Estes registros possuem uma especificidade significativa em relao aos outros.
Se nos registros anteriores foram os pais ou as mes que declaravam o que desejavam, nesse
momento eram as prprias pessoas que selecionavam o que ser assentado. Para alm desse
fator, estes registros so muito mais ricos de informaes, uma vez que h menes sobre o
crianas, jovens e adultos registrados por outrem, o primeiro est em menor nmero. Dentre
os 1.832 registros tardios, 867 (47%) so de auto-declarantes (tabela 3.27). Dentre esse total,
os que se declararam pretos e pardos esto presentes em 513 (59%) registros. Isso demonstra
que tal grupo buscou, de forma contundente, o registro civil de nascimento. Ao separar a
quantidade de registros por cor e por ano, percebe-se um crescimento significativo entre os
anos de 1934 e 1939. Se no primeiro, apenas 201 (23%) pretos e pardos procuraram o registro
civil, no segundo ano, em questo, esse nmero subiu para 309 (35%).
Tabela 3.27 - Total de registros civis de nascimentos tardios de auto-declarantes por cor e ano. Municpio de
Nova Iguau.
boa parcela teve famlia constituda (tabela 3.28). Dentre os 513 registros de pretos e pardos,
infelizmente, em 307 (60%) no h qualquer informao sobre a situao conjugal dos pais.
cliv
Nos 206 registros restantes, a quantidade de pai e me casados so, ao todo, 159 (77%).
declarantes. De acordo com a tabela 3.29, nos 513 registros, em 399 (78%), eles se
declararam como filhos legtimos, enquanto, em 109 (21%), disseram ser filhos naturais.
Por um lado, pode-se presumir que a maior parte dos auto-declarantes possuam famlias
estveis e nucleares. Por outro, preciso relembrar que, o empregado do cartrio obrigado a
registrar tudo aquilo que o declarante fala. Dessa forma, possvel notar que eram poucas as
Tabela 3.28 - Situao conjugal por cor nos registros civis de nascimentos de nascimentos tardios de auto-
declarantes. Municpio de Nova Iguau.
Tabela 3.29 - Legitimidade por cor nos registros civis de nascimentos tardios de auto-declarantes. Municpio de
Nova Iguau.
Dentre os 513 registros, em 504 (98%), no informada a profisso do pai e, portanto, o tipo
de trabalho do pai aparece somente em 11 (2%) assentos (tabela 3.30). Deste total, 6 estavam
(tabela 3.31), pois somente em 28 (5%) registros so declarados as profisses destas, sendo 23
domsticas e 5 lavradoras.
Tabela 3.30 - Profisso do pai por cor nos registros civis de nascimentos tardios de auto-declarantes. Municpio
de Nova Iguau.
Tabela 3.31 - Profisso da me por cor nos registros civis de nascimentos tardios auto-declarantes. Municpio de
Nova Iguau.
Aparentemente, essa parcela da populao conheceu muito pouco dos seus avs. A
quantidade de pessoas, que no conheceram e nem souberam nomear todos os seus avs,
chegou ao nmero de 236 (46%) dos registros (tabela 3.32). Desse total de 513 registros, 22
(4%) conheceu apenas um av. Os que nomearam o av paterno foram 231 (45%) e a av
paterna 225 (44%). Nestes registros, os avs maternos foram menos citados do que nos
registros anteriores, ficando o av materno com 253 (49%) e a av materna com 277 (54%)
registros.
clvi
Tabela 3.32 - Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros
civis de nascimentos tardios de auto-declarantes. Municpio de Nova Iguau.
Porcentagem Total
Av Paterno 45% 231
Av Paterna 44% 225
Av Materno 49% 253
Av Materna 54% 277
Todos os avs 44% 225
Nenhum dos avs 46% 236
Pelo menos um av 4% 22
Total de registros 513
de detalhamento da situao conjugal dos pais, das profisses dos pais e dos nomes avs,
priori, indica que estes tiveram uma ruptura precoce com a comunidade de origem. Mesmo
diante de tal quadro, preciso salientar os indcios de que estes provieram de comunidade
e/ou famlias estveis. Preliminarmente, lcito supor que so pessoas que, aparentemente,
deixaram seus pais e avs quando eram relativamente jovens. Para entender um pouco mais
registrar sem a presena dos pais. Ao analisar o ano do nascimento dos auto-declarantes em
relao ao ano de seu registro, percebe-se que estes eram, em boa parte, jovens e adultos.
Conforme fora analisado neste captulo, na tabela 3.27, quase todos os registros so feitos nos
anos de 1934 e 1939. Na figura 3.5, tomou-se, por base, o ano de 1934. Atravs da linha,
nascidas aps a dcada de 1900. O pico foi no ano de 1913 e, da em diante, apenas diminui,
chegando o ltimo registro, no ano de 1920. A figura 3.6 foi construda a partir dos registros
clvii
recorreram ao cartrio, tendo as nascidas, entre 1917 e 1918, as que mais procuraram se
registrar.
Figura 3.5 Ano de nascimento por regio de nascimento das pessoas que se auto-declararam no ano de 1934.
Municpio de Nova Iguau.
35
30
25
20
15
10
0
89
90
91
92
94
95
96
97
98
99
00
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
18
20
18
18
18
18
18
18
18
18
18
18
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
Dentro Baixada Fora Baixada Total geral
Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau, 1934.
clviii
Figura 3.6 - Ano de nascimento por regio de nascimento das pessoas que se auto-declararam no ano 1939.
Municpio de Nova Iguau.
40
35
30
25
20
15
10
0
81
82
83
86
87
88
89
90
91
92
93
94
95
96
97
98
99
00
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
28
18
18
18
18
18
18
18
18
18
18
18
18
18
18
18
18
18
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
19
Dentro Baixada Fora Baixada Total geral
Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau, 1939.
por sexo, possvel perceber as caractersticas especficas dessa populao de pretos e pardos.
A figura 3.7 foi construda com todos os registros, de 1934, de pessoas que se declararam
pretas e pardas no cartrio de Nova Iguau. Nela, possvel observar que a maior parcela, que
buscou se registrar, era de homens entre 21 e 30 anos. A quantidade de mulheres, que se auto-
declararam, foi muito menor em relao a dos homens, no ano de 1934. Ao se examinar mais
detalhadamente o ano de 1939, chega-se a concluso de, que alm dos jovens e adultos, uma
outra parcela da populao de pretos e pardos buscou o registro. Na figura 3.8 a maior parte
dos que procuraram os registros civis de nascimento continuam sendo homens e adultos entre
Figura 3.7 Faixa etria por sexo de pretos e pardos nos registros civis de nascimentos tardios de auto-
declarantes, 1934. Municpio de Nova Iguau.
61 - +
56 - 60
51 - 55
46 - 50
41 - 45
36 - 40
31 - 35
26 - 30
21 - 25
16 - 20
11 - 15
6 - 10
0-5
Feminino Masculino
Figura 3.8 - Faixa etria por sexo de pretos e pardos nos registros civis de nascimentos tardios de auto-
declarantes, 1939. Municpio de Nova Iguau.
61 - +
56 - 60
51 - 55
46 - 50
41 - 45
36 - 40
31 - 35
26 - 30
21 - 25
16 - 20
11 - 15
6 - 10
0-5
Feminino Masculino
A aparente maior quantidade de homens, nos registros civis, no significa que estes
eram a maioria entre a populao do Municpio de Nova Iguau. Tanto que, de acordo com o
censo de 1940, a diferena entre homens e mulheres nesse municpio, dentre as 140.606
O notvel nmero de homens, presentes nos registros, provavelmente, indica que essas
pessoas buscaram o registro para terem acesso ao trabalho, visto que os novos arranjos de
poucos se dedicaram agricultura. Na tabela 3.33, foi separada por sexo as profisses dos que
se declararam pretos e pardos. Dentre os 165 registros, nos quais so informadas as profisses
dos homens, 110 (67%) esto ligados a trabalhos de operrio, enquanto 15 (9%) so
comerciantes. O impressionante foi perceber que apenas 22 (13%) homens estavam ligados a
trabalhos de cultivo.
Tabela 3.33 Profisso por sexo de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de nascimentos
tardios de auto-declarantes. Municpio de Nova Iguau.
e pardos, e eram compostos em sua maior parte por homens em idade adulta, possvel
perceber a sua especificidade. Nas figuras 3.5 e 3.6 possvel observar que a maior parte dos
figura 3.9, buscou-se dividir a populao auto-declarante, em 1934, entre nascidos fora e
dentro da Baixada por faixa etria. Neste ano, praticamente, quase toda a populao de
Iguau. De uma forma semelhante, mas tendo suas singularidades, esse nmero de 1934 se
manteve nos registros de 1939 (figura 3.10). Ou seja, a maior parcela dos que procuraram se
perceber que, nesse ltimo ano coletado, houve uma busca mais intensa pelo registro civil de
nascimento por uma parcela da populao proveniente de fora da Baixada que possua entre
40 e 60 anos.
Figura 3.9 - Faixa etria por regio de nascimento nos registros civis de nascimentos tardios auto-declarantes
pretos e pardos, em 1934. Municpio de Nova Iguau.
160
140
120
100
Dentro da Baixada
80
Fora da Baixada
60
40
20
0
11 - 15 16 - 20 21 - 25 26 - 30 31 - 35 36 - 40 41 - 45
Figura 3.10 - Faixa etria por regio de nascimento nos registros civis de nascimentos tardios auto-declarantes
pretos e pardos, em 1939. Municpio de Nova Iguau.
120
100
80
Dentro Baixada
60
Fora Baixada
40
20
0
11 - 15 16 - 20 21 - 25 26 - 30 31 - 35 36 - 40 41 - 45 46 - 50 51 - 55 56 - 60
Detalhando os locais de origem, percebe-se que uma boa parcela dos migrados veio
de uma regio especfica do Estado do Rio de Janeiro. Na tabela 3.34, dentre os 513 registros
de pretos e pardos, um total de 186 (36%) registros declararam o Vale do Paraba como o
registros. Na tabela 3.35 (anexo), optou-se por colocar todos os locais de onde os auto-
e Juiz de Fora como os que mais expulsaram populao, ao analisar os registros de 1934 e
1939. Dessa forma, a partir da tabela de locais de origem pode-se construir um mapa que
Tabela 3.34 - Regio do nascimento por cor nos registros civis de nascimentos de auto-declarantes. Municpio
de Nova Iguau.
Paraba, nota-se uma grande presena de homens na faixa etria prpria para o trabalho, entre
operrio e trabalhador; so 43 (26%) registros. Nas outras profisses, a presena de tal grupo
pardas, percebe-se a sua distribuio na Baixada Fluminense. Conforme a tabela 3.36, essa
Nova Iguau. Em Belford Roxo, havia 24 pessoas, enquanto em Mesquita, 126 e, no interior
do municpio, 168.
clxiv
maior parte seguiu o ritmo da populao de pretos e pardos. Dentre os 186 registros, 120
(65%) residiram fora da sede do Municpio de Nova Iguau, enquanto uma pequena parcela,
entender um pouco mais lgica de migrao para esse distrito, seria necessrio estudos
acesso terra.
Tabela 3.36 - Regio da residncia nos registros civis de nascimentos de auto-declarantes. Municpio de Nova
Iguau.
pode-se chegar a suposies interessantes. Nesta parte, parece acertado afirmar que o perfil
das pessoas que buscaram se registrar, era de homens, jovens e adultos, entre 20 e 30 anos,
nasceram entre os anos de 1900 e 1920. De forma semelhante, Ana Rios atravs da anlise de
duas famlias, percebeu que a maior parte dos descendentes de ex-escravos que migraram do
clxv
Vale do Paraba, eram maioria homens e nasceram entre esses mesmos anos de 1900 e 1920.
187
Na realidade, tanto nas entrevistas quanto nos registros, aparentemente, esta populao
evitou, de alguma forma, o trabalho com a lavoura. possvel que, o crescimento urbano com
3.3 A busca pelo registro civil da populao de pretos e pardos na Era Vargas
Nesta ltima parte, ser analisada a importncia do Governo de Getlio Vargas para a
populao de pretos e pardos, na Baixada Fluminense. Para alcanar este objetivo, o presente
texto ser dividido em duas partes. Na primeira, ser feita uma discusso bibliogrfica sobre
esse tema, utilizando, principalmente, os textos de Ana Rios e de Hebe Mattos. Na segunda
parte, ser analisado o registro civil de nascimento do municpio de Nova Iguau. Trata-se,
aqui, de levantar questes sobre o aumento da busca ao registro civil, aps a entrada de
Vargas no governo.
***
187
RIOS, A. Histria Oral e Migrao um debate metodolgico. (mmeo)
clxvi
188
e no respeitavam a legislao existente. Assim como o contrato era rapidamente
por essa autora, houve casos em que os patres tentaram: restringir a movimentao dos
sentiam prejudicados, por vezes, estes colocavam fogo na casa daqueles. Uma das solues
sendo, possivelmente, as conseqncias desses atos, as mais terrveis. Com tal estratgia, os
entanto, a interveno do poder pblico federal no seria vista com bons olhos, uma vez que
contratos de boca e pelos inmeros aspectos relativos parte no monetria dos mesmos.
190
Qualquer tentativa de afirmar a legislao, ou de construir uma nova, aparentemente,
prejudicaria os proprietrios.
188
RIOS, A. & MATTOS, H. Memrias do Cativeiro: Famlia, Trabalho e Cidadania no Ps-Abolio. RJ: Ed.
Civilizao Brasileira, 2005. p. 247.
189
Ibid., p. 249.
190
RIOS, A e MATTOS, H op. cit., p. 148.
clxvii
Vargas assumiu o poder. Nas anlises de Ana Rio de Hebe Mattos, elas demonstraram que nas
do cativeiro e o tempo da liberdade. Para estes dois, nascidos da primeira gerao aps a
191
abolio, o marco de ruptura, com a escravido, foi o Governo Vargas. Em suas
Deveras, Vargas pode no ter conseguido manter uma situao estvel no campo,
porm, a presena do Estado passou a ser mais sentida entre proprietrios e trabalhadores.
Por mais que as aes de Vargas no estivessem direcionadas para o campo, o mundo
agrrio foi modificado durante seu Governo. certo que as leis trabalhistas de 1934 no
chegaram aos trabalhadores rurais; todavia, a emergncia de novos agentes de Estado fez com
representando, em alguns aspectos, a quebra da relao hierrquica presente. Desse modo, foi
possvel notar uma relativa independncia dos tribunais, em relao aos fazendeiros, assim
191
Ibid., p. 248 e MATTOS, H. Marcas da escravido: Biografia, Racializao e Memria do Cativeiro na
Historia do Brasil. Tese para professor Titular no Departamento de Historia da UFF. Niteri, 2004. p. 64. Para
uma leitura dos trechos importantes destas entrevistas ver o captulo Dilogo dos tempos, de RIOS, A. e
MATTOS, H op. cit., p. 127-129.
192
RIOS, A. e MATTOS, H. op. cit., p. 249.
193
MATTOS, H. op. cit., 2004, p. 62.
clxviii
como tornou mais acessvel a busca pelos servios pblicos, por exemplo, Hospitais, escolas,
Para alm da maior presena do Estado, outros elementos devem ser citados, no que
concerne modificao do mundo rural. O crescimento urbano, nas reas prximas ao Vale
apenas as trocas entre mundo rural e urbano colaboraram neste sentido; ora, a ampliao dos
garantiram os direitos dos trabalhadores. lcito supor que tais elementos aumentaram,
40.
mecanismos legais. Nesse sentido, em Nova Iguau, durante o seu governo, foi possvel
perceber a procura intensa pelos registros tardios de nascimentos. Entre essas pessoas
estavam, em boa parte, pretos e pardos, migrados de outras regies do Rio de Janeiro, em
destaque do Vale do Paraba. Para entender, um pouco melhor, de que forma esse governo
contribuiu para incentivar a busca pelo registro civil, dessa parcela da populao que
de Nova Iguau.
194
Ibid., p. 66.
195
Ibid., p. 67.
196
Idem.
clxix
sua efetivao, percebe-se que, entre 1930 e 1939, eles possuem uma caracterstica bem
especfica. Aps a lei de 2.887, de 25 de janeiro de 1914, citada na primeira parte deste
captulo, apenas 16 anos mais tarde novas leis, incentivadoras do registro civil de
cinco anos, as primeiras investidas do governo, em 1914 e 1919, nesse sentido, no aparecem
na mostra analisada.
Ao entrar na dcada de 30, este quadro muda radicalmente. Em tal dcada o Decreto
19.425 ampliou, para quatro meses, o prazo dos registros de nascimentos ocorridos a mais de
registro de nascimento, sem que fosse necessrio o pagamento de multas e a justificativa para
198
o registro tardio. No dia 24 de fevereiro de 1939, o decreto 1.116 parece ter acertado, no
que tange iniciativa ampliar o acesso da populao, ao registro civil. Nesse decreto, todos
que desejavam fazer o registro tardio foram anistiados da multa. O mesmo foi reforado, no
dia 29 de dezembro do referido ano, prorrogando o prazo para que, aqueles que no tivessem
Ao total, nesse perodo, foram promulgados 4 decretos e uma Lei em relao registro
civil, sendo a maior parte deles, como visto acima, direcionados regulamentao do registro
tardio. A investida do Governo Vargas, nessa populao que no havia recorrido ao registro
no tempo correto por lei, aparentemente, pde ser vista nos registros civis de nascimentos do
Municpio de Nova Iguau. Na tabela 3.13, apresentada na parte 3.2 deste captulo, dentre os
1.832 registros tardios, 1.750 (96%) foram realizados entre os anos de 1934 e 1939.
197
Decreto 19425 de 24/11/1930.
198
Decreto 19710 de 18/02/1931.
199
Decreto 1116 de 24/02/1939 e Lei 1929 de 29/12/1939.
clxx
3.11, colocou-se todos os registros de crianas registradas de acordo com a lei, ou seja,
registradas no ano do nascimento, feitos de 1889 a 1939. Como possvel observar, entre os
anos de 1919 a 1939, no que tange s crianas brancas, os pais das pretas e pardas recorreram,
Figura 3.11 Registros realizados no ano de nascimento da criana por cor e ano. Municpio de Nova Iguau.
600
500
400
Branca
Outras cores
300
No Informada
Pardas e pretas
200
100
0
1889 1894 1899 1904 1909 1914 1919 1924 1929 1934 1939
Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau. 1889,
1894, 1899, 1904, 1909, 1914, 1919, 1924, 1929, 1934 e 1939.
aps 1934, entre as pessoas, as quais buscaram registrar seus filhos e se registrar tardiamente,
utilizando-se das leis e decretos promulgados, a maioria era composta por pretos e pardos.
clxxi
Figura 3.12 Registros tardios por cor e ano. Municpio de Nova Iguau.
800
700
600
500
Branca
Outras cores
400
No Informada
Pardas e Pretas
300
200
100
0
1919 1924 1929 1934 1939
no Municpio de Nova Iguau percebe-se uma grande diferena entre os registros feitos no
crianas nascidas dentro da Baixada Fluminense entre 1919 e 1939, tm-se 1.524 (97%) dos
1.569 registros, sobrando 20 (1%) para as nascidas fora do Municpio de Nova Iguau.
mesmo tempo em que os nascidos fora contabilizam 554 (55%) (tabela 3.38).
decretos promulgados, aps 1930, aparentemente, levaram, ao registro civil, uma maior
quantidade de pretos e pardos, os quais legitimaram suas relaes e sua prole, mesmo que
tardiamente. Dentre estes, a maior parte era provinda de outras regies, que no o Municpio
clxxii
de Nova Iguau; destaca-se, para isso o Vale do Paraba que, dentre os 1.001 registros, 283
(28%) eram dessa regio e a Capital Federal que tinha 74 (7%) pessoas.
Tabela 3.37 - Regio de nascimento das crianas registradas no ano de seu nascimento por cor. Municpio de
Nova Iguau.
Por causa da natureza dos registros, torna-se difcil alcanar tambm maiores
concluses, sobre a formao familiar em cada tipo de registro. O problema principal est no
registro tardio, o qual se divide entre os de crianas, jovens e adultos registrados por outrem e
registro civil, pela populao de pretos e pardos, quando se separa estes registros um
panorama muito interessante surge. Dos 1.832 registros tardios, 965 (53%) so de pessoas
os dados presentes, em cada um destes registros, diferem de forma peculiar (tabelas 3.19 e
3.31). No primeiro, a quantidade de registros, onde o pai referido, expressiva, uma vez
que, dentre os 488 registros de crianas pretas e pardas, ele est presente em 217 (44%); e, na
clxxiii
referncia ao pai aparece somente em 9 (2%) dos 513 registros. Destes, 6 trabalham
especificamente na lavoura.
Tabela 3.38 - Regio de nascimento por cor das pessoas registradas fora do ano de seu nascimento (tardios).
Municpio de Nova Iguau.
registros, em apenas 165 (42%), mostram as profisses dos auto-declarantes. Estes 22 (13%)
ano, na tabela 3.39, percebe-se que, em 1934, a categoria operrio aparece de forma
contundente.
clxxiv
Tabela 3.39 - Profisso das pessoas que se auto-declararam por ano. Municpio de Nova Iguau.
Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau. 1924,
1929, 1934 e 1939.
registro civil de nascimento. Embora em 1939 tivesse mais auto-registros do que em 1934, os
registros deste ano eram muito mais completos do que nos outros anos. Coincidncia ou no,
no mesmo ano de 1934, quando foi promulgada a nova constituio de Vargas e as Leis
declarantes, alta.
De certo modo, essas leis e decretos, na dcada de 1930, permitiram a essa parcela da
populao, formada em sua maioria de pretos e pardos, que estava em busca de trabalho ter
maior acesso ao registro civil de nascimento. Nesta dcada, ao examinar com ateno, tanto o
Vale do Paraba quanto a Capital Federal, percebe-se que, nesses lugares o momento, muito
desmandos senhoriais podem ter expulsado essa mo-de-obra para fora da regio. J na
Capital Federal, de acordo com Fisher, a populao de pretos e pardos, que era moradora de
reas mais pobres do centro do Rio de Janeiro, teve de abandonar suas casas. Para esse autor,
clxxv
isso ocorreu devido ao crescimento urbano e ao aumento dos conflitos com os polticos, que
almejavam, a todo custo, o xodo moradores pobres das favelas. De acordo com este autor o
percebidos. Neste sentido, o Municpio de Nova Iguau pode ter funcionado como vlvula de
escape destas duas regies, uma vez que a quantidade de registros de pessoas pretas e pardas
aparente falta de polticas pblicas direcionadas para essa regio, contraditoriamente, tenha
colaborado para a estabilizao de pretos e pardos, oriundo de outras regies em crise, entre
1920 e 1940.
200
FISHER, Brodwyn Partindo a cidade maravilhosa. In: GOMES, Flvio Santos (ORGS.) e CUNHA, Olvia M.
G. Quase-Cidado: histrias e antropologias da ps-emancipao no Brasil. Rio de Janeiro: FGV, 2007. p. 447.
clxxvi
Concluso
provavelmente, deve ser uma das mais difceis da vida de uma pessoas. No deve ser fcil
optar ir para um lugar onde no h qualquer relao social construda, onde no mais filho,
neto e afilhado de algum conhecido na regio, onde no reconhecido por ser um bom
crise. Enfim, migrar, aparentemente, uma situao limite que visa ajudar a famlia de origem
no tomada a esmo. No se migra sem ter a certeza de que possvel, no lugar escolhido,
estabilizao dos descendentes de libertos, ao longo do sculo XX. Apesar dos ltimos anos
alguma forma, mesmo que instvel, permanecer no campo nos primeiros anos do perodo do
ps-abolio. Com a pequena roa, seja doada por patres, ou concedidos por proprietrios
Esses novos tipos de produo exigiam menos trabalho coletivo e mais terra. A
empreendidos por ex-escravos e seus descendentes: aliar o trabalho assalariado nas grandes
mercados locais. Consequentemente, uma das estratgias, encontradas por essa parcela da
populao, foi a migrao para diversos lugares dentro do Vale do Paraba e para outras
para o Municpio de Nova Iguau. Essa escolha foi embasada pelas entrevistas do acervo
suas relaes familiares e sociais. Tanto no Vale do Paraba como no Municpio de Nova
Iguau, pretos e pardos estavam presentes nos registros civis. O ato de registrar os filhos e a
si, pressupe que esses estivessem estabilizados na regio. Estabilizado no significa dizer,
automaticamente, que possuam famlia nuclear formada, pois entre os registros civis
encontrados, uma parte significativa das crianas, registradas como pretas e pardas, eram
filhos de mes solteiras. Dessa forma, com a presena da categoria cor, em quase todos os
registros, foi possvel perceber a formao familiar de pretos e pardos, no municpio de Nova
chegou ao seu auge. Desde 1896, quando da primeira exportao de laranjas para os pases do
sul da Amrica, esse tipo de produo ganhou destaque no Estado do Rio de Janeiro. Na
chcara era o terreno ideal para a plantao de laranjas. Apesar de necessitar de uma rea
pequena para a sua produo, no se sabe ao certo o valor para se iniciar, no entanto,
possvel afirmar que no estava acessvel a todos. Tanto que, as maiores empresas nesse ramo,
espanhis.
para a regio, como o crescimento urbano e a diversificao dos arranjos de trabalho. Nos
nas primeiras dcadas do sculo XX. De 33.396 pessoas recenseadas em 1920, esse nmero
obra nas chcaras de laranja e nos setores ligados a ela, aliada ao crescimento urbano, com
propriedades baratas, ao entorno das regies produtores, levaram Baixada Fluminense uma
aumento pela procura do registro civil, aps esses anos, demonstra que nesse momento as
completas procuraram legitimar seus filhos, as incompletas, com mes solteiras, participaram
ativamente na busca pelo registro civil. Da mesma forma, os nmeros encontrados aps 1930,
no Municpio de Nova Iguau, assemelhavam-se aos de Ana Rios para Paraba do Sul para o
perodo imediato do ps-abolio. O pai estava mais presente nos registros, assim como
dos registros consistia na existncia de uma quantidade considervel de pais, registrando seus
promulgou Leis e Decretos, que incentivavam a busca pelo registro civil de nascimento tardio.
Sem o dever de pagar multa pelo atraso do registro, em Nova Iguau, um grupo especfico
buscou o registro civil, nesse perodo. Na coleta de dados no cartrio dessa regio, foi
possvel encontrar dois tipos de registros tardios: o registro tardio de crianas, jovens e
adultos declarados por outrem e os registros nos quais as pessoas auto-declaravam seu
nascimento. Nos dois casos foi impressionante ver a quantidade de pretos e pardos que
outrem, os pais no mediram esforos para registrar os seus filhos. A maior parte dos registros
eram de crianas entre 0 e 5 anos, registradas como pretas e pardas e nascidas no prprio
anos, percebe-se que a maioria nasceu em regies fora da Baixada Fluminense. Destaca-se,
nesse caso, as pessoas nascidas na regio do Vale do Paraba e que foram registradas,
ser, em sua maioria, pretos e pardos. De acordo com o ano de seu nascimento estavam entre
como operrios e trabalhadores. Esse grupo especfico, de pessoas que buscou se registrarem
no cartrio, era de fora da Baixada Fluminense, e, uma parte significativa, veio do Vale do
ao entorno da sede de Nova Iguau, onde, provavelmente, as propriedades eram mais baratas
e permitia aliar plantao de subsistncia e venda de excedentes nos mercados locais com
trabalho assalariado.
clxxx
A busca pelo registro civil, na idade adulta, pode estar ligada ao perodo Varguista.
Aps 1934 foi intensa a quantidade de pessoas se registrando como operrios e trabalhadores,
no cartrio de Nova Iguau. Os diversos empregos, abertos na Baixada, podem ter exigido a
carteira de trabalho e com ela a identidade civil, atravs da certido de nascimento. Desse
modo, as leis trabalhistas e a criao da carteira de trabalho podem ter incentivado esse grupo,
de trabalho. Aparentemente, essa regio serviu como vlvula de escape tanto do Vale do
Paraba, que estava expulsando pessoas, como do centro do Rio de Janeiro que passava por
um perodo de reformas, e estava retirando a populao pobre, das favelas e dos cortios.
loteamentos de terra, provavelmente, foi assentada nas regies ao entorno da sede essa
Migrar para muitas famlias, como as encontradas durante a pesquisa, significou uma
mudana radical de vida. Efetivamente, a maior parte das histrias, mencionadas nesta
negativo, uma vez que, muitas famlias entrevistadas no sabem, at os dias de hoje, o
paradeiro dos seus parentes migrados. A margem de erro dessa populao era muito pequena,
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clxxxvi
ANEXOS
clxxxvii
Anexo - I
Captulo 1
Tabelas
Tabela 1.3 Populao por ano segundo os censos. Paraba do Sul, Valena, Vassouras, Iguass e Estrella.
Nova Iguau 35
Sarapu 3
Rocha Sorinho 2
Sede 16
Morro Agudo 3
Belford Roxo 7
Mesquita 3
Austin 1
Queimados 7
Queimados (centro) 6
So Pedro 1
Cava 8
Tingu 3
Retiro 4
So Bernardino 1
Meriti 21
Meriti (centro) 18
So Matheus 3
Estrella 22
Estrella (centro) 18
Xerm 4
Nilpolis 6
Bonfim 5
201
Em 1940 foi somado o Municpio de Entre Rios
202
Em 1872 foi somada o Municpio de Estrella com o Municpio de Iguass que atualmente configuram a
Regio Metropolitana do Rio de Janeiro.
clxxxviii
Tabela A.2 Profisso do pai de crianas registradas tardiamente como pretas e pardas. Municpio de Nova
Iguau.
Total
Aougueiro 2
Administrador 1
Agricultor 3
Ajudante 2
Alfaiate 2
Armador 1
Artista 8
Bombeiro Hidraulico 1
Carpinteiro 11
Carvoeiro 2
Chauffeur 10
Comerciante 44
Eletricista 5
Empregado 1
Empregado da Estrada de Ferro Rio D`ouro 3
Empregado do comrcio 1
Empregado do Departamendo Nacional de Sade Pblic 5
Empregado municipal 7
Empregado ou funcionrio publico 205
Estrada de Ferro Central do Brasil 2
Farmacutico 1
Ferreiro 3
Ferrovirio 1
Florista 1
Foguista 1
Funcionrio da Justia 1
Grfico 1
Industrial 1
Jardineiro 1
Jornaleiro 28
Jurista 1
Lavrador 498
Light 4
Lustrador 1
maquinista 1
Marceneiro 3
Marinheiro Nacional 4
Maritimo 1
Mecnico 5
Militar 16
Mortorneiro 1
Motorista 3
Negociante 9
Operrio 245
Padeiro 2
Pedreiro 36
Pintor 6
Pirotcnico 2
Prottico Dentrio 1
Sapateiro 2
Trabalhador 9
clxxxix
Trabalhador da Prefeitura do DF 1
Total geral 1206
Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau. 1924,
1929, 1934 e 1939.
Tabela 3.4 Profisso do pai por cor nos registros civis de nascimentos, 1939. Municpio de Nova Iguau.
Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau. 1939.
cxci
Tabela 3.18 Profisso do Pai por cor nos registros civis de nascimento tardios de crianas, jovens e adultos
declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau.
Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau. 1919,
1924, 1929, 1934 e 1939.
cxcii
Tabela 3.35 Locais de Nascimento no Vale do Paraba nos registros civis de nascimentos dos auto-declarantes.
Total
Alm Paraba 3
Amparo 1
Aparecida do Norte 1
Bananal 1
Barbacena 3
Barra do Pira 8
Barra Mansa 5
Belmiro Braga 1
Bicas 1
Bom Jardim 1
Cambuci 2
Cantagalo 6
Carmo 2
Conservatria 3
Cordeiro 1
Fazenda Boa Vista 1
Fazenda de Santa Ceclia 1
Fazenda de Santa Clara 1
Friburgo 1
Ipiabas 3
Itabopoana 1
Itaocara 2
Itaperuna 4
Itatiaia 1
Jacare 1
Juiz de Fora 12
Juparau 2
Juparau 1
Leopoldina 2
Lima Duarte 8
Mar de Espanha 3
Marip 1
Mendes 2
Miguel Pereira 1
Miracema 2
Monte Verde 1
Muria 1
Paraba do Sul 16
Paty de Alferes 6
Petrpolis 3
Pira 3
Porto das Flores 3
Porto Novo do Cunha 3
Quatis 2
Resende 1
Rio Claro 2
Rio Novo 1
Rio Preto 3
SantAnna de Palmeiras 1
Santa Isabel do Rio Preto 3
Santa Rita de Jacutinga 4
So Francisco de Paula 1
cxciii
So Joo Marcos 5
So Jos do Rio Preto 3
Sapucaia 5
Ub 1
Valena 16
Vassouras 13
Total geral 186
Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau. 1919,
1924, 1929, 1934 e 1939.
cxciv
ANEXOS II
Passagem da entrevista no qual Izaquiel conta sobre o momento que reencontrou seu
sobrinho.
- E a Melinda?
- Melinda foi pro Rio, ficou l no Rio, deixou a menina, a menina morreu.
- No sei a idade que ela tinha no, eu era pequeno, era garoto.
- Foram as duas?
- As duas foram pro Rio, foi uma pessoa daqui, foi por intermdio de uma pessoa que ela foi
se empregar, foi empregar em um lugar, que no sei onde, o nome Laranjeira, e a por l,
minha irm veio e ela no veio, diz que no queria vir aqui mais no, para roa, ficou por l.
Minha irm veio e ela no veio. Depois ento no escreveu mais, papai procurava, mandou
colocar no jornal, que ela sumiu e ela no aparecia de jeito nenhum, depois ento minha me
morreu, chorava sempre por causa dela, meu pai tambm morreu, sem saber. Depois um dia
ela precisou l de documento, documento no Rio, pra tirar documento pra ela, a falou com
filho dela, a ela j tinha filho no Rio, j era casada e tinha filho, filho de um portugus no Rio
e falou com ele que viesse aqui em Paraba do Sul, para ir no cartrio, para tirar o documento
de idade aqui no cartrio, que era para ela poder tirar l o documento no Rio. Depois ele
estao, a ele chegando aqui, quando ele falou o meu nome l com a escrivona, ela me
conhece muito, me conhecia, ela j morreu a escrivona, morreu em Niteri, ela falou assim:
essa pessoa que essa pessoa que voc est procurando por aqui, tem parente aqui, voc tem
parente por aqui, por esse sobrenome que voc me deu. A a escrivona falou para ele assim:
Escuta, voc no tem parente aqui em Paraba? No sei, eu nunca vim aqui, vim aqui pela
primeira vez. Ela falou assim: olha, voc tem parente aqui em Paraba, porque tem um
rapaz que trabalha na estao aqui em Paraba, que deve ser parente da sua me, mas voc
pergunta l estao, quem sabe, mas antes...agora eu posso abrir o cartrio que muito cedo,
mas depois eu posso ir l abrir o cartrio, quando foi um meio-dia, voc vem, mas agora no
posso abrir o cartrio. Porque ensinaram para ele onde era a casa dela, a ele foi na casa dela
e falou com ela, aqui em Paraba. A ele falou: depois eu posso ir l tirar, chamava ris
A ele foi veio na estao e perguntou se no tinha essa pessoa por aqui. Essa pessoa chama,
j fiz dois casamentos dele aqui, chama Izaquiel, Izaquiel o nome dele, voc procura l na
estao, ele guarda na estao, voc procura ele que capaz dele estar l estao, se no
tiver eles sabem onde mora. A ele veio na estao e perguntou, mas eu tinha sado naquela
hora do pernoite da estao, chegando l o agente falou com ele: trabalha sim, ele chama
Izaquiel. Pois , eu queria saber onde que ele mora. Ah, ele mora aqui pra baixo, voc
desce aqui pra baixo pelo lado da Cermica DAngelo, praquele lado, voc pergunta por ali,
que voc vai na casa dele. A ele veio, ele veio direitinho, chegando na Cermica ele
perguntou, a informaram onde eu morava, mas eu j tinha vindo em casa e voltei para
Paraba outra vez, eu estava de bicicleta, naquele tempo eu gostava de andar com um chapu
preto, da fita branca, boiadeiro, ento ele encontrou comigo, bem, veio em casa, na minha
casa, chegou na minha casa minha filha atendeu e ele falou assim: aqui mora um tal de
Izaquiel? Ela falou assim: Mora sim, o senhor deve ter encontrado com ele por a, no
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encontrou no? Ele falou assim: Porque? Senhor no encontrou com um homem por a de
bicicleta, com chapu preto, com a fita branca? Encontrei sim, de bicicleta, um homem
nessas condies. Aquele que meu pai, ele foi l fora em Paraba. Mas ser que eu
voltando encontro ele l? Voltando encontra, porque ele deve estar numa loja. Porque eu
fui numa loja, a menina sabia. Ele est numa loja ali na chegada, pra c da estao, ele est
naquela loja, foi ele e mame. A ele foi, quando ele chegou l, ele olhou e falou assim para
o sogro dele: aquele ali que ns encontremos, ser que ele? Ele falou assim: esse
mesmo que ns encontremos. A ele ficou em p na porta, mas eu tava ainda caoando com a
dona da loja, ela brincava muito comigo, e minha esposa mandando ela cortar o pano ali, ela
escolhendo o pano, a fazenda, ela escolhendo ali, ela cortando. Eles em p na porta. A ele
falou assim: escuta, esse homem que est a, chama Sr. Izaquiel? Ela falou assim: chama,
ele dono desses de trens todos que esto a, brincando com ele, esses trens todos que esto
a. Eu queria falar com ele. A ela falou assim: esse rapaz ali quer falar com voc. A eu
falei: o que que voc quer?. Ele falou assim: O senhor tem algum parente no Rio? Eu
falei: tenho bastante parente no Rio, tenho irmo. Ele falou assim: irm voc no tem
nenhuma no Rio? Falei: , no sei se tenho, porque tem uma irm que se perdeu l embaixo
no Rio, sumiu l embaixo no Rio, no sei se ela viva ou morta. A ele, moreno baixinho,
bigodinho pretinho, era filho de portugus, ento ele falou assim: escuta, mas o senhor
irmo dela, ento a bena, meu tio. A eu falei: mas porque que voc est me tomando a
bena e me chamando de tio? Porque ela minha me, estou vendo que o senhor parece um
pouquinho com ela. A ele me abraou, coisa... A eu falei: como que ? Fiquei todo
emocionado com aquilo, alembrei de minha me, que minha me sempre chorava, no era
filha dela mas ela gostava, ela criou, era enteada, ela chorava, falava que o Rio de Janeiro
sumiu com a filha, coisa e tal, ela chamava ela de filha. Lembrei da minha me que morreu,
ela j era morta e ela apareceu. Falei, mas existe minha irm? Ele falou assim: ela est no
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Rio, minha me, ainda tem outra irm minha, ns somos dois, um casal. A eu falei: ela
est no Rio, est viva? Ele falou: minha me est viva, vim aqui apanhar um documento
aqui, certido dela, para tirar documento pra ela. A eu falei: vamos l pra casa. Trouxe
eu telefonei para o meu irmo no Rio, esse irmo meu que est no Rio, falei para ele que ele
estava l no Rio e no tinha achado minha irm, ainda no viu minha irm, mas eu aqui na
roa j tinha encontrado ela, j tinha encontrado minha irm. Foi uma alegria danada, escrevi
pra ela, ele falou: voc me mata aqui no telefone. Trabalhava l em Engenho de Dentro, ele
era feitor da Light, a ele falou assim: voc mata assim, Izaquiel, me falando uma coisa
dessa. A peguei os detalhes todos com o rapaz, onde que ela morava, morava no Rio, perto
do Tnel velho, sobe uma escadaria, a sobe, dando pelo telefone tudo, dando os detalhes,
falei para ele d para voc ir a? E ele foi certinho na casa dela, na casa da minha irm, ele
falou assim: vou l hoje na casa dela. A eu falei, vai, que assim, assim, assim. Dei os
detalhes e ele foi direitinho na casa da minha irm no Rio, ela tava no Rio. Depois ento ns
- No sei porque ela fez aquilo, ela falou pra mim depois que ela no veio aqui, falei assim
porque que voc no veio, menina, porque que voc no escreveu? Ela falou que no, por
causa daquilo que tinha passado com certeza, a ela ficou com vergonha, no queria encontrar
com essa pessoa mais, com esse marido dela mais. Por causa daquilo que ele fez, coisa e tal,
ela guardou aquilo e no quis encontrar com ele mais. Ento ela falava que no era para falar
ANEXOS III
Registro Base
Nmero vinte nove. Aos desoito dias do ms de janeiro de mil novecentos e vinte e nove,
nesta cidade de Nova Iguass, Distrito do Municpio de Iguass, Estado do Rio de Janeiro, em
nesta cidade, hoje, as dez horas da manh, nasceu uma criana de cor branca, do sexo
feminino, filha natural delle declarante e de Dona S. S., Elle negociante, ela de servio
domstico, ambos naturais do Estado do Rio de Janeiro e residentes neste districto. Avs
que fao este termo que assigna que assina comigo o declarante e as testemunhas A. J. S. e J.
ANEXOS IV
Entrevistados
Izaquiel Incio
Data: 19 de setembro de 1994 e 21 de outubro de 1994
Local: Paraba do Sul, RJ.
Entrevistador: Ana Maria Lugo
Cornlio Cansino
Entrevista feita em 19 de maio de 1995
Juiz De Fora Minas Gerais
Manoel Seabra
Local:So Jos Da Serra Data:10/12/98
Entrevistadora: Hebe Castro e Ldia Celestino Meireles
Transcrio: Karina Cunha Baptista
Dona Jlia
Data: 12 de novembro de 1994
Local: Paraba do Sul, RJ.
Entrevistadora: Ana Maria
Dona Bernarda
Data: 16 de janeiro de 1995
Local: Paraba do Sul, RJ
Entrevistador: Ana Maria
Dona Zeferina
Paraba Do Sul Estado Do Rio De Janeiro
Entrevista Feita Em 15 De Maio De 1995.
Dona Florentina
Data da entrevista: 13/12/2003
Entrevistadores: Carlos Eduardo C. da Costa, Marina Marina Luz Gama e Raquel Fernandes
Pires
Local da entrevista: Comunidade da Fazenda de So Jos da Serra - Valena - Rio de Janeiro
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Dona Nilza
Nome: Nilza Conceio da Silva
Data de Nascimento: 30/09/1936
Entrevista: 25/11/2007
Idade: 71 anos
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