Campesinato Negro No Pós Abolição

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Universidade Federal do Rio de Janeiro

Campesinato Negro no Ps-Abolio: Migrao, Estabilizao e os Registros


Civis de Nascimentos.Vale do Paraba e Baixada Fluminense, RJ.
(1888-1940)

Carlos Eduardo C. da Costa

Rio de Janeiro
2008
ii

Campesinato Negro no Ps-Abolio: Migrao, Estabilizao e os Registros Civis de


Nascimentos.Vale do Paraba e Baixada Fluminense, RJ. (1888-1940)

Carlos Eduardo C. da Costa

Dissertao de Mestrado apresentada ao Programa


de Ps-Graduao em Histria Social,
Departamento de Histria, Universidade Federal
do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos
necessrios obteno do ttulo de Mestre em
Histria Social.

Orientadora: Ana Maria Lugo Rios

Rio de Janeiro
Abril/2008
iii

COSTA, Carlos Eduardo C. da


Campesinato Negro no Ps-Abolio: Migrao, Estabilizao
e os registros Civis de Nascimentos.Vale do Paraba e Baixada
Fluminense, RJ. (1888-1940)/ Carlos Eduardo C. da Costa. Rio de
Janeiro: IFCS, 2008.
xviii, 161f.:il.;30cm
Orientador: Ana Maria Lugo Rios
Dissertao (Mestrado em Histria Social) UFRJ, IFCS,
PPGHIS Programa de Ps-Graduao em Histria Social, Rio de
Janeiro, 2008.
Referncias Bibliogrficas: f. 180-184.
1. Ps-abolio. 2. Migrao. 3. Campesinato Teses. I. RIOS,
Ana Maria Lugo (Orient.). II.Universidade Federal do Rio de
Janeiro. Programa de Ps-Graduao em Histria Social. III. Ttulo.
iv

Campesinato Negro no Ps-Abolio: Migrao, Estabilizao e os Registros Civis de


Nascimentos.Vale do Paraba e Baixada Fluminense, RJ. (1888-1940)

Carlos Eduardo C. da Costa

Orientadora: Ana Maria Lugo Rios

Dissertao de Mestrado submetida ao Programa de Ps-Graduao em Histria Social


(PPGHIS), Instituto de Filosofia e Cincias Sociais, da Universidade Federal do Rio de
Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessrios obteno do ttulo de Mestre em
Histria Social.

Aprovada por:

Orientadora: Prof. Dr. Ana Maria Lugo Rios, UFRJ.


(Presidente)

Prof. Dr. Mnica Grin, UFRJ.

Prof. Dr. lvaro Nascimento, UFRRJ.

Suplentes

Prof. Dr. Antonio Carlos Juc, UFRJ.

Prof. Dr. Roberto Guedes, UFRRJ.

Abril/2008
v

AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar agradeo Universidade Federal do Rio de Janeiro e ao Programa

de Ps-Graduao em Histria Social pela oportunidade de cursar Mestrado para desenvolver

minha pesquisa.

FAPERJ, que sem seu incentivo financeiro, atravs da Bolsa FAPERJ nota 10, esta

dissertao jamais teria se finalizado no prazo estipulado pelo Programa de Ps-Graduao.

Ana Rios, que durante esses dois anos de curso fez muito mais do que a sua

obrigao de orientadora. Ela soube me acalmar nas horas mais tensas e soube me pressionar,

com maestria, nos momentos em que estava relaxado.

Aos professores do Programa de Ps-Graduao em Histria Social da UFRJ, Manolo

Florentino e Mnica Grin que ao longo desses dois anos, a partir de seus exemplos de vida,

ensinaram-me que h muito mais vida alm da academia.

Aos demais professores do PPGHIS os quais tive a oportunidade de conhecer e assistir

as aulas. Muito do que aqui foi escrito deve-se aos cursos ministrados por Manolo Florentino,

Maria Paula Arajo, Samantha VizQuadrat, Antonio Carlos Juc, Ana Rios e Mnica Grin.

As professoras Hebe Mattos e Martha Abreu que fizeram parte da minha formao na

graduao e que me ajudaram em muitos momentos durante a confeco da dissertao.

Ajudaram-me com incentivos financeiros para realizar as entrevistas, no emprstimos de

materiais e com boas conversas sobre o tema desta dissertao.

Agradeo a todos os amigos que fiz no Ofcio do Registro Civil das Pessoas Naturais

da 1 Circunscrio de Nova Iguau, em especial a Dona Dylza, pois sem a boa vontade e o

bom humor deles a pesquisa no teria sado do papel.

Aos meus pais, Jos Hamilton e Maria Lcia que me apoiaram e, em boa parte do

tempo, financiaram-me para que pudesse realizar o desejo de fazer o que mais gosto: estudar.
vi

minha irm Wiviane, que nos momentos mais difceis e desanimadores deu-me

palavras encorajadoras para continuar o trabalho.

Ao meu sobrinho-afilhado Vincius, uma criana especial em minha vida, que me

ensina todos os dias que h vida para alm dos livros.

minha namorada Cristiane Britto, que, durante todos esses anos juntos, soube

compreender o meu gosto pelo estudo. Agradeo pelos momentos de companheirismo,

ajudando a superar as dificuldades e as crises diante de prazos curtos. Agradeo,

principalmente, pela ajuda na leitura dos primeiros textos e na correo destes. Hoje sei que

ela praticamente uma expert em ps-abolio na Baixada Fluminense.

Aos amigos Alexandre Moraes, Bruno Mouzinho, Carolina Peixoto, Fernanda

Thomaz, Igor dos Reis e Tatiane Bracho, pois muito do meu carter e da minha dedicao aos

estudos se deve a eles.

Agradeo, por fim, a todos os amigos que fiz na UFRJ, funcionrios, alunos, colegas, e

professores.

Cada uma dessas pessoas contribuiu de forma decisiva na minha formao acadmica

e pessoal, agradeo a todos vocs.


vii

El pobre no puede errar.

Carlos Eduardo Valncia


viii

RESUMO

COSTA, Carlos Eduardo C. da. Campesinato Negro no Ps-Abolio: Migrao,


Estabilizao e os Registros Civis de Nascimentos.Vale do Paraba e Baixada Fluminense, RJ.
(1888-1940). Dissertao (Mestrado em Histria Social). Programa de Ps-Graduao em
Histria Social, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2008.

Na presente dissertao, buscou-se analisar o processo de migrao de ex-escravos e

de seus descendentes para a Baixada Fluminense, no perodo do ps-abolio. Para tanto,

foram utilizadas entrevistas produzidas por Ana Rios, Hebe Mattos, Robson Martins e Carlos

Eduardo Costa no Vale do Paraba e na Baixada. Somado a isto, coletou-se os registros civis

de nascimentos no Municpio de Nova Iguau entre 1889 a 1939.

Nas dcadas de 20 e 30, em virtude da desestruturao da produo de caf no Vale do

Paraba, e no surgimento de novas formas de economia que exigiam menos trabalhadores,

como o gado e o eucalipto, houve um processo de sada dos libertos e de seus descendentes

dessas antigas reas. Esse foi o mesmo momento no qual a Baixada ganhava destaque

internacional, graas a produo de laranja, e conhecia um grande avano urbano. Diante da

possibilidade de acesso a terras baratas e a diversificao no arranjos de trabalho, nesta

dissertao, percebeu-se que muitos dos trabalhadores no Municpio de Nova Iguau eram de

regies de fora da Baixada.

Somado a estes elementos, na presente dissertao, tentou-se compreender que no

foram somente os integrantes de famlias nucleares que buscaram legitimar seus familiares, no

ps-abolio. Com as leis incentivadoras para o registro civil tardio, durante o Governo

Vargas, um grupo especfico de pretos e pardos, provindos regies de fora da Baixada, em

destaque para o Vale do Paraba, buscaram se registrar.


ix

ABSTRACT

COSTA, Carlos Eduardo C. da. Campesinato Negro no Ps-Abolio: Migrao,


Estabilizao e os Registros Civis de Nascimentos.Vale do Paraba e Baixada Fluminense, RJ.
(1888-1940). Dissertao (Mestrado em Histria Social). Programa de Ps-Graduao em
Histria Social, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2008.
x

LISTA DE FIGURAS

Figura 1.1 Populao por ano segundo os censos.


Paraba do Sul, Valena e Vassouras..........................................................................................................44

Figura 1.2 Populao por ano segundo os censos.


Paraba do Sul, Valena, Vassouras e Iguass. ..........................................................................................45

Figura 1.3 Genealogia da Famlia de Dionsio Antonio Fernandes.


Santa Isabel do Rio Preto, Valena, RJ......................................................................................................50

Figura 1.4 Total de registros civis de nascimentos por ano.


Municpio de Nova Iguau, RJ. ..................................................................................................................70

Figura 1.5 Total da populao recenseada como pretos e pardos.


Paraba do Sul, Valena e Iguass. ...........................................................................................................71

Figura 1.6 Total dos registros civis de nascimentos por cor.


Municpio de Nova Iguau. ........................................................................................................................72

Figura 2.1 Crescimento populacional da Baixada Fluminense de acordo com os censos.


Municpio de Nova Iguau. ........................................................................................................................87

Figura 2.2 Total de crianas registradas no ano de seu nascimento.


Municpio de Nova Iguau. ........................................................................................................................97

Figura 2.3 Total de crianas registradas em ano de seu nascimento por cor e ano.
Municpio de Nova Iguau. ........................................................................................................................98

Figura 3.1 Ano dos nascimentos por cor nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e
adultos declarados por outrem em 1939. Municpio de Nova Iguau. ....................................................144

Figura 3.2 Faixa etria por sexo nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos
declarados por outrem declarados como pretos e pardos por outrem em 1939.
Municpio de Nova Iguau. ......................................................................................................................145

Figura 3.3 Faixa etria por regio de nascimento nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens
e adultos declarados como pretos e pardos por outrem em 1939.
Municpio de Nova Iguau. ......................................................................................................................147

Figura 3.4 Faixa etria por localizao das pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de
nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem, em 1939.
Municpio de Nova Iguau. .....................................................................................................................148

Figura 3.5 Ano de nascimento por regio de nascimento das pessoas que se auto-declararam no ano 1934.
Municpio de Nova Iguau. .....................................................................................................................156

Figura 3.6 - Ano de nascimento por regio de nascimento das pessoas que se auto-declararam no ano 1939.
Municpio de Nova Iguau. .....................................................................................................................157

Figura 3.7 Faixa etria por sexo de pretos e pardos nos registros civis de nascimentos tardios de auto-
declarantes, 1934. Municpio de Nova Iguau.........................................................................................158

Figura 3.8 - Faixa etria por sexo de pretos e pardos nos registros civis de nascimentos tardios de auto-
declarantes, 1939. Municpio de Nova Iguau. ......................................................................................158
xi

Figura 3.9 - Faixa etria por regio de nascimento nos registros civis de nascimentos tardios auto-declarantes
pretos e pardos, em 1934. Municpio de Nova Iguau. ..........................................................................160

Figura 3.10 - Faixa etria por regio de nascimento nos registros civis de nascimentos tardios auto-declarantes
pretos e pardos, em 1939. Municpio de Nova Iguau. ............................................................................161

Figura 3.11 Registros realizados no ano de nascimento da criana por cor e ano.
Municpio de Nova Iguau.........................................................................................................................169

Figura 3.12 Registros tardios por cor e ano. Municpio de Nova Iguau. .............................................170
xii

LISTA DE TABELAS

Tabela 1.1 Populao total recenseada.


Paraba do Sul, Entre Rios, Valena, Vassouras, Iguass e Estrella...........................................................41

Tabela 1.2 Porcentagem da populao classificada como preta e parda nos censos.
Paraba do Sul, Valena e Baixada. ............................................................................................................42

Tabela 1.3 Populao por ano segundo os censos.


Paraba do Sul, Valena, Vassouras e Iguass. ............................................................................. 186 anexo
Tabela 2.1 Total por tamanho das propriedades segundo o censo de 1920.
Municpio de Nova Iguau. .........................................................................................................................80

Tabela 2.2 Total por tamanho das propriedades segundo o censo de 1940.
Municpio de Iguass. .................................................................................................................................81

Tabela 2.3 - Faixa etria da populao recenseada residente na Baixada.


Municpio de Iguass e de Estrella. ............................................................................................................88

Tabela 2.4 - Total de Homens e Mulheres recenseadas. Municpio de Nova Iguau.................................88

Tabela 2.5 - Total de registros civis de nascimentos por cor e ano.


Municpio de Nova Iguau. ........................................................................................................................96

Tabela 2.6 Total e Porcentagem dos registros civis de nascimentos em 1889 por cor.
Municpio de Nova Iguau..........................................................................................................................99

Tabela 2.7 - Situao conjugal dos pais nos registros civis de nascimentos.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................100

Tabela 2.8 Legitimidade nos registros civis de nascimentos registradas por cor.
Municpio de Nova Iguau. ......................................................................................................................102

Tabela 2.9 Total de registros civis de nascimentos por regio de nascimento e cor.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................103

Tabela 2.10 Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas. Municpio de
Nova Iguau...............................................................................................................................................104

Tabela 2.11 Total de registros civis de nascimentos por cor e ano.


Municpio de Nova Iguau.........................................................................................................................107

Tabela 2.12 Presena de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de nascimentos.
Municpio de Nova Iguau.........................................................................................................................108

Tabela 2.13 Situao conjugal por cor nos registros civis de nascimentos.
Municpio de Nova Iguau.........................................................................................................................109

Tabela 2.14 Profisso do pai de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de nascimentos.
Municpio de Nova Iguau.........................................................................................................................109

Tabela 2.15 - Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas. Municpio de
Nova Iguau...............................................................................................................................................110
xiii

Tabela 2.16 Declarantes nos registros civis de nascimentos por cor.


Municpio de Nova Iguau.........................................................................................................................111

Tabela 2.17 Naturalidade do pai nos registros civis de nascimentos por cor.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................112

Tabela 2.18 Regio de origem do pai por ano de pessoas declaradas como pardas e pretas.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................113

Tabela 2.19 - Situao conjugal dos pais por cor de crianas registradas.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................115

Tabela 2.20 Total e porcentagem da legitimidade de pessoas registradas como pretas e pardas.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................115

Tabela 2.21 Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas.
Municpio de Nova Iguau. ......................................................................................................................116

Tabela 2.22 - Naturalidade do pai nos registros civis de nascimentos por cor.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................117

Tabela 2.23 Regio do nascimento nos registros civis de nascimentos por cor.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................120

Tabela 3.1 - Situao conjugal por cor nos registros civis de nascimentos.
Municpio Nova Iguau.............................................................................................................................124

Tabela 3.2 - Legitimidade nos registros civis de nascimentos registradas por cor.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................124

Tabela 3.3 - Declarantes nos registros civis de nascimentos por cor.


Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................125

Tabela 3.4 Profisso do pai por cor nos registros civis de nascimentos, 1939.
Municpio de Nova Iguau............................................................................................................188 Anexo
Tabela 3.5 - Profisso do pai de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de nascimentos por
situao conjugal. Municpio de Nova Iguau..........................................................................................127

Tabela 3.6 - Profisso da me nos registros civis de nascimentos por cor.


Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................127

Tabela 3.7 Profisso da me de pessoas registradas como pretas e pardas por situao conjugal.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................128

Tabela 3.8 - Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas. Municpio de
Nova Iguau...............................................................................................................................................129

Tabela 3.9 Presena de avs paternos e maternos de mes solteiras nos registros civis de nascimentos onde as
pessoas foram registradas como pretas e pardas. Municpio de Nova Iguau. ........................................129

Tabela 3.10 - Regio do nascimento nos registros civis de nascimentos por cor.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................130

Tabela 3.11 Localizao populacional por Distrito de acordo com o censo de 1940.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................131
xiv

Tabela 3.12 Porcentagem e Total de registros civis de nascimentos tardios por ano.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................133

Tabela 3.13 - Total de registros civis de nascimentos tardios por cor e ano.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................136

Tabela 3.14 - Total de registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem
por cor e ano. Municpio de Nova Iguau.................................................................................................137

Tabela 3.15 - Situao conjugal por cor nos registros civis de nascimentos de nascimentos tardios de crianas,
jovens e adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau. ......................................................137

Tabela 3.16 - Declarantes nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por
outrem por cor. Municpio de Nova Iguau................................................................................................138

Tabela 3.17 - Legitimidade nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados
por outrem por cor. Municpio de Nova Iguau.........................................................................................139

Tabela 3.18 Profisso do Pai por cor nos registros civis de nascimento tardios de crianas, jovens e adultos
declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau......................................................................... 190 anexo

Tabela 3.19 - Profisso do pai de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de nascimentos
tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau. ......................140

Tabela 3.20 - Profisso da me por cor nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos
declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau..................................................................................141

Tabela 3.21 - Profisso da me de pessoas registradas como pretas e pardas por situao conjugal nos registros
civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem. Municpio de Nova
Iguau.........................................................................................................................................................141

Tabela 3.22 Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros
civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem. Municpio de Nova
Iguau........................................................................................................................................................142

Tabela 3.23 Presena de avs paternos e maternos de mes solteiras nos registros civis de nascimentos tardios
de crianas, jovens e adultos declarados por outrem, nos quais as pessoas foram registradas como pretas e
pardas. Municpio de Nova Iguau............................................................................................................143

Tabela 3.24 - Regio do nascimento por cor nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e
adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau......................................................................146

Tabela 3.25 Regio da residncia por cor nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e
adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau......................................................................150

Tabela 3.26 Regio do nascimento por ano das pessoas declaradas como pretas e pardas nos registros civis de
nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem.
Municpio de Nova Iguau.........................................................................................................................151

Tabela 3.27 - Total de registros civis de nascimentos tardios de auto-declarantes por cor e ano.
Municpio de Nova Iguau.........................................................................................................................152

Tabela 3.28 - Situao conjugal por cor nos registros civis de nascimentos de nascimentos tardios de auto-
declarantes. Municpio de Nova Iguau....................................................................................................153

Tabela 3.29 - Legitimidade por cor nos registros civis de nascimentos tardios de auto-declarantes.
Municpio de Nova Iguau.........................................................................................................................153
xv

Tabela 3.30 - Profisso do pai por cor nos registros civis de nascimentos tardios de auto-declarantes.
Municpio de Nova Iguau.........................................................................................................................154

Tabela 3.31 - Profisso da me por cor nos registros civis de nascimentos tardios auto-declarantes.
Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................154

Tabela 3.32 - Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros
civis de nascimentos tardios de auto-declarantes. Municpio de Nova Iguau. .......................................155

Tabela 3.33 Profisso por sexo de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de nascimentos
tardios de auto-declarantes. Municpio de Nova Iguau...........................................................................159

Tabela 3.34 - Regio do nascimento por cor nos registros civis de nascimentos de auto-declarantes. Municpio
de Nova Iguau.........................................................................................................................................162

Tabela 3.35 Locais de Nascimento no Vale do Paraba nos registros civis de nascimentos dos auto-
declarantes.Municpio de Nova Iguau......................................................................................... 191 anexo

Tabela 3.36 - Regio da residncia nos registros civis de nascimentos de auto-declarantes.


Municpio de Nova Iguau........................................................................................................................163

Tabela 3.37 - Regio de nascimento das crianas registradas no ano de seu nascimento por cor. Municpio de
Nova Iguau..............................................................................................................................................171

Tabela 3.38 - Regio de nascimento por cor das pessoas registradas fora do ano de seu nascimento (tardios).
Municpio de Nova Iguau.......................................................................................................................172

Tabela 3.39 - Profisso das pessoas que se auto-declararam por ano.


Municpio de Nova Iguau.......................................................................................................................173

Tabela A.1 Propriedades por distrito, 1927. Municpio de Nova Iguau. ...........................................186

Tabela A.2 Profisso do pai de crianas registradas tardiamente como pretas e pardas.
Municpio de Nova Iguau. .....................................................................................................................187
xvi

SIGLAS

AESIRP Arquivo Eclesistico de Santa Isabel do Rio Preto

AMC Acervo Memrias do Cativeiro

AMMN Acervo UFF Petrobrs Cultural de Memria e Msica Negra

RCPNNI Ofcio do Registro Civil das Pessoas Naturais 1 Circunscrio de Nova Iguau

AP Arquivo Pessoal

MJERJ - Museu da Justia do Estado do Rio De Janeiro


xvii

SUMRIO

Introduo
Tema .................................................................................................................................19
Campesinato......................................................................................................................20
Campesinato Negro no Perodo do Ps-Abolio.............................................................23
A pesquisa, metodologia e fontes.......................................................................................28

Captulo 1 Vale do Paraba: a passagem para a liberdade


e suas conseqncias. ...................................................................................................... 33

1.1 A crise econmica e a populao no Vale do Paraba. ................................................34


O caf..................................................................................................................................34
Do caf ao pasto.................................................................................................................37

1.1.2 Populao .................................................................................................................41


Censos................................................................................................................................41

1.2 Trajetrias individuais de ex-escravos e de seus descendentes...................................46


Os ltimos anos .................................................................................................................47
Estabilidade Versus Migrao...........................................................................................54
Migrar................................................................................................................................57

1.3 O Registro Civil de Nascimento..................................................................................62


Legislao..........................................................................................................................65
O Registro Civil no perodo do ps-abolio... 67

Captulo 2 As trajetrias de ex-escravos e de seus descendentes na Baixada


Fluminense.........................................................................................................................73

2.1 A regio da Baixada Fluminense..................................................................................73


De Vila de Iguass a Nova Iguau.....................................................................................73
A crise do caf....................................................................................................................76
A laranja.............................................................................................................................78
Arranjos de trabalho na laranja.........................................................................................82

2.2 Descendentes de libertos nascidos no ps-abolio......................................................84


Motivaes para migrar: laranja, trabalho e terra............................................................89

2.3 A famlia de ex-escravos e de seus descendentes 1888-1940.......................................94


2.3.1 Os registros civis de crianas.....................................................................................95
2.3.2 1889 o imediato ps-abolio.................................................................................98
2.3.3 Os anos posteriores abolio 1888 a 1940.........................................................105
1889 a 1919......................................................................................................................106
1920-1940.........................................................................................................................114
xviii

Captulo 3 - A Migrao e a Estabilizao de Pretos e Pardos


em Nova Iguau..............................................................................................................122

3.1 O ltimo Ano de Coleta, 1939. .................................................................................123

3.2 Os Registros Civis de Nascimentos Tardios ..............................................................133


Registro tardio de crianas, jovens e adultos declarados por outrem.............................136
Os auto-declarantes..........................................................................................................152

3.3 A busca pelo registro civil da populao de pretos e pardos


na Era Vargas ...................................................................................................................164
Pretos e pardos nos registros civis - 1934 e 1939 ...........................................................168

Concluso ........................................................................................................................175

Bibliografia.......................................................................................................................180

Anexos...............................................................................................................................185
I Tabelas..........................................................................................................................186
II O reencontro de Izaquiel ............................................................................................193
III Registro Base.............................................................................................................197
IV Lista dos Entrevistados..............................................................................................198
xix

Introduo

Tema

O tema, da presente dissertao, a migrao de pretos e pardos para a Baixada

Fluminense, entre os anos de 1888 a 1940. Seu objetivo mostrar que, a estratgia de migrar

para o Municpio de Iguass, no incio do sculo XX, um elemento importante para

compreender o perodo do ps-abolio por que:

1 As migraes, dentro do campo e principalmente para centros urbanos em

expanso, demonstram que os ex-escravos e seus descendentes, nascidos e criados no Vale do

Paraba, no estavam isolados no campo. Tinham conhecimento das economias crescentes e

das novas oportunidades de trabalho no Estado do Rio de Janeiro.

2 A crise do caf, a expanso da criao de gado e da produo de eucalipto

dificultou, para muitos, o acesso ao trabalho e a terra. Diante deste quadro, a famlia ex-

escrava no conseguiu reproduzir o seu modo de vida, uma vez que, a pequena roa e o

emprego tornaram-se insuficientes para manter esse grupo estvel. Dito isto, os filhos da

primeira gerao de libertos, nascidos posteriormente abolio, adotaram como uma das

estratgias de sobrevivncia e de reproduo da famlia, a migrao.

3 Durante a dcada de 1930, a crise econmica chegou ao seu auge no Vale do

Paraba. Neste mesmo ano, a produo de laranjas na Baixada Fluminense, principalmente no

Municpio de Nova Iguau, ganhou destaque internacional. A necessidade de um maior

contingente de mo-de-obra, a diversificao das formas de trabalho, o crescimento urbano

dos distritos ao redor da plantao e a possibilidade de adquirir terras mais baratas,

incentivaram a migrao, da populao de pretos e pardos, para a regio da Baixada

Fluminense.
xx

4 Aps a dcada de 1930, durante o Governo Vargas, foram promulgadas leis que

permitiram a populao de pretos e pardos ter maior acesso ao registro civil de nascimentos,

na Baixada Fluminense. Neste sentido, as leis e decretos sobre o registro civil tardio, entre as

dcadas de 1930 e 1940, possibilitaram a um grupo especfico se registrar e legitimar suas

relaes familiares.

Para justificar a formulao dessas afirmaes, necessrio discutir sobre campesinato

e o campesinato negro especfico, para, posteriormente, analisar, de que forma a migrao,

tornou-se uma estratgia para os libertos e seus descendentes no perodo do ps-abolio.

Campesinato

Nesta parte, sero discutidos os aspectos referentes ao campesinato em geral. A partir

de uma discusso bibliogrfica, pretende-se levantar os principais questionamentos de ordem

terica, para no tpico seguinte, apresentar as principais experincias de pesquisas nas

Amricas e principalmente no Brasil.

O estudo do campesinato, em sociedades pr-industriais, permite compreender a

existncia de uma lgica e de um modo de produo interno que no o capitalista. Nesse

nterim, Godelier e Bettelheim1 alertaram para a necessidade de se realizar estudos, sobre a

especificidade da racionalidade econmica de outros modos de produo, que no o

capitalista, e o ponto de partida deveria ser a anlise do clculo das unidades produtivas. Isto

significa dizer que, deve-se atentar para as particularidades da economia camponesa,

analisando as categorias que lhe so prprias e tentar apreender atravs destas, suas leis

prprias e seu funcionamento.

Nesse sentido, a empresa camponesa no apresentava as mesmas caractersticas da

empresa capitalista, no que diz respeito ao trabalho assalariado, a procura de lucros e a

1
GODELIER, M. Rationalit et Irrationalit em Economie. Paris: Franois Maspero, 1968 e BETTELHEIM,
C. Calcul conomique et Formes de Propriet. Paris: Franois Maspero, 1970 apud GARCIA JR., Afrnio
Raul. Terra de Trabalho: Trabalho Familiar de Pequenos Produtores. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1983.
xxi

ampliao das relaes de mercado. Para Aleksandr Chaianov, o campesinato no visava o

lucro sobre o capital investido, mas a procura de um equilbrio timo entre exigncias de
2
consumo da famlia e fora de trabalho disponvel. De acordo com seu argumento, o

trabalho familiar era o ponto central na economia camponesa, uma vez que, dela dependiam

tanto a produo, quanto o consumo.

Na presente dissertao, buscou-se enfatizar a diferenciao de duas falsas

categorizaes: a oposio entre agricultura de subsistncia e agricultura de mercado.

Preocupao, semelhante, foi a de Afrnio Garcia, ao informar que esta oposio sempre

privilegiou o segundo em detrimento do primeiro, uma vez que, a bibliografia clssica

afirmava que s haveria leis econmicas havendo mercado. De acordo com o autor, o

mercado tornou-se uma categoria com contedo dado e que podia definir qualquer sistema

econmico. Desse modo, as crticas a este etnocentrismo terico podem ser encontradas nas

anlises de Polanyi. Toma-se, aqui, por agricultura de subsistncia, tudo aquilo que
3
socialmente necessrio para a reproduo fsica e social do trabalhador e sua famlia.

Evidentemente, esta suposio no invalida a existncia de uma circulao mercantil nas

lavouras de subsistncia, uma vez que, este campesinato familiar comercializava os produtos

excedentes, nos mercados locais.

Em virtude da especificidade da economia camponesa, o parentesco figura central

nesse tipo de produo. De acordo com Witold Kula, devido ao fato de a unidade da produo

e a do consumo ser regido por regras familiares, a diviso do trabalho, internamente, era uma

das particularidades do campesinato. Um dos principais elementos dessa economia a busca

pelo equilbrio entre consumidores e produtores, que por vezes, encontra-se arriscado de se

romper. Giovanni Levi explica um pouco mais sobre esse modelo:

2
ESPADA, H. L. A Micro-Histria Italiana: escalas, indcios e singularidades. Ed. Civilizao Brasileira, Rio
de Janeiro, 2006. p. 239.
3
GARCIA, A. op. cit., p. 15-16.
xxii

Esse modelo baseado na hiptese de uma famlia conjugal que, segundo o tempo
transcorrido desde o matrimonio, deve primeiro manter os filhos que nascem, em mdia a cada trs
anos, como exclusivamente consumidores, at a partir desta data, progressivamente a relao
consumidores/produtores melhora at chegar a quando, sendo a me mais fecunda, todos os filhos
so ao mesmo tempo consumidores e trabalhadores.
Essa relao consumidores/trabalhadores de fato a regra fundamental que nos permite
avaliar as escolhas de cada famlia: escolhas de agregao e desagregao, de contratao de
servos ou de agregao de parentes, de expulso, temporria ou definitiva, de membros. E podemos
alarg-la para alm do esquema da famlia conjugal para fazer dela uma lei explicativa geral: a
famlia em cada uma de suas fases corre o risco de sobrecarga de consumidores e pode escolher uma
poltica corretiva; e isso se verifica, em condies normais, particularmente depois de 12-14 anos de
matrimonio de cada famlia conjugal que a compe. 4

Nesse horizonte, Levi constri a anlise sobre a mobilidade populacional, em sociedades pr-

industriais. Para ele, a migrao sazonal uma das estratgias familiares utilizadas para

manter o equilbrio econmico internamente. Da mesma forma, esses exploravam outros

recursos: como o celibato, o retardo na idade do matrimnio dos filhos e a emigrao

definitiva. Ainda de acordo com este autor, a migrao poderia ser pensada de duas formas: a

migrao normal, feita por rapazes na fase adolescente para adulta; e aquela praticada, pelos

chefes de famlia, quando todas as alternativas de manter o equilbrio se esgotavam. Sem

embargo, nessa dissertao, pensa-se a migrao do ponto de vista da origem, no como uma

desagregao da famlia e da comunidade, mas como uma estratgia para a sua

conservao. 5

As formas de lidar com a crise dependiam, em grande parte, das caractersticas das

famlias. De acordo com Levi, ao analisar os grupos domsticos, por meio de suas estratgias

para manter o equilbrio internamente, demonstrou que, as famlias extensas e ampliadas

compostas por mais de um ncleo familiar eram o modo de organizao que melhor

enfrentava os desequilbrios da relao consumidores/produtores nos momentos de maior

dificuldade do ciclo de reproduo das famlias camponesas. 6

4
ESPADA, H. L. op. cit., p. 242.
5
Idem.
6
Ibidem.
xxiii

Quando se coloca a famlia no centro dos estudos, preciso perceber que, no a

relao de parentesco que importante, mas sim o seu significado social. De sociedade para

outra este significado muda. Dito isso, atravs de seu estudo que se torna possvel

compreender: como a famlia se reproduz, o que a afeta e porque se modifica.7 Parte-se aqui

do mesmo princpio de Ana Rios, na qual a famlia um grupo social ativo, capaz de interferir

socialmente. 8

Nesse trabalho, optou-se por utilizar as mesmas trs nomenclaturas de Rios para

diferenciar os tipos de famlias. Na primeira, encontra-se a famlia nuclear, que composta

pela relao me e/ou pai e filhos solteiros ou sem famlia formada. Na segunda categoria,

encontra-se a famlia ampliada, que agrega os filhos com famlias prprias e outros parentes

de mesmo sangue; como os avs, tios, primos, entre outros. Por ltimo, est a famlia

estendida, que no grupo familiar considerado, inclui pessoas que no possuem vnculo

consangneo. 9

Campesinato Negro no Perodo do Ps-Abolio

Nesta parte, sero levantadas questes relevantes, de trabalhos acadmicos, que tratam

sobre o campesinato negro no perodo do ps-abolio. Os estudos mais recentes tm nas

Amricas, o foco central. Nesse sentido, Rebecca Scott, Thomas Holt e Eric Foner vm

discutindo essa questo, utilizando como base de pesquisa Cuba, Jamaica e Sul dos Estados

Unidos, respectivamente.

7
RIOS, A. L. Famlia e Transio: Famlias negras em Paraba do Sul, 1872-1920. Dissertao. (Mestrado
em Histria) Instituto de Cincias Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niteri, 1990. p. 7.
8
Idem.
9
JOHNSON, Ann Hagerman. The impact of market agriculture on family and household structure in
nineteenth century Chili. Hispanic American Historical Review 58 (4): 625-48. 1978 e KUZNESOF, Elizabeth.
Household Economy and Urban Development, So Paulo, 1765 to 1836. Boulder, Colo., Westview Pres,
1986 apud RIOS, A. op. cit., p. 7.
xxiv

Ao analisar este perodo, toma-se muito cuidado na utilizao do termo ps-abolio.

Esse perodo, ainda hoje, muito caracterizado como o momento da transio da mo-de-

obra escrava para a livre assalariada. No obstante, esse termo est ligado a uma posio

evolucionista, uma vez que afirma haver uma substituio automtica de um sistema por

outro. Ou seja, todos os escravos, aps a abolio, tornar-se-iam, automaticamente,

trabalhadores assalariados. Ao focalizar apenas neste termo, perde-se na anlise toda uma

gama de transformaes empreendidas pelos libertos, principalmente, no que tange a

diversificao dos arranjos de trabalho.

Os escravos e libertos no foram passivos no perodo do ps-abolio, pelo contrrio,

em muitos locais, agiram de forma a tentar mudar a sociedade em que viviam. Esse parece ter

sido, o caso do levante na Jamaica, ocorrido em 1831, no qual os escravos se rebelaram

ateando fogo em casas e em plantaes. Aparentemente, a causa foi a existncia de rumores

de que o Rei havia os libertado e que os proprietrios tinham escondido os papis. Os

escravos estavam em uma guerra defensiva, buscando manter os direitos, os privilgios e as

terras que eles achavam ter direito. Diante destes acontecimentos, pode-se exemplificar, as

medidas tomadas pelo Colonial Office, como a implantao de reformas e a abolio gradual.
10

Assim como na transformao social, os escravos tentaram participar ativamente da

vida poltica de seu pas. Com o fim da escravido, aps a Guerra Civil americana, Foner

aponta que os libertos buscaram reconstruir igrejas, construram escolas para negros e

participaram das eleies como votantes. Assim como em 1887, no perodo da Reconstruo,

quando este grupo realizou uma grande greve que mobilizou milhares de cortadores de cana
11
da Lousiania, desafiando os grandes proprietrios. De forma semelhante, os cubanos de

10
HOLT, Thomas. The Problem of Freedom: Race, Labor, and Politics in Jamaica and Britain, 1832-1938
Baltimore and London: Johns Hopkins University Press, 1992.
11
FONER, Eric. A Short History of Reconstruction, 1863-1877. New York: Harper & Row, 1990.
xxv

ascendncia africana, fizeram uma aliana inter-racial que participou na Guerra de

Independncia de Cuba entre 1895 a 1898. 12

No perodo do ps-abolio, os libertos tentaram ter acesso pequena propriedade de

terra. Na Jamaica, eles juntaram dinheiro, durante anos, para poder comprar o seu pequeno

pedao de roa. Acreditava-se, que esses tenderiam a comprar terras mais baratas,

improdutivas, para subsistncia e mais distantes das grandes propriedades que tinham sua

produo direcionada para o mercado externo. Contudo, o que se pde perceber, na Jamaica,

foi um movimento quase que contrrio. De acordo com Holt, os libertos e seus descendentes

deixaram as fazendas onde foram escravos e compraram pequenas propriedades, localizadas

prximo as parquias, nos centros urbanos e principalmente perto das plantations. Em suas

roas tentavam aliar uma produo de subsistncia com produtos para a venda em mercados

locais. 13

A busca pela independncia dos ex-escravos e de seus descendentes perpassava por

dois fatores: terra e trabalho. Ao comprar a pequena propriedade, em boa parte, as mulheres

saram do eito das grandes lavouras e, aparentemente, viraram-se tanto para dentro de casa

quanto no trabalho familiar da roa. Na Jamaica, em virtude das terras compradas estarem

localizadas prximas aos grandes exportadores, pode ter permitido, aos ex-escravos, misturar
14
trabalho assalariado com produo familiar independente. A diversificao das formas de

trabalho e de renda pode ter possibilitado, aos libertos, uma maior independncia em relao

aos grandes proprietrios.

Atravs destas experincias, possvel perceber quais foram os significados de

liberdade, para os ex-escravos e seus descendentes. Buscaram participar, ativamente, da vida

12
SCOTT, R.J. Alm da Escravido: Investigaes sobre raa, trabalho e cidadania em sociedades ps-
emancipao. RJ: Ed. Civilizao Brasileira, 2005.
13
HOLT, T. op. cit., principalmente captulo 5.
14
Idem.
xxvi

poltica, sendo votantes ou mesmo rebeldes. Procuraram obter a pequena propriedade, para

dela retirar seu sustento e renda. Assim, como a mulher e as crianas deixaram o trabalho

coletivo, optando por cuidar do lar e, consequentemente, o trabalho familiar na roa. Todavia,

aparentemente, ao no conseguir obter os seus desejos, uma das estratgias adotadas pelos

libertos e seus descendentes foi a migrao.

Migrar, para muitos ex-escravos, foi um dos mais importantes significados da

liberdade. De acordo com Foner, com a emancipao aps a Guerra Civil americana, parecia

que metade da populao do sul havia sado pelas estradas. Para este autor, uma das maiores

fontes de orgulho da populao negra, nos Estados Unidos, seria a de usufruir o direito de ir e

vir. 15

A migrao, no perodo do ps-abolio, pode ter motivaes e significados prprios.

De acordo com Foner, durante a Reconstruo, o movimento em massa da populao negra

pareceu aos brancos como uma migrao sem destino. Para eles, isso era uma prova de que os

negros entendiam a liberdade como a negao do trabalho, o que levava a ociosidade e a

vagabundagem. Este autor aponta que, a maior parte dos libertos, no saiu das suas

fazendas de origem e, os que viajaram em geral, no passavam de algumas milhas. 16

Aparentemente, os libertos e seus descendentes buscaram migrar para locais

estratgicos, onde acreditavam conseguir mais liberdade. Foner explica que, as cidades e os

municpios sulistas incharam aps a Guerra Civil americana, visto que nesses locais era

possvel encontrar instituies sociais negras, como escolas, igrejas, sociedades de ajuda

mtua, o exrcito (formado por soldados negros) e a agncia dos libertos. Esses ofereciam

proteo contra a violncia, que se tornou to comum, no Sul dos Estados Unidos. 17

15
FONER, Eric O Significado da Liberdade. Revista Brasileira de Histria, 8, 1988. p. 14-17.
16
FONER, E. op. cit., p. 14.
17
FONER, E. op. cit., p. 15.
xxvii

No processo de migrao, os ex-escravos e seus descendentes, em boa parte dos casos,

visavam encontrar uma alternativa econmica ao trabalho coletivo e rural. Dessa forma, foi

possvel acompanhar muitas famlias, na Jamaica, abandonando as fazendas, aps o perodo

de aprendizagem. Como j mencionado anteriormente, muitos compraram propriedades

onde podiam diversificar as fontes de renda, com trabalho familiar e assalariado nas
18
plantations. De forma um pouco semelhante, no Sul dos Estados Unidos, muitos libertos

migraram para a cidade em busca de melhores condies de trabalho. Para Foner, esse fluxo

inchou o mercado de trabalho, minando a situao econmica dos ex-escravos e destinando-os

aos empregos menos valorizados. As conseqncias desse processo foram intensas para boa

parte da populao de negros, que tiveram de viver em condies indignas nas favelas

construdas nos subrbios da cidade. 19

A busca pelos parentes motivou boa parte dos migrados nos Estados Unidos. Nada

parece ter motivado mais a imigrao no Sul do que o empenho em reunir as famlias,

separadas durante a escravido. De acordo com Foner, a emancipao, aparentemente, era

incompleta, para os libertos, at a reunio dos familiares vendidos como cativos. Em parte dos

casos, as buscas eram fracassadas, pois muitas vezes ao se reencontrar parceiros antigos, esses

j tinham se casado novamente. 20

No obstante, a abolio permitiu a boa parte dos migrados reunir novamente seus

familiares, assim como, reafirmar e solidificar os seus laos. Foner apontou que, no perodo

do ps-abolio, foram muitos os libertos que procuraram legalizar e legitimar suas relaes e

vnculos conjugais. Quando o Departamento de Libertos e os governos estaduais autorizaram

o registro e a celebrao da unio dos escravos, houve uma busca intensa, pelos libertos, para

legitimar a sua famlia.

18
HOLT, T. op. cit.
19
FONER, E. op. cit., p.15-16.
20
FONER, E. op. cit., p. 16.
xxviii

Deste modo, nesta presente dissertao, toma-se os ex-escravos e os seus descendentes

como pessoas que agem e tentam mudar a sua situao, no perodo do ps-abolio. Dentre

todas as caractersticas dos significados da liberdade, aponta-se a migrao como a menos

estudada e a que mais apresenta concluses precipitadas. Aqui, procurar-se atingir uma

experincia nica de migrao, de uma regio que concentrou uma grande populao de

escravos aps 1850, O vale do Paraba, para uma regio at ento no incio do sculo XX

considerada inspita, a Baixada Fluminense. No captulo 1, sero discutidas as experincias

do ps-abolio e de que forma elas influenciaram na construo do objeto desta dissertao.

A pesquisa, metodologia e fontes

A idia de trabalhar com migrao, no ps-abolio, surgiu durante a vigncia da

Bolsista de Iniciao Cientfica do PIBIC/CNPq na Universidade Federal Fluminense, entre

2004 e 2006, sob orientao da Professora Hebe Mattos. Nesse perodo, durante o contato

com as entrevistas depositadas no Acervo Memrias do Cativeiro - feitas por Ana Rios,

Robson Martins e Hebe Mattos - foi possvel constatar a existncia de muitos relatos sobre a

migrao de parentes dos entrevistados. O que mais surpreendeu foram os depoimentos, que

em sua maioria, mencionavam a regio da Baixada Fluminense como destino final dos

parentes migrados do Vale do Paraba.

A partir desses indcios, buscou-se, atravs de outras fontes, compreender a

experincia e a trajetria de pretos e pardos que migraram do Vale do Paraba. Ao ingressar

no curso de Mestrado do Programa de Ps-Graduao em Histria Social da Universidade

Federal do Rio de Janeiro, sob orientao da Professora Ana Rios, tentou-se cruzar as

entrevistas realizadas, no Vale e na Baixada Fluminense, com o censo demogrfico e com o

Registro Civil de Nascimento do Municpio de Nova Iguau. A finalidade desse tratamento de

fontes o de atingir a experincia de migrao, para essa regio.


xxix

Em virtude do tema desta dissertao, optou-se por utilizar quatros censos

demogrficos, de 1872, 1890, 1920 e 1940. Apesar, da presente pesquisa, comear a tratar dos

anos posteriores a 1888, a anlise do censo de 1872 torna-se importante, visto que permite

chegar populao de pretos e pardos antes da abolio. Esse foi o ltimo censo, antes do fim

da escravido, no qual a categoria cor apareceu.

No censo de 1890, a categoria cor permaneceu, o que permitiu, mesmo que

precariamente, ter acesso a um retrato do perodo inicial do ps-abolio. Infelizmente, o

censo posterior s seria realizado trinta anos depois, e esse no informava a cor dos

recenseados. No que tange ao censo de 1890 como o de 1920, entre os estudiosos h um

consenso de que esses apresentam problemas. No entanto, essas so uma das poucas fontes

existentes, para o perodo; apesar disto, nelas possvel encontrar tendncias importantes para

o estudo do perodo do ps-abolio. A categoria cor voltaria apenas no censo de 1940,

aps 50 anos sem qualquer meno a ela. Desse modo, na presente dissertao, selecionou-se

o ano de 1940 como o limite de nossa pesquisa, pois atravs dos dados, obtidos de outras

fontes, seria possvel compar-los com o censo.

Nas entrevistas pesquisadas e realizadas, buscou-se dar um tratamento especfico.

Atravs das fontes orais, procurou-se construir chaves temticas de forma a obter
21
coincidncias narrativas e atingir o processo da migrao. Nessa dissertao sero

analisadas as entrevistas do projeto Memrias do Cativeiro, do acervo Petrobras Cultural

de Memria e Musica Negra no Estado do Rio de Janeiro e as realizadas na Baixada

Fluminense durante a etapa de pesquisa. 22

21
H toda uma bibliografia sobre a problemtica do uso das fontes orais e de como elas podem ajudar na
obteno de dados sobre experincias e trajetrias pessoais que no foram documentadas por escrito. Neste
sentido ver as principais referncias: FERREIRA, M. e AMADO, J. Usos e Abusos da Histria Oral. Rio de
Janeiro: FGV, 1996; HALBWACHS, Maurice. A Memria Coletiva. SP: Vrtice, 1990; POLLACK, Michael.
Memria e Identidade Social. in: Estudos Histricos. RJ, vol. 5, n.10, 1992; PRINS, Gwyn Histria Oral in:
BURKE, P. (org.). A Escrita da Histria: novas perspectivas. SP: UNESP, 1992.
22
As entrevistas do projeto Memrias do Cativeiro e as do Projeto Petrobrs Cultural podem ser lidas na ntegra
nos seguintes stios www.historia.uff.br/labhoi e www.historia.uff.br/jongos/acervo .
xxx

Para o perodo do ps-abolio, so poucas as fontes que mencionam a trajetria dos

libertos ou tratam sobre a cor. Em um esforo inicial, pretendeu-se analisar as fontes

paroquiais de batismo, tanto no Vale do Paraba como na Baixada. Infelizmente, nos anos

posteriores a abolio, esses assentos se tornaram muito pobres de informaes, assim como

no mencionam a cor. A falta desta categoria foi percebida tambm em outras fontes de

pesquisas. Hebe Mattos, ao trabalhar com uma documentao judiciria, percebeu que, em

boa parte dos casos, a cor s era mencionada nos documentos quando havia necessidade de

qualificar a testemunha. De acordo com a autora, o termo preto ou negro, em sua grande

maioria, era usado para fazer referncia a condio de ex-escravo da pessoa citada na

documentao. 23

O registro civil comeou a existir em um ano crucial para o nosso objeto de pesquisa:

em janeiro de 1889. Pode-se apontar como um dos primeiros estudos o de Ana Rios, que

utilizou os registros civis de nascimento e de bito em sua pesquisa para a dissertao. Em

seus dados, a quantidade de registros de casamentos de pessoas negras, ao longo dos anos,

quase inexistiram, dessa forma, ela buscou utilizar como fonte os nascimentos e os bitos.

Nesses, a categoria cor aparece frequentemente, porm, com o passar dos anos, a sua meno

diminui consideravelmente.

De forma um pouco diferente, possvel encontrar, no Oficio do Registro Civil das

Pessoas Naturais da 1 Circunscrio de Nova Iguau, uma documentao com caractersticas

bem especficas. Nessa documentao, impressionante a quantidade de registros que

apresentam a categoria cor. Em virtude da anlise do objeto de estudo, desta dissertao, estar

compreendido em 52 anos (1888-1940) optou-se por digitalizar os registros de nascimentos e

de bitos de cinco em cinco anos. Sendo assim, foram selecionados os anos de 1889, 1894,

1899, 1904, 1909, 1914, 1919, 1924, 1929, 1934 e 1939; que resultou em um total de quase

23
MATTOS, H. Das Cores do Silncio: Significados da liberdade no Brasil escravista. Rio de Janeiro: Arquivo
Nacional, 1995/ Nova Fronteira, 1997. p. 104.
xxxi

12 mil fotos. No entanto, por causa do curto tempo de durao do Mestrado, optou-se por

utilizar apenas os registros civis de nascimentos deste cartrio.

A partir dos dados, obtidos do registro de nascimentos, foi construdo um banco de

dado no Access. Nesse banco h 6774 registros de nascimentos de crianas, jovens e adultos,

entre 1889 e 1939.

Um das primeiras questes que surgiram, na anlise dessas fontes, foi a

representatividade delas em relao realidade. Assim como os censos, os registros civis no

podem ser considerados extremamente confiveis, como ser visto no captulo 1. Ao analisar

as taxas brutas de nascimento e de mortalidade, percebe-se a existncia de uma quantidade

alta de subregistro. Ana Rios fez este clculo para Paraba do Sul e encontrou, entre a

populao de pretos e pardos, um subregistro ainda maior em relao aos censos. Apesar de

toda a problemtica inerente a utilizao destas fontes, elas podem demonstrar tendncias

interessantes sobre o perodo.

No captulo 1, sero discutidas as caractersticas do campesinato negro no Brasil. Na

primeira parte, desse captulo, ser feita uma anlise bibliogrfica do tema, enfatizando as

especificidades do Vale do Paraba. Na segunda parte, atravs da anlise das entrevistas

coletadas no Vale do Paraba, busca-se compreender as experincias e trajetrias pessoais de

migrados, dessa regio, para a Baixada Fluminense. Finalizando, sero apresentadas as

principais caractersticas, dos dados obtidos, do Registro Civil de Nascimento de Nova

Iguau, de modo a comparar com os registros encontrados por Ana Rios, em Paraba do Sul.

No segundo captulo, sero discutidas as principais caractersticas da Baixada

Fluminense, na virada do sculo XIX para o XX. Trata-se, inicialmente, de apresentar um

quadro econmico e poltico, de forma a tentar levantar o que pde ter atrado populao de

pretos e pardos, para essa regio. Na segunda parte deste captulo, sero analisadas as

experincias e trajetrias pessoais dos filhos e netos de libertos, que migraram do Vale do
xxxii

Paraba, e se instalaram, mesmo que de forma precria, na Baixada Fluminense, entre os anos

30 e 40. Por ltimo, ser construdo um panorama dos primeiros anos do ps-abolio no

Municpio de Nova Iguau; para tanto, sero utilizados os registros civis de nascimentos de

crianas registradas no mesmo ano de seu nascimento.

No captulo 3, sero trabalhadas as formas, pelos quais os pretos e pardos buscaram

integrar-se na regio para onde migraram, seja no mundo do trabalho, na regularizao de

arranjos familiares e/ou na busca de identidade civil para si e para seus filhos. Na primeira

parte do texto ser feito um panorama da presena de pretos e pardos, em 1939, ltimo ano de

coleta dos registros civis. Em seguida, sero analisados todos os registros tardios. Esses se

dividem em dois: os registros de crianas, jovens e adultos que foram registrados por outrem;

e os registros de pessoas que, na fase adulta, auto-declararam seu nascimento no cartrio.

Atravs desses registros, sero construdas tipologias dos grupos que buscaram legitimar a sua

famlia e a si tardiamente. Por ltimo, sero analisadas as leis e os decretos promulgados,

entre 1930 e 1940, durante o Governo de Vargas, que, aparentemente, permitiram a um grupo

especfico se regularizar atravs do Registro Civil de Nascimento em Nova Iguau.


xxxiii

Captulo 1 Vale do Paraba: a passagem para a liberdade e suas conseqncias.

No presente captulo, ser discutido o processo de definhamento da economia cafeeira,

na regio do Vale do Paraba, a introduo de novas prticas produtivas e as experincias de

ex-escravos e de seus descendentes na passagem para a liberdade, esta compreendida entre os

anos de 1872 e 1930. Para tanto, o mesmo ser dividido em trs partes:

Na primeira parte do texto, ser feita uma discusso da bibliografia sobre a passagem

para a liberdade no Vale do Paraba, utilizando os trabalhos de Stanley Stein, Warren Dean,

Hebe Mattos, Joo Luis Fragoso e de Ana Rios. Na segunda parte, o texto tratar sobre os

ltimos anos de escravido na regio e os primeiros anos do perodo do ps-abolio,

seguindo as trajetrias pessoais dos avs dos entrevistados que tiveram na famlia as

experincias da passagem para a liberdade e da migrao para a Baixada Fluminense. Para

atingir esse objetivo, sero usados dois tipos de fontes: os censos de 1890, 1920 e 1940 com

a finalidade acompanhar o crescimento populacional nas regies de Valena, Paraba do Sul e

de Vassouras e as fontes orais coletadas para projeto Memrias do Cativeiro, as

depositadas no Acervo UFF Petrobrs Cultural de Memria e Msica Negra, e as

produzidas na regio da Baixada Fluminense para a dissertao. 24

Na terceira parte, ser analisada a possibilidade da utilizao do registro civil como

fonte de pesquisa neste trabalho. O objetivo ser o de comparar os dados gerais obtidos por

Ana Rios, em sua dissertao sobre Paraba do Sul, com os dados coletados no Registro Civil

de Nascimento, do Municpio de Nova Iguau. 25

24
Os dois acervos podem ser consultados no seguinte stio: www.historia.uff.br/labhoi .
25
RIOS, A. L. Famlia e Transio: Famlias negras em Paraba do Sul, 1872-1920. Dissertao. (Mestrado
em Histria) Instituto de Cincias Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niteri, 1990.
xxxiv

1.1 A crise econmica e a populao no Vale do Paraba.

O caf

Nesta parte, sero discutidas as causas que, porventura, influenciaram a crise

econmica da regio cafeeira do Vale do Paraba, mudando, assim, drasticamente a paisagem

da regio. Na segunda metade do sculo XIX embora a economia cafeeira estivesse no auge,

j comeava a demonstrar os primeiros sinais de desgaste.

Para alm das pragas que assolaram as fazendas de caf no final do sculo XIX, a

diminuio da oferta de mo-de-obra contribuiu para o incio da crise. Com o fim do trfico

intercontinental de escravos, houve um aumento nos gastos dentro das fazendas, uma vez que

os mesmo se tornaram escassos. Os emprstimos, calculados pelo valor da escravaria, no

podiam ser amortizados. A compra de maquinarias, para tentar substituir essa mo-de-obra

deficitria, ampliou ainda mais as dvidas adquiridas, pois se mostraram muito mais onerosas

do que era previsto. Para Stein, esses eventos contriburam para que, na dcada de 1870, com

um mercado internacional no favorvel, a economia cafeeira enfrentasse o incio de sua

crise, a qual s terminaria com a implantao do pasto na dcada de 1920. 26

Para entender melhor tal processo, ampliar-se- a discusso abrangendo as possveis

causas que levaram ao fim a poca urea da economia cafeeira no Vale do Paraba.

***

26
STEIN, S. J. Vassouras: Um municpio brasileiro do caf, 1850-1900. RJ, Ed: Nova Fronteira, 1990. p. 253.
xxxv

Geograficamente, a regio do Vale localiza-se ao entorno do rio Paraba do Sul, na

divisa estadual entre Rio de Janeiro e Minas Gerais. Essa regio caracterizada pela presena

de grandes extenses de terra em forma de meias-laranjas, ou morros arredondados. Em

virtude do clima ameno e da presena de um solo frtil, utilizou-se essas pequenas encostas

para a plantao de caf no decorrer do sculo XIX.

As causas, que contriburam para o definhamento econmico da regio, podem ser

encontradas na prpria estrutura de montagem das fazendas de caf. A repetio das tcnicas

de produo, a destruio da mata virgem, e o aumento da plantao de caf, colaboraram

simultaneamente para o desequilbrio no ecossistema da regio. As pragas como formigas,

ervas daninhas, ferrugem e gafanhotos passaram a ser mais facilmente encontradas em reas

devastadas. A tentativa de elimin-las quase sempre era intil, por conta de inseticidas, na

maioria das vezes ineficazes. 27

A partir da segunda metade do sculo XIX, o desgaste do solo acentuou-se. As

mesmas encostas, as quais ajudaram no incio da plantao do caf, foram as piores inimigas

desse tipo de plantao. O sistema empregado pelos fazendeiros previa a derrubada de matas

virgens, nas encostas, para a adubao do solo. Todavia, as eroses e o desmatamento,

promovidos pela falta de cuidado, fizeram com que houvesse mudanas climticas

significativas na regio. A primeira delas foi o desequilbrio na distribuio das chuvas

durante o ano. Combinado a isso, as chuvas, posteriores ao perodo da queimada, levavam a

riqueza mineral e o hmus do solo das encostas para os rios da regio. Portanto, as

tempestades torrenciais combinadas a uma prtica agrcola predatria, empobreceram os solos

da regio. 28

27
FRAGOSO, J. L. Sistemas Agrrios em Paraba do Sul (1850-1920) Um estudo de relaes no-
capitalistas de produo. Dissertao. (Mestrado em Histria Social) Instituto de Filosofia e Cincias Sociais,
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1983. p. 113 e STEIN, S. op. cit., p. 257.
28
FRAGOSO, J. op. cit., p. 113 & STEIN, S. op. cit., p. 257.
xxxvi

Parece acertado que, graas quantidade de mata virgem existente na regio e a

longevidade do caf, pouco se fez para cuidar da terra. De acordo com Fragoso, a baixa

relao populao terra, configurando uma pequena densidade demogrfica, permite a

conformao de um sistema de uso da terra em que as matas substituem o emprego de um


29
trabalho adicional na recuperao das terras. Entende-se que, em virtude da grande

quantidade de mata virgem que ainda existia na regio, os proprietrios no empregaram mo-

de-obra suficiente para sua recuperao. Em vista disso, o dinheiro porventura a ser gasto com

a adubao foi reempregado na derrubada e na plantao de novas reas. Consequentemente

ampliou-se as reas devastadas e de cafezais velhos que no eram derrubados.

Entre as dcadas de 1870 e 1880, o p de caf, at os seus 15, 20 anos, era

aproveitado. 30 No entanto, ao passar dos anos e com a falta de mata virgem, pde-se notar no

Vale do Paraba, a presena de fazendas com cafezais de mais de 20 anos. Com o aumento

dos prejuzos em virtude do desgaste do solo, da imprevisibilidade das chuvas, da falta de

preocupao com a adubao do solo, e da dificuldade da renovao do cafezal, poucos

fazendeiros conseguiram manter sua propriedade e seu investimento na regio. Os maiores

prejudicados foram os pequenos proprietrios, uma vez que os custos exigidos para se manter

a produo tinham aumentado. Desse modo, na tal regio, houve uma crescente concentrao

das propriedades nas mos de poucos fazendeiros. 31

No sistema agrrio em questo nada foi mais marcante do que a diminuio da oferta

de trabalho. Desde 1850, com a proibio do trfico interprovincial, a mo-de-obra cativa teve

um acrscimo exorbitante no seu preo, impossibilitando os pequenos proprietrios em

29
FRAGOSO, J. op. cit., p. 8.
30
STEIN, S. op. cit., p. 260.
31
Ibid., p. 263.
xxxvii

manter suas propriedades. De acordo com Stanley Stein, nesse perodo, eram poucos os que

ainda acreditavam que o pagamento em salrio fora de trabalho livre manteria os lucros. 32

Pde-se perceber nas fazendas de caf, aps a dcada de 1870, o aumento gradativo

das dvidas e a diminuio dos emprstimos. Enquanto os valores dos bens da fazenda, da

maquinaria, da terra e do caf eram valorizados na obteno de emprstimos, havia, tambm,

uma rpida desvalorizao do preo dos cativos. De certa maneira, lograr novos emprstimos

tornou-se difcil para os fazendeiros, visto que sua concesso dependia, em primeiro lugar, da

quantidade e do valor dos cativos empregados no trabalho coletivo.

Os escassos emprstimos obtidos foram empregados na compra de maquinarias, a fim

de amenizar os prejuzos somados com a mo-de-obra escassa e de idade avanada.

Entrementes, tais emprstimos no eram acessveis a todos, visto que para obter essa

maquinaria, os proprietrios deveriam possuir matas virgens, escravos capacitados e uma

plantao de caf produtivo. 33

Manter as mquinas de beneficiamento funcionando e dando lucros tornou-se uma das

maiores dificuldades dos proprietrios nos ltimos anos da escravido. A maquinaria tornou-

se dispendiosa, uma vez que os operadores eram escravos despreparados e o sistema agrrio

exigia muitos braos, seno todos, para ampliar a plantao e para colher a enorme quantidade

de caf. O resultado de todo esse fenmeno foi a inutilizao das mquinas graas s dvidas

contradas ao longo dos anos.

A crise do caf, no final do sculo XIX, no imps mudanas significativas ao sistema

agrrio de produo. O fim da escravido no foi o estopim da crise, embora colaborasse no

agravamento do problema. Em conseqncia desses fatos, ao longo das primeiras dcadas do

sculo XX, o gado passou a ganhar cada vez mais espao e os pastos tomaram conta dos

32
Ibid., p. 324.
33
STEIN, S. op. cit., p. 276.
xxxviii

cafezais decadentes, concentrando ainda mais as propriedades nas mos de poucos

fazendeiros.

Do caf ao pasto

Entre os anos de 1920 e 1930, a crise do caf, a qual se alongara desde a segunda

metade do sculo XIX, chegou ao auge. Enquanto a regio do Oeste Paulista vivenciava o

perodo de crescimento da economia cafeeira, os fazendeiros do Vale do Paraba passavam

pela pior crise j enfrentada. Os grandes cafezais, agora desgastados e velhos, j no

produziam o suficiente para manter o lucro, as terras virgens foram praticamente devastadas e

a quantidade de mo-de-obra se mostrava cada vez mais insuficiente para suprir as fazendas.

Aps a abolio, pouco se fez para reestruturar as formas de cultivo e de reproduo da

plantao de caf. Embora fossem aparentes os problemas inerentes s fazendas do Vale do

Paraba, as mesmas prticas de cultivo do sculo XIX continuavam a ser usadas. 34

Um dos maiores inimigos da regio do Vale do Paraba foram os fazendeiros em si. O

tradicionalismo dos Bares de Caf atrapalhou a introduo de novas prticas de agricultura e

a renovao das antigas. Apesar das dificuldades acima citadas, houve tentativas de introduzir

novas prticas econmicas na regio. No final do sculo XIX, foram vrias as experincias

para se promover a produo de algodo na regio, principalmente em Vassouras, como

aponta Stein: incentivadas pela paralisao da produo na regio do sul dos Estados Unidos,

por causa do fim da Guerra de Secesso, o governo provincial distribuiu sementes de algodo

entre os fazendeiros da regio. 35

No mesmo caminho, algumas fazendas tentaram ampliar a produo da cana-de-

acar. No obstante, mesmo com a produo em larga-escala do caf, algumas fazendas

34
FRAGOSO, J. L. op. cit., p. 109.
35
STEIN, S. op. cit. p. 274.
xxxix

mantinham o beneficiamento da cana para produo de aguardente de consumo interno.

Mesmo procurando ampliar a produo para comercializao no mercado local, pouco foi

efetivado. A economia da regio estava muito comprometida com a monocultura, e a

policultura ainda no possua garantias de retorno certo. 36

Nesse contexto, outros tipos de produo tambm se desenvolveram e ganharam

espao ao longo do sculo XX. Com a dificuldade de reter a mo-de-obra, nas fazendas, e de

atrair novos trabalhadores, culturas que necessitavam cada vez menos de trabalhadores foram

ganhando espao. Nesse prisma, pde-se apontar a plantao de eucalipto e a criao de gado

que cresceram na regio.

No final do sculo XIX e incio do XX, a criao de gado despontou como nova

prtica econmica na regio do Vale do Paraba. Com a diminuio do cafezal nas fazendas, a

terra a ser valorizada, ou seja, os pastos passaram a ter uma participao maior na valorizao

da propriedade em relao aos cafezais. 37

Ora, o processo pelo qual o caf era feito, foi devastador no que tange ao solo.

Portanto, o que provavelmente restaria a fazer era criar gado. De acordo com Fragoso, como

conseqncia de uma economia predadora o pasto uma transformao empreendida pela

agricultura extensiva na paisagem rural e no uma conseqncia da introduo da pecuria

na regio. 38 Dessa forma, o gado se desenvolveu sobre o que sobrou do sistema agrrio de

exportao. 39

Algumas dvidas ainda no foram esclarecidas sobre esse perodo. Seria o pasto

realmente a nica alternativa para aqueles fazendeiros? Sendo o gado uma criao de forma

extensiva e necessitada de pouca mo-de-obra, foi ela quem expulsou os trabalhadores ou a

36
Ibid., p. 275.
37
FRAGOSO, J. op. cit., p. 147.
38
Ibid., p. 152.
39
STEIN, S. op. cit. p. 333.
xl

disponibilidade de mo-de-obra j era baixa? Esse era um perodo de imensa imigrao

estrangeira; ento, por que pouco contingente foi direcionado para a regio do Vale do

Paraba? Os trabalhadores no conseguiram se fixar na regio por falta de trabalho e/ou por

falta de acesso a terra?

Questionamentos parte, entre os anos de 1920 e 1940, diante desse processo de crise

econmica no Vale do Paraba, busca-se, na presente dissertao, demonstrar que possvel

se observar uma movimentao populacional de enormes propores no Estado do Rio de

Janeiro. No perodo ps-abolio, quando o sistema econmico do caf ainda tentava ser

ordenado, muitos libertos se deslocaram tanto para So Paulo quanto para o leste do Rio de

Janeiro. Nesses locais, de acordo com Stein, parte dos fazendeiros conseguiu arcar com altos

salrios e, em contrapartida, os do Vale j no podiam mais. 40

Ao olhar tais reas, durante as primeiras dcadas do sculo XX, pouco se atentou para

o que efetivamente aconteceu com os libertos e seus descendentes sados do Vale do Paraba.

A maior parte dos estudos, j datados, privilegiou a pesquisa sobre a importncia da mo-de-

obra do imigrante e o crescimento do Oeste Paulista. 41 Entretanto, para o Vale do Paraba, os

trabalhos mais atuais tendem a focar o perodo que vai somente at a dcada de 20, buscando

analisar a estabilizao das famlias. 42

Necessrio atentar mais profundamente no apenas para o crescimento econmico

do gado na regio do Vale do Paraba e seu desenvolvimento, mas tambm sobre as outras

40
STEIN, S. op. cit. p. 304.
41
Um dos estudos mais significativos, neste sentido, foi: COSTA, Emlia Viotti Da Monarquia Republica:
Momentos decisivos. So Paulo: Livraria e Editora Cincias Humanas, 1979.
42
As seguintes produes tratam especificamente deste tema: RIOS, A. L. Famlia e Transio: Famlias
negras em Paraba do Sul, 1872-1920. Dissertao. (Mestrado em Histria) Instituto de Cincias Humanas e
Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niteri, 1990; RIOS, A. My Mother Was a Slave, But Not Me:
Black Peasantry and Local Politics in Southeast Brazil, c. 1870-c. 1940. Doutorado. (Doutorado em Histria da
Amrica) University of Minnesota, 2001; MATTOS, H. Marcas da escravido: Biografia, Racializao e
Memria do Cativeiro na Historia do Brasil. Tese para professor Titular no Departamento de Historia da UFF.
Niteri, 2004 e RIOS, A. & MATTOS, H. Memrias do Cativeiro: Famlia, Trabalho e Cidadania no Ps-
Abolio. RJ: Ed. Civilizao Brasileira, 2005;
xli

economias em ascenso no Estado. Dessa forma, ser possvel acompanhar a participao da

fora de trabalho dos libertos e de seus descendentes nas economias prsperas no Estado do

Rio de Janeiro.

1.1.2 Populao

Censos

A histria demogrfica da regio do Vale do Paraba, nos ltimos anos da escravido

ao incio do sculo XX, esteve intimamente ligada ao perodo da escravido, crise do caf e

entrada da criao do gado. Esses fatores influenciaram nas caractersticas da populao, na

virada do sculo. Para construir um panorama significativo da populao no Estado do Rio de

Janeiro, sero utilizadas trs regies de importncia econmica do Vale do Paraba como

Valena, Vassouras e Paraba do Sul comparando com os dados obtidos no Municpio de

Iguass, na atual Baixada Fluminense (tabela 1.1).

Tabela 1.1 Populao total recenseada. Paraba do Sul, Entre Rios, Valena, Vassouras, Iguass e Estrella.

1872 1890 1920 1940


43
Paraba do Sul 37461 27351 52474 50605
Valena 47131 33623 41389 36748
Vassouras 38253 36483 59551 51632
Baixada 44 31251 27083 33396 140606

Fonte: Censos de 1872, 1890, 1920 e 1940.

43
Em 1940 foi somado o Municpio de Entre Rios.
44
Em 1872 foi somado o Municpio de Estrella com o de Iguass.
xlii

Nos ltimos anos de escravido no Brasil, a presena de pretos e pardos era muito

superior quantidade de brancos no Vale do Paraba. 45 Em 1872, no Municpio de Valena, o

censo contabilizou a existncia de 47.131 pessoas das quais 60% eram escravos. Somando

escravos e populao livre de pretos e pardos, chega-se ao total de 35.898 pessoas, ou seja,

76,1 % da populao (tabela 1.2). No entanto, no censo seguinte, em relao populao

composta por pretos e mestios, essa regio contabilizou 22.898 pessoas, ou seja, 68,1% da

populao. Desse modo, a partir de tais dados, pode-se retirar duas concluses sobre a

trajetria de pretos e pardos na regio em Valena.

Tabela 1.2 Porcentagem da populao classificada como preta e parda nos censos. Paraba do Sul, Valena e
Baixada.

1872 1890 1940 Total


Paraba do Sul 56% 57% 46% 60159
Valena 76% 68% 43% 74646
Baixada 27% 65% 49% 94459

Fonte: Censos 1872, 1890 e 1940.

A primeira mostra que, nos municpios selecionados, a populao entre os anos de

1872 e de 1890 aparentemente diminui, indicando que, alm da presena contundente de uma

populao provinda da escravido, os ltimos anos da escravido foram extremamente

conturbados. Esse fato pode ser observado a partir do Quadro demonstrativo da populao

escrava na provncia do Rio de Janeiro de 1885, o qual apontou, em seus clculos, a

presena macia de fazendeiros do Vale do Caf utilizando escravos at os ltimos dias. 46

A segunda trata sobre a permanncia dos ex-escravos na regio. possvel ver, no

censo de 1890, ainda a presena considervel da populao de pretos e pardos na regio. Ao

examinar esse dado, pode se supor que, no perodo do ps-abolio, a permanncia da

populao provinda da escravido foi muito mais significativa do que a migrao.

45
Na presente dissertao optou-se por utilizar a terminologia de poca existente nos registros e nos censos.
Grosso modo sero utilizados para essa populao: pretos e pardos.
46
RIOS, A. op. cit., 1990, p. 22.
xliii

Ao trabalhar a faixa etria de tal populao escrava, seguindo a lgica do comrcio

interprovincial de escravos, crescente aps 1850, era de se esperar nos censos a

predominncia de escravos homens, em idade produtiva, em torno de 20 anos. Todavia, no

censo de 1872 em Paraba do Sul, o equilbrio entre os sexos pde ser encontrado nas faixas

etrias de 1 a 10 e de 11 a 20 anos. Conforme Rios, esses nmeros indicam que a populao

escrava aumentou nos ltimos anos de escravido. 47

A esse fato, mister salientar que, a partir de 1871, no nasceriam mais cativos; dessa

forma, o ltimo escravo nascido antes da lei teria 17 anos em 1888. De acordo com Rios, seria

possvel supor que, no perodo do ps-abolio, a populao provinda da escravido no

municpio de Paraba do Sul possua entre 17 e 46 anos, uma vez que, em 1872, na faixa etria

entre 1 e 30 anos est compreendido 62,9% dos escravos. 48 Isso significa que, uma vez livre,

essa populao estava dentro da fase produtiva de trabalho.

Utilizando como base os dados demogrficos do municpio de Valena, percebe-se

que a populao negra, ao longo dos anos, deixou de ser maioria. Se, em 1872, os pretos e

pardos representavam 76,1% da populao, em 1940, este nmero reduziu para 48%. Deveras,

ainda era significativa a presena da populao negra na regio do Vale do Paraba. 49

Os censos posteriores, de 1900 e de 1920, no traziam informaes sobre a cor dos

recenseados. Aps o censo de 1890, a categoria cor somente retorna no recenseamento de

1940. Entre as discusses atuais, muito se critica sobre o emprego dos recenseamentos de

1890 e de 1920 nas pesquisas demogrficas. O primeiro sofreu grandes problemas em sua

execuo, pois a recm instalada Repblica ainda no havia organizado os trmites

47
Ibid, p. 21.
48
Idem.
49
RIOS, A. op. cit., 1990, p. 23.
xliv

50
necessrios para a realizao do censo. Em razo da falta do retorno de informaes das

parquias responsveis pelos questionrios e da grande desorganizao na realizao censo de

1890, os estudiosos tomam os seus dados como subestimados. Entretanto, no que concerne

aos dados do recenseamento de 1920, estes parecem estar superestimados em relao queles.

Desse modo, torna-se difcil utilizar tais dados, como indicativos de uma movimentao

populacional, em virtude das grandes disparidades. Todavia, nesses censos, grosso modo,

possvel encontrar algumas tendncias, que so reveladoras de aspectos muito interessantes

para outras localidades no Estado do Rio de Janeiro, em especfico caso, a Baixada

Fluminense.

Apesar de um crescimento modesto na populao de Vassouras e de Valena, entre

1890 e 1920 (figura 1.1), esse perodo caracterizou-se pela introduo do gado na regio.

Praticado em moldes extensivos, necessitando cada vez mais de pastos e sem cuidados

especiais no rebanho, a atividade em questo necessitava de uma menor quantidade de mo-

de-obra. Aliada crise da cafeicultura e s novas formas de produo, entre 1920 e 1940,

pode-se acompanhar uma diminuio significativa da populao nos municpios de Valena,

Vassouras e Paraba do Sul. 51

Figura 1.1 Populao por ano segundo os censos. Paraba do Sul, Valena e Vassouras.

50
SENRA, Nelson de Castro Histria das Estatsticas Brasileiras. Rio de Janeiro: IBGE, Centro de
Documentao e Disseminao de Informaes, 2006.
51
No censo de 1940, Entre Rios aparece como um Municpio autnomo de Paraba do Sul. Aqui, optou-se por
somar a populao dos dois municpios.
xlv

160000

140000

120000

100000

Paraba do Sul
80000 Valena
Vassouras

60000

40000

20000

0
1872 1890 1920 1940

Fonte: Censos de 1872, 1890, 1920 e 1940.

Ao analisar comparativamente as quatro regies do Rio de Janeiro, constata-se, grosso

modo, no Municpio de Iguass, um crescimento populacional entre as dcadas de 1920 e

1940 (figura 1.2). Entre esses dois anos, a populao saltou de 33.396 pessoas para 140.606 -

um crescimento de mais de 400% em apenas 20 anos (tabela 1.3 vide anexo). Em

comparao s regies do Vale do Paraba, onde a crise do caf e a introduo do gado

expulsaram a mo-de-obra, a regio de Iguass despontava economicamente no cenrio

nacional e internacional na produo da laranja. 52

Figura 1.2 Populao por ano segundo os censos. Paraba do Sul, Valena, Vassouras e Iguass.

52
Os aspectos econmicos e sociais da Baixada Fluminense, nessas dcadas, que podem ter atrado a populao,
sero discutidas amplamente no captulo 2.
xlvi

160000

140000

120000

100000

Iguass
Paraba do Sul
80000
Valena
Vassouras

60000

40000

20000

0
1872 1890 1920 1940

Fonte: Censos de 1872, 1890, 1920 e 1940.

Se na regio de Valena e de Paraba do Sul a participao de pretos e pardos diminuiu

ao longo do tempo, o mesmo no pde ser dito em relao Baixada Fluminense. De acordo

com os censos, em 1872, no Municpio de Iguass e Estrella, os pretos e pardos eram 8.285

pessoas, ou seja, 26,1% da populao (tabela 1.2). Todavia, em 1890, a presena da populao

de pretos e mestios passou a corresponder 65,3% da populao. 53 Enfim, para 1940, o censo

informava que dentre as 140.606 pessoas recenseadas, 68.482 (48,7%) so pretos e pardos.

Ao exame desses censos, lcito supor alguns dados gerais sobre a regio do Vale do

Paraba e da Baixada Fluminense. Aps o fim da escravido, foi possvel acompanhar o

estabelecimento de uma populao de pretos e pardos durante as primeiras dcadas aps a

abolio, na regio do Vale do Paraba. Da mesma forma, a partir da dcada de 20, percebe-se

o impacto significativo do gado na desestabilizao dessas mesmas famlias, as quais

53
Apesar deste salto, deve-se relembrar o problema levantado anteriormente do censo de 1890.
xlvii

deixaram os municpios de Paraba do Sul, Valena e Vassouras em direo a outras

localidades do Rio de Janeiro. 54

Atravs dos dados do Municpio de Iguass e Estrella, no parece acertado construir

uma ligao direta entre o esvaziamento do Vale do Paraba e o direcionamento de toda a

populao para a mesma. Todavia, ao longo desta dissertao, pretende-se demonstrar que tal

regio pode ter recebido parte significativa, dessa migrao.

1.2 Trajetrias individuais de ex-escravos e de seus descendentes.

Nesta parte, pretende-se acompanhar os ltimos anos da escravido no Vale do

Paraba e as primeiras dcadas do sculo XX, respaldado nas trajetrias de vida de ex-

escravos e de seus descendentes. Atravs de genealogias, busca-se, aqui, acompanhar as

famlias que tiveram, pelo menos, uma migrao em seu meio. Para alcanar tal objetivo,

sero utilizadas transcries de entrevistas coletadas no Vale do Paraba e na Baixada

Fluminense.

Foram selecionados depoimentos, nos quais h experincias vivenciadas pelos avs

e/ou pais que passaram pela experincia do cativeiro. Os entrevistados tiveram algum contato,

mesmo que na infncia, com os ex-escravos e/ou familiares, que possuam memria sobre o

tempo do cativeiro. 55

54
Aqui, deseja-se diferenciar os termos estabelecimento de estabilizao que sero empregados durante a
dissertao. O termo estabelecimento, aqui, possuiu a caracterstica de representar as famlias que
permaneceram, mesmo que precariamente, em seus locais de origem durante curto espao ou longo espao de
tempo, antes de migrarem. Para estabilizao, considera-se as famlias que, aps um perodo conturbado de
mudanas constantes, conquistaram a estabilidade definitiva em uma regio diferente da de origem.
55
Recentemente, Ana Rios procurou demonstrar como foi possvel, na dcada de 1990, colher depoimentos de
netos e filhos de ex-escravos, os quais possuam uma memria familiar sobre seus ascendentes africanos: RIOS,
A. No se esquece um elefante: nota sobre os ltimos africanos e a memria dfrica no Vale do Paraba. In:
FRAGOSO, Joo; FLORENTINO, Manolo; JUC, Antnio Carlos; CAMPOS, Adriana. Nas Rotas do
Imprio: eixos mercantis, trfico e relaes sociais no mundo portugus. Vitria: Edufes; Lisboa: IICT, 2006.
xlviii

Na primeira parte, atravs de bibliografia especializada, sero discutidos os ltimos

anos da escravatura no Brasil, relacionando-os com as trajetrias de vida desses ex-escravos.

Posteriormente, esse processo ser reconstrudo at a dcada de 30, com a finalidade de

evidenciar as dificuldades, os medos, as experincias, e as motivaes para a sada das

famlias do Vale do Paraba.

Os ltimos anos

Os ltimos anos de escravido no Brasil podem ser considerados como extremamente

conturbados. As leis promulgadas, aps 1850, diminuram consideravelmente o poder moral

do senhor. E isso foi sentido, em parte, pelos fazendeiros que buscavam de alguma forma,

manter os escravos em suas propriedades, visto que as fugas em massa se tornaram uma

constante.

Entrando nos ltimos anos da escravido no Vale do Paraba, pode-se perceber como

as leis impactaram no s o poder senhorial, mas tambm influenciaram as relaes

familiares. Em 1869, foi aprovada a Lei que garantia aos escravos a permanncia das relaes

entre casais, e consequentemente, proibia a separao dos filhos at completarem os 12 anos.

Efetivamente, nenhuma lei fortaleceu tanto a comunidade escrava como a Lei do Ventre-
56
Livre; ora, pela primeira vez havia um sinal claro para os cativos de que a escravido

estava chegando ao fim.

Com a intromisso, cada vez maior do Estado, na relao senhor - escravo e com a

criao de Leis que impediam um controle maior da escravaria, a vida dos fazendeiros ficou

mais difcil. Para os escravos, os direitos, considerados costumeiros, passaram a ser positivo.

Tais leis abalaram o poder moral dos escravistas, no Vale do Paraba, consideravelmente nos

56
Para uma discusso ampliada sobre o impacto da Lei Rio Branco, ver: RIOS, A. & MATTOS, H. Op. Cit. p.
89 e CHALHOUB, S. Vises de liberdade: uma histria das ltimas dcadas da escravido na Corte. So Paulo:
Companhia das Letras, 1990.
xlix

anos anteriores abolio, e pde-se constatar diversos conflitos que acabavam em revoltas e

fugas nas regies cafeeiras. 57

Apesar da coeso interna da comunidade escrava e da percepo por parte dos

fazendeiros, de que a escravido estava prestes a findar, no foi possvel conter os diversos

conflitos nos ltimos anos da escravido. Percebendo a dificuldade de se manter a mo-de-

obra e de atrair novos trabalhadores, muitos fazendeiros apostaram na alforria em massa.

Desse modo, buscaram reafirmar a prerrogativa senhorial de concesso de liberdade e os


58
corolrios de dependncia e gratido que tradicionalmente implicavam, ou seja,

procuraram controlar os trabalhadores livres atravs de laos de gratido, aliando uma idia

de conquista benevolncia dos senhores para com seus cativos. 59

Apesar dos esforos empreendidos pelos proprietrios, as fugas em massa tornaram-se

corriqueiras em algumas regies. Entre 1885 e 1887, Dean calculou que, aproximadamente,

10% da populao cativa se deslocou do Municpio de Rio Claro em direo aos centros

urbanos. A resistncia ao trabalho aumentou vertiginosamente, aparentando uma revolta

generalizada. Pela primeira vez, os escravos conduziam armas de fogo e, ao invs de fugir

noite, escondidos dos fazendeiros, pareciam dispostos a enfrentar a polcia. 60

No caso de So Paulo, o grande medo tomou a regio do Vale do Paraba. A fora

policial foi acionada durante tal perodo para amenizar os nimos e manter tranqilos os

fazendeiros da regio. Em 1871, em Rio Claro, 57 fazendeiros pediram ao presidente da

provncia que designasse uma guarnio militar permanente no Municpio, com a finalidade

57
MACHADO, Maria Helena. O Plano e o Pnico: Os movimentos sociais na dcada da abolio. Rio de
Janeiro: EDUFRJ, 1994.
58
MATTOS, H. Das Cores do Silncio. Significados da liberdade no Brasil escravista. Rio de Janeiro, Arquivo
Nacional, 1995/ Nova Fronteira, 1997. p. 268.
59
Idem, principalmente captulo IV.
60
DEAN, W. Rio Claro: Um Sistema Brasileiro de Grande Lavoura (1820-1920). Rio de Janeiro, Ed.: Paz e
Terra, 1977. cap.: 4 e 5.
l

de proteger os proprietrios e impedir as fugas em massa.61 Eram poucos os proprietrios que

haviam pensando no fim da escravido e o que ela representava para os ex-escravos. 62

Internamente, nas fazendas de caf do Vale do Paraba, a percepo do fim da

escravido foi compartilhada entre escravos e senhores. Com o fim do trfico atlntico e com

as leis que tratavam sobre os cativos, pde-se constatar um fortalecimento da comunidade

escrava dentro dos grandes plantis, alm da construo de uma determinada viso de

liberdade. 63

Exemplificando, foi possvel acompanhar genealogicamente a famlia de Dionsio, que

permaneceu na mesma fazenda at o perodo posterior a abolio. V Dionsio nasceu no dia

20 de Maio de 1866, filho de Tertuliano e Miquelina, escravos de Jos Gonalves Roxo. 64

Cresceu junto a seus pais na fazenda So Jos, mesmo local onde nasceram seus filhos e netos

(figura 1.3). Eles tiveram, nessa fazenda, mais cinco filhos. Ainda no perodo da escravido,

nasceu o primeiro irmo de Dionsio, Geraldo Preto, registrado na Igreja de Santa Isabel do
65
Rio Preto no dia 3 de abril de 1870. Os outros cinco irmos nasceram aps a Lei do

ventre-livre: Maria e Joo (gmeos) e Vitalina Preta, nascidos em 1881 e 1886


66
respectivamente. J no caso dos irmos Congo e Zolino, a nica referncia encontrada,

sobre as suas vidas, foi retirada dos depoimentos coletados na Fazenda So Jos. A famlia de

Dionsio pertencia a uma comunidade ampla de descendentes de escravos residentes nessa

mesma fazenda.

61
Idem, p. 125.
62
MACHADO, Maria Helena op. cit.
63
Para uma discusso melhor sobre as Vises de Liberdade, ver a introduo desta dissertao.
64
Livro II de Batismo, fl. 13, termo 29 20/05/1866, AESIRP.
65
Livro II de Batismo, fl. 41, termo 40 03/04/1870, AESIRP.
66
Livro III de Batismo, fl. 98v., termo 27 17/04/1881 e Livro III , fl. 145, termo 7 10/01/1886, AESIRP.
li

Figura 1.3 Genealogia da Famlia de Dionsio Antonio Fernandes - Santa Isabel do Rio Preto, Valena, RJ.

Fonte: Arquivo Eclesistico da Igreja de Santa Isabel do Rio Preto, RJ. Parcialmente publicada em MATTOS,
H. op. cit. 2004.

Historiadores vm discutindo sobre as relaes sociais construdas no ensejo da

escravido e como elas foram construdas. A finalidade dessas pesquisas era a de perceber

quais eram os benefcios que uma comunidade ampla nas senzalas trazia para senhores e
67
escravos. Dentre os diversos temas de famlia escrava, optou-se, aqui, por discutir a

construo de relaes matrimoniais. Durante boa parte do perodo do trfico atlntico, a

relao dentro das fazendas entre as naes africanas era de extrema instabilidade. Parte disso

acontecia em virtude da razo desproporcional entre escravos do sexo masculino e do sexo

feminino. Essa tenso permanente fez com que os africanos e escravos percebessem a

necessidade de ter uma convivncia possvel dentro da fazenda e minimamente foram

estabelecendo laos parentais e matrimoniais buscando, assim, apaziguar os conflitos nas

senzalas.

67
Para uma melhor e extensa discusso sobre as relaes parentais e no-parentais nas propriedades escravistas
ver: FLORENTINO, M. e GES, J. R. A paz nas senzalas: Famlias escravas e trfico atlntico, Rio de Janeiro,
c. 1790 - c. 1850. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira. 1997 e SLENES, Robert. Na Senzala Uma Flor:
Esperanas e recordaes na Formao da Famlia Escrava. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.
lii

Ao analisar os laos parentais, sociais e matrimoniais de famlias, as quais passaram

da escravido ao ps-abolio, o caso de Dona Umbelina emblemtico. Ela nasceu em torno

de 1835, era escrava do Senhor Antenor Souza Vieira, proprietrio da Fazenda Carioca em

Vassouras no Vale do Paraba. No cativeiro, casou-se, pela primeira vez, com o tambm

escravo Sebastio, que lhe deu seis filhos: Maria, Pedro, Horcio, Celina, Marcelino e Joana.

Aparentemente, o relacionamento desses durou pouco tempo, tanto que, na memria familiar,

pouco se fala sobre o av Sebastio, apenas lembrado pela sua cor e condio de escravo. 68

Ainda durante o perodo da escravido, Dona Umbelina casou-se, pela segunda vez,

agora com o sinhozinho, proprietrio da Fazenda Carioca. Antenor era filho de franceses,

proprietrios de fazendas de caf em Vassouras. Nesse casamento, Dona Umbelina teve mais

seis filhos: Ismail, Adlia, Albertino, Adilina, Manoel e Jair.

Para alm dos laos parentais, uma outra forma de constituir redes de sociabilidade foi

se instalando: o compadrio. Com a necessidade de suportar o perodo da escravido e de

aumentar as redes sociais, muitos escravos escolhiam, para padrinhos de seus filhos,

companheiros mais velhos que possuam maior influncia nas senzalas e/ou livres e libertos.69

No que tange participao dos proprietrios na consolidao familiar, a doao de

terras, ainda no perodo da escravido, permitiu, em muitos casos, a estabilizao da

populao de pretos e pardos no Vale do Paraba. Nessa regio houve pouca imigrao

estrangeira, e a falta de mo-de-obra j era sentida desde a poca na escravido. Para manter

em suas propriedades essa mo-de-obra nacional, na qual boa parte era provinda da

escravido, uma das estratgias adotadas, nesse perodo, pelos proprietrios foi a doao de

68
Poucos familiares sabiam do nome do primeiro av. Aps entrevistas com outros familiares de Dona Yvone,
chegamos ao seu nome: Sebastio.
69
Para uma melhor discusso sobre compadrio ver: RIOS, A. L. Famlia e Transio: Famlias negras em
Paraba do Sul, 1872-1920. Dissertao. (Mestrado em Histria) Instituto de Cincias Humanas e Filosofia,
Universidade Federal Fluminense, Niteri, 1990.
liii

70
terras. Antenor, esposo de Dona Umbelina, diante da crise do caf e da economia no Vale

do Paraba, doou boa parte de suas terras para seus escravos. Em menos de cinco anos aps a

abolio, ele faleceu e as suas terras foram divididas entre os filhos do primeiro e do segundo

casamento de Dona Umbelina. At os dias de hoje parte da famlia ainda vive nas terras em

Vassouras.

Os ex-escravos e seus descendentes tomaram como um dos significados de liberdade o

acesso terra prpria. Na maior parte dos casos, este grupo no procurou possuir pequenas

roas para apenas viver da subsistncia. De acordo com Rebecca Scott, os ex-escravos e seus

descendentes buscaram maximizar os seus ganhos a partir da propriedade e/ou posse da terra,
71
porm de uma forma bem diferente da teoria do liberalismo. No caso da Jamaica, os

libertos trabalharam durante anos para comprar pequenos pedaos de terra, buscando, assim,

adquirir terras mais baratas, produtivas e perto dos grandes centros exportadores. 72

Decerto, comprar e/ou adquirir o pequeno pedao de terra no invalidava a busca pelo

trabalho remunerado. Na Jamaica e em Cuba, os libertos conseguiram combinar trabalho de

roa, para subsistncia e para venda nos mercados locais, com o emprego pblico e/ou nas
73
grandes propriedades exportadoras. Ora, os ex-escravos e seus descendentes optaram,

sempre que possvel, diversificar as fontes de renda e as formas de trabalho. Tratava-se de

uma dentre as vrias estratgias para tentar diminuir as incertezas diante do novo contexto de

ps-abolio.

70
Sobre estratgias senhorias para estabilizar a mo-de-obra na passagem da escravido para a abolio ver:
MACHADO, Maria Helena op. cit. e SLENES, Robert; FRY, Peter e VOGT, Carlos. Cafund: A frica no
Brasil. So Paulo: Companhia das Letras, 1996.
71
SCOTT, Rebecca. Emancipao Escrava em Cuba: a Transio para o Trabalho Livre, 1860-1899. Rio de
Janeiro/Campinas: Paz e Terra/Ed. da Unicamp, 1991.
72
HOLT, Thomas. The Problem of Freedom: Race, Labor, and Politics in Jamaica and Britain, 1832-1938
Baltimore and London: Johns Hopkins University Press, 1992. p. 160.
73
SCOTT, R. op. cit., 1991, p. 34.
liv

Pondo em questo o caso brasileiro, a necessidade de colher o caf, em 1888, fez com
74
que diversos fazendeiros improvisassem turmas de trabalho. Conforme Stein, nesse ano

seria feita uma das maiores colheitas j vistas no Vale do Paraba; 75 para isso, os fazendeiros

empregariam vrios meios, inclusive judiciais, para manter a mo-de-obra dentro das

propriedades. Muitos ex-cativos foram presos por vadiagem, outros disputados entre
76
proprietrios. Contudo, ao passar dos anos, parece acertado que a maior parte dos libertos

permaneceu nas fazendas, trabalhando com salrios insatisfatrios. 77

Ainda hoje, pouco se discute sobre a importncia da mo-de-obra nacional no

processo de transio para o trabalho livre. lcito supor que a maior parte dos

trabalhadores no Vale do Paraba, aps 1888, era composta por ex-escravos e seus

descendentes. Em muitos casos, esse grupo buscou, atravs de negociao com o patro, aliar

um trabalho de turma ou de parceira com a produo de alimentos em roa prpria para

subsistncia e para venda em mercados locais. Esse foi o caso dos filhos de Umbelina e de

Antenor que durante as primeiras dcadas do sculo XX, usufruram das terras doadas,

sobrevivendo do que era retirado delas.

Ao longo dos anos, diante da crise do caf, ao que tudo indica, no foi possvel mais

obter trabalho nas propriedades prximas aos locais de moradia. Diante das dificuldades,

Dona Amlia, filha de Umbelina, deu sua terra a uma pessoa que tambm pudesse tomar

conta dos seus filhos, para que ela pudesse procurar emprego nas cidades prximas. O mesmo

aconteceu com seu outro filho, que trocou seu lote por uma criao de porco de seu vizinho. 78

74
Neste sentido falam: MATTOS, H. op. cit., 1997; DEAN, W. op. cit. e STEIN, S. op. cit.
75
STEIN, S. op. cit., p. 303.
76
MATTOS, H, op. cit., 1997.
77
No captulo 3 de seu Livro, Ana Rios discute a lgica dos contratos entre proprietrios e trabalhadores Rurais.
Ela levantou as diversas formas de trabalho empregados no incio do sculo, como o trabalho de turma, a
empreitada, parceria, arrendamento, entre outras. Eram em sua maioria contratos verbais que os tornavam por
vezes muito instveis. RIOS, A. e MATTOS, H. op. cit., captulo 3.
78
Entrevista concedida por Dona Yvone Reis em Mesquita, 2006.
lv

Aparentemente, esse foi o momento no qual o processo da expanso latifundiria, para

obter pastos, ganhou mais fora. Diante da extrema pobreza, a primeira gerao de filhos

nascidos no ps-abolio no encontrou as mesmas oportunidades que seus pais, isso pode ter

influenciado a sada do Vale do Paraba em direo a regies mais prsperas.

Estabilidade Versus Migrao

Para o perodo do ps-abolio, Rios deparou-se com trs tipos de trajetrias nos

depoimentos por ela coletados. No primeiro, ela encontrou, na regio do Vale do Paraba,

comunidades negras que, de alguma forma, conseguiram se manter nas mesmas fazendas

onde seus pais e avs foram colonos e, em alguns casos, at mesmo escravos. No segundo, ela

percebeu a existncia de um campesinato familiar que, pela compra de pequenas

propriedades, por doaes ou por um longo tempo no trabalho de parceria conseguiram se

estabilizar. J no terceiro, nas entrevistas coletadas, ela encontrou famlias que foram privadas

do o direito de trabalhar e de ter a prpria roa. Nesse ltimo caso, h relatos de duas formas

de migrao: entre fazendas, no Vale do Paraba e para os centros urbanos. 79

No presente subitem, sero exploradas as experincias e trajetrias de ex-escravos e de

seus descendentes, que passaram por um perodo de extrema instabilidade. As migraes

relatadas possuram motivaes e naturezas mltiplas; pode-se afirmar, inicialmente, que elas

foram geradas, desde a abolio, pelo desmantelamento das fazendas de caf, com a entrada

do gado e a conseqente perda da roa prpria.

De acordo com Rios, as dificuldades, encontradas pelos libertos e seus descendentes

de manter a estabilidade, comearam na dcada de 30. Com o incio do perodo ps-abolio,


80
e com a decadncia das fazendas, muitos ex-escravos migraram pelo Vale do Paraba. Seu

79
Para uma melhor explorao sobre essas categorias ver: RIOS, A. & MATTOS, H. op. cit., 2005. p. 215-222.
80
Ibid, captulo II.
lvi

Manoel relembra muito bem a poca em que os moradores antigos da Comunidade So Jos

da Serra foram transferidos pelo fazendeiro para as outras terras em So Paulo e para o

entorno da So Jos. Nessa ocasio, V Dionsio passou a trabalhar na Fazenda Empreitada e

para l levou seus filhos, ainda pequenos, e sua esposa.

Rios explorou as motivaes que podem ter levado a essa movimentao constante de

tal grupo. Em um primeiro momento, ela citou que essas mudanas ocorriam desde a poca da

colnia e possuam diversas motivaes. 81 Por causa da natureza do tipo de trabalho, em sua

maioria de parceria e empreitada, e da forma da plantao das mudas de caf, que utilizava a

queimada como forma de preparar a terra, esses trabalhadores tendiam a mudar quase sempre

de trabalho e de moradia. 82

As novas produes, que entravam no lugar dos cafezais, podem ter motivado a sada

desses trabalhadores do Vale do Paraba. As plantaes de eucalipto modificaram a paisagem,

antes dominada por cafezais envelhecidos no Vale do Paraba, e os arranjos de trabalhos, pois

tal tipo de plantao necessitava de muito menos braos do que a plantao de caf. Pode-se

usar como exemplo o caso da famlia de Dona Sebastiana, moradora de Paraba do Sul, que se

mudou da fazenda onde, residia graas expanso da plantao de eucalipto sobre suas roas.
83

Para alm do eucalipto, nada transformou mais vida do campesinato negro do que a

criao de gado. No caso de Dona Umbelina, boa parte dos seus 12 filhos no conseguiu se

manter economicamente na regio. Grileiros e fazendeiros vizinhos queriam expandir suas

terras, para aumentar a rea de pasto de suas propriedades, e avanaram sobre os pequenos

lotes. Mesmo proibidos pela escritura de vender, muitos dos filhos de Dona Umbelina

81
Ibid, p. 227, ver, principalmente, nota 30.
82
Ibid, p. 228.
83
Entrevista: Dona Sebastiana, 1995, MC.
lvii

abdicaram de suas terras em prol de uma pequena quantia de dinheiro; por exemplo, o caso da

Tia Adlia que vendeu seu ltimo lote para comprar um pequeno terreno em Anchieta, na

divisa entre o subrbio do Rio de Janeiro e Nilpolis, na poca, distrito do Municpio de

Iguass. 84

Porm, a maior parte dos relatos sobre a sada do campo versa sobre a violncia. Esse

foi o caso do pai de Cornlio Cansino que, por ter deixado de trabalhar um dia na turma da

fazenda, o proprietrio mandou derrubar as cercas da roa e lanou o gado para acabar com a

pequena lavoura. Histria muito semelhante aconteceu com os pais de Manoel Seabra que

eram constantemente ameaados de terem suas casas queimadas, pelos patres, se no

trabalhassem conforme o que eles desejavam. 85

Atravs das entrevistas, possvel perceber que uma das maiores motivaes para a

migrao foi a privao do acesso roa prpria. Uma das entrevistas mais sintomticas nesse

sentido foi a realizada com Dona Leontina e concedida a Ana Rios, em Cachoeiras de

Macac, norte-fluminense. Perguntada sobre o motivo da sada de sua famlia do Vale do

Paraba, Dona Leontina respondeu:

Porque os fazendeiros parou de dar terra. S que nessas terrinhas agora trabalha com boi,
n? Trabalhar com os colonos, com os empregados, no. Pra trabalhar com boi, pra plantar
capim, ento no d mais. Agente vai fazer o que? Na roa ganhar um salrio l n, pra
plantar capim, sem direito a plantar uma comida, sem direito a plantar nada. [grifo meu]
Ento, acharam... Meu pai n... As mulheres trabalharam como empregada e meu pai,
chegaram pra rua tambm. Da comprou esse terreninho aqui e fez um barraquinho pra
gente. Ns estamos trabalhando de empregada de famlia. E meu pai foi trabalhar de
86
padeiro.

A partir desse pequeno trecho, possvel chegar a suposies importantes. A primeira

a de que apenas o trabalho no era suficiente para sobreviver na regio. Alm de possurem

uma roa de subsistncia, aparentemente, era necessrio complementar a renda com a venda

84
Entrevista: D. Yvone, 2006, AP.
85
Para uma melhor compreenso sobre a relao patro-empregado no ps-abolio ver: captulo 3 de RIOS,
Ana e MATTOS, H. op. cit.
86
Entrevista: Dona Leontina, sem data, MC.
lviii

de seus excedentes. Em segundo lugar, lcito supor que um dos precursores para o xodo no

Vale do Paraba pode ter sido a extino e/ou proibio da roa prpria.

Sem embargo, esse tipo de hiptese ainda precisa de muito mais estudos concernentes

s mudanas na estrutura da propriedade, aps a entrada do gado e da produo de eucalipto.

Muito se discutiu sobre a necessidade de pouca mo-de-obra nesse tipo de cultivo, mas pouco

sobre a existncia e a importncia da mo-de-obra nacional nessa regio. Ainda hoje faltam

trabalhos sobre a relao entre o pasto e a mo-de-obra, em como ela realmente interferiu na

relao fazendeiro-trabalhador livre e se realmente foi a responsvel pela expulso de tal mo-

de-obra.

Migrar

Nesta ltima parte, sero acompanhadas as trajetrias pessoais dos libertos e de seus

descendentes que migraram no perodo do ps-abolio. Com as entrevistas coletadas,

pretende-se construir um perfil das famlias e dos migrados, evidenciando suas experincias e

trajetrias.

Um dos principais marcos nas entrevistas so as divises familiares. Se, no exato ps-

abolio foi possvel construir relaes familiares nucleares e estendidas, nos anos posteriores

dcada 1920, contrariamente, encontra-se na memria familiar as experincias da separao.

V Dionsio saiu da Comunidade e fez uma rocinha na Fazenda da Empreitada, onde criou e

casou boa parte dos seus filhos. Entretanto, ao longo dos anos 1920, viu seus filhos homens,

nascidos aps a abolio, Manoel (20/01/1899), Jos (23/09/1903) e Joaquim (03/03/1908)

sarem da fazenda para trabalhar na produo da laranja no antigo Municpio de Iguass, na


87
Baixada Fluminense. Caso semelhante aconteceu na trajetria familiar de Dona Umbelina:

87
Manoel: Livro IV, fl. 181, termo 8 novembro de 1898, AESIRP; Jos: Livro V, fl. 37, termo 4 23 de
setembro de 1903, AESIRP e Joaquim: Livro V, fl. 89, termo 73 - 3 de maro de 1908, AESIRP.
lix

seu filho Manoel, ao completar a maioridade, em 1922, teve de servir ao militarismo e se

mudou de Vassouras para Nilpolis.

Com a diminuio dos empregos na lavoura, houve uma busca por novos arranjos de

trabalho, motivando a migrao. Nascido em 1915, Seu Ormindo trabalhou bastante na

lavoura, porm, saiu para trabalhar na estrada de rodagem. Posteriormente, conseguiu um

emprego na empresa de energia eltrica do Rio de Janeiro, a Light. Com os dois trabalhos,

teve a primeira oportunidade de sair do Vale do Paraba, morando uma parte da vida no

Engenho de Dentro e, posteriormente, ao aposentar, em Belford Roxo, na Baixada

Fluminense. 88

Os novos arranjos de trabalho, que surgiam com o avano urbano no Vale do Paraba e

no Rio de Janeiro, podem ter ajudado a transferir boa parte dos libertos e de seus descendentes

para outras reas do Estado. Esse foi o caso de Antonio Silva, filho de Dona Umbelina,

nascido em 1912: trabalhou alguns anos na Estrada de Ferro Central do Brasil at que, em

1936, foi transferido para Morro Agudo, no Municpio de Iguass. Nesse local, conheceu sua

esposa e ganhou do emprego uma pequena casa junto ao local de trabalho, na linha frrea.

Atravs das genealogias familiares construdas a partir das entrevistas coletadas e

arquivadas, no Acervo Memrias do Cativeiro, Rios percebeu que a maior parte dos

membros da famlia que no permaneceram na mesma regio onde seus pais cresceram, so
89
os filhos da primeira gerao de libertos, nascidos no ps-abolio. De certo, entre as

famlias entrevistadas foram poucos os filhos da primeira gerao que trabalharam na roa no

Vale do Paraba. O primeiro argumento seria, como j fora mencionado neste captulo, a falta

de trabalho e de roa prpria. Em segundo lugar, pode-se apontar a resistncia em se trabalhar

na roa.

88
Entrevista: Cornlio Cansino, 1995, MC.
89
RIOS, A. Histria Oral e Migrao um debate metodolgico. (mmeo)
lx

Os filhos da primeira gerao de libertos, nascidos no ps-abolio, provavelmente

nasceram entre os anos de 1890 e 1920. Esses ao chegarem fase do trabalho, ou seja, entre

14 e 20 anos, possivelmente no encontraram a mesma situao que seus pais vivenciaram no

fim da escravido. Isso significa que, para eles houve certo impedimento ao acesso roa

prpria, no Vale do Paraba, o que consequentemente, privava a reproduo familiar. O gado

pode ter avanado sobre as terras livres e a pequena roa, sobrevivente de seus pais, no era

suficiente para suprir todos os familiares. Uma das solues encontradas por esse grupo pode

ter sido a migrao para outras reas, em busca de novos arranjos de trabalho.

Nas entrevistas coletadas, possvel perceber que, nas primeiras dcadas do sculo

XX, ocorreram s primeiras migraes, na maior parte com destinos incertos. O pai de Dona

Esperana, Seu Simo, ao ser proibido pelo proprietrio da fazenda de construir sua casa na

propriedade, decidiu sair da regio. Primeiramente, mudou-se para o municpio vizinho de

Barra do Pira. No conseguindo estabilidade no estabilidade no local, visto que muitos

proprietrios ainda estavam mandando seu empregados embora, deixou a cidade e foi para

Santa Cruz onde, pela primeira vez, comprou uma casa. Veio a falecer em So Gonalo, na

casa de sua filha. 90

Entre os anos de 1910 e 1930, a partir das entrevistas coletadas, identifica-se uma

migrao ainda no definitiva. Apesar da possvel negao do trabalho na roa e a busca por

novos arranjos de trabalho, nesse perodo a migrao foi caracterizada pelo trabalho sazonal

em outras regies fora do Vale do Paraba, contando sempre com o retorno para a casa dos

pais ou da comunidade de origem. 91 Nas primeiras dcadas do sculo XX, o primeiro filho de

V Dionsio foi para a Iguass, na Baixada Fluminense, ajudar na colheita e na plantao da

90
Entrevista: Dona esperana, 1993, MC.
91
ESPADA, H. L. A Micro-Histria Italiana: escalas, indcios e singularidades. Rio de Janeiro: Ed. Civilizao
Brasileira, 2006. p. 242.
lxi

laranja. Aos poucos ele levou os outros irmos para ajudar no novo trabalho; porm, todos

sempre retornavam a fazenda para ajudar na economia familiar.

Neste ponto, importante salientar a figura da primeira pessoa que se estabiliza fora

do Vale do Paraba. Ao longo dos anos, principalmente entre os anos 30 e 40, essa migrao

comeou a tomar uma nova caracterstica. Provavelmente, com o aumento do dinheiro

arrecadado nos novos arranjos de trabalho, das novas oportunidades de emprego e com o

crescimento das cidades pequenas, os filhos da primeira gerao de libertos passaram a se

estabilizar definitivamente em diversas regies. Na dcada de 30, Seu Ormindo comprou uma

casa em Belford Roxo e para l levou seus irmos e seu pai. A sua casa se tornou um ponto

central, onde os parentes que desejavam sair do Vale procuravam em primeiro lugar.

Moravam com ele durante meses, at poderem se sustentar sozinhos. 92

Caso semelhante parece ter acontecido com os filhos de V Dionsio. Ao conseguirem

se estabilizar na Baixada Fluminense, suas casas se tornaram ponto de encontro dos familiares

que buscavam alternativas de sobrevivncia. At os dias de hoje, praticamente uma rua inteira

em Queimados est ocupada pelos familiares de Dionsio. 93

A migrao e conseqente separao de famlias, na maioria dos casos, impactaram,

de forma contundente, as memrias familiares. Para os que ficavam, quase sempre avs ou

pais que no conseguiram ou no quiseram sair da lavoura, o medo do sumio dos familiares

permanecia latente em suas memrias. Quase sempre os familiares so lembrados da seguinte

forma: No sei se morto ou se vivo. Uma histria bem emocionante aconteceu com

Izaquiel Incio, que havia perdido contato com uma irm ainda muito jovem. Sua irm foi

para o Rio de Janeiro buscar trabalho em casa de famlia e nunca mais deu notcia sobre seu

paradeiro. Seus pais, preocupados, escreveram cartas para ela, colocaram anncios no jornal,

tudo em vo. Todos os dias, sua me chorava sentindo falta da filha e, infelizmente, os dois

92
Entrevista: Izaquiel Incio, 1994, MC.
93
Entrevista: Florentina Seabra do Nascimento, 2006, AP.
lxii

morreram sem saber notcias dela. Em um dia, o filho dessa irm foi at Paraba do Sul tirar

um documento que ela precisava e, chegando ao cartrio, a escriv, que era muito amiga de

seu Izaquiel, disse ao rapaz que ele tinha parentes ali na regio e perguntou se ele os conhecia.

Obtendo uma resposta negativa, ela indicou o local onde ele morava. Chegando residncia

de Izaquiel e conversando sobre a irm, ele se emocionou muito ao relembrar todos os dias

nos quais a me chorava por falta da filha. A partir desse dia, eles voltaram a se comunicar e a

famlia pde se reunir novamente. 94

Finalizando, ao longo texto compreendeu-se que, nas entrevistas coletadas no Vale do

Paraba, dentre os diversos locais de migrao, foi surpreendente a quantidade de familiares

que mencionaram a regio da Baixada Fluminense. Nos depoimentos, os entrevistados fazem

referncia a parentes prximos e distantes que saram do Vale do Paraba e tiveram como

destino, temporrio ou permanente, a regio metropolitana do Rio de Janeiro. Foi possvel

encontrar essa estabilizao, comeando na dcada de 20 e finalizando nos anos 40. Dessa

forma, para a confeco da dissertao foi selecionado, dentre os vrios locais de

estabilizao dos libertos e seus descendentes, a Baixada Fluminense para pesquisar.

1.3 O Registro Civil de Nascimento

94
Vide esta passagem na ntegra em anexo.
lxiii

Nesta ltima parte, ser discutida a pertinncia das fontes de registro civil de

nascimento para o estudo das famlias de ex-escravos e de seus descendentes. Aqui, optou-se

por dividir o texto em trs partes. Na primeira parte, sero apontados os desejos e o meio

pelos quais essa populao buscou legitimar suas relaes familiares, no perodo do ps-

abolio. No arquivo eclesistico, quase sempre utilizado para realizar essa legitimao, os

registros no apresentam a categoria cor aps 1888. Efetivamente, uns dos poucos registros,

que apresenta essa categoria, so os civis de nascimento.

Na segunda parte, sero delineadas as principais caractersticas de tais fontes e sua

relevncia para o estudo das famlias de ex-escravos e libertos. Na terceira parte, sero feitas

comparaes gerais entre os registros colhidos no Cartrio de Registro Civil de Nascimento

de Nova Iguau com os obtidos por Ana Rios, em Paraba do Sul. Trata-se de levantar as

semelhanas e as diferenas que iro colaborar para a anlise de famlias de ex-escravos e

libertos na dissertao.

***

Com o advento da liberdade, muitos ex-escravos buscaram legitimar suas relaes

familiares, construdas ainda no perodo da escravido, nos Arquivos eclesisticos. Dionsio,

desde a poca da escravido, manteve um relacionamento conjugal com Zeferina, escrava da


95
mesma fazenda. Em 1889, oficializaram o matrimnio, j como Dionsio Crioulo, e ela
96
como Zeferina Crioula no dia 25 de Maio. Esse foi o caso tambm de seu irmo, Geraldo

Preto, que em 1889, j com o nome de Geraldo Fernandes, casou-se com Apolinria da

Conceio, filha natural de Rosria da Conceio. 97

95
Zeferina nasceu no dia 15 de outubro de 1870, filha natural de Paulina, escrava de Francisco Antonio Martins.
Livro II de Batismo fl.35. termo 66, AESIRP.
96
Livro II de Matrimnio fl. 31, termo 59 25 de Maio de 1889, AESIRP.
97
Livro II de Matrimnio fl. 34, termo 100 28 de setembro de 1889, AESIRP.
lxiv

De acordo com Souza, as proclamas de casamento se intensificaram em muitos

peridicos aps 1888. Atravs do Dirio de Minas, de 25 de setembro, pde-se perceber tais

nmeros:

Desde 19 de maio a 17 do corrente, quatro mezes mais ou menos, casaramse em So Joo


Nepomuceno 250 libertos. Em Santa Brbara, termo da mesma cidade, dizem que o nmero de
casamentos de libertos subio a 300. 98

A partir desse recorte de jornal, compreende-se a importncia emprestada pelos ex-escravos

na formalizao de suas situaes conjugais provindas do cativeiro. 99

Assim como da regularizao conjugal, os ex-escravos e seus descendentes buscaram

registrar toda a sua famlia. No ano de 1893 V Dionsio e Dona Zeferina batizaram sua
100
segunda filha, no Distrito de Santa Isabel, Sebastiana. Seus filhos nasceram aps a

abolio, e so: Manoel, Jos e Joaquim. 101 Brandina Maria, sua primeira filha, como nasceu

no Distrito de Ipiabas, o nico registro que menciona o seu parentesco com Dionsio foi o de

seu matrimonio. Nesse assento possvel ver que ela casou aos 14 anos, em 1903, com o

grande amigo de seu pai, Manoel Pereira do Nascimento, ex-morador da Fazenda So Jos. 102

Nas informaes coletadas no Arquivo Eclesistico de Santa Isabel do Rio Preto, foi

possvel acompanhar as mudanas dos nomes prprios na tentativa ou com o objetivo de


103
apagar as marcas da escravido. Em seu assento de Batismo, V Dionsio apenas

98
SOUZA, Snia Maria de. Terra, famlia, solidariedade: Estratgias de sobrevivncia camponesa no perodo
de transio Juiz de Fora (1870-1920). Doutorado. (Doutorado em Histria) Instituto de Cincias Humanas e
Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niteri, 2003. Apud RIOS, A. & MATTOS, H. O ps-abolio
como problema histrico: balanos e perspectivas. In: Topoi, v. 5, n. 8, 2004. p. 186.
99
Idem.
100
Livro IV de Batismo, fl. 93, termo 75 20 de janeiro de 1893, AESIRP.
101
Manoel: Livro IV, fl. 181, termo 8 novembro de 1898, AESIRP; Jos: Livro V, fl. 37, termo 4 23 de
setembro de 1903, AESIRP e Joaquim: Livro V, fl. 89, termo 73 - 3 de maro de 1908, AESIRP.
102
Livro II de Matrimnio, fl. 81, termo 6 23 de Maio de 1903, AESIRP.
103
De acordo com Walter Fraga os nomes como evidncias histricas reveladoras das experincias pessoais,
acontecimentos importantes, vises de mundo, idias e valores culturais, so destacados por vrios autores.
FRAGA, Walter Filho, Encruzilhadas da liberdade: histrias de escravos e libertos na Bahia (1870-1910),
lxv

104
descrito como inocente e escravo de Jos Gonalves Roxo, no entanto, pela primeira vez,

no assento de seu casamento em 1889, aparecia o sobrenome crioulo para ele e sua esposa

Zeferina, demonstrando claramente uma referncia a sua condio de liberto. Contudo, em

1899, ambos batizaram seu segundo filho Manoel na Igreja, adotando os seguintes nomes:
105
Dionsio Antonio Fernandes e Zeferina Maria Antonia. Em 1903, no casamento de seu

grande amigo Manoel com sua filha Brandina, Dionsio manteve o nome, porm Zeferina

mudou mais uma vez o seu sobrenome chamando-se Zeferina Maria da Conceio. 106

Esses dados demonstraram a vontade dos libertos e de seus descendentes em legitimar

as suas relaes familiares. Aps 1888, com a abolio da escravido, tornou-se difcil

acompanhar as trajetrias das famlias de ex-escravos, uma vez que a documentao

eclesistica, mais usada para o sculo XIX, no possua mais a categoria cor. Por outro lado,

os registros civis de nascimentos, casamento e bitos introduziam essa categoria em 1889.

Neste sentido, de acordo com Rios, libertos buscaram [tambm] regularizar suas vidas

familiares atravs do casamento, das promessas lavradas de casamento e declarao de

paternidade, de registro civil de suas crianas. 107

Sendo assim, optou-se, aqui, por utilizar os registros civis de nascimento para

acompanhar a formao e a estrutura das famlias de libertos e de seus descendentes. Para

entender um pouco melhor o funcionamento, os problemas e a importncia dos registros civis,

Campinas, Editora da UNICAMP, 2006. p. 295. Na nota 12 este autor aponta toda uma bibliografia sobre a
discusso das escolhas dos nomes pela populao ex-escravos.
104
Livro II de Batismo, fl. 13, termo 29 20 de maio de 1886, AESIRP.
105
Livro IV de Batismo, fl.181, assento 8 20 de janeiro de 1899, AESIRP.
106
Livro II de Matrimnio, fl.81, termo 6 23 de maio de 1903, AESIRP.
107
RIOS, A. RIOS, A. No se esquece um elefante: notas sobre os ltimos africanos e a memria dfrica no
Vale do Paraba. In: FRAGOSO, Joo; FLORENTINO, Manolo; JUC, Antnio Carlos; CAMPOS, Adriana.
Nas Rotas do Imprio: eixos mercantis, trfico e relaes sociais no mundo portugus. Vitria: Edufes; Lisboa:
IICT, 2006. p. 668.
lxvi

sero analisadas, no texto a seguir, sua estrutura de funcionamento, as leis que o regiram, e as

condies de seu o acesso.

Legislao

Desde a metade do sculo XIX, o governo Imperial tentou, em vo, implantar o

registro civil no Brasil. Os seus interesses estavam basicamente direcionados obteno de

estatsticas oficias sobre a quantidade de imigrantes aportados e da populao do pas por ano.

O registro civil seria uma forma de substituir os censos, uma vez que os mesmos eram

extremamente dispendiosos e demorados.

Em seu esforo inicial, o primeiro decreto previa a laicizao dos registros de


108
nascimentos e de bitos, at ento sob o poder dos padres catlicos. No obtendo xito,

posteriormente, mais dois decretos foram feitos para tentar, de todas as formas, regulamentar

os registros de nascimento, casamento e bito. 109 O ltimo seguiu para a Assemblia Geral, e

por l ficou por muito tempo at ser aprovado. Contudo, o decreto que colocou em prtica o

registro civil foi o de n. 9.886 de 7 de maro de 1888. 110

Os meses, que seguiram a essa lei, foram extremamente conturbados, primeiro, em

virtude da abolio da escravido, e em seguida pelo fim do Imprio. Com o advento da

Repblica e da burocratizao do governo, o Registro civil ganhou novo flego e, em 1889,

os primeiros registros comearam a ser feitos.

Em relao aos registros de nascimento, de casamento e de bito, o decreto de 1888

imps regras para o registro. De acordo com o Art. 6, os empregados do registro civil no

deveriam inserir, nos assentos, seno aquilo que os interessados declarassem. As partes

108
Decreto n. 798 de 18 de junho de 1851. SENRA, N. C. Histria das Estatsticas Brasileiras. Rio de
Janeiro: IBGE, Centro de Documentao e Disseminao de Informaes, 2006. p. 88.
109
So eles: o decreto n. 907 de 29 de janeiro de 1852 e o decreto n. 5.604 de 25 de abril de 1874.
110
Todos os decretos e leis mencionados na presente dissertao foram consultados em SENRA, N. C. op. cit.
lxvii

deveriam, no prazo mximo de trs dias, declarar o nascimento da criana; no entanto, se a

residncia fosse longe do local de registro, esse prazo poderia ser estendido para at 60 dias

(Art. 53). O declarante deveria ser, em primeiro lugar, o pai da criana, se esse estivesse

impossibilitado, era dever da me fazer o registro; se ambos no pudessem declarar, algum

parente prximo deveria se apresentar ao cartrio (Art. 57). Somando a essas condies, os

livros deveriam ter, no mximo, 200 folhas e deveriam ser fornecidos pelos poderes estaduais.

As categorias, que deveriam ser registradas, estavam concomitantemente assinaladas

no decreto. De acordo com o Art. 58, os registros de nascimento deveriam conter os seguintes

elementos: 1) O dia, o ms, ano e lugar do nascimento, e a hora certa ou aproximada; 2) O

sexo do recm-nascido; 3) O fato de ser gmeo; 4) A declarao de ser legtimo, ilegtimo

ou exposto; 5)O nome e sobrenomes que forem ou houverem de ser postos na criana; 6) A

declarao de que nasceu morta, ou morreu no ato ou logo depois do parto; 7) A ordem de

filiao de outros irmos do mesmo nome, que existam ou tenham existido; 8) Os nomes,

sobrenomes e apelidos dos pais; a naturalidade, condio e profisso destes; a parquia ou

lugar onde casaram e o domiclio ou residncia atual; 9) Os nomes, sobrenomes e apelidos de

seus avs paternos e maternos; 10) Os nomes sobrenomes, apelidos, domiclio ou residncia

atual do padrinho, da madrinha e de duas testemunhas, pelo menos, assim como a profisso

destas e a daquele, se o recm-nascido j for batizado.

Mesmo as diretrizes sendo bem especficas, a maior parte dos escrives interpretou a

lei como lhes aprouvessem. Diante das dificuldades encontradas pelo DGE Diretrio Geral

de Estatsticas em receber anualmente os resumos dos registros corretamente, Bulhes de

Carvalho criou um questionrio direcionado aos cartrios, com a finalidade de identificar os

problemas encontrados, por eles, no processo do registro de nascimentos, bitos e

casamentos. A partir do resumo do inqurito, a direo do DGE organizou um projeto de Lei,


lxviii

o qual visava reformular alguns pontos objetivos do registro civil. Porm, uma vez colocado

no congresso, foi discutido e esquecido pelos parlamentares. 111


112
A grande virada, na reformulao dos registros civis, veio aps o ano de 1928.

Aparentemente, as inovaes foram poucas e, na maior parte, restringiam-se a multas dadas

aos cartrios pela demora do envio do resumo anual do registro. Todavia, pela primeira vez,

houve meno incluso da categoria cor nos registros. Mesmo sendo uma novidade, em

questo de decreto, esta prtica j vinha sendo realizada por diversos cartrios. Conclu-se da

que o governo federal parecia muito mais preocupado em receber as estatsticas e os valores

dos registros anuais do que propriamente com a cidadania da populao.

Deveras, no possvel calcular a quantidade de subregistro dessa poca, visto que

no eram todas as pessoas que procuravam o registro. Apesar do baixo custo do registros,

entre 5$000 a 20$000, em um pas, que, no incio do sculo XX ainda era tipicamente rural,

aparentemente o governo no se empenhou em promover campanhas para divulgar e mostrar

a importncia do registro civil.

Sendo assim, mesmo com todos os problemas inerentes ao estudo do registro civil,

esse pode ajudar a chegar s famlias de ex-escravos e de seus descendentes. Apesar de toda a

problemtica sobre a construo temporal da categoria cor nos registros, ela permite, de

certa forma, atingir, atravs das crianas pretas e pardas, essa parte da populao no Estado do

Rio de Janeiro.

O Registro Civil no perodo do ps-abolio

Para o estudo do ps-abolio, Ana Rios lanou mo em sua dissertao, dos registros

civis de nascimento, casamentos e bitos para tentar alcanar qualitativamente as famlias de

pretos e pardos no Vale do Paraba. Da mesma forma, pretende-se nessa ltima parte,

111
SENRA, N. C. p. 371.
112
O decreto n. 18.542 de 24 de dezembro de 1928.
lxix

comparar os dados gerais, obtidos no Registro Civil de Nascimento de Nova Iguau, com os

colhidos por Rios em Paraba do Sul.

Em virtude da natureza catica da introduo do registro civil no Brasil, era de se

esperar que os dados assentados fossem mudando de cartrio para cartrio. Rios encontrou

dificuldades no trabalho com os registros de casamento, uma vez que a maior parte no

apresentava a categoria cor. Eliminada a possibilidade de usar tais registros, concentrou sua

anlise nos nascimentos e bitos. 113

Apesar da quantidade de categorias interessantes, as quais contm o registro civil de

nascimento, um dos maiores problemas recai sobre a representatividade da documentao

frente aos censos. Rios demonstrou que as taxas de mortalidade e de nascimentos


114
evidenciavam um alto subregistro, e que os mesmos aumentavam ao longo dos anos. Em

1889, a populao recorreu de forma contundente aos registros, porm, desse ano em diante,

tal presena diminuiu consideravelmente. A partir desta percepo da quantidade de

subregistro, Rios descartou qualquer tentativa de estudo demogrfico com base no registro

civil. 115

Aqui, compartilha-se as mesmas preocupaes para o trabalho com o registro civil.

Porm, em outras regies, os registros apresentaram caractersticas diferentes das encontradas

em Paraba do Sul. Mesmo com os problemas inerentes natureza dos registros civis, estes

podem demonstrar tendncias importantes da populao de pretos e pardos no Estado do Rio

de Janeiro.

O objeto de estudo da presente dissertao o processo de migrao de famlias

negras que se deslocaram do Vale do Paraba em direo Regio Metropolitana do Rio de

Janeiro, entre os anos de 1888 e 1940. Com o propsito de obter um resultado estatstico

113
RIOS, A. op. cit., 1990, p. 15-16.
114
Ibid., p. 16.
115
Idem.
lxx

confivel e de construir um dilogo com outros trabalhos, foram selecionados os registros

civis de nascimentos encontrados no arquivo do Ofcio do Registro Civil das Pessoas Naturais

da 1 Circunscrio de Nova Iguau, de cinco em cinco anos. Dessa forma, os anos escolhidos

foram: 1889, 1894, 1899, 1904, 1909, 1914, 1919, 1924, 1929, 1934 e 1939. Ao total, foram

6.774 registros inseridos em um banco de dados.

Devido distncia de 50 anos, era de se esperar que houvesse mudanas significativas

na estrutura do registro. No entanto, as modificaes em relao s categorias foram

insignificantes ao longo dos anos. 116

Em comparao aos registros apresentados por Rios, os colhidos em Nova Iguau

apresentam algumas caractersticas especficas. Em primeiro lugar, diferentemente do que

Rios encontrou para Paraba do Sul, a quantidade de registros por ano no municpio de

Iguass cresceu ao longo dos anos. Como se pode ver na figura 1.4, na comparao com os

censos da regio, percebe-se que o registro acompanhou, aparentemente, o crescimento

populacional da regio do antigo Municpio de Iguass.

Aproximando os anos pesquisados com o os censos, chega-se a concluses

interessantes. O que realmente impressiona o crescimento impulsionado, a partir de 1914, e

mais ainda intrigante foi o aumento vertiginoso da busca pelo registro civil aps a dcada de

30, perodo do Governo Vargas. No to surpreendentes foram os ltimos anos dos registros

que, graas s leis incentivadoras, as quais coibiam as multas por atraso no registro, houve a

possibilidade de um bom nmero de pessoas se registrarem j na fase adulta. 117

Um dos grandes diferenciais deste acervo a presena da categoria cor em quase

todos os nossos registros. No primeiro ano do registro, durante os primeiros nove meses, tal

categoria no informada. Apesar disso, ela est presente em 38% dos registros. Todavia,

essa caracterstica muda drasticamente ao longo dos anos. Em 1919, por exemplo, ano em que

116
Em anexo h um assento transcrito que serviu de base para a construo do banco de dados.
117
Sobre a importncia do registro civil no governo Vargas, ver captulo 3 da presente dissertao.
lxxi

o censo foi realizado para ser publicado em 1920, somente 1,47% dos registros no possuem a

cor informada.

Figura 1.4 Total de registros civis de nascimentos por ano. Municpio de Nova Iguau, RJ.

2500

2000

1500

1000

500

0
1889 1894 1899 1904 1909 1914 1919 1924 1929 1934 1939

Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau.
Livros nmero 1, 3, 4, 6, 7, 9, 11, 12, 14, 15, 19, 24, 25, 34, 35, 36, 47, 48, 39, 50, 58, 59, 60 e 61. Nos
seguintes anos: 1889, 1894, 1899, 1904, 1909, 1914, 1919, 1924, 1929, 1934 e 1939.

Ao olhar atentamente para figura 1.5, percebe-se uma presena significativa do grupo

de pretos e pardos nos censos, principalmente aps 1914. Se no Vale do Paraba, essa

populao decresceu entre os censos de 1890 e 1940, na Baixada, a sua presena cresceu

significativamente. Entretanto, nesses dados, h uma lacuna significativa de 50 anos sobre a

cor dos recenseados, j que, aps 1890, somente no censo de 1940 tal categoria retornou.
lxxii

Figura 1.5 Total da populao recenseada como pretos e pardos. Paraba do Sul, Valena e Iguass.

80000

70000

60000

50000

Paraba do Sul
40000 Valena
Iguass

30000

20000

10000

0
1872 1890 1940

Fonte: Censos de 1872, 1890 e 1940.

Aparentemente, o crescimento da populao de pretos e pardos nos censos foi

acompanhado pelo aumento da procura dos registros no Municpio de Iguass (figura 1.6). Na

regio da atual Baixada Fluminense quando, se soma todos os registros, ao longo dos anos

selecionados, pode-se concluir que: em primeiro lugar, em 1894, logo aps a presena da cor

e o incio da implantao do registro civil de nascimentos, a populao de crianas pretas e

pardas era maioria; em segundo lugar, a partir da dcada de 20, pode-se perceber o

crescimento dos registros de crianas pretas e pardas. Logo, nada foi mais surpreendente do

que a grande presena dos pais registrando os filhos pardos e negros e de pessoas se

registrando, nos anos de 1934, e especificamente, em 1939.

Todos esses dados sero analisados, com maior detalhamento, no decorrer da

dissertao. Aqui, basta perceber que, mesmo diante das dificuldades apresentadas pelas

fontes, consegue-se chegar a algumas tendncias: primeiro, o Vale do Paraba, nos censos e

no registro civil de Paraba Sul, aparentemente perdeu populao de pretos e pardos, ao longo
lxxiii

dos anos; segundo, no Municpio de Iguass, em plena expanso econmica em virtude da

produo de laranja, a populao geral cresceu de forma contundente.

Figura 1.6 Total dos registros civis de nascimentos por cor. Municpio de Nova Iguau.

1200

1000

800

Branca
Outras Cores
600
No Informada
Pretos e Pardos

400

200

0
1889 1894 1899 1904 1909 1914 1919 1924 1929 1934 1939

Fonte: Vide figura 1.4.

Com a presena significativa de pretos e pardos procurando se registrar e registrar seus

filhos na Baixada Fluminense licito supor que essa populao procurou se incluir

socialmente. Portanto, nessa regio possvel encontrar uma populao de pretos e pardos

que no se silenciou ou que no foi silenciada.


lxxiv

Captulo 2 As trajetrias de ex-escravos e de seus descendentes na Baixada

Fluminense.

O objetivo deste captulo traar as trajetrias familiares de ex-escravos e de seus

descendentes que migraram, permanente ou temporariamente, para a Baixada Fluminense.

Trata-se de tentar perceber se essa populao, provinda do Vale do Paraba, conseguiu se

estabilizar ou no na regio metropolitana do Rio de Janeiro no primeiro quartel do sculo

XX, e de que forma isso ocorreu.

Este captulo divide-se em trs partes: na primeira, objetiva-se apresentar o contexto

dos municpios de Iguass e de Estrella, no final do sculo XIX. Essas regies,

posteriormente, configurariam o municpio de Nova Iguau. Sero discutidas as configuraes

polticas, econmicas e sociais da regio at os anos 40; na segunda parte, baseado nas

entrevistas realizadas na Baixada Fluminense, busca-se compreender a experincia dos filhos

de libertos, nascidos no perodo do ps-abolio, que migraram especificamente para essa

regio; na terceira parte, sero analisados os registros civis coletados no Oficio de Registro

Civil das Pessoas Naturais da 1 Circunscrio de Nova Iguau, a fim de caracterizar as

famlias de crianas pretas e pardas entre 1888 e 1940.

2.1 A regio da Baixada Fluminense

De Vila de Iguass a Nova Iguau.

Nesta parte pretende-se construir um panorama poltico e econmico da Baixada

Fluminense. Optou-se por dividir o texto em dois subitens. No primeiro, ser apresentado o

contexto poltico, as mudanas territoriais e as regies consideradas nesta dissertao como

Baixada Fluminense. No segundo, sero analisadas as caractersticas da economia local,


lxxv

destacando suas atividades produtivas, e as caractersticas de sua dinmica, em especial, a

produo de laranja, no sculo XX.

Na presente pesquisa, considera-se como Baixada Fluminense toda a regio

pertencente ao antigo municpio de Iguass e de Estrella. Na primeira metade do sculo XIX,

essas regies eram compostas pelas freguesias de Nossa Senhora da Piedade do Inhomirim,

So Joo Batista do Meriti, Santo Antnio da Jacutinga, Nossa Senhora da Conceio de

Marapic, Nossa Senhora do Pilar, Nossa Senhora da Piedade do Iguass e Nossa Senhora da

Guia de Pacopahyba. Todas essas freguesias, aps a dcada de 1940, tornaram-se os

municpios de: Nova Iguau, Queimados, Japeri, Nilpolis, Mesquita, So Joo de Meriti,

Belford Roxo, Mesquita e Paracambi.

No contexto da provncia do Rio de Janeiro, aps a metade do sculo XIX, o

municpio de Iguass tornou-se um dos mais importantes entrepostos comerciais entre o Vale

do Paraba e o porto do Rio de Janeiro. Era uma regio rica em quantidade de rios navegveis

e, ao longo dos principais rios, como Inhomirim e Estrela, havia portos por onde a produo

do caf era levada em pequenos barcos at a Baa de Guanabara, para ser exportada.

De acordo com Waldick Pereira, o Baro de Mau, em 1854, inaugurou a primeira


118
estrada de Ferro, que ligava o Porto de Mau a Vila de Estrella. Era um percurso ainda

pequeno, com apenas 14,5 Km. Contudo, a grande mudana econmica na regio viria em

1858, quando a Estrada de Ferro Central do Brasil passou a cortar a regio de Iguass,

chegando ao municpio de Queimados, como hoje conhecido. Posteriormente, a linha

atingiu a fazenda de Belm, atual Paracambi, recebendo as primeiras cargas de caf de

Mendes, da Sacra Famlia e de Pira. Em 1865, o trem havia chegado a Barra do Pira,

Ipiranga, Vassouras, Desengano, Concrdia, Paraba do Sul e Entre Rios. Naquela poca, o

118
PEREIRA, Waldick. Cana, Caf e Laranja: Histria econmica de Nova Iguau. Rio de Janeiro:
FGV/SEEC, 1977. p. 53.
lxxvi

trem j acumulava as funes de: transporte de passageiros e, principalmente, de conduo da

produo do caf para o porto do Rio de Janeiro.

Com o crescimento econmico promovido pelo trem, o municpio de Estrella, at

ento separada politicamente de Iguass, perdeu importncia na regio. Nesse nterim, o rio

Inhomirim era o responsvel pelo transporte de passageiros e de caf nessa regio; porm com

a linha frrea, houve aumento na capacidade e na velocidade da conduo do caf ao Rio de

Janeiro. De acordo com Pereira, o fim econmico da regio veio quando a linha frrea Gro-

Par chegou a Petrpolis e se estendeu at Areal. Em 1896, a freguesia de Estrella foi extinta

e anexada ao municpio de Iguass. 119

Paralelamente construo das estradas de ferro por toda a Baixada, dois outros

problemas contriburam para crise econmica do final do sculo XIX. Aquela era uma regio

caracterizada por grandes extenses de terras alagadias e de brejos, isso contribua na

proliferao rpida de doenas, o que foi o caso da antiga sede de Iguass, Vila de Cava. Na

virada do sculo, essa regio sofreu um surto de clera-morbus e de malria, que impediu,

temporariamente, o trfego de pessoas e de produtos pelos rios. Parte dos moradores se

mudou para a regio, a qual comeava a despontar economicamente nesse perodo,

Maxambomba.

Maxambomba, no incio do sculo XX, estava crescendo economicamente, primeiro,

por causa da linha frrea que cortava o distrito e, segundo, pela produo de laranjas. Em

virtude desses fatos, de acordo com o decreto n. 1.331 de 9 novembro de 1916,

Maxambomba foi elevada sede do municpio e passou a se chamar Nova Iguau.120

119
PEREIRA, W. op. cit., p. 53.
120
No perodo estudado, entre 1888 a 1940, o nome do Municpio muda pelo menos trs vezes. Para impedir
futuras confuses entre termos, optou-se por utilizar, durante esta dissertao, apenas o nome atual, Municpio de
Nova Iguau, para simbolizar a regio da Baixada Fluminense, antes da diviso em pequenos municpios,
ocorrido aps a dcada de 50.
lxxvii

A crise do caf

O final do sculo XIX, em Nova Iguau, caracterizado pela decadncia na produo

do caf. Ao mesmo tempo em que o caf ganhava importncia econmica no Vale do Paraba

na dcada de 1870, alguns fazendeiros davam incio a essa plantao na Baixada Fluminense.

De acordo com Pereira, a produo de caf no seguiu os moldes das reas economicamente

mais importantes. Apesar da existncia de latifndios e da boa qualidade da terra, a produo

de caf no substituiu completamente a da cana-de-acar, que estava presente em Nova

Iguau desde o sculo XVIII. Aliada a outros fatores como as doenas, a plantao de cana-

de-acar dessa regio nunca ganhou grande destaque no Estado do Rio de Janeiro. Afinal, a

importncia dessa regio, economicamente falando, estava em seu papel de entreposto

comercial com o Rio de Janeiro.

Tanto no Vale do Paraba quanto na produo do caf no municpio de Nova Iguau e

de Estrella encontrava-se a utilizao de mo-de-obra servil. Efetivamente, pouco se sabe

sobre a quantidade e o uso de cativos no cultivo de caf na Baixada Fluminense. Em virtude

de ser um entreposto comercial, alm da venda de caf, os escravos tambm eram levados,

por esses caminhos, at as principais regies de produo cafeeira do Vale do Paraba. No h

estatsticas que contabilizem ou que faam projees sobre a quantidade de escravos que

ficaram na regio. De fato, aps a cesso do trfico em 1850, tanto o Vale como a Baixada

sofrerem com a falta de mo-de-obra.

At hoje no h estudos sistemticos sobre os ltimos anos de escravido na Baixada

Fluminense. No entanto, a partir do censo de 1872 pode-se chegar a algumas caractersticas

importantes da populao escrava na regio. Somando os escravos existentes no Municpio de

Estrella e de Iguass, chega-se ao total de 10.056, ou seja, correspondiam a 32% da populao

em geral. No Municpio de Valena, o nmero de escravos era de 28.496, ou seja, 60,4% das

pessoas recenseadas. Mesmo a Baixada Fluminense concentrando um nmero bem menor de


lxxviii

escravos em comparao a Valena, ainda assim a sua presena bem expressiva nessa

regio.

No final do sculo XIX, a quantidade de escravos existentes na regio de Iguass e de

Estrella decaiu rapidamente. De acordo com o Quadro demonstrativo da populao escrava

no Rio de Janeiro, em 1873, apenas 6.964 escravos foram arrolados, ou seja, um decrscimo
121
de 30% na populao cativa. J a regio de Valena teve sua quantidade de escravos

diminuda em apenas 5%. Essa diferena aumenta drasticamente, em 1883, tanto para a

Baixada quanto para Valena; nesta foram contabilizados 5.296 cativos, enquanto naquela

foram 24.811. Ora, em relao ao censo de 1872, a populao escrava decaiu 48,4% e 13%

respectivamente nestas duas regies. A partir desses dados, ao contrrio das regies

produtoras de caf do Vale do Paraba, na Baixada Fluminense a escravido, provavelmente,

no perdurou fortemente at seus ltimos anos.

A falta de mo-de-obra servil, no final do sculo XIX, pode ter contribudo

substancialmente para o agravamento da crise de produo do caf, na regio da Baixada

Fluminense. No municpio de Nova Iguau, onde a concentrao fundiria era maior, os

proprietrios comearam a se desfazer de suas terras em virtude da grande desvalorizao.

Iniciavam-se, dessa forma, os primeiros loteamentos de terras, as quais foram divididas em

pequenas chcaras no distrito Maxambomba e em seu entorno, criando um mercado

imobilirio de pequenas propriedades nunca antes visto. De acordo com Jorge Lus Rocha, no

perodo entre 1875 a 1899, a maior parte das transaes de terras correspondia a propriedades

de at 150 hectares, ou seja, para a regio de Nova Iguau, eram imveis considerados

pequenos e mdios. 122

121
PEREIRA, W. op. cit., p. 104.
122
ROCHA, Jorge Lus De quando dar os Anis A estrutura fundiria da Baixada Fluminense e suas
transformaes. Hidra de Igoass, n3, Abril/Maio/Junho de 2000. p. 30.
lxxix

A expressiva extenso de terras improdutivas e baratas no centro do Municpio de

Nova Iguau, nos primeiro anos do sculo XX, impulsionou investimentos de novas

produes em pequena escala. Neste nterim crescia como nova oportunidade econmica na

regio a produo da laranja.

A laranja

De acordo com Pereira, a laranja era uma fruta plantada h muito tempo, no Rio de

Janeiro. Produzida em pequenas propriedades ou chcaras, na segunda metade do sculo

XIX, era vendida apenas para o mercado interno. Nesse perodo, So Gonalo, ainda unido ao

Municpio de Niteri, ganhou destaque ao comear uma produo direcionada apenas a

mercados vizinhos ao municpio. J no final do sculo, Tal produo ganhou fora e teve a

sua primeira exportao, em 1886, chegando, primeiramente, aos mercados argentinos e, dois

anos depois, passando a ser comercializada em So Paulo. 123

Na virada do sculo, a produo de laranja se espalhou pelo Rio de Janeiro. Muitas

fazendas que haviam entrado em crise econmica, por causa das produes em larga escala do

caf e da cana-de-acar, estavam abandonadas e/ou foram loteadas. Esse era um cenrio

tpico para o tipo de produo que a laranja exigia, ou seja, a de pequenas propriedades. As

regies que despontavam economicamente no Estado na produo de laranjas, nesse perodo,

foram: So Gonalo, Campo Grande, Bangu, Santa Cruz e Nova Iguau. Para alm do Rio de

Janeiro, So Paulo tambm investiu na produo, obtendo uma maior produtividade por p de

laranja em comparao aos municpios do Rio.

Com o advento da Repblica, foram vrios os setores que incentivaram a produo de

laranja em modelo agro-exportador no Brasil. A plantao de laranjais, nestes moldes, no

Estado do Rio de Janeiro e, especificamente, em Nova Iguau ganhou mais fora com entrada

123
PEREIRA, W. op. cit., p. 114.
lxxx

de Nilo Peanha no Governo. Ao assumir o governo estadual, ele passou a se dedicar ao

desenvolvimento de programas que visassem recuperao econmica do estado.

Entrementes, conforme Marieta Ferreira, ele deixou de ser uma liderana representativa

apenas do setor aucareiro do municpio de Campos, e passou a contar com a sustentao

poltica de setores advindos de outras regies, principalmente das reas cafeeiras do Vale do

Paraba. Apesar de estar ligado as esses setores, Peanha apostava na diversificao da

agricultura como a principal sada para a crise pela qual passava o Estado. 124

Em 1909, Nilo Peanha, ao assumir a presidncia do pas, colocou em prtica seus

planos de incentivo economia fluminense. No mesmo ano, estabeleceu iseno de direitos

aduaneiros sobre as frutas comercializadas entre Brasil e Argentina. Dessa forma, ampliava o

comrcio entre os dois pases, alm de incentivar economicamente a produo de laranjas na

Baixada Fluminense.

Uma segunda caracterstica de seu governo foi o investimento em saneamento bsico

na regio metropolitana do Rio de Janeiro. Embora da busca por solues para tal questo ter

comeado em 1894, o governo de Peanha foi o que mais colaborou para o desenvolvimento
125
da regio. Seus esforos se concentraram nos locais tipicamente pantanosos da Baixada,
126
principalmente beira dos rios Iguass, Sarapu, Inhomirim e Pilar. Ainda que tivesse

governado o pas por apenas um ano e meio, incentivou, de forma contundente, o crescimento

econmico dessa regio. O dessecamento dessas reas e o fim de vrias doenas provenientes

desse tipo de terreno colaboraram na expanso da citricultura em Nova Iguau.

As fazendas, antes utilizadas para a produo de caf e de cana-de-acar, que haviam

se tornado improdutivas, transformaram-se em laranjais. Com o loteamento de terras, na

124
FERREIRA, M. Em busca da Idade do Ouro: as elites fluminense na Primeira Repblica (1889-1930). Rio
de Janeiro: Ed. UFRJ, 1994. p. 21 e 22.
125
O decreto n. 128 de 10 de outubro de 1894 previa estudos para resolver o problema do saneamento.
126
VIANA, M. T. Nova Iguau: absoro de uma clula urbana pelo grande Rio de Janeiro. Nova Iguau,
IBGE, 1962, p. 205, Apud PEREIRA, W. op. cit. p. 115.
lxxxi

virada do sculo, a sede do municpio encontrava-se compartimentada em vrias chcaras e

pequenos stios. Desse modo, em 1920 a laranja comeou a ser produzida em larga escala em

Nova Iguau e, em virtude da produo de laranjas, houve um crescimento econmico,

desencadeando a valorizao das terras na regio.

De acordo com o censo de 1920, Nova Iguau possua uma extenso de terra

equivalente a 144.700 hectares dos quais 117.937 eram em estabelecimentos rurais, ou seja,

81,5% da extenso de terra estavam localizadas no meio rural. Eram, ao total, 280

propriedades, das quais 161 estavam sob controle dos proprietrios, 18 em mos de

administradores e 161 arrendadas. Em 1920, as propriedades que possuam menos de 41

hectares somavam 213, porm a maior parte das terras ainda estava sob controle de uma

pequena parcela de proprietrios (tabela 2.1). Ao analisar o tamanho das propriedades nota-se

que, nesse perodo, a expanso da pequena propriedade ajudou no impulso inicial da produo

de laranja. Proprietrios antigos e novos investiram ou arrendaram suas terras para a produo

de laranja.

Tabela 2.1 Total por tamanho das propriedades segundo o censo de 1920. Municpio de Nova Iguau.

Tamanho (hectares) N. de Propriedades


Menos de 41 213
41 a 100 19
101 a 200 10
201 a 400 10
401 a 1000 11
1001 a 2000 10
2001 a + 7
Total 280

Fonte: Censo Agrcola de 1920.

Atravs do censo de 40, percebe-se que houve um aumento da quantidade de pequenas

propriedades. Em 1940, no auge da produo da laranja em Nova Iguau, somava-se 1.529

propriedades rurais que, dentre elas, 704 estavam sob controle dos proprietrios, 302 sob os
lxxxii

administradores e 523 sob arrendatrios (Tabela 2.2). Nesse perodo, as propriedades com

menos de 50 hectares eram ao todo 1.470 (96%).

Tabela 2.2 Total por tamanho das propriedades segundo o censo de 1940. Municpio de Nova Iguau.

Tamanho (hectares) N.de Propriedades


Menos de 50 1470
50 a 100 30
100 a 200 13
200 a 500 10
500 a 1000 4
1000 a 2500 3
2500 a + 1

Fonte: Censo de 1940.

A maior parte das plantaes de laranjas se concentrou no distrito sede do Municpio

de Nova Iguau. Na tabela A.1 (anexo), possvel acompanhar a diviso territorial das

propriedades por distritos. Em 1932, a sede da regio reuniu 83% dos laranjais. De acordo

com a Diretoria de Agricultura do Estado do Rio de Janeiro, de 1927, eram, ao total, 104

propriedades produtoras na regio e o valor de seus imveis somava um total de

9.753.300$000. 127

Aparentemente esse perodo foi caracterizado por um grande comrcio de pequenas

propriedades na regio. Deveras, pouco se sabe sobre o mercado imobilirio, o valor das

propriedades e qual o perfil dos proprietrios. Pode-se supor apenas que, com o crescimento

econmico da regio sob a produo de laranjas, as propriedades se valorizavam.

Efetivamente, a compra da pequena propriedade ou o arrendamento da mesma no estava

acessvel a todos, uma vez que somente pessoas que possuam dinheiro suficiente poderiam
128
investir. Dessa forma, possivelmente, ao longo desses anos, os fazendeiros mais ricos e

donos de mais de uma propriedade passaram a dominar a produo da laranja na regio.

127
Diretoria de agricultura do Estado do Rio de Janeiro, 1927, apud PEREIRA, W. op. cit., p. 125.
128
PEREIRA, W. op. cit., p. 125.
lxxxiii

A produo da laranja, sob domnio de grandes empresas, conseguiu, entre as dcadas

de 20 e 40, atingir nmeros expressivos na exportao. De acordo com a tabela 2.4, pelo porto

do Rio de Janeiro, no perodo de 27 a 34, foram exportadas 10.674.135 caixas de laranjas que
129
somavam um valor no total de 218.590.586$800. Em 1928, o Estado de So Paulo

contribuiu com a exportao de 205.379 caixas e o Distrito Federal, 432.738. Em 1934 o

Brasil como um todo exportou 2.631.827 caixas e dois anos mais tarde chegou ao nmero de

5.487.043. 130

A participao do Municpio de Nova Iguau na exportao de caixas de laranjas, aps

a dcada 30, ganhou mais destaque em relao a outras regies. Em 1931, a exportao pelo

porto do Rio de Janeiro chegou a um total de 1.236.453 caixas de laranjas, das quais Nova

Iguau colaborou com 687.900.131 Em 1938, somente este municpio exportou 2.111.618

caixas de laranja, destacando-se como maior produtor nacional. 132

Em 1940, a produo havia chegado ao seu auge. De acordo com o censo do mesmo

ano, os estabelecimentos rurais, declarados como produtores de laranja, chegaram ao nmero

de 1.398, em um total de 1529 propriedades. Iso significa dizer que 92% das propriedades

localizadas no Municpio de Nova Iguau estavam direcionados produo de laranja.

Arranjos de trabalho na laranja

Em virtude do crescimento econmico da laranja, na regio da Baixada Fluminense,

houve uma necessidade cada vez maior de mo-de-obra. Os trabalhadores eram empregados

129
PEREIRA, W. op. cit., p. 123.
130
Ibid., p. 123.
131
Idem.
132
SOUZA, Sonali Maria Da Laranja Ao Lote: Transformaes sociais em Nova Iguau. Dissertao.
(Mestrado em Antropologia Social) Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro,
1992. p. 58-59.
lxxxiv

na plantao e na colheita da laranja. Deveras, a produo da laranja impulsionou o

surgimento de novos arranjos de trabalhos ligados direta ou indiretamente a ela.

Por causa da necessidade de capital, para iniciar a plantao, a participao na

produo de laranjas no estava acessvel a todos. O plantio era feito em pequenas e mdias

propriedades, chamadas chcaras, e, na maior parte dos casos, o acesso a elas se dava pelo

arrendamento. Esse foi o momento em que a figura do Chacreiro surgiu; na maior parte,

esta era formada por imigrantes europeus, com destaque para os portugueses. H que se

diferenciar dois tipos de chacreiros: o primeiro, era de grande porte, ou seja, controlava uma

grande extenso de terras e possua um nmero significativo de trabalhadores; e, em segundo,

havia os pequenos chacreiros que contavam apenas com o trabalho domstico para

produzir. 133

Os arranjos de trabalho foram se diversificando graas necessidade de ampliar a

produo. Nesse sentido os chacreiros procuraram empregar a parceria, a meao,

trabalhos assalariados, temporrios e permanentes. De acordo com Sonali Maria Souza, entre

os parceiros, era possvel encontrar a presena de portugueses, como tambm de mineiros e

fluminenses. Contudo, essa no era a forma de trabalho mais largamente utilizada. Parece

acertado que a meao, os trabalhos assalariados e os contratos por empreitada foram as

formas de trabalho mais largamente encontradas. 134

No incio da produo de laranja, muito se utilizou, como mo-de-obra principal, o

trabalhador temporrio. Os catadores e apanhadores de laranja ocupavam uma posio de


135
menor prestgio dentro da hierarquia de produo. A eles, no era permitida a construo

de casas e/ou pequenas plantaes na propriedade. Eram convocados duas vezes por ano, para

a capina e para a colheita, ou seja, um trabalho tipicamente sazonal.

133
SOUZA, S. op. cit., p. 61.
134
Idem.
135
Ibid., p. 66.
lxxxv

Porm, com o passar dos anos, o beneficiamento da laranja trouxe uma diversificao

dos arranjos de trabalho, ampliando sua oferta. Sob o controle do presidente da Repblica,

Washington Luis, mais precisamente do Ministrio de Agricultura, foram instaladas em Nova

Iguau mquinas para o beneficiamento da laranja. Em 1931, havia no municpio 13 packing

houses, divididas em: cinco na sede, cinco em Morro Agudo, trs em Austin e Cabu. 136

Nas casas de embalagem, eram selecionadas as frutas pelo tamanho e padronizadas

para serem comercializados. Durante esse processo, era feita a lavagem, brunimento,
137
embrulho em papel de seda e encaixotamento. Nessas caixas, podia-se alocar at 250

frutos e nelas eram impressas a marca do produtor e o local de origem.

De 1931 a 1935, o nmero de packing houses em Nova Iguau passou de 13 para 24.
138
Nesses barraces empregavam-se cerca de 100 pessoas, entre homens e mulheres. Para

alm desses, os servios secundrios da produo de laranja empregavam ainda mais

trabalhadores. Como exemplo de locais onde havia uma diversificao de arranjos de trabalho

os barraces especializados em produzir as caixas onde eram colocados os frutos.

Conseqentemente, entre as dcadas de 20 e 40 pde-se acompanhar um crescimento

populacional expressivo para o municpio de Nova Iguau.

2.2 Descendentes de libertos nascidos no ps-abolio

O objetivo desta parte ser o de traar as experincias de migrao que tiveram por

destino, temporrio ou definitivo, a Baixada Fluminense, no perodo do ps-abolio. Trata-se

de acompanhar a configurao demogrfica e as histrias de vida dos descendentes de libertos

que migraram entre as dcadas de 20 e de 40 em busca de novos arranjos de trabalho. Sero

136
PEREIRA, W. op. cit., p. 140.
137
SOUZA, S. op. cit., p. 58.
138
PEREIRA, W. op. cit., p. 141.
lxxxvi

selecionadas as entrevistas coletadas no Vale do Paraba e na Baixada Fluminense e os

recenseamentos do IBGE de 1920 e 1940, como fontes de pesquisa. Esta parte est divida nos

seguintes temas: o crescimento da populao, as motivaes da migrao, o crescimento

econmico da laranja e suas conseqncias, os novos arranjos de trabalho, crescimento

urbano, a estabilizao familiar e a localizao das moradias.

***

No captulo anterior, nas entrevistas depositadas no projeto Memrias do Cativeiro,

foi possvel perceber menes a passagens de familiares pela Baixada Fluminense. Para

alcanar as experincias dos filhos de V Dionsio, sero analisadas as entrevistas realizadas

com seus netos: Manoel Seabra, Zeferina do Nascimento e Florentina Seabra. A partir delas,

pode-se construir uma trajetria vista pelos parentes que no migraram.

A quebra da unidade familiar, durante esse perodo, foi presente na memria de quem

fica. Nos depoimentos dos netos de V Dionsio, moradores da Fazenda So Jos da Serra em

Valena, ficou marcada a sada dos tios e do av ainda quando os entrevistados eram muito

jovens, com cerca de dez a doze anos. De acordo com uma primeira anlise dessas entrevistas

lcito supor que, na dcada de 1920, foram em direo regio da Baixada Fluminense

buscar trabalho, visto que, no Vale do Paraba a entrada do gado e de outras produes, que

exigiam uma menor quantidade de trabalhadores, havia ganhado espao. Nos primeiros anos,

os filhos migrados de V Dionsio retornavam casa dos pais. Passavam distantes, por um

perodo, mas posteriormente, voltavam com dinheiro para continuar ajudando na economia

familiar, demonstrando que, aparentemente, viviam uma migrao sazonal.

Apesar das idas e vindas, possivelmente essas famlias mantiveram contatos com seus

familiares, porm, com a estabilizao ao longo dos anos, houve uma quebra familiar
lxxxvii

definitiva. Zeferina conta que o Tio Manoel, filho mais velho de V Dionsio, aos poucos

levou seus irmos mais velhos, Joventino, Sebastio e Hermenegildo para Nova Iguau.

Manoel havia comprado um terreno grande em Cabu, onde conseguiu alocar todos os

familiares que decidiram sair da Fazenda So Jos da Serra. Os irmos homens e mais velhos

comearam a deixar o Vale para morar com os tios na Baixada e ali trabalhar.

Histria muito semelhante ocorreu com o irmo de Izaquiel Incio, morador de

Paraba do Sul, entrevistado por Ana Rios. Seu irmo, Ormindo, filho de ex-escravo, entre as
139
dcadas de 20 e 30, conseguiu um trabalho na empresa de energia eltrica, a Light. De

acordo com a entrevista, Ormindo foi transferido por volta de 1935 para Queimados, onde

trabalhou at se aposentar. Nesse local, comprou um terreno e construiu uma casa de bom

tamanho. Ali passou a receber os parentes que tambm desejavam sair do Vale do Paraba,

tanto que, em 1938, Seu Izaquiel morou com o irmo nessa casa, porm desistiu e voltou para

o Vale.

Nas entrevistas, notou-se que essa migrao iniciou-se ainda nas primeiras dcadas do

sculo XX e, atravs dos censos, possvel supor a existncia desse movimento. Apesar dos

problemas inerentes aos censos, citados no captulo anterior, grosso modo, entre os censos de
140
1872 e de 1920 a populao da Baixada Fluminense variou muito pouco. No primeiro

recenseamento, a populao chegou ao total de 31.251, o que no mudou drasticamente para o

segundo, que j contabilizava 33.396 pessoas (tabela 1.1). Esse foi o perodo caracterizado

pela crise econmica da regio promovida pelo colapso da produo de caf e da cana-de-

acar. A partir da dcada de 1920, com crescimento considervel da produo de laranja,

houve um aumento da populao no Municpio de Nova Iguau (figura 2.1). De 33.396

139
Entrevista: Izaquiel Incio, 1994, MC.
140
Em 1872 optou-se por somar o municpio de Estrela com o Municpio de Iguass, que anos mais tarde, ao
juntar-se, se tornariam o municpio de Nova Iguau.
lxxxviii

pessoas recenseadas, em 1920, esse nmero salta para 140.606 no censo de 1940, ou seja, um

crescimento de mais de 400%. 141

Figura 2.1 Crescimento populacional da Baixada Fluminense de acordo com os censos. Municpio de Nova
Iguau.

160000

140000

120000

100000

80000

60000

40000

20000

0
1872 1890 1920 1940

Fonte: Censos de 1872, 1890, 1920 e 1940.

Ao minudenciar as caractersticas dessa populao, por faixa etria e sexo, um quadro

interessante apresentado. Em virtude da falta de dados complementares da populao, esses

censos demonstram tendncias que sero utilizadas na argumentao. No que concerne faixa

etria da populao, nas dcadas de 20 e de 40, os nmeros so muito prximos. No primeiro

censo, ao fazer clculos para chegar populao jovem, que estava na idade prxima a do

trabalho, chega-se aos seguintes nmeros: entre 10 e 29 anos, h 13.099 pessoas do total de

33.396, ou seja, 38% da populao; j no censo de 1940, essa faixa etria da populao

141
Para o municpio de Nova Iguau no h, nesse perodo, qualquer estatstica referente taxa de natalidade, de
mortalidade e de crescimento vegetativo.
lxxxix

cresceu para 53.513, em um total de 140.606 recenseadas, ou seja, proporcionalmente tambm

38% da populao (tabela 2.3).

Tabela 2.3 - Faixa etria da populao recenseada residente na Baixada. Municpio de Iguass e de Estrella.

1890 1920 1940


Faixa Etria Total Faixa Etria Total Faixa Etria Total
0a9 7177 0a9 9036 0a9 40423
10 a 19 5640 10 a 14 3767 10 a 19 29481
20 a 29 4542 15 a 20 4105 20 a 29 24032
30 a 39 3215 21 a 29 5227 30 a 39 19815
40 a 49 2678 30 a 39 4507 40 a 49 13730
50 a 59 1720 40 a 49 3265 50 a 59 7838
60 a 69 1214 50 a 59 1850 60 a 69 3480
70 a 79 521 60 a 69 1024 70 a 79 1128
80 e + 251 70 a 79 350 80 e + 493
80 a + 169

Fonte: Censos de 1890, 1920 e 1940.

No recenseamento de 20, possvel observar uma diferena entre os sexos (tabela

2.4). Dentre as 33.396 pessoas neste censo, 17.707 so homens, ou seja, 53% da populao.

Por outro lado, em 1940, essa diferena aparenta estar mais equilibrada, constando quase 50%

de cada lado. Analisando a faixa etria por sexo, chega-se a outros nmeros. Em 1920, os

homens entre 10 e 29 anos so 6.809; logo, 38% da populao masculina de Nova Iguau est

nesta faixa etria. Nmero semelhante encontra-se em 1940, visto que entre as 53.513 pessoas

recenseadas entre 10 e 29 anos, 26.748 so homens, ou seja, 37,2%.

Tabela 2.4 - Total de Homens e Mulheres recenseadas. Municpio de Nova Iguau.

1920 1940
Porcentagem Total Porcentagem Total
Homens 53% 17707 51% 71855
Mulheres 47% 15689 49% 68751
Total 33396 140606

Fonte: Censos de 1920 e 1940.

Com a retomada do crescimento econmico, a partir das primeiras dcadas do sculo

XX, essa regio comeou a concentrar uma populao que, provavelmente, estava em busca
xc

de trabalho. Em 1920, a porcentagem maior de homens, entre as faixas etrias de 10 a 29

anos, pode demonstrar a presena de trabalhadores nesta regio. Por ser um perodo de

crescimento e de montagem da produo da laranja, havia a necessidade de muita mo-de-

obra. Ora, por conta dos problemas inerentes aos censos demogrficos, no se sabe onde os

migrantes sazonais foram recenseados, na Baixada ou em sua regio de origem.

O mais interessante que a oferta de mo-de-obra nessa faixa etria se manteve ao

longo dos anos. Na dcada de 40, aparentemente, houve um maior equilbrio entre os sexos. A

partir disso, pode-se supor que essa mo-de-obra migrada, entre os anos de 1920 e 1930,

comeava a se estabilizar no Municpio de Nova Iguau. Deveras, tanto em 1920 quanto em

1940 a porcentagem de homens na faixa etria, entre 10 e 29 anos proporcionalmente,

continuou a mesma: 38%. Esse nmero, supostamente estvel, de pessoas em idade de

trabalho pode ter ajudado no desenvolvimento da produo de laranja e dos setores

secundrios ligados a ela, o que conseqentemente elevou ainda mais o seu crescimento,

atraindo novos trabalhadores.

Motivaes para migrar: laranja, trabalho e terra.

Durante a as dcadas de 20 a 40, o crescimento econmico da laranja parece ter

motivado a migrao de uma populao considervel para a regio da atual Baixada

Fluminense. Esse foi o caso dos filhos de V Dionsio. Dona Zeferina conta que seus tios

saram da fazenda Empreitada, quando ela ainda era criana, e foram em direo s plantaes

de laranja em Nova Iguau. Aps alguns anos de idas e vindas, os tios de Zeferina buscaram

todos os sobrinhos para trabalhar na Baixada. Em sua entrevista, conta que todos trabalharam

durante muitos anos nos barraces de laranja.

A primeira hiptese deste projeto de pesquisa versava sobre a atrao que a produo

da laranja promoveu sobre a populao de pretos e pardos do Vale do Paraba. Em virtude do


xci

crescimento da produo de laranja, exigiu-se cada vez mais mo-de-obra. Paralelamente,

nesse mesmo perodo, o Vale do Paraba intensificou a produo de gado e de outros produtos

que dispensavam trabalhadores. Durante a pesquisa partiu-se da premissa de que uma boa

parte dos filhos de libertos, nascidos no perodo do ps-abolio, havia abandonado as

fazendas de caf para trabalhar nas chcaras de laranja, na Baixada Fluminense.

Efetivamente, ao longo da pesquisa, pde-se constatar a existncia de histrias de

migrao para o municpio de Nova Iguau, que no citavam a laranja como atrativo. Como j

mencionado no captulo anterior, Seu Ormindo, irmo de Izaquiel Incio e morador de Paraba

do Sul, ao longo da adolescncia conseguiu emprego na Light e foi obrigado a se transferir


142
para Belford Roxo. Porm, no caso de Seu Manoel, pai da entrevistada Dona Nilza

moradora de Mesquita - ele foi empregado da Estrada de Ferro Central do Brasil em Valena

e tambm foi transferido para o Municpio de Nova Iguau, mais precisamente para o distrito

de Morro Agudo. 143

Essas duas histrias possuem uma relao muito prxima, visto que a criao de

empregos e a transferncia para a Baixada esto ligadas diretamente ao crescimento urbano da

regio. A produo da laranja havia se concentrado no distrito-sede e nas proximidades,

aumentando o valor das propriedades o que, provavelmente, dificultou a estabilizao da

populao mais pobre nessa regio. Para se ter um parmetro, nos distritos mais distantes

como So Joo de Meriti, Nilpolis e Duque de Caxias no houve essa valorizao. Essas

regies apresentaram um loteamento precoce, j que suas terras no valorizaram com as reas

de laranjais. Com propriedades mais baratas, supostamente, uma parte da populao pde se

instalar nessas regies, onde, consequentemente, houve um crescimento urbano em

propores significativas.

142
Entrevista: Izaquiel Incio, 1994, MC.
143
Entrevista: Dona Nilza, 2008, AP.
xcii

De acordo com Pereira, a partir da dcada de 30 o crescimento urbano de Nova Iguau

acelerou, at ento, no desmembrado em vrios municpios. Para ele, isso foi impulsionado

pelos seguintes fatos: construo de 14 novas estradas, ligando as reas produtoras de laranja

sede do Municpio; introduo da indstria secundria da citricultura; construo do

Hospital; instalao dos primeiros bancos; e instalao das primeiras indstrias, ao total de 19

em 1930.

Entre as dcadas de 30 e 40, a populao mais pobre comeou a se concentrar nas

regies onde a terra era mais barata, ou seja, nos distritos ao derredor de onde era produzida a

laranja. O crescimento urbano foi impulsionado concomitantemente pelas obras federais de

saneamento bsico, na dcada de 30, as quais extinguiram boa parte dos brejos,
144
transformando-os em propriedades. Da mesma forma, a populao comeou a se
145
concentrar perto das estaes de trem que, a partir de 1935, foram eletrificadas. No trecho

da entrevista abaixo, possvel perceber que os irmos de Senhor Cornlio Cansino, nascidos

em Juiz de Fora, naquele perodo, migraram para Baixada e por l se espalharam.

Ah, todos eles casaram, aquele negcio muito sacrifcio, depois que eles foram para o Rio que
melhorou. , eu tenho um irmo que mora l em Nova Iguau. Dois, tem a Teteca, Teteca l em So
Jos, mas a filha dele mora l no Rio de Janeiro, na casa dela, em Nova Iguau, num lugar
chamado K-11. O Tininho tambm. O Antnio mora l numa casa prpria no Rio, em Nova Iguau.
Esse ngelo que morreu tem uma casa l tambm, l em Engenheiro Pedreira, onde aconteceu esse
desastre poucos dias a, n. Tinha uma casa muito boa. Ele trabalhava de pedreiro. E o Sebastio,
esse morava em Nova Iguau tambm, pegado ao meu irmo mesmo. Esse Sebastio que morreu. E
a Alice, a Nice trovoada era filha da falecida tia Eullia, essa que tambm morou pegada ao meu
irmo, casou em So Jos e depois foi embora. Depois que acabou as fazendas, depois de 1900 e
146
poucos pra c, as fazendas acabou, veio todo mundo embora.

Assim como os irmos de Seu Cornlio, o cunhado de Dona Jlia, moradora de Paraba do

Sul, comprou um pequeno terreno em Japeri e para l levou sua irm e seus sobrinhos. Nessa

144
SOUZA, S. op. cit., p. 67.
145
ABREU, Maurcio O espao em Movimento: do urbano ao metropolitano. In: Evoluo Urbana do Rio de
Janeiro. Rio de Janeiro: IPLAN/Jorge Zahar, 1987, p. 107 apud SOUZA, S. op. cit., p. 67.
146
Entrevista: Cornlio Cansino, 1995, MC
xciii

propriedade, ele plantava e vendia os produtos nas feiras prximas. 147 Caso semelhante foi o

do tio de Dona Yvone, moradora de Mesquita. Seu Horcio vendeu seu lote em Vassouras

para comprar uma pequena rocinha em Nilpolis. 148

Contraditoriamente, nada parece ter colaborado mais para a estabilizao familiar do

que a crise da laranja. Pereira apontou que o declnio da produo, no Municpio de Nova

Iguau iniciou-se por volta de 1926. Assinalou a praga da mosca do mediterrneo como

uma das causas da extino da lavoura. Uma vez que as tentativas para elimin-la foram em

vo, esta persistiu at os ltimos dias da produo de ctricos. Para alm das pragas, o incio

da Segunda Guerra Mundial tambm contribuiu para a crise. Os mercados europeus,

principais compradores da produo, fecharam-se por causa da guerra instaurada. Devido

paralisao das navegaes de comrcio, em 1939, as laranjas ficaram estocadas nos portos

apodrecendo e, como conseqncia, a produo declinou acentuadamente. 149

Para evitar uma crise prolongada, muitos proprietrios comearam um processo de

loteamento das terras. De acordo com Pereira, entre 1926 e 1945, foi registrado um total de 21

loteamentos e de 31 desmembramentos de propriedades na Baixada Fluminense. 150

A partir dos dados apresentados, possvel supor que, na dcada 1920, foram poucas

as oportunidades de estabilidade na regio. Naquele perodo, o trabalho era basicamente

sazonal, ou seja, os trabalhadores retornavam aos seus locais de origem. Isso significa que,

priori, a sada dos filhos do Vale do Paraba, nas primeiras dcadas do sculo XX, em busca

de trabalho, pode ter reforado e/ou mantido, mesmo que precariamente, a comunidade de

origem.

147
Entrevista: Dona Julia, 1994, MC.
148
Entrevista: Dona Yvone, 2006, AP.
149
PEREIRA, W. op. cit., p. 144.
150
Ibid., p. 146.
xciv

Na dcada de 30, a partir dos relatos, parece acertado que esse foi o momento de incio

da estabilizao na Baixada Fluminense. Esse processo foi muito semelhante ao encontrado

por Thomas Holt para a Jamaica, no qual os libertos e seus descendentes buscaram comprar

propriedades produtivas que pudessem aliar roa de subsistncia com venda de produtos nos

mercados locais, e trabalho assalariado nas grandes fazendas. 151 Essas pequenas propriedades

estavam localizadas ao redor dos grandes centros empregadores.

Ora, em nenhuma das entrevistas pesquisadas houve menes sobre a compra ou posse

de propriedades, por parte dos descendentes de libertos, onde existia plantao de laranja.

Pelo contrrio, quando nos depoimentos, aqui citados, h aluses sobre a compra e/ou posse

de terrenos, estes se localizavam ao redor da sede produtora de laranja. Na poca, antes do

desmembramento, eram os distritos de: Japeri, Nilpolis, Caxias, Caonze, Cabu,

Queimados, Belford Roxo, Engenheiro Pedreira, entre outros. At os dias de hoje, so

considerados bairros extremamente pobres em relao sede de Nova Iguau.

Deveras, somente nos casos dos netos de V Dionsio h meno da migrao por

causa da laranja. Nas outras entrevistas, como no caso de Seu Cornlio e de Dona Nilza, seus

parentes migraram para a Baixada, a fim de trabalhar em locais diretamente ligados

expanso urbana, por exemplo, a Empresa de energia eltrica e a Estrada de Ferro Central do

Brasil.

Sendo assim, lcito supor que, atravs das entrevistas e dos censos, possvel

perceber a estabilizao das famlias de libertos e de seus descendentes se incrementando e,

ao que parece, finalizando a migrao, na dcada de 40. Ainda assim, poucas questes foram

discutidas, em especfico, no que tange s caractersticas familiares desse grupo na Baixada

Fluminense. Para tanto, buscou-se utilizar os registros civis de nascimentos de Nova Iguau,

151
Uma melhor discusso sobre a estabilizao ser feita, a partir dos registros civis, na parte 3 deste captulo.
xcv

com o objetivo de acompanhar a formao e estabilizao familiar dos descendentes de

libertos.

2.3 A famlia de ex-escravos e de seus descendentes 1888-1940

O objetivo desta ltima parte o de acompanhar a formao das famlias de ex-

escravos e de seus descendentes no Municpio de Nova Iguau. Para tanto, sero utilizados os

dados obtidos da pesquisa realizada no registro civil de nascimentos encontrado neste

municpio.

No mesmo ano de abertura do Ofcio do Registro Civil das Pessoas Naturais da 1

Circunscrio de Nova Iguau, 1889, mais dois cartrios de registro civil passaram a

funcionar neste municpio, nos distritos de So Joo de Meriti e de Vila de Cava. Aqui, optou-

se por focalizar o cartrio de Nova Iguau, pois, como visto na segunda parte deste captulo,

essa regio concentrou a maior parte da populao, entre os anos de 1920 e 1940, e se tornou

um importante centro econmico no Estado. Alm disso, tal cartrio abrangia os distritos que

hoje so os municpios desmembrados de Nova Iguau como: Queimados, Belford Roxo,

Mesquita, Japeri, Duque de Caxias, Nilpolis e Paracambi

Buscou-se analisar o perodo que vai de 1888 a 1940, ou seja, os anos que vo da

abolio ao censo de 1940. Em virtude da quantidade expressiva de registros, selecionou-se os

anos de cinco de cinco, so eles: 1889, 1894, 1899, 1904, 1909, 1914, 1919, 1924, 1929, 1934
152
e 1939. Esses registros pouco mudaram, ao longo do tempo, o que possibilitou o uso de

quase todas as categorias em todos os anos.

Para se chegar s famlias de ex-escravos e de seus descendentes, nesta parte, sero

usados somente os assentos de crianas nascidas no ano de seu registro. Isso porque, nos
152
Como j explicado no captulo anterior, os registros efetivamente s passaram a ser feitos a partir de 1889.
xcvi

ltimos anos, mais precisamente em 1934 e 1939, a quantidade de registros tardios e de

pessoas se auto-registrando na idade adulta cresceu consideravelmente. 153

Dessa forma, busca-se construir as caractersticas da famlia ex-escrava em dois

momentos bem especficos de sua trajetria. No primeiro corte de anlise, selecionou-se os

anos que vo de 1889 a 1919; e, neste perodo, sero encontradas basicamente as famlias de

ex-escravos das antigas fazendas do Municpio de Nova Iguau. Apesar de no ser o tema

principal desta dissertao, muito importante traar as principais caractersticas dessas

famlias para poder comparar e diferenciar das que migraram aps 1920. Alm disso, esta

parte poder trazer subsdios para pesquisas posteriores sobre as famlias de ex-escravos das

antigas fazendas da Baixada Fluminense.

No segundo corte, sero analisados os anos entre 1924 e 1939. Tal perodo de suma

importncia para a pesquisa, visto que, como j estudado na parte 1 deste captulo, entre esses

anos, no Municpio de Nova Iguau, ocorreu um crescimento econmico significativo em

virtude da produo de laranjas. Conseqentemente, estes elementos levaram a uma migrao

sistemtica para a regio. Portanto, busca-se mostrar de que forma foi constituda a

estabilizao das crianas registradas como pretas e pardas, nascidas fora da Baixada, em

especial, provindas do Vale do Paraba.

2.3.1 Os registros civis de crianas

Apesar de no ser procurado por todos, a quantidade de registro de nascimento em

todo o perodo pesquisado surpreende. Nos anos selecionados, entre 1889 e 1939, no registro

civil de Nova Iguau, contabiliza-se um total de 5.897 nascimentos de crianas (tabela 2.5).

Dentre estes registros, 2.908 (49%) so de crianas brancas, 2.631 (45%) de pretas e pardas e

153
Os registros tardios ser o tema de nosso captulo 3.
xcvii

142 (2%) de crianas de outras cores. 154 Dentre todos esses anos, a cor no foi informada em

apenas 4% dos registros.

Tabela 2.5 - Total de registros civis de nascimentos por cor e ano. Municpio de Nova Iguau.

Branca Outras Cores No Informada Pretas e Pardas Total


1889 19 171 47 237
1894 118 1 204 323
1899 86 29 5 112 232
1904 58 24 5 48 135
1909 96 34 3 92 225
1914 72 39 3 73 187
1919 212 2 6 188 408
1924 352 13 3 274 642
1929 469 10 342 821
1934 636 1 7 435 1079
1939 790 2 816 1608
Total 2908 142 216 2631 5897

Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau. Livros
nmero 1, 3, 4, 6, 7, 9, 11, 12, 14, 15, 19, 24, 25, 34, 35, 36, 47, 48, 39, 50, 58, 59, 60 e 61. Anos: 1889, 1894,
1899, 1904, 1909, 1914, 1919, 1924, 1929, 1934 e 1939.

Na figura 2.2, possvel acompanhar a quantidade de registros de crianas por ano, no

cartrio. Nos anos de 1889 e de 1894, aparentemente, houve um crescimento pela busca do

registro de nascimento, em Nova Iguau, no total de 560 registros. Isso evidencia que as
155
famlias procuraram legitimar sua situao logo aps a abolio. Deveras, entre as

crianas, nesses dois anos 251 (45%), foram registradas como pardas e pretas, diferentemente

das brancas, apenas 137 (24%). 156

Entre 1889 e 1914, a mdia de registros por ano manteve-se praticamente a mesma.

Tal nmero s seria superado aps o 1914. A partir do mencionado ano, a quantidade de

registros de crianas aumentou significativamente. Se, em 1914, foram registradas 187

crianas, no ano de 1939, esse nmero chegou a 1.608.

154
Nesta categoria, encontram-se as seguintes cores: morena, fula e clara. Em virtude da pequena quantidade de
registros por ano com essas cores, optou-se por agreg-las em apenas uma categoria: outras cores.
155
Este argumento ser mais bem discutido no decorrer do texto.
156
Para uma maior apreenso desta discusso, ver captulo 1 da presente dissertao.
xcviii

Figura 2.2 Total de crianas registradas no ano de seu nascimento. Municpio de Nova Iguau.

1800

1600

1400

1200

1000

800

600

400

200

0
1889 1894 1899 1904 1909 1914 1919 1924 1929 1934 1939

Fonte: Vide Tabela 2.7.

Dividindo esses registros na categoria cor, v-se uma grande presena dos pardos e

pretos no registro civil (figura 2.3). Nos trs primeiros anos selecionados, eles representam a

maioria dos registros; j no ano de 1914, a quantidade de registros de crianas pretas e pardas

e de brancas praticamente se igualam: 39% cada. A partir da, o nmero de registro de

crianas pretas e pardas ultrapassam, aos poucos, a quantidade de brancos, chegando, em

1939, a totalizar 50,5% dos registros. Baseado nesse dado, vlida a hiptese de que pode ter

aumentado a quantidade de pretos e pardos, na populao em geral, ou esse grupo passou a ter

mais acesso ao registro civil de seus filhos.


157
Estes dados so bem diferentes dos apresentados por Rios em sua dissertao. Em

sua pesquisa, que abarcou os anos de 1889 a 1920, apenas no primeiro ano do registro civil de

Inconfidncia, em Paraba do Sul, havia informaes completas. Dessa forma, ela restringiu

sua anlise aos primeiros anos do ps-abolio e buscou complement-la qualitativamente

com os registros de bitos. De forma a compreender tal processo na Baixada, buscar-se-

157
RIOS, A. op. cit., 1990.
xcix

traar uma comparao entre os registros civis de nascimento de Paraba do Sul e de Nova

Iguau no imediato ps-abolio.

Figura 2.3 Total de crianas registradas em ano de seu nascimento por cor e ano. Municpio de Nova Iguau.

900

800

700

600

500 Branca
Outras Cores
No Informada
400 Pretos e Pardos

300

200

100

0
1889 1894 1899 1904 1909 1914 1919 1924 1929 1934 1939

Fonte: Vide Tabela 2.7.

2.3.2 1889, o imediato ps-abolio

No primeiro ano de funcionamento do Cartrio de registro civil de nascimentos em

Nova Iguau, foram registradas 237 crianas. Desse total, foram encontrados 171 registros

sem meno a cor. Diferentemente dos registros dos anos posteriores, no mencionado ano, a
158
categoria cor s passou a ser registrada do dia 18 de setembro em diante. Assim foi

colocado no primeiro registro:

158
Em virtude da autorizao para digitalizao do arquivo, o Desembargador Dr. Murilo exigiu que no fossem
publicados os nomes e sobrenomes dos registros. Aqui irar-se identificar pelas iniciais.
c

[...] compareceu neste cartrio J.L.G. na presena das testemunhas abaixo nomeadas e
assinadas e declarou que ontem na Rua de Madureira, nesta Freguesia nasceu uma
criana do sexo masculino de cor preta filho legtimo dele declarante e de sua mulher
M.C.O. naturais desta Parquia e de moradia nesta freguesia [...]. 159

Logo, aps a inscrio da categoria cor, as crianas pretas e pardas puderam ser

encontradas. Ao total, foram 47 (19%) registros, enquanto o de crianas brancas estava em

apenas 19 (8%) (tabela 2.6). Apesar das crianas pretas e pardas estarem em um nmero

significativo, no primeiro ano do registro, ainda sim era um nmero muito pequeno em

relao ao total de nascimentos do ano de 1889. Apesar dos poucos registros que indicavam

cor, tentar-se-, a partir deles, demonstrar algumas caractersticas, do mencionado grupo, logo

aps a abolio.

Tabela 2.6 Total e Porcentagem dos registros civis de nascimentos em 1889 por cor. Municpio de Nova
Iguau.

Porcentagem Total
Branca 8% 19
No Informada 72% 171
Pardos e Pretos 19% 47
Total geral 237

Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau, 1889.

Ao analisar as famlias das crianas registradas como pretas e pardas, um quadro

interessante apresentado. Das 47 crianas registradas, 34 (72%) so filhas de mes solteiras.

Apenas em 11 casos, h a presena de famlias nucleares completas e somente em um caso, as

partes demonstram o interesse em se casar (tabela 2.7). 160

159
Livro 1, registro 159, 1889. Ofcio do Registro Civil das Pessoas Naturais 1 Circunscrio de Nova Iguau.
160
Optou-se por utilizar as seguintes terminologias para o estudo das famlias: Famlia nuclear, extensa e
ampliada. Por famlia nuclear, entende-se toda aquela formada somente por pai, me e filhos. A famlia extensa
composta por familiares fora do ncleo, como avs, tios, primos, entre outros. Famlia ampliada toda aquela
que est circunscrita em uma comunidade que agrega pessoas do convvio social, sem qualquer relao parental.
ci

Tabela 2.7 - Situao conjugal dos pais nos registros civis de nascimentos. Municpio de Nova Iguau.

Branca No Informada Pardas e Pretas Total geral


Casados 8 67 12 87
No Informado 2 2
Solteiros 6 94 34 134
Vo se Casar 5 8 1 14
Total geral 19 171 47 237

Fonte: Vide Tabela 2.6.

Ao contrrio dos dados obtidos na presente pesquisa, Rios encontrou, para o Vale do

Paraba, um nmero significativo de famlias nucleares completas entre as crianas pretas e

pardas. Dentre as 230 crianas registradas nessa cor, 41% eram filhas de pais casados, 29%
161
tinham a inteno de casar e somente em 21% o pai esteve ausente. Deveras, a partir dos

dados obtidos em Nova Iguau em 1889, deve-se repensar sobre a existncia de outras

caractersticas que permitiam a formao de famlias nucleares completas no Vale e no na

Baixada.

Ao minudenciar as profisses do pai das crianas registradas como pretas e pardas, os

nmeros tendem a continuar a afastar-se dos de Ana Rios. Para o ano de 1889, no registro

civil de Paraba do Sul, no h uma grande diversificao nas categorias de trabalho,

aparecendo, quase sempre, em maior quantidade o lavrador e o jornaleiro. De acordo com

Rios, o termo lavrador , na maioria das vezes, associado a pessoas encarregadas de

algum empreendimento agrcola prprio, em terras prprias ou alheias. 162 No municpio de

Nova Iguau dentre os 11 registros onde o pai nomeado, 9 estavam na lavoura e 2

encontravam-se empregados como jornaleiros, sendo todos casados. Ainda preliminarmente,

diante da ausncia paterna nas unidades familiares, pode-se concluir que os mesmos

formaram famlias nucleares incompletas.

161
RIOS, A. op. cit., p. 82.
162
Idem.
cii

Com a falta da figura do pai nos registros, chamou ateno a profisso das mes

casadas e quantidade de mes solteiras, ambas na lavoura. Dentre os onze casamentos, nos

quais o registro do pai estava completo, em 10, h informaes sobre as mes. Cruzando tais

informaes com as profisses, percebe-se que as mulheres casadas esto na lavoura,

provavelmente, em trabalho familiar. Em contrapartida, os registros onde as mes esto

presentes no meio domstico so nfimos. Entre as casadas, no existe qualquer meno a

profisso domstica, e entre as solteiras sete classificaram-se como tal. Efetivamente, entre as

mes solteiras o nmero mais perceptvel a presena na lavoura. Dentre os 47 registros, 27

so de mes solteiras de crianas pretas e pardas que foram registradas como atuando nessa

profisso. Esse foi o caso de L. M. S. que foi registrada da seguinte forma:

Aos catorze dias do ms de dezembro do ano de nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil
oitocentos e oitenta e nove, neste Distrito de Paz, Parquia de Santo Antonio da Jacutinga,
Municpio de Iguass, Estado do Rio de Janeiro, comparecer neste cartrio, J. N. em presena das
testemunhas abaixo denominadas e assinaladas, declarou que ontem pelas nove horas da manh no
lugar Riacho, nasceu uma criana do sexo feminino, de cor parda, filha natural de L.N. natural e
residente nesta freguesia, profisso lavoura, a criana neta materna de E. N a qual ser chamada de
163
L. M. S. [...].

No que concerne legitimidade da criana, parece acertado que, entre as famlias sem

pai, as crianas pretas e pardas fazem parte da maioria (tabela 2.8). No ano de 1889, ocorreu

registro de crianas ilegtimas, ou seja, frutos de relacionamentos extraconjugais. Essa

categoria s vai aparecer nos anos de 1919 e 1924, e todos os casos so de crianas pretas e

pardas. No primeiro ano de registro, o nmero de crianas legitimadas seguiu a quantidade de

registros de pais e mes casados. Somente em 11 casos, a criana foi declarada como legtima.

No entanto, a ausncia do pai foi notada, mais uma vez nos registros civis, visto que, em 36

casos (72%), as crianas foram declaradas naturais.

163
Livro 1, registro 226, 1889, RCPNNI.
ciii

Tabela 2.8 Legitimidade nos registros civis de nascimentos registradas por cor. Municpio de Nova Iguau.

Brancas No Informada Pardas e Pretas Total geral


Legtimo 12 74 11 97
No informado 1 1
Natural 7 96 36 139
Total geral 19 171 47 237

Fonte: Vide Tabela 2.6.

Em 1889, a figura que se tornou mais importante, aparentemente, foi a dos parentes

prximos e/ou amigos da famlia da me. Dentre os 36 casos de crianas registradas como

naturais, nenhum deles a me foi a declarante. Nos registros, no foi possvel perceber a

relao entre os declarantes e as mes, em virtude da falta de informao. Provavelmente,

eram pessoas prximas como irmos, vizinhos ou padrinhos da criana. No entanto, embora

no primeiro ano de registro tenha existido a categoria padrinhos, aps o incio da inscrio

da cor, no houve qualquer meno a eles.

No que tange regio de nascimento das crianas, nota-se que, em 1889, as crianas

pretas e pardas eram de origem da prpria Baixada. Ao total, os registros estavam bem

espalhados pela Baixada: 4 em Belford Roxo, 3 em Duque de Caxias, 10 em Mesquita, 12 em

Maxambomba e 15 no interior do Municpio de Nova Iguau (tabela 2.9). Em apenas um

caso, a criana nasceu fora do Municpio, para ser mais preciso, em Minas Gerais.

Em Mesquita, o nmero de crianas pretas e pardas inseridas, no referido ano, no

registro pode mostrar uma presena significativa deste grupo na regio. No final do sculo

XIX, a Fazenda Cachoeira fazia parte do distrito de Mesquita e era de propriedade do Baro

de Mesquita, Jernimo Jos de Mesquita. Conhecido na regio como proprietrio de escravos,

seu inventrio foi aberto em 1878, e ele veio a falecer, em 1888; logo, sua propriedade passou
164
para seu filho, Jernimo Roberto Mesquita. Efetivamente no possvel afirmar, todavia

um forte indcio mostra que os filhos dos escravos do Baro de Mesquita podem ter sido

164
Inventrio de Baro de Mesquita, 1866 e de Jernimo Jose de Mesquita, 1878. Museu da Justia do Estado do
Rio De Janeiro.
civ

registrados nos anos posteriores abolio. Somente no ano de 1889, foram registradas 5

crianas nascidas no lugar denominado Cachoeira, no municpio de Nova Iguau.

Tabela 2.9 Total de registros civis de nascimentos por regio de nascimento e cor. Municpio de Nova Iguau.

Branca No Informada Pardas e Pretas Total geral


Belford Roxo 2 18 4 24
Duque de Caxias 3 30 3 36
Estado Rio de Janeiro 1 1
Estados do Brasil 1 1
Mag 1 1
Mesquita 15 10 25
Minas Gerais 1 1 2
No declarada 10 10
No Localizado 2 2 4
Nova Iguau (sede) 4 41 12 57
Nova Iguau (interior) 9 50 15 74
Vale do Paraba 2 2
Total geral 19 171 47 237

Fonte: Vide tabela 2.6.

Apesar da maior parte das crianas pretas e pardas terem nascido na Baixada, o que

mostra, de certa maneira, um estabelecimento. Em comparao aos dados obtidos no registro

civil de Paraba do Sul, aparentemente, foram poucas as crianas que tiveram contato com os

avs. De forma dessemelhante aos dados obtidos por Ana Rios, onde, em 15% dos casos, as

crianas tiveram a oportunidade de conhecer todos os seus avs, mesmo que apenas

nominalmente, em Nova Iguau, essa porcentagem caiu para 12%. Contudo, tais nmeros

tornam-se ainda mais dspares, no que tange presena dos avs: para Paraba do Sul, Rios

mostrou que 83% das crianas conviveram com pelo menos um av, enquanto na Baixada

esse nmero caiu para 43%. Em Paraba do Sul, em apenas 8% dos registros as crianas pretas

e pardas no poderiam sequer saber o nome dos seus avs, no municpio de Nova Iguau, em

1889, esse valor sobe para 15%. 165

165
RIOS, A. op. cit., p. 86.
cv

Comparando os valores da presena dos avs, ainda assim possvel perceber que, na

Baixada, houve menos contato com os avs. Se os avs paternos e maternos, em Paraba do

Sul, correspondiam a 40% e 43%, respectivamente, esse nmero caiu significativamente, na

Baixada, que totaliza 12% e 38% (tabela 2.10). Porm, a presena da av materna bem

significativa nos dois registros. Em Paraba do Sul, as avs maternas somavam 87%, nmero

muito prximo ao encontrado no Municpio de Nova Iguau, que de 83%.

Tabela 2.10 Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas. Municpio de
Nova Iguau.

Porcentagem Total
Av Paterno 12% 6
Av Paterna 17% 8
Av Materno 38% 18
Av Materna 82% 39
Todos os avs 12% 6
Nenhum dos avs 15% 7
Pelo menos um av 43% 20
Total de registros 47

Fonte: Vide Tabela 2.6.

Efetivamente, no houve um estudo direcionado no sentido de procurar laos

comunitrios nos registros de crianas pretas e pardas em Nova Iguau. Isso porque o maior

indcio, que esses dados fornecem, exatamente a inexistncia de tais laos. No h qualquer

indicao de relao dos padrinhos e dos declarantes, nos registros, com as mes.

Ao examinar os dados retirados no ano de 1889, aparentemente, existiram

comunidades extensas de famlias de ex-escravos e libertos, principalmente entre as pessoas

prximas as mes solteiras. A comparao entre a formao de famlias negras do Vale do

Paraba e a da Baixada Fluminense, no imediato ps-abolio, ainda precisa de muita

pesquisa. Analisando apenas no ano de 1889, lcito supor que os registros indicam que os

pretos e pardos da Baixada Fluminense tiveram dificuldades em formar famlias nucleares

completas com pai, me e filhos. No entanto, a presena significativa de mes solteiras, que
cvi

tem seus filhos registrados, aparentemente, demonstra que a busca pelo registro no era

exclusivo de famlias nucleares completas. Deveras, esse ano pode ter sido de extrema

confuso; todavia, para chegar a melhores concluses, deve-se atentar para os anos

posteriores abolio.

2.3.3 Os anos posteriores abolio 1888 a 1940

O ano de 1889 mostrou um quadro no muito otimista no que tange construo de

famlias nucleares completas no Municpio de Nova Iguau. Ao analisar as informaes

obtidas, supe-se que os libertos atravessaram a escravido formando famlias nucleares

incompletas, tendo a me solteira e os avs maternos como eixo principal. Este fato pode estar

ligado a diversos fatores como: a quantidade de ex-escravos por propriedade, o acesso

pequena roa e a diversificao dos arranjos de trabalho na Baixada Fluminense.

Naquela poca a constituio de famlia dependia da possibilidade de se obter uma

pequena propriedade ou a estabilidade nas fazendas da regio. Ao comparar Paraba do Sul

com o Municpio de Nova Iguau, de acordo com Rios, no primeiro caso, uma parte dos

libertos conseguiu se estabilizar em pequenas propriedades, atravs da compra, de

arrendamentos ou de trabalhos de meao. 166 Contudo, no Municpio de Nova Iguau sabe-se

que, no perodo do ps-abolio, com a diminuio da produo do caf, as propriedades

passaram a ser loteadas. Todavia, ainda no h estudos sobre o valor e o tamanho desses

loteamentos e se o seu preo estava acessvel populao de libertos e de seus descendentes.

Deveras, outros elementos, para alm do acesso terra, podem ter contribudo para a

formao das famlias, ao longo das primeiras dcadas do sculo XX na Baixada Fluminense.

A busca pela estabilidade, pela autonomia e pela possibilidade de ampliao familiar estava

166
RIOS, A e MATTOS, H. op. cit., 2005, principalmente no captulo 3.
cvii

ligada s condies de trabalho e forma como a terra era utilizada. No que se refere aos anos

posteriores abolio, de 1888 a 1920, no Municpio de Nova Iguau, pouco se sabe sobre as

condies de trabalho da populao provinda da escravido.

Aqui, nesta parte, ser possvel aprofundar a investigao sobre a formao dessas

famlias. Aps o ano de 1889, ao contrrio dos registros encontrados por Rios, em Paraba do

Sul, no cartrio de Nova Iguau os registros tornam-se mais completos. Decerto, algumas

categorias alusivas aos registros paroquiais de batismo deixam de ser declaradas, por

exemplo, os padrinhos, a inteno de se casar, o dia do batizado da criana, entre outras.

Com o passar dos anos, a presena de registros de crianas pretas e pardas cresceu.

Nesta parte, acompanhar-se-, at 1919, a construo das famlias de ex-escravos e de seus

descendentes provindos das antigas fazendas de caf e de cana-de-acar do Municpio de

Nova Iguau.

1889 a 1919

No municpio Nova Iguau, no imediato ps-abolio, so escassas as informaes

concernentes ao acesso pequena roa. Os indcios apenas mostram que tal perodo foi

marcado pela crise da produo de caf e de cana-de-acar naquela regio. As antigas

fazendas comearam a ser desmembradas lotes, dos quais nada se sabe sobre o valor das

vendas e a sua quantidade. Portanto, no se pode afirmar se os libertos e os seus descendentes

conseguiram se estabilizar ou tiveram de migrar para outras regies.

Na tabela 2.11, foi montado um panorama com os registros civis de nascimentos

colhidos no Municpio de Nova Iguau, de cinco em cinco anos a partir de 1889 at 1919.

Dentre os anos selecionados, apenas no primeiro, a taxa de cor no informada alta. Se em

1889 a participao de pretos e pardos baixa (19%), nos anos seguintes a quantidade de

sempre ficava acima dos 38%. Em 1894, surpreendentemente 63% dos registros foram de
cviii

crianas pardas e pretas, porm o nmero caiu para 48% em 1899. Nos trs anos seguintes,

ficou entorno dos 39%, para, em 1919, voltar a crescer, chegando a 46%.

Tabela 2.11 Total de registros civis de nascimentos por cor e ano. Municpio de Nova Iguau.

Branca Outras cores No Informada Pardas e Pretas Total geral


1889 19 171 47 237
1894 118 1 204 323
1899 86 29 5 112 232
1904 58 24 5 48 135
1909 96 34 3 92 225
1914 72 39 3 73 187
1919 212 2 6 188 408
Total geral 661 128 194 764 1747

Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau. Anos
1889, 1894, 1899, 1904, 1909, 1914 e 1919.

Apesar da presena significativa de crianas sendo registradas como de pretas e

pardas, os anos em que esse nmero caiu, merecem alguns comentrios. No censo de 1890,

esse grupo correspondia a 63% da populao dos Municpios de Estrella e de Iguass. Mesmo

diante dos problemas inerentes aos censos, era de se esperar que, em 1894, a presena de

pretos e pardos fosse expressiva nos registros civis. Apesar da quantidade significativa de

subregistro, nos dois primeiros anos selecionados, pode-se perceber que essa parte da

populao buscou regularizar a sua situao. De forma semelhante encontrada na pesquisa

do registro civil, por Rios, em Paraba do Sul, aqui se supe que tal interesse em tornar

regular a situao das crianas (...) reflete uma vontade de integrao e no de excluso.

Pode ter sido um sinal de que as famlias tinham, ou esperavam ter, alguma estabilidade nas

suas relaes e na regio. 167

Ao longo dos anos, a quantidade de registros diminuiu consideravelmente, o que,

entretanto, no permite concluir que houve uma diminuio de nascimentos (figura 2.3). Em

1894, foram, ao total, 204 registros de crianas pretas e pardas, enquanto, em 1904, exatos dez

anos aps, esse nmero caiu para 48. De uma forma um tanto quanto interessante, os registros

167
RIOS, A. op. cit., 1990, p. 107.
cix

desse grupo decaram de forma significativa, todavia, nos anos posteriores a 1899, tenderam a

se equilibrar com a quantidade de brancos. Se, no ano de 1899, eram 48% de crianas pretas e

pardas e 37% de registros de crianas brancas, em 1914, esse nmero praticamente se igualou,

ficando 39% e 38,5%, respectivamente (tabela 2.12).

Tabela 2.12 Presena de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de nascimentos.
Municpio de Nova Iguau.

Pardas e Pretas Porcentagem Total geral


1889 47 19% 237
1894 204 63% 323
1899 112 48% 232
1904 48 38% 135
1909 92 40% 225
1914 73 39% 187
1919 188 46% 408
Total 764 1747

Fonte: Vide tabela 2.11.

Baseado na quantidade de subregistro lcito supor que, o ato de registrar no era

acessvel ou no era uma prtica generalizada, no perodo. Nos anos de 1889 e 1894, em sua

maioria, o pai de crianas pretas e pardas estava concentrado no trabalho com a lavoura.

Efetivamente, a reduo de registros pode estar ligada a mudanas nesse grupo que recorria

aos cartrios. Para Rios, em Paraba do Sul, o nmero de crianas pretas e pardas tambm

diminuiu nesse perodo. Para ela isso pode estar ligado no s ao decrscimo de nascimento

de crianas, mas sim na reduo de lavradores pretos e pardos na regio. 168

No Municpio de Nova Iguau, no possvel afirmar que, a diminuio dos registros

est atrelada falta de famlias nucleares completas. No que tange situao conjugal dos

pais, de crianas registradas como pretas e pardas, a maior parte dos registros so de mes

solteiras totalizando, 58,5% (tabela 2.13). Entre os casados, os pais so nomeados em 39%

dos registros. Dos 296 casos de pais casados, em 141 (48%) no h qualquer informao

sobre eles. Apesar disso, dentre os registros que apresentam a profisso dos pais casados de

168
RIOS, A. op. cit., 1990, p. 88.
cx

crianas pretas e pardas, 64% estavam ligados lavoura; o restante deles estava espalhado em

poucas categorias de trabalho, dando destaque para os empregados pblicos e operrios, ao

total de 18 (12%) e 14 (9%), respectivamente (tabela 2.14).

Tabela 2.13 Situao conjugal por cor nos registros civis de nascimentos. Nova Iguau.

Casado No Informado Solteiro Vo se Casar Total


Branca 558 7 91 5 661
Outras Cores 60 2 66 128
No Informada 83 2 101 8 194
Pardas e Pretas 296 20 447 1 764
Total 997 31 705 14 1747

Fonte: Vide Tabela 2.11.

Tabela 2.14 Profisso do pai de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de nascimentos.
Municpio de Nova Iguau.

Total
Artista 4
Cozinheiro 1
Empregado 1
Empregado ou funcionrio pblico 18
Estrada de ferro Rio do Ouro 1
Guarda Armazm Estrada de Ferro 2
Jornaleiro 7
Lavrador 99
Militar 2
No declarada 141
Negociante 1
Operrio 14
Padeiro 1
Pedreiro 2
Sapateiro 1
Trabalhador 1
Total geral 296

Fonte: Vide Tabela 2.11.

Em virtude da pequena quantidade de crianas pretas e pardas registradas como

legtimas, a figura dos avs paternos e maternos est bem abaixo dos encontrados em Paraba

do Sul. Aqui, optou-se por colocar todos os avs nomeados, uma vez que as referncias sobre

a condio de vivo ou falecido ficam raras nos registros. Aps 1889, Rios apontou que a

figura do av materna tende a ser nomeada de forma mais intensa em Paraba do Sul. Em seus
cxi

dados eram, no total, 66% avs paternos, 80% de avs paternas, 65% de avs maternos e 96%
169
das avs maternas, nos quais 48% das crianas tiveram todos os seus avs nomeados. De

forma bem diferente, no Municpio de Nova Iguau, at o ano de 1919, foram nomeados 43%

dos avs paternos, 50,5% de avs paternas, 55% de avs maternos e 89% de avs Maternas

(tabela 2.15). Desse total, 34% das crianas conheceram ou, pelo menos, ouviram falar de

todos os seus avs, no entanto, 38% apenas um av. Deveras, nos dois casos, Paraba do Sul e

de Nova Iguau, a figura das avs eram bem presentes nas famlias de pretos e pardos,

especialmente, as avs maternas.

Tabela 2.15 - Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas. Municpio de
Nova Iguau.

Porcentagem Total
Av Paterno 43% 328
Av Paterna 50,5% 386
Av Materno 55% 418
Av Materna 89% 682
Todos os avs 34% 256
Nenhum av 7% 56
Pelo menos um av 38% 293
Total de Registros 764

Fonte: Vide Tabela 2.11.

As relaes sociais construdas, no ps-abolio, pelas mes solteiras podem ter

incentivado uma procura maior pelo registro civil. Dentre as 764 crianas pretas e pardas

nascidas entre 1889 e 1919, apenas 166 (21%) foram registradas pelos pais (tabela 2.16).

Alm dos avs, que registraram 3 crianas, 595 tiveram como declarantes outras pessoas.

Provavelmente, nesse grupo estavam includos: os irmos, tios, despachantes e outras pessoas

ligadas famlia da me por relaes no-parentais. Ao total, so 442 crianas declaradas

como naturais, nas quais somente os nomes da me e dos avs maternos aparecem. Essas

mes estavam concentradas, principalmente, nos trabalhos domsticos e de lavoura, 33% e

169
RIOS, A. op. cit., p. 109.
cxii

25% respectivamente. Mesmo diante de um quadro de falta de famlias nucleares completas

pai, me e filhos aparentemente, as mes solteiras buscaram legitimar as suas proles.

Tabela 2.16 Declarantes nos registros civis de nascimentos por cor. Municpio de Nova Iguau.

Branca Outras Cores No Informada Pardas e Pretas Total geral


Avs 1 2 3
Avs Maternos 1 1
Avs Paternos 1 1
Me 5 5
Oficial de Justia 1 1
Outra Pessoa 382 97 126 595 1200
Pai 277 31 62 166 536
Total 661 128 194 764 1747

Fonte: Vide Tabela 2.13.

A ausncia masculina nos registros, nesse perodo, expressiva entre as crianas

registradas como pretas e pardas. Ao estudar a situao das famlias negras, Raymond Smith,

de semelhante modo, detectou uma ausncia de homens no Caribe. Para ele, tal fato derivava

dos valores das comunidades negras com relao aos papis assumidos por mulheres e

homens no interior da famlia; enquanto a primeira deveria cuidar do meio domstico e da

prole, queles ficava o papel de prover o sustento familiar. Diante de um quadro de

impedimento ao acesso ao trabalho e terra, em virtude da hierarquizao social baseada na

estrutura raa/classe, os homens negros no encontraram a situao que desejavam no . Dessa

forma, Rios apontou em sua dissertao que a famlia nuclear incompleta, entre os negros

no perodo, pode ter refletido antes a impossibilidade de construir um padro diferente do

que inconstncia ou falta de tradio de organizao familiar. 170

Para Rios, ao contrrio do que usualmente suposto como herana da escravido, em

Paraba do Sul, a famlia nuclear completa e extensa existiu entre pretos e pardos. Se no Vale

do Paraba estava concentrada a maior quantidade de escravos do Rio de Janeiro, no sculo

170
SMITH, Raymond T. The Family and the Modern World System: Some Observation From The Caribbean.
In: Journal of Family History, 3: 4, 1978 apud RIOS, A. op. cit., 1990, p. 112 113.
cxiii

171
XIX, o mesmo no pde ser dito sobre a Baixada. Indubitavelmente, o caso do Vale do

Paraba nico no pas. Ainda no houve pesquisas sobre as caractersticas da escravido, no

final do sculo XIX, na Baixada, que discutam: as quantidades de cativos por propriedade, a

razo de masculinidade, se estavam alocados nos grandes plantis ou em domiclios, entre

outras. No entanto, lcito supor que a falta de uma comunidade estvel nos ltimos anos da

escravido, pode demonstrar a existncia de poucos cativos e pretos livres homens, o que,

provavelmente, impossibilitou a formao de famlias nucleares completas, no perodo do

ps-abolio, na Baixada Fluminense.

Os dados apontam que a maior parte dos homens que registraram seus filhos, entre os

anos de 1894 e 1919, era de fora da Baixada. Dentre os 275 registros, que mostram a

naturalidade do pai, somente 51 casos (18%) so do Municpio de Nova Iguau (tabela 2.17).

Dessa forma, 184 (66%) dos pais vieram de fora do Municpio, destes, 159 (57%) de dentro

do Estado do Rio de Janeiro, 18 (7%) de outros estados do Brasil e 2 (1%) de outros pases.

Tabela 2.17 Naturalidade do pai nos registros civis de nascimentos por cor. Municpio de Nova Iguau.

Branca Outras cores No Informada Pardas e Pretas Total geral


Baixada 66 4 62 51 183
Brasil 72 12 10 40 134
Capital Federal 11 1 5 17
Estado Rio de Janeiro 117 2 4 159 282
Estados do Brasil 25 1 3 18 47
No declarada 226 108 108 489 928
Nordeste 1 1
Pases 141 1 5 2 149
Vale do Paraba 2 1 3
Total geral 661 2 194 764 1747

Fonte: Vide tabela 2.11.

Apesar da dificuldade de analisar os registros civis, em virtude da quantidade de

subregistro, nestes dados possvel encontrar indcios sobre o processo de migrao em

direo Baixada Fluminense. Como j mencionado na parte 2 deste captulo, prximo

171
Os nmeros encontram-se no captulo 1 da presente dissertao.
cxiv

dcada 1920, a produo de laranja comeou a despontar economicamente no mercado

nacional e internacional. Com esse avano, houve a necessidade de um maior contingente de

mo-de-obra. Desse modo, no ano de 1919, dentre os 366 registros onde o pai foi nomeado,

321 (87%) eram de fora do Municpio de Nova Iguau (tabela 2.18). Inseridos neste nmero,

o pai de crianas pretas e pardas, estava presente em 156 registros, dos quais 141 (90%) eram

de fora da Baixada.

Tabela 2.18 Regio de origem do pai por ano de pessoas declaradas como pardas e pretas. Municpio de Nova
Iguau.

1889 1894 1899 1904 1909 1914 1919 Total


Baixada 78 51 28 1 4 3 18 183
Brasil 3 36 49 9 10 27 134
Capital Federal 3 1 1 12 17
Estado Rio de Janeiro 5 45 12 220 282
Estados do Brasil 3 16 3 1 3 21 47
No declarada 143 176 126 83 203 158 42 931
Nordeste 1 1
Pases 4 31 26 2 7 11 68 149
Vale do Paraba 1 1 1 3
Total 237 323 232 135 225 187 408 1747

Fonte: Vide Tabela 2.11.

Como j visto, na parte 2 deste captulo, este o perodo da migrao para a Baixada

Fluminense. Atravs do censo de 1920, aparentemente, foram homens os que migraram, na

maior parte, para o Municpio de Nova Iguau, visto que no recenseamento havia 17.707

(53%) homens e 15.689 (47%) mulheres (tabela 2.4). Sem embargo, provavelmente, nessa

dcada houve incio a grande migrao. Atravs dos registros civis de nascimentos, entre os

anos de 1924 e 1939, tentar-se- caracterizar esse processo de migrao.


cxv

1920-1940

Entre os anos de 1920 e 1940, atravs dos censos, aparentemente, foi possvel

acompanhar o processo de migrao da populao de pretos e pardos para o Municpio de

Nova Iguau. Atravs dos dados obtidos, no registro civil de nascimento dessa regio, nesta

parte busca-se apresentar as caractersticas da populao que migrou, nesse perodo. Trata-se

de tentar identificar qual o perfil das famlias, os locais de origem e quais foram os tipos de

trabalho que essa populao encontrou aps 1920. Em um segundo momento, ser analisado

tanto a possibilidade da estabilizao, quanto a formao de famlias extensas para ex-

escravos e seus descendentes, na Baixada Fluminense.

Se a populao aumentou entre as dcadas de 20 e de 40, do sculo XX, de se

esperar que a procura pelos registros civis seja, de forma semelhante, alta (grfico 2.2).

Colhendo os dados em Nova Iguau, nos anos de 1924, 1929, 1934 e 1939, soma-se um total

de 4.150 registros de nascimentos. Comparativamente, em sete anos selecionados, entre 1889

e 1919, foram coletados apenas 1.747.

Apesar de haver uma boa quantidade de crianas brancas nesses quatro anos, o que

mais surpreendeu foi o crescimento dos registros de crianas pardas e pretas, ao longo dos

anos selecionados (tabela 2.5). No total dos registros, tais crianas eram 1.867 (45%). Ao

separar por ano, v-se que, em 1924, elas somavam 274 (43%); na mesma proporo, em

1929, foram 342 (42%) registros; em 1934, tal nmero passou para 435 (40%), para, em 1939,

chegar a 816 crianas, ou seja, 51% dos registros daquele ano.

No que tange situao conjugal dos pais, percebe-se que, no perodo de 1924 a 1929,

h uma presena maior dos casados (tabela 2.19). Dentre os 1.867 registros de crianas pretas

e pardas, h 1.107 (59%) pais que declararam serem casados, e as crianas de pais solteiros

corresponderam a 625 (33%) registros.


cxvi

Tabela 2.19 - Situao conjugal dos pais por cor de crianas registradas. Municpio de Nova Iguau.

Branca Outras cores No Informada Pardas e Pretas Total geral


Casado 1861 7 19 1107 2994
No Informado 68 1 1 94 164
Solteiro 250 6 2 625 883
Vivo 68 41 109
Total geral 2247 14 22 1867 4150

Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau. 1924,
1929, 1934 e 1939.

Se o nmero de casados nos registros aumentou, era de se esperar que a regularizao

da legitimidade das crianas tambm fosse procurado por essa populao. Em comparao aos

primeiros anos do registro civil, nos quais havia mais registros de crianas naturais, nos

anos aqui analisados o nmero de crianas legitimadas muito maior. Entre as crianas pretas

e pardas, nesse perodo, foram encontrados 1.172 (63%) registros de crianas legtimas (tabela

2.20).

Tabela 2.20 Total e porcentagem da legitimidade de pessoas registradas como pretas e pardas. Municpio de
Nova Iguau.

Porcentagem Total
Ilegtimo 0,70% 13
Legtimo 63% 1172
No informado 1% 35
Natural 35% 647
Total geral 1867

Fonte: Vide Tabela 2.19.

A presena dos avs, nesse perodo, tornou-se bastante expressiva, aumentando

significativamente em relao ao primeiro corte da pesquisa. Optou-se por colocar os avs

que foram nomeados nos registros, visto que no possvel detalhar, devido escassez de

informaes, por exemplo, se eram vivos ou no no dia do registro, entre outras (tabela 2.21).

Ao longo dos quatros anos, selecionados para a pesquisa, foram nomeados 79,5% dos avs

paternos, 81% das avs paternas, 89% dos avs maternos e 95% das avs maternas. Apesar da

figura da av materna ainda ser a mais popular, possvel perceber que a maioria das crianas
cxvii

pretas e pardas tambm conheceu seus avs paternos. Ao contrrio do corte anterior, de 1889

a 1919, nos sete anos selecionados, nessa parte, 79,5% todos os avs foram denominados e

apenas 5% as crianas pretas e pardas, no conseguiam sequer nome-los.

Tabela 2.21 Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas. Municpio de
Nova Iguau.

Porcentagem Total
Av Paterno 79,5 % 1484
Av Paterna 81 % 1509
Av Materno 89 % 1669
Av Materna 95 % 1772
Todos os avs 79,5 % 1484
Nenhum dos avs 5% 95
Apenas um av 5,5 % 103
Total 1867

Fonte: Vide Tabela 2.19.

O mais interessante foi perceber que esses nmeros se aproximavam demasiadamente


172
dos apresentados por Ana Rios, nos primeiros anos do ps-abolio, em Paraba do Sul.

No Municpio de Nova Iguau, entre os anos de 1920 e 1940, o nmero de casados maior do

que o de solteiros; h mais filhos legtimos, e a presena dos avs aumentou

significativamente. Se, no perodo entre 1889 e 1920, Rios encontrou famlias nucleares

completas e extensas, possivelmente estveis, entre as crianas pretas e pardas, os dados desta

dissertao sugerem que somente no perodo aps 1920, no Municpio de Nova Iguau, foi

possvel formar famlias o mesmo tipo de famlia.

Conforme o que fora mencionado, foi possvel identificar muito mais informaes

sobre o pai que registrou seus filhos como pretos e pardos. Nos 1.867 registros deste grupo de

crianas, em 1.268 (68%), o pai nomeado. O mais interessante foi acompanhar o

crescimento da sua participao ao longo dos anos. Em 1924, 151 crianas tiveram o pai

como declarante; em 1929, aumentou para 215; em 1934, chegou a 300, e, em 1939,

172
RIOS, A. op. cit. captulo 4.
cxviii

ultrapassou a quantidade de pai de crianas registradas como brancas, somando as pretas e

pardas, 441 registros.

Ao analisar o pai de crianas registradas como pretas e pardas, em Nova Iguau,

percebe-se que, a maior parte veio de fora da Baixada (tabela 2.22). Em 1924, dos 274

registros, em 190 (70%) o pai no natural da Baixada Fluminense. Desse, 53% veio de

dentro do Estado do Rio de Janeiro. J em 1929, 200 so de fora e no h nenhum registro de

pai sendo natural do Municpio de Nova Iguau. Infelizmente, ao contrrio dos anos

anteriores, nos registros civis de 1934 e 1939, a categoria naturalidade do pai e da me

tornou-se viciada. A partir de 1934, a maior parte dos registros s apontam se os pais so

brasileiros ou no. Entretanto, nos registros realizados na fase adulta, onde h auto-

declarao, tais pessoas deixavam expressas o seu local de nascimento. 173

Tabela 2.22 - Naturalidade do pai nos registros civis de nascimentos por cor. Municpio de Nova Iguau.

Branca Outras cores No Informada Pardas e Pretas Total geral


Baixada 32 1 25 58
Brasil 1055 2 7 961 2025
Capital Federal 53 2 1 16 72
Estado Rio de Janeiro 309 5 6 316 636
Estados do Brasil 71 2 1 62 136
No declarada 317 1 2 476 796
Pases 409 1 5 11 426
Vale do Paraba 1 1
Total geral 2247 13 22 1867 4150

Fonte: Vide Tabela 2.19.

Entre os pais que migraram para o Municpio de Nova Iguau, nesse perodo, muitos

j vieram casados. Este foi o caso de S. S. R., lavrador que, no dia 13 de abril de 1939,

registrou seu filho:

173
Estes registros so tema do captulo 3.
cxix

[...] residente em Tingu, neste, distrito declarou que [...] em casa de sua moradia nasceu uma
criana do sexo masculino, cor parda, que ter o nome de E. S. R. filho legitimo dele declarante e de
sua mulher M. F. S., brasileira, domstica, casados em Vassouras [grifo meu]. 174

Assim como este, outros declarantes j haviam procurado legitimar nos cartrios sua famlia

nos locais de origem. No dia 12 de agosto de 1929 compareceu no cartrio:

J. M. natural deste Estado, casado civilmente no Distrito de Mendes [grifo meu], neste Estado,
militar, residente em Mesquita, neste distrito e declarou que [...] em casa de sua moradia nasceu uma
175
criana do sexo masculino de cor parda que ter o nome de M. M. [...].

Se j migraram casados, seus filhos tambm poderiam ter nascido ainda fora da

Baixada. No dia 14 de Novembro de 1934, foi registrado, no cartrio de Nova Iguau, O. S.

tendo 28 anos e nascido no dia 18 de outubro de 1906, e l compareceu seu pai:

T. S., brasileiro, operrio, residente em Mesquita, nos termos do Decreto Federal numero 19.710
de 18 de fevereiro de 1931 declarou que [...] em Pira, neste Estado, nasceu uma criana do sexo
176
masculina de cor parda [...].

Nos registros civis, entre os anos de 1924 e 1939, foram, ao total, registradas 176 crianas

nascidas fora do municpio. Desse total, 106 nasceram no Vale do Paraba, ou seja, 60% das

crianas registradas como pretas e pardas.

Como fora dito na parte 2 deste captulo, entre 1920 e 1940, houve crescimento

econmico do Municpio de Nova Iguau. Acompanhado a ele, houve a possibilidade de uma

maior diversificao dos tipos de trabalho, o que permitiu ao pai migrado, das crianas pretas

e pardas, se estabilizarem na regio. Deveras, ele estava no trabalho com lavoura, uma vez

que dos 1.206 registros que aparecem a profisso do pai, 498 (41%) so de lavradores (tabela

A.2 - anexo).

174
Livro 59, registro 14140, de 1939, RCPNNI.
175
Livro 35, registro 242, de 1929, RCPNNI.
176
Livro 58, registro 14039, de 1939, RCPNNI.
cxx

Porm, aliado ao crescimento econmico, h o crescimento urbano, que ampliou as

formas de trabalho. Apesar do perodo, entre 1920 e 1940, ser considerado o de maior

crescimento da laranja, os migrados estavam espalhados em outros ramos. Dentre os registros

onde aparece a profisso do pai de crianas pretas e pardas, 58% no trabalhava na lavoura ou

em qualquer profisso ligada agricultura. Se, entre 1889 e 1919, nos registros civis, os pais

estavam divididos em apenas 21 categorias, no perodo seguinte pula, para 53, mostrando uma

grande diversificao nos arranjos de trabalho nessa regio. Deste modo, o pai de crianas

pretas e pardas estava presente nos seguintes ofcios: operrios 245 (20%), empregados

pblicos 205 (17%), comerciantes 44 (4%), pedreiros 36 (3%) e jornaleiros 28 (2%).

Provavelmente, conseguiram se estabilizar na regio graas ao crescimento urbano e a

diversificao dos arranjos de trabalho, e no em virtude da disponibilidade de terra para

plantar sua subsistncia.

Sem embargo, ao analisar as regies de nascimento, das crianas pretas e pardas,

percebe-se que a concentrao dessas famlias se deu ao redor dos grandes centros produtores

de laranja. Das 1.867 crianas pretas e pardas registradas no cartrio de Nova Iguau, apenas

522 (28%) nasceram na sede do municpio, enquanto 1.132 (61%) foram registrados como

tendo residncia os distritos do entorno (tabela 2.23).

Processo semelhante de migrao e estabilizao foi encontrado por Holt, no Caribe

Britnico. Na Jamaica, com o fim da escravido e do perodo de aprendizado, os libertos e

seus descendentes, ao longo de quatro dcadas, abandonaram os antigos plantis e migraram

para diversas reas da colnia. Para este autor, essa migrao teve uma caracterstica bem

especfica. A procura por terra foi um dos significados de liberdade empreendidos por essa

populao, aps o fim da escravido. Era de se esperar que buscassem qualquer propriedade

para dela retirar a sua subsistncia. Todavia, na Jamaica, os libertos e seus descendentes

optavam por comprar terras prximas aos grandes centros produtores de acar e no
cxxi

propriedades distantes e improdutivas. Sendo assim, almejaram locais onde podiam aliar a

pequena produo direcionada para os pequenos locais e para a subsistncia, com trabalho

assalariado; assim, diversificavam as opes de fonte de renda.

Tabela 2.23 Regio do nascimento nos registros civis de nascimentos por cor. Municpio de Nova Iguau.

Branca Outras cores No Informada Pardas e Pretas Total geral


Belford Roxo 135 1 2 223 362
Capital Federal 57 40 97
Duque de Caxias 3 1 16 20
Estado do Rio de Janeiro 21 16 37
Estados do Brasil 7 5 12
Mesquita 325 1 5 328 659
Minas Gerais 8 21 29
No declarada 41 1 1 22 65
No Localizado 3 3
Nilpolis 10 10 20
Nordeste 25 3 28
Nova Iguau (sede) 983 3 8 522 1516
Nova Iguau (interior) 570 5 6 532 1113
Paracambi 1 1 2
Queimados 4 10 14
Rio de Janeiro 1 1
So Joo de Meriti 1 8 9
Vale do Paraba 56 1 106 163
Total geral 2247 14 22 1867 4150

Fonte: Vide Tabela 2.19.

Retornando ao caso da Baixada, nessa ltima parte do captulo, pde-se perceber que o

pai de crianas pretas e pardas conseguiu, de alguma maneira, estabilidade. Deveras, ainda h

necessidade de estudos sobre a forma de acesso a essas propriedades. No entanto, atravs dos

dados obtidos nos registros civis de nascimentos, parece acertado que este se estabilizou ao

redor do distrito produtor de laranja.

Ao se instalar no Municpio de Nova Iguau, entre as dcadas de 1920 e 1940, os

migrados pretos e pardos buscaram legitimar suas famlias e regularizar sua situao. Desse

modo, nos anos selecionados, de 1934 e 1939, foi surpreendente ver a quantidade de pessoas

se auto-declarando, seguidos pelos registros de nascimentos dos filhos. Tanto que, na soma de

todos os assentos, a quantidade de registros de pretos e pardos ultrapassou significativamente


cxxii

o de brancos. Para entender, um pouco melhor, quem eram os migrados e o que permitiu seu

maior acesso ao registro civil de nascimento deve-se analisar, qualitativamente, tais registros

tardios e, principalmente, os dos auto-declarantes.


cxxiii

Captulo 3 A Migrao e a Estabilizao de Pretos e Pardos em Nova Iguau.

O objetivo deste ltimo captulo o de analisar o registro civil de nascimentos do

Municpio de Nova Iguau, entre os anos de 1920 e 1940. Trata-se de identificar, atravs

dessas fontes, quais as caractersticas dos grupos que buscaram o registro civil, nesse perodo.

Ao longo dos anos, as leis que versavam sobre o registro civil foram se modificando.

Possivelmente, a inteno do governo era a de popularizar a busca pelo registro civil, visto

que produzir estatsticas, a partir dos dados obtidos nos cartrios, era muito mais barato do

que promover novos censos. Dessa forma, nenhum outro perodo, aparentemente, ampliou

mais a participao de pretos e pardos, nos registros, do que o do Governo Vargas.

Neste captulo, sero analisados trs tipos de registros encontrados no cartrio de

Nova Iguau, entre 1920 e 1940. Pode-se identificar o primeiro tipo como o das crianas

registradas no ano de seu nascimento, no tempo correto da Lei. Estes assentos foram

analisados, minuciosamente, no segundo captulo. No segundo tipo, encontram-se os registros

feitos tardiamente, ou seja, em outro ano que no o do nascimento da criana. Nestes podem
177
ser encontrados o bebs com um dia de vida, crianas, jovens e adultos que foram

registradas por alguma pessoa pai, me, avs ou outra pessoa. No terceiro tipo de registro,

esto todos aqueles que recorreram ao cartrio para registrar o seu nascimento. Neste caso,

optou-se por denominar tais pessoas como auto-declarantes.

Logo, dividiu-se este captulo em trs partes. Na primeira, faz-se um panorama do

ltimo ano de registros coletado, comparando-o com o censo de 1940. Nesta primeira parte,

os trs tipos de registros no sero divididos para a anlise. Na segunda parte sero analisados

todos os registros tardios. Para uma melhor compreenso optou-se por subdividir esta segunda

177
Optou-se por colocar, nessa categoria, todos os registros onde so mencionados as Leis e os Decretos que
permitiram a populao registrarem, aps o ano de nascimento de seus filhos, sem nus monetrio. Dessa forma,
uma criana nascida no dia 31 de dezembro, provavelmente, se fosse registrada no dia 2 de janeiro poderia
utilizar essas Leis e Decretos.
cxxiv

parte em dois subitens: no primeiro, sero discutidos os registros feitos posteriores ao ano de

nascimento, declarados por uma outra pessoa que no o registrado. Trata-se de destacar, entre

os registrados como pretos e pardos, o perfil das famlias, quais foram as regies de

nascimento e onde esto localizadas na regio metropolitana do Rio de Janeiro. Na seqncia,

sero estudados os registros dos auto-declarantes. Trata-se de discutir as caractersticas deste

grupo: se possuem famlia, onde nasceram, qual o tipo de trabalho que exercem, qual o local

de sua moradia, entre outros.

Na terceira e ltima parte, a partir de uma discusso bibliogrfica e dos registros civis

dos auto-declarantes, ser analisada a importncia do Governo Vargas e promulgao de

novas leis e decretos para o aumento da busca pelo registro civil de nascimentos, entre os

1930 e 1939.

3.4 O ltimo Ano de Coleta, 1939.

O objetivo desta parte ser o de apresentar todos os registros de crianas, jovens e

adultos que foram declarados ou se declararam pretos e pardos no ano de 1939. Trata-se, na

mesma, de examinar minuciosamente os registros civis de nascimentos, do referido ano,

coletados no Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio

de Nova Iguau. Atravs desses dados, pretende-se apresentar os traos que permitem

identificar a estabilizao da populao de pretos e pardos, os quais migraram para o

municpio de Nova Iguau.

Nesse ltimo ano coletado foram registrados 2.100 nascimentos. Destes, 1.130 (54%)

foram de crianas, jovens e adultos registrados como pretos e pardos. No mencionado ano, as

informaes so muito mais completas do que nos anos anteriores; e, com isso, possvel
cxxv

obter resultados mais significativos no que tange populao de pretos e pardos no Municpio

de Nova Iguau.

No que tange constituio de famlias negras nessa regio, ao somar a situao

conjugal dos pais, que registraram seus filhos, com os pais dos auto-declarantes, tm-se um

quadro interessante (tabela 3.1). Em 454 (40%) dos registros de pardos e pretos, o pai aparece

como casado, em 275 (24%) os pais so solteiros e, em 359 (32%), no h qualquer

informao sobre o relacionamento conjugal. No obstante, ao ver a legitimidade das crianas

na tabela 3.2, o quadro torna-se diferenciado. Em 728 (64%) casos, os registrados foram

declarados como legtimos, 361 (32%) eram naturais e, em apenas 27 (2%), no h

informao sobre a legitimidade.

Tabela 3.1 - Situao conjugal por cor nos registros civis de nascimentos. Nova Iguau.

Branca No Informada Pardas e pretas Total geral


Casado 619 2 454 1075
No Informado 192 8 359 559
Solteiro 95 275 370
Vivo 54 42 96
Total geral 960 10 1130 2100

Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau, 1939.

Tabela 3.2 - Legitimidade nos registros civis de nascimentos registradas por cor. Municpio de Nova Iguau.

Branca No Informada Pardas e pretas Total geral


Ilegtimo 6 14 20
Legtimo 833 9 728 1570
No informado 10 1 27 38
Natural 111 361 472
Total geral 960 10 1130 2100

Fonte: Vide Tabela 3.1.

Ao cruzar os dados referentes aos declarantes e cor, chega-se a um resultado

interessante sobre tais registros, no ano de 1939. Em primeiro lugar, dentre os 2.100 registros

desse ano, 492 (23%) so de auto-declarantes. Ao analisar a cor, percebe-se que, entre o
cxxvi

nmero total de pessoas deste tipo de registro, os que se declararam pretos e pardos somam

314, ou seja, 64% dos registros.

Ao tomar os outros registros, nota-se que o pai registrou uma boa parcela das crianas,

dos jovens e dos adultos pretos e pardos, ou seja, ele foi o declarante em 540 (48%) registros

(tabela 3.3). Apesar de o nmero ser relativamente pequeno, mister salientar a presena das

mes como declarantes em 198 (17,5%). Dentre os 1.130 registros, em apenas 77 (7%), outra

pessoa, que no do ncleo familiar, a saber, pai, me e avs, fez a declarao do registro. Em

virtude da presena do pai, da me e de outrem se auto-declarando, lcito supor que, em

1939, houve uma busca intensa, por essa parcela da populao, em legitimar a si e a seus

familiares. 178

Tabela 3.3 - Declarantes nos registros civis de nascimentos por cor. Municpio de Nova Iguau.

Branca No Informada Pardas e pretas Total geral


Avs Paternos 1 1
Me 148 1 198 347
Outra Pessoa 39 1 77 117
Pai 603 540 1143
Prprio 170 8 314 492
Total geral 960 10 1130 2100

Fonte: Vide Tabela 3.1.

Para entender um pouco melhor o papel do pai nomeado nos registros, deve-se

detalhar a sua profisso. Em primeiro lugar, expressiva a gama de novos arranjos de

trabalho existentes em 1939. Na tabela 3.4 (em anexo), ao analisar a profisso por cor,

possvel perceber que, para o pai de pessoas registradas como brancas houve uma maior

participao na diversificao do trabalho. Mesmo diante de um quadro no to animador,

dentre as 63 categorias de trabalhos encontradas nos registros, o pai dos declarados, nos

registros, como pretos e pardos est empregado em 26. Em tais registros, boa parte est

178
Os auto-declarantes sero analisados na segunda parte deste captulo.
cxxvii

empregada na lavoura 181, 121 era de operrios, enquanto 57 trabalhavam em emprego

pblico.

Ao analisar a tabela de profisso, por situao conjugal do pai de pessoas declaradas

como pardas e pretas, um quadro interessante apresentado (tabela 3.5). Dentre os 454

registros de pai casado, 124 (27%) eram de lavradores, 88 (19%) eram de operrios e, no

emprego pblico, estavam 47 (10%). A presena significativa de pai casado em profisses

que, aparentemente, no eram to instveis pode demonstrar a existncia de famlias nucleares

estveis no Municpio de Nova Iguau, em 1939. Todavia, em 96 casos o pai foi nomeado e

declarado solteiro o que provavelmente demonstra que a busca pelo registro no foi apenas de

famlias consideradas legtimas.

Ao analisar as mes, tanto na profisso como na situao conjugal, chega-se a

suposies importantes em relao s caractersticas familiares de pretos e pardos em Nova

Iguau. Ao olhar para a localizao profissional das mes, de pessoas registradas como pretas

e pardas, v-se que 672 (59%) foram declaradas como tendo profisso domstica. (tabela

3.6). Cruzando a situao conjugal com a profisso, nota-se que, entre casadas e solteiras,

quase todas as mes registradas esto localizadas nos afazeres domsticos (tabela 3.7).

Enquanto as casadas, no trabalho domstico, so 387 (58%), as solteiras so 233 (35%). A

quantidade de mes solteiras, nomeadas nos registros, pode evidenciar que a busca pelo

registro civil no se restringiu apenas a famlias nucleares completas. De certa maneira, o ato

de registrar significava a existncia de uma estabilidade familiar. No caso das mes

declarantes e solteiras, os avs maternos aparentam ser o eixo central desse tipo de famlia.
cxxviii

Tabela 3.5 - Profisso do pai de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de nascimentos por
situao conjugal. Municpio de Nova Iguau.

Casado No Informado Solteiro Vivo Total


Ajudante 2 2
Alfaiate 2 2
Armador 1 1
Carpinteiro 3 1 4
Chauffeur 2 2 4
Comerciante 14 4 18
Eletricista 1 1 2
Empregado do Departamento Nacional de Sade Pblica 5 5
Empregado ou funcionrio pblico 47 10 57
Ferreiro 1 1
Funcionrio da Justia 1 1
Grfico 1 1
Industrial 1 1
Lavrador 124 6 46 5 181
Marinheiro Nacional 1 1
Martimo 1 1
Mecnico 1 1
Militar 3 2 1 6
Mortorneiro 1 1
No declarada 140 347 179 36 702
Negociante 2 2
Operrio 83 3 27 1 114
Pedreiro 7 3 10
Pintor 2 2
Pirotcnico 2 2
Prottico Dentrio 1 1
Trabalhador 5 2 7
Total 454 359 275 42 1130

Fonte: Vide tabela 3.1.

Tabela 3.6 - Profisso da me nos registros civis de nascimentos por cor. Municpio de Nova Iguau.

Branca No Informada Pardas e pretas Total geral


Despachante 1 1
Domstica 678 672 1350
Farmacutica 1 1
Funcionrio da Justia 1 1
Lavradora 1 8 9
No declarada 277 10 448 735
Operria 1 1 2
Professora 1 1
Total geral 960 10 1130 2100

Fonte: Vide Tabela 3.1.


cxxix

Tabela 3.7 Profisso da me de pessoas registradas como pretas e pardas por situao conjugal. Municpio de
Nova Iguau.

Casado No Informado Solteiro Vivo Total geral


Domstica 387 21 233 31 672
Funcionrio da Justia 1 1
Lavradora 1 5 2 8
No declarada 65 332 40 11 448
Operria 1 1
Total geral 454 359 275 42 1130

Fonte: Vide Tabela 3.1.

Entre os registros de pardos e pretos no ano de 1939, a presena dos avs foi

significativa. Isso possvel perceber na tabela 3.8. Em 73% dos casos as pessoas registradas

conheceram, ou pelo menos ouviram falar, todos os seus avs e apenas 13% no sabiam

sequer cit-los. O av paterno est presente em 73% dos registros, assim como a av paterna,

a qual tambm est em 73%. Efetivamente, mesmo o nmero sendo igual, no correto

afirmar que, em todos os 73% dos registros, os avs paternos esto presentes, ou seja, podem

existir registros nos quais aparece a av e no o av ou vice-versa. A figura mais sistemtica

nos registros foi a dos avs maternos, uma vez que, foram nomeados 82% dos avs, enquanto

a av materna estava presente em 87% dos registros.

Ao minudenciar a quantidade de avs das mes solteiras, percebe-se a sua importncia

na formao de famlias que no so nucleares (tabela 3.9). Dentre os 275 registros, onde

aparecem s mes solteiras, 52% das pessoas registradas conheceram todos os seus avs e

apenas 3% no saberiam sequer nomear nem um. O av paterno foi citado em 52% registros,

assim como a av paterna que est presente tambm em 52%. A figura dos avs maternos

muito significativa entre as mes solteiras, visto que o av materno foi nomeado em 90,5% e

a av materna em 96% dos registros. Efetivamente, difcil supor se as pessoas registradas

tiveram contato ou no com seus avs, uma vez que boa parte desta populao migrou para a

Baixada entre as dcadas de 1920 e 1930. Entretanto, a partir dos presentes dados, se o ato de

registrar requer uma estabilidade, mesmo que precria, na regio, vlido supor que os pais
cxxx

de pessoas registradas como pretas e pardas tiveram a oportunidade de formar famlia -

mesmo no ncleo me/av materna/av materno e, desse modo, buscaram o registro civil de

nascimentos.

Tabela 3.8 - Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas. Municpio de
Nova Iguau.

Porcentagem Total
Av Paterno 73% 822
Av Paterna 73% 824
Av Materno 82% 929
Av Materna 87% 984
Todos os avs 73% 822
Nenhum dos avs 13% 145
Apenas um av 5% 54
Total de registros 1130

Fonte: Vide tabela 3.1.

Tabela 3.9 Presena de avs paternos e maternos de mes solteiras nos registros civis de nascimentos onde as
pessoas foram registradas como pretas e pardas. Municpio de Nova Iguau.

Porcentagem Total
Av Paterno 52% 143
Av Paterna 52% 143
Av Materno 90,5% 249
Av Materna 96% 265
Todos os avs 52% 143
Nenhum dos Avs 3% 9
Pelo menos um av 5% 15
Total 275

Fonte: Vide Tabela 3.1.

Devido migrao dos anos anteriores, pde-se acompanhar a quantidade extensa de

nascimentos, ocorridos fora da Baixada e registrados no Municpio de Nova Iguau (tabela

3.10). Nesses, a categoria da naturalidade dos pais aparece em quase todos os registros, porm

e infelizmente, no ano de 1939, tal categoria apenas aponta se os pais so brasileiros ou no.

Decerto, ao atentar para os locais de nascimento das pessoas registradas, possvel se ter uma

noo da migrao. O nmero que mais impressionou foi o da quantidade significativa de


cxxxi

registros onde o nascimento ocorreu fora da Baixada, 500 (44%). Desse total, 220 registros

so de pessoas nascidas no Vale do Paraba. 179

Tabela 3.10 - Regio do nascimento nos registros civis de nascimentos por cor. Municpio de Nova Iguau.

Branca No Informada Pardas e pretas Total geral


Belford Roxo 21 63 84
Capital Federal 55 51 106
Duque de Caxias 2 2
Estado Rio de Janeiro 35 1 40 76
Estados do Brasil 12 1 14 27
Itagua 1 1
Mesquita 116 1 138 255
Minas Gerais 17 29 46
No declarada 1 2 3
No Localizado 1 1
Nilpolis 8 9 17
Nordeste 57 43 100
Nova Iguau (sede) 336 249 585
Nova Iguau (interior) 208 1 246 455
Paracambi 2 2 4
Queimados 4 11 15
Rio de Janeiro 2 3 5
So Joo de Meriti 2 1 8 11
Vale do Paraba 82 5 220 307
Total geral 960 10 1130 2100

Fonte: Vide Tabela 3.1.

No censo de 1940, percebe-se que, a populao aumentou no Municpio de Nova

Iguau, essa regio apresentava uma diversificao econmica e um crescimento urbano

significativo. De acordo com tal censo, havia, no municpio todo, 140.606 pessoas; destas,

8.962 (6%) estavam ligadas a atividades de agricultura, enquanto 11.928 (8%) trabalhavam

em indstrias de transformao (tabela 3.11). Aparentemente, a partir do censo citado, a

agricultura deixou de ser a atividade principal. Isso pode ser visto no municpio como um

179
Deveras, somente ao dividir os trs registros os registros de crianas nascidas e registradas no ano de 1939,
os registrados posteriores ao ano de nascimento e os auto-declarantes - que se poder construir a trajetria de
cada grupo no ano de 1939. Isto ser feito de forma mais elaborada no seguir do texto. Entretanto, a preocupao
nesta parte de demonstrar a estabilizao dos libertos e de seus descendentes atravs dos registros civis no ano
de 1939.
cxxxii

todo, uma vez que 39% das pessoas recenseadas se concentravam no quadro urbano, outros

39%, no quadro suburbano e apenas 21% localizavam-se na rea rural. 180

Tabela 3.11 Localizao populacional por Distrito de acordo com o censo de 1940. Municpio de Nova
Iguau.

Populao total Quadro urbano Quadro suburbano Quadro Rural


Nova Iguau (sede) 34680 25% 14303 41% 6295 18% 14082 40%
Belford Roxo 7434 5% 2270 30,50% 1781 24% 3383 45,50%
Bonfim 1232 1% 61 5% 1171 95%
Cava 3048 2% 380 12,50% 75 2% 2593 85%
Caxias 24711 17,50% 12417 50% 11290 45% 1004 4%
Estrella 3617 3% 153 4% 103 3% 3361 93%
Meriti 39569 28% 9741 25% 28453 72% 1375 3,50%
Nilpolis 22341 16% 14845 66% 7496 33,50%
Queimados 3974 3% 1016 26% 2958 74%

Nova Iguau 140606 100% 55186 39% 55493 39% 29927 21%

Fonte: Censo de 1940

Ao dividir tais propores nos distritos do municpio, possvel perceber a forma, pela

qual a populao estava distribuda pelo Municpio. Se as pessoas estavam, em sua totalidade,

na rea urbana, ao olhar para cada distrito, separadamente, pode-se perceber que esse

processo de urbanizao foi muito mais presente em alguns bairros. Na rea correspondente

ao distrito sede de Nova Iguau estava 25% da populao total do municpio. Destes, 41%

encontravam-se no quadro urbano e 40% no quadro rural. Efetivamente havia um equilbrio

entre a estabilizao de pessoas no centro urbano e na rea rural do distrito. Contudo, nos

distritos onde houve um crescimento de tamanho similar, a maior parte da populao se

concentrou nas reas urbanas. Exemplificando, a populao de Meriti correspondia a 28% do

total do municpio; destes, 25% e 72% estavam concentrados nos quadros urbanos e

suburbanos, respectivamente. Situao muito semelhante era a do distrito de Nilpolis, que

180
Deve-se, aqui, fazer uma ressalva quanto s categorias utilizadas nestes dois pargrafos. No censo de 1940,
aparecem apenas estas categorias: quadro urbano, quadro suburbano e rural. As categorias urbano e suburbano
foram utilizados, nesse censo, para a populao aglomerada em centros dotados de um mnimo de servios
coletivos, cujos habitantes se dediquem, em maioria, a atividades alheias vida rural. p. xiv, IBGE, censo
demogrfico de 1940.
cxxxiii

concentrava 16% da populao e desse total, 66% estava no quadro urbano, no entanto, no

houve registro de pessoas no quadro rural.

No que tange s regies do nascimento das crianas pretas e pardas, era de se esperar

que tal populao se concentrasse nas reas urbanas. Na tabela 3.10, dentre os 726 registros

de crianas pretas e pardas, somente 249 (34%) foram declarados como nascidas no distrito

sede de Nova Iguau. Houve uma presena marcante desse grupo nos distritos ao redor da

sede do Municpio. Em Belford Roxo nasceram 63 crianas, enquanto que, em Mesquita,

registrou-se 138. Somando estes nmeros aos dos registros de crianas nascidas fora do centro

de Nova Iguau, chega-se ao total de 66%. Seria lcito dizer que, dentre os registros coletados,

em 1939, os pretos e pardos esto estabilizados nos arredores do distrito sede, locais, estes,

onde o crescimento urbano permitiu a diversificao dos arranjos de trabalho e,

provavelmente, o barateamento das propriedades.

Aparentemente, esse ano foi estratgico, no que concerne s definies dos libertos e

de seus descendentes, que migraram para essa regio. Se, nos anos anteriores, a migrao foi

parte integrante das experincias de ps-abolio, no ano de 1939, a estabilizao das famlias

tornou-se mais perceptvel. Possivelmente, alguns elementos propiciaram essa estabilizao,

como: o avano urbano, o acesso terra, graas aos loteamentos, e os novos arranjos de

trabalho.

No ano de 1939, pretos e pardos procuraram legitimar as suas famlia e a prpria,

mesmo que tardiamente (tabela 3.12). Dentre os 2.100 registros, no ano de 1939, 1.205 (57%)

so registros tardios, ou seja, feitos posteriormente ao ano de nascimento. Estes, diferenciam-

se, em dois tipos, os registros tardios de crianas, jovens e adultos, que foram declarados por

alguma pessoa e os auto-declarantes. Para se ter uma maior amplitude do que significou os

ltimos anos do registro civil de nascimento, para essa populao de pretos e pardos que teve
cxxxiv

o registro tardio, deve-se separar os dois grupos especficos encontrados e analis-los

cuidadosamente.

Tabela 3.12 Porcentagem e Total de registros civis de nascimentos tardios por ano. Municpio de Nova
Iguau.

Porcentagem Total
1919 0,20% 4
1924 0,80% 15
1929 3,40% 63
1934 30% 545
1939 66% 1205
Total geral 1832

Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau, 1919,
1924, 1929, 1934, 1939.

3.5 Os Registros Civis de Nascimentos Tardios

Nesta parte, sero analisados todos os registros civis de nascimentos do Cartrio de

Nova Iguau, os quais no foram feitos no ano de nascimento do registrado. Este registro

tardio pode ser dividido em duas categorias: na primeira, esto bebs de um dia de vida,

crianas, jovens e adultos que foram registrados por algum, na maioria das vezes, pais e

mes. Em contrapartida, h a ocorrncia de registros, nos quais so os prprios que auto-

declaram seu nascimento, no cartrio. Sendo assim, a anlise ser dividida em trs momentos.

No primeiro, sero analisados os aspectos gerais desses registros tardios. Em segundo, os

registros tardios de crianas, jovens e adultos registrados pelos pais, mes, entre outros. Por

fim, sero discutidos os registros dos auto-declarantes.

***
cxxxv

Ao longo dos anos, principalmente entre as dcadas de 1930 e 1940, houve uma

presena sistemtica dos registros tardios no 1 Ofcio de Registro Civil de Pessoas Naturais

do Municpio de Nova Iguau (tabela 3.12). Ao total, foram 1.832 registros declarados nesta

modalidade, ou seja, 27% de todos os registros coletados, entre 1889 e 1939.

Este nmero tambm surpreende ao ser dividido pelos anos. De todos os anos

coletados, somente aps 1919 os registros tardios comearam a aparecer. Na tabela 3.12, j

apresentada, possvel acompanhar o crescimento desses registros: em 1919, foram 4 (0,20%)

registros; em 1924, esse nmero aumenta para 15 (0,80%); em 1929, sobe para 63 (3,4%), e,

em 1934, chega a 545 (30%) registros. No ano de 1939, estavam concentrados em 1.205

(66%) os registros tardios de todos os anos coletados.

As leis e os decretos, direcionadas para os registros civis de nascimentos,

provavelmente, permitiam a uma parcela da populao acesso a eles, anos aps o nascimento

de seus filhos. Durante os primeiros anos de exerccio do Registro Civil, no Brasil, qualquer

registro de nascimento de crianas, aps o perodo dado por Lei, seria cobrado uma multa de

10 mil ris. Efetivamente, mesmo no sendo um valor alto, para a poca, no era qualquer

pessoa que desembolsaria esse valor para registrar seu filho. Entre os dados coletados, em

apenas 15 casos houve registros mediante pagamento de multa. Somado a este fato,

aparentemente, no incio do registro civil, os governos republicanos no se empenharam em

fazer campanhas para divulgar a sua importncia. Em virtude desses fatos, parece acertado

afirmar que o subregistro foi altssimo nos mencionados primeiros anos de registros tardios.

A procura pelo registro civil tardio aumentou, consideravelmente, aps a promulgao

de leis que, priori, incentivaram sua prtica. As primeiras leis, neste sentido, foram as Leis

2.887 de 25 de janeiro de 1914 e a 3.024 de 17 de novembro de 1915. A primeira, permitiu o

registro de nascimento sem pagamento de multas e s exigia um simples requerimento para a

sua efetivao. A segunda, apenas prorrogou o prazo para o registro sem multa. Na realidade,
cxxxvi

mesmo aps esses primeiros incentivos, nos registros coletados, em Nova Iguau, no h

qualquer registro tardio, no ano de 1914 e 1919, que mencione tais leis.

Todavia, somente aps 1919 foi que as leis, provavelmente, tomaram fora e/ou

incentivaram as pessoas a registrar seus familiares. Nos presentes dados, dentre os 4 registros

tardios desse ano, em 3 h pagamento de multa e, apenas em um, mencionada a Lei 3.764 de

10 de novembro de 1919. A mesma regulamentou o registro de nascimento mediante

despachos do juiz togado e duas testemunhas, as quais deveriam assinar o requerimento. Era

de se esperar que, nos anos seguintes, fosse possvel ver essa lei novamente sendo utilizada

pelas pessoas que requeriam o registro. No obstante, nos anos de 1924 e 1929, s h meno

nos registros tardios de pagamento de multa.

Efetivamente, essas primeiras leis de incentivo aos registros parecem no ter atingido

a gama da populao, a qual se encontrava fora da legitimidade civil, no Municpio de Nova

Iguau. Porm, a partir de 1931, as leis e os decretos seguintes levaram aos registros civis um

nmero surpreendente de pessoas. No dia 18 de fevereiro de 1931, o Decreto 19.710 obrigou

os registros de nascimentos, no exigindo pagamento de multas nem, tampouco, a necessidade

de qualquer justificativa para o registro tardio. Nos anos de 1934 e 1939, foram coletados 540

registros que mencionavam esse decreto. No entanto, nada parece ter incentivado mais a

procura pelo registro civil do que o Decreto 1.116 de 24 de fevereiro de 1939. Somente no

ano do funcionamento dessa lei foram feitos 1.187 registros tardios. 181

Baseando-se na possibilidade de acesso de forma gratuita e facilitada, seria lcito supor

que, entre os grupos existentes no Municpio de Nova Iguau, todos buscariam o registro

tardio de nascimento (tabela 3.13). Dentre os 1.832 registros tardios, as pessoas registradas

como pretas e pardas esto presentes em 1.001 (55%) registros. princpio, tais leis parecem

ter incentivado um grupo especfico na busca pela legitimao prpria e de seus familiares.

181
A anlise da importncia, destes decretos e leis, para aumentar a acessibilidade da populao, no registro civil
de nascimento, est na terceira parte deste captulo.
cxxxvii

Tabela 3.13 - Total de registros civis de nascimentos tardios por cor e ano. Municpio de Nova Iguau.

Branca Outras cores No Informada Pardas e Pretas Total geral


1919 1 3 4
1924 9 1 5 15
1929 36 1 26 63
1934 273 13 259 545
1939 489 8 708 1205
Total geral 807 1 23 1001 1832

Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau, 1919,
1924, 1929, 1934, 1939.

Para se ter uma melhor visualizao das caractersticas entre os registros de pretos e

pardos, torna-se necessrio dividir os registros em dois grupos: os registros tardios de

crianas, jovens e adultos declarados por outrem e os registros dos auto-declarantes.

Registro tardio de crianas, jovens e adultos declarados por outrem

Nesta parte, sero examinadas as caractersticas dos registros de crianas, jovens e

adultos que foram registrados por pais, mes, avs ou outras pessoas nos anos posteriores

ao seu nascimento. Trata-se de analisar as famlias de pretos e pardos que buscaram o registro

civil, utilizando as leis e os decretos de incentivo, nos ltimos anos coletados de 1934 e 1939,

evidenciando de suas especificidades, sua formao, sua origem e localizao.

Nos citados registros, possvel encontrar mais categorias do que as apresentadas na

parte 1.3. Em virtude disso, foi produzido um novo banco de dados, o qual incorporou as

seguintes categorias: a idade que a pessoa foi registrada, o local de residncia, a regio da

residncia do registrado, o ano de nascimento, e o tipo de registro - se foi por multa, decreto,

Lei, autorizao judicial, entre outros.

Ao separar a quantidade de registros tardios de crianas, jovens e adultos declarados

por outrem e dos auto-declarantes, chega-se a uma concluso interessante: os dois tipos de

registros somados chegam a 1.832, dentre os quais 965 (53%) so de crianas, jovens e

adultos registrados por outrem. O acesso ao registro, entre os anos de 1919 a 1939,
cxxxviii

aparentemente, foi de igual proporo para ambas as parcelas da populao. Na tabela 3.14,

v-se que a quantidade de registros por cor de quase 50% (488) para pretos e pardos e 50%

(474) para brancos. Todavia, ainda assim, possvel constatar a grande presena de pessoas

pretas e pardas sendo registradas no ano de 1939.

Tabela 3.14 - Total de registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem
por cor e ano. Municpio de Nova Iguau.

Branca Outras cores No Informada Pardas e Pretas Total geral


1919 1 3 4
1924 8 1 4 13
1929 32 24 56
1934 114 1 58 173
1939 320 399 718
Total geral 474 1 2 488 964

Fonte: Vide Tabela 3.13.

Entre os anos de 1919 e 1939, como se pde observar, a populao de pretos e pardos

buscou ainda mais o registro civil. Ao analisar essa parcela da populao, percebe-se que boa

parte dela, que buscou legitimar seus filhos, eram em sua maioria de casados. Na tabela 3.15,

os casados somam-se 252 (53%) e os solteiros so 183 (37,5%). Efetivamente, a presena de

pai e me casados superior, porm, a quantidade de solteiros chama a ateno. A partir desse

detalhe, lcito supor que as famlias, que buscaram os registros tardios, no eram somente

nucleares completas pai/me/filhos.

Tabela 3.15 - Situao conjugal por cor nos registros civis de nascimentos de nascimentos tardios de crianas,
jovens e adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau.

Branca Outras cores No Informada Pardas e Pretas Total geral


Casado 331 1 1 252 585
No Informado 16 19 35
Solteiro 67 1 183 250
Vivo 60 34 94
Total geral 474 1 2 488 964

Fonte: Vide Tabela 3.13.


cxxxix

Ao olhar a legitimidade das crianas e quem as declararam, um panorama semelhante

situao conjugal se apresenta. Na tabela 3.16, no que concerne presena do pai, sendo

nomeado e declarante, ele est em 284 (58%) dos registros. No entanto, entre as crianas

declaradas como provindas de uma relao legtima somam-se 295 (60%), dos registros

(tabela 3.17). A quantidade de registros, nos quais o pai nomeado e o nmero de relaes

legtimas declaradas pode indicar que a maior parte das pessoas, que procuraram tardiamente

o registro civil, era de famlias nucleares completas e, provavelmente, estveis em Nova

Iguau.

Porm, assim como o pai, a me solteira possuiu uma importncia concomitante no

que tange a busca pelos registros civis de nascimentos. Em 165 (33%) registros tardios de

pessoas pretas e pardas, a me procurou registrar sua prole. Ao atentar para a quantidade de

pessoas registradas como sendo filhos de pai e me solteiros, tal nmero cresceu para 188

(38,5%). Embora seja, um nmero menor em relao ao pai como declarante, nos registros

tardios houve uma presena significativa de filhos de famlia nucleares incompletas,

principalmente de mes solteiras.

Tabela 3.16 - Declarantes nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por
outrem por cor. Municpio de Nova Iguau.

Branca Outras cores No Informada Pardas e Pretas Total geral


Avs Maternos 1 1
Avs Paternos 1 1
Me 134 165 299
Outra Pessoa 25 1 2 38 66
Pai 314 284 597
Total geral 474 1 2 488 964

Fonte: Vide Tabela 3.13.


cxl

Tabela 3.17 - Legitimidade nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados
por outrem por cor. Municpio de Nova Iguau.

Branca Outras cores No Informada Pardas e Pretas Total geral


Ilegtimo 3 2 5
Legtimo 393 1 1 295 690
No informado 9 3 12
Natural 69 1 188 257
Total geral 474 1 2 488 964

Fonte: Vide Tabela 3.13.

Ao detalhar um pouco mais a profisso do pai nomeado, declarante ou no, que

registrou seus filhos tardiamente percebe-se a diversificao dos arranjos de trabalho (tabela

3.18 - anexo). Dentre os 488 registros, os quais so de pai das pessoas registradas como pretos

e pardos, a profisso s aparece em apenas 217 registros. Destes, a maior parcela, 86 (40%)

est ligada ao trabalho com lavoura. Para alm deste tipo de trabalho, o pai de tais pessoas

estava alocado em outras profisses ligadas ao avano urbano, 59 (27%) eram operrios,

enquanto 34 (16%) trabalhavam como empregado pblico e 13 (6%) possuam um comrcio

prprio.

Ao cruzar os dados da situao conjugal do pai, de pessoas registradas como pretas e

pardas, com as profisses, percebe-se que os casados esto presentes em 76% dessas

categorias (tabela 3.19). Apesar da maior quantidade dos solteiros no informarem sua

profisso, nos que so mencionados uma caracterstica interessante apresentada. Dentre os

45 registros de pai solteiro, 17 eram de lavrador, 13 de operrio e 7 de comerciante. Deveras,

no possvel afirmar se todas estas categorias profissionais so estveis ou no. Contudo, a

concentrao nestas trs categorias pode informar a existncia de famlias que so ou

pretendiam ser estveis, visto que a busca pelo registro pressupe a existncia de certa

estabilidade familiar, seja ela nuclear ou no.


cxli

Tabela 3.19 - Profisso do pai de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de nascimentos
tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau.

Casado No Informado Solteiro Vivo Total geral


Ajudante 1 1
Alfaiate 2 2
Carpinteiro 3 3
Comerciante 9 4 13
Empregado 1 1
Empregado do Departamento Nacional de Sade Pblica 4 4
Empregado municipal 1 1 2
Empregado ou funcionrio pblico 26 1 7 34
Foguista 1 1
Funcionrio da Justia 1 1
Jornaleiro 1 1
Lavrador 65 17 4 86
Militar 2 1 3
Mortorneiro 1 1
No declarada 86 18 138 29 271
Negociante 1 1
Operrio 42 13 1 56
Pedreiro 3 1 4
Trabalhador 3 3
Total geral 252 19 183 34 488

Fonte: Vide Tabela 3.13.

Ao analisar a presena da me, possvel compreender seu papel na formao dessas

famlias. A quantidade de registros nos quais no declarada a profisso da me um tanto

quanto alta, so 109 (22%); ora, isso faz com que restem apenas 379 para serem analisados

(tabela 3.21). Dentre os 379 casos de pessoas registradas como pretas e pardas as mes so

apontadas, em 377 (99%), como ligadas ao trabalho domstico (tabela 3.20). Ao examinar a

situao conjugal das mes, as quais exercem a profisso domstica, as casadas so 198

(52%) enquanto as solteiras somam 149 (39%). A presena marcante de mes neste tipo de

trabalho sendo casadas ou no, pode informar a existncia de famlias que no so apenas

nucleares.

As mes solteiras esto presentes em boa parte da documentao. Dentre os 488 casos

de pessoas registradas como pretas e pardas, as mes solteiras esto em 183 (37,5%). Destes,

em 101 registros elas foram as declarantes. Aparentemente, por enquanto, lcito supor que as
cxlii

mes solteiras podem ter morado sozinhas, ou com seus pais, e provavelmente, participaram

ativamente do ncleo familiar: avs maternos/me solteira/filhos.

Tabela 3.20 - Profisso da me por cor nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos
declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau.

Branca Outras cores No Informada Pardas e Pretas Total geral


Domstica 360 1 377 737
Funcionria da Justia 1 1
Lavradora 1 1 2
No declarada 112 1 1 109 223
Operria 1 1
Total geral 474 1 2 488 964

Fonte: Vide Tabela 3.13.

Tabela 3.21 - Profisso da me de pessoas registradas como pretas e pardas por situao conjugal nos registros
civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau.

Casada No Informado Solteira Viva Total geral


Domstica 198 2 149 28 377
Funcionria da Justia 1 1
Lavradora 1 1
No declarada 53 17 33 6 109
Total geral 252 19 183 34 488

Fonte: Vide Tabela 3.13.

Nos registros tardios de pretos e pardos, a presena dos avs tambm expressiva.

No possvel afirmar se os registrados tiveram ou no contato com seus avs, no entanto,

sua nomeao muito significativa. Dentre os 488 registros selecionados em 359 (74%),

todos os avs estavam presentes (tabela 3.22). Em contrapartida, 26 (5%) dos registros so de

pessoas que s tiveram contato com apenas um av. E, somente em apenas 14 (3%) casos, no

poderia sequer nomear um deles. Ao dividir entre avs paternos e maternos, percebe-se que os

maternos continuam em alta. O av paterno aparece em 359 (74%) registros, enquanto a av

paterna em 365(75%). Deveras, a paternidade da me continua seguindo como a mais forte

nos registros. O av materno est presente 446 (91%) dos registros, enquanto a av materna,
cxliii

surpreendentemente, foi nomeada em 473(97%). Mais uma vez a famlia da me aparece

como figura central na formao das famlias negras no Municpio de Nova Iguau.

Ao minudenciar os dados coletados de me solteira, percebe-se que a famlia da me

figura central das pessoas registradas como pretas e pardas (tabela 3.23). Dentre os 183

registros de me solteira, o av paterno est em 39%, enquanto a av paterna em 41,5%. A

presena dos avs maternos bem forte nos registros de mes solteiras. O av materno foi

nomeado em 92%, enquanto a av materna estava em 99% dos registros. Aparentemente, os

avs maternos das pessoas registradas j eram estveis na regio. Portanto, provavelmente,

famlias que eram e/ou se pretendiam estveis, independente de sua tipologia, buscaram muito

mais o registro civil do que famlias unicamente nucleares.

Tabela 3.22 Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros
civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau.

Porcentagem Total
Av Paterno 74% 359
Av Paterna 75% 365
Av Materno 91% 446
Av Materna 97% 473
Todos os avs 74% 359
Nenhum dos avs 3% 14
Apenas um av 5% 26
Total de registros 488

Fonte: Vide Tabela 3.13.


cxliv

Tabela 3.23 Presena de avs paternos e maternos de mes solteiras nos registros civis de nascimentos tardios
de crianas, jovens e adultos declarados por outrem, nos quais as pessoas foram registradas como pretas e
pardas. Municpio de Nova Iguau.

Porcentagem Total
Av Paterno 39% 72
Av Paterna 41,5% 76
Av Materno 92% 169
Av Materna 99% 181
Todos os avs 39% 72
Nenhum dos avs 1% 2
Apenas um av 6% 11
Total de registros 183

Fonte: Vide Tabela 3.13.

At o presente momento, os dados obtidos, das famlias de pessoas registradas como

pretas e pardas, assemelham-se em boa parte ao do captulo 2. Isso significa dizer que no ato

do registro, provavelmente, essa populao encontrava-se estabilizada no Municpio de Nova

Iguau. Desse modo, a anlise que segue evidencia caractersticas especficas dos grupos que

buscaram tardiamente o registro civil, principalmente, no que condiz a sua origem e

estabilidade na Baixada Fluminense.

Apesar da grande dificuldade encontrada ao analisar os registros civis de nascimentos,

em virtude da quantidade de subregistro, alguns dados podem indicar tendncias importantes

no que tange migrao e a estabilizao das pessoas registradas como pretas e pardas. Em

tais registros encontram-se categorias muito interessantes que colaboram para a anlise dos

aspectos da migrao e da estabilizao de pretos e pardos que migraram para o Municpio de

Nova Iguau, entre a dcada de 20 e 30, do sculo XX. Essas categorias so: ano de

nascimento, regio do nascimento e faixa etria dos registrados.

Ao examinar os anos de nascimento, como um todo, percebe-se que a busca pelo

registro civil tardiamente, aparentemente, est ligada idade do registrado. Na figura 3.1,

foram colocados os 718 registros tardios, por ano de nascimento da pessoa, encontrados no

ano de 1939. Tal ano foi escolhido por ter concentrado a maior parte de registro de crianas,
cxlv

jovens e adultos registrados por outrem. Na mencionada figura, possvel acompanhar

processos muito interessantes. Dentre as pessoas nascidas, entre 1917 e 1922, e registradas no

ano de 1939, aparentemente, a grande maioria de brancos. No entanto, mesmo sendo em

nmero menor, a presena de pessoas pretas e pardas significativa. O interessante foi notar

que a quantidade de pessoas registradas como pretas e pardas, nascidas aps 1924, foi acima

dos brancos at 1938. Portanto, a maior parte das pessoas registradas, no ano de 1939, era de

pretos e pardos e tinha entre 0 e 15 anos. 182

Figura 3.1 Ano dos nascimentos por nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos
declarados por outrem declarados em 1939. Municpio de Nova Iguau.

90

80

70

60

50

40

30

20

10

0
1911 1917 1918 1919 1920 1921 1922 1923 1924 1925 1926 1927 1928 1929 1930 1931 1932 1933 1934 1935 1936 1937 1938

Branca Pardas e pretas Total geral

Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau, 1939.

Atravs das idades, possvel identificar alguns traos da populao de pretos e

pardos na Baixada que foram registrados tardiamente. Como j visto na tabela 3.14, a maior

parte de todos os registros foram feitos no ano de 1939. Ao analisar a faixa etria por sexo,

182
Nos registros tardios declarados por outrem, no caso limite, trabalha-se com bebs que possivelmente podem
ter nascido no dia 31 de Dezembro e sido registrado no dia 2 de Janeiro. Logo, usa-se o ano zero para simbolizar
esses casos limites.
cxlvi

das pessoas registradas como pretas e pardas, um quadro interessante apresentado (figura

3.2). Em 1939, a maior parte dos registros foi de crianas entre 0 e 5 anos e, aparentemente,

houve um equilbrio dos sexos nesses registros. No entanto, ao se olhar a faixa etria entre os

16 e 20 anos, nota-se uma maior presena de homens, neste grupo, em relao s duas faixas

etrias abaixo, entre 6 a 10 e entre 11 a 15.

Figura 3.2 Faixa etria por sexo nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos
declarados por outrem declarados como pretos e pardos em 1939. Municpio de Nova Iguau.

26 - 30

21 - 25

16 - 20

Masculino
Feminino

11 - 15

6 - 10

0-5

-100 -80 -60 -40 -20 0 20 40 60 80 100

Fonte: Vide Figura 3.1.

Um exemplo bem claro, deste tipo de registro de nascimento, foi o de um rapaz de 16 anos,

aqui, parcialmente transcrito:

Aos vinte e sete dias do ms de novembro de mil novecentos e trinta e nove, nesta cidade, em
cartrio compareceu J. P. V., brasileiro, operrio, residente em Mesquita, neste distrito,
declarou que as cinco horas do dia 5 de agosto de mil novecentos e vinte e trs, em Municpio
de Vassouras, neste Estado, nasceu uma criana do sexo masculino, de cor parda que tomou
183
o nome de S.P. filho legtimo dele declarante e de sua mulher A. P. P. , falecida.

183
Livro 61, registro 15454, de 1939, RCPNNI.
cxlvii

Nos registros, os declarantes se preocuparam em dizer o local de origem das crianas,

jovens e adultos. Na tabela 3.24, dentre os 488 registros, 173 (25%) indicam, como locais de

nascimento, regies fora da Baixada Fluminense. Apesar de ser um nmero baixo, em relao

ao total dos nascimentos, h a evidncia de migrao em outro dado. Dentre os 173

registrados como nascidos fora do Municpio de Nova Iguau, 97 (56%) foram somente da

regio do Vale do Paraba.

Tabela 3.24 - Regio do nascimento por cor nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e
adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau.

Branca Outras cores No Informada Pardas e Pretas Total geral


Belford Roxo 14 31 45
Capital Federal 55 37 92
Duque de Caxias 1 1 2
Estado Rio de Janeiro 20 12 32
Estados do Brasil 7 7 14
Mesquita 56 59 115
Minas Gerais 7 16 23
No declarada 2 3 5
No Localizado 1 1
Nilpolis 10 8 18
Nordeste 25 3 28
Nova Iguau (sede) 160 2 96 258
Nova Iguau (interior) 60 105 165
Paracambi 1 1
Queimados 2 5 7
Rio de Janeiro 1 1
So Joo de Meriti 1 5 6
Vale do Paraba 54 1 97 151
Total geral 474 1 2 488 964

Fonte: Vide Tabela 3.13.

Ao analisar a faixa etria, por regio de origem, aparentemente, possvel perceber o

processo de migrao e de estabilizao da populao de pretos e pardos no Municpio de

Nova Iguau. Na figura 3.3, colocou-se os locais de origem por faixa etria, e ao examinar

registros de crianas, entre 0 e 5, percebe-se uma quantidade considervel de nascidas no

distrito sede e no interior de Nova Iguau. Porm, h a ocorrncia de um dado interessante

quando se observa o nmero de pessoas nascidas na regio do Vale do Paraba entre 16 e 20

anos e registradas no Municpio de Nova Iguau em 1939.


cxlviii

Figura 3.3 Faixa etria por regio de nascimento nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens
e adultos declarados como pretos e pardos por outrem em 1939. Municpio de Nova Iguau.

50

45

40

35

30

25

20

15

10

0
iro

e)

r)

iti
il

a
al

iro
o

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bi
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as

rio

b
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Ig

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C

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o

Es

a
ad

S
ov

ov
st

N
E

0-5 6 - 10 11 - 15 16 - 20 21 - 25 26 - 30

Fonte: Vide Figura 3.1.

Na figura 3.4, foram colocados todos os registros de 1939, conforme a faixa etria e a

regio de nascimento, dentro ou fora da Baixada, da pessoa registrada. Primeiramente, na

figura mencionada, percebe-se que a maior parte dos registrados so crianas, entre 0 e 5

anos, que nasceram na Baixada Fluminense. No entanto, ao examinar a faixa etria entre 11 e

20 anos, possvel perceber que a quantidade de pessoas registradas, em 1939, provindas de

fora do Municpio de Nova Iguau um pouco superior s nascidas nesta regio.


cxlix

Figura 3.4 Faixa etria por localizao das pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de
nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem, em 1939. Municpio de Nova Iguau.

140

120

100

80

Dentro Baixada
Fora Baixada

60

40

20

0
0-5 6 - 10 11 - 15 16 - 20 21 - 25 26 - 30

Fonte: Vide Figura 3.1.

Tomando a cronologia da migrao, utilizada nesta dissertao, que vai de 1920 a

1930, as crianas, jovens e adultos registrados, possivelmente, nasceram nos locais de origem

dos pais, os quais migraram no mesmo perodo. Esse foi o caso de S.P. acima mencionado:

nascido em 1923, deduz-se que, seu pai fez parte da primeira gerao de filhos nascidos aps

a abolio; migrou poucos anos aps o nascimento do seu filho, prximo a dcada de 30;

pode ter migrado sem a famlia, arranjado emprego como operrio e se estabilizado em

Mesquita; e, por fim, uma vez ali instalado, provavelmente, legitimou sua relao conjugal e,

posteriormente, registrou seu filho no cartrio de Nova Iguau.

O ato de registrar significava legitimar as relaes parentais como o casamento e os

filhos. Efetivamente, como j mencionado nesta parte, aparentemente, somente as famlias

estveis e, em especfico, estabilizadas recorriam ao registro civil de nascimento. A partir da

figura 3.3, percebe-se a quantidade de pessoas registradas, entre 11 e 20 anos, provindas de


cl

fora da Baixada. Provavelmente, a migrao, com famlia formada, foi muito mais uma

exceo do que uma regra no caso do Municpio de Nova Iguau.

No que tange faixa etria das pessoas, registradas por regio de origem, possvel

notar um processo de estabilizao. Ao analisar a tabela 3.2, percebe-se, primeiramente, que a

diferena entre homens e mulheres praticamente nfima, ou seja, havia um equilbrio entre

os sexos nos registros tardios. De certa forma, os pais e mes buscaram legitimar ambos os

filhos. Em segundo lugar, na faixa etria entre 0 e 5 anos a quantidade de registros realmente

impressiona. Decerto, ao somar todas as crianas de 0 a 15 anos, chega-se a um total de 73%

de todos os registros. O equilbrio entre os sexos e a quantidade significativa de crianas

registradas tardiamente podem indicar uma estabilizao dessa populao de pretos e pardos,

em Nova Iguau, por volta da dcada de 40.

A busca pelo registro e pela legitimao de todos os seus familiares foi muito

intensificada nesses registros. Ao analisar qualitativamente os registros, encontrou-se muitos

filhos de pretos e pardos sendo registrados todos no mesmo dia. Esse foi o caso de J.G.D. que

registrou cinco filhos no mesmo dia sendo brasileiro, residente neste distrito. No primeiro

filho, declarou que:

No dia 4 de agosto de mil novecentos e trinta e quatro em Paraba do Sul, neste Estado, nasceu uma
criana do sexo masculino, de cor parda que tomou o nome de J.D. filho natural dele declarante e de
184
sua mulher Dona I.C.S. brasileira e domstica.

O seu segundo filho nasceu no ano de 1930, o terceiro em 1931, o quarto em 1934 e o quinto

em 1935, todos nascidos no Municpio de Paraba do Sul. Caso semelhante aconteceu com

L.M.C, em 1939 registrou 3 filhos no mesmo dia. No primeiro filho, o assento mostrou que:

Aos trinta dias do ms de dezembro de mil novecentos e trinta e nove, compareceu L.M.C., brasileiro,
lavrador, residente neste distrito, declarou que as quatorze horas do dia oito de fevereiro de mil
novecentos e vinte nove, em Queimados, neste Municpio, nasceu uma criana do sexo feminino de

184
Livro 61, registro 15759, de 1939, RCPNNI.
cli

cor parda, que tomou o nome de T.J.M filha legitima dele declarante e de sua mulher L.A.M.
185
falecida.

Esta dissertao no enfoca o acesso terra por pretos e pardos na Baixada

Fluminense, porm, possvel levantar questes interessantes concernentes sua

estabilizao, a partir dos registros de nascimento. Para identificar a localizao de tais

pessoas, sero usadas duas tabelas, as quais cruzam a categoria cor com os locais de

residncia dos registrados. Dentre os 488 registros, somente em 90 h meno clara sobre o

local de residncia (tabela 3.25). Nestes, em 75 (83%) casos, tal populao est basicamente

residente fora da sede do Municpio. Semelhante concluso chega-se, ao analisar a tabela

3.26. Em 1939, dentre os 245 registros de crianas nascidas, dentro do Municpio de Nova

Iguau, em 165 (67%), essa populao est fora da sede. Eles esto presentes nos distritos

como Belford Roxo, So Joo de Meriti, Nilpolis, Queimados e, principalmente, em

Mesquita.

Tabela 3.25 Regio da residncia por cor nos registros civis de nascimentos tardios de crianas, jovens e
adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau.

Branca Outras cores No Informada Pardas e pretas Total geral


Belford Roxo 2 2 4
Mesquita 9 14 23
No declarada 405 1 2 398 806
Nova Iguau (sede) 19 15 34
Nova Iguau (interior) 39 56 95
Vale do Paraba 3 3
Total geral 474 1 2 488 964

Fonte: Vide tabela 3.13.

185
Livro 61, registro 15741, de 1939, RCPNNI.
clii

Tabela 3.26 Regio do nascimento por ano das pessoas declaradas como pretas e pardas nos registros civis de
nascimentos tardios de crianas, jovens e adultos declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau.

1919 1924 1929 1934 1939 Total geral


Belford Roxo 2 7 6 16 31
Capital Federal 6 31 37
Duque de Caxias 1 1
Estado Rio de Janeiro 2 10 12
Estados do Brasil 7 7
Mesquita 1 2 4 52 59
Minas Gerais 1 15 16
No declarada 2 1 3
No Localizado 1 1
Nilpolis 2 6 8
Nordeste 3 3
Nova Iguau (sede) 1 1 6 8 80 96
Nova Iguau (interior) 2 7 15 81 105
Paracambi 1 1
Queimados 1 4 5
Rio de Janeiro 1 1
So Joo de Meriti 5 5
Vale do Paraba 12 85 97
Total geral 3 4 24 58 399 488

Fonte: Vide Tabela 3.13.

Ao examinar minuciosamente todos os assentos de pessoas registradas como pretas e

pardas, pode-se levantar suposies interessantes sobre o perodo do ps-abolio, no

Municpio de Nova Iguau. Devido criao de leis incentivadoras para os registros de

nascimentos, aparentemente, a parcela da populao que mais buscou legitimar seus filhos

foram os pais de pessoas registradas como pretas e pardas, sendo estes casados ou no.

Deveras, a partir dessas leis e decretos, foi possvel perceber a formao de famlias de pretos

e pardos estveis e estabilizados na Baixada Fluminense. Apesar da distribuio territorial

dessa populao, no Municpio de Nova Iguau, assemelhar-se ao processo de ps-abolio

britnico186, somente estudos sistemticos sobre a estrutura fundiria, o mercado de terras e a

forma de ocupao, permitiro avanar nessa discusso.

186
HOLT, Thomas. The Problem of Freedom: Race, Labor, and Politics in Jamaica and Britain, 1832-1938
Baltimore and London: Johns Hopkins University Press, 1992, captulo 5.
cliii

Os auto-declarantes

Nesta parte, sero analisados os auto-declarantes que se registraram no Cartrio de

Nova Iguau. Estes registros possuem uma especificidade significativa em relao aos outros.

Se nos registros anteriores foram os pais ou as mes que declaravam o que desejavam, nesse

momento eram as prprias pessoas que selecionavam o que ser assentado. Para alm desse

fator, estes registros so muito mais ricos de informaes, uma vez que h menes sobre o

local de nascimento, a profisso, o local de residncia, o local de casamento, entre outros.

Comparando a quantidade de registros auto-declarados com os registros tardios de

crianas, jovens e adultos registrados por outrem, o primeiro est em menor nmero. Dentre

os 1.832 registros tardios, 867 (47%) so de auto-declarantes (tabela 3.27). Dentre esse total,

os que se declararam pretos e pardos esto presentes em 513 (59%) registros. Isso demonstra

que tal grupo buscou, de forma contundente, o registro civil de nascimento. Ao separar a

quantidade de registros por cor e por ano, percebe-se um crescimento significativo entre os

anos de 1934 e 1939. Se no primeiro, apenas 201 (23%) pretos e pardos procuraram o registro

civil, no segundo ano, em questo, esse nmero subiu para 309 (35%).

Tabela 3.27 - Total de registros civis de nascimentos tardios de auto-declarantes por cor e ano. Municpio de
Nova Iguau.

Brancos No Informada Pardos e Pretos Total geral


1924 1 1 2
1929 4 1 2 7
1934 159 12 201 372
1939 169 8 309 487
Total geral 333 21 513 867

Fonte: Vide Tabela 3.13.

Dentre as pessoas que se auto-declararam no cartrio de Nova Iguau, priori, uma

boa parcela teve famlia constituda (tabela 3.28). Dentre os 513 registros de pretos e pardos,

infelizmente, em 307 (60%) no h qualquer informao sobre a situao conjugal dos pais.
cliv

Nos 206 registros restantes, a quantidade de pai e me casados so, ao todo, 159 (77%).

Declararam tambm haver, entre o pai e a me solteiros somados, 41 (19%) registros. No

obstante, h nmeros muito contraditrios no que condiz legitimidade destes auto-

declarantes. De acordo com a tabela 3.29, nos 513 registros, em 399 (78%), eles se

declararam como filhos legtimos, enquanto, em 109 (21%), disseram ser filhos naturais.

Por um lado, pode-se presumir que a maior parte dos auto-declarantes possuam famlias

estveis e nucleares. Por outro, preciso relembrar que, o empregado do cartrio obrigado a

registrar tudo aquilo que o declarante fala. Dessa forma, possvel notar que eram poucas as

pessoas que se declaravam como filhos naturais.

Tabela 3.28 - Situao conjugal por cor nos registros civis de nascimentos de nascimentos tardios de auto-
declarantes. Municpio de Nova Iguau.

Branca No Informada Pardos e Pretos Total geral


Casado 144 12 159 315
No Informado 170 8 307 485
Solteiro 14 1 41 57
Vivo 5 6 11
Total geral 333 21 513 867

Fonte: Vide Tabela 3.13.

Tabela 3.29 - Legitimidade por cor nos registros civis de nascimentos tardios de auto-declarantes. Municpio de
Nova Iguau.

Branca No Informada Pardos e pretos Total geral


Ilegtimo 1 1 2
Legtimo 306 19 399 724
No informado 2 1 4 7
Natural 24 1 109 135
Total geral 333 21 513 867

Fonte: Vide Tabela 3.13.

Em virtude do tipo de registro, detalhar as profisses do pai e da me tornou-se difcil.

Dentre os 513 registros, em 504 (98%), no informada a profisso do pai e, portanto, o tipo

de trabalho do pai aparece somente em 11 (2%) assentos (tabela 3.30). Deste total, 6 estavam

no trabalho na lavoura. O mesmo caso acontece com o detalhamento da profisso da me


clv

(tabela 3.31), pois somente em 28 (5%) registros so declarados as profisses destas, sendo 23

domsticas e 5 lavradoras.

Tabela 3.30 - Profisso do pai por cor nos registros civis de nascimentos tardios de auto-declarantes. Municpio
de Nova Iguau.

Branca No Informada Pardos e Pretos Total geral


Carpinteiro 1 1
Comerciante 1 1
Empregado ou funcionrio pblico 1 1 2
Lavrador 2 6 8
Mecnico 1 1
No declarada 327 20 504 851
Operrio 1 1 3
Pedreiro 1 1
Total geral 333 21 513 867

Fonte: Vide Tabela 3.13.

Tabela 3.31 - Profisso da me por cor nos registros civis de nascimentos tardios auto-declarantes. Municpio de
Nova Iguau.

Branca No Informada Pardas e Pretas Total geral


Domstica 15 23 39
Lavradora 1 5 6
No declarada 317 21 485 823
Total geral 333 21 513 867

Fonte: Vide Tabela 3.13.

Aparentemente, essa parcela da populao conheceu muito pouco dos seus avs. A

quantidade de pessoas, que no conheceram e nem souberam nomear todos os seus avs,

chegou ao nmero de 236 (46%) dos registros (tabela 3.32). Desse total de 513 registros, 22

(4%) conheceu apenas um av. Os que nomearam o av paterno foram 231 (45%) e a av

paterna 225 (44%). Nestes registros, os avs maternos foram menos citados do que nos

registros anteriores, ficando o av materno com 253 (49%) e a av materna com 277 (54%)

registros.
clvi

Tabela 3.32 - Presena de avs paternos e maternos de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros
civis de nascimentos tardios de auto-declarantes. Municpio de Nova Iguau.

Porcentagem Total
Av Paterno 45% 231
Av Paterna 44% 225
Av Materno 49% 253
Av Materna 54% 277
Todos os avs 44% 225
Nenhum dos avs 46% 236
Pelo menos um av 4% 22
Total de registros 513

Fonte: Vide Tabela 3.13.

Deveras, em comparao a todos os registros apresentados nesta dissertao, as

famlias, de onde os auto-declarantes so originrios, apresentam certa especificidade. A falta

de detalhamento da situao conjugal dos pais, das profisses dos pais e dos nomes avs,

priori, indica que estes tiveram uma ruptura precoce com a comunidade de origem. Mesmo

diante de tal quadro, preciso salientar os indcios de que estes provieram de comunidade

e/ou famlias estveis. Preliminarmente, lcito supor que so pessoas que, aparentemente,

deixaram seus pais e avs quando eram relativamente jovens. Para entender um pouco mais

esse grupo h de se dissec-lo.

Como j mencionado no incio desse subitem, a maior parte dos auto-declarantes se

registraram como pretos e pardos, e, provavelmente, possuam idade suficiente para se

registrar sem a presena dos pais. Ao analisar o ano do nascimento dos auto-declarantes em

relao ao ano de seu registro, percebe-se que estes eram, em boa parte, jovens e adultos.

Conforme fora analisado neste captulo, na tabela 3.27, quase todos os registros so feitos nos

anos de 1934 e 1939. Na figura 3.5, tomou-se, por base, o ano de 1934. Atravs da linha,

possvel acompanhar uma quantidade crescente de pessoas se auto-registrando, em 1934,

nascidas aps a dcada de 1900. O pico foi no ano de 1913 e, da em diante, apenas diminui,

chegando o ltimo registro, no ano de 1920. A figura 3.6 foi construda a partir dos registros
clvii

de auto-declarantes, em 1939. As pessoas nascidas, aps a dcada de 1910, aparentemente,

recorreram ao cartrio, tendo as nascidas, entre 1917 e 1918, as que mais procuraram se

registrar.

Figura 3.5 Ano de nascimento por regio de nascimento das pessoas que se auto-declararam no ano de 1934.
Municpio de Nova Iguau.

35

30

25

20

15

10

0
89

90

91

92

94

95

96

97

98

99

00

01

02

03

04

05

06

07

08

09

10

11

12

13

14

15

18

20
18

18

18

18

18

18

18

18

18

18

19

19

19

19

19

19

19

19

19

19

19

19

19

19

19

19

19

19
Dentro Baixada Fora Baixada Total geral

Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau, 1934.
clviii

Figura 3.6 - Ano de nascimento por regio de nascimento das pessoas que se auto-declararam no ano 1939.
Municpio de Nova Iguau.

40

35

30

25

20

15

10

0
81

82

83

86

87
88

89

90

91

92

93

94

95

96

97

98

99

00
01

02

03

04

05

06

07

08

09

10

11

12

13
14

15

16

17

18

19

20

21

22

23

28
18

18

18

18

18
18

18

18

18

18

18

18

18

18

18

18

18

19
19

19

19

19

19

19

19

19

19

19

19

19

19
19

19

19

19

19

19

19

19

19

19

19
Dentro Baixada Fora Baixada Total geral

Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau, 1939.

Ao analisar, separadamente, os registros de 1934 e de 1939, nas categorias faixa etria

por sexo, possvel perceber as caractersticas especficas dessa populao de pretos e pardos.

A figura 3.7 foi construda com todos os registros, de 1934, de pessoas que se declararam

pretas e pardas no cartrio de Nova Iguau. Nela, possvel observar que a maior parcela, que

buscou se registrar, era de homens entre 21 e 30 anos. A quantidade de mulheres, que se auto-

declararam, foi muito menor em relao a dos homens, no ano de 1934. Ao se examinar mais

detalhadamente o ano de 1939, chega-se a concluso de, que alm dos jovens e adultos, uma

outra parcela da populao de pretos e pardos buscou o registro. Na figura 3.8 a maior parte

dos que procuraram os registros civis de nascimento continuam sendo homens e adultos entre

21 e 30 anos. No entanto, comparando os dados do ano de 1934, as mulheres e as pessoas

acima dos 40 anos recorreram mais ao registro no ano de 1939.


clix

Figura 3.7 Faixa etria por sexo de pretos e pardos nos registros civis de nascimentos tardios de auto-
declarantes, 1934. Municpio de Nova Iguau.

61 - +

56 - 60

51 - 55

46 - 50

41 - 45

36 - 40

31 - 35

26 - 30

21 - 25

16 - 20

11 - 15

6 - 10

0-5

-120 -90 -60 -30 0 30 60 90 120

Feminino Masculino

Fonte: Vide Figura 3.5.

Figura 3.8 - Faixa etria por sexo de pretos e pardos nos registros civis de nascimentos tardios de auto-
declarantes, 1939. Municpio de Nova Iguau.

61 - +

56 - 60

51 - 55

46 - 50

41 - 45

36 - 40

31 - 35

26 - 30

21 - 25

16 - 20

11 - 15

6 - 10

0-5

-120 -90 -60 -30 0 30 60 90 120

Feminino Masculino

Fonte: Vide Figura 3.6.


clx

A aparente maior quantidade de homens, nos registros civis, no significa que estes

eram a maioria entre a populao do Municpio de Nova Iguau. Tanto que, de acordo com o

censo de 1940, a diferena entre homens e mulheres nesse municpio, dentre as 140.606

pessoas recenseadas, respectivamente de 71.855 (51%) e de 68.751 (49%), ou seja, h um

equilbrio entre os sexos, baseado no censo.

O notvel nmero de homens, presentes nos registros, provavelmente, indica que essas

pessoas buscaram o registro para terem acesso ao trabalho, visto que os novos arranjos de

trabalho, provenientes do avano urbano, podem ter exigido o registro civil.

Ao detalhar as profisses, onde esto alocados os auto-declarantes, percebe-se que

poucos se dedicaram agricultura. Na tabela 3.33, foi separada por sexo as profisses dos que

se declararam pretos e pardos. Dentre os 165 registros, nos quais so informadas as profisses

dos homens, 110 (67%) esto ligados a trabalhos de operrio, enquanto 15 (9%) so

comerciantes. O impressionante foi perceber que apenas 22 (13%) homens estavam ligados a

trabalhos de cultivo.

Tabela 3.33 Profisso por sexo de pessoas registradas como pretas e pardas nos registros civis de nascimentos
tardios de auto-declarantes. Municpio de Nova Iguau.

Feminino Masculino Total geral


Barbeiro 1 1
Chauffeur 1 1
Comerciante 15 15
Domstica 88 88
Empregado ou funcionrio pblico 6 6
Farmacutico 1 1
Lavrador 22 22
Martimo 1 1
Mecnico 1 1
Militar 1 1
Motorista 2 2
No declarada 28 232 260
Operrio 105 105
Pedreiro 4 4
Trabalhador 5 5
Total geral 116 397 513

Fonte: Vide tabela 3.13.


clxi

Ao analisar as regies de origem dos auto-declarantes, que se registraram como pretos

e pardos, e eram compostos em sua maior parte por homens em idade adulta, possvel

perceber a sua especificidade. Nas figuras 3.5 e 3.6 possvel observar que a maior parte dos

auto-declarantes so adultos e provenientes de fora da Baixada Fluminense. Em seguida, na

figura 3.9, buscou-se dividir a populao auto-declarante, em 1934, entre nascidos fora e

dentro da Baixada por faixa etria. Neste ano, praticamente, quase toda a populao de

pretos e pardos, que se registraram tardiamente, proveniente de fora do Municpio de Nova

Iguau. De uma forma semelhante, mas tendo suas singularidades, esse nmero de 1934 se

manteve nos registros de 1939 (figura 3.10). Ou seja, a maior parcela dos que procuraram se

auto-registrar possuam entre 21 e 30 anos e eram de fora da Baixada. O interessante foi

perceber que, nesse ltimo ano coletado, houve uma busca mais intensa pelo registro civil de

nascimento por uma parcela da populao proveniente de fora da Baixada que possua entre

40 e 60 anos.

Figura 3.9 - Faixa etria por regio de nascimento nos registros civis de nascimentos tardios auto-declarantes
pretos e pardos, em 1934. Municpio de Nova Iguau.

160

140

120

100

Dentro da Baixada
80
Fora da Baixada

60

40

20

0
11 - 15 16 - 20 21 - 25 26 - 30 31 - 35 36 - 40 41 - 45

Fonte: Vide Figura 3.5.


clxii

Figura 3.10 - Faixa etria por regio de nascimento nos registros civis de nascimentos tardios auto-declarantes
pretos e pardos, em 1939. Municpio de Nova Iguau.
120

100

80

Dentro Baixada
60
Fora Baixada

40

20

0
11 - 15 16 - 20 21 - 25 26 - 30 31 - 35 36 - 40 41 - 45 46 - 50 51 - 55 56 - 60

Fonte: Vide Figura 3.6.

Detalhando os locais de origem, percebe-se que uma boa parcela dos migrados veio

de uma regio especfica do Estado do Rio de Janeiro. Na tabela 3.34, dentre os 513 registros

de pretos e pardos, um total de 186 (36%) registros declararam o Vale do Paraba como o

local de nascimento. Aparentemente, nenhuma outra regio superou essa quantidade de

registros. Na tabela 3.35 (anexo), optou-se por colocar todos os locais de onde os auto-

declarantes saram. possvel perceber os municpios de Valena, Paraba do Sul, Vassouras

e Juiz de Fora como os que mais expulsaram populao, ao analisar os registros de 1934 e

1939. Dessa forma, a partir da tabela de locais de origem pode-se construir um mapa que

demonstra a migrao do Vale do Paraba em direo ao Municpio de Nova Iguau.


clxiii

Tabela 3.34 - Regio do nascimento por cor nos registros civis de nascimentos de auto-declarantes. Municpio
de Nova Iguau.

Branca No Informada Pardas e pretas Total geral


Alagas 1 1
Amazonas 1 1
Belford Roxo 3 16 19
Capital Federal 36 2 36 74
Distrito Federal 1 1
Duque de Caxias 2 2
Esprito Santo 1 1 2
Estado Rio de Janeiro 28 2 50 80
Estados do Brasil 15 2 12 29
Itagua 1 1 3 5
Mesquita 13 17 30
Minas Gerais 18 30 48
No declarada 4 6 10
No Localizado 3 3
Nilpolis 1 1
Nordeste 73 2 56 131
Nova Iguau (Sede) 34 1 44 79
Nova Iguau (interior) 22 2 34 58
Paracambi 2 3 5
Queimados 2 1 4 7
Rio de Janeiro 2 5 7
So Joo de Meriti 2 1 4 7
Vale do Paraba 74 7 186 268
Total geral 333 21 513 867

Fonte: Vide Tabela 3.13.

Ao examinar, mais profundamente, os registros das pessoas provindas do Vale do

Paraba, nota-se uma grande presena de homens na faixa etria prpria para o trabalho, entre

21 e 30 anos. Destes 186 registros, os migrados aparecem, em especfico, na categoria

operrio e trabalhador; so 43 (26%) registros. Nas outras profisses, a presena de tal grupo

pequena, destacando 9 lavradores e 6 comerciantes.

Ao analisar as regies de residncia, das pessoas que se registraram como pretas e

pardas, percebe-se a sua distribuio na Baixada Fluminense. Conforme a tabela 3.36, essa

populao estava estabilizada, principalmente, nas reas ao redor da sede do Municpio de

Nova Iguau. Em Belford Roxo, havia 24 pessoas, enquanto em Mesquita, 126 e, no interior

do municpio, 168.
clxiv

Focando somente os nascidos no Vale do Paraba, percebe-se, em princpio, que a

maior parte seguiu o ritmo da populao de pretos e pardos. Dentre os 186 registros, 120

(65%) residiram fora da sede do Municpio de Nova Iguau, enquanto uma pequena parcela,

66 (35%), conseguiu se estabilizar no distrito sede. Ao longo de toda pesquisa, pde-se

averiguar a quantidade de pretos e pardos que se estabilizaram no distrito de Mesquita. Para

entender um pouco mais lgica de migrao para esse distrito, seria necessrio estudos

direcionados diversificao do trabalho, s indstrias locais e principalmente, em relao ao

acesso terra.

Tabela 3.36 - Regio da residncia nos registros civis de nascimentos de auto-declarantes. Municpio de Nova
Iguau.

Branca No Informada Pardas e pretas Total geral


Belford Roxo 8 1 24 33
Capital Federal 1 1
Japeri 1 1
Mesquita 80 3 126 209
No declarada 49 9 64 122
Nova Iguau (sede) 101 3 130 234
Nova Iguau (interior) 93 4 168 265
Queimados 1 1
Vale do Paraba 1 1
Total geral 333 21 513 867

Fonte: Vide Tabela 3.13.

Efetivamente, conectando estes dados com os obtidos nas entrevistas do captulo 2,

pode-se chegar a suposies interessantes. Nesta parte, parece acertado afirmar que o perfil

das pessoas que buscaram se registrar, era de homens, jovens e adultos, entre 20 e 30 anos,

provindos de regies de fora da Baixada. Os que buscaram os registros, aparentemente,

nasceram entre os anos de 1900 e 1920. De forma semelhante, Ana Rios atravs da anlise de

duas famlias, percebeu que a maior parte dos descendentes de ex-escravos que migraram do
clxv

Vale do Paraba, eram maioria homens e nasceram entre esses mesmos anos de 1900 e 1920.
187

Na realidade, tanto nas entrevistas quanto nos registros, aparentemente, esta populao

evitou, de alguma forma, o trabalho com a lavoura. possvel que, o crescimento urbano com

terras baratas, em larga expanso nesse perodo, tenha motivado, concomitantemente, a

diversificao dos arranjos de trabalho, possibilitando, assim, a estabilizao dessa populao.

3.3 A busca pelo registro civil da populao de pretos e pardos na Era Vargas

Nesta ltima parte, ser analisada a importncia do Governo de Getlio Vargas para a

populao de pretos e pardos, na Baixada Fluminense. Para alcanar este objetivo, o presente

texto ser dividido em duas partes. Na primeira, ser feita uma discusso bibliogrfica sobre

esse tema, utilizando, principalmente, os textos de Ana Rios e de Hebe Mattos. Na segunda

parte, ser analisado o registro civil de nascimento do municpio de Nova Iguau. Trata-se,

aqui, de levantar questes sobre o aumento da busca ao registro civil, aps a entrada de

Vargas no governo.

***

Ao retornar s primeiras dcadas do sculo XX, percebe-se que, no meio rural, os

fazendeiros tentaram, de vrias maneiras, controlar e manter a mo-de-obra em suas

propriedades. De acordo com Rios, os contratos de trabalho entre fazendeiros e trabalhadores,

no Vale do Paraba, foram, na maioria das vezes, negociados informalmente. Mesmo em um

processo de negociao, os proprietrios mantiveram um controle direto sobre esses contratos,

187
RIOS, A. Histria Oral e Migrao um debate metodolgico. (mmeo)
clxvi

188
e no respeitavam a legislao existente. Assim como o contrato era rapidamente

acordado, tambm poderia ser facilmente quebrado.

Prximo dcada de 30, os desmandos dos fazendeiros sobre seus trabalhadores,

aparentemente, aumentaram consideravelmente. De acordo com Rios, desde 1888 e,

posteriormente, entrada do gado, os proprietrios tentaram fixar as normas de contrato de


189
acordo conforme o seu querer, construindo relaes de poder. Nos depoimentos coletados

por essa autora, houve casos em que os patres tentaram: restringir a movimentao dos

trabalhadores, interferir na privacidade das famlias e controlar os horrios. Quando se

sentiam prejudicados, por vezes, estes colocavam fogo na casa daqueles. Uma das solues

encontradas, por boa parte dessa populao, foi a migrao.

No que concerne ao campo poltico, os proprietrios tentaram se manter no poder,

atravs de coero populao local. Os fazendeiros alm de tentar limitar a liberdade

individual e a privacidade, esforaram-se para impor normas de moralidade, padres de

deferncia e lealdade. No votar no candidato do patro significava enfrent-lo diretamente,

sendo, possivelmente, as conseqncias desses atos, as mais terrveis. Com tal estratgia, os

proprietrios conseguiram, de certa forma, dominar as assemblias legislativas estaduais. No

entanto, a interveno do poder pblico federal no seria vista com bons olhos, uma vez que

poderia modificar significativamente a margem de manobra garantida pela fluidez de

contratos de boca e pelos inmeros aspectos relativos parte no monetria dos mesmos.
190
Qualquer tentativa de afirmar a legislao, ou de construir uma nova, aparentemente,

prejudicaria os proprietrios.

188
RIOS, A. & MATTOS, H. Memrias do Cativeiro: Famlia, Trabalho e Cidadania no Ps-Abolio. RJ: Ed.
Civilizao Brasileira, 2005. p. 247.
189
Ibid., p. 249.
190
RIOS, A e MATTOS, H op. cit., p. 148.
clxvii

Para os entrevistados do projeto Memrias do Cativeiro, tal situao mudou, quando

Vargas assumiu o poder. Nas anlises de Ana Rio de Hebe Mattos, elas demonstraram que nas

entrevistas de Cornlio e de Manoel Seabra, percebe-se um marco na memria entre o tempo

do cativeiro e o tempo da liberdade. Para estes dois, nascidos da primeira gerao aps a
191
abolio, o marco de ruptura, com a escravido, foi o Governo Vargas. Em suas

experincias pessoais, o referido governo conseguiu impedir os excessos criminosos, a


192
explorao do trabalho e a expulso dos trabalhadores das fazendas. De acordo com

Cornlio, Getlio teria cumprido a Lei.

Deveras, Vargas pode no ter conseguido manter uma situao estvel no campo,

porm, a presena do Estado passou a ser mais sentida entre proprietrios e trabalhadores.

Conforme Mattos, nas entrevistas realizadas com os descendentes de escravos, que

vivenciaram o perodo Vargas, foi possvel encontrar um determinado processo de

enquadramento da memria, facilmente identificvel com os trabalhos pedaggicos e


193
normalizadores do Estado Novo. De fato, a doao da legislao social por Vargas

marcou uma diviso de tempo na populao rural o tempo do cativeiro e o da liberdade.

Por mais que as aes de Vargas no estivessem direcionadas para o campo, o mundo

agrrio foi modificado durante seu Governo. certo que as leis trabalhistas de 1934 no

chegaram aos trabalhadores rurais; todavia, a emergncia de novos agentes de Estado fez com

que, aparentemente, o governo estivesse mais presente, e, em conseqncia disso,

representando, em alguns aspectos, a quebra da relao hierrquica presente. Desse modo, foi

possvel notar uma relativa independncia dos tribunais, em relao aos fazendeiros, assim

191
Ibid., p. 248 e MATTOS, H. Marcas da escravido: Biografia, Racializao e Memria do Cativeiro na
Historia do Brasil. Tese para professor Titular no Departamento de Historia da UFF. Niteri, 2004. p. 64. Para
uma leitura dos trechos importantes destas entrevistas ver o captulo Dilogo dos tempos, de RIOS, A. e
MATTOS, H op. cit., p. 127-129.
192
RIOS, A. e MATTOS, H. op. cit., p. 249.
193
MATTOS, H. op. cit., 2004, p. 62.
clxviii

como tornou mais acessvel a busca pelos servios pblicos, por exemplo, Hospitais, escolas,

entre outros. 194

Para alm da maior presena do Estado, outros elementos devem ser citados, no que

concerne modificao do mundo rural. O crescimento urbano, nas reas prximas ao Vale

do Paraba, ampliou a oferta de trabalho, atraindo parte dessa populao. Os parentes

migrados, que voltavam ou visitavam a comunidade de origem, podem ter funcionado


195
tambm como os receptores das polticas pedaggicas e culturais do Estado Novo. No

apenas as trocas entre mundo rural e urbano colaboraram neste sentido; ora, a ampliao dos

meios de comunicao, assim como os discursos no rdio, em princpio, influenciaram nas

mudanas ocorridas no campo. 196

Dessa forma, durante o Governo Vargas, a criao e a reafirmao de novos agentes

de estado, de novos meios de comunicao e o crescimento urbano, aparentemente,

garantiram os direitos dos trabalhadores. lcito supor que tais elementos aumentaram,

relativamente, a capacidade de enfrentamento aos fazendeiros, ao longo das dcadas de 30 e

40.

Mesmo diante das dificuldades, no Governo Vargas, a populao rural buscou os

mecanismos legais. Nesse sentido, em Nova Iguau, durante o seu governo, foi possvel

perceber a procura intensa pelos registros tardios de nascimentos. Entre essas pessoas

estavam, em boa parte, pretos e pardos, migrados de outras regies do Rio de Janeiro, em

destaque do Vale do Paraba. Para entender, um pouco melhor, de que forma esse governo

contribuiu para incentivar a busca pelo registro civil, dessa parcela da populao que

encontrou grandes dificuldades no campo, sero analisadas os registros civis de nascimentos

de Nova Iguau.

194
Ibid., p. 66.
195
Ibid., p. 67.
196
Idem.
clxix

Pretos e pardos nos registros civis - 1934 e 1939

Ao analisar todas as leis e decretos referentes regulamentao do registro civil, desde

sua efetivao, percebe-se que, entre 1930 e 1939, eles possuem uma caracterstica bem

especfica. Aps a lei de 2.887, de 25 de janeiro de 1914, citada na primeira parte deste

captulo, apenas 16 anos mais tarde novas leis, incentivadoras do registro civil de

nascimentos, seriam postas em prtica. De acordo com os dados, selecionados de cinco em

cinco anos, as primeiras investidas do governo, em 1914 e 1919, nesse sentido, no aparecem

na mostra analisada.

Ao entrar na dcada de 30, este quadro muda radicalmente. Em tal dcada o Decreto

19.425 ampliou, para quatro meses, o prazo dos registros de nascimentos ocorridos a mais de

30 quilmetros, sem comunicao ferroviria, do cartrio. 197 J em 1931, o decreto obrigou o

registro de nascimento, sem que fosse necessrio o pagamento de multas e a justificativa para
198
o registro tardio. No dia 24 de fevereiro de 1939, o decreto 1.116 parece ter acertado, no

que tange iniciativa ampliar o acesso da populao, ao registro civil. Nesse decreto, todos

que desejavam fazer o registro tardio foram anistiados da multa. O mesmo foi reforado, no

dia 29 de dezembro do referido ano, prorrogando o prazo para que, aqueles que no tivessem

se registrado, pudessem faz-lo. 199

Ao total, nesse perodo, foram promulgados 4 decretos e uma Lei em relao registro

civil, sendo a maior parte deles, como visto acima, direcionados regulamentao do registro

tardio. A investida do Governo Vargas, nessa populao que no havia recorrido ao registro

no tempo correto por lei, aparentemente, pde ser vista nos registros civis de nascimentos do

Municpio de Nova Iguau. Na tabela 3.13, apresentada na parte 3.2 deste captulo, dentre os

1.832 registros tardios, 1.750 (96%) foram realizados entre os anos de 1934 e 1939.

197
Decreto 19425 de 24/11/1930.
198
Decreto 19710 de 18/02/1931.
199
Decreto 1116 de 24/02/1939 e Lei 1929 de 29/12/1939.
clxx

As leis e os decretos, do registro civil entre 30 e 39, buscavam incentivar as pessoas a

se registrarem, porm um grupo, em especfico, recorreu mais do que os outros. Na figura

3.11, colocou-se todos os registros de crianas registradas de acordo com a lei, ou seja,

registradas no ano do nascimento, feitos de 1889 a 1939. Como possvel observar, entre os

anos de 1919 a 1939, no que tange s crianas brancas, os pais das pretas e pardas recorreram,

em comparao, em menor quantidade ao registro civil.

Figura 3.11 Registros realizados no ano de nascimento da criana por cor e ano. Municpio de Nova Iguau.

600

500

400

Branca
Outras cores
300
No Informada
Pardas e pretas

200

100

0
1889 1894 1899 1904 1909 1914 1919 1924 1929 1934 1939

Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau. 1889,
1894, 1899, 1904, 1909, 1914, 1919, 1924, 1929, 1934 e 1939.

No obstante, ao olhar a figura 3.12, comparando os mesmo anos, verifica-se que,

aps 1934, entre as pessoas, as quais buscaram registrar seus filhos e se registrar tardiamente,

utilizando-se das leis e decretos promulgados, a maioria era composta por pretos e pardos.
clxxi

Figura 3.12 Registros tardios por cor e ano. Municpio de Nova Iguau.

800

700

600

500

Branca
Outras cores
400
No Informada
Pardas e Pretas

300

200

100

0
1919 1924 1929 1934 1939

Fonte: Vide Figura 3.11.

Ao analisar o local e a regio de nascimento das crianas pretas e pardas, registradas

no Municpio de Nova Iguau percebe-se uma grande diferena entre os registros feitos no

prprio ano de nascimento e os tardios (tabela 3.37). No primeiro caso, somando-se as

crianas nascidas dentro da Baixada Fluminense entre 1919 e 1939, tm-se 1.524 (97%) dos

1.569 registros, sobrando 20 (1%) para as nascidas fora do Municpio de Nova Iguau.

Em contrapartida, ao analisar todos os registros tardios, percebe-se que, dentre os

1.001 registros, os de pessoas nascidas, no Municpio de Nova Iguau, so 425 (42%), ao

mesmo tempo em que os nascidos fora contabilizam 554 (55%) (tabela 3.38).

Em virtude da quantidade de subregistro, no possvel chegar a concluses

definitivas, contudo, pelos dados, pode-se apresentar algumas tendncias. As leis e os

decretos promulgados, aps 1930, aparentemente, levaram, ao registro civil, uma maior

quantidade de pretos e pardos, os quais legitimaram suas relaes e sua prole, mesmo que

tardiamente. Dentre estes, a maior parte era provinda de outras regies, que no o Municpio
clxxii

de Nova Iguau; destaca-se, para isso o Vale do Paraba que, dentre os 1.001 registros, 283

(28%) eram dessa regio e a Capital Federal que tinha 74 (7%) pessoas.

Tabela 3.37 - Regio de nascimento das crianas registradas no ano de seu nascimento por cor. Municpio de
Nova Iguau.

Branca Outras cores No Informada Pardas e pretas Total geral


Belford Roxo 128 2 3 209 342
Capital Federal 2 3 5
Duque de Caxias 3 1 29 33
Estado Rio de Janeiro 1 5 6
Mesquita 297 1 6 302 606
Minas Gerais 1 6 7
No declarada 39 1 2 21 63
No Localizado 4 4
Nilpolis 2 2
Nova Iguau (sede) 945 5 9 484 1443
Nova Iguau (interior) 563 5 6 492 1066
Paracambi 1 1
Queimados 3 3 6
So Joo de Meriti 3 3
Vale do Paraba 2 6 8
Total geral 1985 15 26 1569 3595

Fonte: Vide figura 3.11.

Por causa da natureza dos registros, torna-se difcil alcanar tambm maiores

concluses, sobre a formao familiar em cada tipo de registro. O problema principal est no

registro tardio, o qual se divide entre os de crianas, jovens e adultos registrados por outrem e

os auto-declarantes. Ao tentar procurar a situao conjugal e a profisso do pai, neste segundo

tipo de registro, a quantidade de referncias muito pequena.

Porm, buscando analisar a influncia do Governo Vargas, na ampliao da busca pelo

registro civil, pela populao de pretos e pardos, quando se separa estes registros um

panorama muito interessante surge. Dos 1.832 registros tardios, 965 (53%) so de pessoas

registradas por outrem, enquanto os auto-declarantes somam 867 (47%). Comparativamente,

os dados presentes, em cada um destes registros, diferem de forma peculiar (tabelas 3.19 e

3.31). No primeiro, a quantidade de registros, onde o pai referido, expressiva, uma vez

que, dentre os 488 registros de crianas pretas e pardas, ele est presente em 217 (44%); e, na
clxxiii

maior parte, esto concentrados no trabalho de lavoura, 86 (40%). J nos auto-declarantes, a

referncia ao pai aparece somente em 9 (2%) dos 513 registros. Destes, 6 trabalham

especificamente na lavoura.

Tabela 3.38 - Regio de nascimento por cor das pessoas registradas fora do ano de seu nascimento (tardios).
Municpio de Nova Iguau.

Branca Outras cores No Informada Pardas e pretas Total geral


Alagas 1 1
Amazonas 1 1
Belford Roxo 17 47 64
Capital Federal 91 2 73 166
Distrito Federal 1 1
Duque de Caxias 3 1 4
Esprito Santo 1 1 2
Estado Rio de Janeiro 48 2 62 112
Estados do Brasil 22 2 19 43
Itagua 1 1 3 5
Mesquita 69 76 145
Minas Gerais 25 46 71
No declarada 6 9 15
No Localizado 4 4
Nilpolis 10 9 19
Nordeste 98 2 59 159
Nova Iguau (sede) 194 3 140 337
Nova Iguau (interior) 82 2 139 223
Paracambi 2 4 6
Queimados 4 1 9 14
Rio de Janeiro 2 6 8
So Joo de Meriti 3 1 9 13
Vale do Paraba 128 1 7 283 419
Total geral 807 1 23 1001 1832

Fonte: Vide Figura 3.11.

Nos assentos de auto-declarantes, a profisso do pai aparece em menor nmero,

entretanto, h informaes complementares nesses registros. Na tabela 3.34, dentre os 397

registros, em apenas 165 (42%), mostram as profisses dos auto-declarantes. Estes 22 (13%)

so lavradores, enquanto um nmero surpreendente de 110 (64%) pessoas so de operrios e

trabalhadores. Ao analisar as profisses de pessoas, que se declararam pretos e pardos por

ano, na tabela 3.39, percebe-se que, em 1934, a categoria operrio aparece de forma

contundente.
clxxiv

Tabela 3.39 - Profisso das pessoas que se auto-declararam por ano. Municpio de Nova Iguau.

1924 1929 1934 1939 Total geral


Barbeiro 1 1
Chauffeur 1 1
Comerciante 7 8 15
Empregado ou funcionrio pblico 6 6
Farmacutico 1 1
Lavrador 20 2 22
Martimo 1 1
Mecnico 1 1
Militar 1 1
Motorista 2 2
No declarada 1 2 42 187 232
Operrio 86 19 105
Pedreiro 4 4
Trabalhador 5 5
Total geral 1 2 177 217 397

Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau. 1924,
1929, 1934 e 1939.

Na Baixada Fluminense, aparentemente, as leis ps-30 incentivaram um grupo

especfico de pessoas na fase adulta e provindas de outras regies do Estado a buscar o

registro civil de nascimento. Embora em 1939 tivesse mais auto-registros do que em 1934, os

registros deste ano eram muito mais completos do que nos outros anos. Coincidncia ou no,

no mesmo ano de 1934, quando foi promulgada a nova constituio de Vargas e as Leis

trabalhistas a quantidade de operrios e de trabalhadores, presente nos assentos dos auto-

declarantes, alta.

De certo modo, essas leis e decretos, na dcada de 1930, permitiram a essa parcela da

populao, formada em sua maioria de pretos e pardos, que estava em busca de trabalho ter

maior acesso ao registro civil de nascimento. Nesta dcada, ao examinar com ateno, tanto o

Vale do Paraba quanto a Capital Federal, percebe-se que, nesses lugares o momento, muito

delicado para tal parcela da populao. No Vale do Paraba a introduo do gado e os

desmandos senhoriais podem ter expulsado essa mo-de-obra para fora da regio. J na

Capital Federal, de acordo com Fisher, a populao de pretos e pardos, que era moradora de

reas mais pobres do centro do Rio de Janeiro, teve de abandonar suas casas. Para esse autor,
clxxv

isso ocorreu devido ao crescimento urbano e ao aumento dos conflitos com os polticos, que

almejavam, a todo custo, o xodo moradores pobres das favelas. De acordo com este autor o

simples fato da discriminao contra os pobres, contra os que desconheciam as leis e os

politicamente fracos traduzia-se no agravamento da segregao racial. 200

Deveras, a situao na Baixada Fluminense, na dcada de 30n era de extrema

expanso urbana e de diversificao dos arranjos de trabalho. Aparentemente, nessa regio, no

citado perodo, os conflitos entre polticos e/ou proprietrios e trabalhadores no foram

percebidos. Neste sentido, o Municpio de Nova Iguau pode ter funcionado como vlvula de

escape destas duas regies, uma vez que a quantidade de registros de pessoas pretas e pardas

vindas do Vale do Paraba e da Capital Federal, significativa. Ainda necessrio estudos

sistemticos sobre a ao do governo de Vargas na Baixada; todavia, pode-se presumir que a

aparente falta de polticas pblicas direcionadas para essa regio, contraditoriamente, tenha

colaborado para a estabilizao de pretos e pardos, oriundo de outras regies em crise, entre

1920 e 1940.

200
FISHER, Brodwyn Partindo a cidade maravilhosa. In: GOMES, Flvio Santos (ORGS.) e CUNHA, Olvia M.
G. Quase-Cidado: histrias e antropologias da ps-emancipao no Brasil. Rio de Janeiro: FGV, 2007. p. 447.
clxxvi

Concluso

Tomar a deciso de abandonar a casa, a famlia, os parentes e os amigos,

provavelmente, deve ser uma das mais difceis da vida de uma pessoas. No deve ser fcil

optar ir para um lugar onde no h qualquer relao social construda, onde no mais filho,

neto e afilhado de algum conhecido na regio, onde no reconhecido por ser um bom

trabalhador e principalmente onde no h qualquer pessoa que o ajude em uma situao de

crise. Enfim, migrar, aparentemente, uma situao limite que visa ajudar a famlia de origem

em primeiro lugar, e, em seguida, manter a sua sobrevivncia. Contudo, a deciso de migrar

no tomada a esmo. No se migra sem ter a certeza de que possvel, no lugar escolhido,

obter recursos para si e para a sua famlia.

No Vale do Paraba, a situao econmica, poltica e social no favoreceu a

estabilizao dos descendentes de libertos, ao longo do sculo XX. Apesar dos ltimos anos

de escravido ter sido conturbado, com fugas em massa, os recm-libertos conseguiram de

alguma forma, mesmo que instvel, permanecer no campo nos primeiros anos do perodo do

ps-abolio. Com a pequena roa, seja doada por patres, ou concedidos por proprietrios

em troca de trabalhos na Turma, aparentemente, boa parte da populao provinda da

escravido conseguiu se manter no Vale do Paraba. Contudo, com o declnio do caf e da

entrada de novos tipos de produo, como o gado e o eucalipto, os descendentes de libertos

no encontraram a mesma situao que seus pais, no perodo do ps-abolio.

Esses novos tipos de produo exigiam menos trabalho coletivo e mais terra. A

diminuio de oferta da pequena roa e a falta de emprego nas grandes propriedades no

permitiu, a boa parte, a solidificao de um dos principais significados de liberdade

empreendidos por ex-escravos e seus descendentes: aliar o trabalho assalariado nas grandes

propriedades com produo independente para subsistncia e venda de excedentes nos


clxxvii

mercados locais. Consequentemente, uma das estratgias, encontradas por essa parcela da

populao, foi a migrao para diversos lugares dentro do Vale do Paraba e para outras

regies do Estado do Rio de Janeiro, em destaque, os centros urbanos em crescimento.

Ao mesmo tempo em que o Vale do Paraba entrava em um processo de crise

econmica, que expulsou mo-de-obra, em outras regies do Rio de Janeiro, novas

produes comeavam a ganhar destaque internacional. Na presente dissertao, optou-se por

estudar o processo de crescimento econmico e urbano da Baixada Fluminense, em destaque

para o Municpio de Nova Iguau. Essa escolha foi embasada pelas entrevistas do acervo

Memrias do Cativeiro as quais, em sua grande maioria, h menes de parentes que

migraram, sazonalmente e permanentemente, para a Baixada Fluminense. Para alm da

anlise qualitativa, buscou-se, tambm, discutir quantitativamente esse processo.

Os libertos e seus descendentes, no perodo do ps-abolio, procuraram legitimar as

suas relaes familiares e sociais. Tanto no Vale do Paraba como no Municpio de Nova

Iguau, pretos e pardos estavam presentes nos registros civis. O ato de registrar os filhos e a

si, pressupe que esses estivessem estabilizados na regio. Estabilizado no significa dizer,

automaticamente, que possuam famlia nuclear formada, pois entre os registros civis

encontrados, uma parte significativa das crianas, registradas como pretas e pardas, eram

filhos de mes solteiras. Dessa forma, com a presena da categoria cor, em quase todos os

registros, foi possvel perceber a formao familiar de pretos e pardos, no municpio de Nova

Iguau, no perodo do ps-abolio.

Na dcada de 1930, a produo de laranjas na sede do Municpio de Nova Iguau

chegou ao seu auge. Desde 1896, quando da primeira exportao de laranjas para os pases do

sul da Amrica, esse tipo de produo ganhou destaque no Estado do Rio de Janeiro. Na

virada do sculo, com a crise do caf e da cana-de-acar na Baixada Fluminense, os

latifndios comearam a ser divididos, e deram origem a mdias e pequenas propriedades. A


clxxviii

chcara era o terreno ideal para a plantao de laranjas. Apesar de necessitar de uma rea

pequena para a sua produo, no se sabe ao certo o valor para se iniciar, no entanto,

possvel afirmar que no estava acessvel a todos. Tanto que, as maiores empresas nesse ramo,

na regio, estavam nas mos de imigrantes europeus, principalmente, portugueses e

espanhis.

O crescimento econmico, em virtude das laranjas, trouxe conseqncias importantes

para a regio, como o crescimento urbano e a diversificao dos arranjos de trabalho. Nos

censos foi surpreendente acompanhar o aumento da populao no Municpio de Nova Iguau

nas primeiras dcadas do sculo XX. De 33.396 pessoas recenseadas em 1920, esse nmero

saltou para 140.606 em 1940. Aparentemente, a combinao entre a necessidade de mo-de-

obra nas chcaras de laranja e nos setores ligados a ela, aliada ao crescimento urbano, com

propriedades baratas, ao entorno das regies produtores, levaram Baixada Fluminense uma

quantidade significativa de pessoas.

Se, efetivamente, no perodo do ps-abolio, na Baixada, no foi possvel formar

famlias extensas e estveis, o panorama da dcada de 30 contribuiu para essa estabilizao. O

aumento pela procura do registro civil, aps esses anos, demonstra que nesse momento as

famlias comearam a se tornar estveis na regio. No apenas as famlias nucleares

completas procuraram legitimar seus filhos, as incompletas, com mes solteiras, participaram

ativamente na busca pelo registro civil. Da mesma forma, os nmeros encontrados aps 1930,

no Municpio de Nova Iguau, assemelhavam-se aos de Ana Rios para Paraba do Sul para o

perodo imediato do ps-abolio. O pai estava mais presente nos registros, assim como

estavam mais espalhados entre os diversos arranjos de trabalhos. No entanto, a singularidade

dos registros consistia na existncia de uma quantidade considervel de pais, registrando seus

filhos, de origem de fora da Baixada.


clxxix

Nessa mesma dcada, de 1930, Getlio Vargas assumiu o poder e, posteriormente,

promulgou Leis e Decretos, que incentivavam a busca pelo registro civil de nascimento tardio.

Sem o dever de pagar multa pelo atraso do registro, em Nova Iguau, um grupo especfico

buscou o registro civil, nesse perodo. Na coleta de dados no cartrio dessa regio, foi

possvel encontrar dois tipos de registros tardios: o registro tardio de crianas, jovens e

adultos declarados por outrem e os registros nos quais as pessoas auto-declaravam seu

nascimento. Nos dois casos foi impressionante ver a quantidade de pretos e pardos que

buscaram o registro Civil.

No primeiro caso, o registro tardio de crianas, jovens e adultos declarados por

outrem, os pais no mediram esforos para registrar os seus filhos. A maior parte dos registros

eram de crianas entre 0 e 5 anos, registradas como pretas e pardas e nascidas no prprio

Municpio de Nova Iguau. Contudo, ao olhar atentamente para as faixas etrias de 15 a 30

anos, percebe-se que a maioria nasceu em regies fora da Baixada Fluminense. Destaca-se,

nesse caso, as pessoas nascidas na regio do Vale do Paraba e que foram registradas,

provavelmente quando seus familiares estavam estveis, no Cartrio de Nova Iguau.

A singularidade, da presente dissertao, consiste na anlise dos registros tardios dos

auto-declarantes. Declararam, nos registros civis de nascimento do Cartrio de Nova Iguau,

ser, em sua maioria, pretos e pardos. De acordo com o ano de seu nascimento estavam entre

os 21 e 30 anos, a idade do trabalho. Dedicavam-se aos empregos ligados ao avano urbano,

como operrios e trabalhadores. Esse grupo especfico, de pessoas que buscou se registrarem

no cartrio, era de fora da Baixada Fluminense, e, uma parte significativa, veio do Vale do

Paraba. Aparentemente, conseguiram se estabilizar, aps o processo de migrao, nas reas

ao entorno da sede de Nova Iguau, onde, provavelmente, as propriedades eram mais baratas

e permitia aliar plantao de subsistncia e venda de excedentes nos mercados locais com

trabalho assalariado.
clxxx

A busca pelo registro civil, na idade adulta, pode estar ligada ao perodo Varguista.

Aps 1934 foi intensa a quantidade de pessoas se registrando como operrios e trabalhadores,

no cartrio de Nova Iguau. Os diversos empregos, abertos na Baixada, podem ter exigido a

carteira de trabalho e com ela a identidade civil, atravs da certido de nascimento. Desse

modo, as leis trabalhistas e a criao da carteira de trabalho podem ter incentivado esse grupo,

de pretos e pardos provindos do Vale do Paraba, se registrar.

Efetivamente, durante o perodo estudado, 1888 a 1940, a regio da Baixada

Fluminense cresceu, ampliando a possibilidade de adquirir terras e diversificando os arranjos

de trabalho. Aparentemente, essa regio serviu como vlvula de escape tanto do Vale do

Paraba, que estava expulsando pessoas, como do centro do Rio de Janeiro que passava por

um perodo de reformas, e estava retirando a populao pobre, das favelas e dos cortios.

Sendo assim, no Municpio de Nova Iguau, onde na dcada de 40 comeava os grandes

loteamentos de terra, provavelmente, foi assentada nas regies ao entorno da sede essa

populao mais pobre, formada em sua maioria por pretos e pardos.

Migrar para muitas famlias, como as encontradas durante a pesquisa, significou uma

mudana radical de vida. Efetivamente, a maior parte das histrias, mencionadas nesta

dissertao, falam de sucesso nesse empreendimento, mas tambm apresentam um carter

negativo, uma vez que, muitas famlias entrevistadas no sabem, at os dias de hoje, o

paradeiro dos seus parentes migrados. A margem de erro dessa populao era muito pequena,

no entanto, se no conseguisse obter sucesso, no empreendimento da migrao, em ltimo

caso havia a possibilidade de se retornar para a famlia no campo.


clxxxi

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35, 36, 47, 48, 39, 50, 58, 59, 60 e 61. Nos seguintes anos: 1889, 1894, 1899, 1904,

1909, 1914, 1919, 1924, 1929, 1934 e 1939.

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clxxxvi

ANEXOS
clxxxvii

Anexo - I
Captulo 1

Tabelas

Tabela 1.3 Populao por ano segundo os censos. Paraba do Sul, Valena, Vassouras, Iguass e Estrella.

1872 1890 1920 1940


Paraba do Sul201 37461 27351 52474 50605
Valena 47131 33623 41389 36748
Vassouras 38253 36483 59551 51632
Baixada 202 31251 27083 33396 140606

Fonte: Censos de 1872, 1890, 1920 e 1940.

Tabela A.1 Propriedades por distrito, 1927. Municpio de Nova Iguau.

Nova Iguau 35
Sarapu 3
Rocha Sorinho 2
Sede 16
Morro Agudo 3
Belford Roxo 7
Mesquita 3
Austin 1

Queimados 7
Queimados (centro) 6
So Pedro 1

Cava 8
Tingu 3
Retiro 4
So Bernardino 1

Meriti 21
Meriti (centro) 18
So Matheus 3

Estrella 22
Estrella (centro) 18
Xerm 4

Nilpolis 6
Bonfim 5

Fonte: Diretoria de Agricultura RJ, 1927.

201
Em 1940 foi somado o Municpio de Entre Rios
202
Em 1872 foi somada o Municpio de Estrella com o Municpio de Iguass que atualmente configuram a
Regio Metropolitana do Rio de Janeiro.
clxxxviii

Tabela A.2 Profisso do pai de crianas registradas tardiamente como pretas e pardas. Municpio de Nova
Iguau.

Total
Aougueiro 2
Administrador 1
Agricultor 3
Ajudante 2
Alfaiate 2
Armador 1
Artista 8
Bombeiro Hidraulico 1
Carpinteiro 11
Carvoeiro 2
Chauffeur 10
Comerciante 44
Eletricista 5
Empregado 1
Empregado da Estrada de Ferro Rio D`ouro 3
Empregado do comrcio 1
Empregado do Departamendo Nacional de Sade Pblic 5
Empregado municipal 7
Empregado ou funcionrio publico 205
Estrada de Ferro Central do Brasil 2
Farmacutico 1
Ferreiro 3
Ferrovirio 1
Florista 1
Foguista 1
Funcionrio da Justia 1
Grfico 1
Industrial 1
Jardineiro 1
Jornaleiro 28
Jurista 1
Lavrador 498
Light 4
Lustrador 1
maquinista 1
Marceneiro 3
Marinheiro Nacional 4
Maritimo 1
Mecnico 5
Militar 16
Mortorneiro 1
Motorista 3
Negociante 9
Operrio 245
Padeiro 2
Pedreiro 36
Pintor 6
Pirotcnico 2
Prottico Dentrio 1
Sapateiro 2
Trabalhador 9
clxxxix

Trabalhador da Prefeitura do DF 1
Total geral 1206

Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau. 1924,
1929, 1934 e 1939.

Tabela 3.4 Profisso do pai por cor nos registros civis de nascimentos, 1939. Municpio de Nova Iguau.

Branca No Informada Pardas e pretas Total geral


Aougueiro 1 1
Agricultor 5 5
Ajudante 2 2
Alfaiate 1 2 3
Ambulante 1 1
Aposentado 1 1
Armador 1 1
Auxiliar de Carista 1 1
Barbeiro 6 6
Bombeiro 2 2
Bombeiro Hidraulico 2 2
carpinteiro 12 4 16
Cetricultor 1 1
Chauffeur 3 4 7
Comerciante 76 18 94
Condutor 2 2
Contador 1 1
Cozinheiro 1 1
Despachante 1 1
Educador 1 1
Eletricista 4 2 6
Empregado do Departamendo Nacional de Sade Pblic 5 5
Empregado Estadual 2 2
Empregado municipal 5 5
Empregado ou funcionrio publico 47 57 104
Escultor 1 1
Estucador 3 3
Ferreiro 1 1
Ferrovirio 1 1
Funcionrio da Justia 1 1
Funcionrio do Ministrio da Guerra 1 1
Grfico 2 1 3
Guarda-Livros 2 2
Industrial 1 1 2
Jardineiro 1 1
Lavrador 141 181 322
Light 5 5
Marceneiro 1 1
Marinheiro Nacional 2 1 3
Maritimo 1 1
Mecnico 13 1 14
Mdico 2 2
Militar 11 6 17
Mortorneiro 1 1 2
Motorista 12 12
cxc

No declarada 497 8 702 1207


Negociante 7 2 9
Operador 1 1
Operrio 52 1 114 167
Padeiro 1 1
Pedreiro 8 1 10 19
Pintor 3 2 5
Pirotcnico 2 2 4
Policia Militar 1 1
Professor 2 2
Proprietrio 2 2
Prottico Dentrio 1 1
Relojoeiro 1 1
Sapateiro 1 1
Serventurio Municipal 1 1
Tintureiro 1 1
Trabalhador 2 7 9
Trabalhador Braal 1 1
Vendedor Pracista 1 1
Total geral 960 10 1130 2100

Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau. 1939.
cxci

Tabela 3.18 Profisso do Pai por cor nos registros civis de nascimento tardios de crianas, jovens e adultos
declarados por outrem. Municpio de Nova Iguau.

Branca Outras cores No Informada Pardas e pretas Total geral


Aougueiro 1 1
Agricultor 3 3
Ajudante 1 1
alfaiate 2 2
Aposentado 1 1
Barbeiro 2 2
Bombeiro Hidraulico 1 1
carpinteiro 1 3 4
Chauffeur 2 2
Comerciante 36 13 49
Condutor 1 1
Cozinheiro 1 1
Educador 1 1
Eletricista 4 4
Empregado 1 1
Empregado do Departamendo Nacional de Sade Pblic 4 4
Empregado Estadual 2 2
Empregado municipal 3 2 5
Empregado ou funcionrio publico 33 34 67
Escultor 1 1
Estucador 2 2
Ferreiro 1 1
Foguista 1 1
Funcionrio da Justia 1 1
Grfico 1 1
Guarda-Livros 2 2
Industrial 1 1
Jornaleiro 1 1
Lavrador 59 1 86 146
Light 2 2
Marceneiro 1 1
Mecnico 4 4
Mdico 1 1
Militar 1 3 4
Mortorneiro 1 1
Motorista 3 3
No declarada 243 1 1 271 516
Negociante 5 1 6
Operrio 33 56 88
Padeiro 1 1
Pedreiro 6 4 10
Pintor 3 3
Pirotcnico 1 1
Professor 1 1
Proprietrio 7 7
Sapateiro 3 3
Trabalhador 3 3
Total geral 474 1 2 488 964

Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau. 1919,
1924, 1929, 1934 e 1939.
cxcii

Tabela 3.35 Locais de Nascimento no Vale do Paraba nos registros civis de nascimentos dos auto-declarantes.

Total
Alm Paraba 3
Amparo 1
Aparecida do Norte 1
Bananal 1
Barbacena 3
Barra do Pira 8
Barra Mansa 5
Belmiro Braga 1
Bicas 1
Bom Jardim 1
Cambuci 2
Cantagalo 6
Carmo 2
Conservatria 3
Cordeiro 1
Fazenda Boa Vista 1
Fazenda de Santa Ceclia 1
Fazenda de Santa Clara 1
Friburgo 1
Ipiabas 3
Itabopoana 1
Itaocara 2
Itaperuna 4
Itatiaia 1
Jacare 1
Juiz de Fora 12
Juparau 2
Juparau 1
Leopoldina 2
Lima Duarte 8
Mar de Espanha 3
Marip 1
Mendes 2
Miguel Pereira 1
Miracema 2
Monte Verde 1
Muria 1
Paraba do Sul 16
Paty de Alferes 6
Petrpolis 3
Pira 3
Porto das Flores 3
Porto Novo do Cunha 3
Quatis 2
Resende 1
Rio Claro 2
Rio Novo 1
Rio Preto 3
SantAnna de Palmeiras 1
Santa Isabel do Rio Preto 3
Santa Rita de Jacutinga 4
So Francisco de Paula 1
cxciii

So Joo Marcos 5
So Jos do Rio Preto 3
Sapucaia 5
Ub 1
Valena 16
Vassouras 13
Total geral 186

Fonte: Ofcio de Registro Civil das Pessoais Naturais da 1 Circunscrio do Municpio de Nova Iguau. 1919,
1924, 1929, 1934 e 1939.
cxciv

ANEXOS II

Passagem da entrevista no qual Izaquiel conta sobre o momento que reencontrou seu

sobrinho.

- E a Melinda?

- Melinda foi pro Rio, ficou l no Rio, deixou a menina, a menina morreu.

- Que idade que ela tinha quando a menina nasceu?

- No sei a idade que ela tinha no, eu era pequeno, era garoto.

- E ela foi pro Rio, o Ormindo j estava l ou no?

- No, o Ormindo era solteiro, quando ela foi pro Rio.

- Ento ela foi a primeira a ir pro Rio?

- Foi ela e foi uma irm, essa tal de Maria.

- Foram as duas?

- As duas foram pro Rio, foi uma pessoa daqui, foi por intermdio de uma pessoa que ela foi

se empregar, foi empregar em um lugar, que no sei onde, o nome Laranjeira, e a por l,

minha irm veio e ela no veio, diz que no queria vir aqui mais no, para roa, ficou por l.

Minha irm veio e ela no veio. Depois ento no escreveu mais, papai procurava, mandou

colocar no jornal, que ela sumiu e ela no aparecia de jeito nenhum, depois ento minha me

morreu, chorava sempre por causa dela, meu pai tambm morreu, sem saber. Depois um dia

ela precisou l de documento, documento no Rio, pra tirar documento pra ela, a falou com

filho dela, a ela j tinha filho no Rio, j era casada e tinha filho, filho de um portugus no Rio

e falou com ele que viesse aqui em Paraba do Sul, para ir no cartrio, para tirar o documento

de idade aqui no cartrio, que era para ela poder tirar l o documento no Rio. Depois ele

chegando aqui, eu trabalha na estao, eu trabalhava na estao, nessa poca eu trabalhava na


cxcv

estao, a ele chegando aqui, quando ele falou o meu nome l com a escrivona, ela me

conhece muito, me conhecia, ela j morreu a escrivona, morreu em Niteri, ela falou assim:

essa pessoa que essa pessoa que voc est procurando por aqui, tem parente aqui, voc tem

parente por aqui, por esse sobrenome que voc me deu. A a escrivona falou para ele assim:

Escuta, voc no tem parente aqui em Paraba? No sei, eu nunca vim aqui, vim aqui pela

primeira vez. Ela falou assim: olha, voc tem parente aqui em Paraba, porque tem um

rapaz que trabalha na estao aqui em Paraba, que deve ser parente da sua me, mas voc

pergunta l estao, quem sabe, mas antes...agora eu posso abrir o cartrio que muito cedo,

mas depois eu posso ir l abrir o cartrio, quando foi um meio-dia, voc vem, mas agora no

posso abrir o cartrio. Porque ensinaram para ele onde era a casa dela, a ele foi na casa dela

e falou com ela, aqui em Paraba. A ele falou: depois eu posso ir l tirar, chamava ris

Prado da Silveira, o nome dela.

A ele foi veio na estao e perguntou se no tinha essa pessoa por aqui. Essa pessoa chama,

j fiz dois casamentos dele aqui, chama Izaquiel, Izaquiel o nome dele, voc procura l na

estao, ele guarda na estao, voc procura ele que capaz dele estar l estao, se no

tiver eles sabem onde mora. A ele veio na estao e perguntou, mas eu tinha sado naquela

hora do pernoite da estao, chegando l o agente falou com ele: trabalha sim, ele chama

Izaquiel. Pois , eu queria saber onde que ele mora. Ah, ele mora aqui pra baixo, voc

desce aqui pra baixo pelo lado da Cermica DAngelo, praquele lado, voc pergunta por ali,

que voc vai na casa dele. A ele veio, ele veio direitinho, chegando na Cermica ele

perguntou, a informaram onde eu morava, mas eu j tinha vindo em casa e voltei para

Paraba outra vez, eu estava de bicicleta, naquele tempo eu gostava de andar com um chapu

preto, da fita branca, boiadeiro, ento ele encontrou comigo, bem, veio em casa, na minha

casa, chegou na minha casa minha filha atendeu e ele falou assim: aqui mora um tal de

Izaquiel? Ela falou assim: Mora sim, o senhor deve ter encontrado com ele por a, no
cxcvi

encontrou no? Ele falou assim: Porque? Senhor no encontrou com um homem por a de

bicicleta, com chapu preto, com a fita branca? Encontrei sim, de bicicleta, um homem

nessas condies. Aquele que meu pai, ele foi l fora em Paraba. Mas ser que eu

voltando encontro ele l? Voltando encontra, porque ele deve estar numa loja. Porque eu

fui numa loja, a menina sabia. Ele est numa loja ali na chegada, pra c da estao, ele est

naquela loja, foi ele e mame. A ele foi, quando ele chegou l, ele olhou e falou assim para

o sogro dele: aquele ali que ns encontremos, ser que ele? Ele falou assim: esse

mesmo que ns encontremos. A ele ficou em p na porta, mas eu tava ainda caoando com a

dona da loja, ela brincava muito comigo, e minha esposa mandando ela cortar o pano ali, ela

escolhendo o pano, a fazenda, ela escolhendo ali, ela cortando. Eles em p na porta. A ele

falou assim: escuta, esse homem que est a, chama Sr. Izaquiel? Ela falou assim: chama,

ele dono desses de trens todos que esto a, brincando com ele, esses trens todos que esto

a. Eu queria falar com ele. A ela falou assim: esse rapaz ali quer falar com voc. A eu

falei: o que que voc quer?. Ele falou assim: O senhor tem algum parente no Rio? Eu

falei: tenho bastante parente no Rio, tenho irmo. Ele falou assim: irm voc no tem

nenhuma no Rio? Falei: , no sei se tenho, porque tem uma irm que se perdeu l embaixo

no Rio, sumiu l embaixo no Rio, no sei se ela viva ou morta. A ele, moreno baixinho,

bigodinho pretinho, era filho de portugus, ento ele falou assim: escuta, mas o senhor

irmo dela, ento a bena, meu tio. A eu falei: mas porque que voc est me tomando a

bena e me chamando de tio? Porque ela minha me, estou vendo que o senhor parece um

pouquinho com ela. A ele me abraou, coisa... A eu falei: como que ? Fiquei todo

emocionado com aquilo, alembrei de minha me, que minha me sempre chorava, no era

filha dela mas ela gostava, ela criou, era enteada, ela chorava, falava que o Rio de Janeiro

sumiu com a filha, coisa e tal, ela chamava ela de filha. Lembrei da minha me que morreu,

ela j era morta e ela apareceu. Falei, mas existe minha irm? Ele falou assim: ela est no
cxcvii

Rio, minha me, ainda tem outra irm minha, ns somos dois, um casal. A eu falei: ela

est no Rio, est viva? Ele falou: minha me est viva, vim aqui apanhar um documento

aqui, certido dela, para tirar documento pra ela. A eu falei: vamos l pra casa. Trouxe

eles pra casa, almocemos aqui em casa, a

eu telefonei para o meu irmo no Rio, esse irmo meu que est no Rio, falei para ele que ele

estava l no Rio e no tinha achado minha irm, ainda no viu minha irm, mas eu aqui na

roa j tinha encontrado ela, j tinha encontrado minha irm. Foi uma alegria danada, escrevi

pra ela, ele falou: voc me mata aqui no telefone. Trabalhava l em Engenho de Dentro, ele

era feitor da Light, a ele falou assim: voc mata assim, Izaquiel, me falando uma coisa

dessa. A peguei os detalhes todos com o rapaz, onde que ela morava, morava no Rio, perto

do Tnel velho, sobe uma escadaria, a sobe, dando pelo telefone tudo, dando os detalhes,

falei para ele d para voc ir a? E ele foi certinho na casa dela, na casa da minha irm, ele

falou assim: vou l hoje na casa dela. A eu falei, vai, que assim, assim, assim. Dei os

detalhes e ele foi direitinho na casa da minha irm no Rio, ela tava no Rio. Depois ento ns

passamos a conviver, ela vinha aqui, eu fui na casa dela.

- Mas porque ela passou tanto tempo sem dar notcia?

- No sei porque ela fez aquilo, ela falou pra mim depois que ela no veio aqui, falei assim

porque que voc no veio, menina, porque que voc no escreveu? Ela falou que no, por

causa daquilo que tinha passado com certeza, a ela ficou com vergonha, no queria encontrar

com essa pessoa mais, com esse marido dela mais. Por causa daquilo que ele fez, coisa e tal,

ela guardou aquilo e no quis encontrar com ele mais. Ento ela falava que no era para falar

nada com ele. Ele estava vivo.


cxcviii

ANEXOS III

Registro Base

Nmero vinte nove. Aos desoito dias do ms de janeiro de mil novecentos e vinte e nove,

nesta cidade de Nova Iguass, Distrito do Municpio de Iguass, Estado do Rio de Janeiro, em

cartrio compareceu O. A. G e em presena das testemunhas, abaixo assinadas, declarou que

nesta cidade, hoje, as dez horas da manh, nasceu uma criana de cor branca, do sexo

feminino, filha natural delle declarante e de Dona S. S., Elle negociante, ela de servio

domstico, ambos naturais do Estado do Rio de Janeiro e residentes neste districto. Avs

paternos G. A. G. e A. A. G e maternos P. L. S. e M. L. S. A criana h de chamar-se I. do

que fao este termo que assigna que assina comigo o declarante e as testemunhas A. J. S. e J.

E. S., residentes neste districto. Eu A. P. D. J., escrivo o escrevi e assino.


cxcix

ANEXOS IV

Entrevistados

Izaquiel Incio
Data: 19 de setembro de 1994 e 21 de outubro de 1994
Local: Paraba do Sul, RJ.
Entrevistador: Ana Maria Lugo

Cornlio Cansino
Entrevista feita em 19 de maio de 1995
Juiz De Fora Minas Gerais

Manoel Seabra
Local:So Jos Da Serra Data:10/12/98
Entrevistadora: Hebe Castro e Ldia Celestino Meireles
Transcrio: Karina Cunha Baptista

Data Da Entrevista: 28 De Novembro De 2003


Entrevistadores: Hebe Maria Mattos e Martha Abreu.

Dona Jlia
Data: 12 de novembro de 1994
Local: Paraba do Sul, RJ.
Entrevistadora: Ana Maria

Dona Nininha: (Claudina de Souza Oliveira)


Entrevista feita em 19 de outubro de 1994
Paraba do Sul Estado do Rio de Janeiro

Dona Bernarda
Data: 16 de janeiro de 1995
Local: Paraba do Sul, RJ
Entrevistador: Ana Maria

Sebastiana E Maria Aparecida


Data: 19 de maro de 1995
Local: Paraba do Sul
Entrevistador: Ana Rios
Entrevistadas: Sebastiana das Graas Gonalves e Maria Aparecida Afonso Ribeiro

Dona Zeferina
Paraba Do Sul Estado Do Rio De Janeiro
Entrevista Feita Em 15 De Maio De 1995.

Dona Florentina
Data da entrevista: 13/12/2003
Entrevistadores: Carlos Eduardo C. da Costa, Marina Marina Luz Gama e Raquel Fernandes
Pires
Local da entrevista: Comunidade da Fazenda de So Jos da Serra - Valena - Rio de Janeiro
cc

Data da Entrevista: 09/05/2006


Entrevistador: Carlos Eduardo C. da Costa

Ivone Vieira Reis


Nascimento: 03/10/1937
Idade: 69 anos
Entrevista realizada em 2006.
Local: Mesquita/Baixada Fluminense

Dona Nilza
Nome: Nilza Conceio da Silva
Data de Nascimento: 30/09/1936
Entrevista: 25/11/2007
Idade: 71 anos
cci

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