Regras e Auto-Regras No Contexto Terapeutico
Regras e Auto-Regras No Contexto Terapeutico
Regras e Auto-Regras No Contexto Terapeutico
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De acordo com a anlise behaviorista radical, todo dos eventos internos. Estes eventos so conside-
comportamento humano modelado pelas con- rados como estmulos ou respostas que fazem
tingncias filogenticas, ontogenticas e culturais parte de uma cadeia entre eventos ambientais
(SKINNER, 1990). externos e comportamentos pblicos.
Um ponto importante nessa anlise compreen- Essa nfase na predio e controle tem como
der que a epistemologia behaviorista radical exige preceito que, na viso behaviorista, todas as causas
tanto a previso como o controle do comporta- so restritas s contingncias ambientais. Em outras
mento (HAYES , 1986; HAYES & B ROWNSTEIN , 1986; palavras, o behaviorismo radical aceita que o nico
S KINNER, 1953). Alm disso, uma vez que o beha- caminho para se modificar o comportamento
viorismo radical adota uma posio ambientalista modificando-se as contingncias em que ele ocorre,
e funcionalista, as explicaes do comportamento quer alterando as ocasies de ocorrncia, a resposta
remetem-se queles eventos ambientais direta- ou suas conseqncias.
mente manipulveis. Estes eventos seriam adju- No entanto, o indivduo pode comportar-se
trios para tanto preve r como controlar o com maior eficincia quando ele capaz de des-
comportamento (H AYES & BROWNSTEIN , 1986). crever seu comportamento e as variveis das quais
Esse pressuposto descarta completamente a ele funo. O seu repertrio descritivo das con-
possibilidade de o comportamento ser causado tingncias que controlam seu comportamento ser
por eventos internos (no nvel da psicologia, pois til para si e tambm para os outros.
podem existir causas fisiolgicas). Skinner (1977, Skinner (1984) distinguiu o comportamento
1984) escreveu extensivamente sobre eventos controlado pelas conseqncias ambientais
privados e os rejeitou como causas do comporta- comportamento modelado pelas contingncias
mento. Isso no significa, contudo, que o behavio- do comportamento controlado pelas descries
rismo radical negue a existncia ou a importncia verbais das contingncias comportamento
controlado por regras.
O comportamento modelado pelas contin-
gncias aquele controlado pelas contingncias
Data de recebimento: 11/12/2003. de reforamento para uma resposta especfica.
Data de aceitao: 30/01/2004.
* Doutor em Psicologia (Uni versidade d e So Paulo), mest re
O comportamento controlado por regras pode
em Psicologia (Pontifcia Universidade Catlica d e Campinas), at ser topograficamente idntico ao comporta-
especialista em Psicologia Clnica, psiclogo clnico, p rofessor
do curso de Psicolo gia da USJT.
mento controlado diretamente pelas contingn-
E-mail: [email protected]. cias de reforamento; contudo, uma vez que a
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(B ARON & GALIZIO, 1983; C ATANIA , S HIMOFF & observao e ao autoconhecimento (ser capaz de
MATTHEWS, 1989; HAYES, Z ETTLE & ROSENFARB, 1989). descrever as contingncias s quais responde e
Sendo assim, seria razovel supor tambm influir nelas), o processo teraputico ocorrer por
que as experincias idiossincrticas no passado meio de questes que, feitas pelo terapeuta (comu-
(histria de reforamento) produzem diferenas nidade verbal), levariam o cliente a descrever seu
individuais tanto para muitas das conseqncias comportamento, sentimentos e a relacionar esses
naturais do comportamento, quanto para o com- comportamentos e sentimentos com o ambiente
portamento de seguir regra. (GUILHARDI, 1999).
Nesse sentido, se poderia at especular que Segundo Zettle (1990), as descries verbais de
pessoas com padres de respostasrgidos ou neu- contingncias que o cliente chega a fazer (com ajuda,
rticos possam ser bons seguidores de regras por ou no, do terapeuta) subseqentemente podem vir
causa de sua histria de punio por no seguir a controlar o comportamento do prprio cliente.
regras (explcitas ou implcitas) que, no passado, Dessa forma, um passo importante na terapia
especificavam comportamentos corretos em uma consiste em planejar contingncias (intervenes,
grande variedade de situaes. estratgias, planos teraputicos, etc.) que levem o
Isso aconteceria porque tais histrias poderiam cliente a estabelecer uma correspondncia entre
produzir uma tendncia para responder a instru- pensar, dizer e fazer. Quando o indivduo segue as
es apenas por terem esse carter, em vez de um prprias descries verbais das contingncias
padro de comportamento para seguir regras por (auto-regras), ele est mais bem preparado para
causa de as conseqncias especificadas funciona- responder s exigncias da seqncia pensamen-
rem como reforadores (Z ETTLE & HAYES, 1982). to-ao. Quando um cliente adquire comporta-
Dentro do contexto apresentado at agora, a mento de seguir regras e auto-regras, ele est mais
interveno teraputica pode ser considerada como bem preparado para lidar com o mundo, porque
um tipo de comportamento verbal, mais especifi- ele mesmo pode, ento, reagir mais eficazmente
camente, um conjunto de regras (no sentido de no momento em que o comportamento modela-
as intervenes serem consideradas como descri- do por contingncias estiver enfraquecido
es de contingncias) que so apresentadas ao (SKINNER , 1988, p. 159).
cliente tendo em vista a alterao ou manuteno Clinicamente falando, contudo, podemos con-
de determinados comportamentos. Ou seja, ao siderar que nem sempre o que o cliente diz des-
apresentar uma regra (descrio, interveno) para creve as reais contingncias em operao. Uma vez
o cliente, o terapeuta est procurando estabelecer que o cliente est diretamente envolvido nas con-
elementos que levem o cliente a discriminar sob tingncias, sua discriminao a respeito delas pode
que condies seu comportamento ocorre, seja ser parcial, equivocada ou at mesmo inexistir.
esse funcional ou disfuncional. Nesse sentido, tanto as regras como as auto-
As intervenes do terapeuta (o controle do regras podem evitar que o cliente entre em contato
comportamento por regras), contudo, so menos com a realidade. Isso acabaria por gerar um con-
eficientes do que o controle exercido diretamente trole fraco das contingncias sobre o comporta-
pelas contingncias atuais e passadas de sua his- mento do cliente, uma vez que ele estaria
tria de vida. Tal diferena entre as foras de ambos preferencialmente respondendo a regras inade-
os controles sobre o comportamento deve-se ao quadas, no entrando em contato direto com as
fato de que, no primeiro caso (controle por regras), conseqncias de seu comportamento.
o comportamento instrudo e, no segundo Sendo assim, o papel do processo teraputico
(controle pelas contingncias), ele modelado dever sempre ser o de facilitar que o cliente entre
e, como tal, diretamente exposto a suas conse- em contato com as conseqncias de seu compor-
qncias reforadoras. tamento, pois a separao entre o comportamento
Uma vez que as intervenes do terapeuta e suas conseqncias naturais , segundo Skinner,
tm como objetivo ltimo levar o cliente auto- alienao (MICHELET TO & SRIO , 1993, p. 20).
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