A Ocupação Dos Espaços Vazios No Governo Vargas
A Ocupação Dos Espaços Vazios No Governo Vargas
A Ocupação Dos Espaços Vazios No Governo Vargas
no governo Vargas:
do Discurso do rio Amazonas saga
dos soldados da borracha
Mara Vernica Secr eto
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Introduo
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a difuso das idias geradas por essa elite. Em Cultura Poltica escrevia esta lti-
ma, composta por um seleto grupo de intelectuais divididos em dois grupos: a
nata do Estado Novo e um conjunto heterogneo de figuras que cobriam um am-
plo leque ideolgico, que ia de Gilberto Freyre a Graciliano Ramos.
Em 1941 Pricles Melo Carvalho (1941: 15-18), diretor de seo do De-
partamento Nacional de Imigrao (DNI), dizia:
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pelato, 1998: 173-191). Silvia Goulart analisou o contedo das matrias publica-
das pelo DEIP de So Paulo na imprensa local em seu estudo de 5.799 recortes de
jornais anexados aos processos do DEIP. Esses processos eram constitudos por
correspondncia de empresas editoriais reclamando o pagamento pela publica-
o de materiais oficiais. Da tabela temtica que ela elabora a partir das matrias
pagas entre 1941 e 1944, depreende-se que o tema do trabalho teve a mesma m-
dia de 2,2% (Goulart, 1990).
Segundo Maria Helena Capelato, o trabalhador que aparecia nos carta-
zes produzidos pelo DIP era representado como fora de trabalho. A organizao
racional do trabalho era representada pelo binmio trabalhador-mquina. Nesse
binmio, a mquina ofuscava o trabalhador. Capelato explica a inexpressiva re-
presentao do operrio na iconografia varguista pela negao estadonovista de
identidade de classe, substituda pela identidade nacional. No entanto, na pro-
paganda destinada ao recrutamento de nordestinos para a Amaznia, o
homem-trabalhador foi a figura central na iconografia.
Um dos conceitos-smbolo utilizados pelo Estado Novo foi a bandeira e
o bandeirismo, aos quais nos referimos. O regime tambm utilizou-se de outros
conceitos de menor sofisticao terica, tais como: a simplicidade e a autentici-
dade da populao sertaneja; o seu destino de desbravadora do Norte e a sua pre-
disposio ao sacrifcio; a ocupao efetiva do territrio brasileiro como aes de
patriotismo; a seca como situao extrema e desumanizante. E, como contrapon-
to a esse ltimo aspecto, a Amaznia era ento apresentada como terra de possi-
bilidades para aqueles que no tinham opo alguma.
A propaganda para mobilizar os trabalhadores para a Amaznia teve
duas dimenses: uma nacional e outra local. Na dimenso nacional, a batalha
pela borracha se encaixava no programa de ocupao e colonizao dos espaos
vazios e nos esforos de guerra do Brasil. Na esfera local, a emigrao de nordes-
tinos para a Amaznia era uma questo que contava com uma longa tradio e al-
guns debates. Um dos destinos mais procurados pelos nordestinos nas conjuntu-
ras de seca, e no apenas nelas, era o Norte, especialmente os estados do Par e do
Amazonas. A propaganda para recrutar trabalhadores explorou alguns elemen-
tos do imaginrio, dos desejos e das emoes, por meio de smbolos e de um dis-
curso direto e apelativo (Secreto, 2003).
O historiador italiano Carlo Ginzburg (2001) analisou um cartaz famo-
so, que todos j vimos alguma vez em sua verso original, ou nas imitaes que
correram o mundo. Durante a Primeira Guerra Mundial, Lord Kitchner, secre-
trio de Guerra de Sua Majestade britnica, realizou um chamado s armas me-
diante um cartaz que teve como resposta um alistamento voluntrio sem prece-
dentes. No cartaz aparecia Lord Kitchner em uma perspectiva que deixava o seu
dedo gigante num primeiro plano apontando para o espectador. Trata-se, segun-
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uma faixa que diz: Trabalhador tambm tem o seu lugar no Estado Novo
(FGV, 1983). Pela metfora espacial, o Brasil em que cada um tinha o seu lugar se
contrapunha quele do passado em que nem todos o tinham, o Brasil de incluso
se opunha, na propaganda, ao Brasil da excluso. O Brasil da unidade era uma so-
matria de lugares. O lugar do sertanejo era no serto.
Outra das peas criadas por Chabloz um cartaz colorido, desenhado a
partir de uma perspectiva muito particular: do interior da casa do sertanejo para
fora. Enquanto grupos de trabalhadores vo para a Amaznia, para a fartura,
quem observa o cartaz pode ser o caboclo passivo da cena ilustrada por Chabloz:
um homem forte encostado no umbral da porta que v passar os caminhes. para
ambos a frase: Vai tambm para a Amaznia protegido pelo SEMTA. O especta-
dor da representao de Chabloz um homem de ps no cho, que est contem-
plando, ou esperando, e em condies de ser um trabalhador recrutado e protegi-
do pelo SEMTA. um caboclo desenhado com traos arredondados, de membros
grandes, como os trabalhadores de Portinari de uma dcada antes.
Uma imagem idlica da floresta amaznica comeou a surgir dos carta-
zes de Chabloz. Num de seus cartazes, Vida nova na Amaznia, a explorao de
borracha aparece como uma atividade de fundo de quintal. Toda a cena idli-
ca e indica fartura: casa, lenha, porcos, galinhas, boi e, para completar o quadro,
uma criana brincando e uma mulher pendurando roupas brancas no varal. At
mesmo a densa floresta amaznica no to fechada e deixa passar alguns raios
de sol. A casa est cercada e o homem est tirando ltex de uma seringa vizinha
ao cercado. Segundo Samuel Benchimol (1945), o que a monocultura fez em ou-
tras regies do Brasil, o extrativismo fez na Amaznia: Seringa e roa, portanto,
no rimam bem Seringa rima bem com bri-bri, com charque e farinha,
com pirarucu seco e feijo. No combina com batatas, legumes, galinhas, ovos,
leite. Nessa ilustrao de Chabloz, o extrativismo ilusoriamente apresentado
como uma atividade complementar na economia camponesa. Salientemos que o
pblico a que era dirigido o cartaz era sobretudo campons, para o qual a agricul-
tura uma parte importante do cotidiano.
O trabalhador recrutado recebia um enxoval composto por uma cala de
mescla azul, uma blusa de morim branco, um chapu de palha, um par de alpar-
catas de rabicho, uma caneca, um prato fundo, um talher que era colher e garfo,
uma rede e um saco de estopa. Esse enxoval foi desenhado por Chabloz e anunci-
ado com as seguintes palavras: Equipamento de viagem fornecido pelo SEMTA.
Este desenho correspondia clusula segunda do contrato de encaminhamento.
As clusulas gerais do Contrato padro de trabalho nos seringais tambm me-
receram o desenho de Chabloz. Estas ilustraes serviam para tornar conhecido
o contedo do contrato numa sociedade em que grande parte da populao era
analfabeta.
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Por isso o recm-chegado diz coisas como: No gosto desta terra feia e
encharcada, ou gosto do enxuto.
No podemos avaliar individualmente o efeito de cada pea de propa-
ganda. Mas podemos pensar no efeito que certos slogans tiveram a partir das re-
clamaes realizadas pelas mulheres dos soldados da borracha depois que foi
cortada a assistncia s famlias em junho de 1944. Os milhares de trabalhadores
nordestinos recrutados desde incios de 1943 para trabalhar na regio amaznica
na extrao da borracha assinaram um contrato de encaminhamento, no qual
podiam optar e a grande maioria optou pela assistncia que o SEMTA oferecia
para suas famlias que ficavam no Nordeste.5 Muitas mulheres (e filhos) desses
trabalhadores permaneceram em seus lugares de origem ou nas hospedarias im-
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Notas
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Resumo
Este artigo analisa dois momentos e duas polticas de ocupao dos espaos
vazios do governo Vargas. O primeiro momento quando so anunciadas a
marcha para Oeste e a incorporao da Amaznia numa poltica de
colonizao. O segundo, quando, na conjuntura da guerra e respondendo aos
compromissos assumidos nos Acordos de Washington, se implementa uma
poltica de mobilizao de trabalhadores para a extrao da borracha, produto
estratgico para a guerra. O artigo explora as representaes dos espaos
geogrfico e social dos sertes e da Amaznia nas criaes de Chabloz e,
finalmente, avalia os efeitos da propaganda, atravs da utilizao de seus
slogans, nas reclamaes que as esposas dos trabalhadores fizeram chegar a
Vargas.
Palavras-chave: fronteira amaznica, soldados da borracha, espaos vazios,
migrao, propaganda, trabalho/trabalhadores
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Abstract
This article analyses two moments and two policies for the occupation of the
empty land during president Vargas administration. The first moment was
when government announced the march to the West and the incorporation of
Amazonia in a policy of colonization. The second was when, in the context of
World War II and responding to the commitments of the Washington
Agreement, government implemented a policy of mobilization of workers for
the rubber extraction, since rubber was a strategic product for the war. The
article explores the representation of the geographic and social spaces of the
sertes e the Amazonia in Chabloz creations and evaluates the effects of
propaganda, through the use of slogans, in the claims that the workers wives
directed to president Vargas.
Key words: Amazonian frontier, rubber soldiers, empty land, migration,
propaganda, work/workers
Rsum
Cet article analyse deux moments et deux politiques doccupation des
espaces vides pendant le gouvernement Vargas. Le premier moment a t
quand le gouvernement a annonc la marche vers ouest et lincorporation de
lAmazonie la politique de colonisation. Le second, quand, dans la
conjoncture de la II Guerre Mondiale et en rpondant aux compromis des
Accords de Washington, a t mise en oeuvre une politique de mobilisation
de travailleurs pour lextraction du caoutchouc, produit stratgique pour la
guerre. Larticle explore la reprsentation des espaces gographiques et
sociaux des sertes et de lAmazonie dans les crations de Chabloz, et
finalement examine les effets de la propagande travers lutilisation de ses
slogans dans les rclamations que les femmes des travailleurs ont adress au
prsident Vargas.
Mots-cls: frontire amazonique, soldats du caoutchouc, espaces vides,
migration, propagande, travailleurs/travail
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