Rimbaud Iluminações PDF
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Iluminaes (1886)
Arthur Rimbaud (1854-1891)
Traduo: Janer Cristaldo
Capa:
Rimbaud, aos 17, por tienne Carjat
provavelmente tirada em Dezembro de 1871
Fotografia conservada na BnF
http://www.bnf.fr
Fonte digital: wikipedia
Fonte Digital
Documento do Tradutor
[email protected]
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Arthur Rimbaud
ILUMINAES
Traduo
Janer Cristaldo
eBooksBrasil
2012
Aps o Dilvio
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rugindo no pomar. Depois, na floresta violeta, coberta
de brotos, Eucaris me disse que chegara a primavera.
Surge, lago, Espuma, rola sobre a ponte a e sobre
os bosques; panos negros e rgos, relmpagos e
trovo, subi e rolai; guas e tristezas, subi e
restaurai os Dilvios.
Pois desde que eles se dissiparam, oh! as pedras
preciosas enterrando-se, e as flores abertas! reina o
tdio! E a Rainha, a Feiticeira que acende sua brasa
no pote de barro, jamais querer contar-nos o que ela
sabe, e que ns ignoramos.
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Infncia
I
Este dolo, olhos negros e crina amarela, sem famlia
nem corte, mais nobre que a fbula, mexicano e
flamengo; seu domnio, azul e verdor insolentes,
estende-se sobre praias conhecidas por ondas sem
naus, de nomes ferozmente gregos, eslavos, clticos.
beira da floresta, as flores de sonho tilintam,
estalam, iluminam, est a donzela de lbios de
laranja, joelhos cruzados no claro dilvio que irrompe
dos prados, nudez que os arco-ris, a flora e o mar
ensombrecem, transpassam, e vestem.
Damas que volteiam nos terraos vizinhos ao mar;
crianas e gigantes, negras soberbas no musgo
verdoso, alfaias, erguidas sobre o solo frtil dos
bosques e jardins degelados jovens mes e irmos
maiores com olhares cheios de peregrinaes,
sultanas, princesas de andar e vestes tirnicas,
pequenas estrangeiras e pessoas docemente
infortunadas.
Que tdio, a hora do corpo querido e do corao
amado.
II
ela, a pequena morta, atrs das roseiras. A jovem
mame defunta desce o patamar. A calea do primo
range na areia. O irmozinho (est nas ndias!) l,
frente ao poente, sobre o campo de cravos. Os
velhos enterrados rgidos na muralha dos goivos.
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O enxame das folhas de ouro cerca a casa do general.
Esto no meio-dia. Segue-se o caminho vermelho
para chegar-se estalagem vazia. O castelo est
venda; as persianas esto soltas. O cura ter levado
a chave da igreja. Em torno ao parque, as guaritas
dos guardas esto desabitadas. As paliadas so to
altas que s se v os cimos sussurrantes. Ademais,
nada h para se ver l dentro.
Os prados sobrem at os vilarejos sem galos, sem
bigornas. A represa est levantada. dos calvrios e
moinhos do deserto, as ilhas e as ms!
Flores mgicas zumbiam. Os taludes o embalavam.
Animais de uma elegncia fabulosa desfilavam. As
nuvens se amontoavam sobre o alto mar feito de uma
eternidade de lgrimas quentes.
III
No bosque h um pssaro, seu canto vos detm e vos
faz corar.
H um relgio que no soa.
H uma catedral que desce e um lago que sobe.
H uma pequena carruagem abandonada nas moitas,
ou que desce a vereda s carreiras, engalanada.
H um grupo de pequenos comediantes disfarados,
vistos na estrada pela beira do bosque. H, por fim,
quando se tem fome e sede, algum que nos expulse.
IV
Sou o santo, orando no terrao, como os animais
mansos pastam at o mar da Palestina.
Sou o sbio na ctedra sombria. Os ramos e a chuva
se arrojam sobre a janela da biblioteca.
Sou o transeunte da grande estrada pelos bosques
anes; o rumor das represas abafa meus passos.
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Vejo, longamente, a melanclica lixvia dourada do
poente.
Eu bem seria a criana abandonada no cais que partir
para o alto-mar, o pequeno servo que segue a
alameda cujo final toca o cu.
As sendas so speras. Os montculos se cobrem de
giestas. O ar imvel. Quo distantes esto os
pssaros e as fontes! Isto s pode ser o fim do mundo,
avanando.
V
Que me aluguem por fim esta tumba, branca de cal e
com as linhas de cimento em relevo bem fundo na
terra.
Apoio meus cotovelos na mesa, a lmpada ilumina
vivamente estes jornais que s releio de idiota, estes
livros sem interesse.
Numa distncia enorme acima da minha sala
subterrnea, as casas se implantam, as brumas se
renem. A lama vermelha ou negra. Cidade
monstruosa, noite sem fim!
Menos acima, esto os esgotos. Dos lados, nada
seno a espessura do globo. Talvez os abismos de
azul, poos de fogo. nesses planos que talvez se
encontrem luas e cometas, mares e fbulas.
Nas horas de amargura, imagino bolas de safira, de
metal. Sou senhor do silncio. Porque uma aparncia
de clarabia empalidecer no canto da abbada?
8
Conto
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aniquilaram provavelmente na sade essencial. Como
no teriam podido dela morrer? Morreram juntos
ento.
Mas este Prncipe morreu, em seu palcio, em uma
idade comum. O Prncipe era o gnio. O Gnio era o
Prncipe.
A msica erudita faz falta a nosso desejo.
10
Desfile
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inteiros.
Sou o nico a possuir a chave deste desfile selvagem.
12
Antigo
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Being Beauteous
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Vidas
I
as enormes avenidas da terra santa, os terraos do
templo! Que fizeram do brmane que me explicou os
Provrbios? Desde ento, de l vejo ainda at as
velhas! Lembro-me das horas de prata e de sol junto
aos rios, a mo da campina sobre minha espdua, e
de nossas caricias em p nas plancies picantes.
Uma revoada de pombas escarlates troa em torno de
meu pensamento. Exilado aqui, tive um cenrio onde
representar as obras-primas dramticas de todas as
literaturas. Eu vos indicaria as riquezas inauditas.
Observo a histria dos tesouros que encontrastes.
Vejo a continuao! Minha sabedoria to desprezada
quanto o caos. Que meu nada, ao lado do estupor
que vos espera?
II
Sou um inventor de mritos bem distintos de todos
quantos me precederam; um msico quase, que
encontrou algo como a clave do amor. Hoje, gentil
homem de uma campina acre no cu sbrio, tanto
comover-se com a lembrana da infncia mendicante,
da aprendizagem ou da chegada em tamancos, das
polmicas, das cinco ou seis viuvezes, e de algumas
bodas onde minha cabea dura impediu-me de seguir
o diapaso de meus camaradas. No lamento minha
antiga parte de alegria divina; o ar sbrio desta acre
campina alimenta ativamente meu atroz ceticismo.
Mas como este ceticismo no pode de agora em
diante ser praticado, e como alias me devoto a uma
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nova perturbao, espero tornar-me um louco muito
cruel.
III
Num sto em que fui encerrado aos doze anos
conheci o mundo, ilustrei a comedia humana. Num
celeiro aprendi a histria. Em certa festa noturna,
numa cidade do Norte encontrei todas as mulheres
dos antigos pintores. Numa velha travessa de paris me
ensinaram as cincias clssicas. Numa magnfica
manso cercada pelo Oriente inteiro coroei minha
imensa obra e passei meu insigne retiro. Misturei meu
sangue. Meu dever me foi devolvido. Nem mais
preciso pensar nisso. Sou realmente de alm-tmulo, e
no tenho mensagens.
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Partida
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Realeza
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uma razo
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Manh de Embriaguez
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Frases
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*
Estendi cordas de sino a sino; guirlandas de janela
janela; correntes de ouro de estrela estrela, e dano.
*
O alto lago fumega continuamente. Que feiticeira ir
erguer-se no crepsculo brando? Que frondescncias
violetas vo descer?
*
Enquanto os fundos pblicos so dissipados em festas
de confraternizao, um sino de fogo rseo tange nas
nuvens.
*
Acentuando um agradvel sabor a tinta da China, um
p negro chove docemente sobre minha viglia.
Diminuo as luzes do lustre, caio na cama e, voltando
para o lado da sombra, eu vos vejo, minhas filhas!
minhas rainhas!
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Operrios
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As Pontes
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Cidade
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Sulcos
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Cidades
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Vagabundos
29
Cidades
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poca, o reconhecimento impossvel. O bairro
comercial um circo de um s estilo, com galerias de
arcadas. No se vem as lojas, mas a neve da calada
est esmagada; alguns nababos to raros quanto os
passantes de uma manh de domingo em Londres, se
dirigem at uma diligencia de diamantes. Alguns divs
de veludo vermelho: servem-se bebidas polares cujo
preo varia de oitocentas a oito mil rupias. Ante a idia
de procurar espetculos neste circo, respondo a mim
mesmo que as lojas devem conter dramas bastante
sombrios. Penso que h uma policia. Mas a lei deve
ser de tal modo estranha, que renuncio a fazer uma
idia dos aventureiros daqui.
O subrbio, to elegante quanto uma bela rua de
Paris, favorecido por um ar luminoso. O elemento
democrtico conta com algumas centenas de almas.
L, no entanto, as casas no continuam; o subrbio se
perde singularmente no campo, o Condado que
ocupa o ocidente eterno das florestas e das plantaes
prodigiosas onde os gentis-homens selvagens
perseguem suas crnicas sob a luz que se criou.
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Viglias
I
o repouso iluminado, nem febre nem langor, no leito
ou no prado.
o amigo nem ardente nem dbil. O amigo.
a amada, nem atormentadora nem atormentada. A
amada.
O ar e o mundo de modo algum buscados. A vida.
Era ento isso?
E o sono refresca.
II
A iluminao volta rvore da obra em construo.
Das duas extremidades da sala, cenrios quaisquer,
elevaes harmnicas se juntam. A muralha diante do
vigia uma sucesso fisiolgica de cortes de frisas, de
faixas atmosfricas e acidncias geolgicas. Sonho
intenso e rpido de grupos sentimentais com seres de
todos os caracteres entre todas as aparncias.
III
As lmpadas e os tapetes da viglia fazem o rudo das
ondas, noite, ao longo do casco do navio e em torno
do steerage.(2)
O mar da viglia, qual os seios de Amlia.
As tapearias, at a meia altura, entalhes de renda,
aparncia de esmeralda, onde se lanam as rolas da
viglia.
.. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. ..
..
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A prancha da lareira negra, reais sis das praias: ah!
Poos de magias; nica viso da aurora, esta vez.
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Mstica
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Aurora
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Flores
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Noturno Vulgar
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Marinha
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Festa de Inverno
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Angstia
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Metropolitano
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as bandeiras negras e os raios azuis, e os perfumes
prpuras do sol dos plos, tua fora.
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Brbaro
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Promontrio
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Cenas
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Noite Histrica
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modo algum ser uma ao legendria!
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Bottom (8)
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H
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Movimento
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Devoo
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Democracia
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Fairy (11)
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Guerra
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Juventude
I
Domingo
Os clculos de lado, a inevitvel descida do cu, e a
visita das lembranas e a assemblia dos ritmos
ocupam a morada, a cabea e o mundo do esprito.
Um cavalo galopa no hipdromo suburbano e ao longo
das plantaes e arvoredos, atingido pelo carbnculo.
Uma miservel mulher de teatro, nalguma parte do
mundo, suspira aps abandonos improvveis. Os
desesperados (12) enlanguecem aps a tempestade, a
embriaguez e as feridas. Crianas pequenas afogam
maldies ao longo dos rios.
II
Soneto
Homem de constituio ordinria, a carne no era um
fruto suspenso no pomar, dias pueris! O corpo, um
tesouro a dissipar; amar, o perigo ou a fora de
Psiqu? A terra possua vertentes frteis em prncipes
e artistas, e a descendncia e a raa nos impeliam aos
crimes e aos lutos: o mundo, vossa fortuna e vosso
perigo. Mas agora, este labor cumprido, tu, teus
clculos, tu, tuas impacincias, no so mais que
vossa dana e vossa voz, no fixadas e de modo
algum foradas e de xito, na humanidade fraternal e
discreta pelo universo sem imagens; a fora e o
direito refletem a dana e a voz somente agora
apreciadas.
III
Vinte Anos
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As vozes instrutivas exiladas...A ingenuidade fsica
amargamente sossegada...Adgio. Ah! O egosmo
infinito da adolescncia, o otimismo estudioso: como
estava o mundo cheio de flores este vero! Os ares e
as formas agonizantes...Um coro, para acalmar a
impotncia e a ausncia! Um coro de vidros de
melodias noturnas...Com efeito, os nervos vo logo
falhar.
IV
Ainda permaneces na tentao de Antonio (13). O
refocilamento do zelo cerceado, os tiques de orgulho
pueril, o abatimento e o espanto. Mas te consagrars a
esse trabalho: todas as possibilidades harmnicas e
arquiteturais gravitaro em torno da tua morada. Seres
perfeitos, imprevistos, se oferecero s tuas
experincias. s tuas cercanias afluir
sonhadoramente a curiosidade de antigas multides e
de luxos ociosos. Tua memria e teus sentidos no
sero o alimento de teu impulso criador. Quanto ao
mundo, quando dele sares, em que se ter
convertido? Em todo caso, nada das aparncias
atuais.
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Saldo
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tm porque perder sua comisso to cedo!
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Gnio
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quebrantamento da graa perpassada por violncia
nova!
Seu olhar, seu olhar! todas as genuflexes antigas e
as penas redimidas aps sua passagem.
Seu dia! a abolio de todos os sofrimentos sonoros e
mveis na mais intensa msica.
Seu passo! as migraes mais enormes que as
antigas invases.
ele e ns! o orgulho mais benvolo que as caridades
perdidas.
mundo! e o canto claro dos novos flagelos!
Ele nos conheceu a todos e a todos nos amou.
Saibamos, esta noite de inverno, de cabo em cabo, do
plo tumultuoso ao castelo, da multido praia, de
olhares em olhares, foras e sentimentos cansados,
cham-lo e v-lo, e despedi-lo, e sob as mars e no
alto dos desertos de neve, seguir suas vises, seus
alentos, seu corpo, sua luz.
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Notas do Tradutor
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Traduo 2012 Janer Cristaldo
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Agosto 2012
eBookLibris
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