A BAHIA NA FEDERAO

Com o seu relativo empobrecimento, a Bahia perdeu o

papel hegemnico na liderana poltica do Pas, que exerceu
no tempo do Imprio. Nessa fase, a Bahia fz 42 ministros d-os Barbacena: a Famlia, a Poltica e
219 que a monarquia teve. So Paulo, a segunda provncia no
particular, contribuiu com 27 nomes para os sucessivos minis- uma Hiptese
trios (estatstica de Tavares de Lyra) .
Na Repblica, elegemos apenas dois Vice-Presdentes: Ma- Jos MURILO DE GARVALHO
; .
noel Vitorino Pereira (em 1894) e Vital Soares, em 1930, que
no tomou posse. Depois de 1945, trs polticos da Bahia con-
tam-se entre os presidentes nacionais de partido: Octvo Man- 1. Introduo; 2. A cidade, as famlias, a poltica; 3. A natureza feudal
da pol1tica de Barbacena; 4. Aspetos metodolgicos e implicaes tericas;
gabeira, Juracy Magalhes (ambos presidiram UDN), e Joo
Mangabeira, presidente do PSB, que foi levado ao psto quando 5. Bibliografia.

ainda militava na poltica do Estado.

No se pode, todavia, desconhecer o papel de relvo da
Bahia na Repblica, mesmo no ltimo meio sculo. Em tdas 1- INTRODUO
as Constituintes esteve numa liderana intelectual no supe-
rada. Ruy foi a maior influncia na Primeira Constituinte e, SoARES FERREIRA, NESTOR MASSENA, C. JARDIM, ALTAIR
depois, o maior orculo das instituies republicanas. Na segun- SAVASSIe outros mais, j se deram ao trabalho de escrever
da Constituinte, Joo Mangabeira, embora no tivesse figurado sbre Barbacena. Todos, porm, o fizeram do-,ponto. de vista
entre os seus membros, exerceu nigualvel influxo, por haver da histria. Ningum, at hoje, que a estudasse sob o ponto
sido relator do projeto de Constituio do govrno, elaborado de vista da cincia poltica. , no entanto, sua problemtica
pela chamada comisso do Itamarati. Na terceira Constituinte, poltica o que Barbacena apresenta de mais atraente para o
Aliomar Baleeiro destacou-se como o lder do trao mais mar- estudioso e foi ela exatamente que nos levou a empreender o
cante da Carta Constitucional de 1946, a chamada "revoluo presente trabalho. Desde 1930 a cidade ~ ~alco de ,uma l~~a
municipalista". Por fim, deve-se lembrar que o maior lder da poltica de famlias que, por suas caractenstlcas, esta a esigrr
redemocratzao do Pas foi Octvio Mangabeira, o adversrio um esfro terico de compreenso. Talvez seja esta mesma
nmero um do regime de 1937. Convm, alis observar que a luta, com seu grande poder de envolvimen,to, que explique a
elite dirigente da Bahia no aderiu ao Estado Nvo. Situacio- ausncia de um enfrentamento direto' do problema. pelos natu-
nistas e oposicionistas em 1937 entraram para a resistncia ao rais do lugar. O nico que ousou abordar o assunto mora no
nvo regime, e se uniram na hora de restaurao da democracia. Rio e o fz acobertando-se sob o manto da fico. Trata-se de
Geraldo Frana de Lima com seu romance Serras Azuis.
Se a Bahia. corrigir as dificuldades econmicas que a afli-
gem e progredir no combate ao analfabetismo, certamente con-
quistar, na Federao, o lugar condizente com o seu volume
populacional, suas' riquezas naturais e sua grande tradio
poltica.
A ns, no nos interessam' a histria, a literatura, o

tudar, do ponto de vista da sociologia poltica" ~ *

ufanismo. Interessa-nos o fenmeno poltico. Interessa-nos es-
se passa
em Barbacena. Como se explica a luta de famligs, ~ual a. na-

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 155'

tureza desta luta, quais as bases em que se apia, qual o me- Ferno Dias e seu cunhado, cel. Domingos Rodrigues da Fon-
, A
canismo por que se rege, qual o sentido que pode ter para os seca Leme, que se estabeleceram na fazenda da Borda, bro
estudos polticos em Minas Gerais e, talvez, no Brasil. da futura povoao. Deve sua existncia e sua evoluo sua
Nosso trabalho, evidentemente, no definitivo e exige privilegiada situada geogrfica de encruzilhada do Caminho
posterior aprofundamento. Uma srie de empecilhos no nos Nvo com o Caminho Velho e com os caminhos que vinham ;io
permitiu trabalhar com questi.onrios. Limitamo-nos aos dados Mato Grosso e de Gois, ponto obrigatrio de passagem para
estatsticos e histricos existentes e a entrevistas com os ele- quem vinha do Rio ou para l se dirigia proveniente das Minas.
mentos mais destacados da poltica barbacenense. A hiptese Desde o incio foi centro comercial importante. Atestam-no
explicativa que levantamos, com base nestes elementos , fica a muito bem as razes invocadas pelo Visconde de Barbacena
exigir posterior investigao para um teste definitivo de sua para atender ao pedido dos moradores no sentido de que o
verdade cientfica. .
arraial fsse elevado categoria de Vila, razes expostas no
A nosso ver, o principal valor de trabalhos dste tipo respectivo Auto de criao:
est em fornecer elementos para possveis generalizaes sbre
" . .. no s por ser o mais central e populoso dste
a evoluo do comportamento poltico em Minas Gerais. O valor
distrito, mas porque sua situao na extremidade do mato
cientfico das generalizaes duvidoso quando no baseadas
e onde, da estrada do Rio de Janeiro se dividem as das comar-
em nmero suficiente de estudos de casos particulares. como
cas desta capitania e as que se encaminham para Gois e
um estudo de caso que acreditamos poder contribuir, com ste
Mato Grosso, fazem mais necessrios e interessantes neste
trabalho, para o enriquecimento dos estudos polticos em Minas.
lugar a polcia, e a Economia Pblica, para a segurana, e
Queremos agradecer a pronta colaborao que recebemos
comodidade dos viajantes, para bem e melhoramento do comer-
em Barbacena de vrias pessoas, entre as quais o deputado Jos
cio, 0 qual aqui tem a sua chave" .1
Bonifcio Lafaiete de Andrada, o ex-governador Jos Fran-
cisco Bias Fortes, o deputado Bonifcio Jos Tamm de An- Ao longo do Caminho Nvo, at a capitania do Rio de
drada, o deputado Joo Navarro, o sr. Paulo Gonalves, diretor Janeiro, e de seu prolongamento, at Congonhas, a Co~oa foi
do jornal "Cidade de Barbacena", os srs. Stlio Ribeiro Na- concedendo vastas sesmaras, iniciando por Garcia PaIS que
varro, da prefeitura municipal, nuar Fares, Altair Savassi, foi quem abriu o Caminho Nvo. Aos poucos, foi-se formando
Jorge Aurlio Possas, Fernando Victor, presidente da Cmara aquilo que OLIVEIRA VIANAchamou de cls feudais e cls paren-
de Vereadores, Ernani Rodrigues Costa, presidente do Sindi- tais. Sobressaam-se o cl parental da fazenda da Borda,
cato dos Txteis, o pe. Sinfrnio de Castro, os funcionrios do ancestrais dos Andradas mineiros, e o dos S Fortes, descen-
Cartrio Eleitoral, da Agncia Municipal de Estatstica e da dentes de Estcio de S. Por ocasio da Inconfidncia, cinco
ACAR. revoltosos eram donos de sesmarias em Barbacena, inclusive
Tiradentes com um seu irmo e Joaquim Silvrio dos Reis. O
2 - A CIDADE, AS FAMLIAS, A POLTICA inconfidente cel. Jos Aires Gomes, dono da Borda, possua
cinco fazendas e era dono de mais de cem escravos.a Sua
A luta poltica de famlias em Barbacena data de 1930. parentela e a dos S Fortes, grandes criadores de gado leiteiro,
Uma rpida viso histrica pode ser de utilidade para o enten- I
I -
dimento do fenmeno. i

Barbacena, .originalmente Borda do Campo, foi fundada 1. Ctr. Rev. do Arquivo Pblico Mineiro, ano I, pg. 1l9.
2. Esta participao de potentados rurais na Inconfidncia Mineira
em 1698 pelos bandeirantes Garcia Rodrigues Pais, filho de ainda no mereceu a devida ateno dos estudiosos.
 d~minaram. a vida poltica de Barbacena no sculo xvm, prn- Campo Verde, dos Paula Lima e dos Lima Duarte; a fazenda
cpalments a partir da criao da Vila em 1791. Um S Fortes dos Moinhos, dos Armond; a fazenda da Conceio, dos Bias
foi o primeiro Juiz Presidente da Cmara, voltando ao psto Fortes; a fazenda de Monte Belo, dos S F.ortes. Como em
por mais sete vzes. No sculo XIX nada se modicou. Os quase todo o Brasil da poca, a posse da terra era a base
Armond, os Teixeira de Carvalho (lderes da Revoluo de quase exclusiva de poder.
1842) e o nvo dono da Borda, Jos Rodrigues Lima Duarte, Em terceiro lugar, temos os nomes de cidades que outrora:
Visconde de Lima Duarte, reinaram sem contestao. O Vis- pertenceram ao enorme municpio de Barbacena. quase uma
conde governou municpio de 1861 a 1880. lista dos nomes e ttulos dos grandes chefes de Barbacena:
Com a Repblica, vai despontando nova famlia que aos Lima Duarte, Paula Lima, Conselheiro Lafaiete, Antnio Car-
poucos se sobrepe s demais: os Bias Fortes. Seu domnio Ias, Bias Fortes, Oliveira Fortes, S Fortes, Pedro Teixeira,
inconteste vai at 1930, quando lhes disputam o poder os mais Caranda.
recentes donos da Borda, os Andradas mineiros; originando-se Esta elite dominou na Colnia, dominou no Imprio e
a luta que at hoje empolga o municpio. domina na Repblica. Na Colnia e no Imprio ela sempre
At 1930 a histria de Barbacena a histria de algumas se mostrou liberal e independente. Fz a Inconfidncia, (embora
famlias, girando em trno dos grandes troncos familiares da tenha dado a seguir sua terra o nome de quem esmagou a
fazenda da Borda. Dstes ltimos surgiram ramificaes hoje revolta), ofereceu-se em 1822 para descer em massa ao Rio
espalhadas por grande parte do Estado. Para citar algumas: em defesa do Prncipe Regente (o que valeu cidade o titulo
os Penido, os Penido Burnier, os Miranda Jardim, os Miranda, de "nobre e muito leal"), fz a Revoluo de 1842, esteve sem-
os Lima Duarte, os Barbosa Lage, os Badar, os Vidigais, os
pre com o partido liberal e, desde incio, apoiou a Repblica.
Paula Lima, os Miranda Lima, os Andradas mineiros etc. Explicamos ste liberalismo pela posio da cidade na linha
Era a "nobreza rural" de que fala o Auto de criao da de comunicaes entre a capital da Provncia e a capital do
Vila. Trs indicadores confirmam o poder e o prestgio destas Imprio. "Chave do comrcio", chamou-a o Visconde de Bar-
famlias. Em primeiro lugar, os ttulos de nobreza e os altos bacena e SAINTH!LAmEem 1816 observava: "H em Barba-
postos militares, principalmente na Guarda Nacional. Se no cena vrias lojas muito bem sortidas, muitas vendas e algumas
so capites e coronis, so bares, condes, viscondes, conse- hospedarias". Segundo o mesmo SAINT HILAIRE,o Caminho
lheiros. S entre os elementos da Borda temos o cel. Domingos Nvo era to movimentado como a estrada de Paris a Tolouse. 3
R. da Fonseca Leme, cel. Jos Aires Gomes, Visconde de Lima :mste contato com outras elites, principalmente as do Rio e de
Duarte, Conselheiro Lafaiete. Entre os Armond, o Conde de Ouro Prto, pode explicar a menor rigidez no pensamento da
Prados, o Baro de Pitangui. O pai de Crispim J acques Bias elite local e certo "urbanismo" em seus costumes. Atesta ste

Fortes era cel. Jos Francisco de Oliveira Fortes. Quanto aos ltimo trao o precoce desenvolvimento da imprensa em Barba-
Andradas, jamais aceitaram ttulos de nobreza no Brasil. Con- cena. Desde 1836 temos notcias de publicaes jornalsteas na
sideram-se oriundos de uma nobreza de sangue proveniente de ;
cidade, muitas vzes editadas pelos prprios donos do poder.
Portugal e Espanha e sempre tiveram um soberano desprzo !i o caso dos Armond, dos Teixeira de Carvalho, e, especialmente,
pela nobreza de ttulos do Imprio.
Em segundo lugar, o grande nmero de fazendas hist-
ricas, ber.os dos grandes troncos familiares. A Borda, dos
I 3. Cfr. ST. HILAIRE, Viagem pelas Provncia8 do Rio de Janeiro e
Minas eras, p. 119 e citado DANIEL DE CARVALHO em Eatudo8 e
Aires Gomes, dos Lima Duarte, dos Andradas; a fazenda de Depoimento8, p. 28.

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~
,
 dos Andradas que jamais se identificaram com a linha "rural" o domnio Andrada vai at 1937. Com a queda de Antnio
de seus predecessores na Borda. 4
Carlos, Benedito Valadares, nomeado interventor em Minas,
:este fato, por sua vez, aliado s vastas ligaes parentais coloca Bias Fortes na prefeitura de Barbacena. Os papis se
e ao grande prestgio dos donos da Borda, principalmente do invertem. Os Andradas sofrem todo tipo de perseguio, desde
Visconde de Lima Duarte, explica, em parte, a ausncia de lutas .~ i
atentados at violao de correspondncia .
de famlias at 1930. Pelo menos, de lutas declaradas. ~ 1 Durante a ditadura , falta da vlvula de escape eleitoral,:
,

Com a Revoluo de 1930 d-se o rompimento das famlias a luta poltica se transfere para as organizaes, como clubes,
Bias Fortes e Andrada , Antes eram aliadas e amcssmas. irmandades, associaes, casas de assistncia. A poltica invade
Basta citar um fato para comprov-Ia: quando Antnio Carlos-
ocupava a presidncia de Minas, seu irmo, Jos Bonifcio, I todos os setores de atividade, obrigando grande parte da popu-
lao a uma definio de lealdade. Fora do poder, em regime
f-Ia dar a Jos Francisco Bias Fortes a Secretaria do Interior. ~ ditatorial, o nico instrumento de luta que resta a Jos Bani-
Bias Fortes, por sua vez, chamou para seu Chefe de Gabinete fcio a advocacia. Defendendo amigos e perseguidos polticos,
a Jos Bonifcio Filho. (O exemplo tpico da modalidade I consegue manter sua liderana e amplia sua rea de influncia
familstca de recrutamento poltico). Bias e Jos Bonifcio
so concunhados, sendo ainda o primeiro padrinho de casa-
! at Juiz de Fora. Bas inicia a guerra dos cargos pblicos, no-
meando amigos, transferindo e destituindo adversrios. 6
mento do segundo. Em trno das duas famlias vo-se polarizando as princi-
O primeiro atrito surgiu com a sucesso de Antnio Carlos pais famlias locais. A populao da cidade se divide em biista
e de Washington Lus. Bias era por Melo Vana para suceder e bonifacista.
aA. ,Carlos e MeIo Viana era por Jlio Prestes para suceder Depois de 1945 a luta se trava nas urnas, sem a violncia
a W. Lus. A. Carlos criara a Aliana Liberal para combater de antes. As duas famlias controlam quase todo o eleitorado
a candidatura Jlio Prestes. Bias se demite da Secretaria. do municpio, que atinge hoje os 15.000. Nenhuma outra fra
Sobrevindo a Revoluo, Jos Bonifcio a lidera em Barbacena, conseguiu quebrar esta estrutura e abalar ste domnio familial
estando Bas no Rio. Aps a vitria, Jos Bonifco nomeado expresso nas votaes do PSD (Bas) e da UDN (Andradas) .
prefeito, sem consulta a Bias. :este, acostumado ao domnio
absoluto do pai sbre o municpio, sente-se diminudo e no
comparece solenidade de posse. Da em diante os aconteci- - 3 - A NATUREZA FEUDAL DA POLTICA
mentos se precipitam. Os bistas sabotam o pagamento do DE BARBACENA
imposto de eletricidade, Jos Bonifcio se v obrigado a usar ste contrle familista sbre uma cidade de 45.000 mil
de energia e chama um chefe de polcia que se notabilizou por habitantes se coloca para ns como um problema a ser escla-
seus mtodos violentos e arbitrrios. Ainda hoje se fala em recido. De modo geral, um contexto urbano no se presta a
Barbacena no regime da "chibata e do purgante" do capo Laerte. padres familistas e patrimonialistas de comportamento.
Artigos violentos so trocados pelos dois chefes atravs da . Neste captulo tentaremos levantar uma hiptese expli-
imprensa .s
cativa. A hiptese ser bastante ampla para abranger os dois

4. Sbre a imprensa em Barbacena, cfr. ALTAlR SAVASSI,A Im- 6. Cfr. AMADEUANDRADA, discurso proferido em 4-6-41;.na Assem-
prensa em Barbacena, publicao da Prefeitura Municipal, 1953. blia Legislativa, transcrito no "Minas Gerais" de 8-8-47. O discurso
5. Cada uma das partes tem uma verso prpria sbre os verdadeiros um documento precioso para se ter uma viso do funcionamento de
motivos do rompimento. Adotamos a que nos pareceu mais verossmil. uma poltica clientelistica.
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perodos distintos da histria poltica de Barbacena - antes desta situao seria uma distribuio cruzada. Por exemplo,
de 1930 e de 1930 em diante. E ser dinmica enquanto tentar alta educao, baixa renda, alto poder poltico, ou: baixa
no s explicar as duas situaes como tambm a transio educao, alta renda, baixo poder poltico etc. li: uma situao
de uma para outra. de incongruncia ou desequilibrio de posies.
Na medida do possvel, iremos fornecendo os indicadores A segunda caracterstica nos diz que, numa estrutura \
que comprovem a hiptese, deixando para discutir o problema feudal, a interao social se faz segundo a soma das posies-
metodolgico no captulo seguinte. que um indivduo ocupa nas vrias dimenses de status, ou
----:/>7 Nossa hiptese que a poltica de Barbacena de natu- segundo sua posio total. A soma das posies pode dar-nos
reza feudal, tanto na primeira como na segunda fase. A pas- vrios perfis sociais diferentes. Assim, podemos ter pessoas
sagem de uma fase para outra se deu atravs de um cresci- altas em tdas as dimenses, pessoas baixas em tdas, pessoas
mento de importncia dos status polticos em detrimento dos baixas em, umas, altas em outras, ou mdias em tdas ete, A
status econmicos, que na primeira fase eram bsicos. Maiores teoria afirma que, numa estrutura feudal, a interao : 1)
explicaes sero dadas no decorrer da anlise. mxima entre os indivduos altos em tdas as dimenses, 2)
menor entre os indivduos altos em tdas e os baixos em tdas,
UM CONCEITODE FEUDALISMO 3) mnima entre os baixos em tdas as dimenses.
ste conceito de feudalismo nos parece mais adequado por
o conceito de feudalismo que vamos utilizar o desenvol- duas razes. A primeira se deve a seu carter abstrato, que
vida pelo prof. JOHANGALTUNGdo Peace Research Institute de lhe d maior flexibilidade, podendo ser aplicado a situaes
! Oslo. 7 Segundo oprof. GALTUNG,uma estrutura feudal se dis-
historicamente distintas. A segunda se prende a sua maior capa-
tingue por duas caractersticas bsicas. A primeira a con- cidade explicatva, de vez que nos fornece a estrutura e o
cordncia de poses," e a segunda a interao segundo a mecanismo de funcionamento de uma realidade feudal. Estas
soma das posies do par. Pela primeira se entende que, numa caractersticas no se encontram, por exemplo, no conceito de
determinada estrutura social, a disposio dos indivduos nas cl eleitoral usado por OLIVEIRAVIANA. O cl eleitoral, como
vrias dimenses de status, como parentesco, renda, poder pol- fuso, para efeitos polticos, do cl feudal com o cl parental,
tico, segue linhas paralelas. Classificando, por exemplo, a dis-
um conceito histrico e de carter descritivo, apresentando,
tribuio dos indivduos nestas dimenses segundo uma escala por isto, menor flexibilidade e menor poder explcatvo.
crdinal tripartida, temos que um indivduo pode ocupar posi-
es altas, mdias ou baixas. A dstribuio paralela quando ANTESDE 1930
um indivduo ocupa posio alta em tdas as dimenses, ou
posio mdia em tdas, OU posio baixa em tdas. Dizemos Passando ao caso de Barbacena, tentaremos aplicar o
que neste caso h uma congruncia de posies. O contrrio conceito situao anterior a 1930. J mostramos o que foi
a poltica de Barbacena neste perodo. Um grupo de famlias,
ligadas posse da terra, detinha todo o poder poltico.
7. o conceito foi exposto em curso ministrado pelo prof. GALTUNG Tomemos a primeira caracterstica de uma estrutura feu-
na Faculdade de Cincias Econmicas da Universidade de Minas Gerais.
dal: a concordncia de posies. As dimenses de estatus mais
8 . Traduzimos aqui por "posio" o trmo ingls "rank", em
espanhol "rango". O trmo portugus no corresponde bem ao original importantes nesta fase so o parentesco, o poder econmico,
mas o que dle mais se aproxima. "Rank" se define como "avaliao traduzido na posse da terra, e o poder poltico. Afirmamos que
diferenciada de status". as grandes famlias eram altas nestas trs dimenses; os escra-
 o'.

vos, agregados, pequenos proprietrios de terra, eram baixos es em que disputou com Hermes da Fonseca a Presidncia
em tdas elas e talvez um pequeno grupo de comerciantes e da Repblica:. "O alistamento de Barbacena , a sse respeito,
artesos mdio em tdas, No exclumos a possibilidade de o caso tpico de contaminao do escrutnio popular ..... essa
casos de incongruncia de posies no ltimo grupo, mas seriam obra-prima da trapaa, oitocentos eleitores inscritos por uma
casos isolados, sem maiores conseqncias. s pena, com uma s letra." 9 Quem era apoiado pelos chefes
Justifiquemos nossa afirmativa. A comear pelo grupo vencia com larga margem de votos a seu favor. O contr1e
mais problemtico, o de posies mdias. E um problema at dos votos era absoluto na zona rural e, embora menor, muito
hoje no resolvido da histria social do Brasil, determinar as grande na cidade. Como exemplo, damos o resultado das elei-
dimenses e a importncia dos grupos mdios urbanos na es presidenciais de 1930, no municpio de Barbacena, Getlio
Colnia e parte do Imprio. Para Barbacena temos algumas Vargas obteve, na cidade, 87% dos votos, contra 13% obtidos
indicaes. Em primeiro lugar, era muito reduzido numrca- por Jlio Prestes. Em doze distritos, de eleitorado rural, Get-
mente. Em 1816, SAINT Hn.AmE calculou em 2.000 a populao lio conseguiu nada menos que 96% dos votos, contra 4% dados
da cidade. Em 1908, esta populao de 8.000, para um total a Jlio Prestes..P No preciso dizer que os chefes locais,
de 60.000 no municpio. Dstes 8.000, tirados os grandes fazen- Bias Fortes e Jos Bonifco, apoiaram Getlio ...
deiros que moravam na cidade e os elementos baixos em tdas '-
l Sbre o grupo alto em tdas as dimenses j fornecemos
as dimenses, como os empregados domsticos, restavam ape- vrias indicaes. E um grupo igualmente reduzido. O pedido de
11
nas comerciantes que, como foi visto, desde a criao da vila 1
i de. criao da vila, em 1791, foi assinado por 105 "nobres",
tiveram certa importncia, e pequenos artesos. Quanto aos ! quase todos grandes proprietrios . Os latifndios, surgidos a
comerciantes, j citamos o testemunho do Visconde de Barba- partir das grandes sesmarias doadas margem do Caminho
cena e de ST. Hn.AmE. Em 1908 havia em Barbacena 236 casas Nvo, caracterizaram a vida econmica, social e poltica do
comerciais. Mas preciso observar que os maiores comercian- municpio at o sculo XX. A fazenda da Borda, por exemplo,
tes, os atacadistas, provvelmente fssem tambm donos de depois de sofrer vrios desmembramentos, , ainda hoje, um
terra, uma vez que muitos dstes moravam na cidade e os prin- autntico latifndio de uns 4 mil ha. de terra. Segundo o Censo
cipais produtos eram exatamente os originrios da lavoura e de 1920, 10% das propriedades rurais de 400 ha. para cima
da pecuria. Nada impede, no entanto, que um ou outro comer- detinham 50% da rea total do municpio e 60 fazendas pos-
ciante mais poderoso, embora no fsse de famlia tradicional j suam rea superior a mil ha. Nesta poca o municpio era o
rural, fsse recrutado pela elite e recebesse o cargo de verea- maior produtor de leite e manteiga do Estado. Em 1925, dos
dor, ou outro qualquer, resultando um perfil mdio equilibrado. 232 estabelecimentos industriais existentes, 182, ou seja, 78%,
Os possveis elementos com desequilbrio de posio eram se dedicavam produo de queijo e manteiga. A economia
marginais. do municpio era quase totalmente agropecuria. No difcil
O que importa que stes indivduos no tinham condies perceber o mecanismo da estratificao: a posio alta na
para disputar o poder s grandes famlias. Jamais passariam, dimenso parentesco fornecia a posse da terra (herana), a
como grupo, da posio mdia. Sua ascenso s podia ser posse da terra determinava o poder econmico e o prestgio,
individual. Na Colnia, nem mesmo podiam votar. No Imprio
e na Primeira Repblica, uma srie de expedientes legais e 9. Cfr. AFONSO ARmos DE MELo FRANCO, Um Estadi8ta da RepbZica,
ilegais garantia o xito dos donos do poder em qualquer eleio. n, pg. 232.
Temos o testemunho de Rui Barbosa sbre a fraude nas ele- io. Cfr. Cidade de Barba cena, edio de 8 de maro de 1930.
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stes, por sua vez, possibilitavam o controle poltico. E temos

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interao. Da a relao entre centralidade, posio alta emaior I
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a "nobreza", alta em tdas as posies. frequncia de interao e vice-versa: periferismo, posio baixa
Diferentemente, o grupo dos baixos em tdas as dimenses e menor freqncia de interao.
era numeroso. Em 1908, dos 60 mil habitantes do municpio, I
J Em nosso caso, teramos, em primeiro lugar, interao
52 mil moravam no campo. Como era pequeno o nmero dos l
:'.; mxima entre os membros pertencentes s grandes famlias.
grandes proprietrios, resta que a maioria era constituda de J
Algumas indicaes podem ser dadas. A comear pelos movi-
escravos (at 1888) agregados, rendeiros, pequenos propriet-
mentos polticos que contaram com a participao da elite f'
rios. Jos Aires Gomes possua mais de cem escravos. No
local: a Inconfidncia, o abaixo-assinado pedindo a criao da
pertenciam s grandes famlias, no herdavam as grandes
Vila, em 1791, o manifesto a D. Pedro r, em 1822, a revoluo
propriedades, no tinham poder econmico, no podiam ter
de 1842. Todos stes movimentos foram feitos pelas grandes
poder poltico. Junto com os baixos e mdios da cidade forma-
famlias, especialmente a revoluo de 1842, que contou com
vam o "povo". Incluem-se neste grupo os famosos "vadios" da
a participao de trs Armond, trs Teixeira de Carvalho, o
Colnia e do Imprio. Em Barbacena eram principalmente ur-
pai de Crispim J aques Bias Fortes e outros. evidente que a
banos. So muitas vzes indivduos em situao anmica, geral-
germinao, o planejamento e o desencadeamento dstes movi-
mente adotando padres de conduta divergente. Saint Hilaire
e.
t. mentos exigiam freqentes contatos entre os lderes. Os Autos
testemunha a existncia de alguns dstes indivduos: "Barba-
da Inconfidncia fornecem abundante informao sbre os
cena clebre entre os tropeiros pela grande quantidade de
. contatos de Tiradentes com os inconfidentes barbacenenses e
mulatas prostitudas que a habitam e entre cujas mos deixm
stes homens o fruto do trabalho". 11 com outras pessoas de destaque.
Temos, ento, dois grupos bem distintos, um alto em Outro dado em favor de nossa hiptese o costume geral
tdas as dimenses, outro baixo em tdas. E ainda um possvel de todo grande fazendeiro possuir casa na cidade ou no arraial.
grupo mdio. A primeira caracterstica das estruturas feudais Barbacena ainda conserva as casas de vrios de seus antigos
se verifica plenamente. chefes como o Conde de Prados, o Visconde de Lima Duarte,
os primeiros Andradas. Quando no moravam na cidade, para
Para a segunda caracterstica maior a dificuldade em
l se transferiam freqentem ente, facilitando assim os conta-
encontrar indicadores. No entanto, os conhecimentos de hist-
tos dificultados pelas grandes distncias entre as fazendas. A
ria social da poca nos fornecem elementos suficientes para
posio geogrfica da cidade, como j observado, era outro
mostrar a justeza da hiptese.
grande fator de contato, inclusive com elites de fora. Alm
Afirma-se a existncia de interao mxima entre os indi-
disto, fora da cidade, apesar das distncias, sempre existiu o
vduos altos em tdas as dimenses) interao mdia entre os
costume de se visitarem as famlias dos fazendeiros, consti-
altos e os baixos, interao mnima entre os baixos. O nexo
tuindo mesmo uma obrigao moral o pagamento de uma
terico que liga as duas caractersticas provm do fato reve-
visita.
lado pelos estudos de pequenos grupos, segundo o qual quanto
mais central fr a colocao de um indivduo numa rde de Em segundo lugar, relaes menos freqentes entre fazen-
comunicaes, mais alta ser sua posio e desenvolver maior deiros e seus dependentes. O conhecimento das relaes sociais
em uma fazenda de escravos ou mesmo numa grande fazenda
de hoje, confirma o fato. Os contatos podem ser mais ou menos
11. Cfr. Viagem pelas Provncias do Rio de Janeiro e Minas constantes, mas so menos intensos e menos ntimos. Alm
Gerais, pg. 119.
disto, no h reciprocidade. O fazendeiro, dono ou no de escra-
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REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS. POLlTICOS .. -i~'
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vos, ocupa posio estratgica na rede de comunicaes. :mIe tesco (herana) e ste adscrito por excelncia. Parentesco
o intermedirio entre seus dependentes e os elementos exter- e posse da terra eram os status bsicos, a partir dos quais se
nos a seu "feudo": outros fazendeiros, dependentes de outros adquiriam outros como a educao, o poder poltico, a "no-
fazendeiros, ou mesmo comerciantes da cidade. Muitas vzes breza", enfim. A situao mais ou menos geral no Brasil da
o fazendeiro o fiador de seu empregado e em certos lugares poca. Os dois status bsicos se relacionam em forma de inter-
o sistema do vale ainda hoje empregado. Enfim, uma rela- causao circular. Se a terra se obtinha por herana, tambni
o de poder. verdade que o prestgio familiar, a criao de uma tradio
Por ltimo, baixo grau de interao entre os indivduos de famlia, se devemmuitas vzes posse inicial da terra, como
perifricos. Esta condio se verificou de maneira perfeita nos foi o caso dos donos das primeiras sesmarias. Atravs da posse
grandes engenhos do Nordeste, onde escravos de donos dife- da terra era possvel a uma famlia subir condio de "no-
rentes no podiam comunicar-se. De modo menos perfeito, breza", s vzes sem que o prprio fator racial o impedisse,
mas no menos real, se verificou e ainda se verifica nas gran- como o caso da famlia Bias Fortes, que conta com um ele-
des fazendas mineiras. A simples distncia entre as fazendas mento de cr entre seus ascendentes. A perda, por qualquer
era um fator de isolamento, de vez que o nico meio de trans- razo, do alto status econmico traduzido na posse da terra,
porte existente, o cavalo, era privilgio de quem tinha dinheiro leva ao conhecidofenmeno das aristocracias decadentes, caso
para compr-lo e terra para sustent-Io : o fazendeiro. A subs- tpico de desequilbrio de status que geralmente se resolve
tituio do cavalo pelo transporte motorizado aumenta o con- pelo isolamento e pela margnalzao. 12
tato entre os fazendeiros, sem, necessriamente, aumentar o A estrutura, de modo geral, esttica e equilibrada. A
contato entre os empregados, uma vez que o cavalo desaparece passagem de uma posio total para outra rara, a mobilidade
ou se limita ao uso interno da fazenda. O contato entre empre- vertical reduzida. Um ou outro elemento em desequlbro
gados de fazendas diferentes s se d nas festas religiosas pode ser assimilado pelo grupo alto eos que permanecem dese-
na cidade ou no arraial. Nos engenhos de acar at ste contato quilibrados no chegam a ameaar o sistema. A base adscritiva
era evitado atravs da construo de capelas ligadas Casa acarreta, necessriamente, a estabilidade.
Grande. Mas, de qualquer forma, um contato espordico e
fortuito, que no permite interao mais estreita, capaz de DEPOIS DE 1930
desenvolver um sistema social parte, com centro indepen- A nova situao -
A situao, aps 1930, bem distinta
dente de poder. da anterior e muito mais complexa. Em conseqncia, a
No que se refere aos grupos mdios, j dissemos que eram aplicao de nossa hiptese apresenta maiores dificuldades e
inexpressivos. Embora em germe significassem um princpio de exige certos desdobramentos tericos. Antes de tudo, porm,
desagregao da estrutura feudal, na realidade no chegavam vejamos as caracteristicas da nova situao.
a amea-Ia, nem a descaracteriz-la. Os traos feudais estavam Vimos que at 1930 Barbacena poderia ser considerada
por demais ntidos. um municpio de populao predominantemente rural e de
Cremos ter demonstrado, na medida do possvel, a validez economia baseada em atividades primrias. A partir de 1930,
da hiptese do feudalismo para a realidade poltica barbaee- vrias transformaes comearam a verificar-se, em parte
nense de antes de 1930. :li: uma poltica feudal com base no
parentesco e na posse da terra. Ou seja, com base na adscro, 12. As peas teatrais de JORGE ANDRADE retratam muito bem .ste
desde que a posse da terra, geralmente, era obtida por paren- fenmeno entre as familias paulstas quatrocentonas.
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REVISTA BRASILEIRA 'DE;ESTUDOS-pOL1"l'ICOSl BARBACENA: "t;'FU{Tl' ,TA.,. A POLlTlCA

devido s transformaes gerais por que passava o pas, em Conforme o quadro r, vemos que se em 1920 77% da
parte devido a particularidades locais. populao era rural, em 1963 79% era urbana. O crescimento
Quanto localizao da populao, temos uma inverso maior da populao urbana entre 1950 e 1960 se deve cons-
completa do quadro anterior. j truo da BR3, que liga Belo Horizonte ao Rio, passando por
J
j
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Barbacena. preciso observar que esta transformao no
QUADRO I
J deve ser totalmente atribuida urbanizao. Grande parte d~
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EVOLUO DAS POPULAOES RURAL E populao rural foi eliminada por desmembramentos de distri-
URBANA DE BARBA CENA tos. Mas o que importa que atualmente em Barbacena a popu-
POPULA(}.J.O lao rural e, portanto, o eleitorado, no tem mais pso decisivo.
ANO
Os distritos emancipados continuam a ter influncia nas eleies
Rural Urbana
I Total
legislativas estaduais e federais, como mostraremos posterior-
1920 69.717 * 20.000 * 89.717 mente. Para o municpio, j em 1945 o eleitorado urbano era
1940 46.009 26.576 72.585 superior ao rural. Em 1963 o eleitorado da cidade era de 14.546
1950 37.942 30.343 68.285 eleitores, contra 1.348 dos distritos, ou seja, 92%.
1960 21.607 44.938 66.545
1963 12.164 42.866 55.030 Paralela a esta transformao demogrfica, temos a trans-
formao na estrutura agrria. Vimos como Barbacena era
dominada por grandes proprietrios rurais, situao ainda per-
Fonte: IBGE. * aproximada.
ceptvel no Censo de 1920, que registra 70% da rea rural como
70 .i
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pertencendo a estabelecimentos entre 100 e 1.000 ha. e mais
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r de 60 propriedades com rea superior a 1.000 ha. O quadro
TI mostra a evoluo da estrutura rural.
'60
- - - - - --URBANO O quadro III, elaborado pela ACAR para 1963 mostra ainda
(11ILHARES de maneira mais ntida a diversidade da situao atual.
DE .50 Vemos neste quadro que 92% das propriedades tm menos
HABI'!1IfTE3)
de 100 ha. quase uma zona de minifndios. Nenhuma pro-
priedade acima de 1. 000 ha. Como no caso anterior, o desmem-
bramento de distritos , em parte, responsvel por esta trans-
formao. Nem tdas as grandes propriedades desapareceram.
-'o Apenas passaram a fazer parte de outros municpios, como

20 -- -- f
..
o caso da prpria fazenda da Borda que hoje se acha no munic-
pio de Antnio Carlos. De qualquer modo, em Barbacena, a
posse da terra no mais base de poder econmico e de dom-
nio poltico.
10 A economia tambm sofreu transformaes importantes.
Entre 1930 e 1940 instalaram-se em Barbacena duas grandes
fbricas de tecidos. Para 1955 temos os seguintes dados do
192'0 ISI40 /!1$() 1960 1963 ffiGE sbre a indstria local (Quadro IV).
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Dados de 1961 aumentam para 112 o nmero de estabele-
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rrios. Segundo os dados acima, a indstria txtil entra com
72% do valor da produo e com 87% da mo-de-obra. Em.
112

como o reconhecem os prprios chefes partidrios. O quadro

1961 sua participao no valor da produo de pouco mais
V mostra o condicionamento da filiao partidria pela luta
de 50% e ocupa mais de 60% da mo-de-obra industrial.
familiar.
O quadro das atividades econmicas, no entanto, mostra
que a pecuria ainda importante, desde que entra com mais QUADRO V

de 60% da renda global. Esta importncia relativa da pecuria .

deve ter cado verticalmente aps o ltimo desmembramento
de distritos, em 1963, que emancipou regies de grande produ-
o leiteira como o distrito de Ibertioga. Mas no dispomos de
1930

Legio de Outubro
I
1933

PP
1931

PPB-UDB
lI 1!145

UDN
Jos Bonifcio
Legio Liberal Mineira
dados posteriores ao desmembramento.
PRM PNM PSD
O comrcio continuou a evoluir, contando a cidade em Bias Fortes PRM
I
1955 com 600 estabelecimentos varejistas e 12 atacadistas,
ocupando mais ou menos 1.500 pessoas. Entre 1930 e 1945, a nica eleio municipal que houve
em Barbacena foi indireta, ganhando Jos Bonifcio. A partir
stes dados mostram a diferena da nova situao. Um
de 1945, os resultados das eleies municipais para a prefei-
aumento acentuado da populao urbana em relao popu-
tura so como mostra o quadro VI.
lao rural e uma industrializao relativamente fraca, quase
O PTB, que o candidato a terceira fra, s lanou
que limitada s duas grandes fbricas de tecidos. Os outros
candidatura prpria em 1954 e 1962. Sua votao significa-
estabelecimentos industriais, como so designados pelos Censos,
tiva em 1954 se deve ao nome do candidato, Jos Ribeiro Na-
excetuando-se uma grande oficina mecnica e uma fbrica de varro, de famlia tradicional que por muito tempo fra aliada
tanques para caminhes, no vo alm do nvel artesanal. Se- dos Bias. J em 1962, com outro candidato, no alcanou mil
gundo o Censo de 1940, 68% da populao ativa se localizava votos. O PTB geralmente ou se alia ao PSD ou UDN. Em
no setor primrio, 22% no tercirio e 10% no secundrio. Em Barbacena se diz: "o PTB so dois: o PTB biista e o PTB
1950 esta distribuio era de 58%, 29% e 13%, respectiva- bonifacista", Atualmente mostra tendncia a uma posio de
mente. O setor tercirio cresce a uma taxa bem superior ao maior independncia. E diz-se, ento i ":o PTB so os amigos
secundrio. de Joo Navarro".
Apesar de tudo isto, a poltica de Barbacena at hoje O contrle do eleitorado pelas famlias em luta quase
comandada por algumas famlias. A nica diferena que, aps completo. Barbacena fechada a influncias de elementos de
1930, h uma polarizao das famlias sob a liderana de duas fora. A resposta que polticos costumam dar a elementos de
delas. Parte segue os Bas, parte segue os Andradas. A ter- Barbacena que os procuram : "ali no posso mexer; aquilo
ceira fra que surge, embora ainda incapaz de se medir com do Bias e do Zzinho". O voto das zonas rurais previsto
as duas anteriores, tambm comandada por uma famlia: os com exatido quase matemtica. O contrle se reflete inclusive
Navarro. Tda a poltica barbacenense condicionada pela luta nas eleies executivas estaduais e federais, embora com menor
das famlias. Os partidos polticos so apenas enquadramentos rigidez, _conforme mostra o quadro VII.
artificiais, exigidos pela legislao eleitoral. No tm nenhum O mesmo se d para os cargos legislativos estaduais e
sentido programtico ou ideolgico. Poder-se-iam inverter as federais, observando-se sempre ligeira vantagem para os
posies partidrias sem que houvesse transformao alguma, Bias (Quadro VIII) .
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QUADRO VI

VOTAAO DOS PARTIDOS NAS ELEIOES PARA PREFEITO ~:.: .1

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1947 1950 1951, 1968 19/1j
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UDN PSD (PTB) UDN PSD (PTB) I UDN PSD UDN (PTB) I PSD (PTB) UDN PI:iO:"
8.085 8.043 6.438 8.712 3.766 4.747 5.930 6.479 4.686 7.16~

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RESULTADOS
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ELEITORAIS
QUADRO

PARA PRESIDENTES
VII

POSTO
E GOVERNADORES
------------------------- I
ANOS

1945
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Dutra
(sede)
P-residente

E. Gomes
(sede)
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----

Fi za
(ser e)
Gov/lrnador
I'.
3.90~

Juscelino
2.641

Juarez Ade mar

9'

Bias
,I Bilac. P. I Gentil N.
11-1~'
1955 (munc. ) (munlc , ) (mm ie. )
2.966 7:3 7.489 2.765
6.247 2' :~':

Lott Jnio PliJ io Rib. pen~i~~:;!

Taneredo Magalhes
1960 (munc.) (munc , ) (mur ie. ) . ,',~~i.\~:.

5.918 6.569 289

6.226 6.159 389
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176 REVISTA BRASILEmA. DE ESTUDOS POLlTICOS
B'ARBACEN.A: .A FAMILIA, A POLtTICA
177
QUADRO VIII
propriedades e que o eleitorado rural perdia sua importncia,
VOTAO DE DEPUTADOS ESTADUAIS E FEDERAIS o poder econmico deixou de ser instrumento hbil para o con- 1
ANOS trle eleitoral. Os chefes polticos tinham que encontrar nova .
CANDIDATOS
1954 1958 1968
.. frmula para prender o nvo eleitorado, quase totalmente ur-
bano. O poder poltico que j possuam e que poderiam perder
Bias Fortes . 4.138 5.555 6.276 (Biazinho) se no descobrissem a nova frmula, foi quem lhes possibilitou:
J. Bonifcio . 3.936 4.696 4.738 a sobrevivncia atravs do contrle dos cargos pblicos. Surgiu
Andradinha . 3.356 3.387 e hipertrofiou-se em Barbacena uma poltica de clientela. O
Navarro . 2.177 (Jos Rib.) 2.390 (Joo) cargo pblico, ao mesmo tempo que fornecia ao poltico o nvo
instrumento de contrle, cumpria a misso de absorver os ele-
mentos vindos das zonas rurais ou de outras cidades e que
ntida a constncia dos votos para cada candidato. Veja- no encontravam colocao, uma vez que a industrializao
se por exemplo, os Navarro. Jos Ribeiro Navarro obteve 2.560 obedeceu a um ritmo lento. De economia primria, Barbacana :
votos para prefeito em 1954, 2 .177 votos para deputado esta- vai-se tornando cidade terciria, sem desenvolver o setor se- .
dual em 1958 e seu sobrinho, Joo Navarro, obteve 2.390 votos cundrio. Quase uma cidade cartorial. Damos a seguir a lista
para deputado estadual em 1962. Cremos estar suficientemente dos rgos pblicos federais, estaduais e municipais existentes
demonstrado o contrle familiar da poltica barbacenense ainda em Barbacena.
hoje. Se so duas ou trs as famlias lderes, problema
I - Federais
secundrio que no muda a natureza do fenmeno.
1- Oolgio Agrcola Diaulas Abreu;
A TRANSIO 2 - Inspetoria Regional de Sericicultura;
Diante de tdas as transformaes verificadas pareceria 3- Posto Experimental de Criao de Barbacena;
impossvel manter nossa hiptese de que a poltica de Barba- 4 - Posto de Vigilncia e Defesa Sanitria Vegetal;
cena seja ainda de natureza feudal. Se usssemos o conceito 5 -"" " "" " Animal' J
de OLIVEIRAVIANA, realmente nos seria impossvel mant-Ia. 6 - 30. Circunscrio de Servio Rural de Defesa e Fo-
Como dissemos, um conceito histrico e a situao histrica mento;
atual de Barbacena totalmente outra, tendo desaparecido
7 - OIBAR (Comissiio Brasileira de Assistncia Educa-
qualquer vestgio de cls feudais e portanto de cls eleitorais,
Uva s Populaes Rurais) ;
no sentido que lhes d o socilogo fluminense. O conceito que
8 - Escola Preparatria de Cadetes do Ar;
adotamos, no entanto, nos permite a manuteno da hiptese
com algumas nuanas. Mesmo que seja como simples hiptese. 9 - 431}Zona de Servio de Fomento Agrcola;
A principal diferena da nova situao a ausncia da 10 - Departamento de Correios e Telgrafos
aliana famlia-propriedade da terra como base do prestgio e (5 Agncias);
do poder poltico. Desapareceram as grandes. propriedades e a 11 - Ooletoria Federal;
populao rural deixou de ser expressiva como fra eleitoral. .. 12 - Agncia Municipal de Estai/istica;
Nossa hiptese que atualmente os status bsicos so o 13 - Caixa Econmica Federal;
familiar e o poltico. medida que desapareciam as grandes 14 - Horto Florestal;
 ..,.--
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BARBACENA;A F..um.IA., A: POLtTICA..
178

15 - Junta de Conciliao e Julgamento do Mini3trio do m- Municipais

Trabalho~'
1- Prefeitura e seus departamentos;
16 - Posto de Fiscalizao do Trabalho de Barbaceno;
17 - Servio de Meteorologia; 2 - 25 grupos escoiares;
18 - SAMDU; 3 - Estao Rodo'lJiria.
19 - SAPS;
20 - Agncia do lAP1; Isto sem contarmos os bancos oficiais, autarquias e rgos
de economia mista como a EFCB, EFCO, Petrobrs, CEMIG,
21 - " " IAPC;
CAMIG, ACAR, CASEMG, DER etc.
22 - " " IAPETEC;
No existem estatsticas oficiais sbre o nmero de funcio-
23 - " " IPASE;
nrios pblicos existentes nestas reparties. Tentamos um cl-
24 - " " IAPB; culo aproximado, atravs de levantamentos nas Coletorias, nos
25 - Servio Mdico do IAPFESP~' Institutos e nas prprias reparties. Chegamos a um nmero
26 - Servio de Recrutamento do Exrcito. aproximado de 5.000, que num eleitorado urbano de 14.000
representa parcela pondervel. O emprgo pblico a principal 1
TI - Estaduais base de sustentao dos polticos. Estabeleceu-se um nvo pacto, ,
semelhante ao antigo pacto feudal em que o senhor dava a pro-
1- Forum; teo em troca da lealdade do sdito. Atravs do cargo pblico
2 - Cadeia; o poltico ganha o voto do funcionrio e muitas vzes de sua
3 - 91' Batalho de Infantaria da PM; famlia e de seus amigos. A famlia to decisiva nas opes
4 - Delegacia FiscaZ; eleitorais que muitas vzes a mulher casada continua votando
com o pai. Da que um emprgo pblico pode conquistar uma
5 - Duas Coletorias Estaduais;
famlia inteira para o poltico.
6 - Caixa Econmica Estadual;
Como o poder poltico que possibilita o contrle dos
7 - Escola Normal Oficial;
cargos pblicos, o status poltico passou a substituir o status (
8 - Ginsio Tiradentes; econmico (posse da terra), como status bsico. Como, igual-
9 - Ginsio Estadual; mente, o recrutamento poltico continua a se fazer em base
10 - Escola Normal Emb. Jos Bonifcio; familial, famlia e poltica so hoje os determinantes principais
11 - 11 grupos escolares; da posio social em Barbacena, Atravs do emprgo pblico,
12 - Centro de Sade; garantem, inclusive, o status econmico. 18
13 - Hospital Colnia de Barbacena;
14 - Manicmio Judicirio; 13 . "O regime politico a. base, o alicerce principal de tda a
15 - IPSE; ordem jurdica, social, econmica". Esta afirmao do deputado Bom-
FCIO ANDRADA (cfr. Parlamentarismo e a Evoluo Bra8'ileira, Belo I
16 - Campo de Aviao; Horizonte, 1962, p. 88) mostra como a predominncia do status poltco :
17 - Duas praas de esporte; se reflete no prprio pensamento dos lideres locais. Caberia aqui um :
18 - Cartrio Eleitoral. captulo de sociologia do conhecimento.
 c,

180
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Ji:ste mecanismo permitiu a sobrevivncia das famlias tra- cena. Orgulho em parte devido tambm atuao brilhante da
dicionais, privadas de sua primitiva base de poder. No entanto, famlia na poltica nacional durante a primeira metade do
nos municpios emancipados, de populao ainda predominan- sculo XIX. Em Barbacena se uniram famlia da Borda,
temente rural, a ordem antiga permanece e boa parcela dos tambm "nobre", mas da nobreza brasileira, essencialmente
votos para os cargos estaduais e federais os chefes polticos rural, nobreza de ttulos, como, alis, tdas as outras famlias
de Barbacena ainda os recebem dstes municpios. O que pode- tradicionais do lugar. O poder poltico estava nas mos desta
ramos chamar de a Grande Barbacena forneceu, nas eleies segunda nobreza por quem, no fundo, os Andradas alimentam
legislativas de 1962, 51% dos votos de Jos Bonifcio, 70% certo desdm. Principalmente em relao famlia Bias Fortes
dos votos de Crispim J. Bias Fortes, 77% dos votos de Bonif- que conta com elementos de cr entre seus ancestrais. Da o
cio Andrada e 40% dos votos de Joo Navarro. As percenta- sentimento de privao relativa dos Andradas perante o fato
gens mais baixas de J. Bonifcio e Joo Navarro, se devem a de estar o poder poltico local nas mos dos Bias. A mais alta
maior votao dstes deputados em Juiz de Fora e Santos Du- posio familiar devia corresponder I ~" maior poder poltico.
mont (J. B.) e Juiz de Fora, Congonhas e Belo Horizonte Estava criada a condio para o desenvolvimento de um poten-
(J. N.). cial latente de agressividade que apenas esperava oportuni-
A adscro continua como trao caracterstico da situao dade de manifestar-se. Esta oportunidade veio em 1930 quando
atual, de vez que o recrutamento poltico familista. Os postos ", um Andrada liderou a revoluo em Minas e outro a liderou em
estratgicos para o contrle dos cargos pblicos que so a re- I Barbacena. As transformaes por que j comeava a passar
presentao estadual e federal, so sempre preenchidos com) o municpio, por sua vez, permitiam ste !racionamento da
elementos das famlias lderes. Os cargos menos importantes liderana. Uma das caractersticas da luta que se seguiu fOI
no legislativo e executivo municipais so entregues a famlias a sempre maior agressividade dos Andradas, o que tpico de
centrais, ligadas estreitamente s famlias lderes. situaes de desequilbrio de posio. A constante vantagem
H

diferena, porm, do quadro anterior, no h uma lide- dos Bias nas eleies mostra a fra da antiga liderana
"rural".
rana nica ou unificada. A partir de 1930 a liderana bpar-
tiu-se, havendo indcios de uma tripartio aps 1954. O fato
A HIPTESE
traz certas modificaes no processo interativo como veremos.
Um dos fatres do rompimento das duas famlias pode ser J hora de tentarmos aplicar nossa hiptese do feuda-
encontrado num desequilbrio de posio da famlia Andrada. lismo nova situao. Comecemos .com a concordncia de
Pareceria contradio afirmar ste desequilbrio uma vez que posies. As dimenses de status mais importantes seriam,
nossa hiptese supe exatamente a no existncia de desequi- agora, poltica, parentesco, renda e educao. J indicamos a
lbrios. Explicamo-nos. ste desequilibrio no se d em relao transformao dos status polticos. Nossa hiptese que con-
s dimenses de status por ns consideradas decisivas. le tinua a no haver desequilbrios importantes de posio nestas
se verifica com a introduo de uma dimenso irrelevante para dimenses. Um grupo de famlias tradicionais continua a CODS-
a estrutura social de Barbacena como um todo, mas impor- tituir o grupo alto em tdas as dimenses. Seus membros so
tante para o caso particular dos Andradas. Trata-se da nobreza geralmente profissionais liberais, principalmente advogados e
de origem. Os Andradas se consideram descendentes de uma
nobreza de sangue e possuem um orgulho de famlia ncom-
14. Veja-se a respeito, JOlIAN GALTUNG, StructuraZ TheOTy of
par velmente maior do que qualquer outra famlia de Barba- ggressWn, em: JournaZ ot Peace Research, voL 2, 1964, pgs. 95-119.
 i

182 ....';"~i"i"~r;?~
mdicos, que so, ao mesmo tempo, funcionrios pblicos. So elementos no padecem desequilirio. So mdios em tdas as .
funcionrios pblicos todos os chefes polticos de Barbacena, dimenses como exige a hiptese. De famlias no tradicionais,
exceo de Jos Bonifco . Elementos altos na dimenso renda mdia, educao secundria e mdio poder poltico. So
econmica, como grandes comerciantes e industriais, se ainda as famlias perifricas que recebem os benefcios das fammas
no fazem parte das famlias dirigentes, so por elas recru- lderes e lhes devotam grande lealdade. O fato indiscutvel no
tados, concorrendo ao psto de vereador ou mesmo de pre- que se refere aos funcionrios pblicos. Os rgos que eon
feito. Os dirigentes das duas principais fbricas de tecidos so gregam stes elementos mdios, como sejam sindicatos e asso:
elementos que vieram de fora e geralmente se mantm afas- ciaes, no desenvolvem nenhuma atividade poltica, no exer-
tados da luta poltica. Outros, porm, se ligam a um dos par- cem nenhuma presso sbre os chefes polticos.
tidos, aumentando o poder "locacional" dos polticos. Os pe- Encontramos elementos desequilibrados entre profess-
quenos desequilibrios que poderia haver entre poder poltico res, principalmente. Mas quase todos les dependem de pol-
e poder econmico desaparecem em funo do referido predo- ticos, uma vez que so funcionrios pblicos na grande maio-
mnio da poltica. Os elementos que no dispem de poder pol- ria. Da no disporem de instrumento algum para disputa do
tico correspondente a seu poder econmico no se sentem em poder. Quanto aos profissionais liberais em geral j observamos
situao de privao relativa devido a ste predomnio e por- que a maioria pertence s famlias tradicionais. Entre os pre-
tanto no desenvolvem agressividade. A comparao feita em feitos e candidatos a prefeito de Barbacena, entre 1930 e 1962,
relao s posies mais baixas, resultando uma satisfao 95% eram liberais. A percentagem para os vereadores de
relativa. Por exemplo, um industrial ou comerciante que seja 36%.
alto na dimenso econmica e menos alto na dimenso poltica, Podemos concluir, ento, que no houve modificaes qua-
ao comparar-se com os polticos no levar em conta sua litativas. A concordncia de posio continua como caracte-
alta posio econmica mas sua menos alta posio poltica, rstica da estrutura social de Barbacena.
dando-se por satisfeito e concordando com o fato de no pos-
Para a segunda caracterstica temos maiores problemas.
suir poder poltico igual ao das famlias lderes. Em Barba-
A polarizao das famlias provocou o surgimento de dois
cena no h orientao para o "achievement" como, alis, era grupos distintos, cada qual com uma famlia lder, um grupo
de se esperar numa estrutura feudal no sentido em que a vimos de famlias centrais e familias perifricas. Para entendermos
caracterizando. A estabilidade sua lei.
o funcionamento da interao social nesta situao necessrio
No difcil, igualmente descobrir uma camada da popu- que recordemos algo da teoria dos conflitos," Em todo con-
lao que ocupa posio baixa em tdas as dimenses. So, flito podemos distinguir duas fases. Logo aps a emergncia
de um modo geral, operrios, empregados domsticos, elemen- do conflito temos a fase da definio das lealdades, caracte-
tos sem emprgo fixo etc. Ao tratarmos da segunda caracte- rizada pelo mximo de violncia e em que as relaes intra-
rstica nos referiremos com mais detalhe a ste grupo, princi- grupo so totalmente positivas e as relaes extragrupo total-
palmente aos operrios. mente negativas. A seguir vem a fase de institucionalizao
A maior diferena com o quadro anterior vamos encon- do conflito, com as lealdades j definidas e certo restabeleci-
tr-Ia no grupo mdio, agora numericamente maior e politi- mento de relaes positivas extra-grupo, caindo ao mesmo
camente mais importante. So funcionrios pblicos inferio-
res, pequenos comerciantes, bancrios, comercirios, choferes, 15. Cfr. JAMES S. COLEMAN, Oommunity Oonflict, Glencee, TIl.,
professras primrias etc. Afirmamos, no entanto, que stes The Free Press, 1957.
 -
REVISTA BRASILEIRA DE: ESTUDOS POL1'l'ICOS

tempo o grau de violncia. Em Barbacena, a primeira. fase nicar-se, principalmente atravs de associaes de elite como
corresponde ao perodo que vai de 1930 a 1950. A partir do o Rotary e o Lions. A freqncia aos clubes deixa de obedecer
momento em que os contendores puderam avaliar as respec- ao facciosismo, surgem clubes neutros e apoltcos.
tivas posies atravs dos resultados eleitorais, foi possvel Nossa hiptese que aos poucos se restabelecero as
introduzir certo grau de racionalizao e diminuir o teor emo- relaes entre as famlias centrais pertencentes a faces dis-
cional da luta. tintas. ste restabelecimento j se verifica em setores apol-"
Durante a primeira fase h certamente uma reduo da tcos e paulatinamente se estender a todos os setores de ativi-
interao entre os elementos de posio alta pertencentes ~ dades. As dificuldades em grande parte so devidas violncia
faces diversas, embora dentro de cada faco esta interao da luta que deixou profundas mgoas na gerao que a viveu.
fsse mxima. Nesta fase Barbacena viu tda sua vida social Mas tudo isto desaparecer com as novas geraes. E, como
fracionada. Dois clubes, duas rdios, dois jornais; irmandades, j dissemos, a violnciano intrnseca a esta luta. No pode-
associaes, instituies, dominadas por uma ou outra faco; mos compar-Ia s lutas de famlias estudadas por CoSTA
proibio de casamentos mistos. O romance Serras Azuis de PINTO. Nestas ltimas a honra da famlia empenhada e elas
Geraldo Frana de Lima descreve de maneira pitoresca esta s terminam com a eliminao fsica de um dos contendores.
fase. a poltizao de todos os setores da vida, o que mais ~'

Em Barbacena a luta apenas poltica e tem a funo princi-

uma vez confirma nossa afirmao a respeito da dominncia pal, embora nem sempre manifesta, de permitir um controle
dos status polticos. simultneo do poder pelas duas famlias. A violncia pertenceu
Dentro de cada grupo verificava-se a hiptese, com m- a uma fase j superada. E nada impede uma diviso pacfica
xima interao poltica entre as famlias centrais e mnima do poder, legitimando-se cada famlia pela capacidade que de-
entre as famlias perifricas. monstre como agenciadora dos intersses dos clientes.
Esta fase, no entanto, foi provisria. Foi apenas o preo A interao mnima entre os elementos baixos pode pare-
do primeiro fraccionamento da liderana. As transformaes cer mais estranha. A vida urbana elimina, de incio, as fron-
sofridas pelo municpio, principalmente o aumento da popula- teiras fsicas das fazendas e reune geogrficamente as pessoas.
o urbana necessitando de colocao,tinham tornado difcil o As atividades urbanas, igualmente, permitem contatos fre-
atendimento de todos por uma nica liderana. Os intersses qentes nos locais de trabalho, de lazer etc. Pareceria difcil
se multiplicavam possibilitando e mesmo pedindo uma lide- falar, ento, de interao mnima num grupo que representa
rana desdobrada. O aspeto violento da ciso se deve em
parte ao que j foi dito da famlia Andrada, em parte ao fato
..
parte aprecivel da populao. E o seria, realmente, se nos
referssemos aqui a todo e qualquer tipo de interao. Mas o
de ter sido a primeira ciso e de ter seguido a uma liderana que nos interessa a interao poltica, a que diz respeito
nica particularmente dominadora. Prova-o o fato de se estar ao poder poltico. E quanto a esta mantemos a hiptese. O
verificando atualmente uma segunda ciso, a partir da fam- principal grupo baixo em Barbacena so os operrios. Entre
lia Navarro, sem trao algum de violncia. A famlia Navarro stes destacam-se os teceles pelo maior nmero. Pois bem,
no padece de desequilbrio de posio e se beneficia da ciso seu rgo representativo, o sindicato, que conta com mais de
anterior como um autntico "tertius gaudens". mil scios, no representa de modo algum a quebra das rela-
Assim que aos poucos a situao vai novamente voltando es patrmonalstas, E podemos falar aqui no s das relaes
configurao anterior. As famlias centrais voltam a comu- polticas mas tambm das relaes econmicas,sem dvida as
 BARBACENA: A. F.AMlLI.A. A POLrrICA 181

mais importantes para a posio social. Em Barbacena encon- 4 - ASPETOS METODOLGICOS E IMPLICAES
tramos os mesmos padres de relaes industriais encontrados TERICAS
por JUAREZBRANDOLoPES em fbricas da Zona da Mata. 16
Do ponto de vista econmico, a relao operrio-patro ainda guisa de concluso, queremos, neste captulo, fazer al-

se faz em grande parte por contato pessoal. O operrio no guns breves esclarecimentos e algumas, tambm breves, obser-
recorre ao sindicato por medo de represlia do patro. Vrias vaes.
prticas patrimonalstas esto ainda em vigor e a participao Como j ficou dito na introduo, o que fizemos foi ape-
na vida sindical mnima. O mesmo se diga quanto poli- nas levantar uma hiptese explicativa para a realidade poltica
tica, O sindicato no formula os intersses dos operrios. No de Barbacena. Para isto nos baseamos principalmente em dados
tem posio ideolgica e no exerce presso sbre os polticos. estatsticos e histricos e em entrevistas pessoais. Tomamos
Basta dizer que o voto operrio em Barbacena ainda predo- como hiptese uma teoria das estruturas feudais e indicamos ,
minantemente PSD e UDN. Os contatos com os polticos, com base nas informaes colhidas, como a realidade poltica
semelhana dos contatos com o empregador, so pessoais, dire- de Barbacena se enquadraria dentro desta teoria. No se trata
de um teste da hiptese. Para test-Ia necessitariamos de outras
tos" Basta passar um dia na casa de um poltico para se com-
modalidades de investigao. trabalho que talvez venhamos
preender o mecanismo do sistema. A ela acorrem todos os tipos
a realizar quando o permitirem as circunstncias. Para a pri-
de pessoas com todos os tipos de problemas a serem resol-
meira fase, alis, bastar uma coleta mais exaustiva de dados
vidos, desde a consecuo de um emprgo at soluo de
estatsticos e histricos, de vez que no possvel outro tipo de
um caso policial, de uma briga domstica. Confirma-se a
investigao. Acreditamos mesmo que os dados levantados
tambm, a existncia de interao mdia entre altos e baixos.
demonstrem com suficiente exatido a validade da hiptese.
Outros sindicatos, no tm igualmente nenhuma atuao O mesmo no se d para a segunda fase. A par de mais dados
poltica. A caracterstica feudal de interao mnima entre os estatsticos, ser necessrio aplicar outros processos de inves-
elementos baixos se verifica plenamente em Barbacena, tanto tigao, como o questionrio, para um teste definitivo da hip-
na poltica como na economia. tese. Teremos que determinar com mais exatido quas so as
Concluimos, assim, pela valdez de nossa hiptese, com as famlias centrais com posio alta, as relaes entre estas
ressalvas apresentadas, tambm para a fase posterior a 1930. famlias, a importncia do elemento familiar no recrutamento
A fragmentao da liderana no modificou a estrutura das poltico, o predomnio da dimenso poltica, a natureza das rela-
relaes sociais. Apenas institucionalizou-se uma diviso de es clientelsticas, as motivaes eleitorais, o mecanismo e as
poder entre famlias tradicionais anteriormente unidas. Basta consequncias do fracionamento da liderana. Somente aps
que se atenda ao fato de que Barbacena permanece totalmente um estudo desta natureza ser possvel concluir-se pela vali-
fechada penetrao de elementos no pertencentes a alguma dade total, pela validade parcial ou pela no validade da hip-
de suas famlias tradicionais. Um elemento de fora encontrar, tese. Ou mesmo, poder ste estudo sugerir desdobramentos ou
aperfeioamentos da teoria de estruturas feudais que utiliza-
unidos contra le, todos os chefes polticos em luta dentro de
mos, na fecunda dialtica entre teoria e pesquisa.
Barbacena.
Independentemente da confirmao ou no de nossa hip-
tese, o presente trabalho nos permite tirar certas concluses
16.- Cfr. JUAREZ B. LoPES, Relations IndustrielZes lians deua: Oom- e fazer algumas observaes de carter terico em relao aos
munauts brsiZiennes, em: 8ocioZogie du TravaiZ, 1961, n9 4, pg. 18-32. estudos polticos em Minas.
 A partir dos estudos pioneiros do prof. ORLANDO M. O caso de Barbacena mostra claramente que elementos de
CARVALHO,17 uma das teses mais difundidas sbre o compor- ocupao tipicamente urbana podem adotar pautas de compor-
tamento eleitoral o enfraquecimento dos partidos de centro, tamento perfeitamente tradicionais. Queremos destacar espe-
PSD, UDN, PR, em benefcio dos partidos urbanos, PTB e cialmente o caso dos advogados. Entre prefeitos e candidatos
PC. Os partidos de centro seriam essencialmente rurais e a a prefeito de Barbacena aps 1930, 47% so advogados. E
urbanizao seria o fenmeno responsvel pela transformao. s
todos os chefes polticos, incluindo os deputados estadnas
Esta tese do prof. ORLANDOM. GARV ALHOno se con- .. :t e federais, so tambm advogados. So, portanto, profissionais
firma em Barbacena , Se le encontrou 50% de elementos "urbanos" que lideram a poltica tradicional em Barbacena.
ligados agricultura, pecuria e comrcio entre os prefeitos O fato vem confirmar estudos feitos sbre o papel dos advo-
do PSD e da UDN em Minas, em Barbacena estas cate- gados nos pases em desenvolvmento.> Os juristas formados
gorias profissionais no possuem um nico representante na tradio do Direito Romano se apresentam como fra
entre os prefeitos e candidatos a prefeito de 1930 at hoje. nitidamente conservadora, como obstculo mesmo ao desen-
Para os vereadores o prof. ORLANDOM. CARVALHO encon- volvimento e modernizao. O fato talvez explique a maior
trou 72% para o PSD e 61% para a UDN. Em Barbacena rigidez ideolgica da UDN pois, segundo o prof. RLANDO DE
temos 42% para o PSD e 46% para a UDN. Por outro lado, CARVALHO, em 1952, 87.% dos deputados estaduais e federais
os profissionais liberais representam 95% dos prefeitos e can- dste partido eram advogados, contra 38% do PSD, onde os
didatos a prefeito em Barbacena e 36% dos vereadores. Nas mdicos chegam a predominar na bancada estadual. :m outro
eleies de 1962 os vereadores funcionrios pblicos represen- fator de estabilizao para a poltica barbacenense. 20
tam mais de 50% do total, ao passo que os fazendeiros apenas Segundo o prof. JLIOBARBOSA, s nas cidades maiores
comparecem com 13 %. Se usarmos, portanto, o critrio da
ocupao para determinar o "ruralismo" ou a "urbanidade" de
(de mais de 20 mil habitantes), estaria sendo destrudo 0-: I
complexo patrmonalista-familar, com o crescente desenvol- !
um partido, em Barbacena o PSD e a UDN so partidos urba- vimento dos setores secundrio e tercirio da econom.ia.21__
nos, tanto quanto o PTB. Alm disto, a acentuada urbanizao Barbacena mais uma vez exceo. Pelo ltimo recenseamento,
de Barbacena no trouxe prejuzos aos partidos centristas. a 6'" cidade de Minas em nmero de habitantes (41. 931) ,
Notamos, realmente, certo crescimento do PTB mas vimos com um setor secundrio aprecivel e um tercirio superdesen-
tambm que ste crescimento no significou nenhuma modifi- volvido. No entanto, vimos que, assim como as ocupaes urba-
cou no processo poltico, obedecendo aos mesmos padres nas, tambm as organizaes urbanas como sindicatos e associa-
clientelsticos do PSD e da UDN.
es, no significam quebra dos padres tradicionais. Valeria
Da julgarmos procedente a observao do prof. JLIO para Barbacena a hiptese gurvtana que o prof. JLIo BAR-
BARBOSAquanto ao uso de categorias ocupacionas como indi-
cadoras do sentido urbano ou rural de um partido poltico. 18
19. JOHAN GALTUNG, DeveZopment and intellectual 3tyZe3, Buenos
Aires, 1964, texto mimeografado.
17. Cfr. ORLANDO M. CARVALHO, Ensaios de SocioZogia Eleitoral, 20. Podamos acrescentar ainda como fator de estabilidade, o fato
ed. da RBEP, Belo Horizonte, 1958. de que a herana politica obedece lei da primogenitura. Pesquisas
18. Cfr. JLIO BARBOSA, Anlise sociolgica da8 elei6es de 1962 realizadas indicam que os prmogntosso menos inovadores e criadores
em Minas Gerais, em: Rev. Bras. de Cincias Sociais, voI. III, ne 2, que os irmos mais jovens.
1963, p. 322 s. 21. Cfr. op. cito pg. 307 e 320.

,
I
/.
 REVISTA BRA.SI.EIR.A.
.:~;~;~i*f~::~Xt1j~'~f~*~r.~~~.
Dm: ESTO'DoS-PLiTICOS"
190

BOSAaplica s cidades menores, isto , a existncia de um anlise tem sido feita apenas em trmos quantitativos, utili-
descompasso social em virtude de uma transformao no nvel zando-se, quanto aos aspetos qualitativos, concluses obtidas
morfolgico no acompanhada de transformaes paralelas nos em contextos diversos do nosso. A partir do fato numrieo da
nveis mais profundos da realidade, como os valres e os mode- urbanizao (a populao mineira vivendo em cidades de mais
los de conduta. A hiptese implica uma srie de dificuldades ~.-
de 10 mil habitantes passou de 8% em 1940 para 12 % em 195.0
tericas no que diz respeito ntercomunicao entre os vrios e a 21% em 1960), conclui-se pelo surgimento de padres ur-
nveis de profundidade e a certa concepo determinista das :;
banos de conduta e pela quebra dos padres rurais tradicionais.
relaes todo-parte numa determinada estrutura social. Mas Na anlise eleitoral ste ponto de vista leva s teses a que nos
no a discutiremos aqui. referimos, sbre a decadncia dos partidos rurais e a ascenso
Confirmando a hiptese do prof. ORLANDOM. CARVALHO, dos partidos urbanos.
existe o estudo de Ltnz SILVAsbre Barroso, cidade prxima Em Minas Gerais, ste enfoque da urbanizao resulta por
a Barbacena, onde recentemente se instalou grande fbrica de demais abstrato. Pelo que podemos deduzir de nosso' estudo,
cimento.22 Quer-nos parecer, no entanto, que o estudo Lmz a correlao entre urbanizao, modernizao e secularizao,
SILVAdeve ser aprofundado para apresentar resultados convin- nos parece muito menor do que geralmente se acredita. Grande
centes. As razes que vimos expondo nos levam a duvidar de parte da urbanizao em Minas se enquadra ainda no conceito
que a transformao tenha sido realmente profunda e signifi- de urbanizao primria, como o caso de Barbacena, H um
que a derrota das grandes famlias. Pois o crescimento do PTB desenvolvimento do tercirio sem que o secundrio se desen-
em Barbacena se faz exatamente nos mesmos moldes do PSD volva no mesmo ritmo. Resultam as cidades cartorias, Se o
e da UDN. Da tambm que a desarticulao das oligarquias caso de Barbacena no nico, como queremos crer, ste tipo
observada pelo prof. ORLANDODE CARVALHO,embora seja um de urbanizao no traz modificaes fundamentais nas rela-
fato, exige muita cautela ao ser interpretada. No precisa es sociais.
significar transformaes qualitativas. A elite fragmenta-se Quanto industrializao, excetuando-se a que se verifica
mas permanece a mesma. recentemente na Zona Metalrgica, pouco vai alm do nvel
De tudo isto, podemos concluir que para se fazerem gene- artesanal. As maiores indstrias so as de tecidos, pioneiras
ralizaes sbre a evoluo do comportamento poltico em em Minas, embora com sculos de atraso em relao a seu
Minas, so necessrios mais estudos de casos como os de Lmz surgimento na Inglaterra. Ora, as relaes industriais nestes
SILVAe como o presente. A anlise apenas baseada em resulta- estabelecimentos cabem perfeitamente nos moldes estabelecidos
dos eleitrais globais til mas no suficiente. S a compa- por JUAREZBRANDOLOPES e que verificamos em Barbacena.
rao entre vrias situaes concretas nos poder capacitar a No so relaes capitalistas tpicas. So feudais. A anlise
tirar concluses com maior grau de preciso. que esquecesse stes fatos estaria fadada a laborar em srios
enganos.
Fundamentalmente, o problema est na maneira de se
Uma concluso se impe: os jovens socilogos e estudiosos
analisar o processo de industrializao e de urbanizao. Esta
da poltica tm a sua frente um campo vasto e apaixonante.
Que les se modernizem mais rpido que nossas estruturas so-
22. Cfr. LUIZ Sn.VA, Implicaes polticas do desenvolvimento ciais e saiam a campo para trabalhos de rigor cientfico cada
industrial em Barroso - MG, em: RBEP, julho de 1960, pg. 234-251. vez mais apurado.
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'!4

192 ,REVISTA BRASU,EIRA DE ESTUDOS POL1TICOS BARBACENA:A F AMn.IA, Ao POLlTICA

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