Rosicler Martins Rodrigues - O Homem Na Pré-História

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Rosicler Martins R o d r i g u e s

Rosicler Martins Rodrigues


Biloga e ps-graduada em Zoologia pela
Universidade d e S o Paulo.
Autora de livros de divulgao cientfica publicados pela
Editora Moderna.

homem
na pr-histria

2 a edio
Edio reformulada

=111 Moderna
Existe uma grandeza no modo de se ver a vida, com seus mltiplos
poderes, como sendo inicialmente soprada pelo Criador em
algumas formas ou em uma s e que, enquanto este planeta foi
girando de acordo com as leis da gravidade, de um comeo to
simples tenham evoludo e continuem a evoluir em infinitas e
maravilhosas formas.

Charles Darwin
A origem das espcies
Sumrio

Apresentao

1 D e onde viemos?

2 O mundo dos primatas

3 O chimpanz e seus hbitos

4 A histria de Lucy

5 O criador da pedra lascada


6 A dominao do fogo 30

7 O Homo sapiens 36

8 O caador de imagens 42

9 A domesticao de plantas e animais 47

1 0 O homem, hoje 52

Consideraes finais 55
Apresentao

s espcies de seres que vivem hoje


so descendentes de outras que
viveram no passado distante, as quais provm de outras
ainda mais antigas. Assim, recuando no tempo, chega-
ramos a tantos milhes de anos que nem conseguimos
imaginar. E a longa histria da vida, iniciada no mar, com
seres diminutos que se transformaram atravs do tempo,
conquistaram a terra firme e povoaram a Terra.
A nossa espcie tambm faz parte dessa histria
Filho da natureza, o ser humano est sujeito s leis da
vida e da morte. Ele tambm um animal. Embora sem
a fora e as garras de um leo, sempre foi caador,
porque inventou armas e armadilhas. No tem a pe-
lagem do urso, mas vive nas regies geladas, fazendo
roupas de panos e peles para se proteger. Mesmo no
tendo dentes resistentes como os do boi ou aguados
como os do co, come plantas e carnes duras, porque
sabe usar o fogo para assar e cozinhar.
O ser humano cria mundos imaginrios, lembra-
-se do passado e sonha com o futuro; sabe que vai
morrer e sente medo da morte. Fala, escreve, l e,
assim, transmite o que sabe para filhos, netos e futuras
geraes. Tem um lugar especial na natureza, mas
no senhor dela.
Hoje, quando tanto se fala do poder que o ho-
mem tem de modificar a vida na Terra, importante
conhecer a origem da nossa espcie, saber como
nossos antepassados sobreviveram e garantiram a
existncia de cada um de ns.
A nossa espcie um resultado provisrio da
natureza e continuar se modificando, como todas
as demais espcies do planeta. N o s s o corpo e nos-
sa mente, nossas relaes com os outros e com
o ambiente esto mudando e seguiro caminhos
que podem levar a uma nova etapa da evoluo da
humanidade.
/ /

c a p t u o

De onde viemos?

Em todas as pocas e em todos os lugares, as pessoas sempre


criaram explicaes sobre a origem do mundo e procuraram respon-
der a uma pergunta: De onde viemos? E ela tem sido respondida
durante sculos atravs de histrias sagradas que narram aconteci-
mentos ocorridos no "princpio" de todas as coisas e de todos os
seres da Terra, graas ao de
entes sobrenaturais. Essas histrias
constituem os mitos.
U m d e s s e s mitos o G-
nesis, narrado na Bblia, o livro
sagrado dos judeus e cristos. Ele
conta como Deus. um ente sobre-
natural, criou o mundo e tudo que
nele existe, inclusive o homem e
W a mulher.
Essa histria mtica da cria-
o, narrada na Bblia, cria um

m
:
mundo mgico que satisfaz reli-
giosidade dos seres humanos.
As explicaes cientficas so-
bre a origem da Terra e dos seres
"Assim o s c u s e a terra e tudo q u e existe
foram a c a b a d o s . E, havendo D e u s a c a b a d o vivos so mais recentes do que o
s u a obra, no stimo dia d e s c a n s o u . "
mito bblico, pois foi somente no
fim do sculo 19
que certos fatos da
natureza levaram
alguns estudiosos a concluir que todas as espcies tm sua "E formou o Senhor
D e u s o homem
origem na aurora da vida. No caso da espcie humana, l do p d a terra e
soprou em s e u
no passado distante existiu uma espcie que pode ter sido
nariz o flego d a
ancestral do homem e tambm do chimpanz. vida. E o homem foi
feito alma vivente.
Naquela poca, as ideias sobre o passado dos seres E d i s s e o Senhor
humanos causaram espanto e indignao. Alguns at D e u s : 'No bom
q u e o homem
aceitaram que as espcies mudam atravs do tempo, e s t e j a s ' . Ento
fez cair um s o n o
uma vez que j tinham sido encontrados muitos fsseis pesado sobre Ado
de animais pr-histricos. Mas afirmar que um ser to e este adormeceu.
E tomou D e u s uma
inteligente como o ser humano tem a mesma origem do de s u a s costelas e
p s a carne em s e u
chimpanz, j era demais!
lugar e d a costela
Muitos consideraram revoltantes tais ideias sobre a tirada d e Ado
formou D e u s uma
origem da espcie humana, contrrias aos ensinamentos mulher."
bblicos, e no pouparam o criador da Teoria da Evoluo
Charles Darwin quando ele publicou, em 1 8 7 1 , seu livro A
origem das espcies. Os jornais da poca publicaram caricaturas,
ridicularizando suas ideias.
Depois de Darwin, muitos outros cientistas se dedicaram a in-
vestigar o passado da humanidade recolhendo pistas que ajudaram a
reconstituir como eram e como viviam nossos remotos ancestrais.
mui Charles Darwin, autor da
Teoria da Evoluo, q u e
revolucionou o s conceitos
s o b r e o ser humano.

Gorila: " E s s e homem quer ofender minha


famlia. Diz que meu descendente".
Senhor Bergh: "Senhor Darwin, dlrija-lhe
uma palavra d e conforto".

Professor Ictlossauro:
"O fssil q u e o s s e n h o r e s
e s t o vendo pertenceu a
algum animal inferior; o s
dentes s o muito frgeis, a
mandbula muito fraca, e o
que mais intriga c o m o e s t e
animal teria conseguido obter
comida".
As pistas mais importantes so o s s o s que mostram se seus
donos eram do sexo masculino ou feminino, jovens ou adultos,
altos ou baixos, velhos ou jovens, m a s no revelam se eram
peludos ou no, gordos ou magros, negros ou brancos. As ima-
gens desses indivduos pr-histricos foram criadas por artistas
que se b a s e a r a m nos dados dos cientistas e em sua prpria
imaginao.
No fcil encontrar o s s o s de seres humanos que morre-
ram h dez mil, cem mil ou at um milho de anos. Uma das
razes que havia poucos seres humanos naquele tempo. Muitos
morriam devorados por animais. Os que morriam de doenas
se decompunham, e os o s s o s expostos a o sol e chuva viravam
p . que o vento levava.
Os o s s o s que e s c a p a r a m de virar p s o aqueles que fi-
caram soterrados em p o o s de asfalto ou em p n t a n o s . Assim
p r o t e g i d o s foram s e tornando mineralizados c o m o p e d r a s .
Esses o s s o s fossilizados foram encontrados por cientistas que
investigam o p a s s a d o , ou casualmente por trabalhadores que
cavavam a terra p a r a construir alicerces ou tneis. Muitos des-
ses o s s o s estavam em p e d a o s , que foram colados c o m o um
quebra-cabea.
Outras pistas importantes para a investigao do p a s s a d o
s o os fsseis de outros animais e de plantas, pois permitem
recriar o cenrio onde nossos ancestrais viviam.
Fundamentais na investigao do nosso p a s s a d o s o os
instrumentos de pedra fabricados pelos homens pr-histricos,
pois ajudam a imaginar como era a sobrevivncia do dia a dia
naqueles tempos.
Os esqueletos e os instrumentos de pedra s o , portanto, a s
principais pistas para descobrir a origem da nossa espcie. Mas
h muitas outras e, quanto mais recente for a p o c a pesquisada,
mais variadas e numerosas sero e s s a s pistas, tornando mais
fcil investigar o p a s s a d o .
Pedras l a s c a v a m
outras p e d r a s at
que f i c a s s e m com
bordas cortantes,
o suficiente para
rachar rvores,
quebrar o s s o s ,
servindo tambm
c o m o arma d e
defesa.

Depois d e bem
pontiagudas, a s
p e d r a s serviam
para tirar o couro
d e animais e fur-
lo e tambm para
desenterrar razes,
alm d e s e r e m b o a s
pontas d e lana.

Dentes de javali, furados de


um lado, encontrados a o
lado d e um esqueleto. Muito
provavelmente formavam um
colar, com um cordo p a s s a d o
atravs d o s furos.
O s s o s d e mamute
encontrados em crculo,
vrios d e l e s e m p
e enterrados. Talvez
tenham servido para
prender a s p e l e s que
cobriam a a r m a o de
uma c a b a n a .

Os cientistas que pesquisam o passado so os arquelogos


(na lngua grega, arqueo = velho e /ogos = estudo). Para poder
compreender melhor a forma de vida passada, eles frequentemente
pedem ajuda aos antroplogos (de antropo = homem), que estudam
povos que, ainda hoje, sobrevivem como nossos antepassados na
pr-histria: para comer, eles caam e colhem frutos, razes, folhas,
ovos, mel, mariscos, sem nada plantar ou criar.

13
c a p t u l o

O mundo dos primatas

Para compreender o passado da humanidade, os cientistas


tambm estudam os primatas, um grupo onde esto os animais mais
parecidos com os seres humanos.

O homem, o chimpanz, o gorila, o orangotango e


o gibo formam o grupo d o s antropides, q u e quer
dizer "parecidos com o homem".

14
Tambm s o primatas o mico, o m a c a c o - a r a n h a e
c e n t e n a s d e outros m a c a c o s do mundo d a s rvores, bem
c o m o o babuno e o mandril, q u e vivem no cho, alm do
lmur, do g l a g o e outros m e n o s conhecidos.

Os primatas, apesar de serem diferentes uns dos outros, tm


caractersticas semelhantes. Todos os primatas, apesar de diferentes
uns dos outros, descendem de pequenos animais como os esquilos,
que viveram h sessenta milhes de anos, ao lado dos dinossauros.
Por terem um ancestral comum, os primatas tm caractersticas
semelhantes.
Vejamos quais so elas.

Postura ereta
Todos os primatas so capazes de ficar em p, embora s os
humanos tenham postura ereta constante, o que foi uma grande
conquista, pois ficar em p libera as mos, permite enxergar mais
No chimpanz, a coluna
vertebral n o fica em linha reta
com a s pernas, e o s msculos
d a s c o x a s no c o n s e g u e m
mant-lo e m p por muito
tempo. Ao andar, ele apoia a s
c o s t a s d a s m o s no cho.

Andar uma adaptao to importante para o ser humano


quanto voar para os pssaros. Foi caminhando que nossos remotos
ancestrais saram da frica e se espalharam pelo mundo...

As mos
Todos os primatas tm mos, mas nenhum tem a habilidade
dos seres humanos, que so capazes de enfiar uma linha na agulha,
girar uma chave de fenda com fora, tocar violo com destreza.
O mico tem mos desajeitadas porque todos os seus dedos
se movem de uma s vez. Os dedos das mos de outros macacos
movem-se melhor, mas somente o polegar
do chimpanz e do homem capaz de
~~7\ encostar nos outros dedos e segurar
;r u at mesmo uma bolinha. Observe
os desenhos:
Mico Chimpanz

Macaco
A viso
Ter m o s hbeis n o serviria muito a o s
primatas se eles no fossem capazes de perceber
a que distncia esto os objetos. Essa outra se-
melhana entre os animais desse grupo: sua viso
em terceira dimenso permite-lhes avaliar a que
distncia esto as coisas.
Vivendo nas rvores fundamental enxergar
bem, porque na hora de saltar de galho em galho
preciso avaliar corretamente a distncia entre
eles.
Muitos primatas tambm percebem cores,
encontrando com facilidade as folhas e os frutos
preferidos no meio da vegetao.
O homem anda ereto, tem os olhos distantes
do cho e percebe a que distncia esto os objetos.
Por isso enxerga melhor e sua viso tem mais al-
cance do que a dos animais que andam de quatro.
Essas caractersticas foram muito importantes para
A percepo de
a sobrevivncia da nossa espcie. Ainda hoje essas profundidade maior
qualidades nos ajudam a sobreviver em vrias situa- nos primatas, q u e tm o s
olhos c o l o c a d o s lado a
es, principalmente no trnsito das cidades. lado na face, pois o c a m p o
d e viso d e um olho s e
s u p e r p e a o do outro.

Tempo de crescimento
Comparados a outros mamferos, os primatas demoram a se
libertar dos cuidados da me. O ser humano o mais dependente.
Quando nasce, no consegue sequer ficar em p e s por volta dos
oito anos que comea a se soltar para o mundo.
Durante o longo tempo em que dependem dos pais, os filho-
tes de primatas aprendem muita coisa. E tudo o que aprenderem
ensinaro para os filhos.
Com a p e n a s um ano d e idade, o gato s o b e nos muros,
c a a , defende s e u territrio e atinge a maturidade social e
sexual. O gorila e o homem, com um ano d e idade, s e q u e r
sobrevivem s e m a proteo d a m e e de outros adultos.

18 Maturidade social
17
16
15
14 Maturidade sexual
13
CD 12
T3
11
cs
10
0)
9
~o 8 Fim da infncia
CO
O 7
c
6
< 5
4
3
2
1
Nascimento
Gato Gorila Homem

Linguagem
Os seres humanos tm a capacidade de emitir sons extrema-
mente variados, que so combinados para formar palavras com
que expressam sentimentos, fatos e
ideias. Assim formada a linguagem.
Desde os tempos pr-histricos ela
usada para transmitir o conhecimento
atravs das geraes. Dessa maneira, o

No incio, a s figuras e o s
sinais eram g r a v a d o s nos
p a r e d e s d e rocha.
conhecimento ampliado e modificado atravs do tempo, resultando
na evoluo da cultura humana, que est sempre se renovando e
criando novos caminhos para o futuro.
Entre os primatas, os humanos so os nicos que tm lingua-
gem elaborada. Por meio dela, o conhecimento vai se ampliando e
a histria da humanidade vai sendo contada atravs do tempo.

c a p t u l o

O chimpanz e seus hbitos

Pesquisadores que convivem com os chimpanzs nas florestas


africanas e criam esses animais como se fizessem parte de suas
famlias contam coisas interessantes sobre eles.
O ser humano sempre se considerou o nico capaz de planejar
e fazer instrumentos porque isso exige vrias habilidades: pensar o
que pretende fazer, imaginar o instrumento, escolher alguma coisa
do ambiente em que vive e com ela elaborar o objeto. Esse proces-
so sempre pareceu ser bastante complicado para a cabea de um
animal, mesmo que fosse um chimpanz.
Grande engano! Os chimpanzs fazem e usam instrumentos
para realizar vrias tarefas. Uma delas tirar cupins dos cupinzeiros.
Com pacincia, os chimpanzs procuram gravetos apropriados
para enfiar nos cupinzeiros. Quando no os encontram, cortam um
ramo e arrancam suas folhas para fazer uma varinha.
Os chimpanzs tambm escolhem pedras e
' V paus para se defender do leopardo, seu pior inimi-
1' vKaSm {'' S- Primeiro, atiram pedras e paus de cima das
: rvores. Depois, se for preciso, enfrentam
a fera com porretes nas mos.
/
T a m b m f a z e m u m a e s p c i e de
tf
esponja para beber gua e se limpar. Pri-
meiro amassam e mastigam um punhado

Chimpanz " p e s c a n d o "


de folhas. Depois mergulham a esponja de
s e u alimento. Ele folhas na gua. Espremida na boca, como tomar
enfia u m a varinha no
cupinzeiro para q u e um copo de gua. Essa esponja tambm usada para
o s cupins a mordam,
limpar os pelos.
ficando a g a r r a d o s
a ela. Em s e g u i d a o Os chimpanzs vivem em sociedade e obede-
chimpanz retira o
galhinho e c o m e o s cem aos lderes do bando. Eles p a s s a m boa parte do
cupins.
dia comendo folhas e frutos. Os machos mais velhos
cuidam da segurana do bando e decidem quando
seguir adiante procura de comida. Quando caam, dividem a
carne entre os caadores.
As fmeas so boas mes e cuidam do bem-estar dos
ilhos at que completem quatro anos. C o m essa idade,
eles se tornam independentes. Mas a afeio entre
me, filhos e irmos permanece por toda a vida.
H uma grande diferena entre ns e os
chimpanzs. Entre eles, a figura do pai no
existe. Os machos adultos so pacientes e brin-
calhes com os filhotes, mas no reconhecem
seus filhos.
Entre o s chimpanzs, o relaes de amizade entre os chimpanzs so visveis
amor d a m e pelo filho
p a r e c e ser to grande apertos de mos, nos passeios de braos dados, nas
quanto o d o s humanos.
es que fazem juntos pela mata.
Seus gestos se parecem demais com os nossos: coam a cabea
quando no entendem o que o outro quer, estendem a mo para
pedir comida, batem nas costas do companheiro em sinal de
camaradagem, agitam os braos para chamar a ateno.

Os chimpanzs aprendem a andar de bicicleta, comer


com garfo e faca, dirigir carros, jogar bola, lavar loua, ligar
a televiso, vestir roupas e danar.
Apesar de to parecidos com os humanos, os chim-
panzs no falam, mas alguns conseguiram aprender a lin-
guagem dos surdos. Outros aprenderam a relacionar figuras
indicadoras de coisas (ma, banana, rvore) com figuras que
indicam aes (andar, comer, dormir). Assim, quando esses
chimpanzs querem passear no parque, por exemplo, mos-
tram para o treinador a figura de uma rvore e a figura As c a r a s e c a r e t a s
d o s chimpanzs
de uma pessoa andando. mostram o que e l e s
Hoje, os cientistas consideram as potencialidades do sentem: fazem bico
quando curiosos,
chimpanz iguais s dos seres humanos, embora menos franzem a testa em
sinal d e ateno,
desenvolvidas. Ou seja, ele capaz de fazer o que fazemos, do gargalhadas
s que no to bem. de alegria e
arregalam o s olhos
O modo de vida dos chimpanzs tem ajudado os de espanto.
pesquisadores do passado a imaginar como deve ter sido
a vida dos ancestrais mais antigos da espcie humana.

S e tirarmos
o s plos do
chimpanz, fica
vidente s u a
semelhana
corn o homem.
c a p t u l o

A histria de Lucy

Troves ecoam no cu. No escuro da madrugada raios ilu-


minam as rvores, o capim seco e as moitas espinhosas. Lucy
acorda assustada e abraa o filhote. Aninham-se no abrigo de
palha da forquilha de uma rvore e escutam a trovoada que se
aproxima.
Outros do bando tambm acordam e sentam-se em seus abri-
gos. Ainda sonolentos, olham o dia que amanhece, coam a barriga,
bocejam e espreguiam, pouco se importando com o vento que
sopra forte, levantando a terra seca e tufos de capim. Os filhotes
abraam as mes, com medo do temporal.
S e m pressa, descem das rvores. Os mais velhos do grunhi-
dos de alerta, porque nessa hora fresca da manh tigres e lees
costumam caar.
A chuva comea a cair torrencialmente e alivia o calor aba-
fado. A fome vence o medo dos raios e troves e eles caminham
lentamente em direo ao rio, procura de comida.
To rpida quanto chegou, a chuva para e o Sol ilumina a encosta.
No caminho para o rio, as fmeas e seus filhotes colhem frutos,
brotos e razes que a enxurrada desenterrou. Os jovens se afastam
para procurar ovos escondidos nas moitas, pequenos roedores
metidos em suas tocas ou larvas nos troncos cados. Os machos
mais velhos sobem a montanha carregando ossos e pedras para se
defender ou atacar. Pode ser que voltem com uma carcaa de animal
roubada das hienas. Pode ser que no voltem, porque ningum vive
muito tempo nesse mundo de dura luta pela sobrevivncia.
Lucy chega beira do rio, que com a chuva tornou-se cauda-
loso. As guas descem rpidas, carregando paus e troncos. Outras
fmeas se aproximam com seus filhotes e, enquanto procuram
comida, os pequenos se pem a brincar no barro. Um instante de
descuido e o filhote de Lucy escorrega, cai na gua e arrastado
pela correnteza. Lucy, desesperada, se atira no rio, enquanto as
outras fmeas gritam, sem poder fazer nada. O filhote consegue
se agarrar a um tronco e puxado e salvo por alguns membros do
grupo. Mas Lucy desaparece nas guas...
Essa histria imaginria, mas no o que aconteceu trs
milhes de anos depois, nas margens de um rio da frica, quando
cientistas que procuravam vestgios do passado encontraram um es-
queleto fossilizado quase completo, enterrado no lodo. Media pouco
mais de um metro de altura, tinha postura ereta, mos semelhantes
s nossas. A forma dos quadris e o pequeno desgaste dos dentes
fizeram os pesquisadores conclurem ser de uma fmea que ainda
no tinha vinte anos quando morreu.
Ha ganhou o nome de Lucy por causa de uma conhecida cano dos
Beatles, Lucy in the sky with diamonds ("Lucy no cu com diamantes"),
que os pesquisadores gostavam de ouvir no acampamento.
Lucy foi considerada o mais antigo fssil dos homindeos
que antecederam o homem. Antes dela, vrios outros tinham sido
encontrados em outras partes da frica. O primeiro foi apenas o
crnio de um menino, resgatado na frica do Sul em 1 9 2 0 . Rece-
beu o nome de australopiteco: em grego, australo quer dizer "sul"
e piteco significa "macaco".
Uma espcie de australopiteco era formada por indivduos de
ossatura robusta; outra era de indivduos franzinos. A testa era curta,
o nariz chato e quase no tinham queixo. O crnio era bem menor
que o do Homo sapiens e a inteligncia, tambm. Acredita-se que,
antes de viverem nas savanas campos abertos da frica , os

Famlia d e
australopitecos,
conforme
imaginamos que
fossem.
O s australopitecus
caadores
andavam a r m a d o s
e s a b i a m atacar
em grupo. Nos
e m b a t e s , venciam
o s maiores, que
s s a b i a m atirar
p e d r a s e no eram
organizados.

australopitecus habitavam as florestas. Mas as secas prolongadas


fizeram a savana avanar sobre elas, que foram se tornando peque-
nas, superpovoadas, cada vez com menos comida para todos.
Supe-se que bandos de australopitecus aventuraram-se pelas
savanas, carregando seus porretes.
Embora sendo mais fracos que os tigres, lees e hienas, tinham
algumas vantagens: andavam sobre dois ps, enxergavam acima do
capinzal, tinham tima viso e mos habilidosas para fazer armas
e usar paus e pedras.
Os australopitecus que permaneceram na floresta continuaram
vegetarianos, alimentando-se de folhas e razes. Caavam s de vez
em quando, como fazem os chimpanzs. Mas os australopitecus das
savanas conviviam com muitos animais e se tornaram caadores, o
que aperfeioou sua habilidade de escolher e preparar pedras, paus
e ossos para instrumentos de ataque e defesa.
Assim, os australopitecus caadores se apoderaram da savana.
Pouco a pouco, se tornaram caadores cada vez melhores. Aprende-
ram a combinar estratgias, atacar em conjunto, numa ajuda mtua,
e depois dividir a carne entre eles.
Lentamente, australopitecos s e aproximam
d e um filhote d e g a z e l a . De um salto,
agarram o animal e o a b a t e m a p e d r a d a s .
E s s e mtodo ainda hoje u s a d o pelos
povos c a a d o r e s d a frica do Sul.
A atividade da caa foi estimulando cada vez mais a ateno,
a audcia e a imaginao dos australopitecos.
Para se comunicar, supe-se que os australopitecos combina-
vam gritos variados para avisar do perigo, indicar o momento certo
de bater em retirada, pedir socorro. Assim, sua intercomunicao
se tornou mais eficiente, ajudando-os no aperfeioamento de sua
organizao. A comunicao e a organizao social se tornaram
cada vez mais eficientes, permitindo explorar ao mximo o ambiente,
construir abrigos e fazer instrumentos variados.
A caa obrigava os machos a se deslocar para longe, ficando
as fmeas com os filhotes. Os jovens brincavam, atrados por tudo o
que era novidade. Aprendiam o que os adultos faziam, mas tambm
criavam coisas novas. Talvez tenham sido eles que, brincando com
os sons, comearam a balbuciar as primeiras palavras.
Foram os australopitecos caadores que evoluram
no correr de vrios sculos e originaram os criadores das O c a a d o r traz
para a famlia o
pedras lascadas. animal q u e caou.
Diferentemente
bom lembrar que o que se conta sobre o modo de d o s chimpanzs,
vida dos australopitecos no pode ser provado. A nica a figura do pai s e
torna presente. O
coisa que deles nos restou foram seus esqueletos e alguns macho tem s u a
f m e a e reconhece
instrumentos feitos de pedra. A maneira como viviam
s e u s filhotes.
foi imaginada pe-
los estudiosos do
passado.
Mas essa ima-
ginao no veio
do nada. N a s c e u
da observao do
modo de vida dos
chimpanzs e dos
p o v o s primitivos
que ainda hoje vi-
vem na Terra.
H3>
c a p t u l o

O criador da pedra lascada

As paisagens da Terra mudam bruscamente quando aconte-


cem terremotos e furaces. Elas tambm mudam lentamente, sem
que percebamos. Pedras que rolam pelas encostas fazem parte da
desintegrao das montanhas atravs dos milnios.
No meio das paisagens que se transformam, a vida tambm
se transforma no decorrer do tempo.
Na infindvel transformao da natureza, os australopitecos
robustos das florestas foram extintos, e os pequenos, depois de dois
milhes de anos, transformaram-se em outra espcie.
Junto aos fsseis desses sucessores dos australopitecos, foram
encontradas as mais antigas pedras lascadas. E por essa razo que
eles ganharam o nome de Homo habilis, por terem sido hbeis
fabricantes de utenslios de pedra.
A inveno da pedra lascada abriu novos caminhos para a sobre-
vivncia dessa espcie. Embora os australopitecos usassem instrumentos
de ossos, paus e pedras cuidadosamente escolhidos na natureza, eles no
conheciam a tcnica de bater uma pedra contra a outra para obter bordas
cortantes. O Homo habilis, porm, j fabricava pedras que serviam
para cortar, triturar, martelar, cavar e furar. Alm de serem armas de
defesa contra os inimigos, serviam para caar e facilitar as tarefas de
colheita e preparo da comida. Alm dos utenslios de pedra, prova-
velmente usavam varas para derrubar frutos, cascas de rvores para
transportar o que colhiam e cascas de ovos para beber gua.
Nesse tempo to distante, a carne era apreciada, mas difcil de
ser conseguida, de modo que os vegetais constituam a maior parte
das refeies. A colheita de frutos, razes e folhas ajudou nossos
antepassados a se familiarizarem com os vegetais e seu uso para
alimentao e cura de doenas.
Supe-se que os indivduos dessa nova espcie j tivessem pele
nua, sem plos, e negra como proteo aos raios solares.
Alguns estudiosos da pr-histria acham que essa espcie no
merece ser includa no gnero Homo o mesmo ao qual pertence
nossa espcie por ter o crnio e, por conseguinte, o crebro me-
nor se comparado ao do homem moderno. De fato, a capacidade
craniana do Homo hbil is de seiscentos e oitenta centmetros
cbicos, ou seja, pouco mais que meio litro, enquanto a do homem
moderno de mil e duzentos a mil e seiscentos centmetros cbicos,
ou seja, bem mais de um litro.
Contudo, quando comparado com o australopiteco, que tinha
apenas quatrocentos e cinquenta centmetros cbicos de capacida-
de craniana, o Homo habilis merece ser levado em maior conta,
principalmente quando se considera que esse era inventor de ins-
trumentos de pedra.
c a p i t u 1 o

dominao do fogo

Anoitece. O vento das montanhas faz com que todos se re-


colham s cabanas, feitas de paus, cobertas de palhas e peles. A
caada do dia garantiu um bom pedao de carne para cada um do
bando. Tambm comeram razes e frutos. Dormiriam tranquilos no
fosse o medo de um tigre que h dias ronda o lugar. O temor torna
o sono leve, e o menor rudo espanta os sonhos.
Alguns jovens esto decididos: sairo para caar o tigre, que
s noite deixa o esconderijo. Tateando, seguem em direo ao
rio. Ao longe, raios riscam o cu e os clares ajudam a encontrar os
caminhos conhecidos, pois h anos acampam nesse mesmo lugar.
De vez em quando, fazem sons estranhos, que exprimem medo
e ansiedade. Acocoram-se ao p de uma rvore para esperar. Tm nas
mos lanas de pau e machados de pedra. Esto prontos para atacar.
Os raios caem cada vez mais perto. De repente, um raio fulmina
uma rvore prxima, que tomba em chamas com um estalo. Assusta-
dos, os jovens chegam perto e ficam olhando o fogo, encantados.
Ficam assim tanto tempo que se esquecem do tigre. At que
um rugido os faz voltar realidade. O tigre est to prximo que
d para sentir seu cheiro.
Num lampejo de memria, um dos jovens se lembra das tantas
vezes que rodeou o fogo, tentando pegar um galho em chamas.
Nem ele nem ningum do seu povo jamais teve a coragem de fazer
isso porque temem o fogo.
Mas agora o rugido ameaador d ao jovem uma fora so-
brenatural, pois est em jogo a sua sobrevivncia. Ele corre at as
chamas, pega um galho aceso e agita-o no ar, como uma tocha,
avanando na direo do animal, que se assusta e foge.
Vitorioso, ele volta para o acampamento com a tocha empu-
nhada. Seus companheiros, atnitos, o seguem e todos admiram
sua coragem. Vencendo o medo, cada um segura a tocha e ela vai
passando de mo em mo.
Fogueiras so acesas no acampamento. O fogo chegou. E dali
em diante manter as feras afastadas e todos podero dormir tran-
quilamente e sonhar. O fogo foi dominado e se torna um aliado.
Essa histria imaginria, pois ningum sabe como aconteceu
o domnio do fogo. Mas ela foi e continua sendo contada por muitos
povos atravs dos mitos. Seja como for que tenha acontecido, o
domnio do fogo trouxe segurana tanto aos caadores que saam em
expedio como ao vigilante que ficava tomando conta dos velhos,
das mulheres e crianas.
Dali para sempre, o calor do fogo assar a carne e cozinhar
as razes, tornando mais fcil mastigar e digerir os alimentos.
No s a b e m o s c o m o seria a fisionomia do Homo erectus, m a s
s e u s e s q u e l e t o s indicam q u e eram altos, d e o s s a t u r a p e s a d a e
msculos fortes. O tamanho do crebro era muito inferior a o do
homem atual.

O domnio do fogo, que deu aos nossos antepassados um


grande poder sobre o meio ambiente, foi uma conquista do Homo
erectus, uma espcie que viveu h cerca de um milho de anos.
O nome dessa espcie Homo erectus indica que esses
nossos antepassados andavam sobre as duas pernas. Mas seu
fssil foi encontrado no sculo 1 9 , quando ainda no se sabia
da existncia do australopiteco e do Homo habilis, que tambm
eram eretos. Na ocasio, o conquistador do fogo foi batizado
com o nome de Pitecantropus erectus, que significa "homem-
-macaco ereto".
Os Homo erectus foram excelentes caadores. Acompanhan-
do as rotas das manadas de pastadores, espalharam-se pelo mundo,
gerao aps gerao, durante um perodo de quase um milho de
anos. Onde a caa era abundante, ficavam alguns anos. S e m ter
como atravessar os grandes rios e as altas montanhas, eram obri-
gados a contorn-los, alongando ainda mais seu caminho. De vez
em quando, dois bandos se encontravam e, havendo comida para
todos, se juntavam.
Durante as caminhadas, o Homo erectus deixou vestgios
de sua existncia: ossadas dos animais que mataram e comeram,
instrumentos de pedra, abrigos, madeira carbonizada e at mesmo
marcas de seus ps.
O vestgio mais antigo do uso do fogo foi encontrado na
China: uma pilha de cinzas com mais de dez metros de altura e
quatrocentos mil anos de existncia. Sua altura descomunal faz
pensar que nessa poca o Homo erectus no sabia fazer fogo e,
quando o conseguia, com a queda de um raio, tinha que mant-lo
aceso, dia e noite. S e a chama se apagas-
se, ele teria que passar frio e comer tudo Geraes e geraes
, , d e Homo erectus foram
cru, enquanto esperava novo raio atear g r a d a t i v a m e n t e ocupando
fogo mata. s u a t e r r a n a t a l
> a frica,
e s t e n d e n d o - s e depois
Europa e sia.

ti*

Pitdown Mauer
* Vertesells
Escale. EUROPA
Torralba/ , \ Choukoutien
Ambrna
ASIA

\
\

5 Olrgesailie
OCEANO

OCEANO a NDICO

ATLNTICO
Quem s a b i a fazer fogo
devia s e r muito admirado e O Homo erectus viveu na frica e
respeitado entre o s Homo
erectus. Isso porque no
tambm nas regies muito frias da Europa,
n a d a fcil atritar um onde sua sobrevivncia s foi possvel porque
pau contra uma pedra at
conseguir calor suficiente ele dominava o fogo. At essa poca, todos
para a c e n d e r gravetos s e c o s
os animais tinham sua sobrevivncia regulada
pelas condies da natureza. Mas, no momen-
to em que dominou o fogo, o Homo erectus tornou-se o primeiro
animal capaz de carregar o calor para onde quer que fosse.
O fogo criou um ambiente seguro e aquecido. Ao redor da
fogueira, os nossos remotos antepassados se sentavam para cortar e
assar carne, comer, dormir, amar e sonhar. Com um vocabulrio que
aumentava pouco a pouco, foram criando os mitos que contavam
a histria e a origem do fogo e de todas as coisas.
O fogo tambm era usado para caar, como indicam as ossadas
de elefantes encontradas em vrios pntanos da Europa. S o tantos
ossos que, supe-se, a manada era empurrada para o pntano por
homens empunhando tochas de fogo.
Para caar, os Homo erectus se comunicavam para combinar
a diviso das tarefas. Eles tambm davam nomes aos animais e s
plantas, aos lugares e instrumentos, aos sentimentos. Assim, pouco
a pouco, o nmero de palavras foi aumentando.
W
: -

. .

9 |

N a s regies d e clima quente, o Homo erectus


abrigava-se em c a b a n a s feitas a o ar livre ou
debaixo de u m a marquise d e pedra, onde
C a r r e g a n d o t o c h a s d e fogo. um
fazia fogo para cozinhar o s alimentos. N a s de
grupo de Homo erectus c e r c a uma
clima frio, abrigava-se e m c a v e r n a s depois de
m a n a d a d e elefantes, empumande-
expulsar o s animais com s u a s tochas.
o s para o pntano. Atolados, s e m
conseguir s e mover, o s animais s o
mortos e e s q u a r t e j a d o s .

35
O Homo erectus tinha crebro maior e memria melhor do
que o australopiteco e o Homo habiis. A estrutura de sua garganta
transformava sons em palavras e foi o desenvolvimento da lingua-
gem, mais do que tudo, que permitiu a transmisso do conhecimento
atravs das geraes.
Pouco a pouco, os Homo erectus foram sendo selecionados
pelo ambiente de cada lugar.
Em seus mil anos de existncia, os Homo erectus enfrentaram
desafios com perseverana e imaginao, resolveram seus problemas
e sobreviveram. A espcie humana deve seu nascimento ao sucesso
desses nossos bravos antepassados.

c a p i t u o

O Homo sapiens

primavera na floresta. Uma raposa pe a cabea para fora


de sua toca, espia e sai com cautela para caar algum rato distra-
do. Precisa estar atenta, porque os gatos cinzentos das montanhas
tambm esto procura de comida.
Manadas de renas, cavalos e touros pastam nos campos que
margeiam o rio. De vez em quando, levantam a cabea e apuram
os ouvidos, porque os lobos podem atacar a qualquer momento.
Elefantes de presas curvas bebem gua do rio.
Na entrada de uma caverna, na encosta que ladeia o vale,
alguns homens endurecem a ponta das lanas nas chamas de
uma fogueira e duas mulheres tiram o couro de uma rena com
facas de pedra. A carne da rena no foi suficiente para todo o
bando e, para matar a fome, as crianas comem nozes. Vai ser
necessrio sair para caar novamente.
T o d o s do bando, umas trinta p e s s o a s , esto ocupados com
as suas tarefas: pegar lenha para a fogueira, buscar gua, esticar
peles para aquecer ao sol, fazer armas e utenslios com pedras e
ossos, enquanto as crianas esperam as mes para colher frutas
e razes na mata.
Os caadores esto prontos! Eles descem a encosta em dire-
o ao rio. Um deles apanha um punhado de terra e solta no ar para
ver em que direo o vento est soprando. Precisam se aproximar
dos animais contra o vento para no serem percebidos.
A beira do rio, um touro pasta longe da manada. A um
sinal, os homens se separam e, em silncio, rodeiam o animal.
Quando esto bem prximos, arremessam suas lanas no touro.
Enlouquecido de dor, ele sai em disparada, mas cambaleia e cai, logo
adiante. Ao ver o touro no cho, um jovem e inexperiente caador
se aproxima para dar o golpe final. Mas, inesperadamente, o touro
rene suas ltimas foras, levanta-se e, num golpe certeiro, atinge
o peito do jovem com seus chifres pontiagudos. Ambos caem: o
jovem, ferido; o touro, morto.
Remdios de ervas no conseguem curar os ferimentos do
rapaz e, no dia seguinte, ele morre. Uma grande tristeza invade o
corao de todos. No fundo da caverna, abrem uma cova rasa, que
cercada de pedras e forrada com couro de rena. Sobre ela colocam
o rapaz, deitado de lado e com as pernas dobradas contra o peito,
como se estivesse dormindo. Em seguida cobrem seu corpo com
flores da primavera, e depois com terra.
A histria imaginria, mas sessenta mil anos se passaram e
uma equipe de arquelogos encontrou a sepultura desse jovem. Das
flores, restaram apenas os gros de plen.
Essa sepultura, descoberta no Iraque, e muitas outras encon-
tradas em vrios locais da Europa pertencem ao mais conhecido
homem pr-histrico: o chamado homem de Neandertal, popular-
mente chamado de "homem das cavernas".
Em vrias sepulturas, ao lado do morto, estavam suas armas e
ossos dos animais que ele caava. Portanto o homem de Neandertal
o primeiro homindeo a deixar vestgios de que acreditava na exis-
tncia da alma e na vida aps a morte. Essa uma das caractersticas
do Homo sapiens.
Alm das sepulturas, ou-
tros achados mostram que eles
acreditavam num mundo m-
gico e sobrenatural. Em vrias
cavernas foram encontradas
pilhas de crnios de ursos cui-
d a d o s a m e n t e arrumadas em
buracos, parecendo altares. Em
outra, encontrou-se uma esttua
O s ursos do p a s s a d o
de barro representando um urso sem cabea, com eram fantsticos animais
um crnio de urso entre os ps. Decerto o crnio era com mais de dois metros
de altura. S u a fora
a cabea da esttua, que seria coberta por uma pele descomunal era venerada
pelo homem d e Neandertal
de urso durante as cerimnias. O corpo da esttua em cerimnias religiosas.
de barro est todo furado por lanas.
O homem de Neandertal tornou-se popular por ter sido o
primeiro fssil humano encontrado numa poca em que nem se
falava em teoria da evoluo. Isso aconteceu em 1 8 5 6 , quando
trabalhadores procuravam clcio em uma caverna nas encostas
do vale do Rio Neander, na Alemanha. Em alemo, tal quer dizer
"vale". Da o nome homem de Neandertal, ou seja, o homem do
vale do Rio Neander.
Naquela poca, a maioria das pessoas acreditava que a vida na
Terra tinha sido criada cerca de cinco mil anos antes de Cristo. Nin-
gum suspeitava que os ossos encontrados pertenciam a um homem
que teria vivido h mais de quarenta mil anos. Alguns acharam que
os ossos eram de um velho reumtico, pelo fato de ter as pernas
ligeiramente arqueadas. Outros pensaram que o dono do esqueleto
tinha andado muito a cavalo...
Em 1924, o homem
d e Neandertal foi
apresentado ao
pblico c o m o um
perfeito imbecil,
numa imagem que s e
popularizou atravs
d a s histrias em
quadrinhos e d o s
d e s e n h o s animados.
Hoje, a representao
do Neandertal mostra
um s e r no muito
diferente do homem
d e hoje.

Anos depois, outros fsseis de Homo sapiens foram encontra-


dos na Frana. A tentativa de reconstituir sua aparncia quando em
vida acabou criando para ele a imagem que a maioria das pessoas
visualiza at hoje: a de um homem peludo, com cara de imbecil, cober-
to de peles, falando atravs de grunhidos; numa das mos segura um
porrete, enquanto, com a outra, arrasta uma mulher pelos cabelos.
Isso aconteceu porque, no fim do sculo 19, a vaidade humana
colocava em nossa espcie todas as qualidades da perfeio. Poucos
acreditavam que h quarenta mil anos teria existido uma raa de
homens semelhante ao homem atual e to inteligente quanto ele.
Vejamos o que se falava sobre a evoluo do homem nessa poca:

" medida que a criao se estende,


Os poderes fsicos e mentais ascendem,
At se elevarem majestosa raa humana."
tambm no aceitavam a inteligncia dos indgenas e de outros
povos primitivos que vivem ainda hoje.
Mas o tempo passou, as ideias mudaram e hoje o homem
de Neandertal reconhecido como um homem pr-histrico ha-
bilidoso, que criou inmeras ferramentas como faca, furadeiras
e raspadores. Aproveitava muito bem os ossos dos animais para
fazer armas e abrigos. Tinha uma sociedade bem organizada, que
cuidava dos velhos e enfermos. No era, portanto, o selvagem
troglodita que muitos imaginam.
Hoje a ideia mais aceita a de que esses homens, que viveram
principalmente na Europa entre duzentos mil e quarenta mil anos
atrs, que tinham crebros to grandes quanto os nossos, ou ainda
maiores, provavelmente sejam descendentes do Homo erectus.
Talvez o futuro venha revelar novas possibilidades, pois
a histria da vida na Terra como um livro que originalmente
tinha muitas pginas, mas dele s nos restaram algumas e, ainda
assim, com umas poucas
linhas leoveis ~ ' o r n s u a s ' a n c a s > o s neandertais
<

c a a m uma rena, um d e s e u s principais


alimentos. Embora tivessem o s s o s
g r o s s o s e forte musculatura, e l e s pouco
diferiam do homem moderno.
c a p i t u l o

~~ O caador de imagens

Durante a noite trs homens sobem por uma trilha iluminada


pelo luar. De quando em quando, param para descansar. Dois, ainda
jovens, carregam s costas sacos feitos de peles. O terceiro, mais
velho, j de barbas brancas, sobe apoiado em seu cajado.
Caminham mais de uma hora. Ao amanhecer, chegam a
um terrao de onde se avista o vale e os campos onde pastam
manadas de gazelas.
Pouco a pouco, o Sol ilumina as folhagens midas de orvalho,
um paredo de pedra e a boca de uma caverna. Um riacho cristalino
vem l do escuro das entranhas da Terra.
Um dos homens pega um pedao de ferro que traz pendurado
no pescoo e risca uma pedra at produzir centelhas para atear fogo
ao capim seco, que ele usa para acender a banha de mamute que
est na ponta de uma tocha.
Segurando-a no alto, entram na caverna. Uma revoada de
morcegos assustados enche de rudos a gruta. Logo na entrada, a luz
ilumina as paredes desenhadas: touros brancos correm pela pradaria,
cavalos vermelhos trotam alegremente, veados com flechas no dorso
fogem em disparada. S o imagens de ao e movimento, formando
um verdadeiro tropel em direo ao fundo da caverna.
Os homens continuam andando pelo tnel de paredes pintadas
e chegam a um grande salo. No teto, a imensa figura de uma vaca
preta parece saltar de uma parede a outra.
Os homens entram em uma galeria estreita onde a luz das
tochas faz danar as imagens de cavalos, touros, bises, cabras,
veados, mamutes, alm de pontos, linhas, retngulos, contornos
de m o s .
O velho senta-se em uma pedra. Ele um grande artista de
sua gerao e continua o trabalho iniciado por artistas de geraes
passadas. Os jovens so aprendizes. Com cuidado, vo tirando
dos sacos o material de trabalho: pedaos de carvo para riscar as
silhuetas dos animais; pedras lascadas para cavar, riscar e furar a
parede; terra colorida por minrios; conchas para misturar a terra
com sangue e gordura; pincis feitos de crina de cavalo.
Eles conhecem bem os animais e com poucos traos desenham
seus contornos. No podem perder tempo, porque logo as renas
seguiro rumo ao norte e eles iro atrs, pois elas so o principal
alimento desses artistas e de seu bando. Estaro de volta na prxima
primavera e continuaro pintando murais nas pedras.
E assim, gerao aps gerao, as paredes dessa e de muitas
outras cavernas da Europa, sia e frica foram cobertas por ima-
gens de animais. Algumas grandes, outras pequenas, s vezes umas
pintadas sobre as outras. Em cada regio, os artistas tinham seu
estilo, mas as pinturas mais bonitas esto nas cavernas da Espanha
e da Frana. Todos os que as visitam saem com a certeza de ter
conhecido um mundo antigo e maravilhoso.
Os homens que criaram essas imagens viveram h mais de
trinta mil anos e eram da mesma espcie que ns: Homo sapiens
sapiens. Eles viviam na Europa, na Africa e na sia. As pinturas
mais famosas so de autoria do "homem de Cro-Magnon", assim
chamado porque o primeiro de seus fsseis foi encontrado em uma
regio da Frana que tem esse nome.
Qual a sua origem? A ideia mais aceita a de que eles descen-
dem do Homo sapiens, cuja origem se confunde com a do Homo
erectus, o descobridor do fogo.
Ningum consegue dizer com certeza o que levou os homens
de Cro-Magnon a gravar e pintar as paredes de cavernas onde eles
nem sequer viviam, escolhendo muitas vezes lugares escondidos de
difcil e perigoso acesso.
Alguns dizem que os Cro-Magnon pintavam animais para se
apoderar de suas almas, tornando mais fcil sua caada. No entanto,
o animal que eles mais caavam, a gazela, pouco representado nos
murais; j o cavalo, raramente caado, a figura predominante.
Reunidos na caverna,
Outros acham que as cavernas pintadas eram o s Cro-Magnon ouvem
lugares sagrados, onde grupos de diferentes regies o feiticeiro falar sobre
a origem d e t o d a s
se reuniam para comemoraes religiosas. E que as a s c o i s a s : o homem,
a mulher, o bem e o
imagens so a narrativa de mitos que contam a origem
mal. S u p e - s e q u e
de todas as coisas. e s s a histria esteja
contada n a s pinturas
Seja qual for a interpretao que se d para a atravs de smbolos,
arte das cavernas, ela o marco inicial dos smbolos representados p e l a s
i m a g e n s d o s animais.
que representam um mundo imaginrio. B e m mais
tarde, essa capacidade de produzir smbolos
levaria criao da escrita.
Alm de pintar, o Cro-Magnon moldava
pequenas estatuetas de mulheres com seios e
ndegas enormes, que certamente no represen-
tavam as mulheres da poca, mas sim a grande
me natureza, que a todos gera e alimenta. Talvez
essas estatuetas, de apenas dez centmetros de
altura, fossem amuletos para se ter boa gravidez,
parto sem problemas, caa abundante, fartura de Um escultor d o s
ltimos retoques
frutos e razes. Tanto quanto ns, eles temiam a em uma estatueta
fome, a doena e a morte. d e barro.
O Cro-Magnon era Embora mudasse de um lugar para outro, esses
um hbil construtor de
armadilhas, c o m o a d a
caadores artistas sempre voltavam para os lugares que
figura (que capturou um estavam nas rotas de migrao dos animais pastadores.
mamute). Ele tambm
inventou a fisga d e traadas de acordo com as estaes do ano.
apanhar peixes, m a s
Alguns estudiosos acham que, h quarenta
no h provas d e que j
u s a s s e arco e flecha. mil anos, vrios grupos que viviam bem ao norte
da Europa atravessaram as terras geladas junto ao
polo, seguindo as manadas de renas. Assim, chegaram Amrica
do Norte. De l, desceram rumo Amrica do Sul, em um longo
trajeto percorrido por vrias geraes.
Outros arquelogos, entretanto, acham que talvez o caminho
tenha sido outro, pois no Brasil j foram encontrados fsseis de
Homo sapiens sapiens mais antigos que os da Amrica do Norte.
Os Cro-Magnon e outras raas de sua poca foram excelentes
caadores. Em um determinado lugar, foram encontrados esqueletos
de mais de cem mamutes e, em outro, acharam-se ossos de cerca de
dez mil cavalos selvagens. Muitos acreditam terem sido eles os cau-
sadores da extino dos mamutes e outros pastadores da poca.
A extino dos mamutes e de outros grandes mamferos pas-
tadores coincide com o avano do gelo dos poios sobre a Europa.
Talvez o frio e a falta de alimento tenham sido a verdadeira causa
da extino desses animais.
Pouco a pouco, a cultura do Cro-Magnon d lugar a outra
de tecnologia mais avanada, produzida por homens que viveram
h doze mil anos. Estes, certamente, j usavam o arco e a flecha,
o barco e o arpo, colhiam trigo selvagem, faziam po e cerveja,
alm de caarem acompanhados do co, desde essa poca o melhor
amigo do homem.

H~9>
c a p t u l o

A domesticao de plantas
e animais

Enquanto alguns homens fazem instrumentos para caar e


colher vegetais, as mulheres e crianas ceifam o trigo selvagem
que cresce por toda parte. tanta a fartura de animais e vegetais
na regio, que h muitas geraes eles vivem nesse mesmo lugar,
comendo o que a natureza oferece.
Sem terem que andar atrs das manadas de pastadores, fixaram
moradia, construindo casas de madeira e pedra.
Um grupo de caadores parte em busca de carne de veado.
Nem precisam se afastar muito da pequena aldeia para cercar um
bando deles. Atiram as lanas e ferem um dos animais, que sai em
disparada e entra na mata. Os homens o perseguem, sem notar a
presena de dois lobos, que tambm estavam caando e se mantm
a distncia, sem contudo perderem a pista de sangue que seu faro
consegue perceber.
S e m um faro to bom quanto o dos lobos, os homens perdem
a pista do veado. Olham para trs e veem os lobos entrar por uma
trilha. A ordem ento se inverte: os homens seguem os lobos, que
seguem o veado.
Numa clareira, os lobos cercam o animal ferido e um deles pula
em sua garganta. Mas os lobos se afastam quando os caadores che-
gam e atiram suas lanas. Um caador abre o ventre do veado, tira
suas vsceras e joga aos lobos, que devoram tudo num instante.
Enquanto isso, na pequena aldeia, uma garotinha que ajuda
a me a colher trigo acha um filhotinho de lobo sem me e morto
de fome. Leva o animalzinho para casa e trata dele com carinho.
Quando o pai volta da caada e v aquele animal em sua casa, fica
furioso. Mas de repente se lembra do lobo que o ajudou a caar o
veado e sua mo acaricia a cabea do filhote.
Meses depois, o homem e o lobo, j crescido, saem para caar
juntos. Da para a frente, ele ser o faro do homem e, juntos, se
tornaro imbatveis.
Essa histria pura imaginao, pois ningum sabe exatamen-
te como aconteceu a domesticao do lobo o co selvagem ,
apenas que essa amizade comeou h mais de dez mil anos.
Pouco a pouco, os homens tambm domesticaram outros
animais selvagens, como as ovelhas e cabras, os javalis, porcos,
cavalos, touros, patos, gatos etc.
Convivendo com as plantas, os homens primitivos foram ven-
do as sementes cair na terra, brotar e virar plantas, que cresciam,
davam flores, que se transformavam em frutos cheios de sementes,
que tambm caam na terra e tudo recomeava. Foi observando
esse ciclo das plantas que eles aprenderam a enterrar as sementes
e esperar a natureza fazer seu trabalho.
Tendo sementes, frutos e razes sempre disposio, alm do
leite e da caa abundante, nossos antepassados criaram comidas e
bebidas, como o po, o queijo, a cerveja e o vinho. Junto com a
culinria nasceram os apetrechos de cozinha: forno, vasilhas, pratos,
panelas, conchas, copos e muitos outros objetos.
A agricultura e a criao de animais se desenvolveram em v-
rias regies da Terra, formando ncleos de habitaes que eram as
A d o m e s t i c a o d o s animais e a agricultura e s t o p r e s e n t e s na Bblia,
n a s figuras d e Caim e Abel, filhos d e Ado e Eva. Abel era pastor d e
ovelhas e Caim, lavrador.

vilas. Elas cresceram e originaram cidades, geralmente localizadas


nos vales dos rios, onde a terra era frtil para a plantao.
Esses nossos ancestrais, que comearam a criar animais e
a plantar vegetais, tambm desenvolveram outras habilidades,
como costurar, fazer sapatos, construir casas, fazer armas, mo-
delar o barro.
As imagens que pela primeira vez surgiram nas paredes das
cavernas, h trinta mil anos, se transformaram atravs do tempo,
tornando-se cada vez mais abstratas.
Esse sistema de sinais evoluiu e se
transformou nos escritos mais antigos do
mundo. Foi atravs deles que a cultura

O s sinais n e s s a s p e q u e n a s p e d r a s foram
feitos h d o z e mil a n o s . Para ns, n o tm
significado, m a s certamente queriam dizer
muita c o i s a para o s criadores d o s smbolos.
humana se estendeu no tempo e no espao, por todo o planeta, atravs
das geraes.
De acordo com as convenes da sociedade moderna, o
nascimento da escrita estabeleceu um marco entre o fim da pr-
histria e o incio da histria e das mais antigas civilizaes do
planeta. Mas se pensarmos na histria da Terra, a pr-histria
faz parte dela.

'" ..tf MAR NEGRO

No c h a m a d o C r e s c e n t e Frtil, a s s i n a l a d o no
m a p a p e l a cor, a s a l d e i a s a g r c o l a s j existiam
h d e z mil a n o s . S i t u a d a entre o s rios Tigre e
Eufrates, e s t a regio d a M e s o p o t m i a (hoje
Iraque), n o m e q u e quer dizer "entre rios". J e r i c ,
J a r m o e Ur s o c o n s i d e r a d a s a s c i d a d e s m a i s
a n t i g a s do mundo.
c a p t u l o

O homem, hoje

Nossa viagem termina quando, dez mil anos atrs, alguns seres
humanos se fixaram onde havia grande fartura de animais (que logo co-
mearam a ser criados, depois de domesticados) e onde a terra era frtil
para plantar vegetais. Construram moradias definitivas, que se transfor-
maram em vilas, originando as cidades mais antigas do mundo.
A pr-histria foi ficando para trs quando os homens riscaram
na argila e na pedra os primeiros sinais, contando o que pensavam
e o que sabiam.
Mais de trs milhes de anos separam as primeiras pedras
lascadas do domnio do fogo. H o intervalo de quinhentos mil

N a s c e m o s para
respirar ar puro.
M a s respiramos ar
poludo.
anos entre as primeiras fogueiras e a domesticao dos animais e
das plantas. Mas apenas oito mil anos separam o surgimento das
cidades do lanamento da primeira espaonave. medida que a
cultura do homem foi se ampliando e se modificando, o mundo foi
mudando cada vez mais rapidamente.

N a s c e m o s para ver
o cu e a s g u a s
cristalinas. M a s o cu
e s c u r e c e u d e fuligem
e muitos rios e s t o
morrendo.

N a s c e m o s com pernas
b o a s para andar e correr.
Mas ficamos horas
sentados.
N a s c e m o s para comer alimentos s a u d v e i s e beber g u a
pura. M a s c o m e m o s c o m i d a s com agrotxicos e b e b e m o s
g u a com s u b s t n c i a s qumicas que no fazem parte dela.

Vivemos quase sem rvores ao nosso redor, sob um cu sem


estrelas, sobre a terra coberta de asfalto. Mas, mesmo assim, parece
que estamos muito bem, pois a espcie humana continua viva na
Terra, criando, inventando e at conquistando o espao com suas
tecnologias modernas. Mas, por mais que sonhe em conquistar o
universo, para onde quer que o ser humano v, tem que levar con-
sigo o ambiente em que vive e em que viveram seus antepassados.
Por isso, no pode perder seu amor pela Terra.
Consideraes finais

S e apagarmos o que nos foi ensinado desde nosso nascimento,


descobriremos em nosso ntimo os nossos antepassados. O fogo, a
gua, o ar, a terra ainda nos despertam as mesmas sensaes que
neles despertavam. Nossos sonhos de amor, esperana, lealdade,
amizade e tantos outros, nossos medos da doena e da morte so os
mesmos dos homens pr-histricos. Cada ser humano, em qualquer
canto da Terra e em todos os tempos, faz parte da mesma espcie,
o que o torna aquilo que ele : o nico animal que se imagina e
imagina o tempo agora e depois da morte.
Por mais que nosso corpo sinta, hoje, as mesmas sensaes
dos nossos antepassados, nunca mais voltaremos vida que eles
viviam. Da mesma maneira que estamos presos s condies de vida
na Terra, estamos presos cultura que desenvolvemos atravs do
tempo. Essa a nossa natureza, a natureza humana.
Pouco a pouco estamos acordando do sonho de progresso e
tecnologia sem fim. No mundo inteiro, jovens e adultos se pergun-
tam de que vale tanto progresso, se cada vez mais corremos o risco
de destruir a Terra com a tecnologia que alcanamos. As invenes
humanas nem sempre podem consertar os problemas criados pela
prpria humanidade.
O homem pode acabar com o planeta Terra, mas no est
programado para isso. Por essa razo, mais e mais pessoas procuram
encontrar solues para os problemas da sociedade moderna. Nessa
busca, o estudo do passado pode nos ajudar a entender o ser humano
de agora e a projetar o ser humano que queremos para o futuro.

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