GADOTTI (2012) - ESTADO E EDUCAÇÃO POPULAR Desafios de Uma Política Nacional
GADOTTI (2012) - ESTADO E EDUCAÇÃO POPULAR Desafios de Uma Política Nacional
GADOTTI (2012) - ESTADO E EDUCAÇÃO POPULAR Desafios de Uma Política Nacional
Para ns, a participao no pode ser reduzida a uma pura colaborao que setores populacionais devessem
e pudessem dar administrao pblica [...]. A participao para ns, sem negar este tipo de colaborao, vai
mais alm. Implica, por parte das classes populares, um estar presente na Histria e no simplesmente nela
estar representadas. Implica a participao poltica das classes populares atravs de suas representaes ao
nvel das opes, das decises e no s do fazer o j programado (FREIRE, 1991: 75).
A Rede de Educao Cidad (RECID), que est completando 10 anos, vem discutindo a construo de
uma Poltica Nacional de Educao Popular. No contexto brasileiro atual em que Paulo Freire foi declarado
patrono da educao brasileira, muito bom ver essa iniciativa que recoloca a necessidade de discusso do
paradigma da Educao Popular num outro patamar: o da poltica pblica.
A Educao Popular tem uma rica histria de ideias, teorias e prticas de uma educao
transformadora. Por isso, convm retomar sua contribuio, fazer um balano e mostrar as suas perspectivas.
claro, o tema exigiria uma pesquisa em profundidade. Por isso, estou me baseando tanto em trabalhos que j
publiquei (GADOTTI & TORRES, 1992; 1994) quanto na experincia vivida, nos ltimos anos, colaborando no
Projeto MOVA-Brasil, uma parceria entre o Instituto Paulo Freire, a Petrobras e a Federao nica dos
Petroleiros, que tambm completa 10 anos. Vou me referendar principalmente na viso que Paulo Freire tinha
como Secretrio Municipal de Educao de So Paulo (1989-1991). Numa poca em que a Educao Popular
estava restrita a experincias no-estatais ele se props institu-la como poltica pblica sem torn-la
exclusivamente estatal, mantendo essa tenso de estar taticamente dentro do Estado e estrategicamente fora
(FREIRE, 1978:69).
Como Secretrio de Educao Paulo Freire no imps suas ideias pedaggicas. Sabia que educao
no se faz por decreto. preciso consensos, alianas, para que uma poltica educacional se torne hegemnica.
Ele deu cursos para merendeiras, vigias, pais de alunos e trabalhadores(as) em educao. Ele fez parcerias
com associaes e movimentos sociais, universidades pblicas e privadas. E mais, criou uma equipe na
Secretaria para atender aquelas associaes e movimentos sociais e populares que no dispunham de
condies estruturais para fazer convnios com a Prefeitura Municipal de So Paulo. Qualificou juridicamente
movimentos que antes no tinham a documentao exigida pela Prefeitura. Paulo Freire sabia que a Educao
Popular como poltica pblica seria um processo longo e que precisava fortalecer as entidades que a
praticavam para que elas no fossem cooptadas pelo poder pblico e pudessem manter sua autonomia ao
conveniar-se com a Prefeitura. Mas no abria mo dessa dialtica entre poder pblico e poder popular.
Recebeu, por isso muitas crticas, sobretudo da imprensa conservadora. Mas no desistiu de seus ideais
pedaggicos, de sua pedagogia do oprimido, buscando torn-la poltica pblica.
Como concepo de educao, a Educao Popular uma das mais belas contribuies da Amrica
Latina ao pensamento pedaggico universal (PALACIOS, 1989; KANE, 2001; EHARA, 2003). Isso se deve,
em grande parte, atuao internacional de um dos seus mais importantes representantes, Paulo Freire. Ele
deixou, por onde passou, as sementes de uma concepo popular emancipadora da educao. Essas
sementes floresceram em numerosos grupos e organizaes, unindo educao, conscientizao, politizao e
( *)
Moacir Gadotti Doutor em Cincias da Educao pela Universidade de Genebra, Doutor Honoris Causa pela Universidade
Rural do Rio de Janeiro, Livre Docente pela Universidade Estadual de Campinas, Professor Titular da Universidade de So Paulo, Fundador
e atual Presidente de Honra do Instituto Paulo Freire. autor de diversos livros, traduzidos em vrios idiomas, entre eles: Pedagogia da
prxis (1996); Histria das ideias pedaggicas (1998); Paulo Freire: Uma biobibliografa (2001); Pedagogia da Terra (2002); Perspectivas
atuais da educao (2003); Os mestres de Rousseau (2004), Educar para um outro mundo possvel (2006) e Educar para a
sustentabilidade (2008). Este texto d sequncia e sistematiza as primeiras colocaes feitas durante a 1 Reunio Ampliada da RECID,
que aconteceu na sede da Caritas Brasileira, em Braslia, dia 31 de maio de 2013, dedicada ao tema Poltica Nacional de Educao
Popular. Agradeo a leitura crtica feita pelos educadores populares do Instituto Paulo Freire - ngela Antunes, Emiliano Liu, Francisca Pini
e Paulo Roberto Padilha sem a qual eu no teria finalizado este texto.
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organizao popular.
A Educao Popular, como prtica pedaggica e como teoria educacional, pode ser encontrada em
todos os continentes. Como concepo geral da educao, ela passou por diversos momentos epistemolgico-
educacionais e organizativos, desde a busca da conscientizao, nos anos 50 e 60, e a defesa de uma escola
pblica popular e comunitria, nos anos 70 e 80, at a escola cidad, entendida por Paulo Freire como escola
de comunidade, de companheirismo; uma escola que vive a experincia tensa da democracia (Entrevista a TV
Educativa em maro de 1997), para, nas ltimas dcadas, transformar-se, num mosaico de interpretaes,
convergncias e divergncias.
Numa poca de perplexidade paradigmtica em relao educao, vale a pena retomar o debate da
Educao Popular como utopia latino-americana (GADOTTI & TORRES, 1994) e mundial que superou, de um
lado, o otimismo pedaggico dos anos 50 e 60 e, de outro, o pessimismo pedaggico dos anos 70 e 80,
constituindo-se, a partir dos anos 1990, em diversas experincias e sob diversas formas, como alternativa real a
uma educao que no atende, com qualidade, aos interesses da maioria da populao.
Na dcada de 1950, a Educao Popular era entendida principalmente como educao de base, como
desenvolvimento comunitrio. No final dos anos 50, duas eram as tendncias mais significativas da Educao
Popular: a primeira entendida como educao libertadora, como "conscientizao" (Paulo Freire) e a segunda,
como educao funcional (profissional), isto , a formao de mo de obra mais produtiva (Unesco).
Na dcada de 1970 essas duas correntes continuaram, a primeira entendida basicamente como
educao no-formal, fora da escola, e a segunda, como suplncia da educao formal. A concepo
libertadora de educao evidencia o papel da educao na construo de um novo projeto histrico, um projeto
popular, fundamenta-se numa teoria do conhecimento que parte da prtica concreta na construo do saber e o
educando como sujeito do conhecimento e compreende a educao no apenas como um processo lgico,
intelectual, mas tambm como um processo profundamente afetivo e social.
essa histria que precisamos rememorar.
1. Antecedentes histricos
A Educao Popular tem envolvido numerosos educadores, movimentos sociais e populares, a
Sociedade Civil e o Estado. Ela est ligada a todo um movimento, de um lado, pela extenso da educao
formal para todos e, de outro, pela formao social, poltica e profissional, sobretudo de jovens e de adultos,
quando no confundida com educao no-formal. Educao no-formal e educao extraescolar so
expresses que valorizam mais o sistmico, o formal e o escolar. A educao no-formal, assim entendida,
seria menos relevante do que a educao formal, posto que a primeira concebida como "complementar de",
"supletiva de", que no tem valor em si mesma. Seria melhor definir a educao no-formal por aquilo que ela
, pela sua especificidade e no por sua oposio educao formal.
O conceito de educao ultrapassa os limites do escolar, do formal e engloba as experincias de vida e
os processos de aprendizagem no-formais, que desenvolvem a autonomia tanto da criana quanto do adulto.
Como diz Paulo Freire, se estivesse claro para ns que foi aprendendo que aprendemos ser possvel ensinar,
teramos entendido com facilidade a importncia das experincias informais nas ruas, nas praas, no trabalho,
nas salas de aula das escolas, nos ptios dos recreios, em que variados gestos de alunos, de pessoal
administrativo, de pessoal docente se cruzam cheios de significao (FREIRE, 1997:50).
A Educao Popular, como uma concepo geral da educao, chegou a opor-se educao de
adultos impulsionada pelo Estado e tem ocupado os espaos que a educao de adultos oficial no levou
muito a srio. Um dos princpios originrios da Educao Popular tem sido a criao de uma nova
epistemologia que respeita valoriza o senso comum no processo pedaggico, problematizando-o, tratando de
descobrir a teoria presente na prtica popular, teoria ainda no conhecida pelo povo, problematizando-a,
incorporando-lhe um raciocnio mais rigoroso, cientfico e unitrio. O senso comum representa, muitas vezes, a
expresso do opressor introjetada no oprimido, devendo, portanto, ser problematizado, questionado e
desconstrudo, mas no ser simplesmente rejeitado, humilhando o oprimido.
Nas dcadas de 1970 e incio da dcada de 1980 costumava-se opor a Educao Popular educao
do sistema (BRANDO, 1994:181). Vivamos em pleno regime autoritrio. Mas o Estado uma arena em que
se confrontam diversos projetos polticos. Ele contraditrio: no interior dos sistemas formais de ensino
podemos encontrar tambm projetos e propostas de uma Educao Popular como poltica pblica. Foi o que
fez, mais tarde, Paulo Freire quando assumiu a Secretaria Municipal de Educao de So Paulo (FREIRE,
1991; TORRES e outros, 2002).
Entretanto, lamentavelmente, a funo educativa do Estado tem sido entendida, quase exclusivamente,
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Pode-se dizer que a Educao Popular passou por trs fases distintas: inicialmente, at os anos 1950
era entendida como extenso do ensino fundamental (educao primria) para todos, j que s a elite tinha
acesso. Depois, ela foi entendida como Educao de Adultos das classes populares, concepo predominante
at os anos 1980. Nas ltimas dcadas ela est sendo entendida pelos movimentos sociais e populares mais
como uma concepo de educao que deve ser estendida ao conjunto dos sistemas educacionais, como
poltica pblica, e no s praticada em projetos de educao de jovens e adultos.
A educao um processo universal, mas so muitas as concepes e prticas que a materializam. Por
isso, preciso qualific-la, isto , dizer de que educao estamos falando. Aqui nos referimos ao paradigma
(DI GIORGI, 1992) da Educao Popular que tem marcado a Amrica Latina e que embasa inmeras
experincias e projetos inspirados em muitos educadores revolucionrios como Jos Marti, Simon Bovar,
Simon Rodriguez, Orlando Fals Borda, Paulo Freire. Trata-se de uma rica e variada tradio reconhecida pelo
seu carter emancipatrio, alternativo, alterativo e participativo.
A educao no um processo neutro. A Educao Popular, como toda educao, sustenta um projeto
de Sociedade. O que a caracteriza sua clara e explcita opo poltica. Em suas origens est: o anarquismo
do proletariado industrial do incio do sculo passado; o socialismo autogestionrio; o liberalismo radical
europeu; os movimentos populares; as utopias de independncia; as teorias da libertao e a pedagogia
dialtica.
Sem perder seus princpios, a Educao Popular vem se reinventando hoje, incorporando as conquistas
das novas tecnologias, retomando velhos temas e incorporando outros: o tema das migraes, da diversidade,
o ldico, a sustentabilidade, a interdisciplinaridade, a questo de gnero, etnia, idade, desenvolvimento local,
emprego e renda etc, mantendo-se sempre fiel leitura do mundo das novas conjunturas.
Nesse contexto, quais seriam as principais contribuies de Paulo Freire a esse paradigma?
Sem ter a pretenso de esgotar o tema, gostaria de apontar, entre tantas contribuies, os seguintes
princpios freirianos:
1. Teorizar a prtica para transform-la. A prtica como base para a gerao do pensamento. Os
sujeitos populares como protagonistas do seu prprio aprendizado e atores de sua emancipao.
2. O reconhecimento da legitimidade do saber popular, da cultura do povo, suas crenas, numa poca
de extremado elitismo. Uma cincia aberta s necessidades populares: a relevncia social como critrio de
qualidade da cincia.
3. Um mtodo de ensino e pesquisa (BRANDO, 1982) que parte da leitura da realidade (leitura do
mundo), da observao participante que parte do concreto, do mundo vivido pelos sujeitos: ensino-
aprendizagem inseparvel da pesquisa, da cultura popular e da participao da comunidade.
4. Uma teoria crtica do conhecimento fundamentada numa antropologia: somos programados para
aprender.
5. Uma educao como prtica da liberdade, precondio para a vida democrtica: educao como
produo e no meramente como transmisso de conhecimentos; a educao como ato dialgico (recusa do
autoritarismo), ao mesmo tempo rigoroso e imaginativo. A educao tradicional, bancria, humilha o aluno e
lhe tira a autonomia e a alegria de aprender. Na Educao Popular, dilogo sinnimo de educao: ele
pressupe reciprocidade e igualdade de condies (BEISIEGEL, 2008).
6. Harmonizao entre o formal e no-formal. O direito educao no apenas direito de ir escola,
mas direito de aprender na escola e ter acesso a oportunidades de educao no-formal (cinema, teatro,
esporte, cultura, lazer...): a marca que queremos imprimir coletivamente s escolas privilegiar a associao da
educao formal com a educao no-formal. A escola no o nico espao da veiculao do conhecimento.
Procuraremos identificar outros espaos que possam propiciar a interao de prticas pedaggicas
diferenciadas de modo a possibilitar a interao de experincias (FREIRE, 1991:16).
7. A utopia como verdadeiro realismo do educador, opondo-se ao fatalismo neoliberal que nega o sonho
de um outro mundo possvel. Para ser realista, o educador precisa ser utpico.
8. A Educao Popular como direito humano, direito de se emancipar, combinando trabalho intelectual
com trabalho manual, reflexo e ao, teoria e prtica, a conscientizao e transformao, a organizao, o
trabalho e a renda.
9. A defesa de uma educao pblica popular, que atenda, com qualidade, aos interesses da maioria da
populao, superando padres elitistas.
As inspiradoras contribuies de Paulo Freire Educao Popular continuam muito atuais,
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constantemente reinventadas por novas prticas sociais e educativas (ASSUMPO, org. 2009). So
particularmente atuais as seguintes teses freirianas:
1. A escola no o nico espao educativo: aprendemos na luta. H muitos e novos espaos de
aprendizagem: o mundo tornou-se educador. Qualquer espao pode ser educativo: conceito de cidade
educadora.
2. A politicidade inerente ao ato educativo: toda educao pressupe um projeto de Sociedade. Uma
intencionalidade poltica emancipadora. A qualidade da educao mede-se pela formao da conscincia
crtica. Leitura crtica do carter injusto da Sociedade e do papel que tem a educao na sua reproduo ou
transformao.
3. A recusa ao pensamento fatalista (neoliberal): o mundo no ; o mundo est sendo (FREIRE,
1997:85).
4. A pedagogia comprometida com a cidadania ativa. A Educao Popular estimula a participao
poltica, cidad, das classes populares para a superao de condies sociais opressivas. Educar para
transformar (WANDERLEY, 1984).
5. A tica como referencial central da busca pela radicalizao da democracia. Nisso Paulo Freire foi
pioneiro na Amrica Latina, contra as velhas teses de esquerda que no valorizavam a democracia. A revoluo
inalcanvel sem a tica.
Pode-se dizer que Paulo Freire foi o educador brasileiro que mais abriu as portas para a Educao
Popular como poltica pblica (PONTUAL, 2004; 2011) por meio de sua atuao como Secretrio Municipal de
Educao de So Paulo. Ele mostrou que a Educao Popular um processo que se constri ao mesmo tempo
dentro e fora do Estado (HECK & PONTUAL, 2012). O Estado, como a Sociedade, no algo monoltico. Ele
est em constante processo de transformao. Por isso, Paulo Freire defendia a tese de que a Educao
Popular pode e deve inspirar as polticas pblicas de educao. Ele queria que se falasse de Educao Popular
na escola pblica e que a prpria concepo popular de educao se tornasse a concepo hegemnica da
educao. Ele no entendia a Educao Popular apenas como educao no-formal, por mais que valorizasse
a informalidade. Ele queria no s democratizar a educao, mas, garantir que ela pudesse ser popular, isto
, incorporar em suas prticas os princpios emancipatrios da Educao Popular como parte de um projeto de
Sociedade: quando fui Secretrio de Educao da cidade de So Paulo, obviamente comprometido com fazer
uma administrao que, em coerncia com o nosso sonho poltico, com a nossa utopia, levasse a srio, como
devia ser, a questo da participao popular nos destinos da escola, tivemos, meus companheiros de equipe e
eu, de comear pelo comeo mesmo. Quer dizer, comeamos por fazer uma reforma administrativa para que a
Secretaria de Educao trabalhasse de forma diferente (FREIRE, 1993: 74).
No h Educao Popular sem cultura popular. Cultura popular vai alm do mbito de atuao dos
profissionais da educao. Como costuma dizer Carlos Rodrigues Brando: eu trabalho com cultura popular
em educao de adultos, como mdico, como engenheiro, como msico, como arquiteto, como economista,
como administrador, enfim, como educador. Dessa forma, podemos dizer que a Educao Popular um
conceito que abrange um vasto campo de interseces. Ela diz respeito aos direitos humanos, pedagogia
crtica, produo de conhecimentos, cidadania, aos movimentos sociais, comunicao e cultura popular,
educao de adultos, educao formal em todos os nveis, educao ao longo da vida, educao
ambiental etc.
Paulo Freire entende Educao Popular como cultura e como processo de mobilizao social com
vistas a criao de um poder popular. Foi assim que ele a definiu, em agosto de 1985, numa entrevista
concedida educadora Rosa Maria Torres. Nessa entrevista ele afirma que a Educao Popular se delineia
como um esforo no sentido da mobilizao e da organizao das classes populares com vistas criao de
um poder popular (Paulo Freire. In: TORRES, org. 1987, p. 74). O espao pblico ser sempre um espao de
disputa de hegemonia, de disputa de projetos de Sociedade. O Estado e a Sociedade no so estticos e
monolticos. Esto sempre em mudana porque so contraditrios (ASSUMPO, org. 2009).
Para fazer Educao Popular no necessrio estar trabalhando com adultos. A Educao Popular
um conceito de educao que independe da idade do educando, porque a Educao Popular, na minha
opinio, diz Paulo Freire, no se confunde, nem se restringe apenas aos adultos. Eu diria que o que marca, o
que define a Educao Popular no a idade dos educandos, mas a opo poltica, a prtica poltica entendida
e assumida na prtica educativa (Id, ib, p. 86-87).
Paulo Freire pegou, no final da vida, um perodo de refundamentao (PALUDO, 2004) da Educao
Popular, correspondente ao final dos anos oitenta e incio dos noventa. A Educao Popular incorporou novos
temas, como o dilogo de saberes, os conceitos de Sociedade Civil, poltica cultural, a questo de gnero, a
questo ambiental, a valorizao da subjetividade, da intertransculturalidade etc., distanciando-se de uma
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leitura puramente classista e reprodutivista da educao. A escola pblica entrou na pauta da Educao
Popular. O Estado deixou de ser encarado como inimigo, como na poca das ditaduras. De uma concepo
superpolitizada e unitria, a Educao Popular tornou-se mais plural, ganhando em diversidade de teorias e
prticas.
Com o processo de democratizao, alguns educadores populares assumiram responsabilidades
governamentais comprometendo-se a fazer o Estado funcionar em favor dos setores mais pobres, o que implica
viver a contradio de estar governando em Estados que funcionavam a favor dos poderosos e tentar inverter
as prioridades, como dizia Paulo Freire ao assumir o cargo de Secretrio Municipal de Educao em So
Paulo. Algumas ONGs passaram a fazer parcerias com administraes populares e democrticas. O processo
da Educao Popular se enriqueceu com as novas propostas de educao cidad e para os direitos humanos.
Para a constituio de uma Poltica Nacional de Educao Popular precisamos ter clareza do que
entendemos por Educao Popular. Dependendo da resposta a essa pergunta podemos pensar numa poltica
nacional de um setor ou modalidade da educao no-formal, por exemplo ou da educao como um todo.
Da a pergunta: de que Educao Popular estamos falando? A Educao Popular pode ser entendida tanto
como uma concepo geral da educao que incorpora prticas, conceitos, metodologias daquela educao
em quaisquer nveis e modalidades de ensino, no setor pblico ou privado, ou como uma educao das
classes populares, que pode ser ou no emancipadora, feita para elas ou com elas, a partir delas.
Quando estamos falando em Poltica Nacional, estamos entendendo e prevendo um Sistema Nacional
de Educao Popular, visando a tornar hegemnica esta concepo de educao no Sistema? Hoje, dadas as
condies que temos, estamos nos limitando a pensar uma Poltica Nacional de Educao Popular voltada para
o atendimento das classes populares, dos grupos econmica e socialmente mais vulnerveis?
Creio que se trata de construir uma Poltica Nacional de Educao Popular que no se limite apenas a
processos de educao no-formal, fora da escola. Ela deve unir o formal e o no-formal, porque o que se
deseja que o Estado assuma a Educao Popular como poltica pblica. O grande desafio unir o que est
acontecendo dentro dela com o que est acontecendo fora, lembrando que nem toda educao no-formal
Educao Popular como a entendemos aqui, como educao emancipadora. Fazer educao no-formal no
significa, automaticamente, fazer Educao Popular. A Educao Popular pode dar-se tanto em espaos
formais quanto em espaos no formais, no nvel da escola e fora dela. Mesmo que possamos nos ocupar de
apenas um dos mbitos - por uma questo de delimitao do campo de atuao - no podemos ignorar outros
mbitos.
Creio que devemos comear pelo campo onde acumulamos fora e avanar neste campo e nos
articular com quem est pensando em fazer o mesmo em outros campos (Educao Popular em direitos
humanos, em sade, educao social, comunitria, EJA, MOVA etc). A Educao Popular no est separada da
educao comunitria e social (GADOTTI, 2012). Seria estratgico envolver todos esses campos - ou o maior
nmero possvel - neste momento, e pensar a longo prazo. Essa no s uma tarefa da RECID mas a RECID,
trabalhando a partir dos princpios da Educao Popular freiriana, pode ser catalizadora desse movimento. Alm
do seu trabalho de base, ela poderia fazer esse trabalho de articulao nacional mapeando iniciativas de
Educao Popular nos ministrios e governos estaduais e municipais. Apesar de todos os avanos na
mobilizao social, no h, at agora, uma rede que possa organizar essa articulao.
A Educao popular inspira uma nova cultura poltica, que representa o aprofundamento e a difuso
dos mecanismos da democracia participativa, bem como dos valores e das prticas da cidadania ativa. Trata-se
de um novo modo de governar, na expresso de Gilberto Carvalho (In: BRASIL, SR/PR, 2011), uma
metodologia de governo e de exerccio do poder que gera uma cultura democrtica, transformando o cotidiano
das vivncias das pessoas. assim que a Educao Popular se transforma num poder popular. Por meio de
uma cultura popular, por meio de uma nova forma de viver em Sociedade, de pensar e agir (democraticamente),
enfim, de bem viver, consigo mesmo, com os outros e com a natureza.
Se o que caracteriza uma poltica pblica a universalidade e a diversidade (regional, poltica,
geracional etc), portanto, a capacidade de atender a todos em sua heterogeneidade, precisamos apontar qual
o beneficirio da Educao Popular como poltica pblica, a quem ela se destina. Uma poltica pblica de
Educao Popular dever ser uma poltica agregadora, cidad, democrtica, intersetorial, emancipadora,
como defende a Plataforma Mundial do Frum Mundial de Educao (www.forummundialeducacao.org). A
Educao Popular visa a construo de um poder popular que no nasce pronto e acabado. Para ser
popular, ele deve construir-se dialogicamente com o povo. O que de todos deve ter a participao de todos.
Ele deve constituir-se em hegemonia (GRAMSCI, 1968), em maioria consciente e organizada. Jamais ser
uma poltica sectria. A Educao Popular representa um conjunto de concepes, princpios e procedimentos
metodolgicos, valores e intencionalidades polticas e ideolgicas, que pode assumir uma srie de formas
distintas, em diferentes espaos, com diferentes funes e escalas de abrangncia, ocorrendo dentro e fora do
Estado.
O avano da Educao Popular dentro do Estado representa o avano do projeto popular no seio da
Sociedade e da sua representao poltica. Em ltima instncia isso significaria que a "pedagogia do oprimido",
como paradigma da educao e da sociedade, s poderia se tornar poltica pblica quando os oprimidos e os
com eles sofrem, mas, sobretudo, com eles lutam, na expresso da epgrafe do livro mais conhecido de Paulo
Freire conquistarem a hegemonia e o poder. Antes disso, trata-se da luta progressiva e progressista, pela
conquista da hegemonia. Por isso, a luta pela Educao Popular como poltica pblica passa necessariamente
pelas lutas para a construo de uma nova hegemonia no seio da Sociedade. A transformao da educao
pblica em Educao Popular depende, em grande medida, dos avanos das lutas sociais e populares para a
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construo de uma nova hegemonia e uma nova direo na Sociedade. A constituio de uma Poltica Nacional
de Educao Popular um processo lento e deve comear, taticamente, por onde for mais vivel na atual
conjuntura.
estatal incide sobre o Estado, com ou sem o suporte da representao poltica tradicional, e contm milhares
de organizaes locais, regionais, nacionais e internacionais, que aumentam sem cessar a sua capacidade de
organizar a sociedade e influir sobre o Estado. Elas promovem sua auto-organizao por interesses
aparentemente particulares: so entidades que militam para defender, desde a ateno para determinadas
doenas, o direito habitao e de acesso terra, at para sustentar demandas tipicamente comunitrias.
Estas entidades podem se tornar reais mediadoras da ao poltica direta dos cidados por seus interesses,
sob controle destes, sem amarrar-se mecanicamente no direito estatal que regula a representao poltica.
O conceito de esfera pblica no-estatal pode referir-se a realidades bem distintas. Uma coisa a
Sociedade Civil participar da elaborao de polticas pblicas, outra coisa a Sociedade Civil executar polticas
pblicas estatais e outra coisa, ainda, a Sociedade Civil desenvolver polticas sociais para atender
necessidades pblicas e contar com o apoio do Estado. Sob o conceito e a prtica de uma gesto pblica no-
estatal no devemos nem desresponsabilizar o Estado de suas obrigaes e nem responsabilizar a Sociedade
Civil por polticas pblicas estatais.
O programa do Oramento Participativo, um bom exemplo de espao de gesto pblica no-estatal
(PONTUAL, 2000). O Oramento Participativo tambm Educao Popular porque desenvolve a conscincia
crtica como condio fundamental para o fortalecimento e desenvolvimento das diferentes formas de
mobilizao e organizao das lutas comunitrias e populares, pela afirmao dos seus direitos e pela
superao das realidades e fatores que os negam. Ele constri conhecimentos sobre participao e controle
social para o desenvolvimento de uma relao crtica entre o poder pblico e os representantes das
comunidades.
O Oramento Participativo tem a vantagem de oferecer um instrumento e uma metodologia de definio
de prioridades estatais pela Sociedade Civil. O Estado continua na sua execuo. O que tem sido controvertido
quando a Sociedade Civil, alm de apontar essas prioridades, passa a fazer parceria (um conceito ambguo)
com o Estado para execut-las. Aqui todo cuidado pouco, mas tambm esse cuidado no pode nos imobilizar,
esperando que o Estado possa fazer o que a Sociedade tambm pode e deve fazer. Como dizia Betinho: quem
tem fome tem pressa. E a fome no s de comida, mas tambm de beleza, como costuma dizer Frei Betto.
Um caso emblemtico de articulao entre Estado e Sociedade Civil o Programa Um Milho de Cisternas
(www.asabrasil.org.br). Segundo Daisy Maria dos Santos (2005:07) trata-se de uma poltica pblica no-estatal
fundada nos marcos da reforma do Estado, no esgotamento das polticas verticais de desenvolvimento rural
federal e estadual, na persistncia dos problemas de subdesenvolvimento do Nordeste rural, em especial na
regio do semirido e na emergncia do conceito de desenvolvimento sustentvel a partir da ECO-92.
Esses e outros programas e projetos, para que eduquem realmente para a cidadania ativa
(BENEVIDES, 1991), precisam explicitar claramente e realizar praticamente sua funo educativa. Dados
recentes do ndice de Desenvolvimento da Famlia (IDF), criado pelo Governo Federal, mostram que o
Programa Bolsa Famlia elevou a renda familiar, mas, no elevou, na mesma proporo, o acesso educao
da populao atendida e nem ao trabalho. Isso demonstra que a erradicao da misria s o comeo (como
diz a propaganda do governo); ela implica na erradicao do analfabetismo que a misria educacional. A
nossa baixa qualidade da educao um fator que impede nosso desempenho econmico. No se pode ter
um Estado melhor do que a cidadania. No existindo esta, apresentam-se solues tendencialmente capciosas,
que no fundo reproduzem a pobreza, j que conservam o pobre como mero beneficirio (DEMO, 2000: 58).
A proposta originria de Frei Betto para o Programa Fome Zero no era s uma bolsa monetria. Era
uma proposta que associava o recurso financeiro Educao Popular e elevao da escolarizao, a passar
do individualismo cidadania (Frei Betto. In: Recid, 2006), por meio da organizao popular (conselhos), com
vistas a um novo modelo de Sociedade, formando o povo para tomar conta do seu destino (Id. ib.), nas
palavras dele. Tratava-se tambm de um processo de sensibilizao, mobilizao e de Educao Popular. E
Frei Betto tinha razo. Agora faz falta esse componente educativo do Programa Bolsa Famlia. Fazem falta
processos educativos formais e no-formais de participao social para uma nova cultura poltica. Enfim, apesar
dos reconhecidos avanos, faz falta uma Poltica Nacional de Educao Popular como compromisso de um
projeto popular de nao.
No trato da chamada esfera pblica no-estatal, a literatura sobre o tema mostra um divisor de guas
entre duas concepes dessa expresso: de um lado temos a viso neoliberal (dominante) que concebe o
pblico no-estatal como uma estratgia de transferncia de responsabilidades do Estado para a Sociedade
na tentativa de diminuir o Estado. O Estado neoliberal capitalista um Estado a favor dos interesses privados,
jogando para o indivduo a responsabilidade pelos seus direitos de sade, educao etc. prprio das polticas
neoliberais promover a privatizao dos servios sociais, mesmo quando o Estado continua na administrao
dessas polticas. Ele transforma direitos sociais em servios sociais prestados pelo Estado e pelo Mercado. De
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outro lado temos uma viso popular do tema, que, inversamente, pensa um Estado mais fortalecido pela
participao ativa da Sociedade. Nessa viso, a esfera pblica no-estatal concebida como estratgia de
publicizao, transparncia e democratizao do Estado, buscando reduzir ou eliminar o carter privado do
Estado. A Educao Popular situa-se nessa viso do Estado, disputando um conceito, uma prtica e um projeto,
dentro e fora do Estado. De um lado temos um projeto de poder mercantil e de outro temos um projeto de poder
popular.
Organizaes no-governamentais no deveriam existir para fazer as vezes do Estado. Quando a
Sociedade Civil se posiciona frente a determinado problema social e age sozinha ou com o apoio do Estado, ela
age no interesse da maioria, por interesse pblico, no por interesses privados ou mercantis. Muitas polticas
pblicas so resultado da presso da prpria Sociedade. No caso da educao muito conhecida a iniciativa
popular das escolas comunitrias, criadas e mantidas pelas prprias comunidades. Na prtica, o que acontece
que, diante da dificuldade de manter essas escolas, as comunidades procuram o poder pblico para obter
assistncia tcnica e financeira e, em muitos casos, essas escolas acabam se tornando escolas pblicas
regulares. o povo, as comunidades, se organizando e agindo para conquistar seus direitos.
A ausncia ou insuficincia de polticas pblicas leva, muitas vezes, a que organizaes da Sociedade
Civil desenvolvam servios comunitrios substitutivos, que atendem aos interesses e necessidades de uma
determinada coletividade. Diante disso, um dos objetivos da luta poltica deve ser transformar esses servios
coletivos e comunitrios em poltica pblica, aos cuidados do Estado. A participao de entidades civis na
implementao das polticas pblicas deve ser entendida pelo conceito de parceria tal como foi desenvolvido
por Paulo Freire quando foi Secretrio Municipal de Educao. O planejamento e a execuo sempre, em
ltima instncia, uma responsabilidade e atribuio do Estado. Ele criou o Movimento de Alfabetizao de
Jovens de Adultos da Cidade de So Paulo (PONTUAL, 1995), o MOVA-SP. Em seu primeiro ano de
funcionamento, em 1990, o MOVA-SP implantou 626 ncleos de alfabetizao em convnio com 57
movimentos populares. Para que uma entidade ingressasse no MOVA-SP bastava ter personalidade jurdica ou
estar ligada a outra entidade juridicamente constituda e atender aos seguintes critrios: a) j desenvolver ou
pretender iniciar trabalhos de alfabetizao e ps-alfabetizao com grupos populares, sem fins lucrativos; b)
que os trabalhos fossem desenvolvidos dentro da concepo poltico-pedaggica libertadora; c) que os
educadores tivessem domnio da leitura e da escrita; d) que os educadores populares se comprometessem a
participar do processo de formao permanente junto ao coletivo dos educadores do projeto MOVA-SP
(GADOTTI & TORRES, 1992:76).
A Sociedade brasileira vm passando por profundas transformaes sociais, polticas e econmicas.
Novas formas de cooperao e colaborao entre o Estado e a Sociedade vm se consolidando, apesar de as
associaes e movimentos sociais estarem passando por frequentes questionamentos, hostilidade e at
criminalizao por parte dos setores mais conservadores e retrgrados da Sociedade mercantil, principalmente
da mdia. Desde os anos 1990, com o crescimento das ONGs, muitas parcerias se estabeleceram na
implementao de polticas pblicas ampliando os espaos de participao dos sujeitos sociais. Como afirma
Gerson Almeida, Secretrio Nacional de Articulao Social da SG/PR, a incorporao de novos sujeitos no
processo de construo das polticas pblicas, por meio das diferentes formas de participao apresentadas ,
em grande medida, responsvel pela melhoria geral dos indicadores sociais que est em curso no pas. A
dinmica de participao e a sua abrangncia fazem com que no seja mais aceitvel qualquer ideia que
dissocie desenvolvimento econmico e social (ALMEIDA, 2010:145).
Iniciativas sociais de interesse pblico das ONGs tornaram-se essenciais para o funcionamento da
democracia. Se elas no existissem, criariam um grande vcuo na Sociedade, haveria um grande prejuzo para
as populaes mais pobres e muitos servios pblicos essenciais no seriam prestados. Nas democracias
modernas as organizaes sociais tm tradicionalmente relaes com o Estado. Sua atuao ainda maior
quanto maior o grau de democracia existente na Sociedade. Elas so entidades sem fins lucrativos e
autnomas, constitudas por grupos de cidados, independentes do Estado e de partidos polticos. Criminalizar
as entidades da Sociedade Civil, partidarizar a discusso desse tema, fazer generalizaes simplistas, tem sido
uma forma que os setores mais conservadores, neste pas, tm usado para frear a crescente influncia dessas
entidades no processo de radicalizao da democracia. Atacar as ONGs hoje atacar a democracia.
pblicas, enfatizando novas formas de gesto social. A relao entre Estado e Sociedade Civil mudou: o
associativismo alterou-se, assim como a forma de os governos relacionarem-se com os grupos e movimentos
organizado. Participao e controle social passaram a ser diretrizes e normativas, regulamentadas por leis e
programas sociais (GOHN, 2011:125-127). Por isso, hoje, existe um contexto favorvel para pensar a
Educao Popular como poltica pblica e, portanto, uma Poltica Nacional de Educao Popular, por conta de
todo o acmulo, sobretudo nos ltimos 10 anos, no campo da participao social e popular.
Mas preciso continuar fazendo uma clara distino entre participao social e participao popular.
A Participao Popular corresponde s formas mais independentes e autnomas de organizao e de atuao
poltica dos grupos das classes populares e trabalhadoras e que se constituem em movimentos sociais,
associaes de moradores, lutas sindicais etc. A Participao Popular corresponde a formas de luta mais direta
do que a participao social, por meio de ocupaes, marchas, mobilizaes sociais, paralisaes, bloqueios de
ruas e estradas, lutas comunitrias etc. Embora dialogando e negociando pontualmente com os governos, em
determinados momentos, essas formas de organizao e mobilizao no atuam dentro de programas pblicos
e nem se subordinam s suas regras e regulamentos. J, a participao Social se d nos espaos e
mecanismos do controle social como nas conferncias, conselhos, ouvidorias, audincias pblicas etc. So os
espaos e formas de organizao e atuao da Participao Social. assim que ela entendida, como
categoria e como conceito metodolgico e poltico, pelos gestores pblicos que a promovem. Essa forma de
atuao da sociedade civil organizada fundamental para o controle, a fiscalizao, o acompanhamento e a
implementao das polticas pblicas, bem como para o exerccio do dilogo e de uma relao mais rotineira e
orgnica entre os governos e a sociedade civil.
Os conselhos foram criados pela Constituio de 1988 como instrumentos de representao e
participao da populao na coisa pblica, gerando uma nova institucionalidade pblica no-estatal ou social-
pblica, viabilizando um novo padro de relacionamento entre Estado e Sociedade. Quanto mais um governo
democrtico, mais a poltica pblica conta com a sociedade, com organizaes da Sociedade Civil (OSCs),
mais agentes no-governamentais participam da gesto pblica (COCCO, GALVO e SILVA, 2003). isso
que est levando a Secretaria Geral da Presidncia da Repblica a propor um Sistema nacional de
Participao Social e uma Poltica Nacional de Participao Social, ao lado da luta por um Novo Marco
Regulatrio para as Organizaes da Sociedade Civil.
O Sistema Nacional de Participao Social, com base no acmulo alcanado at agora no campo da
participao, dever estabelecer princpios que vo orientar e facilitar a participao social na formulao,
implementao, monitoramento e avaliao de polticas pblicas. Um sistema no hierarquizado, aberto e
flexvel, com uma estrutura em rede que garanta a autonomia das organizaes da Sociedade Civil. Esse
sistema fruto de uma poltica que vem sendo construda desde 2003 quando o presidente Lula instituiu,
ampliou e valorizou a participao dos conselhos e das conferncias na elaborao, formulao e gesto de
polticas pblicas e agora se concretiza numa Poltica Nacional de Participao Social que estabelece o
papel do Estado como promotor e garantidor do direito humano participao. O Sistema Nacional de
Participao Social dever articular as polticas de participao social, integrando conselhos, conferncias,
fruns, ouvidorias, audincias e consultas pblicas e rgos colegiados, facilitando a participao de
organizaes e movimentos sociais. Para que se possa consolidar a esfera pblica democrtica e igualitria
preciso que os Zs estejam representados. Esta a verdadeira revoluo do pblico a incidir nas modalidades
de efetivao das estratgias de enfrentamento das desigualdades sociais no pas. a devoluo da palavra e
da ao a quem a histria sonegou o direito de constituir-se como sujeitos na sociedade brasileira (RAICHELIS,
1998:284).
Vista desta forma, a participao social se constitui, tambm, num mtodo de reconfigurao do
prprio Estado. A democracia participativa no concorre com a representativa: elas se complementam, se
fortalecem, aproximando o cidado do Estado. preciso superar o velho modelo tecnocrata de poltica pblica
baseada na premissa do Estado externo Sociedade. A participao social como modo de governar significa
adequar a racionalidade tcnica da administrao pblica a uma nova forma de governar baseada no dilogo
constante com os atores da Sociedade Civil (BRASIL, SR/PR, 2011:83).
Ao falar da Educao Popular como poltica pblica j me perguntaram: o que vai ser da minha
experincia de Educao Popular que no uma iniciativa do Estado? uma iniciativa do movimento popular e
deixar de ser do movimento popular? Vamos deixar de fazer Educao Popular no bairro, nas comunidades?
Vai passar a ser s do Estado? Como vo funcionar os conselhos populares se fizerem parte de uma poltica
pblica?
Sem institucionalidade no h poltica pblica. Entretanto, uma poltica pblica no significa que deva
tudo estatizar. Institucionalizar no estatizar. No se trata de estatizar iniciativas de movimentos sociais e
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jurdico e, pior, quando o Estado buscou regular o setor, acabou criando entraves para a promoo de seus
prprios programas. Isso levou um membro do governo, o professor Paul Singer, da SENAES (Secretaria
Nacional de Economia Solidria), em artigo publicado na Folha de S. Paulo (08/10/08, p. 3) com o ttulo A crise
das ONGs e das polticas sociais, a afirmar que h mais de um ano as relaes entre o Estado brasileiro e as
organizaes no-governamentais esto em Estado quase catatnico, devido a um enrijecimento crescente dos
controles de convnios que regem as parcerias entre ambos. Concordo inteiramente com a posio de Paul
Singer. O governo precisa impedir a atuao das falsas ONGs, como disse Paul Singer nesse mesmo artigo -
como o faz com as falsas empresas - sem impossibilitar que ONGs autnticas, independentemente de seu
tamanho, possam assumir o seu legtimo lugar de parceiras do Estado.
Muitas empresas privadas, que se auto-denominam Sociedade Civil, reagem ferozmente contra
qualquer iniciativa das ONGs, movimentos sociais e populares, afirmando que as organizaes da Sociedade
Civil devem limitar-se a seu papel social, sem nenhuma articulao com o poder pblico. O Estado vive
subordinado lgica da empresa privada capitalista e, neste caso, torna-se uma forma do capital, como
sustenta John Holloway (2003). um Estado altamente preparado para atender ao mercado e completamente
despreparado, legal e administrativamente, para atender s organizaes no-governamentais e movimentos
sociais.
partidos de esquerda que, ao chegarem ao governo, abrem espaos para alianas e parcerias com a Sociedade
Civil.
claro que esse tema merece todo o cuidado pois existem prticas neoliberais de enxugamento do
Estado, que acabam repassando para a iniciativa privada funes que so suas ou, simplesmente, repassam
para o cidado a responsabilidade, por exemplo, pela sua educao. A educao dever do Estado e toda vez
que o Estado repassa essa responsabilidade para o cidado ele est transformando esse direito num servio
prestado apenas queles e quelas que podem pagar por ele. No estamos falando aqui dessa poltica
neoliberal que repassa a execuo das polticas pblicas estatais para a Sociedade Civil e associaes
comunitrias por meio de parcerias.
Uma Poltica Nacional de Educao Popular dever articular as aes e programas j existentes,
evitando o isolamento das aes e experincias sejam elas governamentais ou no governamentais. Ser
preciso mostrar como a prtica da Educao Popular intersetorial e transversal ao conjunto de iniciativas e
polticas governamentais (democratizao da gesto, participao social e popular) articuladas com as polticas
de igualdade e equidade. Como afirmou Selvino Heck, assessor especial da Secretaria Geral da Presidncia da
Repblica, o objetivo desta Poltica o de articular, fomentar, divulgar, produzir conhecimento e trocas de
experincia entre prticas de educao popular desenvolvidas no mbito das polticas pblicas dos governos e
da sociedade civil organizada, consolidando, a partir do respeito autonomia, a educao popular como poltica
pblica, intersetorial e transversal ao conjunto das iniciativas, para avanar na participao cidad, na
democratizao do Estado, de forma articulada com a estratgia de superao da misria e com um modelo de
desenvolvimento com justia social para o Brasil (HECK, 2013). Uma Poltica Nacional de Educao Popular
dever estimular a participao e a politizao da sociedade, em outras palavras, dever possibilitar que as
demandas sociais sejam transformadas em polticas pblicas.
A Educao Popular de hoje tem a cara dos movimentos sociais (GOHN, 2009). Eles se fortalecem
como portadores da esperana, com suas mltiplas subjetividades polticas, lutando por moradia, pelo direito
terra, por transporte, segurana, pelos direitos humanos, pelo meio ambiente, sade, emprego, diversidade
tnica, racial, de gnero, sexual etc. dando novo rosto Educao Popular. A Educao Popular tem, ainda, a
seu favor, hoje, o surgimento das novas foras de poder local democrtico. estratgico contar com essas
duas foras somando iniciativas da Sociedade e do Estado.
A Educao Popular como modelo terico reconceituado pode oferecer grandes alternativas para a
educao formal tambm nos anos que esto por vir, com governos mais democrticos, embora, no Brasil, o
MEC no lhe d importncia. No podemos perder essa oportunidade de tornar a Educao Popular uma
poltica pblica, oportunidade de construir um poder popular, como reivindica a Rede de Educao Cidad e
de fortalecer um processo verdadeiramente revolucionrio de emancipao. Da a necessidade hoje de inserir a
Poltica Nacional de Educao Popular na agenda dos movimentos sindicais, sociais e populares.
Um dos desafios da formulao de uma Poltica Nacional de Educao Popular est na definio e
delimitao do mbito desta poltica. O objetivo implementar a Educao Popular no sistema nacional de
educao? implementar processos de educao no-formal e participao social na gesto e no
planejamento da educao nacional (secretarias de educao)? mobilizar a Sociedade para o controle social
das polticas pblicas? formao para e pela cidadania? um mtodo de governo? Ou tudo isso?
O MEC, quando quer criar uma nova poltica nacional, aps ouvir a Sociedade, costuma criar um Grupo
de Trabalho. Como o nosso tema muito complexo, para a criao de uma Poltica Nacional de Educao
Popular seria necessrio estabelecer pequenos grupos para levantar hipteses sobre cada um dos
componentes de uma sistema nacional de Educao Popular, a partir de um documento comum orientador.
Esse seria para mim o primeiro desafio: construir esse Documento-Referncia, como na metodologia utilizada
pela Conferncia Nacional de Educao (Conae), que seja um documento prospectivo, estratgico e
mobilizador.
A Poltica Nacional de Educao Popular precisa levar em conta tambm o projeto de criao da
profisso de educador social (Projeto de Lei no. 5.346/2009 de autoria do deputado Chico Lopes). Na forma
como apresentada pela lei, a profisso deste educador consagra uma prtica de educao social j
consolidada nos contextos educativos situados fora dos mbitos escolares que envolvem, principalmente,
pessoas e comunidades em situao de risco e ou vulnerabilidade social (In: GARRIDO, Nomia de Carvalho,
Odair M. da Silva, Francisco Evangelista, 2011: 31-34). Por outro lado, dentro da escola, o Programa Mais
Educao (portal.mec.gov.br) criou a figura do professor comunitrio que preciso tambm levar em
conta. O professor comunitrio coordena, na escola, um conjunto de aes socioculturais, desenvolvidas por
universitrios e agentes culturais da comunidade e de ONGs. Cabe a ele coordenar o programa, estabelecendo
a relao da escola com a comunidade e os familiares, bem como desenvolver a sua matriz curricular em
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consonncia com o projeto poltico pedaggico da escola e mediante consulta aos professores.
Precisamos aproveitar da experincia de construo de outras polticas pblicas como a experincia
bem sucedida de criao da Poltica Nacional de Educao Popular em Sade (2012). Precisamos articular a
Poltica Nacional de Educao Popular com as demais polticas populares. Por isso, fundamental mapear e
articular o que j existe no campo da Educao Popular. Articular e potencializar no s o que existe na
Sociedade mas, igualmente, o que j existe em diferentes ministrios e governos estaduais e municipais e
buscar estend-los para outras reas e outros governos, na universidades, governos, ONGs, movimentos
sociais e populares, no contexto dos direitos humanos. Popularizar essas iniciativas. Mapear, conhecer melhor
e potencializar o que j existe no campo da Educao Popular um dos grandes desafios de uma poltica
nacional de Educao Popular. Essas iniciativas no se restringem ao campo da educao propriamente dito.
Elas existem em quase todos setores, secretarias e ministrios onde h democratizao do Estado. So
experincias intersetoriais e transversais importantes e devem fazer parte deste esforo nacional de
transformao da Educao Popular em poltica pblica.
Precisamos, ainda, disputar o conceito de Educao Popular no processo da Conferncia Nacional de
Educao (Conae), ocupar espaos nas conferncias preparatrias e livres, avanar onde hoje vivel, com os
ps no cho e a utopia na cabea. bom lembrar que o Documento Final da Conae de 2010 quando fala das
experincias de educao popular e cidad sugere que que elas sejam incorporadas como polticas pblicas
(BRASIL, MEC/FNE, 2011:29). A luta no ser fcil. Vimos o que est acontecendo com o Plano Nacional de
Educao. Nele, a expresso Educao Popular aparece uma nica vez, associada educao cidad,
como uma estratgia de educao no-formal para a elevao do ndice de Desenvolvimento da Educao
Bsica (IDEB) e a expresso direitos humanos tambm s aparece uma vez quando fala do conceito de
diversidade. Vejam o caminho que precisamos fazer para a Educao Popular ser reconhecida neste pas.
sobretudo no campo da educao. E uma Poltica Nacional de Educao Popular poderia representar esse
avano.
A situao da educao no Brasil pode levar estagnao econmica. E s vai melhorar se houver
repactuao do federalismo brasileiro, fortalecendo a gesto local das escolas com base em padres nacionais
de gesto democrtica e participao popular (GADOTTI: 2013). S vai melhorar se mudar a maneira de
ensinar e de aprender: da decoreba neoliberal apostilada e suas olimpadas ao crculo dialgico de cultura
freiriano: "ensinar e aprender no podem dar-se fora da procura, fora da boniteza e da alegria" (FREIRE, 1997:
67. Quem sabe ensina a quem no sabe. Aprendizado criativo, divertido, e professor autor. O brasileiro precisa
aprender a pensar de forma autnoma. S o ethos freiriano pode salvar a educao brasileira.
A escola sobretudo o lugar do ensino e da aprendizagem. para isso que l se renem estudantes e
professores. E no h nada melhor na vida do que a procura, a beleza e a alegria. Mas como medir isso? Como
medir o grau de felicidade, de boniteza, de alegria? O IDEB passa longe dessa preocupao, passa longe da
qualidade da escola defendida por Paulo Freire: a qualidade dessa escola dever ser medida no apenas pela
quantidade de contedos transmitidos e assimilados, mas igualmente pela solidariedade de classe que tiver
construdo, pela possibilidade que todos os usurios da escola incluindo pais e comunidade tiverem de
utiliz-la como um espao para a elaborao de sua cultura (). A escola deve ser tambm um centro
irradiador da cultura popular, disposio da comunidade, no para consumi-la, mas para recri-la. A escola
tambm um espao de organizao poltica das classes populares (FREIRE, 1991:15-16). O IDEB apenas
um ndice, um nmero, um indicador. Sua finalidade no avaliar a partir de uma perspectiva emancipatria.
Sua perspectiva e finalidade classificatria. Avaliar muito mais do que classificar. mostrar resultados e as
condies desses resultados, mostrar porque as crianas no aprendem ou aprendem o que no precisam.
Avaliar mostrar porque temos tantos analfabetos quantos tnhamos, h 50 anos atrs e porque temos ainda
milhes de crianas fora da escola. Realmente, nas nossas escolas esto faltando ideias inovadoras enquanto
sobram normas, grades curriculares e regulamentos. Para dar certa nossa educao precisam de professores e
alunos mais felizes na escola. Para a escola melhorar no basta mexer nas paredes, na distribuio das
carteiras, nas sries ou ciclos; precisamos mexer no ethos da educao. E no por culta de Vygostsky ou de
Piaget e nem de Paulo Freire.
No posso deixar de falar do perigo de um retrocesso na educao brasileira. Ele est na crescente
perda de hegemonia do projeto educacional por parte do Estado (FRIGOTTO, 2011). O governo j no o
protagonista principal da poltica educacional. a empresa privada. H um crescente processo de
financeirizao, de desnacionalizao e de mercantilizao da educao: de direito educao passa a ser um
servio prestado pelo mercado. Grandes grupos econmicos oferecem financiamento prprio para seus alunos
como faz qualquer loja de eletrodomsticos. Nessas empresas, trabalhadores da educao so demitidos e
readmitidos na forma de rodzio para aumentar o lucro, numa alta rotatividade. No so mais professores
contratados. So executores, facilitadores de aulas pr-formatadas. Vendem apenas sua habilidade de replicar
o sistema.
Infelizmente, isso no acontece s no mercado educacional. Institutos e fundaes de empresas
privadas estabelecem parcerias com o poder pblico: Estados e Municpios compram sistemas privados
incentivados pelos dirigentes do rgos de educao e de suas entidades. Um exemplo dessa poltica est no
ambiente virtual Conviva Educao, cuja gesto est sob a responsabilidade da UNDIME, com apoio do
CONSED, mantido pela parceria de fundaes privadas e o Movimento Todos pela Educao. No site do
CONVIVA, est escrito que o objetivo auxiliar as Secretarias de Educao a gerir sua rede/sistema de ensino.
Gratuitamente, como est destacado no site, convidam municpios a se inscreverem. Tendo se inscrito na
plataforma, as secretarias tm acesso a conceitos, dados e ferramentas que orientem a administrao e gesto
das Secretarias Municipais de Educao, com foco na eficcia da aprendizagem dos alunos. Por outro lado, as
Secretarias oferecem informaes no menos relevantes sobre a poltica educacional de cada municpio.
Dados, redes, formaes, informaes. Como diz a expresso popular, precisamos estar com um olho no peixe
outro no gato. De um lado CONAE, CONSOCIAL, Poltica Nacional de Educao Popular... de outro, propostas
de sistemas de ensino vendidos para redes inteiras de ensino e ambientes virtuais ofertando eficcia na
aprendizagem, respondendo a uma demanda criada pelo IDEB. Deixo para cada um tirar suas concluses
sobre a educao a ser construda e fortalecida em relaes estabelecidas nessas bases e qual nosso papel
nessa histria. Nenhum sistema de ensino neutro. Ele pressupe valores sociais, princpios e objetivos
polticos, enfim, uma viso de mundo.
Uma Poltica Nacional de Educao Popular um sonho possvel. Mas ainda h muito o que fazer para
chegar l. Uma das tarefas urgentes ampliar nossas redes, alargar nossos horizontes, ampliar alianas e
parcerias com quem temos afinidade, mesmo que no comunguem com todos os nossos ideais revolucionrios.
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Nesse processo, devemos tambm levar em conta os limites da educao ao lado de suas
potencialidades polticas, como sempre nos alertava Paulo Freire. Por isso ele chegou a dizer, numa entrevista
a seu amigo Carlos Nuez sou adjetivamente pedagogo, porque, substantivamente, sou poltico (Paulo Freire.
In: NEZ-HURTADO, 2007:9). A educao brasileira, em geral, no tem exercido em toda a sua extenso o
seu papel de organizadora da cultura. Infelizmente so se fala de poltica na escola. preciso acreditar na
poltica, preciso fazer poltica, no negar a poltica como afirmou o ex-presidente Lula no lanamento do livro
10 anos de governos ps-neoliberais no Brasil: Lula e Dilma (SADER, org. 2013), dia 13 de de maio de 2013,
no Centro Cultural So Paulo. Uma das grandes contribuies que a Poltica Nacional de Educao Popular
poder dar educao brasileira colocar o debate da poltica na escola, resgatar a poltica e colocar para
todos e todas a questo de que pas queremos.
Por que discutir poltica na escola? Para formar crianas, jovens e adultos para a democracia, para a
cidadania, para que defendam acima de seus interesses individualistas, o interesse pblico, o interesse dos
mais injustiados, mostrando que possvel, urgente e necessrio mudar a ordem das coisas e que uma
Educao Popular emancipadora eleva nosso grau de civilizao. A poltica organiza a Sociedade.
Enfim, no podemos perder nosso discurso. A tentao abandon-lo por falta de ouvintes dentro e
fora do governo. O rumo j foi dado por Paulo Freire no passado: estar dentro e fora do Estado. No d para
ficar s fora, na crtica externa, poltica ou acadmica, embora essa crtica seja tambm muito importante. A
crtica de fora exerce um papel importante para mudar o dentro. Isso foi reconhecido por Lula no governo:
acolhia a crtica dizendo que sem essa presso de fora no conseguiria certos avanos dentro. Sem a luta de
fora muitas lutas de dentro no seriam viveis. Mas, a luta no interior do Estado imprescindvel.
Neste ano, celebramos os 50 anos de Angicos, os 10 anos da RECID e os 10 anos do Projeto MOVA-
Brasil. Paulo Freire foi declarado patrono da educao brasileira mas seu ethos pedaggico ainda est longe da
poltica educacional. Essas efemrides nos animam a propor uma Poltica Nacional de Educao Popular pois
ela est de acordo com esse novo ethos. Angicos representa um convite a um novo pacto social, em que a
educao, exercida de comum acordo com os movimentos sociais e a Sociedade Civil, torna o Estado um
instrumento de transformao social, um instrumento de gesto do desenvolvimento, um instrumento de luta
contra a opresso, um instrumento de libertao e, no, simplesmente, de regulao e de governana da ao
social, como querem os neoliberais.
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