António de OLIVEIRA SALAZAR - Vol. 3 - Discursos PDF
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Como poderia pois haver medo, se no h razo para o temor? E como poderia o
inimigo vencer-nos, se no temos medo dele? eis porque desde princpio me
pareceram inteis estas palavras.
Nesta pequena faixa ocidental que a Europa se habituou a olhar com comiserao
ou tdio, fizemos o prodgio de reconstruir a Nao na sua feio tradicional
missionria e civilizadora, cavalheiresca e espiritualista; muita vez tivemos de fazer
ouvir no sindrio dos grandes a palavra justa, sem poder ser discutida a nossa
autoridade moral. E os factos demonstraram sempre que tnhamos razo.
Tnhamos razo ao alvitrarmos modestamente que no se sujeitassem a fracassos
sucessivos os estadistas que em conferncias internacionais buscavam entendimentos e
remdios para a crise geral, quando mais fcil e eficaz seria mostrar cada um o seu
esprito de colaborao remediando como pudesse as dificuldades prprias sem
agravar as alheias. Tnhamos razo quando assevermos no poder ser cometido
maior erro que alinhar os povos por ideais de poltica interna, contrapondo-os depois,
e fazer projectar nas relaes internacionais as simpatias dos governantes pelos
sistemas polticos. Tnhamos razo quando, chamando a ateno do mundo para a
verdadeira ndole da guerra de Espanha, procurmos mostrar Europa quanto o seu
equilbrio poderia ser prejudicado com interveno das potncias e como a nica
soluo razovel e feliz teria sido a rpida vitria nacionalista sem auxlios estranhos.
Tnhamos razo quando, opondo-nos entrada dos Sovietes em Genebra, pretendamos
preservar a Sociedade das Naes da infiltrao comunista e salvar, seno no seu
estatuto, ao menos na essncia, para base de futuras construes, os princpios da
igualdade dos Estados, do respeito pela sua independncia, da sua colaborao
amigvel e da superioridade do direito que todos podem ter em relao fora de que
s alguns dispem. E tnhamos ainda razo quando em face da crise da moral
internacional opinvamos ser um perigo confiar duma fraseologia sem sentido, quero
dizer, sem fora na conscincia das naes, a resoluo do que importava paz e
vida de muitas delas.
A Cmara aprovou ontem sobre o relatrio duma comisso especial (que por sua vez
se baseou nos minuciosos estudos do Deputado Sr. Arajo Correia) as contas do
Estado at 1936, e consagrou com o seu voto a administrao pblica, em oito anos e
meio, por que sou directamente responsvel. E a estas poderiam j ser acrescentadas
as de 1937, acabadas de encerrar com saldo de 200 mil contos, tendo-se pago por
conta das receitas ordinrias a quase totalidade daquelas despesas que, pelo facto de
se referirem a grandes obras de fomento, se tinha previsto seriam custeadas por
emprstimos.
Todos estes factos ter contas actuais, dispor de saldos, fazer o julgamento da
gerncia logo que findas so factos nicos no conjunto da nossa histria e so j
factos banais na histria da nossa Revoluo. Por eles se passa com indiferena, e isso
me alegra, pois no h para mim maior prova de estar bem resolvido um problema do
que no dar-se por ele.
A Europa est bastante inquieta e um dos sinais do seu nervosismo sem dvida o
cime que provocam manifestaes correntes de boa amizade internacional e a
necessidade de reafirmaes sucessivas dos mesmos sentimentos, como se os tratados e
os acordos no vivessem da confiana na palavra dos Estados mas se alimentassem
como derrios de constantes declaraes sentimentais. Ns no adoptamos porm essa
forma de proceder, nem na verdade tenho nada a acrescentar ao que disse sobre a
aliana inglesa em 6 de Julho do ano passado. s mesmas necessidades e interesses
correspondem os mesmos sentimentos e compromissos: daqui no se falta ao devido; e
da parte da Inglaterra estou certo de que tambm no.
Em todo o caso no fujo a notar que nos ltimos meses, por vezes em dias seguidos,
jornais de esquerda em Inglaterra ( certo que de muito baixa cotao) agridem
Portugal, convidam o Governo Britnico a rever, como quem diz a abandonar a
aliana, sugerem-lhe se apodere para a sua segurana de territrios nossos, e
parlamentares da oposio insistentemente o provocam a responder sobre a validade
dos tratados e a sua aplicao s colnias, no certamente pelo gosto de ouvirem
confirmar a plena validade de compromissos antigos.
Ora ns sempre considermos por nossa parte a aliana como negcio de Estado e no
fruto de simpatias de partido, e de que assim tambm tem sido do lado ingls temos as
provas das declaraes terminantes que a esse respeito foram feitas por membros da
actual oposio quando no governo, com tal fora se lhes impunha, juntamente com as
responsabilidades dos interesses britnicos, a comunidade de interesses anglo-
portugueses em que se funda a aliana.
Por esta razo, mencionando o facto para acusar-lhe a estranheza, no o tenho
considerado como suficiente para causar-nos preocupaes; antes o tenho atribudo
circunstncia de comearem a aparecer no regime poltico ingls processos de combate
que caracterizam desde o princpio as democracias continentais. Supondo porm que
me engano neste juzo, mais acertada ainda se mostra a poltica que seguimos
valorizar-nos, de modo que a nossa amizade seja sempre querida e o nosso valimento
em favor deste ou daquele nunca nos seja imposto ou declinado, se oferecido.
A situao do Imprio britnico no mundo, a situao de Portugal no Atlntico e em
frica so factores suficientes para nos imporem por tempo imprevisvel a mesma
colaborao de aliados; e por este motivo consideramos da maior importncia para
ambas as naes que o Governo ingls haja tomado a iniciativa de mandar a Portugal
uma misso militar que h vrias semanas estuda com os nossos tcnicos problemas de
interesse comum. H muito tempo se fazia sentir a necessidade de mais estreitos
contactos, de assdua troca de conhecimentos e informaes e at de maiores precises
no que toca ao funcionamento da aliana. Estas particularmente so-nos teis e somos
obrigados a atribuir-lhes o maior interesse, pondo-as, se necessrio, na base de
quaisquer negociaes, pois sem elas no seria nunca fcil definir em Portugal
qualquer poltica militar. E mais no preciso dizer para inferir a perfeita solidez, na
actualidade, dos laos que desde sculos nos unem Inglaterra, sem prejuzo das boas
amizades que a outros nos prendem.
1939 Discurso na grande manifestao dos Sindicatos, Casas do Povo e Casas dos
Pescadores, realizada no Terreiro do Pao em 27 de Fevereiro, sob o tema Revoluo
Corporativa:
Fomos nados e criados, a maior parte de ns, em concepes diferentes das que
inspiram hoje a nossa vida colectiva: era a diviso na poltica, a luta nas classes, a
desordem na economia, o egosmo nas relaes sociais, a elegncia da ociosidade, o
cansao de viver. Muitos disseram: abandonemos a coisa pblica inspirao das
paixes e aos movimentos e caprichos da multido e foi o predomnio da poltica
sobre a vida, com a democracia. Outros afirmaram: criemos sem preocupaes e sem
mtodo as riquezas, elas chegaro com abundncia a cada um e foi o predomnio do
econmico sobre o social, com o liberalismo. Ainda outros defenderam: distribuamos
pelos que somos as riquezas criadas e a criar, segundo a razo suprema dos nossos
apetites e foi o predomnio do social sobre o econmico, pelo socialismo. Mas, se na
desordem poltica, nas injustias da economia liberal, na devastao operada pelo
socialismo estavam as lgicas consequncias dos sistemas, estava tambm a o germe
da runa colectiva. Nem eu sei como a Ptria podia ser nas almas mais que imagem
literria ou velha tradio de hericos feitos a que ia faltando a vida profunda, a
conscincia de uma unidade essencial. Pois que a unidade resiste diviso? Que
solidariedade ao dio? Que comunidade falta de disciplina e de organizao?
E nasceu o corporativismo que, elevado a regra constitucional da ordem nova, a
princpio informador da comunidade nacional, caldeia a Nao no Estado e como a
conscincia activa da nossa solidariedade na terra, no trabalho e na vida, isto , na
Ptria a nossa famlia que no morre.
Podamos no ter feito mais nada podamos no ter melhorado os salrios, nem
feito contratos colectivos, nem estabelecido caixas de previdncia, nem assistido ao
desemprego, nem construdo casas para os operrios e jardins para os filhos dos
pobres, nem aumentado as exportaes, nem defendido os preos podamos nada ter
feito que beneficiasse a economia ou melhorasse materialmente a condio dos
portugueses, e teramos realizado obra imensa s com dar aos trabalhadores a
conscincia e o respeito da sua dignidade, s com ter criado o ambiente de paz social,
s com ter feito compreender, feito viver a solidariedade existente entre os que estudam
as solues e os que organizam e dirigem o trabalho ou o executam, e convencido a
todos a trabalhar cada vez mais para benefcio comum. Era isto sem dvida o que
impunham a razo e a justia, e tambm isto que impem as superiores necessidades
da Nao.
(Discursos, volume 3 , pg. 130, 131 e 132).
Foi a viagem deste ano coroada pela visita Unio Sul Africana, onde o caloroso
acolhimento correspondeu inteiramente amizade e comunidade de interesses entre
os dois pases.
Entretanto era abalada a Europa pela guerra, que a invaso da Polnia pelas tropas
alems estendera Frana e a quase todo o Imprio britnico.
A Alemanha fez-nos saber estar na disposio de respeitar a integridade de Portugal e
das suas possesses ultramarinas em caso de neutralidade; a Inglaterra nada pedira
em nome da aliana e amizade seculares que nos obrigasse a entrar no conflito; ns
no tnhamos neste, parte os interesses que nos solidarizam com todos os mais como
membros da comunidade europeia e filhos da sua civilizao, interesse prprio e
directo a defender. O Governo podia assim manifestar ao Pas a deliberao e a
esperana de manter na paz o povo portugus, salvo se a dignidade, os interesses ou os
nossos deveres no-la viessem a fazer abandonar.
A Junta de Crdito Pblico e todas as seces das finanas do Pas abriro amanh
e nos quinze dias seguintes para receber as propostas de converso. A operao
inteiramente voluntria, isto , no terreno jurdico no h obrigao de a ela
concorrer. As palavras que vim proferir tenderem a mostrar o interesse dos portadores
de aceitar em troca dos seus ttulos o novo Consolidado. Tinham ainda outro intento
investigar se, sendo certo e seguro o seu interesse, no haveria para os portugueses
obrigao moral de faz-lo. Eu creio que sim. No podemos perder nenhuma ocasio
de afirmar a vitalidade nacional, de marcar a autonomia nacional nos interesses, nos
sentimentos, na poltica, na administrao. Podemos agora faz-lo com rara extenso:
no no ano das comemoraes centenrias que vamos faltar a este dever.
(Discursos, volume 3 , pg. 219, 220, 221 e 228).
Discurso na Assembleia Nacional, em 25 de Maio, durante a sesso em que a Cmara
aprovou a Concordata e o Acordo missionrio, assinados no Vaticano em 7 de Maio,
estando em anlise os problemas poltico-religiosos da Nao Portuguesa e do seu
Imprio:
A primeira realidade que o Estado tem diante de si a formao catlica do povo
portugus; a segunda que a essncia desta formao se traduz numa constante da
histria.
Nascemos j, como nao independente, no ceio do catolicismo; acolher-se proteco
da Igreja foi sem dvida acto de alcance poltico, mas alicerado no sentimento
popular. Tem havido atravs da histria incidentes e lutas entre os reis e os bispos, os
governos e o clero, o Estado e a Cria, nunca entre a Nao e a Igreja; quer dizer,
lutas de interesses temporais ou de influncias e paixes polticas, nunca rebelio da
conscincia contra a f. No h em toda a histria apostasia colectiva da Nao, nem
conflitos religiosos que dividissem espiritualmente os portugueses. Com maior ou
menor fervor, cultura mais ou menos vasta e profunda, maior ou menor esplendor de
culto, podemos apresentar perante o mundo, ao lado da identidade de fronteiras
histricas, o exemplo raro da identidade de conscincia religiosa: benefcio
extraordinrio em cuja consecuo se empenhou uma poltica previdente.
O Estado tem-se visto forado a condicionar cada vez mais a liberdade dos
indivduos a necessidades e escopos colectivos; marca a cada passo mais e mais o
carcter puramente civil da sua actividade; estende as suas exigncias formao do
agregado familiar; reivindica a instruo e educao da mocidade; vigia ou dirige a
actividade intelectual; limita a propriedade, redistribui as terras, requisita os frutos do
trabalho; d directrizes, normas, limites economia da Nao; regula o esforo, o
descanso, o divertimento; por vezes chama a si o homem no complexo da sua
personalidade, em corpo e alma, ideias e sentimentos, com excluso de algum mais
como roda de mquina de que ele no pode libertar-se ou fugir; engrandece-se e
diviniza-se; e, sem nada que o limite, pode apresentar-se como a mesma conscincia,
fora e riqueza da nao. H nestas concepes realidades e necessidades novas, e h
tambm meras criaes do esprito, que a experincia costuma condenar e a Histria
grande coveira vai enterrando em seu largo cemitrio. Mas por vezes h mais do que
isso h o ataque a alguma coisa de superior: verdade que resplandece sobre as
contingncias, conscincia que resiste a despojar-se de si prpria, isto , de
inauferveis direitos que derivam da natureza do esprito humano.
certo que estes ltimos pontos nada tm que ver, ou muito pouco, com a poltica e a
organizao do Estado, determinadas por muitas outras condies e circunstncias que
no s princpios abstractos; mas o conceito do homem e da sociedade, da vida e dos
seus fins est no mago da questo.
Quanto a ns que nos afirmamos por um lado anti-comunistas e por outro lado anti-
democratas e anti-liberais, autoritrios e intervencionistas, to rasgadamente sociais
quanto de ns exige o princpio de igualdade de todos perante os benefcios da
civilizao; quanto a ns, trs nicas questes podiam a meu ver tornar impossvel o
acordo, por tocarem em pontos essenciais da doutrina: o reconhecimento de uma
norma moral preexistente e superior ao prprio Estado; a constituio da famlia; a
educao. A Constituio de 1933, com a clarividncia que hoje podemos apreciar,
arrancou o Estado portugus tentao da omnipotncia e da irresponsabilidade
moral, e permitiu atribuir Igreja, na constituio dos lares e na formao da
juventude, aquela parcela de mistrio e de infinito exigida pela conscincia crist e que
s por arremedos vis poderamos substituir. Ir alm, abrindo mo de tudo o mais, seria
fechar os olhos a vivas realidades do nosso tempo; no ir at ali seria igualmente ter
em menos conta o que exigncia de justa liberdade e necessidade da estrutura crist
da Nao portuguesa.
Se, pois, com seriedade e boa f, foi possvel encontrar uma frmula de respeito e
colaborao entre um Estado moderno equilibrado e a Igreja Catlica, devemos
regozijar-nos por ns, em primeiro lugar, depois tambm por contribuirmos para a
soluo de problemas postos com acuidade num mundo que se desagrega pela fora
dos erros ou das armas e preciso refazer em esprito e verdade.
(Discursos, volume 3 , pg. 232, 233, 234, 235, 236, 237).
Que tipo ento preferir? Ns estvamos empenhados em encontrar uma frmula que
respondesse s seguintes condies;
a) A organizao deveria aliviar o hipertrofiado e monstruoso Estado moderno,
desembaraando-o de algumas das suas funes, servios e despesas e
defendendo s por esse facto a liberdade individual e as economias privadas;
b) A organizao deveria ser decalcada, com prejuzo embora da sua pureza
terica e simetria, sobre a vida real do homem na famlia, na profisso, na
sociedade; e, sendo assim, aproveitar o mais possvel as formas conhecidas e
espontneas de organizao a integrar em plano de conjunto;
c) A organizao no deveria dissociar o econmico do social, pela razo
fundamental de que todos os que de qualquer modo trabalham no solidrios na
produo e da produo que todos devem viver;
d) A organizao deveria no perder de vista as realidades supra-individuais e
que, portanto, s verdadeiramente til se conseguir satisfazer os legtimos
interesses privados e ao mesmo tempo promover o interesse colectivo.
E foi por estas razes que pretendemos estabelecer entre os vrios tipos possveis de
organizao e de corporativismo a organizao corporativa portuguesa.
Esta organizao vale pelo que representa como smula ideolgica na transformao
mental e material do Pas mas vale sobretudo praticamente pelos resultados imediatas
em relao economia e s classes trabalhadoras; impe-se pelo seu valor poltico no
Estado e pelo seu valor coordenador na economia e no trabalho nacional. De forma
que antes de critic-la pelo que no fez, com as mil razes por que o no ter feito,
havemos de apreci-la pelo que j realizou.
Ela deu-nos, em primeiro lugar, a paz, no a paz externa, a paz econmica e social no
interior e, com esta, no se perder um dia de trabalho, o aumento de produo
nacional, o progresso econmico, a tranquilidade familiar e pblica inaprecivel bem
para quem viveu os tormentosos anos precedentes.
Imps novo conceito de trabalho e do seu dever social; efectivou a solidariedade,
teoricamente e vmente proclamada antes entre o capital e o trabalho; elevou este pela
sua representao nos mais altos rgos do Estado; chamou as foras econmicas a
participar da responsabilidade na direco econmica nacional, e prestigiou de tal
modo os seus princpios que, antecipando-se-lhe ou seguindo-a, muitas empresas
privadas concorrem por suas foras nas mais benficas realizaes.
Para no ir longe na enumerao de coisas materiais, que alis esto vista, direi
apenas: A organizao corporativa dispe j de 400 Casas do Povo, com 230:000
scios e 12:000 contos de rendimento anual, destinados a assistncia mdica e
farmacutica, a subsdios na doena, no parto, na morte e, quem havia de diz-lo? Na
invalidez, estando j a pagar-se a trabalhadores rurais invlidos e o comeo
1:200 contos anuais de subsdios.
Paralelamente as 20 Casas de Pescadores dispem anualmente de um rendimento que
ora por 3:000 contos, destinados aos mesmos fins.
Os acordos colectivos de trabalho e outras convenes protegem a situao de 200:000
operrios, e 150:000 alm destes beneficiam de salrios mnimos fixados
superiormente. E isto significa que, deixando de lado os trabalhadores rurais e os
pescadores, cerca de metade dos empregados e trabalhadores por conta de outrem no
comrcio e na indstria se encontram protegidos por disposies contratuais ou por
determinao do Governo.
Embora incipiente, o nosso trabalho de casas econmicas j nos proporcionou 3:200
moradias, onde se albergam, na expectativa de propriedade familiar definitiva, 11:000
pessoas, subindo a 42:000 contos os seguros de vida dos respectivos beneficirios. E
no conto os bairros de algumas cmaras nem os de vrias empresas.
Quanto a instituies de previdncia social (muitas vindas do passado), a organizao
dispe de 400 instituies, com fundos no valor de 600:000 contos e benefcios
distribudos na importncia de 56:000 em cada ano. Esto includas nestes globais 12
caixas sindicais de previdncia, com 30:000 contos de fundos e 10:000 de contribuies
anuais, provenientes de 24:000 beneficirios, e as caixas de reforma e previdncia, com
37:000 beneficirios e 22:000 contos de fundos. As caixas sindicais em organizao e
reorganizao, bem como as caixas de reforma ou previdncia no mesmo estado, iro
beneficiar mais cerca de 50:000 indivduos, com 135:000 contos de fundos.
Pelo que respeita a salrios, no s a organizao no tem obstado ao seu aumento,
mas tem-no promovido umas vezes, imposto outras, defendido sempre. Apenas nos
ltimos meses se fez uma pausa na poltica de elevao de salrios, para que o
problema pudesse ser revisto quanto orientao geral e se contrariasse a tendncia
de justificar com esses aumentos altas abusivas de preos. E j deixo de lado a melhor
fiscalizao do trabalho e das suas condies, a realidade da magistratura do trabalho,
as frias pagas, as colnias de frias, a obra cultural da Fundao Nacional para a
Alegria no Trabalho, o cinema e teatro do povo, muitas outras realizaes enfim que
por brevidade tenho de omitir.
Vou terminar e sinto ter de dizer, antes de concluir, algumas palavras desagradveis
e duras.
O Governo tem e eu pessoalmente tenho tambm grandes responsabilidades na falta de
preparao do esprito pblico para asa dificuldades inevitveis e os sacrifcios
impostos pela guerra. Para poupar o mais possvel a Nao na sua vida normal, no se
seguiu o critrio, por outros adoptado, do permanente estado de alarme. Porventura se
lhe deviam ter feito em mincia as dificuldades polticas e econmicas que a cada
momento se tm de vencer, os atritos, as discusses, os riscos que corre a nossa
neutralidade, a crise permanente da paz nos que ainda a conservam. Daqui vem que o
portugus est mimoso deste tratamento paternal, se mostra insofrido, despreocupado,
pouco compreensivo. O Governo no se irrita se pobre gente que precisa
absolutamente de um pouco de carvo ou de azeite se lastima de o no ter ou do tempo
que perde para consegui-lo. Mas no pode desculpar queles a quem no falta o
indispensvel a sua intolerncia, porque nem sempre obtm aquilo de que alis em boa
conscincia no precisam. A nossa atitude digna perante a imensa desgraa da guerra,
os milhes de seres que morrem de fome, de misria e de dor, no um vago sentimento
ou palavra de comiserao, deixada cair com indiferena real, mas a modstia, a
renncia, a pacincia que ao menos traduzam, na falta de auxlios por vezes
impossveis, a verdade de uma comunho ou ambiente moral. Como est longe destes
sentimentos o egosmo calculista e ganancioso que pode iludir a lei para meter em
cofre a misria alheia!
Outro ponto. A crise do mundo no imagem literria; a sua gravidade e profundeza, a
sua extenso, os interesses e conceitos que esto em jogo fazem tremer nos alicerces as
naes e os imprios mais bem constitudos. Repito uma frase de h pouco: ns no
estamos em luta mas estamos na guerra, como os outros. Enquanto o Exrcito que fez a
Revoluo ocupa os postos que lhe foram indicados, a Nao tem o dever de mostrar a
sua unidade, fora e coeso, numa palavra, plena conscincia nacional. Devo louv-la
por essa atitude sem prejuzo de censurar alguns portugueses que de uma ou outra
forma trabalham por destruir a armadura moral do Pas, quando se sabe ser esta um
dos maiores factores da nossa defesa. Alguns alimentam a sua actividade de esperanas
que ningum lhes realizar; outros procuram justificar-se com a sua discordncia da
poltica seguida, como se, fora dos ignorantes ou irresponsveis que no tm elementos
para julgar, algum possa supor que ela podia ou devia ser diferente do que at ao
presente tem sido, na defesa do mais bem compreendido interesse nacional. Sabemos
que outras grandes crises europeias ameaaram semelhantemente dividir-nos volta
de interesses estranhos; mas agora o Governo no pode ser acusado nem de falta de
lealdade, nem mesmo de esquecer deveres especiais de fidelidade a relaes criadas
por sculos de interesses comuns; o que tem procurado ao mesmo tempo ser digno,
embora dentro daquela larga e condescendente benevolncia que a atitude dos
amigos, ainda quando no so mais fracos. Que entre ns alguns estrangeiros se
queixem, admite-se por mal habituados, que portugueses tambm nos ataquem, isso s
quer dizer que a sua medida de dignidade patritica no a nossa. A nossa tommo-la
daqueles portugueses que valiam mais do que valemos e fizeram uma Histria e
criaram uma Nao que somos obrigados, mesmo contra alguns, a respeitar e a
defender.
(Discursos, volume 3 , pg. 385, 386, 413, 414 e 415).