Revista Opiniao Juridica 13 Edt - Artigo Odisseia
Revista Opiniao Juridica 13 Edt - Artigo Odisseia
Revista Opiniao Juridica 13 Edt - Artigo Odisseia
Opinio Jurdica
Ficha Catalogrfica
Opinio Jurdica Revista do Curso de Direito da Faculdade Christus
- n. 13, ano IX, 2011
Faculdade Christus, 2011
Opinio Jurdica
- [n. 13]
Fortaleza: Faculdade Christus.
[2011]v.
I. Direito
CDD : 340
Dados internacionais de catalogao na publicao (CIP).
FACULDADE CHRISTUS
REVISTA
OPINIO JURDICA
Fortaleza, 2011
Opinio Jurdica
Revista do Curso de Direito da Faculdade Christus
n. 13, ano 09, 2011
Diretor
Prof. M. Sc. Roberto de Carvalho Rocha
Mantenedor
Estevo de Carvalho Rocha
Coordenadora-Geral do Curso de Direito
Profa. M. Sc. Gabrielle Bezerra Sales
Coordenadora de Pesquisa e Monografia do Curso de Direito
Profa. M. Sc. Gretha Leite
Editora-Responsvel pela Revista Opinio Jurdica
Profa. Dra. Fayga Silveira Bed
Comisso Editorial
Dra. Cludia Sousa Leito (UECE)
Dr. Clvis Gorczevski (UNISC-RS)
DRA. Danielle Annoni (UFSC)
Dr. Everton das Neves Gonalves (UFSC)
Dr. Etienne Picard (PARIS I SORBONNE)
Dra. Fayga Silveira Bed (FCHRISTUS-CE)
Msc. Fernanda Busanello Ferreira (UNIBRASIL)
Dr. Friedrich Mller (UNIVERSIDADE DE HEIDELBERG/ALEMANHA)
Msc. Gabrielle Bezerra Sales (FCHRISTUS-CE)
Msc. Germana Parente Neiva Belchior (FCHRISTUS-CE)
Msc. Gretha Leite Maia (FCHRISTUS-CE)
Dr. Horcio Wanderlei Rodrigues- (UFSC)
Msc. Isaac Costa Reis (INEP/MEC - PE)
Dra. Joana Stelzer (UFSC)
Dr. Joo Lus Nogueira Matias (UFC)
Dr. Joo Maurcio Adeodato (UFPE)
Msc. Maurcio Timm do Valle (ABDCONST/UNICURITIBA)
Dr. Octvio Campos Fischer (UNIBRASIL/PR E IDP/DF)
Dr. Paulo Bonavides (UFC)
Dr. Rafael Santos de Oliveira - (UFSM-RS)
Dr. Roberto Bueno Pinto (UFU-MG)
Msc. Roberto de Carvalho Rocha (FCHRISTUS-CE)
Dr. Roberto Correia da Silva Gomes Caldas (PUC-SP)
Dr. Roberto Fragale da Silva Filho (UFF-RJ)
Msc. Trcio Arago Brilhante - (FCHRISTUS-CE)
Msc. Vera Lucia da Silva (CNPQ/PPGD/UFSC)
Dr. Willis Santiago Guerra Filho (UNIRIO)
Bibliotecria
Tusnelda Maria Barbosa
Capa
Ivina Lima Verde
Coordenao de Design
John Barros
Programao Visual / Diagramao
Juscelino Guilherme
Correspondncia
Faculdade Christus
Coordenao-Geral do Curso de Direito
Avenida Dom Lus, 911 5 andar
Aldeota CEP 60.160-230
Fortaleza Cear
Telefone: (0**85) 3461.2020
e-mail: [email protected]
Impresso
Grfica e Editora LCR Ltda.
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Site: www.graficalcr.com.br e-mail: [email protected]
Tiragem mnima
400 exemplares
APRESENTAO
Para ultimar os trabalhos de fechamento dessa edio, contamos com
o auxlio luxuoso de 40 pareceristas, dos mais qualificados, sendo 50% do
Cear e 50% de avaliadores externos, cujos pareceres advieram de 5 Estados
da Federao (PR/SC/SP/MG/RS).
A presente edio conta com 18 artigos, dentre os quais, 25% de convidados. Os demais foram aprovados por, no mnimo, dois pareceristas cegos,
nos moldes do sistema double blind review.
Verticalizamos os esforos para atender, cada vez mais, aos parmetros
do Programa Qualis, atingindo, no presente nmero, 61,11% de exogenia
quanto aos artigos publicados; e 66,66% de exogenia quanto aos membros de
nossa ilustrssima Comisso Editorial.
Agradecemos a todos aqueles que nos confiaram seus trabalhos, enviando-os de to longnquas paragens, inclusive de alm-mar. Estamos felizes com
o atual conceito do peridico (B-4) e confiantes de que, graas aos esforos,
tenacidade e ao empenho acadmico de nossos inmeros colaboradores,
conseguiremos avanar ainda mais.
Esperamos, nesse 13 nmero, compartilhar com toda a comunidade
cientfica, do melhor da produo de nosso corpo docente e discente, bem
como, desfrutar do crescimento exponencial da pesquisa jurdica no Brasil,
em termos qualitativos e quantitativos.
A cincia jurdica brasileira vive, hoje, um momento muito especial,
rumo sua consolidao no cenrio acadmico brasileiro. E estamos orgulhosos em dar a nossa contribuio. Mas estamos, sobretudo, gratos a todos
os colegas pesquisadores que dividiram conosco essa conquista.
Aqui, da Cidade Solar, desejamos que essas leituras possam, de algum
modo, iluminar as dobras e tessituras de sua pesquisa.
Fortaleza, maro de 2012.
SUMRIO
APRESENTAO
PRIMEIRA PARTE DOUTRINA NACIONAL
Estabilidade Extraordinria de Servidores Pblicos e a Busca Pela Justia
(Uma anlise do Art. 19 do ADCT/CF88 com base na Teoria dos Direitos
Fundamentais) ................................................................................................... 9
Clovis Renato Costa Farias
Distrados Venceremos: Laboratrio de Criatividade em Direito, Arte e
Cultura Um Estudo De Caso ......................................................................... 34
Fayga Silveira Bed, Trcio Arago Brilhante, Francisco Jos Alves de Arago, Andra
Micaelle Santos Sousa, Maria Eurdice Ferreira Cavalcante, Ana Virgnia Ramos Cardoso
Sade e Meio Ambiente: Uma Imbricada e Necessria Relao ..................57
Germana Parente Neiva Belchior e Gleice Silva Queiroz de Lima
O Ser dos Direitos Humanos na Ponte Entre o Direito e a Msica ................... 71
Horcio Wanderlei Rodrigues e Leilane Serratine Grubba
A Obrigatoriedade de Conexo s Redes Pblicas de Abastecimento de
gua e de Esgotamento Sanitrio e a Remunerao dos Servios ..................... 94
Ivo Csar Barreto de Carvalho e lisson Jos Maia Melo
Jurisdio Constitucional e Controle da Poltica: Fundamento e
(I)Legitimidade Democrtica ....................................................................... 116
Jnio Pereira da Cunha
Estatuto da Igualdade Racial: Aes Afirmativas de Integrao tnica ou
Polticas de Discriminao Reversa? ................................................................. 144
Jos Adeildo Bezerra de Oliveira e Gretha Leite Maia
O Papel do Juiz na Tentativa de Pacificao Social: a Importncia das
Tcnicas de Conciliao e Mediao .............................................................. 156
Jos Herval Sampaio Jnior
Investigando a Possibilidade de Criao do Conselho Nacional da
Defensoria Pblica ......................................................................................... 185
Leandro Sousa Bessa, Mariana Urano de Carvalho Caldas e Caio Werther Frota Neto
RESUMO
A estabilidade extraordinria positivada no art. 19 do Ato das
Disposies Constitucionais Transitrias da Constituio de
1988, que concedeu direitos aos servidores que laboravam em
condies equiparadas aos que prestaram concurso pblico, ante
a existncia da duplicidade de regimes na administrao pblica
brasileira, atende aos valores postados na Constituio de 1988,
bem como ao Estado Democrtico de Direito, devendo no caso
ser vista de forma ampliativa e valorada nos aspectos sociais
intrincados em seu contexto ftico-jurdico. O que, de plano
parece cristalino, mas, que aos olhos da doutrina majoritria
brasileira e da jurisprudncia dos Tribunais Superiores, tem sido
visto restritivamente, reconhecendo-se apenas a estabilidade sem
efetividade, prejudicando os trabalhadores especialmente se tratando de discriminaes sofridas nos prprios locais de trabalho,
quanto na aquisio de direitos decorrentes da relao mantida
com a administrao pblica. Clama-se pelo reconhecimento
do perodo ou da condio de efetivo, que deve ser entendida
no caso excepcional criado pelo art. 19 do ADCT intrincando
os institutos da estabilidade e da efetividade no servio pblico.
Situao que justifica o manejo da teoria dos direitos fundamentais, por tratar-se de direito fundamental de segunda dimenso,
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Conforme a CF/34, o Poder Legislativo votaria o Estatuto dos Funcionrios Pblicos, obedecendo s normas dispostas no texto constitucional, de modo
que o quadro dos funcionrios pblicos compreendia todos os que exercessem
cargos pblicos, seja qual for a forma do pagamento; e que a primeira investidura
nos postos de carreira das reparties administrativas, e nos demais que a lei
determinar, efetuar-se- depois de exame de sanidade e concurso de provas ou
ttulos (art. 170, 1 e 2, CF/34).
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No perodo abrangido pela CF/34, somente foi utilizado o termo estabilidade nos arts. 131 ( vedada a propriedade de empresas jornalsticas, polticas
ou noticiosas a sociedades annimas por aes ao portador e a estrangeiros.
Estes e as pessoas jurdicas no podem ser acionistas das sociedades annimas
proprietrias de tais empresas. A responsabilidade principal e de orientao
intelectual ou administrativa da imprensa poltica ou noticiosa s por brasileiros
natos pode ser exercida. A lei orgnica de imprensa estabelecer regras relativas
ao trabalho dos redatores, operrios e demais empregados, assegurando-lhes
estabilidade, frias e aposentadoria) e 150, f (reconhecimento dos estabelecimentos particulares de ensino somente quando assegurarem. a seus professores
a estabilidade, enquanto bem servirem, e uma remunerao condigna), no
utilizada especificamente para servidores pblicos. E, quanto efetividade, no
h meno especfica, apenas se refere ao efetivo exerccio (art. 169).
A Constituio de 10 de novembro de 193711, no art. 156 dispunha
que o Poder Legislativo organizaria o Estatuto dos Funcionrios Pblicos, que
deveria obedecer a preceitos vigorados pela constituio, tais como o de que
o quadro dos funcionrios pblicos compreenderia todos os que exercessem
cargos pblicos criados em lei, seja qual for a forma de pagamento; bem como
que a primeira investidura nos cargos de carreira se faria mediante concurso
de provas ou de ttulos.
A CF/37, identicamente, no trazia o termo efetividade, mas apenas
efetivo servio (art. 156, e, CF/37). Discriminava apenas que os funcionrios
pblicos, depois de dois anos, quando nomeados em virtude de concurso de
provas, e, em todos os casos, depois de dez anos de exerccio, s poderiam ser
exonerados em virtude de sentena judiciria ou mediante processo administrativo, em que fossem ouvidos e pudessem se defender (art. 156, alnea c,
CF/37). E falava sobre estabilidade no art. 137, f (nas empresas de trabalho
continuo, a cessao das relaes de trabalho, a que o trabalhador no haja
dado motivo, e quando a lei no lhe garanta, a estabilidade no emprego, cria-lhe o direito a uma indenizao proporcional aos anos de servio), e, para os
funcionrio pblico, no art. 157, verbis:
Art 157. Poder ser posto em disponibilidade, com vencimentos
proporcionais ao tempo de servio, desde que no caiba no caso
a pena de exonerao, o funcionrio civil que estiver no gozo das
garantias de estabilidade, se, a juzo de uma comisso disciplinar
nomeada pelo Ministro ou chefe de servio, o seu afastamento do
exerccio for considerado de convenincia ou de interesse pblico.
A Constituio de 194612 dispunha, no art. 186, que a primeira investidura em cargo de carreira e em outros que a lei determinasse seria efetuada
mediante concurso, precedendo inspeo de sade, bem como no art. 187,
que seriam vitalcios somente os magistrados, os Ministros do Tribunal de
Contas, titulares de Ofcio de Justia e os professores catedrticos. E declarava
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no art. 188 como se dava a estabilidade, benesse aos que depois de dois anos
de exerccio, sendo funcionrios efetivos nomeados por concurso; e depois
de cinco anos de exerccio, os funcionrios efetivos nomeados sem concurso,
algo que no se aplicava aos cargos de confiana nem aos que a lei declare de
livre nomeao e demisso.
Torna-se bvio que existiam funcionrios pblicos efetivos sem concurso
pblico e que podiam conquistar a estabilidade, situao que impe questionamentos doutrina restritivista que somente relaciona a efetividade, para
todos os casos (ordinrios e excepcionais), a existncia de concurso pblico,
de modo que a norma foi apenas copiada na histria do constitucionalismo
brasileiro com breves modificaes. Definio com diferenciao restritiva
entre estabilidade e efetividade que, por bvio, pode ser aplicada nos casos
posteriores promulgao da Constituio de 1988 como regra, mas obrigando-se a considerar a salutar vontade do constituinte na positivao do art. 19
do ADCT para beneficiar os trabalhadores.
A estabilidade em 1946 (CF, 18.09.1946) j delimitava que os funcionrios pblicos perderiam o cargo, quando vitalcios, somente em virtude de
sentena judiciria; e quando estveis, no caso do nmero anterior, no de se
extinguir o cargo ou no de serem demitidos mediante processo administrativo
em que se lhes tenha assegurado ampla defesa (art. 189, CF/46). Em casos de
extino do cargo, o funcionrio estvel ficava em disponibilidade remunerada
at o seu obrigatrio aproveitamento em outro cargo de natureza e vencimentos
compatveis com o que ocupava (art. 189, pargrafo nico, CF/46).
Antecedendo a CF/88, a Constituio de 20 de outubro de 196713 (Emendada pela EC n 01/69), dispunha que eram estveis, aps dois anos, os funcionrios, quando nomeados por concurso, e que ningum poderia ser efetivado ou
adquirir estabilidade, como funcionrio, se no prestar concurso pblico (art.
99, 1, CF/67). Declarando ainda que extinto o cargo ou declarada pelo Poder
Executivo a sua desnecessidade, o funcionrio estvel ficar em disponibilidade
remunerada, com proventos proporcionais ao tempo de servio. (art. 99, 2,
como redao dada pelo Ato Complementar n 40, de 1968).
Constata-se que, em anlise histrica e ftico-jurdica o termo estabilidade
englobava o atual conceito de efetividade, sendo que, atualmente, a efetividade
condio sem a qual a estabilidade no pode ocorrer, uma vez que somente se
pode ser estabilizado em cargo de natureza efetiva, permeado pela necessidade,
permanncia e continuidade da prestao.
3 PONDERAES SOBRE A DIFERENCIAO ENTRE ESTABILIDADE E EFETIVIDADE. REGRA E EXCEPCIONALIDADE DO ART.
19 DO ADCT
A utilizao da razoabilidade (bom senso critrio transversal) deve
ser utilizada pelo hermeneuta para afinar a norma justia efetiva no caso de
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trabalhadores que desempenham as mesas funes, ora beneficiados por norma progressiva emanada pelo normatizador constitucional originrio (art. 19
ADCT), no sentido de manter as condies asseguradas aos demais servidores,
uma vez que o Poder Constituinte Originrio reconheceu a prestao, seu valor
e resolveu efetivar os que preenchessem as condies impostas pelo art. 19, do
ADCT, de modo que se deve atender a igualdade e equipar todos os trabalhadores no servio pblico. Asseverando-se que, agir contrariamente, estabelece
clara diferenciao entre servidores que prestavam e, atualmente, prestam seus
servios nas mesmas condies, criando problemas ao invs de manter a justia
social, funo maior do direito, com fim de obter-se a to perseguida Justia.
Atualmente reconhece-se que h diferenas entre estabilidade e efetividade, as quais devem ser ponderadas de forma razovel no caso do art. 19 do
ADCT, seguindo-se pela jurisdio de equidade, assim como considerando o
contexto social em que foi criada a estabilidade extraordinria e a atual situao
aps a promulgao da CF/88. Assim, com a positivao do referido artigo, foi
criada nova condio, pautada no valor social do trabalho, na dignidade da
pessoa humana e na justia social, uma vez que se criou fato completamente
novo para garantir trabalhadores que almejavam e necessitavam trabalhar e
permanecer laborando. Como destacado por Bonavides ao analisar os arts. 39
a 41 da Constituio de 1988:
Estabilidade o direito subjetivo de lastro constitucional que
assegura a permanncia do servidor no servio pblico. O efeito
da aquisio do direito reside na impossibilidade de o servidor ser
excludo do quadro funciona (demisso) sem que tenha cometido
falta grave.
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provimento vitalcio, conforme predispostos, respectivamente, a receber ocupantes transitrios, permanentes ou com uma garantia ainda mais acentuada
de permanncia.
Com relao definio de servidor pblico, conclui Mello17 que so
os que entretm com o Estado e com as pessoas de Direito Pblico da Administrao indireta relao de trabalho de natureza profissional e carter no
eventual sob vnculo de dependncia. Compreende, dentre suas espcies, os
remanescentes do regime anterior, no qual se admitia amplamente o regime de
emprego. Ademais, sopesando a realidade normativa e ftica, assume o autor,
em nota de rodap, o que se segue:
Ditos servidores, ainda que estabilizados pelo art. 19 das Disposies
Constitucionais Transitrias, [...]. Na rbita federal, entretanto, por fora do art.
243 e 1 da Lei n 8.112/90, todos os empregados da administrao direta, das
autarquias e fundaes de Direito Pblico que estavam sob regime de emprego
foram inconstitucional e escandalosamente includos em cargos pblicos sem
concurso algum e, at mesmo, sem que se fizesse acepo entre estabilizados e
no-estabilizados, pelo art. 19 das aludidas Disposies Transitrias.18
Em outras palavras, nos termos registrados pelo autor aludido, houve
no contexto social e ftico-jurdico, uma situao excepcional que inquestionavelmente beneficiou os obreiros, valorizando socialmente seu trabalho, com
reconhecimento legislativo inclusive, a qual no pode ser valorada para prejudicar os que obtiveram o reconhecimento de tais direitos. Assim, a realidade
dos trabalhadores permaneceu e permanece, sem retoques, como servidores
pblicos efetivos e estveis.
A postura retrgrada no se restringe ao Poder Judicirio, mas a outros
rgos como a Procuradoria Geral da Repblica, na Ao Direta de Inconstitucionalidade n 2968-1, tramitando ainda sem qualquer deciso no STF19,
protocolada em 13.08.2003, distribuda ao Ministro Cesar Peluso em 19.08.2003,
que trata sobre a constitucionalidade do art. 243, da Lei n 8.112/90, como se
pode destacar:
ADI PROCURADOR-GERAL ENVIA PARECER AO STF
SOBRE REGIME JURDICO DOS SERVIDORES PBLICOS
O procurador-geral da Repblica, Claudio Fonteles, enviou
parecer ao Supremo Tribunal Federal sobre a Ao Direta de
Inconstitucionalidade 2968, ajuizada em agosto do ano passado
no STF. Na ADI 2968, Fonteles questionou o artigo 243 da Lei
n 8.112/90, que permitiu a investidura de servidores em cargo
ou emprego pblico sem a prvia aprovao em concurso pblico, violando o artigo 37, inciso II, da Constituio Federal.
A ADI foi ajuizada por Claudio Fonteles. Em setembro, o relator,
ministro do STF Cezar Peluso, enviou a ADI para manisfestao
Presidncia da Repblica, Advocacia-Geral da Unio e ao
Senado Federal. Em resposta, essas instituies informaram que
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Ainda diante todo o exposto, que se assoberba na atualidade enfrentando nossa proposta ligada aos valores da Constituio, conscientes da luta pela
Justia e crentes na permanente mudana na dinmica social, ousamos dizer
com Dworkin: As velhas idias so agora abandonadas aqui.21 Assim, conclui
o autor, com relao imprescindibilidade da relevncia poltica que deve ser
considerada nas decises dos juristas, os quais devem fugir mera exegese:
Os juzes no podem decidir qual foi a inteno pertinente dos
constituintes, ou qual processo poltico realmente justo ou
democrtico, a menos que tomem decises polticas substantivas
iguais quelas que os proponentes da inteno ou do processo
consideram que os juzes no podem tomar.22
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Contrariando, tambm, a corrente da igualdade plena entre os detentores da estabilidade ordinria e extraordinria, est o Superior Tribunal de
Justia (STJ), como se pode notar no Acrdo da Quinta Turma, no EDcl no
RMS 14806 / RO, que teve como relator o Ministro Gilson Dipp, julgado em
24/08/2004, publicado no DJ em 27/09/2004, verbis:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO - EMBARGOS
DE DECLARAO - ART. 535 DO CPC. AUSNCIA DOS
PRESSUPOSTOS - SERVIDOR ESTADUAL - MAIS DE
CINCO ANOS CONTNUOS DE SERVIO POCA DA
EDIO DA CONSTITUIO FEDERAL DE 1988 - ESTABILIZADO PELO ART. 19 DO ADCT - NO EFETIVADO
POR CONCURSO PBLICO - NO SUBMISSO LEI
COMPLEMENTAR ESTADUAL N 68/92, O ESTATUTO
DOS SERVIDORES DO ESTADO DE RONDNIA - APOSENTADORIA COM PROVENTOS INTEGRAIS - IMPOSSIBILIDADE - PRECEDENTES - EMBARGOS REJEITADOS.
I - Os embargos de declarao devem atender aos seus requisitos,
quais sejam, suprir omisso, contradio ou obscuridade, no
havendo qualquer um desses pressupostos, rejeitam-se os mesmos, mormente quando o ponto fulcral da controvrsia reside na
insatisfao do ora embargante com o deslinde da controvrsia.
II - Foram considerados estveis no servio pblico todos os servidores civis que j estavam em exerccio h pelo menos cinco anos
continuados, em 5 de outubro de 1988, e que no tenham sido
admitidos na forma regulada no art. 37, inciso II da Magna Carta.
III - Sem a efetividade no cargo pblico, que s pode ser imprimida ao servidor pela aprovao em concurso pblico, no se
pode submeter o empregado pblico contratado pelo regime da
Consolidao das Leis do Trabalho ao Estatuto dos Servidores
do Estado para fins de aposentadoria. Os efeitos da estabilidade
adquirida pelo art. 19 do ADCT limitam-se impossibilidade
de ser afastado do cargo, seno em virtude de sentena judicial
transitada em julgado ou de resultado do processo administrativo disciplinar, no qual lhe tenha sido assegurada ampla defesa,
no transformando em estatutrio aquele que entrou no servio
pblico sem o devido certame. Precedentes.
IV - A estabilidade conferida pelo art. 19 do ADCT no permitiu
o alcance, tambm, da efetividade, que se d nica e exclusivamente atravs da aprovao prvia em concurso pblico de provas
ou de provas e ttulos, conforme exigido pelo art. 37, inciso II da
Constituio Federal de 1988.29
Comentando a postura do STF, destaca-se do voto do relator, Desembargador Federal Rogrio Fialho Moreira, na Primeira Turma do Tribunal
Regional Federal da 5 Regio, em apelao cvel no Processo n 0003262REVISTA OPINIO JURDICA
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Ningum pode ser efetivado ou adquirir estabilidade, como funcionrio, se no prestar concurso pblico.
29 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIA. STJ. Disponvel em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/
ita.asp?registro=200200584190&dt_publicacao=27/09/2004>. Acesso em: 28 dez. 2010.
30 ORGANIZAO INTERNACIONAL DO TRABALHO (OIT). Ilo. Disponvel em: <http://www.ilo.
org/public/portugue/region/ampro/brasilia/rules/organiza.htm>. Acesso em 24 dez. 2010.
31 CONFEDERAO NACIONAL DOS VIGILANTES E PRESTADORES DE SERVIOS. Vigilantecntv. Disponvel em: <http://www.vigilantecntv.org.br/Dieese/nota%20tecnica%2061%20-%20
RatificacaoConvencao158rev.pdf>. Acesso em: 26 dez. 2010.
32 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, op cit.
33 Nome propositalmente recortado para preservar os direitos relativos personalidade do autor da referida
ao, mas que pode ser visualizado no acompanhamento processual via internet na pgina do Tribunal
Regional Federal da 5 Regio.
34 PRESIDNCIA DA REPBLICA. Lei 8.112/90. Planalto. Disponvel em: <http://www.planalto.gov.
br/ccivil_03/Leis/L8112cons.htm>. Acesso em: 27 dez.2010.
35 TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5 REGIO. TRF5. Disponvel em: <http://www.trf5.jus.br/
Jurisprudencia/resultados.html>. Acesso em 24 dez.2010.
36 Idem. Disponvel em: <http://www.trf5.jus.br/archive/2009/08/200482010032621_20090814.pdf>.
Acesso em: 23.12.2010.
37 LIMA, Francisco Grson Marques de. O STF na crise institucional brasileira: estudos de casos: abordagem
interdisciplinar de sociologia constitucional. So Paulo: Malheiros Editores, 2009.
38 MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. Direitos Fundamentais. 2. ed. Coimbra: Coimbra
Editora, 1993, t. 4, p. 213.
39 BARCELOS, Ana Paula de. A eficcia jurdica dos princpios constitucionais: o princpio da dignidade
da pessoa humana. 2. ed.So Paulo: Renovar, 2008, p. 74.
40 LIMA, Francisco Meton Marques de. O resgate dos valores na interpretao constitucional: por uma
hermenutica reabilitadora do homem como ser-moralmente-melhor. Fortaleza: ABC/Livraria FortLivros, 2001, p. 48.
41 LIMA, Francisco Meton, Ibid, p. 50.
42 BORGES, Arthur de Castro. Santo Ivo, patrono dos homens da Justia. 3. ed. So Paulo: LTr, 1994, p.
233.
43 Plurimae leges, pessima res publica: o pior governo aquele que tem muitas leis.
44 DANTAS, Ivo. Novo direito constitucional comparado. 3. ed. Curitiba: Juru, 2010, p. 13.
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RESUMO
O exerccio de competncias e apetncias quanto ao uso da
palavra oral e escrita, por meio do desenvolvimento de habilidades expressivas e performticas, tornam-se ferramentas
para o ensino jurdico, tema que se pretende pesquisar neste
Distrados Venceremos homenagem carinhosa obra homnima do poeta curitibano
Paulo Leminski. Vide: LEMINSKI, Paulo. Distrados venceremos. 5. ed. 3. reimpr. So Paulo: Brasiliense, 2002.
**
Responsvel pela criao e orientao do projeto Distrados venceremos. Professora de
Tpicos Especiais em Direito I na Faculdade Christus. Doutora em Sociologia pela UFC.
Mestre em Direito do Estado pela UFPR. Editora da Revista Opinio Jurdica. Autora de
artigos, organizadora e colaboradora de coletneas.
***
Mestre em Direito Constitucional pela UNIFOR. Professor de Hermenutica. Procurador
Federal. Autor de artigos, organizador e colaborador de coletneas.
****
Graduado em Direito pela Faculdade Christus. Graduando em Histria pela UFC. Integrante de ncleo de pesquisa da Histria UFC. Ex-monitor de Tpicos Especiais em Direito I.
Autor de artigos sobre ensino jurdico.
*****
Graduanda em Direito na Faculdade Christus. Bolsista de pesquisa do Programa de Iniciao
Cientfica, cujo tema de pesquisa o grupo Distrados Venceremos. Co-autora de artigo sobre o mesmo tema, constante dos anais do XX CONPEDI, realizado em Vitria-ES, em 2011.
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Graduanda em Direito na Faculdade Christus. Integrante do Projeto Distrados Venceremos. Co-autora de artigo sobre o projeto Distrados venceremos, constante dos anais do
XX CONPEDI, realizado em Vitria-ES, em 2011.
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Graduanda em Direito na Faculdade Christus. Bolsista de pesquisa do Programa de Iniciao Cientfica, cujo tema de pesquisa o grupo Distrados Venceremos.
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1 INTRODUO
Tudo j foi dito sobre a crise do ensino jurdico. Tudo, ou perto disso. Quem
j no ouviu ou mesmo proferiu uma fala de repdio contra um ensino jurdico
exacerbadamente academicista, dissociado de sua dimenso social e reflexiva?
Quem j no fez coro a Paulo Freire, contra um ensino tributrio do velho modelo
bancarista, em que professores depositam informaes, enquanto os alunos, meros
receptculos, memorizam e reproduzem o seu contedo? 1 Todos ns, atores envolvidos no processo de ensinar e aprender o Direito, temos, em maior ou menor
grau, a conscincia de que entrou em colapso a mentalidade arcaica de que o
ensino jurdico pode ser resumido tarefa de dissecar cdigos em sala de aula. E,
se muitos ainda resistem idia de uma mudana didtico-pedaggica, muito
mais por no saberem como oper-la, do que por simples renitncia.
De fato, em sociedades ps-modernas,2 hipercomplexificadas, que se volatilizam em arranjos instveis, em plena era da velocidade,3 seria ingenuidade supormos
que antigos pactos pedaggicos, calcados no velho argumento de autoridade de que
manda quem pode, obedece quem tem juzo, poderiam surtir os efeitos desejveis.
A despeito disso, no temos nenhuma iluso de que prticas de violncia
simblica 4 comumente perpetradas nos cursos de Direito tenham chegado ao
fim. Por toda parte, ainda pululam professores que, consoante a filosofia de
Maquiavel, preferem ser temidos que amados, 5 valendo-se de toda sorte de
tcnicas de usurpao da autonomia de pensamento de seus alunos, a fim de
convenc-los de que s aos mestres dado pensar; enquanto aos aprendizes
reserva-se a tarefa, bem mais modesta, de anotar.
Dessa forma, ainda hoje observamos currculos jurdicos demasiadamente
normativistas, pautados apenas por uma transmisso de conhecimentos dogmticos, pouco dirigidos soluo real de problemas. Isso resulta na elaborao de
um conhecimento precarizado, cujas conseqncias reverberam na seara jurdica,
culminando na formao de profissionais inbeis e acrticos.
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Grades curriculares relativamente desligadas da realidade social, lastreadas em projetos pedaggicos legalistas, com baixo teor humanstico, e engendradas em relaes professor-aluno autoritrias e verticalizadas: no admira
que tenhamos em sala tantos alunos entediados, desinteressados, apticos, e
em estado de sofrimento psquico.
Assim, os estudos sobre ensino jurdico parecem ter chegado a um ponto
de inflexo. Superabundam diagnsticos sombrios a seu respeito. No por acaso,
crise a palavra mais recorrente quando o tema o ensino do Direito. Mas,
se h muitos trabalhos destinados problematizao e reflexo crtica sobre as
razes que ensejam essa crise, o mesmo no podemos dizer quanto ao volume
de trabalhos que se ocupam em pensar sobre possveis solues e/ou alternativas
quanto aos problemas diagnosticados.
Nesse contexto, entendemos que seria pertinente fazermos um estudo
de caso, a fim de relatar a experincia empreendida pelo projeto Distrados
Venceremos: Laboratrio de Criatividade em Direito, Arte e Cultura, que vem
sendo implementado na Faculdade Christus, em Fortaleza, em diferentes formatos, ao longo de 2011.
O projeto Distrados Venceremos consiste em proposta metodolgica
inovadora, face aos desafios engendrados pela emergncia de sociedades mais
complexas, com mercados mais competitivos - de um lado - e pelo aumento
do nmero de alunos com dficits em sua formao geral, de outro.6 Nesse
contexto de dificuldades ampliadas, o projeto se prope ao desenvolvimento de
competncias e habilidades discursivas, tais como leitura, compreenso, elaborao e interpretao de textos, expressividade e performance, pautadas numa
abordagem ldica, criativa, esttica e sensorial. Como pano de fundo, relaes
horizontalizadas e descontradas embasam a concepo anti-maquiavlica de
que melhor amar, do que temer o conhecimento.
Portanto, o presente artigo vem compartilhar com a comunidade acadmica algumas das experincias traadas at aqui, por meio de um relato vivo,
que conjuga avanos, mas tambm paralisias. Em funcionamento h menos
de um ano, o projeto vem sendo objeto de estudos de campo relativos ao seu
desenvolvimento, os quais, embora se encontrem ainda em fase relativamente
incipiente, j nos autorizam, ao menos, as concluses parciais da pesquisa. Para
tanto, conjugaremos uma anlise que parte de um novo paradigma educacional, em direo s novas diretrizes legais para o ensino jurdico, culminando
em uma abordagem cruzada com a pesquisa de campo focada nesse estudo de
caso. Ento... voil!
2 DO NOVO PARADIGMA EDUCACIONAL S NOVAS DIRETRIZES
PARA O ENSINO JURDICO
Observamos que a sociedade atual se configura em um cenrio cada vez
mais complexo, veloz, plural, fragmentrio e heterogneo; o que demanda uma
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formao profissional capaz de oferecer respostas aos novos desafios. Agora que
a informao est disponvel on-line, ao alcance de uma tecla, a figura do mestre
detentor do saber e da verdade tornou-se insustentvel. De fato, na era digital,
em que os estudantes se vem sufocados por uma sobrecarga ininterrupta de
informaes, trocadas em tempo real e em escala planetria, j no se trata
de termos acesso informao. Trata-se, na verdade, de sabermos o que fazer
com ela. Nesse sentido, convm mapearmos algumas das principais tendncias
contemporneas acerca dos sentidos que a educao deve assumir na sociedade
ps-moderna.
Francisco Gutirrez, ao refletir sobre a necessidade de uma Educao
Planetria, nos ensina que a preocupao do educador no ser tanto a de
ensinar, mas a de promover, provocar, facilitar, criar e recriar experincias de
aprendizagem. 7 Para Gutirrez, tais experincias
[...] tm que preencher as seguintes caractersticas:
Tem que acontecer na vida, na realidade, no processo vital:
vivncias, sucessos, fatos, relatos, partes da prpria vida;
Elas precisam implicar-se em todos os sentidos, quanto mais melhor, em uma dimenso pluri-sensual. S assim elas promovero
o sentido;
Elas tm que satisfazer, agradar, divertir. Jogos para jogar no gozo
de viver prazerosamente o presente;
Tm que despertar interesse, adeso, implicao, relao significativa;
Tm que gestar, criar e recriar relaes com o contexto, com os
outros e consigo mesmo. Dimenso sinergtica que d potncia;
Tm que despertar o desejo de intrometer-se na temtica estudada por meio de implicaes pessoais, comunitrias e sociais;
Tm que empurrar a vontade de se colocar em processo, em
movimento, em ao, para conhecer a realidade em seu porvir, para poder transform-la. um conhecimento produtivo e
transformador.8 (grifos nossos)
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Por seu turno, o professor Slvio Snchez Gamboa, ao tratar dos desafios
da educao em meio ao mundo globalizado, num recorte mais apontado
Amrica Latina, faz-nos perceber que, neste caso, a educao encontra-se num
limbo entre a pr e a ps-modernidade.
Segundo Gamboa, um dos pais da educao moderna, Jan Amos Comenius15, propugnava uma educao para todos, e com qualidade, uma escola que
ensinasse tudo, com aprendizagem satisfatria e competente. Confrontada com
a educao contempornea, a proposta de Comenius revela paradoxos.
A partir dos anos 1970, diz o autor, foram impostas legislaes na
Amrica Latina sobre a profissionalizao do ensino, em conseqncia do
desenvolvimento industrial da regio. 16 Essa poltica traduziria a nova fase de
expanso capitalista, demandando um sistema educativo que formasse os recursos humanos necessrios quela expanso. Treinar o homo faber em detrimento
do homem integral, eis a questo. Sob essa tica fabril, os mtodos pedaggicos
tm objetivos neutros e tecnicistas, a didtica se reduz operacionalizao de
instruo, mecanizando os processos ensino-aprendizagem.
Em sentido contrrio, Comenius pensava num cidado do mundo, que
transcendesse o homo faber. O homem tem necessidade de ser formado para se
tornar homem e no apenas mquina produtiva. Ento, pergunta Gamboa: Qual
a educao para a Ps-modernidade? O que fazer com a educao inconclusa
da Modernidade? 17
Assim, Gamboa entende que o iderio da Modernidade nem chegou a se
realizar plenamente na Amrica Latina, e j esto proclamando uma educao
ps-moderna, por meio de novas ondas tecnicistas, como a informtica e a
microeletrnica. Para o autor, na Amrica Latina, a nova educao, em vez
de resgatar as dvidas da modernidade, cria novos desafios, na medida em que
surgem novos analfabetos e excludos. 18
Ainda que no Terceiro Mundo fosse distribudo um computador por cabea, isto nada modificaria sua situao, pois as
pessoas no saberiam o que fazer com ele. O caminho que leva
utilizao apropriada da informtica, nesses pases, longo e
impregnado de obstculos. 19
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Outro terico que merece a nossa meno o autor da Teoria das Inteligncias Mltiplas. No incio da dcada de 1980, Howard Gardner chamou a
ateno do mundo para a sua TIM - Teoria das Inteligncias Mltiplas.
Gardner considera que h um carter mltiplo na inteligncia, que
consiste na possibilidade de vermos a habilidade se manifestar entre diferentes
dimenses. As inteligncias so distintas, mas interagem entre si.
Para resolver um problema de matemtica, por exemplo, Gardner considera a utilizao das dimenses lingstica e espacial. A inteligncia, segundo
Gardner, no pode ser medida, pois o espectro das oito inteligncias observadas
por ele desenvolvido entre fatores biopsicolgicos e condies ambientais ao
longo da vida do indivduo. Cada inteligncia tem seu prprio sistema simblico
e deriva da compreenso e do uso dos diferentes grupos culturais.
A existncia desses diferentes nveis de inteligncia apia a noo de
que cada um desses nveis tem sua prpria trajetria, de acordo com seu desenvolvimento. Afirma o terico: Cada inteligncia est baseada, pelo menos
inicialmente, em um potencial biolgico que se expressa como o resultado da
interao dos fatores genticos e ambientais. 21
No campo educacional, a Teoria das Inteligncias Mltiplas pode auxiliar
os educadores, apresentando alternativas para as seguintes prticas educacionais:
avaliao, currculo, educao inclusiva e educao ambiental numa abordagem
interdisciplinar e na valorizao de oficinas pedaggicas, projetos educacionais
e centros de interesse.
As inteligncias catalogadas por Gardner so:
a) Inteligncia Lingstica: apresenta elementos primordiais, que
esto presentes na vida do indivduo: escutar, falar, ler e escrever.
Esses elementos do sentidos experincia educacional porque
fazem conexo entre as disciplinas;
b) Inteligncia Lgico-Matemtica: abrange trs campos: matemtica, cincia e lgica. O aluno deve ter habilidade para trabalhar
com nmeros e problemas matemticos. A lgica, por sua vez,
tem a ver com o processo de raciocnio. Ento, a proposta que
o raciocnio lgico seja desenvolvido cientificamente em todas
as disciplinas na arte de resolver problemas, de uma forma interdisciplinar. Ou seja, formular a hiptese, observar, experimentar
dados, interpretar e elaborar concluses;
c) Inteligncia Cinestsica: diz respeito integrao do corpo e
mente. necessrio reintroduzir o conhecimento fsico, por meio
do movimento em sala de aula. Deve enfatizar a integrao entre
as experincias do corpo, relacionando a expresso corporal ao
pensamento abstrato e simblico. Nesse sentido, a arte fundamental. importante que o professor d condies para que o
indivduo possa desenvolver o seu potencial criador;
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O ensino na contemporaneidade deve se pautar por buscar a interdisciplinaridade e a contextualizao. Assim, perseguimos uma viso orgnica
do conhecimento, afinada com as mutaes que o acesso informao est
causando no modo de abordar, analisar, explicar e prever a realidade.
A Teoria das Inteligncias Mltiplas possibilita, portanto, o vislumbre de
novos caminhos na prtica do professor e compe uma nova abordagem: a de
observao e acompanhamento do aluno dentro de suas possibilidades.
No poderamos deixar de analisar por fim e, fundamentalmente, a
publicao, pela Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia
e a Cultura UNESCO, em 1998, de Educao: Um Tesouro a Descobrir
Relatrio da Comisso Internacional sobre Educao para o sculo XXI,
coordenado por Jacques Delors.
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Assim, percebemos que as mais novas diretrizes legais para o ensino jurdico so, na verdade, reverberaes de uma mudana paradigmtica da Educao
contempornea, em termos nacionais e transnacionais. Nesse contexto, o projeto
ao qual dedicamos nosso estudo um laboratrio de experimentaes, que visa
realizao dos ideais pedaggicos aqui apresentados. As atividades realizadas
no projeto oportunizam aos alunos, de forma transdisciplinar e prazerosa, o
exerccio positivo de suas competncias discursivas. A integrao de literatura,
poesia, prosa e aspectos culturais de diversos movimentos artsticos proporcionam ao aluno o alargamento de seu horizonte hermenutico, ao descortinar
novos modos de pensar e de ver o mundo. A experincia se enriquece ainda
mais, por estar amparada em trplice dimenso de extenso, responsabilidade
social e pesquisa. Esta ltima acontece por meio de pesquisa de campo acerca do
ensino jurdico, com foco na anlise dos resultados obtidos pelas metodologias
empregadas no projeto. O que se pretende mensurar, ao longo da pesquisa, ser
o grau de desenvolvimento dos alunos, a partir de sua participao no grupo.
Assim, os alunos envolvidos devem tornar-se objeto e sujeitos da pesquisa, ao
mesmo tempo, por meio de tcnicas de pesquisa qualitativa, tais como, entrevistas, grupo focal e observao participante; alm de mensuraes quantitativas,
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Eis a o mais interessante do grupo: o paradoxo. Este consiste num projeto ambicioso em que os alunos almejam a realizao de objetivos complexos
e variados, mas que so tratados com uma abordagem metodolgica de leveza,
delicadeza, fruio, prazer e ludicidade. Acerca desse paradoxo, a professora
responsvel compartilha alguns de seus questionamentos e inquietaes, colhidos
em nos estudos de campo:
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De acordo com Paulo Freire: [...] a educao se transforma num ato de depositar, em que os educandos
so os depositrios e o educador o depositante. Em lugar de comunicar-se, o educar faz comunicados e
depsitos, que os educandos, meras incidncias, recebem pacientemente, memorizam e repetem. Eis a a
concepo bancria da educao, em que a nica margem de ao que se oferece aos educandos a de
receberem os depsitos, guard-los e arquiv-los. (grifos nossos). FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido.
43. ed. So Paulo: Paz e Terra, 2006, p.66.
2 O termo ps-modernidade remonta dcada de 1960, tendo partido de um movimento que desejava
romper com os padres arquitetnicos adotados pela esttica urbanstica moderna. A expresso ps
transmitia a insatisfao e o desejo de ruptura de seus mentores frente aos valores nos quais se apoiava
o estilo moderno. Era hora, diziam os autores [do movimento], de construir para as pessoas, no para
o Homem. (Cf. HARVEY, David. Condio ps-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudana
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cultural. 9. ed. So Paulo: Loyola, 2000, p. 45.). Logo em seguida, o termo ganhou novos adeptos nas
artes, na literatura e na filosofia, ultrapassando as fronteiras de seu reduto inicial. Sabemos que ainda hoje
no h um consenso acerca do uso da expresso ps-modernidade entre filsofos e socilogos, mas no
est entre os nossos objetivos o enfrentamento da controvrsia suscitada entre os tericos que admitem
a tese da ps-modernidade, tais como Lyotard, Harvey, Bauman e tantos outros, e aqueles que sustentam
a tese de que estaramos vivendo apenas uma radicalizao desdobrada da mesma modernidade. Entre
estes ltimos, destacam-se Anthony Giddens (que prefere o termo metamodernidade), Lipovetsky e
Sbastien Charles (para quem melhor seria falar em hipermodernidade), ou ainda Zarka e Gauchet
(que cunharam o termo ultramodernidade). Todas essas correntes contrrias ao uso da expresso ps-modernidade, a despeito da nomenclatura escolhida, tm em comum a crena de que no teria havido
uma ruptura profunda o suficiente entre o nosso modus vivendi e o dos modernos ao ponto de justificar
o nosso enquadramento numa era distinta da modernidade, isto , numa era ps. Cf. BED, Fayga
Silveira. Ciberintimidade: a escrita de si na era digital. 2010. 246 f. Tese (Doutorado em Sociologia)
Universidade Federal do Cear, Fortaleza, 2010. Ver ainda sobre ps-modernidade: CHARLES, Sbastien.
Cartas sobre a hipermodernidade: ou o hipermoderno explicado s crianas. Trad. Xerxes Gusmo. So
Paulo: Barcarolla, 2009, p. 15-31.
Sobre a velocidade e seus influxos nas sociedades contemporneas, conferir os estudos de VIRILIO, Paul.
Cibermundo: a poltica do pior. Trad. Francisco Marques. Lisboa: Teorema, 2000.
Todo poder de violncia simblica, isto , todo poder que chega a impor significaes e a imp-las
como legtimas, dissimulando as relaes de fora que esto na base de sua fora, acrescenta sua prpria
fora, isto , propriamente simblica, a essas relaes de fora. (Itlico no original). Cf. BOUDIEU,
Pierre; PASSERON, Jean-Claude. A reproduo: elementos para uma teoria do sistema de ensino. 2. ed.
Petrpolis, RJ: Vozes, 2009, p. 25.
MAQUIAVEL, Nicolau. O Prncipe. So Paulo: Martin Claret, 2000.
A proliferao de estudantes universitrios com defasagens em sua formao, em geral, e em sua bagagem
humanstico-cultural, em particular, resultado direto do aumento exponencial do acesso ao ensino superior no Brasil, que, antes, estava restrito quase que somente oferta de vagas nas universidades pblicas.
GUTIRREZ, Francisco. procura de sentido na Educao. In: ROMO, Jos Eustquio. Questes do
Sc. XXI. So Paulo: Cortez, 2003, p. 42.
Ibid., p. 43-44.
GADOTTI, Moacir. Pedagogia da terra e cultura da sustentabilidade. In: ROMO, Jos Eustquio.
Questes do Sc. XXI. So Paulo: Cortez, 2003, p. 49.
So signatrios dessa Pedagogia: Paulo Freire, Leonardo Boff, Boaventura de Sousa Santos, Francisco
Gutirrez, Milton Santos, Fritjop Capra, Edgar Morin, entre outros.
Idem, bidem, p. 50-51.
MORIN, Edgar. A cabea bem feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. Rio de Janeiro: Bertrand
Brasil, 2009. p. 11.
Ibid., p. 11.
Ibid., p. 14-15.
Educador e Filsofo Checo (Morvia 1592 / 1670). Autor de The Labyrinth of the Word and the
Paradise of the Hearth. O estabelecimento da British Royal Society foi nele inspirada. Seus escritos
sobre educao visavam ao aperfeioamento dos alunos em classe e, dessa forma, ao aperfeioamento da
humanidade em geral. Cf. Palmer, Joy A. 50 grandes educadores. So Paulo: Contexto, 2005.
GAMBOA, Slvio Snchez. A globalizao e os desafios da Educao no limiar do novo sculo: um olhar
desde a Amrica Latina. In: LOMBARDI, Jos Claudinei. Globalizao, ps-modernidade e educao:
histria, filosofia e temas transversais. Campinas: Autores Associados, 2003, p. 85.
Ibid., p. 86
Ibid., p. 87.
SCHAFF, 1993 apud Gamboa, Slvio Sanchez. A globalizao e os desafios da Educao no limiar do novo
sculo: um olhar desde a Amrica Latina. In: LOMBARDI, Jos Claudinei. Globalizao, ps-modernidade
e educao: histria, filosofia e temas transversais. Campinas, SP: Autores Associados, 2003, p. 90.
GAMBOA, op. cit., p. 92.
GARDNER, Howard. Inteligncias mltiplas: a teoria na prtica. Porto Alegre: Artes Mdicas, 1995, p.
78.
ALVES, Solange Vitria. Trabalhando as inteligncias mltiplas em sala de aula. Braslia: Plano, 2003,
p. 33-34.
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RESUMO
Durante sculos, o ser humano se apropriou daquilo que a
natureza produz sem qualquer preocupao de ordem ecolgica. Porm, no sculo XX, a natureza comeou a dar sinais
de exaurimento de seus recursos, fazendo surgir uma grave
crise ambiental, prejudicando os sistemas poltico, econmico
e social e, principalmente, a sade de todos os habitantes do
planeta. O objetivo geral deste trabalho , pois, investigar
a relao entre os direitos fundamentais sade e ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, com vistas a garantir
uma sadia qualidade de vida do ser humano. Discorrer acerca
do direito fundamental sade - elencado no caput do art. 6,
como tambm nos artigos 196 a 200 da Constituio Federal
de 1988 pressupe, portanto, falar na qualidade do meio
ambiente, positivado no artigo 225 da Carta Magna. A metodologia aplicada bibliogrfica, terica, descritiva, explicativa
e dedutiva, ressaltando a transdisciplinaridade. A articulao
dessas dimenses resultou em uma compreenso coerente da
atual sociedade de risco e das incertezas a ela inerentes, como
forma de buscar efetivar no apenas o direito fundamental ao
meio ambiente sadio, mas tambm, no menos importante, o
direito sade, erigido pelo constituinte originrio como um
direito fundamental. Os principais resultados obtidos demonstram que, para que os problemas revelados na sociedade de
risco ps-moderna no se apresentem em graus irreversveis,
necessrio se faz repensar o modelo predatrio e poluidor de
desenvolvimento econmico adotado no Brasil, promovendo
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INTRODUO
Durante sculos, o ser humano se apropriou daquilo que a natureza produz
sem qualquer preocupao de ordem ecolgica. Aps o advento da Revoluo
Industrial, que veio a consolidar o sistema econmico capitalista, a natureza
passou a ser cada vez mais explorada, impossibilitando, assim, a renovao de
muitos de seus recursos.
Dessa forma, no sculo XX, a natureza comeou a dar sinais de exaurimento de seus recursos, fazendo surgir uma grave crise ambiental, prejudicando
os sistemas poltico, econmico e social e, principalmente, a sade de todos os
habitantes do planeta.
Como sinais dessa crise tm-se a poluio das guas e do ar, os desastres
naturais, o efeito estufa, a extino de espcies da fauna e da flora, as mudanas
climticas, a contaminao dos alimentos, assim como os processos de eroso,
de desflorestamento e de desertificao.
Referida crise um dos elementos-chave da atual sociedade de risco,
que tem como caracterstica no apenas os riscos ambientais como tambm os
qumicos, os nucleares, os genticos, os econmicos, entre outros.
O objetivo geral deste trabalho investigar a relao entre os direitos
fundamentais sade e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, com
vistas a garantir uma sadia qualidade de vida do ser humano. A metodologia
utilizada bibliogrfica, terica, descritiva, explicativa e dedutiva, ressaltando
a transdisciplinaridade.
Em um primeiro momento do artigo, efetuar-se-o consideraes concernentes sociedade de risco e crise ambiental. Posteriormente, realizar-se- um estudo a respeito do meio ambiente ecologicamente equilibrado como
direito e dever fundamental. Em seguida, far-se- um estudo relativo sade
como direito fundamental. Para, por fim, discorrer sobre os efeitos da qualidade
ambiental na sade humana.
1 CONSIDERAES CONCERNENTES SOCIEDADE DE RISCO E
CRISE AMBIENTAL
Durante o sculo XVIII chamado Sculo das Luzes , a Europa
tornou-se palco de profundas transformaes sociais, econmicas, filosficas e
polticas influenciadas pelo Iluminismo, movimento intelectual caracterizador
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do pensamento da poca, que admitia que os seres humanos tornariam o mundo melhor, mediante a introspeco, o engajamento poltico-social e o livre
exerccio de suas capacidades.
O homem deveria colocar-se no centro das decises e passar a buscar,
por meio da cincia, respostas para as questes que, at ento, eram explicadas
somente pela f. Desse modo, apenas o conhecimento levaria o ser humano a
conquistar a liberdade e a felicidade.
Essa corrente de pensamento tornou-se a mola impulsora de eventos
polticos, sociais e econmicos que se revelariam de extrema importncia para
a constituio do mundo moderno, tais como a Revoluo Francesa e a Revoluo Industrial.
A Revoluo Francesa, conjunto de acontecimentos ocorridos entre os
anos de 1789 e 1799, que marcou a transio entre Idade Mdia e Idade Moderna, proclamava os princpios da liberdade, da igualdade e da fraternidade,
sob influncia de Rousseau.
Por sua vez, a Revoluo Industrial, ocorrida na Inglaterra no sculo
XVIII, apresentou como consequncia o amadurecimento e a consolidao do
sistema econmico capitalista, aumentando a explorao dos recursos ambientais, em funo da produo industrial.1
Dessa forma, a Idade Moderna ficou marcada pelo predomnio do racionalismo, do antropocentrismo clssico, do universalismo, da valorizao
da propriedade, do individualismo, do pragmatismo e da defesa da liberdade.
A cincia moderna, sem saber o que fazer com a complexidade uma das
caractersticas mais visveis no universo do qual se faz parte reduziu o complexo
ao simples, criando os vrios saberes particulares e as diversas especialidades.
Ganhou-se em detalhe, mas perdeu-se a totalidade. Houve um formidvel
esquecimento do ser em favor do existente.2
Ao passo que a filosofia capitalista defende o acmulo de riquezas, o
antropocentrismo, em sua dimenso clssica, eleva o homem a uma posio de
dominao do meio ambiente.
Apesar das muitas inovaes tecnolgicas e dos avanos decorrentes
da Revoluo Industrial, ela tambm intensificou o processo de degradao
ecolgica, marcado pelo uso exacerbado e irresponsvel dos recursos naturais
por parte dos seres humanos, para satisfao de suas necessidades ilimitadas,
impossibilitando, assim, a renovao de muitos desses recursos.
No sculo XX, a natureza comeou, ento, a dar sinais de exaurimento,
fazendo surgir uma grave crise ambiental, prejudicando os sistemas poltico,
econmico e social e, principalmente, a sade de todos os habitantes do planeta.
Como sinais dessa crise tm-se a poluio das guas e do ar, os desastres
naturais, o efeito estufa, a extino de espcies da fauna e da flora, as mudanas
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O art. 5, 2, da Constituio Federal prev: Os direitos e garantias expressos nesta Constituio no excluem outros decorrentes do regime e dos princpios por ela adotados, ou dos
tratados internacionais em que a Repblica Federativa do Brasil seja parte.
** O art. 5, 1, da Lei Maior prev: As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais tm aplicao imediata.
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O art. 196 assim expressa: A sade direito de todos e dever do Estado, garantido mediante
polticas sociais e econmicas que visem reduo do risco de doena e de outros agravos e ao
acesso universal e igualitrio s aes e servios para sua promoo, proteo e recuperao.
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-estar, seja fsico, mental ou social, o que sugere que ela (sade) um sistema
dentro de um sistema maior (a vida), e com tal interage21. Sendo parte de um
sistema, o avano, a garantia e a estabilidade desse direito dependem necessariamente dos progressos feitos em relao queles que com ele se comunicam.
Uma das muitas maneiras de garantir o direito sade se faz por meio
da efetivao do direito ao meio ambiente equilibrado, uma vez que o artigo 3
da Lei n 8080 de 19 de setembro de 1990 (que dispe sobre as condies para
a promoo, proteo e recuperao da sade, assim como a organizao e o
funcionamento dos servios correspondentes) preceitua que a sade tem como
fatores determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentao, a moradia,
o saneamento bsico, o meio ambiente [...]*, ao passo que o artigo 225 da Carta
Poltica de 1988 conceitua meio ambiente como bem de uso comum do povo e
essencial sadia qualidade de vida, o que comprova que sade e meio ambiente
equilibrado mantm entre si uma relao de indissociabilidade.
4 OS EFEITOS DA QUALIDADE AMBIENTAL NA SADE
Assim como as demais espcies vivas, o homem depende essencialmente
do meio em que vive, porquanto todos os organismos vivos s subsistem em virtude de trocas constantes, no existindo, portanto, organismos fisiologicamente
autnomos. O universo , pois, o conjunto das conexes dos sujeitos (rochas,
ventos, sol, guas, florestas, animais, homens) que interagem constantemente
em uma complexa teia de relaes22.
O ser humano totalmente dependente do ar, da gua e das espcies vegetais e animais para sua sobrevivncia. Os danos a eles causados certamente afetaro
a sade humana. Seguindo esse raciocnio, Jean-Franois Mattei refere que:
O ambiente reconhecido como um dos quatro grandes determinantes do estado de sade de uma populao, ao lado dos fatores
genticos, dos comportamentos individuais e da qualidade dos
tratamentos mdicos. A sua deteriorao tem uma grande responsabilidade nas doenas da civilizao: depresso nervosa, hipertenso, perturbaes digestivas. Tratar os problemas do ambiente e da
sade separadamente um erro23.
Dessa forma, no se pode pensar a sade humana desprezando-se o cuidado ambiental (manuteno da sade das demais espcies), j que o nosso
ambiente dirio um <<catalisador>>> real, com seus numerosos factores
fsicos e qumicos que provocam reaces s pela sua presena24.
sabido que a incidncia de doenas varia muito de um lugar para outro,
o que fez que, inicialmente, esse fato fosse atribudo a fatores genticos. Todavia
*
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O art. 3 da Lei n8080 de 1990 assim estabelece: A sade tem como fatores determinantes e
condicionantes, entre outros, a alimentao, a moradia, o saneamento bsico, o meio ambiente,
o trabalho, a renda, a educao, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e servios essenciais; os
nveis de sade da populao expressam a organizao social e econmica do Pas.
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REFERNCIAS
AGROTXICOS esto matando produtor rural (Discurso pronunciado em 9
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RESUMO
Este artigo tem por objeto os direitos humanos, efetivamente a
possibilidade de compreenso da luta por dignidade e por vida
digna a partir da relao entre o direito e a msica. Apesar
de no existir uma teoria que vincule o campo cognitivo do
direito expresso artstica musical ou Teoria Musical, a
relao contingencial entre ambos ocorre de diversas formas.
A msica, muito mais do que qualquer obra de arte, essencialmente quando popular, detm a capacidade de influenciar
*
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1 INTRODUO
A relao entre o direito e a msica no recente. O que recente e
pouco explorado a busca de uma relao terica entre os campos cognitivos do
Direito e da Msica, mais propriamente da Teoria Jurdica e Teoria Musical. At
porque, no existe uma teoria que vincule ambas as esferas do conhecimento,
mas permanecem apenas pontos de encontro e de convergncia.
Se, como afirmamos, a relao do direito e da msica no recente, isso
se deve, em grande parte, a duas posies. Em primeiro lugar, as normativas
jurdicas regulam a explorao da atividade musical, a exemplo do direito autoral,
embora no dialoguem com a Teoria Musical.
Em segundo lugar, a msica, expresso da arte e do ser humano, dialoga
com o direito, principalmente com o direito percebido como um ente social, alm
de promover crticas ao mundo jurdico. Ou no verdade que Raul Seixas1
cantou: Todo homem tem direito de pensar o que quiser [...] todo homem tem
direito de pensar, de dizer e de escrever?
A msica, muito mais do que qualquer obra de arte, essencialmente
quando popular, detm a capacidade de influenciar uma imensa quantidade de
pessoas, tocando nas rdios de norte a sul do pas, pode promover mudanas
de grande porte nos valores sociais, prticas, etc., e, enfim, no prprio direito.
E da que as crticas sociais e do ordenamento jurdico, provindas da
musicalidade, por vezes se escondem por detrs de cifras de signos lingusticos
ambguos. Ou no foi dessa forma que Roberto Carlos2 conseguiu promover uma
crtica ao regime militar, nos anos 70 do sculo XX, principalmente ao exlio de
Caetano Veloso? Diz a letra:
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da prxis social de maior fora vinculante, que visa Justia atravs de normas,
indicando procedimentos e rgos mais nitidamente demarcados do que em
outros tipos de regulamentao da conduta.15
O direito, nesta proposta, a sntese a cada momento, o guia da
prxis humana progressista. Prxis esta que envolve: a) o aproveitamento
das contradies dos sistemas normativos estabelecidos [...]; b) a criao
de novos instrumentos jurdicos de interveno, dentro da pluralidade de
ordenamentos 16
Teorias em que tal viso seja omitida ou negada, segundo Lyra Filho17,
mutilam o direito, paralisando-o na descrio do direito positivado pelo Estado,
para que no se dedique a repensar o direito da independncia econmica e da
liberdade poltico-social. Entende ele e ns que necessitamos buscar a criao
de uma nova sociedade, no fundada em discriminaes, privilgios ou minorias
favorecidas e/ou oprimidas, etc., mas fundada na justia social.
O pensar o direito est ligado a um objetivo nico, a nvel histrico presente, para todas as naes, que a participao progressista do corpo social,
visando a um modelo scio-poltico e jurdico de ampliao da democracia e de
cidadania participativa e ativa (controle do poder). Justamente nesse aspecto
que importa o entendimento da relao entre o direito e a msica, ou seja, a
msica como direito, quando visa ao empoderamente e luta por bens materiais
e imateriais a uma vida digna (direitos humanos).
Concordamos com Lyra Filho, ento, quando ele defende a necessria
destruio da viso positivista da cincia que, atravs do mtodo lgico-formal
da dogmtica, se coloca numa posio de neutralidade e objetividade no ato de
conhecimento do objeto de estudo. Segundo ele, j no sculo XX se sabia que
inexiste a verdade cientfica como uma coisa absoluta e pura.
Isso porque, por exemplo, no que tange s cincias sociais aplicadas,
como o direito, no existe propriamente uma interpretao prvia para que,
aps, emerja a crtica ou conformismo, pois que esses dois elementos j esto
presentes no momento da interpretao.18 Ou seja, a cincia e a ideologia, nesse
ponto, confundem-se e geram um empobrecimento da cincia pela transmisso
de verdades ideolgicas, isto , imagens deformadas do real.19
Por conseguinte, o direito s pode ser apreendido na sua dinmica social, por
meio da dialtica. Apenas uma viso sociolgico-dialtica, que enfatize o devir e a
totalidade, ser capaz de apreender a sntese jurdica a positivao da liberdade
conscientizada e conquistada nas lutas sociais, expresso da justia social atualizada.
Assim, emerge a proposio da dialtica como mtodo de apreenso do
fenmeno jurdico em sua totalidade e devir, e na enunciao de uma nova viso
do que Direito como positivao da liberdade conscientizada e conquistada
nas lutas sociais e formulador dos princpios maiores da justia social que nelas
emergem a partir disto.
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Quer dizer, nesse sentido, Lyra Filho v a dialtica como tendo na totalidade
e no devir as suas mais importantes categorias. A sociedade um sistema (uma
totalidade dialtica) em que tudo est interrelacionado. O mtodo dialtico por
ele empregado busca apreender o objeto do conhecimento em todos os momentos das vrias contradies existentes, tanto a nvel de infra-estrutura como de
superestrutura - ambas a nvel nacional e internacional em seu devir histrico,
em sua transformao constante. Nesta relao dialtica de contradies v a infraestrutura no como determinante, pois ela, tambm em parte, condicionada pela
superestrutura, mas como condicionante. H nesta concepo de dialtica uma
certa influncia da Escola de Frankfurt, alm das influncias hegeliana e marxista.20
Para Chau21 existem trs aspectos importantes na abordagem dialtica
do Direito feita por Lyra Filho. Em primeiro lugar, o Direito temporalizado.
estabelecida a distino entre a lei e o Direito, por meio da emerso do direito em
sua dimenso social e poltica. Em segundo lugar, o Direito apreendido em sua
totalidade, ou seja, na prpria histria22. Finalmente, em terceiro lugar, proporciona a percepo das contradies entre a ideia de justia e as leis, visando sua
superao, para se inserir o Direito para a histria e para a poltica transformadora.
A proposta terica deste autor busca desvincular o direito da lei23 e
coloc-lo a servio da justia social, recuperando a sua dignidade poltica.
Aproveitamo-nos dessa reflexo terica para falar que a desvinculao do direito
lei permite-nos falar da msica como uma manifestao do direito, quando
luta pela dignidade, fato esse que seria impossvel se o direito fosse percebido
apenas como um cdigo normativo (lei). necessrio mudar a teoria do direito
tradicional para poder coloc-lo a servio da democracia.
Trata-se, portanto, de uma proposta terica rompe com o senso comum
terico dos juristas, afastando o direito dos positivismos reducionistas e dos
jusnaturalismos idealistas, buscando coloc-lo dentro da histria e a servio da
sociedade. Ou seja: o legalismo, o idealismo e a validade so substitudos em
sua obra pela legitimidade, a histria e a eficcia.
Considerado um crtico marxista do Direito, Lyra Filho percebe que a
questo central de que partem todos os problemas jurdicos contemporneos
o equvoco generalizado e estrutural existente sobre o que o direito este
tem sido reduzido unicamente ao direito positivado pelo Estado. O fenmeno
jurdico, segundo ele, admite vrias abordagens e no se pode crer que o discurso
elaborado sobre uma delas possa abrang-lo em sua totalidade.
Assim como Lyra Filho, percebemos o Direito como a expresso dos
princpios supremos da justia social de um dado momento histrico. ele
entendido, por conseguinte, como a positivao da liberdade conscientizada
e conquistada nas lutas sociais e formulador dos princpios maiores da justia
social que nelas emergem. Sob essa tica que, nesse momento, podemos preliminarmente falar da relao do direito e da msica quando se trata da msica
como luta por dignidade (direitos humanos) e para o empoderamento.
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na, pois aqueles somente sero provisoriamente o resultado das lutas sociais,
polticas, econmicas, comunitrias, etc., pelo acesso aos bens aptos a garantir
uma vida digna.
Essa luta, por conseguinte, enquanto prtica social, poltica, etc., pode
ocorrer por meio da arte msica. Isso porque, em grande medida, as belas
obras de arte nos permitem uma modificao do olhar, rumo a uma abertura de
conscincia ao novo. Ao invs de nos determos na mera mimetizao temporal e
espacial do passado, podemos vislumbrar criticamente a histria e as necessrias
transformaes sociais.
No campo da msica para a dignidade, a grande obra de arte no encontra
fundamente na erudio do artista ou na harmonia, mas antes, na desestabilizao do institudo para a luta por vida digna. Quando grande obra de arte, a
msica uma descrio crtica da realidade social. Ela luta por dignidade, por
igualdade e pela eficcia dos direitos humanos.
Assim como a vida concreta em sociedade gera reflexo nas criaes das
melodias, as prprias melodias geram consequncias na vida social quando,
criticando a realidade, geram uma conscientizao cidad. So, por conseguinte,
formas de luta pela dignidade.
4 PARA UMA APROXIMAO ENTRE O DIREITO E A MSICA: A
TEORIA DA MUSICALIDADE DO DIREITO
No existe uma Teoria da Musicalidade do Direito. Contudo, o direito se
aproxima da msica, enquanto arte, de variadas maneiras. Em primeiro lugar,
ambos, o direito e a msica, se desenvolvem no mesmo campo, o campo das
relaes humanas.
Em segundo lugar, as consequncias sociais da aplicao do direito geram
influncia nas msicas e letras, que tanto podem elogiar os resultados sociais,
quanto criticar as polticas pblicas, legislaes e as suas consequncias no
mbito da sociedade. E assim, a msica pode, por sua vez, influenciar a prpria
sociedade na busca de empoderamento, de liberdade, de igualdade, etc., enfim,
a msica grita dignidade. Da que a msica pode servir de termmetro para os
pesquisadores do direito. Enfim, o que podemos afirmar que a relao entre
ambos dialtica.
A msica, no somente por meio de suas letras, significantes e significados,
pode nos transformar por meio de sua melodia, aguando nossa sensibilidade.
Importa a Teoria Musical para a esttica e a harmonia. Em conjunto, nos leva a
uma compreenso nova e intersubjetiva. Leva a uma luta por dignidade humana:
[...] um Branco e um Preto unido,
Respostas que cala o ridculo,
Vejo assim confisco,
mundo submisso,
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eu adquiro alivio,
paz para os meu filhos,
na decente, atenciosamente eu sigo em frente tipo assim,
regenerado delinquente l do Brooklyn [...]
mais vale uma famlia e um qualquer no bolso,
medo, talvez desemprego, sofrimento, lamento,
vai ser demais, vou viver sem Paz,
pagar veneno, nas ruas falcatrua z povinho,
um isqueiro, o itinerrio de um puteiro o Brasil [...]35.
Quando grande obra de arte, a msica uma descrio crtica da realidade social. Ela luta por dignidade, por igualdade e pela eficcia dos direitos
humanos. Quer dizer, uma grande obra de arte fruto do seu tempo, do modo
de vida poca, das narrativas, das teorias, da sociedade, da poltica, ou seja,
da conjuntura social que inspira o artista no momento da criao. Isso quer
dizer que o mundo das ideias humanas, mundo das criaes, influenciado pelo
mundo material (mundo concreto), bem como pela conscincia humana. Da
que dizemos que todo o texto tem seu contexto.
Que melhor descrio de uma grande obra de arte, no que tange anlise
social e a luta por bens materiais e imateriais para uma vida digna, assim como
a luta por democracia e cidadania ativa e participativa do que a msica S Deus
pode me julgar, do brasileiro MV Bill? Assim a msica diz:
Vai ser preciso muito mais pra me fazer recuar;
Minha auto-estima no fcil de abaixar, olhos abertos fixados
no cu,
Perguntando a Deus qual ser o meu papel.
Fechar a boca e no expor meus pensamentos,
Com receio que eles possam causar constrangimentos. Ser
que isso?
No cumprir compromisso, abaixar a cabea e se manter omisso.
A hipocrisia, a demagogia se entregue orgia. Sem ideologia, a
maioria fala de amor, no singular. Se eu falo de amor de uma
forma impopular;
Quem no tem amor pelo povo brasileiro;
No me representa aqui nem no estrangeiro;
Uma das piores distribuies de renda;
Antes de morrer, talvez voc entenda. Confesso para ti que
difcil de entender, no pas do carnaval o povo nem tem o que
comer;
Ser artista, Pop Star, pra mim pouco; No sou nada disso, sou
apenas mais um louco, clamando por justia, igualdade racial,
preto, pobre parecido, mas no igual;
natural o que fazem no senado; Quem engana o povo simplesmente renncia o cargo. No caado, abre mo do seu
mandato; Nas prximas eleies bota a cara como candidato;
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Nesse sentido, por meio dessa letra, MV Bill analisa os valores que
regem a sociedade brasileira do sculo XXI. Dentre outras crticas, como
ele mesmo disse, como a morte de um artista vira assunto importante enquanto a morte de milhares de excludos sociais vira apenas estatstica? Por
isso, briga por dignidade. Alm disso, prope uma suposio do futuro e a
possibilidade da fissura com vistas a um novo modelo de sociedade, baseada
na emancipao, na dignidade, na liberdade, na igualdade, na democracia
e na cidadania participativa.
Trata-se de uma letra que induz ao empoderamento cidado e que critica no somente valores sociais, mas tambm polticas pblicas, legislaes,
essencialmente a criminal, o prprio direito, etc. Quer dizer, trata-se de uma
luta popular em prol da dignidade humana.
Assim, no que tange aos direitos humanos e emancipao da cidadania,
a diferena entre as grandes obras de arte e as obras de arte menores vincula-se luta por dignidade. No campo da msica para a dignidade, a grande obra
de arte no encontra fundamento na erudio do artista ou na harmonia, mas
antes, na desestabilizao do institudo para a luta por vida digna.
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Herrera Flores40 disse que nem toda a arte vale igual: existe um critrio
de seleo esttica. Diferenciamos as grandes obras artsticas das obras de menor porte. A diferena reside justamente nas lutas pela dignidade humana. As
pequenas obras so apenas repeties de esquemas conceituais prvios, aceitao
e reproduo de dogmas assumidos acriticamente. J as grandes obras, levam
consigo a potncia humana, a capacidade de criatividade. So movimentos
criadores do que pode vir-a-ser ante a pluralidade do mundo, buscando caminhos
possveis de igualdade e de dignidade.
A arte no pode ficar na simples repetio, mas deve posicionar-se, libertar
a possibilidade de constante recriao do mundo e das relaes humanas. Ao
gritar imanncia, a arte pertence ao mundo humano, alheia s transcendncias
que impedem os seres humanos de se conscientizarem do contexto societrio e
do mundo no qual habitam e, assim, de humanizarem-se.
Isso o que Herrera Flores41 chama de lgica do vulco, ou seja, uma
metfora, no mbito dos direitos humanos e da dignidade humana, para a
aposta na erupo do novo, que muitas vezes se encontra esmagado debaixo
da ptrea laje do convencional. Ou seja, o que j est normatizado e a luta
por novos direitos ou, antes, por bens materiais e imateriais que perfazem
uma vida digna.
A arte filha de Taumas e, assim, descendente da admirao e da surpresa
diante da pluralidade e do movimento do real. [...] toda produo cultural
seja um romance, uma teoria ou uma norma jurdica muda e se transforma ao
largo das histrias pelas quais atravessa o ser humano, nesse contnuo processo
de reao cultural em meio aos sistemas de relaes em que vivemos.42
5 CONSIDERAES FINAIS
Este trabalho teve por objeto vislumbrar a possibilidade de uma interseco entre os campos cognitivos do Direito e Msica para compreender a luta
dignidade humana luz do direito vivo, ou seja, das prticas sociais.
Embora seja recente e pouco explorada a busca de uma relao terica
entre os campos cognitivos do Direito e da Msica, a relao entre ambos no
recente, visto que, em primeiro lugar, as normativas jurdicas regulam a explorao da atividade musical, a exemplo do direito autoral, embora no dialoguem
com a Teoria Musical. Ademais, em segundo lugar, a msica, expresso da arte
e do ser humano, dialoga com o direito, principalmente com o direito percebido
como um ente social, alm de promover crticas ao mundo jurdico.
Ainda assim, para a luta por direitos humanos (dignidade), a msica,
muito mais do que qualquer obra de arte, essencialmente quando popular, detm
a capacidade de influenciar uma imensa quantidade de pessoas, tocando nas
rdios de norte a sul do pas, pode promover mudanas de grande porte nos
valores sociais, prticas, etc., e, enfim, no prprio direito.
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REFERNCIAS
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Ibid., p. 26,
Ibid., p. 26.
Ibid., p. 27.
LYRA FILHO, 1982, op. cit., p. 27-28.
LYRA FILHO; Roberto. Pesquisa em que Direito? Braslia: Nair, 1984a, p. 34.
(LYRA FILHO; Roberto. Por que estudar Direito, hoje? Braslia: Nair, 1984b, p. 24-25.
RODRIGUES, Horcio Wanderlei. O ensino jurdico de graduao no Brasil contemporneo: anlise
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CHAU, Marilena; LYRA FILHO, Roberto. Da dignidade poltica do Direito. Direito e Avesso, Braslia,
Nair, I (2):21-30, jul./dez. 1982, p. 29.
Segundo Chau (1982, p. 29), [...] a apreenso do Direito na totalidade histrica (nacional e internacional) permite rever a idia, clssica no marxismo, segundo a qual o Direito parte da mera superestrutura,
quando se considera, como o faz Roberto Lyra Filho, que a explorao, a desigualdade, a dominao, a
violncia e a injustia se efetuam no nvel da infra-estrutura, graas ao prprio Direito.
Neste sentido, para Faoro (1982, p. 34), pelo menos duas vertentes no pensamento de Lyra Filho evitam
que este caia na armadilha positivista dominante: a) [...] o alargamento do Direito para abranger as normas no estatais de classes e grupos espoliados e oprimidos; e b) [...] de outro lado, [...] franqueia-se
o bloqueio, com a descaracterizao do Direito da qualidade de ideologia.
HELLER, Agnes; FEHR, Ferenc. In: SANTARRITA, Marcos (Trad.). A condio poltica psmoderna. 2. ed. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira, 2002, p. 195.
26 HERRERA FLORES, Joaqun . In: CAPLAN, Luciana; GARCIA, Carlos Roberto Diogo; SUXBERGER,
Antnio Henrique Graciano; DIAS, Jefferson Aparecido (Trad.). Teoria crtica dos direitos humanos: os
direitos humanos como produtos culturais.. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009b, p. 193.
27 HERRERA FLORES, 2009a, op. cit., p. 36.
28 Ibid., p. 36.
29 Ibid., p. 39.
30 Ibid., p. 40.
31 Ibid., p. 78.
32 Ibid., p. 34.
33 Ibid., p. 34.
34 Ibid., p. 34.
35 Trecho extrado da msica Mun-R, de Sabotage.
36 Letra da msica S Deus pode me julgar, de MV Bill.
37 HERRERA FLORES, Joaqun. In: KAWAY JNIOR, Nilo (Trad.). O nome do riso: breve tratado
sobre arte e dignidade. Porto Alegre: Movimento; Florianpolis: CESUSC; Florianpolis: Bernncia,
2007, p. 19.
38 Ibid., p. 14.
39 Utopia o termo cunhado por Thomas More para designar uma ilha lugar que no est em local
nenhum real, somente existindo no plano do ideal, como um projeto de antecipao. As utopias modernas
se inserem na dimenso do futuro, projetando uma antecipao dele como forma de criticar os valores
que predominam no presente. E assim, a utopia existe modernamente em suas mais variadas vertentes,
utopia socialista, capitalista, dos direitos humanos, etc. (SNCHEZ VZQUEZ; 2001, p. 361-363).
40 HERRERA FLORES, 2007, op. cit., p. 19-20.
41 Ibid., p. 31.
42 Ibid., p. 33.
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RESUMO
O presente artigo examina a questo relativa obrigatoriedade ou
no da conexo s redes pblicas de abastecimento de gua e de
esgotamento sanitrio e da remunerao decorrente desses servios,
propondo algumas solues para a implementao do art. 45 da Lei
Federal n 11.445/07.
Palavras-chave: Saneamento Bsico. Servios Pblicos. Obrigatoriedade da Conexo.
1 INTRODUO
O alcance da universalizao dos servios pblicos de saneamento bsico, em especial o abastecimento de gua e o esgotamento sanitrio, constitui
processo cuja etapa necessria passa pela realizao de pesados investimentos
em infraestrutura. Tendo em vista que os investimentos privados, ante as caractersticas que lhes so peculiares, qualificam-se como frmula mais eficiente
para a satisfao, a curto prazo, do direito ao acesso universal, cabe ao poder
pblico, de modo a estimular a participao da iniciativa privada, disciplinar
os servios pblicos mediante regras claras e objetivas.
*
Mestre em Direito Pblico pela Universidade Federal do Cear UFC, Especialista em Direito Tributrio pela Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo PUC/SP, Professor
da Faculdade Christus, Advogado e Procurador-Chefe da Agncia Reguladora de Servios
Pblicos Delegados do Estado do Cear ARCE.
** Mestrando em Direito pela Universidade Federal do Cear UFC, Advogado e Analista de
Regulao da Agncia Reguladora de Servios Pblicos Delegados do Estado do Cear ARCE.
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3 A OBRIGATORIEDADE DE CONEXO
Com efeito, a primeira parte do dispositivo legal (toda edificao permanente urbana ser conectada s redes pblicas de abastecimento de gua e
de esgotamento sanitrio disponveis), numa primeira interpretao, traz uma
determinao do poder pblico direcionada aos proprietrios de edificaes
permanentes urbanas. Referido comando j constava em outras normas federais,
como a Lei Federal n 2.312, de 3 de setembro de 1954, o Cdigo Nacional de
Sade, em seu artigo 11, e o Decreto Federal n 49.974-A, de 21 de janeiro
de 1961, que o regulamentava, no artigo 36, segundo o qual: obrigatria a
ligao de tda construo considerada habitvel rde pblica de abastecimento de
gua e aos coletores pblicos de esgoto.
plenamente vivel a interpretao do artigo 45 da Lei n 11.445/07 no
sentido de se tratar de uma limitao administrativa. A partir da lio dos principais
manuais de Direito Administrativo, a manifestao da limitao administrativa
se caracteriza pela fixao em normas de carter genrico, sem a individualizao
de seus destinatrios, com a imposio de uma conduta para determinao do
direito de propriedade segundo certo interesse pblico relevante.1
No caso do artigo 45 da Lei 11.445/07, o interesse pblico relevante
est consubstanciado em dois pilares constitucionais, a saber: a defesa do meio
ambiente (CR/88, artigo 125, caput) e a garantia da sade pblica (CR/88,
artigo 196, caput). Ademais, considerando a natureza econmica dos servios
pblicos de abastecimento de gua e de esgotamento sanitrio, a elas no escapa
tambm a necessidade de compatibilizao dos princpios norteadores da ordem
econmica da Repblica, conforme disposto no artigo 170 da Constituio:
Art. 170. A ordem econmica, fundada na valorizao do trabalho
humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existncia digna, conforme os ditames da justia social, observados
os seguintes princpios:
I - soberania nacional;
II - propriedade privada;
III - funo social da propriedade;
[...]
V - defesa do consumidor;
VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento
diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e
servios e de seus processos de elaborao e prestao;
[...]. (grifo nosso)
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Para anlise da primeira hiptese para criao das taxas, mister antes
definir o que se entende por poder de polcia. O prprio Cdigo Tributrio
Nacional, em seu art.78, traz uma definio legal do instituto jurdico em
comento, verbis:
Art. 78. Considera-se poder de polcia a atividade da administrao pblica que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou
liberdade, regula a prtica de ato ou absteno de fato, em razo
de interesse pblico concernente segurana, higiene, ordem,
aos costumes, disciplina da produo e do mercado, ao exerccio
de atividades econmicas dependentes de concesso ou autorizao do Poder Pblico, tranqilidade pblica ou ao respeito
propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.
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tributrias. Sacha Calmon Navarro Colho afirma que o sinalagma caracterstica essencial da taxa, em que pese a compulsoriedade de sua exigncia.
Entendemos que o sinalagma no caracterstica da relao jurdico-tributria, incluindo a a das taxas, que envolve o contribuinte e o ente pblico
tributante. preciso no confundir a bilateralidade com o carter sinalagmtico.
A relao jurdico-tributria bilateral (envolve o Poder Pblico tributante e as
pessoas sujeitas a uma imposio tributria estatal), mas no envolve sinalagma,
pois no h uma dinmica transformao das posies dos sujeitos na relao.
A ttulo de comparao, o contrato de compra e venda uma relao
jurdica que envolve um negcio bilateral sinalagmtico. H direitos e obrigaes
recprocos para comprador e vendedor. Cada uma dessas partes figura ora no plo
ativo (detentor de direitos), ora no plo passivo da relao jurdica (detentor de
deveres). Isto no ocorre no cerne da relao jurdico-tributria. O contribuinte
no figura ora no plo passivo, ora no plo ativo da relao. No estamos afirmando
que inexistem direitos e obrigaes recprocos entre o Poder Pblico tributante
e os contribuintes, mas que o direito destes de exigir daqueles a contraprestao
estatal no tem natureza tributria, de carter administrativo.
Esta singela diferenciao entre a bilateralidade e o carter sinalagmtico de uma relao jurdica essencial para entender a existncia ou no do
elemento contraprestacional no mago das taxas.
6 PREO PBLICO
Ao contrrio das taxas que obedecem ao regime jurdico tributrio e,
portanto, constituem obrigao ex lege , os preos pblicos (tarifas) so regidos
pelo direito privado, no havendo em suas relaes jurdicas contedo publicstico. Os preos derivam de contrato firmado entre entes da Administrao
Pblica Indireta (ou entidades delegadas) e o administrado (cidado que pactuou
com o ente pblico ou entidade delegada).
Nota-se, destarte, que os princpios da autonomia da vontade (consensualismo), liberdade contratual e da fora obrigatria dos contratos (pacta sunt
servanda) so inerentes aos contratos em que haja a previso de cobrana de
preos pblicos ou tarifas. Roque Antonio Carrazza alude a essas caractersticas
ao diferenciar as taxas dos preos pblicos:
Se, no entanto, o Estado pretender remunerar-se pelos servios
pblicos que presta ou pelos atos de polcia que realiza (tudo vai
depender de sua deciso poltica, expressa em lei), dever, obrigatoriamente, faz-lo por meio de taxas (obedecido, pois, o regime
jurdico tributrio). Nunca por meio de preos pblicos (tambm
chamados tarifas ou, simplesmente, preos).
Apenas para tangenciarmos o assunto, os preos possuem regime
jurdico diverso das taxas, no sendo dado ao legislador transformar estas naqueles, e vice-versa. De feito, enquanto os preos
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servios ser efetivada por meio de tarifas e de outros preos pblicos decorrentes
da conexo e do uso desses servios.
Como visto, a primeira parte do dispositivo legal, numa leitura inicial da
norma, encerra uma determinao do poder pblico direcionada aos proprietrios de edificaes permanentes urbanas. Seu fundamento pode ser observado
no recente Decreto Federal n 7.217, de 21 de junho de 2010, no art. 3, que
explicita o carter essencial dos servios de saneamento bsico, ligando-se fortemente ao princpio fundamental do art. 2, inc. III, da Lei, para proteo da
sade pblica e do meio ambiente. Tal comando pode ser interpretado sob duas
ticas distintas. A primeira delas entende que a lei teria tornado compulsrios
os servios de abastecimento de gua e de esgotamento sanitrio, j que teria
obrigado conexo. E a segunda, numa interpretao mais difcil, no sentido
de que esse comando seria uma limitao administrativa, expresso do poder
de polcia que visa a dar o contorno dos direitos constitucionais de propriedade
e de sua funo social (art. 5, incs. XXII e XXIII, CR).
Observe-se, ainda, que a prpria lei traz os condicionamentos mnimos
para tal obrigao. Primeiramente, somente se pode exigir a conexo caso as
redes pblicas estiverem disponveis. Na ausncia de redes disponveis, o 1
do art. 45 autoriza a adoo de solues individuais, respeitadas as normas
regulamentares referentes ao servio pblico, ao meio ambiente, sade e aos
recursos hdricos. Outra condio para a obrigatoriedade de conexo est na
ausncia de ressalvas na legislao especfica do servio, que poder dispensar
no todo ou em parte a conexo, de acordo com a poltica pblica que o titular
adotar para os servios. Uma ltima condio, apontada por Roque Carrazza,
no sentido de que, quando se trata do servio de fornecimento de gua e esgotamento sanitrio, a cobrana da taxa somente possvel se tal atividade puder
ser traduzida em unidades de medida e atribuda ao sujeito passivo.28
Entretanto, a parte final do dispositivo vai de encontro interpretao da
primeira. Ora, se a obrigatoriedade de conexo ntida manifestao do poder
de imprio da Administrao, tanto sob a tica de servio pblico compulsrio
quanto de poder de polcia, qualquer cobrana pela realizao dessa atividade
administrativa deve passar pela aplicao de normas tributrias.
Caso se entenda tratar a primeira parte do dispositivo como indicativo
da compulsoriedade do servio, com base no qual seria possvel, conforme a
segunda parte, a cobrana pelo uso do servio decorrente da conexo, inclusive
o potencial, h aqui a perfeita identificao da hiptese genrica de aplicao
da taxa de servios, quando postos disposio. A doutrina tributria quase
unnime quanto obrigatoriedade da cobrana de taxa nessa situao, a saber,
pela mera disponibilidade do equipamento, caso a lei instituidora da taxa considere obrigatria a utilizao de referido equipamento.29
No outro sentido, caso se interprete a primeira parte do dispositivo como
manifestao do poder de polcia atravs de uma limitao administrativa
REVISTA OPINIO JURDICA
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propriedade urbana, sob pena de multa, haver um ato comissivo (conexo) por
parte da autoridade responsvel, e a cobrana dever ser, a princpio, relacionada ao custo dessa atividade. Nesse caso, vislumbrar-se-ia uma taxa de polcia.
Todavia, traduzindo-se num ato de polcia, no poder um delegatrio do Poder
Pblico fazer as vezes deste, com entendimento pacificado no Pretrio Excelso30.
Em suma, caso o titular dos servios deseje cobrar algum valor pela conexo,
ou pelo uso (ainda que potencial) desses servios diante de sua disponibilidade
(em razo da conexo obrigatria), dever faz-lo mediante taxa, nos termos do
art. 145, inc. II, da Constituio e dos arts. 77 e 79 do Cdigo Tributrio Nacional.
Alm disso, a cobrana do uso das redes pblicas apenas ser tarifria se o proprietrio assim concordar e contratar com o prestador de servios, revelando-se
o carter voluntarstico da relao jurdica custeada por tarifa.
O Decreto Federal n 7.217/2010, quando poderia ter solucionado o conflito ao regulamentar a Lei, nos arts. 6 e 11, manteve a mesma determinao,
e, no bastasse isso, qualificou o proprietrio como usurio do servio31 e, ainda,
determinou prazo para que este se conecte, sob pena de multa32.
Portanto, a interpretao do dispositivo, segundo os mtodos clssicos,
no permite em primeiro plano uma aplicao racional e juridicamente possvel.
Faz-se necessrio, nesse diapaso, buscar algumas solues alternativas para a
aplicao da norma.
8 SOLUES ALTERNATIVAS DE INTERPRETAO
As solues alternativas de interpretao devero buscar possveis
aplicaes no no texto da norma em si, mas questionando-se as premissas,
decorrentes dos mtodos literal e lgico, das quais partimos inicialmente para
chegar ao entrave observado.
1. Uma primeira soluo, sempre presente nesse tipo de raciocnio, est
em questionar a constitucionalidade do dispositivo. Ora, ao fazer de um lado
uma imposio aos proprietrios, tpica do poder de imprio da Administrao,
e, de outro, instituir a cobrana mediante preo, essencialmente vinculado
a um compromisso de pag-lo, o dispositivo estaria confrontando o art. 145,
II, da Constituio, que determina a instituio de taxa (e no de tarifa).
Ademais, ainda que se reconhecesse, numa interpretao extensiva ou
analgica de outros preos pblicos a incluso das taxas, de modo a salvaguardar o
dispositivo sob o crivo constitucional, ainda possvel vislumbrar no art. 45 da lei
violao ao pacto federativo (arts. 1 e 18 da Constituio), uma vez que a Unio
estaria determinando aos titulares (Estados e Municpios33), pela via indireta (a
saber, mediante diretrizes gerais), a obrigao de instituir tributo. Somente estes
detm a competncia para instituir ou no as taxas em razo de servios pblicos
que prestem. A obrigao tributria ex legis, a despeito de haver certa discricionariedade na escolha (pr-legislativa) de instituir ou no uma taxa.
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dever faz-lo mediante taxa, nos termos do art. 145, inc. II, da Constituio
e dos arts. 77 e 79 do Cdigo Tributrio Nacional. Alm disso, a cobrana do
uso das redes pblicas apenas ser tarifria se o proprietrio assim concordar e
contratar com o prestador de servios, revelando-se o carter voluntarstico da
relao jurdica custeada por tarifa.
REFERNCIAS
ARAGO, Alexandre Santos de. Direito dos servios pblicos. Rio de Janeiro:
Forense, 2007.
ATALIBA, Geraldo. Hiptese de Incidncia Tributria. 6. ed. So Paulo:
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CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributrio.
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CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributrio. 22. ed. So Paulo:
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CARVALHO FILHO, Jos dos Santos. Manual de Direito Administrativo.
17. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.
COLHO, Sacha Calmon. Curso de Direito Tributrio Brasileiro. 9. ed. Rio
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DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 20. ed. So Paulo:
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FURTADO, Lucas Rocha. Curso de Direito Administrativo. 2. ed. Belo Horizonte: Forum, 2010.
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MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 33. ed. So
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MELLO, Celso Antnio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 24.
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MORAES, Bernardo Ribeiro de. A Taxa no Sistema Tributrio Brasileiro.
So Paulo: RT, 1968.
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Cf. CARVALHO FILHO, Jos dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 17. ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2007, p. 676-679; DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 20. ed. So
Paulo: Atlas, 2007, p. 117-119; FURTADO, Lucas Rocha. Curso de Direito Administrativo. 2. ed. Belo
Horizonte: Forum, 2010, p. 815 GASPARINI, Digenes. Direito Administrativo. 12. ed. So Paulo: Saraiva, 2007, p. 744-745; MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 33. ed. So Paulo:
Malheiros, 2007, p. 632-633; MELLO, Celso Antnio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo.
24. ed. So Paulo: Malheiros, 2007, p. 882-883.
DI PIETRO, op. cit., p. 119; FURTADO, op. cit., p. 815; MEIRELLES, op. cit., p. 633.
Op. cit., p. 632.
CARVALHO FILHO, op. cit., p. 676; DI PIETRO, op. cit., p. 119; FURTADO, op. cit., p. 815; GASPARINI, op. cit., p. 744; MEIRELLES, op. cit., p. 633. Em sentido contrrio, entendendo que as limitaes
administrativas importam apenas numa determinao negativa (no fazer), MELLO, op. cit., p. 883.
ARAGO, Alexandre Santos de. Direito dos servios pblicos. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 148,
166-169; DI PIETRO, op. cit., p. 108; FURTADO, op. cit., p. 665-667; MELLO, op. cit., p. 667-669.
Op. cit, p. 296-297.
Op. cit., p. 551.
HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributrio. 16. ed. So Paulo: Atlas, 2007, p. 333.
CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributrio. 21 ed. rev., ampl. e atual.
So Paulo: Malheiros, 2005, p.499.
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributrio. 22. ed. So Paulo: Saraiva, 2010, p.71.
MORAES, Bernardo Ribeiro de. A Taxa no Sistema Tributrio Brasileiro. So Paulo: RT, 1968, p.38-39.
Ob.cit., p. 54. Em relao ao ltimo elemento, o autor entende a contraprestao como resposta do Estado
ao tributo recebido. Noutros termos, a contraprestao consiste na utilizao das receitas tributrias para
os fins ou atividades estatais, o que caracterstica de qualquer receita derivada.
Constituio Federal, Art. 145, inciso II; Cdigo Tributrio Nacional, Art. 77.
COLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributrio Brasileiro. 9. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2007, p.614.
Ob. cit., p.503.
Vide AgR no RE 361009/RJ, Rel.Min. Joaquim Barbosa, 2 Turma, julg. em 31.08.2010, publ. no DJe de
12.11.2010; RE 416.601, Rel. Min. Carlos Velloso, Pleno, DJ de 30.09.2005; RE 588.332-RG, Rel.
Min. Gilmar Mendes, Pleno, julgado em 16.06.2010.
Apud Roque Antonio Carrazza. Curso de Direito Constitucional Tributrio. 21. ed. So Paulo: Malheiros, 2005.
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributrio. 31. ed. So Paulo: Malheiros, 2010, p. 451.
Ob. cit., p.451.
A contraprestao ora aludida no sentido de troca, ou seja, de uma atividade estatal prestada ao contribuinte.
Fazem parte dessa corrente doutrinria: Hugo de Brito Machado e Kiyoshi Harada.
HARADA, Kiyoshi. Ob.cit., p. 334.
Paulo de Barros Carvalho, Sacha Calmon Navarro Colho, Edvaldo Brito e Alberto Xavier so os expoentes dessa corrente doutrinria.
Ob. cit., p. 509-510.
ATALIBA, Geraldo. Hiptese de Incidncia Tributria. 6. ed. So Paulo: Malheiros, 2005, p.166.
Ob. cit., p. 455.
Ob. cit., p. 456-457.
CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributrio. 21. ed. So Paulo: Malheiros,
2005, p.502.
COLHO, Sacha Calmon. Curso de Direito Tributrio Brasileiro. 9. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro:
Forense, 2007, p. 614.
Vide, a ttulo de exemplo desse entendimento, a ADI 1717, Rel. Min. Sydney Sanches, Pleno, julgado
em 07.11.2002, DJ 28.03.2003, p.61.
A esse respeito, a indicao do proprietrio como usurio do servio nitidamente uma opo do legislador
por um sujeito passivo ficto, ou, se melhor analisado, de um responsvel, sendo uma tcnica tpica do
Direito Tributrio. No mbito da prestao de servios por meio de contrato, o usurio (de direito) ser
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sempre aquele que se assume o compromisso contratual com o delegatrio de efetuar os pagamentos das
tarifas em virtude da utilizao, no havendo vnculo necessrio com a propriedade do imvel ou com os
usurios de fato.
32 A indicao de sano administrativa (multa) pelo descumprimento, como uma forma de execuo
indireta, traduz-se claramente como uma consequncia do atributo da autoexecutoriedade dos atos
administrativos. No cabendo a delegatrios do Poder Pblico a lavratura de auto de infrao, tal sano
tambm corrobora no sentido de se entender a conexo obrigatria como uma limitao administrativa.
33 O tema da titularidade nebuloso, havendo entendimentos em diversos sentidos (no somente em
sentidos opostos). Indicamos esses dois nveis federativos em razo da plausibilidade jurdica de defesa
das respectivas competncias, aliados indefinio pelo Judicirio, pendente de deciso no Supremo.
34 Paira sobre o Decreto Federal n 7.217/10 uma razovel suspeita de ilegalidade e de inconstitucionalidade, porquanto o Poder Executivo federal estaria determinando como a Lei Federal n 11.445/07 deve
ser aplicada pelos titulares dos servios pblicos, que indubitavelmente no so federais. Se a atribuio
constitucional dada Unio foi para instituir diretrizes nacionais do saneamento bsico, no haveria
cabimento para especificao das diretrizes sem violao repartio de competncias constitucionais
entre os entes federativos.
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Resumo
O artigo trata da jurisdio constitucional da poltica, com foco no
fundamento ideolgico e na (i)legitimidade da atuao do Poder
Judicirio sobre os assuntos polticos. Observa-se que o fundamento
ideolgico do controle judicial a filosfica poltica liberal, com a
finalidade de conter os eventuais riscos para os direitos e garantias
individuais levados a cabo pelo Parlamento. Por outro lado, tem-se
por ilegtima a reviso judicial das deliberaes polticas, j que,
no plano da teoria da democracia, parece no ser razovel admitir
que o legtimo representante da soberania popular o Parlamento tenha suas deliberaes invalidadas por um Poder carente de
legitimidade e responsabilidade democrticas, como o caso do Judicirio. Portanto, conclui-se que a interveno judicial na poltica
exorbita do mbito de legitimidade constitucional e democrtica.
Palavras-chave: Jurisdio constitucional. Controle da poltica.
Fundamento ideolgico. (I)legitimidade democrtica.
1 INTRODUO
Um dos assuntos mais debatidos no mbito do direito constitucional
e da teoria poltica na atualidade concernente jurisdio constitucional.
Nada obstante, a maior parte dos trabalhos cinge-se a analisar os aspectos
*
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E completa o autor:
Em outras palavras, tenho certeza de que a m reputao da legislao
na teoria jurdica e poltica est intimamente relacionada com o entusiasmo (especialmente o entusiasmo da elite) por essa mudana. As
pessoas convenceram-se de que h algo indecoroso em um sistema no
qual uma legislatura eleita, dominada por partidos polticos e tomando
suas decises com base no governo da maioria, tem a palavra final
em questes de direito e princpios. Parece ser que os tribunais, com
suas perucas e cerimnias, seus volumes encadernados em couro e
seu relativo isolamento ante a poltica partidria, sejam um local mais
adequado para solucionar questes desse carter.19
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teoria constitucional brasileira como fenmeno natural, necessrio e inevitvel.22 No se poderia esperar, entretanto, uma conduta diferente da doutrina
constitucional ptria, uma vez que a sua origem e a sua natureza so de feio
extremamente liberal-conservadora-autoritria, fato esse que levou e leva os
seus doutrinadores a teorizar, sob a perspectiva liberal 23, no sentido da excluso
do povo, direta ou indiretamente, como agente principal dos processos decisrios
sobre questes fundamentais do Estado brasileiro.
Essa posio liberal-conservadora e antidemocrtica do constitucionalismo nacional foi bem detectada por Antonio Carlos Wolkmer e Martonio
MontAlverne Barreto Lima, quando assinalam, respectivamente, que:
A ausncia de uma prtica autenticamente democrtica nos parmetros do que se convencionou chamar de liberalismo burgus
clssico, faz com que inexista, na evoluo das instituies do Pas,
a linearidade de um constitucionalismo de base popular-burguesa,
pois, quer seja o poltico, quer seja o social, ambos foram sempre
construo momentneas e inacabada das elites oligrquicas. O
constitucionalismo brasileiro tem sido, at hoje, o contnuo produto da conciliao-compromisso entre o autoritarismo social
modernizante e o liberalismo burgus conservador.24
A vocao conservadora do constitucionalismo brasileiro iniciou
com a independncia do pas [...]. No constitucionalismo brasileiro enxerga-se muito pouco a esperana de que a fora dos atores
sociais possa funcionar como motor da atualizao constitucional.
Conseqentemente, a certeza de que dos rgos do Estado depende
a aferio da fora da Constituio Federal de 1988 conduziu a maior
parte da produo constitucionalista a legitimar a judicializao da
poltica. [...] No Brasil de hoje, o constitucionalismo que defende o
ativismo judicial e v nele a redeno de nossos pecados no realizadores da efetivao constitucional possui uma tradio liberal, cuja
origem moderna muito herda da tradio americana de common law.25
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Igualmente, ratifica a tese da soberania do Poder Legislativo numa democracia, outro terico da tradio clssica, Immanuel Kant, na sua Metafsica
dos Costumes, ao ponderar que:
Todo Estado encerra trs poderes dentro de si, isto , a vontade unida
consiste de trs pessoas (trias polticas): o poder soberano (soberania),
na pessoa do legislador; o poder executivo, na pessoa do governante
(em consonncia com a lei) e o poder judicirio, (para outorgar a cada
um o que seu de acordo com a lei), na pessoa do juiz.35
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Efetivamente, no h como sustentar a idia de que os tribunais constitucionais, entenda-se, no Brasil, Supremo Tribunal Federal, sendo antimajoritrios, ou seja, controlando as decises (leis, atos) das maiorias transitrias
no Parlamento, estejam, ao agir assim, corrigindo os abusos eventuais dessas
maiorias e protegendo, necessariamente, os direitos e liberdades fundamentais
dos indivduos plasmados no Texto Constitucional. Isso em virtude da impossibilidade talvez de se demonstrar concretamente que a atividade da justia
constitucional mais positiva do que negativa para a proteo e efetivao dos
direitos fundamentais, e por que no dizer da prpria democracia.
Tanto isso assim que reconhecido inclusive por um dos tericos do
liberalismo contemporneo, Robert Dahl, para quem no se pode comprovar
empiricamente a capacidade efetiva de bloqueio das decises majoritrias pela
Suprema Corte americana, mas apenas a sua capacidade de retardar mudanas.49
E a experincia histrica confirma, de alguma maneira, esta observao.
que, de fato, h inmeros exemplos na jurisprudncia americana (EUA) de
que a atuao da Suprema Corte, no lugar de favorecer os direitos do indivduo,
prejudicou-os, na medida em que, por intermdio do controle judicial, anulou,
por inconstitucionalidade, vrias leis aprovadas pelo Parlamento que protegiam
direitos fundamentais.50
Anota Samuel Freeman que a Suprema Corte americana, durante parcela
significativa de sua existncia [...] tendeu, contra as tentativas de reformas
legislativas, a consagrar constitucionalmente as leis, as convenes e os privilgios vigentes relativos propriedade privada que favoreciam especialmente
aqueles que controlavam legalmente a massa maior de riqueza.51 Assim, a
referida Corte [...] impugnou leis estaduais que, de sua perspectiva, ofendiam
o direito de propriedade e a liberdade contratual 52, assim como leis federais
que infringiam a competncia dos Estados.
A ttulo ilustrativo, pode-se mencionar a invalidao, pela Corte Suprema, de lei do Congresso que dificultava o trabalho infantil (crianas menores
de 14 anos) nas indstrias e minas, por considerar tal matria de competncia
exclusiva estadual.53
Igualmente, tem-se o caso Dred Scott versus. Sandford, em que a Suprema
Corte dos Estados Unidos declarou, em 185754, a inconstitucionalidade de uma
lei federal que proibia a escravido em determinados Estados, sob a fundamentao de que o Congresso no tinha competncia para proibi-la. Desta forma,
retirou do Congresso norte-americano conseqentemente, da deciso da
maioria qualquer possibilidade de abolir ou, ao menos, enfraquecer a instituio
da escravido.55 Ademais, assentou a deciso que Dred Scott, por ser escravo,
no ostentava a condio (direitos e privilgios) de cidado, de tal forma que
no tinha o direito de se fazer representar perante os tribunais federais. 56
Acresa-se, ainda, o caso Lochner versus New York, em que a Suprema Corte declarou inconstitucional lei que estabelecia o tempo de trabalho
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culta que essa deciso possa ser. Este um ponto que tem que ser
pensado: no podemos achar que as solues sero alcanadas pelo
Judicirio, limitando o Direito Constitucional s decises judiciais.
No ser deixando que o tribunal resolva, j que o Executivo no
quis, ou o Legislativo no quis, que eu acredito que ns vamos
resolver ou refletir melhor sobre as questes constitucionais.83
4 CONCLUSO
A ttulo conclusivo possvel fincar a idia de que o fundamento ideolgico da jurisdio constitucional a filosofia poltica do liberalismo. De fato,
tem-se que a tradio liberal, ao defender a separao dos poderes e direitos
individuais, necessitava de um rgo do Estado para fazer frente aos riscos,
porventura advindos de um Parlamento fortemente influenciado pela vontade
popular, para os bens jurdicos por excelncia dessa corrente de pensamento: a
propriedade privada e a liberdade individual.
Assim, pode-se sustentar a tese de que o controle da poltica pelo Judicirio apresenta uma racionalidade evidente, qual seja, domesticar judicialmente a
vontade soberana do povo possivelmente plasmada no Legislativo, restringindo
e controlando o espao da poltica, a fim de levar segurana e certeza jurdicas
para as relaes dominantes, de tal sorte a no submeter a perigo os direitos de
liberdade e propriedades individuais em face das denominadas maiorias parlamentares eventuais e momentneas.
Destaque-se tambm que o controle jurisdicional de constitucionalidade
do comportamento do Parlamento, alm de exorbitante dos limites constitucionais, no se compatibiliza com o princpio da teoria da democracia de matriz
radical, fundada na soberania popular, na qual a vontade do povo, direta ou
indiretamente, superior vontade dos outros poderes.
Assim sendo, quando o Judicirio atua sobre o Legislativo, restringindo-lhes os poderes e invalidando-lhes os atos e deliberaes, tal comportamento
implica vilipndio da soberania popular, uma vez que a vontade ou deciso
poltica do povo passa a ser controlada ou anulada por um rgo sem qualquer
legitimidade e responsabilidade popular. E tal estado de coisas provoca uma
perda democrtica, pela diminuio ou restrio do espao poltico de participao do povo ou pelos resultados das decises dos juzes, que podem, como a
histria jurisprudencial de qualquer pas parece provar, atentar contra os direitos
e garantias da pessoa humana positivados constitucionalmente.
Noutras palavras, o controle jurisdicional evidentemente antidemocrtico, uma vez que constitui fenmeno no qual um Poder do Estado no eleito
diretamente e sem controle peridico de responsabilidade poltica o Judicirio - passa a controlar, restringir, anular a vontade do rgo por excelncia da
representao popular: o Parlamento. Portanto, reveste-se de menos legitimi130
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dade democrtica uma deciso poltica tomada pelo Judicirio do que oriunda
do Parlamento, eis que aquele no se encontra autorizado, constitucional e
politicamente, para decidir matrias polticas.
REFERNCIAS
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Professor de Direito Constitucional, Teoria Geral do Estado e Cincia Poltica da Faculdade Christus.
Professor do Curso de Direito da Universidade de Fortaleza (Unifor). Mestre e Doutorando em Direito
Constitucional (Unifor).
Apud Martonio MontAlverne Barreto Lima. Smula vinculante e constituio dirigente: uma questo
de soberania. In: OLIVEIRA NETO, Francisco Jos Rodrigues de [et. al] (org.). Constituio e estado
social: os obstculos concretizao da constituio. So Paulo: RT; Coimbra: Coimbra, 2008. p. 286.
As produes tericas sobre controle de constitucionalidade no Brasil bem demonstram uma preocupao exclusiva com pontos que envolvem (...) somente a articulao jurdico-dogmtica (...) entre os
dispositivos constitucionais para o resultado daquilo que constitucional ou inconstitucional (LIMA,
Martonio MontAlverne Barreto: A jurisdio constitucional: um problema da teoria da democracia poltica. In: SOUZA NETO, Cludio Pereira da; BERCOVICI, Gilberto; MORAES FILHO, Jos Filomeno
de. Teoria da Constituio: estudos sobre o lugar da Poltica no Direito Constitucional, Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2003, p. 200-201, nota de rodap n. 03.).
Jos de Sousa e Brito diz ser um dos possveis fundamentos da legitimidade do Tribunal Constitucional
a tradio liberal de proteo dos direitos do Homem. BRITO, Jos de Sousa apud TAVARES, Andr
Ramos. Tribunal e jurisdio constitucional. So Paulo: Celso Bastos editor, 1998. p. 73.
Emprega-se neste texto o termo liberalismo no significado poltico moderno, isto , na acepo de Estado
(de direito) com poderes e funes limitadas, em contraposio ao Estado absoluto. Ver: BOBBIO, Norberto. In: NOGUEIRA, Marco Aurlio (Trad.). Liberalismo e democracia. 3. ed. So Paulo: Brasiliense,
1990, p. 08, 17 e 29.
MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituio. Rio de Janeiro: Forense, p. 47, 2003.
As diversas funes do Estado, inicialmente descritas por Aristteles, tiveram sistematizao terica
mais sofisticada e desenvolvida em John Locke e, mais ainda, em Montesquieu. Esses autores clssicos
do liberalismo poltico partiram da premissa de que haveria necessidade de repartio das funes entre
rgos estatais diversos a fim de evitar-se a concentrao abusiva do poder e, por conseguinte, garantir
a liberdade individual.
Para Jorge Miranda, Estado absoluto aquele em que se opera a mxima concentrao do poder no rei
(sozinho ou com seus ministros) e em que, portanto: 1) a vontade do rei (mas sob forma determinadas)
lei; 2) as regras jurdicas definidoras do poder so exguas, vagas, parcelares e quase todas no reduzidas
a escrito. MIRANDA, op. cit., 2003. p. 42.
BERCOVICI, Gilberto. A constituio dirigente e a crise da teoria da constituio. In: SOUZA NETO,
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Claudio Pereira de; MORAES FILHO, Jose Filomeno de; LIMA, Martonio Mont`Alverne Barreto. Teoria
da Constituio: estudos sobre o lugar da poltica no direito constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2003. p. 79. Segundo Fioravanti, no havia na Europa do incio do sculo XX nenhuma Constituio
Democrtica. FIORAVANTI apud CAMPOS, Srgio Pompeu de Freitas, op. cit., 2007. p. 33.
VIEIRA, Oscar Vilhena. A constituio e sua reserva de justia: um ensaio sobre os limites materiais
ao poder de reforma. So Paulo: Malheiros, 1999. p. 43. No mesmo sentido, Cludio Pereira de Souza
Neto: No poucas vezes, tanto no mundo dos fatos quanto no plano terico, a soberania popular foi vista
como uma ameaa liberdade individual. SOUZA NETO, Cludio Pereira de. Teoria constitucional e
democracia deliberativa: um estudo sobre o papel do direito na garantia das condies para a cooperao
na deliberao democrtica. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 19.
A histria da tradio liberal, anota Domenico Losurdo, confunde-se, de certa forma, com a restrio
ao sufrgio universal por meio de discriminaes censitrias, pelas quais as pessoas eram excludas da
cidadania em razo da raa, honra, sexo, quantidade de bens, nvel de escolaridade etc. LOSURDO,
Domenico. In: HENRIQUE, Luiz Srgio (Trad.). Democracia e bonapartismo: triunfo e decadncia do
sufrgio universal. Rio de Janeiro: UFRJ/UNESP, 2004, p. 15-60. Particularmente o captulo I, denominado
A luta pelo sufrgio: uma histria atormentada e ainda no concluda.
Segundo Roy C. Magridis, o ncleo do liberalismo econmico o direito de propriedade, o direito de
herana, o direito de acumular riqueza e capital, a liberdade de produzir, de comprar e de vender. MAGRIDIS, Roy C. apud WOLKMER, Antonio Carlos. Ideologia, Estado e Direito. Revista dos Tribunais,
2003. p. 122.
LOSURDO, 2004, op. cit., p. 117.
Renato Stanziola Vieira assevera que o constitucionalismo trouxe o primeiro argumento favorvel
jurisdio constitucional (Jurisdio constitucional e os limites de sua legitimidade democrtica.
Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 48). Gustavo Binenbojm lembra que um dos formuladores da idia
de jurisdio constitucional foi o idelogo da burguesia Emmanuel Joseph Sieys, para quem caberia a
um tribunal conter os excessos cometidos por maiorias legislativas irresponsveis, cuja vontade no se
poderia sobrepor vontade superior do povo expressa na Constituio (BINENBOJM, Gustavo: A nova
jurisdio constitucional brasileira: legitimidade democrtica e instrumentos de realizao. 2. ed., Rio
de Janeiro: Renovar, 2004. p. 24).
Nesse sentido, confira: LIMA, Martonio MontAlverne Barreto. A jurisdio constitucional: um problema da teoria da democracia poltica. In: SOUZA NETO, Cludio Pereira da; BERCOVICI, Gilberto;
MORAES FILHO, Jos Filomeno de; LIMA, Martonio MontAlverne Barreto. Teoria da Constituio:
estudos sobre o lugar da Poltica no Direito Constitucional, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 229:
A jurisdio constitucional funcionando como a instncia moderadora dos eventuais abusos do poder
legislativo e de sua maioria parlamentar assegurava a estabilidade desejada pelos liberais. Alm da teoria
liberal para justificar o controle de constitucionalidade pelo Judicirio ou cortes constitucionais, h o
argumento procedimentalista e a doutrina substancialista. Na tese procedimentalista, a atribuio do
Judicirio para anular as decises do Parlamento explica-se pela necessidade de garantir as condies ou
regras procedimentais do processo democrtico, atuando estritamente apenas como rbitro da tomada de
deciso poltica. J na tese substancialista, a legitimidade do Judicirio decorre da necessidade de proteo
dos princpios e valores fundamentais, inclusive dos valores morais, em face da vontade legislativa das
maiorias polticas eventuais. Na corrente procedimentalista, alinha-se o nome de John Hart Ely, e, no grupo
substancialista, Ronald Dworkin. Sobre o assunto, ver: STAMATO, Bianca. Jurisdio constitucional.
Rio de Janeiro: Lumen Jris, 2005. p. 103-104 e 159-161; TAVARES, Andr Ramos. Jurisdio constitucional. In: DIMOULIS, Dimitri (Coord.). Jurisdio constitucional. Dicionrio brasileiro de direito
constitucional. So Paulo: Saraiva, 2007. p. 205. Para uma viso ampliada dos argumentos favorveis
jurisdio constitucional, confira: SAMPAIO, Jos Adrcio Leite Sampaio, op. cit., 2002. p. 60-101;
LEAL, Mnia Clarissa Hennig. Jurisdio constitucional aberta: reflexes sobre a legitimidade e os limites
da jurisdio constitucional na ordem democrtica uma abordagem a partir das teorias constitucionais
alem e norte-americana. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 02.
BALEEIRO, Aliomar O Supremo Tribunal Federal, esse outro desconhecido. Rio de Janeiro: Forense,
1968. p. 31 e 35. Nesse diapaso, acrescente-se a ponderao de Domenico Losurdo: [...] nos Estados
Unidos, a Corte Suprema funciona na prtica como uma Terceira Cmara chamada a ser a guardi da
propriedade contra o poder do nmero; e justamente desta forma que ela, no sculo XIX, obstaculiza
fortemente o desenvolvimento da democracia, o associativismo sindical, o imposto de renda progressivo,
a proibio de trabalho infantil, etc.. LOSURDO, Domenico, op. cit., 2004. p. 25.
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16 Cludio Pereira de Souza Neto pondera: O argumento liberal sustenta que a funo da jurisdio
constitucional garantir a liberdade e os direitos das minorias contra as maiorias eventuais. Para esse
ponto de vista, o poder do Estado s legtimo quando exercido de maneira moderada, pelo que, se a
maioria atua imoderadamente, cabe a uma instituio politicamente neutra, como seria o caso das cortes
constitucionais, invalidar a sua ao. Esse argumento [...] enfatiza a proteo das liberdades no-polticas
[...] SOUZA NETO, Cludio Pereira de. Controle de constitucionalidade (legitimidade poltica). In:
TAVARES, op. cit., p. 90.
17 Aqui urge salientar diferena substancial entre o fundamento do controle de cons-
titucional nos Estados Unidos e na Frana. Veja-se que nos Estados Unidos o judicial
review tem como justificativa a desconfiana no Parlamento, j que este visto
como potencial ameaa aos direitos e liberdades individuais, de modo que compete
ao Poder Judicirio atuar ativamente para salvaguarda desses direitos. J na Frana,
a desconfiana d-se em relao ao Judicirio, j que os membros da magistratura
francesa sempre estiveram atrelados ao Antigo Regime, atuando na defesa e conservao intransigente dos direitos e privilgios dos agentes do regime absolutista.
Ver. LEAL, Mnia Clarissa Hennig, Jurisdio constitucional aberta: reflexes
sobre a legitimidade e os limites da jurisdio constitucional na ordem democrtica
uma abordagem a partir das teorias constitucionais alem e norte-americana. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 23, 25 e 27-28; ROCHA, Jos de Albuquerque.
Estudos sobre o Poder Judicirio. So Paulo: Malheiros, 1995. p. 93; HORTA, Raul
Machado. Direito constitucional. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. p. 176. A
esse respeito, observa Mnica Clarissa Hennig Leal: se a desconfiana com relao
aos juzes levou, na Frana, radicalidade do controle de constitucionalidade onde
o mesmo feito em carter preventivo, por um tribunal de natureza poltica essa
mesma desconfiana levou, em outro nvel, excluso dos juzes ordinrios na maioria
dos pases da Europa, atravs do estabelecimento de Tribunais Constitucionais que
se localizam fora da estrutura do Poder Judicirio. LEAL, Mnica Clarissa Hennig,
op. cit., 2007. p. 46.
18 WALDRON, Jeremy. In: BORGES, Lus Carlos (Trad.). A dignidade da legislao. So Paulo: Martins
Fontes, 2003. p. 02.
19 Ibid., 2003. p. 05.
20 CANOTILHO, Jos Joaquim Gomes. Direito constitucional. 6. ed. Coimbra: Livraria Almeida, 1993.
p. 1111.
21 Ibid., 1993. p. 1111.
22 Nesse sentido a idia de Jos Herval Sampaio Jnior, para quem a judicializao da poltica uma
conseqncia lgica e natural da nova concepo de jurisdio no Estado Constitucional Democrtico
de Direito, segundo a qual o ativismo judicial seria indispensvel para proteo e efetividade dos direitos
fundamentais da pessoa humana. SAMPAIO JNIOR, Jos Herval. Nova concepo de jurisdio.
Fortaleza: Unifor, 2007. p. 136. Dissertao de Mestrado. No Brasil, um dos principais trabalhos sobre a
judicializao da poltica decorre de pesquisa realizada por Luiz Werneck Vianna, Maria Alice Rezende
de Carvalho, Manuel Palacios Cunha Melo e Marcelo Baumann Burgos, intitulado de A judicializao
da poltica e das relaes sociais no Brasil. Nesse trabalho, a judicializao do espao poltico vista
como importante meio de democratizao do Estado brasileiro, eis que o Judicirio seria agente essencial
da proteo e concretizao dos direitos constitucionais fundamentais. Ver: VIANNA, Luiz Werneck et
al. A judicializao da poltica e das relaes sociais no Brasil. Rio de Janeiro: Revan, 1999.
23 Cludio Pereira de Souza Neto anota que a teoria constitucional brasileira, embora ecltica, se caracteriza pela
considervel predominncia do argumento liberal para legitimar o controle judicial de constitucionalidade.
SOUZA NETO, Cludio Pereira de. Controle de constitucionalidade (legitimidade poltica). In: DIMOULIS,
Dimitri (Coord.). Dicionrio brasileiro de direito constitucional. So Paulo: Saraiva, 2007, p. 90.
24 WOLKMER, Antnio Carlos. A origem liberal-conservadora do constitucionalismo brasileiro. Revista
de Informao Legislativa, Braslia, ano 22, n. 87, p. 167-174, jun./set. 1985. p. 174.
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So Paulo: Companhia das Letras, 2006. p. 638. Destaque-se que se, na vertente
liberal, a garantia da liberdade requer a separao e limitao dos poderes, na matriz democrtica, o meio ideal para assegurar a liberdade e os direitos do indivduo
o exerccio do poder diretamente pelo povo, isto , o autogoverno democrtico
por intermdio da soberania popular. Ver: MIRANDA, 2003, op. cit., 2003. p. 98.
STAMATO, 2005, op. cit., p. 26. nota n. 08. Anote-se que grande parte dos tericos da Cincia Poltica e Jurdica enxerga um dilema fundamental na relao entre
democracia como questo poltica, relacionada vontade soberana da maioria -,
e constitucionalismo, como questo jurdica, atinente a direitos. A despeito disso,
assevera Martonio MontAlvere Barreto Lima que as decises polticas no significam a superposio do poltico frente ao Direito, uma vez que isso se traduziria
numa inverso do Estado Democrtico de Direito. LIMA. Martonio MontAlverne
Barreto. Jurisdio constitucional: um problema da teoria poltica da democracia. In:
SOUZA NETO, Cludio Pereira da; MORAES FILHO, Jos Filomeno de. Teoria
da Constituio: estudos sobre o lugar da poltica no direito constitucional. Rio de
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34 ROUSSEAU, Jean-Jacques. In: DANESI, Antonio de Pdua (Trad.). O contrato social: princpios do
direito poltico. So Paulo: Martins Fontescial Renovar,ireitocia deliberativa: um ltico, 2003. p. 107.
35 KANT, Immanuel. In: BINI, Edson (Trad.). A metafsica dos costumes. Srie Clssicos Edipro. Bauru
(SP): Edipro, 2003, p. 155.
36 BOBBIO, Norberto apud LIMA, Martonio MontAlverne Barreto. Judicializao da poltica e comisses
parlamentares de inqurito: um problema da teoria constitucional da democracia. Constitucionalizando
direitos: 15 anos da Constituio brasileira de 1988. Rio de Janeiro e So Paulo: Renovar, 2003. p. 222.
37 Anota Gilberto Bercovici: O constitucionalismo foi utilizado, de um lado, para contrapor-se ao contratualismo e idia de soberania popular idias chaves da Revoluo Francesa (...) (apud Renato Stanziola
Vieira: Jurisdio constitucional e os limites de sua legitimidade democrtica. Rio de Janeiro: Renovar,
2008. p. 48).
38 ELY, John apud FREEDMAN, Samuel. Democracia e controle jurdico da constitucionalidade. Lua Nova,
Revista de Cultura e Poltica, n. 32, 1994. p. 182.
39 Ressalte-se que o fato de os membros das cortes constitucionais, e, no caso brasileiro, do Supremo Tribunal
Federal, passarem pela apreciao do Parlamento, no desnatura a crtica de ilegitimidade democrtica da
jurisdio constitucional, visto que a escolha de seus integrantes, em ltima anlise, feita indiretamente,
isto , sem deliberao direta da sociedade por meio do voto popular.
40 BALEEIRO, Aliomar. O Supremo Tribunal Federal: Esse outro desconhecido. Rio de Janeiro: Forense,
1968. p. 44.
41 STAMATO, Bianca, op. cit., 2005. p. 96.
42 LIMA, Martonio Mont`Alverne Barreto. A constituio dirigente e a crise da teoria da constituio.
In: SOUZA NETO, Claudio Pereira de; BERCOVICI, Gilberto; MORAES FILHO, Jose Filomeno de;
LIMA, Martonio Mont`Alverne Barreto. Teoria da Constituio: estudos sobre o lugar da poltica
no direito constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 218. Acerca do carter conservador e
antidemocrtico do controle de constitucionalidade pela jurisdio constitucional, ver, por todos, Lima,
Martonio MontAlverne Barreto: Justia constitucional e democracia: perspectiva para o poder judicirio.
Revista da Procuradoria-Geral de Repblica, So Paulo: RT, jan./jun., n. 08, 1996. p. 81-101.
43 Ulisses pretende ouvir o canto irresistvel das sereias, que enlouquece os homens a ponto de eles se
jogarem ao mar. Ento ordena a seus comandados que tapem os ouvidos com cera e o amarrem ao mastro. Tomado pelo desejo ao ouvir o canto, ele grita desesperadamente para que o desamarrem, mas seus
companheiros no podem escut-lo (REPA, Luis Srgio. A crise da teoria crtica: razo instrumental e
declnio do indivduo. Revista Mente e Crebro. Especial: Mente, Crebro e Filosofia fundamentos
para a compreenso contempornea da psique, So Paulo: Ediouro, 7 ed., 2008, p. 21.).
44 REPA, Luis Srgio. A crise da teoria crtica: razo instrumental e declnio do indivduo. Revista Mente
e Crebro. Especial: Mente, Crebro e Filosofia: fundamentos para a compreenso contempornea da
psique, So Paulo: Ediouro, 7 ed., 2008, p. 21.
45 Daniel Sarmento apud Rodrigo Brando: As culturas liberal e democrtica de proteo dos direitos
individuais no constitucionalismo clssico. Revista de Informao Legislativa, Braslia, a. 44, n. 175,
jun./set., 2007. p. 257.
46 SOUZA NETO, 2007, op. cit., p. 90.
47 VIEIRA, Oscar Vilhena. A Constituio e sua reserva de justia: um ensaio sobre os limites materiais
ao poder de reforma. So Paulo: Malheiros, 1999. p. 19,20 e 227; STAMATO, Bianca, op. cit., 2005. p.
180.
48 CASTRO, Flvia de Almeida Viveiros de. O papel poltico do Poder Judicirio. Revista de Direito
Constitucional e Internacional, a. 11, n. 42, p. 167-180, jan./mar., 2003. p. 175.
49 VIEIRA, Oscar Vilhena. Imprio da lei ou da corte? Dossi, Revista da USP, n. 21, p. 70-77, mar./maio
1989. p. 73. nota n. 06.
50 Jos Albuquerque Rocha adverte que o judicirio viola tambm os direitos fundamentais quando de sua
interpretao, seja limitando-lhes o contedo normativo essencial, seja negando-lhes aplicao. Ento,
sendo as coisas assim, coloca-se a necessidade de proteger os direitos fundamentais contra as violaes
oriundas do judicirio. ROCHA, Jos Albuquerque. Estudos sobre o Poder Judicirio, So Paulo: Malheiros, 1995. p. 6.
51 FREEMAN, Samuel. Democracia e controle jurdico da constitucionalidade. Lua Nova, Revista de
Cultura Poltica, n32, p. 181-199, 1994.
52 MELO, Manuel Palcios Cunha. A suprema corte dos EUA e a judicializao da poltica: notas sobre um
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Traduo de Ricardo Rodrigues Gama. Campinas/SP: Russell, 2002. p. 213. Frise-se que, nada obstante
a jurisprudncia norte-americana haver modificado vrios entendimentos judiciais atentatrios aos
direitos fundamentais, no h razes para sustentar a tese da capacidade, permanente, do Judicirio de
autocorrigir os erros, como defende Leda Boechat Rodrigues. RODRIGUES, 1977, op. cit., p. 62-63 e
133-134. Para Domenico Losurdo Os mritos do liberalismo so importantes e evidentes demais para
que haja necessidade de atribuir-lhe outros, totalmente imaginrios. Faz parte desses ltimos a presumida
capacidade espontnea de auto-correo. LOSURDO, 2006, op. cit., p. 361.
STAMATO, 2005, op. cit., p. 156.
MENDES, Gilmar Ferreira. Prefcio obra de TAVARES, Andr Ramos. Jurisdio e tribunais constitucional. So Paulo: Celso Bastos editor, 1998, p. XIV.
GRIMM, Dieter apud MENDES, Gilmar Ferreira. Prefcio obra de TAVARES, Andr Ramos. Jurisdio
e tribunais constitucional. So Paulo: Celso Bastos editor, 1998, p. XIV.
BCKENFRDE, Ernst-Wolfgang apud LEAL, Mnia Clarissa Hennig, op. cit., 2007. p. 102.
LIMA, Martonio MontAlverne Barreto. A jurisdio constitucional: um problema da teoria da democracia poltica. In: SOUZA NETO, Cludio Pereira da; BERCOVICI, Gilberto; MORAES FILHO, Jos
Filomeno de; LIMA, Martonio MontAlverne Barreto. Teoria da Constituio: estudos sobre o lugar da
poltica no direito constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 239-240.
CAMPOS, Srgio Pompeu de Freitas. Separao de poderes na jurisprudncia do Supremo Tribunal
Federal. Porto Alegre: Sergio Fabris Editor, 2007. p. 242. Ingeborg Maus, ainda, observa: Quando a
justia ascende ela prpria a condio de mais alta instncia da sociedade passa a escapar de qualquer
mecanismo de controle social; controle ao qual normalmente se deve subordinar toda instituio do
Estado em uma forma de organizao poltico-democrtica. No domnio de uma justia que contrape
um direito superior, dotado de atributos morais, ao simples direito dos outros poderes do Estado e
sociedade notria a regresso a valores pr-democrticos de parmetros de integrao social. MAUS,
op. cit., p. 129.
Confira-se, por oportuno, transcrio de parte de artigo de autoria de Manoel Gonalves Ferreira Filho:
[...] o Judicirio goza de uma confiabilidade que os Poderes polticos Legislativo e Executivo perderam.
Estes so olhados com desconfiana pela opinio pblica, alimentada pelos meios de comunicao de
massa. A presuno de que os atos destes dois Poderes sejam legtimos e visem ao interesse geral mantm-se no plano jurdico-formal. Do ngulo da opinio pblica, no. So compostos de polticos e estes so
objeto de escrnio, pois, todos duvidam, trabalhem para o interesse geral. [...]. Este descrdito no colhe
o juiz. No fundo, este uma personalidade mais prxima dos bens pensantes que fazem a opinio pblica.
E mais aceitvel para essa burguesia esclarecida. formado em nvel superior, selecionado por meio de
concurso, adstrito independncia e imparcialidade, por isso entendem essa faixa da sociedade
melhor que a ele seja dada a deciso em matrias importantes como as grandes decises polticas do que
aos polticos vistos como ignorantes, corruptos, interesseiros, demaggicos [...]. FERREIRA FILHO,
Manoel Gonalves. O poder judicirio na Constituio de 1988: judicializao da poltica e politizao
da justia. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro: Renovar, v. 198, out./dez. 1994. p. 15-16.
So autores que comungam com esta viso preconceituosa do Poder Legislativo, entre outros, Luis
Roberto Barroso. BARROSO, Luis Roberto. Comisses parlamentares de inqurito: limite de sua competncia, sentido da expresso constitucional poderes de investigao prprios das autoridades judiciais e
inadmissibilidade de busca e apreenso sem mandado judicial. Boletim de Direito Administrativo, So
Paulo, ano 12, n. 12, dez. 1996. p. 807; TAVARES, Andr Ramos, op. cit., 1998. p. 62; BULOS, Uadi
Lammgo. Comisses parlamentares de inqurito: tcnica e prtica. So Paulo: Saraiva, 2001. p. 203;
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de segurana n. 21.689. Tribunal Pleno. Impetrante:
Fernando Affonso Collor de Mello. Impetrado: Senado Federal. Rel. Min. Carlos Velloso. Braslia, 16 de
dezembro de 1993. Impeachment: jurisprudncia. Braslia: Imprensa Nacional, 1996. p. 38. No plano
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internacional, tem-se, com entendimento similar, o autor Robert Alexy: O cotidiano da explorao
parlamentar contm o perigo que maiorias imponham-se desconsideradamente, emoes determinem o
ocorrer, dinheiro e relaes de poder dominem e simplesmente sejam cometidos erros graves. ALEXY,
Robert: Constitucionalismo discursivo. Traduo Lus Afonso Hech. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
2007, p. 54.
No tocante, especificamente, crtica do Judicirio em termos de que seria um poder mais apto para
decidir fundamentadamente os casos concretos, inclusive, melhor aferindo as decises advindas dos outros
Poderes do Estado, quer parecer a este autor que tal entendimento no passa de prepotncia e arrogncia
da magistratura togada, j que, assim procedendo, arroga para si o monoplio nico, exclusivo e final de
dizer o que certo ou errado, justo ou injusto, conveniente ou inconveniente, oportuno ou inoportuno,
no sistema jurdico brasileiro. Esta observao parafraseou, em certo sentido, o posicionamento esposado
por Guilherme de Souza Nucci, na sua tese de doutorado, na qual dissertou sobre a ilegitimidade dos
tribunais para anular as decises judiciais proferidas por jurados (juzes leigos) nos crimes de competncia
do Tribunal do Jri, uma vez que tal interferncia consistiria, para esse autor, em desrespeito instituio
do Jri e, por via de conseqncia, em violao da soberania (supremacia e independncia) dos vereditos
e da competncia constitucional do povo de julgar seus pares. Ver.: NUCCI, Guilherme de Souza. Jri:
princpios constitucionais. So Paulo: Juarez de Oliveira, 1999. p. 119 e 186, e outras.
Martonio MontAlverne Barreto Lima aduz que h, no Brasil, uma cultura da desconfiana e do preconceito contra a poltica e os polticos. Ver: LIMA, Martonio MontAlverne Barreto. A constitucionalizao
dos procedimentos parlamentares: Legislativo e Judicirio no jogo poltico democrtico. In: SOUZA NETO,
Cludio Pereira de; SARMENTO, Daniel (Coord.). A constitucionalizao do direito: fundamentos
tericos e aplicaes especiais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 652. Sobre o preconceito contra a
poltica, ver: ARENDT, Hannah. O que poltica?. Traduo de Reinaldo Guarany. 6. ed. Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 2006. p. 25-37.
No Brasil atual, constata-se um fato curioso: muitos intelectuais (jornalistas, juristas, formadores de
opinio em geral) dizem-se democratas e defensores da democracia, mas repetem lugares-comuns que
no condizem com a filosofia democrtica, tais como: todo poltico ladro; no Brasil no tem democracia, nepotismo no incompatvel com democracia, o povo no sabe votar. A esse respeito,
importante transcrever a advertncia de Carlos Alberto Libnio, o Frei Betto: Quando admitimos que
todos os partidos so farinhas do mesmo saco, fazemos o jogo dos corruptos, pois quem tem nojo de
poltica governado por quem no tem. Se todos se enojarem, ser o fim da democracia e da esperana
de que, no futuro, venha a predominar a poltica regida por fortes parmetros ticos (E Agora Jos.
Folha de So Paulo, 25. jul. 2005).
LIMA, Martonio MontAlverne Barreto. Judicializao da poltica e comisses parlamentares de
inqurito um problema da teoria constitucional da democracia. Constitucionalizando direitos: 15
anos daConstituio brasileira de 1988. Rio de Janeiro e So Paulo: Renovar, 2003. p. 237.
BERCOVICI, Gilberto. A constituio dirigente e a crise da teoria da constituio. In: SOUZA NETO,
Claudio Pereira de; BERCOVICI, Gilberto; MORAES FILHO, Jos Filomeno de; LIMA, Martonio
Mont`Alverne Barreto (Coord.). Teoria da Constituio: estudos sobre o lugar da poltica no direito
constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 125. Sobre a preservao da garantia das liberdades
constitucionais pelo Judicirio, interessante registrar o pensamento do ministro da Suprema Corte
Americana Robert Jackson, em conferncia na Universidade de Harvard: No sei de nenhum exemplo
moderno, em que qualquer Judicirio tenha salvo um povo inteiro das grandes correntes de intolerncia,
paixo, usurpao e tirania ameaadora da liberdade e das instituies livres. No constitui especulao
ociosa indagar a precedncia, no tempo ou em importncia, de um judicirio independente e ilustrado ou
de uma sociedade livre e tolerante. RODRIGUES, Leda Boechat. Direito e poltica. Os direitos humanos
no Brasil e Estados Unidos. Porto Alegre Coleo AJURIS/8, 1977. p. 95.
Roberto Gargarella apud Emerson Garcia. Jurisdio constitucional e legitimidade democrtica. Leituras
complementares de Constitucional controle de constitucionalidade. Salvador (BA): Podivm, 2007. p.
44. Nota de rodap n. 56.
WALDRON, Jeremy apud STAMATO, Bianca, op.cit., p. 157. Entende-se que os equvocos e arbitrariedades que se imputam comumente ao Parlamento apenas podem ser aferidos de forma legtima pela
prpria sociedade, jamais por autoridades no escolhidas pela vontade popular, como o so os membros
do Judicirio.
DICEY apud FERREIRA, Pinto. Curso de Direito Constitucional. 12. ed. So Paulo: Saraiva, 2002, p.
430.
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73 Notadamente no campo jurdico-poltico, no qual, havendo dvida sobre a possibilidade ou no de controle judicial dos atos do Legislativo, isto , se a questo ou no poltica, tal problema deve ser resolvido
a favor do Parlamento.
74 Tradicionalmente, os juzes formam uma corporao de esprito conservador. COMPARATO, Fbio
Konder, op. cit., 2006. p. 675. Corrobora tal assertiva, Lenio Luiz Streck: O Judicirio ainda possui um
alto grau de comprometimento com a manuteno do status quo [...]. STRECK, Lenio Luiz. Jurisdio
constitucional e hermenutica: uma nova crtica do direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002.
p. 126.
75 De fato, o Poder Judicirio brasileiro [...] sem dvida nenhuma o mais impenetrvel dos Poderes da
Repblica. SOUTO Paulo. Sntese do Relatrio da CPI sobre o Poder Judicirio. Relator Senador
Paulo Souto. Braslia: Senado Federal, 2000. p. 37.
76 A respeito dessa problemtica, confira-se a obra de CASTRO JNIOR, Osvaldo Agripino de. A democratizao do Poder Judicirio. Porto Alegre: Srgio Antonio Fabris editor, 1998. p. 120-121. Diz o autor
citado: O Judicirio brasileiro foi o primeiro a aderir ao malsinado golpe de 64, pior, o Poder Judicirio
absorveu boa parte da estrutura autoritria da ditadura. Ao contrrio dos Poderes Legislativo e Executivo
que, na chamada Nova Repblica se tornaram mais liberais, o Judicirio mantm estas estruturas at
hoje. Est fechado em si mesmo e acha que no pode ser fiscalizado pela sociedade brasileira. fiscal
de si mesmo. Os outros dois poderes buscam sua legitimidade na verdadeira origem do poder, o povo,
enquanto o Judicirio usa outra mecnica. E acrescenta o autor: o Poder Judicirio, o patrimonialista,
em decorrncia da cultura tradicionalista que ainda permeia a maior parte das suas atividades. CASTRO
JNIOR, Osvaldo Agripino de, op. cit., 1998. p. 124. Finalizando, arremata o precitado professor: A
crise do Judicirio que, no caso, decorre do exacerbado corporativismo que norteou as suas atividades,
principalmente no perodo militar, quando seus membros, com poucas excees, aplicaram os dispositivos legais sem que houvesse o menor questionamento sobre a origem da sua legitimidade disposta nos
textos constitucionais elaborados pelos juristas subservientes aos militares. Assim, grande parte destes
magistrados ainda faz parte da magistratura, gerando, ainda, uma cultura jurdica dogmtica e distante
das necessidades da sociedade civil [...]. Ibid., 1998. p. 139.
77 Jos Albuquerque Rocha adverte que o judicirio, justamente por sua origem no representativa, o
rgo menos indicado para o papel de intrprete da vontade do povo, consubstanciada na Constituio
e, por conseguinte, de censor do Legislativo. Efetivamente, inadmissvel que um rgo sem ligaes com
a vontade popular seja encarregado de traduzir, exprimir, compreender e dar significao a esta vontade.
Certamente, aqui, temos uma das explicaes para a no aplicao das regras consagradoras dos valores
democrticos e sociais da Constituio: a origem no democrtica do judicirio a transform-lo em uma
instituio distante do povo e prxima das elites. ROCHA, Jos Albuquerque, op. cit., 1995. p. 80.
78 LIMA, Martonio MontAlverne Barreto. A jurisdio constitucional: um problema da teoria da democracia poltica. In: SOUZA NETO, Cludio Pereira da; BERCOVICI, Gilberto; MORAES FILHO, Jos
Filomeno de; LIMA, Martonio MontAlverne Barreto. Teoria da Constituio: estudos sobrde o lugar
da Poltica no Direito Constitucional, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 206. Ver. MAUS, Ingeborg,
op. cit., 2000, p. 125-156.
79 VIANNA, Luiz Werneck et al. A judicializao da poltica e das relaes sociais no Brasil. Rio de
Janeiro: Revan, 1999, p. 24.
80 FISHER, Louis apud BERCOVICI, Gilberto. Constituio e poltica uma relao difcil, Revista Lua
Nova, n 61, p. 5-24, 2004. p. 21.
81 BERCOVICI, Gilberto. 2 Parte - Mesa Redonda (sntese) In: COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda
(Org.). Canotilho e a constituio dirigente. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 77.
82 Ibid., 2005. p. 77.
83 Ibid., 2005. p. 77.
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RESUMO
O presente estudo busca questionar a eficcia social, cultural
e cidad das polticas de ao afirmativa no Brasil, mais precisamente a prevista na Lei n 12.288, de 20 de julho de 2010, o
Estatuto da Igualdade Racial. A partir de uma anlise multidisciplinar, se h a possibilidade real de tais polticas fomentarem
a igualdade entre as etnias e corrigirem o erro histrico da
escravido e a discriminao em relao ao negro, bem como
o risco de promoverem a diviso da sociedade brasileira e perpetuarem prticas de racismo com a discriminao reversa de
grupos tradicionalmente oprimidos no pas, alm de limitarem
a cidadania cultural dos afrodescendentes com a manuteno
da tradicional mentalidade paternalista e assistencialista na
poltica brasileira.
Palavras-chave: Raa. Etnia. Discriminao. Igualdade. Cidadania.
INTRODUO
Entendendo o campo jurdico como causa e efeito das tenses sociais estabelecidas historicamente a partir de disputas polticas entre os diversos segmentos
sociais e tnicos nacionais, as tentativas de resoluo da problemtica racial, em
um pas marcado, h mais de trezentos anos, por escravismo, como o Brasil, vem
se refletindo na produo normativa desde o contexto imperial brasileiro. Apesar
de podermos citar vrias leis referentes ao comrcio de escravos e ao processo de
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Os versos de Castro Alves nos fazem um relato potico das agruras enfrentadas pelos aproximados cinco milhes de escravos negros que percorreram
o caminho da desgraa scio-cultural. Esse caminho, especificamente falando
do escravismo moderno, foi trilhado por traficantes de escravos entre a frica
e as Amricas durante mais de trezentos e cinquenta anos. Da colnia ao contexto da crise monrquica, a escravido estava largamente instalada no Brasil,
em que uma elite branca comandava os principais postos polticos e detinha os
privilgios sociais. Aps a Lei urea, o instituto jurdico da escravido acabou,
mas a mentalidade escravista se perpetuou. Conforme lies de Fernandes:
Como ex-agentes do trabalho escravo e do tipo de trabalho manual
livre que se praticava na sociedade de castas, o negro e o mulato
ingressaram nesse processo com desvantagens insuperveis. (...)
Percebe-se com facilidade como a degradao pela escravido, a
anomia social, a pauperizao e a integrao deficiente combinam-se entre si para engendrar um padro de isolamento econmico
e scio-cultural do negro e do mulato que aberrante em uma
sociedade competitiva, aberta e democrtica. (Destaque do autor)1
147
a realizar constantes presses ao longo do sculo XIX para que o Brasil acabasse
com a escravido negra.
Alm das razes econmicas, tambm foram feitas as proposies jusnaturalistas dos iluministas, para quem a escravido era contrria aos direitos
naturais do homem, posto que todos sejam livres e iguais perante a natureza.
Fundamentadas em tais proposies, as Declaraes Universais, entretanto, no
incluram os escravos como titulares de direitos. Os discursos humanitrios no
se convertiam em aes ou reconhecimentos expressos do direito ao trabalho,
como pagamento igual para o trabalho igual; do direito educao ou do direito
ao descanso, sem mencionar o direito ao voto. No contexto da independncia
brasileira, intelectuais do porte de Jos Bonifcio comearam a defender discursos
morais, econmicos e sociais contrrios ao escravismo.
medida que as relaes capitalistas avanavam no mundo e no Brasil, o
problema jurdico da escravido era encaminhado para seu fim. O ano de 1850
foi decisivo para a questo do comrcio de escravos, pois, com a Lei Eusbio de
Queiroz, que extinguiu o trfico internacional de escravos para o Brasil, o instituto jurdico facilitou o trfico interno, transferindo os escravos dos latifndios
decadentes do Nordeste para as lavouras do caf do Sudeste. As dcadas de
1870 e 1880 vieram a confirmar o que j se imaginava em meados do sculo: o
fim jurdico do instituto da escravido. No entanto, se for analisada a essncia
das leis abolicionistas, v-se que tais leis seguiam uma sbia lio sobre a lei
e a conservao do poder para uma classe, que diz:
So as suas criaes, meu tio: os grilhes e os bastes. O senhor
as criou h quatrocentos anos e as utiliza at hoje. O senhor
as criou. Mais isso no representa mais do que uma frao da
sua barbrie, meu tio. O senhor utilizou a rvore e a corda para
enforc-lo. Utilizou a faca para castr-lo enquanto ele lutava com
a corda para recuperar o alento. Utilizou o fogo para que ele se
contorcesse ainda mais, porque o enforcamento e a castrao
no eram divertimento suficiente. Depois o senhor utilizou outra
coisa uma das suas criaes essa coisa a que o senhor chama
de lei. Era escrita para o senhor e os de sua espcie, e todo o
homem que no era da sua espcie devia infringi-la mais cedo
ou mais tarde.3
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De acordo com os dados acima e o posicionamento da sociloga, perceptvel o crescimento acentuado do nmero de pessoas que se declaram como
negros exatamente no mesmo contexto em que as aes afirmativas comearam
a ganhar fora e a serem materializadas no pas a partir de normas. Seria isso
um avano na conscincia cultural dos negros ou, pelo contrrio, um meio
para as pessoas em geral, mesmo as que no possuem vnculos sentimentais ou
identitrios com o movimento negro, poderem se beneficiar de alguma forma
com as aes afirmativas?
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No negando a pluralidade cultural tupiniquim, como j foi visto anteriormente, afirma-se, com Magnoli, que o argumento multiculturalista que faz
referncia cor e aos sofrimentos passados da etnia negra como fundamento
para a promoo de polticas pblicas afirmativas concorrem, ao contrrio, para
perpetuao da ideia de racismo no pas. Para Magnoli,
Do ponto de vista terico, o multiculturalismo assenta-se sobre um
primeiro pressuposto que no dramaticamente distinto do artigo
de f do racismo cientfico. Esse pressuposto pode ser expresso
como noo de que a humanidade se divide em famlias discretas
e bem definidas, denominadas etnias. O racismo cientfico fazia
as suas famlias as raas derivarem da natureza. O multiculturalismo faz as etnias derivarem da cultura.10
Dependendo do interesse em questo, pode-se considerar tal argumentao eficaz ou ineficaz para responder aos questionamentos em torno da problemtica da desmarginalizao sociocultural do negro no Brasil contemporneo.
A resposta a tal problemtica, se que possvel encontr-la com preciso,
dever passar por mais estudos e debates pblicos na sociedade brasileira.
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CONCLUSO
A questo do combate aos problemas socioculturais dos povos afrodescendentes no Brasil to controvertida que ultrapassou os sculos e as transformaes polticas e sociais nacionais sem uma soluo minimamente eficaz. Depois
de abolida a escravido, a ausncia de dispositivos integrativos das populaes
negras em uma sociedade de classes como a brasileira gerou dificuldades socioculturais para tais populaes afrodescendentes e acabou por perpetuar o poder
de uma elite branca e racista. No entanto, tais problemticas no podem ser
tratadas com negligncia ou com ligaes a interesses momentneos de polticos, mas sim com as devidas precaues. Nesse sentido, devemos questionar
qual o impacto que um diploma normativo na contemporaneidade, afirmativo
de direitos, pode ter na construo da cidadania dos afrodescendentes, ou se
os legisladores, ao frisarem exclusivamente ou essencialmente o problema da
cor, reconhecem como real e necessrio um acerto de contas. Nesse sentido,
procura-se revisitar a temtica para desafiar a eficcia de uma poltica que, em
respeito s diferenas, no incorra na perpetuao da discriminao.
BIBLIOGRAFIA
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1 FERNANDES, Florestan. A integrao do negro na sociedade de classes. 3. ed. So Paulo: tica, 1978,
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2 MAGNOLI, Demtrio. Uma gota de sangue: histria do pensamento racial. So Paulo: Contexto,
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3 Gaines, 1996. apud: PAC, Robert. Estados Unidos: o sonho inacabado: A longa marcha dos afro-americanos. in: PERRAULT, Gilles (ORG.). O livro negro do capitalismo. 3. ed. Rio de Janeiro: Record,
2000, p. 345-346.
4 MAGNOLI, Demtrio. op. cit., p. 88.
5 FREYRE,Gilberto. Casa-grande & senzala: formao da famlia brasileira sob o regime da economia
patriarcal. 51. ed. So Paulo: Global, 2006. p. 367.
6 DUARTE, Alessandra. Censo 2010: populao do Brasil deixa de ser predominantemente branca. In:
O Globo poltica. Disponvel em: < http://oglobo.globo.com/politica/censo-2010-populacao-do-brasil-deixa-de-ser-predominantemente-branca-2789597#ixzz1L0J5Priu>. Acesso em: 31 mai 2011.
7 MAGNOLI, Demtrio. O pas dos impuros. In: Instituto Millenium. Disponvel em: <http://www.imil.
org.br/artigos/o-pais-dos-impuros/>. Acesso em 31 mai 2011.
8 MELLO, Celso Antnio Bandeira de. O contedo jurdico do princpio da igualdade. 3. ed. So Paulo:
Malheiros, 2011, p. 12.
9 CUNHA, Srgio Srvulo da. Princpios constitucionais. So Paulo: Saraiva, 2006. p. 129-129.
10 MAGNOLI, op. cit., p. 92.
11 NEDEL, Jos. A teoria da justia de John Rawls um esboo. In: FILHO, Agassiz Almeida. & BARROS,
Vincius Soares de Campos (orgs.). Novo manual de cincia poltica. So Paulo: Malheiros, 2008, p.
491-492.
155
RESUMO
O trabalho enfoca o papel do Juiz na busca incessante pela pacificao
social, escopo maior da Jurisdio, tutelando os direitos, por meio da
utilizao de meios alternativos de soluo de conflitos, mais precisamente a conciliao e mediao. Abordam-se as diferenas entre
tais institutos, enfatizando a pouca aplicabilidade de ambos, em que
pese a expressa previso legal da conciliao - o que no ocorre com
a mediao - principalmente pela autoridade judiciria. Prioriza-se a
necessidade de que os Juzes se conscientizem de que esses meios so
mais eficazes, devendo o Poder Judicirio se estruturar melhor com
esse objetivo, criando ambientes que propiciem a soluo consensual
dos litgios, despindo-se dos dogmas atuais que torneiam o tema.
Palavras-Chave: Pacificao Social. Tcnicas de Mediao e
Conciliao. Jurisdio Consensual.
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157
de forma que a pacificao social reste atingida.5 Essa premissa no vem sendo
sentida pelos operrios do direito6, o que pode ser amenizada com a insero
de todos os meios alternativos de soluo dos conflitos.
Acrescente-se, ainda, que essa preocupao constante com a pacificao
social efetiva, por meio de uma soluo consensual, resolve outro problema
grande da prestao jurisdicional, qual seja a morosidade infensa a todos os
procedimentos e que inquieta sobremaneira sociedade quanto atuao
judicial, pois o que interessa para algum que seja reconhecido como titular de
um dado direito, o pronto restabelecimento de forma especfica e a Justia
infelizmente no vem conseguindo e muitas vezes em razo da demora da entrega da prestao jurisdicional, esta no efetiva no sentido de satisfazer pelo
menos ao vencedor.7
Por todos esses motivos, no resta dvida alguma de que o prestgio a
jurisdio consensual no traz nenhum malefcio aos desgnios dessa funo to
cara a sociedade, devendo, por conseguinte, ser prestigiada em todos os sentidos,
como felizmente vislumbrou recentemente o Conselho Nacional de Justia, ao
lanar o dia nacional da conciliao e ao instituir um projeto de estruturao
de todo o Poder Judicirio para obteno de uma soluo amigvel entre os
litigantes judiciais, at mesmo antes de o processo formalmente ser instaurado.8
Pensar em uma atividade jurisdicional que no vise obrigatoriamente a
pacificao social tratar essa funo pblica com descaso, pois todo o agir das
autoridades em geral devem aspirar ao bem comum e este s atingido com
uma soluo efetivamente satisfatria para ambas as partes, mesmo que uma das
partes perca processualmente falando, mas que fique consciente de seus erros.
Destarte, quando se utiliza das formas de auto-composio, as partes
chegam a um consenso, ciente destes erros e infelizmente a sentena quase
nunca os transmite, substancialmente falando, principalmente por sua linguagem tcnica excessiva.
Nessa conjuntura, acredita-se que a Justia de um modo geral, ou seja,
todos aqueles que laboram com o direito e at mesmo os prprios litigantes
devem se imiscuir de um esprito de pacificao social, pois no se pode sempre
tratar o conflito como algo negativo, sendo imperioso a anlise de que, atravs
de um bom dilogo quase sempre se atinge uma boa soluo e principalmente
a satisfao dos que contendem cristalina.
2 MEIOS ALTERNATIVOS DE SOLUO DE CONFLITOS E SUAS
VANTAGENS
J ficou evidente pelas colocaes firmadas, que infelizmente a sentena
no vem conseguindo atingir a almejada pacificao social, indispensvel quando
do surgimento de um conflito, da porque se apresentam com esse desiderato
alguns meios alternativos, que primam pelo aspecto da democracia participativa,
158
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responsabilizando-se os prprios envolvidos pela soluo, j que se estes a encontram, essa premissa, por si s, j se alinha com o escopo de satisfao social.
Nesse contexto, interessa ao presente escrito a anlise dos meios de soluo dos conflitos - ditos democrticos em razo das prprias partes em disputa
resolverem as diferenas - o que se convencionou chamar de auto-composio
e na qual se depreende que, dentre eles, a conciliao e a mediao tem
oportuna possibilidade de direta aplicao na atividade dos Juzes, desde que
seja desconstruda a idia de adversariedade e surja em conseqncia a eficaz
cooperao entre os interessados.
Esse desafio no difcil de ser cumprido, pois as condies normativas
so amplamente favorveis, inclusive de nossa Carta Magna9, da porque o
que falta a conscientizao dessa eficcia quanto ao resultado harmonioso da
soluo e se comear a aplicar as tcnicas existentes na praxe forense, sem se
descurar evidentemente de sua posio diretiva, contudo, esta no inviabiliza
a adoo dessa nova postura.
A negociao por excelncia a forma mais conhecida de soluo dos
conflitos onde as prprias partes, sem qualquer tipo de interferncia de uma
terceira pessoa - da a sua distino com a conciliao e mediao resolvem o
seu litgio atravs de um acordo aps conversao das diferenas. Historicamente, o modo mais antigo de resoluo de desavenas e tem a ntida vantagem
de propiciar a continuidade do relacionamento entre os envolvido, pois sequer
foi necessrio um interventor.10
Por outro lado, percebe-se, claramente, a impossibilidade da utilizao
pelo Magistrado, em razo de que por esta via, mesmo que existente j um
processo, a iniciativa e efetiva soluo dos prprios envolvidos, logo, o que
pode ser feito pelo Juiz uma instigao a que as partes se sentem numa mesa
de negociao para chegarem a um consenso.
J a conciliao a maneira clssica de soluo amigvel dos litgios
quando j existe um processo ou at mesmo antes dele, principalmente pelas
propostas j enunciadas do Conselho Nacional de Justia, onde um terceiro,
que pode ser o Juiz essa a idia principal formule uma resoluo que seja
aceita pelas partes, atravs de propostas das mesmas, ou tambm por sugesto
do terceiro, sendo bastante prestigiada na legislao, inclusive penal.
Essa forma de soluo vem sendo largamente aplicada e com muito sucesso no que tange pacificao social e rpida resoluo, devendo, por isso,
ser mais bem estudada para que se crie a almejada cultura de consensualizao
dos litgios como prioridade.
A mediao, por sua vez, no se preocupa to-somente com a resoluo
do conflito posto em evidncia e a sua caracterstica principal consiste de que
a participao do terceiro, que tambm pode ser o Juiz, estimuladora para que
os interessados encontrem a melhor soluo, prestigiando a continuidade do
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soluo encontrada pelos mesmos deles, o que informa uma maior participao,
ressaltando-se, destarte, que esse modo ainda mais democrtico.
Tambm de se apontar que como os interessados so estimulados a
dialogar e tentar entender o lado do outro, a soluo, quase sempre, prima
no s pela resoluo em especfico do litgio, mas com a continuidade do
relacionamento.14
A par dessas primeiras ponderaes de distino, j se verifica que os dois
modos devem ser utilizados de acordo com o objeto da lide, pois se no h um
relacionamento anterior entre os envolvidos, como por exemplo, um acidente
de trnsito entre desconhecidos, a conciliao parece ser o meio mais eficaz
e at mesmo, dependendo do modo de conduo e tcnicas usadas, pode se
estimular uma amizade.
Noutro quadrante, se a lide trata de um conflito interpessoal entre pessoas
ligadas por um sentimento e que acaba envolvendo uma relao patrimonial, a
mediao se afigura como o instrumento mais eficaz, j que a viso do mediador
no dever ser somente solucionar aquele problema, porm, permitir que os
litigantes possam, entendendo suas diferenas, manter uma relao, no mnimo,
amistosa, atingindo, com mais sucesso, a pacificao social.
Desta forma, analisando com essa viso mais acurada, pode-se depreender facilmente que esses modos de compor um conflito tanto pode ser utilizado
se j houver um processo, pelo Juiz ou seu auxiliar, ou at mesmo antes de se
instaurar um processo, o que se afigura ainda mais benfico, ressalvando, que
se por acaso, dentro de um processo judicial se tentar a soluo, por um desses
meios, deve se despir daquela idia de adversariedade, prestigiando sempre a
cooperao e o dilogo.
Nesse diapaso, ainda se pode ressaltar como distino entre os dois modos, que a conciliao prevista expressamente na legislao processual civil,
trabalhista e at mesmo penal em alguns casos, pois como o Poder Pblico de
algum modo interfere no mrito, contudo, sem decidir, parece que esse meio fora
priorizado, o que no se entende cientificamente falando, j que na mediao,
apesar de no haver essa interferncia, o trabalho e at mesmo importncia da
figura do mediador bem mais relevante do que a do conciliador, conforme
ser percebido quando do estudo das tcnicas.
A mediao tambm previne com muita mais eficcia a possibilidade de
novos conflitos, j que a conversao priorizada e a deciso das prprias
partes, logo, a dificuldade para no haver seu cumprimento bem menor do que
na conciliao, at mesmo, pela natureza das causas que a ela so submetidas.
Ressalve-se, por ser esse o objetivo desse artigo, que tanto a conciliao
como a mediao quanto ao cumprimento do acordado, so mais eficazes, nesse
quadrante, do que as decises jurisdicionais, o que deve ser levado em considerao em razo do movimento de algum tempo pela efetividade do processo.
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resultados positivos para se atingir a pacificao social, de que os Juzes conheam as tcnicas de conciliao e mediao que os orientaro para um bom
desempenho dessa atividade.
Em que pese os estudiosos no se referirem a esse primeiro elemento como
tcnica, entende-se pertinente que para ambos os institutos, deve a autoridade
judiciria ou seus auxiliares se preocuparem em criar um ambiente para a soluo
amigvel, de modo que aquela postura e indicaes de adversariedade sejam
esquecidas e os envolvidos se sintam bem a vontade para dialogar, quebrando
os protocolos formais que acabam os intimidando, para tanto, devem se despir
daquele sentimento de superioridade e tentar conversar de igual para igual.
Nesse sentido, ainda se deve pensar que o espao fsico seja agradvel e
que a posio de um em frente ao outro pode inibir o acordo, logo, o ideal que
todos fiquem sentados em crculo como se estivessem conversando normalmente,
sem aquele ar de litgio, muito comum nas salas de audincia dos fruns. No
est se dizendo que deve necessariamente se criar uma sala em especfico para
esses dilogos, mas, na medida do possvel, mudar o ambiente tradicional j vai
ser um grande passo.18
Desta forma, faz-se necessrio que o Poder Judicirio adapte-se a essa nova
realidade, que como dito, no tem qualquer elemento de excluso quanto aos
procedimentos j existentes na Justia, motivo pelo qual os Juizes, antes mesmo
das tcnicas, precisam saber de modo cristalino seus desafios na conciliao e
mediao, ficando claro que para a primeira, as coisas so mais simples, pelo
seu prprio objetivo e natureza dos conflitos que a envolvem, e essa distino,
no final das contas, vai fazer a diferena, no somente quanto s tcnicas, mas
principalmente pelo modo de conduo e objetivo final de cada instituto.
A conciliao tem uma vantagem sobre a mediao em termos legais para
fins de sua imediata aplicao, ou melhor, dizendo, completa observao, pois se
constitui como direito das partes de poderem conversar com o fim de se chegar
a um acordo, j que em todos os procedimentos judiciais deve o Juiz tent-la a
qualquer momento, afora as previses especficas nesse sentido - principalmente
a do procedimento considerado padro, o ordinrio - que na audincia preliminar
determina que se inicie com a conciliao, no sendo lgico que essa atividade
se subsuma a perguntar as partes se tem acordo. Pensar dessa maneira tratar
o processo como despresivo a dignidade da pessoa humana.
Entretanto, alguns desafios so bem claros, pelo menos quanto conciliao: primeiro, como se preparar tecnicamente quando voc no tem muito
tempo; segundo, como descobrir os verdadeiros interesses envolvidos no conflito
e saber o que realmente o outro lado quer; terceiro, como se posicionar diante
de um no - que to comum pelo menos no incio das conversaes -; quarto,
como criar uma opo que facilite a outra parte dizer sim, sem entrar no mrito
e de nenhum modo forar a parte; quinto, como gerar solues para se obter
ganho mtuo, dentre outros, que surgem em cada caso.
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Desta forma, parece que somente a utilizao correta das tcnicas conduzir a uma eficaz soluo e esses obstculos sero facilmente enfrentados e
transpostos. Os estudiosos do tema trazem inmeras tcnicas, muitas vezes,
distintas umas das outras, somente pela nomenclatura, as vezes com acrscimos
no vistos em uma tcnica, por conseguinte, criando outras, motivo pelo qual,
a experincia do subscritor comungada com essas idias o que se vislumbrar
nesse trabalho.
Quanto conciliao, podem-se enunciar as seguintes: primeiro, as
pessoas devem ser conscientizadas da importncia e o resultado prtico do ato
de conciliar, principalmente a satisfao social e o conseqente cumprimento
do acordado, para tanto, o Juiz deve conversar genericamente nesse sentido;
segundo, saber resumir as idias, de modo a destacar as convergncias, terceiro, ser bastante flexvel ao lidar com o nvel cultural das partes; quarto, dar o
direito de todos falarem, mas respeitando sempre que cada um fala, sem interrupo do outro; quinto, ter a mente aberta e receptiva para ouvir, sem que
seus juzos de valores, de algum modo, inibam as partes de se abrir, j que essa
escuta, chamada de ativa, tambm pode ser eficaz na conciliao, visto que na
mediao imprescindvel.
Sexto, a linguagem deve ser a mais simples possvel, evitando os juridiques; stimo, deve ter uma postura calma e serena, em que a sua autoridade
no se imponha pelo cargo e sim pelo modo de conduzir e se portar perante as
partes; oitavo, deve estudar previamente o caso antes do encontro, de modo
que conhecendo os anseios e resistncia, tenha melhores condies de propor
uma soluo; nono, na medida do possvel e sem exageros ou emisso de posio pessoal, destacar como a jurisprudncia e a lei tratam da situao em tese,
pois essa explicao esclarece muitos dos pontos controvertidos, que inclusive
devem ser fixados antes mesmo da tentativa de conciliao, evidentemente
sem preocupao tcnica, j que servir to-somente para subsidiar o ato consensual; dcimo, quando for o caso, com o mesmo escopo da anterior, enunciar
conciliaes anteriores sobre a mesma situao jurdica, sem contudo emitir
qualquer posio meritria, ou seja, tudo em tese.19
Ressalve-se, contudo, que essas so algumas das tcnicas e dependendo
da situao, outras especficas devem ser implementadas em cada caso concreto,
contudo, o mais importante a conscientizao dos Juzes do uso dessas tcnicas
e o esprito de conciliao a qual deve reinar at o ltimo momento em que se
possa atingir o acordo.
Por fim, quanto conciliao e at mesmo j servindo para a mediao,
imperioso que se destaque o que o Juiz, no exerccio dessas funes consensuais,
no pode ser: confuso, indeciso, agressivo e emotivo, visto que tais situaes
emocionais deixam as partes instveis e descredibilizam atuao judicial, podendo gerar desconfiana e com isso, uma das partes ou todas, no quererem
sequer comear ou continuar o ato de tentativa da soluo amigvel.
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como uma peculariedade que marca todo esse procedimento e na qual, desde
j, se vislumbra que algumas das tcnicas de conciliao no podem ser usadas
pelo Mediador.
Antes de se tecer os comentrios sobre as tcnicas propriamente ditas,
torna-se imprescindvel que se fale sobre os princpios que a regem, bem assim
as fases desse procedimento, que pode ser judicial ou no, contudo, no se
pode ter qualquer tipo de formalidade. Quanto aos princpios, sbia a lio
de Fernando Horta:
A mediao pode ocorrer dentro de um processo judicial, ou fora
dele, aquela endoprocessual, esta, extra processual, e se caracteriza pela observncia dos seguintes princpios, assim resumidos:
- Voluntariedade: aceitao por livre iniciativa ou aceitao das
partes. Significa a disposio de cooperao para o objetivo da
mediao.- No adversariedade: no competio das partes, as
quais no objetivam ganhar ou perder, mas solucionar o problema.Interveno neutra de terceiros: terceira parte, catalisadora das
solues. Neutralidade:no interferncia no mrito das questes.
Imparcialidade: isto , ausncia de favoritismo ou preconceitos
com relao a palavras, aes ou aparncia, significando, por parte
do mediador, um compromisso de ajuda a todas as partes, por parte do mediador, um compromisso de ajuda a todas as partes e na
manuteno desta imparcialidade no levantamento de questes, ao
considerar temas como justia, equidade e viabilidade de opes
propostas para acordo. - Autoridade das partes: poder de deciso
sobre as questes em disputa, j que so elas as responsveis pelos
resultados e pelo prprio andamento do processo. Flexibilidade
do processo: a mediao no um processo rgido, uma vez que
no est restrita aplicao de normas genricas e pr-estabelecidas
e sua estruturao depende, basicamente, das partes e dos procedimentos por elas prprias escolhidas. Informalidade, que se caracteriza pela ausncia de estrutura e inexistncia de conformidade a
qualquer norma substantiva ou de procedimento. Privacidade:
a vontade das partes se manifesta de maneira autnoma, baseadas
em interesse privados, no mbito privado. Consensualidade, no
sentido de no haver uma deciso imposta s partes. Levase em
considerao o resultado de deliberao das partes e desta vontade
que extrair a sujeio ao acordo da surgido. Confidencialidade,
que um dos princpios norteadores da mediao. As informaes
so restritas ao mbito das partes e do interventor. Salvo restritas
eventualidades (por exemplo, os prprios sujeitos darem publicidade
ao processo ou s decises, visto que tem liberdade para tal), nada
pode ser utilizado em juzo ou ter publicidade. Negrito nosso. 22
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pontos de atrito, de forma que no se discuta o que j seja aceito pelos litigantes;
coordenar a discusso entre as partes mediadas, cooperando e ajudando a discutir
com respeito; ressaltar as convergncias e divergncias, sugerindo opes para o
superamento destas, contudo, no se pode propor a soluo, porque nesse caso
seria uma conciliao; Motivar a criatividade, na procura de solues.
Auxiliar as partes a descobrirem seus reais interesses, permitindo que
o acordo seja justo, eqitativo e duradouro, logo no h como pensar em desigualdade entre as partes; permitir a livre expresso emocional, motivo pelo
qual no deve o Juiz interferir na fala da parte, sem que seja um esclarecimento,
pois a sua principal funo ouvir, de forma ativa evidentemente; utilizar uma
escuta ativa para verificar a sinceridade das emoes; em alguns casos, utilizar
sesses privadas com apenas uma das partes, desde que tambm o outro tenha
o mesmo contato o que se chama de caucus 26;
importante no perder o controle da situao; tambm deve manter
a ordem mediante uma regra basilar: uma pessoa fala de cada vez; utilizar
parafraseamento: ouvir e repetir conceitos usando palavras diferentes; trabalhar uma questo de cada vez; conclamar as partes para expressarem seus
sentimentos com lealdade de forma que o conciliador possa sugerir uma opo
de soluo que atenda as partes; sugerir uma parada nas negociaes quando
o clima estiver tenso.27
Ressalve-se, que todas essas tcnicas - apesar de extremamente importantes no devem ser valorizadas, da mesma forma que as vezes se prestigiam as
formalidades, pois o fim maior deve ser sempre lembrado, qual seja, que as partes
consigam encontrar uma soluo de consenso que evidencie a continuidade do
relacionamento e a autodeterminao das mesmas, visto que esse instrumento
se perfectibiliza como um elemento concretizador da democracia.28
A par de todas essas colocaes sobre os princpios, tcnicas e at mesmo
fases ou etapas com relao mediao e conciliao as quais acabam se imbricando justamente por seus elementos comuns, vislumbra-se, de forma clarividente, que os Juzes, de um modo geral, mesmo naqueles casos em que envolvam
direitos indisponveis29, devem utilizar essas formas alternativas de soluo dos
conflitos, sem as suas tradicionais regras30, pois se assim ocorrer, pode-se afirmar,
que tal atitude vai ser igual a no tentativa de uma soluo amigvel.
5 LIMITES FORMAIS E MATERIAIS PARA O USO DA MEDIAO
E CONCILIAO PELOS JUZES
Como tudo na vida relativo, nada mais natural de que haja limitaes
nessa atividade dos magistrados, em que pese todas as vantagens desses institutos e suas informalidades, todavia, muitas situaes inviabilizam por completo,
tanto a conciliao quanto a mediao, no s pela natureza desses mtodos,
bem como a prpria essncia de algumas matrias dos conflitos e a prpria
estrutura do Poder Judicirio, logo, essa anlise torna-se imprescindvel, visto
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que em alguns casos a almejada pacificao social somente vai ser alcanada
por uma atuao mais firme e decisiva da Justia, que, como percebido, no se
coaduna com os institutos em exame.
Nesse sentido, nem sempre possvel que os Juzes se utilizem desses meios
alternativos de soluo dos conflitos, quer por limitao formal quer material.
Quanto ao primeiro aspecto, cedio que o ordenamento jurdico, em relao
a algumas matrias, no admite conciliao e muito menos mediao, como
por exemplo, a maioria esmagadora dos delitos penais.31
Quando ocorre tal tipo de ilcito, por mais que vtima e acusado tenham
chegado a um consenso quanto ao fato analisado na Justia, somente essa tem
competncia para solucionar esse caso, pois a sociedade se sente lesada e esse
bem jurdico protegido pela legislao, logo o acordo no vai, de um modo
geral, influir na atuao jurisdicional stricto sensu.32
Por outro lado, de se destacar que at mesmo em casos que outrora no
se admitia transao, como por exemplo, os direitos indisponveis33 e aqueles
que envolviam o Poder Pblico, para ser bem especfico, hodiernamente, j
se permitem que por acordo, se finde processos que tenham tais objetos, demonstrando, por conseguinte, que a Justia consensual vem ganhando espao
e quem sabe cada vez mais se amplie para atingir outros objetos, at mesmo
penal, evidentemente, em caso de reconhecimento pelo acusado da culpa e a
aplicao direta da pena privativa de liberdade.
Pode se pensar que hoje inimaginvel, mas possvel, pois a conscincia do malfeitor ser o elemento que justificar a pena, at mesmo sem o
devido processo legal, mas nunca como regra geral e sim exceo sob condicionantes rgidas.34
Quanto s limitaes materiais, pode-se enunciar, primeiramente, que
a boa-f a mais importante, pois como se admitir que os envolvidos possam
conciliar e principalmente se submeterem mediao se estiverem ocultando a
verdade ou at mesmo mentindo, como infelizmente muito comum na praxe
forense, logo, imprescindvel que essa cultura de litgio e suas amarras sejam
deixadas de lado quando as partes quiserem resolver os seus problemas pela
via consensual.35
Outra grande limitao para o desenrolar dessas atividades junto Justia diz respeito necessidade imanente de que as partes estejam em condies
de igualdade e para tanto a atividade do Juiz, utilizando-se do seu chamado
poder assistencial36, vital, pois em caso das partes no estarem nessa posio,
o dilogo, com certeza, vai ser infrutfero, podendo haver coaes ou por qualquer forma imposio, o que vai de confronto aos princpios que informam a
conciliao e mediao.
Destarte, somente o equilbrio entre as partes conduzir a um resultado
efetivo quanto pacificao social, visto que patente, ser a igualdade, uma
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No h como se fugir dessa realidade, pois a mediao judicial nos conflitos familiares, j foi inclusive privilegiada - pelo projeto de lei que tramita no
Congresso Nacional, tratando da mediao prvia e incidental com a previso
de que o Juiz dever contar com um co-mediador, que poder ser um psiclogo,
psiquiatra, terapeuta ou assistente social, dependendo do caso em especfico,
para auxiliar nesse processo de estmulo s partes na criao da melhor soluo.48
Em se tratando especificamente dos casos mais comuns de conflitos familiares, quais sejam os divrcios e separaes judiciais, a mediao se amolda como
uma luva, visto que nessas situaes as partes esto emocionalmente abaladas
e as angstias e decepes do relacionamento se apresentam bem evidentes,
sendo necessria a interveno de uma pessoa, preparada tecnicamente, que
propicie o restabelecimento da comunicao, na maioria das vezes, j se encontra interrompida, atravs de um dilogo, em p de igualdade, com o uso da
boa-f e pensamento firme na manuteno do relacionamento, principalmente
se houver filhos, que no podem ser prejudicados nessa ruptura, logo, o acordo
prioriza tais valores.49
Alm do mais, de se frisar que a jurisdio tradicional procura quase
sempre um culpado pelo rompimento da sociedade conjugal, quando a realidade demonstra que quase impossvel se imputar a somente um dos cnjuges a
culpa, j que na essncia todo relacionamento difcil, por si s, em razo das
diferenas de comportamento e a falta de compreenso.
Destarte, como na mediao, o dilogo a sua fora motriz, os envolvidos
passam a perceber que o mais importante no est no que ocorreu e sim no
presente e futuro do relacionamento, que apesar de no ser o escopo necessariamente a continuidade da relao amorosa, no mnimo, deve se buscar a
amizade, visto que quando existem filhos, a ruptura total inaceitvel.
Dentro dessas peculariedades dos conflitos familiares, principalmente
os que envolvem diretamente o casal e a possvel separao de fato, quando j
no presente tal fato, a mediao consegue adentrar no mago dos problemas,
priorizando o presente e futuro, mostrando s partes que o acordo obtido pelos
mesmos, responsabiliza-os de uma forma mais intensa para o constante cumprimento do acordado.
Por outro lado, propicia que o respeito prevalea acima de tudo, j que
um dia, os mediados estiveram juntos e formaram uma famlia, por conseguin174
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te, podem manter, pelo menos, uma relao amistosa que deixe de lado o que
aconteceu e passe a tratar o problema no como uma coisa ruim, mas na realidade uma inevitabilidade do destino, que no necessariamente traz somente
efeitos malficos.
Essa percepo pode facilmente ser obtida atravs das sesses de mediao, pois nesta, o comprometimento transferido para os prprios envolvidos,
com to-somente a intermediao de uma pessoa que no se encontra emocionada, logo, a soluo descurada das picuinhas infelizmente existentes quando
do rompimento, j que o desabafo em conjunto alivia em muito toda essa carga
emocional e quando esses sentimentos so deslocados, e a primazia passa a ser
outra, o acordo uma questo quase que automtica, eis que os mesmos percebem claramente que um terceiro no vai ter condies de decidir por eles.50
Nesse diapaso, a mediao familiar com certeza a melhor forma de se
compor os conflitos surgidos de qualquer tipo de relao familiar, justamente
porque, ao considerar todas as situaes emocionais, as diferenas existentes
entre os envolvidos, conseguem estimular naturalmente o acordo.
Destarte, o que o mediador familiar deve fazer, principalmente se for o Juiz,
compreender essas peculariedades e a partir delas, de modo imparcial e sem
expressar qualquer emoo, conduzir todo esse processo serenamente, at que os
prprios envolvidos encontrem a melhor soluo para o seu conflito em especfico.
7 CONCLUSES
A principal funo da atividade jurisdicional , sem sombra de dvidas,
a pacificao social e infelizmente esta no vem sendo alcanada pelas vias
tradicionais, logo, se faz necessria a utilizao de meios alternativos e os mais
democrticos possveis, para soluo dos conflitos, visto que os mesmos possuem
caractersticas que se afinam com a satisfao social, principalmente pela efetiva
participao dos prprios interessados.
Afora o fator de eficcia social do acordado pelas partes, as formas de
auto-composio tambm prestigiam a questo da celeridade e at mesmo efetividade, bem como, quando os acordos so realizados, evita-se perda de tempo
e economiza-se financeiramente, da porque, esses fatores devem ser levados em
considerao pelo Juiz a fim de que passem a utilizar tais meios, sem que haja
qualquer demrito atividade jurisdicional propriamente dita.
A conciliao e a mediao no podem ser compreendidas como institutos que iro excluir a atividade jurisdicional, pois na realidade, elas so
complementares, contudo, so mais eficazes em relao satisfao social dos
contendores, escopo maior do Direito e na qual h algum tempo a jurisdio
vem esquecendo pela supervalorizao do processo.
Na conciliao, o Juiz tem uma participao mais intensa em relao ao
resultado, pois pode propor solues que sero aceitas pelas partes. J na mediaREVISTA OPINIO JURDICA
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10
11
jurisdicional, em boa hora comearam a ser utilizadas solues do Direito norte-americano, conhecidas como
Alternative Dispute Resolution(ADR), quais sejam o Juzo Arbitral, a Conciliao e a Mediao. SALES, Llia
Maia de Morais; VASCONCELOS, Mnica Carvalho. Mediao Familiar: Um estudo histrico-social
das relaes de conflitos nas famlias contemporneas. Fortaleza: Expresso Grfica e Editora Ltda, 2006.,
Apresentao.
J se encontra no Congresso Nacional um projeto de lei sobre a mediao, atualmente no Senado Federal,
sob a relatoria de Pedro Simon, na qual se prev duas formas de mediao, a prvia e a incidental, ou
seja, dentro do processo, o que fortifica a tese de que suas tcnicas podem normalmente serem utilizadas
em todos os processos e procedimentos que prevem a conciliao, justamente porque no h qualquer
incompatibilidade, contudo, infelizmente tal projeto no prev que as partes necessariamente sentem
numa mesa de negociao, como requisito para admissibilidade da ao e consequentemente a espera da
sentena, como se esta fosse a salvadora do mundo, o que cedio que os juzes no podem ser tidos
como Deuses.
inquestionvel que o principal objetivo da jurisdio, o que lhe faz a essncia, seu carter de pacificao. Neste
sentido, muito mais salutar que se encontrem frmulas de consenso, para que a pretenso resistida chegue a bom
termo, atingindo-se o ideal de justia das partes. TAVARES, Fernando Horta. Mediao & Conciliao.
Belo Horizonte: Editora Mandamentos, 2002, p. 17.
Entende-se que esta expresso representa melhor essa nova atividade de efetiva proteo dos direitos e
na qual todos os que laboram com o direito no podem continuar sendo mecnicos frios da lei, da porque
o termo operrio, sem sombra de dvida, simboliza uma atuao mais ativa e ao mesmo tempo menos
ligada as formalidades que infelizmente ainda dominam o meio jurdico.
Em nosso livro Medidas Liminares no Processo Civil: Um novo enfoque, O ministro Jos Augusto Delgado
em seu prefcio atesta para a necessidade inadivel de uma pronta entrega da prestao jurisdicional,
bem assim chama a ateno para o fim harmonioso que o processo deve perseguir, consoante pode se v
a seguir: Os estudiosos do Direito Processual Civil esto convencidos de que tcnicas novas devem ser introduzidas na legislao brasileira formal para que sejam atendidas, com eficcia, segurana e efetividade, esse anseio
da cidadania. H de se gerenciar o processo de modo que instrumentos de ao alcancem esse objetivo, sem se
afastar do respeito ao princpio democrtico informador do devido processo legal. Urge que o Direito Processual
Civil consagre, do modo mais evidente e convencedor, o querer constitucional representativo do sentimento da
Nao, que o do Estado Brasileiro tornar vivo e constante o objetivo primordial posto em sua Carta Magna,
no seu prembulo, que a entrega da paz com a rpida soluo dos conflitos vivenciados pelo cidado em suas
relaes comuns e extraordinrias no ambiente social, familiar, financeiro, comercial, industrial e institucional.
Jos Luiz Carlos de Lima e Jos Herval Sampaio Jnior, Medidas Liminares no Processo Civil Um novo
enfoque, 1 Edio, Editora Atlas, 2005, pg. 14.
O movimento nacional pela Conciliao e os seus atos normativos podem ser consultados no site www.
cnj.gov.br, ao qual se acredita, que se por acaso essa poltica for posta em prtica, o que pelo menos j
se iniciou formalmente desde o ltimo dia 08 de dezembro de 2006, a Justia entrar em uma fase que a
esperana de uma pacificao social passa a ser um sonho bem possvel e real, j que os resultados desta
experincia so bem exitosos nesse sentido.
Ns, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assemblia Nacional Constituinte para instituir em Estado democrtico,
destinado a assegurar o exerccio dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurana, o bem-estar, o desenvolvimento,
a igualdade e a Justia como valores de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e
comprometida, na ordem interna e internacional, com a soluo pacfica das controvrsias, promulgamos, sob a proteo
de Deus, a seguinte Constituio da Repblica Federativa do Brasil Grifo nosso. Prembulo da Constituio Federal
de 1988.
Sem interveno de terceiros, as partes procuram resolver as questes, resolvendo disputas mediante discusses
que podem ser conduzidas pelas partes autonomamente, ou por representantes. Por isso, alguns autores, no a
consideram uma forma de soluo de conflitos propriamente dita. A negociao usada para qualquer tipo de
disputa e faz parte do dia-a-dia transacional. uma atividade constante entre advogados. um mtodo apropriado a ser utilizado quando as partes continuam a ter relaes comerciais, cotidianamente, ou quando possvel
soluo criativa, sendo certo que tal vnculo caracteriza-se pela confiana mtua e credibilidade entre as partes.
TAVARES, op. cit., p. 42.
Interessante de se ressaltar nesse contexto a posio dos processualistas constitucionais Antonio Carlos
de Arajo Cintra, Ada Pelegrini Grinover e Cndido Rangel Dinamarco em sua obra Teoria Geral do
Processo, que de maneira clara enfocam a vantagem dos meios alternativos, j os intitulando como de
pacificao social, merecendo, por conseguinte, ser transcrito: Abrem-se os olhos agora, todavia, para todas
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essas modalidades de solues no-jurisdicionais dos conflitos, tratadas como meios alternativos de pacificao
social.Vai ganhando corpo a conscincia de que, se o que importa pacificar, torna-se irrelevante que a pacificao
venha por obra do Estado ou por outros meios, desde que eficiente. Por outro lado, cresce tambm a percepo
de que o Estado tem falhado muito na sua misso pacificadora, que ele tenta realizar mediante o exerccio da
jurisdio e atravs das formas do processo civil, penal ou trabalhista. CINTRA, Antonio Carlos de Arajo;
GRINOVER, Ada Pelegrini; DINAMARCO, Cndido Rangel. Teoria Geral do Processo. 20. ed. Editora
Malheiros, 2004, pgs. 25-26.
Assim, o esprito de conciliao deve nortear os envolvidos nas disputas judiciais, uma vez que, por
melhores que sejam as leis e a prestao da atividade jurisdicional, ningum decide os conflitos mais
adequadamente aos respectivos interesses do que os prprios litigantes. A mediao frutfera proporciona
aos profissionais da rea do Direito a rara satisfao de poder rapidamente resolver o problema. O aperto
da mo ao trmino da audincia, em que a conciliao foi atingida, representa o retorno das partes
normalidade social. O que mais poderiam pretender advogados e Juzes? SOUZA NETO, Joo Baptista
de Mello e. Mediao em juzo Abordagem prtica para obteno de um acordo justo. So Paulo:
Editora Atlas, 2000, p. 101.
Despido o magistrado do preconceito contrrio quanto a se dedicar francamente tarefa de obter a conciliao e,
tambm ele, desprovido da vaidade de ver sua bela sentena elogiada pelos Tribunais, estar livre para perceber,
na fase de conciliao, o que significa incorporar a lei, o arqutipo do pai e que, aos olhos das partes interessadas
sua palavra impressiona, contundente. A fala inicial do magistrado nas audincias de conciliao penetra a
conscincia dos envolvidos e com eles mantm contato direito. um desperdcio perder esse momento por ignorar
sua importncia e eficcia. Ibid., p. 48.
Outra vantagem importante da mediao a contnua e intensa discusso sobre o conflito. Aqui, no se objetiva
apenas a consecuo do acordo, mas o melhoramento e a continuao do relacionamento dos mediados. Nesta
discusso, as pessoas so consideradas como seres nicos, devendo ser respeitadas como tais...Em suma, a mediao
bastante vantajosa. Seus objetivos no atingem apenas os problemas, refletindo seus efeitos nos mediados e na
sociedade, fortalecendo e preservando o relacionamento existente entre as pessoas. SALES; VASCONCELOS,
op. cit., p. 94-95.
Ibid., p. 90-91.
A mediao procura valorizar esses laos fundamentais de relacionamento, incentivar o respeito vontade dos
interessados, ressaltando os pontos positivos de cada um dos envolvidos na soluo da lide para, ao final, extrair
como conseqncia natural do procedimento os verdadeiros interesses em conflito. TAVARES, op. cit., p. 64.
Em outras palavras, a mediao inclui na sociedade na medida em que aumenta a autodeterminao e a responsabilidade dos mesmos. Assim, por meio desse procedimento, os indivduos passam a ter voz mais ativa dentro da
sociedade, uma vez que possuem autonomia e so responsveis por solucionar suas controvrsias. Como ressaltamos
em outro momento: A mediao apresenta-se, pois, com o objetivo de oferecer aos cidados participao ativa na
resoluo de conflitos, resultando no crescimento do sentimento de responsabilidade civil, cidadania e de controle
sobre os problemas vivenciados. Dessa maneira, apresenta forte impacto direto na melhoria das condies de vida
da populao na perspectiva do acesso justia, na concretizao de direitos, enfim, no exerccio da cidadania.
SALES; VASCONCELOS, op. cit., p. 90-91.
Em compromisso de palestra na cidade de Barbacena, verificou-se que um Juiz daquela comarca, vibrador por excelncia, com a certeza de que essas vias consensuais so a melhor forma para compor
os litgios, principalmente os de famlia, onde o mesmo jurisdiciona, sem qualquer ajuda financeira do
Tribunal, deu um passo significativo quanto ambientao do espao fsico a ponto de criar 04(quatro)
salas, nominadas de conciliao, para junto com seus auxiliares servir exclusivamente para esse fim,
incluindo a evidentemente, as mediaes. Para tanto, comprou sofs, mesas de centro, aparelho de som,
etc., Disps a sala da forma em que as partes ficavam entre si se olhando mutuamente sentadas no sof,
tendo ao centro uma mesinha onde havia caf, bolachas, bombons, etc. , tudo isso com um som ambiente
que tranqilizava os nimos. Depois de um longa conversa com o citado Juiz, este contou que o ndice de
acordo chegava a 90 % (noventa por cento) e o que as partes sentiam necessidade era de conversar, se
abrir, serem ouvidas, servio que tecnicamente parece ser de outro profissional, mas que nessas tcnicas
constitui uma das maiores habilidades. olhando mutuamente sentadas no sofente para esse fim, incluindo
a tentar conversar de igual para igual, a fim de que
Interessante que se transcrevam neste momento as reflexes de Fernando Horta, baseado nas lies de
Luiz Fernando Keppen sobre a importncia desse movimento pela soluo amigvel com uma tcnica da
atividade jurisdicional, ressaltando o valor da tentativa: Voltando indagao sobre a validade do esforo nas
tentativas de conciliao, temos que a resposta no poderia ser outra, que no em sentido afirmativo. Indubitvel
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que tal mtodo pacifica as relaes conflituosas, humanizando o direito, devendo, por isto mesmo, ser assimilado
como tcnica, a de propiciar melhores resultados, tudo em benefcio dos atores no palco judicial e da sociedade
que servimos .E se afinal, este resultado no for alcanado? Se no houver frutos, valeu a beleza da flores. Se
no houver flores, valeu a sombra das folhas. Se no houver folhas, valeu a inteno da semente. TAVARES,
op. cit., p. 127-128.
Essas ponderaes foram colhidas, com alguns complementos do j citado livro de Fernando Horta, mais
precisamente na pgina 126.
Alm do mais de se esclarecer que a idia amplamente divulgada de que a conciliao uma atividade
simples e que no tem qualquer dificuldade no corresponde a realidade, pois tenho quase dez anos
como Juiz e como tenho conscincia constante de minha ignorncia, sempre estou estudando e tenho
capacidade para estudar qualquer assunto tcnico, logo, sem qualquer menosprezo a matria jurdica,
tenho condies de confeccionar qualquer tipo de deciso judicial, porm no posso falar o mesmo sobre
uma atividade de conciliao e mediao. Desta forma, no tenho dvidas de que essa atividade requer
um preparo tcnico constante, contudo no o lado racional que domina, da porque os juzes devem
se desprender desses dogmas e procura sempre a composio amigvel do litgio, podendo inclusive ficar
horas conversando nesse sentido.
TAVARES, op. cit., p.67-68.
Analistas e juzes tem muito em comum, embora as diferenas os faam como gua e vinho. Os dois lidam com
processos iniciados h muito e a cujos fatos s tem acesso limitado. Atuamos com os elementos que nos chegam
por meio das partes envolvidas, de acordo com seus interesses. Se nas pelejas jurdicas as partes brigam e no
consultrio o cliente a nica parte interessada, no devemos subestimar a capacidade que o conflito interno tem
de sonegar informaes, obstruir o processo, insistir na idia de ganhar quando o fundamental o acordo entre as
partes, j que lutamos contra ns mesmos. Essas ponderaes so de Henrique L.M Torres, disposta como
apresentao do livro j citado de Joo Baptista. SOUZA NETO, op. cit., p. 14.
Ressalte-se que, dependendo do conflito e da concepo de cada mediador, algumas etapas podem ser suprimidas,
ao passo que outras possam ser introduzidas. SALES; VASCONCELOS, op. cit., p. 96.
Essas reflexes foram trazidas aps leitura da obra de Juan Carlos Vezzulla, Teoria e Prtica da Mediao, V Edio Comentada e Corrigida, editado pelo Instituto de Mediao e Arbitragem no Brasil, mas
como j ressalvado, essas etapas podem ser suprimidas ou at acrescidas, dependendo da situao, bem
como no h qualquer rigidez para a sua seqncia, todavia, percebe-se que pelo menos as primeiras so
indispensveis, mas o Juiz no pode, em nenhum momento, querer atuar como Juiz, Advogado, Arbitro,
Promotor, etc, sua funo meramente de auxlio e deve contar com um conhecimento interdisciplinar,
da porque, a atividade de Mediador no necessariamente realizada por um profissional do direito.
Em todo o procedimento o mediador realiza uma escuta ativa dos problemas, ou seja, permanece atento para
captar todas as linguagens, associando as verbais com as simblicas e no verbais. O corpo realmente fala; as
expresses demonstram sentimentos. SALES; VASCONCELOS, op. cit., p. 98. Ainda nesse assunto,
entende-se que durante todo o procedimento de mediao no deve o Juiz, sob hiptese alguma, deixar
que suas expresses sejam transmitidas para a parte, ou seja, o seu equilbrio emocional deve perdurar
durante toda sua atuao, sem que qualquer postura diferente seja realizada, sob pena das partes perderem
a confiana no Mediador.
Essas tcnicas so trazidas por Fernando Horta em obra j citada vrias vezes nesse trabalho, complementadas com as experincias do subscritor como mediador, principalmente em conflitos de famlia, logo,
muitas outras tcnicas podem ser implementadas, desde que haja sempre a prioridade para o constante
dilogo, o cooperativismo, a efetiva participao das partes, a no imposio da deciso, ou seja, todos os
princpios j tambm expostos por esse autor.
Nesse sentido se indica, para aprofundamento do estudo, a obra o Discurso e o Poder, de Boaventura
de Souza Santos, que ressalta a importncia de se criar mais instrumentos de democracia participativa,
complementando a representativa, a fim de que essa juno possa de fato fazer que o povo verdadeiramente
decida as questes de seu interesse.
A lei 10.444/02 alterou a redao do artigo 331 do CPC para expressamente permitir que todos os direitos
que admitam transao tenham necessariamente a audincia ali prevista, pois esse momento bastante
propcio e na realidade se constitui como direito da parte a esse contato direto com a autoridade judiciria.
H pouco tempo, em uma aula de mediao, um juiz perguntou-me como se pode executar um acordo obtido
mediante um processo de mediao. Ficou abalado com a minha resposta: os afetos nunca podem ser executados.
Minha resposta o surpreendeu porque estava raciocinando com os mitos, as crenas, o senso comum dogmtico
que organiza as cabeas dos juristas em geral. A mediao precisa ser entendida, vivida, acionada com outra
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cabea , a partir de outra sensibilidade, refinada e ligada com todas as circunstancias, no s do conflito, mas
do cotidiano de qualquer existncia. Quem vai mediar, precisa estar ligado com a vida. Luis Alberto Warat, O
ofcio do Mediador, Florianpolis: Habitus Editora, 2001. Esses, com certeza, so um dos maiores desafios
dessa nova postura dos Juzes nessa funo de tentativa de se chegar a uma soluo amigvel.
Em matria criminal, a conciliao vinha sendo considerada inadmissvel, dada a absoluta indisponibilidade da
liberdade corporal e a regra nulla poena sine judicio, de tradicional prevalncia na ordem constitucional brasileira.
Nova perspectiva abriu-se com a Constituio de 1988, que previu a instituio de Juizados Especiais providos
por Juzes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliao, o julgamento e a execuo..de infraes
penais de menor potencial ofensivo...permitidos, nas hipteses previstas em lei, a transao e o julgamento de
recursos por turma de juzes de primeiro grau. CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, op. cit., p. 27-28.
Ressalve-se que as Leis dos juizados especiais, quer estadual quer federal, prevem a possibilidade de
que alguns ilcitos penais possam ser resolvidos mediante composio civil entre as partes e at mesmo
transao direta com o Ministrio Pblico, o que demonstra que a justia consensual vem ampliando seu
espectro de atuao em todos as searas, inclusive penal.
Trata-se dos chamados direitos da personalidade (vida, incolumidade fsica, liberdade, honra, propriedade
intelectual, intimidade, estado). Quando a causa versar sobre interesses dessa ordem, diz-se que as partes no
tm disponibilidade de seus prprios interesses (matria penal, direito de famlia etc.). Mas, alm dessas hipteses
de indisponibilidade objetiva, encontramos aqueles casos em que uma especial condio da pessoa que impede
a disposio de seus direitos e interesses( indisponibilidade subjetiva); o que se d com os incapazes e com as
pessoas jurdicas de direito pblico. Antonio Carlos de Arajo Cintra, Ada Pelegrini Grinover e Cndido
Rangel Dinamarco, Teoria Geral do Processo, 20 Edio, Editora Malheiros, 2004, pg. 29.
Esclarea-se que a Constituio Federal prev como direito e garantia fundamental do cidado o devido
processo legal, contudo, o que se prega que esse direito possa ser renunciado em caso de pleno reconhecimento da ilicitude, logo, em havendo aceitao, lhe seja imposto a pena, suprimindo algumas etapas do
processo, tudo pela via consensual.
A mediao, para ser bem sucedida, pressupe boa-f de ambas as partes. Os mediadores devem estar dispostos
para assimilar os princpios da mediao, sobretudo para agir de modo solidrio e verdadeiro. Infelizmente, em
nossa sociedade, ainda predomina a arcaica mentalidade de cultura do litgio, em que s partes interessa obter
vantagens ganhar. SALES; VASCONCELOS, op. cit., p. 95.
Este poder amplamente utilizado pelos operrios do direito a par do princpio da igualdade das armas,
mesmo tendo cincia de que no exerccio dessa atividade consensual no qualquer espao para a cultura
de litgio propriamente dito, o juiz no pode deixar de est atento as diferenas econmicas e sociais das
partes e quando a mesma for discrepante deve adotar medidas que busquem igualar pelo menos nessa
conversa, o que difcil na prtica, contudo, no impossvel.
Essa acepo do princpio da oralidade inclui, evidentemente, os seus subprincpios, quais sejam a concentrao, a imediatividade, a identidade fsica do Juiz e a irrecorribilidade das decises interlocutrias,
que quando aplicados, na prtica, privilegiam a percepo dos sentimentos e emoes, que infelizmente
no so repassados pelo princpio da escritura. Desta forma, no s o movimento pela efetividade e o mais
recente da conciliao so importantes, pois a adoo na ntegra do princpio da oralidade, com certeza,
aproximar a Justia da verdade real e, por conseguinte, nos casos de tentativa de soluo amigvel, esse
contato imprescindvel.
Uma tarefa bsica dos processualistas modernos expor o impacto substancial dos mecanismos de processamento
de litgios. Eles precisam, consequentemente, ampliar sua pesquisa para mais alm dos tribunais e utilizar os
mtodos de anlise da sociologia, da poltica, da psicologia e da economia, e ademais, aprender atravs de outras
culturas. CAPPELLETI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso Justia. Porto Alegre: Srgio Antonio Fabris
Editor, 1988, p. 13.
Como j salientado, hoje no mais existe apenas o modelo patriarcal de famlia. Na verdade, coexistem diversas
formas, que so marcadas pelos traos de igualdade, individualidade e afetividade. As famlias enfrentam um
processo de instabilidade, uma vez que as mudanas ainda no foram assimiladas por toda a sociedade. Homens,
mulheres, idosos, crianas e adolescentes ainda no conseguem administrar as diferenas que esto surgindo em
meio a essas famlias eudemonistas. Como no mais existem papis pr-estabelecidos, verifica-se a necessidade
de constantes negociaes no seio familiar. SALES; VASCONCELOS, op. cit., p. 116.
Ibid., p. 118-119.
Interessante abordagem sobre a impossibilidade de a jurisdio conseguir resolver efetivamente os conflitos
familiares, foi feita por Fernando Horta, em livro j citado, na qual o mesmo conclui nesse sentido, aps
estudo em sala de aula, com vrios estudiosos do direito, que atestaram eficcia da mediao nesses
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conflitos. So suas as seguintes digresses: Guarda dos filhos a resposta jurisdicional a controvrsia tende a
seguir parmetros pr-estabelecidos de conduta do pai ou da me, aplicando cegamente a este ou quele princpios
pautados pela moral e pelo comportamento social. Tal determinao pode ser nefasta para a criana ou desatender
sua expectativa, ou deixar a descoberto suas reais necessidades. Na mediao so exatamente estas necessidades que pautaro o acordo sobre a guarda, levando os pais a se entenderem, visando ao maior conforto fsico e
espiritual de seus filhos.Neste sentido, a mediao conduz a um questionamento principal: quais as necessidades
das criana? E indagao seguinte: qual a melhor maneira de atender a essas necessidades? O procedimento
da mediao, cuidar, ento, para resolver a questo da guarda dos filhos: que futuros planos de paternidade
podem vocs entabular, de forma a continuar o trabalho de educao e amor com seus filhos? TAVARES, op.
cit., p. 72. A continuidade de suas reflexes no mesmo diapaso se referem eficcia social com relao
tambm a penso para os filhos, penso do ex-cnjuge e diviso de bens, abarcando enfim quase todos
os conflitos familiares, pelo menos os mais comuns atritos.
A deciso imposta, fruto da anlise do arcabouo legal vis--vis verdade formal que se apresenta nos autos,
acaba, no mais das vezes, gerando um resultado semelhante quele que, nas negociaes, conhecido por barganhas baseada nas posies, levando a uma partilha de perdas e ganhos entre os litigantes (mesmo a vitria total
ter consumido tempo, dinheiro e energias, sendo provvel que ainda haver resistncia na fase de execuo). A
deciso obtida com a mediao judicial tem mais probabilidade de conseguir resultado eficiente com a chamada
barganha de interesses, obtendo solues integrativas que satisfaam o maior nmero possvel das necessidades
de ambas as partes SOUZA NETO, op. cit., p. 53.
Fernando Horta em estudo j referido chama a ateno para tal fato, acrescentando que tal funo tambm exercida pelo Ministrio Pblico: Na realidade, revelou-se no citado trabalho, embora sem se observar
adequadamente seus princpios, a mediao j manejada cotidianamente pelos advogados em seus escritrios,
e pelos Promotores de Justia, quando atuam nos litgios de famlia. Dessas mediaes, geralmente derivam as
peties de acordo de separao consensual, nada impedindo que da mesma forma se operem as modificaes de
clusula da separao, ou de guarda dos filhos, majorao ou minorao de penso etc, tudo isso gerando to-somente a celebrao de novo acordo (ou aditivo a outro) e transformando-se em nova obrigao. TAVARES,
op. cit., p. 71.
Pois tudo toma tempo e o tempo inimigo da efetividade da funo pacificadora. A permanncia de situaes
indefinidas constitui, como j foi dito, fator de angstia e infelicidade pessoal. O ideal seria a pronta soluo,
to logo apresentados ao juiz. Mas como isso no possvel, eis a demora na soluo dos conflitos como causa
enfraquecimento do sistema CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, op. cit., p. 26.
Cita-se como exemplo o Tribunal de Justia de Santa Catarina, que expressamente regulamentou a
questo da mediao por resoluo.
Por muitas vezes os Juzes se deparam com a seguinte situao: o marido ou a esposa pedem ao magistrado
que o outro seja obrigado a voltar o relacionamento ou coisa parecida, o que como se sabe impossvel,
no s pelo fato de que no se pode obrigar a duas pessoas ficarem juntas, bem como pela inexistncia
de fatores objetivos que apontem para a certeza de que essa a melhor deciso. Nesse tocante, parece
que tambm impossvel se imaginar que um terceiro, que no conhece as partes e muitos menos as suas
intimidades, os seus conflitos internos, as suas dificuldades de relacionamento, as diferenas, etc. possa
dizer quem o culpado da separao e a partir da determinar vrias providncias. Esse simples raciocnio
j suficiente para apontar que nesses conflitos, somente os prprios envolvidos podem encontrar a melhor
soluo para os seus problemas, visto por mais competentes que sejam os advogados, no conseguiro
exprimir em suas peties todos os valores envolvidos naquele conflito, muito menos os Juzes tero
elementos objetivos para aferir com exatido em suas sentenas todas as problemticas.
SALES; VASCONCELOS, op. cit., p.122-123.
Nesse sentido tambm h previso do projeto Movimento pela Conciliao, do Conselho Nacional de
Justia, que orienta os Tribunais a se estruturarem para inserirem tanto previamente como j no curso
do processo todos os meios consensuais de soluo dos conflitos, inclusive a mediao.
Em muitos casos, intenso o sofrimento de um casal que decide pelo rompimento, havendo filhos ou no. Durante
este processo, geralmente a sensao de fracasso vem acompanhada de depresso, dio, angstia, sentimento de
traio, humilhao, alm das dificuldades financeiras, decorrentes da repartio de rendas e despesas. Haim
Grunspun aponta as fases de desconstruo da famlia: I-Desiluso de uma das partes, II-A manifestao de
insatisfaes, III-A deciso de se divorciar, IV-Agindo na deciso, V-Aceitao crescente. Desse modo, o sofrimento
inicia-se com a desiluso. Insatisfeitos com a relao conjugal, os esposos trocam ameaas de separao e de divrcio,
demonstrando sua insastifao. Geralmente, percebe-se a existncia de ressentimentos que foram acumulados ao
longo da convivncia, que se exprimem por sentimentos como: amor, culpa, ansiedade etc. Uma vez decididos a
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tornar concreta a separao, os cnjuges vivenciam uma nova realidade permeada por tenso e angstia. Em um
primeiro instante, normal que um dos cnjuges ou ambos enfrentem um momento de negao, recusando-se a
aceitara separao, afirmando que se trata apenas de uma situao passageira. SALES; VASCONCELOS,
op. cit., p.125. rcio, demonstrando sua insastifaa desiluonstru rompimento, havendo filhos ou nes.
50 A mediao oferece ao casal separado uma oportunidade de reorganizao das suas relaes parentais de modo
pacfico. A partir da escuta da realidade e dos anseios do outro, verifica-se a possibilidade de restaurao da
confiana rompida. Nessa reorganizao, o procedimento busca ressaltar a importncia da co-parentalidade,
demonstrando a necessidade dos filhos de manter a ligao com seus pais. Nesse enfoque, a mediao melhora
o relacionamento entre o casal rompido e, consequentemente, facilita a convivncia dos filhos...Note-se que a
mediao familiar facilita a manuteno dessas relaes continuadas, propondo uma verdadeira mudana de
paradigma. Esse processo incentiva as partes a observarem positivamente os conflitos, entendendo-os como fatos
naturais. A partir destas transformaes, os parentes passam a conviver melhor, evitando novas contendas. Ibid.,
p. 129/130.
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RESUMO
Este trabalho objetiva analisar a Proposta de Emenda Constitucional n 525/2010, tendente a criar o Conselho Nacional
da Defensoria Pblica (CNDP), investigando-se a necessidade
da instituio do rgo para a efetivao do acesso condigno
dos cidados justia. Para tanto, desenvolveu-se pesquisa
bibliogrfica, referente Defensoria Pblica, ao Conselho Nacional de Justia (CNJ) e ao Conselho Nacional do Ministrio
Pblico (CNMP). Em relao primeira, fez-se necessrio
tambm a observncia Constituio e Lei Orgnica Federal,
apontando-se os princpios, as funes e a estrutura da instituio; a anlise do III Diagnstico da Defensoria Pblica no
Brasil; a realizao de entrevistas, concedidas por membros da
Defensoria Pblica do Cear. No que concerne aos Conselhos
j existentes, utilizou-se o mtodo comparativo, destacando-se
o posicionamento de doutrinadores e magistrados a respeito
da criao desses rgos, seguindo-se ao exame das melhorias
trazidas ao Judicirio e ao Ministrio Pblico. Como o tema
ainda no foi devidamente discutido, empregou-se o mtodo
dialtico, concluindo-se, ao final da apreciao deste estudo,
pela imprescindibilidade da criao do CNDP, cuja composio
hbrida impediria o corporativismo e cuja atuao, alm de
outros benefcios, evitaria o desrespeito s crescentes funes
*
Mestre em Direito Constitucional pela Unifor; Defensor Pblico; professor do curso de Direito da Faculdade Christus.
** Aluna do 5 semestre do curso de Direito da Faculdade Christus; pesquisadora do Programa
de Iniciao Cientfica da Faculdade Christus 2010/2011.
*** Aluno do 5 semestre do curso de Direito da Faculdade Christus; pesquisador do Programa
de Iniciao Cientfica da Faculdade Christus 2010/2011.
REVISTA OPINIO JURDICA
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Leandro Sousa Bessa y Mariana Urano de Carvalho Caldas y Caio Werther Frota Neto
1 INTRODUO
A expectativa em torno da criao do Conselho Nacional da Defensoria
Pblica (CNDP), cuja funo seria eliminar a diferena de tratamento existente
entre os membros da Defensoria Pblica e os membros do Judicirio e do Ministrio Pblico e garantir maior efetividade e unidade quela funo essencial
Justia, surgiu a partir da Proposta de Emenda Constitucional n 525/2010,
de iniciativa do deputado Mauro Benevides (PMDB/CE).
De fato, aps chamada Reforma do Judicirio (Emenda Constitucional
n 45/2004), com a criao do Conselho Nacional de Justia (CNJ) e do Conselho Nacional do Ministrio Pblico (CNMP), a sociedade tem testemunhado
um crescente grau de democratizao das instituies Judicirio e Ministrio
Pblico, paralelamente uniformizao de procedimentos, importante para a
segurana jurdica, bem como um controle mais efetivo das funes administrativas e financeiras dos juzos, tribunais e rgos ministeriais.
No se olvida que, poca da instituio dos referidos conselhos, muitos
se mostraram contrrios sua criao, afirmando que mais importante seria o
fortalecimento das corregedorias e das ouvidorias, rgos de controle interno do
Poder Judicirio e do Ministrio Pblico. Tais argumentos costumam ser esgrimidos tambm em oposio criao do Conselho Nacional da Defensoria Pblica.
Entretanto, como mostra o III Diagnstico da Defensoria Pblica no Brasil, tais
mecanismos correcionais nem sequer existem em algumas Defensorias, no
havendo, assim, um efetivo controle disciplinar dos integrantes da carreira, bem
como no h um rgo nacional, de composio hbrida, para uniformizao de
procedimentos ou de controle da atuao administrativa e financeira.
A experincia tem mostrado que, distante de fragilizar as instituies, o
CNJ e o CNMP afinam-se com os anseios da sociedade, haja vista que atribuem
maior transparncia e eficcia s aes dos integrantes daquelas instituies,
servindo, consequentemente, como instrumentos para o desenvolvimento da
democracia. Entretanto, fundamental para o desenvolvimento da pesquisa
analisar os diferentes pontos de vista acerca do assunto, buscando-se traar
um paralelo do perodo de criao dos referidos rgos com a atual situao da
Defensoria Pblica, utilizando-se da pesquisa bibliogrfica e das informaes
coletadas durante a realizao das entrevistas.
Toda a pesquisa observa a Lei Complementar n 80/1994 (com alteraes
feitas pela Lei Complementar n 132/2009), que organiza a Defensoria Pblica
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acordo com a Constituio e com os princpios que a fundamentam, podendo-se afirmar que o controle do Poder Judicirio pela sociedade e pelos prprios
juzes um requisito da democracia, sendo ele a garantia de eliminao das
aes e omisses que, ocultas ou protegidas pelo pretexto da preservao da
independncia, impedem o Judicirio de ser um verdadeiro Poder democrtico23.
De acordo com o 4 do artigo 103-B da Constituio, compete ao
Conselho o controle da atuao administrativa e financeira do Poder Judicirio
e do cumprimento dos deveres funcionais dos juzes, cabendo-lhe, essencialmente, as atribuies expostas nos seus sete incisos, que, em sntese, tratam da
competncia material do CNJ, quando este pratica atos que no visam propriamente gerao de efeitos jurdicos, como a elaborao de relatrios, e da sua
competncia normativa, como no caso, por exemplo, da estipulao de normas
de conduta24, possibilitando-se a melhoria do Judicirio a nvel nacional, sem
haver, destaque-se, qualquer ingerncia no mbito jurisdicional.
Apesar de ter sido criado com o objetivo de estabelecer a possibilidade de
efetivo controle administrativo centralizado de legalidade sobre a atuao dos diversos
juzes e tribunais25 (grifo do autor), o CNJ no retira destes suas competncias
privativas, elencadas no artigo 96 da Carta Magna, no se atingindo, portanto, o
autogoverno do Judicirio. Quanto funo correicional e disciplinar, tambm
no se exclui a competncia das corregedorias, que, como ressaltou Wagner Gonalves, antes da Reforma do Judicirio, no eram suficientes para coibir e evitar as
omisses e o comportamento desidioso de alguns servidores do Poder Judicante26.
Por fim, ressalte-se que o 7 do artigo 103-B prev a criao de ouvidorias de justia, competentes para receber reclamaes e denncias de qualquer
interessado contra membros ou rgos do Poder Judicirio, ou contra seus
servios auxiliares, percebendo-se, novamente, a preocupao do constituinte
derivado em aproximar os rgos estatais dos cidados, proporcionando-se aos
usurios da Justia a oportunidade de aprimor-la.
2.2.2 Argumentos contrrios sua criao e os avanos no Judicirio
Apesar do atual consenso acerca da necessidade do CNJ, vrios foram os
argumentos apresentados por magistrados e doutrinadores a fim de se declarar
a inconstitucionalidade do rgo, entre eles a suposta violao ao princpio da
separao de poderes, clusula ptrea prevista no art. 60, 4, da Carta Magna.
Tal transgresso ocorreria em virtude do Conselho compor-se de forma hbrida,
fato que, como j se elucidou, no compromete a independncia do Judicirio
nem o desempenho da sua funo jurisdicional27.
Pode-se afirmar que a implantao de um rgo de controle para o
Judicirio no Brasil fora atrapalhada por incertezas, medos, discursos corporativos e preconceitos28. Grande parte dessa oposio foi composta por setores
conservadores da magistratura, devendo-se destacar que, como preleciona
Marcelo Ucha, a Associao dos Magistrados do Brasil (AMB) foi, ao longo
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dos anos, a inimiga nmero 1 do controle do Poder Judicirio, tanto assim que
foi a primeira entidade da sociedade civil a posicionar-se contrariamente ao
recm-criado Conselho Nacional de Justia29 (grifo do autor).
No dia 9 de dezembro de 2004, um dia aps a promulgao da Emenda
Constitucional n 45/2004, a AMB j havia proposto a Ao Direta de Inconstitucionalidade n 3367-1/DF, buscando obstar a instituio do nefito
Conselho, pretenso que fora definitivamente afastada pelo STF, no dia 13 do
ano seguinte30.
Alexandre de Moraes, que j foi membro do CNJ, apresenta, de forma
clara e conclusiva, trs caractersticas que confirmam a sua constitucionalidade, a
saber, ser rgo integrante do Poder Judicirio (CF, art. 92, I-A), sua composio
apresentar maioria absoluta de magistrados e possibilidade de controle de suas
decises pelo STF (CF, art. 102, I, r) 31.
Embora tenha havido inicialmente evidente desconfiana acerca das
melhorias que o CNJ poderia gerar, restaram inegveis, aps a instituio do
mencionado rgo, os significativos avanos ocasionados ao Poder que integra.
Dentre as medidas de maior destaque, tiveram repercusso nacional a Resoluo n 3, que extinguiu definitivamente as frias coletivas nos tribunais, e a
Resoluo n 7, que atacou o nepotismo no Judicirio32, sendo ambas do ano
posterior sua criao (2005).
Ainda em conformidade s lies de Ucha, alm das conquistas supramencionadas, muitas outras foram alcanadas pelo Conselho nos anos seguintes
sua instituio, referentes s mais diversas matrias, como desvios funcionais,
moralidade pblica, levantamentos estatsticos, estudos especficos relacionados
aos problemas do Judicirio, realizao de conferncias, seminrios, etc33.
No mbito penal, importante se destacar as melhorias obtidas com o
mutiro carcerrio, criado, em 2008, pelo ministro Gilmar Mendes, e responsvel pela libertao de 20 mil presos que j haviam cumprido a pena a que
foram condenados ou se encontravam privados de sua liberdade ilegalmente34.
Por fim, indispensvel se faz enfatizar que o Conselho tambm traa metas35
ao Poder Judicante, podendo-se indicar, resumidamente, as relativas a 2011,
referentes gesto, modernizao das audincias, celeridade processual e
responsabilidade social.
2.3 O Conselho Nacional do Ministrio Pblico
Igualmente institudo pela EC n 45/2004, o Conselho Nacional do
Ministrio Pblico (CNMP) destina-se, basicamente, a acompanhar a atuao
dos promotores e procuradores do Pas e uniformizar recomendaes propostas
funo essencial Justia incumbida de defender a ordem jurdica, o regime
democrtico e os interesses sociais e individuais indisponveis (CF, art. 127).
Prevendo-se as atividades do Corregedor nacional e das ouvidorias, conclui-se
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nistrao superior e de execuo da Defensoria Pblica do Cear, objetivando-se conhecer a opinio deles em relao PEC em estudo, cujo contedo foi
previamente analisado.
Como o tema surgiu recentemente, no se constatando, at o presente
momento, a sua discusso em outros trabalhos cientficos, foi utilizado, como
forma de abordagem, o mtodo dialtico, propiciando-se, aps o exame da
atuao da Defensoria Pblica e dos Conselhos j existentes, a observncia a
posicionamentos favorveis e contrrios criao do CNDP e determinao
da Comisso de Constituio e Justia e de Cidadania pela inadmissibilidade
da PEC, o delineamento de ilaes que vo ao encontro proposta de criao
do CNDP.
4 ANLISE DOS RESULTADOS
Com a apreciao deste estudo, evidencia-se, primeiramente, o carter imperioso da Defensoria Pblica para a proteo e garantia dos direitos
fundamentais dos cidados necessitados, mostrando-se a atuao concreta
e supra-individual da instituio essencial prpria concretizao do Estado
Democrtico de Direito. Constata-se, tambm, o grande contraste existente
entre a previso normativa e as limitaes apontadas pelo estudo diagnstico,
restringindo-se o direito de acesso justia e, consequentemente, a promoo
da cidadania, mostrando-se urgente a adoo de medidas afirmativas voltadas
sua efetivao.
Quanto estruturao, verifica-se que, apesar de j conter certa miscigenao em virtude da introduo de representantes da sociedade civil por meio
das ouvidorias, a maioria das Defensorias Pblicas no cumpre o imperativo
legal, sendo os ouvidores inexistentes ou integrantes da prpria instituio,
impedindo-se a contribuio do povo no processo de aperfeioamento e controle
da qualidade dos servios prestados.
Em relao ao CNJ e ao CNMP, no obstante muitos doutrinadores e
magistrados terem se mostrado contrrios criao deles, v-se a essencialidade desses Conselhos no processo de busca de celeridade e transparncia para
a prestao jurisdicional e para a atividade de acusao e fiscalizao da lei,
respectivamente, mostrando-se o carter hbrido desses rgos fundamental
para a eliminao do corporativismo e para a salvaguarda da autonomia do
Judicirio e do Ministrio Pblico, possuindo, para tanto, competncia material e normativa.
Empreendendo-se, finalmente, a anlise da ntegra da PEC n 525/2010
e o exame das entrevistas concedidas por alguns membros da instituio,
permite-se revelar a necessidade da criao do CNDP, apesar de a Comisso de
Constituio e Justia e de Cidadania a consider-la atualmente invivel, haja
vista que o rgo de controle, dentre outros benefcios, possibilitaria o alcance
do almejado tratamento isonmico Defensoria Pblica frente aos rgos
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1 ANDRADE, Carlos Augusto Medeiros de. O acesso justia e a Defensoria Pblica. Revista da OAB-CE, n. 07, p. 326, jan./jul. 2002.
2 SARLET apud LIMA, Frederico Rodrigues Viana de, Defensoria Pblica. Salvador: Jus Podivm, 2010,
p. 65-66.
3 SARLET apud LIMA, Frederico Rodrigues Viana de, Defensoria Pblica. Salvador: Jus Podivm, 2010, p. 68.
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4 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso Justia. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor,
1988-2002, p. 12.
5 ANDRADE. Carlos Augusto Medeiros de. O papel da Defensoria Pblica no acesso do cidado
justia. 2005. 150 f. Dissertao (Mestrado em Direito Constitucional) Universidade de Fortaleza,
Fortaleza, 2005, p. 71.
6 LIMA, Frederico Rodrigues Viana de, ob. cit., p. 88.
7 DINIZ apud LIMA, Frederico Rodrigues Viana de, Defensoria Pblica. Salvador: Jus Podivm, 2010, p. 89.
8 ROCHA, A. S.; BESSA, Francilene Gomes de Brito. Defensoria Pblica Brasileira: Realidade e Perspectivas. In: Guilherme Jos Purvin de Figueiredo, Andr da Silva Ordacgy. (Org.). Advocacia de Estado e
Defensoria Pblica. Curitiba: Letra da Lei, 2009, p. 35.
9 MINISTRIO DA JUSTIA. III Diagnstico Defensoria Pblica no Brasil. Braslia-DF, 2009. Disponvel
em : <http://www.anadep.org.br/wtksite/IIIdiag_DefensoriaP.pdf>. Acesso em: 10 ago. 2010.
10 Ibid.
11 Ibid.
12 ROCHA, A. S.; BESSA, Francilene Gomes de Brito, ob. cit., p. 34.
13 LANDIM, Maria Nomia Pereira. A Defensoria Pblica e a proteo dos direitos metaindividuais
no Estado Democrtico de Direito. 2008. 113 f. Dissertao (Mestrado em Direito Constitucional).
Universidade de Fortaleza, Fortaleza, 2008, p. 33.
14 LIMA, Frederico Rodrigues Viana de, ob. cit., p. 97.
15 Ibid., p. 99.
16 LANDIM, Maria Nomia Pereira, ob. cit., p. 65.
17 LIMA, Frederico Rodrigues Viana de, ob. cit., p. 157.
18 MINISTRIO DA JUSTIA. III Diagnstico Defensoria Pblica no Brasil. Braslia-DF, 2009. Disponvel
em <http://www.anadep.org.br/wtksite/IIIdiag_DefensoriaP.pdf>. Acesso em: 10 ago. 2010.
19 ROCHA, A. S.; BESSA, Francilene Gomes de Brito, ob. cit., p. 44.
20 SADEK, Maria Tereza Aina. Poder Judicirio: perspectivas de Reforma. Opinio Pblica, Campinas, v.
10, fas. 1, mai. 2004, p. 48.
21 UCHA, Marcelo Ribeiro. Controle do Judicirio: da expectativa concretizao (o primeiro binio
do Conselho Nacional de Justia). 2007. 207 f. Dissertao (Mestrado em Direito Constitucional).
Universidade de Fortaleza, Fortaleza, 2007, p. 10.
22 UCHA, Marcelo Ribeiro, ob. cit., p. 28.
23 DALLARI apud UCHA, Marcelo Ribeiro. Controle do Judicirio: da expectativa concretizao
(o primeiro binio do Conselho Nacional de Justia). 2007. 207 f. Dissertao (Mestrado em Direito
Constitucional). Universidade de Fortaleza, Fortaleza, 2007, p. 48.
24 UCHA, Marcelo Ribeiro, ob. cit., p. 71.
25 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 23 ed. So Paulo: Atlas, 2008, p. 523.
26 GONALVES, Wagner. O Controle externo do Judicirio e do Ministrio Pblico. Revista Jurdica
Consulex, Distrito Federal, v. 8, fas. 173, mar. 2004, p. 34.
27 ADI n 3367-1/DF, Rel. Min. Cezar Peluso, DJ 22.9.2006.
28 UCHA, Marcelo Ribeiro, ob. cit., p. 61.
29 Ibid., p. 62.
30 Ibid.
31 MORAES, Alexandre de, ob. cit., p. 519.
32 UCHA, Marcelo Ribeiro, ob. cit., p. 82.
33 Ibid.
34 Mutiro Carcerrio do CNJ j permitiu a libertao de 20 mil presos em um ano e sete meses. Jus Brasil,
16 abr. 2010. Disponvel em: <http://www.jusbrasil.com.br/noticias/2156686/mutirao-carcerario-do-cnj-ja-permitiu-a-liberacao-de-20-mil-presos-em-um-ano-e-sete-meses >. Acesso em: 2 abr. 2011.
35 CNJ estabelece metas para 2011. Jus Brasil, 16 jan. 2011. Disponvel em: < http://www.jusbrasil.com.
br/noticias/2534904/cnj-estabelece-metas-para-2011>. Acesso em: 2 abr. 2011.
36 BRASIL. PEC n 525/2010. Cmara dos Deputados. Disponvel em: <http://www.camara.gov.br/sileg/
integras/828068.pdf>. Acesso em: 30 jan. 2011.
37 Ibid.
38 Ibid.
39 Ibid.
40 Entrevista concedida no dia 14 de maro de 2011.
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41 MINISTRIO DA JUSTIA. III Diagnstico Defensoria Pblica no Brasil. Braslia-DF, 2009. Disponvel
em: <http://www.anadep.org.br/wtksite/IIIdiag_DefensoriaP.pdf>. Acesso em: 10 ago. 2010.
42 Dados obtidos em entrevista concedida no dia 16 de maro de 2011.
43 Dados obtidos em entrevista concedida no dia 16 de maro de 2011.
44 QUARANTA, Roberta Madeira. Conselho Nacional da Defensoria Pblica: Por que no? ANADEP,
13 abr. 2010. Disponvel em: <http://www.anadep.org.br/wtk/pagina/materia?id=8658>. Acesso em: 10
mai. 2010.
45 Dados obtidos na entrevista concedida no dia 14 de maro de 2011.
46 MATSUURA, Lilian; GHIRELLO, Mariana. Aes coletivas podem ser a soluo para a Justia. Revista
Consultor Jurdico, So Paulo, 6 mar. 2011. Disponvel em: <http://www.conjur.com.br/2011-mar-06/
entrevista-marcus-vinicius-lima-chefe-dpu-sao-paulo>. Acesso em: 15 mar. 2011.
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RESUMO
Os valores polticos na epopeia homrica so estudados em vista da
produo da Ilada e da Odisseia. Nessas obras h grande contribuio para o Direito Poltico, como a verificao da criao de um
ideal burgus antes mesmo da formao da burguesia como classe,
bem como seus ideais polticos de posse, propriedade e famlia. A
epopeia aparece como ligao entre o mito e o esclarecimento (Alfklrung) conforme entendido por Adorno e Horkheimer, tambm
como forma de criao tica por meio da esttica. A dominao de
classes j aparece, na leitura frankfurtiana, em Homero como tipo a
ser superado, sendo a Dialtica do Esclarecimento, o melhor estudo
sobre o tema e muito importante para estudar a cidadania cultural.
Palavras-chave: Homero. Direito Poltico. Filosofia do Direito.
Ao denunciar sem maiores qualificaes a epopia como
romance, ele deixa escapar o que a epopia e o mito tem
de fato em comum: dominao e explorao (ADORNO; HORKKEIMER, 2006: p. 49).
INTRODUO
comum creditar civilizao grega o ttulo de bero da cultura ocidental. Isso no exagero, seja pela influncia da lngua, seja pelos costumes,
ou pelos valores humanistas. O que nos cabe no presente trabalho entender
quais os aspectos existentes no nascedouro da Grcia Antiga influenciam, hoje,
o estudo do Direito Poltico e Econmico, em especial, a partir da produo
potica de Homero.
* Artigo apresentado em forma de comunicao oral no XX Congresso do CONPEDI, em 2011.
** Bacharel e Mestrando em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (SP). Bolsista CAPES/Prosup. Graduando em Filosofia pela Faculdade de Filosofia, Letras e Cincias
Humanas da Universidade de So Paulo (SP). Membro do Grupo de Pesquisas Cidadania e
Direito pelo olhar da Filosofia: tipologia da ao jurdica e poltica na teoria marxista.
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A introduo do mito no pensamento poltico moderno , portanto, tanto um fator de miopia histrica, ou ento um evento
qualitativo, uma transformao do objeto de mito em si. [...]
Identificar o momento (ou momentos) em que os mitos polticos
se tornaram modernos requer que distingamos tais mitos como
clssicos ou antigos. Enquanto h vrias caractersticas que diferenciam essas duas categorias, argumentaria que o primeiro e
mais importante contraste deita na relao entre um mito e a era
ou cultura que o produziu. Para as mitologias polticas clssicas, o
principal valor do mito reside em sua autoridade tradicional (no
sentido de Max Weber): o mito mais velho, e quanto mais respeitvel a sociedade qual ele est ligado, mais autoritrio ele .8
207
esse elemento racional, iluminista ou esclarecedor, para no confundir, por uma leitura apressada, com a doutrina desenvolvida apenas na Idade
Moderna que mostra a atualidade do estudo da obra homrica. Afinal, o
romance, cujos primrdios remontam Antiguidade, precisou de centenas de
anos para encontrar, na burguesia ascendente, os elementos favorveis a seu
florescimento. At l, frise-se, so os ideais burgueses que permeiam a epopeia,
separada do romance, apenas, pela forma do livro14.
O papel fundamental da produo de Homero sobre a formao do homem grego destacada por Jaeger que v a impossibilidade e estudo da civilizao daquele povo sem incluir o estudo da obra literria.15 o que nos permite
afirmar que a esttica condiciona a tica e por ela mutuamente condicionada.
Essa relao dialtica entre as categorias filosficas fica clara com a viso da
literatura como produo educadora.
Nesse sentido que Walter Benjamin, com campo revolucionrio, liga
a importncia da arte na formao poltica de um povo: A dialtica dessas
tendncias [evolutivas da arte] no menos visvel na superestrutura que na
economia. Seria, portanto, falso subestimar o valor dessas teses [sobre a arte]
para o combate poltico16, seja para a conformao do povo aos valores de
uma classe dominante, do Estado, ou mesmo para a produo de um esprito
libertador. A esttica condiciona a tica: a ao sempre delimitada pelo modo
com um povo recebe e compreende a produo cultural de sua poca. Um povo
que absorve uma cultura construtora de conscincia, dotada de aura prpria o
hic et nunc de seu tempo, muito mais crtico, exigente e consciente de seu
papel. O contrrio tambm verdadeiro: para destruir um povo, destrua sua
cultura, povoe sua mente com o lixo cultural que apenas (re)produz, somente
repete, no reflete.
Na Ilada, a figura de Fnix, mestre de Aquiles, bem como os tipos da
Telemaquia e de Ulisses, na Odisseia, so grandes exemplos dessa relao entre
a esttica e a tica na obra de Homero como meio de educao e formao do
homem grego. Nessas figuras, o papel do tutor, ou Mentor nome de um amigo
prximo e, por fora do travestismo de Palas Atenas, guia de Telmaco, filho
de Ulisses na indicao do caminho a seguir na busca do verdadeiro ideal de
arete (dignidade, honraria, dignificao)17 imprescindvel. Isso notado no
Canto II, versos 267 a 271 da Ilada18.
E quem o homem Ulisses que Palas Atenas na figura do amigo da
famlia, Mentor admoesta para que Telmaco o siga como exemplo de vida?
o pai, o dono de terras, o senhor de escravos, o detentor de grandes honrarias e
respeito por parte de seus ajudantes e dos prprios deuses, que luta para voltar
a sua terra, famlia e tesouros.
Esse ideal de educao do homem o que perdurar por toda a obra de
Homero e ser impregnado na formao do grego que dele l e houve falar, seja
na aristocracia, seja nos cantos populares posteriores.
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5 Como se sabe, no h certeza sobre local e data de nascimento de Homero. Mais do que isso, no se sabe
nem mesmo se existiu, se foi um nico Homero, ou se vrios Homeros compilaram os mitos na formao
de uma epopia. Seguindo a tradio, admitimos, aqui, que um nico existiu na Grcia Antiga.
6 MATOS, op. cit., p. 87.
4
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political thought is thus either a factor of historical shortsightedness, or else a qualitative event, an
internal transformation of the object myth itself []. Identifying the moment (or moments) when
political myths became modern requires that we distinguish such myths from classical or ancient ones.
While there are various characteristics that differentiate these two categories, I would argue that
the first and most important contrast lies in the relation between a myth and the age or culture that
produced it. For classical political mythologies, the principal value of a myth resides in its traditional
authority (in Max Webers sense): the older the myth, and the more venerable the society to which
it is attached, the more authoritative it is.
9 BENJAMIN, Walter. Sobre o conceito da Histria. ROUANET, Srgio Paulo (Trad.). Magia e tcnica,
arte e poltica. Obras Escolhidas. 7. ed. So Paulo: Brasiliense, 1994, p. 229.
10 GAGNEBIN, Jean-Marie. Resistir s sereias. In: SOCHA, Eduardo (org.). Escola de
8
11
18
HOMERO, In: NUNES, Carlos Alberto (Trad.). Odisseia. Rio de Janeiro: Ediouro,
2001, p. 49.
23
24
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26
27
28
219
uma queda irrevogvel da metafsica, afetando no s as classes pobres, banhadas na indstria cultural de
massa, mas tambm nas chamadas semicultas, pois a condio geral a de que o esprito foi conquistado
pelo carter fetichista da mercadoria (1996, p. 398 e 400).
29 MARCUSE, Herbert; HEIDEGGER, Martin. In: WOLIN, Richar (Trad.). Herbert Marcuse and Martin
Heidegger: an Exchange of Letters. New German Critique. Durham: Duke University Press, 2001, n.
53, Spring-Summer, p. 28-32, p. 31.
30 TIBURI, Mrcia. Crtica da razo e mmeses no pensamento de Theodor W.
39
40
41
42
43
44
45
WOLFF, Hans Julius. The origem of judicial litigation among the Greeks. Revista Traditio, 1946, v. 4, p. 31-87, p. 36. No original: A priori, we may consider it as no less true
to life than the wedding-scene which is supposed to have been depicted in another
sector of the shield. It is of course impossible to decide whether the poet describes
a custom known to him from his own observation or merely relates memories from
a past age which lingered on his period.
46 Ibid., p. 46. No original: [...] the protection of the debtor against unlawful execution.
47 GRINOVER, 1998, p. 14.
48 BEDAQUE, Jos Roberto dos Santos. Estabilizao da tutela antecipada. In: COSTA,
220
n. 13 - 2011
221
RESUMO
Aanlise de propostas de lei ordinria e complementar que
alteram e ampliam o potencial de utilizao do instituto da
transao em matria tributria, ao lume dos princpios constitucionais, tributrios e administrativos que condicionam a
atuao da Administrao Tributria, sugerindo-se a adoo
*
Este artigo foi inspirado e adaptado do trabalho monogrfico de concluso de curso apresentado por Caroline Mello Boaroli para obteno do Grau de Bacharel, no Curso de Direito da
Universidade do Extremo Sul Catarinense, UNESC, com Linha de Pesquisa em Direito Tributrio, o qual foi aprovado com nota mxima e meno honrosa com louvor pela banca
composta pelos Professores Maurcio Muriack de Fernandes e Peixoto (orientador), Mrcia
Andria Schutz Lrio Piazza e Maicon Henrique Alssio, por ocasio da apresentao verbal
realizada em 22 de novembro de 2011.
** Advogado da Unio de Categoria Especial, Mestre em Ordem Constitucional pela Universidade
Federal do Cear (UFC-2000), e Professor de Processo Constitucional do Curso de Graduao
em Direito da Universidade do Extremo Sul Catarinense (Unesc). Ex-professor da Universidade
Catlica de Braslia (UCB). Ex-Professor da Universidade Federal do Cear. Ex-Coordenador-Geral (Nacional) de Assuntos Militares da Procuradoria Geral da Unio (PGU/AGU).
*** Bacharelanda do Curso em Direito da Universidade do Extremo Sul Catarinense-UNESC
e estagiria do Tribunal de Justia do Estado de Santa Catarina, atuando perante a Vara da
Fazenda Pblica em Cricima-SC.
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A Transao Como Forma de Extino do Crdito Tributrio: Uma Anlise das Alteraes Preconizadas
Pelos ProMetos de Lei N 5.0822009 e 4692009, Sob a egide dos Princpios da Administrao Tributria
1 INTRODUO
O presente artigo tem como principal escopo concretizar uma anlise
jurdica perfunctria e introdutria acerca do instituto da transao, como
modalidade de extino do crdito tributrio, especialmente, no pertinente s
mudanas propostas por intermdio de dois projetos de lei, ora autuados sob
o n 5.082/2009 (projeto de lei ordinria) e sob o n 469/2009 (projeto de lei
complementar), que ainda tramitam no Congresso Nacional, por ocasio da
confeco do presente labor.
A transao instituto expressa e originariamente previsto pelo Cdigo
Tributrio Nacional como um dos motivadores legais da extino do crdito
tributrio; no entanto, at os dias atuais, no ocorreu a regulamentao deste
instituto no mbito federal, por meio de lei ordinria, bem como, em face da
atual conjuntura de autocomposio estimulada pela doutrina especializada e
pela prpria jurisdio, eis que a redao do artigo 171 do Cdigo Tributrio
Nacional perdura em se revelar inadequada ou lacunosa, motivo pelo qual sua
utilizao tambm tem sido escassa no mbito estadual e municipal..
Tais motivos, em verdade, ensejaram a apresentao, pelo Governo Federal, dos epigrafados projetos de lei, os quais procuram regulamentar a transao
na seara federal e ampliar seus atuais horizontes normativos.
Assim, verifica-se a necessidade de uma anlise dessas mudanas propostas luz de alguns princpios que regem a Administrao Tributria e o prprio
Direito Tributrio vigente. Para tanto, neste trabalho, foram abordados os aspectos especficos do Direito Tributrio, bem como da Administrao Tributria
e, ainda, tratou-se da transao do crdito tributrio conforme albergada nos
projetos de lei. Buscou-se elucidar o contedo, as vantagens e algumas inviabilidades da transao, na forma preconizada nestes projetos de lei.
Tal tema de grande importncia, haja vista que tal instituto instrumento apto a solucionar demandas que envolvem os contribuintes e o Estado, e tal
potencial no pode permanecer ignorado pelo legislador e pelos operadores do
direito, mxime, em quadra temporal em que a desjudicializao e a autocomposio so correta e freqentemente estimuladas como verdadeiras panacias
para a soluo de problemas juridicamente idnticos e massificados, descrio
que se encaixa perfeio nos constantes e infindveis conflitos tributrios.
No entanto, apesar de estar o instituto da transao previsto pelo Cdex
Fiscal, o mesmo tem origem no direito privado, e, ao ser aplicado e regulamenREVISTA OPINIO JURDICA
223
tado em um ramo de direito pblico, pode gerar problemas jurdicos, administrativos e operacionais srios, tanto para o Estado como para os contribuintes,
motivos pelos quais impende os alinhavar e enfrentar a deliberao iminente
dos epigrafados projetos de lei sob um ponto de vista crtico e propositor de
solues, labuta que passamos a empreender doravante.
2 A ADMINISTRAO PBLICA E A ATIVIDADE TRIBUTRIA: A
ADMINISTRAO TRIBUTRIA
2.1 Origem, conceito, natureza jurdica e estrutura da Administrao Tributria
A Atividade Financeira do Estado existe para servir de instrumento assecuratrio consecuo dos desideratos estatais finalsticos, nos mais diversos
aspectos, destacando-se, sobretudo, as finalidades estatais de investimentos
em reas voltadas concretizao dos direitos fundamentais, em geral, e dos
direitos sociais, econmicos e culturais, em especial, bem como na estruturao
e na prestao dos servios pblicos.
A mais importante das receitas obtidas pela atividade financeira estatal
emana da atividade exacional, por meio da arrecadao compulsria dos tributos.
Esta prerrogativa prevista e delimitada pela Constituio, dotando cada ente
poltico de competncia tributria. Assim, cada qual pode instituir e cobrar
os tributos do qual titular, numa atividade que pressupe o poder e dever de
faz-lo. Dessa forma, a estrutura destinada a arrecadar e fiscalizar os tributos
o que se poderia denominar de Administrao Tributria1.
Para Kiyoshi Harada2 administrao tributria a atividade do poder
pblico voltada para a fiscalizao e arrecadao tributria. um procedimento
que objetiva verificar o cumprimento das obrigaes tributrias [...].
No mesmo giro, Luciano Amaro3 ensina que o papel desempenhado pela
Administrao Tributria de grande relevncia no que concerne ao recolhimento dos tributos, isto, porque, dela emanam os atos que conferem exigibilidade ao crdito e, ainda, a ela incumbe a tarefa de verificar o cumprimento
das obrigaes tributrias.
A Administrao Tributria pode ser conceituada como o conjunto de
rgos e agentes pblicos estatais aos quais incumbe realizar a tarefa de executar
a legislao tributria e, conseguintemente, gerir, fiscalizar e arrecadar os tributos
previstos no ordenamento jurdico brasileiro.
No Direito Constitucional Brasileiro h norma expressa que conceitua
a Administrao Tributria como atividade essencial ao funcionamento do
Estado 4, motivo pelo qual dever ser estruturada atravs de carreira especfica
de servidores, no plano federal, estadual, distrital e municipal.
Alm disso, a prpria Constituio Brasileira afirma que a administrao
fazendria e seus servidores fiscais tero, dentro de suas reas de competncia e
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m)
n)
o)
p)
repetindo-se esta providncia at o dia 31 de janeiro de cada ano, dando publicidade e transparncia normatizao tributria (vide artigo 212 do Cdigo
Tributrio Nacional e do artigo 150, 5, da Constituio da Repblica);
Prerrogativa de autotutela da Administrao Tributria, consistente em
exceo ao princpio da imutabilidade do lanamento tributrio, autorizando
o Fisco a, extraordinariamente regra do artigo 145 do Cdex Fiscal, alterar o lanamento anteriormente realizado, desde que relativo s hipteses
debuxadas no artigo 149 do Cdigo Tributrio Nacional e desde que no
tenha ocorrido a decadncia tributria18;
Prerrogativa de a Administrao Tributria poder proceder aferio indireta
ou o arbitramento da base imponvel do tributo, nas hipteses enumeradas
no artigo 148, do CTN, o qual serve de supedneo para o lanamento por
valor presumido, e desde que observados os princpios da finalidade da lei,
da razoabilidade, da proporcionalidade e da capacidade contribuinte 19;
Prerrogativa da Administrao Tributria de operacionalizar, nos limites da
auto-executoriedade e observando as hipteses de interveno obrigatria
da jurisdio, todas as garantias e privilgios do crdito tributrio20, enumerados nuclearmente porm, de forma no exclusiva, nos artigos 183 a
192 do Cdigo Tributrio Nacional;
Prerrogativa da Administrao Tributria de constituir o crdito tributrio21, atravs da realizao do lanamento tributrio ou do cotejar do autolanamento realizado pelo contribuinte, nos estritos termos da legislao
tributria vigente poca da ocorrncia do fato gerador (vide arts. 142 e
144 do Cdigo Tributrio Nacional).
229
Portanto, delineadas as atividades elementares da Administrao Tributria, conveniente analisar os limites de seu efetivo cumprimento, tendo
como parmetro a aplicabilidade dos princpios da Administrao Pblica
Administrao Tributria.
A atividade da Administrao Tributria deve estar permeada pela
ordem de princpios jurdicos e garantias fundamentais prprios do sistema
jurdico vigente.
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Estas propostas esto repercutindo de forma a acarretar em uma srie de discusses por parte dos juristas, uma vez que, com eles (os projetos em epgrafe), se
passa a admitir a transao na composio de conflito ou de litgio bem como,
sob certo aspecto, transfere do Judicirio para a Administrao Tributria uma
grande parte do procedimento de cobrana de dvidas tributrias, sob o argumento de ser medida indispensvel ao estgio atual de arrecadao no pas.
3.1.1 Argumentos em favor da utilizao e ampliao da transao em matria
tributria: exposio dos motivos justificadores
Segundo os motivos expostos pelos preconizadores do anteprojeto de Lei
Ordinria n 5.082/2009, os dispositivos que ali se encontram foram elaborados
no intuito de viabilizar e regulamentar a previso j contida na atual e vigente
redao dos arts. 156, inciso III e 171 do CTN. Conforme os mesmos, tal implementao viria a contribuir para a plena eficcia do princpio da eficincia,
j que constituiria uma nova relao entre Administrao e contribuinte, permitindo uma maior participao deste; desta forma, argumenta-se, se tornaria
mais vivel a cobrana dos crditos tributrios, j que grande parte da carga
tributria do pas no consegue ser convertida aos cofres pblicos. Na mesma
linha retrica, a celebrao da transao se tornaria melhor do que uma deciso
judicial tendo em vista que o anteprojeto de estabelece a criao de um rgo
julgador especializado o que acabaria por aperfeioar e uniformizar a interpretao das normas tributrias no mbito da Administrao e ainda diminuiria os
desperdcios pblicos decorrentes do sistema de cobrana que vigora atualmente,
dada a ineficcia do processo de execuo fiscal. Da mesma importncia o
argumento acerca da morosidade na resoluo judicial e administrativa dos
litgios tributrios o que acaba por prejudicar a livre concorrncia, uma vez que
as sociedades empresrias que cumprem com suas obrigaes fiscais so levadas
a concorrer com outras que postergam o adimplemento de suas obrigaes tributrias, por meio de discusses judiciais e administrativas de carter meramente
protelatrio (BRASIL, 2011-D).
Hugo de Brito Machado e Hugo de Brito Machado Segundo36 destacam, ainda, que os que defendem a transao em matria tributria o fazem
por acreditar que a parcela de discricionariedade conferida Administrao
na composio do litgio mais eficaz no que concerne satisfao do crdito
tributrio e que ser exercida de acordo com o objetivo precpuo daquela, qual
seja o interesse pblico.
Desse modo, pode-se afirmar que a insero da possibilidade de
transao no sistema tributrio brasileiro configuraria um novo
paradigma na relao entre a Administrao Tributria e os
contribuintes, que deixariam de se confrontar indefinidamente e
arcar com os custos e a insegurana que essa condio lhes proporciona, para passarem a compor as posies divergentes, a fim
de estabiliz-las em um patamar razovel para ambas as partes.37
233
Por outro lado, concomitantemente com o projeto de lei ordinrio acima mencioado, tambm tramita o Projeto de Lei Complementar n 469/2009,
elaborado originariamente no mbito do Ministrio da Fazenda, que - alm de
outras mudanas - objetiva alterar a redao do art. 171 do CNT, adotando
um modelo mais amplo de transao tributria, passando a admitir a atuao
preventiva da Administrao Tributria, segundo consta de sua oficiosa exposio de motivos (BRASIL, 2011-E).
Descritos de forma nuclear os motivos que justificam a elaborao dos
projetos de lei em questo, coerente estabelecer o entendimento que norteia
a utilizao da transao como forma extintiva do crdito tributrio, conforme
atualmente prevista, bem como os pontos que esto sendo objeto de crticas e
de controvrsias por parte da doutrina, procedendo ao seu devido equacionamento, o que passamos a realizar doravante.
3.2 O entendimento atual acerca da utilizao da transao do crdito tributrio
Acerca da previso contida no art. 171 do CTN, Vittorio Cassone38
leciona:
[...] em nosso ver, a transao, insituto de direito privado adotado
pelo direito tributrio, somente ocorre em casos excepcionais,
de estrema dificuldade econmico-financeira do sujeito passivo,
situao que merecer o devido exame para justificar a transao.
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Para tanto se pode depreender que a adeso aos programas de arrecadao importa em transao quando resulta em concesses concomitantes do
sujeito ativo e passivo do crdito tributrio, diga-se o pagamento pelo sujeito
passivo e no apenas o parcelamento do dbito. Compreendidos tais aspectos
relevantes da utilizao da transao tributria, oportuno verificar os pontos
controversos que emanam dos projetos de lei em exame.
REVISTA OPINIO JURDICA
237
Bernardo Ribeiro de Moraes46 menciona que transigir em matria tributria apenas possvel quando j existe lide judicial instaurada:
Assim, verifica-se que a transao tem por objeto exclusivamente
a terminao de litgio e o no litgio, dvida ou controvrsia
(como no direito privado). Como litgio somente existe em
processo contencioso, onde existe formao de juzo para a
apreciao da causa, a transao somente pode ser realizada
em processos judiciais.
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15, inciso IV, do projeto de Lei n 5.082/2009, que admite a transao em via
administrativa, propondo as seguintes modalidades:
Art. 15. So modalidades de transao para os fins desta
Lei: I - transao em processo judicial; II - transao em insolvncia civil, recuperao judicial e falncia; III - transao por
recuperao tributria; IV - transao administrativa por adeso
(BRASIL, 2011-G).
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Comentando tais dispositivos Tatiana Abranches56 assevera que o princpio da legalidade bem como a vinculao do ato administrativo de que resulta o
tributo, devem regulamentar a transao de forma a estabelecer que a obrigao
tributria decorra diretamente da lei, sem qualquer ligao com a vontade da
Administrao Pblica ou mesmo do contribuinte.
Assim, o princpio da legalidade vincula a autoridade administrativa,
no permitindo quela negociar com o sujeito passivo os termos de dispensa
ou reduo de tributo5758.
REVISTA OPINIO JURDICA
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Por sua vez, Hugo de Brito Machado67 favorvel realizao da transao, nos moldes em que aplicada atualmente:
Para aceitarmos a transao no Direito Tributrio, realmente,
basta entendermos que o tributo, como os bens pblicos em geral,
patrimnio do Estado. Indisponvel na atividade administrativa,
REVISTA OPINIO JURDICA
245
Em suma, necessrio encontrar uma soluo harmoniosa entre os princpios da impessoalidade e da supremacia do interesse pblico, de um flanco,
e o da eficincia administrativa, de outro, a se encontrar critrio objetivo que
permita a eficincia buscada pelos projetos de lei no aperfeioamento e na regu246
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00204/2008, Submete, em anexo, o anteprojeto de lei da Lei Geral de Transao em Matria Tributria ao Excelentssimo Senhor Presidente da Repblica.
Disponvel em: <http://www.camara.gov.br:. Acesso em: 14 set. 2011.
______. Poder Executivo. Exposio de motivos interministerial n 187/2008:
Submete (em anexo) o anteprojeto de Lei Complementar que altera e acrescenta
dispositivos da Lei n 5.172, de 25 de outubro de 1966, Cdigo Tributrio Nacional CTN ao Excelentssimo Senhor Presidente da Repblica. Disponvel
em: <http://www.camara.gov.br>. Acesso em: 14 set. 2011.
______. Superior Tribunal de Justia. Recurso Especial 1244347-MS
(2011/0050368-5). Recorrente: Estado do Mato Grosso do Sul. Recorrido: Comaves Indstria e Comercio de Alimentos Ltda. Relator: Min. Mauro Campbell
Marques. Julgado em 14/04/2011. Disponvel em: <www.stj.jus.br>. Acesso
em: 14 set. 2011.
______. Projeto de Lei n 5.082/2009: Dispe sobre transao tributria, nas
hipteses que especifica, altera a legislao tributria e d outras providncias.
Disponvel em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 14 set. 2011.
______. Projeto de Lei Complementar n 469/2009: Altera e acrescenta
dispositivos Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Cdigo Tributrio Nacional. Disponvel em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 14 set. 2011.
BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributrio. 4. ed. So
Paulo: Noeses, 2007.
CAIS, Cleide Previtali. O processo Tributrio. 6. ed. So Paulo: RT, 2009.
CAMPOS, Dejalma de. Direito Processual Tributrio. 9. ed. So Paulo: Atlas,
2007.
CARRAZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributrio.
22. ed. So Paulo: Malheiros: 2008.
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributrio. 20. ed. So Paulo:
Saraiva, 2008.
CASSONE, Vittorio. Direito Tributrio: fundamentos constitucionais da tributao, classificao dos tributos, interpretao da legislao tributria, doutrina,
prtica e jurisprudncia, atual. de acordo com as EC n. 32, de 11/9/2001, e n
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COLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributrio Brasileiro.
Rio de Janeiro: Forense, 2010.
251
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3
4
5
6
8
9
ALVES, Tiago Carneiro; COSTA, Tiago Durante da. In: Anlise dos dispositivos constitucionais da
nova administrao tributria: pareceres. Braslia: Fenafisco, 2008, p. 24-26.
HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributrio. 11. ed. So Paulo: Atlas, 2003, p. 477.
AMARO, Luciano. Direito tributrio brasileiro. 17. ed. So Paulo: Saraiva, 2011, p. 507.
Artigo 37, inciso XXII, da Constituio da Repblica: Art. 37: (...) XXII - as administraes tributrias
da Unio, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municpios, atividades essenciais ao funcionamento do
Estado, exercidas por servidores de carreiras especficas, tero recursos prioritrios para a realizao de suas
atividades e atuaro de forma integrada, inclusive com o compartilhamento de cadastros e de informaes
fiscais, na forma da lei ou convnio. (Includo pela Emenda Constitucional n 42, de 19.12.2003)
Vide artigo 37, inciso XVIII, da Constituio da Repblica.
Nesse sentido, Hugo de brito Machado explicita a imbricao entre a competncia tributria e a atividade
administrativa de fiscalizao tributria, in literris:
a atribuio constitucional da competncia tributria implica atribuio do poder de fiscalizar. Mas isso
no o bastante. O poder de fiscalizar atribudo entidade de direito pblico interno, vale dizer, Unio,
ao Estado, e ao Municpio. H necessidade de norma definindo o rgo de cada uma dessas entidades,
ao qual fica reservado o exerccio do poder de fiscalizar. E ainda, h necessidade de norma definindo,
em cada rgo competente para o exerccio do poder de fiscalizar, a competncia da autoridade para o
desempenho dos atos de fiscalizao. Tal como a capacidade indispensvel para a validade dos atos
jurdicos em geral, a competncia requisito necessrio para a validade dos atos administrativos, entre
os quais os atos da Administrao Tributria e, mais especificamente, os atos da fiscalizao tributria
(MACHADO, Hugo de Brito. Comentrios ao Cdigo Tributrio Nacional. So Paulo: Atlas, 2005, v.
III, p. 744).
O artigo 2 da Lei Ordinria Federal n 11.457/2007, a qual criou a Secretaria da Receita Federal do
Brasil, estipula que lhe compete, alm das atribuies j previstas em lei, planejar, executar, acompanhar
e avaliar as atividades relativas tributao, fiscalizao, arrecadao, cobrana e recolhimento das
contribuies sociais previstas nas alneas a, b e c do pargrafo nico do art. 11 da Lei no 8.212, de 24 de
julho de 1991, e das contribuies institudas a ttulo de substituio.
10 Na esfera do Distrito Federal, o artigo 111 da sua Lei Orgnica no menciona como atribuio da
Procuradoria-Geral do Distrito Federal a apurao da liquidez e certeza e a feitura da inscrio da dvida
ativa, mas, opostamente, menciona expressamente to-somente a representao judicial para a cobrana
da dvida em que o Distrito Federal seja o credor, motivo pelo qual a Secretaria da Fazenda acumula as
atribuies de cobrana administrativa do lanamento fiscal e realizao da inscrio na dvida ativa.
11 Segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal, embora as leis sobre a criao de tributos no sejam
privativas do Poder Executivo, as leis de criao de rgos e cargos pblicos da Administrao Tributria
se submetem s exigncias dos artigos 61, 1, inciso II, alnea e e 84, inciso II, da Constituio da
Repblica, motivo por que so leis de iniciativa privativa do poder executivo federal, estadual, distrital
ou municipal [vide julgamento da Ao Direta de Inconstitucionalidade n 2405 MC/RS - item III
da ementa, in verbis: ... III - Independncia e Separao dos Poderes: processo legislativo: iniciativa das
leis: competncia privativa do Chefe do Executivo. Plausibilidade da alegao de inconstitucionalidade de
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A Transao Como Forma de Extino do Crdito Tributrio: Uma Anlise das Alteraes Preconizadas
Pelos ProMetos de Lei N 5.0822009 e 4692009, Sob a egide dos Princpios da Administrao Tributria
expresses e dispositivos da lei estadual questionada, de iniciativa parlamentar, que dispem sobre criao,
estruturao e atribuies de rgos especficos da Administrao Pblica, criao de cargos e funes
pblicos e estabelecimento de rotinas e procedimentos administrativos, que so de iniciativa reservada
ao Chefe do Poder Executivo (CF, art. 61, 1, II, e), bem como dos que invadem competncia privativa
do Chefe do Executivo (CF, art. 84, II). Conseqente deferimento da suspenso cautelar da eficcia de
expresses e dispositivos da lei questionada].
12 HARADA, op. cit., p. 478.
13 CAMPOS, Dejalma de. Direito Processual Tributrio. 9. ed. So Paulo: Atlas, 2007, p. 19.
14 Importante frisar que o Superior Tribunal de Justia entende ser lcito s entidades federativas criar obrigaes acessrias at mesmo para pessoas fsicas ou jurdicas que no estejam adstritas ao cumprimento
das obrigaes principais, desde que observados os princpios da razoabilidade e proporcionalidade:
Ementa: 1. O ente federado legiferante pode instituir dever instrumental a ser observado pelas pessoas fsicas
ou jurdicas, a fim de viabilizar o exerccio do poder-dever fiscalizador da Administrao Tributria, ainda que
o sujeito passivo da aludida obrigao acessria no seja contribuinte do tributo ou que inexistente, em tese,
hiptese de incidncia tributria, desde que observados os princpios da razoabilidade e da proporcionalidade
nsitos no ordenamento jurdico (...) (REsp 1116792/PB, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEO,
julgado em 24/11/2010, DJe 14/12/2010. Disponvel em: www.stj.gov.br. Acesso em 20 de outubro de 2011
15 relevante mencionar que, eventualmente, o prazo prescricional tributrio, o qual em regra de cinco
anos, contados da data de sua constituio definitiva, pode sofrer modificaes em sua contagem casustica em decorrncia das hipteses de suspenso da exigibilidade do crdito tributrio (previstas no artigo
151 do Cdigo Tributrio Nacional) ou das situaes legalmente previstas de interrupo da prpria
prescrio tributria (nos termos do artigo 174, pargrafo nico, do Cdigo Tributrio Nacional). Nessas
circunstncias, o dever de conservao tambm ir ser estendido at o timo em que efetivamente ocorra
a prescrio.
16 Por expressa previso legal do artigo 197, pargrafo nico, do Cdigo Tributrio Nacional, tal prerrogativa no abrange informaes submetidas a dever legal de sigilo profissional, como existe em relao aos
ministros confessionais, aos advogados, aos mdicos e s instituies financeiras.
17 Segundo o artigo 202 do Cdex Fiscal, sob pena de nulidade da inscrio, estas devem ser as informaes
obrigatrias a constarem na inscrio inscrio da dvida ativa, no seu termo e certido:
I - o nome do devedor e, sendo caso, o dos co-responsveis (os quais somente podero ser executados
fiscalmente se constarem originariamente da inscrio, no tnedo de ser necessaiamente scios da empresa
vide julgamento do HC 86.309-MS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 8/2/2011),
bem como, sempre que possvel, o domiclio ou a residncia de um e de outros;
II - a quantia devida e a maneira de calcular os juros de mora acrescidos;
III - a origem e natureza do crdito tributrio (crdito tributrio originrio de tributo ou de multa tributria), mencionada especificamente a disposio da lei federal, estadual, distrital ou municipal em que
seja fundado;
IV - a data em que foi inscrita;
V - sendo caso, o nmero do processo administrativo de que se originar o crdito;
VI inscrio em livro prprio e em folha de inscrio especfica, a qual dever ser expressamente indicada na Certido da Ddiva Ativa, a qual ser utilizada como ttulo executivo extra-judicial para fins de
interposio da ao de execuo fiscal.
Interpretando o artigo supra citado, colhe-se trecho da obra de MACHADO, Hugo de Brito. Curso de
Direito Tributrio. 27. ed. So Paulo: Malheiros, 2006, p. 270:
O crdito tributrio levado inscrio como dvida depois de definitivamente constitudo. A inscrio no ato
de constituio do crdito tributrio. Pressupe, isto sim, que este se encontre regular e definitivamente constitudo
e, ainda, que se tenha esgotado o prazo fixado para seu pagamento.
A constituio em dvida ativa ocorre depois de esgotado o prazo fixado para o adimplemento do crdito
de natureza tributria, por inrcia do sujeito passivo. visto como um ato de controle de legalidade, j
que os profissionais legitimados podem, neste momento, impedir que crditos, j constitudos, eivados
de vcios prossigam sem a devida reviso (CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributrio.
20. ed. So Paulo: Saraiva, 2008, p. 577).
Paulo de Barros Carvalho (2008, p. 578) assevera que a inscrio em dvida ativa tem por escopo a
constituio unilateral do ttulo executivo que servir de base para a cobrana judicial dos crditos no
pagos Fazenda Pblica.
Ao ser inscrito em dvida ativa o dbito tem por base o valor do tributo que deixou de ser pago, mas
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continuar a ter seu valor corrigido. Deste modo ao valor inscrito inicialmente sero sobrepostos os juros
de mora (KFOURI JR, Anis. Curso de Direito Tributrio. So Paulo: Saraiva, 2010, p. 285).
Conforme se pode depreender dos ensinamentos alhures mencionados a constituio do crdito como
dvida ativa da Fazenda Pblica, atividade incumbida Administrao Tributria, representa um momento
crucial uma vez que o crdito regularmente constitudo e no adimplido pelo sujeito passivo transforma-se em ttulo executivo extrajudicial, o que possibilita sua cobrana em via judicial por meio de especial
processo jurisdicional de execuo forada, denominado como execuo fiscal, nos termos da Lei
Ordinria Federal n 6.830/80.
18 O Superior Tribunal de Justia acolhe o entendimento de que este preceptivo do CTN instituiu a figura
do princpio da imutabilidade do lanamento tributrio, o qual, insculpido no artigo 145, do CTN,
prenuncia que o poder-dever de autotutela da Administrao Tributria, consubstanciado na possibilidade de reviso do ato administrativo constitutivo do crdito tributrio, somente pode ser exercido nas
hipteses elencadas no artigo 149, do Codex Tributrio, e desde que no ultimada a extino do crdito
pelo decurso do prazo decadencial qinqenal, em homenagem ao princpio da proteo confiana do
contribuinte (encartado no artigo 146) e no respeito ao ato jurdico perfeito (REsp 1115501/SP, Rel.
Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEO, julgado em 10/11/2010, DJe 30/11/2010).
19 Sobre o lanamento por arbitramento, o Superior Tribunal de Justia j assentou a respeito do artigo 33,
6, da Lei Ordinria Federal n 8.212/91, o qual regulamanta o arbitramento no mbito das contribuies
sociais para a seguridade social, in verbis:
Ementa: (...)
29. Outrossim, a Administrao Tributria pode proceder aferio indireta ou arbitramento da base imponvel do tributo, nas hipteses enumeradas no artigo 148, do CTN, verbis: Art. 148. Quando o clculo
do tributo tenha por base, ou tome em considerao, o valor ou o preo de bens, direitos, servios ou
atos jurdicos, a autoridade lanadora, mediante processo regular, arbitrar aquele valor ou preo, sempre
que sejam omissos ou no meream f as declaraes ou os esclarecimentos prestados, ou os documentos
expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado, ressalvada, em caso de contestao,
avaliao contraditria, administrativa ou judicial.
30. O artigo 33, 6, da Lei 8.212/91, determina que, se, no exame da escriturao contbil e de qualquer
outro documento da empresa, a fiscalizao constatar que a contabilidade no registra o movimento real
de remunerao dos segurados a seu servio, do faturamento e do lucro, sero apuradas, por aferio
indireta, as contribuies efetivamente devidas, cabendo empresa o nus da prova em contrrio.
31. Destarte, a ausncia de documentao que reflita, de maneira idnea, a realidade dos fatos, autoriza
a autoridade fiscal a proceder aferio indireta das contribuies sociais devidas, desde que observados os princpios da finalidade da lei, da razoabilidade, da proporcionalidade e da capacidade
contribuinte, sendo certo, ainda, que a expedio de Ordens de Servio a fim de regular o procedimento
de arbitramento da base de clculo, autorizada pela lei ordinria, no caracteriza ofensa ao princpio da
legalidade tributria estrita (...).
(REsp 719.350/SC, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/12/2010, DJe
21/02/2011).
20 Nesse sentido, a doutrina abalizada de Luiz Felipe Silveira Difini afirma, categrico:
Em face da supremacia do interesse pblico, consubstanciado na realizao do crdito tributrio, a lei
concede a este especiais garantias e privilgios, mais extensos do que desfrutam os crditos dos particulares.
Garantias so os meios jurdicos que cercam o direito do Estado receber os crditos tributrios (por exemplo,
a inoponibilidade a este dos nus reais) e privilgios, a posio de superioridade do crdito tributrio em
relao aos demais (por exemplo, sua posio privilegiada na falncia) (DIFINI, 2005, p. 324).
21 O Superior Tribunal de Justia tem entendimento no sentido de que a natureza do lanamento realmente de
constituio do crdito tributrio, de tal modo que se cria uma norma individual e concreta constitutiva do
crdito tributrio (lanamento tributrio ou ato de formalizao do prprio contribuinte) (REsp 796.064/
RJ, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEO, julgado em 22/10/2008, DJe 10/11/2008. No mesmo
sentido: AgRg nos EDcl no REsp 871152/SP; AgRg nos EDcl no REsp 901797/SP; EDcl nos EDcl no
AgRg no REsp 760100/SP; EDcl no AgRg nos EDcl no REsp 871152/SP. Ver tambm: REsp 855.917/RS,
Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/11/2008, DJe 15/12/2008: o lanamento
tributrio veculo introdutor de norma individual e concreta constitutiva do crdito tributrio.
Outrossim, ver: (AgRg no Ag 1070751/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em
23/04/2009, DJe 03/06/2009: o lanamento compulsrio e a nica declarao unilateral constitutiva
ipso jure do crdito tributrio.
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Pelos ProMetos de Lei N 5.0822009 e 4692009, Sob a egide dos Princpios da Administrao Tributria
Tambm, neste ltimo julgado epigrafado, o STJ entendeu que o autolanamento, efetuado pelo prprio
FRQWULEXLQWHLQFOXVLYHTXDQGRID]FRQVVmRGHGtYLGDDWUDYpVGHGHFODUDomRDGPLQLVWUDWLYDGHUHQGLmentos, tambm hiptese de constituio vlida em potencial do crdito tributrio, motivo pelo qual
se conta o prazo prescricional para a exigibilidade judicial dos valores confessados pelo contribuinte a
partir da data em que este auto-constituiu o crdito tributrio:
1. Lavrada a declarao de reconhecimento do dbito, via Declarao de Rendimentos, constituindo o
crdito tributrio, remanesce ao Fisco o prazo qinqenal para a propositura da ao de exigibilidade
da exao reconhecida.
(...)
6. Relativamente ao valor declarado, a prpria declarao de dbito efetivada pelo contribuinte constitui o crdito tributrio, prescindindo de ato de lanamento. Assim, podendo desde logo ser objeto de
execuo scal, tem-se que, nesta hiptese, no h que se falar em decadrncia, porquanto j constitudo
o crdito, mas to-somente em prescrio para o ajuizamento da ao executiva.
7. A ausncia da notificao revela que o fisco, em potncia est analisando o quantum indicado pelo contribuinte, cujo montante resta incontroverso com a homologao tcita. Diversa a situao do contribuinte que
paga e o fisco notifica aceitando o valor declarado, iniciando-se, a fortiori, desse termo, a prescrio da ao
(AgRg no Ag 1070751/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 23/04/2009, DJe
03/06/2009). Disponveis em: www.stj.jus.br. Acesso em 20 de outubro de 2011.
22 O Supremo Tribunal Federal denomina de estatuto do contribuinte o conjunto de normas constitucionais
que servem de proteo ao contribuinte dos potenciais arbtrios do Poder de Tributar, seno vejamos, in
literris:
Ementa. (...) O ordenamento constitucional brasileiro, ao definir o estatuto dos contribuintes, instituiu, em
favor dos sujeitos passivos que sofrem a ao fiscal dos entes estatais, expressiva garantia de ordem jurdica que
limita, de modo significativo, o poder de tributar de que o Estado se acha investido (...).ADI 2551 MC-QO/
MG - MINAS GERAIS. Disponvel em: www.stj.gov.br. Acesso em 20 de outubro de 2011.
23 Consubstanciam protees integrantes do Estatuto do Contribuinte, dentre outras garantias expressas
ou tcitas ordem constitucional ao contribuinte, a regras, princpios e imunidades tributrias que esto
previstas nuclearmente porm, no-exclusivamente nos artigos 150, 151 e 152 da Constituio da
Repblica.
24 Podemos mencionar, dentre outros, como princpios constitucionais gerais que devem ser observados pela
Administrao Tributria, seja na normatizao ou na operacionalizao dos seus poderes: a dignidade
da pessoa humana; o pluralismo; a cidadania; a livre iniciativa e o valor social do trabalho; a separao
dos poderes; a soberania popular; a razoabilidade; a construo de uma sociedade justa livre e fraterna/
solidria; e o Estado Democrtico de Direito.
Obviamente, no h falar em Administrao Tributria atuando de forma vlida e sem a observncia desses
princpios constitucionais gerais.
Por menos curial que seja, mais do que comum e freqente a atuao do Fisco em total desacordo com
um ou mais de tais princpios constitucionais gerais, tornando invlidas normas, atos administrativos e
iniciativas governamentais contrrias a tais postulados. Em face da restrio focal deste artigo, abrimos
mo de tecer, neste timo, maiores consideraes a respeito do assunto.
25 Os princpios da legalidade administrativa, da supremacia do interesse pblico, da indisponibilidade
do patrimnio e do interesse pblico, da leladade ou da boa-f administrativa, da impessoalidade, da
moralidade, da probidade e da publicidade, dentre outros.
26 Vide artigo 108, inciso III, do Cdigo Tributrio Nacional.
27 CARVALHO, op. cit., p. 64-65.
28 ALVES; COSTA, op. cit., p. 35.
29 MESSA, op. cit., p. 37-43.
30 Nesse diapaso, ver os seguintes trechos da seara das transcries do Informativo STF 584), in verbis:
Administrao Tributria - Submisso ao Regime das Liberdades Individuais - Prova Ilcita - Ilicitude
por Derivao (Transcries)
HC 103325-MC/RJ*
ADMINISTRAO TRIBUTRIA FISCALIZAO PODERES NECESSRIO RESPEITO AOS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS DOS CONREVISTA OPINIO JURDICA
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TRIBUINTES E DE TERCEIROS.
- No so absolutos os poderes de que se acham investidos os rgos e agentes da administrao tributria, pois
o Estado, em tema de tributao, inclusive em matria de fiscalizao tributria, est sujeito observncia de
um complexo de direitos e prerrogativas que assistem, constitucionalmente, aos contribuintes e aos cidados em
geral. Na realidade, os poderes do Estado encontram, nos direitos e garantias individuais, limites intransponveis,
cujo desrespeito pode caracterizar ilcito constitucional.
- A administrao tributria, por isso mesmo, embora podendo muito, no pode tudo. que, ao Estado, somente
lcito atuar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei (CF, art. 145, 1), consideradas, sobretudo, e
para esse especfico efeito, as limitaes jurdicas decorrentes do prprio sistema institudo pela Lei Fundamental,
cuja eficcia que prepondera sobre todos os rgos e agentes fazendrios restringe-lhes o alcance do poder de
que se acham investidos, especialmente quando exercido em face do contribuinte e dos cidados da Repblica, que
so titulares de garantias impregnadas de estatura constitucional e que, por tal razo, no podem ser transgredidas
por aqueles que exercem a autoridade em nome do Estado.
A GARANTIA DA INVIOLABILIDADE DOMICILIAR COMO LIMITAO CONSTITUCIONAL
AO PODER DO ESTADO EM TEMA DE FISCALIZAO TRIBUTRIA CONCEITO DE CASA
PARA EFEITO DE PROTEO CONSTITUCIONAL AMPLITUDE DESSA NOO CONCEITUAL, QUE TAMBM COMPREENDE OS ESPAOS PRIVADOS NO ABERTOS AO PBLICO,
ONDE ALGUM EXERCE ATIVIDADE PROFISSIONAL: NECESSIDADE, EM TAL HIPTESE,
DE MANDADO JUDICIAL (CF, ART. 5, XI).
- Para os fins da proteo jurdica a que se refere o art. 5, XI, da Constituio da Repblica, o conceito normativo
de casa revela-se abrangente e, por estender-se a qualquer compartimento privado no aberto ao pblico, onde
algum exerce profisso ou atividade (CP, art. 150, 4, III), compreende, observada essa especfica limitao
espacial (rea interna no acessvel ao pblico), os escritrios profissionais, inclusive os de contabilidade, embora
sem conexo com a casa de moradia propriamente dita (NELSON HUNGRIA). Doutrina. Precedentes.
- Sem que ocorra qualquer das situaes excepcionais taxativamente previstas no texto constitucional (art. 5, XI),
nenhum agente pblico, ainda que vinculado administrao tributria do Estado, poder, contra a vontade de
quem de direito (invito domino), ingressar, durante o dia, sem mandado judicial, em espao privado no aberto
ao pblico, onde algum exerce sua atividade profissional, sob pena de a prova resultante da diligncia de busca e
apreenso assim executada reputar-se inadmissvel, porque impregnada de ilicitude material. Doutrina. Precedentes
especficos, em tema de fiscalizao tributria, a propsito de escritrios de contabilidade (STF).
- O atributo da auto-executoriedade dos atos administrativos, que traduz expresso concretizadora do privilge
du prelable, no prevalece sobre a garantia constitucional da inviolabilidade domiciliar, ainda que se cuide de
atividade exercida pelo Poder Pblico em sede de fiscalizao tributria. (...)
Publique-se.
Braslia, 30 de maro de 2010.
Ministro CELSO DE MELLO
Relator.
Ainda, no julgamento do Habeas Corpus HC - 97567 (vide seo de transcries do Informativo STF n 574),
entendeu-se que seria ilcito o Estado determinar escuta ambiental de escritrio de advocacia, pois tal situao
levaria ao descumprimento do direito fundamental inviolabilidade domiciliar.
31 Vide deciso judicial no Informativo do Supremo Tribunal Federal n 613:
Quebra de sigilo bancrio pela Receita Federal - 1
O Plenrio, por maioria, proveu recurso extraordinrio para afastar a possibilidade de a Receita Federal ter
acesso direto a dados bancrios da empresa recorrente. Na espcie, questionavam-se disposies legais que autorizariam a requisio e a utilizao de informaes bancrias pela referida entidade, diretamente s instituies
financeiras, para instaurao e instruo de processo administrativo fiscal (LC 105/2001, regulamentada pelo
Decreto 3.724/2001). Inicialmente, salientou-se que a Repblica Federativa do Brasil teria como fundamento a
dignidade da pessoa humana (CF, art. 1, III) e que a vida gregria pressuporia a segurana e a estabilidade, mas
no a surpresa. Enfatizou-se, tambm, figurar no rol das garantias constitucionais a inviolabilidade do sigilo da
correspondncia e das comunicaes telegrficas, de dados e das comunicaes telefnicas (art. 5, XII), bem como
o acesso ao Poder Judicirio visando a afastar leso ou ameaa de leso a direito (art. 5, XXXV). Aduziu-se, em
seguida, que a regra seria assegurar a privacidade das correspondncias, das comunicaes telegrficas, de dados
e telefnicas, sendo possvel a mitigao por ordem judicial, para fins de investigao criminal ou de instruo
processual penal. Observou-se que o motivo seria o de resguardar o cidado de atos extravagantes que pudessem,
de alguma forma, alcan-lo na dignidade, de modo que o afastamento do sigilo apenas seria permitido
mediante ato de rgo eqidistante (Estado-juiz). Assinalou-se que idntica premissa poderia ser assentada
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RESUMO
No presente artigo, trabalha-se essencialmente a tematizao da
identidade nacional, a partir da historiografia, que nos possibilitou
compreender como possvel contar a histria com mltiplos
olhares. Em outras palavras, pode-se recontar a histria, j que
esta no se encontra fixa no tempo, imutvel e acabada. Mesmo
um fato distante pode ganhar um novo significado, ainda que com
os limites que lhe so intrnsecos. Buscou-se, tambm, enfatizar
o pensamento poltico tradicional, considerado como aquele
formado, especialmente, pelos autores dos anos 1930. Nesses, foi
possvel apontar a influncia do pensamento weberiano. Posteriormente, apresentam-se as crticas dos autores contemporneos
que proporcionaram uma reviso do modo como o brasileiro
sempre se compreendeu. Enfim, este artigo almejou contribuir
para a questo democrtica, j que, dependendo do modo como
o povo conta sua histria, influencia, decisivamente, na assuno
de responsabilidade quanto a seu destino pblico.
Palavras chaves: Identidade. Patrionialismo. Democracia. Brasil.
INTRODUO
No Brasil, desde que comeou o processo de explorao e colonizao,
h um abismo entre o ftico e o normativo. Quando o portugus se instalou nas
terras dos ndios, seja com a pretenso apenas de explorar os recursos daquela
*
Mestre em Teoria do Direito e doutorando em Direito Privado pela PUC Minas. Professor
na Faculdade Mineira de Direito/PUC Minas e na Faculdade Novos Horizontes.
** Mestrando em Direito Pblico pela PUC Minas. Professor na Faculdade Mineira de Direito/
PUC Minas.
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terra ainda inclume, seja j no perodo que comeou com uma atitude de colonizao, iniciou um processo de implementao de regras que jamais recebeu
uma eficaz acolhida por parte de seus destinatrios. Muitos fatores contriburam
para que isso ocorresse. Um deles foi a dureza de tais mandamentos, j que os
mesmos visavam, to somente, otimizar a forma da metrpole obter benefcios em
sua colnia. O outro, tambm fundamental, que medida que ia se constituindo
a gente brasileira, por um lado, por outro, o da metrpole normatizadora, uma
indiferena e at mesmo uma cegueira quanto s especificidades daquelas nascentes formas de vida, que eram to diferentes das europias, tomava conta de
nossos descobridores/exploradores /colonizadores. Um ltimo fator foi a ausncia
de colaborao brasileira na elaborao de tais leis. Dessa forma, fazer com que o
povo brasileiro tivesse conscincia jurdica, tornando as leis eficazes, era exigir
demais de uma gente que das leis recebia apenas o rigor das cobranas de impostos
e a truculncia do autoritarismo metropolitano. Ora, essa percepo do Estado
como algo que apenas explora e pune fez com que surgisse, gradualmente, naquela
incipiente sociedade, uma forte descrena quanto ao mesmo, fazendo com que a
vida pblica fosse sinal de um certo terror para a maioria das pessoas. Digo maioria
porque, para a minoria, a situao era outra. Para aqueles que possuam alguma
relao com o poder, as leis no eram to rigorosas. Alis, curioso e lastimvel
estudar a histria do Brasil e perceber que est na formao de nossa sociedade
um desejo incomensurvel, por parte de uma camada social, de participar da vida
pblica. Obviamente, que com o interesse de receber do Estado todos os benefcios e privilgios possveis e no para contribuir para o desenvolvimento do pas.
Todos esses fatores, o abismo entre o ftico e o normativo e a espria
apropriao privada dos cargos pblicos somados ao fato que houve uma delicada
e de grandes repercusses transferncia de terras da Coroa portuguesa para as
mos de particulares, fez com que a separao pblico/privado nunca ocorresse
de forma cabal em nosso pas. Da advieram conseqncias que so facilmente
notadas por qualquer brasileiro e em qualquer poca em que tenha vivido: do
poder pblico pode se esperar muito pouco (ou, ao contrrio, muito para alguns),
j que de certa forma, ele tem servido principalmente aos interesses privados
daqueles que tem o privilgio de serem, nas palavras de FAORO, os donos do
poder (2001). Situao que faz nascer uma relao promscua entre os interessados, ou seja, uma rede de favores, de corrupo e de relaes inescrupulosas
comea a se instalar entre aqueles que detm ou que pretendem deter o poder.
Simultaneamente, os que esto fora do jogo, cada vez mais ficam submetidos
ao autoritarismo desse poder privado que se instalou no mbito pblico.
Essa preliminar abordagem evidencia-nos a problemtica relao pblico/
privado nas origens do Brasil. Mas h mais dificuldades para rechear esta complicada situao: o que os socilogos e antroplogos chamam de dramas sociais
do cotidiano. Em nosso caso, o famigerado voc sabe com quem est falando?
e o peculiarssimo jeitinho brasileiro. Um, autoritrio, presunoso e arrogante.
O outro, cordial, suave e at simptico. Ambos, rompendo as barreiras que
separam a vida pblica da vida privada.
REVISTA OPINIO JURDICA
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Esta a posio de Habermas (HABERMAS, 1997, p. 369 e ss.) Segundo ele, Weber identificou
apenas um aspecto da ao social que se caracteriza, principalmente, pela ao comunicativa.
REVISTA OPINIO JURDICA
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De qualquer modo, um tremendo mal-entendido supor que uma metodologia individualista pressupe tambm um sistema individualstico de valores.
Uma opinio to errada quanto confundir a tendncia relativamente inevitvel
dos conceitos sociais adquirir um carter racional, baseando-se na crena de
que motivos racionais ou que o racionalismo pode ser positivamente avaliado.6
Em outras palavras, precisamos entender que a anlise de Weber no
uma defesa nem, sequer, um reducionismo individualista da ao, mas, principalmente, uma metodologia.
Outro aspecto metodolgico valiosssimo em Weber e que ser muito utilizado
por Srgio Buarque de Holanda em Razes do Brasil o conceito de tipo ideal. Para
Weber, podemos atribuir sentido a uma ao histria, situada no tempo e no espao,
assim como podemos trabalhar metodologicamente com o tipo ideal, conceitual
de sentido subjetivo, atribudo a um ator hipottico num dado tipo de conduta.7
O conceito do tipo ideal permitir que essa metodologia seja utilizada por autores
em quaisquer sociedades, pois, a mesma no leva em conta, como uma espcie de
padro normativo fixo que pode ser exportado irrestritamente, caractersticas locais.
E, conexionando os dois conceitos citados, temos que a construo de uma ao
rigorosamente racional, de acordo a fins, por causa da sua clara inteligibilidade e
falta de ambigidade racional, serve sociologia como um tipo ideal. 8
Na introduo de seu famoso livro A tica protestante e o esprito do capitalismo, Weber nos mostra que somente na civilizao ocidental, haverem aparecido
fenmenos culturais dotados (como queremos crer) de um desenvolvimento
universal em seu valor e significado.9 Assim foi com o desenvolvimento da
cincia, do capitalismo, do Estado moderno, do direito formal burgus.
Para Weber, no h como separarmos o advento dos Estados modernos
do surgimento do capitalismo e do direito formal. Ao discorrer sobre as origens
do capitalismo, diz o autor que
[...] entre os fatores de importncia incontestvel, encontra-se as
estruturas racionais do direito e da administrao. Isto porque o
moderno capitalismo racional baseia-se, no s nos meios tcnicos
de produo, como num determinado sistema legal e numa administrao orientada por regras formais. Sem esta, seriam viveis
o capitalismo mercantil aventuroso e especulativo, e ainda toda
espcie de capitalismo politicamente determinados, mas no o
seria empresa racional alguma sob iniciativa particular, com capital
fixo e baseada num clculo seguro.10
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[...] para o direito, o aparecimento das religies de redeno possibilitou a separao definitiva entre preceitos jurdicos e normas religiosas...outrossim, a racionalizao do direito torna-se possvel quando
se processa um distanciamento total dos preceitos religiosos ou ticos.
Moral e direito assinalam complexos de racionalidade distintos.12
267
Antes de explicar com profundidade os motivos que levaram o capitalismo a se desenvolver entre os protestantes, Weber menciona dados que so
estatsticos e intuitivos ao mesmo tempo: boa parte da fortuna do mundo est
nas mos de protestantes assim como a maioria dos paises mais avanados economicamente serem tambm de maioria religiosa protestante16. E para entender
o por que disso ser assim, devemos entender que o racionalismo econmico
uma caracterstica intrnseca aos protestantes, sendo, desnecessrio e equivocado
buscar na histria ou em outros fatores explicaes de tal racionalidade17. Para
Weber, foi o calvinismo, dentre as religies reformadas, a que mais promoveu o
desenvolvimento do esprito do capitalismo.18
Uma importante mudana operada pela Reforma foi a valorizao do
trabalho secular a partir do sentido atribudo palavra vocao, dado por Lutero.
Diferentemente do que era para os catlicos,
[...] nesse conceito de vocao que se manifestou o dogma central
de todos os ramos do Protestantismo, descartado pela diviso
catlica dos preceitos ticos em praecepta e consilia, e segundo a
qual a nica maneira de viver aceitvel para Deus na superao
da moralidade secular pela ascese monstica, mas sim no cumprimento das tarefas do sculo, imposta ao indivduo por sua posio
no mundo. Nisso que est sua vocao. 19
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O trabalho e uma recusa em desfrutar a vida passam a ser caractersticas de um ascetismo que foi decisivo no surgimento do capitalismo. Havia um
incentivo ao trabalho e a se buscar o lucro, mas uma condenao ao usufruir
das riquezas. Uma combinao de fatores que foi fundamental para o desenvolvimento do capitalismo.
A avaliao religiosa do infatigvel, constante e sistemtico labor
vocacional secular, como o mais alto instrumento de ascese, e,
ao mesmo tempo, como o mais seguro meio de preservao da
redeno da f e do homem, deve ter sido presumivelmente a
mais poderosa alavanca da expresso dessa concepo de vida,
que aqui apontamos como esprito do capitalismo.23
269
Assim, com essa espria apropriao privada dos cargos pblicos, a separao pblico/privado nunca ocorreu de forma cabal em nosso pas. Em outras
palavras, por toda parte, em todas as atividades, as ordenanas administrativas,
dissimuladas em leis, decretos, avisos, ordenam a vida do pas e das provncias,
confundindo o setor privado ao pblico.26
Um outro problema brasileiro diz respeito nossa recepo ao Liberalismo. Importado sem exame e sem problematizao, essa ideologia deparou-se
com peculiaridades de nossa poltica e sociedade levando seus representantes
uma duplicidade, j que, ao chegarem ao poder, tornavam-se conservadores.
Acerca do capitalismo, Faoro nos diz que um capitalismo politicamente
orientado, aventureiro sobreviveu e influenciou o capitalismo moderno, de
ndole industrial. Como conseqncia, a comunidade poltica conduzia os
negcios, como negcios privados seus, na origem, como negcios pblicos
depois. Dessa realidade se projeta, em florescimento natural, a forma de poder,
institucionalizada num tipo de domnio: o patrimonialismo, cuja legitimidade
assenta no tradicionalismo assim porque sempre foi.27
A percepo de Faoro que o capitalismo no foi capaz de promover,
para alm das tcnicas industriais uma transformao de mentalidades, j que
devido persistncia secular da estrutura patrimonial28, certas caractersticas
na economia e do Estado moderno no nos alcanaram. Assim se como vimos
acima, para Weber, capitalismo, Estado moderno e direito formal burgus so
fenmenos cooriginrios e interdependentes, na formao do Brasil, tais fenmenos ficariam comprometidos desde o incio, em virtude do privatismo, da
apropriao privada do espao pblico.
Num estgio inicial, o domnio patrimonial, desta forma constitudo pelo estamento, apropria as formas econmicas de desfrute
dos bens, das concesses, dos cargos, numa confuso entre o setor
pblico e o privado, que com o aperfeioamento da estrutura, se
extrema em competncias fixas, com diviso de poderes, separando-se o setor fiscal do setor pessoal. O caminho burocrtico do
estamento, em passos entremeados de compromissos e transaes,
no desfigura a realidade fundamental, impenetrvel s mudanas.
O patrimonialismo pessoal se converte em patrimonialismo estatal,
que adota o mercantilismo como tcnica de operao da economia.
Da se arma o capitalismo poltico, ou o capitalismo orientado. 29
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271
Temos uma tradio que, sem descuidar dos estmulos socioculturais ao comportamento prtico, enfatiza o aspecto mais propriamente institucional da anlise. Raimundo Faoro e Simon
Scwartzman so bons exemplos dessa tradio institucionalista(SOUZA, 1999, p. 38).
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Enquanto o protestante asctico encarna a personalidade tpica da modernidade, racional e igualitrio, confiante nas relaes formais asseguradas pelo
direito, o homem cordial, por sua vez, , avesso s relaes formais, age movido
por emoes e no afeito civilidade, que tem como pressuposto a igualdade.
O que nos mostra quo distante um tipo (ideal) do outro:
[...] uma leitura atenta da caracteriologia do homem cordial
permite deduzir que, ele sim, , na verdade, o inverso perfeito do
protestante asctico como definido por Max Weber. O homem
cordial a ausncia de personalidade por excelncia, no sentido de
que o contraponto implcito na cabea de Srgio Buarque, leitor
da obra weberiana primeira hora, a personalidade por excelncia
para Weber: o protestante asctico39
273
8 A QUESTO HISTRICA
No h dvida de que preciso valorizar nossa histria. No comeamos
nossa histria, nem pessoal e nem social, a partir do nada. Entretanto, o que
se nos coloca o seguinte: Mas que histria? Contada por quem? Imutvel? E
ser inocente qualquer forma de contar a histria? Ou a tambm h questes
que merecem reflexo? Entendo que existimos no tempo: os homens e as
sociedades humanas, por serem temporais, no permitem um conhecimento
imediato, total, absoluto e definitivo. A reescrita da histria torna-se, ento,
uma necessidade.40 A vivncia no presente, com suas mudanas, aprendizado e
ressignificaes de fatos ocorridos, modifica a percepo que se tem do passado.
E este constantemente reelaborado pelo presente:
O presente muda e, nesta sua mudana, o passado e o futuro so
constantemente rearticulado, obrigando reescrita da histria...
As mudanas no processo histrico alteram as interpretaes da
histria. Toda interpretao, que uma atribuio de sentido ao
vivido, se assenta sobre um mirante temporal, um ponto de
vista, em um presente v-se a partir de um lugar social e um
tempo especficos.41
Alm disso, como foi falado acima acerca do narrar naes e da escolha que se faz do passado, pode-se perceber uma perspectiva que expe, a
todo instante, o discurso histrico crtica. No se trata, portanto, de uma
determinada viso da histria, mas, antes de tudo, de uma viso das vises que
se fazem da histria. Em outras palavras, uma questo de historiografia:
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9 A QUESTO DA IDENTIDADE
Aqui os problemas no so menores. Alm de se poderem acumular as
dificuldades j mencionadas, falar em identidade nacional, no singular, aps os
problemas j enfrentados, praticamente impossvel. Querer se delinear uma
nica identidade nacional aceitar uma imobilidade social, uma histria fixa,
uma narrativa totalizante. O certo que no se pode falar em carter nacional, em caractersticas nicas de uma nao. Toda inteno unificadora, nesse
campo, engessa, reduz e aprisiona. O mais adequado renunciar pretenso
de se encontrar uma identidade comum a todos as pessoas de uma determinada
sociedade. prefervel pensar em pluralidade de identidades. Toda sociedade
composta por pessoas diferentes, por contradies, por conflitos e divergncias.
O importante
[...] provar que deve haver, em todo processo identitrio, seja ele
de natureza tnica, nacional, cultural ou religiosa, uma salutar
dose de ambigidade, de ambivalncia, de aceitao da diversidade constitutiva de qualquer estado de sociedade. Assim, a(s)
identidade(s) sempre melhor usar a palavra no plural!45
Ademais, ainda com relao identidade, h um importante debate terico, muito relevante para a presente discusso: o debate entre essencialistas
e no essencialistas.
[...] a formulao essencialista do problema do ponto de vista
da continuidade: de onde viemos: Quem somos? E seremos? E
fomos? Quem o nosso outro absoluto? Qual o ncleo autntico e estvel do nosso eu e grupo? O que constitui a nossa
unidade acima de toda mudana e vicissitude? E constroem uma
ontologia, uma metafsica do ser como ser...A formulao no
essencialista do ponto de vista da descontinuidade: como temos
nos representado? Como essas representaes nos afetam? Quem
podemos nos tornar? O que desejamos ser? Os no essencialistas
vem a identidade construda historicamente pelo discurso e em
relaes prticas e mltiplas, a vem como um processo nunca
completado e sempre transformado, como um avano em direo
a um processo nunca completado e sempre transformado, como
um avano em direo ao um eu desconhecido.46
275
Deste modo, entendo no ser possvel endossar o pensamento dos essencialistas, segundo o qual o conceito de identidade (no singular) poderia,
inclusive, ser o suporte de um patriotismo.
CONCLUSO
O presente trabalho pretendeu fazer uma conexo entre alguns conceitos do pensamento de Weber e a anlise que feita sobre o Brasil. Ainda que
possa discordar dos rumos de tais anlises tiveram, inegvel, entretanto, sua
importncia para nos ajudar a nos compreendermos. E o instrumental terico
weberiano foi fundamental nessa empreitada. Mas ele precisa ser relativizado.
Procuramos, tambm, demonstrar que devemos ficar atentos ao modo que
contamos nossa histria e pensamos nossa identidade.
Obviamente, no Brasil h muitos problemas que so percebidos ao longo de
sua histria. O entrelaamento entre o pblico e o privado, o autoritarismo, a corrupo, a acentuada desigualdade social, a criminalidade, a impunidade, uma cidadania
deficitria. Enfim, mazelas que qualquer olhar lanado sobre o pas, erudito ou no,
capta em uma realidade complexa e complicada. Dificilmente discordaramos das
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A partir do que foi falado, discordo dos tericos que tentam encontrar
identidades comuns para ser o suporte, o fundamento para o patriotismo. Entretanto, no pretendo, de forma nenhuma, descartar todo tipo de patriotismo, mas
apenas aquele que exige uma unidade de identidade e que desconsidera o atual
pluralismo societal. Sendo assim, concordamos com Habermas quando ele diz que
[...] a existncia de sociedades multiculturais, tais como a Sua
e os Estados Unidos, revela que uma cultura poltica, construdas
sobre princpios constitucionais, no depende necessariamente de
uma origem tnica, lingstica e cultura comum a todos os cidados.
Uma cultura poltica liberal forma apenas o denominador comum
de um patriotismo constitucional capaz de agudizar, no somente o
sentido para a variedade, como tambm a integridade das diferentes
e coexistentes formas de vida de uma sociedade multicultural.53
No pretendi abordar o assunto com alguma profundidade, o que deixarei para outras ocasies. Acerca do patriotismo constitucional e sua relao com a histria, a identidade e o
pluralismo, ver CATTONI DE OLIVEIRA (2005)
REVISTA OPINIO JURDICA
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REFERNCIA
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WEBER, 1989, op. cit., p.29.
Ibid., p. 9-10.
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Ibid., p. 10.
ARGELO, op. cit., p. 160.
Ibid., p. 160.
Ibid., p. 161
Ibid., p. 161.
VIANA, op. cit., p.175.
WEBER, 1996, op. cit., p. 19-21.
Ibid., p. 23.
Ibid., p.26.
Ibid., 1996, 53.
Ibid., p.76-77.
Ibid., p. 80.
Ibid., p. 113.
Ibid., p. 123.
FAORO, Raymundo. Os donos do poder: Formao do patronato poltico brasileiro. 3. ed. So Paulo:
Globo, 2001, p. 448.
Ibid., p.448-449.
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47
48
49
50
51
52
53
Ibid., p. 452.
Ibid., p. 819.
Ibid., p. 822.
Ibid., p. 823.
Ibid., p. 837.
Ibid., p. 837.
HOLANDA, Srgio Buarque de. Razes do Brasil. 26. ed. So Paulo: Companhia das Letras, 2005, p. 146.
Ibid., p.146.
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Csar de Castro (Org.). Nenhum Brasil existe: Pequena Enciclopdia. Rio de Janeiro: UniverCidade
Editora, 2003, p. 361.
Ibid., p. 361.
SOUZA, op. cit., p. 33.
Ibid., p. 34-35
REIS, Jos Carlos. As identidades do Brasil: de Varnhagen a FHC. 8. ed. Rio de Janeiro: FGV, 2006a, p.
7.
Ibid., p. 9.
Ibid., p. 9.
ROCHA, op. cit., p. 21.
FREITAS, op. cit., p. 8-9.
BERND, 2003, op. cit., p.27.
REIS, Jos Carlos, As Identidades do BRASIL 2: De Calmon a Bomfim. A favor do Brasil: direita ou
esquerda?. Rio de Janeiro: FGV, 2006b, p. 11.
HABERMAS, Jrgen. A luta por reconhecimento no Estado Democrtico de Direito. In: SPERBE, George; SOETHE, Paulo Astor (Trad.). A incluso do outro: estudos de teoria poltica. So Paulo: Loyola,
2002.
BERND, 2003, op. cit., p. 21.
REIS, 2006b, op. cit., p. 13.
Ibid., p. 13.
Ibid., p. 22.
CATTONI DE OLIVEIRA, Marcelo Andrade. Poder Constituinte e Patriotismo Constitucional. Belo
Horizonte: Mandamentos, 2006, p. 87.
HABERMAS. Cidadania e identidade nacional. In: SIEBENEICHLER, Flvio Beno (Trad.). Direito e
Democracia: entre facticidade e validade. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997, v. 2, p. 289.
THE IDEOLOGY OF DELAY AS OF THE WERBERIAN ANALYSIS OF BRAZIL AND THE (REBUILDING OF NATIONATIANL IDENTITY
ABSTRACT
This article aims at focusing essentially on the theme
of national identity, as of the historical assets which
has enabled us to understand how History can be
told from multiple perspectives. In other words,
History can be retold, since it is not fixed in time,
unchanging and completed. Even a long gone fact
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RESUMO
O presente trabalho tem por fim identificar meios aptos a aparelhar o Estado a efetivar polticas de proteo e preservao
ambientais, de forma sustentvel. Utiliza-se do Direito Tributrio
como mais uma ferramenta para impulsionar o recicle de lmpadas fluorescentes, atravs da instituio e cobrana de taxas
pertinentes decorrentes do servio, bem como contribuio de
interveno no domnio econmico, tendo esta ltima por meta
o custeio financeiro para a criao de indstrias de reciclagem.
Palavras-Chave: Tributao Ambiental. Fiscal e Extrafiscal.
Lei de Resduos. Lmpadas Fluorescentes. Polticas Pblicas.
Logistica Reversa.
1 INTRODUO
A partir da Conveno de Estocolmo em 1972, o direito ao meio ambiente
equilibrado transmudou-se de uma garantia de falcia, at ento com base
jusnaturalstica, passando a fazer parte da seara dos direitos humanos, para, no
* Advogada. Bacharela em Direito pelo Centro Universitrio Jorge Amado.
** Professor de Direito Ambiental e Constitucional do Centro Universitrio Jorge Amado/Unijorge. Mestre e Doutorando em Direito Pblico da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
Visiting Scholar da Michigan State University (MSU/USA). Pesquisador Visitante da University of Science and Technology of China (USTC/China). Membro-fundador da Asociacin
Latinoamericana de Derecho Ambiental. Pesquisador do Ncleo Interdisciplinar de Pesquisa
e Extenso em Direito Ambiental e Direito Animal NIPEDA/UFBA: www.nipeda.direito.
ufba.br. Presidente do Instituto Abolicionista Animal IAA: www.abolicionismoanimal.org.
br. Coordenador da Revista Brasileira de Direito Animal E-mail: [email protected].
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2 TRIBUTAO AMBIENTAL
A Lei Maior ao prever em seu art. 225, que todos tm direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial
sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder pblico e coletividade o dever de
defend-lo e preserv-lo para as presentes e futuras geraes (CF, 1988), criou
imposies explcitas ao Poder Pblico e coletividade do dever de defend-lo
e preserv-lo e uma obrigao implcita de no degrad-lo.
Resta conferido, portanto, s normas protetivas ambientais um plus, que
o supedneo constitucional, transmudadando-se em um direito fundamental.
Com isso sua proteo e preservao, bem como a punio de prticas degradatrias ganham maior reforo, posto que agora esto amparadas no sustentculo
de todo o ordenamento jurdico ptrio, conferindo s normas infraconstitucionais sustento e validade. Este avano foi alcanado devido a amplas discusses,
sobretudo, aps a Conferncia de Estocolmo de 1972, que significou o primeiro
passo de carter mundial para soluo dos problemas ambientais. J. J. Canotilho e
Vital Moreira, por tal razo afirmam categoricamente que o direito ao ambiente
reputado como sendo um dos novos direitos fundamentais (1991,p.37).
Conforme bem descreve o Ministro do Superior Tribunal de Justia,
Antonio Benjamin:
No so poucas, nem insignificantes, as conseqncias da concesso de status de direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Antes de mais nada, o direito fundamental
leva formulao de um princpio da primariedade do ambiente,
no sentido de que a nenhum agente, pblico ou privado, lcito
trat-lo como valor subsidirio, acessrio, menor ou desprezvel.
Alm disso, como direito fundamental, estamos diante de direito
de aplicao directa, em sentido preceptivo e no apenas programtico; vale por si mesmo, sem dependncia da lei. A ulterior
regulamentao ou desenvolvimento pelo legislador ordinrio
ajudar somente a densificar a sua exeqibilidade. E vincula, desde
logo, todas as entidades pblicas e privadas1
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Entender o Tributo Ambiental, ir alm da relao Estado versus contribuinte. , antes de tudo, voltar os olhos para a atividade do homem moderno,
pois a degradao desenfreada e sem responsabilidade do meio ambiente, e isto
inegvel, tem sido feita para atender de forma imediata, embora descontrolada,
as exigncias sociais.
Em outras palavras as exigncias sociais tm um peso direto no quadro
que se apresenta. Seria, portanto, inconsistente e superficial, buscar atravs
desse trabalho criticar a relao, da qual no se pode abrir mo, existente entre
meio ambiente e sua explorao econmica.
de fundamental importncia a busca por um desenvolvimento econmico sustentvel. O Estado no pode fechar os olhos para isso, devendo atuar
com a sua longa manus. Para tanto, h que se valer do Poder de Polcia Estatal,
muito bem referido pelo Professor Heron Gordilho.
[...] na falha do mercado, o Estado deve intervir, quer seja instituindo tributos ambientais com vista a financiar os danos decorrentes de
determinada atividade degradante, quer concedendo subvenes,
incentivos ou graduando diferenciadamente as alquotas dos impostos existentes....preveno, que exige que o poder pblico evite a
ocorrncia dos danos ao meio ambiente , de modo que as atividades
potencialmente poluentes devam ser consideradas antecipadamente, para que seja possvel a reduo ou a eliminao de suas causas6
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E prossegue:
A lei, como preceituao geral que , tem em vistas situaes
abstratamente consideradas, fazendo-se preciso acomod-ls s
situaes particulares compreendidas na generalidade de seu enunciado. Esses fenmenos que lhe sucedem, tendendo a concretizar a
vontade nela expressa, so normalmente e primariamente o objeto
da funo administrativa. Atendendo natureza e repercusso
de tais atos na ordem jurdica pode-se definir essa funo como
aquela pela qual o Estado determina situaes jurdicas individuais,
concorre para a sua formao, e pratica atos materiais12
Aos agentes administrativos so conferidos poderes e deveres. Em verdade, os poderes so meros instrumentos do fim ltimo colimado que o cumprimento integral dos deveres, com a prestao eficiente dos servios pblicos.
Jos dos Santos Carvalho Filho ao se debruar sobre os poderes administrativos
ensina que:
[...] deles emanam duas ordens de conseqncia: 1) So eles
irrenunciveis; e 2) Devem ser obrigatoriamente exercidos pelos
titulares. Desse modo, as prerrogativas pblicas, ao mesmo tempo
em que constituem poderes para o administrador pblico, impe-lhe o seu exerccio e lhe vedam a inrcia, porque o reflexo desta
atinge, em ltima instncia, a coletividade, esta a real destinatria
de tais poderes.13
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Contudo, quaisquer tipos de atuaes estatais devem estar atreladas aos princpios ambientais: do desenvolvimento sustentvel, da precauo e da preveno.
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Este material ao mesmo tempo em que sinnimo de eficincia e economia atinge diretamente a sade pblica uma vez que seu descarte de maneira
inconseqente gera danos ao meio ambiente, contaminando a flora e fauna. O
ser humano pode se contaminar de forma direta, tendo contato com o produto
in natura, ou indireta, atravs do ciclo da cadeia alimentar. Pesquisas comprovam que:
[....] geralmente quem foi intoxicado dessa maneira pode apresentar sintomas como dor de estomago, diarria, tremores,depresso,
ansiedade, gosto de metal na boca, dentes moles com inflamao e
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O prisma de tal logstica parte do princpio de que quanto maior a nocividade do produto, maiores devero lhe ser dirigidos os especiais cuidados,
visando o seu reaproveitamento e contnuo fluxo.
A logstica inversa, conhecida tambm por reversvel, reversa ou
verde, a rea da logstica que trata, genericamente, do fluxo
fsico de produtos, embalagens ou outros materiais, desde o ponto
de consumo at ao local de origem.26
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A busca pelo fluxo das matrias primas uma tendncia mundial, ganhando cada dia mais fora e relevncia.
No Brasil existe um Comit Interministerial de Incluso Social de Catadores de Materiais Reciclveis criado por Decreto Federal em 11/09/2003,
o qual coordenado pelo Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate
Fome e Ministrio das Cidades. Dentre seus objetivos destacamos o de auxiliar
o processo de estruturao da logstica, de armazenamento e transporte de
resduos slidos.
Conforme dito alhures, todos os atores sociais tm que estar envolvidos
no processo da logstica-reversa. Sejam os produtores, sejam exportadores, os
importadores, os distribuidores, os comerciantes, os consumidores, e com posio
de merecido destaque, para os trabalhos desenvolvidos pelas cooperativas de
catadores de materiais reciclveis, que tanto tm contribudo com seus esforos
para um contnuo fluxo de matrias primas, o que, sem dvida, de grande
valia para o meio ambiente e para o desenvolvimento econmico sustentvel.
5 CONCLUSO
Diante de todas as explanaes at agora apresentadas possvel chegar
s seguintes concluses:
1
A partir da Conveno de Estocolmo de 1972 inicia-se o processo de positivizao do direito ambiental, afastando-se da concepo puramente jusnaturalista. Fruto da evoluo dos direitos, com a passagem do Estado Liberal
para um Estado mais intervencionista, com o reconhecimento e proteo
dos direitos ditos difusos, reputados como aqueles de objeto indivisvel, cuja
titularidade no se pode determinar, a Constituio Federal de 1988 dedicou
um capitulo especial ao meio ambiente incumbindo a todos a sua proteo
e preservao, conferindo-lhe um satus de direito fundamental. Com isso
restou definido que tanto os poderes pblicos como toda a sociedade civil
tem o dever de contribuir na questo ambiental.
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301
Dvida no resta, de que as lmpadas fluorescentes tm importncia estratgica para o setor energtico de qualquer pas, todavia, apresenta em sua
composio a substancia qumica mercrio, elemento altamente txico que
pode provocar danos irreversveis ao ser humano.
Notou-se,, ademais, a ausncia de normatizao federal, necessria a disciplinar a questo dos resduos slidos decorrentes da atividadde produtiva,
especialmente aqueles resduos nocivos, de forma a amenizar os profundos
impactos ambientais por ele causados quando do seu descarte no ecossistema, de modo a oferecer mecanismos que viabilizem o seu fluxo no moldes
da moderna concepo da logstica-reversa. Impe-se tal regramento.
O Estado tem o poder-dever de atuar na questo ambiental por assim
reclamar o interesse pblico, assim, e mesmo em ateno ao princpio da
solidariedade para subsidiar e fomentar tal atividade h necessariamente de
haver uma respectiva fonte de custeio. Para tanto, o Estado deve se valer
do Direito Tributrio.
A contributividade mostrou-se como fator decisivo para amenizar os efeitos
da poluio causada pela ausncia de reciclagem de lmpadas compactas
fluorescentes, como desdobramento do princpio constitucional do poluidor-pagador.
Por se tratar de servios pblicos prestados ao contribuinte ou potencialmente postos a sua disposio, decorrendo tal atividade do exerccio do poder
de polcia, as taxas mostraram-se um caminho natural para contraprestao
de tais servios.
Verificou-se a necessidade de um estruturao industrial adequada a atender
a demanda de reciclagem, que vem crescendo em escala geomtrica, ao
mesmo tempo em que se notou a ausncia das referidas indstrias suficientes
a operacionalizar o fluxo dos resduos slidos, chegando-se concluso pela
necessidade da instituio de contribuies de interveno no domnio econmico, a cargo da Unio, para a constituio de um fundo a ser destinado
ao financiamento de tais imprescindveis e vultosos empreendimentos.
Constatou-se, outrossim, que as exaes extrafiscais, ao lado das exaes
de ndoles fiscais, tambm podem contribuir para tal desiderato, como forma de estmulo queles que participam de todo o ciclo do produto, neles
compreendidos os importadores, exportadores, produtores, comerciantes,
consumidores e, com enfoque especial, s cooperativas de catadores de
matrias reciclveis, que tanto tm contribudo com seus esforos para um
contnuo fluxo dos resduos slidos, o que, sem dvida, de grande valia
para o meio ambiente e para o desenvolvimento econmico sustentvel.
Citamos como exemplo, o instituto do depsito-retorno, j largamente utilizado em relao s baterias veiculares, mostrando-se positivo, pois estimula
o consumidor que ganha descontos quando da aquisio de novos produtos.
Todos devem contribuir para reduzir ao mximo a quantidade de resduos
slidos oriundos da atividade econmica, na busca de um fluxo no ciclo de
tais produtos.
302
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Seja atravs de contribuies fiscais, seja atravs de contribuies extrafiscais, a finalidade maior a ser perseguida a salvaguarda do meio ambiente,
preservando-o para as presentes e futuras geraes, visando obter um desenvolvimento econmico sustentvel, para o que a logstica-reversa tem
se mostrado um verdadeiro instrumento viabilizador de tal fim.
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Ibid., p. 576.
10 BALEEIRO, Aliomar. Limitaes ao Poder de Tributar. 7. ed. Rio de Janeiro, Forense, 2006 ,p.2.
11 MENDES,Gilmar Ferreira; COELHO, Inocncio Mrtires, GONET, Paulo Gustavo
12 Ibid., p. 41.
13 CARVALHO, Jos Crespo de; DIAS, Eurico Brilhante. Estratgias logsticas: como
14 MEIRELLES, Hely Lopes., Direito Administrativo Brasileiro. So Paulo: Malheiros, 2004, p. 88.
15 MELLO, Celso Antnio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. So Paulo:
19
20 CENEPI, op. cit., p.1.
21 SOUZA; BARBOSA, op. cit. p.4-7.
22 OLIVEIRA, Rafael Azeredo. Responsabilidade pelo descarte indevido de lmpadas
23
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THE TAX LAW AS A TOOL FOR THE ADOPTION OF AFFIRMATIVE ENVIRONMENTAL POLICIES: THE STUDY OF FLUORESCENT LAMPS.
ABSTRACT
This paper aims at identifying the ways to enable to equip
the State to enforce policies towards the protection and
preservation of the environment as a sustainable practice.
We use the Tax Law as another tool to foster the recycling
fluorescent lamps, with the imposition and collection of
fees under the relevance of the service, as well as offering a
contribution towards the intervention in the economic, the
latter having as its target the financial ground for the financial
creation of recycling plants.
306
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RESUMO
O presente artigo busca realizar uma anlise sobre a relevncia
do cuidado e da vulnerabilidade, como valores jurdicos, a serem
considerados na deciso dos juzes, com o fito de efetivar direitos
de pessoas com deficincia, atendo-se anlise pormenorizada
das pessoas autistas, que compem um dos grupos vulnerveis,
pertencentes quela novel conceituao jurdica das pessoas com
deficincia. O tema nos leva a uma importante reflexo jurdica,
pois no se trata apenas do reconhecimento de mais alguns direitos
no sistema jurdico (alis, mostra-se insuficiente a mera declarao
de direitos, ainda que em mbito internacional, sob o espeque de
Direitos Humanos), mas da necessidade de, no caso concreto, existir
um julgamento alicerado na realidade social, preocupado com a
vulnerabilidade dos membros dessa relao, bem como o cuidado
em atender as necessidades desses seres humanos marginalizados
por incuos pr-conceitos da minoria. Pautadas no desiderato constitucional, do atingimento felicidade, como desdobramento dos
aludidos princpios constitucionais implcitos da vulnerabilidade e
do cuidado, so apontados os ensinamentos demonstrados no filme:
Uma Famlia Especial, que devem ser empregados como mtodos
de incluso social de pessoas autistas, como meio consagrador de
respeito dignidade humana, esta, vista por um vis diferenciado,
posto que sob um enfoque juridicamente atualizado dos Direitos
Fundamentais, sugerindo assim, que a vida imite a arte.
Palavras-Chave: Pessoas com Deficincia. Autismo. Incluso Social.
Princpios Constitucionais. Cuidado. Vulnerabilidade.
*
Mestre em Direito Constitucional. Especialista em Direito Processual e em Direito Constitucional. Professora universitria e de cursos de Ps-Graduao. Advogada. E-mail: [email protected].
** Mestre em Direito Constitucional. Especialista em Direito Constitucional. Professora universitria. Procuradora Jurdica Municipal. E-mail: [email protected].
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1 INTRODUO
A sociedade contempornea vem demonstrando ter sido alvo de importantes transformaes, com relao aos direitos de grupos vulnerveis.
A vulnerabilidade est intrinsecamente presente nos seres humanos, pois
todos esto sujeitos a serem feridos, atacados em sua complexa estrutura fsica e
mental, porm, nem todos sero atingidos com a mesma intensidade, em razo
de cada indivduo se encontrar em estados de suscetibilidade distintos.
No campo dos Direitos Fundamentais, o cuidado e a vulnerabilidade vm
ganhando espao a cada dia, tendo em vista que a dignidade o locus sagrado
do ser humano, pois para que um Estado Democrtico de Direito disponha de
uma sociedade equilibrada, indispensvel a valorizao jurdica do cuidado e
da vulnerabilidade no sistema jurdico.
Estes novos valores jurdicos vm sinalizando ao Direito a importncia
do reconhecimento de princpios especficos, os quais fundamentam o Estado,
a dirimir conflitos, muitas vezes at lacunosos na legislao, sendo viabilizada
aludida interpretao, diante dos propsitos sagrados, presentes no sistema jurdico nacional (atravs dos nominados Direitos Fundamentais) e internacional
(atravs dos nominados Direitos Humanos).
A incluso um direito constitucional, o qual um desdobramento do
princpio da dignidade humana, que tambm assegura cuidado, por ser inerente
vulnerabilidade no ser humano, e essencial garantia da felicidade, como
valor jurdico.
Embasadas, nestas premissas, as autoras pretendem inferir que os ideais
inclusivistas nunca devem exaurir-se e esgotar-se, em razo de os seres humanos
serem inacabados, devendo buscar sempre novas experincias, que tero como
corolrio, novos valores a serem interpretados pelos operadores do direito e
garantidos pelo Estado.
Mas de que forma deve-se disseminar e assentar esta incluso social?
Para responder esta indagao, as autoras propem-se primeiramente a
elucidar, atravs da situao vivenciada por pessoas com deficincia, especificamente as pessoas pertencentes ao grupo vulnervel dos autistas, a fim de,
aps tecidas as ponderaes imprescindveis conceituao e enquadramento
da temtica, asseverar que as tcnicas empregadas no filme: Uma Famlia
Especial constituem-se aptas e eficazes ao atingimento da efetivao ampla e
irrestrita deste desiderato constitucional, para estas pessoas autistas.
Nesta senda, anseiam despertar reflexes voltadas para o fato de que o
desenvolvimento de mtodos inclusivistas, fincados nos propsitos constitucionais da eliminao do preconceito e segregao, devem se enveredar para
o cumprimento dos princpios do cuidado e vulnerabilidade, considerada a
abrangente significncia de ambas, que acabam por desaguar na salvaguarda
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vida comunitria, bem como no da garantia de um salrio mnimo de benefcio mensal e no caso da promoo de criao de programas de preveno e
atendimento especializado.
possvel aferir-se assim, que no fora encontrada definio precisa e
acabada, acerca da nomenclatura, nem no dicionrio da Lngua Portuguesa e
nem no de Filosofia, e sequer, no Jurdico.
Sem desistir do intento, recorreu-se histria, que vem nos mostrar
que diversas discusses houveram, a respeito do tema, resultando todas elas,
invariavelmente, no enfoque da falha, retratando a indicao de imperfeio
das pessoas, outros estudos desta natureza trazem o apontamento restritivo, a
certas espcies de deficincias, como a deficincia fsica, a mental e a sensorial, e somente estas que estariam enquadradas conceituao, das pessoas
com deficincia.
Por oportuno, cabe salientar, que outras duas formas de pensar a deficincia nos so trazidas, uma delas baseia-se no modelo mdico (mais antiga) e
a outra, baseia-se no modelo social (tendncia atual).
Elucidativamente, a principal caracterstica do modelo mdico centra-se
na descontextualizao da deficincia, enfocando-a como sendo a ocorrncia
de um incidente isolado; infelizmente, h tempos esse modelo tem influenciado
documentos legais e aes protetivas no mundo inteiro.
Segundo Claudia Werneck, este modelo mdico tem relao com a homogeneidade, porque trata a deficincia como um problema do indivduo (e,
no mximo, de sua famlia) que deve se esforar para se normalizar perante
os olhos da sociedade9.
Sob uma outra nuance, o modelo social da deficincia valoriza a diversidade e surgiu por iniciativa de pessoas com deficincia, reunidas no Social
Disability Movement, na dcada de 60, este movimento provou que a maior parte
das dificuldades enfrentadas por pessoas com deficincia, resultavam da forma
com que a sociedade lidava com as limitaes de cada indivduo.
Importante colacionar, nesta oportunidade, a posio trazida no Manual
de Desenvolvimento Inclusivo, por Claudia Werneck10, que segue: De acordo
com o modelo social, a deficincia a soma de duas condies inseparveis: as seqelas
existentes no corpo e as barreiras fsicas, econmicas e sociais impostas pelo ambiente
ao indivduo que tem essas seqelas.
E arremata: Sob esta tica, possvel entender a deficincia como uma construo coletiva entre indivduos (com ou sem deficincia) e a sociedade. grifo nosso
de se ver que o modelo social o mais adequado, porque analisa o
todo, valorizando a importncia do ambiente na vida das pessoas. Portanto,
mister que se propague a tica desse modelo, para que se tenha um perfeito
entendimento acerca da abrangncia deste conceito: deficincia.
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refere a tratados de direitos humanos, sendo que se subdividem em: tratados gerais
(por abordarem vrios direitos humanos, tendo alcance universal); os especficos
(por abordarem questes especficas); os que protegem certas categorias de pessoas
(nestes estariam includos as pessoas com deficincia) e os que dispem contra
as discriminaes em geral (includas, uma vez mais, as pessoas com deficincia).
esta proteo de direitos, deve-se salientar que a evoluo social
ocupou-se de empregar-lhes um enfoque transmutado, como pondera Norberto
Bobbio: [...] O elenco dos direitos do homem se modificou, e continua a se modificar,
com a mudana das condies histricas [...] direitos que as declaraes do sculo
XVIII nem sequer mencionavam, como os direitos sociais, so agora proclamados com
grande ostentao nas recentes declaraes [...].19
No sendo diferente o que diz respeito aos direitos das pessoas com deficincia, j que certos direitos antes proclamados, hoje tiveram a sua nfase
modificada, de molde que, as mencionadas transmutaes fundamentam-se
na ptica diversificada que foi sendo atribuda significao das dimenses dos
direitos fundamentais20, no decorrer da evoluo dos tempos, sendo certo que
a dignidade da pessoa humana, passou ento a ser contemplada sob um prisma
diferenciado, igualmente, vinculando-se liberdade de autonomia, proteo
da vida e outros bens fundamentais contra ingerncias estatais.21
Inserto neste anseio de resguardo dignidade da pessoa humana,
visualiza-se historicamente, que as pessoas com deficincia vem ocupar este
painel de salvaguarda.
O mbito de proteo no se d apenas no Brasil, sob a anlise do texto
constitucional, mas contempla ainda, preocupao de todos os pases, que so
signatrios da Conveno Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficincia22, cuja aprovao se deu em dezembro de 2006, pela ONU.
O Brasil, que figura como Estado parte da aludida Conveno, ratificou-a,
juntamente com o protocolo facultativo, atravs do Congresso Nacional, em
09 de julho de 2008 (Decreto Legislativo n 186/2008), frise-se porm, que se
percorreu um longo caminho, para atingir este marco de proteo, consolidada
nvel de Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia, com aplicao em mbito internacional.
Vejamos: Indica-se, primeiramente, a Declarao de Direitos do Deficiente Mental (proclamada pela Assemblia Geral das Naes Unidas, em 20 de
dezembro de 1971) e a Declarao dos Direitos das Pessoas Deficientes (Resoluo aprovada pela Assemblia Geral da Organizao das Naes Unidas, em
09 de dezembro de 1975), por engendrarem o sculo XX, no obstante tenha-se
verificado na histria resqucios de proteo, em data anterior.
Desde os textos histricos, bem como os primeiros ordenamentos jurdicos
j traziam notcias de proteo da pessoa com deficincia e em linhas gerais
apontamos alguns deles: 1- pode-se verificar nas Cartas de Hammurabi, em que
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trazido o caso de um surdo que havia sido roubado e que ento se determinou
a convocao do ladro, para que procedesse a restituio ao surdo; 2- na ndia,
o seu primeiro legislador, na Estncia 394, do Livro VIII, veio determinar em
suma, a iseno de impostos s pessoas com certas deficincias e, 3- na Lei das
Doze Tbuas, foi preceituado que se uma doena ou velhice impedisse o citado
em juzo, de andar, aquele que havia originado a sua citao deveria fornecer-lhe
um cavalo e se no o aceitasse, devia ser-lhe fornecido um carro.
Da bblia, pode-se identificar o tema abordado em Levtico 19:14, em
que assevera que no ser amaldioado o surdo, nem ser posto tropeo diante
do cego, mas temer a teu Deus.
expressada ainda, a salvaguarda de direitos das pessoas com deficincia, em demais documentos, de mbito internacional, como a Declarao dos
Direitos da Criana, que em seu quinto princpio estabelece proteo criana
incapacitada, fsica, mental, moral ou socialmente, sendo que a prefalada Declarao dos Direitos do Deficiente Mental, de 1971, foi o primeiro instrumento
especfico a tratar das pessoas com deficincia, a qual elenca princpios gerais a
serem observados, como o tratamento isonmico, direito educao e capacitao
profissional, ao atendimento mdico especializado, reabilitao, a exercer uma
atividade produtiva, a viver em famlia, a ser protegida contra exploraes, abusos
ou tratamentos degradantes, bem como a serem assistidas em processos judiciais.
Outra demonstrao de preocupao histrica com os direitos destas pessoas
est presente na Conveno da OIT, sob n 159/83 determina que cada pas, que dela
seja membro, formule e aplique uma Poltica Nacional sobre reabilitao profissional
e emprego de pessoas com deficincia, objetivando fazer com que estas consigam se
empregar, serem mantidas em seus empregos e sintam-se bem nestes empregos, no
desempenho de suas funes.
No que pertine ao direito de acesso e permanncia nas escolas, que foi
assegurado s pessoas com deficincia, de maneira ampla, em junho de 1994,
quando representantes de 88 pases, incluindo o Brasil, reuniram-se em assemblia para a Conferncia Mundial de Educao Especial, tendo naquela ocasio
aprovado a denominada Declarao de Salamanca sobre Princpios, Poltica e
Prtica em Educao Especial.
Tal como no Brasil, na Comunidade Europia, um em cada dez cidados
sofre certa deficincia, seja fsica, mental, sensorial ou psquica; o Estudo censitrio denominado: O Portador de Deficincia no Brasil 1991, realizado pela
Coordenadoria Nacional para Integrao da Pessoa Portadora de Deficincia
(CORDE), em parceria com o Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e com o Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada (IPEA),
indica um percentual de 1,14% de pessoas com deficincia no Brasil.
Deve-se enfatizar, entretanto, que este ndice distancia-se bastante da
estimativa da ONU, posto que segundo esta, cerca de 10% da populao mundial
sofre de algum tipo de deficincia.
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o tempo todo, mas apesar disso, deve tentar deix-los caminhar um pouco por
seus prprios ps, deixar que se arrisquem um pouco dentro das suas limitaes.
As reflexes que o pblico induzido a fazer, face s mensagens transmitidas pelo filme, expe um mtodo real de incluso social, consubstanciado no
amor e dedicao da me, que no poupa esforos para ver seus filhos felizes,
mesmo nas atividades mais singelas do dia a dia. Aquelas mensagens levaram-nos a lanar a exposio do tema, com o fito de asseverar, que a vida deveria
imitar a arte, sempre!
A sociedade, os familiares e o Estado devem espelhar suas atuaes naqueles mesmos ensinamentos, que nos foram transmitidos, para que se torne
vivel ousar falar-se em efetiva incluso social das pessoas autistas, no Brasil,
posto tratar-se de propsito ainda inalcanado, neste sculo XXI, apesar do
imenso rol de legislaes e instrumentos normativos mundialmente consagrados
h dcadas, reconhecedores dos direitos das pessoas com deficincia.
8 CONSIDERAES FINAIS
O objetivo de um Estado Democrtico de Direito a realizao do bem
comum, atravs da criao de uma sociedade livre, justa e solidria, sem distino
de qualquer natureza, portanto, qualquer forma de discriminao no poder
ser aceita pelo povo brasileiro.
A proteo de pessoas com deficincia, cuja conceituao engloba as
pessoas autistas, exige do Magistrado, reflexes acuradas no momento da defesa
dos interesses desse grupo, sempre considerando o estgio vulnervel que essas
pessoas se encontram, em razo da discriminao que sofrem.
A vulnerabilidade e o cuidado se apresentam como valores jurdicos a serem
apreciados na defesa de direitos, impedindo a existncia de obstculos colocados
para a no efetivao de um direito fundamental do ser humano.
Assim, no presente estudo, o cuidado e a vulnerabilidade foram analisados
como valores jurdicos a serem considerados pelo Magistrado no momento de
suas decises, afinal, o que o cuidado, seno a expresso da aplicao dos
direitos fundamentais, para a realizao da dignidade humana?
A prefalada dignidade humana vem desaguar numa conceituao abrangente,
que se destina ampla, incondicionada e irrestrita incluso social dos grupos vulnerveis (presentes as pessoas com deficincia, como espcie destes), cuja salvaguarda
transcende a rbita do ordenamento jurdico brasileiro, encontrando-se erigido sob
a seara do direito internacional, nominados direitos humanos, portanto a conscientizao acerca da necessidade de concesso de meios e tcnicas voltadas proteo
destas pessoas fator incontroverso, apesar de ainda inatingido efetivamente.
Em decorrncia, objetiva-se lanar o ensinamento no sentido de que
devem ser incutidas reflexes advindas dos desmesurados esforos que Maggi,
a me de sete filhos, dentre os quais, quatro tm autismo, em grau maior ou
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menor, no filme: Uma Famlia Especial, para traz-los ao mundo real, fazendo-os interagir com os irmos e a sociedade, de modo que se possa acreditar no
potencial das pessoas com deficincia, grupo vulnervel, que carece do cuidado,
a fim de que possa ser-lhes dadas oportunidade de convivncia, inclusive para
que as pessoas que no so deficientes, tenham igual oportunidade de conviver com as diferenas e criem mtodos para suplantar eventuais dificuldades,
sacramentando os valores jurdicos do cuidado e da vulnerabilidade.
Doar-se ao semelhante, para facilitar o convvio destes, em sociedade,
viabilizando a sua efetiva incluso subsume alcanar uma posio na sociedade
e uma atuao, como ser humano, que seja apta a acolher o outro, vulnervel
que , respeitando as suas dificuldades e diferenas e apesar disso, dar-lhe um
voto de confiana, oportunizando meios de vida social, feliz, que um desdobramento do princpio da dignidade humana, interpretao hodiernamente
concebida pelo instituto dos Direitos Fundamentais.
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9 WERNECK, Claudia. Ningum mais vai ser bonzinho na sociedade inclusiva. 2. ed., Rio de Janeiro:
WVA, 2000, p. 33.
10 Ibidem, p. 27.
11 Terminologia questionada por SGUIN, Elida. Minorias e grupos vulnerveis: uma
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abordagem jurdica. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 09, vez que conceituar minorias
complexo, j que no condiz com um contingente numericamente inferior, como
grupos de indivduos, destacados por uma caracterstica que os distingue dos outros
habitantes do pas, estando em quantidade menor, em relao populao deste,
devendo ser sopesada a realidade jurdica ante as conquistas modernas.
ARAUJO, Luiz Alberto David. A proteo constitucional das pessoas portadoras
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16 RULLI NETO, Antonio. Direitos do portador de necessidades especiais. So Paulo: Fiuza, 2002, p.
68.
17 RAMOS, Andr de Carvalho. Teoria geral dos direitos humanos na ordem inter-
18 Ibidem, p. 51.
19 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. 11. ed. Rio de Janeiro: Campus, 1992, p. 18.
20 Direitos fundamentais so os direitos, destinados ao ser humano, reconhecidos e positivados por
cada Estado.
21 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficcia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
1998, p. 53.
22 A matria elevada ainda, categoria de Emenda Constitucional, por fora do disposto no art. 5, 2
da CF, segundo entendimento de Flvia Piovesan.
23 FREIRE JNIOR, Amrico Bed. O controle judicial de polticas pblicas. So Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 2005, p. 47.
24 OLIVEIRA, Guilherme de. PEREIRA, Tnia da Silva. Cuidado & Vulnerabilidade. So Paulo: Atlas,
2009, p. 310.
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RESUMO
O presente estudo analisa a responsabilidade (objetiva) do Estado por danos causados a indivduos e grupos sociais em razo
de eventos climticos extremos resultantes do fenmeno das
mudanas climticas, considerando os aspectos socioeconmicos que lhe so correlatos e a atuao omissiva ou insuficiente
*
Mestre em Direito Pblico pela PUC/RS (Bolsista do CNPq). Membro do NEDF Ncleo de Estudos
e Pesquisa de Direitos Fundamentais da PUC/RS. Associado do Instituto O Direito por um Planeta
Verde, da Associao dos Professores de Direito Ambiental do Brasil (APRODAB) e do Instituto Brasileiro de Advocacia Pblica (IBAP). Professor-convidado da Especializao em Direito Constitucional
da PUC/SP e da Especializao em Direito Ambiental da PUC/RJ. Autor da obra Direitos fundamentais e proteo do ambiente. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008; co-autor, juntamente com
Ingo Wolfgang Sarlet, da obra Direito constitucional ambiental: estudos sobre a Constituio, os direitos fundamentais e a proteo do ambiente. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2011 (no prelo); e co-organizador da obra coletiva A dignidade da vida e os direitos fundamentais para alm dos humanos.
Belo Horizonte: Editora Frum, 2008. Membro-colaborador do Ncleo Especializado de Cidadania e
Direitos Humanos da Defensoria Pblica do Estado de So Paulo. Defensor Pblico (SP).
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responsabilidade pelos danos causados a tais pessoas em um episdio climtico extremo decorrente das mudanas climticas que tenha ocasionado o
deslizamento de terra e enchentes no local das suas moradias.
Tal questo se coloca em razo de que, muitas vezes, se verifica a omisso
estatal em implementar polticas pblicas que atendam de modo adequado e
suficiente tutela do ambiente, especialmente no tocante questo climtica,
o que ocorre no caso de o ente estatal no fiscalizar e coibir o desmatamento de florestas e a emisso dos gases responsveis pelo aquecimento global,
reprimindo civil, administrativa e criminalmente tais condutas de modo
efetivo e satisfatrio. A mesma conduta omissiva do Estado no caso do
Poder Legislativo ocorre quando ele no atua no sentido de estabelecer um
marco regulatrio adequado ao combate do aquecimento global e das suas
conseqncias10, de modo a adequar as atividades produtivas a padres ecologicamente sustentveis, inclusive sob a tica dos princpios da preveno e da
precauo. O Estado brasileiro tem por misso e dever constitucional atender
ao comando normativo emanado do art. 225 da nossa Lei Fundamental, sob
pena de, no o fazendo, tanto sob a tica da sua ao quanto da sua omisso,
incorrer em prticas inconstitucionais ou antijurdicas autorizadoras da sua responsabilizao por danos causados a terceiros - alm do dano causado ao meio
ambiente em si. Com a colapso ambiental11 que se avizinha em decorrncia das
mudanas climticas, o Estado no pode silenciar, uma vez que o seu silncio e
inrcia, do ponto de vista jurdico, resultam em omisso inconstitucional para
com os seus deveres imperativos de proteo da qualidade ambiental e dos
direitos fundamentais das pessoas que habitam o seu territrio, inclusive sob
a perspectiva das futuras geraes. E tais omisses ganham maior intensidade
normativa, sob a perspectiva da sua inconstitucionalidade e da necessidade de
reparao por parte do Estado, quanto maior o grau de exposio existencial
dos indivduos e grupos sociais atingidos.
O presente ensaio, com base nas consideraes at aqui firmadas,
tem como propsito analisar como e em que medida o Estado pode ser responsabilizado pelos danos patrimoniais e extrapatrimoniais causados s pessoas
atingidas por desastres ambientais atrelados aos efeitos negativos das mudanas
climticas, como enchentes, deslizamentos de terra, secas, etc. Alm disso,
objetiva-se tambm verificar, para alm da perspectiva da responsabilizao
do Estado, a possibilidade de reivindicar judicialmente prestaes socioambientais (moradia, sade, alimentao, renda mnima, assistncia social,
qualidade ambiental, etc.) em face do Estado por parte das pessoas atingidas
por tais episdios climticos extremos, dada a vulnerabilidade existencial e
jurdica em que se encontram muitas vezes, tendo em vista o dever do Estado
de tutelar os seus direitos fundamentais e assegurar a elas nada menos do que
uma vida digna, sob a perspectiva, inclusive, do direito fundamental ao mnimo
existencial socioambiental ou ecolgico.
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quais possuem um acesso mais restrito aos servios pblicos essenciais (gua,
saneamento bsico, educao, sade, etc.), bem como dispem de um acesso
muito mais limitado informao de natureza ambiental, o que acaba por
comprimir a sua autonomia e liberdade de escolha, impedindo que evitem
determinados riscos ambientais por absoluta (ou mesmo parcial) falta de informao e conhecimento. Diante de tal quadro de injustia socioambiental,
refora-se o dever do Estado de tutelar os direitos fundamentais e a dignidade
de tais pessoas, inclusive sob perspectiva da sua responsabilizao por condutas omissivas em face do seu dever de proteo ambiental quando guardem
alguma relao causal, mesmo que indireta, com os danos patrimoniais e
extrapatrimoniais sofridos por tais pessoas. Entre os deveres de proteo
ambiental conferidos ao Estado, pode-se elencar, de forma apenas exemplificativa, a fiscalizao e proibio de queimadas e desmatamentos ilegais, a
recuperao de reas degradas (ex. assoreamento de rios), a fiscalizao e
proibio de emisso ilegal de gases responsveis pelo aquecimento global,
a criao de rgo pblico especializado para socorrer as vtimas de eventos
climticos extremos, etc.
Outro aspecto importante relacionado s mudanas climticas e
questo da justia ambiental diz respeito ao surgimento dos refugiados
ambientais. Os episdios climticos relatados acima, muitas vezes, em decorrncia da sua intensidade e dos danos pessoais e materiais gerados, alteram
o cotidiano de vida de inmeras pessoas e grupos sociais, ocasionando,
muitas vezes, o seu deslocamento para outras regies, de modo a fugirem
de tais desastres ecolgicos e resguardarem as suas vidas. Conforme apontado pelo Diretor do Instituto para o Meio Ambiente e Segurana Humana
da Universidade das Naes Unidas, JANOS BOGARDI, at 2010, existiro, ao redor do mundo, pelo menos cinqenta milhes de refugiados
ambientais, sendo que os pases mais pobres sero os mais afetados, em
especial em suas reas rurais, tendo como principal causa a degradao
da terra e a desertificao, decorrentes do mau uso da terra somado s
mudanas climticas e amplificado pelo crescimento populacional. 18 De
tal sorte, a figura dos refugiados ambientais guarda relao direta com a
questo climtica e, por conseqncia, o cenrio socioambiental que lhe
est subjacente, uma vez que o deslocamento de tais pessoas dos seus locais
originrios ser motivado, na maioria das vezes, pela busca de condies
de vida que atendam a um padro de bem-estar mnimo, tanto em termos
sociais quanto ambientais. Ignorar a feio socioambiental que se incorpora hoje aos problemas ecolgicos potencializa ainda mais a excluso e
marginalizao social (to alarmantes no nosso contexto social), j que o
desfrute de uma vida saudvel e ecologicamente equilibrada constitui-se
de premissa ao exerccio dos demais direitos fundamentais, sejam eles de
matriz liberal sejam eles de natureza social.
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passa pela tarefa de promover a realizao dos direitos fundamentais, retirando possveis bices colocados sua efetivao. De acordo com tal premissa,
a implantao das liberdades e garantias fundamentais (direito vida, livre
desenvolvimento da personalidade, etc.) pressupe uma ao positiva (e no
apenas negativa) dos poderes pblicos, no sentido de remover os obstculos de
ordem econmica, social e cultural que impeam o pleno desenvolvimento da
pessoa humana.24 Nesse sentido, uma vez que a proteo do ambiente alada
ao status constitucional de direito fundamental (alm de tarefa e dever do Estado
e da sociedade) e o desfrute da qualidade ambiental passa a ser identificado
como elemento indispensvel ao pleno desenvolvimento da pessoa humana,
qualquer bice que interfira na concretizao do direito em questo deve ser
afastado pelo Estado (Legislador, Administrador e Judicial), venha tal conduta
(ou omisso) de particulares, seja ela oriunda do prprio Poder Pblico.
Sob a perspectiva da tutela da ambiente, CANOTILHO afirma que, ao
lado do direito ao ambiente, situa-se um direito proteo do ambiente, que
toma forma de deveres de proteo (Schutzpflichten) do Estado, expressando-se
nos deveres atribudos ao ente estatal de: a) combater os perigos (concretos)
incidentes sobre o ambiente, a fim de garantir e proteger outros direitos fundamentais imbricados com o ambiente (direito vida, integridade fsica, sade,
etc.); b) proteger os cidados (particulares) de agresses ao ambiente e qualidade
de vida perpetradas por outros cidados (particulares).25 Na mesma perspectiva,
FERREIRA MENDES destaca que o dever de proteo do Estado toma a forma
de dever de evitar riscos (Risikopflicht), autorizando o Poder Pblico a atuar em
defesa do cidado mediante a adoo de medidas de proteo ou de preveno,
especialmente em relao ao desenvolvimento tcnico ou tecnolgico26, o que
de fundamental importncia na tutela do ambiente, j que algumas das maiores
ameaas ao ambiente provm do uso de determinadas tcnicas com elevado
poder destrutivo ou de contaminao do ambiente (vide o exemplo do aquecimento global). CANADO TRINDADE, por sua vez, aponta para o dever e
a obrigao do Estado de evitar riscos ambientais srios vida, inclusive com a
adoo de sistemas de monitoramento e alerta imediato para detectar tais riscos
ambientais srios e sistemas de ao urgente para lidar com tais ameaas.27 A
idia formulada por CANADO TRINDADE adequada tutela do ambiente
atrelada s questes climticas, pois tais sistemas estatais de monitoramento
e alerta imediato e de ao urgente permitiriam uma atuao mais efetiva
em casos de eventos climticos extremos (enchentes, desabamentos de terra,
etc.), de modo a antecipar os desastres naturais e tutelar, de forma preventiva,
os direitos fundamentais das pessoas expostas a tais situaes.
A consagrao constitucional da proteo ambiental como tarefa estatal,
de acordo com o entendimento de GARCIA, traduz a imposio de deveres
de proteo ao Estado que lhe retiram a sua capacidade de decidir sobre a
oportunidade do agir, obrigando-o tambm a uma adequao permanente
das medidas s situaes que carecem de proteo, bem como a uma especial
responsabilidade de coerncia na auto-regulao social.28 Em outras palavras,
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pode-se dizer que os deveres de proteo ambiental conferidos ao Estado vinculam os poderes estatais ao ponto de limitar a sua liberdade de conformao na
adoo de medidas atinentes tutela do ambiente. No caso especialmente do
Poder Executivo, h uma clara limitao ao seu poder-dever29 de discricionariedade, de modo a restringir a sua margem de liberdade na escolha nas medidas
protetivas do ambiente, sempre no intuito de garantir a maior eficcia possvel
do direito fundamental em questo. Na mesma vereda, BENJAMIN identifica
a reduo da discricionariedade da Administrao Pblica como benefcio da
constitucionalizao da tutela ambiental, pois as normas constitucionais
impem e, portanto, vinculam a atuao administrativa no sentido de um
permanente dever de levar em conta o meio ambiente e de, direta e positivamente, proteg-lo, bem como exigir o seu respeito pelos demais membros da
comunidade estatal.30 Em outras palavras, pode-se dizer que no h margem
para o Estado no atuar ou mesmo atuar de forma insuficiente ( luz do
princpio da proporcionalidade) na proteo do ambiente, pois tal atitude estatal
resultaria em prtica inconstitucional.
A Constituio Federal traz de forma expressa nos incisos do 1 do art.
225 uma srie de medidas protetivas do ambiente a serem levadas a efeito pelo
Estado, consubstanciando projees de um dever geral de proteo do Estado31
para com direito fundamental ao ambiente inscrito no caput do art. 225. Entre
as medidas de tutela ambiental atribudas ao Estado, encontram-se: I) preservar
e restaurar os processos ecolgicos essenciais e prover o manejo ecolgico das
espcies e ecossistemas; II) preservar a diversidade e a integridade do patrimnio
gentico do Pas e fiscalizar as entidades dedicadas pesquisa e manipulao de
material gentico; III) definir, em todas as unidades da Federao, espaos territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alterao
e a supresso permitidas somente atravs de lei vedada qualquer utilizao que
comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteo; IV) exigir,
na forma da lei, para instalao de obra ou atividade potencialmente causadora
de significativa degradao do meio ambiente, estudo prvio de impacto ambiental, a que se dar publicidade; V) controlar a produo, a comercializao e o
emprego de tcnicas, mtodos e substanciais que comportem risco para a vida,
a qualidade de vida e o meio ambiente; VI) promover a educao ambiental
em todos os nveis de ensino e a conscientizao pblica para a preservao do
meio ambiente; e VII) proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as
prticas que coloquem em risco sua funo ecolgica, provoquem a extino de
espcies ou submetam os animais crueldade. Por fim, deve-se destacar que o
rol dos deveres de proteo ambiental do Estado traado pelo 1 do art. 225
apenas exemplificativo32, estando aberto a outros deveres necessrios a uma
tutela abrangente e integral do ambiente, especialmente em razo do surgimento
permanente de novos riscos e ameaas Natureza provocadas pelo avano da
tcnica, como o caso, por exemplo, do aquecimento global.
O atual perfil constitucional do Estado (Socioambiental) de Direito
brasileiro, delineado pela Lei Fundamental de 1988, d forma a um Estado
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o do direito fundamental, sob pena de sua ao no primeiro caso - ou omisso - no segundo caso - acarretar em prtica antijurdica e inconstitucional. Se
tomarmos a questo do aquecimento ambiental como exemplo, considerando os
deveres de proteo ambiental delineados na nossa Constituio, a no-atuao
(quando lhe imposto juridicamente agir) ou a atuao insuficiente (de modo
a no proteger o direito fundamental de modo adequado e suficiente, atravs
da adoo de medidas voltadas ao combate das causas geradoras e agravadoras
do aquecimento global) pode ensejar a responsabilidade do Estado, inclusive
no sentido de reparar os danos causados a indivduos e grupos sociais afetados
pelos efeitos negativos das mudanas climticas (por exemplo, enchentes, desabamentos de terra, secas, etc.).
Quanto s excludentes de ilicitude caracterizadas pela fora maior, caso
fortuito, ou fato de terceiro, a tendncia doutrinria prevalecente de no aceit-las
para a excluso da responsabilidade quando estiver em pauta a tutela de interesses
difusos, como o caso do direito ao ambiente, j que, como destaca MORATO
LEITE, tais direitos fogem da concepo clssica de direito intersubjetivo.43
Trata-se, em verdade, da aplicao da teoria do risco integral responsabilidade
civil por dano ambiental, o que ocasiona a inaplicabilidade das excludentes arroladas acima.44 Como assevera BENJAMIN, defensor da adoo da teoria do risco
integral no mbito do direito ambiental, por fora da aplicao dos princpios do
poluidor-pagador, da precauo e da reparabilidade integral do dano ambiental, so
vedadas todas as formas de excluso, modificao ou limitao da reparao
ambiental, que deve ser sempre integral, assegurando proteo efetiva ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado.45 Nesse sentido, em raciocnio que tambm
pertinente para afastar as excludentes da responsabilidade estatal, ainda mais
num contexto poltico onde privado comumente se apropria do pblico, como
no caso brasileiro, MANCUSO enftico ao afirmar que se nos afastarmos da
responsabilidade objetiva, ou se permitirmos brechas nesse sistema, os interesses
relevantssimos pertinentes ecologia e ao patrimnio cultural correro alto risco
de no restarem tutelados ou reparados, porque a fora e a malcia dos grandes
grupos financeiros, cujas atividades atentam contra aqueles interesses, logo encontraro maneiras de safar-se responsabilidade.46
Especificamente no tocante excludente da fora maior, j que diz respeito
mais diretamente ao tema central do presente estudo, pois os fatos da Natureza
que a caracterizam podem ser decorrentes das mudanas climticas, a anlise do
caso concreto pode levar a diferentes entendimentos. Por exemplo, no tocante
a danos ambientais decorrentes de um abalo ssmico, ocasionado pelo deslocamento de placas tectnicas, o mais provvel que tal fato da Natureza no
tenha qualquer relao com a ao ou omisso humana e, portanto, tampouco
com relao ao ou omisso do Estado. Agora, por outro lado, caso verificado que determinado fato da Natureza (por mais difcil que talvez isso seja na
prtica) como, por exemplo, enchentes e desabamentos em certa localidade
decorrentes de determinado episdio climtico extremo - pode estar (mesmo que
indiretamente) atrelado ao ou omisso estatal, tem-se uma situao diversa,
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agravados pelo aquecimento global, para afastar o nexo causal, dever o ente
estatal demonstrar que cumpriu com os seus deveres de proteo ambiental de
modo adequado e suficiente tutela do direito fundamental em questo, no
tendo, portanto, de forma omissiva ou comissiva, contribudo para a ocorrncia
do evento danoso. Tal pode ser demonstrado com a comprovao, pelo ente
estatal, de que adota polticas pblicas ambientais adequadas ao combate das
causas do aquecimento global, como, por exemplo, atravs da fiscalizao e
represso ao desmatamento em reas ecolgicas protegidas (Mata Atlntica,
Amaznia, Cerrado, Pantanal, etc.), do estmulo estatal a fontes energticas
no-poluentes, da criao de rgos estatais com a funo de atuar em situaes
emergenciais decorrentes de episdios climticos extremos, da criao de rgos
e polticas pblicas voltadas ao combate da emisso de gases poluentes geradores
do aquecimento global, promoo de campanhas pblicas de conscientizao
sobre a questo das mudanas climticas, etc.
Mas importante deixar claro que, muitas vezes, a exposio de determinados indivduos e grupos sociais aos efeitos negativos das mudanas climticas
potencializada no apenas pela omisso do ente estatal em adotar polticas
pblicas suficientes ao enfrentamento das causas do aquecimento global, mas
porque, num momento anterior, tambm o Estado foi omisso em garantir o
acesso aos direitos sociais bsico da populao carente, aumentando o grau de
vulnerabilidade de tais pessoas aos episdios climticos. Nesse sentido, a falta
de acesso a uma moradia simples e segura pode fazer com que determinados indivduos e grupos sociais venham a ocupar reas de risco ambiental por absoluta
falta de opo, j que no dispem de recursos financeiros para se instalarem
em outra localidade, sendo, em decorrncia disso, vitimados por enchentes e
desabamentos de terra. Em outras palavras, o problema social que antecede a
questo climtica configura-se como fator determinante para a vulnerabilidade
existencial e jurdica de tais pessoas em situaes de desastre natural. A dupla
omisso do Estado verificada no exemplo em questo resulta da sua conduta
omissiva ou insuficiente em assegurar a tais pessoas tanto o acesso s prestaes
sociais bsicas indispensveis a uma vida digna quanto qualidade (e segurana) do ambiente. O Estado, no caso, omitiu-se no apenas em relao aos seus
deveres de proteo para com os direitos fundamentais sociais, mas tambm
em relao ao direito fundamental de tais pessoas a viverem em um ambiente
sadio, equilibrado e seguro.
Outro aspecto importante atinente matria em pauta diz respeito
responsabilidade solidria do Estado por fato provocado por terceiro, uma vez
que, conforme se pode apreender do seu dever constitucional de proteo
ambiental desenvolvido em tpico antecedente, tal ter por fundamento a
sua omisso em fiscalizar e adotar polticas pblicas ambientais satisfatrias
no controle de atividades poluidoras. De tal sorte, a omisso do ente estatal
em atender norma constitucional e impedir a perpetuao de determinada
prtica poluidora levada a cabo por terceiro poder ensejar sua responsabilidade solidria pelo dano ambiental.50 Em que pese o argumento contrrio
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Tais prestaes materiais indispensveis a uma vida digna (mnimo existencial social e ecolgico) tomam a forma normativa de um direito fundamental
originrio (definitivo), identificvel luz do caso concreto e passvel de ser
postulado perante o Poder Judicirio, independentemente de intermediao
legislativa da norma constitucional e da viabilidade oramentria, a confirmar
a fora normativa da Constituio e dos direitos fundamentais. Tal formulao
est alicerada justamente na caracterizao do direito fundamental ao mnimo existencial como uma regra jurdico-constitucional extrada do princpio
da dignidade humana a partir de um processo de ponderao com os demais
princpios que lhe fazem frente. De acordo com o modelo de ALEXY, que toma
por base a ponderao dos princpios em coliso, o indivduo tem um direito
definitivo prestao quando o princpio da liberdade ftica tenha um peso
maior do que os princpios formais e materiais tomados em seu conjunto (em
especial, o princpio democrtico e o princpio da separao de poderes), o que
ocorre no caso dos direitos sociais mnimos (ou seja, do mnimo existencial)63,
tornando o direito exigvel ou justicivel em face do Estado. No caso do
mnimo existencial ecolgico, opera a mesma argumentao, j que por trs de
ambos est a tutela da dignidade humana fazendo peso na balana. Assim, o
mnimo existencial ecolgico d forma a posies jurdicas originrias, detentoras
de jusfundamentalidade e sindicalidade, no dependendo de intermediao do
legislador infraconstitucional para se tornarem exigveis.
Com relao suposta invaso do Poder Judicirio64 no mbito das
funes constitucionais conferidas ao Poder Legislativo e ao Poder Executivo,
em desrespeito ao princpio da separao dos poderes, importante destacar
que a atuao jurisdicional s deve se dar de maneira excepcional e subsidiria,
j que cabe, precipuamente, ao legislador o mapeamento legislativo de polticas pblicas e, posteriormente, ao administrador a execuo dessas, tanto na
seara social como na seara ecolgica, ou mesmo em ambas integradas, como
ocorre no caso do saneamento bsico.65 Agora, diante da omisso e descaso
do rgo legiferante ou do rgo administrativo em cumprir com o seu mister
constitucional, h espao legitimado constitucionalmente para a atuao do
Poder Judicirio no intuito de coibir, luz do caso concreto, violaes queles
direitos integrantes do contedo do mnimo existencial (social ou ecolgico),
j que haver, no caso, o dever estatal de proteo do valor maior de todo o
sistema constitucional, expresso na dignidade da pessoa humana. A reforar
tal entendimento, SARLET acentua que, na esteira da doutrina dominante,
ao menos na esfera das condies existenciais mnimas encontramos um claro
limite liberdade de conformao do legislador.66
Para alm dos direitos liberais e sociais j clssicos, chegado o momento
histrico de tomarmos a srio tambm os direitos ambientais, reforando o seu
tratamento normativo, inclusive com a consagrao do direito fundamental
ao mnimo existencial socioambiental. justamente a dignidade humana que
assume o papel de delimitador da fronteira do patamar mnimo na esfera dos
direitos sociais67, o que, luz dos novos contornos constitucionais conferidos
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GORE, Al. Earth in the balance: ecology and the human spirit. Boston/New York/London: Houghton
Mifflin Company, 1992, especialmente p. 56-80. E, mais recentemente (2006), merece destaque o vdeo-documentrio Uma verdade inconveniente (An unconvinient true) produzido por AL GORE sobre
o aquecimento global. Tal luta ecolgica lhe rendeu o Prmio Nobel da Paz em 2007, dividido com os
cientistas do Painel Intergovernamental sobre Mudana do Clima (IPCC) da ONU.
No incio de fevereiro de 2007, foi divulgado o relatrio de avaliao da sade da atmosfera (AR4) feito
pelo quadro de cientistas da ONU do Painel Intergovernamental sobre Mudana do Clima (IPCC),
onde resultou comprovado que o aquecimento global causado por atividades humanas, bem como que
as temperaturas subiro de 1,8C a 4C at o final deste sculo. Jornal Folha de So Paulo, 03.02.2007.
Reportagem de Marcelo Leite. Caderno Especial sobre Clima.
LOVELOCK, James. A vingana de Gaia. Rio de Janeiro: Editora Intrnseca, 2006, p. 24.
Nesse cenrio de episdios climticos extremos, deve-se registrar que, em 2004, as populaes da regio
sul do Estado de Santa Catarina e da regio nordeste do Estado do Rio Grande do Sul testemunharam o
primeiro furaco denominado de Catarina - registrado historicamente no Atlntico Sul. Os cientistas
que participaram de encontro promovido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais para debater o
fenmeno natural em questo chegaram ao consenso no sentido de que o mesmo se tratava de um furaco
na sua fase final Categoria 2, de acordo com a escala Saffir-Simpson -, com rajadas de ventos de at 180
hm/h. O prejuzo causado pelo episdio climtico foi estimado em 250 milhes de reais.
Sobre a perda da biodiversidade acarretada pelo aquecimento global, v. WILSON, Edward O. A criao:
como salvar a vida na Terra. Traduo de Isa Mara Lando. So Paulo: Companhia das Letras, 2008, p.
134.
O Relatrio de Desenvolvimento Humano 2007/2008 do Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento descreve que a atividade mais intensa das tempestades tropicais uma das certezas resultantes
das alteraes climticas, de modo que o aquecimento dos oceanos ir impulsionar eventos climticos
cada vez mais intensos (p. 101). Relatrio de Desenvolvimento Humano 2007/2008 do Programa das Naes
Unidas. PNUD. Disponvel em: <http://www.pnud.org.br/rdh/>. Acesso em: 13 mar. 2009.
No Estado de Santa Catarina, onde as catstrofes ambientais alcanaram maiores propores, registraram-se, em decorrncia das chuvas ocorridas em dezembro de 2008, 135 mortes e 78 mil pessoas desabrigadas.
Reportagem sobre chuvas em Santa Catarina. In: Folha Online. Disponvel em: http://www1.folha.uol.
com.br/folha/especial/2008/chuvaemsantacatarina/. Acesso em: 13 de maro de 2009.
Alicerado em tal premissa socioambiental, o Relatrio de Desenvolvimento Humano 2007/2008 do
Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento refere que vivendo em habitaes improvisadas
situadas em encostas vulnerveis a inundaes e deslizamentos de terra, os habitantes das zonas degradadas
esto altamente expostos e vulnerveis aos impactos das alteraes climticas (p. 102). E, mais adiante,
destaca ainda, j com o olhar voltado atuao estatal, que as polticas pblicas podem melhorar a
resilincia em muitas zonas, desde o controlo de inundaes proteco infraestrutural contra os deslizamentos de terra e proviso de direitos formais de habitao aos habitantes de reas urbanas degradadas
(p. 102). Relatrio de Desenvolvimento Humano 2007/2008 do Programa das Naes Unidas. PNUD.
Disponvel em: <http://www.pnud.org.br/rdh/>. Acesso em: 13 mar. 2009.
A corroborar tal entendimento, WINTER destaca os trs pilares - econmico, social e ecolgico - de
sustentao do conceito de desenvolvimento sustentvel. WINTER, Gerd. Desenvolvimento sustentvel,
OGM e responsabilidade civil na Unio Europia. Campinas: Millennium Editora, 2009, p. 2 e ss.
Nessa perspectiva, merece registro a recente elaborao, no mbito dos trs entes federativos, de legislao
voltada especificamente questo das mudanas climticas, sendo a mais significativa delas a Lei que
instituiu a Poltica Nacional sobre Mudana do Clima (Lei 12.187, de 29 de dezembro de 2009). Tambm
se destacam as seguintes legislaes estaduais e municipais: Poltica Estadual de Mudanas Climticas
do Estado de So Paulo (Lei 13.798, de 09 de novembro de 2009), Lei sobre Mudanas Climticas,
Conservao Ambiental e Desenvolvimento Sustentvel do Estado do Amazonas (Lei 3.135, de 05 de
junho de 2007), Poltica Estadual sobre Mudanas Climticas e Desenvolvimento Sustentvel do Estado
de Santa Catarina (Lei 14.829, de 11 de agosto de 2009), Poltica Estadual sobre Mudanas Climticas do
Estado de Gois (Lei 16.497, de 10 de fevereiro de 2009), Poltica Estadual sobre Mudanas Climticas,
Conservao Ambiental e Desenvolvimento Sustentvel do Estado de Tocantins (Lei 1.917, de 17 de
abril de 2008), Poltica de Mudana do Clima do Municpio de So Paulo (Lei n 14.933, de 05 de junho
de 2009).
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11 Vide a obra de DIAMOND, Jared. Collapse: how societies choose to fail or succeed. New York: Penguin
Books, 2005.
12 BECK, Ulrich. La sociedad del riesgo: hacia una nueva modernidad. Barcelona: Paids, 2001, p. 40-41.
13 Nosso Futuro Comum/Comisso Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. 2.ed. Rio de Janeiro:
Editora Fundao Getlio Vargas, 1991, p. 43.
14 luz da mesma perspectiva, a Lei 6.938/81 (Arts. 1 a 4) coloca como o principal objetivo da Poltica
Nacional do Meio Ambiente a compatibilizao do desenvolvimento econmico-social com a preservao da qualidade do meio ambiente e do equilbrio ecolgico, o que estabelece o necessrio respeito
preservao ambiental para a composio do desenvolvimento econmico e social.
15 Conforme apontam ACSELRAD, HERCULANO e PDUA, o tema da justia ambiental que indica a
necessidade de trabalhar a questo do ambiente no apenas em termos de preservao, mas tambm de
distribuio e justia representa o marco conceitual necessrio para aproximar em uma mesma dinmica
as lutas populares pelos direitos sociais e humanos e pela qualidade coletiva de vida e sustentabilidade
ambiental. ACSELRAD, Henri; HERCULANO, Selene; PDUA, Jos Augusto (Orgs.). Justia ambiental e cidadania. 2.ed. Rio de Janeiro: Relume Dumar, 2004, p. 16.
16 Tambm sobre a idia de justia ambiental e de um Estado de Justia Ambiental, conferir a obra de MORATO
LEITE, Jos Rubens; AYALA, Patryck de Arajo. Direito ambiental na sociedade de risco. So Paulo:
Forense Universitria, 2002, p. 28-39.
17 CAVEDON, Fernanda de Salles; VIEIRA, Ricardo Stanziola; DIEHL, Francelise Pantoja. As mudanas
climticas como uma questo de justia ambiental: contribuies do direito da sustentabilidade para uma
justia climtica. In: BENJAMIN, Antonio Herman; LECEY, Eladio; CAPPELLI, Slvia (Orgs.). Anais
do 12 Congresso Internacional de Direito Ambiental. So Paulo: Imprensa Oficial, 2008, p. 756.
18 BOGARDI, Janos. A era dos refugiados ambientais. In: O Globo. Noticirio de 31 de dezembro de 2006.
Publicao: 12/10/2005. Disponvel em: <http://www.gabeira.com.br/noticias/noticias.asp?id=1958>.
Acesso em: 09 mar. 2009.
19 BARROSO, Lus Roberto. Proteo do Meio Ambiente na Constituio Brasileira. Revista Trimestral
de Direito Pblico, n. 2. So Paulo: Malheiros, 1993, p. 59.
20 Como o caso, por exemplo, das Constituies Portuguesa (1976) e Espanhola (1978).
21 Cfr., especialmente, a Declarao de Estocolmo das Naes Unidas sobre Meio Ambiente Humano (1972),
a Declarao do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (1992), a Conveno-Quadro
das Naes Unidas sobre Mudana do Clima (1992), a Conveno sobre Diversidade Biolgica (1992)
e a Declarao e Programa de Ao de Viena, promulgada na 2 Conferncia Mundial sobre Direitos
Humanos (1993).
22 Quanto aos dispositivos constitucionais que relacionam a temtica ambiental com outros temas e direitos fundamentais, pode-se destacar, de forma exemplificativa: arts. 7, XXII, e 200, VIII, (direito do
trabalho); art. 170, VI (ordem econmica e livre iniciativa); art. 186, II (direito de propriedade); art. 200,
VIII (direito sade); art. 216, V (direitos culturais); art. 220 3, II (comunicao social); art. 225,
1, VI (direito educao); e art. 231, 1 (direitos indgenas).
23 Registra-se que h inmeras denominaes para o novo modelo de Estado de
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Anlise Luz dos Deveres de Proteo Ambiental do Estado e da Proibio de Insucincia na Tutela do Direito Fundamental ao Ambiente
24 PEREZ LUO, Antonio E. Los derechos fundamentales. 8.ed. Madrid: Editorial Tecnos, 2005, p. 214.
25 CANOTILHO, Jos Joaquim Gomes. O direito ao ambiente como direito subjetivo. In: CANOTILHO,
Jos Joaquim Gomes. Estudos sobre direitos fundamentais. Coimbra: Coimbra Editora, 2004, p. 188.
26 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade. 3. ed. So Paulo:
Saraiva, 2004, p. 12.
27 CANADO TRINDADE, Antnio Augusto. Direitos humanos e meio ambiente: paralelo dos sistemas
de proteo internacional. Porto Alegre: SAFE, 1993, p. 75.
28 GARCIA, Maria da Glria F. P. D. O lugar do direito na proteo do ambiente. Coimbra: Almedina,
2007, p. 481.
29 Sobre a idia de dever discricionrio (e no poder discricionrio!) como eixo metodolgico do Direito
Pblico, lapidar a lio de BANDEIRA DE MELLO: o dever que comanda toda a lgica do Direito
Pblico. Assim, o dever assinalado pela lei, a finalidade nela estampada, prope-se, para qualquer agente
pblico, como um im, como uma fora atrativa inexorvel do ponto de vista jurdico. BANDEIRA DE
MELLO, Celso Antnio. Discricionariedade e controle jurisdicional. 2. ed. So Paulo: Malheiros, 2007,
p. 15.
30 BENJAMIN, Antnio Herman. Constitucionalizao do ambiente e ecologizao da Constituio
brasileira. In: CANOTILHO, Jos Joaquim Gomes; MORATO LEITE, Jos Rubens (Orgs.). Direito
constitucional ambiental brasileiro. So Paulo: Saraiva, 2007, p. 75.
31 MILAR tambm destaca a idia em torno de um dever estatal geral de defesa e preservao do meio
ambiente, o qual seria fragmentado nos deveres especficos elencados no art. 225, 1, da Constituio.
MILAR, Edis. Direito do ambiente. 4.ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 189 e ss.
32 Tambm no sentido de conferir ao dispositivo do art. 225, 1, natureza meramente exemplificativa, e
no numerus clausus, v. BARROSO, Proteo do meio ambiente..., p. 68.
33 A respeito da consagrao do modelo de Estado de Direito contemporneo como um
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Reflexes sobre o papel do Ministrio Pblico frente mudana climtica: consideraes sobre a
recuperao das reas de preservao permanente e de reserva legal. Planeta Verde. Disponvel em:
<http://www.planetaverde.org/mudancasclimaticas/index.php?ling=por&cont=artigos>. Acesso em:
04 abr. 2010.
Como exemplo de atuao da Defensoria Pblica na tutela do ambiente, registra-se a recente ao civil
pblica interposta contra a expanso da monocultura de eucaliptos no Municpio de So Luiz do Paraitinga, no Vale do Paraba. Em Agravo de Instrumento (Proc. 759.170.5/3-00), foi proferida deciso pelo
Des. Samuel Jnior, da 1 Cmara de Direito Ambiental, do Tribunal de Justia do Estado de So Paulo,
que suspendeu novos plantios e replantios de eucalipto na rea do referido Municpio at que fossem
realizados estudo de impacto ambiental e relatrio de impacto ambiental.
Sobre o conceito de mnimo existencial ecolgico ou socioambiental, v. SARLET, Ingo W.; FENSTERSEIFER,
Tiago. Estado Socioambiental e mnimo existencial (ecolgico?): algumas aproximaes. In: SARLET,
Ingo W. (Org.). Estado Socioambiental e direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
2010, p. 11-38.
HBERLE, Peter. A dignidade humana como fundamento da comunidade estatal. In: SARLET, Ingo
Wolfgang (Org.). Dimenses da dignidade: ensaios de filosofia do direito e direito constitucional. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p. 130.
MOLINARO, Carlos Alberto. Direito ambiental: proibio de retrocesso. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2007, p. 113. Sobre o tema do mnimo existencial ecolgico, v. o ltimo tpico da obra FENSTERSEIFER, Tiago. Direitos fundamentais e proteo do ambiente: a dimenso ecolgica da dignidade
humana no merco jurdico-constitucional do Estado Socioambiental de Direito. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2008.
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contra o que a clusula da reserva do possvel, em vista de previso oramentria e condies financeiras
do ente pblico, no pode fazer frente. DIREITO PBLICO NO ESPECIFICADO. AO CIVIL
PBLICA. LOTEAMENTO IRREGULAR. PARQUE PINHEIRO MACHADO. REDE DE ESGOTO.
RESPONSABILIDADE. O dever de garantir infra-estrutura digna aos moradores do loteamento Parque
Pinheiro Machado do Municpio de Santa Maria, pois deixou de providenciar a rede de esgoto cloacal
no local, circunstncia que afetou o meio ambiente, comprometeu a sade pblica e violou a dignidade
da pessoa humana. Implantao da rede de esgoto e recuperao ambiental corretamente impostas ao
apelante, que teve prazo razovel dois anos para a execuo da obra. Questes oramentrias que no
podem servir para eximir o Municpio de tarefa to essencial dignidade de seus habitantes. Prazo para
concluso da obra e fixao de multa bem dimensionados na origem. Precedentes desta Corte. Apelao
improvida (TJRS, Ap. Cvel 70011759842, 3 Cm. Cvel. Rel. Des. Nelson Antnio Monteiro Pacheco,
julgado em 01.12.2005). Sobre o tema, segue deciso do Tribunal de Justia do Estado de So Paulo: Ao
civil pblica. Rede de esgoto local a lanar efluentes em cursos dgua sem prvio tratamento. Ofensa
ao direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (Constituio Federal, artigo 225,
caput). Infrao ao disposto na Constituio Estadual (artigo 208). Alegada ofensa discricionariedade da
Administrao sem fora para afastar a interveno do Poder Judicirio, uma vez provocado (Constituio
Federal, artigo 5, n. XXXV). Condenao do Municpio a providenciar estao de tratamento mantida.
Prazo considerado razovel, sobretudo ante desprezo da Administrao para com longo tempo com que
busca se subtrair ao cumprimento de um dever. Apelao no acolhida (TJSP, Apel. Cvel 363.851.5/0,
Seo de Direito Pblico, Cmara Especial de Mio Ambiente, Rel. Des. Jos Geraldo de Jacobina Rabello,
julgado em 12.07.2007).
Nesse ponto, merece registro a denncia feita por KRELL ao tratar do controle judicial de omisses
administrativas na rea do saneamento ambiental, no sentido de que, especialmente na rea do saneamento bsico, o desempenho do Poder Pblico tem sido insuficiente, o que se deve aos altos custos
das obras e a sua baixa visibilidade poltica. KRELL, Andras J. Discricionariedade administrativa e
proteo ambiental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 81.
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficcia dos direitos fundamentais. 9. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 371.
SARLET, op. cit., p. 372.
Sobre a atuao do Poder Judicirio em sede de tutela do ambiente, cfr. SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. O papel do Poder Judicirio brasileiro na tutela e efetivao dos direitos e deveres
socioambientais. Revista de Direito Ambiental, So Paulo: Revista dos Tribunais, n. 52, out./dez. 2008,
p. 73-100.
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RESUMO
Santa Catarina localiza-se na regio Sul do Brasil, tendo fronteira ao Leste com o Oceano Atlntico. Nessa regio litornea,
uma das principais fontes de rendimentos da populao vinculada atividade pesqueira, realizada por meio de pequenas
embarcaes e em sistema de economia familiar. Apesar da
relevncia do trabalho da mulher na pesca artesanal, esta no
considerada profissional da pesca. Isso porque tal modalidade
de pesca uma atividade econmica tradicional, caracterizada
pela desigualdade entre gneros. O reconhecimento da mulher
como profissional da pesca assegurar o acesso a benefcios trabalhistas e previdencirios, realizando preceitos constitucionais
e de Direitos Humanos.
Palavras-chave: Pesca artesanal. Gnero. Trabalho.
*
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INTRODUO
O objeto do presente trabalho expor e investigar o reconhecimento
jurdico de uma atividade laboral humana especfica, fonte de condies objetivas e subjetivas de existncia. Trata-se da pesca conhecida como artesanal.
caracterizada pelo trabalho pouco mecanizado, empregando como meio
de realizao apenas motores de pouca potncia em pequenas embarcaes
(quando no apenas com remos e velas), contando, no mais, com a fora e o
empenho do corpo humano. Embora a indstria pesqueira tenha desenvolvido
um arsenal tecnolgico1, subsiste e afirma-se a pesca artesanal distante dessas
indstrias. Isso porque atividade fonte geradora de renda de muitas famlias
(mais de 600 mil pessoas, segundo dados do Ministrio da Pesca e Aquicultura)2
e possibilita o desenvolvimento econmico autnomo, distante de um mercado
de trabalho formal e urbano.
Alm desse carter imediato de fonte de recursos econmicos, no
possvel deixar de lado um outro motivo para a subsistncia da pesca artesanal:
a continuidade de uma atividade tradicional, que garante a identidade de muitas
comunidades litorneas e ribeirinhas. tambm a pesca artesanal, ento, alm
de fonte de renda, uma maneira de manuteno de vnculos humanos.
preciso ainda situar que a modalidade de pesca artesanal objeto do
presente trabalho a pesca martima, realizada nas regies litorneas do Estado de Santa Catarina. Este recorte somente um cuidado provisrio para
a delimitao dos estudos, excluda liminarmente a anlise de comunidades
pesqueiras ribeirinhas.
Faz-se necessrio tal recorte do campo de trabalho por um motivo fundamental. A pesca artesanal desenvolvida com caractersticas diversas a depender
do local de sua realizao. Isso porque o arsenal tcnico diferenciado para a
pesca em rios e em mares. Dentre a pesca martima h tambm diferentes tcnicas, com o uso de diversas modalidades de equipamentos, ante a diversidade
geogrfica do extenso litoral brasileiro (aproximadamente 8.000 km). Portanto,
o recorte geogrfico faz-se necessrio unicamente por razes pragmticas.
Entretanto, mesmo perante o recorte da pesca artesanal martima, ainda
necessrio especificar a anlise. Isso porque, como se trata de uma atividade
tradicional, em que o desenvolvimento tcnico da realizao do trabalho est
intimamente vinculado com as caractersticas do meio ambiente, h grande
variedade de tcnicas utilizadas. Pretende-se, aqui, somente abordar as tcnicas
caractersticas do Estado de Santa Catarina. Estudar a realidade catarinense foi
uma escolha pois desenvolvimento do presente trabalho ocorre na Capital do
Estado (Florianpolis), onde situada a Universidade Federal de Santa Catarina. Nesse momento da pesquisa, fez-se necessria a delimitao espacial da
abordagem, privilegiando o estudo dos temas locais. Por outro lado, o recorte
geogrfico tambm fundamentou-se no fato de ser a pesca artesanal em Santa
Catarina relevante em termos de produo estadual de pescado. Conforme daREVISTA OPINIO JURDICA
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No mais, o Cdigo de Pesca previa a necessidade da matrcula do pescador profissional em rgos competentes. Essa matrcula distingue pescador
profissional industrial e artesanal. Isso porque a inscrio do pescador industrial
era efetivada perante a Capitania dos Portos18, mediante cursos de aprendizagem e realizao de provas para a comprovao dos conhecimentos tcnicos
necessrios. Entre pescadores profissionais industriais h diviso do trabalho:
a tripulao , em regra, composta por um mestre, um condutor, um contra-mestre, um cozinheiro e demais tripulantes. Tal subdiviso acarreta diferentes
responsabilidades e nveis de remunerao. Para ocupar a posio de mestre
pesqueiro e condutor necessrio, alm da inscrio como pescador profissional,
o assento comprovando a realizao de cursos especficos junto Capitania dos
Portos. Ao exerccio da funo de pescador em embarcaes pesqueiras de mdio
e grande porte, necessrio portar a Carteira de Inscrio e Registro (CIR),
conferida pela Capitania dos Portos e reconhecida pela Diretoria de Portos e
Costa (DPC) do Ministrio da Marinha do Brasil.
Portanto, o pescador profissional industrial, para exercer sua profisso,
deve contar com a carteira profissional especial. A fiscalizao do exerccio
regular da pesca, poca do Cdigo de Pesca era realizada concomitantemente
pela Capitania dos Portos e pela Superintendncia do Desenvolvimento da
Pesca (SUDEPE). Esta Superintendncia foi criada em 1962 para gerenciar e
estimular o desenvolvimento da atividade pesqueira no Brasil19. SUDEPE
competia a imposio de multas para empresas e trabalhadores que exeram
atividades pesqueiras em desconfomidade com as determinaes legais, mediante
a ausncia dos registros necessrios.
Ao pescador profissional dedicado pesca industrial, alguns direitos so
garantidos, como receber remunerao durante o perodo de vedao legal
pesca de determinadas espcies (conhecido como defeso)20, alm da contagem
do tempo para a aposentadoria obedecer a regras especiais21. Tais regras para
aposentadoria especial so previstas no no Cdigo de Pesca, mas no artigo 31
da Lei n. 3.807, de 1960, abrangendo todos os trabalhadores em condies
penosas e/ou insalubres22. Quanto ao recebimento de verbas durante o defeso, o
pescador industrial obteve, a partir da Constituio de 1988, o direito a receber
remunerao (salrio-base da categoria) por parte da empresa empregadora,
embora o pescador no estivesse trabalhando.
J o pescador comercial artesanal no tem o registro na mesma instituio, ou seja, sua matrcula no conferida pelos rgos do Ministrio da
Marinha. Isso porque o desenvolvimento de sua atividade no tem requisito de
cursos tcnicos. Ademais, a pesca realizada artesanalmente caracterstica de
comunidades tradicionais, por meio de pequenas embarcaes, sem autonomia
para transitar em guas profundas. O registro dessas embarcaes, bem como
dos pescadores artesanais era, e ainda nos dias atuais realizado por sesses
denominadas Colnias de Pescadores23. Mas o registro do pescador artesanal
no era obrigatrio.
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barco chega beira a praia, efetuada a descarga dos peixes. Muitas vezes, so
utilizadas estruturas de vime ou bambu, chamadas sambur. Esses recipientes
profundos so o meio pelo qual o pescador leva o pescado praia. J na praia,
as mulheres aguardam a descarga do pescado. Ali, as mos femininas, realizam
a separao das espcies de pescado e a pesagem. Aps esse procedimento, as
mulheres so incumbidas da limpeza dos peixes, que engloba a retirada das escamas e a esviscerao. No caso da pesca do camaro, as mulheres passam-no
para um tanque e iniciam a retirada de sua carapaa (ou simplesmente casca).
Ento, as mulheres so responsveis por tornar o pescado livre de suas partes
inutilizveis ao consumo humano. E dessa forma, acabam por agregar valor ao
pescado, posto que o processamento aumenta o valor deste.
Essa atividade ainda extremamente comum entre as mulheres. No apenas na Baa de Babitonga, mas tambm na Enseada de Porto Belo, nas praias de
Bombinhas, nas praias de Governador Celso Ramos, nas praias do municpio de
Florianpolis, em Palhoa (Praia da Pinheira) e nas praias de Garopaba43. Essas
so as principais regies pesqueiras identificadas no Estado de Santa Catarina,
onde aproximadamente 25 mil pessoas tm ainda como atividade profissional
e principal fonte de rendimentos a pesca artesanal.
Alm do beneficiamento inicial do pescado, s mulheres tambm compete, no mais das vezes, o reparo e a confeco de redes de pesca. As malhas, hoje
tecidas em fios de nylon, so elaboradas de forma a prender o pescado dentro da
rede, podendo, portanto, variar conforme a espcie de pescado a ser capturado.
Esse trabalho tradicionalmente do campo feminino na pesca e tornaram-se famosas as mulheres rendeiras. Tanto assim que inclusive a localidade
da Lagoa da Conceio, em Florianpolis, teve por nome de Rendeiras sua
principal via de acesso44.
Todas as atividades desenvolvidas pelas mulheres agregam valor econmico, e, portanto, so relevantes fontes de sustento para suas famlias. H
o reconhecimento, nas localidades referidas, da importncia do trabalho das
mulheres, tanto por seus familiares como por parte das prprias mulheres.45
Alm da importncia imediata do trabalho realizado pela mulher na agregao de valor econmico, no se pode ignorar que essas mulheres so a base
do sustento cultural da atividade pesqueira. No s porque ensinam seus filhos
e filhas a atividade pesqueira, preservando formas de trabalho tradicional, mas
tambm porque lutam pela prpria perpetuao da comunidade. Realizam-se
como sujeitos polticos quando se envolvem na luta por melhores condies de
vida e na resistncia contra processos especulativos sobre as terras onde vivem.46
Apesar do importante papel que desempenham em suas comunidades,
as mulheres pescadoras tm seu trabalho como extenso natural dos afazeres
domsticos. Isso porque no considerada profissional autnoma da pesca artesanal. Muitas delas no detm qualquer registro do desenvolvimento de suas
atividades. No tm carteira de trabalho, no so aceitas como pescadoras. Por
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Tal situao de total dependncia da mulher em relao ao homem comea a ser rompida socialmente, no momento em que mulheres operrias oferecem
sua fora de trabalho nas cidades. Nas indstrias, a crescente necessidade de
mo-de-obra faz incorporar nos postos de trabalho as mulheres. O movimento de
industrializao e urbanizao brasileiro ocorre fundamentalmente na dcada de
1920, em centros j urbanos como era a Capital da Repblica, o Rio de Janeiro.
Partindo para a anlise legislativa, as mulheres brasileiras comeam a
conquistar a cidadania em 1932, oportunidade em que o Cdigo Eleitoral provisrio brasileiro previu a possibilidade do voto da mulher. Entretanto, o voto
feminino era unicamente forma de manobra poltica. Isso porque somente as
mulheres casadas, com a permisso do marido, vivas e solteiras com renda
prpria poderiam votar. Com a renovao do Cdigo do Eleitor, em 1934, as
restries deixaram de existir e somente em 1946, o voto passou a ser obrigatrio
para homens e mulheres.
Para muitos, essa possibilidade do voto, oferecida sem restries s
mulheres em 1934, foi um marco para as conquistas sociais femininas no pas.
Entretanto, a possibilidade do voto no garantia s mulheres a autonomia na
contratao e nem a liberdade para poder participar do mercado de trabalho.
Essa liberdade s era conferida s operrias das fbricas51. Eis a o nicho em que
a mulher conquista seu espao, muito mais pelo interesse de desenvolvimento
econmico da indstria que por motivos de igualdade jurdica.
Sobre igualdade jurdica, deve-se ainda asseverar que no havia qualquer segurana especfica ao trabalho da mulher. As jornadas extenuantes de
trabalho eram comuns a homens e mulheres. Entretanto, a remunerao do
contingente feminino era bastante inferior. O grande argumento era a pouca
especializao do trabalho da mulher. Excetuando-se, portanto, os salrios, o
tratamento dispensado mulher era o mesmo em relao ao operrio homem.
A nica regulamentao nacional de que se tem notcia poca foi o Decreto
n 21.364, de 1932, que limitou as jornadas de trabalho a 8 (oito) horas dirias.
A primeira norma federal que tratou do trabalho da mulher foi o Regulamento do Departamento de Sade Pblica, estabelecido pelo decreto n. 16.300,
de 21 de dezembro de 1926. Tratava da licena maternidade para a mulher
operria. Era facultado trabalhadora da indstria e do comrcio afastar-se do
servio um ms antes e outros trinta dias aps o parto. Era facultado tambm
trabalhadora o tempo para amamentao, muito embora o intervalo de tempo
no fosse determinado legalmente. Previa tambm a construo de creches e
salas de amamentao prximas ao local de trabalho.52 Mesmo assim, a desigualdade no mercado de trabalho persistia. Legalmente, para exercer atividade
profissional, a mulher era ainda incapaz, dependendo da anuncia de seu marido.
Outro fator que diante das normas protetivas, os empregadores comearam
a evitar a mo-de-obra feminina. Como o gozo da licena maternidade e do
perodo de amamentao eram facultativos, prtica comum era comprometer
a mulher, pelo prprio contrato de trabalho, a no gozar o tempo da licena.
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da Faculdade de Cincias Econmicas da Universidade Federal do Rio Grande
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Dentre os instrumentos desenvolvidos para a pesca em escala industrial figuram modernas embarcaes,
equipadas com aparelhos de alta tecnologia (radares, GPS e computadores de bordo com piloto automtico) e com grande capacidade para estocagem do pescado. Alm disso, motores potentes aliam-se aos
equipamentos para conferir grande autonomia de navegao s embarcaes.
2 Fonte: stio do Ministrio da Pesca e Aquicultura. www.mpa.gov.br. Acesso em 13 de julho de 2010.
3 Definio prevista na Lei n. 11.959, de 29 de junho de 2009, que dispe sobre a
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Lagoa dos Patos a maior laguna do Brasil e a segunda da Amrica Latina, situa-se no estado brasileiro do
Rio Grande do Sul. Tem 265 quilmetros de comprimento e uma superfcie de 10.144 km, estendendo-se
na direo nor-nordeste-sul-sudoeste, paralelamente ao Oceano Atlntico.
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Frizzo. Pesca artesanal no Rio Grande do Sul: os pescadores de So Loureno do Sul e suas estratgias de reproduo social. Porto Alegre,
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pdf?sequence=1>. Acesso em: 07 jul. 2010, p. 8.
13 Decreto-lei n. 221, de 28 de fevereiro de 1967. Dispe sobre a proteo e estmulos pesca e d outras
providncias. Revogou o Decreto-lei n. 794, de 19 de outubro de 1938, que at ento regulava a pesca
no Brasil.
Cabe salientar que a competncia para regulamentar a atividade pesqueira no Brasil era, e permanece ainda
pela Constituio da Repblica Federativa do Brasil vigente nos dias atuais (de 05 de outuro de 1988),
da Unio. (Art. 22. Compete privativamente Unio legislar sobre: I - direito civil, comercial, penal,
processual, eleitoral, agrrio, martimo, aeronutico, espacial e do trabalho.) (sem grifo no original)
14 O pescador amador necessitava, como ainda necessita, de registro de pesca, fornecido pelo Ministrio da
Marinha, atravs das sesses da Capitania dos Portos. Para a concesso do referido registro necessrio
que o pescador realize provas tericas de conhecimentos bsicos em navegao. Com a aprovao nas
provas, consegue-se a habilitao para as seguintes modalidades:
Capito-Amador - apto para conduzir embarcaes entre portos nacionais e estrangeiros, sem limite
de afastamento da costa.
Mestre-Amador - apto para conduzir embarcaes entre portos nacionais e estrangeiros nos limites da
navegao costeira.
Arrais-Amador - apto para conduzir embarcaes nos limites da navegao interior.
Motonauta - apto para conduzir JET-SKI nos limites da navegao interior.
Veleiro - apto para conduzir embarcaes a vela sem propulso a motor, nos limites da navegao
interior.
Fonte: stio da Capitania dos Portos do Rio de Janeiro. https://www.mar.mil.br/cprj/habama.html#.
Acesso em 06 de julho de 2010.
15 Tambm o Ministrio da Marinha, por meio das Capitanias dos Portos, que detm a atribuio para
conceder registro de embarcaes e de pesquisadores para a realizao de pesca com intuito de pesquisa
cientfica. Aos pescadores nessa categoria, exigido o registro da embarcao unicamente com finalidade
de pesquisa e que seja vinculada a instituies brasileiras de pesquisa que detenham por Lei a atribuio
de coletar material biolgico para fins cientficos (artigo 32, Cdigo de Pesca de 1967).
16 Decreto-lei n. 221, de 28 de fevereiro de 1967. Artigo 26 Pescador Profissional aquele que, matriculado
na repartio competente segundo as leis e regulamentos em vigor, faz da pesca a sua profisso ou meio
principal de vida. Segundo o artigo 28, no seu pargrafo primeiro, a matrcula ser emitida pela Capitania
dos Portos e Ministrio da Marinha.
17 Cumpre relembrar que o Cdigo de Pesca foi publicado na poca do Regime Militar Brasileiro, instaurado
aps o Golpe Militar de 1964, quando foi deposto o presidente Joo Goulart. Seguia-se, `a poca, a ideologia
de estmulo ao desenvolvimento nacional (ou perseguia-se a idia de Milagre Econmico Brasileiro), cuja
meta era promover desenvolviemento de cinquenta anos em cinco. Pode-se observar o prprio Cdigo
de Pesca de 1967 tem por objetivo o estmulo ao desenvolvimento nacional, atravs da industrializao
do setor pesqueiro. Com vistas ao referido desenvolvimento, a preocupao com as condies de vida e
trabalho, ou mesmo as preocupaes sociais em relao aos trabalhadores da pesca eram tmidas (seno
nulas). Por essa razo, o Cdigo de Pesca de 1967 no dedica-se definio de pescador. A preocupao
maior era justamente em oferecer estmulo industrializao do setor produtivo pesqueiro. Tanto assim
que, a partir do Cdigo de Pesca, pessoas jurdicas nacionais tiveram iseno sobre imposto de importao
sobre produtos industrializados (embarcaes, maquinrios e petrechos de pesca) at 1982 (artigo 73),
bem como iseno de Imposto de Renda incidente sobre os resultados financeiros obtidos at o ano de
1989 (artigo 80). V-se, portanto, a grande preocupao com o estmulo ao desenvolvimento do setor
pesqueiro, e poucas preocupaes sociais com o pescador.
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18 As Capitanias dos Portos so rgos administrativos vinculados ao Ministrio da Marinha, junto aos
Portos brasileiros, cujas atribuies principais so a fiscalizao e a ordenao da atividade porturia e
pesqueira. Consulta ao stio da Marinha no Brasil: https://www.dpc.mar.mil.br/CDA/mapa_capitanias.
htm, em 05 de julho de 2010.
19 A SUDEPE (Superintendncia de Desenvolvimento da Pesca) foi criada pela Lei Delegada n. 10, de
11 de outubro de 1962, durante o governo do Presidente Joo Goulart. Esse perodo poltico brasileiro
caracterizou-se pela reestruturao de uma economia marcada por altas taxas inflacionrias. Para enfrentar
o problema da inflao e promover a estabilidade econmica brasileira, o governo planejou e realizou as
chamadas reformas de base, que eram medidas econmicas e sociais de carter nacionalista que previam
uma maior interveno do Estado na economia.
20 Defeso: perodo legal, determinado pelo rgo de tutela ambiental (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente - IBAMA), em que proibida a pesca e captura de certas espcies de pescados. Algumas espcies
de animais aquticos precisam de proteo em certas pocas do ano, quando ocorre a sua reproduo. A
pesca realizada no momento de reproduo de espcies marinhas, como o camaro, acarreta a diminuio
sensvel dos cardumes. Para evitar o comprometimento e a extino das espcies, h regulamentao
governamental na proibio da pesca de determinadas espcies por algum perodo anual (como o caso
do camaro e da anchova). Algumas vezes ocorrem vedaes momentneas e extraordinrias, quando da
diminuio drstica de determinadas espcies. Esse perodo de proibio da pesca chamado defeso, e
pode variar de durao conforme a espcie pesqueira e o grau de comprometimento da espcie.
21 Para aposentadoria, em virtude das condies de trabalho do pescador, necessrio contar o perodo de
20 anos de exerccio profissional, com respectivo recolhimento de contribuio previdenciria. Entretanto,
cada ano profissional completo corresponde 250 (duzentos e cinquenta) dias e no 365 (trezentos e
sessenta e cinco) dias como o calendrio convencional. Por conta disso possvel ao pescador aposentar
com menor tempo de contribuio Previdncia Social se comparado aos trabalhadores no embarcados.
22 Artigo 31. A aposentadoria especial ser concedida ao segurado que, contando no mnimo 50 (cinqenta
) anos de idade e 15 (quinze) anos de contribuies tenha trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou
25 (vinte e cinco) anos pelo menos, conforme a atividade profissional, em servios, que, para sse efeito,
forem considerados penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo. (sic). Ou seja,
a previso de direitos sociais (como a aposentadoria especial) dos pescadores no advm do Cdigo de
Pesca. Foram determinados em 1960 e mantidos na legislao previdenciria sucessiva (de 1968 e de
1991 atualmente em vigor no Brasil).
23 As Colnias de Pescadores foram introduzidas no Brasil no perodo imperial (data de 1808 a Primeira Colnia de Pescadores do Brasil, situada em Recife, capital do Estado de Pernambuco, no nordeste brasileiro).
Servem como verdadeiros Sindicatos dos Pescadores Artesanais, realizando registros de embarcaes e
organizando trabalhadores artesanais em suas demandas por reconhecimento jurdico. Durante a confeco
deste trabalho no foi possvel precisar a quantidade de Colnias reconhecidas juridicamente no Brasil.
Entretanto sabe-se que, ao menos, em cada entreposto pesqueiro h uma Colnia de pescadores.
24 Criada pelo Governo Federal, por meio da Medida Provisria n 103, de 1 de janeiro de 2003, em seu
art. 1, 3 , IV a Secretaria Especial de Aqicultura e Pesca da Presidncia da Repblica SEAP/PR, que
teve por objetivo estruturar polticas pblicas para o setor pesqueiro nacional.
25 A Previdncia Social brasileira estabelece, pela Lei n. 8.213, de 1991, a necessidade de combinar-se o
critrio etrio com o tempo de contribuio Previdncia Social, para o segurado-trabalhador fazer jus
aposentadoria integral (pelo Regime Geral da Previdncia Social). necessrio, para aposentar-se com
proventos integrais relativos ao valor de contribuio, at o teto (em torno de trs mil e quinhentos reais
atualmente), deter homens 35 anos de contribuio e mulheres 30 anos. O critrio etrio, concomitante
ao critrio contributivo era considerado como mnimo de 60 anos para mulheres e 65 anos para homens.
Art. 201 - Pargrafo 7 assegurada aposentadoria no regime geral de previdncia social, nos termos da lei,
obedecidas as seguintes condies: (Redao dada pela Emenda Constitucional n 20, de 1998)
I - trinta e cinco anos de contribuio, se homem, e trinta anos de contribuio, se mulher; (Includo dada
pela Emenda Constitucional n 20, de 1998)
II - sessenta e cinco anos de idade, se homem, e sessenta anos de idade, se mulher, reduzido em cinco anos
o limite para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que exeram suas atividades em regime
de economia familiar, nestes includos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal. (Includo
dada pela Emenda Constitucional n 20, de 1998)
Na reduo etria que se verifica a presena do pescador artesanal. Para aposentar, o pescador deve, ento,
contar com o mnimo de sessenta anos de idade, se homem, e cinquenta e cinco, se mulher. A contribuio
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dos que eercem atividade laboral perigosa ou insalubre, a aposentadoria deve combinar a idade com o
tempo de 180 meses (15 anos) de contribuio.
Entretanto, esse critrio etrio estabelecido no inciso II do pargrafo 7 do artigo 201 da Constituio da
Repblica Federativa do Brasil, pela Emenda Constitucional n. 20, de 16 de dezembro de 1998, era antes
inexistente na legislao brasileira. Bastava o trabalhador contar com o tempo de contribuio. Ocorre que
h intenso debate sobre a matria. Em 2008, as Turmas de Uniformizao de Jurisprudncia dos Juizados
Especiais previdencirios, competentes pela matria, derrubaram o requisito etrio, por ter gerado uma
srie de incongruncias na concesso dos benefcios previdencirios. Ao judicial oriunda do Estado do
Rio de Janeiro, processo n. 2004.51.51.023555-7. Entretanto, a combinao do critrio contributivo
com o etrio que legalmente assegura a aposentadoria no Brasil pelo Regime Geral de Previdncia Social,
a despeito do julgado acima referenciado.
26 O Seguro-Desemprego um benefcio integrante da seguridade social, garantido pelo art. 7 dos Direitos
Sociais da Constituio Federal, e tem por finalidade promover a assistncia financeira temporria ao
trabalhador desempregado, em virtude da dispensa sem justa causa. Consiste no pagamento de 3 (trs)
a 5(cinco) parcelas, de valores variveis at o teto aproximado de R$ 800,00 (oitocentos reais). Fonte:
Ministrio do Trabalho e Emprego. Stio http://www.mte.gov.br/seg_desemp/default.asp, acesso em 13 de
julho de 2010.
27 prevista a cobertura dos eventos de doena, invalidez, morte, includos os resultan-
tes de acidentes do trabalho, velhice e recluso (grifo nosso) pela Previdncia Social.
Tal o disposto no artigo 201, inciso I da Constituio da Repblica Federativa do
Brasil, de 05 de outubro de 1988. A lei n. 8213, de 1991 definiu, no seu artigo 19,
o que acidente de trabalho. Foi definido tambm que a Previdncia Social conceder benefcio durante o perodo em que for considerado o trabalhador inapto para
suas funes habituais pela percia mdica da prpria Previdncia. Tal medida no
afasta a responsabilidade civil do empregador quando da inobservncia de regras de
segurana no desenvolvimento da atividade da empresa.
33 Conforme o artigo 11, VII, da Lei n 8.213/91, 1, que dispe, in verbis: Entende-se como regime de
economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da famlia indispensvel prpria subsistncia e exercido em condies de mtua dependncia e colaborao, sem a utilizao de empregados.
34 Recorte do texto do pargrafo nico do artigo 4, Lei n. 11959, de 29 de junho de 2009.
35 Redes de pesca so aparelhos para pescar flexveis, geralmente de fibras relativamente delgadas e com
malhas de tamanho menor que a menor dimenso dos peixes ou mariscos que se pretendem capturar com
elas. J os espinhis so estruturas dotadas de uma linha central firme, de onde partem linhas secundrias,
dotadas de anzis nas pontas.
36 Extrado do artigo 4, caput e pargrafo nico, da Lei n. 11.959, de 29 de junho de 2009.
37 Dados Ministrio do Desenvolvimento Agrrio: http://portal.mda.gov.br/portal/saf/programas/pronaf/2258903, acesso em 17 de julho de 2010.
38 So Francisco do Sul a terceira localidade mais antiga do Brasil. Sua ocupao
remonta a poca dos descobrimentos. Foi descoberta em 1504 por franceses, mais
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41 Entenda-se aqui atividades vinculadas empresa do turismo, tais como cozinheiras, camareiras, comercirias e garonetes. Dessa maneira, a comunidade local tornou-se mo-de-obra pouco especializada para
o desenvolvimento da explorao turstica das praias. Embora os nveis salariais no sejam atraentes, tais
atividades suplantaram a realizao da pesca. Fundamentalmente, o fenmeno deve-se aos riscos e ao
desgaste fsico das prprias condies de realizao da pesca artesanal.
42 BORGONHA; BORGONHA, op. cit.
43 Todas as localidades aqui referenciadas so municpios litorneos do Estado de Santa Catarina. Dentre
tais municpios so comuns a prtica da pesca artesanal, inserida pela populao originria e predominantemente de ascendncia aoriana.
44 As Rendeiras, patrimnio cultural local, so mulheres que ainda trabalham em
47
48 Lendas como a da sereia, da moria, hbitos de higiene aps o manejo com o pescado, formas de conservao e preparo, alm do prprio reconhecimento dos ventos e da umidade do ar, fazem com que as
mulheres detenham conhecimentos necessarios prtica pesqueira. Tais saberes dificilmente encontrariam
outra forma de repasse que no a oralidade atravs do ambiente familiar ou domstico, fundamentalmente.
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49 Lei n. 3071, de 1 de janeiro de 1916. Revogado recentemente pela Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de
2002.
50 o que se depreende da leitura do texto original:
Art. 6. So incapazes, relativamente a certos atos (art. 147, n. 1), ou maneira de os exercer:
I. Os maiores de dezesseis e menores de vinte e um anos (arts. 154 a 156).
II. As mulheres casadas, enquanto subsistir a sociedade conjugal. (sem grifo no original)
51 importante destacar que o setor industrial em que a mo-de-obra feminina era
empregada foi justamente o da indstria pouco mecanizada, caracterstica das tecelagens e alfaiatarias. Muitas das vezes, as mulheres realizavam suas atividades em
casa, como as bordadeiras e as costureiras. Isso justificava os menores salrios em
relao aos homens, tendo em vista que estes eram a fora de trabalho das indstrias
mecanizadas, com ganhos muito maiores (metalrgia, por exemplo). (CALIL, La
Elisa S. Direito do Trabalho da mulher: A questo da igualdade jurdica ante a
desigualdade ftica. So Paulo: LTr, 2007, p.16)
57
58
62
63 Ibid.
64 A grande questo que, com as linitaes legais ao trabalho da mulher, justificava-se menores salrios
e menor nvel de empregabilidade entre as mulheres. No mais, o grande argumento para essas normas
protetivas era justamente a possibilidade de conciliao da atividade da trabalhadora com suas atividades
393
domsticas. O pressuposto papel exclusivo da mulher nas atividades domsticas que fazia com que fosse
necessria a vedao da hora-extra ou do trabalho noturno. Portanto, a preocupao no era voltada
sobre a pessoa da mulher, mas sim sobre a manuteno de seu papel como a rainha do lar. Percebe-se,
com esse discurso protetivo, o locus determinado para a mulher na sociedade no como profissional, mas
como a nica responsvel pela manuteno da ordem no lar, como a nica responsvel pela educao dos
filhos. Esse papel comea a ser repensado, inclusive em termos da legislao, quando se insere a clusula
fundamental da Constituio que afirma a igualdade entre homens e mulheres, em deveres e direitos. A
partir desse momento, que se verifica o incio do processo de desconstruo do papel social natural
da mulher como do lar pela construo de um papel profissional da mulher.
65
66
Art. 5 Todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pas a inviolabilidade do direito
vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade, nos termos seguintes:
I - homens e mulheres so iguais em direitos e obrigaes, nos termos desta Constituio;
(sem grifo no original)
Art. 7. Art. 7 So direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, alm de outros que
visem melhoria de sua condio social: (...)
XVIII - licena gestante, sem prejuzo do emprego e do salrio, com a durao de
cento e vinte dias; (...)
67 Deve-se levar em conta aqui que a dita escolha passa por influncias ainda do papel histrico da mulher
no papel reprodutivo. Essa escolha ainda no to livre quanto se pretende, em termos de sociedade
brasileiro. isso porque a dinmica social no Brasil no to desapegada das tradies do sculo XX. Outro
elemento que corrobora a tese da escolha determinada da mulher em relao maternidade pode-se obter
atravs das teses biolgicas quanto importncia da maternidade, como se fosse um elemento necessrio
afirmao do gnero feminino. De outro lado, por meio da legislao brasileira, pode-se ainda perceber
o papel reprodutivo da mulher quando da vedao legal do aborto. A prtica de interrupo da gravidez,
em qualquer estgio de desenvolvimento do feto (mesmo ainda nos primeiros dias de gestao) ainda
considerada crime pelo Cdigo Penal brasileiro, acarretando penas mulher que o pratica e equipe
(mdicos, enfermeiros ou parteiras) que a auxilia. Portanto, a maternidade no Brasil ainda no um
espao de livre deliberao feminina.
68 Cada hora-extra, trabalhada alm da jornada de trabalho de oito horas dirias, dever ser remunerada
no mnimo 50% da hora normal. Com a dispensa acordada entre trabalhadores e empregadores, significa
que o produtor pode deixar de pagar o adicional, simplesmente dispensando os empregados horas antes
em outro dia. Tal prerrogativa de compensao de horas completamente proibida ao trabalhador urbano.
Tal era a situao de desigualdade entre o trabalhador urbano e rural, antes da Constituio Federal de
1988.
69 Lei n. 8212, de 24 de julho de 1991.
Art. 12. So segurados obrigatrios da Previdncia Social as seguintes pessoas fsicas: (...)
VII - como segurado especial: o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatrio rurais, o pescador artesanal
e o assemelhado, que exeram essas atividades individualmente ou em regime de economia familiar, ainda
que com auxlio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cnjuges ou companheiros e filhos
maiores de 14 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar
respectivo. (Redao dada pela Lei n 8.398, de 7.1.92) (sem grifo no original). Ressalta-se sua alterao
pela Lei n. 11.718, de 20 de junho e 2008. Essa lei permite outras formas de comprovao do tempo de
servio em condio especial, como notas fiscais e declaraes de imposto de renda, visando facilitar a
contagem de tempo para a aposentadoria especial.
70 Conhecido vulgarmente como 13. salrio, pois corresponde a referida gratificao a um ms de remunerao do trabalhador a ser pago at o dia 20 de dezembro. calculado proporcionalmente aos meses de
servio, sendo que contando com 12 meses, tem-se direito remunerao integral de um ms de servio.
As despesas referentes gratificao natalina correm por conta do empregador.
71 Previso da Lei n. 11.324, de 2006.
72 Aviso Prvio o nome que se d no Brasil comunicao antecipada e obrigatria (Legislao Trabalhista/
CLT) que uma parte deve fazer outra de que deseja rescindir o contrato de trabalho sem justa causa.
No caso dos trabalhadores domsticos, previa a legislao que o aviso deveria ser dado pelo empregador
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com antecedncia mnima de 8 dias. Ocorre que a Constituio Federal de 1988 determina aviso prvio
de 30 dias para todos os trabalhadores. Portanto, 30 dias antes da dispensa do empregado, o empregador
precisa comunic-lo de sua dispensa. Nessa ocasio, poder o aviso prvio ser trabalhado (o trabalhador
permanece em suas funes por mais trinta dias, com reduo de carga horria para que possa buscar
novo emprego) ou indenizado (o trabalhador no mais comparece ao emprego, recebendo a verba salarial
de forma antecipada). Fonte: Ministrio do Trabalho e Emprego. www.mte.gov.br.
395
E FICCIA
ADEQUAO NA T UTELA
S ANCIONATRIA DOS B ENS AMBIENTAIS*
E
Helosa Oliveira**
1 Introduo. 2 Tutela dos Bens Ambientais: Eficcia e Adequao do Direito
Sancionatrio. 2.1 A centralidade do Direito Administrativo no Direito do
Ambiente. 2.2 Preveno, Direito Penal e Direito Administrativo Sancionatrio. 2.2.1 Princpio da preveno. 2.2.2 Preveno e Direito Penal: os fins das
penas, o Direito Penal de Risco e a antecipao da tutela penal. 2.2.3 Preveno e Direito Administrativo Sancionatrio: a sano pelo facto ex ante. 2.3
Em especial, a eficcia processual e procedimental. 2.3.1. Da inflexibilidade
garantstica do processo penal, da (suposta) flexibilidade do procedimento
administrativo sancionatrio e da fuga s garantias do processo penal. 2.3.2
Em especial, o Princpio da Oportunidade. 2.3.2.1. Colocao do problema:
legalidade vs. oportunidade. 2.3.2.2. Oportunidade e processo penal 2.3.2.3.
Oportunidade e procedimento administrativo sancionatrio. Bibliografia.
RESUMO
O artigo investiga quais os meios mais adequados tutela dos
bens ambientais: a via do Judicirio, em face do Direito Penal;
e/ou a via administrativa, mediante o Direito Administrativo
Sancionatrio. O estudo conclui que a interveno penal deve
ser evitada sempre que houver outro meio menos repressivo,
que seja apto a garantir eficazmente a tutela ambiental.
Palavras-chave: Bens ambientais. Tutela sancionatria. Eficcia. Adequao.
1 INTRODUO
A preservao do ambiente um valor essencial no Estado de Direito
moderno. Talvez por isso, o ambiente tem sido uma das reas em que o Estado
mais tem assumido as suas vestes de regulador, impondo Administrao Pblica,
aos Tribunais e aos particulares complexas tarefas hermenuticas para cumprir
e fazer cumprir as normas ambientais.
Mas nenhuma norma relevante se no for efectiva, se a sua vigncia no
for garantida pelo Estado, em ltimo caso atravs do Direito Sancionatrio. Poucos
so os diplomas em matria ambiental que no esto munidos de um arsenal de
*
O presente texto corresponde, com algumas alteraes, ao Relatrio do Seminrio de Direito Penal e Contra-ordenacional do Ambiente (Mestrado em Cincias Jurdico-Ambientais,
Ano Lectivo 2008/2009). Foi elaborado sob orientao do Professor Doutor Paulo de Sousa
Mendes.
** Monitora e Doutoranda da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa; Advogada.
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A preveno da leso dos bens ambientais deve ser identificada, essencialmente, com antecipao da tutela18. A antecipao da proteco significa que,
mais do que no serem admitidas leses aos bens ambientais, no permitida
a criao de risco de leso dos bens ambientais. Consequentemente, a mera
criao de risco passa a ser fundamento para indeferimento de pretenses ou
mesmo de imposio de proibies, medidas preventivas ou de compensao
aos operadores econmicos. A densificao destas questes e a distino entre
risco e perigo em pouco serviriam a natureza deste trabalho: o que relevante
aqui dar como assente que o princpio da preveno ter um contedo tanto
mais amplo quanto mais aceitarmos a antecipao da proteco.
H que concretizar em que termos o princpio da preveno tem sido e
pode ser operativo. A sua operatividade mais visvel ser certamente enquanto
critrio de actuao da Administrao no caso concreto, servindo de fundamento
para indeferimento de pretenses de particulares assim como de imposio de
condies, medidas de minimizao ou medidas de compensao. Mas no
apenas esta a operatividade do princpio. Para alm de ser tambm relevante
em termos de interpretao de normas, servir tambm enquanto orientao
poltico-legislativa. Neste sentido, so corolrios do princpio da preveno19
a criao de inverses do nus da prova20, a imposio de uma regra de indeferimento tcito nos procedimentos autorizativos ambientais21, o recurso
figura dos actos precrios22, o reforo dos meios de actuao da administrao
inspectiva e a efectivao da fiscalizao e punio das infraces ambientais.
Chegados a este ponto, h que saber at que ponto existe no Direito
Penal e do Direito Administrativo Sancionatrio um princpio da preveno
ou mecanismos de aplicao com contedo coincidente com o que acabmos
de explanar.
2.2.2 Preveno e Direito Penal: os fins das penas, o Direito Penal de Risco e a antecipao da tutela penal
O problema dos fins das penas est indissociavelmente ligado ao problema
da funo e legitimao do Direito Penal e, enquanto tal, to antiga como
a dogmtica penalista. Contudo, se verdade que as finalidades da punio
foram debatidas para legitimar a represso penal e combater as penas cruis
e desumanas, constatamos que as consequncias que dessas teorias se podem
retirar tocam em vrios outros problemas da dogmtica penal, nomeadamente
ao nvel da estrutura da imputao jurdico-penal e dos critrios para determinao da medida da pena.
As teorias dos fins das penas podem ser classificadas de diversas formas,
mas para o que aqui relevante reportamo-nos apenas s finalidades preventivas. O objectivo desta anlise claro e limitado: determinar se o princpio
da preveno tem um contedo que corresponda materialmente s finalidades
preventivas das penas.
REVISTA OPINIO JURDICA
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As teorias relativas, apesar de aceitarem que a aplicao da pena significa a imposio de um mal, justificam essa imposio como uma finalidade
preventiva, que poder incidir sobre o prprio agente preveno especial,
positiva (preveno integradora) e negativa (intimidatria do agente) ou
sobre a sociedade preveno geral, positiva (reforo da validade da norma e
da tutela de bens) e negativa (intimidatria da comunidade). Estes conceitos
permitem-nos rapidamente concluir que, apesar de denominadas preventivas,
as finalidades das penas no tm um contedo coincidente com o princpio da
preveno no Direito do Ambiente.
certo que estamos a falar de Direito Sancionatrio, pelo que nunca
o contedo do princpio da preveno poderia ser rigorosamente transposto.
De facto, o que est em causa quando falamos de preveno a adopo de
medidas para evitar leses, e o Direito Sancionatrio j a reaco a uma leso.
Por outro lado, a preveno e represso podero servir a mesma finalidade, que
a proteco dos bens ambientais, sendo indubitvel que o efeito dissuasor do
Direito Penal desempenha uma funo preventiva. Mas o que se pretende aqui
saber no se o Direito Penal ou o Direito Administrativo Sancionatrio podem
ter uma dimenso preventiva fica assente que sim. A questo que se coloca a
de saber se o Direito Penal pode, pela sua natureza e estrutura prprias, antecipar
o facto punvel de forma a valorar negativamente e com a mesma relevncia
o dano causado e a criao do perigo, como faz o Direito Administrativo, ao
abrigo do princpio da preveno. Esta possibilidade revelaria a adequao da
tutela penal dos bens ambientais, luz do transversal princpio da preveno.
Assim, no sero tanto as finalidades das penas que nos podem ajudar
nesta tarefa, mas mais o Direito Penal de risco e o problema da antecipao da
tutela penal.
O Direito Penal de risco traduz uma funcionalizao do Direito Penal s
necessidades da sociedade de risco. Implica uma coliso com pontos nevrlgicos
do Direito Penal clssico, que tutelava os direitos fundamentais dos indivduos
e sancionava apenas as leses desses bens. Para o que aqui releva, esta funcionalizao implica uma antecipao decidida da tutela penal para estados prvios (e
mesmo ainda muito distantes) da leso de interesses socialmente relevantes23.
A realidade do Direito Penal de risco tem demonstrado exigir, para alm de
uma mutao de um Direito Penal fragmentrio para um Direito Penal expansivo24,
uma alterao de diversos paradigmas do Direito Penal clssico25, para permitir a
punio alargada de condutas omissivas ou negligentes, a responsabilizao das
pessoas colectivas, a construo de tipos aditivos ou cumulativos, a desmaterializao do bem jurdico26 e o aumento do nmero de tipificaes de crimes de perigo27.
Ora distinguem-se os crimes de perigo concreto e os crimes de perigo
abstracto, consoante a criao de perigo seja ou no elemento do tipo, havendo
quanto aos segundos uma presuno inilidvel de perigo da conduta. Podemos
afirmar desde j que se trata assim de uma antecipao da tutela semelhante
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Caber agora tentar retirar algumas concluses. Em primeiro lugar, voltamos a afirmar que a antecipao da tutela penal para estgios anteriores por
vezes muito distantes da efectiva leso do bem jurdico, em especial atravs
dos crimes de perigo abstracto, um mecanismo semelhante aos do princpio
da preveno no Direito Administrativo. Tanto assim que os crimes de perigo
parecem ser o modelo standard nas reformas penais mais recentes, no tendo
os crimes ecolgicos fugido regra37. Neste sentido, conseguimos encontrar no
Direito Penal a consagrao do princpio da preveno.
Contudo, a antecipao da tutela penal coloca problemas que deixam
as maiores dvidas relativamente compatibilidade do Direito do Ambiente
preventivo e carente de uma sistemtica tutela antecipada com a prpria
natureza, postulados e princpios bsicos de Direito Penal, entre os quais se
destacam, desde logo, os princpios da subsidiariedade e da culpa.
especialmente elucidativo que, aps a consagrao (mais que) frequente
de crimes de perigo abstracto, a doutrina continue a debater-se com a tentativa
de legitimao e justificao desta estrutura, mesmo aps uma manifesta flexibilizao de paradigmas do Direito Penal clssico. ainda notria a procura
dogmtica de alternativas cuja legitimao seja clara, mas que, contudo, afastaro necessariamente o Direito Penal do princpio da preveno38.
2.2.3 Preveno e Direito Administrativo Sancionatrio: a sano pelo facto ex ante
curioso verificar que inexiste na doutrina administrativista literatura
jurdica com desenvolvimento paralelo ao da doutrina penalista quanto estrutura da infraco. Perguntamo-nos, portanto, se devemos aproveitar algum
do labor j desenvolvido nesta rea pelos penalistas para uma dogmatizao do
Direito Administrativo Sancionatrio.
Em geral, no tem a doutrina administrativista ou penalista tido grande
pudor quanto aplicao dos princpios e teoria de Direito Penal ao Direito
Administrativo Sancionatrio, com algumas consequncias nefastas, nomeadamente ao nvel da assuno da funo prpria deste ramo do direito e do seu
desenvolvimento doutrinrio autnomo.
Contudo, h que constatar que no bvia a necessidade de dogmatizao
da estrutura das infraces administrativas. que os problemas relacionados
com a antecipao da tutela penal (em especial, os relacionados com a tutela de
bens jurdicos com dignidade penal) no se colocam no Direito Administrativo
Sancionatrio. Demonstrao disso mesmo a utilizao (mais que) frequente
e nada censurada de uma estrutura em tudo semelhante dos crimes de
perigo abstracto.
De facto, o Direito Administrativo Sancionatrio pode abarcar condutas
axiolgico-socialmente neutras, uma vez que, materialmente, isso que o distingue
do Direito Penal39. Com isto no pretendemos afirmar que no existe ilicitude
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sendo certo que no haver abertura de inqurito quando a denncia manifestamente infundada ou no concretizada55. Pode ainda haver ao longo de
todo o processo penal, at ao seu trmino, a admissibilidade de juzos de oportunidade, antes ou depois da passagem para a fase judicial do processo penal.
Trataremos estes casos unitariamente, embora a distino pudesse ser til num
estudo aprofundado sobre o assunto56.
A consagrao de mecanismos de oportunidade tem ocorrido desde logo ao
nvel constitucional, quando se admitem imunidades parlamentares e regimes especiais
de exerccio da aco penal quanto a rgos de soberania57. Mas para alm destas
consagraes (com uma ratio diversa), podemos encontrar diversos mecanismos de
oportunidade, como o caso do arquivamento do processo58, a suspenso provisria
do processo59 ou at mesmo formas processuais especficas em caso de consenso60.
So apontadas diversas razes a favor de uma consagrao do princpio
da oportunidade no processo penal: o alvio dos tribunais de processos sem
gravidade objectiva; os inconvenientes at para a vtima - de uma audincia
formal ou a preveno da instrumentalizao do processo penal para finalidades de dio ou rancor pessoais. Ademais, haver situaes em que o diminuto
grau de ilicitude, a quase justificao do facto ou a quase excluso da culpa, a
antiguidade dos factos, a idade do agente e a suficincia das sanes no penais justificariam o recurso ao princpio da oportunidade, assim como em casos
de simples desnecessidade de punio, por inexistncia, no caso concreto, de
qualquer razo preventiva que a justifique.61
Contra o princpio da oportunidade, pode desde logo colocar-se a questo de saber se pode existir qualquer discricionariedade no exerccio da aco
penal, considerando que no estamos perante um processo de partes e que no
existe disponibilidade do objecto. O maior obstculo sua consagrao tem
sido o princpio da igualdade, que obrigaria a que, verificados os pressupostos
substantivos e adjectivos, fosse exercida a aco penal62.
Apesar de todas as vantagens do princpio da oportunidade, torna-se
claro que nos sistemas com matriz legalista as cedncias feitas tm como
finalidade a flexibilizao dos processo penal tendo em vista o desentorpecimento dos tribunais, funcionando as outras razes supra identificadas como
o diminuto grau de culpa ou a quase justificao do facto como limites
negativos ao princpio da oportunidade e no propriamente como ratio da
sua consagrao. Por isso mesmo, as consagraes do princpio da oportunidade vem a sua aplicao limitada a casos em que a quebra da solenidade e
inflexibilidade garantstica do processo penal vista com menor gravidade:
os casos de criminalidade de bagatela.
Por outro lado, as cedncias ao princpio da oportunidade passam pela
consagrao de mecanismos de oportunidade estritamente regulada em que o
legislador imps critrios rigorosamente delimitados. Neste cenrio, at duvidoso que haja sequer qualquer margem efectiva de apreciao, ou se existe
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do Cdigo Penal. Parte Especial. Coimbra: Coimbra Editora, t.2, 1999, p. 952.
5 Neste mesmo sentido, veja-se (Comte&Krmer, 2004: 164), (Teixeira, 2001: 36) e (Rexach, 2005: 62).
6 Mendes, Paulo de Sousa. Vale a pena o Direito Penal do Ambiente?, Lisboa: AAFDL, 2000, p. 127.
Sublinhe-se, contudo, que muitas vezes os regulamentos administrativos limitam-se a reproduzir o que
foi fixado por organismos comunitrios especializados (GOMES, Carla Amado. Risco e modificao do
acto autorizativo concretizador de deveres de proteco do ambiente. Coimbra: Coimbra Editora, 2007,
p. 461.
7 Esta remisso para normas tcnicas tanto pode consubstanciar actos de emisso peridica e de contedo
circunscrito, como o caso da fixao dos valores limites de emisso por regulamentos administrativos,
como actos destitudos de periodicidade pr-determinada e que tm um contedo mais abrangente
(melhores tcnicas disponveis).
8 Neste sentido, repudiando a tese de que o Direito Penal dependeria de outros ramos do direito que criariam
ilicitude, sendo o Direito Penal meramente sancionatrio, vide (Dias, Jorge de Figueredo. Direito Penal.
Parte Geral. Coimbra: Coimbra Editora, 2004a, p. 14.
9 Que pode ser entendida em dois sentidos: a impossibilidade de concretizao dos elementos do tipo sem
remisses/dependncia de actos administrativos; e o Direito Penal enquanto mera forma de tutela ao
servio do Direito Administrativo (Mendes, op. cit., p. 148), (Pinto, 2000: 381), (Hassemer, 1996: 324)
e (Silva, 2008: 274).
10 Catenacci, Mauro; Heine, Gnter. La tensione tra Diritto Penale e Diritto Amministrativo nel sistema
tedesco di tutela dellambiente. Rivista Trimestrale di diritto penale delleconomia, ano III, n. 4, out./dez.
1990, p. 921-942, p. 923.
11 A acessoriedade administrativa apresent[a-se] neste domnio como absolutamente necessria, () [no
havendo] no momento presente, alternativa vivel (Dias, op. cit., p. 378).
12 Pinto, Frederico Lacerda da Costa. Sentido e limites da proteco penal do ambiente. Revista Portuguesa
de Cincia Criminal, ano 10, n. 3, jul./set. 2000, p. 371-387, p. 383.
13 Garcia, Maria da Glria. O lugar do Direito na proteco do ambiente. Coimbra: Almedina, 2007, p. 57
e Antunes, Tiago. O ambiente entre o Direito e a tcnica. Lisboa: AAFDL, 2003, p. 15.
14 Como por exemplo a Agncia Portuguesa do Ambiente, Instituto da Conservao da Natureza e da
Biodiversidade, Administraes das Regies Hidrogrficas, SEPNA Servio de Proteco da Natureza
e do Ambiente, Inspeco-Geral do Ambiente e do Ordenamento do Territrio.
15 Rodrigues, op. cit., p. 953.
16 (GOMES. Carla Amado. Dar o duvidoso pelo (in)certo? Reflexes sobre o Princpio da Precauo. In
Gomes, Carla Amado (ed.). Textos dispersos de direito do ambiente. Lisboa: AAFDL, p. 143-174, 2005,
p. 141.
17 GOMES, 2000, op. cit., p. 22.
18 Poderamos identificar outras dimenses do princpio da preveno, identificando-o, em geral, com tudo
o que possa prevenir a leso de bens, nomeadamente atravs da dissuaso de potenciais lesantes. Mas a
verdade que no Direito do Ambiente preveno significa antecipao, e neste ponto que se diferencia
dos outros ramos do Direito.
19 GOMES, 2005, op. cit., p. 171.
20 Ou seja, caberia ao particular no mbito do procedimento administrativo ou processo ambiental a prova
de que a sua actividade no ir lesar grave e irreversivelmente os bens ambientais, em vez de ter a Administrao de o demonstrar positivamente na fundamentao de actos de indeferimento.
21 Apesar disto, a legislao ambiental tem vindo a adoptar uma regra de deferimento tcito.
22 GOMES, 2007, op. cit., p. 247.
23 (DIAS, op. cit., 132). O Direito Penal de risco objecto das maiores querelas na dogmtica jurdico-penal da actualidade, por haver quem sustente, em especial a Escola de Frankfurt, que o Direito Penal
no pode servir para tutelar os riscos da sociedade ps-industrial, estando limitado tutela dos direitos
individuais. (DIAS, op. cit., p. 216).
24 Que coloca em causa ou, pelo menos, obriga a uma reformulao do princpio da subsidiariedade do direito
penal (Prittwitz, 2004: 38), (Silva, 2005: 262). De facto, assiste-se crescente utilizao do Direito Penal
como meio de conduo e controlo de sectores da actividade social que surgiram por via da dinmica
da diferenciao social e se emanciparam relativamente racionalidade prtico-tica. essa utilizao
que, como vimos j, promove a expanso e a consequente hipertrofia da matria penal, a flexibilizao
e descaracterizao das categorias e critrios de imputao tradicionais e a crescente desformalizao do
processo penal o que, tudo somado, contribui para o sacrifcio injustificado de direitos fundamentais,
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para a perda da convico de obrigatoriedade das leis penais e para a desvalorizao da pena que se v
transformada num risco social (DIAS, 2009, op. cit., p. 31).
DIAS, O direito penal entre a sociedade industrial e a sociedade de risco. Estudos em homenagem
ao Professor Doutor Rogrio Soares, Coimbra: Coimbra Editora, p. 583-613, 2001b, p. 598 e Hassemer,
Winfried. Rasgos y crisis del derecho penal moderno. Anurio de derecho penal e cincias penales, t. 45,
n. 1, jan./abr. 1992, p. 235-249, p. 237.
DIAS, 2009, op. cit., p. 771.
Em geral, entende-se por crime de perigo aquele em que a realizao do tipo incriminador no tem como
consequncia a leso efectiva do bem jurdico, bastando-se antes com a mera colocao em perigo do
bem jurdico protegido.
HASSEMER, 1992, op. cit., p. 242 e Moura, Jos Souto de. O crime de poluio. A propsito do art.
279. do Projecto de Reforma do Cdigo Penal. Revista do Ministrio Pblico, ano 13, n. 50, abr./jun.
1992, pp. 15-38, p. 24.
MOURA, 1992, op. cit., p. 24.
DIAS, 2004a., op. cit., p. 83.
Buergo, Blanca Mendoza. Exigencias de la moderna poltica criminal y principios limitadores del derecho
penal. Revista de Administracin Pblica, n. 121, p. 279-321, 1990, p. 298.
COSTA, 2000a, op. cit., p. 568. tambm necessrio saber quais os critrios para determinar a linha de
probabilidade de concretizao do risco a partir da qual h uma situao de perigo jurdico-penalmente
relevante (Ibid., p. 578).
Dias, Jorge de Figueiredo. Sobre o papel do direito penal do ambiente na proteco do ambiente. Revista
de Direito e Economia, ano IV, n. 1, jan./jun. 1978, p. 3-23, p. 17). Note-se, contudo, que o autor parece
ter mudado a sua posio relativamente admissibilidade constitucional de crimes de perigo abstracto
em geral, conforme resulta de (Dias, 2004a: 293). Tambm (Costa, 2000a: 571) explicita que se nem
todas as criminalizaes de condutas violadoras de bens jurdicos so legtimas, foroso tambm aceitar,
mesmo que s em termos lgico-argumentativos, que nem todos os meios neste contexto, nem todas
as tcnicas de construo do tipo merecem o juzo abonatrio de incontestada legitimidade.
DIAS, 2004a, op. cit., p. 293.
Assim, a ttulo de exemplo, (Costa, 2000a, op. cit., p. 646.) refere que no legtima a norma que
preveja que aquele que andar com chapu na cabea ser punido com pena de priso de, uma vez
que, apesar de os elementos do tipo estarem perfeitamente delimitados, no se consegue descortinar
qual o bem jurdico-penal protegido. Por isso, autonomizamos um outro requisito para a legitimidade da
incriminao mediante um crime de perigo abstracto: que seja possvel identificar qual o bem jurdico
tutelado (Dias, 2004, op. cit., p. 293). H inmeras outras construes relativas aos crimes de perigo
abstracto: podero ser vistos como casos de violao de deveres de cuidado sem consequncias, havendo
mesmo quem entenda que no estaremos perante proteco de bens jurdicos mas da validade da norma
em si mesmo considerada como bem jurdico (Jakobs), ou garantia de segurana (Kinduser, apud Roxin,
Claus. In: PEA, Diego Manuel et al (Trad.). Derecho Penal. Parte General. Madrid: Civitas Ediciones,
1997, t. 1, p. 409).
DIAS, 2004a, op. cit., p. 294.
BUERGO, 1990, op. cit., p. 297.
Neste mesmo sentido, acrescentando que mesmo quando actua preventivamente o Direito Penal no
consegue resultados satisfatrios, refere (HASSEMER, 1996, op. cit., p. 324) que o direito ambiental
visa a preveno, enquanto o direito penal, por seu turno, no s no actua preventivamente, por via de
regra, como tambm, quando seja o caso de se querer faz-lo actuar dessa forma, nada mais se consegue
do que obter resultados sofrveis.
Conforme refere (Nieto, Alejandro. Derecho administrativo sancionador. 4. ed. [s/l]: Tecnos, 2005, p.
182) delito ser el incendio de un inmueble; infraccin administrativa, la edificacin con materiales
inflamables que pueden provocar fcilmente un incendio.
Carvalho, Amrico Taipa de. Direito penal: parte geral. Questes fundamentais. Porto: Universidade
Catlica, 2003, p 64 e DIAS, 2004a, op. cit., p. 150.
No falta quem questione a legitimidade da criminalizao dos delicta mere prohibita, infraces a meros
interesses funcionais e que no tm ligao com chamado mundo da vida e experincia prtica, conceitos
relacionados com o consenso social quanto aos valores fundamentais (Dias, 2004a: 113).
NIETO, op. cit., p. 182.
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76 (MENDAZONA, op. cit., p. 1454), aceitando o princpio de oportunidade no procedimento administrativo sancionatrio, entende que podemos avanzar dos criterios (si bien con un inevitable grado de
de vaguedad), a partir de los cuales no sea legtimo reconocer a la Administracin competente margen
alguno de discrecionalidad en el caso concreto de que se trate, como son: 1) la gravedad del hecho
constitutivo de la infraccin; y 2) las repercusiones de dicha accin o, ms concretamente, la entidad
del riesgo originado o del dao efectivamente producido. J (VEIGA, 2009, op. cit., p. 144), tem uma
posio diversa da restante doutrina. Resumidamente, entende que h juzo de oportunidade quando as
autoridades administrativas agem na sua funo de superviso; j no ser esse o caso quando exerce funes
de fiscalizao e punio. Numa tentativa de separao das duas reas de actuao, o autor individualiza
duas questes que evidenciariam essa diviso: as proibies de prova e as nulidades de actos processuais.
Apesar de esta construo ser uma proposta nova e de maior abertura ao princpio da oportunidade, ela
destaca-se por um formalismo e irrealismo que nos impede de a ela aderir.
77 Esta classificao foi proposta por R. A. Kagan e J. T. Scholz apud Abbot, Carolyn. The regulatory enforcement of pollution control laws: the australian experience. Journal of environmental law, v. 17, n. 2,
pp. 161-180, 2005, p. 161.
78 Esta modalidade de infractores foi considerada aquando da elaborao do artigo 20., n. 1, da Lei n.
50/2006, de 29 de Agosto, que prev o benefcio econmico obtido pelo infractor como critrio para
determinao do montante da coima a aplicar.
79 ANDRADE, 1998, op. cit., p. 85 e DIAS, 1983, op. cit., p. 326.
80 PALMA, 2004, op. cit., p. 85 e LOZANO, op. cit., p. 412.
81 WATSON, 2005, op. cit., p. 207-213.
82 PALMA, 1994a, op. cit., p. 59 e ANDRADE, 1992, op. cit., p. 178.
83 ANDRADE, 1992, op. cit., p. 184. Contudo, ressalve-se o recente desenvolvimento nesta matria,
impulsionado por Gnter Jackobs.
84 PALMA, 1995, op. cit., p. 199.
85 ANDRADE, 1992, op. cit., p. 185.
86 PALMA, 1994b, op. cit., p. 438.
87 PINTO, 2000, op. cit., p. 373 e FERRARI, 2003, op. cit., p. 1194.
88 ANDRADE, 1992, op. cit., p. 186.
89 Integrando, portanto, o Direito Penal simblico (Hassemer,1996, op. cit., p. 327).
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des personnes victimes dune catastrophe lintrieur dun autre Etat (or, ceci
irait lencontre dun droit international de lHomme la vie, notamment).
lheure actuelle, le droit international ne permet pas une telle ingrence dautant
plus que la souverainet de lEtat est un principe fondateur38.
Nanmoins, depuis les annes quatre-vingts, les ONG interviennent sur
les lieux des catastrophes cologiques tout en proclamant une forme de droit
dingrence humanitaire . Ayant suscit dnormes dbats, il aura nanmoins
eu le mrite de donner limpulsion lAssemble gnrale des Nations-Unies
afin dadopter une premire Rsolution n 43/131 du 8 dcembre 1988 relative
lassistance humanitaire aux victimes de catastrophes naturelles et situations
durgence. Quelques temps aprs est adopte la Rsolution n 45/100 du 14
dcembre 1990 qui cre les couloirs humanitaires afin de permettre le libre
acheminement de lassistance travers le territoire de lEtat sinistr. Malgr
les avances que peuvent apporter ces rsolutions, elles nont quun impact
limit car elles ne sont pas assimiles du vritable droit39 et elles noffrent pas
rellement une protection efficace. En effet, ces rsolutions subordonnent toujours lassistance et laide humanitaire au respect du principe de souverainet.
Jetons-y un il :
Rappelant la souverainet, lintgrit territoriale et lunit nationale des
Etats et reconnaissant que cest chaque Etat quil incombe au premier
chef de prendre soin des victimes de catastrophes naturelles et situations
durgence du mme ordre se produisant sur son territoire () 40
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leur coin sans que cela nait dimpact considrable. Dautant plus quil apparat que ces quatre Etats La Grce, la Sude, la Finlande et lItalie nont
que trs peu fait usage de cette facult doctroi de protections aux personnes
victimes de catastrophes naturelles (en raison mme du fait quil ny a aucune
obligation internationale contraignante). Lors de la catastrophe de Tchernobyl
en 1985, seul le Danemark aurait explicitement abord le problme du refuge
cologique mais les requrants nont obtenu aucun statut ni un quelconque
titre juridique qui puisse leur faire valoir leurs droits46. Au niveau international,
on peut citer lexemple canadien. En effet, aprs le Tsunami du 26 dcembre
2004 en Thalande, le Ministre de la citoyennet et immigration Canada
a prcis quil allait acclrer les demandes des trangers membres de familles
de ressortissants trangers au Canada victimes du Tsunami47 (mais loctroi sest
fait au cas par cas selon les dossiers et il fallait donc tablir un lien avec une
personne vivant au Canada, ce qui rend laide presque illusoire).
En dfinitive et devant une telle disparit de solutions , la complexification de laction collective internationale et la multiplication des flux des dplacs
obligent repenser srieusement les fondements et la finalit du droit international
des rfugis 48
II La construction dun statut pour le migrant climatique
Le Rapport de lUNU-EHS49 publi en 2005 a permis de lancer quelques
initiatives la fois populaires50 mais aussi tatiques afin dtablir un modle
juridique qui puisse offrir aux personnes victimes de catastrophes naturelles un
statut protecteur. Relevons-en deux parmi la plthore dides qui fleurissent au
sein de la doctrine internationaliste.
1 LEXTENSION DE LA DEFINITION DE REFUGIE ISSUE DE LA
CONVENTION DE GENEVE DE 1951
Daucuns estiment quil est possible damender la Convention
de Genve de 1951 afin quelle devienne applicable aux rfugis de
lenvironnement. Ceci est envisageable par la mthode des Protocoles additionnels afin que lon tienne compte notamment de lvolution de la prise
en compte des droits humains lchelle internationale51. Qui plus est, la
dfense des droits humains semble tre au cur de lmergence dune nouvelle forme de justice environnementale52. En appui de cette affirmation, il
ne faut pas perdre de vue que dj, la Dclaration de Rio de Janeiro de 1992
prcisait en son principe premier que les tres humains sont au centre des
proccupations relatives au dveloppement durable. Ils ont droit une vie saine
et productive en harmonie avec la nature 53.
Cependant, nous estimons que cette position est critiquable. En effet, nous
avons relev plus avant que lesprit de la Convention de Genve est bas sur une
toute autre conception que celle qui proccupe les rfugis lis lenvironnement54.
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mons quune dfinition large et la fois suffisamment prcise devrait tre rdige
dans la Convention. Elle dfinirait le champ dapplication de la Convention
tant ratione materiae que ratione personae. Ainsi, le migrant forc 75 ou le
migrant environnemental 76pourrait tre facilement identifi et protg par
la Convention pour autant quun lien soit tabli entre sa situation actuelle et
la catastrophe environnementale (autrement dit, que la qualit de sa situation
soit infrieure celle quil avait). Le migrant forc acquerrait alors de plano jure
un statut de droit. Il ne sagirait pas dun droit individuel mais bien collectif :
une forme de droit de lHomme, issu de la troisime gnration des droits de
lHomme (les droits collectifs) car lhomme ne peut plus se sauver lui-mme, pas
plus que la communaut laquelle il appartient, sans une solidarit objective de tous
les membres de la communaut internationale 77. Nanmoins, comme nous lavons
dj relev, il faut viter une vision trop anthropocentrique qui ngligerait tous
les aspects lis la biodiversit. Les droits de solidarit seraient complmentaires
au statut confr par la Convention.
Ainsi, toutes les personnes identifies comme ayant leur domicile ou
identifies comme vivant dans le primtre gographique concern par la catastrophe, acquerraient immdiatement le statut de migrant environnemental
protg par la Convention ds que lagence internationale fixerait la catastrophe
comme tant une catastrophe environnementale78. Dans pareil cas, soit le retour
la maison restera possible et la protection de la convention jouera jusqu ce
que la situation soit rtablie, soit le retour savrera impossible. Cest exactement
cette dernire hypothse qui est envisageable dans le cas dune le qui serait
engloutie par les eaux. Lon pense notamment aux les Tuvalu ou mme aux
Maldives actuellement trs actives sur le plan international79.
En consquence, une protection internationale ne peut pas tre limite
ratione temporis ; elle doit tre casuistique et dpendra du type et de lampleur
de la catastrophe, selon les critres dfinis par la Convention.
3.2 Application du principe d e la responsabilit commune mais diffrencie
Le rythme rapide du rchauffement climatique dans lArctique pose un
norme dfi la population des Inuits80. Cest pour cette raison quils ont soumis une
ptition la Commission Interamricaine des droits de lhomme81 afin de dmontrer
ltroite corrlation entre le rchauffement climatique et les droits de lhomme.
Les changements dans leur vie a dj mis en pril le droit la vie, la
protection physique, la scurit, la sant, la proprit, etc.
Plus fondamentalement, lintrt de cette ptition82 est le fait quelle soit
dirige contre les Etats-Unis dAmrique (dcrt comme tant le second plus
grand pollueur mondial avec une pollution atteignant les 19,9 % des gaz effet
de serre en 2007)83. Lintim est ici particulirement intressant au regard du
principe de responsabilit commune mais diffrencie. En effet, on retrouve ce
principe dans la Dclaration de Rio de Janeiro :
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BIBLIOGRAPHIE
ALLAND, D., et TEITGEN-COLLY, C., Trait du droit dasile, P.U.F. collection droit
fondamental, 2002, p. 398.
AMADO GOMES, C., Elementos de apoio disciplina de Direito Internacional do
Ambiente, aafdl, Lisboa, 2008, pp. 367 et s.
BACHELET, M., Lingrence cologique, d. Frison-Roche, p. 49
BELAIDI, N., La lutte contre les atteintes globales lenvironnement : vers un ordre
public cologique ?, Ed. Bruylant, Bruxelles, 2008.
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plnipotentiaires sur le statut des rfugis et des apatrides ; convoque par lOrganisation des Nations-Unies
en application de la rsolution 429 (V) de lAssemble gnrale en date du 14 dcembre 1950 (entre en
vigueur le 22 avril 1954, conformment aux dispositions de larticle 43). (Cest nous qui soulignons)
D. ALLAND et C. TEITGEN-COLLY, Trait du droit dasile, P.U.F. collection droit fondamental, 2002, p. 398.
C. COURNIL, op. cit., p. 1042.
titre exemplatif : Port-au-Prince, ville en morceaux au temps du cholra , Le Figaro, 27 novembre
2010 (Hati tant dans une situation de quasi-guerre civile aprs le grave tremblement de terre survenu
le 12 janvier 2010).
Hormis le cas dune le compltement sous-eau, le refuge cologique peut sexercer intra muros comme
cest le cas actuellement en Australie ( ce sujet consulter ladresse internet suivante : www.lemonde.fr
article du 17 janvier 2011 : Inondations : lAustralie sattend une facture record ).
C. COURNIL, A la recherche dune protection pour les rfugis environnementaux : actions, obstacles,
enjeux et protections , Revue Asylon(s), N6, novembre 2008 (disponible ladresse internet suivante :
http://barthes.enssib.fr/Terra/article843.htlml#nh7 ; dernire consultation 09/02/11).
Directive 2004/83/CE du Conseil, du 29 avril 2004, concernant les normes minimales relatives aux conditions
que doivent remplir les ressortissants des pays tiers ou les apatrides pour pouvoir prtendre au statut de rfugi ou
les personnes qui pour dautres raisons, ont besoin dune protection internationale, et relative au contenu de ces
statuts, J.O.U.E, 30 septembre 2004, L 304/12.
Les motifs sont les suivants : peine de mort ou excution / torture ou traitements ou sanctions inhumains
et dgradants infligs un demandeur dans son pays dorigine / menaces graves et individuelles contre
la vie ou la personne dun civil en raison dune violence aveugle et en cas de conflit arm interne ou
international.
Directive 2001/55/CE du Conseil, du 20 juillet 2001, relative des normes minimales pour loctroi dune
protection temporaire en cas dafflux massif de personnes dplaces et des mesures tendant assurer un quilibre
entre les efforts consentis par les Etats membres pour accueillir ces personnes et supporter les consquences de cet
accueil, J.O.C.E., L 212/12, 7 aot 2001, pp. 12 23.
Article 4, 1.
En 2004, deux dputs europens membres des partis cologistes ont dpos une dclaration pour un
statut communautaire de rfugi cologique mais la dclaration na pas t adopte, faute de consensus sur
cette question (6 avril 2004, n9/2004, 324 103).
Convention de lOUA rgissant les aspects propres aux problmes de rfugis en Afrique, 1001 UNTS, entre
en vigueur le 20 juin 1974. Lentiret de cette Convention est disponible ladresse internet suivante :
http://www.aidh.org/Biblio/Txt_Afr/instr_conv_69.htm
(Cest nous qui soulignons) ; Article 1er 2, de la Convention de lOUA.
R. DEGNI-SEGUI, Laction des institutions africaines en matire de rfugis , in Droit dasile et des rfugis,
colloque de Caen SFDI, d. Pdone, Paris, 1997, p. 232.
Pour une tude approfondie sur cette question : N. BELAIDI, La lutte contre les atteintes globales
lenvironnement : vers un ordre public cologique ?, Ed. Bruylant, Bruxelles, 2008.
Voir Supra., p. 4.
Paix et scurit dans la CEEAC, Actes du colloque international Friedrich Ebert Stiftung, Presses universitaires
dAfrique, Yaound, 2007, p. 33.
F. TIBERGHIEN, Rfugis cologiques ou climatiques : de nombreuses questions juridiques en suspens ,
accueillir n246, 17, p. 1 (disponible ladresse internet suivante : http://www.revues-plurielles.org /_uploads/pdf/47/246/deplaces_environnementaux.pdf).
HRC, Environmental migrants and refugees , Refugees Magazine, Geneva, UNCHR, Issue 127, 2002,
p. 12-13.
Le HCR nayant fait quune premire fois rfrence aux migrants climatiques en
1997. ce sujet : P. GONIN et V. LASSAILLY-JACOB, Les rfugis de lenvironnement,
une nouvelle catgorie de migrants forcs ? , R.E.M.I., 2002, (18) 2, p. 139.
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32 Pacte international relatif aux droits civils et politiques, adopt et ouvert la signature, la ratification
et ladhsion par lAssemble gnrale dans sa rsolution 2200 A (XXI) du 16 dcembre 1966.
33 Les prvisions sont pour 2050 sont alarmantes : plus de 200.000 millions de personnes seraient des rfugis
climatiques. La protection doit imprativement tre collective . ce sujet : N. MYERS, Environmental
Refugees , Population and Environment, vol. 19, n2, 1997, p. 167.
34 P. GONIN et V. LASSAILLY-JACOB, op. cit., p. 143.
35 V. MAGNINY, op. cit., p. 491.
36 V. MAGNINY, op. cit., p. 462.
37 C. COURNIL et P. MAZZEGA, Rflexions prospectives sur une protection juridique des rfugis cologiques ,
REMI, n1, 2007, p. 9.
38 P. DAILLER et A. PELLET, Droit international public, d. LGDJ, 7e d., Paris, 1999, p. 37.
39 O. CORTEN et P. KLEIN, Lassistance humanitaire face la souverainet des Etats , R.T.D.H., n11, juillet,
1992, pp. 343 et s. ; Les rsolutions relvent plutt de la soft law et nont pas deffet contraignant en droit
pour les Etats des Nations-Unies.
40 Rsolution 45/100 du 14 dcembre 1990 (68e sance plnire), 3e paragraphe (Cest nous qui soulignons).
41 Voir Infra., p. 14 propos du modle juridique pour le statut de rfugi cologique.
42 () La communaut internationale doit faire tout son possible pour aider les Etats sinistrs () .
43 J.M. LA VIEILLE, Lassistance cologique , R.E.D.E., n4/2006, p. 404.
44 D. BOUTEILLET-PAQUET, La protection subsidiaire : progrs ou recul du droit dasile en Europe ? Une analyse
critique de la lgislation des Etats membres de lUnion europenne, in D. BOUTEILLET-PAQUET Dir., La protection subsidiaire des rfugis dans lUnion europenne : un complment la Convention de Genve ?, Bruxelles,
Bruylant, 2002, p. 181 et s.
45 Voir Supra., p. 4 et s.
46 Ibidem., p. 182 dans la note (88).
47 Cit par C. COURNIL, op. cit., p. 1052.
48 F. CRPEAU, Droit dasile : de lhospitalit aux contrles migratoires, d. Bruylant, Bruxelles, 1995, p. 318.
(Cest nous qui soulignons)
49 United Nations University UNU-EHS Institute for Environment and Human security, 2005, As
Rank of Environmental Refugees Swell Worldwide, Calls Grow for Better Definition, Recognition, Support .
Ce Rapport est disponible ladresse internet suivante : http://www.ehs.unu.edu/file/get/3916 (dernire
consultation : 08/02/2011).
50 titre dexemple, LAppel de Limoges sur les rfugis cologiques de 2005 qui prend la forme dune
rsolution demandant aux Etats et autres acteurs de rflchir notamment llaboration dun statut
international des rfugis cologiques.
51 P.-O. CHARLEBOIS et P. HALLEY, Reconnaissance du statut juridique de rfugi environnemental titre de
mesure dadaptation aux changements climatiques : dification dune nouvelle responsabilit collective en
vertu du droit international de lenvironnement in Diffrentes perspectives pour un mme but : un meilleur
environnement, 3e Colloque tudiant de lIHQEDS, Universit Laval, France, 2007, p. 95.
52 A. MICHELOT-DRAFT, Enjeux de la reconnaissance du statut de rfugi cologique pour la construction
dune nouvelle responsabilit internationale , R.E.D.E., vol. 4/2006, p. 440.
53 Dclaration de Rio de Janeiro, 1992, No. E.73.II.A.14.
54 Voir. Supra., p. 4.
55 C. COURNIL, op. cit., p. 1060. Lauteur voque la possibilit pour les Etats de mler rfugis environnementaux et rfugis politiques de sorte quen prenant comme alibi les procdures dasile, les Etats en
profitent pour interprter trop rigoureusement les motifs de la Convention de Genve. Toutefois, lauteur
dpasse ce problme en proposant la cration dune instance internationale charge de protger les
rfugis cologiques mme si cela risque dtre difficile, admet lauteur.
56 Par exemple, dans le cadre du droit un environnement sain, ce droit doit tre accompagn de procdures
et dinstitutions appropries qui en assurent lapplication. Si tel nest pas le cas, le droit est vid de son
effectivit. Ce serait videmment pareil pour le droit un statut de rfugi cologique. ce sujet : A.
KISS, Dfinition et nature juridique dun droit de lhomme lenvironnement in Environnement et
droit de lhomme, UNESCO, 1987, p. 15.
57 G.S. MCCUE, Environmental Refugees: Applying International Environmental Law to Involuntary
Migration , The Georgetown International Environmental Law Review, vol. 6, p. 178.
58 P.-O. CHARLEBOIS et P. HALLEY, op. cit., p. 96.
59 En effet, la Convention de Genve est particulirement inspire par les droits de lhomme. La cration
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dune nouvelle convention permettrait de trouver une autre source principale dinspiration que ce sont
les principes fondamentaux du droit international de lenvironnement.
Dclaration de Stockholm, 1972, No. E.73.II.A.14., principe 21 (Cest nous qui soulignons).
S. DOUMB-BILL, Droit international et dveloppement durable in Les Hommes et lEnvironnement
En Hommage Alexandre Kiss, d. Frison-Roche, Paris, 1998, p. 248.
E.B. WEISS, D.B. MAGRAW et P. SZASZ, International environmental law: Basic Instruments and
References , Transnational Publishers, 1992-1999, p. 22.
P.-O. CHARLEBOIS et P. HALLEY, op. cit., p. 96.
G.S. MCCUE, op. cit., p. 180. Lauteur voque les principes de prvention, le devoir de minimiser les
dommages, la fourniture dinformation et le devoir de compensation.
N. STERN, 2006, Stern Review: The Economics of Climate Change , HM Treasury, p. 77 (et voir note 33).
N. MYERS, op. cit., p. 167.
Groupe dExperts Intergouvernemental sur lEvolution du Climat.
C. COURNIL, op. cit., p. 1060.
Dans le but dviter des dilutions de responsabilits des multiples acteurs sur le terrain, le flou du partage
des comptences et la rivalit entre les organismes comptents. Voir : J.-H. ESCHENBCHER, Comment assurer
un meilleur fonctionnement du systme daction concerte, R.M.F., dcembre, 2005, p. 15.
Le financement viendrait du fonds central durgence humanitaire cr par lAssemble gnrale des
Nations-Unies le 15 dcembre 2005.
propos de la possibilit de dauto-rduire la souverainet tatique : M. BACHELET, Lingrence cologique,
d. Frison-Roche, p. 49. Selon lauteur, il faudrait adopter des normes multisectorielles, des normes de
solidarits internationales pour faire face aux risques que court la plante en passant par un abandon
partiel de la souverainet tatique.
Une liste des pays ayant montr, par divers indicateurs, leurs moyens de rpondre une catastrophe de
grande ampleur serait dresse. Ceci va lencontre du principe de souverainet tatique mais le changement
des principes est ncessaire pour faire voluer le droit international de lenvironnement. Voir Supra., p. 10.
Sa comptence serait fixe par une forme de clause compromissoire obligatoire en cas de violation de la
Convention.
Il y a : (1) les accidents naturels (2) les accidents industriels (3) les conflits arms.
Nous prfrons parler de migrants forcs plutt que rfugis environnementaux . La smantique porte ici tout le poids de son importance : le premier terme
laisse penser quil y a une force majeure la base du dplacement, le second
laisse, en filigrane, penser que lon assimile inconsciemment rfugis politiques (ou
conomiques) et rfugis environnementaux.
76 A. SUHRKE et A. VISENTIN, The environmental Refugee : a new approach , Ecodecision, 1991, p. 73-74.
77 M. EL KOUHENE, Les garanties fondamentales de la personne en droit humanitaire et droits de lhomme, d.
Martinus Nijhoff Publishers, Dordrecht, Pays-Bas, 1986, p. 3.
78 Mme dans le cadre dun conflit arm car lenvironnement peut-tre utilis comme arme de guerre
(lexemple le plus connu tant les victimes de lagent orange la guerre du Vitnam).
79 Le 26 mars 2008, le Conseil des droits de lhomme a pris la rsolution dite Droits de lhomme et changements climatiques dans laquelle il demande au HCR de consulter les Etats, ainsi que dautres institutions
internationales afin de conduire une tude dtaille sur les liens entre droits de lhomme et changement
climatique. En effet, les Maldives estiment que les changements climatiques sont en train de violer les
droits de lhomme.
80 Peuple autochtone des rgions arctiques de Sibrie et dAmrique du Nord.
81 Le sommaire de la ptition est disponible ladresse internet suivante : http://www.inuitcircumpolar.com
/files/uploads/icc-files/FINALPetitionSummary.pdf (dernire consultation 09/02/11).
82 Celle-ci a nanmoins t rejete au motif quil ntait pas prouv que ces faits violent des droits protgs
par la Dclaration amricaine des droits et devoirs de lhomme.
83 Rapport 2010 de lagence internationale de lnergie (AIE) disponible ladresse internet suivante :
http://www.iea.org/co2highlights/co2highlights.pdf (dernire consultation : 09/02/11).
84 Dclaration de Rio de Janeiro de 1992, principe 7 (Cest nous qui soulignons).
85 G. COMETTI, Rchauffement climatique et migrations forces, le cas de Tuvalu, The Graduate Institute Publications, Genve, n5, 2010, p. 58.
86 Voir Supra., p. 9.
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n. 13 - 2011
87 M. BACHELET, op. cit., p. 214. Peut-tre cela passera-t-il par la jurisprudence la Cour internationale de
Justice ou par la coutume internationale.
88 P.-O. CHARLEBOIS et P. HALLEY, op. cit., p. 96.
89 Pour une rtrospective des vnements marquants de lanne 2010, ladresse internet est la suivante : http://
aliensx.over-blog.com/article-2010-une-annee-de-catastrophes-naturelles-exceptionnelle-63666361.
Html (dernire consultation : 09/02/11).
90 Cit par C. COURNIL, op. cit., p. 1061, note (97).
91 P. Gonin et V. Lassailly-Jacob, op. cit., p. 157.
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NORMAS DE PUBLICAO
1 LINHAS DE PESQUISA
Os temas podero receber abordagens variadas, tanto de natureza mais
dogmtica, quanto teortica. So admissveis leituras histricas, polticas, jurdicas, metodolgicas e interdisciplinares. facultado aos autores abordar apenas aspectos especficos no contexto maior da linha de pesquisa escolhida.
So elas:
1) Constituio, Estado e Sociedade
2) Direitos Humanos e Fundamentais
3) Teoria Poltica e do Direito
4) Estado Democrtico de Direito
* A submisso do artigo, sem qualquer meno de autoria, para os pareceristas, ficar a cargo da
Editora-responsvel.
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n. 13 - 2011
Normas de Publicao
Elementos textuais:
Modelo A:
1 Introduo
2 Desenvolvimento
3 Concluso
Modelo B:
1 Introduo
2 Referencial Terico
3 Metodologia da Pesquisa
4 Anlise dos Resultados (deve conter a anlise dos dados obtidos)
5 Concluso
Elementos ps-textuais:
Exemplo:
REVISTA OPINIO JURDICA
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Normas de Publicao
TTULO DO ARTIGO
Joo J. Joo*
Pedro P. Pedro**
Maria M. Maria***
O texto deve ser digitado com letra Times New Roman, tamanho 12,
usando espao entrelinhas 1,5 e espaamento entre pargrafos de 0 pt antes e
06pt depois. O espao da primeira linha dos pargrafos de 1cm. As citaes
de mais de trs linhas, as notas de rodap, as referncias e os resumos em
vernculo e em lngua estrangeira devem ser digitados em espao simples.
O formato do papel a ser utilizado, tanto na verso eletrnica quanto na
impressa, deve ter formato A4 (210 mm x 297 mm), com as seguintes margens:
superior e esquerda - 3,0cm; inferior e direita - 2,0 cm.
O trabalho deve estar obrigatoriamente digitalizado em Word.
4 REFERNCIAS
As referncias devem ser constitudas por todas as obras citadas no
artigo e devem ser listadas de acordo com a norma ABNT-NBR-6023/2002,
conforme exemplos abaixo:
Livros
ALVES, Roque de Brito. Cincia Criminal. Rio de Janeiro: Forense, 1995.
BANDEIRA, Manuel (Org). Gonalves Dias: poesia. 11. ed. Rio de Janeiro:
Agir, 1983.
Artigos em peridicos
MONTEIRO, Agostinho dos Reis. O po do direito educao... Educao &
Sociedade, Campinas, SP, v. 24, n. 84, p. 763-789, set. 2003.
O MELHOR de dois mundos. Aps, So Paulo, ano 1, p. 24-25, fev. 2003.
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Breve currculo
Breve currculo
Breve currculo
n. 13 - 2011
Normas de Publicao
MONTEIRO NETO, Armando. Desonerao da folha salarial. Estado de Minas, Belo Horizonte, n. 22.368, p. 9, 26 mar. 2003.
Sites
CONY, Carlos Heitor. O frgil lenho. Folha online, So Paulo, 19 jan. 2004.
Disponvel em: <www.folha.uol.com.br/folha/pensata/ult505u135.shtml>.
Acesso em: 19 jan. 2004.
FREIRE, Jos Bessa. O patrimnio cultural indgena. In: WELFORT, Francisco; SOUZA, Mrcio (Org.). Um olhar sobre a cultura brasileira. Braslia:
Ministrio da Cultura, 1998. Disponvel em: <http: // www.minc.gov.br/textos/olhar/patrimonioindigena>. Acesso em: 20 jan. 2004.
5 CITAES
As citaes devero ser feitas da seguinte forma (NBR 10520): citaes
de at trs linhas devem estar contidas entre aspas duplas; as citaes de mais
de trs linhas devem ser destacadas com recuo de 4cm da margem esquerda,
em Times New Roman 10, sem aspas.
Para enfatizar trechos da citao, deve-se destac-los indicando essa
alterao com a expresso grifo nosso entre parnteses aps a chamada da
citao ou grifo do autor, caso o destaque j faa parte da obre consultada.
A referncia da citao ser feita em nota de fim, aps as referncias do texto.
6 ABSTRACT E KEYWORDS
Aps as referncias, seguem-se as notas de fim; aps as notas de fim,
culminando todo o trabalho, deve-se fazer constar o ttulo do artigo, o resumo e as palavras-chave em verso para o ingls, com recuo de 4cm, em
espao simples.
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GRFICA LCR
Tel. 85 3105.7900 | Fax. 85 3272.6069
Rua Israel Bezerra, 633 | Dionsio Torres | Fortaleza | CE
[email protected] | www.graficalcr.com.br
Este nmero da revista foi composto na fonte GoudyOlSt BT, corpo 11.
O miolo foi impresso em papel AP 75 g/m2 e a capa em carto supremo 250 g/m2.
Impresso pela Grfica LCR.