1 - José Patrício Bispo Júnior, Gleide Magali Lemos Pinheiro
1 - José Patrício Bispo Júnior, Gleide Magali Lemos Pinheiro
1 - José Patrício Bispo Júnior, Gleide Magali Lemos Pinheiro
Professor Adjunto da
Universidade Federal da Bahia (UFBA), campus de Vitria da Conquista.
@ - [email protected] Gleide Magali Lemos Pinheiro Doutora em Enfermagem.
Professora Adjunto da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB),
Departamento de Sade II. @ - [email protected]
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ntroduo
Palavras-chave:
Participao Social;
Conselhos de
Sade; Deliberao;
Poltica de Sade;
Sistema nico de
Sade.
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Aspectos Metodolgicos
Esta investigao caracteriza-se como estudo de caso (YIN, 2010), em que
o campo de estudo foi constitudo pelo Conselho Estadual de Sade da
Bahia (CES/BA). O recorte temporal do estudo foi delimitado no intuito de
se analisar duas gestes com linhas ideolgicas distintas. A ltima gesto
liderada pelo partido Democratas (antigo Partido da Frente Liberal), ocorrida
entre 2003 e 2006, de natureza conservadora e liderada pelo ento senador
Antnio Carlos Magalhes; e gesto liderada pelo Partido dos Trabalhadores,
de 2007 a 2011, de orientao progressista.
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Resultados e Discusso
Influncia e acompanhamento do Conselho sobre a agenda
poltica
Os resultados evidenciam um baixo poder de influncia do CES/BA sobre
a agenda da poltica de sade do Estado. O Conselho, apesar de manter
bom nvel discursivo em suas reunies plenrias, denota baixa capacidade
propositiva sobre a poltica de sade, conforme se observa no relato do
entrevistado: acho que um conselho participativo, observador e questionador.
Agora, eu acho que tem um poder aqum do que poderia ter no processo de
definio. (Entrevista 11).
Sobre a natureza deliberativa, o CES/BA percebido pelos conselheiros,
muito mais como espao de homologao das proposies do gestor do que
como locus de avaliao e direcionamento da poltica de sade estadual.
Os entrevistados, em sua maioria, assinalam que o Conselho desempenha
um papel muito mais de fiscalizao e acompanhamento das prestaes
de contas e dos relatrios da gesto do que a funo propositiva sobre as
polticas. O discurso do entrevistado a seguir, exemplifica tal percepo:
Ento, a participao do conselheiro, assim, era importante na vigilncia,
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Mesmo em razo das distintas atitudes dos gestores para com o Conselho,
possvel concluir sobre a baixa capacidade dos representantes sociais em
interferir sobre a agenda poltica do Conselho. Na gesto carlista, o estilo
pouco democrtico da gesto e a consequente no valorizao dos movimentos
sociais evidenciam a impermeabilidade da agenda para os segmentos no
pertencentes gesto. Por sua vez, o governo petista, mesmo com uma prtica
participativa e de proximidade com os movimentos sociais, no abria mo
do controle da agenda e articulava fortemente a aprovao no Conselho das
decises tomadas no nvel central.
Outra dificuldade observada, e que interfere no desempenho do Conselho,
a baixa capacidade de acompanhamento da poltica de sade deliberada.
Os conselheiros relataram grande dificuldade de acompanhamento das
aes decididas em plenrio, principalmente pela grande demanda de
tempo que este acompanhamento de aes exige. O Conselho possui extensa
pauta de discusses e deliberaes, no sendo possvel fazer avaliaes
pormenorizadas se as aes deliberadas esto ou no sendo implementadas
pela gesto. Nesse sentido, emerge como fator impeditivo para o bom
desempenho do conselho a multiplicidade de atribuies e responsabilidades
a cargo dos conselheiros de sade. Os entrevistados indicaram que as aes
do rgo so demasiadamente amplas e que para o conselheiro cumprir suas
responsabilidades, conforme preconizado, teria que se dedicar integralmente
funo de conselheiro. Argumentam, no entanto, sobre a impossibilidade de
atuarem exclusivamente como conselheiros, visto que j so sobrecarregados
por suas funes profissionais e na militncia em suas entidades de origem.
O discurso de um representante usurio ilustra a sobrecarga de tempo exigida
do conselheiro:
Ento, para alm da reunio do conselho, voc ainda tem
reunies de outras comisses, reunies extraordinrias,
visita a alguma unidade de sade, relatrio para d
parecer. Tudo isso leva a gente a extrapolar o que seria,
digamos assim, convencional da funo. (Entrevista 07).
Sobre esta temtica, Labra (2010) destaca que a amplitude de responsabilidades
inerentes aos conselhos de sade est relacionada s expectativas de seus
idealizadores. Para esses, as atribuies de conselheiros seriam totalmente
exequveis, contariam sempre com os meios adequados para a sua efetivao
e com autonomia suficiente por parte dos colegiados, fatores quase nunca
observados na prtica dos conselhos. Por sua vez, Delgado e Escorel (2008)
salientam que os marcos legais que regulamentam os conselhos de sade
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at sem realizar sua leitura. Por outro lado, os gestores estaduais e municipais
referem no existir conflito de competncias entre as duas instncias. Para esses
segmentos, o que existe a falta de entendimento de algumas representaes do
conselho quanto aos papis das duas instncias, o que conduziria disputa de
espao do conselho para com a CIB. Segundo os gestores, ao CES/BA caberiam
a apreciao e a deliberao sobre a macropoltica do Estado, no sentido de
debater e aprovar as linhas gerais de ao, enquanto a CIB teria uma atuao
mais operativa, de carter gerencial, focada na definio de arranjos para
viabilizar a execuo da poltica deliberada.
No obstante as definies conceituais apresentadas pelos gestores, os
discursos desvelaram que a efetiva definio da poltica de sade passa,
realmente, pela CIB. A fala de um gestor esclarece a situao vivenciada: O
povo ficava no conselho gritando e a CIB decidindo, n? (Entrevista 17). Alguns
gestores exibem, inclusive, uma viso limitada sobre o carter deliberativo do
Conselho, como se a negociao entre gestores se sobrepusesse ao processo
de deliberao pblica institudo no SUS: porque as polticas de sade como
elas prescindem, elas podem prescindir da deliberao do conselho, mas no
podem prescindir da pactuao intergestores (Entrevista 18).
A relao entre os conselhos de sade e as comisses intergestores suscita
debates e anlises de especialistas diversos da rea. Para Crtes (2009),
a institucionalizao das comisses intergestores teve influncia sobre a
dinmica e o espao deliberativo dos conselhos. A autora destaca o fato de
que essas comisses passaram a ser os principais espaos institucionais
da tomada de deciso sobre o funcionamento geral do SUS, o que afetou
negativamente a capacidade dos conselhos de sade se consolidarem como
frum central da tomada de deciso setorial.
Especificamente sobre a gesto estadual, Lotufo e Miranda (2007)
identificaram fragilidades da participao social na formulao dos planos
estaduais de sade. Neste processo, os conselhos estaduais atuam muito mais
como instncias de homologao do que propriamente espao de formulao
de diretrizes para a elaborao dos planos. Os achados desses autores
evidenciam o espao central ocupado pela CIB e a influncia dos gestores
municipais sobre a definio das polticas nos estados em concomitncia
com a perda da capacidade de interferncia dos conselhos estaduais.
Pellegrini (2007), ao debater sobre os papis institudos nos espaos de
deliberao do SUS, infere que a crescente valorizao das comisses
intergestores carrega consigo a proposio implcita de enfraquecimento
dos conselhos de sade, submetendo-os ao lugar de instncia secundria
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do SUS. Questiona ainda sobre a validade legal das decises da CIB e CIT
que se sobrepem s deliberaes dos conselhos. Isto porque, as comisses
foram criadas por meio de uma norma infralegal, a NOB 93, instituda por
portaria do Ministrio da Sade. Segundo o autor, uma portaria ministerial
no pode conceder superioridade hierrquica ao carter deliberativo dos
conselhos de sade, institudos por meio da Lei 8142/90.
As comisses intergestores, apesar de exercerem forte influncia sobre a
conduo da poltica de sade, permaneceram sem amparo legal por um
perodo de quase 20 anos. Foram criadas em 1993, mas apenas em 2011
foi publicada a Lei 12.466, que reconhece essas instncias como frum de
negociao e pactuao sobre os aspectos operacionais do SUS (BRASIL, 2011).
Embora gestores estaduais e municipais da Bahia tenham convergido na
defesa das comisses como espao central de deliberao e deciso das
polticas estaduais, isso no significa que o ambiente da CIB seja um
espao harmnico e de consenso fcil entre seus membros. A disputa entre
representantes do Estado e dos municpios se mostrava de modo bastante
conflituoso e, por vezes, extrapolava o ambiente da comisso e manifestavase nas plenrias do CES/BA.
Mesmo com o domnio e a forte influncia dos partidos governistas no
direcionamento das aes do Conselho, a competio por espaos e
recursos entre o Estado e os municpios, muitas vezes, se sobrepunham
ao alinhamento ideolgico do grupo dominante. Assim, em determinados
momentos nas duas gestes, os representantes dos municpios, mesmo com
fortes vnculos poltico-partidrios com os gestores estaduais, se opuseram
ao posicionamento e orientao destes, conformando alianas, mesmo que
provisrias, com outros representantes de municpios que faziam oposio
ao governo estadual. Tal situao evidencia que a disputa por captao de
recursos e o corporativismo dos representantes municipais, em determinados
contextos, soam mais forte do que o vnculo e a orientao partidria.
Ento, mesmo havendo identidade partidria h um
conflito a pela distribuio de recurso, o que fica com
o estado, o que fica com o municpio. E esses conflitos
se manifestavam no conselho estadual anterior entre o
representante do COSEMS e o gestor estadual, que eram
politicamente ligados ao PFL. E se manifestou depois
entre dois representantes que tambm eram da mesma
identidade partidria, no caso, ligados ao PT. (Entrevista 11).
Consideraes Finais
possvel concluir que o CES/BA exerceu baixo poder de influncia sobre o
direcionamento da poltica de sade do Estado. Apesar do espao participativo
e da possibilidade de expresso dos conselheiros, especialmente na ltima
gesto analisada, o Conselho se debruava, majoritariamente, sobre assuntos
pautados pela gesto; ou seja, as reunies do Conselho eram tidas como
bastante discursivas, mas se discutia o que era mais convenienteaos gestores.
Os representantes sociais demonstraram frgil capacidade de proposio sobre
a agenda poltica. Assim, o Conselho visto como espao para discusso e
homologao das polticas de sade definidas pelo nvel central da gesto.
Observa-se grande embate sobre o tema dos modelos de gesto das unidades
prestadoras dos servios. De um lado, os gestores em defesa de maneiras
de flexibilizao na gesto; de outro, os representantes sociais mantiveram
atitude firme na defesa de um modelo puramente estatal. Foram relatadas
frustraes e embates pelo fato de o governo petista aprofundar os modus
operandide administrao indireta, com destaque para as fundaes estatais
de direito privado e as PPP, em sentido contrrio s expectativas dos
representantes sociais.
Os tensionamentos na relao entre o CES e a CIB emergiram como fator
de destaque na realidade analisada, com evidncias sobre a usurpao do
poder deliberativo do Conselho Estadual por parte da CIB. Os resultados
demonstram que a efetiva definio da poltica de sade passa realmente
pela CIB e que o Conselho fragilizado no processo de deliberar sobre os
caminhos e as prioridades das polticas a serem implementadas.
A capacidade do Conselho em deliberar e fazer acontecer a poltica
deliberada remete discusso sobre as arenas interna e externa como espao
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Artigo
Recebido: 10/03/2016
Aprovado: 02/05/2016
Keywords:: Social
Participation;
Health Councils;
Deliberation; Health
Policy; Unified
Health System.
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