1 Alquimia Crista
1 Alquimia Crista
1 Alquimia Crista
ALQUIMIA
CRISTA
Denis Labour
PREFACIO
I.
COMO
LIMPAR
O
INCONSCIENTE? O SEGREDO DAS LGRIMAS
IV. A REGENERAO DA CARNE
ESOTERISMO E CRISTIANISMO REGENERAO E
SUBSTNCIAS DO CORPO A DEMANDA DO GRAAL A
OBRA DE REGENERAO PAI NOSSO QUE ESTAIS NOS
CUS O SANGUE, ANTDOTO UNIVERSAL
V. "E QUE SURJA A ESTRELA D'ALVA EM NOSSOS
CORAES"
A GRAVIDEZ DA ALMA O EMBRIO DE
IMORTALIDADE E QUE SURJA A ESTRELA D ALVA
EM NOSSOS CORAES
PREFCIO
Numa ptica sociolgica, toda a religio assume-se como
omniabarcante e exclusivista, enquanto institucionalizada sobre
uma sistematizao teolgica de valores e vectores padronizantes
de uma mensagem ordenadora da dinmica evolutiva do Cosmos
e resgatante do percurso tico do Homem, numa perspectiva de
autoridade tutelar absoluta face relao com a dimenso
transcendente do Divino.
O desenvolvimento histrico de todo o fenmeno religioso etnoculturalmente diferenciado evidencia de forma clara a sua
fragmentao ou individualizao em segmentos independentes
que se reclamaram igualmente da mesma exclusividade
cosmolgica e soteriolgica, sempre pretendendo representar a
legitimidade nica da F identificada.
No contexto civilizacional da Tradio religiosa do Ocidente, a
evoluo histrica do Cristianismo, desde a sua gnese at
actualidade, corresponde clara e exemplarmente anlise atrs
apontada, de tal modo que a generalidade das suas denominaes
sempre negou, em consequncia, a presena intencional de
qualquer contedo hermtico na transmisso pedaggica do
Cristo, enquanto codificada nas Escrituras neotestamentrias
cannicas ou apcrifas.
Nesta obra notvel e acessvel, como um manual de sntese, o
astrlogo e hermetista francs Denis Labour aborda
desenvolvida e aprofundadamente - numa dupla perspectiva
original de explanao terica e aplicao prtica - a dimenso
alqumica do esoterismo cristo, expressa na transfigurao
redentora do Homem e do Universo e conducente fuso unitiva
com Deus, muito para alm do conformismo burgus ou do
militantismo social to caractersticos da realidade sociolgicoreligiosa da nossa civilizao ocidental.
I.
SUA IMAGEM E SUA SEMELHANA
O homem enquanto imagem de Deus Deus disse: "Faamos o
homem nossa imagem, como nossa semelhana, e que eles
dominem, sobre os peixes do mar, as aves do cu, os animais
domsticos, todas as feras e todos os rpteis que rastejam sobre a
terra". Deus criou o homem sua imagem, imagem de Deus ele
o criou, homem e mulher ele os criou.
Gn 1, 26-27
A ALMA IMORTAL?
Dum lado est o esprito, doutro lado est a matria. Se algo no
pertence ao esprito, pertence matria. Se no pertence
matria, pertence ao esprito. O homem composto de dois
elementos distintos: o corpo e a alma. Quando a morte ocorre,
apenas o corpo se desagrega na terra, enquanto que a alma,
liberta, continua a viver junto de Deus. Eis o que pensa a maioria
das pessoas.
Ora, esta viso segundo a qual a alma est presa num corpo como
um pssaro numa gaiola de origem platnica. Ela no se aplica
nem ao judasmo nem ao cristianismo, ainda que algumas frases
da Bblia, influenciadas pela filosofia grega, paream adopt-la.
O CORPO A FORMA SOB A QUAL A ALMA APARECE
Na Bblia, as noes de alma e de corpo no tm o sentido que
lhes atribumos habitualmente. Para isto ser compreendido, no
devemos ler a Bblia com os culos do homem do Sec. XX. Na
Bblia, a carne est unida alma. O que conta, antes de tudo, o
23). Ou, segundo uma outra verso do mesmo versculo, ele f-lo
imagem da sua prpria eternidade.
A REALIDADE
ARQUTIPO
DO
HOMEM
ENCONTRA-SE
NO
O sonho de Ado
Notas:
1
a verso escolhida pelos tradutores da Bblia de
Jerusalm.
2
4
Gregrio Palamas, Deuxime Lettre Bariaam 48 ;
Gregrio Palamas, Oeuvres, tomo 1, pag.287 (em grego).
5
6
Citado por Jevtic, Athanase, Thologie asctique, Institut de
Thologie
Orthodoxe Saint-Serge, Paris, 1986.
7
8
"Antes" significa "no princpio" e no "na origem dos
tempos". O tempo e
o espao pertencendo criao, estes conceitos no tm qualquer
sentido para alm dessa criao.
9
15
De Vlection de la Grce.
16
II.
DEUS FEZ-SE HOMEM PARA QUE O HOMEM SE
TORNASSE DEUS
A deificao do homem
Por elas nos foram dadas as preciosas e grandssimas promessas
a fim de que assim vos tornsseis participantes da natureza
divina depois de vos libertardes da corrupo que prevalece no
mundo como resultado da concupiscncia (2 Pd 1, 4)
A primeira revelao
Vrios filsofos da Antiguidade, as velhas religies de Mistrios,
os construtores de catedrais, os alquimistas da Renascena e os
tesofos cristos insistiram neste ponto: o universo que nos rodeia
ele prprio uma Revelao. Deus estendeu nossa volta o
mundo dos corpos para que encontremos no sensvel algo pelo
qual possamos voltar para ele. O universo uma imagem sensvel
de Deus para que toda a obra denote o seu autor. Num quadro de
pintura, um perito reconhece o pintor pois o quadro exprime algo
do seu criador. Tambm o mundo que percepcionamos revela o
seu Criador pois a grandeza e a beleza das criaturas fazem, por
analogia, contemplar seu Autor (Sb 13, 5).
Cada coisa ento um sinal em que Deus se d a conhecer a ns.
Eis a carta do simbolismo medieval, em teologia, em filosofia e
at na arte decorativa das catedrais. O universo teofnico de Scoto
Ergeno, o liber creaturarum de Guilherme d'Auvergne e de
Boaventura, o simbolismo dos Lapidados e dos Bestirios, sem
esquecer o que orna os prticos das nossas catedrais ou
resplandece nos seus vitrais, so outras tantas testemunhas desta
confiana crist na translucidez dum universo, onde o mais
pequeno dos seres um indcio da presena de Deus. Sendo as
criaturas imitaes de Deus, as suas propriedades fundamentais e
as relaes dessas propriedades entre elas ajudam-nos a conhecer
as de Deus.
Segundo Scoto Ergeno, todos os seres criados so luzes, e cada
coisa, at a mais humilde, no , no fundo, seno um crio onde
flameja, ainda que fracamente, a luz divina. Composta por um
enorme nmero de pequenas luzes, a criao uma iluminao
destinada a mostrar Deus. O universo cessaria se Deus deixasse
de brilhar.
to grande glria nesta glria da alma, que ele exalta Deus sua
maneira: sentindo-o nos ossos, conforme o que dizia David: Meus
ossos todos diro: lahweh, quem igual a ti...? (SI 34, 10). E
porque tudo o que possamos dizer ainda pouco, por isso que
basta dizer, tanto daquilo que se passa no corpo como daquilo que
se passa no esprito, que ele sente a vida eterna27. porque eles
tm conscincia da transfigurao simultnea do corpo e da alma
que os cristos tm um imenso respeito pelas relquias dos santos.
A graa de Deus, actuante nos corpos dos santos durante as suas
vidas, continua nas suas relquias, das quais Ele faz instrumentos
de cura.
A pedra vulgar assim transformada em pedra preciosa. O cristal
penetrado pela luz torna-se luz, o ferro levado ao fogo torna-se
fogo.
Para Baslio de Cesareia, O poder divino apareceu atravs do
corpo humano, como uma luz atravs das membranas
transparentes, brilhantes, para aqueles que tm o corao
purificado.
Este processo de deificao confere ao homem um corpo novo, o
corpo de Luz prometido aos eleitos para a eternidade (Mt 13, 43).
Mas estes podem revesti-lo sem que tenham deixado esta terra. O
corpo terrestre transformado em corpo de glria (Fl 3, 21), num
corpo espiritual (1 Co 15, 44) incorruptvel, que nos faz revestir a
imagem do Ado Celeste (15, 49). Substitui-se ao corpo natural, a
esta tnica de pele com que o homem foi revestido na aurora dos
tempos. Ento osjtistos brilharo como o sol no Reino de seu Pai
(Mt 13, 43).
O SEU ROSTO RESPLANDECIA
Na abordagem desta questo da deificao, preciso evitar um
primeiro erro, frequente nos meios esotricos. O corpo glorioso
Notas
1
"Esta doutrina possui um vasto fundo escriturstico neotestamentrio (relativo aos textos do Novo Testamento) que
aparece na continuidade do ensinamento veterotestamentrio
(relativo aos textos do Antigo Testamento). Esta continuidade
manifesta-se de forma mais clara em Jo 10, 34, onde a frmula do
Salmo 81,6 recuperada por Cristo: "Eu disse: sois deuses." O
mesmo Salmo no seu primeiro versculo proclama: "Deus se
levanta no conselho divino, em meio aos deuses ele julga. "A
afirmao, repetida por duas vezes pelo apstolo Paulo, faz eco a
estas frmulas: "Porque somos tambm da sua raa (...) ns
somos de raa divina" (At 17, 28-29). Uma outra afirmao
essencial a do apstolo Pedro: pela glria e virtude de Deus "nos
foram dadas as preciosas e grandssimas promessas afim de que
assim vos tomsseis participantes da natureza divina" (2 Pd 1, 4).
Outras frmulas atestam duma assimilao ao Cristo: "Pois todos
vs que fostes baptizados em Cristo, vos vestistes de Cristo " (Gl
3, 27); "J no sou eu que vive, mas Cristo que vive em mim " (Gl
2, 20). temtica da divinizao do homem devem ser ligadas as
3
"Factus est Deus homo ut homo fieret Deus", Sermo 128,
PL, t. 39, col. 1997;
trata-se dum sermo de Natal. 45e/./nz.,I,3,PG13,769B.
5
10
11
12
13
14
19
20
21
22
23
24
25
26
27
Viveflamme, II, 5.
l. pag. 324,12.
32
33
34
35
III.
COMO FAZER?
a.
Os Mistrios
Aquele que come a minha carne e bebe o meu sangue permanece
em mim e eu nele (Jo 6, 5-6)
A GUA, O SANGUE E A CARNE
As energias contidas no corpo glorificado do Cristo so
comunicadas aos seus iniciados e asseguram a sua deificao.
Esta comunicao efectua-se, entre outros meios, pelos
sacramentos, a que a tradio oriental chama "Mistrios". Na sua
principal acepo, a palavra grega mysterion no significa
"secreto", "oculto", "escondido". Designa em primeiro lugar uma
realidade transcendente, que pode, sem dvida, ser objecto de
velamento, mas que pode tambm ser objecto duma revelao,
sem por isso perder o seu nome de mysterion. Esta palavra
aparece vinte e uma vezes em S. Paulo, quatro vezes no
Apocalipse, trs vezes nos Evangelhos sinpticos numa passagem
paralela.
Soprando o Esprito onde e quando quer, tentar indicar o nmero
de sacramentos existentes revelador duma vaidosa
racionalidade, desconhecida dos Padres da Igreja. Mas dois deles,
o baptismo (seguido do crisma) e a eucaristia, formam os
principais Mistrios de que depende a deificao do homem. Na
pregao realizada a respeito da ferida feita pelo soldado romano
a Jesus na cruz, S. Joo Crisstomo resume: No apenas por
acaso que dois jactos jorraram, mas porque a Igreja se formou
das duas; e os que so iniciados sabem que foram regenerados
pela gua e alimentados pelo sangue e pela carne. Esta a origem
dos Mistrios*.
O BAPTISMO
O baptismo introduz no homem o princpio divinizante das
energias incriadas. Ou mais exactamente, ele introduz o homem
insiste sobre o facto que o Esprito est tambm ele presente neste
mistrio. E por vezes chamado de "Fogo" pela tradio sria.
Quando os fiis recebem o corpo e o sangue de Cristo, eles
recebem tambm o Esprito Santo. A pedido do celebrante,
pedido esse a que se d o nome de "epiclese", o Esprito vem
incorporar-se nestes oblatos, que representam Cristo sepultado. A
se opera uma restaurao, uma recriao anloga quela que se
efectuou na manh de Pscoa no corpo do Salvador. Transformaos em princpio de vida capaz de deificar a assembleia que os
recebe pela comunho: o Po da vida que muda, transforma,
assimila aquele que o come* H uma permanncia de Cristo no
cristo e do cristo no Cristo: Aquele que come a minha carne e
bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele (Jo 6, 5-6). Esta
recepo do Esprito pela eucaristia igualmente afirmada por
Isaac de Antioquia (Sec. Vo). Para exortar os fiis a
aproximarem-se da mesa eucarstica, ele clama: Vinde beber,
comer a chama que vos far anjos de fogo, e provai (pela vossa
boca) o sabor do Esprito Santo para que os vossos nomes sejam
inscritos entre as potncias espirituais.9 Poderamos multiplicar
estes testemunhos. Eles provm no somente dos Padres da
Igreja, mas tambm dos textos litrgicos. Este, tirado das Matinas
do segundo domingo aps Pentecostes, celebradas na Igreja de
Antioquia, indica a presena do Esprito na eucaristia e compara-a
presena do fogo num forno: Eis que o corpo e o sangue so um
forno no qual o Esprito Santo o Fogo.10
Na celebrao, onde o Esprito Santo actualiza e manifesta a
morte e a ressurreio de Cristo, o "corpo de morte" satura-se
pouco a pouco com eternidade, esboando a sua metamorfose em
"corpo de glria"; A matria... recebe nela a fora de Deus.11 A
modalidade decada da natureza reabsorvida na sua modalidade
glorificada.
(At 8, 30-31)
O SENTIDO LITERAL E O SENTIDO ESPIRITUAL
A Bblia introduziu na histria um dinamismo secreto. Ela
comporta-se como um verdadeiro fermento. Mas a sua simples
leitura, ainda que assistida por todas as ferramentas intelectuais da
exegese insuficiente. Faltam-nos as chaves da leitura. a
prpria Bblia que nos adverte. Citemos o episdio de Filipe que
persegue uma carruagem a pedido expresso de Deus e do seu
Esprito: O Anjo do Senhor disse a Filipe: "Levanta-te e vai, por
volta do meio-dia, pela estrada que desce de Jerusalm a Gaza. A
estrada est deserta". Ele se levantou e partiu. Ora, um etope,
eunuco e alto funcionrio de Candace, rainha da Etipia, que era
superintendente do seu tesouro, viera a Jerusalm para adorar e ia
voltando. Sentado na sua carruagem, estava lendo o profeta Isaas.
Disse ento o Esprito a Filipe:"Adianta-te e aproxima-te da
carruagem. Filipe correu e ouviu que o eunuco lia o profeta Isaas.
Ento perguntou-lhe: 'Entendes o que ests lendo?" Como o
poderia, disse ele, se algum no me explicar Convidou ento
Filipe a subir e sentar-se com ele (At 8, 26-31).
Para compreender esta existncia dum duplo - ou triplo -sentido
das Escrituras, sigamos Orgenes. Deus concede o seu dom quele
que o busca com pacincia onde ele se esconde: na sua Palavra.
Mas desta Palavra, apenas conhecemos a Escritura. Sem os signos
com que se reveste, no conheceramos esta palavra de Deus.
Estes signos, a letra da Escritura, formam o corpo desta Palavra:
a todos;
-
interior.
INTERPRETATIVAS
LEGADAS
PELOS
A ORAO INSISTENTE
Tal como lembrado no episdio de Jacob lutando com Deus at
que este o abenoe (Gn 33, 27), Cassiano sabe que obtemos o que
desejamos Dele importunando Deus, que nos exorta a pressionlo pelas nossas violncias20. Porque a paixo foi dada aos
violentos para que dela se sirvam para forar as portas do Reino.
Estamos no Oriente, junto de Padres que sabem que Deus
oriental, e que Daniel orou e insistiu vinte e um dias antes de ser
atendido (Dt 10, 1).
Repitamos: Deus gosta de ser importunado. E para Ele uma prova
de amor e de fidelidade. Deus no se parece com o homem
ocupado que diz no seu escritrio "O vosso tempo precioso, o
nosso tambm". Voltemos a ler Lc 11, 5-9 luz da orao
insistente!
Assim que nos sentirmos contrariados nas nossas aces, ou que
as nossas foras diminuem, temos o direito de interpelar com as
suas prprias palavras aquele que nos disse que queria fundar a
sua Igreja sobre ns: temos o direito de o lembrar que as suas
palavras no podem passa?"21 O prprio Cristo nos recomenda
esta atitude: Contou-lhes ainda uma parbola para mostrar a
necessidade de orar sempre, sem jamais esmorecer. "Havia numa
cidade um juiz que no temia a Deus e no tinha considerao
para com os homens. Nessa mesma cidade, existia uma viva que
vinha a ele dizendo: "Faz-me justia contra o meu adversrio!
Durante muito tempo ele se recusou. Depois pensou consigo
mesmo: Embora eu no tema a Deus, nem respeite os homens,
contudo, j que essa viva est me dando fastio, vou fazer-lhe
justia, para que no venha por fim esbofetear-me. E o Senhor
acrescentou: Escutai o que diz esse juiz inquo. E Deus no faria
justia a seus eleitos que clamam a ele dia e noite, mesmo que os
faa esperar? Digo-vos que lhes far justia muito em breve... (Lc
18, 1-8).
ORAES CURTAS
dito nas Instituies de Cassiano: Os mestres da vida espiritual
pensam que mais vale fazer oraes curtas e repeti-las mais vezes.
Multiplicando essas oraes, ligar-nos-emos mais intimamente a
Deus, e, tornando-as curtas, evitaremos melhor as flechas que o
demnio lana, sobretudo nessas ocasies, contra ns22. Assim,
diz ele noutro texto, devemos fazer oraes curtas mas frequentes,
com medo de que, se forem longas, o inimigo tenha tempo de
lanar algumas distraces no nosso corao23. Segundo esses
mestres, a orao breve mais facilmente pura, porque isenta de
distraces. E para chegarmos unio com Deus, eles achavam
muito eficazes esses rpidos lampejos que partiam do corao.
Recuai to atrs quanto quiserdes, encontrareis Set, o substituto
de Abel, que foi o primeiro a invocar o nome de lahweh (Gn 4,
26). Isaac fez o mesmo (Gn 26, 25). Encontrareis tambm os
Apstolos, tal como nos relatam Clemente de Alexandria,
Cassiano ou Joo Crisstomo: Dizei em vs mesmos: Tem
piedade de mim, meu Deus e assim tereis acabado a vossa orao.
Santo Agostinho repetia "Deo gratias" e falava de oraes
frequentes mas muito breves e como que rapidamente lanadas
(quodammodo jaculatas), o que deu origem expresso orao
jaculatria. Igncio utilizava O Beata Trinitas enquanto que
Francisco Xavier preferia O Sanctissima trinitas. Um rico
habitante de Assis convidou So Francisco a passar a noite na sua
casa para poder espiar as suas oraes. Ouviu-o repetir com fervor
toda a noite estas palavras: Meu Deus e meu Tudo. No -h
nenhuma necessidade de variar as invocaes, pois: As rvores
que so muitas vezes transplantadas no tm razes24. Uma nica
frase de adorao chega para que a vontade mantenha o fogo de
mim" (Lc 18, 13 e 18, 38), para repetir 3000 vezes por dia. Ps-se
obra. Durante dois dias, tive algumas dificuldades, depois
tornou-se to fcil que quando eu no dizia a orao, sentia o
desejo de retom-la e ela corria com facilidade e ligeireza, sem as
dificuldades do incio. Depois, durante uma semana permaneci
numa cabana solitria recitando todos os dias as minhas 6000
oraes sem me preocupar com mais nada e sem ter que lutar
contra os pensamentos... O que aconteceu? Habituei-me to bem
orao que se eu parasse por um curto instante, sentia um vazio,
como se tivesse perdido alguma coisa; assim que retomava a
minha orao, sentia-me de novo leve e feliz. Quando encontrava
algum, no tinha vontade de falar, desejava apenas estar s e
recitar a orao, to habituado me sentia ao fim de uma semana.
Depois passou para 12000: Passei todo o vero a recitar
incessantemente a Orao de Jesus e estive perfeitamente
tranquilo. Durante o meu sono, sonhava por vezes que recitava a
orao. E durante o dia, se acontecesse encontrar pessoas,
pareciam-me to amveis como se fossem da, minha famlia. A
orao passou depressa "para o seu corao", tendo apenas que
contar as batidas deste para verificar o seu nmero.
Esta orao no apenas oriental ou eslava. Praticando a orao
contnua, Richard Rolle (1290-1349) explica-nos que ao fim de
trs anos, menos trs ou quatro meses, as portas do cu se abriram
para ele: Estava sentado numa capela e enquanto me encantava
com a doura da orao, senti de repente um calor alegre e
desconhecido. Mas antes fiquei perturbado, interrogando-me
durante muito tempo sobre o que isso poderia ser. Estava certo de
que isso no vinha duma criatura mas sim do meu Criador, pois
tornava-se cada vez mais quente e cada vez mais alegre. Na
verdade, meio ano, trs meses e algumas semanas passaram neste
calor odorante, sensvel e inesperado at que eu recebesse o som
celeste e sobrenatural, o qual pertence ao carinho da orao
O LUGAR DO CORAO
O homem do passado considerava o corao, e no o crebro,
como a sede do pensamento. Jesus repete-o. Mas trata-se do
corao entendido como centro do peito, e no do rgo. O
homem estava consciente dos pensamentos que tocavam no
diafragma ou nas entranhas. A palavra grega phren, que significa
esprito, a raiz da palavra diafragma. O "corao" constitui o
centro do homem. Ele a sede das violentas conflagraes entre
toda a espcie de desejos que nos obrigam a fazer o que no
queremos. tambm a que se pode abrir um cu interior mais
vasto que o universo pois a transcendncia enche-o com a sua
irradiao: O pas espiritual do homem que tem a alma purificada
est dentro dele. O sol que brilha nele a luz da Trindade... ele
admira a beleza que v nele, cem vezes mais luminosa que o
esplendor solar. a o Reino de Deus que est escondido dentro
de ns, segundo a palavra do Senhor29. O corao profundo
como uma espcie de "supra-consciente" que aspira a se abrir
sobre o abismo da luz divina. O corao o corpo no mais
profundo do corpo30, isto o germe do corpo de glria:
Apoiando a tua barba, contra o teu peito, dirige o olho do corpo
ao mesmo tempo que o teu esprito sobre o centro do teu ventre,
isto , o teu umbigo, comprime a aspirao de ar que passa pelo
nariz (...) e examina mentalmente o interior das tuas entranhas na
busca do lugar do corao, a onde todos os potncias da alma
gostam de se reunir. (...) Assim que o esprito tiver encontrado o
lugar do corao, ele ver o firmamento que a se encontra...31. A
Regenerao consiste em fazer desaparecer a casca que mantm
preso o corao divino. Devemos aprender a descer no nosso
corao, a penetrar progressivamente na espessura de Deus. A
frmula de invocao mais usada neste processo Senhor Jesus
Cristo, tem piedade de mim, pecador no sentido de "toma-me na
tua presena misericordiosa". Esta frmula pode ser:
As tcnicas psicossomticas
Preparar o vaso
No se pe vinho novo em odres velhos; caso contrrio, estouram
os odres, o vinho se entorna, e os odres ficam inutilizados. Antes
o vinho novo se pe em odres novos; assim ambos se conservam,
(Mt 9, 17)
O SILNCIO DA ALMA
O homem pode aparentemente viver na solido, abster-se de
proferir qualquer palavra e estar interiormente inquieto e agitado.
Citemos as palavras de Abba Poemen: H um homem que parece
calar-se, mo o seu corao condena os outros; um homem destes
fala incessantemente. Mas h um outro que fala de manh noite,
e no entanto guarda o silncio, isto , no diz nada que no tenha
utilidade para os outrosm. Numa das suas respostas, Joo de Gaza
distinguiu claramente silncio interior de silncio exterior. Um
irmo que vivia em comunidade achava que a sua tarefa de
carpinteiro do mosteiro era uma fonte de perturbao e de
distraco. Pediu para se tornar eremita a fim de praticar o
silncio de que falam os Padres. Joo recusou este pedido: Tal
como a maioria,, tu no percebes o que significa o silncio de que
falam os Padres. O silncio no consiste em guardar a boca
fechada. Um homem que pronuncia dezenas de milhar de palavras
pode permanecer no silncio ao passo que aquele que pronuncia
uma palavra intil deve lembrar-se que infringe o mandamento do
Senhor: "No dia do Julgamento, prestars contas de cada palavra
intil sada da tua boca"40.
O SILNCIO OBJECTIVO
Este discernimento no se resume a separar as ideias justas ou
boas das ideias errneas ou ms. Visa reconhecer a origem, a
natureza e a finalidade dos germens "passionais", sugestes
fugazes, impulses obcecantes subidas do subconsciente. S deste
modo possvel permanecer diante de Deus com a mente no
corao e ficar assim na Sua presena incessantemente, dia e
noite. O nefito deve saber calar-se com a boca e com os
pensamentos, quer durma, quer vigie. Tal como Ulisses tapando
as orelhas para no ceder seduo das sereias, a sua alma deve
permanecer insensvel a todas as vozes e a todos os rumores da
O GESTO JUSTO
Outrora, os movimentos desenvolviam-se no coro, e era
importante que o sacerdote vivesse a cerimnia nos mnimos
gestos e at s pontas dos dedos, como uma dana sagrada, pois o
cumprimento da liturgia exige um certo nmero de movimentos.
O sacerdote aprende a executar cada um deles com perfeio, e
depois, a encade-los todos. Executado numa posio de
constatao activa, isto permite, no somente para aquele que o
v, mas para aquele que o vive, a possibilidade dum contacto com
o Divino. Quando o sacerdote se submete durante meses ao rigor
dos exerccios de relaxamento, de respirao, da atitude justa e do
gesto puro, da colocao da voz e do treino do canto, ele
compreende que deve entrar plenamente no rito; de corpo, alma e
esprito. Cada liturgia pode at transformar o seu corpo e dar sua
forma uma transparncia.
O ESPAO SAGRADO
Ningum consegue escutar uma sinfonia ou admirar um quadro
numa sala onde reine um odor a gs insuportvel. Na igreja, tudo
est ligado. A arquitectura tem em conta um efeito to discreto
quanto o das volutas de fumo do incenso ondulando sobre os
frescos e enlaando os pilares. Essas volutas alargam os espaos
arquitectnicos da igreja, atenuando a secura e o rigor das linhas,
parecendo insuflar-lhes movimento e vida. Lembremo-nos do
ritmo dos celebrantes, dos jogos de luzes sobre as dobras dos
tecidos preciosos, os perfumes de incenso, a atmosfera to
particular ionizada pelas chamas de milhares de crios.
COMO LIMPAR O INCONSCIENTE?
A participao na liturgia envolve o cristo na totalidade da sua
pessoa, e pode ir muito longe na sua profundidade, na medida em
que este estiver pronto a entregar-se totalmente, e a deixar o seu
Notas
1
Trata-se duma aluso ao Monte Tabor, onde a tradio situa
o episdio da Transfigurao (Mateus 17, 9; Marcos 9, 2-10;
Lucas 9, 28-36).
2
5
Praticada segundo um rito diferente, a confirmao o
equivalente, na Igreja Romana, ao crisma das Igrejas orientais.
6
Discours calchtique, 37
10
11
12
15
16
17
18
23
24
47
6
Salvo meno em contrrio, as citaes seguintes deste
captulo so extradas desse texto.
V.
"E QUE SURJA A ESTRELA-D'ALVA EM NOSSOS
CORAES"
ESTRELA-D'ALVA
EM
NOSSOS
Notas:
1
Hymnes.
5
Saint Martin a Vialetes d'Aignan, 5 de Janeiro 1787, ap.
Saint Martin, Thosophie
et Tologie, Documents martinistes, 1980, pag. 65.
6
Para a desenvolver com exactido, tomarei a maior parte das
informaes que
Catchse.
10
EthiqueX, 870.
gentes, odiadas pelo mundo, mas eleitas pelo Senhor, que Deus d
a paz que sentis agora em vs... E o que sentis mais? Perguntoume o padre Serafim.
-
Ele continuou:
a doura de que falam as Santas Escrituras: "Eles saciamse com as riquezas da tua casa, e Tu os deleitas com a torrente da
tua doura". So as delcias que enchem de novo os nossos
coraes e que se expandem por todos os nossos vasos num
contentamento indizvel. Os nossos coraes fundem, por assim
dizer, nesta doura, e somos ambos penetrados por uma tal
beatitude que nenhum idioma o poderia expressar... E que sentis
ainda?
-
UMA
CHAMA
Cristo, o Verbo e apenas Ele que deve ser o mestre, que deve ser
o iniciador". "E apenas Deus e o seu Esprito Santo que vos
podem dar a verdade perfeita, mas preciso pedi-la
humildemente". "Deus d a Sabedoria e espalha-a largamente
sobre aqueles que o amam... mas recusa-a ao orgulho e
soberba"... E o que preciso saber, que quando o sangue,
quando a substncia viva dum ser foi marcada como o lacre dum
selo, e isto com o seu consentimento, ser-lhe- quase impossvel,
se mais tarde reconhecer que o selo tem defeitos, apagar essa
impresso. Apenas o poder fazer aceitando uma impresso ainda
mais forte, revestindo-se duma armadura mais poderosa, e isto
no ser sem grandes lutas e grandes choques. Poderamos
encontrar mais do que um exemplo. Por vezes, mesmo aquele que
foi aceite segundo os ritos, que membro duma confraria
inicitica ou oculta, poderosa, paga imediatamente com a sua vida
a falta de querer, no trair a confraria, mas apenas deix-la. No
se brinca impunemente com as misteriosas leis do sangue. Cabe
ao postulante escolher bem. Tudo isto diz respeito quilo a que
chamei iniciaes em modo humano, iniciaes em suma...
secundrias. igualmente no sangue e pelo sangue que operam,
como j o assinalei antes, por um lado as bnos e por outro
lado, felizmente apenas at quarta gerao, as maldies, os
feitios, etc. ...pois o filho, o neto, o bisneto dum ser que foi
maldito segundo os ritos ou dum ser que foi enfeitiado
plenamente e com razo, carregaro ainda o peso dessa maldio
ou desse feitio. Trata-se aqui duma lei terrvel, lei essa que um
dos aspectos daquela que visa os males de transmisso hereditria
mas aqui em modo psquico e... 'magntico...
... precisamente porque, pelo seu sangue, o homem participa da
natureza tenebrosa ao mesmo tempo que participa da luz, porque
est no limite entre a luz e as trevas, que ele pode agir pela magia
tanto para o bem como para o mal; porque o sangue contm os
Uso interno