Arte Despertar Livro Portugues

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 121

ARTE DESPERTAR: PRIMEIRA DCADA

ARTE DESPERTAR: PRIMEIRA DCADA

So Paulo, 2010
Associao Arte Despertar

NOSSA ARTE
DESPERTAR O MELHOR
DO SER HUMANO

01 I 02

0
IMPRESCINDVEIS UTPICOS

4
09

1
A NOO DE RESPONSABILIDADE SOCIAL
EM PERSPECTIVA HISTRICA: DO INCIO
DA MODERNIDADE AO CONTEXTO QUE
GEROU A ASSOCIAO ARTE DESPERTAR

NDICE

UM POUCO DE NS

79

MARIA ANGELA DE SOUZA LIMA RIZZI


MARIA HELENA DA CRUZ SPONTON

EDUARDO MONTECHI VALLADARES

5
A VISO DO LADO DE FORA

23

RUI LUIS RODRIGUES

153

6
ONTEM, HOJE E AMANH

207

REGINA VIDIGAL GUARITA

LINHA DO TEMPO

41
OS PARCEIROS

213

CURRCULOS DOS AUTORES

221

REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

225

PATROCINADORES

235

2
O INDIVDUO E A ARTE DE RECRIAR-SE

53

FELIPE DE SOUZA TARBOLA

3
DESPERTAR COM E PARA A ARTE
MARIA CHRISTINA DE SOUZA LIMA RIZZI

67

01 I 02

01 I 02

IMPRESCINDVEIS UTPICOS
EDUARDO MONTECHI VALLADARES

01 I 02

IMPRESCINDVEIS UTPICOS

em mim
eu vejo o outro
e outro
e outro
enfim dezenas
trens passando
vages cheios de gente
centenas
o outro
que h em mim
voc
voc
PAULO LEMINSKI
Contranarciso (1980)

Este texto um convite. Caro leitor, leia atentamente o livro que est em
suas mos. Ele conta, em captulos escritos por diferentes autores, os
dez anos de trajetria da Associao Arte Despertar. Essa , com certeza,
uma histria que merece ser conhecida.
Sabemos que dcadas so marcaes arbitrrias, embora possuam uma
representao simblica bastante grande para a maioria das pessoas. Na
histria da humanidade a predileo pelo nmero dez no foi um acontecimento fortuito. Na Antiguidade alguns povos primitivos adotaram a
diviso em dez porque simbolizava a ideia de fim, de consumao. Essa
noo provavelmente est ligada ao fato de, com o auxlio dos dedos, s
podermos contar at dez. Mesmo hoje, quando fingimos que j somos
civilizados, ainda continuamos presos s antigas crenas de nossos ancestrais. Mas, de qualquer forma, a publicao de um livro que relata os dez
anos de atuao de uma entidade que cotidianamente nos mostra que a
solidariedade possvel e que as perspectivas propostas so realizveis
sempre uma notcia alvissareira.
A razo da existncia da Associao Arte Despertar despertar pessoas,
procurando assegurar que cada indivduo tenha possibilidade de acesso
ao seu potencial criativo. Talvez o seu papel mais importante seja nos
lembrar o tempo todo de algo do qual os homens j deveriam estar suficientemente persuadidos: o Outro no deve jamais ser tratado como um
objeto inanimado, que pode ser manipulado impunemente. necessrio
sempre levar em considerao seus desejos e suas vontades, suas caractersticas e suas singularidades.
Existe uma questo tica fundamental para cada um de ns: como devo
viver? Em uma de suas ltimas entrevistas, o filsofo francs Michel Foucault observou: O que me surpreende o fato de que, em nossa sociedade,
a arte se tornou algo relacionado apenas a objetos e no a indivduos ou
vida. (...) Mas a vida de cada indivduo no poderia se tornar uma obra

10 I 11

de arte? Por que uma mesa ou uma casa so


objetos de arte, mas no as nossas vidas? As
respostas s perguntas feitas por Foucault talvez sejam um bom caminho a ser trilhado por
todos aqueles que se indagam sobre como devem encaminhar sua vida.

mos os nicos responsveis pela escolha de


objetivos e dos caminhos para atingi-los. Por
termos a absoluta liberdade de fazer as nossas
opes, a modificao do projeto inicial , a
todo o momento, possvel. Ns somos aquilo
que decidimos ser.

O que Foucault chamou de esttica da existncia um convite a que nos tornemos


responsveis pela beleza de nossa prpria vida.
Isso pode ser alcanado por todos aqueles que
forem capazes de promover um questionamento tico e construir um estilo de vida pautado
por valores generosos, solidrios e ousados. A
ideia de que devemos nos ver como um objeto em constante processo de autoelaborao
tambm exige o uso de grandes doses de criatividade. A aceitao dessa abertura para as
novidades significa no reconhecer qualquer
tipo de enquadramento, rejeitando toda tentativa de normalizao.
O cuidado de si (aquele que pretende tomar a si
mesmo como objeto de cuidado) no significa
que no se possa olhar os Outros. Pelo contrrio, a partir do, e com o Outro, que nos
tornamos, no incio e ao longo de toda a nossa
vida, aquilo que somos: seres humanos sociais.

Todos estamos continuamente vivenciando situaes problemticas ou absurdas. Em funo


da nossa finitude importante termos cuidado
na escolha de nossos caminhos. A descoberta
de que somos livres traz inevitavelmente a angstia, pois somos responsveis por todas as
consequncias advindas de escolhas. Fugir
liberdade significa aceitar a presena de algum
que se responsabilize por nossa vida. O fato de
nossos sucessos ou fracassos poderem ser atribudos a Outro pode at trazer uma sensao
de tranquilidade e segurana, mas sinaliza que
escolhemos viver na condio de servos. Ao
optar pela liberdade, encarando a angstia de
frente, assumimos o risco de viver uma aventura que no tem roteiro traado. Em suma, risco
sinnimo de liberdade. Talvez nada seja mais
desprezvel do que aquele que sempre um
cauteloso pouco a pouco. Podemos, portanto,
escolher fazer de nossa vida uma obra de arte.
Basta ousar.

Para o filsofo Jean-Paul Sartre, o homem est


condenado a ser livre, o que significa que so-

No ato de produzir arte est presente o uso do


real e do imaginrio, do subjetivo e do objetivo,

do no utilitrio e do prtico. As obras de arte,


assim como aqueles que ousam romper com
a mesmice, sempre possuem diversas camadas
de significaes. Elas permitem no apenas retratar um mundo, mas tambm uma variedade
de leituras to grande quanto a imaginao de
quem as produz. justamente essa possibilidade de emergncia de to imensa diversidade
de olhares que pode fazer da arte um agente
facilitador da relao entre os homens.
Outro dado importante que a arte possibilita momentos de catarse (do grego katharsis;
traduzido por purgao, purificao), ou seja,
uma poderosa descarga de emoes que faz
com que as tenses individuais sejam aliviadas pelo fato de as pessoas poderem
vivenciar uma comunho. Tambm importante recordar que, para Aristteles, filsofo
ateniense do sculo IV a.C., a catarse possua
uma clara conotao moral e poltica. Ela era
significativa para o aperfeioamento moral
da plis (Cidade-Estado na Grcia Antiga),
permitindo que os cidados encontrassem
solues para seus conflitos de interesse e
de opinio. Uma cidadania ativa aquela em
que os cidados efetivamente participam das
decises polticas que os afetam. Para que
isso ocorra, so necessrias duas condies:
a existncia de isonomia (igualdade perante a
lei) e a presena efetiva da isegoria (igualda-

de no direito de expor e discutir em pblico


opinies sobre aes que a cidade deve ou
no realizar).
No sculo XXI, aps uma srie de conquistas
que ampliaram os direitos individuais, ainda persistem flagrantes desigualdades. A situao de
todos aqueles que vivem em condio de fragilidade de relativo, mas perceptvel, esvaziamento de sua condio de cidadania. Parece
que foram condenados ao reino dos sem-memria, dos sem-razo, dos sem-voz. A tutela
que exercida sobre essas pessoas, mesmo
que haja a inteno de proteg-las, pode levar
ao enfraquecimento de suas subjetividades.
Por isso, necessria uma postura sempre
atenta dos profissionais que atuam em programas voltados a elas.
preciso assegurar que os silenciados de todos
os tipos possam falar. Silenciados so todos
aqueles que, ainda que estejam urrando suas
dores e seus sofrimentos, no so escutados.
Isso ocorre porque muitas vezes os gritos encontram apenas ouvidos moucos, incapazes de
despertar para ouvir a voz do Outro. Tratados
como marionetes, cujos cordis podem ser
manipulados arbitrariamente, no so vistos
como seres humanos, mas como simples objetos animados no processo produtivo. tarefa
de todos restituir-lhes a voz.

12 I 13

Muitas vezes, nossa identidade pode ficar diminuda pela realizao de


trabalhos repetitivos e montonos. As atividades em que no h espao
para expresso de desejos e de individualidade acabam corroendo nosso
amor-prprio e nos embrutecendo.
O cotidiano tanto pode ser um espao e um tempo de repeties enfadonhas como uma condio essencial para que se criem os laos de solidariedade para uma vida mais prazerosa. Cabe a cada um fazer a escolha
que quer para si, entendendo que esta pode contribuir para a criao de
empreendimentos coletivos.
A luta pelo reconhecimento da unicidade de cada pessoa marca da
Associao Arte Despertar. Em dez anos de existncia, inmeros
projetos foram desenvolvidos em vrias comunidades de baixa renda.
As dezenas de milhares de pessoas (crianas, jovens e adultos) atendidas
ao longo desse perodo foram tratadas sempre como seres dotados de
qualidades originais, que possuam necessidades diferenciadas. Este talvez seja o seu grande mrito: trabalhar a incluso cultural de populaes
desfavorecidas, respeitando cada indivduo.
Isso significa que, ao mesmo tempo em que procura transformar um ambiente marcado por diversas carncias, reconhece e valoriza a identidade,
as razes e o meio sociocultural de cada um dos beneficirios.
No transcorrer dos projetos so desenvolvidas diversas atividades artsticoeducativas em artes visuais, artes cnicas, msica ou literatura. Contadores
de histrias incentivam a paixo pela leitura, alm de encantarem e ampliarem o repertrio cultural de todos os que participam dessa atividade.
Com o objetivo de ampliar a viso de mundo e experimentar novas formas de olhar e pensar, so organizadas visitas a exposies e museus, idas
a espetculos, shows e palestras.

Outro ponto que merece destaque a capacitao de jovens que vivem


nas comunidades em que os programas so desenvolvidos. No se trata apenas de assegurar a formao de pessoas para difundir propostas,
mas tambm habilit-las a ampliar espaos de cidadania. Nos encontros
so discutidas questes que envolvem relao interpessoal, limites, autodisciplina, trabalho em grupo, noes de pertencimento, identidade,
incluso-excluso, aspectos que motivam a elaborao de projetos de vida.
Essa preocupao com a capacitao contnua no se limita s pessoas
atingidas pelos programas. Ela tambm est presente, de maneira obsessiva, entre os participantes das equipes tcnicas e do Conselho Diretor.
A Associao Arte Despertar tambm tem se dedicado promoo de
aes em hospitais. A ideia utilizar a arte como um dos componentes do
processo teraputico, o que pode beneficiar no apenas o paciente, mas
todos os profissionais das equipes de sade. Nessas intervenes procura despertar, por meio de atividades artsticas, a capacidade de reflexo
humanizada, influenciando as pessoas a vivenciarem experincias que as
afastem do estresse geralmente enfrentado no cotidiano de um hospital,
que as faam afastar-se da dor, do sofrimento, da relao estritamente
profissional e as motivem a voltar sua ateno para o estabelecimento da
dignidade humana.
Ao valorizar o carter nico de cada paciente por meio da arte possvel
revitalizar um exerccio de imaginao e de liberdade negado por uma
cultura hospitalar marcada pela superespecializao. A arte, especialmente nesse contexto, uma forma de percepo e de expresso humana
capaz de desvelar a realidade interior e exterior. Ela proporciona outras
leituras do mundo, abre possibilidades para questionamentos e pode contribuir para humanizar as relaes, fazendo com que todos percebam que
a doena no privou o paciente de seus direitos e ele uma pessoa, no
mais um caso que precisa ser rapidamente resolvido. O dilogo possvel

14 I 15

de se estabelecer a propsito da vivncia artstica tem ainda a potencialidade de contribuir


com o tratamento das doenas.
As molstias no so apenas um dado biolgico.
s vezes, a dor mais dilacerante pode ser aquela que mesmo os sedativos mais poderosos no
podem atenuar. No cotidiano das internaes
no raro que um paciente deixe de ser visto
como ser dotado de desejos, inquietaes e incertezas. Ele apontado como um observador
passivo de sua prpria vida. Nessas situaes o
estmulo arte pode ajudar na construo de
um novo modo de existir no mundo que abarca as manifestaes de solicitude como forma
de buscar compreender o ser doente em sua
existncia plena.
Algumas palavras, de to usadas, perderam sua
fora, viraram jarges esvaziados de significado. Isso lastimvel, j que muitos desses
termos hoje rotos representam os melhores
projetos que homens e mulheres foram capazes de sonhar. O programa da Modernidade,
inaugurado com a busca da Liberdade, da
Igualdade e da Fraternidade, ainda no se completou, mas sua implantao continua sendo
uma exigncia premente.
Quantas vezes aqueles que tentaram organizar atividades em que o cuidado de si tambm
envolve o cuidado do Outro foram tratados

como utpicos, sonhadores? Os denominados


realistas adoram chamar de utpicos queles
que no abdicaram da possibilidade de sonhar
e de implantar projetos transformadores. Os
que dizem ter os ps no cho afirmam que
devemos nos ater apenas quilo que possvel. O problema que o possvel deles muito
pouco. Os apologistas de uma sociedade racionalizada e organizada em torno do consumo e
do mais egosta dos individualismos renunciam
s pulses de vida e se acreditam modernos.
No passam de conservadores.
bom lembrar que a palavra utopia significa
lugar nenhum, ou lugar que no existe. Ora,
o fato de algo no existir no significa impossvel de vir a ser construdo. Por isso, ela
tambm pode ser entendida como relacionada
a todo sonho generoso de renovao social.
Denominar as pessoas que trabalham na Associao Arte Despertar de sonhadoras ou
utpicas no significa, de modo algum, acuslas de terem uma viso ingnua sobre o papel
da arte. No se trata de confundir o incentivo
ao processo criativo com a procura tresloucada
da descoberta da to almejada panaceia.
A cura para todas as molstias no est obviamente na arte. Alm disso, no podemos nos
esquecer da viso utilitarista e manipuladora
em relao arte adotada pelos regimes tota-

litrios do sculo XX. No totalitarismo a lei se


confundia com a vontade do Fhrer (nazismo)
ou do Guia Genial dos Povos (stalinismo), que
se identificava com a vontade do partido e do
Estado. O objetivo final era a abolio completa das vontades individuais, o fim da distino
entre a vida pblica e a vida privada. Como
todo pensamento dogmtico, nazismo e stalinismo eram essencialmente maniquestas. O
Bem e o Mal eram definidos de maneira ntida.
As nuances no eram levadas em considerao
e eles no toleravam qualquer tipo de crtica
ou questionamento. Os dois regimes tinham
suas listas de artistas que deviam ser poltica e
ideologicamente execrados. A arte, nesse caso,
era a arte do regime. O artista oficial era apenas
panfletrio de uma ideologia estabelecida pelos
lderes. Ao impedir qualquer tipo de debate, ao
impor rgidas receitas a serem seguidas por todos, instituam uma tutela revoltante sobre a
criao literria e artstica.
O que a Associao Arte Despertar prope
bastante diferente disso. Eu arriscaria dizer
que as pessoas que l trabalham so, em vrios
sentidos, herdeiras de vrias geraes de generosos idealistas.
No agitado ano de 1968, Paris foi tomada por
sonhadores que encheram as ruas e praas
da cidade com seus slogans carregados de desejos. Mesmo passados tantos anos, algumas

dessas reivindicaes continuam mantendo o


seu frescor, como, por exemplo: A imaginao no poder e Sejamos realistas, exijamos
o impossvel. De certo modo, ser utpico
ser o realista que almeja o impossvel, pois
intui que no existe uma soluo verdadeira
ou definitiva. Essa meta inalcanvel, visto
que a humanidade se desloca sem parar, criando constantemente novas necessidades. Mas
esse utpico, ou o realista que sonha com o
impossvel, tambm sabe que conspirar respirar junto e que a felicidade s possvel se
for um projeto coletivo.
A Fraternidade, a Liberdade e a Igualdade no
foram at agora conquistadas, mas busc-las se
mostra atual e vital. Se a utopia no foi alcanada, ela pode, pelo menos, ser vislumbrada. E
espantosamente linda.
Por sua vez, os sisudos realistas, os eternos ps
no cho, perderam a elegncia que acreditavam
ter, tornaram-se burocratas que se escondem
atrs de suas escrivaninhas (reais ou metafricas). Com supostos discursos pragmticos, no
passam de disseminadores do cinismo.
Quanto mais cinza vai ficando o cu, mais importante se torna a existncia de sonhadores.
Mudanas fundamentais s podem ser originrias de coraes e mentes apaixonados. Afinal,
apenas pessoas embebidas pela paixo so ca-

16 I 17

pazes de modificar radicalmente sua vida, desistir de projetos h muito


consolidados e arriscar tudo pelo novo e desconhecido. Somente eles, os
utpicos sonhadores, podem nos tirar da dormncia e nos proporcionar
um efetivo despertar. Por tudo isso, eles so cada vez mais imprescindveis.
O senso comum afirma que s til o que pode gerar riqueza, prestgio,
poder. Caso fiquemos presos apenas a esse sentido da palavra, de fato, a
atuao da Associao Arte Despertar no tem nenhuma utilidade. Porm, se traduzirmos utilidade como tudo que capaz de trazer benefcios
aos seres humanos, esses inteis homens e mulheres que nela trabalham so imprescindveis.
No h garantias de final feliz. Nunca h. Mas existe a aposta na razoabilidade humana, na possibilidade de elaborao conjunta de uma
responsabilidade tica que objetive a construo de um mundo pessoal
e comunitrio menos sofrido e, portanto, mais feliz. Talvez iniciativas
como a da Associao Arte Despertar no tenham fora suficiente
para mudar o curso da histria. Mas se elas conseguirem, pelo menos,
fazer com que um nmero cada vez maior de pessoas perceba que
fundamental olhar o Outro, por si s isso j um fato relevante, que
merece comemoraes.

BEM-VINDOS A ESSA AVENTURA

Por isso, reitero o convite leitura cuidadosa deste livro. Espero que
ele contribua para que um nmero maior de pessoas conhea o trabalho desses sonhadores e perceba que ainda possvel fazer com
que algumas utopias se tornem realidade. Que essa realidade inspire
novos sonhos, outras utopias. E que, nesse compartilhamento de sonhos, cada um de ns, leitores, venha a se tornar mais um comparsa
dessa empreitada. Afinal, quem disse que a palavra cmplice significa
apenas reunio de pessoas para promover atos maldosos ou ilcitos? A
Associao Arte Despertar, formada por um bando de idealistas incorrigveis, nos mostra exatamente o contrrio.

01 I 02

01 I 02

A NOO DE RESPONSABILIDADE SOCIAL


EM PERSPECTIVA HISTRICA: DO INCIO
DA MODERNIDADE AO CONTEXTO QUE GEROU
A ASSOCIAO ARTE DESPERTAR
RUI LUIS RODRIGUES

01 I 02

UM LENTO DESPERTAR

O homem reinventa constantemente seu modo de viver em sociedade.


Num processo sempre complexo, porque inclui negociar no apenas
com os dados concretos da realidade, mas tambm com as estruturas
mentais e os imaginrios de cada poca, o ser humano encontra caminhos pelos quais concede significado ao mundo que o rodeia. Nada mais
inadequado, portanto, do que julgarmos aes e procedimentos de outra
poca luz da nossa prpria. Quando pensamos em responsabilidade
social encontramos uma ilustrao perfeita desse fato.
A expresso responsabilidade social diz respeito valorizao e busca
da dignidade humana, ao cuidado integral do homem, com ateno para
as mltiplas dimenses que o constituem. Isso realizado a partir da
conscincia de que o equacionamento das questes sociais responsabilidade de toda a coletividade.
Eliminao da desigualdade, humanizao das relaes sociais, valorizao do indivduo e de sua autonomia todas essas preocupaes so recentes, tpicas de nossa poca e encontram-se expressas num vocabulrio
que no faria sentido cem anos atrs. Isso no significa, contudo, que
outros perodos histricos tenham desconhecido a preocupao com o
ser humano. De uma forma ou de outra, o cuidado com o semelhante
tem nos acompanhado ao longo de nossa histria; mudaram, todavia, as
formas de elaborao desse cuidado, bem como os pontos de vista a partir dos quais a sociedade, teatro dessas preocupaes, era pensada.
Por muito tempo, a preocupao com o bem-estar de outros seres humanos, especialmente daqueles em situao de fragilidade, caminhou ao lado
de uma noo esttica de sociedade. Para permanecer apenas nos limites
da civilizao ocidental, a atitude tpica do pensamento medieval diante
do que hoje chamamos de problemas sociais serve-nos de exemplo.
Sem uma compreenso mais acurada das causas reais da pobreza, restava
ao homem medieval apenas o recurso de entend-la como expresso da

24 I 25

vontade de Deus; por meio da pobreza a graa


divina salvava o pobre, assim como salvava o
rico pelo exerccio da caridade. Essa perspectiva mostra-se mais ou menos constante ao
longo do primeiro milnio de civilizao crist;
para Joo Calvino, em pleno sculo XVI, a pobreza no era mais caminho de salvao, mas
continuava a ser expresso da soberania divina.
J na mstica franciscana, por outro lado, o pobre era imagem de Cristo e a pobreza ganhou
um novo valor teolgico e moral, tornando-se
modelo e fonte de inspirao.
Em grande medida, a perspectiva da sociedade como realidade dinmica uma das caractersticas da Modernidade. O sculo XVI assistiu a uma mudana decisiva na maneira de
se pensar a questo dos que se encontravam
em situao de fragilidade social. Tomada em
si mesma, a pobreza j no representava virtude evanglica; o humanista espanhol Juan
Luis Vives (1492-1540) chegou a sugerir em
seu De subventione pauperum (Sobre a
ajuda aos pobres, 1526) que Cristo no reconheceria como pertencentes a si pobres to
afastados dos costumes e da santidade de vida
que ele ensinou. Tanto em ambientes catlicos quanto em contextos protestantes, medidas severas comearam a ser tomadas para a
represso da mendicncia: procurava-se suprimir, assim, aquilo que antes era visto como
necessrio exerccio da piedade crist.

Esse foi o momento, contudo, em que novas


formas de tratar as questes ligadas pobreza foram encontradas. O grande xodo rural
verificado nas duas primeiras dcadas do sculo XVI nos Pases Baixos e nos territrios
alemes levou implementao de medidas
visando otimizar o cuidado dos que se encontravam em situao de misria. A obra
de Vives fruto desse perodo, representando de forma emblemtica as solues ento
encontradas. Para ele, o homem torna-se
efetivamente humano pelo aprendizado; assim, a capacitao tcnica era vista por Vives como fundamental para a eliminao da
misria. Em seu trabalho, Vives demonstrou
um grande conhecimento da manufatura txtil de seu tempo, chegando a fazer consideraes sobre o necessrio equilbrio entre a
oferta e a demanda de mo de obra.
Todavia, mais do que nos detalhes prticos
de seu programa de ajuda aos pobres, num
aporte que hoje chamaramos de ideolgico
que a contribuio de Vives se revelou decisiva. Ele demonstrou como a atitude tradicional interpretava erroneamente as palavras de
Cristo em Marcos 14:7 (Na verdade, sempre tereis os pobres convosco), tomando-as
na forma de uma aceitao resignada, como
se a pobreza fizesse naturalmente parte da
ordem social. Vives tambm desprezou o hbito, arraigado, de se considerar os pobres

como entidades sagradas, os sancti pauperes, agentes, pela pobreza, da


sua prpria salvao e da salvao dos demais membros do corpo
social. Ao mesmo tempo, Vives se mostrou bastante compassivo em
relao aos que se encontravam realmente em situao de necessidade.
Podemos sumariar a posio de Vives afirmando que ela representa
um reconhecimento, ainda que embrionrio, do carter complexo
das relaes sociais. A misria possui causas efetivas, no atreladas vontade de Deus mas a dinmicas sociais bastante concretas.
Evidentemente, essa anlise no foi conduzida de forma objetiva
por Vives; suas recomendaes para a eliminao da misria, contudo, refletem uma percepo acurada de suas causas. O cio, por
exemplo, visto como um dos principais fatores de fomento da
pobreza; para corrigi-lo no bastam leis impostas pela autoridade
civil. Eventualmente, torna-se necessria a capacitao profissional
do indivduo ou sua realocao em regies onde exista demanda
para suas atividades. Ao refletir sobre os benefcios de se combater
em tais termos a pobreza, Vives tambm d conta de uma refinada
compreenso das dinmicas sociais: ele intui, por exemplo, que um
dos resultados positivos de se aliviar a misria seria a diminuio
dos crimes.
O ser humano tem mais facilidade para viabilizar novas tecnologias
do que para mudar as antigas e arraigadas concepes que constituem seu universo mental. A lenta passagem de uma noo esttica
de sociedade para outra, dinmica, que responde a causas materiais
e que, portanto, comporta a possibilidade da mudana, exemplifica
bem esse trabalho complexo que a transformao do imaginrio.
No que diz respeito ideia de responsabilidade social os incios da
Modernidade marcaram um decisivo ponto de inflexo.

26 I 27

O limiar da Modernidade assinalou, tambm, a emergncia de dois fatores importantssimos para as transformaes que geraram a perspectiva
de responsabilidade social. Trata-se do Estado moderno e das modernas
relaes de mercado.
O Estado moderno caracterizou-se pela centralizao poltica e administrativa, que obrigou criao de um aparelho burocrtico capaz de absorver as mltiplas funes que o Estado passou a concentrar (arrecadaes,
monoplio da violncia atravs dos exrcitos nacionais, subordinao dos
mais diversos foros autoridade central). Esse processo, grosso modo,
estabeleceu-se de modo irreversvel na passagem do sculo XVI para o
XVII e desenvolveu-se at chegar, no sculo XIX, aos Estados-nao plenamente consolidados.
Por outro lado, a expanso europeia para outros continentes, possibilitada
pelos desenvolvimentos tecnolgicos do sculo XV, permitiu a configurao de uma economia-mundo marcada pelas relaes de centro e periferia.
No bojo desse processo, o capitalismo se estabeleceu produzindo novos
sentidos para a noo de mercado ao longo de uma histria complexa,
assinalada por fases (comercial, industrial, financeira) e por crises. Mas
significativo observar que todos os principais embates ideolgicos da poca moderna giraram em torno dessas duas grandezas, desde o liberalismo
econmico clssico, com Adam Smith (para quem o Estado deveria ser
colocado sombra pela mo invisvel do mercado), at o socialismo,
com sua perspectiva de controle e eliminao do mercado que, ao fim e
ao cabo, deveria conduzir prpria superao do Estado.
No sculo XIX, o triunfo da ideologia liberal assentou como fato a
noo ideolgica de separao absoluta entre trs esferas distintas: a esfera poltica, a esfera econmica e aquela considerada como de natureza
sociocultural. No difcil enxergar nessa diviso tripartite a presena
das esferas do Estado e das relaes de mercado, acrescidas de outra que

DA FILANTROPIA AO
TRANSFORMADORA

passava a se delinear, a esfera da sociedade civil.


A moderna departamentalizao dos estudos
universitrios, consagrada em fins do sculo
XIX, representou a oficializao dessa perspectiva, medida que incorporou a noo de que
tais realidades (a social, a poltica, a econmica)
poderiam ser estudadas isoladamente.
Tanto essa departamentalizao quanto sua matriz, a diviso tripartite, mereceram crticas severas que lhes foram endereadas pelas cincias
humanas ao longo do sculo XX. Essas esferas
no so, e nunca foram, autnomas. Desde seu
incio, as relaes capitalistas de mercado estiveram mescladas com o poder poltico; a vida
social, por seu lado, no se realiza parte da
economia ou da poltica. No entanto, o que nos
interessa reconhecer o quanto essas grandezas
(especialmente Estado e mercado) tornaram-se
decisivas para a autocompreenso da sociedade
ocidental e para sua maneira de pensar o problema da responsabilidade social.
Em pleno florescimento do capitalismo industrial, no sculo XIX, as questes sociais eram
ou negligenciadas ou tratadas em termos de filantropia; neste segmento, comearam a notabilizar-se alguns grandes detentores do capital,
ao lado de instituies j tradicionais nesse tipo
de atividade, como as igrejas. A participao
do Estado existia, mas era mnima, em consonncia com a ideologia liberal. A principal mu-

dana nesse quadro se deu por conta da grande


crise mundial do capitalismo financeiro, no decorrer da dcada de 1920. O caos social decorrente dessa crise teve que ser enfrentado com
ferramentas estatais. Do ponto de vista terico,
os subsdios para essa ao estatal haviam sido
lanados, pouco antes, pelo economista ingls
John Maynard Keynes. Para este economista, o
Estado possua, entre as suas funes, tambm
a de estabelecer polticas sociais pblicas cuja
criao legitimava, inclusive, a atuao direta
do Estado na economia. Tais polticas, como
a adoo de medidas visando o pleno emprego
e a criao de garantias sociais previdncia,
salrio-mnimo etc. , tinham como finalidade,
na lgica de Keynes, estimular o consumo ao
fomentar o poder aquisitivo da populao.
A doutrina do Estado de bem-estar social
(welfare state), como ficou conhecida, respondia
tanto necessidade especfica do capitalismo
de superar uma crise cclica, mas que atingira
propores gigantescas, quanto s presses
por mudanas sociais estimuladas pela pregao socialista. Enquanto no contexto norteamericano a motivao principal, ao menos em
termos do discurso ideolgico, continuou sendo a revitalizao do capitalismo, na Europa
a social-democracia serviu-se do conceito para
estimular a distribuio de renda e atingir uma
situao de equilbrio frente s demandas sociais. importante assinalar que o Estado de

28 I 29

bem-estar social representou uma mudana


significativa no tratamento das questes sociais,
em relao s posturas filantrpicas prvias:
sua principal inovao era o reconhecimento
da responsabilidade do Estado na equalizao
desses problemas.
A crise do Estado de bem-estar social um
fenmeno complexo cuja anlise as paixes ideolgicas tornam ainda mais difcil. Pode-se afirmar, no entanto, que a crise financeira da dcada de 1970, somada ao peso excessivo das estruturas burocrticas do Estado, comprometeram
profundamente a viabilidade das aes estatais
reguladoras no campo social. Deve-se acrescentar a esse quadro, ainda, as diferenas flagrantes
entre centro econmico e periferia, to caractersticas da economia-mundo moderna; nesse
sentido, lcito perguntar se e em que medida
pases perifricos, como o Brasil, tiveram alguma experincia efetiva com o welfare state.
Todavia, a segunda metade do sculo XX preparou as condies necessrias para algumas mudanas importantes no tratamento dos problemas sociais e, em especial, na noo de responsabilidade social. A disseminao de um iderio
de justia social amplamente compartilhado; os
desenvolvimentos do pensamento filosfico no
sculo XX, com sua valorizao da liberdade e
autonomia humanas; a percepo no apenas
do carter predatrio do capitalismo, mas prin-

cipalmente dos estragos causados natureza e


s relaes sociais pela aplicao indiscriminada da razo instrumental, ou seja, da razo
entendida to somente como ferramenta para o
progresso tcnico; a emergncia de movimentos sociais na periferia da economia-mundo, especialmente no contexto da descolonizao da
frica e da sia e do irrompimento de revoltas
na Amrica Latina: esses fatores obrigaram a
uma reconfigurao dos termos do debate, que
se centrara de forma demasiado simplista nos
papis do Estado e do mercado.
Enquanto a atividade filantrpica sempre se
pautara por princpios assistencialistas, a conscincia emergente na segunda metade do sculo XX encaminhava-se para o reconhecimento da necessidade de aes transformadoras
no mbito das questes sociais. No bastava
minorar os males da desigualdade; era preciso
trabalhar pela superao desses problemas em
diversas frentes. Por outro lado, mesmo a atuao do Estado nas questes estruturais no era
mais vista como suficiente. De objeto passivo
da ao, fosse das iniciativas filantrpicas mais
ou menos regidas pelo capital, fosse do Estado
em sua tentativa de promover o bem-estar da
sociedade, o ser humano precisava passar a sujeito ativo, a agente das transformaes do seu
prprio mundo. Foi a partir desse denso caldo
de cultura que surgiu, nas ltimas dcadas do
sculo XX, o conceito de Terceiro Setor.

O TERCEIRO SETOR:
GNESE DE UM CONCEITO

Em fins do sculo XX, o processo de formao da economia-mundo,


cujo incio pode ser emblematizado pelas grandes navegaes do sculo
XV, alcanou seu pice com uma configurao absolutamente mundializada e ocidentalizada do planeta. Ao mesmo tempo, nossas sociedades
tornaram-se especialmente complexas, a tal ponto que passou a ser difcil explicar essa nova realidade social em termos das duas grandezas
tpicas da poca moderna, o Estado e o mercado, ou mesmo em termos
da velha estrutura tripartite proposta pelo liberalismo. Por outro lado, a
reflexo crtica de boa parte da intelectualidade ocidental parecia buscar
um caminho alternativo, para longe das respostas tradicionais oferecidas
pelo laissez-faire liberal e das solues estatizantes propostas tanto pelo
socialismo quanto pelo welfare state.
Ao propor sua teoria crtica da sociedade, a Escola de Frankfurt, formada por intelectuais que, a partir da dcada de 1920, procuraram repensar o marxismo com o auxlio de aportes oriundos de outras cincias
humanas, foi decisiva para encaminhar a reflexo ocidental para alm
das polarizaes nas quais ela se encerrara (especialmente as polarizaes
Estado/mercado e capital/trabalho). Um de seus mritos foi demonstrar
como a razo instrumental, o conceito iluminista de razo aplicado aos
objetivos tcnicos da civilizao industrial, encontrou guarida mesmo no
mbito do marxismo ortodoxo. Os resultados negativos dessa aplicao
da razo instrumental, como o descaso ecolgico patente nas sociedades
industriais e a banalizao do ser humano, que alcanou seu auge nos totalitarismos, poderiam ser encontrados, portanto, em todas as sociedades
e no apenas naquelas alinhadas a um dos polos ideolgicos caractersticos do sculo XX.
Eficientssima e inspiradora em sua anlise da sociedade dominada pela
razo tcnica, a teoria crtica, exemplificada pela Dialtica do Esclarecimento de Theodor Adorno e Max Horkheimer, no ofereceu todavia
uma perspectiva de escape do quadro sufocante de uma sociedade que

30 I 31

Habermas no formulou o conceito de Terceiro Setor, cuja origem ser detalhada a seguir. Mas quase consensual a percepo de
que a teoria de Habermas pode ser invocada
como matriz desse conceito, sobretudo em
dois pontos fundamentais: a identificao de
uma terceira esfera na sociedade, com uma
lgica diferente tanto em relao ao mercado
quanto ao Estado; e a perspectiva de que as
sociedades contemporneas, em sua complexidade, no admitem mais solues oriundas
das antigas polarizaes.

divduos atravs do dilogo; trata-se de uma


esfera de autonomia, sempre em luta contra
a colonizao imposta pelo mundo sistmico.
A disputa poltica fundamental das sociedades
contemporneas se d, segundo Habermas,
nesse confronto entre mundo sistmico e
mundo da vida. Ao mesmo tempo, as sociedades contemporneas so de tal complexidade que no podem mais ser explicadas pelo
recurso ao materialismo histrico proposto
por Marx, com sua noo de um determinado
grupo social como porta-voz dos anseios dos
segmentos oprimidos da sociedade. O mundo
da vida representaria o mundo da interao,
marcado pelo dilogo entre indivduos heterogneos em termos da antiga noo de classe, mas tornados autnomos e capazes de se
opor, a partir de valores solidrios, ao Estado
e ao mercado. Trata-se, portanto, de uma esfera pblica, mas que procura superar os limites colocados pela polarizao entre poltica e
economia, entre Estado e mercado.

Para Habermas, Estado e mercado constituem o mundo sistmico, fundamentado


pela razo instrumental e marcado pelas relaes tpicas do capitalismo, sobretudo pelo
controle do indivduo a partir das exigncias
do capital. Em oposio ao mundo sistmico
situa-se o mundo da vida, a esfera da sociedade e da cultura, fundado na linguagem e
marcado pela busca do consenso entre os in-

De forma concomitante ao desenvolvimento


desse iderio, nos anos posteriores Segunda Guerra Mundial surgiram diversos organismos cujas caractersticas de atuao e objetivos, como a preservao e ampliao dos
direitos humanos, a difuso cultural, a luta
contra a fome, a preocupao com a educao, no se enquadravam nas configuraes
tpicas dos partidos polticos ou das organi-

atingiu seus limites e, portanto, beirava a autodestruio. Esse trabalho de redimensionar


alternativas para o futuro seria conduzido posteriormente, por pensadores que podem ser
considerados como herdeiros da teoria crtica proposta pela Escola de Frankfurt. Dentre
eles, o mais relevante para uma compreenso
do surgimento do conceito de Terceiro Setor ,
sem dvida, Jrgen Habermas.

zaes sindicais e patronais. Desvinculadas


tambm de estruturas governamentais, essas
entidades principiaram como rgos de cooperao internacional que, nos quadros da luta
pela descolonizao na dcada de 1960, representavam uma oposio alternativa a grupos ditatoriais ou afinados com polticas colonialistas.
O grande mrito dessas primeiras organizaes
no governamentais est justamente no fato de
oferecerem um caminho pelo qual a sociedade
civil pde comear a refletir sobre as questes
sociais mais prementes e a intervir nelas, sem
a mediao tradicional das estruturas de governo, dos partidos polticos e dos sindicatos.
Essas formas tradicionais de interveno nas
questes sociais encontravam-se hipertrofiadas, incapazes de permitir a participao de
segmentos mais amplos da sociedade na transformao da realidade. Por outro lado, inmeros agentes sociais despontavam, comprometidos com perspectivas humanitrias e imbudos de uma forte conscincia da necessidade
de cimentar solidariamente as relaes sociais.
Tais agentes, oriundos de segmentos sociais
diferentes, refletiam na prtica o conceito de
Habermas da necessria autonomia dos indivduos e de sua capacidade de articular-se pelo
dilogo. Aglutinados em grupos e organizaes criados para dar forma s suas preocupaes sociais, esses agentes so os responsveis
pelo surgimento do Terceiro Setor.

A denominao Terceiro Setor, de origem


norte-americana, sintetiza a viso especfica de
sociedade cuja formao procuramos acompanhar: enquanto o Primeiro Setor diz respeito
s atividades pblicas de responsabilidade do
governo e o Segundo Setor refere-se s atividades de natureza privada voltadas para fins
lucrativos, o Terceiro Setor se coloca como
relativo a uma esfera pblica, mas que no se
confunde nem com o governo, nem com as
finalidades particularistas geralmente identificadas com os interesses privados. Para o antroplogo Rubem Csar Fernandes, o Terceiro
Setor aparece como um arranjo complexo e
instvel de oposio e complementaridade que
age num espao pblico no estatal. Ele faz
contraponto, assim, tanto s aes do governo
como s do mercado; ao faz-lo, recupera o aspecto trinrio, permitindo escapar dicotomia
pblico-estatal/privado-mercado. Com isso, o
Terceiro Setor pensa a vida pblica numa perspectiva integradora, visto entender que ela no
se esgota no mbito do Estado e que agentes
privados no esto necessariamente atrelados
aos interesses particularistas do mercado.
Nesse sentido, possvel traar um paralelo
entre a concepo de vida pblica sustentada
pelo Terceiro Setor e a noo de vita activa
defendida pelos humanistas cvicos italianos
de princpios do sculo XV. Para estes, a participao pblica era entendida como a nica

32 I 33

maneira pela qual a tirania, grande mal das


cidades-estado italianas nos sculos XIV e XV,
poderia ser evitada; da a preocupao desses
pensadores em no mais se dirigirem, nos seus
escritos, apenas aos governantes e magistrados,
mas massa dos cidados, procurando impelila preocupao com os negcios pblicos.
Nesses humanistas, portanto, pode ser encontrada uma noo de vida pblica que no se
restringe ao Estado e ao seu aparelhamento,
elementos que, efetivamente, ainda no se encontravam de todo formados. inegvel que
na Modernidade as foras sociais que possibilitaram a consolidao do Estado centralizado
limitaram fortemente essa noo ao produzirem a identificao entre pblico e estatal,
que foi decisiva para tornar vivel esse novo
projeto de Estado. Tal identificao passou a
ser contestada nos ltimos anos, a partir no
apenas da conscincia de uma hipertrofia bvia do Estado, mas tambm da percepo do
quanto semelhante limitao representou em
termos de perda da participao de estratos
mais amplos da sociedade na vida pblica.
Dentre as principais crticas que a noo de
Terceiro Setor tem recebido, duas so de especial relevncia. A primeira contesta a prpria existncia de uma terceira esfera social
autnoma em relao ao Estado e ao capital. Para esses crticos, tal esfera seria uma
construo ideolgica destinada a esvaziar a

participao poltica efetiva; seu aspecto daninho residiria justamente na suposio de


que agentes sociais poderiam operar livres
de quaisquer condicionamentos de classe. A
outra sugere que a noo de Terceiro Setor
resultado direto da ideologia neoliberal e que
procura, em consonncia com essa ideologia,
sucatear as estruturas do Estado, desresponsabiliz-lo em relao s questes sociais e
enfraquecer as conquistas obtidas no passado pelo conjunto da sociedade, ao convertlas, de direitos adquiridos, em simples servios prestados por iniciativas privadas.
Essas crticas merecem considerao. Ser abordado, mais adiante, o problema do iderio neoliberal e do que ele representou no contexto
de surgimento e consolidao do Terceiro
Setor. A questo da desresponsabilizao do
Estado frente aos problemas sociais sria e
no pode ser tratada como mera argumentao
ideolgica. Todavia, necessrio, aqui, efetuar
uma constatao importante: o que se busca
efetivamente no Terceiro Setor um novo paradigma de ao pblica, um paradigma mais
condizente com a organizao complexa das
sociedades atuais e menos comprometido com
estruturas formadas no mbito da Modernidade. As crticas que o Terceiro Setor recebe, por
seu turno, ainda se concentram nessas estruturas e ignoram a multiplicidade de atores que
passaram a integrar as dinmicas sociais.

O CONTEXTO DE SURGIMENTO DA
ASSOCIAO ARTE DESPERTAR

Quando a Associao Arte Despertar iniciou suas atividades, em 1997, o


Brasil inseria-se numa conjuntura singularmente complexa. O contexto
externo era o da j mencionada mundializao, com as relaes econmicas tornando ainda mais tnues os limites entre o nacional e o transnacional. Em termos negativos, essa situao provocou crises em segmentos
da indstria nacional, incapazes de resistir sem protecionismos estatais
concorrncia tpica de uma economia mundializada; essas crises, por
sua vez, tiveram efeitos sociais graves, com a preocupante elevao dos
ndices de desemprego. A estabilizao monetria que vinha sendo conquistada desde meados da dcada tinha como contrapartida, portanto,
uma situao de desestabilizao social.
Esses foram anos de grande expanso da ideologia neoliberal em amplos
segmentos da sociedade brasileira. Essa ideologia parecia corroborada
pela falncia do Estado nacional, asfixiado por uma mquina que crescera monstruosamente ao longo da ditadura militar, durante a qual se praticara um arremedo de welfare state sustentado por emprstimos externos;
essa situao era, ainda, intensificada pela corrupo sistmica. Os resultados dessa falncia se faziam sentir especialmente no campo social, com
a severa queda de qualidade dos servios pblicos fundamentais (sobretudo sade e educao), a crise no setor previdencirio, a proliferao da
violncia e os reflexos sociais das diversas deficincias de infraestrutura.
O surgimento de grande nmero de iniciativas alinhadas com o Terceiro Setor nesse perodo, bem como o crescimento de organizaes no
governamentais cujas atividades eram de uma forma ou de outra sustentadas por empresas privadas, dentro do conceito que viria a ser conhecido como Responsabilidade Social Empresarial ou RSE, deram
oportunidade a que muitos crticos julgassem as atividades do Terceiro
Setor como resultado da aplicao pura e simples do iderio neoliberal.
Para esses crticos, o pensamento neoliberal visava uma reestruturao
produtiva cujo objetivo era precarizar as relaes de trabalho de forma

34 I 35

a maximizar o lucro; pretendia tambm reformar o


Estado, de maneira a exclu-lo do tratamento das
questes sociais, tendo em vista seu alto custo. O
Terceiro Setor serviria como elemento que, atravs
de atividades pontuais de ajuda direta ou de projetos destinados a despertar a criatividade social dos
atingidos, se encarregaria de suprir as necessidades
abandonadas pelo Estado. Em ltima anlise, a atuao do Terceiro Setor cooperaria, segundo esses
crticos, para a desresponsabilizao social do Estado e para a despolitizao da sociedade.
preciso observar que essas crticas, conquanto
possuam elementos vlidos que indicam potenciais
riscos de instrumentalizao ideolgica, no refletem
todavia nem as intenes efetivas dos movimentos
que integram o Terceiro Setor, nem a noo democrtica de sociedade que informa essa perspectiva.
No se pretende o desmonte do Estado, sua desresponsabilizao frente s necessidades sociais ou a fragilizao dos direitos adquiridos pela populao. Ao
contrrio, o que se vislumbra a criao de mltiplos
foros de participao poltica e a disseminao de iniciativas que, ao congregar indivduos autnomos e
conscientes em projetos de natureza social, viabilizem o dilogo, a interao e uma atuao muito mais
ampla da sociedade no enfrentamento de suas prprias mazelas.
Tais iniciativas nascem da crescente conscincia
de responsabilidade social manifesta em mltiplos
segmentos da sociedade, desde instituies familia-

rizadas de longa data com a filantropia, passando


por grupos tradicionalmente ligados a militncias
humanitrias e incluindo empresas cada vez mais
conscientes da impossibilidade de se continuar pensando unicamente em termos de lucros. Suas atividades so desenvolvidas a partir das competncias
individuais, com a valorizao, extremamente benfica, do sujeito que aprende a enxergar o valor social
de um talento ou de uma paixo pessoal. O trabalho
de organizaes como a Associao Arte Despertar
seria, efetivamente, impossvel sem esse aproveitamento dos talentos individuais, formados ao longo
do tempo em cada histria de vida especfica. O
ingrediente da paixo tambm fundamental,
medida que determina o envolvimento do sujeito
com os objetivos da organizao. Ao mesmo tempo
em que aumenta a eficincia do trabalho oferecido,
esse emprego do talento individual impede a formao, nas pessoas envolvidas com o trabalho, daquela
atitude burocrtica to frequente nas iniciativas de
natureza estatal, nas quais o indivduo virtualmente
desaparece atrs de normas e procedimentos.
O trabalho em rede, atravs de parcerias e alianas,
permite a obteno de resultados mais satisfatrios;
evita-se, ao mesmo tempo, o desperdcio de recursos. Nos ltimos anos, a experincia tem mostrado
a essas organizaes a importncia do desenvolvimento de tecnologias sociais, caracterizadas por
simplicidade, baixo custo, fcil entendimento e carter disseminvel, como ferramentas importantes
para a consecuo dos seus objetivos.

A Associao Arte Despertar veio a existir e completou sua primeira dcada, portanto, num contexto
de crescente valorizao do dilogo entre as diferentes foras sociais tendo em vista a humanizao das
relaes dentro da sociedade. Enquanto a aplicao
indiscriminada da razo instrumental levou a uma
profunda desvalorizao dos seres humanos, fenmeno que se manifestou tanto no sistema capitalista
quanto nas tentativas de construo do socialismo,
o incio do novo milnio assistiu ao aprofundamento da conscincia de que era preciso reagir a isso,
reafirmando a dignidade do ser humano e investindo em sua autonomizao. A economia de mercado, percebe-se hoje, precisa ser domesticada social
e ecologicamente: a subordinao dos valores econmicos e poltico-partidrios ao interesse comum
deve incluir no somente o respeito ilimitado ao ser
humano mas, tambm, o respeito por sua casa, o
ambiente onde ele vive.
A tentao das anlises demasiadamente simplistas
afastada quando considera-se que, ao longo da
primeira dcada do sculo XXI, o prprio paradigma neoliberal deu sinais de exausto. Algumas de
suas limitaes j haviam sido expostas por Habermas, para quem o capitalismo tardio objeto de
intervenes estatais frequentes com vistas a melhorar as condies de realizao do capital, no
obstante pregar, do ponto de vista ideolgico, a total ausncia do Estado. Esse carter ideolgico do
paradigma neoliberal (ou seja, o fato de ele existir
mais como discurso legitimador do que como rea-

lidade prtica) ficou patente atravs de duas crises


marcantes: a emergncia da violncia fundamentalista assinalada pelo 11 de setembro de 2001, que reforou o papel do Estado na segurana, revertendo
a tendncia caracterstica da dcada anterior no sentido da lenta eliminao das fronteiras e, com elas,
do prprio carter nacional dos Estados modernos;
e a crise financeira de 2008, que trouxe memria
a necessidade de uma ateno peridica do Estado
s realidades econmicas.
O conjunto da anlise deixa claro que o futuro imediato no comporta a eliminao da figura do Estado, essa soberba construo que nos foi legada pela
Modernidade. Tampouco comporta a superao do
capital nos moldes previstos pelo marxismo ortodoxo. Todavia, a realidade atual em nada reflete os
arranjos do antigo liberalismo. A conjuntura radicalmente nova e sugere a necessidade de novos mecanismos de interveno poltica, de novas formas
de participao cvica e de objetivao da cidadania.
Num contexto como este, organizaes como a Associao Arte Despertar tm um papel fundamental
a desempenhar, que ultrapassa mesmo os resultados
obtidos por suas atividades diretas. Trata-se de um
papel na formao e autonomizao de indivduos
que, atravs de iniciativas como essas, descobriro
sua prpria maneira de exercer o mais antigo e humano dos direitos: o direito de intervir positivamente no mundo em que vivem.

36 I 37

O QUE OCORRER COM A TERRA, RE CAIR SOBRE OS FILHOS DA TERRA.


Manifesto do Chefe Seatlle ao Presidente dos EUA

01 I 02

Delineamento de uma
economia-mundo como
preparao do moderno
conceito de mercado
Desenvolvimento do
capitalismo comercial

LINHA DO TEMPO

LEGENDA
MUNDO E BRASIL: CONTEXTO POLTICO E ECONMICO
TERCEIRO SETOR NO BRASIL
ASSOCIAO ARTE DESPERTAR

Passagem do capitalismo
industrial ao financeiro
Triunfo do liberalismo
Estado moderno
consolidado na forma
de Estados-nao

Joo Calvino: a pobreza


no mais como forma
de salvao, mas ainda
como expresso da
vontade divina

Surgimento do
pensamento socialista
Preocupaes sociais
tomam a forma
de aes filantrpicas

SC. XVIII

Desenvolvimentos
tecnolgicos
e descobrimentos

Incio da
consolidao
do Estado
moderno,
centralizado
e burocrtico

SC. XIX

Juan Luis Vives,


De subventione pauperum
(1526): reconhecimento
das causas sociais
da pobreza

SCS. XVI/XVII

SC. XVI
Mstica franciscana:
pobreza como modelo,
forma de salvao
e fonte de inspirao

SC. XV

SC. XII

1 MILNIO DA CIVILIZAO CRIST:

Pobreza como
expresso da
vontade de Deus

Regulamentao da
mendicncia e leis
para auxlio aos pobres
em diversas cidades
europeias

Capitalismo
industrial

Doutrina do Estado de bem-estar social (welfare state)

Implantao do Euro em parte dos


pases membros da Unio Europeia

Promulgao do
Estatuto da Criana
e do Adolescente
(ECA), Lei n 8069/90

Organizaes no Governamentais comprometidas com


a luta de redemocratizao

Instituio do Sistema
nico de Sade (SUS)

Criao do Prmio ECO de


Cidadania Empresarial

Criao do Conselho
Municipal de Assistncia
Social, Lei n 2469/96

Criao da Rede de ONGs da


Mata Atlntica
Criao do Instituto
Ayrton Senna

Conceituao da Arte
Despertar

Criao da Associao
Brasileira de Organizaes no
Governamentais (ABONG)
Criao do Conselho Nacional
dos Direitos da Criana
e do Adolescente (CONANDA)
Lei n 8242/91
Promulgao da Lei Federal
de Incentivo Cultura
(Lei Rouanet), n 8313/91

Promulgao da Lei
Orgnica da Assistncia
Social (LOAS), n 8742/93
Promoo da Campanha
contra a fome, por Herbert
Jos de Souza (Betinho)

2010
Reeleio de Luiz Incio Lula da
Silva como presidente do Brasil

Fundao da Rede de Informaes para


o Terceiro Setor (RITS)

Promulgao da Lei do
Voluntariado, n 9608/98

Criao do Centro de Empreendedorismo


Social e Administrativo do Terceiro
Setor (CEATS)

Criao do Instituto Ethos

Criao do Centro de Voluntariado


de So Paulo (CVSP)

Incio das atividades


da Associao Arte Despertar
Aprovao da Constituio
do Grupo
de Institutos, Fundaes
e Empresas (GIFE)

Incio da parceria com o Centro Infantil


da Aldeia SOS Rio Bonito
a partir de projeto piloto

Constituio jurdica
da Associao Arte Despertar
Aprovao do primeiro projeto
no Ministrio da Cultura (MinC),
por meio da Lei Rouanet
Incio da parceria com
o Programa Einstein
na Comunidade
de Paraispolis (PECP)

Promulgao da Lei da
Organizao da Sociedade
Civil de Interesse Pblico
(OSCIP), n 9790/99

Obteno do Certificado de
Utilidade Pblica Municipal
Registro no Conselho Municipal
dos Direitos da Criana e do
Adolescente (CMDCA)
Incio da parceria com o Instituto
de Oncologia Peditrica (IOP) Grupo de Apoio ao Adolescente
e Criana com Cncer (GRAACC)
Criao de website

Criao do Programa
Comunidade Solidria
Criao da Pastoral
da Criana

Incio da parceria com o Instituto do


Corao do Hospital das Clnicas (InCor)
a partir de projeto piloto

Incio do Programa de
Humanizao da Assistncia
Hospitalar (PNHAH)
pelo Ministrio da Sade

Incio de projeto aprovado


na Lei Rouanet, ampliando
as atividades em 40%

Criao do Programa Fome Zero,


em substituio ao Programa
Comunidade Solidria
Obteno do Certificado de
Utilidade Pblica Estadual

Obteno do Certificado
de Utilidade Pblica Federal
Inscrio no Conselho
Estadual de Assistncia
Social de So Paulo
Aprovao de projeto
na Secretaria Municipal
de Cultura/Lei Mendona

Incio da parceria com


o Instituto de Ortopedia
e Traumatologia do Hospital
das Clnicas (IOT) e Instituto
de Infectologia do Hospital
Emlio Ribas
Realizao de projeto
de capacitao para
estudantes voluntrios
Incio de projeto de
voluntariado empresarial

Criao da Poltica Nacional


de Assistncia Social (PNAS)

Inscrio no Conselho Municipal


de Assistncia Social (COMAS)

Incio do trabalho pro bono


jurdico pelo escritrio De
Goeye - Advogados Associados

Inscrio no Conselho Nacional


de Assistncia Social (CNAS)

Incio da produo de material


de apoio arte-educativo

Obteno do Certificado
de Entidade Beneficente
de Assistncia Social (CEBAS)

Contratao do Instituto
Fonte, para consultoria
em sustentabilidade

Aprovao do primeiro projeto


em seleo pblica do Programa
Petrobras Social

Criao do slogan: nossa


arte despertar o melhor
de ser humano/de voc

Incio da parceria com o Hospital


da Criana do Grupo Hospitalar
Nossa Senhora de Lourdes

Eleio de Barack Obama,


como presidente dos EUA

Eleio de Dilma Rousseff,


como presidente do Brasil

Conscientizao da necessidade
de sustentabilidade para projetos
do Terceiro Setor

Criao do Sistema nico


de Assistncia Social (SUAS)
Multiplicao de projetos
ligados ao Terceiro Setor
devido estabilidade monetria
e crescimento econmico

Terceiro Setor entendido


como locus vivel para a
participao do indivduo na
transformao da sociedade

2009

Eleio de Luiz Incio


Lula da Silva como
presidente do Brasil

2005

ONU estabelece as metas


do milnio

Protocolo de Kyoto

Incio de auditoria externa


da PricewaterhouseCoopers

Associao Arte Despertar


completa sua primeira dcada

Aprovao do primeiro
projeto em seleo pblica
do Programa Petrobras
Fome Zero

Incio da parceria com


a Santa Casa de So Paulo

Realizao das atividades nas UTIs


da Santa Casa de So Paulo

Incio da parceria com a


Secretaria da Sade da Prefeitura
Municipal de Guarulhos, com
atuao em cinco hospitais

Incio da parceria com Ncleos


Socioeducativos na Comunidade
de Paraispolis

Incio dos projetos de


formao para educadores
Incio da parceria
com o Projeto Viver
na Comunidade
do Jardim Colombo

Gravao de CD pelas
crianas e jovens de projeto
na Comunidade de Paraispolis

Retirada das tropas norteamericanas do Iraque

Crise financeira mundial refora


percepo da exausto do
paradigma neoliberal

2007

Crescimento da
conscincia ecolgica

Nova filantropia nos EUA:


doaes bilionrias por Bill Gates
e Warren Buffett

Eleio de George
W. Bush, presidente
dos EUA

Promulgao da Lei de Utilidade Pblica


Federal n 91/35
Criao da Legio Brasileira de Assistncia (LBA)

Comunidade Europeia
assinala tendncia
de relativizao das
fronteiras nacionais

2006

Criao da Poltica Nacional


de Humanizao (PNH)

2002

1999

1993
Agenda 21 para
o meio ambiente,
criada na ECO 92

1997

Dcadas 1980/1990: multiplicao de ONGs


e de iniciativas ligadas ao Terceiro Setor

Estabilizao monetria
no Brasil, conjugada a
crises sociais e exausto
dos servios pblicos

Eleio de Fernando
Henrique Cardoso
como presidente
do Brasil

1995

Nos EUA, ecloso dos movimentos de luta por direitos civis


dos negros com Martin Luther King Jr.

Reunificao da Alemanha

1992

1990

Emergncia da noo de Terceiro Setor

Fim do Apartheid
na frica do Sul

EUA e aliados
invadem o Iraque

Reeleio de George W. Bush,


presidente dos EUA

2008

Invaso do Afeganisto pelos EUA

2004

2001

Relatrio da Comisso
Internacional sobre Educao
para o Sculo XXI, Unesco

Incio da Segunda Intifada

Desenvolvimento da ideologia neoliberal

Conscincia do Terceiro Setor como espao


de dilogo visando a transformao da realidade

Lanamento do Plano
Real no Brasil: incio da
estabilizao monetria
brasileira, conjugada a
crises sociais e exausto
dos servios pblicos

1998

Tratado de Maastricht,
tambm conhecido como
Tratado da Unio Europeia
(TUE)

Reeleio de Fernando
Henrique Cardoso,
presidente do Brasil

11/09/2001: ataques terroristas


inauguram preocupao com
o Terror e assinalam fraquezas
do paradigma neoliberal

2003

Dcada de 1970: Crise do Estado de bem-estar social

Queda do Muro
de Berlim

Fim da Unio Sovitica

Criao da Lei de Diretrizes


e Bases da Educao Nacional
(LDB)

SC. XXI - 2000

1989

Dcada de 1960: descolonizao e emergncia de


movimentos sociais na periferia da economia-mundo

1996

Promulgao da nova
Constituio Brasileira

Incio da Guerra do Golfo

1994

Escola de Frankfurt: crtica da razo instrumental


presente tanto no capitalismo quanto no socialismo

1991

1988

Cenrio ps II Guerra Mundial: criao da ONU


e desenvolvimento das primeiras Organizaes
no Governamentais

1982

SC. XX

Dcada de 1920: grande crise do capitalismo financeiro

Elaborao do primeiro material


multimdia para hospitais
Aprovao do primeiro projeto
no Programa de Ao Cultural
(ProAC) da Secretaria de Estado
da Cultura de So Paulo
Aprovao do primeiro projeto
no Fundo Municipal da Criana
e do Adolescente (FUMCAD), da
Prefeitura Municipal de So Paulo

Promulgao da nova Lei


da Filantropia, n 12.101/09

Implantao de tecnologia social:


Tecnologia Arte Despertar
Recebimento do Prmio Cultura
e Sade, promovido pelos
Ministrios da Cultura e Sade
Incio da parceria com
o Instituto do Cncer
do Estado de So Paulo (ICESP)
Incio da parceria com
o Ncleo Educacional
da Santa Casa de Diadema
Incio do trabalho pro bono
em propriedade intelectual pelo
escritrio Gusmo & Labrunie

Sistematizao da Tecnologia
Arte Despertar
Renovao da parceria com a
Secretaria da Sade da Prefeitura
Municipal de Guarulhos
Implantao da Tecnologia Arte
Despertar para profissionais
da sade nos Hospitais
Municipais da Criana e de
Urgncias em Guarulhos
Implantao da Tecnologia
Arte Despertar para profissionais
da sade no Hospital Nossa
Senhora de Lourdes
Incio de atividades formativas
em cursos tcnicos de
enfermagem na Escola Nossa
Senhora de Lourdes
Incio da parceria com
o Hospital e Maternidade
So Lucas, em Diadema

A NOO DE RESPONSABILIDADE
SOCIAL EM PERSPECTIVA HISTRICA

A CINCIA DESCREVE AS COISAS COMO SO; A ART E COMO SO SENTIDAS, COMO SE SENTE QUE SO.
Fernando Pessoa

01 I 02

O INDIVDUO E A ARTE DE RECRIAR-SE


FELIPE DE SOUZA TARBOLA

01 I 02

O INDIVDUO E A ARTE DE RECRIAR-SE

O que me surpreende
o fato de que, em
nossa sociedade, a arte
tenha se transformado
em algo relacionado
apenas a objetos e no
a indivduos ou vida;
que a arte seja algo
especializado ou feito
por especialistas que
so artistas.
Entretanto, no poderia
a vida de todos se
transformar numa obra
de arte?
Por que deveria uma
lmpada ou uma casa
ser um objeto de arte, e
no a nossa vida?
(FOUCAULT, 1995, P. 261)

primeira vista haveria algo mais distante da imagem de um cientista


do que a de um artista? Comparar a ordem relacionada ao trabalhoso
uso do pensamento lgico e do rigor do mtodo cientfico aplicados na
busca da verdade com uma atividade centrada na criatividade e na expresso de sentimentos pode parecer algo inusitado. E realmente ; embora
no tenha sido sempre assim; afinal, o que dizer de algum voltado com
a mesma intensidade tanto arte quanto cincia, como Leonardo da
Vinci? O que dizer da importncia que a pesquisa metdica sobre as dimenses e leis de propores do corpo humano e arte desempenhou em
suas criaes?
Atualmente no raro encontra-se disseminado um ensino de cincias
como a repetio de uma frmula pronta e mais frequentemente ainda
depara-se com interpretaes ligeiras da criao artstica como atividade
livremente inspirada na emotividade do autor.
Para alm desses esteretipos construdos a partir do sculo XIX e do
contnuo processo de especializao do trabalho, pode-se afirmar que
ambas as atividades, entretanto, tratam de percepes de mundo singulares, de formas de expresso da realidade que, ao mesmo tempo, no descartam nem a beleza, por um lado, nem tampouco o esforo, por outro.
No clebre artigo A sociologia como uma forma de arte (2000), o
socilogo norte-americano Robert Nisbet afirma que a imaginao
o elemento responsvel por este estreitamento dos laos entre cincia e arte, esferas da vida humana igualmente mobilizadas pelo desejo
de compreender, interpretar e comunicar este entendimento aos semelhantes. Se a neutralidade na cincia uma meta sempre pretendida,
considera-se atualmente que ela nunca possvel, uma vez que o cientista
tambm subjetivamente guiado, no mnimo, pelas condies de sua poca, pelos problemas de sua sociedade, chegando at mesmo a nortear-se
pelos valores do grupo em que se situa. De forma equivalente, percebe-se

54 I 55

algo semelhante no outro polo desta relao:


independentemente da linguagem e do suporte,
teatro, poesia, pintura, msica ou qualquer outra forma de arte so meios de, a partir de um
determinado ponto de vista, jogar luz sobre a
realidade. Ou ser que a obra de Machado de
Assis no fonte inesgotvel de leituras sobre a
realidade social brasileira do sculo XIX?
Cincia e arte so, portanto, formas autorais
de dizer o mundo, de comunicao. Esta ,
indubitavelmente, a ao necessria subsistncia psquica e social dos seres humanos,
desde a afirmao aristotlica de que o homem um animal poltico, ou seja, de que
no seramos plenos, no desenvolveramos
totalmente nossas capacidades, caso no vivssemos coletivamente, o que somente
possvel graas a outra caracterstica humana: o domnio da linguagem e do raciocnio
lgico. Abundam casos na literatura, na psicologia e na lingustica, de pessoas que teriam sido encontradas sem contato humano,
supostamente criadas por animais, ou que
simplesmente teriam conseguido sobreviver
e crescido isolados. Estas pessoas no tiveram a oportunidade de aprender a falar e, nas
tentativas de adaptao vida coletiva, no
se ajustaram aos padres de civilizao, ao
tipo de pensamento abstrato constantemente requerido pelo nosso estilo de vida repleto
de operaes simblicas.

Esta comunicao se tornou cada vez mais necessria medida que aumentaram as chances
de falar outras lnguas, de ser diferente das
demais pessoas dos prprios grupos. A partir
de uma determinada poca da histria da humanidade, ampliaram-se as possibilidades de
divergncias na construo pessoal de valores
e vises de mundo distintos do restante do
grupo de pertena. A reflexo sobre esta questo de coexistncia de diferentes estilos de vida
por parte de membros de uma mesma coletividade caro Sociologia, uma vez que, ela mesma, justamente, surge como uma cincia que
se prope a problematizar sobre a sensao de
crise causada pelos eventos constituintes do
perodo conhecido como Modernidade. Neste
momento, marcado sobretudo por revolues
(Revoluo Industrial, Revoluo Francesa,
por exemplo) e pelas consequncias da perda da capacidade da tica religiosa influenciar
outras reas da vida coletiva, que, a partir de
ento, puderam ter funcionamentos prprios.
A linhagem familiar de origem, o gnero e a posio social deixaram de ser atributos decisivos
na constituio identitria das pessoas, que, a
partir da Modernidade, ganharam maior autonomia e mobilidade para jogar com as influncias coletivamente herdadas.
A necessidade de formao especializada
para produo industrializada e o aumento
de trocas com diferentes grupos propiciados

pela vida urbana permitiram que aflorassem


outros modelos constitutivos, que se quebrasse com o monoplio de padro de ser
humano existente nas comunidades tradicionais. A prpria noo de indivduo, membro
da espcie dotado de particularidades nicas
a ponto de ser uno e insubstituvel s emergiu a partir mesmo da Modernidade, quando
se abalou a importncia do coletivo sobre as
pessoas, quando se rompeu o molde a partir
do qual eram todos (con)formados.
Cabe, portanto, perguntar se no seria justamente a diferena entre os indivduos a base
do atual modo de vida? Afinal, a especializao
que exige formao distinta e que acarreta uma
interdependncia mtua favorece, em grande
medida, o desenvolvimento cientfico e tecnolgico to valorizado contemporaneamente.
Se a vida moderna foi marcada pela perda de
significado dos antigos modos de pensar, sentir e agir, isto se deve crise (termo que, aqui,
no deve ser tomado de forma negativa) dos
valores, crenas, hbitos e costumes que marcaram a histria humana durante a sociedade
feudal, quando o ser humano, durante quinze
sculos, viveu sob forte influncia dos dogmas
religiosos e em pequenos agrupamentos abrigados em lotes de terras dotados de valores, leis,
idiomas, moedas, exrcito, unidades de peso e
medidas prprios, consequncia da baixa troca

comercial e moral entre os feudos. A vontade


do novo que alimenta a chamada autodestruio inovadora caracterstica da economia
capitalista relegaria as pessoas a constantes e
sucessivas pequenas revolues cotidianas.
Este mundo instaurou no s uma nova sensibilidade, outros valores e sistemas polticos
e econmicos at ento inimaginveis, como
tambm gerou novas formas de sociabilidade
e interao entre indivduos abertos e plurais,
ansiosos pelo que efmero, fragmentrio e
fugidio. A inveno dos indivduos, inaugurada
na Modernidade, aprofundada no sculo XIX,
conheceu seu pice na dcada de 1960, quando
chegou ao fim a crena no progresso, ocorreu
desestabilizao das instituies e cresceu sobremaneira a importncia atribuda singularidade individual (graas ao acmulo de fatos
como: desastre da Guerra do Vietn, terrorismo internacional, crise econmica, escassez de
matria-prima, o medo de desastres nucleares).
Tal fato s foi ainda mais agravado com o fim
das utopias coletivas proporcionado pelas consequncias das experincias socialistas. Com o
Muro de Berlim caram tambm crenas em
projetos de transformao da vida social pela
participao em movimentos polticos. Por
aqui, o final da ditadura militar leva a uma democracia em que partidos no tm representatividade, polticos representam a si mesmos e
as campanhas so alvo de espetacularizao tal

56 I 57

que famosos e celebridades rapidamente so alados como alternativas


para o enfadonho processo de debate de posies idnticas. Todos em
favor da educao, da melhoria do sistema pblico de sade, de melhores
condies de vida para aposentados.
Os dados que indicam a rejeio dos jovens em participarem da vida
coletiva por meio de filiao partidria no contradizem, no entanto, a
forte adeso a novas formas de participao coletiva: se entre as dcadas de 1970 e 1980 as aes coletivas foram, no Brasil, predominantemente impulsionadas pelos anseios de redemocratizao do pas e de
implementao de um novo projeto poltico, sobretudo via participao popular organizada por entidades poltico-partidrias, sindicais e
religiosas, os anos 90 foram marcados por lutas contra discriminaes,
excluses e segmentaes. Desta dcada at meados dos anos 2000,
decnio que marca os primeiros dez anos de existncia da Arte Despertar, tivemos em nosso pas a aglutinao de pessoas em torno de projetos comuns que no necessariamente esto ligados s reivindicaes
de alteraes macroestruturais.
O crescimento da chamada classe mdia teve como pano de fundo a
democratizao dos rgos, coisas e causas pblicas, somada estabilidade financeira e sucesso presidencial, mudou o foco das causas
coletivas ao direito a ter direitos. A garantia de acesso aos servios pblicos existentes e igualdade formal perante o Estado ocorre em relao a
direitos previamente existentes, mas neste perodo ocorreu no Brasil uma
ampliao da ideia de cidadania, permitindo a grupos e setores anteriormente alijados de direitos organizarem-se para reivindicarem tambm o
direito de ter a prpria diferena reconhecida. A criao de direitos sobre
o prprio corpo, direito proteo ambiental e moradia so exemplos
de inovaes que passam pela aquisio formal de um novo patamar
jurdico, mas que levam em considerao um novo modelo de relaes
sociais mais democrticas, que requer sujeitos sociais ativos e conscientes,

aptos a reivindicar no apenas pertena a um sistema sociopoltico, mas


tambm a requerer o direito de participar da definio deste prprio sistema. Autonomia e identidade so as tnicas dessas reivindicaes. Alm
da organizao e formalizao de movimentos sociais de minorias, a
participao na vida coletiva se d, em grande medida, pela atuao em
instituies do Terceiro Setor (este o momento de consolidao das organizaes no governamentais no pas) que suprem carncias de atuao
do Estado, que no referido decnio esteve mais prximo da adoo de
postura gerencial-reguladora do que indutora de bem-estar social.
Organizaes e redes so formadas ento por aqueles que acreditam
partilhar identidades semelhantes. Esta comunidade de comuns que
agrupa iguais, mas, concomitantemente, separa dos demais no sentida como algo sufocante para o indivduo, ao menor transtorno, basta
desplugar-se. A racionalidade e as aes estratgicas superam a emotividade e a paixo, fazendo com que estas organizaes adotem a profissionalizao de seus integrantes.
Neste contexto, a vida humana tornou-se um processo de constituio sempre aberto. Sem projetos para o futuro, sem vontade de participao na esfera pblica, com interesses cada vez mais voltados aos
ganhos individuais, valorizando a exposio da vida privada, da intimidade (prpria e alheia), os indivduos deste nosso momento histrico
no tm sentido da continuidade histrica: o modo de vida passado no
informa mais a vida presente, que muda com cada vez mais rapidez; e o
futuro incerto, quando no soa como uma ameaadora trombeta apocalptica (aquecimento global, atentados terroristas, bombas nucleares,
desastres ecolgicos, novas doenas so somados e resultam em um
sentimento de iminncia de riscos). Protege-se, resguarda-se, vela-se e
recicla-se o presente; aprisionados, assim, em uma juventude sem fim,
os indivduos deste tempo encontram-se submetidos a uma conexo
com a vida e com o mundo.

58 I 59

Escolhe-se o mais fcil, momentaneamente mais prazeroso, desiste-se


facilmente da tica do dever, do investimento a longo prazo. No mundo,
mas alheio a ele, submetidos avalanche de dados, imagens, informaes produzidas nesta Era Informacional, nada se retm, nada guardado, no h preocupao com a memorizao. O novo sempre vem.
Hedonistas, as pessoas investem tempo, energia, dinheiro em tentar conhecer melhor o prprio eu, buscando sua essncia na/pela ioga, psicanlise, meditao, acupuntura e terapias zen. At mesmo religies que
prometem formas coletivas de salvao declinam; a prtica individual
que liberta o indivduo.
As pessoas estariam neste contexto de tal modo libertas das amarras da
coletividade que poderiam, inclusive, imaginar e inventar para si uma
nova identidade. Fato que nunca se falou tanto da prpria vida, declarou-se e publicou-se a prpria intimidade, assim como nunca se fez
tanto relato biogrfico. Blog-se o imperativo da vez. A moda se abrir,
contar tudo sem demora aos amigos das redes sociais, aos desconhecidos
seguidores de todos os passos.
Cabe lembrar que este estado de coisas a existncia de indivduos livres, racionais, desejosos de satisfazerem-se ao mximo resultado de
um processo social. Se o eu j no mais encarado de forma passiva,
como gesso a ser modelado pelas determinaes dadas em sua origem,
atribui-se sua capacidade de reflexividade, de se colocar em questo, de
ponderar a respeito de si e do mundo a partir das condies existentes
em seu prprio cotidiano.

cial importncia levar em considerao a capacidade do indivduo em se


transformar ao longo da vida. Os indivduos so capazes de refletir sobre
o prprio processo de formao; com isso, abre-se caminho interveno pessoal da prpria identidade.
Esta identidade, alis, deve ser pensada como estando sempre inacabada,
sempre em vias de constituio. Assim como salutar no conceb-la
como uniforme, ela tambm no necessariamente coerente.
Atualmente, portanto, estariam todos, a princpio, mais dispostos a tomar parte na reflexo e construo das prprias trajetrias, de serem coautores da prpria biografia, do que a participar de uma proposta de
transformao da realidade coletiva pensada por outros e decidida para
alm do alcance das vistas. Tomar a arte, em seus mais variados matizes, como instrumento de promoo do pleno desenvolvimento humano
pode tambm significar conceber a criao de si como um passo alm na
conquista de uma liberdade mais responsvel sobre a prpria vida; esta
transcendncia permitiria ainda uma ultrapassagem de um desgnio individual para um comprometimento coletivo: entender qual a funo das
influncias externas sobre si pode ser o incio multiplicador de uma responsabilizao humanizadora sobre a formao daqueles que ainda
viro, uma chance de recriar o coletivo a partir da recriao do indivduo.

Partindo da concepo de indivduo no apenas como um membro de


certa espcie, mas tambm como aquele ser indiviso, no dividido, pode-se pensar que, a despeito das mudanas ocorridas ao longo da vida
do sujeito, h algo de permanente: a identidade. Para alm de conceber
o papel de outras instncias na formao individual, tambm de cru-

60 I 61

01 I 02

A ARTE NO REPRODUZ O QU E VEMOS. ELA NOS FAZ VER.


Paul Klee

01 I 02

DESPERTAR COM E PARA A ARTE


MARIA CHRISTINA DE SOUZA LIMA RIZZI

01 I 02

DESPERTAR COM E PARA A ARTE

Quando Regina Vidigal Guarita me convidou a colaborar, com reflexes a


respeito da Arte e seu Ensino, para desenhar o que viria a ser a Associao
Arte Despertar, o pas vivia uma efervescncia epistemolgica em relao
ao ensino de Arte, ocasionada pelo processo de concepo e maturao
da Abordagem Triangular, elaborada por Ana Mae Barbosa, ento Diretora do Museu de Arte Contempornea da Universidade de So Paulo.
Foram muitas as conversas e encontros voltados para o desafio de fundamentar teoricamente as aes da futura Associao Arte Despertar. Algumas questes constituram nosso ponto de partida:

No mais limitada
tarefa de anlise da
beleza, nos tempos
contemporneos,
a Esttica amplia
seu campo de
questionamento
acerca da natureza
do objeto de Arte e
do carter de sua
criao, apreciao,
interpretao,
avaliao, assim
como acerca das
relaes da Arte
com a sociedade,
tudo isto podendo
ser examinado em
diferentes nveis
de complexidade
DONALD CRAWFORD

1. Como as pessoas se relacionam com a Arte?


2. Como elas aprendem Arte?
3. O que importante ser ensinado em Arte?
4. Como os contedos de aprendizagem em Arte podem ser organizados?
5. As situaes de trabalho com Arte a serem oferecidas pela Associao
Arte Despertar se configuraro como Ensino e Aprendizagem da Arte?
6. Qual a especificidade da ao da Associao Arte Despertar?
Haver a inteno de impactar sobre a realidade da Arte-educao?

1 Donald Crawford. The Questions of Aesthetics. In: Tpicos


Utpicos, Ana Mae Barbosa, p. 41

Nessa ocasio, os subsdios tericos e metodolgicos que caracterizam


a Abordagem Triangular do Ensino da Arte deram suporte ao aprofundamento dessas questes, em decorrncia da atualidade e pertinncia da
investigao desenvolvida por Ana Mae, com base nos movimentos educacionais Escuelas al Aire Libre, do Mxico, Critical Studies, da Inglaterra,
e Discipline Based Art Education, dos Estados Unidos.

68 I 69

Conforme Ana Mae, a construo do conhecimento em Arte acontece


quando h a interseco da experincia com a codificao e a informao.
Nesse contexto, a pesquisa e a compreenso das questes que envolvem
o modo de inter-relacionamento entre Arte e Pblico tornam-se objeto
de conhecimento. Graas a isso, a composio de um Programa do Ensino de Arte precisa considerar trs aes bsicas executadas no contato
com Arte: Fazer Arte, Ler Obras de Arte e Contextualizar as informaes
e o conhecimento a respeito de Arte em dilogo com outras reas do
conhecimento humano. Logo, so viveis as seguintes possibilidades de
articulao de aes:

SEQUNCIA 1

LER

FAZER

CONTEXTUALIZAR

SEQUNCIA 2

FAZER

LER

CONTEXTUALIZAR

SEQUNCIA 3

CONTEXTUALIZAR

FAZER

LER

SEQUNCIA 4

LER

CONTEXTUALIZAR

FAZER

SEQUNCIA 5

CONTEXTUALIZAR

LER

FAZER

SEQUNCIA 6

FAZER

CONTEXTUALIZAR

LER

No h um procedimento dominante ou hierrquico na combinao dessas aes e seus contedos. Ao contrrio, vale mais o conceito de pertinncia na escolha, enfatizando sempre a coerncia entre os objetivos e
os mtodos. Em vista disso a organicidade e flexibilidade no arranjo da
proposta pedaggica tambm so importantes.

Esse procedimento pode ser melhor explicitado a partir da observao da


srie de figuras, apresentadas a seguir:
Na Figura 1, a Construo do Conhecimento em Arte se d na interseco do Fazer, do Ler e do Contextualizar. Decorre da interao dinmica
dos sujeitos que agem na realidade, composta, por sua vez, da realidade
biolgica e da realidade sociocultural. Nas palavras de Ana Mae:
Figura 1 A Construo do Conhecimento em Arte

O intercruzamento de padres estticos e o discernimento de valores


devia ser o princpio dialtico a presidir os contedos dos currculos da
escola, atravs da magia do fazer, da leitura deste fazer e dos fazeres
de artistas populares e eruditos, e da contextualizao destes artistas
no seu tempo e no seu espao. (BARBOSA, 1994, p.34).
A Figura 2 representa em cores as trs grandes formas de pensamento
humano que interagem na realidade bio/socio/cultural: ARTE (vermelho), FILOSOFIA (verde) e CINCIA (azul). As cores que surgem
do encontro destas derivadas representam a multiplicidade de reas
mobilizadas em um mesmo ato de conhecimento.
Os pontos luminosos aqui correspondem ao momento em que se interseccionam o Fazer Arte, o Ler Obras de Arte e o Contextualizar o
conhecimento de Arte/a respeito de Arte a partir das escolhas feitas
pelos sujeitos envolvidos em processos artsticos. Nas palavras de
Deleuze e Guattari:

Figura 2 Aproximao visual dinmica da realidade bio/socio/cultural

O que define o pensamento, as trs grandes formas de pensamento, a


Arte, a Cincia e Filosofia, sempre enfrentar o caos [...] Mas a Filosofia
quer salvar o infinito, dando-lhe consistncia [...] A Cincia, ao contrrio,
renuncia ao infinito para ganhar a referncia. A Arte quer criar um finito
que restitua o infinito [...] (Deleuze e Guattari, 1992).

70 I 71

A Figura 3 atribui cores s trs grandes formas de pensamento. A Figura 4 representa por formas as aes constitutivas da Construo de
Conhecimento em Arte.

Esses fundamentos tericos deram sustentabilidade para as aes da Associao Arte Despertar.
Nos anos seguintes, a ao e a reflexo a respeito da prtica deram consistncia metodolgica ao seu fazer, da derivando-se a qualidade que
poder ser apreciada ao longo desta publicao comemorativa dos 10
anos de sua existncia.

A Figura 5, por sua vez, mostra a articulao dupla que se configura:


aes (Fazer, Ler e Contextualizar) so relacionadas s reas de conhecimento (Arte, Cincia e Filosofia).
J a Figura 6 apresenta o processo de interseco mais explicitado: aes
e reas de conhecimento em determinada realidade bio/socio/cultural.

Figura 3

Figura 4

Figura 7

A aproximao visual a cada uma das formas, como ilustra a Figura 7,


possibilita perceber que o conhecimento de determinada rea composto por colaborao e subsdios de outras, pois a diviso disciplinar dos
saberes em reas distintas, que fez parte da construo social do conhecimento no Ocidente, j no responde compreenso de realidade e conhecimento caractersticos do incio do XXI. A Figura 8, ento, reproduz
a dinmica das aes e conhecimentos em afastamento, aproximao e
fuso. Quando fundidas de determinada maneira passam a constituir a
Arte e/ou o conhecimento sobre Arte, realimentando a dinmica sociocultural da realidade:
O conhecimento pertinente deve enfrentar a complexidade. Complexus significa o que foi tecido junto: de fato, h complexidade quando
elementos diferentes so inseparveis constitutivos do todo (como o
econmico, o poltico, o sociolgico, o psicolgico, o afetivo, o mitolgico), e h um tecido interdependente, interativo e inter-retroativo entre
o objeto de conhecimento e seu contexto, as partes e o todo, o todo e
as partes, as partes entre si. Por isso, a complexidade a unio entre a
unidade e a multiplicidade. (MORIN, 2000, p.38)

Quanto Abordagem Triangular, tornou-se o paradigma do ensino contemporneo de Arte, j que permite estreita inter-relao entre os sujeitos
e a Arte, atualizando tambm sua dinmica e importncia sociocultural.
Por isso, para realizar um balano das aes desenvolvidas pela Associao Arte Despertar, possvel propor algumas questes decorrentes da
escolha terico-metodolgica:
Qual a compreenso que a Associao Arte Despertar desenvolveu a respeito desta abordagem de ensino de Arte e como ela foi operacionalizada
nas vrias aes realizadas desde o incio?
Tal compreenso est presente em todas as linguagens artsticas?
Houve mudanas ao longo do tempo? Quais?

Figura 5

Figura 6

Figura 8

Houve dificuldades? Houve acertos? Quais? Que solues


foram encontradas?
Qual o impacto desta concepo de Construo de Conhecimento
em Arte no processo constitutivo da Associao Arte Despertar?

72 I 73

01 I 02

FELIZ AQUELE QUE TRANSFERE O Q UE SABE E APRENDE O QUE ENSINA.


Cora Coralina

01 I 02

UM POUCO DE NS
MARIA ANGELA DE SOUZA LIMA RIZZI
MARIA HELENA DA CRUZ SPONTON

01 I 02

ARTE DESPERTAR E GOVERNANA


PRIMEIRAS AES

medida que ns, filhos, fomos


crescendo, ela foi se estruturando para
o encontro do l fora, com o que era, de
fato, o DNA dela, a arte. Quando surgiu
esse encontro, lembro dela saindo com
uma mesinha que ela possua em casa.
Tinha uma mesinha, uma cadeira. Da
perguntvamos o que voc vai fazer
l?. E ela respondia ah, no sei.
DARIO FERREIRA GUARITA NETO

Despertar a
potencialidade de
indivduos por meio
da arte e da cultura,
possibilitando o
exerccio de aes
transformadoras

Lembro-me do primeiro livro que


minha me trouxe para casa sobre
a Arte Despertar. Ela fazia isso de um
jeito muito natural. Ela buscou coisas
que estavam dentro dela, sempre
com muita paixo e muito brilho nos
olhos. Acho que isso foi o incio da
Associao, e o que possibilitou
a riqueza desse trabalho.

MISSO

HELOISA GUARITA PADILHA

So raras as ideias que nascem prontas e acabadas, e este no foi o caso


da Arte Despertar. Pelo contrrio, do impulso criador desta instituio
at os dias atuais, muita coisa mudou, desafios surgiram e foram superados, outros tantos se avizinham. A exigncia de se adaptar s mais
diversas situaes e a permanente vontade de transformar fazem parte
do DNA da Associao.
No incio, o Ncleo Arte Despertar, como foi chamado, correspondeu
inteno de consolidar um trabalho de educao e arte com crianas
que fizesse diferena em relao s propostas educativas dispensadas
populao em situao de vulnerabilidade social. A ideia de privilegiar
aes de incluso partiu de sua diretora-presidente que, em contato
com diferentes consultores, debateu conceitos, definiu reas de abrangncia e, favorecendo o acesso arte, cultura e educao, gestou as
primeiras aes institucionais.
Ao mesmo tempo em que as reflexes desenvolvidas no Ncleo iam
se definindo, foram tomadas medidas para constituir a Associao
como sujeito jurdico, tornando-a apta para atuar. Possibilitava-se,
assim, que as prticas executadas se desenvolvessem com mobilidade e segurana.
Uma equipe multidisciplinar, formada por profissionais especializados,
desenvolveu os primeiros projetos, oportunizando que crianas se manifestassem por meio da arte.
As atividades que, atravs dos tempos, vieram a constituir uma metodologia prpria, sempre se concretizaram mediante a construo de parcerias.

80 I 81

Os parceiros so instituies identificadas com os objetivos e a misso


da Arte Despertar e compartilham o mesmo compromisso tico, pois
consideram o outro e o acolhem em suas diferenas, j que trazem para
as relaes cotidianas dos seus espaos de ao o respeito e o dilogo,
competncias prprias da natureza humana.
Duas atividades deram incio Associao: um trabalho em hospital, em
parceria com o Instituto do Corao/InCor do Hospital das Clnicas
da Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo(HCFMUSP),
e um projeto na Aldeia SOS em Rio Bonito, So Paulo, realizados em
agosto de 1997.

uma atuao eficaz, a partir das diferentes linguagens da arte, sempre


deve estar comprometida com princpios da tica, solidariedade, cidadania, respeito, autonomia e valorizao humana.

Eu, particularmente, no gosto da


palavra Terceiro Setor, eu prefiro
chamar de organizaes da sociedade
civil. Ela tem uma conotao muito
importante, porque usada pelo lado
afirmativo que ela tem pela sociedade,
e no pela negao, de organizaes
que no so do governo.

Esses aspectos, presentes desde os primeiros trabalhos da Associao,


quando era constituda por uma pequena equipe, continuam a nutrir
os atuais projetos, mais complexos e abrangentes, mas que apostam
na possibilidade de dar sentido vida e projetar o futuro por meio da
arte e da cultura.

MARCOS KISIL

GOVERNANA INSTITUCIONAL
Seis meses mais tarde, em 15 de janeiro de 1998, constituda juridicamente, criou-se a Associao Arte Despertar, organizao sem fins lucrativos, cuja misso despertar a potencialidade de indivduos por meio
da arte e da cultura, possibilitando o exerccio de aes transformadoras.
Ao adotar a arte, a educao e a cultura como pilares de sustentao do
seu fazer, a Arte Despertar passou a difundir valores que explicitam suas
principais convices:

o equacionamento das questes sociais de responsabilidade de toda


a coletividade (organizaes sociais, governos, setor privado e comunidade em geral) e de cada indivduo em particular;
o desenvolvimento de competncias e habilidades humanas torna
cada indivduo mais apto a interagir com o seu contexto, favorecendo
que realize aes viabilizadoras de transformaes positivas;
a vivncia com arte no exige conhecimentos prvios ou habilidades
especficas, mas sensibilidade e motivao para um envolvimento em
que todos so iguais perante o que proposto;

Para adquirir a forma de Associao, foi necessrio produzir um Estatuto, que determinou as diretrizes reguladoras da ao da Arte Despertar;
constituir conselhos e diretoria; alm de investir na probidade e iseno
de seu sistema de governana.
Inicialmente participaram da instituio pessoas que, de alguma forma,
haviam contribudo para a sua criao. Estes, conforme o Estatuto, constituram os Associados Fundadores. Tambm se criaram as categorias
Associados Benemritos e Associados Contribuintes, e foram definidas
as competncias dos Associados: respeitar, observar ou alterar o Estatuto Social, eleger conselheiros, destituir dirigentes, verificar as contas,
deliberar sobre as demonstraes financeiras e transaes patrimoniais
importantes e extinguir a Associao.
Da mesma forma, instituiu-se o Conselho Consultivo e o Conselho Fiscal, compostos por membros voluntrios, dispostos a aceitar a responsabilidade de assegurar a realizao do compromisso social da Associao
Arte Despertar e de zelar por sua integridade moral e tica.
Desde ento, para viabilizar uma governana saudvel e garantir a sustentabilidade da instituio, todos os conselheiros disponibilizam tempo, ex-

82 I 83

Um momento simbolicamente importante do processo de criao institucional foi a escolha de uma logomarca capaz de sintetizar as propostas
da Arte Despertar. Inicialmente, a forma de uma clula bem definida
e orgnica se colocava acima do nome da Associao, escrito por extenso, em destaque. Mais tarde, a logomarca foi modificada, subtraiu-se
a palavra Associao para demonstrar a consolidao da instituio e,
mantendo a organicidade, deu-se destaque clula. Esta passou a sugerir
movimento, traduzindo a evoluo institucional como um caminho que
aponta, simultaneamente, para a continuidade e a mudana.

perincia e competncia, de modo a manter a viso estratgica institucional, analisar relatrios, avaliar questes jurdicas, financeiras ou contbeis.
A tarefa do Conselho Consultivo cuidar do desenvolvimento da Associao, aconselhar, orientar e indicar os melhores meios de manuteno
das polticas e da misso institucional. J o Conselho Fiscal responsvel
por verificar a administrao contbil, fiscal e financeira, mediante anlise
de informaes ou documentaes e emisso de pareceres.
As ferramentas usadas para o desenvolvimento das aes de governana so assembleias e reunies. Dada a relevncia dessas aes para
a gesto institucional, so preparadas pela equipe administrativa e validadas pela direo.

As pginas que seguem mostram que, desde as primeiras iniciativas, desenvolvidas por uma pequena equipe, at os atuais projetos, mais complexos e abrangentes, houve sempre compromisso com o desenvolvimento humano, a valorizao do indivduo por meio da arte e cultura
e o favorecimento de acesso a bens culturais. Os avanos, conquistas,
enfrentamento de dificuldades e superao de obstculos empreendidos
durante uma dcada colaboraram para a construo de saberes que esto
aqui registrados.

Os assuntos operacionais so delegados Diretoria e Equipe Administrativa da Arte Despertar. A Diretoria composta por trs membros: um
diretor-presidente e dois diretores. A ela compete interagir com os Conselhos e a Equipe Administrativa, alm de responsabilizar-se por elaborar e
implementar todos os processos operacionais e financeiros da Associao.
A Equipe Administrativa, composta por trs gerncias (financeira, de projetos e de produto) e estagirio, responsvel pela execuo dos projetos.
Ainda, para assegurar a credibilidade e transparncia da Arte Despertar,
desde o ano de 2004, realiza-se uma auditoria externa, com o intuito de
submeter os controles internos da organizao a uma validao.
Todos os atos de governana tm como finalidade, desde a origem, favorecer o cumprimento do papel social da Arte Despertar, cujo objetivo
levar seus participantes a despertarem para si prprios e para o universo
cultural em que esto inseridos e a que tm direito. Com base nisso, a Associao desenvolve iniciativas de insero social em espaos educativos
no formais e de sade.

Decorridos dez anos de atividades, hora de realizar um balano do


trabalho executado, o qual transformou ambientes e pessoas, colaborou
para a solidificao de relaes interpessoais e incentivou o florescimento
de potencialidades e habilidades em espaos por onde, tradicionalmente,
a arte no costumava transitar.

Redesenhamos essa marca, brincando com


os pesos, com a tipologia. Deixamos em
caixa baixa, antes era caixa alta, e tambm
colocamos essa clula um pouco mais para
a direita, deixando ela mais solta. O logo vai
crescendo, como se fosse uma rede social.
TERESA GUARITA GRYNBERG

84 I 85

Arte Despertar at hoje uma grande


representao de muita sabedoria.
J aprendi muitas coisas e j ensinei
muitas coisas para as minhas amigas.
Eu j tenho 4 anos que estudo na Arte
Despertar, imagine quanta coisa j me
ensinaram. Se no fossem vocs
eu no saberia nada.
Faz 5 anos que entrei, e nunca mais
quis sair. A Arte Despertar comeou
em outubro de 1998 e eu entrei em
novembro de l998. Fiquei at hoje
no mesmo curso de Artes e pretendo
continuar. Quero que a Arte Despertar
permanea aqui, porque ela mudou
a vida de muita gente como fez comigo.
Eu, E., estou no curso h 5 anos e no
me arrependo de faz-lo. Eu sei que
est acabando, mas s no ano de
2003, e j vai comear em 2004 mais
um ano novo de artes plsticas. Vai ser
tudo de bom outra vez.
A Arte Despertar me fez virar outra
pessoa, antigamente eu no gostava
nem de ouvir a palavra curso. Agora eu
estou em artes plsticas, agora sim
o que eu quero.
PARTICIPANTES DOS PROJETOS

86 I 87

ARTE, EDUCAO E CULTURA:


PRESSUPOSTOS

O tempo modifica as pessoas, a sociedade, o planeta. A tnica da existncia humana, na contemporaneidade, a mudana. Entretanto, na perspectiva institucional, alguns princpios sempre serviram de base para a ao
da Arte Despertar: a conscincia tica, a solidariedade, a cidadania, o respeito, a autonomia e a valorizao humana. Por se constituir como instituio do Terceiro Setor, a Associao compartilha com as demais a ideia
de que o desenvolvimento das questes sociais e culturais tarefa de toda
a coletividade e de cada indivduo, j que ferramenta de transformao.
Em decorrncia, procura integrar segmentos diversos, constituindo uma
rede de parcerias comprometidas com aes de responsabilidade social.
Nas escolhas institucionais, arte e cultura tm um papel importante no
processo de acolhimento, reinsero e reestruturao da sociedade. Desde as primeiras aes, houve interesse em possibilitar interao entre
pessoas, envolvendo-as em processos arte-educativos e culturais capazes
de fortalecer diferentes formas de humanizao, incluso social, reflexo,
comunicao, expresso e construo de conhecimento.

Reconhecemos que
a arte representa a
apoteose cultural de
uma sociedade, mas
reservamos um espao
bem pequeno para a
sua aprendizagem nas
instituies culturais.
Por qu?
ANA MAE BARBOSA

A Arte Despertar entende que, em contato com a arte, se desenvolvem


a percepo, a imaginao, a memria, a ateno, o raciocnio, o juzo, o
pensamento e a linguagem, elementos do processo de cognio de si, do
outro e do entorno. Ao interagir com seu pblico, o trabalho institucional busca aliar o perceptvel ao inteligvel. Pelo respeito e adequao s
singularidades dos pblicos com os quais se relacionam, os arte-educadores, aos poucos, vo descobrindo seu potencial perceptivo, mnemnico
e intelectual, o que torna possvel vivenciar o encontro com a arte como
experincia que propicia conhecimento e autorealizao.
Relacionada ao contexto especfico em que ocorre, essa prtica, juntamente com a reflexo e a interao que oportuniza, abre-se para uma
multiplicidade de pontos de vista, de modos de expressar a criatividade e
de favorecer trocas interpessoais.

88 I 89

Por isso, ao atuar nesse campo, a Associao contribui para avanos significativos em aes de responsabilidade social, uma vez que amplia espaos de criao e dilogo atravs da arte e da cultura, favorecendo, por
meio delas, o estreitamento das relaes humanas.
Entre as caractersticas dos projetos que desenvolve e que os torna singulares, est o deslocamento da equipe de arte-educadores para os espaos
de ao: comunidades e hospitais nos quais a arte e a cultura fazem diferena. Tambm relevante destacar que as relaes interpessoais oportunizadas pela ao institucional favorecem a aprendizagem pela experincia, a descoberta dos talentos de cada um, e investem na experimentao
e na expresso da sensibilidade por meio das linguagens da arte.
Os conceitos e escolhas subsidirias das aes da Arte Despertar se
apoiam em pressupostos que situam a arte como atividade criativa que
demanda experimentao, apreciao e interpretao de diferentes cdigos, por meio dos quais os seres humanos buscam se comunicar e atribuir
sentidos ao mundo. Em vista disso, princpios organizadores da ao institucional, apresentados a seguir, foram desenvolvidos por suas equipes
arte-educativas e orientam suas prticas.

ARTE TRANSFORMAO
A arte pode elevar o homem de um estado
de fragmentao a um estado de ser ntegro,
total. A arte capacita para compreender
a realidade e ajuda no s a suport-la
como a transform-la, aumentando-lhe
a determinao de torn-la mais humana
e mais hospitaleira para a humanidade.
A arte uma realidade social. A sociedade
precisa do artista, este supremo feiticeiro,
e tem o direito de pedir-lhe que ele seja
consciente de sua funo social. Mesmo
o mais subjetivo dos artistas trabalha em
favor da sociedade. Pelo simples fato de
descrever sentimentos, relaes e condies
que no haviam sido descritos anteriormente
[...], representa um impulso na direo de
uma nova comunidade cheia de diferenas
e tenses, na qual a voz individual no se
perde em uma vasta unissonncia.
ERNST FISCHER

Fundamento das aes institucionais, a arte tem papel importante na vida


das pessoas, sobretudo em uma sociedade estruturada de forma desigual.
O acesso a ela pode significar solues criativas aos desafios do cotidiano,
entre os quais, a incluso.
O racionalismo do sculo XIX determinou que a sociedade valorizasse
a linguagem cientfica e discursiva, fato que relegou a um segundo plano,
em boa parte do sculo XX, a importncia da alfabetizao visual para
compreender outras linguagens. Entretanto, j na virada do sculo, a imagem se destaca como a linguagem caracterstica do sculo XXI, presente
em outdoors, na comunicao televisiva, no computador. Em consequncia,
para dar conta da vida cotidiana, importante conhecer diferentes linguagens e interagir com variadas manifestaes artsticas, como modos de expresso, vivncia interpessoal e forma de acesso cultura contempornea.
Por reconhecer a necessidade da arte e sua capacidade transformadora, a ao da Arte Despertar difunde a ideia de que o fazer artstico contribui para o desenvolvimento humano, amplia seu potencial
cognitivo de conceber e olhar o mundo de modos diferentes, intimamente ligados aos interesses de quem aprende a atribuir sentidos.
Esta maneira de propor experimentaes com arte pode romper barreiras de excluso, visto que a prtica arte-educativa est embasada
no no talento ou no dom pessoal, mas na capacidade de experimentar de cada um.
Os beneficiados pela ao da Arte Despertar so estimulados a se arriscar,
a se expor, a desenhar, pintar, representar, tocar, escrever, ler, considerados, no como competio, mas sim, como vivncias (pessoal ou coletiva). Partindo desse princpio, todos se reconhecem como participantes
e construtores de seus prprios percursos, descoberta assegurada pelo
objeto artstico que passa a ter sentido e deixa de ser visto como incompreensvel ou elitista distante da realidade.

90 I 91

Assim concebida, a arte leva em considerao


diferentes formas de produzir, de compreender e organizar a vida social. A cultura, por sua
vez, aparece em permanente transformao,
amplia-se e possibilita aes que pem em destaque a construo de conhecimento. Nesse
sentido, no h diviso entre teoria e prtica,
entre razo e percepo, mas investimento em
uma postura integradora, que valoriza competncias e habilita quem cria ou aprecia a lidar
com a complexidade.
A arte ultrapassa o sentido imediatista da vida.
Apresenta-se como forma de construo de
conhecimento, desenvolve a percepo, a imaginao, a memria, a ateno, o raciocnio, o
juzo, o pensamento e a linguagem, elementos que compem o processo cognitivo. Por
meio deles, conforme o educador Paulo Freire
(1982), a humanizao se configura em ponto
de chegada, portadora de capacidades que desenvolvem a conscincia e habilitam a agir e a
pensar de modo autoral.
Ao abordar as linguagens da arte como reas de
construo, conhecimento e expresso, a Arte
Despertar se coloca em sintonia com os recentes achados no campo do ensino de arte. Ao
refletir a respeito do prprio percurso da rea,
colabora para consolidar uma postura pedaggica e fortalece a concepo de arte como conhecimento especfico, uma vez que a entende

como processo de cognio em que, segundo


Rudolf Arnheim (2002), perceber uma forma
de conhecer, o que possibilita refletir, compreender o mundo e adquirir ferramentas que podem viabilizar sua transformao.

A grande diferena foi essa, porque a


maioria dos trabalhos que se faz hoje
para, e o nosso envolveu o com.
LGIA CORTEZ

As aes da Arte Despertar partem do entendimento de que o ser humano um animal


simblico. Ele inventa e cria smbolos para
interpretar o mundo, recorre capacidade de
simbolizar para se reportar razo, mas tambm linguagem, arte, religio e ao mito,
como assevera Ernest Cassirer (1994). Sem
isso, a vida humana resumir-se-ia satisfao
de necessidades biolgicas e interesses prticos, sem qualquer projeto.
Cada indivduo, ao combinar percepo,
imaginao, repertrio cultural e histrico, l
o mundo e o reapresenta sua maneira, utilizando formas, cores, sons, movimentos, ritmos, cenrios. Esses e outros elementos da
arte constituem as linguagens a que recorre a
Arte Despertar, tendo em vista sua inteno
de humanizar, resgatar a autoestima, formar
e incluir socialmente.

ARTE CIDADANIA
O movimento do mundo palavra e da palavra
ao mundo est sempre presente. Movimento
em que a palavra dita flui do mundo mesmo
atravs da leitura que dele fazemos. De
alguma maneira, porm, podemos ir mais
longe e dizer que a leitura da palavra no
apenas precedida pela leitura do mundo, mas
por uma certa forma de escrev-lo ou de
reescrev-lo, quer dizer, de transform-lo
atravs de nossa prtica consciente.
PAULO FREIRE

Voc sabe que eu no queria participar,


pois estou triste e nervosa com
o problema de J. Agora at eu me
espantei como eu sou boa nisso, sei
desenhar, e contar histria. Eu mesma
dou parabns para voc, dona Maria!
Quero voltar para minha casa e ser
voluntria em algum hospital que
me queira, pois j sei o que arte e
tambm fazer arte! Foram vocs meus
professores. (...) E esto me ajudando
a entender o problema de J. Obrigada!
M. FATIMA, ME DE PACIENTE

Os estudos de quatro educadores contribuem e fundamentam as prticas


da Arte Despertar: Paulo Freire, Jean Piaget, Lev Vygotski e Elliot Eisner.
O conceito de educao popular, apresentado pela teoria freireana,
orientador das prticas da Arte Despertar, propondo-se a transformar
a realidade a partir do protagonismo dos sujeitos. Ao desenvolver aes
conjuntas em diferentes espaos pblicos, a Associao amplia as possibilidades de vivncia e forma comunidades de cultura que recriam permanentemente o legado de Paulo Freire em oficinas, jornadas, grupos de
estudos e de trabalho. Estes, comprometidos com processos de ensino
e aprendizagem, investem na emancipao de populaes socialmente
vulnerveis. A valorizao do cotidiano, do conhecimento, de saberes
e tradies populares vivenciados abrem perspectiva para reconhecer a
criatividade individual.
Em A importncia do ato de ler (1982), Freire apresenta o quanto a
leitura pode instigar e subsidiar o estudo do cotidiano vivido. Para uma
experincia se concretizar como educao, so necessrios dilogo, troca, interao. Ao dialogar, sujeitos pensam juntos e recriam a realidade,
desde que tenham como fundamento a verdade. J em Pedagogia do
oprimido (2005, p.90), Freire declara: (...) a palavra verdadeira, que
trabalho, que prxis, transformar o mundo: dizer a palavra no privilgio de alguns homens, mas direito de todos os homens. Nessa perspectiva, torna-se possvel uma dialtica entre a ao e a reflexo, essencial
para uma educao problematizadora do real.
Ao formular os pressupostos da pedagogia libertadora, Freire apresenta a
tecnologia como instrumento para possibilitar ao educando a ao sobre
o objeto de estudo, bem como a concepo de novas vises de mundo,
pois julga que no se assimila passivamente um contedo, mas trabalhase com ele de diversos modos. Por isso, Moacir Gadotti (1979, p.107)
caracteriza Freire como um construtivista crtico:

92 I 93

Aprende-se quando se quer aprender e s se aprende o que significativo, dizem os construtivistas. Paulo Freire tambm foi um dos criadores
do construtivismo, mas do construtivismo crtico. Desde suas primeiras
experincias no nordeste brasileiro, no incio dos anos 60, buscava fundamentar o ensino-aprendizagem em ambientes interativos, atravs
do uso de recursos audiovisuais. Mais tarde reforou o uso de novas
tecnologias, principalmente o vdeo, a televiso e a informtica. Mas
no aceitava a sua utilizao de forma acrtica.
Para Jean Piaget (1974), atravs de aes, o sujeito extrai o conhecimento.
O pesquisador suo apregoa uma educao inovadora, ativa, que motive
aquele que aprende a realizar descobertas e se ver como parcela relevante
no processo de ensino-aprendizagem.
A nfase na natureza social humana, atribuda ao russo Lev Vygotski
(1991), completa a concepo sociointeracionista e construtivista adotada pela Arte Despertar. Embora, em linhas gerais, haja mais divergncias
que convergncias entre Piaget e Vygotski, ambos entendem o conhecimento como adaptao e como construo individual, concordando
que a aprendizagem e o desenvolvimento so autorregulados. Enquanto
Piaget se interessa pela forma como o conhecimento construdo da
sua teoria se debruar sobre a construo mental do indivduo -, Vygotski
destaca a maneira como os fatores sociais e culturais influenciam o desenvolvimento intelectual de quem aprende.
Piaget destaca os aspectos biolgicos no processo de educao. Para ele,
os estgios do desenvolvimento da inteligncia esto apoiados na biologia e so idnticos em todos os seres humanos. Do mesmo modo, a aquisio do conhecimento ocorre por meio de trocas e interaes com o objeto a conhecer. O indivduo reconstri o objeto, para se apropriar dele e
dar-lhe significados, primeiramente pela ao, depois, pela representao.

Cada vez fica mais evidente para todos


a importncia desse trabalho e como
conseguimos atingir cada ser humano
no que ele tem de mais precioso na vida:
sua identidade. Por meio da msica, da
literatura e das artes plsticas, a equipe
com extrema competncia acessou esse
lado saudvel, ou melhor, o ser humano
saudvel que todos podem ser, e assim
resgataram-se as lembranas, as alegrias, as
histrias, as potencialidades e habilidades,
as risadas, as lgrimas (...) de todos que
tiveram a oportunidade de ter um contato
com a arte da Arte Despertar. (...)
O encerramento no podia ser melhor,
a rvore da vida trouxe aos hospitais
esperana, desejo de renovao e pode
abarcar os sonhos, os desejos de todos.
Acredito que foi a sntese do semestre, do
trabalho, j que a cada dia que estamos
l procuramos resgatar todas essas
coisas de cada paciente, acompanhante,
enfermeira, mdico, etc. (...)
CAMILA BIGIO GRYNSZPAN, PSICLOGA

Vygotski, por outro lado, valoriza questes do mbito da cultura. Para


ele, o desenvolvimento do indivduo sempre ligado ao aspecto cultural,
incorporado histria dos sujeitos. Na cultura, cada um passa a simbolizar e a criar elementos significativos que do sentido vida. Por estarem,
indivduo e cultura, intimamente ligados, a arte atua na organizao e
construo de mundo, possibilitando a reflexo sobre as prticas sociais
luz de instrumentos criados pela mente para interpretar o mundo.
Outros conceitos importantes para a prtica da Associao devem tributo a este estudioso, como o resgate da zona real dos participantes (seus
saberes efetivos), para ampliar, em seguida, a zona proximal (os saberes
possveis), os quais podem ser ativados pelo trabalho educativo com arte
e cultura e aumentam a capacidade de resoluo de problemas.
O pensamento de Elliot Eisner (1987) tambm d suporte para a ao
da Arte Despertar. Segundo ele, na relao com a arte, as pessoas fazem
principalmente quatro coisas: Elas veem arte. Elas entendem o lugar da
arte na cultura, atravs dos tempos. Elas fazem julgamentos sobre suas
qualidades. Elas fazem arte. Esses movimentos baseiam-se na especificidade de cada obra e em detalhes da relao obra/pblico. Podem ser
mediados por aes capazes de apontar novos significados para diferentes pblicos, atualizando-as ou contextualizando-as a partir de motivaes individuais ou coletivas.
Nesse sentido, Eisner e Freire se aproximam. Enquanto o primeiro enfatiza a imaginao, o outro sugere a prevalncia do dilogo para consolidar a conscincia social. Em ambos a educao mediada pelo mundo,
formatada pela cultura e influenciada por linguagens. H tambm forte
impacto de crenas, necessidades e valores, moderados pela individualidade. Se, para Freire, ter conscincia da experincia gera conhecimento,
para Eisner, experimentar o mundo emprico, dependente do sistema
sensorial biolgico, refina os sentidos e alarga a imaginao. Realiza-se

94 I 95

ento, por meio da arte, um trabalho que potencializa o conhecimento e


amplia a conscincia do contexto em que cada sujeito se insere. Por isso
a arte importante: ela estimula a tolerncia ambiguidade, explora mltiplos sentidos e significaes. Nela no h certo e errado: tudo mais ou
menos adequado, mais ou menos significativo, mais ou menos inventivo
ou teraputico.

A obra de arte possui qualidades emocionais e cognitivas que contm


informaes de ordem social e cultural. Para compreend-la, preciso
contextualizar o conhecimento sociocultural que est sendo comunicado, pois a arte est sempre relacionada a valores especficos, a sintomas
psicolgicos e a vises de mundo que a concretizam como fato social.
Essa perspectiva apresentada por Fayga Ostrower (1987), para quem
possvel reconhecer que o potencial consciente e sensvel de cada um
se realiza sempre dentro de formas culturais. Por compartilhar dessa
ideia, a Arte Despertar preocupa-se com o resgate cultural e histrico
dos grupos com os quais interage.
Por isso, tambm importante considerar o conceito de multiculturalidade, apresentado no Brasil por Ana Mae Barbosa (1998). Graas ao
multiculturalismo, todos podem ter acesso aos conhecimentos propostos pela arte, desde que sejam sensveis a diferentes formas de cultura e de saber e desenvolvam competncia para integrar diversidades e
singularidades caractersticas dos agrupamentos sociais. Na sociedade
brasileira contempornea, frequentemente, indivduos de variados grupos culturais interagem com outros de culturas e subculturas diferentes. Embora todos se liguem estreitamente, podem ser identificados por
raa, gnero, orientao sexual, idade, situao geogrfica, renda, classe
social, ocupao, educao, religio. Uma atitude multiculturalista frente arte, portanto, deve estar atenta s formas como cada grupo a situa
em suas vidas, procurando entender que, embora todos necessitem de

ARTE EDUCAO
Somente uma educao que fortalece a
diversidade cultural pode ser entendida
como democrtica. A multiculturalidade
o denominador comum dos movimentos
atuais em direo democratizao
da educao em todo o mundo. (...)
A preocupao com o pluralismo cultural,
a multiculturalidade, o interculturalismo
leva necessariamente a considerar e
respeitar as diferenas, evitando uma
pasteurizao homogeneizante.
ANA MAE BARBOSA

Eu achei legal porque tinha o bumba-meu-boi,


o cabeo, a Catirina, e no meio da festa eu
vi minha me e ela tirou foto de mim. Gostei
do feiticeiro e gostei muito da msica e da
histria do vaqueiro que corta a lngua do boi
e d para a mulher grvida. E tambm porque
uma lenda muito bonita. Minha me tirou a
foto dos bois porque eram bonitos e tinham
flores nas costas.
ISATMERA, 10 ANOS,
COMUNIDADE DE PARAISPOLIS

arte, o prprio conceito pode diferir de acordo com os valores e a forma de insero na vida de cada um.
Em qualquer situao, entretanto, vale destacar que o pensamento e o
sentimento esto presentes, pois, como diz Fayga Ostrower (1987, p.39),
o criar um processo existencial, no lida apenas com pensamentos,
nem somente com emoes, mas se origina das profundezas do nosso
ser, onde a emoo permeia os pensamentos ao mesmo tempo em que
a inteligncia estrutura e organiza as emoes. A ao criadora d forma, torna legvel, inteligvel o mundo das emoes.
Ao considerar o poder transformador da arte, bem como as condies
que ela possui de proporcionar vivncias culturais, em especial junto s
populaes socialmente vulnerveis ou queles que se encontram hospitalizados, a atuao da Arte Despertar, por meio de ao arte-educativa
no formal, amplia a possibilidade de colaborar para a conquista da cidadania e a elevao da autoestima dessas populaes.
Suas prticas envolvem sempre ao, articulao com as realidades representadas e reflexo, formatando uma metodologia cujo desenvolvimento universaliza o direito arte e cultura e procura realizar cada
procedimento como etapa vivenciada de um processo de aprendizado
e aprimoramento pessoal dos que dele participam.

96 I 97

Para criar, o ponto de partida a realidade, mas tambm preciso mobilizar experincias anteriores, a histria pessoal e cultural, determinada
pelo tempo e o espao, e recorrer a diferentes artifcios que deem novos
significados ao que se v, rememora ou sente. O mesmo percurso cumprido pelo espectador ao apreciar a arte, pois ele atribui sentidos ao que
v, ouve ou l, a partir de seu universo prximo. Este conhecimento, organizado atravs de sistemas simblicos, pode se expressar por imagens,
gestos, palavras, sons, formas que constituem as linguagens atravs das
quais o ser humano interroga o mundo que o rodeia.

LINGUAGENS DA ARTE: DESENVOLVIMENTO


CULTURAL E TRANSFORMAO SOCIAL

As atividades desenvolvidas pela Arte Despertar priorizam as linguagens


teatral, visual, literria e musical. Embora possuam semelhanas, cada linguagem guarda sua especificidade e indica um recorte terico orientador
de abordagem metodolgica especfica.
Atravs da linguagem teatral, destacam-se aes de leitura, escrita, apreciao e reflexo. Por ser uma atividade realizada em grupo, desenvolvida a partir de vivncias, conhecimentos e experincias individuais, mas
capaz de promover a aquisio de novas compreenses coletivas ao
explorar diferentes contedos dramticos. Prticas cooperativas, motivadas pela vivncia dramtica, valorizam a colaborao, a interdependncia e
a reflexo sobre valores e atitudes inerentes convivncia em grupo, bem
como a elevao da autoestima e o autoconhecimento.
A linguagem das artes visuais desenvolve habilidades de ver, julgar e interpretar imagens da cultura visual, atravs das quais possvel atribuir sentidos, acompanhar processos de criao, pesquis-los e document-los, em
mbito individual ou coletivo. Ao exercitar esta linguagem, consolida-se uma
alfabetizao visual que propicia condies para decodificar e ressignificar
os contextos em que aparece, alm de abrir caminho para a experimentao
pessoal, a significao, a valorizao da autoestima, a oportunidade de pensar
sobre arte e formular juzos crticos a respeito da produo prpria ou alheia.

No decorrer do trabalho vamos criando uma


forma de comunicao silenciosa, propiciando
um timo entrosamento. A msica, os
bonecos, a fantasia muda o foco do paciente
e possibilita que ele esquea que est em
um ambiente hospitalar. Fico feliz em poder
trabalhar com profissionais de alto nvel, os
que trabalham no hospital e os que ficam
tambm nos bastidores da Arte Despertar.
MAURICIO ANACLETO, ARTE-EDUCADOR

A linguagem literria explora a potencialidade representativa do mundo da fico,


forma ou desenvolve o hbito de leitura e
o prazer do contato com gneros literrios
atravs da contao de histrias, de recriao
e de conversa a respeito do lido. Estimulase uma apreciao ativa, em que a produo
de sentidos a respeito de diferentes situaes
humanas frente ao contexto social ou s dificuldades pessoais so trazidas tona atravs
da fantasia, possibilitando vivncias e reflexes variadas do seguro lugar de leitor. Ao
mesmo tempo, valoriza-se a manifestao de
leitura crtica, quando o leitor toma a palavra
e produz inferncias provocadas pelo que
leu, realizando uma leitura autoral.
Nas aes que envolvem a linguagem musical so desenvolvidas atividades de apreciao, execuo e composio, com o objetivo
de formar ou ampliar repertrio, desenvolver
noes de disciplina, equilbrio, sintonia e respeito, viabilizando a expresso da cultura local,
o refinamento da escuta e a criao musical.
As linguagens privilegiadas determinam a
formao da equipe, as reas de atuao da
Arte Despertar, alm de orientarem a definio da metodologia de ao e a formao
de parcerias. So trabalhadas de modo a privilegiar tanto o fazer quanto a apreciao e
a compreenso da arte, representadas por

vivncias de ser, estar, participar, aprender


a ver, ouvir, tocar e expressar o que sente.
Aspectos relacionados ao ser se explicitam
no encontro com o grupo, formado por
iguais, em que a individualidade e a autoestima se fortalecem. O estar decorre de
percepo e vivncia de pertencimento, de
sentir-se parte de uma coletividade, o que
desenvolve o vnculo, a cooperao, o afeto
e a cumplicidade, bem como o respeito s
diferenas. J, por meio do participar so
favorecidos a responsabilidade, o envolvimento e o comprometimento com a atividade. No mbito do aprender a ver, ouvir
ou tocar, a sensibilizao para as diferentes
linguagens explorada, o que abre caminho
para a expresso do sentir, alm de novas
e diferentes formas de comunicao, capazes de atribuir outros significados ao pensamento, s emoes, afetividade.
O processo criador, provocado pela ao de
arte-educadores mediada pela arte, favorece
descobertas e o traado de caminhos pessoais, sem comparaes ou competitividade, o que fundamental para o desenvolvimento e amadurecimento individual e para
a ampliao do prprio olhar. Em todas as
situaes de aprendizagem, a interveno
especializada transformadora, pois ensina
a construir sentidos.

98 I 99

Foi muito bom. Acho que uma


excelente oportunidade para
entender o quanto gratificante
ser parte integrante de uma ao
social e sentir que seguramente
estas duas horas de dedicao
do nosso tempo so de enorme
importncia para quem as recebe.
A parceria do Banco com a Arte
Despertar est de parabns pela
iniciativa! Acho que muitos tm a
vontade de participar de projetos de
voluntariado, mas no o fazem por falta
de oportunidade. Foi fantstico estar
com aquelas crianas, proporcionando
um pouquinho de alegria em
momentos to delicados. Estou
ansiosa para a minha prxima visita.
O projeto foi muito importante para
o desenvolvimento da solidariedade
entre os funcionrios. Acredito
que, assim como nas minhas
atitudes, o projeto tenha contribudo
diretamente ao trabalho de todos
os funcionrios que participavam.
FUNCIONRIOS QUE PARTICIPARAM
DE PROJETO NO HOSPITAL DA CRIANA
NOSSA SENHORA DE LOURDES

100 I 101

SENSIBILIDADE ARTSTICOCULTURAL, ASPECTOS


METODOLGICOS E ATIVIDADES
RELEVANTES

O olhar do indivduo sobre o mundo, que no envolve s a viso, mas


cada partcula da individualidade, est profundamente colado histria
pessoal, cultura, ao tempo e ao momento especfico da vida de cada um,
como assevera Danilo Miranda (2006, p.20):
(...) as memrias das brincadeiras nos parques, das cantorias dos terreiros, dos desenhos das crianas, dos sons caboclos, estas memrias do
ntimo (...) memrias das pequenas coisas no utilitrias, no civilizadas
todas elas resduos orais da cultura, to breves quanto a existncia. Mrio de Andrade acreditava que o verdadeiro patrimnio de um povo estava
materializado nestas coisas menos nobres, que se esvaem como a voz:
coisas perecveis, relacionais, efmeras e, por isso mesmo, vivas.
As aes da Arte Despertar investem nas relaes interpessoais e na
transformao do ambiente. Alm de estimularem a expresso individual,
desenvolvem a criatividade, especialmente a capacidade de criar solues
diferentes para um mesmo desafio. So justificadas por seus pressupostos
tericos e se concretizam atravs de atividades arte-educativas e culturais,
motivadoras, levadas a diferentes espaos e pblicos, mediante atendimentos pontuais, oficinas e vivncias, capacitaes, cursos, palestras ou
visitas a instituies culturais. Sua implementao envolve processos de
representar ou expressar o mundo real, favorecendo a intercomunicao
e a sensibilidade pessoal.
A sensibilidade entendida como capacidade de captar e expressar sentimentos, mas tambm como responsvel pela construo de conhecimento, j que pode ser a porta de entrada para a criao de significados,
durante a mediao realizada pela arte e pela cultura.
A habilidade de lidar com o sentir adquirida a partir de estmulo, em
decorrncia de experincias individuais, que podem ser expressas por
gestos, palavras, desenhos ou mesmo pelo olhar.

102 I 103

Na perspectiva de Ana Mae Barbosa sensibilidade o conjunto de funes orgnicas que


buscam a inteligibilidade, o prazer, a sensualidade. Para a autora (2005, p.99), A arte, como
linguagem aguadora dos sentidos, transmite
significados que no podem ser transmitidos
por meio de nenhum outro tipo de linguagem,
discursiva ou cientfica. Ela vista, ento, como
instrumento para a busca da percepo sensvel,
que capacita a sentir e perceber o mundo.
A Arte Despertar exercita o ver a partir do
olhar do outro, o que torna possvel aprofundar o campo da imaginao e compreender o
papel que ela pode ter na criao de significados pessoais ou culturais. Pela sensibilidade,
o mundo percebido, mas antes ele criado pela imaginao. O sensvel , ento, um
saber que se mescla ao pensamento racional,
embora esteja mais ligado aos sentidos. Ao
propor que pessoas em situao de vulnerabilidade social ou de sade abram os sentidos,
a Arte Despertar indica o mais importante
aspecto de sua base metodolgica: o resgate ou desenvolvimento da sensibilidade, ou
seja, da capacidade de todos os participantes
de uma ao reconhecerem as sensaes que
lhes so oferecidas pelos sentidos a partir da
experincia vivida.
Assim, os arte-educadores, que fazem a mediao por meio da arte e da cultura, privilegiam

o processo perceptivo e despertam em seus interlocutores o interesse por registros de identidade e pertencimento. Em consequncia, na
interao entre espectador e objeto, ou entre
produtor e sua obra, as informaes so captadas pelo corpo, as sensaes so assimiladas
antes de se tornarem reflexo.
Por isso h interao entre os participantes
das aes da Arte Despertar, pois h contato entre diferentes formas de ver o mundo e
desfrutar emoes. Nesse contexto, conscientizar-se da prpria reflexo exerc-la como
uma prtica, abrindo perspectiva para a transformao. tambm uma forma de ser e estar
sensvel aos prprios pensamentos, deixandose afetar por eles.
A sensibilidade, entretanto, no s a capacidade de perceber, mas tambm de interpretar
sensaes, ampliando as condies de leitura. Nesse sentido, nas iniciativas promovidas
pela Arte Despertar, todos so, simultaneamente, aprendizes e educadores. Por isso, ao
definir espaos de ao ou temas a serem
desenvolvidos, as linguagens da arte e da cultura, veculos de atuao da Arte Despertar,
so tambm vividas pelos mediadores, e todos, simultaneamente, aprendem e ensinam,
propem e participam, questionam e argumentam, sensibilizam e sensibilizam-se com
seu fazer.

MEDIADORES DA AO
O ser humano inclinado por natureza,
inexoravelmente, a estabelecer vnculos
com os outros e a se relacionar com
os demais, j que encontra neles uma
referncia inevitvel para apoiar sua
incompletude original. Graas a esses
contatos em nossa existncia, chegamos
a ser o que somos. Existimos coexistindo,
apesar de nossa vontade, inclusive.
GIMENO SACRISTN

A Arte Despertar proporciona a interao da arte com o pblico atravs


da mediao dos arte-educadores com crianas, jovens e adultos. Realiza
vivncias significativas de ampliao do conhecimento de si e do mundo atravs da arte, transformada em poderosa aliada na construo de
projetos de vida.
As intervenes promovidas pela Arte Despertar tm como responsveis
profissionais que conhecem o contedo a ser tratado e so capazes de conduzir discusses produtivas e orientar processos de descoberta por parte
dos demais participantes da ao. Em decorrncia de formao e experincia, eles tambm atuam como formadores, em cursos e capacitaes.
Considerando a natureza da mediao, um planejamento cuidadoso sempre antecede a execuo das aes. Para atender cada espao de interveno, as equipes de trabalho so compostas por um pedagogo, um psiclogo e arte-educadores. Este grupo organiza um plano de ao, pesquisa, amadurece propostas, reporta-se a experincias j vivenciadas e, em
consonncia com as caractersticas dos beneficirios e as especificidades
do local de interveno, define prioridades, linguagens da arte a serem
trabalhadas e modos de atuao.
Por ser a primeira aproximao da prtica, o planejamento coloca os mediadores em consonncia com o meio em que atuaro e os objetivos que
pretendem alcanar. Durante a execuo, a equipe mantm reunies regulares para refletir a respeito do que foi realizado, deixando-se tambm
afetar pelos prprios pensamentos a partir da experincia. Assim, a sensibilidade abre perspectiva para o mediador, alm de perceber, interpretar
sensaes, colocando-se, pela reflexo, na condio de quem aprende.
Nesse sentido, sua ao concretiza a mxima de Alicia Fernandez (2001,
p.42) que diz: s quem se posiciona como ensinante poder aprender e
quem se posiciona como aprendente poder ensinar. Em consequncia,
para realizar um trabalho intimamente ligado ao sensvel, necessrio

104 I 105

ser capaz de render-se a ele, estabelecendo uma via de mo dupla cujo


resultado valoriza a mediao realizada pela Associao Arte Despertar.
Ao mudar o olhar, muda tudo. Bergson (1978) dizia que os sentimentos so geradores de ideias. A relao com a experincia torna as
atividades realizadas significativas e elas so capazes, ento, de modificar aqueles que a vivenciam. A experincia domnio da interpretao, depende do modo como as situaes so lidas. Jorge Larrosa
(2001), educador catalo, afirma que apenas os acontecimentos que
tocam aquele que aprende transformam-se em experincias, so apropriados como significativos.
Logo, por ser um pesquisador da realidade e conduzir o exerccio da observao, percepo, anlise crtica e criatividade, o arte-educador compreende sua responsabilidade social e investe na interao, sabe como se
constri o conhecimento e planeja levando em conta a realidade, alm de
avaliar permanentemente sua prtica, alterando-a, se necessrio.
, enfim, comprometido com novos paradigmas que orientam o pensar pedaggico, pois adota uma concepo diferenciada em relao ao
ensinar e aprender, baseada na troca e na interao, em que todos so
parceiros e colaboradores. Nessa perspectiva, constitui-se, simultaneamente como um investigador que se prope a pesquisar e se aprofundar sobre conceitos tericos e a prtica, referente s metodologias de
ensino e s linguagens da arte, suas relaes com a cultura, suas particularidades, seus cdigos, materiais e formas de construo e expresso.
A dimenso investigativa alimentada por pesquisas individuais, cursos
de formao e pela anlise crtica de seu prprio trabalho. H tambm
momentos de troca com toda a equipe, em que so discutidos os planos
de ao e as problematizaes da decorrentes e nos quais acontece a
socializao das experincias e a avaliao do processo.

Nesse sentido, o arte-educador tambm um mediador, um facilitador, a quem cabe valorizar o repertrio e a identidade das pessoas,
criando situaes que convoquem uma participao ativa, em que aspectos novos sejam agregados para promover o enriquecimento e ampliao cultural e possibilitar que os envolvidos se reconheam como
produtores de conhecimento.

Tratando-se de jovens que vivem


em uma comunidade como essa,
onde h muita violncia, o resultado
est sendo timo, porque eles esto
se tornando mais espontneos,
eles participam bastante das
atividades, esto se tornando
jovens com cabeas mais crticas.

ESPAOS DE AO
RAFAEL ALEXANDRE GOMES,
MOSTEIRO SO GERALDO

Se as coisas so inatingveis (...) ora!


No motivo para no quer-las (...)
Que tristes os caminhos, se no fora
a mgica presena das estrelas.
MRIO QUINTANA

O acesso produo cultural e artstica um direito de todos. Para trilhar


esse caminho em busca da arte e cultura, a Arte Despertar concretiza sua
presena em hospitais e em comunidades onde no existe acesso a este
tipo de produo.
Entretanto, o projeto de interveno no decorre de imposio ou de
alguma alternativa discutida apenas entre a equipe da Associao. Ao
contrrio, a partir de uma apresentao geral do projeto e da aceitao
da parceria, arte-educadores, coordenao pedaggica e assessoria psicolgica so destacados e, em comum acordo com os parceiros, decidem as linguagens, a periodicidade, os recursos e a forma de ao. Esta
primeira etapa do processo tem, portanto, profundo sentido pedaggico, pois aproxima a Arte Despertar da cultura do parceiro, permite
supor os modos de agir e de inserir-se na realidade em que ir atuar,
tomando a arte e a cultura como critrio de mediao.
A ao da Arte Despertar decorre do contexto, de anlise e reflexo a
respeito da realidade prxima. Logo, esta etapa destinada ao conhecer
no um ato passivo, envolve troca entre parceiros, dilogo e aprofundamento da cultura de cada um. O agir que da decorre tende tambm a
ser dinmico e transformador, profundamente enraizado na cultura do
lugar de ao.

106 I 107

Trabalhar com arte em comunidade entrar


em contato com ns mesmos. (...) Eu
conheo desde quando entrei aqui no PECP,
em 2002. Na verdade eu no trabalhava
com arte e cultura aqui, vim trabalhar com
arte e cultura faz mais ou menos uns trs
anos. Eu via o trabalho da Arte Despertar
aqui como observadora. E sempre fiquei
muito emocionada pela qualidade, com
o desempenho, com o desenvolvimento
das crianas e dos jovens, da qualidade do
trabalho desenvolvido. (...) Muitas vezes eu
comecei a perceber que era a Arte Despertar,
medida que vocs faziam as exposies,
que faziam um trabalho com a comunidade,
as apresentaes do que era desenvolvido
durante o ano. E era sempre muito
apaixonante, dava sempre para ver que algo
de fato acontecia, assim, no era algo s
para expor, era algo bem desenvolvido com
as crianas, com as famlias, o compromisso,
a seriedade do trabalho. Nunca vi, nesses
anos todos, pai reclamando dos professores
da Arte Despertar, nem dos arte-educadores.
Por exemplo, eu nunca vi falta de arteeducadores. E quando uma criana fala da
Arte Despertar sempre com muito amor,
muito carinho.
VANDA MAFRA FALCONE, PROGRAMA
EINSTEIN NA COMUNIDADE DE PARAISPOLIS

108 I 109

Quando o trabalho se desenvolve em comunidades, para crianas e


jovens em situao de vulnerabilidade social ou em projetos de capacitao de jovens ou educadores sociais, o foco da ao institucional
pautado por valores eminentemente arte-educativos e culturais. Da
mesma forma, se prope a criar oportunidades de interao entre os
diferentes grupos, de modo a favorecer, por meio da sensibilidade
das linguagens da arte, a realizao dos chamados quatro pilares da
educao: aprender a conhecer; aprender a fazer; aprender a viver
juntos, a conviver com o outros; aprender a ser, conforme indica
Jacques Delors, no Relatrio da Unesco (1999).
A violncia e a vulnerabilidade social vm se acentuando no mundo contemporneo, e entender a relao entre elas um grande desafio aos governos e sociedade civil. Crianas e jovens de classes populares esto
entre os grupos mais atingidos e so precrios os servios pblicos, as
condies de vida, as oportunidades de lazer e as perspectivas de mobilidade social a eles destinados, o que interfere sobre as formas de sociabilidade que costumam exercer, suas expectativas em relao ao futuro e ao
traado de projetos de vida.
Diante disso, torna-se imperioso propor alternativas alm do convvio
escolar que lhes oportunizem relacionar-se socialmente. A ao da Arte
Despertar tem como objetivo quebrar o ciclo perverso da vulnerabilidade
por meio de iniciativas em que possam se tornar protagonistas de mudanas, rejeitando a incerteza e a insegurana em que vivem, e buscando,
atravs da arte e de elementos da cultura, concretizar potencialidades
individuais e contribuir para a soluo de problemas de seu cotidiano de
forma criativa.
As propostas desenvolvidas na comunidade indicam que a arte pode ser
um dos caminhos possveis para a ampliao do contato com a cultura, a
valorizao da autoestima e o delineamento de projetos de vida.

Comunidades

O primeiro trabalho foi um desafio instigante,


provocou questionamentos e exigiu mudanas
frequentes para o atendimento ao pblico. No
entanto, possibilitou aprendizagens importantes e fortaleceu convices institucionais aperfeioadas em diferentes aes com as comunidades da zona sul da cidade de So Paulo.
Em projetos cujo pblico eram os jovens, o
protagonismo juvenil foi incrementado, investindo no desenvolvimento de projetos
para a vida pessoal e coletiva, traduzidos em
aes que pudessem contribuir para o delineamento de um percurso diferente e a imediata incorporao de interesses de pesquisas
relacionadas s artes e cultura, bem como
de atitudes, valores e comportamentos propcios obteno de uma ocupao saudvel e
educativa. Foi exitosa a pressuposio de que
quanto mais consistente fosse o projeto de futuro, tanto mais o jovem procuraria obter bom
desempenho nas atividades cotidianas imediatas, mais abrangente e crtica seria sua viso
a respeito da realidade e mais significativas se
tonariam as indicaes relacionadas aquisio de conhecimentos especficos, at mesmo
no mundo do trabalho.
Experincia geradora de aprendizagens e
transformadora do entorno social, foi projeto que envolveu ex-alunos de oficinas de artes
visuais da Arte Despertar. Nessa ao, estes

jovens tornaram-se referncia para outros da


mesma comunidade, empoderando-se por se
constiturem como monitores, guias e exemplos para os mais novos em situaes de sensibilizao artstica.
Ainda em comunidades, ocorreram aes de
formao de educadores de creche, tornandoos mais aptos a explorar as diversas linguagens
no contato com crianas de zero a seis anos.
Em uma das edies da oficina, a atividade
teve como ponto de partida a narrao de histrias e a cultura local. Embora dedicadas ao
trabalho com os pequenos, elas despertaram o
interesse dos educadores por pesquisa e aprofundamento de contedos ligados aos demais
habitantes da comunidade, contribuindo para
o resgate de suas prprias histrias e origens.
Um dos compromissos da Arte Despertar, ao
interagir com essas comunidades, ampliarlhes o capital social, favorecendo a insero
no mundo da cultura e da arte e possibilitando
que reconheam seu potencial, que aprendam
e desenvolvam hbitos de usufruir dos equipamentos culturais existentes no espao urbano.
Desse modo, a ao institucional promove a
incluso, d acesso a espaos e bens de lazer,
entretenimento e cultura, amplia a convivncia de crianas e jovens com a comunidade em
geral. Alm disso, investe na humanizao, na
insero sociocultural e na difuso de conhe-

110 I 111

cimento, com potencial de apontar projetos de futuro, pois as aprendizagens realizadas promovem a reflexo a respeito das alternativas de
mudana. Assim, em vez de pessoas habituadas ao estado atual das coisas, a Arte Despertar aposta na formao de cidados dispostos a se
envolverem a fundo em aes capazes de transformarem a sociedade
para melhor.
A cada encontro, em cada oficina, independentemente do lugar,
possvel desencadear o processo criador dos educandos e tambm
dos arte-educadores. Os encontros, ento, se tornam significativos,
ampliam o conhecimento de si e do mundo, e podem ter como culminncia uma exposio de trabalhos de artes visuais, a produo de
um livro de poemas, a narrao da histria do lugar ou a gravao
de um CD de msica.

No ambiente hospitalar, a arte sugerida como forma de atenuar as


agruras do cotidiano. Recorre a diferentes manifestaes expressivas
para favorecer que os sujeitos envolvidos expressem suas imagens internas e inconscientes atravs de vivncias com arte e cultura, o que
equivale a compreend-las como meio de se expressar, se comunicar
e criar, enfrentando de forma pr-ativa o sofrimento e as limitaes
impostas pela doena.
Ao recorrer s linguagens das artes, possvel resgatar o que h de potico e criativo em cada um, despertando habilidades, potencialidades e
sentidos muitas vezes esquecidos ou sombreados por momentos de dor
e de angstia individual. A organizao de ambientes favorveis, descontrados, aliada a momentos de relaxamento de todos os presentes
(pacientes, acompanhantes e profissionais da sade), propicia situaes
de protagonismo que contrastam com a passividade e a sujeio, frequentemente encontradas em hospitais.

Hospitais

Quando vocs chegaram, era uma


novidade a arte levada ao hospital.
Como tnhamos trabalhado muito
tempo em escola, tnhamos como
ideia que era s um fazer, um simples
pincel. Em termos de vida, houve em
minha mente uma divisria, antes e
depois de conhecer o trabalho da Arte
Despertar. Essa arte, desenvolvida
com os pacientes e acompanhantes,
mostrou que tinha objetivos,
planejamentos, profissionais que
fazem a diferena com a arte.
Hoje no conseguimos ver o GRAACC
sem a Arte Despertar, pois todos
esperam e gostam do trabalho;
para eles isso muito importante.
O paciente tem oportunidade de
conhecer a arte e a cultura com um
grupo especializado. Essas pessoas
que fazem a diferena. A Arte Despertar
faz a diferena no dia-a-dia do GRAACC!
DORA SAGGESE E PATRICIA PECORARO,
BRINQUEDOTECA, GRAACC

Na percepo de senso comum, hospitais so


lugares de vivncia fragmentada e desestimulante, que tendem a anular as subjetividades.
O investimento em atividades que possam
romper com isso importante para que os
sujeitos que por ali passam possam estabelecer relaes positivas. A linguagem da arte
favorece a expresso de emoes, sentimentos e pensamentos, valendo-se de um trabalho de humanizao como mola propulsora
para estreitar relaes, promover a confiana
entre pacientes e profissionais de sade, diminuir a dor, dialogar com familiares e visitantes,
alm de quebrar a rigidez e a relao hierrquica entre mdicos e internados.
A interveno artstica e cultural promovida
pelas aes da Arte Despertar pode criar situaes integradoras e instigantes, que abrem
caminhos para novas descobertas e outros traados nos objetivos de vida pessoal e coletiva
de todos os envolvidos, independentemente
das situaes-limite de vida que estejam enfrentando, seja como profissionais da sade,
pacientes ou acompanhantes.
Um dos aliados nessa transformao o carter ldico que, segundo o historiador Johan
Huizinga (2008), em seu Homo Ludens,
compartilha valores com a arte. Ao aproximar
arte ao ldico, a ao da Arte Despertar cria
uma rea de escape, oferecendo, atravs de

atividades pontuais e desinteressadas, oportunidade de dar expresso vida, valorizar a


identidade, resgatar a cultura de origem e criar
outro mundo possvel, saudvel e sensvel.
Nessa situao, como declara o pensador ingls Herbert Read (2001), a arte estimula fuga
do caos e fortalece um movimento de humanizao ordenado pelo ritmo da vida. Atravs do
ldico, a arte interrompe o cotidiano, suspende
por instantes a realidade angustiante e a substitui por outra, fascinante e envolvente. Este aspecto sugere a quebra de uma ordem estabelecida e, ao aceitar a proposta, o grupo/o indivduo ressignifica o ambiente, se evade para uma
esfera de atividades autnomas, normalmente
conservadas na memria depois de finalizadas.
Alm da capacidade de retirar o indivduo da
rotina hospitalar, as atividades promovidas pela
Arte Despertar tambm desafiam ao compartilhamento de emoes, provocando experincias sensveis. Os arte-educadores estimulam
os sentidos de todos os envolvidos, resgatam e
fortalecem traos da identidade cultural de origem, possibilitando-lhes vivenciar e perceber
sentimentos que podem se tornar poderosos
aliados na superao dos limites impostos pelas contingncias do cotidiano de um hospital.
Ao se vincularem por meio da arte, todos os
participantes iniciam um processo de troca de

112 I 113

resolver problemas, promovendo o aprender a fazer; e se valem da


arte como processo de conhecimento do mundo, de sua histria, sua
natureza, incentivando o aprender a conhecer.

repertrios em que, mutuamente, oferecem e absorvem conhecimentos


e afetos. Este processo, sem comeo, meio ou fim, est em constante
metamorfose, o que exige uma interveno planejada, orientao psicolgica e pedaggica dos arte-educadores e disponibilidade para socializarem repertrios de experincias dos seus acervos pessoais.

METODOLOGIA DE AO
O trabalho desenvolvido pela Arte Despertar nos hospitais procura levar arte e cultura para todos indiscriminadamente, articulando palavras,
imagens e sons. As atividades arte-educativas atuam como estimuladoras
do lado saudvel e criativo dos pacientes, favorecendo a expresso de
individualidades e ampliando sensibilidades. A experincia esttica instiga olhares, pensamentos individuais e coletivos, aprofundando formas
de ver, ouvir e sentir o mundo ao redor. Nesse contexto, arte e cultura
atuam como instrumentos mediadores do dilogo entre o ser humano e
a realidade apresentada.
As regras rgidas dos ambientes hospitalares muitas vezes impem algum
estranhamento interveno da Arte Despertar e, em vrias ocasies, foi
necessrio tempo at o entendimento da proposta. Entretanto, medida
que a ao se desenvolvia, seu efeito era percebido e a interao entre as
equipes se estreitava, ocasionando at mesmo atividades conjuntas ou
demanda por parte do profissional da sade de atendimento a pacientes
mais necessitados.
Ainda que tenham um sentido mais genrico, os quatro pilares da educao, presentes no relatrio de Jaques Delors, tambm so contemplados nas aes da Arte Despertar em hospitais, j que elas fortalecem o
indivduo e melhoram a autoestima, sendo, portanto, mobilizadoras do
aprender a ser; estabelecem um dilogo e transformam o ambiente
pela introduo de objetos pessoais, fotos, desenhos, que valorizam o
aprender a conviver; exercitam novas maneiras de ver, tocar, ouvir,

Tnhamos reunies. Eu indicava


textos, discutia. E ento a gente
discutia a teoria e depois fazia
uma transposio da teoria para as
possibilidades de prtica da Arte
Despertar, pensando na formao
daqueles que viriam trabalhar na
Associao e em uma fundamentao,
num perfil das atividades.
MARIA CHRISTINA DE SOUZA LIMA RIZZI

Ento na hora que a Arte


Despertar entra para ajudar e usa
a arte como instrumento, no
um instrumento s ldico, um
instrumento que serve para recriar
esse mundo que o indivduo perdeu.
MARCOS KISIL

medida que a Associao realiza suas aes, vai construindo uma metodologia decorrente da preocupao de assegurar que as prticas repercutam suas escolhas tericas e possam ser replicveis em diferentes espaos.
Nesse sentido, seja em comunidades ou em hospitais, h interesse em
se apropriar do que acontece no entorno para, ento, planejar atividades
que faam sentido para os diferentes sujeitos envolvidos e estejam apoiadas nos pressupostos tericos antes enumerados.
Esse percurso, organizado a partir da realidade definida pelos parceiros,
tem reflexo nos contedos e nas linguagens da arte abordadas nos projetos, orienta o planejamento das aes e das atividades arte-educativas
levadas a diferentes espaos e pblicos, por meio de atendimentos, sensibilizaes pontuais, oficinas e vivncias, capacitaes, cursos, palestras
ou visitas a instituies culturais.
Todo trabalho planejado, executado e avaliado pela equipe Arte Despertar, constituda, como j se disse, por arte-educadores, pedagogos e
psiclogos, com suporte administrativo.
A metodologia de interveno social que faz uso das linguagens da arte
desenvolvida pela Arte Despertar retoma a viso triangular apresentada
por Ana Mae Barbosa. Ela aborda o objeto ou ato artstico, explora a
compreenso do contexto histrico em que o objeto ou ato foi produzido e estimula o fazer artstico, por meio de experincias significativas,
ressignificando o lugar da arte na vida de cada um.

114 I 115

Comunidades

Relativamente ao fazer, as atividades prticas desenvolvidas, sejam elas


em artes visuais, teatro, msica ou literatura, capacitam para uma melhor
compreenso do objeto ou do ato artstico. Ao realizar diferentes etapas
da construo da arte, quem a vivencia passa a perceb-las como resultado de trabalho e no do gnio de um artista. A produo perde a aura
e revela proximidade com o indivduo que a concebe, possibilitando que
o fazer artstico represente um encontro com desejos, anseios e posturas
diante das coisas do mundo. Esta atividade traz em si uma forte carga
ldica, em que a capacidade de recriar o mundo infinita, especialmente
se for enriquecida com recursos tcnicos.
Quanto ao ler/apreciar, pressupe a interpretao especfica dos cdigos da msica, do teatro, da literatura e das imagens visuais, que tambm so formas de leitura do mundo, ligadas s habilidades de ver, julgar
e interpretar sentidos da arte e da cultura.
J ao proporcionar o conhecer/contextualizar/refletir a arte
como objeto scio-histrico, h estmulo para compreender materiais, meios e suportes diversificados em funo do uso expressivo
e da capacidade criadora de sujeitos para questionar as coisas do
mundo. Em outras palavras, um dilogo constante sobre a importncia da arte, e do papel que ela exerce na construo do conhecimento capaz de investir na formao de pessoas melhores, produtoras e consumidoras de bens culturais.
Embora as aes da Arte Despertar guardem unidade de princpios,
as estratgias e indicadores de avaliao diferem bastante conforme o
lugar da interveno, pois so determinadas de acordo com o pblico
destinatrio e o contexto de insero.

Quando voc acompanha a criana


do comeo do ano at o final, faz uma
diferena enorme, o desenvolvimento,
o desabrochar impressionante.
MARIA NADIR AZEVEDO DE MORAES

A metodologia que aprendi na Arte


Despertar adotada na minha
vida profissional, e uso a msica
como instrumento de ensino.
ANA MARTA OLIVEIRA DO NASCIMENTO

Em comunidades, os projetos consistem em uma opo educativa que


parte dos anseios da comunidade e se prope a favorecer a compreenso
da cultura, desenvolver aes de intervenes artsticas capazes de mobilizar para a reflexo e a ao sobre a realidade prxima, abrindo perspectivas para planejar o futuro. Em vista disso, a aprendizagem decorre
da capacidade de pensar e julgar dos que se envolvem no processo, desenvolvendo a autonomia, a disciplina e a criatividade pessoal e do grupo.
Em consequncia, o aprendido torna-se mais significativo, dinmico e
interessante, j que decorre da realizao de pesquisas, investigao, registro de dados, formulao e verificao de hipteses que transformam
quem aprende em sujeito de seu prprio conhecimento.
Nesse contexto, as oficinas de teatro so compostas de trs etapas
principais: jogos teatrais, processo de preparao e a apresentao
propriamente dita, todas sempre com trs momentos: aquecimento,
jogos e improvisao.
As oficinas de teatro iniciam com a proposio de jogos teatrais, que objetivam promover o conhecimento, a integrao e o respeito entre os participantes, despertar sua ateno e criatividade, alm de exercitar habilidades bsicas da linguagem, de forma ldica e dinmica. A segunda etapa
composta pelo processo de preparao, que inclui atividades de escolha,
criao, ensaios e montagem de pea ou cenas. A culminncia ocorre com
a terceira etapa, a apresentao, que corresponde ao ato teatral propriamente dito, mostrado comunidade e a outros pblicos preagendados.
Na estrutura da oficina os momentos de aquecimento, jogos e improvisao permitem uma apropriao gradativa do processo de desenvolvimento
da linguagem. Durante o aquecimento, destaca-se o desenvolvimento da
socializao e desinibio, favorecendo a integrao dos participantes e

116 I 117

A Fada e o Violeiro
Em dezembro eu estava na sala de espera do Hospital das Clnicas,
enquanto minha irm era submetida a um cateterismo. Eu estava cansada como
todos ali, o rosto das pessoas j apresentava marcas da espera, o humor exaltado.
Os mdicos faziam tudo para atender da melhor forma possvel, tambm estavam
cansados e, por mais que tentassem ser gentis no conseguiam satisfazer a todos,
tambm pareciam exaustos. Algumas pessoas mais impacientes reclamavam da
demora, do cansao, do calor, da fome, de tudo! O rosto fechado de cada um com
seus problemas. Nenhum sorriso naquele ambiente. L no fundo comecei a ouvir
uma msica, uma voz muito afinada, olhei para trs, pude ver aquela garota de um
metro e sessenta, olhos castanhos, cabelos curtos e encaracolados, acompanhada
por um violeiro dos olhos azuis como o cu, lembro que tocavam msicas natalinas.
Parecia mgica, as pessoas comearam a sorrir aliviadas, a pequena Fada foi
cantando Asa Branca, Quinem Jil e assim por diante. O Violeiro cantante
chamava todos para acompanh-los na cantoria. Aqueles olhos azuis iluminavam o
sorriso da Pequena, que usando um miniacordeom, cantava. Tocavam e cantavam
como crianas que brincam em um parque de diverses. O rosto das pessoas, o
ambiente, tudo estava iluminado. Os mdicos, os pacientes, os familiares, todos
cantarolando e sorrindo, como se o dia tivesse acabado de comear. Os dois saram
contentes e cantando como os anjos que acompanham as crianas, deixando em
cada rosto o sorriso. Levaram todo o cansao e apatia do ambiente. No satisfeita,
corri at eles, perguntei seus nomes e peguei um folheto, precisava de uma prova
de que realmente no estava sonhando, de que existem pessoas como aqueles
anjos, como a Fada e o Violeiro!
Espero que este trabalho continue sempre. Parabns pequena Fada, parabns
Violeiro. Vocs realmente conseguiram despertar o melhor do ser humano!
LOUISEANNE RGO BALDEZ, ACOMPANHANTE NO INCOR

118 I 119

preparando-os para a atividade a ser desenvolvida. Os jogos e improvisaes so momentos de


criao de pantomimas individuais e coletivas,
faz-de-conta e jogos dramticos que pressupem oportunidades de autoconhecimento e
de fortalecimento do grupo, desenvolvimento
de confiana em si e nos outros.
A partir da escolha de tema e texto, o grupo
elabora as cenas, explora e descobre detalhes
tcnicos, introduz elementos de cenrio e adereos, confeccionados por eles ou adequados
ao espao e aos recursos disponveis, tais como
iluminao, pano de boca, sonoplastia, etc.
Nas aes continuadas, a cada incio de ano,
muitos participantes novos aparecem, o que
pode alterar as caractersticas do ano anterior, implicando em adequaes e reformulaes, uma vez que a seleo das atividades
pelo arte-educador pressupe conhecimento
dos interesses e necessidades de cada grupo,
considerando, especialmente, a faixa etria.
O surgimento de novos integrantes permite
a indicao de alguns monitores voluntrios,
escolhidos entre os participantes mais antigos, que se tornam mediadores em aes de
socializao e desinibio.
Todo o processo desenvolvido com o interesse de oferecer oportunidades de prazer e
critrios de qualidade e variedade artstica, o que,

conforme j foi salientado, favorece o desenvolvimento da sensibilidade e maior intimidade


com a arte, aspecto relacionado positivamente
com a formao de si e com a possibilidade de
melhor se relacionar com o entorno social e interagir com espaos culturais.
Relativamente s artes visuais, em salasambiente ou no, as atividades desenvolvidas proporcionam contato com a linguagem
plstica pela manipulao de diferentes materiais, como pigmentos naturais pesquisados
pelos grupos, alm de tintas guache, plstica,
nanquim e aquarela, lpis grafite e de cor, giz
de cera e crayon, argila e massinha. A utilizao desses materiais possibilita a descoberta
e o reconhecimento de si como produtor e
construtor de sentidos e histrias no grupo.
Cada espao de atuao apresenta desafios
especficos equipe da Arte Despertar e demanda encaminhamentos distintos, considerando a continuidade ou incio da relao e
do contedo, a manuteno ou construo
do grupo e do vnculo com os arte-educadores e com o trabalho, o respeito ao espao e
ao material, bem como a manuteno da assiduidade e do compromisso com a atividade. Ao finalizar cada projeto, realiza-se uma
exposio para a comunidade.

Para oportunizar contato com a literatura,


a contao de histrias tambm um recurso trabalhado nas oficinas da Arte Despertar e se destaca por seu aspecto ldico.
Escolhidas a partir de um tema, de acordo
com a faixa etria e o interesse do grupo, as
histrias contadas motivam para a leitura e
estimulam a imaginao.
A narrao oral valoriza a literatura como patrimnio da humanidade, alm de estimular a
memria, a identidade, a imaginao e o conhecimento das culturas locais, pois forma de
expresso artstica de pessoas, comunidades e
povos, ainda na atualidade.
Alm de desenvolvimento fsico-motor, devido manipulao do corpo e da voz, a contao de histrias pode favorecer a formao
integral de um grupo, pois atua em vrias reas: em nvel intelectual, desperta interesse pela
leitura e estimula a imaginao; no aspecto comunicativo, provoca produo de sentidos e
propicia o dilogo ou o reconto e proporciona a interao sociocultural, pois estreita laos
sociais e forma comunidades de leitura. Ao
promover a formao de contadores de histrias, capacita-os para a percepo e uso dos
valores do texto, para as mltiplas possibilidades de abordagem que oferecem, bem como
para o valor da memria afetiva que forma os
acervos pessoais.

As histrias contadas tambm so construtoras de conhecimento social sobre a realidade


e produzem valores e conceitos. Embora se
apoiem na fico, podem investigar a realidade social, problematiz-la, colaborando
para a construo de uma conscincia tica
do ser humano.
Nas aes da Arte Despertar, os encontros
de contao de histrias so precedidos por
uma atividade de aquecimento ou jogo de
ateno. A narrao acontece com ou sem
o apoio de livros ou objetos de cena. Os ouvintes se envolvem a partir do enredo e so
chamados a participar das aventuras e suspenses relatados, seja pelo questionamento
a respeito das descobertas e dos exemplos
de vida que as personagens transmitem, os
mitos e arqutipos de que tratam, ou as
questes internas (identidade, autoestima,
conceitos) e externas (famlia, comunidade,
sociedade, amizade, enfim, relacionamentos
em geral) que tematizam os textos.
Os encontros costumam ser planejados em
trs etapas: absoro, reflexo e comunicao, que no aparecem necessariamente nesta ordem. Na etapa de absoro, so criadas
condies para ouvir a histria e penetrar no
seu universo imaginrio; na de reflexo, so
oferecidos desafios que favorecem comentrios sobre a trama da histria, a atribuio de

120 I 121

sentidos e a problematizao de suas questes


mais relevantes; na de comunicao, so apresentadas possibilidades de expresso de pensamentos e sentimentos a propsito do que foi
contado, por meio da realizao de atividades
plsticas, escritas ou corporais, produzidas individual ou coletivamente.
Fortalecer a prpria histria e a identificao com as razes culturais , tambm, uma
forma de contribuir para a preservao da
memria da fundao musical do pas. As
oficinas de msica desenvolvem um trabalho de resgate da contribuio afro-brasileira,
da msica regional e folclrica, alm de desafiarem construo de instrumentos e explorarem a percusso corporal.
A msica capaz de desenvolver competncias
relacionadas ao conhecimento do patrimnio
cultural sonoro do entorno e a autonomia
para interferir sobre ele, criando ou atribuindo novos sentidos ao conhecido com base
em experincias individuais ou coletivas. Tais
experimentaes habilitam a apreciar msica
com senso crtico e a execut-la, no caso das
oficinas, atravs de instrumentos de percusso
alternativos ou de entoao de canes.
Como, nas aes realizadas, os pblicos preferenciais so crianas e jovens, qualquer linguagem de arte utilizada tem o cuidado de

favorecer o desenvolvimento humano. Assim,


as oficinas viabilizam construir a noo de
grupo e de vnculo nas relaes entre os participantes e os arte-educadores; promovem a
participao e o envolvimento com a atividade,
expressos no compromisso de presena e na
responsabilidade pela manuteno dos combinados; desenvolvem atitudes e valores positivos, embasadores de relaes entre as pessoas
e o ambiente; proporcionam alternativas artsticas motivadoras, que inserem os grupos ativamente em seu meio e desenvolvem atitudes
responsveis, que os habilita a resgatar, registrar e ressignificar a prpria histria cultural.
Assim, as oficinas proporcionam o desenvolvimento de potencialidades expressivas,
tais como:

Hospitais

As aes nos hospitais sempre envolvem duplas de arte-educadores, preferentemente de diferentes linguagens, o que amplia o horizonte de expectativas e alarga o leque de conhecimentos dos participantes. O planejamento tem a sustentao de profissionais das reas de pedagogia e
psicologia, fundamentais na estruturao e fortalecimento de vnculos
com os parceiros e com o grupo atendido, assim como em todos os demais encaminhamentos necessrios ao xito da ao.

Eles tm uma profissionalizao e


contedo, porque aqui no qualquer
um que pode contar uma histria para
as crianas. Ento preciso entender
o mundo delas, e so os profissionais
que tm uma metodologia.

interesse pelas artes como forma de conhecimento, interpretao e expresso do ser humano sobre si e sobre o mundo que o cerca;

CLIA YUKIKO OSATO

criao de um espao de troca de informao e cultura diferenciada e ldica;

Gostaria de parabeniz-los pelo seu


trabalho maravilhoso. Meu pai est na
recuperao de uma cirurgia no InCor e
o projeto de vocs ajudou-o a ter uma
atividade que o animou e emocionou.
Muito obrigado e continuem com esse
trabalho maravilhoso.

busca de expresso das vivncias, contedos


e temticas prprias dos grupos;
contato e pesquisa de diferentes procedimentos artsticos, para ampliao de repertrio e estmulo da criatividade.

No ambiente hospitalar, o envolvimento dos arte-educadores com os


pacientes ocorre aps conversa com a chefia da enfermagem, para certificao do estado clnico e das necessidades especficas existentes.

CLOVIS, FILHO DE PACIENTE

Ainda que sejam os principais propositores, durante a implementao do


que foi planejado, os arte-educadores priorizam a observao, isto , silenciam e escutam com sutileza o outro. Assim, tornam-se aptos a ver o todo,
o coletivo, e as partes, os indivduos, e tambm a registrar o essencial, produzindo conhecimento a partir da experincia vivida, como diz Madalena
Freire. Esses elementos, inerentes ao ato de observar, constroem formas
de respeitar a dor do outro ou de partilhar de suas alegrias e conquistas.
A observao permeada por questes como: quem o destinatrio
da ao? De onde vem? Que histrias traz consigo? Qual sua herana cultural? um participante ativo? Est s? Tem acompanhante?
Resiste ao convite? Acolhe o que lhe proposto? Permanece calado? Consegue estabelecer algum dilogo, entrando em sintonia com
os demais? A resposta a essas perguntas, sempre presentes na rotina
dos arte-educadores, possibilita traar um panorama geral do efeito da
arte em espaos de sade.
Outro aspecto caracterstico da ao em hospitais a formulao de
atividades pontuais, realizadas em espaos nem sempre favorveis a
intervenes em arte e que precisam respeitar o ritmo de cada pacien-

122 I 123

te. Esse aspecto especialmente relevante em interaes com crianas,


pois elas cobram a exposio de seus trabalhos de arte, a concluso
das msicas que aprendem a cantar, a finalizao das histrias que
lhes so contadas.
O planejamento semestral construdo com a presena de toda a equipe,
quando so definidos os temas a serem abordados, os objetivos, contedos e estratgias possveis para cada espao, faixa etria, situao fsica
dos participantes, bem como as formas de avaliao. A equipe enriquece
o documento com acrscimos pertinentes a cada linguagem da arte.
Cada espao de trabalho no hospital requer especificidades. Nas UTIs,
por exemplo, podem ser realizadas atividades literrias (histrias, poesias, rimas, quadrinhas, parlendas, causos, etc.), atividades com a linguagem musical cujo repertrio escolhido procure contemplar o gosto
de cada paciente (jogos musicais, canes, canto e escuta, uso de pequenos instrumentos como ovinhos, maracas, guizos) e atividades em
artes visuais, pela proposio de imagens para apreciao e explorao
do contexto do que foi apresentado.
Nas salas de quimioterapia, quartos e unidades de transplante de medula ssea, os procedimentos e atividades so muito semelhantes, pois
os pacientes geralmente se encontram acamados ou em procedimentos limitadores da participao. Eles exigem uma ateno mais individualizada e tranquila, voltada para a apreciao de imagens, audio
de msicas, poesias, histrias que explorem jogos de palavras, ritmos,
sons. O arte-educador que trabalha neste contexto precisa estar atento s reaes dos pacientes, as quais determinam a mudana, a continuidade ou a finalizao da atividade.

Ao ser convidada a desenvolver um


trabalho no IOP/GRAACC, junto Arte
Despertar, fiquei entusiasmada, esse
sempre foi um sonho meu. O projeto
que desenvolvi para essa oportunidade
consiste em levar a possibilidade das
crianas se transportarem atravs
da imaginao a lugares encantados,
permeados de cores, sabores, cheiros.
(...) Parti para a sala de quimioterapia,
utilizava como apoio cnico uma saia
de fitas e um sino. Entrei naquela sala
tocando sino e fui surpreendida pelo
barulho das argolas se fechando, das
crianas cobrindo-se com seus lenis
azuis, a televiso continuava ligada,
as enfermeiras fazendo seus deveres
me olhavam com o olhar de quem
diz voluntrios. Contei a histria que
tinha preparado e s vezes me peguei
prestando ateno numa agulha
furando o brao de uma criana, me
esquecendo do que estava fazendo
e algumas vezes fui para a outra sala
sentindo um n que apertava com fora
meu pescoo. Sa de l com muitas
perguntas que o tempo e pessoas
experientes responderam. As questes
foram acalmando dentro de mim e
ultrapassei assim esse desafio bsico.

Nos espaos do ambulatrio, que costumam ter um pblico de diferentes procedncias aguardando atendimento, as linguagens musical e
literria so as mais adequadas, desde que apresentem repertrio compatvel com a procedncia do grupo. O mesmo acontece no saguo
de entrada dos hospitais e em outros locais com grande trnsito, que
requerem propostas coletivas.
As aes da Arte Despertar tambm intervm junto aos profissionais da sade, possibilitando que conheam, vivenciem, apreciem
e contextualizem a arte. Esses profissionais experimentam alternativas dinmicas e sensveis que minimizam o efeito estressante do
ambiente em que atuam e exercitam um novo olhar sobre o espao
cotidiano de trabalho.
As intervenes realizadas pela Arte Despertar em hospitais possuem
o objetivo de socializar diferentes culturas com pacientes, familiares
e profissionais da sade pelo resgate e valorizao de razes culturais
e pela ampliao de horizontes e repertrios artsticos. Desse modo,
elas contribuem para disseminar a humanizao hospitalar, otimizando potencialidades e aspectos saudveis dos beneficirios envolvidos
com a Associao.

CONTEDOS DA MEDIAO

Para a operacionalizao das atividades da Arte Despertar, alguns tpicos


orientam os mediadores em suas intervenes arte-educativas, sempre
adequados s particularidades de cada espao ou pblico.
O objetivo da escolha oportunizar planejamento e melhor aproveitamento das intervenes que realizam, sempre fundamentadas pelos pressupostos tericos anteriormente referidos.

URGA MAIRA CARDOSO, ARTE-EDUCADORA

124 I 125

Quanto aos contedos, as oficinas costumam abordar:

Comunidades

O hospital parece um lugar para a morte,


mas na verdade para a vida. E vocs
trazem vida!

linguagem artstica artes cnicas: teatro; conscincia e movimento corporal; organizao espacial; exerccio do imaginrio; jogos e brincadeiras corporais; comunicao verbal e no verbal; desinibio;

PACIENTE, SANTA CASA DE SO PAULO

linguagem artstica artes visuais: exposies; pintura; gravura; escultura; desenho; artes plsticas;

estranho comear este relatrio


pensando que no estarei mais
com vocs o ano que vem. Mas assim
so os processos da vida, sempre
em transformao.

linguagem artstica literatura: contao de histrias; roda de conversa;


causos; poesias; resgate e criao de histrias; lendas; mitos;
linguagem artstica msica: conhecimento; aprofundamento e experimentao de tcnicas e recursos da msica percussiva; escuta; exerccios de respirao e relaxamento; pulsao e ritmo; canto espontneo;
construo de instrumentos; jogos e brincadeiras cantadas;
desenvolvimento humano e questes sociais: cidadania; incluso social; valores; problemas comunitrios; violncia; direitos e deveres;
diversidade; identidade; alteridade; empreendedorismo; protagonismo;
autonomia; relacionamentos; comportamento; postura; tica; responsabilidade social; trabalho em equipe;
arte e cultura: cultura popular (em especial a brasileira); razes; identidade; manifestaes populares; folclore;
cultura geral: histria da arte; alfabetizao cultural e visual; diversidade cultural do Brasil por origem, movimentao, papis e gnero;
ao cultural em diferentes espaos (museus, bibliotecas, casas de
cultura, teatros, espaos comunitrios/expositivos); processo criador;
apreciao esttica.

Ele aprendeu mais, se desenvolveu


muito nos trabalhos escolares, ficou
muito ativo, uma pessoa obediente e
muito organizadora, aprendeu muito
e est aprendendo mais a cada dia.
Obrigada pelo projeto Arte Despertar.
Valeu pelo meu filho! Agradeo o
ensino que vocs do.
Gostaria que os cursos continuassem,
porque os alunos esto sendo mais
abertos com a famlia, os amigos, e
mais responsveis. Os cursos no
so s aprendizagem, mas sim teoria
psicolgica para a mente.
PAIS DE PARTICIPANTES

Desde que comecei a atuar nos


hospitais, vivi muitas coisas, entre
superao de alguns medos,
descobertas, conquistas, algumas
turbulncias. No incio dvidas: como
me comportar em um ambiente onde as
pessoas esto doentes? Como no ser
invasiva? Como trabalhar a arte? Como
encarar a possibilidade da morte dos
pacientes? Enfim, com o tempo estas
dvidas foram sendo solucionadas, e
eu, aos poucos, fui amadurecendo.
(...) O trabalho na Arte Despertar
mudou uma srie de conceitos
que eu tinha sobre as pessoas,
relacionamentos, vida, arte e morte.

Hospitais

Quanto aos contedos, as oficinas costumam abordar:

linguagem artstica msica: universo musical; escuta; exerccios


de respirao e relaxamento; pulsao; ritmos; canto espontneo;
construo de instrumentos; jogos e brincadeiras cantadas;
sequncias sonoras; resgate musical, referendado na identidade
do paciente; conhecimento da histria e perodos das msicas
abordadas; audio de obras musicais no conhecidas, com
o intuito de enriquecer repertrio;
linguagem artstica literatura: roda de conversa; contao de histrias;
causos; poesias; rimas; parlendas; trava-lnguas; resgate e criao de
histrias; mitos; lendas;
linguagem artstica artes visuais: tcnicas; materiais; recursos;
expresso e produo artstica; resultados e efeitos; conhecimento
de fases, movimentos e artistas; pintura; gravura; fotografia; cartonagem; recorte;
arte e cultura: cultura popular (em especial a brasileira); razes;
identidade; manifestaes populares; folclore;
cultura geral: apreciao e fruio de obras de arte; alfabetizao
cultural e visual; diversidade cultural do Brasil por origem, movimentao, papis e gnero; ao cultural em diferentes espaos (museus,
teatros); processo criador; apreciao esttica.

PAULA GALASSO, ARTE-EDUCADORA

126 I 127

Relatrio de arte
Ao iniciar o curso de Artes, no acreditava que o mesmo pudesse ajudarme a melhorar minha prtica cotidiana enquanto educador.
Foi difcil compreender de que forma as diversas abordagens artsticas ali
tratadas poderiam subsidiar meu trabalho como educador, com crianas
de 6 a 15 anos, com expectativas e interesses bastante diferenciados.
medida que fui me apropriando dos conceitos e abordagens, comecei a estabelecer
relaes entre a prtica educativa, as diferenas individuais e a importncia
da expresso artstica para o desenvolvimento da criatividade humana.
Considerando-se que a arte est muito presente no cotidiano, embora
nem sempre seja percebida, um bom exemplo quando ao acordarmos
olhamos no espelho e, utilizando os padres com os quais nos identificamos,
elaboramos nosso desenho para iniciar o dia, ou quando observamos uma
obra de arte desenvolvemos nossa sensibilidade ao atentarmos para o
sentimento que o artista expressa atravs das cores, sombras, luz, etc.
Sei que preciso aprender muito ainda sobre a importncia da arte. No entanto,
gostaria de deixar registrado que o curso da Arte Despertar trouxe-me contribuies
valiosas medida que fui aplicando os conhecimentos adquiridos em minha prtica,
podendo observar que apesar das expectativas e interesses diferenciados para cada
faixa etria, as expresses e criaes produzidas pelos educandos favoreceram
no s o desenvolvimento da criatividade, como tambm possibilitaram um melhor
relacionamento entre eles, os quais, mais tolerantes e sensveis, passaram a
observar a arte sob um outro olhar, agora pautado no respeito pelo diferente.
PEDRO JOO DA SILVA, ASSOCIAO SANTO AGOSTINHO

128 I 129

AES PARA PROMOVER DIFERENA


NOS ESPAOS DE ATUAO

Numa sociedade de informaes e conhecimentos compartilhados, cujas


oportunidades de aprendizado no se encontram mais restritas ao ensino
formal, impossvel descuidar do carter educativo de iniciativas no
vinculadas escola, pois tambm elas podem ser capazes de fomentar
a aquisio de habilidades no plano das sociabilidades, da ampliao do
repertrio cultural, da participao na vida pblica, da fluncia comunicativa e do domnio de outras linguagens, formando sujeitos competentes
para interagir com os outros.
A articulao de saberes entre reas que relacionam teoria e prtica favorece a construo de uma equipe integrada que procura desenvolver atividades por meio das diferentes linguagens da arte. Tambm a permanente
reflexo sobre as atividades realizadas, a explorao das potencialidades
de cada rea e sua contribuio para os objetivos gerais da Associao
vm tornando a capacidade de percepo e escuta mais aguada, colaborando para solidificar uma metodologia prpria de ao.

COORDENAO PEDAGGIGA

Algum s se torna
marceneiro tornandose sensvel aos signos
da madeira e mdico
tornando-se sensvel
aos signos da doena
GILLES DELEUZE

Certa vez, durante uma atividade, a


coordenadora pedaggica me disse:
Para tudo tem uma soluo criativa,
e me mostrou o quanto importante
observar e escutar. Levo isso comigo at
hoje. Aprendi a ser mais perseverante e
a acreditar que sou capaz.
CARLA BATISTA ALVES

A coordenao pedaggica acompanha e observa a atuao dos demais


profissionais, orientando-os a respeito das aes a serem implementadas
nos diferentes espaos, com vistas a favorecer as interaes e fortalecer
vnculos com os parceiros. Ela tambm acompanha o planejamento e
regula as aes para promover a construo de sentidos e aprendizagens
que apontem para a compreenso de conceitos, processos e valores que
interessem estimular.
Ao pretender assegurar oportunidades de formar para a vida, a coordenao pedaggica observa a realidade como ponto de partida da experincia
a ser vivenciada.
Qualquer situao educativa complexa, permeada por conflitos de
valores e perspectivas que demandam um trabalho integrado e inte-

130 I 131

grador, com clareza de objetivos e propsitos e com um espao de autonomia profissional. Por isso, no exerccio de sua funo, a coordenao
pedaggica produz a articulao crtica entre os arte-educadores e seu
contexto de atuao, entre os pressupostos tericos e a prtica, investindo em um processo, ao mesmo tempo, formativo, emancipador, crtico
e comprometido, como j se viu anteriormente, ao caracterizar os arteeducadores como mediadores da ao.
Nesse sentido, cabe coordenao pedaggica organizar espaos, tempos e processos que considerem que as prticas precisam corresponder
aos pressupostos tericos que as organizam e que esto em constante
processo de redirecionamento, com vistas a se assumirem em sua responsabilidade social e crtica.
Em vista disso, a coordenao pedaggica, com os demais participantes da equipe, seleciona, organiza, analisa criticamente e observa a possibilidade de reconstruo de valores, conhecimentos, crenas e hbitos
apreciados pelo pblico beneficiado pela ao da Arte Despertar, atravs
de reunies de trabalho coletivo. Juntos, todos procuram viabilizar que,
apoiados em vivncias anteriores, os beneficirios se envolvam em situaes que ampliem seus horizontes de expectativas e interesses, proporcionando outras experincias, avanos cognitivos e o estabelecimento de
novas relaes com o contexto.
Ao problematizar e agregar conhecimento tcnico aos procedimentos das aes planejadas em equipe, a coordenao pedaggica investe na possibilidade de promover aprendizagens em que ao e
expresso mostrem o que os sujeitos envolvidos no processo sentem, pensam e sabem, de modo a poderem ampliar a percepo de
si e do mundo.

ASSESSORIA PSICOLGICA

E a as crianas se sentiram muito


confiantes, elas contavam histrias,
as dificuldades, os acontecimentos,
tanto que depois mudamos o tipo de
orientao, superviso, e comeamos
um trabalho muito forte com os
professores, de apoio psicolgico,
porque era muito difcil. Como lidar
com certas questes?
LGIA CORTEZ

O suporte psicolgico da Arte Despertar contribui com aspectos relacionados ao ambiente, aos arte-educadores e, indiretamente, ao pblico a
quem se destinam as aes e ao contexto social e cultural.
A assessoria psicolgica atua como facilitadora e mediadora nos trabalhos da equipe de arte-educadores, fornecendo suporte psicossocial
frente s questes provenientes do ambiente de trabalho e das relaes
estabelecidas com seus beneficirios, tanto no hospital, com pacientes,
acompanhantes e profissionais da sade, quanto na comunidade, com
crianas, adolescentes e jovens. Ela cria possibilidades para que todos
percebam seus potenciais e suas limitaes e fortaleam seus relacionamentos interpessoais.
Uma leitura do espao a partir do olhar da psicologia procura compreender as situaes vivenciadas e fornecer dados relacionados ao perfil
do pblico a ser trabalhado. Da mesma forma, contribui na orientao
dos arte-educadores, para a interao com o pblico atendido e adequao das atividades.
Nos hospitais, aes simples, como chamar o paciente pelo nome, conhecer sua identidade e nvel sociocultural, podem assegurar respeito
identidade e histria pessoal de quem, devido internao, abandona a
rotina e papis sociais.
Tambm a escolha vocabular, adotando uma linguagem simples e acessvel, pode ser sinalizadora, na perspectiva de pacientes e familiares, da
disponibilidade para a interao, colocando todos mais vontade para
exporem medos, dvidas e questionamentos.
J nas comunidades, a assessoria psicolgica pode abrir espao para a
discusso de questes como violncia domstica, agressividade e dificuldades comportamentais.

132 I 133

MEDIAO ESPECIALIZADA

Aes de desenvolvimento pessoal e social devem levar em conta o que


est presente no cotidiano e ser trabalhadas pelo vnculo, pela confiana
estabelecida e pelo compromisso assumido por todos, aspectos viabilizados pela ao especializada da assessoria psicolgica.

Eu falava para os profissionais: olha,


um compromisso, no pode faltar
por nada. Porque a criana vai esperar,
e essa criana que j foi vrias
vezes abandonada precisa daquele
compromisso que foi firmado.

Cabe, tambm, psicologia, a flexibilidade, de acordo com a especificidade de cada projeto, a compreenso das caractersticas, dificuldades e potencialidades dos diferentes pblicos atendidos, respeitando os aspectos
psicossociais para a seleo e adequao dos contedos de acordo com
as necessidades apresentadas.

LGIA CORTEZ
Estas assessorias, formadas por profissionais de artes visuais, msica,
teatro e literatura, so responsveis pela referncia, estudo, pesquisa,
contedo, e repertrio da Arte Despertar. Elas disponibilizam acompanhamento e suporte tcnico, orientando os arte-educadores por meio de
encontros de assessoria e formao continuada.
Segundo depoimento de Stela Barbieri: Ns tnhamos reunies onde
aprendamos muito umas com as outras. Na poca, a Snia Silva era assessora de msica, a Lgia Cortez, de teatro, Maria Helena da Cruz Sponton, de artes plsticas, e eu de literatura. A reflexo do grupo era muito
potente. Coordenada pela Regina, a equipe era vigorosa, era um dilogo
comprometido com o trabalho realizado, discutamos as questes conceituais a partir da experincia vivida e dos desafios que se apresentavam
nos vrios contextos dos locais onde trabalhvamos. Para fazer a arte
acontecer, esbarrvamos em muitos pontos das outras instituies que
nada tinham a ver com a arte, mas que precisavam ser resolvidos para
no atropelar os processos delicados e sensveis que ocorriam nos encontros. Aprendi muito com o compromisso que cada pessoa tinha com
o trabalho. Acredito e espero que eu tenha deixado ali meu encanto pelo
universo cultural das vrias etnias.

ASSESSORIA PARA LINGUAGENS ARTSTICAS


Com o final das assessorias e a
formao da equipe de capacitao,
voltei a me sentir motivada. muito
bom poder estar com um grupo to
criativo, em que as ideias surgem
abundantes e as afinidades vo se
consolidando. Sinto com alegria que
podemos produzir grandes obras de
arte. Novos e velhos projetos, outras
perspectivas, nosso livro. (...) Estamos
afinando nossos instrumentos. (...)
Viver afinar um instrumento.
De dentro pra fora, de fora pra dentro
(Walter Franco)
ALCITA COELHO, ASSESSORA

E a criana sente muito a troca do


arte-educador, ento essa constncia,
essa perseverana de trabalhar
com os mesmos profissionais
foi um ponto muito positivo.
JOS FERRAZ FERREIRA FILHO

Os arte-educadores da Associao, que abrangem diferentes linguagens


da arte - artes visuais, literatura, msica e teatro - desenvolvem e executam, de forma participativa, uma metodologia centrada na construo
de saberes sobre arte e elementos da cultura, por meio de prticas e
reflexes. Em interao com a coordenao pedaggica, utilizam instrumentos metodolgicos caractersticos da ao educativa, tais como
planejamento, observao, registro, reflexo e avaliao das prticas
desenvolvidas, de forma a poderem continuamente realimentar e qualificar seu fazer. Nesse mbito, vale ressaltar o esforo de interao
entre as linguagens, o que fortalece o grupo e os conceitos estruturais
das linguagens da arte que constituem a prtica cotidiana, seja nos hospitais ou nas comunidades, ampliando o horizonte de experincias de
todos os envolvidos.
Ao se colocarem como mediadores entre a arte e os destinatrios, os
arte-educadores tm o compromisso de perceber suas necessidades e interceder para assegurar equilbrio, considerando as condies de interao e aprofundando cada descoberta, de forma a atribuir sentido arte
e valorizar a histria pregressa de cada um. Este fato colabora para o
enfrentamento da situao presente e pode favorecer o planejamento do
futuro dos envolvidos nas atividades.
Nesse sentido, compete a eles fazerem uma seleo adequada dos contedos, tendo por base a faixa etria e o contexto em que esto inseridos
seus destinatrios, considerando as variveis decorrentes da realidade que
cada espao impe.
Desse modo, a ao dos mediadores potencializa oportunidades de incorporao de percepes, interpretaes individuais, informaes, conhecimentos, relaes com o mundo, favorecendo a construo de um
todo articulado e significante, que liga o conhecimento tornado til ao
fluxo dinmico da vida.

134 I 135

A forma de associao com parceiros, a sistemtica e as rotinas de atuao adotadas pela Arte Despertar so caracterizadoras da prxis institucional e elementos que promovem o conhecimento da organizao e de
seu funcionamento.

SISTEMATIZAO DE PROJETOS,
ROTINAS DE ATUAO E AVALIAO

A parceria pode ser entendida como um compartilhamento de responsabilidades para alcanar um objetivo comum. Ela caracterizada
por respeito mtuo e disposio para negociar, o que implica repartir informaes, responsabilidades, habilidades, tomada de decises e
prestao de contas.

Parcerias

Antes de firmarem compromisso, as entidades parceiras discutem a


proposta de ao coletivamente, avaliam a disponibilidade para realizao do planejado e asseguram a destinao de espao fsico para
que ocorram.

Sistematizao

As aes da Arte Despertar se concretizam mediante a construo de


parcerias com instituies identificadas com os objetivos e a misso institucional. Para que se realizem, so necessrias algumas condies:

disponibilizao de espao fsico - desde que comeou a se estruturar


institucionalmente, a Arte Despertar optou por estar onde se encontram seus destinatrios preferenciais e se props a construir conhecimentos e alternativas diferenciadas a partir do lugar dessas pessoas.
Assim, suas aes acontecem sempre em hospitais ou em espaos
das comunidades em que atua;
compartilhamento do mesmo compromisso tico - detentora de uma
metodologia prpria e a instituio que busca recursos e assegura uma
equipe e materiais para as aes que executa, a Arte Despertar sempre
se associa a instituies que sejam sensveis ao interesse de promover
aes que dignifiquem o ser humano;
valorizao de iniciativas que tragam para as relaes cotidianas maior
familiaridade com a arte e a cultura, vistas como questes
de sensibilidade e de cidadania.

Em reunio observei a integrao da


equipe, o respeito que cada um tem pelo
trabalho do outro, a escuta, a entrega
e integridade. Fiquei impressionada
com o envolvimento da equipe de
coordenao e suporte com o trabalho.
Ainda me sinto chegando e conhecendo.
Tenho tentado fazer isso com cuidado,
respeito e delicadeza que o trabalho
merece e necessita. Sinto que encerro
o semestre com a certeza de que estou
realizando uma ao que me alimenta,
comove, instiga, me faz crescer e me d
muita alegria.
CLIA GOMES CHAVES, ARTE-EDUCADORA

Em todos os projetos, aspectos como o ambiente, o pblico, o contexto social e cultural, suas caractersticas e necessidades especficas
so prioritrios, desde o planejamento at o balano final. A pesquisa,
a anlise, a compreenso e a avaliao desses itens so realizadas sistematicamente por toda a equipe, reunindo saberes das vrias reas.
As aes desenvolvidas pela Arte Despertar decorrem de um fazer
coletivo, pautado por uma concepo arte-educativa organizada
para transformar as realidades em que atuam. Para isso, constituda por profissionais com formao especfica e experincia, e possui
uma organizao administrativa que est a servio dos objetivos que
quer realizar.
Seus projetos esto atentos a critrios pedaggicos que favorecem as
aprendizagens, oferecem assistncia didtico-pedaggica constante
aos arte-educadores, assegurando a realizao de reunies, espao
para a discusso sobre questes de interesse coletivo, troca de experincias, estudo sobre temas que melhorem a qualidade do trabalho
e articulem as diferentes linguagens da arte, de modo a favorecer o
desenvolvimento de aes.
Os projetos envolvem parceiros definidos, equipes diferenciadas e
um plano de ao compartilhado. Estruturam-se de modo a possibilitar a realizao dos seguintes instrumentos: plano de ao, relatos
semanais, planejamento semestral, avaliao processual e relatrios
semestrais e anuais.

136 I 137

Planejamento anual
o planejamento de todas as aes necessrias para o desenvolvimento
dos projetos a serem realizados no ano. o momento para identificar e
relacionar as prioridades de cada projeto e suas relaes com a instituio
parceira, com o pblico a ser atendido e as atividades a serem desenvolvidas, objetivando mais qualidade e eficincia nos resultados.

No decorrer dos anos, algumas


vezes, eu fui chamada para conversar
com os arte-educadores, nesses
encontros que eles sempre faziam,
ou na abertura de ano de trabalho, do
semestre, ou fechamento.

A pormenorizao do plano colaborativa, envolve equipe executora e


coordenaes administrativa e pedaggica e assessoria psicolgica.

MARIA CHRISTINA DE SOUZA LIMA RIZZI

Aes culturais
So aes pontuais desenvolvidas pela equipe tcnica, com o propsito de apresentar a
metodologia, difundir e divulgar o trabalho
da Arte Despertar para diversos pblicos,
em momentos pertinentes aos objetivos da
Associao.

Planejamento semestral
Realizado em equipe pelos arte-educadores, coordenao pedaggica
e assessoria psicolgica, busca discutir contedos e objetivos, organizar
e estruturar as atividades arte-educativas e administrar a progresso do
planejamento para o semestre.
Consiste tambm em uma ao de desenvolvimento da competncia de
trabalho em equipe, anlise em conjunto de situaes de aprendizagem e
reflexo a respeito das diferentes prticas profissionais.

Os projetos da Associao Arte Despertar se realizam a partir das seguintes aes: atividades arte-educativas, sadas e aes culturais, reunies tcnicas e formativas.
Atividades arte-educativas
Realizadas nas linguagens das artes visuais, literatutura/contao de histrias, teatro e msica, planejadas e desenvolvidas por arte-educadores,
com possvel auxlio de monitores, tendo em vista despertar as potencialidades do indivduo por meio da arte e da cultura.

Os projetos so desenvolvidos nas reas


de incluso social, humanizao hospitalar
e formao de educadores, o que confere
s atividades realizadas caractersticas distintas e desdobramentos especficos, por
serem constitudas para pblicos diversificados. No entanto, todas buscam cumprir
a misso institucional e so organizadas de
forma sistemtica.

Rotinas de atuao

Toda sada decorre de ao previamente planejada, com justificativa e objetivos definidos,


uma vez que parte da prtica educativa. Tambm importante a avaliao posterior da ao,
que deve explicitar a pertinncia das escolhas e
ampliar o repertrio cultural, fornecendo subsdios para outras atividades.
Na ocasio, pesquisada a agenda cultural da
cidade, valorizando a arte brasileira e os equipamentos culturais de iniciativa pblica. Isso
amplia experincias e repertrio artstico-cultural e possibilita interao por meio da cultura.

As aes culturais nos projetos desenvolvidos


em comunidade tambm englobam o compartilhamento dos resultados dos trabalhos
realizados, por meio de apresentaes musicais, teatrais e exposies de artes visuais.

Reunies tcnicas
As reunies tcnicas constituem-se de troca de
saberes, por meio dos relatos individuais entre a equipe, caracterizando assim um espao
efetivo de reflexo e aprendizagem. Ocorrem
sistematicamente e possibilitam trabalhar os aspectos operacionais quanto organizao das
aes, ao acompanhamento e avaliao das
atividades desenvolvidas.

Sadas culturais
As sadas culturais tm como objetivo a ampliao ou aprofundamento de contedos
tratados durante as oficinas arte-educativas
e culturais. Esto diretamente ligadas ao
processo de trabalho e visam ao enriquecimento e complementao das aes vivenciadas na prtica semanal.

Reunies formativas
As reunies formativas visam ampliao e ao
enriquecimento do repertrio de toda a equipe.
Ocorrem trs vezes ao ano, mediante definio
prvia do tema a ser estudado. So fundamentais para a educao continuada, atualizao,
coeso da equipe, apropriao da metodologia
e da linha de atuao da Arte Despertar.

138 I 139

Registros
O registro realizado pelos arte-educadores um procedimento que permite acompanhar o trabalho, por meio de observao, depoimentos
e documentao de cada etapa desenvolvida. tambm o resultado
da leitura crtica sobre o fazer, com a inteno de relatar e aprimorar
aspectos que tenham facilitado ou dificultado o desempenho do planejamento e o alcance dos objetivos dos projetos. So tambm instrumentos de comunicao entre arte-educadores, coordenao pedaggica e
assessoria psicolgica.

Avaliao

Relatrios

A anlise deste relatrio ocorre nas reunies tcnicas com a presena


tambm da equipe administrativa, para mensurar a ao institucional em
relao aos objetivos propostos.

Alm desses, so realizados registros fotogrficos com intuito de captar


as imagens dos momentos significativos das atividades e document-las,
para elaborao de relatrios administrativos e metodolgicos.
Avaliao de processo
Tem o objetivo de monitorar e refletir sobre o processo arte-educativo
para redirecionamento das aes planejadas e estabelecer estratgias,
identificando fatores facilitadores que possibilitem ajustes, se necessrio,
para a continuidade do projeto.
Avaliao de resultados
Ao finalizar o projeto, realiza-se uma avaliao ampla e abrangente, para
verificar o resultado dos objetivos propostos, as aprendizagens conquistadas, os desafios superados, lies aprendidas durante a execuo das
atividades e caractersticas da instituio parceira. Esta avaliao visa a
aperfeioar novos encaminhamentos para futuros projetos.

Relatrios anuais
Realizam o fechamento e registro de todos os trabalhos desenvolvidos
ao longo do ano pela Arte Despertar, em que so demonstrados os
resultados quantitativos, qualitativos, depoimentos e ilustrao com
registros fotogrficos.

Mesmo o paciente que est em


estado de coma, ele tem reaes
quando a msica tocada ou
contada uma histria.
D. H., HOSPITAL MUNICIPAL DE
URGNCIAS, GUARULHOS/SP

O trabalho da Arte Despertar


essencial para uma UTI, porque
ele modifica inevitavelmente a
perspectiva de melhora dos pacientes.
R. F. A., HOSPITAL STELLA MARIS,
GUARULHOS/SP

Relatrios semestrais
Contemplam o resumo dos registros preenchidos ao longo do semestre
pela equipe tcnica. Neles, a equipe manifesta pontos positivos, impasses
ou aspectos que necessitam de reformulao para otimizar as aes e
viabilizar a continuidade no prximo semestre. uma oportunidade para
realizar uma avaliao baseada em trs reas arte-educao, pedagogia e
psicologia que fundamentam a metodologia Arte Despertar.

Eu tive oportunidade de aprender e


transformar minha vida e acredito no
aprendizado solidrio, em multiplicar o
conhecimento. Quando recebi o convite
para fazer o curso de capacitao, em
2004, fiquei super satisfeita, pois teria
a oportunidade de difundir a bagagem
cultural e as vivncias que adquiri.
CARLA BATISTA ALVES

140 I 141

O processo de humanizao do Servio de


Terapia Intensiva vem se desenvolvendo no
decorrer destes anos com a participao ativa
da equipe multiprofissional, desmistificando
o que muitos acreditam ser uma UTI.
O Projeto Arte Despertar encantou a
todos: doentes, equipes e familiares.
Atravs de suas atuaes, possibilitou
momentos agradveis de reflexo,
relaxamento e descontrao. Com isso,
entramos em contato com sentimentos
que nos remetem sensao de
conforto e at mesmo alvio da dor.
Hoje, a integrao do projeto com o
cotidiano da UTI notria. Os familiares
voluntariamente se incluem nas atividades.
A equipe multiprofissional seleciona os
pacientes a serem atendidos. Atravs
destas aes, percebemos repercusses
positivas no relacionamento interpessoal,
bem-estar dos pacientes e dos familiares.
uma grande satisfao ter a equipe
da Arte Despertar no Servio de Terapia
Intensiva da Santa Casa de So Paulo.
ANGELA HABERKORN, PATRICIA DE MARCO,
M. INES MUR, M. ANGELA PASCHOAL
E DR. ELZO PEIXOTO, SANTA CASA DE SO PAULO

142 I 143

Os projetos da Associao Arte Despertar, ao nascerem de uma


parceria, conforme explicitado no captulo Sistematizao de projetos,
rotinas de atuao e avaliao, trazem, na prpria estrutura, a possibilidade de continuidade.
As instituies parceiras so os locais de desenvolvimento do conhecimento e constituem permanente laboratrio de vivncia e aprendizado para a Associao.
A cedncia de espaos nos hospitais e comunidades, bem como, de
profissionais, propicia um contato direto da equipe Arte Despertar (arte-educadores, pedagogo e psiclogo) com as aes realizadas
na prtica do dia-a-dia da instituio parceira, bem como com as
dificuldades e demandas do pblico atendido, possibilitando uma
aprendizagem significativa e duradoura.

DISSEMINAO DO CONHECIMENTO
PARA A SUSTENTABILIDADE
DA ARTE DESPERTAR

Os materiais elaborados at ento so organizados a partir de registros e do incio sistematizao da metodologia Arte Despertar.
Possuem foco na ampliao de repertrio e disseminao da metodologia e so documentados em vdeo e em multimdia.
A linguagem utilizada no material simples, concisa e objetiva, ressaltando os pontos essenciais da anlise e reflexo surgidas a partir
da prtica. A estrutura do Material de Apoio Arte-Educativo permite que ele transite em diferentes espaos de formao e seja utilizado com diversos pblicos, potencializando a ao institucional.
A articulao com as instituies parceiras, a troca de saberes, a socializao dos conhecimentos aprendidos e do material produzido
embasam a formao de uma rede. Esta constitui-se na meta maior e
necessria para assegurar a disseminao da metodologia Arte Despertar e sua sustentabilidade.

Este modelo de atuao realiza o objetivo de formao de multiplicadores da Associao, viabiliza e d continuidade ao aprendizado
e amplia o pblico atendido. Ao se tornar um multiplicador, o profissional percebe a necessidade de uma formao permanente e se
torna um parceiro na aprendizagem.
Outra forma compreendida como necessria para garantir a disseminao do conhecimento produzido consiste no registro, sistematizao e edio das atividades-eixo elaboradas, atravs da publicao de
um Material de Apoio Arte-Educativo. Este material possibilita
ao profissional dar continuidade e fortalecer sua prtica, recorrendo,
sempre que necessrio, fundamentao e/ou atualizao do contedo produzido.

144 I 145

146 I 147

01 I 02

GOSTO DE VIAJAR POR PA LAVRAS DO QUE DE TREM.


Manoel de Barros

01 I 02

A VISO DO LADO DE FORA

01 I 02

A VISO DO LADO DE FORA

Neste captulo foi pedido a alguns dos colaboradores e parceiros que


dissertassem sobre suas impresses e vises a respeito da Arte Despertar.
Eles foram de vital importncia para a Associao, pois juntos, desde o
primrdio, fizeram parte da histria, contribuindo com questes estruturais, conceituais, administrativas, jurdicas, no suporte das atividades
desenvolvidas e na participao dos projetos.
Alguns, usando seus conhecimentos do Segundo Setor, trouxeram suas
competncias para dentro da casa.
Outros, em funo de suas atividades, permitiram que a Associao pudesse levar sua expertise para empresas e instituies que passaram a
apoiar a causa ou abriram suas portas para receber os servios da Arte
Despertar.
Para melhor entendimento, os depoimentos foram colocados de maneira
livre, coloquial e cronolgica, permitindo ao leitor um acompanhamento
da evoluo da Arte Despertar. Estas palavras ajudam a visualizar a Associao do lado de fora.

154 I 155

Ana Marta Oliveira do Nascimento

Guilherme Vidigal Andrade Gonalves

Rogrio Magon

Associao Santo Agostinho (ASA)

Unio Vidigal Ltda

Instituto Fonte

Antonio Srgio Petrilli

Heloisa Guarita Padilha

Telma Sobolh

Instituto de Oncologia Peditrica (IOP) -

RGNutri

Hospital Israelita Albert Einstein

com Cncer/Universidade Federal de So

Jos Ferraz Ferreira Filho

Teresa Guarita Grynberg

Paulo (GRAACC/UNIFESP)

J Ferraz Business Development

Estdio Colrio

Carla Batista Alves

Lgia Maria Camargo Silva Cortez

Valdir Cimino

Universidade Mackenzie

Escola Superior de Artes Clia Helena

Associao Viva e Deixe Viver

Grupo de Apoio ao Adolescente e Criana

Carlos Vicente Serrano Junior

Lcio de Castro Andrade Filho

William Malfatti

Instituto do Corao do Hospital

Grupo Ultra

Grupo Fleury

da Universidade de So Paulo

Marcos Kisil

Wilze Laura Bruscato

(InCor HCFMUSP)

Fundao Maria Ceclia Souto Vidigal

Irmandade da Santa Casa

das Clnicas da Faculdade de Medicina

de Misericrdia de So Paulo

Clia Yukiko Osato

Maria Christina de Souza Lima Rizzi

Instituto do Corao do Hospital

Escola de Comunicao e Artes

das Clnicas da Faculdade de Medicina

da Universidade de So Paulo

ENTREVISTADOS

RUMO VIDA PROFISSIONAL


Ana Marta Oliveira do Nascimento

Conte um pouco sua vida.


Eu era uma adolescente que falava pouco, reservada, odiava o mundo e
achava que todos estavam contra mim. Com 14 anos de idade, conheci o
projeto da ONG Arte Despertar. A msica me ajudou a trabalhar essas
questes e as transformaes foram acontecendo de uma forma muito
sutil. Quando me dei conta, estava num outro momento, me transformei
em outra pessoa.
Quando conheceu o projeto da Arte Despertar?
E o que voc achou das atividades?
Conheci o projeto em 2000, numa fase em que no levava as coisas a
srio, sem perspectiva de vida. Ia escola porque tinha que ir, mas no
estudava a srio. Fiquei sabendo de um projeto de msica que ia comear
na comunidade de Paraispolis e chamei uma amiga. Fomos ver como
era e, apesar de no ser o que espervamos, voltei no outro sbado. Eu
queria ouvir Spice Girls e no projeto tinha Palavra Cantada. Apesar de
achar estranho, no decorrer das aulas fui me entrosando com o pessoal e
pegando gosto pela percusso.

da Universidade de So Paulo
(InCor HCFMUSP)

Maria Nadir Azevedo de Moraes


Escola Habitat

Dario Ferreira Guarita Filho


Guarita & Associados

Maria Stela Fortes Barbieri


Instituto Tomie Ohtake

Dario Ferreira Guarita Neto


Amata Brasil SA

Patrick Charles Morin Jr.


Morin Assessoria Empresarial Ltda

Enrique De Goeye Neto


De Goeye Advogados Associados

O que o trabalho da ONG despertou em voc?


Despertou-me a curiosidade, o gosto pela msica, o interesse pela cultura
afro-brasileira. A partir da comecei a estudar sobre o tema, sobre o maracatu. Comecei a me interessar e a me dedicar msica. Como recompensa, fui convidada para tocar na banda da qual as arte-educadoras Beth
Beli e Adriana Arago faziam parte.
Eu no tinha interesse por nada e o projeto me fez ver quem eu realmente sou. Comecei a sonhar, a me perceber como pessoa e a reconhecer
minha identidade cultural. Hoje tenho orgulho em falar que sou uma mu-

156 I 157

lher negra. A vida me deu oportunidade para transformar minha histria,


me fortalecer e buscar coisas em que acredito. Hoje eu vou atrs do que
quero, sou verdadeira com meus desejos e crenas. Valorizo a cultura
afro-brasileira e me identifico com ela.
Em que sentido voc acha que houve melhora?
Identifiquei-me muito com as arte-educadoras, com elas aprendi o que
disciplina e responsabilidade. Elas plantaram em mim a semente do
acreditar, o pensamento positivo. Se no tivesse participado do projeto
de msica da Arte Despertar, provavelmente minha vida seria totalmente
diferente. J tentei imaginar como seria e fico pensando que talvez nem
tivesse terminado o ensino mdio e j estaria com pelo menos dois filhos,
como o que acontece com grande parte das meninas da comunidade. E
essa histria de vida no me atrai. Estou muito satisfeita com a vida que
tenho hoje e com o que j conquistei. O projeto ajudou a ampliar minha
viso de mundo, me proporcionou acesso a outra realidade, coisa que
sozinha no teria sido possvel fazer.
O que levou voc a ser voluntria da Arte Despertar?
Hoje voc uma arte-educadora?
Recebi o convite para fazer o curso de capacitao e atuei durante um
tempo como arte-educadora nos projetos da Arte Despertar, mas hoje
no atuo mais. Quando ainda era educanda, durante as atividades, trabalhamos com vrios valores, entre eles o da solidariedade. Aprendi que o
aprendizado tambm pode ser solidrio. Ento percebi que podia contribuir e o quanto gratificante ser um multiplicador, poder passar para

outro o que eu aprendi. Gostei tanto da experincia de trabalhar com


educao que participei de um processo seletivo para o Centro Comunitrio de Paraispolis. Lembro de que o primeiro ritmo que aprendi foi o
bumba-meu-boi. Isso me marcou tanto que, sempre que comeava um
novo projeto como educadora, eu propunha a primeira atividade com
essa msica.
Para voc, qual a importncia desse projeto?
O trabalho foi fundamental na escolha do caminho que minha vida seguiu. Foi a porta que precisava para explorar muitas possibilidades. No
tinha muita perspectiva de crescimento pessoal, mas pela ao das arteeducadoras percebi que tinha capacidade para msica e para ensinar.
E como participar e trabalhar em prol do prximo?
Assim como o projeto me despertou, tambm quero que isso acontea
com outras pessoas. Quero contribuir para elas terem a mesma oportunidade que eu tive, espero fazer diferena para o prximo.
Para voc, o que significa ser uma arte-educadora?
Um educador precisa antes ser verdadeiro consigo mesmo para depois
ensinar algo ao outro. No acredito no faa o que digo, mas no faa o
que eu fao. A gente tem que dar exemplo para os educandos, muitas
vezes somos a referncia que eles tm. O trabalho de educador muito
gratificante. Hoje, no meu trabalho, lido com crianas e procuro ensinar a cultura brasileira por meio da msica. A metodologia que aprendi
na Arte Despertar adotada na minha vida profissional, e uso a msica
como instrumento de ensino.

158 I 159

Conte um pouco sua vida.


Sou Carla Batista Alves, 23 anos, nascida e criada na comunidade de
Paraispolis. Sou bolsista da Universidade Mackenzie, onde curso Letras
e Traduo. Sempre gostei muito de estudar, no entanto no tinha oportunidade, nem perspectivas de ter, at que a ONG apareceu e eu abracei.
Quando conheceu o projeto da Arte Despertar?
Em 2001, queria aprender a desenhar e a Arte Despertar tinha um projeto na comunidade, de artes plsticas, que se chamava Despertando para
a paz com arte. Imaginava que arte era s esttica, e ali descobri que
tambm subjetiva, que no tem um padro, que um canal de expresso.
No imaginava que o projeto ia tomar a dimenso que tomou em minha
vida. Busquei as atividades para aprender a desenhar e tive a interveno
de pessoas iluminadas. As arte-educadoras conseguiram me despertar
para a arte. Participei de inmeros projetos de artes visuais e de msica
na comunidade de Paraispolis, organizados pela Arte Despertar.
Em que sentido voc acha que houve melhora?
A comunidade onde moro vista como um lugar violento, onde as pessoas no tm oportunidade de crescimento. No entanto, eu sou a prova
de que isso no verdade. possvel crescer, sim, basta querer. Claro
que eu tive muita sorte de frequentar um projeto social que me abriu
tantas portas. Mas antes disso, quando tinha 15 anos, eu no saia de casa
sozinha, com medo da violncia. No conhecia nada, nunca tinha ido a
um shopping sequer. Era insegura, medrosa, me sentia inferior. Hoje sou
uma pessoa comunicativa, me expresso bem, sou criativa e desenvolvi
mecanismos e tcnicas para expressar sentimentos por meio da arte. Eu
gosto do que produzo, acho que so peas interessantes. Antes no tinha
perspectiva de vida e hoje tenho metas e objetivos, corro atrs do que
quero. Para o futuro, pretendo atuar no segmento de artes plsticas. E,
para quem no saa de casa sozinha, penso em ir para a Frana aperfeioar o idioma.

Carla Batista Alves

Quanto tempo voc frequentou o projeto em Paraispolis?


Foram 9 anos. Durante esse perodo participei como educanda e educadora.
Para voc, qual a importncia desse projeto?
A Arte Despertar marcou muito minha vida. A partir do projeto, aprendi
a compartilhar o aprendizado, pude vivenciar vrias experincias. Participar da Arte Despertar foi muito importante pra mim. Sou o que sou hoje
porque passei por esses processos e vivi essas experincias.
Como o trabalho da ONG despertou voc?
Despertou-me medida que no me contento mais com o mundo medocre, sem perspectiva de vida. Passei a acreditar que sou capaz, que posso
criar da forma que eu quero e como eu gosto, basta ser pertinente ao que
planejei. Antes era presa esttica, e hoje vejo a arte como expresso de
sentimentos. Os materiais so apenas o meio para produzir arte, e a esttica no o mais importante.
Como esse trabalho influenciou na sua vida?
Participar dos projetos oferecidos na comunidade de Paraispolis me
proporcionou experincias profissionais. Fui muito bem orientada por
profissionais, pessoas que marcaram minha vida para sempre. Isso influenciou o meu carter e, com certeza, contribuiu para eu conseguir meu
primeiro emprego como arte-educadora. Certa vez, durante uma atividade, a coordenadora pedaggica me disse: Para tudo tem uma soluo
criativa, e me mostrou o quanto importante observar e escutar. Levo
isso comigo at hoje. Aprendi a ser mais perseverante e a acreditar que
sou capaz. Com as arte-educadoras, aprendi a explorar os materiais, entender o processo de criao, as possibilidades e tcnicas para trabalhar.
Tambm vivi experincias emocionais que me deram fora para lidar com
as oportunidades que foram desencadeadas na minha vida. Acreditei que
eu era capaz quando ningum acreditava, como, por exemplo, quando
solicitei a bolsa da faculdade.

160 I 161

Hoje voc arte-educadora?


No mais, porque o projeto no mais desenvolvido na comunidade de
Paraispolis, mas j fui e, se a ONG tivesse continuado o trabalho l, eu
ainda estaria participando. A comunidade um lugar violento e o trabalho
da ONG fez diferena para muitas pessoas. uma forma de se descobrirem como indivduos, de se valorizarem como integrantes da sociedade.
O que levou voc a ser voluntria da ONG?
Eu tive oportunidade de aprender e transformar minha vida e acredito
no aprendizado solidrio, em multiplicar o conhecimento. Quando recebi o convite para fazer o curso de capacitao, em 2004, fiquei super
satisfeita, pois teria a oportunidade de difundir a bagagem cultural e as
vivncias que adquiri.

ESTRUTURAO INSTITUCIONAL

Quando a Arte Despertar comeou existia uma ideia de ncleo, de clula,


um conceito nico, que depois se multiplicou, tornou-se orgnico, mutvel.
De incio, embora a ideia j estivesse definida, no se sabia em que se tornaria.
Para criar o logotipo, no poderia ser uma marca dura, tinha que ser malevel,
mais arredondada. Tambm nas cores, preferimos as mais quentes, cores da
natureza, um pouco de terra, do sol, pois o trabalho envolvia pessoas, seres
humanos. A marca a apresentao grfica de uma empresa e a representa.
Esta marca deve carregar o DNA da empresa nesse grafismo.
Ainda sobre as cores, escolhemos o marrom, o laranja, que so cores
quentes. E tambm criamos uma tipologia sem serifa, pois um projeto
ousado, um projeto novo.
TERESA GUARITA GRYNBERG

Para voc, o que significa ser uma arte-educadora?


No imaginava que tinha capacidade para ensinar. muito gratificante
acompanhar o processo dos educandos e ver que voc faz a diferena
na vida deles. Nesses projetos sociais, a arte-educadora, alm de fazer
o papel educativo, muitas vezes faz tambm o papel de pai e me. A
gente lida com pessoas muito carentes, sem orientao. O trabalho do
arte-educador ensinar e estimular o gosto pela arte, mas, para isso, o
primeiro passo conquistar a confiana do grupo. Eu acho muito prazeroso esse trabalho, me sinto de fato cidad por fazer a diferena na vida
dessas pessoas.

Para estruturao da Arte Despertar foram utilizados o conceito e a linha


mestra seguida pelas empresas de negcio. Os estatutos, a governana,
fugiam um pouco da filosofia do Terceiro Setor, muito mais incipiente na poca
da sua fundao do que nos dias de hoje.
Assim, juntaram-se a ns profissionais de marketing, advogados, auditores,
na procura de trazer para o mercado uma empresa moderna e tentando fugir
do conceito da filantropia tradicional. Foi eleita uma diretoria, um conselho
atuante para acompanhar seu desenvolvimento.
Antes de sair a campo, renomados profissionais na arte de educar atravs
do teatro, da contao de histrias, das artes e da msica se reuniram e
traaram os objetivos e os caminhos para atingi-los.
DARIO FERREIRA GUARITA FILHO

162 I 163

Foi muito difcil fazer o Estatuto. O que precisava, qual o objeto


social, qual a misso. Hoje em dia voc liga no escritrio de
advocacia e cria um. Acho que naquela poca no era assim.
GUILHERME VIDIGAL ANDRADE GONALVES

A estrutura foi sendo cada vez mais aprimorada, foi um crescimento


talvez mais orgnico, com as prprias pessoas, mas com a ajuda
de muita gente de fora, que trouxe conhecimento, aperfeioou
a equipe e o aspecto com relao captao dos recursos.

Entrei para o conselho da Arte Despertar e continuo a acompanhar os vrios


projetos da instituio. Mas aquilo que mais me marca na Arte Despertar
que a liderana pensa grande. Eu tenho acompanhado e visto
que a instituio hoje est posicionada para ter um impacto muito expressivo
na sociedade brasileira no contexto da humanizao em hospitais.
A instituio entende bem os desafios, sabe quais so as tcnicas que
devem ser introduzidas, ela aprende fazendo, e tem tido muito sucesso, eu
acho, em levar para frente o projeto a que est se propondo. Ento eu estou
muito impressionado, bem impressionado, e no tenho muita dvida de
que, no futuro, essa ONG trar mudanas muito benficas para o Brasil.
PATRICK CHARLES MORIN JR.

JOS FERRAZ FERREIRA FILHO

Foi importante o desenvolvimento do conceito da Associao: nossa arte


despertar o melhor de voc. Tambm foi importante a instituio dos conselhos
Consultivo e Fiscal e a separao destes dos fundadores e associados.
DARIO FERREIRA GUARITA NETO

Acho muito interessante ser conselheiro da Arte Despertar, porque


uma instituio que trata seus projetos com muita profissionalizao.
Discute objetivos e formas de atuao de maneira muito organizada e clara.
A instituio criativa e gere seus projetos com planos muito bem traados.
Com minha experincia empresarial, vejo a Arte Despertar como uma
organizao, e colaborar com ela muito satisfatrio, pois fao comentrios
sobre planejamentos e objetivos muito bem analisados. Minhas opinies
buscam dar opes de caminhos alternativos e instigar novas propostas.
LCIO DE CASTRO ANDRADE FILHO

164 I 165

Quando iniciamos a parceria, ns trocamos um voto de confiana.


No sabamos se ia dar certo, se teramos resultados satisfatrios, mas
comeamos a trabalhar e atender a demanda da Arte Despertar.
No decorrer dos anos, a Associao cresceu e as atividades aumentaram.
A parceria se fortificou e as duas partes esto satisfeitas com os resultados,
e o fruto do trabalho gratificante. Temos orgulho dessa parceria.
O escritrio De Goeye Advogados Associados elegeu a Arte Despertar para
fazer o abono. Dedicamos horas de trabalho em prol dessa causa, firmando
uma parceria. Por exemplo, a Arte Despertar tem contato com empresas
de grande porte e pessoas que acreditam e apostam no trabalho que
desenvolvido. As parcerias que firmam precisam ser acertadas com contratos
e acordos. Tudo precisa ser transparente e perfeitamente alinhado. H
tambm questes trabalhistas. Ns garantimos a segurana de todas
as questes jurdicas da Arte Despertar. Os trabalhos so realizados por
advogados das diversas reas do escritrio, de acordo com a demanda.
ENRIQUE DE GOEYE NETO

ESTRUTURAO METODOLGICA

Quando eu era educadora e docente no museu na rea de Arte Contempornea,


no incio do sonho da Arte Despertar, o museu era dirigido pela professora Ana
Mae Barbosa, eminente arte-educadora, que foi procurada pela Regina Guarita
atravs da irm dela, que pertencia Associao de Amigos do Museu. Tinha
uma proximidade e ela queria formar o que seria a Arte Despertar. A Ana Mae
me indicou para conversar com a Regina e ver de que maneira eu poderia
ajudar na fundamentao da Arte Despertar. Ento o nosso primeiro contato
foi desse convite. Eu fui, j era na Rua Helena.
Neste momento, a Ana Mae Barbosa tinha acabado de configurar
conceitualmente o que ficou conhecido como Proposta Triangular do
Ensino da Arte. Essa Proposta Triangular estava nascendo, e as primeiras
experincias estavam sendo feitas pensando no ensino da arte desta forma, e
foi esta discusso que eu trouxe para a Regina na Arte Despertar.
A minha participao nessa conceituao foi no embasamento terico. Com
a chegada e contratao dos arte-educadores, essa fundamentao foi
discutida e operacionalizada por projetos com esses profissionais que vieram.
um trabalho muito srio, muito consequente, muito importante. E ele
acontece numa conjuno de vrios itens. A Arte Despertar tem uma misso,
que a promoo do outro atravs do acesso s atividades artsticas. O que
eu vi, ao longo desses anos, e vi por meio de relatrios ou apresentaes que
eu fui assistir, teatro, msica, que realmente o trabalho foi feito com muita
qualidade, os indivduos tiveram possibilidades de desenvolvimento pessoal
e esttico.
MARIA CHRISTINA DE SOUZA LIMA RIZZI

166 I 167

Eu sei que, primeiro, foi uma experincia maravilhosa ser convidada para
trabalhar na Arte Despertar. Eu no lembro direito como que foi, lembro
do meu primeiro contato com a Regina, atravs de amigos comuns, alguma
coisa assim. Eu fiquei muito animada e achei que aquele trabalho realmente
tinha uma conceituao e uma dedicao muito grande, muito legal.
Ento era para fazermos algumas coisas no hospital, isso foi o maior desafio
do mundo: o que fazer l? E tambm em um lugar chamado Aldeia SOS,
onde o trabalho estava se iniciando e o teatro foi uma das possibilidades.
LGIA CORTEZ

Um dos primeiros desafios foi formar a equipe, que comeou bem pequena,
depois se ampliou. (...)
A minha ao foi sempre junto aos educadores, tanto os que atuavam
em hospitais quanto os que atuavam nas comunidades trabalhando com
histrias da tradio oral. Ns procuramos sempre ativar um imaginrio
relacionado diversidade cultural, s vrias etnias, s festas sazonais, um
universo que dialogasse com a cultura de cada pessoa que encontrvamos.
Era um trabalho de dilogo entre vrias culturas. Eu fazia oficinas de formao
bastante intensas, em que estudvamos as histrias, vamos arte, ouvamos
a msica de uma mesma etnia. Tinha inteno de tecer uma viso abrangente
com vrios olhares para uma mesma cultura.
STELA BARBIERI

Eles sempre trabalharam com profissionais, educadores, que tm formao


pedaggica. Ento a Arte Despertar introduziu o brincar como uma forma de
educar, de agregar cultura, tanto para a criana quanto para a famlia. Desde
msica, artes plsticas. (...) Nossa! Artes plsticas era uma coisa brbara!
CLIA YUKIKO OSATO

Tem outra instncia, que o trabalho com os arte-educadores. Eles foram


chamados a desenvolver e mesmo coordenar trabalhos. Para eles, o
trabalho tambm foi uma instncia de formao. Eles tiveram acesso
a cursos, palestras, reunies de construo de trabalho, o que ajudou
no s a construir o perfil da Arte Despertar, mas tambm na construo
profissional deles. E eu vi muita gente que amadureceu no seio do processo
da Arte Despertar e tem hoje uma atuao diferenciada na sociedade
em geral, na rea de artes e arte-educao. Formaram-se lideranas.

O grande desafio foi como chegar nessas crianas. O contato comeou a ser
em grupo, mas falvamos com cada criana. Num determinado momento,
comeamos a trabalhar com as mes, para elas entenderem, verem e
valorizarem esses trabalhos. Foi um grande aprendizado e um dado de
realidade muito difcil.
Logo depois fomos para Paraispolis, que foi um convnio com o Programa
Einstein na Comunidade de Paraispolis. Comeou muito pequeno, as
crianas divididas por idade, e l, por mais que as crianas tivessem falta de
recursos, elas tinham a estrutura da famlia.
LGIA CORTEZ

MARIA CHRISTINA DE SOUZA LIMA RIZZI

168 I 169

Acredito que a arte realmente seja uma maneira de despertar, rea de


transformao, que leva o indivduo a mudar o seu olhar, a sua viso do
mundo. A arte trabalha com a sensibilidade e a percepo das pessoas,
possibilitando outras maneiras de aprender, que podem trazer uma luz,
uma nova perspectiva. A Regina sempre trabalhou com a arte como forma
de aprender com a prpria experincia, fazer um trabalho no processo
e trajetria de cada participante. Nunca deu passos largos demais, que
atropelassem o processo, sempre foi um passo aps o outro, numa
construo contnua que conta com a participao de todos. (...)
O universo das histrias pode levar um indivduo a recontar a sua prpria
histria. A Regina Machado, que uma grande contadora de histrias,
costuma dizer que existe um eixo vertical, que o eixo da histria, que
faz uma inciso com o eixo horizontal, que o eixo da nossa vida. E
nesse encontro que voc pode, atravs daquela histria, recontar sua
prpria histria. O principal para o contador de histrias estar a servio
da histria e a servio daquele ouvinte. Neste encontro est a potncia
transformadora, atravs da obra de arte. Ento a obra de arte o ponto de
contato, neste encontro de ambas as partes que acontece a possibilidade
da transformao, de fazer aquele paciente que est doente ver o mundo
sob outro ponto de vista. Essa luz no fim do tnel est na obra de arte.
Eu acho que o contador de histria precisa se conhecer muito bem
e conhecer muito bem o universo das histrias, o universo cultural
mesmo, tudo aquilo que cerca a histria, o ambiente, a significao, os
cheiros, os climas, os sabores. Isso tudo impregna a histria, todas essas
camadas de leitura que uma cultura possibilita esto ali concentradas. A
complexidade humana das agruras da alma esto ali sintetizadas.

Todos ns temos a arte dentro da gente. s uma questo de deixar aflorar.


Mais do que isso, eu acho que a arte vital. No uma escolha, totalmente
diferente voc trabalhar com qualquer outra coisa que no seja arte. Ela
profissionalizante para um trabalho posterior. Quando voc trabalha com
arte, ela de formao do indivduo. Isso pode ser benfico, pode aliviar
e ser positivo medida que outros ouvem, uma forma de comunicao
metafrica. (...) E isso muito importante para darmos vazo a monstros,
medos, dificuldades, atravs dessa forma de arte. E o outro ver seu trabalho
fundamental. preciso ter apresentao, exposio, comunicao.
LGIA CORTEZ

Ns amos aos hospitais, nas comunidades, e eu fazia esse trabalho de


assessoria em servio, a partir da prtica dos educadores. Era um trabalho
muito interessante, pois o educador era desafiado o tempo todo a estar
presente na relao com cada pessoa que encontrava, achando brechas na
dor ou na tristeza daquelas pessoas para acessar seu lado saudvel e cheio de
esperana, criando um mundo interno de imagens e histrias, onde a sequncia
narrativa podia suspender por instantes a realidade e trazer outras emoes.
STELA BARBIERI

STELA BARBIERI

170 I 171

Mas o que eu vejo que esse desafio de trabalhar com uma pessoa que
est em uma situao diferenciada, seja porque no est podendo se
locomover, ou porque est com algum rgo do sentido prejudicado
momentaneamente, ou debilitada, deve exigir destes arte-educadores a
construo de procedimentos absolutamente singularizados para cada
situao. Ento, s vezes, aquele paciente est l, na semana seguinte pode
no estar. Voc nunca sabe, chegando l, com quem voc vai realmente
trabalhar e como a disponibilidade daquela pessoa naquele momento.
Tem gente em quimioterapia, s vezes em hemodilise, ou na UTI, ento
so situaes muito diferenciadas. Isso exigiu da equipe da Arte Despertar
uma formulao de princpios para criar estratgias de trabalho, no s do
procedimento com aquela pessoa que est sendo atendida, como tambm a
organizao do material da ao. O que levar, como levar, como acondicionar,
como preparar. Isso tudo foi uma criao do processo da Arte Despertar.
MARIA CHRISTINA DE SOUZA LIMA RIZZI

Mas, o mais importante, que a grande maioria das crianas que convivem
aqui no hospital nunca foi exposta a esse tipo de estmulo, ento ao dar a
elas uma iniciao cultura, notamos assim o interesse que muitas delas
tm. (...) Curar no mais o suficiente, queremos curar com qualidade
de vida, com insero social, com qualidade no sentido de que saia daqui
depois e tenha chance de achar um trabalho, um emprego, estudar e, se
possvel, que saia daqui com novas capacitaes, com novos estmulos,
que siga sua vida com um impacto favorvel, que esta doena no pare a
vida da criana. (...) Para mim, o conceito bsico de humanizao voc
tratar os outros como voc gostaria de ser tratado. Ento, como eu gostaria
de ter uma criana minha tratada dentro de um hospital? Qual a forma
que voc sente que importante para isto? E eu acho que isso evoluiu
muito, parece que qualquer coisa que voc desse antigamente estava bom,
porque a criana era menos favorecida. E o que a gente sentiu aqui com
nossa experincia que o contrrio. Ns somos solidrios, ns queremos
ser parceiros dessas famlias, a ideia resgatar, junto com outras ONGs, o
direito que a criana tem de ser atendida. Eu vejo isso na Arte Despertar, os
arte-educadores tm um dever muito srio a cumprir e so extremamente
objetivos com isso, ao passar ensinamento para essas crianas. (...) Ento
eu acho que esse modelo de humanizao, em que voc faz o tempo passar
dentro do hospital, amenizando a dor, amenizando o trauma, fundamental.
ANTONIO SRGIO PETRILLI

172 I 173

A Santa Casa de Misericrdia de So Paulo, que cuida basicamente de sade,


tambm tem um brao cultural. Ela valoriza muito a questo cultural, quer
dizer, a Santa Casa cuida, atravs da Lei Rouanet, de projetos, de museus. Ns
temos um museu aqui dentro, a prpria instituio j tem uma valorizao
deste aspecto cultural, artstico. Ento a partir do momento em que a Arte
Despertar entra, j tem consonncia com a maneira nossa de pensar, de
pensar arte, de valorizar a arte. Ento, trazer a arte das suas formas mais
simples para esses nossos pacientes, por exemplo, trazer para eles um outro
patamar. Sai da corporeidade e entra em um outro nvel de vivncia. E isso,
claro, traz benefcios para todo mundo. Para o paciente, para a instituio.
WILZE LAURA BRUSCATO

Acho um papel fundamental. Eu vou tomar uma rea sobre a qual eu me


sinto mais confortvel em falar, que da humanizao, principalmente
junto aos trabalhos que a Arte Despertar faz nos hospitais. Acho isso
de uma riqueza enorme, por duas razes. A primeira uma razo que se
encontra no setor mdico, porque medida que voc introduz especialidade,
tecnologia, subespecialidade etc., voc est mais concentrado em saber
se a tecnologia faz o diagnstico, o tratamento, e a relao entre os que
cuidam do doente. O doente est todo centrado pela mquina. E a se perde
todo o sentido humano da relao. Ao mesmo tempo que essas mudanas
foram feitas para que novas tecnologias ajudassem o paciente, elas tambm
passaram a otimizar o tempo dos profissionais, embora afastando-os do
doente. Portanto, o tempo de relao passou a ter um valor estritamente
tcnico. E todo um outro lado do paciente, que afeta a vida familiar, o
trabalho, e que traz um processo grande de angstia, foi sendo descartado
da relao. Esse um grande problema do setor hoje. Ento na hora que
a Arte Despertar entra para ajudar e usa a arte como instrumento, no
um instrumento s ldico, um instrumento que serve para recriar esse
mundo que o indivduo perdeu. uma chance que o sistema de sade
negou. Ento a Arte Despertar joga um papel extremamente importante, e
aqui eu vou colocar essa importncia primeiro no prprio bem-estar do
paciente, da famlia, mas indiretamente na criao de condies para que os
componentes psquicos da doena no afetem os componentes somticos
da doena, porque toda doena psicossomtica. Ento, se voc pode entrar
no componente emocional do indivduo, voc consegue fazer com que ele
no piore o componente fsico. Por isso eu acho um trabalho muito rico. Eu
estou pegando o ngulo do hospital porque uma rea com a qual eu estou
mais acostumado e um trabalho em que no importa onde o paciente est,
pode estar em So Paulo, no Rio, em Macei. Ento a Arte Despertar extrapola
o que est fazendo, ela quase se coloca numa posio de ter que disseminar
suas prticas, suas experincias, para que outros possam repeti-las.
MARCOS KISIL

174 I 175

Acredito na vertente que o tratamento no evolui apenas com remdio,


preciso olhar o emocional. Pessoas depressivas atraem doenas
e tm uma recuperao mais demorada, enquanto pessoas alegres
tm uma evoluo mais rpida no quadro clnico.
CARLOS VICENTE SERRANO JUNIOR

A criana chega l sem noo do seu contedo artstico, seja teatro,


artes plsticas, msica ou literatura. No desenvolver da criana e no despertar
dela, ela consegue expressar-se, pintando, tocando e cantando ou fazendo
teatro. impressionante ver a evoluo de uma criana em um ano.
Eu aprendi muito. outro enfoque, no um aprendizado em que existe
cobrana, no h preparao para entrar num primrio, no h cobrana
de uma alfabetizao. outra coisa, desabrochar a criana. Eu aprendi
muito na Associao e por esta razo pude atuar em outros projetos.
MARIA NADIR AZEVEDO DE MORAES

Metodologia fundamental, seno o projeto no funciona. Esse projeto da Arte


Despertar, por exemplo, ningum seria capaz de fazer se no tivesse uma estrutura.
Nosso patrocnio era um benefcio para as crianas e tinha uma metodologia que
garantia esses benefcios. E mesmo as aes voluntrias tm uma metodologia.
Tem outra questo, isso novo nos ambientes das empresas. Quando voc introduz
um projeto desse numa empresa, se ele no tiver consistncia e der errado, ela
demora a fazer algo parecido novamente e voc acaba estragando uma boa ideia.

CENRIO

Eu tive o privilgio de comear a trabalhar nesse setor em um particular


momento histrico da realidade brasileira, em que fiz parte de uma gerao
de estudantes universitrios que se envolveu nas questes sociais
quando o Brasil no tinha democracia. E uma das grandes dificuldades de
no ter democracia no existir o desenvolvimento da cidadania como a
possibilidade de participar do processo poltico decisrio que afeta a vida
de todos ns. Ento a minha gerao uma gerao que sempre teve uma
preocupao de resgatar esse valor. Esse resgate comea no final do regime
militar, mas ele se consolida quando o Brasil comea a se inserir novamente
na histria democrtica, a partir de 1975, quando os militares deixam
o governo, e se projeta muito fortemente em 88, quando promulgamos
uma nova Constituio do Brasil. Tive essa felicidade de participar dessa
gerao que lutou, inseriu e consolidou um regime democrtico para o pas.
Em 1988, no mesmo ano da nova constituio, eu fui para os EUA fazer um
doutoramento em administrao e foi muito interessante a descoberta l
de dois personagens que no conhecia no Brasil, se que eles existiam. Um
personagem o que classifico como empreendedor social, que um indivduo
que tem ideias de como alterar um status quo e transformar a sociedade, e
que normalmente no usa recursos financeiros para realiz-las. O outro
personagem o filantropista, que tem dinheiro, soube ganhar dinheiro, mas
nem sempre algum envolvido nas questes sociais. Portanto, o casamento
desses dois personagens permite que a sociedade faa uma participao nos
seus destinos fora da arena de governo. Isto eu no conhecia no Brasil, onde
todas as decises que afetavam a sociedade eram tomadas pelos governos
de ento. Eu encontrei isso nos EUA e me apaixonei pelo tema.
Eu acho que houve grandes e importantes avanos nos ltimos dez anos.
(...) Voc hoje encontra uma vontade muito grande na profissionalizao
das organizaes da sociedade civil que levam a srio a sua misso, que
planejam, que tm modelos gerenciais, fazem uso do sistema de tecnologia
da informao, que pem nfase no recrutamento de pessoal. Ento todas
essas tarefas so tarefas que vm de uma organizao profissionalizada.

WILLIAM MALFATTI

176 I 177

No incio do Terceiro Setor, havia um entendimento de que tudo era


importante. As organizaes tinham certa dificuldade em focar, em encontrar
o seu prprio caminho, sua trajetria, a sua vocao. O resultado que
houve muito desperdcio de energia, de esforo, de recurso financeiro,
porque as organizaes no tinham claro o que elas queriam fazer. Ento
isso mudou nesse tempo. Hoje elas querem saber a misso, qual seu
papel, quais as atividades programticas, os indicadores de sucesso, que
hoje fazem parte dessas organizaes e que no existiam h dez anos.
Essa outra mudana. Outro fato para o qual eu queria chamar ateno
que essas organizaes comearam a perceber que o setor um setor
que exige parceria. Eu acho que quando comeou havia como se fosse
uma reteno de energia e todo mundo queria sair fazendo tudo. E nesse
processo era mais exitoso aquele que conseguia fincar sua marca como
marca. No era comum fazer parcerias. As organizaes queriam que os
seus projetos fossem um projeto seu. E isso era natural, eu estou dizendo
que, naquele momento, era muito importante o indivduo marcar posio.
Hoje as pessoas esto mais conscientes de que o trabalho exige parceria, e
parceria desde o incio do programa. E o ltimo elemento que antes elas
se classificavam como ONGs porque no queriam trabalhar com o governo,
e hoje elas tm conscincia do papel que o governo tem, de disseminar o
seu trabalho para a populao. Ento aquela ntida separao entre no
governo e governo se perdeu e hoje elas sabem que precisam trabalhar
juntos para o sucesso de qualquer processo de participao cidad.
Aqui no Brasil estou no setor social desde os primeiros momentos de
redemocratizao, o que me levou a estar envolvido com vrios movimentos,
que vm desde a Constituinte, e com o aparecimento de vrias organizaes,
como o Instituto Ayrton Senna, a Abrinq, a criao do Ethos, a criao do
Centro de Voluntariado de So Paulo, grupos acadmicos de estudos do
Terceiro Setor. Tive o privilgio de acompanhar todo esse movimento e sou
uma daquelas pessoas que se sentem absolutamente gratas e convencidas
de quanto esse setor pode fazer bem para a sociedade. Eu particularmente

no gosto da palavra Terceiro Setor, eu prefiro chamar de organizaes


da sociedade civil. Ela tem uma conotao muito importante, porque ela
usada pelo lado afirmativo que ela tem pela sociedade e no pela negao, de
organizaes que no so do governo. Meu batismo e meu crescimento no
Terceiro Setor foi em torno dessa histria que eu te contei. Contando nisso os
meus 30 anos de experincia.
MARCOS KISIL

Acredito que exista hoje um nvel de profissionalismo muito maior. E dentro


disso comearam a existir processos semelhantes aos da estrutura de
empresas do Segundo Setor. Ento o Terceiro Setor comeou a entender isso
como um modelo de eficincia, o que fez com que ocorresse uma evoluo
nos ltimos dez anos. Alm disso, o dinheiro muito melhor investido hoje,
graas a essa profissionalizao.
HELOISA GUARITA PADILHA

Eu acho que ele tomou o espao da iniciativa pblica. O Terceiro Setor veio
ocupar essa lacuna de carncia e naturalmente surgiram distores, mas
existe um trabalho bastante laborioso, srio, porque ns temos contato
com outras ONGs e vemos que um trabalho bastante eficiente, que
desenvolvido por outros, que fazem o mesmo que ns. Naturalmente isso
no aconteceu somente no Brasil, mas aqui a desigualdade grande,
vemos que o campo muito frtil. Temos visto que pessoas que esto
abrindo uma ONG nos procuram, acabamos virando referncia.
JOS FERRAZ FERREIRA FILHO

178 I 179

Houve um forte crescimento nesses ltimos anos, porm sem organizao.


No s em relao a trabalhos sociais, mas tambm ao voluntariado. Ao longo
dos 23 anos trabalhando nessa rea, ao fazer uma anlise, percebo que esse
novo cenrio muito bom, pois antes ramos vistos como pessoas que no
tinham o que fazer, principalmente ns, mulheres.
TELMA SOBOLH

Ns, nesta instituio, com certeza mudamos. Eu entendo que muitas


instituies de sade acabam colocando hbitos de humanizao s para
seguir de acordo com as determinaes ministeriais, no o que acontece
conosco. Ns j tnhamos um bero, antes, no toa que temos este nome,
Santa Casa de So Paulo. Ento ns j tnhamos este olhar humanizado.
Eu entendo que a Associao Arte Despertar, que est fazendo dez anos,
comeou a pensar nisso de um modo geral, porque faz mais ou menos esse
tempo que o Ministrio da Sade comeou a pensar.
WILZE LAURA BRUSCATO

Eu acho que ainda temos algumas questes no resolvidas. Colocaria


como no resolvida a questo do entendimento que o governo deveria ter
com relao s organizaes da sociedade civil. Ainda falta ao Brasil um
quadro legal e mais incentivo por parte do governo ao papel que o Terceiro
Setor pode executar. Parece-me que o governo demonstra ainda um certo
temor de apoiar de maneira incisiva o que a sociedade pode fazer por si.
Ainda precisa ser trabalhado, a sociedade precisa fazer lobby no sentido
de forar polticas pblicas, no sentido da questo cidad. Uma segunda
preocupao a nossa preocupao com a governana e a rotatividade de
liderana que essas organizaes precisam. Muitas dessas organizaes
foram criadas por pessoas que se mantiveram ao longo do tempo nelas, o
resultado que da no existe uma segunda gerao que foi trabalhada ou
gerada. Eu estou dizendo isso em mbito geral, que o Terceiro Setor tem
uma dificuldade em gerar novos lderes. Uma terceira preocupao uma
preocupao com o uso, que deveria ser mais frequente, de avaliaes.
Ns estamos acostumados no Brasil a avaliar produtos, mas no avalio o
processo que tive para fazer isto ou aquilo, nem o impacto que ele teve na
vida das pessoas que foram beneficiadas. (...) Ento esses trs pontos so
os pontos que ainda faltam ser trabalhados.

A questo da humanizao vem ganhando cada vez mais espao. Hoje, h


uma tendncia internacional de ter assistncia social ligada humanizao
para identificar meios e estratgias para trabalhar o emocional do paciente.
A tendncia evoluir cada vez mais. Os hospitais esto conscientes dessa
necessidade e j comearam a identificar meios para que a humanizao
hospitalar se torne rotina nos hospitais junto aos tratamentos.
CARLOS VICENTE SERRANO JUNIOR

MARCOS KISIL

180 I 181

Ento falta mesmo essa viso de rede, de Primeiro, Segundo e Terceiro


Setor se abraarem para produzirem indicadores. As ONGs muitas vezes
se veem como concorrentes, porque um indivduo, quando monta uma
proposta, no v se j existe outra semelhante que possa potencializar a
sua. No, ele quer montar a dele.
Eu acho que falta ainda a visibilidade para muitas ONGs que so muito
legais, muito corretas, mas elas no tm espao para mostrar o seu
trabalho. O Terceiro Setor j aparece como um paradigma a ser quebrado,
quando surge como uma organizao no governamental. O no j
descompromete tudo. (...) Ento assim, tem que fazer junto com o
governo, quero ter o apoio dele, quero ter o apoio da iniciativa privada,
porque quero fazer alguma coisa para todos. E se imaginarmos tambm
pela tica de investimentos, em qualquer crise, antes de cortarem o
marketing ou o treinamento das pessoas, as empresas cortam o social.
Eu diria que j existe uma poltica, ento temos que fazer isso acontecer.
Nosso desafio esse, essa transformao. E se pudermos dar poder ao
nosso paciente, levar informaes para que ele possa prevenir a sua sade,
se todas essas aes, de fato, esto promovendo isso, o que esperamos
menos fila e profissional mais valorizado. (...) Isso para todos. Quando
levamos essa viso para todos, o futuro ganha.

ERROS E ACERTOS

E esse trabalho foi desenvolvido com muito profissionalismo. Me chamou a


ateno o fato da Associao Arte Despertar no trabalhar com voluntrios,
mas sim com profissionais, e acho que isso foi um ponto muito importante.
JOS FERRAZ FERREIRA FILHO

Os arte-educadores eram remunerados, isso foi uma das primeiras


coisas que a Regina disse na reunio. E eu achei isso muito interessante
e importante, porque um trabalho, e mais do que tudo, o vnculo com
a criana precisa acontecer de fato. Tinha um trabalho a ser conquistado,
tinha um objetivo, uma misso de aprendizado artstico. E eu acho que
isso d um outro objetivo. Quando voc trabalha com criana e voc fala de
profissionais remunerados, voc consegue uma continuidade, um vnculo
diferente do que se fosse voluntrio.
Eu falava para os profissionais: olha, um compromisso, no pode faltar
por nada. Porque a criana vai esperar, e essa criana que j foi vrias
vezes abandonada precisa daquele compromisso que foi firmado.
LGIA CORTEZ

VALDIR CIMINO

182 I 183

Os beneficiados pela ao da Arte Despertar poderiam, nestes dez anos,


ser numericamente muito superiores, mas a constante procura da
perfeio limitou este universo.
Isso, por exemplo, nos levou conscientizao de que atuar em hospitais
era o aspecto mais importante e original do nosso fazer. Em consequncia,
to logo comeamos a reunir reflexo a respeito da experincia, j nos
preocupamos em definir um manual de trabalho com foco na humanizao
dos hospitais atravs da arte.
O profissionalismo tornou-se marca da Associao e vai continuar sendo
sua principal caracterstica, ainda que, para isso, ela precise estender
sua ao a um menor nmero de pessoas.
Na relao com os parceiros, esta profissionalizao, a procura
por fazer com a mxima perfeio, por registrar e divulgar com vistas
a difundir as aprendizagens, nem sempre foi bem entendida por todos.
Como empresrios que so, muitos nos solicitam maior rapidez, mais
divulgao do seu patrocnio, maior volume de beneficirios.
DARIO FERREIRA GUARITA FILHO

Eu no trabalho na Arte Despertar, mas tenho a impresso de que eles


esto sempre construindo. Eles tm um ponto forte, estar em evoluo,
sempre em processo de construo.
TERESA GUARITA GRYNBERG

A Arte Despertar tentou vrios campos, e hoje ela tem o amadurecimento


de todas essas tentativas bem-sucedidas, e eu sinto a Associao muito
equilibrada, com uma histria j feita, um legado j construdo. duro que
hoje ainda seja tudo centrado na figura da Regina, mas eu acho que o jeito
do trabalho dela pode ter uma importncia muito grande.
LGIA CORTEZ

Em nosso Comit de Humanizao j vimos que o nosso olhar precisa ter


duas vertentes, no adianta a gente pedir para o profissional da sade que
aja com humanidade com o paciente, se ns, como instituio, no agirmos
com humanidade com o profissional da sade. Ento ns temos estas
duas vertentes. O paciente e o familiar, e o olhar voltado para o cuidado
humanizado com o prprio profissional da sade. Ele est lidando o tempo
todo com dor, sofrimento, morte. Ento ele precisa tambm de um cuidado
especfico, importantssimo para a instituio que tenhamos estas aes.
Para o paciente, por exemplo, quando o grupo atua diretamente com ele,
alivia muito o seu sofrimento. O familiar, quando est acompanhando,
tambm participa, ento so momentos de alvio daquela tenso
que o hospital traz. E o paciente tambm v esse alvio, porque a partir
do momento que o profissional da sade est tendo um processo
de humanizao, ele pode lidar com mais leveza, com mais alegria com
o paciente. Ento o paciente e o familiar se beneficiam dos dois lados.
o que a gente espera e o que tem acontecido.
WILZE LAURA BRUSCATO

184 I 185

Um dos maiores resultados a criana, a famlia, saber que o hospital no


s sofrimento. Ento, muitas pessoas passam a vida toda retornando para
o hospital, e essa lembrana que elas tm da hospitalizao algo bom,
que no s dor e sofrimento, mas esse lado ldico, que importante no
s para a criana, mas para o adulto tambm.

A humanizao hospitalar consiste, na verdade, numa nova maneira de


praticarmos as aes de sade. Porque as aes de sade tm que ocorrer, mas
elas podem ocorrer de forma humanizada. Ento a maneira de se trabalhar na
sade que tem que ser humana. Desde o bom dia at o procedimento mdico.
WILZE LAURA BRUSCATO

Existem estudos que comentam que melhora at a imunidade das crianas.


Porque elas deixam de ficar tristes, diminui a ansiedade, a preocupao.
Canaliza para onde? Para o prazer, o prazer de ouvir msica, de cantar, de ouvir
histria, de criar, e isso se manifesta no organismo, na questo fisiolgica.
Melhora a imunidade, e com isso a ideia at diminuir o tempo hospitalar.
CLIA YUKIKO OSATO

E as crianas se sentem absolutamente envolvidas no sentido de entender


que o hospital no s um lugar onde elas vo usar agulhas, tomar remdios e
afins. (...) Ento entendemos que esse conceito que a Arte Despertar faz aqui
dentro conosco extremamente til para que possamos ter um atendimento
humano, para as crianas. (...) Elas aceitam melhor e muitas vezes conseguem
receber o tratamento de que precisam. Aumentando a aderncia e aumentando
a complacncia, percebe-se que muitas vezes aumenta tambm a sobrevida.
ANTONIO SRGIO PETRILLI

A Arte Despertar est dando suporte e apoio emocional aos pacientes,


a partir do trabalho de Humanizao que vem desempenhando.

A atuao da Arte Despertar no ngulo hospitalar aquela questo de que no


s para as crianas, mas tambm para ns, profissionais. Hoje, por exemplo,
era um dia que eu precisava deles, porque eles quebram aquele clima agitado
at para ns, funcionrios, ento imagina para uma criana, para uma famlia.
Esta atuao traz um equilbrio para o ambiente. (...) A humanizao hospitalar
bem isso. Quando os profissionais comeam a entrar naquele mecanismo
hospitalar, de preocupao, de decises, de procedimentos dolorosos, os
arte-educadores acabam quebrando esse mecanismo, aliviando, e isso a
humanizao. E a grande proposta da Arte Despertar essa.
CLIA YUKIKO OSATO

Sempre achei interessante desenvolver aes junto comunidade. Acredito


no ser humano, e por isso me dedico a ele. Como empresrio, preciso me
valer de pessoas bem preparadas, mas o ser humano tem carncias. Sempre
me apaixonei por ajudar a preparar e desenvolver pessoas e muito tocante
ver os depoimentos contando a evoluo e como a vida delas melhorou
com este apoio. E eu tenho essa mesma sensao com os projetos da Arte
Depertar. Sinto uma melhora na qualidade de vida dos profissionais da sade
e pacientes atendidos pela Associao.

CARLOS VICENTE SERRANO JUNIOR


LCIO DE CASTRO ANDRADE FILHO

186 I 187

Bom, vou comear pelo que deixei. Deixei uma porta aberta, porque foi
bacana isso, eu sai da empresa e o projeto continuou, foi isso que provou
a legitimidade do projeto, que era da empresa, no meu. Foi porque ele era
qualificado e est l at hoje. E o que a Arte Despertar deu pra mim? Bom, me
ensinou a olhar a questo do aproveitamento da Lei Rouanet de uma forma
diferente. Eu tinha tido uma experincia anterior, quando aproveitamos
essa lei de uma forma grandiosa, mas de baixo impacto social. Confesso que
eu desacreditei sobre o projeto da Arte Despertar, e de fato conseguimos.
Quer dizer, eu acho que a Arte Despertar me ensinou a ver que a quantidade
financeira na mo no fator para voc se inserir em um projeto ou no.
Provou-se ali que com poucos recursos voc pode fazer um projeto relevante.
Outro fator foi ver o impacto de um projeto desses na comunidade. Porque, at
ento, eu nunca tinha entrado em uma favela e uma vez a Regina me convidou
para ir. A voc v que o projeto do Programa Einstein na Comunidade de
Paraispolis tem um alcance fabuloso, transformou aquela comunidade.
As pessoas que esto no entorno sabem que tm um ponto de apoio para a
sade, para a educao, para a escola, e um projeto para desenvolvimento
cclico e cultural. Voc v o impacto disso para uma comunidade, v que
as pessoas tinham cara de futuro, tinham cara de que estavam felizes,
de que tinham alguma coisa de melhor por vir l na frente. E elas exigem esse
respeito porque constituram ali uma comunidade. Voc v aquelas pessoas
evoluindo, cada vez mais organizadas, ganhando sua vida honestamente. H
uma viso muito equivocada do que favela, do que comunidade. Voc acha
que ali so pessoas sem perspectiva, pessoas perigosas, pessoas que no
tm uma atividade, esto ali a esmo. completamente diferente. Voc entra
l e v que todas as oportunidades que surgem ali as pessoas abraam. A Arte
Despertar me despertou para ver uma comunidade de forma diferente. uma
boa, porque eu acho que quem passa por isso comea a pensar melhor no que
favela e no que comunidade. E esse o grande ensinamento que tem ali.

O trabalho da Arte Despertar maravilhoso e de tirar o chapu! um


trabalho muito bom, muito planejado, sabe-se onde atuar e onde se quer
chegar. Com a msica em Paraispolis impressionante!
MARIA NADIR AZEVEDO DE MORAES

Acho que uma caracterstica dela se colocar de um modo um pouco


tmido. No sei se um erro. um jeito muito conservador. uma
caracterstica, que tem alguns benefcios e tem uma srie de malefcios.
No sentido de disposio, de atrair pessoas, pode-se dizer que um erro.
GUILHERME VIDIGAL ANDRADE GONALVES

Acho que a primeira rodada como instituio foi com uma empresa farmacutica, e o primeiro tombo tambm foi com ela, quando mudou o presidente
e mudaram os patrocnios tambm. Da a gente precisou correr atrs de outro.
DARIO FERREIRA GUARITA NETO

muito importante que as pessoas conheam esse trabalho, o que aconteceu


nos ltimos anos, quais so os nmeros, etc., para que a Associao cresa.
Precisamos mostrar o que feito para que todas possam conhecer. preciso
multiplicar esse conhecimento em lugares nunca antes imaginados. Por isso,
podemos pensar em uma expanso do trabalho, ou seja, um modelo multiplicador.

WILLIAM MALFATTI
HELOISA GUARITA PADILHA

188 I 189

Uma das primeiras parcerias que estabeleci junto ao Programa Einstein na


Comunidade de Paraispolis foi com a Arte Despertar. Porque acredito que
a criana consiga se desenvolver por meio da arte, ou seja, ela consegue
crescer e ser uma pessoa inteira, caso tenha a possibilidade de se expressar,
de mostrar o que pensa e o que acha da vida. Desde o incio tem sido uma
relao muito boa, por isso acredito que cresci junto com a Arte Despertar.

FORMAO DE PARCERIAS

A Arte Despertar foi fundamental na programao da comunidade em


Paraispolis. (...) No entanto, em relao s organizaes do Terceiro Setor,
importante perceber que uma ONG no uma empresa como outra qualquer.
Por isso, acredito que s permanecero as que realmente tiverem estabilidade
em todos os sentidos, ou seja, que passem credibilidade no mercado. (...)
Tnhamos na cabea que precisvamos dar as melhores condies para os
parceiros trabalharem conosco, tanto na parte fsica como na administrativa.

TELMA SOBOLH
TELMA SOBOLH

A minha relao com a Arte Despertar foi bastante interessante, porque


eu estava ingressando em uma empresa com a misso de estruturar sua
rea de comunicao e fortalecer sua marca no Brasil. Naquele momento
em que estvamos montando o projeto, apareceu a proposta da Arte
Despertar. E tinha l o projeto Fim de Semana com Msica, na comunidade
de Paraispolis. Era um projeto incentivado pela Lei Rouanet e tinha grande
potencial de alcance social, porque a proposta era dar para as crianas
da comunidade uma atividade aos sbados. A ideia da Arte Despertar
era levar uma proposta que viabilizasse atividades, que inspirasse as
crianas a se interessarem por msica. (...) E o projeto foi uma enorme
surpresa. (...) Isso foi em 2000 e continua at hoje. E um projeto que
conseguimos levar de forma bem estruturada, porque ele comeou
com o primeiro grupo, vieram outros e serviram para mostrar a msica
para as crianas, e quem gostou se profissionalizou e vive de msica.
WILLIAM MALFATTI

Na poca em que eu era presidente do JP Morgan, a ideia e a viso que eu tinha


era que a nossa instituio apoiaria iniciativas e projetos nos quais nossos
empregados pudessem participar ativamente, para viver uma experincia que
acho importantssima: sentir que todos ns fazemos parte de uma sociedade,
e temos que ajudar as pessoas que precisam de ajuda. E que, no fim, participar
na sociedade no simplesmente fazer uma doao, , de fato, se esforar
para entender os desafios das organizaes que esto se propondo a criar
valor no sentido social e, nesse contexto, participar ativamente e fazer com
que esse trabalho produza resultados. E havia tambm um outro objetivo:
atravs de um esforo dessa natureza, a equipe da instituio, no caso o JP
Morgan, se identificaria com a natureza das organizaes responsveis pelos
projetos atravs do trabalho em comum. Nada melhor que o trabalho realizado,
de humanizao em hospitais, que a Arte Despertar vinha fazendo, porque
atravs desse trabalho entre os funcionrios e a Arte Despertar, eles sentiram
diretamente o que trabalhar em conjunto para melhorar as condies, no s
hospitalares, mas de vida de quem precisa. Isso deu um resultado fantstico
em nvel organizacional. Muito se falava na organizao do trabalho que
os funcionrios faziam no fim de semana, de noite, das canes que eles
cantavam, dos desenhos que faziam, e isso criava em toda a instituio JP
Morgan um orgulho de fazer alguma coisa que est trazendo resultados
importantes para outros seres humanos, para indivduos doentes.
PATRICK CHARLES MORIN JR.

190 I 191

Houve um primeiro contato da Arte Despertar com a instituio.


E eu fui chamada para isto, na qualidade de presidente do Comit de
Humanizao. E, olha, trata-se de um namoro, noivado e casamento que
esto dando muito certo at hoje. Porque de pronto ns nos identificamos
muito com os valores, com as vises, ento houve uma identidade muito
grande. E a partir de ento, quer dizer, ns tivemos os nossos primeiros
encontros de apresentao mtua, a Associao nos mostrou o trabalho
que gostaria de desenvolver aqui. Ento o Comit teve a autorizao
dos nossos superiores. E a Associao, na verdade, j traz uma equipe
muito boa, ento ela nos traz um cronograma relativamente fcil de
implantar nas unidades. Para essa implementao tambm se ouviu a
diretoria das unidades. E a partir de ento temos feito reunies regulares,
mensais, comigo, e tambm com uma pessoa representando o local onde a
Associao tem realizado suas atividades. E isto tem dado muito certo.

Esperamos que essa parceria com a Arte Despertar se mantenha, temos


muito interesse em dividir esse espao aqui com um projeto que est
dando muito certo. Ento gostaramos tambm de aproveitar para
agradecer o esforo, a colaborao, porque estamos tentando fazer algo
que puxe para o mesmo lado, que curar as crianas e faz-las sair daqui
vitoriosas e enfrentar o resto das vidas como cidads competentes.
ANTONIO SRGIO PETRILLI

A parceria entre o escritrio De Goeye Advogados Associados e a Arte


Despertar comeou h tempos e foi resultado de um lao de amizade. Durante
uma reunio, eles me contaram como era o trabalho que realizavam e eu achei
maravilhoso, muito bem desenvolvido e srio.

WILZE LAURA BRUSCATO


Interessei-me pela causa e achei que deveria dedicar um tempo para trabalho
pro bono, forma de trabalho voluntrio na qual a atividade exercida com
carter e competncias profissionais, mas sem remunerao.
E a Arte Despertar teve incio bem no momento em que se comeava
a comentar sobre humanizao no meio hospitalar, isso faz mais de
dez anos. A proposta comeou naquele perodo, tanto que na poca
tinha muito pouco desses momentos. (...) Na poca, ns tnhamos um
grupo aqui no Hospital das Clnicas que tinha a proposta de ajudar o
paciente, s que com necessidades bsicas, no tinha nenhum grupo
que pensasse na questo do paciente, principalmente da criana.
CLIA YUKIKO OSATO

ENRIQUE DE GOEYE NETO

Acho os projetos muito interessantes e eficazes, e isso possvel perceber


pelos resultados e aceitao dos parceiros e patrocinadores. A resposta
das entidades que abrem as portas para o trabalho da Arte Despertar e dos
beneficiados traduz o quanto a instituio est ajudando e til para o ser
humano. Inclusive, em alguns hospitais a Arte Despertar est h anos, o que
comprova o quanto seu trabalho efetivo.
LCIO DE CASTRO ANDRADE FILHO

192 I 193

Acho que estamos num momento muito melhor do que dez anos atrs. Tem uma
curva de aprendizado a valiosa e tem projetos muito bons a serem olhados. Acho
tambm que as empresas esto mais conscientes de que precisam envolverse de alguma forma e este um dos grandes aprendizados que aconteceu.
A evoluo que houve foi que as empresas passaram a acompanhar melhor a
utilizao desses recursos e esse o grande avano. As empresas encontraram
oportunidades de inserir as pessoas nesses projetos. Para a marca
da empresa, l na ponta, faz bem, e para o esprito da empresa tambm. (...)
As empresas esto colocando essas questes como metas corporativas.

SUSTENTABILIDADE

Ento, para a sustentabilidade, no comeo o intuito era captar patrocnio para


fazer a Arte Despertar girar. Em seguida, foi o projeto incentivado, no qual,
em vez de pagar impostos, investia-se em projetos. E agora, o mais bacana,
a venda de produtos. A Arte Despertar uma empresa em que se vende
produtos e se tem o encontro de interesses entre o Terceiro Setor e a iniciativa
privada, as empresas. (...) Esse produto me interessa, portanto compro esse
produto como um negcio. Um negcio sem fins lucrativos. Acho que esse o
pice da sustentabilidade da Associao.
DARIO FERREIRA GUARITA NETO

Esses recursos foram destinados para a comunidade e mexeram com as


pessoas diretamente. Ento ele foi um projeto que no se limitou em promover
a cultura, que a essncia da Lei Rouanet, mas ele causou um impacto social.
A partir da, fomos convidados a fazer palestras sobre nossa parceria e
sobre como era o projeto. Ento eu tive a oportunidade de participar com
a Arte Despertar em duas palestras que fizemos para apresentar o projeto
para outras empresas. E as pessoas se surpreendiam com este formato
de utilizao da Lei naquele momento. Foi especial. Era fcil voc aderir
a um projeto como esse. E eu acho que essa questo do aproveitamento
do incentivo fiscal, nesse projeto, foi um exemplo. Um exemplo porque
ele vlido para hoje ainda, nove anos depois. um projeto que tem uma
validade presente, ele ainda um smbolo.
WILLIAM MALFATTI

As dificuldades que enfrentvamos eram sair de mos abanando de diversos


contatos. Tivemos sucessos tambm, mas era de certa forma frustrante
levar um trabalho to maravilhoso e no conseguir um investidor.
JOS FERRAZ FERREIRA FILHO

Quando voc doa para um hospital, por exemplo, eu sei que foi para uma
finalidade especfica. Assim, para a Arte Despertar, pensamos em diferentes
formas para isso e foi criado um fundo especfico, do qual sairia uma verba
para a Associao. Uma parte desse rendimento seria voltada sempre para ela,
independente da variao. E isso funcionou bem, ou seja, com retirada duas
vezes ao ano. um valor que tem importncia para a Arte Despertar e temos
o compromisso de continuar com ele. Em primeiro lugar, o modelo precisa
ser sustentvel. No adianta voc ganhar cinco mil reais de salrio e querer
doar quatro, porque no vai funcionar. Tem que ser algo verdadeiro, que caiba
no oramento. Assim, para o modelo ser bem feito, preciso estipular um
nmero fixo. Alm disso, como o fundo no agressivo, quando pensamos em
longevidade preciso pensar em moderao, ou seja, com uma rentabilidade
boa, mas sem correr muito risco, j que desse fundo voc ter um ganho do
qual ser retirado um percentual estabelecido previamente.
Por isso, manter tudo dentro de uma estrutura conservadora o que faz dar
certo. Podem ser valores muito grandes ou pequenos, o importante que a conta
esteja dentro de uma realidade familiar ou individual e que tenha durabilidade.
HELOISA GUARITA PADILHA

194 I 195

Ficamos entre a cruz e a espada por ter os ovos em uma s cestinha, porque
se algum parceiro muda de ideia, o que eu vou fazer? Ento, muitas vezes se
perde, e as maiores angstias so sempre quando revalidamos um contrato.
O sofrimento de ficar sem dinheiro passamos todo ano, normal. Vamos
consolidando a credibilidade a partir do momento que esses investidores veem
resultado e se sentem participativos, a partir do momento que a empresa vem
buscar resultados positivos com as organizaes.
VALDIR CIMINO

Ento, so pessoas que vieram do mundo empresarial e trouxeram para a


organizao uma rede de contatos muito interessante. E, logo, apoios muito
significativos surgiram. Apesar de serem apoios bastante fortes, no h em lugar
nenhum uma garantia de ficar por muito tempo. Ento, na poca, a questo era
como tornar isso sustentvel, como a organizao iria dividir melhor os ovos na
cesta, porque tinha um ou dois patrocinadores fortes. A maior parte do oramento
estava centralizada em uma ou duas grandes fontes de financiamento. Ento
tinha essa preocupao, voc tem a cesta l e, se cai, tem um srio problema de
sustentabilidade. Fomos chamados naquele momento, para olhar essa questo.
A sustentabilidade no passa simplesmente pelo mbito financeiro. Ela passa por
uma srie de outros que, somados, vo trazer a sustentabilidade para a organizao.
ROGRIO MAGON

Foi um trabalho bom de conscientizao para descentralizao, porque a


Regina centralizava e ao mesmo tempo sem ela no funcionava. E ao longo
do trabalho ficou claro que isso era um problema para a sustentabilidade.
Portanto, foi importante para a evoluo da Arte Despertar.

Essa foi sempre uma preocupao que eu coloquei para a Regina, porque
obviamente as empresas procuram se colar em um objetivo de imagem ao
fazer aes como essa, isso legtimo. O segredo est em saber como usar
isso, e sempre tivemos esta responsabilidade de no deixar o marketing
ser maior que a ao e no ter essa desproporo. O marketing uma
consequncia da grandiosidade do projeto. No queramos usar o projeto
como um trampolim para fazer uma propaganda. Tinha um envolvimento,
e o projeto era um exemplo para outras empresas, marcava presena na
comunidade e levava as crianas at a empresa para terem o trabalho delas
valorizado. Aumentamos o projeto para um CD e as crianas at gravaram
um em estdio.
WILLIAM MALFATTI

Ento comeam a existir as empresas que tm um profundo equilbrio entre


o social, o econmico e o ambiental. No mais como algum diferencial, mas
como uma necessidade de ser para poder existir. As empresas que surgem
agora esto num mundo novo, onde o consumidor demanda. um estgio
que exige uma mudana de hbito do consumidor final, e isto um tema
dificlimo. As empresas que no estiverem com esse equilbrio bem feito
comearo a perder competitividade. E dependendo do setor, acho
que as organizaes que ganharam muito destaque no mercado so as no
governamentais, que hoje em dia fazem parte da discusso da sociedade
de uma forma extremamente importante. A fora que elas tm
muito grande e a capacidade de influncia muito forte.
DARIO FERREIRA GUARITA NETO

GUILHERME VIDIGAL ANDRADE GONALVES

196 I 197

Toda instituio do Terceiro Setor tem um grande desafio, que a


sustentabilidade, seja financeira, seja um projeto bem montado, que d para
multiplicar. A Arte Despertar, na minha viso, est ciente dos dois desafios e
est trabalhando nos dois, financeiro e de sustentabilidade
no contexto do projeto. Os maiores obstculos ou um dos grandes problemas
em boa parte das organizaes do Terceiro Setor se verem assistencialistas.
A Arte Despertar no se v assim, ou seja, no tem limite o trabalho que pode
fazer, j que ela est focando no treinamento e no preparo de intermedirios
que vo trabalhar com quem vai ser beneficiado no final da cadeia. As outras
ONGs, uma grande parte delas, trabalham diretamente com o beneficirio final
e isso cria uma necessidade de recursos humanos e financeiros muito grande,
que muitas vezes difcil desenvolver. A Arte Despertar no, tem um foco
muito mais interessante, est focando nos intermedirios hoje, grande parte
em hospitais, as enfermeiras, os mdicos etc., ajudando-os e treinando-os no
contexto da humanizao de hospitais e levando-os a fazer o trabalho com
seus colegas, com outros colegas, para o efeito multiplicador acontecer.
Ento eu acho que o modelo da Arte Despertar muito interessante e leva a
ter sucesso sem estar constantemente precisando de mais recursos, sejam
humanos ou financeiros, porque isso vai acontecer quase naturalmente.
PATRICK CHARLES MORIN JR.

E eu tenho impresso que para essa nova fase da Arte Despertar esse ser
o grande mote.
JOS FERRAZ FERREIRA FILHO

Ns somos parceiros no Congresso de Humanizao. Essa a maior parceria,


em que trocamos informao, compartilhamos e produzimos o evento. Ns
abraamos essa causa porque, se voc fortalece a causa, voc fortalece todas
as ONGs que esto ao redor.
VALDIR CIMINO

Tenho ideia sim da importncia do trabalho jurdico que desenvolvemos


para Arte Despertar. Tambm acredito na importncia da contribuio
para um mundo melhor. Todo exerccio bem feito, com esprito de
transparncia, qualidade tcnica e honestidade colabora para melhorar
o mundo. Acredito que ns, profissionais liberais, temos capacidade
para contribuir para melhorar o mundo e a vida das pessoas. Se cada
um melhorar o que faz, o mundo caminha junto.
ENRIQUE DE GOEYE NETO

198 I 199

Minha expectativa que seja, de fato, uma instituio relevante no


contexto da sociedade brasileira, que saia de So Paulo um dia e consiga
atingir o Brasil inteiro com seus produtos, e continue transformando a
sociedade com essas caractersticas que vimos nos ltimos dez anos.
Eu no tenho a expectativa de que veremos um dia qual o exato valor
daquilo que fazemos, mas que conseguiremos saber que esse tipo
de proposta promove uma mudana muito importante em quem est
recebendo esse trabalho. E com isso, esperamos que um dia consigamos
virar uma poltica pblica. isso que espero para os prximos anos.
DARIO FERREIRA GUARITA NETO

Eu concordo com o que ele falou, mas, um dos desafios procurar


descentralizar a liderana da Regina nos prximos dez anos. Eu teria essa
meta, que super importante para perpetuar a Arte Despertar, alm de
transformar esse trabalho todo em algo replicvel. Agora, quando vai ser feito,
qual a abrangncia disso, no sei. (...)
GUILHERME VIDIGAL ANDRADE GONALVES

Uma fora bem atual, est aqui a prova, que so vocs. Jovens empresrios que
esto chegando hoje na liderana das organizaes e que vm com uma outra
cultura, uma cultura diferente das geraes anteriores, que no se preocupavam
com essas questes, que viviam um outro perodo econmico, que no tinham
esse tipo de preocupao. Hoje, essa nova gerao de empresrios e executivos
j vm com essa cultura, j ouvem isso desde criana, j fazem parte da cultura.
Ento isso um ganho que vem de forma natural. Uma segunda fora muito
importante a sustentabilidade do planeta. Os empresrios esto vendo que

no adianta tapar o sol com a peneira, o planeta est consumindo o restinho dos
seus recursos, que se a gente no souber dar uma freada nisso e trabalhar de
uma forma mais humana, mesmo que deprede menos, no vai ter planeta para
uma prxima gerao. Ento essa uma fora que est impulsionando bastante,
ela pega inicialmente a questo ambiental, mas passa pela questo social
fortemente. E a terceira fora a sociedade. Que apesar de voc estar falando
que difcil mudar hbitos de consumo, pelo menos uma parte da sociedade j
sabe que no pode comprar aquele produto que no tem aquele selo e tal. Ainda
no uma mudana grande porque o mercado no se regulou dessa forma,
mas j existe um bom nvel de conscincia da sociedade para empresas que
atuam de forma correta. Ento eu acho que essas trs foras ajudam muito essa
questo e favorecem. E a quarta fora essa que voc falou, com a possibilidade
que vem no bojo da volta da democracia para o Brasil, a possibilidade de
expresso democrtica das associaes, das ONGs e tudo mais. Isso veio da
nova constituio para c. Antes de 1988, meia dzia de pessoas reunidas em
uma associao dava cadeia. Ns aqui, antes de 1988, seramos acusados de
comuna, de esquerda. Ento acho que isso veio da para c e mudando muito. A
sociedade, quer organizada ou no, j est de olho. Ainda incipiente? Claro, um
projeto novo, que no tem 20 anos. Mas j d sinais. Voc v que hoje no se fica
to impune como antes. Voc tem a sociedade e a mdia podendo se expressar,
as coisas no acontecem assim, sem que a sociedade fique sabendo. (...)
Eu no estou no dia-a-dia da organizao, eu no estou familiarizado com o
planejamento mais recente, mas eu vejo assim, tambm, como o Guilherme
est falando. o desafio da liderana, da sucesso, porque hoje so dez
anos de muito impulso da Regina. Que cara vai ter essa instituio daqui para
frente, como ela vai estar nos prximos anos? Como essa transio de um
perodo pioneiro para uma organizao mais madura, que tem o seu trabalho
vinculado com os princpios do pioneiro, mas sempre tendo uma gesto que
possa ser compartilhada por vrias pessoas? Acho que esse continua a ser
um desafio muito grande.
ROGRIO MAGON

200 I 201

01 I 02

NO SE DESCOBREM NOVAS TERRAS SEM CONSENTIR EM PERDER A PRAIA DE VISTA POR UM LONGO TEMPO.
Andr Gide

01 I 02

ONTEM, HOJE E AMANH


REGINA VIDIGAL GUARITA

01 I 02

ONTEM, HOJE E AMANH

Que indivduos so esses que no decorrer desses dez anos investiram


tempo e conhecimento na Associao Arte Despertar? O que os motivou a se comprometerem com a sua misso: despertar a potencialidade
de indivduos por meio da arte e da cultura, possibilitando o exerccio de
aes transformadoras?
Certamente fazem parte de um grupo privilegiado de cidados partidrios do entendimento de que a transformao positiva de cada indivduo
responsvel pela mudana da sociedade, do mundo.

ONTEM

A Arte Despertar, na sua concepo, privilegiava crianas em comunidades de baixa renda e em hospitais.
Em seguida, naturalmente, foram engajados neste rol de beneficirios,
adolescentes, jovens e adultos. Adultos porque acompanhavam suas
crianas nos hospitais, e adolescentes e jovens porque se interessavam
pelas propostas de arte e cultura oferecidas nas comunidades.
A prtica social exigia responsabilidade, mas a persistncia surgia como
elemento imprescindvel na conquista de resultados.
A falta de modelos de gesto jurdica, financeira e social obrigava os profissionais envolvidos no dia-a-dia dos projetos a usar de muita criatividade na busca de boas estratgias e solues prprias.

S a mudana que
queres ver no mundo

Neste momento as aes da Arte Despertar se circunscreviam a um pblico ainda reduzido, porm engajado, fiel e observador em relao ao
carter transformador das propostas.

MAHATMA GANDHI (1869-1948)

208 I 209

Passados dez anos, o compromisso da Associao para com a sociedade


exigiu um repensar para fazer frente s novas expectativas e demandas, a
comear pelo conceito de sustentabilidade que se instaurou como prerrogativa mxima para a perenidade de qualquer instituio do Terceiro Setor.

HOJE

A Arte Despertar est fazendo e vai


fazer um trabalho importantssimo
para a sociedade. Interessante que
nem sempre vamos ver l de fora esse
trabalho, porque um trabalho que
est sendo feito em outro nvel, com
os mdicos, enfermeiras etc., mas de
impacto muito grande em hospitais.

Neste sentido, para a sustentabilidade da Arte Despertar, criada uma


tecnologia social, resultante da sistematizao de uma metodologia consolidada durante dez anos em hospitais e comunidades e cujas caractersticas refletem o perfil da sociedade atual, ou seja, a capacidade de
disseminao, o baixo custo e o fcil entendimento na sua aplicao.
A criao da Tecnologia Arte Despertar (TAD) ampliou a linha de
ao da Associao. Alm de surgir como um elemento de sustentabilidade financeira, j que foi desenhada para ser um produto e caracterizada como uma prestao de servio, a TAD se props a disseminar
e implantar sua metodologia em hospitais em consonncia com a Poltica Nacional de Humanizao e em comunidades de baixa renda, na
formao de educadores.

PATRICK CHARLES MORIN JR.


O importante que a Arte Despertar
est conosco no apenas olhando
para o nosso paciente e para o
familiar do nosso paciente, mas
tambm para o profissional da
sade. E isto, para ns, muito
importante, cuidar de quem cuida.

A comunicao surgiu como elemento vital tanto para dar visibilidade e


credibilidade Arte Despertar na divulgao de suas aes, quanto na
participao e comprometimento dos profissionais no compartilhamento de ideias e de opinies, fortalecendo capacidades.

AMANH

Daqui para a frente, aps anos de exerccio de uma prtica cujo objetivo
maior foi valorizar o indivduo, a Arte Despertar quer ampliar o espectro
de suas aes, atingindo e fortalecendo a quem mais precisa no apenas
na promoo de seus direitos, mas tambm na criao de um novo perfil,
do protagonista e do crtico experiente, capaz de favorecer o desenvolvimento social, o cidado!
Para tanto, a Associao pretende divulgar a Tecnologia Arte Despertar e implant-la onde haja espao para a transformao deste cidado, seja em ambientes de sade, de educao ou no meio empresarial,
cumprindo assim seu papel na criao de uma sociedade capaz de projetar um futuro promissor.

WILZE LAURA BRUSCATO


Para a construo da nova linha de ao, foi necessrio agregar profissionais Arte Despertar que estivessem em sintonia com a construo
da nova proposta e que tornassem suas experincias individuais em
experincias coletivas. O comprometimento e a participao de todos
como equipe era essencial para o xito do novo propsito.
No incio, projetos-piloto facilitaram o entendimento e o engajamento
dos profissionais. A diversidade de parcerias proporcionou o contato
com propostas congneres, fortalecendo a equipe em competncia e
vivncia. A prtica do dia-a-dia gerou um conhecimento importante,
que uma vez sistematizado tornou-se contedo da Tecnologia Arte
Despertar. Para acompanhar os resultados foram criados mtodos
avaliativos e indicadores.

O trabalho de humanizao junto aos


profissionais da sade de extrema
importncia, e alm de trabalhar o
emocional, d animo e incentivo a
lidar com os seus pacientes e oferecer
um cuidado melhor. Ento, de forma
indireta, os pacientes tambm so
beneficiados nesse processo.

Esta evoluo retratada da Arte Despertar s foi possvel graas ao comprometimento de seus associados, conselheiros, diretores, parceiros, patrocinadores e profissionais da Associao, responsveis pela conquista
de resultados positivos. A estes deixo meu agradecimento.
Regina Vidigal Guarita
Diretora-presidente

CARLOS VICENTE SERRANO JUNIOR

210 I 211

OS PARCEIROS

01 I 02

OS PARCEIROS

A Associao Arte Despertar agradece a todos que acreditaram em sua causa e contriburam
para o seu crescimento, tornando seus projetos uma realidade.

COLABORADORES ARTE DESPERTAR


Adriana Freires Arago

Claudia Viri de Oliveira

Adriana Maria Motta de Siqueira

Cleide Beatriz Masini Barbosa

Alberto Duvivier Ortenblad

Clodoaldo Aparecido Alves Silva

Alcides de Lima Junior

Conceio Aparecida da Costa

Alcita Maria Coelho de Lima

Cristiana Arantes Lanhoso

Alessandra P. S. Peixoto

Cristiana Lima Gabriel

Alex Rosato

Cristiane Alves Silva

Amanda dos Santos Agostini

Cristiane Sayegh

Amaury Costa Brito

Daniel Coelho Matos

Ana Cristina Simes Parente

Daniela Helena Biancardi

Ana Emlia C. Ribeiro

Daniela Rodrigues Flor

Ana Luisa Lacombe

Dbora Cristina de Melo Ramires

Ana Maria Rodolpho Domingues

Dbora Kikuti da Silva

Ana Rosa A. Arajo Costa

Denis Henrique da Silva Duarte

Andr Pereira Lindenberg

Denise Garcia dos Santos Chaves

Andr Vicino de Lucca

Diana Matsumoto

Andra de Almeida Bossi

Edson Pereira de Luna

Andra Mangabeira Faingezicht

Elisabeth Belisrio

Andrezza Medeiros Vieira da Silva

Estevo Silva da Conceio

Anglica Costa Arechavala

Everaldo da Silva Santos

Anna Carolina Loiacono

Fabiane Cristina Matias Schwenkow

Bruno Almeida Silva

Fabiane da Silva Reginaldo

Camila Bigio Grynszpan

Fbio Nogueira de Matos Martins

Camila Miccas

Fbio Vieira Rodrigues Rosa

Clia Gomes Chaves

Fernanda Efigenia Ribeiro

Chake Erkizian

Fernanda Kelly da Silva Brito

214 I 215

Fernando Nitsch Borges de Almeida

Lus Roberto Soares dos Santos

Renata Flaiban Zanete

Gabriel Jnior

Maicira Maria Oliveira Trevisan

Renata Munhoz Martins

Gabriela Villaboim de Carvalho Hess

Mara Daniel Vaz Valente

Renato Tocantins Sampaio

Geraldo Maria Orlando Filho

Mrcia Cristina da Silva

Graziela K. Kunsch
Helena Domingos

PARCEIROS (PESSOAS FSICAS)

Fabio Noto

Lygia Fonseca Vidigal

Fernanda Niemeyer

Manoel Carlos da Costa Santos

Alberto Malta de Souza Campos

Flora Romanzoni

Marcia Maria Abreu V. Pinheiro

Ricardo Marques de Souza

Alssio Calil Mathias

Gasto Augusto Bueno Vidigal

Marcos Lima de Freitas

Marco Antonio da Silva

Rita de Cssia Demarchi

Alexandre Grynberg

Gasto de Souza Mesquita

Maria Beatriz Portugal Gouvea

Marco Antonio Ramos Borneu de Abreu

Roberta Delizoicov

Alexandre Negro

Gilberto Dantas

Maria Carolina Sapata

Joo Gomes da Silva

Marco Aurlio de Arajo Silva

Roberta Maia Sessa Frederico

Alice Ferreira

Giordano Biagi

Maria da Penha F. da Cruz

Joo Mauro

Maria Angela de Souza Lima Rizzi

Roberta Paola Parente

Alvaro Cesar Ferrari

Gisela Guarita Levy

Maria Eugnia Saldanha

Joelma Correia de Andrade

Maria Christina de Souza Lima Rizzi

Rodrigo Dionisio

Andr Mesquita

Giselle Cicotti

Maria Helena Ribeiro do Valle

Jos Henrique Reis de Menezes

Maria das Graas Saturnino de Lima

Rodrigo Y. Castro

Andr Sobral

Guilherme Vidigal Andrade Gonalves

Maria Lcia Ferlini

Joyce Helena Bisca

Maria Fernanda Cardoso Santos

Rosana Errico

Andr Victor Neuding

Heloisa Guarita Padilha

Maria Nadir Azevedo de Moraes

Joyce Machado de Coimbra

Maria Graziella Guarita

Rosngela Almeida

Andreia da Silva Silveira

Henrique Lacerda de Camargo

Maria Virginia Leardi

Joyce Menasce Rosset

Maria Helena da Cruz Sponton

Samara Ferreira

Anna Ceclia Pinheiro Malta Campos

Ibsen Augusto Ramenzoni

Marlia Fernanda Correia S. Pedroso

Juliana Leis Balsalobre

Maria Helena Webster

Sandra Urizzi Lessa

Antonio Augusto Abreu Sampaio

Irineu Ferman

Marina Brant de Carvalho

Juliana Yogui

Maria Stela Fortes Barbieri

Silvana Abreu

Antonio Carlos Vidigal

Joo C. Marchesan Filho

Marina Brito Gonalves

Karin Michaelis Oppenheim

Maria Tereza Estrabon Falabella

Slvia Cristina Roque Mascarenhas Cruz

Camila Vieira Santos

Jos Alberto Tozzi

Marina Mendes Bassalo Mesquita

Karin Patrcia da Silva

Marlia Pontone Hellmeister

Slvia Regina Monteiro

Carlos Alberto Gramani

Jos Benedito Rodrigues Jnior

Maurcio Souen

Kelly Aparecida da Silva

Marilisa Galvo Basso de Oliveira

Simone Moerdaui

Carlos Vicente Serrano Junior

Jos Ferraz Ferreira Filho

Maurlio Biagi Filho

Kelly Aparecida da Silva Jardim

Marina Quinan

Solange Salva

Celina Ida de A. S. Campello

Jos Roberto Opice

Maurcio Pompia Fraga

Laura Dantas de Souza Pinto

Marllon Brando Feitosa Chaves

Sonia de Almeida Sampaio Teixeira

Celso Clemente Giacometti

Jos Romeu Ferraz Neto

Ney Castro Alves

Laura Finocchiaro

Marta Labriola Sandler

Sonia Lazara Biroli de Medeiros

Cristiano Biagi

Josefa Rodrigues

Olvia Gonalves Messa

La Pintor de Arruda Oliveira

Mauricio Anacleto

Sonia Silva

Dalva Funaro Gasparian

Laura Suarez Gomes

Orlando Gicomo Filho

Leila Garcia

Milena de Marco

Tmara David de Oliveira Sousa

Daniel Vianna Silveira

Lgia Souto Vidigal

Patrcia de Queirs Mattoso

Leila Yuri Sugahara

Murilo Krammer

Tnia Marilis de Oliveira Piffer

Dario Ferreira Guarita Filho

Luciana Freitas Pupo Nogueira

Patrick Charles Morin Jr.

Letcia de Cssia Cocciolito

Nadia Ferreira Esteves Tadema

Telma Helena dos Santos

Dario Ferreira Guarita Neto

Luciano Sapata

Paulo Augusto Ramenzoni

Lgia Cristina Dantas

Orlene Queila de Oliveira

Tereza Simonsen de Ferraz Ferreira

Dinah Portugal Gouvea

Lcio de Castro Andrade Filho

Paulo Brasil Moraes F. Velloso

Lgia Maria Camargo Silva Cortez

Paula Galasso

Thelma Lbel

Dora Guarita Levy

Luis Eduardo da Costa Carvalho

Paulo Brito

Lgia Nbrega

Paulo Fernando Dias de Toledo Pitombo

Urga Mara Cardoso

Edith Geribello

Luiz Eduardo Campello Filho

Paulo de Tarso C. Opice

Lilian dos Santos Magnani

Priscila Basile de Moraes Leme

Vincius Spinelli Peixinho

Eduardo Junqueira da Motta Luiz

Luiz Fonseca de Souza Meirelles Filho

Paulo Guaspari

Luciana Caldeira Viacava

Rafael Galli

Viviane Xavier Marques

Eduardo Vidigal Andrade Gonalves

Luiz Martins

Raquel Carvalho Oliveira

Luciana de S Bertossi

Rafael Masini Barbosa

Eleonora Pitombo

Luiz Masago Ribeiro

Reinaldo Marques

Luciane Toffoli

Regina Vidigal Guarita

Fabiana Fagundes

Luiz Vicente Barros Mattos Jr.

Renata Camargo Nascimento

216 I 217

Renata Cavalcanti Biselli

PARCEIROS (PESSOAS JURDICAS)

Roberto A. Gomes Dantas

De Goeye Advogados Associados

Instituto Arte na Escola

Museu de Arte Moderna de So Paulo (MAM)

Teatro Brincante

Deloitte Touche Tohmatsu Auditores Independentes

Instituto Camargo Corra

Novartis Biocincias SA

Teatro Clia Helena

Roberto Jaime Engels

Aldeias Infantis SOS de Rio Bonito/SP

Epanor Lecca SA

Instituto Criar de Cinema e TV

Novartis Sade Animal Ltda

Teatro FUNARTE

Roberto Pereira de Almeida Filho

Associao Crescer Sempre

Escola Estadual Maria Zilda Gamba Natel

Instituto de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clnicas (IOT)

Novartis Seeds Ltda

Teatro Padre Bento (Guarulhos/SP)

Robertson Emerenciano

Associao Santo Agostinho (ASA)

Escola Habitat

Instituto do Cncer do Estado de So Paulo (ICESP)

Ncleo Educacional da Santa Casa de Diadema

Teatro Santa Cruz

Rosa Helena M. Pinheiro

Associao Viva e Deixa Viver

Espao Cachuera

Instituto do Corao do Hospital das Clnicas da Faculdade de Medicina

Odontoclnicas

The Key Organizaes e Marcas Cidads

Ruy Simes Pinto Jr.

Associao Viver em Famlia para um Futuro Melhor

Estdio 185

da Universidade de So Paulo (InCor HCFMUSP)

Olivieri & Signorelli Advocacia

Theca Corretora SA

Sandra Alves Silva

Banco ABC Brasil

Estdio Colrio

Instituto Fonte

Oxiteno Nordeste SA Industria e Comrcio

Tiffany & CO

Srgio Paula Souza Caiuby

Banco Indusval Multstock

Fundao Armando Alvares Penteado (FAAP)

Instituto Ita Cultural

Parque Alfredo Volpi

Tostex Haddock Lobo

Sheila Lyrio

Banco Mercantil Finasa

Fundao Bienal de So Paulo

Instituto Minidi Pedroso de Arte e Educao Social (IMPAES)

Parque Burle Max

UBS Pactual Asset Management

Simone Guaspari

Banco Pecnia SA

Fundao Faculdade de Medicina

Instituto Tomie Ohtake

Perxidos do Brasil Ltda

UBS Pactual Corretora de Mercadorias

Sonia da Cunha Bueno Vidigal

Banco Sudameris

Fundao Julita

Intercode Tecnologia

Petrobras Petrleo Brasileiro SA

Unio Brasileira de Vidros SA

Stefan Neuding Neto

Bandeirante Energias do Brasil

Fundo Municipal da Criana e do Adolescente (FUMCAD)

Irmandade da Santa Casa de Misericrdia de So Paulo

Petrleo Ipiranga

Unio Vidigal Participaes Ltda

Suzana C. Scuracchio

Banespa SA

Galo SA

Ita Seguros SA

Pinacoteca do Estado de So Paulo

Tania Morin

Biblioteca Anne Frank

Goldman Sachs do Brasil Corretora de Ttulos e Valores Mobilirios SA

Jardim Botnico de So Paulo

Pr do Som Produes Artsticas

Teresa Guarita Grynberg

Biblioteca Hans Cristian Andersen

Grfica Igupe

Jardim das Esculturas/Parque da Luz

Posto de Orientao Familiar (POF)

Tereza Proena

Boehringer Ingelheim do Brasil Qumica e Farmacutica Ltda

Grupo de Apoio ao Adolescente e Criana com Cncer (GRAACC)

JP Morgan

Prefeitura Municipal de Guarulhos

Terezinha Gotti

Brasmetal Waelzholz SA - Indstria e Comrcio

Grupo Ultra

Lecca SA

Prefeitura Municipal de So Paulo

Vera Ins Marmo Masago Ribeiro

CBI Indstria e Comrcio Ltda

Guarita Associados

Mahil Participaes Ltda

PricewaterhouseCoopers

Vernica Tutundjian

Centro Cultural do Banco do Brasil (CCBB)

Gusmo & Labrunie

Mapfre Seguros

Programa Einstein na Comunidade de Paraispolis (PECP)

Victor Artur Renault

Centro Cultural Herman Gmeiner

Hedging-Griffo Asset. Management SC Ltda

Maring SA - Cimento e Ferro Liga

Projeto Arrasto

Virgnia Garcia de Souza

Centro Cultural Rebouas

Hedging-Griffo Corretora de Valores SA

Markiodonto

RGNutri

Viviane Cohen Nascimento

Centro de Estudos e Pesquisas em Educao, Cultura e

Hospital da Criana Nossa Senhora de Lourdes

Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr. e Quiroga Advogados

Secretaria da Sade de Guarulhos

Ao Comunitaria (CENPEC)

Hospital e Maternidade So Lucas (Diadema/SP)

Minerao Buritirama SA

Secretaria de Cultura de Guarulhos

Centro de Voluntariado de So Paulo (CVSP)

Hospital Geral de Guarulhos

Ministrio da Cultura

Secretaria de Estado da Cultura de So Paulo

Coelho da Fonseca Empreendimentos Imobilirios

Hospital Israelita Albert Einstein

Ministrio da Sade

SESC

Colgio Santa Cruz

Hospital Maternidade Jesus Jos e Maria (Guarulhos/SP)

Mosteiro So Geraldo

SESI

Companhia Agrcola Usina Jacarezinho

Hospital Municipal da Criana (Guarulhos/SP)

Museu da Casa Brasileira

Social Web

Companhia Melhoramentos Norte do Paran

Hospital Municipal de Urgncias (Guarulhos/SP)

Museu da Imagem e do Som (MIS)

Stan Desenvolvimento Imobilirio

Comunitas - Parcerias para o Desenvolvimento Solidrio

Hospital Nossa Senhora de Lourdes

Museu da Lngua Portuguesa

Stan Empreendimentos e Participaes Ltda

Conselho Municipal da Criana e do Adolescente (CMDCA)

Hospital Stella Maris (Guarulhos/SP)

Museu de Arte Contempornea da Universidade de So Paulo (MAC/USP)

Teatro Alfa

Construes e Comrcio Camargo Corra SA

Instituto Alfa de Cultura

Museu de Arte de So Paulo (MASP)

Teatro Brasileiro de Comdia

218 I 219

CURRCULOS DOS AUTORES

01 I 02

Eduardo Montechi Valladares

0
IMPRESCINDVEIS UTPICOS

Ps-doutorando em Histria pela Unicamp. Doutor e mestre em Histria Social pela USP. Bacharel e licenciado em Filosofia pela USP e em
Histria pela PUC-SP. Autor do livro Anarquismo e anticlericalismo,
Editora Imaginrio (2000), e coautor de Revolues do sculo XX,
Editora Scipione (1995). Corroteirista e consultor histrico do filme
Ns que aqui estamos por vs esperamos (1999).

Rui Luis Rodrigues


Historiador formado pela Faculdade de Filosofia, Letras e Cincias
Humanas da Universidade de So Paulo. Atualmente, realiza estudos
de doutoramento em Histria Social na mesma Universidade.

3
DESPERTAR COM E PARA A ARTE

Maria Christina de Souza Lima Rizzi


Professora Doutora do Departamento de Artes Plsticas e do Programa
de Ps-Graduao em Artes Visuais. Coordenadora da Licenciatura em
Artes Plsticas, Escola de Comunicaes e Artes da Universidade de
So Paulo.

1
A NOO DE RESPONSABILIDADE SOCIAL
EM PERSPECTIVA HISTRICA: DO INCIO
DA MODERNIDADE AO CONTEXTO QUE
GEROU A ASSOCIAO ARTE DESPERTAR

4
UM POUCO DE NS

Maria Angela de Souza Lima Rizzi


Educadora, formada em Pedagogia pela Faculdade de Educao da Universidade de So Paulo, trabalha em projetos sociais desde 1990. De 2000
a 2007 atuou como coordenadora pedaggica e atualmente pedagoga
dos projetos na Associao Arte Despertar.

Maria Helena da Cruz Sponton

Felipe de Souza Tarbola


Mestre em Sociologia da Educao pela Faculdade de Educao da USP
e especialista em Sociopsicologia pela Fundao Escola de Sociologia
de So Paulo. Graduado em Cincias Sociais e Filosofia pela Faculdade
de Filosofia, Letras e Cincias Humanas da USP, e em Jornalismo pela
FIAM/FAAM. vice-diretor, professor e pesquisador na Escola de
Aplicao da Faculdade de Educao da USP.

Arte-educadora e psicopedagoga. Professora convidada da Faculdade de


Sade Pblica da Universidade de So Paulo. Coautora do livro Educao Ambiental e Sustentabilidade, editado pela Manole/USP. Consultora de Humanizao do Instituto do Cncer do Estado de So Paulo
(ICESP). De 1997 a 2007 atuou na coordenao pedaggica e atualmente
pedagoga dos projetos na Associao Arte Despertar.

2
O INDIVDUO E A ARTE DE RECRIAR-SE
6
ONTEM, HOJE E AMANH

Regina Vidigal Guarita


Empreendedora social, idealizadora e diretora-presidente da Associao Arte Despertar.

222 I 223

REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

01 I 02

1
A NOO DE RESPONSABILIDADE SOCIAL EM
PERSPECTIVA HISTRICA: DO INCIO
DA MODERNIDADE AO CONTEXTO QUE GEROU
A ASSOCIAO ARTE DESPERTAR
Rui Luis Rodrigues

ADORNO, Theodor W., HORKHEIMER, Max. Dialtica do esclarecimento.


Traduo. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1985.

HABERMAS, Jrgen. A crise de legitimao do capitalismo tardio. Traduo. Rio de


Janeiro: Tempo Brasileiro, 2. edio, 1994.

SKINNER, Quentin. As fundaes do pensamento poltico moderno. Traduo. So


Paulo: Companhia das Letras, 1996.

BARBOSA, Lia Pinheiro. Significados do Terceiro Setor: de uma nova prtica


poltica despolitizao da questo social. Sociedade e cultura 9, 2006, p. 173-186.

______. A revoluo e a necessidade de reviso na esquerda. O que significa


o socialismo hoje? In: BLACKBURN, Robin (org.). Depois da queda. O fracasso
do comunismo e o futuro do socialismo. Traduo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2.
edio, 1993.

VIVES, Juan Luis. De subventione pauperum sive De humanis necessitatibus, Libri II. In: C.
MATHEEUSSEN et. al. (ed.). Selected Works of Juan Luis Vives, Vol. IV (Latin text,
introduction, critical edition, translation and notes). Leiden: Brill, 2002.

BARON, Hans. The Crisis of the Early Italian Renaissance. Princeton, NJ: Princeton
University Press, 1966.

______. Tcnica e cincia como ideologia. Traduo. Lisboa: Edies Setenta, 2009.
DAGNINO, Renato, BRANDO, Flavio Cruvinel, NOVAES, Henrique
Tahan. Sobre o marco analtico-conceitual da tecnologia social. In: DE PAULO,
Antonio (ed.). Tecnologia social: uma estratgia para o desenvolvimento. Rio de Janeiro:
Fundao Banco do Brasil, 2004, p. 15-64.
DAVIS, Natalie Zemon. Ajuda aos pobres, humanismo e heresia. In: IDEM,
Culturas do Povo: Sociedade e cultura no incio da Frana moderna. Traduo. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1990, p. 23-61.
DELUIZ, Neise. Formao do sujeito e a questo democrtica em Habermas.
Boletim Tcnico do Senac 21, 1995, p. 1-8.
FERNANDES, Rubem Csar. Privado, porm pblico: O Terceiro Setor na Amrica
Latina. Rio de Janeiro: Relume-Dumar, 3. edio, 2002.

WALLERSTEIN, Immanuel. A descoberta da economia-mundo. Traduo.


Revista Crtica de Cincias Sociais 69, 2004, p. 3-16.

IOSCHPE, Evelyn Berg (org.). 3. Setor: desenvolvimento social sustentado. So Paulo/


Rio de Janeiro: GIFE/Paz e Terra, 2. edio, 2000.
LUCAS, Marclio Rodrigues. Os sentidos e os limites da responsabilidade social
empresarial: estudo de caso sobre os projetos do Instituto Algar. Habitus 4, 2007,
p. 37-53.
______. Um novo aperto no parafuso: o terceiro setor e a estratgia de
despolitizao da questo social. Urutagu 13, 2007. Disponvel em www.
urutagua.uem.br/013/13lucas.htm , acesso em 9/9/2010.
ROSA, Maria Cristina. Globalizao e diviso territorial do trabalho: uma
introduo discusso das novas tendncias na produo do espao. Acta
Scientiarum 20, 1998, p. 115-119.

______. O que Terceiro Setor. In: IOSCHPE, Evelyn Berg (org.). 3. Setor:
desenvolvimento social sustentado. So Paulo/Rio de Janeiro: GIFE/Paz e Terra, 2.
edio, 2000, p. 25-33.

SCHILLING, Heinz. Early Modern European Civilization and its Political and Cultural
Dinamism. Lebanon, NH: University Press of New England, 2008.

GODINHO, Vitorino Magalhes. Os Descobrimentos e a economia mundial. Lisboa:


Editorial Presena, 2. edio ampliada, 3 vols., 1984.

SIEBENEICHLER, Flavio Beno. Jrgen Habermas, razo comunicativa e emancipao.


Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 3. edio, 1994.

226 I 227

2
O INDIVDUO E A ARTE
DE RECRIAR-SE
Felipe de Souza Tarbola

BAUMAN, Z. Comunidade: a busca por segurana no


mundo atual. Rio de Janeiro: J. Zahar, 2003.
______. Identidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Editor, 2005.
DAGNINO, E. (org) Anos 90: poltica e sociedade
no Brasil. So Paulo: Ed. Brasiliense, 1994.
DUBAR, C. A socializao: construo das identidades
sociais e profissionais. So Paulo: Martins Fontes, 2005.
______. A crise das identidades: a interpretao de uma
mutao. So Paulo: Edusp, 2009.
ELIAS, N. A sociedade dos indivduos. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Editor, 1994.
FOUCAULT, M. Sobre a genealogia da tica: uma
reviso do trabalho. In: RABINOW, P.; DREYFUS, H.
Michel Foucault. Uma trajetria filosfica. Para alm
do estruturalismo e da hermenutica. Rio de Janeiro:
Forense Universitria, 1995.

GOHN, M. G. (org) Movimentos sociais no incio


do sculo XXI: antigos e novos atores sociais. Petrpolis:
Vozes, 2003.

3
DESPERTAR COM E PARA A ARTE
Maria Christina de Souza Lima Rizzi

LAHIRE, B. O homem plural: os determinantes da ao.


Petrpolis: Vozes, 2002.
LASCH, C. O mnimo eu: sobrevivncia psquica em tempos
difceis. So Paulo: Brasiliense, 1986.
LIPOVETSKY, G. A era do vazio: ensaios sobre o
individualismo contemporneo. Barueri: Manole, 2005.
NISBET, R. A sociologia como uma forma de arte.
In: Revista Plural. So Paulo: 7, USP, p. 111-130,
1 sem/2000.
SENNET, R. O declnio do homem pblico: as tiranias
da intimidade. So Paulo: Cia. das Letras, 2001.

BARBOSA, Ana Mae. A imagem no ensino da arte: anos oitenta e novos tempos.
So Paulo: Perspectiva, 1994.
______. Tpicos utpicos. Belo Horizonte: Com Arte, 1998.
______. (org). Inquietaes e Mudanas no Ensino da Arte. So Paulo: Cortez, 2002.
DELEUZE, G. e GUATTARI, F. O que a filosofia?. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1992.
MORIN, Edgar. O problema epistemolgico da complexidade. Lisboa: EuropaAmrica, 1996.
______. Os sete saberes necessrios educao do futuro. So Paulo: Cortez; Braslia,
DF: UNESCO, 2000.
RIZZI, M.C.S.L. Olho Vivo: arte-educao na exposio labirinto da moda, uma aventura
infantil. So Paulo: USP-SP, Tese de doutorado, 1999.
______. Reflexes sobre a Abordagem Triangular do Ensino da Arte. In: BARBOSA. Ana
Mae (org.). Ensino da arte: memria e histria. So Paulo: Perspectiva, 2008, p. 335-348.

GIDDENS, A. Modernidade e Identidade. Rio de


Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2002.
GOHN, M. G. Histria dos movimentos sociais: a construo
da cidadania dos brasileiros. So Paulo: Loyola, 1995.

228 I 229

4
UM POUCO DE NS
Maria Angela de Souza Lima Rizzi
Maria Helena da Cruz Sponton

ARNHEIM, Rudolf. Arte e percepo visual: uma psicologia da viso criadora. So Paulo:
Cengage Learning, 2002.

DELORS, Jacques. Educao: um tesouro a descobrir. So Paulo: UNESCO; MEC;


Cortez, 1999.

AZEVEDO, D.M; SANTOS J.J. Relato de Experincia de Atividades Ldicas


em uma Unidade Peditrica. Revista Nursing, v.78, n.7 novembro 2004.

EISNER, Elliot. Estrutura e mgica no ensino da Arte.


In: BARBOSA, Ana Mae. Arte-educao: leitura no subsolo.
So Paulo: Cortez, 1987, p. 77-92.

BARBOSA, Ana Mae. Arte-educao no Brasil: das origens ao modernismo. So Paulo:


Perspectiva, 2002.

FERNNDEZ, Alcia. 2001. O saber em jogo. Porto Alegre: Artmed, 2001.

______. Tpicos Utpicos. Belo Horizonte: COM ARTE, 1998.

FISCHER, A necessidade da arte. Rio de Janeiro: Zahar, 1966.

MIRANDA, Danilo Santos de. As misses e o progresso. In: Misso de pesquisas


folclricas: msica tradicional do Norte e Nordeste, 1938. So Paulo: Prefeitura
da Cidade de So Paulo; Secretaria Municipal de Cultura; Centro Cultural So
Paulo. 2006.
OSTROWER, Fayga. Criatividade e processo de criao. Petrpolis: Vozes, 1987.
PASCAL, Christine; BERTRAM, Tony. Desenvolvendo a qualidade em
parcerias: nove estudos de caso. Porto: Porto Editora, 1999.
PIAGET, J. Aprendizagem e conhecimento. So Paulo: Freitas Bastos, 1979.

______. Multiculturalidade na educao esttica. In: www.tvebrasil.com.br/salto/


boletins2002/mee/meetxt3.htm. Acesso em maro de 2010.

FREIRE, Madalena. Dilogos sensveis: um espao para a psicanlise


na pedagogia Espao Pedaggico. So Paulo: 1, jul de 1998.

______. Dilemas da Arte/Educao com mediao cultural em namoro com as tecnologias


contemporneas. In:______. Arte/Educao Contempornea: consonncias internacionais.
So Paulo: Cortez, 2005.

FREIRE, Paulo. A importncia do ato de ler. So Paulo, Cortez, 1982. ______.


Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1996. GADOTTI, Moacir.
Conscientizar para libertar. In: TORRES NOVOA, Carlos Alberto (Org.). A prxis
educativa de Paulo Freire. So Paulo: Loyola, 1979.

QUINTANA, Mario. Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2005.

HUIZINGA, Johan. Homo ludens. So Paulo: Perspectiva, 2008.

VYGOTSKI, Lev. Pensamento e linguagem. So Paulo: Martins Fontes, 1991.1974.

LARROSA, Jorge. Linguagem e educao depois de Babel. Belo Horizonte:


Autntica, 2004.

WINNICOTT, Donald. Natureza humana. Rio de Janeiro, Imago, 1990.

______. A imagem do ensino da arte: anos oitenta e novos tempos. So Paulo:


Perspectiva, 1991.
BERGSON, Henri. As duas fontes da moral e da religio. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.
CALLIGARIS, Contardo. Revista mal-estar e subjetividade. Fortaleza v. 2, n. 2,
p. 2758. Set, 2002.
CASSIRER, Ernest. Ensaio sobre o homem: introduo a uma filosofia da cultura humana.
So Paulo: Martins Fontes, 1994.
DELEUZE, Gilles. Proust e os signos. Rio de Janeiro: Forense Universitria, 2003.

READ, Herbert. A educao pela arte. So Paulo: Martins Fontes, 2001.


SACRISTAN, Gimeno. Educar e conviver na cultura global: as exigncias da cidadania.
Porto Alegre: Artmed, 2002.

______. Notas sobre a experincia e o saber da experincia. Palestra proferida no


13 COLE-Congresso de Leitura do Brasil, realizado na Unicamp, Campinas/SP,
no perodo de 17 a 20 de julho de 2001. http://www.miniweb.com.br/atualidade/
info/textos/saber.htm. Acesso em maio de 2010.
MARTINS, Vnia Paiva. A Humanizao e o ambiente fsico hospitalar. Tese de
mestrado. Joo Pessoa, Universidade Federal da Paraba, 2004.

230 I 231

FRASES DOS CAPTULOS

1
SEATTLE (Chefe ndio). Preservao do meio ambiente: manifesto do Chefe
Seattle ao Presidente dos EUA. So Paulo: Babel Cultural, 1987, p. 39.

2
PESSOA, Fernando; MARTIN, Claret; FONSECA, Cristina; BRUNO, J.C..
O Pensamento vivo de Fernando Pessoa. So Paulo: M. Claret, 1986, p. 82.

3
LOPES, Rodrigo Garcia. Vozes e vises - Panorama da arte e da cultura norteamericanas hoje. So Paulo: Editora Iluminuras, 1996, p. 81.

4
VILLAMARN, Alberto J.G. Citaes da cultura universal. Porto Alegre: Editora
AGE, 2002, p. 174.

5
BARROS, Manoel. Retratos do artista quando coisa. Rio de Janeiro: Editora
Record, 1998, p. 15.

6
KAPLAN, Allan. O processo social e o profissional de desenvolvimento. Artistas
do invisvel. So Paulo: Instituto Fonte para o Desenvolvimento Social e Editora
Fundao Perpolis, 2005, p. 181.

232 I 233

PESSOAS FSICAS E PESSOAS JURDICAS

Andr Victor Neuding


Carlos Alberto Gramani
Celso Clemente Giacometti
Dario Ferreira Guarita Filho
Dario Ferreira Guarita Neto
Gasto Augusto de Bueno Vidigal
Guilherme Vidigal Andrade Gonalves

PATROCINADORES

Jos Ferraz Ferreira Filho


Lcio de Castro Andrade Filho
Luiz Eduardo Campello Filho
Luiz Fonseca de Souza Meirelles Filho
Luiz Vicente Mattos Jr.
Ney Castro Alves
Patrick Charles Morin Jr.
Srgio Paula Souza Caiuby
Teresa Guarita Grynberg

234 I 235

ORGANIZAO
Arte Despertar
Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)
(CRB-8/6331, SP, Brasil)
Associao Arte Despertar
Arte Despertar: primeira dcada / autoria de Associao
Arte Despertar. So Paulo : Arte Despertar, 2010.
ISBN 978-85-63880-00-0
1. Arte e Cultura 2. Incluso Social 3. Sade
4. Terceiro Setor I. Arte Despertar II. Ttulo
CDD-360

COORDENAO EDITORIAL
Helena Domingos
Maria Helena Webster
AUTORES
Eduardo Montechi Valladares
Felipe de Souza Tarbola
Maria Angela de Souza Lima Rizzi
Maria Christina de Souza Lima Rizzi
Maria Helena da Cruz Sponton
Regina Vidigal Guarita
Rui Luis Rodrigues

ASSESSORIA PARA O CAPTULO


UM POUCO DE NS
Maria Heloisa Corra Toledo Ferraz
ENTREVISTAS PARA O CAPTULO
A VISO DO LADO DE FORA
Lucas de Oliveira
Oficina da Comunicao Integrada

PESQUISA DE ACERVO
Claudia Viri de Oliveira
COPYDESK
Gipe Projetos Educativos Ltda
COORDENAO ICONOGRFICA
Helena Domingos
Regina Vidigal Guarita
PRODUO FOTOGRFICA
Guto Seixas
Acervo Arte Despertar
PROJETO GRFICO
Estdio Colrio
EDITORAO ELETRNICA
Estdio Colrio
REVISO
Caroline Franco
PRODUO GRFICA
GFK Comunicao

Rua Helena, 309 cj. 11 - Vila Olimpia


So Paulo/SP - CEP 04552-050
[email protected]
www.artedespertar.org.br

01 I 02

Fonte Garamond e Conduit Papel Couch Fosco 180 g/m2 Impresso GFK Tiragem 2 000

01 I 02

Você também pode gostar