Manual Carnes

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Curso Profissional de Processamento e Controlo da Qualidade

Alimentar

Processamento Geral dos Alimentos

Manual de Carne e Produtos Crneos


2015

As protenas
A carne, leite, ovos, leguminosas ou vegetais so fontes bsicas de protenas, que
so macromolculas formadas por outras pequenas molculas, os aminocidos. Cada
protena formada, no mnimo, por trs aminocidos.
Embora haja 20 tipos diferentes de aminocidos nem todos podem ser fabricados
pelo corpo humano, os chamados aminocidos essenciais.
As protenas desempenham um papel muito importante no nosso organismo,
fornecem o material para a construo e manuteno dos rgos e tecidos. As protenas
no corpo so constantemente quebradas e repostas, utilizando para isso as protenas dos
alimentos.
Vegetais (legumes, leguminosas, nozes)
Protenas
Animais (carne, peixe, ovos, leite e laticnios)
As protenas vegetais so consideradas incompletas por serem pobres em
aminocidos essenciais enquanto as protenas animais, que contm todos os aminocidos
essenciais, so consideradas completas.
Deve-se consumir diariamente entre 10% e 35% de protenas.
Estrutura de um aminocido

Grupo Amina

Grupo Carboxilo

Carbono
Radical

Os aminocidos essenciais

Isabel Vieira dos Mrtires

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A carne como alimento


A carne o conjunto digestvel de protenas, cidos essenciais e fonte de ferro e
vitamina B12, mais disponvel, equilibrado e fcil de obter.
Quando se fala em carne, enquanto alimento, fala-se dos tecidos dos animais, que
inclu os msculos, rgos e outros tecidos comestveis. Efetivamente, quase todas as
espcies podem ser utilizadas como alimento, embora a maioria das carnes consumidas
pertenam a animais domsticos ou aquticos.
Nas espcies mais consumidas a nvel mundial temos a vaca, o porco, as aves, a
ovelha, o coelho, o peixe e o marisco e nas espcies menos consumidas temos a cabra, o
cavalo, o veado, o camelo, o lama, o bfalo e o antlope. Existem ainda espcies
consumidas localmente como ursos e focas (esquims), rinocerontes, hipoptamos e
elefantes (frica Central), cangurus (Austrlia) ou baleias (Japo e Noruega). Em lugares
muito especficos e muito raramente ainda existem povos que se alimentam de carne
humana.
A carne em termos de consumo

A carne em termos composio

Carnes vermelhas

Sunos, bovinos, ovinos, caprinos

Msculos

Aves

Galinhas, patos, gansos, perus

Nervos

Animais marinhos

Peixes, marisco, bivalves, cefalpodes

Gorduras

Carne de caa

Animais selvagens

Vasos sanguneos

O consumo de carne est ligado diretamente ao estado econmico de um pas ou


indivduo. Quanto maior o consumo de carne melhor se encontra o pas (ou o indivduo)
a nvel econmico.

A composio da carne
Isabel Vieira dos Mrtires

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As propriedades fsicas do msculo e tecido conjuntivo vizinho so importantes


para a utilizao da carne como alimento. A quantidade de tecido conjuntivo
diretamente proporcional dureza da carne.
Os nutrientes presentes na carne so, principalmente, protenas, gorduras,
hidratos de carbono, vitaminas e sais minerais.
A principal contribuio nutritiva da carne est na qualidade e quantidade das
suas protenas, no contributo dos aminocidos, cidos gordos e sais minerais essenciais e
no seu contedo em vitaminas do complexo B.
A carne tem entre 15% a 23% de protenas, sendo as mais importantes a mioglobina
-pigmento muscular, as globulinas, a actina e a miosina.
A carne tem, geralmente, menos de 1 g de hidratos de carbono em cada 100 g. Estes
hidratos de carbono so constitudos principalmente pelo glicognio e pelo cido lctico.

Miosina

Glicognio e cido lctico

A maioria dos minerais necessrios ao crescimento humano encontram-se na


carne com a exceo do clcio. A disponibilidade de ferro vai depender da quantidade de
mioglobina presente.
A carne contm todas as vitaminas lipossolveis, que se encontram,
primariamente, nos tecidos gordos ligados carne, as vitaminas hidrossolveis do
complexo B e um pouco de vitamina C.
Destaca-se a importncia da carne como fonte de vitamina A, (nica fonte de
vitamina A biologicamente ativa) e como fonte de vitaminas do complexo B
(indispensveis ao crescimento e manuteno do corpo). , contudo, pobre em vitamina
C.
As gorduras formam depsitos separados fisicamente da carne ou infiltram-se
entre as fibras musculares. O desenvolvimento da gordura intramuscular denomina-se de
marmoreado e utiliza-se para determinar o ndice de gordura dos animais.
Os cidos gordos que com mais frequncia encontramos na carne so o oleico, o
palmtico e o esterico. A dureza da carne depende principalmente dos cidos palmtico e
esterico.
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cido oleico

A carne tem tambm quantidades apreciveis de fosfolpido e colesterol.

Fosfolpidos

Colesterol

A converso do msculo em carne


A carne composta, basicamente, dos tecidos muscular, conjuntivo, epitelial e
nervoso.
Os msculos tm uma grande variedade de tamanhos e formatos e so os rgos
ativos do movimento. So constitudos por tecido muscular e possuem a capacidade de se
contrair, atravs de certos estmulos claros e utilizando o ATP (molcula orgnica
responsvel pelo armazenamento de energia nas suas ligaes qumicas). Deste modo
transmitem movimentos aos ossos, aos quais esto ligados.
A contrao muscular d-se com a sada de um impulso eltrico do sistema
nervoso central, conduzido atravs de um nervo at ao msculo. Cada fibra de msculo
apresenta dois tipos de estruturas filiformes muito delgadas, chamadas miofilamentos
grossos (miosina) e finos (actina) e com esta contrao ocorre a um encurtamento das
fibras musculares, em que o filamento de actina desliza sobre o filamento de miosina,
deslocando-se assim as bandas I no sentido da banda A.

Msculo relaxado

Msculo a contrair

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Msculo contrado

Os msculos so capazes de converter energia qumica em mecnica durante a


contrao mas esta capacidade perde-se com a morte.
Com a morte ocorre o rigor mortis, ou a rigidez da morte, durante o qual os
msculos contraem-se permanentemente uma vez que no tm energia para reverter o
relaxamento. O rigor mortis desaparece com a deteriorao fsica da estrutura muscular.
Este encurtamento das fibras musculares levam perda de maciez do msculo e
este convertido em carne.
Entre 35% a 65% do peso das carcaas provm dos msculos esquelticos. Esta
percentagem depende da fase de crescimento e engorda do animal.
Na carcaa a percentagem de gordura inversamente proporcional percentagem
de msculo e isto afeta o valor comercial. Este facto influenciado por fatores genticos e
por fatores ambientais durante o crescimento e desenvolvimento do animal.

Alteraes post mortem


Aps a morte do animal a produo de ATP d-se na ausncia do oxignio,
havendo por isso produo de cido lctico. Isto leva a uma diminuio do pH at se
atingir os 5,4.
O fim de vida de um animal leva a uma perda de proteo contra a invaso
bacteriana (embora o aumento temporrio do pH fornea alguma proteo
antibacteriana), uma perda da integridade estrutural (que tem velocidades diferentes para
os diferentes animais e pode-se associar a diferenas qualitativas do msculo enquanto
alimento) e uma degradao enzimtica (so libertadas enzimas com a descida de pH que
levam, em parte, s alteraes post mortem).
Tambm fisicamente o msculo altera-se:
Na cor passa de um vermelho brilhante para um vermelho mais escuro
(quase prpura). Quando a carne fresca cortada pela primeira vez a sua exposio ao
oxignio leva a uma oxigenao da mioglobina e a cor aviva-se temporariamente;
Na firmeza por estarem ligados aos ossos os msculos so firmes e com o
rigor mortis tornam-se mais firmes e rgidos. Mas com o processo de maturao,
conforme ocorre a degradao enzimtica e a desnaturao proteica, o msculo perde
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firmeza e os tecidos tornam-se mole;


Nas propriedades fixadoras da gua a gua, na clula, atua como
transportadora de substncias e como lubrificante, mantm a turgidez e constitui um
importante componente em muitas reaes qumicas. Com a desnaturao proteica e
aumento da acidez h perda de gua e assim perda de suculncia e palatabilidade.
O tempo que demora o rigor mortis a aparecer varia de espcie para espcie:
Para os bovinos entre 4 a 10 horas;
Para os sunos entre 15 minutos a 4 horas;
Para as aves entre 5 minutos a 1 hora.
A temperatura tem influncia na velocidade das reaes qumicas. Assim, quanto
maior a temperatura mais rapidamente se d a descida de pH.
Durante o perodo post rigor o msculo apresenta uma nova srie de alteraes, as
quais se manifestam especialmente aps o desaparecimento da rigidez muscular. Este
desaparecimento no um retroceder nas alteraes provocadas pelo rigor mortis, uma
vez que o msculo apesar de perder a sua rigidez no volta a recuperar a sua elasticidade
nem se torna reversvel o encurtamento sofrido.
A mudana mais notria na carne, quando desaparece o rigor, um aumento da
tenrura. Por isso, em vrios pases, a carne, em especial a de bovino, sofre um processo de
maturao, ou seja, o amaciamento da carne no frio durante alguns dias, antes do seu
processamento ou consumo.
Tambm durante os primeiros dias aps o rigor observa-se uma lenta mas
contnua subida do pH, atravs da qual o pH volta a valores de cerca de 6,5 (em trs dias
aproximadamente), o que traz consigo uma recuperao da capacidade de reteno de
gua (capacidade especialmente importante na carne que ir ser utilizada no
processamento de enchidos).

O stress e a carne
O stress num animal pode ter origem em vrios fatores:
Deslocar-se para um ambiente que no familiar;
Fatores ambientais (a temperatura, a humidade, a luz, o rudo e o espao);
Fadiga;
Estar num ambiente lotado.
Qualquer que seja a razo do stress animal as respostas fisiolgicas sero as
mesmas: alteraes no ritmo cardaco, na velocidade de respirao, na temperatura
corporal e na presso sangunea.
Nos msculos a resposta ao stress traduz-se numa exigncia de contrao, o que
leva a uma necessidade do aumento do fluxo sanguneo. Mas, muitas vezes, o sistema
circulatrio no capaz de proporcionar as quantidades de sangue necessrias s
contraes musculares. Nestes casos os msculos entram em estado de emergncia
havendo a degradao do glicognio (para obteno de energia) pela via anaerbia, o que
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leva produo de cido lctico, que se deposita nas fibras musculares. Este cido lctico
num organismo vivo ir ser reconvertido em glicognio (no fgado) ou em energia (no
corao) mas tal no possvel se o organismo estiver morto.
O cido lctico nos msculos leva a um aumento de pH, que por sua vez leva a
uma perda de gua por parte dos tecidos musculares. Esta perda de gua ir tornar a
carne mais dura pelo que importante manter os animais para abate o mais relaxado
possvel.
O nvel de resistncia ao stress no igual para todas as espcies, pelo que
importante ter isso em conta quando se lida com os animais para abate.
Alm do stress existem outros fatores (na produo animal) que influenciam as
propriedades musculares da carne. o caso das propriedades fsicas hereditrias, do tipo
de dieta dada ao animal e o ambiente em que o animal cresce.

Fases do abate
O abate de um animal sempre um processo stressante mas pode-se sempre
atenuar este stress tendo alguns cuidados com os bichos durante a transformao dos
tecidos do animal vivo em alimento comestvel.
1. O transporte e a descarga
Esta a primeira fase de qualquer processo de abate e uma das mais stressantes
para os animais.
Estes so transportados em camies ou vages, por vezes sem as condies
mnimas de bem-estar (de temperatura, de humidade e de lotao). Caso os animais
tenham sido submetidos a temperaturas e humidades elevadas estes devem ser
refrescados atravs de meios adequados, aquando da descarga.
Todos os matadouros devem dispor de equipamento e instalaes adequados
descarga dos animais dos meios de transporte e havendo uma demora no abate estes
devem ser protegidos contra condies climatricas adversas e beneficiar de ventilao
adequada. Durante a descarga os animais no devem ser amedrontados, excitados,
maltratados ou derrubados e os que corram o risco de se ferirem devem ser mantidos e
estabulados separadamente.
As condies e o estado sanitrio dos animais devem ser inspecionados
diariamente.
O descanso e alimentao de um animal antes do abate permitem estabilizar os
valores de pH e de humidade dos msculos, obtendo-se deste modo uma carne com
maior qualidade.
2. Insensibilizao ou atordoamento
Os animais devem ser deslocados e encaminhados com cuidado, e se necessrio,
conduzidos um a um para o local de abate.
Antes do atordoamento os animais devem ser imobilizados de modo a evitar
quaisquer dores, sofrimento, agitao, leso ou contuso inteis.
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O atordoamento um processo que quando aplicado a um animal lhe provoca


rapidamente um estado de inconscincia no qual mantido at ocorrer a morte.
Em Portugal os mtodos utilizados so:
Atordoamento com pistola de mbolo retrctil;
Atordoamento por concusso;
Electronarcose ou atordoamento eltrico;
Atordoamento com atmosfera modificada ou exposio ao dixido de
carbono.
importante que haja formas de verificar se o processo de atordoamento est a ser
corretamente executado, consoante a espcie e tamanho do animal. Os operadores
responsveis pela execuo do mtodo devem ser competentes e treinados para o efeito.
3. Sangria e suspenso
Aps o atordoamento, os animais devem ser sujeitos sangria, o mais rapidamente
possvel, devendo esta ser efetuada de modo a provocar um escoamento de sangue rpido
profundo e completo. A sangria deve ser sempre efetuada antes que o animal recupere a
conscincia.
Todos os animais que foram atordoados devem ser sangrados por corte de, pelo
menos, uma das suas artrias cartidas ou dos vasos de onde derivam.
Sempre que seja utilizada uma guilhotina automtica para a sangria das aves de
capoeira, deve existir uma ajuda manual que permita o abate imediato se a guilhotina no
funcionar.
Por vezes utilizam-se mtodos que provocam imediatamente a morte do animal:
Instrumentos mecnicos que penetram no crebro;
Injeo de uma dose letal de uma substncia com propriedades anestsicas;
Eletrocusso com paragem cardaca;
Exposio ao monxido de carbono;
Exposio ao dixido de carbono.
4. Esfola, escaldo, depilao e raspagem
Nesta fase, e no caso dos bovinos, retirada a pele ao animal.
No caso dos sunos o animal escaldado, por imerso em gua quente ou
utilizando ar humidificado presso, para facilitar a remoo dos pelos. Seguidamente o
suno depilado por:
Depilao manual ou mecnica
Depilao por asperso em tnel
Depilao por banho de vapor de gua
Depilao por chamusco.
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Com este ltimo mtodo necessrio passar as carcaas por outra mquina
depiladora, que elimina o resto dos pelos e material carbonizado.
5. Eviscerao
Consiste no retirar das vsceras do animal o mais rapidamente possvel tendo o
cuidado de evitar o derrame do contedo digestivo.
A carcaa depois lavada.
6. Diviso da carcaa
As carcaas so divididas ao meio, longitudinalmente, ou so enviadas para a
desossa e divididas em seces menores e cortes individuais para comercializao.
7. Refrigerao
As carcaas so ento arrefecidas para reduzir o mais possvel o crescimento
microbiano (conservao). Para reduzir a temperatura interna para -7C, elas so
arrefecidas em cmaras frigorficas com temperaturas entre 0C e 4C.

Mtodos de conservao
Os mtodos de conservao da carne dividem-se em:
Mtodos fsicos refrigerao, congelao, secagem e esterilizao.
Mtodos qumicos salga, cura e fumeiro.
Em muitos casos, na produo dos produtos crneos, so utilizadas combinaes
de diferentes mtodos.

Produtos transformados
Dos produtos transformados com a carne como base temos, entre outros:
Produtos cozidos - Fiambres, Mortadelas, Salames, Galantines, Pastas de
carne, Pats, Merenda de carne, etc.;
Produtos fumados - Presuntos, Paios, Toucinhos fumado ou "Bacon",
Entremeadas salgada, Chourios, Linguias, Chourio, Salpico, Enchidos de caa, etc.

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