Mitagens e Seus Significados No Noroeste Amaz Ônico-2
Mitagens e Seus Significados No Noroeste Amaz Ônico-2
Mitagens e Seus Significados No Noroeste Amaz Ônico-2
Traduo para a lingual portuguesa efetuada por Maria Slvia Cintra Martins (DL/UFSCar), com a autorizao do
autor para a finalidade desta obra.
H tambm aquelas que so denominadas casas de pedra, em que seres primordiais menores
viviam; casas das almas animais (laradathe) em todo mundo inferior, assim como cavernas,
montanhas, e lagos, sendo todos eles associados de alguma forma com os seres primordiais.
As fronteiras das mitagens que vamos considerar so:
-
Para o leste, no rio Cuduiary, onde h povos que falam a lngua tukano, sendo que h
um grupo inteiro que hoje fala a lngua tukano, mas que antes falava lngua do tronco
Aruaque. Histrias sagradas, cosmologias muito semelhantes mitagem Hohodene;
Para o Norte esto outros povos de lngua Aruaque; no Alto Rio Guainia,
encontramos outra mitagem com arranjo semelhante do espao-tempo sagrado que
corresponde a seu Universo.
Os Lugares Sagrados:
Uaracapory: lugar da rvore de Vida, Kaali ka Thadapan, orgem dos poderes de
pajs, malikai;
Mothipana: Fortaleza das mulheres, Amarunai, depois que elas roubaram as flautas
dos homens; lugar de orgem de todas as guas dos rios;
Hipana: centro do Universo, umbigo do cu, onde Kuwai nasceu, as flautas sagradas
(o corpo dele) foram feitas, e os antepassados sairam do umbigo do cu;
Enukwa: lugar de saida dos antepassados dos Walipere-Dakenai;
Iaradathita: lugar das almas dos Animais e seu chefe;
Enipan: lugar do primeiro ritual de iniciao;
Tunui: serra da orgem dos peixes
Waliro: lugar da grande plantao de Kaali thayri, que deu orgem s plantas
cultivadas;
A Grande Cidade de Nhiaperikuli: onde o seu irmo mais novo Mawerikuli est
enterrado;
Warukwa: ilha da casa de Nhiaperikuli; onde Uliamali, a cobra grande, foi morta;
Obs.: existem numerosos outros lugares de importncia para os sibs casas dos seus
ancestrais, casas das suas almas cinco no total pela regio assim como as casasde-pedra de espiritos como os Yoopinai, Casa de Frutas (Maliweko), Kachiripan (casa
das flechas, onde Nhiaperikuli matou o Chefe dos Eenunai) somente um mapa mais
detalhado poder localizar todos esses lugares.
Nhiaperikuli (Xavier Leal, 2008) no Alto Rio Yawiary, saindo do Alto Iana; os Baniwa da
regio do Mdio Iana afirmam que o centro do mundo para eles so as cachoeiras do Jandu
perto da foz do Aiary, onde se diz que aconteceram os primeiros ritos de iniciao. Em suma,
existe o que podemos chamar de um arranjo ideal de lugares sagrados que est mapeado em
lugares geogrficos distintos (vejam-se Wright, 1993; Hill, 1993). 2
Este pargrafo e o anterior no constam do texto original em ingls. Fazem parte de informao fornecida
organizadora deste volume em mensagem de correio eletrnico no ano de 2011.
que os seres humanos vivem hoje; isto se deu em um Outro Mundo, a uma grande
distncia a montante. Quando a Grande rvore foi cortada, ento toda a humanidade
obteve alimento para seus jardins, e os xams obtiveram seus objetos de poder;
2) Hipana 3: Trata-se do lugar mais significativo de todos, o lugar de nascimento do
universo e da humanidade para vrios povos do Norte do tronco lingstico aruaque.
Localizado no Alto Rio Aiary, considerado o lugar de nascimento dos ancestrais dos
Piapoco, Hohodene, Dzawinai, Warekena, Kabiyari, Yukuna, e Tariano;
3) O lugar de surgimento dos Walipere-dakenai Enukwa (tambm chamado
Pukweipan, uma corredeira ligeiramente a jusante vindo de Hipana). O surgimento
dos Baniwa (um grupo tnico distinto no Alto Rio Guainia, em volta da cidade de
Maroa) deu-se em Cuyari (Vidal, 1987:139). 4
O Universo teve incio no Hipana 5; as pedras e petroglifos desse local ilustram isso; o
mundo tal qual os seres humanos conhecem tambm comeou a, na forma da deidade filho do
Sol chamado Kuwai.
Figura 4: mapa do Hipana e de todas as pedras, rochas, traos com significado, conforme
me foi explicado pelo xam Mandu da Silva (1989); basicamente, o stio dividido em duas
metades, superior e inferior (iguais: pakuaka). A metade superior o local em que a divindade
criadora fez as flautas e as trombetas sagradas do corpo de seu filho Kuwai. Tambm a vila em
que as flautas foram feitas. A Figura 5 mostra detalhe a esse respeito. Vrias pedras na parte
superior das corredeiras do Hipana representam as flautas sagradas de Kuwai com as penas de
falco que do poder s flautas para formar a voz de Kuwai; cascalho que representa a queima
da doena. As Figuras 6/7/8/9 mostram um grupo de quatro pedras mais importantes,
localizadas uma bem ao lado da outra, todas tendo a ver com Amaru, a primeira mulher, que deu
luz Kuwai; o falso Kuwai, que as mulheres podem ver (desenhos de msica de flauta, uma
peneira, e um chicote todos usados em rituais de iniciao); o verdadeiro Kuwai, que elas no
podem ver. Uma outra pedra, mais longe, representa, conforme se diz (Etnollanos, s/d.), o
verdadeiro Kuwai(chamado Kurawa); o corpo de Amaru com representaes de um
lagarto, um retngulo dividido, e um jaguar-xam, representao das Pliades; e o lugar onde
3
Ver Figura 1 (Foto de W.C. Wright, 2009). Vista area das cachoeiras do Hipana, lugar de Origem do Universo.
Ver Figura 2.
5
Ver Figura 3. Vista a montante (I.Fontes, 2010) .
4
Amaru se sentou quando deu luz Kuwai. Uma quarta pedra parece ser equivalente primeira
pedra de Amaru (Fonte: Etnollanos, s/d.; entrevistas do autor com Mandu da Silva, 2000). As
Pliades (= novo ano); lagarto (Yoopinai?), e retngulo (tempo de gerao?).
Em vrias pedras no Hipana e em Pukweipan, logo abaixo do Hipana, h imagens de
Kuwai (A Figura 10 mostra uma imagem semelhante ao que deve ter sido a aparncia de Kuwai
em uma de suas representaes: como um conjunto de entalhes pontuais, resultando no formato
de um corpo triangular, com um grande par de olhos no lugar da cabea, e segurando um basto
numa mo).
Um autor disse que a Figura 10 mostra uma representao de uma figura que podem ser
as Pliades segurando um chicote ou basto na mo esquerda, com uma cabea em forma oval,
e um corpo cheio de furos. O corpo cheio de furos pode vir a significar a ona pintada cuja
pelagem est coberta com algo que tem a aparncia de furos ou de buracos. A representao
completa assemelha-se com o xam jaguar, as mscaras de Kuwai, que os Tariano usavam
outrora e que se assemelham muito com a figura representada na pedra.
Em outros petroglifos, Kuwai representado como o bicho-preguia ou como o macaco
aranha, pendurado numa rvore. O corpo de Kuwai apresenta mltiplas formas atravs de sua
histria pica, assim como em vrios lugares da mitagem, os quais ilustram aspectos
fundamentais da natureza do mundo de Kuwai, que este mundo.
As Figuras 11/12 mostram em detalhe os petroglifos do falso Kuwai. A Figura 13 o
lugar em que se sentava Amaru, e onde se espera que os jovens iniciados se sentem de forma a
terem corpos bem formados. A Figura 14: a placenta de Kuwai, em forma de raio-ferro
(niamaru; dakatha). Figura 15: Kuwai gravado numa grande pedra em Pukweipan, olhando a
jusante note as mos de 2 e 3 dedos, o corao/ a alma, o cordo umbelical. Figura 16 uma
enorme rocha saindo em protruso do rio, conhecida como Dzuliferi, o xam primordial.
Vrios petroglifos gravados nela (veja-se tambm Gonzalez-Nanez 2007).
Figura 17: Ilha de Warukwa, casa de Nhiaperikuli, onde Nhiaperikuli pegou sua mulher
tendo relaes com a Anaconda; cemitrio de Hohodene; algumas localizaes de petroglifos
muito antigas e intocadas. No Alto Rio Uaran, h um lugar chamado Mothipana, onde h
grandes formaes de pedra que representam a fortaleza das primeiras mulheres que tinham
roubado dos homens e escondido, em seu corpo, as flautas e trombetas sagradas. Esse o lugar
em que as mulheres realizaram o primeiro rito de iniciao para sua filha. Tambm o lugar da
Origem de Todas as guas correntes dos Rios da terra. H formaes de pedra da primeira
mulher, a fortaleza de Amaru o equivalente feminino da cidade de Nhiaperikuli.
Figuras 18/19/20/21. Descoberta importante feita em 2007-8. H um aglomerado de
formaes de pedra no crrego Yawiary afluente do Alto Iana que se chama A Grande Cidade
de Nhiaperikuli. A excelente dissertao de Mestrado de Carlos Csar Leal Xavier (2008),
defendida junto ao Museu Nacional, apresenta os achados fascinantes que ele fez recentemente
em conjunto com seus guias Kuripako, nesse stio, localizado a uma hora de caminhada indo do
crrego para a floresta. Trata-se de um arranjo de pequenas pedras - que aparentemente se d de
forma natural, mas que possui uma ordem e significados atribudos ao arranjo como um todo que
os Kuripako denominam A Cidade do deus sol criador Nhiaperikuli.
Nada semelhante a isso foi relatado na literatura a respeito dos Baniwa (ou dos povos
Aruaque com relao a esse assunto). Mostra uma cena do mito de Mawerikuli, a primeira
pessoa a morrer, tendo sido depois enterrado embaixo da casa de Nhiaperikuli, de acordo com a
tradio de enterro de muitas geraes passadas. Embaixo da enorme casa de pedra, h uma
laje de pedra com formato de tumba, com algo semelhante a uma rocha colocado no alto de uma
das extremidades, com a aparncia muito prxima de mscaras morturias esculpidas em
madeira, as quais os Hohodene costumavam pr em seus mortos h algumas geraes. A laje de
pedra a tumba de Mawerikuli. Atrs da casa h uma pedra cozinha e, ao redor da casa, vrios
postos de sentinela onde os pssaros de estimao de Nhiaperikuli, a guia harpia, e outros
pssaros sentinelas, chamados Tchitchiro e Madoodo, podiam alertar a respeito de pessoas que se
aproximassem. A cena faz lembrar o momento em que a morte veio ao mundo.
A Cidade apenas uma parte de um stio muito maior associado com outros lugares,
como a caverna das mulheres fotografada por Xavier (2008) (Figura 21). Este stio complexo
contm um grande nmero de petroglifos, formaes rochosas e cavernas. Perto dele, h tambm
um lugar, floresta adentro, na direo do rio Iana, onde h uma grande rocha de forma achatada
no alto de um morro, com vista sobre um rio e sobre uma vasta extenso da floresta um lugar
onde, conforme se diz, Nhiaperikuli sentou-se e viu como seria o mundo. Todos esses
lugares so interligados por estradas ou trilhas amplas, de tal forma que uma mitagem
completa demonstraria interconexes nos temas, assim como quais seriam, dentre as centenas de
histrias que os Baniwa e Kuripako contam, as mais memorveis, ou seja, aquelas que tm a ver
com o Comeo da Vida, o comeo da morte, os primeiros ritos de iniciao, a batalha dos sexos,
e a grande rvore de nutrio e de rap dos xams. O complexo total de lugares constitui uma
geografia sagrada, uma mitagem, pois cada stio estabelece a conexo entre Este Mundo e o
Mundo-de-antes do passado primordial. Muitos desses lugares esto cercados de tabus que
impedem que as pessoas no-abenoadas (desprotegidas por cnticos xamnicos) se
aproximem deles ou entrem neles. Diz-se que os lugares esto cheios de veneno (manhene),
assim como o mundo inteiro dos mortos. Por qu? Os petroglifos, pedregulhos etc. so
transformaes petrificadas do que antes estava vivo, onde os seres primordiais cheios de seus
poderes perigosos fizeram acontecer coisas que depois se tornaram solidificadas, como
memrias imortais de como a vida veio a ser do jeito que hoje.
As
relaes
entre
os
seguintes
lugares
constituem
mitagem
para
os
10
lugar
chamado
Yuri
(=Dzuli/Dzuliferi);
um
riacho
chamado
11
atual (Veja-se Wright, 1993; Hill, 1993, Vidal, 1987; Gonzalez nez, 2007; Leal Xavier, 2008).
Mais anlise deve ser feita com vistas a mapear cada um dos nomes espirituais de lugares em
mapa geogrfico de grande escala, revelando-se, conforme acredito, de que maneira se atribuem
significados, de forma mais densa, a certas sees ou lugares dos rios no Noroeste Amaznico
comparando-se com outros. A partir disso, alm dos numerosos lugares mencionados em outras
histrias sagradas, nossa noo de mitagem mostraria o sentido sagrado dos lugares entre os
Baniwa.
Cada comunidade pode ter sua prpria flauta ou trombeta escondida no fundo de um
crrego prximo. H, assim, uma ligao direta entre a identidade comunitria, a identidade
frtrica e o lugar na mitagem. Isto de enorme importncia para a compreenso da razo por que
os Baniwa afirmam que Este Mundo o mundo de Kuwai. Assim como em outras reas
indgenas do mundo na Austrlia Aborgene, por exemplo a presena dos ancestrais, atravs
de petroglifos, stios sagrados e partes reais do corpo do ancestral, constitui uma ligao slida
entre os povos vivos e seu territrio local ancestral. Esta ligao s pode mudar se, por exemplo,
uma comunidade se mudar permanentemente para outro lugar, mas, ento, deve ser realizada
uma cerimnia conduzida pelos xams de modo a assegurar que o poder do ancestral Kuwai ser
transferida de forma segura. J que uma mudana dessas equivale a ter que levar num pacote,
para um novo lar, todos os ossos dos ancestrais e o poder sagrado incorporado neles.
Cnticos Kalidzamai para os rituais masculinos de iniciao 6
A base dos cnticos kalidzamai cantados nos ritos de iniciao masculinos e femininos
(denominados Kuwaipan, Casa de Kuwai) o mito de Kuwai, o filho de Nhiaperikuli e Amaru
(para verses completas, ver Wright, 2011; para uma verso Dzauinai, ver Hill, 2009).
Como um todo, os cnticos consistem de dezesseis conjuntos, cantados com interldios
em que os cantadores sopram fumaa de tabaco em vasilhas de pimenta. Em essncia, os
cnticos recontam uma srie de cinco viagens feitas pelos homens para recuperar as flautas e
instrumentos sagrados de Kuwai, os quais as mulheres haviam roubado de Nhiaperikuli. As
mulheres, Amarunai (ou Inamanai), levam os instrumentos mundo afora, parando em inmeros
Este item apresentado de forma sumria, no tendo sido traduzidas, para esta edio, partes que dizem respeito
contextualizao dos cnticos kalidzamai.
12
lugares onde tocam a msica de Kuwai. Quando fizeram isso, o mundo se abriu ganhando seu
tamanho atual, com corredeiras, montes, rios, cidades e fins de mundo (ou pontas do cu).
Nhiaperikuli e os homens perseguem (napiinetaka) as mulheres e Kuwai, seguindo-os at o fim
do mundo, onde abandonam as mulheres e a msica de Kuwai e trazem de volta (nadietawa)
os cnticos para o centro do mundo no Hipana, um crrego no Alto Aiary, lugar da criao de
Kuwai e stio da emergncia dos ancestrais da humanidade. Como um ancio afirma de forma
concisa: Kuwai deu incio ao mundo, isto , o mundo de hoje e todos os lugares nele
comearam com as viagens e a msica de Kuwai.
Construo Semntica nos Cnticos Aes Xamnicas
As aes rituais predominantes atravs dos cnticos concentram-se em trs formas de
atividade xamnica: (1) As viagens/jornadas de Kuwai (ianhiakawa) e a perseguio
empreendida pelos homens (napiinetaka, caada, perseguio, Hill, 1989) atrs das mulheres
at os confins do mundo onde deixam (napeku) a msica de Kuwai e retornam para o centro do
mundo em Hipana; (2) secagem do perigo (metakenam nakanupam), secagem da saliva
(metakenam liahnumanam) dos iniciados, secagem da doena que consome (metakenam
purakanam) dos iniciados; e (3) trazer de volta (nadietaka) os cnticos, a pimenta e o tabaco
das extremidades das jornadas para o centro.
A primeira forma relaciona-se diretamente com a parte 6 do mito, quando as mulheres
roubam os instrumentos e Nhiaperikuli as persegue at declarar uma guerra, jogando as
mulheres nas quatro direes. Na traduo dos cnticos deste episdio, Nhiaperikuli manda
(lipira) as mulheres para os fins do mundo, perseguindo-as medida que elas param em
determinados lugares e tocam o Kuwai. A noo de perseguio ambgua: por um lado,
refere-se imagem de um caador-guerreiro ao tratar das aes dos homens contra as mulheres
como inimigas; por outro lado, as mulheres criativamente abrem o mundo com Kuwai, j que os
homens, conforme se relata, no podiam fazer outra coisa seno segui-las. Ou, Nhiaperikuli
manda as mulheres com Kuwai nas jornadas.
Esta ambigidade na agncia do termo essencial para a dinmica das jornadas. Em
contraste com os kalidzamai do nascimento de crianas, que simplesmente junta (liwaketa)
nomes de espritos de determinadas categorias, e nos quais, no mximo, os nomes de espritos
podem cruzar as categorias, aqui a perseguio dos espritos abre os domnios para um nvel de
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incluso mais alto e mais amplo, da forma com que Hill (1993) sugere em sua anlise dos
cnticos Dzauinai. Os cantadores, de fato, usam o processo de juno no decorrer de suas
jornadas juntando, por exemplo, os espritos de Kuwai, os peixes ancestrais, as crianas da
doena que consome (purakalinyai ienipe) mas como se juntassem esses espritos e, com eles,
seguissem em frente na perseguio de outros. Dessa forma, wapiinetaka a fonte de movimento
que ultrapassa a classificao taxonmica de juno para incluir classes de espritos e criar
outros. Nesse sentido, replica o ser de Kuwai poderoso, da abertura do mundo, que tudo inclui.
A segunda forma de atividade diz respeito ao xamanismo preventivo secar o molhado
dos iniciados, impedindo que a umidade dos espritos faa mal a eles, evitando a doena
destruidora. Em certo sentido, este processo equivale ao cozimento da condio crua do peixe
nos rituais de nascimento das crianas. Para entender as noes de umidade e de doena
destruidora, deve ser feita referncia ao mito, pois a crena de que aquele que v Kuwai, seus
instrumentos sagrados, torna-se fraco, sua pele amarelece, seu corpo se consome e sua saliva cai
constantemente. Esta a condio de purakali; de acordo com o mito, o filho de Kaali (de cujo
corpo nasceu a primeira mandioca) avisou para que no comesse peixe cru pois ficaria doente,
foi em frente e comeu peixe e comeou a perder energia (lipurakawa). Seu brao murchou como
uma fruta de ing; seu joelho inchou como uma batata que cresceu demais; o lado de seu joelho
caiu; sua perna parecia um fruto de inaj; a sola de seu p virou uma tartaruga; ele comeou a
ouvir um zumbido alto em suas orelhas; ele viu o Kuwai branco (Kuwai haaledzuli) e seu
outro, o peixe surubi branco. Ele pensou que estava morrendo e chamou seu pai: Pai, estou
morrendo, eu definhei. Ele chamou e chamou, do jeito que as cigarras (dzurunai) chamam: Paa-a-ai, eu definhei. Ele se transformou num pssaro japu vermelho e depois num preto, e
medida que cantavam sua saliva caa no cho.
Sem o kalidzamai, os iniciados sofreriam um processo de desgaste como o descrito no
mito. A associao de Kuwai com a condio de umidade explicada pela sua ligao com o
mundo dos mortos, os primeiros ancestrais que eram humanos e tambm animais, e que saram
dos buracos das corredeiras do Hipana que conduzem ao mundo-de-baixo. O poder ancestral est
intimamente associado com os rios, o mundo subaqutico dos mortos, onde so guardadas as
flautas e trombetas sagradas (no fundo do rio) quando no esto sendo usadas.
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Nomeao de lugares
De longe a nica categoria mais importante de nomes refere-se aos lugares (centenas de
lugares so nomeados nos cnticos), indicados pela raiz dzakale (referente a stio de aldeia) e o
classificador -kwa adicionado a todos os nomes de lugares. Os lugares so classificados na
categoria espiritual Ipanai, casa (-nai, coletivo, ser animado). Dessa forma, os nomes de lugares
consistem da construo: -pani kwam dzakale (nome) (casa) (classificao) (vila). Fica claro,
no entanto, que o mapeamento de lugares no se refere apenas ocupao humana, nem os
cnticos se referem estritamente geografia humana. Concretamente, os lugares so
predominantemente rios, corredeiras, montes e lagos associados com os espritos de Kuwai
(Kuwainai), ancestrais frtricos, ancestrais peixes, casas das almas dos mortos, Amarunai,
Maakunai, os espritos amimais (itchirina i, eenuna i), as pessoas brancas, outros povos nativos.
Em resumo, a categoria espiritual de ipanai agrupa todas as classes de seres, e especialmente
seres espirituais, associados com lugar, que habitam o universo Hohodene. Maakunai, os
brancos, Amarunai e outros povos nativos formariam uma classe de seres caracterizados pelo
trao comum de alteridade e, portanto, estariam do lado dos seres-de-alm, na periferia da
sociedade Hohodene. So inimigos potenciais, contra os quais foram travadas guerras e, por isso,
assemelham-se aos espritos (animal, gua etc.) que podem causar dano aos seres humanos.
Os lugares podem, ainda, ser caracterizados por traos relacionados com a imagem do
corpo de Kuwai: seus dois olhos (dthamaat i), sua boca (kanumakade), seu pnis (liishi), seu
nico brao (manaapan) que podem ser descries poticas de traos geogrficos, como um rio
que no se bifurca, uma caverna etc. Ou esto relacionados com o conjunto de flautas sagradas
que envolvem Kuwai. O conjunto completo de cnticos recria, assim, o corpo inteiro de Kuwai e
sua representao na orquestra de instrumentos. Uma srie de tipos de lugares repetida em
certas partes no decorrer de todos os cnticos: montes de cabelo de esprito animal, lugares de
veneno (hidzapa needz u ); lugares de casas de espritos animais (itchinaikwam, itchikakwam,
itchidapa n); casas de espritos-abelha, lugares de mel e do reavivar da alma ( maapanaikwa m,
maapakwa m ); lugares de dia claro (hlimaliakwa m).
A significao destes lugares repetidos em seus contextos ainda no est clara para mim.
Numerosos lugares esto conectados atravs dos eventos e personagens dos mitos de Kuwai, da
emergncia frtrica, da criao de peixes. Assim, sua significao pode ser determinada atravs
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17
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nos cnticos. Seu conhecimento do baixo Orinoco (Puerto Carrea, Bolvar, Caracas) pode
tambm se referir s misses religiosas espanholas, assim como ao contato com povos nativos
que viviam nessas reas perifricas (os Bar e Makiritare). A distncia geogrfica novamente se
correlaciona com distncia social: os povos nativos da periferia so os Maakunai, os parentes
(nalimathana) contra os quais os Hohodene travaram guerra e o homem branco.
A viagem final transpe-se exclusivamente para as extremidades do mundo conhecido
dentro de um tipo de sinalizao dos limites do horizonte oriental. Este ltimo grupo de cnticos
cantado ao amanhecer, quando o sol se levanta a leste, dessa forma sua nfase predominante
centra-se no retorno dos cantadores do horizonte oriental a montante, e de volta para o centro
mtico e para a terra natal dos Hohodene no Aiary. O retorno a montante correlaciona-se com a
nfase ritual em trazer de volta o tabaco, reavivar os iniciados e mandar a msica de Kuwai de
volta ao cu (isto , quando se completa a iniciao). O poder extraordinrio dos cnticos
kalidzamai para a iniciao, que faz com que, inquestionavelmente, representem a arte suprema
do cntico xamnico na cultura baniwa, reside em seu efeito, cumulativo e totalizador, de incluir
todos os tipos de seres em um, e um-em-todos, Kuwai. Trata-se de sua capacidade de atravessar
os limites espaciais e temporais nos planos vertical e horizontal do cosmos dentro de uma viso
abrangente do mundo tal qual foi criado e tal qual se transformou historicamente. dessa forma
que entendemos a afirmao dos cantadores de que o mundo de Kuwai (Kuwai hekwap i) se
refere estrutura e dinmica de uma ontologia do ser. Esta viso partilhada por vrios povos
de lngua Maipure do noroeste amaznico, que tambm tm tradies das viagens de Kuwai.
Concluo com a afirmao de que a tradio Hohodene das viagens de Kuwai representa,
acima de tudo: 1) uma noo de territorialidade, muito especial entre os Hohodene, da forma
com que aparece quase inteiramente definida na segunda viagem de Kuwai; 2) uma noo de
identidade coletiva, da sociedade Hohodene e de outros povos na periferia (grupos de afins,
Maakunai, o homem branco), como aparece definido na terceira e na quarta viagem; e 3) um
senso de conhecimento histrico cumulativo, que inclui as experincias de contato, redes de
comrcio e guerras com outros grupos tnicos, e que est sempre aberto para novas experincias
e interpretaes.
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Figura 1 (M.C. Wright, 2009): Viso area de Hipana, lugar da origem do mundo.
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Figura 2 (Foto de M.C. Wright, 2009). Pukweipan Baixo Hipana, Rio Aiary, Norte
Amaznico. Viso area mostrando a parte baixa da cachoeira, Enukwa, ou Pukweipan, Origem
dos Walipere-dakenai.
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METADE SUPERIOR DO
HIPANA :
1. Tuwiri flauta redonda;
2. Waliadua flauta longa;
3. Peeriphe - penas de
falco;
4. Neeri pakuaka: rea de
blocos de pedra que
representa a vila em que
Nhiaperikuli deixou as
pedras de Kuwai ;
5. Impuridadaes deixadas
pelos Iniciados
6. Atalho que conduz vila de
Uapui.
Figura 5
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Figura 7: Hipana Quatro pedras importantes - Falso Kuwai, Amaru, Kurawa (Ao
fundo: O verdadeiro Kuwai), e o lugar onde Amaru se sentou.
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Figura 9 e 10: O falso Kuwai Uma das quatro pedras importantes - com petroglifos
ilustrando: a dor do chicote; uma peneira; e o som das flautas sagradas (como soam).
Figura 11: Reproduo dos petroglifos na pedra de falso Kuwai na cachoeira de Hipana
(Cornelio et al., 1999).
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Figura 12: Esprito das Pliades - Petroglifo de Kuwai, Filho do Sol. Corpo cheio de
buracos, com chicote na mo (Weigel, 1996).
Figura 13
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Figura 14: Buraco em uma das pedras de Hipana, diz-se representar a placenta de Kuwai,
em forma de um corpo de arraia (Weigel, 1996).
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Figura 17: Ilha de Warukwa (igarap Uarana) Lugar onde Nhiaperikuli matou a
Anaconda (Fontes, 2010). A mulher de Nhiaperikuli traiu-o com a Anaconda.
Figura 18: Mapa de alto Iana. Regio onde se localiza a cidade de Nhiaperikuli.
(XAVIER LEAL, 2008)
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Figura 19. Cidade de Nhiaperikuli. Lugar onde Mawerikuli, a primeira pessoa a morrer,
foi enterrado (XAVIER LEAL, 2008).
32
Figura 20: Mapa da Cidade de Nhiaperikuli (XAVIER LEAL, 2008): Leste, o tmulo de
Mawerikuli; Norte, conduz at o porto; Centro, a casa e a cozinha; Oeste, o lugar dos 2
pssaros sentinelas; Sul leva ao alto do rio Uaups (Xavier Leal, 2008).
33
Figura 22: O universo baniwa HEKWAPI , de acordo com os pajs (Wright, 2011), consiste de
trs partes principais: o Outro mundo, este mundo, e o mundo de baixo.
Primeiro Conjunto de Cnticos KALIDZAMAI para jovens
1. Oopikatsa ikenyua Kuwai H muito tempo veio Kuwai.
2. Oopikatsa ikenyua Kuwai H muito tempo veio Kuwai.
3. Ikenyuaka Kuwai Veio Kuwai.
4. Pamadsuakakwam eenu O meio do cu.
5. Hliepoliekwam eenu O cordo umbilical do cu.
6. Kadzukaramita likenyuakatsa lipirami Dzaui Nhiaperikuli Assim aconteceu no comeo a
sua criao o Jaguar Nhiaperikuli.
7. Kadzukaramita likenyuakawa lipirami Dzaui Nhiaperikuli Assim aconteceu no comeo a
sua criao o Jaguar Nhiaperikuli.
8. Ikapenam Kupikwam Dzakale Ele viu a Vila de Hipana.
9. Kupikwam Dzakale. A Vila de Hipana.
10. Kadzukarumita ikenyuakawa Kuwainai Assim comearam os espritos de Kuwai.
11. Kadzukarumita ikenyuakawa Kuwaikam Assim comeou Kuwai.
12. Ikatsenam ikenyuakawam lihriuenam Dzaui Nhiaperikuli. Veja comeou para ele
Jaguar Nhiaperikuli.
13. Lipirami Dzaui Nhiaperikuli Sua criao Jaguar Nhiaperikuli 7.
14. Pamudsuakakwam Kupikwam dzakale O centro da vila de Hipana.
7
lipirami: criao no sentido de cuidado, como com um animal de estimao, mas tambm utilizado para crianas.
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lihrinam, o pnis de seu filho, referindo-se ao mito em que Nhiaperikuli manda seu filho lavar seu pnis de
madrugada, mas as mulheres chegam antes e roubam o Kuwai. A palavra seria uma contrao de liri-ishi.
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likuruapo eenu, literalmente, a coroa do cu, mas usado metaforicamente para os chicotes rituais.
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Thuwa uma trombeta/um pssaro japu de Kuwai, o ancestral da fratria dos Walipere-dakenai cujo nome
sagrado Dzuli-ieni, filhos de Dzuliferi's (o primeiro xam).
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87. Nakanupa nanakua walikaniri Seu perigo sobre eles nossos jovens.
88. Kuwaika thuwa O japu de Kuwai.
89. Wapinetaka Kuwainai Perseguimos os espritos de Kuwai.
90. Wapinetaka Kuwainai Perseguimos os espritos de Kuwai.
91. Kadzukarumita ikenyuakawam lihrinam Dzaui Nhiaperikuli Assim foi comeou o pnis
de seu filho Jaguar Nhiaperikuli.
92. Inyaikwam dzakale A vila lugar do demnio.
93. Inyaikwam dzakale A vila do demnio.
94. Wapinetakam Kuwainai Perseguimos os espritos-Kuwai.
95. Ikatsenam Kukwa Veja o lugar- Ku 11
96. Lihriuenam Dzaui Nhiaperikuli Para ele Jaguar Nhiaperikuli.
97. Kuwaikwam Dzaui Nhiaperikuli O lugar-Kuwai jaguar Nhiaperikuli.
98. Kuwaikwam Dzaui Nhiaperikuli O lugar-Kuwai jaguar Nhiaperikuli.
99. Watabubukwam dzakale A vila do lugar-da-saliva-cadente.
100. Watabubukwam dzakale A vila do lugar-da-saliva-cadente.
101. Hademitam nakanupam nanakuam walikaniri ienipe Nunca seu perigo sobre eles
nossos jovens.
102. Kuwaikam dapa A paca de Kuwai.
103. Kuwaikam dapa A paca de Kuwai.
104. Kuwaikam manderi O caxinguel de Kuwai.
105. Ikatsenam Kuwaikam manderi Veja o caxinguel de Kuwai.
106. Ikatsenam hliepolepi Kuwai Veja seu Cordo umbilical Kuwai.
107. Kuwaikam manderi O caxinguel de Kuwai.
108. Tsinikwam dzakale A vila lugar-(jacu?).
109. Metakenam linupanam nadzenam walikaniri ienipe Seque seu perigo deles nossos
jovens.
110. Ikatsenam likaiteni Kapelikwam dzakale Veja ele diz vila lugar- (?).
111. Hliepolepi Kuwai Seu cordo umbilical Kuwai.
112. Hadalikwam dzakale Vila lugar- (?).
113. Manderi nakenyuakam Manderi Kuwainai Caxinguel eles comearam espritos-Kuwai
caxinguel 12.
114. Pamusuakakwam Kuwai Kuwainai O lugar-do-meio espritos-Kuwai Kuwai.
115. Hipanakwam dzakale A vila Hipana-lugar.
116. Pamudsuakakwam Hipanakwam dzakale O lugar-do-meio vila Hipana-lugar.
117. Neeninam ikatsenam ekuakuam lihriuenam Dzaui Nhiaperikuli Para eles, veja o lugarmargem para ele Jaguar Nhiaperikuli.
118. Ehnipanikwam dzakale A vila Jandu-lugar.
119. Ehnipanikwam dzakale A vila Jandu-lugar.
120. Ikatsenam dupitchikwam Veja o lugar-cesta.
121. lihriuenam Kuwai Para ele Kuwai.
122. Hipanikwam dzakale A vila Hipana-lugar.
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Kukwa, Ku-, as primeiras duas letras do nome de Kuwai, e o som que ele faz na estao chuvosa.
Manderi, o caxinguel, que demarcou a rvore paxiba de Kuwai para fazer as flautas sagradas.
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123. Ikatsenam liakenam nakapenam Malinali ienipe Guarde seu nome eles viram as crianas
Malinali.
124. Ehnipanikwam dzakale A vila Jandu-lugar.
125. Ikatsenam thirulikwam Veja o lugar-espremedor-de-mandioca.
126. Nakakarumi ipeku Malinali ienipe Eles colheram frutas, ele jogou-as, as crianas
Malinali.
127. Thirulikwam dzakale O lugar-espremedor-de-mandioca.
128. Nakapenam Ehnipanikwam dzakale Eles vem a vila Jandu-lugar.
129. Ikatsenam pitchidakwam dzakale Veja a vila-lugar-de-cutia.
130. Noentakanam nadzenam walikaniri ienipe Eu jogo fora deles nossos jovens.
131. Ikatsenam pitchinamiwanale Preste ateno no canto do lugar-da-cutia.
132. Lihrinam Dzaui Nhiaperikuli O pnis de seu filho Jaguar Nhiaperikuli.
133. Ehnipanikwam dzakale A vila Jandu-lugar.
134. Ikatsenam pitchi Veja a cutia.
135. Liakenam Kuwai O nome de Kuwai.
136. Pitchipi liakena Kuwai Cutia o nome de Kuwai.
137. Ehnipanikwam dzakale A vila Jandu-lugar.
138. Ikatsena (?) Veja (?).
139. Dupitchikwam dzakale A vila lugar-cesta.
140. Pitchidakwam dzakale A vila lugar-Cutia.
141. Ehnipanikwam dzakale A vila Jandu-lugar.
142. Himena wapinetaka Kuwainai Oua-nos perseguindo os espritos-Kuwai.
143. Himena wapinetaka Kuwainai Oua-nos perseguindo os espritos-Kuwai.
144. Ehnipanikwam dzakale Vila-Jandu.
145. Ikatsenam wadietakam dthema Veja-nos trazer de volta o tabaco.
147. Pipi liako Kuwai Pipi diz Kuwai.
148. Ehnipanikwam dzakale A vila Jandu-lugar.
149. Wadietakam kalidzamai Trazemos de volta a cantoria.
150. Iatetenam kalidzamai A cantoria da pimenta.
151. Idthemanam kalidzamai A cantoria do tabaco.
152. Iatetenam kalidzamai A cantoria da pimenta.
153. Kupikwam dzakale A vila lugar-Hipana.
154. Kupikwam dzakale A vila lugar-Hipana.
155. Hipanakwam dzakale A vila lugar-Hipana.
156. Wadietakam dthema Trazemos de volta o tabaco.
157. Ikatsenam ekuakuam hliwanale eenu Preste ateno no canto-margem do cu.
158. Ikaiteni ()-nereni Ele diz (?).
159. Ekuakuam hliwanale eenu O canto-margem do cu.
160. Watsulematsa iedahle Nossa nascente do Solimes.
161. Watsulematsa iedahle Nossa nascente do Solimes.
162. Dumatchipanikwam dzakale Cabelo-veneno vila-lugar.
163. Dumatchipanikwam dzakale Cabelo-veneno vila-lugar.
164. Wadietakam dthema Trazemos de volta o tabaco.
165. Watsubulikwam pamudsuam (?)-lugar entremeio.
166. Wadietakam dthema Trazemos de volta o tabaco.
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