Resumo Academico
Resumo Academico
Resumo Academico
Entre os autores consultados, verifica-se que sob o rtulo geral de resumo so reunidos diferentes
gneros textuais (ou sub-gneros) resumo indicativo, resumo informativo, resumo crtico ou
resenha que se distinguem na forma e na funo. As diferentes categorias estabelecidas para o
resumo pautadas na ABNT acentuam a confuso terminolgica, uma vez que as nomenclaturas
adotadas confundem-se com a denominao dada por outros manuais aos mesmos gneros
acadmicos, como por exemplo: resumo indicativo e fichamento; o resumo crtico e resenha.
Essa confuso terminolgica traz conseqncias para a produo do resumo tanto para o
professor como para os alunos que muitas vezes no conseguem chegar a um consenso quanto
expectativa um do outro.
Alm disso, as definies apresentadas so de cunho estruturalista e oferecem uma viso
simplista do processo de produo, uma vez que, de acordo com elas, para resumir, bastaria ao
leitor descodificar o texto-fonte para depois codific-lo sinteticamente. Elas desconsideram o
funcionamento discursivo em jogo no processo de elaborao do resumo. Por isso, rever o
conceito de resumo a partir de perspectivas que tenham como base a teoria da enunciao e que
partam da noo de gnero torna-se fundamental.
Gnero textual
Segundo a concepo de Bakhtin (1952/1992[1], p. 279), os gneros so padres relativamente
estveis de texto, do ponto de vista temtico, composicional e estilstico, que se constituem
historicamente pelo trabalho lingstico dos sujeitos nas diferentes esferas da atividade humana,
para cumprir determinadas finalidades em determinadas circunstncias. As atividades e
expectativas comuns, que definem necessidades e finalidades para o uso da linguagem, o crculo
de interlocutores, que define hierarquias e padres de relacionamento, a prpria modalidade
lingstica (oral ou escrita), ligada ao grau de proximidade e intimidade dos interlocutores, tudo
isso acaba definindo formas tpicas de organizao temtica, composicional e estilstica dos
enunciados.
Os gneros se realizam empiricamente nas mais diferentes espcies de texto, orais ou escritas,
que circulam em nosso uso cotidiano e so denominados de receita culinria, telefonema, carta,
romance, manuais de instruo, bula de remdio, lista telefnica, notcias, dentre muitos outros.
Para produzir qualquer um desses textos, o sujeito aciona, alm de suas representaes sobre a
situao de ao linguagem, seus conhecimentos sobre os modelos portadores de valores de uso
elaborados pelas sociedades anteriores, ou seja, os gneros indexados disponveis no intertexto
(cf. Bronckart, 1999: 137).
Embora qualquer falante da lngua portuguesa consiga identificar facilmente qualquer dos textos
listados anteriormente, isso s possvel porque esses gneros so formas convencionais de
enunciados, mais ou menos estveis, histrica e socialmente situadas. No entanto, o aspecto
convencional no impede a tendncia inovao e mudana, que confere aos gneros
dinamicidade e complexidade varivel. Isso porque eles se definem no apenas por propriedades
lingsticas, mas predominantemente por propriedades funcionais e pragmticas (cf. Marcuschi,
2002: 19-36).
A tendncia inovao e mudana gera a necessidade de os gneros serem apreendidos no dia-adia pelos membros de uma comunidade. Isso porque, tal como postulou Bakhtin (1952/1992) os
gneros so modelos comunicativos utilizados socialmente, que funcionam como uma espcie de
padro global que representa um conhecimento social localizado em situaes concretas e que
nos permitem identificar um texto individual como membro de uma classe mais geral. Por isso,
para Marcuschi (2002: 20-21), os gneros no dependem de decises individuais e no so
facilmente manipulveis, eles operam como geradores de expectativas de compreenso mtua,
sendo as propriedades inalienveis dos textos empricos guias que direcionam produtor e
receptor.
Uma outra considerao de Marcuschi (2002) sobre os gneros que esses podem apresentar-se
bastante heterogneos com relao forma lingstica. Isso porque h muitos casos em que no
a forma no determina o gnero, tal como exemplifica o autor (p. 21), um texto pode ser
considerado como um artigo cientfico se publicado numa revista cientfica, j se o mesmo texto
for publicado num jornal dirio ele passa a ser um artigo de divulgao cientfica. O que muda
no o texto, mas sim sua funo e principalmente os seus aspectos scio-comunicativos. Assim,
para definir um gnero Marcuschi defende que preciso considerar os papis dos atores, as
funes e objetivos do evento comunicativo e o modelo disponvel no intertexto[2]. Essas
consideraes atestam que dominar um gnero no dominar suas caractersticas lingsticas,
mas sim uma forma de realizar lingisticamente objetivos especficos em situaes particulares
de uso (cf. Marcuschi, 2002: 35-36).
A perspectiva terica scio-interacionista postula que a comunicao humana realizada atravs
de uma forma textual concreta, produto de uma atividade de linguagem em funcionamento numa
dada formao social. De acordo com Bronckart (1999: 137), as formaes sociais elaboram os
diferentes gneros em funo de seus objetivos, interesses e questes especficas. Para o autor, as
formaes scio-discursivas[3] designam as diferentes formas que toma o trabalho de
semiotizao em funcionamento nas formaes sociais (p. 141).
Bronckart (op. cit., p. 103), tal como Marcuschi (2002), baseando-se tambm em Bakhtin,
postula ainda que, se os gneros so meios scio-historicamente construdos para realizar
objetivos comunicativos determinados, a apropriao dos gneros um mecanismo
fundamental de socializao, de insero prtica nas atividades comunicativas humanas. Por
isso, para a realizao de uma comunicao eficiente, fundamental o conhecimento do gnero
envolvido numa determinada prtica social.
Diante desse quadro terico, podemos considerar o resumo como um gnero na medida em que
ele uma realizao lingstica em funcionamento em diferentes instncias da sociedade atual,
entre elas o ensino superior.
Gnero resumo
Como os gneros definem-se predominantemente por propriedades funcionais e pragmticas,
preciso, antes de tecer o conceito de resumo acadmico, fazer uma breve considerao sobre a
esfera social na qual esse gnero circula. Tambm preciso conhecer os estudos atuais sobre o
resumo que o redefinem a luz das teorias que se fundamentam nas noes bakhtinianas de gnero
textual.
Diante dessas consideraes, optei por realizar em primeiro lugar uma investigao sobre o meio
de circulao desse gnero, o contexto acadmico, abordando tambm os papis dos atores,
configurando tambm as funes e os objetivos desse evento comunicativo. Em seguida passo ao
levantamento das contribuies de alguns lingistas que se preocuparam em entender o resumo
como um gnero textual.
Contexto acadmico
Resumir uma das prticas lingsticas mais freqentes na vida cotidiana. Saber resumir textos
lidos uma capacidade necessria, nas sociedades letradas, para o desempenho de vrias funes
e atividades profissionais. Por exemplo: um advogado precisa resumir o que leu num processo;
um administrador, o que leu num projeto; um jornalista, o que ouviu numa entrevista e assim por
diante.
Resumir tambm um saber-fazer necessrio ao universo do ensino. Schneuwly e Dolz (1999)
acreditam que o resumo constitui-se num eixo de ensino/aprendizagem essencial para o trabalho
de anlise e interpretao de textos e, portanto, um instrumento interessante de aprendizagem
(p. 15).
Resumo acadmico
Diante de todas essas consideraes, defino como resumo acadmico um texto que explicita de
forma clara uma compreenso global do texto lido, produzido por um aluno-leitor que tem a
funo demonstrar ao professor-avaliador que leu e compreendeu o texto pedido, apropriando-se
globalmente do saber institucionalmente valorizado nele contido e das normas as quais o gnero
est sujeito. Nessa esfera de circulao, a funo do resumo acadmico ser um texto autnomo,
que recupera de forma concisa o contedo do texto lido numa espcie de equivalncia
informativa que conserva ou no a organizao do texto original.
Quanto funo, vemos que o resumo no contexto acadmico serve tanto ao aluno, como
eficiente instrumento de estudo dos inmeros textos tericos e cientficos que tem que ler, quanto
ao professor, como instrumento de avaliao que permite verificar a compreenso global do texto
lido. Alm disso, o resumo acadmico pode ser considerado um gnero que proporciona ao aluno
a insero nas prticas acadmicas.
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