Francisco Campos - O Estado Nacional
Francisco Campos - O Estado Nacional
Francisco Campos - O Estado Nacional
Novo,presentesosMinistrosEuricoGasparDutraeFranciscoCampos.
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O ESTADO NACIONAL
Mesa Diretora
Binio 2001/2002
Senador Jader Barbalho
Presidente
Senador Edison Lobo
1 Vice-Presidente
Suplentes de Secretrio
Senador Alberto Silva
Conselho Editorial
Senador Lcio Alcntara
Presidente
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O ESTADO NACIONAL
Sua estrutura
Seu contedo ideolgico
Francisco Campos
Braslia 2001
O Conselho Editorial do Senado Federal, criado pela Mesa Diretora em 31 de janeiro de 1997,
buscar editar, sempre, obras de valor histrico e cultural e de importncia relevante para a
compreenso da histria poltica, econmica e social do Brasil e reflexo sobre os destinos do Pas.
COLEO BIBLIOTECA BSICA BRASILEIRA
A Querela do Estatismo, de Antnio Paim
Minha Formao, de Joaquim Nabuco
A Poltica Exterior do Imprio (3 vols.), de J. Pandi Calgeras
O Brasil Social, de Slvio Romero
Oito Anos de Parlamento, de Afonso Celso
Captulos de Histria Colonial, de Capistrano de Abreu
Instituies Polticas Brasileiras, de Oliveira Viana
A Cultura Brasileira, de Fernando Azevedo
A Organizao Nacional, de Alberto Torres
Deodoro: Subsdios para a Histria, de Ernesto Sena
Rodrigues Alves: Apogeu e Declnio do Presidencialismo, de Afonso Arinos de Melo Franco (2 volumes)
Presidencialismo ou Parlamentarismo?, de Afonso Arinos de Melo Franco e Raul Pila
Rui o Estadista da Repblica, de Joo Mangabeira
Pensamento e Ao de Rui Barbosa, seleo de textos pela Fundao Casa de Rui Barbosa
Eleio e Representao, de Gilberto Amado
Dicionrio Biobibliogrfico de Autores Brasileiros, organizado pelo Centro de Documentao do
Pensamento Brasileiro
Observao sobre a Franqueza da Indstria, do Visconde de Cairu
A Renncia de Jnio, de Carlos Castello Branco
Joaquim Nabuco: revolucionrio conservador, de Vamireh Chacon
Histria das Idias Polticas no Brasil, de Nelson Saldanha
A Evoluo do Sistema Eleitoral Brasileiro, de Manuel Rodrigues Ferreira
Projeto grfico: Achilles Milan Neto
Senado Federal, 2001
Congresso Nacional
Praa dos Trs Poderes s/n CEP 70168-970 Braslia DF
[email protected]
http://www.senado.gov.br/web/conselho/conselho.htm
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Campos, Francisco, 1887-1968.
O Estado nacional : sua estrutura, seu contedo ideolgico /
Francisco Campos. Braslia : Senado Federal, Conselho
Editorial, 2001.
226 p. (Coleo Biblioteca Bsica Brasileira)
1. Poltica e governo, Brasil (1930-1937). 2. Reforma judiciria,
Brasil. 3. Estado Novo (1937-1945), Brasil. I. Ttulo. II. Srie.
CDD 320.981
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Sumrio
NOTA DO EDITOR
pg. 9
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Nota do Editor
Francisco Campos foi o principal autor da Constituio outorgada de 1937, que no chegou a vigorar efetivamente, posto que seria
submetida a um plebiscito que nunca se realizou. A Constituio de
1937, conhecida como Polaca, apresentava ntida orientao fascista.
Ainda no campo jurdico, Francisco Campos ficou frente da
comisso revisora do novo Cdigo Penal de 1940, cujo anteprojeto, trazido a pblico em 15 de maio de 1938, fora elaborado por Alcntara
Machado. A comisso revisora era composta por eminentes juristas como
Nlson Hungria, Roberto Lira, Vieira Braga e Narclio de Queirs,
alm da colaborao de Antnio Jos da Costa e Silva, aquele que fora
um dos mais abalizados comentaristas do novo Cdigo Penal da Repblica. Concludo o projeto definitivo, aprovado posteriormente, passou a
viger a partir de 1 de janeiro de 1942. Como de praxe, da autoria
do ento Ministro da Justia Francisco Campos a Exposio de Motivos dirigida ao Presidente da Repblica, Getlio Vargas.
O Estado Nacional, agora reeditado pelo Conselho Editorial do Senado Federal, coletnea de discursos, entrevistas e conferncias
proferidos pelo ministro da Justia de Getlio, constitui uma espcie de
fundamentao doutrinria e filosfica do Estado Novo, a exemplo do
salazarismo e do fascismo de Mussolini. Trata-se, portanto, de um
pensamento poltico autoritrio de cariz francamente fascista.
Na perspectiva de colocar disposio dos leitores textos representativos de nossa cultura poltica, vista na democrtica complexidade
dos embates de idias, doutrinas e propostas, inclusive no que se refere ao
nosso ordenamento jurdico, que publicamos o presente livro, para que
se compreenda em toda a sua dimenso um perodo da histria recente do
Brasil.
O C ONSELHO EDITORIAL DO SENADO FEDERAL
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specto trgico das pocas de transio Educao para o que der e vier A sofstica moderna Papel do mito soreliano Fichte e a sua frmula pattica Primado do irracional Tentativa de definio Apario de Csar O mundo poltico fora
construdo imagem do mundo forense Quando o baixo profundo de
Calib interrompeu a voz de Ariel Clima das massas A tcnica do
Estado totalitrio ao servio da democracia Queremos Barrabs!
Deslocamento do centro da deciso poltica Um conto chins
Como se forma a vontade dos povos Amor fati.
A SPECTO TRGICO DAS POCAS DE TRANSIO
Quando escolhi o tema deste monlogo, no pensei na vossa
e na minha impacincia. Ao primeiro golpe de vista, porm, percebi que
o caminho era difcil e, sobretudo, longo. E que o melhor para nos distrair da caminhada no seria um monlogo, que a torna mais fatigante e
montona, mas uma imensa e alegre controvrsia, em que cada um, sem
outro interesse que no fosse o interesse pelo jogo das idias, confes-
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sasse, em voz alta, o que realmente pensa sobre o mundo dos negcios
humanos. Esse mundo est mudando nossa vista, e mudando sem nenhuma ateno para com as nossas idias e os nossos desejos. Nele a
nossa gerao no encontra resposta satisfatria s questes que aprendeu a formular, nem quadram com as solues que lhe foram ensinadas
por uma laboriosa educao os problemas que desafiam a sua competncia. Que esta a situao em que nos encontramos h mais de vinte
anos o que mostra, com relevo extraordinrio, o movimento que se
vem operando na educao. A esta que incumbe, com efeito, adaptar
o homem s novas situaes. Nenhum setor, portanto, refletir com
mais fidelidade a inquietao contempornea do que aquele cuja funo
consiste precisamente em adaptar o homem ao ambiente espiritual do
nosso tempo. Ora, o que se nota nesse domnio que vai por ele uma
grande desarrumao. Os valores consagrados foram postos em dvida,
sem que se fizesse a sua substituio por outros valores. O que caracteriza a educao, em nossos dias, que ela no uma educao para este
ou aquele fim, para um quadro fixo, para situaes mais ou menos definidas, mas no sei para que mundo de possibilidades indeterminadas;
no uma educao para tais ou quais problemas, porm uma educao
para problemas, uma educao que se prope no a fornecer solues,
mas a criar uma atitude funcional do esprito, isto , atitude para o que
vier, seja o que for e de onde quer que venha, como a da sentinela atenta,
noite escura, s sombras e aos rumores.
No h mais solues, nem problemas que possam antecipadamente ser postos em equao. H apenas uma situao problemtica,
ou, antes, situao que muda segundo uma razo que ainda no conseguimos fixar. De onde no pode a educao exercer-se sobre problemas
definidos, que, postos hoje em certos termos, tero amanh configurao diversa, exigindo novo exame e outra posio relativa dos elementos.
Acontece, no entanto, que essa uma educao ainda procura dos
seus mtodos se possvel, numa educao para problemas, encontrar-se um mtodo que no seja igualmente problemtico.
O fato que os mtodos tradicionais foram postos de lado e
que ainda no foram encontrados os novos mtodos. Estamos diante do
problema de como tratar satisfatoriamente no problemas definidos,
mas simplesmente problemas de que no podemos antecipar os termos
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ou prever a configurao dos elementos. Esta s poder ser, evidentemente, a educao do futuro e para o futuro. H, porm, o problema
das geraes j educadas, ou em curso de educao, das que foram ou esto sendo educadas num determinado clima espiritual ou no pressuposto
de haver problemas definidos suscetveis de solues definidas. Essas
geraes foram ou esto sendo educadas por um mundo anterior ao
atual, por um mundo em que havia tipos e arqutipos, por um mundo
de esprito platnico, um mundo de ordem e de hierarquia, um mundo
de modelos e de formas, em que os problemas eram dceis e educados
como essas rvores de jardim que obedecem, no seu crescimento, direo do jardineiro. E enquanto, na pedra de aula, no papel e nas prelees, os educadores construam os modelos segundo os quais haviam de
configurar-se os problemas humanos, estes, como se o mundo houvesse
passado da escala de Plato para a de Herclito, estavam mudando, e
mudando num sentido estranho, porque segundo uma razo que no
era a da mecnica dos quadros negros e sob a influncia de valores no
computados na tabulao das pessoas educadas. Da, o mundo da interpretao construdo segundo os nossos desejos, e o mundo da realidade
refratrio a um sistema interpretativo, em desacordo com a escala e o
passo dos acontecimentos.
o aspecto trgico das pocas chamadas de transio.
A poca de transio precisamente aquela em que o passado
continua a interpretar o presente; em que o presente ainda no encontrou as suas formas espirituais, e as formas espirituais do passado, com
que continuamos a vestir a imagem do mundo, se revelam inadequadas,
obsoletas ou desconformes, pela rigidez, com um corpo de linhas ainda
indefinidas ou cuja substncia ainda no fixou os seus plos de condensao. Ns fomos educados pelo passado para um mundo que se supunha continuar a modelar-se pela sua imagem. O nosso sistema de referncias continuou a ser o que fora calculado para um mundo de relaes
definidas ou constantes, mas ns nos vemos confrontados com uma
realidade em que as posies no correspondem s fixadas na carta topogrfica. O que chamamos de poca de transio exatamente esta
poca profundamente trgica, em que se torna agudo o conflito entre as
formas tradicionais do nosso esprito, aquelas em que fomos educados e
de cujo ngulo tomamos a nossa perspectiva sobre o mundo, e as
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A SOFSTICA MODERNA
Entre Scrates e os sofistas havia um dilogo, ou uma discusso,
porque um e outro admitiam valores comuns, pelo menos um valor, o
valor de verdade. A sofstica de hoje, continuando embora a empregar a
linguagem dos valores tradicionais, eliminou a substncia de qualquer
valor, at do valor de verdade, pois a sua significao passou a ser exatamente o contrrio, o valor de verdade no consistindo a rigor na verdade,
mas naquilo que, no sendo a verdade, funciona, entretanto, como
verdade. Teremos oportunidade de ver a importncia dessa atitude do
esprito no mais no plano da especulao, porm da mais prtica das
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prticas, que a prtica poltica. Veremos, com efeito, como se constituiu uma teologia poltica que tem por substncia a afirmao de que o
seu dogma fundamental deve ser acreditado como verdadeiro, conquanto
declare que o seu valor no precisamente um valor de verdade. A teologia soreliana do mito poltico no mais do que uma aplicao, como
o reconhece o seu prprio autor, da filosofia de Bergson e, pensamos
ns, mais diretamente do pragmatismo anglo-saxo e do seu conceito de
verdade. Do estudo das condies do mundo moderno, Sorel chegou
concluso de que s uma revoluo total mudar o sistema de posies
de formas econmico-polticas, cujas injustias tanto o impressionaram.
No seu entender, porm, aquela revoluo no resultar fatalmente das
condies internas do regime capitalista, como queria Marx, pois a estrutura social mais complexa do que a descrita pelo marxismo, que a
reduziu oposio entre duas classes. A idia de Marx no verdadeira,
mas, acreditada como verdade, constitui o nico instrumento capaz de
conduzir grande revoluo. Convm, portanto, cultivar a idia de luta
de classes e forjar um instrumento intelectual ou, antes, uma imagem
dotada de grande carga emocional, destinada a servir de polarizador das
idias ou, melhor, dos sentimentos de luta e de violncia, to profundamente ancorados na natureza humana.
Esta imagem um mito. No tem sentido indagar, a propsito
de um mito, do seu valor de verdade. O seu valor de ao. O seu valor
prtico, porm, depende, de certa maneira, da crena no seu valor terico,
pois um mito que se sabe no ser verdadeiro deixa de ser mito para ser
mentira. Na medida, pois, em que o mito tem um valor de verdade,
que ele possui um valor de ao, ou um valor pragmtico.
PAPEL DO MITO SORELIANO
O papel do mito soreliano , portanto, equvoco, e nisto reside a
sua principal vantagem, ou a principal vantagem que lhe atribui Sorel, e
que consiste em ser irrefutvel: quand on se place sur ce terrain des mythes, on
est labri de toute refutation. A impossibilidade de refutar Sorel est exatamente em que ele atribui ao mito dois valores contraditrios: o valor de
verdade para os que acreditam no mito, e o valor de artifcio puramente
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tcnico para os que sabem que se trata apenas de uma construo do esprito. Atacado do ponto de vista da teoria do conhecimento, Sorel sorri
da objeo, alegando que ele prope no uma verdade, mas o oposto da
verdade. Mas, quando atacado, no terreno prtico, pelo argumento de
que o mito s funcionar como motivo de ao enquanto conservar seu
valor de verdade, responder que isto equivale a reconhecer ao mito um
valor puramente de verdade, porque o que nele se postula a impossibilidade da sua realizao e, portanto, o seu carter ltimo e final de inverificvel. A sofstica atual tem dois critrios de verdade: a verdade que se
sabe ser a verdade, pois, se no houvesse um critrio da verdade, no
haveria como distinguir entre mito e verdade, e a verdade que, embora
no sendo verdadeira, funcionar indefinidamente como verdade, porque o
que ela postula da realidade , por definio, insuscetvel de verificar-se.
A refutao de Sorel torna-se, assim, impossvel, no porque a sua doutrina seja irrefutvel, mas porque ele mesmo se encarregou de refut-la
por antecipao. No se arromba, evidentemente, uma porta aberta,
nem se toma de assalto uma fortaleza abandonada. No se poder, no
entanto, contestar que a fortaleza tenha sido ocupada, porque nela j
no se encontravam os seus defensores.
A duplicidade do mito, no sentido soreliano, no se limita
apenas ao plano terico. Toda tcnica, ainda a do esprito, indiferente
aos fins. A tcnica espiritual da violncia, que Sorel havia construdo
com o fim de tornar agudo o antagonismo entre duas classes, mobilizando-as para uma guerra permanente, tinha por objeto, de acordo com
as tendncias e simpatias intelectuais do autor, dissolver a unidade do
Estado, construda pelos juristas, graas ao emprego de mtodos artificiosos de racionalizao, prprios teologia, no multiverso poltico do
sindicalismo.
FICHTE E A SUA FRMULA PATTICA
Aconteceu, porm, que a tcnica espiritual da violncia, destinada por Sorel a dissolver a unidade do Cosmos poltico, haveria de ser
empregada, logo depois, num sentido absolutamente oposto, isto , no
sentido de pr fim luta de classes e reforar a unidade poltica do
Estado. Ao politesmo poltico de Sorel, e pelos mesmos processos inte-
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inconsciente coletivo, seio materno dos desejos e dos pensamentos humanos. O que novo a aliana do ceticismo com o romantismo, o
emprego, pelos sofistas contemporneos, das constelaes romnticas
como instrumento ou como tcnica de controle poltico, tornando ativas,
atravs da ressurreio das formas arcaicas do pensamento coletivo, as
emoes de que elas continuam a ser os plos de condensao e de expresso simblica. Alis, o estado de alma favorvel germinao dos
mitos polticos da violncia j vinha sendo preparado antes da guerra.
Esta acabou por libertar foras que at ento se vinham mantendo em
estado latente graas crena, embora j vacilante, em certas formas tradicionais de cultura moral e poltica, de que o grande conflito acabou
por mostrar a tenuidade, para no dizer ausncia, de substncia ou de
medula espiritual. As filosofias antiintelectualistas do fim do sculo XIX
e do princpio do sculo XX, dando ao ceticismo das elites novos fundamentos na razo, no lhes forneceu, porm, novos contedos espirituais, a no ser a vaga indicao, tanto mais poderosa quanto mais vaga,
de que os valores supremos da vida no constituem objeto de conhecimento racional, podendo apenas ser traduzidos em smbolos ou em
mitos, isto , em expresses destitudas de valor terico, cuja funo
no dar a conhecer, mas to-somente reviver os estados de conscincia
ou as emoes de que so apenas a imagem mais ou menos inadequada.
PRIMADO DO IRRACIONAL
Assim se instalava no centro da vida o primado do irracional,
e, em se tratando de formas coletivas de vida, o primado do inconsciente coletivo, por intermdio de cujas foras subterrneas ou telricas se
tornava possvel realizar, de modo mais ou menos completo, a integrao poltica, que o emprego da razo somente obtivera de maneira precria e parcial. O irracional o instrumento da integrao poltica total,
e o mito que a sua expresso mais adequada, a tcnica intelectualista
de utilizao do inconsciente coletivo para o controle poltico da nao.
Assim, as filosofias antiintelectualistas forneciam aos cticos no uma f
ou uma doutrina poltica, mas uma tcnica de golpe de Estado. Ao servio dessa tcnica espiritual coloca o maravilhoso arsenal, construdo
pela inteligncia humana, de instrumentos de sugesto, de intensifica-
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APARIO DE CSAR
As massas encontram-se sob a fascinao da personalidade
carismtica. Esta o centro da integrao poltica. Quanto mais volumosas e ativas as massas, tanto mais a integrao poltica s se torna
possvel mediante o ditado de uma vontade pessoal. O regime poltico
das massas o da ditadura. A nica forma natural de expresso da vontade
das massas o plebiscito, isto , voto-aclamao, apelo, antes do que
escolha. No o voto democrtico, expresso relativista e ctica de preferncia, de simpatia, do pode ser que sim pode ser que no, mas a forma
unvoca, que no admite alternativas, e que traduz a atitude da vontade
mobilizada para a guerra.
H uma relao de contraponto entre massa e Csar. Os
ouvidos habituados a distinguir, a distncia, o rumor das coisas que se
aproximam, percebem, sob o tropel confuso das massas, cuja sombra
comea a dominar o horizonte da nossa cultura, os passos do homem
do destino.
Essa relao entre o cesarismo e a vida, no quadro das massas, , hoje, um fenmeno comum. No h, a estas horas, pas que no
esteja procura de um homem, isto , de um homem carismtico ou
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A entrada das massas no cenrio poltico, com o seu irreprimvel pthos plebiscitrio e os novos instrumentos mticos de configurao intelectual do processo poltico, que , de si mesmo, ou, por natureza,
irracional, ou apenas suscetvel de uma inteligibilidade parcial, j est
exercendo sobre ele uma influncia decisiva, no sentido de torn-lo cada
vez mais irracional, e de latente em ostensivo o estado de violncia, que
constitui o potencial energtico at aqui dissimulado pelas ideologias racionalistas e liberais, e do qual, em ltima anlise, resultam as decises
polticas. Essa influncia traduz-se, de modo particular, pelo divrcio,
hoje confessado, entre a democracia e o liberalismo. O sistema democrtico-liberal fundava-se, com efeito, no pressuposto de que as decises
polticas so obtidas mediante processos racionais de deliberao e de
que a dialtica poltica no um estado dinmico de foras, mas de tenso
puramente ideolgica, capaz de resolver-se num encontro de idias,
como se se tratasse de uma pugna forense. Haveria aqui toda uma pgina
a escrever sobre a influncia da mentalidade forense da sofstica jurdica
na tentativa de dissimulao ou subtilizao da substncia de irracionalidade que constitui, de modo especfico, a medula do processo poltico.
O sistema intelectual, que constitui o pressuposto ou a
premissa maior inarticulada do liberalismo do sculo passado, construiu
o mundo poltico imagem do mundo forense, ampliando ao plano ou
ao teatro da ao poltica as categorias formalsticas do processo do
foro, no quadro das quais se resolvem, por uma balana de argumentos
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ou uma dialtica de idias e razes, de acordo com as premissas ou presunes infantis do pensamento jurdico, os conflitos submetidos arbitragem do juiz. Para essa psicologia intelectualista, as decises resultam
exclusivamente de elementos intelectuais, a substncia irracional da vontade representando apenas um instrumento passivo destinado a obedecer
aos decretos da razo e a execut-los. De acordo com esses pressupostos
intelectualistas que se construiu a teologia democrtico-liberal. Para
esta, com efeito, a deciso poltica objeto de um processo puramente
intelectual, no se reservando outro papel vontade que o de cumprir
as decises da inteligncia. Da a diviso dos poderes: de um lado, o parlamento, deliberando pela tcnica das discusses ou da dialtica racional,
de cujo funcionamento resultariam, por hiptese, as decises polticas;
de outro lado, o Executivo, centro da vontade, e a que se reserva no a
faculdade de tomar decises, mas simplesmente a de executar a deliberao do parlamento. A extenso desses pressupostos a todo o processo
democrtico, e, particularmente, ao da formulao da vontade geral, d
a imagem esquemtica da aplicao dos processos forenses s deliberaes polticas. H, decerto, no processo democrtico, um irredutvel
momento de irracionalidade, que , precisamente, o da formulao da
vontade geral mediante o voto. A este momento, porm, a democracia
faz preceder, como no processo parlamentar das decises polticas, o da
livre discusso, destinado a esclarecer as vontades convocadas a participar da deliberao final. A eleio, que um julgamento de Deus, vem,
assim, a revestir-se, como a deciso do juiz no processo forense e a dos
representantes do povo no processo parlamentar, de uma aparncia de
racionalidade, que satisfaz plenamente s modestas exigncias intelectuais
do sistema. Este, porm, s se completa por um pressuposto ltimo e
final, que o da existncia de uma opinio pblica em que as razes de
um e de outro lado so cuidadosamente pesadas em vista de uma deciso
racional ulterior. A tcnica de formao, ou de organizao, em um foro
comum, do conglomerado catico das opinies individuais, de cuja condensao num plo nico se constitui a opinio pblica, o arsenal com
que o liberalismo contribui para o aparelhamento intelectual da democracia: a liberdade de reunio, de associao, de imprensa e das demais
manifestaes do pensamento. Segundo o postulado liberal, o processo
poltico, passando por essas fases de tratamento ou de elaborao forense,
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definidas e intransponveis. A opo, pressuposto bsico da livre discusso e do sistema de opinio, s pode exercer-se entre termos mais
ou menos indiferentes, ou entre os quais no exista um estado agudo de
tenso, de conflito polar ou de extremada antinomia. As decises polticas
fundamentais so declaradas tabu e integralmente subtradas ao princpio da livre discusso. O sistema constitucional dotado de um novo
dogma, que consiste em pressupor, acima da Constituio escrita, uma
Constituio no escrita, na qual se contm a regra fundamental de que
os direitos de liberdade so concedidos sob a reserva de se no envolverem no seu exerccio os dogmas bsicos ou as decises constitucionais
relativas substncia do regime. A opinio demarca-se, dessa maneira,
um campo reduzido de opo, no qual to-somente se encontram as decises secundrias ou os temas partidrios que no interessam os plos
extremos do processo poltico, exatamente aqueles em torno dos quais
se organizam e concentram as constelaes de interesse e de emoo de
maior poder ou de mais intensa carga dinmica. Assim, a democracia,
para salvar as aparncias de racionalizao do seu sistema poltico, recorre, como ultima ratio ou como recurso de defesa dos resduos do liberalismo, a que ela sempre esteve to intimamente associada, aos processos irracionais de integrao poltica, transformando as decises
fundamentais, sobre cuja correo no admite controvrsias, em dogmas,
em relao aos quais, como nas teologias polticas antiliberais, exige, pelo
menos, as marcas exteriores do assentimento e da conformidade. Eliminando do seu sistema o princpio de liberdade de opo, com a amplitude
em que o havia formulado o liberalismo, a democracia perde o seu carter relativista e ctico, trao secundrio que ela devia sua fortuita
associao com a doutrina liberal, passando a ser um sistema monista de
integrao poltica, em que as decises fundamentais so abertamente
subtradas ao processo dialtico da discusso, da propaganda e da publicidade, para serem imputadas a um centro de vontade, de natureza to
irracional como os centros de deciso poltica dos regimes de ditadura.
A presso determinada pelo advento das massas determinou, assim,
uma crise interna do regime democrtico, levando-o, pelo abandono das
suas premissas liberais, a um estado de permanente contradio consigo
mesmo, estado este que no poder, evidentemente, contribuir, seno
de maneira transitria, para a manuteno dos ltimos traos que ainda
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Q UEREMOS B ARRABS!
Fechemos, porm, com o maior dos exemplos, porque depois
do seu nome nenhum mais poder ser ouvido: Captulo XVIII do
Evangelho de So Joo. Eles conduziram Jesus da casa de Caifs ao
pretrio; era de manh. Mas, eles no quiseram entrar no pretrio para
no se manchar e a fim de comer as pscoas. Pilatos saiu, pois, ao seu
encontro e disse: Que acusao tendes contra este homem? Eles lhe
responderam: Se no se tratasse de um malfeitor no o teramos trazido
tua presena. Pilatos lhes disse: Julgai-o vs mesmos, segundo a vossa
lei. Os judeus lhe responderam: No nos permitido dar a morte a
ningum a fim de que se realizasse a palavra que Jesus tinha dito, indicando de que morte ele devia morrer. Pilatos, voltando ao pretrio,
chamou Jesus e lhe disse: s o rei dos Judeus? Jesus respondeu: s tu
que dizes isto ou outros te disseram? Pilatos respondeu: que eu sou
judeu? Tua Nao e o chefe dos sacerdotes te entregaram a mim: que fizeste? Jesus respondeu: Meu reino no deste mundo; se meu reino
fosse deste mundo, aqueles que me servem ter-se-iam oposto a que eu
fosse entregue aos judeus, mas agora meu reino no deste mundo. Pilatos lhe disse: s rei? Jesus respondeu: Tu dizes, eu sou rei e vim a
este mundo para dar testemunho da verdade: quem da verdade, escuta
a minha palavra. Pilatos disse: Que a verdade? Dizendo isto, ele saiu
de novo ao encontro dos Judeus e lhes disse: Para mim, ele no tem
crime. Mas costume que eu vos entregue algum na festa de Pscoa.
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Quereis que eu vos entregue o rei dos judeus? Ento, todos gritaram:
Ele no, mas Barrabs! Ora, Barrabs era um ladro termina o evangelista.
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tem um contedo de significao didtica, ou onde reinam os professores, cuja funo conjugar o presente e o futuro nos tempos do pretrito. Para as decises polticas uma sala de parlamento tem hoje a
mesma importncia que uma sala de museu. H um episdio que desenha, com traos de caricatura, a situao de perplexidade a que chegaram os parlamentos.
U M CONTO CHINS
Conta Spender, no seu livro sobre a vida pblica na Inglaterra,
que, em 1920, recebeu, na sala de redao do seu jornal, a visita de trs
simpticos e inteligentes chineses que desejavam ouvir a sua opinio
sobre os negcios pblicos da China e particularmente sobre o impasse
verdadeiramente extraordinrio em que ento se encontravam. Era o
caso que o parlamento se achava instalado, os deputados eram assduos,
assentavam-se regularmente, falavam, tornavam a assentar-se e falavam
de novo. O cerimonial no deixava a desejar. Nada, porm, acontecia.
Como Mr. Asquith no exercesse no momento nenhuma funo oficial
na Inglaterra e lhes parecesse que somente um ingls poderia dar remdio situao, pediam a Spender que os aproximasse de Mr. Asquith, a
ver se ele podia passar alguns meses em Pequim, para transmitir aos chineses a cincia ou a tcnica de fazer acontecer alguma coisa num parlamento. Mas, se nada acontecia no parlamento chins, no era, evidentemente, por falta de congenialidade dos processos intelectuais que
lhe so prprios com o temperamento de uma raa to notria e abundantemente dotada para os jogos da inteligncia e a sutileza das idias.
Nada acontecia no parlamento chins, porque nada acontecia em nenhum parlamento do mundo, porque um parlamento , precisamente, o
lugar onde nada acontece e nada se decide. A poltica vive, porm, de
acontecimentos e de decises. Se o centro a que a deciso juridicamente
imputada nada decide, forma-se imediatamente ao seu lado um centro
de decises de facto. Assim se resolveu na prpria China, sem as luzes de
Mr. Asquith, o impasse ou o estado de perplexidade do parlamento.
Na Alemanha, enquanto um parlamento em que j houve o
maior nmero de partidos procurava inutilmente chegar a uma deciso
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Essas as foras elementares que os juristas pretendem fascinar, no com a mscara de Medusa com que os Csares paralisam o inconsciente coletivo em que se desencadeou o estado de violncia pela
hipnose do medo ou do terror, mas com o sortilgio de frmulas ou de
cerimnias j destitudas de qualquer significao ou substncia espiritual.
O processo poltico, assim o nacional como o internacional, tem por
medula uma constelao polar, ou uma constelao em que existem, ao
menos em estado virtual, dois campos nitidamente separados por uma
linha ou uma zona de tenso. Esta constelao pode, em determinados
momentos, apresentar um estado de tenso atenuada, quando os conflitos
que constituem o seu contedo, no se armam entre termos extremos
ou polares. H no entanto, no processo poltico, um estado latente de
violncia, que pode resolver-se em estado de agresso atual. Essa passagem do estado latente ao estado atual de violncia, que uma
possibilidade imanente ao processo poltico, o que se verifica, com
freqncia, em certas democracias, em que ao julgamento de Deus das
eleies se segue, com espantosa regularidade, o julgamento de Deus
das revolues.
Toda integrao poltica, por mais ininteligvel que seja o seu
processo, sempre uma tentativa de racionalizao do irracional. O irracional, porm, contm elementos absolutamente refratrios a todos
os processos de racionalizao. Ora, o processo poltico, definido pela
constelao polar, eminentemente do domnio do irracional ou do
ininteligvel. No possvel nenhuma integrao poltica total enquanto
o homem, definido por si mesmo como animal racional, conservar e defender, como vem fazendo com crescente veemncia, o seu patrimnio
hereditrio. No dia em que a massa nacional fosse integrada politicamente de maneira a no deixar resduos, ela deixaria simplesmente de
ser Estado, que um conceito poltico, isto , um conceito polmico, a
menos que, como entidade nacional, entrasse em relao de tenso com
outras massas nacionais. De igual modo, admitir a integrao poltica da
humanidade postular um estado apoltico do homem, porque a humanidade no poderia constituir um termo da constelao polar, em falta de
outro termo com que pudesse entrar em relao de conflito. A Sociedade
das Naes, no dia em que, como Forum Mundi, pudesse exercer a
funo, que lhe atribuda, de integrar politicamente a humanidade,
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AMOR FATI
Eu desejaria fazer as minhas despedidas com um conto azul.
salutar, porm, de vez em quando, olhar a realidade na face e ler na
sua mscara a mensagem que o destino a encarregou de transmitir aos
homens. J soou, quase simultaneamente em todos os meridianos, a
hora da advertncia e do alerta. J se ouve, ao longe, traduzido em todas
as lnguas, o tropel das marchas sobre Roma, isto , sobre o centro das
decises polticas. No tardaro a fechar-se as portas do frum romano
e abrir-se as do Capitlio, colocado sob o sinal e a inovao de Jpiter, ou
da vontade, do comando, da AUCTORITAS, dos elementos masculinos
da alma, graas aos quais ainda pode a humanidade encarar de frente e
amar o seu destino: AMOR FATI.
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nacional.
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nomia, o retrato das suas verdades histricas, sociais e econmicas, rompendo a mscara das frmulas e das convenes que o desfiguravam.
1930 E 1937
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processar-se superfcie da vida social, sem perturbar as atividades do trabalho e da produo. Hoje, porm, quando a influncia e o controle do Estado sobre a economia tendem a
crescer, a competio poltica tem por objetivo o domnio das
foras econmicas, e a perspectiva incomparavelmente mais
sombria da luta de classes.
Em tais circunstncias, a capacidade de resistncia do
regime desaparece e a disputa pacfica das urnas transportada para o campo da turbulncia agressiva e dos choques
armados.
AS PROMESSAS DO PARASO ECONMICO
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TCNICA DA VIOLNCIA
Se a democracia de partidos j no comportava a luta poltica
prpria da poca democrtica e liberal, as novas formas de antagonismo
poltico, peculiares ao nosso tempo, agravaram, de modo impressionante,
os perigos que a democracia de partidos representa para a ordem e a paz
pblica.
Com efeito, contrastando com os antagonismos da poca
democrtica e liberal, os quais podiam desenvolver-se sem graves perigos para a ordem e a paz pblica, mediante os processos clssicos da
discusso e da propaganda, porque base e como limite da oposio
poltica existia o reconhecimento, pelos contendores, dos postulados e
das convenes fundamentais do regime, o antagonismo entre as novas
formaes partidrias do nosso tempo reveste-se de um carter polar ou
absoluto, no existindo terreno comum de mediao ou entendimento
entre a extrema esquerda e a extrema direita.
O uso de violncia, como instrumento de deciso poltica,
passou para o primeiro plano, relegando os processos tradicionais de
competio, e onde quer que se abra a perspectiva dessa luta, torna-se
imprescindvel reforar a autoridade executiva, nica cujos mtodos de
ao podem evitar o conflito ou impedir que ele assuma a figura e as
propores da guerra civil.
Da o fato de termos vivido, durante mais de quarenta anos,
em regime constitucional terico e em estado de inconstitucionalidade
crnica, mal dissimulado por instituies que j haviam caducado antes de viver.
Ora, no era possvel que continussemos a viver de expedientes, emergindo do prolongado torpor dos tempos otimisticamente, denominados normais para os curtos perodos de excitao e de alarme, findos
os quais trocvamos a posio de viglia pela do repouso, da inrcia e da
injustificvel e cega confiana nos favores sempre precrios do destino.
O MONSTRUOSO APARELHAMENTO DE 1934
Criticando com exatido a Constituio de 1934, vasada nos
moldes clssicos do liberalismo e do sistema representativo anterior
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O ESPRITO DE REFORMA
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Da o desinteresse que se observa em quase todo o mundo pelas campanhas eleitorais. Nelas o povo no encontra os grandes motivos ou os
grandes temas humanos, acessveis ao interesse geral, que, no sculo
passado, davam vida poltica, nas suas fases agudas, a aparncia movimentada e dramtica. medida que os problemas em debate se tornam
complexos e, pelo seu carter tcnico, imprprios a provocar nas massas
a emoo, a opinio pblica passa a desinteressar-se do processo poltico
propriamente dito, s exigindo dos governos resultados que se traduzem
efetivamente em melhoria do bem-estar do povo. A opinio em todo o
mundo entrou em estado de apatia ou de indiferena mais ou menos
acentuada.
Acrescentem-se a este quadro as deficincias e lacunas do
sistema da educao. claro que, dada a natureza dos problemas que
constituem hoje o objeto da poltica, esta no pode mais fazer-se a no
ser mediante decises tomadas com conhecimento de causa. Ora, a
educao, por mais que se tenha generalizado a instituio primria,
ainda no constitui um bem ao alcance de todos, ou a maioria. O sistema de educao em vigor em todo o mundo ainda um sistema mais
ou menos fechado, acessvel to-somente a pequeno nmero. A massa
eleitoral continua em estado de ingenuidade em relao aos problemas
capitais da poltica e do governo. Mudaram os problemas e no se alterou o processo poltico, ou, em outras palavras, a emoo continua a
ser instrumento que as massas eleitorais aplicam aos problemas polticos,
quando estes perderam o carter dogmtico, prprio das grandes questes gerais e humanas, que apaixonavam as massas eleitorais do sculo
passado. A Constituio de 10 de novembro no faz mais, restringindo
o uso do sufrgio universal, do que aceitar uma situao de fato, hoje
geral do mundo.
No abandonou, porm, nem podia faz-lo, o sufrgio universal. Reservou-lhe o papel prprio ou a funo mais adequada sua
natureza. Ao sufrgio universal so submetidas apenas as questes que
so da sua competncia prpria, questes essencialmente polticas, eminentemente polticas, colocadas em termos simples e gerais, suscetveis
de interessar realmente o povo e para cuja deciso no se exija da massa
eleitoral seno a vista panormica da vida poltica.
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DELEGAO DO PODER LEGISLATIVO
A Constituio de 34 vedava, em termos absolutos, a delegao de poderes. Foram os tribunais que, na expresso do professor
Goodnow, tomaram da cincia poltica uma nebulosa teoria e a transformaram em uma regra ineficaz e inaplicvel.
A Constituio de 10 de novembro permite expressamente a
delegao do Poder Legislativo.
Nisto, ainda, a Constituio de 10 de novembro atendeu
realidade. No h hoje nenhuma controvrsia relativamente incapacidade do corpo legislativo para a legislao direta. a sobrevivncia de
um rgo s condies que o geraram. No sculo passado, o papel do
Estado era, antes de tudo, negativo: intervir o menos possvel. O Parlamento era um rgo eminentemente poltico, cuja funo no era
uma funo tcnica, mas poltica: controlar o governo e servir de rgo autorizado de expresso da opinio pblica. A legislao limitava-se a regular questes gerais e simples. Ora, a atividade parlamentar
sofreu duas modificaes radicais. A primeira delas no seu carter representativo, ou como rgo de expresso da opinio pblica. Com o
vertiginoso progresso das tcnicas de expresso e de comunicao do
pensamento, o Parlamento perdeu a sua importncia como frum da
opinio pblica, que hoje se manifesta por outros meios mais rpidos,
mais volumosos e mais eficazes. A opinio desertou os parlamentos,
encontrando novos modos de expresso. Ela no s deixou de exprimir-se pelos parlamentos, como os colocou sob o controle dos meios
de formao e de expresso da opinio pblica. As salas das assemblias
legislativas no comportam a opinio pblica de hoje, cujo volume exige
espaos mais amplos.
Por sua vez, mudaram as funes do governo: de negativas
passaram a positivas. A legislao hoje uma imensa tcnica de controle da vida nacional, em todas as suas manifestaes. A legislao
perdeu o seu carter exclusivamente poltico, quando se cingia apenas
s questes gerais ou de princpios, para assumir um carter eminentemente tcnico.
Os processos parlamentares continuaram os mesmos, a funo dos parlamentos passou a ser infinitivamente mais complexa e di-
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fcil. Ora, um corpo constitudo de acordo com os critrios que presidem constituio do Parlamento inapto s novas funes que pretende exercer. Capacidade poltica no importa capacidade tcnica, e a
legislao hoje uma tcnica que exige o concurso de vrios conhecimentos e de vrias tcnicas. Da incapacidade do Parlamento para a funo legislativa resulta a falta de rendimento do seu trabalho. No s o
Parlamento funciona a maior parte do tempo no vazio, fugindo, assim,
execuo de uma tarefa acima das suas foras e que no pode ser realizada mediante os defeituosos processos parlamentares, como, quando
aborda a tarefa, o faz, a maior parte das vezes, de pontos de vista estranhos aos verdadeiros interesses em jogo, considerando as questes mais
no plano do interesse poltico ou das exigncias eleitorais, do que no seu
plano prprio e adequado. Um corpo numeroso, constitudo de vrias
tendncias, de grupos e at de matizes individuais no rene, evidentemente, os requisitos prprios a uma obra legislativa homognea e consistente. E o que se observa nos mais importantes documentos legislativos, bastando citar, como exemplo expressivo, a prpria Constituio
de 34, trabalhada, de modo aparente e manifesto, por vrias e opostas correntes, que quebraram, assim, o principal carter de uma lei desse vulto
a sua unidade ideolgica e tcnica.
Da o movimento geral em todo o mundo para retirar do Parlamento a iniciativa da legislao e estender cada vez mais o campo da
delegao de poderes. No h hoje obra legislativa importante que no
tenha sido iniciativa do governo ou no seja o resultado de uma delegao do Poder Legislativo. Quase toda a legislao recente na Inglaterra
feita por Orders in Council e Departmental Regulations, isto , legislao pelo
Executivo, mediante delegao de poderes.
Nos Estados Unidos, pas em que sempre existiu a preveno
dos tribunais contra a delegao, a legislao pelo Executivo, ou delegada, constitui hoje a massa mais importante da produo legislativa.
No s em outros pases a legislao direta pelo Parlamento
se mostrou impraticvel. Entre ns, os seus defeitos esto patentes a todas as vistas. O processo de crivar de emendas, muitas vezes de carter
pessoal, um projeto de lei, um processo corrente na forma parlamentar
de legislao. Os grandes projetos, em que a unidade de princpio e de
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tcnica qualidade capital, no podiam sair desse processo seno deformados, mutilados e imprestveis.
A extenso e a prolixidade dos debates tomavam, ainda, quase
todo o tempo til das assemblias, de sorte que a obra legislativa no
correspondia, pelo minguado volume, ao tempo e ao esforo que nela
se gastavam. O presidente observou, com a maior justeza, que a quase
totalidade dos projetos de iniciativa do governo ficaram durante anos
parados nas comisses ou no plenrio, a mquina parlamentar confessando-se impotente para dar conta da parte capital da sua tarefa.
Somando-se a esses inconvenientes e agravando-lhes os resultados, h que acrescentar a ftil liberdade concedida a qualquer membro
do Parlamento para tomar o tempo e a ateno dos seus pares com iniciativas de carter puramente individual. A vontade de no se mostrar
inativo, ou antes, de manifestar aos eleitores o seu interesse pelo mandato, levava quase todos os membros do Parlamento a tomar iniciativas
de legislao, que no contavam com nenhuma probabilidade de se
transformarem em leis, sobrecarregando, apenas, inutilmente, o trabalho
das comisses e as ordens do dia de plenrio. A Constituio de 10 de
novembro, reconhecendo o mal, deu-lhe o remdio. A iniciativa da legislao cabe, em princpio, ao governo. A nenhum membro do Parlamento lcito tomar iniciativa individual de legislao. A delegao de
poderes no s foi permitida, como se tornou a regra, pois a Constituio
prescreve que os projetos de iniciativa do Parlamento devem cingir-se a
regular a matria de modo geral, ou nos seus princpios, deixando ao
governo a tarefa de desenvolver esses princpios, e regular os detalhes.
EVOLUO DA DEMOCRACIA
A nova Constituio profundamente democrtica. Alis, a expresso democrtica, como todas as expresses que traduzem uma atitude
geral diante da vida, no tem um contedo definido, ou no conota valores eternos. Os valores implcitos na expresso democracia variam
com os tipos de civilizao e de cultura. A democracia reinante no sculo
XIX era fundada nos princpios e no estado de esprito que comearam a
tornar-se explcitos no fim no sculo XVIII. Era uma atitude de revolta
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A MQUINA ADMINISTRATIVA
Se o Estado amplia o seu controle sobre todas as foras nacionais,
claro, para que a sua ao seja eficaz, se torna necessrio que ele
disponha de uma mquina de governo capaz, flexvel e de rendimento
correspondente s suas responsabilidades. A construo constitucional
da mquina do governo propriamente dita simples e prtica. Toda ela
construda em torno de uma idia central, favorvel ao eficaz do
governo: o governo gravita em torno de um chefe, que o presidente
da Repblica. A este cabe dar a impulso s iniciativas dos demais rgos
do governo. O instrumento capital do governo , porm, a administrao.
Cumpre, pois, que a mquina administrativa seja regulada segundo o
mesmo mtodo que presidiu organizao do governo. A mquina
administrativa deve ser pronta, capaz e responsvel. Organizada para a
ao, no pode dispersar-se em movimentos descoordenados, perder-se
em perplexidades ou desbaratar o tempo e o dinheiro, repetindo em
cada setor servios que devem ser concentrados em um s. O princpio
da concentrao de servios da mesma natureza em um s departamento
um princpio de eficincia e de economia.
O recrutamento do pessoal administrativo deve obedecer a
normas inflexveis de capacidade e de interesse pblico, no podendo o
servio pblico ser considerado como reserva destinada a alimentar uma
incontentvel clientela eleitoral.
A estabilidade do pessoal no deve excluir a responsabilidade,
nem impedir a realizao do bem pblico. O servio pblico no organizado para o funcionrio, mas para o povo ou para a nao. No pode
haver garantias contra o interesse pblico. O interesse pblico h de
ditar o ingresso do funcionrio na carreira e o seu afastamento do servio.
Do mesmo modo que o governo se organiza em torno do chefe do
Estado, cada departamento ou setor da administrao deve organizar-se
em torno do chefe. Este, o princpio de autoridade e de responsabilidade,
sem o qual no pode haver governo e administrao da coisa pblica.
Assim como os indivduos organizam a administrao dos seus negcios,
assim deve a nao organizar a dos seus interesses.
O regime liberal, que aprovava os mtodos da administrao
privada, fundados no princpio da autoridade e da responsabilidade,
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quando se tratava do interesse pblico, achava que este podia ser administrado mediante processos caticos ou pela incompetncia do sufrgio.
Se o liberalismo achava que o sufrgio era o melhor meio de designar
um governo competente, por que no o aplicava administrao dos
interesses privados? que, para o liberalismo, o importante, o capital
era o indivduo: o coletivo, o pblico era apenas um acervo de interesses
sem dono e destinado, portanto, a ser distribudo entre os mais ativos e
empreendedores, isto , os demagogos, os agitadores e os manipuladores
sub-reptcios da opinio.
LIBERDADE
Um dos pontos essenciais do regime a definio da liberdade.
Sua importncia, entre ns, tem sido meridianamente proclamada.
Importncia, porm, s de palavras.
Com o falso pretexto da liberdade, criaram-se os poderes irresponsveis que, aproveitando-se da chance ou das circunstncias favorveis, estabeleceram o seu domnio sobre a nao domnio econmico, mediante as poderosas organizaes econmicas, e domnio
poltico, mediante as arregimentaes partidrias em que o princpio
democrtico no era observado. Essas organizaes, criadas fora do
Estado, enfraqueceram-lhe o poder e passaram a exercer um verdadeiro
poder de natureza pblica, em proveito de interesses privados. Os fracos,
os desprotegidos, e entre estes se deve contar o interesse nacional, ficaram com a liberdade nominal, e efetivamente sem nenhum direito.
No regime liberal organizou-se um novo feudalismo econmico
e poltico.
Somente o Estado, porm, est em condies de arbitrar ou
de exercer um poder justo. Ele representa a nao, e no o instrumento dos partidos e das organizaes privadas.
O regime corporativo no exclui a liberdade; apenas torna
justo o seu exerccio.
A coletividade, at agora, era uma entidade annima e abstrata. Cumpre que seja uma realidade concreta e definida, oferecendo
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ao indivduo um quadro dentro do qual o exerccio da liberdade seja garantido e tenha sentido.
A organizao no suprime nem oprime a liberdade individual:
limita-a, para melhor defend-la, assegurando-a contra o arbtrio das
organizaes fundadas no interesse de grupos constitudos, sombra da
anarquia geral, sobre a base do interesse privado.
O poder econmico e o poder financeiro no podem continuar a ser poderes arbitrrios. Cumpre que se exeram no sentido do
interesse geral. Ao governo dos particulares se substituir o governo
do pblico.
Postular a liberdade simples postular a fora. necessrio
que sejam postuladas ao mesmo tempo a liberdade e a justia, ou antes,
a liberdade como exerccio de um poder justo.
Lacordaire resumiu numa frase lapidar a crtica do liberalismo:
Em toda sociedade em que h fortes e fracos, a liberdade que escraviza e a lei que liberta.
LIBERALISMO, MARXISMO, CORPORATIVISMO
O liberalismo poltico e econmico conduz ao comunismo. O
comunismo funda-se, precisamente, na generalizao vida econmica
dos princpios, das tcnicas e dos processos do liberalismo poltico.
Toda a dialtica de Marx tem por pressuposto essa verdade: a
continuao da anarquia liberal determina, como conseqncia necessria,
a instaurao final do comunismo.
Marx no podia, porm, prever a revoluo operada no pensamento poltico do sculo XX. A revoluo poltica impediu a revoluo
comunista. O grande pensamento poltico, afirmativo e orgnico, que se
substituiu ao ceticismo liberal, interrompeu o processo de decomposio,
que Marx postulava como necessrio e fatal. Suprimidas as condies
criadas pelo liberalismo implantao do comunismo, o marxismo
perdeu a atualidade, passando ao rol das teorias caducas em que foi to
frtil o sculo XIX.
O corporativismo mata o comunismo como o liberalismo
gera o comunismo. O corporativismo interrompe o processo de decom-
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A vida econmica no tinha outro regulador a no ser a vontade dos fortes, isto , daqueles que, graas espoliao ou s conjunturas
favorveis do livre jogo econmico, lograram constituir o seu feudo. A
livre concorrncia era uma corrida sem fim para objetivos puramente individuais. Num mesmo setor da produo podiam afluir, ao mesmo
tempo, capital e trabalho em proporo superior s necessidades do
consumo, ao passo que outros ramos da produo til e necessria,
mngua de recursos, no correspondiam s exigncias do mercado.
Agravando os males da concorrncia anrquica os poderes financeiros,
interessados exclusivamente na especulao, estimulavam, com a mira
to-somente nos resultados imediatos, a inverso de capitais, sem ateno s necessidades reais da produo, e assim distribuam o crdito no
na conformidade dos interesses da economia nacional, mas na dos seus
outros prprios interesses.
A livre concorrncia transformava-se, dessa maneira, numa
corrida desordenada para a crise. Sobrevinda esta, os poderes financeiros,
cuja assistncia se tornava ento mais necessria, retraam-se e procuravam liquidar as suas carteiras. O capital fixo, porm, no se podia desinvestir com a mesma facilidade com que se investira. No momento do
pnico, aqueles que o produziram e que se mostram intransigentes em
relao ao dogma da livre concorrncia, voltavam-se para o Estado e entregavam-se sua tutela improvisada, pedindo o ressarcimento. custa
da Nao, dos prejuzos de uma aventura em que, para embarcar, no se
lembraram de pedir ao Estado os competentes passaportes. Sob a
presso dos interesses polticos e eleitorais, estreitamente ligados
finana, o Estado tomava sobre si os prejuzos, distribuindo pela economia nacional as conseqncias das loucuras individuais de alguns aventureiros.
Da os tumores de fixao, formados na economia nacional, e
que tendiam a tornar-se rgos permanentes dessa economia, continuando a viver do trabalho daqueles a quem no tocaria nenhuma parte
nos lucros da especulao, se esta desse resultados positivos.
A organizao corporativa garante a liberdade de iniciativa de
uns, nos limites em que no prejudica igual liberdade de iniciativa de
outros, e, sobretudo, nos limites em que a liberdade individual no
constitui atentado contra o bem comum.
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O 10 de novembro resultou, antes de tudo, da profunda e urgente necessidade de integrar as instituies no senso das realidades
polticas, sociais e econmicas do Brasil, num momento em que essa
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A instantaneidade da ao contida num acontecimento histrico no quer dizer improvisao das idias a que ela corresponde. A
acumulao das foras espirituais que inspiram uma grande reforma
poltica processa-se lentamente, atravs de rduas experincias e longos
transes, nos quais as necessidades de renovao se cristalizam na conscincia
de que preciso oper-la. Mas, assim como repentinamente se deflagra,
pela ao das correntes eltricas, a tempestade que um lento processo de
condensao havia preparado, assim tambm, na vida dos povos, irrompe de sbito, pela presso da Histria e pela agravao das suas causas, a
energia renovadora que se vinha condensando na atmosfera social.
Foi o que aconteceu em 10 de novembro. Desde muito tempo,
o Brasil compreendia e sentia que no podia continuar como estava.
Todos os brasileiros queriam uma nova ordem e estavam preparados
para receb-la, se ela em verdade correspondesse, como de fato corresponde, ao bem do Brasil.
A conscincia nacional j est formada e orientada quanto s
vantagens do atual regime. Prova-o a aceitao imediata, sem restries,
de todo o pas.
A consolidao do regime processa-se com a facilidade, a
segurana e a rapidez que derivam da sua conformidade com o esprito
e o interesse da Nao.
D EMOCRACIA SUBSTANTIVA E DEMOCRACIA FORMAL
A reeleio do Presidente da Repblica por um ou mais
perodos, possibilitada pelo processo de escolha do art. 84, no
colide com o sentido democrtico da formao constitucional
brasileira, que a carta de 10 de novembro procurou preservar?
A democracia no , antes e tudo, uma renovao de
valores e um campo propcio a que todas as vocaes polticas aspirem ao supremo governo do pas? Por outro lado, no
se proporciona ao Presidente da Repblica meio fcil de prorrogar o perodo do seu mandato, em virtude do disposto no
pargrafo nico do art. 84?
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no implica concluso de que o sufrgio universal seja um sistema necessrio de escolha, nem de que o Presidente da Repblica deva exercer
o seu cargo por um curto perodo de tempo, no podendo ser reeleito.
absurdo tirar de uma noo meramente formal de democracia concluses que a prtica repele. Os meios pelos quais a vontade popular se
pode fazer sentir tm de ser estabelecidos de acordo com a realidade
social e no com os ensinamentos meramente dialticos.
O liberalismo entendia que o chefe de Estado no devia ser
reeleito, porque o conceito de democracia se ope permanncia longa
dos indivduos nos postos de Governo. No h, porm, tal oposio.
Desde que a vontade popular inequvoca reeleger o chefe do Estado,
essa reeleio perfeitamente democrtica e mais til ao bem-estar
comum que a mudana necessria dos homens. O povo deve ser o juiz
nico da oportunidade de ser o presidente substitudo. Foi o que visou a
lei fundamental vigente, admitindo a possibilidade da reeleio do
presidente.
Democracia no quer dizer governo transitrio, no quer
dizer governo mutvel, para que se possam contentar todas as ambies
polticas. A poltica liberal criou a ambio dos postos de Governo,
tema que s pode interessar aos indivduos que aspiram ao poder. O
Governo devia ser distribudo sucessivamente a vrios indivduos para
que cada um tivesse a sua vez. O Governo desviou-se de sua finalidade, que a realizao do bem pblico, para servir apenas aos grupos
que dele se apoderam periodicamente.
A democracia exige que os valores sejam renovados, quando
assim convm vontade popular. Um regime democrtico no significa
regime em que a renovao de valores se faa a prazo certo, em que
estejam marcadas as fases para uns descerem do poder e permitirem que
a ele subam outros. O bem-estar geral, que determinado pela vontade
do povo, tem o primado de todos os valores sociais. Estes devem ser
renovados apenas quando o bem-estar geral o exigir.
Ainda aqui no posso deixar que passe em silncio a questo
relativa ao carter democrtico do novo regime.
Para alguns espritos, ou ingnuos em relao aos fatores reais
que influem efetivamente nos governos chamados democrticos, os
interessados em transformar os meios em fins, idealizando-os para o
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efeito de assegurar, pela reverncia pblica, a sua continuao, a democracia no se define pelos valores ou pelos fins, mas pelos meios, pelos
processos, pela mquina, pela tcnica ou pelos diversos expedientes
mediante os quais os polticos fabricam a opinio ou elaboram os substitutos legais da vontade do povo ou da Nao.
Ora, a mquina democrtica no tem nenhuma relao com o
ideal democrtico. A mquina democrtica pode produzir e tem, efetivamente, produzido exatamente o contrrio da democracia ou do ideal
democrtico. Dadas as condies de um pas, quanto mais se avoluma e
aperfeioa a mquina democrtica, tanto mais o Governo se distancia
do povo e mais remoto da realidade se torna o ideal democrtico.
No haver ningum de boa-f que d como democrtico um
regime pelo simples fato de haver sido montada, segundo todas as
regras, a mquina destinada a registrar a vontade popular. Seja, porm,
qual for a tcnica ou a engenharia de um governo, este ser realmente
democrtico se os valores que inspiram a sua ao decorrem do ideal
democrtico.
A experincia de todo o mundo, e a nossa em particular, vem,
precisamente, em abono da tese. Se h um ideal democrtico, este h de
resolver-se, em ltima anlise, na abolio do privilgio, na igual oportunidade assegurada a todos, na utilizao da capacidade, na difuso, a
mais larga possvel, dos bens materiais e morais com que os progressos
da civilizao e da cultura tm concorrido para tornar a vida humana
mais agradvel e melhor. Ora, seria pueril afirmar que a mquina ou os
expedientes democrticos produzem, de si mesmos, esses resultados. O
que se verifica, ao contrrio, que, quanto mais se aperfeioa e complica
o maquinismo democrtico, tanto mais se dificulta ao povo no somente a participao nos processos de governo, como a sua inteligibilidade
ou a sua compreenso pela maioria do pas. Entre o povo e o Governo
multiplicam-se os intermedirios, indivduos e grupos, profissionalmente especializados na manipulao de uma imensa e complexa mquina
de Governo, de cujo funcionamento resulta, precisamente, o contrrio
da promessa democrtica. Ao invs de abolir os privilgios, estes crescem
dia a dia, somados aos antigos novos privilgios, exatamente os que
decorrem da mediao exercida por indivduos e grupos, politicamente
profissionalizados, entre o povo e o Governo. Os privilgios, ameaados
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cessem e no estivessem sujeitos a limitaes. O exerccio desses poderes tambm no infalvel, nem coloca o Presidente acima de qualquer
exame. Ao invs disto, cabe-lhe responsabilidade criminal pelos atos,
definidos em lei, que atentarem contra a existncia da Unio, a Constituio,
o livre exerccio dos poderes polticos, a probidade administrativa, a
guarda e o emprego dos dinheiros pblicos e a execuo das decises
judicirias. A primazia concedida ao Presidente da Repblica, tornando
possvel o melhor desempenho das funes de Governo, no isenta os
seus atos do exame, da crtica e da punio.
LIMITES DA IRRETROATIVIDADE DAS LEIS
A omisso do dispositivo das Constituies de 91 e de
34, que vedava as leis retroativas, significa a possibilidade de
atingirem as leis ordinrias quaisquer direitos adquiridos na
conformidade de leis anteriores?
A supresso, no texto constitucional, do princpio da irretroatividade das leis no significa a adoo do princpio contrrio, isto ,
da retroatividade. No na Constituio, mas na lei civil, que esse princpio deve figurar. A no retroatividade to-somente uma norma de
interpretao, uma regra de hermenutica, e por ela se entende que o intrprete, ou o juiz, no pode aplicar a lei nova s relaes jurdicas j
consumadas na vigncia da lei antiga. No deve, porm, esse princpio
constituir uma limitao ao Poder Legislativo; quando circunstncias especiais exigirem a reviso das relaes jurdicas acabadas, o legislador
no pode ficar privado da faculdade de promulgar leis retroativas, pois o
Estado, como guarda supremo do interesse coletivo, no deve atar as
prprias mos pelo receio de, em certas contingncias, ter que ferir ou
contrariar direitos individuais.
A no retroatividade das leis, postulada como proibio ao
Poder Legislativo, no passava de um exagero do individualismo jurdico
e, sobretudo, do individualismo econmico, que reclamavam rigorosa
neutralidade do Estado, no domnio do comrcio jurdico. Mas o Estado,
ante as novas condies de vida do mundo, no pode continuar a ser
um simples espectador que se limite a assistir s lutas da competio in-
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No domnio do direito criminal, onde as prerrogativas individuais poderiam correr maior perigo, a Constituio conservou o princpio
tradicional de que as penas estabelecidas ou agravadas na lei nova no
se aplicam aos fatos anteriores (art. 122, 13). Aos crimes cometidos
anteriormente, a lei nova s se aplica quando beneficiar o ru, pois, no
havendo ofensa a nenhum direito adquirido, no se deve sequer falar
de efeitos retroativos.
A Constituio de 10 de novembro situou, portanto, o problema
da irretroatividade das leis dentro das suas justas fronteiras, rigorosamente de acordo com as conquistas da cincia jurdica e as condies de
vida do mundo contemporneo.
COMPETNCIA DO C ONSELHO DA ECONOMIA NACIONAL
A competncia do Conselho da Economia Nacional,
constante do art. 61, apesar de se no dizer privativa, exclui a
legislao votada pelo Parlamento sobre essas matrias? Nos
casos das letras b e c, maxime em face do art. 62, e apesar do que
dispe o art. 63, parece que se trata de verdadeira legislao
emanada do Conselho. Essa restrio da competncia do Parlamento justificvel? No seria prefervel que, em todos os
casos, o Conselho tivesse funo meramente consultiva? E
quanto organizao corporativa da economia nacional
(letra a), qual a ndole legislativa ou consultiva da sua
atribuio?
A natureza e as finalidades do Conselho da Economia
Nacional, definidas no art. 61, envolvem o corolrio de que toda a
legislao atinente s matrias especificadas, isto , s questes de ordem
econmica e organizao sindical, deve ser elaborada com a cooperao
do Conselho. Essa interveno do rgo representativo das foras
econmicas do pas assunto de importncia bsica na estrutura e no
funcionamento do Estado Novo e est direta e indissoluvelmente ligada
ao sentido do regime estabelecido pela Constituio.
As vantagens de tal cooperao so to grandes, do ponto de
vista da garantia de solues apropriadas a inmeros problemas de ordem
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nos limites das prprias autorizaes. Alis, a delegao do poder legislativo no novidade que a Constituio de 10 de novembro haja inventado. Trata-se de uma prtica universal. Nos pases de regime representativo, ainda naqueles de instituies mais liberais, o processo de delegao funciona normalmente. Se o que se ensinasse nas nossas escolas
fosse a prtica e no apenas a teoria das instituies polticas, no haveria
necessidade de demonstrar que em nenhum pas do mundo, seja qual for
a sua forma de governo, a legislao obra exclusiva do Parlamento. A
legislao delegada j suplanta em todos eles, pelo vulto e pela importncia das matrias, a legislao direta. Comparando a legislao
delegada e a legislao direta, na Inglaterra, e estabelecendo entre elas a
relao de filho e pai, Cecil Carr, no seu livro de 1921, j escrevia que
in mere bulk the child now dwarfs the parent, isto , o filho j suplanta o pai
em volume. Em 1920, ao passo que figuravam, no Statute book, apenas
82 atos do Parlamento, o nmero de leis editadas pelo Governo, mediante delegao, era dez vezes maior. O volume anual, correspondente
a 1920, de leis votadas pelo Parlamento, contm 600 pginas; os dois
volumes, em que para o mesmo ano se acham reunidas, as estatutary rules
e orders in Council (legislao delegada) somam cerca de 3.000 pginas.
Em 1904, a legislao delegada, em vigor na Inglaterra ocupava
13 volumes. Em 1927, de 43 atos votados pelo Parlamento, 26 continham delegao do Poder Legislativo. A delegao do poder legislativo
hoje um dos lugares comuns da vida poltica na Inglaterra, diz
Robson, no seu livro de 1923, intitulado Justice and Administrative Law.
Nos Estados Unidos, a legislao delegada uma prtica normal
de governo.
James Hart, no livro que dedicou ao assunto, em 1925, diz
que, da presidncia de Washington de Coolidge, o presidente expediu
atos de legislao delegada que regulavam no somente deveres de
funcionrios, mas tambm interesses de particulares. E acrescenta:
Desde que o Congresso, em 1917-18, investiu o Presidente Wilson de
poderes extraordinrios, envolvendo o exerccio da mais larga discrio,
tanto os tcnicos como o pblico em geral comearam a verificar que
no passa de uma fico a afirmativa de que o presidente no pode
legislar. Segundo Hart, a histria da delegao legislativa, nos Estados
Unidos, pode dividir-se em seis perodos: 1789-1815; 1815-1861;
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outro poder tome a seu cargo a tarefa, cuja realizao o bem pblico
exige.
Quanto aos decretos-leis, previstos no art. 14 da Constituio,
acham-se, tambm, em absoluta conformidade com as atribuies conferidas ao chefe da Nao, e no infringem as que so dadas ao Parlamento, tanto mais quanto, neles, conforme o texto do citado art. 14, o
presidente obrigado a cingir-se aos dispositivos constitucionais e aos
limites das dotaes oramentrias.
O critrio de atribuir ao presidente da Repblica a faculdade
de expedir, nos limites das dotaes oramentrias, decretos-leis sobre a
organizao administrativa, o comando geral e a organizao das foras
armadas, dos mais justificveis. A administrao tem por chefe o presidente: a ele cabe a responsabilidade pela ao administrativa do governo. Da eficincia do instrumento destinado ao executiva, ningum
pode ser melhor juiz do que o chefe do Executivo. Atribuir-lhe a responsabilidade pelo rendimento da mquina que ele no possa remodelar
de acordo com as exigncias da ao , evidentemente, um contrassenso.
O vcio do regime liberal consistia em dar o poder a quem no tinha a
responsabilidade. A Constituio de 10 de novembro, obra de senso comum, associa responsabilidade o poder. Nisto, ela no faz mais do que
seguir o critrio de acordo com o qual os homens prudentes administram os seus negcios.
C OMPOSIO DA C MARA DOS DEPUTADOS
A limitao do nmero de deputados a 10 no mximo
e a trs no mnimo, por Estado, no desatende a diversidade
de populao dos vrios Estados? Isto variando, em
escala muito mais extensa, a populao dos estados, essa
limitao no acarretar injustamente a igualdade de representao de estados de populao muito desigual?
Sua pergunta refere-se a disposio contida no art. 48 da
Constituio. Devo observar que esse dispositivo obedeceu preocupao
poltica de evitar um Parlamento numeroso. A experincia demonstrou
que as assemblias so tanto menos fecundas e teis quanto maior
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oriunda da independncia, no estar anulado pela subordinao que por fora acarreta uma funo pblica?
A admisso da censura prvia Imprensa, instituda
pela lei ordinria, com carter permanente, corresponde a
uma necessidade do regime?
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Esta a opinio pblica dos filsofos, o mito racionalista criado pelo esprito especulativo da filosofia do sculo XVIII, a que faltava
a experincia dos fenmenos de base das instituies democrticas e
para a qual a opinio pblica do sculo XX constituiria uma novidade
to surpreendente quanto as recentes inovaes na tcnica do transporte e da comunicao. Ns sabemos, porm, que a opinio pblica no
o anjo do racionalismo poltico do sculo XVIII, gerado e alimentado
no ter da razo pura. Atrs da opinio pblica esto os engenhos mecnicos que a fabricam em grande escala. Os poderosos instrumentos de
propaganda, todos eles de propriedade privada, podem a qualquer momento soprar o vento da opinio pblica no sentido dos interesses que
os controlam. A opinio pblica tende, cada vez mais, a tornar-se a expresso das opinies ou dos interesses de um pequeno nmero de personalidades, de agncias de publicidade ou de grupos mais ou menos
numerosos de empresas de indstria e de comrcio.
Eis como a opinio pblica, instncia final do Governo, pode
ser dirigida precisamente no sentido de obstruir a ao do Governo, na
sua funo de promover e defender o interesse pblico contra os interesses criados, com ele incompatveis.
O problema cifra-se, portanto, em afirmar a autoridade pblica
contra aqueles que procuram usurpar o maior dos poderes polticos
para fins estranhos ou contrrios ao interesse pblico. Os Governos totalitrios resolvem o problema, englobando a Imprensa no Governo. As
chamadas democracias liberais nada fazem, deixando, assim, crescer, dia
a dia, a massa de obstrues e de resistncias ao Governo, que o reduzem a uma mquina de ineficincia e de perplexidade. Elas continuam a
interpretar o presente em termos do passado, as realidades em termos
da razo pura, traduzindo os fatos em mitos, as coisas concretas em abstraes, os poderes reais e efetivos em entidades neutras e incorpreas.
Elas persistem aplicando os dogmas da liberdade de pensamento e de
expresso nos mesmos termos em que foram formuladas por uma poca
que no conhecia o cinema, o broadcasting, a Imprensa de tosto, toda a
aparelhagem tcnica que a revoluo industrial colocou disposio dos
particulares para verter em termos de interesse pblico os seus prprios
interesses.
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Dadas as condies do mundo contemporneo, as suas condies de vida e o seu imenso arsenal de tcnica da ao pblica, indispensvel reinterpretar em termos do presente uma doutrina formulada
para outras condies de vida e, o que mais importa, formulada por filsofos, o que quer dizer avant la lettre, ou anteriormente a qualquer experincia.
Alis, nas prprias democracias liberais, o problema do controle
pblico est em ordem do dia: o cinema e o broadcasting j se encontram
no regime de controle pblico, em muitas das maiores democracias do
mundo.
Ningum poder negar que os instrumentos de propaganda e,
portanto, de formao da opinio pblica, levantam um grave problema
de Governo. , estou de acordo, um problema complexo e delicado,
que deve ser pesado com serenidade e objetividade, mas nem por isto
excludo de uma considerao urgente e vigorosa. Nem o exagero dos
regimes totalitrios, nem a criminosa negligncia dos regimes puramente
liberais. O nosso dever, do Governo e da Imprensa, procurar a linha
mdia, ao longo da qual possamos colaborar de boa-f e de boa vontade.
O sacrifcio ser tanto menor para os verdadeiros jornalistas, quanto a liberdade de Imprensa no significa, muitas vezes, liberdade para eles,
seno para a empresa econmica a que prestam honestamente a preciosa
assistncia do seu talento, da sua competncia e, sobretudo, dos seus
sortilgios ou do seu it sobre a opinio pblica.
O problema continua no canteiro. excusado encarecer que
o Governo no tem outro interesse que o de resolv-lo de maneira inteligente e humana. Que a Imprensa o ajude a examin-lo sob todos os
seus aspectos o que ele deseja e espera.
R ESTRIES AO P ODER LEGISLATIVO DO
PARLAMENTO
No ficam demasiado comprometidos o prestgio e a
autoridade dos membros do Parlamento pela faculdade conferida a qualquer das Cmaras de declarar vago o seu lugar
(art.43); pela competncia no Conselho da Economia, a que
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DECLARAO DA INCONSTITUCIONALIDADE
DAS LEIS
A subordinao do julgado sobre inconstitucionalidade
de lei deliberao da Cmara dos Deputados no despoja o
Poder Judicirio de uma prerrogativa que lhe era essencial? No
lhe parece inconveniente, por outro lado, dar a um poder poltico a prerrogativa de decidir da constitucionalidade das leis?
H na pergunta um equvoco. A Constituio no submete
Cmara dos Deputados a prerrogativa de julgar constitucional uma lei
declarada inconstitucional pelo Poder Judicirio. O que a Constituio
confere ao Parlamento a faculdade de remover a inconstitucionalidade,
mediante nova votao da lei, o que equivale, praticamente, a emendar a
Constituio, tornando compatvel com esta a lei impugnada.
O uso dessa prerrogativa rodeado de cautelas especiais: exige a
iniciativa do Presidente da Repblica, dois teros de votos numa e noutra
Cmara, e, finalmente, que se trate de interesse nacional de alta monta.
Passando agora a responder pergunta, no me parece essencial
ao Poder Judicirio a prerrogativa de declarar a inconstitucionalidade
das leis ou de recusar-lhes a execuo, com fundamento na sua incompatibilidade com a carta constitucional. Para que se pudesse considerar
como essencial essa prerrogativa, seria indispensvel que sem ela no se
pudesse conceber a existncia do Poder Judicirio.
Ora, tal prerrogativa no um atributo que se encontre reconhecido universalmente ao Poder Judicirio. Ao contrrio, um atributo
do Poder Judicirio do tipo americano, e, mesmo nos Estados Unidos,
seriamente combatido com os melhores fundamentos.
A Constituio americana , como se sabe, obra de um pequeno
nmero de grandes legistas. A supremacia do Poder Judicirio, mediante a
prerrogativa que lhe foi atribuda de guarda supremo da Constituio, foi
um arranjo ou uma construo imaginada por legistas.
Os legistas so, por natureza, conservadores, e a perspectiva
de mudanas, inovaes ou experincias sempre os intimida. Os interesses criados constituem o centro das suas preocupaes. Nos arranjos
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Sntese da Reorganizao
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O PRESIDENTE GETLIO VARGAS
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ALGUNS ASPECTOS DA LEI
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legislativa que o ministrio tem exercido, quer diretamente, quer participando de comisses especiais.
AS ACUMULAES
Com o Decreto-Lei n 24, o Estado Novo ps termo a uma
situao que, h mais de um sculo, desafiava a boa vontade e a energia
dos governantes. O novo regime no podia encarar o problema das
acumulaes com a fraqueza e a passividade dos regimes anteriores.
Inspirado no bem-estar do povo que legitimamente aspira aos cargos
pblicos o atual governo enfrentou interesses e ambies que se
contrapunham aplicao da lei, com a orientao segura e inflexvel,
procurando, em cada caso, dar uma deciso conforme o esprito e a letra
da Constituio. Protegido em suas decises pelo chefe do Governo, o
Ministrio da Justia grangeou, desde logo, a confiana popular. Inmeras consultas dos demais rgos do Governo Federal e dos estados,
de entidades pblicas e de particulares foram prontamente respondidas
e suas decises acatadas. Dentro de pouco tempo, firmou-se a convico
geral de que o problema das acumulaes, dentro do Estado Novo, no
sofreria os colapsos e as reticncias a que estivera sujeito em pocas
anteriores.
Firmada jurisprudncia com a fiel aplicao da lei, o Governo
pode, hoje, afirmar ao pas que o problema das acumulaes est solvido
e que no mais se reproduziro os abusos e a licena, to prprios do
regime democrtico-liberal.
DISSOLUO DOS PARTIDOS POLTICOS
Foi um dos primeiros atos do Governo, aps o 10 de novembro, e da sua oportunidade, os acontecimentos que se seguiram,
aqui e no estrangeiro, tm dado constante e eloqente testemunho. Os
partidos polticos e as organizaes parapartidrias no tinham outro
fim seno o de satisfazer os apetites das faces regionalistas, indo at
ao sacrifcio de segurana nacional e dos mais altos interesses do Brasil.
Extirpando o mal quando nem todos ainda lhe divisavam nitidamente
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LOTEAMENTO DE TERRENOS
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reclamada h longos anos. Ela foi feita num plano consentneo com o
interesse que procura defender e que, sendo o interesse do Tesouro, ,
principalmente, o interesse do povo. O crdito do Fisco um crdito
do povo contra a minoria de devedores remissos que se julgam com o
direito de gozar, gratuitamente, dos benefcios que a maioria paga.
Inspirada nas modernas idias processuais, a lei do Executivo fiscal
permite cobrar, em pouco tempo, crditos que as leis antigas deixavam
dormir durante anos, quando no morrer no esquecimento dos arquivos
e nos infinitos meandros da chicana forense ou administrativa.
PROCESSO PENAL
O projeto do Cdigo de Processo Penal, resultando de um
imperativo da Constituio de 1937, como o era da de 1934, mas que os
tumultuosos legisladores da segunda Repblica no souberam realizar, j
est concludo.
De par com a necessidade de coordenao das regras do
processo penal num cdigo nico para todo o Brasil, impunha-se o
seu afeioamento ao objetivo de maior facilidade e energia da ao repressiva do estado. As nossas leis vigentes de processo penal asseguram
aos rus, ainda que colhidos em flagrante ou confundidos pela evidncia
das provas, um to extenso catlogo de garantias e favores, que a represso ter de ser deficiente, decorrendo da um indireto estmulo
criminalidade. Urgia abolir semelhante critrio de primado do interesse
do indivduo sobre o da tutela social. No se podia continuar a transigir
com direitos individuais em antagonismo ou sem coincidncia com o
bem comum. O indivduo, principalmente quando se mostra rebelde
disciplina jurdico-penal da vida em sociedade, no pode invocar outras
franquias ou imunidades alm daquelas que o garantem contra o exerccio
do poder pblico, fora da medida reclamada pelo interesse social.
Se, por um lado, os dispositivos do projeto tendem a fortalecer
e prestigiar a atividade do Estado, na sua funo repressiva, certo, porm, que asseguram, com muito mais sinceridade do que a legislao
atual, a defesa dos acusados. Ao invs de uma simples faculdade outorgada a estes, e sob a condio de sua presena em juzo, a defesa passa a
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porm, abrem-se diante de ns: ou respeitar as linhas do processo tradicional, ou seguir a corrente reformadora que tem reunido as preferncias
dos melhores estudiosos da matria.
Que seria, porm, o sistema tradicional brasileiro? Como
identific-lo, de resto, nesse puzzle de normas regionais, de peculiaridades,
de convenincias, de erros acumulados em cinqenta anos de multiplicidade e descontinuidade processual?
No preciso discutir o mrito intrnseco, ou a lgica, do
Regulamento n 737, ou das Ordenaes do Reino, que constituem o
fundo, a base do processo at agora em vigor no Brasil e contra o qual
se levantou, com freqncia, a voz das ctedras, do foro, dos anfiteatros,
do parlamento e dos comcios, e at o esprito da anedota e da fbula.
Digamos apenas que ele deixou de corresponder s necessidades do
nosso tempo tempo em que necessrio viver mais depressa. O mundo
transformou-se, as relaes de direito complicaram-se demasiadamente
para que pretendamos satisfaz-las com o instrumento primitivo que
contentava o homem habituado liteira e ao carro de bois.
O que eu tenho a dizer sobre a reforma do processo j o
disse h vrios anos, falando aos meus colegas do Congresso de Direito
Judicirio, em julho de 1936:
O sistema legal por caractersticas inerentes sua
prpria estrutura e natureza das suas funes , precisamente,
o mais refratrio mudana e o de passo mais lento no sentido
das crises e das transformaes. A rigidez das linhas do sistema
legal e, particularmente, o fato de que o ministrio ou o exerccio das atividades legais constituem ainda, aos olhos do
pblico, uma tcnica de processos obscuros dificilmente
acessveis ao entendimento comum, formam uma atmosfera
propcia conservao e perpetuao de hbitos, ritos e tradies, muitas vezes incompatveis com exigncias que em
outros sistemas da vida coletiva j determinaram movimentos
de reajustamento e de adaptao, ou respostas adequadas e
satisfatrias.
Mais, portanto, no sistema legal do que em qualquer
outro, torna-se necessrio manter em atividade o esprito de
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vertigem das competies da era capitalista, na qual o ritmo
das relaes individuais e coletivas e o ciclo dos negcios criaram um novo sentimento do tempo, inteiramente particular
nossa poca.
Justia rpida e barata no , portanto, apenas uma
frase com que os eternos descontentes costumam variar a expresso da sua impertinncia histrica. uma justificada imposio das demais tcnicas do trabalho humano sobre aquela
que se encontra adormecida no cego automatismo dos seus
processos e uma inevitvel exigncia de economia dos demais
sistemas da vida coletiva, no sentido de que o sistema judicirio
trabalhe no tempo ou no ritmo do seu funcionamento, de
maneira a impedir as frices, os atritos e as demoras prejudiciais sua capacidade de produo e rendimento.
E mais:
Tanto a primeira quanto a segunda medida se resumem
simplesmente em tornar o direito permevel s transformaes intelectuais operadas em todos os domnios da atividade
cientfica e prtica, mdica, econmica, industrial e poltica.
O que se exige, em suma, que o direito se beneficie
dos mesmos mtodos de apreciao e de estudo que tornaram
possveis os rpidos progressos da Medicina, as transformaes dos processos industriais e o melhoramento ou a racionalizao de todas as tcnicas do trabalho humano. Para isto,
necessrio que os homens transportem para o domnio jurdico as mesmas perspectivas intelectuais em que se habituaram
a situar os demais objetos do conhecimento humano e utilizem, quanto ao direito, os hbitos com que as cincias de observao e de experincia imprimiram uma nova orientao
ao seu esprito.
No possvel que a experincia jurdica no se organize
como as demais em um aparelho de sistematizao e de controle, destinado no somente a melhorar o funcionamento da
Justia, como a tornar mais precisa ou mais conveniente a
formulao do direito. Urge que a experincia dos juristas seja
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pelo Estado Novo. Era necessrio, efetivamente, rever essa matria, que
o dolce far niente dos velhos legisladores deixara complicar-se, com gravame da Nao. Houve tempo em que os legisladores e os homens de
Estado, com as facilidades oferecidas vinda e fixao dos estrangeiros,
davam a impresso de procurar a mudana da raa, dos costumes, da
lngua e at, talvez, do nome de nosso Pas. O Presidente Getlio
Vargas, porm, desde o incio do seu Governo, vem desenvolvendo
uma estupenda poltica de nacionalizao, que encontrou nos textos do
ano passado o seu corpo definitivo.
Essas leis tm uma significao tal, como nunca se havia antes
encontrado na histria de nossa ptria. Elas exprimem um estado de
conscincia coletiva.
A raa brasileira foi bastante inteligente, bastante tenaz, bastante herica para conquistar e reivindicar este territrio, para repelir
agresses, para esmagar inimigos, para construir uma civilizao de primeira plana. A ajuda estrangeira foi, apenas, episdica e acessria. Nunca,
porm, nunca e o Brasil j selou com o sangue o seu amor liberdade
nunca essa ajuda poder importar a instaurao de um regime de capitulaes ou de concesses, cujos catastrficos efeitos j so demasiadamente
conhecidos para que algum povo tenha a coragem de afront-los.
Para ns, os estrangeiros que se encontram no Brasil, e, assim
considerados, os indivduos como os seus capitais e interesses, no tm
representao poltica, no tm voz coletiva.
O Brasil no comporta colnias com privilgios de extraterritorialidade, nem minorias, nem o exerccio de proteo poltica. Os
estrangeiros aqui podem viver tranqilamente, aqui gozam de direitos
civis, que podem fazer valer perante os tribunais como qualquer brasileiro, aqui toleramos que se associem para fins de beneficncia e de cultura. Mas todo e qualquer intuito poltico, ainda que remoto, terminantemente proibido, e nenhuma interferncia do exterior nos far mudar
de atitude. A ao do Governo, nesse particular, tem-se exercido com
moderao, procurando antes convencer do que punir. J tempo, porm,
que todos se tenham convencido de que a deciso no mudar e de que a
represso se tornar mais inflexvel, enquanto persistirem as tentativas
de fraudar, de iludir ou de ignorar a lei.
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AO LEGISLATIVA DE OUTROS MINISTRIOS
Eu me tenho circunscrito, at agora, a recordar a atividade legislativa do Governo Nacional, exercida por intermdio do ministrio a
meu cargo. No campo dos demais ministrios, a ao legislativa tem
correspondido de idntico modo e to proficuamente necessidade de
assegurar, num plano jurdico harmonioso, o bem e o progresso do Pas.
E aqui me refiro, somente, expresso da atividade do Governo por
meio de textos de lei, deixando de lado a obra de aparelhamento nacional,
de desenvolvimento econmico e de aperfeioamento intelectual e
moral, que vem sendo realizada sem esmorecimento e cujos proveitos
se fazem cada dia mais patentes no crescimento da produo e na atmosfera de trabalho, de ordem e de confiana, que nos autoriza a fazer
um juzo otimista a respeito do futuro da nossa Ptria. Esse programa
de equipamento material teve, h pouco, sua melhor definio no decreto-lei que disps sobre o grande plano de obras pblicas de interesse
nacional, a executar-se dentro de curto perodo, e que j se acha em comeo de realizao, ou em estudos adiantados.
GUAS E MINAS
Lembrem-se, por exemplo, ainda no terreno da atividade legislativa, as leis, sobre energia hidrulica e sobre minas, que tiveram por fim
completar os textos existentes e dar-lhes, por assim dizer, fora executria,
rompendo de vez o cipoal de tergiversaes e de manejos com que
tentaram embargar o passo do estado, na defesa dos bens do seu solo.
Ns conhecemos o nmero e a fora dos interesses que se
movimentam em torno das riquezas nacionais e que nos cumpre reduzir
aos seus limites legtimos se quisermos continuar como donos desta terra
que a audcia e tenacidade dos nossos antepassados dilatou e povoou. As
leis de minas e de guas vieram colocar nas mos do Brasil o controle e
o aproveitamento de sua imensa riqueza de potencial eltrico e de minerais. Foi um grande benefcio que hoje ns j podemos compreender
devidamente, mas que os que vieram depois de ns sabero agradecer
com ainda mais fundados motivos.
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PETRLEO
Chamo especialmente a ateno para a legislao relativa ao
petrleo. O abastecimento de combustvel, to necessrio ao funcionamento das indstrias, como indispensvel organizao da defesa
nacional, no podia continuar merc das competies e dos acordos
privados, que no tinham outro fim seno auferir o maior lucro no menor
tempo possvel. Por outro lado, as pesquisas do combustvel nacional
cujos indcios eram to evidentes que s aos cegos no lograriam convencer estavam sendo inexplicavelmente prejudicadas. Regulando a
matria, o governo criou o Conselho Nacional de Petrleo, entidade oficial, porm gozando de ampla autonomia e por isso mesmo capaz de
organizar, nesse difcil terreno, a defesa da economia nacional. O Conselho est em franca atividade e cumprindo admiravelmente a sua tarefa.
Dele podemos esperar uma grande obra.
C ONSELHO DO COMRCIO EXTERIOR
Ao Conselho Federal de Comrcio Exterior, criado h alguns
anos, o Presidente Vargas continua a dedicar aquela mesma ateno
com que lhe acompanhou, desde o incio, o desenvolvimento. rgo
informativo por excelncia nas questes concernentes s nossas importaes e, principalmente, s exportaes, o Conselho detm ainda, por
enquanto, um certo nmero das atribuies de controle e organizao
que a Constituio confere ao Conselho de Economia Nacional. Em lei
recente, a sua competncia foi ampliada e a sua organizao desdobrada
com essa finalidade. A sua ao, que j tem dado to bons resultados at
agora, ganhar nova fora e incremento.
APROVEITAMENTO DA BAIXADA FLUMINENSE
Os ingentes esforos do Governo do Presidente Getlio
Vargas para sanear a Baixada Fluminense e promover-lhe o aproveitamento agrcola vinham sendo, h alguns anos, frustrados por grilheiros,
antigos e recentes, que procuravam, por todos os meios, desde a chicana
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at as ameaas contra os funcionrios federais no exerccio de suas atribuies, canalizar em proveito prprio os benefcios feitos s terras pelo
poder pblico. Fazia-se mister obviar a esse abuso, criando para os terrenos da Baixada, e especialmente da Fazenda Nacional de Santa Cruz,
o regime jurdico que mais lhes conviesse. Um decreto-lei atendeu a essa
necessidade. Aquelas terras eram, desde tempos remotos, propriedade
da Unio, e assim foram declaradas na lei, que adotou algumas disposies de ordem prtica para defender os direitos do Governo. Essas
providncias, que a alguns crticos pareceram escapar aos limites da
competncia legislativa, e a outros se afiguravam revolucionrias,
obtiveram, j agora, a sano pacfica dos tribunais.
SERVIO MILITAR
Entre os mais importantes atos legislativos do Governo est o
decreto assinado pelo Presidente, na Pasta da Guerra, sobre o servio
militar, e a que necessrio dar, nos jornais e em todos os rgos de
divulgao, o relevo que merece. Nessa lei, as obrigaes para a segurana nacional e a defesa da ptria so definidas na amplitude que lhes
deu a Constituio. O servio militar deixa de ser apenas o dever de um
estgio nas fileiras e um afeioamento rudimentar s suas exigncias,
para tornar-se, por assim dizer, um hbito de cada cidado, uma preocupao familiar e permanente. Essa ntima ligao com a Fora
Armada, essa estreita relao com o seu esprito, que o esprito de hierarquia e disciplina, ser um precioso elemento de educao da mocidade
e da populao em geral. Para o servio da Ptria no h idade, no h
sexo, no h condio social ou familiar: todos so obrigados a servir,
de uma forma ou de outra, na fileira ou fora dela, de acordo com as suas
aptides, porque sobre cada um repousa um pouco da responsabilidade
pela independncia, pela integridade e pela honra do Brasil. A nova lei
vem assim completar, no campo da defesa nacional, e sob um aspecto
diverso, os atos com que o Governo acudiu s exigncias do equipamento do Exrcito e da Marinha.
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A Consolidao Jurdica do
Regime
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PROBLEMAS MATERIAIS E MORAIS
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hora de instabilidade generalizada, que atinge o homem, os seus interesses, as suas crenas e os seus princpios mais slidos, o problema
cruciante de cada povo a cristalizao de uma ordem efetiva, em torno
de um ncleo orgnico. Podemos resumir o problema num mnimo de
palavras: a necessidade de governos que, realmente, governam.
Com efeito, o regime de 10 de novembro so ainda palavras
do presidente no suprimiu, mas regulou o respeito aos direitos e s
garantias individuais. Ele reconhece a iniciativa individual, propiciando-lhe um clima de expanso que a torna mais viva do que antes.
Coexistem o individualismo, como caracterstico do poder de criao,
signo da fora, da inteligncia e do esprito, e a ao propulsiva e coordenadora do Estado.
Eis o pensamento do supremo responsvel pelos destinos do
Brasil e que a ns, seus colaboradores, cumpre desenvolver na esfera de
atribuies que nos est traada pela sua esclarecida e firme vontade.
UMA REIVINDICAO POPULAR
J entreguei ao presidente o projeto do Cdigo de Processo
Civil, amplamente conhecido do Pas pela divulgao que mandei dar ao
anteprojeto, no Dirio Oficial e em avulso. sabido que, nesse projeto, se
preferiu, ao processo escrito, atualmente em vigor, e cujos vcios so em
grande parte responsveis pelo descrdito da Justia entre a massa do
povo, o sistema denominado da concentrao e oralidade.
Um mau acordo deixar, assim o esperamos, de ser melhor
que uma boa demanda, e a chicana forense encontrar, finalmente, um
srio obstculo. A reforma do processo significa muito mais do que
uma questo de tcnica: ela constitui uma reivindicao popular, o aparelho judicirio perdendo o carter de um segredo carismtico s acessvel aos grandes iniciados e manejados merc das convenincias e dos
interesses puramente individuais, para tornar-se um instrumento adequado pesquisa da verdade nos feitos e distribuio da Justia entre
as partes em conflito. O juiz no ser mais o mero espectador do combate
entre os litigantes, limitado a decidir sobre os dados, certos ou falsos,
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Cdigo. Esta seria tarefa para muitos anos e, talvez, fora de possibilidade de realizao.
Julguei mais acertado desmembrar o Cdigo em vrias partes,
confiando cada uma delas a uma equipe de especialistas. Assim, convidei
para o penoso encargo os meus ilustres colegas Srs. Clodomir Cardoso,
Trajano de Miranda Valverde, Figueira de Almeida, Hugo Simas e Joo
Vicente de Campos. Outros nomes sero provavelmente acrescidos a
esta lista, e o Ministrio da Justia est disposto a receber a colaborao
de todos os estudiosos da difcil matria.
Homens de esprito novo e aberto influncia do moderno
pensamento jurdico, os que tomaram a seu cargo a tarefa sabem que, se
renovar as instituies do direito privado, no entregar as leis do Pas
seduo de experincias perigosas e de novidades nefelibticas; por outro
lado, numa poca em que as distncias materiais so vencidas pelo progresso, o respeito s realidades e peculiaridades nacionais no consiste
em isolar o direito brasileiro de toda repercusso dos sistemas universais.
Os homens esto cada vez mais prximos uns dos outros pelos interesses
econmicos tanto quanto pela cultura e at, paradoxalmente, pela trgica
intensidade das suas paixes.
FACILIDADES MOBILIZAO DO CAPITAL BRASILEIRO
necessrio dar, aos capitais brasileiros, facilidades para mobilizar-se com segurana, principalmente aplicar-se s indstrias nacionais
o que a Constituio lhes reservou. preciso estimul-las nesse sentido.
Desde que a lei atribui a brasileiros a exclusividade de certas atividades
econmicas de interesse para o Pas, no possvel deix-las sem realizao.
A DEFESA DA ECONOMIA POPULAR
No entanto, ao regular as sociedades annimas, sem dvida a
mais elstica das formas de sociedade comercial e a mais favorvel ao
desenvolvimento dos grandes negcios, a lei estabelecer as regras indis-
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pensveis para, definindo as responsabilidades de acionistas e administradores, salvaguardar os interesses da economia popular, que a Constituio protege.
SANEAMENTO DA SOCIEDADE ANNIMA
A reforma visar ao saneamento da sociedade annima, removendo os motivos do descrdito em que incorreu por toda parte esse
formidvel instrumento de reunio e de emprego de capitais.
O saneamento das sociedades annimas s poder fazer-se
mediante a concentrao dos poderes e das responsabilidades da gesto
em uma nica pessoa.
Outro mal das sociedades annimas consiste na inrcia e no
absentesmo dos acionistas. Torna-se necessrio colocar entre a direo
e a assemblia geral de acionistas um conselho de vigilncia, entre cujos
poderes deliberativos ser talvez conveniente incluir o da escolha da
administrao.
U MA RESPOSTA AO AMADORISMO
As objees oralidade do processo da falncia no tm cabimento. Nem vale invocar o exemplo do passado, cujos erros a lei em
vigor no corrigiu. Oralidade no processo no significa, como tem
parecido equipe de amadores da processualstica, um intil bate-boca
que o juiz desprezar quando houver de apreciar a causa. A nova lei de
processo associar ao debate oral a maior autoridade do juiz, que intervm no feito para tornar possvel o descobrimento da verdade e assegurar,
com o rpido andamento da causa, a boa administrao da Justia, em que
a sociedade e o Estado tm tanto interesse quanto as partes litigantes.
C DIGO DE TRANSPORTES
No me parece acertado codificar o direito martimo como
disciplina parte. Todas as modalidades de transporte martimo,
terrestre e areo devem ser reguladas em uma nica lei.
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Os pontos comuns so to numerosos que constitui um atentado aos princpios da economia e da tcnica legislativa a tentativa de separar em corpos distintos materiais de to ntima e profunda conexo.
O DIREITO MARTIMO E A REVOLUO INDUSTRIAL
O rpido desenvolvimento, a contnua progresso da Marinha
Mercante (confrontemos o nmero, a estabilidade, o raio de ao, a
velocidade e a tonelagem dos navios daquela poca com os de hoje;
avaliemos a poderosa influncia exercida sobre o transporte naval, sobre a indstria do armamento e sobre a economia dos transportes
pelas renovadas conquistas das cincias da natureza: estruturas metlicas,
propulsores mecnicos, rapidez e facilidade de comunicaes, transmisses de ordens e notcias atravs do oceano e do espao atmosfrico),
e a convico se impor de que o gnio humano provocou, dentro desse
prazo, uma verdadeira revoluo na navegao martima, alterando-lhe
fundamentalmente as condies, seja em relao aos riscos que corre,
seja em relao s necessidades derivadas do distanciamento do navio
do porto e do seu isolamento na vastido do oceano, seja, enfim, em relao aos negcios e contratos, que sofreram verdadeiras metamorfoses
e se desdobram em gigantescas propores.
Solicitada por essas mutaes radicais, a ateno do Legislativo
deveria estar especialmente vigilante. Entretanto, o contrrio o que sucedeu. Salvo algumas intervenes insignificantes (leis sobre hipotecas
martimas, sobre conhecimentos e frete), os congressos e governos
mantiveram-se indiferentes ao direito do mar.
Concorreram, talvez, para essa inrcia, os dogmas consagrados
da imutabilidade e da peculiaridade do direito martimo. Donde uma
discordncia visceral entre as condies econmicas e os meios de navegao, de uma parte, e, de outra parte, a legislao martima.
Essa abdicao lamentvel do legislador teve como conseqncia que as normas em vigor do Cdigo de Comrcio, relativas quase
por inteiro a uma situao de transaes que chamaremos de antigo regime, se tornam incoerentes, quando no francamente nocivas, desde
que aplicadas ao trfego nutico moderno e mecnica atual.
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anfbia, move igualmente os navios e os trens-expressos, o direito martimo tornou-se tambm anfbio. Todo o sistema da Ordenao de Lus
XIV, como o do nosso Cdigo, que a reproduz, gira em torno da situao criada pelo isolamento do navio em viagem e dos poderes do capito como representante forado do armador e dos carregadores, das
responsabilidades que nessa dupla qualidade lhe competem e da sua
ao para amparar-lhes os interesses. O capito, magister navis nico senhor a bordo depois de Deus, acumulava todas as funes na expedio
martima, desde o fretamento, a estiva e a arrumao, at a descarga e a
entrega; demandava e era demandado pessoalmente, em nome do proprietrio armador e dos carregadores, era comerciante, administrador,
depositrio, gerente, fretador, comissrio e representante. Hoje, porm,
o capito um simples tcnico e sua funo quase nica a direo do
navio. A parte comercial est inteiramente a cargo do armador e de seus
prepostos, inclusive estiva e arrumao a bordo. Nem em viagem o
capito intervm na carga, pois, logo depois do carregamento, os pores
so fechados, e s abertos chegada, ou nas escalas. No h, assim,
necessidade de abrigar as leis martimas dentro de um quadro especial
na organizao do direito. Ele se acomodar perfeitamente num cdigo,
ou lei orgnica geral sobre transportes, juntamente com a navegao
fluvial, area e terrestre.
EM RESUMO
As normas do direito terrestre direito civil, comercial, industrial e social que afastaram, em quase todas as matrias de grande
relevncia, as normas peculiares de direito martimo, tendem, cada vez
mais, a sobrepor-se-lhes, porque aquilo que as distinguia outrora era ser
o direito terrestre excessivamente individualista, jus proprium um direito
para determinada sociedade, dentro de determinado territrio, ao passo
que o direito martimo era um direito de solidariedade, com tendncias
universalidade, um verdadeiro jus gentium. Hoje, porm, o direito terrestre,
socializando-se, suavizou as arestas e alargou o quadro rgido em que o
afeioara o duro gnio romano. Seus princpios fundamentais so idnticos
em todo o mundo civilizado. A tendncia universalizao verifica-se
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ESTATUTO PESSOAL
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FALNCIAS
H opinies, sem dvida respeitveis, em favor da limitao
da falncia aos comerciantes. Pessoalmente, e ressalvado novo exame de
matria, inclino-me pela remodelao da execuo concursual, no sentido
de estabelecer-se a falncia civil.
Penso que no foi um bem que s tivessem passado ao Cdigo
Civil as disposies do Projeto Primitivo sobre preferncias e privilgios,
abandonando-se as que estabeleciam o regime da insolvncia civil, j
antes adotado por Coelho Rodrigues e que constituria largo avano no
sentido de estabelecer-se um direito falimentar unificado. A aplicao do
processo de concurso a todos os devedores insolventes, sem distinguir
entre comerciantes e no comerciantes, necessidade j reconhecida
pelas legislaes alem e sua e pela doutrina.
RETOMANDO UMA VELHA TENDNCIA DO DIREITO BRASILEIRO
Em nosso direito, o dec. nmero 370, de 2 de maio de 1890,
artigo 380, j sujeitava jurisdio comercial e falncia todos os signatrios de efeitos comerciais, inclusive os que contrassem emprstimos
mediante hipoteca, penhor agrcola ou bilhetes de mercadorias. Teramos,
assim, a possibilidade da falncia do devedor no comerciante, se leis
posteriores no nos tivessem remetido para o grupo dos pases que distinguem a falncia do devedor comerciante e a insolvncia do
devedor civil.
H, como observa Navarrini, uma considerao bvia na
qual se quebram todos os argumentos apresentados pelos que defendem o chamado sistema francs: que no existe motivo para tutelar-se mais eficazmente quem d crdito ao comerciante. A tutela deve
ser a mesma, quer se trate de devedor comerciante, quer se trate de
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E A POLTICA?
poltica?
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ecadncia do processo tradicional O processo como instrumento de dominao poltica A concepo duelstica e a concepo
autoritria do processo Sentido popular do novo sistema A opinio de
Taft, Elihu Root e Roscoe Pound A restaurao da autoridade e o carter popular do Estado A funo do juiz na direo do processo
Chiovenda e a concepo publicstica do processo Willoughby, Suderland e os poderes do juiz Produo e apreciao das provas Formas
das aes Recursos Nulidade Oralidade, concentrao e identidade
do juiz Crticas e objees ao sistema oral Fontes do sistema tradicional A elaborao do projeto A reforma do processo e a unidade
poltica do Pas.
DECADNCIA DO PROCESSO TRADICIONAL
Este documento legislativo j era uma imposio da Lei
Constitucional de 34, e continuou a s-lo da Constituio de 37. Era,
porm, sobretudo, uma imposio de alcance e de sentido mais profundo: de
um lado, a nova ordem poltica reclamava um instrumento mais popu-
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lar e mais eficiente para distribuio da Justia; de outro, a prpria cincia do processo, modernizada em inmeros pases pela legislao e pela
doutrina, exigia que se atualizasse o confuso e obsoleto corpo de normas
que, variando de estado para estado, regia a aplicao da lei entre ns. J
se tem observado que o processo no acompanhou, em nosso Pas, o
desenvolvimento dos outros ramos do Direito. O atraso em que se
achavam as nossas leis judicirias refletia-se sobre o trabalho dos estudiosos, e, enquanto por toda parte as construes tericas mais sagazes, e
por vezes mais ousadas, faziam da cincia do processo um campo de intensa renovao, a doutrina nacional retardava-se no repisar de praxes,
frmulas e mximas de que fugira o sentido e de que j no podamos
recolher a lio. O processo era antes uma congrie de regras, de formalidades e de mincias rituais e tcnicas a que no se imprimia nenhum
esprito de sistema e, pior, a que no mais animava o largo pensamento
de tornar eficaz o instrumento de efetivao do direito. Incapaz de colimar o seu objetivo tcnico, que o de tornar precisa em cada caso a
vontade da lei, e de assim tutelar os direitos que os particulares deduzem em juzo, o processo decara da sua dignidade de meio revelador do
direito e tornara-se uma arma do litigante, um meio de protelao das situaes ilegtimas, e os seus benefcios eram maiores para quem lesa o
direito alheio do que para quem acorre em defesa do prprio.
O PROCESSO COMO INSTRUMENTO DE DOMINAO POLTICA
Pode-se dizer, porm, que no foi de carter meramente tcnico a crise do nosso Direito Judicirio. As profundas transformaes
operadas em todos os campos da atividade humana, particularmente as
transformaes sociais e polticas, conrreram para manifestar a extenso
dessa crise, pois levaram os benefcios da ordem jurdica a terrenos que
a velha aparelhagem judiciria no estava capacitada para alcanar. O
processo em vigor, formalista e bizantino, era apenas um instrumento
das classes privilegiadas, que tinham lazer e recursos suficientes para
acompanhar os jogos e as cerimnias da justia, complicados nas suas
regras, artificiosos na sua composio e, sobretudo, demorados no seu
desenlace. As transformaes polticas que entre ns se cumpriram
abrem, entretanto, o gozo dos instrumentos de governo a uma imensa
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massa humana, que antes no participava deles seno indireta e escassamente, e assim impem um novo regime administrao da Justia.
Antes, esta podia ser assimilada a certos servios pblicos, destinados ao
uso de alguns, e em relao aos quais o estado pode revelar menos vigilncia, deixando aos interessados o cuidado de melhor-los. Em tal atmosfera, o processo poderia continuar a ser um conjunto de regras
destinadas a orientar a luta judiciria entre particulares, que dela se serviriam merc do seu interesse ou dos seus caprichos. ainda a concepo
duelstica do processo judicirio, em que o estado faz apenas ato de presena, desinteressando-se do resultado e dos processos pelos quais foi
obtido. A transformao social elevou, porm, a justia categoria de
um bem geral, e isso no apenas no sentido de que ela se acha disposio de todos, mas no de que a comunidade inteira est interessada na
sua boa distribuio, a ponto de tomar sobre si mesma, atravs dos seus
rgos de governo, o encargo de torn-la segura, pronta a acessvel a
cada um. Responsvel pelos bens pblicos, o estado no pode deixar de
responder pelo maior deles, que precisamente a Justia, e sua organizao e ao seu processo h de imprimir os traos da sua autoridade.
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Os defeitos apontados pelos trs grandes nomes da jurisprudncia americana so os mesmos de que padece a nossa administrao
da justia, particularmente o instrumento, pelo qual ela se exerce, que
o processo.
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WILLOUGHBY, SUDERLAND E OS PODERES DO JUIZ
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PRODUO E APRECIAO DAS PROVAS
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munhas so escolhidas unicamente em ateno ao fim de fornecerem prova que favorecer a parte responsvel pela sua escolha. Devia verificar-se, e provavelmente na maioria dos casos
certo, que tais testemunhas no so chamadas a depor e no
depem contrariamente a suas convices. um fato, contudo, inevitvel, que tais testemunhas sofrem um incentivo
para fazer seu depoimento, tanto quanto possvel, conforme
os desejos das partes que as chamaram. Na melhor das
hipteses, elas procuram apresentar os fatos favorveis s
alegaes de tais partes, enquanto no fazem esforo algum a
respeito dos fatos que lhes so desfavorveis. Mesmo quando
isso no se d, sempre resta o fato que s so chamadas
como peritos as pessoas que prvia inquirio das partes se
revelam inclinadas a dar, por motivo de convico cientfica
ou de outra natureza, o testemunho desejado. O resultado do
sistema que, na maioria dos casos em que se exige prova
dessa natureza, so apresentadas ao tribunal provas parciais e
contraditrias, deixando-lhe assim, ou ao jri, o encargo de
decidir entre pontos de vista em conflito.
Se algum tem em mente a natureza especial dessa prova
e o seu objetivo prprio, no encontrar justificao alguma
para tal sistema. Todos os argumentos so a favor do estabelecimento da regra segundo a qual os peritos, em qualquer
caso, devem ser escolhidos e convocados por iniciativa do
prprio tribunal. Se assim convocados, eles sero escolhidos
de maneira inteiramente desinteressada, e no tero outro objetivo seno esclarecer o tribunal, quanto sua capacidade lhes
permita. Fazendo uma seleo de tais peritos, o tribunal ser
influenciado somente pelo desejo de assegurar a sua mais til
informao e de modo algum pela direo que possa tomar o
testemunho.
Parece razovel pensar, pois, que, via de regra, sero
obtidos peritos de maior competncia, j que a no adoo
desse sistema devida quase exclusivamente liberdade indefensvel com que so tratadas nos tribunais as partes litigantes,
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como num duelo judicirio, presidido por um juiz com poderes de rbitro. (Willoughby, op. cit., pgs. 479-480).
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cesso que afetam materialmente os direitos das partes, isto ,
que pela sua natureza hajam infludo realmente no julgamento
proferido, e aquelas que so de uma natureza menos importante ou puramente tcnica, as quais, ainda que admitidas
como erros, no do motivos razoveis para se acreditar que
tenham impedido a parte agravada de apresentar inteiramente
o seu interesse ou que tenham infludo sobre o juiz, ou o jri,
no proferir suas decises. Manifestamente, os argumentos em
favor da permisso de uma reforma da deciso, no caso de
erros da primeira categoria, so mais fortes que no caso dos
da segunda. Permitir os recursos em todos os casos em que
se alegue estar errado o julgamento com relao aplicao
de regras, sejam ou no tais erros de natureza a se supor
que tenham afetado o julgamento, acarretar males desproporcionados aos benefcios que se podem verificar em casos
relativamente raros. Abre a porta ao uso do direito de recorrer
simplesmente com propsitos protelatrios, e aumenta as
despesas do pleito, o que tudo trabalha em desfavor da parte
fraca.
Alm disso, a existncia de to largo direito afeta
profundamente todo andamento da espcie em juzo. O processo tende a tornar-se conhecido como uma provocao para
o erro; isto , algo em que o advogado da defesa no somente
consagra sua atuao a combater a matria alegada pelo queixoso, como procura induzir o advogado deste ou o juiz presidente a cometer algum erro tcnico, na aplicao das regras,
para nisto basear um recurso ao tribunal superior. A tal ponto
isto levado, onde o sistema prevalece, que o processo s
vezes descrito como algo em que o julgador est mais em causa
do que o prprio demandado.
lamentvel que seja este o sistema geralmente
adotado, e que, embora, nos ltimos anos, se tenham manifestado tendncias para abandon-lo, ainda prevalea largamente
nos Estados Unidos. Ele constitui um dos maiores defeitos
da nossa administrao judiciria. A sua adoo entre ns
devida inteiramente atitude assumida pelos tribunais, no
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A ELABORAO DO PROJETO
A publicao do anteprojeto, inspirado nos princpios da oralidade da concentrao e de cuja elaborao se incumbiu, por solicitao
deste ministrio, o meu amigo e brilhante advogado Pedro Batista
Martins, provocou de todo o Pas sugestes da maior valia. E adeptos
do sistema cresceram de nmero, principalmente entre aqueles que de
perto sentem a necessidade de uma reforma de fundo da nossa antiquada
legislao processual.
O anteprojeto foi largamente discutido, e advogados, juzes,
institutos e associaes remeteram ao ministrio cerca de quatro mil
sugestes, todas minuciosamente examinadas e muitas includas entre as
emendas sofridas, pelo texto.
Dediquei-me pessoalmente, apesar dos mltiplos e crescentes
afazeres do meu cargo, reviso do anteprojeto. Revi-o no uma, porm
muitas vezes, e pude contar, para a sua redao final, com o precioso
concurso do meu caro amigo Dr. Abgar Renault, ilustre diretor do Departamento Nacional de Educao. Pesei a responsabilidade que havia
assumido e longamente meditei sobre os principais temas do processo,
concluindo por julgar do meu dever apressar a reforma do nosso processo, se necessrio, como penso, remediar de maneira urgente o descrdito em que, no por culpa dos juzes, mas graas aos defeitos do seu
instrumento de trabalho, vem, dia a dia, caindo, no conceito pblico, a
justia administrada pelo Estado. Nem me teria proposto mais este encargo superior s minhas foras, se no houvesse, desde logo, sentido o
interesse que Vossa Excelncia associava aos trabalhos de reforma legis-
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Discurso proferido em 10 de
maio de 1938.
ez de novembro no foi um episdio. Assinala, ao contrrio, o comeo de uma poca. O episdio no tem contedo espiritual e
projeo histrica: faltam-lhe o impulso ideolgico e a perspectiva no
tempo, elementos essenciais para que os acontecimentos se desenvolvam no sentido da durao e se organizem segundo as linhas de uma
ordem que, antes de existir nas coisas, j era na inteligncia e na vontade
humana. O episdio instantneo, no tem volume no tempo. No
existe no episdio a vontade de durar, a fora de crescimento e de expanso, graas s quais a deciso dos homens se apodera do tempo
para nele criar a sua histria e realizar a sua vocao.
Uma poca no so seis meses de histria. Uma poca uma
atmosfera, uma ambincia, um clima. Com o Dez de Novembro comeou para o Brasil uma atmosfera, uma ambincia, um clima. Em primeiro
lugar, o clima da ordem: no apenas o da ordem nas ruas, mas, antes de
tudo, e sobretudo, o clima da ordem no Estado. O Estado passou a ser
uma ordem, isto , um sistema animado de um esprito e de uma vontade,
unificado em torno de uma pessoa, que em poltica a primeira categoria
da realidade. O Estado tem um chefe. A poltica deixou os bastidores
das combinaes para ser o que , efetivamente, nas grandes horas dignas
de serem prolongadas no tempo e vividas em toda a plenitude: as deci-
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que ali est existe para o povo, sob a forma por que o povo representa
naturalmente o Estado, a forma humana da pessoa.
O segundo ponto a notar, no novo clima poltico criado no
Brasil pelo acontecimento de 10 de novembro, o carter popular do
Estado. Este trao resulta, alis, do anterior: somente um Estado que se
encarna num chefe pode ser um Estado popular. O Estado sem chefe
uma entidade para juristas, algebristas e especuladores da poltica, da
bolsa, da indstria e da finana, interessados em que o Estado seja
amoral, apoltico, neutro, indiferente, uma disponibilidade a ser usada
nas combinaes ou na concorrncia de interesses. O povo, como o
Criador, no conhece o Estado desencarnado, reduzido a smbolos e
esquemas jurdicos. O Estado popular o Estado que se torna visvel e
sensvel no seu chefe, o Estado dotado de vontade e de virtudes humanas, o Estado em que corre no a linfa da indiferena e da neutralidade, mas o sangue do poder e da justia. O povo e o Chefe, eis as duas
entidades do regime. O Estado do povo e para o povo, e, por isto,
um Estado de chefe porque o povo, como todos os grandes criadores,
representa, sob a forma humana da pessoa, o poder digno de ser amado
e obedecido, o poder animado do esprito de proteo, de justia e de
eqidade.
O terceiro ponto, na nova ordem de coisas do Brasil, que o
nosso Estado hoje um Estado Nacional.
Existe, efetivamente, um governo, um poder, uma autoridade
nacional. O Chefe o Chefe da Nao. Mas no o Chefe da Nao
apenas no sentido jurdico e simblico. o Chefe popular da Nao. A
sua autoridade no apenas a autoridade legal ou regulamentar do antigo
Chefe de Estado. A sua autoridade se exerce pela sua influncia, pelo
seu prestgio e a sua responsabilidde de chefe. Somente um Estado de
Chefe pode ser um Estado Nacional: unificar o Estado unificar a
Nao. Foi o que se deu no Brasil. A inflao de prestgios locais ou
regionais, ou de prestgios nascidos sob a influncia de combinaes, sucedeu, com a deflao poltica operada no Pas com o advento do Estado
Novo, a instaurao de uma autoridade nacional: um s Governo, um
nico Chefe, um s Exrcito. A Nao readquiriu a conscincia de si
mesma; do caos das divises e dos partidos passou para a ordem da unidade, que foi sempre a da sua vocao.
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O Dez de Novembro ps termo ao jogo, aos passes e s encantaes, e confiscou os instrumentos de prestidigitao com que os
especuladores do regime operavam sobre a boa f do povo, narcotizada
pelas drogas polticas que lhe davam a iluso de serem da sua vontade as
decises tomadas em seu nome.
O Dez de Novembro no foi um ato de violncia. O antigo
regime era, evidentemente, um regime demissionrio e caduco. Os seus
braos senis no podiam mais abarcar o tronco do poder, cujo vulto
havia crescido na proporo do crescimento do Pas. Cada vez mais
divorciada do regime, a Nao havia crescido fora dos quadros desse
regime e adquirira a conscincia de que os instrumentos de governo
no estavam condicionados s exigncias, s dificuldades e s imposies da vida em nosso tempo. Os verdadeiros interesses nacionais no
encontravam ressonncias nas salas deliberativas, umas, calculadas para
os segredos e as combinaes, e outras, para a frase espetacular em que
a substncia do governo se dissolvia em fatuidades discursivas.
O Estado Novo nasceu como uma imposio da ambincia
social e poltica em que vnhamos vivendo. Inspirou-o e permitiu-lhe a
realizao o estado de incerteza em que estava o Brasil, insatisfeito com
a soluo das suas instituies e desassossegado em face das solues
agressivas e extremas que se propunham ao seu caso, nenhuma delas
com razes no passado, justificaes no presente e perspectivas para o
futuro.
O estado era uma terra de ningum mais ou menos ao
alcance dos imperialismos estaduais, que medravam e cresciam custa
da unidade espiritual e poltica da Nao. Era imperioso remover os
obstculos que impediam a ao, imediata e eficaz, necessria para compor e restaurar aquela unidade, imprimindo-lhe o sentido da ordem, da
deciso e da vontade sem o que o estado, ao invs de aglutinao, se
transformava motivo de discrdia, de conflitos e de divises. Com a sua
unidade ameaada, sem ordem interna, e sem segurana externa, ao Brasil
faltavam os instrumentos adequados sua prpria restaurao, e a tais circunstncias acrescia ainda o fato de que se haviam artificialmente estabelecido lutas e antagonismos polticos e sociais, a que no correspondia
nenhum sentimento substancial e para os quais o Pas no se encontrava
preparado. O Brasil estava dotado de instituies em que no ressoavam
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O novo governo correspondeu ao novo estado e transformou-se em um vasto e poderoso sensorium, atravs de cuja sensibilssima
capacidade de captao e ressonncia repercutem, com a densidade e a
profundeza das vozes da vida, as ansiedades, as esperanas e as aspiraes da Nao.
Urge agora que todos os brasileiros, com aquele mesmo sentido de ordem na unidade, se integrem e se fundam num s pensamento,
que o de criar no Pas uma atmosfera de confiana e de boa vontade, a
fim de que antagonismos pessoais, intrigas e lutas de grupilhos e campanrios no perturbem o ritmo do trabalho do Brasil e do seu crescimento,
nem desviem de seus desgnios a linha clara e definida que o destino lhe
traou.
Este o sentimento do povo brasileiro, que plebiscitou o regime
antes do seu advento e que s ter inspiraes e motivos para, na oportunidade prpria, confirmar a antecipao do seu voto e reafirmar o
imperium da sua vontade.
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blemas do presente em funo do futuro, a sua serenidade reflete a intimidade com o tempo, intimidade essencial aos grandes construtores,
habituados perspectiva e ao espao e, acima de tudo, s leis do crescimento e da maturidade, cujo tecido se confunde com o tecido do
tempo. Serenidade, tempo, meditao, eis, em resumo, a cincia e a
prtica da poltica, como de toda construo que pretenda conquistar o
tempo e durar na sua dana e nas suas vicissitudes.
Dois anos constituem apenas um comeo. No h bronze,
nem mrmore que, em dois anos, adquira a ptina das obras definitivas.
um prazo para linhas gerais, experincias, ajustamento de quadros,
desbravamento do terreno. Contudo, o que nesse interregno j realizou
o Estado Novo, constitui, sem dvida, um grande avano no tempo.
Sente-se que as peas esto ajustadas, a locomotiva abastecida de combustvel, os trilhos lanados no cho, e que j comeou a arrancada para
o futuro. Os sfregos, os aodados, os impacientes no se daro por
satisfeitos. Quereriam que, em dois anos, j tivssemos chegado ao fim
da carreira. No existem para eles o tempo e a meditao, os dois instrumentos que tornam possvel ao homem conquistar, num mundo de
movimento e de transformaes, postos de resistncia e durao. A
matria-prima que as mos do nosso Presidente trabalham no matria
bruta e imensurvel. o Brasil o Brasil territrio, o Brasil Nao, o
Brasil homem, o Brasil sangue, msculos, sensibilidade, vida, o Brasil
vivo. Os problemas a serem resolvidos exigem a rotao do esprito em
rbitas imensas. Em domnios como estes, a precipitao, a afoiteza, o
aodamento, constituem faltas contra o esprito, contra os sentimentos
de compreenso e de fraternidade humana.
A fortaleza no exclui a humanidade. A fortaleza de nimo,
que um dos traos fundamentais do nosso grande chefe, disputa no
seu corao primcias generosidade. S os fortes perdoam e ele tem
perdoado, at em conjunturas em que a falta de perdo seria estrita
justia. Ao lado, porm, ou talvez acima da fortaleza do carter, h outra
a da inteligncia, a da vontade, a do esprito, que no se deixa desviar
da sua rota, do seu programa e da sua vocao.
Compreenso e humanidade, eis as duas grandes faculdades
que o homem de estado, que trabalha no plano do esprito e da vida,
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no pode dispensar, sob pena de ser a sua obra estril e ridas e inviveis as
suas criaes.
Ningum melhor compreendeu o Brasil do que o nosso Presidente, cujas antenas registram ainda os movimentos de opinio que
no impressionam a sensibilidade comum. Ele sente como sente o povo
brasileiro; ele surpreende na fase nascente as aspiraes e as tendncias
populares, identificado pelo pensamento e pelo corao com o povo
que o festeja e o aclama como protetor e justiceiro. Sereno e imparcial,
o sentimento cristo de humanidade tem sido uma das fontes de inspirao do seu governo, sempre inclinado para a sorte das crianas, dos
trabalhadores, dos deserdados, no apenas por sentimento de caridade
ou de altrusmo, mas por um alto sentimento de dever para com a coletividade que lhe entregou a direo dos seus destinos.
Esse o homem diante do qual se inclinaram os estandartes
das lutas fratricidas o construtor, o pacificador, o homem do destino,
fechado consigo mesmo para melhor compreender, no plano de sua
vida interior, a vida do Brasil, a imagem do seu presente e o panorama
do seu futuro.
O homem completa e corrige o regime. Amplia os seus quadros, retifica as suas linhas e abre espao colaborao de todos. No
h vencedores nem vencidos, quando uns e outros, sombra de um
chefe de esprito compreensivo e tolerante, se dispem a cooperar na
obra comum, animados do mesmo amor que o anima em relao ao
Brasil.
Que todos os brasileiros, como o grande chefe que est nos
segredos e na intimidade do tempo, possam a este, como squilo,
dedicar orgulhosamente a sua obra: o Brasil do Estado Novo, o Brasil
Maior.
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Juramento do Brasil
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Graas queles que na hora decisiva, vivos ou mortos, acordaram na posteridade, o Brasil pode continuar a ser uma Nao. Como
acontece s vezes, na Histria, o curso do destino pode ser, ltima
hora, mudado pela deciso dos homens. Assim, em novembro de 35, a
deciso dos homens mudou o curso da nossa histria. A atmosfera
poltica, social e intelectual que ento envolvia o Brasil indicava que
havamos chegado hora funesta das grandes provaes coletivas, que
s podem ser impedidas por oportunas decises armadas, pelo emprego
consciente e severo da fora ao servio de uma ordem espiritual que
ainda no perdeu a f nas suas razes. O Brasil ainda no havia perdido
a f nas suas razes, a f no seu passado e no seu futuro, a f na ordem
espiritual, sob a influncia de cujos mandamentos havia formado o seu
corao e a sua inteligncia, a f que lhe havia valido mais de um sculo
de independncia, de soberania e de unidade.
Esta independncia, soberania e unidade, ns a conquistamos,
novamente, em 35.
Ns a conquistamos pela deciso e pela fora deciso e fora
que tornam possvel aos homens mudar o curso do destino.
Rememorando os mortos, relembrando a sua bravura e o seu
sacrifcio, no esqueamos, contudo, os vivos as Foras Armadas do
Brasil, fiis sua misso histrica, identificadas com a existncia nacional,
disciplinadas, atentas e vigilantes, guardas da independncia, da soberania
e da unidade do Brasil Foras Armadas para cumprir, nas horas graves,
as decises que, para que no mude o Brasil ou para que o Brasil continue, mudam o curso dos acontecimentos e, portanto, da histria e do
destino.
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Orao Bandeira
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dade que se conquista pela vontade e pelo corao, a unidade que somente pode reinar, quando se instaura, pelas decises histricas, por
entre as discrdias e as inimizades pblicas, uma s ordem moral e
poltica, a ordem soberana, feita de fora e de ideal, a ordem de um
nico pensamento e de uma s autoridade, o pensamento e a autoridade
do Brasil.
No ano passado, nesta mesma solenidade, eu tive a fortuna de
dirigir a palavra juventude do Brasil. Ento, os tempos adversos nos
traziam comprimido o corao. Mal convalescendo de uma crise decisiva,
cuja fase aguda ainda no havia passado, tnhamos diante de ns a perspectiva de que, em dias bem prximos, voltaria a repetir-se o espetculo
da intranqilidade e da insegurana pblica, que um regime incapaz
havia transformado em estado normal, confirmando, assim, o teorema
poltico milenar de que, nas pocas de dissoluo e de crise, se no se
constitui o governo forte e responsvel, a desgraa se apodera das
naes e nada se salva se no se salva na runa geral o centro de lucidez
e deciso que, na confuso dos espritos e na vacilao das vontades,
responde pelo rumo e pela ordem. Dizia, ento, que o Brasil, no clima
aquecido pela passagem do blide moral das revolues, estava exigindo
uma redefinio em termos de cultura, de vontade, de governo e de
justia, e que no se podia frustrar impunemente juventude o direito
de reinterpretar o passado em termos do presente e do futuro.
Essa reinterpretao um ano depois se fazia, e os termos em
que est feita no foram escolhidos arbitrariamente, seno por um
plebiscito tcito, em que se pronunciaram as foras vivas e responsveis
do pas, as que o regime extinto havia proscrito das suas cogitaes, as
foras novas e as foras tradicionais do Brasil, as mais ameaadas,
porque as mais modestas e as mais silenciosas, as foras de criao, de
trabalho e de defesa nacional.
Sob a inspirao dessas foras, em cujo nome se instaurou o
novo regime, que se procede a esta consagrao do Brasil sua Bandeira,
a bandeira nica de todos os brasileiros. Honrai a vossa Bandeira,
juventude do Brasil, consagrando a ela o vosso ideal, jurando criar valores
para o Brasil, trabalhar por ele e defend-lo, dedicando-lhe o vosso
pensamento e o vosso corao.
Antes de tudo, soldados do Brasil!
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Orao Bandeira
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jovial, um sim ao Brasil que foi e ao Brasil que , um sim ao seu passado
e ao seu presente, a aceitao do Brasil como a Histria o fez, do Brasil
brasileiro, do Brasil com o nosso cu, a nossa luz, as nossas guas, o
nosso sentimento, os nossos costumes, a nossa f, a nossa civilizao e
a nossa lngua.
A ptria no , porm, apenas uma ddiva do cu. Os homens
constroem a sua ptria como os pssaros, o seu ninho, os trmitas, as
suas cidades de mistrio e de silncio, os rios, o seu curso, e o coral, os
seus arquiplagos de sonho. Cada uma dessas construes representa
esforo, trabalho, sacrifcio, tenacidade na luta, obstinao no instinto
ou na vontade, continuidade na ao e, nas construes humanas, as
difceis e raras virtudes de modstia na grandeza de desinteresse, de
disciplina, de humildade, porque a construo da ptria pelos homens
uma construo no tempo para a eternidade.
Cada gerao, trabalhando no seu tempo, com as suas limitaes, as suas contingncias, os seus erros, cada indivduo no seu ofcio,
na sua profisso, na estreiteza do horizonte quotidiano da sua vida, est,
sem o saber, contribuindo para a obra comum, cujo perfil no tempo
somente nos dado representar no esprito nos raros momentos como
este, de emoo coletiva, quando no plano da nossa vida individual se
projeta, por um instante, a imagem dessa constelao de sentimentos
do sentimento da terra, do cu, da lngua, das lembranas e dos acontecimentos vividos em comum, e que abre ao nosso esprito e ao nosso
corao, sobre os tempos passados e os tempos a vir, a imensidade
desse horizonte virtual em que o sentimneto da ptria alarga no sentido
do eterno as pequeninas dimenses da nossa vida. O sentimento da
ptria d ao homem uma nova dimenso a dimenso ideal que prolonga
a sua vida na linha do passado e na linha do futuro, dando-lhe o sentimento de que a sua vida no apenas um efmero acidente no oceano
do tempo, mas, como o coral, um elemento destinado edificao de
continentes.
Em torno desse edifcio, porm, nem sempre o tempo sereno, os ventos favorveis e as guas unidas e tranqilas. H, na Histria,
pocas de inquietao e de insegurana, de intranqilidade e de perigos,
pocas em que os homens sentem que a sua nao, o seu pas, a sua
ptria, para que continue a ser construda e defendida, exige vigilncia,
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coragem, virtudes fora do comum, severa disciplina, exemplar devotamento, mobilizao da inteligncia e da vontade e, sobretudo, ordem e
paz interiores, a fim de que do interior da prpria casa no se abra a
fenda destinada a minar os alicerces do edifcio.
No nosso tempo, as ptrias esto em perigo. Sopra sobre elas,
principalmente sobre as fracas e pequeninas ptrias, o vento da inquietao e da ameaa. A hora que o destino nos reservou na Histria no
a do sossego, da confiana e do repouso, a hora dourada em que, depois
de haver trabalhado, o homem espera, cantando, que os frutos e as searas
amaduream ao sol.
Depois de haver trabalhado, os homens, se querem colher,
devem montar guarda s suas searas. A ptria no mais, como nas
pocas felizes, um dom do acaso, da natureza ou da Histria. Ela tem
de ser conquistada todos os dias pelo trabalho perseverante, a ininterrupta vigilncia e a disciplina da inteligncia e da vontade. A hora no
apenas a do trabalhador, mas tambm, e principalmente, a do soldado, a
hora da ordem, da ateno e do silncio, a hora da viglia, a hora em que
a sentinela escuta, vigia e espera.
Esta a advertncia e a lio do nosso tempo: as ptrias esto
em perigo. A hora no das dissenses, das agitaes e das discrdias
internas. A hora no dos estandartes, que separam, mas da bandeira,
que rene, congrega e irmana. Em nenhum tempo, talvez, festa da
Bandeira se possa atribuir o sentido que tem a de hoje: o sentido de advertncia e de convocao. sombra dessa Bandeira, cada brasileiro
um soldado e, seja qual for o seu ofcio ou a sua profisso, a sua alma h
de ser uma alma de soldado, pronta a atender, disposta a obedecer,
preparada para a privao e para o sacrifcio.
Brasileiros, cerrai fileiras em torno dessa Bandeira, com ela e
por ela, para diante e para cima, ainda que por entre a tempestade; com
ela e por ela, seja qual for a hora que nos reserve o destino; com ela no
corao e as mos em continncia o compromisso de nunca faltarmos
ao Brasil!
.............................
ndice Onomstico
A
Alcntara Machado 142, 145
All Smith 31
Almeida, Cndido Mendes de 141
Asquith 34
Gentile 20
Goodnow 53
Guimares, Hahnemann 144
B
Barbosa, Rui 114, 180
Barrabs 32
Bergson 16
Bevilqua, Clvis 155, 156
Birkenhead (lorde) 103
Braga, Antnio Vieira 141, 143
Bridoie 127, 178, 186
Hart 88
Hegel 18
Hennebicq 151
Herclito 13
Hitler 35
Holmes, Oliver 59
Hungria, Nlson 141, 143
C
Caifs 32
Campos, Joo Vicente de 146
Cardoso, Clodomir 146
Carr, Cecil 88
Carvalho, Carlos de 156, 158
Csar 11, 23, 24, 35
Chagas 114
Chiovenda, Giuseppe 161, 167
Coelho Rodrigues 157
Costa e Silva 143
Cruz, Osvaldo 114
E
Espnola, Eduardo 156
squilo 209
Euclides 92
F
Fichte 11, 17, 18
Figueira de Almeida 146
Azevedo, Filadelfo 145
Frontin 114
L
Lacordaire 63
Lasky, Harold 90
Leo (imperador) 180
Lira, Roberto 143
Lloyd George 32
Lus XIV 152
M
Marshal 90
Martins, Pedro Batista 129, 181
Marx 16, 63, 64
Medeiros, Jos Viriato Sabia de 180
Morato, Francisco 180
Mouro, Joo Martins Carvalho 180
Mussolini 18
N
Navarrini 157
Newton 92
Nonato, Orozimbo 145