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FACULDADE DE LETRAS
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM LETRAS
Instituio depositria:
Biblioteca Central Irmo Jos Oto
Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul
BANCA EXAMINADORA
_________________________________________________
Profa. Dr. Maria Luiza Ritzel Remdios - PUCRS
_________________________________________________
Profa. Dr. Rosani rsula Ketzer Umbach UFSM
_________________________________________________
Prof. Dr. Benito Bisso Schmidt - UFRGS
_________________________________________________
Profa. Dr. Maria Helena Menna Barreto Abraho - PUCRS
__________________________________________________
Prof. Dr. Urbano Zilles - PUCRS
AGRADECIMENTOS
Quando
opto
carimbados
por
valores,
previamente
eles
por
esto
minhas
RESUMO
ABSTRACT
This dissertation aims at bringing together some critical theories, data and studies
too much spread in Brazil about the biographical species and their dialogue with the
location of culture, specifically with history and fictional narrative. In order to do so, its
discussed Daniel Madelnats notion on the long dure covered by a classical paradigm of
biography, which extends ever since the Greco-Roman antiquity to the Enlightenment. The
notions of biographical space, biographical literature and biographical pact were
coined by me embased on Philippe Lejeunes concepts. Italo Calvinos thought on the
classical text and his memos for the 21st millennium underlie the analysis of a corpus
formed by some narratives produced from the late 20th century to the 21st century. This study
has as its goal understanding possible links between the biographical forms and contemporary
tendencies on historiography and on the novelistic fiction.
SUMRIO
10
11
Bartleby y compaia
12
Le pacte autobiographique
Em virtude da existncia de gneros vizinhos biografia, como autobiografia, auto-retrato, confisses, dirio ntimo e
memrias, bem como pela contribuio de textos epistolares, ensasticos e hbridos romances de modulao
autobiogrfica ou biogrfica, o roman-fleuve ou o romance de formao , Philippe Lejene diz que seria possvel
falar de um vasto espao autobiogrfico. Em todos esses construtos lingsticos, h sempre uma vida a ser
contada, e nem to somente por intermdio da primeira pessoa ou da autoconfisso dissimulada em outros pontos de
vista, razo por que considero ainda mais apropriado utilizar o termo espao biogrfico (Cf. LEJEUNE, 1975).
13
reavaliaes dos historiadores quanto a tpicos como acontecimento, fato histrico, fontes,
linguagem e referncia. Ainda preciso definir o objeto, ao qual distintas representaes
chamaram de literatura.
Uma vez que os campos histrico e literrio sofrem variaes axiolgicas e
epistemolgicas, delimit-los pressupe uma breve retomada de seus percursos. Assim
fazendo, posso contribuir aos estudos conjuntos da histria e da literatura no Brasil, pois raros
so os empenhos desse tipo, no que diz respeito s formas biogrficas, do mesmo modo, ao
espao e ao gnero biogrficos.2 maneira de um Readers Guide, o trabalho dota-se das
intenes de servir como guia, na acepo lata, mas despretensiosa, do termo.
Enfocando caractersticas transdisciplinares da filosofia, da histria e da literatura, as
obras relacionadas ao eixo temtico pretendem-se afastadas de uma viso histrica
totalizante. Desde j, esclareo que refuto a confuso da interdisciplinaridade obtusa com a
transdisciplinaridade, pois entre, atravs e alm de qualquer disciplina, a prtica
transdisciplinar supe no a totalidade, mas a complexidade, a diversidade e a pluralidade
intrnseca realidade... Trata-se muito mais de uma atitude do que uma disciplina
especfica (FEITOSA, p. 96, 2004).
Dou especial ateno, em um primeiro momento, s teorias da histria e aos estudos
sobre a memria. No campo das investigaes literrias, cobram relevncia a teoria crtica, a
narratologia, a esttica da recepo, o comparatismo, os estudos culturais, o psestruturalismo e o ps-modernismo. As teorias da recepo fornecem suporte ao pensamento
de Philippe Lejeune, cujas idias de pacto autobiogrfico e pacto romanesco se mostram
tributrias dessas formulaes tericas, as quais tambm so vistas a partir das leituras
operadas pelos estudiosos brasileiros Luiz Costa Lima e Regina Zilberman.
A literatura comparada fornece suas chaves-mestras de anlise por meio da
intertextualidade,3 dos espaos intervalares, do hibridismo e dos cruzamentos discursivos,
interessando-me especialmente a contextualizao de identidades. Por intermdio desses
2
O volume organizado por ngela de Castro Gomes (2004) concentra-se em temporalidade no abarcada por
esta tese: do sculo XIX ao XX. Alm disso, no estuda as formas biogrficas ou a biografia, e sim, as
escritas de si. Nesse caso, tambm se encontra o livro coordenado por Maria Luiza Remdios (1997). A obra
de Franois Dosse (2007) aposta na biografia, entretanto, cinco dos seis captulos dedicam-se ao gnero em
suas concepes modernas e at mesmo ps-modernas. No se adequaria especificamente ao presente trabalho,
j que viso em especial ao paradigma clssico das espcies biogrficas, embora contemple suas relaes
com a narrativa histrica e ficcional produzida na ps-modernidade.
A partir do prprio dilogo firmado entre Julia Kristeva (1969) e Mikhail Bakhtin, a estudiosa blgara
estabelece o conceito de intertextualidade. O mecanismo compreende os ecos de outros discursos na
literatura, suas vinculaes com os universos do real, alm do destaque ao carter pluridiscursivo dos textos
literrios.
14
aspectos, pretendo referendar um dilogo, j estabelecido pela teoria literria atual, entre o
comparatismo e os Cultural Studies. Em relao aos encaminhamentos ps-estruturais,
convoco suas bases francesas, da mesma forma, o corpo teortico do ps-modernismo tornase basilar considerao da narrativa ficcional contempornea.
Tais inferncias me oferecem subsdios para visualizar os primrdios do espao
biogrfico como uma zona ocupada pela filosofia, a histria, a potica, a retrica e a sofistica.
Interligando esses campos, a memria cobra valor em seus vnculos com o tempo e a histria.
Ao contrrio do inconsciente, submete-se a mecanismos controladores, razo por que no
desejo abdicar do crontopo4 a fim de rasurar algumas inapropriaes, constantemente
repetidas sobre a biografia e os gneros a ela contguos.
Entre tais usos inapropriados, ressaltam: a tomada de uma parte (gnero
autobiogrfico) pelo todo (espao biogrfico); a indistino entre os discursos autobiogrfico
e biogrfico; o estabelecimento fundacional da narrativa biogrfica no sculo XVIII. Ainda
preciso rediscutir usuais afirmativas sobre a ausncia de uma noo de individualidade nas
pocas que precederam ao iluminismo. Tambm se faz necessrio reavaliar o emprego
indiscriminado de literatura confessional, literatura ntima ou literatura intimista,
relativamente ao espao biogrfico.
Da o propsito de recorrer a certa remontagem do tear em que se imbricam os fios da
biografia, da cultura, da fico, da histria, das sociedades e da memria, ela mesma,
ancorada em quadros sociais. O empreendimento supe a desmemria, no sentido de uma
operao para esquecer as marcas disciplinares que delimitam graves fronteiras entre a
historiografia e a teoria literria. Na verdade, filosofia e histria, quando aqui vistas pelo
avesso, contribuem a fixar uma potica do espao ou do gnero biogrfico.
Por idntico modo, a sugerida desleitura das obras de crtica ou de teoria literria mais
auxiliam a uma leitura a contrapelo da cultura, da histria e da historicidade, correspondentes
ao perodo enfeixado no trabalho. Assim, a tese justificada formalmente, ao se enquadrar na
linha de pesquisa do Programa de Ps-Graduao em Letras da PUCRS, denominada Margens
da Literatura: Produo e Recepo. Como tal, visa a fortalecer os encaminhamentos tericos
a respeito da biografia e do romance.
Os gneros mencionados vm sendo recebidos com sucesso pelo pblico-leitor e
O vocbulo crontopo resulta da fuso dos termos gregos Khrnos (tempo) e Tpos (lugar), mostrando-se
fundamental ao pensamento bakhtiniano sobre o texto literrio. Cf. BAKHTIN, 1992, p. 327-414.
15
Considero metafico biogrfica quela metafico historiogrfica cujo protagonista baseia-se num ser
histrico, em geral, j conhecido por outros meios. Para o conceito, ver: HUTCHEON, 1991, p. 38.
O paradigma clssico da biografia regula-se: pelos feitos de grandes homens, pelas divises estruturais das
narrativas e por um conjunto de temas semelhantes. Cf. MADELNAT, 1983, p. 6-38.
16
enfatizando as rotas cruzadas que desembocam na criao ficcional cujo mote o discurso
biogrfico. Para atender a esse fim, abordo os seguintes trabalhos historiogrficos: O diabo e
a terra de Santa Cruz (MELLO E SOUZA, 2000); O queijo e os vermes (GINZBURG, 1987).
Tambm estas obras literrias, cujas tradues, ainda que no eliminassem consultas
aos textos originais, permitem cit-las a partir das edies brasileiras: O paraso na outra
esquina (VARGAS LLOSA, 2003b) e As cidades invisveis (CALVINO, 1990a). Ao princpio
de um longo e no menos rduo caminho, os fins desde logo se justificam por meio dum
conceito de crtica como forma ps-freudiana de autobiografia. Uma autobiografia
ideolgica, terica, poltica cultural. E digo autobiogrfica porque toda crtica se escreve a
partir de um lugar preciso e de uma posio concreta (PIGLIA, 1994, p. 70-71).
A metodologia hermenutica se orienta em Paul Ricoeur e solicita aportes tericos dos
estudos de gnero. Ainda pretendo deslocar o trabalho intercomunicabilidade das teorias
histrica e literria, verificvel em obras que tematizam a biografia ou que procedem a sua
ficcionalizao. Aps revisar e discutir os esquemas conceituais encontrados na bibliografia
selecionada, passo anlise das obras literrias seminais, definidas como corpus do trabalho.
Tal percurso deve associar o interesse pelo evento longue dure. Concentrando-se na
Antigidade, nas Idades Mdias,7 na modernidade inicial, na modernizao epistemolgica e
no acolhimento dessas temporalidades por narrativas ps-modernas, o trajeto desliza ao
labirinto do No da crtica latino-americana, em sua maior parte, detida no barroco e nas
expresses vanguardistas alto-modernas.
A noo de Idade Mdia foi imposta pelos renascentistas, estabelecendo uma fronteira entre seus tempos e o
perodo antigo. Poderia comear em: 310 (reconhecimento a cultos cristos); 392 (oficializao do
cristianismo); 476 (deposio do ltimo imperador romano); 698 (conquista muulmana a Cartago). Para seu
final, apresentam-se as datas de 1453 (queda de Constantinopla) e 1517 (incio da Reforma Protestante). Os
historiadores ingleses usam o termo Middle Ages, que lhes parece refletir melhor as complexidades medievais.
Cf. FRANCO JR, 2001.
17
2002). Em vnculo estreito com as prticas e as aes da pedagogia, tais formas inscrevem-se
nesta abordagem epistemolgica e metodolgica, por compreend-la como processo
formativo e autoformativo, atravs das experincias dos atores em formao (SOUZA, 2006,
p. 138). Excluo tambm a histria de vida, conceito relacionado
a uma denominao genrica em formao e em investigao, visto que se revela
como pertinente para a autocompreenso do que somos, das aprendizagens que
construmos ao longo da vida, das nossas experincias e de um processo de
conhecimento de si e dos significados que atribumos aos diferentes fenmenos que
mobilizam e tecem a nossa vida individual/coletiva (SOUZA, 2006, p. 139).
18
confessionais, intimistas etc. que formam o espao autobiogrfico, percorrido com segurana
e mestria por Lejeune (1971, 1975, 1980, 1986, 1989a, 1991a, 1991b, 1993, 1996, 1998a,
1998b, 2005, 2007, 2008). Zona em que por igual no adentro, a literatura de testemunho
apresentada de forma introdutria nos panoramas traados por Mabel Moraa (1995) e
Mrcio Seligmann-Silva (2003).
Aparte as problemticas da mediao autoral, do valor de verdade imputado aos textos
e das pressuposies hierrquicas verificadas nos atos ou intenes de conferir voz aos
subalternos,
Em outros casos, que at agora receberam ateno bastante menor da crtica, o
testemunho se oferece como documento que ilumina uma rea perifrica e
usualmente relegada da sociedade, desde a qual, se pem a descoberto contradies
ticas ou convencionalismos que, geralmente, nem so questionados a partir do
discurso literrio tradicional (MORAA, 1995, p. 513).
19
20
O vocbulo imaginrio utilizado como um designativo quase neutro, se comparado s idias tradicionais a
respeito do termo. Como no se trata de, face ao texto literrio, determinar o imaginrio como uma faculdade
humana, mas de circunscrever as maneiras como ele se manifesta e opera, com a escolha desta designao
aponta-se antes para um programa do que para uma determinao. Trata-se de descobrir como o imaginrio
funciona, para que, a partir dos efeitos descritveis, abram-se vias para o imaginrio (ISER, 1983, p. 413).
10
Textos em estgio acabado, quando referidos em outras obras, constituem o hipertexto, passvel de fornecer
base a infindveis relaes intertextuais. Um livro do qual se extraiam dados, motivos, personagens, temas
etc., igualmente rotulado de hipotexto, bem como a hipertextualidade faz-se implementar nas redes
virtuais. Assim, a identidade autoral no fica presa obra, pois o autor pode ser localizado extratextualmente;
em contnuo processo de interao, ele transcende o texto e se expressa tambm por outras marcas: cartas,
fotografias, confisses, entrevistas, leituras, releituras e reeescritas. Nesse vaivm do texto ao que o contorna,
envolve e at recobre, chega-se identidade do sujeito-autor (ZILBERMAN, 2004a, p. 97).
21
Em seu interior, o destaque ao gnero biogrfico visa identificar sob que estratgias
fundamentais ele se orienta. Dessa maneira, centro-me nas relaes entre histria e literatura,
bem como da fico contempornea com as espcies biogrficas e o gnero biogrfico, no
desenrolar do captulo conclusivo, de nmero 4, Re(vises) do paraso: sete passeios por
sendas que se bifurcam. As anlises das obras literrias e histricas fazem-se guiar pelo texto
de Calvino Seis propostas para o prximo milnio (1990b) e pelos hipertextos dele
originados: Seis passeios pelos bosques da fico, de Umberto Eco (1994) e Tres propuestas
para el prximo milenio (y cinco dificultades), de Ricardo Piglia.
Atravs de tais obras e dos expedientes que visam a abord-las, discuto as idias a que
me permitam chegar, tanto o estudo das teorias, quanto a pesquisa histrica e os
empreendimentos analticos, apresentados e confrontados s reflexes abarcadas pela histria,
a teoria da literatura e a teoria literria contemporneas. Enfeixo resultados conclusivos no
subcaptulo 4.4 Memorial: porque um eu se desl ao ler e a reler vidas alheias. As
remontagens ficcionais mostram-se determinantes pesquisa, uma vez que, ao se utilizar
dessas tticas, o gnero romanesco vem-se renovando e continua a ser lido na
contemporaneidade, notoriamente audiovisual e miditica.
As ticas, ou seja, as polticas de escolha dos valores que guiam a investigao, pemse ao lado da epistemologia, do conjunto das maneiras de observar o mundo e pensar sobre
ele. Definir, situar, discutir, relacionar entre si as espcies biogrficas, o gnero biogrfico e a
literatura biogrfica proposta contida neste breve passeio fico e histria, evocando a
passagem na qual, para no se converter em pedra ao lutar contra Medusa, Perseu dirige sua
mirada quilo que s pode-se revelar por uma viso indireta, por uma imagem capturada no
espelho. Sou tentado de repente a encontrar nesse mito uma alegoria da relao do poeta com
o mundo, uma lio do processo de continuar escrevendo (CALVINO, 1990b, p. 16-17).
No intuito de responder aos objetivos do empreendimento, a transdisciplinaridade no
se dissocia de mtodos comparativos, tampouco de um trnsito dialgico entre os indivduos e
as respectivas culturas. O caminho percorre bosques e sendas bifurcados memria deste
novo milnio ou de outros, bem mais antigos. Nem to dantesco, do modo que primeira
vista poderia parecer, nem to sinttico maneira de Calvino, o presente desafio convoca
inclusive a filologia, esse amor s letras.
22
23
Matria e memria
A palavra biografia tem origem etimolgica nos vocbulos gregos Bios (vida) e
Grphein (desenhar, gravar, ou a ao de escrever, descrio, tratado ou estudo). Partindo
desse pressuposto, uma espcie biogrfica se faria suportar pela escrita, por descries orais e
at mesmo por imagens. O conceito expresso por grafia, tambm presente em historiografia,
suscita o retorno a uma das perguntas iniciais desta pesquisa: vidas ou histrias podem ser
escritas, desenhadas, gravadas em algum lugar?
Para respond-la, faz-se necessrio lembrar que fontes remotas duma arte biogrfica
encontram-se nos relatos dedicados a patriarcas e reis de Israel (Antigo Testamento), bem
como aos heris picos de sagas gregas, germnicas e clticas. Outro tipo biogrfico
despontava nos ensinamentos de santos e sbios, constantes nos livros profticos da Bblia.
De modo semelhante, nas sentenas de Buda; nos fragmentos antolgicos de Confcio e nas
palavras dos Sete Sbios da Grcia.11
No Ocidente, as espcies que se assemelham s narrativas biogrficas remontam era
clssica dos gregos (sc. V-IV a.C.). Alm dos fragmentos com teor biogrfico, os helenos
puderam conservar alguns resduos de mitos aqueus e das epopias do perodo arcaico (VIIIV a.C.). Articuladas, linguagem e memria haviam permitido a circulao oral dessas
histrias, at que o alfabeto se revelasse um importante aliado contra o esquecimento e o risco
da efemeridade, prprio memria.
Substituindo as faculdades de memorizao, a escrita se conecta nem to somente
histria da potica ocidental, mas tambm s histrias da filosofia e da prpria historiografia.
As primeiras escritas conjugaram uma contabilidade elementar com o sistema de
representaes mticas e se viabilizaram em paralelo ao desenvolvimento da metalurgia e dos
agrupamentos humanos. A descontinuidade entre o meio pensado e o ser pensante acontecia
11
Muitas histrias da Bblia centraram-se na narrao biogrfica: No e sua arca; Moiss, Jos, Joo Batista, os
reis magos; Davi e Golias, Sanso e Dalila; Josu, o homem que fez parar o Sol; Daniel na cova dos lees.
No por acaso, personagens e temas bblicos foram retomados em vrias obras da literatura ocidental, como
Jos e seus irmos, por Thomas Mann, Esa e Jac, por Machado de Assis, Jac e Raquel, por Cames. Cf.
BIOGRAPHY, 1990; MACHADO, 2002, p. 40.
24
junto fixao agrcola: O seu fundamento est na criao de uma imagem csmica cujo
pivot a cidade (LEROI-GOURHAN, 1985, p. 210, v. 1).
Os poemas picos sinalizam certa articulao dos velhos modos de falar; sua
transcrio, paralela ao nascimento do alfabeto, revela a capacidade dos textos homricos em
transmitir suas narrativas sob condies ainda pr-letradas. A mimese homrica, entretanto,
no tentava copiar da aparncia; igual ao mito, vinha das figuras inteirias cuja unidade j
existia antes da observao de que se faziam objeto. Sua presena viva e sua diversidade
provm, como possvel perceber por toda parte, da situao em que inevitavelmente elas se
vem envolvidas; e essa situao que determina suas aes e seus procedimentos
(AUERBACH, 1997a, p. 14-15).
Originalmente, a palavra grega Mthos designava qualquer narrao, ficcional ou que
se ligasse a eventos reais, para depois exprimir narrativas de ordem lendria ou maravilhosa.
Assim, os mitos reunidos na Teogonia (1979) e nOs trabalhos e os dias (1996) indicam que
Hesodo (sc. VIII a.C.) pareceu compreender a necessidade de unificar o conjunto humano,
confrontando-o com a ordenao do cosmos.12 O registro mtico e a poesia pica, bem como
os universais poticos que vieram depois deles drama e lrica sofreram os efeitos da
tenso entre as modalidades orais e escritas da linguagem.
Isso no constitui um elemento isolado de outras tenses: em percurso jamais
cumprido sobre uma linha reta nem constante, a civilizao helnica enfrentava longo
processo de modificaes polticas, religiosas e sociais. A sistematizao dos mtodos de
escrever proporcionava uma das condies para que os gregos se enamorassem de Sopha,
quer dizer, da sabedoria. Os gregos principiaram lentamente a desenvolver-se conforme os
modos de pensamento lgico e analtico, encaminhando-se filosofia, entre os sculos IX e
VI a.C.
Arquloco de Paros (c. 680-646 a.C.) criticava o ideal herico, rechaava o mito e
expunha seu desejo de inscrever-se no poltico. Para Max Treu (1955), a doutrina da mmesis
fora testemunhada ineditamente pelo arcaico poeta, em sua expresso A palavra a imagem
da realidade. Arquloco descerrou caminhos para uma grande ruptura na arte potica dos
helenos, que Simnides de Cos (c. 556-c. 467 a.C.) teria o mrito de assinalar, ao pratic-la
como um ofcio e ao defini-la como um produto ilusrio.
12
A Ilada e a Odissia j so construes complexas, indicando o comeo de uma parceria fecunda entre o oral
e o escrito. Cf. HAVELOCK, 1996b, p. 16.
25
Seria notvel que os poetas no mais recorressem simples recitao, para apresentarem suas obras. Desde o
sculo VII a escrita a forma necessria de publicao (DETIENNE, 1988, p. 57). Porm, o termo lrico, tal
como hoje se usa, ps-clssico, e se emprega, freqentemente, para identificar as fragmentrias relquias de
uma srie de poetas entre Arquloco e Simnides. Em seu prprio tempo, esses poetas [lricos] no eram lidos,
mas ouvidos. Para alcanar, em qualquer medida, o que chamamos de publicao, suas obras deviam ser,
no escritas, mas executadas, perante audincias grandes ou pequenas (HAVELOCK, 1996b, p. 26).
14
O substantivo filsofo no consta em documentos escritos antes do ltimo quartel do sculo V a.C. Os prsocrticos tiveram que descobrir o pensamento conceitual como idia e mtodo antes de surgirem os produtos
do pensamento, isto , os sistemas. Abrangem de Xenfanes a Demcrito, mas a chamada Escola de Mileto
no pode ser includa porque, no direcionamento da mente grega ao abstrato, qualquer contribuio que
possam ter feito se perdeu. Todas as suas ipsissima verba desapareceram e com elas qualquer indcio de
tentativas conceituais (HAVELOCK, 1996a, p. 315).
15
O real compreendido como o mundo extratextual, que, enquanto faticidade, prvio ao texto e que
ordinariamente constitui seus campos de referncia. Estes podem ser sistemas de sentido, sistemas sociais e
imagens do mundo, assim como podem ser, por exemplo, outros textos, em que se efetua uma organizao
especfica, ou seja, uma interpretao da realidade. Em conseqncia, o real se determina como o mltiplo dos
discursos, a que se refere o acesso ao mundo do autor, tal como mostrado pelo texto (ISER, 1983, p. 412413).
26
16
No quer dizer que a potica e a retrica j existissem como slidos campos do discurso e do conhecimento,
mas coube a Scrates e aos sofistas unific-los como campos e reconhec-los como tpicos, a fim de preparar
o caminho para que se tornassem disciplinas (HAVELOCK, 1996a, p. 315).
17
Estas palavras relacionavam-se com pate (engano) quando a filosofia empenhou-se para substituir o discurso
figurativo pelo conceitual: Eikn (signo e presena duma coisa ausente); Eidlon (o acontecimento
representado e ausente). Nas reflexes platnicas, ambas envolvem a problemtica da imaginao, que
compreenderia tambm a da memria, e admitem as respectivas tradues: cpia com idia de fiel
semelhana; imagem do evento copiado. Cf. RICOEUR, 2004, p. 20-33.
27
uma identificao entre artista e pblico. Acontecendo durante a reencenao dos poemas, o
elo condenado pelo filsofo de Atenas entre platia e declamador constituiria um ato e
um estado mimtico. No entanto, a raison dtre do seu ataque que, na execuo potica,
como era praticada at ento na Grcia, no havia um original. O termo mmesis escolhido
por Plato como o nico perfeitamente adequado (HAVELOCK, 1996a, p. 177).18
Aristteles (384-322 a.C.) retomava fundamentos platnicos a respeito da memria
(Mnm), todavia, separou-a da rememorao (Anamnssi). No livro I de sua obra Metafsica
(1979, p. 8-35), o filsofo de Estagira declara que a primeira conservaria o passado,
equivalendo lembrana das sensaes percebidas e imaginadas, ao passo que a segunda
consistiria no ato de convocar as impresses sensoriais, atravs da vontade. Um estmulo
sentido pelo ser humano produziria forma analgica sensao experimentada, vinculando as
coisas de que se recorda ao recebimento por meio dos sentidos.
Conforme o estagirita (1994, p. 281-304), a memria equivale a uma qualidade (afeto)
do sensvel ou do julgado. As rememoraes devem-se a tal estado sensrio, indutor de suas
existncias, no tempo decorrido entre o retorno do elemento afetivo e sua primeira impresso
na alma, como imagem. A problemtica da imagem na lembrana era trazida pela distino
aristotlica entre os termos Phantasma (a inscrio mesma, um desenho, um quadro etc.) e
Eikn (a representao de algo diverso).
Os elos da memria com a imaginao, as recordaes e a distncia temporal ainda
exigiram a definio de Mnmoneuma. Esse vocbulo significava uma lembrana, um
souvenir, j que faria pensar em algo distinto de sua prpria constituio. Integrando a parte
do esprito que deveria interseccionar-se com os mecanismos imaginativos, a memria era
conferida ao passado e a imagem, distanciada duma simples acepo de cpia, o que no
eliminava uma aporia da presena da ausncia (KRELL, 1990; RICOEUR, 2004, p. 33-41).
Ao supor a experincia como necessria realizao dos artefatos culturais,
Aristteles fica mais prximo ao reconhecimento dos universos da fico. Quando se
reconhece um ato de fingir nas estruturas ou nos elementos de um texto, os critrios naturais
quanto a este mundo representado esto suspensos. Assim, nem o mundo representado retorna
18
A mmesis veio equivalendo ao conceito tradicional de representao, embora no se confundisse com uma
cpia. Seu objeto, mimema, importa enquanto ilustra uma determinada viso de mundo; a arte causa o
regozijo do filsofo e do intrprete ao confirmar a justeza de suas idias. Assim o no entendimento da
mimesis correspondia a uma hierarquia implcita: em primeiro plano, apontava o discurso conceitual, o que
diz o que e separa a verdade das opinies, seja ele identificado com o discurso filosfico ou com o
cientfico. ele ento que disciplina os discursos inferiores, que carecem de sua incidncia para que se digam
valorizveis ou desprezveis (COSTA LIMA, 1981, p. 227).
28
por efeito de si mesmo, nem se esgota na descrio de um mundo que lhe seria pr-dado.
Estes critrios naturais so postos entre parnteses pelo como se (ISER, 1983, p. 400).
No sculo em que viveram os filsofos de Atenas e Estagira, Grammatiks passou a
fazer parte do vocabulrio grego; nomeava os aptos a ler, tomando lugar ao termo precedente:
Kritiks. Na mesma centria, um tipo de ancestral do papel, manufaturado a partir da planta
do Cyperus Papirus, expandiu-se desde o Egito e daria nova forma de disposio aos antigos
textos. A inovadora tcnica do papiro, lado a lado com a descoberta de outros suportes,
proporcionariam terrenos mais amplos secularizao da memria e da palavra.
A decadncia da plis jogava papel essencial ampliao das espcies biogrficas, que
se tornariam mais relevantes quando a runa da sociedade urbana produzisse uma idia de
generalizado desencanto. A biografia ocidental ia surgindo enquanto se alterava o status dos
gregos, ou seja, durante a ruptura havida entre a civilizao da plis e os grandes imprios
que se lhe seguem. Na crise, impe-se a necessidade do registro, cujo balizamento so vidas
que se relatam (CARINO, p. 160, 1999).
Em lugar dos sete sbios gregos, foi Sopha quem, ao se recolher na escrita, passou a
se transmitir atravs do mito, da poesia, retrica, sofstica, filosofia, histria e, ainda, do
discurso tico-poltico. Entravada no pretrito arcaico, a Paidea de Homero fez-se
advertncia, lembrana, memorizao e se faria reminiscncia, rememorao ou retorno do
reprimido. Como a musa, de canto sedutor, os saberes ocidentais aqui fluem desde o leito de
Mnmosine, a me das musas. Memria encarnada, ela ajuda na identificao das barreiras
por cujo intermdio se pode combater as aes erosivas de Amles, o rio do esquecimento.
1.2.2 A escrita das Dxai e as biodoxografias
Uma vez mais, e a exemplo do que fizemos com nossa alma, ao
modelar uma espcie de fico de cera, construamos em cada alma um
viveiro para os mais variados pssaros, alguns em bandos, apartados
dos demais, e alguns poucos, ainda, solitrios, a voarem pelo meio de
todos, por onde bem lhes apetece.
PLATO
Teeteto
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30
novamente encontrada, viria instaurar a tradio doxogrfica, segundo Geoffrey Kirk, John
Raven e Malcolm Schofield (1994, p. XV). O livro remete a um extravio precedente, ao
efetuar citaes do pr-socrtico Tales de Mileto (c. 625/4-558/6 a.C.).
As pontas desse novelo seriam atadas pelo erudito germnico Hermann Diels que, ao
raiar do sculo XX, publicaria Os fragmentos dos pr-socrticos, texto aprimorado pelos
contributos de Walther Kranz na edio de 1951-1952. Os autores helenistas relacionam o
material doxogrfico em duas colunas: na primeira, segmentos que conferiam maior
importncia a opinies e teses, dizeres e sistemas filosficos (fragmentos B). No segundo
grupo, eles ordenam os registros assinalados pelo fornecimento de testemunhos, que tratavam
preferencialmente da categoria Vidas (fragmentos A).
Inscrito pioneiramente na espcie biogrfica da doxografia, Xenofonte (c. 428-355
a.C.) escreveu Apologia de Scrates, ou Defesa de Scrates, ou ainda, Memrias de Scrates,
em que deu a conhecer algumas facetas cotidianas do pensador. O assim denominado antigo
Xenofonte continuou no caminho de Bios em Kyropaideia, Hiern e Anbasis (c. 380 a.C.).
No ltimo texto, relata episdio vivido por ele prprio, durante a retirada dos mercenrios
gregos da Prsia, tambm se apresentando como autobiogrfico.
Dignas de serem mencionadas como exposies doxogrficas independentes da
reunio teofrstica, e com carter biogrfico, so as obras centradas em Herclito de feso,
atribudas ao platnico Herclito do Ponto (sc. IV a.C.) e ao estico Cleanto de Assos (300220 a.C.). O mesmo pode ser dito sobre Aristxenes de Tarento (sc. IV a.C.) e as diversas
biografias contadas entre suas produes, a se destacando a narrativa que enfoca a vida de
Pitgoras (c. 580-497/6 a.C.). Ainda no se deve ser obliterar uma Vida dos gregos, por
Dicearco de Messina (c. 350 a.C.-290 a.C.).
Embora no alcanassem o nvel que nossa atual cultura poderia supor, as prticas de
letramento vinham-se ampliando desde que a civilizao helnica respirou novos ares
polticos, no sculo V a.C. As biodoxografias necessitavam ocupar-se da carreira dos
cidados, de seus papis sociais, entretanto, figuram poucos sofistas nas recompilaes
doxogrficas, talvez devido grande ascendncia de Aristteles sobre a doxografia que lhe
sucedeu. Mesmo assim, trechos de Grgias, Hpias, Prdico e Protgoras conseguiram aportar
era helenista (sc. III-I a.C.).
Ao raiar desse perodo, as facilitaes detectadas no papiro vieram contribuir para o
estabelecimento da Biblioteca de Alexandria. Seus bibliotecrios passavam a unificar os
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Sobre textos atribudos aos dois Hiplitos, o romano e um asitico, ver: PIERANTONIO, p. 55-75, 2006.
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de Plotino (250-270 d.C.) e uma biodoxografia sobre Pitgoras. Tal como Porfrio, e ao
mesmo estilo de suas vidas romanceadas, Jmblico de Clquis (sc. IV) viria enfocar o
citado matemtico, e filosofador, em Da vida pitagrica.
A doxografia se apresenta, pois, como informao, fonte, compilao e catlogo,
assinalando-se por determinadas maneiras de encapsular os dados fornecidos, como
deformao. O fato vem a ser, primeiramente, um factum, algo fabricado, uma fico
significante, no dizer da filloga Barbara Cassin (1999, p. 36-41). Em seu pensamento, nunca
se alcanaria integralmente a verdade por tal meio, uma vez que a fixo revela-se
igualmente discursiva, como efeito do significante e produtora de resultados.
Na extremidade anterior desse panorama, situa-se o Epos homrico, uma das ltimas
testemunhas do predomnio da transmisso oral, da experincia rtmica memorizada.
Compreendida como natureza, a realidade precedeu ao ser humano e lhe era independente: sua
converso em real se faz atravs de um processo duplo, paralelo, mas distinto: por sua
nomeao que no se restringe a dar nome a partes da realidade e pela formulao de
molduras determinadoras da situao decodificante da palavra (COSTA LIMA, 1981, p. 223).
A Odissia de Homero encontra-se entre as primeiras composies picas que o
alfabeto registrou. Sedimentada nesse poema, a guerra com os troianos serve para inaugurar
novo conflito. Um dos motivos que explicam as peripcias de Ulisses no caminho casa
perfeita, e tambm seus infortnios, a vingana de Poseidon, protetor de Tria e desafeto
do rei de taca, responsvel direto pela queda da cidade onde o soberano dos mares detinha
seus templos (ZILBERMAN, 2004b, p. 145).
Durante a era clssica dos helenos, o caudal supremo foi mesmo a filosofia,
modelada na cera secular da memorizao e da escrita. A pica desembocava na lrica ou no
drama, conduzindo esta pesquisa aos estudos poticos, retricos e histricos que, juntos ou
apartados, mostram-se tributrios da mitologia. Lembra-nos Italo Calvino (1990b, p. 16-17)
que os mitos no requerem pressa: melhor deixar que eles se depositem na memria,
examinar pacientemente cada detalhe, meditar sobre seu significado sem nunca sair de sua
linguagem imagstica.
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O nascimento da tragdia
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Os gregos designavam o que conhecemos por figura como: Eidos, Morph, Plsis, Schma, Typo. A traduo de
Eidos por forma satisfatria, evocando linhas de contorno a certas figuras. Cf. AUERBACH, 1997b, p. 13-17.
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a.C.) davam motivos s personagens zombadas pelos dramas cmicos de Aristfanes (c. 448c. 380 a.C.).
Scrates, como visto, era honrado em distintas apologias de Plato e Xenofonte. Em
ambas, transparecem traos incipientes da biografia; mais na obra do ltimo e menos na do
primeiro, que d voz ao mestre em Grgias ou a oratria, A Repblica e trilogia socrtica,
composta pela Apologia, Crton e Fdon. Quando a filosofia tica se ergueu, a questo das
histrias individuais que merecessem relatos encerrava problemtica de maior alcance:
sobre quem estaria capacitado para participar da vida pblica e dirigi-la. A posio
tradicional, certamente aristocrtica, considera a virtude algo natural, fruto da
herana, tanto quanto os traos fsicos e que, alm do mais, pode desenvolver-se
mediante a imitao da conduta dos antepassados. A posio dos sofistas a respeito
da virtude no unnime, mas, em todo caso, no se encontram posturas radicais,
salvo em excees, como Antfone e Crtias. Na maioria dos sofistas, a oposio
phsis/paidea no radical nem excludente (BELLIDO MELENO, 1996, p. 14).
George Misch (1950, p. 5) e Arnaldo Momigliano (1971, p. 12-14) afirmam que a concepo de autobiografia
ainda era inexistente.
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Arnaldo Momigliano (1971, p. 12-14) reitera que a concepo de autobiografia ainda era inexistente.
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nova vida e outra descendncia a Enias, calcando-o na figura do imperador de Roma, Otvio
Csar Augusto.23
Pouco mais tarde, com quatro livros de elegias, despontava outro autor do Lcio:
Sexto Proprcio (c. 47 a.C.-c. 15 d.C.). O primeiro de seus textos Monobiblos ou Livro de
Cntia fora dedicado musa, cuja presena tambm se fez marcar no segundo livro. Na
prxima obra, ele concederia espao temtica nacionalista e s elegias fnebres:
Aqueles poemas nacionais, apenas esboados no terceiro livro, acentuam-se no
quarto volume, ocupando a maior parte de suas pginas. Desta vez, j separado de
Cntia, Proprcio imprime um novo tom sua lira, resolvendo tambm celebrar a
ptria, suas lendas, seus heris, suas virtudes. Revela-se a um verdadeiro Calmaco,
deixando entrever as influncias recebidas do poeta alexandrino. No entanto, no
oculta o sentimento de romanidade, a inspirao religiosa e nacional com que canta
a ptria (MENCALHA DE SOUZA, p. 119, 2006).
24
A palavra latina Figura significava forma plstica. Marco Terncio Varro (c. 116-27 a.C.), Marco Tlio
Ccero (106 a.C.-44 a.C.) e Tito Lucrcio Caro (98-55 a.C.) assinalaram as variaes do conceito no mundo
romano, a partir dos termos gregos. Assim, Forma, como idia que informa a matria, era utilizada para
Morph e Eidos, transmitindo a noo de modelo, qual tambm se usou Exemplar. Para Schma,
normalmente se empregava Figura. J Typos queria dizer impresso e Plasis , plasma, a coisa criada, a
forma recebida. A conexo com vocbulos como esse levou Figura a prevalecer sobre Statua, Imago, Effigies,
Species, Simulacrum [esttua, imagem, efgie, figura, simulacro]. Mesmo que Figura equivalesse ao grego
Schma, mais ampla e dinmica do que o ltimo termo. Cf. AUERBACH, 1997b, p. 13-17.
Em Lucrcio, pela primeira vez, encontrava-se Figura como viso de sonho, imagem da fantasia,
fantasma. O intelectual tambm lhe deu o sentido de tomo. Junto a modelo, cpia, fico, plano
arquitetnico ou posio sexual (em Ovdio), todos esses sentidos ligavam-se a Figura. O vocbulo teve
significado definitivamente plstico, sendo que a figura considerada como das mais prprias foi a aluso
velada em suas diversas formas. Cf. AUERBACH, 1997b, p. 25.
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Cpia do primeiro, seria esse o mundo da vida, cujas tentativas artsticas de reproduzi-lo
consistiriam simulacros, imitaes do j imitado.
Tratado do Sublime
Nesses termos, as Vidas de Cornelius Nepos (c. 100-c. 24 a.C.) contam episdios
acerca do general Anbal e do poeta tico, por exemplo, num molde que depois utilizaria
Plutarco. Na passagem era crist, Nicolau de Damasco realizou as crnicas do rei Herodes e
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produziu Epistola ad Pisones, batizada como Ars Poetica, na qual j percebia os traos
construtivos da obra de arte. O pensamento no seria exclusivo da epstola horaciana,
fazendo-se presente nas consideraes de Ccero e Quintiliano (c. 35-c. 95).25
A idia aparece no tratado Do Sublime cuja autoria credita-se ao suposto Longino ou
Dionsio (1995), que muitos tm por annimo: requer-se nas esttuas a semelhana com o
homem; na eloqncia, a superao das faculdades humanas (p. 106). Principalmente nos
mencionados tratadistas, e de modo similar noutros poetas ou pensadores antigos, as
estruturas textuais guiavam-se pelo crivo de quem as organizava. Isso acontecia em virtude
do compromisso histrico entre forma e contedo, fato que no perceberam os repetidores e
diluidores da potica clssica, que tomaram o acidental as solues dadas pelo essencial: a
busca de solues adequadas a novas necessidades (BRANDO, 1995, p. 1-18).
As energias criativas da potica teriam florescido num campo semeado s narrativas
de assinalamento biogrfico. Pessoas de real existncia eram utilizadas como personagens na
maioria das obras de Plato, cujos ttulos carregam os nomes dos respectivos protagonistas:
Crmide; Crtilo; Crtias; Eutidemo; Eutfron; Fdon; Fedro; Filebo; Hpias Maior; Hpas
Menor; on; Laques; Lsis; Mnon; Parmnides; Protgoras; Teeteto; Timeu. Ainda que
filosficos, esses dilogos do sculo V a.C. inspiravam-se por um tipo de relacionamento
mimtico:
Eles so tipicamente compostos com inocente descaso pela documentao anterior; e
se fossem privados dessa inocncia jamais poderiam vir a ser o que so. curioso e
interessante o fato de que Plato, no correr do sculo IV, querendo apresentar
credenciais de uma produo compatvel com uma poca letrada, sente-se, todavia,
livre de inventar, em apoio de seu escrito, uma documentao do sculo V que,
verossimilmente, nunca teria podido existir (HAVELOCK, 1996b, p. 32).
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No pensamento de Ccero, Exempla legados por seres de boa reputao e bom nome
guiariam atos e reflexes dos futuros indivduos. Esse orador identificou os componentes da
virtude: Fora, Justia, Temperana e Prudncia, dentro da qual, se localizariam a
inteligncia, a memria e a providncia. Nos passos da filosofia platnica, o retrico
determinava que um homem virtuoso seguisse aos princpios da razo e da ordem natural das
coisas, harmonizando-os at se tornarem procedimentos habituais (YATES, 2005, p. 20).
Maria Luiza Corassin (p. 104-105, 1997) frisa que Cornelius Nepos e Plutarco
reiteravam seus ofcios como escreventes de Vidas: a Historia, regida pelo verbo fazer, e a
Vita, pelo ser, teriam respectivamente carter pblico e privado. Conciliados a uma filosofia
pragmtica, os pressupostos de Ccero (1899) recomendavam que os vares ilustres fossem
narrados atravs de feitos e virtudes, igualmente, das vidas exemplares. Uma definio
ciceroniana se manteria por longo prazo: a histria , na verdade, a testemunha dos tempos;
luz da verdade; vida da memria; mestra da vida; mensageira do passado (II, 9, 36).27
Seguindo rumo contrrio expresso socrtica Conhece-te a ti mesmo , as
verdades eram progressivamente internalizadas:
Paradoxalmente, a memria, antes de ser reminiscncia, apropriao; o presente,
antes de ser volta ao passado, mirada para o futuro; a vida, antes de ser balano,
processo de transformao. A memria (o presente, a vida) se exercita sob a forma
de exerccios progressivos de memorizao, desde que nos entendamos sobre o
sentido novo desta palavra (SANTIAGO, 2004, p. 205-212).
27
Historia Vero Testis Temporum; Lux Veritatis; Vita Memoriae; Magistra Vitae; Nuntia Vetustatis.
45
Figura
Expresso devedora da seguinte trilogia, em seu conjunto, intitulada conforme o primeiro volume: COSTA
LIMA, Luiz. O controle do imaginrio: razo e imaginao nos tempos modernos (1984); Sociedade e
discurso ficcional (1986); O fingidor e o censor (1988).
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GRARD GENETTE
Metalepsis: de la figura a la ficcin
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nada era feito. No se elimina totalmente a hiptese de sua apresentao como registro duma
srie de acontecimentos, todavia, o encadeamento parattico das aes no significa que o
poema pico primitivo seja uma crnica, pois a idia de uma seqncia natural no tempo,
imune subjetividade por parte do poeta, mais complexa [...] A cronologia depende em
parte do domnio do tempo como uma abstrao (HAVELOCK, 1996a, p. 209).
A ao na Ilada e a experincia na Odissia preenchiam o espetculo concretizado,
que durava um dia. Homero adentrou ao terreno das composies peridicas, mas que nada
teriam a ver com as antigas escritas histricas. Mais perto dessas narrativas, estariam os
domnios de Bios, ainda que j fossem registradas algumas distines entre tais reas. No
entanto, Aristteles (1966, p. 78) parecia localizar as Vidas numa zona de abrangncia da
histria, segundo esta passagem da Potica, muito difcil de elidir:
a poesia algo de mais filosfico e mais srio do que a histria, pois refere aquela
principalmente ao universal, e esta o particular. Por referir-se ao universal, entendo
eu atribuir um indivduo de determinada natureza, pensamentos e aes que, por
liame de necessidade e verossimilhana, convm a tal natureza; e ao universal, assim
entendido, visa a poesia, ainda que d nomes aos seus personagens; particular, pelo
contrrio, o que fez Alcibades ou o que lhe aconteceu.
Como visto, uma configurao mais precisa do espao biogrfico se afirmava no incio
da era crist. Plutarco havia fornecido importantes pistas quanto a diferenciar os relatos
histricos daquelas narrativas cujos ttulos, ao serem transliterados do grego para o latim,
designariam igualmente sua natureza: Bioi e Vitae. O autor de Vidas paralelas demonstrava
pouco interesse pelos determinantes estruturais e sempre reivindicava com energia a
superioridade dos sinais da alma sobre a etiologia poltica (LORIGA, 1998, p. 228).
De ttica semelhante, valeu-se o escritor duma colnia norte-africana de Roma, Lucius
Apuleius (125-c. 180), em texto de marca encomistica: Apologia. No sculo II, um satirista
nascido na ento provncia romana da Sria Luciano de Samsata (125-c. 190) enveredou
pelos campos da teoria em Como se deve escrever a histria. Brando (2001) afirma que o
libelo, dirigido aos historiadores das guerras prticas, aborda o manejo da histria em relao
ao ficcional (Psedos); ao verdadeiro; poltica; liberdade pura do poeta.
O trecho que se pde conservar do Satyricon Banquete do Trimalcio (sculo I
d.C.) apresenta-se como uma das produes mais alheias ao briografismo. Nele, as
personagens eram focadas em traos esquemticos:
55
O romance, finalmente, fabula milesiaca, gnero ao qual pertence, no fim de contas,
a obra de Petrnio, est, em outros fragmentos ou obras que conservamos, to
fortemente carregado de elementos mgicos, aventurosos, mitolgicos e, sobretudo,
erticos, que de maneira alguma pode ser considerado uma imitao da vida
quotidiana de ento sem falar da estilizao irreal e retrica da linguagem. O que
mais se aproxima da representao ampla, verdadeiramente quotidiana da existncia,
algo da literatura Alexandrina; talvez as duas mulheres do festim de Adnis, em
Tecrito, ou o processo do alcoviteiro, de Herodas. Mas tambm estes dois trechos
composies em verso so, com respeito ao realismo, infra-estrutura sociolgica,
mais brincalhes e mais estilizados na linguagem do que Petrnio (AUERBACH,
1971, p. 26).
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de
globalidade
que
veio
antecipando
galxia
de
Gutemberg.
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latinas de Bocio. Por sua vez, o termo biografia era cunhado pelo neoplatnico Damaskios
(c. 462-538 d.C.), a quem se atribui uma narrativa intitulada Vida de Isidoro.30
Na mesma centria, o realismo eclesistico da Histria dos Francos, por Gregrio de
Tours (c. 538-594), tentava imitar o acontecimento de forma sensvel, e nunca visada pela
historiografia romana. A cronologia implantada na Primeira Idade Mdia31 retomava antigas
formulaes da histria greco-romana. As perspectivas cronolgicas da histria crist
provinham de noes bblicas, quase todas, cristalizadas numa liderana religiosa individual,
como Daniel, No, Abraao, Davi e Jesus Cristo.
Isso conduz Le Goff (2003, p. 116) idia de que um retorno ao antigo classicismo no
seria privilgio da Renascena:
Em 776 comea o cmputo por Olimpadas, em 754 a lista dos foros de Esparta, em
686-685 a dos arcontes epnimos de Atenas, em 508 o cmputo consular de Roma.
Em 45 a.C., Csar tinha institudo em Roma o calendrio juliano. O cmputo
eclesistico cristo refere-se datao da festa da Pscoa. As hesitaes quanto
fixao do incio da cronologia e do incio do ano duraram muito tempo. As atas do
Conclio de Nicia so datadas quer com os nomes dos cnsules, quer dos anos da
era dos selucidas (312-311 a.C.). Os cristos latinos adotaram inicialmente, em
geral, a era de Diocleciano, ou dos Mrtires (284); mas, no sculo VI, o monge
romano Dinis, o Pequeno, props-se a adotar a era da Encarnao, fixando o incio
da cronologia na data do nascimento de Cristo.
A partir desse momento, em que a biografia passou a existir como palavra, no mais tratarei das outras
espcies que integram o espao biogrfico, a no ser quando estritamente necessrio.
31
Arnold Hauser divide os tempos medievais em trs fases: a economia natural do primeiro perodo; a cavalaria
galante da Alta Idade Mdia e a cultura burguesa urbana do fim da era. Com sua diviso, parece concordar a
equipe autoral de Burns, ao separar as Idades Mdias em: Inicial (500-1050); Alta (1050-1300) e Tardia
(1300-1500). Franco Jr. procede a esta classificao: Primeira Idade Mdia (sc. IV a meados do VIII); Alta
Idade Mdia (meados do sc. VIII a fins do X); Idade Mdia Central (sculos XI-XIII) e Baixa Idade Mdia
(do sculo XIV a meados do XVI). O autor situa a infncia e adolescncia medievais entre os sculos IV e X;
a maturidade, do XI ao XIII e a senilidade, durante o XIV e o XVI. Ver: BURNS; LERNER; MEACHAM,
1990, p. 203-236; FRANCO JR, 2001; HAUSER, 1995, p. 123-131.
62
integrar pelos relatos hagiogrficos que, contudo, no pertenciam ordem do clericato. Como
exemplo, as Paixes dos mrtires no foram introduzidas na liturgia romana seno
tardiamente (sculo VIII). O mesmo ocorre na Igreja grega onde a hagiografia, entretanto, se
desenvolve muito mais rpido e, a partir do sculo IX, freqentemente entre os leigos
(CERTEAU, 2002, p. 271).
Os atos escritos davam instrumentalizao a duas lnguas que competiam, mas por
igual, operavam como meios intertradutrios. De tal maneira, puderam estabelecer uma
comunidade de leitura tanto em grego quanto em latim, de forma semelhante ao que ocorre
em culturas de bilingismo. Ainda que no seja possvel ignorar as diferenas bvias entre o
esprito dos escritores gregos e o dos latinos, na prosa e na poesia continua a ser verdade que,
se hoje os identificamos pelo ttulo comum de clssicos, este uso reflete uma realidade da
histria da cultura (HAVELOCK, 1996b, p. 339).
A converso da escrita em fenmeno generalizado somente ocorreria nos anos de
1800. Entretanto, isso remonta ao perodo decorrido entre os sculos IX e XIII, atestando-se
na difuso da obra de Santo Beda, o Venervel. O medievalista Paul Zumthor estudaria
alguns dos mais antigos textos em vernculo francs (8 e 9 centrias), distinguindo os
monumentos lingsticos dos simples documentos: os primeiros respondem a uma inteno
de edificao, no duplo significado de elevao moral e de construo de um edifcio,
enquanto os segundos respondem apenas s necessidades de intercomunicao corrente (LE
GOFF, 2003, p. 535).
Nos passos de So Beda, e ao raiar do sculo IX, a annima Historia Britonum
[Histria dos Bretes] notabilizou-se por equvocos que ingressariam nos estudos histricos
como verdades inquestionveis (RIQUER, 2003). Nessa moldura, surgiu por vez primeira o
general Arts, feito heri nacional dos bretes, e cuja base histrica se assenta em Victrix,
comandante romano que lutou a favor da Bretanha. A histria inventada remete ao
pensamento de Iser (1983, p. 385) acerca daquilo que, num livro, no s deve ser
identificvel como realidade social, mas que tambm pode ser de ordem sentimental e
emocional. Estas realidades por certo diversas no so fices, nem tampouco se transformam
em tais pelo fato de entrarem na apresentao de textos ficcionais.
Entre a mitistria, as lendas e a biografia, transitava o monge Einhard (c. 775-840),
autor da Vita Caroli Magni [Vida de Carlos Magno]. O monumento lingstico seria digno de
memria pstera, retro-alimentando as indefinies da histria, da potica e da retrica, bem
como sucessivas reescritas, em prosa e em poesia. Da 9 centria, ainda se destacam: uma
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O sangue a metfora da graa. Da a necessidade das genealogias. A santificao
dos prncipes e o enobrecimento dos santos esto em simetria, de texto para texto:
estas operaes recprocas instauram em hierarquia social uma exemplaridade
religiosa e sacralizam uma ordem estabelecida (tal o caso de So Carlos Magno ou
So Napoleo). Mas, igualmente, obedecem a um esquema escatolgico que inverte
a ordem poltica para substitu-la pela celeste e transformam os pobres em reis. De
fato existe circularidade: cada ordem reconduz outra (CERTEAU, 2002, p. 273).
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tarde, faria parte da Vida de Santo Anselmo, atribuda ao monge Eadmer (scs. XI-XII). Na
pennsula itlica, o mercador veneziano Marco Polo daria conta de suas andanas orientais no
livro chamado Il Milione (1298). Biografia, fico, histria e relato de viagens a se
confundem, da mesma forma que as audincias dos sculos XI, XII e XIII no distinguiam
entre a narrao histrica e a pica medieval.
A poesia dita provenal , de fato, occitana, compreendendo a produo em lngua de oc (lange doc), do Midi
francs e da regio ao sul do rio Loire. Como nao sem Estado, a Occitnia abrange no s a Provena, mas
tambm: Aquitnia, Auvrnia, Gasconha, Guyenne, Lemosim, Poitou, o Languedoc e o Delfinado. Considerando o
fator lingustico-cultural, englobaria alguns vales alpinos na Itlia e o Vale de Ar na Catalunha.
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Mesmo imbricado s canes de gesta, o romance medieval apartou-se daquelas produes, as quais se valiam
do canto e tematizavam as faanhas do heri que encarnava uma ao coletiva. O romance destinava-se
leitura e recitao, demonstrando carter descritivo-narrativo. Cf. ZUMTHOR, 1993. Baseado nesse
medievalista, Aguiar e Silva (1974, p. 9) esclarece: o romance medievo encontra-se profundamente ligado
historiografia - na lngua francesa, durante os sculos XII e XIII, os vocbulos roman e estoire so
equivalentes -, com a qual partilha de importantes caracteres estruturais. Apareceram assim, nas literaturas
europias da Idade Mdia, extensas composies romanescas, freqentemente em verso, em que podemos
discriminar duas grandes correntes: por um lado, o romance de cavalaria; por outro, o romance sentimental.
67
vem a ser experimentado antes de modo difuso, informe, fluido e sem um objeto de
referncia. Ele se manifesta em situaes inesperadas e da que de advento arbitrrio,
situaes que ou se interrompem ou prosseguem noutras bem diversas (ISER, 1983, p. 386).
O primeiro trao marcante da fico residiria numa ausncia de univocidade:
Por mais ignorantes que sejamos em cincias exatas, devemos saber que o objeto de
uma cincia exata tanto mais correto quanto mais unvoco for. Neste sentido,
diremos que o objeto ficcional se desloca no antpoda do objeto cientfico (ou
mesmo filosfico). Em termos menos tcnicos, no ficcional, os elementos
componentes so ao mesmo tempo signos eleitos por sua materialidade, pela
luminosidade ou obscuridade engendrada por sua expresso sonora e expresso
de desejo. Desejo entretanto no menos ambguo: se, por um lado, no deixa de ser
uma apetncia de fato mantida pelo sujeito emprico que o inscreve. Apetncia ento
de quem? Da possibilidade que o autor se permite atualizar sob o disfarce do
fingimento (COSTA LIMA, 1987, p. 487).
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O crculo de Guido Guinizelli (1230-c.1276) contou com Dante, Guido Cavalcanti (c. 1250-1300) e Cino da
Pistia (falecido em 1337). A poesia nuova italiana mostra-se mais lgica do que aquela realizada pelos poetas
francos Bernard de Ventadour (c. 1125-1200) e Peire Vidal (c. 1175-c.1205).
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latina ou do prximo Oriente, pelos numerosos espaos dessa, que uma das mximas
catedrais da cultura ocidental.
Entre suas bases e seus acabamentos, conciliam-se o estilo sincrtico, verificado no
Cor Gentile, com a lgica do realismo tomstico:
Embora santo Toms seja capaz de construir o mundo catlico-aristotlico num
bem-acabado sistema, um edifcio no qual Deus, as substncias separadas, o
homem, sua alma, e a natureza tm, cada um, lugar apropriado, ele no o povoa com
indivduos, nomeados e caracterizados separadamente. Dante, por outro lado, vive
entre figuras da sua fantasia potica, cada uma das quais brotou da inspirao
irracional de um momento concreto e, com a ajuda do pensamento filosfico, ele
consegue definir a natureza, lugar, classe e atividade prprias de cada figura
(AUERBACH 1997a, p. 98-99).
Ainda que jamais narrasse o evento sob a forma desconexa das lendas, Dante valeu-se
de figuras lendrias ou de pessoas conhecidas, a exemplo de Bruneto Latini, Cavalcante e
Guido Cavalcanti; Farinata degli Uberti, Filippo Argenti, Francesca da Rimini e Pier della
Vigna. Eliminando a temporalidade em sua obra, o poeta se aproximava de Aristfanes,
porm, as semelhanas ficam por conta de suas crticas e da estratgia consistente em chamar
personalidades histricas ao potica. O florentino erige um outro da multido no Outro
mundo, para que interprete l sua realidade essencial, como se ele fora to famoso como um
dos seus contemporneos, como uma figura mtica ou, pelo menos, historicamente
estabelecida (AUERBACH, 1997b, p. 182-183).
Os retratos do ser humano, que Dante pretendeu oferecer, ajudavam a estruturar seu
projeto monumental. Ele assim exemplifica um dos pressupostos das teorias da recepo e do
efeito, segundo o qual, a partir do momento em que a realidade repetida no fingir se
transforma em signo, ocorre forosamente uma transgresso de sua determinao
correspondente. O ato de fingir , portanto, uma transgresso de limites. Nisso se expressa sua
aliana com o imaginrio (ISER, 1983, p. 386).
A retrica ento preponderava nas universidades, enquanto Agostinho continuou a ser
bem recebido, em contato com as filosofias grega, judaica e rabe. A idia platnica do
conhecimento transparece nas leituras alegrias que So Toms propunha, embasado nos
conceitos do racionalismo e do realismo aristotlico. Buscando conciliar a filosofia clssica e
a f crist, o telogo exclua o sentido figurado das exegeses bblicas:
No est facultado poesia, portanto, exprimir verdades essenciais, que s se
encontram nas Escrituras, as nicas que contm sentido espiritual, passvel de ser
desvendado pela alegoria factual. Contudo, Santo Toms admite a possibilidade de
as Escrituras apresentarem verdades que extrapolem a compreenso humana atravs
da figura de coisas corporais, entendendo que a leitura do texto sagrado se funda,
70
acima de tudo, no sentido literal ou sentido histrico. [...] A teoria de Santo Toms
assenta-se na distino entre simbolismo das palavras e simbolismo das coisas,
cabendo alegoria divina a virtude da arte autntica. As fices poticas, no
passando de um sentido literal, limitam-se a, no mximo, ilustrar uma verdade
teolgica (FONSECA, 1991, p. 22-23).
A divina comdia
71
72
No trmino das Croniche Fiorentine, escritas por seu pai, Filippo Vilani modificava o
foco histrico tradicional, justapondo marcas pessoais dos biografados aos retratos externos.
Suas Vite Degli Uomini Illustri Fiorentini comeam no poeta Claudiano (sc. V) e chegam a
73
personalidades que lhe eram contemporneas, como Brunetto Latini, Coluccio Salutati e
Guido Cavalcante. O autor espelhou-se nas habilidades familiares, mas por igual em
Boccaccio, a quem homenageia numa Vita, incluindo-o no mais alto patamar da erudio,
junto a Dante, Petrarca e Zanobi Strada.
Em formatos antigos ou novas formas, os textos ampliavam-se para alm dos
clssicos. O leitor no s posto em presena de uma vastssima memria coletiva, cuja
matria j no tem possibilidades de fixar, como tambm se v confrontado com a explorao
de novos escritos (LEROI-GOURHAN, 1987, p. 62). Desse modo, em terras espanholas,
Rodrguez de Lena relatou o confronto entre Suero de Quiones e uma legio de cavaleiros
europeus no Libro del Paso honroso (c. 1434).
Os costumes da cavalaria ibrica foram narrados por Gutierre Dez de Games, em sua
crnica de Dom Pero Nio, intitulada El Victorial (c. 1436). Os espanhis desempenhavam-se
nas Vidas reais desde Pero Lpez de Ayala (1332-1407) e Alvar Garca de Santamara (13701460). Ferno Lopes (c. 1380-1459) parece ser o responsvel pela Crnica do condestvel D.
Nuno lvares Pereira e se destaca, junto ao cronista Gomes Eanes de Azurara (1410-1474),
pelas narrativas focadas em reis portugueses.
O relevo dado s crnicas histricas e s memrias fazia-se acompanhar do interesse
despertado pelos registros de episdios importantes na vida de proeminentes indivduos. Scrates,
Sneca e o papa Nicolau V integraram o elenco digno de ser lembrado por Giannozzo Manetti
(1396-1459). Em suas Vidas filosficas, Guarino Veronese (c. 1370-1460) d centralidade a
Plato, ao passo que Leonardo Bruni (c. 1370-1444) elege Aristteles como protagonista.
Manetti no excluiu o triunvirato da erudio florentina de suas biografias; Dante e
Petrarca so igualmente abordados por Bruni em Historia Fiorentini Populi, texto marcante
por se desviar do providencialismo histrico. O autor contempla questes pblicas
envolvendo o poeta florentino, mas no deixa de lado alguns detalhes, como sua caligrafia e o
lento falar. Tambm divide a narrativa sobre o filsofo de Estagira no que chama de duas
voltas em torno da pista: uma, tratando da vida pblica; a outra, dedicada s
particularidades: pernas finas, seus olhos pequenos, seu hbito de usar muitos anis e assim
por diante (BURKE, p. 90, 1997).
As biografias fundamentavam-se nos exemplos greco-latinos, mas os textos poticos
encontravam apurado modelo em Petrarca, entre cujas obras, sobressai frica, um pico sobre
o conquistador Cipio Africano. J Boccaccio empenha-se em narrar os amores de Biancifiore
74
com Florioes nos cinco volumes do Filocolo. Considerada como a primeira narrativa italiana
de fico, baseia-se na obra toscana Il cantare di Fiorio e Biancifiore, devedora dum poema
medieval francs, que circulou em vrias verses.
A prosa ficcional da Itlia integrava o Novellino, marcando-se pela nitidez e a
brevidade dos eventos narrados; moldou-se nos exemplos morais em latim (Exempla). A se
deslumbrariam algumas visadas constelao do Como Se, por meio do gnero buclico
renascentista, em que a fico pela primeira vez se autotematizou. Da que na cloga, assim
como no romance e no drama pastoris, venha indicado que o mundo pastoril representado no
se confunde com o pastorismo real (ISER, 1983, p. 401).
A Comedia delle ninfe fiorentine de Boccaccio foi popularizada como Ninfale d'Ameto
(1344) ou pelo nome de seu protagonista, o pastor Ameto. Nele, transfigurava-se o autor, cuja
amada Maria d'Acquino inspirou e ofereceu ttulo Elegia di madona Fiammetta. A figura
dessa filha natural do rei Roberto dera inspirao a outros trabalhos boccaccianos e integraria
o Decamero, em que o prprio escritor se disfara, sob a pele de Dioneo.
O novelista italiano adotava semelhante procedimento com uma Senhora Flora, na
qual se baseou para compor a Signora Fiordaliso do Decameron. Outras pessoas figuram com
seus nomes reais, a exemplo de: Giotto di Bondone, Guido Cavalcanti e Saladino; o rei
siciliano Guilherme II, os malandros Bruno e Buffalmaco, assim como sua vtima,
Calandrino. O subttulo da mencionada coletnea refere-se ao prncipe Galeotto, aludindo a
uma passagem da Comdia de Dante, na qual Paolo e Francesca tomam conhecimento da
histria daquela nobre personagem artrica (DOMBROSKI, 1972).
Boccaccio no encontraria termo de comparao com a potica antecedente.
Ordenando seus microcosmos artsticos, o escritor italiano fazia com que o acontecimento
vivido deixasse de operar como um exemplo moral e no mais servisse
despretensiosa vontade de rir do povo, mas ao divertimento de um crculo de
pessoas jovens, distintas e cultas, damas e cavaleiros que se deleitam com o jogo
sensvel da vida, e que possuem sensibilidade, gosto e opinio refinados; para
anunciar esta inteno na sua narrao, ele criou a sua moldura. O nvel estilstico do
Decameron lembra muito o gnero antigo correspondente, o antigo romance de
amor, a fabula milesiaca (AUERBACH, 1971, p. 185).
75
40
Dom Juan Manuel, assim como Lope de Vega e Raimundo Lulio, vrias vezes utilizaram-se de uma obra que
muito circulou na Idade Mdia Baarlaam e Josafat adaptao crist da lenda de Buda, produzida em
grego no sculo VII pelo monge Juan de Sabbas. Cf. ARIAS; HADIS, 2001, p. 129-141.
76
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Dispersa demanda
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Mimesis
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pblico se interessaria pela histria nacional e pelas histrias imaginrias, mas pouco se
importava em distinguir entre o lendrio e o supostamente verdadeiro. Toda essa demanda
laica por obras histricas tornaria o espao biogrfico um tanto quanto suspeito para os
historiadores.
Gesta Ferdinandi (1445-46), trabalho daquele mesmo Loureno Valla, foi
severamente criticado por mencionar risadas e roncos de soberanos. Estando na zona
histrica, mais dignificante do que a biogrfica, seu autor deveria eximir-se de tais
detalhamentos. Das Vidas, exigir-se-ia um conceito mais satisfatrio gradativa busca da
autenticidade documental, que poderia colocar em risco a baliza das existncias prodigiosas
(MADELNAT, 1983, p. 45).
Burckhardt exemplifica a natureza verstil do novo indivduo atravs de Enea Silvio
Piccolomini que, alm de assumir o papado em 1458 como Pio II, era poeta e cosmgrafo. Em
Commentari, o papa se confundiria em retratista e bigrafo, representando as criaturas
humanas por meio dos caracteres que mais as identificavam. Os Comentrios ainda
transformam o autor-protagonista em sujeito da histria: a autobiografia se resolve em
historiografia, contudo, no se anula nessa (GUGLIELMINETTI, 1977, p. 210).
Na parte norte da Itlia, os tiranos faziam-se prncipes ou requintavam seus meios de
dominao, envoltos na complexidade do aparelho estatal-citadino, com certa independncia
do poder pontifcio. Giannantonio Campano (1429-1477) e Pier Candido Decembrio (13921497) elaboraram, nesta ordem, as Vidas dos condottieri Braccio da Montone e Niccolo
Piccino. Inspirada em Suetnio, a escrita biogrfica de Decembrio abarca igualmente Filippo
Maria Visconti e Francesco Sforza, sucessivos governantes do ducado de Milo.
A histria do rei Alfonso de Aragn, narrada por Antonio Panormita (1394-1472) e
Bartolomeu Fazio (1440-1467), soma-se s precedentes para comprovar a paridade entre os
prncipes e aqueles braos do mercenarismo, quando se trata da dignificao pela memria.
Ao exibirem os topnimos de nascimento, ao lado dos nomes batismais, Sigismondo de
Rimini e Federico de Urbino indicam o grau de liberdade gozado pelas cidades italianas.
Entre demais poderosos, eles davam forma a um tipo de municipalismo em cujo seio geravase o mundo da cultura: O Imprio da Igreja mantinha, com os poderes principescos ou
republicanos locais, uma relao extremamente variada, em acordo com a multiplicidade de
formas em que tais estados se apresentassem (FERNANDES, p. 185, 2004).
80
81
Santiago (1455-1460). Fernn Prez de Guzmn, em Generaziones y semblanzas (14501455), oferece retratos de personalidades das cortes de Enrique III e Juan II: Ayala, Villena,
Dom Alvaro de Luna etc. Conhecido pela narrativa de corte biogrfico, Hernando del Pulgar,
em Claros varones de Castilla (1486), focaliza os reis Juan II e Enrique IV, bem como a
rbita cortes, em que se contam, dentre outros, Dom Rodrigo Manrique e o marqus de
Santillana (SNCHEZ ALONSO, 1947-1950).
A biografia transpunha os limites romnicos, por meio de Tito Livio Frulovisi, um
italiano expatriado, que se volta para o rei ingls Henrique V em Vita et Gesta Henrici Quinti
(1438). O alastramento do humanismo ao Norte europeu tambm se daria por intermdio da
vida de Petrarca, narrada pelo erudito holands Rudolf Agrcola (1473-1474). Narrativas
como essas se contaminaram por estratgias ficcionais e normas da retrica, tanto que
Jouvencel (c. 1465), por Jean de Bueil (1405-1477), receberia a etiqueta de romance
biogrfico (HUIZINGA, 1952).
Aps o humanismo do Trecento, a farsa realstica dos mistrios conduziu a formas que
no se mostraram suficientemente enrgicas para manterem as interpretaes figurais, decorrentes
da mistura estilstica crist. Uma viva representao do ser humano, quer dizer, a imagem
criatural, ultrapassava os limites do cristianismo, acorrendo em simultneo com o cavaleirismo
cerimonial. Essa convivncia se alastrara pelo sculo XIV, embora tivesse adquirido contornos
mais definidos no decorrer do sculo XV (CARPEAUX, 1978, p. 271-437).
Assim, Iigo Lpez de Mendoza o marqus de Santillana (1398-1458) ps a
figura de Boccaccio no contexto da derrota naval sofrida pelo rei Alfonso V, em sua
Comedieta de Ponza. O autor realizava um encmio ao revs, na diatribe contra Dom lvaro
de Luna que constitui sua obra Doutrinal de privados. O nobre poeta disps ainda de outras
figuras histricas em Coronacin de Mosn Jordi de Sant Jordi, Defuncin de Don Enrique
de Villena e Dilogo de Bas contra la Fortuna.
Juan de Mena (1411-1456) valeu-se do mesmo recurso na composio de estilo
trovadoresco Coronacin del Marqus de Santillana. Em intertextualidade mantida com a
Divina comdia, ele trouxe Dom lvaro de Luna e Lorenzo Dvalos, entre outras
personalidades histricas, para a recriao textual dEl laberinto de Fortuna, ou Las
trescientas. De forma similar, na antologia intitulada Cancionero de Stiga, figuram
diversos nobres que freqentavam a vida palaciana no tempo de Alfonso V.
82
No tempo e no espao representados, a nobreza via uma orientao didtica em fices de tal espcie e se
espelhava em suas histrias. Cf. RIQUER; COMAS, 1993, p. 572-578.
83
bastava que pudessem ser alegorizados conforme os nveis de interpretao
medieval. No momento, contudo, em que essa cosmoviso entrou em crise e o
julgamento individual assumiu o peso que j se lhe reconhece no sculo XV, o libi
do fictcio deixa de vigorar. Noutras palavras, o risco do controle do ficcional existiu
pelo menos desde que a linguagem teolgica teve a necessidade de se armar em
dogmas, evitando a fluncia imagtica da linguagem mtica. Mas esse risco s se
atualizaria quando a rigidez conceitual da cosmoviso teolgica j no se mostrou
capaz de se conciliar com o peso concedido ao julgamento individualizado (COSTA
LIMA, 1988, p. 361-362).
A stira popular da Espanha quatrocentista foi reunida nas Coplas del Provincial, que
no poupam os mais importantes medalhes da corte de Enrique IV. Frei igo de Mendoza
(1424-c.1508) teria escrito as Coplas de Mingo Revulgo (c. 1464), nas quais o referido
soberano transfigura-se no pastor Candaulo. Jorge Manrique (c. 1440-1479) prestava tributo
memria do pai nas Coplas por la muerte de su padre e seu tio Diego Gmez Manrique (c.
1412-1490) havia procedido dessa forma honorfica nas Coplas a Diego Arias de vila.
Juan del Encina (c. 1469-1529) produziu clogas inspiradas pelo bucolismo italiana:
Fileno; Zambardo y Cardonio; Cristino y Febea; Plcida y Victoriano. O autor, entretanto,
no abandona os traos nacionais em suas ltimas obras. Se as primeiras imitaes efetuadas
durante a regncia da escatologia crist ligaram-se ao firme objetivo de vivificar histrias da
Bblia, Dante animou, dentro da moldura figural, todo universo histrico e toda figura humana
que sua pena conseguiu atingir.
A partir das inmeras vozes, tornadas audveis pela voz do escritor italiano, a mimese:
no estava mais sujeita s leis aristotlicas e j no se enquadrava em qualquer dos gneros
clssicos. Nisso ela se parecia a toda a arte crist da Idade Mdia, embora de modo mais
consciente (AUERBACH, 1997a, p. 117). Sucedendo ao humanismo florentino, a narrativa
francesa ressaltou determinadas caractersticas sensveis-criaturais:
Boccaccio e o primeiro humanismo no mais sentiam aquela seriedade criatural na
experincia da vida; na prpria Frana, e em toda parte, ao norte dos Alpes, todo
realismo srio estava ameaado de morte por sufocao, causada pela trepadeira da
alegoria; mas a fora espontnea do sensvel era mais forte, e dessa forma, o
realismo medieval-criatural alcanou o sculo XVI; conferiu ao Renascimento um
forte contrapeso oposto s foras separadoras dos estilos, que brotaram da imitao
humanista da Antigidade (AUERBACH, 1971, p. 224).
84
por algumas expanses, ora conectadas com as mudanas que seriam infringidas mmesis de
Aristteles.
Canti carnascialeschi
42
Um ilegvel manuscrito srio do sculo IX traz a inscrio livro que contm a histria das mil noites. O
acrscimo de uma noite mostra a coerncia na organizao daquele outro manuscrito, de 1455, a ser traduzido,
organizado e aumentado pelo erudito francs Antoine Galland no sculo XVIII. Cf. JAROUCHE, 2006
85
86
limites, no substituvel pelo real a que se refere, porquanto garante ao imaginrio sua
significao e, mais ainda, a condio de sua experimentabilidade, no s pela determinao de
sua configurao, quanto por sua referncia a algo real (ISER, 1983, p. 411).
Na realidade, desde os anos finais do Quattrocento tera parte do Cinquecento, a
pennsula itlica vivia turbulenta fase poltica, em vnculo direto com determinado
enfraquecimento de seu poderio econmico. Ao norte, o continente europeu presenciaria
diversas inovaes, resultantes do acmulo mercantil proporcionado pelas novas colnias. Em
simultneo, irradiava-se o humanismo neoplatnico, abrangendo a viso heliocntrica de
Nicolau Coprnico (1473-1543).
Entre tais humanistas, Marslio Ficino (1433-1499) traduziu Plato ao latim,
salientando as charneiras entre religio e filosofia, bem como se empenhou em revalorizar a
escolstica, afirmando as caractersticas moventes da natureza humana. De acordo com
Ficino, o ser humano era dotado de extrema liberdade para proceder a suas escolhas. Poderia
exercer seu livre arbtrio para degenerar no mundo das coisas inferiores ou regenerar na
ordem divina, superior. (HANSEN, 1986, p. 67).
Giovanni Pico della Mirandola (1463-1494) reagiu a determinados excessos do
humanismo. O pensador estudou a Cabala e o Talmud, harmonizar a filosofia platnica com a
aristotlica, o cristianismo e a mstica judaica. Seu sobrinho, Giovanni Francesco, alm de
carregar o mesmo nome, como ele, desempenhou-se nos estudos filosficos, e produziria um
relato sobre o tio: Ioannis Pici Mirandulae Vita (1496). Em meio a novidades to
impressionantes, como a Bblia impressa e o continente americano, Pico se libertava dos
traos sincrticos que vieram assinalando seu pensamento.
Ele combate a astrologia no Discurso sobre a dignidade do homem (1496), em que
recupera o espao do mdico rabe Averris e dos sbios hebraicos, deslocando a centralidade
da tradio greco-romana. As esperanas que depositava no intelecto e na racionalidade
incentivaram as reflexes de Erasmo Desidrio (c. 1467-1536). Associado com as idias de
Joo Calvino (1509-1564) e Martin Lutero (1483-1546), Erasmo dava corpo cultura
renascentista da Europa setentrional, a realar o sentimento religioso e a verdade da f.
Em coetneo aos passos iniciais do absolutismo monrquico, consolidava-se a reforma
protestante. Seu iderio atentou s possibilidades humanistas de veicular as expresses
contrrias ao dogmatismo da igreja catlica e de educar os seres humanos, mirando ao
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caminho da salvao. No reino espanhol, o Erasmismo destacava-se com Juan Lus Vives
(1492-1540).
Os humanistas italianos haviam inaugurado uma cincia histrica profana, sem fbulas
nem intervenes sobrenaturais, que se estenderia de Leonardo Bruni (1404) aos historiadores
franceses Etienne Pasquier, Franois Hotman, Claude Fouchet, Lancelot-Voisin de La
Popelinire, Louis Le Roy e Nicolas Viguer. Prpria ao humanismo, a erudio seria
retomada na segunda metade do sculo XVI. O hbito daquelas colees, reunidas na Itlia e
depois na Frana, difundia-se graas ao financiamento dos mecenas.
Herana involuntria dos antigos, o documento se apresentava especialmente como
testemunho escrito. Mediando a propriedade, os registros da vida civil e a presena da
autoridade, seu carter objetivo parecia opor-se marca intencional do monumento, conforme
verificada nO livro do corteso (1516) de Baldesar Castiglione. Nesse tempo, reafirmava-se
freqentemente a distino feita por Plutarco entre as ordens do biogrfico e do histrico.
Entre os cronistas do rei espanhol Carlos V, destacaram-se Antonio de Guevara e Pero
Mexia, o primeiro, com seu Libro Aureo de Marco Aurlio (1528). Os cronistas portugueses
Damio de Gois e Rui de Pina deram tons lendrios a suas narraes concentradas nos reis
lusitanos. Os autores tentavam disfarar sua natureza de produto do imaginrio. O fictcio
procura se vender como sendo o que no : como estria sucedida, respeitosa do cotidiano,
submetida ao critrio da verdade (COSTA LIMA, 1987, p. 488).
Tendendo ao fictcio ou mirando histria, a biografia dava sintomas de alargamento
numa obra com foco em So Jernimo (1516), redigida por Erasmo de Roterd. Esse
pensador serviria de modelo ao texto de Beatus Rhenanus (1540) que, da mesma forma,
protagonizaria uma narrativa biogrfica. Tambm o reformador Melanchton e o humanista
Lipsius, todos tiveram seus bigrafos, para no falar nos santos, como Vicente Ferrer e Incio
de Loyola, cujas vidas foram escritas no novo estilo humanista por Ransano e Ribadeneira
(BURKE, p. 85, 1997).
Narrativas dessa espcie proliferavam na Itlia, onde crescia o interesse pelas histrias
com fundamento em soldados e sultes, de Paolo Giovio (1483-1552). Na mesma contextura,
Giovanni Corsi retratou Marslio Ficino (1505) e, na esteira da obra boccacciana, mulheres
humanistas, como Isabella dEste e Margarida de Navarra, viam-se contempladas por
narraes de Giuseppe Betussi (c. 1512-1573). Vrios casos biogrficos transitaram do
fictcio ao ficcional, impondo relaes dialticas entre o imaginrio e o vivido:
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A compreenso de cada um dos dados (Gegebenen) j uma transgresso, e o
escalonamento dos diversos atos de fingir se manifesta como um processo de
traduo gradual, no qual o dado correspondente pertena ele ao contexto,
organizao dos campos semnticos ou ao que se pe entre parnteses sempre
algo transgredido. Se os atos de fingir encontram seu trao comum na transgresso,
ento face a este que se mostra a atualidade das diversas particularidades
(Besonderheiten), pois estas se realizam como operaes complementares, que
permitem o processo de reformulao do mundo, que no encontra seu idntico no
mundo, deixando aberta tanto a experincia, quanto, por fim, a compreenso (ISER,
1983, p. 411).
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(1548) e Giovanni Battista Pigna dirigiu o foco de uma Vita ao poeta Ludovico Ariosto
(1554). O arquiteto Filippo Brunelleschi veio integrar um elenco de artistas cujas vidas
fundamentaram os trabalhos de lies moralizantes, desenvolvidos pelo pintor Giorgio Vasari
(1511-1574).
Tambm arquiteto, esse artista narra histrias envolvendo Piero della Francesca, como
se fossem reais, mas que parafraseiam anedotas sobre:
antigos pintores gregos contadas por Plnio em sua Histria natural. A histria sobre
como o cardeal Granville ditava simultaneamente para diversos secretrios o eco
de uma anedota que tanto Plnio quanto Plutarco escreveram sobre Jlio Csar. Os
historiadores se acostumaram ao fato de escritores medievais usarem topoi dessa
natureza, tal como acontece no famoso caso da vida de Carlos Magno por Einhard,
que adorna o biografado com as caractersticas hericas de vrios imperadores
romanos, inclusive tomando de emprstimo expresses como corpore fuit amplo
ataque robusto (BURKE, p. 83, 1997).
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Desde o final do sculo XV, as biografias dos escritores eram publicadas como
prembulos de seus livros. Edies dos antigos poetas Estcio, Plauto, Claudiano e Horcio
precediam-se das narraes de suas vidas, realizadas pelo humanista florentino Pietro Crinito,
e que antes haviam integrado uma coleo (1508). Por meio idntico, as narrativas biogrficas
de So Jernimo e Erasmo valeram como prefcios e as Ouevres, ou Opere, de Calvino,
recebiam o acrscimo da verso francesa de sua Vida ou da traduo desse texto ao latim.
No mesmo rumo, a Vita di Boccaccio, por Francesco Sansovino, resultaria de
encomenda para o Decameron a ser editado em 1546. A narrativa sobre o poeta Ariosto, de
Giovanni Pigna, seria includa junto ao Orlando furioso, a partir do ano 1556. Assim tambm,
desde 1583, o construto biogrfico de Bernardino Marliani Baldessar Castiglione
passaria a fazer parte de um conhecido texto do escritor biografado: O corteso.
Presente nas Vidas de artistas, certa hibridez do retrato com a biografia teve por
modelo Imagines, de Varro. Segundo Peter Burke (p. 87, 1991), tornava-se uma prtica
bastante trivial que os textos dramticos e poticos trouxessem as imagens de seus autores.
Elas eram dispostas, geralmente, por frontispcio, como nos casos de Ariosto (1532), Erasmo
(1533), Petrarca (1536), Ronsard (1552), Vasari (1568) e Shakespeare (1623).
O bardo ingls e o ficcionista castelhano Miguel de Cervantes Saavedra (1547-1616)
situam-se na arte maneirista, que vingou a partir da dcada de 1520. Seus adeptos buscavam
maior expresso subjetividade, no bojo de renovado interesse pelas vidas hericas e por uma
cavalaria nem to forte quanto a medieval. O maneirismo vincula-se realidade poltica da
Europa, conforme as descries de Maquiavel nO Prncipe (1532) e do cronista espanhol
Luis de Avila y Zuiga, em Comentrio de la guerra de Alemania por Carlos V (1548).
As novelas de cavalaria experimentavam grande sucesso junto a espanhis e franceses,
enquanto as fices narrativas da Frana e da Itlia seguiam fornecendo seus prottipos s
demais regies europias. Ainda vigoravam reescritas poticas, tais como Orlando furioso
(1516), texto no qual Ludovico Ariosto (1474-1533) valia-se de obra homnima, do j
referido Matteo Boiardo. O assinalamento do intertexto aqui opera no sentido de revelar o
discurso entre fices e, assim, mostra a preocupao de impedir que uma fico, que no se
evidencia por si mesma, se qualifique como realidade (ISER, 1983, p. 399).
Apresentando os discursos ficcionais de maneira explcita ou implcita, os domnios da
potica estendiam sua magnitude Espanha quinhentista. Com motivos de sobra para
qualificarem o perodo como Siglo de Oro, seus artistas tomavam a linha dianteira no mapa
92
cultural do Ocidente. Mesmo ao tentarem se explicar, a princpio, para fugirem a seu estatuto
ficcional, as obras literrias espanholas davam-se a conhecer sob uma aparncia de realidade,
da qual se valiam para que operassem como transcendentes ao real.
Entre os fios que teceram o extenso Sculo de Ouro, Los quatro libros de Amads de
Gaula centram-se numa nica personagem, moda das escritas de vida. O annimo texto
portugus circulava desde o sculo XIV, mas uma verso definitiva dessas novelas seria
fixada em 1508 pelo escritor castelhano Rodrguez de Montalvo. A consistir no primeiro ciclo
espanhol de cavalaria, originou as sries dos Amadis, imortalizados por Feliciano da Silva.
O protagonista de Don Palmern de Oliva (1511) seria reproduzido exausto, como
em Don Palmern da Inglaterra (1547) e nos inmeros cavaleiros, andantes ou no, cujas
aventuras correriam mundo.43 Muitas vezes, os autores de tantos Palmerines no explicitavam
suas fundamentaes, mascarando o ato de fingir, trao bsico a uma obra ficcional. Seguindo
as formulaes de Iser (1983, p. 398), a renncia ao desnudamento no resulta
necessariamente de uma inteno de fraude; ele no se realiza porque do contrrio seria
afetado o valor da explicao ou da fundamentao.
Devedor dos elementos cavaleirescos e de temas trgicos ou burlescos potica
italiana, o subgnero da novela sentimental viu-se representado na Pennsula Ibrica por
Diego San Pedro. Em sua obra Crcel de amor (1492), o protagonista Leriano, encarcerado,
sofre de amores pela princesa Laureola. Essa mistura do biogrfico e do ficcional serviria
como importante fundamento dialgico para um texto atribudo a Fernando Rojas, original
poca, por misturar aspectos do drama e da fico narrativa: La Celestina (1499).
Subtitulada como tragicomedia de Calisto y Melibea, o ttulo da Celestina destaca o
nome da alcoviteira que intercede para a unio do casal de personagens que lhe intitula,
recorrendo em especial ao intertexto com Petrarca. Sua vasta intertextualidade fixada, entre
demais nomes, com a Commedia Poliscena de Bruni; Historia Duobus Amantibus, do cardeal
Piccolomini; Elegia di madonna Fiammeta, de Boccaccio. A remisso s novelas de cavalaria
ocorre no plano simblico do rapaz que, por acaso, encontra uma bela moa.44
A histria toma rumos distintos, quando centrada na referncia burguesia urbana
espanhola, e matizada por uma finalidade moralizante, no sentido de reprimir as sedues
43
Necessrio inferir que o sculo XIV j registrava os antecedentes da cavalaria espanhola, em notrio dilogo
com a potica francesa: a Gran conquista de Ultramar e o Libro del Caballero Cifar.
44
A obra apresentou, fundamentalmente, duas verses: a Comdia (1499, 16 atos) e a Tragicomdia (1502, 21 atos).
Celestina teria inspirado a ama da pea Romeu e Julieta, de Shakespeare. Cf. LIDA DE MALKIEL, 1970.
93
materiais. A pardia ao amor corts dirigia-se s personagens das classes altas, enquanto a
cobia devia atingir outros estratos sociais. Os motivos da avareza, do egosmo e do
individualismo somam-se aos temas do amor proibido, da corrupo e das lutas entre opostos,
representadas especialmente pelas contendas entre cristos novos e judeus conversos.
Todas essas temticas no equivalem ao fictcio apresentado pela hbrida tragicomdia
La Celestina. Tampouco as mudanas nas relaes sociais e os mltiplos espaos de sua
cidade arquetpica:
quanto menos o sentido este fundo, tanto menos o fictcio capaz de s-lo. Se o
sentido a operao semntica que se realiza entre o texto, como configurao
fictcia de um imaginrio, e seu receptor, ento o fictcio, como ato negador do
imaginrio, apenas a condio para a reformulao das realidades postas e da
transgredidas no texto. Como, no entanto, o imaginrio no texto literrio se
concretiza e se torna eficaz apenas atravs do fictcio, ele precisa introduzir-se na
lngua (ISER, 1983, p. 412).
94
Rabelais tematizou as descobertas, enquanto More dispusera, no centro de sua obra, o lusitano
Rafael Hythlodaemus, sobrenome que se traduz como narrador de histrias fantsticas.
O autor tinha bebido nas fontes da oralidade para compor Pantagruel (1532). Alm
disso, recorreu ao antigo poeta Luciano, a sermes da Idade Mdia Tardia, a uma edio de
contos populares e a notcias referentes s terras novas, de maneira que uma de suas
personagens chama-se Pietre lvares, enviando ao capito-mor da armada portuguesa que
navegou para o Brasil. A histria escrita antes, mas publicada depois Gargantua (1534) j
se afastou das tradies orais; resultava numa linguagem mais permevel ao academicismo.
Vivendo no quadro artstico do ocaso medieval, Rabelais procurava um caminho
oposto moldura cosmolgica e religiosa de sua poca. No quer dizer que tivesse um
enquadramento anticristo, mesmo ao expressar a vitria da natureza e a dinmica da
corporalidade. Isso vem fortalecer a provocao de Arnold Hauser e dos medievalistas ao
estudo das inter-relaes medievo-renascentistas, possibilitando questionar o freqente
argumento sobre a origem do indivduo na moderna Renascena.
As criaturas rabelaiseanas gozaram de maior liberdade em seus desejos, instintos e
reflexes do que aquelas imaginadas nos perodos antecedentes. No constitui um caso de
simples resoluo, todavia, que se distingam como mais individuais em virtude dessas
prerrogativas. O carter unitrio do cosmos imaginado pelo cristianismo, e a conservao
figural do mundano na sentena divina, conduziam para uma permanncia muito forte e
indestrutvel do pessoal, o que pode ser demonstrado com maior nitidez em Dante, mas
tambm aparece em outros casos; justamente isto que agora est em perigo (AUERBACH,
1971, p. 238).
A cultura popular e o humor, revelados pelo escritor francs, uniam-se a uma
concepo do ser humano
libertada dos conceitos emoldurantes cristo e estamentais da Idade Mdia. Mas nem
por isso ele cabe na moldura dos conceitos antigos; a Antigidade significa para ele
libertao e ampliao do horizonte, mas nunca uma nova limitao ou
compromisso; nada est mais longe dele do que a antiga diviso dos gneros
estilsticos, que levou na Itlia, j no seu tempo e logo mais, na Frana, ao purismo e
ao classicismo. Para ele, no h medida esttica; tudo casa com tudo
(AUERBACH, 1971, p. 238-239).
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Vida nova
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no Siglo de Oro espanhol atingiu a coletnea editada pelo cronista Pedro Mexia, no estilo das
antigas miscelneas gregas e latinas: Silva de varia leccin (1540).
Joan Timoneda seguiria esse caminho com pequenos contos, mentiras, fbulas,
reunidos em seu anedotrio El Patrauelo (1567). O autor no descarta flashs de vida, uns
clares biogrficos, como nas histrias de Grislida e Apolnio. Relacionada por igual
com o mundo greco-latino, a novelstica pastoril enraizava-se nas tradies helenistas e no
primeiro humanismo, como se sabe, desde o bucolismo de Tecrito e Virglio aos trabalhos
boccaccianos Ninfale DAmeto e Ninfale fiesolano.
O gnero se acresceu das tonalidades que lhe forneceram as cartas de Vespcio, bem
como duas obras editadas no sculo XVI: Novae Novi Orbis Historia, de Girolamo Benzoni, e
Delle Navigationi et Viaggi, de Giovanni Battista Ramusio (NUEZ, 1972, p. 85). A pastoril
extraa seu molde preponderante do escritor italiano Jacopo Sannazaro (1456-1530). Trata-se
dum compsito ficcional em prosa e poesia Arcdia (1502) que relata o percurso do
jovem napolitano chamado Sincero, desde a frustrao amorosa e o idlio junto a pastores
arcadianos, ao retorno para sua cidade originria, onde toma conhecimento de uma tragdia.
Na Pennsula Ibrica, as novelas pastoris incorporaram a melancolia portuguesa da
Menina e moa (1554) de Bernardim Ribeiro. O escritor bilnge Jorge de Montemayor, com
Los siete libros de Diana (1559?), evocava o idealismo utpico da vida natural. Os seguintes
autores procederiam da mesma forma em suas respectivas obras: Gil Polo, La Diana
enamorada (1564); Glvez de Montalvo, El pastor de Flida (1582) e Surez de Figueroa, La
constante Amarilis (1607).
Miguel de Cervantes e Saavedra adentrou na fico narrativa por intermdio da
novelstica pastoril. Sua novela de estria La Galatea (1585) disfara como pastores
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alguns seres histricos do tempo representado no texto ficcional. Assim ocorre com as
seguintes personagens: Meliso (Dom Diego Hurtado de Mendoza); Australiano (Dom Juan de
Austria); Larisleo (Mateo Vasquez); Siralvo (Glvez de Montalvo) e Lauso (o prprio
Cervantes).
Produzida por Nuez de Reinoso, a Historia de los amores de Clareo y Florisea
(1552-1565), como toda obra pertencente novelstica bizantina, possui enorme dbito com a
Historia etipica dos amores de Tegenes e Clariclea (sc. III). Desde a descoberta do
manuscrito grego e da primeira edio em Basilia, no ano de 1534, esse texto foi traduzido
ao latim e aos principais vernculos. Atribudo a Heliodoro, motivou criaes que passaram a
mesclar seu carter sentimental com o relato fundamentado em viagens ou peripcias.
Tambm circulavam novelas histricas sem autoria definida, como as mouriscas, entre
as quais, Historia del Abencerraje y de la hermosa Jarifa (1565). A narrar o ambiente
corteso e cavaleiresco dos mouros granadinos, tal narrativa seria baseada em alguns fatos de
seu passado recente. Do mesmo modo, parece referencial a Historia de los bandos de Zegres
y Abencerrajes (1595-1619). Os textos em grifo reescreviam diversas histrias extradas do
repositrio cultural e inspirariam obras posteriores.
Na passagem ao sculo XVII, o judeu-espanhol Mateo Alemn contribuiu para dar
forma ao subgnero da fico picaresca, atravs da Vida del pcaro Guzmn de Alfarache
(1599). Esse texto d espao s andanas do escritor por terras americanas, que se interpem a
fragmentos clssicos, expresses prosaicas e ditos populares. De semelhante modo, contempla
intertextos com Ozmn y Daraja, da tradio moura; Dorido y Clorinia e Bonifacio y
Dorotea, de motivos italianos.
Alm dos Pirineus, Torquato Tasso (1544-1595) destacava o verossmil no lugar do
imaginativo, submetendo a ordem ficcional ao domnio do fictcio. O escritor italiano referiuse s cruzadas e cavalaria, sintetizando a Humanitas greco-latina com o nacionalismo em
suas epopias Jerusalm Libertada (1575) e Jerusalm Conquistada (1593). Na ltima,
ressalta uma orientao ps-tridentina, figurando alegoricamente a alma humana no heri
Godofredo; o corpo, nos soldados; as faculdades, em Tancredo e Renaud; as tentaes, em
Armida e Ismen (MONIZ, 2007).
Muitos leitores portugueses acessaram a cultura renascentista italiana por meio da
lngua espanhola. Entre os tais, havia de estar um qualificado leitor do poeta Virglio Lus
Vaz de Cames (c. 1524-1580) sobre quem, desde a data do nascimento, tudo so
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livro do trabalho em destaque, louva Plutarco, em virtude das dimenses concedidas por esse
bigrafo ao cosmos interno e vida privada, no lugar da rbita externa e da coisa pblica.45
Conforme o pensador francs, as Amricas inverteriam a imagem da civilizao, pois
o indgena gozava de mais liberdade, sade e igualdade social do que o europeu. A mitologia
em torno ao bom selvagem atualizava o mito greco-latino da Idade do Ouro, na qual os
seres humanos viveriam segundo as leis da natureza, em harmonia com os outros animais e
em fraternidade com seus semelhantes. Esse mito pode ser verificado em poetas como
Virglio e Ovdio ou em filsofos como Plato e Aristteles (SOUZA FILHO, p. 81, 2002).
A recusa dos mitos pseudo-histricos, inaugurada pelo humanismo italiano do
Quattrocento, encontrou continuidade no sculo XVI, por meio dos historiadores franceses,
em cujo grupo, a expressiva frao de juristas ia tomando distncia dos eruditos. Os homens
da lei e das letras deram contornos crtica documental, mas no retiraram a histria dos
campos da potica. Essa disciplina institua seu poder regulador, como se sabe, mas os
domnios poticos e histricos mal se distinguiam quando os historiadores de princpios do
sculo XVII comearam a se afastar dos letrados.
O meio jurdico ento prefigurava o saber histrico a ser capitaneado pelos filsofos
do Sculo das Luzes. Os eruditos alcanavam expressivo progresso em seus trabalhos, sem
que sassem das raias dos colecionadores, da histria-monumento. De acordo com Le Goff
(2003, p. 527), a palavra Documentum, provinda de Docere (ensinar), e situada no mesmo
campo semntico de Dxa, evoluiria para o significado de prova, cobrando utilizao no
vocabulrio legislativo.
No eplogo quinhentista, o terceiro crculo da cincia histrica findava com a idia
duma histria perfeita, enquanto comeara retomando aos antigos a noo de Historia
Magistra Vitae. Sob as abrangncias da contra-reforma, a Renascena trilhava longo caminho.
Principiara com a redescoberta das culturas clssicas, mirou a tais exemplos e assistia s
prprias extenses, hispanizada em diversos barrocos que variavam segundo as regies e os
receptores, contudo se orientassem pelo jogo religionrio das celebraes tridentinas.
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como afins prosa ficcional corrente: dilogos baseados no falar cotidiano; saltos
cinematogrficos do discurso narrativo; introduo de novos episdios, comentrios e
divagaes. De forma semelhante, os seguintes caracteres: apresentao do universo em
mudana; desvios da rota romanesca; alteraes de carter das personagens; a falta de
uniformidade no desenvolvimento da histria romanesca.
Entre as duas partes de sua obra-mestra, e sob o signo barroco, Cervantes redigiu
Novelas ejemplares (1613). O escritor castelhano se mostrava consciente da importncia que
passou a ter para as letras de seu pas. No prlogo da coletnea, declara:
Meu talento e minha inclinao conduziram-me a esta escrita, e tanto quanto eu me
considere, assim o : sou o primeiro a novelar em lngua castelhana, porque as
muitas novelas que nela andam impressas, todas so traduzidas de lnguas
estrangeiras. No entanto, estas so de fato minhas, nem imitadas nem roubadas; meu
talento as engendrou, e minha pena as pariu, e vo crescendo nos braos da imprensa
(CERVANTES SAAVEDRA, 1994, p. 12).
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acomete de sentimentos doentios pela jovem Leonora. O carter realista da novela no oculta
suas referncias: Orlando enamorado, Orlando furioso, Filocolo, Decameron e a quinta
narrativa das Novelle escritas por Matteo Bandello (1485-1561).
O licenciado Vidriera privilegia Toms Rodaja, a debater-se com a questo do
pecado original, e cuja demncia o leva a imaginar que seu corpo fosse de vidro. Os textos
centrados no marido extremamente zeloso e no bacharel Vidriera evidenciam o conflito
quixotesco sociedade versus indivduo. Por sua vez, A Senhora Cornlia divide seus
cenrios entre aventuras de viagens, o mundo social da corte espanhola e o centro econmico
da Espanha, radicado na zona de Sevilha.
As intenes observadas nas referidas obras ficcionais no se encontram no sistema
referencial que transgridem, nem na materializao do imaginrio. Entre tal conceito e o
mundo, a intencionalidade revela-se como figura de transio, com o estatuto da atualidade,
segundo Iser (1983, p. 390). Atualidade a forma de expresso do acontecimento, e a
intencionalidade possui o carter de acontecimento na medida em que no se limita a designar
campos de referncia.
Cervantes produziu ainda uma novela bizantina, editada postumamente: Los trabajos
de Persiles y Segismunda, historia septentrional (1616). Tematiza o amor e a peregrinao,
vividos por Auristela e Periandro cujos nomes supostos como reais figuram no ttulo. Prsiles
e Sigismunda vinculam-se mentalidade redentora do barroco:
Depois de comprovar o fracasso da utopia nos mundos construdos pela imaginao
educada (quer dizer, o fracasso das utopias renascentistas), Cervantes lana suas
personagens busca da utopia barroca, dentro do mundo real ou, se assim desejado,
fora dele, mas um fora que no implica outro lugar, a no ser o no-lugar absoluto:
o lugar de Deus. A ilha de Policarpo, em Prsiles, equivale venda de Juan
Palomeque no Quixote. Ambas as cenas constituem o eixo dos respectivos
romances. [...] Abandonada a esperana renascentista, a segunda parte do Prsiles
uma incurso pelo mundo da contra-reforma. A partir de agora, no h lugar para
mundos fora do mapa, ou hic sunt leones. A partir de agora, o Paraso (ou o inferno)
est aqui e agora; somos ns mesmos (BAENA, p. 136, 1988).
Uma narrativa espanhola de natureza bizantina era lida sob o prisma biogrfico: El
peregrino en su patria (1616), escrita por Flix Lope de Vega Carpio (1562-1635). Gonzalo
de Cspedes y Menezes, com a novela Poema trgico del espaol Gerardo (1615-1617),
deu vazo a expectativas semelhantes, procedendo busca da unidade narrativa por meio
dum considervel nmero de eventos particulares. J Francisco Lpez de Ubeda revelou-se
pioneiro, ao encarnar a figura picaresca na personagem feminina de La pcara Justina
(1605).
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Aventurarse perdiendo, Zelima, escrava moura, era reconhecida como a proceder duma
pessoa real e, simultaneamente, como fruto da imaginao.
Em certo ponto da novela, a personagem anuncia que seu nome Isabel Fajardo:
Sua realidade no nada mais nada menos do que aparncia, mas sua aparncia
revela a realidade de sua condio feminina. um emblema ambulante, mas seu
relato enuncia uma total subverso dos valores do emblema. Uma denncia. [...]
Uma situao real que se expressa com tpicos literrios e que se veste de fico
(RUIZ-GLVEZ PRIEGO, 2001, p. XXVI, XXXIII).
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Mximas morais
Na segunda metade do sculo XVI, uma espcie cultista de barroco foi denominada
preciosismo, indicando certa mudana na potica francesa. Madame de Svign (16261696) e Madeleine de Scudry (1607-1701) aderiram s formas preciosistas. A ltima
transferiu a vida social de sua poca para o cosmos da Antigidade, nas seguintes novelas,
publicadas sob o nome de seu irmo Georges, tambm escritor: Ibrahim (1642); Artamenes ou
Le Grand Cyru (1649-1653); Cllie, histria romana (1654-1660); Almahide, lesclave reine
(1660); Matilde dAguilar, histoire espagnole (1667).
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camponeses e dos pobres, sem lugar no espao artstico do sculo XVII (GRAWUNDER,
1996, p. 80).
Peter Burke (p. 89, 1997) sublinha o destaque oferecido, na vasta seara do espao
biogrfico, s falas entre as personagens e ao desenvolvimento da personalidade. Cada vez
mais dramtico e usual a partir do sculo XVI, o dilogo recobrava tamanha importncia que,
mais tarde, se transformaria em gnero do espao biogrfico. Um dos primeiros tipos assim
elaborados, a Apologia de Scrates, por Xenofonte, havia sido modelar para os autores
renascentistas Galeotto e Panormita.
Na 17 centria, o texto inspirou Baltasar Porreo a compor seus Dictos y hechos del
seor rey Don Felipe Segundo (1628). O bigrafo espanhol tambm produziu relatos acerca
de Dom Juan da ustria, bem como sobre os cardeais Gil de Albornoz e Gonzalo Jimnez de
Cisneros. Na Itlia, Giovan Battista Manso escreveu a Vita di Torquato Tasso (1621) e, a
modo de uma carta ao prncipe Leopoldo de Medici, Vincenzo Viviani elaborou Racconto
istorico della vita di Galileo (1654).
Giovanni Passeri (1610-1679) seguiu os passos de Vasari ao biografar artistas
barrocos, assim, comprova que os modelos italianos para as escritas de vida se impunham
como prioritrios, encontrando adeptos por todos os lados. Karel van Mander igualmente
havia-se orientado pela obra de Vasari para criar seu Livro dos pintores (1604). O artista
holands demonstrava sinais apreciveis da biografia ntima, porm, tal caracterstica se
manifestara em textos antecedentes, conforme acentuam as investigaes desenvolvidas por
Donald Stauffer (1964).
No correr do sculo XVI, as narrativas biogrficas eram formadas em sries
categricas, quase todas, cabveis s espcies da 17 centria. Algumas delas podiam ressaltar
as categorias morais (constncia, coragem, estabilidade, prudncia etc); outras, os atributos
mdicos (carter sanguneo, fertilidade, melancolia, robustez etc). Avultava certa tenso entre
o indivduo pensado como exemplar e, por outro lado, como um ser nico; salientava-se o
fator esttico da personalidade, quer dizer, como resultado fixo duma equalizao de vrios
humores (HAMPTON, 1990).
A previsibilidade do futuro herico dependia, em certos casos, de toda uma conjuntura
favorvel, intimamente ligada com o nascimento do ser humano a ungir-se pela fama. De
mais a mais, vingava uma noo de que a pessoa se desvelaria por meio das frases proferidas,
idia que manifesta duas concepes retricas: da palavra como gesto e ao; do talento
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Entre tais historiadores, destacaram-se os franceses, como Bodin, Louis le Roy, Lancelot-Voisin de la
Popelinire, Nicolas Verguer etc.
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e 1600 no se reduziu noo de uma histria exemplar, pois era ultrapassado pela histria
perfeita, integral ou acabada. Mesmo entre os que defendiam esse conceito, seguiu
vigorando a teoria providencialista crist, do agostinismo histrico, cuja mais relevante
expresso se daria por meio de Jacques-Bnigne Bossuet (1627-1704).
Seu trabalho Discours sur lhistorie universelle (1681) abriria flancos a um senso de
racionalidade histrica, pois tomava os acontecimentos particulares, verificados na histria
dos imprios, como integrantes de sistemas gerais. Para Bossuet, a interveno divina seria
rara e se viabilizaria por intermdio de causas secundrias. A oscilao do teocentrismo
Ratio moderna encontra suas imagens no livro sagrado e no saber livresco, duas formas
representativas do aparelho regulador do imaginrio, uma no sculo XVII e a outra, no que
lhe sucederia.
O romance Dom Quixote de La Mancha e a coletnea de epigramas Maximes (1664),
do escritor Franois de La Rochefoucauld (1613-1680), operam como excees a uma regra
quase geral. Ambos textos fugiram ao controle da imaginao, antes exercido pela igreja, mas
que passaria a domnio secular, tendo suas fontes no iluminismo francs. Em ambos
escritores, o termo comparativo a que visa o como se recebe uma certa concreo. Outra vez
assim se mostra uma caracterstica do fictcio, pela qual o mundo organizado no texto
transgredido em favor de atividades dele orientadoras. E tambm o imaginrio se transforma
na configurao concreta de atividades de representao (ISER, 1983, p. 405).
Contudo, a esttica marcada pelas contrariedades barrocas voltava-se contra si mesma:
o pensamento neoclssico imbuiu-se do racionalismo de Boileau, ao passo que a lngua
francesa e suas belles lettres dominariam a cena cultural do Ocidente. Constantes agonias pelo
unitrio atingiram a infinitude do espao e a incompreenso do silncio, conforme as
reflexes de Blaise Pascal (1632-1662). Uma sinfonia de angstias revelava-se como a grande
pea dos sculos barrocos, vidos por uma regncia que unisse o racionalismo sensibilidade
humana sobre o universo, maneira da orquestrao metafsica encaminhada pela filosofia
ontolgica de Nicolas Malebranche (1638-1715).
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No mesmo conjunto da Utopia, de More, e dA cidade do sol (1602) de Toms Campanella, pode ser includa
uma narrativa de Bacon: The New Atlantic (1616).
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e crtica: o engenho (faculdade para descobrir o que pode ser verossmil); a tpica (espcie
de arte que disciplina as invenes do engenho).
Para Vico, o mtodo cientfico resulta da compreenso humana, razo pela qual, as
verdades so verossmeis e muitas delas escapem demonstrao lgica, envolvendo-se por
mitos, fbulas, alegorias e vrias linguagens. Vinculado filologia, seu conceito de tempo
histrico guiava-se pela circularidade mtica. Sua obra Scienza Nuova tornava mais espessa
uma constelao de filsofos da histria cujo princpio de vigncia remonta, no mnimo, a
Maquiavel.
O conceito de filosofia da histria devido a Franois-Marie Arouet, o Voltaire
(1694-1778), mas pode retroceder ainda mais, encontrando Santo Agostinho, Herdoto e
alguns trechos bblicos do Primeiro Testamento. Neste caso, Waldir Cauvilla (2007) infere
que o seguinte fragmento estatuiria um sentido de permanncia, a ser levado em conta:
No h nada novo debaixo do sol, e ningum pode dizer Eis, aqui est uma coisa
nova, porque ela j existe nos sculos que passaram antes de ns. No h memria
das coisas antigas, mas tambm no haver memria das coisas que ho de suceder
depois de ns entre aqueles que vivero mais tarde (Livro do Eclesiastes, 1, 4,8-11).
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nome de esprito. A partir dos empiristas, o eixo da filosofia europia, ora concentrado na
Inglaterra, deslizava Frana e Alemanha.
A reflexo histrica de cunho filosfico ampliou-se com o enciclopedista CharlesLouis de Secondant, o baro de Montesquieu (1689-1755). As razes do iluminismo
espraiavam-se a diferentes universos, favorecendo a diversificao de teorias nostlgicas,
pedaggicas e utpicas. Na rea da histria, os crticos da segunda metade do sculo XVII
haviam recomendado o estudo das cartas para fins de prova, mas agora, a reorganizao das
leis e do direito passava a situar o documento em primeiro plano.
Registros mantidos por instituies setecentistas apontam ao declnio dos monumentos
e ao pleno ascenso dos documentos. A partir do sculo XVIII, a categoria biogrfica da
felicidade, existente nos antigos prodgios, se convertia em noo pessoal e privada. Junto
aos monumentos, s inscries e s esttuas, a biografia sinalizava ao desejo de memria das
personalidades histricas. As vidas exemplares dos homens ilustres, dos heris e dos
prncipes, concederam-lhes uma espcie de imortalidade literria e pedaggica para a
edificao dos sculos futuros (GUSDORF, p. 10, 1991).
Voltaire escreveu A histria de Charles XII da Sucia (1734); O Sculo de Lus XIV
(1752); Ensaio sobre a histria geral, os costumes e o esprito das naes desde Carlos
Magno at nossos dias (1756). O maluco e infeliz rei sueco era contraposto a seu glorioso
adversrio Pedro, o Grande. Se o bigrafo francs no enaltecia o herosmo, achava que as
grandes inteligncias permitiam reconhecer as surpresas da histria, esses acontecimentos
imprevisveis e to essenciais num campo onde necessariamente no acontece o que
verossmil (LORIGA, 1998, p. 229-230).
A prtica dos historiadores tocava nos frgeis limites da biografia:
Dos gregos do sculo V a. C. ao Dicionrio histrico e crtico de Bayle no final do
sculo XVII, passando pelos cumes de Suetnio, Plutarco, Eginardo, Joinville, pelos
vales das hagiografias medievais e pelas encostas cada vez mais escarpadas da
erudio nascente, com Bolland e Papebroch, o panorama mudou, mas conservaramse em grande medida os artifcios retricos, as preocupaes de louvor e o carter
literrio das construes, indicando quase sempre a ausncia ou, pelo menos, o lugar
secundrio ocupado pelo aspecto referencial da narrativa, que far a fortuna da
historiografia posterior, propriamente moderna (NEVES, 2002).
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A nova conjuntura requeria uma imagem de homem pblico, a ganhar vulto em seu
posto de cidado bem-sucedido. A criatividade dos narradores dirigiu-se ao relato biogrfico
de carter profissional, inserido na biobibliografia, no dicionrio histrico, no discurso
cerimonial e no elogio, formas que se autenticavam quando reconhecidas em existncias
concretas. Os avanos cientficos engrossavam as circunstncias que dariam centralidade ao
ser humano no conjunto dos eventos sociais (CARINO, p. 153-182, 1999).
Recm a cultura inglesa se tornava conhecida no mundo. As biografias conquistavam
o pblico-leitor; nem poderiam lembrar as mesmas narrativas que, durante o sculo XVII,
ficaram ilhadas no Reino Unido. Em tal circunstncia, distinguiram-se publicaes: do bispo
de Salisbury, Gilbert Burnet (1643-1715); de Izaak Walton (1593-1683), John Aubrey (16261697) e Margareth Cavendish (1624-1674).
O jurista ingls Roger North (16531734) produziria vultososo trabalho sobre trs dos
seus irmos. Editadas postumamente sob o ttulo The Lives of the Norths, as biografias
abarcam o primeiro ensaio crtico-terico sobre a narrativa biogrfica, definindo suas ligaes
com a histria e tornando patente seu ideal de objetividade. Alm de tudo, a obra se apresenta
sedutora, no formato de uma deleitvel narrativa (MADELNAT, 1983, p. 48).
No seria contempornea, pois, a ateno suscitada pelas biografias e gneros a ela
aproximados. Tampouco se revela indito um procedimento como este de Madelnat a
48
Ao estabelecer essa linha histrica, sobre a qual se haveria estendido a narrativa biogrfica, Madelnat procede
a um estudo aplicativo da teorizao de Thomas Kuhn (2003) acerca dos paradigmas na histria da cincia.
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reescrever Lejeune para definir biografia: narrativa em prosa, escrita e tambm oral,
efetivada por um narrador, com foco numa personalidade histrica, realando a vida desse
indivduo, bem como o prolongamento do seu carter ao longo da existncia (MADELNAT,
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1983, p. 18).
A ascenso do romance
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Entre as tradues mais recentes das Mil e uma noites, encontram-se os seis volumes traduzidos diretamente
do rabe pelo professor brasileiro Mamede Mustafa Jarouche (2006); o texto estabelecido por Ren Khawan,
que se baseou na retomada de verses dos sculos XVI e XVII (1986); uma adaptao de fontes alems para a
lngua francesa, por Armel Guerne (1966); a traduo ao espanhol, de Rafael Cansinos, publicada no Mxico.
Muitas edies ocidentais foram impregnadas do tom vitoriano, da infantilizao das histrias ou da
licenciosidade ertica. Para um histrico sobre outras tradues da coletnea, como a de Edward Lane, Enno
Littmann, Gustavo Weil, Joseph-Charles Mardrus e Richard Burton, ver: BORGES, 1953, p. 99-134.
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Referidos textos dialogam com narrativas de Sir Walter Raleigh e William Dampier, da mesma forma, com o
relato do corsrio ingls Woodes Rogers, intitulado A Cruising Voyage Round the World. Entre seus
intertextos franceses, encontram-se os trabalhos dos viajantes Esquemelin de Oexmelin, Jacques Mass e
Ravenau de Lussan. Cf. NUEZ, 1972, p. 100.
53
A mitologia em torno do Eldorado, lugar imaginrio, deve sua construo ao mito anterior do El-Dorado,
monarca feito douro e, assim tambm, os europeus passaram a supor que fossem as ruas, as casas e as cidades
dos reinos americanos. Cf. GALEANO, 1986, p. 158.
123
124
vigilncia exercida pelo poder e expem, por meio de vidas individuais caricaturadas, as
mazelas de toda a sociedade. (CARINO, p. 161, 1999).54
Descerrado pela efervescncia ficcional espanhola e inglesa, o perodo ureo da
esttica barroca terminava quase em simultneo morte do cientista francs Bernard Le
Bovier de Fontenelle (1657-1757). Defensor dos tempos modernos, ele afirmava que a prova
testemunhal de quem acredita numa coisa estabelecida no tem fora para apoi-la, mas o
testemunho dos incrdulos tem suficiente vigor para destru-la (FONTENELLE, 2005).
De tal forma, Colombo no inspirou nenhuma epopia na Espanha, nem deu nome
Amrica, batizando apenas uma parte do Novo Mundo. No entanto, sua primeira carta sobre a
terra lanou a idia do bom selvagem, a qual brotava particularmente nos escritos de
Rousseau. Na virada do sculo XVII para o XVIII, outras experincias de viagens e
conquistas tinham relatado as Amricas como diversas do contexto oriental, numa espcie de
rousseaunismo avant la lttre.
Como se sabe, o universo interior j era considerado em tempos antecedentes. A noo
de privacidade, todavia, ganhou fora entre os anos de 1600 e 1770, com o advento da
filosofia moderna. Movidos por fins reformadores, os livros e as bibliotecas, alm de
caracterizarem a intimidade como passatempo da vida privada, facilitando a aquisio de
conhecimentos, do prestgio leitura, como exemplariza A Tempestade, de Shakespeare
(GRAWUNDER, 1996, p. 79).
Localizado numa ilha distante, o cenrio shakespeareano dessa obra, datada de 1623,
firma seus intertextos com A Repblica de Plato e a Utopia de Thomas More. Por outro vis,
a cintilam os relatos de viagem, pois o texto referia-se a um acontecimento da conquista
platina, anteriormente, contado pelo navegador portugus Ferno de Magalhes (1480-1521).
A temtica e o nome dados personagem Miranda enraizavam-se no mundo histrico, mas a
arte renascentista a se dispunha como um passado a ser vencido pela filosofia empirista, da
mesma forma que a esttica barroca se fazia suceder pela Ratio moderna.
As crticas de artes e letras traziam cena, dentro da repblica dos sbios, o
confronto entre antigos e modernos, enformando a compreenso de tempo que geraria um
abismo entre passado e futuro (KOSELLECK, 1965, p. 20). Outra criatura do bardo ingls nA
tempestade, Caliban espelhou a metfora de um Outro que o prprio imprio desejaria
54
O romance enquanto prosa ficcional era apreciado pelos habitantes da Amrica Portuguesa desde meados do
sculo XVIII, precisamente, desde 1769. Cf. ABREU, 2003, p. 265-266.
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55
56
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A divina comdia
127
A ordem do discurso
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1788) revelaram-se fundamentais, principalmente, atravs das vrias fases na vida de Maom,
oferecidas por seu autor, Edward Gibbon (1737-1794). Foi com ele tambm que surgiu o
emprego moderno da palavra historiografia.
Lucien Febvre (1989, p. 282) afirma que, no sculo XV, sem referir-se a um cargo
especfico, Alain Chartier utilizou o termo historigrafo, no sentido de uma honrosa
distino. Significando escrita da histria, a historiografia, assim como a biografia, encerra
no prprio nome o paradoxo e quase o oximron do relacionamento de dois termos
antinmicos: o real e o discurso. Ela tem a tarefa de articul-los e, onde este lao no
pensvel, fazer como se os articulasse (CERTEAU, 2002, p. 11).
Gibbon articulou a clssica erudio com a histria filosfica no Ensaio sobre o
estudo da literatura (1761) e na referida obra Declnio e queda do Imprio Romano. O
historigrafo ingls sintetizou as correntes histricas que lhe antecederam, as quais no se
deixam resumir pela Historia Magistra Vitae. A exemplaridade nelas avultante resistiu at o
momento em que a luta entre o sbio pedante e o gentleman bem-educado acabou com a
vitria do erudito sobre o filsofo (LE GOFF, 2003, p. 85).
Iniciada nos medievos, slida no Renascimento, posta no coletivo pela erudio, a
crtica de arquivo foi em sntese uma procura de autenticidade. No sculo XIX, incrementavase a partir da universidade alem de Gttingen, quando historiadores eruditos constituram as
bases da documentao histrica, difundindo novos mtodos e seus resultados. Faziam isso
atravs de publicaes ou do ensino institucional, pesando sobre eles a fora do
historicismo.57
Em particular na Alemanha, a primeira fonte historicista revoltava-se contra o
iluminismo. Desse modo, Humboldt veiculara uma teoria das idias histricas, em resumido
trabalho cujo ttulo pode-se traduzir como O dever do historiador (1821). Suas idias no
so metafsicas, platnicas, so idias historicamente encarnadas num indivduo, num povo
(esprito do povo, Volkgeist), numa poca (esprito do tempo, Zeitgeist), mas permanecem
vagas (LE GOFF, 2003, p. 89).
No bojo da revolta anti-iluminsta, o entendimento histrico ao qual visava Georg
Wilhelm Hegel (1770-1831) pressups a dispensa das evidncias em favor de abordagens
57
O termo historicismo aqui utilizado no sentido da tradio histrica acadmica, desde Wilhelm von
Humboldt (1767-1835) e Leopold van Ranke (1795-1886) a Ernst Troeltsch (1865-1923) e Friedrich
Meinecke (1862-1954). Assinala-se por uma espcie de afetividade entre historiador e objeto, pela
canonizao da historiografia burguesa e a idia de um tempo cronolgico linear, homogneo e vazio. Cf.
BENJAMIN, 1994.
131
filosficas. Para fins didticos, a filosofia da histria teria iniciado com Herder, em Idias
para uma histria filosfica da humanidade (1784) e terminaria pouco depois da morte de
Hegel, uma vez publicadas suas Conferncias sobre a filosofia da histria (1837).58
Socilogos como Saint-Simon (1760-1825), Auguste Comte (1798-1857) e Herbert
Spencer (1820-1903) tomavam as estruturas scio-econmicas como foco central, integrando
a segunda fonte historicista que, de certa forma, dava continuidade s Luzes. O historicismo
assinalou as reflexes do sculo XIX, conseguindo finalmente triunfar devido teoria de
Darwin sobre o evolucionismo em The Origin of Species (1859). O conceito central desta
teoria o de desenvolvimento, muitas vezes tornado mais rigoroso pelo apoio do conceito de
progresso (LE GOFF, 2003, p. 88-89).
A cincia social marxista rejeitou a filosofia da histria, porm, os vnculos entre
questes filosficas e histricas eram imanentes ao materialismo histrico de Karl Marx
(1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895). Nos Anais franco-alemes de 1844, Marx
agradou-se do texto que a publicara Engels, intitulado Esboo para uma crtica da economia
poltica, e decidiu conhecer o autor, firmando com ele um verdadeiro pacto
de amizade, fraternidade, sobretudo, de radical colaborao terico-metodolgica na
construo dos referenciais da Concepo Materialista da Histria, bem como na
crtica sociedade do capital. A colaborao resulta em textos fundamentais ao
materialismo histrico, como A Sagrada Famlia e Manifesto do Partido Comunista,
alm das inmeras correspondncias redigidas. Contudo, o cerne da Concepo
Materialista da Histria estaria posto na obra que, segundo Marx [Para a crtica da
economia poltica, p. 53], pela impossibilidade de sua publicao, foi entregue
crtica roedora dos ratos, tanto mais a gosto quanto j havamos atingido o fim
principal: a compreenso de si mesmos. O manuscrito, crtica da filosofia pshegeliana e seu carter ideolgico, s viria a pblico em 1932, com o ttulo A
ideologia alem (DANTAS JNIOR, 2005, p. 136).
Cauvilla (20007) encontra uma filosofia da histria especulativa em Comte, Marx, Spengler e Toynbee. Essa
perspectiva receberia os seguintes tratamentos: metafsico (Hegel), emprico (Toynbee) e religioso (Niebuhr).
59
A tambm se incluem Nietzsche, Gabriel Marcel (1889-1973) e Martin Heidegger (1889-1976).
132
133
134
De acordo com Paul Valry (1997), a potica se revitalizou a partir de Edgar Allan
Poe (1809-1849). Uma nebulosa estabelecida em Frana traduzia as composies e
reciclava as idias desse escritor norte-americano, no sem antes debat-las e test-las. A
contar entre tais poetas, crticos, estetas e artistas, Charles Baudelaire (1821-1867)
responsabilizou-se por veicular a palavra Modernidade, num artigo a que intitulou Le peintre
de la vie moderne (1860-1863).
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Depois
de
1848,
uma
vez
apaziguados
temporariamente
os
movimentos
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fariam com que uma herdeira da retrica a estilstica engrossasse tal sistema de
conhecimento e tivesse grande voga entre os alemes e os espanhis.
A primeira guerra mundial dava incio Era dos extremos (HOBSBAWM, 1995) em
cuja ponta, ocorreria o ato inaugural da teoria da literatura,61 atribudo ao movimento
formalista russo. Em outro ponto, dilatava-se a produo criativa dos escritores ocidentais, em
meio a tensionamentos constantes entre a continuidade modernista e o antimodernismo
(LODGE, 1991, p. 3-16). Nem sempre apartadas pacificamente, essas tenses se inclinariam,
de forma respectiva: a) ao privilgio da linguagem sobre a representao, de que exemplo o
concretismo brasileiro; b) aos modelos mimticos, cujas expresses bastante conhecidas
encontram-se nos neo-realismos, no realismo socialista e no romance histrico.
A experincia imposta pela mimese veio gerando algumas dificuldades em teorizar
acerca de tal conceito. Nem os tratados de Aristteles lhe ofereceram tratamento explcito,
ainda que o estagirita se demonstrasse lcido ao formular, com nitidez, a razo do interesse
provocado pela mimesis trgica: o sentimento de alvio catrtico. A potica da modernidade
como que inverteu os fatores: a catarse desprezvel; o distanciamento, o desejvel (COSTA
LIMA, 1981, p. 232).
Os historiadores julgariam o gnero biogrfico inadequado, devido carncia de
articulaes lgicas e procedimentos analticos, entretanto, as biografias no eram banidas,
nem do universo dos escritores, nem dos leitores. Mesmo documentadas em textos, as vidas
ilustres podem classificar-se na linhagem clssica de transmisso da experincia comunitria.
E foi, justamente, o esgaramento dessa linhagem que sinalizou, para Walter Benjamin, a
acelerao das perdas e transformaes desencadeadoras da modernidade (CARDOSO,
2002, p. 112).
A teoria e a arte potica de Paul Valry ergueram a ponte que ligaria Edgar Allan Poe,
a moderna lrica francesa e Jorge Luis Borges. Nascido na era do capital, aquele poeta das
Variedades presenciou a Belle poque dos imprios e viria a falecer no breve sculo XX.
Da velha Europa ao Novo Mundo, a novidade apresentada pela esttica dos tempos modernos
reside na concepo de que os elos da literatura com o mundo, alm de percorrerem o
caminho do real ao imaginrio, andam igualmente pela trilha inversa.
61
Consideraes sobre a teoria da literatura so extradas de: CULLER, 1999; LODGE, 1988; REIS, 1997;
RICE; WAUGH, 1996.
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Erich Auerbach, a teoria da literatura se tornava robustecida com o ingresso, em suas fileiras,
das filosofias da existncia, destacadamente, do existencialismo de Jean-Paul Sartre. Em
1948, esse pensador indagava: O que a literatura? e, nas recordaes da segunda guerra
mundial, portanto, bem antes de Pierre Bourdieu, anunciara o extravio definitivo da iluso
biogrfica, a qual consistiria em acreditar que uma vida vivida possa assemelhar-se a uma
vida contada (QUINTILIANO, 2005, p. 279).
As linhas fenomenolgicas dos estudos literrios se difundiam, tanto quanto o New
Criticism americano. Seus pontos cardeais localizam-se nos Estados Unidos de 1948, com o
lanamento do livro escrito por Warren e Wellek Teoria da Literatura (1956) e na
Frana, com a traduo dos formalistas, a que procederia Tzvetan Todorov, em 1965. Roman
Jakobson apostou na textualidade, a qual se veria reforada na metade dos anos 50, com a
semitica, o estruturalismo francs e a semiologia.
Os empreendimentos do romanista Ernst Robert Curtius autor de Literatura
europia e Idade Mdia latina (1948) mais se inclinavam cincia da literatura. O fillogo
germnico no acreditava em tamanha mobilidade do literrio que, ao enfrentar as mudanas
da histria, correspondesse sua no-identidade com perodos atravessados por uma
constelao histrica diversa. Sem ter pretendido colaborar com a teoria da literatura, Curtius
lhe fornece entretanto um material de primeira ordem (COSTA LIMA, 1975, p. 24).
No percurso da literatura comparada, so de extrema valia as pesquisas dos formalistas
eslavos. Suas abordagens viriam somar-se efetivao de leituras contrastivas entre obras de
diferentes nacionalidades, prtica recorrente nos estudos literrios. O conjunto ganharia vigor
com a entrada dos conceitos bakhtinianos na Europa ocidental, sobretudo, a noo de uma
dinmica da incidncia ideolgico-social, responsvel pelo dilogo efetivo da obra literria
com as coordenadas histrico-sociais que a regem.
Cada um a sua maneira, o anglo-argentino Jorge Luis Borges e o norte-americano,
residente na Inglaterra T.S. Eliot haviam proposto maneiras diferenciadas de abordar a
tradio literria. Novas discusses nesses domnios alimentavam-se desde que Borges
publicara sua primeira coletnea de contos: Historia universal de la infmia (1935). Esse
mestre na montagem de jogos do real com a fico logo se tornaria famoso, ao levantar
problemas que seduziriam as investigaes da literatura em toda a extenso do sculo XX.
Autoria, duplicidade, intertexto, traduo e transculturalidade eram temas amplamente
discutidos pelo aclamado escritor. Em dois de seus ensaios, Kafka y sus precursores (1989,
140
p. 170-174) e Pierre Mnard, o autor do Quixote (1986, p. 29-38), Borges considera que
cada escritor cria seus antecessores, ou que nossas concepes de autoria, passado e futuro
so passveis de mudana. O autor dO informe de Brodie constri determinada imagem de
histria, ao elaborar uma narrativa que, de certo modo, descreve e explica, organizando os
tpicos do discurso de acordo com um quadro de referncias, estabelecendo conexes entre
autores e textos, de uma maneira especfica (JOBIM, 1992, p. 139).
Em artigo que igualmente desloca idias de influncia e subalternidade, Joo Carlos
Teixeira Gomes (1995, p. 71-93) pensa em literaturas emissoras e literaturas receptoras.
Sob tal perspectiva, Borges, os poetas concretistas brasileiros e o romancista Jorge Amado
inverteriam tradicionais relaes de dependncia. Suas obras definem expresses remetidas a
culturas que, anterior e equivocadamente, eram tomadas como matrizes das literaturas
argentina e brasileira. Gomes inclui, no rol das literaturas emissoras, a forma real
maravilhosa, assumida por grande parte das narrativas hispano-americanas.
Segundo declarava o franco-cubano Alejo Carpentier em 1949, no prlogo de seu
romance El reino de este mundo (1969, p. 7-14), o real maravilhoso liga-se ao fato de que o
mito no decorre somente da fantasia. Presente na realidade americana, tal caracterstica se
identificaria como um espao em anexo vida cotidiana. Por isso, temos de dar nome a
nossas coisas, a nossos homens, e projet-los nos acontecimentos universais para que o
cenrio americano deixe de ser uma coisa extica (CARPENTIER, 1984, p. 77).
A tal objetivo, visava uma grande parte dos ficcionistas latino-americanos durante as
dcadas de 40 e 50, dentre os quais, alm de Borges, avultam Bioy Casares e Julio Cortzar,
bem como um talo-cubano de nome Italo Calvino. A fecundidade desses narradores
encontrou amparo no incremento das polticas de cooperao entre as Amricas. Num
contexto beneficiado pelo avano dos meios de comunicao de massa, o irmo do norte
recebia significativa leva de imigrantes dos vizinhos pases latinos, ao mesmo tempo em que
lhes exportava uma nascente cultura de massas e o American Way of Life.
Do outro lado da guerra fria, o entusiasmo suscitado pela revoluo cubana de 1959
contribuiu tambm, com seus ideais emancipatrios, para difundir os bens simblicos das
Amricas. Explodia o Boom romanesco, portanto, sem nascer de uma partognese, como
poderia ter parecido a alguns dos mais desavisados Latin-Americanists. Destecendo as leituras
de Jorge Luis Borges, por exemplo, pblico e notrio que, nos ensaios de suas fices,
correm juntos, tanto Leibniz quanto Schopenhauer e suas filosofias.
141
No tempo dos homens partidos, Alejo Carpentier fez-se amigo do lder surrealista
Andr Breton, em cujo crculo, a leitura de Nietzsche apresentava-se como basilar. Assinalado
pelo surrealismo, Humphrey Jennings foi uma das mais importantes figuras da srie de aes
culturais e conjuntas, desencadeadas aps o choque da primeira grande guerra. Se tal
movimento deveria suscitar, na Gr-Bretanha, uma mobilizao pela restaurao cultural
nos crculos da intelectualidade conservadora, ele teve tambm o efeito de abrir o leque das
teorias e das prticas culturais nos setores crticos (MATTELART; NEVEU, 2004, p. 40).
A partir dos English Studies ensino de lngua inglesa classe operria e no bojo do
New Criticism, erguera-se o Materialismo Cultural. Sob a liderana de F.R. Leavis, os
intelectuais britnicos que o representaram veiculavam suas perspectivas na revista de crtica
literria Scrutinity, a circular entre os anos de 1932 e 1953. Eles confrontariam a Great
Tradition inglesa com a cultura de massas, detendo-se em sentidos histricos e sociolgicos
das culturas.
Desse Big Bang, irradiavam-se os Cultural Studies, cuja teoria e prtica viriam
desafiar os limites tradicionalmente definidos entre a cultura popular e a erudita. A
metodologia dos estudos literrios viu-se afetada pela biografia, pela estatstica, pela histria
oral e pelos recursos audiovisuais. De tal forma, e na tentativa de compreender uma expresso
cultural de importante recepo pelo grande pblico, retifico afirmaes correntes de que o
gnero biogrfico era preterido pelo materialismo histrico na primeira metade do sculo XX.
Para tanto, convoco a marxista Rosa Luxemburgo no livro de Paul Frlich (1976).
Alm dessa narrativa, podem ser listadas: a obra de David Riazanov (1973) sobre os trabalhos
e as vidas de Karl Marx e Friedrich Engels, assim como a biografia de Marx escrita por Franz
Mehring (1973). Essa pequena mostra confirma que as biografias recuperavam prestgio,
instituindo seu paradigma (ex)contemporneo, desde Times Square a So Petersburgo.
142
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Um acelerado incremento dos mass media parecia ressuscitar, dentre os mortos, aquela
batalha demasiado antiga entre Altheia e Dxa. Suas fices, como outras, seguem os
parmetros de distanciamento do real. Na teoria de Iser, os espaos vazios, a serem
complementados pelo leitor, permitem a comunicao, quer literria, quer no, explicando-se
assim a relao entre o novo e a repetio. claro que esta relao no ocorre linearmente,
mas sim atravs de regresses e progresses sucessivas, sem se fechar numa harmonia com
qualquer tipo de identidade (LOBO, 1992, p. 240).
Uma vez que o pretrito no se deixa apreender, mister no distinguir entre seus
traos teis ou inteis. Guidas pelo princpio construtivo, as narraes de experincias
comuns geram outras narrativas, abertas e fragmentrias, nas quais a rememorao pode
desencantar futuros e captar o tempo de agora. A partir dos erros lidos ao avesso, o porvir
prometido desde a ao presente; tambm o projeta, ao refletir sobre os instrumentos que
viabilizam atos e atitudes do dia-a-dia:
as anotaes que fao durante a leitura so mantidas na memria vicria do meu
computador. Tal como o estudioso renascentista que podia perambular vontade
pelas cmaras de seu palcio da memria para recuperar uma citao ou um nome,
eu entro cegamente no labirinto eletrnico que zumbe atrs do monitor. Auxiliado
pela memria dele, posso lembrar mais exatamente (se a exatido importante) e
mais copiosamente (se a quantidade parece valiosa) do que meus ilustres
antepassados, mas ainda preciso ser aquele que encontra uma ordem nas notas e tira
concluses. Trabalho tambm com medo de perder um texto memorizado
medo que para meus ancestrais s vinha com as dilapidaes da idade, mas que para
mim est sempre presente: medo de uma falta de energia, de tocar na tecla errada, de
falha no sistema, de vrus, de um disco defeituoso, coisas que podem apagar tudo na
minha memria, e para sempre (MANGUEL, 1997, p. 80).
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Mal de arquivo
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A escrita da histria
Acontecia uma histrica mudana, classificada por Franois Furet (1986, p. 81-98)
como passagem da histria-narrativa histria-problema.63 O trnsito define-se pela
inveno das fontes, bem como pela ruptura com a narrativa e o evento singular, de modo a
enfrentar a histria acontecimental, evenemencial, ou historizante. A stima linha da
cincia histrica, iniciando a partir dos anos 1930, conhece ao mesmo tempo uma crise e
uma moda da histria, uma renovao e um alargamento considervel do territrio do
historiador, uma revoluo documental (LE GOFF, 2003, p. 112).
Historiadores envolviam-se em caloros debates, por exemplo, com a sociologia geral
de Franois Simiand ou a com psicanlise freudiana. Os psicanalistas teriam sido pioneiros
O primeiro livro escrito em conjunto por Marx e Engels A ideologia alem no d nenhum fundamento a
qualquer concepo idealista da histria. A produo da vida, feita por aes concretas, essa sim,
considerada um fenmeno histrico. Cf. DANTAS JNIOR, 2005.
63
A tese de George Lefebvre, Paysans du Nord de la France pendant la Rvolution (1924) contribuiu
sobremaneira referida mudana. Cf. CERTEAU, 2002, p. 111.
62
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entre os anos de 1950 e 60, quando a observao dos movimentos coletivos sobrepujasse as
aes estudadas atravs da tica de uma personalidade.
O afastamento da narrativa se transformava num dos algozes da biografia:
coube aos Annales as mais poderosas crticas ao mtodo. E, embora Febvre e
Braudel tivessem tomado figuras histricas como marcos referenciais de suas obras,
o fizeram no sentido de situar tais vidas no correr da longa durao: Rabelais, Lutero
e Felipe II estariam, assim, inelutavelmente submetidos s foras profundas da
histria (MOTTA, p. 105, 2000).
histria
experimentaria
uma
virada
epistemolgica,
retornando
ao
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Seus componentes so as proximidades temporal e material do tema e do fato narrado. A expansividade dos
media crucial mtua implicao do historiador e do jornalista. Cf. LACOUTURE, 2001, p. 215-240.
A micro-histria nasceu na Itlia, ressaltando o intercmbio com as cincias sociais, a reduo das escalas
observveis e o estudo intensivo dos documentos. Cf. LEVI, 1992, p. 133-162.
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tais contraposies deram acesso, entre outras coisas, ao re-debate da mimese. No presente
momento da tese, interessa-me a reviso desse conceito, no mbito das reflexes de Luiz
Costa Lima (1988). Da sublinhar o complexo identificatrio por ele detectado em Nietzsche,
Heidegger, Derrida, Gilles Deleuze, Lyotard e Borges (COSTA LIMA, 1980, p. 229-258).
As presenas de Husserl e Heidegger impunham-se aos estudos literrios. Reflexes
de tais filsofos confluam dos crculos fenomenolgicos e da potica gerativa de Noam
Chomsky escola de Zurich, representada por Emil Staiger, e crtica ontolgicohermenutica, defendida no Brasil por Eduardo Portela. A potica desviava-se categoria do
potico, noo que, sem se confinar especificidade da Literatura, assimila as instncias do
literrio e do existencial (SOUZA, 1987, p. 52).
A teoria literria haveria de marcar suas diferenas em relao teoria da literatura,
pois essa ltima constitui um brao da literatura geral e do comparatismo. Um terico da
literatura reflete sobre as condies da literatura em si, da crtica literria e da histria
literria, assumindo papel de crtico da crtica, ou seja, de metacrtico. Por sua vez, o terico
literrio demonstra carter de maior opositividade, identificando-se mais com a crtica
ideologia, dentro dessa, teoria da literatura.
Em tais marcos, a teoria literria era colocada em prtica desde os formalistas russos:
passa a existir quando a abordagem dos textos literrios no mais fundada em
consideraes no lingsticas, consideraes, por exemplo, histricas ou estticas;
quando o objeto da discusso no mais o sentido ou o valor, mas modalidades de
produo de sentido ou de valor. Essas duas descries da teoria literria (crtica da
ideologia, anlise lingstica), se fortalecem mutuamente, pois a crtica da ideologia
uma denncia da iluso lingstica (da idia de que a lngua e a literatura so
evidentes em si mesmas): a teoria literria expe o cdigo e a conveno ali onde a
teoria postulava a natureza (COMPAGNON, 2006, p. 24).
151
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A teoria de Jauss caracteriza-se por uma refutao aos mtodos tradicionais da historiografia literria, particularmente,
no que tangem narrao amarrada, e cronologicamente alinhada, de acontecimentos artsticos aos fatos de uma poca
ou sociedade. Compreendendo a obra literria em sua histria mesma, como se fosse um organismo vivo, em dilogo
permanente com as diversas sociedades. Conforme o terico, ainda que o texto seja uno, transforma-se em outro, ao
responder diferentes questes, provocadas por leitores os mais variados. Cf. ZILBERMAN, 1989.
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Histria e memria
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A vida literria faz-se atravs de mecanismos extra-oficiais: contatos entre produtores, editores, meios de
circulao e receptores; no se sustenta apenas no texto, muito menos em sua qualidade intrnseca ou
imanente. Consiste naquelas atividades feitas na vida em si, na rua, nos bares, nas academias, nos grupos, nas
instituies etc. Para ilustrar, j entre os sculos XIX e XX, se o Estado no se responsabiliza pela
alfabetizao do pblico, nem preserva os interesses do pas no mercado nacional, a nomeao de escritores
para cargos pblicos consistia, de um lado, na confisso de sua impotncia institucional; de outro, na tentativa
de remendar a impotncia de forma canhestra, mutilando simultaneamente a instituio literria, por no
reconhec-la enquanto tal, e o servio pblico, no qual postulava a existncia do cio necessrio criao
(LAJOLO; ZILBERMAN, 2003, p. 71).
Siegfried Schmidt pensa que modelos diferentes de histrias literrias devem levar em conta outros sistemas
sociais, imbricados ao tipo de representao que neles se deseja imprimir. Cmbios nas estruturas e funes
do sistema literrio precisam ser descritos como processos de mltiplas faces, redes complexas entre sistemas,
no podendo elidir os papis do sujeito nos sistemas literrios modernos, os quais, assim, se revelam como
rea de grande interesse aos estudos da biografia. Cf. SCHMIDT, 1996, p. 101-131.
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Especialmente aps a guerra em frica e a redemocratizao dos pases sulamericanos, elites intelectuais e organizaes populares empenharam-se em redefinir suas
atuaes, inspirando-se nas medidas adotadas pelos culturalistas de Birmingham. Vrias
culturas passavam a exigir seus direitos autonomia, sem predominncias ou assimilaes
que destruam suas especificidades, e se postula uma convivncia fraterna entre as diferenas
sociais, com respeito mtuo e essa a sua melhor faceta, pois significa uma recusa
homogeneizao proveniente da hiper-administrao (BORDINI, p. 13, 2006).
Iuri Lotman (1995, p. 26) trata dos cdigos semiticos que, semelhana do que
ocorreu entre os povos africanos e latino-americanos, fazem a pessoa sem biografia criar
determinado texto sobre uma pessoa com biografia. O torico d relevo para duas grandes
narrativas biogrficas, a de Tolsti e a de Dostoivski, biografias sem as quais se tornaria
157
impensvel uma percepo da obra dessses escritores e da cultura do sculo XIX em geral.
Por outro vis, Ernst Curtius projetara o texto literrio sob a forma dum jogo, constitudo por
topoi (peas temticas) que podem ser enumeradas ad infinitum.
Ainda que eurocntrica, a noo de linguagem comum, pressuposta em Curtius, viria
juntar-se ao pensamento de Costa Lima (1981, p. 233):
Se esta concluso parecer plausvel, sua primeira conseqncia prtica ser o no
privilgio, pelo analista, de alguma propriedade esttica, substitudo pelo estudo de
como, em um perodo histrico demarcado, se atualiza a idia de mimesis em
relao com as formas vigentes de representao social. Assim seria menor o risco
das normatividades estticas, sempre abusivas, bem como menor a vigncia do
purismo absentesta, i. e., a inclinao de abordar a arte por si mesma, fora da
adequao com o seu contexto: quer o original, quer aquele a que ela se propagou.
ao
singular.
Tais
posturas
encontravam
paralelo
nos
correntes
158
159
160
161
O conceito de ps-modernismo se fixa quando as marcas da arte e da literatura altomodernas, quer dizer, do entre-sculos XIX-XX, so confrontadas aos traos artsticoliterrios que assinalam as dcadas finais do sculo XX. O termo ps-moderno j fora usado,
no continente americano, por socilogos e crticos. Designa o estado da cultura aps as
transformaes que afetaram as regras dos jogos da cincia, da literatura e das artes a partir do
final do sculo XIX (LYOTARD, 2002, p. XV).
A ps-modernidade pode retroceder at os anos de 1960, evidenciando-se atravs dos
movimentos de contracultura e da contestao racionalidade humanista-liberal. No entanto,
em 1948, Max Planck afirmava que para que uma nova verdade cientfica fosse
aceite, o melhor seria esperar que morressem os seus opositores e punha desta forma
em causa a prpria racionalidade da cincia. Mas seria Thomas Kuhn com a
Estrutura das Revolues Cientficas (1962) a provocar uma profunda viragem na
forma de pensar a cincia. Ao defender que ela no cumulativa, que evolui por
roturas e por mudanas de paradigmas incomensurveis entre si, ele introduziu o
relativismo no cerne da atividade cientfica e pode por isso mesmo considerar-se
como um ps-moderno avant la lettre. Foi s em 1979 que Jean-Franois Lyotard
publicou La Condition Postmoderne (VELOSO, 2006).
Trabalhos como O fim da histria e o ltimo homem, no qual Francis Fukuyama louva
o progresso das democracias neoliberais, obtm respostas negativas alegao de que o psmodernismo e a ps-modernidade sejam anistricos. O prprio filsofo nipo-estadunidense
(1999) reconhece que o triunfo do mercado no sela os momentos agonizantes da histria.
Transformaes biolgicas, ocasionadas por novssimas descobertas cientficas, antes poriam
termo s cincias naturais, gerando o desaparecimento da humanidade.
No conjunto dos estudos culturalistas, ps-coloniais e mesmo ps-modernistas,
multiplicam-se as contestaes poltica global do capitalismo tardio:
Evidentemente, necessrio convir quanto a isto: se no h mais homens, a
democracia corre o risco de se esvaziar. Para evitar semelhante perigo, bastaria,
segundo Fukuyama, que os pases regulassem politicamente o desenvolvimento e a
utilizao da tcnica. Piedosa inteno que no come po e que lhe permite manterse em silncio a respeito do essencial: o mercado que mantm o desenvolvimento
162
infindvel das tecnocincias, as quais, no reguladas, conduzem diretamente para
uma sada fora da humanidade (DUFOUR, 2005).
Para tanto, cita a p. 56 da obra Le plaidoyer pour lhistoire, de Bloch: Que entendemos por documentos,
seno um rastro, ou seja, a marca perceptvel aos sentidos que deixou um fenmeno em si mesmo impossvel
de captar? (RICOEUR, 1994, p. 215).
163
164
Paul Feyerabend (1989) afirma que o desenvolvimento da cincia d-se apenas na luta
contra o poder e no quando se instauram os momentos positivos, conforme deseja Thomas
Kuhn. Segundo Imre Lakatos e Alan Mursgrave (1979), o conhecimento cientfico atingido
por meio de programas investigativos que rivalizam entre si. Mesmo ao atuarem
simultaneamente, pode ser que determinado programa, mentado at como invivel, se eleve
hegemonia ou emergncia e que, do contrrio, programas solidamente hegemnicos ou com
grandes chances de emergncia, apaguem-se do campo do saber.
Ao discorrer sobre Dante Alighieri, Erich Auerbach j sugere, por vias indiretas,
desconfiar de uma durao extremamente longa quanto do paradigma clssico das
biografias. Conforme o erudito germnico: Hesitamos em empregar a to abusada palavra
clssica porque o estilo novo e medido, hostil a qualquer extravagncia formal, incorpora
um elemento de inquietao e veemncia que no se coaduna com a arte e poesia da
Antigidade greco-romana (AUERBACH 1997a, p. 89).
Sobre o classicismo francs do final da 17 centria a meados da 18, assim esclarece
Auerbach (1971, p. 343-344):
A separao clssico-francesa dos estilos muito mais do que mera imitao da
Antiguidade no sentido dos humanistas do sculo XVI; o modelo antigo
intensificado, e h uma quebra violenta com a tradio popular milenar, crist e
misturadora de estilos; a exacerbao da personagem trgica (ma gloire) e o culto
das paixes, levado ao extremo, precisamente anticristo.
165
O termo clssico exige o retorno de Calvino (1993) para quem uma obra clssica a
que suscita releituras e mantm as impresses de uma descoberta, ao indicar visadas
precedentes e os traos por ela mesma impressos cultura. Os clssicos ainda provocam
demandas pelo texto original e, quando enfim lidos, mais ainda se revelam inditos, devendo
ter a medida do universo, como o Aleph de Borges. Um clssico dispe a novidade maneira
duma cortina musical, mas sem prescindir desse barulho de fundo. clssico aquilo que
persiste com rumor mesmo onde predomina a atualidade mais incompatvel (p. 14-15).
Obras clssicas no podem ser indiferentes, pois necessitam operar como parmetros,
por confronto e coincidncia. Todavia, os regulamentos do cnone literrio brasileiro tomam
configurao difusa, pois a literatura se debate em busca de manifestao autnoma e cada
obra escrita e publicada no Brasil tem dificuldade em alcanar o status de clssico. Logo,
apresentam pouca visibilidade, seguidamente substitudos por exemplos de fora
(ZILBERMAN, p. 4, 2001).
Em vrios estudos e publicaes nacionais, o conjunto ao qual venho chamando de
espao biogrfico geralmente rotulado como literatura ntima, literatura intimista, literatura
confessional, gnero autobiogrfico e gnero biogrfico. Os termos so aplicados
indistintamente para dar nome a todo grupo de escritas que abarque narrativas nas quais o
tema central se volte ao sujeito do enunciado. Nelas, a personagem da narrativa enfrenta
reconstrues operadas pela linguagem para equivaler ao ser real, mas acaba por resultar
numa outra criatura: no mais o sujeito emprico, nem ficcional em totalidade.
As expresses que se acompanham da palavra literatura revelam-se inadequadas, pois
o conjunto discursivo em questo remonta Grcia antiga. Ademais, o termo apenas passou a
vigorar no Ocidente a partir do sculo XVIII. At cerca de 1650 a literatura francesa
ignorava a escritura porque enquanto a lngua hesite quanto sua prpria estrutura, uma moral
da linguagem impossvel; a escritura s aparece no momento em que a lngua, constituda
nacionalmente, torna-se uma espcie de negatividade (BARTHES, 1990, p. 158).
Terry Eagleton, ao dissociar a literatura da noo de uma entidade estvel, mira s
concepes que vingam depois dos anos de 1700. No campo literrio, inclui alguns tipos de
fico e outras notaes, inclusive no ficcionais, e tambm metaficcionais, entretanto, muita
retrica elaborada no literatura. A literatura, no sentido de uma coleo de obras e valor
real e inaltervel, distinguida por certas propriedades comuns, no existe (EAGLETON,
1983, p. 11-12).
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167
168
ficcional, estampados no paratexto das obras literrias, ou por intermdio de outras marcas.
Importante ver como ambos os pactos, autobiogrfico ou romanesco, coadunam-se tanto a
Jauss quanto a Iser, no momento em que os tericos da recepo consideram previamente
fadadas ao fracasso as poticas que buscam definir a literalidade pela especificao de sua
configurao discursiva e [eles] vem a literatura como produto de dupla ao a do poeta e a
do receptor ou do efeito nele causado (COSTA LIMA, 1981, p. 227).
A literatura biogrfica j possui uma constelao terica, a formar os rudimentos de
uma potica, neste caso, entendida como a literatura existente sobre determinado tema e que
pode ser reunida coerentemente, sendo tambm dotada de historicidade. A modo de exemplo,
bastaria reunir as consideraes de Elizabeth Bruss (1991), Mikhail Bakhtin (1990, 1992) e a
teorizao hors-concours de Philippe Lejeune, conforme a qual, biografia e autobiografia, em
particular, se opem atravs de uma
hierarquizao das relaes de semelhana e de identidade: na biografia, a
semelhana deve sustentar a identidade, enquanto na autobiografia a identidade
sustenta a semelhana. A identidade o ponto de partida real da autobiografia; a
semelhana, o horizonte impossvel da biografia. A diferente funo que cumpre a
semelhana nos dois sistemas explica-se por essa razo (LEJEUNE, p. 58, 1991).
169
mecanismos da vida literria ou s engrenagens do sistema literrio, em suas interrelaes com o mundo da cultura.
Muitas expresses atuais do gnero biogrfico suscitam dilogos, ficcionalizaes,
intertextualidades, teorizaes. No mbito das articulaes narratolgicas, os estudos de
Lejeune mostram-se de grande valia, principalmente, por haverem observado como o gnero
autobiogrfico e seus vizinhos movimentam-se na direo do receptor, argumento com o qual
concorda o terico brasileiro Costa Lima (1991, p. 231) quando se refere mimese: a
semelhana, portanto, entre a representao mimtica e as representaes do leitor que
presidem a sua identificao.
Iser e Jauss acentuam que os estudos do literrio devem confrontar duas variveis: as
expectativas sociais aquilo que se considera mimtico, potico ou ficcional e o
esquema75 contido pela prpria obra. De acordo com o primeiro terico, a marca da fico
no designa nem mais a fico, mas sim o contrato entre autor e leitor, cuja
regulamentao o texto comprova no como discurso, mas sim como discurso
encenado. Deste modo, por exemplo, os gneros literrios se apresentam como
regulamentaes efetivas de largo prazo, que permitem uma multiplicidade de
variaes histricas nas condies contratuais vigentes entre autor e pblico.
Contudo, mesmo designaes de curto prazo, especficas a certas situaes, como a
de romance no ficcional, funcionam do mesmo modo, porquanto a conveno a
afirmada justamente por seu desmentido (ISER, 1983, p. 397).
Por isso, a partir das inferncias de Lejeune, proponho um termo que ele no utiliza,76
mas deixa implcito: pacto biogrfico, o qual ocorre ao nvel de uma conexo entre
narrador, autor, personagem e modelo extratextual, similarmente ao desenvolvimento do
pacto autobiogrfico: a) o emprego de ttulos e/ou subttulos (Biografia; O caso, Histria de;
Vida de etc.); b) a seo inicial do texto, na qual o narrador se compromete a escrever sobre
um sujeito que j no mais o emprico, mas tambm no ficcional; c) o nome dado
personagem na narrao, devendo coincidir com o nome do modelo, o que leva,
necessariamente, ou ao nome, ou aos indicadores pelos quais era conhecido o ser real, em sua
existncia pblica ou privada.
Atento aos rumores dessa memria, tento reencontrar os contextos como partes
integrantes do prprio texto, maneira instigada por Umberto Eco (1991). A ttica no
concebe o simples uso de uma obra com vistas ao entendimento da moldura; de outro modo,
75
76
O esquema opera como um filtro que habilitaria o receptor a juntar e a processar os dados oriundos da
percepo. Cf. ISER, 1996a, p. 50-55.
O prprio Lejeune reconhece que no resolve satisfatoriamente algumas questes, como os graus de
identidade, o estilo, o contedo do texto (uma narrativa biogrfica, a recapitulao de uma vida) e as tcnicas
narrativas (a exemplo da focalizao). Ver: LEJEUNE, 1983;1980; 1986; 1989; 1998; 2003.
170
As conferncias esto publicadas em Lezioni americane: Sei proposte per il prossimo millennio (No Brasil,
Seis propostas para o prximo milnio: lies americanas). Essa obra pstuma teve seus captulos
organizados de acordo com os ttulos das palestras: Leveza, Rapidez, Exatido, Visibilidade e
Multiplicidade. Quando faleceu Calvino, em 1985, a sexta comunicao j estava definida, embora no
fosse escrita, e seria intitulada Consistncia.
171
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Se o inferno antes residiu na escrita e o Jardim do den, no Verbo, a pena colonizadora veio
traar o semi-grafo continente americano, nele distinguindo um paraso a ser conquistado.
173
ndios
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sob essa tica que so apresentados e representados a feminista Flora Tristn e seu
neto, o pintor Paul Gauguin, na obra literria de Mario Vargas Llosa,78 lanada em 2003, e
que se intitula O paraso na outra esquina.79 Mesmo nominadas, em correspondncia aos
seres de real existncia que as originam, as personagens em destaque j seguem lgica da
fico, ao adentrarem no texto ficcional, norteando-se, pois, por uma questo de estatuto. No
se trata, portanto, de checar os acontecimentos narrados com aqueles cujos eventuais
documentos possam atestar sua ocorrncia real, mas de examinar qual modo de leitura
proposto pelo autor e pelos editores.
A obra em questo pode ser considerada ficcional, em primeiro lugar, porque seu
paratexto assim nos indica, conforme a ficha catalogrfica romance peruano (p. 04) e a
epgrafe de Paul Valry Que seria, pois, de ns, sem a ajuda do que no existe? (p. 07).
O afastamento da mera reproduo dos fatos e sujeitos histricos j comea a ser definido nas
abas do livro, onde Wladir Dupont afirma que estamos diante de um romance. Esse tradutor
da destacada criao do escritor peruano para a lngua portuguesa informa que embora
tambm baseado em fatos comprovados, apresentado de forma mais vagarosa, reflexiva,
permeado de vos mais literrios.
Localizado o pacto romanesco, por meio dos expedientes antes identificados, a
economia da narrativa permite inferir, apesar das volumosas descries espaciais, que a
ocorre um visvel predomnio do interno sobre o externo, conforme atestam vrias incurses
ao ntimo dos protagonistas. Tal veiculao se d por meio de uma mistura de discurso
indireto livre com discurso dirigido ao modelo, esse, em segunda pessoa, caracterstico de
biografias laudatrias. A mescla discursiva paralela intercalao dos captulos (um
centrado em Flora, outro em Paul), bem como utilizao combinada de tais nomes e dos
apelidos dos protagonistas (Andaluza/Madame-la-Colre e Koke), denotando um jogo do
narrador entre distanciamento e aproximao s personagens.
A instncia narrativa, desse modo, descreve com propriedade: os mal-estares de Flora,
suas dores de estmago e tero; a repugnncia perante o sexo com o marido; as paixes por
78
Jorge Mario Pedro Vargas Llosa nasceu em Arequipa (1936). Estreante na literatura, consagrou-se com o
prmio Leopoldo Arias pelo livro de contos Los jefes (1959). Publicou as seguintes narrativas: La ciudad y los
perros (1963); La casa verde (1966); Conversacin en La Catedral (1969); Pantalen y las visitadoras
(1973), La ta Julia y el escribidor (1977); La guerra del fin del mundo (1981); Historia de Mayta (1984);
Quin mat a Palomino Molero? (1986); El hablador (1987); Elogio de la madrastra (1988); Lituma en los
Andes (1993); Los cuadernos de don Rigoberto (1997); La fiesta del Chivo (2000); El paraso en la otra
esquina (2003); Travesuras de la nia mala (2006).
79
VARGAS LLOSA, 2003b. Todas as citaes sero extradas dessa edio, acompanhadas apenas da indicao
do nmero das respectivas pginas.
176
Olympia Maleszewska e Elonore Blanc; os galanteios e assdios, por parte de vrios homens
com os quais no concretiza relaes sentimentais; sua comoo diante das nfimas condies
de trabalho dos operrios com quem mantm contato, em peregrinaes diaspricas. O
despertar da conscincia da protagonista, que a leva a agir, conscientizando os trabalhadores
face s injustias sociais, acontece na viagem a Arequipa (Peru), quando seu navio aporta em
Cabo Verde, onde se depara com as atrocidades da escravido.
Nas partes do romance que dizem respeito a Gauguin, so freqentes as descries
minuciosas de suas experincias sexuais, seu processo criativo e reflexes sobre o fazer
artstico, assim como sua emoo frente morte da filha, Aline Gauguin. O sofrimento da
me do artista, Aline Chazal, que chegou a ser abusada sexualmente pelo pai, alia-se a outros
indicadores da relevncia dada ao fator interno do protagonista: seu casamento com a
dinamarquesa Mette Gad; a paixo pela bret Madeleine Bernard; as desavenas com Vincent
Van Gogh; os envolvimentos amorosos com a javanesa Anah e outras nativas da Polinsia:
Titi Peitinhos, Pauura, Tehaamana e Vaeoho; o calvrio perante as transformaes
ocasionadas pela sfilis, contrada no Panam em 1887.
Tanto em relao narrativa de Gauguin quanto de Flora, no verificada a
construo das personagens como tipos, nem de subjetividades unificadas, pois se desvelam
em suas complexidades individuais. Para escapar pobreza, vivida aps 1807, ano da
prematura morte do pai, a bastarda Florita vai trabalhar na oficina de gravura e litogravura do
mestre Andr Chazal em 1819. O casamento com o patro resulta em trs filhos
Alexandre, Ernest-Camille e Aline e numa srie de maus tratos, que a levam ao campo em
1825, alegando necessidade de recuperao do primognito, o qual morrer em 1831. Apesar
de agredir a mulher, Chazal sempre vence processos contra ela e pela guarda dos filhos.
Visando a fugir do esposo e da justia, a protagonista embrenha-se pelo interior da
Frana em 1832. Durante o calvrio em que sua vida se transforma, visita o primo, Dom
Mariano de Goyeneche, na cidade de Bordeaux. Na casa dele, refugia-se por quase um ano,
aps deixar Aline sob os cuidados de uma senhora que se apieda de sua histria. Ficando com
o pai, Ernest-Camille falecer posteriormente. Dom Mariano providencia a viagem da prima a
Arequipa. Ela tem por objetivo convencer Dom Pio Tristn a reconhec-la como filha
legtima do irmo desse poderoso peruano. Planeja, com isso, aferir renda que proporcione
conforto material e espiritual a si mesma e a seus dois filhos, longe do desequilibrado marido.
Frustrada essa expectativa, a Andaluza retorna a seu pas em 1835.
177
178
forma que a falta de indicativos das fontes histricas no estabelece a configurao de uma
biografia, no caso estrito.
O gnero biogrfico rege-se pela semelhana, devendo definir a que campos do real
aponta. Inicialmente, o livro merecedor de averiguao sob o prisma dos estudos culturais
por se aproximar a uma notao que no forma o conjunto da alta cultura e recebida com
xito pelo pblico, assim como alcana ampla difuso pelos meios mediticos. Por outro lado,
sua proximidade e concomitante no enquadramento ao romance histrico ou
metafico biogrfica ps-moderna faz com que transite pelos entrelugares to caros ao psestruturalismo.
Os estudos ps-estruturalistas, via Althusser, constituem-se numa das mais
significativas importaes tericas realizadas pelos Cultural Studies britnicos. Trazida em
suas reflexes, a posio relativa de local-limite, ocupada pela narrativa, em funo de sua
impureza, notada nesta passagem: nem francs nem europeu, Paco. Embora minha
aparncia diga o contrrio, sou um tatuado, um canibal, um desses negros l do Taiti (p.
131).
A representao da Amrica Latina, outrora colonizada, bem como a resposta s
narrativas-mestras europias, provinda do escritor cujo bero uma ex-colnia, habilitam o
artefato de Vargas Llosa a certa perspectiva ps-colonialista. Isso fica evidente na viso de que
a arte deve abrir-se ao mundo, misturar-se s demais culturas, arejar-se com outros ventos,
outras paisagens, outros valores, outras raas, outras crenas, outras formas de vida e de moral
(p. 446). Da mesma forma, o entrecruzamento das vidas dos protagonistas opera como exerccio
de literatura comparada, ao justapor: personagens masculino e feminina; dois perodos distintos
(meados e fim do sculo XIX); diferentes sociedades (Frana, Peru, Inglaterra, Taiti e ilhas
Marquesas); os escritos autobiogrficos de Flora e a obra pictrica de Gauguin.
Os indcios ps-modernistas, ps-estruturalistas, ps-coloniais e comparatistas, aqui
no se aprimoram em virtude do enfoque culturalista. Todavia, ratificam as mencionadas
zonas de correspondncia entre tais formulaes crticas, as aes prticas dos estudos
culturais e as obras ficcionais rotuladas como ps-modernas, na falta ainda de outro nome.
Uma vez que o romancista peruano doutor em Filosofia e Letras80 e tambm exerce
80
Graduado em Literatura pela Universidad Nacional Mayor de San Marcos (Lima, 1958), no ano seguinte, o
escritor recebeu bolsa de estudos para cursar doutorado em Filosofia e Letras na Universidad Complutense de
Madrid. Defendeu a tese de doutoramento em 1971. Cf. MARIO VARGAS LLOSA, 2006.
179
atividades de crtico,81 parece transformar em prtica literria seus conhecimentos das teorias
mais proeminentes do sculo XX.
O texto de Vargas Llosa, de tal forma, se abre a todas essas possveis leituras e coloca
em ao a transdisciplinaridade que baliza os estudos culturais na dcada de 1970, a partir do
reconhecimento dos limites dos estudiosos em relao a reas afins, como a economia, a
histria e a sociologia. O autor em destaque vem a inserir, no plano de seu romance, os trs
mais importantes sinais que o culturalismo desenvolve at os anos de 1980: o carter
transdisciplinar; a renovao dos objetos e dos problemas da cultura; a combinao entre
pesquisa e engajamento.82
A recusa das hierarquias acadmicas no passa apenas por aquela espcie de pardia
da biografia, mas igualmente pela divulgao de textos populares e no-cannicos,
aproveitados pela narrativa ficcional lloseana. No que se refere construo de Flora,
destacam-se os opsculos escritos pelo ser histrico que inspira essa personagem: A unio
operria; Peregrinaes de uma excluda; As peregrinaes de uma pria; Sobre a
necessidade de dar uma boa acolhida s estrangeiras; Passeios por Londres.
Por outra via, as menes a Fourier, Proudhon, Robert Owen, Saint-Simon, e ao livro
A viagem por Icria, de tienne Cabet, provocam a recirculao desses autores, situados
margem do socialismo cientfico. Muitas vezes tidos como representantes do socialismo
utpico, sendo desprezados por sua carga de ingenuidade e bizarrice, tais pensamentos
desalojam outros nobres motivos de intertexto. Igualmente, a organizao dos captulos
dedicados a Flora orientada por eventos que se desenrolam entre abril e novembro de 1844,
maneira de um dirio ntimo.
As constantes viagens da memria, inseridas para recompor o passado da protagonista,
reforam a modificao verificada no emprego dos objetos dignos de estudo e o
questionamento do cnone ocidental, literrio ou historiogrfico. o que tambm ocorre no
segmento centrado em Gauguin, pois todos os captulos a constantes so organizados em
Entre as produes do crtico, esto: Carta de batalla por Tirant lo Blanc (1969); Historia secreta de una
novela (1969); Garca Mrquez: historia de un deicidio (1971, tese de doutorado); La orga perpetua:
Flaubert y Madame Bovary (1975); Entre Sartre y Camus (1981); La utopa arcaica, Jos Mara Arguedas y
las ficciones del indigenismo (1996); Cartas a un joven novelista (1997); El lenguaje de la pasin (1999);
Bases para una interpretacin de Ruben Daro (2001, tese de licenciatura); La verdad de las mentiras (2002);
La tentacin de lo imposible: Los Miserables de Victor Hugo (2004); Un demi-sicle avec Borges (2004).
82
O engajamento assenta-se no compromisso com um projeto de transformao da existncia. Embora as aes
engajadas circunscrevam-se ao sculo XX, sua ancestralidade outorgada a Pascal e Voltaire. Tais posturas
encontram pontos de referncia em Zola, Victor Hugo e Chateaubriand. A perspectiva do intelectual
engajado, com figurino ideal em Jean-Paul Sartre, seria retomada por Pierre Bourdieu. Cf. BENIT, 2002.
81
180
funo de distintas telas produzidas pelo artista. Tambm consta uma referncia ao livro que o
teria inspirado a viajar para o Taiti: Le mariage de Loti ou Rarahu, de Pierre Loti.
Por curioso que possa parecer, as idias liberais de Vargas Llosa no vm tona
quando ele combina sua pesquisa histrica, resultante no artefato literrio, com a perspectiva
engajada. O engajamento manifesta-se, entre outros fatos, na crtica a um sistema literrio
vulnervel s repercusses ideolgicas da mdia, e representado pelas dificuldades que a
imprensa objeta venda dos livros de Flora, por ela mesma realizada, de porta em porta. No
deixa de ser irnica a observao de uma das mais divulgadas premissas econmicas do
liberalismo a lei do mercado responsvel pelo pauperismo do fim da vida de Gauguin, o
qual somente aps a morte alcana alta cotao nas flutuaes das bolsas de arte europias.
Essas engrenagens do mercado artstico so mostradas por Nstor Garcia Canclini
(2003, p. 330):
Tanto o artista que, ao pendurar os quadros, prope uma ordem de leitura quanto
o arteso, que articula suas peas seguindo uma matriz nica, descobrem que o
mercado os dispersa e ressemantiza ao vend-los em pases diferentes, a
consumidores heterogneos. Ao artista restam s vezes as cpias, ou slides, e
algum dia um museu talvez rena esses quadros, de acordo com a reavaliao
que experimentaram, em uma mostra na qual uma ordem nova apagar a
enunciao original do pintor. Ao arteso resta a possibilidade de repetir peas
semelhantes, ou ir v-las seriadas em uma ordem e em um discurso que no
so os seus num museu de arte popular ou em livros para turistas.
181
comeou quando, em Lima, a Conveno Nacional elegeu, para suceder ao
presidente Agustn Gamarra, que terminou seu mandato, o grande marechal dom
Luis Jos de Orbegoso, em vez do general Pedro Bermdez, protegido de Gamarra
e, sobretudo, da mulher deste, dona Francisca Zubiaga de Gamarra, apelidada de
Marechala, uma personagem cuja aurola de aventura e lenda a fascinou desde que
dela ouvira falar pela primeira vez. Dona Pancha, a Marechala, vestida de militar,
havia combatido a cavalo ao lado de seu marido e governado com ele. Quando
Gamarra ocupou a presidncia, ela teve tanta ou mais autoridade que o marechal nos
assuntos do governo e no vacilou em puxar uma arma para impor sua vontade, em
brandir o chicote ou em esbofetear quem no lhe obedecesse ou respeitasse, como
teria feito o mais beligerante macho (p. 277).
182
As aes dos grandes industriais e banqueiros europeus, das elites locais e dos
colonos, aliadas presena das igrejas catlicas e protestantes, no aparecem como
determinadas. Do contrrio, a narrativa enfatiza a criao da histria dos oprimidos por meio
da luta social, a investir contra o poder financeiro e patriarcal no segmento protagonizado por
Flora; contra a moral burguesa na parte centralizada em Gauguin. Em vez do posicionamento
populista que abordaria as culturas margem da hegemonia, mas legitimando a cultura
dominante, o narrador d relevo s estruturas de sentimento, responsveis, junto a outros
fatores, pelas diferenas entre as identidades nacionais, tnicas, sexuais ou regionais.
A observao mais prxima das interaes sociais no cotidiano e dos significados e
valores culturais das diferentes sociedades revela um quadro em que a sombria Europa se
descortina to ou mais miservel do que a Amrica Latina e a Polinsia. Essas duas regies
so narradas com sol e colorido, ainda que no seja omitido o enorme abismo entre suas
classes, nem obliteradas as circunstncias e estruturas de suas pobrezas.
A presena de uma cultura hegemnica (europia) assegura comunicao imediata
entre todos os seus membros, radicados na prpria matriz ou em outros continentes,
contribuindo desmobilizao das classes dominadas (ndios, escravos, proletrios europeus
etc). A ordem estabelecida legitimada atravs da hierarquizao, de maneira que as culturas
dominadas se definem por sua distncia em relao dominante. A hierarquia se estabelece,
fundamentalmente, por meio do poder simblico do jornal, do romance e do cristianismo, seja
ele catlico ou protestante.
As culturas locais ou regionais, contrapostas a essa forma de dominao, oferecem
sinais de resistncia, como nas festas taitianas onde os nativos usufruem a liberdade sexual,
nas celebraes religiosas dos indgenas peruanos, nas crenas e supersties desses povos, na
manuteno das lnguas quchua no Peru e maori na Polinsia. As figuras de Flora e Gauguin
resultam do consenso entre culturas em choque, mesmo que se oponham hegemonia.
Elas capitalizam simbolicamente os frutos dessa oposio e de suas inclinaes s
culturas subalternas, transferindo-os ao poltica e artstica, que os torna reconhecidos
nessas reas, embora tardiamente. Contra a vontade de ambas, a extrema-uno recebida pela
feminista e o enterro do pintor em cemitrio catlico so sintomticos do poder simblico,
uma forma transformada, quer dizer, irreconhecvel, transfigurada e legitimada, das outras
formas de poder (BOURDIEU, 2004, p. 15).
183
massivamente
nos
anos
de
1800.
Do
mesmo
modo,
83
A virada etnogrfica pode ser pensada como identificao dos meios mais eficazes para analisar em campo
enigmas ligados a processos de decomposio/recomposio identitria, compreender consumos culturais e
prazeres miditicos que poderiam parecer escandalosos a intelectuais marcados pelo marxismo. Confira:
MATTELART; NEVEU, 2004, p. 110.
184
A aferio dessa incidncia numa obra literria torna-se um pouco dificultada, em virtude
da indisponibilidade dos meios interativos de que a televiso se utiliza, muitos deles, financiados
por merchandising, campanhas governamentais, anncios publicitrios etc. Entretanto, no deixa de
ser conveniente a averiguao da maneira pela qual o livro, como produto cultural, tem sua
recepo orientada, no por profissionais das letras, mas pelos representantes da grande imprensa.
No caso da edio brasileira dO paraso na outra esquina, isso atestado por sua
contracapa, onde cintilam trs releases apreciativos de talhe impressionista, extrados dos
jornais O Estado de So Paulo, Folha de So Paulo e O Globo, todos eles, do centro do pas.
Na discusso do circuito de produo-circulao-recepo dos artefatos literrios, tambm
no poderia passar ao largo de um fato que me provoca desde a primeira leitura do romance
em apreciao: a simpatia do autor por suas personagens revolucionrias e libertrias.
Isso poderia ser tomado como estratgia de marketing e se vincular a uma abordagem
de economia poltica da mdia e da cultura, vis um pouco esquecido pelos estudos culturais
desde os anos de 1980, com a despolitizao e marginalizao dos pais fundadores
(Hoggart, Thompson, Williams, Hall), em benefcio de autores catalogados como psmodernos. Ento, reconhecendo seu pblico-alvo nos que comungariam das mesmas
discusses acerca da literatura, ser que Vargas Llosa submete suas concepes ideolgicas84
ao raciocnio econmico da rentabilidade em curto prazo e se orienta em funo dos
horizontes de expectativas de seus virtuais leitores?
Se confirmada essa hiptese, no teria sido mais fcil associar-se moda teoricista da
relativizao e da desconstruo indiscriminadas? No entanto, o escritor peruano conserva a
perspectiva do embate, da prtica construtora dos espaos de negociao e transformao,
aliando-se s questes com as quais se defrontavam os estudos de cultura nos anos de 1970 e
que devem ser retomadas, no seria demais repetir. O estatuto do cultural, as conexes
transdisciplinares produtivas e o modo como o engajamento pode mover o trabalho intelectual
so trazidos luz pelo romance em tela, cuja ambientao no sculo XIX parece sinalizar s
mudanas na economia global.
Nesta fase do sistema econmico mundial, a que Fredric Jameson (1996) chama de
capitalismo tardio, as lutas passam a ser fragmentadas, agrupando-se majoritariamente em
torno de entraves sofridos por grupos que, em muitos casos, j nem so minoritrios. As
84
Tais concepes podem ser conhecidas por meio do livro de memrias El pez en el agua (1993), bem como
por publicaes de cunho poltico, reunidas em: Contra viento y marea (1980-1993); A Writer's Reality
(1991); Desafos a la libertad (1994); Making Waves (1996); Piedra de toque (2001).
185
186
Um tempo multplice e ramificado no qual cada presente se bifurca em dois futuros,
de modo a formar uma rede crescente e vertiginosa de tempos divergentes,
convergentes e paralelos. Essa idia de infinitos universos contemporneos em que
todas as possibilidades se realizam em todas as combinaes possveis no uma
digresso do conto mas a prpria condio para que o protagonista se sinta
autorizado a cometer um delito absurdo e abominvel que lhe imposto por sua
misso de espionagem, seguro de que aquilo ocorre em apenas um dos universos
mas no nos outros (CALVINO, 1990b, p. 134).
85
Mais do que aes, as prticas culturais so atuaes. Representam, simulam as aes sociais, mas s s vezes
operam como ao. Talvez o maior interesse para a poltica de considerar a problemtica simblica no resida
na eficcia pontual de certos bens ou mensagens, mas em que os aspectos teatrais e rituais do social
evidenciam o oblquo, o simulado e o distinto em qualquer interao. Cf. CANCLINI, 2003, p. 350.
86
A agncia ps-colonial a ao que subverte o discurso imperialista. Os elementos de conscincia social
imperativos para a agncia (ao deliberativa, individuada e especificidade de anlise) podem ser pensados
agora como externos epistemologia que insiste no sujeito anterior ao social ou no saber do social negando a
diferena particular na homogeneidade transcendente do geral. Cf. BHABHA, 2003, p. 239-274.
187
Refiro-me ao filme A classe operria vai ao paraso (1971), no qual um operrio-modelo defronta-se com a
tenso entre a descoberta da conscincia de classe e os sonhos de consumo da classe mdia.
188
189
190
encarnou seletivamente e que permanecem pela vontade dos homens ou pelo trabalho do
tempo: festas, emblemas, monumentos, comemoraes, elogios, dicionrios, museus etc.
Os objetos da memria podem ser materiais, mas sobretudo imateriais, como frmulas,
divisas e palavras-chave. A elasticidade conceitual dos loci memoriae permite sua
operatividade
em
distintos
pases
hoje
mltiplas
anlises
os
aplicam.
191
192
trazidos luz no primeiro livro vm a ser narrados em etapas de suas vidas individuais.
maneira do que preconiza Benjamin, os reprimidos da histria, iluminados como se por um
relmpago, possibilitam apreender a vastido das prticas inquisitoriais.
Cabe recordar os tempos precedentes moderna vigncia da Inquisio, quando recm
o capitalismo urbano se configurava:
nas cidades em que a mulher suportava o fardo mais pesado de uma vida de
limitaes, as bruxas voavam noite montadas em cabos de vassouras ou em
veculos ainda mais leves, como espigas ou palhas de milho. Antes de serem
codificadas pelos inquisidores, essas vises fizeram parte do imaginrio popular, ou
at mesmo, diga-se, da vida real. Vejo uma constante antropolgica nesse nexo entre
a levitao desejada e a privao sofrida. Tal o dispositivo antropolgico que a
literatura perpetua (CALVINO, 1990b, p. 39-40).
Desse modo, na vila da Vigia, em Couto Marim, Adrio Pereira da Silva administra o
engenho de aguardente do padrasto, fazendo tambm captura de escravos fugitivos. Em 1754,
numa dessas diligncias, deixa cair um pedao de papel que consigo porta, destinado a lhe
provir sucesso com as mulheres e a bem sair-se das brigas. Por causa do amuleto, Adrio cai
sob o tribunal inquisidor, embarcando para Lisboa no ano 1754 e, no seguinte, depois de
sofrer torturas, enviam-no aos crceres secretos.
Em 1758, o Santo Ofcio decide pela evidncia do pacto e faz Adrio sair em auto de
f, encarochado por feiticeiro, devendo abjurar. Condenado ao crcere e a hbito penitencial
perptuo, deve cumprir cinco anos em degredo nas gals do rei. Entre 1760 e 1766, ele
solicita comutao, alegando doena difcil de ser curada, deixa vora e serve ao exrcito no
Par. Nesse caso, a alternativa de interpretar a diferena nos termos de uma oposio entre
elites e massas arrisca-se enganadora quando no explicita que o corte produzido pelas
Luzes muda a natureza dessa distino elite/massas (CERTEAU, 2002, p. 185).
Cerca de 1752, Salvador de Carvalho Serra, mulato pobre, filho de mineiro com
escrava forra, seleiro e residente em Tapanhuacanga, Minas Gerais, come aproximadamente
sete pedaos de hstia, razo pela qual preso. Remetido a Lisboa em 1757, sua primeira
confisso d-se no ano posterior, quando confirma ter ingerido as partculas sagradas,
porm, mudaria uns pontos dessa histria noutra entrevista. Passados quatro anos, ele
comparece a auto pblico, para ouvir sua sentena e fazer abjurao de leve suspeita na f.
Instrudo nos mistrios, Salvador cumpre as demais penas e penitncias espirituais,
paga os 2961 ris de custas do processo e parte ao degredo de dois anos em Castro Marim, no
Algarve, aonde chega em 1761. O mulato precisa entender smbolos que no lhe pertencem;
193
assim como a lngua, sua cultura deve ser decodificada pelos colonizadores. Ocorre que, a
partir de meados do sculo XVIII, se forma uma combinao durvel quase-estrutural,
durante pelo menos cem anos entre um fundo popular a decifrar e uma racionalidade
cientfica cujo contedo afetivo est colocado fora dela (CERTEAU, 2002, p.175).
Quando a esttica barroca ainda se caracteriza pelas contraposies das imagens, de
Minas Gerais que partem as histrias de outras pessoas delatadas ao Santo Ofcio: Luzia da
Silva Soares e Luzia (ou Luiza) Pinta. Solteira, preta forra e natural de Angola, a ltima reside
na vila de Sabar, quando encarcerada em 1742. Os habitantes do lugarejo costumavam
busc-la para que fizesse adivinhaes e realizasse curas, nas cerimnias noturnas do calundu.
Luzia Pinta ento usava vestir-se com trajes inusitados, a cabea coberta por
grinaldas e toucas, punha-se a danar ao som de instrumentos africanos, logo entrando em
transe. Alguns reiteram que trazia cascavis enroladas nas pernas e nos braos; era assistida
por outros negros que, com ela, cantavam, danavam, bebiam do vinho. A dvida da
Inquisio consiste em identificar o calundu ao pacto com o demo, mas acabam por enviar a
calundureira ao tribunal portugus, onde sua primeira confisso acontece a 1743.
Do mesmo ano, data o libelo acusatrio de Luzia ou Luiza que, considerada renitente,
recebe o ato pblico de culpada por leve suspeita na f em 1744, devendo abjurar. Degredamna para Castro Marim por quatro anos, numa evidncia de que o costume passa a se
transformar em instrumento: uma sociedade adquire, por a, o poder de se aperfeioar
indefinidamente, de agir sobre si mesma, de modificar sua natureza, de se construir. Do
costume, se passa educao: no final do sculo, este mito d civilizao a imagem de
uma conquista (CERTEAU, 2002, p. 18).
Luzia da Silva Soares, contando 40 anos, mora no local hoje conhecido por Mariana
quando, em 1738, seus senhores a acusam de pacto demonaco. Presa, sob torturas e a desfilar
acorrentada pelo arraial, depois da priso, vem a ser recolhida num crcere do Rio de Janeiro.
Em 1742, ela parte a Lisboa, onde suas confisses tanto impressionam que os inquisidores
ordenam a reinterpelao das testemunhas, no entanto, apenas em 1744 ouvem-se as pessoas
cientes das sevcias pelas quais tinha passado.
Finalmente, a negra posta em liberdade. Como suas prticas supersticiosas haviam
sido purgadas, os inquisidores acham por bem encerrar o processo em 1745. A histria dessa
mulher constri-se atravs de uma linguagem dupla: uma, confessvel, produtora de uma
razo esclarecida que organiza uma axiomtica da utilidade social; outra, das crenas
194
desautorizadas mas ainda existentes que, denegadas no presente, tomam o aspecto de uma
origem obscura (CERTEAU, 2002, p. 175).
No Sculo das Luzes, a cultura era lanada por meio das categorias filosficas do bem
comum, da utilidade pblica, da universalidade etc. A era iluminista revelou-se profcua em
figuras suspensas no ar. No foi em vo que, no incio do sculo, a traduo francesa de
Antoine Galland de As mil e uma noites havia aberto fantasia ocidental os horizontes do
maravilhoso oriental: tapetes volantes, cavalos voadores, gnios que saam de lmpadas
(CALVINO, 1990b, p. 36).
No sculo XVII, quando se gerava uma irrupo libertina da moral sem religio,
produziram-se dois movimentos recprocos:
elementos doutrinais at ento organicamente combinados se desarticulam: entre os
libertinos, as condutas do saber se dessolidarizam da razo unitria, da qual a f
era o princpio: na feitiaria, os smbolos coletivos de dependncia religiosa se
destacam das igrejas para formar o lxico imaginrio de uma anti-sociedade; entre
os espirituais, a experincia pessoal aprofunda itinerrios biogrficos ou
psicolgicos estranhos s linguagens institucionais e teolgicas que at ento
organizaram seu desenvolvimento. Por outro lado, esta desarticulao obedece a
clivagens sociais que se acentuam [...] os libertinos so cidados senhores da escrita,
j dotados do lugar social e de um instrumento tcnico, atravs dos quais ir se
formar o novo poder burgus: a feitiaria se recruta nos meios rurais, menos
enquadrados e como que massificados pelas prprias mobilidades que subvertem as
hierarquias locais; os msticos se encontram, freqentemente, entre estes
magistrados submetidos contradio entre a fidelidade a uma tradio cultural e a
diminuio de seu poder econmico ou poltico (CERTEAU, 2002, p. 158).
195
196
protagonista dos mais requeridos pelas anedotas populares: atravs da cultura oral, Pedro
Malazarte conquistava casa-grande ou senzala, sobrados e mucambos. No se fez apenas de
risos e douras, como visto, a vida privada no Brasil aucareiro. Sua pujana, desde ento
para desfrute de poucos, era cultivada pelos horrores do escravismo, os quais no mereceriam,
durante os trs primeiros sculos que sucederam o descobrimento, grande ateno dos nossos
homens de letras (FRANA, p. 82, 1999).
Ainda que tardiamente, os narradores coloniais adotariam postura distinta quanto ao
bom selvagem. Escritores vinculados Academia dos Renascidos convocaram
personalidades indgenas a seu elenco biogrfico de 1759, dispondo-as junto a governantes,
latifundirios, magistrados, vares tutelares etc. O mito da generosa terra medieval de
Cocanha, em sua reformatao pelo iniciante capitalismo e pela mentalidade renascentista,
roubava espaos textuais s vises do paraso (HOLANDA, 1969).
Esses traos marcam a Histria da Amrica Portuguesa (1730) de Sebastio da Rocha
Pita, imprimindo-se tambm Cultura e opulncia do Brasil por suas drogas e minas. O
jesuta italiano Andr Joo Antonil responsabilizou-se por essa narrativa histrica, publicada
em Lisboa no ano de 1711. A escrita da colnia brasileira dava prosseguimento a dilogos
estabelecidos com o barroco espanhol, atravs de Pita e Nuno Marques Pereira, autor do
romance alegrico Peregrino da Amrica (1728).
Ambrsio Fernandes Brando dedicou maior espao aos negros de Guin no
fartamente documentado Dilogo das grandezas do Brasil (1618). A narrativa do judeu
portugus menciona exorbitantes lucros obtidos com o comrcio escravista e adentra na
retrica das escritas de vida. Dessa forma, o escritor descreve alguns escravos quanto
compleio fsica (seus organismos de boa regenerao) e aos detalhes privados (suas
habilidades com plantas medicinais).
Produzida em 1627 pelo religioso franciscano Vicente do Salvador, a Histria do
Brasil tambm se revela mesquinha com a cultura africana, embora sinalize s fugas e s
rebelies escravas. Outras escritas guardam silncio bastante longo a respeito dos negros e
suas revoltas. A rebelio de Palmares, deflagrada em 1663, aciona os lderes Ganga Zumba e
Zumbi memria, enquanto a biografia da escrava rebelde Anastcia oscila entre a histria e
o mito, a lenda e a santidade.
Santos, heris bblicos e profetas de Israel povoam sermes de Antnio Vieira (16081697). Contrrio catequese para escravos ou defensor da importao de angolanos, o padre,
197
198
Memria do fogo
199
missionrio ingls amaldioou quem lhe disse h doze anos, que a Amrica estava com as
ruas cobertas de ouro e de prata, e que era preciso caminhar com cuidado para no tropear
nos diamantes (GALEANO, 1986, p. 318-319).
O novo continente comeava a ser escrito por intermdio: a) de miradas estrangeiras;
b) dos narradores americanos, fossem ndios ou filhos de europeus (criollos); c) dos rastros da
memria. A imagem de um celeiro de matrias-primas substitua olhares precedentes,
oriundos do imaginrio europeu medieval ou renascentista, mas desde os primeiros tempos, a
mitologia ednica, impressa s representaes simblicas, veio anunciando a terra de
promisso:
As riquezas descobertas na Amrica (prata, ouro, pedras preciosas) facilitaram a
acumulao do metal necessrio ao fortalecimento do capitalismo. O Mundus Novus
mostrava-se paradisaco e acolhedor, mas nem Colombo, investigando a origem do
ouro portado pelos ndios que recepcionam os navegadores, nem Vespcio,
registrando cuidadosamente a rentabilidade possvel dos produtos encontrados
(madeira e prolas) deixaram de salientar as vantagens e os lucros a advirem da
ocupao da terra. Ao sublinhar potencialidades semelhantes no territrio ao seu
alcance, cronistas religiosos e portugueses acompanham a tendncia, reforando,
sua maneira, uma imagem em circulao na Europa. Essa imagem convinha
expanso do sistema financeiro capitalista, de modo que, ao promov-la, anotando
na possesso americana as riquezas a serem recolhidas e os ganhos a obter, esses
autores afinam-se tica prpria quele modelo econmico (ZILBERMAN, p. 15,
1993).
200
201
Sobre a mesma regio, escreveram o padre Jos de Acosta e Pedro Cieza de Leon, o
qual decidira ouvir ancios indgenas antes de configurar a Crnica del Per. Daz de Castillo
reivindicava o papel dos soldados na Verdadera historia de los sucesos de la conquista de la
Nueva Espaa e um outro escritor pergunta a quem debitar as crueldades, culpa do espelho
ou da cara? O rei no pensa duas vezes. Por decreto, ordena a apreenso de todos os
manuscritos que deixou frei Bartolom de las Casas para que no cheguem s mos dos maus
espanhis e dos inimigos da Espanha (GALEANO, 1986, p. 221).
Posteriormente editados como Brevsima relaccin de la destruccin de las Indias e
Historia general de las Indias, os trabalhos desse religioso conjeturaram que os indgenas
teriam destinos melhores no inferno. Nas prprias terras, derramavam sangue, ardiam nas
fogueiras ou eram lanados ira dos cachorros. Outros evangelizadores prestaram
contribuies a futuras biografias americanas e, assim, o frei Diego Duran resgataria uma
parcela da tradio asteca em sua Historia de las Indias de Nueva Espaa e islas de tierra
firme.
Apresentando semelhantes objetivos, Bernardino de Sahagn dedicou-se Historia
general de las cosas de Nueva Espaa e frei Toribio de Benavente o Motolnia a uma
Historia de los indios de la Nueva Espaa. A Espanha tanto pressionou que, por volta de
1532, o Tribunal do Santo Ofcio se instalava em Portugal, onde visou primeiramente a
cristos novos e a conversos portugueses, e logo passaria a investigar toda pessoa com
ascendncia negra ou indgena. Das brumas de Salem a Santa Maria de Buenos Aires,
decretou-se a primeira temporada de caa s bruxas na histria colonial americana.
A Amrica Portuguesa figura em registros lusitanos e nos relatos de viagens feitas no
sculo XVI por navegantes de outras nacionalidades. As reportagens do Mundo Novo
confundiam os desconhecidos povos americanos com habitantes da ndia ou do Catai, j
conhecidos, muitas vezes, por meio de correntes leituras. Segundo Todorov (1993), no se
demonstrava rara uma idia de que certos grupos indgenas se originassem das tribos
extraviadas, as quais teriam constitudo o tronco da civilizao judaica.
As Crnicas das ndias no impem limites entre realidade objetiva e subjetiva.
Suas fronteiras tornam-se obscurecidas por obra duma cultura que acasalava
os fatos e as fbulas; os atos e sua projeo lendria. Essa confuso de ambas
ordens, sculos mais tarde, alcanar com um Borges, um Carpentier, um Cortzar
ou um Garca Mrquez, grande prestgio literrio. Aquilo que os crticos batizaro
com a etiqueta de realismo mgico, e que muitos vo considerar como um trao
prototpico da cultura latino-americana, j pode ser rastreado nessa maneira de
alternar a realidade com a fantasia que impressiona tanto nas primeiras relaes
202
escritas sobre a Amrica (VARGAS LLOSA, p. 16, 1999).
203
os sculos XVII e XVIII, quando eram descobertos e traduzidos importantes textos que
depem sobre as culturas pr-colombinas. Assim, a obra Chilam Balam, produzida em lnguas
maias, refere as funes religiosas do calendrio e abriga livros de predies dos antigos
sacerdotes. Mencionada coletnea rene-se a Barthes (1990, p. 12) quando esse aborda as
representaes pela linguagem, por meio de um conceito tributrio da noo de fonema:
Se eu fosse um escritor, j morto, como gostaria que minha vida se reduzisse, pelos
cuidados de um bigrafo amigo e desenvolto, a alguns pormenores, a alguns gostos,
a algumas inflexes, digamos: biografemas, cuja distino e mobilidade poderiam
viajar fora de qualquer destino e vir tocar, maneira dos tomos epicurianos, algum
corpo futuro, prometido mesma disperso; uma vida furada, em suma, como Proust
soube escrever a sua na sua obra, ou ento um filme moda antiga, de que est
ausente toda palavra e cuja vaga de imagens (esse flumen orationis em que talvez
consista o lado porco da escritura ) entrecortada, moda de soluos salutares,
pelo negro apenas escrito do interstcio, a irrupo desenvolta de outro significante:
o regalo branco de Sade, os vasos de flores de Fourier, os olhos espanhis de Incio.
Por seu turno, Fernando de Alva Corts Ixtlilxchitl produziu a Relacin histrica de
la nacin tolteca, onde relata acontecimentos referentes conquista da Nova Espanha e
histria de seu povo. O mesmo autor escreveu Historia Chichimeca, rebatizada como Historia
general de la Nueva Espaa. Entre importantes legados de populaes que habitam o atual
Mxico, encontra-se uma narrativa de Hernando Alvarado Tezozmoc sobre a destruio das
urbes mexicas: Crnica Mexicayot.
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O narrador
Em seu cannico trip, formado por Experincia e pobreza, A obra de arte na era
de sua reprodutibilidade tcnica e O narrador, Walter Benjamin (1994, p. 114-119; p. 165221) volta-se memria coletiva, mas igualmente enfatiza os princpios de subjetividade,
ligados de modo duplo e recproco aos de historicidade. No ltimo de tais artigos, estabelece a
tipologia do marinheiro comerciante e do campons sedentrio, a quem cabiam as histrias
contadas e recontadas no mbito de suas comunidades de vida e discurso. Beirando a
extino, esse papel ocupado pelas formas narrativas, que teriam o papel de conservar os
eventos no mais memorizados, mas rememorados, notavelmente, o gnero romanesco,
herdeiro da crnica histrica.
O pensador sino-germnico prefere a memria involuntria de Proust concepo
memorialstica de Bergson, mostrando as divergncias entre o escritor e o filsofo, num dos
trabalhos dedicados ao poeta francs Charles Baudelaire (BENJAMIN, 2004, p. 103-149). No
entendimento benjaminiano, quando a escrita se transformava numa prtica regida por
convenes, provocando a ciso do trptico experincia-memria-oralidade. Se os melhores
textos no se distanciam das antigas narrativas orais, aqui se incluem algumas espcies que
fazem parte do espao biogrfico, a exemplo dos discursos vocalizados em praas pblicas, da
Grcia ou da Roma clssicas.
216
Italo Calvino (1990a) rege-se mais pelo ouvido do que pelos olhos e indica a primeira
fonte que escuta, ao intitular As cidades invisveis.89 Esse adjetivo sensorial envia aos vrios
textos implcitos na obra, cuja contracapa, de imediato, referenda uma relao proposta entre
invisibilidade e intertextualidade. vista do leitor, o paratexto anuncia que o texto
emoldurado concentra todas as reflexes e experincias do escritor em um s smbolo: a
cidade.
A urbe deixa de ser um conceito geogrfico para se tornar o smbolo complexo e
inesgotvel da inexistncia humana. Na primeira aba do livro, o editor esclarece: Tal como
Scherazade, que conta, noite aps noite, mil e uma histrias ao sulto [...] Marco Polo
descreve para Kublai Khan, a quem serviu durante muitos anos, as incontveis cidades do
imenso imprio do conquistador mongol. O texto da aba dialoga com Seis propostas para o
prximo milnio, do mesmo autor, e com As viagens de Polo (1997).
Tais leituras compem o que no imediatamente visto nessa narrativa, como sua
relao com a Odissia e a Ilada, uma vez que o viajante se desloca pela sia, volta a sua
cidade, guerreia por ela e narra suas peripcias. A informao paratextual ainda anuncia o
tom encantatrio prprio das fbulas e contos populares. Nesta rede de textos curtos, cada
pgina uma surpresa e com freqncia cada surpresa traz, embutida dentro dela, uma
outra surpresa, tal como certas cidades comportam outras dentro de seus muros.
Por outro vis, o ensaio de Stphane Yerasimos (1999, p. 21) autentica o carter
referencial daqueles certos relatos do Oriente, dizendo que o famoso veneziano, ao se deparar
com a grande muralha chinesa, no duvida um s momento de que se trata da muralha da
lenda. E esta dependncia parece-lhe to exclusiva que, uma vez estabelecida, no mencionar
mais a muralha da China, como se ela s existisse para justificar Gog e Magog. Segundo o
Coro e o Primeiro Testamento, esses povos habitavam a extremidade nordeste da terra e
deveriam sair de seus antros para invadi-la, na aproximao dos ltimos dias.
Na segunda aba do livro em anlise, so prometidos os mistrios de algumas cidades
e tantas outras de nomes to femininos, comportamentos to singulares e aparncias to
enganadoras. A peregrinao a sugerida reenvia intertextualidade estabelecida por As
viagens com a mitificao da Campostela indiana, ou seja, as visitas ao tmulo de So
Tom, o apstolo que queria ver para crer. Tambm remete ao intertexto com a lenda de
Prestes Joo, o rei cristo que viera do Oriente derrotando medas e persas e, podendo salvar o
89
As referncias extradas da edio em destaque sero apenas indicadas atravs dos correspondentes nmeros
de pgina, entre parnteses.
217
Ocidente invadido pelos rabes, identifica-se com um soberano mongol, logo derrotado por
Gengis C.
Transformando-se depois em ttulo distribudo aos chefes religiosos dos Oengut,
Prestes Joo faz-se invisvel e se torna mais conveniente lenda. Neste sentido, os editores
alertam que as sete ou setenta e sete maravilhas das cidades calvinistas dependem muito das
respostas que o leitor possa buscar a suas prprias perguntas. Lembram do conselho de Marco
Polo a Kublai Khan, impregnado de relaes numricas, como de resto, outros pontos dos
relatrios do comerciante.
Calvino vale-se igualmente da numerologia para dar visibilidade s 55 cidades
imaginrias de seu artefato literrio. Somadas, elas conduzem ao nmero dez (um + 0) = um,
algarismo da criao, inclusive literria. O criador, alm disso, organiza seu guia sumrio em
nove captulos, sendo que o primeiro e o nono compem-se de dez subcaptulos. Essas
divises internas so intituladas com cuidado, segundo as combinaes nos captulos: 1)
Primeiro de As cidades com: a) e a memria, b) e o desejo, c)e os smbolos,
d)delgadas; 2) Nono de As cidades com: a) e os mortos; b) e o cu; c)
contnuas; d) ocultas.
Aps suas correspondentes titulaes, os subcaptulos so numerados, em ordem
crescente, e consoante inseres dos segundos termos combinatrios. De acordo com a ordem
de entrada de cada um dos segundos componentes dos ttulos, alguns deles vo
desaparecendo, para dar espao a outros. O primeiro captulo, por exemplo, comporta As
cidades e a memria (1, 2, 3 e 4), ao passo que a segunda seo tem somente um subcapttulo
intitulado As cidades e a memria (5). O conjunto que vai do segundo ao oitavo segmento
j no apresenta nenhuma combinao de As cidades com e a memria.
Esses captulos tambm levam seus correspondentes algarismos por ttulos, mas se
dividem em cinco subcaptulos, intitulados conforme os anteriores. Ao final, a soma de todos
os sub-segmentos totaliza 73 (dez) = um, referindo-se novamente ao nmero que, alm de
reger a criao, se vincula liderana e s invenes. Em sua inveno literria, Calvino
utiliz-se das intertextualizaes realizadas por Marco Polo no livro das maravilhas.
A vislumbrada por Yerasimos, a lenda medieval O romance de Alexandre tem sua
estrutura assumida pelo escritor talo-cubano, ao dotar seus captulos de semelhante
independncia. Da mesma forma, a lenda da rvore S-rvore Seca, depois de haver sido
reapropriada pelo veneziano, incorpora-se nAs cidades invisveis. Na montagem dessa obra,
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Apagada sua individualidade, o heri submerge nos domnios imperais de um protoEstado cuja corrupo gangrenosa demais para ser remediada pelo nosso cetro, que o
triunfo sobre os soberanos adversrios nos fez herdeiros de suas prolongadas runas (p. 910). Se as muralhas e as torres destinadas a desmoronar (p. 10) parecem cumprir uma
amartia, os caminhos em que a comoo e a persuaso retricas se entremeiam aos
discernimentos da histria e s possibilidades ficcionais so mostrados pelo mercador a
Kublai Khan. Esse j consegue discernir [...] a filigrana de um desenho to fino a ponto de
evitar as mordidas dos cupins (p. 10).
Desprendida do predomnio pico, a narrativa do veneziano assinala-se por um trnsito
da reminiscncia memria. Cr-se que a brevidade das histrias na mente humana pode
salvar-se pela invocao s musas, no entanto, a memria que assegura a representao das
coisas, embora precise resignar-se com o fato de o passado s deixar pegadas e no voltar
nunca mais. Desse modo, Calvino tece a narrativa com a lembrana da religiosidade
medieval, associando a vida monstica evaso do real, tambm proporcionada pela fico.
No subcaptulo intitulado As cidades e a memria 1, o autor parece amarrar os laos
entre os livros de Enoch, do Gnesis e do Zohar. Vinculado ao nmero trs, o grupo social da
famlia se faz presente na recriao da viagem de Marco, Matteo e Nicolao Polo ao Oriente:
Partindo dali, e caminhando por trs dias em direo ao Levante, encontra-se Diomira,
cidade com sessenta cpulas de prata, esttuas de bronze de todos os deuses, ruas lajeadas de
estanho, um teatro de cristal, um galo de ouro que canta todas as manhs no alto de uma
torre (p. 11).
Os cinco elementos descritos reenviam ao Livro de Enoch, especificamente, quele
circuito que chega ao novo homem, tendo sua origem no Pai (aqui representado pelo burgo
desde o qual Deus mira). Nesse lugar, de onde Ele v tudo, a viso medieval da natureza
como o alfabeto do mundo, e da Providncia, a dirigir seu discurso ao homem em trevas,
exposta na noite de setembro, quando os dias se tornam mais curtos (p. 11). Herana da
tradio grega, e com eixo principal na alegoria, a exegese assim trazida como intertexto e
estratgia narrativa.
A alegoria opera como memria de um saber que j no existe, renovado pela
figurao, valoriza a anterioridade do que verdadeiro sobre o que escrito, dito e vivido,
quando a interpretao feita, reescreve-se o livro do mundo (HANSEN, 1986, p. 51). A
decifrao alegrica recorrente em todas as coisas que o viajante j conhece por t-las visto
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em outras cidades (p. 11). As novas belezas ocultam-se na histria, ao passo que o antigo
tambm se faz descobrir por intermdio do novo.
As maravilhas de Calvino, antes de pertencerem sua fico, haviam sido oralmente
descritas por Marco Polo e escritas por seu companheiro de crcere. Por outro lado, a dico
do mundo recomposto parte do clamor gutural de uma mulher, enquanto o sentido da viso
possibilitado por lmpadas multicoloridas que se acendem juntas nas portas das tabernas (p.
11). O confronto entre os mundos vivido e imaginado rememora-se por meio da inveja
daqueles que imaginam ter vivido uma noite igual a esta e que na ocasio se sentiram
felizes (p. 11).
A referncia encontrada em Diomira, lugar divino, dialoga com a Cidade de Deus, de
Agostinho (2003), enviando s metforas que o santo catlico utiliza para denominar os
lugares da memria: antros e cavernas sem nmero; grandes campos; vastos palcios.
A intertextualidade com a patrstica igualmente transparece em As cidades e a memria 2,
subseo na qual aqueles palcios sem endereo tm escadas em caracol, incrustadas de
caracis marinhos (p. 12). Ao passo que o substantivo precedente duplicado, a urbe de
Isidora, onde se fabricam perfeio binculos e violinos (p. 12), relaciona-se a Iso igual
em cores, formas, nmeros, etc. como o algarismo dois (um + um) e os objetos feitos de
duplos (duas lentes, o arco e o instrumento de cordas).
Pela doutrina de Santo Agostinho, o mundo fsico seria o espelho embaado do mundo
espiritual, da mesma forma que as brigas de galo se degeneram em lutas sanguinosas entre os
apostadores (p. 12). Nas escadarias em que Calvino revela a conexo da memria com o
olhar, ouvem-se os passos de Benjamin (1994, p. 215). Comum a todos os grandes
narradores a facilidade com que se movem para cima e para baixo nos degraus de sua
experincia, como numa escada.
Nessa Isidora, que pode equivaler ao ouro, a Dris (uma das nereidas) ou aos agentes
do culto de sis (uma das prticas msticas mais difundas na Idade Antiga), o narrador alude
memria dos deuses pagos ainda cultuados, num tempo em que o cristianismo se expandia,
combatendo-os. A relao com Civitas Terrena, tambm de Agostinho, aparece logo na
entrada da cidade de Calvino. A santificao na terra, com vistas recompensa celestial,
exemplar porque o homem que cavalga longamente por terrenos selvticos sente o desejo de
uma cidade (p. 12).
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um gato que se introduz numa janela (p. 14) pode vincular-se s enciclopdias medievais,
como o Phisyologus, destinadas compreenso do mundo pela natureza.
Abre-se igualmente uma cadeia metafrica, seguindo a conexo vista por Rbano
Mauro no sculo X, entre as trs virtudes teologais (caridade, f, esperana) e os sentidos de
Jerusalm: tropolgico (literal ou histrico), alegrico e anaggico. Desse modo, a cidade dos
judeus, interpretada como a igreja de Cristo e a cidade de Deus, nAs cidades invisveis,
equivale Zara dos altos basties. A urbe dos baluartes amuralhados comporta infinitas
surpresas: da narrativa a reaparecer nos degraus de que so feitas as ruas em forma de
escada (p. 14) e da memria, irrefrevel na cclica circunferncia dos arcos dos prticos
(p. 14).
Nos fios narrativos, tecidos por relampejos memorialsticos, espao e tempo no se
dimensionam, conforme indica a metfora sobre a impossibilidade de se saber quais lminas
de zinco (p. 14) recobrem os tetos da cidade. Verificando que no se pode ordenar tempo e
memria em uma via reta, Calvino mistura as idades Mdias e Moderna. As dimenses
circulares de Zara assim se chocam a seu passado, entre a linha de tiro da canhoneira que
surge inesperadamente atrs do cabo e a bomba que destri o canal (p. 14).
Os pescadores beira-mar tecem, fiam, jogam suas redes, metforas da narrativa
compartilhada, antes trabalho manual do que arte, verificado nos rasgos nas redes de pesca e
os trs velhos remendando as redes que, sentados no molhe, contam pela milsima vez a
histria da canhoneira (p. 14). Conforme Joo Hansen (1986, p. 157), a ligao entre as vidas
religiosa e a social na idia da Civitas Dei nunca foi suficientemente completa para que os
grupos polticos e as relaes de sangue adquirissem um carter religioso na mente popular.
Da o reaparecimento da embarcao de artilharia nas reentrncias narrativas da urbe
indescritvel, onde a memria a reabalita, como pertencente ao usurpador, que dizem ser o
filho ilegtimo da rainha, abandonado de cueiro ali sobre o molhe (p. 14).
As melhores narrativas provm dos exemplos anteriores e dos cronistas ligados
histria sagrada. Quando representam seus episdios como modelos de histria do mundo,
especialmente atravs dos seus representantes clssicos, os cronistas medievais, precursores
da historiografia moderna, tm como alicerce o plano de salvao, cuja origem divina,
isentando-se, portanto, do nus da explicao verificvel (BENJAMIN, 1994, p. 209). Para o
filsofo alemo, os seres no mais podiam sentir-se em contato harmnico com a natureza,
nessa poca, qual o narrador se conserva fiel.
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inconsciente so: H, Q e Z. Para entrar em Zora, precisa-se transpor seis rios e trs cadeias
de montanha, numa equao aditiva que gera nove: ansiedade e compaixo; idealismo e
universalismo. Tambm vinculado sabedoria, o nono algarismo se encaixa na urbe descrita,
pois os homens mais sbios do mundo so os que conhecem Zora de cor (p. 20).
Nos primrdios da economia monetria convencional, expandiam-se as lnguas
vernculas e ocorria o grande cisma da igreja catlica. O catolicismo jogava novo papel na
criao da ordem correta do mundo, vindo colidir com o ascetismo e a contemplao. Da
mesma forma, quem guarde aquela cidade na memria imagina-se a andar por suas ruas e se
recorda de nove locais e objetos: o relgio de ramos, a tenda listrada do barbeiro, o esguicho
de nove borrifos, a torre de vidro do astrnomo, o quiosque do vendedor de melancias, a
esttua do eremita e do leo, o banho turco, o caf da esquina, a travessa que leva ao porto
(p. 19).
Como Zora obrigada imobilidade e imutabilidade, para facilitar a memorizao,
definhou, desfez-se e sumiu. Foi esquecida pelo mundo (p. 20). Na seqncia histrica, o
subcaptulo As cidades e os smbolos 1 reapresenta o desenvolvimento do direito e da
mquina administrativa do papado, ocorrido no sculo XII. Outros smbolos advertem aquilo
que proibido em algum lugar entrar na viela com carroas, urinar atrs do quisque, pescar
com vara na ponte e aquilo que permitido: dar de beber s zebras, jogar bocha, incinerar o
cadver dos parentes (p. 17).
A difuso da poesia cancioneira e trovadoresca, bem como a diviso clssica entre a
potica e a retrica, so assim expressas: a pegada na areia indica a passagem de um tigre; o
pntano anuncia uma veia de gua; a flor do hibisco, o fim do inverno [...] rvores e pedras
so apenas aquilo que so (p. 17). Ao lado das alegorias, os grandes movimentos do vulgo
aparecem nas portas dos templos, nos quais se vem as esttuas dos deuses, cada qual
representado com seus atributos: a cornucpia, a ampulheta, a medusa, pelos quais os fiis
podem reconhec-los e dirigir-lhes a orao adequada (p. 17).
A teoria da dupla verdade teolgica (da f) e filosfica (da razo) mostrada na
citao que faz referncia a um dos mais importantes comentadores de Aristteles: a tira
bordada para a testa significa elegncia; a liteira dourada, poder; os volumes de Averris,
sabedoria (p. 18). O carter de voluptuosidade simbolizado por uma pulseira para o
tornozelo (p. 18) enquanto a forma e o lugar ocupados por cada edifcio na organizao
urbana bastam para indicar a sua funo: o palcio real, a priso, a casa da moeda, a escola
pitagrica, o bordel (p. 18).
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O profano insinua-se em Tamara, cidade onde penetra-se por ruas cheias de placas
que pendem das paredes (p. 17). O carter mundano convive com o sagrado, porque, nO
livro de Enoch, Thamar o local de nascimento do Messias, assim como Keturan representa a
imagem do esprito do Pai, Maria prefigurada em Sarah e os que tm f, em Ribkah (a
virgem). O uso da figura de linguagem parece justificado pela concepo revelada por
Calvino, quando compara Dante a Cavalcante no livro Seis propostas para o prximo milnio:
Em Dante, o advrbio come encerra toda a cena na moldura de uma metfora, mas
esta adquire no interior dessa moldura uma realidade concreta, da mesma forma
como concreta e dramtica a paisagem do Inferno sob uma chuva de fogo, que a
comparao com a neve ilustra. Em Cavalcanti, tudo se move to rapidamente que
no podemos nos dar conta de sua consistncia mas apenas de seus efeitos; em
Dante, tudo adquire consistncia e estabilidade: o peso das coisas estabelecido com
exatido. Mesmo quando fala de coisas leves, Dante parece querer assinalar o peso
exato dessa leveza. (CALVINO, 1990b, p. 26-27).
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impossvel saber (p. 18). Smula do pensamento escolstico, a conciliao entre a filosofia
clssica e a f crist admitia que a revelao divina no exclui o conhecimento que pode ser
adquirido naturalmente, pela experincia e a razo. Do lado de fora, estende-se vazia at o
horizonte, abre-se o cu onde correm as nuvens. Nas formas que o acaso e o vento do s
nuvens, o homem se prope a reconhecer figuras: veleiro, mo, elefante (p. 18).
Como lembra Benjamin, os narradores orientais, vinculados histria profana, e dos
quais Scherazade digna de imitao, corporificam bons exemplos de narrativa perfeita.
Entre a metade do sculo XIII e a primeira do sculo XIV, o Livro das mil e uma noites
passou a possuir os traos que hoje o caracterizam. Foi a poca em que Marco Polo ditou As
Viagens, ponto culminante do primeiro captulo dAs cidades invisveis de Calvino.
Cr-se que os contos orientais, presentes naquela obra, teriam sido configurados por
vrias mos e diversos idiomas, por diferentes espaos e tempos. A oralidade que os assinala
conflui para coroar a perfeio prpria s camadas constitudas pelas narraes sucessivas,
reunidas em torno das formas de trabalho manual, conforme Benjamin (1994, p. 206). Suas
concluses de que alma, olho e mo inscrevem-se num mesmo campo so constantemente
evocadas por Calvino, assim como diversos intertextos fixados nAs cidades invisveis.
Interagindo, aqueles elementos definem uma prtica que nos deixou de ser familiar,
pois o papel da mo no trabalho produtivo tornou-se mais modesto, e o lugar que ela ocupava
durante o ato de narrar agora est vazio: a narrao, em seu aspecto sensvel, no de modo
algum o produto exclusivo da voz. Na verdadeira narrao, a mo intervm decisivamente,
com seus gestos, aprendidos na experincia do trabalho, que sustentam de cem maneiras o
fluxo do que dito (BENJAMIN, 1994, p. 220-221).
Nem Marco Polo, nem Italo Calvino, fazem ouvidos de mercador s histrias das
quais tomaram conhecimento; regem-se pelas memrias do olhar e auricular. O espao puxa
os fios da narrativa do veneziano, enquanto o escritor talo-cubano esconde a histria por
detrs dos smbolos que instaura em seu texto multiplicador. Se a musa do romance
consagrada a um heri, uma peregrinao ou combate, a da narrativa exaltada em nome de
muitos fatos difusos.
A obra calvinista se afasta do romance, com olhos bem abertos, voltados s fabulosas,
orientais ou populares narrativas do passado, como a crnica fantasiosa do senhor Polo. Se o
gnero romanesco, a partir do sculo XIX, passou a ser tributrio da rememorao
perpetuadora do tempo dos maquinrios e a lutar contra o poder de Cronos, o livro das
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cidades que se ocultam e se desvelam entra no futuro com a cabea voltada para trs. Nas
runas divisadas, muitos outros textos e smbolos: janelas que se abrem, Words for Windows,
como os olhos vm a ser janelas.
Para vencer o esforo e a canseira, o mar, o perigo e o abismo espelham cus gticos,
romnicos e, em outras anlises, borgianos, pardicos, ps-modernos. Ou ldicos, tal e qual o
cu e o inferno do Jogo da amarelinha de Cortzar, outro intertexto de Calvino. Cada
narrativa auscultada nos labirintos da leitura e do ouvido uma do relator do Livro das
maravilhas e a outra, do mesmo autor de Por que ler os clssicos capaz, depois de
milnios, de suscitar espanto e reflexo. Ela se assemelha a essas sementes de trigo que
durante milhares de anos ficaram fechadas, hermeticamente, nas cmaras da pirmides e que
conservam at hoje suas foras germinativas (BENJAMIN, 1994, p. 204).
Calvino (1990b) diz que s consegue falar de nossa poca valendo-se de um grande
desvio, ao evocar a frgil Medusa de Ovdio e o betuminoso Lcifer de Montale. Muito
dificilmente, um romancista poder representar sua idia de leveza ilustrando-a com exemplos
tirados da vida contempornea, sem conden-la a ser o objeto inalcanvel de uma busca sem
fim (p. 19). Marco Polo est para Calvino quase como Nietzsche, para Heidegger, pois
conforme Benedito Nunes (2000, p. 57-58), o Eterno Retorno e o ltimo deus ainda unem
os dois pensadores, mesmo considerando que Heidegger tenha rejeitado afinal a vontade de
potncia, substituda pela serenidade (Gelassenheit), como nova forma de Rettung, de
salvao (Nada podemos fazer, somente esperar).
Borges est para Calvino assim como Calvino para Piglia, numa rua nunca de mo
nica. A terceira proposta desse escritor argentino ao 21 milnio a clareza da linguagem:
Piglia busca resgatar a funo utpica da literatura. A literatura seria um antdoto
contra a peste da linguagem (de que fala Italo Calvino, ao discorrer sobre a
exatido), que faz repetir e modular as construes monolticas da realidade e se
relaciona lngua tcnica, demaggica, publicitria que a sociedade imps. Seus
argumentos esto bem prximos da proposta de Italo Calvino, ao falar do excesso
das imagens no mundo contemporneo (GOMES, p. 19, 2004).
Piglia detecta uma sria clivagem entre a lngua pblica, mais bem representada pelos
discursos polticos, e outras utilizaes da linguagem que dela se apartam. Ao lado da
mediocridade reinante, da inteligncia emocional, impe-se um estilo que vem
transformando a comunicao humana em coisa de medocres, a ser manejada pelos que
falam em pblico, no importa onde estejam, desde o presidente dos Estados Unidos ao
operador de telemarketing. Talvez os estudos literrios, a prtica discreta e quase invisvel do
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A leitura de Benjamin faz lembrar que o passado possui futuros potenciais, de tal
forma, a sexta noo de literatura a ser desenvolvida por Calvino nas Northon Conferences
seria intitulada Consistncia e trataria do Bartleby, personagem de Herman Melville. O
escriturrio ficcional daria mote para o tema da impossibilidade da escrita. Sua concretizao
no romance de Vila-Matas vem pontuando esta tese sob a forma de um fantasma; como nela,
Borges em Calvino; como em Eco, Piglia e Vila-Matas, as Seis propostas para o prximo
milnio e sobretodos, como em Calvino, Melville, numa ato de ab-rogao, a saber, a
desconstruo do privilgio de uma tradio cannica, escrita na lngua dominante, como a
norma esttica universal (BOTELHO, p. 182, 2004).
As anlises aqui empreendidas permitem distinguir o conjunto normativo-referencial
de que disponho as expectativas compartilhadas com outros leitores. Esse horizonte no se
afasta da ps-modernidade, nem das convenes culturais que orientam as noes utilizadas
para considerar as obras de Vargas Llosa (2003) e Laura de Mello e Souza (2000). O
pensamento de Iser se encontra com o de Jauss justamente nesse conceito de repertrio, o
qual se forma por intermdio das escolhas, das selees, dos fragmentos de outras leituras e
literaturas, de um enfeixamento terico que no relegue a multiplicidade, porque neste
momento to catico e fragmentado quanto o texto e a prpria sociedade, somente atravs de
um apelo a diversas teorias se poderia proceder a uma anlise textual (LOBO, 1992, p. 246).
A micro-histria de Ginzburg dispe as heterogeneidades do moleiro no contexto,
como prope Rojas (2000, p. 38), de modo a superar as relaes binrias contexto-indivduo e
moldagens contextuais sob a forma daqueles cenrios de papelo nos antigos teatros. A
biografia e suas condies vem-se igualmente alteradas por Calvino, quando visa Kublai
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Bartleby y compaa
Bartleby e companhia
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Caderno H
O repertrio memorialstico trilha um longo percurso, desde as formulaes platnicoaristotlicas at Ccero, Quintiliano, Santo Agostinho, So Toms de Aquino, Michel de
Montaigne, John Locke e Henri Bergson. No entanto, a memria se v refugiada nos estudos
do campo psicolgico e ainda hoje no merece captulos especiais em trabalhos que se
abrigam sob o ttulo comum da teoria literria. Como acontece na histria e na sociologia,
para ficar com os ramos do saber aqui destacados, o tema somente recebe considervel
ateno dos estudos literrios no sculo XX.
Mesmo assim, est por surgir uma obra do porte das de Halbwachs e Le Goff, que trate
em particular de suas relaes com a literatura, um flagrante dbito, ao se pensar que, do lado
da produo, h quase um sculo existem os vultosos textos de James Joyce e Marcel Proust,
por exemplo. Nem tudo ausncia: trs dos mais respeitados pensadores da literatura no
sculo passado, Mikhail Bakhtin, Walter Benjamin e Paul Ricoeur, abordam a problemtica
da memria. Pelas bordas, j que apenas Bakhtin porta o ttulo de licenciado em letras, mais
especificamente, em histria e filologia pela Universidade de So Petersburgo.
No seria de estranhar os traos que assinalam a contribuio de Bakhtin teoria e
anlise cultural:
Uma viso unitria, transdisciplinar, das cincias humanas e da produo cultural,
baseada, nas palavras de Todorov, na identidade de seus materiais, de seus textos e
de seu mtodo: a interpretao. A definio abrangente de Bakhtin para texto, como
aquilo que diz respeito a toda produo cultural fundada na linguagem (e para
Bakhtin no h produo cultural fora da linguagem), tem o mrito de apagar as
linhas divisrias entre texte e hors-texte (STAM, 1992, p. 13).
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como Benjamin exortava a fazer, preciso aprender a ler os testemunhos s avessas, contra
as intenes de quem os produziu. S dessa maneira ser possvel levar em conta tanto as
relaes de fora quanto aquilo que irredutvel a elas (GINZBURG, 2002b, p. 43).
A segunda metade do sculo XX passa por uma febre memorialista; segue os
resduos pretritos em notaes culturais que conseguem sobreviver fria destrutiva da
Modernidade. Leitores mostram-se vidos pelas autobiografias, por livros de memrias, pelas
biografias. Na histria e na literatura, os interesses tambm se voltam memria da oralidade,
de modo que um objeto literrio deixa de identificar-se com documento escrito, chegando
inclusive a acolher a literatura oral (SOUZA, 1987, p. 133).
As formas realistas, muitas delas, de teor autobiogrfico e biogrfico, no
proporcionam acesso imediato realidade, como queriam os positivistas, mas tampouco
obstruem a viso dos rastros do passado, dessa passagem de uma presena, como lembra
Ricoeur (1994, p. 196-216). O historiador Franois Hartog (1996) e o terico da literatura
Antoine Compagnon (2006) pem-se de acordo quanto importncia da hermenutica
ricoeuriana, principalmente, no que respeita abertura dos novos horizontes de
possibilidades; distncia do sujeito ao objeto; noo de pertencimento, por parte do
investigador.
A histria da vida privada, domstica, os foros ntimos e o cotidiano agora so
passveis de representao pela linguagem. Com todas as deformaes, esquecimentos e
obliteraes implicados no processo da escrita, sobrepem-se esfera pblica da histria.
Para a maioria dos talentos criativos do mundo no europeu que no estavam confinados por
suas tradies nem eram simples ocidentalizadores, a tarefa principal parecia ser descobrir,
erguer o vu e apresentar a realidade contempornea de seus povos (HOBSBAWM, 1995, p.
190).
O gnero biogrfico um velho conhecido de historiadores ligados ao marxismo. A
interpretaes marxistas voltadas para o domnio da abordagem sociolgica, outros vetores
juntam-se a partir dos anos 70, especialmente, os aportes da psicanlise, em vnculo estreito
com as prprias discusses ocorridas no mbito de renovao da cincia histrica. No
causaria espanto que:
Pierre Chaunu, campeo da histria serial, voltada para o coletivo, saudasse
entusiasmado, em 1982, uma nova leva de biografias com elevadas tiragens. Afinal,
por que no encarar essas obras, destinadas a reencontrar a palpitao do ser, o
destino individual e o drama da conscincia, como uma espcie de compensao
tradio dos Annales, funcionando ambas as tendncias como o yin e o yang
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alternados do pensamento chins, indicando o holismo e o individualismo presentes
em todas as sociedades? (NEVES, 2002).
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muitas vezes, feitos por outros, quando no falsos, ou fake. Porm, a biografia uma coisa e
outra coisa, as formas biogrficas, entre as quais, as biografias romanceadas.
A editora Planeta da Espanha mantm uma coleo, Memoria de la historia, em que
algumas personagens, em funes de personalidades histricas, oferecem a impresso de
vivenciarem os eventos dos quais o ser histrico em si haveria tomado parte. Sob outra forma,
a histria narrada em terceira pessoa, sem abdicar das normas e convenes que regem o
trabalho de um historiador. No entanto, as narrativas demonstram-se mais agradveis leitura
do que um volumoso tratado (ROMERA CASTILLO, 2007).
Carlo Ginzburg e Laura de Mello e Souza incluem-se entre importantes mostras dum frtil
dilogo da histria com a literatura. Suas obras confirmam o diferencial do mtodo, da
epistemologia e dos fatores culturais, a distingui-los de um contista, novelista ou romancista,
embora utilizem artifcios que tornam seus estudos to sedutores quanto uma boa narrativa
ficcional. Desse modo, engrossam concluses quanto problemtica do trabalho histrico no se
concentrar na forma, antes residindo no carter da histria contada e naquilo que dela se espera.
possvel a estilizao biogrfica, segundo constatado em Vargas Llosa (2003b) e
Calvino (1990a) dentre outros romancistas que utilizam tal estratgia, mas a obra ficcional
enfrenta processos de figurao, dispositivos retricos destinados a configur-la. O tratamento
da personagem biogrfica no constitui problema ontolgico pois, se o autor mentir, caluniar,
difamar, as questes recaem ao terreno da tica. Menos vale quem seria o inspirador da
personagem e mais valor tm os mecanismos por meio dos quais trat-los como literrios:
conceitos como literatura culta/literatura de massa/ literatura popular, ou literatura
nacional/literatura universal, fico/no-fico perdem sua fora delimitadora. Hoje
se torna impensvel a noo de que a literatura s tal quando produzida por um
gnio, por uma espcie de inspirao inexplicvel, que no deve nada tradio ou
s instituies ou pessoas que formam o chamado sistema literrio. As bandeiras
atuais so o hibridismo e a intertextualidade: nada provm do nada (BORDINI, p.
15, 2006).
A moderna teoria literria tem postulado a distino entre categorias abstractas, universais literrios
desprovidos de vnculos histricos rgidos os modos: lrica, narrativa e drama e categorias historicamente
situadas e apreendidas por via emprica , os gneros: romance, conto, tragdia, cano, etc. Assim, falar
de gneros narrativos aludir a categorias histricas, tais como a epopia, o romance, a novela ou o conto (v.
estes termos), nos quais se reconhecem implicaes periodolgicas mais ou menos efetivas, e tambm, se
quisermos ter em conta gneros que contemplam as propriedades de narratividade (v.), mas que nem sempre
se inscrevem no campo da ficcionalidade, a autobiografia, a biografia ou o dirio (v. estes termos), desde que
neste ltimo a dinmica narrativa se sobreponha propenso intimista (REIS; LOPES, 1994, p. 187).
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gnero, mas hbrido e no qual, ao narrar um outro, o bigrafo termina por narrar a si mesmo,
mostrando as inmeras facetas reveladas pelo outro, ou que outros lhe apresentam desse
sujeito-objeto. Da que a histria e a historiografia, a literatura e a biografia, a histria da
literatura e a histria literria, bem como as teorias da literatura e literria sejam aqui
enfrentadas como elementos histricos, numa dinmica de transmisso e recepo.
A memria opera como fio condutor entre tais zonas e o dilogo entre elas, como fator
central do trabalho, maneira do que preconiza Eduardo Coutinho (2003). Minando as
representaes lineares da histria da literatura, ao mesmo tempo, esfacelando sua imagem de
corpo inquebrantvel, o hipertexto com o qual se pe a dialogar envolve uma dialtica entre
as operaes biogrfica, historiogrfica e literria. Desse modo, Philippe Lejeune oferece
subsdios para que o espao biogrfico e a literatura biogrfica sejam visualizados como
entrelugares, bordejados pela histria, a potica e a literatura, mas tambm pela filosofia, a
pedagogia, a retrica, a psicanlise, a semitica, a sociologia etc.
O estabelecimento da biografia no corresponde existncia do indivduo ou das
noes de individualidade. Tampouco se relaciona aos modos de perceb-los, mas ao
conceito de tal percepo, segundo Levi (1996). O historiador diz que, a partir do romance
(Sterne, Diderot), porquanto esse tentava construir a imagem de um homem complexo,
contraditrio, cujo carter, opinies e atitudes estavam em perptua formao, essa crise
chega autobiografia (Rousseau) e finalmente biografia propriamente dita (p. 170).
Tambm pela histria, Paulo Castagnoli Pereira das Neves (2002) discorre sobre o
ceticismo, a dvida e o interesse por condutas humanas, que inserem a biografia crtica,
desinvolta, indutiva e realista nas tendncias gerais do sculo XVIII, juntamente com o
nascimento do romance Fielding, Smollett e Sterne. Peter Burke (p. 98, 1997) confirma:
Rousseau, nas suas Confessions, apresenta a sua prpria vida dessa forma. O Bildungsroman
como foi escrito por Goethe e outros seria inconcebvel sem essa mudana de viso.
O educador Jonaedson Carino (1999, p.163) reitera: O sculo XVIII introduz
mudanas no gnero biogrfico que equivalem a uma mudana de mentalidade da sociedade.
Na arte narrativa, essa nova mentalidade encarna-se na forma romance. Conhecido manual
de literatura estabelece que a biografia romanceada busca tcnicas de caracterizao da
personagem, de tratamento do tempo, de ilustrao, de espaos, etc., consolidadas pela
tradio romanesca propriamente dita; deste modo, a biografia acaba por ser tributria do
legado de subgneros como o romance de educao, o roman fleuve, o romance histrico
etc (REIS; LOPES, 1994, p. 49).
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91
A febre biogrfica chega inclusive ao famoso ursinho polar do Zoolgico de Berlim. Sua biografia
autorizada Knut, o pequeno filhote de urso produzida pelo escritor norte-americano de livros infantis,
Craig Hatkoff. Cf. DAMASCENO, 2007.
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(2004) e Regina Zilberman (2005b). Como exemplo negativo, esta pesquisa teve em mente
jamais seguir a metodologia de Harold Bloom, autor que suga literaturas alheias, mas se
demonstra mesquinho ao fornecer referncias.
Na tentativa de enviar seu cnone de volta para o centro, por meio desta leitura
suplementar, lembro de Jean-Franois Lyotard (1993) quando infere que ps no quer dizer
movimento de come-back, de flash-back. Ps significa um processo em ana: anaggico,
analtico, de anamnese, de anamorfose, para cuja operacionalidade, torna-se imprescindvel
um certo esquecimento inicial. Por isso, ao enfocar a memria, dou-me o direito de trazer
lembrana minha dissertao de mestrado, mas com o fim de tambm (des)l-la (MITIDIERIPEREIRA, 1998).
Nesse trabalho, analiso a obra romanesca Santa Evita, de Toms Eloy Martnez, em
dois de seus nveis narrativos: o biogrfico e o metaficcional biogrfico. Para complementar o
tema a desenvolvido, resolvi aprofund-lo na tese em nvel de doutorado. Desde l, ficava no
ar a pergunta sobre como proceder abordagem de uma obra literria pela perspectiva da
biografia, enquanto sua relao com a teoria literria ainda se mostra incipiente,
concentrando-se mais na referncia e nas questes acerca do gnero narrativo.
Bastante leal para com os objetivos benjaminianos de escovar a histria pelo avesso,
evitei perquirir outra vez a metafico biogrfica e a biografia enquanto gneros
estabelecidos. Dediquei-me tambm a um estudo que situa os antecedentes da biografia e de
suas espcies contguas, permitindo-me cunhar o termo espao biogrfico. Precisei verificar
o tratamento do gnero biogrfico na narrativa histrica e na fico romanesca, para tanto,
analisando expresses contemporneas dessas formas narrativas. J estava por demais
evidente que ocorria majoritria tendncia metaficcionalizao biogrfica, subgnero do
romance ps-moderno que, de notao emergente, transformava-se em hegemnica.
Em vez de rediscuti-las, preferi enveredar por transcurso que me afastasse, o quanto
possvel, dos vcios classificatrios que obcecam a histria da literatura de corte tradicional:
Ironicamente, Borges enseja a seu leitor, possvel ficcionista ou provvel filsofo,
livrar-se de classificaes, at ento genericamente respeitadas como corretas, seno
mesmo como naturalmente corretas. A fico nega qualquer cumplicidade com o
fictcio [...] despreza a inferioridade a que lhe relegara a razo e passa a julgar os
demais discursos segundo os seus prprios parmetros. O controle da razo passa a
ceder ao controle exercido pela... fico. Entre um e outro controle, a situao no se
torna menos insatisfatria. Seria preciso que o discurso ento dominante fosse
menos controlador (COSTA LIMA, 1988, p. 368).
Na primeira parte da tese, reside o como da questo, a fao histria, que no seria
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241
Ao inscrever minha voz no desenvolvimento terico, levo a idia de agncia aonde for
possvel, pois a teoria no ensina o que o sentido: quanto aos fatores de inteno, texto,
leitor e contexto, contribuem, cada um, para uma soma que o sentido (CULLER, 1999, p.
116-117). Ao citar, valho-me da tcnica moderna da bricolagem, entretanto, sob a mirada de
Antoine Compagon (1996). Assim, dou crditos a quem os merece, quando prticas em curso
insistem na ocultao das fontes ou no plgio deslavado. A citao representa a prtica
primeira do texto, o fundamento da leitura e da escrita: citar repetir o gesto arcaico do
recortar-colar, a experincia original do papel, antes que ele seja a superfcie de inscrio da
letra, o suporte do texto manuscrito ou impresso (p. 41).
A postura que adoto vem a ser mais tica do que potica, retrica, filosfica, histrica ou
literria; antes de mais nada, consiste em agenciamento tico. Num segundo plano, restitui o
conceito de um responsvel pela enunciao, sem confundi-lo com a idia de autoria genial. Se a
memria est localizada numa regio do crebro denominada hipocampo, este trabalho
constri-se a partir de hipotextos, como ao tratar dos signos do texto, de todas as linguagens
que o atravessam e que formam como que a profundeza achamalotada das frases
(BARTHES, 2004, p. 29).
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265
ANEXOS
266
Outros links:
Diretrio de
grupos de
pesquisa
Dados pessoais
Nome
Nome em citaes bibliogrficas
Sexo
Endereo
profissional
Endereo eletrnico
Formao acadmica/Titulao
2004 - 2008
267
1996 - 1998
1984 - 1989
1981 - 1983
1972 - 1980
2007 - 2007
2005 - 2005
Formao complementar
268
2004 - 2004
2003 - 2003
2000 - 2000
1999 - 2000
1996 - 1997
1995 - 1996
1995 - 1995
1995 - 1995
1989 - 1995
1988 - 1988
269
1987 - 1987
1982 - 1985
Atuao profissional
Vnculo institucional
2008 - Atual
Vnculo institucional
2006 - 2006
Atividades
03/2008 - Atual
03/2008 - Atual
01/2006 - 06/2006
270
Disciplinas ministradas
Literatura Inglesa I
Literatura Inglesa II
Vnculo institucional
2004 - 2008
Vnculo institucional
1996 - 1998
Atividades
03/2004 - Atual
04/1996 - 09/1998
04/1996 - 09/1998
03/1996 - 09/1998
271
Vnculo institucional
2007 - 2007
Atividades
03/2007 - Atual
Disciplinas ministradas
Estudos Orientados
Produo Textual
Crtica Literria
Vnculo institucional
2006 - 2006
Atividades
07/2006 - 12/2006
03/2006 - 06/2006
Vnculo institucional
272
2003 - 2004
Atividades
06/2003 - 06/2004
Vnculo institucional
1992 - 1996
Outras informaes
Vnculo institucional
1990 - 1992
Atividades
07/1992 - 12/1996
03/1990 - 07/1992
273
Vnculo institucional
1982 - 1996
Atividades
03/1994 - 04/1996
09/1991 - 08/1994
09/1990 - 08/1991
02/1987 - 08/1990
07/1985 - 01/1987
07/1982 - 12/1984
Linhas de Pesquisa
1.
274
2.
3.
275
4.
Literatura Sul-Rio-Grandense
Objetivos: Organizar, conservar, catalogar, informatizar e manter a documentao referente
aos sul-escritores rio-grandenses integrantes do: Projeto de Pesquisa Acervos de escritores
sulinos Descrio: Organizao, conservao, catalogao, informatizao e manuteno da
documentao literria de acervos de escritores sulinos, a saber, Erico Verissimo, Dyonlio
Machado, Reynaldo Moura, Josu Guimares, Mario Quintana, Pedro Geraldo Escosteguy,
Zeferino Brazil, Lila Ripoll, Manoelito de Ornellas, Oscar Bertholdo e Francisco Fernandes, para
fins de preservao, difuso e constituio de um Banco de Fontes da Literatura Brasileira..
Situao: Concludo; Natureza: Pesquisa. Alunos envolvidos: Graduao ( 6) / Especializao (
0) / Mestrado acadmico ( 2) / Mestrado profissionalizante ( 0) / Doutorado ( 2) . Integrantes:
Maria Luza Ritzel Remdios - Integrante / Luciana Haesbaert Balbueno - Integrante /Andr
Mitidieri - Integrante/ Elaine Azambuja de Lima - Integrante / Ana Letcia Fauri - Integrante /
Carolina Milanez - Integrante / Adriana de Oliveira Santos - Integrante / Maira Andretta Motta Integrante / Dileta Silveira Martins - Integrante / Erick Eduardo Vargas - Integrante / Soraya
Patricia Rossi Bragana - Integrante / Alice T Campos Moreira - Integrante / Dino del Pino Integrante / Mara Lcia Barbosa - Integrante / Leda T Martins - Integrante / Gustavo Brauner Integrante / Felipe Raskin Cardon - Integrante / Claudia Abianna - Integrante / Maria da Gloria
Bordini - Coordenador. Finaciador(es): Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e
Tecnolgico - Bolsa / Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior - Bolsa /
Fundao de Amparo Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul - Auxlio finaceiro. Nmero
de produes C, T & A: 38 / Nmero de orientaes: 8..
Palavras-chave: Acervo Literrio; Anlise Crtica; Histria; Memria.
5.
6.
276
7.
8.
reas de atuao
1.
Grande rea: Lingstica, Letras e Artes / rea: Letras / Subrea: Lnguas Estrangeiras
Modernas / Especialidade: Lngua Inglesa.
277
2.
Grande rea: Lingstica, Letras e Artes / rea: Letras / Subrea: Literaturas Estrangeiras
Modernas.
3.
Grande rea: Lingstica, Letras e Artes / rea: Letras / Subrea: Literatura Comparada.
4.
Grande rea: Lingstica, Letras e Artes / rea: Letras / Subrea: Literatura Brasileira.
5.
Grande rea: Lingstica, Letras e Artes / rea: Letras / Subrea: Teoria Literria.
6.
Grande rea: Lingstica, Letras e Artes / rea: Letras / Subrea: Escritura e Espao
Biogrfico.
Idiomas
Compreende
Fala
Escreve
Prmios e ttulos
2006
2006
2006
1997
278
1997
1996
1996
1995
1995
1995
1995
1994
1991
1991
1991
279
Emlio Zueda.
1991
1991
1990
1990
1989
1988
1986
1984
1984
Produo tcnica
Produo bibliogrfica
Produo
artstica/cultural
Demais trabalhos
280
1.
2.
MITIDIERI, Andr Luis . O Sculo das Luzes por Alejo Carpentier. Guavira Letras, v.
6, p. 27-33, 2008.
3.
4.
5.
6.
MITIDIERI, Andr Luis . Itinerrios de Eva Pern: fbula, biografia, fico. Literatura
em Debate, v. 1, p. 10-ITINERARIOS-ITINERARIOS.pdf, 2007.
7.
8.
MITIDIERI, Andr Luis . Seria difcil ler Ulisses hoje?. Arquiplago: Revista de livros e
idias, Porto Alegre, v. 04, p. 26-27, 2006.
9.
10.
11.
12.
MITIDIERI, Andr Luis . Alejo Carpentier n'O Sculo das Luzes: Revoluo Francesa
no Caribe?. Letras de Hoje, v. 41, p. LH-2006.60[1].p, 2006.
13.
14.
MITIDIERI, Andr Luis . Ora (direis) ouvir maravilhas.... Nau Literria, v. 2, p. 64-77,
2006.
281
15.
MITIDIERI, Andr Luis . Meu Pai Oxal: o fator construtivo da poesia em uma cano
popular. Letras & Letras, v. 22, p. 193-203, 2006.
16.
17.
MITIDIERI, Andr Luis . Nas instncias de So Bernardo: quatro espaos de
circulao da memria. Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 40, n. 142, p. 45-63, 2005.
18.
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MITIDIERI, Andr Luis . Que meda essa? Qu? Mda? Mda?. Em questo,
Segundo Caderno, p. 12 - 12, 14 out. 2006.
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MITIDIERI, Andr Luis . Done Fezinha s na rede pro povo. Em questo, Segundo
Caderno, p. 14 - 14, 29 set. 2006.
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MITIDIERI, Andr Luis . Fefe em Copa & Incor: Versos Hericos. Em Questo.
Caderno B, p. 13 - 13, 15 jul. 2006.
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MITIDIERI, Andr Luis . Dona Felcia tarja preta. Em questo, Caderno B, p. 13 - 13,
10 jun. 2006.
23.
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MITIDIERI, Andr Luis . Tua felx columbra mactat et palum mostrat. Em questo,
Caderno B, p. 13 - 13, 29 abr. 2006.
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286
4, 09 nov. 1996.
40.
MITIDIERI, Andr Luis . Felcia Off-Festival - Cena Um. A Gralha, Caderno C, p. 4 4, 02 nov. 1996.
41.
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MITIDIERI, Andr Luis . Felcia e o Destino (do Seu Borba). A Gralha, Caderno C, p.
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MITIDIERI, Andr Luis . Felcia de Casa e Amiga Nova. A Gralha, Caderno C, p. 4 4, 17 jul. 1996.
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Portuguesa; V SINELE Seminrio Internacional do Ensino de Lngua
Estrangeira/Espanhol; V SINELE - Seminrio Internacional etc. Erechim : Editora da
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Lngua Portuguesa IX Semana Acadmica de Letras. So Leopoldo (RS) : Editora da
Unisinos, 2004. v. 001. p. 44-44.
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MITIDIERI, Andr Luis ; PIANOWSKI, F. . O dirio rosa de Dona Felcia 2007 (Blog
Artstico-Literrio).
2.
290
3.
Produo tcnica
1.
MITIDIERI, Andr Luis ; BALESTRA RODRIGUES, Silvio Hctor ; BORDINI,
M.G. ; REMEDIOS, M. L. R. ; LEITES, Amalia Cardona ; ALMEIDA, Lara de . O Mapa
de Quintana: Uma Potica da Memria. 2006.
1.
2.
3.
MITIDIERI, Andr Luis . Relaes entre histria e fico no romance Santa Evita.
1997. (Apresentou Palestra).
4.
5.
MITIDIERI, Andr Luis . Encontro com Autor Presente. 1996. (IV Feira Municipal do
Livro).
6.
MITIDIERI, Andr Luis . Patagnia - o inslito das terras argentina e chilena. 1996.
(Apresentou Palestra).
7.
8.
291
9.
10.
11.
12.
13.
Produo artstica/cultural
1.
2.
3.
MITIDIERI, Andr Luis . Andante sin pasaporte - 1 Feira do Livro do Mercosul. 1996.
(Apresentao de obra artstica/Literria).
4.
5.
MITIDIERI, Andr Luis . Desde a volta de La Luna em Noite, Cultura e Arte. 1995.
(Apresentao de obra artstica/Literria).
6.
7.
8.
9.
10.
292
11.
12.
13.
14.
15.
16.
17.
18.
MITIDIERI, Andr Luis . Sem guia de viagem. 1994. (Apresentao de obra
artstica/Literria).
19.
MITIDIERI, Andr Luis ; VILAVERDE, Neuri . Amrica que te Quero Latina. 1992.
(Apresentao de obra artstica/Outra).
20.
21.
MITIDIERI, Andr Luis . III Salo Municipal do Jovem Artista. 1992. (Apresentao de
obra artstica/Outra).
22.
23.
24.
25.
293
26.
27.
28.
29.
30.
31.
32
33
Demais trabalhos
1.
2.
3.
MITIDIERI, Andr Luis . Acervo Literrio de Zeferino Brazil. 1998 (Projeto CNPq Acervos de Escritores Sulinos).
4.
MITIDIERI, Andr Luis . Acervo Literrio de Zeferino Brazil. 1997 (Projeto CNPq
Acervos de Escritores Sulinos).
5.
MITIDIERI, Andr Luis . Acervo Literrio de Zeferino Brazil. 1996 (Projeto CNPq
Acervos de Escritores Sulinos).
6.
7.
MITIDIERI, Andr Luis . Escola de Samba Unidos dos Canudos - Relaes Pblicas.
1988 (Atividade Comunitria e Cultural).
294
8.
9.
MITIDIERI, Andr Luis . Diretrio Acadmico Dr. Cyro Lees. 1987 (Presidncia).
10.
MITIDIERI, Andr Luis . Escola de Samba Unidos dos Canudos - Relaes Pblicas.
1987 (Atividade Comunitria e Cultural).
11.
12.
MITIDIERI, Andr Luis . Diretrio Acadmico Dr. Cyro Lees. 1986 (Presidncia).
13.
MITIDIERI, Andr Luis . Escola de Samba Unidos dos Canudos - Relaes Pblicas.
1986 (Atividade Comunitria e Cultural).
14.
Bancas
Participao em bancas examinadoras
1.
FEIJO, M. P.; SIMON, L. A.; MITIDIERI, Andr Luis. Participao em banca de Blau
Boelter da Rosa. Entre a fico e a realidade: uma identidade humanista entre. 2006.
Trabalho de Concluso de Curso (Graduao em Letras) - Universidade da Regio
da Campanha.
2.
3.
SOARES, Mari R.; SANTOS, Paulo Roberto; MITIDIERI, Andr Luis. Participao em
banca de Milena de Souza da Silva. O Professor: os limites ente a literatura e a
histria em um romance ambientado na fronteira. 2006. Trabalho de Concluso de
Curso (Graduao em Letras) - Universidade da Regio da Campanha.
295
4.
BALBINOT, M.; MITIDIERI, Andr Luis. Participao em banca de Rose Mari Lunardi
do Amarante. A narrao do Brasil em Iracema, de Jos de Alencar e em Capo
Pecado, de Ferrz. 2006. Trabalho de Concluso de Curso (Graduao em Letras) Universidade da Regio da Campanha.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
SIMON, L. A.; MITIDIERI, Andr Luis. Participao em banca de Mrcia Lopes Denis.
Cidadania e linguagem: funo da escola. 2004. Trabalho de Concluso de Curso
(Graduao em Curso de Letras) - Campus Universitrio de Alegrete.
11.
12.
SIMON, L. A.; MITIDIERI, Andr Luis. Participao em banca de Jussli Zacaria dos
Santos. A origem da Lngua e da literatura espanhola. 2004. Trabalho de Concluso
de Curso (Graduao em Curso de Letras) - Campus Universitrio de Alegrete.
13.
ROCHA, M. S.; MITIDIERI, Andr Luis. Participao em banca de Elcira Pinto Dutra.
A metafico historiogrfica em. 2004. Trabalho de Concluso de Curso (Graduao
em Curso de Letras) - Campus Universitrio de Alegrete.
296
Outras participaes
1.
FEIJO, M. P.; SIMON, L. A.; PITHAN, A. M. H.; LOPES, C.; CUNHA, V. A.; SANTOS,
T. L.; MITIDIERI, Andr Luis. Comisso Julgadora do Carnaval de Rua. 1992.
Prefeitura Municipal de Alegrete Rs.
Eventos
Participao em eventos
1.
Seminrio Nacional de Estudos Literrios e Sem. de Estud. Lit. Reg. Sul. 2007.
(Participaes em eventos/Seminrio).
2.
SENAEL - Sem. Nac. Estud. Lit. e Sem. Estudos Literrios da Regio Sul.O mapa de
Quintana: uma potica da memria. 2007. (Participaes em eventos/Seminrio).
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
297
11.
12.
13.
14.
15.
16.
17.
18.
19.
20.
21.
22.
23.
24.
298
25.
26.
27.
28.
29.
30.
31.
32.
33.
34.
35.
36.
37.
38.
299
39.
40.
41.
42.
43.
44.
II Congresso Internacional das Linguagens.Debatedor no cine-frum The Hours Stefhen Daupry. 2004. (Participaes em eventos/Congresso).
45.
46.
47.
48.
49.
50.
51.
52.
300
(Participaes em eventos/Encontro).
53.
54.
55.
56.
57.
58.
59.
60.
61.
62.
63.
64.
65.
66.
301
67.
68.
69.
70.
71.
72.
73.
74.
75.
76.
77.
78.
79.
80.
81.
302
82.
83.
84.
85.
86.
87.
88.
89.
90.
91.
92.
93.
94.
95.
96.
97.
303
98.
99.
100.
101.
102.
103.
104.
105.
106.
107.
108.
109.
110.
111.
Organizao de eventos
1.
2.
304
(Organizao de evento/Outro).
3.
MITIDIERI, Andr Luis . Concurso Literrio Dr. Cyro Lees. 1987. (Organizao de
evento/Concurso).
4.
5.
6.
Orientaes
Orientaes em Andamento
Orientaes concludas
Orientaes em andamento
1.
Neiva Bonfanti Rosa. A questo social na obra de Mario Quintana. Incio: 2008.
Monografia (Aperfeioamento/Especializao em Dilogos entre Histria e Literatura
no Brasil Con) - Instituto Educar Brasil. (Orientador).
2.
Adriane Pereira Finoketti. Dr. Romrio: uma biografia sem fim. Incio: 2008.
Monografia (Aperfeioamento/Especializao em Dilogos entre Histria e Literatura
no Brasil Con) - Instituto Educar Brasil. (Orientador).
1.
305
1.
2.
3.
4.
Cnthia Gracielli Soares Leal. Voz Autobiogrfica nAs Meninas de Lygia. 2006.
Trabalho de Concluso de Curso. (Graduao em Letras) - Universidade da Regio
da Campanha. Orientador: Andr Luis Mitidieri Pereira.
306