A Inconstitucionalidade Dos Crimes de Perigo Abstrato

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A INCONSTITUCIONALIDADE DOS CRIMES DE PERIGO ABSTRATO

THE UNCONSTITUTIONALITY OF THE ABSTRACT DANGER OF CRIMES


SANTOS, Jeruza Wilezilek Ikuno dos 1
KILIM, Emily Weber 2
SILVA, Wesley Turim Bueno da3
SOUZA, Thas Borges de4
VIEIRA, Tiago Vidal5
Resumo
O presente trabalho busca examinar os crimes de perigo abstrato, se estes se revestem da constitucionalidade ou no, objetivando demonstrar ser o
Direito Penal a ultima ratio, sendo que os demais ramos do direito devem ofertar proteo suficiente aos bens jurdicos, de modo que o Direito Penal
intervenha de forma mnima, preservando o status libertatis do cidado. Com o intuito de melhor esclarecimento do tema, buscamos atravs da anlise
dos princpios constitucionais penais relativos aos crimes de perigo abstrato, descrevendo os diferentes crimes de perigo, alm dos julgados dos tribunais
superiores acerca do tema com nfase ao STF (Supremo Tribunal Federal) questionar a constitucionalidade do supracitado crime. Destacando a
relevncia do tema, e que os mesmos no possuem uma estrutura tpica formal e violam princpios aqui analisados, para ao final poder-se- concluir a
constitucionalidade de tais crimes.

Palavras-chave: crime de perigo abstrato; constitucionalidade; princpios constitucionais.

Abstract:
This study aims to examine the crimes of abstract danger, if these are of the constitutionality or not, aiming to demonstrate the Criminal Law be the
"last resort", and the other branches of law should offer sufficient protection to the legal goods, so that the criminal law intervenes minimally, preserving
the "status libertatis" citizen. In order to better clarify the issue, we look through the analysis of criminal constitutional principles concerning abstract
danger of crimes, describing the different crimes of danger, beyond judged by higher courts on the subject with emphasis on the STF (Supreme Court)
question the constitutionality of the aforementioned crime. Highlighting the importance of the topic, and they do not have a formal structure and typical
violate principles discussed here to the end it will be possible to conclude the constitutionality of such crimes.

Keywords: abstract danger crime; constitutionality; Constitutional principles.

1.

INTRODUO

Tema bastante discutido no cenrio atual, atravs da evoluo da sociedade e o tendencioso de um direito penal
do mnimo, os crimes de perigo abstrato vem sendo constantemente questionados, inclusive no que tange o mbito
constitucional. Busca-se tutelar o direito, mas fundado no Princpio da Proporcionalidade, excessos devem ser evitados.
Porm, faz-se necessrio compreender cada instituto que envolve a Teoria do Crime, para somente assim, entender
a questo Constitucional abordada em relao aos crimes de perigo abstrato.
Antes de discutir a constitucionalidade de qualquer crime, importante que no haja dvida quando ao
entendimento sobre os mesmos. Sendo imprescindvel destacar que os crimes de perigo abstrato referem-se a uma
possibilidade de ofensa ao bem jurdico tutelado pelo Estado, no apenas uma presuno instituda pelo legislador. Esta
temtica atual, repercute na sociedade, pois tais crimes violam princpios constitucionais, fato este que no pode
prevalecer, causando certa impreviso e equvocos que precisam ser arguidos.
Percebe-se assim, a necessidade de Direito Penal tutelar bens jurdicos muito significativos para a sociedade,
evitando a banalizao do prprio direito e em detrimento a gravidade das sanes aplicadas neste processo e por ele
impostas.
Neste escopo, buscamos discorrer num primeiro captulo, um pouco da Histria do prprio direito, focado no
direito penal, por conseguinte explanar um pouco dos Princpios Constitucionais Penais, logo aps explicar a Teoria do
Crime, tipos de crime de perigo e por ltimo tratar dos Crimes de Perigo abstrato, questionando sua Constitucionalidade.
Desta forma, considerar que os crimes de perigo abstrato, cuja consumao ocorre com a simples verificao de uma
situao hipottica de perigo, no deveriam, nem poderiam ser tratados como crimes, mesmo porque importam uma
afronta ao sistema democrtico Constitucional.
Acadmica do curso de Direito da Faculdade Assis Gurgacz FAG. E-mail: [email protected]
Acadmica do curso de Direito da Faculdade Assis Gurgacz FAG. E-mail: [email protected]
3
Acadmico do curso de Direito da faculdade Assis Gurgacz FAG. E-mail: [email protected]
4
Acadmica do curso de Direito da Faculdade Assis Gurgacz FAG. E-mail: [email protected]
5
Prof do curso de Direito da faculdade Assis Gurgaz FAG. E-mail: [email protected]
1
2

Captulo 1 A Evoluo do Direito Penal

Conhecer e estudar a evoluo histrica-penal imprescindvel para se compreender e avaliar o sistema punitivo
contemporneo. No h como desvencilhar a histria do direito penal. Desde os primrdios os crimes vem acontecendo
e faz-se necessrio buscar um ordenamento coercitivo de controle e represso de tais aes lesivas que garantissem o
convvio harmnico da sociedade.
Devido a este fato o homem vem se protegendo ao longo da histria de todas as maneiras que pde encontrar.
Atravs do desenvolvimento da razo, atributo da espcie humana, o homem organizou-se em grupos e sociedades, porm
nem sempre essa organizao ocorreu de forma harmnica, revelando uma parte muito instintiva do ser humano, sua
agressividade. Desta forma, o homem tem aprendido a conviver em sociedade, numa verdadeira societas criminis, sendo
este o motivo precpuo do surgimento do Direito Penal, visando a defesa da coletividade e promoo de uma sociedade
pacfica.
Se estes instintos agressivos no viessem tona, no haveria necessidade de um arcabouo jurdico coercitivo
capaz de frear o animus do indivduo, o jus puniendi, e principalmente delegar ao Estado essa funo por meio do
Contrato Social. Assim, o Direito Penal evoluiu acompanhando a humanidade, sendo essa transformao bem conceituada
por Noronha (1991), que diz:
A histria do direito penal a histria da humanidade. Ele surge com o homem e o acompanha atravs dos tempos,
isso porque o crime, qual sombra sinistra, nunca dele se afastou. (...) Em regra, os historiadores consideravam vrias
fases da pena: a vingana privada, a vingana divina, a vingana pblica e o perodo humanitrio. Todavia deve
advertir-se que esses perodos no se sucedem integralmente, ou melhor, advindo um, nem por isso o outro
desaparece logo, ocorrendo, ento, a existncia concomitante dos princpios caractersticos de cada um: uma fase
penetra na outra, e, durante tempos, esta ainda permanece a seu lado (NORONHA, 1991).

Vale ressaltar que os conceitos, valores sociais e as necessidades humanas que movem o Direito, variam ao longo
do tempo, fazendo com que esta cincia esteja em constante mutao e evoluo. Da a necessidade de se conhecer a
histria do Direito para, somente assim, analisar de forma clara as intenes do legislador.
Lembramos que anterior ao Direito Positivo como conhecemos, passamos por diferentes formas de obteno da
segurana. No incio os indivduos agiam movidos por seus instintos, revidando agresses sofridas, sem preocupao com
a justia; depois passamos por perodos de vingana, sendo elas: a vingana privada (Lei de Talio, Lei das XII tbuas,
Cdigo de Hamurabi, etc.), a vingana divina (que visava a intimidao atravs da religio), a vingana pblica (visava
atemorizar as pessoas atravs de penas de morte, confisco de bens de forma a evitar a repetio de crimes), e logo aps o
Direito Romano com seu carter sagrado no qual se confundia a figura do soberano e do sacerdote, utilizando penas para
acalmar os deuses. J o Direito Medieval foi influenciado pelo Direito Cannico, Direito Romano e Germnico, poca de
maior interferncia da igreja Catlica nos Estados; aplicavam a pena de morte com requintes de crueldade, sempre com
o intuito de coagir atravs dos exemplos. poca esta, considerada a fase negra do Direito Penal em que suscitamos a
Inquisio, a caa s Bruxas nos deixando como legado centenas de mortes e o livro MALEUS MALEFICARUM.
Com o Iluminismo surge a sociedade tal qual imaginada por pensadores, socilogos como Weber, vista como
responsvel por seus atos, mas que para tanto teve a necessidade de firmar-se um contrato, no qual afianava que a
liberdade natural do homem, seu bem estar e sua segurana seriam preservados atravs do contrato social, que culminou
na organizao da sociedade civil como a conhecemos, que para Rousseau, o homem nasce bom, mas a sociedade
responsvel por corromp-lo, inserido neste meio que transforma e transformado encontra-se o ser humano. Tambm
foi nesta mesma poca de transformaes que se apregoaram a reforma das leis, bem como da administrao da justia
penal, no fim do sculo XVII. Imbudo do fervor iluminista, apregoados por Rousseau e Montesquieu surge Cesar
Bonesana, Marqus de Beccaria com sua obra Dos Delitos e Das Penas, pequeno livro que se tornou smbolo da reao e
repdio ao panorama penal em vigor na poca, ressalto recordar, ideais estes adotados pela Declarao do Homem e da
pela prpria Revoluo Francesa.
Todos estes novos moldes passaram a interferir nos direitos e garantias individuais e coletivos, impossibilitando
ao Estado responsabilizar-se pela segurana das pessoas, surgindo o Direito Positivo, denominado como o conjunto de
regras que regem uma sociedade. Mas o que mesmo o Direito?
Direito, do latim Directum, que significa aquilo que reto; ou ainda oriundo do verbo Deligere significando dirigir
ou alinhar.
Segundo postula Norberto Bobbio, Direito quando h um conflito entre duas pessoas ou mais, e existe a
interferncia de uma terceira pessoa para dirimir a um equacionamento de uma problemtica qualquer. O que de
sobremaneira se aplica ao Direito penal que, segundo Capez (2013), tem como misso proteger os valores fundamentais

para a subsistncia do corpo social, tais como a vida, a sade, a liberdade, a propriedade, etc, so eles os direitos de 1
gerao ou dimenso.
Para a sua efetiva proteo o Cdigo Penal se mune tambm dos princpios gerais do direito, sendo o principal
deles o Princpio da legalidade, em seu art. 1 No h crime sem lei anterior que o defina. No h pena sem prvia
cominao legal. Com seu fundamento constitucional no art. 5, XXXIX, assim, com base neste e outros princpios
relevantes buscaremos debater acerca da dos crimes de perigo abstrato e sua constitucionalidade.

2.

PRINCPIOS CONSTITUCIONAIS PENAIS

Nossa Carta Magna possui em seu interior diversos princpios, alguns especificamente penais, sejam eles expressos
ou implcitos. Mas o que so eles, os princpios? Na tentativa de responder este questionamento, buscamos Bandeira de Melo
(1996) ao dizer que:
Princpio , por definio, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposio fundamental
que irradia sobre diferentes normas compondo lhes o esprito e servindo de critrio para sua exata compreenso e
inteligncia, exatamente por definir a lgica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tnica e
lhe d sentido harmnico. o conhecimento dos princpios que preside a inteleco das diferentes partes
componentes do todo unitrio que h por nome de sistema jurdico (MELO, 1996)

Neste sentido, so eles que delimitam um norte ao Direito Penal brasileiro. Com destaque aos Princpios da
Legalidade, da Interveno Mnima, da Ofensividade e da Proporcionalidade.

2.1 Princpio da legalidade

Tal princpio encontra sua disposio no artigo 5, XXXIX da Constituio Federal e no artigo 1 do Cdigo Penal:
Art. 5, XXXIX no h crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prvia cominao legal. (CF/88)
Art. 1. No h crime sem lei anterior que o defina. No h pena sem prvia cominao legal. (Lei n 2848/40)

A frmula deste princpio Constitucional, a materializao da mxima de Von Feuerbach: Nullum crimen nulla
poena sine lege. Sendo este, o mais importante instrumento constitucional de proteo ao indivduo no moderno Estado
Democrtico de Direito, proibindo a retroatividade da criminalizao ou agravao de fato anterior, a analogia como
criminalizao de condutas, e principalmente a subsuno da conduta ao fato concreto previsto na legislao. Constituindo
uma efetiva limitao ao poder punitivo do Estado. Francisco Muoz Conde e Mercedez Garca Arn (2007) leciona que:
A gravidade dos meios que o Estado emprega na represso do delito, a drstica interveno nos direitos mais
elementares e, por isso mesmo, fundamentais da pessoa, o carter de ultima ratio que esta interveno deve ter,
impem necessariamente a busca de um princpio que controle o poder punitivo estatal e que confine sua aplicao
em limites que excluam toda arbitrariedade e excesso do poder punitivo ( MUOZ E GARCA, 2007).

Com efeito, Claus Roxin (2008) salienta que:


[...] uma lei indeterminada ou imprecisa e, por isso mesmo, pouco clara no pode proteger o cidado da
arbitrariedade, porque no implica uma autolimitao do ius puniendi estatal, ao qual se possa recorrer. Ademais,
contraria o princpio da diviso dos poderes, porque permite ao juiz realizar a interpretao que quiser, invadindo,
dessa forma, a esfera do legislativo (ROXIN (2008).

O Direito Penal um direito positivo, no havendo possibilidade de costumes e princpios no escritos ou mesmo
da analogia para se estabelecer delitos ou penas. Cabendo somente a esfera legislativa, o estabelecimento de fatos
criminosos ou no, bem como das penas a eles imputadas, fruto do sistema do Checks and balances (freios e contrapesos),
legitimando um Estado democrtico de Direito.

2.2

Princpio da ofensividade

Este princpio tambm conhecido como da lesividade, determina que no existe crime sem efetiva leso ou ameaa
concreta ao bem jurdico tutelado pelo Estado, expresso pela mxima Nullum crimen sine iniuria. Ele nos auxiliar
informando condutas que podem sofrer o rigor legal, desconsiderando fatos materialmente no ofensivos. Sendo ele
invocado quando suscitamos a inconstitucionalidade de alguns crimes, no caso em questo, do crime de perigo abstrato,
posteriormente melhor explanado. Neste sentido Bitencourt (2008) assinala:
O princpio da ofensividade no Direito Penal tem a pretenso de que seus efeitos tenham reflexos em dois planos:
no primeiro, servir de orientao atividade legiferante, fornecendo substratos poltico-jurdicos para que o
legislador adote, na elaborao do tipo penal, a exigncia indeclinvel de que a conduta proibida represente ou
contenha contedo ofensivo aos bens jurdicos socialmente relevantes, no segundo plano, servir de critrio
interpretativo, constrangendo o intrprete legal a encontrar em cada caso concreto indispensvel lesividade ao bem
jurdico protegido (BITENCOURT, 2008).

Considerando tais fatos, este princpio desempenha algumas funes, sendo elas: proibir a incriminao de uma
atitude interna (ningum pode ser punido por seus sentimentos e pensamentos); proibir a incriminao de uma conduta
que no exceda o prprio autor (somente punvel fato que atinge terceiro); proibir a incriminao de estado ou condies
essenciais (o direito penal do fato e no do autor); proibir a conduta desviadas que no afetem qualquer bem jurdico
(reprovadas moralmente).
Nesse sentido, tal princpio visa punir aes ou omisses que realmente causem lesividade aos bens jurdicos
tutelas, no meras suposies.

2.3 Princpio da Interveno Mnima

O referido princpio corolrio ao princpio da Dignidade da Pessoa Humana que est previsto no artigo 1, III da
Constituio Federal, segundo ele o Direito Penal salvaguarda dos bens jurdicos mais significativos da sociedade.
Bitencourt (2008) discorre precisamente:
O Princpio da interveno mnima, tambm conhecido como ultima ratio, orienta e limita o poder incriminador do
Estado, preconizando que a criminalizao de uma conduta s se legitima se constituir meio necessrio para a
proteo de determinado bem jurdico. Se outras formas de sano ou outros meios de controle social revelarem-se
suficientes para a tutela desse bem, a sua criminalizao inadequada e no recomendvel. Se para o
restabelecimento da ordem jurdica violada forem suficientes medidas civis ou administrativas, so estas que devem
ser empregadas e no as penais. Por isso, o Direito Penal deve ser a ultima ratio, isto , deve atuar somente quando
os demais ramos do Direito revelarem-se incapazes de dar tutela devida a bens relevantes na vida do indivduo e da
prpria sociedade (BITENCOURT, 2008).

Essa limitao ao poder punitivo estatal realizado pelo Princpio da Interveno Mnima, atravs dele se objetiva
dizer que o Direito Penal atuar somente quando houver ataque grave aos bens jurdicos mais relevantes, pode-se dizer
que ele a expresso positiva do Princpio da Insignificncia, determinando critrios qualitativos, ou seja, relacionado a
natureza do bem jurdico tutelado e quantitativos, que trata da extenso da leso do bem jurdico. Devendo o Direito Penal
atuar de forma subsidiria, como ltimo modo de ao, quando qualquer outro ramo do direito falhar.
2.4 Princpio da Proporcionalidade
Este princpio, tambm denominado de princpio da razoabilidade, tem por finalidade precpua equilibrar os
direitos do indivduo com os anseios sociais. Preceitua que nenhuma garantia constitucional goza de superioridade sobre
as demais, de modo a aniquilar outra de valor e grau equivalente.
Embora o referido princpio no encontre-se expresso no texto constitucional, para a maioria da doutrina e da
jurisprudncia ele teria arrimo no 2 do artigo 5:
Art. 5 - [...]

2 - Os direitos e garantias expressos nesta Constituio no excluem outros decorrentes do regime e dos princpios
por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a Repblica Federativa do Brasil seja parte (Constituio
Federal de 1988).

Este princpio tem a funo de preservar os direitos fundamentais. E devido carga axiolgica neles contidos, os
princpios vivem em constante tenso, no h de se cogitar um sistema constitucional democrtico direitos fundamentais
absolutos, para tanto, neste aspecto se insere o Princpio da Proporcionalidade, como instrumento limitador a estes
direitos, ponderando a cada caso concreto, sempre que ocorrer um conflito entre princpios constitucionais ou direitos
fundamentais. Neste referido artigo, o invocamos no intuito questionar a gravidade da leso em relao aos crimes de
perigo abstrato.

3.

Teoria do Crime e Tipos de crime de perigo abstrato

Como ponto de partida para compreender se um fato pode ser considerado crime, buscamos fundamentao na
Teoria do Crime, que de acordo com a corrente majoritria ptria, crime um fato tpico, ilcito e culpvel. Assim nos
indagamos:
O que crime?
Segundo Fernando Capez (2013): o crime pode ser conceituado sob os aspectos material e formal ou analtico.
Sob o aspecto material, crime pode ser definido como todo fato humano que, propositada ou descuidadamente, lesa ou
expe a perigo bens jurdicos fundamentais; em relao ao aspecto formal, considera-se infrao penal tudo o que o
legislador descrever como tal, pouco importando seu contedo. J no conceito analtico, o que busca um prisma jurdico,
estabelecendo os elementos estruturais de um crime.
Para um melhor entendimento, ao considerar o crime o legislador estipulou alguns requisitos nos quais a conduta
necessariamente deve ser encaixada, so eles:
- fato tpico, a conduta deve estar prevista no tipo incriminador e ainda afetar ou ameaar de forma relevante os
bens jurdicos tutelados (liberdade, vida, patrimnio, etc....), para no ferir o Princpio da legalidade (art. 1 - No h
crime sem lei anterior que o defina. No h pena sem prvia cominao legal.). Ele possui os seguintes elementos: 1)
conduta (dolosa ou culposa, omissiva ou comissiva); 2) resultado (apenas nos crimes materiais); 3) nexo de causalidade
(entre a conduta e o resultado); 4) tipicidade (formal ou conglobante). Se a conduta encaixar-se nos elementos supra,
passamos a investigar se o mesmo lcito ou no.
- ilcito, conduta contrria ao ordenamento jurdico. Para verificar a ilicitude, primeiramente deve-se verificar se
est presente algumas das excludentes de ilicitude: 1) estado de necessidade; 2) legtima defesa; 3) estrito
cumprimento do dever legal; 4) exerccio regular de direito; 5) livre e eficaz consentimento do ofendido. Se possuir
alguma das hipteses o fato no ilcito.
- culpvel, cabe agora averiguar a presena de elementos essenciais da culpabilidade. So eles: 1) imputabilidade
(art. 26 do CP doena mental; art. 27 do CP, maturidade penal; art. 28, 1 do CP, embriaguez proveniente de caso
fortuito ou fora maior; condio de silvcola inadaptado); 2) potencial conscincia sobre a ilicitude do fato (erro de
proibio inevitvel, art. 21 do CP, parte intermediria); 3) exigibilidade de conduta diversa (art. 22 do CP, coao
moral irresistvel e obedincia hierrquica).
Encerrada a anlise e finalmente podendo concluir se estamos diante de um crime. Apesar de, ser uma maneira um
pouco simplista os argumentos acima apontados podem defender a absolvio de algum por no ter cometido um crime.

3.1 Crimes de perigo abstrato

Para o efetivo entendimento do conceito de crime de perigo e suas espcies, faz-se necessrio a diferenciao
entre os crimes de perigo e de dano. Segundo Rogrio Greco (2011), crimes de dano:
[...] so aqueles que, para a sua consumao, deve haver a efetiva leso ao bem juridicamente protegido pelo tipo.
A conduta do agente, portanto, dirigida finalisticamente a produzir o resultado, acarretando dano ou leso para o

bem protegido pelo tipo penal, a exemplo do que ocorre com os crimes de homicdio e leso corporal (GRECO,
2011).

Nesse sentido, para que ocorra a consumao do crime de dano aquele tipo penal exige a leso ou o dano ao bem
jurdico tutelado. Lembrando que a ausncia de leso fica caracterizada como tentativa ou indiferente penal. Por outro
lado, temos os crimes de perigo abaixo conceituados por Estefam e Rios Gonalves (2012), sendo que:
H crimes, por outro lado, cuja consumao se d quando o bem jurdico sofre um perigo (ou ameaa) de leso. A
simples exposio do bem a tal perigo j suficiente para que a infrao esteja consumada. So exemplos de crimes
de perigo o art. 130 (Expor algum, por meio de relaes sexuais ou qualquer ato libidinoso, a contgio de molstia
venrea, de que sabe ou deve saber que est contaminado), ou art. 131 (Praticar, com o fim de transmitir a outrem
molstia grave de que est contaminado, ato capaz de produzir contgio), o art. 132 (Expor a vida ou a sade de
outrem a perigo direto ou iminente), todos do Cdigo Penal (STEFAM E RIOS GONALVES, 2012).

Observa-se que nos crimes de perigo, o elemento subjetivo o dolo de perigo, tais crimes se consumam com a
simples criao de perigo, sem a necessidade de efetiva leso, no ensejando o dano, nem mesmo de forma eventual.
Esses delitos so subdivididos em: 1) crime de perigo real ou concreto; 2) crime de perigo abstrato ou
presumido; 3) crime de perigo abstrato de periculosidade real, os quais sero analisados a seguir.
A simples presuno do perigo da conduta do agente suficiente para a penalizao. Greco (2008) descreve esse
delito:
Diz-se abstrato o perigo quando o tipo penal incriminador entende como suficiente, para fins de caracterizao do
perigo, a prtica do comportamento comissivo ou omissivo por ele previsto. Assim, os crimes de perigo abstrato
so reconhecidos de perigo presumido. A viso, para a concluso da situao de perigo criada pela prtica do
comportamento tpico, realizada ex,ante, independentemente da comprovao, no caso concreto, de que a conduta
do agente produziu, efetivamente ou no, a situao de perigo que tipo procura evitar (GRECO, 2008).

Para este tipo de delito, no h a necessidade de ser provado, ele presumido juris et de jure, basta a simples
prtica da ao que se presume perigosa para que a lei a considere ilcita. Os crimes abrangidos por esta classificao
pretendem, em alto grau de proteo; evitar o dano, mesmo naquelas condutas que no possam efetivamente ou
diretamente provocar um dano. Se refutar o comportamento, mesmo que presumido, venha a contrariar a lei formal em
vigncia.
O Direito, desse maneira, procura atacar no somente as condutas que possam causar lesividade concreta e direta,
mas tambm antecipar-se, investindo contra os agentes que pratiquem atos potencialmente danosos aos bens jurdicos
tutelados, da a criminalizao dos crimes de perigo.
As caractersticas destes crimes, tornam o nus da prova uma situao peculiar, j que o fato danoso e o nexo de
causalidade inexistem, resta ao acusado escassas chances de defesa. Cruz (estig. Ipbeja, Acesso em 30 de mai. 2015)
discorre sob outra perspectiva, discutindo se:
[...] haver atipicidade da conduta quando se comprove a absoluta inocorrncia (ou ausncia) do perigo no caso
concreto para o bem jurdico. Nos delitos de perigo abstrato d-se uma presuno juris tantum e no jutis et de jure
da existncia do perigo (CRUZ, estig. Ipbeja, Acesso em 30 de mai. 2015)

Segundo tal pensamento, tipifica-se a conduta como crime de perigo somente aquele que traduza perigo real ao
bem jurdico tutelado, caso contrrio, haver atipicidade.
Alm dos crimes de perigo abstrato e concreto j explanados, surge uma nova modalidade de crime de perigo,
tratada neste artigo pelo Promotor Rogrio Sanches (jusbrasil, acesso em 30 de mai. 2015) que ensina:
De acordo com essa nova espcie de infrao penal, teramos no apenas dois tipos de crime de perigo (abstrato e
concreto), mas sim trs! No crime de perigo abstrato (ou puro), o risco advindo da conduta absolutamente
presumido por lei, bastando a violao da norma. J no crime de perigo concreto, o risco deve ser comprovado. A
acusao tem o dever de demonstrar que da conduta houve perigo real para a vtima certa e determinada. No crime
de perigo abstrato de perigosidade real, o risco ao bem jurdico tutelado deve ser comprovado, dispensando vtima
certa e determinada. dispensvel a superao de um determinado risco base ao bem jurdico protegido. (jusbrasil,
acesso em 30 de mai. 2015)

Na verdade, existe a necessidade da anlise do caso concreto, e neste caso no havendo uma vtima certa e
determinada este crime, acaba por se igualar as caractersticas do crime de perigo comum e deixam de ser enfoque
deste trabalho. Assim sendo, passamos para o prximo e ltimo captulo em que abordaremos a di scusso central deste
artigo: a Inconstitucionalidade dos crimes de perigo abstrato.

4.

Inconstitucionalidade dos crimes de perigo abstrato

Aps toda a anlise anterior, em que passamos por uma linha temporal, explicando desde a Evoluo do Direito
Penal ao conceito de crime abstrato. Podemos agora discorrer sobre sua constitucionalidade. Tema de relevante
importncia seja no mbito doutrinrio ou jurisprudencial, mas que causou calorosas discusses.
Esses crimes pressupem a criao de perigo pelo sujeito da conduta, significando o este punido pela simples
desobedincia da lei, sem a necessria comprovao de leso ou ameaa de leso ao bem jurdico tutelado. Alguns
exemplos destes crimes so: o trfico de drogas, o porte de armas, a embriaguez ao volante e outros tipos penais em que
s h indicao da conduta, sem meno ao resultado.
sabido que a maioria da doutrina e jurisprudncia contrria a tese de inconstitucionalidade dos crimes de perigo
abstrato, Capez (2013) nos diz que:
Entendemos que subsiste a possibilidade de tipificao dos crimes de perigo abstrato em nosso ordenamento legal,
como legtima estratgia de defesa do bem jurdico contra agresses em seu estgio ainda embrionrio, reprimindose a conduta, antes que ela venha a produzir um perigo concreto ou dano efetivo. Trata-se de cautela reveladora de
zelo do Estado em proteger adequadamente certos interesses. Eventuais excessos podem, no entanto, ser corrigidos
pela aplicao do princpio da proporcionalidade (CAPEZ, 2013).

Estefam e Gonalves (2012) se posicionam dizendo:


Muito embora seja a questo cercada de polmica, acreditamos serem vlidos os crimes de perigo abstrato ou
presumido. Isto porque o legislador age conforme a Constituio quando seleciona condutas socialmente perniciosas
e potencialmente lesivas, incriminando-as em seus estgios iniciais. Cuida-se de atividade legislativa, decorrente da
soberania estatal, que no ofende a dignidade da pessoa humana ou a presuno de culpabilidade, pelo contrrio,
trata-se de agir de modo preventivo, antes que a leso ao bem esteja consumada. Com efeito, a maneira mais eficaz
de prevenir o roubo ou o homicdio no prender o ladro ou o assassino, algo reconhecidamente necessrio, mas
evitar que ele saque a arma ou a dispare (STEFAM E GONALVES, 2012).

Por assim dizer essa corrente defende os crimes de perigo abstrato alegando sua constitucionalidade, pois os
mesmos no infringem princpios, mas agem de forma preventiva, evitando a leso ou ameaa de leso.
O Supremo Tribunal Federal tambm concorda com essa tese, a seguir um julgado a respeito (STF. HC.
104.410/RS):
HABEAS CORPUS. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DESMUNICIADA. (A) TIPICIDADE DA
CONDUTA. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS PENAIS. MANDATOS
CONSTITUCIONAIS DE CRIMINALIZAO E MODELO EXIGENTE DE CONTROLE DE
CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS EM MATRIA PENAL. CRIMES DE PERIGO ABSTRATO EM FACE
DO PRINCPIO DA PROPORCIONALIDADE. LEGITIMIDADE DA CRIMINALIZAO DO PORTE DE
ARMA DESMUNICIADA. ORDEM DENEGADA. 1. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS
PENAIS. 1.1. Mandatos Constitucionais de Criminalizao: A Constituio de 1988 contm um significativo elenco
de normas que, em princpio, no outorgam direitos, mas que, antes, determinam a criminalizao de condutas (CF,
art. 5, XLI, XLII, XLIII, XLIV; art. 7, X; art. 227, 4). Em todas essas normas possvel identificar um mandato
de criminalizao expresso, tendo em vista os bens e valores envolvidos. Os direitos fundamentais no podem ser
considerados apenas como proibies de interveno (Eingriffsverbote), expressando tambm um postulado de
proteo (Schutzgebote). Pode-se dizer que os direitos fundamentais expressam no apenas uma proibio do
excesso (bermassverbote), como tambm podem ser traduzidos como proibies de proteo insuficiente ou
imperativos de tutela (Untermassverbote). Os mandatos constitucionais de criminalizao, portanto, impem ao
legislador, para o seu devido cumprimento, o dever de observncia do princpio da proporcionalidade como
proibio de excesso e como proibio de proteo insuficiente. 1.2. Modelo exigente de controle de
constitucionalidade das leis em matria penal, baseado em nveis de intensidade: Podem ser distinguidos 3 (trs)
nveis ou graus de intensidade do controle de constitucionalidade de leis penais, consoante as diretrizes elaboradas
pela doutrina e jurisprudncia constitucional alem: a) controle de evidncia (Evidenzkontrolle); b) controle de
sustentabilidade ou justificabilidade (Vertretbarkeitskontrolle); c) controle material de intensidade (intensivierten
inhaltlichen Kontrolle). O Tribunal deve sempre levar em conta que a Constituio confere ao legislador amplas
margens de ao para eleger os bens jurdicos penais e avaliar as medidas adequadas e necessrias para a efetiva
proteo desses bens. Porm, uma vez que se ateste que as medidas legislativas adotadas transbordam os limites

impostos pela Constituio o que poder ser verificado com base no princpio da proporcionalidade como proibio
de excesso (bermassverbot) e como proibio de proteo deficiente (Untermassverbot) , dever o Tribunal
exercer um rgido controle sobre a atividade legislativa, declarando a inconstitucionalidade de leis penais
transgressoras de princpios constitucionais. 2. CRIMES DE PERIGO ABSTRATO. PORTE DE ARMA.
PRINCPIO DA PROPORCIONALDIADE. A Lei 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento) tipifica o porte de
arma como crime de perigo abstrato. De acordo com a lei, constituem crimes as meras condutas de possuir, deter,
portar, adquirir, fornecer, receber, ter em depsito, transportar, ceder, emprestar, remeter, empregar, manter sob sua
guarda ou ocultar arma de fogo. Nessa espcie de delito, o legislador penal no toma como pressuposto da
criminalizao a leso ou o perigo de leso concreta a determinado bem jurdico. Baseado em dados empricos, o
legislador seleciona grupos ou classes de aes que geralmente levam consigo o indesejado perigo ao bem jurdico.
A criao de crimes de perigo abstrato no representa, por si s, comportamento inconstitucional por parte do
legislador penal. A tipificao de condutas que geram perigo em abstrato, muitas vezes, acaba sendo a melhor
alternativa ou a medida mais eficaz para a proteo de bens jurdico-penais supraindividuais ou de carter coletivo,
como, por exemplo, o meio ambiente, a sade etc. Portanto, pode o legislador, dentro de suas amplas margens de
avaliao e de deciso, definir quais as medidas mais adequadas e necessrias para a efetiva proteo de determinado
bem jurdico, o que lhe permite escolher espcies de tipificao prprias de um direito penal preventivo. Apenas a
atividade legislativa que, nessa hiptese, transborde os limites da proporcionalidade, poder ser tachada de
inconstitucional. 3. LEGITIMIDADE DA CRIMINALIZAO DO PORTE DE ARMA. H, no contexto emprico
legitimador da veiculao da norma, aparente lesividade da conduta, porquanto se tutela a segurana pblica (art. 6
e 144, CF) e indiretamente a vida, a liberdade, a integridade fsica e psquica do indivduo etc. H inequvoco
interesse pblico e social na proscrio da conduta. que a arma de fogo, diferentemente de outros objetos e artefatos
(faca, vidro etc.) tem, inerente sua natureza, a caracterstica da lesividade. A danosidade intrnseca ao objeto. A
questo, portanto, de possveis injustias pontuais, de absoluta ausncia de significado lesivo deve ser aferida
concretamente e no em linha diretiva de ilegitimidade normativa. 4. ORDEM DENEGADA (STF. HC.
104.410/RS)
.

Para estes juristas e Tribunais citados, os crimes de perigo abstrato so constitucionais, por crerem ser a melhor
soluo para a proteo dos bens jurdico a serem tutelados penalmente.
J em corrente contrria, afirmando serem tais crimes inconstitucionais, adotam esta posio: Rogrio Greco, Luiz
Flvio Gomes, Cezar Roberto Bitencourt, Damsio de Jesus, e outros.
Luiz Flvio Gomes (2009) atribui inconstitucionalidade a esse tipo penal, em razo de no poder delimitar direitos
fundamentais bsicos, como a liberdade ou o patrimnio, sem que seja para proteger concretas ofensas a outros direitos
fundamentais.
Esse tipo penal presumido pelo legislador, o que para Damsio de Jesus (jurisite, acesso em 30 de mai. 2015):
[...] no se permitindo prova contrria. Esse delito viola o princpio da legalidade, pois faz depender o
crime de lei que o define. E delito , em princpio, um fato tpico, que tem na conduta seu primeiro
requisito. De modo que o sujeito responde pelo fato cometido, no podendo o legislador estender,
mediante presuno, a responsabilidade parte do tipo no concretizada. Significa que o autor no
realiza o tipo por inteiro, uma vez que parte dele presumida pelo legislador (jurisite, 30 de mai. De
2015).

Desta forma, esses crimes ferem o princpio da legalidade, haja vista que o legislador no previu a conduta de
forma completa, no fazendo a devida descrio. Salienta-se tambm que os mesmos crimes violam o princpio da
culpabilidade, sendo este incompatvel com presunes legais, e por consequncia tambm violam o princpio da
presuno de inocncia o que no se harmoniza com a presuno de perigo. Todo indivduo considerado inocente at
que haja sentena condenatria penal transitada em julgado, tendo por base provas produzidas respeitando o devido
processo legal, direito presente em nossa Constituio.
Outra questo duvidosa, se refere a existncia do fato ou da sua autoria, sabido que em nosso ordenamento existe
a presuno de inocncia e com ela o in dubio pro reo, assim a norma infraconstitucional no pode rejeitar tal posio,
devendo que haja a comprovao de lesividade ao bem jurdico. O que no ocorre nos crimes de perigo abstrato ferindo
mais um princpio o da Ofensividade. Por isso manifestam-se Bitencourt (2008) e Greco (2008):
Para que se tipifique algum crime, em sentido material, indispensvel que haja, pelo menos, um perigo concreto,
real e efetivo de dano a um bem jurdico protegido. Somente se justifica a interveno estatal em termos de represso
penal se houver efetivo e concreto ataque a um interesse socialmente relevante, que represente, no mnimo, perigo
concreto ao bem jurdico tutelado. Por essa razo, so inconstitucionais todos os chamados crimes de perigo abstrato,
pois, no mbito do Direito Penal de um Estado Democrtico de Direito, somente se admite a existncia de infrao
penal quando h efetivo, real e concreto perigo de leso a um bem jurdico determinado. Em outros termos, o
legislador deve abster-se de tipificar como crime aes incapazes de lesar ou, no mnimo, colocar em perigo concreto
o bem jurdico protegido pela norma penal. Sem afetar o bem jurdico, no mnimo colocando-o em risco efetivo, no
h infrao penal (BITENCOURT, 2008)
Atualmente, os crimes de perigo abstrato tm sido combatidos pela doutrina, uma vez que no se verifica, no caso
concreto, a potencialidade de dano existente no comportamento do agente, o que seria ofensivo ao princpio da
lesividade (GRECO, 2008).

Neste diapaso, temos a Lei n. 10.826/2003, que versa sobre o porte ilegal de arma de fogo de uso permitido. As
jurisprudncias o tratam como crime de perigo abstrato, conforme supracitado. Porm, para que haja sua caracterizao
precisa-se sempre a comprovao da conduta dolosa, que ele tenha provocado algum perigo ou ameaa de perigo a um
bem tutelado. Podemos assim concluir que o sujeito que portasse arma de fogo ilegal, mas que se esta se encontrasse
desmuniciada, sem possibilidade de alcance da munio, no sendo possvel leso a bens jurdicos alheios, o fato seria
atpico.
Observemos a seguinte jurisprudncia (TJ/RS. ACR. 70055920300 RS):
Arma de fogo. Porte ilegal. Arma desmuniciada, sem possibilidade imediata de munio. Fato atpico. Falta de
ofensividade. Atipicidade reconhecida. Absolvio. HC reconhecido para esse fim (TJ/RS. ACR. 70055920300 RS).

Para concluir, inegvel o valor dos bens tutelados pelo Direito Penal, e neste caso pelos crimes de perigo abstrato,
mas contudo possumos diferentes ramos que melhor protegeriam esses bens, efetivando um Estado Democrtico de
Direito que no esteja vido em punir tudo e todos, nem mesmo afronte sua Carta Magna, mas que respeite suas leis e
cidados primando pela justia.

Consideraes finais

O presente trabalho suscitou questionar a constitucionalidade dos crimes de perigo abstrato, trazendo em seu bojo,
ambas as teorias e se posicionando em relao a sua inconstitucionalidade. Lembrando que o Direito Penal apenas admite
a existncia de determinado tipo penal quando realmente existir real e concreto perigo de leso a um bem jurdico tutelado,
caso contrrio, existem outros ramos do direito que podem ser acionados para preserv-lo.
Neste sentido, o Direito Penal deve atuar como ultima ratio, a fim de limitar a criminalizao das condutas e a
banalizao do prprio direito, zelando sim, por aqueles bens mais importantes ao indivduo e a sociedade, primando pelo
bem estar e segurana pblica.
Em que pese a maioria dos doutrinadores e da jurisprudncia dos Tribunais Superiores se posicionarem em sentido
contrrio, e que tal posio fere os princpios garantistas consagrados em nosso ordenamento, assim temos uma situao
na qual ocorre a violao aos princpios fundamentais em nossa lei Maior, a Constituio.

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