Conceitos de "afectos" e "perceptos" de Gilles Deleuze e Felix Guattari, na obra "O que é filosofia?".
O texto é basicamente o mesmo da obra original, mas há adaptações em alguns trechos para servir ao objetivo das oficinas.
Conceitos de "afectos" e "perceptos" de Gilles Deleuze e Felix Guattari, na obra "O que é filosofia?".
O texto é basicamente o mesmo da obra original, mas há adaptações em alguns trechos para servir ao objetivo das oficinas.
Conceitos de "afectos" e "perceptos" de Gilles Deleuze e Felix Guattari, na obra "O que é filosofia?".
O texto é basicamente o mesmo da obra original, mas há adaptações em alguns trechos para servir ao objetivo das oficinas.
Conceitos de "afectos" e "perceptos" de Gilles Deleuze e Felix Guattari, na obra "O que é filosofia?".
O texto é basicamente o mesmo da obra original, mas há adaptações em alguns trechos para servir ao objetivo das oficinas.
A arte conserva e a nica coisa no mundo que paisagem". se conserva em si [conserva e mantm vivo] a arte. A obra de arte um ser de sensao, e nada mais. Ela existe em si. O que que se conserva na obra e que a constitui enquanto arte? A moa esculpida na pedra guarda a pose h cinco mil anos e no depende mais daquela que posou nem daquele a esculpiu. O ar guarda a agitao, o sopro e a luz que tinha, tal dia do ano passado, e no depende mais de quem o respirava naquela manh.
O artista cria blocos de perceptos e afectos,
mas a nica lei da criao que o composto deve ficar em p sozinho. O mais difcil que o artista o faa manter-se em p sozinho. Para isso preciso, por vezes, muita inverossimilhana geomtrica, imperfeio fsica, anomalia orgnica, do ponto de vista de um modelo suposto, do ponto de vista das percepes e afeces vividas.
E a arte no conserva como a a indstria, que
Todavia, os blocos precisam de bolses de ar e acrescenta uma substncia para fazer o produto de vazio, pois mesmo o vazio uma sensao. perecvel durar. Ela conserva em si. Uma tela pode ser inteiramente preenchida, a ponto de que mesmo o ar no passe mais por ela; O que que se conserva ali que tambm independente de personagens eventuais, como o mas algo s uma obra de arte se, como diz o pintor chins [Huang Pin-Hung], guarda vazios espectador que a experimenta? suficientes para permitir que neles saltem O que se conserva um composto de afectos cavalos. e perceptos (um bloco de sensaes) Pintamos, esculpimos, compomos, Embora, de fato, a obra no dure mais do que escrevemos, atuamos com afectos e perceptos. seu suporte e os materiais de que se constitui - e Pintamos, esculpimos, compomos, escrevemos, atuamos afectos e perceptos. mesmo que o material s durasse alguns segundos - daria sensao (afectos e Os perceptos e afectos no so referncias perceptos) o poder de existir e de se conservar em si, na eternidade que coexiste com esta que remetam a objetos. Se se assemelham a algo, uma semelhana produzida por seus curta durao. prprios meios. E o sorriso sobre a tela somente feito de cores, de traos, de sombra e de luz. Os afectos no so mais sentimentos, transbordam a fora daqueles que so O afecto no o sorriso, nem o sorriso o atravessados por eles, assim como os perceptos afecto. Algo da sensao do sorriso vive na obra no so mais percepes, so independentes por seus prprios meios materiais, compe o daqueles que os experimentaram. afecto que se auto-sustenta e conserva, e que As sensaes (afectos e perceptos) so seres provoca, no espectador capaz de capt-lo, a sensao do sorriso, seu ar, seu momento que valem por si mesmos e excedem qualquer gravado em durao no bloco de afectos e experincia vivida. Existem na ausncia do homem. Porque o homem, tal como ele fixado perceptos. na pedra, sobre a tela, ao longo das palavras [ou
O plano do material (tela, leo, cor, trao do
verdade que toda a obra de arte um pelo do pincel; corpo, gesto, movimento, palavra, monumento, mas o monumento no aqui o que tons de voz etc) sobe irresistivelmente e invade o comemora um passado, um bloco de sensaes plano de composio dos afectos e perceptos. presentes que s devem a si mesmas sua prpria conservao, e do ao acontecimento o O plano do material a condio de fato composto que o celebra. chega a ser indiscernvel do plano de composio O que conta no a memria, a fabulao. dos afectos e perceptos a condio de direito , mas suas naturezas diferem. O que se conserva No se escreve com lembranas de infncia, mas de direito, na obra, no o material, que com blocos de infncia, que so devires-criana constitui a sua natureza de fato. do presente. A msica est cheia disso. Mas o que interessante notar aqui que Port, preciso no memria, mas um material material e sensao apresentam-se complexo que no se encontra na memria, mas indiscernveis porque nenhum pedacinho material nas palavras, nos sons, nos gestos. (em sua forma, disposio, organizao, etc) da Os personagens no podem existir, seno obra, que seja, deixar de sustentar a entrando imperceptivelmente na paisagem e composio dos perceptos e dos afectos, que compondo nela, com ela, por ela (sendo ela sero invadidos pelo material, no se atravs de si prprios) o composto de sensaes constituindo, os perceptos e afectos, fora da finitude espacial e temporal do material fsico da que a sabe em si: bloco de afectos e perceptos. obra. Os afectos so precisamente estes devires no humanos do homem, como os perceptos so Os afectos e perceptos no se realizam no material sem que o material entre inteiramente as paisagens no humanas da natureza. nos afectos e perceptos. Toda a matria se "H um minuto do mundo que passa", no o torna expressiva. o afecto que metlico, conservaremos sem "nos transformarmos nele", cristalino, ptreo. Como diz Czanne: a sensao diz Czanne. no colorida, ela colorante. "As grandes paisagens tem, todas elas, um carter visionrio. A viso o que do invisvel se torna visvel... a paisagem invisvel porque quanto mais a conquistamos, mais nela nos perdemos. Para chegar paisagem, devemos sacrificar tanto quanto possvel toda determinao temporal, espacial, objetiva; mas S passamos de um material a outro do este abandono no atinge somente o objetivo, ele violo ao piano, do pincel brocha, do leo ao afeta a ns mesmos na mesma medida. Na pastel se o composto de sensaes o exigir. paisagem, deixamos de ser seres histricos, isto O objetivo da arte, por meio dos materiais, , seres eles mesmos objetivveis. No temos arrancar o percepto das percepes do memria para a paisagem, no temos memria, objeto e dos estados de um sujeito percipiente, e nem mesmo para ns na paisagem. Sonhamos arrancar o afecto das afeces, passando de em pleno dia e com os olhos abertos. Somos um estado a outro. furtados ao mundo objetivo mas tambm a ns mesmos. o sentir." Erwin Straus, Du sens des Extrair um bloco de sensaes, um puro ser sens, Ed. Millon, p. 519. de sensaes. Para isso preciso um mtodo que No estamos no mundo, tornamo-nos com o varie com cada autor e que faa parte da obra. A pesquisa da sensao, como ser, inventa mundo. Ns nos tornamos contemplando-o. procedimentos diferentes em cada autor e em Tornamo-nos universo. Devires animal, cada obra. vegetal, molecular, devir zero. Para sair das percepes vividas no basta Kleist sem dvida quem mais escreveu por memria que convoque somente antigas afectos, servindo-se deles como pedras ou percepes. armas. Apreendendo-os em devires de petrificao brusca ou de acelerao infinita, A memria intervm pouco na arte (mesmo e no devir-cadela de Pentesilia e seus sobretudo em Proust). perceptos alucinados.
por isso que quem pintor tambm mais
que pintor, porque ele faz vir diante de ns, na frente da tela fixa, no a semelhana, mas a pura sensao da flor torturada, da paisagem cortada, sulcada, comprida.
Que terror invade a cabea de Van Gogh,
tomada num devir girassol? A fabulao criadora nada tem a ver com uma lembrana. Com efeito, o artista excede os estados perceptivos e as passagens afetivas do vivido. um vidente, algum que se torna. Ele, o artista, viu na vida algo muito grande, demasiado intolervel tambm, e a luta da vida com o que a ameaa, de modo que o pedao de natureza que ele percebe, ou os bairros da cidade, e seus personagens, acedem a uma viso que compe, atravs deles, perceptos desta vida, deste momento, fazendo estourar as percepes vividas numa espcie de cubismo, de simultanesmo, de luz crua ou de crepsculo, de prpura ou de azul, que no tem mais outro objeto nem sujeito seno eles mesmos.
Como tornar um momento do mundo durvel
ou faz-lo existir por si? Virginia Woolf d uma resposta que vale para a pintura ou a msica tanto quanto para a escrita: "Saturar cada tomo", "eliminar tudo o que resto, morte e superfluidade", tudo o que gruda em nossas percepes correntes e vividas, tudo o que alimenta o romancista medocre. S guardar a saturao que nos d um percepto, "incluir no momento o absurdo, os fatos, o srdido, mas tratados em transparncia". Os artistas so como os filsofos: tem freqentemente uma saudezinha frgil, mas no por causa de suas doenas nem de suas neuroses, porque eles viram na vida algo grande demais para qualquer um, grande demais para eles, e que ps neles a marca discreta da morte. Mas esse algo tambm a fonte ou o flego que os fazem viver atravs das doenas do vivido (o que Nietzsche chama de sade).
"Um dia saberemos talvez que no havia arte,
Os perceptos podem ser telescpicos mas somente medicina..." (Michaux). oumicroscpicos, do aos personagens e s paisagens dimenses de gigantes, como se estivessem repletos de uma vida qual nenhuma Estes fragmentos foram adaptados pela percepo vivida pode atingir. Oficina de Criao Teatral a partir do texto referenciado abaixo. O grosso dos conceitos e Pouco importa que esses personagens sejam ideias neles fiel ao original, sendo a maior medocres ou no: eles se tornam gigantes parte copiada ipsis literis dessa obra. - toda fabulao fabricao de gigantes. Medocres ou grandiosos, so demasiadamente vivos para serem vivveis ou vividos. Thomas Wolfe extrai de seu pai um gigante, e Miller, da cidade, um planeta negro.
DELEUZE, Gilles e Guattari, Flix. O que
filosofia? Traduo de Bento Prado Jr. e Alberto Alonso Munoz. So Paulo: Editora 34, 2008.