Arte e Tecnologia
Arte e Tecnologia
Arte e Tecnologia
Igor Capelatto
ARTE E TECNOLOGIA
SUMRIO:
CONSIDERAES INICIAIS: AS OVELHAS 09
ELTRICAS DE PHILIP K. DICK, COMO METFORA
PARA UM NOVO PENSAMENTO SOBRE A
ARTE-EDUCAO, A PARTIR DOS AVANOS
TECNOLGICOS
CULTURA TECNOLGICA
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COMO 49
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ARTE E TECNOLOGIA
Por ser essncia criativa, a arte depende de aparatos mecnicostecnolgicos, que por sua vez, esto associados a produtos fsico-qumicos, para
ser expressa. Ela cria seus prprios cdigos para comunicar-se, de acordo com
o segmento artstico em questo, interagindo com os cdigos impostos pelos
aparatos utilizados.
Se considerarmos o corpo como forma de expresso (performances, arte
teatral, dana, canto etc.), podemos dizer que ele uma estrutura biolgica, que
se torna ferramenta-suporte para a arte: por que ento no dizer que a biologia
humana uma composio mecnico-tecnolgica?
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CULTURA TECNOLGICA
As tecnologias, entre os artistas, no so nem brinquedos
nem utenslios, elas so veculos que permitem a explorao
de inumerveis caminhos de si mesmo. Para [] artistas, as
tecnologias permitem a descoberta de incalculveis escalas do real
embrenhadas por cada pessoa e perdidas na densidade de todos.
(DYENS, Ollivier)
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Para iniciar uma reflexo mais minuciosa sobre a relao entre a arte e a
tecnologia e tambm a educao, elucidando ainda mais o que cultura tecnolgica
e assim, o conceito de hibridismo cultural, ou ainda, antes de entramos em
pormenores sobre filosofias da arte e pedagogias de ensino, faremos um primeiro
7 Ao falarmos em pintura digital, os fac-similes (reprodues com extrema semelhana ao original)
impressos com texturas e relevos em tamanho real de obras de arte famosas, muitas vezes,
enganam os olhos dos espectadores, dificultando identificar se a imagem exposta a obra
original ou uma rplica.
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Escolhemos exemplificar este livro com algumas obras que trazem consigo,
de alguma maneira, um carter pedaggico de compreenso dessa nova lngua (ou
lnguas), que est nascendo na era ciberntica e que auxilia na reflexo sobre como
inserir esses novos indivduos tecno-cibernticos e suas tecnologias no contexto
histrico-educacional das cincias e artes, para que humanos e andrides possam
se comunicar entre si.
Para que o artista dialogue com o pblico dessa nova gerao tecnolgica (e
por que no afirmar, ciberntica?) e no mbito educacional, para que o professor
dialogue com a percepo de realidade da nova gerao de alunos (ciber-alunos?)
necessrio o aprendizado dessas novas lnguas. Mas como se comunica esse
novo pblico?
A partir desse questionamento, elaboramos um pequeno ensaio sobre
a obra-instalao A ltima Ceia, de Peter Greenaway, a fim de observar como
o artista se apropria da tecnologia no constructo de uma linguagem artstica,
procurando refletir sobre como ela agrega possibilidades na criao artstica, ao
mesmo tempo em que elabora conceitos sobre novas linguagens, isto , sobre as
novas narrativas que surgem em ritmo acelerado no mundo contemporneo, pois
como afirma Cohen (2012, p.301):
Em A ltima Ceia, Peter Greenaway concebe a luminosidade,
nas projees, como aquelas mutaes maneiristas entre
padres constitudos. A luz difusa pintada por Leonardo abre-se
multiplicao de feixes de luz sobre a figura central, prepara um
fundo escuro que se contrape s incidncias pontuais de luz sobre
8 A escolha pela anlise das instalaes de Greenaway, neste momento de nossa reflexo, se d
pelo carter hermtico da relao entre narrativas (linguagens), cultura e tecnologia presentes
em sua obra.
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A tecnologia, por sua vez, a ferramenta que amplia essa reflexo, uma
vez que a acelerao tecnolgica (cientfica) tem como um de seus anseios, a
reproduo fiel da realidade ou mesmo a sua superao, e que denominada
de hiper-realismo11 no campo das artes. So cientistas, filsofos, artistas, enfim,
pensadores que querem construir ovelhas eltricas mais realistas do que as
ovelhas reais.
Porm, a arte de Peter Greenaway a ser analisada, neste livro, no o
cinema, uma de suas importantes ferramentas construtivas, mas uma de suas
instalaes. The Last Supper (A ltima Ceia) faz parte de uma srie intitulada
Nine Classical Paintings Revisited (Nove Pinturas Clssicas Revisitadas), em que o
artista trabalha com tecnologias da imagem e som, interferindo diretamente nos
facsimiles ou nas pinturas originais. A escolha dessa obra (de Greenaway) se deu
pelo seu carter hipermiditico, uma vez que ela envolve diferentes aplicaes
da tecnologia no contexto da arte e tambm pelo hibridismo nos que se refere
s tcnicas e gneros artsticos. Greenaway, por exemplo, utiliza a tecnologia de
projetores de alta definio sobre a obra renascentista A ltima Ceia, de Leornado
DaVinci, para criar efeitos de luz inspirados nas pinturas barrocas.
A instalao, que pode ser vista parcialmente em registro do vdeo-projeo
no site The Guardian12 e making of da montagem no Dailymotion13, foi montada em
diversos espaos, sendo que a inaugurao aconteceu no refeitrio do convento
de Santa Maria delle Grazie, em Milo, na Itlia. A obra apresenta a pintura original
de DaVinci ou facsimile14 em tamanho real, recortes impressos e ampliados de
11 Essa busca pela imagem absoluta do real, em 1973, chamou a ateno da galerista Isy
Brachot, que convidou alguns artistas para uma exposio de imagens, por ela denominadas de
hiper-realistas. A exposio chamou a ateno para a tcnica fotorrealista, que alguns artistasfotgrafos como Chuck Close e Gerhard Hitcher, vinham desenvolvendo. Nessa tcnica, o artista
faz uso (sempre) de uma fotografia (geralmente fotografada por ele prprio) como referncia
para a obra, desenvolvida por meio de materiais de desenho e pintura, buscando uma iluso
de realidade maior do que a prpria fotografia. Anos depois, a terminologia fotorrealismo foi
deixada de lado e artistas, curadores e crticos, apropriaram-se do termo proposto por Brachot:
hiper-realismo, uma vez que fotorrealismo levava o pblico a acreditar (apesar de ser essa a
essncia do fotorrealismo) que estava indo a uma exposio de fotografia e no de desenho/
pintura. Alm disso, alguns artistas fotorrealistas tiveram trabalhos negados em sales de arte,
por enviarem uma obra classificada como pintura, quando, na verdade, estavam expondo
fotografias. Em entrevista ao site da New York Gallery of Modern Art, Close afirma que, apesar
de ter sido senso comum a alterao da terminologia dessa tcnica, ter sido barrado em um
salo, porque sua pintura fora confundida com fotografia, fez dele um exmio mestre da arte
fotorrealista. (CAPELATTO, 2014, p.39).
12 Disponvel
em:
http://www.theguardian.com/culture/video/2008/jul/02/greenaway.last.
supper Acesso em 11/05/2014.
13 Disponvel em: http://www.dailymotion.com/video/xp1i8d_leonardo-s-la-ultima-cena-petergreenaway-installation_creation Acesso em 11/05/2014.
14 Facsimile: reproduo de originais, principalmente de obras de artes, em impresses que recriam
texturas e volumes das tintas, degradaes do tempo e de outras manifestaes presentes na
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obra original. No caso dos facsimilies utilizados por Greenaway, alm de toda essa gama de
informao fiel obra original, o artista procurou reproduzir com o mximo de fidelidade o
suporte em que as obras originais foram criadas.
15 Esse hibridismo pode ser denominado de Pluriculturalismo das Artes e das Cincias (ou ainda
das Tecno-Midiaticas Cincias) como propem Valente e Mazzone (2007), ao longo de seus
ensaios, no livro A Aprendizagem na Era das Tecnologias Digitais.
16 Disponvel
em:
http://www.armoryonpark.org/index.php/programs_events/detail/last_
supper_peter_greenaway/ - Acesso em 10/05/2014.
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Por sua vez, Greenaway busca elementos por detrs dessas camadas de
tinta, indo alm do que os olhos veem na pintura. Para tanto, recorre aos estudos
19 Ao falar de estilos, estamos associando linguagem e tcnica.
20 Disponvel
em:
http://www.scanopia.com/leonardo-da-vinci/the-last-supper-beforerestoration.html
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Figura 9 - Details of Renaissance Paintings: Sandro Botticelli, Birth of Venus, 1482 (WARHOL,
1984)24
b. Mltiplas Narrativas
Ao tratar das interao entre a arte e a tecnologia, estabelecem-se, acima
de tudo, as relaes entre as linguagens (captulo 3 e 5) e as diversas lnguas de
que a arte e a tecnologia se apropriam, em suas particularidades, assim como as
relaes entre linguagens, tanto no que se refere s aproximaes quanto aos
afastamentos e abismos que existem entre elas.
As linguagens so compostas por signos, elementos que constroem
narrativas e que carregam informaes culturais. Assim sendo, refletir sobre
narrativas em arte e tecnologia consiste em refletir sobre histria, geografia,
poltica, religio, etc. Enfim, significa pensar nas mais diversas reas do
conhecimento (captulo 3).
A obra hipermiditica A ltima Ceia, de Peter Greenaway, apresenta uma
gama de narrativas dentro do contexto hbrido de suas relaes, transitando por
diversas reas de conhecimento. Nesse sentido, a histria pode ser observada
principalmente nesses quatro eixos: a narrativa do tema (a histria da ltima
Ceia a histria de Jesus), a narrativa do contexto da obra (os dados histricos da
pintura e de Leonardo DaVinci, seu autor), a narrativa de uma histria que est
sendo contada por Greenaway (com base em estudos, descobertas e suposies)
e a narrativa do pblico (cada espectador cria sua prpria interpretao).
A geografia (Cartografias do Espao, conforme Leo, 2004) se destaca de
dois modos: geografia histrica (posicionamento do espectador no lugar da obra
de DaVinci Santa Maria delle Grazie, em Milo, na Itlia e o lugar do tema o
salo em que se situa a mesa da ltima Ceia, bem como o suposto Monte das
Oliveiras, ao fundo, destacado pelo uso de luz e sombra neobarroca [vide figura
24 Disponvel em: http://www.warhol.org/collection/art/work/1998-1-307/ - Acesso em 11/05/2014
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Figura 10: Fragmento da projeo da instalao The Last Supper (Greenaway, 2010)26.
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Figura 11: Instalao de The Last Supper, no Park Avenue Armony, em Nova Iorque, EUA, 201130.
b. Ferramentas Criativas
No campo das artes, falar em tecnologia significa falar em ferramentas
criativas, pois so os dispositivos, as programaes (dados de comando) desses
dispositivos e suas diretrizes que definem como sero executadas determinadas
obras. Desse modo, ao mesmo tempo em que o artista tem domnio sobre a
ferramenta, ela tambm o domina. Segundo Machado (2007, p. 24):
As tcnicas, os artifcios, os dispositivos de que se utiliza o artista
para conceber, construir e exibir seus trabalhos no so apenas
ferramentas inertes, nem mediaes inocentes, indiferentes aos
resultados, que se poderiam substituir por quaisquer outras. Eles
esto carregados de conceitos, eles tm uma histria, eles derivam
30 Disponvel em: http://www.theartblog.org/2011/01/peter-greenaways-the-last-supper-aretrospective-view/
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dos facsimiles, de sintticos (tinta qumica criada em laboratrio para ser utilizada
em impressoras) para compreender como o suporte sobre o qual a imagem
pintada ou impressa est sobreposta e que vai ser projetada a imagem digital,
bem com a tinta que est nesse suporte (pintura ou facsimile) refletem a luz. A
combinao da luz digital com a pintura (ou facsimile), na parede, resultar na cor
que Greenaway supe ser a cor original utilizada por DaVinci.
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Dessa forma, ele amplia a exposio reflexiva de sua obra, que transpassa
pela pesquisa histrica do tema (Cristo e A ltima Ceia) e do artista (Leonardo
DaVinci), das artes e tecnologias e coloca em pauta elementos que constestam
a prpria histria das artes (se era senso comum que, no Renascimento, artistas
pintavam o manto de Cristo com pigmento vermelhon, por que alguns estudos
revelam uma possvel pintura violeta no manto sagrado de A ltima Ceia, de
Leonardo DaVinci?). Como afirma Diana Domingues, em Arte e vida no sculo
XXI: tecnologia, cincia e criatividade (2003), no mbito das artes, a tecnologia
possibilita novos estudos, observaes e crticas acerca das linguagens, que
compe esse vasto campo, bem como as suas relaes com os meios tecnolgicos.
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Figura 14: Dois momentos do clip-poema Sem Sada (Augusto de Campos, 2003)40
arquivos gerados pelo Adobe Flash, que podem ser exportados tanto para suportes de web
como para mdias de vdeo (dvd e blu-ray).
40 Disponvel em: http://www2.uol.com.br/augustodecampos/clippoemas.htm Acesso em
19/05/2014
41 Video completo em: https://www.youtube.com/watch?v=7hji5v68upM&list=PL83D597C861
BAFF69&index=20 canal do Youtube, do prprio Arnaldo Antunes, que inclui outros vdeopoemas e clipes. Acesso em 19/05/2014
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gasto pelo leitor para realizar o jogo proposto e que pode ser interrompido ou
continuado em qualquer instante.
Para nos aprofundarmos um pouco mais na questo cartogrfica (espaotempo) das transmdias, escolhemos o Projeto AirCity47 (AirCity Research, 2012)
parma realizar u estudo de caso, uma vez que alm de transitar por diversas
tecnologias, esse projeto apresenta uma relao forte entre reas diversas do
conhecimento (interdisciplinaridade). De acordo com Hildebrand (2012):
AirCity Research so instalaes artsticas que envolvem a
utilizao de espao fsico, mdias mveis e locativas (Android,
iPhone e Tablets), rede sem fio, mapeamento e som, todos
articulados atravs de PureData e Processing. A proposta explora
a possibilidade de atingir os limites do visvel e do invisvel de uma
localizao fsica, a partir de uma abordagem social, poltica e
esttica. As instalaes so sistemas por meio dos quais o pblico
pode explorar diferentes reas do som ao explorar o local.
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em uma parceria entre Hermes Renato Hildebrand, Efrain Foglia e Daniel Paz de
Araujo, entre outros artistas, tanto os autores do projeto quanto o pblico que
interage, seja na instalao (fsica) seja por meio do site-blog, so programadores
de histria.
Observamos uma nova narrativa sobre trs locais onde a instalao foi
desenvolvida, quais sejam: Santa Maria/Rio Grande do Sul, Cunha/So Paulo e
Paraty/Rio de Janeiro. Alm da histria local atual e do passado que esto nos
registros acadmicos e bibliotecrios, surgem histrias que contam outros
acontecimentos que marcaram o povo local. Em Cunha e Paraty, surgem novos
fatos que colocam em discusso o que os livros e a mdia tradicional contam sobre
a trajetria da Estrada do Ouro, entre outras tramas. Em Santa Maria, uma foto
postada no site-blog revela acontecimentos polticos e personagens envolvidas.
H a narrativa pela imagem fotogrfica e pelos infogramas contidos no objeto
registrado.
https://www.youtube.com/watch?v=onUmrPHixG4
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sociais. Para Hildebrand e Foglia (2012, p.51), [...] o Projeto AirCity uma forma
de se estender as cidades contemporneas transformando as noes de espaotempo, territrio e lugar. Conforme os autores:
O projeto AirCity, como um work in process, vem sendo
desenvolvido em vrias verses. Air City um projeto de mdia
locativa aplicado ao espao digital pblico. O sistema permite ao
usurio navegar (usando um telefone celular) dentro do espao
fsico de modo a ativar sons localizados nos espaos pblicos.
A utilidade do sistema diversa, desde instalaes sonoras at
a possibilidade de criar udios grficos que envolvem o uso de
espao fsico, dispositivos mveis (Android e / ou iPhone), redes
sem fio de mapeamento e de som, todos articulados atravs
do software PureData e do Processing. A proposta explora a
possibilidade de ativar o espao invisvel de uma localizao
fsica, a partir de uma abordagem social, poltica e esttica. As
instalaes so sistemas que o pblico ativa diferentes reas de
som e imagens, enquanto explora ferramentas de localizao.
(HILDEBRAND e FOGLIA, 2012. p.52)
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Figura 18: Ilustrao (de CHYMPANBOY) criada no software livre open source54 MyPaint55
Ilustrao Digital
A pintura, o desenho ou a ilustrao apropriam-se das mais diversas
ferramentas (tecnologias) para sua produo. Na sala de aula, muitas vezes,
determinados recursos no so acessveis por diversos motivos, dentre eles,
o espao fsico escolar. Nesse contexto, o meio digital surge como uma das
possibilidades para encontrar uma variedade de ferramentas para a produo
desse tipo de arte.
Diversos so os softwares (programas) que trabalham com mecanismos
artsticos para a produo do que podemos denominar de ilustrao digital, e que
envolve desenho, iconografia e pintura. As plataformas de produo digital no
esto limitadas aos computadores (desktops ou laptops), pois esto disponveis
tambm em tablets e celulares, que atualmente, possuem inmeras verses dos
mais variados programas de ilustrao digital. Dentre essa imensa diversidade de
softwares, podemos encontrar programas de desenho, de interveno fotogrfica,
de colorizao (pintura), de modelagem (criao de objetos e personagens 2D e
3D), de montagem (colagem digital), de Histrias em Quadrinhos, entre outros.
54 Open sources: so softwares (programas) com dados de programao abertos (liberados), que
permitem que usurios e programadores possam modific-los, a fim de aprimor-los ou adaptlos a determinadas necessidades e contextos.
55 Disponvel em : http://mypaint.intilinux.com/?page_id=530 Acesso em 02/06/2014
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Figura 21: Plataforma do Twiddla, que demonstra a insero de uma imagem (upload) no quadrobranco 03/06/2014
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entre outras, alm de apresentar toda uma gama de ferramentas com suas
variaes. Por exemplo, o programa permite escolher no somente a espessura do
trao, mas tambm a variao do grafite (HB, 2B, 6B, etc.).
Mltiplas linguagens da pintura, do desenho e da ilustrao publicitria,
institucional, entre outras, podem ser exploradas durante o aprendizado da arte,
por meio desse software, sem a necessidade de adquirir as ferramentas fsicas,
uma vez que algumas delas, tais como as tintas e outras, possuem determinadas
caractersticas que exigem cuidado no manuseio e utiliz-las em determinados
espaos ou com determinadas faixas etrias no seria possvel. Assim, possvel
representar digitalmente como foi feita a mistura de tinta de uma pintura
renascentista ou impressionista, por exemplo.
Ainda com relao ilustrao digital, as histrias em quadrinhos
constituem um tipo de linguagem que permite associar ilustrao (imagem),
texto (literatura) e a iconografia (onomatopeias, bales de fala, de pensamento,
entre outros), na construo de uma narrativa hbrida, que pode ser elaborada
em inmeros estilos e apropriar-se de inmeros contedos, podendo assim, ser
utilizada em quaisquer reas de conhecimento (disciplinas).
Para a criao de uma histria em quadrinhos,62 basta um lpis, uma
borracha, uma folha de papel e uma ideia. Contudo, alguns aparatos surgiram, ao
longo dos anos, para facilitar a produo de uma HQ, tais como as rguas gabarito
(moldes com os bales de fala), as folhas transfer de retcula (pontilhados para
uso em sombras e hachuras), as canetas especficas para arte-final, os papis
produzidos exclusivamente para desenho de histria em quadrinhos, o lpis azul
especial para HQs e Mangs (a arte-final em nanquim aplicada sobre ele, sem
precisar apag-lo, pois ao scanear a HQ para colorizao e impresso, o trao do
lpis eliminado), entre outros.
A computao vem ao encontro da produo das histrias em quadrinhos,
seja auxiliando na elaborao dos textos, outrora manuscritos ou datilografados
em mquina de escrever, seja na colorizao, com recursos avanados de softwares
profissionais como o Photoshop ou com softwares livres como o MyPaint, que
cria, alm das cores, efeitos de luz e sombra, arte-final (efeitos de nanquim) e
retculas (com inmeras possibilidades de texturas). Nesse sentido, alguns
softwares disponibilizam recursos prprios da construo das HQs, prontos para
serem aplicados, como o caso do sistema online livre PIXTON63, que oferece, ao
62 HQ: Histrias em Quadrinhos. Em ingls, so denominadas de Comic Book, em Portugal de Banda
Desenhada, e em alguns pases europeus, de Graphic Novels (que nos EUA e Brasil nomeiam
as edies especiais com histrias fechadas, em formatos especiais, geralmente impressos em
papel com gramatura maior do que as revistas normais e com capa dura). Alm do estilo japons
de Mang.
63 Disponvel em: http://www.pixton.com/br/ - Acesso em 03/06/2014
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Figura 22: Sesso do Pixton para escolas (vdeo de apresentao disponvel em: http://www.
pixton.com/br/schools/overview)
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bem como enredo, so propostos pelo escritor portugus Vasco Ribeiro, conforme
assinala Hugo Salvador, no portal P372.
Neste projecto [join2write], cada escritor, que no tem de ser
um escritor de profisso, continua uma estria que est a ser
contada, dando sequncia narrativa com as suas palavras e de
acordo com o seu prprio imaginrio e criatividade. O objectivo
que os autores/escritores colaborem com desconhecidos e,
empatias parte, escrevam um livro, uma narrativa com princpio,
meio e fim, levando a cabo um projecto em que a criao de cada
um e o respeito pela criao do outro e pelo objectivo final so
determinantes para o sucesso do mesmo.
Figura 24: Ilustrao de Rita Correia, para o livro colaborativo De Braos Levantados74
Vdeos Digitais
Ao falarmos em arte, uma das reas que tem maior popularidade nos dias
atuais o cinema, e que na sala de aula de arte-educao, geralmente usado
como ferramenta de anlise (assistir a um filme e debater sobre ele, por exemplo).
Enquanto produo, o cinema parece um tanto distante do ambiente escolar,
devido dificuldade de acesso tecnologia cinematogrfica. No entanto, o avano
tecnolgico levou o cinema para o campo do vdeo digital e, atualmente, possvel
produzir filmes com recursos mais acessveis, como, por exemplo, com cmeras
de celulares, tablets, cmeras fotogrficas digitais de baixo custo com recursos de
filmagem, alm de softwares gratuitos para tablets, celulares e computadores de
edio de vdeo.
Com essas ferramentas, possvel criar filmes de fico de curta, mdia
e longa-metragem, documentrios, vdeo-artes, vdeo-danas e videoclipes, entre
outros formatos/categorias. Os contedos abrangem inmeros temas, abrindo
espao para o dilogo entre arte e tecnologia (interdisciplinaridade), e o suporte
tecnolgico serve como ferramenta pedaggica para dialogar com a Matemtica
(regra dos teros para dimensionar vdeos, por exemplo), com a Fsica (luz e cor) e
com outras disciplinas.
Dentre as mltiplas possibilidades de filmagem digital, os filmes produzidos
em celulares (Cell-films) tm ganhado espao nos festivais e na internet e se tornado
uma linguagem (e tcnica) interessante para ser usada em sala de aula. Existem
softwares de edio de vdeo para celulares e na medida da impossibilidade de
exibi-lo em suportes externos (Tvs, Projetores), o vdeo pode ser compartilhado
via bluetooth ou infravermelho,75 com outros aparelhos, ou ainda, ser enviado para
sites como o Youtube, o Vimeo ou para blogs ou Facebook, etc.
Nesse subcaptulo, apresentaremos alguns exemplos de filmes de
celulares, assim como algumas referncias de programas gratuitos para edio de
vdeo, que podem ser utilizados por alunos e professores, no ambiente escolar. De
acordo com Lucena (2008, p. 2137):
[...] o estudo das possibilidades estticas, poticas e de linguagem
dos vdeos produzidos com o uso da webcam e cellcams (cmeras
de celulares) possibilitam acompanhar o desenvolvimento de novas
formas de expresso artstica e oferecer ferramentas para uma
interpretao da produo audiovisual na contemporaneidade,
quando surgem conceitos como cinema expandidoexpanded
cinema (YOUNGBLOOD, 1970). A variedade de dados e mdias que
esto convergindo em um nico aparelho constitui-o como um
espao da heterogeneidade.
75 Bluetooth e Infravermelho so duas das tecnologias mais comuns para transmitir dados sem o
uso de cabos.
65
Figura 25: Como se toca se dana (filme de celular, de Rafael Vilela e Rodrigo Cardoso, 201176)
66
Figura 27 e 28: Frames do filme Carteira de Pescador (Philipe Antunes e equipe, 2011)
79 Disponvel em: MONTEIRO, Castellano Fernandes. Celular na sala de aula como alternativa
pedaggica no cotidiano das escolas. Anais da 29 reunio anual da ANPEd-Educao, Cultura e
Conhecimento na Contemporaneidade: Desafios e Compromissos. Caxambu: ANPEd 29 (2006).
80 Link para acesso aos vdeos do festival Cel.u.Cine: https://www.youtube.com/channel/
UCeXFNDV164d-RaRbufnEVCw Acesso em 06/06/2014
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CONSIDERAES FINAIS
Em uma San Francisco ps-apocalptica, o caador de recompensas
Rick Deckard (que possua uma ovelha real que morreu de ttano), tenta
enganar a todos, inclusive a si mesmo, de que sua nova ovelha eltrica
igual a uma de verdade, enquanto realiza um trabalho que odeia, e lida
com sua esposa viciada em estmulos artificiais. (MCKINTY, Adrian)
82 Tte--tte: relao presencial; contexto fsico, onde os corpos esto presentes, um ao lado do
outro.
70
Figura 29: Capa de Guillermo Murua83 (EUA, 2010), para o conto Andrides Sonham com Ovelhas
Eltricas?
71
utiliza essas novas ferramentas, isto , que faz uso de determinada tecnologia se
comunica. Para Flusser (1998, p. 72):
No importa que coisa a lngua possa articular (e somos tomados
de vertigem se consideramos quanta coisa pode articular),
articula ela tambm a essncia (consciente e inconsciente) do
grupo que a ela recorre para comunicar-se. Ela , entre muitas
outras coisas, tambm esprito de tal grupo tornado objeto. E
quem admitir o fato (embora no necessariamente na formulao
proposta), dever concordar que a contemplao de uma lngua
um mtodo excepcionalmente apto a revelar o esprito do grupo
que a fala. A vivncia concreta prova que no pode haver real
compreenso do grupo (povo, etnia, ou no importa que nome
queiramos dar a um grupo lingustico) sem real compreenso,
isto , domnio, da sua lngua.
72
REFERNCIAS
ALBERTINO, Orlando Lopes. Navegar () Impreciso: Reconhecendo a Arte do
Sculo XX a partir de Nome, de Arnaldo Antunes. Viria: UFES. 1999.
ANTUNES, Arnaldo. In: www.youtube.com/watch?v=EDUFC_e4xuE&feature=
related. Acesso em 23/ 07/ 2009.
BONILHA, Caroline Leal. Alm da normatizao binria do corpo: hibridismo e
mestiagens nas obras de Nan Goldin e Matthew Barney. ARTEFACTUM-Revista de
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CAPELATTO. Igor. Fotografia. PARAN: UAB/UNICENTRO. 2014. Verso digital.
______; COHEN, Rosa . A ltima Ceia de Peter Greenawway: um recorte barroco.
Imagofagia, v. 9, p. 1, 2013.
CAVALCANTI, Anna H. Arte e Natureza em Nietzsche e August Schlegel. Rev. Filos.,
Aurora, Curitiba, v. 20, n. 27, p. 351-366, jul./dez. 2008.
COHEN, Rosa. Nova especialidade hbrida na obra de Peter Greenaway. As
circunscries pictrico cinticas das instalaes. Estdio: artistas sobre outras
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______. Motivaoes Pictoricas e Multimediais na Obra de: Peter Greenaway. So
Paulo: Ferrari, 2008.
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