Geografia Pequena Historia Critica (Fichamento)
Geografia Pequena Historia Critica (Fichamento)
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Captulo 1
O objeto da Geografia
Alguns autores definem a Geografia como o estudo das relaes entre o homem
e o meio, ou, posto de outra forma, entre a sociedade e a natureza. Dentro desta
concepo aparecem, pelo menos, trs vises distintas do objeto: alguns autores vo
apreend-lo como as influncias da natureza sobre o desenvolvimento da humanidade.
Estes tomam a ao do meio sobre os homens e as sociedades, como uma verdade
inquestionvel, e caberia Geografia explicar as formas e os mecanismos pelos quais
esta ao se manifesta. Desta forma, o homem posto como um elemento passivo, cuja
histria determinada pelas condies naturais, que o envolvem. Outros autores,
mantendo a idia da Geografia, como o estudo da relao entre o homem e a natureza,
vo definir-lhe o objeto como a ao do homem na transformao deste meio. Assim,
invertem totalmente a concepo anterior, dando o peso da explicao aos fenmenos
humanos. Caberia estudar como o homem se apropria dos recursos oferecidos pela
natureza e os transforma, como resultado de sua ao. H ainda aqueles autores que
concebem o objeto como a relao entre si, com os dados humanos e os naturais
possuindo o mesmo peso. Para estes, o estudo buscaria compreender o estabelecimento,
a manuteno e a ruptura do equilbrio entre o homem e a natureza. A concepo
ecolgica informaria diretamente esta viso. A discusso, entre estas trs vises do
objeto, expressa o mais intenso debate do pensamento geogrfico.
Captulo 2
O Positivismo como fundamento da Geografia Tradicional
Apesar do elevado numero de definies de objeto existentes na reflexo
geogrfica, possvel apreender-se uma continuidade neste pensamento. Esta advm,
principalmente, do fundamento comum de todas as correntes da Geografia Tradicional
sobre as bases do positivismo. Uma primeira manifestao dessa filiao positivista est
na reduo da realidade ao mundo dos sentidos, isto , em circunscrever todo trabalho
cientfico ao domnio da aparncia dos fenmenos. Outra manifestao da filiao
positivista, tambm traduzida numa mxima geogrfica, a idia da existncia de um
nico mtodo de interpretao, comum a todas as cincias, isto , a no aceitao da
diferena de qualidade entre o domnio das cincias humanas e o das cincias naturais.
O homem vai aparecer como um elemento a mais da paisagem, como um dado do lugar,
como mais um fenmeno da superfcie da Terra. A unidade do pensamento geogrfico
deste termo, o contedo a ele referido era por demais variado. Desta forma, pode-se
dizer que o conhecimento geogrfico se encontrava disperso. Por um lado, as matrias
apresentadas com essa designao eram bastante diversificadas, sem um contedo
unitrio. Por outro lado, muito do que hoje se entende por Geografia, no era
apresentado com este rtulo. Este quadro vai permanecer inalterado at o final do sculo
XVIII. Ao se analisar as colocaes desses autores (at o sc. XVIII), observa-se que a
maior parte dos temas tratados pouco ou nada tm em comum com o que posteriormente
ser considerado Geografia. Na verdade, trata-se de todo um perodo de disperso do
conhecimento geogrfico, onde impossvel falar dessa disciplina como um todo
sistematizado e particularizado. Nlson Werneck Sodr denomina-o de pr-histria da
Geografia.
A sistematizao do conhecimento geogrfico s vai ocorrer no incio do sculo
XIX. Estes pressupostos histricos da sistematizao geogrfica objetivam-se no
processo de produo. Assim, na prpria constituio do modo de produo capitalista.
O primeiro destes pressupostos dizia respeito ao conhecimento efetivo da extenso real
do planeta. Isto , era necessrio que a Terra toda fosse conhecida para que fosse
pensado de forma unitria o seu estudo. O conhecimento da dimenso e da forma real
dos continentes era a base para a idia de conjunto terrestre, concepo basilar para a
reflexo geogrfica.
Esta condio comea a se realizar com as grandes navegaes, e as
conseqentes descobertas, efetuadas pelos europeus, a partir do quinhentismo. Tal
condio vai se substantivando com o prprio avano do mercantilismo e com a
formao dos imprios coloniais. A apropriao de um dado territrio implicava o
estabelecimento de uma relao mais estreita com os elementos a existentes, logo, num
maior conhecimento de sua realidade local. O domnio implicava em ir alm do simples
conhecimento de novas terras, era necessrio penetr-las e criar a estabelecimentos
constantes, enfim apropri-las. A explorao produtiva dos territrios coloniais, com o
estabelecimento de atividades econmicas, aprofundava ainda mais o conhecimento de
suas caractersticas.
Com o desenvolvimento do comrcio colonial, os Estados europeus vo
incentivar o inventrio dos recursos naturais, presentes em suas possesses, gerando
informaes mais sistemticas, e observaes mais cientificas. Assim, passou-se dos
relatos ocasionais aos levantamentos mais tcnicos; das expedies exploradoras s
expedies cientficas. O interesse dos Estados levou ainda fundao de institutos nas
metrpoles, que passaram a agrupar o material recolhido, como as sociedades
geogrficas e os escritrios coloniais. A Geografia da primeira metade do sculo XIX
foi, fundamentalmente, a elaborao desse material.
Outro pressuposto para o aparecimento de uma Geografia unitria, residia no
aprimoramento das tcnicas cartogrficas, o instrumento por excelncia do gegrafo.
Era fundamental, para a navegao, poder calcular as rotas, saber a orientao das
correntes e dos ventos predominantes, e a localizao correta dos portos. Estas
exigncias fizeram desenvolver o instrumental tcnico da cartografia. Finalmente, a
descoberta das tcnicas de impresso, difundiu e popularizou as cartas e os Atlas. Todas
estas condies materiais, para a sistematizao da Geografia, so forjadas no processo
de avano e domnio das relaes capitalistas. Dizem respeito ao desenvolvimento das
foras produtivas, subjacente emergncia do novo modo de produo.
Uma primeira valorizao do temrio geogrfico vai ocorrer na discusso da
Filosofia. As correntes filosficas do sculo XVIII vo propor explicaes abrangentes
do mundo; formulam sistemas que buscam a compreenso de todos os fenmenos do
real. Propor a explicao racional do mundo implicava deslegitimar a viso religiosa,
logo, a ordem social por ela legitimada. Esta perspectiva, de explicar todos os
fenmenos, englobava tambm aqueles tratados pela Geografia, sendo assim um
fundamento geral de sua sistematizao. Outra fonte da sistematizao geogrfica pode
ser detectada nos pensadores polticos do Iluminismo. Estes autores foram os portavozes do novo regime poltico, os idelogos das revolues burguesas, os propositores
da organizao institucional, que interessava ao modo de produo emergente. Em suas
argumentaes, passaram por temas prprios da Geografia, notadamente ao discutir as
formas de poder e de organizao do Estado.
Rousseau, por exemplo, discutiu a relao entre a gesto do Estado, as formas de
representao e a extenso do territrio de uma sociedade. Dizia ele que a democracia
s era possvel nas naes pouco extensas, e que os Estados de grandes dimenses
territoriais tendiam necessariamente a formas de governo autocrticas. Outro autor
iluminista, Montesquieu, em sua clebre obra O esprito das leis, dedica todo um
captulo discusso sobre a ao do meio no carter dos povos. Nesse sentido, elabora
teses profundamente deterministas, como a de que os povos que habitam regies
montanhosas teriam uma ndole pacfica (pois contariam com uma proteo natural do
meio), ao passo que os habitantes da plancie seriam naturalmente guerreiros (em face
da contnua possibilidade de invases propiciada pelo relevo plano). De todo modo,
estas discusses vieram enriquecer a posio desfrutada pelos temas geogrficos; suas
citaes so comuns nos trabalhos dos primeiros gegrafos. Tambm os trabalhos
desenvolvidos pela Economia Poltica atuaram na valorizao dos temas geogrficos.
Os economistas polticos discutiram questes geogrficas, ao tratar de temas como a
produtividade natural do solo; a dotao diferenciada dos lugares, em termos de
recursos minerais; o problema da distncia, o do aumento populacional, entre outros.
Finalmente, o temrio geogrfico vai obter o pleno reconhecimento de sua
autoridade, com o aparecimento das teorias do Evolucionismo. Estas, contemporneas
da sistematizao da geografia, forneceram o patamar imediato da legitimao cientfica
dessa disciplina. O Evolucionismo, visto como conjunto de teorias, que partem das
formulaes de Darwin e Lamarck, d um lugar de destaque, em sua explicao, ao
papel desempenhado pelas condies ambientes; na evoluo das espcies, a adaptao
ao meio seria um dos processos fundamentais. Ao incio do sculo XIX, a malha dos
pressupostos histricos da sistematizao da Geografia j estava suficientemente tecida.
A Terra estava toda conhecida. Estas condies haviam se constitudo no prprio
processo de formao, avano e domnio das relaes capitalistas. Tal processo realiza
tanto os pressupostos materiais, quanto os vinculados evoluo do pensamento. A
sistematizao da Geografia, sua colocao como uma cincia particular e autnoma,
foi um desdobramento das transformaes operadas na vida social, pela emergncia do
modo de produo capitalista. E, mais, a Geografia foi, na verdade, um instrumento da
etapa final deste processo de consolidao do capitalismo, em determinados pases da
Europa.
Os autores considerados os pais da Geografia, aqueles que estabelecem uma
linha de continuidade nesta disciplina, so alemes Humboldt e Ritter. Na verdade,
todo o eixo principal da elaborao geogrfica, no sculo XIX, estar sediado neste pas.
da Alemanha que aparecem os primeiros institutos e as primeiras ctedras dedicadas a
esta disciplina; de l que vm as primeiras teorias e as primeiras propostas
metodolgicas; enfim, l que se formam as primeiras correntes de pensamento. Tal
relao, entre o aparecimento da Geografia e a via do desenvolvimento do capitalismo
na Alemanha, no gratuita ou aleatria. Por esta razo, cabe discuti-la.
Captulo 4
A sistematizao da Geografia: Humboldt e Ritter
A especificidade da situao histrica da Alemanha, no incio do sculo XIX,
poca que se d a ecloso da Geografia, est no carter tardio da penetrao das relaes
capitalistas nesse pas. Na verdade, o pas no existe enquanto tal, pois ainda no se
constituiu como Estado Nacional. A Alemanha de ento um aglomerado de feudos
(ducados, principados, reinos) cuja nica ligao reside em alguns traos culturais
comuns. Inexistente qualquer unidade econmica ou poltica, a primeira comeando a se
formar no decorrer do sculo XIX, a segunda s se efetivando em 1870, com a
unificao nacional. Assim, a Alemanha no conhece a monarquia absoluta (forma de
governo prpria do perodo de transio), nem qualquer outro tipo de governo
centralizado. O poder est nas mos dos proprietrios de terras, sendo absoluto e a nvel
local a estrutura feudal permanece intacta. neste quadro que as relaes capitalistas
vo penetrar, sem romper (ao contrrio, conciliando) com a ordem vigente. Tal
penetrao vai produzir um arranjo singular, aquilo que j foi chamado por alguns
autores de feudalismo modernizado. Isto , um relativo desenvolvimento do
capitalismo, engendrado por agentes sociais prprios do feudalismo a aristocracia
agrria; uma transformao econmica, que se opera sem alterar a estrutura do poder
existente.
O capitalismo penetra no quadro agrrio alemo sem alterar a estrutura
fundiria. A propriedade da terra, origem de todo o poder, permanece nas mos dos
elementos pr-capitalistas. Estes se tornam capitalistas, pela destinao dada
produo: o latifndio, que possua uma economia fechada, de autoconsumo, passa a
produzir para um mercado. Entretanto, as relaes de trabalho no se alteram - a
servido (forma de relao de trabalho tpica do feudalismo) permanece como base de
toda a produo. Assim, mesclam-se elementos tipicamente feudais com outros prprios
do capitalismo: produo para o mercado, com trabalho servil.
No ocorre, na Alemanha, uma revoluo democrtico-burguesa. A burguesia
alem s se desenvolver sombra do Estado, e de um Estado comandado pela
aristocracia agrria. Este o quadro da Alemanha, na virada do sculo XVIII. A prpria
sedimentao das relaes capitalistas e, principalmente, o expansionismo napolenico,
vo acender nas classes dominantes alems a idia da unificao nacional. Esta meta
passa a ser, a partir de um certo momento, uma necessidade para a prpria continuidade
do desenvolvimento alemo. Este se havia acelerado, em funo do bloqueio continental
imposto por Bonaparte, que propiciou uma incipiente industrializao em algumas
cidades da Alemanha, alm de incrementar o comrcio interno. Este ideal de unidade
vai ter sua primeira manifestao concreta com a formao, em 1815, da Confederao
Germnica, que congregou todos os principados alemes e os reinos da ustria e da
Prssia. Apesar de no constituir ainda uma unificao nacional, estabeleceu maiores
laos econmicos entre seus membros, com o fim dos impostos aduaneiros entre eles.
dentro desta situao que se pode compreender a ecloso da Geografia. Temas
como domnio e organizao do espao, apropriao do territrio, variao regional,
entre outros, estaro na ordem do dia na prtica da sociedade alem de ento. , sem
dvida, deles que se alimentar a sistematizao geogrfica. Do mesmo modo como a
Sociologia aparece na Frana, onde a questo central era a organizao social (um pas
em que a luta de classes atingia um radicalismo nico), a Geografia surge na Alemanha
onde a questo do espao era a primordial. As primeiras colocaes, no sentido de uma
Geografia sistematizada, vo ser a obra de dois autores prussianos ligados aristocracia:
Alexandre Von Humboldt, conselheiro do rei da Prssia, e Karl Ritter, tutor de uma
famlia de banqueiros.
Humboldt possua uma formao de naturalista e realizou inmeras viagens. Sua
proposta de Geografia aparece na justificativa e explicitao de seus prprios
procedimentos de anlise. Assim, no estava preocupado em formular os princpios de
uma nova disciplina. Desta forma, seu trabalho no tinha um contedo normativo
explcito. Seus principais livros so Quadros da Natureza e Cosmos, ambos publicados
no primeiro quartel do sculo XIX. Caberia ao estudo geogrfico: reconhecer a
unidade na imensa variedade dos fenmenos, descobrir pelo livre exerccio do
pensamento e combinando as observaes, a constncia dos fenmenos em meio a suas
variaes aparentes. Desta forma, a Geografia seria uma disciplina eminentemente
sinttica, preocupada com a conexo entre os elementos, e buscando, atravs dessas
conexes, a causalidade existente na natureza. Em termos de mtodo, Humboldt prope
o empirismo raciocinado, isto , a intuio a partir da observao.
A obra de Ritter j explicitamente metodolgica. Em seu principal trabalho,
Geografia Comparada, h um intuito deliberado de propor uma Geografia, sendo assim
um livro normativo. A formao de Ritter tambm radicalmente distinta da de
Humboldt, enquanto aquele era gelogo e botnico, este possui formao em Filosofia e
Histria. Ritter define o conceito de sistema natural, isto , uma rea delimitada
dotada de uma individualidade. A Geografia deveria estudar estes arranjos individuais, e
compar-los. Cada arranjo abarcaria um conjunto de elementos, representando uma
totalidade, onde o homem seria o principal elemento. Assim, a geografia de Ritter ,
principalmente, um estudo dos lugares, uma busca da individualidade destes. A proposta
de Ritter , por estas razes, antropocntrica (o homem o sujeito da natureza), regional
(aponta para o estudo de individualidades), valorizando a relao homem-natureza. Em
termos de mtodo, Ritter vai reforar a anlise emprica para ele, necessrio
caminhar de observao em observao.
A obra destes dois autores compe a base da Geografia Tradicional. Todos os
trabalhos posteriores vo se remeter s formulaes de Humboldt e Ritter, seja para
aceit-las, ou refut-las. Apesar das diferenas entre estas a Geografia de Ritter
regional e antropocntrica, a de Humboldt busca abarcar todo o Globo sem privilegiar o
homem os pontos coincidentes vo aparecer, para os gegrafos posteriores, como
fundamentos inquestionveis de uma Geografia unitria. Assim, estes autores criam uma
linha de continuidade no pensamento geogrfico, coisa at ento inexistente. A gerao
que se segue de Humboldt e Ritter vai se destacar mais pelo avano empreendido na
sistematizao de estudos especializados do que pela Geografia Geral.
Captulo 5
Ratzel e a Antropogeografia
Um revigoramento do processo de sistematizao da Geografia vai ocorrer com
as formulaes de Friedrich Ratzel. Este autor, tambm alemo e prussiano, publica
suas obras no ltimo quartel do sculo XIX. Enquanto Humboldt e Ritter vivenciaram o
aparecimento do ideal de unificao alem, Ratzel vivencia a constituio real do
Estado nacional alemo e suas primeiras dcadas. Suas formulaes s so
compreensveis em funo da poca e da sociedade que as engendram. A Geografia de
Ratzel foi um instrumento poderoso de legitimao dos desgnios expansionistas do
Estado alemo recm-constitudo. L. Febvre chegou a denomin-la de manual de
dilogo com Ratzel. O principal artfice desta empresa foi Vidal de La Blache. Este
autor, que publicou suas obras nas ltimas dcadas do sculo passado e nas primeiras do
atual, fundou a escola francesa de Geografia e, mais, deslocou para este pas o eixo da
discusso geogrfica, at ento sediado na Alemanha.
Do mesmo modo que as colocaes de Ratzel embasavam-se na situao
concreta de sua poca e de sua sociedade, a Geografia de Vidal de La Blache s ser
compreensvel em relao conjuntura da Terceira Repblica, ao antagonismo com a
Alemanha, e particularidade do desenvolvimento histrico da Frana. Ambos
veicularam, atravs do discurso cientfico, o interesse das classes dominantes de seus
respectivos pases. A proposta de Ratzel exprimia o autoritarismo, que permeava a
sociedade alem; o agente social privilegiado, em sua anlise, era o Estado, tal como na
realidade que este autor vivenciava. A proposta de Vidal manifestava um tom mais
liberal, consoante com a evoluo francesa, e sua anlise partiu do homem abstrato do
liberalismo. Vidal, vestindo uma capa de objetividade, condenou a vinculao entre o
pensamento geogrfico e a defesa de interesses polticos imediatos, brandindo o clssico
argumento liberal da necessria neutralidade do discurso cientfico. Com esta postura,
atacou diretamente o carter apologtico do expansionismo alemo, contido nas
formulaes de Ratzel. Isto no quer dizer, como ser visto a seguir, que a Geografia
vidalina no veiculasse uma legitimao ideolgica dos interesses franceses. Apenas,
esta vinculao era mais dissimulada, os temas polticos no eram tratados diretamente,
a legitimao do imperialismo francs era mais mediatizada e sutil. Na verdade, Vidal
imprimiu, no pensamento geogrfico, o mito da cincia assptica, propondo uma
despolitizao aparente do temrio dessa disciplina.
Entretanto, a Geografia francesa que esconjurou a Geopoltica vai criar uma
especializao denominada Geografia Colonial. Outra crtica de princpio s
formulaes de Ratzel incidiu no seu carter naturalista. Isto , Vidal criticou a
minimizao do elemento humano, que aparecia como passivo nas teorias de Ratzel.
Uma terceira crtica de Vidal Antropogeografia, derivada da anterior, atacou a
concepo fatalista e mecanicista da relao entre os homens e a natureza. Assim,
atingiu diretamente a idia da determinao da Histria pelas condies naturais. Vidal
de La Blache definiu o objeto da Geografia como a relao homem-natureza, na
perspectiva de paisagem. Colocou o homem como um ser ativo, que sofre a influncia
do meio, porm que atua sobre este, transformando-o. Observou que as necessidades
humanas so condicionadas pela natureza, e que o homem busca as solues para
satisfaz-las nos materiais e nas condies oferecidos pelo meio. Neste processo, de
trocas mtuas com a natureza, o homem transforma a matria natural, cria formas sobre
a superfcie terrestre: para Vidal, a que comea a obra geogrfica do homem.
Assim, na perspectiva vidalina, a natureza passou a ser vista como possibilidades
para a ao humana; da o nome de Possibilismo dado a esta corrente por Lucien
Febvre. A teoria de Vidal concebia o homem como hspede antigo de vrios pontos da
superfcie terrestre, que em cada lugar se adaptou ao meio que o envolvia, criando, no
relacionamento constante e cumulativo com a natureza, um acervo de tcnicas, hbitos,
usos e costumes, que lhe permitiram utilizar os recursos naturais disponveis. A este
conjunto de tcnicas e costumes, construdo e passado socialmente, Vidal denominou
gnero de vida, o qual exprimiria uma relao entre a populao e os recursos, uma
situao de equilbrio, construda historicamente pelas sociedades. A diversidade dos
meios explicaria a diversidade dos gneros de vida.
Geografia caberia estudar os gneros de vida, os motivos de sua manuteno
ou transformao, e sua difuso, com a formao dos domnios de civilizao. Em
termos de mtodo, a proposta de Vidal de La Blache no rompeu com as formulaes de
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