O Canto Do Guerreiro
O Canto Do Guerreiro
O Canto Do Guerreiro
(GONALVES DIAS)
Carline Barbon
dos Santos
INDIANISMO ROMNTICO
Os indgenas, com suas lendas e mitos, seus dramas e conflitos, suas lutas e amores, sua fuso
com o branco, ofereceram-lhe um mundo rico de significao simblica. Embora no tenha
sido o primeiro a buscar na temtica indgena recursos para o abrasileiramento da
literatura, Gonalves Dias foi o que mais alto elevou o Indianismo.
A obra indianista est contida nas Poesias americanas dos Primeiros cantos, nos Segundos
cantos e ltimos cantos, sobretudo nos poemas Marab, Leito de folhas verdes, Canto
do piaga, Canto do tamoio, Canto do guerreiro e I-Juca-Pirama, este talvez o ponto
mais alto da poesia indianista.
uma das obras-primas da poesia brasileira, graas ao contedo emocional e lrico, fora
dramtica, ao argumento, linguagem, ao ritmo rico e variado, aos mltiplos sentimentos,
fuso do potico, do sublime, do narrativo, do dilogo, culminando na grandeza da
maldio do pai ao filho que chorou na presena da morte.
Pela obra lrica e indianista, Gonalves Dias um dos mais tpicos representantes do
Romantismo brasileiro e forma com Jos de Alencar na prosa a dupla que conferiu carter
nacional literatura brasileira.
O CANTO DO GUERREIRO
APONTAMENTOS
Para que o ndio seja elevado condio de mito nacional, necessrio submet-lo a uma
espcie de deformao idealizante, eliminando dessa imagem tudo que possa contrariar o
estatuto de heri e os valores morais e cristos da civilizao ocidental. Para esse retrato
idealizado, so tomados os atributos do cavaleiro medieval e da tica corts (nobreza, coragem,
lealdade...) a fim de fazer o ndio, como antepassado do brasileiro, equiparar-se
qualitativamente ao conquistador.
Com isso, explica Antonio Candido (1918), o indianismo surge no apenas como passado mtico e
lendrio, mas tambm como passado histrico, maneira da Idade Mdia, de modo que lenda e
histria se fundem num esforo de suscitar um mundo potico digno. O temrio indianista serve,
assim, como compensao inexistncia de um passado medieval ligado ao pas e to
valorizado pelos romnticos europeus.
Na poesia de Gonalves Dias, uma das representaes mais acabadas dessa associao entre o
ndio e o cavaleiro medieval est em I-Juca Pirama, seguido pelos heris indgenas de poemas
como Canto do Guerreiro e Canto do ndio.
Essa viso trgica da conquista parece se justificar pelo antilusitanismo que marca o esprito
de revoltas regionais como a Balaiada, pois Gonalves Dias vivencia na provncia natal as
tenses desde a independncia nacional at essas rebelies do nativismo exaltado latinoamericano contra a persistncia da dominao portuguesa mesmo depois de 1822.
O Canto do Guerreiro pertence a uma dimenso potica que trata com otimismo os feitos do
ndio, mas convm dizer que por trs do aparente otimismo que Gonalves atribuiu a este
poema haja vista que o nico dentre a sua obra indianista que no trata explicitamente a
destruio a que os ndios se submeteram por causa da chegada dos europeus h um
pessimismo no prprio cntico.
O Canto do Guerreiro canta os feitos e a bravura de um combatente indgena; de todas as
honras e gostos da vida, nenhuma era maior para os ndios do que matar e tomar nomes nas
cabeas de seus inimigos.
O poeta estabelece um dilogo entre o chefe indgena e sua tribo, onde apenas um interlocutor
dirige o seu canto e suas indagaes; ao mesmo tempo, o ato em que o chefe indgena convida
seus guerreiros para ouvir seu cantar tambm a maneira como o poeta convida o seu leitor
para ouvir o cntico do bravo guerreiro.
Aqui na floresta
De ventos batidos,
Faanhas de bravos
No geram escravos
Que estimem a vida
Sem guerra e lidar.
O poeta abre um cenrio de uma selva intocada pelos colonizadores, as primeiras
palavras so direcionadas por um interlocutor que no o guerreiro, como se fossem
uma informao ao leitor quanto ao local e o que se h-de cantar: na selva intocada
pelos colonizadores faanhas de bravos no geravam escravos, que valorizavam a vida
sem guerra e lidar.
Valente na guerra
Nos poemas picos de Gonalves, percebe-se a grande presena dos costumes de guerreiros
embrutecidos; na sociedade indgena a sobrevivncia de um guerreiro era alimentada pela
honra e fazia parte do ritual da vida.
O Guerreiro continua cantando seus feitos de guerra, ningum melhor que ele guiava a flecha
emplumada na direo correta; havia capturado mais inimigos que todos; e indaga quem com
mais energia cantava os seus feitos. Depois de cantar seus feitos de guerra, o Guerreiro canta
a sua destreza na caa:
A ona raivosa
Se esconde no cu.
Eis uma face pessimista do poema: os ventos no gemem; as matas no tremem no sentido indicado e as aves
no possuem pranto lastimoso.
O poeta poderia ter simplificado o canto melanclico da ave solitria, porque o cntico dela triste. A
afirmao triste carpido, o termo triste por si s inspira a melancolia do canto da ave, mas o poeta refora a
tristeza, o triste carpido, como o triste barulho de uma ave, o triste pranto lastimoso.
L vo pelas matas;
No fazem rudo:
O vento gemendo
E as malas tremendo
E o triste carpido
Duma ave a cantar,
So eles - guerreiros,
Que fao avanar.
Guerreiro canta o seu exrcito e a sua fora. Seu exrcito era composto de mil guerreiros que deixavam os
campos juncados de mortos, no entanto nenhuma alma dentre os seus se perdia:
Mil homens viveram,
Mil homens so l.
E ento se de novo
Eu toco o Bor;
De todo no ,
Tal eles se escoam
Aos sons do Bor.
_ Guerreiros, dizei-me,
_ To forte quem ?
O Guerreiro compara seu exrcito com uma fonte que salta da rocha balburdiando,
vibrando por um entusiasmo de descontentamento. Porque por mais que haviam vencido a
batalha, no perecendo uma s alma entre eles, e deixando assim o campo juncado de
mortos, saem descontentes, porque a ira no est apagada.
O Canto do Guerreiro o poeta quis celebrar a glria dos feitos de uma tribo e o poema
acaba por encerrar-se com uma vitria insatisfeita e melanclica.
O que deveria ser um canto de celebrao vitoriosa torna-se um canto queixoso, que
parte do otimismo de um exrcito nativo que s sabe vencer, cujo cantor o mais forte
entre seus soldados para o pessimismo, porque a vitria no completa, a vingana
no foi capaz de aniquilar a clera.
REFERNCIAS:
GRIZOSTE, Weberson Fernandes. O Reflexo anti-pico de Virglio no indianismo de
GonalvesDias<http://www.assis.unesp.br/Home/PosGraduacao/Letras/ColoquioLetras/patriciaaparecida.
pdf> Acesso: 14 de nov. 2014
FARIA, Patricia Aparecida Gonalves. AMERICANIDADE EM O CANTO DO NDIO DE GONALVES DIAS
<http://www.assis.unesp.br/Home/PosGraduacao/Letras/ColoquioLetras/patriciaaparecida.pdf> Acesso:
17 de nov. 2014
MARQUES, Wilton Jos, O ndio e o destino atroz. Disponvel em:
<www.ufscar.br/~neo/Estudos/O_indio_e_o_destino_atroz.pdf> Acesso: 15 de nov. 2014