Perfil de Características Sensoriais de Pescados Coletados em Pesqueiros Da Região Metropolitana de São Paulo
Perfil de Características Sensoriais de Pescados Coletados em Pesqueiros Da Região Metropolitana de São Paulo
Perfil de Características Sensoriais de Pescados Coletados em Pesqueiros Da Região Metropolitana de São Paulo
INTRODUÇÃO
No Brasil, a produção de pescado vem diminuindo a cada ano. A falta de
dados sobre o potencial pesqueiro e a ausência de um controle efetivo da captura de
peixes têm gerado a sobrepesca, causando impactos ao meio ambiente e impedindo
o aumento da produção de maneira racional (Pimentel & Panetta 2003a).
Com a finalidade de minimizar a pesca descontrolada e inadequada, seja para
fins esportivos ou alimentares, foram criados os empreendimentos atualmente
conhecidos como “pesque e pague”. No Brasil, essa atividade vem ocupando,
gradativamente, posição de destaque quanto aos aspectos econômicos e de produção
(Leitão et al. 1997).
Na Grande São Paulo, devido à necessidade de formas variadas de lazer por
parte da população, tem sido comum a procura por áreas ao ar livre em regiões
periféricas, aumentando as áreas de lazer e as oportunidades de pesca. Embora o
número de pesqueiros seja grande, ainda falta maior controle desses ambientes no
que diz respeito à qualidade da água e dos aspectos sanitários. Os pesqueiros
enquadram-se na classe de água doce para criação natural e/ou intensiva de espécies
comuns da aqüicultura destinada, entre outros, à alimentação humana (Matsuzaki et
al. 2004).
Além dos benefícios sócio-econômicos do sistema, deve-se considerar que o
pescado, como alimento, é importante fonte nutricional, capaz de fornecer ao
organismo humano os nutrientes indispensáveis que mantêm suas funções vitais. A
carne de peixe é rica em proteína e lipídios. A proteína, pelo balanceamento de
aminoácidos essenciais, tem alto valor nutritivo. Os lipídios, pela presença dos ácidos
graxos ômega 3, têm efeitos redutores sobre os triglicerídeos e o colesterol sanguíneo,
reduzindo o risco de doenças cardiovasculares (Agnese et al. 2001).
Segundo Faveret-Filho & Siqueira (1997), no que diz respeito à alimentação
saudável, o consumo de carne branca, como a do peixe, é tendência mundial, incluindo
o Brasil. Aumentando-se a quantidade e a qualidade do pescado produzido, há
164 PESQUEIROS SOB UMA VISÃO INTEGRADA DE MEIO AMBIENTE, SAÚDE PÚBLICA E MANEJO
EUA como disciplina científica empregada para evocar, medir, analisar e interpretar
reações características de produtos, quando percebidas pelos órgãos da visão, olfato,
paladar, tato e audição, se baseia no uso de equipe de pessoas treinadas para a avaliação
de características sensoriais. O método apresenta a vantagem de não necessitar de
equipamento específico de laboratório, podendo o pescado ser examinado com rapidez
onde quer que esteja. As impressões registradas são o resultado da interação de vários
fatores psicológicos, fisiológicos e ambientais, incluindo estado de saúde, acuidade
sensorial, etc. (Rabelo 1988).
No controle de qualidade, os atributos sensoriais a serem medidos geralmente
são os considerados críticos. Assim, num método de qualidade (Quality Method), uma
equipe sensorial pode avaliar os produtos em escala, como, por exemplo, de proporção,
dando pontuação de 0 a 10, em que se pode dimensionar 0 = pobre e 10 = excelente.
Dessa maneira, a equipe produz uma estimativa de qualidade que pode ser global ou
com qualificações para atributos distintos (Muñoz 1999).
Queiroz et al. (1993) propuseram uma escala não estruturada, a partir de termos
descritivos registrados por uma equipe treinada de julgadores, para avaliar o frescor de
pescados estocados em gelo, traçando um perfil de deterioração com o tempo de
estocagem (6 a 9 dias).
O método de escala de pontos é utilizado para determinar o nível de qualidade
sensorial de alimentos por ser simples, flexível, pela sua diversidade e por facilitar a
análise estatística dos dados obtidos (Chaves 1980; Monteiro 1984). Nesse método, a
pressuposição fundamental é de que os pontos sejam proporcionais ao grau de qualidade
e importância da característica a ser medida (Chaves 1980). Para a eficiência da escala é
necessário desenvolver uma ficha de análise realista, com fator de qualidade devidamente
escolhido e que reflita sua importância (Monteiro 1984).
Para avaliar o perfil de características sensoriais, os julgadores devem estar
devidamente treinados no emprego da escala de pontos e conhecer os diferentes graus
de qualidade, para que, avaliando as amostras, confiram-lhes escores apropriados (Chaves
1980; Monteiro 1984). A escala deve ser de tal forma que uma pequena diferença no
escore reflita uma diferença semelhante na característica de qualidade medida. Por
meio da escala, pode-se classificar as amostras de acordo com o número de pontos
atribuídos pela equipe ou por classes, como, por exemplo: excelente, ótimo, bom,
regular, deficiente, inaceitável, etc. (Chaves 1980).
Neste método, para todos os atributos sensoriais de aparência, odor, textura e
sabor são somados o total de pontos, tirando-se uma média geral, em relação à soma
das respostas dos julgadores. Com os dados obtidos monta-se um gráfico a fim de
visualizar melhor todos os resultados para cada um dos atributos medidos (Monteiro
1984).
Segundo Callegari-Jacques (2003), a estatística pode fornecer um conjunto de
técnicas e condicionar uma postura crítica sobre a interpretação e elaboração das
CAP 11 – PERFIL DE CARACTERÍSTICAS SENSORIAIS DE PESCADOS COLETADOS... 167
conclusões de dados. É necessário identificar o tipo de variável a estudar, uma vez que
a cada situação se recomenda diferente procedimento estatístico, considerando-se a
divisão ocorrida entre as variáveis quanti e qualitativas. Estatística é a denominação
dada a uma quantidade calculada com base nos elementos de uma amostra que descreve
a informação contida num conjunto de dados, como média, percentagem, desvio-
padrão e coeficiente de correlação.
Em análise sensorial, para interpretação dos dados coletados, são empregados
vários procedimentos estatísticos, como a distribuição de freqüência por histogramas,
análise de variância uni ou multivariada e técnicas de mapa de preferência e análise de
componentes principais (Haj-Isa 2001).
A análise de variância, ANOVA, é uma técnica estatística robusta desenvolvida
por R. A. Fisher e que fornece resultados confiáveis mesmo com considerável
heterocedasticidade, desde que os tratamentos amostrais sejam iguais ou próximos.
Ela decompõe em vários componentes identificáveis a variação total entre valores
obtidos no experimento. Em cada componente se atribui a variação a uma causa ou
fonte de variação diferente, o número de causas ou fatores de variação depende do
delineamento da investigação, que num modelo simples pode ser completamente
casualizado (Callegari-Jacques 2003).
A ANOVA permite estabelecer se médias de diferentes populações em estudo
são iguais ou não (Faria et al. 2000). Em complemento, pode-se empregar o teste de
Tukey para identificar quais as médias que, tomadas duas a duas, diferem
significativamente entre si. Finalmente, na apresentação dos resultados de uma
comparação múltipla entre médias, usualmente colocam-se letras ao lado das médias,
de maneira que letras iguais indiquem médias que não diferem significativamente entre
si ao nível de significância estabelecido (Callegari-Jacques 2003).
É fundamental observar que a aplicação de uma técnica estatística sofisticada
nem sempre é o caminho mais adequado para melhor analisar uma pesquisa. Nada
substitui o planejamento adequado, a aleatorização, o trabalho cuidadoso no laboratório
ou no campo e o controle das variáveis intervenientes (Callegari-Jacques 2003).
Também, a análise de componentes principais (ACP) tem se mostrado eficiente
para os casos em que a análise sensorial gera grande volume de informações, dificultando
a visualização do perfil sensorial de cada amostra. Seus resultados são plotados em
eixos ortogonais, de tal forma que as amostras são expressas como pontos ou figuras
geométricas e os atributos sensoriais, como vetores. As amostras similares ocupam
regiões bem próximas no gráfico, sendo vizinhas dos vetores que as caracterizam
(Faria et al. 2000).
Esta pesquisa teve por objetivo avaliar o perfil de características sensoriais e
estimativas de qualidade, segundo o grau de frescor, de pescados coletados em
lagos de pesca localizados na Região Metropolitana de São Paulo, em dois períodos
do ano.
168 PESQUEIROS SOB UMA VISÃO INTEGRADA DE MEIO AMBIENTE, SAÚDE PÚBLICA E MANEJO
MATERIAL E MÉTODOS
MATERIAL
Foram encaminhados diretamente ao Instituto de Pesca de São Paulo pescados
de tilápia (Oreochromis niloticus, Tilapia rendalli e Tilapia St. Peters), bagre africano (Clarias
gariepinus), carpa (Cyprinus carpio), piau (Leporinus macrocephalus), cará (Geophagus brasiliensis)
e pacu (Piaractus mesopotamicus) coletados em 30 lagos distintos do tipo “pesque e pague”,
todos localizados na Região Metropolitana de São Paulo. Esses lagos foram selecionados
e amostrados conforme critérios metodológicos descritos no capítulo Características
Gerais e Práticas de Manejo em Pesqueiros da Região Metropolitana de São Paulo,
com coletas realizadas em duas épocas do ano.
Após a coleta, os peixes foram embalados em sacos plásticos devidamente
identificados com etiqueta e transportados em caixas de isopor com gelo. No laboratório,
foram armazenados em geladeira doméstica, com temperatura média de 5ºC,
procedendo à análise sensorial após, no máximo, 24 horas da entrada das amostras.
MÉTODOS
Foram recrutados dez candidatos a julgadores entre os funcionários do Instituto
de Pesca, de ambos os sexos, com idades variando entre 25 e 45 anos. Desses candidatos
selecionaram-se quatro julgadores, considerando-se, principalmente, que os mesmos
tivessem conhecimento prévio sobre as espécies distintas de pescados, interesse e
disponibilidade de tempo para participar da pesquisa.
Inicialmente, os candidatos participaram de um sistema de mesa-redonda para
discussão de termos descritivos apropriados a serem utilizados durante a avaliação
sensorial. Foram utilizados para orientação os parâmetros estabelecidos nas
características gerais de pescados citados pelas legislações em vigor, Portaria MAA no
185/97 (Brasil 1997), e pelo Código Sanitário do Estado de São Paulo, Decreto no
12.48678, referente às Normas Técnicas Especiais Relativas a Alimentos e Bebidas
(São Paulo 2001).
A equipe de julgadores, em consenso, definiu a terminologia mais apropriada,
considerando os atributos de aparência visual, sensação olfativa e textura manual,
totalizando nove atributos sensoriais. Na ocasião, também foram estabelecidos dentro
de uma escala classificatória de pontuações os valores numéricos de 1 a 4 (Quadro 1).
A somatória das pontuações de todos os atributos sensoriais representou a estimativa
de qualidade do pescado segundo seu grau de frescor (Quadro 2).
CAP 11 – PERFIL DE CARACTERÍSTICAS SENSORIAIS DE PESCADOS COLETADOS... 169
ANÁLISE ESTATÍSTICA
Na análise sensorial foi utilizado o delineamento experimental de blocos
completos balanceados. Os dados sensoriais obtidos foram avaliados
estatisticamente utilizando o aplicativo Statistical Analysis System (SAS, versão 6.12),
através da ANOVA e do teste de médias de Tukey, com nível de erro de 5%.
Utilizou-se a ACP para expressar a média dos resultados obtidos na forma gráfica
bidimensional.
RESULTADO E DISCUSSÃO
Os resultados médios do perfil de características sensoriais dos pescados de
diferentes espécies capturadas nos 30 pesqueiros da Região Metropolitana de São Paulo,
em duas épocas do ano, estão apresentados na Tabela 1. Verifica-se que houve diferença
significativa (p < 0,05) entre os pesqueiros para os atributos sensoriais avaliados nesta
pesquisa.
Segundo a Tabela 1, em relação ao atributo cor, o pesqueiro 28 apresentou a
menor média (3,29), revelando cor ligeiramente anormal para a espécie. Na avaliação
da aparência dos olhos, o lago 2 (3,22) apresentou menor valor. Não houve diferença
significativa (p > 0,05) na aparência das brânquias dos peixes.
Quadro 3 Modelo de ficha do teste classificatório para perfil de características sensoriais de pescados.
Nome: Data:
Por favor, avalie cada amostra codificada de pescado, marcando com um X o valor de pontuação (s) correspondente aos atributos
( ) Desvio-padrão.
Os lagos 2 e 17 mostraram peixes com escamas pouco aderidas à pele e ligeiro
brilho metálico, revelando as menores pontuações (3,39 e 3,43, respectivamente). Para
a mucosidade, o lago 2 (3,31) revelou a menor média. Em relação à integridade dos
peixes, houve grande variabilidade entre os pesqueiros, com menor valor para o lago 2
(2,92), que não diferiu do 17 (3,10) e do 29 (3,33). Para o atributo odor houve também
grande variabilidade, com valor mínimo 2,93 para o lago 2, que não diferiu dos lagos 6,
8, 9, 13, 14, 16, 17 e 26. Em relação à firmeza abdominal, o lago 26 (3,21) revelou
menor média. O lago 9 (3,59) revelou menor valor para firmeza muscular.
Na Tabela 2 estão apresentados os parâmetros estatísticos de mediana, média, desvio-
padrão, variância e valores mínimos e máximos do perfil de características sensoriais dos
exemplares de pescados representativos dos 30 pesqueiros estudados. As médias variaram
na faixa de 2,92 a 4,00 para os nove atributos sensoriais relativos à aparência visual, sensação
olfativa e textura. Embora tenha havido diferenças significativas (p < 0,05) entre os pesqueiros,
para os atributos sensoriais, os valores médios ficaram próximos ao intervalo de pontuação
3 a 4 (Quadro 1).
Valores médios*
Atributos sensoriais
Mediana Média Desvio-padrão Variância Mínimo-máximo
Aparência visual
Cor 3,71 3,71 0,18 0,03
3,29-4,00
Olhos 3,73 3,73 0,14 0,02 3,22-3,93
Brânquias 3,75 3,79 0,13 0,02 3,50-3,97
Escamas 3,80 3,80 0,16 0,03 3,39-4,00
3,31-4,00
Mucosidade 3,79 3,81 0,19 0,03
2,92-4,00
Integridade 3,65 3,68 0,25 0,06
Sensação olfativa
Odor 3,61 3,75 0,34 0,11 2,93-4,00
Textura manual
Firmeza abdominal 3,71 3,71 0,18 0,03 3,21-4,00
Firmeza muscular 3,89 3,93 0,11 0,01 3,59-4,00
*Coleta em 30 pesqueiros da Região Metropolitana de São Paulo.
Pesqueiro Nº
Parâmetro 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15
Grau de 35 30 36 35 34 34 34 32 33 35 35 34 34 33 35
Frescor
Estimativa de E B E E E E E B E E E E E E E
qualidade
Pesqueiro Nº
Parâmetro 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30
Grau de 33 31 34 34 35 33 34 34 35 33 32 34 33 33 33
Frescor
Estimativa de E B E E E E E E E E B E E E E
qualidade
0,6
8
0,5 Integridade
0,4 4 Cor
1 Mucosidade
Componente principal 2 (10,92%)
26 20
0,3
9
0,2 6
13 Olhos
19
27 3
0,1 14
0 7 24
22
16 30
15 11 25
Escamas
–0,1
18 10 Firmeza muscular
29 23
–0,2 21 Odor
17
–0,3 12
.
5
28
–0,4
Firmeza abdominal
–0,5 Guelras
2
–0,6
–0,4 –0,3 –0,2 –0,1 0 0,1 0,2 0,3 0,4
Componente principal 1 (53,72%)
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176 PESQUEIROS SOB UMA VISÃO INTEGRADA DE MEIO AMBIENTE, SAÚDE PÚBLICA E MANEJO