GUERRA, Paula (2012) - A Cidade Inclusiva IN Desafíos Da Governação Das Cidades Do Século XXI PDF

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Retos de la accin de gobierno para las ciudades del siglo XXI Desafos da governao das cidades do sculo XXI

Coordinadores de la publicacin Coordenadores da publicao


Antnio Manuel Figueiredo, Jose Manuel Pea Penabad y Enrique Jos Varela lvarez

Autores
Jos Mara Ares Abalo Joaquim Borges Gouveia Francisco Crdenas Ropero Lus Castanheira Rubn Cid Fernndez Antnio Manuel Figueiredo Paula Guerra Jos Mara Mella Mrquez Josep Mara Pascual Esteve Jos Manuel Pea Penabad Elisa Prez Babo Carmen Pineda Nebot Paulo Pinho Enrique Jos Varela lvarez

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RETOS DE LA ACCIN DE GOBIERNO PARA LAS CIUDADES DEL SIGLO XXI

DESAFOS DA GOVERNAO DAS CIDADES DO SCULO XXI

2012

CAPTULO 8 A CIDADE INCLUSIVA


Paula Guerra Sociloga. Professora Auxiliar do Departamento de Sociologia da Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Investigadora do Instituto de Sociologia da Faculdade de letras da Universidade do Porto.

NDICE: 1. A excluso social como resposta cidade fragmentada; 2. Da cidade exclusiva cidade inclusiva: imperativos de uma narrativa de mudana paradigmtica; 3. A cidade inclusiva matizada pela inovao social em prol da justia espacial; 4. Desafios, contextos, prticas e aes em prol de uma cidade inclusiva; 5. Interveno, governance e gesto do social para a incluso. Referncias bibliogrficas. PALAVRAS-CHAVE: Excluso social, incluso social, inovao social, redes, participao e justia social.

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Era uma vez um pintor que tinha um aqurio com um peixe vermelho. Vivia o peixe tranquilamente acompanhado pela sua cor vermelha at que principiou a tornar-se negro a partir de dentro, um n preto atrs da cor encarnada. O n desenvolvia-se alastrando e tomando conta de todo o peixe. Por fora do aqurio o pintor
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assistia surpreendido ao aparecimento do novo peixe. O problema do artista era que, obrigado a interromper o quadro onde estava a chegar o vermelho do peixe, no sabia que fazer da cor preta que ele agora lhe ensinava. Herberto Hlder (2009) - Teoria das Cores. Os passos em volta.

1. A EXCLUSO SOCIAL COMO RESPOSTA CIDADE FRAGMENTADA O conceito de excluso social representou para o mundo ocidental, no alvor dos anos 1980, uma resposta face ao crescendo de divises, fraturas e desigualdades sociais, e que tinham expresso e visibilidade acrescidas na cidade (Hayes et all., 2008; Bland, 2007; Bradshaw, 2003). Segundo Gilles Lamarque, a excluso social no mais do que o prolongamento do conceito de nova pobreza engendrado no incio da dcada de 1980 para designar todos os indivduos que so vtimas da crise econmica e que esto sujeitos a mltiplas dificuldades resultantes do processo de desqualificao social (Lamarque, 1995). Esse termo designa no s a degradao do mercado de emprego e a decadncia/regresso das solidariedades scio-comunitrias, mas sobretudo a sobrevivncia (im)possvel de uma populao localizada margem do progresso econmico e da partilha dos benefcios da resultantes (Paugam, 1996: 6). Assim, na sua forma original, o termo excluso social foi usado para descrever processos de desintegrao social (Clavel, 1998), isto , as variadas fragmentaes e eroses dos laos entre o indivduo, a sociedade e o Estado (Paugam 1991, 1996; Castel, 1995). A excluso resulta de processos pertencentes desinsero social (rutura de laos de solidariedade e risco de marginalizao), desintegrao do sistema de atividade econmica ou de emprego (perda de competncias socioprofissionais, perda de emprego, rendimento insuficiente) e desinsero das relaes sociais e familiares (fragilizao das relaes interpessoais e dos sentimentos de pertena scio-comunitrios) (Costa, 1998; Xiberras, 1996; Hills et all., 2002).

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A abordagem da excluso marcou tambm uma primeira aproximao analtica do capital social. Max Weber ao referir as estratgias de fechamento estava j a identificar as estratgias das classes sociais dotadas de maiores recursos econmicos e profissionais que queriam conservar o monoplio de acesso a esses mesmos recursos (Capucha, 2010). Os excludos sero, em ltima instncia, os que no tm direito a um rendimento, a um trabalho, a uma atividade econmica, educao, formao, sade, habitao e igualdade de oportunidades. As representaes da excluso social assentam em dois eixos de anlise especficos. O primeiro situa as estruturas e os processos a um nvel macro que determinam as oportunidades inscritas nos sistemas sociais e o outro eixo, a um nvel das prticas e dos quadros de interao, que se prende com as capacidades das pessoas para aproveitarem as oportunidades (Capucha, 2010). A excluso social difere do termo hegemnico de pobreza em trs sustentculos distintos. O primeiro move-se de uma anlise esttica para uma anlise dinmica, apreendendo os processos pelos quais os indivduos e grupos se tornam excludos. O segundo compreende a privao como multidimensional, envolvendo habitao, educao, rendimentos, emprego, sade, fragmentao identitria, etc. O terceiro interpreta a privao e a pobreza como estando imbricadas com as relaes sociais, rejeitando uma perspetiva atomstica. Em muitas perspetivas, a excluso social no se refere primordialmente privao material, mas ao acesso e ao uso de um conjunto de servios e participao societal. A maior parte das aproximaes excluso social do particular nfase s inter-relaes excluso social, econmica e poltica (Geddes, 2000). No despiciendo lembrar aqui que o debate poltico em torno do fenmeno da excluso social algo recente em Portugal. No incio dos anos 1980, a pobreza e a excluso social constituam assuntos no muito abordados nem pelos polticos nem pelos mass media (Guerra, 2002). No incio da dcada de 1990, o Governo toma conscincia que apesar do significativo crescimento econmico, continuam a persistir casos de pobreza em alguns segmentos sociais. Simultaneamente, implementam-se alguns programas destinados a combater a pobreza a nvel nacional e local, sob impulso poltico e financeiro da Comunidade Econmica Europeia (Pereirinha, 1993). A excluso social tornou-se uma dominante no discurso poltico relacionada com a privao e a regenerao na Europa ocidental. A excluso funciona assim como um catch-all que envolve pobreza, desemprego, marginalizao, guetizao, etc. Isto , uma mistura entre os problemas sociais e econmicos que acompanharam a reestruturao industrial das sociedades ocidentais desde o incio dos anos 1980 (Seyfang, 2004).

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A cidade palco por excelncia da emergncia, visibilidade e uso da excluso. O que no quer dizer que estas questes no se possam colocar nos campos, mas perante uma generalizao do urbano, inevitvel a sua associao cidade. No meio urbano, por conseguinte, tal como refere Serge Paugam, far-se- sentir de forma mais acutilante, o que este autor apelida de sociedade produtivista, em que a integrao assenta, em grande parte, sobre a atividade profissional que assegura paralelamente a segurana material e financeira, as relaes sociais, a organizao do tempo quotidiano, dos espaos e da identidade (Paugam, 1991: 215). Desta feita, nas ltimas dcadas a excluso social nas reas urbanas tornou-se persistente, mostrando que o problema se agudizou com a globalizao e com a mudana tecnolgica. As cidades europeias tm uma larga tradio de combate excluso social (Dubet & Lapeyronnie, 1992). Durante dcadas, os governos urbanos desenvolveram estratgias e polticas de combate pobreza e excluso, muitas delas derivadas de polticas de desenvolvimento econmico, de educao e habitao, etc. Existe uma considervel variao na forma como os problemas tm sido tratados, cada pas europeu tem a sua prpria tradio no combate pobreza e excluso (Duprez e Hedli, 1992). Nos anos 1990, existiu alguma convergncia na abordagem: a integrao poltica e a parceria local foram os conceitos chave (Geddes, 2000). Nos anos recentes, emergiu um novo otimismo tecnolgico relacionado com as novas possibilidades de novas tecnologias de informao e conhecimento tm para combater a excluso social (Durieux, 2003). Estamos perante uma mescla conceptual derivada de uma praxis poltica e social, e ainda investigativa. Com o incio dos anos 1990, ampliou-se o uso do termo excluso social. A sua utilizao tornou-se generalizada e contribuiu para modificar a representao tradicional de pobreza. Isto no significa que as desigualdades desapareceram; antes reconfiguraram-se e complexificaram-se, dada a heterogeneidade das situaes, o seu cariz instvel, persistente, dinmico e evolutivo, atestando fenmenos de precarizao, de rutura, de individuao e de crise de identidade, ou mesmo, de vazio social. A abordagem em termos de excluso foi determinante para um alargamento de horizontes polticos e analticos, mas acabou por no trazer grandes blsamos para os males que queria atacar. Alis, o uso excessivo da retrica da excluso social tem levado sua vulgarizao e esvaziamento, motivando a sua reconfigurao e reorientao para novas derivas conceptuais e empricas. Inseriram-se nesta abordagem algumas intervenes relevantes no quadro das cidades portuguesas e referentes ao Programa URBAN. Aqui, e porque estu-

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damos de perto o Bairro Cerco do Porto no quadro do URBAN Vale de Campanha, importa especificar alguns atributos da estratgica levada a cabo que acabaram por estar na origem da prpria necessidade de reconfigurao paradigmtica para a incluso social que abordamos no ponto seguinte (Guerra, 2002a). A estratgia de requalificao esttica e funcional do Bairro procurou, no s uma requalificao fsica, como uma mudana de atitude dos residentes face ao espao habitado, implicando-os na conceo e desenvolvimento das melhorias operadas no Bairro. Em termos metodolgicos, a interveno assentou numa aposta em solues de qualidade arquitetnica que restitussem a dignidade ao espao e que marcassem uma rutura com anteriores conceitos e atitudes estticas. Uma reabilitao em extenso e profundidade que integrasse a requalificao exterior dos blocos habitacionais, uma renovao e reorganizao dos espaos pblicos e das estruturas de apoio animao. Uma interveno que se concretizou, tambm, com o lanamento de aes de animao do espao pblico do Bairro atravs do incremento de um programa ldico e cultural para a praa central deste espao e da criao de um esquema de manuteno dos espaos e jardins, responsabilidade de uma empresa de insero de jardins e ofcios criada no seio das aes da Fundao para o Desenvolvimento do Vale de Campanh. Obviamente que a incluso de metodologias de participao no urbanismo em particular, e no planeamento em geral podero revelar potencialidades de envolvimento de uma populao historicamente excluda de qualquer tipo de deciso. Contudo, importante, e dadas a concluses apuradas no decorrer da nossa investigao, que se tenha em linha de conta a pluralidade e heterogeneidade de situaes de excluso e de estigmatizao, diferenciadamente vividas e sentidas nos quotidianos. Admite-se que a regra a da heterogeneidade das situaes de excluso, recuperveis umas, inelutveis no curto prazo outras, criadoras de ruturas de identidade por perda de laos e sociabilidades comunitrias algumas, deslizantes e conformadas outras ainda (Almeida, 1993: 833). Configura-se, ento, como pressuposto orientador de qualquer interveno a efetuar, a auscultao das aspiraes, gostos, motivaes e interesses de toda a populao residente do Bairro, de forma a evitar processos de distanciamento da populao face aos poderes estabelecidos. Tambm parece importante referir que qualquer estratgia de requalificao dever assumir as condies sociais estruturantes da populao em presena, dando particular enfoque sua persistncia enquanto matizadoras da apropriao e vivncia social do territrio. Neste campo, no ser difcil observar, no momento presente, o Bairro do Cerco enquanto espao

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esteticamente renovado, mas onde se evidenciam as condies plurais de excluso e de estigmatizao sociais, herdadas e reproduzidas. 2. DA CIDADE EXCLUSIVA CIDADE INCLUSIVA: IMPERATIVOS DE UMA NARRATIVA DE MUDANA PARADIGMTICA Numa poca que se supe de mudana prxima, como classifica Tony Judt (2011), numa sociedade em que o medo ressurge com uma diversidade de faces; da perda de emprego, da perda de terreno para os outros numa distribuio de recursos cada vez mais desigual, da perda do controlo das circunstncias e rotinas da vida quotidiana, dos imigrantes, do outro, das fronteiras abertas e das comunicaes livres, da rapidez incontrolvel da mudana, impe-se uma necessidade reflexiva sobre os caminhos da coeso social. O novo milnio trouxe consigo a incluso social enquanto resposta e no alternativa excluso. A incluso social reflete uma aproximao dinmica (proactiva) ao bem-estar (Sandell, 1998), implicando muito mais do que quebrar barreiras, pois requer investimentos e capabilities para potenciar e desenhar condies para a incluso, num esforo holstico por parte dos atores sociais e sociedades. Esta mudana paradigmtica compagina a importncia do conhecimento em sentido amplo e tem inerente um reconhecimento do conhecimento implcito e tcito imanente das prticas dos atores sociais, das comunidades e das instituies (Gertler, 2001). assim que este conhecimento passa a ser um diferencial bsico de desenvolvimento e competitividade. Os processos e estratgias de incluso social encontram-se indissociveis das dinmicas de informao, conhecimento e inovao da nossa sociedade (Winden, 2001). Entramos, ento, na mudana paradigmtica para a incluso. Aqui tem particular fora a abordagem anglo-saxnica da incluso, conhecida como new labours thinking (Lister, 1998), que se tem vindo a centrar na anlise da poltica social no mbito de domnios como: o trabalho, o emprego, os rendimentos e a integrao comunitria (Seyfang, 2004). So ilustrativas algumas iniciativas sociais comunitrias com o papel de condio complementar para a ativao de suportes informais nas comunidades. Estas iniciativas, habitualmente combinam objetivos sociais, comunitrios e econmicos, sendo uma das suas frmulas mais interessantes no Reino Unido, o Local Exchange Trading Schemes (LETS). O Time Banks um outro tipo de comunidade, tambm a estabelecida que tem como objetivo a economia social, especialmente para fortaleer as relaes de vizinhana atravs de redes de suporte num esquema para alm da economia nacional, dando valor s atividades voluntrias na comunidade. Estas iniciativas foram desenhadas para
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construir capital social (Seyfang, 2004): questo decisiva nesta nova axiomtica da incluso. Neste entendimento confiasse que estes caminhos s so possveis de percorrer, escorados na compreenso da pluralidade das diferenas dos indivduos em sociedade. Excluso, segregao, integrao e, atualmente, incluso, entendida como educao/cidadania inclusiva, so marcas de um caminho longo, de investigao, de praxis, de questionamento constante de concees e prticas, que refletem um afinamento do trilho de acordo com as caractersticas econmicas, sociais e culturais de cada poca. A consciencializao da sociedade pelos seus direitos direito educao, igualdade de oportunidades, participao ativa nas polticas que conduzem as suas vidas e a luta empreendida com o sentido de justia e equidade, transformaram a abordagem cidade. Um outro olhar, tentando ultrapassar a excluso e a segregao, abriu assim caminho para a integrao, respeitando a individualidade e a diferenciao de ator social. A este respeito importante a mudana de perspetiva acerca dos processos e mecanismos de segregao scio-espaciais em meio urbano, admitindo-se que no existem determinismos, na medida em que muitas das perspetivas acerca da concentrao e da segregao descuram as oportunidades oferecidas pela presena de redes de solidariedade local em muitos destes contextos e que tm demonstrado um papel de coeso integradora (Bolt et all., 1998). escala portuense, basta enunciar o recente exemplo da demolio da torre 5 do Bairro do Aleixo e o que essa ocorrncia desvendou em termos de social intensive networks. Nas sociedades atuais, o crescimento econmico e a competitividade industrial esto dependentes de altos nveis de educao e de uma fora de trabalho qualificada (Furlong et all., 2003). Concomitantemente, surge a defesa de uma educao inclusiva que implica uma filosofia de ativao que dos cidados tendo em vista a sua autonomia e participao, e simultaneamente das instituies, propiciando-lhe condies para a capacitao dos cidados (McWilliams, 2004). Estamos aqui diante um duplo movimento de incluso que tem a ver com a capacitao das pessoas e das prprias instituies sociais (Furlong et all., 2003). A educao inclusiva centra-se na ideia de que todos os que esto na escola a permanecem para aprender, para participar e interagir nesse quadro sociabilitrio, no obstante as diferenas e dificuldades de cada um. Estes so desafios de adaptao por parte da sociedade, promovendo assim novas situaes de aprendizagem e de vivncia comunitria plena (Furlong et all., 2003; Donnelly e Coakley, 2002).

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E este o postulado supremo da incluso. integrao subsistiu o princpio da normalizao. Por normalizar entende-se reconhecer aos indivduos os mesmos direitos, em aceit-los de acordo com as suas especificidades, proporcionando-lhes os servios da comunidade que contribussem para desenvolver as suas potencialidades. Existe um reconhecimento valorizado que passa pelo aceitar das diferenas na doena, na cultura, na religio, no emprego, nos modos de vida. Implica o desenvolvimento humano, dependendo dos talentos, das competncias, das capacidades e escolhas e o envolvimento e engagement na vida comunitria. Cabe aqui fazer referncia importncia da recreao pela msica, pelas artes e pelos espetculos enquanto formas importantes de incluso social, integrando modalidades desportivas, prticas reiteradas de exerccio fsico e de fruio ldica do espao pblico (Bailey, 2007; Secker et all., 2007). A estratgia de abordagem parece ser a da proximidade, partilhando espaos sociais e fsicos para alcanar as oportunidades de interao e reduzir as distncias sociais entre as pessoas. Importante ainda o reconhecimento da urgncia da utilizao sincrnica de procedimentos formais e informais de integrao, no deixando de fora nenhum caminho ou possibilidade de percorrer a mudana. A incluso ilustra uma nova etapa assente na aceitao e valorizao da diversidade, na cooperao entre diferentes e na aprendizagem da multiplicidade; um processo atravs do qual a sociedade, nas suas mais diversas dimenses, se adapta de forma a poder incluir todos os indivduos que, por sua vez, se preparam para desempenhar um papel nessa sociedade. Assume-se, neste quadro, a importncia da vivncia numa sociedade multicultural (Omdvar & Richmond, 2003). Entende-se que a imigrao contribui de forma acumulada para o capital humano de uma cidade, assumindo uma essencialidade irresistvel dentro de uma nova economia e numa lgica de multiplicao de capital cultural (Papillon, 2002). Diversas cidades, distintas culturas, variadas linguagens, diferentes vises do mundo encontram espaos de mescla do ponto de vista cultural, social e econmico no contexto urbano, possibilitando criatividade e inovao. de sublinhar ainda que a narrativa da incluso social reedifica a cultura na charneira da integrao social (Bianchini, 2006). Na transio do sculo XX para o sculo XXI, a evidncia e a eminncia de alguns dados propiciou uma maior ateno cultura como fator e contexto de integrao social. Alguns desses dados radicam no aumento da criao de emprego e no crescimento do rendimento provenientes do turismo, no crescimento do mercado internacional de bens e servios produtos culturais e no forte crescimento da procura de bens culturais. Todos

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os produtos e servios que combinam uma dimenso cultural com o seu aspeto utilitrio so reconhecidos como geradores de valor acrescentado e motores de desenvolvimento (Sandell, 2003). As abordagens baseadas em projetos, parcerias, contratos, capital social, etc. demonstraram que o desenvolvimento local depende tambm da capacidade dos stakeholders locais de identificar estrangulamentos e potencialidades do seu territrio, de planear projetos e de gerir em comum os seus recursos disseminando pontos de referncia que estimulam o estabelecimento de sinergias entre os atores e o prosseguimento de projetos comuns, criando um contexto atrativo para os habitantes de um territrio e como alavanca de criao de produtos que associam as dimenses esttica e utilitria (Scott, 2000; Storper e Scott, 2009). consensual hoje a ideia de que a coeso social beneficia da existncia de redes culturais a exposio dos indivduos perante o mesmo sistema de valores leva-os a perceber e a concordar com certas prioridades. Ora, a utilizao das prticas culturais tem efeitos diretos e indiretos em termos de integrao social pois contribuem de forma positiva para o seu bem-estar psicolgico e social (Kinder e Harland, 2004) e aumentam a sensibilidade criativa e empreendedora. Tambm, do razo e consistncia a uma memria coletiva da comunidade (Sharp et all., 2005) e servem como reservatrio de ideias criativas e intelectuais para as geraes futuras (Reeves, 2002). No poderamos deixar de referir nesta mudana paradigmtica, a teoria da qualidade social emergente na European Foundation on Social Quality em finais dos anos 1990 (Beck et all., 1997, 2001). Esta teoria considera que o mundo social se operacionaliza pela interao e interdependncia entre o bem-estar pessoal e a identidade social (Beck et all., 1997). Este dualismo, no dualidade, implica quatro condies bsicas para o seu desenvolvimento: os atores sociais devem ter possibilidades de interao o que lhes permitir o emporwerment pessoal (Friedman, 1996); os contextos organizacionais e sociais devem ser marcados pela acessibilidade aos diferentes atores, propiciando a incluso social; as aes humanas devem estar munidas de recursos materiais e sociais facilitadores da interao, fomentando a segurana socioeconmica; e, last, but not the least, deve existir um consenso e partilha de valores e normas possibilitando a coeso social (Beck et all., 2001). Assim, a qualidade social define-se pela envolvente que permite s pessoas a participao na vida social e econmica e o desenvolvimento comunitrio num quadro de bem-estar e de potencial individual.

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Assim, podemos dizer com Lus Capucha que a qualidade social no decorre da natureza das prprias coisas, antes s pode ser resultado da mobilizao de poder e, em particular, das polticas pblicas(Capucha, 2010: 31). Nesta linha, as polticas pblicas ativas so as que so capazes de dar competncias s pessoas e, conjuntamente, as que tm capacidade para facultar a sua insero no mercado de trabalho, nos servios e cuidados de sade, nos sistemas de educao e formao, no mercado de habitao, nos sistemas de proteo e segurana, em famlias, em comunidades arreigadas... A aplicao destes princpios leva necessria combinao de polticas universais com polticas de diferenciao numa complementaridade e interface colaborativo (Capucha, 2010: 31). Esta operacionalizao tem tido eco recente na iniciativa Cidade para tod@s (Sugranyes e Mathivet, 2010) que defende que uma cidade para todos concede a palavra a todos os atores que lutam pelo direito a essa cidade, apropriando-se dele como proposta de mudana; h quem defina tamanho objetivo de quimera ou iluso, neste projeto chamam-lhe utopia indispensvel para outro mundo possvel. Assim sendo, uma poltica pblica tendo como horizonte a felicidade deve ser avaliada em termos de eficincia em proporcionar aos indivduos e s suas famlias capacidades para concretizar atos valiosos para si e para o seu coletivo, integrando a suas aes individuais, as condies territoriais e a avaliao que concretizam dos seus prprios atos (Sugranyes e Mathivet, 2010). A anlise da cidade de hoje, onde se representam as cidades do Eixo Atlntico, deve tomar em considerao algumas dimenses chave da diversidade sustentvel e da incluso (Andersen e Kempen, 2001): acesso ao mercado de trabalho, reconhecimento do capital humano e cultural das populaes, acesso a competncias e programas educativos, acesso cultural aos servios sociais, comunidade forte baseada nas redes de vizinhana, espaos pblicos inclusivos para lazer e expresso de diferenas, acesso qualidade dos servios de habitao, reconhecimento das diferenas culturais no planeamento e no policy making, medidas antidiscriminao no emprego e na habitao. Enfim, a incluso social um processo que garante que as pessoas em situao de pobreza e de excluso social acedam s oportunidades e aos recursos necessrios para participarem plenamente nas esferas econmica, social e cultural e para beneficiarem de um nvel de vida e bem estar considerado normal na sociedade em que vivem (Comunidade Europeia, 2005: 9). neste quadro de um processo plural de incluso, porque situado em diferentes escalas da sociedade e da esfera de realizao das populaes e dos seus quadros de vida, que iremos equacionar o contexto e situao da possibilidade de condies de coeso social nas cidades do Eixo Atlntico.

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3. A CIDADE INCLUSIVA MATIZADA PELA INOVAO SOCIAL EM PROL DA JUSTIA ESPACIAL A inovao social a proposta de uma via efetiva e criativa para a resoluo de problemas sociais, no sentido de melhorar o bem-estar social e assim promover o desenvolvimento. Esta proposta ativa de forma dinmica a relao entre estrutura e agncia, atravs da afirmao do papel do indivduo na sociedade, do poder de agncia de indivduos e organizaes, e da incessante capacidade humana para a reinveno (Westley, 2008: 1, 2). A mudana social processa-se em ciclos de longa durao, de acordo com as dinmicas de resilincia dos sistemas scio-ecolgicos, no constante (re)equilbrio das suas foras. Atualmente, assistimos a fortes desequilbrios, na qualidade ambiental, na estabilidade das economias e dos sistemas polticos e na justia social que comprovam a necessidade de mudana. Ora, a inovao social vem propor uma mudana que restaura a capacidade de resilincia dos sistemas, a partir da capacitao das populaes, potenciando o seu capital humano e social. Nesse processo de capacitao, as organizaes do terceiro setor assumem um papel central, porm as suas iniciativas s sero efetivas na promoo de desenvolvimento, se, em primeiro lugar, se centrarem nas pessoas com quem trabalham ou seja, a adoo da mxima trabalhar com e no para e, em segundo lugar, cooperarem ativa e produtivamente entre si, e com as entidades do setor pblico e do setor privado praticar o trabalho em rede. Segundo Nilsson, a significncia de um processo de inovao social mede-se no s pela escala que atinge nmero de pessoas, rea geogrfica, como pelo seu alcance capacidade de agitar diversas dimenses sociais, e, ainda pela ressonncia que provoca a intensidade com que capta a imaginao das pessoas (2003: 3). O alcance implica uma abordagem integrada dos problemas sociais, percebendo que as suas causas so to complexas como as formas que assumem, estando frequentemente interligadas diferentes dimenses da excluso (ex: habitao degradada/insucesso escolar). A ressonncia a capacidade de uma determinada iniciativa social captar a imaginao dos indivduos, de forma a integrar-se nas suas estruturas mentais, nas suas prticas sociais, promovendo uma reinterpretao e uma apropriao da mensagem que favorea a sua reproduo. Estes trs critrios so fundamentais na anlise de qualquer dinmica de inovao social, visto que abrangem o seu potencial de difuso. O leitor reconhecer aqui a importncia da referncia ao projeto Es.Col.A. Espao Coletivo Autogestionado

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do Alto da Fontinha no Porto. Trata-se de um stio auto gerido que funciona num espao ocupado autarquia e tem como propsito fomentar o desenvolvimento da comunidade local (lugar de convvio, com cozinha comunitria, cicloficina, biblioteca, acesso internet, teatro, cinema) com a ajuda de voluntrios ao servio da dinamizao cultural e social da populao local. Este projeto desenvolve-se margem e mesmo em oposio autarquia. Est associado a um espao de cultura libertria de divulgao musical e cultural, a Casa Viva. A ideia mais recorrente que a inovao social decorre da sociedade civil. Mas importa reconhecer que para alm da sociedade civil, dos movimentos sociais e das organizaes do terceiro setor, tambm o Governo, as instituies religiosas, as universidades, as empresas, assim como indivduos com particular influncia social e poltica se podem assumir como agentes de inovao social ao dinamizar processos que impliquem uma mudana significativa na resoluo de problemas sociais (Mulgan, 2007). Ora, cabe aqui o projeto Sonpolis da Cada da Msica no Porto iniciado em 2008. Este projeto pretende ser uma plataforma de abertura, troca e dilogo com a comunidade. O resultado final foi um puzzle de peas compostas por cada um dos grupos numa grande diversidade espacial, social e musical, sendo esta a matriz deste projeto de msica nas comunidades. Posteriormente, e dentro do plano de trabalho do Curso de Formao de Animadores Musicais e inscrito no Sonpolis da Casa da Msica, surgiu o Coro de S. Tom associado s crianas do Bairro de S. Tom no Porto. Orientado por formadores do Servio Educativo, este coletivo mantm um vnculo estreito com o projeto escolar da EB1/JI de S. Tom, e envolve mais 100 crianas entre os 3 e os 11 anos do Bairro, contando com a cooperao dos professores e demais funcionrios da escola e as famlias, tem vindo a desenvolver atuaes regulares na Casa da Msica e no s. Tambm o projeto Som da Rua - Sonic Street Ensemble - um grande ensemble de incluso social. O projeto comeou em 2009 quando se criou um grupo musical constitudo por pessoas com percursos de vida difceis, socialmente fragilizadas. Desta motivao nasceu um repertrio prprio, emocionalmente intenso, que depressa conquistou o reconhecimento pblico. Hoje o Som da Rua uma formao com uma identidade singular e em permanente evoluo. Este um dos projetos mais representativos da interveno social do Servio Educativo da Casa da Msica, desenvolvido em parceria com vrias instituies de solidariedade da Grande rea Metropolitana do Porto. A Casa vai a Casa um servio ao domiclio concebido para comunidades que no se podem deslocar Casa da Msica: este projeto pressupe a visita de

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formadores do Servio Educativo a instituies. Tem como objetivo propiciar uma vivncia musical positiva em hospitais, centros de apoio terceira idade, infncia e a cidados com necessidades especiais, unidades de recluso e instituies de solidariedade social. Trata-se de um projeto que procura combate a excluso e o estigma, restaurando um sentido de comunidade e ativando a autoestima de cada um dos participantes. O caso dos servios pblicos prende-se em grande medida com a capacidade de interao efetiva entre a entidade estatal que os gere e as dinmicas da sociedade civil nas comunidades que deles usufruem. A chave para a melhoria da qualidade de servios pblicos est na capacidade de desenvolver solues locais e baseadas em relaes sociais funcionais. Grande parte dos problemas sociais atuais resultam da disfuncionalidade das relaes que sustentam as comunidades onde o envelhecimento e a solido associada so paradigmticos. As solues de peer-to-peer tm se demonstrado valiosas, justamente, porque um dos motivos que leva as pessoas a mudarem os seus hbitos e comportamentos, seja deixar de fumar, ter uma alimentao mais saudvel ou fazer reciclagem, o facto de respeitarem pessoas que conseguiram fazer o mesmo (Leadbeater, 2009: 5). A aposta neste tipo de soluo impe uma flexibilizao dos sistemas pblicos, atualmente marcados por uma forte centralizao, racionalizao e burocratizao. Para tal, necessrio encarar os servios pblicos, ao mesmo tempo, como prolongamento e como alicerce, das relaes sociais que sustm o dia a dia das populaes. Consideremos aqui a Escola de Segunda Oportunidade (resultante de uma parceria entre a Associao para a Educao de Segunda Oportunidade, Direo Regional de Educao do Norte e Cmara Municipal de Matosinhos). preciso sublinhar que os resultados desta Escola de Segunda Oportunidade so muito positivos, pois a quase totalidade dos seus alunos chegam ao fim do ano letivo com competncias adquiridas numa das quatro reas vocacionais (artes, apoio ao lar, cozinha e informtica) e vo regressar ao ensino regular com um certificado que lhes dar equivalncia do 6., 7., 9. ano, conforme o caso. Mas mais do que estas competncias adquiridas, importa sublinhar a nova perspetiva com que partem estes alunos; a da diversidade de caminhos, no confinados ao mundo pequeno do bairro. E mais, salientar que a via de sada foi o hip hop e que atravs dele se combateu o insucesso escolar desbravando os medos dos alunos, valorizando os seus saberes e prticas, sabendo os porqus das suas falhas e das suas ausncias, conhecendo as suas histrias de vida.

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A inovao social no cruzamento da justia espacial a senda ltima do debate acerca da incluso. Se observarmos a realidade da grande maioria dos pases, vemos facilmente que a maximizao dos mnimos sociais no eficiente, as desigualdades sociais esto longe de aumentar as possibilidades dos mais desfavorecidos. sobre esta realidade, nomeadamente sobre as desigualdades em nveis de desenvolvimento, que importa agir no sentido da mudana, respeitando princpios universais de justia. O conceito de justia incorpora assim uma dimenso de agncia, uma componente prtica de projeto em construo que segundo Brawley passa pela denncia das desigualdades espaciais e sociais e do uso ilegtimo do poder estatal e econmico em variados aspetos da vida coletiva como a segregao crescente, a vigilncia urbana, a aquisio privada de infraestruturas pblicas, a crescente militarizao de fronteiras nacionais e municipais (Bret, 2009; Brawley, 2009: 27). A noo de justia espacial entendida como a perspetiva integrada da justia social e poltica numa determinada rea geogrfica. A aceo espacial permite-nos avaliar tanto os resultados dos sistemas de redistribuio, como os graus de acesso e participao nos processos de tomada de deciso, quer a nvel quantitativo, quer qualitativo. Permite-nos ainda transpor barreiras disciplinares e propor metodologias de promoo da justia e da democracia. Analisando as realidades multiescalares a que vivemos, percebe-se claramente a causalidade espacial da justia, nomeadamente na face do desenvolvimento e do subdesenvolvimento (Soja, 2009: 32-33). Assim, se as principais questes a respeito do desenvolvimento se referem distribuio dos recursos e organizao das atividades socioeconmicas de acordo com critrios de eficcia (capacidade de atingir objetivos) e eficincia (capacidade de rentabilizar meios na prossecuo de fins), a articulao entre estes critrios deve adequar-se ao ideal de justia como equidade (maximizao das oportunidades de todos, privilegiando os mais desfavorecidos, no sentido de garantir a igualdade de oportunidades). A justia assume-se como condio e, ao mesmo tempo, como objetivo central do desenvolvimento, dando propsito aos processos de deciso e planeamento pblico. Como alis o enuncia Marcuse, a respeito do planeamento urbano: a justia (a cidade justa) o objetivo ltimo do planeamento, no um objetivo entre objetivos, e no apenas de vrios planos, mas do planeamento em geral (Marcuse, 2009: 49). Esta viso da justia como o garante da liberdade econmica, social e poltica dos cidados e, da satisfao das mesmas como a realizao plena do objetivo ltimo do desenvolvimento - o bem-estar social, fundamental para o processo de mudana sistmica que a inovao social preconiza.

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4. DESAFIOS, CONTEXTOS, PRTICAS E AES EM PROL DE UMA CIDADE INCLUSIVA No obstante a diversidade que trespassa os territrios e cidades do Eixo Atlntico, possvel, se quisermos tomar como referncia a narrativa e conceptualizao da incluso anteriormente traada, a identificao de um conjunto de tendncias evolutivas inerentes aos contextos e modos de vida das populaes e que configuram uma procura sistemtica por patamares mais slidos de incluso, e inerentemente inovao social e justia espacial. Ser esta a altura adequada para salientar que os grupos particularmente propensos excluso social (Guerra, 2010; Pinto, 2010; Castro, 2010) so os grupos com handicaps especficos (pessoas com deficincia, imigrantes), os grupos desqualificados (desempregados de longa durao, trabalhadores com qualificaes baixas ou obsoletas, os idosos, famlias monoparentais) e os grupos margem (pessoas sem-abrigo, toxicodependentes e ex-toxicodependentes, jovens em risco e reclusos e ex-reclusos). Esta propenso vlida escala das cidades do Eixo Atlntico, como igualmente vlida para o territrio nacional e europeu. Este exerccio ser feito dentro de certos limites, pois no procuramos exaustividade, mas relevo e salincia a dimenses fundamentais da desigualdade atual. Importar reter primeiramente que a desigualdade social inerente s condies de bem-estar e de qualidade de vida, tendo em linha de conta as vulnerabilidades e riscos de no-sade/doena (fsica e mental) relacionados aos seus determinantes modos de viver, condies de trabalho, habitao, ambiente, educao, lazer, cultura, acesso a bens e servios essenciais tem vindo a tomar uma maior expresso em virtude das condicionantes demogrficas de aumento da longevidade e da vivncia de uma velhice mais desprotegida. Tomadas na sua amplitude, as consequncias de uma velhice desprotegida tambm se alastram um pouco por todas as cidades, quer nas mais litorais, quer nas mais interiores, dando salincia a um contexto de solido e anomia. Assim, estamos perante vulnerabilidades e limites de incluso com incidncia intensa na realidade metropolitana (Porto, Vila Nova de Gaia, Vila do Conde, Matosinhos) e interior (Mirandela, Peso da Rgua, Lamego, Macedo de Cavaleiros, Vila Real e Bragana, Chaves), mas que desponta j com toda a premncia no Cvado e no Ave (Barcelos, Famalico, Braga, Guimares). Continuando a focalizar-nos nas tendncias que limitam e obstaculizam a incluso social, no podemos deixar de referir um crescendo do sentimento de insegurana nsito aos contextos urbanos em presena e com grande nfase nas

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zonas mais interiores (Vila Real, Bragana, Mirandela, Macedo de Cavaleiros, Lamego, Rgua), segundo uma espcie de lastro que comeou na dcada de 19990 na Grande rea Metropolitana. A existncia de uma perceo/sentimento de maior ou menor segurana tambm uma determinante de desigualdade social. A segurana constitui um valor fundamental e a sua associao a uma grande diversidade de fatores exige a adoo de uma abordagem holstica, com grande nfase nas intervenes sociais, econmicas e familiares, numa perspetiva de mdio/longo prazo. So fundamentais a este nvel, as possibilidades de interveno ao nvel da gesto/mediao da conflitualidade entre vizinhos e ao nvel intrafamiliar e comunitrio, promovendo o envolvimento da comunidade na resoluo dos problemas de segurana. Reconhecendo as limitaes destas tendncias, que por certo o leitor tambm identificar, no podemos deixar de referir que as desigualdades passam tambm, no plano das representaes simblicas, pelo enraizamento identitrio e pela existncia de uma tessitura intensa de memrias e de representaes do mundo, quer seja do espao habitado, do vivido quotidiano, da relao com a cidade, da relao com a escola ou da relao com os poderes, entre outras. Assim, a crescente fragmentao dos modos de vida ocasionada pela mudana de paradigmas culturais e canis de interao decorrentes da globalizao e da sociedade em rede tm ditado inmeras fragmentaes. E isto to mais verdadeiro, quando reconhecemos a presena de mobilidades intensas para estas cidades e concelhos ao longo da derradeira dcada. Portanto, a presena de minorias tnicas e de imigrantes em muitos destes contextos, dever levar a um combate sistemtico de determinadas formas de etnocentrismo fortemente enraizadas nas populaes, nos tcnicos e nos poderes polticos. Esse desenraizamento comeou por ser mais intenso e visvel nos grandes centros e zona metropolitana tendo vindo espalhar-se crescentemente pelas cidades mdias e pequenas. Fator determinante tem vindo a ser a crescente retrao da sociedade providncia que funcionou durante dcadas como vlvula amortecedora de fragilidades econmicas e socais e que atualmente se encontra em franca regresso mesmo em contextos urbanos de pequena dimenso. O modelo de desenvolvimento social e econmico (sobretudo no Ave e no Cvado) que assentou (e com xito) nas baixas qualificaes, na economia subterrnea e nas baixas remuneraes, tem levado a intensos, renovados e inesperados processos de excluso social. Assim, das desigualdades (subjetivas e objetivas) decorrem intensos, renovados e inesperados processos de excluso social. Importa acentuar a pluralidade de vivncias face excluso, designadamente num conjuntura atual

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onde o discurso e a conjuntura de crise econmica (por exemplo, a inevitabilidade dos cortes salariais, o crescendo de desemprego) tm entrado de forma acutilante no quotidiano de toda a populao. Assim, e numa encruzilhada complexa, a crise de ajustamento estrutural para o modelo de desenvolvimento com incorporao de emprego qualificado e baseado no conhecimento, o deficit de setores exportadores, a tradicional situao de baixos salrios mas altos nveis de emprego at ao sculo XXI, o endividamento e pobreza tradicional e a grande polarizao social ao nvel de rendimentos, tm vindo a lanar um nmero crescente de pessoas em situao de excluso e consequentemente no includas na sociedade e isto mais premente no Vales do Ave e Baixo Tmega. As desigualdades face escola e aos recursos e competncias escolares continuam tambm a ser fundamentais para a configurao de percursos mais ou menos acentuados de excluso. Importava avaliar se o conjunto de medidas recentes, designadamente sob o mote das novas oportunidades (acompanhados de iniciativas em prol da promoo da qualidade de processos e prticas educativas; o aperfeioamento de programas de aprendizagem em geral e desenvolvimento interpessoal; a promoo e desenvolvimento da competncia de educadores; o desenvolvimento de programas de formao de recursos humanos para a promoo de habilidades sociais em crianas, adolescentes e jovens; a melhoria das competncias sociais e profissionais das crianas, jovens e adolescentes; o incremento das estratgias de gesto e de competncias parentais) tm vindo a ter impactos positivos na atenuao das desigualdades e na efetivao real de um conjunto de habilidades vendveis para a sociedade configurando uma escola inclusiva. por demais evidente a importncia do rompimento da relao entre a competitividade e a coeso social. Esta fratura leva prpria fragmentao e ineficcia do Estado Providncia e consequentemente ter de levar a uma nova discusso em torno da conciliao de dois vetores que parecem estar cada vez mais inconciliveis, sendo fulcral repensar estratgias de aproximao entre ambos. Crescentemente, tem vindo a desenhar-se um quadro de partilha de responsabilidades entre as autoridades pblicas centrais e locais no tocante interveno em matria de coeso social. Esta partilha crescente de responsabilidades e de competncias deriva da necessidade de intervir de forma mais eficaz em processos de excluso social de carter complexo, diverso e varivel no espao e no tempo. Assim, uma nova exigncia em termos de poltica social, tem vindo a fomentar o aparecimento de redes de apoio social integrado ao nvel local que possam contribuir para ativar os meios e agentes de resposta, conjugar esforos de diferentes entidades com interveno

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social, otimizar as respostas existentes a nvel local e inovar a concretizao das medidas de poltica social. por isso considerada a necessidade de estabelecimento de um frum de congregao e de articulao de esforos (recursos e aes do mbito social - Rede Social), baseado na adeso livre das autarquias e das entidades pblicas e privadas sem fins lucrativos que nela queiram participar. Para este plano de abordagem, outras duas questes se tornam essenciais. O aumento do desemprego e do mau emprego (ligado a baixas remuneraes, vnculos contratuais instveis, baixas qualificaes) tem vindo a ter um papel importante no apelidado agudizar das desigualdades, pois o modelo econmico anterior falhou (modelo que gerou, sustentou e instigou muitos desses fenmenos de mau emprego). Por um lado, importa refletir acerca do desemprego persistente em grupos desfavorecidos e suas consequncias, tais como, a relevncia do desemprego feminino (baixas qualificaes e fraca motivao para a reentrada no mercado de trabalho); o desajustamento entre as competncias dos desempregados e as necessidades do mercado; o recuo da economia informal com impacto no rendimento; o apoio social sobrepe-se aos baixos salrios e ao custo do acesso ao mercado de trabalho. Por outro lado, o emprego vulnervel e economicamente pouco rentvel tem levado predominncia dos baixos salrios, ao recuo da economia informal com impacto no rendimento, precariedade dos novos empregos, nomeadamente nos servios, s crescentes ameaas de desemprego e a um perfil de baixas qualificaes dos ativos empregados. Importa pois, perceber e refletir acerca das consequncias destas duas modalidades de (des)insero no mercado de trabalho e seus impactos nos processos de excluso e de pobreza. Se formos, designadamente, capazes de combinar estas tendncias numa s matriz interpretativa rapidamente chegamos ao desenho de um quadro de cidade inclusiva que para j exclusiva ainda em muitas das suas dimenses. A demonstrao desta assero revela-se pelo facto de existirem dimenses do desenvolvimento que no esto a ser cumpridas e que se sustm muito para alm dos condicionalismos econmicos. Estamos a falar da urgncia da promoo da participao da populao como atores do seu prprio desenvolvimento, envolvida na determinao dos seus prprios problemas; da defesa e praxis de um trabalho em rede e em parceria articulao com outros atores e sua corresponsabilizao (Estado, autoridades locais, empresas, organizaes diversas); da ativao de capacidades locais potencialidades e recursos endgenos, individuais e coletivos (empowerment); da referncia a um territrio, a uma identidade e uma memria; da qualidade social da comunidade; de uma viso e metodologia holstica intersectorial e multidisciplinar;
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da abertura mudana e da procura da diversidade de caminhos, de processos e resultados. Importa notar que na ltima dcada estas tendncias tm teimado em persistir no obstante os esforos feitos a nvel local, envolvendo parcerias Estado, autarquias, terceiro setor, para combater e contrariar os contedos das tendncias. No chegaramos ao ponto de lhes chamar boas prticas, mas to simplesmente estratgias de enfrentamento dos problemas e de ativao de uma lgica de desenvolvimento sustentada nos concelhos. Passando agora para a interpretao das interaes entre estruturas/condicionantes de excluso/incluso e prticas, vamos referenciar algumas experincias, mostrando que as intervenes em prol da incluso esto em curso, no obstante a sua ainda ineficcia na resoluo plena dos problemas sociais que tm atravessado na ltima dcada de forma intensiva e extensiva as cidades e seus concelhos. Barcelos detm uma relativa vitalidade demogrfica de Barcelos no quadro da Regio Norte e no Cvado. A existncia de uma estrutura demogrfica juvenilizada escala europeia compele a desafios relevantes do ponto de vista de um tecido urbano criativo e empreendedor. A ainda presena de uma dicotomia de modos de vida assentes na tradio versus modernidade apresenta-se como um fator de estrangulamento na fixao e atratividade do concelho. Essa mesma configurao impele a existncia de atividades importantes no domnio da olaria e do figurado mas tambm nas movimentaes juvenis associadas msica rock; reside na integrao destes dois mundos a possvel sada para um territrio mais inclusivo. A Rede Social tem levado a cabo um importante trabalho de integrao sectorial e territorial, mas importante investir em iniciativas de cruzamento e complementaridade essencialmente radicadas na inovao social capazes de terem valor social, mas simultaneamente sustentabilidade econmica. Interessa tambm relevar que o concelho de Viana do Castelo confirma um perfil de onde a qualidade de vida se pode ancorar s vivncias populacionais, quer nos situemos em meio urbano, quer em meio rural. Recentemente, este concelho tem vindo a afirmar-se crescentemente como espao de multiculturalidade, isto , como espao de convivncia de diferentes culturas no seio de um mesmo territrio, acionadas pela existncia de diversas comunidades tnicas geradas pela imigrao voluntria ou forada. Estas comunidades tnicas so marcadas pela diferena em termos de lngua e/ou religio e/ou usos e costumes e essa diversidade tem caracterizado Viana do Castelo na atualidade.

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Desta feita, a presena de populaes imigrantes (brasileira, ucraniana, africana e chinesa), embora com dimenses ainda relativamente contidas se comparadas com outras realidades locais ou regionais, tem levado a uma nova plataforma de integrao, sendo de salientar que estas comunidades esto de forma genrica bem integradas na sociedade vianense. Em termos de fatores crticos, podemos considerar a falta de informao sistemtica acerca desta populao, tambm de carter bastante voltil, a existncia de situaes de desemprego que aumenta a sua fragilizao em termos de integrao, a sua dependncia face aos servios locais de Segurana Social, no tocante a subsdios, a existncia por parte da populao residente de um sentimento de fechamento e de desconfiana face a esta populao e a necessidade de respostas mais assentes na parceria e colaborao entre as diversas instituies de interveno. Tambm a implantao da Rede Social e das parcerias para o desenvolvimento social tem vindo a revelar-se uma plataforma de interveno vivel face a problemticas sociais de pendor mais complexo e diversificado geograficamente. O processo de implementao da Rede Social tem sido lento, mas assume, neste momento, uma dinmica acrescida, havendo por parte da sua liderana e parceiros uma conscincia clara da sua importncia. Neste momento, o programa encontra-se numa fase de revivificao por via da atualizao de instrumentos, metodologias e diagnsticos, sendo este um patamar determinante para a sua matizao enquanto plataforma de entendimento, de ativao e de envolvimento para o desenvolvimento social do concelho. O modelo social de desenvolvimento do Baixo Tmega apresenta algumas caractersticas importantes, a saber: a importncia dos mecanismos da economia subterrnea no papel de combate pobreza e excluso mecanismos compensatrios (em regresso nos ltimos anos); o aumento das situaes de pobreza, sobretudo de novos pobres; a importncia do consumo naturalizado e intergeracional de lcool e permeabilidade a modalidades de consumo de substncias psicoativas em franco crescimento; a relevncia de um contexto de vivncia ainda rural mas permevel a consumos urbanos e a situaes de (sobre)vivncia ligadas economia informal; a presena de alguns contextos de vivncia marcada por uma certa desintegrao e desenraizamento juvenil e presena de manifestaes urbanas muito foradas; o aumento da precarizao das famlias (endividamento) e aumento da dependncia face s prestaes sociais; o crescendo da sinalizao de comportamentos de risco associados ao alcoolismo e toxicodependncia; a presena de uma estruturao familiar de perfil tradicional mas crescentemente confrontada pela transio entre um quadro de filiao tradicional e um quadro de

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desafiliao marcado designadamente pelo aumento do nmero de idosos isolados e das famlias monoparentais; a importncia dos mecanismos de proteo social e das concretizaes no terreno do Estado Providncia e consequente fragilizao social por via da dependncia e diminuio da importncia dos mecanismos da sociedade providncia. Aqui se situa Penafiel que tem vindo a operar na atenuao destes traos justamente pelo reforo e/ou reativao da interveno Rede Social e da sua Plataforma supra concelhia; o incremento/ valorizao de outros espaos de parcerias e trabalho em rede existentes; o reforo da insero das problemticas da incluso socioeconmica na agenda das organizaes locais; o desenvolvimento de organizaes e/ ou servios especializados de proximidade s famlias; a adoo de metodologias/ prticas de insero que contemplem a diversidade de problemas face ao mercado de trabalho; a rentabilizao dos instrumentos de apoio disponveis; a disponibilizao de instrumentos de orientao estratgica para a interveno das organizaes; e a capacitao institucional (recursos materiais e humanos). Estas linhas de ao derivam e fundam-se no trabalho de terreno desenvolvido e na considerao de todo um conjunto de opinies e de percees dos atores locais envolvidos na realizao deste Estudo. Vila Nova de Famalico tem vindo a destacar-se em termos nacionais pela experincia que o municpio tem vindo realizar em termos de polticas de interveno social, designadamente orientada para um modelo de qualificao /certificao dessa interveno marca decisivamente este domnio da ao municipal. A Rede Social, existente desde o projeto-piloto de 1996, utilizada no como um fim ou como uma instituio, mas como um instrumento para a anlise e diagnstico de problemas e dinmicas sociais do concelho, para o planeamento da interveno, para a organizao concertada das instituies e associaes envolvidas e para a interveno mais local. A panormica da ao social concelhia permite elencar reas de excelncia da interveno: sade escolar, aprendizagem ao longo da vida, Rede Social, qualidade dos servios sociais e o atendimento e acompanhamento social integrado. Este modelo de interveno social de referncia alis tambm a pedra de toque do concelho de Matosinhos que sendo pioneiro na ativao de uma estratgica de desenvolvimento social que remonta j aos incios dos anos 1990, tem marcado ponto a nvel nacional no tocante habitao, ao associativismo, escola e ao atendimento social integrado. Com todas as cautelas exigidas por uma enunciao no exaustiva tambm poderemos referir Braga. Braga tem sido desafiada crescentemente por uma localizao de populaes de baixos recursos em habitao social que tem desembocado em desafios de natureza quase metro-

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politana a esse nvel, mas tem ativado uma politica de ao social de integrao e desenvolvimento em torno do combate aos efeitos de gueto contidos pelas grandes concentraes habitacionais. Tambm a crescente presena de populao imigrante tem levado a uma interveno voltada para a vivncia intercultural marcante. 5. INTERVENO, GOVERNANCE E GESTO DO SOCIAL PARA A INCLUSO
CAPTULO 8. A CIDADE INCLUSIVA

Os elementos do problema constituam-se na observao dos factos e punham-se por esta ordem: peixe, vermelho, pintor sendo o vermelho o nexo entre o peixe e o quadro atravs do pintor. O preto formava a insdia do real e abria um abismo na primitiva fidelidade do pintor. Ao meditar sobre as razes da mudana exatamente quando assentava na sua fidelidade, o pintor sups que o peixe, efetuando um nmero de mgica, mostrava que existia apenas uma lei abrangendo tanto o mundo das coisas como o da imaginao. Era a lei da metamorfose. Compreendida esta espcie de fidelidade, o artista pintou um peixe amarelo. Herberto Hlder (2009) - Teoria das Cores. Os passos em volta.

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Fazendo uma deriva at ao Estado Providncia portugus, podemos referir que assenta num modelo que pode ser apelidado de quase ou semi-Estado Providncia porque no se compagina com os quatro elementos centrais de estruturao de um Estado Providncia: o pacto entre capital e trabalho e a conciliao do capitalismo com a democracia; a consonncia entre acumulao e legitimao; o nvel elevado das despesas sociais; e a incorporao dos direitos sociais enquanto direitos de cidadania e no enquanto fruto de benevolncia estatal (Mozzicafredo, 1992). Ora, esta configurao teve, tem e ter impactos inelutveis nos processos de interveno para a incluso social. Reconhecemos, desta forma, alguns traos distintivos do Estado Providncia portugus: o carter dual, fragmentado e corporativo das prestaes sociais, o hibridismo e mescla entre o setor pblico e privado; as lgicas clientelistas e particularistas fruto de um Estado fraco em termos de autonomia face aos interesses partidrios; a postura dependente e assistida presente nos padres culturais da populao (Guerra, 2002b).

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Neste ponto, e como pedra de toque, ao falarmos de elementos de contexto ao Estado Providncia portugus, no podemos deixar de referir a presena por todo o territrio nacional, de polticas fiscais sem funo redistributiva e a existncia de sistemas de proteo com baixos nveis de desempenho geral. Tambm a alterao de dinmicas demogrficas e familiares importante e tem contextualmente uma causalidade relevante designadamente no aumento do envelhecimento desprotegido e no aumento da monoparentalidade. de destacar ainda, enquanto fatores explicativos do contexto, o desajustamento entre a dinmica de apostas nas qualificaes (individuais e institucionais) e o ritmo de mudana pouco acelerado do modelo de desenvolvimento econmico presente, assim como o desenho de polticas ativas de emprego com dificuldades em atuar na ativao e capacitao dos pblicos mais desfavorecidos. No mbito dos valores e representaes sociais, o facto de se estar perante um modelo social em mudana mas que ainda assenta nas baixas capabilities para enfrentar o mercado de trabalho um elemento de fundamental considerao explicativa (Quaternaire Portugal, 2008). Ora bem: configurao do Estado e estruturas e prticas sociais com baixa capacidade de reivindicao da incluso e inovao social. Assim, uma concluso deste captulo assenta na difcil resoluo do dilema entre as fragilidades do Estado Providncia e as crescentes exigncias em termos de respostas sociais tendentes a processos de incluso, inovao e justia sociais. Um dos principais desafios de governance sugere uma nova exigncia em termos de poltica social, fomentando o aparecimento de redes de apoio social integrado ao nvel local que possam contribuir para ativar os meios e agentes de resposta, conjugar esforos de diferentes entidades com interveno social, otimizar as respostas existentes a nvel local e inovar a concretizao das medidas de poltica social. por isso considerada a necessidade de estabelecimento de um frum de congregao e de articulao de esforos (recursos e aes do mbito social), baseado na adeso livre das autarquias e das entidades pblicas e privadas sem fins lucrativos que nela queiram participar. Em parte este desafio est conseguido por via da implantao a partir de 1996 no territrio portugus do Programa Rede Social. No entanto, e apesar de reconhecermos as suas imensas potencialidades enquanto plataforma de planeamento estratgico de poltica social a uma escala local e regional, importa relembrar por um lado, as ainda intensas dificuldades da interiorizao dos seus processos, mas tambm por outro, o seu crescente esvaziamento poltico e econmico. Continuamos a defender que os seus princpios de atuao so os mais ajustados para a resoluo do dilema supraenunciado, mas tambm devemos declarar a sua ainda frgil condio de plataforma de interveno.

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Esta questo remete para a enunciao do que consideramos serem os princpios de interveno em matria social e que so exatamente os mesmos que pautam a Rede Social: integrao, articulao, subsidiariedade, inovao e participao. O princpio de integrao assenta nas seguintes bases: convergncia das medidas econmicas, sociais e ambientais, entre outras, com vista promoo das comunidades locais, atravs de aes planificadas, executadas e avaliadas de uma forma conjunta; convergncia de ajustamentos recprocos das pessoas, grupos sociais e da prpria sociedade; incremento de projetos locais de desenvolvimento, fazendo apelo participao de todos os intervenientes locais e congregao dos recursos de todos, para resoluo dos problemas sociais. Os seus pressupostos so a competncia social e a adaptao social; competncia social a capacidade que a sociedade deve ter de integrar todos os seus membros, investindo em aes que visam as mudanas necessrias, adaptao social a capacidade que cada um tem de utilizar os mecanismos facilitadores dessa adaptao, com vista sua autonomia pessoal. O princpio da integrao implica a conjugao das polticas sociais, da sade, emprego, educao, habitao e outras, uma conceo de desenvolvimento do territrio com viso global e a participao dos cidados. O princpio de articulao refere-se necessidade de articular numa parceria efetiva e dinmica a interveno social dos diferentes parceiros com atividade num determinado territrio (articulao dos parceiros). Por tudo isto, a atividade dos municpios nesta matria deve ser um suporte para a ao, criar sinergias entre os recursos existentes e potenciar as competncias existentes na comunidade, fornecendo uma logstica comum aos diversos parceiros e promovendo projetos sem substituir a ao dos departamentos e/ou entidades parceiras. A parceria, construda na base de um objetivo comum, pressupe: definir o objeto da cooperao e equacionar, em conjunto, o contributo de cada parceiro; organizar a parceria de acordo com modelos operacionais e eficazes, atravs de um esquema participativo mais reduzido ou mais alargado de parceiros, consoante os momentos e o tipo de aes a desenvolver; traduzir concretamente a parceria atravs de aes que permitam ajustar os diferentes modos de interveno e proporcionar uma aprendizagem da cooperao; corresponsabilizar os parceiros envolvidos no desenvolvimento e sucesso do conjunto das aes, pressupondo que os vrios agentes definam, para alm dos interesses respetivos e at das suas divergncias, uma estratgia comum. Atravs do princpio de subsidiariedade pretende-se ativar uma lgica de resoluo dos problemas nas instncias de mbito mais reduzido (micro), evitando a

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sua transferncia para instncias de mbito mais amplo, garantindo, assim, o apoio destas s primeiras, quando necessrio. Assume-se, deste modo, que no local que os problemas tero que se resolver, prximo das populaes, de uma forma concertada, articulada e preventiva, garantindo uma lgica de planeamento descendente. As vantagens da subsidiariedade na interveno local so as seguintes: possibilitar identificar necessidades, recursos e capacidades dos agentes de mudana; conhecer os efeitos reais das polticas sectoriais e globais; visualizar novas oportunidades e iniciativas, pela implicao dos diferentes agentes locais no desenvolvimento de projetos prprios; ensaiar, inovar, enraizar e integrar as aes; criar espaos de autonomia, organiz-los e geri-los; possibilitar a criao de condies de exerccio de solidariedade e de interveno coletiva, estrategicamente participada, planeada e avaliada; adquirir condies efetivas para o ressurgimento de processos de crescimento harmoniosos e controlados, onde as dimenses econmicas, culturais, sociais e ambientais se cruzam numa finalidade comum, a melhoria de vida e realizao das pessoas, famlias e comunidade em geral. Incontestavelmente, o espao privilegiado de desenvolvimento de processos participativos o local, no exerccio da democracia participada e de formas de regulao social, em que o Estado, sociedade civil organizada e cidados se juntam afim de criarem fatores de mudana propiciadores da insero dos mais desfavorecidos. O princpio de participao assenta na perspetiva de que o combate pobreza e excluso social tanto mais efetivo quanto mais resulte de um processo amplamente participado pelas populaes, onde as organizaes de base associativa constituam instrumentos de reforo dos elos sociais. Este mesmo princpio parece caracterizar a prpria estratgia de planeamento para o desenvolvimento no seu todo, na medida em que se v surgir um novo contexto mais alargado, sistmico e integrado, que constitui hoje o terreno das polticas pblicas - desenvolvimento local, luta contra a segregao e excluso, promoo identitria, garante de patrimnios identitrios, etc.. As autoridades locais ampliam o seu campo de ao e alimentam novas iniciativas no domnio do urbanismo, da organizao urbana, das polticas sociais, da cultura, da ao econmica, etc.. Este desenvolvimento das responsabilidades locais resultado quer de transferncias institucionais de competncias, quer da difuso de novas prticas acionadas pelos novos problemas, procedimentos por vezes experimentais de incio, mas progressivamente estabilizados. Estas experincias tm em comum alguns procedimentos de parceria e de negociao que caracterizam o incio do processo: discusso inicial do desenho do

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projeto, acordo sobre o programa de ao e um calendrio de realizaes, cofinanciamento pelos destinatrios, etc. As polticas contratuais colocam em contacto o Estado, as coletividades locais e a sociedade civil sem relaes tutelares (embora no necessariamente igualitrias) previstas, ou no, pela lei. Entram na cena uma pluralidade de atores, de configurao e legitimidade social diversa - pblicos e privados; centrais, regionais, locais; econmicos, sociais, culturais, etc. - e as negociaes adquirem nova visibilidade e legitimidade. Por fim, o princpio de inovao impe-se, uma vez que, ao surgirem novas problemticas e mutaes sociais a um ritmo acelerado, urgente uma mudana de mentalidades e de atitudes e a aquisio de novos saberes. imprescindvel inovar nos processos de trabalho, descentralizar os servios, desburocratizar, visando uma informao ativa atravs de um sistema de comunicao fcil e acessvel entre os servios e os cidados, possibilitando a partilha de informao. Os desafios atuais no campo incluso social so influenciados quer pelas grandes alteraes em curso nos sistemas de bem estar, quer pelo perfil de extenso e de severidade que ganharam em tempos recentes os problemas sociais, designadamente no campo das fragmentaes e fraturas sociais. Uma primeira questo central de governance e de gesto a este nvel, como referimos, indica a urgncia da territorializao da poltica social enquanto forma mais adequada de resposta diversidade e complexidade dos problemas sociais, sua extenso e severidade. A territorializao tem vindo a acentuar dinmicas distintas (mas que se apresentam como contributos complementares) seja pela via da descentralizao e/ou desconcentrao, seja pelo trabalho em parcerias locais e por via de iniciativas de desenvolvimento local. E este um processo que apesar de ter velocidades diferentes, vai acontecendo por via das autarquias e do seu entendimento do Programa Rede Social. Uma segunda questo remete necessariamente para a importncia de provises sociais que garantam a realizao dos direitos sociais civilizacionais alcanados e com particular realce para a contribuio dos servios pblicos, estando claramente aqui em causa entre outras medidas, o Rendimento Social de Insero. Seria importante a este nvel, percebermos o claro alcance do ainda opaco Plano de Emergncia Social. A garantia de provises sociais adequadas e justas tem levado a reconceber as modalidades de esperado impacto na vida dos cidados designadamente atravs dos equipamentos sociais e da elevao das taxas de cobertura dos equipamentos scias, designadamente ao nvel da infncia e da terceira idade.

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Correlativamente, importa afirmar a relevncia de iniciativas de carter experimental e apostadas na procura e consolidao de inovao ao nvel da incluso social e que remetem para procedimentos de inovao social envolvendo a diversidade de atores em presena. O desenvolvimento de um processo de inovao social assenta em trs pilares estruturantes: a procura efetiva, a oferta efetiva e as estratgias efetivas. A procura efetiva o reconhecimento da necessidade social abordada por promotores diretos consumidores de produtos, servios, ou voluntrios, e, promotores indiretos patrocinadores, fundaes. A oferta efetiva a nova ideia gerada para responder a essa necessidade ou necessidades, e as formas de a operacionalizar e expandir que lhe so associadas. As estratgias efetivas correspondem aos financiamentos, aos agentes envolvidos e s metodologias de aplicao que favorecem a absoro da inovao social pelos mercados. Este habitualmente o pilar menos estvel, dado o nmero limitado de organizaes e redes, assim como de profissionais de gesto na rea, que permita estabelecer comunidades de prtica, o que provoca a escassez de mtodos e tcnicas apropriados. Cabe aqui fazer referncia ao papel do system entrepreneur que define os agentes com a capacidade de trabalhar os contextos institucionais de forma a obter maior aceitao e alargar os impactos de uma iniciativa. Na sua aplicao incluso social, convm referir os elementos cruciais de estruturao de uma iniciativa: um modelo de negcio que acompanhe a misso da organizao e que a torne sustentvel; um modelo de governance que fornea um mapa claro do controle das operaes permitindo a comunicao de resultados; um conjunto de fontes de financiamento; um esquema de rede de cooperao (parceiros) e comunicao (o capital relacional da iniciativa); um modelo de staff (pessoal) que inclua o papel dos voluntrios; e um plano de desenvolvimento de sistemas de investigao, sistemas tecnolgicos e de gesto da informao, de sistemas financeiros e de prestao de contas, de sistemas de distribuio (logstica, controlo de qualidade, transparncia) e de gesto do risco (Mulgan, 2007). Por todas as especificidades e protocolo, ser importante investir num largo processo de aprendizagem face inovao social, pois sabemos que o seu modus operandi em muito se distancia desta perspetiva. Outro ponto de ancoragem para a governance e gesto da incluso social prende-se com o que consideramos as condies estruturais de ao para a incluso: a necessidade de um conhecimento aprofundado sobre os problemas e a sua natureza, de molde a alcanar uma compreenso simultaneamente especfica e de relao com o contexto nacional e global:

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 A necessidade de trabalhar a sensibilidade pblica e poltica para a urgncia e vantagens de intervenes no campo dos problemas sociais; a necessidade de desenvolver aes seja de pendor reparador, seja de orientao incidentemente preventiva;  A necessidade de antecipao estratgica de riscos sociais e animao pr-ativa da adaptao necessria nos dispositivos de captao da realidade;  A necessidade de aes urgentes, o que no pode nem adiar a definio de iniciativas a mais mdio e longo prazo, nem adiar a qualidade das provises;  A necessidade de facilitar e promover a inovao nas formas de resposta, designadamente contribuindo para o aperfeioamento das respostas pblicas correntes, quer a nvel local, quer escala regional ou nacional;  A necessidade de articulao e cooperao, designadamente atravs da corresponsabilizao e parcerias; a necessidade de adequar a natureza dos recursos natureza dos problemas e potencialidades;  A necessidade de preparar recomendaes de polticas convergentes com os desgnios de superar os problemas sociais. Finalmente, temos de sublinhar que todos os referenciais de incluso social so claros nas dimenses de interveno, isto , dado o carter holstico de uma sociedade inclusiva, ser necessrio acionar simultaneamente dimenses de interveno coletiva e dimenses de interveno ao nvel da agncia, do sujeito. Assim, e situando-nos no plano da interveno coletiva, importa no descurar o apoio e reforo do papel do mercado de trabalho enquanto plataforma de recursos e reestruturao da identidade pessoal e social. Ora, situa-se aqui o fomento criao de emprego, o incremento da inovao social e econmica e a procura de equidade no emprego e no nvel de vida (Guerra, 2010). Ainda na esfera coletiva, importa reforar o papel das instncias de socializao nomeadamente, a famlia, a vizinhana e outros grupos primrios atravs do reforo dos papis de mediao e intermediao da famlia, da escola e do associativismo (Castro, 2010). A adequao, inovao e integrao das polticas pblicas sobretudo atravs da cooperao e coproduo de solues com a sociedade civil deve ser outra das dimenses de atuao fundamental da ao coletiva. A interveno coletiva ter ainda muito a ganhar ao promover a elaborao de projetos de mbito e ambio local adequados ao desenvolvimento de base local.

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Concomitantemente, as dimenses mais importantes de interveno ao nvel dos sujeitos concentram-se na garantia da segurana na sobrevivncia quotidiana, na procura de um sentimento de pertena a uma comunidade, na potenciao de resilincia, confiana em si e capacidade de ao e na demanda da confiana nos outros e nas instituies, indo de uma esfera de direitos sociais mnimos (habitao, sade, justia), passando pelo sentimento de equidade nas oportunidades, a consolidao do capital social, a aquisio e treino de competncias e capacidade de ao, at ao desenvolvimento do sentimento de pertena a redes (Castro, 2010; Pinto, 2010; Guerra, 2010). REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS Almeida, J. Ferreira de (1993), Integrao social e excluso social: algumas questes, Anlise Social. Vol. XXVIII. N 123-4. Andersen, H. e Kempen, R. van (2001), Social Fragmentation, Social Exclusion and Urban Governance: an introduction, em Andersen, H. e Kempen, R. Van (eds.), Governing European Cities: social fragmentation, social exclusion and urban governance, Aldershot: Ashgate. Atkinson, A., Cantillon, B., Marlier, E. e Nolan, B. (2005), Taking Forward the EU Social Inclusion Process. Report - Final version, Luxembourg: An Independent Report Commissioned by the Luxembourg Presidency of the Council of the European Union. Bailey, Richard (2007), Evaluating the relationship between physical education, sport and social inclusion, Educational Review Vol. 57:1, pp. 71-90 (Acedido em: http://dx.doi.org/10.1080/0013191042000274196). Beck, Wolfgang, Maesen, Laurent Van der, Walker, Alan (2001), Theorizing social quality: the concepts validity, in Social Quality. A vision for Europe, Haia: Kluwer Law International. Beck, Wolfgang, Maesen, Laurent van der, Walker, Alan (eds.) (1997), The social quality of Europe, The Hague: Kluwer Law International. Bland, D. (2007), The social exclusion discourse: Ideas and policy change, Policy and Politics Vol. 35(1), pp. 123139.

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