Teoria Do Dinheiro e Crédito
Teoria Do Dinheiro e Crédito
Teoria Do Dinheiro e Crédito
145) (1911)
Sobre o Texto:
Ludwig von Mises foi um dos grandes expoentes da chamada Escola Austraca de Economia. Dentre outras caractersticas essa escola de pensamento caracterizada por se focar nos processos de dinmica (mudana) do mercado e negar o uso de instrumental matemtico para suas anlises.
Em Teoria do Dinheiro e Crdito Mises se prope a fazer um tratado econmico sobre um assunto que muito confunde os economistas: o da moeda.
Esse trecho selecionado e traduzido do Captulo 2 da segunda parte do livro. Aqui ele se dedica a refutar a Teoria Quantitativa da Moeda, que afirma que variaes na quantidade de dinheiro resultaro em variaes
proporcionalmente inversas no poder de compra da moeda. Em contraposio a essa viso mecanicista ele prope uma teoria dinmica, que leva em considerao o ponto de partida das alteraes e a atitude dos agentes para com relao a elas.
Os seguintes conceitos retirados do prprio livro talvez ajudem o leitor menos familiarizado com alguns termos tcnicos de economia:
Dinheiro-mercadoria: dinheiro que ao mesmo tempo tambm um bem tangvel (ouro, por exemplo).
Dinheiro de crdito: dinheiro que constitui em direitos de recebimento (um cheque pr-datado, por exemplo).
Fiat money: dinheiro legal, ou seja, que assim o graas ao reconhecimento da lei (nossos reais brasileiros, por exemplo).
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8 Conseqncias de um aumento na quantidade de dinheiro enquanto a demanda por dinheiro fica imodificada ou no aumenta no mesmo passo.
Aquelas variaes na razo entre a demanda individual por dinheiro e sua oferta que surgem por causas puramente individuais no pode, como uma regra, ter uma influncia quantitativa muito grande no mercado. Na maioria das vezes elas sero inteiramente, ou ao menos parcialmente, compensadas por variaes contrrias emanando de outros indivduos no mercado. Mas uma variao do valor objetivo de troca do dinheiro s pode surgir quando uma fora que exercida em uma direo no cancelada por outra contrria na direo oposta. Se as causas que alteram a razo entre a oferta de dinheiro e sua demanda do ponto de vista do indivduo consistem meramente em fatores pessoais e acidentais que dizem respeito apenas aquele indivduo, ento, de acordo com a lei dos grandes nmeros, provvel que as foras emergindo dessa causa, e agindo em ambas as direes no mercado, se contrabalancearo. A probabilidade de a compensao ser completa maior quanto maior for a quantidade de agentes econmicos individuais.
Mas o caminho outro quando perturbaes ocorrem na comunidade como um todo, de uma forma que altere a razo entre a oferta de dinheiro dos indivduos e sua demanda por ele. Tais perturbaes, claro, no podem ter outro efeito seno afetar as valoraes subjetivas do indivduo; mas as primeiras so fenmeno econmico social no sentido de que elas influenciam as valoraes subjetivas de um grande nmero de indivduos, se no simultaneamente e na mesma intensidade, pelo menos na mesma direo, fazendo com que haja necessariamente algum efeito resultante no valor de troca objetivo do dinheiro.
Na histria do dinheiro uma parte especialmente importante foi desempenhada por aquelas variaes no seu valor objetivo de troca que surgiram em conseqncia de um aumento na oferta de dinheiro enquanto a demanda por ele continuou inalterada ou pelo menos no aumentou na mesma proporo. Essas variaes, verdade, foram as que primeiro chamaram a ateno dos economistas; foi com o propsito de explic-las que a Teoria Quantitativa da Moeda foi primeiramente proposta. Todos os escritores lidaram
minuciosamente com aquelas. ento talvez justificvel dedicar ateno especial a elas e usa-las para iluminar certos pontos tericos importantes.
Seja l qual for a forma que encontrarmos para ilustrarmos o aumento na oferta de dinheiro, seja vindo de uma produo crescente [*1] ou importao da substncia a qual o dinheiro-mercadoria feito, ou atravs de uma nova emisso de fiat-money ou dinheiro de crdito, o dinheiro novo sempre aumenta a oferta de dinheiro a disposio de certos agentes econmicos individuais [*2]. Um aumento na oferta de dinheiro numa comunidade sempre significa um aumento da renda monetria de um nmero de certos indivduos; mas tal aumento no necessariamente significa ao mesmo um aumento na quantidade
de bens que se encontram a disposio da comunidade, ou seja, no significa um aumento do dividendo nacional. Um aumento na quantidade de dinheiro de crdito ou fiat s deve ser tratado como um aumento na quantidade de bens disposio da sociedade se permite a satisfao de uma demanda por dinheiro que at ento era satisfeita pelo dinheiro-mercadoria, uma vez que o material o qual o dinheiro-mercadoria teve ento que ser adquirido atravs da entrega de outros bens em troca dele ou produzido ao custo de renunciar algum outro tipo de produo. Se, por outro lado, a no existncia da nova emisso de dinheiro de crdito ou fiat no tivesse resultado em um aumento da quantidade de dinheiro-mercadoria, ento o aumento da oferta de dinheiro no pode ser tomado como um aumento da renda ou riqueza da sociedade.
Um aumento na oferta de dinheiro da sociedade sempre significa um aumento na quantidade de dinheiro possuda por um nmero de certos agentes econmicos, sejam eles os emissores do dinheiro de crdito ou fiat ou os produtores da substncia a qual o dinheiro-mercadoria feito. Para essas pessoas, a razo entre a demanda por dinheiro e a oferta alterada; elas possuem uma superabundncia de dinheiro e uma escassez relativa de outros bens econmicos. A conseqncia imediata de tais circunstncias que a utilidade marginal da unidade monetria para elas diminui. Isso
necessariamente influencia seu comportamento no mercado. Elas esto numa posio de compradores mais forte. Elas expressaro agora no mercado sua demanda pelos objetos que desejam de maneira mais intensa do que antes; elas esto em condio de oferecer mais dinheiro pelas mercadorias que desejam adquirir. Ser o resultado bvio de tal processo que os preos dos bens desejados iro subir, e que o valor de troca objetivo do dinheiro ir cair em comparao.
Mas essa alta de preos de maneira alguma ficar restrita aos mercados dos bens que so desejados por aqueles que originalmente possuem o dinheiro novo a sua disposio. Somando se a isso, aqueles que levaram tais bens ao mercado tero suas rendas e suas proporcionais ofertas de dinheiro aumentadas e, por sua vez, estaro em posio de demandar mais intensivamente os bens que desejam, de maneira que tais bens tambm subiro de preo. Dessa forma, o aumento de preos continua, possuindo um efeito decrescente [*3], at todas as mercadorias, algumas em maior, outras em menor proporo, sejam afetadas por ele [1].
O aumento na quantidade de dinheiro no significa um aumento na renda de todos os indivduos. Pelo contrrio, aquelas parcelas da comunidade que so as ltimas a serem atingidas pela quantidade adicional de dinheiro possuem suas rendas reduzidas, como uma conseqncia da diminuio do valor do dinheiro engendrada pelo aumento de sua quantidade; ocuparemos-nos disto mais tarde. A reduo da renda dessas ltimas classes inicia agora uma contratendncia, a qual se ope a tendncia da diminuio do valor do dinheiro devido ao aumento da renda daquelas outras classes, no entanto sem ser capaz de anular completamente seu efeito [*4].
Aqueles que sustentam a verso mecnica da Teoria Quantitativa da Moeda sero os mais inclinados a acreditarem que um aumento na quantidade de dinheiro dever eventualmente levar a um aumento uniforme nos preos de todos os bens econmicos, e menos clara sua concepo da forma pela qual a determinao dos preos afetada por tal aumento. A compreenso cuidadosa do mecanismo atravs do qual a quantidade de dinheiro afeta os preos das mercadorias torna seu ponto de vista completamente insustentvel. Uma vez que a quantidade aumentada de dinheiro recebida em primeiro lugar apenas por uma quantidade limitada de agentes econmicos, e no por todos eles, o
aumento de preos primeiramente permeia apenas os bens que so demandados por aquelas pessoas; alm disso, afeta tais bens mais do que afeta quaisquer outros no percurso. Quando o aumento de preos se espalha mais profundamente, se o aumento na quantidade de dinheiro apenas um fenmeno transitrio, ser impossvel para o aumento diferencial dos preos desses bens ser completamente mantido; certo grau de ajustamento ter que ocorrer. Mas no haver tal ajuste completo dos aumentos de forma que todos os preos aumentem na mesma proporo. Os preos das mercadorias aps a alta de preos no representaro a mesma relao entre si antes do incio; a queda do poder de compra do dinheiro no ser uniforme no que toca aos diferentes bens econmicos [*5].
Hume, deve ser noticiado, baseia seu argumento com relao a esse assunto na suposio de que todo ingls milagrosamente dotado de cinco peas de ouro durante a noite [2]. Mill corretamente nota isto, que o aumento na quantidade de dinheiro no leva a um aumento uniforme da demanda por mercadorias em separado; os artigos de luxo das classes mais pobres subiriam de preo mais do que outros bens. Tudo o mais constante, ele cr que um aumento uniforme nos preos de todas as mercadorias, e proporcionalmente ao aumento da quantidade de dinheiro, ocorreria, se os desejos e inclinaes da comunidade coletivamente no que diz respeito ao consumo permanecessem os mesmos. Ele assume, no mais artificialmente que Hume, que para toda libra, ou shilling, ou penny em posse de qualquer um, outra libra, shilling ou penny seria instantaneamente adicionada [3]. Mas Mill falha em perceber que mesmo nesse caso uma alta uniforme de preos no ocorreria, mesmo supondo que para cada membro da comunidade a proporo entre oferta de dinheiro e riqueza total fosse a mesma, de maneira que a adio de quantidade de dinheiro suplementar no resultasse na alterao da riqueza relativa dos indivduos. Isso aconteceria uma vez que, mesmo nesse caso um tanto impossvel, todo
aumento na quantidade de dinheiro necessariamente causaria uma alterao nas condies de demanda, o que levaria a um aumento de preos no uniforme dos bens econmicos dos indivduos. Nem todas as mercadorias seriam demandadas mais intensivamente, e nem todas aquelas que fossem demandadas mais intensivamente seriam afetadas na mesma intensidade [*6] [4].
No h qualquer justificativa para a crena difundida que variaes na quantidade de dinheiro devam levar variaes inversamente proporcionais no valor objetivo de troca do dinheiro, de forma que, por exemplo, uma duplicao na quantidade de dinheiro leve a um reduo pela metade do poder de compra da moeda.
Mesmo assumindo que de uma maneira ou de outra admitivelmente difcil imaginar como a oferta de moeda de todos os indivduos fosse ampliada de maneira que sua posio relativa quanto a outros proprietrios de bens ficasse inalterada, no difcil provar que a variao subseqente no valor objetivo de troca do dinheiro no seria proporcional a variao na quantidade de dinheiro. Se o possuidor de a unidades de dinheiro recebe b unidades adicionais, logo de maneira alguma verdade dizer que ele ir valorar seu estoque total a+b exatamente com a mesma intensidade que valorava apenas a quantidade a. Uma vez que agora ele possui um estoque maior, ele ir valorar cada unidade menos do que antes; mas quo menos depender de toda uma srie de circunstncias individuais, de valores subjetivos que sero diferentes para cada indivduo. Dois indivduos que so igualmente ricos e que possuem um estoque de dinheiro a, de maneira alguma chegaro mesma variao em seu apreo pela quantidade aps um aumento de b unidades em cada um dos seus estoques de dinheiro. No nada seno um absurdo assumir que, digamos, a duplicao da quantidade de dinheiro a disposio de um indivduo levar a
uma reduo pela metade do valor de troca que ele atribui a cada unidade monetria. Imaginemos, por exemplo, um indivduo que costuma manter em caixa um estoque de 100 coroas [*7], e suponha que a quantia adicional de 100 coroas seja paga por algum a esse indivduo. A mera considerao desse exemplo suficiente para mostrar a completa fantasia de todas as teorias que prescrevem a variaes da quantidade de dinheiro um efeito uniformemente proporcional no poder de compra da moeda. No envolve modificaes essenciais ao exemplo supor que aumentos similares na quantidade de dinheiro so vivenciados por todos os membros da comunidade como um todo.
O erro no argumento daqueles que supe que uma variao na quantidade de dinheiro resulta numa variao inversamente proporcional no seu poder de compra reside no seu ponto de partida. Se desejarmos chegar a uma concluso correta, devemos examinar a forma pela qual um aumento ou diminuio na quantidade de dinheiro afeta as escalas de valor dos indivduos, porque apenas destas que as variaes das propores de troca dos bens procedem. A pressuposio nos argumentos daqueles que mantm a teoria de que mudanas na quantidade de dinheiro tm um efeito proporcional no poder de compra do dinheiro a proposio de que se o valor da unidade monetria dobrasse, metade da oferta de dinheiro a disposio da comunidade teria a mesma utilidade que possua antes a oferta inteira. A veracidade dessa
Em primeira instncia, deve ser mostrado que o nvel da oferta total de dinheiro e o nvel do valor da unidade monetria so questes de completa indiferena quando a utilidade obtida do uso do dinheiro est sendo discutida. A sociedade est sempre desfrutando da utilidade mxima obtida do uso do dinheiro [*8]. Metade do dinheiro disposio da comunidade proporcionaria a mesma satisfao que o estoque completo, mesmo se a variao do valor da unidade
monetria no fosse proporcional variao da quantidade de dinheiro. Mas importante notar que de maneira alguma segue que duplicar a quantidade de dinheiro significa reduzir pela metade o valor de troca do dinheiro. Teria que ser demonstrado que emanam foras das valoraes individuais dos agentes econmicos que so capazes de criar tal variao proporcional. Isso nunca poder ser provado; de fato, o contrrio provvel. J demos uma prova dessa incapacidade para o caso de que um aumento na quantidade de dinheiro possuda pelos agentes econmicos individuais envolve ao mesmo tempo um aumento de sua renda ou riqueza. Mas mesmo quando o aumento da quantidade de dinheiro no afeta a riqueza ou renda dos agentes econmicos individuais, o efeito o mesmo.
Vamos supor que um homem consegue metade de sua renda na forma de ttulos que rendem juros e metade na forma de dinheiro; e que ele acostumado a poupar trs quartos de sua renda, fazendo-o segurando os ttulos e usando aquela metade de sua renda que recebe em dinheiro igualmente para pagar por seu consumo corrente e para a compra de mais ttulos. Agora vamos supor que uma variao na composio de sua renda ocorra, de maneira que ele passe a receber trs quartos em dinheiro e apenas um quarto em ttulos. A partir de agora ele usar dois teros de suas receitas em dinheiro para a compra de ttulos que rendem juros. Se o preo dos ttulos sobe, ou, o que d na mesma, os juros auferidos caem, ento em ambos os casos ele estar menos interessado em comprar e ir reduzir a soma que ele iria ento empregar para comprar os ttulos; ele acabar percebendo que a vantagem de uma reserva monetria um pouco aumentada excede aquela que poderia ser obtida atravs da aquisio de ttulos. No segundo caso ele sem dvida estar propenso a pagar um preo maior, ou mais corretamente, comprar uma quantidade maior a um preo mais alto do que no primeiro caso.
Mas ele certamente no estar preparado para pagar duas vezes mais por uma unidade de ttulo no segundo caso tanto quanto no primeiro caso.
Enquanto os expoentes prvios da Teoria Quantitativa da Moeda so mencionados, a suposio que variaes na quantidade de moeda teriam um efeito inversamente proporcional no seu poder de compra pode at no entanto ser justificvel. fcil se confundir nesse ponto se tentado explicar o fenmeno valor do mercado se referindo ao valor de troca. Mas inexplicvel que aqueles tericos que tambm supem que esto defendendo a teoria subjetiva do valor possam cair em armadilhas similares. A culpa aqui s pode recair na concepo mecnica do processo de mercado. Dessa forma at Fisher e Brown, cujos conceitos da Teoria Quantitativa da Moeda so mecnicos, e que tentam expressar em equaes matemticas a lei pela qual a lei do valor do dinheiro determinada, necessariamente chegam concluso que variaes na razo entre a quantidade de dinheiro e sua demanda levam a variaes proporcionais no valor objetivo de troca do dinheiro [5]. Como e atravs de que canais isso se processa no exposto pela frmula, uma vez que ela no possui referncia alguma aos fatores que so decisivos em causar variaes nas propores de troca, isto , variaes nas valoraes subjetivas dos indivduos.
Fisher e Brown do trs exemplos para provar a veracidade de suas concluses. No primeiro, eles comeam com a suposio de que o governo muda a denominao do dinheiro, de forma que, por exemplo, o que era anteriormente chamado de meio-dlar chamado agora de dlar inteiro. bvio, eles afirmam, que isso causar um aumento na quantidade de dlares em circulao e que os preos reconhecidos em termos dos novos dlares tero que ser duas vezes maiores que anteriormente. Fisher e Brown podem estar certos at a, mas no nas concluses que pretendem retirar. O que seu exemplo lida na verdade no um aumento na quantidade de dinheiro, mas meramente uma alterao
em seu nome. Do que o dinheiro mencionado nesse exemplo realmente consiste? do material o qual os dlares so feitos, da promessa que lastreia um dlar de crdito, a bugiganga [*9] que usada como dinheiro ou a palavra dlar?
O segundo exemplo dado por Fisher e Brown no menos incorretamente interpretado. Eles comeam com a suposio de que o governo divida cada dlar em dois e cunhe um novo dlar com cada metade. Aqui novamente tudo o que ocorre uma mudana de nome.
Em seu terceiro exemplo eles ao menos tentam lidar com um aumento real na quantidade de dinheiro. Mas esse exemplo to artificial e enganoso quanto aqueles de Hume e Mill, os quais j tratamos com algum detalhe. Eles supem que o governo d a todos um dlar extra para cada dlar j possudo. J mostramos que nesse caso uma mudana proporcional no valor de troca objetivo da moeda no pode se efetivar.
Apenas uma coisa pode explicar como Fisher capaz de manter sua Teoria Quantitativa mecnica. Para ele a Teoria Quantitativa da Moeda parece uma doutrina peculiar ao valor do dinheiro; de fato, ele a contrasta abertamente com as leis de valor dos demais bens econmicos. Ele diz que se o estoque de acar mundial aumentasse de um milho de libras para cem milhes, disso no seguiria que cem libras teriam o valor possudo agora por uma libra. Apenas o dinheiro peculiar nesse aspecto, de acordo com Fisher. Mas ele no d uma prova dessa afirmao. Com a mesma justificativa de Fisher e Brown para sua frmula mecnica para o valor do dinheiro, uma frmula semelhante poderia ser elaborada para o valor de qualquer mercadoria, e concluses similares extradas a partir dela. Que ningum tenta fazer isso deve ser explicado simples e unicamente pela circunstncia de que tal frmula contestaria to claramente
nossa experincia das curvas de demanda para a maioria das mercadorias, que ela no poderia em momento algum ser sustentada.
Se compararmos dois sistemas econmicos estticos, que no diferem em nada exceto que em um deles haja duas vezes mais dinheiro que em outro, parecer que o poder de compra da unidade monetria em um sistema deva ser igual metade do poder de compra da unidade monetria no outro. Contudo, no devemos concluir disto que uma duplicao da quantidade de moeda deva levar a uma reduo pela metade do poder de compra da unidade monetria; cada variao na quantidade de dinheiro introduz um fator dinmico no sistema econmico esttico. A nova posio de equilbrio esttico que estabelecida quando os efeitos das flutuaes assim colocadas em funcionamento so finalizados no pode ser a mesma que existia antes da introduo da quantidade adicional de dinheiro [*10]. Consequentemente, no novo estado de equilbrio as condies de demanda por dinheiro, dado certo valor de troca da unidade monetria, tambm sero diferentes. Se o poder de compra de cada unidade da quantidade duplicada de dinheiro fosse reduzido pela metade, a unidade no teria a mesma significncia para cada indivduo sob as novas condies como tinha no sistema esttico anterior ao aumento na quantidade de dinheiro. Todos aqueles que creditam a variaes na quantidade de dinheiro um efeito inverso proporcional no valor da unidade monetria esto aplicando a condies dinmicas um mtodo de anlise que serve apenas para condies estticas.
tambm completamente incorreto pensar na Teoria Quantitativa da Moeda como se as caractersticas em questo afetando a determinao do valor fossem peculiares ao dinheiro. A maioria dos defensores anteriores e posteriores da teoria caram nesse erro, e os ataques ferozes e frequentemente brbaros que
foram direcionados a ela revelam-se melhor quando sabemos deste e de outros erros do mesmo tipo dos quais seus expoentes foram culpados.
Notas do Autor
[1] Cp. Hume, Essays (ed. Frow.de, London), pp. 294 ff.; Mill, op. cit., pp. 298 ff.; Cairnes, Essays in Political Economy, Theoretical and Applied, London 1873, pp. 57 rT.; Spiethoff, Die Quantitatstheorie, pp. 250 ff.
[4] Cp. Conant, What determines the Value of Money? (Quarterly Journal of Economics, Vol. XVIII, 1904), pp. 559 ff.
[5] Cp. Fisher and Drown, op. cit., pp. 28 ff., 157 ff.
Notas do Tradutor
[*1] Mises tem em mente metais preciosos, mas tal produo pode ser estendida a qualquer mercadoria que esteja servindo como um meio de troca indireta em larga escala.
[*2] importante dar ateno ao fato que o dinheiro novo chega s mos de alguns agentes privilegiados primeiro.
[*3] importante notar que o aumento de preos no uma coisa homognea, como se fosse dada por um nvel geral de preos. Ele distorce preos de mercadorias em especfico, gerando sinais mltiplos para os agentes que os interpretaro de maneira pessoal, de acordo com seu conhecimento (ou seja, subjetivamente), e far com que seus planos de ao atinjam um grau maior de descoordenao.
[*4]
Fica-se
claro
ento
que
interferncias
externas
intencionais
ao
funcionamento natural do mercado monetrio (assim como em qualquer outro mercado) geraro um grupo perdedor e um ganhador. Isso exatamente o que est acontecendo com a famigerada crise do subprime. Os governos pelo mundo inteiro esto injetando esse dinheiro novo nas mos dos pobres banqueiros, em detrimento da grande maioria da populao que colocar suas mos em tal dinheiro depois de considervel tempo, enfrentando maiores preos. Na realidade, a prpria crise resultado de intervenes externas intencionais pretritas, algumas das quais Mises discute j em 1911 na Teoria do Dinheiro e Crdito, como o sistema de reservas bancrias fracionrias. Sobre outras intervenes estruturais no mercado monetrio, meu blogue
(www.enxurrada.blogspot) e seus links recomendados, como por exemplo, o Mises Institute (Brasil) possuem outras informaes.
[*5] O que Mises quer sugerir que os preos iro diferir em proporo, no havendo uma mera subida nominal (por exemplo, dois preos que antes se relacionavam em 1 : 2 no se relacionaro em 2 : 4, e sim por outras relaes, como por exemplo 2 : 5, gerando tendncias a mudanas nos dados econmicos preferncias dos consumidores, mtodos de produo usados,
etc. devido compreenso pessoal subjetiva dos agentes de tais mudanas dos dados).
[*6] Percebe-se que como os preos relativos mudam, alguns ficam relativamente mais ricos que outros aps a introduo do novo dinheiro, pois suas mercadorias so mais (menos) bem valoradas pelos demais agentes no mercado. H na verdade uma redistribuio de riqueza.
[*8] De um ponto de vista Hayekiano ou Kirzneriano tal proposio duvidosa, uma vez que trocas mutuamente benficas e desejadas pelos agentes podem no estar sendo realizadas por ignorncia pura dos agentes quanto a sua possibilidade.
[*9] Token.
[*10] Na realidade o sistema econmico nunca est em um equilbrio esttico e nunca chegar a algum, embora possua foras que o levem cada vez mais em direo a um ponto de equilbrio. A velocidade e intensidade de tal caminhada em direo a um ponto de equilbrio esttico dependem de quo estveis so os dados do sistema (preferncias individuais, preos, conhecimento tcnico, etc) e sua interpretao pelos agentes econmicos. O prprio Mises mais tarde em Ao Humana explicita tais fatos.
Sobre o Texto:
Ludwig von Mises foi um dos grandes expoentes da chamada Escola Austraca de Economia. Dentre outras caractersticas essa escola de pensamento caracterizada por se focar nos processos de dinmica (mudana) do mercado e negar o uso de instrumental matemtico para suas anlises.
Em Teoria do Dinheiro e Crdito Mises se prope a fazer um tratado econmico sobre um assunto que muito confunde os economistas: o da moeda.
Esse trecho selecionado e traduzido do Captulo 6 da segunda parte do livro. Aqui ele se dedica a investigar as conseqncias econmicas ao longo do tempo de aumentos e diminuies da quantidade de dinheiro num sistema. Sua concluso a de que temos redistribuies de renda e riqueza.
Os seguintes conceitos retirados do prprio livro talvez ajudem o leitor menos familiarizado com alguns termos tcnicos de economia:
Dinheiro-mercadoria: dinheiro que ao mesmo tempo tambm um bem tangvel (ouro, por exemplo).
Dinheiro de crdito: dinheiro que constitui em direitos de recebimento (um cheque pr-datado, por exemplo).
Fiat money: dinheiro legal, ou seja, que assim o graas ao reconhecimento da lei (nossos reais brasileiros, por exemplo).
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Captulo VI
Variaes no valor de troca objetivo do dinheiro incitam deslocamentos na distribuio de renda e propriedade, de um lado porque os indivduos so capazes de fazer vista grossa a variabilidade do valor do dinheiro, e por outro lado porque variaes no valor do dinheiro no afetam todos os bens econmicos e servios uniforme e simultaneamente.
Por centenas, mesmo milhares de anos, as pessoas falharam completamente em perceber que variaes no valor objetivo de troca do dinheiro poderiam ser induzidas por fatores monetrios. Elas tentaram explicar todas as variaes de preos exclusivamente pelo lado das mercadorias. Foi a grande conquista de Bodin fazer o primeiro ataque contra essa suposio, que logo ento desapareceu rapidamente da literatura cientifica. Ela continuou por um bom tempo a dominar a opinio dos leigos; mas hoje em dia parece ter sido sacudida at mesmo aqui. Todavia, quando os indivduos esto trocando bens presentes por bens futuros eles no levam em conta em suas valoraes as variaes no valor objetivo de troca do dinheiro. Tomadores e credores no esto acostumados em considerar possveis flutuaes futuras no valor de troca objetivo do dinheiro.
Transaes nas quais bens presentes so trocados por bens futuros tambm ocorrem quando uma obrigao futura tem que ser cumprida, no em dinheiro, mas em outros bens. Ainda mais freqentes so transaes nas quais os
contratos no tm que ser cumpridos por ambas as partes at certo ponto no tempo. Todas essas transaes envolvem um risco, e tal fato bem compreendido por todos os contratantes. Quando algum compra (ou vende) contratos futuros de milho, algodo, ou acar, ou quando algum entra num contrato de longo prazo para o abastecimento de carvo, ferro ou madeira, se est bem ciente dos riscos que esto envolvidos na transao. O agente ir cuidadosamente pesar as chances de variaes futuras nos preos, e frequentemente tomar precaues, atravs de seguros e transaes de hedging [*1] como aquelas que as modernas tcnicas de troca desenvolveram, para reduzir o fator aleatrio em suas transaes.
Ao fazerem contratos de longo prazo envolvendo dinheiro, as partes contratantes geralmente no esto cientes de que esto tomando parte numa transao especulativa. Os indivduos so guiados em suas negociaes pela crena de que o dinheiro estvel em seu valor, ou seja, que seu valor objetivo de troca no est sujeito a flutuaes, ao menos no que seus determinantes monetrios esto relacionados. Isso evidenciado mais claramente na atitude tomada pelos sistemas legais com relao ao problema do valor de troca objetivo do dinheiro.
Na lei, o valor de troca objetivo do dinheiro estvel. de vez em quando afirmado que os sistemas legais adotam a fico da estabilidade do valor de troca do dinheiro; mas isso falso. Ao armar uma fico, a lei requer que ns tomemos uma situao atual e a imaginemos diferente do que realmente , tanto pensando em elementos no existentes como adicionados a ela ou pensando em elementos existentes como removidos dela, com vistas a permitir a aplicao de mximas legais as quais se referem apenas a situao ento transformada. Seu propsito ao fazer isso possibilitar decidir casos de acordo com uma analogia quando uma ordem direta no se aplica. Toda a natureza das fices legais determinada por esse propsito, e so sustentadas at onde so necessrias. O legislador e o juiz sempre esto cientes de que a situao fictcia no corresponde realidade. da mesma forma com a assim chamada fico dogmtica que empregada na jurisprudncia de maneira a permitir fatos legais serem sistematicamente classificados e relacionados uns
com os outros. Aqui, novamente, a situao pensada como se existisse, mas no afirmada como existindo [1].
A atitude da lei perante o dinheiro um problema um pouco diferente. O jurista completamente desfamiliarizado com o problema do valor do dinheiro; no sabe nada sobre flutuaes em seu valor de troca. A ingnua crena popular na estabilidade de seu valor de troca foi admitida na lei com toda sua obscuridade, e nunca nenhuma grande causa histrica de grandes e repentinas variaes no valor do dinheiro providenciou um motivo para exame crtico da atitude legal perante o assunto. O sistema de lei civil j tinha sido constitudo quando Bodin deu o exemplo de tentar remontar variaes no poder de compra do dinheiro a causas que exercem sua influncia pelo lado monetrio. Nessa questo, as descobertas de economistas mais modernos no deixaram trao algum na lei. Para a lei, a invariabilidade do valor do dinheiro no uma fico, mas sim um fato.
Tudo o mais constante, a lei devota sua ateno a certas questes incidentais de valor do dinheiro. Ela lida profundamente com a questo de como as existentes obrigaes legais e dbitos deveriam ser reconhecidos como afetados pela transio de uma moeda para outra. Antigamente, a jurisprudncia devotava a mesma ateno degradao real da moeda [*2] que um pouco mais no futuro viria a devotar aos problemas criados pelas cambiantes polticas de Estado de escolher primeiro entre dinheiro de crdito e dinheiro metlico e depois entre ouro e prata. No entanto, o tratamento que essas questes receberam nas mos dos juristas no resultou de reconhecimento do fato de que o valor do dinheiro est sujeito flutuao contnua. De fato, a natureza do problema, e a forma pela qual foi tratado, tornaram isso impossvel desde o incio. Foi tratado no como uma questo da atitude da lei para com variaes do valor do dinheiro, mas como uma questo do poder do Prncipe ou Estado modificar arbitrariamente obrigaes existentes e assim ento destruir direitos existentes. De uma s vez, isso deu origem a questo de se validade legal do dinheiro era determinada pelo carimbo do soberano do pas ou pelo contedo metlico da moeda; depois, a questo de se o comando da lei ou a livre disposio do comrcio deveria definir se o
dinheiro era de curso legal ou no. A resposta da opinio pblica, fundada nos princpios da propriedade privada e proteo de direitos adquiridos, foi a mesma em ambos os casos: Front quidque contractum est, ita et solvi debet; ut cum re contraximus,re solvi debet, veluti cum mutuum dedimus, ut retro pecuniae tantundem solvi debeat [2]. A restrio nessa conexo, que nada deveria ser reconhecido como dinheiro exceto o que era reconhecido como tal no momento que a transao foi efetuada e que o dbito deveria ser quitado novamente no meramente em metal, mas na moeda que havia sido especificada no contrato, vinha da viso popular, tomada como a nica correta por todas as classes da comunidade e especialmente pelos mercadores, a qual dizia que o que era essencial numa moeda era seu contedo metlico, e que o carimbo no possui outro significado seno um certificado das autoridades quanto ao seu peso e pureza. No passava pela cabea de ningum tratar moedas em transaes comerciais diferentemente de outras peas de metal do mesmo peso e pureza. Na verdade, atualmente negado que o padro monetrio era metlico.
A viso de que no cumprimento de obrigaes firmadas em termos de dinheiro apenas o contedo metlico do dinheiro deveria ser levado em conta prevalecia contra a doutrina nominalista exposta pelas autoridades cunhadoras. manifesta nas medidas legais tomadas para estabilizar o contedo metlico da cunhagem, e desde o fim do sculo dezessete, quando as moedas se desenvolveram em padres monetrios sistemticos, essa viso tem garantido o critrio para determinar a proporo entre duas moedas diferentes do mesmo metal (quando em circulao simultnea ou sucessivamente), e critrio para as tentativas, sabidamente mal sucedidas, de tentar combinar os dois metais preciosos num sistema monetrio uniforme [*3].
Mesmo o aparecimento do dinheiro de crdito, e os problemas que ele trouxe, no poderiam direcionar a ateno da jurisprudncia para a questo do valor do dinheiro. Um sistema de papel-moeda era imaginado como um de acordo com o esprito da lei apenas se o papel-moeda continuasse constantemente equivalente ao dinheiro metlico ao qual era originalmente e que veio a substituir ou se o contedo ou valor metlico das notas continuasse decisivo
em contratos ou dvidas. Mas o fato de que o valor de troca do prprio dinheiro metlico est suscetvel a variaes continuou a escapar do reconhecimento legal e da opinio pblica, pelo menos no que concerne o ouro (e atualmente nenhum outro metal precisa ser levado em considerao); no h mxima legal alguma que tome conta disto, mesmo que seja bem sabido por economistas por mais de trs sculos.
Nessa crena ingnua na estabilidade do valor do dinheiro a lei est em harmonia completa com a opinio pblica. Quando qualquer tipo de diferena surge entre a lei e a opinio pblica, uma reao deve seguir necessariamente, um movimento se vira contra aquela parte da lei que se sente ser injusta. Tais conflitos tendem a acabar numa vitria da opinio sobre a lei; ultimamente a viso da classe dominante foi incorporada lei. O fato de que em lugar algum possvel descobrir um trao de oposio atitude da lei nesse assunto do valor do dinheiro mostra claramente que suas medidas com relao a esse assunto no podem estar opostas opinio geral. Ou seja, no apenas a lei, mas tambm a opinio pblica nunca esteve preocupada com qualquer dvida com relao estabilidade do valor do dinheiro; de fato, tem estado to livre de dvidas quanto a isso que por um perodo extremamente longo o dinheiro foi tratado como uma medida de valor. E ento, quando algum entra numa transao de crdito que deve ser cumprida em termos de dinheiro, nunca passa por sua cabea que deve levar em conta flutuaes futuras no poder de compra da moeda.
Toda variao na relao de troca entre o dinheiro e outros bens econmicos muda a posio assumida inicialmente pelas partes nas transaes a crdito em termos de dinheiro. Um aumento no poder de compra do dinheiro desvantajoso para o credor; uma diminuio no seu poder de compra tem significncia contrria. Se as partes contratantes levassem em conta as variaes esperadas no valor do dinheiro quando trocassem bens presentes contra bens futuros, essas conseqncias no ocorreriam. (Mas bem verdade que nem a extenso nem a direo dessas variaes podem ser previstas.)
A variabilidade do poder de compra do dinheiro apenas levada em conta quando a ateno desviada para o problema graas a coexistncia de dois ou mais tipos de dinheiro cuja relao de troca est sujeita a grandes flutuaes. geralmente reconhecido que possveis variaes futuras nas taxas de cambio so totalmente levadas em conta nos termos de transaes de crdito de todos os tipos. O papel desempenhado por consideraes desse tipo, tanto na troca dentro pases onde mais de um tipo de dinheiro est em uso e na troca entre pases com moedas diferentes, bem conhecido. Mas a considerao da variabilidade do valor do dinheiro em tais casos feita de uma forma que ainda no incompatvel com a suposio de que o valor do dinheiro estvel. As flutuaes no valor de um tipo de moeda so medidas pelo equivalente de uma de suas unidades em termos de unidades de outro tipo de dinheiro, mas o valor desse outro tipo de moeda por sua vez suposto constante. As flutuaes da moeda cuja estabilidade em prova so medidas em temos de ouro; mas o fato de que moedas lastreadas em ouro tambm esto sujeitas a flutuaes no levado em conta. Em suas transaes os indivduos levam em conta as variaes do valor de troca objetivo do dinheiro, na medida em que estejam conscientes delas; mas esto conscientes delas apenas no que toca a certos tipos de dinheiro, no com relao a todos. O ouro, o principal meio de troca hoje em dia, considerado como estvel em valor [3].
Assim que variaes no valor de troca objetivo do dinheiro so previstas, elas influenciam os termos das transaes a crdito. Se uma queda futura no poder de compra da moeda reconhecida, os emprestadores devem estar preparados para o fato de que a soma de dinheiro que um devedor repaga na concluso da transao dever ter um poder de compra menor do que a soma originalmente emprestada. Os emprestadores, na verdade, estariam melhores no emprestando, e comprando outros bens com seu dinheiro. O contrrio verdade para os devedores. Se eles compram mercadorias com o dinheiro que tomaram emprestados e as vendem novamente aps um tempo, eles obtero um excedente sobre a soma que precisam pagar de volta. Consequentemente no difcil entender que, assim que depreciaes contnuas so reconhecidas, aqueles que emprestam dinheiro demandam taxas mais altas de juros e aqueles que tomam emprestado esto aceitando pagar essas taxas
mais altas. Se, por outro lado, se espera que o valor do dinheiro aumente, ento a taxa de juros ser menor do que teria sido at ento [4].
Assim, se a direo e extenso das variaes no valor de troca do dinheiro pudessem ser previstas, elas no seriam capazes de afetar as relaes entre devedores e credores; as alteraes a vir no poder de compra poderiam ser suficientemente levadas em conta nos termos originais da transao de crdito [5]. Mas j que essa suposio, mesmo que flutuaes relativas ao dinheiro de crdito e fiat-money ao ouro estivessem em pauta, nunca vlida exceto numa maneira muito imperfeita, a margem deixada nos contratos de dbito para variaes futuras do valor do dinheiro necessariamente inadequada; mesmo ainda hoje em dia, aps as grandes e rpidas flutuaes no valor do ouro que ocorreram desde o estopim da Grande Guerra, a grande maioria daqueles preocupados com a vida econmica (algum poderia dizer, de fato, todos eles, exceto aqueles que esto familiarizados com economia terica) so completamente ignorantes do fato de que o valor do dinheiro varivel. O valor das moedas lastreadas em ouro ainda tomado como estvel.
Aqueles economistas que reconheceram que mesmo o valor do melhor dinheiro varivel recomendaram que ao se firmar os termos das transaes de crdito, ou seja, os termos nos quais bens presentes so trocados por bens futuros, o meio de troca no deveria ser apenas uma mercadoria, como comum atualmente, mas sim uma cesta de bens; possvel pelo menos em teoria se no o na prtica incluir todos os bens econmicos em tal cesta [*4]. Se essa proposta fosse adotada, o dinheiro ainda seria usado como um meio de troca de bens presentes; mas em transaes a crdito as obrigaes pendentes seriam quitadas no atravs do pagamento da soma nominal de dinheiro especificada no contrato, mas pelo pagamento de uma soma de dinheiro com o poder de compra que a soma original possua quando o contrato foi feito. Assim, se o valor objetivo do dinheiro aumenta durante o perodo do contrato, uma soma menor correspondente ser paga; se o valor diminui, uma soma maior correspondente.
Os argumentos dedicados acima ao problema de medir variaes no valor do dinheiro mostram a inadequao fundamental de suas recomendaes. Se os preos dos vrios bens econmicos so considerados com o mesmo peso na determinao dos coeficientes de paridade sem se levar em conta suas quantidades relativas, ento os males para os quais o remdio buscado podem ser simplesmente agravados. Se s variaes dos preos de mercadorias como trigo, centeio, algodo, carvo e ferro so dadas a mesma significncia que s variaes dos preos de mercadorias como pimenta, pio, diamantes ou nquel, ento o estabelecimento do Padro Tabelado teria o efeito de fazer o contedo dos contratos de longo prazo ainda mais incertos que hoje em dia. Se o que chamado de uma mdia ponderada, na qual cada mercadoria individual possui um efeito proporcional sua significncia [6], utilizada, ento as mesmas conseqncias ainda seguiro assim que as condies de produo e consumo se alterarem. Isso porque os valores subjetivos atribudos pelos seres humanos aos diferentes bens econmicos esto to susceptveis a flutuaes constantes quanto as condies de produo; mas impossvel levar em conta esse fato ao determinar os coeficientes de paridade, porque estes devem ser invariveis para se permitir conexo com o passado.
provvel que as associaes imediatas de qualquer meno hoje em dia aos efeitos das variaes do valor do dinheiro nas relaes de dbito existentes sero em termos dos resultados dos monstruosos experimentos de inflao que caracterizaram a histria recente da Europa. Em todos os pases, durante a parte final desse perodo, os juristas discutiram a fundo a questo de se teria sido possvel ou se ainda sim seria possvel, atravs da lei existente, ou criando novas leis, amenizar o prejuzo causado aos credores. Nessas discusses era usualmente deixado de lado o fato de que variaes no contedo dos contratos de dbito que eram conseqncias da depreciao do dinheiro eram devidas atitude tomada pela prpria lei com relao ao problema. No como se o sistema legal estivesse sendo chamado para remediar uma inconvenincia pela qual no fosse responsvel. Foi sua prpria atitude que foi sentida como sendo uma inconvenincia a circunstncia de que o governo havia criado a depreciao. Quanto mxima legal pela qual
uma nota bancria inconvertvel de curso legal tanto quanto o dinheiro de ouro que estava em circulao antes do estopim da Guerra, com o qual a primeira no tem nada em comum exceto o nome marco, ela uma parte de um sistema de regras legais que permitem o Estado explorar seu poder de criar dinheiro novo como uma fonte de renda [*5]. Ele no pode mais ser dissociado desse sistema assim como as leis cancelando a obrigao dos bancos de converter suas notas e obrigando-os a fazerem emprstimos para o governo para a emisso de novas notas.
Quando juristas e empresrios afirmam que a depreciao do dinheiro tem uma influncia muito grande em todas as relaes de dbito, que ela torna todo tipo de negcio mais difcil ou at mesmo impossvel, que ela invariavelmente leva conseqncias que ningum deseja e que todos sentem ser injustas, ns naturalmente concordamos com eles. Numa ordem social que
completamente fundada no uso do dinheiro e que toda a contabilidade feita em termos de dinheiro, a destruio do sistema monetrio significa nada menos que a destruio da base de todas as trocas. Entretanto, esse mal no pode ser combatido por leis criadas ad hoc com o intuito de remover o fardo da depreciao de algumas pessoas, ou grupos de pessoas, ou classes da comunidade, e consequentemente o impor de maneira ainda mais pesada em outros. Se no desejamos as conseqncias perniciosas da depreciao, ento temos que nos convencer de se opor s polticas inflacionrias pelas quais a depreciao criada.
Foi proposto que as pendncias monetrias deveriam ser acertadas em termos de ouro e sem estarem de acordo com sua quantia nominal. Se essa proposta fosse adotada, para cada marco que fosse emprestado a soma que teria que ser repagada teria que ser aquela que no momento da quitao comprasse o mesmo peso de ouro que o marco era capaz quando o contrato de dbito foi acertado [7]. O fato de que tais propostas agora so elaboradas e contam com aprovao mostra que o estatismo j perdeu sua fora no sistema monetrio e que as polticas inflacionistas esto inevitavelmente se aproximando de seu trmino [8]. Mesmo h alguns poucos anos, tal proposta teria sido ridicularizada ou ento rotulada como alta traio. (, pelo jeito, caracterstico que o primeiro
passo em direo fortificao da idia de que o curso legal de papel moeda deveria ser restrito ao seu valor de mercado foi tomado sem excees em direes que eram favorveis ao tesouro nacional.)
Para se livrar das conseqncias de polticas inflacionistas ilimitadas apenas uma coisa necessria a renncia a qualquer medida inflacionista. O problema que os defensores do Padro Tabelado tentam resolver atravs de uma moeda mercadoria suplementar a moeda metlica, e que Irving Fisher tenta resolver atravs de suas propostas para estabilizar o poder de compra do dinheiro, um de natureza diferente lidar com variaes no valor do ouro.
A concepo ingnua do dinheiro como estvel em valor ou como uma medida de valor tambm responsvel pelo clculo econmico ser realizado em termos de dinheiro.
Mesmo em outros assuntos, a contabilidade no perfeita. A preciso de suas afirmaes apenas ilusria. As valoraes de bens e direitos com as quais ela lida esto sempre baseadas em estimativas que dependem em maior ou menor medida de fatores incertos e desconhecidos. Assim que essa incerteza se revele no lado das mercadorias nas valoraes, a prtica comercial, sancionada pela lei, tenta superar essa dificuldade atravs do exerccio da maior cautela possvel. Com esse propsito ela demanda estimativas conservadoras dos ativos e estimativas liberais dos passivos [*6], de forma que o comerciante possa ser preservado de se iludir sobre o sucesso de suas empreitadas e seus credores protegidos.
Mas existem tambm deficincias na contabilidade que so devidas incerteza quanto as suas valoraes que resultam da propenso a variao do valor do prprio dinheiro. Dessas, o comerciante, o contador, e os tribunais de comrcio esto igualmente despercebidos. Eles tomam o dinheiro como uma medida de preo e valor, e reconhecem to livremente em unidades monetrias quanto em unidades de rea, comprimento, capacidade e peso. E se um economista
calha em direcionar sua ateno natureza dbia do processo, ele no entende nem o porqu de seus comentrios [9].
Esse desprezo pelas variaes no valor do dinheiro no clculo econmico falseia toda a contabilidade de lucros e perdas. Se o valor do dinheiro cai, a contabilidade ordinria, a qual no leva em conta a depreciao monetria, mostra lucros aparentes, porque ela equipara s somas de dinheiro recebidas pelas vendas um custo de produo calculado em dinheiro de maior valor, e porque ela amortiza dos registros originalmente estimados em dinheiro de valor maior itens de dinheiro com um valor menor. O que ento impropriamente tomado como lucro, ao invs de parte do capital, consumido pelo empreendedor ou repassado para o consumidor na forma de redues de preos que caso contrrio no teriam sido efetuadas ou repassadas aos trabalhadores na forma de salrios mais altos, e o governo age tributando tal soma como renda ou lucros [*7]. De qualquer forma, o consumo de capital resulta do fato que a depreciao monetria falseia a contabilidade de capital. Sob certas condies, a conseqente destruio de capital e aumento do consumo podem ser parcialmente contrabalanceados pelo fato de que a depreciao tambm d origem a lucros genunos, aqueles dos devedores por exemplo, os quais no so consumidos mas sim colocados em reservas. Mas isso nunca poder mais que balancear parcialmente a destruio do capital induzida pela depreciao [10].
Os consumidores das mercadorias que so vendidas muito barato como um resultado desse falso reconhecimento induzido pela depreciao no precisam ser necessariamente habitantes do territrio no qual o dinheiro depreciado usado como moeda corrente. As redues de preo trazidas pela depreciao da moeda encorajam exportaes para os pases cujo valor do dinheiro ou no est caindo ou ao menos no to rapidamente quanto. O empreendedor que est operando em termos de uma moeda com valor estvel incapaz de competir com o empreendedor que est preparado para fazer praticamente uma doao de parte de seu capital aos seus fregueses. Em 1920 e 1921, mercadores Holandeses que haviam vendido mercadorias para a ustria eram capazes de compr-las de volta muito mais barato aps certo tempo, porque os
comerciantes Austracos falharam completamente em perceber que as estavam vendendo por menos que elas custavam.
At quando a verdadeira situao no seja reconhecida, costumeiro regozijar-se numa forma mercantilista ingnua com o aumento das importaes e ver na depreciao do dinheiro um prmio de exportao bem vindo. Mas uma vez que descoberto que a fonte de onde o premio flui o capital da comunidade, a o procedimento de liquidao usualmente tomado como menos favorvel. Novamente, em pases importadores a atitude do pblico oscila entre indignao contra o dumping e satisfao com as condies favorveis de compra.
Aonde a depreciao da moeda um resultado da inflao governamental criada pela emisso de notas, possvel evitar esse efeito desastroso no clculo econmico conduzindo todos os registros em termos de um dinheiro estvel. Mas quando a depreciao uma do dinheiro mundial, o ouro, no h muita escapatria [11].
3 Conseqncias sociais de variaes do valor do dinheiro quando apenas um tipo de dinheiro empregado
Se ignorarmos a troca de bens presentes por bens futuros, e restringirmos nossas consideraes por enquanto queles casos nos quais as nicas trocas so aquelas entre bens presentes e dinheiro presente apenas, veremos de uma vez uma diferena fundamental entre os efeitos de uma variao isolada em um preo de uma mercadoria emanando unicamente do lado real, e os efeitos da variao na relao de troca entre o dinheiro e os demais bens econmicos em geral, emanando do lado monetrio. Variaes no preo de uma mercadoria em particular influenciam a distribuio de bens entre indivduos primariamente porque a mercadoria em questo, se no desempenha um papel nas relaes de troca, ex-definitione no distribuda entre os indivduos em proporo a sua demanda por ela. H agentes econmicos que a produzem (no sentido amplo da palavra, para que incluamos os mercadores) e a vendem, e h agentes econmicos que meramente a
compram e a consomem. E so bvios quais efeitos resultariam de um deslocamento da relao de troca entre esse bem em particular os demais bens econmicos (incluindo o dinheiro); claro quem estaria em condies de se beneficiar daquele e quem sairia prejudicado.
Os efeitos no caso do dinheiro so diferentes. Ao passo que lidamos com o dinheiro, todos os agentes econmicos so at certo ponto mercadores [12].
Todo agente econmico individual mantm um estoque de dinheiro a disposio que corresponde a forma e a intensidade com a qual ele capaz de expressar sua demanda por dinheiro no mercado. Se o valor de troca objetivo de todos os estoques de dinheiro no mundo pudesse ser instantaneamente e em igual proporo aumentado ou reduzido, se de uma s vez os preos monetrios de todos os bens e servios pudessem subir ou cair uniformemente, a riqueza relativa dos agentes econmicos individuais no seria afetada. O clculo monetrio subseqente seria com figuras maiores ou menores; e tudo. A variao no valor do dinheiro no teria outro significado seno um similar a uma variao no calendrio ou de pesos e medidas.
Os deslocamentos sociais que ocorrem em conseqncia de variaes no valor do dinheiro resultam apenas da circunstncia de que essa suposio nunca vlida. No captulo lidando com os determinantes do valor objetivo de troca do dinheiro foi mostrado que variaes no valor do dinheiro sempre comeam em um determinado ponto e gradualmente se disseminam atravs de toda a comunidade. E apenas por isso que tais variaes possuem um efeito na distribuio social da renda.
verdade que variaes nas relaes de troca do mercado que emanam do lado das mercadorias tambm no so como regra completadas de uma s vez; elas tambm comeam em algum ponto em particular e depois se espalham com maior ou menor rapidez. E graas a isso, variaes de preos de tal natureza tambm so seguidas por conseqncias que so devidas ao fato de que variaes nos preos no ocorrem todas de uma vez, mas apenas gradualmente. Mas essas so conseqncias que so percebidas de maneira
sinalizada apenas por um nmero limitado de agentes econmicos, em outras palavras, aqueles os quais, como intermedirios ou produtores, so vendedores da mercadoria em questo. Alm disso, essa no a soma das conseqncias de variaes no valor de troca objetivo de uma mercadoria. Quando o preo do carvo cai porque a produo aumentou enquanto a demanda ficou inalterada, ento, por exemplo, esto em apuros aqueles varejistas que investiram em estoques dos atacadistas ao preo antigo, mas agora s podem se livrar deles ao preo novo. Contudo isso sozinho no responde por todas as mudanas sociais trazidas pelo aumento da produo de carvo. O aumento da oferta de carvo ter melhorado a posio econmica da comunidade. A queda no preo do carvo no significa meramente um rearranjo de renda e propriedade entre produtor e consumidor; tambm expressa um aumento no dividendo nacional e na riqueza nacional. Muitos ganharam o que ningum perdeu. No caso do dinheiro diferente.
A causa mais importante da diminuio do valor do dinheiro que devemos levar em conta um aumento da oferta de dinheiro ao passo que sua demanda permanece a mesma, ou ento cai, ou ainda, se aquela cresce, cresce menos que a oferta. Esse aumento na oferta de dinheiro, como vimos, comea com os donos originais da quantidade adicional de dinheiro e s ento se transfere queles que negociam com tais pessoas, e por a em diante. Uma valorao subjetiva menos intensa ento transmitida de pessoa em pessoa, porque aqueles que se vem em posse de uma quantidade adicional de dinheiro esto propensos a aceitar pagar preos mais altos do que antes. Preos mais altos levam a produo mais elevada e salrios mais altos, e, porque isso tudo geralmente considerado um sinal de prosperidade econmica, uma queda no valor do dinheiro , e sempre tem sido considerado um meio
extraordinariamente efetivo de aumentar o bem estar econmico [13]. Isso uma viso errnea, porque um aumento na quantidade de dinheiro no resulta em um aumento da oferta de bens de consumo disposio das pessoas. Seu efeito pode muito bem consistir em uma alterao da distribuio de bens econmicos entre os seres humanos, mas de maneira alguma, exceto na circunstncia casual referida na pgina 138 acima, pode aumentar diretamente a quantidade total de bens possudos pelos seres humanos, ou ento seu bem
estar. verdade que tal resultado ser trazido indiretamente, de tal forma que qualquer mudana na distribuio tambm pode afetar a produo; isto , atravs daquelas classes em cujo favor a redistribuio ocorre, utilizando-se de seu comando adicional de dinheiro para acumular mais capital do que seria acumulado por aquelas pessoas de quem o dinheiro foi retirado [*8]. Mas isto no nos interessa aqui. Estamos interessados se a variao do valor do dinheiro possui qualquer outro significado econmico alm do seu efeito na distribuio de renda. Se no possui outro significado econmico [*9], ento o aumento de prosperidade s pode ser apenas aparente; isso uma vez que ele s pode beneficiar uma parte da comunidade as expensas de uma perda correspondente de outra parte. E assim na realidade. O custo deve ser suportado por aquelas classes ou pases que so as ltimas a serem atingidas pela queda no valor do dinheiro.
Vamos, por exemplo, supor que uma nova mina de ouro seja inaugurada em um Estado isolado. A quantidade de ouro suplementar que flui dali at o comrcio chega primeiro aos donos da mina e ento vai para aqueles que negociam com eles. Se dividirmos esquematicamente toda a sociedade em quatro grupos, os donos da mina, os produtores de bens de luxo, os produtores remanescentes e os agricultores, os dois primeiros grupos sero capazes de desfrutar dos benefcios resultantes da reduo do valor do dinheiro, o primeiro mais ainda do que o ltimo. Mas assim que o dinheiro atinge o terceiro grupo, a situao est alterada. Os lucros obtidos por este grupo como um resultado da maior demanda dos dois primeiros j tero sido contrabalanceados em algum tanto pelo aumento de preos dos bens de luxo, que j tero desfrutado de todo o efeito da depreciao quando comearem a afetar outros bens. Finalmente, quanto ao quarto grupo, o processo todo no resultar em nada alm de perdas. Os fazendeiros tero que pagar mais caro por todos os produtos industriais antes que sejam compensados pelos preos mais altos dos produtos agrcolas. verdade que no final, quando os preos agrcolas subirem, o perodo de dificuldade econmica para os fazendeiros j ter passado; mas no ser mais possvel ento para eles garantirem lucros que os compensaro pelas perdas que sofreram. Isto , eles no sero capazes de utilizar suas receitas ampliadas para comprar mercadorias a preos
correspondentes ao nvel antigo de valor do dinheiro; isso porque o aumento dos preos j ter atingido toda a comunidade. Assim as perdas sofridas pelos fazendeiros no momento em que ainda vendiam seus produtos a preos antigos, mas tinham que pagar por produtos de terceiros aos novos e mais altos preos continuam no compensadas. So essas perdas dos grupos que so os ltimos a serem atingidos pela variao do valor do dinheiro que constituem em ltima instncia a fonte dos lucros feitos pelos donos da mina e grupos mais prximos conectados com eles.
No h diferena entre os efeitos na distribuio de renda e riqueza que so provocados pelo fato que variaes no valor objetivo de troca do dinheiro no afetam bens e servios diferentes ao mesmo tempo e com a mesma intensidade, seja numa situao de dinheiro metlico ou de dinheiro de crdito ou fiat-money. Quando o aumento da oferta de dinheiro se d por meio de emisso de papel-moeda ou de notas bancrias inconvertveis [*10], apenas num primeiro momento certos agentes econmicos iro se beneficiar da quantidade adicional de dinheiro que se espalha apenas gradualmente por toda a comunidade. Se, por exemplo, h uma emisso de papel moeda em tempos de guerra, as novas notas chegaro primeiro nos bolsos dos contratantes de guerra [*11]. Como resultado, a demanda dessas pessoas por certos artigos aumentar, assim como o preo de venda destes, especialmente se forem artigos de luxo. Assim, a posio dos produtores desses artigos ser melhorada, sua demanda por outras mercadorias tambm aumentar, e dessa maneira o aumento de preos e vendas continuar, se distribuindo num nmero de artigos constantemente aumentado, at que tenha, enfim, atingido todas elas [14]. Nesse caso, como antes, h aqueles que ganham com a inflao e aqueles que perdem com ela. Quanto mais cedo algum est em condies de ajustar sua renda monetria ao seu novo valor, mais favorvel ser o processo para ele. Quais pessoas, grupos, e classes se do melhor nisso tudo, e quais se do pior, depende dos dados atuais de cada caso individual, sem conhecimento dos quais no estamos em posies de formar um julgamento.
Deixe nos abandonar o exemplo de um Estado isolado e virar nossa ateno aos movimentos internacionais que surgem devido a uma queda no valor do dinheiro devido a um aumento em sua quantidade. Aqui, novamente, o processo o mesmo. No h aumento na oferta de bens disponvel; apenas sua distribuio alterada. O pas no qual novas minas esto localizadas e os pases que negociam diretamente com ele tem sua posio melhorada pelo fato de que eles ainda so capazes de comprar mercadorias de outros pases aos preos antigos quando a depreciao em casa j aconteceu. Aqueles pases que so os ltimos a serem atingidos pela nova corrente de dinheiro so aqueles que devem em ltima instncia pagar o custo do maior bem estar dos outros pases [*12]. Dessa forma a Europa fez um mau negcio quando as recm descobertas minas de ouro da Amrica, Austrlia, e frica do Sul deram origem a um tremendo boom nesses pases. Palcios brotaram do dia para a noite aonde no havia nada exceto florestas virgens e desertos h alguns anos atrs; as pradarias foram intersectadas por ferrovias; e toda e qualquer coisa no caminho de ser bem de luxo que poderia ser produzida pelo Velho Mundo encontrou mercados em territrios nos quais at pouco atrs tinham sido povoados por nmades nus e em pessoas que at pouco tempo atrs estavam sem mesmo as mais limitadas necessidades de existncia. Toda essa riqueza foi importada dos antigos pases industriais pelos novos colonizadores, os sortudos cavadores, e paga em ouro que foi gasto assim que o foi recebido. verdade que os preos pagos por essas mercadorias eram maiores do que teria correspondido ao antigo poder de compra do dinheiro; entretanto, no eram to altos para que cubram completamente as novas circunstncias. A Europa exportou navios e trilhos, bens metlicos e txteis, moblia e mquinas, por ouro o qual ela pouco ou nada necessitava, uma vez que todo o que ela possua era suficiente para todas suas transaes monetrias.
Uma diminuio do valor do dinheiro ocasionada por qualquer outro tipo de causa teria um efeito completamente similar. As conseqncias econmicas de variaes no valor do dinheiro so determinadas no por suas causas, mas sim pela natureza de seu lento progresso, de pessoa a pessoa, de classe a classe, e de pas a pais. Se considerarmos em particular aquelas variaes no valor do dinheiro que surgem da ao de vendedores quando os preos esto em
elevao, como descrito no segundo captulo dessa parte, veremos que a diminuio gradual do valor do dinheiro resultante constitui uma das motivaes dos grupos que aparentemente ditam a alta de preos. Os grupos que iniciam o aumento o vem contra sua prpria vantagem quando os demais grupos eventualmente tambm aumentam seus preos; mas os grupos iniciais recebem seus preos mais altos quando os preos das coisas que compram ainda esto no nvel mais baixo. Isso constitui um ganho permanente para eles. Este contrabalanceado pelas perdas daqueles grupos que so os ltimos a aumentarem os preos dos seus bens ou servios; esses j tm que pagar preos mais altos quando ainda esto recebendo preos mais baixos por aquilo que vendem. E quando eventualmente tambm aumentam seus preos, ao serem os ltimos a fazer eles no podem mais cobrir suas perdas anteriores custa das demais classes da comunidade. Assalariados costumavam estar nessa situao, porque como uma regra o preo do trabalho no participava dos estgios iniciais do movimento de alta de preos. Aqui os empreendedores ganhavam aquilo que os trabalhadores perdiam. Por um longo tempo, servidores civis estavam na mesma situao. Suas numerosas reclamaes eram parcialmente baseadas no fato de que, uma vez que rendas monetrias no podiam ser facilmente aumentadas, eles tinham que pagar o custo do aumento contnuo de preos. Mas recentemente esse estado de coisas mudou atravs da organizao dos servidores civis em linhas de sindicato, o que os permitiu garantir uma resposta mais rpida s suas demandas por aumentos salariais.
O inverso do que verdade numa depreciao no valor do dinheiro vale para um aumento de seu valor. A apreciao monetria, assim como a depreciao monetria, no ocorre subitamente e uniformemente atravs da comunidade inteira, mas como uma regra comea a partir de classes especficas e se espalha gradualmente. Se no fosse esse o caso, e se o aumento no valor do dinheiro se desse quase simultaneamente em toda a comunidade, ento no seria acompanhada pelo tipo especial de conseqncias econmicas que nos interessam aqui. Deixe nos supor, por exemplo, que a falncia de instituies de crdito de um pas leve a um pnico e que todos estejam prontos para vender mercadorias a qualquer preo ofertado para se ver na posse de
dinheiro, enquanto por outro lado no se acham compradores seno por preos muito reduzidos. possvel que o aumento do valor do dinheiro que viria como conseqncia de tal pnico afetaria todas as pessoas e mercadorias uniformemente e simultaneamente. Como uma regra, entretanto, um aumento no valor do dinheiro se espalha apenas gradualmente. Os primeiros daqueles que tem que se contentar com preos pelas mercadorias que vendem mais baixos do que os anteriores, enquanto ainda tem que comprar pelos preos antigos, so aqueles prejudicados pelo aumento do valor do dinheiro. Aqueles, entretanto, que so os ltimos que tem que reduzir os preos das mercadorias que vendem, e enquanto isso estavam em condies de se aproveitar da queda do preo das outras coisas, so aqueles que lucram com a mudana.
Dentre as conseqncias de variaes no valor do dinheiro temos aquelas variaes entre a relao de troca entre de tipos diferentes de dinheiro, nas quais a cincia econmica est extremamente interessada. Esse interesse foi despertado pelos eventos da histria monetria. Ao longo do sculo dezenove, o comrcio internacional se desenvolveu de uma maneira at ento inimaginvel, e as conexes econmicas entre os pases se tornaram extraordinariamente estreitas. E bem nesse momento quando as relaes comerciais estavam comeando a se tornarem mais ativas, os padres monetrios dos Estados individuais estavam se tornando mais diversos. Um nmero de pases se engajou por um perodo maior ou menor no dinheiro de crdito, e os demais, que estavam parcialmente em ouro e parcialmente em prata, rapidamente estavam em dificuldades, porque a razo entre os valores desses dois metais preciosos, que havia mudado apenas vagarosamente durante sculos, subitamente comeou a exibir variaes bruscas. Em anos recentes ainda foi atribudo um significado prtico muito maior a esse problema graas aos acontecimentos monetrios dos perodos de guerra e ps-guerra.
Vamos supor que um quilo de prato fosse trocvel por 10 quintais de trigo, e que com o valor objetivo de troca da prata sendo reduzido pela metade devido,
digamos, a uma descoberta de minas novas e mais produtivas, um quilo daquela no seria mais capaz de comprar mais do que cinco bushels [*13] de trigo. Partindo daquilo que j foi dito sobre a relao de troca natural entre dois tipos de dinheiro, segue que o valor objetivo de troca da prata em termos de outros tipos de moeda tambm teria sido agora cortado pela metade. Se previamente tivesse sido possvel comprar um quilo de ouro com quinze quilos de ouro, seriam necessrios agora trinta quilos de prata para realizar a mesma transao; isso porque o valor objetivo de troca do ouro em relao as mercadorias teria se mantido inalterado, enquanto aquele da prata teria sido reduzido pela metade. Agora essa mudana no poder de compra da prata sobre as mercadorias no aconteceria de uma s vez, mas constantemente. Um tratamento completo foi dado maneira pela qual a mudana comear a partir de certo ponto e gradualmente se espalhar em outras direes, e s conseqncias desse processo. At agora ns s investigamos aquelas conseqncias que ocorrem dentro de uma rea com um padro monetrio uniforme; mas agora devemos buscar as conseqncias posteriores envolvidas em relaes comerciais com reas nas quais outros tipos de dinheiro so empregados. Uma coisa que era vlida para o caso anterior pode ser estabelecida tambm para esse: se variaes no valor objetivo de troca do dinheiro ocorressem uniforme e simultaneamente por toda a comunidade, ento tais conseqncias sociais no poderiam de forma alguma surgir. O fato de que essas variaes sempre ocorrem uma aps a outra o fator nico para seus notveis efeitos econmicos.
Variaes no valor objetivo de troca de um dado tipo de dinheiro no afetam a determinao da relao de troca entre esse e outros tipos de dinheiro at que comecem a afetar mercadorias que so ambas objetos de relaes comerciais entre as duas reas ou que ao menos so capazes de assim se tornarem com uma mudana moderada nos preos. O ponto no tempo no qual essa situao nasce determina os efeitos sobre as relaes comerciais das duas reas que resultaro de variaes no valor objetivo de troca do dinheiro. Esse valor varia de acordo com a forma pela qual os preos das mercadorias envolvidas nas trocas internacionais so ajustados ao novo valor do dinheiro, antes ou depois dos preos das demais mercadorias. Sob a moderna organizao do sistema
monetrio esse ajuste usualmente feito primeiramente nas Bolsas de Valores. A especulao com o cambio e nos mercados de ttulos antecipa variaes futuras nas relaes de troca entre os diferentes tipos de dinheiro num momento no qual variaes do valor do dinheiro ainda no completaram de forma alguma seu curso ao longo da comunidade, talvez quando elas tenham apenas o iniciado, mas de qualquer maneira antes de terem atingido as mercadorias que desempenham um papel decisivo no comrcio exterior. Seria um pssimo especulador aquele que no captasse o curso dos eventos ao longo do tempo e agisse de acordo. Mas assim que a variao da taxa de cmbio aconteceu, ela provoca uma reao no comrcio internacional de uma maneira peculiar at que todos os preos de todos os bens e servios tiverem sido ajustados ao novo valor objetivo de troca do dinheiro. Durante esse intervalo as margens entre os diferentes preos e salrios constituem um fundo que algum dever receber e algum abandonar. Numa palavra, estamos aqui novamente confrontados com uma redistribuio, a qual notvel uma vez que sua influncia se entende alm da rea na qual o bem cujo valor objetivo de troca est em mutao empregado como dinheiro domstico. claro que essa o nico tipo de conseqncia que pode surgir de variaes no valor do dinheiro. O estoque social de bens no foi incrementado de forma alguma; a quantidade total que pode ser distribuda continuou a mesma.
Assim que uma mudana incompleta no valor objetivo de troca de qualquer tipo particular de dinheiro se expressa em taxas de cmbio, uma nova oportunidade de auferir lucros aberta, tanto para exportadores quanto para importadores de acordo com o poder de compra do dinheiro descendente ou ascendente. Vamos considerar o primeiro caso, o de uma diminuio do valor do dinheiro. Uma vez que, de acordo com nossas pressuposies, mudanas nos preos domsticos ainda no esto finalizadas, os exportadores se beneficiam da circunstncia de que as mercadorias que negociam j alcanam os preos novos mais altos enquanto que as mercadorias e servios que desejam, e o que de particular importncia, o fatores de produo materiais e pessoais que empregam, ainda so obtidos aos preos antigos mais baixos. Se o exportador que embolsa esse ganho um produtor ou um intermedirio, impertinente para nossa investigao atual; tudo o que precisamos saber que
nas dadas circunstncias as transaes resultaro em lucros para alguns e perdas para outros.
De qualquer maneira o exportador divide seus lucros com o importador e consumidor estrangeiros. E at mesmo possvel isto depende da organizao do comrcio exportador que os lucros retidos pelo exportador sejam apenas aparentes, e no reais.
Assim o resultado ser sempre que os ganhos dos compradores estrangeiros, que em certos casos so divididos com exportadores caseiros, sero contrabalanceados pelas perdas que so sofridas inteiramente em casa. claro que o que foi dito da promoo da exportao atravs da falsificao do clculo monetrio se aplica tambm ao prmio de exportao que surge de uma diminuio do valor do dinheiro.
Notas do Autor:
[1] Cp. Dernburg, Pandekten, 6. Aufl. Berlin 1900, I Bd., p. 84. Sobre o fato de que uma das caractersticas principais de uma fico a conscincia explcita de sua condio ficcional ver tambm Vaihinger, Die Philosophie des Als oft, 6. Aufl., Leipzig igao, p. 173 (Traduo para ingls, The Philosophy of'As If, Kegan Paul, London 1924).
[2] L. 80, Dig. de solutionibus et tiberationibus 46, 3. I'omponius libro quarto ad Quintum Mucium, Cp. ver mais em Seidler, op. cit., pp. 685 ft'.; Endemann, op. cit., II I3d., p. 173.
[3] Numa resenha da primeira edio (Die Neue Zeit, 30 Jahrgang, II BD., p.102), Hilferding criticou os argumentos acima como meramente engraados. Talvez seja exigir muito esperar que esse senso de humor indiferente seja
captado por aquelas classes da nao Alem que sofreram as conseqncias da depreciao do marco. H ainda um ano ou dois nem mesmo esses parecem ter compreendido o problema um pouco melhor. Fisher (Hearings before the Committee on Banking and Currency of the House of Representatives, 67th Congress, 4th Session, on H.R. 11788, Washington 1923, pp. 5 ff., 25 ff.) d ilustraes tpicas. Foi certamente um destino cruel para a Alemanha que sua poltica econmica e monetria nos anos recentes ficasse nas mos de homens como Hilferding e Havestein, os quais no eram qualificados nem para lidar com a depreciao do marco com relao ao ouro.
[4] Hearings before the Committee on Banking and Currency of the House of Representatives, 67th Congress, 4th Session, on H.R. 11788, Washington 1923, pp. 5 ff., 25 ff.)
[6] Cp. Walsh The Measurement of General Exchange Value, pp. 80 ff.; 2izek, Die statistischen Mittelwerte, Leipzig 1908, pp. 183 ff.
[8] Deve-se lembrar que tudo isso foi escrito em 1924. (Nota do tradutor da verso em ingls)
[9] Em Viena em Maro de 1892, nas sesses da Comisso de Investigao Sobre a Moeda que foi convocada para a preparao da regulao da moeda Austraca, Carl Menger disse:
Eu gostaria de adicionar que no apenas legisladores, mas todos ns em nossa vida cotidiana, estamos acostumados a desprezar as flutuaes no poder de compra da moeda. Mesmo banqueiros distintos como vocs, senhores, realizam seus balancetes ao final do ano sem investigar se por acaso a soma de dinheiro que representava a cota de capital ganhou ou perdeu poder de compra.
Essas afirmaes de Menger no foram compreendidas pelo diretor do Bodenkreditanstalt, Theodor von Taussig, o mais proeminente de todos os banqueiros Austracos. Ele respondeu:
Um balancete um balano da propriedade ou ativos de uma companhia ou indivduo contra seus passivos, ambos expressos em termos da medida de valor ou padro monetrio aceito, por exemplo, na ustria o florim. Agora eu no consigo ver como quando assim estamos expressando propriedade e dbitos em termos do padro (o qual assumimos ser homogneo) podemos levar em conta variaes no padro de medida ao invs de levar em conta variaes no objeto a ser medido, como de praxe.
Taussig falhou completamente em perceber que o ponto em discusso era a estimativa do valor dos bens e a quantidade de depreciao a ser deduzida, e no como o balano de direitos e obrigaes monetrias, ou como uma contabilidade de lucros e perdas, se essa no for absurdamente inexata, deve lidar com variaes no valor do dinheiro. Menger no teve oportunidade de focar nesse ponto em sua resposta, uma vez que ele estava ao invs interessado em mostrar que suas afirmaes no deveriam ser interpretadas, como Taussig estava propenso a fazer, como uma acusao de prtica desonesta por parte dos diretores do banco. Menger adicionou:
O que eu disse era meramente de todos ns, no apenas dos diretores dos bancos (eu disse at homens como aqueles que esto no comando dos bancos), cometem o erro de no levar em conta na vida cotidiana as mudanas no valor do dinheiro.
(Cp. Stenographische Protokolle uber die vom 8. bis 17. Marz 1S92 abgehaltenen Sitzungen der nach Wien einberufenen Wahrurtgs-EnqueteKommission, Vienna 1892, pp. 211, 257, 27)
[10] Cp. Meu livro, Nation, Staat unci Wirlschaft, Vienna 1919, pp. 139 ff. Uma srie completa de escritos lidando com esses assuntos apareceu na Alemanha e na ustria.
[12] Cp. Ricardo, Letters to Malthus, ed, Bonar, Oxford 1887, p. to.
[14] Cp. Auspitz and Lieben, Untersuchungen iiber die Theorie des Preises, Leipzig 1889, p. 65.
Notas do Tradutor:
[*1] Hedging seriam transaes que teriam como objetivo minimizar o risco. Por exemplo, algum que mexe com importao tem dvidas quanto ao cmbio futuro. Essa pessoa ir comprar um contrato de opo de moeda estrangeira. Ela pagar um valor presente para ter o direito de compra de certa quantidade de moeda estrangeira no futuro a um valor pr-fixado no contrato, no sendo obrigada a executar a compra se as condies futuras forem tais que comprar a moeda estrangeira vista no mercado seja mais barato do que nos termos do contrato. Empresas que negociam tais transaes de risco so chamadas de hedge funds.
[*2] Antigamente, quando os reis queriam recursos, eles simplesmente recolhiam as moedas de prata e ouro em circulao, e as recunhavam, devolvendo ao pblico moedas com menor pureza e ficando com o contedo restante. Dessa forma, os governantes se apropriavam do ouro e prata dos sditos. Quando atualmente o governo incorre em dficits pblicos ou emite moeda, ele est fazendo algo anlogo com sua populao.
[*3] O sistema bimetlico no funcionava direito porque os governos tentavam determinar a taxa de cmbio entre os metais, funo que deveria ser cumprida pelo processo de mercado. Na prtica, os governos criavam uma diferena de preos artificial entre o mundo interno e o externo. Se, por exemplo, o preo do ouro em termos de prata dentro do pas sob o regime de cmbio fixo estivesse mais barato do que no mundo exterior (digamos 15 pratas por ouro l dentro contra 20 pratas por ouro l fora), compensaria para os agentes de dentro do pas trocarem prata por ouro sob a paridade fixa e venderem o ouro no exterior, realizando lucros (ganhando 5 pratas extra). Essa a chamada Lei de Greshan, que postula que a moeda ruim (no caso a artificialmente desvalorizada, a prata) expulsa do pas a moeda boa (no caso a artificialmente valorizada, o ouro).
[*4] Em seu Desnacionalizao do Dinheiro, Hayek prope que a moeda seja emitida levando-se em conta as relaes de troca de uma cesta de bens primrios.
[*5] Mises a se refere ao problema da moeda de curso legal, ou seja, algo que a lei reconhece e obriga a aceitao como meio de pagamento. Ao obrigar um meio de pagamento a ser aceito, o governo implicitamente legaliza o sistema de reservas fracionrias sistema no qual os depsitos bancrios no so mantidos 100% nos cofres do banco. Isso proporciona aos bancos a oportunidade de emprestar parte do dinheiro dos correntistas sem seu consentimento, criando novos meios de pagamento e expandindo a oferta monetria. O Estado pode se valer desse sistema para criar dinheiro e utilizalo.
[*6] Para simplificar o entendimento, ativos podem ser considerados como fontes (possveis) de renda e passivos como fontes (possveis) de despesas.
[*7] Para clarificar o ponto de Mises: imagine que um empresrio teve custos de 10, uma receita de 20, incorrendo num lucro de 10. Suponha tambm que o dinheiro perdeu valor de forma que aquelas coisas com as quais o empresrio gastaria antes 10 agora lhe requerem 15. Como o aumento de preos no
instantneo e homogneo, o nosso empresrio, que na realidade lucrou 5, pensa que lucrou 10. Se ele resolver investir, abaixar seus preos ou aumentar os salrios de seus funcionrios antes de perceber a perda do valor do dinheiro, poder vir a gastar mais que os 5 que ele realmente lucrou, consumindo seu capital e cometendo um erro crasso.
[*8] bem verdade que numa situao hipottica o dinheiro poderia ser redistribudo casualmente em favor de algum empreendedor que realizasse um investimento tecnicamente mais produtivo do que aquele que seria realizado pelo antigo dono. Mas defender tal redistribuio seria um argumento utilitarista e sem bases morais (como o respeito a um sistema qualquer pr-definido de propriedade). Nesse caso em particular a oportunidade de lucro existe (o investimento tecnicamente mais produtivo), e est esperando algum
empreendedor alerta aproveita-la, ou seja, mais cedo ou mais tarde a prpria livre interao humana encontrar uma soluo para o problema.
[*9] Alteraes no valor do dinheiro possuem sim outros significados econmicos, reconhecidos pelo prprio Mises neste livro e por outros autores.
Com o novo dinheiro, mais fundos podem ser canalizados para o mercado de emprstimos, fazendo a taxa monetria de juros cair. Isso modifica os preos relativos entre bens de ordem mais elevada (mais distantes do consumo) e preos de bens de ordem mais baixa. Por qu? Processos mais demorados de produo costumam ser mais rentveis (um agente s empregar um processo mais demorado, tudo o mais constante, se for mais rentvel que um menos demorado), e, como a taxa de juros monetria caiu, alguns desses processos mais demorados parecem agora lucrativos. Na realidade os agentes pensam que h poupana real suficiente para tocar os projetos ao longo do tempo, sinal transmitido pela taxa monetria de juros mais baixa. Entretanto, a adio de dinheiro no aumentou a quantidade de poupana real para tocar esses
projetos, apenas redistribuiu riqueza, como Mises enfatiza. Num futuro no muito distante, quando os preos dos bens de ordem mais baixa tiverem sido pressionados para cima, devido competio desses novos investidores, os agentes percebero que no h poupana real suficiente para tornarem os investimentos feitos lucrativos. Isso gera uma tendncia de nova mudana dos preos relativos, agora tornando os bens ordens mais baixa mais caros em relao aos bens de ordem mais elevada, agora inteis. a recesso.
Para uma leitura mais aprofundada sobre os ciclos econmicos, ver os seguintes livros:
Mises Theory of Money and Credit Mises Ao Humana Hayek Prices And Production
[*10] Uma nota bancria inconvertvel seria um fruto do sistema de reserva bancria fracionria. Ou seja, seria uma nota para a qual no existiria dinheiro (seja ele ouro, fiat-money, dinheiro de crdito, etc.) em caixa no banco para redimi-la, caso todos os detentores de notas bancrias chegassem ao mesmo tempo no banco para quita-las.
[*11] Isso um fato recorrente na histria. Os exemplos mais citados so: assignats (no perodo da Revoluo Francesa) e os greenbacks (na Guerra Civil Americana). Virtualmente todas as guerras governamentais do sculo XX e XXI foram e so pagas com emisso de dinheiro. O governo americano, por exemplo, financia seus gastos militares atravs de um dficit pblico monumental.
[*12] Essa uma questo mais complexa, que remete ao tema de exportao de inflao. Teoricamente, h vrios fatores influindo em tal questo: regime cambial (fixo ou desregulado); padro monetrio (padro ouro, papel-moeda estatal, moedas privadas, etc.); sistema bancrio (reservas fracionrias ou
100%) e, claro, o problema do conhecimento (que leva em conta o fato de que mudanas em qualquer varivel econmica no esto disponveis para todos instantaneamente, e nem so interpretadas de maneira igual pelos agentes).
Mises d nfase a um cenrio onde temos o padro ouro, cmbio fixo (as moedas equivalem a um peso de ouro) e sistema de reservas fracionrias. O definidor em ltima instncia se h ou no exportao de inflao, em minha opinio, seria o problema do conhecimento, sendo as demais variveis influentes apenas na intensidade e forma de como a desvalorizao se processa.
Nesse cenrio proposto, a descoberta de novas minas de ouro daria oportunidade para os detentores da moeda lastreada nesse ouro comprar bens dos demais pases que esto dentro do padro ouro a um preo inicialmente mais baixo do que aqueles que compraro depois. Pases com sistema bancrio mais desenvolvido (e que por conseqncia criam mais moeda no sistema de reservas fracionrias) tendem at certo ponto a levar vantagem no comrcio, pois podem trocar notas bancrias inconvertveis por bens ou ouro antes que os demais agentes percebam o truque. Num momento posterior a presso se daria no cmbio, impossibilitando que o sistema prossiga, mas sempre haver uma janela de lucros e perdas enquanto os agentes no identificarem que esto sendo ludibriados.
Atualmente, a situao ser um tanto quanto semelhante com a crise do subprime. Se o governo americano injetar mais dlares na economia, aqueles que negociam mundialmente em dlar, e que no tm condies no momento de usar outra moeda, que tm contratos fixos de longo prazo para recebimento de dlares, ou que simplesmente so obrigados a usar dlares (a maioria da populao americana) sero prejudicados em favor daqueles que receberem os dlares antes (os banqueiros de Wall Street).
Em suma, quero dizer que a exportao de inflao, significando uma elevao de preos iniciada em um pas e absorvida por outro, est ligada a
alguns fatores bsicos: quantidade de pessoas que usam a moeda depreciada no pas no emissor; fatores potencializantes de emisso e recepo de nova moeda (sistema de reservas fracionrias, dficit pblico, cmbio fixo, quantidade de contratos inalterveis j feitos, monoplio estatal da moeda); e ao fluxo de informaes do sistema, que quanto mais eficiente, mais evita que as pessoas se envolvam em transaes potencialmente malficas, que disseminam a alta de preos.
[*13] Se tratam de medidas de quantidade. Um quintal seria 100 quilos e 1 bushel-trigo seria 27,2154 quilos.