TARGINO, M. G. A Biblioteca Do Século XXI:...

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Maria das Graas Targino RESUMO Objetiva-se discutir os paradigmas norteadores da biblioteca do sculo XXI e, por conseguinte, da cincia

da informao (CI). A priori, consideram-se trs pontos: (1) a biblioteca como instituio fundamentalmente social e, portanto, sujeita s mudanas que afetam a sociedade; (2) a mobilidade irreversvel dos paradigmas, em qualquer rea de atuao; (3) a ao profissional e governamental como elemento determinante da atuao das instituies. Como inevitvel, ao atravessar as vrias fases histricas, a biblioteca assimila a realidade dos diferentes perodos e assume posturas paradigmticas distintas. De incio, prevalece o modelo centrado na disponibilidade, que prioriza grandes colees e edifcios majestosos, perfazendo o just in case: o leitor tem a seu dispor a informao demandada, graas ao browsing real. Paulatinamente, consolida-se o modelo centrado na acessibilidade. a prevalncia do just in time, graas ao intercmbio com as demais unidades de informao conectadas em rede e ao browsing virtual. A expanso das tecnologias propicia o advento da biblioteca virtual (BV) e a emergncia do paradigma informacional ou digital. Porm, insistese na idia de que profissionais e governantes so os responsveis, por excelncia, pela vigncia dos paradigmas alusivos s bibliotecas. E mais, eles no so per se excludentes, face diversificao sempre existente de culturas, pases e povos, o que significa dizer que BV subsistem ao lado de bibliotecas tradicionais, em pleno sculo XXI. Bibliotecas: paradigmas e modelos. Cincia da Informao: paradigmas e modelos. Cincia da Informao.

Palavras-chave:

* Professora da Universidade Estadual do Piau. Professora colaboradora do Programa de Ps-Graduao em Cincia da Informao da Universidade Federal da Paraba. E-mail: [email protected]

1 PALAVRAS INICIAIS
civilizao propriamente dita, segundo os meios de comunicao de que se utiliza, tem seu incio com a escrita [...] E como bvio, medida que a escrita evolui, dene as prprias leis de funcionamento, adquirindo misso essencial ao desenvolvimento da sociedade moderna. E esta sociedade desenvolvida, tecnolgica e avanada, que segundo os comuniclogos, absorve com tal intensidade os meios de comunicao de longo alcance (rdio, televiso, telefone, cinema), que decreta a morte do livro (grifo nosso) e inicia seu retorno oralidade.

como Marshall McLuhan, desprezam os livros, a exemplo do que ocorreu no sculo IV a. C., quando Plato se ops radicalmente escrita, embora ele prprio escrevesse seus argumentos e os registrasse [...] Esta a grande contradio: os mesmos que admitem e apregoam a morte do livro (grifo nosso), e, por conseguinte, das bibliotecas (grifo nosso), reconhecem a impossibilidade de uma civilizao sem papis [...] No se pode pensar na manipulao da informao pelos computadores sem a utilizao da escrita.
(TARGINO, 1980. p. 3).

Esta no apenas a opinio de comuniclogos. Homens cultos da atualidade,


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artigo de reviso
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A BIBLIOTECA DO SCULO XXI: novos paradigmas ou meras expectativas?

Maria das Graas Targino A epgrafe ora transcrita, extrada de trecho publicado h exatamente 28 anos atrs, nos d dimenso exata de como as discusses se perpetuam ao longo dos anos. Somente como ilustrao, o decantado risco de privatizao das universidades pblicas e a decadncia do ensino em geral e da educao superior, em particular, constituem tema de meu primeiro artigo publicado em jornal, no caso, Jornal do Commercio (Recife, Pernambuco), em 1968, nos meus longnquos 20 anos. Descubro um tanto assustada: a mesma abordagem do ano 2008, sculo XXI reforma universitria e sua implicaes, professores mal remunerados, acervos bibliogrcos desatualizados etc.etc. De forma similar, a morte do livro e das bibliotecas consiste em tema recorrente nas mais distintas ocasies. No somente com o avano dos meios de comunicao, como a epgrafe insinua, como tambm, com a expanso das microedies, sobretudo, na dcada de 70, quando os documentos assumem formatos reduzidos, em suportes diversicados, como lmes e chas, trazendo tona vantagens de armazenamento, de facilidade de distribuio e de reproduo. No momento atual, a supremacia das tecnologias de informao e de comunicao (TIC), especicamente, a internet, faz ressurgir uma antiga questo: a sobrevivncia das bibliotecas, ou melhor, os paradigmas e as expectativas que rondam a biblioteca do sculo XXI e, por conseguinte, a cincia da informao (CI). Consensualmente, tericos, como Manuel Castells, Michael Schudson, Alvin Toer e Raymond Williams evidenciam a ntima interrelao entre sociedade e tecnologia e viceversa. A revoluo tecnolgica ou as revolues tecnolgicas caminham, simultaneamente, com a histria da humanidade. O avano cientco e tecnolgico tem sempre a sociedade como referncia. Impossvel desprezar a premissa de que as inovaes tecnolgicas constituem relevante fator de mutaes sociais, culturais e econmicas, com a substituio do paradigma da sociedade industrial pelo da sociedade psindustrial, cujo eixo da economia a produo, distribuio e difuso da informao e do conhecimento, gerando novo setor do sistema produtivo, o quaternrio. Este incorpora as atividades da indstria da informao e do conhecimento: imprensa, bibliotecas, institutos de pesquisa, bancos de dados, sistema educacional e 40 instituies similares, como Castells (2001, 2003) desenvolve em La sociedad red e em La galaxia internet. Porm, nessa corrida quase desenfreada em busca de novos paradigmas que sustentem as bibliotecas, nossa prtica prossional e a cincia da informao, h que considerarmos trs pontos elementares. Em primeiro lugar, a biblioteca , fundamentalmente, instituio social. Como tal, est sujeita a todo e qualquer processo de transmutao que atravessa a sociedade. Em qualquer nvel que opere, cabe a ela maximizar a utilidade social dos registros grcos ou eletrnicos, mantendo vivas a identidade e a memria da cultura nacional e local, ou seja, a biblioteca no est margem da sociedade. Ao contrrio. Est inserida no mago da tessitura social, e, assim sendo, sofre as mutaes contnuas que afetam a sociedade como um todo. Relacionando-se cultura e biblioteca como organismo social, objetivo primordial de toda e qualquer biblioteca a preservao e a disseminao dos valores da formao cultural nacional, evitando, desse modo, que o desenvolvimento do processo tecnolgico valorize, excessivamente, as idias importadas em detrimento das geradas no Pas. O segundo ponto a destacar que, em qualquer circunstncia e em qualquer rea de atuao, incluindo a CI, princpios verdadeiros em certas pocas so modicados ou substitudos diante de novas descobertas. Isto corresponde mobilidade irreversvel dos paradigmas, congurando a to comentada revoluo cientca, expresso cunhada por Kuhn, ainda nos anos 60, embora Plato (2002) gure como o primeiro a recorrer noo de paradigma em sentido prximo ao adotado at os dias de hoje, em sua obra Dilogos: o banquete; fedon, sosta, poltico. Aqui, vale o adendo de que, para muitos acadmicos e cientistas, os paradigmas so aplicveis to-somente aos campos devidamente consolidados como cincia. E, na concepo de Kuhn, as cincias sociais, em geral, esto em estgio embrionrio, e, portanto, so prparadigmticas. Outra observao pertinente alusiva s polmicas inndveis sobre o uso de paradigma como sinnimo de modelo (do grego paradeima = modelo), como sua etimologia sugere. Exemplicando: Renault (2007) argumenta que o paradigma est ao lado da teoria; o modelo, por

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A biblioteca do sculo XXI sua vez, est atrelado ao mtodo. Arma, ainda, que um mesmo paradigma pode conter vrias teorias e uma teoria, abrigar vrios modelos, embora seu texto no esclarea satisfatoriamente como isto se d, no campo da CI. Outro adendo refere-se s tendncias lideradas por Wersig (1993), no sentido de condenar o estudo da cincia da informao, sob o prisma dos paradigmas, argumentando que mais ecientes do que eles so as abordagens voltadas para questes especcas, capazes de conduzir a resolues, tambm especcas:
[...] de modo mais realista [...] as diferentes abordagens caracterizam-se pela transdisciplinaridade, pela nfase em determinado modelo ou esquema e pelo foco nos problemas prticos da rea, nas solues adotadas e nos estudos empricos (CAMPOS; VENNCIO, 2007, p. 108).

a importncia da biblioteca nas escolas, nos institutos de pesquisa, nas universidades etc., no h administrador que refute seu valor. No momento das decises, os cortes oramentrios, a designao de servidores imprestveis ou a indicao de nomes polticos para as cheas dessas instituies desmentem as palavras vs de muitos administradores e governantes. Contra essa postura, no h paradigma que resista inoperncia e ao desvirtuamento das bibliotecas como centros de ao cultural.

MUTABILIDADE

DOS

PARADIGMAS

INSTITUIO BIBLIOTECA

No entanto, seguimos a linha kuhniana, segundo a qual a cincia caminha face troca de paradigmas. Paradigmas como premissas compartilhadas por membros de determinada comunidade cientca. Seus partcipes possuem interesses comuns em torno de uma especialidade, submetendo-se a um processo de educao similar e acessando a mesma literatura tcnica. Isto gera certo nvel de agregao e unio, embora esses grupos no estejam livres de conitos e disputas internas. Novas idias pem em crise um paradigma at ento estabelecido. Nasce, ento, um novo paradigma que traz consigo uma nova viso da prxis cientca, incorporando novos temas prioritrios, novas tcnicas e mtodos, novas hipteses e teorias, num ciclo contnuo e permanente, e mais do que isto, inesgotvel. Isto , teorias so contestadas, revistas e questionadas por sua auto-sucincia, por seu absolutismo, observando-se crescente busca de uma cincia pluralista, capaz de perceber e respeitar a totalidade dos fenmenos, numa viso holstica. O terceiro aspecto que merece nfase que, antes de qualquer elemento, a ao prossional e governamental que determina a atuao das instituies. No importa conceituao, categorizao ou tipologia de bibliotecas, se no h predisposio dos prossionais em consolidlas como tal e, sobretudo, se no existir vontade poltica para acion-las como verdadeiros centros de aprendizagem. Questionados sobre

Diante do exposto, sem rgidas preocupaes histricas, em termos gerais, lembramos que os vestgios das primeiras bibliotecas nos conduzem aos registros em suporte mineral. A escrita registrada em tabletes de argila e, posteriormente, no papiro e no pergaminho. Aos manuscritos, se sucede o papel, que favorece a expanso das bibliotecas, restritas, poca, s classes favorecidas, nos castelos medievais, com ostensiva marginalizao dos plebeus. Graas a Johann Gutenberg (c. 1398-1468), alemo e inventor da imprensa, os impressos conquistam espao e acarretam profundas transformaes de natureza sociocultural e educacional. No sculo XVI, as bibliotecas sofrem mudanas ainda mais profundas, por conta da laicizao. A excluso do elemento religioso como item dominante da informao permite o incio da democratizao da informao e o posicionamento gradativo da biblioteca como instituio social. a hora das bibliotecas modernas. Seu trao marcante o abandono do posto de guardi ou co de guarda das informaes, at ento inerente s bibliotecas medievais (entre o comeo do sculo V e meados do sc. XV), com conseqente disseminao da informao. Grande parte das bibliotecas passa de particulares para pblicas. Emergem as bibliotecas especializadas, priorizando reas do conhecimento. Mais adiante, os anos 60 e 70 do sculo XX trazem, ocialmente, as novas tecnologias de informao e de comunicao, como resultado dos avanos da indstria eletrnica, expandindose, vertiginosamente, ao nal desse sculo e no sculo atual, embora ressaltemos que, desde 41

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Maria das Graas Targino os primrdios, ao tentar dominar a natureza via recursos rudimentares para garantir sua sobrevivncia, o homem gera o processo tecnolgico. Anal, a expresso ainda em uso novas tecnologias aplicadas a quaisquer ramos do saber refere-se muito mais ao estgio atual dos processos tecnolgicos do que ao adjetivo novas, na acepo restrita de nomear aquilo que tem pouco tempo de existncia. Tal como a revoluo industrial, a revoluo tecnolgica tem provocado profundas alteraes na congurao social do Ocidente. Citamos, por exemplo, a descentralizao da economia, a alterao das prticas culturais, a redenio do trabalho e a popularizao da informao. Ora, se a informao sempre fez parte da vida da humanidade, na funo de instrumento propulsor do avano do conhecimento humano, das naes e dos povos, hoje, assume natureza revolucionria. Suas dimenses quase innitas, seu carter instantneo, seu alcance global e seu volume imensurvel transcendem o alcance e o controle dos cidados, haja vista que no obedece a delimitaes espaciais, lingsticas, culturais e polticas, atingindo as mais distintas facetas da vida do ser humano. Isto signica que as inovaes tecnolgicas so decisivas na mutabilidade dos paradigmas concernentes biblioteca, em sua condio de instituio social. E, como inevitvel, ao atravessar as vrias fases histricas, indo do perodo medieval contemporaneidade, a biblioteca assimila a realidade dos diferentes perodos e assume posturas paradigmticas distintas. De incio, a biblioteca tradicional, que prioriza as grandes colees e os edifcios majestosos. O valor social das bibliotecas est intimamente atrelado dimenso fantstica de suas colees, perfazendo a expresso just in case. Quer dizer, no momento exato, o leitor tem a seu dispor a informao demandada, ali na prateleira, mediante consulta aos catlogos ou, se a biblioteca de livre acesso, graas possibilidade do browsing real. Talvez, na viso defendida por Renault (2007), este corresponda ao paradigma fsico ou sicalista, que prioriza as coisas. Paulatinamente, h visvel e indiscutvel substituio do modelo de biblioteca centrado na disponibilidade por um novo modelo centrado na acessibilidade. a prevalncia do just in time, com destaque para o intercmbio com as demais unidades de informao conectadas em 42 rede e para o browsing virtual. So iniciativas para consolidar a mudana de paradigma do acervo para a informao, do suporte fsico para a informao, em que a biblioteca tradicional d lugar biblioteca ao cultural: o importante suprir as demandas do usurio, de imediato, no importa o suporte ou a localizao fsica da informao, o que encontra equivalncia no paradigma cognitivo associado ao social. Isto , a idia de objetivao da informao, quando se atribui signicados em consonncia com as demandas dos indivduos, leva em conta tanto o repertrio cognitivo de cada um como o contexto no qual est imerso. E, obviamente, a valorizao da informao se insere mais e mais no contexto da comunicao eletrnica, visando expandir a biblioteca virtual (BV), como possibilidade real e no utopia. Como decorrncia, a BV se fortalece. Ganha contornos variados e denominaes distintas (nunca consensuais), como Marchiori (1997) detalha biblioteca automatizada / eletrnica / digital / binica / without walls library (sem paredes) / no fsica / polimdia / ciberteca / desktop library illimited. Enquanto a diversidade terminolgica reete a dinamicidade prpria de conceitos em construo, asseguramos que a BV (ou a designao que se queira optar) permite ao leitor posicionar-se como ator e autor do processo de comunicao, graas facilidade de obteno de informaes. A informao est, agora, em toda parte. Seu acesso se d atravs das redes eletrnicas de comunicao, de qualquer lugar e por qualquer indivduo. A interrelao mais efetiva e crescente entre emissor e receptor visvel. Por conseguinte, o processo de comunicao, de repasse de informaes e de apreenso de novos conhecimentos se dinamiza e se enriquece na multiplicidade de leituras agora possvel, de tal forma que, com certeza, estamos vivenciando, mais do que nunca, novo paradigma informacional ou um paradigma digital. interessante transcrever as diferenas (Quadro 1) entre os modelos de bibliotecas, construdo por Valentim, ainda em 1995, e que persiste atual, lembrando que com o novo modelo de biblioteca, o prossional assume a funo de gatekeeper, selecionando e / ou assinalando as informaes adequadas s demandas dos usurios, graas s redes e bases de dados. Porm, sua intervenincia acompanhada pelos olhos atentos dos indivduos, que podem aceitar ou contestar.

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A biblioteca do sculo XXI

BIBLIOTECA ANTIGO MODELO Estrutura hierrquica Enfoque no acervo Organizao esttica Trabalho desenvolvido em servios Gerenciamento centralizado Conhecimentos especcos Relacionamento competitivo Motivao individual Aes controladas Atendimento pessoal Pesquisa in loco Acervo linear Linguagem controlada Entrada de dados referenciais Servios in loco Produtos impressos Utilizao de sistemas ilhados Utilizao de mdia nica
Fonte: VALENTIM, 1995, p.

BIBLIOTECA NOVO MODELO Estrutura horizontal Enfoque na informao Organizao dinmica Trabalho desenvolvido em projetos Autogerenciamento Conhecimentos amplos Relacionamento cooperativo Motivao de equipes Aes inovadoras Atendimento remoto Pesquisa remota Acervo ptico Linguagem livre Entrada do texto completo Servios on-line Produtos automatizados Utilizao de sistemas integrados Utilizao de multimdia

Quadro 1: Mudana de paradigmas na biblioteconomia

MUTABILIDADE

DOS

PARADIGMAS

BIBLIOTECAS X FORMAS DE ATUAO

No entanto, se as concepes da instituio biblioteca se alteram ao sabor das mutaes da sociedade da informao ou sociedade do conhecimento ou sociedade da aprendizagem, como querem alguns, decerto, muito mais do que a tipologia em si ou a denominao dada biblioteca, o que determina a adoo de paradigma x ou y por determinada instituio a forma de atuao. Isto signica que, em pleno sculo XXI, em meio ao domnio irreversvel do uxo informacional contnuo e inesgotvel, possvel encontrar, em diferentes pases e em diferentes localidades, a nomeada biblioteca tradicional. No nos referimos s bibliotecas de associaes de bairro, s bibliotecas comunitrias, s bibliotecas infanto-juvenis ou escolares, que sobrevivem s duras penas em realidades socioeconmicas adversas, em pases em desenvolvimento ou naes miserveis.

Fazemos aluso, sim, quelas instituies que possuem boas condies de funcionamento, ou, no mnimo, razoveis, mas priorizam acervo, armazenagem, recursos materiais, instalaes, equipamentos etc.etc. em detrimento da proviso ou antecipao de informaes ao pblico-alvo. Podem at no armazenar grandes acervos. Podem at manter conexo internet disposio dos usurios, mas os servios esto distantes da ao cultural no sentido estrito do termo, em que prossional e pblico so atores e agentes sociais, distantes do esteretipo do elemento passivo e amorfo. So bibliotecas, em pleno sculo XXI, que conservam os livros em estantes a sete chaves. So bibliotecas de poderosas faculdades particulares de ensino superior, cujas portas esto cerradas visitao do pblico ou cujo acesso somente possvel mediante autorizao formal da administrao superior da entidade. H um adendo: estamos falando somente em consulta ao acervo, nem sequer no uso de quaisquer outros servios rotineiros, como emprstimo domiciliar. 43

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Maria das Graas Targino Sob tal tica, sempre um risco refazer a histria das bibliotecas a partir to-somente da fase histrica em que esto inseridas. Exemplicando, Marchiori (1997) fala de trs perodos principais: a biblioteca tradicional (de Aristteles at a fase inicial da automao de bibliotecas); a biblioteca moderna, que incorpora a automao signicativa parte dos servios tcnicos e acompanha a expanso da tecnologia do CD-ROM; a biblioteca do sculo XXI, que disponibiliza informaes de qualquer parte do mundo por meio das redes eletrnicas de informao, com nfase para a internet. Insistimos, porm, que a diferenciao dos paradigmas biblioteca tradicional (primazia das grandes colees); biblioteca ao cultural (primazia dos usurios); biblioteca virtual (primazia do uxo informacional ou paradigma informacional ou paradigma digital) soa falsa e articial, quando nos movemos por conceitos estanques ou movidos por perigosas generalizaes. Em qualquer instncia, a biblioteca , por sua natureza, instituio cultural e social, como antes enunciado. As razes so distintas. A princpio, os recursos documentais so um dos mecanismos sociais de maior relevncia para a preservao da memria racial e a biblioteca um aparelho social para transferir isso ao consciente dos indivduos. Assim, a biblioteconomia toma o lugar que lhe cabe entre os fenmenos a serem discutidos em qualquer sistema de cincia social, no apenas como ramo do conhecimento que se dedica a reunir, organizar, disseminar e / ou at produzir o conhecimento registrado, mas, essencialmente, como servio social de vital importncia para a evoluo da sociedade. Ademais, se a cultura, qualquer que seja ela, no pode ser entendida como fenmeno isolado, armamos que para sua preservao e comunicao, a biblioteca instituio-chave. Aqui, ressaltamos que biblioteca no interessa o conceito de cultura como sinnimo de erudio. Trata-se de concepo, que peca sensivelmente em sua essncia, pois conduz tendncia de segregar a comunidade em duas categorias: os letrados, de um lado; os analfabetos ou no letrados, do outro. Em linha oposta, o bibliotecrio precisa ter em mente as concepes tericas fundamentadas em proposies antropolgicas ou sociolgicas, fartamente difundidas, segundo as quais, a cultura o complexo que abrange conhecimentos, crenas, artes, moral, leis, costumes e outras 44 capacidades e hbitos adquiridos pelo homem como membro da sociedade. Neste sentido, o essencial, quando se discutem os novos paradigmas da biblioteca no sculo XXI, a nova postura que se espera do prossional bibliotecrio. As numerosas transformaes sociais, decorrentes dos avanos cientcos e tecnolgicos, indiscutivelmente, atingem nossa vida individual e prossional. H prosses que morrem ou agonizam, como as dos copidesques, sineiros, sapateiros, forneiros, moleiros e alfaiates. H prosses que nascem e se fortalecem, como as de blogueiro poltico, site acquisitor (funo principal: localizar reas para instalao de antenas de redes de telefonia celular); help desk (prestar assessoria na rea de informtica a pessoas fsicas e jurdicas); hacker de segurana (prevenir possveis ataque de hackers aos sistemas informatizados); gestor de mudana (orientar os recursos humanos sobre eventuais modicaes nas estruturas empresariais); analistas de lgica industrial; arquiteto da informao (distribuir os contedos nos sites); webmaster (gerar e operacionalizar sites); e webdesigner, responsvel pelo aspecto visual dos sites na web. H prosses que tendem a se modicar, como as do bibliotecrio e dos prossionais de informao, em geral. Por sobrevivncia, estes devem ir alm das tarefas rotineiras, como emprstimo domiciliar, servio de orientao de usurios e levantamentos bibliogrcos on-line para assumir outros encargos, a exemplo da avaliao, planejamento, implantao de redes de informao em empresas industriais; programas de gerenciamento de informao na automao de bibliotecas e instituies congneres; e edio de revistas tcnico-cientcas. Isto porque, se, no dia-a-dia, qualquer prossional, independentemente de sua atuao, precisa de informaes, isto no o transforma em prossional da informao. Talvez, por designar um novo prossional (ou, pelo menos, assumindo novos papis e funes) ou por se referir a uma atividade, que incorpora aspectos multidisciplinares, esta expresso ainda possui conceituao frgil. Na realidade, deveria nomear quem se dedica informao, o que implica atualizao, capacidade de pesquisa e de manuseio de suportes variados, tendo em vista, sempre, as demandas informacionais do pblico. O prossional da informao quem

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A biblioteca do sculo XXI adquire informao registrada (no importa em que tipo de suporte), organiza, descreve, indexa, armazena, recupera e distribui essa informao, tanto em sua forma original, como em produtos elaborados a partir dela, excluindo os produtores de informao, quais sejam, os cientistas e tecnlogos. Assim, todos os bibliotecrios so ou deveriam ser prossionais da informao, mas nem todos os prossionais da informao so bibliotecrios. A eles, somam-se documentalistas, arquivistas, muselogos, administradores, contadores, analistas de sistema, comuniclogos, jornalistas, publicitrios, estatsticos, engenheiros de sistemas, socilogos, educadores, dentre outros, com nfase para ocupaes emergentes, como os citados webmasters e os analistas de lgica industrial. Esperam-se desses prossionais, responsveis pelo fortalecimento de bibliotecas representativas do sculo XXI, e, portanto, fortalecidas por paradigmas que se sustentam no apenas no avano tecnolgico, mas na valorizao do usurio, requisitos e atribuies peculiares (GUIMARES, 1997; MASON, 1990). Por exemplo, so requisitos bsicos do prossional da informao: viso gerencial; capacidade de anlise; criatividade; atualizao. Em se tratando da viso gerencial, esta permite ao prossional da informao tomar decises, de forma racional e eciente, diante de questes, como o custo da informao e seu carter estratgico, ao lado de capacidade de anlise como subsdio para a referida tomada de deciso, face diversicao de suportes, multiplicidade de uso da informao e s demandas informacionais gradativamente mais singulares e individuais. Trata-se de adotar atitudes especcas, tais como, noo precisa de tempo e de espao; conhecimento de condies nanceiras e de investimentos em recursos humanos, engenharia e administrao de fontes de informao e gesto eletrnica de documentos. Alm do mais, a criatividade indispensvel para qualquer prossional. Inclui ingredientes cognitivos e perceptivos, como: originalidade, criticidade, liderana, sensibilidade diante de situaes novas, exibilidade e uncia, lembrando, como se diz, no cotidiano, que criatividade consiste, fundamentalmente, em buscar novas solues para velhos problemas. Tambm merece ateno a capacidade de atualizao no processo de educao continuada. Como visto, alm de essencial a qualquer prosso, a atualizao, que requer leitura, estudo e pesquisa, vai alm dos conhecimentos tcnicos. Se a alfabetizao em novas tecnologias de informao e de comunicao a condio primeira para que prossionais da informao e, especicamente, bibliotecrios, atuem como multiplicadores e alfabetizadores na sociedade, h outras habilidades que extrapolam a intimidade com o computador. a motivao pessoal, o conhecimento de idiomas; a capacidade de conviver em grupo; o dinamismo; a persistncia; a viso interdisciplinar; o prossionalismo; a capacidade de comunicao e de fazer alianas; a competncia; a responsabilidade; a capacidade de inovao, embora os requisitos ora enunciados, em termos genricos, sejam bsicos para qualquer outra prosso. Por outro lado, vital reforar que a mutabilidade dos paradigmas intervenientes na vida das bibliotecas, tais como as formas de atuao dos prossionais bibliotecrios do sculo XXI exigem reviso e reestruturao imediata dos cursos de graduao na rea. preciso que os alunos estabeleam contato permanente com as TIC. Estas no devem gurar apenas como disciplina curricular ou contedo programtico. Em linha oposta, precisam estar presentes como suporte ao ensino de temas diversicados, indo, por exemplo, da indexao ao estudo de usurio, da catalogao gerao de fontes de informao, a m de que o alunado / futuros prossionais se habilitem a lidar com as perspectivas de desenvolvimento de bibliotecas, associadas necessidade de integrao e gesto de materiais e servios do universo impresso e do novo mundo digital. Um outro aspecto na formao do bibliotecrio do sculo XXI vincula-se citada viso gerencial na rea de informao. Na mesma linha de raciocnio, est a abordagem dos suportes de informao como um todo, eliminando-se, de vez, a idia da informao restritamente bibliogrca. Acrescentamos que os cursos de graduao no podem perder de vista a relevncia da educao continuada para seus graduandos, quer ao longo da formao bsica, quer aps sua concluso. Enm, so urgentes estruturas curriculares mais exveis, que contemplem um nmero maior de matrias optativas e interdisciplinares. So urgentes currculos mais integradores, que favoream 45

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Maria das Graas Targino e estimulem viso ampla de mundo, em que as tcnicas, como elementos essenciais, atuem, de fato, como meros instrumentos para difuso de informaes aos diferentes segmentos sociais. Os bibliotecrios do sculo XXI, independentemente da nomeao de quaisquer paradigmas, precisam acompanhar os movimentos de democratizao da informao. Estamos vivenciando, por exemplo, o movimento mundial de acesso livre informao cientca, liderado, em termos de Brasil, pelo Instituto Brasileiro de Informao em Cincia e Tecnologia (IBICT, 2005), rgo do Ministrio da Cincia e Tecnologia e lder do Manifesto Brasileiro. O acesso livre se impe como modalidade de publicao de artigos cientcos que cresce, de forma veloz, graas aos repositrios de acesso livre e / ou a softwares de cdigo aberto. A Open Archives Initiative ou Iniciativa dos Arquivos Abertos (OAI) consiste em reviso do prprio processo de comunicao cientca, com base na implantao de solues tecnolgicas integradas, mediante procedimentos, tais como: auto-arquivamento pelos autores; metadados padronizados para descrio; acesso livre produo cientca e o Protocolo OAI. H, tambm, alternativas que consolidam o paradigma vigente no mbito das bibliotecas do sculo XXI, em que o uxo informacional e as potencialidades do mundo digital so a grande estrela. Dentre eles, est o Creative Commons (CC): projeto sem ns lucrativos, j em vigor em diferentes pases, incluindo o Brasil, que disponibiliza licenas exveis para obras intelectuais. Construdo a partir da lei atual de direitos autorais, possibilita o compartilhamento de criaes, incluindo msicas, lmes, imagens e textos on-line (cientcos ou no), devidamente identicados com licena CC. Tomando como referncia a idia dos direitos reservados, como se d nos direitos autorais tradicionais, o CC adota a opo de alguns direitos reservados. Isto , com a referida licena, o autor mantm os seus direitos autorais, mas, simultaneamente, possibilita a outros copiar e distribuir a sua obra, com a condio de que atribuam o devido crdito, obedecendo s condies previamente especicadas. Caso o autor disponibilize a sua produo, sem nenhuma condio, deve optar pelo domnio pblico (CREATIVE Commons, 2008). Conseqentemente, o CC emerge como uma das formas de acesso e de uso da informao cientca, de cunho democrtico. 46

4 FINALIZANDO
Por m, reforamos a idia de que so os prossionais e os governantes os responsveis, por excelncia, da vigncia dos paradigmas emergentes. Se, no momento, a informao em circulao o motor da sociedade contempornea, bibliotecas e bibliotecrios precisam estar alertas s novas formas de relaes sociais e prticas culturais advindas das aplicaes tecnolgicas em informao, conscientes, porm, que no se trata de relao simplista de causa e efeito, em que a alteraes infra-estruturais correspondem mudanas superestruturais. Cada tecnologia tem seu prprio espao, seu prprio tempo, seu prprio pblico. Ocorrem sim, mutaes, adaptaes e avanos: as inovaes tecnolgicas no se contrapem quelas em uso, mas a complementam. As bibliotecas virtuais avanam e avanaro mais e mais este um caminho sem volta mas sua ecincia ainda est vinculada ecincia dos prossionais da informao ou do bibliotecrio, em particular. E mais, ao lado das BV, sobrevivero bibliotecas tradicionais e bibliotecas ao cultural. Assim, quando nos perguntam se as bibliotecas fsicas ainda existiro, respondemos sem titubear: Sim, persistiro, porque a diversicao de culturas, de pases e de povos um fenmeno que persistir. Agora mesmo, no momento em que alardeamos a proliferao das BV no mundo e no Brasil, vivenciamos extrema contradio. Segundo o ndice de Desenvolvimento Humano (IDH), introduzido pelo Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) para avaliar a qualidade de vida e o progresso humano, por meio da conjuno de trs indicadores longevidade, nvel educacional e acesso a recursos o Piau consta na ltima colocao no ranking dos Estados brasileiros, com IDH igual a 0,534. Pode-se argumentar que os ndices so sempre nmeros sintticos, e, por conseguinte, sujeitos s imprecises, alm de que, no Brasil, os trs rgos envolvidos, o PNUD, o Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada (IPEA) e a Fundao Joo Pinheiro (FJP), ainda hoje, trabalham com dados alusivos a 2003. No entanto, no Piau, dentre seus 223 municpios, somente 10 mantm bibliotecas cadastradas no Sistema Nacional de Bibliotecas Pblicas (FUNDAO BIBLIOTECA NACIONAL, 2008).

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A biblioteca do sculo XXI Sob esta tica, asseguramos que h e sempre haver diferenas entre os pases e dentro dos pases. E mais, sempre existiro governantes e administradores com vises distintas de mundo. Sempre existiro bibliotecrios tradicionais em seu apego a acervos intocados e preservados. Sempre existiro pblicos mais, ou menos conscientes ante seus deveres e direitos como cidado. E, sobretudo, no podemos perder de vista o fato de que, em nosso Pas, o acesso ao circuito informativo no garante per se a incluso social. Aliada marginalizao educacional, social, cultural, econmica de parcelas signicativas da populao brasileira, h, agora, os analfabetos digitais ou os excludos digitais, representados por todos aqueles que continuam fora do circuito informacional. E no so poucos. De qualquer forma, resta a esperana de que, cada biblioteca, em qualquer lugar, possa se transformar em lugar aprazvel, atraente e dinmico, recorrendo evoluo das tecnologias para oferecer s coletividades um mundo informacional multicolor atravs de programas de computador, da televiso e do rdio, e da prpria internet, com suas potencialidades mpares. Estas so as expectativas (meras expectativas) que podemos delinear para a biblioteca do sculo XXI, qualquer que seja a denominao dos novos paradigmas, como prescrito tambm por Aquino, quando diz, com pertinncia e apuro:

11).

A memria histrica alerta-nos de que no devemos esquecer que a CI [cincia da informao] assumiu seu decisivo papel no desenvolvimento da cincia e da tecnologia e que continua a desempenhar sua funo social, hoje acrescida das questes relacionadas aos usurios e suas necessidades de informao, e que suas novas funes tm sido ampliadas e redesenhadas no novo paradigma tecnolgico centrado na informao e no conhecimento (grifo nosso). Mas consideramos a necessidade de intensificao das prticas sociais, de compromisso de seus atores sociais: pesquisadores, ensinantes e aprendentes (AQUINO, 2007, p.

THE LIBRARY OF THE TWENTY-FIRST CENTURY: new paradigm or mere expectations?


Abstract This work aims to evaluate the guideline paradigms of the 21st century libraries, and therefore, of the information science (IS). First, three points are considered: (1) the library mainly as a social institution and therefore subject to society changes; (2) the irreversible mobility of paradigms in any area of performance; (3) the professional and governmental actions as a determinant element of institutional performance. Inevitably, as library goes through the many historical phases, it assimilates the reality of different periods and assuming distinct paradigmatic positions. Initially, the availability-centered model prevails, which prioritizes great collections and majestic buildings, the just in case model: the reader has the demanded information available thanks to the real browsing. Gradually, the accessibility-centered model is consolidated. It is the just in time prevalence, thanks to the exchange between the other wired information units and to the virtual browsing. The technology expansion leads to the advent of the virtual library (VL) and the emergence of the informational or digital paradigm. However, insisting on the idea that professionals and the government are responsible for the validity of allusive libraries paradigms is still a practice. And it is also necessary to take into account the culture, countries and people diversity, which means that the virtual libraries coexist with traditional libraries in 21st century. Libraries: paradigms and models. Information Science: paradigms and models. Information Science.

Key-words:

Artigo recebido em 22/12/2008 e aceito para publicao em 23/08/2009


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Maria das Graas Targino

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