Dinâmica Territorial Das Assembléias de Deus
Dinâmica Territorial Das Assembléias de Deus
Dinâmica Territorial Das Assembléias de Deus
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CINCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PS-GRADUAO E PESQUISA EM GEOGRAFIA
NATAL/RN 2010
Dissertao apresentada ao Programa de PsGraduao e Pesquisa em Geografia, do Centro de Cincias Humanas, Letras e Artes, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito para obteno do grau de Mestre em Geografia, rea de Concentrao em Dinmica e Reestruturao dos Territrios na Linha de Pesquisa Identidade e Cultura, sob a orientao do Prof. Dr. Anelino Francisco da Silva.
NATAL/RN 2010
Biblioteca Setorial do Centro de Cincias Humanas, Letras e Artes (CCHLA). Arajo, Bruno Gomes de. A dinmica territorial da Assemblia de Deus no Serid do Rio Grande do Norte / Bruno Gomes de Arajo. 2010. 294 f. : il. Dissertao (Mestrado em Geografia) Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Cincias Humanas, Letras e Artes. Programa de Ps-Graduao e Pesquisa em Geografia, Natal, 2010. Orientador: Prof. Dr. Anelino Francisco da Silva. 1. Territorialidade humana. 2. Assemblia de Deus. 3. Pentecostalismo Serid, Regio do (RN). 4. Evangelizao. 5. Poder disciplinar. I. Silva, Anelino Francisco da. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Ttulo.
RN/BSE-CCHLA
CDU 911.6(813.2)
FOLHA DE APRESENTAO
No trabalho de Dissertao de Mestrado em Geografia, intitulado de Dinmica territorial da Assemblia de Deus no Serid do Rio Grande do Norte apresentado pelo aluno Bruno Gomes de Arajo, integraram a banca examinadora os seguintes mentores:
BANCA EXAMINADORA
Prof. Dr. Anelino Francisco da Silva Universidade Federal do Rio Grande do Norte Centro de Cincias Humanas, Letras e Artes Departamento de Geografia Orientador
Prof. Dr. Werther Holzer Universidade Federal Fluminense Departamento de Geografia Examinador externo
Prof.Dr. Jos Lacerda Alves Universidade Federal do Rio Grande do Norte Centro de Cincias Humanas, Letras e Artes Departamento de Geografia Examinador interno
_________________________________________________________________ Prof. Dr. Luiz Carvalho Assuno Universidade Federal do Rio Grande do Norte Centro de Cincias Humanas, Letras e Artes Departamento de Cincias Sociais Suplente
Dedico Ao meu pai Mario Gomes de Arajo (in memorian), por sua vida de luta e amor pelos seus, e por ter me ensinado em suas visitas ao serto seridoense, a apreciar perpetuamente a beleza da natureza e a simplicidade das pessoas.
AGRADECIMENTOS
acolhimento e crticas foram alguns dos elementos dispensados construo desta pesquisa, e dos quais procurei me apropriar durante os momentos em que me dedicava escrita. Antes mesmo de aplicar-me a esta empreitada, sabia dos eminentes obstculos que sobreviriam, quis pagar o preo! [...] vejo o quanto foi necessrio encontrar-me na adversidade, pois que valor ento teria esta vitria? O propsito desta luta agora conhecido e desejo fazer notrio a tantos o grande e maravilhoso elenco que o Senhor ps minha disposio: Agradeo por Elizete, me amada, que dedicou maior parte de sua vida no cuidado dos filhos e que na minha trajetria acadmica foi o principal anjo a guiar-me, doando-se mais do que podia a este meu objetivo, a ela meu amor eterno! Ao meu pai Mrio Gomes (in memria) pelo seu carinho, companheirismo, amor e fora que ainda me contagiam na busca de meus objetivos deixaste um legado perptuo em minha vida! Grato tambm pelo meu irmo Hlio maior incentivador desta pesquisa ; Eli meu parceiro incondicional e minhas irms Jarlene, Jacione, Patrcia por terem cuidado, desde minha tenra idade, deste irmo mais novo aconselhando, brigando, amando e torcendo por meus ideais. De modo especial Luz Pinheiro (cunhado) e aos meus sobrinhos Samuel Alves e Jeremias. Nesta jornada no poderia esquecer-me dos primos Paulo Davy e Bruno Felipe que como irmos acompanharam de perto essa caminhada e juntamente com minha querida tia Daluz e Francisco Milans apoiara-me oralmente neste perodo. Incluo tambm neste rol o amigo e irmo Carlos Barata (Jnior) por ter abraado esta causa e ter segurado minha mo desde nossa infncia at o atual momento. Obrigado pelo bero de minha formao crist a Assemblia de Deus Madureira, que me proporcionou a base emprica de toda essa pesquisa. Nela pelos irmos que me amaram e de mos dadas caminharam ao meu lado como 7
os longnimos irmos: Valmir companheiro de todas as horas Denilza (Ninha), Geazi, Ilka, Chalinio, Vanuza e tambm o prezado irmo Dioclio. Grato sou, por que nesta caminhada pude compartilhar e guardar preciosos momentos ao lado dos irmos Moacir, Marilac, Moab e Felipe. De modo especial a Moamma Mayanna com a qual vivi tambm momentos nicos, e que juntamente comigo sonhou ver a concretizao deste trabalho, meu muito obrigado! Aos dedicados obreiros do ministrio como o Pr. Geraldo Carneiro (in memorian), Pr. Jos Aelson, Ev. Manoel Garcia, Ev. Jerncio, Ev. Jacinto, Aux. Edivaldo, Aux. Paulo Oliveira, Aux. Almirante, a eles expresso meu
agradecimento pelas oraes e lies conferidas no mbito da igreja. Manifesto minha profunda gratido pela Igreja Sede das Assemblia de Deus no Rio Grande do Norte IEADERN que no hesitou em prestar o apoio financeiro pesquisa de campo. Ao pastor presidente Raimundo Joo de Santana que como bem afirmara (...) quero ter minha mo nesta obra! (...), aos pastores Jozenil Barbosa, Elizeu Moreira e Francisco Marto que me serviram de condutores na busca de informaes nos labirintos da exaustiva historiografia da igreja. Deveras agradecido pela honra de ter compartilhado o embrio desta pesquisa com o pastor Elinaldo Renovato, que com sua percepo afinada de pesquisador entendeu a importncia desta obra para a AD no RN, financiando parte da pesquisa de campo e sendo um mediador entre este trabalho e a CPAD representada pelo seu diretor executivo o pastor Claudionor Corra de Andrade. Sinto-me lisonjeado pela Casa Publicadora das Assembleia de Deus CPAD por ter presenteado a pesquisa com exemplares de livros que serviram de subsdio terico para a construo do primeiro e segundo captulo dessa dissertao. Minha gratido se estende ao Deputado e pastor Antnio Jcome por ter subsidiado financeiramente uma poro considervel deste projeto de pesquisa, pela competncia e responsabilidade no mbito de sua vida crist e poltica. Lembro tambm dos obreiros da Assemblia de Deus do RN em Currais Novos que se doaram em tempo e em fora de tempo, dispensando informaes no perodo em que estvamos centrados no levantamento historiogrfico dos trabalhos evangelsticos da igreja. Desta forma, presto minha gratido ao presbtero e mestre Francisco Galdino, ao presbtero Souza, ao dicono Luiz 8
Antnio (Luizinho) e ao pastor Dijeso Gomes por seu reconhecimento e considerao manifestos a esta pesquisa. Fao tambm saber da satisfao em ter entrevistado a pioneira da AD em Currais Novos Maria Lourdes, que tomada por emoo contagiante narrou para a pesquisa fatos remotos da histria da igreja, nunca antes publicados. No tocante aos amigos, irmos e parceiros que tambm apresentaram seu valor nesta caminhada destaca-se Wolmar Bastos, Joab Franklen, Edilson Souza, que dedicaram momentos preciosos, a ouvir-me nos debates e discusses acerca da vida e do tema da pesquisa, obrigado pelas vrias lies que aprendemos juntos! Dedico tambm esta orao aos pastores Jimmy Johnson (Presbiteriana) e Samuel Cavalcante (Batista) por terem acrescentado e estimulado o conhecimento nas vrias discusses que tivemos durante a formulao deste projeto. Aos irmos Josean e Andressa pelos momentos de confraternizao e pela responsvel anlise gramatical desta escrita. Que esta splica de ao de graa chegue tambm aos obreiros e irmos da Assemblia de Deus de Caic, que foram instrumentos essenciais para o resgate dos fatos e acontecimentos relativos histria da igreja. Quero com sincera satisfao destinar os frutos desse trabalho ao presbtero Josenilton Dantas, que alegremente conduziu-me s pessoas certas durante a pesquisa de campo na cidade de Caic. Aos amigos e irmos Alberanir e Mrcio que com uma hospitalidade divina me receberam no recinto de seus lares. Com alegria rogo por uma vida de paz, ao pioneiro da AD em Caic o presbtero Ablio Damsio que narrou maior parte da esquecida histria da igreja, como tambm a irm Maria Aparecida pioneira no estudo acadmico sobre a AD em Caic. Ao pastor Josaf Loureno e sua famlia que facilitou-me e muito obteno de dados para a pesquisa, indicando irmos e colocando sua residncia a disposio. Graa e paz aos obreiros e irmos da Assemblia de Deus em Parelhas, pela recepo amiga e acima de tudo crist. So eles os presbteros Jos Fernandes (Z Borges) e Eduardo Buriti como tambm pastor Antnio que prontamente colocou-se disposio da pesquisa. Sem esquecer jamais da nossa querida e pioneira Maria Lourdes Campos arquivo vivo que aos 89 anos e fragilizada pelos ardores desgastantes do tempo, conseguiu narrar com vigor
toda a histria da igreja em Parelhas com a veemncia de quem realmente viveu para um propsito divino. Dentre tantos te glorifico pela vida de Cludio e Luciana (Presbiteriana) que me receberam, por mais de uma vez, em sua acolhedora residncia e pela vida do irmo Aluzio Nicolau (Presbiteriana) que cedeu gentilmente sua entrevista sobre o protestantismo em Parelhas. Agradeo ao pr. Jos Filho pela recepo em sua casa, durante minha passagem por Acari, muitas bnos em seu ministrio! To certo como vive o Senhor, que nunca me esquecerei dos tempos vividos, dos amigos e professores agraciados no CERES UFRN Campus de Caic. L dei os primeiros passos em direo vida profissional acadmica. Foi l que comecei a entender o uso, a forma e a funo do conhecimento cientfico para o bem estar e dignificao do ser humano. Para encontrar meu lugar neste universo multidimensional de conhecimentos contraditrios, lgicos e inacabados tive que contar com pessoas, que como eu, se encontravam na mesma circunstncia. Foram eles: Edson, Sidney, Rodolfo, Evanuel, Hugo, Lucilio, Sebastio, Digenes, Felipe (in memorian), Nivaldo, Magno e Everilson; ontem apenas estudantes universitrios em busca de um sonho, hoje, grandes pesquisadores e profissionais em suas reas. Tambm so lembrados com muita saudade os meus fidelssimos amigos e colegas da graduao Sued, Aline, Eugnio e Hosana. Agradeo por ter me posto diante de grandes mentores intelectuais que com suas diferentes metodologias enriqueceram a minha formao acadmica. Inicio pela minha principal mentora a Dr. Ione Diniz Morais, da qual sou tributrio da sua impecvel performance intelectual, pedaggica e humana como tambm de entrar no mundo da pesquisa geogrfica, minha perpetua gratido! Aos professores Dr. Eugnica Maria, Dr. Flvo Elano, Dr. Muirakytan Kennedy, Dr. Douglas Arajo e Dr. Iranilson Buriti, Esp. Gregrio e o dedicado e descobridor de talentos o professor Renato Rocha que ensinou-me a lhe dar com as variveis do complexo mtodo cientfico. Recordo com muita gratido do sbio e inesquecvel professor Dr. Adalberto Varela, que alm de compartilhar os aposentos de sua estadia em Caic, me presenteou com valiosas lies no laboratrio LARENASTER e durante as aulas de astronomia nas dependncias da Estao Climatolgica do Serid na UFRN.
10
Indispensveis para minha formao foram os dois anos estudos de realizados na Base de Pesquisa: Educao e Sociedade do CERES. Durante a experincia como aluno de Iniciao Cientfica, tive a oportunidade de ensaiar os primeiros acordes desta cano, nos artigos que (re)elaborados compem esta dissertao. Foi na base de pesquisa escrevi meus primeiros artigos e obtive uma viso mais apurada de outras reas do conhecimento como Histria e Pedagogia atravs das pesquisas orientadas pelos professores Dr. Antnio Lisboa, Dr. Henrique Alonso e Dr. Tnia Alves. Desejo bnos aos funcionrios do CERES como nosso motorista e camarada Base Area, irm Onilda (bibliotecria), Marinilce (secretria do DHG), Jnior e Charles (LABOINFOR), Idelbram (secretrio) e Chico (Estao Climatolgica). Agradeo pelo amigo e irmo Ms. Daniel Nicolau por sua parceria acadmica nas discusses e artigos e por ter acrescentado indispensvel conhecimento nesta pesquisa durante sua elaborao at sua concluso. O translado dos meus estudos de Caic para o Centro de Cincias Humanas, Letras e Artes CCHLA em Natal foi o grande marco na minha construo enquanto pesquisador. Os amigos e colegas que me acompanharam e cresceram ao meu lado como Gnison Costa, Diana e ao apaixonado gegrafo Carlos Eugnio tambm so personagens deste evento. No poderia esquecer os grandes colegas do programa como Diego Salomo, Alber, Kelson e Raimundo, parabns por suas conquistas! Ecoa ainda em meus ouvidos a arte da cincia geogrfica entoada nas aulas dos professores do Programa de Ps-Graduao em Geografia PPGEo como o Dr. Valdenildo Pedro, Dr. Maria Helena Braga, Dr. Beatriz Pontes e os professores visitantes do programa como a Dr. Maria Adlia, Dr Maria Laura, Dr. Maria Encarnao Sposito e o Dr. Paulo Cezar da Costa. Entre esses, meu orientador o Dr. Anelino Francisco da Silva por ter acreditado, acolhido e doado seu conhecimento construo desta obra dissertativa, sendo no transcurso destes dois anos um verdadeiro guia no mundo do conhecimento geogrfico. Aos amigos e companheiros da Residncia de Ps-Graduao (Pouso) o Dr. Alcides Vanderley, Ms. Jos Evis e Ms. Joo Batista com os quais tive o prazer residir durante minha estadia em Natal. Agradeo profundamente aos grandes amigos e pesquisadores Rosenilson Dantas e Hugo Homeros pelas 11
ajudas prestadas deste os tempos da graduao at a ps-graduao e ao estimado historiador seridoense Ms. Helder Alexandre pelas belssimas conversaes sobre o Serid colonial. Por fim ao Instituto Federal do Rio Grande do Norte Campus Currais Novos, onde conclui a ltima parte desta obra, sempre amparado pela resignao das minhas tias Ftima Azevedo, Jlia Maria e Mgna. Que a paz seja com todas! Ademais agradeo por todos aqueles que me foram indispensveis, que podem at fugir de minha memria mais nunca do meu corao (...)
12
Sofrer em silncio, sufocar a voz do primeiro instinto um sacrifcio admirvel. Vitria espiritual. Herosmo viril. Redime as nossas fraquezas, levanos mais perto de Deus... Queimuxes so confisses de derrota. Mrio Pissara de Almeida
13
RESUMO
No Serid norte-rio-grandense possvel identificar junto s modalidades de poder como a poltica e a econmica, grupos religiosos mantendo sob seu controle reas, pessoas e fluxos, como tambm fixando novos pontos de atuao. Esse domnio alude a um campo de poder espacialmente delimitado, ou seja, a um territrio demarcado e projetado para fins de reproduo no espao. Entre o pluralismo religioso, a Igreja Assemblia de Deus, em sua dinmica territorial, se destaca no cenrio religioso por suas estratgias de delimitao e crescimento espacial, que num ininterrupto processo de circunscrio (1943-2010) conseguiu ampliar a escala material e simblica de seu poder a todas as cidades seridoenses. A Assemblia de Deus enquanto maior denominao pentecostal do Brasil foi estruturada no Serid/RN, seguindo um modelo de governo dividido em Campos Eclesisticos sediados nas cidades de Caic, Currais Novos e Parelhas. Esses centros de comando interligam um nmero circunscrito de igrejas atravs de cdigos normativos, que expressam uma dimenso funcional (burocrtica) e noutra simblica (carismtica) num s campo de domnio territorial. Deste modo, a manuteno do poder territorial na Assemblia de Deus feita atravs de uma gesto carismtico-burocrtico, expressa na interdependncia de mecanismos materiais e imateriais. O contato duradouro dos fiis com esses mecanismos de controle institucional revelou identidades territoriais, que reacendem o sentimento de pertena do fiel tanto ao sistema de crena pentecostal quanto comunidade assembleiana. Considerando as novas possibilidades de articulao do territrio seridoense com outros territrios culturalmente mais mltiplos, observaram-se adaptaes e revalorizaes culturais. Quanto ao territrio assembleiano esse se apresentou defensivo diante dessa tendncia de hibridao cultural, resistindo a um dialogo mais estreito com os novos elementos simblicos, principalmente aqueles vindos do multifacetado movimento neopentecostal. Ao contrrio de igrejas mais abertas e flexveis outros sistemas de significao, a Assemblia tenta reforar os limites do seu territrio prezando pela ortodoxia de seus usos e costumes. Palavras-chave: Territrio, Assemblia de Deus, Serid
14
Summary In the norte-rio-grandense backwoods is possible to join to the power forms both political and economical ones, religious groups keeping under your control areas, people and flow of them, as well as settling new places of acts. That control refers to a field of power delimited by space, in other words, it refers to a territory marked and planned to reproductive intentions on the space. In relation to the religious pluralism, the Assembly of God church, in your territorial dynamics, has been standing out by the strategies of delimitation and space increase which by a constant territorial division process (1943-2010) managed to widen material and symbolic scale of its power for all cities of the Rio Grande do Norte backwoods. The Assembly of God church as the greatest Pentecostal denomination of Brazil was formed in the Rio Grande do Norte Serid, following a ecclesiastical and governmental model divided into three ecclesiastical fields hosted in those following cities: Caic, Currais Novos and Parelhas. Those headquarters interlink a limited number of churches through normative codes, which they express a functional dimension (bureaucratic) and in another symbolic one (charismatic) in an only field of territorial control. In this manner, the maintenance of the territorial power in the Assembly of God church is done by a charismatic-bureaucratic administration, expressed in the interdependent of material and abstract mechanisms. The believers permanent contact toward those mechanisms of institutional control revealed territorial identities which causes a feeling of property of the believer as much to the Pentecostal belief system as to community of the Assembly of God church. Considering new possibilities of articulation of the Rio Grande do Norte backwoods towards others territories more multiple, culturally, noticed cultural adjustments and revaluation at themselves. In relation to the territory of the Assembly of God church this one has exposed itself defensive faced with that cultural hybridization tendency, resisting a closer dialogue to new symbolic elements, mainly those came from the multifaceted neo-pentecostal movement. Unlike more open and flexible churches towards others significant systems, The Assembly of God church tries to reinforce the boundaries of its territory considering by the orthodoxy of its routine and customs. Key-words: Territory, Assembly of God, Serid (Rio Grande do Norte backwoods).
15
LISTA DE ILUSTRAES
Mapa 1 Figura 1
24
Organograma Instancias territoriais da Assemblia de Deus no Brasil ............................................................................................ 105 Organograma hierarquia eclesistica das Assembleia de Deus ...................................................................................................... 115 Organograma da Jurisdio dos Campos Eclesisticos das Assembleia de Deus no Serid/RN ........................................... 124 rea Central de Caic ................................................................. 135
Figura 2
Figura 3
Organograma Flexibilidade espacial dos pontos de pregao .... 138 Formao da Jurisdio Regional da AD de Caic (1962-1972). Formao da Jurisdio Regional da AD de Caic (1975-1995). 140 145
Organograma ciclo anula dos obreiros pelas congregaes de Caic 151 ............................................................................................ Sobreposio da AD em territrio catlico (1950-1969) .............. 160 Formao da Jurisdio de Regional da AD de Currais Novos (1982-2000) .................................................................................
Mapa 5 Mapa 6
166
Mapa 7
Formao da Jurisdio Regional da AD de Parelhas (1965 1969) ............................................................................................ 182 Principais Blackbones do Brasil Redes de Alta Capacidade ....... 238 Lgica da aniquilao do espao pelo tempo no Serid ............. Multiterritorialidade: territrios-rede e territrios zona ................. 240 241
Cartaz do Cactus Moto Fest em Currais Novos: exemplo de hibridismo cultural no Serid ....................................................... 242 Logotipo da Rede Serid de Supermercados ............................. 243
Figura 10
16
LISTA DE TABELA
Tabela 1
239
17
LISTA DE SIGLAS
Associao Atltica do Banco do Brasil Assemblia de Deus Assemblia Geral Extraordinria Assemblia Geral Ordinria
CEMADERN Conveno Estadual de Ministros do Rio Grande do Norte CGADB CNBB CONAMAD Conveno Geral das Assembleia de Deus no Brasil Conferncia Nacional de Bispos do Brasil Conveno Nacional de Ministros das Assembleia de Deus em Madureira Casa Publicadora das Assembleia de Deus Centro de Excelncia em Pesquisa, Inovao e Difuso Empresa Brasileira de Correios e Telgrafos Empresa Brasileira de Telecomunicaes Escola Teolgica das Assembleia de Deus do Brasil Igreja Evanglica Assemblia de Deus do Rio Grande do Norte Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica Instituto Superior de Estudos da Religio Igreja Universal do Reino de Deus Companhia Telefnica do Rio Grande do Norte Telemar Norte e Leste
18
SUMRIO
1 2
INTRODUO .................................................................................... TERRITRIO E PENTECOSTALISMO: UMA DELIMITAO GEOGRFICA E HISTORIOGRFICA PARA AS ASSEMBLEIA DE DEUS ............................................................................................ TERRITRIO E SUA MULTIPLICIDADE CONCEITUAL ................... TERRITRIO SOB O BINMIO MATERIAL-IDEALISTA .................. PERSPECTIVA RELACIONAL: UMA TICA SOBRE A TERRITRIO DAS ASSEMBLEIA DE DEUS .................................. GNESES DO MOVIMENTO PENTECOSTAL .................................. Ascenso do Mundo avivalstico .................................................... Azuza Street 312: a irradiao do pentecostalismo para o mundo ................................................................................................ A MARCHA DO PENTECOSTALISMO NO BRASIL .......................... Estruturas da territorialidade do Pentecostalismo Clssico no Brasil .................................................................................................. Neopentecostais: uma renovao do pentecostalismo brasileiro A IURD e a teologia da prosperidade .............................................. A territorialidade do neopentecostalismo nos centros urbanos brasileiros ..........................................................................................
23
29 29 29
32 33 37
41 46
2.5 2.5.1
48 51 53
55
2.6
PENTECOSTALISMO NO SERID: NUANCES DA TERRITORIALIDADE DAS ASSEMBLIA DE DEUS ........................ Serid, a sociedade da resistncia ................................................. SantAnna, smbolo de resistncia cultural no Serid .................
58 59 63
2.6.1 2.6.2
2.6.3
A evangelizao e estabelecimento da Assemblia de Deus na dcada de 1940 a 1980: o nascimento de uma territorialidade religiosa no Serid ............................................................................
68
19
3.
EXPANSO E GESTO DOS TERRITRIOS DA ASSEMBLIA DE DEUS NO SERID NORTE-RIO-GRANDENSE .......................... SISTEMA TERRITORIAL DAS ASSEMBLEIA DE DEUS NO SERID: UM OLHAR PANORMICO ................................................ AS INSTNCIAS DO PODER TERRITORIAL DA ASSEMBLIA DE DEUS NO BRASIL, FORMAO E RELAES DE PODER ........... Frentes evangelsticas da Assemblia de Deus no Brasil de 1911 a 1930: expanso e gesto sob a liderana dos missionrios suecos ......................................................................... Fundao da CGADB: reestruturao e unicidade do poder territorial das Assembleia de Deus no Brasil ............................... GESTO DO PODER INSTITUCIONAL ASSEMBLEIANO: UMA DOMINAO CARISMTICO BUROCRTICA .............................. INSTNCIAS TERRITORIAIS DAS ASSEMBLEIA DE DEUS E A TRANSMISSO DO PODER .............................................................. CGADB, instncia regencial do poder ............................................ Convenes Estaduais, instncias decodificadoras do poder .... Tessitura do poder territorial da Assemblia de Deus no RN ...... Campos Eclesisticos, instncias executoras do poder............... CAMPO ECLESISTICO DE CAIC ................................................. Formao da Jurisdio Regional: a delimitao de novas fronteiras religiosas no Serid ........................................................ Estratgia de controle espacial: pontos-de-pregao como ao primeira da territorializao assembleiana .................................... Formao da jurisdio citadina: novos espaos, novos territrios ........................................................................................... CAMPO ECLESISTICO DE CURRAIS NOVOS ............................... O estabelecimento da Assemblia de Deus em territrio catlico ............................................................................................... Formao da Jurisdio Regional, um novo redimensionamento da territorialidade assembleiana no Serid
83
3.1
83
3.2
89
3.2.1
90
3.2.2
96
3.3
100
3.4
132
3.5.2
136
3.5.3
146 153
3.6 3.6.1
153
3.6.2
162
20
3.6.3
168
3.7 3.7.1
CAMPO ECLESISTICO DE PARELHAS ............................................ A formao da Jurisdio Regional: de ponto-de-pregao Sede de Campo Eclesistico ........................................................................ Formao da Jurisdio Citadina, uma territorialidade invasiva......
176
176 186
3.7.2
CONSTRUINDO OS LIMITES SUBJETIVOS DO TERRITRIO: A ASSEMBLIA DE DEUS E SUA DEMARCAO CULTURAL NO SERID ................................................................................................. O PODER PENTECOSTAL COMO FORA ESTRUTURANTE DO TERRITRIO ........................................................................................ RECONHECENDO OS LIMITES INVISVEIS DO TERRITRIO ........... TRANSMISSO DOS CDIGOS E A SEMNTICA DO TERRITRIO ASSEMBLEIANO .................................................................................. A COMPLEXIDADE DA IDENTIDADE TERRITORIAL NA CONTEMPORANEIDADE ..................................................................... IDENTIDADE ASSEMBLEIANA E PENTECOSTAL: REFERENCIAIS DE SIGNIFICAO E PERTENCIMENTO NA ASSEMBLIA DE DEUS ................................................................................................... FEIES DA DINMICA MULTITERRITORIAL SERID E AS SUAS IMPLICAES NO TERRITRIO DA ASSEMBLIA DE DEUS ................................................................................................................ Geometrias do poder e multiterritorialidade ...................................... Formao do territrio-zona: primeiras articulaes do territrio seridoense ............................................................................................. Novas possibilidades de articulao do territrio seridoense: dinmica zonal e multiterritorial do Serid .......................................
192
4.1
192 198
4.2 4.3
206
4.4
215
4.5
219
4.6
226 225
231
235
4.6.4
Dinmica multiterritorial e (re)essencializao das identidades territoriais nas Assembleia de Deus ................................................. CONSIDERAES FINAIS ................................................................... REFERNCIAS ...................................................................................... APNDICE ............................................................................................. ANEXOS .................................................................................................
21
INTRODUO
22
1 INTRODUO
A dinmica religiosa no Serid Potiguar vem passando por mudanas significativas devido multiplicidade de denominaes religiosas que
desenvolvem continuamente estratgias peculiares de controle e reproduo espacial. Nesse processo de difuso espacial, observada a produo de territrios pelos diversos segmentos religiosos, instrumento ressaltado por Rosendahl (2005, p.2), como extremamente importante para a existncia e reproduo do agente que os criou e os controla. A Assemblia de Deus, vertente do protestantismo pentecostal1 tem se sobressado atualmente no contexto religioso, em razo do amplo processo de apropriao espacial e da disseminao de suas identidades pela sociedade seridoense. Os assembleianos chegaram ao Serid, em 1943, e tiveram, como ponto de partida, a cidade de Currais Novos onde iniciaram seus trabalhos evangelsticos. Com mais de sessenta e sete anos de existncia, a Assemblia de Deus amplia sua organizao territorial todas as cidades do Serid norte-riograndense (Mapa.1, p.23), sendo uma das denominaes evanglicas mais influentes e atuantes na regio. O proselitismo religioso propagado pelos assembleianos uma estratgia bastante utilizada neste processo de circunscrio espacial, perfazendo toda sua prtica socioespacial. O fenmeno assembleiano permite pensar numa territorialidade religiosa ou, como disse Rosendahl (2005, p.4), no conjunto de prticas desenvolvidas no sentido de controlar um dado territrio, onde o efeito do poder do sagrado reflete uma
1
identidade
de
um
sentimento
de
propriedade
mtuo.
O Protestantismo Pentecostal um movimento religioso que se iniciou no E.U.A em 1906 na cidade de Los Angeles especificadamente na Rua Azuza, onde houve um grande avivamento caracterizado pelo batismo no Esprito Santo com nfase a glossolalia. O avivamento da Rua Azuza liderado pelo pastor Willian Seymor, difundiu-se rapidamente nos E.U.A e chega no Brasil em 1910 com a Igreja Congregao Crist. Desde sua gnese at os tempos hodiernos o movimento cresce e se estabelece no Brasil atravs de denominaes que esto divididas em trs tipologias que lhes conferem temporalidades e caractersticas diferentes dentro do pentecostalismo como: Pentecostalismo Clssico 1910, Assembleia de Deus (maior Igreja pentecostal do Brasil) e Congregao Crist (com nfase no Batismo no Esprito Santo); Deuteropentecostalismo 1950, Igreja do Evangelho Quadrangular, Igreja Pentecostal Unida do Brasil, O Brasil para Cristo, Igreja Pentecostal Deus Amor, Casa da Bno, Igreja Unida e Igreja de Nova Vida ( com nfase na cura divina) ; Neopentecostais, Igreja Universal do Reino de Deus, Igreja Internacional da Graa e Comunidade Evanglica Sara Nossa Terra ( com nfase na Teologia da Prosperidade).
23
24
A constatao deste fenmeno religioso nos levou a eleger o tema desta dissertao como: A Dinmica Territorial das Assembleia de Deus no Serid do Rio Grande do Norte (1943-2010), observando que, neste recorte temporal, que o sistema de campo das Assembleia de Deus foi construdo e organizado juridicamente em todas as cidades seridoenses, resultando num legtimo territrio religioso. A importncia e atualidade do presente estudo residem, na projeo espacial que os grupos pentecostais tm assumido no Brasil e especificamente no Serid. O cenrio religioso brasileiro, no limiar do sculo XXI, assiste a continuidade de movimentos religiosos essencialmente urbanos como o pentecostalismo, que com suas estratgias de difuso territorial busca acompanhar as intensas transformaes sociais decorrentes dos elementos modernos da cultura de massa. O crescimento pentecostal nas regies brasileiras constatado estatisticamente pelo IBGE no recenseamento de filiao religiosa de 2000, onde foi revelado um contingente expressivo de 17,4 milhes 2 de pentecostais praticantes, nmero que colocou o Brasil no patamar de segundo maior pas protestante do mundo, atrs apenas dos Estados Unidos. Propagadora do pentecostalismo clssico ou tradicional, a Assemblia de Deus, segundo Pierrucci (2000, p. 288), constitui-se na maior igreja pentecostal no Brasil, tendo uma posio de destaque, tanto a nvel nacional quanto regional. A relevncia do crescimento desta denominao religiosa torna-se ainda mais evidente quando se sabe que os assembleianos chegaram ao Serid dois sculos depois do catolicismo (1700) e mais de meio sculo aps o protestantismo tradicional (1900). Assim, em um espao de tempo relativamente curto, a Assemblia de Deus consegue manifestar sua expanso atravs de uma organizao territorial bastante singular pelas cidades do Serid, organizao esta que, transpe a nave de suas igrejas e delimita espaos diante do competitivo quadro religioso e de uma sociedade cada vez mais secularizada. Na histria do pensamento geogrfico, segundo Santos (2002, p.5), o tema da religio na geografia foi relativamente marginalizado, por causa da forte
2
O crescimento pentecostal evidenciado pela projeo poltica de seus lderes. Segundo Cesar (1999, p.24) os 15 milhes de evanglicos votantes no Brasil elegeram, em 1996, para o Congresso Nacional 32 deputados, dos quais 18 eram de procedncia pentecostal.
25
influncia do positivismo geogrfico, vertente esta responsvel em parte, pelo desinteresse dos gegrafos pelo fenmeno religioso. Entretanto ventos de renovao na Geografia sopram em direo s abordagens que consideram fundamental a subjetividade, o imaginrio e o simbolismo no processo de entendimento do complexo papel da ao humana na superfcie terrestre. A partir de ento, as abordagens geogrficas relativas ao espao social se tornaram mais plurais. O espao social, segundo Santos (1985, p. 6), dinmico e plural, ou seja, a economia, as instituies, o meio ecolgico e o homem constituem-se como elementos do espao e lhes conferem dinamicidade e pluralidade. Entre esses elementos sociais, a religio tem merecido ateno na produo do conhecimento geogrfico pela dinmica territorial que manifesta nas reas em que se prope a atuar. Na assertiva de Santos (2002, p.7), o estudo geogrfico da religio no Brasil ainda embrionrio tendo, portanto, muito a desenvolver. Na dcada de 1970, no entanto, o tema da religio atraiu o interesse de alguns gegrafos brasileiros, que em sua maioria concentram-se no eixo So Paulo - Rio. Em Rosendahl (2005) o desenvolvimento da perspectiva geogrfica da religio ainda recente, isso em parte explica o fato dos trabalhos desenvolvidos nos ltimos dezessete anos no Brasil, que do continuidade a esta produo, estarem centralizados em torno da dinmica espacial da Igreja Catlica Romana. Neste sentido, ressalta-se a importncia do estudo de outras territorialidades religiosas que configuram o diversificado quadro religioso existente em nossa regio. Sendo assim, a escrita que revela o domnio espacial da Igreja Assemblia de Deus no Serid, est dividida em trs captulos que trazem reflexes dentro do campo discursivo da cincia geogrfica, sobre o poder do sagrado pentecostal que cresce na base de numa escala (i)material sobre as cidades seridoenses. O segundo captulo Territrio e pentecostalismo: uma delimitao geogrfica e historiogrfica para as Assembleia de Deus, faz-se um esforo para situar a pesquisa sobre a Assemblia de Deus no tempo e no espao, identificando a ancestralidade do movimento e a linearidade de seu crescimento no Brasil, at sua difuso no Serid norte-rio-grandense. No resgate 26
historiogrfico do pentecostalismo, analisada a formao do seu sistema de crena, da qual as Assembleia de Deus tributa todo seu mstico ritual que encerra seu territrio cultural. O terceiro captulo intitulado Expanso e gesto dos territrios da Assemblia de Deus no Serid norte-rio-grandense destina-se anlise do crescimento do territrio funcional (material) das Assembleia de Deus, no que tange as estratgias territoriais arquitetadas para o desenvolvimento do seu poder institucional. Neste aspecto, identificamos as relaes de poder que sustentam e asseguram a coeso territorial da AD. A depreenso da produo territorial dos assembleianos no Serid objetivou tambm entender numa perspectiva
relacional, como foi estruturado a poltica eclesistica da igreja, e como ela construiu as delimitaes dos seus campos operacionais atravs de uma multiescalaridade de poderes compreendida como uma rede de centralidades, definidas na [...] complementaridade existente entre circulao e a comunicao, como fluxos materiais e imateriais (SAQUET, 2010, p.76). As principais fontes utilizadas para a construo deste captulo foi o Estatuto e Regimento Interno da IEADERN, que possibilitou o conhecimento dos cdigos normativos elencados para o sistema territorial das Assembleia de Deus no Rio Grande do Norte. O quarto e ltimo denominado por ns como, Construindo os limites subjetivos do territrio: a Assemblia de Deus e sua demarcao cultural no Serid investigou-se o universo das representaes e signos pentecostais como elementos estruturantes do territrio cultural das Assembleia de Deus no Serid. Os smbolos delimitativos do pentecostalismo estruturam o territrio imaterial da AD, pautado no poder do sagrado, onde os limites inscritos se do necessariamente pela valorizao atribuda aos dispositivos sacros. Ao trmino da discusso identificam-se tambm os processos dinmicos que perpassam o Serid na contemporaneidade, como o fenmeno da multiterritorialidade, e as implicaes deste no territrio seridoense e na postura defensiva do territrio das Assembleia de Deus. A anlise da dinmica do territrio (i)material da Assemblia de Deus no Serid, discutida respectivamente no segundo e terceiro captulo, est fundamentada terico-metodologicamente no binmio materialismo-idealismo. O territrio assim depreendido estabelece a indissociabilidade das escalas de poder material/imaterial, no processo delimitao espacial. Desta forma, por questo de 27
metodologia, que, construiu-se para melhor compreenso, uma discusso (materialista) do territrio no segundo captulo e outra (idealista) no terceiro captulo. No entanto, sempre tratando cada uma dessas escalas como inseparveis e complementares no processo de controle espacial das Assembleia de Deus no Serid. No que diz respeito ao resgate historiogrfico, a falta de registros documentais que contemplassem a memria dos principais fatos que ilustram a fundao da AD nas cidades de Currais Novos, Parelhas e Caic, determinou que fosse produzida uma srie de entrevistas com os pioneiros dos trabalhos evangelsticos. A maioria deles j com a idade avanada receberam-nos gentilmente no resguardo de suas residncias. Entusiasmados e com certa nostalgia narraram fatos esquecidos e at desconhecidos por muitos, os quais temos a oportunidade de compartilhar nesta dissertao. Para realizao das entrevistas foi utilizado como suporte tcnico, um roteiro que embora contivesse perguntas objetivas apresentou-se aberto aos detalhamentos dos fatos. Para registrar com absoluta preciso os depoimentos, utilizamos um gravador de som digital, essencial para a organizao cronolgica de todos os eventos narrados. A luz das discusses, leituras e vivncias centradas no mundo pentecostal, apresentamos esta dissertao como produto inacabado, com o desejo permanente de que ela contribua para o avano dos estudos religiogeogrficos no RN como tambm para toda classe de pesquisadores do fenmeno religioso.
28
29
2.1 TERRITRIO E SUA MULTIPLICIDADE CONCEITUAL O territrio enquanto conceito chave das Cincias Humanas foi ao longo de sua construo, sendo ampliado e redefinido na medida em que se aprofundavam as discusses acerca de sua essncia. Poderamos de forma simplria e genrica antecipar o conceito de territrio definindo-o como todo
e qualquer espao em que h um domnio estabelecido. No entanto, na variedade dos poderes que envolvem o espao dominado, que o territrio complexificado ou at impossibilitado de uma definio mais precisa ou fechada. O termo passou a trafegar em eixos diferenciados assumindo vrias conotaes especficas, e em alguns casos bastante restritivas. As possibilidades de apreenso do conceito, hoje, so mltiplas, e se manifestam nas diversas leituras sobre relaes de poder: na cincia poltica, quando se aponta o domnio dos estados-naes, na concepo de base de produo pela economia, nos debates antropolgicos sobre a dimenso simblica das sociedades tradicionais, na compreenso sociolgica que o enfoca como interventor das relaes sociais e na psicologia, quando esta o insere dos debates sobre a construo das subjetividades ou da identidade pessoal entre outros. Esta amplitude conceitual conferiu ao territrio polissemias especficas, porm complementares, e por conseqncia tornou ainda mais pertinente os estudos sobre a relao sociedade-natureza. Junto a esse enriquecimento terico-metodolgico, o territrio se tornou ao mesmo passo complexo e confuso, exigindo um uso adequado do conceito em certas abordagens.
A primeira diviso pela qual objetivamos destacar abarca uma viso parcial de territrio, que inclui as dimenses (natural, econmica, poltica e cultural) a outra integradora, que revela a necessidade de apreender o territrio no mais numa viso restritiva, e sim multiescalar, considerando mais de uma caracterstica bsica na anlise territorial. Aqui o gegrafo convidado a olhar o 30
territrio como um hbrido entre o universo material e ideal, ou seja, na apreenso do territrio em suas mltiplas esferas. Conforme destaca Haesbaert [...] o territrio no deve ser visto simplesmente como objeto em sua materialidade [...] uma noo de territrio que despreze sua dimenso simblica, mesmo entre aquelas que enfatizam seu carter poltico, est fadada a compreender apenas uma parte dos complexos meandros do poder (HAESBAERT, 2001, p.118-119). Tributria do marxismo ortodoxo a concepo materialista exerceu predominncia nos estudos geogrficos. A herana antropolgica do territrio na Geografia se manifestou pela negligncia entre sociedade e natureza. De acordo com Godelier apud Haesbaert (2007, p.47) a noo de territrio para Antropologia era a de fonte de recursos identificado pelas sociedades tradicionais como um espao apropriado, onde se provinham os recursos para sobrevivncia (por exemplo: disponibilidade de animais e plantas para colheita, fertilidade dos solos e presena de gua para agricultura). A vertente materialista leva em considerao, as relaes econmicas ou de produo, que possivelmente tem sua razo original contida na forte vinculao ao espao fsico da terra. Na Geografia a materialidade do territrio foi amplamente difundida como sendo base material para as relaes de produo, como requisito importante na compreenso da organizao territorial. J o no caso da perspectiva idealista o territrio trs consigo elementos que o define como um espao apropriado simbolicamente, enfatizando a importncia de referncias invisveis, subjetivas ou ideais no processo de delimitao de fronteiras territoriais. Para enxergar os limites desse territrio, necessrio se faz decodificar os signos que residem no conjunto dos cdigos culturais. Para Haesbaert (2004, p.49) discusso idealista do territrio se consolidou no momento em que se entendeu que,
[...] o que reivindica uma sociedade ao se apropriar de um territrio o acesso, o controle e o uso, tanto das realidades visveis quanto dos poderes invisveis que as compem, e que parecem partilhar o domnio das condies de reproduo da vida dos homens tanto a deles prpria quanto a dos recursos dos quais eles dependem.
31
Para Bonnemaison e Cambrezy apud Haesbaert (2007, p.51) o territrio cultural precede o poltico, uma vez que, nas sociedades agrcolas pr-industriais e nas sociedades primitivas de caadores e coletores, o territrio se definia por um principio cultural de identificao e pertencimento. O territrio dentro da percepo idealista tem sua dimenso
representativa reforada pelo valor simblico inerente ao processo de delimitao e controle de espaos. A busca pelo entendimento do territrio enquanto valor est na incapacidade da abordagem utilitarista ou materialista do territrio em dar autonomamente, ou de forma independente, respostas s principais formas de poder do mundo contemporneo. Para Haesbaert as escalas de poderes simblicos e materiais inscritos num territrio constitudo, so indissociveis, e que a apreenso das relaes de poder no espao passa por essas duas dimenses, o territrio, portanto, construdo o jogo entre material e
imaterial, funcional e simblico. Poderamos mesmo afirmar que as concepes de territrio capazes de responder melhor pela realidade contempornea devem superar os dualismos fundamentais: tempo-espao, fixao-mobilidade, funcional e simblico (HAESBAERT, 2007, p.37).
Sendo assim Haesbaert prope uma anlise do territrio em duas perspectivas analticas no excludentes, mas complementares expressas na abordagem materialista-idealista do territrio, desta forma convidando os gegrafos a superarem a dicotomia material/ideal [...] envolvendo, ao mesmo tempo, a dimenso espacial material das relaes sociais e o conjunto de representaes sobre o espao ou o imaginrio geogrfico que no apenas move como integra ou parte indissocivel destas relaes (HAESBAERT, 2007, p.42). O estudo geogrfico da Assemblia de Deus, no est atrelado aqui a uma noo fragmentada ou isolada de territrio, ao contrrio fundamenta-se numa abordagem hbrida, a partir da qual, mltiplas escalas de poder se revelam num territrio poltico e simblico, que intimamente relacionados se complementam no campo de domnio do sagrado pentecostal no Serid.
32
2.3 PERSPECTIVA RELACIONAL: UMA TICA SOBRE O TERRITRIO DAS ASSEMBLEIA DE DEUS
A leitura dos fenmenos religiosos hodiernos, por exemplo, o crescimento do movimento pentecostal atravs de uma tessitura peculiar, demanda uma anlise territorial, que revele de forma responsvel as dimenses poltica e cultural imbudas nas estratgias de criao e gesto de territrios pela maior denominao pentecostal do Brasil, a saber: a Igreja Assembleia de Deus. Ao estudar o pentecostalismo da Assemblia de Deus como fenmeno religioso, em sua dinmica territorial, suas redes de templos, seu discurso como tambm suas reas de influncia no Serid, no podemos deixar de lado seu vis poltico e mtico (cultural), que aparecem indissociveis neste processo circunscrio espacial. Desta forma, desvendar o arranjo territorial assembleiana numa viso parcial (seja poltico, cultural, econmica) to somente, resultaria numa compreenso limitada de suas estratgias de reproduo territorial. Diante deste desafio cabe a adoo de uma abordagem terica que nos possibilite enxergar o territrio no somente em sua dimenso idealista, mas tambm materialista, e que nos direcione a uma apreenso clara da territorialidade pentecostal. A concepo relacional do territrio nos permite
transitar na via materialista e idealista do conceito, superando os limites de uma leitura unidimensional atravs de uma anlise mais precisa da apropriao e domnio espacial. O conceito de territrio na perspectiva relacional ou absoluta exprime as relaes sociais ou mais especificamente relaes de poder. O carter absoluto ou relacional tratado por Haesbaert tanto no sentido idealista de um conhecimento apriori de mundo quanto no sentido materialista mecanicista sob o qual defende o territrio como um substrato fsico acessrio ou quase nulo como palco onde se d a trama dos atores sociais. O poder em seu sentido relacional conforme discorre Haesbaert (2007) pode ser ampliado ao ponto de incluir alm as relaes de poder sociais (o poder simblico) o que nos remete a um estudo cultural dos cdigos e signos que envolvem o territrio. Sendo assim, o territrio pode ser definido, tendo como referncia perspectiva material-ideal, onde quer que ele seja projetado.
33
Ao adotarmos a perspectiva relacional do territrio foi importante considerar a percepo de que [...] ele no significa simplesmente enraizamento, estabilidade, limite e/ou fronteira (HAESBAERT, 2007, p.56). Assim sendo a abordagem relacional considera o espao demarcado em sua mobilidade, fluidez e conexes com outros territrios em suas diversas configuraes. Como concepo terica, resgatamos conceito de territorialidade em Sack apud Rozendahl (2005, p.2) definida como uma estratgia de controle sempre vinculada ao contexto social a qual se insere, sob o qual indagaremos as relaes de poder que definem tais aes estratgicas. A proposio de Sack nos ajudar a desvendar quais as relaes de poder so prioritrios neste processo de territorializao. Ademais entendemos que o controle, o ordenamento e a gesto do espao enquanto trunfos pertinentes a existncia do territrio, de modo algum restringem-se aos aspectos funcionais e burocrticos, junto a eles soma-se as intervenes de ordem cultural e portando ideolgicas, sendo estes os elementos imateriais que tambm estruturam o territrio.
2.4 GNESES DO MOVIMENTO PENTECOSTAL No que diz respeito emergncia de um territrio, sendo este, produto de um conjunto de formas materiais ou subjetivas licito dizer que tal evento surge alicerado numa superfcie preexistente de sistemas de objetos e aes, que interagem entre si, continuamente, ao longo do desenvolvimento das sociedades. neste substrato fsico que os agentes sociais projetam a dinmica dos fenmenos sociais e lhe confere heterogeneidade. A natureza dos projetos forjados neste substrato (espao) define o propsito pelo qual o mesmo ser usado ou transformado, contudo isso no significar dizer que esses processos no sofram interferncia desse campo de foras que o espao, visto aqui, em sua instncia social. A ordem espacial dos objetos e das prticas sociais de fundamental importncia quando o objetivo apreend-los, pois a mesma surge como condio bsica existncia destes. Entende-se, ento, que o espao intervm, a princpio, pelas possibilidades e obstculos que oferece a toda e qualquer relao social que busca produzir uma representao por meio de cdigos e sistemas smicos. 34
anlise
da
difuso
espacial
do
pentecostalismo
exige
uma
compreenso dos elementos imateriais contidos nos movimentos que o antecederam e que impulsionaram, inicialmente, a difuso de princpios doutrinrios com nfase na ao dos Dons do Esprito Santo (avivamento), sua difuso nos Estados Unidos (Los Angeles) no sculo XVIII e IX, e, por fim, na trajetria do movimento pentecostal no Brasil at sua chegada no Serid norte-riograndense. Para essa anlise o espao que evocamos o das representaes, que por sua vez, manifesta a dinmica do sagrado3 em forma de transmisso de crenas, convices e comportamentos adquiridos. O movimento pentecostal, tal como se apresenta hoje, tem seus fundamentos doutrinrios e exegticos derivados dos cristos do sculo 2, que pregavam a veracidade da manifestao dos sinais de maravilhas e dons prometidos nos ensinamentos contidos no evangelho de Marcos, cap.16 vs.17-18 e 1Corintios cap.12 escrito pelo apstolo Paulo. Vrios pensadores e lderes de igrejas crists se apropriaram desses ensinamentos, disseminando em suas obras e homilias eruditas. A corrente teolgica que dava nfase ao esprito proftico e a prticas miraculosas de cura crescia, e era responsvel pela crena na emergncia de um avivamento no mundo cristo, caracterizada pela densa atmosfera emocional e pelas experincias sobrenaturais dos Dons do Esprito Santo4, que deveriam ser exercitados por todos aqueles que se auto-proclamassem discpulos de Jesus Cristo. O avivamento se transformou numa demanda religiosa de lideres reformados no sculo 17, os quais acusavam o cristianismo de est inerte e preso
3
No que registra Gil Filho o sagrado uma categoria de interpretao e avaliao a priori, e como tal, somente podemos remet-la ao contexto religioso. Neste sentido a teoria do sagrado em Otto nos permite resguardar um atributo essencial para o fenmeno religioso ao tempo que o torna operacional [...] sendo assim o sagrado reserva aspectos dito racionais, ou seja, passveis de apreenso conceitual atravs de seus predicados, e aspectos dito racionais, que escapam primeira apreenso, sendo estes exclusivamente enquanto sentimento religioso (OTTO apud GIL FILHO 2001, p.2). Segundo Rosendahl (2002, p.27) o sagrado se manifesta sempre como uma realidade de ordem inteiramente diferente da realidade do cotidiano. 4 Os dons do Esprito so caracterizados a princpio como as coisas espirituais (gr.pneumatika) graas ou favores (charismata) e demonstraes ou manifestaes (phanerseis). O apstolo Paulo analisa os Dons Espirituais no mbito da unidade e pluralidade que os envolvem, concluindo de imediato que essas manifestaes proporcionam edificao e santificao ao corpo de membros de uma igreja (1Co 12.7-11). De acordo com o texto do captulo 12 da primeira carta do apstolo Paulo aos Corntios os dons so especificados como: dom da palavra de sabedoria, conhecimento, da f, curas, operaes de milagres, profecia, discernimento de Espritos, variedades de lnguas, interpretao de lnguas e dons ministeriais (apstolos, profetas, Evangelistas, Doutores ou mestres), (ARAJO, 2007, p. 268-269).
35
suas ritualidades e doutrinas pouco eficientes, necessitando urgentemente de uma nova dinmica. Nesse perodo, tambm possvel verificar os recintos embrionrios que revelam ancestralidade do pentecostalismo contemporneo. O avivamento, como um dos atributos do sagrado, definido por Arajo (2007, p.109),
Obra de Deus pelo seu Esprito por meio da Palavra, levando os espiritualmente mortos a viverem a f de Cristo e renovando a vida interior de crentes negligentes e sonolentos (...) avivamento, desta forma, anima e reanima igrejas e crentes a causarem um impacto espiritual e moral nas comunidades (...) o avivamento implica numa restaurao inicial, seguida pela manuteno do renascimento por tanto tempo quanto a visitao durar (...) um despertamento em dirigido por um movimento do Esprito Santo trazendo a essncia do cristianismo do Novo Testamento igreja de Cristo e aos seus relacionamentos com a comunidade.
Refletir sobre o espao e/ou territrio, sob o ponto de vista do avivamento, remete a noo de hierofania apresentada por Eliade (2002, p.25) este termo no implica qualquer preciso suplementar: exprime apenas o que est implicado no seu contedo epistemolgico, a saber, que algo de sagrado se nos mostra. O avivamento seria ento uma hierofania, ou seja, uma realidade sagrada manifesta num espao formado por um sistema religioso, simblico, carregado de valores e significados. O espao do avivamento produto primeiramente das concepes teolgicas de lideres reformados. A teologia do protestantismo de esprito testemunhava a necessidade de execuo dos Dons do Esprito, cujo objetivo era trazer um despertamento que impulsionasse o evangelismo, o ensino e a ao social dos protestantes. Para isso, acreditavam que a efuso especial do Esprito Santo seria a primeira evidncia do avivamento e que esse contato transcendental traria uma nova dinmica ao protestantismo, aproximando-o em essncia do cristianismo primitivo. O espao avivado um lugar ocupado por agentes que transcende sua concretude a um universo simblico e sobrenatural, constitudo pela prtica da glossolalia5 (falar em lnguas), curas, milagres, danas espirituais e xtase em
5
O fenmeno da glossolalia vem do grego "glssa" [lngua]; "lal" falar, essa experincia sobrenatural consiste numa expresso vocal inspirada segundo os telogos pentecostais, pelo Esprito Santo em forma de efuso, mediante a qual o crente fala numa lngua (Gr. glossa) que
36
oraes fervorosas. Essas hierofanias correspondem aos elementos imateriais que formam e do significado ao espao avivado. Trata-se de um espao apropriado simblico-expressivamente, onde essa apropriao est alicerada no valor de uso, como descreve Seabra apud Cruz (2007, p.106), uso concreto do tempo, do espao, do corpo que da concretude, e abriga as dimenses da existncia e os sentidos da vida. o espao das vivncias em sua dimenso mstica ou transcendental, o qual pode ser traduzido como sendo o espao vivido, que carrega consigo um espectro de valores, forte sentimento de pertena e que por fim abriga qualitativamente o sagrado. Proeminentes cristos como Eusbio de Cesaria (260-340), Agostinho (354-430), Gregrio o Grande (540-604) anunciavam esses dons de forma ainda tmida. Mas aps a Reforma Protestante no sculo 16, os movimentos avivalistas tomaram impulso na Europa. Para os primeiros avivalistas, o espao era transmutado de uma realidade imediata para outra sobrenatural onde a ao do Esprito Santo prevalecia no exerccio dos dons de profecia, vises, revelaes e xtase espiritual. Todos esses fenmenos correspondem realidade sagrada manifesta pelo avivamento. Na assertiva de Eliade (2002, p.35), a crena numa determinada hierofania (realidade sagrada), resulta na seletividade espacial, onde a experincia do sagrado produz no religioso a convico de uma realidade absoluta de um ponto fixo,
Para o homem religioso, o espao no homogneo: o espao apresenta roturas, quebras. H pores do espao qualitativamente diferentes das outras(...) No te aproximes daqui, disse o Senhor a Moiss, descala as sandlias; porque o lugar onde te encontras uma terra sagrada (xodo,III, 5)(...) H, portanto, um espao sagrado, e por conseqncia forte, significativo e h outros no sagrados, e por conseqncia sem estrutura nem consistncia, em suma: amorfos(...) Mas ainda: para o homem religioso esta no-homogeneidade espacial traduz-se pela experincia de uma oposio entre o espao sagrado nico que real, que existe realmente e tudo, a extenso informe que o cerca.
A viso heterognea do espao para o homem religioso, em funo do ambiente o qual acredita ser exclusamente sagrado, torna-se seu principal critrio
nunca aprendeu(...) Essas lnguas podem ser humanas, i.e., atualmente faladas Atos dos Apstolos cap 2.v 6, ou desconhecidas da terra cf. 1 Co 13.1, (ARAJO 2007, p. 429).
37
de seletividade espacial e responde, assim, pelo no reconhecimento de outros espaos qualitativamente sagrados. A formao de espaos de avivamento, tal como qualquer outro recinto de prtica religiosa, a resultado da crena irredutvel de que somente sua realidade sagrada responde pelos mistrios da criao do cosmos, do homem, da natureza e da existncia da vida. Essa tambm uma das concepes destacadas por Eliade (2002, p. 37) a descoberta ou a projeo de um ponto fixo o Centro- equivale criao do Mundo. Ao pensar a natureza da exclusividade religiosa, Eliade nos possibilita identificar como ponto fixo do pentecostalismo, eixo central de toda a orientao futura: o avivamento; sendo este a mxima do valor cosmolgico, da orientao do ritual, da construo de espaos avivados e da verso primeira do pentecostalismo.
2.4.1 Ascenso do mundo avivalstico No que notifica Arajo (2007, p.109), os historiadores identificam seis ondas de avivamento ou despertamentos, aps a grande reforma iniciada por Martinho Lutero em 31 de outubro de 1517, continuando at o ltimo grande avivamento no sculo 20 e que prossegue ainda nos dias hodiernos. O primeiro grande avivamento foi registrado na Amrica do Norte, a partir de 1727 com Theodore J. Frelinghuysen (1691-1747), Gilbert Tenent (1703-1764), Jonathan Edwards (1703-1758), George Whitefield (1714-1770) e John Wesley (1703-1791). O segundo se deu por volta de 1800. Enquanto o segundo se restringiu aos lideres presbiterianos e congregacionistas, o avivamento do sculo 19 atingiu inmeras denominaes americanas, mais especialmente os batistas e metodistas, que se expandiram rapidamente tornando-se os maiores dentre os protestantes na Amrica do Norte. Neste segundo despertamento destaca-se o telogo Charles G. Finney (1792-1875), o qual acreditava que o avivamento era produto de tcnicas que incluam apelos insistentes e carregados de emoo, aconselhamento pessoal dos decididos e sries prolongadas de reunies evangelsticas. As conseqncias do segundo avivamento das igrejas norte americanas e europias repercutiu na introduo de novas estratgias evangelsticas como a criao de sociedades bblicas, de misses, das escolas dominicais e em vrias reformas sociais como abolio do comrcio de escravos, 38
prises reformadas e inmeras instituies de benevolncia abertas (ARAJO 2007, p.109). O terceiro veio com o renascimento em 1830, que influenciou a Amrica do Norte e vrios pases, principalmente a ndia e o Ceilo. Esse avivamento tem sua explicao no anti denominacionalismo difundido pelos Plymouth Brethren, na pessoa de seu lder John Nelson Darby no qual em seus sermes declarava a necessidade urgente de humildade e santidade em toda hierarquia clerical. Posteriormente a este, surgiu o grande despertamento iniciado em 1857 no Canad, alcanando maior visibilidade na Amrica do Norte e Austrlia. Os nomes de destaque dessa poca so Dwight L. Moody, Ira D. Sankey, William e Catherine Booth (fundadores do exrcito da salvao), Charles Spurgeon, James Caughey, Hudson Taylor que deu incio China Inland Mission (Misso para o Interior da China), e Bernado que fundou os famosos orfanatos. De igual modo destacam-se como fatos importantes nesse terceiro avivamento, as conferncias de Keswick que deram incio ao Movimento de Santidade na Gr-Bretanha, ensinando os cristos a se portarem submetidos a um estilo de vida pautado na santidade, unidade e orao. Outro avivamento foi iniciado em (1880-1903) com o nome de Novo Renascimento onde houve grande difuso evangelstica. Em alguns momentos era considerado como o ressurgimento das ondas de despertamentos anteriores. Os agentes de despertamento foram Sam Jones, J.Wilber Chapmam e Billy Sunday, na Amrica do Norte, Andrew Murray, na frica do Sul, e John McNeil, na Austrlia. Por fim, considerado pelos telogos pentecostais como o ltimo dos grandes despertamentos, o avivamento pentecostal foi caracterizado pelo desencadeamento de uma onda de avivamentos em vrios pases, sobretudo nos Estados Unidos em 1900, que mais tarde, se tornaria num dos maiores fenmenos religiosos da contemporaneidade. O termo pentecostal, segundo Emlio Conde apud Arajo (2008, p.553), foi usado a partir de 1907 na Gr-Bretanh, pelas igrejas histricas tradicionais (anglicanas, episcopais, metodistas, evanglicas) para se referir aos crentes que criam e recebiam o batismo no Esprito Santo. A analogia entre os crentes que
39
crem no batismo no Esprito Santo6 (falar em lnguas) e a festa no Dia de Pentecostes7 ocorre em funo das manifestaes de poder por meio dos dons do Esprito Santo. Na assertiva de Souza (2004, p.16) a relao do pentecostalismo enquanto movimento a citada festa indireta e acidental. Em sua anlise, o autor declara que a doutrina pentecostal est diretamente ligada descida do Esprito Santo e no a festa de pentecostes, como relatada no livro bblico de Atos dos Apstolos. Ele conclui que o pentecostalismo no faz aluso festa cosmopolita judaica (o sentido legtimo do termo), mas as manifestaes dos carismas do Esprito, prometido e enviados aos cristos primitivos, coincidentemente ocorridas no dia de pentecostes. Os avivamentos pentecostais esto ligados ao Movimento de Santidade surgido no sculo 19. Este movimento avivalstico eclodiu na Europa e principalmente nos Estados Unidos, motivado por um profundo desejo de uma determinada classe de protestantes, de vivenciar as hierofanias do Esprito Santo. Nesse avivamento destacava-se a prtica o falar em lnguas, que aos poucos se tornava a marca distintiva do pentecostalismo em meio diversidade religiosa. Nos Estados Unidos, os avivamentos pentecostais foram mais dinmicos e tiveram maior difuso espacial que na Europa. A teologia e rituais remanescentes dos Quacres (Tremedores) de Massachusetts, o Pietismo Europeu8 de Philipp Jakob Spener, surgido na Alemanha no sculo 17, o Movimento Keswick de Smith e Boardmam como tambm o Wesleyanismo,
6
Conhecido popularmente como Batismo com Esprito Santo, a glossolalia vem do grego "glssa" [lngua]; "lal" falar, um fenmeno onde o indivduo cr expressar-se em uma lngua por ele desconhecida (ANDRADE 1998, p.23). Festa cosmopolita descrita no cap. 2 do livro de Atos dos Apstolos foram vistas por eles lnguas repartidas, como que de fogo (...) e todos foram cheios do Esprito Santo, e comearam a falar noutras lnguas (...). O pentecostes comemorado pelos judeus na colheta no ms Siv (junho). No registro do evangelista Lucas vrias pessoas presenciam e outras recebem o fenmeno da efuso do Esprito Santo. O pietismo teve como seu formulador Philipp Jakob Spener (1635-1705), com sua obra Pia Desideria(1675), apoiado por August Hermam Francke (1663-1727), Johann Albrecht Bengel (1687-1752) e Gottfried Arnold (1660-1714). Principais caractersticas do pietismo so: 1) afirmam a possibilidade de uma experincia pessoal com Deus (...); 2) a insistncia em que a experincia com Deus tem implicao direta quanto maneira pela qual o crente pode viver (santificao); 3) os requisitos de uma comunidade que sempre compreenda a si mesma com uma postura contra o contexto social maior; 4) cronologicamente, a designao da confluncia particular dessas preocupaes como posterior ao desenvolvimento da ortodoxia confessional e anterior Iluminismo; 5) uso exclusivo do termo para grupos protestantes, embora idias e nfase comuns sejam encontradas entre cristos ortodoxos e catlicos romanos (ARAJO 2007, p.586).
40
influenciaram alguns dos pensamentos que norteavam os avivalistas americanos, principalmente, no que diz respeito ao falar em lnguas e cultos voltados para o emocionalismo. Mediante a adeso das correntes teolgicas pietista e wesleyana vrios grupos ligados ao Protestantismo por sua vez, de Esprito desenvolveram outros grandes
movimentos
que,
desencadearam
submovimentos
caracterizados por Souza (2004, p.18) como movimentos do tipo reavival (reavivalistas) e holiness (santificador). Os movimentos pentecostais norte-
americanos do sculo 19 foram antecedidos pelo de origem wesleyana, denominado Holiness Movement (Movimento de Santidade) de 1860, considerado o movimento inspirador dos demais movimentos pentecostais. Em essncia, esse buscava a reforma das instituies metodista e adequ-las s prticas dos evangelistas dos acampamentos avivalistas. A partir de ento, diversos movimentos avivalisticos subseqentes deram mpeto a mensagem da santidade como Avivamento de Shilon (Maine) 1893, As Torres de Orao Sandford (Maine) 1880, Os Albergues da F e Cura Divina (Nova Iorque) 1882, entre outros. Na batalha pelo estabelecimento de um espao de santidade legtimo nas igrejas metodistas surge o Apostolic Faith Movement (Movimento da F Apostlica), idealizado por Charles F. Parham (1873-1929), fundador da Betel Bible School (Escola Bblica Betel). Como dirigente da escola teolgica Parham formulou um sistema de ensino regrado pelo estudo interpretativo da Bblia luz da sua prpria exegese. No final do ano de 1900, sua hermenutica levou seus alunos a darem especial ateno ao fenmeno descrito no livro de Atos dos Apstolos cap.2. A partir da concluiu que o falar em lnguas seria a evidncia bblica do batismo no Esprito Santo (ARAJO 2008, p.599). O Movimento da f Apostlica de Parham conseguiu crescer sob a bandeira de seu ministrio de cura em cidades prximas a Kansas, Missouri e Oklahoma. J no Texas em 1905, Parham conhece, em Houston, o jovem advogado por nome de Warren Fay Carothers que tambm se sobressaia como veemente pregador metodista. Juntos, no fim do citado ano fundaram uma Escola Bblica que se tornou recinto de aprendizagem de personalidades do movimento pentecostal como William Seymour, que mais tarde viria atender (contra a vontade de Parham) a um convite para pregar em Los Angeles. Durante seu exerccio ministerial acusaes sobre sodomia pesam sobre Parham, 41
ocasionando o desligamento de alguns de seus seguidores. Em conseqncia desse fato as misses de f apostlica no Mdio-Oeste nos E.U.A, perderam fora e os dissidentes de Parham substituram o termo Apostolic Faith por Pentecostal, por acharem mais conveniente em funo do oprbrio gerado pelo primeiro. No que expe Arajo (2007, p.600), o Movimento de F Apostlico pode ser considerado como o antigo sinnimo para o Movimento Pentecostal. A expresso Movimento Pentecostal se tornou mais usual e se remetia aos participantes de diversos ministrios avivalistas que comearam a trabalhar com autonomia. O pentecostalismo enquanto terminologia dada ao movimento avivalista iniciado por Parham, nasce em 1901, na cidade de Topeka (Kansas). Neste evento foram notificadas impetuosas manifestaes de glossolalia na Escola Bblica Betel, sendo considerado como o marco dos princpios teolgicos do pentecostalismo. A Escola Bblica Betel ensinava que, o falar em lnguas seria a evidncia primeira do batismo no Esprito Santo (ARAJO, 2007, p.600). Aps este evento, sucessivos avivamentos foram registrados como, Avivamento de Galena, em 1903 no Kansas, Avivamento de Houston em 1903-04 no Texas, Avivamento de Baxter Springs,em 1906 no Kansas, Avivamento da Rua Bonnie Brae, de 1906 em Los Angeles e o Avivamento da Rua Azuza de 1906 tambm em Los Angeles. Em razo da expanso e impactos causados por este ltimo, mdia e a sociedade em Los Angeles, nos deteremos em descrever especificamente o contexto e os efeitos deste avivamento que marcou o pentecostalismo mundial. 2.4.2 Azuza Street 312: a irradiao do pentecostalismo para o mundo Azuza Street 312, Los Angeles (Califrnia), foi o endereo de um dos maiores espaos de avivamentos decorrente da Misso de F Apostlica, idealizado por Charles F. Parham. O avivamento da Rua Azuza foi, de fato, uma extenso das reunies avivalistas iniciadas na Bonnie Brae Street 214, na casa de Richard e Ruth Asberry, fruto tambm do Movimento da F Apostlica iniciado em Los Angeles. Durante o inverno e o incio da primavera foram estabelecidas em 14 de abril de 1806, as reunies avivalistas numa antiga igreja episcopal metodista afro-americana em Stevens AME Church, nome do prdio que 42
hospedou a Misso da Rua Azuza. Para compreender a singularidade do avivamento na Rua Azuza indispensvel anlise do contexto religioso em Los Angeles, que motivou a difuso de vrios outros espaos de avivamento sob a hierofania do batismo no Esprito Santo. A princpio reconhecemos que o caminho para a proliferao de espaos de avivamento em Los Angeles foi preparado pelas correntes teolgicas norteadas pelo restauracionismo que invadiu vrios movimentos avivalistas. O restauracionismo convidava os cristos a voltarem a operar os mesmos sinais de maravilhas que os apstolos do Novo Testamento, ou seja, era um desejo ao retorno dos tempos de glria das manifestaes miraculosas descritas no perodo neotestamentrio. Surgiram tambm os avivamentos de fronteira termo
empregado para designar as reunies feitas ao ar livre, nos quais se via o dirigente assentar-se numa cadeira em frente congregao, cultos ao ar livre em lugares arborizados e debaixo de estruturas feitas de pequenos galhos e ramos e rvores, caracterizados tambm pelas reunies demoradas e permanentes, apelos a no-crentes aps a mensagem para aceitarem a Jesus (ARAJO, 2007, p.603). O Movimento da Santidade, aos poucos, invadia os plpitos de igrejas tradicionais. Os sermes de pastores tradicionais como Joseph Smale da First Baptist Church (Primeira Igreja Batista) de Los Angeles, permeados de princpios sutilmente deferidos sobre a Segunda Obra, ensino do Movimento de Santidade, comearam a incomodar a ala conservadora da igreja. Essa postura lhe custou oposies e mais tarde seu desligamento da Primeira Igreja Batista. Essa se tornou a conseqncia comum de todos os pastores e membros de igrejas que reconheceram os princpios pentecostais. As doutrinas da Santidade contriburam na fertilizao do campo religioso de Los Angeles, trazendo uma compreenso sobre o poder que havia na redeno de Cristo; uma fez consumada era suficiente para em uma dupla maldio derramar dupla cura, impulsionando, nas liturgias das igrejas, a prtica da cura divina. Por fim os eventos profticos introduzidos no contexto norteamericano por meio das inmeras conferncias de profecia bblicas e pelo uso da bblia de estudo, conhecida com a Scofield Reference Bible, que trazia notas de rodap de John Nelson Dardy, responsvel pelos antigos eventos profticos na Gr-Bretanha. 43
J com o quadro religioso envolvido pelo restauracionismo sob a roupagem dos movimentos profticos e cura divina, comearam a circular, em Los Angeles entre 1904 e 1905, notcias do avivamento nos pases de Gales e GrBretanha, decorrentes do trabalho desenvolvido pelo jovem evangelista Evan Roberts. O fenmeno religioso de Gales objeto de anlise da obra de Shaw, intitulada de The Great Revival in Wales (O grande avivamento no pas de Gales), que conseguiu a marca de uma das obras crists mais lidas na cidade de Los Angeles, entusiasmando igrejas a buscar o avivamento (ARAJO, 2008, p.604). Nesse perodo caracterizado por profundas cises, o avivamento atinge na primavera de 1905, a Segunda Igreja Batista de Los Angeles. Nesta, Jlia W. Hutchis e vrias famlias, aps adotarem a segunda obra foram excludas da membresia e fundaram, numa pequena loja nas avenidas Ninth e Santa F, uma Misso (lugar de reunies que davam continuidade a mensagem avivalstica), onde puderam ensinar a doutrina da santidade livremente. A procura destes por um mentor espiritual que liderasse o ensino da santidade resultou no convite ao pastor pentecostal William Joseph Seymour de Houston. O referido pastor iniciou as reunies introduzindo em seus sermes, a veracidade do Falar em Lnguas (lnguas estrangeiras no estudadas), herana do seu aprendizado na Betel Bible School, o qual julgava ser essa a evidncia primeira do batismo no Esprito Santo. Ao discordar da teologia anunciada por Seymour, Jlia W. Hutchis manifesta sua oposio ao princpio da evidncia apontado em seu sermo, o que resultou no prematuro desligamento de Seymour da Misso em Santa F. Aps o desligamento, um adepto da teologia de Parham, por nome de Edwards S. Lee convidou Seymour para morar, em sua residncia, por algum tempo. Mas tarde, Seymor tambm recebe o convite dos Asberry, em Bonnie Brae Street. Antes de sair para a temporada na casa dos Asberry, na segunda feira do dia 9 de abril de 1906, Seymour ouviu o relato de Lee, o qual testificava a viso que teve, na qual os apstolos o ensinaram como falar em lnguas. Aps o testemunho, Seymour props uma orao e, em instantes, Lee falou em Lnguas (ARAJO 2008, p. 605). A experincia foi notificada por Seymour na congregao em Bonnie Brae, quando simultaneamente Jennie Evans Moore e outros membros vivenciaram a experincia do falar em lnguas. Um ano aps a abertura dos trabalhos na Azuza Street, as multides no cessavam de visitar esse grande avivamento. A mdia secular como O Los 44
Angeles Times enviou um reporte para observar in loco esse indito fenmeno religioso. As reunies, segundo Arajo (2008, p.605), eram descritas da seguinte forma:
os cultos eram longos e de forma geral espontneos (...) a msica era capela, embora um ou dois instrumentos fossem tocados (...) incluam cnticos, testemunhos dados por visitantes ou lidos daqueles eu escreviam para misso, orao, momento de apelo para pessoas aceitarem a Cristo, apelo santificao ou ao batismo no Esprito Santo (...) sermes normalmente no eram preparados antecipadamente e eram tipicamente espontneos(...) orao pelos enfermos eram tambm freqentes nos cultos.
Aos poucos, a liturgia espontnea de Seymour foi conquistando dezenas de religiosos despertando, novamente, a ateno do Los Angeles Times, quando um de seus reprteres visitou a misso, em 17 de abril de 1906 e destacou numa de suas manchetes, que a multido participante as reunies era composta, em sua maioria, por negros e um pouquinho de brancos. Este crescimento tornou-se ainda mais significativo e diversificado devido expanso demogrfica, registrada entre 1880 e 1910 na cidade de Los Angeles. O crescimento populacional nesse perodo em Los Angeles sulperou o ndice de todas as cidades americanas. Entre a populao nativa da cidade, estavam inclusos mexicanos, japoneses e europeus estavam inclusos. No ano de 1910, 75% da populao era constituda de pessoas provenientes de imigrantes ou filhos de imigrantes, em relao aos de origem americana (ARAJO, 2008, p.605). O contexto cosmopolita das reunies na Azuza Street se tornou um fato significativo na difuso espacial e teolgica de seu avivamento. A diversidade tnica presente nesse avivamento, mais tarde se tornaria a razo pela a qual o pentecostalismo da Rua Azuza chegaria a outras naes. A fim de legitimar a ligao de sua obra com a de Charles Parham, Seymour escreve para a secretaria de Parham descrevendo a grandiosidade da Misso Azuza e solicitou a credencial de ministro prometida tempos atrs. Em setembro de 1906 o peridico da Azuza publicou o desejo de Parham de conhecer a Misso de Azuza. A esperada visita foi realizada em outubro do decorrente ano, porm a avaliao de Parham quanto teologia empregada na 45
Misso Azuza foi negativa. Ao analisar os artigos de f que regiam o trabalho de Seymor, Parham ignorou terminantemente o avivamento em Azuza Street. Diante dessa divergncia, os dois avivalistas perderam afinidade eclesistica, mas no doutrinria. A Misso Azuza ganha autonomia em relao ao Movimento da F Apostlico, mas continuou a ter xito notrio. Um fato considervel da Misso Azuza era a rotatividade de seus visitantes. Entre 1906 e 1908 um fluxo contnuo de novos simpatizantes acrescentou seu ambiente multicultural, sendo uma clientela inconstante e passageira. O objetivo desses que iam conhecer o ministrio de Seymour variava entre a curiosidade e a esperana de vivenciar algo novo que pudesse compartilhar como outras pessoas um novo ensino, uma nova liturgia, um modelo de postura crist que pudesse acrescentar virtudes a seus ministrios. A Misso Azuza se tornou, ento, um ponto de convergncia e irradiao de pentecostais. Decididos a difundir esse espao de avivamento em outros pases, diversos evangelistas saram dos E.U.A para a realizao desse objetivo entre os quais se destacaram Gaston B. Cashwell e Frank Bartleman, e entre os pastores, Elmer Fisher, William Pendleton, William H. Durham e Joseph Smale, esses foram os primeiros arautos do pentecostalismo da Misso Azuza em outras culturas. A influncia teolgica, doutrinria e litrgica da Misso Azuza nas nascentes igrejas pentecostais de Los Angeles, em 1912, foi direta e efetiva. A repercusso do trabalho de Seymour, em mbito nacional, se deu indiretamente pela continuidade do avivamento da Rua Azuza por meio das novas igrejas pentecostais, continuidade essa que marcou o primeiro processo de pentecostalizao9 das igrejas americanas. As frentes pentecostais norteamericanas, nas primeiras dcadas do sculo 20, cresceram no sentido Sul Mdio-Oeste e prevaleceram entre a populao economicamente menos favorecida. Segundo Souza (2004, p.18), a ecloso do movimento pentecostal nos Estados Unidos, de onde se disseminou para o mundo, deu-se entre a populao negra; em praticamente todos os lugares, iniciaram suas comunidades
Processo pelo qual uma igreja com sistema doutrinrio tradicional sofre ao aderir sutilmente aos usos e costumes tpicos do pentecostalismo seja no louvor, na liturgia ou na prtica da homiltica.
46
eclesisticas entre as populaes de baixa renda. Observa-se que o segmento em que o pentecostalismo americano obteve mais xito constitua-se de norteamericanos, em sua maioria, pobres vivendo em condies mnimas de renda. importante lembrar que nesse perodo ainda era vigente a segregao racial entre brancos e negros, o que justificava a existncia de igrejas majoritariamente negras, como hoje em dia comum nos Estados Unidos. A projeo internacional do movimento da Rua Azuza veio com os primeiros missionrios pentecostais que se dispuseram a fazer misses transculturais levando a mensagem pentecostal aos continentes asitico, africano e Amrica do Sul. Saram diretamente da Rua Azuza para a China (sia oriental) os missionrios: Thomas Junk, bem como Bernt e Magna Bernsten; Ryan liderou um grupo de Jovens na misso das Filipinas (sia meridional), no Japo (sia oriental) e na cidade chinesa de Hong Kong; na frica do Sul (frica meridional) a misso ficou a cargo de Tom Hezmalhalch e John G. Lake; as misses no Egito (frica do Norte), pas de maioria islmica, foram desenvolvidas pelo o Pastor Post, que fixou-se como missionrio permanente e expandiu o pentecostalismo. Diante dessa dinmica missionria, o pentecostalismo comeou a entrar na corrida por novos adeptos junto ao protestantismo de converso. Os agentes do movimento pentecostal buscaram sempre uma reproduo contnua desses espaos de avivamento, dogmatizando modelos de comportamento, formando opinies, organizando estratgias evangelsticas e lanando, ante o pluralismo religioso, as bases de sua territorialidade religiosa.
O Pentecostalismo introduzido no Brasil nas primeiras dcadas do sculo XX. Em 1910 foi fundada no Paran e em So Paulo, a primeira igreja pentecostal em terras brasileiras, a Congregao Crist do Brasil. No mesmo ano dois missionrios suecos, o Pastor batista Gunnar Vingren e o metalrgico Daniel Berg, chegaram dos Estados Unidos trazendo a mensagem pentecostal, produto de suas experincias no espao avivado da North Avenue Mission de Chicago. Os dois missionrios, at ento batistas avivados, chegaram a Belm do Par e, em 1911, fundaram a Igreja Misso de F Apostlica, que em 2 de maio de 1914 47
veio se chamar Assemblia de Deus. Esta nova denominao, legitimada no Brasil, foi ligada ao Conclio Geral das Igrejas Pentecostais Americanas, por influncia do Reverendo Gunnar Vingren. A Assemblia de Deus responsvel pela disseminao do
pentecostalismo em territrio brasileiro, ampliando em todos os Estados o movimento pentecostal. De acordo com Cabral (1998, p.67-8), a Assemblia de Deus no Sudeste do pas foi fundada em 1924, pelo pastor Gunnar Vingren, que instituiu oficialmente a Assemblia de Deus no Rio de Janeiro. Segundo Vasconcelos (1983, p. 37), a Assemblia de Deus chega regio metropolitana de So Paulo em novembro de 1927, atravs do Pastor Daniel Berg, sendo este o pioneiro na evangelizao pentecostal na capital paulista. As Assembleia de Deus, juntamente com a Congregao Crist do Brasil, formam a ala clssica do pentecostalismo. O termo clssico segundo Arajo (2007, p.568) restringe-se idia de antiguidade ou pioneirismo, em funo do surgimento das novas igrejas pentecostais (neopentecostalismo), que possuem caractersticas teolgicas liberais e doutrinariamente menos exigentes. O pentecostalismo no Brasil tem se mostrado no decorrer de sua evoluo como um movimento mutante, tendo em vista a sucesso de submovimentos nascidos no seu interior como: Movimento Unicista (1914), Movimento da Cura Divina (1946), Movimento Proftico (1984), Movimento de Restaurao Apostlica (2000), entre outros. Estes expressam as tentativas de diversificao e resignificao do movimento durante suas primeiras dcadas de existncias at os tempos hodiernos. O pentecostalismo um fenmeno religioso essencialmente urbano que com suas estratgias de difuso territorial, busca acompanhar as intensas transformaes sociais decorrentes dos elementos modernos da cultura de massa. O crescimento pentecostal no Brasil foi constatado pelo IBGE, no recenseamento de filiao religiosa de 2000, que revelou um contingente de 17,4 milhes de pentecostais10 praticantes, nmero este que colocou o Brasil no
10
O crescimento pentecostal evidenciado pela projeo poltica de seus lderes. Segundo Cesar (1999, p.24) os 15 milhes de evanglicos votantes no Brasil elegeram em 1996 para o Congresso Nacional 32 deputados, dos quais 18 eram de procedncia pentecostal.
48
patamar de segundo maior pas protestante do mundo, atrs apenas dos Estados Unidos. O espao se apresenta, em suas dimenses fsicas e culturais, como interventor dos processos de transmisso socioreligiosa. Desta forma a grande mobilidade do pentecostalismo nas regies brasileiras demandou a adeso e emprstimos de elementos da cultura local, isso se deu quando o movimento se estabeleceu em espaos estranhos ao de sua origem. Esse fato esclarecido por trs razes principais: a primeira que quando uma denominao amplia sua religiosidade e se transporta para uma sociedade diferente da sua, gera a necessidade de compatibilidade cultural; a segunda que para haver uma adaptao sociocultural dessa religio, principalmente em ambientes secularizados, necessrio que haja uma superao de vcuos culturais devido o fato de todo qualquer segmento religioso apresentar um corpo inacabado de doutrinas, usos e costumes; terceira que essa adaptao scio-cultural s obtm xito quando h uma abertura para a insero de elementos exgenos a ela. No processo de expanso em territrio brasileiro, o pentecostalismo em seu vis clssico ou ortodoxo permaneceu inflexvel a uma abertura cultural, implicando na marginalizao socioespacial do movimento. O pentecostalismo conservador, desde sua gnese at os dias atuais, tenta relutantemente ser imune ao devastador processo de aculturao religiosa, distintivo inequvoco de sua doutrina, usos e costumes. Tal conservadorismo relegou a expanso do movimento s camadas economicamente menos favorecidas e, conseqentemente, aos espaos perifricos das grandes cidades e metrpoles. Esse fato que caracteriza a gnese do crescimento pentecostal nas cidades brasileiras analisado por David Cabral, que destaca o crescimento vertiginoso do pentecostalismo, na dcada de 1920, nos subrbios das regies metropolitanas do Brasil como Realengo, Bangu e Madureira no Rio de Janeiro. O autor ressalta o significativo crescimento do movimento no bairro de Madureira, em funo do intenso trabalho evangelstico realizado por Paulo Leivas Macalo, um dos pioneiros do pentecostalismo no Brasil e membro fundador das Assembleia de Deus (CABRAL, 1998, p.71).
49
2.5.1 Estruturas da territorialidade do Pentecostalismo Clssico no Brasil Sediando os dois principais Ministrios11 Pentecostais do Brasil, o Rio de Janeiro vivenciou o avano do pentecostalismo clssico em sua rea Metropolitana, nos primeiros anos da dcada de 1990. De acordo com o estudo de caso de Mnica Machado (1993, p.8), sobre a territorialidade pentecostal em Niteri RJ h uma caracterstica peculiar do crescimento pentecostal, a autora constata que as condies scio-econmicas e espaciais onde o pentecostalismo clssico se expandiu, lhe conferiu um carter perifrico. Considerado como religio dos pobres12, o pentecostalismo clssico cresce significadamente em espaos onde h maior vulnerabilidade social, realidade atestada pela declarao do pastor assembleiano Ricardo Gondim em relao ao proselitismo do Pentecostalismo Clssico: Os maiores avanos da igreja no Brasil esto ocorrendo entre os pobres, entre os mais alienados, social e culturalmente (Ricardo Godim apud Shaull, 1999, p.162). Providos de um discurso teologicamente simplificado, de pastores com orientao laica e bens msticos, dentre eles o mais importante: O Batismo no Esprito Santo, o Pentecostalismo Clssico conseguiu adentrar com sucesso nos espaos de excluso, compreendido como zonas onde h a expresso mxima das diferenas sociais, econmicas e culturais. Os pentecostais, com sua habilidade emprica de evangelizar, conseguem dar uma resposta imediata necessariamente de ordem mstica, ao sofrimento cotidiano de seus proslitos, trabalhando na valorizao das relaes pessoais gerando um aumento da autoestima de seus membros, alm da ajuda mtua com o estabelecimento de laos de confiana e fidelidade. (ALMEIDA, 2004, p.21)
11
A Assemblia de Deus a maior igreja evanglica de cunho pentecostal do Brasil e da Amrica Latina. Sua estrutura poltico administrativa dividida em duas grandes Convenes Nacionais: CGADB E CONAMAD, a primeira formada por um conjunto de Ministrio So Cristovam e a segunda administrada pelo Ministrio de Madureira respectivamente (ARAJO, 2007, p.152). 12 O pentecostalismo clssico assim adjetivado entre os cientistas sociais, por atuar majoritariamente em zonas onde h extrema pobreza. No que ressalta Csar (1999, p.29) uma das mais importantes questes levantadas sobre o movimento pentecostal, refere-se ao seu crescimento principalmente entre as classes menos favorecidas da sociedade.
50
Inseridos nos espaos menos favorecidos das grandes e pequenas cidades brasileiras, que se caracteriza pela extrema precariedade social, o pentecostalismo clssico encontrou antagonicamente um ambiente propcio a difuso da f pentecostal. Nestes espaos deferido um discurso emocional de consolo, dando a essa parcela pobre da populao urbana a oportunidade de no mais se sentir excludos, mas inclusos numa importante misso: alcanar almas perdidas; imperativo indissocivel do discurso pentecostal, essa se torna uma estratgia altamente eficaz no desenvolvimento da territorialidade do
pentecostalismo clssico, cujo o objetivo principal conquistar novos adeptos e assim aumentar seu raio de influncia demarcando seus territrios. Considerando que o Brasil um pas composto por uma populao majoritariamente pobre, e que o alcance desses, por qualquer religio significa uma posio hegemnica ante o pluralismo religioso, o crescimento contnuo do pentecostalismo se tornou, previsivelmente, uma ameaa para algumas religies tradicionais, como o catolicismo e os protestantes histricos. Falar em territrio seria falar, implicitamente, noo de limite que, mesmo no sendo traado, como em geral ocorre, exprime a relao de poder que um grupo mantm com uma poro do espao. Neste sentido o quadro religioso no Brasil revela uma competio, onde o crescimento de um, torna-se um sinal da perca ou recuo do poder do outro. Na dcada de 1990 j era possvel notar a hegemonia pentecostal no cenrio protestante. Em 1996, o nmero de pentecostais j somava entre 15 e 20 milhes, ou seja, 10% a 15% da populao brasileira, enquanto que as igrejas histricas contavam com cerca de 2% da populao (CESAR, 1999, p.23). Os mecanismos de difuso scioespacial do pentecostalismo clssico so os grandes responsveis pela veracidade dos nmeros supracitados e respondem pelo incessante crescimento e dinamismo do fenmeno nas camadas mais baixas da sociedade. A territorialidade desenvolvida pelos pentecostais caracterizada pela autonomia que cada lder eclesistico, juntamente com seus obreiros tem apesar de subordinados a uma instancia superior, de desenvolver projetos sociais, estratgias evangelsticas e at de abrir novos templos se houver efetiva demanda. A dinmica territorial do pentecostalismo clssico, principalmente nas periferias urbanas, resultou numa organizao espacial que seguido por todos 51
os templos sedes e rege o crescimento do movimento no territrio nacional. Trata-se de uma rede de congregaes e subcongregaes satlites que trabalham de forma parcialmente autnoma e que so ligadas e assistidas por um templo-sede, formando uma circunscrio eclesistica, ou seja, uma rea geogrfica e religiosamente delimitada. Essas redes reproduzem a mensagem pentecostal em contextos de extrema carncia, desenvolvendo continuamente mecanismos de superao das mltiplas formas que a pobreza assume nessas comunidades, tanto de ordem material quanto espiritual. Os circuitos de trocas, que envolvem dinheiro, comida, utenslios, informaes e recomendaes de trabalho, so apontados por Almeida (2004, p.21), no como programas filantrpicos, como fazem os catlicos e kardecistas, mas de uma reciprocidade de solidariedade entre os prprios membros. Este fato constatado, por exemplo, em Paraispoles, segunda maior favela da Regio Metropolitana de So Paulo; nesta comunidade o vnculo de sociabilidade dos pentecostais torna-se to influente na nave das congregaes que, esses irmos de f preferencialmente se tornam parentes entre si. Um dos mecanismos da territorialidade pentecostal neste contexto o incentivo a ajuda mtua, sendo essa uma estratgia de controle vinculada realidade a qual se insere os moradores de Paraispoles. Tais mecanismos de ajuda mtua so fundamentais para a reproduo e fortalecimento do territrio pentecostal, aumentando ainda mais a identificao do pentecostalismo clssico com os pobres, os sofredores e marginalizados de uma sociedade cada vez mais seleta. Desta forma, o pentecostalismo torna-se, um movimento popular. Embora a territorialidade do pentecostalismo clssico esteja
georefernciada, principalmente, nos espaos marginais social, seus centros de comando ou templos-sedes encontram-se nas vias principais das grandes cidades, da mesma forma que as parquias e igrejas do tipo neopentecostais, que tambm instalam seus templos-centrais em zonas citadinas de maior privilgio. O diferencial que a territorialidade inventada pelos pentecostais clssicos possui uma dimenso espacial maior que a dos neopentecostais, pois conseguem desenvolver seus mecanismos em espaos de extrema precariedade social, construindo uma rede territorial descentralizada e, algumas vezes, informal (fugaz), o que facilita, dentro de uma circunscrio pentecostais clssica, um
52
(re)arranjo de congregaes e sub-congregaes, o que faz ser seus territrios flutuantes ou at mesmo instveis no espao urbano.
O avano do pentecostalismo clssico nas metrpoles e cidades brasileiras atravs de um diversificado conjunto de Ministrios denominacionais e redes de congregaes no impediram que, o movimento pentecostal tomasse novos rumos e incorporasse novos mtodos de proselitismo e crescimento espacial. As dcadas de 1950 a 1980 so fundamentais para entender a nova configurao que o pentecostalismo assumiu e como esta proporcionou uma nova dinmica ao movimento no Brasil. No perodo de 1910 a 1950, a vertente clssica dirigiu de forma hegemnica o movimento pentecostal, sempre inflexvel s inovaes e transformaes em seu corpo doutrinrio e em suas estratgias evangelsticas. Portanto, o pentecostalismo neste recorte permaneceu inalterado. Em 1950, ventos de renovao direcionaram o movimento a um novo patamar no quadro religioso, explorando novos meios e estratgias de expanso. Em 1953 o movimento no Brasil vivenciou uma nova busca a novos fiis. Analisando esse novo perodo o qual denomina de Deuteropentecostalismo13, Ricardo Mariano (1999, p.30) o distingue pelo surgimento de igrejas pentecostais como a Igreja do Evangelho Quadrangular, que difundiu de forma sistemtica mensagens com nfase na Cura Divina e arriscou novos mtodos de difuso evangelstica. Esse momento que perpassou o pentecostalismo apresentou-se inovador, no no ponto de vista teolgico, e sim estratgico. Pioneiros e responsveis pelas primeiras inovaes no pentecostalismo brasileiro, Harold Williams e Raymond Broathight exploraram as ondas de rdio para promover o primeiro mtodo de evangelismo em massa, construindo juntamente com o
13
Designa a segunda onda do Movimento Pentecostal, que surgiu na dcada de 1950, no Brasil, quando chegaram em So Paulo dois missionrios norte-americanos da Internacional of The Foursquare Gospel. Na capital paulista, eles fundaram a Cruzada Nacional de evangelizao e centrados na cura divina, iniciaram a evangelizao das massas, principalmente pelo rdio, contribuindo bastante para expanso do pentecostalismo no Brasil. Fundaram a Igreja do Evangelho Quadrangular. No segmento, sugiram grupos semelhantes, tais como O Brasil para Cristo, Igreja Pentecostal Deus Amor, Casa da Beno, entre outras (ARAJO, 2007, p. 266).
53
clssico pentecostalismo predecessor, s bases para o maior fenmeno socioreligioso brasileiro de todos os tempos, o Neopentecostalismo. O dinamismo que impulsionou o pentecostalismo nos tempos hodiernos , a priori, resultado da adeso de um conjunto de princpios e prticas vinculados a uma corrente teolgica, que mostrou-se capaz de acompanhar a acelerada transformao da sociedade contempornea: a Teologia da Prosperidade14. O neopentecostalismo e a difuso de sua moderna teologia emergiram no cenrio religioso do Brasil em 1970 e diferencia-se do pentecostalismo clssico em diversos aspectos, sobretudo nos objetivos, estratgias e georeferenciamento espacial. Essa trade uma proposio analtica que objetiva desenvolver uma compreenso da territorialidade dessa neoreligiosidade, mostrando como se processou as articulaes de sua estrutura no espao urbano. O neopentecostalismo possui diretrizes e tendncias de crescimento que desafiam os paradigmas dos segmentos evanglicos mais conservadores, rompendo com mtodos tradicionais de evangelismo e arrecadao financeira. Essa mudana de postura que se inseriu no pentecostalismo, refletiu o desejo de uma classe religiosa, dirigida por uma mentalidade empreendedora, de conquistar espaos altamente valorizados. Os neopentecostais desenvolveram um modelo de igreja moderna, pronta para atender as demandas de uma sociedade materialista que segue triunfante no sculo XXI. Discorrendo sobre as intenes das igrejas neopentecostais, testifica Conten; Dozon; Oro (2003, p. 12), no se satisfaz mais, como acontecia em suas formas anteriores, com um proselitismo discreto, margem, e com um apelo aos crentes para a obteno de uma pureza maior. Esta assertiva revela claramente o cerne do pensamento dos lderes neopentecostais, que se lanaram na corrida por adeptos acirrando a competitividade religiosa no pas. So identificadas como as principais igrejas neopentecostalismo do Brasil: Universal do Reino de Deus (Rio, 1977), Internacional da Graa de Deus (Rio, 1980), Renascer em Cristo (SP, 1986) e Comunidade Evanglica Sara
14
Originria dos EUA e difundida pelo pastor Kenneth Hagin, nos ensinamentos de confisso positiva na dcada de 1940, ela surge como movimento doutrinrio em 1970. Na mesma dcada chega ao Brasil penetrando nas igrejas e ministrios paraeclesisicos, em especial: Internacional da Graa, Universal, Renascer em Cristo, Comunidade Evanglica Sara Nossa Terra, Nova Vida, Bblica da Paz, Cristo Salva, Cristo Vive, Verbo Vivo Nacional do Senhor Jesus Cristo e Adhonep (MARIANO, 1999, p.157).
54
Nossa Terra (Gois, 1976)15. Estes so caracterizadas pela adoo da Teologia da Prosperidade, que de forma sucinta, sustenta a idia de que o cristo salvo tem o direito a uma vida plena de realizaes de ordem social e financeira. Mediante o aperfeioamento dos ensinos bblicos que tratam sobre prosperidade financeira, os arautos da teologia da prosperidade formaram um imprio empresarial, questionado pelo ministrio pblico, por polticos, pela mdia e at por outros segmentos evanglicos, quanto aos mtodos de crescimento adotados. A grande ala do neopentecostalismo no Brasil a Igreja Universal do Reino de Deus - IURD, dado ao seu incrvel desenvolvimento institucional16 nas dcadas de 1970, 1980 e 1990, chegando em 2000 com um crescimento anual de 25,7%17, e uma forte influncia na poltica e mdia do pas.
2.5.3 A IURD e a Teologia da Prosperidade A Igreja Universal do Reino de Deus IURD tornou-se a cone do movimento neopentecostal, principalmente por sua organizao institucional reconhecidamente multinacional. Esse mega empreendedorismo religioso iniciado em territrio brasileiro, foi em busca de mercados religiosos em outros pases. Segundo Ari Oro, Andr Corten e Jean-Pierre (2003, p.29) o nmero de igrejas da IURD instaladas em territrios estrangeiros estimado mais de duzentos e vinte um templos, em 1995, mais de quinhentos em 1998, e no ano de 2001, mil templos foram registrados. A IURD um exemplo de religiosidade flexvel e adaptvel a elementos culturais exgenos. Diferentemente do pentecostalismo clssico, que se mostrou inflexvel a uma aculturao religiosa permanecendo como um movimento religioso perifrico, os neopentecostais redefiniram seus objetivos e seguiram exatamente o oposto.
15
Essas denominaes so as primeiras a difundir por meio de rdios, televiso e peridicos os ensinamentos referentes Teologia da Prosperidade, contribuindo para o avano neopentecostal atravs do televangelismo evanglico no Brasil. 16 Inaugurada em 1977 a IURD consegue nos primeiros oitos anos de existncia abrir 356 templos; doze anos depois, 571. Em 1995, a imprensa atribua-lhe 3 mil templos [...] Em julho de 2002 a revista Veja lhe atribuiu 7 mil templos e 14 mil pastores, alm das igrejas instaladas em mais de quarenta paises. (CORTEN; DOZON; ORO; 2003 p.41). 17 Atlas de Filiao Religiosa e Indicadores Sociais do Brasil/IBGE 1999 e 2000 apud Gwercmam (2004 p. 52-67).
55
As instituies do novo pentecostalismo constroem seu corpo de doutrinas sob de forma progressiva e dissimuladamente sincrtico. Analisando o processo de aculturao na IURD Almeida (2004, p.3) afirma que, ela tem desenvolvido um sincretismo s avessas, que opera na lgica dos binmios negao/assimilao e inverso/continuidade. A negao e assimilao se do respectivamente na hostilidade que essa desenvolve contra outras religies e ao mesmo tempo na incorporao de traos e elementos pertencentes religies rivais. Essa digresso ideolgica que permeia a aculturao neopentecostal, uma das mais eficientes formas de acolhimento sociocultural encontrado pelo movimento. Seus lderes se afastam de todos os parmetros tradicionais, que limitaram os pentecostais clssicos a uma clientela de baixo poder aquisitivo e aos espaos das periferias urbanas. Observa-se no processo de filiao nas igrejas neopentecostais, uma tolerncia quanto aos usos e costumes de seus fiis. O fato que muitas delas no postulam uma vida regrada de pr-requisitos doutrinrios, sendo menos exigentes em termos de compromisso exclusivo com instituio, aliviando e muito a bagagem de seus membros. A Teologia da Prosperidade tem servido aos neopentecostais como um manual religioso de instrues, que guia o fiel a uma vida de sucesso. Enquanto Teologia Pentecostal leiga e simples do pentecostalismo clssico trabalhou nos seus primeiros anos de existncia com a valorizao das relaes pessoais, o que no significou deficincia financeira, a Teologia da Prosperidade explorou o esprito empreendedor de seus lderes e fiis, incentivando e desafiando-os a investir no Reino de Deus, principalmente com seus recursos financeiros. O discurso apoiava-se na promessa de que esse investimento seria revertido em recompensas materiais e divinas. nas facetas desse discurso que se apia a territorialidade do neopentecostalismo. O sucesso desse movimento religioso no reside somente na mercantilizao do sagrado, mas tambm no contexto social na que foram fertilizadas as sementes desse discurso. Descrevendo a topografia do terreno onde cresceram as razes da Teologia Prosperidade, destaca Mariano referindose a realidade brasileira (2003, p.53),
56
[...] basta atentar, no decorrer desse perodo, para: a agudizao das crises sociais e econmicas brasileira; o elevado aumento do desemprego; o recrudescimento da violncia e da criminalidade; a destradicionalizao e modernizao sociocultural, a vigncia de plena liberdade religiosa e de um mercado religioso pluralista; a baixa regulao da religio; o enfraquecimento religioso, a secularizao e o declnio numrico da Igreja Catlica; a larga e contnua expanso pentecostal.
Nessas condies de crescimento do neopentecostalismo vale considerar a territorialidade proposta por Sack apud Rosendahl (2005, p. 3), o qual define como uma estratgia de controle sempre vinculada ao contexto social a qual se insere. A Teologia da Prosperidade responde a essa realidade supracitada, comum em pases subdesenvolvidos, indicando alternativas e possibilidades de ascenso e superao, por meio de um processo em que o fiel confronta, declara e anuncia antecipadamente a posse de uma beno futura. Essa pregao regida pela Confisso Positiva tem atrado indivduos as mais distintas classes sociais, principalmente aqueles que desejam obter prosperidade financeira atravs de um contato com o mundo espiritual, numa espcie de sociedade com Deus.
As igrejas neopentecostais se organizam em torno de uma lgica empresarial, desenvolvendo todo um marketing nos testemunhos de milagres vivenciados em suas reunies. Esses comerciais religiosos transmitidos via rdio, Internet e incisivamente pela TV, propagandeiam as curas, reconciliaes matrimoniais e, principalmente, a prosperidade financeira que atinge seus fiis. As campanhas levantadas nessas igrejas direcionadas a problemas de diversas ordens tm a finalidade nica de interceder por uma graa divina, desafiando a f de quem ansiosamente procura uma soluo, a doar deliberadamente parte de seus recursos financeiros como sacrifcio em favor de sua beno. Essas sees religiosas chegam casa dos milhes e serve como capital inicial para empreendimentos religiosos. 57
Da a territorialidade deve ser reconhecida como uma ao, uma estratgia de controle afirmou (SACK apud ROSENDHAL 2005, p. 4). Sendo assim identificamos a operacionalizao da Teologia da Prosperidade como a forma ativa da territorialidade dessa estratgia, e os templos, recintos onde ocorre essa dinmica, como territrio simblico e politicamente delimitado no espao. A ampla territorialidade dos neopentecostais foi preparada sob a gide de um poder centralizador. Essa caracterstica marca tambm a constituio de sua hierarquia eclesistica e espacial. A centralizao responsvel pela coeso e unidade de suas redes congregacionais. A organizao piramidal, os princpios de verticalidade e uma gerncia no fragmentada das igrejas neopentecostais suprimiram os focos de autonomia no mbito de suas instituies. A administrao atenta dos neopentecostais impediu a onda de cismas em suas denominaes. Contrariamente, o pentecostalismo clssico nas primeiras dcadas de expanso, construiu circunscries religiosas autnomas que ao gerar tenses entre seus limites sofreu a maior diviso institucional do segmento, como foi o caso da Assemblia de Deus, na CGADB de 1989, em Salvador BA. Com o modelo de gesto centralizada, os neopentecostais controlam com destreza a rpida expanso de suas igrejas nas metrpoles brasileiras. Esse domnio fundamental para unicidade de sua rede. Na IURD, a concentrao do poder eclesistico agiliza vrios processos decisrios, tornando eficientes as transmisses de ordens superiores e a realizao dos trabalhos administrativos, organizacionais e evangelsticos (MARIANO, 2003, p.57). O modelo de centralidade e verticalidade adotado pelos lderes da IURD permite administrao integralizar os recursos coletados. Nas instituies
neopentecostais, a centralizao financeira crucial para subsidiar investimentos altos e estratgicos nos setores mais priorizados como emissoras de TV e radiofnicas. O neopentecostalismo trs consigo uma gama de igrejas com tendncias modernas de empreendimentos religiosos. Esses agentes do sagrado procuram se instalar nos espaos centrais das grandes metrpoles para desenvolver suas aes proslitas. Suas igrejas, apesar de possurem um amplo contingente de pessoas com baixo poder aquisitivo, conseguiram conquistar uma significativa
58
parcela da classe mdia, entre os quais empresrios que investem seus lucros nos projetos e campanhas da igreja. O geoferenciamento dos tempos da IURD realizado pelo CEPID apud Almeida (2004, p.23), revela que esto concentrados basicamente nas vias principais e distantes das reas de maior vulnerabilidade e que a implantao desses templos, tal como suas catedrais luxuosas nos centros urbanos, visam conseguir visibilidade e adeso em massa. A grande peripcia espacial do neopentecostalismo est ligada ocupao do espao e do tempo nas grandes cidades. A IURD investiu em
alugueis e aquisies, nos pases onde atua salas de cinema ou prdios de tamanho equivalentes, sempre situados em locais estratgicos, com forte densidade de circulao humana. (MARIANO, 2003, p.31) Essa forma de apropriao da IURD nos centros urbanos tornou-se um modelo de ocupao adotado por vrias igrejas que buscam situar-se em espaos preferenciais. Esses imveis perdem sua funcionalidade primeira e so transformados em naves religiosas com formatos padronizados, que obedecem a um estilo simblico, como cruzes e castiais, fazendo referncia ao cristianismo e judasmo. Ricardo Mariano (2003, p. 31) reconhece que a estratgia espaotemporal desenvolvida pela IURD promove uma captao mxima de clientes potenciais. O tempo possui importncia vital para a adeso em massa. Nesse sentido, a maioria das igrejas adquam ao ritmo frentico das grandes cidades. Os horrios dos cultos so flexveis a rotina de trabalho dos fiis. Prolongando o tempo de funcionamento, essas igrejas conseguem atender, por dia, dezenas de pessoas; algumas delas funcionam 24 horas. Seguindo modelos inovadores, forjando novas estratgias evangelsticas e lanando tendncias no mundo religioso, os neopentecostais redefinem simblico e espacialmente, o pentecostalismo nos espaos citadinos. Seus territrios so incorporados paisagem (de)sacralizada das grandes cidades, sendo, em parte, responsvel pelo retorno do sagrado aos ambientes secularizados da sociedade contempornea.
59
O estabelecimento do pentecostalismo no Serid, enquanto neoreligiosidade fruto do proselitismo evangelstico dos assembleianos. A verso clssica ou ortodoxa, o pentecostalismo difundido pela Assemblia de Deus no Serid, seguiu a mesma tendncia de crescimento das metrpoles brasileiras, expandindo-se com notoriedade entre a populao carente e de baixa renda. Os pentecostais assembleianos, ao iniciarem os trabalhos evangelsticos no Serid, encontraram um espao frtil a cultura de uma nova semente de f. A razo que explica o xito da territorialidade pentecostal das Assembleia de Deus, entre os seridoenses, em parte reside na eficincia na mensagem dos Dons Espirituais, a princpio proferido num contexto de resistncia cultural evidenciado pela territorialidade catlica e de intensas transformaes scio-espacial caracterizado pelo crescimento e mobilidade populacional e pela transio rural/urbano de vrias cidades seridoenses. Marca distintiva do pentecostalismo clssico ante o pluralismo religioso, este vinculada mensagem dos Dons Espirituais, sendo esta uma homiltica18 que busca capacitar o fiel a viver sob a conscincia de uma vida simples e centrada na proclamao das doutrinas pentecostais baseadas nos ensinamentos bblicos. A mensagem do avivamento pentecostal difundida pelas Assembleia de Deus instrumento responsvel pela atrao de novos fiis, prope uma nova forma de espiritualidade e regra de f, baseados no exerccio dos Dons Espirituais e Ministeriais, construdos sobrenaturalmente pela comunho, fidelidade e dedicao a obra de Deus. Na comunidade assembleiana onde o pentecostalismo ortodoxo fielmente desenvolvido, o crescimento espiritual mais enfatizado que o econmico embora a maioria dos lderes e membros assembleianos tenham sado de camadas sociais economicamente baixas. Isso no significa dizer que a mensagem do pentecostalismo clssico seja avessa a prosperidade financeira; antes prepara o individuo para ter uma postura de vida desligada do apego a bens
18
" a arte de pregar sermes", "a cincia da pregao", "arte de fala religiosa". Do grego: "Homileo" (conversa, fala, em esprito de camaradagem).
60
materiais preparando-o espiritualmente para enfrentar os percalos da vida em sociedade como de sua realidade imediata.
2.6.1 Serid, a sociedade da resistncia No espao do avivamento a pobreza assume status de humildade e simplicidade, caractersticas altamente valorizadas na doutrina pentecostal das Assembleias de Deus e que traduz o ideal de estilo de vida repassado pelos lderes pentecostais clssicos. Antes da presena do pentecostalismo assembleiano, a sociedade seridoense do final do sculo XIX construa sua trama regional, em um contexto perpassado por sucessivos processos de estruturao regional19. A dinmica das transformaes no Serid remeteu a sua populao a perodos de ascenso e decrescimento, durante o desenvolvimento socioeconmico da regio. O histrico dos processos que marcaram a formao regional do Serid definiu o perfil sciocultural dos seridoenses e a propenso destes ao acolhimento de discursos que estimulassem a superao das adversidades regionais. A pobreza das famlias seridoenses assinalada, a princpio, pela fragmentao fundiria no final do sculo XVIII incio do XIX, perodo esse marcado pelo fenmeno do partilhamento das propriedades estabelecida tradicionalmente em caso de morte e/ou matrimnio (ARAJO 2003, p.204). Em decorrncia da morte dos pais a diviso intra-familiar sob os ditames dos inventrios, resultou na formao de mdias e pequenas propriedades. Sendo assim, a pequena parcela de terra legada a cada um dos descendentes, no proporcionava as mesmas condies de sustentabilidade para suas famlias que iam se perpetuando, prescrevendo o panorama do empobrecimento da sociedade seridoense. A tradio dos dotes tambm foi responsvel, em parte, pelo crescimento das pequenas propriedades20 e conseqentemente por atenuar esse
19
Os processos que marcaram a delimitao dos limites regionais do Serid no sculo XIX, no que ressalta Morais foram de ordem poltica (configurao de mapas polticos, referenciadores de delimitaes municipais, eclesisticas e judiciais), social (reveses demogrficos vinculados a alternacia de secas e invernos e a disseminao de doenas), econmicas (fazeres econmicos vinculados a atividades agropastoris) e culturais (saberes construdos no entrelaamento entre Educao e Poltica e vivncias msticas enredadas no real) (MORAIS 2005, p.105). 20 Segundo Morais (2005, p.149) em 1775, foram contabilizadas 70 fazendas na Freguesia de SantAna do Serid. Registrou-se uma expanso vertiginosa na quantidade de propriedades de
61
quadro. Na ocasio a filha ao se casar herdava uma parcela de terra que, na maioria das vezes, provinha da diviso da propriedade paterna subtraindo ainda mais o espao da grande propriedade. Outro fato importante nesse contexto de empobrecimento ressaltado por Morais (2005, p. 149) no sendo alvo principal da economia exportadora, a pecuria no foi capaz de gerar as mesmas condies de acumulao possibilitadas por outras atividades. Os anos que compreendem o final do sculo XVIII e incio do sculo XIX caracterizaram-se nos escritos de Guerra apud Morais (2005) como cenrios antagnicos de penria e resistncia. Esses episdios de sobrevivncia revelaram, a face cruel da vida sertaneja nesse perodo visando descortinar as experincias diuturnamente vividas com doenas e pestes, secas e enchentes, abundncias e escassezes, crenas e esperanas, promisses e realizaes. O contexto de miserabilidade desenhado pelas estiagens resultou na elaborao de novas estratgias de superao pela sociedade seridoense. A existncia de uma dupla realidade pairava no Serto Seridoense onde, a vida e morte seguiam seu curso numa estreita relao. As intempries climticas e a inexistncia de uma rede sanitria, foram s grandes responsveis pela a alternncia dos perodos de fartura e abundncia no Serid, como pela onda de pestes e doenas infecto-contagiosas propagadas no seio da populao. Na dcada de 1840, os eventos notificados provam a coexistncia dessa dupla realidade. A epidemia do Mal triste, em 1841, abriu temporada de calamidade e anunciou o porvir, com o flagelo da mortandade do gado, a carestia e a fome, um preldio quase que proftico dos tempos futuros. O inverno regular dos anos subseqentes atenuou esse quadro, multiplicando a safra de legumes e a reproduo do gado. No entanto, o ano de 1847 foi marcado pela espantosa peste de ratos (MORAIS, 2005, p.131). Nos anos de 1850 e 1860, a sociedade seridoense viveu sob a imprevisibilidade dos espordicos anos de abastana, em contrapartida os de 1854 e 1864 foram abalizados pela carestia dos bens de consumo, implicando no aumento do nmero de pessoas em situao de fome. No entremeio dos anos de 186621 a 1870, o inverno no
modo que, em 1862, o numero de estabelecimento j era de 622, ou seja, uma taxa de crescimento da ordem de 788,57% em 87 anos.
21
Nesse ano constituiu uma referencia de que o quadro de pobreza apresentado no estava somente relacionado seca. Neste ano, o inverno foi regular, inclusive com enchentes em
62
contabilizou mais os benefcios, em razo das doenas que se difundira, rapidamente, motivadas pelo precrio nvel de sanidade pblica, o que gerou uma assustadora srie de bitos. A esperana da melhoria na qualidade de vida do homem sertanejo renasce com a cotonicultura. As guerras norte-americanas geraram dois ciclos de exportao do algodo norte-rio-grandense nos respectivos perodos de batalhas, levando-o a se tornar base da economia regional nas dcadas de 1850 e 1860, juntamente com a produo aucareira (MORAIS, 2005 p. 123). Os primeiros sinais de retrao na prspera produo algodoeira norterio-grandense veio com a retomada da produo algodoeira dos E.U.A aps as guerras. A queda do preo no mercado agrcola em 1872 lanou os produtores numa crise sem precedentes e a seca de 1877 abateu de vez a economia algodoeira, ultrapassando os limites das relaes econmicas atingindo violentamente a sociedade do semi-rido potiguar e provncias adjacentes. Reconhecidamente a mais penosa desde a de 1845 a seca de 1877 exps de forma inigualvel a pobreza, misria, fome, sede e desolao na paisagem sertaneja. A vegetao adormecida do Serid foi revitalizada mais uma vez nos primeiros anos de 1880, com destaque para os perodos entre 1881 e 1883, quando ocorrem farturas nos roados e gua nova nos rios Serid e Piranhas (MORAIS 2005, p. 135). No obstante a essa realidade, a febre miasmtica de 1882 penitenciava a vida dos seridoenses. A ltima dcada do sculo XIX foi identificada, por Guerra (apud Morais 2005, p.136), como perodo de alta pluviosidade na regio com inverno regular, notvel e abundante (...) que provocou aguadas por todos os lados, inundaes e enchentes transmutando a caatinga do tom cinza das secas para o verde dos campos e das pastagens crescidas. Porm, o inverno contraditoriamente acabou por agravar ainda mais a misria uma vez que as guas torrenciais levaram embora lavouras inteiras, ocasionando escassez de alimentos e, logicamente, a carestia destes, limitando ainda mais o poder de consumo da populao.
alguns lugares, mas o preo do gado foi considerado muito caro e, em termos de alimentos, a populao vivenciou forme e carestia (GUERRA apud MORAIS 2005, p. 132).
63
Apesar das crises que perpassaram o cotidiano do seridoense durante todo sculo XIX, os ndices de natalidade permaneciam elevados como tambm os ndices de mortalidade infantil, decorrente da proliferao de doenas e da misria deflagrada pela seca. Sobre esse fato Morais (2005, p.137) relata que as altas taxas de mortalidade eram superadas por ndices de natalidades ainda mais elevados resultando em crescimento vegetativo positivo. Esse padro de comportamento atingido pela populao seridoense mediante esse dinmico ciclo vital (nascimento, crescimento e morte), reflete, para Morais, a saga da resistncia do povo seridoense. No sculo XX registrou-se o notvel crescimento das cidades seridoenses, motivado pela derrocada dos pilares da economia seridoense como algodo-pecuria-minerao, resultando intensificao do fluxo populacional da zona rural para periferias urbanas. Foi marcante tambm a fragmentao do espao seridoense resultando na criao de novos limites municipais, fortalecendo identidades e as estruturas do poder local. Na dcada de 1990 o tercirio j pronunciava como o setor mais forte da economia regional. neste contexto urbano/ tercirio, que Morais (2005) identifica na poltica, economia e cultura, a conformao de cenrios de resistncia regional, manifestos pelas identidades que afloraram dos objetos, personagens, prticas, discursos e imagens da regio. Na economia, o saber-fazer do seridoense traduz a qualidade dos produtos da terra como queijo de manteiga, queijo de coalho, manteiga da terra ou do Serto carne-de-sol e os bordados. Seus produtos surgem no mercado regional como peculiaridades da cultura sertaneja, conferindo o prestgio e a boa comercializo da culinria seridoense. Na poltica, os seridoenses tambm consolidaram as bases de sua identidade regional atravs dos discursos e smbolos que retratam o que o (ser)to seridoense. Figuras polticas como Vivaldo Costa e Manoel Torres de Arajo emitiram discursos que estereotipavam o Serid, uma estratgia poltica para afirmar e delimitar campos de ao e influncia de poder. A adoo do jerimum como smbolo de campanha fez de Vivaldo Costa um cone da representatividade seridoense. A aluso do jerimum trajetria poltica de Vivaldo explicada por Morais (2005, p.31): o jerimum se constitui um fruto resistente daqueles que garante ao sertanejo a possibilidade de 64
armazenamento para o consumo nos perodos de escassez (...) resistente, como tambm resistente o homem sertanejo. Esse smbolo tornou-se um referencial da vida laboriosa do Serid, origem de Vivaldo Costa. J a construo imagtica de Manoel Torres como poltico seridoense, segundo Morais (2005), forjado pelo contedo imaterial, portanto abstrato/subjetivo, relacionado s crenas e valores morais do sertanejo no sendo manifesto ento em formas materiais e espaciais. O esteretipo homem de fibra relacionado ao personagem poltico Manoel Torres, foi edificado sob os atributos conferidos pela sociedade seridoense, sua prtica poltica, a saber: honestidade, sinceridade, lealdade e coerncia. No mbito cultural, a resistncia do seridoense enquanto agente que redefine sua identidade ante o suposto processo de enfraquecimento ou desenraizamento territorial destacado por Haesbaerth (2001), se revela nas cantorias locais (violeiros), nas festas tradicionais (vaquejada/So Joo) e na religio, sendo emblemtica a devoo SantAna. Dentre os cenrios de resistncia do Serid, elegeu-se como foco de anlise a cultura, e nesta, o culto a SantAna, como dispositivo de domnio territorial catlico e elemento de resistncia cultural ao estabelecimento dos
Para compreender as bases da territorialidade desenvolvida pelas Assembleia de Deus no Serid, necessrio se faz registrar os obstculos culturais enfrentados por esta instituio e, portanto identificar seus dispositivos de controle social. Ao iniciar seus trabalhos evangelsticos na sociedade da resistncia os assembleianos esbarraram com seu restrito territrio nos limites do amplo domnio catlico construdo secularmente sob fortes vnculos espaciais e identitrios. A dominao do catolicismo no Serid est intimamente ligado ao modelo de colonizao adotado por Portugal no Brasil, no sculo XVII, que tinha as diretrizes polticas e ideolgiacas fundamentadas na primazia do papado. Por essa razo, a evangelizao catlica caminhou junto com a dominao colonial sob o pacto do padroado: em recompensa com o envolvimento direto do Estado 65
portugus na converso dos infiis, o papa concedia Coroa, o controle sobre as novas igrejas (PIERUCCI, 2000, p.282). O desbravamento do interior da Capitania do Rio Grande via atividade pecuarista, foi marcado pelos conflitos entre colonizadores e naes indgenas que h tempos habitavam este espao. Juntos a estes, estavam os jesutas, missionrios catlicos que desenvolviam a primeira forma de proselitismo neste espao: a converso dos selvagens. O povoamento do Serid, Morais apud (Macedo 2002, p.36) efetivou-se aps o genocdio das naes indgenas nas Guerras dos Brbaros (1687-1697), sendo possvel o estabelecimento dos primeiros currais de gado que, ao crescerem, se estruturavam como fazendas. Aps efetiva ocupao, as primeiras famlias chegaram ao Serid, em meados do sculo XVIII, especificamente em 1720; eram pessoas vindas principalmente das capitanias do Rio Grande, Paraba e Pernambuco. O processo de colonizao portuguesa foi crucial para a implementao dos ritos catlicos, na forma de devoo smbolos e imagens no modus vivendi da sociedade elitizada que se estabelecia. As estratgias de apropriao executadas pelo colonizador serviram de canal para o estabelecimento da territorialidade catlica na nascente sociedade seridoense. O convnio entre Estado e Igreja possibilitou, alm do domnio scioreligioso, o controle sobre os limites territoriais do que viria a ser o Serid, antes referenciado pela Geografia da Ribeira definida pelo Rio Serid e seus afluentes. Essa primeira circunscrio oficial, que envolveu o espao hoje conhecido como Serid, correspondeu a Freguesia da Gloriosa Senhora SantAna do Serid22. O crescimento da populao sertaneja e a inviabilidade de locomoo no interior da Freguesia de Nossa Senhora do Bom Sucesso do Pianc (Capitania da Paraba) foi a razo do desmembramento espacial de parte de sua jurisdio, formando a Freguesia que levava o nome de SantAna, smbolo da devoo catlica no Serid hodiernamente. Os smbolos do poder catlico foram aos poucos sendo erguidos no interior da Freguesia da Gloriosa Senhora SantAna do Serid e
22
Como forma de delimitar o poder civil e religioso foi normatizada pela Carta Rgia de 1699 a criao de Freguesias que alm de uma parquia constitua-se de instncias do poder do Estado como comarcas e milcias. A Freguesia da Gloriosa SantAnna criada em virtude da proviso de 20 de fevereiro de 1747, do Bispo de Pernambuco, Dom Frei Luiz de Santa Tereza, pelo edital do visitador licenciado, inspetor da sua relao com a comunidade. Tais registros encontram-se no livro de tombo n 1 da Matriz de Caic, registrado pelo Vigrio Manoel Jos Fernandes em 27 de novembro de 1845 Diocese de Caic (apud Nascimento Neto, 2005, p.48).
66
denotavam a estruturao do sistema territorial catlico, como a construo de igrejas matriz e capelas23. Aos poucos os marcos territoriais do catolicismo foram se multiplicando, em funo das demandas religiosas das povoaes que cresciam no territrio da Freguesia. Portanto, a origem do culto SantAna, no Serid, est ligado a criao da Freguesia da Gloriosa SantAna em 1748 e se difundiu quando a Povoao de Caic tornou-se sede da Freguesia. A ascenso poltica da Povoao de Caic sede de Freguesia se deu atravs de sua estrutura poltico-administrativa, a igreja e o pelourinho (MORAIS 2005, p.78). Esse fato revela a condio de destaque dessa Povoao, cujos moradores assumiram a incumbncia de construir um templo para substituio da antiga capela de adorao SantAna. A construo da Matriz, em 1748, nos arredores do Poo da Casa Forte do Cu significou a expresso mxima da territorialidade catlica na poca, emergido como um dispositivo simblico de dominao religiosa fincada no seio da freguesia. O santurio de SantAna reflete o poder da hierocracia que h na adorao aos santos padroeiros catlicos, que, ao longo do tempo se tornaram verdadeiros guias dos sertanejos seridoenses. A expanso de naves catlicas pela freguesia tinha como objetivo despertar ainda mais o sentimento religioso de seus fiis e preservar a imagem de SantAna como um elemento de identificao territorial. Isso mostra claramente como foi a estratgia de ampliao dos domnios catlicos no sculo XVIII, pelo territrio do Serid ainda em formao. O espao que compreendia a circunscrio da Freguesia da Gloriosa SantAna do Serid, passou por sucessivos desmembramentos o que resultou na (re)definio dos limites atuais do Serid e na construo de uma identidade territorial prpria. Sobre esse fato descreve Morais (2005, p. 81-82) ao vincular os nomes dos lugares aos das freguesias, a Igreja Catlica semeava vestgios de identidade entre homens e espao. Assim, a devoo a SantAna e a religiosidade vo se insurgindo como traos de uma identidade territorial em formao, circunscrita e manifesta no espao seridoense. O poder institucional da Igreja Catlica na demarcao de fronteias regionais sobressaiu ao dos coronis. Os limites de atuao do poder poltico23
No que afirma Morais (2005, p.79) ao perquirir as surpreendentes veredas da histria regional, descortinou-se um cenrio em que fazendas, capelas e povoaes formavam o territrio da Freguesia da Gloriosa Senhora SantAna do Serid.
67
administrativo que divide a Paraba e Rio Grande do Norte, hoje, foram definidos por um sentimento de pertena religioso circunscrio de SantAna e que ficou entendido segundo Morais (2005), como primeira manifestao da nascente identidade seridoense. A atitude de anunciar a populao da Fazenda Esprito Santo (atual Cidade de Ouro Branco) pertencente a sua freguesia, o Padre Manoel Rodrigues Xavier (vigrio da Freguesia de Nossa Senhora da Guia do Patos) da capitania paraibana, fez acender a chama de uma suposta identidade regional, quando nesse caso os moradores da fazenda do Esprito Santo recusaram que a capela de Santa Luzia pertencesse jurisdio da Freguesia de Patos (MORAIS 2005, p.86). A soluo vem nas determinaes do despacho episcopal emitido de Olinda, que reconheceu, em 1790, que os fiis da Fazenda Esprito Santo estavam sob a jurisdio da Freguesia de SantAnna do Serid, reafirmando mais uma vez a devoo destes com a padroeira. Fica evidente a participao do catolicismo e de sua territorialidade no processo de redimensionamento da regio do Serid e sua interveno na inveno de identidades em vrias localidades freguesia a fora. O crescimento do culto a SantAna e outros padroeiros catlicos seguiu o ritmo de evoluo das escalas locais do espao seridoense, no momento em que dados epaos foram gradativamente assumindo condio de povoaes, depois municpios-vilas e cidades. A elevao da Povoao de Caic Municpio Vila consolidou este local como centro de poder da freguesia e com o respaldo religioso da celebrao SantAnna, que a 40 anos j fazia parte dos festejos de seu povo, tornou o ponto focal do poder catlico nessas plagas. No decurso da inveno do que ser seridoense, a adorao a SantAnna foi paulatinamente se tornado um forte elemento de identificao regional. Dessa identidade religiosa24 nasceu um significativo referencial de identidade territorial, que transcorreu inmeras geraes e manifesta-se na atualidade por meio da festas de padroeiros amplamente celebrados pelo povo seridoense. A Festa de SantAnna comemorada em Caic, durante 10 dias no ms de julho englobando o
24
A identidade religiosa seria uma construo histrico-cultural socialmente reconhecvel do sentimento de pertena religiosa [...], por exemplo, reconhecemos uma identidade catlica por meio da representao institucional, da prtica ritual e dos atos de consagrao (...), no entanto, em uma igreja de constituio recente, de carncia simblica e ritual e prtica religiosa flexvel, ainda no pode definir o perfil da identidade (...), a identidade religiosa est relacionada a uma determinada temporalidade e espacialidade (Gil Filho 2001, p.48).
68
dia 26 (Dia de SantAnna), o evento catlico, e, por conseguinte religioso mais expressivo do Serid. Peregrinaes, missas, leiles e forrs antecedem os festejos da padroeira e respondem pelo maior percentual de fundos arrecadados durante os festejos. Mais uma vez, Morais (2005, p.326) revela as razes dessa suntuosa devoo,
A resposta a essa questo encontra-se nos labirintos da histria e remonta aos alicerces da formao regional, empreendimento realizado pela colonizao portuguesa, que deixou para a cultura seridoense, dentre outros legados, o da religiosidade.
A Festa de SantAna traduz-se como um forte marco de resistncia cultural, visto o sentimento de pertena que emerge nos tradicionais rituais e eventos que comporta. A procisso o ritual da festa onde se concentram as maiores demonstraes de f e devoo padroeira. Nesta, os devotos erguem o smbolo mximo de sua religiosidade numa marcha citadina perfazendo ruas e avenidas at a chegada na matriz. O jantar de SantAnna outro momento importante nos festejos da padroeira e o carter segregador desse evento perfeitamente passvel de uma anlise espacial. O jantar de SantAnna vinculou-se aos festejos como momento que rene em essncia a classe mais privilegiada e suas famlias, distanciando-se de uma inteno primeira que era a de congregar todo e qualquer devoto de SantAnna. O vis capitalista desse evento transmutou-se numa ntida segregao scio-espacial em pleno largo de SantAnna. O acesso ao espao onde se encontra farta mesa de iguarias controlado pelo valor cobrado, limitando o ambiente onde acontece o tradicional jantar, s pessoas que possuem condies financeiras compatveis com o valor da senha. No entanto, em geral o jantar de SantAna no interpretado pelos devotos em geral, como sendo um mecanismo de segregao social, mas como uma festa social que visa arrecadar fundos para a parquia. A festa assim feita, de momentos naturalmente divergentes que ultrapassam regra de f dos mais conservadores e que atinge um grau de antagonismo expresso na dialtica do Sagrado/Profano. Esse paradoxo atinge seu ponto mximo nas festas culturais, onde grupos musicais e a vendagem de 69
bebidas reacendem o culto ao corpo e aos prazeres (profanos) da sociedade em torno da Matriz de SantAnna. Na anlise de Eliade (2002, p. 40), esse fato compreendido pela concepo qualitativa que o homem religioso tem do espao a igreja participa de um espao de todo diferente do das aglomeraes humanas que a envolvem (...) no interior do recinto sagrado o profano transcendido. Diante do que expem Eliade observamos que para os devotos de SantAnna a dimenso de uma vida sacra restringe-se a nave da igreja durante as celebraes litrgicas e pela coeso que os smbolos sacros despertam na maioria dos fiis. O espao externo s portas da igreja para estes o mundo profano e sem vinculo e sem nenhum compromisso com o sagrado. Durante as comemoraes h tambm o espao da cultura regional. A Feirinha de SantAnna um reduto da cultura seridoense, onde a identidade do seu povo materializada nas guloseimas vendidas nas barracas que tomam todo largo da matriz. Artefatos religiosos so comercializados juntamente com produtos da culinria regional revelando artes, costumes e tradies do povo seridoense. A solenidade final da Festa de SantAnna se projeta com uma grandiosa procisso que acaba em frente matriz, onde a imagem de SantAnna recebe as honrarias finais dos fiis seridoenses que louvam e enaltecem sua figura de me, protetora, intercessora e provedora de bnos para a terra rida, bero de suas vivncias. No decorrer desse suntuoso evento que inebria a cidade de forma a despertar, a ateno dos cticos e sem religio, possvel observar efetivamente, a poderosa territorialidade catlica sendo desenvolvida, no controle de determinados espaos e da grande massa de pessoas que esto sob sua autoridade espiritual e institucional.
2.6.3 A evangelizao e estabelecimento da Assemblia de Deus na dcada de 1940 1980: o nascimento de uma nova territorialidade religiosa no Serid
O potencial da territorialidade catlica est ligado forma autosustentvel que a devoo dos fiis assume nos tradicionais ritos, transcorridos em eventos como a Festa de SantAna. Esse tipo de evento religioso no somente uma forma de manifestao da cultura popular, mas, sobretudo um mecanismo que a Igreja se prende para fazer a manuteno de um catolicismo 70
cada vez mais distante dos processos dinmicos decorrentes da modernidade e que tambm atinge o Serid. Observa-se, ainda a predominncia do catolicismo nas famlias seridoenses, e apesar da ortodoxia da igreja catlica ser inflexvel aos ditames de uma invasiva cultura ps-moderna, seu sistema de crenas permanece numa posio de hegemonia ante o pluralismo religioso. A tradio catlica manifesta nas festas de padroeiros um meio de reafirmao do poder catlico e como construo religiosa inventada e reinventada, tem a finalidade de legitimar, no tempo e no espao, sua secular estrutura territorial no Serid. No entanto a qualidade dessa hegemnica tradio relativizada em funo do modus vivendi e das ideologias sociais da populao em geral, que em muito se distancia das doutrinas catlicas e negam sua autoridade normativa. Esse quadro nos remete a uma reflexo do sujeito catlico, sua natureza, sua razo de ser e o que igreja verdadeiramente considera ser um autntico catlico. A resposta a essa problemtica no objeto de nossa anlise, e sim os fatos que decorrem dela. A inconstncia e incoerncia dos fiis quanto prtica doutrinaria da igreja sinaliza a fragilidade da territorialidade catlica e prescreve um anacronismo entre a postura da igreja e a cultura de massa. O domnio catlico est fundamentado nos pilares da tradio que, por anos, vem perdendo fora nas decises polticas da sociedade num processo conhecido como secularizao25. Ao lado desse processo est o crescimento do pluralismo religioso, em especial das denominaes pentecostais que agora coexiste, ao lado do catolicismo desenvolvendo estratgias de controle territorial nas cidades seridoenses. Dentro do dinmico processo de nascimento de novas territorialidades religiosas voltamos nossa ateno s estratgias evangelsticas das Assembleia de Deus, que respondem pelo controle e gesto de seus territrios no Serid. Levantando a bandeira do pentecostalismo ortodoxo, essa denominao mostrouse capaz de arregimentar um nmero significativo de membros em sua maioria,
25
O fenmeno da secularizao ou dessacralizao pode ser entendido como ao poltica, com a finalidade ltima de reduzir a influncia das instituies eclesisticas em todos os setores da vida social (ROSENDAHL, 2001, p. 20).
71
provenientes de um catolicismo mal compreendido e confrontado com verdades bblicas. A Assemblia de Deus chega ao Estado do Rio Grande do Norte muito mais cedo do que nas regies Sul e Sudeste do pas. O Estado norte-riograndense recebe o pentecostalismo assembleiano em 1918 na cidade de Natal. Na ocasio, o Pastor Adriano Nobre era enviado de Belm do Par para a capital potiguar, no propsito de reconhecer o trabalho, realizar o primeiro batismo e instalar oficialmente uma igreja da Assemblia de Deus (VASCONCELOS, 1983; p.30). A Igreja Assemblia de Deus, no Serid norte-rio-grandense, fruto do projeto de interiorizao da f pentecostal pela liderana pastoral da Igreja Sede em Natal. O processo de estabelecimento das Assembleia de Deus no Serid ser entendido em trs realidades citadinas: Currais Novos, Caic e Parelhas. O trabalho evangelstico das Assembleia de Deus, desenvolvido durante 1940 a 1980 nestas cidades, foi determinante para que hoje, cada uma estivesse na condio de sede do poder territorial da igreja no Serid. Isso se deu em funo do crescimento e difuso destas igrejas, no apenas em contexto local, mas tambm em cidades circunvizinhas. A presena da f pentecostal no Serid identificada pela primeira vez segundo relato de Maria de Lourdes Campus da Silva 26, em 1942, numa pequena congregao da Assemblia de Deus situada na antiga Rua do Caj, em Currais Novos, coordenada pelo pentecostal Joo Joaquim. A congregao de Currais Novos era um ramo do Campo de Santa Cruz supervisionado pelo evangelista Manoel Rodrigues de Menezes que por sua vez estava sob as diretrizes da Igreja Sede em Natal. Em 1946, Joo Joaquim, cabo da polcia militar, foi transferido para Caic e junto com ele, a mensagem dos Dons do Esprito, semente da f pentecostal. Antes de sua ida para Caic, Joaquim repassou a direo das reunies para uma assdua cooperadora do movimento, a senhora Severina Morais Pereira (mais conhecida como irm Birina), que deu prosseguimento aos cultos pentecostais em solo curraisnovense.
26
Pioneira da Igreja Assemblia de Deus em Currais Novos desde 1943. Entrevistada na sua residncia em 05/11/2006.
72
O trabalho de evangelizao das Assembleia de Deus em Currais Novos, na dcada de 1940 apresentou sinais de progresso em razo do crescimento demogrfico resultante da significativa demanda por mo-de-obra ocasionada pela explorao do minrio sheelitfero na Mina Breju. A congregao ampliou sua clientela no auge da minerao em 1945, quando a cidade recebeu um intenso contingente de operrios para somar fora de trabalho na produo sheelitfera na Mina de Tomaz Salustino. O nmero de oito operrios vindos de Fortaleza-(CE), j adeptos do pentecostalismo, se integrou, com suas famlias, ao movimento j estabelecido em Currais Novos. A freqncia destes fiis nos cultos exigia que caminhassem 12 km da Mina Breju at a congregao da Assemblia de Deus, na residncia da irm Birina, situada na cidade. O corpo de membros aumentou consideravelmente com a chegada desses novos cooperadores. A partir da, o espao tornou-se pequeno para o crescente nmero de membros. Neste momento, havia uma maior assistncia da Igreja Sede, em Natal, enviando com freqncia o pastor Pires, Firmino de Castro e Manoel Gomes. O pastor Manoel Leo tambm dava sua assistncia, periodicamente, ao trabalho em Currais Novos. Em Caic o pioneiro da evangelizao pentecostal, foi Joo Joaquim, que vindo de Currais Novos abriu em 1946 num pequeno Grupo Familiar, nas dependncias de sua residncia. Conforme registra Cruz (1992, p.12), a congregao localizou-se nas ruas onde Joo Joaquim morou, Generina Vale, depois Joel Damasceno, Professor Viana e mais tarde Quintino Boaiva. A instabilidade, quanto localizao do ncleo familiar em Caic, durante seus primeiros anos de existncia, mostra falta de recursos dos membros para adquirir, um terreno para erigir um templo na rea urbana. De fato, a evangelizao das Assembleia de Deus na dcada de 1940 caracterizou-se num empreendimento religioso tmido e discreto, pelo fato de sua mensagem ser pregada num territrio eminentemente catlico e, por tanto, resistente a qualquer pregao que no fizesse aluso a Nossa Senhora. Os primeiros membros assembleianos em Caic, notificados por Cruz (1992), foram Jos dos Santos, Terezinha de Jesus Silva e seus pais vindos do catolicismo e presbiterianismo. Neste perodo, a pequena congregao j contava com dezesseis adeptos entre congregados, membros e obreiros. 73
A evangelizao assembleiana era desenvolvida estrategicamente em ncleos familiares, dirigidos por Joo Joaquim que pregava os ensinamentos pentecostais dos Dons do Esprito e as manifestaes de glossolalia marcavam a liturgia assembleiana. O crescimento desses ncleos evangelsticos resultou no choque desse minsculo territrio com os campos de atuao do catolicismo na cidade. Esse episdio narrado por Cruz (1992, p.13),
Para se realizar um culto nesta poca, era preciso marc-lo em duas casas distantes uma da outra. Isso porque o padre Guilherme Lantmam, sabendo onde iria se realizar um culto, logo providenciava, numa casa vizinha, reunies catlicas como forma de intimidar os evanglicos e impedir uma possvel participao dos catlicos da rea (...) muitas vezes ele conseguia impedir que o culto prosseguisse(...) segundo um dos entrevistados, atravs dos seminaristas e as pessoas que o acompanhavam, estes em certas ocasies at jogando pedras.
O relato que se mostra, traduz o ambiente de hostilidade que se estabeleceu em resposta pregao das Assembleia de Deus. O padre holands Guilherme Lantmam, proco na cidade de Caic, se tornou uma voz ativa contra a evangelizao assembleiana, fundamentando sua justificativa no argumento de que essa neoreligiosidade persuadia seu rebanho a se tornarem crentes. Com o passar do tempo essa hostilidade se transformou numa intolerncia pacfica, no momento em que no mais se viu oposio como as que provocadas pelo proco holands. O trabalho em domiclios realizado por Joo Joaquim pertencia ao Campo de Santa Cruz que, lentamente expandia seu raio de atuao nas cidades seridoenses. Os obreiros no cessavam de realizar reunies, nem de buscar novos fiis pela cidade. Em 1948 o pastor Manoel Rodrigues lder do Campo de Santa Cruz decidiu por razes at ento desconhecidas, transferir o trabalho de Caic jurisdio do Campo de Au, na poca, dirigido pelo pastor Manoel Leo. Neste mesmo ano Joaquim transferido de seu emprego como militar para Baixa Verde. Para substituir Joo Joaquim em sua funo pastoral, o pastor Manoel Leo responsvel pelo trabalho em Caic, convocou o Presbtero Francisco Bezerra para assumir e dar continuidade obra na cidade. 74
Na cidade de Parelhas a primeira evangelizao protestante se deu em 1963 na praa da cidade, tendo como primeiro pregador o pastor Presbiteriano Pedro Bezerra. Nesse ano tambm a pregao pentecostal em Parelhas discretamente difundida, atravs de missionrios das Assembleia de Deus vindos da cidade de Currais Novos. A evangelizao presbiteriana na cidade de Parelhas chamou a ateno de Maria de Lourdes. Admirada com o discreto trabalho do pastor presbiteriano, Maria de Lourdes decide escrever uma carta sua cunhada Severina Morais Pereira (irm Birina) de Currais Novos, relatando sucintamente sobre os atos evangelsticos promovidos pelos presbiterianos, que juntos somavam-se inexpressveis, cinco membros. Venturosa com a notcia, irm Birina, pioneira das Assembleia de Deus em Currais Novos, envia uma carta de retorno Maria de Lourdes, anunciando uma futura visita em sua residncia e que aproveitaria a ocasio para conhecer os irmos presbiterianos. No decorrente ano a missionria Severina Morais (Birina) prontamente cumpriu sua promessa, vindo casa de sua cunhada Maria de Lourdes como tambm alguns dos irmos presbiterianos. Nesta visita, a irm Birina props a realizao de um culto domiciliar noite. Com a permisso de Maria de Lourdes, Birina desenvolveu seu propsito missionrio, convidando o quanto pde pessoas para ouvir um pouco da mensagem pentecostal, e tambm para conhecerem ao embrionrio trabalho assembleiano. O nmero de visitantes que compareceram no culto, excedeu as expectativas da Irm Birina e at mesmo de Maria de Lourdes. Sendo assim, o primeiro culto assembleiano em Parelhas foi realizado em 28 de fevereiro de 1963, na casa de Maria de Lourdes, na Rua Ccero Tomas de Azevedo n 689. Apesar da significativa participao de pessoas de procedncia catlica no histrico culto evangelstico, no houve registro de converses ou quem quisesse se ajuntar ao convite evanglico naquela noite. Irm Birina props que os cultos continuassem a serem realizados, na casa de Maria de Lourdes, a partir de ento. Consentindo proposta, Maria de Lourdes na condio de auxiliadora da misso assembleiana, disponibiliza sua residncia para os trabalhos evangelsticos da igreja, tornando sua casa no primeiro ncleo de evangelismo assembleiano em Parelhas-RN.
75
Antes de retornar para Currais Novos a irm Birina promete trazer casa de Maria de Lourdes, o Pastor Miguel Campos, para celebrar o segundo culto do trabalho assembleiano na cidade de Parelhas. Passados alguns dias chegou residncia de Maria de Lourdes, uma pequena caravana de Currais Novos formada pelo Pastor Miguel Campos e Maria Campos, sua esposa, irm Birina, irm Maria e a irm Rosinha. Neste dia foi realizado novamente, um modesto culto na residncia de Maria de Lourdes. O ponto de pregao domiciliar de Parelhas, a partir de ento, ficou sendo assistido pela igreja de Currais Novos durante os meses de maro, abril e maio. Neste ltimo o pastor Miguel Campos telefona para o Pastor Raimundo Santana (presidente do Campo no Serid), e agenda sua visita na cidade no dia 7, no objetivo de contemplar a nascente igreja em Parelhas. Neste dia o pastor Miguel Campos realiza um suntuoso culto, Maria de Lordes a acolhedora do trabalho assembleiano, decidiu torna-se adepta, vinculando-se como congregada Igreja Assemblia de Deus, passando da condio de assistente para a de membro oficial do trabalho em Parelhas. O culto realizado dia 7 de maio estiveram presentes o Pastor Miguel Campos e esposa, irm Birina e uma caravana formada por jovens, todos vindos de Currais Novos. O pastor Raimundo Santana em 14 de maio d continuidade a pregao pentecostal em Parelhas, seu ponto de apoio foi casa de Maria de Lourdes,. Disposto a dirigir o culto Raimundo Santana. Em sua empreitada evangelstica de Raimundo Santana, cinco pessoas aceitam ao convite e se tornam congregados27, do ponto-de-pregao da Assemblia de Deus. O trabalho evangelstico assembleiano permaneceu na residncia de Maria de Lourdes at 1964, ano em que as reunies so transferidas para outro ponto de pregao na casa do irmo Manoel Gomes, lugar onde se passou a dar mais nfase aos cultos de orao. A redefinio das estratgias evangelsticas das Assemblia de Deus foi estimulada pela dinmica scioespacial desferida aps a derrocada das economias tradicionais que reconfigurou o perfil regional. O Serid, no sculo XX,
27
Segundo Maria de Lourdes dos primeiros membros de Parelhas era compostos em sua maioria por mulheres casadas e algumas crianas, de forma que o nmero de jovens era quase que inexistente.
76
foi marcado pelo crescimento e mobilidade populacional estimulados por processos scio-espaciais impressos na regio. Os anos que abarcam o perodo entre 1900-1970, o ritmo na migrao da populao campesina acelerou rumo s reas urbanas, acarretando um verdadeiro xodo rural. Essa nova dinmica populacional estava ligada aos efeitos decorrentes da crise do trip das economias tradicionais como algodo-pecuria-minerao, o que impulsionou os fluxos de deslocamento rural-urbano. No decorrer deste fenmeno, a elevao do contingente urbano foi notrio devido o processo de reorganizao espacial seridoense onde vrios desmembramentos territoriais foram realizados, fragmentando o espao regional em 14 novos municpios. Na dcada de 1980 os municpios seridoenses cresciam sob oscilao de nmeros percentuais entre populao rural e urbana, destacando-se sempre as taxas dessa ltima. J no intervalo entre 1991 e 2000 o contingente urbano acelera seu crescimento onde se tornou-se ainda mais ntido o movimento rural-urbano. No que ressalta Morais (2005, p.275), o incremento populacional nas cidades seridoenses gerou uma demanda social pela ampliao da infra-estrutura de saneamento bsico, eletrificao, transportes, pavimentao e iluminao de ruas. Nesse perodo o segmento de prestao de servios aumentou significativa com destaque para os transportes, as comunicaes e o comrcio, era a reconfigurao do perfil scio-econmico da regio que passava de agrrio/rural para tercirio/urbano. J em exerccio no pastorado, Raimundo Santana28 definiu novas estratgias de crescimento para dinamizar a evangelizao na cidade de Caic. A primeira empreitada foi a construo do templo sede de Caic em 1962. Deste ponto fixo emanariam todas as decises referentes expanso citadina das Assembleia de Deus. Alm do templo sede, foi pensado um mecanismo de assistncia social, comumente adotado por instituies religiosas que objetivam aumentar a dimenso social de suas aes de forma discreta e sem despertar
28
Depois de vinte e dois anos na frente do trabalho o Presbtero Francisco Bezerra remanejado de sua funo pastoral, em 1960, para outra igreja at ento desconhecida onde sucedido por Raimundo Joo de Santana, presbtero vindo de Natal. A nomeao de Raimundo Santana ao pastorado se deu em junho de 1960, sendo esta uma determinao do Ministrio de Natal, que gozava do poder de interveno nas ordenanas pastorais das igrejas no interior. A deciso do Campo de Natal mostra, claramente, que o Campo de Au estava subjugado a um centro de comando maior, no caso a Igreja sede em Natal, que controlava o remanejamento pastoral no Rio Grande do Norte.
77
maiores receios. Esse mtodo mostra-se eficiente no momento em que, as denominaes religiosas so acionadas pela populao carente, simplesmente, por seu carter filantrpico e no espiritual dissimulando qualquer inteno ideolgica. Esse artifcio foi concretizado com a fundao da escola primria Assemblia de Deus e do Centro Social que distribua, gneros alimentcios (em convnio com a Diaconia-Natal). Conforme Cruz (1992), a escola foi criada provisoriamente nas dependncias da casa pastoral em 1962, em parceria com a prefeitura de Caic, e oferecia um currculo em nvel de alfabetizao. Com aumento do nmero de crianas, essa escola passou a funcionar num prdio cedido pela Maonaria. No centro Social que funcionava no prdio da escola, eram oferecidos cursos de bordados, corte e costura, flores e outros. Nesse projeto, as pessoas que participavam eram em maior numero catlicos da periferia como Nova Descoberta e Joo XXIII. A filantropia em si eficiente no proselitismo de novos membros, uma vez que em contato com o projeto caridoso, a populao pode de forma mais branda e amigvel receber convites para participar de reunies e se tornar, em curto prazo um membro da igreja. Na gesto pastoral de Raimundo Santana, a Assemblia de Deus alcanou parte da periferia e o distrito municipal de Caic. Enquanto que a igreja, em Caic, definia suas reas de atuao e ampliava seus territrios, a Assemblia de Deus em Parelhas ainda inaugurava seu primeiro templo em 1965, e Currais Novos somente realizou o primeiro culto em templo prprio, em 1969, construdo na gesto do pastor Sebastio Pires. Em 1965 o pastor Raimundo Santana inicia o projeto para compra de um terreno para construo de um templo maior para a igreja de Parelhas. O propsito de erguer uma Igreja mais espaosa refletia o crescimento do nmero de membros e o xito do evangelismo assembleiano. Para levantar fundos para a construo do templo, foi criado em Parelhas pela superviso do Clube da Diaconia de Natal, o Clube de Mes. O clube de Mes consistia numa instituio com fins lucrativos das Assembleia de Deus, que oferecia cursos de bordados, coordenado pela irm Maria Lourdes, que atuava tambm como professora. O Clube de Mes possua tambm um carter assistencial, onde periodicamente recebia donativos vindos da Amrica do Norte, por intermdio da igreja central de Natal. Esses donativos eram repassados para os associados do Clube de Mes. 78
Durante a vigncia do Clube de Mes, o Pastor Raimundo Santana conseguiu comprar todos os materiais para construo da igreja. Ao iniciar a construo o pastor Raimundo Santana, v-se sem dinheiro para cobrir os gastos de mo-de-obra, tambm houve problemas relacionados falta de gua necessria para o preparo da massa do concreto. Essa escassa realidade justiava-se pela vigente pobreza dos irmos da poca como tambm pelo penoso contexto das secas, vivida por toda populao seridoense, deflagrada em 1960. Os gestos de voluntariedade dos irmos parelhenses foram decisivos neste rduo perodo de precariedade social. Para no cessar com as obras da construo do templo os irmos parelhenses formaram mutires de trabalho e levantaram as paredes do templo, como fato tambm vivenciado pela irm Maira de Lourdes que na poca se juntou ao mutiro de trabalhadores, trazendo na cabea gua do aude pblico para encher os tambores da construo. Desta forma a edificao do primeiro templo foi possvel mediante o esforo cooperativo dos membros pioneiros. Em 20 de novembro de 1965 o templo maior inaugurado com um grandioso culto. Da capital Natal29, caravanas de jovens e obreiros como tambm uma banda de msica que chegaram vinheram para o culto de abertura do primeiro templo de Parelhas. Durante o dia, os obreiros ficaram hospedados no colgio Baro do Rio Branco, enquanto que os msicos foram acolhidos numa casa em frente AABB. Esse evento contou com a parceria da prefeitura, que providenciou a retirada vegetao ao redor da igreja. A noite da inaugurao contou com ampla participao dos cidados parelhenses. No culto de abertura obreiro Manoel Matias foi nomeado como pastor na direo do trabalho em Parelhas, recebendo a assistncia peridica do pastor Raimundo Santana de (Caic) e Miguel Campos de (Currais Novos). Em Currais Novos a construo de um templo era uma necessidade imediata, porm, as condies financeiras, no que tangia a arrecadao de dzimos e ofertas entre os fiis ainda, era insuficiente para aquisio de um terreno no centro da cidade. Em 1969, na gesto do Pastor Sebastio Pires, o terreno doado e templo sede construdo na Rua Laurentino Bezerra. A partir
29
Na poca o pastor presidente das Assembleia de Deus no Rio Grande do Norte era o Pastor Joo Batista.
79
de ento, a Assemblia de Deus marca definitivamente a fixabilidade do seu territrio em Currais Novos. O templo das Assembleia de Deus constitui-se num territrio impregnado de significados e smbolos inerentes ao movimento pentecostal. O Fogo e o Batismo no Esprito Santo so os elementos marcantes do sistema de crena nas dos assembleianos e que rege a hierocracia da igreja, o poder do sagrado e suas prticas litrgicas. Com o templo construdo, o Pastor Sebastio Pires inicia os trabalhos de evangelizao pela cidade de Currais Novos, com um crescimento discreto e principalmente perifrico. Deste modo, o pentecostalismo assembleiano aos poucos foi abrindo pontos de pregao e valendo-se de uma simples interpretao bblica na durante os primeiros anos de evangelismo social. Na dcada de 1970 com objetivo de consolidar ensino da mensagem pentecostal, o pastor Raimundo Santana abre sob a responsabilidade da Assemblia de Deus de Caic, escolas bblicas dominicais nas congregaes de Nova Descoberta, Joo XXIII e Stio Riacho da Roa em Caic, e formou grupos vocais de jovens (Estrela de Jac), de crianas (Boas Novas) e senhoras (Lrio dos Vales). Nas escolas bblicas, as doutrinas e regras de f so ensinadas de forma mais sistemtica e formal; o currculo corresponde aos da teologia bsica e para essa misso so escolhidos os membros mais exmios no estudo de temas bblicos. O trabalho no Serid caminhou sob o pastorado de Raimundo Santana at 1971 quando foi transferido para Parnamirim e o pastor Jos Barreto assumiu seu lugar. A permanncia do pastor Jos Barreto na Igreja, em Caic, durou somente trs anos, o qual teve como primazia os trabalhos internos como o culto matutino e a construo da casa pastoral. No intervalo desses trs anos, o domnio da igreja em algumas reas recuou e a dimenso social sofreu um significativo retrocesso com o fechamento da escola primria e do centro social (CRUZ, 1992, p.15). Transferido em 1974, Jos Bezerra foi substitudo pelo pastorado de Jessuir Lisboa Barreto. A estratgia evangelstica do pastor Barreto se deu no mbito do evangelismo em massa com a realizao do primeiro congresso de jovens e de senhoras. O evangelismo em massa se apropria de tcnicas que permitem o 80
alcance de um nmero mximo de pessoas, em tempo mnimo. Os congressos so eventos anuais realizados, normalmente, durante trs ou quatro dias, onde na programao est a realizao de cultos noite e seminrios e estudos bblicos pela manh e tarde. Diz-se de jovens por que organizado pelos jovens da igreja local com a coordenao de um presidente e superviso do pastor. O objetivo desses congressos alcanar um numero potencial de jovens catlicos, ateus, cticos e espritas. Os rituais que transcorrem nos congressos de mocidade so assim expostos por Arajo (2007, p.204): o ponto mais alto a mensagem ministrada por um pregador (...) as principais nfases so o avivamento espiritual com o batismo no Esprito Santo, santificao e evangelizao e dedicao a obra de Deus com dons e talentos. A clientela jovem extremamente cobiada pelas lideranas das Assembleia de Deus, naturalmente pelo vigor e pela fora inerente a essa faixa etria. Converter um jovem significa para os assembleianos uma vida inteira de servios prestados a obra, e mesmo sendo um investimento longo prazo, gera timos retornos a instituio. A nova dinmica dada aos trabalhos da Igreja em Caic culminou na abertura de mais uma congregao, inaugurada no bairro Castelo Branco em uma na casa doada pela jovem Vera Lcia Nogueira Paiva. Outra rea de atuao assembleiana, foi estabelecia no Bairro Joo Paulo VI, aonde houve um evangelismo discreto e algumas converses de catlicos f pentecostal (CRUZ, 1992, p.16). A partir dos anos de 1980, os pastores que assumiram a direo da Igreja em Caic e cultivaram novas formas de transmisso da mensagem pentecostal. Com a sada do pastor Jessuir Barbosa em 1983 Caic, a liderana dos trabalhos (j em curso) foi assumida pelo pastor Jos Juvncio, que comanda a Assemblia de Deus, apenas um ano, at a pose do pastor Manoel Barbosa em 1984. A gesto de Manoel Barbosa foi ainda mais desafiadora no que se refere divulgao da mensagem pentecostal na sociedade caicoense, lanando mo adotando de tcnicas de evangelismo em massa. No mesmo ano em que foi apresentado como pastor da igreja criou um jornal O ATALAIA, que continha sees de noticias sobre Serid e devocionais evangelsticos, que, de forma sistemtica, anunciavam as doutrinas pentecostais. Exploraram ondas de rdio com a criao do programa radiofnico Vida Nova, na rdio A voz do Serid. Ainda na dcada de 1980 foi construda uma congregao no bairro Joo XXIII 81
em Caic, procedeu-se a ampliao do domnio territorial da igreja em Caic Timbaba dos Batistas. O trabalho do pastor Manoel Barbosa na igreja de Caic elevou a sua condio Sede de Campo. Os dzimos dos membros conferiam autonomia financeira referida igreja e a possibilidade de sustentar congregaes e trabalhos em cidades circunvizinhas, o que elevou sua posio na hierarquia territorial sede de Campo. Todavia, a Assemblia de Deus, em Currais Novos, j havia conhecido o potencial da evangelizao radiofnica em 1975, quando foi implantada a Rdio Breju. A Assemblia de Currais Novos ampliou significadamente sua difuso evangelstica ao explorar a tcnica de evangelismo em massa, quando transmitiu a mensagem pentecostal a todo municpio e em cidades adjacentes. Esse empreendimento conferiu Assemblia de Deus do Serid, pioneirismo na explorao da tcnica radiofnica30 no meio evanglico. A rdio e a mensagem impressa revelam a busca de uma nova clientela, mais informada e em condies de vida melhores do que a populao perifrica. Esse empreendimento religioso mostra a clara inteno da Assemblia de Deus de querer alcanar uma classe mais privilegiada da sociedade caicoense e curraisnovense. Isso significa que a territorialidade assembleiana apesar de priorizar as reas perifricas, na dcada de 1970 e 1980, denotava o empenho de seus pastores para aumentar o raio de influncia de seus restritos territrios nos centros urbanos. Esses fatos emergem como vestgios que expressam o interesse da igreja, tambm pelas elites. A expanso de novas congregaes em torno da populao mais carente e em condies precrias de moradias tornou-se uma meta da igreja na dcada de 1960. A prioridade da classe urbana economicamente fragilizada foi estratgia espacial mais eficaz na ampliao das reas citadinas sobre sou controle, ou seja, na formao de novos territrios. A despeito das periferias urbanas observada uma influncia mnima da territorialidade catlica e das igrejas evanglicas tradicionais. A anlise de Souza (2004, p.24), deixa claro essa assertiva, historicamente, havia um fosso enorme deixado tanto pelo catolicismo quanto pelo protestantismo em relao aos interesses das classes populares (...).
30
Histria oral de Maria de Lourdes Campus da Silva entrevistada na sua residncia em 05/11/2006.
82
Essa lacuna no Serid comeou a ser preenchida princpio pelo discreto evangelismo das Assembleia de Deus. O proselitismo dos pobres e o discurso da superao ganhou espao e acolhimento nos templos assembleianos. Sobre a evangelizao da Assemblia de Deus importante ressaltar que, a maioria de seus agentes, provm de bairros perifricos e que, portanto se infiltram com mais facilidade nestes espaos de precariedade social. Esta causalidade nos remete a entender o pentecostalismo assembleiano como uma religiosidade adaptada ao espao do pobre. Nesse modo de ser religioso, o fiel desprende-se de liturgia sistemtica, sendo possvel expressar sua f de forma livre e espontnea. Assim a territorialidade das Assembleia de Deus se estabelece seguindo a mesma tendncia de crescimento do pentecostalismo em nvel nacional, como um espao de pouca elaborao teolgica e de mais experincias espirituais. Souza (2004, p.24) lana um olhar sociolgico, que revela das bases dessa territorialidade, ao afirmar que
[...] necessrio ressaltar que o espao do pobre coincide com o espao natural onde nasceu o pentecostalismo; no se tratando, nesse particular, de um espao do outro, mas do lugar prprio dos pregadores pentecostais e a multido dos fiis aflora no meio da pobreza, na periferia urbana.
O substrato analtico de Souza capaz de decifrar as nuanas da territorialidade das Assembleia de Deus, quando confronta a condio social do agente evangelizador com a do evangelizado. Aqui se decodifica os mecanismos da estratgia e revela a simplicidade com que ela se difunde em meio populao economicamente menos favorecida. O exerccio de compreenso da evangelizao assembleiana est em avaliar a natureza das relaes sociais que se inscreve nesses campos de poder. O que se torna claro que h um espao comum compartilhado entre o evangelizado e o evangelizador, onde as adversidades so sentidas e vividas intensamente por ambas s partes. Fica evidente que o referido espao o da excluso onde as benesses do progresso inexistem e seus habitantes seguem a marcha do desenvolvimento tcnicocientfico-informacional como meros espectadores de uma realidade distante e excludente. Os assembleianos vem neste contexto urbano, uma terra frtil 83
germinao da f pentecostal, regada pela mensagem dos Dons do Esprito acessveis to somente pela comunho e fidelidade entre o homem e Deus.
84
85
O circunspecto evangelismo da Igreja Evanglica Assembleia de Deus (AD) nos municpios seridoenses de Caic, Currais Novos e Parelhas, no entremeio das dcadas de 1940 a 1980, revelou o mpeto e a estratgia organizacional da referida instituio no estabelecimento de um controle territorial peculiar, como tambm na ampliao e no domnio de uma rede de igrejas e congregaes difundidas, sobretudo nas cidades limtrofes e em suas periferias urbanas. A construo dos templos de Caic, Currais Novos e Parelhas at o final da dcada de 1960, hoje igrejas Sede de Campo Eclesistico, fortaleceu a estrutura do embrionrio sistema territorial da denominao, constituindo-se, dessa forma, como pontos de sustentao e de gesto dos territrios assembleianos no Serid. Assim, por meio do contnuo trabalho evangelstico dos assembleianos, correspondente aos perodos de 1943 a 1993, a territorialidade assembleiana abarcou todo espao seridoense, no entanto, ainda superado pela secular territorialidade catlica. Com isso, o poder evangelstico da Assembleia de Deus difundiu dentro de seus limites de influncia no Serid um discurso religioso pautado nos bens msticos, os quais enfatizavam os Dons do Esprito Santo como proposta de vida crist, a princpio regrada numa espiritualidade asctica. Esse evangelismo caracterstico do pentecostalismo ortodoxo, arquitetado nas plagas seridoenses, manifestou-se hodiernamente numa lgica territorial compreendida to somente pelo controle de seus campos eclesisticos, o qual no momento foi regido pelo templo de Caic. No entanto, mais tarde apresentou uma tessitura tridimensional, dividida em trs campos autnomos, em funo da abertura de pontos de pregao e congregaes por intermdio das igrejas de Currais Novos e Parelhas. bem verdade que ao desenvolverem o seu projeto de cunho proslito nas cidades seridoenses supracitadas, os assembleianos no tiveram como 86
objetivo imediato a apropriao concreta de espaos citadinos, e sim uma apropriao abstrata, influenciando determinado grupo social. Essa apropriao abstrata lhes assegurou uma representao, como tambm a permanncia em locais, bairros, zonas, entre outros segmentos espaciais. Assim, para o nascimento de um ncleo evangelstico, a princpio pregavam-se as verdades pentecostais ao indivduo, e havendo adeso, logo a residncia desse novo convertido tornava-se ponto de difuso da mensagem assembleiana. Esse artifcio sustentou as bases espaciais da nascente territorialidade da Igreja Assembleia de Deus em seus primrdios no Serid. Cabe ressaltar o que elucidou Raffestin (1993, p.144) sobre a essncia de uma apropriao espacial: [...] produzir uma representao do espao j uma apropriao [...], mesmo se isso permanece nos limites de um conhecimento. De fato, a pregao dos Dons do Esprito como representao ou marca distintiva foi o principal trunfo territorial31 desenvolvido pelos assembleianos no perodo de 1943 a 1960. Essa estratgia revela a primeira imagem objetiva do embrionrio territrio, uma vez que foi a partir dele que se desenvolveu um campo de poder, regido por um sistema de cdigos de conduta compreendidos na execuo de um Estatuto e de um Regimento Interno. Diante desse contexto, o territrio assembleiano, ainda em 1960, era informe no que diz respeito tessitura espacial de seus templos. A constituio de trs templos assembleianos neste perodo dilatou sua tessitura territorial e lhe conferiu formas mais articuladas, visto que, se tornara possvel ligar os pontos de pregao e congregaes a centros gestores fixos. Desse modo, com os templos prprios de Caic, Currais Novos e Parelhas a Assembleia de Deus no Serid expandiu-se em sentido circunscrito por cidades adjacentes. Entretanto, somente depois das construes dos templos foi que o projeto de ampliao pde contar com estruturas eclesisticas efetivamente organizadas. A igreja de Caic na hierarquia regional, encontrava-se, em 1960, na condio de centro de comando das Assembleias de Deus no Serid, em virtude do nvel dos empreendimentos evangelsticos desenvolvidos pelos assembleianos caicoenses.
Consequentemente, a igreja em Currais Novos expandiu a sua territorialidade por meio de um processo de abertura de novos trabalhos evangelsticos, enquanto
31
Esse termo se remete a determinados mecanismos espaciais, que asseguram a defesa do territrio (HAESBAERT , 2007, p.55).
87
que Parelhas, mesmo auxiliando vrios trabalhos evangelsticos em cidades vizinhas, no conquistou autonomia ante a igreja de Caic, no que diz respeito gesto de suas igrejas filiais. Dentre os mecanismos anteriormente citados sero destacadas, no captulo a seguir, as prticas territorializantes que se configuram como prolongamento e consequncia dos mecanismos imateriais, que os precederam no estabelecimento dessa territorialidade religiosa. Desvendar-se- o processo de formao e gesto dos territrios assembleianos no Serid, sob a abordagem relacional como consequncia direta das relaes de poder (HAESBAERT, 2007, p.55). A territorialidade
assembleiana, assim analisada, tambm considera como ponto fundamental das relaes sociais, as configuraes espaciais em sua concretude. Isso significa enxergar a base material do territrio como componente indissocivel das relaes de poder que o envolvem. Contudo, o j referido autor faz um alerta para no cair num excesso de sociologizao, j que pode menosprezar a concretude espacial e consequentemente desgeografizar o territrio (HAESBAERT, 2007, p. 55). Sabe-se que o territrio relacional no se revela apenas por uma teia de relaes sociais, ele envolve um complexo de processos sociais e espao material, no importando se este ltimo de primeira ou segunda natureza (GODELIER apud HAESBAERT, 2007, p. 56). importante tambm avaliar que neste processo dialtico, o territrio no necessariamente estvel no que se refere aos seus limites e fronteiras, antes o sistema territorial dinmico, caracterizado pelo movimento e fluidez de suas delimitaes. Com isso, tratando-se da formao da tessitura territorial da Assemblia de Deus, compreendeu-se que os pontos operacionais de evangelismo que organizados nas dcadas de 1970 a 1990, foram estabelecidos de forma aleatria e transitoriamente. Aleatoriamente, porquanto no haviam no ponto de vista geogrfico pr-requisitos indutivos para a abertura de uma congregao, a no ser o de conquistar almas para Cristo, e transitrio, porque muitas das congregaes tiveram um carter fugaz, em virtude de se encontrarem em sales e/ou em prdios locados. A fugacidade e a temporalidade dos pontos de pregao assembleianos eram controladas pelo poder centralizador do pastor. Essa centralizao decisria 88
constituiu-se como um mecanismo essencial para manter a unidade ministerial do corpo de obreiros, e, por conseguinte, do territrio. Para manter um territrio articulado e um conjunto de princpios doutrinrios32, a Assembleia de Deus tenta, at hoje, preservar a sua unidade territorial perpetuando junto aos membros, congregados e, sobretudo, aos obreiros, o seu sistema normativo, o qual pouco flexvel a inovaes e, ainda, desenvolvendo uma superviso contnua de atos administrativos. A pouca flexibilidade normativa (doutrina/estatuto) e a ampla flexibilidade espacial (autonomia para abertura de congregaes) formam uma combinao estratgica que ainda subsiste por ser uma gesto, que apesar de concentrar as decises estatutrias dos campos do Serid Igreja Evanglica Assembleia de Deus no Rio Grande do Norte (IEADERN) Central, localizada em Natal/RN, resguarda o poder de interveno local aos pastores supervisores dos campos seridoenses. A liberdade que esses pastores de campo seridoenses tm para tomar decises relativas gesto interna e aos pontos de evangelizao manifesta os micropoderes, os quais assumem maior nitidez em suas formas mais elementares, tais como: a nomeao de obreiros e membros para cargos e departamentos da igreja, assim como para a direo de congregaes. Dessa forma, os nomeados para cargos de direo executaro as determinaes inerentes a funo que lhe foi atribuda, e estaro sob a orientao espiritual e doutrinria do pastor. Para Foucault, o grande decifrador das formas do poder, os mecanismos de dominao, so refletidos nos poderes que [...] se exercem em nveis variados e em pontos diferentes da rede social e neste complexo os micropoderes existem integrados ou no ao Estado (FOUCAULT, 2005, p.12). Neste aspecto o poder assembleiano no reside necessariamente num sistema tradicional de dogmas rigidamente estabelecidos para limitar as aes de seus fiis, e sim em um sistema disciplinar entendido por Foucault como mtodos que permitem o controle minucioso das operaes do corpo, que assegura a
32
A doutrina das Assembleia de Deus um prolongamento das Doutrinas Pentecostais que distinguem suas denominaes ou movimento dentre as igrejas protestantes e evanglicas. As doutrinas pentecostais so sistematizadas nos seguintes temas: a doutrina do Esprito Santo, Batismo no Esprito Santo (glossolalia). Dom ou dons do Esprito Santo so mencionados em 1 Corntios 12.1-11, os quais so: profecia, lnguas, dons de curar e maravilhas e os dons ministeriais (ARAJO, 2008, p.152)
89
sujeio constante de suas foras e lhes impem uma relao de docilidadeutilidade (FOUCAULT, 2005, p.17). Constatou-se que para desenvolver uma gesto pacfica nos campos assembleianos, os lderes trabalham uma ideologia de submisso, que prepara os fiis para o trabalho evangelstico. No entanto, para que isso ocorra imprescindvel a pregao de verdades bblicas, encontradas em vrios trechos nas epstolas paulinas, as quais produzam uma concepo de humildade e subordinao aos lderes. Como todo territrio fruto de relaes de poder, delimitadas concreto e simbolicamente no espao, sero mencionadas as principais instncias e mecanismos de controle territorial destes pentecostais ortodoxos, que sintetizam a singular hierocracia33 das Assembleias de Deus no Serid. Tais mecanismos visam proteger os pilares de sua estrutura territorial dos abalos ssmicos provocados pelo forte processo de secularizao da sociedade. A preocupao em preservar as suas bases territoriais, denota a luta pela (re)afirmao do poder por parte de suas lideranas. Assim sendo, indispensveis a todo e qualquer territrio, os trunfos territoriais podem ser redefinidos sempre que se mostrarem ineficientes na proteo de suas fronteiras. Durante a concepo dos campos eclesisticos vrios trunfos foram aprimorados, outros acrescentados e muitos redefinidos. O advento tanto da pluralidade religiosa, quanto das novas estratgias34 de evangelizao foram determinantes para que os pastores assembleianos abdicassem de alguns preceitos, que h muito eram vistos como ameaa integridade crist dos irmos, como, por exemplo, o uso do rdio e da televiso35.
33
Na anlise de Rosendahl (2001, p.9) a hierocracia se remete ao poder do sagrado - que se manifesta espacialmente por uma organizao territorial religiosa. 34 Essas estratgias envolvem adoo de mtodos de evangelizao promovidos pelos evanglicos como, por exemplo, peridicos, rdio, internet, TV, entre outros. 35 Nas Assembleia de Deus, a discusso sobre a questo se era lcito ou no a igreja utilizar o rdio como instrumento de evangelizao comeou oficialmente na Conveno de 1987, realizada em So Paulo (SP). A referida conveno decidiu, unanimemente, aprovar o uso do rdio como instrumento de evangelizao, assim [...] no poucos crentes assembleianos, pelo simples motivo de possurem ou assistirem s programaes da caixa mgica de som um dos ttulos dados pejorativamente, foram disciplinados. E em 1957, sete anos aps as primeiras transmisses da TV brasileira, a Conveno Geral das Assembleia de Deus, reunida na AD de Belo Horizonte (MG), debateu o uso da televiso pelos crentes assembleianos. Os convencionais decidiram-se pela proibio, sob pena de excluso dos crentes que assistissem ou possussem o aparelho. Quatro Convenes Gerais aps a realizada em Belo Horizonte, na Assemblia Geral das Assembleia de Deus, realizada na cidade de Fortaleza (CE), em 1968, o assunto entrou novamente em pauta. Assim, aps muito debate, em 1969, o Mensageiro da Paz publicou a resoluo convencional sobre o tema, com o seguinte teor: 1) os pastores e evangelistas da
90
J quanto ao sistema hierrquico assembleiano possvel perceber que, diferentemente dos sacerdotes catlicos, comumente ordenados aps uma longa preparao teolgica e vocacional, os seus obreiros so classificados mediante uma vida crist exemplar, como tambm pela relevncia dos trabalhos prestados igreja, sendo irrelevante a sua profundidade em conhecimento teolgico. Entretanto, o domnio de fundamentos e conceitos bblicos indispensvel. Ainda concernente ao corpo de sditos assembleianos, Arajo define as caractersticas bsicas desses obreiros designados para serem auxiliares ministeriais em nveis diferenciados:
[...] nas Assembleias de Deus o termo obreiro designado de todos os cargos, desde os auxiliares de trabalho e diconos (ajudantes do dirigente no ofcio do culto ou nas demais atividades das igrejas) at os pastores. Para a escolha e ordenao de obreiros, desde as primeiras dcadas da AD, prevalece o critrio da espiritualidade e da prtica do trabalho na igreja local, em detrimento da necessidade do conhecimento bblico e formao teolgica, embora nas primeiras Convenes Gerais, como a de 1935, a liderana da denominao j manifestasse preocupao com a formao bblica e teolgica do obreiro, principalmente os dirigentes de igreja e os pregadores (ARAJO, 2008, p.519).
A no exigncia de um perodo formal e/ou acadmico de estudos teolgicos permite que as ADs, em curto prazo, tenham a disposio delas um nmero potencial de obreiros dispostos a auxiliar tanto financeiramente, quanto na realizao de projetos evangelsticos. Desta forma, a abertura de novas congregaes pde contar com obreiros empiricamente preparados para o ofcio da pregao e da direo da liturgia dos cultos. O pastor da Igreja Sede de Campo, pastor supervisor 36 , tem seus poderes restritos sua jurisdio eclesistica, intervindo de forma absoluta nas decises locais e parcialmente nas igrejas filiais. Esse padro de gesto prolongase a todos os pastores de igrejas filiais, distinguindo-se apenas na interveno de decises de carter jurisdicional do campo, estritas apenas aos pastores supervisores.
Assemblia de Deus no Brasil no devem usar aparelhos televisores; 2) Os que j o possuem, devem desfazer-se deles at a prxima conveno; Os obreiros devem recomendar s igrejas que abstenham do uso de televisor; 4) Que os que possuem desfaam-se dos mesmos, a fim de evitar a suspenso (ARAJO, 2008, p.725-844). 36 Conforme prescrevem os artigos 23 e 24 dispostos no captulo VII, seo I do Regimento Interno da IADERN. (REGIMENTO INTERNO DA IEADERN. Disponvel em: <http://www.adnatal.org.br/documentos.htm> Acesso em: 13 fev. 2010).
91
A dimenso territorial da Assembleia de Deus no Serid faz parte de um amplo projeto de interiorizao concebido pela Igreja Sede Estadual da IEADERN e executado pelas igrejas de Caic, Currais Novos e Parelhas. O mencionado projeto foi orientado pelo Pr. Joo Batista da Silva, na ocasio, presidente da IEADERN, na dcada de 1960. Na gesto desse pastor a Assemblia de Deus conseguiu estender a todos os 123 municpios do estado do Rio Grande do Norte sua atuao evangelstica. A amplitude territorial alcanada no RN pela Assembleia de Deus demandou um projeto de integrao entre a IEADERN as igrejas do interior. Todavia, esse feito foi realizado somente pelo Pr. Joo Gomes da Silva, que sucedeu o Pr. Joo Batista na presidncia da IEADERN, no ano de 1993. Nessa gesto a jurisdio eclesistica da AD no Serid foi (re)formulada, com a finalidade primeira de organizar espacialmente o crescimento da denominao e aperfeioar a transmisso das instncias do poder assembleiano. Com isso, em 2009, uma comisso foi formulada com o objetivo de adaptar os campos s novas exigncias administrativas e doutrinrias das Assembleias de Deus no RN. O Estatuto Social e o Regimento interno da IEADERN sero os principais indicadores da gesto territorial, os quais sero investigados no presente estudo, e nortearo o desvendamento das diversas relaes de poder reproduzidas pelos campos assembleianos na regio do Serid norte-rio-grandense.
3.2 AS INSTNCIAS DO PODER TERRITORIAL DA ASSEMBLIA DE DEUS NO BRASIL, FORMAO E RELAES DE PODER
Olhando o interior do territrio assembleiano possvel perceber um corpo eclesistico organizado hierarquicamente e submetido autoridade do pastor. Nas igrejas sede de Caic, Currais Novos e Parelhas, por exemplo, o pastor em exerccio assume a funo de Supervisor de Campo. Alm de liderar a hierarquia de obreiros do local. Entretanto, esse quorum de obreiros juntamente com o seu respectivo pastor, esto sujeitos s normas e aos regimentos emitidos por uma instncia supra-regional e outra supra-local. 92
Dessa forma, as resolues dos artigos estatutrios emitidos a todos os campos eclesisticos da Assembleia de Deus no Serid obedecem s diretrizes de rgos idealizados para reger o poder institucional e identitrio assembleiano, como a Conveno Geral das Assembleias de Deus (CGADB) no Brasil e a IEADERN na condio de Sede Estadual das Assembleias de Deus no RN, residida na cidade do Natal. Para entender a transmisso do poder no sistema territorial assembleiano no Serid sero traadas as frentes evangelsticas sentido Norte-NordesteSudeste, responsveis pela formao das primeiras lideranas nacionais, em seguida, sero decompostas as suas autarquias institucionais, analisando-se como se efetua o escoamento do poder entre as instncias assembleianas e como ele interfere nas decises das igrejas a nvel local.
3.2.1 Frentes evangelsticas da Assembleia de Deus no Brasil de 1911 a 1930: expanso e gesto sob a liderana dos missionrios suecos
O processo de estabelecimento da Assembleia de Deus no Brasil, ocorrido a partir de 1911 no estado do Belm do Par (PA), perseverou mesmo diante de uma significativa incapacidade financeira dos membros fundadores, uma vez que sem nenhum auxlio de um programa missionrio, os pioneiros Daniel Berg e Gunnar Vingren, estavam desprovidos a princpio de [...] recursos humanos, tcnicos e monetrios (ARAJO, 2008, p. 39). Dessa forma, como estavam impossibilitados de formar um quorum de obreiros que os auxiliassem na criao de ncleos evangelsticos e de novas igrejas no Belm do Par, a evangelizao pessoal, de incio, se tornou o principal objetivo dos pioneiros. As primeiras funes ministeriais37 na Assembleia de Deus no eram distribudas sob critrios regimentais e/ou estatutrios, e sim de forma espontnea. Para ser obreiro bastava que o indivduo desenvolvesse um trabalho comprometido com os propsitos dos missionrios e se apresentasse como um crente fiel e dedicado obra evangelstica.
37
Na Assemblia de Deus os cargos de cooperador, dicono, presbtero, evangelista so concedidos aos fiis levando como critrios essenciais a obedincia e a dedicao deles com o ministrio local.
93
Essa flexibilidade na nomeao hierrquico-eclesistica se mostrou como uma ttica adotada pelos pioneiros para arregimentar o primeiro corpo ministerial da igreja no pas. Nesse perodo, conforme afirma Arajo (2008), grande parte das funes ministeriais eram desenvolvidas por estrangeiros (suecos) que vinham para o Brasil a convite de Gunnar Vingren e Daniel Berg,
Primeiros momentos da Assembleia de Deus. poca de pioneirismo, dos primeiros missionrios estrangeiros entra as Assembleias de Deus, uns serviam como pastores, outros como evangelistas, outros como doutrinadores, escritores e mestres (ARAJO, 2008, p.39)
No caso dos ministrios de ensino como os desenvolvidos por doutrinadores e escritores, a Assembleia de Deus teve a importante contribuio de obreiros de boa qualificao teolgica, como o missionrio sueco Lars-Erik Samuel Nystrm, que alm de ser missionrio no Belm do Par, Acre, So Paulo e Rio de Janeiro, trabalhou como escritor, desenvolvendo as primeiras sistematizaes doutrinrias da insipiente teologia pentecostal brasileira. As primeiras nomeaes pastorais foram designadas pelos missionrios Daniel Berg e Gunnar Vingren, aps um ano de trabalho evangelstico no estado do Par. A falta de pastores e obreiros j se fazia sentir, em razo do
crescimento do nmero de membros em vrias cidades do estado paraense. Dessa forma, em 1912, foi registrada a primeira ordenao pastoral38 de um brasileiro nas Assembleias de Deus no Brasil. Todavia, mesmo sem um quadro efetivo de pastores para gestar as primeiras igrejas, as frentes missionrias das ADs no cessavam de avanar no Estado do Norte rumo ao Nordeste. Essas frentes eram compostas basicamente pelos pioneiros Daniel Berg, Gunnar Vingren, alguns missionrios suecos e membros locais. Assim sendo, durante um perodo de oito anos, a comear de 1911, essa frente evangelstica conseguiu instituir 15 igrejas em diferentes cidades e distritos paraenses, abarcando uma poro considervel do referido estado. Assim, no entremeado desses anos, especificadamente em 1914, comeam as primeiras evangelizaes das Assembleias de Deus no sentido
38
O primeiro pastor consagrado pelas Assembleia de Deus foi Isidoro Filho, consagrado pelo missionrio Gunnar Vingren. Ele foi ordenado para pastorear uma igreja em Soure, na Ilha de Maraj. Esse feito marca o incio da formao da liderana brasileira (ARAJO, 2008).
94
Norte-Nordeste39. Movidos pela falta de missionrios experientes que ajudassem no crescimento humano e espacial das igrejas, Vingren e Berg viajaram a Estocolmo e l efetuaram a ligao de suas igrejas no Brasil misso sueca, coordenada por Lewi Pethrus, pastor da Igreja Filadlfia de Estocolmo e lder internacional do Movimento Pentecostal na Sucia. Com isso, a partir desse momento o Brasil se tornou oficialmente campo missionrio sueco, e passou a receber reforos peridicos40 de missionrios vindos da Sucia para auxiliar e fundar novos trabalhos em nome da Assembleia de Deus. A ao evangelstica das Assembleias de Deus em Belm obteve um modesto aumento no perodo de 1916 a 1920, especialmente nas Ilhas do Par41 e nos distritos cortados pela estrada de ferro: So Lus, Capanema, Catipuru e Bragana. Entre esses anos citados destaca-se o ano de 1917 pelo incio da imprensa assembleiana, com a criao do Jornal Voz da Verdade, substitudo pelo jornal Boa Semente em 1919. Diante disso, a expanso das Assembleias de Deus no sentido NorteNordeste continuou ininterrupta, e at 1921, a AD j possua frentes evangelsticas em quase todos os estados do Nordeste, o que inclua Alagoas (em 1914), Pernambuco (em 1916), Rio Grande do Norte (em 1918) e Maranho (em 1921). A maioria dos trabalhos institudos no Nordeste foi aberta por missionrios da misso sueca e por membros de procedncia nordestina que haviam tido a experincia pentecostal no Belm do Par. Dessa forma, ao retornarem para as suas terras de origem, esses novos convertidos levaram com veemncia a indita mensagem pentecostal aos sertes nordestinos. Sem nenhuma ordenao ministerial formal, esses desbravadores pentecostais recebiam o aval entusistico de Vingren e Berg para abrirem ncleos evangelsticos em nome da misso assembleiana.
39
O primeiro trabalho no nordeste brasileiro foi em Uruburetama (CE). Ele foi iniciado por Maria Jos, ex-batista e cooperadora dos missionrios Daniel Berg e Gunnar Vingren no estado do Belm no ano de 1911. No decorrente ano, em 12 de outubro, chegou ao Estado do Alagoas o missionrio sueco Otto Nelson e em 14 de dezembro chegou a Campina Grande na Paraba, levando a mensagem pentecostal, Manoel Francisco Dudu (ARAJO, 2008, p. 79). 40 Os perodos nos quais a misso brasileira recebeu missionrios suecos foram: 1914; 1916; 1917; 1918; 1921; 1922; 1923; 1924; 1928 e 1930. 41 Conforme registrou Arajo (2008, p.81), o missionrio Samuel Nystrm, deixou o trabalho nas Ilhas do Par com 14 igrejas estabelecidas.
95
Mesmo com as enormes dificuldades de locomoo, ocasionadas pela imensido do territrio brasileiro, Vingren visitou42 vrios trabalhos assembleianos no Nordeste, evangelizando, inaugurando ncleos evangelsticos e dando assistncia doutrinria. Em 1921, reavendo a necessidade de integrao e compartilhamento de experincias dos pastores43 do Norte, [...] realizou-se, de 18 a 22 de agosto na AD de So Lus, a primeira Conveno Regional do Estado do Par e do Brasil (ARAJO, 2008, p. 44). A conveno de So Lus teve a participao exclusivamente das igrejas do Par. Porm, esse evento se concretizaria como um modelo de gesto assembleiana a nvel regional que seria adotado mais tarde por lideranas de vrias regies do pas. Entretanto, somente na dcada de 1920 os missionrios suecos voltaram os olhos para o Sul e o Sudeste do Brasil. De acordo com o relato de Arajo (2008, p.81) Gunnar Vingren realizou um itinerrio missionrio durante trs meses, e antes de visitar as cidades de [...] Tubaro, Cricima e Itaja, cidades de Santa Catarina [...], ele realizou uma sondagem em Santos (SP), efetuando na ocasio um discreto evangelismo e, posteriormente, seguiu para o Rio de Janeiro. Em 07 de julho, Vingren realizou um culto em um orfanato localizado no bairro So Cristovo, o qual era dirigido pelo missionrio ingls Robert (Jaime Roberto). Nesse evento 16 pessoas aceitaram a mensagem pentecostal. Isso indicou que o local se tratava de um campo frtil para novos proselitismos. Todavia, mesmo com as converses que ocorreram no culto, o primeiro corpo de adeptos assembleianos no Rio de Janeiro se formou apenas em 1923, por meio dos cultos realizados na residncia do Sr. Eduardo de Souza Brito, com assistncia de alguns crentes que haviam se mudado de Belm para o Rio de Janeiro (ARAJO, 2008, p. 82). J no estado de So Paulo, em razo do descontnuo evangelismo iniciado por Vingren em Santos (SP) no ano de 1920, somente em 1924 por meio de Daniel Berg e esposa foi retomado o evangelismo no referido estado. Aps trs anos estruturando e liderando a igreja de Santos Berg viajou para So Paulo
42
As viagens missionrias de Vingren ao Nordeste brasileiro foram para: Alagoas (em 1914); Cear (em 1915) e em 1920 o missionrio realizou uma grande viagem, passando novamente pelo Cear, depois pelo Rio Grande do Norte, Paraba e Pernambuco (ARAJO, 2008, p. 79-81). 43 O principal assunto tratado parece ter sido a evangelizao, o esclarecimento de pequenas dvidas teolgicas e o andamento dos trabalhos das igrejas representadas (ARAJO, 2008, p.81).
96
(capital do estado). Porm, antecipadamente transferiu a sua liderana para o missionrio noruegus Jahn Srheim, que h algum tempo o auxiliava em seus trabalhos pastorais. Assim, cinco anos depois da abertura dos trabalhos em So Paulo (capital), o percurso evangelstico da Assembleia de Deus contabilizara 16.000 membros e 150 igrejas (ARAJO 2008, p. 84). Neste perodo a mensagem pentecostal j havia percorrido 20 dos 26 estados da federao brasileira44. Os missionrios suecos neste perodo ainda detinham o controle das nomeaes pastorais e das decises doutrinrias da igreja. Todavia, o crescimento de novas igrejas na dcada de 1920 foi sustentado em sua maioria por pastores e membros brasileiros, fortalecendo, dessa forma, a liderana nacional, que estaria por conquistar mais autonomia ante a gesto dos missionrios suecos, uma vez que a autoridade normativa dos missionrios suecos nos conceitos teolgicos e evangelsticos restringia a atuao dos pastores brasileiros. Em sntese Arajo (2008, p.45) traa o cenrio do controle territorial da igreja exercido pelos missionrios suecos em 1929. De acordo com ele:
Das 21 igrejas principais no pas nessa poca, os missionrios pastoreavam sete (Belm, Porto Alegre, Santos, So Paulo, Rio de Janeiro, Macei e Recife) e exerciam sua liderana direta sobre os pastores de oito (Macap, Salvador, Niteri, Aracaju, Campina Grande, Manaus, So Lus e Porto Velho). Ou seja, os missionrios suecos detinham a liderana de mais de 70% das principais igrejas, sem contar a influncia indireta em outros estados.
Diante disso, em 1929 o poder institucional das Assembleia de Deus comeou a ser debatido pelas lideranas nacionais dos estados do Norte e Nordeste, no que diz respeito liberdade para desenvolver novas estratgias evangelsticas. Com a liderana sueca45 pastoreando os maiores templos do pas, ficou notria a fora decisria desses estrangeiros nos rumos doutrinrios e
44
Arajo demonstrou quem levou primeiro a mensagem pentecostal e quando pregou, no representando necessariamente quem e quando a Assemblia de Deus foi fundada no estado. Ele retratando o Incio das Assembleia de Deus por estados (ARAJO, 2008, p.54). 45 A liderana sueca remete-se aos missionrios que alm de Gunnar Vingren e Daniel Berg assumiam cargos pastorais nas Assembleia de Deus em 1929 como Nels Nelson (Belm do Par); Gustav Nordlund (Porto Alegre, RS); Bruno Skolimowski (Curitiba, PR); Simon Lundgren (Santos, SP); Samuel Nystrn (So Paulo); Algot Svensson (Macei, AL); Nels Nelson (Macap, AP); Otto Nelson (Salvador, BA) e Samuel Hedlund (Niteri, RJ).
97
expansivos da igreja no Brasil. A dominao sueca sustentou um forte propsito das lideranas nacionais do Norte e Nordeste pela autonomia de suas decises eclesistica. Com isso, os pastores pertencentes s regies citadas, h algum tempo sentiam uma relativa supresso das suas atuaes evangelsticas ante a liderana sueca. Decididos a ampliar o espao poltico-eclesistico no apenas dos pastores brasileiros no Norte e Nordeste, mas tambm das demais lideranas nacionais, em seus respectivos campos jurisdicionais, [...] um grupo de obreiros46 se reuniu, de 17 a 18 de fevereiro de 1929, em Natal (RN), para tomar uma deciso e [...] ao final da reunio, consentiram em agendar outro encontro, tambm em Natal, mas desta vez, reunindo tanto os pastores nacionais como os missionrios suecos (ARAJO, 2008, p.45). Deste modo, o segundo encontro foi marcado para setembro de 1930, e estaria em pauta o anseio dos pastores brasileiros em decidir sobre os seus mtodos de crescimento. O que significava mais liberdade para o controle socioespacial de suas igrejas. importante ressaltar o cenrio poltico brasileiro neste perodo, o qual descrito por Lewi Pethrus da seguinte maneira: [...] havia fortes rompimentos polticos no pas, e o nacionalismo tinha contribudo para criar uma certa averso a estrangeiros (PETHRUS apud ARAJO, 2008, p.45). Ainda nesse trecho de sua biografia Lewi Pethrus, lder da misso sueca em Estocolmo, tenta explicar a motivao das lideranas brasileiras na busca por mais autonomia, como sendo um estopim que [...] tinha encontrado como mola propulsora a forte ideologia nacionalista, muito viva no incio do sculo XX (ARAJO, 2008, p.104). Portanto, essa foi uma das hipteses levantadas pelos suecos nesse perodo para tentar compreender esse movimento que se formara no seio da denominao. O encontro marcado para setembro de 1930 soou como um sinal de uma eminente diviso institucional, que poderia comprometer a coeso territorial da Assembleia de Deus na poca. Esse episdio marcou a primeira (re)estruturao da territorialidade assembleiana, a nvel nacional, traando novas regras de crescimento e atuao evangelstica para a igreja.
46
Os pastores presentes na reunio preliminar na capital potiguar foram: Ccero Canuto de Lima, Francisco Gonzaga da Silva, Antnio Lopes, Ursulino Costa, Jose Amador, Napoleo de Oliveira Lima, Jos Barbosa, Francisco Csar, Natanael Figueiredo e Pedro Costa.
98
Destarte, a conveno das lideranas nacionais e suecas na cidade do Natal em 1930 foi determinante para o destino da Assembleia de Deus no pas. A convergncia das lideranas para capital potiguar, alm de legitimar a autonomia das lideranas nacionais, resultou numa organizao supra-regional, que regeria continuamente a territorialidade de vrias convenes estaduais assembleianas. A criao da Conveno Geral das Assembleias de Deus (CGADB), em 10 de setembro de 1930, assinalou uma nova era de crescimento e reafirmao do poder da AD no Brasil, transformando-se na maior instncia do poder da igreja no pas.
3.2.2 Fundao da CGADB: reestruturao e unicidade do poder territorial das Assembleias de Deus no Brasil
At a realizao da primeira Conveno Geral das Assembleias de Deus no Brasil pairou o receio de uma possvel desarmonia entre as duas bancadas de pastores, uma formada pela liderana nacional e outra pela sueca. Com isso, para pacificar eventuais desentendimentos nesse encontro, o missionrio Gunnar Vingren convidou o lder da misso sueca, o pastor Lewi Pethrus, para contribuir com a preservao da unidade denominacional das Assembleias de Deus no Brasil. Na primeira Conveno Nacional das Assembleias de Deus, a qual ocorreu em 1930, foi eleito como primeiro presidente o pastor Ccero Canuto de Lima de Joo Pessoa (PB), destacando-se tambm por ser um dos idealizadores da mencionada conveno. Na pauta da conveno foram apresentados para discusso os seguintes temas:
1) o relatrio do trabalho realizado pelos missionrios; 2) a nova direo do trabalho pentecostal no Norte e Nordeste; 3) a circulao dos jornais Boa Semente e O Som Alegre; 4) o trabalho feminino na igreja [...] (ARAJO, 2008, p. 209).
Dos temas apresentados, o segundo teve uma conotao relevante para o futuro da liderana nacional e, consequentemente, para a unicidade territorial das igrejas do Norte e Nordeste e tambm com as nascentes igrejas do Sul e Sudeste. Dessa forma, para dissipar o temor dos participantes da conveno de 99
que acontecesse uma provvel ciso na igreja, os pastores responsveis pela organizao da conveno afirmaram no existir [...] nenhuma inteno por parte dos obreiros nacionais de dividir as Assembleias de Deus. Eles desejavam apenas mais autonomia, e instaram para que no fossem mal compreendidos e para que a obra no Brasil continuasse unida (ARAJO, 2008, p. 208). Assim, passada a exposio dos relatrios dos missionrios, o segundo tema foi introduzido pelo pastor Lewi Pethrus, o qual antecipou a concluso dos missionrios suecos com a seguinte ressalva:
Nesta oportunidade, eu falei sobre se no havia chegado o tempo quando os pastores brasileiros tomariam a seu cargo a inteira responsabilidade pelo trabalho na regio Norte (entenda-se aqui Norte e Nordeste) do Brasil (PETHRUS apud ARAJO, 2008, p.209).
Diante do exposto, percebe-se que no sucinto discurso do Pr. Pethrus ele mostrou uma exmia habilidade pacificadora, prescrevendo uma soluo harmoniosa e, com isso, evitando abalar a estrutura territorial das Assembleias de Deus. Assim sendo, aps o referido tema ter sido plenamente discutido, concluram-no com a declarao a seguir apresentada:
[...] o trabalho nos estados do Amazonas, Par, Maranho, Rio Grande do Norte, Paraba e Pernambuco, onde j havia cerca de 1.000 membros e 160 igrejas, deveria ser entregue inteiramente aos obreiros nacionais [...] tambm foi apresentados pelos missionrios que todos os templos e locais de reunio que pertenciam a Misso (sueca) deveriam ser entregues, sem nenhum custo, s respectivas igrejas locais brasileiras. Se isto no fora feito, teria de fazer-se e est terminado at o dia 1 de julho de 1931 (PETHRUS apud ARAJO, 2008, p. 210).
Alm dessa histrica manifestao da poltica territorial assembleiana, o terceiro tema em pauta se mostrou igualmente importante para a unidade denominacional da igreja. A fuso dos peridicos Boa Semente (com circulao na regio Norte) com O Som Alegre (com circulao na regio Sudeste) criando o Mensageiro da Paz foi outro marco de unificao47 das Assembleias de Deus no
47
Logo os dois jornais assumiram posies antagnicas e regionalistas, sem que houvesse interferncia mtua em suas reas de atuao. Tornaram-se dois rgos oficiais distintos, do Norte e do Sul. Isso resultou em certos constrangimentos entre as lideranas da poca [...] (ARAJO, 2008, p. 457).
100
Brasil, uma vez que esse novo jornal se tornaria, naquele momento, um rgo oficial da igreja e um mecanismo de difuso das decises e aes tomadas pela conveno a nvel nacional. Portanto, com a consumao dos trabalhos realizados na conveno de 1930 encerrou-se a influncia majoritria da Misso Sueca nas Assembleias de Deus do Brasil, ficando, em sntese, assegurada a participao ativa dos pastores brasileiros nas decises administrativas das ADs no mbito regional, e como estratgia poltica neutralizou-se uma possvel dissidncia nos ministrios assembleianos48 do Norte e Nordeste. Tornou-se claro ento para os participantes do evento que o crescimento territorial das Assembleias de Deus no pas no poderia se manteria coeso, no que se refere unidade de sua rede de ministrios, sem que houvesse uma macroestrutura que regesse por meio de um nico estatuto as suas instncias de base. Sendo assim, os pastores presentes na conveno de 1930 decidiram instituir uma Conveno Geral, para ser um encontro permanente de pastores e pregadores das Assembleias de Deus no Brasil. O objetivo dela seria reunir as lideranas assembleianas uma vez ao ano para tratar sobre os rumos da igreja. Por essa razo, a partir da a Conveno Geral passou a ser denominada pelos pastores com o nome de Conveno Nacional ou de Semana Bblica. No entanto, para validar a Conveno Geral como organismo definidor de parmetros para os pastores das Assembleias de Deus no Brasil, foi necessrio que as igrejas passassem por duas fases de reestruturao, as quais fortaleceram e graduaram a relevncia desses pastores na regncia dos campos assembleianos no Brasil. A primeira fase49, ocorrida em 1946, teve como primeiro mecanismo reestruturador o Estatuto Social. Esse documento conferiu igreja personalidade jurdica, dando-lhe a aptido genrica para adquirir e contrair obrigaes, representando legalmente as Assembleias de Deus no Brasil. A CGADB, sigla da conveno de pastores assembleianos, conforme registrado no artigo 4, Inciso III (p.7) do Estatuto Social da conveno, foi atribudo o poder de tratar de todos os assuntos que, direta ou indiretamente, digam respeito s Assembleias de Deus no Brasil, quando solicitada. O privilgio institucional da
48
Nas Assembleia de Deus, a rea de atuao de um Ministrio formado por uma igreja-sede (igreja-me) e suas diversas congregaes e/ou cidades, em um ou mais estados (ARAJO, 2008, p.153). 49 a Essa fase diz respeito s decises tomadas na 15 Conveno Geral realizada em Recife (PE), em 1946.
101
CGADB
representou,
em
outras
palavras,
direito
de
supervisionar
permanentemente assuntos administrativos e artigos de f constituintes nos regimentos internos dos ministrios ligados a sua jurisdio. J o segundo mecanismo executado foi a aprovao da transferncia do direito de propriedade da Casa Publicadora das Assembleias de Deus (CPAD)50 para a Conveno Geral das Assembleias de Deus (CGADB). Contudo, embora a CPAD estivesse localizada nas dependncias do campo assembleiano de So Cristovo (RJ), [...] de acordo com seus estatutos da poca (1940), no pertencia a qualquer igreja ou conveno particular (ARAJO, 2008, p. 167). Assim, incorporando a Casa Publicadora como patrimnio institucional da Conveno Geral, os participantes da conveno de 1946, reunidos na cidade do Recife (PE), legitimaram juridicamente o jornal Mensageiro da Paz como rgo oficial da CGADB, restringindo a publicao deste e de outros peridicos assembleianos ao mbito editorial da CPAD, uma vez que se CGADB tivesse uma nica editora, ela poderia conter o avano de ensinamentos teolgicos divergentes a sua regra de f, que alimentasse focos de dissidncia ou comprometesse a unidade territorial das Assembleias de Deus. No entanto, a importncia da CPAD na gesto da CGADB se deu gradativamente por meio de sua contribuio no aperfeioamento da
comunicao entre pastores e membros. Dessa forma, a Casa Publicadora, enquanto editora, se tornou o pilar da educao crist da CGADB para as ADs brasileiras, sobretudo no que diz respeito aos assuntos teolgicos e aspectos da doutrina pentecostal. Esses ensinamentos foram difundidos por meio de via impressa atravs de um conjunto de publicaes editoriais, as quais possuam um suporte pedaggico especfico para todas as faixas etrias. Assim como a primeira fase de estruturao, a segunda divide-se tambm em dois momentos. O primeiro refere-se instituio de cargos administrativos
50
Fundada na CGADB de 1940 em Salvador (BA), a Casa Publicadora das Assembleia de Deus (CPAD) teve como primeira estrutura fsica, a redao do peridico o Mensageiro da Paz, editado pelo missionrio norte-americano Andrew Hargrave. O projeto de fundao da CPAD como de sua personalidade jurdica foi adiantado em funo do Decreto emitido pelo Presidente Getlio Vargas em 1940, momento no qual o governo exigia que todos os jornais do pas se registrassem imediatamente no Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), organismo controlador da imprensa. E imps que somente entidades com personalidade jurdica possussem jornais, o que levou a CPAD a se tornar proprietria do Mensageiro da Paz. Hoje a CPAD uma das maiores editoras evanglicas do Brasil e principal veculo de difuso da mensagem impressa pentecostal no pas por meio de jornais e revistas, alm de obras de autores nacionais e internacionais.
102
para a Conveno Geral das Assembleias de Deus em 1979 e o segundo est relacionado criao de suas dependncias fsicas em 1996. At 1979 a Conveno Geral no possua estrutura fsica prpria e nem uma hierarquia administrativa que possibilitasse expediente dirio e atendimento aos pastores, por isso ela utilizou provisoriamente as instalaes da Casa Publicadora. Todavia, a criao de uma secretaria geral para CGADB ficou ainda mais imprescindvel com a constatao do crescimento da rede de templos e de membros nas igrejas de todo pas, uma vez que em 1979 as Assembleias de Deus j somavam um nmero de 5.600.000 fiis, distribudos em 22.000 igrejas autnomas, 36.000 templos e 55.000 obreiros (de pastor a auxiliar de trabalho)51. Ainda no decorrente ano, na Conveno Geral realizada em Porto Alegre (RS), foi instituda uma Secretaria Geral para organizar toda documentao pertencente CGADB e atualizar o arquivo geral de pastores, o qual foi criado em 1964. E para liderar a nascente estrutura administrativa foi escolhido o presbtero e Administrador de Empresas Nemuel Kessler, visto que quando ele estava no cargo de Secretrio-adjunto montou a primeira organizao da Secretaria Geral com funcionrios remunerados trabalhando em expediente dirio. J o segundo momento dessa segunda fase de estruturao ocorreu na dcada de 1990, momento esse no qual o crescimento das Assembleias de Deus apresentou outro significativo avano. Segundo o censo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE)52, nesta ltima dezena do Sculo XX a igreja contabilizou 5.000.000 de membros, incluindo pastores e obreiros. Diante desse dado do IBGE, o Pr. Jos Wellington Bezerra da Costa, lder do ministrio assembleiano do Belenzinho (SP) e eleito presidente da CGADB em 1988, coordenou o projeto de construo do prdio administrativo da Conveno Geral, executando assim o segundo momento de estruturao, inaugurando em 26 de novembro de 1996, a sede administrativa da Conveno Geral no estado do Rio de Janeiro. O referido Pr. demarcou espacialmente a instncia mxima do poder assembleiano, concretizando a estrutura fsica do maior rgo viabilizador de projetos e metas de expanso para as Assembleias de Deus no Brasil. Percebese ento que esses acontecimentos consumaram o ciclo de estruturao e de
51 52
Informao extrada do livro de Arajo (2008, p.95.). IBGE apud ARAJO, 2008, p.97.
103
fortalecimento da CGADB no sculo passado, e reafirmaram a autoridade e o pacto institucional entre os pastores brasileiros.
ASSEMBLEIANO:
UMA
O contedo jurdico dos regimentos e estatutos das Assembleias de Deus, em essncia, perpassado de mecanismos imateriais (transcendentais) de poder. Esses elementos intangveis (espirituais) tm as suas razes plantadas na crena. E como acredita Weber (2001), esses elementos nascem em um ambiente social de forte evidncia carismtica53. Acredita-se que no centro da autoridade carismtica, conforme analisa Souza (2004, p.55), residem os princpios de venerao, de santidade e de extracotidianidade. No recinto carismtico a ordem se estabelece pelos mecanismos espirituais de submisso como, por exemplo, revelaes e dons sobrenaturais, que persuadem a conscincia do indivduo a obedecer manifestao do sagrado. O carisma a fonte de onde emana o poder pentecostal, caracterizando-o como uma das mais eficientes formas de poder religioso hodiernamente. Apreende-se que diferentemente das formas racionais e tradicionalizantes que norteiam as associaes humanas, que encontram fora e legitimidade num governo central e nas tradies vigentes, o pentecostalismo legitima a sua autoridade nas experincias sobrenaturais (msticas) que transcendem a razo natural dos sistemas sociais. Assim, a Assembleia de Deus enquanto instituio de natureza pentecostal sustenta as suas normas estatutrias no poder carismtico, o qual responde pela validao subjetiva de seu sistema territorial, mediante a imposio de experincias de estrito domnio sobrenatural,
[...] este s poder de fato na medida em que reconhecido no contexto de uma relao intersubjetiva, quer no reconhecimento que um indivduo manifesta acerca de uma divindade, quer no consentimento da existncia de uma fora sobrenatural que um indivduo reconhece existir noutro [...] (ARAJO, 2008, p.56).
53
O termo carismtico derivado da palavra grega charis (uma graa ou um dom), que o termo usado na Bblia para descrever um conjunto amplo de experincias sobrenaturais (especialmente em I Corntios 12-14). O termo genrico usado para descrever os cristos que crem que manifestaes do Esprito Santo operadas na igreja crist do primeiro sculo, tais como curas, milagres, profecia e glossolalia (falar em outras lnguas ou idiomas), esto disponveis aos crentes contemporneos e devem ser experimentados na atualidade (ARAJO, 2008, p.154).
104
Desta forma, percebe-se que o domnio, enquanto consequncia direta do poder, se manifesta na proporo em que o seu contedo absorvido como verdade incontestvel. Isso significa entender o poder do sagrado como resultado inequvoco da conformidade de elementos msticos por aqueles que os experimentam cotidianamente. O consentimento dos fiis nas verdades msticas impostas por um poder carismtico parte do pressuposto de que o discurso que o lder carismtico sistematiza de inspirao divina, e que se divina, designo do prprio Deus. Esta (in)conscincia possibilitou no pentecostalismo a construo de um sistema hegemnico, caracterizado por Souza (2004, p.58) como personalizado e fundamentado na autoridade incontestvel e extraordinria de uma liderana. O autor ressalta, ainda, que a prtica desse poder foi quem estabeleceu a organizao das condutas cotidianas carismaticamente impostas que com o tempo conquistaram o reconhecimento dos carismaticamente dominados, os quais acreditam que:
[...] seus lderes so, antes de tudo, escolhidos de Deus, possuidores de dons extraordinrios, entre os quais destaca-se um tipo de saber de natureza sagrada, uma posse primria das revelaes divinas (SOUZA, 2004, p.58).
Assim, possvel encontrar nesta apreciao analtica as razes que motivaram nas Assembleias de Deus a existncia de pastores e obreiros teologicamente leigos, exercendo funes de liderana. A posse de dons sobrenaturais tem influncia crucial na posio do obreiro na hierarquia de ministros assembleianos, uma vez que "[...] os espaos de privilgios so ocupados por indivduos a quem se atribui a posse de dons sobrenaturais (SOUZA, 2004, p. 57). O portador dos dons espirituais quem constri, apoiado pelos fiis, as condies para que o poder se exera hegemonicamente. O controle carismtico cria uma estrutura de defesa eficiente para o seu detentor, visto que todas as determinaes emitidas por esse lder carismtico tm respaldo em seus dons espirituais e provm de uma autoridade espiritual. Esse domnio do sagrado
105
neutraliza qualquer interveno ideolgica humana nas regras de f 54 emitidas pelo lder carismtico, atingindo, dessa forma, a vida cotidiana dos fiis. Ao analisar a eficincia do poder, Foucault (2005) estabelece a compreenso de que o mesmo no existe enquanto valor inerente s relaes sociais, mas como um mecanismo que pode ser exercido. De acordo com ele [...] o poder no existe; existem sim prticas ou relaes de poder (FOUCAULT, 2005, p.13). A viso do poder para Foucault aqui, estritamente sociolgica, no entanto, a concepo de imaterialidade do poder defendida em sua assertiva, comprova a existncia do poder carismtico na medida em que ele se manifesta como domnio que influencia o sujeito a executar determinado estilo de vida crist. O exerccio duradouro de um domnio carismtico inevitavelmente translada-o de seu carter tradicional para o burocrtico. Essa uma (re)estruturao do poder carismtico, que de acordo com Souza (2004), tem a sua razo de ser pela rotinizao das funes carismticas, ou seja, pela forma cotidiana (rotineira) assumida por um poder que de natureza mstica. O aumento do nmero de fiis em uma instituio de dominao carismtica, por exemplo, o indicador mais preciso da passagem do poder carismticotradicional para o carismtico-burocrtico. Essa reestruturao do poder carismtico est estreitamente relacionada ao crescimento do contingente de adeptos e demanda de servios burocrticos que trabalhem para a manuteno do poder do lder carismtico. Assim sendo, para que isso se efetuasse foi necessrio a criao de um aparato administrativo na igreja que racionalizasse os seus rituais sagrados e cotidianos em um modelo de gesto, protegendo os seus bens patrimoniais e imateriais do ataque de foras opositoras. Souza discerne o domnio carismtico-tradicional do carismticoburocrtico em seus aspectos funcionais. De acordo com ele:
[...] A diferena entre uma dominao e outra reside no fato de que na dominao carismtico-tradicional, todos os poderes e oportunidades de todas as espcies esto vinculados ao carisma pessoal [...] o elemento relevante nessa fase da dominao a pessoa carismtica [...]. Na dominao carismtica burocratizada, o lder carismtico exerce o mando atravs de sistemas
54
[Em latim: regula fidei] Normas que tm por objetivo direcionar a f de acordo com o modelo encontrado nas escrituras do Antigo e Novo Testamento. A nica regra de f para os reformadores era a Bblia. Com o tempo, porm, foram redigindo suas declaraes e artigos de f, catecismos e credos. Haja vista a Declarao de f de Westiminster (ANDRADE, 1998, p. 252).
106
administrativos. O lder legitimado mediante leis, normas e estatutos e por um quadro administrativo que atenda s exigncias, normais de um padro de conduta cotidiano [...] (SOUZA, 2004, p. 61).
Assim, a instituio de uma gesto carismtico-burocrtica , com efeito, uma necessidade irredutvel das denominaes pentecostais e neo-pentecostais. Essa necessidade se instalou quando ambos os movimentos formaram, entre as dcadas de 1980 e 1990, um corpo massificado de fiis no Brasil. Com isso, sem a existncia de dispositivos administrativos seria impossvel desenvolver estratgias de crescimento e preservar o lugar de centralidade de suas lideranas. O sistema carismtico-burocrtico o modelo central da gesto dos territrios assembleianos. Destarte, apoiado nele que os membros das ADs organizam as suas instncias territoriais, as quais por sua vez, desenvolvem os trunfos (estratgias de defesa) para proteger as estruturas ministeriais da igreja. O esprito da dominao hegemnica nas Assembleias de Deus, encontra-se dentro de suas autarquias territoriais, que em smula formam uma rede de relaes associativas, a qual transmite o poder carismtico-burocrtico s suas estruturas de base. O esforo de decodificao do modelo gestor principal das Assembleias de Deus objetivou estabelecer o entendimento do projeto no qual o poder institucional assembleiano est inserido. Composta de uma instncia supraregional ligada a outras de relevncia supra-local, a organizao territorial das Assembleias de Deus consegue transmitir diretrizes e normas estatutrias a uma ampla rede de lideranas, que com o mesmo vigor, interfere nos Campos Eclesisticos do Serid, os quais idealizam seus projetos em comum acordo com dispositivos estatutrios de um governo maior.
DAS
ASSEMBLEIA
DE
DEUS
Como j foi ressaltado anteriormente, a gesto carismtico-burocrtica define o campo de poder no qual foram organizadas as estruturas territoriais assembleianas. Apreendeu-se tambm que as instncias do poder territorial das 107
Assembleias de Deus no foram estabelecidas concomitantemente como uma estrutura territorial pronta ou acabada. Na verdade, a constituio de cada uma delas adveio da necessidade gradual de uma organizao administrativa das relaes de poder entre os lderes e pela massificao de seus membros nos estados brasileiros. Com isso, para poder articular-se administrativa e doutrinariamente a CGADB s demais Assembleias de Deus espalhadas pelo pas foi adotado o modelo de gesto supra-local, o qual foi criado em 1921 na AD de So Lus (MA), denominado de Conveno Regional. J as convenes estaduais so formadas por ministrios assembleianos e existem como uma ponte na qual se transitam as diretrizes emitidas pela CGADB aos Campos Eclesisticos que esto na base de sua hierarquia territorial da igreja, como pode-se observar na (FIG. 1), a seguir exposta, que apresenta o organograma das instncias territoriais da Assembleia de Deus no Brasil. Assim, a execuo dos parmetros estatutrios da CGADB, segue uma linha hierrquica que passa pelas convenes estaduais, sedes dos campos eclesisticos at as igrejas filiais.
Figura 1 - Organograma Instncias territoriais da Assembleia de Deus no Brasil Fonte: Elaborado pelo autor (2010)
A autonomia um dispositivo assegurado nos ministrios que compem as convenes regionais, entretanto, os regimentos internos, regulamentos e atos 108
normativos e suas entidades assistenciais no podero contrariar os termos presentes no Estatuto da CGADB. Dessa forma, ainda que os ministrios assembleianos possuam uma determinada autonomia, ou seja, que sejam confiados poderes a eles para resolver qualquer questo de ordem interna ou externa, administrativa, judicial ou espiritual, eles devero est em harmonia com os procedimentos contidos no Estatuto Social, sendo qualquer ato contrrio passvel de advertncia, suspenso ou desligamento da CGADB. As instncias territoriais como a CGADB, Convenes Regionais, e Campos Eclesisticos existem para administrar casos especficos relacionados integridade institucional das Assembleias de Deus. Cada uma possui importncia vital para a unidade territorial da igreja no pas, sendo presididas internamente por pastores de forte vis administrativo e poltico.
A Conveno Geral das Assembleias de Deus - CGADB, idealizada em 1930 e juridicamente reconhecida em 1946, uma Assembleia Geral Ordinria (AGO) de pastores assembleianos e realizada no intervalo de dois anos, com importncia institucional supra-regional. Nela so discutidas e estabelecidas diretrizes estatutrias e regimentais que regulam as aes eclesisticas e administrativas dos ministrios devidamente cadastrados. A sua primeira organizao administrativa de carter interino denominada de Mesa Diretora 55, a qual assessorada por um amplo conjunto de conselhos56 e comisses57, que elaboram planos e estratgias de crescimento, com o objetivo primeiro de promover uma atuao coerente entre as demais instncias de base. Conforme registrou Arajo (2008, p. 212): em 2006 havia 58 convenes estaduais e regionais cadastradas na CGADB, incluindo as Convenes nos
55
A Mesa Diretora a principal liderana da CGADB, ela composta pelo Presidente e cinco Vicepresidentes, cinco Secretrios, dois Tesoureiros e um Secretrio-adjunto. REGIMENTO INTERNO DA CONVENO GERAL DAS ASSEMBLEIA DE DEUS NO BRASIL. Disponvel em:<http://www.adnatal.org.br/documentos.html>. Acesso em: 13 de fev. 2010. 56 Conselho Consultivo, Conselhos Regionais, Conselho Administrativo da CPAD, Conselho Fiscal, Conselho de tica e Disciplina, Conselho de Educao e Cultura Conselho de Doutrina, Conselho de Ao Social, Conselho de Capelania, Conselho de Comunicao e Imprensa, Conselho Poltico e Conselho de Misses (Idem, 2010). 57 Comisso de Temrio, Comisso Jurdica, Comisso de Relaes Pblicas, Comisso de Apologtica, Comisso de Plano Estratgico de Evangelismo e Discipulado e Comisso Eleitoral e Suas Atribuies (Idem, 2010).
109
Estados Unidos, Japo e Europa. A fora institucional da Conveno Geral noticiada aqui em sua projeo internacional. A ligao de convenes de outros pases CGADB revela que o seu poder normativo conseguiu ultrapassar os limites nacionais e reger a conduta eclesistica de lideranas provenientes de mltiplos contextos culturais e religiosos. Pode-se dividir a regncia normativa da CGADB em trs categorias distintas, tais como: doutrina, ao social e eclesistico-administrativa. O reagrupamento dos cdigos estatutrios da CGADB em classes diferenciadas tem como objetivo prtico descrever melhor a dissoluo de seu poder nas Convenes Regionais, Ministrios, Campos Eclesisticos e igrejas filiais. Logo, o poder institucional da Conveno Geral pode ser interpretado como uma trade regencial. Assim, a doutrina como primeiro arcabouo dessa trade regencial, comanda toda a ideologia teolgica, cultural e comportamental dos pastores, obreiros e membros das Assembleias de Deus. Equivale tambm dizer que, por meio dela que as normas estatutrias so legitimadas perante a comunidade assembleiana. Todavia, olhar a doutrina apenas como um conjugado de princpios disciplinadores desprezar o seu contedo espiritual e suplantar a subjetividade humana em detrimento do seu carter sacro, pois ele a fonte da autoridade doutrinria. Sabe-se que as doutrinas bsicas58 das Assembleias de Deus so de natureza pentecostal, e tm como marca distintiva a incorporao de bens msticos, relacionados s manifestaes sobrenaturais, com forte nfase no batismo do Esprito Santo. Desse modo, fundamentada nos princpios pentecostais59 a doutrina das Assembleias de Deus foi sistematizada e estabelecida como um regime central, que todos em torno de sua jurisdio devem adotar e, sobretudo cumprir.
58
As doutrinas bsicas tm como temas: a cura divina, a igreja, os dons espirituais, os falsos mestres, o arrebatamento da Igreja, o batismo no Esprito Santo, o falar em lnguas, provas do genuno batismo no Esprito Santo, os pastores e os seus deveres e as qualificaes morais do pastor. 59 Os princpios pentecostais fazem aluso aos ensinamentos do Apstolo Paulo em sua primeira epstola aos Corntios, referenciados no captulo 12. Nessa passagem bblica o apstolo discorre sobre vrios aspectos sobrenaturais da vida crist como, por exemplo, curas, operaes de milagres, profecias, discernimento de espritos, variedades de lnguas, interpretao de lnguas e dons ministeriais.
110
Nos primrdios da igreja, em 1911, a doutrina pentecostal era difundida nos ensinamentos e sermes dos pioneiros Daniel Berg e Gunnar Vingren. Porm, o projeto de construo de um formato sistmico de doutrinas assembleianas, em tese, s comeou com a criao da Conveno Geral em 1930, e consolidou-se com o tempo durante outras sees da Conveno Geral, especialmente as realizadas nas dcadas de 1970 e 198060. A competncia da Conveno Geral para desenvolver um corpo sistematizado de doutrinas era fato consensual entre as lideranas assembleianas no pas desde 1930. Contudo, a legitimao de sua personalidade jurdica fortaleceu ainda mais essa prerrogativa. Arajo (2008, p.212) reproduz sobre esse fato, a seguinte nota do peridico Mensageiro da Paz:
Desde as primeiras assembleias gerais, a nota de convocao publicada no Mensageiro da Paz dizia que as Assembleias de Deus seriam representadas na Conveno Geral (MENSAGEIRO DA PAZ apud ARAJO, 2008, p. 245).
A construo de um documento nico de princpios normativos revelou a fase de incorporao de uma Teologia Formal vivida pela CGADB nas dcadas de 1970 e 1980, a qual foi subsidiada pelos estudos e publicaes doutrinrias da CPAD. Essa fase consequncia direta da lgica do sistema carismticoburocrtico no qual a Assembleia de Deus projetou as suas instncias territoriais, e corresponde ao que Max Weber denominou de rotinizao do carisma (WEBER apud SOUZA, 2004, p.38). A rotinizao do carisma refere-se aquisio de um padro lgico que transfigura as experincias msticas para uma experincia racionalizada e burocratizada. A rotinizao do carisma concretiza-se na doutrina, e, conforme Souza (2004, p.39), ela tem a funo de [...] tornar inteligvel as manifestaes sobrenaturais, de modo que facilite sua traduo, tendo em vista a comunicao da experincia para outros [...]. Dessa forma, no perodo que identifica-se como o da pr-sistematizao doutrinria, tempo em que no havia uma doutrina plenamente elaborada, as Assembleias de Deus se ativeram a uma racionalidade leiga, com diretrizes soltas e guiadas na maioria das vezes pelo emocionalismo
60
Segundo registra Arajo (2008, p.218), a doutrina apareceu no quadro de temas da CGADB pela primeira vez em 1973, partir de ento se tornou tema quase que permanente durante as Convenes Gerais realizadas em 1977, 1979, 1981, 1987 e 1995.
111
durante as liturgias. Assim, a ausncia de uma doutrina esquematizada em temas e de importantes fatores de valorizao institucional colocaram em risco, por exemplo, a sua identidade ante os vrios outros movimentos pentecostais61. Os princpios doutrinrios operam atualmente como trunfos territoriais que exercem resistncia ao liberalismo religioso, o qual com sutileza vem modificando os usos e costumes62 das Assembleias de Deus. A CGADB ao desenvolver a sua regncia doutrinria integra um grupo especializado de pastores que produzem o que pode-se chamar de unificao do credo assembleiano, essencial para a conexo ideolgica entre suas lideranas no Brasil. No que diz respeito retificao ou alteraes nos pontos fundamentais das doutrinas bsicas assembleianas, essas se restringem s reunies da CGADB, fora delas nenhuma modificao conceitual ou teolgica poder ter validade institucional. A difuso da doutrina assembleiana se d em trs nveis. O primeiro nvel est nas discusses teolgicas realizadas nas convenes da CGADB, nas quais o Conselho de Doutrina assume o papel de revisar e promulgar aos participantes das convenes as alteraes na estrutura da doutrina e nas publicaes da CPAD. O segundo nvel fica sob a responsabilidade das convenes estaduais ou regionais, uma vez que atendem a essas decises e viabilizam a informao da CGADB para os seus respectivos ministrios. J o terceiro nvel, ou seja, patamar termina com a execuo das determinaes pelos ministrios e suas igrejas, por meio de ensinamentos e especficos mtodos disciplinares aplicados naqueles que porventura venham a infringir pontos fundamentais da doutrina. Com isso, para uma transmisso formal dos dogmas assembleianos a CGADB tem utilizado, no decorrer dos anos, um nmero expressivo de publicaes de sua editora CPAD. Arajo (2008, p.272) assegura que [...] os peridicos publicados na Casa Publicadora (Mensageiro da Paz, A Seara e
61
Os movimentos pentecostais surgidos no Brasil foram: Pentecostalismo Clssico (em 1910), Assemblia de Deus (maior Igreja pentecostal do Brasil) e Congregao Crist (com nfase no Batismo no Esprito Santo); Deuteropentecostalismo (em 1950), Igreja do Evangelho Quadrangular, Igreja Pentecostal Unida do Brasil, O Brasil para Cristo, Igreja Pentecostal Deus Amor, Casa da Bno, Igreja Unida e Igreja de Nova Vida (com nfase na cura divina). Neopentecostais: Igreja Universal do Reino de Deus, Igreja Internacional da Graa e Comunidade Evanglica Sara Nossa Terra (com nfase na Teologia da Prosperidade). 62 Segundo o telogo Antonio Gilberto apud Arajo (2008) a expresso usos e costumes definida, no contexto religioso, como sendo uma forma de expresso do testemunho cristo, de comportamento social, de porte e postura do crente e da congregao, confirmando ou comprometendo a doutrina bblica, a tica crist e a moral evanglica.
112
Obreiro) tm sido um dos instrumentos disseminadores da doutrina pentecostal nas Assembleias de Deus. Ainda segundo o autor, entre os anos de 1930 e 2005 havia uma mdia de trs artigos por edio, tratando-se neles de temas referentes ao pentecostalismo, com maior destaque para o Mensageiro da Paz, visto que nas suas primeiras trs dcadas de circulao (1930 a 1950) a mdia anual chegava a quase trs artigos. Tambm foi lanada pela Casa Publicadora, em 1995, a Bblia de Estudo Pentecostal e em 2000 a revista Pentecostes, ambas com nfase na doutrina pentecostal. Outro forte disseminador dos dogmas pentecostais nas ADs so as Lies Bblicas usadas nas Escolas Bblicas Dominicais (EBDs). Hoje em dia esses so os peridicos da CPAD mais utilizados como veculo de difuso da doutrina pentecostal a nvel local nos templos assembleianos. A transmisso impressa dos dogmas da igreja auxilia os seus pastores e educadores cristos a desenvolverem a racionalizao dos dogmas, como tambm ajuda-os na moldagem do comportamento social e espiritual de seus membros. Alm do Conselho de Doutrina da CGADB, outros rgos operam em favor da conservao doutrinria das Assembleias de Deus, tais como: o Conselho Consultivo, o Conselho Administrativo da CPAD, o Conselho de tica e Disciplina, a Comisso de Apologtica, a Comisso de Plano Estratgico de Evangelismo e Discipulado e o Conselho de Educao e Cultura. O segundo item dessa trade regencial diz respeito competncia legal da CGADB, que desenvolver parmetros para a ao social das Assembleias de Deus no Brasil. As primeiras iniciativas das ADs na obra social ocorrem nos primeiros anos de sua fundao, na dcada de 1930, na igreja-me localizada no Belm do Par. Na gesto do pastor Samuel Nystrm (1924-1930) e Nels Nelson (1930-1950) foram criados trs departamentos de ao social: Caixa de Beneficncia, Caixa Morturia e Caixa das Vivas. Hodiernamente a ao social das Assembleias de Deus presente na sociedade brasileira faz parte do amplo ativismo filantrpico pentecostal, o qual a cada ano ganha acolhimento na precariedade socioeconmica das classes de baixa renda. A atuao solidria, no entanto, mostrou-se um dispositivo inseparvel das prticas evangelsticas dos pentecostais. A importncia desse mtodo no crescimento numrico dos pentecostais foi revelada em vrios estudos 113
realizados na ltima dcada do sculo XX, os quais apontam o perfil socioeconmico daqueles que aderiram ao pentecostalismo nesse perodo. Conforme Ricardo Mariano (1999) a pesquisa de mbito nacional realizada pela Datafolha, em 15 de agosto de 1994, alm de revelar a superioridade dos pentecostais entre os evanglicos, com uma maioria de 76%, adentrou na descrio socioeconmica de seus adeptos, j que:
[...] verificou que comparados aos adeptos de outras religies, eles possuam o maior contingente de analfabetos (11%) e o de pessoas que cursaram at o primeiro grau (68,3%), o maior nmero de trabalhadores que recebiam at dois salrios mnimos (33,3%), taxa de desempregados acima de mdia nacional (8,2%) e a maior proporo de ocupados como trabalhadores por conta prpria irregulares (27,2%) (PIERUCCI apud MARIANO, 1999, p.12).
A citada pesquisa confirmou o crescimento do pentecostalismo entre as populaes economicamente desprivilegiadas e mostrou, em outras palavras, que essa realidade social seria pertinente no cotidiano da maioria dos seguidores do movimento no sculo XXI. Tendo em vista a vastido da misria da sociedade, e a lenta resposta dos aparelhos assistenciais do Estado brasileiro, os pentecostais criaram vrias entidades sociais e aprimoraram outras, com o intuito de amenizar a pobreza dentro de suas comunidades, alm de promover a visibilidade poltica 63 de seus lderes. Para controlar a ao social das Assembleias de Deus, a CGADB na 33 Assembleia Geral Ordinria (AGO), realizada em 1997, em Belo Horizonte (MG), criou o Conselho Permanente de Ao Social. A criao desse rgo na Conveno Geral representou a inteno dos participantes em sustentar uma influncia nas inmeras entidades sociais das Assembleias de Deus espalhadas pelo Brasil. O Conselho de Ao Social possui onze membros, sendo dois de cada regio e trs da regio Sudeste, dentre eles ministros de notvel experincia em matria de ao social, indicados pelo presidente da CGADB durante o perodo da AGO e por esta referenciada. Alm da instituio desses cargos, lideranas nacionais reunidas em 1997, na cidade de Belo Horizonte atriburam ao Conselho de Ao Social da
63
Um dos exemplos mais notrios dessa estratgia foi a visibilidade poltica adquirida pelo Senador e Bispo da Igreja Universal do Reino de Deus Marcelo Crivella por meio de seu projeto social ligado a Associao Beneficente Crist (ABC), denominado Fazenda Cana. O referido projeto funciona em favor das reas carentes no nordeste brasileiro.
114
CGADB a responsabilidade de [...] funcionar como rgo normativo de ao social para as Assembleias de Deus no Brasil [...] e de [...] estabelecer diretrizes mestras da ao social em seus diferentes nveis, inspiradas nos princpios fundamentais da Bblia Sagrada e de conformidade com as exigncias legais [...] (ARAJO, 2008, p.2). Percebe-se que a ao social difundida nas comunidades carentes um programa estratgico para as igrejas pentecostais, porquanto neles circundam intenes reais de evangelizao e, ainda, de estabelecimento de primeiro contato com pessoas no crentes. A dimenso da ao social das Assembleias de Deus acompanha a sua ampla estrutura denominacional no Brasil e tem servido tambm como uma ponte entre as autoridades polticas. Em razo da efetiva atuao social da Igreja em todas as regies do pas, o Governo Federal, por meio de uma mensagem oficial do Presidente Lus Incio Lula da Silva ao Mensageiro da Paz em 27 de maro de 2003, externou o desejo de estabelecer uma parceria com a denominao para a implementao de projetos pilotos como o Fome Zero. Essa parceria ainda resultou na solicitao do presidente Lula de um representante da AD no Conselho de Desenvolvimento Econmico e Social de seu governo. Destacou ainda o Governo que com o apoio de instituies como a Igreja, os seus projetos estariam dando os primeiros passos na direo de uma sociedade mais segura, justa e equnime. De acordo com o Presidente:
[...] convocamos instituies que, tradicionalmente, realizam obras sociais e conhecem de perto nossas carncias. As igrejas evanglicas Assembleias de Deus esto no cotidiano de muitos brasileiros h mais de 90 anos, juntamente com outras instituies que tambm se preocupam com a reverso das injustias sociais. Juntos estaremos levando adiante o debate e promovendo aes pblicas responsveis, voltadas para a soluo duradoura dos problemas gerados pela desigualdade no Brasil (MENSAGEIRO DA PAZ apud ARAJO, 2008, p.2).
A resposta da AD, emitida pelo Conselho de Ao Social da Conveno Geral convocao presidencial, foi a idealizao do Nao Sementeira, um projeto social criado para contemplar reas como: sade e previdncia, regaste da cidadania, gerao de emprego, renda, entre outras. Alm dessa parceria, outra foi assinada em 2003 na rea da educao. O Governo Federal fechou um 115
convnio com a CPAD e inseriu o seu projeto denominado Ler Viver dentro do programa governamental de erradicao da analfabetizao. Diante do exposto, apreende-se que o campo social tem se mostrado o principal meio de vinculao entre a igreja e a poltica e vice versa. Sabe-se que ambas instituies se valem do artifcio assistencialista para promoo de suas lideranas, numa espcie de reciprocidade do poder, na qual os meios se cruzam e as finalidades se distanciam, todavia tudo contribui para o aumento do domnio territorial deles. Dando continuidade questo da difuso da doutrina assembleiana, o terceiro item regencial remete-se ao ditame de parmetros normativos da CGADB rede eclesistico-administrativa das Assembleias de Deus no Brasil. As regras do poder inicialmente comeam por meio do Estatuto Social da Conveno Geral e se difundem atravs dos Estatutos Sociais, os quais so adaptados por cada ministrio assembleiano. O Estatuto Social o documento normatizador das aes administrativas e eclesisticas dos pastores assembleianos ligados CGADB pelas convenes estaduais. Alm dele h ainda o Regimento Interno, que outro mecanismo que complementa a gesto carismtico-burocrtica dos estatutos nos sistemas administrativos assembleianos. Assim, para a orientao dos artigos estatutrios dos ministrios assembleianos a CGADB, por meio do documento denominado Estatuto Modelo, guia juridicamente todas as Convenes Estaduais. O referido estatuto foi pensado como um projeto de adequao para os demais estatutos dos templos sedes de cada ministrio. Esse padro regencial visa garantir a unidade da gesto assembleiana em todo pas, aperfeioando, dessa forma, a transmisso vertical do poder entre as suas instncias territoriais. O itinerrio dos cdigos de conduta administrativa e eclesistica da AD comea nos Conselhos e Comisses da Conveno Geral, passando pelos Conselhos Regionais64 e Convenes Estaduais, terminado na execuo das normas pelas igrejas sedes de campo e igrejas filiais.
64
Os Conselhos Regionais so denominados da seguinte maneira: Regio Norte - Conselho Regional Norte; Regio Nordeste - Conselho Regional Nordeste; Regio Sul - Conselho Regional Sul; Regio Sudeste - Conselho Regional Sudeste; Regio Centro-Oeste - Conselho Regional Centro-Oeste. Compete aos respectivos Conselhos Regionais: I - promover a paz e a harmonia entre as igrejas e ministros da regio; II - reunir-se sempre que necessrio para apreciar os casos enviados pela Mesa Diretora, emitindo parecer; III - encaminhar Mesa Diretora relatrio anual de suas atividades; IV - acionar atravs da Mesa Diretora, outro Conselho Regional e/ou a Comisso Jurdica, nos processos litigiosos, quando necessrio; V - quando solicitado pela Mesa
116
A observncia da execuo dos mencionados cdigos fica sob a tutela de cada pastor, o qual sustenta a sua autoridade nos estatutos e regimentos internos compostos por uma srie de dispositivos de controle das aes administrativas e eclesisticas. Os dispositivos estatutrios e regimentais do aos pastores autonomia para nomear os obreiros, para exercer funes administrativas ou eclesisticas. A liberdade conferida aos pastores para separar obreiros a cargos dentro da igreja mantm em vigncia a hegemonia do poder local das ADs. Desse modo, a postura unilateral dos pastores amplamente desenvolvida pelas instancias menores da AD e revela-se como o centro das relaes de poder entre as lideranas na nave das igrejas. Nesse contexto, para a organizao interna da hierarquia nas Assembleias de Deus, os estatutos preceituam a existncia de uma estrutura administrativa formada por rgos ou diretorias, nos quais o pastor da igreja ter exclusividade65 para presidir a maioria deles. Os rgos administrativos de uma igreja assumiro carter geral quando esta jurisdicionar uma srie de Campos Eclesisticos. Quanto as demais igrejas sedes de campo e filiais, elas tero rgos de relevncia local. Nessa ordem de idias, percebe-se que os rgos da Conveno Geral, por meio de seu Estatuto, deliberam cdigos jurdicos e administrativos que repercutem nas Convenes Estaduais e em seus respectivos ministrios. Destarte, todas as convenes devem se adequar e efetuar um trabalho em inteira harmonia, sempre encaminhado Mesa Diretora da CGADB ofcio e cpia autenticada da Ata da assembleia respectiva realizada, contendo todos os temas discutidos e aprovados pelos seus ministros. A no observncia da citada norma por uma Conveno Estadual resultar na suspenso do seu registro na CGADB, at que ela venha a atender a exigncia de prestao de relatrio administrativo. Esse procedimento institucional garante o controle das instancias estaduais da
Diretora emitir parecer acompanhado de criteriosa anlise, ocorrendo o pedido de cadastramento e registro de uma Conveno Estadual ou Regional; VI - apresentar relatrio AGO (ESTATUTO DA CGADB, Disponvel em: <http://www.cgadb.com.br>. Acesso em: 02 jan. 2007) 65 [...] segundo o Projeto de Adequao de Estatuto (do Artigo 27, Inciso II do captulo VIII, setembro de 2003), excetuando o Pastor Presidente, todos os membros da diretoria sero eleitos em Assemblia Geral Ordinria, conforme o artigo 22, e empossados imediatamente e tero mandato de 1 (um) ano, permitida a reconduo e permanecero em cargos at a posse de seus substitutos." PROJETO DE ADEQUAO DE ESTATUTO. Estatuto das Assembleia de Deus, setembro de 2003 .(Disponvel em: <http://www.cgadb.com.br>. Acesso em: 02 jan. 2007).
117
Igreja, e deixa sob vigilncia as suas aes administrativas, objetivando frear qualquer ato ilcito ao Estatuto da CGADB. A CGADB, na sua competncia institucional de emitir parmetros de atuao administrativa para AD no Brasil, interfere nas decises locais por meio da superviso de atas das reunies feitas pelas Convenes Estaduais. Esses documentos descrevem na Conveno Geral a administrao de um ministrio realizada em um estado da Federao brasileira. Em outras palavras, possvel dizer que os rgos administrativos da AD esto interligados territorialmente por instncias em escala nacional, estadual e local. Esse sistema territorial de poder religioso, tambm une o vasto quadro hierrquico-eclesistico das Assembleias de Deus, conhecido tambm como quadro de obreiros. Desta forma, possvel entender as instncias territoriais como um sistema dirigido por hierarquias eclesisticas, uma vez que as instncias assumem importncia nacional, estadual e local na gesto interna. Ao contrrio da organizao hierrquica de cargos administrativos, a hierarquia de ministros assembleianos, demonstrada por meio do organograma (FIG.2), a seguir apresentado, padronizada, de sorte que a mesma organizao eclesistica encontrada em todas as igrejas, independente de sua importncia dentro do sistema de territorial.
Figura 2 Organograma hierarquia eclesistica das Assembleias de Deus Fonte: Elaborado pelo autor (2010)
Como j foi mencionado, a indicao de membros ao quadro eclesistico ou de obreiros a cargos superiores uma deciso restrita ao pastor, podendo ter 118
a participao consultiva de evangelistas e presbteros. Porm, vale ressaltar que para cada cargo especfico os estatutos das Convenes Estaduais estabelecem uma srie de requisitos a serem parcialmente preenchidos pelos indicados. Na Assembleia de Deus o poder circula limitadamente entre o sistema administrativo e eclesistico. Portanto, somente os obreiros so designados para exercerem cargos de liderana dentro da igreja. No entanto, por trs dessa regra, existe uma estratgia de gesto bastante eficaz nas Assembleias de Deus. A razo est no plano de gesto feito unicamente por obreiros indicados, o que fortalece a hegemonia dos pastores nas ordenaes. E, tambm, por que alm do requisito vocacional, os obreiros que ocupam funes administrativas, atenderam antecipadamente a pr-requisitos66 ideolgicos, aumentando, dessa forma, a atmosfera de fidelidade e submisso aos pontos mais altos da hierarquia. Toda Conveno Estadual ligada a CGADB assume o compromisso de cadastrar e registrar a ela, obrigatoriamente, os seus ministros ordenados em suas assembleias. Segundo dados do Instituto Superior de Estudos da Religio (ISER), divulgados na primeira dcada de 2000, a CGADB possua cerca de 3,5 milhes de membros cadastrados, entre pastores, evangelistas e presbteros. Apreende-se com esse dado que o ordenamento de ministros (pastores) assembleianos tem atingido nmeros expressivos, suprindo rapidamente a demanda das suas igrejas. No ano de 2003 a Assembleia de Deus j registrava cerca de 30.000 pastores, 15.000 igrejas sedes e um total de 7.000.000 de membros67. A ordenao pastoral seguiu o ritmo de crescimento de sua estrutura territorial. Todavia, o crescimento do nmero de pastores sempre foi tema pertinente nas Convenes Gerais68, quanto qualidade ministerial desses lderes.
Recentemente, critrios mais rigorosos de ordenao pastoral foram discutidos na Assembleia Geral Ordinria da CGADB de 2005, realizada no Rio de Janeiro, atentando para a ordenao de pastores com formao teolgica, visto como um procedimento positivo para as igrejas, as quais a cada dia recebem membros, com apurada viso crtica da realidade mstica.
66
Alm dos pr-requisitos espirituais para exercer cargos ministeriais, existem outros ainda fundamentais: Ser obediente doutrina e aos usos e costumes da IEADERN, ser fiel comprovadamente nas contribuies para a Igreja e ter testemunho pautado nos princpios das Sagradas Escrituras. 67 ARAJO, 2008, p.103 68 A ordenao pastoral foi tema da CGADB de 1941, 1962, 1966, 1975 e 1983.
119
Sabe-se que como toda organizao estabelecida por um sistema eleitoral, as relaes polticas entre os ministros da CGADB no foge ao crivo da concorrncia institucional69. Partindo dessa premissa, ocorre uma luta pelo poder, no qual o acesso limitado a pastores de alta influncia nacional e regional. A capacidade de influncia dos lderes pentecostais, na anlise de Souza (2004, p.65), est relacionada ao processo de produo dos bens de salvao, que inevitavelmente passa por dois setores: o respaldo dos leigos e da congregao, e uma rede de apoio que sustenta legitimamente as pretenses e reivindicaes do lder eclesistico. Sem a conquista de uma significativa massa de fiis e o apoio de uma liderana experiente e veterana, a concorrncia de um candidato para assumir a um cargo numa instncia territorial torna-se fraca, e, muitas vezes, nula. Quanto maior a instncia, maior ser a exigncia atrelada habilidade desse lder em reunir uma comisso de apoio que ultrapasse a influncia paralela do seu concorrente. Assim, a posio na hierarquia administrativa definida muitas vezes pelo discurso carismtico, que influencia psicologicamente os membros, e que, por consequncia, ganha legitimidade perante as lideranas. Isso mostra que alm do aspecto espiritual, prevalece um espectro de valores humanos nas instncias assembleianas, evidenciando o estilo democrtico com que as disputas so realizadas. A hierarquia administrativa das Assembleias de Deus tem a sua camada exterior formada pelos ministros da CGADB. E antepostas a ela esto s hierarquias das demais instncias territoriais. Sendo assim, a estratigrafia administrativa revela a escala do poder territorial de cada pastor, o que permite a observao no campo das disputas do pentecostalismo. Souza (2004, p.66) enxergou como concorrncia vertical e horizontal,
69
Refere-se aqui s disputas por cargos administrativos nas instncias territoriais e a cargos eclesisticos, pois estes no so passam por processo eleitoral, e sim pela aprovao de prrequisitos institucionais previstos no Estatuto da IEADERN. ESTATUTO DA IEADERN. Cap. V, Seo II, art. 51 (Disponvel em: <http://www.adnatal.org.br/documentos.htm>. Acesso em: 13 fev. 2010).
120
A verticalidade das disputas d visibilidade a tenses confinadas entre os diferentes patamares da hierarquia: diconos presbteros evangelistas pastores. Ao passo que a concorrncia horizontal se d mediante a busca de um status diferenciado do mesmo escalo, pelo melhor desempenho de um ministro em relao aos demais.
Nessa ordem de entendimento, a concorrncia vertical mostra-se como estgio inicial das disputas para a concorrncia horizontal. Essa pr-disputa, explica-se pelo nvel de posicionamento (cooperador, dicono, presbtero, evangelista, pastor) em que deve estar um obreiro para concorrer a determinados cargos ou presidncia de uma instncia territorial. O outro patamar dessa concorrncia determina que somente pastores podero concorrer presidncia da Conveno Geral ou de uma Conveno Estadual. Isso indica que a disputa nesse patamar se dar no campo das horizontalidades. Deste modo, nesse patamar de concorrncia todos os que almejam posies superiores nas instncias esto hierarquicamente igualitrios, de modo que, a relevncia de seus trabalhos ser o principal diferenciador entre eles. A disputa no campo horizontal dar-se somente entre pastores, quando esses atendem, a alm da habilidade poltica de recrutamento, a uma srie de requisitos estatutrios70. Nessa perspectiva, as eleies em todas as instncias assembleianas so feitas autonomamente pelas lideranas que as compem. Nenhuma autoridade atribuda condio de intervir no resultado eleitoral da outra, somente a CGADB possui poder, no de anular, mas de reconhecer nacionalmente a legitimidade do processo eleitoral e das condies morais do candidato eleito. Com isso, a Conveno Geral assume, mesmo que indiretamente, uma ao interventora na poltica das instncias de base, porquanto os pastores candidatos a cargos de presidncia em instncias estaduais precisam estabelecer uma relao amistosa com a CGADB, para que a sua candidatura seja reconhecida pelos demais ministros assembleianos.
70
De acordo com o Estatuto da IEADERN, Art. 18, poder concorrer a sua presidncia, desde que atenda aos seguintes requisitos: I ter, no mnimo, quinze anos de ministrio pastoral, no mbito da IEADERN; II nunca ter sofrido nenhuma sano e/ou medida disciplinar; III ser referendado por, no mnimo, dez pastores Supervisores de Campo e/ou Coordenadores de Setor; IV estar em pleno gozo de seus direitos estatutrios; V - apresentar requerimento de registro de candidatura junto Comisso Eleitoral; VI ter condies fsicas e mentais adequadas, comprovadas atravs de exame e percia mdica. ESTATUTO DA IEADERN. (Disponvel em: <http://www.adnatal.org.br/documentos.htm>. Acesso em: 13 fev. 2010).
121
por intermdio de seu estatuto e de uma influncia indireta na poltica eclesistica nas Convenes Estaduais que a CGADB rege em nvel nacional o quadro eclesistico-administrativo das Assembleias de Deus. A atuao da CGADB apresentou xito no desenvolvimento da unidade territorial das ADs, j que se mostrou um sistema favorvel autonomia administrativa dos pastores e inflexvel doutrinariamente. A coeso territorial da Assembleia de Deus, de fato, vem sendo um consenso de regras entre os ministrios. Ela viabiliza-se por uma instncia mxima, que formula e intermedia tais relaes de poder.
Na estratigrafia das instncias territoriais assembleianas, as Convenes Regionais esto na segunda posio e reunidas nas Assembleias Gerais Ordinrias da CGADB equivalem a Assembleia Geral71, rgo mximo da Conveno Geral. Separadas, as Convenes Estaduais em seus campos operacionais, assumem outra caracterstica dentro do sistema territorial assembleiano. Segundo Arajo (2008, p.206) isoladamente elas representam um [...] tipo de associao de pastores e evangelistas das Assembleias de Deus em mbito estadual, interestadual ou regional, cadastrada e registrada na CGADB. A primeira verso da Conveno Estadual de pastores assembleianos foi a reunio realizada em 1921, na Vila de So Luiz, localizada em Igarap-Au (PA). O evento foi historicamente registrado como o primeiro encontro de pastores da Assembleia de Deus no Brasil. Dessa forma, mediante a importncia desse tipo de reunio para a unidade da Igreja, a Conveno Geral de 1935 realizada em Joo Pessoa (PB), outorgou a autorizao para a criao de convenes em todos os estados, nos quais houvessem trabalhos implantados das Assembleias de Deus. Desde ento as Convenes Estaduais se tornaram um elo de contato entre a CGADB e os pastores assembleianos espalhados pelo Brasil.
71
A Assembleia Geral da CGADB constituda por todos os membros no gozo de seus direitos na forma prevista no seu estatuto. o rgo mximo e soberano de decises, com poderes para resolver quaisquer negcios, decidir, aprovar, reprovar, ratificar ou retificar os atos de interesse da CGADB realizados por qualquer rgo dela ou de pessoa jurdica vinculada.
122
Cada Conveno Estadual organizada por um ministrio assembleiano em particular. Os ministrios possuem campos de trabalho evangelstico delimitados geograficamente, assim, por se tratarem de jurisdies eclesisticas, eles acabaram tornando-se as principais razes de desentendimentos entre igrejas, no que diz respeito a noo de limite. Ainda que houvesse na Conveno Geral das Assembleias de Deus medidas disciplinares72 para expanso de campos ministeriais, a prtica de invaso de um ministrio em reas j assistidas por outro se tornou comum entre alguns deles, especialmente o Ministrio de Madureira73, que com o acentuado crescimento adentrou na rea jurisdicional de outros ministrios74. Por conseguinte, em trinta anos o Ministrio de Madureira se estendeu a outros estados, se tornando o maior entre os ministrios assembleianos do Brasil. Em 2 de maio de 1958, Paulo Leivas Macalo, pioneiro do ministrio, fundou a Conveno Nacional de Ministros das Assembleias de Deus em Madureira (CONAMAD) e igrejas filiadas. Assim, na morte do pastor Macalo, em 1982, a estrutura ministerial da igreja de Madureira apresentava cerca de 200 pastores, 500 evangelistas, 2 mil presbteros, 5 mil diconos, 4 mil auxiliares, 6 mil msicos, 600 igrejas, mil congregaes, 3 mil pontos de pregao e um total de 500 mil membros e congregados (ARAJO, 2008 , p.32). Por essa razo, para reafirmar a autoridade da Conveno Geral ante a CONAMAD, a Assembleia Geral Extraordinria (AGE) realizada em Salvador (BA), em 1989, decidiu impor penalidades s atitudes ministeriais da Igreja de Madureira. A postura dos participantes do evento representou o primeiro abalo na coesa estrutura territorial da Assembleia de Deus de Madureira, por no cumprir
72
Refere-se s determinaes da CGADB de 1977, realizada em Recife (PE), na qual foram divulgadas medidas disciplinares sobre a questo de invaso de campo eclesistico por outros ministrios, tais como: [...] 1) os trabalhos ora legalizados, onde haja paz mtua, permanecero como esto; 2) No ser permitida doravante, a partir desta Conveno, a intromisso de todos e quaisquer obreiros em campos alheios; 3) Os casos existentes, porm em litgio, sero tratados pela junta Executiva da Conveno Geral; 4) Aos infratores que contrariarem os referidos princpios, caber, como disciplina, a inelegibilidade a quaisquer cargos relacionados a CGADB e a CPAD; 5) O obreiro que deixar de respeitar estas normas ficar privado de portar documento de ministro outorgado pela Conveno Geral [...] (ARAJO, 2008, p.153) 73 O Ministrio de Madureira foi criado pelo pastor Paulo Leivas Macalo em 1 maio de 1953, data em que foi inaugurado o templo central no Bairro de Madureira (origem do referido ministrio). De fato o Ministrio de Madureira fruto de um amplo trabalho evangelstico do pastor Paulo Leivas pelos subrbios do Rio de Janeiro, e hoje se apresenta como um Ministrio independente da CGADB. (ARAJO, 2008, p. 32) 74 Essa questo da invaso de campo pelo Ministrio de Madureira foi tema de debate da CGADB de 1957, realizada em Belo Horizonte - MG (ARAJO, 2008, p.153).
123
os Incisos I e V do Artigo 9 do Estatuto da Conveno Geral, hoje incisos V e VI, os quais vedavam a vinculao de seus membros outra conveno nacional ou de carter geral, com abrangncia e prerrogativas da CGADB. Dessa forma, foi aprovado o desligamento do Ministrio de Madureira da Conveno Geral, e entre outras medidas, a suspenso dos direitos de ministros dos pastores e evangelistas da referida igreja. Desde ento, a Madureira se tornou independente com uma Conveno Nacional paralela a Conveno Geral das Assembleias de Deus, preteritamente constituda e denominada CONAMAD. Em 2005 a conveno da Igreja de Madureira apresentava cerca de 31.627 ministros registrados, e uma quantidade de 2,5 milhes de membros no Brasil e no exterior (ARAJO, 2008, p.33). Nessa ordem de entendimento, com o exemplo do Ministrio de Madureira, possvel entender que a autonomia dos ministrios assembleianos est sujeita s normas de controle territorial definidas pela CGADB. Tais medidas exigem que os ministrios procedam em comum acordo com suas resolues, caso contrrio tero os seus direitos eclesisticos suspensos da Conveno
Geral. Como instncias intermedirias entre a instncia mxima e as instncias de base, as Convenes Estaduais representam um frum de deliberao e difuso de normas estatutrias, servindo como fio condutor do poder que vai do macro para o micro. Uma conveno estadual formada por uma Assembleia Ministerial, na qual esto aptos a participar somente pastores e evangelistas. Nesse tipo de reunio, a segregao hierrquica manifesta e os assuntos de maior relevncia institucional so limitados ao escalo maior da liderana. Esse modelo de gesto rene o topo das lideranas locais, e uma vez sancionadas as normas, restam aos demais pastores e evangelistas somente viabilizarem a sua execuo com a ajuda dos presbteros, diconos e cooperadores. Depois das convenes estaduais, nenhuma instncia tem poder legal para reunir obreiros e modificar o que foi estabelecido. Assim sendo, a soberania normativa das convenes estaduais permanece inalterada no estado do RN. Isso explica a importncia supra-local das convenes estaduais na tessitura territorial das Assembleias de Deus. Toda conveno estadual possui um estatuto e regimento prprio, um sistema normativo formulado para reger o territrio eclesistico formado por 124
unidades territoriais como, por exemplo, campos-eclesisticos, igrejas sede, filiais e setores de congregao. Entretanto, esses documentos so revisados75 e orientados pelas normas estatutrias da CGADB. A vigilncia normativa um procedimento indispensvel da gesto assembleiana e desenvolvida
A Igreja Evanglica Assembleia de Deus no RN (IEADERN) um dos diversos ministrios assembleianos organizados estadualmente, e que difunde, majoritariamente, as resolues da CGADB no Rio Grande do Norte. A IEADERN organizada por um grupo de rgos condutores, criados para administrar a sua estrutura interna e externa. Essas estruturas, dizem respeito ao Templo Sede da IEADERN, aos setores de congregaes e rede de campos eclesisticos, as suas igrejas filiais e respectivas congregaes. So seus rgos: a Assembleia Geral, a Assembleia Ministerial, a Diretoria Geral e o Conselho Fiscal. Alm desse grupo, h outro grupo de rgos que tambm foi institudo pelo Estatuto da IEADERN para administrar as igrejas sedes de campos e suas filiais nas cidades localizadas no interior do estado do RN. Com isso, cada igreja do interior possui uma Assembleia Local, um Ministrio Local, uma Diretoria Local e
Departamentos. Na condio de templo central, a IEADERN sedia a Conveno Estadual de Ministros do RN (CEMADERN). Como os demais ministrios assembleianos, a IEADERN possui um Estatuto Social e um Regimento Interno que o complementam no comando de assuntos administrativos e eclesisticos, tais como: instalao e emancipao de igrejas filiais e congregaes, membresia, processos disciplinares, estrutura administrava, sucesso de pastores
75
Segundo o Artigo 14, Pargrafo I, Inciso I disposto no Estatuto da IEADERN dever de cada conveno estadual encaminhar, via ofcio, para arquivo na CGADB, cpia autenticada de seu estatuto e regimento Interno atualizados.
125
Dentro da grande Natal a IEADERN tem sob a sua jurisdio eclesistica 24 setores76 de congregaes. Dessa forma, ela possui influncia sobre 24 Campos Eclesisticos, os quais esto espalhados nas 4 mesorregies 77 do RN. Percebe-se que a abrangncia territorial da IEADERN no estado norte-riograndense absoluta78, auferindo-se, desse modo, a sua tessitura, como a maior entre as igrejas evanglicas, uma vez que em determinadas cidades em que existem trabalhos da Assembleia de Deus, no h igrejas tradicionais evanglicas79 atuando. Nessa perspectiva, as convenes estaduais de ministrios
assembleianos, como a CEMADERN, exercem uma funo utilitria para as instncias de base da igreja. Como receptoras do poder da CGADB, emitidos em forma de parmetros e diretrizes, as Convenes Estaduais interpretam essas informaes e constroem adaptaes em seus estatutos, cuidando para que tais regras sejam entendidas pelos lderes locais. Destarte, a comunicao do poder feita em escalas superpostas de hierarquias administrativas. Vale ressaltar que, a coerncia administrativa e estrutural dos territrios assembleianos depende muito de como as informaes so difundidas pela tessitura. Assim, os cdigos estatutrios e regimentais so repassados para os pastores de cada campo eclesistico na Conveno Estadual da IEADERN. Essa funo fica sob a responsabilidade da CEMADERN, rgo de deliberao da IEADERN. Esse importante aparelho administrativo acionado uma vez ao ano para transmitir normas e esclarecer pontos chaves para os demais pastores do RN. Com isso, entre os objetivos da CEMADERN, o mais importante facilitar a compreenso dos cdigos a toda a estrutura administrativa dos campos eclesisticos. Essa orientao feita aps a elaborao ou a alterao de regimentos e atos normativos inscritos no estatuto da IEADERN, portanto, aps isso a Conveno de Ministros rene anualmente as principais lideranas estaduais para transmitir as novas resolues administrativas.
76
Setores correspondem aos bairros, nos quais h uma igreja plo e ligadas a ela vrias congregaes e sub-congregaes. (Disponvel em: <http://www.adnatal.org.br/capital.htm>. Acesso em: 15 fev. 2010). 77 O Rio Grande do Norte divide-se me 4 mesorregies denominadas: Oeste Potiguar, Central Potiguar, Agreste Potiguar, Leste Potiguar (FELIPE; CARVALHO, 1999, p.14). 78 Os 24 campos eclesisticos de forma circunscrita supervisionam igrejas em todas as cidades do RN (Disponvel em: <http://www.adnatal.org.br/interior.htm>. Acesso em: 15 fev. 2010. 79 Essa afirmao refere-se s denominaes tradicionais como a Presbiteriana e a Batista pelo alcance espacial de suas igrejas no RN.
126
Em face desse cenrio, possvel perceber o poder institucional assembleiano como um sistema marcado por etapas deliberativas e unidirecionais80, transmitido por instncias territoriais, que viabilizam a criao, a difuso e a execuo de cdigos administrativos. por meio dessa lgica institucional que o poder transmitido nos territrios assembleianos, respondendo pela unidade de sua grandiosa estrutura territorial. Cabe, no entanto, o entendimento de que a dinmica do poder institucional da Assembleia de Deus no est expresa apenas nas instncias que legislam o poder, mas, sobretudo, nas instncias que o executam, j que so elas que do fora e concretude ao domnio territorial assembleiano. Assim, para a anlise do cumprimento do poder nas Assembleias de Deus preciso que se desvenda a organizao territorial dessas instncias de base, bem como a natureza dos seus principais mecanismos coercitivos usados para fins de controle. Apreende-se com o exposto, que os Campos Eclesisticos so verdadeiras torres de vigia do poder assembleiano. Ou seja, essas instncias de base supervisionam os fiis e aplicam todas as normas deliberadas pelas instncias legisladoras. Sendo assim, a linha de frente dos territrios assembleianos nas cidades e distritos de todo Brasil.
Os campos eclesisticos formam a base de sustentao de toda estrutura territorial da Assembleia de Deus. por meio deles que os territrios assembleianos ganham visibilidade espacial ante aos outros territrios religiosos. O trabalho de superviso da igreja sede do campo eclesistico d sentido ao poder in loco das ADs. A sua utilidade dentro do sistema territorial vai alm da simples vigilncia administrativa e doutrinria de igrejas, porquanto so eles, tambm, que executam os mtodos disciplinares aplicados nos membros e obreiros assembleianos. A estrutura territorial de um campo eclesistico assembleiano definida por Arajo (2008, p.152), como sendo [...] a rea de atuao de um ministrio
80
O poder aqui visto como um encaminhamento de normas sempre de uma instncia maior para outra menor.
127
formado por uma igreja-sede, igreja-me, e as suas diversas congregaes e/ou igrejas filiadas, agrupadas dentro de um bairro e/ou cidades em um ou mais estados (Figura 3). Identifica-se, ento, a lgica territorial dos campos eclesisticos, como sendo a organizao de uma rede de igrejas, congregaes 81 e sub-congregaes em torno de uma Igreja Sede.
Figura 3 Organograma da Jurisdio dos Campos Eclesisticos das Assembleia de Deus no Serid/RN Fonte: Elaborado pelo autor (2010)
Como pode-se observar na figura anterior apresentada, a igreja sede a principal instncia de comando das igrejas filiais e congregaes, e mantm a sua jurisdio em dois nveis: doutrinrio e administrativo. Os tipos de jurisdio dos campos eclesisticos representam a territorialidade em duas escalas espaciais diferentes. A jurisdio regional simula a forma de superviso do campo num conjunto de cidades, enquanto que a jurisdio citadina representa a forma de superviso do campo na cidade que se encontra a sua sede. O campo eclesistico um sistema hierrquico construdo
gradativamente. Ao contrrio de determinadas hierarquias eclesisticas que estabelecem de imediato os seus centros de comando, na AD o ponto mais alto da hierarquia, geralmente, se constitui aps um histrico de extensos trabalhos
81
Dentro da estrutura organizacional das Assembleia de Deus, a congregao um ncleo de pregao fundado e ligado igreja-sede. Geralmente as congregaes encontram-se nos bairros perifricos, em pequenos sales prprios ou locados. J as sub-congregaes so igrejas fundadas por outras congregaes.
128
evangelsticos e de estruturao eclesistica. Dessa forma, dentro desse sistema territorial, a maioria das igrejas sedes de campo foram antes igrejas filiais ou congregaes. A condio de sede adveio do xito do trabalho de estruturao interna e, especialmente, na expanso espacial de igrejas e congregaes assembleianas. Isso indica a clara possibilidade de promoo hierrquica entre as instncias de base da AD, uma vez que igrejas filiais podem passar de simples pontos de evangelizao a sedes de comando territorial. A elevao na hierarquia territorial de uma congregao est relacionada autonomia financeira e reproduo espacial de outras igrejas e congregaes. Entretanto, para que haja o reconhecimento na promoo das congregaes a instncia preciso que elas obedeam a critrios estabelecidos pelas convenes estaduais. Com isso, o processo de emancipao de uma congregao obedece a critrios estatutrios da Conveno Estadual a qual pertence. Assim, a emancipao apenas de ordem financeira82, permanecendo as igrejas filiais ou congregaes sob a forte vigilncia doutrinria e administrativa da igreja sede. No caso da elevao de uma igreja filial sede de campo, para que isso ocorra ela dever apresentar nmeros que comprovem a quantidade de fiis sob a sua jurisdio. No caso da IEADERN, essa estrutura dever ter um total de mais de mil membros arrolados, em comunho, no municpio em que se localizar a igreja sede de campo83". A comprovao do nmero de membros e obreiros torna-se um indicador eloquente do nvel de controle da estrutura ministerial. E somente aps essa comprovao que uma igreja pode reivindicar uma rea de controle independente. Esse momento representa para o pastor do nascente campo, a oportunidade de aumentar a sua participao, tanto nas decises locais quanto nas estaduais, podendo assim concorrer presidncia dos rgos deliberativos da sua Conveno Estadual. As igrejas sedes de campos eclesisticos so dirigidas por pastores que recebem a funo de supervisionar uma srie de igrejas filiais pertencentes a sua
82
Apesar de na prtica as congregaes serem criadas e sustentadas a princpio pela igreja filial ou sede, segundo o estatuto da IEADERN, elas devem nascer j independentes financeiramente, aps ser comprovada a necessidade de sua existncia. No citado estatuto, para a criao de uma congregao dever existir, no mnimo, trinta pessoas que se renam regularmente em um bairro ou localidade, em ambiente com mnimas condies de funcionalidade, e que possam contribuir com as despesas mnimas para a sua manuteno. REGIMENTO INTERNO DA IEADERN - Cap. II, Art. 2 (Disponvel em: <http://www.adnatal.org.br/documentos.htm>. Acesso em: 13 fev. 2010). 83 REGIMENTO INTERNO DA IEADERN. Cap. II, Art. 2 (Disponvel em: <http://www.adnatal.org.br/documentos.htm>. Acesso em: 13 fev. 2010).
129
jurisdio. Os pastores supervisores so designados pelas igrejas sedes estaduais, que prontamente lhes conferem autonomia para administrar o seu campo eclesistico, porm dentro de parmetros estatutrios e regimentais. Assim, compete igreja sede de campo e a sua rede de igrejas filiais o zelo e o cumprimento das diretrizes normativas adaptadas pelas Convenes Estaduais. Essa funo caracteriza o campo eclesistico, como instncias de base na estrutura territorial assembleiana, j que pela sua intermediao que se efetua o contato da comunidade assembleiana com as regras disciplinadoras do poder. Nessas circunstncias, possvel identificar a execuo de vrios micropoderes, desenvolvidos nas naves eclesisticas pela liderana local84. O alvo do poder sempre ser os membros, arregimentados para ser a classe que consente a autoridade dos lderes. A anlise de Foucault sobre as formas mais elementares do poder desloca a ateno para entender-se como se processa esse fenmeno nos campos eclesisticos. Para isso, primeiramente o autor instiga para a compreenso da atmosfera, na qual so construdas as microesferas de poder:
[...] a ateno as suas formas locais, a seus ltimos lineamentos tem como correlato a investigao dos procedimentos tcnicos do poder que realizam um controle detalhado, minucioso do corpo gestos, atitudes, comportamentos, hbitos, discursos (FOUCAULT, 2005, p.12).
Em
outras
palavras,
como
parte
de
um
todo,
os
poderes
compartimentados dentro das igrejas se integram a uma estrutura maior de comando eclesistico. Sendo assim, sero identificadas as variaes do poder no seio das igrejas assembleianas, mostrando os campos eclesisticos como sistemas de poderes [...] que no se encontra unicamente nele localizado, mas o ultrapassa e complementa (FOUCAULT, 2005, p.13). Com isso, seguindo os sinais de Foucault e os seus lineamentos, observa-se as camadas internas das relaes de poder que se efetuam nos campos eclesisticos. Desse modo, por meio dos micropoderes possvel identificar a dissoluo do poder nas esferas menores dos campos eclesisticos e delinear a periferia do poder assembleiano. Vale destacar que, a natureza do poder
84
A liderana local formada por rgos administrativos comuns as igrejas sede e igrejas filiais, tais como: Assemblia Local, Ministrio Local, Diretoria Local e Departamentos.
130
central85 assembleiano, no foge ao domnio do mstico. J que, os micropoderes esto irredutivelmente ligados a um poder central, nascido e estruturado no sagrado. Com isso, as suas variaes circunstancialmente representam a continuidade dessa natureza transcendental. Como instncia responsvel pela execuo do poder doutrinrio e administrativo assembleiano, os campos eclesisticos objetivam produzir, acima de tudo, domnios que atendam aos interesses das instncias superiores. Considerando a noo de produtividade que o poder consegue efetuar, Foucault (2005) identifica o corpo humano como o principal alvo dessa fora produtiva. Isso mostra que o corpo humano objeto principal de aprimoramento e adestramento dessa fora modeladora. Assim, por meio da disciplina ou poder disciplinar86 que o corpo sede regncia da doutrina, dessa forma, ela controla suas aes, para que seja possvel e vivel utiliz-la ao mximo, aproveitando as suas potencialidades e utilizando um sistema de aperfeioamento gradual e contnuo de suas capacidades (FOUCAULT, 2005, p. 16). O poder disciplinar exerce controle sobre o corpo, atravs de trs caractersticas de dominao presentes em seu sistema poltico: controle do tempo, organizao do espao e vigilncia. Sendo esses dois ltimos instrumentos de controle que identificam os limites do poder interno nas igrejas dos campos eclesisticos. Logo, percebe-se que a obedincia (in)consciente ao poder disciplinar nas Assembleia de Deus, antes de tudo, fruto da sujeio ntima dos fiis ao sagrado. No entanto, para a manuteno perene do sagrado, tcnicas de controle inerentes ao poder disciplinar so impostas pelos estatutos e regimentos internos, compartimentando e complementando, ao mesmo tempo, o poder central. A caracterstica divisria do poder disciplinar conduz ao entendimento da organizao intraespacial das igrejas sedes e filiais em termos de funcionalidade. Uma vez que:
85
Refere-se ao poder central as atribuies normativas unicamente desenvolvidas pelo Pastor, ou seja, a autoridade que lhe resguardada pelo estatuto e regimento interno de intervir em todos os setores e rgos da igreja. 86 Foucault esclarece o poder disciplinar como sendo uma tcnica, um dispositivo, um mecanismo, um instrumento de poder, que permitem o controle minucioso de operaes do corpo, que assegura a sujeio constante de suas foras e lhes impem uma relao de docilidade (FOUCAULT, 2005, p. 16). Segundo Hall Stuart o objetivo do poder disciplinar consiste em manter as vidas, o trabalho, as felicidades, os prazeres do indivduo, assim como sua sade fsica e moral, suas prticas sexuais e sua vida familiar, sob estrito controle e disciplina, com base no poder dos regimes administrativos [...] (HALL, 2002, p.42).
131
[...] a disciplina um tipo de organizao do espao. uma tcnica de distribuio dos indivduos atravs da insero dos corpos em um espao individualizado, classificatrio, combinatrio. Isolado em um espao fechado, esquadrinhado, hierarquizado, capaz de desempenhar funes diferentes segundo o objetivo especfico que dele se exige (FOUCAULT, 2005, p.17).
Por essa razo, a lgica organizacional produzida pelo poder disciplinar resultado da distribuio de funes especficas no ambiente interno de instituies, como, por exemplo, igrejas sedes e filiais. A segmentao de atividades instituda, para que melhor se proceda a execuo do poder central. Os rgos locais da Assembleia de Deus cumprem essa misso e servem de abrigo para os micropoderes, os quais definem o limite interno do poder nos campos eclesisticos. A IEADERN determina87, para cada igreja do campo, a existncia de uma Assembleia Local, um Ministrio Local, uma Diretoria Local e Departamentos. Os coordenadores desses rgos devero ser eleitos por um modelo monocrtico, dirigido pelo pastor. Isso significa que, cada rgo tem seu coordenador escolhido unicamente pelo pastor, o qual seleciona um dirigente e seu vice. Os escolhidos so geralmente do corpo de obreiros ou suas mulheres. Em especfico, os selecionados para dirigir os Departamentos, tm a liberdade de criar normas de condutas para o respectivo grupo que ir coordenar. Os departamentos
assembleianos mais comuns so: Infantil, Misses (evangelizao), Louvor (corais e grupos musicais), Eventos (realizao de festas, cruzadas e congressos), entre outros. Os lderes desses departamentos exercem, mesmo que limitado, um controle sobre determinados grupos da igreja, seja na organizao do comportamento de seus liderados para a apresentao de tarefas dentro da igreja, ou na criao de planos de trabalho. Os integrantes de cada departamento, por sua vez, sujeitam-se s regras de cada tarefa, comprometendo-se a se empenhar no cumprimento do dever proposto. Com o exposto, apreende-se que os micropoderes subsistem com uma realidade irredutvel das naves
assembleianas. Esses poderes moleculares so desenvolvidos pelos cargos menores da hierarquia assembleiana. Juntos, eles representam as variaes do poder central, expresso na figura do pastor.
87
ESTATUTO DA IEADERN. Cap. III, Seo I, Art. 18 <http://www.adnatal.org.br/documentos.htm>. Acesso em: 13 fev. 2010).
(Disponvel
em:
132
Outro instrumento de controle caracterstico do poder disciplinar a vigilncia, que de igual modo trabalha em funo de um poder central. Analisando o projeto penitencirio panopticon, desenvolvido no sculo XVIII pelo jurista ingls Jeremy Bentham, Foucault identificou que se tratava de uma tecnologia de poder, prpria para resolver os problemas de vigilncia (FOUCAULT, 2005, p.221). Ainda que o princpio da visibilidade (vigilncia) no comande plenamente a tecnologia do poder nas sociedades modernas, pode-se identificar as suas modificaes nos procedimentos colocados em prtica nas instituies hodiernas. O olhar do poder sobre as atitudes cotidianas difuso e posiciona-se estrategicamente sob vrios ngulos. Dessa forma, o indivduo quase no escapa da interrupta vigilncia do poder. Assim sendo, a sensao de monitoramento causada no indivduo o constrange e, muitas vezes, o obriga a regular-se sempre que as suas atitudes se desviam da lgica normativa do sistema de poder vigente. Adverte, ainda Foucault que, a vigilncia desempenha o seu trabalho por meio de uma rede de poder piramidal, em que o topo e a base formam uma conexo interdependente, no sentido de que o pice e os elementos inferiores da hierarquia esto em uma relao de apoio e de condicionamento recprocos (FOUCAULT, 2005, p. 221). A vigilncia do poder nas igrejas assembleianas se d, portanto, de dentro para fora e revela-se como instrumento de controle fundamental para a conservao doutrinria. O olhar do poder posicionado primeiramente no interior dos templos, como lentes interpostas viso, nas quais dispositivos aumentam o alcance dessa contemplao subordinadora, conseguindo ultrapassar os limites internos da nave eclesistica. Como se percebe, o templo o espao de vigilncia mais habitual das religies. Mais do que qualquer outro espao social, esse ambiente permite a observao dos atos mais concretos de devoo ao sagrado. O cristianismo em suas variantes fundamenta a necessidade de reunio, congregao, ajuntamento88 dos que professam a sua f em Jesus Cristo. Sustentado at hoje, esse princpio bsico da doutrina crist arregimenta pessoas a conviverem em espaos sacros, espaos esses onde, tambm, se efetua um domnio, uma
88
A carta paulina de Efsios 2.19, defende a existncia de um espao de adorao para os seguidores de Jesus Cristo.
133
vigilncia duradoura. Nessa ordem de entendimento, o sacerdote, figura sacra do lder da igreja, quem orienta o povo a permanecer nesta contnua aliana. O discurso do sacerdote cristo apoiado em escritos apocalpticos, que trazem a ideia de uma condenao futura. A punio divina dada aos que contradizem as doutrinas bblicas, paira sobre cada atitude do fiel e, ao mesmo tempo, o convoca a permanecer irrepreensvel. Deste modo, baseadas nesse paradigma cristo, as normas regimentais e estatutrias assembleianas so idealizadas e apresentam um conjunto de mecanismos idealizados para conter a desobedincia em massa. A poltica de vigilncia na AD, portanto, uma herana de princpios bblicos interpretados pelo cristianismo. A Assembleia de Deus uma denominao ligada ao protestantismo por meio do pentecostalismo, e como tal, representa um ramo tardio89 do cristianismo no Brasil. A vigilncia do poder na AD efetuada pelo sacerdote (pastor) e pelos seus obreiros. Esses agentes exercem o olhar atento do poder sob as diretrizes do poder central. Em sntese, o poder central assembleiano, dita que, ao contrariarem a doutrina bblica ou descumprirem as normas regimentais ou estatutrias, os membros da igreja estaro sujeitos a penalidades90. Sendo a aplicao dessa penalidade de estrita competncia do pastor, o qual organiza um conselho eclesistico para pr em vigor um processo disciplinar ao indivduo infrator. A existncia de uma hierarquia de obreiros aumenta ainda mais o grau de viso do poder central do pastor. Uma vez que eles servem ao ministro como agentes de superviso ou monitoramento, formando uma extenso especfica do seu olhar. importante notar que, o olho do poder central observa no somente o proceder intrainstitucional, mas tambm o extrainstitucional, visto que a comprovao de atos contrrios ao poder central fora do mbito da igreja, no escapa a extenso desse olhar vigilante. Neste caso, o olhar do poder assembleiano ampliado pelos olhares paralelos de testemunhas, que podem ser membros da prpria instituio ou at mesmo pessoas no religiosas. Sabe-se
89
Conforme Souza (2004, p.122), o pentecostalismo foi a ltima expresso do protestantismo a se instalar no pas. 90 As penalidades so dirigidas para duas classes de fiis, tais como: I aos membros: a) advertncia verbal ou escrita; b) suspenso; c) excluso. II aos congregados: a) advertncia verbal ou escrita; b) suspenso; c) desligamento do cadastro de congregados. ESTATUTO DA IEADERN. Cap. II, Seo V, Art. 10 (Disponvel em: <http://www.adnatal.org.br/documentos.htm>. Acesso em: 13 fev. 2010).
134
que o alcance desse olhar institucional se torna possvel pela construo de um esteretipo assembleiano. J que, o perfil das vestimentas e o comportamento social dos membros da AD so pautados em valores morais de santidade crist. O carter separador deste esteretipo possibilita que eles sejam reconhecidos entre outros grupos sociais e religiosos. Sobre esse assunto Mariano assegura que:
Os pentecostais, por vrias dcadas, mantiveram-se presos a um rgido esteretipo que muitos deles parecia imutvel, porque estaria baseado na vontade divina expressa nas Sagradas Escrituras [...] basta v-los que logo os identificamos, pejorativamente, como crentes, bblias, glrias, aleluias e at bodes (MARIANO, 1999, p.187).
O esteretipo asctico, diz respeito ortodoxia dos assembleianos na preservao dos usos e costumes denominacionais. Dessa forma, eles conseguiram fortalecer no movimento pentecostal uma marca distintiva, que os colocou em um grupo diferenciado do protestantismo, denominado de pentecostalismo clssico. Consequentemente, como forma de mostrar a diferena entre o sagrado e profano, os lderes assembleianos enfatizam doutrinariamente a importncia de preservar socialmente a identidade esttica91 dentro e fora da igreja. Apreendese que a criao de um esteretipo assembleiano mostrou-se como um dispositivo que aciona o olhar inibidor do poder. Visto que, a no observncia desse esteretipo sujeita o infrator a um processo disciplinar. Assim, a vigilncia do poder identificada pela fora coercitiva de mltiplos olhares, de crentes e no crentes, queles que se transmutam de um perfil conservador para outro liberal 92. A convergncia de olhares reprovadores possui um efeito constrangedor no momento em que eles indicam que uma regra est sendo descumprida. As vigilncias paralelas ou extrainstitucionais contribuem, destarte, para que o olhar central do poder seja sentido fora dos domnios da igreja e instaure no indivduo o sentimento de responsabilidade para com a identidade esttica e comportamental da igreja.
91
A identidade esttica dos assembleianos socialmente reconhecida no uso de calas compridas pelos homens e pelas mulheres no uso de saias e cabelos grandes. 92 Aqui expe-se os atos de negligncia do perfil asctico assembleiano produzidos por membros que ignoram certos aspectos dos usos e costumes relacionados ao modo de se vestir socialmente.
135
A vigilncia do poder assembleiano no Serid norte-rio-grandense efetuada pela jurisdio de trs campos eclesisticos sediados nas cidades de Caic, Currais Novos e Parelhas. Essas circunscries eclesisticas esto ligadas IEADERN e, regionalmente, abarcam uma srie de cidades localizadas nas micro-regies do Serid oriental e ocidental. As igrejas sede de campos eclesisticos so verdadeiras torres de vigia do poder institucional nas cidades seridoenses. Em funo do contexto social das possibilidades de expanso urbana e das estratgias adotadas para este fim, os campos da AD desenvolveram uma dinmica territorial peculiar em torno das 18 cidades do Serid. A formao dos Campos Eclesisticos resultado de um trabalho intensivo de ampliao de igrejas e pontos de pregao. Dessa forma, a flexibilidade espacial uma das estratgias mais marcantes no processo de estabelecimento de templos nas urbes seridoenses. Os campos eclesisticos atravs da reproduo de igrejas e congregaes mantm, hoje, uma das maiores estruturas religiosas da regio. Em plena expanso, os Campos Eclesisticos da AD coexistem ao lado da hegemnica territorialidade catlica e de outras igrejas igualmente divergentes.
3.5 CAMPO ECLESISTICO DE CAIC 3.5.1 Formao da Jurisdio Regional: a delimitao de novas fronteiras religiosas no Serid
A cidade de Caic, reflexo da espacializao da economia pecuarista no Serid, outrora teve a sua primeira delimitao territorial exatamente igual a atual regio seridoense. Tal configurao obedecia no apenas a uma delimitao capitalista, mas tambm religiosa93. A historiografia revela que a estrutura de seu ncleo urbano em 1800, tambm foi definida pelo poder religioso e tinha como
93
Sobre esse fato afirma Morais (2005, p.83): [...] os limites geogrficos de sua jurisdio eram demarcados pelos limites das freguesias (Freguesia da Gloriosa SantAna do Serid), desde que se tratasse de espao com ocupao consolidada [...] o municpio Vila Nova do Prncipe estendia-se por todo Serid, numa evidente superposio das escalas municipal e regional
136
referncia a Matriz de SantAna. Assim, a partir desse fixo foram sendo configuradas as primeiras vias pblicas de Caic. Esse legado de poderes espaciais do catolicismo em Caic veio distintamente com a intrepidez de seus povoadores, os quais semearam os atos de devoo e os cristalizaram, espacialmente na construo da igreja de SantAna em 1784. O catolicismo, da primeira metade do sculo XIX, demonstrava vigorosamente a sua influncia e domnio na demarcao do espao urbano caicoense. Porquanto, alm do poder de delimitao espacial a influncia sociocultural da igreja marcou o legado desta embrionria sociedade. Assim, com a criao, pelo Pe. Francisco de Brito Guerra, da Escola de Latim de Caic (1836) caracterizou-se a posio da igreja no direcionamento de conhecimentos culturais para os habitantes da Vila Nova do Prncipe. O primeiro impacto no comando da Igreja Catlica na regio conhecida como Serid, se deu aps quase dois sculos de hegemonia nessas terras94. Esse acontecimento foi uma deciso da poltica nacional, e que tambm se fez valer nas reas de domnio catlico na regio da Cidade do Prncipe (Caic final do sculo XIX), e nas demais vilas que compunham o espao seridoense da poca. O estabelecimento da laicidade foi o golpe desferido no domnio Catlico, criando a condio de exclusividade da sua autoridade espiritual na sociedade brasileira. No entanto, dois anos aps a proclamao da Repblica (1889) o Estado brasileiro decretou a constituio de 1891, na qual a moderna Liberdade de Culto foi instaurada. De acordo com Pierucci foi implantado: [...] o respeito a todas as formas de expresso religiosa, o respeito escrupuloso s convices mais ntimas de um ser humano, a liberdade de conscincia (PIERUCCI, 2000, p. 283). Assim sendo, o decreto do Governo Republicano soou como uma abertura para o pluralismo religioso, possibilitando a expanso de novas religiosidades, sobretudo a difuso do protestantismo, maior concorrente do catolicismo em terras seridoenses. No Serid os protestantes que iniciaram um proselitismo paralelo aos catlicos foram os presbiterianos (no final do Sculo XIX). Conforme Martins
94
Aqui faz-se aluso ao perodo de exclusividade do catolicismo, enquanto movimento religioso na regio do Serid, desde o processo de ocupao em 1697, aps o extermnio indgena perpetuado pelo sistema de jurisdio das Freguesias de Nossa Senhora do Bom Sucesso de Pianc em 1721 e da Freguesia da Gloriosa SantAna do Serid em 1748, at a declarao da constituio de 1891.
137
(1997, p. 26) o carter missiolgico dessa denominao no Nordeste obedecia a um chamamento missionrio estabelecido pela igreja nacional, na metade do sculo XIX. A chegada desses protestantes de cunho calvinista sinalizava o incio do pluralismo religioso no Serid. Uma vez que, o estabelecimento da Igreja Presbiteriana significava a tolerncia religiosa por parte da religio hegemnica, de coexistir com outra instituio rival. A emergncia do pluralismo religioso no Serid reflexo da diversidade de identidades religiosas, o que, por sua vez, indica ter ligao direta ao processo de implementao de novos elementos religiosos numa sociedade
tradicionalmente catlica. O incremento populacional decorrente da urbanizao das cidades seridoenses indica o incio desse processo. J que, a sociedade tornou-se culturalmente diversificada e aberta s novas experincias
sociorreligiosas. No final da dcada de 1990 Martins (1997, p. 12) afirmou que o Serid j contava com denominaes religiosas provenientes, em sua maioria, das culturas norte-americana e europia, como, por exemplo, as Testemunhas de Jeov (proveniente dos EUA), Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos ltimos Dias Mrmons - (proveniente dos EUA), Espiritismo (proveniente da Frana), Igreja Presbiteriana (provenientes da Sua), Igreja Batista Regular (proveniente dos EUA), Igreja do Evangelho Quadrangular (proveniente do Canad), Igreja Metodista (proveniente dos EUA), Primeira Igreja Batista (proveniente dos EUA), Igreja Adventista do Stimo Dia (proveniente dos EUA) e tambm foi notificada a existncia do Budismo, religio originria da cultura asitica. O crescimento de novas denominaes religiosas nos bairros perifricos e a forte marca do catolicismo nos bairros centrais de Caic revelam uma geografia do poder, na qual o controle territorial de cada uma apresenta foras e dimenses diferenciadas em determinadas reas da cidade. Sabe-se que a distribuio das igrejas pela cidade pode ser determinante para o sucesso de suas estratgias de evangelizao, seja em uma zona, bairro ou rua. Em virtude disso, tomando como exemplo a igreja catlica da cidade de Caic, possvel identificar o raio de controle de uma instituio religiosa em relao outra. A dimenso da territorialidade catlica na cidade de Caic, como abordado anteriormente, foi constituda historicamente pela construo de seu ncleo urbano baseado nos padres coloniais, caracterizado pela exclusividade de sua atuao como instituio religiosa e atravs de um forte domnio 138
sociocultural. Todos esses fatores conjugados justificam a sua influncia no espao central da cidade de Caic. A configurao atual do centro insere a Catedral de SantAna e os seus principais patrimnios na periferia do centro. Esta nova interpretao espacial foi motivada pela redefinio do centro de Caic95, que transmutou a condio de centro para o setor densamente ocupado pelo comrcio. O espao central de Caic circunscreve, hoje, o eixo de cruzamento das avenidas Coronel Martiniano, que corta a cidade no sentido leste-oeste, e a Serid [...] (MORAIS, 1999, p.251). Esse eixo assume atualmente a funo de centro comercial, local onde esto localizados os principais segmentos do setor tercirio. Correspondendo a essa reconfigurao funcional do espao caicoense, a representao catlica est referenciada, hoje, nas reas circunvizinhas ao ncleo central da cidade. Portanto, na paisagem perifrica do centro de Caic que o catolicismo resguarda as suas arquiteturas, smbolos e monumentos que sinalizam os limites de sua dominao nessa rea da cidade. Os geossmbolos que delimitam a territorialidade na periferia do centro esto representados no interior do Complexo histrico-cultural da cidade de Caic, como pode-se perceber na Figura 4, que a seguir ser apresentada:
Esse conjunto de ncleos culturais ganham existncia na conjuno: do Lago da Igreja do Rosrio, da Praa Senador Dinarte Mariz e do Largo da
95
Conforme afirma Morais (1999, p. 252): o cerne deste processo est nas alteraes do contedo funcional do ncleo central, espao em que as residncias cederam lugar ao comrcio em expanso.
139
Catedral de SantAna. Alguns dos mais notveis monumentos catlicos de Caic esto erguidos no interior desse complexo, tais como: Matriz de SantAna, Arco do Triunfo, Praa Mons. Walfredo Gurgel e o Sobrado do Padre Guerra. Os marcos catlicos so tambm visualizados fora do complexo histrico-cultural como a Capela da Casa de Evangelizao RCC (Centro-Cadoshy) e a Capela do Educandrio Santa Teresinha, Parquia de So Jos e a Parquia de Nossa Sr. de Ftima, entre outros. Diante do exposto, fica evidente que o poder simblico da igreja tem sua maior expressividade nos bairros centrais da cidade, o que no se efetua com a mesma intensidade nos bairros perifricos de Caic. Ficando, assim, esses espaos da cidade relegados expanso de novas denominaes, sobretudo das pentecostais.
3.5.2 Estratgia de controle espacial: pontos de pregao e como ao primeira da territorializao assembleiana Dentre as igrejas que se valem de uma atuao perifrica destaca-se a Assemblia de Deus (AD), a qual possui, historicamente, uma estratgia de crescimento voltada para periferias urbanas. Apesar da localizao central da Igreja Sede em Caic, sua tessitura estende-se dinamicamente pelas reas de maior vulnerabilidade social. O primeiro Grupo familiar96 da Assemblia de Deus na cidade de Caic foi estabelecido em 1946, que logo mais tarde deu lugar ao modelo de reproduo espacial conhecido como ponto de pregao97. Com isso, o grupo familiar iniciado
96
uma reunio litrgica desenvolvida em um recinto domiciliar pelos membros fundadores das Assemblia de Deus no incio do sculo XX. Esse agrupamento consiste em cultos domsticos organizados geralmente por uma famlia sem fins proslitos. Dentre as finalidades dessas reunies esto o desenvolvimento das experincias carismticas, ensinamentos bblicos e da doutrina pentecostal. O grupo familiar foi primeira forma de organizao dos pioneiros das Assembleia de Deus e era considerado um trabalho informal no ponto de vista institucional, at ser reconhecido pelas lideranas de uma Igreja Central. Na hierarquia espacial pode-se aferir como a mais elementar organizao de membros e missionrios das Assembleias de Deus ao empreender o estabelecimento de um trabalho evangelstico efetivo numa cidade. Pode assim tambm dizer, que foi a molcula formadora de vrios pontos de pregao e at congregaes em diversas cidades em vrias regies no Brasil no sculo XX. 97 O ponto de pregao um local fora do mbito da igreja ou do grupo familiar escolhido para a difuso evangelstica pelas Assembleias de Deus. Somente constitui-se em um ponto de pregao os trabalhos que so abertos e assistidos por uma igreja central. Para criao de um ponto de pregao os lderes assembleianos comumente adotam galpes, varandas, praas ou at mesmo a frente das residncias para se tornarem um ponto de difuso do Evangelho. Esse mtodo diferencia-se do grupo familiar, simplesmente pelo seu carter proslito, ou seja, pelo esforo persistente e sistemtico na arregimentao de novos seguidores. Outra caracterstica
140
em Caic pelo pioneiro Joo Joaquim transforma-se logo em um ponto de pregao, quando efetivamente o trabalho lana-se na busca de novos adeptos. Estes recintos de reunio so as sementes que do origem a uma congregao, depois a uma igreja e assim sucessivamente. Sendo assim, o ponto de pregao a clula formadora das instncias de base da Assemblia de Deus. Simbolicamente os pontos de pregao se configuram como espaos de representao do sagrado pentecostal e no que diz respeito a sua utilizao pelas Assembleia de Deus, este mecanismo apresentou uma interessante mobilidade no espao urbano. Dessa forma, objetiva-se entender a flexibilidade espacial dos pontos de pregao pelo seu vis simblico, uma vez que esses eles representam a primeira estratgia evangelstica das Assembleia de Deus nas cidades. Qualquer lugar ou ambiente pode se tornar temporariamente em um ponto de pregao. Contudo, para tornar um espao secular98 em um ponto de pregao, transfigura-se temporariamente o lugar (varanda, depsito ou at mesmo a fachada de uma casa) em um ambiente de orao e anunciao do evangelho, adicionando apenas um plpito e cadeiras, sendo essa a atmosfera caracterstica de um ponto de pregao. Assim sendo, esses locais que pregam a mensagem dos Dons Espirituais, no existem como estruturas fixas no espao, no qual se reconhece uma igreja, capela ou congregao. Pois, como lugares de representao no dependem de estruturas fsicas construdas personalizadamente para abrigar seu cerimonial, mas apenas de um espao que acolha, mesmo que temporariamente, sua ritualidade e intencionalidade espiritual. Quando os lugares onde se instalam os pontos de pregao conseguem ser comprados e estruturados administrativamente, logo se elevam a condio de congregao e, dependendo do crescimento at de igreja. Aps o lugar assumir status de congregao, o ponto de pregao transmutado para semear a mensagem pentecostal em outras ruas e bairros, distritos etc (Figura 4).
98
dos pontos de pregao a sua fugacidade espacial, uma vez que os lugares onde se aplicam essa estratgia evangelstica so escolhidos temporariamente para se proceder a criao permanente de uma congregao, e logo aps so transpostos para outras ruas, bairros, zonas entre outros espaos. Na hierarquia espacial os pontos de pregao a base formadora das instncias territoriais das Assembleias de Deus. Diz-se aqui todos os lugares desprovidos em sua gnese de caractersticas religiosas.
141
Figura 4 Organograma flexibilidade espacial dos pontos de pregao Fonte: Elaborado pelo autor (2010)
Portanto, o ponto de pregao assim uma estratgia evangelstica fugaz no ponto de vista de sua fixabilidade espacial, visto que a existncia momentnea desse mecanismo permite que o proselitismo assembleiano se difunda mais rapidamente nos espaos urbanos. Os registros histricos no mencionam onde e quando se formou a primeira congregao em Caic. No entanto, a utilizao de pontos de pregao, como estratgia de evangelizao, foi registrada por Maria Aparecida (1992), na dcada de 1940, nas Ruas Generina Vale, Professor Viana, Quintino Boaiva e Joel Damasceno. Nesta ltima foi onde se constituiu definitivamente o ponto de fixo do trabalho assembleiano em Caic, o que se remete a interpretar como sendo a primeira congregao das Assembleia de Deus em Caic99. Nesse sentido, a misso dos pastores naquele momento era empenha-se o mximo no desenvolvimento e multiplicao de novas igrejas, sem necessariamente se preocupar com o controle e a qualidade desse crescimento, uma vez que o aumento de igrejas e congregaes neste perodo era o alvo mais
99
O trabalho de secretaria desenvolvido nos templos das Assembleia de Deus no Serid, at a ltima dcada do sculo XX, foi colocado em segundo plano pelas igrejas-me. Isso se deve a continuidade da filosofia eclesistica dos lderes da poca em que iniciaram os primeiros trabalhos evangelsticos no RN, em 1960 a 1970.
142
perseguido pelos lderes da AD, enquanto isso os trabalhos internos da secretaria ganhavam pouca ateno e recebiam o mnimo de investimentos dos pastores no Serid. Com isso, o resultado foi uma ampla rede de igrejas e congregaes dirigidas por um governo sem formalidades administrativas e legislaes estatutrias e regimentais definidas. As ordens e diretrizes proferidas nas reunies locais e regionais neste perodo eram apenas registradas em ata, possuindo um carter mais deliberativo e consensual do que propriamente jurdico. Por isso, esse perodo confirma a ausncia de artigos estatutrios que regulassem o crescimento da Assemblia de Deus, como tambm de um regimento estadual que orientasse a jurisdio de cada igreja-me. Dessa forma, observa-se que a informalidade" prevalecia nos assuntos de natureza administrativa nas primeiras dcadas de atuao da igreja no Serid. Devido inexistncia de um arquivo geral na secretaria da Igreja Sede em Caic, quase nada pde ser coletado acerca de datas relativas fundao das igrejas que atualmente formam o campo caicoense, dentro do recorte temporal da pesquisa que vai de 1943 a 2009. Sendo assim, a historicidade dos eventos escritos daqui em diante faz partes dos retalhos da histria oral resgatada da memria dos pioneiros. Com isso, a cronologia precisa dos fatos fugiu do registro memorial desses primeiros assembleianos entrevistados, possibilitando a anlise das igrejas do Campo Eclesistico de Caic, no em seus respectivos anos de criao, mas pela classificao genrica de datas chaves que serviu como referncia aos acontecimentos espaciais sequenciados. Durante os anos que se prosseguiram entre 1940 a 1960, a Assemblia de Deus em Caic sobreviveu diante do proselitismo de outras igrejas, perpetuando os ensinamentos pentecostais em um modesto templo localizado na Rua Joel Damasceno. No decorrer deste mesmo perodo no se registrou um projeto ousado de crescimento, somente um evangelismo restrito aos adeptos da igreja100. Entretanto, a dcada de 1960 representou um perodo ureo no fortalecimento da referida instituio e na difuso espacial de novos templos e congregaes, na qual a base territorial regional do Campo Eclesistico de Caic
100
143
foi ganhando feies mais ntidas e, gradativamente, sobrepondo-se a poro Oeste do Serid. Assim sendo, a construo do templo em 1962, foi o marco inicial desse processo de expanso da Assembleia de Deus na zona urbana de Caic e no sentido Oeste do Serid Potiguar. De incio, o plano de difuso colocado em ao pelo templo de Caic ficou voltado para determinadas cidades seridoenses, especialmente para as limtrofes, visto que o sistema de jurisdio de campos eclesisticos ainda no havia sido estabelecido para fins de organizao territorial das igrejas-me no Estado do RN, pois no havia uma jurisdio legalmente estabelecia. Convencionalmente os ncleos evangelsticos fundados por uma igrejame e mais tarde elevados a condio de igrejas, pertenciam a uma rea de abrangncia espacial de sua respectiva igreja fundadora, de sorte que no haviam cdigos institudos que definisse o limite territorial das igrejas-me. No entanto, a igreja em Caic, na hierarquia regional, apresentava-se como igrejame, pelo fato de ser uma igreja multiplicadora de outras novas. Neste contexto, a igreja em Caic tinha a maior expressividade no direcionamento dos trabalhos evangelsticos em todo Serid. No relato oral concebido por Ablio Damsio, identificam-se duas fases de expanso regional da igreja-me em Caic. Esse duplo processo revelou alguns dos mecanismos evangelsticos utilizados pelas Assembleias de Deus em Caic para expandir seu o raio de influncia eclesistica em outros municpios. A primeira fase de ampliao da rea que abrange hoje o Campo Eclesistico de Caic corresponde ao tempo de gesto do Pastor Raimundo Santana na igreja-me de 1962 a 1973. Este foi o primeiro pastor a desenvolver a rede de igrejas que integram e recente Jurisdio Regional do templo de Caic. Naquele momento, um intenso trabalho de explorao de mtodos evangelsticos assembleianos foram postos em prtica, e entre os mais utilizados estava os pontos de pregao. Dessa forma, responsvel por coordenar a construo do templo em Caic, o Pastor Raimundo Santana obteve o apoio fervoroso dos obreiros locais com quem pode requerer a assistncia para dinamizar seus projetos evangelsticos. A primeira fase de expanso de novos trabalhos assembleianos em parte seguiu a dinmica espacial em que se passava o territrio seridoense, contexto 144
esse impulsionado pela cotonicultura, a qual procedeu a uma srie de desmembramento de novos municpios. O espao regional nesse tempo obteve maior redimensionamento interno do que outros precedentes, pois
Dos 23 municpios que, direta ou indiretamente, foram desmembrados de Caic, 14 forma oficialmente criados no interstcio 1940/1970, ou seja, 60, 87%. Foi o perodo de mais intenso fracionamento territorial no Serid correspondendo a uma fase em que a oligarquia regional encontrava-se fortalecida econmica e politicamente (MORAIS, 2005, p. 217).
Nesse sentido, a primeira etapa de expanso regional das Assembleias de Deus de Caic na dcada de 1960, como exposto, sobrepem ao perodo em que o Serid vivenciara uma fase de (re) estruturao territorial via economia algodoeira, refletindo na delimitao de 6 (seis) novos territrios municipais. O estratagema espacial adotado pelo Pastor Raimundo Santana em 1962, para a instalao de trabalhos evangelsticos nas cidades adjacentes foi os pontos de pregao. Essa ttica de crescimento foi a mais vivel, devido incapacidade financeira da igreja de Caic em arcar com a construo de templos em outros municpios. Desse modo, antes do estabelecimento dos pontos de pregao numa cidade, geralmente se realizava dois tipos de evangelizao: o primeiro se dava pelos contatos dos adeptos assembleianos em outras cidades, os quais tomavam a iniciativa de promover a evangelizao de parentes e amigos. Conquistando a converso destes, os missionrios assembleianos acionavam a ajuda da Igreja em Caic, para que o Pastor Raimundo Santana instalasse um ponto de pregao na respectiva cidade do novo convertido. O segundo tipo de evangelizao distinguia-se pela prpria autonomia da igreja de Caic, quando Pastor Raimundo Santana, juntamente com seus obreiros, realizavam uma evangelizao de reconhecimento e promovia cultos pblicos, at que houvesse adeso de pessoas e se efetivasse um ponto de pregao101. A partir desse comportamento estratgico, vrios ncleos evangelsticos foram implantados na gesto do Pastor Raimundo Santana, fora dos limites da cidade de Caic. Segundo o Presbtero Ablio Damsio, o primeiro ponto de pregao criado pela igreja em Caic foi na cidade de Jardim de Piranhas. Outros municpios tambm esto inseridos nesse processo de implantao dos pontos de
101
Entrevista concedida pelo pioneiro da Assemblia de Deus de Caic, o Presbtero Ablio Damsio, em 09 jan. 2010, no seu estabelecimento de trabalho.
145
pregao no perodo de (1962-1972) como, Jucurutu, Serra Negra do Norte, So Joo do Sabug, Ouro Branco e Ipueira (Mapa 3, p.142).
146
147
A segunda fase de expanso da igreja-me de Caic sobre a poro Oeste Serid identificada nas palavras de Ablio Damsio, no perodo em que intercala a gesto dos pastores Jos Barreto (1972-1975), Jessu Lisboa Barreto (1975-1984) e Abner Alves de Sousa (1995-2004), como lderes da igreja-me de Caic. A curta gesto do Pastor Jos Barreto, sucessor de Raimundo Santana em 1972, em trs anos a igreja de Caic obteve um minucioso avano em sua jurisdio regional, com a criao do trabalho evangelstico na cidade de So Fernando. A viso deste Pastor esteve voltada para a reestruturao das dependncias da igreja-me de Caic, conforme elucida Maria Aparecida (1992, p.15) uma das primeiras providncias foi construo da casa pastoral. Sendo assim, a casa pastoral anexa ao templo de Caic se destinou morada dos pastores at a reconstruo do templo, iniciada mais tarde na gesto de Antnio Marrocos. Em 1975, o Pastor Jessu Lisboa Barreto assume a direo da Assembleia de Deus de Caic e continua com a poltica de reproduo de novos trabalhos, utilizando basicamente os mesmos princpios de crescimento dos pastores precedentes, investindo na implantao de um ncleo evangelstico no municpio de Timbaba dos Batistas e no Distrito caicoense conhecido como Lajinha. A continuao e crescimento dos ncleos evangelsticos criados nestas cidades, mesmo com o auxlio recorrente dos obreiros de Caic, dependia em grande parte dos adeptos locais. De praxe, a igreja-me reduzia a assiduidade de sua assistncia, quando os trabalhos locais comeavam a dar sinais de autonomia financeira e administrativa. Essa relativa independncia sinalizava o progresso dos trabalhos evangelsticos nas cidades relacionadas anteriormente, ocorrendo em cada uma delas eventos e situaes diversas, e que dado ao conjunto de particularidades que envolveu esse processo no houve detalhes no registro oral dos entrevistados. Neste caso, o fato importante a se destacar nesta primeira e segunda fase foi a prioridade empregada para a reproduo de novos templos e na ampliao da rea de influncia evangelstica. Com isso, mesmo no estando em vigor antes da implantao do trabalho de Januncio Afonso, em 1995, Distrito de Jucurut, o sistema de Campos Eclesisticos foi antecedido por uma jurisdio 148
informal, estabelecida por concordata, preexistente atual jurisdio respaldada por um Estatuto Social e Regimento Interno. Diante disso, a ligao da igreja-me de Caic aos seus ncleos evangelsticos e igrejas filiais era simplesmente pactual e sem contrato jurdico. Portanto, o controle da expanso regional da Assemblia de Deus em geral, estava firmado nos laos de fidelidade ministerial dos obreiros com seus respectivos pastores, na conservao de princpios doutrinrios e na
subordinao hierrquica. Assim sendo, aps a fundao do ltimo ponto de pregao evangelstico instalado no municpio de Jucurut, pelo Pastor Abner Alves, em 1995, a igrejame de Caic desenhava um traado circunferencial de influncia institucional em nove cidades (Mapa 4, p.145). Posteriormente a essa fase, comea a difuso de novas congregaes pela periferia urbana caicoense; era o incio de outra fase, agora da multiplicao de novos territrios na zona urbana de Caic, a qual responde hodiernamente sua Jurisdio Citadina. Juntamente com os pontos de pregao as congregaes, enquanto artifcio territorial de expanso foi um dos recursos mais utilizados pelos assembleianos neste processo de crescimento pelos bairros caicoenses. Dentro desta gesto territorial, as congregaes apresentam-se com locais de culto, geralmente estabelecidos em pequenos prdios, pertencentes ou locados pela igreja-me. Dessa forma, a congregao tem com a funo fixar um ponto de difuso do evangelho em um bairro e dar assistncia aos membros que moram prximos a ela. Sendo assim, a existncia de um templo central facilitou o controle do crescimento na malha urbana de Caic, possibilitando um acompanhamento contnuo dos pontos de pregao e do investimento na construo de congregaes. Alm disso, a disponibilidade de obreiros para dirigir essas
estruturas, tambm contribuiu para a escolha dessas estratgias, sendo a quantidade de cooperadores e diconos proporcionais a demanda das congregaes criadas nesse percurso temporal.
149
150
A formao do Campo Eclesistico de Caic, e mais especificamente sua jurisdio citadina, dar-se entre 1975 a 1995; e mais tarde em um momento especfico de redefinio da economia de Caic, que repercutiu na ampliao de seu tecido urbano nos anos 80/90. O direcionamento das congregaes da Assemblia de Deus para as zonas perifricas de Caic em parte reflexo de uma tendncia nacional, em que a transmisso do poder entre as instncias territoriais, por meio de reunies ministeriais e convenes estaduais, nas quais os lderes de contnuo sustentaram o foco da evangelizao nos espaos onde havia maior relaxamento por parte de outras denominaes. Cabe ressaltar que, as periferias das cidades so reas pouco visadas pelo catolicismo e o protestantismo tradicional. Com isso, o pentecostalismo, especialmente assembleiano, se valeu desse descuido para investir ainda mais sua mensagem e delimitar seus territrios nestes espaos. No pastorado de Jessuir Barreto de 1975 a 1984 foram abertas os dois primeiros pontos de pregao nos bairros Joo XXIII, Rua Espiridio Eloi de Souza e no Castelo Branco, na Rua Gonzaga Nbrega, 200. Antes de sua transferncia para a cidade de Macaba, Jessuir Barreto constri o templo da congregao do Castelo Branco. Na direo do Pastor Manoel Barbosa (1987-1989) foi construdo o templo de Joo XXIII e fundado a terceira congregao (no Bairro Paulo VI, na Rua Luscivnia Medeiros, 515). Seu sucessor o Pastor Joo Batista da Silva Filho, no perodo de (1989-1992), ergue o templo de Paulo VI em umterreno doado pela prefeitura. Contudo, para concretizar essa empreitada o Pastor Joo Batista vende parte do terreno para subsidiar a construo do templo de Paulo VI, a qual hoje representa uma das maiores congregaes da Assemblia de Deus em Caic. Aps a implantao dessas congregaes, v-se uma reconfigurao no espao urbano de Caic, manifesta na criao dos novos bairros102, o que derivou na expanso de sua rea citadina entre de dcada 80 90. Assim, a igreja-me passou a focalizar os novos bairros, que aos poucos acentuava a rea perifrica de Caic e
102
O perodo que compreende a dcada de 80/90 emergiu-se novos bairros em torno de Caic como na Zona Oeste: Walfredo Gurgel, Joo Paulo II, Frei Damio, Distrito Industrial e Soledade; Zona Norte: Vila do Prncipe, Recreio, Samana, Alto da Boa Vista, Salviano Santos e Senador Dinarte de M. Mariz; Zona Leste: Penedo; Sul: Conjunto do IPE, Jardim Satlite, Residencial Canutos, Santa Costa e Vila Altiva (MORAIS, 1999 p. 204).
151
de igual forma as possibilidades de evangelismo. importante lembrar que neste perodo a conjuntura econmica de Caic entrava no perodo ps-crise do algodo, a qual marcada pelos processos de periferizao via ampliao e surgimento de bairros e, ainda, pela redefinio funcional da rea central da cidade [...] (MORAIS 1999, p. 203). Por ocasio a quarta congregao criada na gesto do Pastor Antnio Marrocos Sobrinho (1992-1998), no Bairro Soledade, hoje localizada na Rua Josefa Antnia da Conceio, 240. A viso do Pastor Marrocos seguiu o padro de
evangelismo assembleiano ao anunciar a mensagem pentecostal numa zona sofrida pela falta de assistncia governamental. Neste passado o bairro de Soledade apresentava um os maiores ndices de pobreza da cidade. Nele foram construdos os serrotes, dificultando a vida dos moradores [...] principalmente no que se refere aos aspectos de abastecimento dgua, sistema de esgotos e circulao de automveis (MORAIS, 1999, p. 205). A pobreza desse bairro era em grande parte consequncia da falta de infra-estrutura, o que no impediu a existncia de uma congregao e a ao evangelstica dos obreiros assembleianos em seus adornos. Na gesto de Antnio Marrocos, o processo de aberturas de novas congregaes sofre certa estagnao. Pois, o intervalo de quase cinco anos sem abrir novos pontos de pregao est relacionado ao investimento dos membros na reconstruo da Igreja-me. Essa empreitada teve carter urgente, ao constatar que os pilares que sustentavam a igreja estavam comprometendo sua estrutura. Com isso, na reconstruo da igreja-me, sua estrutura foi totalmente derrubada e idealizada uma nova divisria para sua nave. Assim sendo, o novo prdio apresentou a ampliao da rea social e de ensino, dispondo de um departamento infantil e refeitrio, no espao que abrigava a casa pastoral. Tambm foi criada outra sala de aula na altura do plpito e uma suntuosa galeria que aumentou o nmero de aposentos dentro da igreja. Durante a edificao do novo templo, o projeto do Pastor Antnio Marrocos estava centrado na concluso das obras de reconstruo, porm essa misso foi relegada ao seu sucessor o Pastor Abner Alves de Souza. Na gesto pastoral de Abner Alves (1998-2004) foi concludo o acabamento das obras na igreja-me e fundada a quinta congregao no Bairro de Boa Passagem. Esse trabalho se constituiu pela transferncia do trabalho antes realizado no Bairro do Alto da Boa Vista. Neste caso ocorreu uma inverso do movimento evangelstico assembleiano, na qual sai de um bairro em processo 152
estruturao para um j estruturado. Esse fato no desviou o sentido da expanso da Assembleia de Deus rumo s reas perifricas de Caic. Nesse perodo a liderana estadual passou por mudana em sua direo, como tambm no ordenamento territorial das Assembleias de Deus no Rio Grande do Norte (RN). Dessa forma, em outubro de 1998 a Conveno Estadual de Ministros da Assembleia de Deus no Rio Grande do Norte (CEMADERN) foi convocada, extraordinariamente, para eleger o novo Pastor-Presidente da Igreja Evanglica Assembleia de Deus no Rio Grande do Norte (IEADERN). Sendo vitorioso ao cargo Raimundo Joo de Santana, Pastor da AD de Parnamirim/RN. Sendo assim, dos 200 convencionais presentes na seo plenria, entre evangelistas e pastores, 124 votaram a favor do Pr. Raimundo Joo de Santana103. A administrao do Pastor Raimundo Santana d sequncia aos projetos de estruturao administrativa, iniciados pelo Pastor Joo Gomes, resumidos em trs linhas: 1) Reestruturar e reorganizar a Igreja, na Capital, de forma a otimizar o uso do potencial humano que h nela; 2) Desenvolver, ainda mais, a evangelizao no Estado e a misso transcultural; 3) Promover uma maior integrao entre a Capital e o Interior104. Alm da conjuntura poltica da igreja, a estrutura territorial passa por uma redefinio, com a substituio da nomenclatura Cabea-de-Campo, nome popular entre as lideranas ao se referir a uma igreja-me, por Igreja Sede de Campo. Em 2000, os Campos Eclesisticos passam a designar a jurisdio territorial de cada das igrejas-me das Assembleias de Deus em todas as regies do Estado do Rio Grande do Norte. Com isso, os pastores das igrejas Sedes de Campo Eclesistico dentro do sistema jurisdicional adquirem juntamente com suas funes eclesisticas o desgnio de Supervisor de Campo. Diante dessa nova perspectiva, ao estabelecer a organizao territorial, o Pastor Raimundo Santana, juntamente com a Assembleia Ministerial, conserva os princpios de descentralizao do governo da IEADERN, atribuindo autoridade regencial s Igrejas Sede dos Campos Eclesisticos sobre suas igrejas filiais e respectivas congregaes. O Estatuto Social e o primeiro Regimento Interno aprovados pela
103
HISTRICO DA ASSEMBLIA DE DEUS RN, Histria recente e desafios futuros. (Disponvel em: <http://www.adnatal.org.br>. Acesso em: 15 fev. 2010). 104 HISTRICO DA ASSEMBLIA DE DEUS RN. Histria recente e desafios futuros. (Disponvel em: <http://www.adnatal.org.br>. Acesso em: 15 fev. 2010).
153
Assembleia Geral e vigorados em janeiro de 2010, revoga os estatutos anteriores 105 e adiciona novos cdigos que legitimam o novo ordenamento territorial da Assembleia de Deus no RN. Esses documentos de leis eclesisticas registrados em cartrio, na verdade, legitima o que antes j era desenvolvido em temos de controle administrativo na referida Igreja de Deus nas dcadas de 1970 a 1980. Porm, no que tange a regulao do Estatuto Social em seus dispositivos normativos, o Regimento Interno apresentou-se como uma inovao que esclarece os meios e as finalidades permitidas para que se desenvolva a instalao e emancipao de igrejas em torno de cada Campo Eclesistico. Prosseguindo com os trabalhos evangelsticos no Serid, a gesto do Pastor Josaf Loureno, na Igreja Sede do Campo Eclesistico de Caic, foi principiada tendo como respaldo a nova redefinio territorial da Assembleia de Deus em Campos Eclesisticos. Dessa forma, a instalao de trabalhos nos crescentes bairros perifricos de Caic mostrou-se ser uma prioridade do Pastor Josaf Loreno, que em sua gesto deu um novo ritmo dinmica de ampliao da jurisdio citadina. Nesse sentido, ao iniciar seus trabalhos pastorais na igreja-me em 2004, Josaf Loureno funda trabalhos de evangelizao e termina a construo da congregao de Boa Passagem. Com as obras do templo plenamente concludas pela gesto anterior, o Pastor Josaf empenhou-se em mais uma campanha de abertura de novos trabalhos evangelsticos. O seu primeiro alvo foi o Bairro Valfredo Gurgel, situado ao longo do eixo da BR 427, que interliga Caic a Jardim de Piranhas. Era a fundao do quinto trabalho de evangelismo congregacional ligado Igreja Sede de Campo em Caic. Neste bairro, o Pastor constri uma congregao na Rua Jos A. Vieira, 60, e fixa o ponto e difuso da mensagem assembleiana neste espao. A histria desse bairro guarda uma profunda ligao com o movimento das populaes rurais em direo a cidade, visto que a sua populao, em geral, remanescente da zona rural e desenvolve atividades ligadas a esse setor. Portanto, a populao do Valfredo Gurgel formada em sua maioria por pessoas de baixo nvel de renda que subsistem de trabalhos temporrios (como exemplo, pedreiros) ou subempregos na economia informal (MORAIS, 1999, p. 206).
105
O primeiro Estatuto da Assemblia de Deus no Rio Grande do Norte foi construdo e formalizado em 29 de maio de 1943, sendo alterado em 22 de novembro de 1971 e 08 de outubro de 1984.
154
Em consequncia do impulso demogrfico na dcada de 1980, o Valfredo Gurgel passa a constar como um dos maiores e mais populosos bairros da cidade (MORAIS 1999, p. 206). Esse perfil socioeconmico do Bairro Valfredo Gurgel descrito, correlacionado ao intuito evangelstico da congregao assembleiana, confirma a estratgia de aproximao destes nos espaos com menor nvel socioeconmico de Caic. Em continuidade ao pastorado de Josaf Loureno, a stima congregao da Igreja Sede de Caic foi consolidada no Bairro Recreio, sendo a nica congregao instituda em um prdio locado. A constituio do Recreio derivou-se de um projeto habitacional do Estado viabilizado pela Prefeitura Municipal de Caic em 1989, quando [...] 72 casas construdas foram destinadas populao de baixa renda [...] (MORAIS, 1999, p. 218). O aspecto social da populao do Recreio em parte pode ser evidenciado na prpria origem do bairro, constituindo-se em um espao, do ponto de vista emprico, comum a realidade de outros bairros j evangelizados pelos assembleianos. A oitava congregao aberta pelo Pastor Josaf est situada no Bairro Salviano Santos, tambm na Zona Norte (Caic). Nele foi construdo um prdio para abrigar a congregao, localizada na Rua Aristovaldo Pereira de Queiroz, 02. No que se refere constituio do bairro, trata-se de um conjunto habitacional ocupado em 1997, para populao de baixa renda. Sendo assim, as casas do referido bairro, segundo Morais (1999, p. 220), alm de minsculas [...] apresentavam rachaduras em suas paredes, demonstrando comprometimento em suas estruturas [...]. Esse quadro prescreve a situao de dificuldade financeira em que se encontravam os seus primeiros habitantes, em no terem alternativa de casa prpria, alm das doadas pela prefeitura no Conjunto Habitacional do Salviano Santos. Por conseguinte, a nona congregao oficialmente fundada e construda pelo Pastor Josaf est situada em Lajinha, Distrito de Caic, localizado a 18 km de seu permetro urbano. Diferente das outras, esta congregao possui um obreiro efetivo, exclusivamente dedicado obra nela realizada. O obreiro dirigente da congregao em Lajinha assume em tempo integral todos os trabalhos de culto e evangelizao. Dessa forma, nas demais congregaes, os dirigentes so nomeados pelo pastor da Igreja Sede do campo, para dirigir durante um ano os trabalhos em cada bairro. Aps essa temporada, os obreiros so redistribudos para outras
155
Figura 5 Organograma ciclo anual de obreiros pelas congregaes de Caic Fonte: Elaborado pelo autor (2010)
Assim, em suma, a jurisdio da Igreja sede em Caic, abrange os bairros da Zona Norte: Boa Passagem, Recreio, Salviano Santos e Lajinhas; Zona Oeste: Joo XXIII, Paulo VI, Soledade e Valfredo Gurgel e Zona Sul: no Castelo Branco. A territorialidade da Assembleia de Deus de Caic espraia-se
majoritariamente na sua regio perifrica. A expanso de novos territrios no encerrou com as congregaes citadas previamente, exercendo as atribuies previstas no Regimento Interno106, o Pastor Josaf na condio de Supervisor de Campo estabeleceu um plano de trabalho para o ano de 2010, incluindo nesse planejamento a fundao de oito novas congregaes nos bairros de Barra Nova, Frei Damio Joo Paulo II, Itans, Canudos e Filhos e Alto da Boa Vista. A igreja Catlica desde a primeira dcada do sculo XXI j demonstra certa preocupao com sua atuao e mantm vrios arranjos institucionais, os quais demonstram sua consagrada hegemonia territorial, diante do advento de identidades religiosas107 no-catlicas, em especial as de orientao pentecostal.
106
Essa atribuio diz respeito ao Artigo 24, Inciso I, do captulo VII, contidos no Regimento Interno da IEADERN. REGIMENTO INTERNO DA IEADERN. (Disponvel em: <http://www.adnatal.org.br/documentos.htm>. Acesso em: 13 fev. 2010).
107
A identidade religiosa seria uma construo histrico-cultural socialmente reconhecvel do sentimento de pertena religiosa [...], por exemplo, reconhecemos uma identidade catlica por
156
Diante dessa nova realidade, a Assembleia Pastoral Diocesana, realizada nos dias 07 e 08 de novembro de 2003, tinha em pauta a construo do 7 Plano Diocesano de pastoral para o perodo de 2004-2007. A plenria formada por um grupo de mais de cem agentes de pastoral, constitudos de sacerdotes, diconos, religiosas, seminaristas e demais fiis leigos das diversas pastorais, servios e movimentos reunidos em torno do Bispo Diocesano e assessorado pelo Pe. Manoel Godoy do Instituto Nacional de Pastoral (CNBB), reconheceram ao construir o projeto particular de evangelizao, voltado para a realidade da Diocese de Caic intitulada Santas Misses Populares, a retrao do esprito missionrio da Igreja Catlica o que motivou o diagnstico de uma certa estagnao do domnio simblico da mesma no Serid expresso no discurso conclusivo da Assembleia de Deus:
[...] a partir da avaliao efetuada por cada Zonal sobre a nossa prtica pastoral do ltimo ano sob a fora do Projeto Ser Igreja no Novo Milnio, o que foi visto como bastante feliz e proveitoso para a formao e aprofundamento da nossa identidade eclesial, vimos a necessidade de nos voltarmos para uma ao mais concreta e visvel do ponto de vista pastoral como resposta aos desafios da evangelizao na realidade scio-eclesial de hoje, profundamente marcada pelo pluralismo religioso e o revigoramento das seitas se manifestando com mais empenho nas periferias urbanas (ANURIO DIOCESANO, 2007, p. 8).
O discurso proferido pelos sacerdotes catlicos chamava a ateno para o crescimento acentuado dos grupos religiosos, especialmente os de carter pentecostal, que j so maioria no cenrio evanglico seridoense. O crescimento pentecostal no Serid de fato foi impulsionado pelas prticas territorializantes da Assembleia de Deus. Com isso, no decorrer do sculo XX o trabalho assembleiano se mostrou modesto, hoje, sua abrangncia j vidente entre as demais territorialidades religiosas estabelecidas nas cidades seridoenses. Portanto, a territorialidade assembleiana em Caic mostrou-se como um sistema flexvel de delimitao espacial, onde pontos de pregao estabeleceram-se e transitaram com admirvel facilidade entre os bairros perifricos de Caic. Essa estratgia de criao de novos territrios responsvel no s pela formao da jurisdio citadina de Caic, mas de outras igrejas sedes de campo no Serid.
meio da representao institucional, da prtica ritual e dos atos de consagrao [...], no entanto, em uma igreja de constituio recente, de carncia simblica e ritual e prtica religiosa flexvel, ainda no pode definir o perfil da identidade [...], a identidade religiosa est relacionada a uma determinada temporalidade e espacialidade (GIL FILHO, 2001, p. 48).
157
Entre as jurisdies eclesisticas das Assembleias de Deus no Serid, o campo de Caic abrange a maior rea de controle territorial a nvel regional e citadino como ser constatado mais a diante com a anlise dos Campos Eclesisticos em Currais Novos e Parelhas.
Semelhantemente a Caic, o processo de formao do municpio de Currais Novos e a definio primeira do seu territrio estiveram ligados delimitao de fronteiras da igreja catlica. Nesse episdio da histria curraisnovense destaca-se o Coronel Cipriano Lopes Galvo, pernambucano de Igarassu, como o primeiro a iniciar o povoamento nessas terras em 1755 alguns quilmetros de distncia e acima da confluncia do Rio Totor com o Rio So Bento (antigo Maxinar) (SOUZA, 2008, p. 40). A idia de construir uma capela pelo Capito Cipriano Lopes foi concretizada anos mais tarde pelo seu filho e herdeiro de suas terras, o Capito-mor Cipriano Lopes Galvo. A capela construda em 1808 foi destinada devoo de SantAna e localizou-se nas terras doadas pelo Capito-mor, especificamente na ponta da Serra do Catunda. Segundo Morais (2004, p.114), a freguesia da Nossa Senhora SantAna de Currais Novos108 fundada em 1884 [...] teve como referncia a capela edificada pelo Capito-mor Cipriano Lopes Galvo. E ento, o ncleo urbano comeou a se formar entorno da Capela de SantAna dando as primeiras feies da zona urbana de Currais Novos. Sendo assim, as construes circunscritas envolta da Capela de SantAna, tambm serviu de base para a conformao do Municpio Vila de Currais Novos criado em 1890. A histria revelada por Souza (2008) demonstra o patrimnio de SantAna em Currais Novos como sendo um amplo conjunto de terras doadas pelo Capito-
108
A Freguesia da Senhora SantAnna de Currais Novos foi desmembrada da Freguesia de Nossa Senhora da Guia do Acari.
158
Mor Cipriano Lopes Galvo, dentro e fora dos limites109 do municpio-vila, somado s terras doadas por Francisco de Oliveira Galvo correspondente as ruas Sete de Setembro, Laurentino Bezerra at as margens dos rios Totor e So Bento. Ao lavrar a escritura das terras doadas em cartrio, os lderes catlicos incorporam a elas o frum (o imposto da santa), tributado a todos os que possuem comrcio e casas dentro da rea pertence aos domnios patrimoniais da Parquia de SantAna. Com base no relato supracitado, a territorialidade catlica em Currais Novos consolidou suas bases de controle dissolvendo sua influncia pelos segmentos polticos e sociais, exercendo a representatividade em vrios momentos histricos importantes da cidade. A fora da representao catlica nos primrdios da fundao do municpio repercutiu em todas as esferas da sociedade curraisnovense, especialmente nas construes erguidas e na educao, fruto de obras assistenciais da igreja. Nesse sentido, a participao da Parquia de SantAna em obras assistenciais est ligada a criao de centros educacionais de grande relevncia para populao curraisnovense. Dentre elas est tradicional Escola de Nossa Senhora (1942) e o Educandrio Jesus Menino (1944). Tambm produto das obras assistenciais da parquia, o Hospital Regional Padre Joo Maria 110. Contudo, os marcos histricos de Currais Novos tambm apontam para o catolicismo como o principal movimento cristo no sculo XIX, visto que o simbolismo catlico denotou uma geografia do sagrado na construo e ampliao de espaos sacros. Assim, a territorialidade catlica em Currais Novos, nesta perspectiva, percebida pelas insgnias visualizadas em vrias edificaes como: o Cemitrio de SantAna (1892), o Monumento do Cristo Rei (1937), a Cruz de Mrmore111 (1974) e as Cruzes das Misses Populares112 (2006), entre outros.
109
As terras doadas do Capito-Mor correspondem na poca meia lgua de terras em cada face, indicado a ponta da Serra do Catunda (local da atual Matriz de SantAna). Foram ainda doadas ao patrimnio de SantAna pelo Capito-mor Cipriano Lopes Galvo, terras adjacentes ao municpiovila de Currais Novos conhecida na poca como Serra Azul (atuais municpios de Cerro Cor e Lagoa Nova) em 1808. Mais tarde seu filho Capito-mor Gonalo Lopes Galvo oferta ao patrimnio de SantAna terras iniciando-se na atual rua Vivaldo Pereira indo at o final da rua Antnio Eduardo Bezerra subindo, encontrando-se margem esquerda do rio Totor (SOUZA, 2008 p. 55). 110 O hospital surgiu da iniciativa do Monsenhor Paulo Herncio aps o acidente com feirantes nas proximidades do Stio Juazeiro do Cip. Suas primeiras instalaes foram disponibilizadas na Casa de So Vicente hoje CIAC. Mais tarde o governador Cortez Pereira, com a doao do terreno por Manoel de Silvina, constri o hospital regional e inaugura suas dependncias em 11 de maro de 1975. 111 Esse monumento benzido e canonizado pelo padre Ausnio Filho, foi erguido em memria do acidente em 13 de maio de 1974, onde um nibus desgovernado na BR-226, prximo a ponte do
159
Portanto, so inegveis na paisagem urbana de Currais Novos evidncias que comprovam a toda e qualquer denominao protestante, tradicional ou pentecostal, que ao chegar nesta cidade esto adentrando em territrio eminentemente catlico. Nesse sentido, os geossmbolos impressos no lugar enfatizavam as fronteiras da territorialidade catlica sobre o espao urbano curraisnovense, ou seja, os contornos do territrio catlico tinham como reforo o valor simblico de vrios monumentos que expressam sua ideologia religiosa. Contudo ainda que detivesse um controle quase que absoluto dos artigos de f cristo que regiam a sociedade curraisnovense, a laicidade do Estado brasileiro, j vigente no final do sculo XIX, resguardava o direito a realizao de toda e qualquer forma de culto religioso em todo territrio nacional. Com isso, a liberdade de culto tornou possvel a entrada de novas denominaes crists e
consequentemente a formao de novas territorialidades religiosas em Currais Novos. No que registra Martins (1997, p. 26), o primeiro protestante em Currais Novos foi o Manoel de Barros Vasconcelos (irmo Neco Barros), procedente da cidade de Guarabira (PB), onde fora sacristo. Adepto da Igreja Presbiteriana do Brasil, Manoel Barros anunciou em Currais Novos o evangelho, segundo a hermenutica calvinista na primeira dcada do sculo XX. Sua pregao procedeu ao primeiro proselitismo protestante na cidade, quando Manoel Tomaz de Arajo 113, proprietrio da grfica que imprimia o jornal O Progresso114, se converteu a f protestante. Os cidados curraisnovenses Manoel Barros e Manoel Thomaz so, portanto, responsveis pelo estabelecimento do protestantismo e
concomitantemente da fundao da Igreja Presbiteriana em Currais Novos. Com o estabelecimento da nova igreja evanglica, a difuso da mensagem protestante causou descontentamento do vigrio da Parquia de SantAna, o Padre Pedro Paulino da Silva115. Alm disso, a publicao em 1924 de um panfleto por
Rio So Bento, atropelou vrias pessoas, morrendo 24 entre crianas e adultos. (SOUZA, 2008, p.217). 112 Conforme Rodrigues (2008, p. 217), nove cruzes so distribudas em vrios pontos da cidade, marcando a realizao das Santas Misses Populares, no perodo de 11 a 17 de setembro de 2006, pela Parquia da Imaculada Conceio. 113 Manoel Tomaz chegou a Currais Novos em 1901, vindo de So Miguel de Jucurutu, onde era comerciante (MARTINS, 1997, p. 27). 114 O jornal O Progresso foi o primeiro peridico a circular na cidade de Currais Novos em 1906. 115 Dcimo vigrio da Parquia de SantAna, chegou a Currais Novos em 15 de abril de 1924, permanecendo na cidade at 20 de agosto de 1928. Ligado a literatura, orador sacro e poltico
160
Manoel Thomaz, intitulado A Luz da Verdade, adentrou nas reas de influncia dogmtica catlica como o centro da cidade, esbarrando nos limites de um territrio subjetivo. Esse fato, conforme Martins (1997), manifestou a insatisfao do proco Pedro Paulino, quando este repudiou116 o contedo117 do folheto, como tambm a sua distribuio entre a populao curraisnovense. Dessa forma, o descontentamento do proco nesse perodo revelou a coliso da territorialidade evanglica com os espaos sob domnio religioso da igreja catlica, ficando clara a existncia no apenas de fronteiras concretas, mas ideologicamente delimitadas no espao urbano curraisnovense pelo catolicismo. A continuidade dos trabalhos presbiterianos nas primeiras dcadas do sculo XX em Currais Novos foi preservada em um modesto templo, que segundo Daniel Martins (1997, p. 29), localizou-se na Rua do Velame, atual Slvio Bezerra de Melo, por trs do Banco do Nordeste. O trabalho protestante encontrava nimo e assistncia nas visitas peridicas dos reverendos118 que viajavam ao Serid em misses evangelsticas. Diante desse contexto o protestantismo pentecostal chega a Currais Novos na primeira metade do sculo XX, sendo os primeiros cultos pentecostais realizados em 1942 com um grupo familiar, o qual, segundo entrevista realizada com Maria de Lourdes Campus da Silva119, foi organizado pelo pioneiro Joo Joaquim da Silva o (irmo Joo Soldado), policial militar e membro da Assembleia de Deus, que vindo morar em Currais Novos anunciava a mensagem dos Dons do Esprito nos aposentos de sua residncia, localizada na antiga Rua do Caj (atualmente Rua Jos Milans). O assembleiano Joo Joaquim, de acordo com Cruz (1992, p.12), era auxiliar em Currais Novos, do Evangelista Manoel Rodrigues Menezes, responsvel pela Assembleia de Deus de Santa Cruz.
renomado, o Padre Pedro Paulino iniciou entre vrios trabalhos a Congregao da Doutrina Crist, para preservao dos dogmas catlicos (SOUZA, 2008, p. 231). 116 A mensagem do livreto publicado em 1924 reproduzida literalmente por Martins, na qual Manoel Thomaz expe seu dilogo com o padre Pedro Paulino [...] no pensei que aqui houvesse quem se atrevesse escrever um folheto contra a Nossa Senhora Padroeira, e ter mais a ousadia de sair entregando de porta em porta! [...] (MARTINS, 1997, p. 28). 117 O contedo do folheto trazia o ponto de vista bblico acerca da idolatria, interpretada por Manoel Thomaz, como a adorao aos santos padroeiros catlicos. 118 Segundo o levantamento do saudoso Rev. Eliel foram registradas as visitas de vrios pastores em: setembro de 1928, Rev. William Calvin Porter; dezembro de 1939, Rev. Manoel Pereira; maro de 1942, Rev. Elias Bezerra; outubro de 1939, Rev. Abel Siqueira Bitu (um dos mais profcuos Evangelistas do Nordeste); junho de 1951, Rev. James Smith; abril de 1954. Ver Benedito Matos (MARTINS, 1997, p.29). 119 Maria de Lourdes Campus da Silva foi uma das pioneiras do pentecostalismo em Currais Novos, membro da Igreja Assemblia de Deus desde 1943 (Entrevista realizada na sua residncia em 05 nov. 2006).
161
O grupo familiar organizado na residncia Joo Joaquim recebeu como primeiros adeptos o casal evanglico vindo da Paraba, conhecidos como Trajano e Rosinha120. Com a chegada deste casal o grupo familiar obtm um pequeno avano no nmero de fiis. Por conseguinte, registrou-se outro aumento em funo de numa evangelizao bem sucedida de Rosinha Maria Idalino e ao casal Severina Morais e Cezariano, seu esposo, arregimentando assim mais uma famlia para o grupo familiar121. Neste perodo, trs famlias faziam parte do embrionrio trabalho assembleiano em Currais Novos. Entretanto, o grupo familiar sob a liderana de Joo Soldado durou at sua transferncia para Caic em 1946, onde previamente repassou a responsabilidade do trabalho, por ele iniciado, a senhora Severina Morais Pereira (Birina), a qual no hesitou em continuar com o grupo familiar em sua residncia, na Rua Cipriano Lopes Galvo. O trabalho realizado na casa de Severina Morais, do mesmo modo da liderana de Joo Soldado, apresentou um discreto crescimento em 1945 com a chegada de uma famlia vinda de Fortaleza (CE), motivada pela produo mineral em ascenso em Currais Novos. O contexto em que esta famlia ajunta-se ao grupo familiar de Severina Morais remonta ao perodo ureo da produo sheelitfera de Currais Novos, em que a demanda da indstria mineradora impulsionou um significativo crescimento populacional no incio da dcada de 1940. Nessa perspectiva, no que registra Morais (2005, p.176), os dados censitrios da poca revelam que a taxa de crescimento da populao total de Currais Novos, entre 1940/1950, foi de 22,14%, no entanto o contingente urbano aumentou em 95,57%. Com isso, dada a contratao de quase 2000 funcionrios, o Desembargador Tomaz Salustino de Melo, proprietrio da Mina Breju, construiu nos arredores da sua indstria sheelitfera uma Vila Operria, disposta de uma infraestrutura com casas, escola, templo religioso, clube e espao esportivo para abrigar as famlias dos operrios. Dessa forma, a chegada da famlia vinda de Fortaleza significou mais do que um acrscimo no nmero de adeptos na casa de Severina Morais. Pois a adeso da referida famlia ao grupo familiar teve um peso significativo para que o trabalho em Currais Novos obtivesse o reconhecimento da Igreja Sede Estadual em Natal. Portanto, a ligao do trabalho da Rua Cipriano Lopes Galvo Sede Estadual da
120 121
Maria Lourdes Campus da Silva (Entrevista realizada em 04 abr. 2010, Currais Novos/RN). Idem.
162
Assembleia de Deus remete a uma anlise sobre o olhar estratgico da liderana em Natal para o Serid. Assim sendo, a despeito dessa ao eclesistico-administrativa, entende-se que a percepo dos pastores da sede estadual, ao notificar a ascenso econmica em Currais Novos e o aumento demogrfico, gerou a necessidade de oficializar um trabalho evangelstico neste espao promissor. Desse modo, a oficializao do grupo familiar como um trabalho da Assembleia de Deus de Currais Novos, mostrou o desejo dos lderes estaduais em expandir novas igrejas no interior e de aumentar o raio de domnio territorial da instituio. De fato a expanso dos novos trabalhos dirigidos pelos obreiros de Currais Novos ocorreu, porm, no motivada pelos processos econmicos e sociais notificados na expanso da jurisdio do Campo em Caic, mas essencialmente pelas prticas territorialistas de delimitao, atuao e influncia efetuadas em cidades adjacentes. Antes da ligao do trabalho evangelstico Igreja Sede das Assembleias de Deus do RN, os membros do grupo familiar em Currais Novos utilizavam de maneira informal o nome da Assembleia de Deus para identificar a ela as prticas de seus procedimentos litrgicos e aspectos doutrinrios, efetuados em suas reunies e na evangelizao de pessoas. Nesse sentido, at o reconhecimento do trabalho em Currais Novos, sua membresia era assistida pela AD de Caic, a qual prestava auxlio ao grupo familiar da Rua Cipriano Lopes Galvo, enviando mensalmente alguns de seus obreiros para celebrar a Santa Ceia122. Assim, a ajuda de Caic ao trabalho de Currais Novos mostrava a condio privilegiada de autonomia e fora eclesistica da sua liderana diante de outros trabalhos assembleianos no Serid. Somente na dcada de 1950 pode-se confirmar legalmente a existncia de um trabalho evangelstico das Assembleia de Deus de Currais Novos. Isso por causa dos procedimentos formais de ligao do trabalho do grupo familiar com a Igreja Sede, em Natal, que desde sua fundao em 1942 no havia sido efetuado
122
[Do lat. Coena ceia] Segunda ordenana da Igreja, instituda na noite em que o Senhor Jesus foi trado. Tendo como elementos o po e o vinho (simbolizando respectivamente o corpo e o sangue do senhor), constituindo-se em um sermo dramtico por lembrar-nos, atravs de palavras e atos, a paixo e morte de Cristo. a cerimnia mais solene da Igreja. A Ceia do senhor possui duas mensagens centrais. A primeira memorial: porque todas as vezes que comerdes deste po e beberdes deste clice anunciais a morte do senhor; a segunda, proftica: at que ele venha. I Co. 11. 26 (ANDRADE, 1997, p. 79).
163
pelos pastores. Contudo, administrativamente esse grupo de fiis ainda no pertencia a nenhum centro de comando legtimo da Assembleia de Deus. Portanto, em 1953, j com o trabalho formalmente reconhecido pelo templo Sede em Natal, o grupo familiar transferido na condio de Templo da Assembleia de Deus para um pequeno prdio locado na Rua Laurentino Bezerra 123. A transferncia do trabalho foi idealizada pelo primeiro Ministro da igreja em Currais Novos o Pastor Bevenuto. Vindo de um pastorado em So Jos do Mipib e enviado pelo templo Sede Estadual, o Pastor Bevenuto inicia oficialmente o ciclo pastores da Assembleia de Deus de Currais Novos. Com a inaugurao do primeiro templo, na Rua Laurentino Bezerra, a Igreja supracitada demarcou seu centro de comando em solo urbano que legalmente pertencia Igreja Catlica. Diante desse acontecimento, discorreu um fato incomum dentro dos domnios do sagrado na zona urbana curraisnovense, como a sobreposio de territrios religiosos, uma vez que a instalao da Assemblia de Deus em terras pertencentes ao Patrimnio de SantAna tornou-se possvel, no pelo consentimento da Igreja Catlica, mas pela autonomia do governo municipal da poca em administrar terrenos baldios no centro da cidade. Pois, historicamente, o frum foi legalmente institudo como uma taxa mensal e caracterizado como um imposto tributado anualmente sobre o uso do solo urbano dentro rea que representa o Patrimnio de SantAna (Mapa 5).
123
Segundo Joabel Rodrigues (2008), historicamente, a Rua Laurentino Bezerra faz parte das terras doadas por Oliveira Galvo ao patrimnio de SantAna, em Currais Novos, de onde cobrado o Imposto da Santa (Frum).
164
Mapa 5 Sobreposio da AD em territrio catlico (1950-1969) Fonte: Adaptado pelo autor (2010)
Diante
disso,
liderana
assembleiana,
assegurada
pelo
direito
constitucional que isenta todos os segmentos religiosos de impostos como o IPTU, no era constrangido a pagar o frum, mecanismo esse que conferia estabilidade financeira ao territrio de sua concorrente. Assim, na Rua Laurentino Bezerra os trabalhos se estenderam por quase vinte anos (1950-1969), passando pela direo da igreja os pastores: Manoel Rodrigues, Manoel Gomes, Francisco Bezerra e Pastor Miguel Campos. A gesto do Pastor Sebastio Alves, o sexto mandado por Natal, foi decisiva para a consolidao da AD de Currais Novos, e para que sua territorialidade se estendesse aos municpios vizinhos. A construo da igreja-me das Assembleias de Deus em Currais Novos em (1969) constituiu-se como a base de mais um territrio religioso, no qual estava por
165
iniciar uma nova expanso de trabalhos evangelsticos em grande parte da poro Oriental124 do Serid norte-rio-grandense e parte da regio da Serra de Santana. O templo foi inaugurado no mesmo ano, e fixou o segundo ponto de desenvolvimento territorial da Assembleia de Deus no Serid. Contudo, a sobreposio de territrios no significou, consequentemente, uma sobreposio de territorialidades. Isso se explica na segmentao das estratgias de crescimento e de controle da Assembleia de Deus, as quais tiveram a princpio carter exgeno, marcada pelo estabelecimento de congregaes em cidades circunvizinhas. Dessa forma, a prioridade na criao de igrejas em outras cidades pela igreja-me de Currais Novos, aps sua instituio em 1969, confirma que as prticas territorializantes dos assembleianos no se chocavam com limites da territorialidade catlica, porquanto foram desenvolvidas fora do mbito do espao que circunscreve o Patrimnio de SantAna. Sendo assim, o proceder amistoso dos assembleianos ante a territorialidade catlica est restrito apenas ao processo da formao de sua Jurisdio Regional, onde grande parte dos esforos dos obreiros da igreja-me em Currais Novos, a partir de 1970, foi concentrado no proselitismo evangelstico em outras cidades. 3.6.2 Formao da Jurisdio Regional, um novo redimensionamento da territorialidade assembleiana no Serid
A expanso dos trabalhos de evangelizao da igreja-me de Currais Novos em outras cidades no seguiu o mesmo ritmo de crescimento constatado na igreja de Caic, que no final da dcada de 1960 j havia constitudo trabalhos em oito cidades circunvizinhas125. Na voz dos entrevistados nenhum processo
socioeconmico foi identificado como relevante para a poltica territorial das reas fora do seu permetro citadino. Sendo assim, analisamos a formao e consolidao da Jurisdio Regional do Campo Eclesistico de Currais Novos, como sendo um processo que teve maior respaldo nas estratgias de apropriao dos
125
O Serid Oriental uma microrregio que divide poltico-administrativamente a regio do Serid, formada pelos municpios de Currais Novos, Acari, Cruzeta, So Jos do Serid, Carnaba dos Dantas, Jardim do Serid, Ouro Branco, Santana do Serid, Parelhas e Equador. Esse fato corresponde aos trabalhos evangelsticos abertos em Jardim de Piranhas, Jucurutu, Serra Negra do Norte, So Joo do Sabug, Ouro Branco, Ipueira, Jardim do Serid e Parelhas na gesto do pastor Raimundo Joo de Santana (1960-1970).
166
econmica, espacial e social, evidenciados no Serid126 entre as dcadas de 1950 1990, pelo trip da economia: pecuria-algodo-minerao. Conforme Maria Lourdes127, os anos que se transcorreram entre 1950 a 1975, a igreja em Currais Novos limitou-se em dirigir o seu quadro de membros na Rua Laurentino Bezerra. O segundo pastor da igreja-me, Manoel Rodrigues,
tentou apresentar uma nova configurao na escala de domnio da igreja, criando o trabalho evangelstico em Cruzeta, constituindo assim a primeira congregao gerada pelo templo de Currais Novos. Desde ento, cada uma das gestes subsequentes foram marcadas por uma inrcia territorial, constatada pela inexistncia de congregaes abertas pela igreja-me de Currais Novos, visto que nenhuma estratgia de apropriao espacial foi registrada durante a gesto dos pastores sucessores a Manoel Rodrigues como: Manoel Gomes, Francisco Bezerra, Miguel Campos, Sebastio Alves e Mizael Alves, com exceo do Pastor Manoel Matias Silvestre (Bezinho), o qual em 1961 abre o primeiro ponto de pregao no municpio de Flornia. Portanto, aps a gesto de Manoel Matias a estagnao do crescimento territorial da igreja-me de Currais Novos evidenciou o interesse mnimo dos pastores em alargar os limites jurisdicionais da igreja-me. Contudo, a quebra na inrcia das prticas territorializantes da igreja-me em Currais Novos dar-se- na gesto do pastor, ministro Jos Gilvncio (1975 1981), quando este inicia a evangelizao das cidades de So Vicente, Serro Cor e Bod. Ao utilizar os tradicionais mtodos de evangelismo, o Pastor Jos Gilvncio abre um novo circuito de reproduo de territrios em nome da igreja-me do municpio, voltando sua viso especialmente para as cidades da poro Oriental do Serid. Neste perodo, a igreja de Cruzeta apresenta sinais de progresso na gesto do Pastor Manoel Xavier, fato esse comprovado com a criao de uma congregao na cidade de So Jos do Serid em 1976. A ausncia de fontes que detalhem datas e os artifcios priorizados da abertura dos trabalhos evangelsticos nas cidades mencionadas, se grupo familiar, pontos de pregao ou congregaes, impede de afirmar quais dentre esses mtodos foi predominante. No entanto, a assistncia dos obreiros de Currais Novos aos trabalhos j constitudos pelo Pastor Jos Gilvncio, pressupe a existncia de congregaes como mtodo prioritrio, no s deste, mas de outros pastores que
126
Estes processos dizem respeito criao de novos municpios, ampliao do setor tercirio pelo fluxo rural-urbano vivenciados no Serid decorrentes da ascenso e transio das economias de base como pecuria, cotonicultura e minerao. 127 Maria Lourdes Campus da Silva (Entrevista realizada em 04 abr. 2010 - Currais Novos/RN).
167
continuaram com a expanso da jurisdio da igreja-me. Alm disso, outra evidncia que se mostrou igualmente reveladora, foi a anlise da prpria diferena organizacional entre congregao e grupo familiar. Pois, a primeira,
necessariamente, criada por uma igreja-me e legalmente reconhecida pela Sede Estadual. J o grupo familiar constitui-se em um trabalho informal e sem fins proslitos, de assembleianos que objetivavam organizar um primeiro corpo de membros para assim serem legitimados como congregao ou igreja. Quanto s congregaes como mtodos de disseminao espacial das Assembleia de Deus, implementados pelo Pastor Jos Gilvncio, respondem pela eficincia e rapidez com que os trabalhos de evangelizao foram abertos em sua gesto. Outro fator positivo na escolha da congregao como mtodo de estabelecimento espacial, foi baixo custo exigido aos recursos financeiros da igrejame em Currais Novos, visto que a acomodao de uma congregao numa rea urbana no dependia da boa infra-estrutura disponvel no bairro e da condio social dos seus respectivos adeptos. Diante dessa realidade, os trabalhos evangelsticos nas cidades de So Vicente, Flornia, Serro Cor e Bod, de incio foram desenvolvidos em pequenos prdios e tiveram como primeiros obreiros pessoas de leigas no estudo teolgico, comprovando que a qualificao moral dos ministros era creditado na AD como um dos requisitos primordiais para a promoo cargos de liderana. Quanto ao processo de expanso das Assembleias de Deus no Srido, no se tem arquivado, nas secretarias dos Campos Eclesisticos, nenhum documento estatutrio que apontasse a regularizao nos procedimentos de abertura e fechamento de obras evangelsticas durante as dcadas de 1960 e 1970. Em suma, todo processo de expanso das AD no interior do Estado norterio-grandense, durante a gesto do Pastor Joo Batista de Silva, presidente da Sede Estadual de 1960 a 1993, foi desenvolvido tendo apenas como parmetro a criao espontnea de pontos de pregao e congregaes. Portanto, a autonomia administrativa das igrejas-me de Currais Novos em criar novos trabalhos, no entremeio deste perodo, no foi baseada em normas e critrios que orientassem o plano evangelstico dos pastores no Serid, mas a espontaneidade e disposio eram os atributos inseparveis de toda prtica territorial dos obreiros assembleianos de Currais Novos.
168
Estes assistentes pastorais exerciam vrias funes eclesisticas como dirigir cultos, ministrar santa ceia, realizar oraes, ministrar pregaes e evangelismos domiciliares nos bairros onde as congregaes se localizavam. Uma das ltimas empreitadas do Pastor Jos Gilvncio, antes de ser transferido, foi a construo da casa pastoral ao lado da igreja-me. As casas pastorais possuem uma utilidade estratgica na gesto das Assembleias de Deus no Serid. Alm de servir de residncia aos pastores da referida igreja, elas agilizam o processo de transferncia dos ministros dentro de um Campo Eclesistico. Pois, assegurando a infra-estrutura de moradia, o
remanejamento pastoral torna-se mais rpido e menos dispendioso para as igrejas. Por esse motivo, a maioria das casas pastorais no Serid foi erguida ao lado dos templos, possibilitando um contato contnuo e menos burocrtico do pastor com a comunidade religiosa. Posteriormente ao pastorado de Jos Gilvncio, passaram pela igreja-me de Currais Novos os pastores Edson Alves (1981-1983) e Joo Batista da Silva Filho (1983-1986). Os cinco anos que se seguiram entre a gesto destes pastores, a igreja-me no apresentou crescimento em sua jurisdio regional. Esse tempo caracterizou-se pela assistncia aos trabalhos j abertos em outras cidades e na regncia doutrinria da membresia local. Outro redimensionamento na jurisdio eclesistica da igreja-me em Currais Novos foi registrado na fala de Maria de Lourdes128, na gesto pastoral de Joaquim Varela da Silva (1986-2000), um dos mais longos pastorados exercidos na Assembleia de Deus de Currais Novos. A administrao do Pastor Varela encerra o ciclo de reproduo da igreja-me em cidades do Serid com a abertura dos trabalhos evangelsticos de Tenente Laurentino e Lagoa Nova (Mapa 6, p.166)
128
Maria Lourdes Campus da Silva (Entrevista realizada em 04 abr. 2010 - Currais Novos/RN).
169
170
No ano da transferncia do pr. Joaquim Varela, em 2000, funda o primeiro trabalho local e permanente de evangelismo, a congregao da Rua Paraba no Bairro Santa Maria Gorete. A igreja-me neste tempo circunscrevia uma rea de influncia e autoridade eclesistica em oito templos em cidades diferentes, entretanto no municpio de Currais Novos apenas um bairro estava sob seu alcance evangelstico. Quanto ao aspecto poltico-administrativo todos estes trabalhos pertenciam a uma jurisdio, ainda no definida estatutariamente na IEADERN, isto , a convenincia e o pacto de submisso eram os grandes elos entre a igreja-me de Currais Novos suas igrejas filiais. At a constituio do sistema de Campos Eclesisticos em 2000, a jurisdio regional de Currais Novos no possua cdigos internos que assegurasse seu territrio de eventuais desmembramentos, na medida em que a funo de supervisionar as igrejas geradas pelo seu projeto evangelstico no estava juridicamente definida em Estatuto. Dessa forma, a passagem da condio de Igrejame ou Cabea de Campo para Igreja Sede de Campo est atrelada ao estabelecimento do Estatuto vigorado em 2010129 emitido pela Igreja Sede Estadual a IEADERN. O territrio dos Campos Eclesisticos est definido no Estatuto da IEADERN130 e, baseado em seus artigos normativos a Jurisdio Regional da Assembleia de Deus de Currais Novos, traa um contorno jurisdicional nas igrejas filiais distribudas em oito municpios, onde mantm contnua superviso administrativa e eclesistica.
129
Condio de Currais Novos como Igreja Sede de Campo reconhecida pela sua relevncia evangelstica e institucional foi remitido juridicamente pela IEADERN passou a vigorar aps a aprovao em Assemblia Geral e registro em Cartrio competente, em 1 de janeiro de 2010, conforme est registrado na Seo III (das Disposies Finais) do Estatuto da IEADERN. 130 O artigo 38, do Captulo VI e seo I do Estatuto da IEADERN, esclarece a dimenso da jurisdio dos Campos Eclesisticos que abrangem em sua jurisdio administrativa e territorial a sede, os bairros, distritos e municpios onde mantm Igrejas Filiais e Congregaes que so subordinadas Igreja Sede, nos termos do 2 do art. 1, deste Estatuto.
171
Nesse sentido, o Campo Eclesistico representa uma extenso da atuao ministerial da IEADERN em cada uma das regies do Rio Grande do Norte. Com isso, todas as igrejas ligadas a uma Igreja Sede de Campo Eclesistico executam o ideal doutrinrio, descritos nos termos de confisso de f esposados pela IEADERN. Os pastores das igrejas Sede do Campo so designados pelo pastor presidente da IEADERN e na funo de supervisores, comumente tem seus pastorados prolongados no mbito do templo sede, pelo fato de assumirem uma gesto mais abrangente que a dos pastores das igrejas filiais. Assim, o remanejamento de pastores das igrejas filiais procede-se pela sugesto ou requisio do pastor supervisor na rea sob sua jurisdio. Portanto, a transferncia de pastores dentro do Campo Eclesistico de Currais Novos mantida com regularidade ao ponto das igrejas filiais apresentarem, frequentemente, minuciosas mudanas em suas ritualstidades litrgicas131. Desse modo, a troca de pastores permite que a igreja local assuma nova postura conduzida pela gesto estabelecida. Por esse motivo, a mudana frequente de pastores tida como positiva, em virtude da possibilidade de dinamizao os trabalhos evangelsticos que estiverem estagnados, evitando tambm o comodismo da liderana como a monotonia na sujeio dos liderados. Em razo destas circunstncias, foi efetuada a substituio do Pastor Joaquim Varela pelo ministro Jonas Antnio dos Santos em 2000, dcimo terceiro pastor a assumir a AD de Currais Novos. Em seu curto pastorado no templo central, Jonas Antnio empreendeu a ampliao do altar e a criao de duas congregaes no municpio curraisnovense, impulsionado o avano da Jurisdio Citadina do templo Sede. Sua substituio efetuada em 2001, pelo Pastor Raimundo dos Santos que em dois anos deixa construdo um refeitrio coletivo, edificado em anexo a estrutura da igreja. O servio ministerial do Pastor Raimundo no privilegiou a poltica de ampliao de novas congregaes em Currais Novos, dando nfase aos ensinamentos internos e a assistncia dos trabalhos congregacionais. Seu pastorado caracterizou-se numa gesto curta e pouco expressiva do ponto de vista evangelstico. Aps Raimundo dos Santos, assume o Pastor Josino Maciel Bezerra
131
Dentro das Assembleia de Deus pode-se dividir a classe de pastores em ortodoxos e flexveis, no que diz respeito aos usos e costumes tradicionalmente estabelecidos como regra comportamental e esttica dos assembleianos.
172
em 2001, dcimo quinto lder do templo sede de Currais Novos. O pastorado de Josino tenta seguir a poltica de expanso citadina, criando a congregao da Rua Antnio Othon de Arajo, no Bairro Dr. Silvio Bezerra. Um ano apenas foi conferido a Josino Maciel na igreja de Currais Novos, vindo substitu-lo em 2004 o Pastor Edjeso Gomes de Frana, dcimo sexto lder da AD, o qual continua at o atual momento, e em 2010 desenvolve a superviso do Campo Eclesistico de Currais Novos sobre oito igrejas filiais. O trabalho do Pastor Edjeso na Igreja Sede e no Campo Eclesistico destaca-se pelo seu vis administrativo do que propriamente expansivo dos trabalhos evangelsticos. Essa constatao refere-se aos procedimentos tomados em sua gesto, observados no seu esforo e apoio campanha iniciada pelo secretrio da Igreja Sede, Luis Antnio em 2009, que tinha como meta principal a aplicao de parmetros administrativos s demais secretarias das igrejas filiais do Campo Eclesistico de Currais Novos. Estava claro que, essa empreitada tinha como produto final o fortalecimento da estrutura administrativa das igrejas filiais, congregaes, como tambm da Igreja Sede, no qual veremos mais adiante com a anlise da formao da Jurisdio Citadina da Igreja Sede de Currais Novos.
No intervalo de trinta anos (1969-2000) a prtica territorial da Igreja Sede da Assembleia de Deus de Currais Novos esteve centrada na delimitao de espaos de evangelizao em outros municpios, resultando numa jurisdio regional que comporta hoje um Campo Eclesistico demarcado por normas e regras que funcionam como dispositivos de controle do territrio. A delimitao do territrio por cdigos normativos remete-se ao que Rosendahl (2008) caracterizou de limites invisveis, que efetivamente delimitam o territrio e, ao mesmo tempo, tornam efetivo seu contedo, que envolve no apenas diretamente as restries eclesisticas, mas tambm devotos, profissionais especializados e instituio subordinadas hierarquicamente [...] (ROSENDAHL, 2008, p. 56). Portanto, ao ampliar sua evangelizao no municpio de Currais Novos, a Assembleia de Deus, estrategicamente, contornou seus limites territoriais, 173
promovendo a estabilidade espacial dos novos pontos de difuso evangelstica (o fixo), incentivando a assistncia dos membros nas novas congregaes (o fluxo) e selecionando dentre o corpo de obreiros aqueles que participariam do ciclo anual de dirigentes. Essa conduta norteou os pastores na execuo dos projetos que previam a criao de novas congregaes em Currais Novos. O fixo e o fluxo, conforme Rosendahl (2008) parte constituinte do territrio e apresentam-se como elementos pelos quais a funo de domnio do territrio exercida. Pode-se observar que, a dinmica entre fixo e o fluxo interliga as congregaes ao templo central como vias de conexo, por meio dos quais, circulam as informaes necessrias ao domnio territorial citadino como normas estatutrias, doutrina, usos e costumes. esse o movimento contnuo dos dispositivos de controle, transitados semanalmente por obreiros dirigentes e membros da Igreja Sede s congregaes.
O
mostrou-se como uma fora centrfuga, devido o seu desenvolvimento pelos bairros perifricos da cidade. Contudo, entre os anos de 2000-2010, esse desenvolvimento no apresentou nmeros considerveis, tendo em vista o nmero de bairros ainda no abrangidos pela Assembleia de Deus. Dentre os 13132 bairros curraisnovenses, apenas quatro possuem congregaes da AD, so eles: Dr. Jos Bezerra, Paizinho Maria, Dr. Silvio Bezerra de Melo e Santa Maria Gorete. Nenhuma tentativa de abertura de novas congregaes foi registrada oficialmente antes de 2000, porm sabe-se que, o perodo predecessor a este, era comum entre os pastores na dcada de 1980 e 1990, a utilizao dos pontos de pregao como artifcio principal para investir na criao de novas congregaes, visto que a falta de terrenos prprios via aquisio ou doao, manteve a territorialidade local da Igreja Sede atada evangelizao temporria pelos bairros de Currais Novos133. Assim sendo, o primeiro ponto fixo de evangelizao da Igreja Sede em Currais Novos foi instalado em 2000, sob a gesto do Pastor Joaquim Varela, na Rua Paraba, situada no Bairro Santa Maria Gorete. Este bairro tem seus limites referenciados ao Norte pelo Bairro J.K, ao Sul pelo Centro, a Leste pelo Parque Dourado e a Oeste pelo Bairro Cel. Manoel Salustino. A origem do referido bairro,
132
Currais Novos tem sua rea citadina representada pelos bairros, como o Centro, Manoel Tomaz de Arajo, Antnio Rafael, Prof. Gilberto Pinheiro, Antnio Rafael, Coronel Manoel Salustino, Silvio Bezerra de Melo, J.K, Dr. Jos Bezerra, Parque Dourado, Santa Maria Gorete e Walfredo Galvo. 133 Francisco Galdino Sobrinho (Entrevista realizada em 15 abr. 2010).
174
conforme Souza (2008, p. 205), surgiu com a construo da Capela, iniciada em 1951 e inaugurada no dia 6 de julho de 1952, por Mons. Paulo Herncio de Melo. Com o tempo casas e ruas comearam a serem traadas nas reas laterais e, principalmente, atrs da Capela. Nos primeiros anos da sua fundao, a congregao da Rua Paraba tornou-se mais um ponto de apoio espiritual para membros e outros evanglicos, do que necessariamente um centro de evangelismo no Bairro Santa Maria Gorete. Crculos de oraes, cultos de libertao e viglias atraiam uma massa de pentecostais desejosos por experincias avivalsticas. Levando em conta a funo tradicional das congregaes, que a de exercer um evangelismo efetivo nos arredores de sua delimitao, observa-se que a prioridade da congregao da Rua Paraba foi, de incio, (re) elaborada pela demanda espiritual dos assembleianos em promover reunies avivalsticas. Esse fato comprova a existncia de um processo de (re) significao para alm da viso expansionista das congregaes, enquanto estratgias de crescimento territorial; centros de avivamento pentecostal, mediante aos novos propsitos firmados pelos lderes de exercitar de forma mais efetiva as experincias carismticas nas naves congregacionais. Vale destacar que as reunies
avivalsticas, hoje, cada vez mais, ganham notoriedade nas congregaes, eventos estes que em um passado prximo ficavam restritos ao templo maior da Assembleia de Deus. Em dez anos de existncia (2000-2010), as dimenses internas da congregao na Rua Paraba permaneceram praticamente inalteradas,
demonstrando que o aumento do nmero efetivo de fiis, neste espao de tempo, no justificou uma ampliao nas suas dependncias ou at mesmo sua mudana para outro local. Este fato emerge como uma evidncia que ratifica a pouca prioridade dos obreiros, os quais por ela passaram, em desenvolver projetos de evangelsticos. A congregao da Rua Paraba subsiste hodiernamente, promovendo regularmente seus trabalhos litrgicos duas vezes por semana e, segundo dados 134 dispostos na Secretaria da Igreja Sede em Currais Novos, seus membros somam um total de 59 participantes. Isto mostra que um ponto importante para a territorialidade da Igreja Sede
134
Deus
no
RN
(CURRAIS
NOVOS,
175
no o recrutamento de novos adeptos, como antes mencionado, mas sua fora de atrao de pentecostais de vrias denominaes. Nessa perspectiva, a
convergncia dos crentes para Rua Paraba ps em evidncia o conceito de avivamento carismtico, contribuindo para a reafirmao dos princpios de um pentecostalismo ortodoxo, fortalecendo as bases identidade religiosa da comunidade assembleiana. A criao da segunda congregao teve o respaldo da gesto de Jonas Antnio, que comandou os trabalhos da Igreja Sede de 2000-2001. Para o estabelecimento dessa congregao foi adquirido um terreno na Rua Riacho Machinar, no Bairro Dr. Jos Bezerra (Promorar), e iniciada uma ampla campanha de arrecadao de recursos para subsidiar a construo de um templo. A origem do Bairro Dr. Jos Bezerra decorre do Projeto Habitacional PROMORAR, destinado populao carente de Currais Novos, cuja renda impossibilitava a aquisio da casa prpria. Seus limites esto referenciados pelo Bairro Valfredo Galvo, ao Norte do Bairro J.k, e a Oeste com o Bairro Parque Dourado. Essas casas foram entregues em fevereiro de 1984, e teve o nome de suas ruas referenciadas por rios e riachos que serpenteavam o relevo curraisnovense. Sua denominao foi legalmente constituda pela Lei n. 1163, de 21 de junho de 1990, artigo 2, 1, na administrao do prefeito Mozart Dias de Almeida (1989-1992). A congregao do Bairro Dr. Jos Bezerra possui a maior estrutura fsica entre as fundadas pela Igreja Sede. Suas dimenses foram projetadas similarmente a de uma igreja-me e possua at 2008, segundo o censo da secretaria da Igreja Sede, um total de 45 membros efetivos. O padro de recrutamento de novos adeptos desenvolvido por essa congregao, deste a sua fundao, permanece guiado pelas formas tradicionais de evangelismo como, convites dos membros a conhecidos, pregaes nos cultos semanais e comisses de visitas. Um dos primeiros mtodos de evangelizao apostado pela congregao em 2000 foi o projeto Grupos Familiares. O mencionado plano evangelstico consistia na aplicao de estudos bblicos nas residncias dos membros da congregao. Nesta ocasio, o membro anfitrio do grupo familiar ficava na responsabilidade de convidar a sua vizinhana para se fazer presente ao estudo em sua residncia, criando assim uma agradvel e discreta oportunidade para se ministrar os ensinamentos bblicos. Durante os anos que se seguiram, os grupos familiares foram gradativamente sendo suprimidos, devido os diferentes 176
mtodos adotados pelos obreiros que fizeram parte do seu quadro de dirigentes. A congregao do Bairro Dr. Jos Bezerra permanece desenvolvendo seus trabalhos rotineiros, como os cultos aos Domingo, teras e quintas-feiras, servindo alm de um efetivo centro de difuso evangelstica para a Igreja Sede, um ponto de apoio para os fiis, que por razes diversas encontram-se impossibilitados de frequentar os cultos do templo sede no centro da cidade. A terceira congregao tambm foi criada no pastorado de Jonas Antnio em 2000, tendo como campo operatrio o Bairro Paizinho Maria. A formao deste bairro est historicamente ligada ao estabelecimento da Inspetoria, uma repartio federal subordinada ao DNOCS, responsvel em 1935 pela construo da ponte sobre o Rio So Bento, logo abaixo do Poo das Pedras (Poo de SantAna). Durante a construo da BR 226, o Departamento de Estradas e Rodovias instala sua secretaria na antiga Inspetoria, criando ao lado uma infra-estrutura para alojar mquinas e soldados do Batalho de Construo e Engenharia do Exrcito que participavam das obras de terraplanagem da BR 226. A denominao do bairro foi legalmente oficializada na administrao do prefeito Mariano Guimares (19631969), disposta pela Lei n. 427, em 22 de agosto de 1966. Ao atravessar o Bairro Paizinho Maria possvel observar a Oeste da Avenida 13 de Maio (sentido Currais Novos Natal) o crescimento acentuado de reas habitacionais, poro esta responsvel pelo alargamento de suas
dependncias. Os contornos limtrofes do Paizinho Maria esto definidos a Oeste pelo Rio So Bento, separando-o do Bairro Parque Dourado, a Leste pelo permetro urbano da BR 226, ao Norte pela Rua Jos Alves Pinheiro e ao Sul pela Rua Josu Bezerra Simes. A congregao do referido bairro foi instalada em um prdio locado na Rua Benedito Gonalves, tendo como rea de atuao evangelstica a Avenida 13 de Maio, e em seu interior possui um raio de abrangncia basicamente definido pelas ruas que circunscrevem a Benedito Gonalves, como a Xinda Xavier, Abrao Azevedo, Jos de Ins e a Jorge Guimares. Entender a congregao do Paizinho Maira como uma extenso da territorialidade da Igreja Sede, submeter suas prticas espaciais ao crivo das aes que so inerentes a um sistema territorial. Pois, toda prtica espacial, conforme Raffestin (1993, p.150) est [...] induzida por um sistema de aes ou de comportamentos [...] e que por fim traduz-se numa produo territorial. Dessa forma, os artifcios de induo evangelstica como panfletagem, 177
cultos ao ar livre, convites pessoais e pblicos (carro de som), so algumas das tticas j exploradas pelos dirigentes desta congregao, e constituem-se em elementos que revelam a formao de um territrio religioso. Contrapondo as estratgias de atrao dos assembleianos, com principal mtodo evangelstico das igrejas neopentecostais de Currais Novos, que promovem na cidade o chamamento de pessoas, via carro de som, difundindo um discurso sob a promessa de soluo imediata de diversos tipos de sofrimento do cotidiano135; o evangelismo das Assembleia de Deus, em especial a do Paizinho Maria, caracteriza-se por um estilo restrito, dispensando sua mensagem
evangelstica a algumas ruas do bairro, e mais direcionada as demandas espirituais do que materiais. Essa opo por um evangelismo discreto e sem espetacularizao de seus rituais litrgicos est relacionada ao comprometimento da congregao do Paizinho Maria com os princpios doutrinrios do pentecostalismo ortodoxo, que prescrevem uma atuao evangelstica isenta de inovaes do tipo Teologia da Prosperidade, demonizao do sofrimento, santificao (uno) de artigos pessoais ou pregaes de auto-ajuda. Contudo, a pregao simples e sem pretenses de massificao de sua clientela tem sido a marca do evangelismo dos membros e obreiros dessa congregao entre os anos de 2000 2009. Em continuidade, dois anos aps a fundao da congregao do Paizinho Maria, o Pastor Josino Maciel, em 2003, investe na evangelizao do Bairro Dr. Slvio Bezerra de Melo (Matadouro). Seus principais artifcios de sondagem e tentativa de estabelecimento espacial foram os pontos de pregao, tendo em vista que os trabalhos de evangelizao no bairro seguiram-se sustentados por esse mtodo at a chegada do pastor Edjeso Gomes, na Igreja Sede em 2004. Portanto, a rea total do Bairro Dr. Slvio Bezerra de Melo est delimitada pelo Rio Totor, ao Norte; ao Sul, pelo permetro da BR 226; a Leste, com o Rio Currais Novos; e a Oeste, pelo stio da Cidade. Sendo conhecido desde suas primeiras ruas como Bairro do Matadouro, teve sua denominao oficial estabelecida pela Lei n. 826, de 7 de julho de 1978, sancionada pelo prefeito Geraldo Gomes de Oliveira no segundo ano de seu primeiro mandato a frente do municpio de Currais Novos de 1977 a 1983. No decorrer dos primeiros seis anos de existncia, o evangelismo neste bairro ficou regido pela administrao do Pastor Edjeso Gomes, que anualmente
135
Refere-se aos principais elementos que fazem parte do discurso das Igrejas Neopentecostais como curas e milagres e a moderna Teologia da Prosperidade.
178
nomeava obreiros da Igreja Sede para liderar suas atividades. At 2008, de acordo com dados do censo (2008)136 da secretaria da Igreja Sede, a congregao possua uma mdia de oito membros efetivos. Ainda na gesto de Edjeso Gomes, o trabalho evangelstico do Bairro Dr. Slvio Bezerra de Melo foi transmutado de ponto de pregao para congregao em um prdio locado, quando em 14 de dezembro de 2009 transfere-se para um prdio construdo em um terreno doado na Rua Antnio Othon de Arajo, por um de seus congregados o Senhor Amrico (nome popular). A congregao est situada a margem direita da Av. Pres. Getlio Vargas no sentido Currais Novos Caic e, conforme o nmero de membros descritos anteriormente, ainda est nos primeiros estgios de recrutamento de novos adeptos. Os fatos comprovam que, a utilizao prolongada do ponto de pregao, e logo mais de uma estrutura locada para fixar inicialmente uma congregao no Bairro Dr. Slvio Bezerra, no sucedeu a uma condio favorvel de crescimento. No entanto, a estabilidade espacial conquistada em 2009, com a fixao definitiva no prdio da Rua Antnio Othon de Arajo, poder contribuir para que seja efetivada uma evangelizao nas ruas adjacentes congregao e, consecutivamente na ampliao dessa para outras mais distantes. As quatro congregaes ligadas Igreja Sede de Currais Novos e seus respectivos dirigentes possuem autonomia para desenvolver eventos e novas formas de evangelizao, todavia obedecendo as diretrizes doutrinrias das Assembleias de Deus e suas normas estatutrias e regimentais. bem verdade que, a abertura das congregaes no perodo de 2000-2001 pelo Templo Sede, no obedeceu criteriosamente todas s normas dispostas nos termos do Regimento Interno, pelo fato destas serem vigoradas somente em janeiro de 2010. Os critrios de estabelecimento espacial trazidas pelo novo Regimento Interno da EADERN definem como se dar a expanso de novas congregaes em torno dos bairros, distritos ou municpios. Segundo as normas do Cap. II, do art. 2, do Regimento Interno137, so levados em considerao quesitos como: necessidade de instalao, quantidade efetiva de trinta membros no incio do trabalho e
136 137
Quadro estatstico da AD/RN (CURRAIS NOVOS, MINISTRIO/CONGREGAES, 2008). O captulo II do Regimento Interno correspondente aos pargrafos I, II e III exige que sejam confederados os seguintes preceitos: I haver necessidade, que justifique a instalao de uma Congregao ou Igreja Filial em determinada localidade; II existir, no mnimo, trinta pessoas que se renam regularmente em um bairro ou localidade, em ambiente com mnimas condies de funcionalidade, e que possam contribuir com as despesas mnimas para a sua manuteno; III existncia de obreiros que possam ser designados para atender as atividades inerentes ao trabalho tais como: direo, secretaria, tesouraria e outras necessrias ao desenvolvimento do trabalho.
179
autonomia financeira ante a Igreja Sede e obreiros em suficientes para exercer atividades administrativas. Essas regras visam fortalecer as jurisdies dos Campos Eclesisticos, evitando um crescimento desproporcional capacidade de assistncia financeira e eclesistica por parte dos Templos Sede de Campo, contribuindo para uma expanso qualitativa das congregaes. As quatro congregaes fundadas pela Igreja Sede do Campo Eclesistico de Currais Novos possuem membros efetivos e um corpo de obreiros assduos, porm todas exercem uma evangelizao ainda restrita nos bairros onde esto localizadas. Com a emisso do Regimento Interno em 2010, a autonomia dos pastores da referida igreja em Currais Novos para abrir novas congregaes est sujeita a cdigos, com peso decisivo no crescimento da Jurisdio Citadina nos prximos anos.
3.7.1 A formao da Jurisdio Regional, de ponto-de-pregao Sede de Campo Eclesistico A ocupao do espao que conforma o municpio de Parelhas est atrelada a constituio de assentamentos s margens do Rio Serid, por intermdio de senhores donatrios, provenientes dos Estados do Pernambuco e da Bahia que receberam a concesso das sesmarias para estimular a produo de atividades agropastoris. Um dos primeiros povoadores foi o Tenente Francisco Fernandes de Souza que fixou residncia por volta de 1711. A Fazenda Boqueiro representa o primeiro marco da fundao do territrio parelhense, fundada em 1850 pelo fazendeiro Flix Gomes Pereira. Da fazenda Boqueiro derivou-se o nome Estrada Boqueiro, ponto de encontro de viajantes vaqueiros com destino ao Estado da Paraba e feira de Conceio do Azevedo (Jardim do Serid) (MORAIS, 2005, p. 212). O encontro desses viajantes pela Estrada do Boqueiro costumeiramente aos domingos resultou em corridas entre vaqueiros, os quais apostavam na resistncia e velocidade de seus cavalos. Por causa disso, a corredeira de duplas de vaqueiros, fazendo parelhas de cavalos, se popularizou, mais tarde o termo que foi adotado e deu nome Vila de Parelhas em 1926, um ano depois adquiriu foros de cidade em 1927.
180
A formao do municpio tambm resguarda uma profunda ligao com o catolicismo e seus projetos de evangelismo, visto que a cidade tem como forte e significativo marco de sua gnese Capela de So Sebastio, fundada pelos devotos Sebastio Cosme e Luiz Cosme, aps uma graa alcanada, posteriormente onda da epidemia Clera Morbus que assolou o Estado norte-riograndense em 1856. O arruamento do centro da cidade de Parelhas iniciou com a expanso de casas em torno da Capela de So Sebastio, formando primeiramente a Rua do Rio, atualmente a Praa Flix Gomes. As representaes do catolicismo sempre estiveram presentes na produo do espao parelhense138, estabelecendo uma ordem religiosa por intermdios de signos, cdigos e imagens. Estas representaes, visivelmente delimitadas no espao, apontam para um controle simblico em diferentes pontos da cidade, e expem as fronteiras de um territrio catlico. Nesse sentido, at a chegada do evangelismo protestante em 1963, o catolicismo permaneceu exclusivo durante 107 anos entre os habitantes do territrio parelhense. Com isso, o secular evangelismo catlico respondia pela intensidade do poder simblico que projetara na cidade de Parelhas antes da chegada do presbiterianismo. Contudo, a pregao protestante adentra o territrio catlico em Parelhas no ano de 1963, tendo como protagonista o Pastor Francisco Bezerra, da Igreja Presbiteriana de Caic. Suas pregaes tinham como ponto de difuso a Praa Arnaldo Bezerra e com a ajuda de caixas amplificadas que estendiam o alcance sonoro de sua mensagem evangelstica s ruas adjacentes. No resgate histrico de Alusio Nicolau139, o primeiro cidado parelhense alcanado pela pregao do Pastor Francisco foi o senhor Severino Nicolau da Silva140 ainda em 1963, homem este que mais tarde se tornaria uma das lideranas religiosas mais influentes na cidade. Dessa forma, interessado em estabelecer um local fixo para a continuidade dos trabalhos evangelsticos do Pastor Francisco Bezerra, o novo convertido
138
O catolicismo ergueu vrios templos em pontos diferentes na cidade de Parelhas, como a Igreja Matriz de So Sebastio (Centro); o Santurio de Nossa Senhora de Ftima (Centro); a Capela de So Jos (Bairro So Sebastio); Capela de Santo Antnio (Povoado Cobra); Capela de Virgem dos Pobres (Sitio Quintos) e a Capela da Virgem dos Pobres (Stio Juazeiro). 139 SILVA, Alusio Nicolau da. Histria da Igreja Presbiteriana em Parelhas. Parelhas/RN, 28 abr. 2010. Entrevista concedida a Bruno Gomes de Arajo. 140 Ex-combatente da II Guerra Mundial, enviado para Itlia como pracinhas (aliados), para lutar contra a expanso fascista de Mussolini.
181
Severino Nicolau disponibiliza um pequeno espao em sua residncia, na Rua Antnio Jos de Lima, no dia 23 de agosto de 1963. Sendo assim, a residncia desse novo convertido tornou-se o primeiro centro fixo de evangelismo protestante em Parelhas. O telhado de sua residncia servia de sustentao para dois altosfalantes utilizados para ecoar as mensagens que ele mesmo testificava como sendo a nicas verdades salvvicas. Portanto, a evangelizao da Igreja Presbiteriana em Parelhas,
indiretamente incentivou o advento do protestantismo pentecostal, uma vez que o evangelismo do Pastor Francisco Bezerra, em 1963, estimulou a adepta da Assembleia de Deus, Severina Morais (Birina), de Currais Novos a conhecer e ajudar na difuso da mensagem protestante na cidade. importante destacar, que o protestantismo em Parelhas se estabeleceu numa relao de reciprocidade entre denominaes doutrinariamente antagnica. Dessa forma, o movimento deu seus primeiros passos em direo a um projeto evangelstico mais abrangente, o qual posteriormente resultou em novas territorialidades religiosas e, consequentemente, no entrecruzamento destas com os campos operacionais do catolicismo. Assim sendo, os rumores do nascente evangelismo protestante em Parelhas mobilizou Severina Morais, pioneira da Assembleia de Deus de Currais Novos, a conhecer os presbiterianos e tambm, abrir um ponto de pregao naquela cidade. Ao visitar Parelhas no dia 28 de fevereiro de 1963, Severina realiza o primeiro culto domstico na casa de sua cunhada Maria de Lourdes, e ao constatar a cidade de Parelhas como um campo promissor para o evangelismo pentecostal agenda outro culto para maro de 1963. Nesta segunda oportunidade, o lder da AD de Currais Novos, Pastor Miguel Campos, juntamente com sua esposa, acompanha a pioneira Severina em sua ida cidade de Parelhas, onde juntos realizaram um culto pblico na Praa Arnaldo Bezerra. Nesse momento ficou claro para os catlicos o mpeto proslito dos protestantes e o surgimento de um pluralismo religioso na cidade de Parelhas. Aps retornar a Parelhas, em 7 de maio de 1963, acompanhado por uma grande caravana de jovens, o Pastor Miguel Campos realizou outro culto na praa da cidade, momento este em que Maria de Lourdes, at ento simpatizante do evangelismo assembleiano, decidiu se converter a f pentecostal e participar como uma assdua cooperadora do projeto evangelizador.
182
Assim, sem um ponto de apoio para os trabalhos da Assembleia de Deus de Parelhas, Maria de Lourdes oferece a fachada de sua casa para servir de ponto de pregao. O embrionrio trabalho da AD de Parelhas no ficou somente sob a responsabilidade assistencial da Igreja em Currais Novos, visto que o Pastor Raimundo Santana, lder da Assembleia de Deus de Caic, a convite do Pastor Miguel Campos, auxilia o ponto de pregao e realiza seu primeiro culto em solo parelhense em 14 de maio de 1963. Neste culto, cinco pessoas de procedncia catlica aceitam a mensagem e tornam-se congregados do ponto de pregao. Com isso, a assistncia da AD de Currais Novos a esse novo ponto durou efetivamente durante os meses de maro, abril e maio de 1963, ao passo que a igreja de Caic continuou constante em seu auxlio, dando prosseguimento e idealizando projetos de evangelismo junto aos irmos parelhenses. O ponto de pregao da AD de Parelhas apresentou uma nica mobilidade espacial durante os seus primeiros anos de existncia. Os trabalhos da referida Igreja permaneceram na casa de Maria de Lourdes at 1964, quando foi transferido para residncia de Manoel Gomes at a construo do templo central. A construo do templo Central da Assembleia de Deus de Parelhas, no ano de 1965, foi um projeto da Igreja de Caic, e teve a colaborao indispensvel dos assembleianos parelhenses na concretizao desse empreendimento. A campanha iniciada em 1964, com o proposto de levantar fundos para edificao do templo, teve como artifcio principal o Clube de Mes141. Deste rgo saiu maior parte do dinheiro que seria utilizado compra do material para a construo. Com o terreno adquirido na Rua Maximiano da Costa, n 66, e o material de construo a disposio, os membros da igreja de Parelhas no possuam o suficiente para arcara com os custos da mo-de-obra. Essa escassa realidade atestada por Maira de Lourdes142 justificava pela vigente pobreza dos membros da poca, como tambm pelo penoso contexto das secas deflagrada em 1960, vivenciada por toda populao seridoense. Portanto, os
141
Para a construo do templo, foi criado em Parelhas, pela superviso do Clube da Diaconia de Natal, o Clube de Mes. O clube de Mes consistia numa instituio com fins lucrativos das Assembleia de Deus, o qual oferecia cursos de bordados, coordenado pela irm Maria Lourdes, que atuava tambm como professora. O Clube de Mes tambm vendia subsdios vindos da Amrica do Norte por intermdio da igreja central de Natal. Conforme Douglas Arajo apud Flvio Epifnio, (2009, p.29) "a Assemblia de Deus aplicou um trabalho na regio do Serid, oriundo dos Estados Unidos da Amrica (EUA), denominado de Aliana para o Progresso atravs do qual eram oferecidos, populao mais carente, produtos como roupas e calados a preos muito baixos. 142 Maria Lourdes Campos da Silva (Entrevista realizada em 17 nov. 2009 - Parelhas/RN).
183
gestos de voluntariedade dos irmos parelhenses foram decisivos neste rduo perodo de precariedade social, uma vez que para iniciar as obras de construo do templo, os assembleianos parelhenses formaram mutires de trabalho e levantaram as paredes do templo, como fato tambm vivenciado pela irm Maira de Lourdes a qual na poca juntou-se ao mutiro de trabalhadores, trazendo na cabea gua do aude pblico para encher os tambores da construo. Dessa forma, a edificao do primeiro templo foi possvel mediante o esforo cooperativo dos membros pioneiros. Em 20 de novembro de 1965, o templo maior inaugurado com um jubiloso culto de aes de graa. Neste culto de abertura foi nomeado como pastor local o obreiro Manoel Matias Silvestre que ficou na direo do trabalho em Parelhas, recebendo a assistncia peridica dos Pastores Raimundo Santana (Caic) e Miguel Campos (Currais Novos). A partir de ento, a fora institucional da Assembleia de Deus de Parelhas comea a se manifestar com o levante ministerial de obreiros dentro de sua nave eclesistica. Assim sendo, no final da dcada de 1960, o trabalho evangelstico foi impulsionado por homens leigos, porm assduos em estudos bblicos e na pregao evangelstica. Nessa perspectiva, a ascenso de obreiros com mpeto na pregao pentecostal como o obreiro Ribeiro, que dentre os demais se destacou na igreja como um proeminente evangelista, foi estabelecido um novo perfil na pregao dos cultos durante a gesto do Manoel Matias, por intermdio de mensagens, as quais enfatizavam a necessidade de evangelismo143. Esse preldio avivalstico vivido pelos membros em Parelhas, mais tarde repercutiria em sua prtica territorial com a criao de novos pontos de pregao em cidades circunvizinhas. Desse modo, movido por uma conscincia missionria, o Pastor Manoel Matias, juntamente com seu corpo de obreiros, funda o primeiro ponto de pregao no municpio de Acari em 1968. Alm disso, paralelo ao projeto de evangelismo da igreja de Parelhas em Acari, a AD de Caic, em 1968, sob a gesto de Raimundo Santana, implantava uma congregao no municpio de Equador, e nomeia o obreiro Martins Alves da Silva para pastorear seu primeiro corpo de fiis. Transferido em janeiro de 1969, a fim de pastorear o trabalho que fundara em Acari, o Pastor Manoel Matias promove o primeiro evangelismo pentecostal na cidade de Jardim do Serid. Segundo Francisco Flvio (2009, p.28), as aes evangelsticas em Jardim do Serid consistiam em visitas aos lares, distribuio de
143
184
literaturas com trechos bblicos, evangelizao pessoal e culto em pontos estratgicos da cidade. Ainda conforme o referido autor, a assistncia aos trabalhos evangelsticos da AD de Jardim do Serid ficou sendo prestada pela Igreja de Caic que formando caravanas, na maioria de jovens, [...] visitavam os lares [...] sempre conduziam consigo literaturas com mensagens oportunas, alm de procurarem explicar, aos ouvintes, o significado de tal escritura (EPIFNIO, 2009, p. 28). Outro feito da gesto de Manoel Matias na igreja de Acari, em 1969, foi assistncia ao trabalho de Carnaba dos Dantas. Assim, abertura do primeiro ponto de pregao no referido municpio no foi registrada por nenhuma das secretarias dos Campos Eclesisticos, porm de acordo com o respaldo histrico de Jos Fernandes (Z Borges) a implantao da AD nessa cidade atribui-se igreja de Acari. O segundo obreiro com funo pastoral na AD de Parelhas foi o Dicono Severino Anzio do Nascimento. Os anos de sua gesto na Igreja supracitada permanecem ainda indefinidos144, no entanto a confluncia de datas entre seu pastorado e dos que o sucederam apontam para o ano de 1969. No entanto, os anos em que Severino Anzio passou a frente da AD, nenhum feito administrativo foi registrado que apontasse para um crescimento jurisdicional da Igreja de Parelhas, deixando apenas como evidncia de sua contribuio a continuidade das mensagens que estimulavam o fervor evangelstico, iniciado anteriormente nos sermes de Ribeiro no pastorado de Manoel Matias, e que se perpetuaram a at chegada do seu sucessor. O terceiro obreiro com funo pastoral a liderar a AD de Parelhas foi o Presbtero Francisco Ribeiro, tambm citado aqui sem a data exata do incio de sua gesto. Segundo o relato de Jos Fernandes (Z Borges), o Presbtero esteve na liderana da AD cinco meses antes de sua substituio em 1970. Seguindo o esprito do momento, que evocava a igreja em Parelhas ao evangelismo, o Presbtero Francisco Ribeiro e o obreiro Jos Fernandes, abrem juntos outro ponto de pregao agora em Santana do Serid em 1969, o segundo ponto criado pela AD, alargando assim a linha que delimitava o domnio eclesistico da referida Igreja (Mapa 7, p.182).
144
Partindo das datas apresentadas por Jos Fernandes da Silva (Z Borges), a gesto de Severino Anzio do Nascimento foi referenciada tendo como indicativo perodo de cinco meses de seu substituto, o Presbtero Francisco Anzio, como tambm de seu sucessor em 1970 o obreiro Jos Fernandes.
185
186
A reproduo de trabalhos evangelsticos pela Igreja de Parelhas em cidades limtrofes deu-se no perodo de 1969 a 1968, alcanando, como exposto anteriormente, as cidades de Acari e Santana do Serid. Sendo assim, na alternncia de pastores que sucederam a gesto de Jos Fernandes (1970-1973), o quarto com funo pastoral a liderar a AD de Parelhas, a igreja permaneceu com uma administrao voltada para estruturao local do trabalho. No histrico das gestes pastorais da AD de Parelhas, apresentado na fala de Jos Fernandes, que vai de 1973 at 1997, conclui-se que os esforos dos pastores estiveram centrados na cooperao dos trabalhos em outras cidades e, especialmente na doutrinao dos assembleianos parelhenses. Desse modo, numa exposio sequencial das sucesses pastorais no perodo supracitado na AD de Parelhas temos: Joo Batista da Silva, Jurandir Barreto, Vicente Batista da Silva, Raimundo dos Santos, Francisco Cirilo da Silva, Sebastio Rodrigues do Nascimento e Joo de Souza. Dentre estes, destaca-se o quinto dirigente, o
Dicono Joo Batista da Silva, que em sua funo pastoral (1973-1981) ampliou as dependncias do templo da AD no municpio. O traado jurisdicional da Assembleia de Deus at meados da dcada de 1970 j havia abrangido integralmente a regio seridoense, tendo como centros principais de difuso as igrejas de Caic e Currais Novos. Diante desse contexto, a imagem do territrio das Assembleia de Deus no Serid de 1970 at 2000 podia ser descrita como uma rede de igrejas filiais ligadas a um centro de comando nico no caso a Sede Estadual/IEADERN, pela qual as questes doutrinrias e administrativas das igrejas seridoenses eram diretamente conduzidas liderana da IEADERN, sem que houvesse uma pr-deliberao de lderes regionais. O processo de descentralizao foi conduzido pelo Pastor Raimundo Joo de Santana, aps sua eleio para presidente da IEADERN em 1999. No decorrente ano, em Janeiro de 2000, a Igreja Sede Estadual em Assemblia Geral, anuncia uma indita organizao territorial para as igrejas de Estado. Assim surgem os Campos Eclesisticos, de uma reorganizao das jurisdies das igrejas-me, totalizando desta forma a criao de 24 Campos Eclesisticos das Assembleia de Deus no estado Norte-rio-grandense.
187
Antes desta nova configurao, as igrejas-me que gozavam de uma posio de liderana a nvel regional, como Caic e Currais Novos estavam consignadas na IEADERN como igrejas cabea de campo. Com a criao dos Campos Eclesisticos, as referidas igrejas so redefinidas para Igrejas Sede de Campo Eclesistico. importante destacar que, esse novo sistema territorial no estava resguardado por um Estatuto nem Regimento Interno. A fundao, tal como os propsitos dos Campos Eclesisticos, ficou descrita apenas em Ata na IEADERN, nenhum documento jurdico foi elaborado para definir os deveres e diretos das igrejas do Campo Eclesisticos. Assim sendo, antes da nova jurisdio decretada em 2000, as igrejas do Serid encontravam-se hierarquicamente abaixo de duas igrejas cabea de campo, como Caic e Currais Novos. A sujeio das igrejas do Serid a estas igrejas no presumia interveno administrativa nem eclesistica, mas uma abertura para possveis aconselhamentos relacionados a questes internas. Esse tipo de relao entre as igrejas cabea de campo e as igrejas filiais foi estabelecido com o tempo e de forma consensual. Ao que tudo indica a jurisdio eclesistica, nesse tempo, consistia no respeito das igrejas filiais s igrejas cabea de campo. Essa reverncia se perpetuou ao longo dos anos, e fruto da assistncia recebida pelas igrejas-me (cabea de campo) no incio de seus trabalhos evangelsticos. Com a criao desse novo sistema territorial, as igrejas de Caic e Currais Novos permaneceram em sua condio de privilgio no plano regional, tornando-se Campos Eclesisticos. No entanto, essa organizao tambm impetrou a igreja filial de Parelhas na gesto do Pastor Valdemar Flix Sobrinho, visto que o momento ureo da AD de Parelhas neste perodo apresentou-se como um dos fatores definidores para sua ascenso hierrquica no sistema territorial assembleiano. Dessa forma, no incio de 2000, o Pastor Valdemar inicia um grandioso projeto de reconstruo do templo da AD de Parelhas, contando com os recursos da prpria igreja. A princpio, a amplitude da construo foi caracterizada por alguns obreiros, como desproporcional capacidade do montante recolhido mensalmente pela igreja nos dzimos e ofertas. Nestas condies, alm dos dzimos e ofertas outro mtodo de arrecadao foi desenvolvido, como os tales de contribuio de mensal. Essa contribuio extra somou-se a doao feita pelo governo municipal e pela IEADERN. Com isso, o ousado projeto do Pastor Valdemar Flix, foi concludo no prazo de seis meses, resultando no maior templo das Assembleias de Deus no 188
Serid. Os critrios utilizados para elevao da igreja em Parelhas Sede de Campo Eclesistico parecem est ligados aos mritos acumulados durante sua existncia. Alm do histrico de criao e assistncia aos trabalhos evangelsticos na dcada de 1960 aos pontos de pregao nos municpios de Acari e Santana do Serid, a estrutura fsica do templo construdo em 2000 foi decisiva para sua graduao na hierarquia territorial. A partir da criao dos Campos Eclesisticos, as igrejas filiais pertencentes jurisdio da AD de Caic, como Carnaba dos Dantas, Equador e Santana do Serid, foram desmembradas e adicionadas jurisdio do recm criado Campo Eclesistico de Parelhas. Essa reconfigurao de reas jurisdicionais da Assembleia de Deus no Serid apresentou trs Campos Eclesisticos autnomos dispostos pelos limites territoriais das Igrejas Sedes de Caic, Currais Novos e Parelhas. Portanto, durante os anos que transpassaram o perodo de 20002010, as Igrejas Sede dos Campos Eclesisticos no Serid atuavam sem o respaldo de normas estatutrias na conduo de suas supervises rede de igrejas filiais. Com o estabelecimento do novo Estatuto e Regimento Interno, em 1 Janeiro de 2010, pela IEADERN, as Igrejas Sede Campos Eclesisticos passaram a ter mais clareza em suas atribuies enquanto centros de superviso regional, visto que esses documentos impetram todas as regras de interveno das Sedes em suas respectivas igrejas filiais. Diante dessas novas regras, observa-se ento que a Assembleia de Deus no Estado do Rio Grande do Norte marcada por uma transio em sua poltica territorial. Fato este que se remete a entender como a passagem de uma jurisdio informal para outra legalizada, uma vez que essa legalizao da jurisdio dos Campos Eclesisticos, nesta presente anlise, diz respeito ao registro do Estatuto da IEADERN na comarca de Natal, procedimento este que conferiu regularidade jurdica ao sistema territorial assembleiano. Assim, regido por princpios estatutrios e regimentais desde 2010, os Campos Eclesisticos do Serid, em sua estrutura organizacional, desenvolvem formas simtricas de gesto territorial. Por outro lado, embora o livre-arbtrio seja um dos elementos principais do governo das Igrejas Sede de Campo, toda deciso emitida pelos pastores supervisores dever est em perfeita consonncia com os parmetros normativos da IEADERN. 189
Contudo, o governo da Assembleia de Deus aps a emisso do Estatuto e Regimento Interno tornou-se regrado por mecanismos de controle bem definidos, o que se pode afirmar na concepo de Souza (2004, p. 61) como o triunfo da racionalidade burocrtica sobre a dominao carismtica tradicional. A AD, enfim, reafirma seu perfil, confirmada agora em leis e cdigos que tem como objetivo primeiro preservar sua ortodoxia.
A multiplicao de pontos de pregao e congregaes da AD em bairros e distritos de Parelhas teve como ponto de propagao espacial o templo da Rua Maximiano da Costa, construdo em 1965. Entretanto, foi por intermdio do Pastor Raimundo Joo de Santana da AD de Caic, a abertura do primeiro trabalho evangelstico de Parelhas em 1967, o Povoado Santo Antnio (Povoado Cobra), localizado a 18 km do permetro urbano de Parelhas, foi atingido pela mensagem pentecostal em 1967, quando o Pastor Raimundo Santana, junto com obreiros parelhenses, perseverou em um trabalho de evangelismo entre os moradores do povoado. O topnimo do lugar objetivamente alertava para a existncia de uma territorialidade religiosa j estabelecida, ou seja, a referncia a Santo Antnio fazia jus a uma eminente delimitao catlica. Pois a Igreja Catlica antecipadamente deixara sua marca dentro dos arredores do povoado, erguendo a Capela de Santo Antnio, expresso concreta da devoo coletiva ao padroeiro catlico. De forma mais intensa ao que acontece em reas citadinas como bairros e ruas de Parelhas, a tradio no povoado Santo Antnio assume uma conotao de vitalidade, e na maioria das vezes que d significado ao lugar, ressaltando-se ento o que afirmou Maffesol (1987, p. 32): o costume faz uma comunidade existir como tal. Nesse sentido, o reconhecimento da carga simblica do templo catlico e dos rituais transmitidos no seio da comunidade, como mecanismos intangveis de controle territorial, que se presume o nvel de resistncia da populao do Povoado Santo Antnio ao evangelismo pentecostal, visto que o fator cultural revelou-se como um dos elementos mais veementes de oposio ao proselitismo 190
assembleiano, o que explica o progresso em longo prazo de seu evangelismo. Dessa forma, o trabalho iniciado por Raimundo Santana e continuado pelos obreiros de Parelhas, teve uma receptividade bastante restrita, tendo em vista o forte vilipndio sofrido pelos demais moradores do povoado. No entanto, as peridicas evangelizaes, realizadas aos domingos tarde, teve como primeiros frutos os senhores Jos Benedito e Antnio. A converso desses moradores foi importante para instalao de um ponto de pregao no povoado. Sendo assim, a casa de Jos Benedito tornou-se o primeiro recinto de difuso da mensagem pentecostal no povoado Santo Antnio. O amparo da igreja de Parelhas ao evangelismo na comunidade do povoado Santo Antnio, com o tempo torno-se menos efetivo, visto a pouca ateno recebida pelos planos de trabalhos dos pastores quem passaram pela igreja no percurso das dcadas de 1970-1990 como: Joo Batista da Silva, Jurandir Barreto, Vicente Batista da Silva, Raimundo dos Santos, Francisco Cirilo da Silva, Sebastio Rodrigues do Nascimento e Joo de Souza. Desde a fundao do primeiro ponto de pregao no Povoado Santo Antnio em 1967, at meados da dcada de 2010, difundiu-se um modesto trabalho evangelstico, no resultando em um crescimento significativo de novos convertidos. Contudo, o propsito de evangelismo na comunidade foi conservado e em 29 de outubro de 2005 aconteceu o lanamento da pedra fundamental, evento realizado pelo Pastor Antnio Marrocos Sobrinho (2003-2007), dcimo quarto pastor a liderar a AD de Parelhas. A construo do templo no povoado Cobra ficou sob os investimentos da igreja da Carnaba dos Dantas, com inaugurao em 4 de maro de 2007. Aps esse feito, cogitou-se na gesto do Pastor Jaime Mariano de Azevedo Filho (20072010), o ligamento da congregao AD de Carnaba dos Dantas. A tentativa de transferir a congregao do povoado Santo Antnio a outra jurisdio foi interrompida pelo seu sucessor o Pastor Antnio Oliveira (2010), em reconhecer a improcedncia tica do ato, que no considerava o histrico de mais de 30 anos de assistncia e atuao evangelstica dos obreiros da AD de Parelhas entre os moradores do povoado. A segunda congregao foi criada pelo Pastor Josu Macrio (19971999), no prdio locado no Bairro So Sebastio, em 1998. O Bairro So Sebastio separado dos demais bairros de Parelhas pela passagem do Rio Serid Oeste,
191
tomando assim caracterstica de periferia urbana. Em nmeros de habitantes est entre os mais populosos da cidade, com uma mdia de 1.915 moradores145. A primeira incurso religiosa neste bairro foi efetuada pelo catolicismo, que ergueu uma das imagens mais possantes na paisagem do bairro, a Capela de So Jos. A atuao dos catlicos ento evidenciada antes da implantao da congregao da AD no Bairro So Sebastio. No entanto, o ardor da f catlica mostrou-se mais tolerante do que no Povoado Santo Antnio, destacado anteriormente. Esse indcio comprovado na flexibilidade dos moradores em receber de forma mais pacfica o proselitismo pentecostal. Passados sete anos de evangelismo, a Assembleia de Deus, sob o pastorado de Antnio Marrocos, lana a pedra fundamental da congregao em 2004 e inaugura sua construo em 2005. Sua armao fsica a maior entre as congregaes levantadas pela Igreja Sede de Parelhas, at o momento, e possui um corpo de obreiros ativos que dirigem suas reunies nas teras e quintas-feiras. Por conseguinte, o terceiro ponto de propagao evangelstica da AD na zona urbana de Parelhas foi idealizado na administrao pastoral de Valdemar Flix Sobrinho em 2001, no Bairro Ivan Bezerra. O Bairro est localizado na zona perifrica do centro de Parelhas e tem seus limites definidos com o Bairro Cruz do Monte, a Oeste; e a Leste com o Bairro Dinarte Mariz. A implantao da congregao da AD no Ivan Bezerra no significou o entrecruzamento de territorialidades religiosas antagnicas, isso porque a ao catlica no bairro apresentava pouca expressividade nas proximidades da congregao, e nenhuma delimitao material/imaterial assinalava uma resistncia ao pentecostalismo assembleiano. O evangelismo pentecostal no Ivan Bezerra predomina por meio das Igrejas Deus Amor e Assembleia de Deus. Em quantidade de possveis conversos, o Bairro Ivan Bezerra apresenta-se como o maior setor de evangelizao da AD de Parelhas. Com mdia estimada de 2.631146 moradores, o Ivan Bezerra um campo de possibilidades para o proselitismo assembleiano, que promove com frequncia a entrega de folhetos evangelsticos, evangelismo pessoal (nas casas) e cultos pblicos em diferentes ruas do bairro. Um ano depois do estabelecimento da congregao em um prdio locado, o Pastor Valdemar constri em 2002 um templo prprio no Ivan Bezerra para
145
Dados coletados no banco de dados do Sistema de Informao de Ateno Bsica (SIAB/ 2010), na Secretaria Municipal de Sade de Parelhas/RN. 146 Idem.
192
abrigar as liturgias pentecostais da AD, e assinalar a imagem da territorialidade do templo Igreja Sede de Campo no centro do bairro, fazendo conhecer tanto a apropriao quanto o controle de um territrio em restrito crescimento, porm contnuo. Por fim, a quarta e quinta congregao criada pela Igreja Sede de Parelhas teve suas fundaes no ano de 2006, pelo Pastor Antnio Marrocos nos Stios Colonos e Boa Vista, respectivamente. A primeira foi erguida ainda na gesto de Antnio Marrocos, a segunda foi construda pelo Pastor Jaime Mariano. A expanso de trabalhos nas zonas rurais tem sido uma tendncia isolada da Igreja de Parelhas, tendo em vista o crescimento da jurisdio citadina das Igrejas Sede de Caic e Currais Novos, quase que predominantemente em reas urbanas. Sendo assim, a prtica evangelstica nos stios Colonos e Boa Vista, est ainda em seus estgios iniciais. No entanto, os mtodos de difuso da mensagem pentecostal, nestes locais, so os mais tradicionais, como evangelismo pessoal e entrega de folhetos temticos e pregaes pblicas. Pois, o plano de crescimento em comunidades rurais recente, e concluir o xito ou fracasso da territorialidade nestes espaos ainda demanda tempo, de sorte que qualquer anlise imediata sobre as estratgias de evangelismo torna-se imprecisa e antecipada e, portanto, fugiria ao crivo de um julgamento responsvel. Dessa forma, via implantao de pontos de pregao e estabelecimento de congregaes, a AD tem expandido sua Jurisdio Regional e Citadina pelo Serid norte-rio-grandense. Estas estruturas definem o contedo material do territrio da Assembleia de Deus e manifesta sua tessitura nas cidades seridoenses. Assim desvendado, so esses os grandes trunfos territoriais forjados pelos assembleianos para adentrar no cotidiano das comunidades, e, por conseguinte, onde se d o controle dirio dos fiis. Nesse sentido, ressaltando a eficcia das unidades territoriais do catolicismo, Rosendahl (2005) considera que essas favorecem o exerccio da f da identidade religiosa do devoto. Enquanto centros de controle pastoral, o referido autor sugere que, as estruturas catlicas encontram fora no notvel exemplo de organizao da vida social e ntima dos habitantes, pontuando o tempo cotidiano da comunidade (ROSENDAHL, 2005, p. 3). No distante desse cenrio, a territorialidade dos Campos Eclesisticos obtm a mesma resposta, s que em dimenses menores, produzindo o ambiente de f de devoo por meio da Igreja Sede, igrejas filiais, congregaes e pontos de 193
pregao. Pode-se entender que, a abrangncia dos territrios assembleianos no Serid est estritamente relacionada com a aproximao das formas de vida nos locais por onde se props a atuar. At aqui se investigou o corpo exterior do territrio assembleiano, mostrando por assim dizer, o esqueleto e as articulaes de sua organizao espacial. Assim sendo, ser explorado adiante, numa viso essencialmente idealista, a alma e o esprito do seu territrio, ou seja, descortinar o cenrio dos signos das representaes e cdigos que respondem pelo poder invisvel e primeiro desse amplo campo de domnio da Assembleia de Deus.
194
195
4 CONSTRUINDO OS LIMITES SUBJETIVOS DO TERRITRIO: A ASSEMBLIA DE DEUS E SUA DEMARCAO CULTURAL NO SERID 4.1 O PODER PENTECOSTAL COMO
FORA
ESTRUTURANTE
DO
Os aspectos objetivos que hoje normatizam e controlam a nave dos templos das Assembleia de Deus no Serid, foram apriore, antecedidos por uma apropriao subjetiva, regrada num sistema de crenas que prevaleceu e deu significado ao poder institucional do territrio. O conjunto de valores sacros compartilhados nos espaos litrgicos das AD revela a existncia de um controle esttico e comportamental dos fiis, e tem a fora de dissoci-los dos outros sistemas religiosos. A territorializao atravs dos signos e cdigos transcendentais exprime as primeiras formas de apropriao da AD nas cidades seridoenses. O pentecostalismo ortodoxo a definio mais precisa do sistema religioso desenvolvido na Assemblia de Deus, e comporta uma srie de bens msticos, fundamentados nas experincias carismticas. A posse do carisma147 preceitua a autoridade das lideranas. A comunidade assembleiana por sua vez, receptora e difusora dos ritos elaborados pela cpula de pastores dirigentes. As representaes carismticas identificadas nos cultos como (glossollia, interpretao de lnguas, revelaes divinas, arrebatamentos espirituais, exorcismos e oraes por enfermos) exprimem com nitidez a existncia de um domnio espiritual, portanto (i)material, capaz de organizar indivduos imbudos de uma mesma necessidade
transcendental, num e espao e grupo. Ao falar-se em domnio a noo de poder est simultaneamente implcita; o mesmo acontece quando destacamos os limites de alguma prtica no espao, o conceito de territrio logo fica subtendido. Sendo assim, identificamos o poder das lideranas nas Assembleia de Deus condicionado ao atributo indissocivel do universo religioso: O sagrado. desta realidade fenomnica que [...] o poder religioso se manifesta na capacidade de influenciar conscincias e que a extenso dessa influncia psicolgica que um lder
147
Para Weber como se sabe o carisma uma qualidade extraordinria, de carter extracotidiano reconhecida como tal por um grupo social que caracteriza alguns indivduos (profetas, feiticeiros, chefes militares, demagogos) detentores de um carisma pessoal, mas tambm instituies, derivado, derivado a apropriao de um carisma pessoal fundador (proftico), rotinizado (WEBER apud ORO, p.283)
196
exerce sobre um grupo de fiis define o nvel de privilgio e o volume do poder que o mesmo ocupar no interior de uma hierarquia (SOUZA, 2002, p.57). A natureza do poder nas Assembleia de Deus no foge lgica do sagrado enquanto elemento inerente ao fenmeno religioso. O domnio abstrado dessa fora atraente, onde seus portadores se valem da autoridade nela encontrada, para se dirigir [...] s pessoas como representantes de um poder sobrenatural que no admite ser questionado e requer incondicional (WEBER apud SOUZA, p.57). O poder assim concebido, tendncia formao de lideranas hegemnicas, que na maioria das vezes monopolizam as esferas do comando institucional. O reconhecimento do poder no sagrado, passa pela concepo intersubjetiva do sujeito religioso seja na identificao de virtudes sacras do outro, ou no simples consentimento de uma submisso necessria vida religiosa. A crena no sobrenatural antecede sujeio ao sagrado. Todo sistema religioso depende de uma atitude crdula para ser legitimado. Aqui faz-se referncia ao cenrio da f religiosa (imaginrio cristo), mecanismo que faz existir os elementos msticos mediante as possibilidades de devoo ao sagrado. O conhecimento metafsico do poder religioso reitera a premissa de que, sua essncia advm do inacessvel, do plano superior da espiritualidade e das revelaes divinas que se apresentam como sistemas de comunicao entre o finito e o infinito. A sacralidade que envolve a essncia do poder religioso poderia em sua acepo se desvanecer com a prpria dificuldade de apreciao do fenmeno religioso, no fossem as bases dos estudos sociais de mile Durkheim. Ao focar seus estudos sobre o fato religioso Durkheim (1996) descreve a oposio recorrente entre f e razo nas idias de alguns pensadores, de que, a religio seria um fato misterioso, incognoscvel que fugia ao entendimento pleno dos mtodos racionais de apreenso da realidade,
[...] seria, assim, uma espcie de especulao sobretudo aquilo que escapa cincia e, mais geralmente, ao pensamento distinto. As religies, [...] diametralmente opostas por seus dogmas, esto de acordo para reconhecer tacitamente que o mundo, com tudo o que contm e com tudo o que o cerca, mistrio que pede explicao; portanto ele faz consistir essencialmente em uma crena na onipotncia de alguma coisa que supera a inteligncia (DURKHEIM, 1996, p.45-55).
No entanto o desafio pregado pelo positivismo no significou para Durkhein que, o fenmeno religioso no pudesse ser passvel de uma anlise objetiva, ou de 197
v-lo em sua realidade imediata. Ao mencionar a contribuio da Filosofia no estudo acerca da essncia das religies, concentra sua crtica na forma de como o tema foi tratado: infelizmente, o mtodo que ordinariamente empregam para resolv-lo puramente dialtico: limitam-se a idia que tm da religio, ainda que devam ilustrar os resultados dessa anlise mental com exemplos tomados das religies que mais bem realizam seu ideal (DURKHEIM, 1996, p.32). A crtica de Durkheim aliava-se ao o pensamento inovador de sua proposta, que era a de olhar os elementos constitutivos da religio como fatores que, num momento, converge-se para uma mesma natureza elementar. Sua concepo ultrapassava a anlise pura e simplesmente das caractersticas exteriores e visveis da religio. Considerava importante entender o que de comum pode ser apreensvel toda variedade existente de rituais religiosos,
Na base de todos os sistemas de crenas e de todos os cultos deve, necessariamente, haver certo nmero de representaes fundamentais e de atitudes rituais que, apesar de da diversidade das formas que uma e outras puderam assumir, apresentem, por toda parte, o mesmo significado objetivo e tambm, por toda parte, exercem as mesmas funes. So esses elementos pertencentes que constituem o que existe de eterno e de humano na religio; formam todo contedo objetivo da idia que se exprime quando se fala da religio em geral (DURKHEIM, 1996, p.33).
Nesta perspectiva analtica, o Sagrado indentifca-se como elemento comum, e inseparvel de toda prtica religiosa, e mais objetivamente do fenmeno pentecostal. Nos estudos sobre as modalidades da experincia religiosa, Rodolf Otto esclarece o verdadeiro sentimento que envolve o sujeito religioso [...] encontra o sentimento de pavor diante do sagrado, diante deste mysterium tremendum, diante desta majestas que exala uma superioridade esmagadora de poder; encontra o temor religioso diante do mysterium fascinans, onde se expande a perfeita plenitude ser [...] (ELIADE, 2002, p.24). Esse sentimento que emana da experincia com o sagrado reconhecido por Otto como numinoso148, que em si, no passvel de uma preciso conceitual, porm o que o torna operacional e possvel de entend-lo o que dele resultante. Para Gil Filho, entender o sagrado enquanto categoria necessrio submeter o sentimento religioso ao plano fenomnico, e desta forma transpor o sagrado de sua
148
Conforme afirma Gil Filho (2001, p.46) o cerne da experincia religiosa que no acessvel apreenso, porm seus efeitos de carter emocional so reconhecveis.
198
dimenso no-racional para uma racional, firmando que, todavia, no plano fenomnico ele se apresenta em uma diversidade de relaes que nos possibilita estud-lo escala das cincias humanas (GIL FILHO, 2002, p. 257). Para qualificar e reconhecer o sagrado em sua expresso concreta, o autor apresenta instncias analticas possveis. Dentre elas, a que considera o sagrado pelos seus predicados e reconhece a sua lgica simblica, nos possibilita compreender a materialidade do fenmeno religioso em sua exteriorizao. Esta base analtica do sagrado concluda por Gil Filho (2002, p.257) em sua forma mais emblemtica [...] sendo assim o entendemos enquanto sistema simblico e projeo cultural. Objetivando o sagrado em seus predicativos essenciais inscritos pela lgica simblica que dele se projeta, pode-se analisar a implicao desses no sujeito religioso, como sendo um dispositivo de dominao e estruturao do territrio. Seria um retorno ao o que Bourdieu (2001, p.9) chamou de poder simblico, um poder de construo da realidade que e tende a estabelecer uma ordem gnoseolgica o sentido imediato do mundo [...] quer dizer, uma concepo homognea do tempo, do espao, do nmero, da causa, que torna possvel a concordncia entre as inteligncias. Interessa religio enquanto instituio integrante da macro estrutura de smbolos que agenciam a ordem social, tirar proveito desses mecanismos de controle, para promover seus sistemas doutrinrios pois [...] a religio contribui para a imposio (dissimulada) dos princpios de estruturao da percepo e do pensamento do mundo e, em particular, do mundo social [...] na medida em que impe um sistema de prticas e de representaes cuja estrutura objetivamente fundada em um princpio de diviso poltica apresenta-se como estrutura natural sobrenatural do cosmos (BOURDIEU, 1992, p.33-34). O sagrado encontra nos sistemas simblicos, um meio de perpetuar-se e reproduzir seu poder [...] poder invisvel o qual s pode ser exercido com a cumplicidade daqueles que no querem saber que lhe esto sujeitos ou mesmo que o exercem (BOURDIEU, 2001, p. 8). A cognio do poder nestas circunstncias cria as condies favorveis para a formao de um campo de representaes simblicas que, com efeito, impera nas atitudes do sujeito religioso. O poder que faremos aluso trata-se de um domnio especfico do sagrado, aprimorado historicamente em rituais avivalsticos e (re)significado ao contexto 199
regional: o poder pentecostal. Esse sistema de crena no Brasil e mais em exclusivamente no Serid, foi implantado pela Assemblia de Deus, que enriqueceu o seu corpo de significados msticos conferindo-lhe autenticidade ante o pluralismo religioso. O poder pentecostal traduzido in loco na forma de culto e pelos paradigmas doutrinrios das Assembleia de Deus. A base conceitual desse sistema religioso referencia-se nos trechos que fazem aluso ao dia de Pentecostes, descritos no livro dos Atos dos Apstolos verso 2. O texto bblico descreve a efuso do Esprito Santo na festa da colheita do trigo em Jerusalm, acontecimento este que marcou o fenmeno da interpretao misteriosa de vrios idiomas por aqueles que participavam desse evento cosmopolita: (...) Ora, estavam habitando em Jerusalm judeus, homens piedosos de todas as naes (...) porquanto cada um dos ouvia falar na sua prpria lngua (...). O mencionado evento representa para os doutrinadores pentecostais uma das evidncias de que o Esprito Santo confere contemporaneamente aos crentes, uma variedade de Dons Espirituais, entre eles, o dom da palavra de sabedoria, conhecimento, da f, curas, operaes de milagres, profecia, discernimento de Espritos, variedades de lnguas e etc. O sistema simblico das Assembleia de Deus caracteriza-se como uma verso ortodoxa (tradicional) do pentecostalismo, construdo na valorizao dos dons espirituais como virtudes essenciais a serem alcanadas pelos fiis. Dentre eles, destaca-se o Dom Espiritual de falar em outras lnguas, atravs do batismo com o Esprito Santo e com Fogo149. Na Assemblia de Deus, historicamente se tornou convencional a supervalorizao da (glossollia); fenmeno demonstrado no falar em outras lnguas, tido como de origem divina reproduzida em cadeia sonora, sem significado sistemtico que permitia a inteligibilidade, considerada como estranhas aos ouvintes. O sagrado pentecostal revela-se na dinmica dos Dons Espirituais nas liturgias fervorosas das Assembleia de Deus. Ao individuo portador do Dom Espiritual, atribui-se uma autoridade sobrenatural; este mensageiro do sagrado movido por sua resoluta convico de ser algum vocacionado a realizar coisas
149
Essa prtica ritualstica considerada como cerne do culto pentecostal, segundo os telogos pentecostais, tem sua fundamentao bblica no texto do Evangelho de Mateus cap.3 vers. 11 E eu, em verdade, vos batizo com gua, para o arrependimento; mas aquele que vem aps mim mais poderoso do que eu; cujas alparcas no sou digno de levar; ele vos batizar com o Esprito Santo, e com fogo
200
grandiosas para Deus, pois acredita que dentro de si h um poder esperando para ser liberado (SOUZA, 2004, p.27). Os Dons Espirituais possuem uma utilidade funcional para os fiis; servem para atender as adversidades do cotidiano. Conforme a dinmica do evento, os Dons Espirituais emite uma espcie de fora sobrenatural, acionada quando a f posta em primeira instncia, capaz de produzir no indivduo o nimo necessrio para superar os obstculos humanamente intransponveis. Nesse momento o poder pentecostal reconhecido como tal e entendido no plano representativo (simblico), como a atuao inequvoca do Esprito Santo na nave da Assemblia de Deus. A hierofania pentecostal concebida pelo exerccio dos dons espirituais [...] como uma realidade de ordem inteiramente diferente da das realidades naturais (ELIADE, 2002, p.24). A operao dos Dons Espirituais no espao do templo do fiel a reverncia no recinto, pois algo de sagrado se nos mostra. nessa noo de sagrado que segundo Souza (2004, p. 26) responde pelo desenho do fiel pentecostal na vida eclesistica e no meio da sociedade ampla. O poder do sagrado ultrapassa os domnios da experincia religiosa, para formar uma tica social que modela o sujeito em meio ao espao profano. Seria o que Souza (2004) denominou de tica Pentecostal, a continuidade da experincia do sagrado na vida secular, que demonstra a influncia do poder pentecostal para alm da vida religiosa. A conduta do indivduo pentecostal na sociedade regida por fundamentos que refletem uma concepo de mundo baseada em trs aspectos: a noo de sagrado, a concepo da atividade de Deus e a concepo do sentido da vida (SOUZA, 2004, p.26). Se tratando do pentecostalismo ortodoxo, essa tica se desdobra mais numa postura asctica diante dos modismos sociais e comportamentos mundanos (profanos) e na aplicabilidade de um evangelismo intencionado a efetuar uma mudana na percepo de mundo do sujeito, do que necessariamente na utilizao desse espectro de valores para fins de asceno social como no
neopentecostalismo. Podemos assim falar de um poder pentecostal, como uma hierofania peculiar do sagrado, que rege a comunidade de fiis das Assembleia de Deus, nos moldes de representaes que, decodificadas viabilizam o reconhecimento do espao apropriado, da uniformidade existente nos limites da f pentecostal.
201
Os territrios em sentido lato so produzidos conforme Saquet (2010, p.126) espao-temporalmente pelo exerccio do poder por determinado grupo ou classe social, ou seja, pelas territorialidades cotidianas. Em Haesbaert (2007) observa-se o reconhecimento do territrio pelos seus referenciais imateriais o territrio considerado como um signo, cujo significado somente compreensvel a partir dos cdigos culturais a qual se inscreve (HAESBAERT, 2007, p.69). A apropriao subjetiva do espao uma abordagem que reivindica o reconhecimento da dimenso oculta dessa apropriao, baseada nos valores no apenas materiais, mais tambm ticos, espirituais, simblicos e afetivos (BONNEMASION; CAMBRZY apud HAESBAERT, 2007, p.72). J em Raffestin (1993, p.153) o territrio implica simultaneamente no conceito de limite que mesmo no sendo traado, como em geral ocorre, exprime a relao que um grupo mantm com uma poro do espao. Destas idias fundamenta-se o territrio cultural, que engloba uma variedade de estudos relacionados aos fenmenos culturais, que promovem delimitao do espao atravs da valorizao simblica. A concretude das fronteiras convencionais do territrio aqui d lugar a uma demarcao ideolgica, fundamentada no valor atribudo aos smbolos msticos que referenciam os contornos da prtica territorializante. A noo de sagrado mais uma vez recorrida para elucidar a configurao desses limites intangveis. No tocante ao domnio produzido pela sacralizao do lugar Eliade (2002, p.40) ressalta que todo espao sagrado implica uma hierofania150, uma irrupo do sagrado que tm por resultado o destacar um territrio do meio csmico envolvente e o torn-lo qualitativamente diferente. Eliade fornece-nos uma forma peculiar de reconhecimento dos limites do territrio religioso, sendo que essa identificao somente possvel pela manifestao irredutvel do sagrado no espao. Assim, nosso entendimento de ser guiado pelos permetros do territrio em sua dimenso e escala representativa ou simblica. Considerando assim, o espao religioso
150
Sobre o a hierofania este termo no implica qualquer preciso suplementar: exprime apenas o que est implicado no seu contedo epistemolgico, a saber, que algo de sagrado se nos mostra (ELIADE 2002, p.25).
202
encontra-se apropriado pelo domnio do sagrado em suas formas mais distintas e elementares. Ao enfatizar a dimenso transcendente que delimita o espao religioso necessrio reconhecer os efeitos da carga simblica, e seu poder estruturante, que indicam os aspectos mais ntidos de seus limites. Os significados contidos nos smbolos acionam a cognio do sujeito para distinguir entre o espao apropriado pelas representaes e suas adjacncias. Os limites no se investem de formas aparentes nem de geometrias visveis, a linha que demarca o espao sagrado, via de regra se d na percepo do coercvel, da singularidade, do enigmtico que envolve o lugar. A mensagem emitida ao cognitivo do indivduo, pelas representaes, per se, circunscrevem o espao tornando-o singular e distinto dos demais o territrio refora uma dimenso enquanto representao, valor simblico [...] por isso, o territrio primeiro um valor, pois a existncia, e mesmo a necessidade para toda a sociedade humana de estabelecer uma relao forte, ou mesmo uma relao espiritual com seu espao de vida, parece claramente estabelecida (HAESBAERT, 2007, p.71). A atitude de estranhamento no lugar ou de reconhecimento meu lugar, determina os limites da interao do sujeito com o espao balizado pelos signos, isso o leva a distinguir o territrio pelas vias de identificao, onde a distino mais precisa dos limites territoriais o sentimento de pertena. Os rituais religiosos conseguem expressar de forma categrica como os limites de um territrio podem ser configurados a partir das significaes simblicas. Trazendo a tona anlise do sagrado no plano fenomnico apresentado por GIL Filho (2002, p.257) possvel visualizar os limites considerando as seguintes proposies,
(i)A primeira refere-se a sua materialidade fenomnica a qual apreendida atravs dos nossos instrumentos preceptivos imediatos. Refere-se a exterioridade do sagrado e sua concretude. (ii)A segunda a apreenso conceitual atravs da razo pela qual concebemos o sagrado pelos seus predicados e reconhecemos a sua lgica simblica. Sendo assim, o entendemos enquanto sistema simblico e projeo cultural. Trata-se de uma possibilidade muito presente na anlise filosfica e antropolgica
Baseado nas possibilidades analticas acerca das relaes com o sagrado possvel induzir ao entendimento do fato concreto, ilustrando atravs de um fato 203
hipottico como os smbolos podem ajudar na visualizao dos limites de um territrio (i)material. Imaginemos um evento ecumnico, onde vrios segmentos do sagrado como, Mulumanos, Judeus, Catlicos e Pentecostais, estivessem fora de suas Mesquitas, Sinagogas, Parquias e Templos (exterioridade do sagrado e sua concretude) estivessem reunidos num grandioso estdio, vestidos de uma mesma tnica, impossibilitando de imediato distino da crena de cada grupo. Nesta situao, como reconhecer os grupos religiosos e diferenci-los em seus respectivos sistemas de crenas? Poder-se-ia ento propor outro fato hipottico para decidir a questo: Concebemos ento que, na mesma circunstncia houvesse um momento de splica coletiva, em que fosse permitido aos grupos de cada segmento religioso, erguer sua orao utilizando-se de seus prprios sistemas simblicos, ento veramos: uns encurvados sobre um pequeno tapete e voltados para o Leste em direo Meca, outros colocando sobre a cabea um pequeno chapu em forma de circunferncia (Quip), alguns estariam projetando uma cruz entre os ombros e a fronte, na medida em que outros estariam orando em lnguas estranhas glossolalia. Neste aspecto constata-se que, a sacralidade um substantivo de globalizao (DUPRONT apud ROSENDAHL, 2001, p.21). No entanto cada um dos grupos religiosos obedece a regras que os permite reconhecer em seus predicativos sacros. Assim sendo, os cdigos so os referenciais mais elucidativos, pois,
a partir deste quadro referencial, podemos deduzir que as formas e os contedos relativos ao sagrado podem ser considerados como fonte de conhecimento do modo como se apresentam conscincia, restrito aos limites de como se manifestam [...] intumos que o sagrado no est apenas na percepo imediata das formas e do seu contedo, mas tambm nos atos que suscitam a conscincia, sendo possvel admitirmos que se crie uma determinada expresso do sagrado no mbito do pensamento (GIL FILHO, 2005, p. 53).
Os smbolos so portadores de significao e encerram a homogeneidade do espao ecumnico transformando noutro totalmente segmentado e repleto de linhas divisrias. Os instrumentos perceptivos de cada sujeito religioso podem assim constatar, a existncia de espaos apropriados por sistemas simblicos. Todo territrio implica numa territorialidade e vice-versa. Desse modo, convm ao raciocnio do territrio (i)material notabilizar as implicaes da 204
territorialidade numa abordagem tambm idealista. Primeiramente entendemos a territorialidade como a regncia do poder (valores) dos signos que circundam no espao, e este por sua vez, sobre os indivduos regidos pela sua influncia. A territorialidade ao mesmo tempo processo e resultado da produo do territrio, e sempre apresenta artifcios diferenciados que determinam sua tessitura. Pode-se assim entender que h neste sentido, vrias territorialidades que constroem uma multiplicidade de territrios, dos quais podemos cotidianamente vivenciar na escala das multiterritorialidades151. Identifica-se a no materialidade do territrio pela fora restritiva que o contedo ideolgico exerce nos grupos religiosos atravs dos signos. Assim (i)materialidade do territrio reconhecida pelas significaes conferidas objetos sacros. Esses sistemas de valores respondem pela manuteno do poder eclesistico mediante a [...] percepo das limitaes imperativas do controle e gesto de determinados espaos sagrados por parte de uma instituio religiosa (GIL FILHO, 2003.p 96). A territorialidade na perspectiva de Gil Filho (2003) apresenta-nos o discernimento apropriado para aferir o poder do sagrado como um domnio estruturante de um grupo religioso. O poder do sagrado transparece os limites ideolgicos do territrio, portando um lineamento (i)material, que d sentido e forma as estratgias utilizadas para o controle dos fiis em seus espaos de atuao. Os valores atribudos aos sistemas simblicos permitem o reconhecimento dos limites do territrio, limites estes imperceptveis quando se quer consider-los em formas puramente materiais. Por isso que, os smbolos so referenciais (cdigos), e no os limites em si. A delimitao do terririo (i)material acontece no campo das ideias, na crena irredutvel no sagrado e portanto no subjetivo do sujeito religioso, quando o mesmo identifica o valor smblico do espao. A territorialidade no territrio (i)material assume qualificaes inatas ao carter prprio desse espao de limites intangveis. Neste aspecto a gesto dos valores contidos nos referenciais sacros que elucida essa assertiva. Na medida em os sacerdotes organizam esses referenciais simblicos na nave do templo para fins
151
Perspectiva de anlise do territrio em Haesbaert (2007) que enfatiza o reconhecimento de mltiplas territorializaes, produto da sobreposio e/ou da combinao particular de controles, funes e simbolizaes, exemplificados nos territrios pessoais de alguns indivduos ou grupos mais globalizados capazes de vivenciar cosmopolitismo dos mltiplos territrios nas grandes metrlopes. A multiterritorialidade (ou multiterritorializao) seria ento a [...] sobreposio ou a imbricao entre mltiplos tipos territoriais (o que inclui territrios-zona e territrios-rede), mas tambm de sua experimentao/reconstruo de forma singular pelo indivduo, grupo social ou instituio (HAESBAERT, 2007, p.343)
205
ritualsticos, esto necessariamente delimitando a sacralidade de cada rea, da podemos reconhecer a invisibilidade das estratgias territoriais, ou seja, sua territorialidade imaterial. A conduta reverencial e a aes de cada fiel sero
balizadas no espao sacro mediante a disposio e arranjo desses referenciais sacros. Seguindo esse pensamento Saquet analisa as ideias de Raffestin e conclui que ele numa compreenso tambm semiolgica, reconhece aspectos das funes [...] do sagrado e do profano [...] a territorialidade compreendida como relaciona e dinmica, variando no tempo e no espao, como um carter (i)material ligado aos trs mundos: do real, das sensaes e da representao (SAQUET, 2010, p.77). Para alm da identificao do poder religioso objetivado na concretude dos templos religiosos, verificamos como as estratgia para unificao do grupo foi desenvolvida por meio de um territrio e uma territorialidade imaterial, e como elas serviram ao controle ideolgico das Assembleia de Deus no Serid norte-riograndense. Os territrios das Assembleia de Deus podem ser caracterizados pela sua dominao poltica e apropriao simblica. Ao conhecer esse territrio invisvel e suas implicaes na gesto eclesistica, o esforo analtico aqui, empenha-se em entend-lo sob a interao de mltiplas dimenses [...] atravs das relaes conjuntas de dominao e apropriao, ou seja, de relaes de poder em sentido amplo (HAESBAERT, 2007, p. 340). Isso equivale observar, como o poder dos smbolos colaboram para no poder poltico eclesistico vigente nas Assembleia de Deus. A ambivalncia dimensional de seu poder direcionada para a comunidade assembleiana como um campo de domnio imaterial integrado para manter a coeso da materialidade territorial. Perceber o territrio imaterial das Assembleia de Deus decodificar as representaes simblicas do pentecostalismo. Os valores contidos nos smbolos transmitem todo poder transcendental para a comunidade assembleiana. Os Dons Espirituais para o fiel pentecostal revestem-se de significados e apresentam-se como referenciais subjetivos do territrio pentecostal. Somente atravs da identificao dos imperativos doutrinros relacionados aos Dons Espirituais possvel reconhecer do territrio pentecostal em seus limites imateriais na nave de cada templo. Os dons de profecia e variedades de lnguas (Batismo do Esprito Santo) sobressaem entre os demais, com os referenciais mais contundentes de que se est diante do territrio pentecostal. Essas experincias msticas evidenciam o territrio 206
sagrado do pentecostalismo, porquanto a hierofania (manifestao do sagrado) est sendo vivenciada e ao mesmo tempo reverenciada pelos fiis. A manifestao do sagrado nas Assembleia de Deus transcorre-se num cenrio dinmico e carregamento de contedo emocional. Descrevendo a experincia transcendental do pentecostalismo Souza (2004 p.38) reitera,
trata-se de uma iniciao nos ministrios da graa divina traduzidos pela experincia denominada de batismo do Esprito Santo, mediante a qual as pessoas experimentam o xtase e participam do mundo sobrenatural
O poder mstico experienciado nas Assembleia de Deus permanece atrelado aos ministrios espirituais152 que fundamentam toda sua prtica litrgica e ritualstica. Alm de uma experincia mstica, o batismo do Esprito Santo como o falar em Lnguas Estranhas (glossolalia). Os dons de Cura e Milagres apresentamse como [...] a porta de acesso para o mundo pentecostal [...] distingue o pentecostalismo das demais confisses crists [...] marca a entrada dos indivduos no universo pentecostal (SOUZA, 2004, p.38). A operao desses dons nos procedimentos litrgicos da Assemblia de Deus sinaliza os adornos limtrofes do seu territrio imaterial. Para o indivduo pentecostal a atmosfera extraordinria proporcionada pela execuo dos Dons Espirituais, apresenta-se em sua conscincia como a shekinan de Deus153, fogo purificador, revestimento de poder, afugentamento do mal, libertao de doenas e opresses psicolgicas etc. O sentimento numinoso deste modo, despertado no indivduo pentecostal, fazendo-o reconhecer que est em territrio sagrado. Essa constatao desencadeia uma srie de atitudes de devoo e sujeio aos comandos dos portadores desses dons. lcito ento afirmar que, o conjunto de significados atribudos aos dons espirituais funciona ao comando das autoridades eclesisticas nas Assembleia de Deus, como dispositivos de controle. Os meandros do poder institucional aportam-se na valorizao da natureza sacra residente nos dons espirituais, para estabelecer
152
Os ministrios espirituais nas Assembleia de Deus consistem no desenvolvimento e no aperfeioamento dos Dons do Esprito, podem ser: o dom de profecia, lnguas, interpretao de lnguas, entre outros. 153 Transliterao da raiz hebraica shkn (habitar) utilizados pelos Rabinos do judasmo ortodoxo. Esse termo refere-se glria visvel de Deus habitando no meio de seu povo. usualmente empregado pelos evanglicos para designar a presena radiante de Deus, como a que vista numa coluna de fogo Monte Sinai, no Propiciatrio entre os querubins no Tabernculo do Templo entre outros eventos.
207
difundido e creditado que, em nenhuma postura deliberada contra os usos e costumes pode haver manifestao do sagrado e, por conseguinte, validade perante a hierocracia assembleiana. Entre os dons espirituais, a glossolalia (o falar em lnguas estranhas), alcanada atravs da experincia mistica do batismo com o Esprito Santo, apresentou-se como o mais apreciado atributo espiritual nas Assembleia de Deus. A experincia do sagrado pentecostal de fato, uma espcie de introduo aos ministrios eclesisticos das Assembleia de Deus. Sem a qual, o fiel assembleiano estar limitado ao corpo de liderados, impossibilitado de ascender na hierarquia de obreiros, condio esta prescrita no Estatuto da IEADERN154. Entende-se com isso, que o recebimento do batismo com o Esprito Santo considerado pelos pastores das Assembleia um atributo fundamental de santidade, sendo este o maior sinal que os membros e obreiros podem oferecer, como forma de obedincia e aceitao ao sistema de crena das Assemblia de Deus. Torna-se claro que, as relaes de poder no campo eclesistico das Assembleia de Deus esto fortemente atreladas a esse predicativo mstico, que fortalece as estruturas subjetivas de seu territrio. nesta estratgia que a territorialidade imaterial das Assembleia de Deus assegura o consenso ideolgico de sua liderana, elemento tambm importante para a coeso do territrio poltico. A consonncia ideolgica evita dissenses doutrinrias, que podem causar a diviso entre lideranas e a conseqente quebra da unidade territorial. O territrio imaterial como espao circunscrito por valores msticos, e sua territorialidade, entendida como a regncia dos valores espirituais, vital para manuteno e integrao do poder eclesistico, mantendo essa doutrina como distintivo de sua autoridade ante o pluralismo religioso. O territrio pentecostal das Assembleias de Deus no perodo de sua fundao no Serid/RN, tinha seus contornos reconhecveis e apenas pelos valores espirituais que perfaziam as praticas territorializantes no espao citadino, a inexistncia de um governo poltico- administrativo eclesistico formal no perodo de sua fundao ilustra essa afirmao.
154
O Captulo V trata da Comisso de Ingresso de Obreiros, respectivamente nas sees I, II, III e IV onde apresenta o Item II O batismo com o Esprito Santo, como condio aos cargos de Pastores, Evangelistas, Presbteros e Diconos.
208
As primeiras reunies de pessoas de f pentecostal na regio Serid iniciase na dcada de 1940, com os Grupos Familiares, bem como pequenas unidades pentecostais que no representavam a Assembleia de Deus, enquanto instituio reconhecidamente organizada num corpo poltico eclesistica formal mas
unicamente pela adoo e valorizao do seu sistema de crena enquanto doutrina essencial, constitua-se ento de um territrio de delimitaes imateriais, de cunho ideolgico, e no propriamente jurdica. Em Currais Novos de 1942 1953 as representaes carismticas dos Dons Espirituais difundidas pelos pioneiros nos grupos familiares, resguardavam-se nos limites de um territrio subjetivo, uma vez que estes no se valiam de estruturas concretas de um domnio poltico eclesistico, mas de liturgias informais concebidas dentro de uma atmosfera de cdigos e smbolos pentecostais. O espao sob o domnio semntico dos dispositivos espirituais conferida pelos dons espirituais, balizavam toda as dimenses do ambiente e referenciavam seus limites. Na cidade de Caic a delimitao primeira de um territrio simblico antecipou expressividade visual dos templos assembleianos. Uma cartografia de representaes desenhada na cidade. Em 1946, o grupo familiar formado na residncia do senhor Joo Joaquim demonstrou que, o movimento pentecostal delimitara a princpio o espao minsculo de adorao, caracterizado como um foco do avivamento nestas plagas. Mesmo instvel, considerando assim sua fixabilidade no espao, o territrio simblico da Assemblia de Deus neste perodo, conservou a aliana entre dos primeiros adeptos, mesmo na transitoriedade locacional do pontode-pregrao155. As narrativas orais testificam que, o governo eclesistico estruturado nas gestes de templos e congregaes, sobreveio aps quase vinte anos especificamente na dcada de 1950. Antes disso, o sistema simblico, era apregoado em sermes simples de homens leigos na teologia, entretanto experientes e hbeis quanto ao exerccio funes eclesisticas. Desta forma manteve-se o domnio e a preservao dos limites do territrio imaterial neste tempo, contribuindo definitivamente para a no disperso do rebanho. A constituio de um campo de representaes do sagrado pentecostal na cidade de Parelhas se deu em 1963 atravs de fiis da Assemblia de Deus de Currais Novos. A durao do governo baseado exclusivamente no reconhecimento e submisso dos valores morais e das regras extrados do sistema simblico
155
Sem templo prprio o trabalho de Caic em 1940 localizou-se em diferentes ruas como Generina Vale, Quintino Boaiva e Joel Damasceno, permanecendo definitivamente nesta ltima.
209
pentecostal, foi relativamente curta, se comparado aos casos das cidades de Caic e Currais Novos. Nestas cidades, quando se estabeleceu o trabalho de Parelhas j possuam uma hierarquia eclesistica; relaes de poder de um territrio poltico em formao. Os fiis parelhenses estiveram por pouco tempo orientados apenas pelas significaes do sagrado pentecostal. Em 1965 aps a inaugurao do primeiro templo, foi instituda uma liderana interina para guiar de forma mais sistemtica as liturgias da igreja e a evangelizao citadina. H, porm, um momento em que a materialidade do territrio sucede assim ao domnio que outrora era constitudo somente pelos valores espirituais, porm jamais o anula, ao contrrio, o complementa como uma espcie de interposio de escalas de domnio, que fortalece a estrutura de um territrio que hbrido em suas dimenses de poder. A ambivalncia do territrio aqui defendida uma forma de introduzir outra anlise que buscar entender como se processou a informao dos cdigos durante os primeiros anos de evangelismo at os tempos mais recentes. A visualizao do territrio em duas escalas tem o objetivo de redimensionar o olhar geogrfico para compreender os smbolos como uma apropriao ideologia e os suportes materiais e burocrticos do espao como via de ampliao dessa poltica cultural.
4.3 TRANSMISSO DOS CDIGOS E A SEMNTICA DO TERRITRIO ASSEMBLEIANO A produo territorial em sua totalidade depende da informao, e o xito desta, resguarda-se na eficincia dos dispositivos que mediam sua transmiso no tempo e no espao. Em sua anlise Claude Raffestin (1993, p.153) declarou que todos ns combinamos energia e informao, que estruturamos com cdigo em funo de certos objetivos [...] ns elaboramos estratgias de produo, que se chocam com outras estratgias em diversas relaes de poder. O autor deixa claro que o domnio espacial articulado necessariamente pela informao que, viabiliza o exerccio do poder e o perpetua nos interstcios do tempo. A decodificao dos sistemas smicos do territrio aparece como um desafio aos gegrafos culturais que objetivam entender como a linguagem do poder, produz um espao restritamente controlado por sentidos e valores. luz 210
desta questo posto que, sem linguagem no h leitura possvel, no h interpretao e, portanto, nenhum conhecimento sobre a prtica que produziu o territrio (RAFFESTIN, 1993, p.153). Insistir-se-, na importncia que os cdigos tiveram e permanecem tendo para a manunteno do territrio (i)material das Assembleias de Deus. A reproduo do poder necessitou de um sistema smico prprio, para que seu domnio no viesse a se desvanecer ante outras prticas religiosas. Embora seja o maior movimento pentecostal do Brasil, a Assembleia de Deus e sua liderana, no se deram ao empenho de construir uma sistematizao teolgica formal de suas convices espirituais. Talvez seja esta, a grande dificuldade conceitual do pentecostalismo de no existir uma reflexo teolgica que defina a epistemologia teolgica de seu sistema de crena. Na liturgia assembleiana, na maioria das vezes, a experincia emocional com o sagrado sempre supera a racionalidade do evento, pois segundo a expresso corriqueria entre os fiis Tudo mistrio de Deus. Desta maneira, a Assembleia de Deus evoluiu nas regies brasileiras, restringindo-se de uma aplicar um filosofia teolgica mais elucidativa as suas doutrinas e liturgias. Sobre a teologia pentecostal, no se encontrou um corpo coerente e sistematizado de pensamentos disposio dos assembleianos, isso condicionou o ensinamento espiritual dos fiis discipulados simples e prticos isso porque havia a preferncia por ensinamentos pragmticos quanto aos aspectos da vida crist, prevalecendo sobre tudo experincia prtica na experimentao dos carismas. O que se conclui que na AD h apenas referncias para estudos
teolgicos, como as obras lanadas por telogos escandinavos e norte-americanos, e no um sistema teolgico e filosfico que versem sobre a natureza do pentecostalismo. Pode-se falar assim, da influncia de dois estilos, mas apenas de uma corrente teolgica predominante, conhecida como dispensacionalismo156.
156
Popularizado nos Estados Unidos pelos comentrios de John Darby atravs da Bblia de Referncia Scofield, tem sido defendido por instituies de estudos teolgicos, como o Mooy Bible Institute e o Dallas Theological Seminary. O dispensacionaismo um esquema de interpretativo enxertado no corpo tradicional da doutrina crist. No fazia parte s principais tradies teolgicas do cristianismo reformado e do Wesleyano, embora muitos de seus defensores baseiem suas orientaes gerais nestas tradies. No obstante, o sistema dispensacional exerce uma forte influncia na igreja americana e muito difundido. A interpretao do dispensacionalismo varia, mas sua hiptese bsica que Deus lida com raa humana em dispensaes sucessivas. (do gr. oikonomina) um perodo de tempo durante o qual o homem testado quanto sua obedincia e a alguma revelao especfica da vontade de Deus. Cada dispensao tem seu incio, seu teste, e seu trmino em julgamento, de acordo com o contnuo fracasso da humanidade. A maioria dos intrpretes dispensacionalistas identifica sete dispensaes: da Inocncia, da Conscincia, do Governo Civil, da Promessa, da Lei, da Graa e do Reino. Alm disso, o dispensacionalismo faz
211
Entretanto, o contato com a escola dispensacionalista deste a sua popularizao no ano de 1950, ficou cingido a um nmero reservado de pastores assembleianos basicamente no Sudeste do pas, no gerando expressividade entre os pastores do nordeste. Por muito tempo nas Assembleia de Deus do RN, o ensinamento bblico e o a incipiente teologia empregada nestes discipulados, eram desenvolvidos
informalmente nas escolas bblicas dominicais. Hoje as igrejas da regio metropolitana do Natal contam com um centro de formao teolgica a Escola Teolgica das Assembleia de Deus do Brasil ESTEADEB157, a princpio idealizada em 1977 com o nome de Escola Bblica Permanente na reunio de pastores do Nordeste, sediada pela Igreja Sede em Natal na gesto pastoral de Joo Batista da Silva (1960 1993). Em 1970, foram dados os primeiros passos para a incorporao de uma teologia formal nas Assembleia de Deus no RN, porm a abrangncia desta proposta ainda permanece limitada, atingido uma quantidade pequena de pastores. No Serid, os membros da AD no dispem de um instituto que proporcione o estudo formal da Teologia. A linha teolgica e doutrinria da AD ensinada informalmente nos templos desde 1960 pelo sistema de escolas bblicas dominicais atravs das Lies Bblicas158 da CPAD, que de forma transversal adicionam conhecimentos teolgicos aos vrios temas relacionados vida crist. As experincias prticas com o universo mstico pentecostal, sempre tiveram mais relevncia na definio do territrio assembleiano do os ensinamentos teolgicos. Quando comparadas igrejas tradicionais como a Presbiteriana do Brasil, observa-se exatamente o contrrio, seu territrio reconhecido mais pelos aspectos da teologia calvinista, do que atravs de seus rituais msticos.
uma ntida distino entre Israel e a Igreja, que representam essencialmente dois povos de Deus (ARAJO, 2008, p.611).
157
fruto de um projeto denominado Escola Bblica Permanente iniciado pelos pastores do Nordeste como Rio Grande do Norte, Sergipe, Lagoas, Paraba, Pernambuco, Alagoas e So Paulo em 1977 na Assemblia de Deus em Natal (RN). A finalidade era melhorar os conhecimentos teolgicos dos obreiros da regio. Aps as reunies de 1978 e 1980 ficou definido o apoio das igrejas do Nordeste e de So Paulo e o nome da instituio como Escola Teolgica das Assembleia de Deus no Nordeste ESTEADENE. Em abril de 1981 a ESTEADENE passou a integrar e receber o apoio de ministrios assembleianos de Minas Gerias e So Paulo, quando mesmo ano passou a ser conhecida como Escola Teolgica das Assembleia de Deus no Brasil ESTEADEB, Em agosto de 1981, ficou estabelecido que a Esteadeb obedeceria a mesma linha doutrinria das Assembleia de Deus. [...] no final dos anos 90, as escolas filiais da Esteadeb passaram a funcionar de forma independente, porm mantendo nome como escolas que funcionam no Nordeste. (ARAJO, 2008, p.284- 285). 158 Revistas de estudos bblicos trimestrais e principal instrumento para educao crist nas Assembleia de Deus no Serid.
212
No pensamento de Durkheim (1996) todas respondem, ainda que de maneiras diferentes, a determinadas condies da vida humana. Sua compreenso acerca dos diferentes sistemas religiosos culminava na seguinte concluso [...] umas podem ser ditas superiores s outras, pelo fato de colocarem em jogo funes mentais mais elevadas, so mais ricas em idias e imagens, e sua sistematizao mais erudita (DURKHEIM, 1996, 31). A transmisso dos cdigos religiosos das Assembleia de Deus no Brasil esteve ligada a uma tradio oral e gestual prpria do pentecostalismo. A formao do sistema simblico prenunciou a formao de uma linguagem sacra nas Assembleia de Deus, e possui estreita relao com a mensagem dos Dons Espirituais e na aculturao, isto , atravs da adeso de elementos culturais pelos fiis pela fora dos regionalismos. A interao entre os componentes da cultura regional com smbolos msticos da Assembleia de Deus revelam-se nas formas lingusticas e sociais, confirmando um ntido sincretismo, comportando assim, elementos distinguveis e prprios deste sistema simblico. A aquisio de elementos da cultura regional seridoense pelo sistema simblico pentecostal assembleiano aconteceu de modo progressivo e pouco permevel. Contudo essencial entender como a comunicao desses referenciais culturais contribuiu para o significado religioso desse territrio pentecostal. Antes de saber como se deu a transmisso imprescindvel identificar quais cdigos foram preservados e mais difundidos neste processo. Como antes posto, toda significao do sagrado pentecostal est fundamentada nas experincias msticas dos Dons Espirituais. A mensagem pentecostal de poder, libertao e salvao associado diretamente com os dons de profecia, cura, operao de maravilhas e variedade de lnguas, herdada historicamente pelas abordagens teolgicas dos pioneiros Daniel Berg e Gunnar Vigren, se tornou a matriz da pregao dos pastores da Assemblia de Deus, disseminada desde os primrdios da igreja na mecanizao repetio de comportamentos emotivos nos plpitos durante as reunies assembleianas. Distinguimos assim duas tipologias, pelas quais os preceitos pentecostais so transmitidos nas Assembleia de Deus, um ligado a oralidade (pregaes) e outro numa mmica pentecostal, portando relacionado (gestos). Em casos especficos a aprendizagem pela observao de gestos suplanta efetuada pela oralidade. Entre essas duas categorias de repasse de significaes no se interpem instrumentos que sirvam de canal dentre sujeito emissor e o sujeito receptor. O 213
gesto permite uma apreenso imediata de ritmos corporais e sua sincronizao no espao. Por esta razo, que o movimento observado e a palavra que o
acompanha frequentemente permitem a aquisio de prticas [...] no domnio dos comportamentos sociais, os gestos e palavra do origem a rituais (CLAVAL, 2007, p. 67). A figura do pregador veemente no pentecostalismo incorporada e
reproduzida na postura dos pastores assembleianos, demonstra como alguns dos cdigos gestuais resistiram ao tempo e aos modismos das novas geraes. A pregao em voz alta, expresses superemotivas nos sermes, dana no esprito159, pulos e carreiras na (glossolalia), imposio de mos em oraes se perpetuaram como cdigos gestuais assimilados e perenizados mediante a observao da homilia pentecostal pelos obreiros e membros. O ensinamento formal no necessrio para a assimilao desses cdigos gestuais, seu prendizado dar-se atravs da observao e espontaneidade apenas faz-se necessrio est perto daqueles de quem se quer copiar os gestos para seguir as etapas, misturar-se a um grupo para apreender as regras de polidez e de troca (CLAVAL, 2007, p.67). Somam-se a esta herana de cdigos gestuais, os adjetivos do discurso pentecostal, que tem sua exegese vinculada ao poder do Esprito Santo, simbolizado no Fogo, onde se faz meno ao texto do livro de Atos dos Apstolos sobre o dia de pentecostes: e foram vistas lnguas repartidas como que de fogo. Deriva-se dessa abordagem teolgica uma gama termos tradicionalmente mantidos, inventados e (re)inventados como jarges160 o que possibilitando a associao deireta do pregador ao sistema de crena pentecostal. Uma linguagem sacra assim foi construda e retransmitida no tempo e em vrios espaos do cotidiano mstico das Assembleia de Deus. Um conjunto de aluses ao fogo foi absorvido pelos fiis assembleianos durante as liturgias e comumente recitados no cotidiano e durante as oraes, sendo presumvel identificar essa linguagem sacra ao sistema de significados pentecostal. Dentre as mais conhecidas espada de fogo, sapato de fogo, anjo de fogo, labaredas de fogo, batismo com foto, lngua de fogo todas essas derivaes so usadas quanto se faz referencia ao poder do Esprito Santo nas reunies no momento da pregao e nas splicas. Considerando a eficcia desses cdigos em termos de transmisso sabe-se que, a difuso desses no espao possui um alcance limitado. O repasse desse
159
Movimento fsico similar a dana, presumivelmente feito sob a influncia e controle do Esprito Santo (ARAJO, 2008, p.257) 160 Dentre as mais comuns esto expresses do tipo: varo de fogo, espada de fogo, labaredas de fogo, sapato de fogo, roda de fogo etc,
214
sistema de significaes na regio do Serid norte-rio-grandense esteve ancorado aos sistemas mais tradicionais de comunicao como a mensagem falada e gesticulada. As novas mdias, enquanto mtodos tcnicos mais eficazes e de maior difuso espacial, tiveram pouca participao no processo transmisso do sistema de significaes das Assemblias de Deus na regio seridoense. A primeira experincia da AD no uso da mdia de massa foi em 1975 na Rdio Breju Currais Novos. Outra discreta tentativa de veicular a mensagem pentecostal nas cadeiras de rdio foi registrada na gesto do pastor Manoel Barbosa na AD de Caic, na dcada de 1980, com o programa radiofnico Vida Nova na emissora A voz do Serid. Os cdigos grficos escrita tambm tiveram participao mnima neste processo de transmisso. Uma tradio de registros escritos no foi cultivada nas Assembleia de Deus do Serid. Manuscritos histricos que preservem as experincias do passado inexistem nas secretarias das igrejas Sede de Campo Eclesistico. Constata-se o prevalecimento de uma cultura religiosa fundamentada basicamente na experincia, o que reflete a objetividade desse sistema religioso. Com isso no se indaga aqui, que as representaes do sagrado pentecostal, difundidas na AD, sejam repassadas por meio de sistemas ultrapassados, mas ao contrrio disso, evidenciamos como os princpios tradicionais de transmisso da cultura foram eficazes na preservao e difuso desses cdigos, que hoje referenciam a tessitura subjetiva do territrio assembleiano no Serid. Segundo Claval (2007) numa comunicao oral h uma perda de contedos quando esses so transmitidos pelos vrios sistemas comunicao como escrita, fala e gestos, numa relao espao/tempo. A informao um conjunto de cdigos que, ao serem repassados por instrumentos intermedirios, sofrem subtraes de alguns deles, ou seja, a informao amputada por perdas que se produzem na codificao durante a transmisso em linha e na decodificao (CLAVAL, 2007, p.69). Ao expor uma anlise da transmisso acerca da comunicao via oral e escrita, o autor verifica diferenas substanciais no que diz respeito perda de cdigos em cada uma dessas modalidades em linha correspondente a (codificao-decodificao), e em trocas simetrias e assimtricas (tempo). No sistema de comunicao oral, a informao lida com perdas mnimas durante a codificao e decodificao, pois durante o processo de transmisso o ouvinte recebe quase tudo, constituindo assim uma troca simtrica. Quanto escrita a perda de informao em linha fica reduzida a quase nada, no entanto o processo 215
de codificao e a decodificao amputa toda mensagem que se refere aos gestos e s atitudes. Este esboo analtico permite compreender a importncia que a comunicao oral e gestual teve para a preservao do sistema de significao pentecostal na Assemblia de Deus. Afirma-se ento que, a herana pentecostal transferida s geraes de fiis na AD, no se deu somente pelos ritos e linguagem sacra, mas tambm, pela mensagem escrita que sustentou as bases conceituais da simbologia pentecostal, fundamentando seus significados numa hermenutica bblica singular. A predominncia dos cdigos grficos esteve centrada na definio da prtica pentecostal. Sua funo nesse processo era dar respaldo bblico 161 ao sistema de crena, e no necessariamente ser um meio de transmisso dos usos e costumes assembleianos. A potencialidade dos meios de comunicao em massa e dos cdigos grficos foi limitadamente explorada, sobressaindo em detrimento delas, as formas tradicionais de comunicao. Porm, os modelos de transmisso cultural seguidos pela Assemblia de Deus no Serid/RN perenizaram-se no tempo, assegurando a permanncia das caractersticas pentecostais no perfil e no estilo ritualstico de suas igrejas filiais. Mesmo tendo um alcance concentrado no espao, os modelos orais e gestuais de perpetuao cultural, foram utilizados em estratgias que possibilitaram suas difuses em massa. Os eventos promovidos pela Assemblia de Deus no Serid norte-rio-grandense contriburam para a abrangncia espacial de seu sistema de crena. Os tradicionais Congressos de Mocidade e Cruzadas Evangelsticas so eventos promovidos h vrias dcadas pelas Assembleia de Deus em todo o pas. O objetivo central desses encontros a reunio em massa dos assembleianos e a conquista de novos adeptos. Essas concentraes possibilitam a convergncia, e ao mesmo tempo, e o contato de assembleianos de cidades e estados diferentes. Unidos numa s f, o compartilhamento em massa dos cdigos e de suas significaes tem o poder de tornar esse conjunto de crenas ainda mais significativo para o fiel, uma vez que, todos em sua volta simultaneamente desenvolvem as mesmas prticas msticas. O aspecto psquico consensual induzido
161
A Bblia a fonte principal para o sistema simblico pentecostal nas Assemblia de Deus, principalmente o Livro de Atos dos Apstolos e as epstolas do Apstolo Paulo.
216
neste tipo de reunio cede lugar aos automatismos verbais nas liturgias das Assembleia de Deus como a glorificao162. A glorificao parte fundamental de experincia com o sagrado no pentecostalismo. Nos cultos ela propagada publicamente na nave das igrejas pelos lderes e fiis das Assembleia de Deus. So emitidas exaustivamente e em tom altivo, Glrias e Aleluias no decurso das oraes e pregaes, facilitando a formao de uma atmosfera emocional no seio da igreja. O exerccio duradouro e sistemtico da glorificao gerou na Assemblia de Deus um automatismo verbal que conduz o fiel a pronunciar quase que espontaneamente esses predicativos em momentos de extrema comoo religiosa. Esses cdigos orais de adorao possuem importantes significados espirituais dentro das Assembleias de Deus. Quanto mais repetitiva e praticada for glorificao pelo sujeito assembleiano, mais evidncias ele estar dando, de que est avivado e cheio do poder do Esprito Santo. Como o fogo a insgnia do poder do Esprito Santo no pentecostalismo, deriva-se ento a terminologia Fogo Pentecostal. Para os assembleianos pentecostais o sagrado assim simbolizado: como um fogo abrasador, que delimita, demarca e rodeia todo o lugar, constituindose num Territrio de Fogo, que no imaginrio do sujeito pentecostal mantm todo o mal e toda sua horda de demnios distncia. O legado cultural deixado por esses sistemas de transmisso Paul Claval (2007, p.81) afirma que [...] das representaes, passa-se a conjuntos de ideias que organizam o mundo, a conceitos abstratos, a teorias, que esto, pois, na base do saber. Sem os sistemas de transmisso oral e gestual, a canalizao dos cdigos e das normas subjetivas no cognitivo dos fiis, tornar-se-ia menos dependente de uma experincia prtica163 e mais dependente da instruo terica. As atitudes fundamentam-se na valorizao daquilo em que se acredita, como bem destaca Claval (2007, p.82) [...] os valores estruturam-se em conjuntos de crenas e de normas abstratas de comportamento que so do domnio da religio ou da metafsica. A reverncia inicial dos assembleianos dentro do templo tambm faz parte dos cdigos gestuais. Todo fiel ao adentrar o espao de adorao ajoelhase e desenvolve rapidamente um contato com o transcendental. Essa postura um
162
So pequenas frases repetidas comumente em voz alta pelos assemblianos em suas reunies, com o objetivo de engrandecer a providncia divina. Essa prtica faz parte do sistema de cdigos do pentecostalismo ortodoxo e o distintivo mais explcito dos assembleianos ente o pluralismo religioso. 163 Relacionado tambm as limitaes de um saber Tcnico, que necessita de um contexto direto dos gestos (CLAVAL, 2007, p.67).
217
sinal de humildade e honra que o fiel tem para com a casa de Deus (o santurio). Alm desse significado espiritual, a reproduo desse ato nas Assembleias de Deus, se transformou num procedimento tico dentro do templo, [...] a repetio ganha s vezes colorao moral: o gesto tem seu valor pelo simples fato de se reproduzir indefinidamente [...] se torna um ritual entre o que transmitido de gerao a gerao [...] (CLAVAL, 2007, p.80). Visto assim, o significado do territrio da AD vincula-se intimamente ao sagrado pentecostal, enriquecido por um espectro de valores msticos, que se traduzidos regras e dispositivos normativos abstratos relevam os limites imateriais do territrio. A introduo dos valores pentecostais no Serid potiguar pelas Assembleias de Deus se deu concomitantemente com a criao dos grupos familiares na dcada de 1942 em Currais Novos e na cidade de Caic em 1946. Porm, o desenvolvimento desse sistema de crena na regio do serid est referenciado no prprio alargamento da tessitura poltica do territrio assembleiano nas
espacializaes intraurbanas das cidades seridoenses. Isso significa que, o aumento da escala poltica (congregaes e templos) representava tambm a ampliao das escalas geogrficas de um domnio subjetivo, (smbolos e valores msticos). Ambas as escalas prosseguiam conectadas e superpostas, pois, aderir ao pentecostalismo assembleiano seria submeter-se a dois sistemas de controle, que esto separados nesta anlise por uma questo de metodologia, contudo os dois domnios fazem parte do mesmo antro de controle territorial, vistos como poderes indissociveis neste processo, sendo a manuteno do sistema poltico dependente do simblico espiritual e vice e versa. Esse entrecruzamento de domnios remete-se antes de tudo ao contato do individuo com valores historicamente estabelecidos. Neste caso, os valores que revestem a urea do territrio conectam-se intimamente alma do indivduo, formando no transcurso do tempo, um elo que ser muitas vezes utilizado como mecanismo de luta e reafirmao, ou seja, de defesa, acionada toda vez que foras opostas incidirem querendo subverter ou eliminar os elementos mais preciosos dessa relao. inevitvel pensar que, a permanncia duradoura do indivduo e seu histrico de experincias com sagrado, no ambiente pentecostal, no lhe traga apegos sensveis por meio de laos afetivos e que por conseqncia disso, no projete nele uma identidade religiosa. At aqui analisou-se a transmisso dos 218
smbolos e significados do territrio, que vivenciados demoradamente produz o mais importante trunfo de defesa e reconhecimento dos limites do territrio: a identidade. As implicaes conceituais das novas abordagens sobre a questo da identidade colocam-nos diante uma problemtica pertinente: sujeito assembleiano ou
pentecostal? Longe de dar uma resposta conclusiva a essa pergunta, pretende-se contribuir para anlise integradora do territrio assembleiano, abrindo o debate e traando consideraes acerca das possibilidades de anlise da identidade religiosa dentro do objeto de pesquisa em debate.
4.4
COMPLEXIDADE
DA
IDENTIDADE
TERRITORIAL
NA
CONTEMPORANEIDADE
A discusso sobre identidade tem sido enriquecida, em funo das novas abordagens desenvolvidas pelas cincias sociais para ler a complexidade do momento atual, onde os processos dinmicos dos espaos articulados em redes tornam o sujeito cada dia mais globalizado e descentralizado do seu lugar de origem. O questionamento dos velhos paradigmas164 vem com o deslocamento do sujeito pela compresso espao-tempo165, em que David Harvey que numa perspectiva historicista apresenta a aniquilao do espao pelo tempo no que chamou de compreenso tempo-espao, promove o encolhimento dos espaos pela eficincia e rapidez com que se do hoje os processos sociais. Doutra forma, para explicar o mesmo fenmeno e a intensificao das interaes scioespaciais Anthony Giddens defende o alargamento do espao pelo desencaixe espaotemporal,166 onde as relaes sociais so deslocadas de seus contextos imediatos em direo ao redor do globo, e reestruturadas pelas extenses indefinidas de espao-tempo. Neste sentido, Giddens e Harvey evidenciam que o centro de referncia dos sujeitos (identidade) no espao diante do movimento (desencaixe/compreenso), ao mesmo tempo em que transportado para outros espaos perpassados por vrios
164
Concepes do Sujeito no Iluminismo e Sujeito Sociolgico, que mesmo em suas diferentes abordagens acerca do centro interior do homem, defendia a linha comum de que o indivduo possua uma identidade central e estvel quando aos mundos culturais que eles habitam (HALL, 2002, p.12). 165 Harvey fundamenta esse processo mostrando como os novos sistemas de transportes e comunicao ao longo da histria do capitalismo revolucionaram nossas experincias espaotemporais (HAESBAERT, 2007, p.161) 166 Esse processo tambm descrito por Giddens como desalojamento social, uma espcie de [...] extrao das relaes das sociais dos contextos locais de interao e sua reestruturao ao longo de escalas indefinidas de espao-tempo (HALL, 2002, p.16)
219
outros centros de referncia, fato este vivenciado na ampliao das possibilidades de articulao do sujeito com outros sistemas culturais ao redor do globo. Em vez de ter um centro de referncia exclusivo ou fixo que serve de princpio articulador ou organizador nico, o sujeito ps-moderno em Ernest Laclau apud Hall (2002, p.16) visto como sendo perpassados por uma multiplicidade de centros de poder que no o define, pois que [...] o que define o local no simplesmente aquilo que est presente na cena; a forma visvel do local oculta s relaes distanciadas que determinam a sua natureza (GIDDENS apud HALL, 2002, p.72). Observando o impacto desses processos globalizantes sobre a identidade Stuart Hall (2002), integra-se discusso, evidenciando o lado conflituoso de identificao do sujeito na modernidade tardia. Para esse autor, os processos dinmicos de desencaixe (local-global) e compresso (global-local), tornam as identidades igualmente instveis e variveis, se comportando no espao com uma celebrao mvel formada e transformada continuamente em relao s formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam. Esse transito dinmico de identidades para Hall (2002, p.77) uma via de mo dupla [...] h juntamente com o impacto do global, um novo interesse pelo local. Existe assim uma espcie de negociao entre os aspectos mais particulares e universais das identidades. Em vez de pensar a substituio do local pelo global, ou um local fora da lgica de uma globalizao, Hall (2002, p. 78) acredita que a globalizao venha produzir [...] simultaneamente, novas novas identificaes globais e novas identificaes locais. J Rogrio Haesbaert (2007) ao analisar a desterritorializao (fim dos territrios), na perda de sentido do lugar, contexto imediato167 ou especificamente de seus limites na noo de esvaziamento do espao no conceito de desencaixe espao-temporal de Giddens e no reducionismo materialista de Harvey em considerar o movimento das redes globalizadas na compresso espao-tempo como uma crise do espao de representaes (smbolos, crenas e identidades) 168
167
Essa concluso parte da anlise da extenso e intensidade desse processo globalizador [...] no plano da extenso, elas serviram para estabelecer formas de interconexo social que cobrem o globo; em termos de intensidade, elas alteram algumas das caractersticas mais ntimas e pessoais de nossa existncia cotidiana (GIDDENS, 1991, p.21). 168 A crise se instalou na medida [...] em que as culturas nacionais tornaram-se mais expostas a influncia externa difcil conservar as identidades culturais intactas ou impedir que elas se tornem
220
em que o mundo representado no local, ou seja, o espao global o espao comum entre os sujeitos admite que ambos apresentam-se equivocados em suas concluses: o que podemos perceber pelos discursos de Giddens e Harvey
que tanto um quanto outro esto falando, para brincar com as palavras, de uma dissoo-associada entre tempo e espao, ou melhor, de um espao-tempo que se dissocia para reconfigurar em novas bases, em novas localizaes em sentido amplo. Isto para aqueles que relacionam desespacializao com desterritorializao, seria o mesmo que falar em uma desterritorializao que implica sempre uma nova territorializao [...] trata-se na verdade de uma leitura muito simplificada da desterritorializao, associada apenas aos processos de compresso e/ou desencaixe espao-tempo, envolvidos sobretudo com a questo da distncia fsica, ou, nos termos de Shields [...] com a forma espacial da ausncia-presena. (HAESBAERT, 2007, p.165).
Assim
compreendido,
Haesbaert
(2002)
enxerga
fenmeno
da
desterritorializao como sendo a interao dos territrios no movimento cclico de indivduos, produtos e informao pelas redes globais gerando concomitantemente uma (re)territorializao produzida pela experimentao/reconstruo particular pelo indivduo169, grupo social ou instituio [...] em outros territrios (grifo nosso) (HAESBAERT, 2007, p.343). justamente no interior dessa dinmica combinada de des-reterritorializao, que Haesbaert identifica o fenmeno da multiterritorialidade, vista como ao ou processo dinamizado pelas as redes,
Esta multiplicidade e/ou diversidade territorial em termos de dimenses sociais, dinmicas (ritmos) e escalas resulta na justaposio ou convivncia, lado a lado, de tipos territoriais distintos [...] mltiplos territrios ou mltiplas territorialidades (HAESBAERT, 2007, p.343).
na dimenso cultural que o autor discute como as identidades se comportam nos processos dinmicos da globalizao que promovem uma tendncia de homogeneizao destas atravs do hibridismo dos referenciais identitrios. Numa
enfraquecidas atravs do bombardeamento e da infiltrao cultural [...] fenmeno conhecido como homogeneizao cultual (HALL, 2002, p.74-76). 169 Haesbaert faz aluso ao campo do subjetivo ou da cognio do sujeito e de sua forma de conceber o mundo em sua volta, pois o mesmo pode produzir [...] seus (mlti) territrios integrando, de alguma forma, num mesmo conjunto, sua experincia cultural, econmica, poltica em relao ao espao (HAESBAERT, 2007, p.341)
221
leitura oposta a de hibridao cultural,170 feita pelos tericos da desterritorializao, em que, tais processos desenraizam e enfraquecem as identidades territoriais, ao ponto das pessoas no mais desenvolverem laos simblicos com os lugares em que vivem, Haesbaert (2007) v o fenmeno do hibridismo cultural 171 como vinculado ao fenmeno da multiterritorialidade, que promove ou gera uma reterritorilizao (processo de multiterritorializao) em que,
o mais comum que as pessoas e os grupos sociais desenvolvam, concomitantemente, vnculos identitrios com mais de um territrio ao mesmo tempo, ou com territrios que em si mesmos manifestam caractersticas muito mais instveis, mltiplas e/ou hbridas (HAESBAERT, 2007, p.49).
A identidade como elemento da cultura pode est parcial ou totalmente mergulhada nessa complexa e dinmica multiterritorialidade, que na luz dos conceitos de Haesbaert (2007), alm de significar experincia de vrios territrios tambm a possibilidade de acessar ou conectar diversos territrios, tanto pelas vias concretas de deslocamento fsico quanto s virtuais condicionadas pelo ciberespao. Antes de tudo, para entender o impacto deste processo to dinmico e de repercusso mundial que a multiterritorialidade em nosso contexto, importante a conhecer o terreno em que as identidades so manifestas na Assemblia de Deus. Procedendo assim, ser possvel lidar com as devidas propores e intensidades desse fenmeno primeiramente no territrio seridoense para ento reduzir escala do territrio assembleiando, no insistindo numa anlise desproporcional do acontecimento a nvel local.
4.5 IDENTIDADE ASSEMBLEIANA E PENTECOSTAL: REFERENCIAIS DE SIGNIFICAO E PERTENCIMENTO NAS ASSEMBLEIA DE DEUS DO SERID
Torna-se fundamental identificar os corolrios tericos da identidade para localizar os centros do sentimento de pertena do territrio assembleiano no Serid.
170
Conforme Haesbaert (2007, p.46) o emprego do termo um translado de sentido remontando a um sentido biolgico e, mais especificamente botnico (como at hoje aparece na cincia agronmica), passa de um conceito fisiolgico, ao longo do sculo XIX, para um conceito central dos Estudos Culturais, especialmente na chamada abordagem ps-colocial. 171 O observa-se esse fenmeno gerado ou promovido [...] pelas novas tecnologias comunicacionais, pela reorganizao do pblico e do privado no espao urbano e pela desterritorializao dos processos simblicos (CLANCLINI apud HAESBAERT, 2007, p.48).
222
Identidade
como
uma
ininterrupta
construo
histrico-cultural
de
significados, implica tempo e referenciais concretos. Isso indica que, determinados sentimentos de pertena e reconhecimentos afetivos, esto dispostos em espacialidades e temporalidades diferentes e se moldam continuamente [...] com base em um atributo cultural ou, ainda, um conjunto de atributos culturais interrelacionados, o(s) qual(ais) prevalece(m) sobre fontes de significao (CASTELLS, 1999, p.22). Este primeiro corolrio admite que o sujeito seja composto por vrias identidades, sendo referenciado por centros de significaes inacabados e abertos a novos processos de identificao mltiplos e variveis, pois, o sujeito assume identidades diferentes em diferentes momentos, identidades que no so unificadas ao redor de um eu coerente (HALL, 2002, p.13). Outro importante corolrio a ser destacado a relao contrastiva em que se forma a identidade. Partindo das consideraes anteriores de que a identidade no um centro fixo nem fechado de significados, pode-se afirmar que, ela sempre estar disposio de vrios centros de significao, que podero se conectados a este centro ou no, processo esse inscrito sempre no campo das relaes sociais, hoje intensificado de sobremaneira pelo perodo tcnico-cientfico-informacional. contrastiva porque a interao (relao) como o outro mesmo que dicotmica, parte fundamental na formao das identidades do sujeito, pois no jogo da diffrance172 que a identidade tem seu significado definido e (re)definido. Em sntese, o processo de reconhecimento dos aspectos mais representativos de nosso (s) sentimento (s) de pertena dar-se tambm na alteridade das relaes sociais. A forma in-visvel da identidade destacada aqui como terceiro corolrio inerente a sua construo. Neste, as identidades so necessariamente construdas numa dialtica entre o material/simblico, objetivo/subjetivo dos processos sociais. Ao ser referenciada em sistemas simblicos ou na realidade concreta, a identidade tem sua concepo no subjetivo do sujeito. E nessa construo imaterial que a identidade ganha sua invisibilidade. Da mesma forma, na ao das prticas sociais vinculadas objetividade dos smbolos que a identidade ganha sua concretude. Sendo ento que, um olhar unvoco definitivamente inapropriado o estudo da
172
Conceito utilizado por Jacques Derrida para desconstruir uma qualquer essencializao da identidade como algo absoluto em si mesmo A diffrance, o jogo sistemtico das diferenas, dos rastros de diferena, do espaamento, pelo qual os elementos se remetem uns com os outros. Esse espaamento a produo, ao mesmo tempo ativa e passiva (...) dos intervalos sem os quais os termos plenos no significariam, funcionariam (...) o jogo das diferenas supem, de fato, snteses e remessas que impedem que em algum momento, em algum sentido, um elemento simples esteja presente em si mesmo e remeta a si mesmo (DERRIBA apud CRUZ. V.C ).
223
identidade, j que sua construo feita numa contnua indissociabilidade entre o material e o simblico. A construo das identidades no pode ser feita separando delas seu contedo visvel (referencial material) e sua natureza invisvel (representaes subjetivas). A valorizao de um aspecto em detrimento do outro no teoricamente vivel, porquanto, se h sempre algo mais alm da cultura, algo que bem mais captado pelo textual/discursivo, h tambm algo mais alm do assim chamado material, algo que sempre cultural e textual (CHUCE apud CRUZ, 2007, p. 99). O ultimo corolrio a ser destacado que a identidade no genuinamente desprovida de uma inclinao poltica ou despretensiosa por assim dizer; sua formao tambm estratgica e posicional. Este o processo de construo mais tenso e conflituoso da identidade, percebido na luta dos grupos sociais pelos seus referenciais identitrios, defendidos estrategicamente para viabilizar projetos e interesses prprios. Os processos de identificao parte constituinte das relaes de poder, de modo que [...] a compreenso das configuraes dessas relaes de poder no possvel sem o reconhecimento do seu carter cultural ativo, na medida em que expressam, produzem e comunicam significados (LVARES; DAGINO; ESCOBAR, 2007, apud CRUZ. V. C, 2007, p.99). No h assim como amputar da identidade as relaes de poder envolvidas na sua construo, que comumente marca a diferena e a desigualdade dos grupos sociais,
[...] as identidades emergem no interior do jogo de modalidade especficas de poder, e so assim mais o produto da marcao de diferena e da excluso do que o signo de uma unidade idntica, naturalmente constituda (HALL, apud CRUZ.C.V, 2007, p.99).
Nessa poltica identitria compreende-se que, a reproduo de smbolos e representaes por determinado grupo e sua afirmao diante de outros, dar-se nos meandros do exerccio de poder, ou seja, as relaes de dominao, mantm muitas vezes as identidades servindo ao interesse de minorias, que manipulam de forma estratgica seus referenciais identitrios impondo-os. A identidade posicional, uma vez que, est relacionada a decises tomadas pelos sujeitos, que pode ser estratgicas na medida em que disputam outros recursos simblicos e materiais [...]
224
para garantir o acesso privilegiado aos bens sociais (SILVA apud CRUZ.C.V, 2007, p.100). O conjunto de corolrios aludido, objetiva fornecer as bases para compreender as identidades emergidas na comunidade assembleiana como territoriais, suscitadas pela combinao justaposta de mltiplas escalas de poder num territrio de dupla face. O que torna um conjunto de pessoas uma comunidade no sentido operacional no somente os laos contnuos de solidariedade e relaes afetivas, mas tambm um espao comum onde so compartilhadas normas de um governo, histria ou legado cultural. O princpio comunitrio est presente em diferentes graus na sociedade e em determinados grupos sociais ele pode ser mais evidente do que em outros, ou ser meramente transitrio ou apresenta-se regular. Nestas circunstncias pode-se ento considerar o corpo de fiis das Assembleia de Deus uma comunidade religiosa, pois estes se encontram unificados num mesmo espao/territrio pelos valores morais e religiosos construdos historicamente, como tambm pela concretude do sagrado que permite essa comunho ideolgica ser visualizada em sua unicidade em meio paisagem urbana. Fica notrio ento que, a unidade da comunidade assembleiana est associada a uma dualidade de domnios que se ajustam para fazer desse grupo religioso uma espcie de Tribo Urbana
173
, no no sentido de informalidade e
fluidez destacado por Michel Maffesoli, mas no que ele reconhece como relao proxmica174, vista na interao conjunta de indivduo entre diferentes de grupos (neo)tribais, onde faz referncia ao sentimento de pertena do sujeito filosofia material/idealista de sua tribo, e suas possveis implicaes na sua vida em sociedade. Segundo Maffesoli (1987, p.196) os jogos da proxemia se organizam
173
A cultura das tribos urbanas informal, bem diferente das organizaes ligadas ao "burguesismo" permeadas pelo nosso taylorismo ocidental, que rejeita a emoo e os sentimentos coletivos (coisa ) tpica de uma cultura empresarial . O neotribalismo pratica uma "solidariedade orgnica" que vai de encontro a essa "solidariedade mecnica dos indivduos racionais" do capitalismo. O neotribalismo no se ope frontalmente ao poder poltico como o faz o proletariado. Isso no quer dizer, no entanto, que as tribos urbanas sejam passivas ou que no prestem ateno no jogo poltico. O que as tribos fazem evitar as formas institucionalizadas de protesto (comcios, greves e piquetes) das quais o proletariado se vale. A resistncia das tribos mais "subterrnea" valendo-se - por exemplo - da msica para afirmar sua no-adeso "assepsia social" dos mantedores da Ordem. Essa "desqualificao" praticada pelas tribos, com o tempo, "corri progressivamente a legitimidade do poder estabelecido". 174 Descreve o espao pessoal de indivduos num meio social, definindo-o como o "conjunto das observaes e teorias referentes ao uso que o homem faz do espao enquanto produto cultural especfico". Descreve as distncias mensurveis entre as pessoas, conforme elas interagem, distncias e posturas que no so intencionais, mas sim resultado do processo de aculturao.
225
como nebulosas policentradas, isso porque o contato com o diferente ora aproximam ora distanciam, muitas vezes com a revelia de uma intolerncia pacfica ou eliminacionista. O apego indiscriminado e no crtico aos recursos matrias e simblicos de uma comunidade pode despertar tanto uma relao animosa quanto o desejo de aniquilamento ao grupo opositor. Sendo assim, a existncia perene de uma comunidade pautada numa tentativa de afirmao social, pelo direito de preservar e/ou adaptar s expresses materiais e simblicas de seus sistemas de significaes, tpico do carter estratgico posicional dos referenciais identitrios. Portanto, baseando-se no curso duradouro dos laos de fraternidade, de ajuda mtua, dos valores cristos, dos vnculos de parentescos, da comunho religiosa que transcorridos dentro das comunidades religiosas das Assembleia de Deus, pode-se fazer referncia a uma identidade assembleiana. Esta identidade no uma prerrogativa dos fiis assembleianos no Serid, mas de todo contexto cultural onde uma comunidade assembleiana encontra-se inserida. Outro forte centro de identificao do fiel na Assemblia de Deus o pentecostalismo ortodoxo. Este sistema de crena tem sido a principal insgnia da comunidade assembleiana ante outros sistemas religiosos. Os smbolos do pentecostalimo ortodoxo durante toda trajetria da Assemblia de Deus no Serid vem influenciando em nveis variados a vida social e religiosa dos seus fiis. Os traos mais caractersticos dessa influncia so descritos na: nfase de uma espiritualidade emocional expressa nos cnticos e oraes, espontaneidade de falar glria a Deus, aleluias, lnguas estranhas, pregaes em voz alta, resistncia aos modismos sociais representada no rigorismo tico nos usos e costumes, oraes coletivas em voz alta, forte identificao com a populao economicamente desprivilegiada entre outros. O ser pentecostal est assim ligado a especficos referenciais msticos e a acertos padres de comportamento inerentes ao movimento pentecostal. No entanto o sistema simblico/material do pentecostalismo nunca esteve totalmente fechado a novas incorporaes e (re)signifinicaes como s que projetadas pelas igrejas neopentecostais. O sujeito assembleiano encontra-se a frente de um forte sistema religioso de identificao, e o histrico deste, nesta atmosfera impregnada de smbolos e valores pentecostais que o templo Assemblia de Deus, acende a identidade do fiel crena pentecostal, o que se pode entender como Identidade pentecostal. 226
Por ser um sistema religioso no prprio, mas moldado em suas caractersticas atuais pela Assemblia de Deus, nos contextos regionais brasileiros, o pentecostalismo ortodoxo enquanto sistema nico de smbolos, rituais, significaes e comportamentos alicerado nas experincias msticas nos Dons do Esprito Santo confunde-se com a prpria identidade assembleiana. Baseando-se no pressuposto terico do corolrio identitrio que admite a pluralidade de centros referncia num mesmo sujeito, possvel destacar a(s) identidade(s) como sentimentos construdos num conjunto de significaes variveis, indicando que, o fiel da Assemblia de Deus no momento do culto esteja localizado sobre um duplo espao de referncia material/simblico
(templo/significaes) e ao mesmo tempo sujeito a dois centros de referncia identitria: sistema comunitrio/social (identidade assembleiana) e o sistema mstico/transcendental (identidade pentecostal). Destarte, essas identidades podem ser visualizadas a partir de seus elementos constitutivos, legislativos, representativos, ideolgicos e signatrios, responsveis pela criao e solidificao dos limites (i)materiais do territrio da Assemblia de Deus no Serid. Pois as identidades de natureza religiosa como as identificadas nas Assembleia de Deus so de fato territoriais, porquanto so projetadas a partir de um territrio, e este movido por escalas sobrepostas de poderes,
O territrio envolve sempre, ao mesmo tempo, [...], uma dimenso simblica, cultural, por meio de uma identidade territorial atribuda pelos grupos sociais, como forma de controle simblico do espao onde vivem (podendo ser, portanto, uma forma de apropriao), e uma dimenso mais concreta, de carter poltico-disciplinar: apropriao dos indivduos (...) Assim, associar o controle fsico ou a dominao objetiva do espao a uma apropriao simblica, mais subjetiva, implica em discutir o territrio enquanto espao simultaneamente dominado e apropriado, ou seja, sobre o qual se constri no apenas um controle fsico, mas tambm laos de identidade social (HAESABERT, 2002, p.120)
Deste modo, na fuso da escala poltica (Campos Eclesisticos) com a escala cultual (smbolos/significaes), que se observa um nico territrio sobre o qual se constroem as identidades do fiel assembleiano. Como bem acena Cruz (2007, p.103) cada territrio se constri por uma combinao e imbricao nica de mltiplas relaes de poder, do mais material e funcional, ligado a interesses
227
econmicos e polticos, ao poder mais simblico e expressivo, ligado s relaes de ordem mais estritamente cultural. Conforme o seu pressuposto relacional e contrastivo a identidade formada mediante um sistema de classificao que diferencia ou separa um determinado domnio do outro. Classificar ou diferenciar sugere o estabelecimento de limites que mantenham a estabilidade e a coeso da prpria ideologia segregadora. Processos relacionados multiterritorialidade pressionam as identidades territoriais como a assembleiana e pentecostal, a redefinirem os limites de seus contedos num movimento incessante de ampliao e minimizao de escalas de domnio. A insero no Serid de denominaes pentecostais entre o incio da dcada de 2000 2010 como a Universal do Reino de Deus, Igreja do Evangelho Quadrangular, Igreja Evanglica Pentecostal O Brasil para Cristo, Igreja Evanglica do Avivamento Bblico e Igreja Internacional da Graa de Deus, colocou a Assemblia de Deus sob alerta quanto a essa diversidade pentecostal ou pentecostalidade, que tenta promover uma experincia pentecostal com outros moldes, sendo mais flexveis e abertos introduo de novos elementos. O conceito de pentecostalidade175 adotado aqui, no considera a definio integral apresentada por Bernardo Campos, mas somente quando esta reconhece as multifaces do movimento pentecostal. A formulao de Bernardo Campos torna-se incoerente quando defende a diversidade pentecostal e despreza o carter delimitativo ou territorial dessa variedade de movimentos pentecostais. Ora, uma vez conceituando o pentecostalismo em suas diversas formas, o autor mesmo recusando classifica e reconhece as alteridades na diversidade. Ao classificar necessariamente faz-se uma delimitao para enfatizar diferenas e especificidades. Nesta situao, no se pode negar as fronteiras postas por ele mesmo quando segmenta prprio movimento, ou seja, dos diversos territrios que h nele. Se o movimento pentecostal diversificado ou varivel tambm formado por territrios uns com
175
Termo primeiramente usado pelo telogo e filsofo peruano pentecostal Bernardo Campos, para definir uma experincia universal e profundamente humana que se manifesta por meio de diversas formas de pentecostalismo, no tendo fronteiras nem classe, nem d ideologia, nem de territrio, nem de confisso, possuindo ainda a capacidade permear diversas classes scias freqentemente antagnicas e processos histricos radicalmente opostos (ARAJO, 2008, p.566-567).
228
limites mais flexveis do que outros menos, mas todos sempre esto promovendo desigualdades pelas delimitaes que impem. O ritmo da insero de novos subsdios nos procedimentos litrgicos, ticos e sociais das Assembleia de Deus, mostra em que grau a instituio vem sendo afetada pelas novas tendncias do mundo pentecostal. Mais especificamente interessa saber como as identidades assembleiana e pentecostal do seridoense vem se moldando diante do processo dinmico da multiterritorialidade. Para isso, imprescindvel considerar proposies que so relevantes para a compreenso do fenmeno da multiterritorialidade no territrio assembleiano. A primeira delas que quando se fala no assembleiano pentecostal seridoense fica notrio que est se jogando com trs tipos identidades numa mesma anlise. Os atores revelam-se num momento em sua identidade assembleiana outras vezes pentecostal e noutras como seridoense. Sendo assim, tendido que as foras que pressionam o territrio seridoense so as mesmas que atingem o territrio assembleiano. importante considerar a plasticidade de cada uma dessas identidades enquanto componentes de uma cultura religiosa e regional. A abertura delas ao dilogo com outras mais distantes define o nvel de hibridismo de cada uma, no somente a disponibilidade de interao importante neste processo, mas tambm as possibilidades de mediao dessas atualmente. Considerando que a lgica estrutural da multiterritorialidade efetiva-se por um conjunto de redes globais que interconecta os territrios em vrios graus e intensidades, teremos que observar a dinmica multiterritorial dos territrios em anlise, dentro de uma distribuio desigual de fluxos, comeando pelo territrio seridoense e suas conexes com o mundo, at chegar s cercanias do territrio assembleiano.
4.6 FEIES DA DINMICA MULTITERRITORIAL NO SERID E AS SUAS IMPLICAES NO TERRITRIO DA ASSEMBLIA DE DEUS
Num espao cada vez mais dinmico, interdependente e diversificado como o que vivemos atualmente, pensar o Serid como um territrio imvel, fechado e 229
estvel quanto as suas fronteiras, limit-lo a uma leitura geogrfica tradicional e reacionria excluindo pelo menos de forma insuficiente de uma tendncia global e que de alguma forma ou de outra atinge a tudo e a todos. Para encontrar o Serid nas interconexes globais necessrio , anlise que se pretende fazer, primeiramente reduzir a escala dos territrios envolvidos em propores milimtricas e ao mesmo tempo aument-las ao gigantesco escopo de suas dimenses globais, nunca perdendo o foco o seu objeto de pesquisa. Consciente dessa difcil tarefa necessrio optar por uma observao terico-metodolgica que no fuja do problema da reduo/ampliao de escalas, e que aponte caminhos para entender a multiplicidade de formas, tamanhos e direes dessas escalas. Encaminha-se ento, essa complexa tarefa de localizar o territrio seridoense no emaranhado conjunto de interconexes entre territrios, pela tica das geometrias do poder. O conceito de geometrias do poder tem sua origem e fundamentao nas crticas que Doreen Massey transcorreu aos estudos de David Harvey acerca da compresso espao-tempo. Ao se apropriar dessa definio para estudar os processos dinmicos e globais de interconexo dos espaos Massey considerou que,
Esse ponto concerne no simplesmente questo de quem se desloca e quem no se desloca, embora este seja um de seus elementos importantes; diz respeito tambm ao poder em relao aos fluxos e ao movimento. Diferentes grupos sociais tm distintas relaes com essa mobilidade igualmente diferenciada: alguns so mais implicados do que outros; alguns
iniciam fluxos e movimentos, outros no; alguns esto na extremidade receptora do que outros; alguns esto efetivamente aprisionados por ela (MASSEY apud HAESBAERT, 2007, p.166).
Nesta
perspectiva
compresso
tempo-espao
no
considera
incluso), passando despercebida das relaes de poder que se distribuem de forma desigual na interligao dos territrios. Desta forma, as geometrias do poder so caminhos que possibilitam mostrar as formas, escalas e graus de uma sociedade complexa altamente desigual e diferenciada (HAESBAERT, 2007, p.169). Influir a discusso sobre territrio seridoense pelas geometrias do poder reconhecer que dentro da conjuntura dos territrios hegemnicos (territrios-rede) em que imperam as conexes, os fluxos, a mobilidade h (territrios-zona) que 230
interagem pelas redes com outros territrios do poder poltico(s), econmico(s) e especialmente cultural(is) de formas e intensidades variveis. Portanto as
geometrias do poder o encaminhamento central para situar o territrio seridoense entre as diversas escalas e modalidades da multiterritorialidade contempornea. A multiterritorialidade condicionada pelas possibilidades que um territrio apresenta para vivenciar concomitantemente mltiplos territrios e territrios mltiplos, em diferentes amplitudes. Essa assertiva resguarda ento, qualquer tentativa de tornar nesta anlise, o territrio seridoense um territrio mltiplo (territrio-rede) composto por vrios multiterritrios, mas sim como um dos mltiplos territrios (territrio-zona) pertencentes a outras geometrias de poder, mais amplas e difusas. Perceber o Serid como territrio-zona perceb-lo numa nova abordagem conceitual que ultrapassa a [...] concepo zonal ou real de territrio, superfcie relativamente homognea e praticamente sem movimento [...] s se definiria como tal pela predominncia das dinmicas zonais sobre as reticulares pela sua dissociao. Temos em Haesbaert (2007, p.348) duas perspectivas de anlise da multiterritorialidade (...) aquela que diz respeito multiterritorialidade moderna, zonal ou de territrios de redes, embrionria, e a que se refere multiterritorialidade ps-moderna, reticular ou de territrios-rede propriamente ditos, ou seja, a multiterritorialidade em sentido estrito. A multiterritorialidade assim envolve uma imbricao dinmica de territriosrede e territrios-zona. Ambos no fogem ao domnio das articulaes em rede, no entanto h uma distino bsica em termos de funcionalidade,
[...] territrios-zona, mais tradicionais, forjados no domnio da lgica zonal, com reas limites (fronteiras) relativamente bem demarcados e com grupos mais enraizados enraizados, onde a organizao em rede adquire um papel secundrio, os territrios, configurados sobretudo na topologia ou lgica das redes, ou seja, so espacialmente descontnuos, dinmicos (com diversos graus de mobilidade) e mais susceptveis a sobreposies; e aquilo que denominamos de aglomerados[...] (HAESBAERT, 2007, p.306).
176
, mas no
Sendo assim, o Serid caracterizado com um territrio-zona, por ainda prevalecer uma territorializao tradicional numa lgica (relativa) de exclusividade,
176
As dinmicas reticulares caracterizam os territrios em que h maior fluidez e mobilidade dos processos socioeconmicos e culturais, comumente associadas por Haesbaert multiterritorialidade dos territrios-rede.
231
que no admitem sobreposies de jurisdies e defendem maior homogeneidade interna [...] (HAESBAERT, 2007, p.342). Ao identificar o Serid como um territrio-zona, faz-se referncia especialmente a posio do territrio, dentro de outras geometrias de poder, e de suas articulaes com outros territrios no que Haesbaert (2007) reportou como organizao espao-territorial da multiterritorialidade. No entanto se levarmos em considerao as novas possibilidades de conexes tambm presentes no territrio seridoense, como as efetivadas pelo crescimento do acesso a outros territrios pelas redes informacionais, veremos uma realidade efetivamente nova no Serid. Com isso, possvel encontrar lgica zonal do territrio seridoense interpelada pela lgica reticular dos territrios-rede, em diferentes pontos nas cidades como, por exemplo, nos locais de acessos a rede virtual como lan-houses, domiclios ou em estabelecimentos comerciais, tambm com intensidades variadas e possveis de serem aferidas pelas trilhas das geometrias do poder. Mesmo sendo um territrio-zona as vias de acesso pela rede mundial de computadores insere o territrio seridoense (discretamente) nos processos multiterritoriais contemporneos, pois,
[...] se de forma mais coerente, quisermos enfatiz-la enquanto ao ou processo implica assim a possibilidade de acessar ou conectar diversos territrios, o que pode se dar atravs de um mobilidade concreta, no sentido de um deslocamento fsico, quanto virtual, no sentido de acionar diferentes territorialidades mesmo sem deslocamento fsico, como nas novas experincias espao-temporais proporcionadas atravs do ciberespao (HAESBAERT, 2007, p.343).
Se o territrio seridoense no est envolvido diretamente na dinmica da multiterritoridade contempornea177, como experincia total, em sua condio de territrio-zona encontra-se de outra forma, no sentido de uma experincia estrita ou ps-moderna. A multiterritorialidade no experinciada no territrio seridoense no contato imediato ou real com mltiplos territrios, mas pode ser acionada pelas redes informacionais.
177
Para Haesbaert (2005) existem duas formas de conceber a multiterritorialidade no tempo e no espao: uma mais tradicional em sentido geral resultante da sobreposio de territrios, hierarquicamente articulados, encaixados e outra contempornea (ps-moderna) efetivamente mais dinmica e interativa, onde os territrios sobrepostos possuem maior fluidez e conectividade com outros territrios pelas vias da mobilidade fsica e/ou informacional.
232
A acessibilidade aos meios informacionais ou virtuais constitui-se para Haesbaert (2007) um elemento primordial da nova multiterritorialidade que dependendo da classe social ou grupo pode levar o sujeito a usufruir de forma plena dessa nova multiterritorialidade fazendo este [...] a todo tempo [...] recombinar (e descombinar) territrios [...] (HAESBAERT, 2007, p.348). A multterritorialidade contempornea no territrio seridoense, mesmo em sua lgica propriamente zonal, parte das relaes virtuais no que Haesbaert (2007) conheceu de nova integrao do territrio, possvel graas s novas redes (virtuais) dispostas no territrio. Desta forma a experincia multiterritorial no Serid est ligada no a uma dimenso quantitativa, mas qualitativa, ou seja, na [...] possibilidade de combinar de uma forma indita a interveno e, de certa forma, a vivncia, concomitante, de uma enorme gama de diferentes territrios (HAESBAERT, 2005, p.13). Para o autor essa a condio ps-moderna da multiterritorialidade, evidenciada pelo contato com outros territrios mltiplos, sem necessidade de deslocamento fsico, intimamente ligado aos fenmenos da compresso e do desencaixe espao-temporal178. Depreende-se tambm que, a nova multiterritorialidade possvel de ser vivenciada no territrio-zona seridoense, pelas redes virtuais, ainda privilgio de poucos, porquanto, envolve a relao entre as geometrias do poder local, passiveis de serem identificadas pelas condies socioeconmicas de cada indivduo. O discurso da incluso e excluso ganha sentido nesta anlise, pois se trata de diferentes sujeitos e suas condies de acessibilidade a esses recursos territoriais. De forma bastante enftica a multiterritoridade processada no Serid est reduzida ao nvel da individualidade. A articulao em territrios-rede no uma prerrogativa do territrio em si, mas do sujeito seridoense que segundo seu poder de acessibilidade poder ou no articular-se a outros territrios mltiplos e construir seu prprio (multi)territrio pessoal . Sobre esta questo Haesbaert, ressalta que [...] muito importante distinguir entre multiterritorialidade potencial (disponvel, realizvel) e multiterritorialidade efetiva (realizada de fato) (HAESBAERT, 2007, p.350).
178
A revoluo tcnico-cientfico-informacional tem otimizado a velocidade das informaes, pessoas e capital no globo atravs das redes gerando o fenmeno do espao sendo aniquilado pelo tempo lido por David Harvey como um encurtamento (compresso) das distancias no sentido global-local, j em Anthony Giddens essa velocidade permite um deslocamento (desencaixe) dos espaos no tempo em sentido local-global.
233
A importncia da multiterritoridade nos estudos culturais do Serid reside no fato de que, o territrio no absolutamente homogneo e genuno enquanto ao contedo cultural hoje vivenciado. O territrio encontra-se s portas de uma nova era, participando mesmo de forma reconhecidamente menos intensa, dos novos processos de identificao territorial. As feies da multiterritorilidade no Serid j so possveis ao menos de serem apontadas em seus aportes tcnicos, quanto s suas feies mais simblicas, ou seja, suas implicaes na cultura regional, ainda permanecem escondidas nas variantes identitrias dos sujeitos seridoenses. Em outras palavras, a influncia multiterritorial convive hoje nas entre linhas de uma identidade seridoense hegemnica, que segundo Morais (2005) resiste sobre as bases de matrizes simblicas, pressionadas a se recomporem constantemente pelo movimento incessante das transformaes socioespaciais.
Compreender hoje o lugar do territrio seridoense nos dinmicos processos do mundo globalizado faz-se necessrio compreender alguns dos importantes eventos histricos principalmente os relacionados economia que possibilitou a conexo do territrio regional a outros centros do poder. O histrico de articulao do Serid com outros espaos comea com o desbravamento de um territrio simbolicamente indgena, para a implementao de atividades capitalistas do colonizador portugus. A produo do territrio regional quase sempre esteve centrada numa lgica centro-periferia, seja quando seu espao esteve na diviso territorial do trabalho destinado produo de gado 179 no sculo XVII, ou quando mais recentemente encontrou-se na condio de principal exportador de matrias primas como algodo e minrio para grandes centros
179
A demarcao desses espaos de produo representou a definio de uma certa hierarquia de poder em nveis internos. A Zona da Mata, reduto de cultura canavieira, atividade fundamental na estrutura mercantilista da economia colonial, tornou-se responsvel pelas articulaes com o mercado externo. O Serto, ao desenvolver a pecuria para fins de fornecimento de couro, carne e animais para o trabalho, passou a funcionar como rea de produo complementar cana de acar (MORAIS, 2007, p. 60).
234
industriais180 no final do sculo XIX a meados do sculo XX entrando no circuito econmico mundial como fornecedor de subsdios para a base produtiva. A consolidao do trip algodo-pecuria-minerao foi fundamental tanto para a articulao interna quanto externa do territrio seridoense, expandido os corredores de exportao via criao de rodovias, e at aeroportos 181, na medida em que tambm o inseria nos projetos de modernidade atravs dos discursos e prticas polticas das elites locais. Neste momento a cotonicultura assume grande relevncia e impulsiona a estruturao dos primeiros espaos urbanos seridoenses, [...] Algumas cidades 182 passaram de meros entrepostos de comercializao a centros de beneficiamento do produto, tornando-se tmidos referentes do discurso da modernizao [...] O perfil industrial-urbano, corolrio do projeto de modernizao da sociedade brasileira, atingiu o Serid mesmo que de modo pouco expressivo (MORAIS, 2005, p.169). A indstria txtil no sudeste era o principal mercado consumidor o algodo seridoense, que importava a maior parte da produo do algodo de fibra longa. O capital gerado pelo algodo at 1960 teve participao maior na estruturao do setor tercirio com destaque para obras de infraestrutura expressas na criao de instituies pblicas e privadas como tambm a instalao do sistema de telecomunicaes, fundamentais para articulao de servios comerciais nos principais centros distribuio do Serid como as cidades de Caic e Currais Novos. A interconexo comercial do Serid passa ento a ser impulsionada pelas novas condies estruturais advindas da economia algodoeira, o que favoreceu ao crescimento dos centros de distribuio, que funcionavam como mediadores entre produo e consumo, desempenhando um importante papel na organizao
180
O que diz respeito projeo do algodo do Serid este [...] conquista conotaes mais altas o que qualquer outro, nesse mercado de consumo, sendo que as fbricas inglesas de tecidos finos so as suas principais compradoras, j agora em concorrncia com as tecelagens brasileiras que todos os dias esto aprimorando a sua produo e produzindo tecidos de melhor qualidade (MEDEIROS, 1990, p.27) 181 Referimos as pistas de pouso existentes na dcada de 1950 nas cidades de Caic e em Currais, que quando reportadas pela imprensa local como aeroportos, reforavam o imaginrio dos seridoenses de o desejo de serem modernos, fato este descrito no espao caicoense por Marcos Antnio (2008) Embora o Jornal A Flha empregasse o termo aeroporto para designar o espao onde as aeronaves realizavam os pousos e as decolagens, na atualidade o termo que mais se adequaria a estrutura ao qual este mesmo se reportava seria pista de pouso. Isso revelava o desejo das pessoas que produziam o jornal dotar simbolicamente, por meio da linguagem, a cidade de signos de modernidade urbana. No entanto, achamos conveniente preservar o termo aeroporto pela ocorrncia e pela inteno com o qual foi utilizado no peridico (ARAJO, M.A.A 2008, p.98). 182 O Rio Grande do Norte, em 1942, dos 168 estabelecimento industriais de algodo, cerca de 25 estavam no Serid, dos quais destacavam-se as usinas de beneficiamento e de fabricao de leo, assim distributivas: Serra Negra (1), Parelhas (13), Jardim do Serid (5), Currais Novos (13), Acari (6) (CLEMENTINO, 1987, p. 137).
235
espacial do territrio, conforme Lobato (2001, p.18), [...] A organizao espacial da distribuio emerge fundamentada na diviso social e territorial do trabalho, na existncia de uma [...] articulao de diferentes reas produtoras, e tem como locais as cidades que se interligam atravs do comrcio atacadista, varejista e dos servios. As feiras livres despontavam-se como os principais espaos comerciais de circulao do capital na poca, convergindo consumidores de vrias cidades vizinhas, com destaque para as realizadas em Currais Novos e Caic, que entre as demais desenharam juntas a maior rede de distribuio comercial de produtos agrcolas, roupas e miudezas, articulando o comrcio atacadista e varejista de vrias localidades no Serid. Esses mercados peridicos transformavam-se em verdadeiras localidades centrais183, visto que determinados dias da semana, seus ncleos ligavam a outros pequenos ncleos de produo, ao mesmo tempo os articulavam entre si, num movimento de [...] sincronizao espao-temporal das atividades [...] de cada mercado [...] numa lgica de tempo e espao, envolvendo o deslocamento peridico e sincronizado dos participantes de um dado mercado (CORRA, p.50-51). Associa-se tambm a vitalidade econmica da cotonicultura e minerao fragmentao do territrio com a criao de seis novas municipalidades redimensionando o territrio, que anteriormente contava apenas com dezesseis municpios. Esse quadro de fracionamento sem dvida beneficiou tambm ao aumento da escala dos poderes polticos locais. O setor mineral foi um dos grandes pilares para o desenvolvimento e articulao territorial. Entre as cidades envolvidas na atividade mineradora como Parelhas, Acari, Carnaba dos Dantas, Ouro Branco destaca-se Currais Novos que despontou em 1954 com a maior produo de Sheelita da Amrica Latina. Os principais centros internacionais de importao do minrio curraisnovense durante 35 anos foram os Estados Unidos da Amrica, Inglaterra, Holanda e Sucia. A prosperidade vinda com a produo e comercializao do minrio de ferro extrado do tungstnio nas terras do Tomaz Salustino Gomes de Melo, alcanou a cidade de Currais Novos trazendo novos ares de modernidade, como a construo do cinema local, agncia bancria, difusora radiofnica, hotel e praas.
183
A discusso das localidades centrais ou centros de distribuio varejista e de servios foi resgatada por Robeto Lobato (2001) em sua anlise sobre as redes hierarquizadas forjadas entre a produo propriamente dita e o consumo final.
236
No municpio outras empresas do ramo financiadas pelo capital nacional e estrangeiro tambm participavam da extrao de minrios entres elas estavam os grupos: Minerao Wachang; A minerao Sertaneja; A Minerao Termoliga (Barra Verde); A Mina de Ouro ou de Mina So Francisco; e a Mina Poo Entupido (stio Poo Entupido). Quanto integrao externa, os primeiros indcios de que o territrio seridoense j se encontrava de certa forma articulado a outros territrios veio com a derrocada da base produtiva em 1970 com a cotonicultura, e na dcada de 1980 com o declnio na atividade mineradora. A desarticulao das principais exportaes era um reflexo da onda de oscilaes na economia brasileira que tambm sofria com a instabilidade da economia internacional,
Este panorama de debilidade econmica estava articulado
trama dos mercados internacional e nacional, cujas oscilaes em termos de oferta e demanda imprimiam vulnerabilidade aos produtos regionais. No ltimo quartel do sculo XX, algodo e scheelita transitavam de transitavam de itens exponenciais da pauta de exportaes do estado e do pas a produtos inviavelmente econmicos[...] (MORAIS, 2005, p.252).
O declive do ncleo da economia algodo-pecuria-minerao, foi responsvel por desencadear um processo migratrio no sentido campo/cidade onde em 1980 no quadro regional a populao citadina j era de 63,63% enquanto que a da zona rural correspondia a 36,37%184 do total. O territrio entra num processo de redefinio de sua economia, especializando e ampliando atividades ligadas ao setor de servios. A urbanizao continua, porm, atrelada a uma lgica tercirio/urbana, ancorada no crescimento de servios distributivos 185 basicamente representados pelos,
transportes, comunicaes e comrcio, com destaque para pequenos negcios urbanos; servios sociais na esfera da sade, educao e administrao pblica, com expressiva relevncia em termos de gerao de emprego e renda; servios pessoais correspondentes a hotelaria, alimentao, higiene pessoal, cultura e diverso, que apesar da expanso ainda demonstra insuficincias; e os servios produtivos tcnicoprofissionais, de crdito, capitalizao e comrcio de imveis,
184
IX Recenseamento geral do Brasil 1980, Sinopse preliminar do censo demogrfico Rio Grande do Norte (MORAIS, 2005, p.276). 185 Segundo Clementino apud Morais (1999, p.185), [...] o tercirio apresenta basicamente quatro subsetores de servios, que comportam os seguintes segmentos: Servios distributivos, comrcio armazenagem, transportes e comunicao; Servios sociais [...] Servios pessoais [...] Servios produtivos.
237
O perfil scioeconmico das cidades seridoenses transmutado aos poucos de seus aspectos rurais para feies mais urbanas reconhecidas na centralizao de atividades comerciais e de servios pblicos nas reas citadinas. A concentrao de pessoas nas cidades exigiu maior ateno do poder pblico, no sentido de prover o melhoramento das condies de vida urbana para a populao atravs de aes governamentais que privilegiassem a instalao de saneamento bsico e projetos habitacionais. Nas linhas de conexo do territrio seridoense a outros centros regionais, antes dominadas marjoriariamente pelo fluxo de mercadorias primrias como algodo e minrio, passam transitar outros produtos com nvel maior de especializao. Alm do desenvolvimento do setor tercirio algumas atividades de carter produtivo passaram a ter expressividade nos novos redirecionamentos da economia seridoense. A reintegrao da econmica seridoense a demanda dos mercados consumidores iniciou-se na dcada de 1990 representada por atividades ligadas indstria ceramista, a produo de gneros alimentcios, pequenas unidades fabris do setor txtil como bonelarias e fbricas de confeco de roupas, sendo que estas ltimas grandemente estimuladas pela terceirizao efetuada por grandes empresas da capital do estado. Os ltimos decndios do sculo XX o territrio seridoense encaminhou sua vocao econmica pelas diretrizes do setor tercirio. Sua populao passou a reproduzir os smbolos de sua cultura num territrio mais diversificado e urbanizado pelas rdeas da modernidade, cada vez mais metamorfoseado e distante daqueles territrios desvanecidos, compostos anteriormente pelas paisagens rurais das fazendas de criar, territrios dos currais ou das plantaes do outro branco que enfatizavam o territrio algodoeiro.
4.6.3 Novas possibilidades de articulao do territrio seridoense: dinmica zonal e multiterritorial do Serid
No territrio seridoense as atividades ligadas ao setor tercirio tiveram suas estruturas operacionais adequadas vagarosamente aos feixes de inovao 238
resultantes da prpria complexificao da organizao econmica e administrativa das empresas brasileiras. O incremento de tecnologias da informao responsveis pela otimizao das articulaes internas e externas do territrio, adveio com a prpria necessidade de modernizao de algumas atividades do setor tercirio, principalmente naquelas com maior movimento em capital, dependentes de uma maior especializao em suas transaes comerciais, como servios tcnicoprofissionais186 ou servios de apoio produo e a atividade profissional. Conforme registrou Morais (1999) o crescimento no campo das
telecomunicaes j se fazia sentir em Caic no final da dcada 1990, com a considervel expanso dos servios especializados na instalao de sistemas de telefonia celular e telefonia pblica. Os sinais de recepo de canais livres tambm foram multiplicados atravs de receptores coletivos e antenas parablicas. A freqncia radiofnica resumida na AM foi ampliada pelas sintonias FM, emitidas a toda rea urbana e rural. A unidade da Empresa Brasileira de Correios e Telgrafos EBCT, teve seus servios aprimorados seguindo o processo modernizao ocorrido em toda estrutura da empresa a nvel nacional. Os maiores avanos se deram nos centros regionais como Caic e Currais Novos, e suas assistncias a outros municpios proporcionou de certa forma um movimento centrfugo desses servios especializados. Os investimentos efetuados pelo setor privado foram importantes para a entrada de novas tecnologias hoje dispostas no territrio seridoense. A cidade de Currais Novos esteve igualmente na vanguarda desse processo de aquisio de modernas tecnologias da comunicao no Serid. A primeira freqncia AM foi disponibilizada em 1959, havendo uma ampliao do setor no decorrer das dcadas de 1980 e 1990 com a implantao das sintonias FMs. A primeira rede telefnica foi instalada em 1963, engendrando uma melhoria nas atividades comerciais da cidade e sua conexo com outros plos comerciais do estado. A agncia dos Correios e Telgrafos inaugurada desde 1888, possui hoje, um moderno aparato de servios correspondncias que ao lado das transportadoras responde pela dinamizao do fluxo de mercadorias compradas em vrios centros comerciais do pas.
186
Encontra-se nesta tipologia de servios: Agncias Bancrias, Agncias de Publicidade, Auditorias e Consultoria Empresarial, Cooperativas Mdico-Odontolgica, Serigrafias, Grficas, Oficinas, Transportadoras, Assistncias tcnicas, Construtoras, entre outros. (MORAIS, 1999, p.200).
239
A empresa curraisnovense Sidys TV a Cabo em 1987, definitivamente d um salto no ramo das novas tecnologias da informao, trazendo populao a oportunidade de ter em suas residncias atravs de assinatura mensal uma variedade de canais nacionais e internacionais, alm de disponibilizar na grade de sua programao televisiva, trs canais locais, que privilegiam a informaes da esfera social, legislativa e religiosa do municpio respectivamente como o Canal 4 TV Comunitria (2003), TV Cristo Rei (2003) e a TV Cmara (2004). Com uma transmisso televisual voltada para contedos regionais, a Sidys TV a Cabo vem se tornando uma forte ferramenta de divulgao do saber fazer187 seridoense, favorecendo tanto articulao do comrcio local quanto a promoo dos aspectos culturais e identitrios do Serid. O outro lado desse avano tecnolgico que ele se deu de maneira desigual no territrio, tendo alguns dos servios mencionados dispostos
exclusivamente nos plos de Currais Novos e Caic, enquanto que, no restante das cidades seridoenses o espraiamento das tecnologias da informao se manifesta de forma heterognea e bastante varivel. Com a chegada das redes informacionais, a lgica zonal do territrio seridoense passava a coexistir numa escala ainda pequena com a nova flexibilidade das redes informacionais. A internet chega ao Serid no incio da dcada 1990 pelos cabos da rede telefnica, administrados na poca pela antiga estatal TELERN. Uma das primeiras instituies no Serid a utilizar a novssima tecnologia de transferncia virtual de dados, denominada de Internet, foram s agncias do Banco do Brasil com a finalidade de agilizar, reduzir e melhorar a prestao de servio a seus clientes. A liberalizao para comercializao da internet no Brasil por meio provedores, se deu graas portaria criada em 1995 pelo Ministrio das Comunicaes e da Cincia e Tecnologia. A partir de ento a escapabilidade das redes se intensifica e a internet comea a se popularizar nas principais regies metropolitanas do pas e estendidas s regies interioranas. Em meados da dcada de 2000 comeam a surgir no Serid s primeiras empresas comercializando assinaturas de acesso domstico internet como a Star
187
No cenrio da resistncia cultural Morais (2005) ressalta a identidade do seridoense residente nos produtos da terra como queijo de coalho, manteiga da terra e bordados, diferenciados qualitativamente pela marca do saber fazer que mescla arte, tradio e inovao, evidenciando que a carga histrica no foi consumida pelo tempo e nem pelas adversidades (MORAIS, 2005, p.315).
240
Conect em Currais Novos e a Oi Velox em Caic, interligadas por redes menores s Backbones188 (Espinha Dorsal), redes de alta capacidade das gigantes TELEMAR (OI) e EMBRATEL (FIG. 6),
Figura 6 - Principais Backbones do Brasil Redes de Alta Capacidade Fonte: <www.arede.inf.br/inclusao/images/capa_mapa.jpg> Acesso em 09 de Junho de 2010.
A aquisio do ciberespao no Serid torna-se possvel atravs dos servios oferecidos por provedores e operadoras telefnicas. O tipo de velocidade de acesso internet oferecido por provedores no territrio seridoense est dividido em suas categorias: Dial-up (linha discada) que requer a utilizao de linhas telefnicas com a velocidade mnima 56kbps e a banda larga que oferece velocidades variadas entre 128kbps e 512kbps por meio de redes cabiadas ou redes locais sem-fio Wi-Fi que utiliza tecnologias que distribuem um sinal de internet de uma linha central s antenas de rdio instaladas na casa dos usurios. A tecnologia Wireless (sem fio) j presente no territrio seridoense permite que os provedores ofeream internet a uma rea geogrfica mais abrangente, sem a necessidade de fios ou cabos, atravs da radiofreqncia de antenas utilizadas para amplificar o sinal de rdio emitido pelos dispositivos sem-fios instalados nas
188
Esquema de ligaes centrais de um sistema mais amplo, tipicamente de elevado desempenho.As redes que formam a Internet so interligadas por outras redes de alta capacidade, chamadas Backbones (so poderosos computadores conectados por linhas de grande largura de Banda, como canais de fibra ptica, elos de satlite e elos de transmisso por rdio). Uma breve introduo ao uso dos recursos disponveis na rede <www.assis.unesp.br/egalhard/imagens2/rnp07a.jpg> Acesso em 09 de junho de 2010.
241
empresas provedoras. A invisibilidade da rede permite tambm o fluxo invisvel e instantneo de informaes a distncias quilomtrico sendo verdico dizer que h tambm no Serid a aniquilao do espao pelo tempo. A tabela apresenta as principais empresas do setor de servios de internet do Serid (Tabela 1):
Cidades Caic Caic, Currais Novos Caic Caic, Currais Novos, Jardim do Serid, Jucurut, Parelhas Caic Caic Parelhas Currais Novos Currais Novos Caic
Serid Net Speed Net MK Vex Sidys TV a Cabo Star Conect Serid Net
Tabelas 1 Principais provedores de Internet do Serid Fonte: Entrevista realizada junto s empresas em Junho/ 2010 1. Star Conect 2. Ativa Comunicaes
Termos como Bluetooth e Wi-Fi Wireless Fidelity (fidelidade sem-fio), que aludem a transmisso de informao curtas e longas distncias respenctivamente, se tornam a cada vez mais populares no cotidiano de jovens e adultos no Serid. Tal como afirmou Haesbaert dentro dessas articulaes espaciais em rede surgem territrios-rede flexveis onde o que importa ter o acesso, ou aos meios que possibilitem a maior mobilidade fsica dentro da(s) redes(s), ou aos pontos de conexo que permitam jogar com as multiplas modalidades de territrios existentes criando a partir dai uma nova multiterritorialidade (HAESBAERT, 2005, p. 14). Todavia nunca exaustivo enfatizar que, mesmo em sua crescente popularidade, as novas tecnologias da informao encontram-se limitadas ao poder de aquisio dos sujeitos, portanto restringem-se a um grupo seleto. Da interconexo dos territrios pelas vias informacionais ou virtuais emerge a condio ps-moderna da multiterritorlialidade, evidenciada em um novo territriorede em sentido estrito ou rede-territrio onde a [...] perspectiva euclidiana de um 242
espao contnuo praticamente sumcumbe descontinuidade, fragmentao e simultaneidade de territrios que no podemos mais distinguir claramente onde iro eclodir, pois formaes rizomticas tambm so possveis (HAESBAERT, 2007, p.348). A invisibilidade da rede permite tambm o fluxo invisvel e instantneo de informaes a distncias quilomtricas, sendo verdico dizer que h tambm no Serid a aniquilao do espao pelo tempo (FIG. 7)
Figura 7 Lgica da aniquilao do espao pelo tempo no territrio seridoense Fonte: Elaborado pelo Autor
O alargamento da vida de relaes sociais tambm uma novidade para o seridoense, pois as conexes em redes permitem o contato com pessoas em diferentes cidades da regio, mesmo quando este est geograficamente limitado. Alm de poder vivnciar a nova multiterritorialidade pela conexo com vrios territorios mediante a velocidade e interatividade das redes, os serdoenses podem observar movimento do territrio-zona pelas linhas informacionais. As novas possibilidades de articulao pelas conexes em rede permitiram hospedar a imagem do territrio seridoense no ambiente virtual dos ciberespaos. Hodiernamente a marca Serid trafega pelos vrios pontos de conexo no mundo, por meio de domnios de sites que hospedam contedos relacionados a poltica, sociedade e cultura seridoense. Ao mesmo tempo entra no territrio, pelas redes, uma carga ainda maior de informaes de vrios outros terrtrios-zona e territriosrede (FIG. 8)
243
Embora o territorio seridoense apresente-se com maior fluidez e articulaes mais dinmicas e rizomticas, a identidade territorial de seus habitantes tem sido (re)valorizada nos ciberespaos, ante a tendncia de aculturao provocada pelas redes virturais. A lgica zonal do terririo seridoense, manifesta-se tambm nos espaos vituais, na importncia dada aos elementos culturais da regio em sites que divulgam ao mundo as tradies do seridoense. As (re)definies culturais do sujeito seridoense ou suas (re)territorilizaes como diria Haesbaert a partir do contato com essa nova multiterritorialidade disponvel no Serid, no so aferidas nesta anlise. Porm notrio reconhecermos de que a dinmica multiterritorial perpassada no territrio via internet, tem gerado uma busca pela (re)essencilizao da identidade territorial, identificvel na valorizao dos produtos regionais vendidos no site turstico
(http://www.roteiroserido.com.br/) que descortina todas peculiaridades do Serid como suas atrativas paisagens naturais e culturais. Sobre a (re)essencializao da identidade territorial, pode-se afirmar que a identidade seridoense perdura atualmente ao lado de num processo de hibridao cultural recente na regio, manifesto nas festas de motoclubes que mistura ao mesmo tempo aspectos da cultura norte americana e sertaneja (FIG. 9)
244
Figura 9 Cartaz do Cactus Moto Fest em Currais Novos: exemplo de hibridismo cultural no Serid Fonte: <http://www.revistamotoclubes.com.br> Acesso em 09 de Junho de 2010.
A festa em si propicia a fuso de elementos culturais, possveis de serem notados na vendagem de comidas tpicas do Serid associada ao tradiconal perfil norte-americano dos motoqueiros vestidos de jaquetas pretas expondo entre tantas outras a marca Harley-Davidson, como tambm no entretenimento musical da festa que reune bandas de reegae, rock e forr. O Caic Moto Fest e o Cactus Moto Fest, so os principais eventos da modalidade, destacando esse ltimo como um dos maiores encontros de motoqueiros do Nordeste, instituido na programao cultural do Roteiro Serid. Existem vrios motoclubes criados na propria regio como: Carcars do Serid, Caveiro do Asfalto, Cactus Moto Club, Comando do Asfalto, Caveiras do Serto, Cameles Caicoense, Boqueiro Motoclube, Drages do Serid entre outros. Enquanto uns promovem a incluso de novos elementos culturais numa abertura ao hibridismo, outros reforam a lgica zonal numa espcie de invocao identidade territorial seridoense. Grupo de empresrios vem utilizando o potencial das tecnologias da informao, para promover uma imagem unificada do territrio seridoense em torno de uma estratgia que une num s engodo (Figura 6), o peso da identidade regional e o marketing comercial, valorizando o vislumbre de referencias identitrios dos seridoenses em seus logotipos,
245
Figura 10 Logotipo da Rede Serid de Supermercados Fonte: <www.redeserido.com.br/images /logo_redeserido.png> Acesso em junho de 2010.
O logotipo acima apenas um dentre vrios anncios comerciais existentes nas cidades seridoenses, que reforam a predominncia da lgica zonal no territrio. Muitos tm apostando no valor simblico que h na marca Serid, nas propagandas de seus empreendimentos comerciais, na inteno presumvel de provocar no sujeito o despertamento pelos referenciais culturais, objetivando assim ascender preferncia ou exclusivismo pelo o que da terra, demonstrando assim, uma recusa por smbolos de outras culturais. Nesse exemplo pode-se evidenciar a lgica zonal sendo efetuada na regio seridoense, na pouca abertura dada para a diversificao de elementos culturais. No logotipo supracitado possvel tambm de se verificar a lgica zonal sendo interpelada pela reticular, onde lgica das redes mesmo que de forma secundria adotada por alguns empresrios para fortalecer econmica da regio. Diante desses novos e dinmicos processos de reconfigurao territorial, a identidade seridoense vem se (re)definindo ao trmino da primeira dcada do sculo XXI. As dinmicas zonais ainda prevalecem e reivindicam contra o enfraquecimento da identidade seridoense, mesmo quando essas dinmicas apresentam-se mais abertas como nas festas de moto clubes ou mais fechadas como na nfase dada marca Serid pelo setor de comercial. Mesmo no ambiente dinmico e multiterritorial dos ciberespaos a identidade territorial seridoense, tem sido revalorizada pelos servios tursticos que espetacularizam os principais referenciais culturais do (ser)to seridoense.
246
4.6.4 Dinmica multiterritorial e (re)essencializao das identidades territoriais nas Assembleia de Deus Reduzindo a escala da anlise territorial chega-se ento ao outro patamar das geometrias do poder: o territrio das Assembleia de Deus. Como o territrio assembleiano est encaixado ou justaposto ao territrio seridoense, e as foras geradas pelas transformaes tcnicas e socioculturais que pressionam a identidade seridoense, so as mesmas que incidem sobre as identidades territoriais da AD no Serid. Por conseguinte, discorrer-se-, de como essa onda de inovaes tem afetado os elementos culturais do sistema religioso assembleiano. O sujeito assembleiano em algum momento pode apresentar-se como um sujeito seridoense, mesmo recusando alguns dos elementos da cultura regional, considerados como pagos. Essa mltipla identificao uma realidade que, inevitavelmente atinge e respalda a formao identitria de todos pentecostais assembleianos que convivem cotidianamente com alguns dos elementos culturais da regio seridoense. Isso demonstra que a justaposio do territrio da AD no Serid, reflete dupla escala de poder que envolve a identidade assembleiana, pentecostal e seridoense concomitantemente. Foram abordadas anteriormente, algumas das aes que procuram resignificar a identidade seridoense diante das novas possibilidades de articulao do territrio, principalmente nas que proporcionaram uma maior mobilidade e interatividade com outros territrios culturais, como o caso do acesso a internet. Antes de identificar algumas das aes institucionais da AD diante desse mais novo panorama social, imprescindvel destacar o tipo de territorializao que ela exerce perante as dinmicas multiterritoriais. Considerando os dispositivos normativos do Estatuto e Regimento Interno da IEADERN, observa-se que a AD no Serid desenvolve um domnio relativamente fechado, podendo ser identificado nos fins ou objetivos de territorializao propostos por Haesbaert (2005, p.5), como [...] identificao ou simbolizao de grupos atravs de referentes espaciais (a comear pela prpria fronteira) ou [...] disciplinarizao ou controle atravs do espao (fortalecimento da idia de indivduo atravs dos espaos tambm individualizados). Os cdigos que regem a conduta dos lderes e liderados priorizam a ortodoxia e a tradio dos usos e costumes, tanto mbito das igrejas como fora dela. A pouca flexibilidade doutrinria expressa no Estatuto Social e Regimento Interno
247
demonstra que o conservadorismo ainda predomina no territrio das AD no Serid e fazendo com que seu sistema de crena (pentecostalismo) seja considerado como clssico, pelo fato de ainda permanecer com suas caractersticas primrias ante as novas tendncias de modernizao, ocorridas na dcada de 1990 pelas igrejas neopentecostais brasileiras. Desta forma, os Campos Eclesisticos da AD em sua totalidade, identificamse como territrios-zona, forjados numa lgica de controle restrito utilizando prioritariamente o recurso a limites mais exclusivistas ou a fronteiras bem demarcadas (HAESBAERT, 2007, p.307). Pode-se entender tambm que, a relao entre a AD (territrio eclesistico) e o Serid (territrio regional) se d numa justaposio de territrios-zona, o que justifica a existncia de uma diversidade territorial, que se interpelam por terem seus substratos fsicos encaixados um no outro. A justaposio de territrios contribui para que em determinados momentos, processos que incidem sobre um, tenha relevncia para o outro num movimento pendular de efeitos. Por encontrar-se sobreposto em um territrio visivelmente maior que a regio do Serid, o territrio da AD se vale da infraestrutura e dos servios disponveis para exercer sua territorialidade como, rede telefnica, rede eltrica, rede informacional, instituies judiciais, setor comercial, segurana entre outros essenciais ao bom funcionamento de suas atividades. Portanto, se as conexes virtuais possibilitam que o territrio seridoense participe mesmo que de forma restrita da dinmica multiterritorial, reconhece que o territrio assembleiano possui a mesma probabilidade de desfrutar dessa dinmica multiterritorial mediante aos aportes tcnicos inscritos do Serid. Assim inconcebvel dissociar ou excluir o territrio assembeliano dos processos sociais advindos juntamente com as novas articulaes do territrio seridoense. Os ditames dos processos sociais coagem os territrios a adaptarem e/ou refazerem seus limites o que pode representar o avano ou o recuo deles. Segundo Ricardo Mariano (1999) existe dentro das igrejas pentecostais ortodoxas um movimento de flexibilizao ou de abertura para uma nova reformulao de suas caractersticas dogmticas,
Os usos e costumes tradicionalmente praticados no pentecostalismo clssico [...] reconhecidos pelos crentes como smbolos da converso, prova de regenerao e sinal de santificao, esto, com poucas excees, sendo flexibilizados ou
248
adaptados aos novos valores, hbitos e gostos dos fiis a aos estilos de vida dos virtuais adeptos (MARIANO, 1999, p.204).
Estudando as igrejas pentecostais da regio metropolitana de So Paulo, o autor identifica uma tendncia de liberalizao dos usos e costumes no pentecostalismo ortodoxo, desencadeada no final da dcada de 1990 que de forma sutil alcanou tambm as Assembleia de Deus. fato que a AD nas regies metropolitanas no est justaposta num territrio-zona, mas em um territrio-rede descritos por Haesbaert (2007, p.342) como espaos de territorializaes [...] efetivamente mltiplas, resultantes da sobreposio e/ou da combinao particular de controles, funes e simbolizaes, como nos territrios pessoais de alguns indivduos ou grupos mais globalizados [...]. Na metade da dcada de 1980 novos paradigmas doutrinrios comeam se alastrar por meio do neopentecostalismo nascido basicamente nas metrpoles brasileiras de So Paulo e Rio de Janeiro. As igrejas ligadas a essa nova neoreligiosidade so responsveis pela redefinio do pentecostalismo no Brasil e tiveram seu crescimento fundamentado em movimentos essencialmente dinmicos e multiterritorizados, obedientes a uma lgica capitalista que promoveram uma mercantilizao do sagrado. As grandes mudanas ocorridas nas igrejas evanglicas durante as dcadas de 1980 e 1990 no Brasil foram protagonizadas pelas igrejas neopentecostais, que difundiram dois dos maiores movimentos religiosos da contemporaneidade conhecido como a Teologia da Prosperidade189 e do Movimento Gospel190. O neopentecostalismo abandona toda rgida doutrina do pentecostalismo clssico para promover o crescimento de suas instituies.
189
A teologia da prosperidade conforme Arajo (2007, p.617) tributria das reflexes teolgicas e filosficas de religiosos americanos no sculo XIX. A forma embrionria dessa nova doutrina residia nos ensinos metafsicos ligados filosofia do novo pensamento de Phine P. Quimby (180266), o qual estudara espiritismo, ocultismo, hipnose e parapsicologia. Herdeiro dos ensinamentos de Quimby, Essek Willian Kenyon constri um arcabouo teolgico sincrtico no qual denomina de confiso positiva da palavra de Deus. Seus ensinamentos so trabalhados por Kenneth Hagin, sendo este o maior divulgador da teologia da prosperidade, influenciando vrios pregadores nos E.U.A. Em suas cruzadas Hagin atestava que a prosperidade era um direito divino, onde a partir dessa idia formulou as leis da prosperidade para serem recitadas diariamente por aqueles em busca de sade e riqueza. O movimento gospel surge com uma onda de aculturao onde incorporado todo e qualquer ritmo musical, incluindo os vinculados a dana e a maneiras sensuais, como lambadas, e a valores de estilos de vida opostos aos dos crentes como rock, funk e rap, o movimento gospel enfrentou resistncia, sofreu acusaes de mundanismo e de desvio doutrinrio (MARIANO, 1999, p. 213).
190
249
O discurso da fidelidade financeira da Teologia da Prosperidade e o perfil liberal do Movimento Gospel abalaram de certa forma as estruturas da ala tradicional do pentecostalismo, que at ento defendia uma identidade religiosa irredutvel e imune a qualquer tentativa de sincretismo. As consideraes de Arajo (2008) demonstram a tenso vivida pelo pentecostalismo clssico quanto s inovaes trazidas pelo diversificado sistema neopentecostal,
Com o surgimento das igrejas neopentecostais, houve ruptura na tradicional identidade pentecostal, principalmente na parte esttica, na aparncia, irrompendo um novo modo de ser pentecostal: movimento gospel com a pregao do evangelho por meio de rock e demais ritmos tidos como profanos e da moda; liberalizao dos usos e costumes e hbitos dos crentes; estratgias e formas de evangelizao contextualizadas, com uso da televiso, shows, bares, blocos no carnaval, marchas; a salvao e vida crist como fonte de bnos aqui e agora, nas finanas, sade e empreendimentos terrenos; menos nfase unicamente no poder e espiritualidade do batismo no Esprito Santo e dons espirituais; novas formas na luta contra o Diabo, a carne e o mundo [...] (ARAJO, 2008, p. 357.)
Os
centros de
comando
do pentecostalismo clssico
que
esto
basicamente localizados nos espaos reticulares e dinmicos das regies metropolitanas sentem de forma mais agressiva a presso exercida pela diversificao dos sistemas de crena dos neopentecostais. Nestes centros as redes imperam com novas capacidades e ritmos, fazendo com que ocorra uma difuso crescente de fluxos imateriais que, atravs da conexo na descontinuidade, introduzem aspectos geopolticos novos e sublinham a necessria atualizao da prpria noo de territrio (BAKIS apud HAESBAERT, 2007, p.295). O sincretismo religioso trs o discurso da desterritorialiazao, se mostrando tambm como um dos processos de desenraizamento dos referenciais simblicos, que em nossa anlise desintegraliza o movimento pentecostal. Na abordagem sociolgica de Ricardo Mariano (1999, p. 204) esses processos desterritorializadores so tidos por ele como mudanas, decorrentes das revolucionrias transformaes culturais e comportamentais, das quais ningum ficou imune, que varreram o Ocidente a partir dos anos 60. Dentre as conseqncias trazidas pela Teologia da Prosperidade est a desvinculao institucional do prprio fiel. Um dos artifcios mais importantes para o fortalecimento denominacional valorizada pelos pentecostais clssicos ou ortodoxos, como a sociabilidade comunitria, suprimida por mecanismo de adeso em massa 250
onde nesses meios, quase no h lugar para a vivncia de um corpo unificado de significados e valores, uma vez que a lgica capitalista inserida nessas igrejas permite que o adepto participe das reunies da igreja sem ter que praticar uma tradio religiosa expressa num conjunto de princpios e valores sectrios. A desvinculao de um sistema normativo se d pela terceirizao da f. Essa nova ordem foi estabelecida pelo aumento da demanda por servios religiosos, onde qualquer individuo pode, sem necessariamente ser um membro efetivo, transferir sua orao e suplica aos profissionais da f nas campanhas temticas promovidas por vrias igrejas neopentecostais. O movimento gospel191, por sua vez mais difundido pelos grupos musicais das igrejas evanglicas, defende uma filosofia de vida crist alternativa e sem apegos a tradicionalismos, onde o crente no mais referenciado por um s esteretipo como, por exemplo, a do religioso com a Bblia embaixo do brao e palet, mas, por vrios perfis mais atpicos ao meio conservador evanglico como com cabelos compridos, brinco, tatuagem e roupas mais coloridas. O movimento gospel aberto a todas as tribos, que ao aderi-lo o individuo no precisa abandonar o estilo de suas vestimentas nem to pouco o grupo a qual pertence, pois sua permanncia neste poder resultar em mais convenes ideologia gospel. No meio gospel no h um distintivo padro, ningum mais rotulado, pois todos esto visivelmente iguais na diversidade de estilos, j que o que os une no normas nem perfis fechados, mas a mensagem do evangelho de Cristo. Outra forte influncia do movimento gospel nas liturgias dos cultos. O apego exagerado a normas e procedimentos que conduz uniformidade seqencial dos cultos abandonado por vrias igrejas neopentecostais. A Igreja Renascer em Cristo a principal cone nas transformaes litrgicas, promovendo reunies em forma de shows em cinemas, teatros e prdios desativados. Esses imveis quando locados ou adquiridos perdem sua funcionalidade primeira sendo transformados em igrejas, onde a liturgia tradicional sede espao para a outra descontrada e diversificada como detalha Mariano (2002, p.215-218), [...] descontrados, vestidos
191
Segundo Ricardo Mariano ressalta que no Brasil a msica gospel nada tem haver com spiritual ou com a musicalidade pretrita dos negros norte-americanos. Ela se define pela mensagem. Para os crentes, gospel toda msica que fale de Deus, de seus atributos prprios e propsitos. Vinculadas a diversas igrejas, existem centenas de bandas gospel espalhadas no pas, grande parte delas no eixo So Paulo-Rio de Janeiro. Sem preconceitos, todos os ritmos, gostos e estilos musicais esto contemplados: rock, funk, punk, dance music, blues, rap, pop, heavy metal, white metal, reggae, jazz, balda, lambada, samba, pagode, baio, sertanejo, forr [...] (MARIANO, 1999, p.213).
251
de jeans e folgadas camisetas com inscries bblicas, [...] enquanto isso danam imitando coreografias de dana profanas. As inovaes ocorridas no meio evanglico pentecostal mostram o quanto multiplicidade de territrios pentecostais agenciou uma espcie de religiosidade sem razes e/ou de referenciais bem demarcados. O desenraizamento patente na territorialidade desses movimentos, e aludem problemtica da desterritorializao, em funo da dissolvisso dos limites territoriais nas e pelas denominaes neopentecostais, especialmente por encontrarem num contexto diversificado e de transformaes repentinas das metrpoles. Para Haesbaert todo processo desterritorializador seria uma multiterritorialidade, ou seja, um processo de (re)territorializao em que estamos envolvidos, construindo territrios muitos mais mltiplos ou, de forma mais adequada, tornando muito mais complexa nossa multiterritorialidade (HAESBAERT, 2007, p.1). O pentecostalismo torna-se muito mais complexo na atualidade, em funo dos territrios-rede em que se encontram envolvido, caracterizados pela dinmica de interconexes e recombinao de territrios mltiplos. O estudo de Ricardo Mariano sobre a nova sociologia do pentecostalismo brasileiro est focado no crescimento da teologia da prosperidade e do movimento gospel no contexto cosmopolita da regio metropolitana de So Paulo e indiretamente faz meno dos processos globalizantes facilmente reconhecidos nas igrejas neopentecostais. Embora relate as transformaes revolucionrias que pressionam as igrejas do pentecostalismo clssico, o autor no especifica quais os campos simblicos esto sendo impactados por essas transformaes. Identificamos que, as mudanas trazidas com o movimento gospel e pela teologia da prosperidade atingem principalmente os dois principais centros de significao das Assemblia de Deus: a identidade assembleiana e pentecostal. Foram estes ncleos de identificao que mais sentiram a presso ocasionada pela liberalizao dos princpios doutrinrios da teologia da prosperidade e do movimento gospel. Dentro desses movimentos h uma rica fuso de elementos culturais realizados no mbito de dinmica mutliterritorial das grandes cidades
metropolitanas, interpretada aqui como um movimento de coage o pentecostalismo ortodoxo a se abrir para um dilogo mais estreito com novos conceitos religiosos. O consenso entre as Assembleia de Deus dirigidas pelos parmetros da CGADB, ante essa onda de inovaes, foi a de no abrir mo dos aspectos mais essenciais de sua tradio, por questes relacionadas prpria doutrina de 252
santidade vivenciada desde seus primrdios e por outras ligadas poltica eclesistica. Mesmo nas grandes cidades como So Paulo afirma Mariano (1999, p. 205) a Assemblia de Deus, embora esteja aos poucos, mas em flagrante descompasso, acompanhando as transformaes da sociedade e do movimento pentecostal, ainda consta entre as igrejas que mais interpem resistncia s mudanas nos rgidos usos e costumes. O neopentecostalismo no Serid um fenmeno ainda recente e a proposta de vida crist trazida com ele no teve tanta expressividade quanto nas regies metropolitanas. A inexistncia de estudos regionais que contemplem a formao do neopentecostalismo no Serid nos direcionou analisar os possveis eventos que contribuam para a atrao de novas demoninaes religiosas para a regio: como o processo de modernizao e o acentuado contingente urbano das cidades seridoenses, ambos eventos esto intimamente ligados. A modernizao da regio seridoense esteve ligada aos efeitos decorrentes da crise das economias tradicionais como o trip algodo-pecuria-minerao, o que na dcada de 1980 impulsionou os fluxos de deslocamento rural-urbano. No que ressalta Morais (2005, p.275) o incremento populacional nas cidades seridoenses gerou uma demanda social pela ampliao da infra-estrutura de saneamento bsico, eletrificao, transportes, pavimentao e iluminao de ruas. Nesse perodo o segmento de prestao de servios aumentou significadamente com destaque para servios como transportes, comunicaes e comrcio era a reconfigurao do perfil scio-econmico da regio que passava de agrrio/rural para tercirio/urbano. Assim o aumento populacional em ambientes urbanos se deu pela derrocada da dos pilares da economia algodo-pecuria-minerao,
responsvel por desencadear um processo migratrio no sentido campo/cidade, que por conseguinte demandou a melhoria das condies de vida de populao. A boa infraestrutura das cidades um forte fator de atrao religiosa, pois facilita a instalao de suas naves e favorecem o acesso e freqncia dos fiis. Este o caso da maioria das igrejas do ramo neopentecostal que seguem a lgica de instalao da IURD em Caic e Currais Novos. Segundo Almeida (2004, p.23) os lideres da IURD procuram instalar seus templos basicamente nas vias principais e distantes das reas de maior vulnerabilidade, e que a implantao desses templos, tal como suas catedrais luxuosas nos centros urbanos visam conseguir visibilidade e adeso em massa.
253
O aumento populacional nas cidades seridoenses apresenta-se como campo vasto para conquista de novos fiis. Levando em considerao que, as instituies religiosas so mantidas pelas doaes e sistema de dzimos, quanto maior o contingente populacional, maior ser a possibilidade de acolhimento e apoio financeiro de templos e de suas lideranas. Ao descrever a massa de capital circundante na regio do Serid Morais (2005, p.279) deduz que, dada significativa participao dos servios pblicos no mbito do tercirio essa massa tem sua origem nos salrios, penses e aposentadorias pagas populao. Somente o contingente atual da populao urbana conseguiria dar suporte financeiro ao crescente quadro religioso seridoense, fatores esses decisivos para a implantao de uma denominao neopentecostal. Em decorrncia dessa multiplicidade de prticas religiosas que permeiam a sociedade seridoense surge tambm novos territrios sagrados em pleno Territrio de SantAna. Mesmo sendo uma tendncia nacional a flexibilizao dos usos e costumes nas Assemblia de Deus do Serid, tem acontecido lentamente e sem demais progressos, tendo em vista o forte ascetismo predominante nas igrejas, que ainda se opem aos modismos das novas geraes de membros e pastores. Os traos da identidade assembleiana tm sido resguardados no genuinamente na conservao dos usos e costumes, que hoje se representa como uma tradio expressa num conjunto de posturas ticas e no perfil esttico dos membros. Esses costumes seguidos pela comunidade assembleiana, que vo desde o desuso de barba crescida ao uso de cabelos crescidos pela mulher, como tambm na valorizao na compostura das vestimentas fora e dentro do templo. O forte sentido de comunidade cultivado na Assemblia de Deus facilita o consenso dos membros em no flexibilizar a tradio dos usos e costumes. Em contrapartida a nova lgica adotada pelo neopentecostalismo rompe com a obrigatoriedade de sociabilidade comunitria, no momento em que privilegiam a adeso em massa de novos fiis. No que se refere identidade pentecostal essa foi a que mais tem sofrido alteraes em torno de seu contedo simblico. O sistema de crenas pentecostal o grande responsvel pela identificao ou reconhecimento do espao mstico do fiel. Desta forma, o pentecostalismo enquanto sistema de crena pautado necessariamente na experincia mstica com Esprito Santo, e se mstico (misterioso) tambm imprevisvel e age de forma no sistemtica. Os pentecostais foram formados com esta conscincia, que no poucas vezes, essa tem gerado 254
equvocos quanto ao entendimento da verdadeira experincia com o Esprito Santo. Os neopentecostais so tributrios dessa mentalidade e seguem enriquecendo os smbolos que representam a experincia com Esprito Santo. Partindo dessa caracterstica do pentecostalismo percebe-se que no h regras ou requisitos bem definidos para serem observados quando se busca a experincia pentecostal. O pentecostalismo de fato um sistema aberto, diferente dos usos e costumes que so cdigos bem previsveis e fechados. Por ser um sistema de crena mais flexvel entendemos a crena pentecostal em sua plasticidade onde nada pode frear a incorporao de elementos novos quando so apresentados como substitutos ou complementares dos j existentes (CLAVAL, 2007, p.87). Nos ltimos decndios da dcada de 1990, os neopentecostais por meio da teologia da prosperidade e do movimento gospel enriqueceram o vocbulo pentecostal. A obra com tom de alerta, lanada em 2007 pela editora da CGADB intitulada: Mais Erros Que Um Pregador Deve Evitar192, escrita por Ciro Sanches Zibordi, mostra como entrada sorrateira dos jarges e clichs neopentecostais ameaa a integridade doutrinria do pentecostalismo tradicional. Tendo em vista multiplicidade de referenciais simblicos que fazem meno ao sistema de crena pentecostal, pode-se dizer que a prpria identidade pentecostal plstica por ser facilmente adaptvel a novos valores msticos forjados pelas igrejas neopentecostais, o que o torna bem mais instvel e difcil de conceitu-lo hodiernamente, fato este ponderado por Claval (2007, p.86) quando recita o fato de que os homens estejam inscritos numa continuidade e sejam sempre herdeiros no os priva de criatividade. a prpria elasticidade do sistema de crena pentecostal que facilita que os limites subjetivos do territrio assembleiano sejam discretamente transpassados por novos smbolos e valores. O pentecostalismo assembleiano resiste contendo a ploriferao desses movimentos dentro de seus templos atravs dos cdigos de conduta constitudos nos Estatutos e Regimentos Internos, que apenas retardam mais no cessam com a incorporao de novos elementos em suas comunidades.
192
Neste livro o presbtero da AD Ciro Sanches trs uma reflexo sobre os principais termos implementados principalmente pelas igrejas neopentecostais como: fui chamado para pregar milagres, no desista dos seus sonhos, esta uma gerao de adoradores, eu lhe transfiro minha uno, crente com barulho est com defeito de fabricao entre outros empregados nas liturgias pentecostais.
255
Sentindo mais prximo o contexto e o poder de transformaes, a Assemblia de Deus no Serid tem procurado proteger seu rebanho de possveis contatos com as ideologias neopentecostais. Os elementos do movimento gospel e da teologia da prosperidade nascidos em ambientes multiterritoriais das grandes cidades, j so modestamente desenvolvidos pelas igrejas neopentecostais no Serid que tentam se adequar as transformaes da sociedade contempornea. Por ser um territrio-zona que valoriza uma maior homogeneidade de seu grupo, a Assemblia de Deus tem se fechado diante dos processos de hibridao ou sincretismo dos neopentecostais. No vivenciando efetivamente um contexto multiterritorializado das regies metropolitanas a comunidade assembleiana apenas expectadora desses processos que de forma restrita atinge o territrio seridoense como demonstrado em suas novas articulaes. Essa postura da AD apresenta-se como um retorno ao fundamentalismo pentecostal, o que segundo Haesbaert lida o outro lado dos processos de multiterritorializao em que suas identidades territoriais so re-essencializadas. Ao lado dos hibridismos ou de suas tendncias, h tambm surgimento de fundamentalismos que se recusam manter um maior intercmbio cultural. No caso da AD no Serid podemos afirmar numa busca pela reessencializao das identidades territoriais, atravs a execuo dos dispositivos normativos do Estatuto e Regimento da IEADERN, que em essncia no amplia, mas estabiliza as escalas materiais e simblicas de seu poder ante a minuciosa dinmica multiterritorial que circula o territrio seridoense pelas redes e suas influncias mais imediatas do neopentecostalismo. A assertiva de Burke apud Haesbaert (2007, p.51) descreve que o hibridismo enquanto uma troca ou enriquecimento cultural s vezes ocorre em detrimento de algum. No domnio poltico da AD segue essa realidade entre nova e a velha gerao de lderes. No raro o conflito desses dois grupos tem favorecido
manobras polticas que buscam a permanncia de poder da classe mais antiga de pastores, pois tanto a indentidade como a sua re-essencializao no formadas [...] por grupos buscando reconhecimento, mas tambm por grupos buscando a dominao (ISIN & WOOD apud HAESBAERT, 2007, p.50). Os fatos comprovam que os lideres assembleianos tem escolhido ficar distantes e at mesmo de fora, dessa onda de hibridismo cultural que os cercam tanto pelas vias tecnologias quanto pelo sincretismo neopentecostal. O ritmo
256
contrrio seguido pela Assemblia de Deus no Serid em parte um receio diante da,
[...] aparente perda de referenciais identitrio-territoriais e/ou frente fragilizao material e simblica, ou ainda atravs de uma avaliao crtica (por averso e/ou temor) em relao velocidade das transformaes e multiplicidade desses referenciais [...] muitos grupos se apegam as suas razes identitrias, que se tornam assim uma espcie de ltimo capital (simblico), reconstrudo atravs da histria e da geografia e, por isto, tido como slido e indestrutvel (HAESBAERT, 2007, p.63).
Parece que nas Assembleia de Deus o novo assume quase sempre assume conotaes de profano daquilo que vem para subverter os valores sacros de seu sistema de crena. O discurso dos lideres assembleianos tem defendido uma recluso territorial, o que para os mais conservadores uma ao benfica contra a entrada do mundo na igreja, que facilita o retorno aos princpios no pentecostalismo ortodoxo. A Assemblia de Deus est entre aqueles grupos que tentam assegurar a impermeabilidade dos limites material/simblico do seu territrio, sempre na inteno de preservar sua exclusividade diante da confuso identitria que vivem vrias denominaes evanglicas. No se pode concluir ainda se essa recluso territorial em meio ao crescente a multiterritorialidade trar o resultado esperado pela denominao que : sobreviver ntegra e ortodoxa e como o maior movimento pentecostal do pas, diante dos processos dinmicos e globalizantes da contemporaneidade.
257
258
Consideraes finais A Igreja Assemblia de Deus enquanto fenmeno religioso tem conseguido por meio das suas estratgias de dominao espacial d continuidade difuso do movimento pentecostal em terras brasileiras procurando sempre aproximar-se essencialmente do contedo simblico dos movimentos avivalsticos iniciados no final do sculo XIX na Amrica do Norte como tambm na Europa. Para que as principais caractersticas do pentecostalismo fossem
preservadas em meio ao contexto metamrfico das regies metropolitanas, como tambm nas realidades menos dinmicas das cidades interioranas, a Assemblia de Deus adotou ortodoxia como linha central de toda sua prtica territorial. O conservadorismo estabelecido pela liderana eclesistica reside apenas nos preceitos ideolgicos e doutrinrios, porm sua metodologia de crescimento mostrou-se mvel no espao urbano das cidades. Ao contrrio de um previsvel efeito retroativo, as estratgias de crescimento adotadas acabaram por tornar a sua territorialidade dinmica e flexvel. Mesmo com um crescimento marginal ou perifrico, a territorialidade assembleiana alcanou com maestria populao pobre de grandes cidades brasileiras como Rio de Janeiro e So Paulo, o que lhe concedeu o status de maior denominao evanglica do pas e tornou-se impreterivelmente uma das principais marcas de sua estratgia evangelstica. Ao se estabelecer no Serid norte-rio-grandense em 1942 a Assemblia de Deus empregou de forma bastante coerente os mtodos de crescimento adotados pelos templos centrais da AD nas grandes cidades, o que resultou em trs Campos Eclesisticos. Inicialmente, em contra partida a AD aplacou revelia da prpria cultura seridoense. A formao territorial e identitria do Serid que se confundia com a prpria histria da Igreja Catlica, explica em parte, resistncia da populao fortemente ligada a uma identidade religiosa catlica ao proselitismo pentecostal assembleliano nos seus primeiros anos de evangelizao. O pouco acolhimento dos seridoenses a essa nova religiosidade, apenas retardou, mas no impediu que a influncia da AD se expandisse no quadro religioso seridoense. A eficincia da territorialidade da AD no Serid est fundamentada num sistema de crena (pentecostal) e como tambm no sistema de reproduo territorial (pontos de pregrao, congregao e templos). Como o poder objetiva o controle
259
sobre homens e coisas, esses so os principais mtodos utilizados pelos lderes assembleianos para expandir o raio de dominao nas cidades seridoenses. Tais mtodos so construdos na superposio de escalas de poder imbricados no vis material/idealista de suas aes. De forma indissocivel esses poderes apresentaram-se como um duplo domnio presente no processo de criao de novos territrios. O domnio (i)material da AD no Serid, mostrou que o territrio transpassado por dimenses inseparveis de poderes que se complementam nesse processo de circunscrio espacial. Desta forma as estratgias de controle do territrio assembleiano so guiadas pela dualidade do controle que se apresenta funcional e simblico no mesmo campo de poder. A gesto dos territrios assembleianos qualificou-se como carismticoburocrtico uma vez que o domnio simblico necessitou ser organizado administrativamente em funo do crescimento do nmero de igrejas como de membros nos Campos Eclesisticos. Por ser uma instituio que privilegia os aspectos msticos do territrio em face das demandas administrativas, o territrio assembleiano ainda apresenta deficincias no setor de secretaria, que aos poucos comeou a ser reorganizada pelas Igrejas Sedes de Caic e Currais Novos na dcada de 2010. Os Campos Eclesisticos da AD no Serid resultam do crescimento parcelado e descontnuo de igrejas-me estabelecidas nas cidades de Caic, Currais Novos e Parelhos, que cobriram a regio por meio de duas configuraes territoriais chamada por ns, de Jurisdio Regional e Jurisdio Citadina. Os Campos Eclesisticos na hierarquia territorial da AD so instncias simplesmente executoras de diretrizes e normas deliberadas pelas instncias superiores. A autonomia dos Campos Eclesisticos reside apenas em tomar decises administrativas locais e regionais, quanto reformulao dos aspectos legislativos e doutrinrios, e, portanto ideolgicos, fica restrito cria de pastores ligados IEADERN e CGADB respectivamente. Se tratando do crescimento de cada campo eclesistico, todos de forma menos ou mais intensa, foram impulsionados pelas dinmicas advindas com a decadncia das economias tradicionais, o que proporcionou dinmicas variveis devido as reconfiguraes espaciais e crescimento populacional do Serid de 1970 1980. O crescimento dos territrios assembleianos se d basicamente entre populao urbana, principalmente naquelas onde h maior precarizao das condies sociais. 260
Outro caso importante a ser destacado que, agrupado ao crescimento do territrio poltico da AD est expanso de um territrio simblico onde sua escala pode ser perfeitamente referenciada na prpria tessitura do territrio material ou funcional. O territrio imaterial estruturado pelo sistema de crena denominado pentecostal, que rege a ritualizao do sagrado nas Assembleia de Deus e define sua identidade religiosa. Nesse territrio intangvel so identificados domnios espirituais possveis de serem capitados pela decodificao dos valores a eles atribudos, somente atravs nos quais se reconhecem os limites desse campo de poder. A fora que emana dessa atmosfera mstica reitera e resguarda o poder das lideranas, que trabalham a conformao e obedincia dos fiis atravs dos cdigos estatutrios e regimentais da IEADERN. A transmisso da simbologia pentecostal no tempo e no espao seridoense esteve arraigada nas experincias prticas dos membros, o que deixou evidenciado que toda informao transferida aos adeptos foram assimiladas por meio de uma tradio oral e gestual. Alcanando em maior nmero pessoas simples e leigas quanto formao teolgica, o repasse dos preceitos doutrinrios e ritualsticos do pentecostalismo na AD se tornou menos burocrtico pelo fato desse sistema de crena ser compreendido na maioria das vezes pela observao de gestos e pelo escutar sucessivo da linguagem sacra pentecostal. Foi atravs dessa metodologia que a AD conseguiu arregimentar rapidamente um nmero de ministros proporcional ao crescimento de membros durante sua expanso no Serid. A pouca formao teolgica de seus lideres era compensada pelas virtudes e pelo comprometimento que eles apresentavam no exerccio dos seus pastorados. Sendo assim a avaliao dos aspectos morais era o principal norteador para a consagrao de pastores e obreiros nas Assembleia de Deus. Os smbolos transmitidos ao longo do tempo foram identificados como os referenciais mais ntidos dos limites do territrio imaterial da AD. No entanto, os smbolos so apenas referenciais que acionam o cognitivo do fiel para encompreender o valor sacro residente neles. A demarcao desse territrio imaterial se d, portanto, no campo cognitivo do sujeito religioso, ou seja, no valor sacro por ele atribudo aos smbolos pentecostais. Somente atravs desta anlise pde-se averiguar a existncia de um domnio puramente invisvel, onde as fronteiras se interpem aos indivduos pela fora do seu significado. 261
Neste contexto observou-se construo de identidades, uma ligada comunidade assembleiana e outra ao sistema de crena pentecostal. O contato duradouro do fiel quem projeta num sentimento de pertena, formando assim, um sujeito assembleiano e pentecostal ao mesmo tempo. Como todo indivduo no composto por uma nica identidade e que toda identidade no fixa ou fechada em si mesma, tentou-se identificar os principais processos contemporneos que atingem as identidades tidas como territoriais. Entre eles esto os fenmenos da compresso espao-tempo e do desencaixe espao-temporal, como processos ocasionados pela rapidez das informaes, capital e pessoas pelas redes globais. Tais fenmenos desferiram um impacto significativo no contedo das identidades territoriais em nosso tempo, pelo fato de possibilitar como nunca antes, o contato do indivduo com outros territrios mltiplos e mltiplos territrios. Ao estudar a identidade assembleiana e pentecostal ante esses processos globalizantes, nos ativemos a entend-las como territoriais, para ento, inseri-las no debate da Multiterritorialidade. Como a multiterritorialidade invoca o entendimento da interao e superposio de territrios-rede com territrios zona, foi necessria a caracterizao primeira do territrio seridoense em suas dinmicas zonais, para ento chegar a escala zonal do territrio assembleiano, tudo pela tica das geometrias do poder, que reconhece as distintas relaes entre os territrios que h entre diante dos fluxos e movimento das redes. Como o territrio assembleiano superpe o territrio seridoense, averiguouse que as possibilidades de conexo com processos como a multiterritorialidade so possveis e realizveis para ambos, mas sempre na individualidade de cada sujeito. A multiterritorialidade um fenmeno dinmico que perpassa o territrio seridoense pelas vias informacionais, no como uma experincia total do territrio, mas de forma restrita e ao campo da individualidade. possvel identificar a dinmica multiterritorial no Serid pelo entrecruzamento da dinmica zonal com a reticular em locais onde h acesso as conexes de internet, em que nesse aparato tcnico as pessoas podem utilizar a rede para ligar-se a outros territrios. Mesmo havendo um aparato tcnico capaz de proporcionar a multiterritorialidade (psmoderna) via internet, a inexistncia de estudos voltados para uma verificao mais rigorosa desse fenmeno territorial, no nos deixa falar de numa multiterritorialidade efetiva realizada pelo sujeito seridoense, mas sim de uma dinmica multiterritorial disponvel apenas para o campo individual dos sujeitos seridoenses. 262
O territrio encontra-se s portas de uma nova era, participando mesmo de forma reconhecidamente menos intensa, dos novos processos de identificao territorial. Sendo assim, a dinmica multiterritorial tal como ele se apresenta no Serid, coloca a identidade seridoense, assembleiana e a pentecostal num mesmo campo de instabilidade, em funo dos fluxos de informaes que adentram pelas novas redes disponveis no territrio principalmente a internet. A entrada sutil de novos elementos culturais se d sutilmente, e a reao dos seridoenses tem sido tanto a de recusar quanto a de diversificar a ampliao de referenciais identitrios. Essa via de mo-dupla foi identificada de forma mais ntida na classe comercial. Essa se utiliza dos novos meios de articulao, reforando a identidade seridoense na valorizao dos referenciais culturais do Serid como estratgia de marketing comercial, em contra partida h outros promovem uma abertura para novas inseres culturais como comprovado nas festas de moto clubes. Quanto poltica do territrio assembleiano diante dessas novas dinmicas que transpassam as redes, observou-se uma resistncia, em manter uma relao mais estreita com que os novos elementos simblicos circundantes no Serid. O Movimento Gospel e a Teologia da Prosperidade, incorporados da dcada de 1980 pelas igrejas neopentecostais so as principais inovaes ideolgicas do cenrio pentecostal. O neopentecostalismo massificou nos espaos miditicos e
informacionais a proposta de vida crist anunciada pelo Movimento Gospel e pela Teologia da Prosperidade. Esses movimentos trocaram o paradigma do crente estereotipado por um perfil esttico asctico, por outro mais diversificado e alternativo, estabelecendo-se assim como a principal contracorrente do
conservadorismo das Assembleia de Deus. As igrejas neopentecostais so os novos conquistadores da f do sculo XXI, que como estratgia evangelstica vem se adaptando aos costumes das sociedades multiteritorializadas. Podemos dizer que o neopentecostalismo fruto de processos inerentes a prpria multiterritorialidade, que tambm atingiu a religio diversificando seus sistemas de crena, num sincretismo que re-define e re-significa em novas bases, s doutrinas pentecostais. Dessa forma para os neopentecostais o que prevalece ideologia crist residente na conscincia e no os esteretipos comportamentais da gerao conservadora. No Serid a liberalizao trazida pelo neopentecostalismo ainda sutil, mas preocupa a ala conservadora das AD, pois o abandono de princpios doutrinrios
263
que aludam a uma vida crist dissolve a diferena, o que visto pela liderana como extremamente negativa e prejudicial para a sua unidade denominacional. A problemtica sempre foi como AD mesmo mostrando um ritmo contrrio diante da crescente possibilidade de interao com o novo ou mltiplo por meio das redes que perpassam o Serid, constitui-se num territrio dinmico. O
posicionamento oposto da AD, perante a tendncia de homogeneizao do sistema simblico pentecostal, se revelou na busca pela re-essencializao de suas identidades. Procurando a redefinio delas, nesse perodo de intensas
transformaes no seio do pentecostalismo brasileiro, AD no Serid assim tem se fechado diante da hibridao cultural promovido pelo neopentecostalismo. Num ritmo contrrio ao da liberalizao dos usos e costumes, a AD tem privilegiado a diferena, ou poderamos dizer a exclusividade de seu sistema de crena em meio multiplicidade de significaes do pentecostalismo. O fundamentalismo religioso da AD neste primeiro decndio do sculo XXI tem mostrado que mesmo o relativo fechamento ao intercmbio cultural no significou a retrao da dinmica territorial por ela desenvolvida. As estratgias de crescimento espacial juntamente a atuao evangelstica da comunidade
assembleiana dos campos eclesisticos da AD os territrios religiosos mais dinmicos na regio seridoense. Certamente o conhecimento sobre domnio espacial da Assemblia de Deus no Serid no se encerra nesta anlise, ao contrrio, introduz nele os estudos geogrficos para desvendar, em parte, os campos de poder dela que se mostrou uma das denominaes pentecostais mais atuantes no Serid em nosso tempo. A leitura do poder deve ser ampliada incessantemente, pois sendo dinmico, ele se mostrar no tempo e no espao com novas formas, no entanto seu objetivo ser sempre o mesmo.
264
265
ALMEIDA, Ronaldo de. Religio na metrpole Sociais, vol.19, n.56, p.15-27, Out. 2004,
paulista.
ANDRADE, Claudionor Correia de. Dicionrio teolgico. Rio de Janeiro: CPAD, 1998. ARAJO, Andriel Cleber Santos. Evanglicos, poltica e sociedade. (Monografia) Centro de Ensino Superior do Serid, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Caic, 2002. ARAJO, Bruno Gomes de. Circunscries Urbanas do Pentecostalismo em Currais Novo/RN. IN: Tnia Cristina Meira Garcia, Camilo Rosa Silva (orgs.) Educao e sociedade: temas de pesquisa/ Joo Pessoa: Idia, 2008, p 114-124. ARAJO, Douglas. A morte do serto antigo: o desmoronamento das fazendas agropecurias em Caic e Flornia (1970-90). 2003. Tese (Doutorado em Histria) Centro de Filosofia e Cincias Humanas, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2003. ARAJO, Isael de. Dicionrio do Movimento Pentecostal. CPAD. 2008. ARAJO, Marcos Antnio Alves de. Sobre pedras entre rios: modernizao do espao urbano de Caic/RN (1950/1960). Dissertao. (Mestrado em Geografia) Centro de Cincias Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2008. AZEVEDO, Eduardo Buriti de. Histria das congregaes da Assemblia de Deus em Parelhas. Parelhas/RN, 27 abr. 2010. Entrevista concedida a Bruno Gomes de Arajo.
BOURDIEU, Pierre. O poder simblico. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2001.
CARLOS, Ana Fani Alessandri. A cidade. So Paulo: Contexto, 1999. CABRAL, David. Assembleia de Deus: a outra face da histria. Rio de Janeiro: Betel, 1998. CESAR, Waldo & SHAULL, Richard. Pentecostalismo e futuro das igrejas crists. Petrpolis/So Leopoldo: Vozes/Sinodal, 1999. CLAVAL, Paul. Campo e perspectiva da geografia cultural. In ROZENDAHL, Zeny & CORREA, Roberto Lobato. (orgs) Geografia cultural: um sculo (3). Rio de Janeiro: EDUERJ, 2001, v 9, p. 133-186. CLAVAL, Paul. A Geografia Cultural. 3.ed. Florianpolis: Editora da UFSC, 2007, CLEMENTINO, Maria do Livramento Miranda. O maquinista do algodo e o capital comercial. Natal: Editora Universitria/UFRN, 1987. CRUZ, Maria Aparecida da. A historia das Assembleia de Deus em Caic/RN. (Trabalho de Pesquisa). Centro de Ensino Superior do Serid, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Caic, 1992.
266
CRUZ, Valter do Carmo. Territorialidades, identidades e lutas sociais na Amaznia. In: ARAJO, Frederico Guilherme Bandeira de; HAESBAERTH, Rogrio (Orgs.). Identidades e territrios: questes e olhares contemporneos. Rio de Janeiro: Access, 2007. DAMSIO, Ablio. Histria da Assemblia de Deus em Caic. Parelhas/RN, 09 jan. 2010. Entrevista concedida a Bruno Gomes de Arajo.
DEUS, Jos Antnio Souza de. Linhas interpretativas e debates atuais no mbito da geografia cultural, universal brasileira. Caderno de Geografia, v.15, n. 25, p. 45-59, 2 semestre. Belo Horizonte, Instituto de Geocincias UFMG, 2005. DIOCESE DE CAIC. Anurio diocesano- 2007. (NMI, 43). Caic: Graficalar, 2007. DURKHEIM, mile. As formas elementares da vida religiosa. Traduo de Joaquim Pereira Neto. So Paulo: Martins Fontes, 1996. DEUS, Jos Antnio Souza de. Linhas interpretativas e debates atuais no mbito da geografia cultural, universal brasileira. Caderno de Geografia, V.15, n.25, p. 45-59, 2 semestre. Belo Horizonte, Instituto de Geocincias UFMG, 2005. EPIFANIO, Francisco Flvio. A ASSEMBLIA DE DEUS EM JARDIM DO SERID/RN: rejeio e aceitao. (Monografia). Centro de Ensino Superior do Serid, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Caic, 2009. ELIADE, M. O sagrado e o profano. So Paulo: Martins Fontes, 2002. ESTATUTO DA IEADERN. (Disponvel <http://www.adnatal.org.br/documentos.htm>. Acesso em: 13 fev. 2010. em:
FELIPE, J. L. A; CARVALHO, E. A. Atlas escolar do Rio Grande do Norte - 2 Edio. 2. ed. Joo Pessoa: Grafset, 2007. 112 p.
GIDDENS, Anthony. As conseqncias da modernidade. So Paulo: Ed. UNESP. 1991. 2 GIL FILHO, Sylvio Fausto ; ALVES, Luiz Alberto Sousa . O sagrado como foco do fenmeno religioso. In: Sergio Rogrio Azevedo Junqueira; Llian Blanck de Oliveira. (Org.). Ensino Religioso: memrias e perspectivas. 1 ed. Curitiba: Editora Champagnat, 2005, v. 01, p. 51-83
267
GIL FILHO, Sylvio Fausto ; GIL, A. H. C. F. . Identidade religiosa e Territorialidade do sagrado: notas para uma teoria do fato religioso. In: ROSENDAHL, Z. & CORREA, R.L. (Org.). Religio, identidade e territrio. 1 ed. Rio de Janeiro: Ed UERJ, 2001, v. 09, p. 39-55. ______.Estruturas da territorialidade Catlica no Brasil. Scripta Nova (Barcelona), Barcelona - Espanha, v. X, n. 205, p. 205, 2006.
______. Igreja Catlica Romana em Curitiba (PR): estruturas da territorialidade sob o pluralismo religioso. Ra'e ga, Curitiba, v. 07, n. 7, p. 95-110, 2003. GWERCMAM, Srgio. Evanglicos. In: Revista Super Interessante n 197 (Fevereiro 2004). So Paulo: Editora Abril, 2004, p. 52-67. HALL, Stuart. A identidade cultural na ps-modernidade. 7.ed. Rio de Janeiro: DP&A , 1999. HAESBAERT, R. O mito da desterritorializao: do fim dos territrios multiterritorialidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007. ______. Identidades territoriais: entre a multiterritorialidade e a recluso territorial (ou: do hibridismo cultural essencializao das identidades). In: ARAJO, Frederico Guilherme Bandeira de; HAESBAERTH, Rogrio (Ogs.). Identidades e territrios: questes e olhares contemporneos. Rio de Janeiro: Access, 2007, p.33-56. ______ Territrio, cultura e des-territorializao. In. ROSENDAHL, Zeny. CORRA, Roberto Lobato. (Orgs). Religio, identidade e territrio. Rio de Janeiro: EDUERJ, 2001. v.09, p.115-140 _______. Da Desterritorializao Multiterritorialidade. Boletim Gacho de Geografia, Porto Alegre, v. 29, n. 1, p. 11-24, 2003. HISTRICO DA ASSEMBLEIA DE DEUS RN. Histria recente e desafios futuros. Disponvel em: <http://www.adnatal.org.br>. Acesso em: 15 fev. 2010.
LUCENA, Joserr de Oliveira. Sntese de um resumo: histria da igreja Presbiteriana no Serid (1900 1997). (Monografia) Centro de Ensino Superior do Serid, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Caic, 2002.
MACDO, Josenilton Dantas. Histria das congregaes da Assemblia de Deus em Caic. . Caic/ RN, 09 jan. 2010. Entrevista concedida a Bruno Gomes de Arajo. MACHADO, Mnica Sampaio. A territorialidade pentecostal: uma contribuio dimenso territorial da religio. Revista Espao e Cultura. Rio de Janeiro, n. 2, Jun. 1996, p. 36-49, Rio de Janeiro: UERJ, NEPEC, 1996.
268
MACHADO, Mnica Sampaio. A territorialidade pentecostal: uma contribuio dimenso territorial da religio. Revista Espao e Cultura n2 (Junho. 1996). Rio de Janeiro: UERJ, NEPEC, 1996, p. 36-49. MAFFESOLI, Michel. O tempo das tripos: o declnio do individualismo nas sociedades de massa. Rio de janeiro: Forense-Universitria, 1987 MARIANO, Ricardo. Sociologia do novo pentecostalismo no Brasil. So Paulo. Edies Loyola, 1999. MARTINS, Daniel Rodrigues. A pedra mais preciosa: a histria da Igreja Presbiteriana em Currais Novos. Campina Grande: Grfica Marcone, 1997. MEDEIROS, Maria Suelly da Silva. A produo do espao das pequenas cidades do Serid Poriguar. Dissertao. (Mestrado em Geografia) Centro de Cincias Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2005. MEDEIROS, Jos Augusto Bezerra de. Serid. 2ed. Braslia: Centro Grfico do Senado Federal, 1980. MORAIS, Ione Rodrigues Diniz. Desvendando a cidade: Caic em sua dinmica espacial. Braslia: Senado Federal, 1999. _______. Serid norte-rio-grandense: uma geografia da resistncia. Caic: Ed. do autor, 2005.
MORAES, Antnio Carlos Roberto. A gnese da geografia moderna. So Paulo: HUCITEC, Editora da Universidade de So Paulo, 1989.
NASCIMENTO NETO, Luiz Eduardo do. Territrio das festas religiosas no Serid potiguar. Dissertao. (Mestrado em Geografia) Centro de Cincias Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2005. ORO, Ari Pedro; Igreja Universal: um poder poltico. In: Ari Pedro Oro; Andr Cortem; Jean-Pierre Dozon (Org). Igreja Universal do Reino de Deus: os novos conquistadores da f. So Paulo: Paulinas, 2003. (Coleo religio e Cultura). PIERRUCCI, Antnio Flvio, Apndice: as religies no Brasil. GAARDE, J; VICTOR, H; HENRY, N (orgs). O livro das religies. So Paulo: Companhia da Letras, 2000. RAFFESTIN, C. Por uma geografia do poder. So Paulo: tica, 1993. REGIMENTO INTERNO DA CONVENO GERAL DAS ASSEMBLEIA DE DEUS NO BRASIL. Disponvel em:<http://www.adnatal.org.br/documentos.html> A cesso em: 13 de fev. 2010.
ROSENDAHL, Zeny, Territrio e territorialidade: uma perspectiva geogrfica para o estudo da religio. Comcincia, 2005. 269
______. Territrio e territorialidade: uma perspectiva geogrfica para o estudo da religio. Conscincia, 2005.
______. Espao e religio: uma abordagem geogrfica. 2. ed. Rio de Janeiro: EDUERJ, 2002.
______. Espao, poltica e religio. In: ROSENDAHL, Zeny; CORREA, Roberto Lobato, (Orgs) Religio, identidade e territrio. Rio de Janeiro: EDUERJ, 2001.
PROJETO DE ADEQUAO DE ESTATUTO. Estatuto das Assembleia de Deus, setembro de 2003 .(Disponvel em: <http://www.cgadb.com.br>. Acesso em: 02 jan. 2007). SAQUET, Marcos Aurlio. Abordagens e concepes de territrio. 2.ed. So Paulo: Expresso Popular. 2010. SANTOS, Milton. Espao e mtodo. So Paulo: Nobel, 1985. SANTOS, Alberto Pereira dos. Introduo geografia das religies. So Paulo: Revista GEOUSP, 2002, v.11, p.21-33. SAUER, Carl O. Geografia cultural. In ROSENDAHL, Zeny; CORREA, Roberto Lobato. (Org) Geografia cultural: um sculo (1). v 9, p. 99-110, Rio de Janeiro: EDUERJ, 2001. SILVA, Alusio Nicolau da. Histria da igreja Presbiteriana em Parelhas. Parelhas/RN, 28 abr. 2010. Entrevista concedida a Bruno Gomes de Arajo. SILVA, Jos Fernandes. Histria da Assemblia de Deus em Parelhas. Parelhas/RN, 17 nov. 2009. Entrevista concedida a Bruno Gomes de Arajo. SILVA, Maria Lourdes Campos da. Histria da Assemblia de Deus em Parelhas. Parelhas/RN, 17 nov. 2009. Entrevista concedida a Bruno Gomes de Arajo. ______. Histria das congregaes da Assemblia de Deus em Currais Novos. Currais Novos/RN, 04 abr. 2010. Entrevista concedida a Bruno Gomes de Arajo. SILVESTRE, Manoel Matias. Histria da Assemblia de Deus em Acari. Currais Novos/RN, 03 maio 2010. Entrevista concedida a Bruno Gomes de Arajo. SOBRINHO, Francisco Galdino. Histria das congregaes da Assemblia de Deus em Currais Novos. Currais Novos/RN, 15 mar. 2010. Entrevista concedida a Bruno Gomes de Arajo. SOUZA, Alexandre Carneiro de. Pentecostalismo: de onde vem para onde vai?; um desafio s leituras contemporneas. Viosa: Ultimato, 2004.
270
SOUZA, Marcelo Jos Lopes de. O territrio: sobre espao e poder, autonomia e desenvolvimento. In: CASTRO, In Elias de. (Ogs.) Geografia: conceitos e temas. 6 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003, p. 77-116. SOUZA, Joabel R. de. SantAna, uma bela festa; uma longa histria. Currais Novos: Ed. do autor, 2005. _______, Totor, bero de Currais Novos. Natal: Editora Universitria/UFRN, 2008. VASCONCELOS, Alcebades P. Sinopse histrica das Assembleia de Deus no Brasil. Manaus: IBADAM, 1983. ZIBORDI, Ciro Sanches. Mais erros que um pregador deve evitar. Rio de Janeiro, CPAD, 2007. WEBER, Max. A tica Protestante e o Esprito do Capitalismo. So Paulo, Martins Claret, coleo obra prima, 2001.
271
272
APNDICE 01
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CINCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PS-GRADUAO E PESQUISA EM GEOGRAFIA
Roteiro da Entrevista
Cidade _______________________________________________ Data ___/___/____ Nome do Entrevistado ___________________________________________________ Cargo que exerce na igreja _______________________________________________
Questionamentos
1 1.1 1.2 1.3 1.4 1.5 2 2.1 2.2 2.3 2.4 2.5
Fundao do trabalho evangelstico na cidade: Ano e local das primeiras reunies Nome do pastor responsvel Nome dos primeiros adeptos Acolhimento social da nova igreja Primeiros ensinamentos pentecostais Incio da evangelizao na cidade Ano e estratgias evangelsticas (panfleto, cultos ao ar livre, visitas domiciliares outros) reas priorizadas na cidade (periferia, centro) Pblico alvo (jovens, adultos, idosos) Nmero de adeptos efetivos Primeiras congregaes e pontos-de-pregao no municpio
Formao da estrutura fsica, ministerial e congregacional da Igreja Me Construo do Templo Sede Nome e ano dos pastores que exerceram liderana na igreja Primeiros obreiros da igreja Descrio da liturgia dos primeiros cultos do templo Mudanas doutrinrias observveis durante o crescimento da Igreja no Serid
273
274
MESA DIRETORA DA CONVENO GERAL DAS ASSEMBLEIA DE DEUS NO BRASIL BINIO 2007-2009 Presidente 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 Pr. Jos Wellington Bezerra da Costa (SP) Pr. Pr. Pr. Pr. Pr. Jos Antonio dos Santos (AL) Temoteo Ramos de Oliveira (RJ) Ubiratan Batista Job (RS) Sebastio Rodrigues de Souza (MT) Gilberto Marques de Souza (PA)
Vice-Presidente Vice-Presidente Vice-Presidente Vice-Presidente Vice-Presidente Secretrio Secretrio Secretrio Secretrio Secretrio Pr. Pr. Pr. Pr. Pr.
Virgnio Jos de Carvalho Neto (SE) Josias de Almeida Silva (SP) Israel Sodr (PR) Orcival Pereira Xavier (DF) Lucifrancis Barbosa Tavares (AP)
1 Tesoureiro 2 Tesoureiro
Secretrio-Adjunto Pr. Cyro Mello (RJ) COMISSO PR-REFORMA Presidente Pr. Abiezer Apolinrio da Silva (BA) Vice-presidente Pr. David Tavares Duarte (MS) Secretrio Pr. Vanderlei Torres Bib (RJ) Relator Pr. Carlos Gomes Galvani (SP)
275
Membros Pr. Moiss Rodrigues (SP) Pr. Wolmar Alcntara dos Santos (BA) Pr. Paulo Rodrigues de Morais (SP) Tcnico Convidado: Pr. Dr. Antonio Carlos Lorenzetti de Mello (RN)
CAPTULO I Do Nome, Natureza, Sede, Foro e Fins Art. 1. A Conveno Geral das Assembleia de Deus no Brasil, neste Estatuto denominada por sua sigla CGADB, fundada em 1930 e registrada em 1946, pelos pastores Samuel Nystron, Ccero Canuto de Lima, Paulo Leivas Macalo, Jos Menezes, Nels Julius Nelson, Francisco Pereira do Nascimento, Jos Teixeira Rego, Orlando Spencer Boyer, Bruno Skolimowski, Jos Bezerra da Silva e outros, uma entidade civil de natureza religiosa, com fins no econmicos, tendo por sigla CGADB, com durao por tempo indeterminado. Art. 2. A CGADB tem sua sede na Avenida Vicente de Carvalho, 1083, Rio de Janeiro - RJ. Onde tem o seu foro. Art. 3. So finalidades da CGADB: I - manter e zelar pelo seu patrimnio; II - promover a unio e o intercmbio das Assembleia de Deus no Brasil; III - atuar no sentido da manuteno dos princpios morais e espirituais das Assembleia de Deus no Brasil; IV - zelar pela observncia da doutrina bblica, incrementando estudos bblicos e outros eventos; V - manter o controle de seus rgos, da Casa Publicadora das Assembleia de Deus CPAD e das demais pessoas jurdicas existentes ou que venham a existir, quando necessrio, propugnando pelo desenvolvimento dos mesmos; VI - promover e incentivar a proclamao do evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo, atravs da obra missionria; VII promover o desenvolvimento espiritual e cultural das Assembleia de Deus, mantendo a unidade doutrinria; VIII - promover a educao em todos os seus nveis e a assistncia filantrpica; IX - inscrever e credenciar como membros, os ministros das Assembleia de Deus no Brasil, exercendo ao disciplinar sobre os mesmos, conforme normas estabelecidas neste Estatuto e Regimento Interno; X - orientar a prtica da cidadania dos seus membros; XI - reconhecer e inscrever as Convenes Estaduais ou Regionais da mesma f e ordem. CAPTULO II Da Competncia
276
Art. 4. Compete CGADB: I - cadastrar e registrar as Convenes Estaduais ou Regionais das Assembleia de Deus no Brasil; II - tratar de todos os assuntos que direta ou indiretamente digam respeito s Assembleia de Deus no Brasil, quando solicitada; III - assegurar a liberdade de ao inerente a cada Igreja Assemblia de Deus no Brasil, na forma de sua constituio estatutria, sem limitar as suas atividades bblicas acorde com este Estatuto, com absoluta imparcialidade; IV - julgar e decidir sobre quaisquer pendncias existentes ou que venham a existir entre ministros ou Convenes Estaduais ou Regionais. Pargrafo nico. Consideram-se aes inerentes a cada Assemblia de Deus no Brasil: a) a constituio e fins da Igreja; b) a administrao geral dos bens; c) o disciplinamento dos membros; d) a separao de presbteros e diconos; e) a apresentao de candidatos a pastores e a evangelistas na respectiva Conveno Estadual ou Regional; f) a movimentao de missionrios; g) a abertura e emancipao de congregaes ou igrejas filiadas. CAPTULO III Dos Membros, Direitos, Deveres e Penalidades Art. 5. So membros da CGADB, os ministros (pastores e evangelistas), devidamente ordenados, integrados e registrados na CGADB, como tambm os ministros jubilados, todos credenciados pela respectiva Conveno Estadual ou Regional. 1. A CGADB no reconhece a figura do evangelista ou pastor autorizado por qualquer Igreja ou Conveno Estadual ou Regional. 2. Os ministros das Assembleia de Deus, oriundos do exterior e domiciliado no Brasil, sero credenciados pela CGADB atravs de uma Conveno Estadual ou Regional. 3. Os convencionais da CGADB em dia com suas anuidades e Convenes Estaduais ou Regionais recebero a cada dois (2) anos novas credenciais. 4. Os Convencionais que no atenderem as condies do pargrafo acima, no tero suas credenciais renovadas. Art. 6. Nenhum membro responder solidria ou subsidiariamente pelas obrigaes da CGADB, porm a prpria Conveno responder com seus bens. Art. 7. So direitos dos membros da CGADB: I - ter acesso s Assembleia Gerais Ordinrias ou Extraordinrias, atendido o
277
disposto nos incisos III e IV do art. 8. deste Estatuto; II - indicar candidatos, votar e ser votado em Assemblia Geral, nas condies previstas neste Estatuto; III - mudar de sua Conveno Estadual ou Regional para uma congnere, na forma do estabelecido na de origem, a qual comunicar a Conveno Geral; IV - pedir o seu desligamento, com a anuncia da Conveno Estadual ou Regional de origem, com a obrigatria devoluo da credencial e a quitao de eventuais dbitos na tesouraria da Conveno Geral. Art. 8. So deveres dos membros da CGADB: I - cumprir o disposto neste Estatuto, bem como as Resolues das Assembleia Gerais e da Mesa Diretora da Conveno Geral; II - obedecer ao credo doutrinrio das Assembleia de Deus no Brasil, publicado no rgo oficial da CGADB Mensageiro da Paz; III - contribuir pontual e regularmente com suas anuidades; IV - pagar a taxa integral de inscrio, para participar de uma Assemblia Geral, ou no montante de 40%, quando abdicar da hospedagem e alimentao fornecidas pela CGADB, mesmo com participao parcial; V - devolver a igreja que preside, com o respectivo patrimnio, Conveno Estadual ou Regional, quando desejar mudar-se para outra congnere, desde que o referido patrimnio seja legalmente escriturado em nome da Conveno a que esteja filiado, devendo apresentar ata da Igreja e seu ministrio autorizando sua transferncia; VI - entregar a congregao que esteja dirigindo, com o respectivo patrimnio, quando solicitado pela administrao da igreja sede qual esteja filiado, assumindo o nus de dbitos indevidamente contrados na sua gesto; VII - participar das Assembleia Gerais da CGADB. Art. 9. vedado aos membros da CGADB: I - abrir trabalhos em outra regio eclesistica e receber ministros ou membros de uma Assemblia de Deus no Brasil atingidos por medida disciplinar; II - apoiar, em qualquer hiptese, trabalhos dissidentes por acaso existentes ou que venham a existir em qualquer regio eclesistica da mesma f e ordem; III - vincular-se a qualquer tipo de sociedade secreta; IV - vincular-se a movimento ecumnico; V - vincular-se a mais de uma Conveno Estadual ou Regional; VI - vincular-se a outra conveno nacional ou de carter geral, com abrangncia e prerrogativas da CGADB; VII - exercer seu ministrio isoladamente, sem vnculo a uma Conveno Estadual ou Regional; VIII - exercer funes ministeriais, isoladas ou no, onde a Igreja ou Conveno Estadual ou Regional da qual se transferiu, mantenha atividades; Descumprir as normas estatutrias, regimentais e demais resolues da CGADB. Art. 10. Perdero a condio de membros da CGADB os infratores do disposto no artigo 9. deste Estatuto. Art. 11. Fica impedido de ocupar cargo na CGADB, o membro que: I - esteja cumprindo medida disciplinar aplicada pela Conveno Geral; II - inadimplente com a CGADB e a Casa Publicadora das Assembleia de Deus; III - ausente da Assemblia Geral, ressalvado motivo de fora maior.
278
Pargrafo nico. Diretores da CPAD so impedidos de ocupar cargos nos rgos da CGADB. Art. 12. da competncia da Mesa Diretora da CGADB, apreciar, julgar e aplicar, em primeira instncia, as penalidades previstas no Regimento Interno da CGADB, ao infrator do disposto no art. 9 deste Estatuto, assegurando-lhe amplo direito de defesa e recurso Assemblia Geral. Art. 13. O recurso previsto no art. 12 deste Estatuto ser exercido no prazo de quinze dias, contados da data do recebimento da notificao da deciso.
279
ANEXO 02
ESTATUTO DA IEADERN
CAPTULOS I II (sees I, II, III, IV, V e VI) III (sees I, II, III e IV) IV (sees I, II, III, IV e V)
Art. 1 A Igreja Evanglica Assemblia de Deus no Rio Grande do Norte, fundada nesta Cidade do Natal, aos 24 de maio de 1918, pelo Pastor Adriano Nobre, e, de acordo com o Art. 5, Inciso VI, da Constituio da Repblica Federativa do Brasil e demais normas atinentes matria, doravante denominada IEADERN, uma organizao religiosa que tem por finalidade propagar o Evangelho de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, sendo pessoa jurdica, de direito privado, sem fins econmicos. 1 A IEADERN tem Sede e Foro na Cidade do Natal, Estado do Rio Grande do Norte. 2 A IEADERN poder fundar em cada bairro, distrito e municpio do Estado, ou fora dele, Igrejas Filiais e Congregaes, respeitando as normas que regem o assunto, nos termos do Regimento Interno. 3 As Igrejas Filiais sero regidas por este Estatuto, e no tero estatuto prprio. 4 As Igrejas Filiais podero ser emancipadas, adquirindo personalidade jurdica prpria, por iniciativa da Presidncia da IEADERN ou por solicitao das mesmas, mediante pleno acordo e expressa autorizao da Assemblia Ministerial da IEADERN, nos termos do art. 23 deste Estatuto observadas as condies previstas no Regimento Interno. 5 O tempo de durao da IEADERN indeterminado. Art. 2 A IEADERN, constituda da Igreja Sede, das Igrejas Filiais, e de suas Congregaes, obedece aos princpios que regem as demais Igrejas Evanglicas, denominadas Assembleia de Deus filiadas Conveno Geral das Assembleia de Deus no Brasil CGADB, tendo unicamente a Bblia por sua regra de f e prtica, sendo, no entanto, autnoma para resolver, por si mesma, quaisquer questes internas, de ordem espiritual ou material que, porventura, venham a surgir em sua Sede, nas Igrejas Filiais e suas respectivas Congregaes. CAPTULO II DOS MEMBROS E CONGREGADOS Art. 3 A IEADERN compe-se de nmero ilimitado de membros e congregados, de ambos os sexos, sem distino de qualquer natureza que se mantenham fiis aos princpios fundamentais, estabelecidos neste Estatuto, e de acordo com as Sagradas Escrituras.
280
Seo I Das Categorias Art. 4 Os membros da IEADERN se dividem nas seguintes categorias: I Membros; II Congregados. Seo II Da Admisso Art. 5 Sero admitidos como membros da IEADERN, as pessoas que: I converterem-se f crist evanglica, mediante confisso pblica, e forem batizadas em guas, por imerso, em nome do Pai, e do Filho, e do Esprito Santo, atendido um dos seguintes requisitos: a) serem solteiras; b) serem casadas civilmente; c) serem vivas; d) serem divorciadas. II procederem de outras Assembleia de Deus, ou de outras igrejas evanglicas, respeitado o disposto no inciso I deste artigo, e comprometerem-se a acatar a doutrina e os costumes adotados pela IEADERN e forem recebidos pela Igreja Local. 1 Nos casos previstos neste artigo, a admisso do candidato estar condicionada sua declarao expressa de concordncia com este Estatuto. Em se tratando de candidato adolescente, haver a necessidade de autorizao expressa de seus pais ou responsveis. 2 No sero admitidas como membros da IEADERN as pessoas que comprovadamente contrariem os princpios das Sagradas Escrituras, ou que estejam apontadas nos crimes ou condutas previstos no art. 13, conforme o disposto no Regimento Interno, Captulo III, Seo III. 3 Os estados civis de que tratam as alneas b, c, e d, no se aplicam unio de pessoas do mesmo sexo, por contrariarem os princpios das Sagradas Escrituras, conforme Dt 23.17,18; Lv 18.22; 20.13; Rm 1.24-28; I Co 6.10; I Tm 1.10. 4 As pessoas de que tratam o Inciso I alneas a, c e d, devem viver sem relacionamento marital ou homossexual. 5 Ao serem admitidos, os membros tero os seus nomes registrados em Rol de Membros, na Igreja Sede, nas Igrejas Filiais e/ou Congregaes. 6 No sero admitidas como membros da IEADERN pessoas que pertenam a sociedades secretas. Art. 6 Sero admitidos como Congregados da IEADERN, as pessoas que se converterem f crist evanglica mediante confisso pblica de que aceita a Jesus Cristo como Salvador, e passe a freqentar com regularidade os cultos. Pargrafo nico. Os Congregados tero seus nomes registrados em um Cadastro de Congregados, na Igreja Sede, nas Igrejas Filiais e/ou Congregaes.
281
Seo III Dos Direitos Art. 7 So direitos comuns a todos os membros e congregados em comunho: I receber orientao espiritual; II participar de atividades administrativas na IEADERN, de acordo com a sua habilidade, por designao da Diretoria; III solicitar transferncia para outra Igreja de mesma f e ordem ou desligamento do Rol de Membros ou Cadastro de Congregados. Art. 8 So direitos dos Membros: I votar para os cargos ou funes previstos neste Estatuto, bem como fazer uso da palavra em reunies de Assemblia Geral, de acordo com o Regimento Interno; II ser ordenado, consagrado ou separado para o servio do Evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo, respeitadas as condies previstas nos artigos 51, 52 e 53 deste Estatuto. Pargrafo nico. O disposto neste artigo no se aplica aos absolutamente e relativamente incapazes civilmente. Seo IV Dos Deveres Art. 9 So deveres dos membros e congregados da IEADERN: I participar com assiduidade, das reunies e cultos da Igreja; II entregar os seus dzimos regularmente ao tesouro da igreja onde se congrega, de conformidade com as Escrituras Sagradas; III contribuir com ofertas de conformidade com as Escrituras Sagradas; IV viver de conformidade com a doutrina bblica e os usos e costumes adotados pela IEADERN, conforme prescritos no Regimento Interno; V respeitar e acatar as decises emanadas da IEADERN desde que no contrariem o presente Estatuto; VI rejeitar movimentos ecumnicos, e outros contrrios aos princpios bblicos adotados pela IEADERN. Seo V Das Penalidades Art. 10. Os membros e congregados da IEADERN que contrariarem a doutrina bblica ou descumprirem as normas estatutrias e regimentais, de acordo com a gravidade da falta, estaro sujeitos s seguintes penalidades, a serem aplicadas pela Direo da Igreja: I aos Membros: a) advertncia verbal ou escrita; b) suspenso; c) excluso. II aos Congregados: a) advertncia verbal ou escrita; b) suspenso; c) desligamento do Cadastro de Congregados.
282
Art. 11. A advertncia ser aplicada, de forma verbal ou escrita, aos membros e congregados que transgredirem os preceitos bblicos, as normas estatutrias ou regimentais, desde que no constituam falta mdia ou grave. 1 Constituem faltas leves passveis de advertncia as seguintes prticas: I tecer comentrios desabonadores sobre a igreja ou a sua liderana; II deixar de cumprir normas ou recomendaes de carter administrativo; III deixar de comparecer s reunies nas quais se fizer necessria a sua presena; IV deixar de respeitar os usos e costumes da IEADERN, prescritos no Regimento Interno; V cometer outras faltas assemelhadas. 2 A advertncia ser verbal, quando as faltas forem cometidas pela primeira vez. Em caso de reincidncia, a advertncia ser dada por escrito. Art. 12. A suspenso da comunho ser aplicada, de forma pblica, aos membros e congregados que de forma deliberada, aps serem advertidos pela segunda vez, permanecerem transgredindo os preceitos bblicos, as normas estatutrias ou regimentais, desde que esta atitude no constitua falta grave, nos termos do art. 13. Pargrafo nico. As faltas previstas nos artigos 11 e 13, sero convertidas, para efeito de aplicao das penalidades, em faltas mdias nos termos do Regimento Interno. Art. 13. Os membros da IEADERN sero disciplinados, com pena de excluso, pelas seguintes faltas, consideradas graves: I prticas sexuais ilegais sendo assim consideradas para os fins deste artigo, aquelas que tenham, pelo menos, uma das seguintes caractersticas: a) prticas sexuais havidas sem consensualidade entre os envolvidos; b) prticas sexuais que envolvam duas pessoas no ligadas entre si pelo vnculo matrimonial; c) prticas sexuais entre pessoas do mesmo sexo, ainda que respaldadas legal e judicialmente. II realizao de quaisquer condutas definidas como delito na legislao penal ptria, desde que praticadas com dolo, ainda que tentadas, e que no haja contradio entre a norma legal aplicada ao caso concreto e as Sagradas Escrituras; III promoo de dissidncia, ciso, cisma ou diviso de qualquer natureza, que repercuta na integridade organizacional da Igreja ou de seus membros; IV - flagrante desrespeito s deliberaes e diretrizes legitimamente estabelecidas pela Igreja, atravs de sua Presidncia, Diretoria ou Comisses, manifestando ostensiva oposio; V realizao de condutas que contrariem as doutrinas bblicas estabelecidas na Confisso de F esposada pela IEADERN; VI - ausncia s reunies regulares da Igreja, por um perodo superior a 120 dias, sem qualquer comunicao ou justificativa; VII abandono da f crist, ou adoo de princpios divergentes das doutrinas bblicas professadas pela IEADERN; VIII prtica de atos lesivos moral, ou contrrios boa fama, ou que se caracterizem como vcios prejudiciais sade, conforme I Co 3.16,17; ou que estabeleam enlace matrimonial com pessoas que no professem a mesma f evanglica, conforme adverte II Co 6.14-18. 1 Uma vez configurada a hiptese prevista no inciso VI, a Igreja encaminhar uma comisso para falar pessoalmente com o membro ausente, e somente aps ouvir suas razes, levar o caso instncia competente para a aplicao da sano. 2 Os Congregados da IEADERN sero disciplinados com pena de Desligamento pelas faltas, consideradas graves, constantes deste Artigo.
283
Seo VI Do Processo Disciplinar Art. 14. A Direo da IEADERN designar uma comisso para proceder ao processo disciplinar relativo ao membro da Igreja, sendo-lhe assegurado o direito a ampla defesa. Art. 15. A autoridade eclesistica, responsvel pela presidncia do processo disciplinar de membro da Igreja, poder propor a suspenso provisria da comunho da Igreja, ou o afastamento temporrio do denunciado de qualquer cargo ou funo que esteja exercendo, nos termos do Regimento Interno, pelo tempo que entender necessrio, a seu critrio, at posterior deliberao, quando estiver presente um dos seguintes requisitos: I - existncia de fortes indcios da prtica de qualquer conduta descrita no art. 13 deste Estatuto, que possa ensejar imediata repercusso prejudicial imagem da Igreja na sociedade; II - possibilidade de o membro investigado frustrar o regular processo disciplinar, caso continue no pleno gozo de seus direitos institucionais; III - quando a demora puder tornar a aplicao da penalidade ineficaz. Art. 16. A forma de aplicao das penalidades, e os procedimentos de reintegrao dos membros suspensos ou excludos, sero estabelecidos no Regimento Interno. Art. 17. Quando o membro da igreja for o Pastor Presidente, ou membro da Diretoria Geral e incorrer nas prticas constantes do art. 13, combinado com o disposto no art. 30 2, incisos I e II, dever ser instaurado o procedimento disciplinar nos termos do Regimento Interno, sendo-lhe assegurado o direito a ampla defesa. Pargrafo nico. Havendo confisso espontnea, ser tomada a termo e inibir o prosseguimento do processo disciplinar, sem prejuzo da aplicao da penalidade prevista para o caso.
CAPITULO III DA ADMINISTRAO Seo I Da Estrutura Administrativa Art. 18. So rgos da IEADERN: I Assemblia Geral; II Assemblia Ministerial; III Diretoria Geral; IV Conselho Fiscal. Art. 19. So rgos da Igreja Sede e das Igrejas Filiais: I - Assemblia Local; II - Ministrio Local; III - Diretoria Local; IV Departamentos. Pargrafo nico. A Diretoria Geral, no mbito da Sede, exercer tambm a funo da Diretoria Local.
284
Seo II Da Assemblia Geral Art. 20. A Assemblia Geral o rgo mximo de deliberao da IEADERN, com competncia para resolver todos os casos a ela submetidos, sejam de ordem espiritual ou material. Art. 21. A Assemblia Geral constituda pelos membros da IEADERN, em comunho, sendo suas resolues devidamente registradas em atas e consideradas coisa julgada. Art. 22. Compete Assemblia Geral: I aprovar a indicao ou escolha do Presidente da IEADERN; II aprovar a escolha dos membros da Diretoria e do Conselho Fiscal; III aprovar as contas; IV reformar o Estatuto. 1 A Assemblia Geral ser presidida, sempre, pelo Presidente da IEADERN, ressalvadas as faltas ou impedimentos, ocasies em que a sua presidncia ser exercida pelo 1 VicePresidente, ou pelos demais membros da Diretoria, por sua ordem. 2 A Assemblia Geral ser convocada com antecedncia mnima de trinta dias atravs de edital, publicado em rgo de divulgao oficial da IEADERN. 3 Para instalao da Assemblia Geral dever haver a presena de no mnimo dois mil membros, em primeira convocao, e no havendo o quorum citado, aps trinta minutos, em segunda convocao, com qualquer nmero de membros. 4 A Assemblia Geral ser convocada, ordinariamente, pelo Presidente, uma vez por ano, ou extraordinariamente, para reformar o Estatuto, ou ainda, quando as circunstncias exigirem. 5 As deliberaes e resolues da Assemblia Geral devero ser decididas por aclamao da maioria simples dos membros presentes. 6 Caso o nome indicado ou escolhido para sucesso do Pastor Presidente no seja aprovado pela Assemblia Geral, dever ser efetivado um processo eletivo, no prazo de sessenta dias, obedecido o disposto nos pargrafos 5 e 6 do art. 30. Seo III Da Assemblia Ministerial Art. 23. A Assemblia Ministerial da IEADERN o rgo de deliberao da IEADERN, com competncia para resolver os casos a ela submetidos, sejam de ordem espiritual ou material. Art. 24. A Assemblia Ministerial constituda pelos Pastores e Evangelistas da IEADERN, sendo suas resolues devidamente registradas em atas. Art. 25. Compete a Assemblia Ministerial: I referendar a indicao do Presidente, nos termos do 5 do art. 30; II - referendar a escolha dos membros da Diretoria Geral e do Conselho Fiscal; III - referendar a indicao dos Supervisores de Campo e Pastores das Igrejas Filiais; IV referendar, anualmente, as contas da Diretoria Geral; V referendar o Anteprojeto do Estatuto; VI elaborar ou alterar regimentos ou atos normativos; VII referendar a onerao, alienao, cesso ou locao de bens patrimoniais; VIII - autorizar a contratao de emprstimos, financiamentos ou obrigaes em casos de repercusso e interesse geral da IEADERN, omissos neste Estatuto; IX - instaurar procedimento disciplinar, em face de denncia, que envolva o Pastor Presidente; X - declarar a destituio do Pastor Presidente; XI - escolher o substituto do Pastor Presidente, em casos de transferncia espontnea para outra Igreja, renncia, morte ou destituio.
285
1 A Assemblia Ministerial ser presidida, sempre, pelo Presidente da IEADERN, ressalvadas as faltas ou impedimentos, ocasies em que a presidncia ser exercida pelo 1 Vice-Presidente, ou pelos demais membros da Diretoria, por sua ordem. 2 O quorum mnimo para instalao da Assemblia Ministerial ser de maioria absoluta de seus membros, em primeira convocao, e no havendo o quorum citado, aps trinta minutos, em segunda convocao, com qualquer nmero de membros. 3 As deliberaes e resolues da Assemblia Ministerial devero ser decididas por aclamao ou escrutnio secreto, por maioria simples dos votos. 4 A Assemblia Ministerial ser convocada, ordinariamente, pelo Presidente, uma vez por ano, ou extraordinariamente, quando as circunstncias exigirem, com antecedncia mnima de cinco dias teis. Seo IV Da Diretoria Geral Art. 26. A Diretoria Geral da IEADERN o rgo administrativo e executivo, competindo-lhe: I exercer as funes de rgo normatizador da IEADERN, em primeira instncia; II elaborar e executar o programa anual de atividades; III contratar e demitir funcionrios, fixando-lhes a remunerao; IV desenvolver atividades e estratgias que possibilitem a concretizao dos alvos prioritrios da Igreja; V administrar o patrimnio geral da IEADERN em consonncia com este Estatuto; VI prestar contas, anualmente, Assemblia Ministerial. Art. 27. A Diretoria Geral da IEADERN ser composta pelos seguintes membros: Presidente, 1 e 2 Vice-Presidentes; 1 e 2 Secretrios; 1 e 2 Tesoureiros. Todos escolhidos dentre os membros do Ministrio. 1 Os cargos de Presidente, 1 e 2 Vice-Presidentes sero privativos de Pastores; os demais cargos podero ser exercidos por Evangelistas. 2 Os cargos da Diretoria Geral sero exercidos por ministros da IEADERN, na Igreja Sede. 3 Os membros da Diretoria-Geral, exceto o seu Presidente, cumpriro um mandato de um ano, sendo permitida uma ou mais recondues.
CAPTULO IV DOS CAMPOS ECLESISTICOS, DAS IGREJAS FILIAIS, DOS SETORES, DAS CONGREGAES E DOS DEPARTAMENTOS Seo I Dos Campos Eclesisticos de Atuao Ministerial Art. 38. Os Campos Eclesisticos, de atuao ministerial da IEADERN, abrangem em sua jurisdio administrativa e territorial a sede, os bairros, distritos e municpios onde mantm Igrejas Filiais e Congregaes que so subordinadas Igreja Sede, nos termos do 2 do art. 1, deste Estatuto. Pargrafo nico. Em cada Campo Eclesistico, de atuao ministerial, haver uma Igreja Sede do Campo, cujo Pastor ser o Supervisor do respectivo Campo, com atribuies definidas no Regimento Interno.
286
Seo II Das Igrejas Filiais Art. 39. As Igrejas Filiais, nos termos do 3, do art. 1 deste Estatuto, situar-se-o nas sedes dos municpios, agrupadas num campo eclesistico, para fins de administrao, nos termos do Regimento Interno. Art. 40. As Igrejas Filiais sero administradas por uma Diretoria Local, composta de: Presidente, 1 e 2 Vice-Presidentes, 1 e 2 Secretrios, 1 e 2 Tesoureiros. Pargrafo nico. Os Secretrios e Tesoureiros devem ser escolhidos dentre os membros da igreja. Art. 41. Ser concedido ao Pastor na direo de Igreja Filial, um sustento pastoral, retirado das contribuies da Igreja, conforme Regimento Interno. Art. 42. Compete Diretoria da Igreja Filial, no mbito de sua jurisdio o seguinte: I executar as normas da IEADERN; II elaborar e executar o programa anual de atividades; III contratar e demitir funcionrios, fixando-lhes a remunerao; IV desenvolver atividades e estratgias que possibilitem a concretizao dos alvos prioritrios da Igreja; V administrar o patrimnio da IEADERN, sob sua responsabilidade, em consonncia com este Estatuto. Art. 43. Os membros das Diretorias Locais tero competncias anlogas s dos membros da Diretoria Geral no que couber. Art. 44. vedado s Igrejas Filiais, salvo com expressa autorizao da Diretoria Geral, praticar qualquer operao financeira estranha s suas atribuies, tais como: penhora, fiana, aval, procurao, emprstimos, alienao de bens patrimoniais, bem como registrar em cartrio ata ou estatuto, sendo nulo de pleno direito qualquer ato praticado que contrarie o presente Estatuto. Art. 45. As Igrejas Filiais prestaro contas de suas atividades e movimento financeiro periodicamente, conforme determinado pela Diretoria Geral, atendendo s normas brasileiras de contabilidade e legislao pertinente, acompanhada dos respectivos documentos revestidos das formalidades legais. Pargrafo nico. A Diretoria Geral poder autorizar s Igrejas Filiais atravs de documento especfico, proceder a abertura e movimentao de conta bancria em nome da Igreja, a ser assinada conjuntamente pelo Pastor da Igreja Filial e pelo respectivo tesoureiro. Seo III Dos Setores Art. 46. Os Setores Eclesisticos e Administrativos constituem-se de, no mnimo, cinco Congregaes, tendo por finalidade o melhor desempenho das atividades da IEADERN. Pargrafo nico. Em cada Setor, haver uma Congregao Plo, dirigida por Pastor ou Evangelista, que ser o Coordenador do Setor, com atribuies definidas no Regimento Interno. Seo IV Das Congregaes Art. 47. As Congregaes da IEADERN, vinculadas Igreja Sede ou a Igrejas Filiais, tm por finalidade exercer a ao eclesistica e administrativa na rea de sua jurisdio, definida em Regimento Interno. 1 As Congregaes sero dirigidas, preferencialmente, por Ministros ou Presbteros.
287
2 A estrutura administrativa das Congregaes dever adaptar-se, no que couber, a da Igreja a que estiver vinculada. 3 Os Dirigentes de Congregao no tero permanncia definitiva frente s mesmas, podendo ser adotado o rodzio ou substituio entre eles, quando necessrio, visando o interesse maior da igreja. Art. 48. As Congregaes sero agrupadas em Setores Eclesisticos e Administrativos, tendo por finalidade o melhor desempenho das atividades da IEADERN. Seo V Dos Departamentos Art. 49. Os Departamentos so rgos de execuo das atividades da IEADERN, atuando em conjunto com as Igrejas Filiais e Congregaes. 1 Os Departamentos tero normas de funcionamento definidas pela Diretoria Geral. 2 Os Departamentos podero estruturar-se de acordo com as necessidades de sua ao, em subdivises administrativas. 3 Os Departamentos sero administrados por Diretores, indicados pelo Presidente, e pelos Pastores das Igrejas Filiais, podendo ser por eles prprios dispensados, a qualquer tempo.
288
ANEXO 03
REGIMENTO INTERNO DA IEADERN CAPITULO I DAS DISPOSIES INICIAIS Art. 1 O presente Regimento Interno tem por finalidade regulamentar o Estatuto da Igreja Evanglica Assemblia de Deus no Rio Grande do Norte, denominada IEADERN, no que se fizer necessrio. CAPITULO II DA INSTALAO E EMANCIPAO DE IGREJAS FILIAIS E CONGREGAES Art. 2 A IEADERN poder estabelecer em cada bairro, distrito e municpio do Estado, ou fora dele, Igrejas Filiais e Congregaes, respeitando os seguintes critrios: I haver necessidade, que justifique a instalao de uma Congregao ou Igreja Filial em determinada localidade; II existir, no mnimo, trinta pessoas que se renam regularmente em um bairro ou localidade, em ambiente com mnimas condies de funcionalidade, e que possam contribuir com as despesas mnimas para a sua manuteno; III existncia de obreiros que possam ser designados para atender as atividades inerentes ao trabalho tais como: direo, secretaria, tesouraria e outras necessrias ao desenvolvimento do trabalho. Art. 3 Podero ser emancipadas, adquirindo personalidade jurdica prpria, as Igrejas Filiais que atenderem as seguintes condies: I ser sede de campo eclesistico; II ter, no mnimo, mil membros arrolados, em comunho, no municpio em que se localizar a igreja sede de campo; III justificao consubstanciada apresentada Assembleia Ministerial da IEADERN; IV estar em dia, junto Igreja Sede, com as obrigaes sociais, trabalhistas, tributrias, contbeis e demais compromissos financeiros assumidos junto a terceiros; V a proposta de emancipao dever definir a jurisdio eclesistica a ser abrangida pela nova igreja, com especificao de igrejas e congregaes que ficaro sob a responsabilidade da nova pessoa jurdica; VI os bens patrimoniais administrados pela igreja a ser emancipada, bem como das igrejas e congregaes que ficaro sob a sua responsabilidade, ficaro alienados em seu favor, constando na ata da Assembleia que outorgar a emancipao; VII demonstrarem condies econmico-financeiras, que lhe permitam atividade autnoma. Pargrafo nico. Aps o cumprimento das exigncias do presente artigo, a IEADERN, em Assembleia Geral Extraordinria, outorgar a emancipao da igreja filial.
289
CAPITULO III DOS MEMBROS Seo I Dos Direitos Art. 4 So direitos comuns a todos os membros e congregados em comunho: I receber orientao espiritual em termos de doutrina, ensino, aconselhamento, e outras orientaes afins, de conformidade com a Palavra de Deus; II solicitar a realizao de sua cerimnia de casamento, desde que o outro nubente, do sexo oposto, tambm seja membro ou congregado da IEADERN; III solicitar a sua readmisso uma vez sanada a causa da sua excluso ou desligamento aps cumpridas as exigncias do Estatuto; IV solicitar sua transferncia para outra Igreja Evanglica Assemblia de Deus filiada Conveno Geral das Assembleia de Deus no Brasil CGADB; V solicitar seu desligamento por motivos pessoais, desde que no contrarie o disposto no art. 13, do Estatuto. Seo II Dos Deveres Art. 5 Os membros da IEADERN devero viver de conformidade com a doutrina bblica por ela esposada, observando, as seguintes normas: I honrar e respeitar os pastores e demais lderes e oficiais da Igreja, conforme prescrito em Hb 13.7,17; II tratar os demais membros e congregados com amor e respeito cristos, conforme Jo 13.34,35; Fp 2.3,4; III portar-se de maneira exemplar na igreja, na famlia, na vida profissional, na vida social e em geral, conforme I Co 10. 31,32; Cl 3.17,23; IV zelar pela pureza da vida sexual observando o que preceitua a Palavra de Deus, conforme o disposto em I Co 6.18-20 e referncias; V respeitar a igreja, no proferindo nem aceitando crtica desarrazoada com referncia mesma, conforme I Co 10.32. Pargrafo nico. Quanto s demais doutrinas a serem observadas pelos membros da IEADERN, deve ser obedecido o que preceitua a Palavra de Deus. Art. 6 So deveres dos membros e congregados da IEADERN, com relao aos usos e costumes, observar as seguintes normas: I usar trajes que respeitem a honestidade, o pudor e a modstia crist, que contemplem a decncia, o recato, a sobriedade, a reverncia e o respeito ao corpo como templo do Esprito Santo, e que no despertem a sensualidade, a lascvia e a concupiscncia da carne, com base no prescrito na Palavra de Deus, em Dt 22.5; I Co 6.19,20; I Tm 2.9a; I Pe 3.3; II o homem dever conservar o uso do cabelo curto, por ser-lhe honroso, conforme o prescrito em I Co 11.4,7,14; III a mulher dever manter o uso do cabelo crescido, por ser-lhe honroso, conforme o prescrito em I Co 11.5,6,10,15; IV evitar os usos e costumes contrrios aos ensinados pela IEADERN, com base em I Tm 2.9b; I Pe 1.13; 3.3. Pargrafo nico. Os que deixarem de atender estas normas devero ser admoestados, e, no as atendendo, no podero assumir ou permanecer no exerccio de quaisquer funes na igreja. Seo III Do Procedimento Disciplinar
290
Art. 7 Ao membro acusado assegurado o contraditrio e a ampla defesa, com os meios e recursos a ele inerentes. Art. 8 Os procedimentos disciplinares relativos s penalidades de advertncia e suspenso, constantes dos artigos 11 e 12 do Estatuto, sero efetuados de forma simplificada ouvindo-se os faltosos, individualmente ou em presena de testemunhas, se necessrio, conforme o caso, evitando-se medidas precipitadas. Em casos que envolvam os menores de idade, a aplicao da pena se dar em reunio reservada com a presena dos pais ou responsveis. 1 - A suspenso de que trata o artigo 12 do Estatuto poder ser aplicada da seguinte forma: I suspenso de cargo, funo, ou atividades; II suspenso de comunho; 2 - A suspenso de cargo, funo, ou atividades ser comunicada, reservadamente, ao rgo, ou ao colegiado a que o faltoso estiver ligado; a suspenso da comunho ser comunicada igreja pelo pastor, em culto ou reunio privada, de carter administrativo. 3 - A suspenso de que trata o Inciso I deste artigo, ser aplicada por prazo estipulado pela Direo da Igreja a que o membro estiver vinculado. 4 - A suspenso de que trata o Inciso II deste artigo, ser aplicada pelo prazo de trs a seis meses, para faltas leves; e de seis a doze meses, para faltas mdias. 5 - As faltas leves, constantes do art. 11 do Estatuto, sero convertidas em mdias, para efeito de aplicao das penalidades, se acompanhadas dos seguintes agravantes: a) ter cargo, funo ou atividade na Igreja; b) cometer falta pblica e notria que comprometa o bom nome da Igreja; c) ser reincidente; d) ter mais de dois anos de membro; e) causar prejuzo moral ou material a terceiros; f) ser casado, no caso de faltas de ordem sexual. 6 - As faltas graves, constantes do art. 13 do Estatuto, sero convertidas em mdias, para efeito de aplicao das penalidades, se acompanhadas das seguintes atenuantes: a) no ter cargo, funo ou atividade na Igreja; b) no cometer falta pblica e notria que comprometa o bom nome da Igreja; c) no ser reincidente; d) ter menos de dois anos de membro; e) no causar prejuzo moral ou material a terceiros; f) ser solteiro, no caso de faltas de ordem sexual; g) confessar espontaneamente a falta cometida. Art. 9 Nos casos de excluso de que trata o art. 13 do Estatuto, sero observadas as seguintes diretrizes: I recebimento da denncia; II a denncia deve ser instruda com informaes documentais e/ou testemunhais, dirigida ao pastor da igreja; III o pastor da igreja designar uma comisso de disciplina que dever apurar os fatos denunciados, ouvindo, pela ordem: o denunciante, as testemunhas, se houver, e, por ltimo o denunciado, dando-lhe ampla oportunidade de defesa; IV todos os depoimentos sero tomados por escrito, e faro parte do procedimento disciplinar; V a comisso de disciplina ter o prazo de at trinta dias para apresentar o relatrio da apurao dos fatos. Se houver necessidade, o prazo poder ser prorrogado por mais trinta dias; VI O membro s ser considerado culpado aps o cumprimento de todas as etapas do procedimento disciplinar. Em caso de haver procedncia nos fatos denunciados, conforme o relatrio da comisso de disciplina, nos termos deste artigo, o pastor da igreja aplicar a penalidade de excluso, nos termos do art. 13 do Estatuto;
291
VII - o pastor da igreja comunicar a aplicao da pena de excluso, em culto ou reunio de carter administrativo. Em casos que envolvam os menores de idade, a aplicao da pena se dar em reunio reservada com a presena dos pais ou responsveis. VIII se os fatos apurados no tiverem indcios da procedncia da acusao o pastor da igreja dever suspender ou arquivar os procedimentos. Pargrafo nico. No sero objeto de prova os fatos notrios, incontroversos ou confessados. Art. 10. O membro que for excludo poder ser readmitido comunho, em culto ou reunio de carter administrativo, observadas as seguintes diretrizes: I obedecer, durante o perodo da sua disciplina, as orientaes da autoridade eclesistica e freqentar os trabalhos a fim de ser observado pela igreja; II durante o perodo da disciplina no voltar a cometer a mesma falta ou outras sujeitas s penalidades constantes deste Regimento; III demonstrar bom testemunho, no cumprimento da disciplina mediante arrependimento e abandono das faltas cometidas; IV aps cumprir o perodo disciplinar de, no mnimo um ano, solicitar a reconciliao, voltando comunho da igreja. Art. 11. Em caso de denncia contra o Pastor Presidente, membro da Diretoria Geral, ou Ministro, que tenha incorrido nas prticas constantes do Art. 13 do Estatuto, combinado com o disposto no art. 30, 2, Incisos I e II do Estatuto, dever ser obedecido o seguinte procedimento: I em se tratando do Pastor Presidente, a denncia conter a indicao de provas, a assinatura do denunciante, e ser dirigida ao Vice Presidente da Assembleia Ministerial nos termos do 1 do art. 25, do Estatuto; a) durante a execuo do processo disciplinar, envolvendo a sua pessoa, o Pastor Presidente dever afastar-se do cargo, mantendo-se o seu sustento pastoral; II - em se tratando de membro da Diretoria Geral ou Ministro, a denncia conter a indicao de provas, a assinatura do denunciante, e ser dirigida ao Presidente da Assembleia Ministerial. a) conforme o caso, sendo aceita a denncia, o Presidente ou Vice Presidente da Assembleia Ministerial designar uma Comisso de Disciplina, composta de cinco Ministros, sob a presidncia de um Pastor, e seguir o disposto nos artigos 7 ao 10 deste Regimento Interno; b) a Comisso de Disciplina ter um relator escolhido dentre os integrantes, e poder contar, com uma Assessoria Jurdica; c) a Comisso de Disciplina ter um prazo de trinta dias para apresentar relatrio com parecer fundamentado; podendo este prazo ser prorrogado por igual perodo. III em se tratando de Presbteros ou Diconos a denncia conter a indicao de provas, a assinatura do denunciante e ser encaminhada ao Pastor da Igreja a que o mesmo estiver filiado. Art. 12. Os obreiros de que trata o artigo 11, que forem disciplinados nos termos do art. 13, do Estatuto, combinado com o disposto no art. 9, deste Regimento, podero ser readmitidos como membros da Igreja, respeitado o previsto no art. 10, e s podero reassumir cargo ou funo, aps o perodo mnimo de cinco anos, a critrio da Direo da Igreja.
292
CAPITULO IV DA ADMINISTRAO Seo I Da Estrutura Administrativa Art. 13. A constituio e competncia da Assemblia Geral, da Assemblia Ministerial, da Diretoria Geral e do Conselho Fiscal esto definidas nos artigos 20 ao 29 do Estatuto. Art. 14. A Assemblia Local constituda pelos membros da lEADERN, em comunho, nas Igrejas Filiais, e ser convocada uma vez por ano, com a finalidade de aprovar a indicao dos membros da Diretoria Local e deliberar sobre outros assuntos eclesisticos e/ou administrativos. Art. 15. O Ministrio Local constitudo pelos Pastores, Evangelistas, Presbteros e Diconos. Art. 16. A Diretoria Local o rgo executivo competindo-lhe coordenar e supervisionar as atividades eclesisticas e administrativas no mbito da Igreja Filial, nos termos do art. 40 do Estatuto. CAPITULO V DA SUCESSO DO PASTOR PRESIDENTE Seo I Disposies Preliminares Art. 17. Sendo deflagrado o processo eleitoral nos termos do 6 do art. 30 do Estatuto, o Presidente da Assemblia Ministerial designar uma Comisso Eleitoral, composta de cinco Ministros, que fixar as normas para o processamento das eleies. Pargrafo nico. A Comisso Eleitoral dever tomar as seguintes providncias: I divulgao de Edital visando o processo eleitoral; II elaborao do modelo de requerimento de registro de candidatura; III elaborao da lista de eleitores aptos a votao; IV confeco de cdulas a serem utilizadas na votao; V instalao de cabines para votao com urna vedada e lacrada; Seo II Dos Candidatos Art. 18. Tendo em vista o disposto no Inciso XI do art. 25 do Estatuto, qualquer Pastor, que tenha sido ordenado ou reconhecido pela IEADERN, poder inscrever-se como candidato ao cargo de Pastor Presidente, desde que atenda aos seguintes requisitos: I ter, no mnimo, quinze anos de ministrio pastoral, no mbito da IEADERN; II nunca ter sofrido nenhuma sano e/ou medida disciplinar; III ser referendado por, no mnimo, dez pastores Supervisores de Campo e/ou Coordenadores de Setor; IV estar em pleno gozo de seus direitos estatutrios. V - apresentar requerimento de registro de candidatura junto Comisso Eleitoral; VI ter condies fsicas e mentais adequadas, comprovadas atravs de exame e percia mdica. Pargrafo nico. Para atender o disposto no Inciso III, cada Ministro s poder referendar uma candidatura.
293
Art. 19. A Comisso Eleitoral iniciar os trabalhos de acordo com as normas estabelecidas e dar incio a votao pelos candidatos e eleitores presentes. Pargrafo nico. A votao se dar por escrutnio secreto. Art. 20. Encerrada a votao, o Presidente da Comisso Eleitoral adotar as seguintes providncias: I recolher as urnas com as cdulas de votao; II emitir um boletim em que conste o total de Ministros votantes, assinado por todos os membros da Comisso Eleitoral e pelos fiscais dos candidatos; III cada candidato dever credenciar um fiscal junto Comisso Eleitoral, que se encarregar da contagem dos votos; IV as cdulas sero separadas e apuradas em grupo de vinte e devero ser anexadas ao mapa de apurao para totalizao dos votos; V concluda a totalizao dos votos o Presidente da Comisso Eleitoral, proclamar o resultado da eleio. Art. 21. Ser considerado eleito, pela Assemblia Ministerial, o candidato que obtiver a maioria simples dos votos vlidos. Pargrafo nico. O candidato que obtiver a maioria simples dos votos vlidos ser apresentado a Assemblia Geral para aprovao. CAPITULO VI DOS CAMPOS ECLESISTICOS Art. 22. Os Campos Eclesisticos, em sua constituio, devero atender aos seguintes critrios: I ter uma igreja filial, que possa ser a sede do campo; II ter uma estrutura ministerial, que inclua, pelo menos, dois ministros, alm de presbteros e diconos; III ter a igreja-sede do campo estrutura financeira para sua auto-sustentao; estar em dia com suas obrigaes sociais, trabalhistas, tributrias, contbeis e demais compromissos, junto a terceiros; IV - poderem reunir, no mnimo, cinco igrejas filiais; V terem, no mnimo, oitocentos membros, arrolados, incluindo a sede do Campo. CAPITULO VII DOS OBREIROS Seo I Dos Supervisores de Campos Art. 23. Os Supervisores de Campos sero Ministros, designados pelo Pastor Presidente da IEADERN, mediante Portaria, nos termos do pargrafo nico do art. 31 do Estatuto, e exercero o cargo, enquanto bem servirem Igreja, respeitado o limite de idade, previsto no 3, do art. 30 do Estatuto. Art. 24. Os Supervisores de Campo, conforme o disposto no art. 59 do Estatuto, tero as seguintes atribuies: I presidir as seguintes reunies: a) a Assemblia Local; b) o Ministrio Local; e c) a Diretoria Local.
294
II exercer as atividades administrativas, no mbito do Campo, estabelecidas em um Plano de Trabalho Anual, que inclua o planejamento, a organizao, a direo e o controle das atividades exercidas, na sede do campo e suas congregaes, bem como supervisionar as atividades nas igrejas filiais e suas respectivas congregaes; III escolher os membros da Diretoria da Igreja Sede do Campo, bem como os dirigentes de congregao e de departamentos e setores administrativos, vinculados Igreja-Sede do campo, bem como designar assessores, de acordo com a necessidade do servio; IV sugerir Diretoria da IEADERN a movimentao de obreiros, no mbito do Campo sob sua superviso. V ordenar despesas e exercer o controle e execuo financeira, podendo movimentar e encerrar contas bancrias, bem como assinar, juntamente com o Tesoureiro da Igreja Sede do Campo, todos os documentos, relativos a operaes financeiras, nos termos do art. 45, do Estatuto; VI assinar, com os demais membros da Diretoria e Diretores de Departamentos, documentos relativos s suas reas de competncia; VII orientar a participao de membros das igrejas do Campo, especialmente aqueles integrantes do Ministrio, Presbitrio e Diaconato, em atividades administrativas, sociais, polticas ou assemelhadas, no mbito externo da igreja; VIII praticar os demais atos administrativos de sua competncia; cumprir e zelar pelo fiel cumprimento do Estatuto da IEADERN e deste Regimento; IX praticar, ad referendum da Diretoria da Igreja Sede, atos da competncia desta, cuja urgncia recomende soluo imediata; X - adquirir bens patrimoniais, respeitado o disposto no Inciso XVII do art. 31 do Estatuto da IEADERN; XI assinar contratos e convnios, respeitadas as normas constantes do Estatuto da IEADERN; XII supervisionar as igrejas filiais ligadas ao seu campo eclesistico. Seo II Dos Dirigentes das Igrejas Filiais Art. 25. Os Dirigentes das Igrejas Filiais sero designados pelo Pastor Presidente da IEADERN, mediante Portaria, nos termos do pargrafo nico do Art. 31 do Estatuto, e exercero o cargo, enquanto bem servirem Igreja, respeitado o limite de idade, previsto no 3, do art. 30 do Estatuto. Art. 26. Os Dirigentes das Igrejas Filiais, conforme o disposto no art. 59 do Estatuto, tero as seguintes atribuies: I presidir as seguintes reunies: a) a Assemblia Local; b) o Ministrio Local; e c) a Diretoria Local. II exercer as atividades eclesisticas e administrativas a seu cargo, em consonncia com o Supervisor do Campo; III elaborar e executar o Plano Anual de Trabalho que inclua as atividades a serem realizadas pela igreja filial, em consonncia com a Superviso do Campo; IV escolher seus auxiliares de acordo com as necessidades da igreja local; V executar atividades de execuo financeira que lhe forem autorizadas pela IEADERN; VI cumprir e zelar pelo fiel cumprimento do Estatuto e deste Regimento; VII zelar pelo patrimnio da igreja sob sua responsabilidade; VIII praticar os demais atos administrativos de sua competncia; IX - cumprir as demais determinaes da Direo da IEADERN. Art. 27. A renda eclesistica dos Dirigentes das Igrejas Filiais ser definida pelo Ministrio Local.
295
Pargrafo nico. Na definio da renda eclesistica dos Dirigentes das Igrejas Filiais sero levados em conta os seguintes critrios: I as condies financeiras das Igrejas Filiais; II o desempenho eclesistico e administrativo dos Dirigentes das Igrejas Filiais; III as prioridades e necessidades das Igrejas Filiais; IV a regularidade da contribuio previdenciria dos Dirigentes das Igrejas Filiais, constante dos pargrafos 1 e 2 do art. 54 do Estatuto. Seo III Dos Coordenadores de Setor Art. 28. Os Coordenadores de Setor tero as seguintes atribuies: I coordenar as reunies eclesisticas e administrativas do Setor; II coordenar as atividades das Congregaes do Setor; III assessorar o Pastor, a que estiver subordinado, na designao dos Dirigentes de Congregao; IV realizar despesas, que forem expressamente autorizadas pelo Pastor a que estiver subordinado, e prestar contas conforme determinado pela IEADERN; V - transmitir aos Dirigentes de Congregao do Setor as orientaes que forem determinadas pelo Pastor a que estiver subordinado; VI cumprir e zelar pelo fiel cumprimento do Estatuto. Seo IV Dos Dirigentes de Congregao Art. 29. Os Dirigentes de Congregao tero as seguintes atribuies: I - dirigir as atividades eclesisticas e administrativas na Congregao, em consonncia com o Coordenador do Setor; II convocar e dirigir as reunies da direo da Congregao; III designar auxiliares para as funes eclesisticas e administrativas para o funcionamento dos diversos rgos da congregao; IV realizar despesas, que forem expressamente autorizadas pelo Pastor a que estiver subordinado, e prestar contas conforme determinado pela IEADERN; V transmitir Congregao as orientaes que forem determinadas pela autoridade eclesistica a que estiver subordinado; VI cumprir e zelar pelo fiel cumprimento do Estatuto.
296