Livro Oficina Brincando Na Diversidade Cultura Na Infancia
Livro Oficina Brincando Na Diversidade Cultura Na Infancia
Livro Oficina Brincando Na Diversidade Cultura Na Infancia
Cultura Na INfNCIa
17, 18 e 19 de outubro de 2008 - SESC Vila Mariana / SP
NDICE
Apresentao Ministrio da Cultura _______________________ 04 Apresentao Fundao Orsa ____________________________ 06 Programao da Oficina ________________________________ 08
17 de outubro de 2008
MAnh Mesa de abertura
Participao
Srgio Mamberti, secretrio da Identidade e da Diversidade Cultural do MinC e atual presidente da Fundao Nacional de Artes (Funarte); Amrico Crdula, gerente e atual secretrio da Identidade e da Diversidade Cultural do MinC; Maria Alice Oieno, gerente de Programas Socioeducativos do Sesc/ SP; Renata Sanches, coordenadora de Programas e Projetos Especiais da Fundao Orsa; Gabriel Guimard, articulador da Rede Cultura Infncia.
prOGraMaO Da OfICINa
Participante Organizao/ Instituio Fundao Abrinq Guaimb - Espao e Movimento CriAtivo SID/MinC Instituto Maurcio de Sousa Aliana pela Infncia Escola Nacional de Circo SAV/MinC Associao Picolino de Artes do Circo SPPC/MinC Fundao Casa Grande - Memorial do Homem Kariri Funarte
Painel 1
Brincar
A expresso cultural da infncia.
Moderadora
Ilona Hertel (Sesc/SP).
Participao
Valsca Moura, da Fundao Casa Grande (Cear); e Maria Amlia Pereira, da Casa Redonda Espaos de Brincar (So Paulo).
Apresentao
Lydia Hortlio.
Interveno Cultural
Cludio Thebas, como palhao Olimpo.
Painel 2
Fazer cultural para a infncia.
Antnia Rangel Antonia Valsca Moura Cordeiro Antonio Carlos de Oliveira Junior (Jucca) Antonio Carlos Martinelli Jr. Beatriz Rosenberg Camila Rodrigues Leite Ceclia Garoni Celso Henrique Gonalves Darcsio Natal Muraro Debora Serritielo Emanuela de Souza Dantas Fabiano de Oliveira Moraes Gabriela Della Nina Gambi Giovana Barbosa Gracia Lopes Lima Henrique Santana Hermes Bernardi Jr.
Moderador
Gabriel Guimard, da Rede Cultura Infncia.
TArde Abertura
Atividade ldica conduzida por Lydia Hortlio.
Participao
Karen Acioly, do Centro de Referncia do Teatro Infantil (Rio de Janeiro); e Beatriz Rosenberg, do Instituto Marlin Azul Programas de TV para a Infncia (So Paulo).
18 de outubro de 2008
MAnh Abertura
Atividade ldica conduzida por Lydia Hortlio. Senna Salerno, da Multirio (Rio de Janeiro).
So Paulo - SP So Paulo - SP So Paulo - SP So Paulo - SP So Paulo - SP So Paulo - SP Braslia - DF So Paulo - SP So Paulo - SP So Paulo - SP So Paulo - SP Braslia - DF Natal - RN
Painel 4
Polticas Pblicas do MinC. Moderador Amrico Crdula, da SID/MinC.
Silvana Meireles, secretria de Articulao Institucional e coordenadora executiva do Programa Mais Cultura MinC; e Gabriela Gambi, da Coordenao Geral do Livro e Leitura MinC.
Painel 3
Comunicao (espaos/meios).
Moderador
Milton Pereira, da Fundao Orsa.
Participao
Ana Paula Santana, chefe de gabinete da Secretaria do Audiovisual MinC; Antnia Rangel, gerente da Secretaria de Programas e Projetos Culturais do MinC;
TArde
Sequncia do Painel 3 Plenria para definio dos princpios da cultura na infncia.
Participao
Marcelo Bressanim, do Sesc/SP; e Marcelo
19 de outubro de 2008
MAnh
Reunies dos grupos de trabalho.
Brasilia - DF So Paulo - SP
TArde
Plenria da oficina, com a apresentao das propostas de diretrizes e aes
A oficina teve como objetivo promover a reflexo sobre o tema e o conceito cultura na infncia, a fim de contribuir para a elaborao de diretrizes e aes para o Plano Nacional de Cultura nos seguintes eixos: fomento, memria e comunicao.
Fomento Aes que estimulem e apoiem a cultura na infncia, por intermdio de polticas que contemplem
suporte para projetos e iniciativas.
Patrimnio/Memria Aes que contribuam para a preservao, a manuteno e a transmisso do patrimnio material e do patrimnio imaterial relacionados cultura na infncia.
Comunicao Aes que difundam e divulguem a cultura na infncia por intermdio dos meios de comunicao (audiovisual, radiodifuso, internet, mdia impressa, publicidade, etc.). A oficina foi composta de atividades ldicas, painis temticos, grupos de trabalho e de uma plenria deliberativa. Cada atividade teve as seguintes caractersticas:
Metodologia da Oficina
A metodologia desenhada para a oficina possibilitou plena interao dos participantes com a mesa de debates e com os painis. Com isso, buscou-se favorecer o envolvimento do pblico com as discusses e assegurar sua influncia na indicao de propostas de polticas pblicas para a infncia. O objetivo foi criar condies para um exerccio coletivo de sntese, de identificao de pontos de convergncia, de divergncia e de priorizao, expresso na valorao das ideias e na limitao do nmero de diretrizes que poderiam ser elaboradas em cada grupo. Para assegurar a ampla circulao de conceitos e informaes, a oficina se valeu do uso de recursos como o registro e a divulgao do material de sntese das exposies e debates e o registro visual durante todo o processo de construo das propostas nos grupos de trabalhos e na plenria, garantindo plena interatividade entre os participantes.
Painis Temticos Apresentao de temas de interesse sobre cultura na infncia. Os painis possibilitaram
aos participantes trocar experincias e conhecer iniciativas voltadas infncia realizadas em diversos pontos do pas, como produo de teatro e TV para a infncia, a relao com jogos eletrnicos e internet e as polticas pblicas do MinC que dialogam com a questo.
Grupos de Trabalho Constituio de trs grupos de trabalho com o objetivo de debater temas relacionados aos trs eixos da oficina: fomento, patrimnio e difuso e sua interface com o Plano Nacional de Cultura. As discusses realizadas no mbito dos grupos de trabalho visaram debater e apresentar propostas, diretrizes e aes que possam subsidiar a elaborao de polticas pblicas do MinC em relao cultura na infncia e, em especial, a formatao do Plano Nacional de Cultura. Plenria Instncia deliberativa composta por todos os participantes da oficina. Nela, foram apreciadas as
propostas de diretrizes e aes elaboradas nos grupos de trabalho. As indicaes dos trs grupos foram apresentadas pelos respectivos relatores, compondo um painel geral de sugestes para avaliao e deliberao da plenria.
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atIvIDaDEs Da OfICINa
Abertura
17 de outubro de 2008
Participantes Srgio Mamberti, secretrio da Identidade e da Diversidade Cultural do MinC e atual presidente da Fundao Nacional de Artes (Funarte); Amrico Crdula, gerente e atual secretrio da Identidade e da Diversidade Cultural do MinC; Maria Alice Oieno, gerente de Programas Socioeducativos do Sesc/SP; Renata Sanches, coordenadora de Programas e Projetos Especiais da Fundao Orsa; Gabriel Guimard, articulador da Rede Cultura Infncia.
Maria Alice Oieno Estou aqui hoje, com muita honra, representando o nosso diretor, Danilo Miranda. J faz alguns meses que estamos atuando para a realizao deste evento e com grande satisfao que vemos o seu incio. Para ns, do Sesc/SP, o assunto criana um dos mais caros, um dos mais importantes, j que a nossa misso trabalhar para o desenvolvimento integral das pessoas. E a infncia tem um destaque significativo nesse trabalho. Oferecer oportunidades e situaes de descoberta faz parte do trabalho de contribuir para o desenvolvimento integral das pessoas. Com nossa ao, tentamos oferecer espaos para as descobertas a todas as faixas etrias. Um exemplo disso a Mostra de Artes do Sesc/SP, que oferece um conjunto de atividades que provocam e surpreendem o pblico, tentando afastlo da linearidade do dia-a-dia e possibilitando, com isso, que as descobertas venham tona. Com as crianas, o empenho do Sesc/SP no diferente. Procuramos desenvolver espetculos e atividades que sejam provocadores da curiosidade e que estimulem as descobertas. Nossos espaos tm essa mesma finalidade. Buscamos criar situaes para o surgimento das descobertas e oferecer lugares nos quais a brincadeira possa acontecer naturalmente. Estive recentemente com a minha filha no Sesc Bertioga, no litoral de So Paulo. L, existe um espao que oferece jogos com objetivos a serem atingidos e atividades a serem feitas. Ela e todos os amiguinhos fizeram tudo absolutamente na contramo das regras estabelecidas. As crianas reinventaram as normas. Isso nos mostra, com clareza, que a forma de ao do Sesc est correta, j que o nosso objetivo criar situaes de descoberta para as crianas que despertem a curiosidade e a pesquisa e que as faam exercitar suas potencialidades e vontades.
Albert Einstein j dizia que a brincadeira a mais elevada forma de pesquisa. Essa frase uma grande inspirao. No Sesc/SP, criamos situaes e espaos nos quais a brincadeira acontece de forma livre, criativa e experimental. Para tanto, existem diversos recursos ldicos que sinalizam, inspiram, mas no do a soluo para as crianas. O que desejamos que essas solues surjam do prprio ato de brincar. Existem 31 centros de atividades do Sesc no Estado de So Paulo, e cada unidade apresenta suas particularidades. Umas so mais urbanas, outras so mais campestres. Umas so grandes, com espaos amplos; outras so pequenas. Enfim, cada uma, a seu modo, aplica a filosofia do Sesc/SP de acordo com suas possibilidades estruturais e arquitetnicas e em sintonia com suas comunidades. Ou seja: cada unidade tem tambm sua cultura prpria. Pretendemos que essa forma de atuar esteja presente em todas as nossas aes, nas diversas iniciativas voltadas a todas as faixas etrias, especialmente no trabalho desenvolvido para as crianas. por isso que participamos desta oficina com gosto e interesse.
Antes de tudo, quero agradecer a disposio de todos de participar deste encontro histrico. Quero agradecer a todos os parceiros: Sesc/SP, Ministrio da Cultura e Fundao Orsa. Um ano e meio depois de nossas primeiras conversas, chegamos finalmente a este momento to aguardado. A Rede Cultura Infncia nasceu em dezembro de 2006, a partir de um grupo de discusses na internet que j conta em todo o Brasil com a participao de 2.500 pessoas que se relacionam, de alguma forma, com o universo da criana e da infncia. A articulao deste movimento nacional que ser construdo a partir de hoje algo de grande valor e tenho a esperana de que essa construo realmente ocorrer. bom que se diga que no temos a pretenso de inventar a roda, pois muito j foi feito de importante por indivduos e por instituies em prol das crianas e da infncia no Brasil. Estamos seguindo apenas o fluxo contnuo deste rio chamado histria. Reunir tantos interlocutores que transitam entre arte, cultura, educao e infncia, dialogando, propondo polticas pblicas e sendo escutados pelo governo federal representa uma iniciativa pioneira. Em uma de minhas conversas com o Ministrio da Cultura, Amrico Crdula perguntou se havia uma sistematizao na organizao do setor, se havia algum tipo de mobilizao orga-
nizada. Eu lhe disse que havia pessoas e instituies que faziam coisas importantes nessa rea, mas que no existia uma organizao nos moldes de um movimento ou de um frum especfico para a infncia, como o Frum dos Direitos da Criana e do Adolescente. Mas disse tambm que estvamos caminhando para isso. Acho que este evento poder ser decisivo para o avano desse processo de mobilizao. No sou a favor da segmentao da cultura. Sou a favor de darmos visibilidade s partes sem perdermos de vista a totalidade das aes. Estou convencido de que cabe sociedade e ao poder pblico a criao de mecanismos de comunicao e de troca de experincias entre todos os setores da cultura, favorecendo o surgimento de processos entre geraes que possam desenvolver, digamos, uma viso mais holstica do ser humano e da sociedade. E que a infncia possa, portanto, dialogar com a velhice. Ns, pesquisadores, artistas, educadores, representantes de instituies, fazemos parte de um todo e temos em comum a criana e a infncia. Esse pblico a razo de nossa aliana e o principal motivo da nossa unio. No podemos perder isso de vista. A criana e a infncia no so temas abstratos, no so nmeros apenas. Elas esto a, em nosso dia-a-dia, na figura dos nossos filhos, dos nossos educandos e das crianas de rua espremidas entre os carros nos faris das cidades.
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atIvIDaDEs Da OfICINa
O ltimo levantamento realizado pelo IBGE, em dezembro de 2007, aponta a existncia no Brasil de uma populao de 184 milhes de habitantes. Desse total, 40% so crianas e adolescentes, de zero e 16 anos de idade. Trata-se de um nmero muito significativo, que, talvez, devesse inspirar a criao de um Ministrio especfico s para esse segmento da populao. Exageros parte, o olhar diferenciado que se tem sobre essa gigantesca parcela da populao ainda tmido, principalmente se levarmos em conta a dimenso e a importncia estratgica que eles, as crianas e os adolescentes, representam para uma nao. Estamos falando do capital humano mais precioso de um pas. Sempre se falou que as crianas so o futuro do Brasil, mas nunca se assumiu que elas so mais do que o futuro: elas so o presente deste pas, a joia mais cara e rara da qual todo governo deveria cuidar com amor, zelo e carinho. No podemos perder o bonde da histria. Devemos insistir para que a cultura na infncia esteja na pauta de preocupaes das instituies, dos governos, da mdia e das empresas. Para finalizar: a infncia vai muito alm de uma determinada faixa etria pela qual o ser humano passa obrigatoriamente. Ela tambm um estado arquetpico e simblico, repleto de importantes valores, como o encantamento do mundo, o ldico e a sinceridade, valores que deveriam balizar as aes do ser humano adulto e com ele conviver. Os estudos tericos, as prticas sobre as crianas e a infncia e as experincias extradas da vivncia com elas deveriam ser os elementos norteadores para a construo de um novo mundo e de uma nova sociedade. Gostaria de encerrar lendo um poema de Fernando Pessoa, tirado do livro Mensagem, e que muito caro para mim. Diz assim:
O EsfOrO GraNDE E O hOMEM pEquENO Eu, DIOGO CO, NavEGaDOr, DEIxEI EstE paDrO aO p DO arEal MOrENO E para DEaNtE NavEGuEI. a alMa DIvINa E a OBra IMpErfEIta. EstE paDrO sIGNala aO vENtO E aOs Cus quE, Da OBra OusaDa, MINha a partE fEIta: O pOr fazEr s COM DEus. E aO IMMENsO E pOssvEl OCEaNO ENsINaM Estas quINas, quE aquI vs, quE O Mar COM fIM sEr GrEGO Ou rOMaNO: O Mar sEM fIM pOrtuGuEz. E a Cruz aO altO DIz quE O quE ME h Na alMa E faz a fEBrE EM MIM DE NavEGar s ENCONtrar DE DEus Na EtErNa CalMa O pOrtO sEMprE pOr aChar.
O Ministrio da Cultura busca estabelecer parcerias com a sociedade, por meio de suas instituies e da colaborao individual. Assim, temos elaborado as nossas polticas pblicas. E assim que o Brasil vai se encontrar. No Ministrio, temos construdo polticas a partir do dilogo e da transversalidade, algo que s a cultura pode oferecer. Buscamos transitar entre os temas mais gerais e os mais especficos, como o caso da cultura na infncia. Amigos, eu estou convencido de que no se pode relacionar infncia apenas com o futuro. Devemos pensar a infncia como parte do nosso presente. Desde 2003, o MinC assumiu o compromisso de apoiar, valorizar e reconhecer a diversidade cultural brasileira em todos os seus aspectos. Faz isso da forma preconizada pela Conveno sobre a Promoo e a Proteo da Diversidade das Expresses Culturais, adotada pela Unesco e promulgada em 2007 no Brasil. Sua inspirao que nos faz estarmos todos juntos aqui, hoje. Falar em diversidade significa falar na insero de toda a sociedade nas polticas pblicas do governo federal. Em nossa primeira gesto, entre 2003 e 2006, foi criada a Secretaria de Identidade e da Diversidade Cultural. Ela surgiu num momento de reestruturao do Ministrio, que visava ampliar sua atuao, de modo a trabalhar com os vrios segmentos da diversidade tnica, social e cultural, com os responsveis pela expresso das culturas populares, como os grupos de gays, lsbicas, bissexuais,
travestis e transexuais, de indgenas e de ciganos. No segundo mandato do presidente Lula, a partir de 2007, ns procuramos no s aprofundar a interao com os segmentos com os quais j trabalhvamos, mas tambm ampliar o raio de nossa atuao, abrangendo tambm o campo da sade coletiva, em sua dimenso social e cultural. Por conta disso, temos promovido iniciativas voltadas, por exemplo, a portadores de sofrimento psquico (como o projeto Loucos por Diversidade), s comunidades em situao de risco social, aos imigrantes africanos com problemas de referncia identitria, aos deficientes fsicos e aos trabalhadores. Tambm nos preocupamos com o chamado recorte etrio, buscando implementar polticas pblicas para idosos, jovens e crianas. A realizao desta oficina surgiu de um esforo da Rede Cultura Infncia, representada aqui por Gabriel Guimard. Posso dizer que ele foi o grande provocador para que a oficina acontecesse. Em fevereiro de 2007, Gabriel procurou o MinC e apresentou uma proposta de criao participativa de uma poltica pblica especfica para a infncia. A demanda nos inspirou. Estamos hoje, aqui, dando incio a um novo processo de construo colaborativa, utilizando uma metodologia j empregada na elaborao de outras polticas pblicas. Esta uma oficina de escuta e de dilogo. Um evento para saber ouvir e para que possamos aceitar e reconhecer o outro. Uma oportunidade para que pensemos juntos sobre quais polticas pblicas podero ser construdas para atender cultura na infncia e
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responder s demandas do Conselho Nacional da Infncia e da Adolescncia, no qual o Ministrio da Cultura tem representao. Nossa inteno, portanto, abordar o tema da infncia com base em trs grandes eixos: o fomento, a memria e a comunicao. Temos algumas preocupaes especficas, como a influncia da cultura de massa e dos meios de comunicao sobre a infncia, movimento que tem levado perda dos jogos, das brincadeiras tradicionais e dos espaos ldicos. Queremos discutir outras questes complexas, entre elas a do consumo e da induo das crianas ao
consumismo, porque hoje as crianas so tratadas como consumidoras e no mais como cidads. E esse apelo tem produzido forte impacto, por exemplo, na alterao de hbitos alimentares das nossas crianas. nossa convico tambm de que o tema da incluso digital ao pblico infantil deva ser objeto de uma poltica pblica. Outra tarefa que precisamos abraar a da incluso da cultura na infncia nas diretrizes e nas aes do Plano Nacional de Cultura que est em tramitao no Congresso Nacional. Precisamos, mais do que nunca, ter conscincia de que a criana
um agente ativo da sociedade. Eu tenho um carinho especial pelo tema. Gosto muito de crianas. Tenho quatro filhos e netos. Minha relao com as crianas sempre foi muito criativa No processo de aproximao do Ministrio com as culturas indgenas e com as culturas tradicionais, temos percebido a importncia das crianas na vida da comunidade. Deixemme contar uma histria. Recentemente, em visita Alemanha, um ndio xavante comentou com os anfitries: T percebendo que este povo no tem futuro, no. No vejo nas ruas mulher de barriga, criana, gente idosa. Aqui, as pessoas no valorizam a prpria cultura. Isso deve ser porque a gua, aqui, vira para o outro lado, e o cu t todo bagunado. Deve ser por isso que eles no se entendem. Como estava no Hemisfrio Norte, ele no conseguia reconhecer as constelaes e achava que essa era a causa daquela desorientao. So referenciais como esses que a sociedade vai perdendo. Como o da relao com a natureza e com o meio ambiente. E quando se fala de polticas para a infncia, deve-se pensar sobre essa inverso de valores, muitas vezes motivada pela ambio do lucro. Creio tambm que a crise que estamos vivendo hoje no mundo, pensando no sentido que o I Ching d ao termo, pode ser uma oportunidade de mudana, de construirmos uma nova sociedade. Queria falar para vocs tambm da minha experincia pessoal com as crianas. Como muitos sabem, trabalhei na srie de TV Castelo R-Tim-Bum. Tenho 50 anos de carreira, j fiz trabalhos importantssimos. Mas posso dizer que a obra mais relevante, como maior marca na minha trajetria de artista e cidado, foi o papel de tio Vtor no Castelo R-Tim-Bum, pela relevncia que o programa teve na formao da criana brasileira. Sempre que eu participo, por exemplo, de alguma reunio da Unio Nacional dos Estudantes e digo raios e troves!, todo mundo comea a cantar o tema do programa. que todos os jovens j haviam assistido ao Castelo. Outro exemplo: um dia, um avio em que eu estava teve de descer em Tucum, no meio da selva amaznica, para ser abastecido. Sa do avio e, de repente, apareceu um menino, que me disse: No acredito, o tio Vtor est aqui!. E rapidamente aquele lugar ficou cheio de crianas me abraando, me beijando. Todas elas me viam como algum da sua intimidade. No Castelo, o tio Vtor no era o pai do Nino. Ele estabelecia limites, mas tambm alargava a dimenso do sonho, da utopia, da criao, das relaes com as linguagens artsticas e das responsabili-
dades sociais. Tudo de um jeito to ldico que no se via aquilo como alguma manifestao de ditadura. Ao contrrio. E eu ainda encontro muitos jovens e pais que continuam assistindo ao R-Tim-Bum. Gostaria de contar mais uma histria para vocs. Em 1988, na campanha da Luiza Erundina para a Prefeitura de So Paulo, organizamos uma atividade chamada Palanque Cultural. Nela, a candidata se apresentava, mas quem falava mesmo era o pblico. Num dos eventos, a Erundina perguntou s pessoas o que esperavam de seu governo. Um menino de rua da Praa da Repblica se antecipou, tomou a palavra e disse: Que a senhora nos livre da tristeza e da humilhao. Ele no pediu nada. Pediu apenas respeito sua dignidade como cidado. Na hora, todos ficaram em silncio. O pai do garoto era policial e a me, domstica. Como ele apanhava dos dois, dizia que, apesar de ser perigosa, a vida na rua era melhor do que a que tinha no prprio lar, porque se sentia mais preservado. Ou seja: temos pela frente o desafio de construir uma poltica de Estado para a infncia que no se limite educao, que tenha amplitude e englobe as diversas iniciativas que vm sendo desenvolvidas no pas. Por que eu digo isso? Porque, se quisermos falar de um novo Brasil, ns deveremos falar de uma poltica de Estado responsvel para a infncia, de uma poltica que reforce o que a sociedade j vem construindo. E so as parcerias institucionais que ajudaro a levar adiante projetos dessa dimenso. Para tanto, precisamos de uma ativa participao da sociedade, de forma consciente e responsvel, para que consigamos alcanar os objetivos almejados. Com isso, poderemos, de fato, fortalecer a identidade da infncia e valorizar atividades voltadas a essa faixa etria. E de que forma? Promovendo o fomento, a memria e a difuso da cultura na infncia no pas. Por ltimo, quero fazer um agradecimento Fundao Orsa e ao Sesc/SP, na figura de seu diretor, Danilo Miranda, que tm um papel de grande responsabilidade social e so um exemplo para ns em todo o trabalho que viermos a desenvolver. Desejo a todos aqui presentes um bom trabalho e que possamos colher os frutos deste sonho que comearemos a transformar em realidade.
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O que cultura na infncia
17 de outubro de 2008
Apresentao Lydia Hortlio Amrico Crdula Gostaria de apresentar uma baiana de Salvador que teve a infncia em Serrinha, no interior da Bahia, com formao em msica, piano, educao musical e etnomusicologia. Uma mulher com vivncia na Alemanha, Sua e Portugal, e que se dedica ao estudo da msica brasileira, especialmente ao estudo da msica das populaes do serto da Bahia e da msica das crianas. Com vocs, para uma fala inspiradora, Lydia Hortlio: Lydia hortlio Evocando o poeta, fao-o como um chamado, como um convite para entrarmos num balo: o balo do Sonho, e viajarmos juntos, alto, longe, fundo, em direo ao Reino da Infncia... As imagens que lhes sero apresentadas contam a histria do que brincaram os Meninos do mundo, desde que se tem notcia at os nossos dias. Ao longo dessa histria, veremos aflorar as lembranas dos Brinquedos da Infncia de cada um de ns. Elas viro compor, atravs de uma sinonmia de todos os tempos e de todos os lugares, a segunda parte da promessa que fiz para este nosso encontro: os paralelos com o Brasil contemporneo. Nesta oportunidade, tenho a imensa satisfao de lhes apresentar frutos de um trabalho de pesquisa que j leva
muitos anos na busca de uma compreenso da Criana atravs do seu movimento prprio: o Brinquedo, o Brincar. E para estend-la a tempos que ficaram bem mais para atrs, nada melhor do que recorrer Beleza, Arte dos Povos, onde iremos encontrar, aqui e ali, documentos da Infncia da Humanidade, como sinais os mais sensveis de nossa caminhada. Assim veremos, como ponta do fio de um novelinho que se desenrola h muito, muito tempo, que os Carrinhos de Lata puxados pelos meninos na periferia de nossas cidades, se movem pela mesma vontade que animava os meninos da Prsia h mais de 1100 anos a.C. Consideremos o Brinquedo de Cavalinho, cujo movimento leva a Criana a transportar-se, ser veloz, passar alm, voar! Vemos ento que ele est presente em vrias pocas e lugares, servindo aos cavaleiros do Sonho, os artfices do Novo, arautos do Futuro! As Bonecas de Pano, que encontramos entre ns nas feiras do interior, tambm esto em Luxor, ao lado das pirmides... Cada Brinquedo de Criana um impulso de vida, um gesto da evoluo, uma forma de realizao e de busca... Arqutipo e smbolo, necessidade e linguagem, esforo e Brinquedo: onde estaria a linha divisria?! Certamente que no encontraramos. E a est, justamente, o mistrio, a pista para a compreenso da Criana: sua inteireza, a multiplicidade e riqueza de expresso, o imprevisvel, a obedincia ao movimento interno, a espontaneidade, a Alegria! Que maravilha, se pudssemos conhecer, um por um, os gestos do Brincar de todos os tempos. Talvez assim tivsse-
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, a Crianca Nova que habita onde vivo. D-me uma mo a mim e a outra a tudo que existe... , a Crianca Eterna acompanha-me sempre. , a direco do meu olhar o seu dedo apontando..."
Fernando Pessoa
mos um retrato mais verdadeiro do Ser Humano: um retrato de corpo inteiro! Mesmo porque o Corpo, com todos os seus talentos, o territrio de manifestao da Infncia. E se no nos dado encerr-la no bolso, tanto melhor, pois sempre haver meninos no mundo inventando novos Brinquedos e reinventando outros, e mais uma vez estaremos diante do milagre vivo do essencial, e da chance de aprendermos liberdade...
No repertrio relativamente pequeno que temos a oportunidade de ver agora, logo se mostrar a graa e o poder do Ser-Humano-Ainda-Novo, tentando inscrever-se na Criao atravs do conhecido e do inesperado, sonhando e ousando sempre, integrando-se consigo mesmo, com o outro e com o mundo.
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O homem s inteiro quando brinca. E somente quando brinca que ele existe , Na completa acepco da palavra: homem."
Friedrich von Schiller
Se observarmos as Crianas, e tivermos a sorte de v-las em verdade, o que quer dizer, brincando, vamos concordar perfeitamente com o mestre alemo, e com tantos outros que vm fazendo a apologia do Brinquedo ao longo de nossa Histria. Quem no se lembra dos Cozinhados debaixo de uma mangueira, das Rodas e Brinquedos Cantados em noite de lua, do silncio e carreiras no Esconde-Esconde sol a pino para chegar a salvo na picula sob o fresquinho de uma rvore amiga?!
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Mais do que nunca, precisamos reconduzir os meninos ao seu espao primeiro: a natureza"
, o Exerccio de ser Crianca...
Para que isto acontea, porm, necessrio voltarmos ao Jardim: Natureza. Brincar tornou-se, antes de mais nada, uma questo ecolgica. preciso desenvolvermos uma compreenso renovada do milagre da Vida e do papel do Ser Humano na Criao. Devemos s nossas Crianas, nada menos que o restabelecimento de seu verdadeiro habitat. Num pas como o nosso, de 8.500.000 Km, isto no deveria ser impossvel. Tudo depende do grau de conscincia que desenvolvermos e da disposio sincera em assumir uma responsabilidade que de todos e de cada um. H algumas dcadas atrs, em Paris, os estudantes foram s ruas e lanaram um grito que varreu o Planeta:
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a expresso cultural da infncia
BRINCANDO NA DIVERSIDADE: CULTURA NA INFNCIA
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Painel 1 - Brincar
Moderadora
Ilona Hertel, do Sesc/SP
Participao
Valsca Moura, da Fundao Casa Grande (Cear); e Maria Amlia Pereira (Pel), da Casa Redonda Espaos de Brincar (So Paulo)
Valsca Moura Os dois vdeos a serem apresentados foram escolhidos porque retratam dois bairros de Nova Olinda, que no tm muitas opes de cultura para as crianas. Em 1992, o casal de msicos Alemberg e Rosiane passou alguns meses na Chapada do Araripe, na regio do Cariri. A famlia do Alemberg tinha uma casa no local que havia sido dos avs dele foi a primeira casa da cidade, em Nova Olinda. No local, o casal resolveu criar o Memorial do Homem Cariri. Como at ento as crianas da regio tinham a casa como uma
ro tudo com os outros participantes a fazer revista em quadrinhos, a filmar... O prximo filme que eu vou mostrar para vocs foi feito por uma criana de dez anos, o Rodrigo. Ele mostra como temos a oportunidade de brincar e sonhar l dentro. O nome do vdeo Meu Olhar sobre a Casa Grande. Na Casa Grande sempre assim: a criana entra brincando. uma casa de brinquedo, na qual se aprende brincando com coisas de verdade. O Rodrigo pegou uma cmera e foi filmando. Os maiores passam o conhecimento para os menores, que passam para os pequenos, que passam para quem est chegando. A troca de conhecimento vai acontecendo. A diferena entre a nossa instituio e as outras que, na Fundao Casa Grande, os lderes so jovens. Alemberg e Rosiane so os mentores da instituio, mas quem fica l de segunda-feira a segunda-feira somos ns, para fazer o programa de rdio e para receber quem chegar l para conhecer as instalaes. Eu entrei na fundao com quatro anos. Brincava, tinha aula de violo, participava da rdio, da brincadeira do chocolate, comia bombom. Hoje estou numa etapa em que ensino outras crianas a desenhar, a fazer o programa de rdio. Na Casa Grande, o espao da criana e do adolescente. O meu Estado pequeno. Nas cidades do interior, o nvel de educao muito baixo. Um livro, dois livros por ano tudo o que as crianas leem. Na fundao, h os laboratrios de produo, o laboratrio de contedo, a gibiteca, a biblioteca, a videoteca, a
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Ilona Hertel Boa Tarde. No sei se algum aqui teve a oportunidade de ver um espetculo que est na Mostra de Artes do Sesc/SP. Trata-se de uma apresentao que revela a condio de extrema vulnerabilidade da infncia, a exposio a que ns submetemos a infncia, em todas as suas dimenses: na sua subjetividade, no seu corpo, nas suas expresses. Deparar-se com isso assustador, porque faz pensar que, ao desejarmos estar do lado da infncia, somos abusivos com a criana, achando que temos tudo a dizer para ela, que podemos fazer as escolhas por ela. Quando vi esse espetculo, que me deixou muito triste ao pensar na minha condio de adulto e em como os adultos olham pouco para as crianas, eu falei: Meu Deus, caiu a ficha! E no era essa a inteno do Sesc quando foi montada essa grade de programao para a mostra. Estou hoje aqui mediando uma mesa que abordar o trabalho de duas casas e casa lembra acolhimento, lugar de conforto e de respeito. Espera-se que seja assim; deseja-se que seja assim. Faz muito sentido comearmos esta fase do nosso encontro com o relato de duas mulheres de geraes distintas, com experincias muito diferentes, e que falam de casas.
rea de lazer onde realizavam suas brincadeiras, Alemberg e Rosiane se deram conta de que as crianas ficaram curiosas com o destino da casa. No incio, a ideia no era montar a Fundao Casa Grande, mas sim o Memorial do Homem Cariri, para resgatar a cultura dos povos do Cariri. Mas as crianas foram chegando e a Casa Grande nasceu, tendo, logo de incio, 200 crianas para serem mantidas com R$ 200,00. Claro que brincar na terra importante, mas a Casa Grande trouxe algo novo para as crianas: possibilitou a elas sonhar. E, quando se tem um sonho, j se percorreu metade do caminho. O prximo passo realiz-lo. A Fundao Casa Grande foi crescendo, e as crianas foram chegando. Alemberg e Rosiane explicavam para elas a respeito do que havia no memorial e, rapidamente, as prprias crianas tornaram-se guias do local. E foram elas prprias que sugeriram: Alemberg, bora criar uma TV Casa Grande?. Compraram uma cmera, graas aos patrocinadores, e depois, dentro da Casa Azul que a casa de brinquedo, onde as crianas brincam e aprendem , comearam a funcionar uma gibiteca, uma videoteca e uma biblioteca. Ao lado, havia a primeira escola da cidade. Como o sonho foi muito grande, permitiu ampliar a Casa Grande. Em 1998, o prdio foi restaurado e hoje funciona ali uma escola de comunicao. No local, hoje, h quatro programas: Memria, Comunicao, Arte e Turismo. O Programa de Memria o incio de tudo, porque foi por meio das pesquisas feitas para montar o memorial que surgiu a Casa Grande. Seu objetivo resgatar a histria dos nossos antepassados. As crianas e os jovens aprendem sobre os ndios Cariri. Quando um visitante chega l, Filipe, que tem nove anos de idade, explica a ele todos os detalhes da Casa Grande. As crianas, desde pequenas, comeam a frequentar o local e vo crescendo e passando por vrias reas: quem se interessa mais por uma delas se aprimora. A primeira vez que entrei na Casa Grande, fui atrada pela escolinha: queria brincar. A porta de entrada da Fundao Casa Grande a escolinha, onde h um programa de rdio infantil, um programa feito por crianas para as crianas. Existe a hora de se contar histrias, h as brincadeiras de roda. Atualmente, como a Casa Grande aumentou, haver um programa de comunicao: a rdio, a TV e a editora. Se as crianas se interessarem pela rea, aprende-
Ao desejarem estar ao lado da infancia, os adultos tambm so abusivos, achando que tem tudo a dizer para as crianas, que tem tudo a escolher por elas"
BRINCANDO NA DIVERSIDADE: CULTURA NA INFNCIA
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internet, a TV, a editora, a rdio. E todo o conhecimento colocado em prtica: se eu aprendo uma forma nova de desenhar, uso o que aprendi para fazer uma histria em quadrinhos. A escola avalia o aluno por meio das notas. Na Casa Grande o sistema de avaliao assim: h o boletim on-line, chamado de blog, e cada um tem o seu. Durante a semana, todos devem ler um gibi, um livro, passar na videoteca, fazer uma pesquisa na internet e, depois, fazer um relato no blog. Quem no cumpre a meta em uma semana, na seguinte dever ler dois gibis, dois livros... O que se percebe no que as crianas no gostam de ler, mas que elas no tm hbito, porque muitos pais no leem em casa ou, s vezes, nem sabem ler. Se a escola no incentivar, fica difcil. A rea que as crianas mais gostam a da internet, por isso buscamos uma maneira de equilibrar as atividades: o passe livre. preciso passar quatro horas nos laboratrios de contedo para se ganhar esse passe e ter acesso liberado para a internet. A ideia de Alemberg e Rosiane levar o mundo para o serto. Maria Amlia Pereira (Pel) Agradeo a oportunidade de ver uma das primeiras iniciativas que buscam, de fato, colocar a infncia em seu devido lugar, e, dentro da infncia, dar o espao de sujeito que a criana merece. Acho que a Lydia foi profundamente inspiradora nesta manh. No universo da infncia, a poesia e a imagem falam muito mais do que o discurso, porque o brincar est ligado iniciao humana neste planeta, porque criana tem um recurso fantstico, que o brincar, que a natureza lhe d. E hoje est impedida dessa atividade. Esse exerccio contm os princpios fundamentais da liberdade, da bondade. A prpria palavra brincar vem etimologica-
mente de brincos, as primeiras canes com que uma me embala seu filho. A lngua portuguesa tem duas palavras para definir o momento da infncia: o jogo e o brincar, que nas demais lnguas so uma palavra s. A ns, brasileiros, que temos na nossa lngua essa distino entre jogar e brincar, cabe um aprofundamento srio em relao a essa distino, porque a que vamos encontrar a essncia do brincar e tambm a essncia do ser brincante que somos ns. Quando uma lngua tem uma palavra, tem a natureza dessa palavra dentro dela. Eu queria dizer Lydia que me lembrei de algumas frases que as crianas dizem quando brincam, e que tem muito a ver com essa vida do lado de l. Esse passeio entre terra e infinito. Quando a criana est brincando de fazer uma casinha e vira para voc, que est muito perto e que no est ensinando a brincar, porque no existe ensinar a brincar , ela diz assim: Voc me ajuda a fazer eu?. Ou outra criana para a qual voc pergunta como ela conseguiu fazer aquilo, como ela est inventando aquela brincadeira, e ela responde: Deus que me ensinou. Se Ele ensinou, parece a mesma madorna do Z de Bi, uma memria ancestral que est dentro de ns, que h milhes de anos processa esse conhecimento o qual a educao mais cognitivista e racionalista deixou de lado. No apenas por deixar de lado, mas porque existe uma conscincia que tem medo do brincar, porque o brincar trabalha com a criatividade, com a liberdade, e isso perigoso numa sociedade como a nossa. Quando a Lydia falou sobre a questo da madorna, daquele brincante que se reportava a imagens que via e assim construa os brinquedos, eu me lembrei de uma frase do Milton Santos em que ele diz que ns habitamos dois lugares: a terra e o infinito. Eu acho que as crianas so mestras nessa circulao, elas fluem no espao l e c porque tm uma comunho profunda, intacta dessa relao corpo e alma, dessa relao ser humano e natureza. Eu espero que consigamos sair deste encontro com uma deciso muito importante: de reconhecermos que sem natureza no h brincar. A linguagem do brincar uma linguagem mediadora de vnculos. Eu digo hoje que falar do brincar falar da sobrevivncia da espcie humana. Ao deixarmos as crianas brincarem, estaremos construindo o melhor currculo educacional de um pas. Acho que estamos preocupados com essa cultura na infncia porque estamos preocupados com a humanidade. Vou aproveitar para falar um texto do Mrio de Andrade: O brinquedo socializa mais do que uma sesso solene, e na liberdade do brinquedo se determinam inconscientemente muitas caractersticas de uma raa. Poder-se-ia escrever um livro sobre psicologia das raas estudando unicamente os brinquedos nacionais. Portanto, olharmos para a nossa infncia e para os nossos brinquedos olharmos para uma cultura que est adormecida.
Consideraes Finais
Maria Amlia Pereira Foi dada a partida para serem colocadas as questes relacionadas com a cultura na infncia, com o aval de um Ministrio. Acredito que todos ns temos experincias para trocar e enriquecer esse possvel documento que sair daqui com o objetivo de buscar caminhos para que, como Valsca disse, se d lugar de direito humano s crianas, aos adultos, aos adolescentes, aos velhos. Espero que tenhamos o direito de sermos felizes, que o mais importante, porque algumas das grandes questes do brincar so a alegria, o direito vida, o direito de dar um sim vida. Estamos num momento em que h uma escolha a ser feita, em que se pode colocar a dimenso da vida como um direito humano. Que o brincar seja reverenciado e referendado aqui como a iniciao humana ao processo criador.
Ilona Hertel S queria relatar aqui uma fala que ouvi da Esmeralda Ortiz, que alguns de vocs devem conhecer: ela jornalista, trabalha com roteiro para cinema, e passou parte da sua vida de criana e adolescente em situaes de rua ou na Febem. Ela dizia o quanto a criana brinca em qualquer circunstncia: mesmo quando todas ficavam nuas, sentadas numa sala sem janela, passavam o dia inteiro brincando com os dedos e criando situaes de desafio, mesmo porque, naquela circunstncia, no podiam brincar com as outras crianas. Faz pensar que o meio urbano excludente, mas, de qualquer forma, as crianas encontram o caminho. Gracia Lopes Lima, do Projeto Cala-boca j Morreu Brincar com coisas srias e aprender coisas srias. Voc acabou de dizer uma das coisas mais importantes, que o direito de a criana produzir cultura com o uso das tecnologias. Acho que o trabalho da Fundao Casa Grande tem um grande salto. No momento em que as tecnologias ficam mais baratas, as crianas esto sendo incitadas a consumi-las. Ns temos a um projeto que transforma as crianas de consumidoras em produtoras. Pessoa da platia Como podemos articular essa possibilidade de contato direto com a natureza, mesmo que seja nessa cidade de pedra? Como articulamos o contato com essa tecnologia, pensando nessa lgica da produo, nesse sujeito que cria, que produz, que constri, que faz histria e que amplia sua percepo do mundo? Como podemos articular no s o contato com a natureza, mas tambm o contato com as tecnologias? Essa ampliao da percepo se d tanto pela natureza quanto pela tecnologia. Jacqueline Baumgratz, da Companhia Cultural Bola de Meia Parece que h uma combinao entre criana e futuro, e acho bastante pertinente que conversemos com o presente. O presente de vida e o presente do agora, no com o vir a ser. E essa questo do srio me incomoda, como se ser srio fosse importante e como se o brincar fosse uma coisa menor, menos importante. Acho interessante discutir essa questo. Amrico Crdula Eu queria saber como vocs gostariam que a cultura na infncia fosse inserida como poltica pblica. Essas experincias poderiam ser referenciais, no sentido de merecer replicao? Maria Amlia Pereira Essa questo da distino entre brincar e jogar me persegue. Eu no saberia dizer se tenho a resposta, mas sinto que dentro dessa distino esto aspectos fundamentais do desenvolvimento humano, no seu incio. Vejo uma diferena entre o game e o play e acho que o termo play no equivale ao brincar da nossa lngua, que est mais aproximado do game do ponto de vista da cultura ingle -
Debate
Darcsio Muraro, do Instituto de Filosofia da USP e da Fundao Sidnio Muralha Queria questionar sobre a diferena entre brincar e jogar, porque essa diferenciao conceitual importante para pensar a discusso da infncia. H um autor americano que estabelece uma distino entre duas palavras no ingls: play e game. E h uma discusso de que o brincar uma atividade mais relacionada imaginao, mais ldica, e de que o jogar relaciona-se s regras. H uma diferena entre o mundo da imaginao e o mundo que se torna mais racional com o jogo. Como voc diferencia essas duas questes? Renata Bittencourt, do Ita Cultural As duas exposies me emocionaram porque sou educadora e hoje tenho a oportunidade de trabalhar com o circo, que um imaginrio. Por que a construo do conhecimento precisa ter um sabor amargo, doer, ser sria demais? Ns nos esquecemos de que a brincadeira se coloca como uma possibilidade de construo de conhecimento, mas com sabor, como Valsca falou. Quando se utiliza toda essa gama de possibilidades, no se precisa tirar o sabor da vida. Karen Acioly, do Centro de Referncia do Teatro Infantil A questo que se coloca no s do brincar e do jogar, mas do brinquedo e do corpo da criana como veculo de comunicao, do prazer em todos os sentidos. Trata-se do brincar como ponto de contato entre as diferenas. Hermes Bernardi Jr., da Associao de Escritores e Ilustradores de Literatura Infantil e Juvenil do Rio Grande do Sul O que foi comum em ambos os vdeos que so comunidades carentes, comunidades mais perifricas e humildes. Eu queria pensar o espao do brincar nas grandes cidades, no meio do concreto e com famlias que tm poder aquisitivo maior.
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sa, europia. Nesse sentido, h um componente mais sutil a ser pensado. Quando assisto a uma criana brincando, como se ali existisse um pacto, um canal de ligao profunda entre a terra e esse infinito. Existe ali um processo verdadeiramente espontneo. A finalidade do brincar encerra-se em si mesma. Tanto que a criana que brinca inaugura um tempo diferente do cotidiano e um espao que foge ao espao fsico onde aquele brincar est acontecendo. Eu diria a vocs com tranquilidade, com a experincia de 25 anos assistindo a esse brincar mais espontneo, mais da natureza humana em sua essncia, que como se se estabelecesse um corpo energtico ali. A criana, inclusive, se mostra s vezes profundamente silenciosa na sua brincadeira, a ponto de ela ser respeitada pelas outras crianas. Quando esse brincar est acontecendo, como se ele tivesse um crculo ao redor dele, um campo, um acontecer de vida misterioso, porque o que ocorre est se dando internamente. O externo simplesmente uma evidncia. Mas est se processando, por meio desse brincar, algo que internamente se ordena, se auto-regula, cresce e se afirma com a essncia. A alma est presente ali. J o jogo responde a algo que vem de uma estrutura externa. Tambm significa uma aprendizagem interna, mas a liberdade e a vontade que aparecem no sentido do brincar me parecem ser um elo extraordinrio da vinculao do ser humano com seu hbitat, com a Terra, com a vida. E ali se constri o conhecimento. Um conhecimento que no precisa ser medido, avaliado, inventado, explicado. Ele se processa dentro do prprio ser. Lvi-Strauss fala um pouco da participao mstica, no sentido dessa ligao que as sociedades mais primitivas tm em relao aos seus fazeres. E, nesse sentido, o brincar profundamente srio. Traz uma seriedade tanto que a alegria s vezes silenciosa e o brincar, muitas vezes, recheado de algo que extrapola, que grita, que berra, que, enfim, repleto de muito movimento. Tenho uma infinidade de documentos, de falas, de presenas, de fotografias em que v esse elemento mais misterioso da vida acontecendo no brincar. A neurobiologia, hoje, traz a compreenso do nosso crebro como algo que tem dois hemisfrios. Eu diria que o hemisfrio do brincar o do lado direito, onde est o sonho, a imaginao, o sensvel, aquilo que no tem uma certa lgica. E no hemisfrio esquerdo ocorre o pensamento mais lgico, objetivo, o da cincia. Acredito que existe um corpo taloso que se comunica e a criana estabelece essa comunicao, ainda. E, do ponto de vista da educao, o que acontece que se bloqueou o hemisfrio do brincar em nome daquele conhecimento que se quantifica, que se avalia, que tem objetividade. Carregamos isso h 300 anos, trazido pelo positivismo, pelo mecanicismo, pelo racionalismo. Estarmos hoje aqui uma amostragem importante de que estamos mais sensveis. Porque essa fala, h 25 anos, no teria
ouvidos em nenhum espao educacional. No entanto, hoje j h pessoas procura desse conhecimento e j h casas como a da Valsca. A educao que privilegia o cognitivismo est destruindo nossas crianas. O primeiro movimento do brincar no corpo e na oralidade. E a oralidade saiu da escola e o importante a escrita. Sabemos que a criana refaz biolgica e psicologicamente a histria do ser humano, da espcie humana e que preciso um certo perodo de tempo para que isso acontea. Essa escola que est a hoje, a meu ver, uma escola que anuncia o velho, que fragmenta, que divide, que separa. E o brincar seria essa outra linguagem, a linguagem do sensvel, que traria esse componente para restaurar o equilbrio. No negar a cabea, mas trazer o corao, trazer o corpo, trazer a sensibilidade e resgatar a unidade perdida. Quanto questo do corpo como brinquedo, se h o espao da natureza, esse corpo um grande brincante. um veculo de expresso dessa alma brincante. No precisamos criar currculos para a brincadeira. Deixe as crianas no espao que elas fazem e desenvolvem as suas necessidades. Lembro um trabalho feito na Bahia, em 1982, quando nos foi dado um parque para que desenvolvssemos um projeto com as crianas que moravam numa favela localizada numa encosta, perto dali. Esse parque tinha alguns declives gramados e uma rua de cimento por onde passava o caminho que recolhia folhas secas do cho. Logo nos primeiros dias, as crianas no iam para os gramados, simplesmente corriam em debandada. O que eles precisavam era do corpo livre, correndo, sem perigo. Tivemos uma reunio com as professoras e elas diziam: Nossa, vejam como as crianas
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Na brincadeira, como se existisse um pacto, um canal de ligao profunda entre a terra e o infinito"
no conseguem utilizar o espao da natureza, um gramado to bonito! Como difcil para elas entrar em contato com uma coisa sensvel e bonita. Fomos ento para a regio onde essas crianas moravam e vimos a favela numa encosta. Ora, os corpos dessas crianas j estavam acostumados aos declives, s encostas e ao morro, onde elas se desafiavam a cada momento por meio do brincar. Quando ocorre uma conexo pela brincadeira e tudo aprendido, a criana parte para outra atividade. A riqueza da brevidade dessas brincadeiras est justamente nesse processo do ser humano como aprendiz nato: uma vez dominado um saber, ele quer ir adiante. Essas crianas passaram alguns meses correndo com folhas na mo, correndo com carrinho de lata, com os aros, porque eles estavam tendo, pela primeira vez, a experincia corporal de estar no plano. No era uma negao de que eles no sabiam usar o gramado, nem subir. Era a necessidade do corpo. E, mais uma vez, o brincar respondeu a necessidades vitais. No existe uma brincadeira que no tenha, dentro dela, um sentido verdadeiro de desenvolvimento da criana que est brincando. Quanto questo urbana, vou dizer francamente que tenho pena das crianas da cidade. Basta ver o que acontece quando se recebe essas crianas num espao da natureza, como a Casa Redonda. So crianas de dois a sete anos, num momento em que a pulso do corpo est ali como elemento fundamental. Pois elas tm medo de bicho, no colocam o p na grama, no querem tocar na areia. Tudo sujo, tudo ruim, tudo pica. Ora, nos primeiros anos de vida, essa averso ao prprio hbitat, onde esto os
elementos da natureza, significa que aquele ser foi tirado de sua casa e isso me parece muito perigoso, inclusive no processo atual de educao ambiental, que introduz a natureza para a criana via discurso. O cuidado com a natureza por meio do discurso no acontece, fica apenas no plano terico. A criana um ser que, onde estiver, buscar a sobrevivncia. Certamente, dentro da cidade ela encontra brechas para buscar essa qualidade que lhe pertence mas que, uma vez limitada, pode lev-la a adoecer. E as crianas esto adoecendo, haja vista o nvel de agressividade dentro das escolas urbanas. De outra parte, preciso situar a discusso dos limites entre a informao e o conhecimento. Hoje, vejo algumas amigas encantadas porque um menino de apenas trs anos j vai direto para o computador. A imagem, para a criana, algo fantstico. a linguagem dela. Ela simplesmente fica fascinada pelos programas de televiso, com os quais difcil competir a menos que se tenha natureza ao redor. Se no houver natureza, a criana vai correr para dentro do computador, que outro mundo que est surgindo para ela. S que, ali, ela fica sentada, vivenciando experincias completamente distantes do processo que o corpo tem para se manifestar. H ali adrenalina sendo mobilizada, a qual se transforma em toxinas, porque a criana no sai correndo, no se movimenta. E ela vai incorporando aquilo tudo. Se prestarmos muita ateno no rosto e no corpo de uma criana de sete, oito ou nove anos que passa duas a trs horas dirias em frente a uma televiso e compararmos com o de uma criana pulando
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e dando cambalhotas na natureza, no haver dvidas de que uma mais viva do que a outra. Quanto poltica pblica que se quer em relao infncia, h muito a ser feito! Em primeiro lugar, uma tomada de conscincia de quem a criana, no como objeto, e do que a infncia, no a infncia construda num discurso mental, mas o perodo em que h componentes a serem vivenciados no espao da natureza pelo sujeito vital que a criana. Acho que deve haver polticas pblicas que exijam que a escola no minta, usando grama plstica onde diz existir um jardim. As crianas esto praticamente imobilizadas dentro da sala
No adianta criarmos espaos dentro de ONGs. O que tem de mudar o sistema de educao, que tirou a possibilidade de permanncia, de existncia desse processo de conhecimento que estamos chamando aqui de brincar porque ele menor. Porque, para o sistema, brincar no um processo de conhecimento uma atividade recreativa. a questo do tempo livre: se a criana no tem nada melhor para fazer, vai brincar. Por isso que eu me preocupo com a questo da conscincia sobre a cultura na infncia. A lngua da infncia o brincar e, para que as pedagogias entrem nessa linguagem, preciso que elas desenvolvam a inteligncia que a criana tem quando brinca.
gem que tem a oralidade e a escrita e que se supe que estejam ali como recursos dominados, mas no se escreve nem se fala. E se coloca tudo a servio de um instrumento que chega a comprometer a prpria auto-estima da criana: uma vez que ela no consegue usar o equipamento em sua qualidade inteligente, passa a utiliz-lo simplesmente para os games. Valsca Moura A gibiteca aberta para as crianas, para todos. Para ter acesso, h a carteirinha de scio: o aluno vai, leva a ficha, tem o nome dele no computador. Agora vai ser feita a ficha on-line, para dispensar a carteirinha.
At os dez anos de idade, todo o processo de absoro de um conhecimento passa pelo corpo"
de aula porque hoje no h espao na rua. Para a populao, tanto a dos centros urbanos como a das periferias, a rua uma ameaa. Ns teremos que redefinir o conceito da escola como espao social: as crianas a frequentam porque os amigos esto l. Porque, se fosse s pelos professores, elas no iriam. H que se redefinir o espao escolar dentro de uma cidade como um espao de socializao. E acabar com essa linearidade, porque hoje, uma vez que no h mais famlias grandes e o espao da rua, a criana adestrada para conviver apenas com a mesma faixa etria: meninos de quatro anos com meninos de quatro anos, meninos de cinco anos com meninos de cinco anos, e assim por diante. Isso fazia sentido nas bases em que a escola se sustentava anteriormente, quando a criana ia para a escola num perodo e para a rua no outro. E a vida se processava na rua. Nos anos 1940, o exerccio democrtico se fazia por meio das brincadeiras de rua, nas quais as regras eram estabelecidas pelas prprias crianas, num processo que envolvia entrosamento e interao. Ali estavam ocorrendo espontaneamente exerccio de liberdade e respeito s regras de socializao e ao outro. Hoje qualquer atividade fica praticamente confinada numa redoma, sempre com um adulto presente, controlando tudo para que no degringole. Quanto poltica pblica, acho muito bom que hoje ns tenhamos entrado pela porta da cultura, que uma porta mais livre. Uma porta que aposta na histria humana. Porque, na esfera da educao, estamos blindados. Acho que a tarefa que a rea da cultura mobilize uma mudana na educao porque nossas escolas precisam mudar. Sobre a questo da tecnologia: ela algo recente, que vem, na verdade, tendo papel importante no processo de desenvolvimento e educao. Vejo a tecnologia como instrumento a servio do homem, em primeiro lugar. Temos de comear a pensar um pouquinho sobre esse a servio do homem. Assim como distinguimos o brincar e o jogo, temos de distinguir tambm o momento de introduzir a tecnologia no mundo da infncia. Preocupo-me ao ver, cada vez mais, a sabedoria se tornando um saber e o saber se tornando informao com a tecnologia muito voltada para o entendimento da informao como conhecimento. E, nesse momento, acho que devemos prestar muita ateno ao que estamos propondo como recurso do instrumento inteligente a servio do desenvolvimento harmonioso de um ser humano. Do ponto de vista da infncia, sou extremamente radical: acho que para a criana at os sete ou dez anos todo o processo de absoro de um conhecimento passa pelo corpo, pelo que se chama de experincia corporificada, o que significa que a aprendizagem se faz por sinapse de alguns neurnios, que se repetem, que experimentam e se colapsam. A partir desse processo h um conhecimento, que aquilo que penetra em mim e, a partir da, eu passo a ser agente desse conhecimento. Do ponto de vista atual da educao, me parece que h uma fascinao pela tecnologia, que esto colocando dentro da escola laboratrios com computadores a servio de informaes. Nas escolas pblicas brasileiras, o que est se dando o seguinte: as crianas vo para o computador, que uma lingua-
Kelloggs, que patrocinaram dois gibis todos contra o fumo e Aids , possvel imprimir grande quantidade de exemplares, que so distribudos em escolas e para os turistas, alm de alguns que ficam na gibiteca, que funciona todos os dias, da uma s cinco da tarde. Na parte da manh, aberta para as crianas e jovens da Fundao Casa Grande e para o turismo. A Casa Grande tambm relaciona-se com o turismo de contedo. Quem mora em outro lugar e vai para l com seus filhos, encontra um lugar onde eles podem ler e brincar. Na biblioteca temos um contador de histrias e h um programa de rdio, de criana para criana. Os frequentadores de l que no sabem ler comeam na figurinha, e aos poucos vo aprendendo mais a leitura. Sobre a questo do brincar com coisas de verdade: l, na Casa Grande, ns brincamos e tambm aprendemos. interessante ter uma cmera e um computador e poder us-los. L muito livre, a criana tem disponibilidade para utilizar os equipamentos e aprender. Naquele meio de convivncia, ela pode at comear a ter uma viso do que vai querer ser no futuro. A ideia da Fundao Casa Grande no s ensinar as crianas e os jovens a utilizar os equipamentos, mas tambm formar um cidado. Tudo o que a criana e o adolescente fazem na Casa Grande, mesmo brincando, para ser usado em sua formao no futuro. A tecnologia muito importante quando as crianas e os adolescentes usufruem dela e elas prprias comeam a produzir.
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O acervo da gibiteca foi montado por meio do patrocnio de um projeto enviado para a Fundao Kelloggs. Ns vamos melhorando nossas produes dentro da Casa Diretora, que outro laboratrio da Fundao Casa Grande, onde se produzem revistas em quadrinhos. O maior objetivo da gibiteca que as crianas e os jovens que gostam de quadrinhos possam se aprofundar mais para conhecer autores, desenhistas, roteiristas. E que o quadrinho passe a ser um elemento natural na vida dos jovens. Ns temos na gibiteca o trabalho com as crianas, para que aprendam a ler e a escrever com o universo do quadrinho. Tambm h a biblioteca, aberta para as crianas s ter a carteirinha de scio, a ficha on-line. Uma das preocupaes da Casa Grande resgatar as lendas de nossa regio, para as pessoas conhecerem. Uma forma que encontramos de as crianas entenderem essas lendas foi transform-las em histrias em quadrinhos. Tambm tratamos de temas de sade, como tabagismo e Aids, e temos projetos como o de formao de platia, que so programas que desenvolvem a imaginao da criana. Quando se tem um parceiro, como Unicef e Fundao
Se a tecnologia for usada corretamente, poder trazer benefcios importantes para a vida das pessoas. A criana deveria ser tratada e reconhecida como ser humano. As pessoas devem passar a olhar para ela, ver que ela importante. Se a criana de zero a trs anos tiver uma infncia boa, uma infncia com os pais presentes, com educao, ela vai ser feliz, saudvel. Se no tiver esse cuidado, podero ocorrer coisas ruins em sua vida. Ilona Hertel Para encerrar, gostaria de colocar uma discusso do Walter Benjamim sobre a questo da construo histrica do brinquedo em contraposio quase que imediata negao da brincadeira. O brinquedo se constituindo como uma negao da brincadeira. Lembrar que o brinquedo, assim como a tecnologia, ou qualquer coisa que um de ns faa, diz o Walter Benjamim, uma proposta para a criana. E a resposta sempre vem pela brincadeira. A grande tarefa que ficou aqui para o Ministrio o reconhecimento da dimenso humana das crianas e dos adolescentes. No mais da infncia, mas de crianas e adolescentes. Esse um ponto de partida interessante para qualquer poltica pblica.
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Moderador
Gabriel Guimard, da Rede Cultura Infncia
Participao
Karen Acioly, do Centro de Referncia do Teatro Infantil (Rio de Janeiro); e Beatriz Rosenberg, do Instituto Marlin Azul Programas de TV para a Infncia (So Paulo)
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Karen Acioly Vou comear situando um pouco o trabalho que fazemos no Rio de Janeiro desde 2001. Nesse ano, Artur da Tvola foi convidado a ser o secretrio municipal de Cultura. Eu nunca o havia visto e fazia um trabalho na Central do Brasil, no Teatro da Light, de sensibilizao e formao de plateias. Era gratuito, todo mundo tinha sua senha, e os espetculos eram de altssimo nvel porque havia um aporte de recursos do setor privado. Nessa poca, ele props: Vamos fazer alguma coisa aqui, na cidade, para sensibilizao e formao de plateia. Eu falei: Posso inventar o que eu quiser?. Pode. Mas voc vai me dar verba, vai fazer parte do seu oramento a importncia da criana dentro do municpio do Rio de Janeiro?. Esse trabalho durou dois anos e conseguimos implantar vrios espetculos infantis e todos eles eram assistidos pelos alunos de escolas municipais. Mas acabou. O Artur da Tvola saiu da secretaria, entrou outro governo e tivemos que dar continuidade a projetos j iniciados e que no tiveram suporte. Em seguida, entrou o Miguel Falabella na Secretaria de Cultura do Rio e eu vi que havia um teatro disponvel e que era o melhor lugar para dar continuidade ao trabalho. E agora vou retomar a fala da manh, sobre estarmos perto da natureza com as crianas. Eu sugeri: H um teatro na rea VIP da cidade, o teatro do Jquei Clube. Vamos tomar esse teatro para as crianas. Ser que vo deixar? Que vai dar certo?. A resposta foi positiva. Vai dar certo. Por que temos de dar sempre os lugares que ningum quer para as crianas? Vamos ao Teatro do Jquei Clube, na rea nobre da cidade, onde h cavalos, olha que beleza! Se a criana no gostar do que est assistindo, ela pode ver cavalos tomando banho. Vai ser uma recordao para toda a vida: o teatro
dos cavalinhos, e tal. Ento, ocupamos o espao e fundamos o primeiro Centro de Referncia do Teatro Infantil. Evidentemente, no havia verba: Vocs rebolem, faam sem verba. Conseguimos muita ajuda das companhias de teatro e fizemos o nosso primeiro banco de textos nacionais e internacionais para crianas. Hoje temos 250 peas que nunca foram digitalizadas por falta de recursos, mas gostaria de compartilhar com todos que esto aqui essa possibilidade de difundir novos autores do teatro para criana, tanto do Brasil como de outras partes do mundo. Ns resolvemos fazer, com esses textos, uma memria histrica. L no Centro de Referncia j foram encenados 350 espetculos diferentes. J fizemos residncias de artistas variados nos horrios ociosos do teatro. O teatro um espao pblico, e ns entendemos que, mesmo sem dinheiro, preciso ocupar os diversos horrios disponveis. Ento, na parte da manh, tem residncia; tarde, espetculo para as crianas pequenas; noitinha, para as crianas maiores; noite, para adolescentes e jovens. E foi assim que comeamos a movimentar e triplicar o pblico do teatro. Descobri que a dramaturgia do Rio de Janeiro precisava se relacionar com a de outros Estados, com a de outras partes do mundo. A partir disso, fundamos o Festival Internacional Intercmbio de Linguagens. O Brasil tem em seu interior vrios pases, vrias culturas. Precisvamos conhecer melhor o que o outro aqui no Brasil. Por isso trouxemos as companhias internacionais para conviverem conosco. No vdeo, vocs vero todas as ONGs com as quais fizemos contato e que trabalham seriamente a questo da dana, a questo do teatro, da msica. Esse outro projeto, que comeou com o Centro de Estudos e Pesquisas Pblicas e se chama Brasil e Juventude Transformando com Arte. Ele acontece uma vez por ano e mais de 300 jovens se renem todos os dias para fazer oficinas conjuntamente e, depois, criam e dirigem um espetculo, que se chama Mistura de Linguagens, ou Mistura Irm. Ns chamamos todos os participantes e falamos: Vocs vo se conhecer agora, em cena. E uma loucura. A maioria das crianas com quem trabalhamos vive em regio de risco. O interessante, tanto em um projeto quanto no outro, que h a mistura das comunidades, das linguagens. E h o adolescente que cuida da criana, a famlia envolvida, o que muito
No importa de onde a criana venha. Seu olhar para o mundo sempre o da boa f, o olhar de quem ve o mundo pela primeira vez com vontade"
importante. Ns no pensamos a criana sem o afeto e a proteo do adulto como responsvel. Da ltima vez, sentimos muito a falta do voto das crianas para escolher o que elas queriam para o prximo festival. Ns sempre fazamos pelo voto popular: as crianas escolhiam, com critrios bastante subjetivos, os seus espetculos de preferncia. Gostaramos muito que o Centro de Referncia no fosse extinto. No sabemos o que vai acontecer no prximo governo, mas queremos manifestar a vontade de que o trabalho continue. E falar sobre os nossos meios de produo, sobre a articulao nacional e internacional importante para que no fiquemos voltados cada um para a sua prpria realidade. importante que nos comuniquemos, que aproveitemos esse encontro de articulao nacional. No importa de onde ela vem, o olhar da criana para o mundo sempre aquele olhar da boa f, de quem v o mundo pela primeira vez, com vontade. Devemos expressar esse respeito pela criana no oramento do MinC. Um oramento que preveja a articulao entre cultura e educao. Entre pais e filhos. Vem surgindo uma clula familiar completamente nova, principalmente nos centros urbanos. E isso muda tudo quando se pensa em infncia. Em relao ao tempo subjetivo que o tempo do silncio da criana , concordo que as crianas urbanas perderam muito de sua capacidade de escuta. Elas perguntam, mas nem querem a resposta. S querem perguntar. muita informao...
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Por fim, gostaria de citar uma ao feita por ns este ano e que deu certo. Com o Ministrio da Justia, promovemos uma campanha contra o massacre de nossas crianas pela indstria da violncia e da pornografia precoce. No toa que o Brasil tem nveis altos de prostituio infantil e de violncia entre os jovens. Mas queria compartilhar com vocs sadas, e no pessimismo. Apenas sadas: vontade de ir para a frente, de avanar, de formar mais cidados felizes neste pas to grande e to diferente dos pases europeus, onde tudo j est pronto. Na Frana, as crianas vo trs vezes por semana ao teatro para assistir a peas e a concertos. Aqui, temos tudo por fazer. L est tudo pronto quando no em decadncia. Mas aqui, no. Temos o caos pela frente, para organizar e para construir. Beatriz Rosenberg H uma coisa muito interessante na minha rea de trabalho, que a parte do cultural, do artstico, que o que as crianas mais fazem. No Brasil, as crianas assistem a uma mdia de quatro horas e meia de televiso por dia. Como simplesmente no podemos ignorar o poder de atrao da televiso, penso que o melhor que temos a fazer, ento, uma televiso de qualidade. Quando comecei a pensar sobre o que iria falar aqui, eu me dei conta de que, na rea da cultura, fazer pela criana muito diferente do que fazer para a criana. A vantagem de a criana produzir a manifestao cultural, principalmente utilizando a tecnologia de mdia, que ela tambm aprende um pouco a no ser manipulada pela mdia. Ela entende que, se eu colocar uma msica de suspense sobre a imagem dos passos de uma pessoa, isso predispe a acontecer alguma coisa. J se a msica for de um piano suave, esses passos podem sugerir apenas um passeio. Quando a criana tem a possibilidade de entender e ler a mdia, ela fica menos vulnervel. Inclusive na questo da violncia. A criana que conhece mdia consegue entender que no faz sentido um filme no qual o heri com armadura de ferro e um vilo, com armadura dez vezes maior, lutam e destroem toda uma cidade s para descobrir quem vai ficar com a mocinha. A criana que faz mdia no ver somente as exploses e os incndios produzidos pela luta, mas poder perceber o quanto aquilo est custando e como o prprio heri no tem remorso, como sua violncia inconsequente. Seria muito interessante a possibilidade de dar para as crianas, e tambm para os professores de escola, uma leitura da mdia. Como se faz anlise de livros, pode-se fazer tambm a anlise da mdia, para capacitar professores e crianas a escolher o que vo ver na televiso para no serem enganados a ponto de acharem que aquela luta entre o grande heri e o inimigo maravilhosa. Para enxergarem o que est alm dessa luta.
Devemos capacitar os professores e as crianas para ler a mdia e, com isso, escolher o que assistir na TV"
Outra questo importante qual a diferena entre fazer pela criana e fazer pelo adulto. Sou uma pessoa adulta que, h muito tempo, faz televiso para crianas. Um fazer cultural importante. E eu fiquei refletindo sobre como ns pensamos a televiso. Quando cria um programa, a equipe da TV Cultura primeiro pensa para que ele vai servir. Depois de ver todas essas manifestaes teatrais to lindas e to novidadeiras, acho que na televiso no h grandes inovaes: estamos l para ganhar uma audincia muito grande. E, para ganhar uma audincia muito grande, muitas vezes as televises abusam bastante. Voltando ao modo como fazemos televiso: em primeiro lugar, num canal educativo, numa emissora pblica, preciso saber para que vai servir o programa a ser criado. Cada um pode ter uma utilidade especfica. Pode significar oferecer um produto de qualidade que, de alguma maneira, ajude a transformar a criana. Mas o que se quer? Transformar essa criana num pblico consumista? Isso o que a maior parte das televises faz com os anncios, criando necessidades que no existem. Pode-se tambm pensar na televiso ajudando a criana a conhecer melhor o mundo. A televiso como janela. Queria chamar a ateno para o foco da TV sobre a criana urbana. Ns temos muito mais televiso que retrata criana urbana do que criana que vive na praia ou em reas rurais. Vamos assistir a uns dois ou trs exemplos, depois continuamos. (vdeos so exibidos) Essa uma maneira de fazer televiso para as crianas: mostramos outras crianas e como elas vivem no resto do Brasil. Ainda como prova de que podemos criar um universo das crian-
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Cocoric. Esse programa foi criado pela TV Cultura em 1995 porque nos demos conta de que no se mostrava nenhum ambiente rural. Tnhamos programas com peixes, que era o Glub Glub, tnhamos o Castelo e tudo o mais. Mas nada que fizesse referncia ao ambiente rural, com o qual as crianas da cidade tinham pouco contato como as sementes se transformam em rvores, da onde vem o leite, por exemplo. Retomamos o personagem Jlio, que havia sido criado para um programa especial de 1989, e que tinha dado muito certo. Aproveitamos o Jlio, colocamos trs galinhas para contracenarem com ele e, aos poucos, foram surgindo outros personagens: os papagaios, o cavalo Alpio, a vaca Mimosa, o porco Astolfinho. No Cocoric h tambm muitas canes. O programa visto por crianas muito pequenas: os bebs adoram, embora ele seja feito para a faixa etria de trs a seis anos. As canes so muito importantes, e ns as aproveitamos para contar coisas para as crianas. Em sua maioria, elas so compostas por Hlio Ziskind, que um grande talento. Agora, vamos ver o clipe de uma cano de que as crianas gostam muito. Depois, vamos falar um pouco de como fazer para crianas o que as crianas gostam. um clipe sobre o coc. (O clipe apresentado). Esse foi um vdeo premiado e difcil de fazer. Ns sabamos que as crianas gostam de falar em coc o tempo todo e quisemos dar um sentido para isso, ensinar para as crianas o processo diges-
tivo e o tema da fertilizao da terra. Foi um trabalho difcil. Tivemos acompanhamento de psiclogos e pedagogos que sempre colaboram com a TV Cultura. Demorou, mas ficou muito bom. Os americanos odeiam. Esses dois vdeos so divertidos, bem feitos, mas tambm tm um propsito de tornar o Brasil mais conhecido, o modo de viver no Brasil mais conhecido. O vdeo do coc tinha razo de ser. Mas uma coisa que a TV faz, e que talvez ns desconsideremos quando falamos com as crianas, permitir que elas compreendam um pouco melhor a si mesmas e lidem com certos sentimentos que so muito complicados. Eu queria mostrar um exemplo disso em Confisses de Adolescente, mas acho que no h tempo. a histria de quatro irms de 13 a 17 anos. A menina de 15 a 16 anos nunca beijou, e a de 13, nesse episdio, que se chama O Primeiro Beijo, faz na escola a brincadeira da pra, uva, batata frita ou ma, e sorteia justamente o menino que ela quer beijar. Ela beija o garoto por quase 12 minutos. Sendo que a menina de 15 nunca beijou. Tudo isso a questo do crescimento e de experimentar coisas com o outro sexo pode ser tratado na televiso. O Pingu, que uma animao alem muito interessante, mostra um personagem que faz coisas erradas: faz coisas escondido, malcriado, mas a histria sempre d um jeito de ele consertar seus erros e de terminar bem. So possibilidades que a televiso abre para fazer com que as crianas entrem em contato com seus prprios sentimentos e que aceitem o fato
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de terem esses sentimentos, ao perceberem que eles so comuns s outras crianas. O problema da televiso que nem tudo TV Cultura. E a televiso ns, que fazemos, sabemos muito bem um mercado muito diferente de teatro ou das brincadeiras. um mercado que envolve uma quantidade muito grande de dinheiro. Ningum mais faz televiso sem pensar em subprodutos como o game, o livro, os lenis, a mochila, o suquinho porcaria. No caso do Cocoric, pelo menos, ns temos livros, vdeos e DVDs que so bons. Mas, na maior parte dos programas para criana... o fazer para a criana, s que muito mais comercial do que era no comeo do sculo passado, antes do advento da televiso e do cinema. A situao fica mais complicada quando se pensa nos valores que esto sendo passados para as crianas. So os valores do High School Musical, esse grande sucesso que faz com que as meninas mudem o objetivo: se antes a ideia era casar, agora a meta ter fama, ser popular. Quando se assiste a uma propaganda voltada para crianas em que o menino
defenda que no se deve ver televiso antes dos dois anos de idade na Frana, isso foi proibido. Depois dessa faixa de zero a dois anos, h os pr-escolares, que vo de trs a seis anos, e nesse mercado pode-se encontrar um material bem interessante, internacional. H tambm o pblico de sete a dez anos, que vem sofrendo uma mudana: o que se gosta de ver agora so os programas de meninas populares, enquanto os garotos preferem atraes com ironias e violncia porque a violncia carregada de emoo, desperta sentimentos fortes. Nesse contexto, o que se pergunta como fazer uma televiso que tenha sucesso, que seja assistida pelas crianas quando, na verdade, elas querem ver pegadinhas, piadinhas. E no se pode dizer que elas esto erradas. Quando se pergunta para um garoto se Cavaleiros do Zodaco muito violento, ele vai dizer: O bem sempre vence. o que daria razo para a violncia presente no desenho. Eu me preocupo com a influncia da indstria cultural no crescimento das crianas, no padro de vida que elas vo ter e nas aspiraes que vo alimentar. Quando ns fazemos programas para bebs, pomos muita cor, um ritmo mais lento, bastante cano, trabalhamos com elementos ldicos como bonecos e desenhos. Quando fazemos para crianas de trs a seis anos que a minha idade favorita, porque quando todos adoram aprender , elas reagem muito bem, acham tudo engraado. Mas quando se pensa na faixa dos sete aos dez, temos essa questo complicada, tanto que, se observarmos, a TV Cultura, agora, tem pouca produo para essa faixa etria. H coisas interessantes para sete a dez anos, mas no so as que fazem sucesso. Ns nos vemos num dilema que : como atingir as crianas e, ao mesmo tempo, passar ideias que so de desenvolvimento, de
Quem faz TV de qualidade, sempre vive o dilema de como alcanar as crianas e, ao mesmo tempo, passar idias de crescimento, respeito e cidadania"
fala para o pai: Me deixa na esquina da escola porque eu no quero que meus amigos me vejam nesse carro, o que est sendo dito de verdade? Se no forem incorporadas formao infantil atividades que apontem para esses absurdos, teremos crianas muito sensveis aos apelos da televiso e da indstria cultural. Na indstria cultural, at bebs so tratados como pblico consumidor, embora a Associao Americana de Pediatras crescimento, de respeito, de cidadania e de direitos humanos. ( exibido um vdeo alemo). Esse vdeo tem conceitos cientficos totalmente absurdos, como pasta de dentes que faz arco-ris, Sol que anda para c e para l. Mas ele muito interessante! E as crianas, quando viram, na Alemanha, amaram. Porque ele uma reinveno. Acho que devemos produzir para crianas programas que sejam bem diferentes.
Gabriel Guimard Quero comear essas consideraes com uma frase do Stanislavsky, grande mestre russo do teatro do sculo XX, que todos devem conhecer: O teatro para crianas deve ser feito como o teatro para adultos, porm melhor. Essa frase baliza no s o teatro, mas todos os suportes artsticos. Vejo nesses vdeos que a Karen e a Bia mostraram que existe uma excelncia, que no h uma concesso para a infantilizao. Essa uma luta da arte contempornea atual desenvolvida para a criana. Porque realmente existem muitos percalos pelo caminho: muitas pessoas, at letradas, acham que a arte para criana tem de ser uma coisa infantilzinha, algo menor, porque a criana no vai entender se tudo no estiver bem explicado. Precisamos ter muito cuidado na aceitao dessa produo cultural rasa. Um trabalho de produo cultural sempre precisa de dinheiro, mas o que eu vi nesses filmes no so cenrios grandes possvel desenvolver um trabalho nesse nvel mesmo em companhias menores. Existe uma frase muito interessante: a produo cultural para criana no considerada obra de arte. Vou falar do teatro, que a minha rea. comum perguntarem: Quando que voc vai fazer teatro para adulto?. Ou na literatura: Quando que voc vai fazer um livro para adulto?. Esta outra luta que se enfrenta. Trabalhar com a criana e com a infncia visto como coisa menor. Isso tem que acabar. Temos de colocar os pingos nos is. Um tema de longa discusso a questo dos projetos sociais, das ONGs e fundaes versus a arte e a produo artstica. Existe grande ateno nesses projetos do MinC para insero social e produo cultural, mas, muitas vezes, isso tudo vira uma oficina de trs semanas e o participante tem de apresentar alguma porcaria. E dizem, ento, que o objetivo no que ele se torne um artista, um profissional. Mas as pessoas perdem de vista que a disciplina que existe na arte j um trabalho da auto-estima. Temos de tomar muito cuidado com isso. Seria proveitoso fazer uma mesa para essa questo projetos culturais x produes artsticas, porque um caso muito srio. H muita coisa ruim e muita picaretagem nesse sentido.
dos e a desejar brinquedos? O problema maior no desejar os bens materiais, mas incorporar os bens simblicos representados pela comida e pelos brinquedos. Uma TV pblica, educativa, no deveria agir com essa violncia contra as crianas, como os outros canais... E a segunda questo: Gostaria de saber da TV Cultura se existem a investigao e o desejo de incorporar produes em desenho, em especial brasileiros e da Amrica Latina. Ilona Hertel Foi trazida a questo do contedo no suporte televiso. Mas a minha questo anterior. se o suporte adequado. Ns precisaramos discutir um pouco mais. Eu fico assustada quando falam de televiso para bebs. Daqui a pouco, ns teremos menininhos pequenininhos sem movimento algum diante de um aparelho de televiso. Devemos avaliar se, de fato, o suporte adequado e interessante para o desenvolvimento da inteligncia integral da criana. No s uma questo de contedo. Essa uma questo que precisamos de fato compreender e analisar. Beatriz Rosenberg No tenho nada a ver com a TV Cultura. Inclusive, no estou mais na rea dos infantis; estou na rea dos documentrios. Assim, vou responder como Bia, e no como TV Cultura. Posso dizer que eu, pessoalmente, acho a publicidade uma coisa horrorosa. Sou totalmente contra; acho que no deve existir. Mas h outras pessoas que no acham isso. A TV Cultura tem dificuldades financeiras, embora veicule tantos anncios. E a produo nacional to pequena... Se pelo menos o dinheiro fosse aporte para se fazer uma produo nacional... Mas a TV Cultura est produzindo pouco, mesmo na rea dos desenhos. A TV R Tim Bum est produzindo desenho possui uma estrutura menos rgida, menor, com uma produo mais gil. No livro que eu escrevi, A TV Que Seu Filho V, eu digo que a televiso tecnologia, meio. O que se faz com ela, como usada, depende de cada um. Temos de dar um uso para ela. Por isso, importante termos uma poltica pblica sobre o assunto. No um livro a favor ou contra a televiso; um livro para usarmos bem a televiso. Nele, eu coloco a publicidade como a produo mais nociva para as crianas. mais nociva do que a violncia, porque gera valores que so muito mesquinhos. Com relao televiso para bebs, no tenho muita experincia na rea. H pesquisas a respeito e, embora os mdicos, a Frana e os americanos sejam totalmente contra, pelo que sei os resultados
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Debate
Gracia Lopes Lima Em nome do respeito que temos pela TV Cultura, fao duas questes: Que explicaes a TV Cultura tem para si mesma que justifiquem a veiculao de anncios publicitrios que incentivam as crianas a comer produtos inadequa-
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no foram concludentes. J vi muita me falar que pe o filho meia hora para ver televiso e a criana gosta, fica calma. Aos seis meses, oito meses, a criana j imita coisas da televiso, j faz os movimentos, bate palminhas. Tem uma interao. Talvez seja o caso de discutirmos como a televiso para bebs usada, e no sua proibio. Por mim, a criana no deveria ver vrios programas que a televiso mostra, como, por exemplo, o telejornal, pois elas no entendem. algo extremamente assustador para elas, principalmente para as crianas menores. Elas acham que o pai pode jog-las pela janela ou sofrer um desastre de avio, porque viram isso no noticirio. O telejornal no trata do cotidiano, trata de coisas extraordinrias quanto piores elas forem, maior ser a audincia. Ento, eu diria: no, crianas no podem ver telejornal. Pode-se depois at conversar com elas sobre temas difceis. Joo Augusto Figueir, do Instituto Zeroaseis Para crianas de zero a seis anos, h uma fundamentao cientfica. Sou mdico e vou apresentar uma anlise do ponto de vista mdico. No fomos consultados em relao adequao da televiso para bebs. No emitimos opinies ideolgicas, dogmticas. Ns nos reportamos literatura mdica e cientfica, e h um volume enorme de publicaes com pesquisas sobre televiso para bebs. E no h, at o momento, nenhuma evidncia da utilidade de crianas menores de trs anos se exporem televiso. Mas existe um enorme volume de evidncias de que ela provoca efeitos negativos, como a postura que a criana adota vendo a televiso. Ou o fato de que bebs de zero a trs anos que veem televiso, quando mais velhos, tornam-se mais rebeldes no que se refere a desligar o aparelho. Ficam, vamos dizer assim, com adio televiso. Essa questo da movimentao do corpo est bastante tolhida pelas atividades ligadas televiso. Hoje, nossa recomendao a de que no se exponha a criana televiso, pelo menos antes dos trs anos. Com relao aos telejornais, concordo inteiramente com o que foi dito. J fiz uma proposta pblica, em um canal de televiso, de que os telejornais aglutinassem todas as tragdias num nico e ltimo bloco de notcias. E que, antes da exibio, houvesse uma recomendao aos pais de que esse bloco no recomendado para crianas menores. Essa sugesto est ainda no vazio. Fui chamado algumas vezes para opinar em relao repercusso que o caso Isabela teve entre as crianas no Brasil. E as repercusses foram terrveis, muito ruins. Imagine uma criana dopada, uma criana cujo pai violento, uma criana que mora num prdio, presenciando as cenas que foram exaustivamente mostradas. O resultado disso foi muito negativo para a infncia no Brasil. Acho que ns precisamos ter mais voz.
Karen Acioly Aqui vai uma sugesto associada: que o governo no veicule suas propagandas nos horrios de programas nos quais as crianas no so respeitadas. Porque nutrir esses horrios com verba pblica, com propaganda do governo significa estimular que tais programas continuem passando esse tipo de mensagem. Se eu fosse membro do governo, nunca colocaria uma propaganda ligada a uma tragdia pblica, como todas as que passam no Jornal Nacional, por exemplo. H muita verba do governo naquele lugar, naquele horrio, para aquelas emissoras. Amrico Crdula Ns temos um problema que a questo de contedos para infncia, seja no teatro, seja na TV, em funo do crescimento da tecnologia. No momento em que estamos abrindo a pauta da TV digital, gostaria que a Bia falasse um pouco sobre isso. O que a TV Cultura j pensa nesse sentido, j que vamos tratar de interatividade, e as crianas de hoje so as mais interativas possveis, muito por conta da internet. A internet uma porta aberta, enquanto a TV ns ainda podemos desligar, sabemos que determinada programao fixa. Com a TV digital, isso muda. Eu tambm gostaria de saber como o teatro vai acompanhar esse crescimento tecnolgico. O teatro infantil hoje comea a ser desinteressante a vem um Felipe Gentil e faz um teatro que deixa as crianas encantadas. Maria Helena Masquetti, do Instituto Alana A TV Cultura se comprometeu a no mais exibir publicidade para criana a partir de janeiro de 2009. Isso j um bom comeo, um bom exemplo. Em relao TV para bebs, ns precisaramos tambm refletir que a criana fusionada com a me: bebs no definem limites entre o que ele e o que a me.
Ao olhar para a TV, a criana est sendo treinada para gostar do que ve nela, inclusive da publicidade"
Ns temos de pensar como a criana vai se sentir em relao televiso, que tem movimento e som, mas que no abraa, que no beija, no encosta, no d calor, no tem mo. A criana, nos primeiros meses, projeta parte de si mesma no objeto e do objeto para dentro dela. No possvel prever o que vai acontecer. Ento, uma rea muito delicada. No mnimo, seria prudente, j que no se sabe o que fazer, no incentivar que bebs assistam TV. Alm disso, do ponto de vista da liberdade publicitria, olhar para a TV e se encantar com ela um modo de treinar a criana para gostar do que v nela. Se a publicidade estiver l, a tendncia a criana gostar. E consumir televiso consumir tambm publicidade. Como os americanos gostam de dizer, condenar a criana no mais do bero universidade, mas do bero ao tmulo. Marcelo Salerno, da Multirio Tudo isso que est sendo dito muito prximo do que ns pensamos e buscamos na Multirio. Somos uma produtora de multimdias, produzimos para internet, impressos, televiso e outras mdias. Temos uma produo de muito xito em animao. Animao profissional, de alta qualidade tcnica e de contedo, e tambm animao com crianas, feita por crianas, com roteiro delas. Ns, logicamente, damos a elas o embasamento necessrio. E, nesse sentido, existe produo. Pode ser pequena, mas fica claro que o poder pblico consegue assumir respon-
sabilidade nessa produo, que no vinculada venda de produtos. Se a venda de produtos for uma consequncia, consequncia, no a causa. Na nossa infncia, nossos pais dirigiam os carros sem cinto de segurana e meu pai no era irresponsvel. Era apenas outro momento. Hoje, nenhum pai responsvel faria isso. Hoje assiste-se a uma srie de animaes que at podem ser espetaculares, mas que nascem a partir de uma demanda: vender balas. Ento, vamos criar um boneco, colocar vrios acessrios, que a o pblico vai comprar vrios produtos. Acredito que a possibilidade de o poder pblico se envolver na produo de contedo de mdia para crianas real, como todas as timas iniciativas que vm surgindo. E outra questo importante que, se aqueles que tm a inteno comercial esto formando do bero ao tmulo, ns temos de confront-los, formando tambm nossa audincia. Ns temos de oferecer produtos de qualidade para formarmos mediadores de todo e qualquer contedo que chegue s crianas, que so os pais, em primeiro lugar, e os professores tambm. Temos de investir nesses mediadores, na formao dessa audincia e, logicamente, nas crianas. Ao iniciar a criana para que tenha senso crtico em relao ao produto oferecido, estaremos fazendo um bom papel. A questo cientfica inquestionvel: h que se respeitar o tempo, a formao, o processo de desenvolvimento da criana.
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vamos conseguir afastar a criana da televiso. As mes trabalham. Elas no ficam em casa e, portanto, no tm controle. A soluo dar mais qualidade. Karen Acioly Sobre os novos produtores de desenhos animados no Rio: eu fui jurada no Festival de Cinema Infantil, e a produo est incrvel em termos de crescimento, de qualidade, de investimento. Precisamos, cada um em sua cidade, mostrar muito da produo local, para que no se perca a memria de cada lugar. S poderemos ter a tecnologia e fazer bom uso dela se tivermos noo da sua histria e no perdermos de vista que ela o ponto de partida para qualquer uso da tecnologia avanada. Acho que o teatro tem uma funo que no s artesanal. O teatro tem a funo de misturar linguagens. O teatro, a pera, o circo fazem isso desde sempre. O principal elemento que diferencia o Brasil a mistura de hip hop com a harpa regional, por exemplo. Como naquele espetculo que fizemos, no qual, num primeiro momento, apresentava-se o grupo de harpa regional do Mato Grosso, depois os ndios Cariri, e assim por diante. S o Brasil tem essa possibilidade de miscigenao, sem ser cada um no seu gueto. Voc Brasil. Esse o nico pas em que todo mundo se mistura com a maior facilidade. Ento, vamos aproveitar isso como o uso das tecnologias no teatro, sem
Beatriz Rosenberg A TV digital vai abrir inmeros canais novos e de interatividade. No sei como a TV Cultura est se preparando para isso. O que posso dizer que, da mesma forma que a televiso tecnologia, a televiso digital tambm tecnologia. O consumidor pode escolher o uso que vai dar a ela. No mbito da televiso digital, interativa, vai ser para vender. O telespectador est vendo uma cena e compra na hora o vestido que a atriz est usando. Acho que temos de nos preparar para isso, temos de formar audincia. A TV Cultura, a partir de janeiro, no vai mais exibir propaganda no horrio infantil. Houve um momento em que, nesse horrio, entrava no ar o planto de jornalismo e apareciam notcias de inundao na ndia, casa caindo, etc. Discuti isso com a Cultura. Falei: Se vocs precisam pr telejornal, ento no coloquem a imagem, porque a imagem chocante. A TV Cultura est abrindo novos canais, porque a televiso digital permite que se divida o sinal de transmisso em at cinco canais. A TV Cultura j est sendo segmentada: h a TV R Tim Bum e a Univest, que o canal de educao. No estou aqui como representante da TV Cultura. Se fosse, no teria posto os anncios na programao. Os anncios so melhores do que os desenhos animados em termos de tecnologia, de msica, de animao. algo incrvel, eu vejo e falo: Que horror! Os brinquedos de menina so para pintar a unha, para cozinhar, para fazer cabelo. E os brinque-
dos de meninos so pirata, torre medieval. duro ser menina! A propaganda incentiva as meninas a serem umas boboquinhas. A indstria de brinquedos reduz a menina a um universo muito restrito. Karen Acioly Temos de ter noo de outra realidade: as crianas esto sozinhas em casa, muitas vezes com a bab. Ento, muito mais prudente ter bom contedo, porque as crianas vo assistir televiso, de um modo ou de outro. Essa estimativa de quatro horas dirias na frente da televiso at otimista, porque j ouvi estatsticas ainda piores. Quero tambm dizer que fiz uma pera para bebs que teve grande sucesso de pblico e de escuta musical. Acho que os bebs tm mais sentidos do que ns. Renata Meirelles Dias de Carvalho, pesquisadora Quero mencionar o programa Catavento, da TV Cultura. Era um programa que incentivava a criana a levantar, a cantar, a falar, e teve um sucesso muito grande. Foi na poca do incndio da TV Cultura e, mesmo assim, ganhou o NHK, que o Oscar do programa educativo. Acho que contedo que faz a criana pensar, levantar, interagir possvel de ser feito. Ns realizamos o programa numa poca em que a TV no tinha verba nenhuma. Penso que, juntados aqui todos esses talentos, pode-se chegar a uma concluso e isso se tornar pblico, para que possamos fazer com que esse rumo mude, porque no
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plenamente vivel termos contedos de televiso que faam as crianas pensarem, levantarem e interagirem"
perder a inocncia, sem perder o parque. Quanto mais se oferecer para as crianas, mais elas vo desenvolver o senso crtico e voltar para brincar onde quiserem, com o corpo delas, na areia, etc. Tenho uma filha que brinca o dia inteiro, mal v televiso e ela tem acesso s coisas. Ela nunca ser proibida de ver um filme que eu considere bom para ela. Tem um olhar crtico a, tambm. Mas ela prefere brincar. Ns jamais vamos tirar o brincar da criana e nem o teatro do artesanal. Regina Machado, da Escola de Comunicaes e Artes da USP A Pel falou sobre a importncia da conscincia do que ser criana, como ela se forma dentro de ns e em que situao possvel form-la. Eu vi uma notcia, uma descrio, sem nenhum tom crtico, a respeito de uma menina de cinco anos que acabou de ganhar o concurso de Miss Mundo. A entrevista era com a me dela. E a reprter perguntou o que havia mudado na vida da menina depois de ela ter sido escolhida miss. A me respondeu: Pintaram alguns convites para comerciais de TV; agora, se tiver convite para uma ponta numa novela da TV, vai ser muito bacana. A reprter perguntou: E na escola? uma criana normal, s que muito badalada por todas as outras crianas. Nova questo: E ela vaidosa? A me respondeu: Muito, quando a gente sai de carro, ela no sai sem pentear o cabelo, retocar o blush. Na bolsa dela tem o pente, o celular pink, o gloss... A me contava isso com uma naturalidade absoluta. E a reprter tambm. Tudo foi publicado como uma notcia absolutamente normal. Eu fiquei com esse fato na mente. Ela s um dos exemplos que fazem parte dos horrores que ns estamos trazendo aqui, das belezas que estamos trazendo aqui. Essa me to vtima quanto essa criana. No adianta, ento, trabalharmos somente com as crianas.
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Painel 3
(espaos/meios)
Painel 3 - Comunicao
Comunicao (espaos/meios)
Moderador
Milton Pereira, da Fundao Orsa
Participao
Marcelo Bressanin, do Sesc/SP; e Marcelo Senna Salerno, da Multirio Milton Pereira A Fundao Orsa tem como instituidor e mantenedor o Grupo Orsa, que destina 1% de seu faturamento bruto anual para diversas aes sociais em mbito nacional. O grupo formado pelas empresas Orsa Celulose, Jari Celulose e Orsa Florestal. Quando recebemos o convite do Ministrio da Cultura, do Sesc/SP e da Rede Cultura Infncia para estabelecermos uma parceria, com vistas realizao desta oficina, no hesitamos em aceit-lo. Entre suas linhas de atuao, a Fundao Orsa possui experincia na rea da primeira infncia, tendo uma parceria com a cidade de Caraguatatuba (SP), por meio do Programa de Formao dos Profissionais de Educao Infantil. Com a sua finalizao e a necessidade de um acompanhamento tcnico pedaggico das unidades de educao infantil, originou-se o Programa de Gesto Pedaggica para Infncia (Progepi), que visa promover o desenvolvimento integral de crianas de zero a seis anos em seus aspectos fsicos, cognitivos, psicolgicos e sociais, entre outros. Marcelo Bressanin Vou discutir o tema relacionado ao Programa Internet Livre, que hoje conta com 22 salas instaladas no Sesc/SP O . programa voltado para a produo de contedos em linguagens e mdias digitais. Foi criado h cinco anos, ligado ideia de incluso digital. Mas essa proposta, hoje, j questionada, pelo menos no mbito da ao do Sesc. Falarei de infncia e de jogos eletrnicos. De incio, gostaria de dizer para vocs que esta uma fala muito localizada, sobre uma experincia especfica do Sesc/SP, com repercusso razovel dentro da instituio. Mas que parte de um problema que ns tnhamos por volta do final de 2005, quando comecei a atuar nesse programa na unidade Sesc Pompia, onde h uma das mais antigas salas de internet livre. Naquela sala, constatamos algumas questes relativas ao acesso de jovens, adolescentes e crianas infraestrutura instalada, com vrios computadores, teles, plasmas, todos conectados internet. Percebemos que era invivel aplicar qualquer iniciativa como workshops,
cursos e atividades de formao naquele espao, porque havia um boicote generalizado. Podia-se propor, por exemplo, como programao cultural algo que se considerasse interessante para esse pblico juvenil ou infanto-juvenil: a adeso era praticamente nula. Havia uma recusa total do usurio, mesmo por parte de crianas muito novas, por causa da grande disponibilidade de jogos eletrnicos na internet. Elas acessavam o site, faziam cadastro, criavam um e-mail e podiam passar o dia inteiro naquele espao, jogando em rede com colegas e amigos. Havia grupos de dez, 12 adolescentes , ou dez, 20 crianas, que jogavam com os irmos. Alguns nem tinham altura sufi-
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Os jogos eletrnicos so associados preconceituosamente a baixo rendimento escolar, isolamento social e vcio"
ciente para alcanar os bancos da sala, mas se sentavam ali e passavam o dia todo, depois do horrio da escola. Ficavam at a hora em que a sala encerrava as atividades, recusando-se terminantemente a participar de qualquer outra atividade. bvio que, quando no havia pblico algum inscrito nas atividades, elas eram canceladas e as mquinas ficavam disponveis para outros usos. Pensando nisso, ns nos colocamos algumas questes sobre como usar aquele equipamento de forma a contemplar os interesses do pblico, atraindo-o para os tipos de questes que gostaramos de tratar dentro de um programa institucional do Sesc, que tem a postura de trabalhar continuamente com o que chamamos de educao informal e continuada por meio de linguagens da cultura. Em todas as reas de atuao do Sesc, h a tnica da educao continuada. Ns nos perguntvamos como trazer essa tnica para um espao da internet j tradicional, com uso bastante assimilado pelos usurios da unidade Pompia, sobretudo em relao a jogos eletrnicos. Esses jogos, no senso comum, so um tipo de manifestao cultural associado a ideias preconceituosas como baixo rendimento escolar, isolamento social, vcio, leso. toda uma carga de questes negativas, que interpreto como resultado do quase total desconhecimento do pblico em relao a esse tipo de linguagem sobretudo do pblico educador e dos pais. H uma enorme ignorncia sobre o que so os videogames, sobre o que so essas linguagens, sobre o tipo de uso que pode ser feito e sobre o tipo de recursos que oferecem. E, por conta disso, existe um discurso muito pejorativo. Com
rarssimas excees, os jogos eletrnicos esto sendo discutidos academicamente, de forma mais sria. A questo era como trazer aquele espao e os desejos daquele pblico, que j estava bastante solidificado, para uma ao sociocultural mais pertinente ao que o Sesc se prope a realizar e realiza h tempo com outras linguagens. Pensando nesse contexto, defrontamo-nos com a subutilizao de um equipamento sofisticado e importante. Pensamos, ento, numa maneira de aproximar esse equipamento de um uso mais satisfatrio: o projeto batizado de Game e Cultura. Trata-se de um festival de jogos eletrnicos, que teve sua primeira edio realizada em 2005, no Sesc Pompia. Foi criado com o intuito de discutir com o pblico infanto-juvenil o universo dos jogos eletrnicos. Discutir literalmente, em mo dupla. Oferecemos ao pblico diferentes leituras do universo dos jogos eletrnicos e tambm ouvimos o que ele pensava a respeito disso. Era uma tentativa de identificar seus interesses. A primeira montagem do Game e Cultura funcionou de 8 a 30 de janeiro de 2008 como uma mostra interativa. A curadoria foi feita por um pesquisador da rea de games do Senac, Al Machado, autor do Game Brasilis, uma compilao de toda a produo de jogos criados no Brasil. O evento foi itinerante: da unidade Pompia, viajou para o Sesc Santo Andr e depois para a unidade Ribeiro Preto. Foi um grande sucesso de pblico e de crtica, porque mostrou algumas possibilidades de uso e trabalho com games que eram pouco exploradas dentro da nossa instituio. Ns tnhamos uma mostra que reunia os dez principais jogos
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eletrnicos feitos no Brasil. Havia muitos outros, mas a mostra limitouse a dez diferentes tipos de jogos: desde o primeiro criado no Brasil, o jogo Amaznia, de 1983, no qual os usurios tinham de escrever o tempo inteiro para jogar (a interatividade era simples, com todos os comandos feitos por meio de textos escritos), at jogos desenvolvidos muito mais tarde, baseados em programas de televiso. Na montagem feita no galpo do Sesc Pompia, havia nichos circulares com computador e um desses dez jogos instalados. Ao redor desses nichos, displays em backlight exibiam informaes histricas sobre os jogos: seus criadores, a tecnologia utilizada e tambm qual a repercusso na imprensa poca de seu lanamento. Existiam tambm reas de convivncia. As pessoas podiam entrar nesse espao e jogar nesses nichos cada um dos dez jogos. Ns trouxemos todos os criadores desses jogos, como o Renato Giovanni, criador do Amaznia. O pblico pde conversar com eles, saber quais eram seus interesses e quais eram as tecnologias envolvidas na criao. As perguntas eram as mais engraadas possveis, de um pblico de crianas de seis a 12 anos. E havia tambm perguntas, s vezes, bem sofisticadas.
verso inicial do projeto. Selecionamos cinco equipes por meio de um jri para participar de uma competio. Durante 24 horas os estudantes foram instalados num galpo do Sesc Pompia, das 18 horas de uma sextafeira s 18 horas do sbado. Eles ficaram isolados, sem celular, telefone, relgio ou calculadora. Receberam assistncia mdica e alimentao. Foi um Big Brother. s 18 horas de sexta-feira, projetamos o tema sobre o qual eles deveriam trabalhar e o desafio era entregar uma fase de um jogo fun-
Chamamos tambm um artista multimdia e a Gamion, empresa de produo de games. Pedimos a eles que criassem um antijogo, batizado pelas crianas como O Jogo Chato. O artista e a dupla de tcnicos da Gamion ficaram instalados dentro do espao da exposio: durante todo o tempo da mostra, trabalharam numa espcie de gaiola. As crianas podiam observar e dar palpites durante a criao. A ideia era fazer um jogo politicamente correto. Se numa determinada cena o personagem tivesse de pilotar uma lambreta pela cidade de So Paulo, que era o cenrio do jogo, haveria ali uma placa indicando o limite de 60 quilmetros por hora. Se o jogador ultrapassasse essa velocidade, automaticamente o jogo era interrompido e o jogador, direcionado para o site do Detran. Se o personagem estivesse num barco e, diante de um derramamento de combustvel, no tomasse logo uma providncia, o jogo era interrompido e o jogador, encaminhado para o site de uma ONG de proteo ambiental. O jogo era impossvel de ser jogado. No filo mercadolgico, os jogos so politicamente incorretos, e o pblico no levado a discutir essas questes. Ao contrrio, neles, as regras so sabotadas o tempo todo. Quando se cria um jogo politicamente correto, ele fica chato. E discutir a chatice do jogo com as crianas era curioso, porque elas ficavam irritadas por no conseguir jogar. Uma etapa do projeto foi o enduro. Abrimos inscries pelo site do Sesc para equipes de estudantes que quisessem propor projetos de jogos, para uma faixa etria um pouco maior. Eles tinham de ser minimamente habilitados em termos de criao tcnica, tinham de saber programao de computadores. Tivemos 13 grupos inscritos. Cada um mandou um projeto de jogo e uma
cionando no perodo de 24 horas. O jri escolheria a melhor das cinco. O tema foi a malandragem brasileira. Passamos a eles uma srie de informaes, msicas do Chico Buarque, do Noel Rosa e alguns poemas. O jogo que ganhou se chamava Malandro Gato que j Nasce com Bigode. A funo era fazer o gato escalar um prdio. L no alto havia uma gatinha que ficava pedindo presentes. Sempre que o gato ia l embaixo pegar o que a gatinha queria, tinha um tempo determinado para voltar. No meio do caminho, porm, havia obstculos e a gata mudava de ideia: num primeiro momento, ela queria peixe; mais tarde, uma garrafa de leite. A cada mudana, o gato precisava descer e subir de novo at conseguir entregar os presentes. Nesse perodo, tambm foram oferecidos 12 tipos de oficinas para o pblico, com ou sem computadores desde oficina de desenho de personagens ou criao de roteiros at programao tcnica de jogos. Naquele mesmo espao das oficinas, um pblico de seis a 60 anos pde sentar. Ns montamos uma programao de modo que quem participou de todas as oficinas pde conhecer toda a criao de um jogo, desde o primeiro momento. Ou seja, qual seria a histria do jogo inteiro, do roteiro at a programao de todas as questes tcnicas: a imagem, o som, a jogabilidade. Era possvel conhecer superficialmente toda a sequncia da criao de um jogo eletrnico. Por fim, fizemos um simpsio para discutir questes ligadas aos jogos eletrnicos. Algum tempo depois, em 2006, realizamos a 2 edio do simpsio, que se chamou Game e Cultura Passando de Fase. Ns,
literalmente, passamos para um segundo nvel de discusso, chamamos novamente cengrafos para desenvolver um projeto a Duda e o Z de Oliveira , agora com a ideia de discutir os jogos em rede. Alguns deles chegam a ter 600 mil pessoas jogando a mesma partida ao redor do mundo. Esses jogos, os massive multiplayers, foram o tema desse segundo evento. Fizemos tambm um histrico sobre o tema, apresentando as primeiras mquinas de jogos eletrnicos em grupo: os Arcades, os primeiros videojogos que existiram nos Fliperamas. Naquelas mquinas, j havia a possibilidade de dois, quatro e at seis pessoas dividirem a mesma partida. A ideia da exposio era reproduzir o ambiente dos sites na internet onde esses games so jogados. So ambientes modulares, muitas vezes inspirados em castelos, em espaos fantsticos. Nossa cenografia foi um castelo totalmente fantstico. Foram usados blocos slidos, parecidos com os usados para modelar um game quando o programador trabalha no computador. A exposio teve a ideia de trabalhar com esses blocos slidos e com texturas, que so basicamente os elementos tcnicos usados para criar ambientes virtuais. Um elemento muito interessante no portal da exposio era uma porta de castelo medieval. Havia uma cmera conectada a toda essa estrutura de videowall interna: quando se entrava na exposio, a imagem era capturada e todos que estavam l dentro sabiam quem estava entrando naquele espao fsico. Telas projetavam a imagem de quem estava entrando no espao. Era como se a pessoa estivesse entrando em um site e se conectando ao espao virtual, porm de forma fsica. Ns optamos por mostrar apenas jogos que no estavam no mercado, que no eram jogos de Nintendo e de outras marcas
comerciais. As oficinas foram realizadas com foco em crianas, pais, educadores e pblico de terceira idade. Tambm fizemos uma srie de encontros com tericos, pesquisadores e bate-papos com professores universitrios, curadores de games, sempre com a participao direta do pblico. Promovemos tambm shows de bandas que fazem msicas para games ou que usam videogames como instrumentos musicais. E tambm performances. Criou-se, por exemplo, uma parafernlia com videogames para fazer msica eletrnica. Depois da oficina, houve um workshop para jovens e adolescentes explicando como se fazia para tocar e criar msica com os videogames. Organizamos, ainda, um simpsio para discutir a permanncia prolongada na internet de pessoas participando de games. Nesses espaos virtuais, o jogador cria um bonequinho para o representar o avatar e associa caractersticas fsicas, sociais e psicolgicas a esse personagem. Chamamos tambm uma srie de pessoas para discutir com Lina Cardoso, com Helena Mariane e com Lcia Santaella, especialistas da rea de semitica, como se d a representao do indivduo dentro do espao virtual, do jogo eletrnico em rede. Como comum no Sesc, a frequncia das exposies abrange desde o adulto com a famlia at o pblico de terceira idade: os avs e as avs, acompanhados de seus netos. Gostaria de encerrar minha fala levantando algumas questes. A primeira a seguinte: quando se mostra para o pblico infantil, infanto-juvenil ou adulto jovem as possibilidades embutidas no processo de construo de um jogo, como um videogame, h um retorno enorme, porque as pessoas se percebem capazes, com pouqussimo tempo de dedicao exclusiva. Com uma oficina de dez
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Marcelo Salerno A Multirio, ou Empresa Municipal de Multimeios da Cidade do Rio de Janeiro, integrante da Secretaria Municipal de Educao do Rio de Janeiro. Estamos diretamente relacionados educao pblica no municpio e temos produo em mdias diferentes, como impressos, material audiovisual (que inclui o cinema, a televiso e boa parte da internet), suporte digital e, por fim, a internet vista como mdia. No aquela internet tradicional, que hoje j passado e que ocupava um papel de divulgao institucional das empresas, inclusive as da rea de mdia. Ns encaramos a internet como uma mdia real.
virtuais nos quais se trabalha de forma muito prxima imagem captada pela fotografia ou pelo vdeo. Alguns filmes tm uma temtica interessante. Por exemplo, a srie Juro que Vi trabalha o resgate do folclore. Fizemos quatro filmes: Curupira, O Boto, Matita Per, Iara e agora estamos fazendo O Saci. Existem verses diferentes dos mitos, at porque o Brasil um pas gigantesco. Fizemos uma pesquisa profunda, com uma equipe multidisciplinar que ajudou a desenvolver uma metodologia numa escola, com um grupo heterogneo de crianas, de diferentes classes sociais e gneros. Levamos as pesquisas e os nossos achados sobre cada lenda, formamos grupos, as crianas contaram umas para as outras e nos ajudaram a encontrar solues para a narrativa, a imagem, a arte do filme. E o que isso tem a ver com internet? Bem, talvez as comunidades sejam o que mais atrai os jovens para o uso da web. O Brasil, hoje, ocupa o segundo lugar no ranking mundial dos maiores tempos de navegao na web e boa parte do tempo que se ocupa ainda est relacionada ao lazer, ao entretenimento. A perspectiva de crescimento grande. O Brasil est crescendo, e muito, na ocupao do tempo na internet. Tem a ver com entretenimento, mas no s. Tambm o uso de servios tem seu peso, e a possvel verificar certas tendncias. Servios como consulta pblica, pagamento de taxas e bancos tm sido mais utilizados nas classes A e B. E as outras classes sociais tambm tm um crescimento muito rpido na utilizao da internet. Principalmente na parte de comunidade, de discusso, de namoro, MSN. O computador est sendo desmistificado. Hoje, a informtica
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horas, uma criana de oito ou nove anos de idade percebe que capaz de produzir a trilha sonora de um videogame; que capaz de criar um bonequinho animado no computador exatamente igual ao que ela est acostumada a manusear quando joga o videogame; que capaz de entender como funcionam todas as opes de escolha. Percebe o que a escolha de um ou outro caminho pelo personagem representa dentro de uma narrativa escrita: o roteiro que foi escrito para aquele jogo existir. A criana comea a entender que, antes de ser um jogo, o game foi um roteiro escrito com determinadas possibilidades de escolha. E a criana percebe que capaz de fazer isso tambm, que capaz de escrever um roteiro e transform-lo numa narrativa audiovisual dentro do computador. Por outro lado, comeam-se a perceber mudanas nas mes e nos pais que tradicionalmente diziam para os filhos: Sai da frente desse computador e vai jogar bola. Tenho um vdeo com uma entrevista na qual um pai diz que, pela primeira vez, ele estava tomando a bola do filho para mand-lo assistir oficina de videogame. Ou o depoimento de uma senhora, dizendo que pela primeira vez sentou-se ao computador com os netos e no quis sair antes deles. H pais que tinham certa resistncia a essa linguagem e que, agora, perguntam para a equipe do Sesc: Onde meu filho pode estudar mais sobre isso?, Existem universidades que oferecem cursos para o meu filho se tornar designer de games?, uma carreira to interessante quanto qualquer outra rea do conhecimento?. Houve inmeras perguntas, muitas delas mandadas para
o site do Sesc: Meu filho teve aula com o professor do Game e Cultura e quer saber como continuar tendo aulas. Ou: Eu queria saber se meu filho tem como fazer um curso de programao de msica para videogame no Sesc. As pessoas comeam a levantar a possibilidade da aprendizagem formal a partir de um suporte que, antes, era visto s como um brinquedo e, muitas vezes, como brinquedo olhado como vcio ou causa de afastamento social. Por outro lado, tambm observamos que a imprensa comeou a ouvir os pesquisadores, passando a colocar suas questes de modo muito menos preconceituoso. Os jornalistas deixaram de perguntar, como sempre: Qual dano um game pode causar a crianas e adolescentes?. Quando entrevistavam especialistas, os reprteres perguntavam: Quais os ganhos possveis para uma criana ou adolescente que passa horas nos videogames? O que isso traz ao desenvolvimento da habilidade motora? O que isso pode trazer como ganho na percepo visual, no reconhecimento de formas, na agilidade de percepo dessas crianas?. As matrias publicadas a partir dessas entrevistas ganharam um tom diferente daquele ao qual estvamos acostumados, at mesmo na prpria instituio. Quando propusemos pela primeira vez realizar uma exposio sobre jogos eletrnicos, ouvimos insistentemente: Por que o Sesc vai fazer uma exposio sobre jogos eletrnicos?. Trs anos depois, no temos mais de enfrentar essa pergunta dentro da instituio. Ns vamos fazer exposies sobre os jogos eletrnicos. E no vamos realiz-las s no Sesc Pompia, mas vamos fazer com que elas circulem pelo Sesc Ribeiro Preto, pelo Sesc Campinas, pelo Sesc Itaquera, Sesc Interlagos e por todos os outros nos quais possamos colocar a discusso em pauta. Porque ficou claro que, se assumirmos esse preconceito, ns nunca iremos investigar o problema. E, se no investigarmos, nunca haver condies tericas e tcnicas para discutir o problema e para entender o que est acontecendo com o pblico que vai utilizar esse videogame. iluso se pensar que ns, instituio cultural, pais, escola ou qualquer outro tipo de educador, e nossas recomendaes formais vamos impedir o uso do videogame. O pblico continuar usando, e ns seremos excludos dessa discusso por no entendermos o que e como est sendo utilizado ou como poderia ser utilizado.
Somos parte integrante da rede de ensino do Rio de Janeiro uma rede gigantesca, com mais de 1.600 escolas , e o Rio de Janeiro uma cidade plural, a comear pela questo do ambiente: h floresta, montanha, mar, mangue, centro urbano, concreto. As escolas tambm apresentam esse tipo de diversidade. Dentro de uma escola pblica, encontram-se pessoas profundamente carentes, vtimas de violncia, e tambm jovens de classe mdia, classe mdia alta, dependendo de sua localizao. A Multirio tem um pensamento integrado, para que as sadas sejam adequadas ao seu suporte. Trabalhamos de forma muito integrada. o que chamamos de convergncia de mdias. Sempre que possvel, buscamos fazer que o aproveitamento pelos alunos, professores e pblico em geral, de uma forma ou de outra, se d por mais de uma mdia. H sempre a preocupao de seguirmos temticas como o respeito cultura, ao folclore, o resgate das tradies. Mas nada que seja retrgrado ou afirmativo. Estamos sempre discutindo novas formas, ouvindo novas teorias, sempre com o apoio da vida acadmica e de profissionais de mdia de boa qualidade, de preferncia os melhores do mercado. Entre eles, esto alguns contratados por ns (temos um grupo de funcionrios concursados de primeira linha) e aqueles que so nossos convidados. Sempre que possvel, tentamos dar visibilidade para aquilo que nos caro mesmo que no seja uma atividade especfica da Multirio, buscamos nos apropriar do contedo por meio das conversas com esses profissionais. Esse o pensamento interno. Desenvolvemos uma srie de produtos que utilizam a experincia de professores e alunos. Temos um respeito profundo pelo professor, pelas necessidades do professor na escola, pela escola propriamente dita. E, sempre que possvel, apoiamos a utilizao das mdias em sala de aula e ajudamos a us-las. Entendemos que no possvel ficar retrocedendo, demonizando certas atividades. Toda nova mdia recebe rtulos. Ns bem sabemos os malefcios da televiso, mas tambm sabemos que o suporte bem utilizado algo maravilhoso para fomentar a cultura, a educao. Isso vale tambm para o livro. No podemos confundir o suporte com a utilizao que ele vem recebendo. Entendemos que a internet algo importantssimo. O suporte digital o principal a ser discutido. Com o suporte digital, ns temos a apropriao por crianas e adultos de diversas linguagens que eram mais distantes. Um aspecto muito interessante a apropriao desses recursos recursos de narrativa, recursos como a imagem, a palavra, como a publicao dessas produes. Esse o mote principal do que a internet representa para ns, que temos preocupao em relao educao. Nesse contexto est inserido tambm o videogame. No h dvida de que o videogame pode ser considerado uma mdia de ``concorrente da prpria televiso e de outras mdias, tanto no sentido comercial como no sentido de que a representao das imagens tende a convencer o jogador de estar vivendo em ambientes
O computador deve ser desmistificado e ser entendido como mais um recurso nossa disposio"
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est to facilitada que chega a assustar quem ainda no rompeu com seus preconceitos e medos. Isso acontece: quem nunca viu uma senhora amedrontada diante de um terminal bancrio? A pessoa fica bloqueada, e simplesmente no l o que est na tela. No caso especfico da internet, temos conseguido conquistar uma tranquilidade, um pouco tardia, na utilizao. Esse tipo de popularizao deve-se ao fato de o computador ter perdido o status de boneca de 15 anos aquela boneca que o suburbano d para a filha de 15 anos e que, plastificada, posta atrs do sof, onde ningum pode toc-la. O computador, durante muito tempo, foi assim. Ficava quase num oratrio, num nicho especial dentro da casa. Hoje, no. Todo mundo, em especial os jovens, est usando o computador, e vemos o equipamento sendo vendido nas Casas Bahia. O preo tem cado, e muito. E h tambm outro detalhe de que muitos se esquecem: computador no s aquela mquina com monitor; o computador est no microondas, no qual voc programa o tempo de cozimento; est no automvel... Tudo tem um computador. O ponto : o computador deve ser desmistificado, deve ser entendido como mais um recurso. E a utilizao que se d a ele a questo a ser levantada. Vamos voltar internet. Uma questo importante na parte da divulgao de contedos da internet a utilizao das lan houses. Quando falo que as estatsticas indicam crescimento das classes C, D e E na utilizao dos computadores, no me refiro apenas ao acesso s mquinas (s vezes bastante ultrapassadas), mas tambm ao uso das lan houses. So espaos que, aqui em So Paulo, so encontrados em qualquer esquina, onde, inicialmente, eram vendidos servios de informtica: e-mail, videogame etc. A questo do contedo dos videogames nas lan houses, onde no h uma mediao por parte do pai ou professor, pode ser complicada. Como ter certeza do contedo que est sendo acessado? O problema est na internet ou na falta de mediao em casa? fato que existe contedo muito perigoso na rede. E talvez o maior perigo esteja na convivncia virtual que, ao mesmo tempo, algo muito interessante. Todos ns, de uma forma ou de outra, principalmente ao brincar, promovemos uma suspenso da realidade. E, como j foi claramente apresentado, a brincadeira, para a
criana, um momento de experimentao. Tanto nos jogos quanto no brincar, o momento em que se cria e se aprende a seguir hierarquia e regras. Existe uma questo de respeito e colocao em outro papel. A criana brinca de ser o pai, de ser bombeiro. Ela no quer fazer errado; deseja fazer o certo. Por isso a brincadeira tem de ser respeitada. Uma tendncia natural do ser humano se agregar, compor grupos, buscar uma colocao social. Isso se torna extremamente interessante quando se tem a opo de escolher a prpria aparncia. Quando o ser humano tem a opo de escolher o que , ele cria um novo personagem. De um lado, uma liberdade maravilhosa. Todos ns j quisemos, em determinados momentos, ter outra aparncia ou ser outra coisa. Ao mesmo tempo, porm, essa liberdade do mundo digital permite que o interlocutor no seja quem se espera que ele seja. Da a importncia de haver um responsvel monitorando o uso da internet pelo jovem, para saber o que ele est fazendo e com quem est se relacionando. Quando uma criana se expe no Orkut, por exemplo, pode ser roubada. Mas, se bem usado, o Orkut no d margem para que isso ocorra. Na questo do letramento para as mdias, temos de preparar o jovem, seus pais e professores para a utilizao desses recursos, para entenderem que a internet uma realidade. Em boa medida, existem momentos de pico, motivados pelo af de empresas ou pela moda, mas indiscutvel que este um caminho que no tem mais volta. O computador est, e para sempre estar, presente na nossa vida, em especial na educao, como um facilitador assim como tambm um facilitador para quem produz desenho animado, ou para quem tem uma cozinha automatizada. Entendendo que isto um fato, ns tentamos pesquisar, ouvir os especialistas a fim de que, no trato com os alunos e professores da rede municipal, possamos adotar uma postura equilibrada, com firmeza naquilo que necessrio e orientando sempre que possvel. A pgina www.multirio.rj.gov.br/riomidia um centro de referncia. Um espao no qual os materiais so discutidos e apresentados questes como a classificao indicativa e outras relacionadas ao respeito infncia e aos jovens, alm de teses
acadmicas. Em nosso entendimento, no possvel se determinar tudo s pessoas. Nosso objetivo discutir, trazendo para o debate profissionais que entendem desses assuntos. Nosso portal tem um vis inicial que atender ao professor. Posso destacar uma rea chamada Ns da Escola, que na televiso tem a meta de apresentar e divulgar aes exitosas existentes na rede. No propaganda. uma alternativa ao noticirio que mostra a fila para conseguir vaga na escola porque aquilo d notcia. No porque o noticirio esteja interessado nisso at porque h escolas sem filas, mas ningum mostra. O portal Ns da Escola, que tem uma rea diretamente relacionada com contedos para professores, disponibiliza vrios materiais. Um programa muito interessante com o qual comeamos a trabalhar chama-se Sculo XXI. um contedo no qual existe uma estrutura de apresentao, que chamamos de chave, onde os assuntos so divididos. Esse contedo prev, em especial, o estmulo ao uso de qualquer mdia na escola, entendendo que, quando se fala de tecnologia, a escrita uma tecnologia, o vdeo uma tecnologia... Recursos que usamos so tecnologias que surgiram, s quais a sociedade se adequou e aprendeu a utilizar. Na nossa produo temos aplicativos que tentam ser atrativos, utilizando-se inclusive da linguagem dos videogames, cuja influncia se verifica at na questo esttica. possvel perceber, nas outras mdias, elementos que tm referncia no videogame. Por exemplo, um aplicativo que uma orquestra, no qual um contedo criado com assessoria de um maestro da Orquestra Sinfnica Brasileira ensina s crianas qual a famlia de cada instrumento e qual sua sonoridade. Tambm h aplicativos que explicam questes
ambientais, como o aquecimento global e o fenmeno da inverso trmica. E, sempre que possvel, os contedos so relacionados a momentos que estamos vivendo. Por exemplo, nas eleies presidenciais, fizemos uma galeria de presidentes, com a histria de cada um, etc. Todos esses contedos vm acompanhados de matrias que sugerem ao professor aprofundamento, utilizao, atividades, sugestes de materiais para usar na sala. A ideia propor, indicar caminhos e confiar aos professores, principalmente queles que j tm uma relao com a mdia, a utilizao dos materiais. Por fim, tambm temos um trabalho junto s escolas, de organizao de oficinas. Promovemos desde cursos de internet para iniciantes at oficinas de animao. Comeamos com os brinquedos pticos, mostrando quo divertida aquela prtica, e a o menino sai falando: Olha o filme que vou fazer. Esse o ponto. Acho que, seja pela via digital, seja pela impressa, temos de inventar. Temos de assumir que h riscos, que existe muito contedo ruim, mas tambm admitir ser inevitvel e necessrio que a escola esteja preparada para se apropriar desse material. Para encerrar: o preconceito existe e precisamos estar preparados para lutar contra ele. Mas muito perigosa, hoje, a utilizao que os jovens tm dado a certos recursos, no mbito das comunidades, como a cmera digital. comum que as menininhas, muito lindas em sua juventude, se fotografem ou se deixem fotografar. S que esto tambm num momento de iniciao sexual e ficam tentando copiar certos dolos e suas danas. Quando essa criana no for mais criana e buscar um emprego, um concurso pblico, o nome dela poder estar associado a uma foto considerada pornogrfica. H tambm o caso de declaraes no Orkut como Eu odeio Paraba. H jovens que se identificam com esse tipo de conceito Eu odeio negro, Abaixo os gays e criam essas comunidades. Tudo o que postado na internet fica l para sempre. No estou dizendo que temos de combater apenas o uso. Temos de combater os conceitos que levam a esse tipo de utilizao.
Debate
Milton Pereira Tanto na fala de Marcelo Salerno quanto na de Bressanin tivemos uma questo fundamental, que a democratizao das ferramentas tecnolgicas. um ponto comum entre as duas apresentaes o quanto isso tem um papel fundamental na questo da educao. Nesse aspecto, a adaptao dos espaos torna esse aprendizado muito mais ldico. Sobretudo na faixa etria de que estamos falando, algo que torna agradvel o aprendizado.
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Hermes Bernardi Jr. Esse momento deveria ser o de olharmos para trs e planejarmos novamente o futuro, mesmo com essas tecnologias. Preocupa-me o fato de a criana no ter educao e ser jogada nesse universo da tecnologia. O Salerno falou: A criana, ali, pode ser o que ela ; enquanto todos ns podemos querer ser outra coisa. Eu quero ser eu, quero ser aceito nessa sociedade como eu sou, com os meus valores. No quero ir para o computador e ser outro personagem. Maria Amlia Pereira Eu acho que a tecnologia um instrumento importante, no pode ser negado. Mas tem de ser considerada uma questo: quando se coloca que existe um preconceito, acho que tem que se ouvir. E o preconceito foi muito colocado em relao a educadores e pais, que so os elementos que esto recebendo o resultado daquilo que vem acontecendo de 20 anos para c. Ns estamos recebendo nas salas de aula e dentro da famlia o resultado de se ter uma criana durante quatro horas dirias diante de uma televiso. Recebe-se na escola um corpo agitado, perturbado. Precisamos observar o ndice de crianas que esto tomando tranquilizantes, as taxas de hiperatividade e de dficit de ateno. Devemos discutir isso paralelamente acelerao do processo de uso da televiso, do computador e da internet. Em segundo lugar, pergunto: medida que o espao pblico foi oprimido e que no existe mais a rua, a criana de sete ou oito anos de idade no transita justamente na hora em que deveria se apropriar da cidade, dos espaos da natureza, criando seus grupos de aventura e espaos de conversa? Esse espao no existe mais e est se transformando no espao da internet. Porque no existe mais a vida conversvel, j que nem sequer a escola permite esse espao de socializao e de comprometimento do grupo. Essa reflexo deve ser levada em conta juntamente com a informao de que a criana gosta do computador, de que a criana adora internet. E adora porque no tem alternativa. como se diz: se der uma banana ao macaco, ele s vai comer banana. No se pode considerar o grupo que est reagindo contra isso como simplesmente preconceituoso, mas preciso entender o seu conceito, uma vez que existe hoje reflexo entre os educadores em relao aceitao do fascnio com a tecnologia que serve muito mais ao adulto criador da tecnologia do que propriamente s crianas.
, Crianca tem de brincar, tem de pisar no cho, praticar arte, ouvir e produzir msica"
medida que difundimos mais possibilidades de mdia, abrimos espaos e acostumamos as crianas a ficar mais tempo diante das telas, estamos abrindo mais um espao de publicidade. Porque eles vo pensar assim: o que est sendo desenvolvido, como podemos entrar nisso? O marketing pensa isso 24 horas por dia. Amrico Crdula A internet tem um passado, j est na nossa vida. Como vocs pensam uma poltica pblica para a questo da internet voltada para a infncia? Marcelo Salerno Vou assumir como minha incapacidade de comunicar o mau entendimento que o Hermes teve em relao ao que eu disse. O que eu quis dizer que ns, num momento ou outro, vivemos o papel de outro, num baile de mscaras. Foi nesse sentido que mencionei a suspenso da realidade. O que eu disse que existe isso, um fato. O mundo virtual, o second life existe. Nossa produo dentro da Multirio totalmente associada escola, a partir dos parmetros da Secretaria de Educao, dentro do contexto necessrio ao professor e ao aluno. Por isso, eu insisti que o nosso ncleo de publicaes impressas to importante o livro, a revista, o material audiovisual em televiso e cinema. Tentamos trabalhar de forma integrada, dando ouvido aos professores, sem ditar regras, permitindo que o professor pesquise e se aprofunde. Quanto s brincadeiras, baseado em questes biolgicas e pedaggicas, a Multirio alinhada com o pensamento que acredita que criana tem que ser criana. Criana tem de brincar, tem de pisar no cho, praticar arte, ouvir e produzir msica. Vemos a criana como autor em todos os momentos. No defendemos o uso de computador em tenra idade. Marcelo Bressanin O Sesc no tem uma poltica pblica. uma empresa privada e, portanto, tem uma poltica para com seu pblico. O Sesc no tem verba pblica; tem verba de empresas privadas. A questo que defendo como profissional do Sesc oferecer acesso tecnologia de melhor qualidade possvel, com a ideia de desmistificar, de permitir ao pblico entender o que est por trs dela em todos os sentidos, seja um software, um hardware, uma programao de teatro, uma prtica de esportes, questes relativas alimentao. Enfim, qualquer tipo de tecnologia pensada. Eu acho que outras leituras so preconceituosas. Em relao tecnologia, temos de manter a postura de abrir caixas-pretas, de desvendar mecanismos de funcionamento em todos os nveis possveis, de oferecer ao pblico a possibilidade de conhecer esses mecanismos e, se desejar, de se apropriar deles da maneira como achar mais proveitosa, mais interessante. Claro, com a devida mediao, dentro do nosso espao. No temos como garantir mediao nenhuma fora do nosso espao. Essa a poltica que estamos defendendo. E tambm a poltica de democratizar o acesso a esses softwares, por isso usamos softwares livres. Para impedir que o pblico seja direcionado prtica da pirataria. Quando ouvimos que a escola recebe hoje um corpo agitado, uma criana hiperativa, ou crianas tomando tranquilizantes, e que isso resultado de uma poltica de 20 anos de acesso televiso, acha que h uma razo plena. o resultado de uma exposio indiscriminada mdia, sem qualquer tipo de mediao crtica. No h crtica e no h critrios. Ningum aqui escapou do que a Rede Globo realizou no Brasil durante um tempo, que foi a produo de um pblico absolutamente despreparado para ler a mdia. Se ns mantivermos a mesma postura em relao s mdias eletrnicas e informatizadas, vamos produzir uma nova gerao ainda mais hiperativa, ainda mais agitada, porque estamos mantendo uma posio acrtica em relao a esses meios, uma vez que nos recusamos a entender os procedimentos crticos que esto por trs deles. Eu continuo mantendo a minha fala integralmente no sentido de que o preconceito , sim, uma marca muito forte em relao s tecnologias. H um preconceito que no permite que se chegue sequer ao entendimento, para que se tenha a produo do conhecimento crtico necessrio e para que sejam conhecidos os critrios necessrios para mediar a informao que est sendo levada s crianas e aos adultos que, no futuro, vo criar novas geraes ainda mais histricas, hiperativas e agitadas.
Pessoa da plateia Busca-se mudar a lgica: ao invs de consumista, a criana passa a ser produtora. Como se isso fosse mudar a perspectiva. Faz sentido se mudar a lgica se o instrumento no contribui para a formao do ser humano mais sensvel, imaginativo, conectado no pensar, no sentir, na ao? Faz sentido se mudar essa lgica se esse instrumento no est contribuindo para o ser humano, que mais conectado com a natureza, mais conectado com a realidade? Outra coisa: essa questo sempre traz como justificativa o contedo. Ser que na nossa Histria o problema foi falta de inteligncia? Quero usar como exemplo a crtica de Adorno experincia de Auschwitz. Ele dizia que l no faltava inteligncia, havia muita cincia e capacidade para levar judeus morte. O que faltou? Faltou a capacidade de se afetar com a dor do outro. Ser que o que est faltando na formao das nossas crianas contedo? inteligncia? Ou uma inteligncia que conectada com uma emoo, com uma ao, e que, portanto, tem inteireza? Que tipo de pessoa queremos formar? Que tipo de sociedade? Para que toda essa parafernlia de mdia se nem conseguimos resolver o nosso espao social? Estamos criando uma quarta dimenso, vivemos na internet e os problemas prticos da vida que nos fazem humanos no conseguimos resolver. Pessoa da plateia Eu estive no Kid Power, que um encontro para desenvolver formas de comunicao publicitrias para a criana. Eles comearam um dos painis assim: Bem-vindo ao mundo da baixa renda, da cesta bsica, do videogame, da lan house. O que acontece que a publicidade no se preocupa muito com o problema social. Ela quer saber o que est acontecendo e como vai atuar l. Ela descobriu, inclusive, que a criana da classe C convence os pais se disser que aquilo que est pedindo vai influenciar na educao. A criana sabe que pode pedir um computador se o pai achar que para a educao.
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Outra questo muito importante a mudana de paradigma em relao utilizao desses recursos tecnolgicos. Como ter uma aceitao dessas ferramentas e a possibilidade de se utilizlas no s com as crianas, mas tambm com as pessoas ligadas sua formao? H essa troca de experincia entre formadores de opinio, que so as pessoas ligadas formao das crianas.
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Painel 4
do MinC
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Moderador
Amrico Crdula, gerente e atual secretrio da Identidade e da Diversidade Cultural do MinC
Participao
Ana Paula Santana, da Secretaria de Audiovisual do MinC; Antnia Rangel, gerente da Secretaria de Programas e Projetos Culturais do MinC; Silvana Meireles, secretria de Articulao Institucional e coordenadora executiva do Programa Mais Cultura MinC; e Gabriela Gambi, da Coordenao Geral do Livro e Leitura MinC
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Amrico Crdula A Secretaria da Identidade e da Diversidade Cultural nasceu em 2004 a partir de uma reforma do Ministrio da Cultura, tendo como base um processo de discusso que ocorre h 30 anos a Conveno da Unesco sobre a Proteo e Promoo da Diversidade das Expresses Culturais. Esse debate teve incio nos anos 1970, quando a Frana comeou a discutir a questo de cotas de tela dentro do cinema francs, dizendo: No queremos mais a hegemonia da indstria norte-americana, que hoje tem 95% das salas de exibio, sobre o cinema mundial. A partir da, na Frana, estabeleceu-se que 50% dos filmes em cartaz passariam a ser em lngua francesa. Isso gerou um debate que culminou com a Conveno da Unesco. A discusso permaneceu por muito tempo centrada na imposio cultural, porque, quando assistimos a uma produo norteamericana, no consumimos apenas a obra artstica, mas tambm todos os produtos contidos nela. E isso cria o efeito da globalizao dentro dessa indstria. Quando a questo foi para a Unesco, comeou-se a discutir sobre os contedos. J na gesto do ministro Gilberto Gil, o Brasil sugeriu uma mudana na conveno, que a princpio trataria apenas dos contedos culturais: ns sugerimos a ampliao para a diversidade das expresses culturais. A Secretaria da Identidade e da Diversidade Cultural (SID) foi criada com o intuito de dialogar com as mais diferentes expresses culturais e tambm com a meta de criar polticas pblicas para
segmentos com pouca visibilidade. Nesse sentido, comeou a trabalhar com as culturas populares e tradicionais. O MinC realizou, em 2005, por exemplo, um seminrio de cultura popular que mobilizou 15 estados, com oficinas de discusso sobre quais seriam as diretrizes de aes para a construo de uma poltica cultural. Quando se fala de poltica pblica, fala-se de programas e aes, tais como editais, que so processos democrticos e transparentes, nos quais a concorrncia entre os participantes mais abrangente. Nessa poltica de recorte institucional, todas as secretarias trabalham hoje com a questo da distribuio nacional, e isso atinge outros mecanismos, como a Lei Rouanet, por exemplo. Assim, foram feitos editais para as culturas populares. O edital de 2007, Mestre Duda 100 anos de Frevo, distribuiu 260 prmios a grupos tradicionais. Com o prmio, aqueles que precisavam da manuteno de roupas, sapatos e instrumentos, por exemplo, puderam resolver parte de seus problemas e continuar com as brincadeiras. Tambm premiamos iniciativas da sociedade civil e de entidades pblicas que trabalham com cultura tradicional. Em 2007, ns fizemos o Edital de Premiao para as Culturas Populares verso Mestre Humberto de Maracan, com a distribuio de R$ 10.000,00. Foram 240 prmios nas categorias Mestres, Grupos Tradicionais Formais e Grupos Tradicionais Informais. Houve 700 inscritos e os prmios foram distribudos em 23 estados. A importncia do prmio, apesar de ter um valor pequeno, simblica, porque os estados, hoje, j comeam a criar seus prprios editais para a cultura tradicional. O Ministrio da Cultura tem o menor oramento da Unio, 0,6%. Portanto, quando realiza aes desse tipo, o grande desafio atingir todas as manifestaes das culturas populares. Para se ter uma ideia, Minas Gerais tem uma federao que rene 8 mil congadas! Em 2009, em parceria com o Ministrio do Desenvolvimento Social e com o Ministrio do Meio Ambiente, ser feita uma grande pesquisa sobre as comunidades tradicionais, que hoje so mais de 100 mil no Brasil. Tendo por base essa poltica, o MinC criou em 2006, o 1 Encontro Sul-Americano das Culturas Populares, com a presena de oito pases, e comeou a compartilhar suas polticas. O 2 encontro ser em Caracas, em 2008 quando discutiremos uma poltica dentro da agenda do Mercosul Cultural (frum com os dez ministros da Cultura da Amrica do Sul), com
vistas ao intercmbio da produo cultural. O 3 Seminrio Nacional ocorrer em 2008 no 4 Encontro de Mestres do Mundo, em Juazeiro do Norte, quando pretendemos levar os 260 premiados de 2007. Ser um encontro s de mestres, durante o qual eles passam o dia inteiro se conhecendo em rodas do artesanato, da oralidade, da religiosidade, da dana, da msica. No ser um encontro de experts ou intelectuais. O anterior aconteceu em Limoeiro do Norte, uma cidade muito pequenininha e que no suportaria a quantidade de participantes prevista para esta edio. Por isso, o prximo encontro ser no Cariri. J na rea de Culturas Indgenas, o MinC criou um grupo de trabalho a partir do Frum Cultural Mundial de 2004: 33 representantes dos povos indgenas se reuniram e elaboraram uma carta para o ministro Gilberto Gil e para o presidente Lula, na qual revelaram o desejo de participar da criao de polticas pblicas para a cultura. A partir disso, formamos um grupo de trabalho que demandaram tambm a criao de um programa nacional de valorizao das culturas indgenas e de um edital especfico, de modo a atender dinmica desses povos. Fizemos uma parceria com a Associao Guarani Tenonde Por e, com o patrocnio da Petrobras, lanamos dois editais. No primeiro, tivemos 504 inscries e premiamos 82 iniciativas. Pela primeira vez dentro do Ministrio, atendemos dinmica indgena por meio de inscries feitas oralmente. Criamos uma rede para que as inscries chegassem s aldeias e os prprios
indgenas se inscreviam, sem intermedirios. E, a partir disso, constitumos o mapeamento dessas culturas. No estamos trabalhando apenas com a dana, a msica e o artesanato, mas com o universo cultural indgena, como as casas de parto, o modo de vida, a alimentao, e com todo o amplo conhecimento que faz parte da vida, uma vez que os indgenas no separam educao de cultura. Cada iniciativa recebeu R$ 15.000,00 e tivemos uma parceria importantssima com o SESC/SP, que publicou um catlogo com todas as inscries e organizou o evento de premiao. Na segunda edio, ampliamos o nmero de iniciativas premiadas foram 102 projetos e aumentamos o valor para R$ 24.000,00. Tivemos 695 inscries. Verificou-se tambm que
Uma das missoes do MinC criar polticas pblicas para segmentos de menor visibilidade"
BRINCANDO NA DIVERSIDADE: CULTURA NA INFNCIA
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existem indgenas ressurgidos em lugares como o Piau. Grupos comearam a se autodeclarar indgenas. No Cear existiam cerca de 40 etnias. Esse nmero chegou a quatro e hoje j h 22. Tambm promovemos uma capacitao em audiovisual, em parceria com o Projeto Vdeo nas Aldeias. A ideia formar os indgenas para que eles produzam seus prprios filmes, em sua lngua, e, com isso, criar uma grande rede. Ns tambm trabalhamos com a diversidade sexual, com o segmento LGBT lsbicas, gays, bissexuais, travestis, transgneros e transexuais. Comeamos a mapear as aes desses grupos e fizemos editais para fomentar, primeiramente, as paradas do orgulho gay e, depois, houve iniciativas na rea de literatura, com cursos e seminrios em torno da produo desses movimentos. Atualmente existem cerca de 100 paradas em todo o Brasil, com uma diversidade fantstica. Tambm apoiamos a Conferncia Nacional LGBT, com uma mostra da produo cultural desse movimento. Foi a primeira conferncia do gnero no mundo. Dela participaram 14 pases observadores. Hoje, existe um observatrio de polticas pblicas para o movimento LGBT que congrega aes de diversos ministrios como da Sade, da Cultura e dos Direitos Humanos. Sobre as culturas ciganas, vale destacar, temos hoje cerca de um milho de ciganos no Brasil. Esse nmero igual ao da populao indgena e inclui no s os nmades, mas tambm os residentes em cidades. O preconceito contra os povos ciganos muito
grande e no se conhece sua cultura. Portanto, foi organizado um grupo de trabalho que vai produzir uma publicao sobre preconceito. Alm disso, foi institudo o dia 24 de maio como o Dia Nacional do Cigano. Tambm foi realizado um edital de premiao. Na rea de diversidade etria, fizemos um edital para a cultura como meio de insero do idoso. Esses editais so curiosos, pois permitem que se tenha contato com experincias maravilhosas das quais ningum tem conhecimento. Com os 20 prmios distribudos, no valor de R$ 20.000,00, essas experincias, alm do reconhecimento do Estado, podem ter continuidade. Tambm ser realizado um encontro para as avs. Vamos reunir as avs que existem nas culturas tradicionais, nas comunidades ciganas, dentro do movimento LGBT, e lev-las para que compartilhem experincias. Certamente, muitas histrias sero contadas. Quanto juventude, o MinC trabalha com o hip hop, movimento que existe em todo o Brasil. Recentemente nos reunimos em Braslia com representantes de vrios grupos e planejamos a criao de um edital especfico. Em 2007, foi realizado o RAP REP, Encontro de Rappers e Repentistas, em que se constatou que nossos rappers j esto aqui h muito tempo, so os repentistas. As aes de sade e cultura, por sua vez, so fruto de parceria com o Ministrio da Sade. Realizamos, por exemplo, aes para a cultura da sade mental, como a oficina Loucos pela Diversidade. Alm disso, estamos produzindo um edital para o tema da sade mental e uma mostra cultural com grupos de
teatro e msica. Lanamos tambm uma publicao com o contedo dessa oficina. H ainda o projeto Vidas Paralelas, sobre histrias dos trabalhadores. Estabeleceu-se uma rede formada por 648 trabalhadores, 24 profissionais por Estado, sendo 12 formais e 12 informais. Todos foram capacitados para contar suas histrias por meio de um telefone celular. Ferramentas como o vdeo, a fotografia, a poesia e o blog foram usadas para eles se conhecerem. Atualmente, o projeto est na fase de capacitao e se estender para a Amrica Latina no prximo ano. Por fim, realizaremos oficinas com pescadores tradicionais, em parceria com a Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca. Reuniremos pescadores de rios e do mar para atender a uma demanda do Conselho Nacional da Sustentabilidade dos Povos e Grupos Tradicionais. E hoje comeamos aqui o processo de escuta das demandas para a cultura na infncia. Aproveito ainda para convid-los a conhecer mais detalhes sobre a poltica da Secretaria da Identidade e da Diversidade Cultural por meio do portal www.cultura.gov.br. Ana Paula Santana Em 2003, a Presidncia da Repblica reconheceu o audiovisual como tema estratgico, no de governo, mas de Estado. Hoje, o audiovisual um dos cinco maiores segmentos da economia mundial. O Brasil, at ento, no tinha reconhecido esse nicho cultural e de mercado. Em 2003, foi lanada a poltica nacional para o audiovisual brasileiro, com a criao de um trip institucional, composto pelo Conselho Superior de Cinema, integrado hoje por nove ministros de Estado e pela sociedade civil. Nesse conselho, so definidas as diretrizes e a poltica audiovisual daquilo que o pas quer ver em suas telas, o que deseja no campo da regulao e em termos de contedo. Esse conselho a entidade mxima. H tambm a Secretaria do Audiovisual, uma unidade do Ministrio da Cultura; e a Agncia Nacional do Cinema, responsvel pelo fomento, pela regulao e pela fiscalizao do setor audiovisual.
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dever do governo fazer polticas e incentivar as aoes que estejam ajudando a formar as crianas"
Em 2003, o ministro Gilberto Gil ampliou o conceito do que cultura, o que tem nos obrigado, no Ministrio, a pensar na ampliao do escopo de nossa atuao. A secretaria, que antigamente preocupava-se apenas com a mdia cinema, agora tem de assumir novas responsabilidades. Hoje, nosso foco mudou: trabalhamos com cinema, contedo para televiso, novas mdias que contemplam a internet, a telefonia celular, a TV digital e com a TV pblica brasileira. Outro ponto interessante a ampliao do acesso aos bens culturais. A sociedade brasileira, quando instigada a trabalhar com uma gesto compartilhada com o governo, comea a ter acesso ao que o poder pblico est fomentando. A acessibilidade fator fundamental para comearmos a criar um dilogo com a sociedade e a construir polticas pblicas. Nessa perspectiva, e dentro da proposta de dilogo social, foram criadas polticas especficas de fomento a projetos e programas cinematogrficos e audiovisuais. So projetos de capacitao, de preservao da memria e de intercmbio audiovisual. So nossas grandes linhas de atuao e, dentro do possvel, tentamos contemplar a questo da criana, porque de nossa responsabilidade fazer poltica e incentivar as aes que esto formando as nossas crianas. No campo cinematogrfico, a Secretaria do Audiovisual lanou em 2003 um edital de produo de curtas com a temtica infanto-juvenil. Foi nossa primeira parceria com a TV pblica brasileira: o projeto Curta Criana, feito com a antiga TVE do Rio de Janeiro, em que o Ministrio fomentava a produo de filmes com temtica especfica. Foi a primeira vez que o MinC fez um recorte temtico em sua poltica de editais, j com a garantia de espao para que esse contedo chegasse ao pblico-alvo. Precisvamos ter o espao de uma televiso pblica que tivesse contedo de qualidade para a criana. Fizemos quatro editais, e nossa parceria hoje continua com a TV Brasil. Recentemente, o ministro da Cultura lanou tambm a poltica nacional para o desenvolvimento da animao brasileira. Como foi dito, pelo menos 80% de nossas telas so ocupadas por produes estrangeiras, seja na televiso, seja nas salas de cinema. A produo desse contedo estrangeiro, na maioria das vezes, envolve profissionais brasileiros que trabalham no exterior. Por que no incentivar esses profissionais a produzirem contedos responsveis dentro do Brasil? Foi com esse raciocnio que o MinC lanou essa poltica e, com base nela, foi criado o Programa Anima TV, que consiste no desenvolvimento de sries de animao para crianas a serem exibidas em toda a rede da Empresa Brasil de Telecomunicaes, na TV Brasil e tambm na TV Cultura de So Paulo.
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Antigamente, quando se falava em cinema, pensava-se, produzia-se, mas nunca se chegava ao final da cadeia produtiva. Fomentava-se um curta-metragem para crianas, mas ele no chegava ao pblico e a parceria com a televiso foi estratgica para se conseguir a exibio. Comear a produzir contedo formatar um produto brasileiro feito para crianas brasileiras, que esto acostumadas cultura estrangeira porque no tm acesso prpria cultura. No por falta de interesse, mas por falta de acesso ao formato, ao trao de um desenho animado brasileiro. O modelo do Anima TV, de produo de televiso, est sendo replicado no Mercosul. Nesse ponto, contemplamos outro vetor de atuao do Ministrio que o da diversidade. Queremos que nossos pases irmos saibam o que produzimos, e que ns saibamos o que eles produzem. No mbito de nossa poltica, temos o Anima TV e o Anima Sul. No painel anterior, evidenciou-se que ainda existe certa resistncia em relao s novas mdias. Mas o MinC tem uma poltica bastante forte para elas. Trabalha, por exemplo, por uma poltica responsvel para os jogos eletrnicos, pensando no pblico consumidor. A criana s vai jogar no computador aquilo a que ela tiver
mensagem. O Ministrio do Meio Ambiente, por exemplo, trabalha conosco num edital especfico de animao como forma de atingir seu pblico e construir uma conscincia ambiental. Em parceria com o Ministrio do Meio Ambiente e com a TV Brasil, elaboramos um edital para contedo de animao sobre o aquecimento global. Outro parceiro estratgico tem sido o Ministrio da Educao, que adquire, por meio da TV Escola, muitos produtos desenvolvidos com recursos da Secretaria do Audiovisual. Essa ao ajuda a criar educao para o audiovisual e por meio do audiovisual. O projeto Revelando os Brasis tambm interessante. Tratase de um programa maravilhoso, dedicado a municpios de at 20 mil habitantes. Qualquer cidado conta uma histria que, se selecionada, transformada em um vdeo a ser exibido no circuito comunitrio. O grande diferencial desse programa que no se trabalha com um profissional, mas com uma pessoa comum, que passa por um processo de capacitao tcnica e consegue fazer da sua histria um vdeo. Ela filma, edita e acompanha o processo at o final, a exibio. O projeto leva os 40 vdeos produzidos a cada cidade que teve um cidado contemplado. Nela, armamos um grande espao de exibio.
A secretaria est aberta a propostas e a sugestes. Existem vrios setores da sociedade que lidam com a questo do audiovisual e tm preocupao com a temtica infantil. Apoiamos festivais de cinema especfico para crianas e adolescentes. Antnia Rangel O Cultura Viva o principal programa da Secretaria de Programas e Projetos Culturais, cujo objetivo reconhecer, identificar e potencializar as aes culturais que j existiam. O principal foco do programa o Projeto Pontos de Cultura, formado por projetos e entidades que j desenvolviam suas atividades sem auxilio do governo, dando a cada um deles um apoio de at R$ 180 mil num primeiro momento, divididos em cinco parcelas, e, atualmente, em trs. H hoje, em outubro de 2008, 800 Pontos de Cultura. A forma encontrada para manter a ao como uma rede orgnica e viva foi colocar todos eles em contato, fazendo com que se relacionem e constituam uma rede, com diversas temticas e diversos pblicos. Foram criados tambm os Pontes, locais que recebem um recurso maior com a finalidade de articular, capacitar, mobilizar e difundir as aes de entidades constitudas como Pontos de Cultura e dos Pontos de Cultura, em geral. Alm dessas aes, h o Escola Viva. Formamos uma rede por meio de um edital de premiao em 2007, foram concedidos 120 prmios a entidades que mantm uma relao com a escola formal , e temos usado os Pontes para ajudar a implementao das aes. Temos tambm a Ao Gri, que busca valorizar a tradio oral e preservar os saberes que no esto nos livros. Num primeiro edital, foi concedida uma bolsa a 250 mestres e gris aprendizes. Num segundo edital, houve a oferta de mais 300 bolsas. Essa ao implementada por meio do Ponto Gro de Luz, o Ponto Gri. Na rede, contabilizamos a existncia de quase 200 Pontos de Cultura voltados para o lazer e para a recreao, uma ao mais direcionada infncia. Temos planos para uma ao mais especfica dirigida s crianas no mbito do Programa Mais Cultura. A ideia montar uma rede de ludicidade em funo da grande quantidade de pontos voltados para a infncia. Todos os Pontos de Cultura tm em comum um kit multimdia computadores, mesa de som, cmara de vdeo, cmara fotogrfica , para que possam produzir e divulgar seu contedo. Houve tambm uma ao com a TV Brasil para que pudessem difundir o contedo criado. Vale lembrar que o projeto de ludicidade oferece 200 prmios de R$ 18.000,00 para a montagem de brinquedotecas. Silvana Meireles O Programa Mais Cultura o mais importante do Ministrio porque agrupa vrios programas que j eram desen-
volvidos. Essa a sua diretriz. Ele se insere em uma agenda social da segunda gesto do governo Lula, que criou quatro grandes programas: o PAC, da rea de infraestrutura; o Pronasci, da segurana cidad; o da educao; e a agenda social, que o PAC da cultura. Essa agenda tem sete eixos e entre eles est o da cultura, com o Programa Mais Cultura. Seu objetivo dialogar com todas as aes da agenda social e com as iniciativas da sociedade civil. Se pudssemos resumir o programa em poucas palavras, elas seriam incluso social e acesso. O Mais Cultura importante porque, pela primeira vez, o governo absorve a necessidade da cultura em sua poltica de desenvolvimento. Essa sinalizao to expressiva que o programa tem um oramento maior do que o do prprio Ministrio da Cultura. Inicialmente, houve um debate dentro do prprio governo, que queria tratar a cultura como algo transversal s outras polticas, mas no com a autonomia atual. Seu papel seria o de argamassa dentro do prprio governo, integrando vrios ministrios e vrias aes que j eram desenvolvidas. Para montar o programa, o MinC baseou-se em alguns dados estatsticos que se mostravam preocupantes. O Mais Cultura busca apresentar propostas visando reverso desses ndices, ou pelo menos minimizao deles. Seu foco so as classes C, D e E, com recorte especfico na juventude, embora crianas, idosos e outros segmentos etrios estejam includos. Os dados so:
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Apenas 13% dos brasileiros vo ao cinema alguma vez por ano. 92% dos brasileiros nunca frequentaram museus. 93,4% jamais frequentaram uma exposio de artes. Sabemos que isso se deve no s pela ausncia de museus, mas tambm pela barreira que existe entre o museu e o cidado. 78% dos brasileiros nunca assistiram a um espetculo de dana, embora quase 20% saiam para danar. Mais de 90% dos municpios brasileiros no possuem qualquer centro cultural. No possuem sala de cinema, museu, teatro.
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O brasileiro l, em mdia, 1,8 livro por ano. Recentemente, foi lanada uma nova pesquisa, e j h um aumento nesse nmero, mas no muito significativo. O baixo ndice de leitura est associado ao fato de 73% dos livros estarem nas mos de apenas 16% da populao e tambm ao preo mdio do livro, a despeito de termos visto algumas editoras criando edies de bolso, mais acessveis. Mas o impacto de uma desonerao da cadeia do livro, feita na primeira gesto do governo Lula, para o consumidor sobretudo para o pblico dessas classes com as quais o Mais Cultura vai trabalhar no suficientemente significativo para colaborar para o aumento da mdia de livros lidos por ano. 7. Cerca de 600 municpios brasileiros nunca receberam biblioteca dos quais 405 ficam no Nordeste e apenas dois no Sudeste. Isso j aponta, no territrio brasileiro, as necessidades de algumas regies em detrimento de outras. 8. 82% dos brasileiros no possuem computador em casa. Neste universo, 70% no tm acesso internet, nem no trabalho, nem na escola. S estamos falando do acesso mquina. No estamos falando, aqui, do contedo e do tipo de relao que se estabelece com o equipamento. Uma pesquisa feita em So Paulo, na Biblioteca Mrio de Andrade, indicou que 80% dos frequentadores que acessam a internet usam o MSN ou visitam sites pornogrficos. Esses dados nos indicam algumas aes que devem ser implementadas para trabalharmos com os estudantes que esto consultando a internet. 9. Mais da metade da populao que trabalha no campo da cultura est no setor informal, sem carteira assinada, atuando por conta prpria. 10. A despeito de todos os dados apresentados, resultados de um recorte no Censo do IBGE e de algumas pesquisas do IPEA mostram que o gasto mensal com cultura ocupa a 6 posio no oramento da famlia brasileira e supera o gasto com educao , independentemente de classe social. Diante desse cenrio, o Ministrio da Cultura definiu alguns desafios, como a questo do acesso, no s no sentido de potencializar as aes existentes nas comunidades, mas tambm no de garantir o acesso dessa populao aos equipamentos que esto nos centros urbanos, como, por exemplo, museus e centros cultu-
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rais. H uma barreira que impede a populao de criar intimidade com o equipamento cultural muitas vezes, falta dinheiro para tomar o nibus at l, ou simplesmente se ignora a existncia de atividades nesses locais. A relao entre cultura e educao segue muito presente no MinC. H mais de 20 anos, a rea da cultura se dissociou do Ministrio da Educao e, desde a primeira gesto do ministro Gilberto Gil, o MinC vem promovendo a reaproximao com a educao. O Mais Cultura surge como um programa que pode, em vrias reas do Ministrio da Educao, promover esse resgate. Recentemente, uma pesquisa feita no Rio de Janeiro apresentou um dado interessante: se, no passado, associava-se a quantidade de bens materiais possibilidade de um futuro sucesso profissional da criana e do jovem, a pesquisa mostrou que, hoje, muito mais determinante a quantidade de livros a que esse jovem tem acesso durante sua formao. H tambm a questo da cultura digital. Como promover criteriosamente a interao qualificada da populao com o mundo digital? O desafio da integrao das geraes, da famlia e da comunidade est intrinsecamente ligado ao desafio da qualificao do ambiente social. No possvel se pensar em desenvolver vrias aes se a criana est descolada da famlia ou se ela vive em um ambiente social muito degradado. Ns temos vrias experincias, inclusive uma no Ponto de Cultura da Mangueira, que trabalham com os saberes comunitrios integrados a uma escola da mesma regio. Aquela mesma pesquisa apontou como dois fatores fundamentais para o desenvolvimento do leitor o incentivo dado pela me e a proximidade de uma biblioteca. O ambiente familiar talvez seja o mais importante para a formao de uma criana do ponto de vista emocional e, tambm, intelectual. A questo da cultura e do trabalho coloca um desafio que vai ao encontro daquele dado da informalidade da mo-de-obra no
setor da cultura. Do ponto de vista mercadolgico e de empregabilidade dos jovens, no h profissionais qualificados em algumas atividades tcnicas cujo mercado vem se desenvolvendo no Brasil, o que talvez aponte um caminho para inserir esses jovens no mundo do trabalho e, ao mesmo tempo, tirar da informalidade uma srie de brasileiros que atuam no campo da cultura. Finalmente, h a questo da diversidade cultural, que se relaciona no s com o Programa Mais Cultura, mas que tem sido uma diretriz importante do Ministrio da Cultura. Esse conjunto de desafios foi agrupado, e o programa trabalhar com duas dimenses da cultura. A primeira a da cidadania, na qual identificamos duas linhas de ao: cultura e cidadania e cidade cultural. A segunda a dimenso econmica da cultura, na qual est a terceira linha de ao, a de cultura e renda. Foi nessas trs linhas que o MinC agregou e potencializou as aes que j eram desenvolvidas no mbito do prprio Ministrio, as aes desenvolvidas em outros ministrios e, evidentemente, as novas aes implementadas para dar conta desse desafio. Dentro da diretriz de integrar aes existentes se inserem os Pontos de Cultura. A meta do programa de que, at 2010, tenhamos 3 mil pontos instalados em todo o pas. Em parceria com 23 Estados, j existem 1.268. H Estados que esto lanando editais e outros que j preparam o perodo de seleo. A Bahia j est fazendo convnios com 150 pontos que atenderam a todas as diretrizes do Programa Mais Cultura. Seguindo a mesma lgica dos Pontos de Cultura, haver outras aes mais segmentadas, os Pontos de Memria, com a criao de museus comunitrios. J existe um Ponto de Cultura que tambm virou Ponto de Memria: o Museu da Mar, no Rio de Janeiro. E h os Pontos de Leitura, que vo revelando e fomentando iniciativas da sociedade civil. Foi lanado recentemente no Recife um Ponto de Leitura muito emblemtico, voltado para as crianas de uma favela, por iniciativa de algum da prpria comunidade, uma das mais violentas da cidade. Ainda em gestao, a partir do edital da ludicidade, esto os Pontinhos de Cultura. Uma vez que no possui expertise na rea da infncia, o Ministrio ir mapear as experincias existentes na sociedade. Na sequncia, haver um encontro dos Pontos de Cultura que trabalham com a ludicidade e que foram selecionados pelo edital com os que j pertencem rede existente. Em relao ao livro e leitura, alm dos Pontinhos de Cultura, algumas aes trabalham com a meta de, at 2010, zerar o nmero de municpios brasileiros sem bibliotecas pblicas municipais. Hoje, segundo o Sistema Nacional de Bibliotecas Pblicas, h cerca de 660 municpios sem biblioteca. Ao mesmo tempo, h uma segunda ao, a de modernizao que no se restringe ao acervo, aos equipamentos e
ao mobilirio, mas que contempla uma nova forma de ver e tratar o espao da leitura como um ambiente amigvel, de encontro, inserido na comunidade e que desenvolva outras atividades alm da leitura. Ainda no campo da produo e da distribuio de livros populares, h a rede Biblioteca Viva, que visa articulao das bibliotecas estaduais, pblicas, municipais, escolares e comunitrias j existentes. Quem far essa articulao sero os agentes de leitura, jovens formados para desenvolver a aproximao das famlias com o livro. Eles atuaro diretamente nas comunidades por meio do ato de contar histrias, da revelao da literatura. Outra ao tem como foco os microprojetos culturais, que possuem recorte bem especfico: jovens na faixa etria dos 15 aos 29 anos. uma aposta na produo j existente, voltada para esse pblico ou realizada por ele, com investimento que vai de um a 30 salrios mnimos para pequenos produtores que jamais teriam acesso s leis de incentivo. Em 2008, essa ao estar na regio do semi-rido, que uma das prioridades do recorte territorial do Mais Cultura. Trata-se de capacitao cultural, que vai ao encontro do dado sobre a informalidade no campo da cultura. O programa aponta para quatro linhas: gesto cultural, formao tcnica, formao artstica e transmisso dos conhecimentos tradicionais. H ainda os projetos de espaos culturais para mltiplos usos. Hoje, ns estamos estimulando a qualificao de propostas de construo desses espaos no mbito do PAC da infraestrutura. Foram selecionados, em vrias capitais, projetos que estavam sendo desenvolvidos no PAC para regies de alta vulnerabilidade social. Os espaos j esto sendo construdos nessas regies pelo PAC infraestrutura, com o Ministrio respondendo pela qualificao desses projetos. Alm disso, o MinC reunir especialistas em televiso e pes-
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quisas sobre a rea. Isso o capacitar para a elaborao e o lanamento do primeiro edital de teledramaturgia do Mais Cultura. Vrios outros projetos sero lanados at 2010. Sobre o Programa de Promoo do Artesanato Tradicional (Promoart), que trabalha com artesanato de cultura tradicional, possvel informar que sua abrangncia foi definida a partir no s do alcance de programas como o Pronasci, que mapeou 85 localidades com os maiores ndices de violncia, incluindo 13 capitais, mas tambm do levantamento dos menores ndices de educao bsica e IDHs. Por conta disso, trs regies so prioritrias para a poltica do governo brasileiro: o semi-rido, a rea de revitalizao do Rio So Francisco e a BR 163, na regio Norte. Para viabilizar esse programa, que j completou um ano, o Ministrio da Cultura articulou-se com vrios parceiros, inclusive do governo e de bancos oficiais. Para atingir todas as metas a que se prope, o programa precisa de um investimento da ordem de R$ 4 bilhes. A proposta que parte desses recursos venha do prprio oramento, e parte seja obtida por meio de parcerias com os Estados, a iniciativa privada e as instituies estatais. O Ministrio tem se proposto a incorporar experincias bem-sucedidas na sociedade civil e nos Estados. Trabalha tambm com a ideia de colocar o selo do Mais Cultura em aes desenvolvidas por instituies da sociedade civil, focadas no pblico e nos princpios que foram aqui apresentados.. Amrico Crdula A Secretaria de Ao Institucional coordenar a 2 Conferencia Nacional de Cultura, em 2009.
Gabriela Gambi Desenvolveu-se um mapa de aes que no trabalha com recursos, mas com o cadastro de aes relacionadas com o livro e a leitura. Esse mapeamento comeou h mais de dois anos, e o PNLL tornou-se uma marca para essas aes que esto articuladas em uma mesma linha de atuao. O texto do PNLL foi elaborado ao longo de 97 encontros de trabalho, sempre considerando as demandas da sociedade civil. O plano acabou se tornando um indutor de polticas pblicas a partir dessa demanda social. No h um vnculo governamental tratase de uma portaria e no est relacionado com nenhum rgo. A finalidade bsica do PNLL trabalhar com educao e cultura. Tudo o que hoje se faz em relao ao livro e leitura muito relacionado cultura e educao. O plano trabalha sobre quatro eixos e foram destacadas aqui as aes que esto ligadas com a infncia. Em primeiro lugar, o PNLL uma plataforma virtual que as pessoas que desenvolvem aes relacionadas ao livro e leitura acessam e na qual cadastram suas informaes em um formulrio bastante simples. Assim, consegue-se fazer um mapeamento de aes de livro e leitura no Brasil inteiro. Isso fundamental porque permite identificar as iniciativas que surgem em todo o pas de forma normalmente espontnea, buscando, de alguma maneira, conciliar interesses e estabelecer uma interlocuo. O plano possui quatro eixos. O primeiro o da democratizao do acesso ao livro e leitura, com a conquista de novos espaos. Da mesma maneira, o uso de tecnologia de informao
e comunicao um suporte para se conseguir estimular a criana e promover a leitura. Para isso, contamos com apoio do Ministrio da Comunicao e de telecentros, que fazem parte da modernizao de bibliotecas. O segundo eixo, o da formao de mediadores, fundamental para se conseguir trabalhar a leitura e o hbito da leitura. Para responder a essa demanda, temos os Pontos de Leitura e a ao dos agentes de leitura, projeto que ainda est na fase de capacitao. uma iniciativa que surgiu no Cear, inspirada nos agentes de sade. O terceiro eixo o da valorizao da leitura e da comunicao. Uma meta do Programa Mais Cultura a modernizao de bibliotecas de referncia para que trabalhem com o conceito de biblioteca viva. Ou seja: com o conceito de biblioteca como espao cultural multiuso, uma biblioteca de fruio, onde as pessoas tenham contato prazeroso com a leitura. Trouxe uma frase de Gabriela Mistral para ilustrar o que pretendemos: Deve-se ler como se come, todos os dias. At que a leitura seja como o olhar, exerccio natural, mas sempre prazeroso. E isso algo que no acontece da melhor forma possvel nas escolas: fazer da leitura algo prazeroso e que seja parte do diaa-dia. No um dever, mas um exerccio. Da mesma forma que precisa do espao para correr, a criana necessita do espao para o exerccio mental. Ou seja: a leitura como algo fundamental para a plena realizao da condio humana e para a sensibilizao do homem. possvel contar uma histria, criar identificao, gerar um olhar que vem de fora para dentro. Por essa identificao, a pessoa consegue formar uma nova viso e uma nova reflexo sobre a prpria realidade. O quarto eixo o do entendimento do mundo e do protagonismo, ou seja, o de conseguir qualificar as relaes entre seres humanos e as relaes de cada um com a prpria sociedade. Temos, por exemplo, o desafio de levar a leitura para o terreno do brincar, fazendo com que ela no seja uma atividade chata, uma obrigao ou um castigo, mas algo prazeroso, como o deleite esttico de uma criana que v um livro e o manuseia. H os pictures books, que so livros que trabalham com a ludicidade e com as cores. Com eles, a prpria criana pode montar a histria e usar o livro da maneira que quiser, numa valorizao do protagonismo e da autonomia. Entre os nossos desafios, o maior o de criar o hbito da leitura nas crianas. E, nesse campo, a famlia fundamental, no s em relao ao livro, mas em relao formao de qualquer hbito cultural. A famlia vem em primeiro lugar, depois surge a escola e, por isso, importante estarmos unidos ao MEC. O ato de contar histrias outro tema importante. o momento em que se consegue juntar realidade com ludicidade, com imaginao, criando uma ponte com a criana e entrando em seu imaginrio. um momento poderoso tambm para se trabalhar conceitos de forma natural. A mediao da leitura
muito importante, ainda mais em um pas como o Brasil, com uma enorme taxa de analfabetismo. Ele til tambm para os adultos e, por isso, os agentes de leitura trabalham na formao de famlias leitoras. Ao se contar histrias e se fazer a mediao da leitura, consegue-se resgatar o encantamento do mundo. O Frum de Leitura definiu algumas recomendaes. A primeira delas fazer com que o Conselho Nacional de Educao reintroduza a literatura nas diretrizes curriculares e que isso seja desvinculado da disciplina de Lngua Portuguesa. Outras recomendaes so a elaborao de um guia sobre a literatura na escola e a transformao de professores em mediadores, porque, se a mediao no acontece na famlia, a escola precisa exercer esse papel. Ou seja: no se pode deixar que o livro tenha um carter utilitrio, que sirva para educar a criana para determinada ao ou para o vestibular. fundamental que a literatura seja entendida como fonte de prazer e de fruio, portanto preciso colocar as bibliotecas e seus funcionrios no corao das escolas. Quanto ao Ponto de Leitura, apenas o primeiro concurso foi realizado, o que significa que se est em fase de aprendizado. O objetivo reconhecer, premiar, dar visibilidade e identificar pessoas e instituies que trabalham com a promoo do livro e da leitura no pas. Pretendemos premiar 600 Pontos de Leitura. Uma das questes dos Pontos de Cultura sua constituio legal, pois muitos deles so bibliotecas domsticas. Por isso, transformamos a premiao num kit com mobilirio e acervo. O layout composto por um acervo de, no mnimo, 500 exemplares de material bibliogrfico. H tambm um computador, uma mesa e uma cadeira, alm de duas estantes baixas, com rodinhas, para os livros infantis. O layout flexvel, pode ser disposto da maneira como o proponente imaginar. No existe cadeira nem mesa de estudo a inteno que o leitor se acomode no ambiente, que tem tapete estilo tatame emborrachado e almofadas. O acervo ser definido pela Fundao Biblioteca Nacional.
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Na Bienal do Livro de So Paulo, fizemos, no estande do PNLL, um prottipo de como imaginamos que ser um Ponto de Leitura. H vrios candidatos a se tornarem Pontos de Leitura, como o Lo do Peixe, dono de uma peixaria em Minas Gerais, que comeou a juntar livros e apaixonou-se por eles. Lo passou a emprestar livros a outros feirantes e clientes, e hoje tem o Clube da Leitura, que fica ao lado de sua barraca de peixe. J em Ponta Grossa, h o Banco da Leitura, que faz um trabalho excelente, sem recurso nenhum normalmente, os prprios frequentadores da biblioteca tomam a iniciativa de comprar mais livros, doar uma estante ou pintar a casa. A Barca dos Livros, por sua vez, mais estruturada. Trabalha de forma muito especfica com a questo do acesso, por meio de um barco que atende s comunidades ribeirinhas da regio Norte do pas. interessante ver essa mobilidade do livro. Para tal, no se precisa de muitos equipamentos, como no cinema. Precisa-se simplesmente do mediador, do livro e da imaginao. Outro exemplo a Arca das Letras, iniciativa bastante conhecida e maravilhosa do Ministrio do Desenvolvimento Agrrio. Existe ainda a Borracharioteca, pertencente a um borracheiro que, certo dia, achou um livro no lixo, apaixonou-se pela leitura e que, hoje, tem uma biblioteca em plena borracharia. Em Braslia, h um aougue que faz trabalho semelhante. O Ponto de Leitura justamente a oportunidade de reconhecermos a criatividade e a iniciativa das pessoas.
Debate
Fabiano de Oliveira Moraes, do Portal Roda de Histrias Sou contador de histrias e vivo em Vitria. No tenho a mesma divulgao de meus trabalhos de que quem est nos grandes centros. Encontrei projeo, contudo, com um site criado em 2005, o www. rodadehistorias.com.br. O site surgiu para congregar contadores de histrias de todo o Brasil pela internet. Por meio das aes do MinC, ele foi reconhecido no ano passado e recebeu o prmio Mestre Duda de Culturas Populares. Foi tambm contemplado com a Lei do Audiovisual. Mas o problema a captao dos recursos. Darcsio Muraro Quero citar uma frase de Sidoneo, poeta portugus: A criana tem que receber um corpo infantil como um balo. Jogar com ele,atir-lo para o ar, ser livre, brincar. Esse o mote do trabalho da Fundao com a Literatura. A preocupao da fundao olhar a literatura do nosso Estado, o Paran, que pouco significativa na comparao com a do restante do Brasil. O mesmo vale para o mercado editorial. Vocs, por acaso, conhecem alguma editora paranaense? Talvez s a Positivo, que de livros didticos. Pensando nisso, criamos em 2004 o Encontro Paranaense de Literatura Infanto-juvenil. Em 2007, tivemos a segunda edio. Ns mandamos o projeto do encontro para aprovao pela Lei Rouanet, ainda em 2005, mas no tivemos sucesso. Com quem conversamos no MinC? Porque o insucesso da parceria com o Ministrio se deveu dificuldade de dilogo. Lydia Hortlio O MinC usou o termo brinquedoteca. Eu queria pedir para mudar esse nome para territrio do brincar. Ilona Hertel A brincadeira no deve ficar restrita a um lugar que se reserve para os brinquedos e para que crianas se encontrem com esses brinquedos. Quando chamamos de binquedoteca, de ludoteca, etc., assumimos que deve haver um lugar especfico para a criana brincar. como se fosse um espao cheio de prateleiras. E assim que na Europa se entende brinquedoteca. O mais importante o brincar, e no o brinquedo. Jaqueline Baumgratz Fizemos questo de colocar o nome Pontinho de Cultura para reafirmar um conceito. O termo brinquedoteca traz consigo outro conceito importado, que engessa. Os espaos do brincar, por sua vez, ampliam. As palavras que a educao at hoje utiliza, como infncia, aluno, supervisor, delegacia de ensino, grade curricular e pblico-alvo podem ser modificadas. Mudar palavras o primeiro passo para modificar o mundo. Silvana Meireles Fabiano abordou a Lei Rouanet. O Ministrio est propondo uma reformulao da lei. Adianto que a questo de
Gostaria de sugerir que, nesse segmento a ser trabalhado pelo MinC, o de um ofcio nacional de difuso artstica para a infncia, pudssemos fazer festivais e programas nacionais itinerantes, a exemplo do antigo Projeto Mambembinho. Deveramos reforar essa ideia, em vez de falar que Rio e So Paulo esto timos, ento devemos cuidar do resto do Brasil. Hermes Bernardi Jr. Proponho incluir livros nos Pontos de Brincar, de modo que eles tambm possam ser associados ao prazer e brincadeira. Outra coisa: no vejo o Sul do Brasil contemplado nas aes do MinC. Os critrios de educadores e coordenadores para a escolha dos livros que vo para a sala de aula so os preos baixos e no a qualidade. O custo de um bom livro de R$ 25,00 a R$ 30,00. quase impossvel fazer livro razovel por menos. Pessoa da plateia A infncia poderia ter um setor especfico? fundos e da captao est no cerne da nova proposta. Especialmente para pequenos projetos, que usam investimentos de um a 30 salrios mnimos. Tarcsio, se a interlocuo que voc est propondo sobre a questo do fomento, a Secretaria do Fomento do Ministrio da Cultura quem estabelece esse tipo de dilogo. Ela tem uma central de atendimento, mas h uma deficincia nessa rea. No inicio do governo Lula, havia 200 projetos por ms para anlise. Hoje, de 800 a mil projetos so analisados mensalmente. Antnia Rangel Com referncia aos pontinhos e brinquedoteca: essa ao foi baseada numa iniciativa da Secretaria de Esportes, que de brinquedotecas mesmo. Ns demos o nome de Bola-de-meia e os profissionais da USP nos ajudaram a elabor-la. Isso j est corrigido no edital, que no fala mais em brinquedoteca, mas em Pontinhos Espaos do Brincar. Renata Meirelles Ontem, Beatriz Rosenberg disse que, no Brasil, as crianas veem mais de quatro horas de televiso por dia. E que, j que isso ocorre, devemos produzir um material de qualidade para a TV. Devemos pensar tambm nos bebs que esto comeando a assistir aos programas de TV. Quatro horas e meia de televiso so uma calamidade, um malefcio para as crianas. Karen Acioly Gostaria de saber se poderemos formar aqui uma comisso para trabalhar a articulao nacional com o MinC. Como garantir, dentro do Fundo Nacional de Cultura, um oramento visvel voltado para esse segmento? Muito se fala de centralizao dos centros urbanos. No verdade, temos perdido muitas das conquistas histricas do Rio e de So Paulo. Amrico Crdula Ns temos uma Secretaria de Polticas Culturais, que cuida de polticas para todas as reas, de forma ampla. Outras secretarias, como a SID, tratam da incluso de segmentos que ainda no tiveram atendimento do governo. Em um dado momento, a Funarte poderia abraar o teatro infantil. Esses encaminhamentos devero sair dos grupos de trabalho, assim como a sugesto de que se faa um grupo de trabalho para cultura na infncia. Poderamos pensar at numa cmara setorial. Tratase de um movimento de todos os Estados, de pessoas que trabalham com msica para criana, com literatura para criana, com teatro para criana, com jogos, brincadeiras, com a arte de contar histrias. Isso pode sair daqui como um encaminhamento, j que este um espao de dilogo para a construo de polticas pblicas. Mas, mais importante do que isso a construo do Plano Nacional de Cultura. No produtivo criar iniciativas que podem ser desmontadas com uma mudana de governo. Na verdade, temos de comear a pensar no direito de todo cidado ao acesso a polticas culturais. Estou falando dos indgenas, dos LGBTs, dos ciganos, de todo mundo. O que se busca traz-los para a cidadania cultural. Temos de pensar na sociedade inteira, Por isso, a SID atende a esses segmentos que no tiveram oportunidade. Para responder ao Hermes: Todos os editais contemplam o Rio Grande do Sul. Temos, por exemplo, os Territrios da Cidadania, que constituem uma prioridade da agenda social do governo. So
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973 municpios selecionados, com base em seus IDHs. Todos os nossos editais tm uma distribuio para a regio Sul. Agora mesmo, o edital de culturas populares contemplou iniciativas do Rio Grande do Sul, bem como o Edital para Culturas Indgenas. Silvana Meireles H os editais nacionais, que contemplam todo o territrio nacional, mas h tambm os editais por estado. Isso, sobretudo no mbito do Mais Cultura. Para que os editais sejam estadualizados, preciso que os governos queiram o programa e assinem um termo de adeso a ele. Hoje, temos 14 Estados que assinaram e quatro que expressaram interesse, mas o Rio Grande do Sul no se manifestou. Sobre os livros populares: essa ao prev a publicao de bons autores, com bom acabamento, boa impresso, a preos populares, para distribuio at gratuita. O que ainda est em discusso como ser essa distribuio, inclusive pelo volume de recursos disponveis: s R$ 500 mil. Cada exemplar negociado a preo de custo, R$ 1,00, o que significa 500 mil livros distribudos em 2008. Parece muito, mas, quando pensamos na populao brasileira, pouco. O interesse do Ministrio discutir com prefeituras e Estados para potencializar essas aes. Est em curso a construo do Sistema Nacional de Cultura, que prev a participao dos trs entes federais, para que todas as aes do MinC possam ser definidas e tambm estadualizadas. Iniciou-se tambm uma discusso com a Funarte sobre a circulao de espetculos e exposies pelo territrio nacional. Depende muito, tambm, da vontade dos Estados. A regio Nordeste a mais articulada, razo pela qual, com a exceo da Paraba, todos os demais Estados j aderiram ao Programa Mais Cultura. Amrico Crdula O Sistema Nacional de Informao Cultural, que est sendo construdo e debatido, ser a base para se verificar se determinada ao em um municpio pode ser
Ana Paula Santana Tambm acho um absurdo a criana brasileira passar de quatro horas a seis horas na frente da televiso. Com base nisso, a Secretaria do Audiovisual mudou o conceito dos editais sobre contedo infantil. Acho que a Secretaria do Audiovisual, sozinha, no tem como desenvolver uma poltica para contornar o problema. Mas o Ministrio est lanando outras polticas e programas para tirar as crianas da frente da televiso: os Pontos de Cultura, os Pontos de Leitura, o Mais Cultura. Se hoje as crianas passam mais de quatro horas em frente televiso, daqui a pouco, juntando TV e internet, esse total passar para oito horas. Se no temos como concorrer com essa escolha, podemos trabalhar para garantir um contedo de qualidade. Algum disse que, quando lanamos os editais, no havia nenhuma preparao para produo desse contedo. A secretaria tem mudado a lgica dos editais e est trabalhando em programas. O Anima TV no s produo, tem uma oficina de planejamento e de desenvolvimento, para a qual so convidados especialistas no assunto e no nosso pblico. Antnia Rangel Hermes sugeriu colocarmos livros nos pontinhos. Ns buscamos no impor nada. A ideia reconhecer e identificar o que j existe. Nada impede que nesses espaos de brincar haja livros entre os equipamentos comprados, mas cada entidade decide o que deve ser feito. Luciana Bernardo J discutimos diversas formas e locais para o desenvolvimento da cultura do brincar. A Associao Viva e Deixe Viver capacita voluntrios para levar a leitura e o ldico para dentro dos hospitais. Com exceo das penitencirias, os hospitais so os lugares mais preconceituosos, onde no existe infncia. S para ns, os contadores de histrias, as crianas podem dizer no, eu no quero. Por isso, existe o
Lucilene da Silva, da Associao da Aldeia de Carapicuiba Ns, que atuamos nas escolas pblicas, vemos o espao do brincar muito cerceado. So locais cimentados, sem natureza, com quadras restritas ou salas com 45, 50 crianas. Maria Amlia Pereira Eu queria saber se h no MinC uma compreenso da infncia como patrimnio humano. E, sendo patrimnio humano, eu acho que o MinC, o MEC e o Ministrio do Meio Ambiente deveriam se organizar para a poltica da infncia. Por exemplo, junto com os Pontinhos de Cultura deveriam existir espaos de natureza. Mas, na verdade, h espaos que so como o presdio do Carandiru! A criana tem o corpo para produzir todos os verbos que a natureza humana lhe deu: subir, descer... E, se ela faz isso com o corpo dela, depois vai fazer com a mente. E, se ela no fez com a mente, vai ficar no computador e na internet. Maria Helena Masquetti Ontem, fiquei com saudades da criana que eu fui e entendi que aconteceram coisas que me levaram a um certo endurecimento. Quantos outros pais podem no sentir essa empatia com a criana, podem no incentivar o prprio filho a sentir a alegria da infncia, de brincar? Temos de combater essa falta da infncia dentro de muitos pais. Renata Bittencourt E as crianas de abrigo ou de rua? Conheo Pontos de Cultura que trabalham com crianas em vulnerabilidade social. Essas crianas precisam de cidadania e de cultura.
Antnia Rangel Em relao ao meio ambiente: temos vrios Pontos de Cultura que trabalham essa questo, mas no h uma parceria firme, no Cultura Viva, com o Ministrio do Meio Ambiente. Sobre o Escola Viva: lanamos em 2007 um edital para identificar e mapear as entidades que fazem o trabalho em conjunto com as escolas. A Rede Escola Viva est com 120 escolas e, agora, comeamos o trabalho de capacitao. Outro exemplo a experincia de Nova Iguau, o Bairroescola, que trata da questo da escola que no tem um espao de brincar. Foi feita uma parceria com vrias entidades que atuam no bairro, desenvolvendo atividades culturais, esportivas e de lazer na comunidade. As crianas no turno que eles foram obrigados a implantar na escola saem do espao escolar para fazer as suas atividades em outros locais, sejam Pontos de Cultura, sejam entidades. Foram 90 Pontos de Cultura implementados na cidade. Sobre as crianas de rua, ainda no temos uma ao especifica. H Pontos de Cultura que trabalham com elas. Por exemplo, no Rio Grande do Sul, h um Ponto excelente que utiliza o conceito de no tirar a criana da rua, mas de lhe oferecer segurana. A criana tem um local para tomar banho e para frequentar as oficinas, mas pode entrar e sair quando quiser. Silvana Meireles O MEC est voltado articulao escola-comunidade, tanto que o Mais Educao atuar preferencialmente fora da escola. E estamos fazendo o Mais Cultura dialogar com o Mais Educao, usando a experincia dos Pontos de Cultura.
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Diretrizes e Aoes
A formulao de propostas de diretrizes para o Plano Nacional de Cultural foi precedida de debates para o estabelecimento de um pacto entre os participantes da oficina sobre os princpios da cultura na infncia. Essa atividade, que fez parte da plenria da oficina, buscou reunir um conjunto de ideias-fora, capturadas nas falas, nos debates da mesa e nos painis, e previamente sistematizadas e valoradas pelos participantes. Os princpios consolidados foram os que apresentaram melhores condies para angariar apoios na sociedade, promover a convergncia de opinies, aglutinar as pessoas em torno das propostas e apontar caminhos para uma compreenso coletiva sobre a tema cultura na infncia. As ideias apresentadas aos participantes e as respectivas pontuaes foram as seguintes:
Do debate, do agrupamento e da sistematizao das ideias apresentadas, emergiu um entendimento coletivo a respeito do conceito cultura na infncia. Esse trabalho resultou tambm na elaborao do seguinte texto-argumento:
Ideias-fora
Ptos
Cultura na infncia a cultura do brincar, espao do corpo, da imaginao, da liberdade. ......................................................................... 14 Brincar como produo do conhecimento. ........................................................................................................................................................... 12 Criar poltica pblica para acompanhar os contedos veiculados pelas mdias para crianas. ...................................................................... 12 Conhecimento manifestado por meio da expresso do corpo (movimento, ritmo, fruio, etc.) ............................................................... 10 Espao primeiro de brincar: com/na natureza (fogo, terra, gua, ar) .................................................................................................................9 Produo para as crianas ..........................................................................................................................................................................................8 Criana como produtora e criadora ...........................................................................................................................................................................8 Reconhecimento da criana como um sujeito presente e atuante .....................................................................................................................7 Incluir crianas e adolescentes atuantes nos debates sobre cultura, infncia, brincadeira e diversidade .....................................................7 Resgatar a unidade do ser, integrando o conhecimento racional ao ldico e subjetivo ..................................................................................5 Atuar junto aos adultos para formar a conscincia do ser criana .....................................................................................................................5 Valorizao da prpria cultura ....................................................................................................................................................................................4 Valorizar o ldico, a oralidade e o brincar como a construo de saberes, avesso educao racionalista e fragmentada .....................4 Apostar na cultura na infncia para construo e afirmao da cultura brasileira ............................................................................................4 Incluso de produo de contedo pelo poder pblico .........................................................................................................................................4 Brincar e viver, existir, acontecer e ser feliz ............................................................................................................................................................3 Aprendizado intrageracional (criana aprende com criana) na infncia ..........................................................................................................3 Preservar a integridade corporal das crianas nos meios de comunicao visual ............................................................................................3 Propor debates e aes que questionem as relaes de poder centradas nos adultos e que abram espao para voz e olhar infantil ...................................................................................................................................3 Oralidade e tradio permeando a ludicidade e a infncia .................................................................................................................................2 Brincar: linguagem mediadora de vnculos ............................................................................................................................................................2 Estmulo memria histrica, mitos e tradies brasileiras .................................................................................................................................2 Aprender brincando .....................................................................................................................................................................................................1 Reencantamento do mundo ......................................................................................................................................................................................1 Respeito ao processo de ser criana.........................................................................................................................................................................1 TV para bebs: estmulo ou passividade? ................................................................................................................................................................1 Contato da criana com a natureza e o meio ambiente nos espaos de socializao (familiar, escolar, bairro, etc.) .................................1
A cultura na infncia tem como um dos principais atributos o brincar, cujo sentido revelado nas ideias a seguir: Cultura na infncia a cultura do brincar, espao do corpo, da imaginao, da liberdade. Brincar viver, existir, acontecer e ser feliz. O brincar uma linguagem universal. Brincar: uma linguagem mediadora de vnculos. Brincar como um processo de conhecimento. Compreender a essncia do ser brincante (brincar-jogar). O brincar tambm um espao de silncio, da no produo e do devaneio infantil, sendo respeitado como uma construo e conscincia de si prprio. Brincar concebido como um ato simblico e de conexo com o sagrado.
ser direito da criana e do adolescente ter sua integridade fsica assegurada com espaos para o seu brincar; ser direito da criana ter acesso aos nveis mais elevados da pesquisa e da criao artstica; ser direito da criana brincar e divertir-se; opinar e expressar-se; respeitar o tempo da criana, dar a ela liberdade para viver sua primeira infncia; ser direito da criana o acesso aos recursos da natureza no como conhecimento de seus mecanismos, mas para sentir-se parte dela; respeitar o processo de ser criana; respeitar o ritmo de cada criana; reconhecer a criana como sujeito presente e atuante em seu desenvolvimento, levando em considerao a realidade e o contexto em que ela est inserida para no ferir os processos.
Ideias complementares
Conhecimento manifestado por meio da expresso do corpo (movimento, ritmo, fruio, etc.). Oralidade e tradio permeando a ludicidade e a infncia. Reencantamento do mundo. Livro como fonte do prazer e do brincar. Buscar um conceito (palavra) mais adequado para definir os anos iniciais da criana. Afirmao da brincadeira e no do brinquedo. Investir na cultura para a criana investir na produo de sade, bem-estar fsico e psicossocial. Cultura e infncia: espao para a vida criar, reconstruir e comunicar novos sentidos. Ao ajudar a criana a desenvolver algum juzo crtico em relao mdia, podemos estar convidando-a a abandonar precocemente seu mundo ldico. As emissoras de rdio e televiso, e todo o audiovisual, somente exibiro - no horrio recomendado para o pblico infanto-juvenil programas com finalidades educativas, artsticas, culturais e informativas; O adulto elevar-se altura e grandiosidade da criana.
Entende-se, no mbito da cultura na infncia, que ser criana : ser protagonista; ser um sujeito presente e atuante; ser um sujeito criador, portador de saberes; ser autor de sua prpria histria, narrada oralmente no brincar; ser um sujeito histrico, social e cultural; ser brincante; ser um sujeito que reinventa, recria o mundo; ter desejos, direitos e conhecimento; ser sujeito produtor de cultura e capaz de criar.
Em relao aos direitos fundamentais das crianas, afirmamos: cumprir o Estatuto da Criana e do Adolescente (ECA) nas aes do MinC; ser direito da criana e do adolescente ter acesso aos bens culturais (ECA);
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Diretrizes e Aoes
Resultados dos Grupos de Trabalho
Cada grupo de trabalho se encarregou de redigir as propostas de diretrizes e aes definidas em seus debates para apresentao na plenria. Em seu trabalho, os grupos foram subsidiados pelas ideias e sugestes apresentadas durante a mesa de debate e os painis, incluindo as contribuies dos participantes, que foram reunidas e agrupadas conforme o quadro a seguir: EIXO MEMRIA E PATRIMNIO Priorizar as crianas como pblico (e como criadoras) nos museus e instituies culturais, sob uma perspectiva crtica. Garantir espaos de convvio entre geraes. Painel das ideias-fora relacionadas a diretrizes e aes nos eixos fomento, comunicao e memria/patrimnio Estimular o aprendizado com a prpria faixa gerao (criana aprender com criana) na infncia. Valorizar a prpria cultura. Difundir nacionalmente as produes voltadas para crianas. DIRETRIZES EIXO FOMENTO Garantir, preservar e incentivar a cultura do brincar. Garantir, preservar e incentivar a produo cultural de qualidade para crianas. Valorizar o ldico, a oralidade e o brincar como a construo de saberes, avesso educao racionalista e fragmentada. Destinar oramento para o segmento cultura na infncia. Reconhecer a criana como produtora e criadora. Difundir em mbito nacional as produes voltadas para crianas. AES Formar Agentes de Cultura na Infncia. Formar educadores e pais para a compreenso da criana, da infncia, do brincar, da TV... Criar um programa cultural da infncia. Investir em trabalhos com os cuidadores e educadores que apresentem brincadeiras, e incentivar a leitura por meio do ldico. Incluir produo de contedo pelo poder pblico. Elaborar editais para prticas do brincar. Produzir para as crianas. Estimular a memria histrica, os mitos e as tradies brasileiras. Apostar na cultura na infncia para construo e afirmao da cultura brasileira. Atuar junto aos adultos para formar a conscincia do ser criana. OUTRAS IDIAS Definir a natureza como o espao primeiro do brincar (fogo, terra, gua, ar). Estimular o contato da criana com a natureza e o meio ambiente nos espaos de socializao (familiar, escolar, bairro, etc.). Resgatar a unidade do ser, integrando o conhecimento racional ao ldico e subjetivo Incluir crianas e adolescentes atuantes nos debates sobre a cultura, infncia, brincadeira e diversidade. Criar um grupo de trabalho da cultura da infncia. OUTRAS AES Efetuar mudanas nos espaos e prticas escolares, garantindo que esses espaos sejam para as crianas, o que assegurar um menor ndice de analfabetos funcionais e insatisfeitos: crianas e educadores. Propor debates e aes que questionem as relaes de poder centradas no universo adulto e que abram espao voz e ao olhar infantil. O espao da poesia da criana. AES Efetuar levantamento de iniciativas no Brasil sobre trabalhos realizados para a infncia.
DIRETRIZES EIXO COMUNICAO Formar audincia crtica e consciente da estrutura da indstria cultural (inclusive professores). Preservar a integridade corporal das crianas nos meios de comunicao visual. Gerar mecanismos para a criao de um processo crtico na criana a respeito dos meios de comunicao de massa (TV, internet...). Compreender a tecnologia como ferramenta de aproximao entre adultos e crianas. Criar poltica pblica para acompanhar os contedos veiculados pelas mdias para crianas. Utilizar a tecnologia para desenvolvimento da criana. Democratizar o acesso s ferramentas tecnolgicas.
AES
Resultado da Plenria
Aps a apresentao dos resultados dos grupos de trabalho pelos respectivos relatores, houve a leitura das diretrizes, a apresentao de destaques e seu debate pela plenria. Concluda a reviso das diretrizes dos trs eixos, os participantes se dedicaram reviso das aes sugeridas. Ao final, a oficina aprovou as seguintes propostas de diretrizes e de aes para insero no Plano Nacional de Cultura. Discutir a questo: TV para bebs - estmulo ou convite passividade? Ampliar o universo das crianas por meio da televiso criana vendo criana.
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Diretrizes e Aoes
DIRETRIZES E AES PARA A CULTURA NA INFNCIA. EIXO FOMENTO
RECOMENDAES GERAIS: Articular as polticas pblicas voltadas cultura para as crianas e adolescentes. Criar um fundo nacional de cultura da criana com recursos da iniciativa privada e gerenciado pela Secretaria da Identidade e da Diversidade Cultural do MinC. DIRETRIZES AES
1. Propor ao Congresso Nacional a criao de uma lei que fomente a cultura da criana. 2. Criar um grupo de trabalho interministerial, sob a coordenao da SID, para identificar e mobilizar recursos para aes de cultura na infncia. 3. Criar mecanismos de financiamento com carter de continuidade para fomento da cultura na infncia (editais, convnios, etc).. 1. Promover a capacitao de agentes multiplicadores da cultura na infncia. 2. Promover a ocupao de equipamentos pblicos (escolas, praas, bibliotecas) como espao de fruio da cultura na infncia. 3. Garantir a pauta da cultura na infncia nos conselhos de direito da criana, integrando as aes da cultura na infncia. 1. Promover aes de intercmbio internacional, nacional e regional entre as diversas culturas da infncia, contemplando a diversidade. 2. Capacitar adultos para o dilogo com a criana, permitindo sua produo. 1. Promover aes integradas com o MEC que possibilitem a difuso e democratizao dos bens culturais produzidos. 2. Criar programas de formao de pblico para as mais diversas linguagens artsticas, buscando difundir e facilitar o acesso da criana produo artstica. 3. Lanar editais de fomento produo, difuso, pesquisa e manuteno do trabalho de grupos de companhias e conjuntos artsticos voltados para a criana. Ao transferida do Grupo de Trabalho Memria para o Grupo de Trabalho Fomento: Criar editais para habilitar e conveniar como Pontinhos de Cultura instituies que atuam no segmento de crianas e adolescentes. III. GARANTIR ESPACO DE CIRCULAO E EXPRESSO DA PRODUO CULTURAL DAS CRIANAS QUE ASSEGURE A SUA PLENA MANIFESTAO.
EIXO COMUNICAO
RECOMENDAES: Considerar a criana um ser integral, dotado das capacidades cognitivas, afetivas e simblicas. Ampliar e garantir o acesso aos equipamentos culturais para que as crianas tenham oportunidade e possibilidade de exercer sua expresso.
DIRETRIZES
AES
1. Formar mediadores para aes culturais e encontros, e estimular outros canais voltados para crianas. 2. Realizar oficinas e encontros, organizados pelo Minc e pela sociedade civil, em que crianas se expressem. 3. Criar canais (redes, comunidades digitais, blogs, cartas, encontros presenciais, vituais e nas mdias) para que as crianas se expressem espontaneamente. 1. Mapear, documentar, exibir e premiar produes sobre o brincar das crianas. 2. Definir a exibio obrigatria de curtas brasileiros antes da de filmes infantis internacionais nas salas de cinema (tema no discutido). 3. Garantir como contrapartida a cada publicao infantil internacional que as editoras publiquem ttulos infantis nacionais de e para as crianas, por meio de premiao, estmulo, selo de qualidade, etc. 4. Garantir veiculao sobre a cultura na infncia nos meios de comunicao. 1. Criar revistas, programas de rdio e TV e livros realizados inteiramente por crianas, a partir de suas escolhas. 2. Criar mostras internacionais, nacionais e regionais de produes de crianas. 3. Ocupar os espaos pblicos com produes culturais de crianas, aproveitando a infraestrutura disponvel desses lugares.
I. GARANTIR RECURSOS NO ORAMENTO DO MINC PARA IMPLEMENTAO DE POLTICAS PBLICAS QUE CONTEMPLEM A CULTURA, EM TODAS AS SUAS DIMENSES, DA E PARA A CRIANA.
II. VALORIZAR E FOMENTAR A CULTURA RELACIONADA AO CIDADO DE ZERO A DOZE ANOS EM TODOS OS ESPAOS E CONTEXTOS DO TERRITRIO NACIONAL.
III. GARANTIR A PARTICIPAO DA CRIANA NA FORMULAO DE POLTICAS PBLICAS, RESPEITANDO SUAS ESPECIFICIDADES.
IV. GARANTIR E MANTER O PROCESSO DE CRIAO E DESENVOLVIMENTO DA PRODUO CULTURAL PARA A CRIANA EM TODAS AS SUAS DIMENSES, BEM COMO POSSIBILITAR A DEMOCRATIZAO DO ACESSO A ESSES MEIOS.
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EIXO MEMRIA
RECOMENDAES: Garantir a primazia da criana em todo o processo de afirmao de sua cultura. Garantir que a criana se expresse na linguagem do brincar. Garantir dilogo entre as geraes e com a prpria gerao.
Diretrizes e Aoes
DIRETRIZES
AES 1. Promover a formao de educadores brincantes. 2. Realizar encontros para socializao e difuso dos saberes e fazeres da e para a cultura da criana. 3. Promover redes e troca de experincia entre aes em cultura da criana e educadores nos mbitos regional e nacional. 1. Criar e desenvolver acervos (brinquedos, documentos, suportes audivisuais) relacionados cultura na infncia. 2. Criar editais que contemplem pesquisa, recuperao de acervo e publicaes relacionadas cultura na infncia (msicas, brinquedos, brincadeiras, histrias...). 3. Publicar pesquisas na rea da cultura da criana e criar espaos de difuso (sites, centros de referncia, etc). 4. Promover poltica interministerial envolvendo o MEC para articular modos de difuso do patrimnio material e imaterial da cultura na infncia. 5. Mapear aes relacionadas cultura na infncia. 1. Manter praas e parques com atividades para crianas e famlias. 2. Criar espaos pblicos na natureza voltados convivncia de crianas. 3. Criar museus da cultura na infncia. 4. Propiciar a criao e a manuteno de centros de referncia da criana, onde haja aes voltadas para: 5. Estimular o brincar; divulgar pesquisa/estudo sobre o tema; realizar trocas entre geraes que garantam a propagao de tradies; formar educadores que atuem junto s crianas. 1. Estimular aes culturais e de mediao adequadas aos contextos das instituies culturais. 2. Elaborar editais voltados valorizao e preservao dos mestres da cultura brasileira. 3. Criar cooperativas de artesos de brinquedos populares. 4. Distribuir brinquedos populares e outros materiais para espaos voltados criana. 5. Criar aes de reconhecimento, valorizao e preservao das manifestaes orais e brincadeiras tradicionais. 6. Desenvolver dinmicas de escuta e participao de crianas na definio das aes institucionais pblicas e privadas.
Nunca houve um evento semelhante no pas. Pela primeira vez, conseguimos reunir parceiros que trabalham com o tema da infncia. Estamos num primeiro degrau, mas temos tudo para construir e precisamos manter a mobilizao.
Gabriel Guimard, Rede Cultura Infncia.
Nunca tinha visto antes tamanha abertura para se discutir a criana como sujeito e no como um objeto abstrato para o qual se fixam diretrizes sem a conscincia de quem esse ser e de que ele tem uma voz que precisa ser ouvida.
Maria Emlia Pereira, orientadora do Centro de Estudos Casa Redonda Espaos de Brincar
II. GARANTIR O DESENVOLVIMENTO DE PESQUISA, DOCUMENTAO, MAPEAMENTO E DIFUSO DA CULTURA DA CRIANA EM SUA QUALIDADE DE PATRIMNIO MATERIAL E IMATERIAL.
Precisamos criar espaos que reconheam a expresso das crianas, para que elas se manifestem como so, o que pensam e o que sentem. A oficina mostrou a necessidade de nos organizarmos e ampliarmos o dilogo com o poder pblico Assim, poderemos pensar em uma cultura da criana que seja legitimada e que tenha um lugar garantido nas polticas do Estado.
Camila Leite, do Instituto Arte Tear
Esperamos que a poltica cultural para a infncia se concretize e que essa faixa etria seja realmente valorizada no Brasil. Muita gente diz que criana um ser humano que ainda no coisa alguma. Para ns, a infncia uma fase plena, com identidade e cultura prprias.
Ilona Hertel, do Sesc/SP
III. DESENVOLVER UMA POLTICA AMPLA DE IMPLEMENTAO, VALORIZAO E ADEQUAO DE ESPAOS PBLICOS DESTINADOS AO EXERCCIO DA CULTURA DA CRIANA, PRIVILEGIANDO O CONTATO COM A NATUREZA.
A iniciativa do MinC de criar uma interlocuo com a sociedade fundamental para a construo de uma poltica verdadeiramente democrtica.
Joo Augusto Figueir, do Instituto ZeroAseis
A infncia um tema muito falado, mas pouco trabalhado pelas polticas pblicas do Estado. urgente a criao de uma poltica que articule as diversas experincias desenvolvidas no pas.
Srgio Mamberti, secretrio da Identidade e da Diversidade Cultural do MinC e atual presidente da Funarte
O evento foi um bom momento de reflexo. Muitas vezes, quem produz para a criana no tem oportunidade de pensar sobre seu ofcio. E entender o ato de brincar fundamental para quem lida com criana.
Anselmo Serrat, da Associao Picolino de Artes do Circo
IV. PROMOVER O ACESSO E A APROPRIAO DA CRIANA AO PATRIMNIO MATERIAL E IMATERIAL DA HUMANIDADE EM TODAS AS EXPRESSES CULTURAIS E DIVERSIDADE DE LINGUAGENS ARTSTICAS, CONTEMPLANDO A TRANSMISSO DE SABERES E FAZERES DA TRADIO ORAL.
Foi gratificante ver tanta gente preocupada com a questo da cultura na infncia. A criana tambm deve ser vista como prioridade nas polticas do MinC para museus e instituies culturais, com espao nos acervos para a questo do brinquedo e para a documentao da cultura na infncia.
Renata Bitencourt, coordenadora dos programas de Educao do Ita Cultural
O evento ofereceu a todos uma reflexo: do que as crianas do futuro vo brincar? Num mundo marcado pela individualidade e pela competitividade, precisamos resgatar as brincadeiras e lembrar que na infncia se aprende brincando e se aprende dividindo.
Lucia Bernardo, da Associao Viva e Deixe Viver
A oficina mostrou que temos o dever de ouvir mais as crianas e aprimorar o nosso processo de escuta, de modo a construirmos projetos que sejam, de fato, transformadores da realidade infantil.
Renata Sanches, da Fundao Orsa
As crianas abandonadas no esto somente nas periferias, mas tambm nos condomnios de luxo. H uma frase do escritor uruguaio Eduardo Galeano que diz: Num bar de Madri um cartaz informa: proibido cantar perto do balco. No aeroporto do Rio de Janeiro, muitos cartazes informam: proibido brincar com os carrinhos de bagagem. Ou seja, ainda existe gente que canta. Ainda existe gente que brinca.
Cludio Thebas, o palhao Olimpo
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ISBN 978-85-89322-03-4
788589 322034
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