A Filosofia de Deleuze
A Filosofia de Deleuze
A Filosofia de Deleuze
5 A experincia dos encontros ................................................... Sentir e pensar nos encontros................................................. Sentir e pensar de outro modo nos encontros........................ A intensificao nos encontros............................................... A disparao intensiva nos encontros.................................... A proliferao intensiva.......................................................... Como percorrer os encontros conceituais deleuzeanos?..... tica dos encontros.................................................................. III. Dez conceitos........................................................................................22 Atual e virtual........................................................................... Complicao.............................................................................. Corpo.......................................................................................... Corpo sem rgos...................................................................... Devir............................................................................................ Hecceidade.................................................................................. Linha de fuga.............................................................................. Multiplicidade............................................................................ Plano de imanncia.................................................................... Sntese disjuntiva........................................................................ IV. V. VI. Percursos e influncias..........................................................................26 Bibliografia..............................................................................................30 Dados a respeito do autor do ensaio......................................................32 ***
2 I. O filsofo e o seu tempo Gilles Deleuze nasceu em Paris no dia 18 de janeiro de 1925, s 2:45. Recordando a infncia 1, diz que sua me era a melhor das mulheres e que seu pai, engenheiro, era um homem delicado, benevolente e charmoso. Por ser proprietrio de uma empresa de impermeabilizao de telhas, diz-se que a famlia era burguesa e apavorada com a corroso financeira dos anos 30: crise econmica, somavam-se as medidas populares tomadas pelo Front Populaire (1936-1937). Enfraquecido seu prprio negcio, o pai passou a trabalhar para outra empresa. Nessa tensa atmosfera, marcada por lutas sociais, reacionarismo, antisemitismo e guerra que Gilles vivia sua infncia, assim como seu irmo, Georges Deleuze, um pouco mais velho que ele. A respeito do irmo, Gilles mostra-se discretssimo nas entrevistas. Mas, sem dvida, o destino de Georges trouxe para muito perto de Gilles uma dor que se espalha com a invaso nazista: que Georges, cursando o secundrio no Liceu Carnot, em Paris, e participando, como outros jovens, do movimento de Resistncia, foi preso e morto no trem que o conduzia ao campo de concentrao de Auschwitz. A ocupao nazista j provocara no adolescente Gilles uma descoberta: deixei de ser idiota, diz. que, crescendo numa famlia inculta e sendo um jovem extremamente medocre nos primeiros anos escolares, sem interesse algum, sua oportunidade de acordar dependia da complexidade de outros encontros, como ainda conceituar sua filosofia. Esse acordar no ficou s na oposio aos intolerveis. Por exemplo, beira-mar, em Deauville, onde, por um tempo, os meninos ficaram sob os cuidados de uma dona de penso, foi-lhe marcante ver pessoas que olhavam o mar pela primeira vez, imersas na experincia do prodigioso, do esplndido, do inimaginvel, do sublime e grandioso. Admirou uma jovem de Limousin contemplando o mar durante horas. Tanto esse ver que v Vises quanto o ouvir que ouve Audies precisa dos outros. Quando se acordado num certo momento, a gente acordado por algum, diz ele ao recordar a bela voz com que Pierre Halbwachs, ento professor em Deauville, lia com entusiasmo aos alunos, e a ele em
As anotaes entre aspas so extradas das letras E (Enfance Infncia), F (Fidlit Fidelidade) e P (Professeur Professor) de LAbcdaire de Gilles Deleuze, entrevista a Claire PARNET realizada por P. A. Boutang em 1988 e transmitida em srie televisiva a partir de novembro de 1995 pela TV-ART, Paris: Vdeo Edition Montparnasse, 1996. Sobre o esquerdismo de Deleuze, ver letra G (Gauche Esquerda).
3 particular, textos de Baudelaire, de Anatole France, de Gide... encontros que lhe abriram o mundo da literatura e o impressionaram enormemente 2. Descobre a filosofia nas aulas do professor Vial, em 1943, no Liceu Carnot, naquela Paris invadida 3. Ouviu que havia coisas estranhas, os conceitos, as idias de Plato, e isto lhe pareceu muito vivo, animado, algo que era para mim, diz. Desde ento, nunca mais teve problemas escolares: em letras e filosofia, tornei-me muito bom aluno. Entre 1944 e 1948, cursou filosofia na Sorbonne. Admirava seus professores e ganhava novos amigos 4. Nessa Paris da Libertao, aos 22 anos, em 1947, sob a direo de Hippolyte e Canguilhem, Deleuze obtm seu Diploma de Estudos Superiores sobre David Hume (1711-1776), estudo que ganhar excepcional acolhida acadmica 5. Em 1948, passa pelo concurso que lhe d o direito de ensinar histria da filosofia no secundrio e na universidade. Neste momento, JeanPaul Sartre (1905-1980) traz a ele novos ares e novas maneiras de pensar 6. Entre 1948 e 1957, lecionou no Liceu de Amiens (uma cidade livre), no de Orlans (uma cidade severa) e no Louis-le-grand em Paris. Depois, e j casado com Fanny (Denise Paule) Grandjouan em 1956 7, torna-se assistente na Sorbonne em histria da filosofia entre 1957 e 1960, e pesquisador ligado ao Centro Nacional de Pesquisas Cientficas (CNRS) at 1964; ensina na Faculdade de Lyon entre 1964 e 1969. admirvel sua capacidade de trabalho nesses anos 8. No intervalo dessas obras, em 1962, teve seu primeiro encontro com Michel Foucault (1924-1984). Considerava-o o maior pensador atual, o maior filsofo moderno, dedicando-lhe o livro Foucault (1986). Ambos
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Dois anos antes de sua morte, Deleuze diz que a literatura, atravessada por uma vida, pode levar a linguagem a uma reviravolta, a um limite, a um fora ou a um avesso que consiste em Vises e Audies que j no pertencem a lngua alguma e que no so fantasmas, mas Idias que o escritor v e ouve nos interstcios, nos desvios de linguagem. Cf. A literatura e a vida (1993), em Critique et clinique (1993). 3 Ele v que h os indiferentes situao poltica, que h os partidrios do governo que se rendeu Alemanha nazista em 1940; mas ele tambm sente a presena dos jovens resistentes, os rumores que espalham a histria de Guy Moquet, fuzilado em 1941 pelos ocupantes; e no ano seguinte, em 1944, sentir os rumores que comunicam o massacre praticado pelos nazistas na cidade de Oradour-sur-Glane vitimando mais de 600 civis no dia 10/06/1944, incluindo mulheres e crianas. 4 Professores como Ferdinand Alqui, Georges Canguilhem, Maurice de Gandillac, Jean Hippolyte. Alm dos amigos que j tinha (Michel Tournier e os irmos Claude e Jacques Lanzmann), ganha outros, como Michel Butor, Olivier Revault dAllones, Jean-Pierre Bamberger e Franois Chtelet, a quem homenagear com o livro Pricles e Verdi A filosofia de Franois Chtelet (1988). 5 Empirismo e subjetividade (1953). 6 Ver Il a t mon matre (1964), em A Ilha deserta (2002). 7 Os filhos Julien Deleuze e Emilie Deleuze nascem em 1960 e 1964, respectivamente. 8 Alm de dois importantes artigos sobre Bergson na dcada de 50, publica Nietzsche e a filosofia (1962), A filosofia crtica de Kant (1963), a primeira edio de Proust e os signos (1964; a 2 ed. vir em 1976), o pequeno Nietzsche (1965), O Bergsonismo (1966) e Apresentao de Sacher-Masoch (1967).
4 reformularam o modo de pensar a relao dos intelectuais com o poder. Unia-os forte admirao mtua, rarssimo exemplo de fecunda ligao de diferenas intelectuais entre pensadores vivos 9. A partir de 1969 at sua aposentadoria em 1987, Deleuze sentiu-se um professor feliz ao ministrar, na Universidade de Paris VIII-Vincennes, cursos que se tornaram famosos, muitos dos quais correm pela Internet. Seja nas obras j referidas, seja nos cursos, Deleuze j impunha sua maneira prpria de mover-se em estudos filosficos e literrios. Mas a prova disso incontestvel em Diferena e repetio (1968), a obra que estabelece com exaustivo rigor a problemtica de uma filosofia da diferena, prova secundada de um modo disciplinado por Espinosa e o problema da expresso (1968), e, de um modo livre, por Lgica do sentido (1969), alm do pequeno Espinosa (1970), ampliado em Espinosa Filosofia prtica (1981). Antes dessa ampliao, e j com os devires colhidos nos encontros de Maio de 1968, temos a veemente radicalizao dessa filosofia em obras que contaram com a importantssima colaborao de Flix Guattari (1930-1992), e que ressoam nos mais variados campos culturais: O Anti-dipo (1972), Mil plats (1980) e O que a filosofia? (1991), trs grandes e distintos movimentos da srie Capitalismo e Esquizofrenia. Salientemos ainda o bloco de obras que do testemunho dos encontros que Deleuze intensificou entre filosofia e artes mundo 11. Mas quando o corpo, doente, j no pode reiterar a vitalidade dos encontros, uma velha tarefa grita sua urgncia: a de conceber a prpria morte e afirmar alguma potncia num lance final. Deleuze suicida-se em Paris no dia 4 de novembro de 1995 12. ***
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entrevistas e artigos escritos ao longo de uma vida filosfica e eticamente atenta ao seu
Para avaliar o alcance desse respeito mtuo, cf. tambm Michel Foucault, Theatrum philosophicum, Paris: Critique, novembro de 1970, n 282, republicado, primeiramente, em M. Foucault, Dits et crits, Paris: Gallimard, 1994, tomo II, texto 80, pp. 75-99, e, depois, no cinqentenrio daquela revista: Critique, agostosetembro de 1996, n 591-592, pp. 703-726. 10 Alm dos referidos Proust e Sacher-Masoch, temos: Kafka Por uma literatura menor (com Guattari 1975), Superpositions (com Carmelo Bene 1979), Francis Bacon: Lgica da sensao (1984), Cinema 1. A imagem-movimento (1983), Cinema 2. A imagem-tempo (1985). Por que no incluir A dobra. Leibniz e o Barroco (1988)? E por que no Pricles e Verdi (1988)? Incluo O esgotado (1992) e Crtica e clnica (1993). 11 Dilogos (com Claire Parnet 1977 e 2 ed. 1996), Conversaes 1972-1990 (1990), A Ilha deserta e outros textos 1953-1974 (2002) e Dois regimes de loucos 1975-1995 (2003). 12 Sobre homenagens pstumas, ver Cadernos de Subjetividade, So Paulo: Educ, n especial, Gilles Deleuze (Org. por Peter Pl Pelbart e Suely Rolnik), junho de 1996.
5 II. A filosofia de Deleuze A experincia dos encontros No conjunto dos seus escritos, entrevistas e aulas, Deleuze consolidou conceitualmente uma determinada filosofia da experincia: a experincia da complexidade dos encontros. Do abstrato ponto de vista dos ismos, essa filosofia no se define como um empirismo vulgar e nem como um dogmatismo, pois ela quer evitar tanto o erro empirista de deixar exterior o separado quanto o erro dogmtico de sempre preencher o que separa. O que ela quer assinalar o ponto crtico em que a diferena, como diferena, exerce a funo de reunir no sentido de um diferencial capaz de reunir heterogneos que ela se define como empirismo transcendental 13. Se acharmos que uma tal filosofia complica as coisas, ela nos responder que a complicao j est nos prprios encontros. Em nossos estados de vivncia comum, nesses estados de no-filosofia, sentimos que uma admirao, um espanto ou um susto em face de algo uma experincia complexa que nos lana para dimenses no contidas nesse algo, mas que nele insistem. Todo encontro ordinrio est exposto a uma reviravolta instantnea que pode projetar tudo para fora dos eixos. como se a prpria vida se sentisse abalada por esse vinco em que uma experincia ordinria dobrada junto a outra, a extraordinria. Pressentimos que a efetiva complexidade da experincia dos encontros depende do que se passa nessa dobra, razo pela qual manteremos nosso nimo aberto sua explicitao. Cada um sente e exprime a seu modo essa ocorrncia simultnea de linhas divergentes, a estranha dobradura na qual os juntados experimentam seu prprio vnculo como sendo aquilo que os lana num tempo fora dos eixos: o fantasma que aparece a Hamlet, revelando que sua me e seu tio assassinaram seu pai, um lance complicando sua situao, a sensao de um eu rachado e de um tempo que no se reconcilia consigo mesmo. o que diz a singular expresso de Shakespeare: o tempo est fora dos gonzos 14. Deleuze leva esta e outras frmulas poticas ao encontro de subverses kantianas. Neste caso, a subverso consiste em pensar o tempo como forma autnoma, forma imutvel da mudana e do movimento, a forma pura da determinao pela qual o eu penso determina o eu sou. Com isso, esse eu ganha a rachadura que no se nota
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Diffrence et repetition, pp. 221 e 187. Tr. br. : 1 ed., pp. 278-279 e 237 ; 2 ed., pp. 244 e 209. Shakespeare, Hamlet, I, 5 (The time is out of joint).
6 na frmula cartesiana do cogito: penso, logo existo experincia pedindo passagem. Por que esse flerte com uma subverso kantiana? Quando Deleuze cria ou apreende uma ressonncia como essa entre Hamlet e Kant, vemos que a complexidade da experincia dos encontros insinua-se tambm na elaborao conceitual. que essa ressonncia romntica, criada entre o filsofo e o personagem literrio, passa por referncias a combinaes de um novo conceito de tempo. Essas combinaes ocorrem num plano que se erige medida que um filsofo tomado pela criao dos seus conceitos. Portanto, pensar conceitualmente os encontros exige dedicao aos prprios encontros conceituais. Sem essa dedicao no se entra em filosofia alguma, dedicao que tambm a do empirismo, pois ele trata o conceito como o objeto de um encontro, como um aqui-agora 16; e Zourabichvili acerta ao dizer que a exposio dos conceitos a nica garantia de um encontro com um pensamento 17. Para Deleuze e Guattari, ao lado da arte e da cincia, o pensamento filosfico uma das trs grandes formas ou vias de pensar. Sem hierarquia, elas so basicamente definidas pela comum tarefa de enfrentar o caos. Mas cada uma erige seu prprio e distinto plano de exerccio do seu modo de pensar. Enquanto a arte pensa por sensaes, traando um plano de composio, enquanto a cincia pensa por funes, traando um plano de coordenadas, a filosofia, ao enfrentar a catica dos encontros, traa um plano de imanncia que se erige medida que ela pensa por conceitos
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. a complexidade da
experincia nos expe a uma dupla impregnao: a da prpria catica dos encontros seja l com o que for e a do vai-e-vem vertiginoso, voltiginoso 19, que os conceitos exibem nos variados encontros mtuos a que so levados por problemas a que tm de corresponder.
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Gilles Deleuze, Sur quatre formules potiques qui pourraient rsumer la philosophie kantienne (1986). Ver Critique et clinique, pp. 40-49. Tr. br. pp. 36-44. Ver tambm Deleuze e Guattari, Quest-ce que la philosophie ?, Exemplo 1, pp 29-31 ; tr. br. pp. 37-40. 16 Diffrence et rptition, p. 3. Tr. br. : 1 ed., p. 17 ; 2 ed., p. 17. 17 Franois Zourabichvili, Le vocabulaire de Deleuze, Paris : Ellipses, 2003, Introduo, item 2 18 Quest-ce que la philosophie ?, pp. 186, 187 ; tr. br., 253, 254. 19 Em Ave, Palavra (12/20), voltiginoso um intensificador que Guimares Rosa pe em companhia de peresperto numa expresso que diz uma viso de colibris: depois, mudam com a luz, bruxos pretos, uns sacis de perespertos, voltiginosos, eltricos, com valores instantneos. Cf. Nilce SantAna Martins, O Lxico de Guimares Rosa, So Paulo: Edusp, 2001.
7 Esses problemas no so verborragias, como os tais eternos problemas da filosofia, que seriam sanveis por uma higienizao da linguagem. So problemas que ganham sua objetiva verdade numa pragmtica dos encontros20. Com efeito, em O que a filosofia?, os conceitos ganham sentido por corresponderem dinamicamente a problemas que lhes transferem uma fora de autoposio, de modo que eles, irredutveis arbitrariedade subjetiva ou ao simples engajamento discursivo do filsofo, implicam um modo de inveno sensvel ao carter problemtico dos encontros. Desde o primeiro livro de Deleuze, esse carter efetivamente problemtico est numa relao de imanncia com a circunstancialidade dos encontros e j se insinua na idia de que os encontros constitutivos do prprio sujeito implicam relaes exteriores aos termos relacionados21. Em outro escrito, Deleuze deixa ver que a prpria voz incide na dinmica dos encontros conceituais:
a filosofia a arte de inventar os prprios conceitos, de criar novos conceitos dos quais temos necessidade para pensar nosso mundo e nossa vida. Deste ponto de vista, os conceitos tm velocidades e lentides, movimentos, dinmicas que se estendem ou se contraem atravs do texto: eles no remetem a personagens, mas so eles prprios personagens, personagens rtmicos. Eles se completam ou se separam, confrontam-se, estreitam-se como lutadores ou como apaixonados 22 .
Sentir e pensar nos encontros Isso nos leva a perguntar por conceitos deleuzeanos que nos ajudem a pensar o que se passa na dobra de complicao dos encontros, a pensar aquilo que nos liga experincia dos encontros, s circunstncias de suas ocorrncias, ao que nos abre ao seu jogo de foras, ao que nos absorve em suas tenses etc. Lembremo-nos de uma das frases ditas por Deleuze ao recordar sua infncia: quando se acordado num certo momento, a gente acordado por algum. A cada instante, um problemtico alvoroo de encontros vai golpeando o meio da nossa imerso vital. O encontro com algum ou algo de fora propicia e at mesmo impe, por vezes muito violentamente, a experincia de variaes no simplesmente autodeterminadas. O encontro no s importante para acordar a gente, para nos fazer sentir nossa situao de outro modo, pois ele tambm
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Eis a primeira regra que Deleuze extrai de Henri-Louis Bergson (1859-1941): Aplicar a prova do verdadeiro e do falso aos prprios problemas, denunciar os falsos problemas, reconciliar verdade e criao no nvel dos problemas. Le Bergsonisme, p. 3. Tr. br., p. 8. 21 Empirisme et subjectivit, p. 109-110 . Tr. br., p. 110-111. 22 Deleuze, Ce que la voix apporte au texte (1987) O que a voz proporciona ao texto (1987), em Deux rgimes de fous, Paris: Minuit, 2003, p. 303.
8 ocorre na experincia de outros verbos do viver, como imaginar, memorar, falar... e tambm pensar, caso este que nos interessa particularmente, pois o prprio encontro com o pensamento de um filsofo acaba nos dando o que pensar, acaba nos forando a pensar a prpria diferena que o atrai e que nos contamina. Dentre as linhas que nos ligam experincia dos encontros, duas delas gozam de um privilgio que se reitera h sculos. Trata-se de sentir e pensar. Quando Deleuze retoma conceitualmente os encontros, notamos que ele elabora uma singular relao entre sentir e pensar. O que o atrai nessa nova elaborao? O que o atrai aquilo que determina seu destino, sua fortuna, seu fado, sua sorte na histria da filosofia: a problemtica da diferena embutida nos encontros. A relao entre sentir e pensar foi reelaborada graas a essa nova problemtica, justamente porque se tornou possvel notar o quanto, nos encontros, algo impunha a cada uma dessas linhas uma fissura at ento insuficientemente tematizada. A mera pluralidade dos sentidos no diz o drama que se passa quando, ao romper a prpria tecedura do sentir, uma fissura propaga-se como raio e vem fissurar o pensar, o imaginar etc. Isto impe a Deleuze a tarefa de corresponder conceitualmente a essa dramaturgia. A frmula resumidora disso esta: eis-nos forados a sentir e a pensar a diferena23. Ento, a pergunta pelo que se passa na dobra de complicao dos encontros deve agora se aproximar de outra pergunta: aquela interessada no modo pelo qual certa idia de diferena atua nessa dramaturgia em que sentir e pensar so ditos afetados por uma fissura que, duplicando-os, impe uma reviso de suas relaes. Com efeito, Deleuze contraria toda uma tradio que, segundo ele, erigiu uma imagem dita dogmtica do que significa pensar. Como forma da representao, essa imagem simplifica o problema: algo impressiona nossos sentidos, nossa percepo o apreende, e nosso pensar o representa a partir do esforo voluntrio, do exerccio natural de uma faculdade; essa faculdade de pensar estaria por si mesma, desde o seu ntimo, dotada de uma afinidade com o verdadeiro, de modo que o pensador, enquanto tal, se caracterizaria por uma boa vontade, assim como seu pensamento se caracterizaria por uma natureza reta, atribuindo-se os erros e desacertos a paixes, a uma falta de mtodos etc.24. Trata-se de subverter essa forma, essa imagem
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Diffrence et rptition, p. 293. Tr. br., 1. ed. p. 363; 2 ed. p. 320. Diffrence et rptition, p. 171. Tr. br.: 1 ed., p. 218; 2 ed., p. 192.
9 representativa ou recognitiva que escamoteia o que efetivamente se passa quando sou levado a sentir, a pensar etc. E como Deleuze faz isso? Ele o faz, chamando a ateno para a prpria experincia de encontros que, disparando a sensibilidade, disparam o pensar. Em aliana com Proust, ele dizia que o pensamento nada sem algo que force a pensar, que faa violncia ao pensamento 25. Isto no quer dizer que, no encontro, no haja conscincia do algo encontrado: pode ser fulano, que reconheo pelo semblante ou pela voz, pode ser determinada favela, que reconheo por ter vivido em seu labirinto etc. Do mesmo modo, no encontro, aquele que percebe esse algo tem conscincia de o estar apreendendo com alegria ou dor. Porm, se o encontro ficasse apenas nisso, nesse nvel da conscincia de algo e na conscincia dos sentimentos pessoais, ento no se poderia, rigorosamente, cham-lo de fundamental, do ponto de vista da problemtica que nos ocupa. Digamos que um encontro desse tipo, isto , nesse nvel, no s inevitvel como necessrio, til etc. do ponto de vista da sobrevivncia, dos passeios, da vida em geral. Ele est presente em qualquer circunstncia e funciona na comum apreenso das situaes. So encontros extensivos. Sentir e pensar de outro modo Como o plano de organizao dos encontros extensivos no esgota a problemtica dos encontros, precisamos retomar a pergunta: concretamente, que ocorre nos encontros que Deleuze considera fundamentais, encontros que pem em jogo uma outra experincia de exerccio das faculdades de sentir, de memorar, de imaginar, de pensar etc? Num encontro dito fundamental, o que se passa um processo complexo: suponhamos que eu, neste aqui e agora, neste atual presente em que vivo, esteja saboreando a qualidade sensvel deste gostoso e leve bolinho chamado madalena, como aquela de Proust, por exemplo; e suponhamos que, como Proust, esse encontro gustativo com a madalena desencadeie em mim uma alegria to singularmente intensa que no posso atribu-la apenas a isto que me foi dado neste encontro, a esta qualidade sensvel do bolinho na minha boca; assim como no posso explic-la recorrendo a lembranas do vivido por mim no passado. Por que? Porque essa intensa alegria, que s pode ser sentida, abre-me a estados aos quais sou involuntariamente lanado; impe-me
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10 atmosferas que transbordam situaes vividas; abre-me a virtualidades que insistem naquilo que me foi dado no encontro, mas que no aparecem no prprio dado. Ora, um encontro desse tipo no um encontro qualquer. Vejamos. certo que tambm aqui, como nos encontros extensivos, temos conscincia dos partcipes: ficamos alegres ou levamos um susto quando encontramos Scrates, o templo ou o demnio; e temos conscincia de estarmos apreendendo a presena dessas companhias sob tonalidades afetivas diversas, admirao, amor, dio, dor. Ou seja: mesmo um encontro fundamental comporta as sries das diferenas extensivas que, num encontro marcadamente extensivo, so aparentemente as nicas; vale dizer: nunca estamos totalmente livres do senso comum, de modo que nos reconhecemos contentes ao saborear a madalena, que ela um sensvel na recognio, isto , que conta com o acordo pelo qual os sentidos (viso, paladar etc), em seu exerccio emprico, reportam-se a um objeto (a madalena) que pode ser lembrado, imaginado, concebido. De repente, porm, a intensidade da alegria fissura a linha do sentir, escapa das ligaes recognitivas comandadas pelo senso comum, com o que a linha do pensar tambm fissurada, pondo em nocaute o voluntarismo e a boa vontade do pensador. E at uma lgrima pode saltar, forando-nos a perguntar pelo que se passa nesse estranho instante que lanceta passado e futuro simultaneamente. Paradoxo: a filosofia um modo de pensar por conceitos, mas o pensamento no seria suficiente, por si, para chegar necessidade do que pensado ou prpria necessidade de pensar. O que preciso ocorrer para que haja essa dupla necessidade? Eis como Deleuze encaminha a resposta numa frase que escancara sua filosofia intromisso do fora, isto , ao acaso do encontro: no contemos com o pensamento para assentar a necessidade relativa do que ele pensa; contemos, ao contrrio, com a contingncia de um encontro com aquilo que fora a pensar, a fim de realar e erigir a necessidade absoluta de um ato de pensar, de uma paixo de pensar. o cuidado com essa abertura aos encontros que justifica o combate pela destruio da imagem de um pensamento que pressupe a si prprio e que se julga capaz de fixar um fundamento das coisas. E uma outra afirmao acrescenta mais um ponto nesse combate: h no mundo alguma coisa que fora a pensar. Este algo o objeto de um encontro fundamental e no de uma recognio.
11 Primeiro, no sabemos ainda como opera esse algo. Por isso, no antecipamos o seu nome. Mas, pela frase, desconfiamos que essa alguma coisa no se esgota como objeto para o pensamento de um sujeito pronto e recognitivo, j que posta como objeto de um encontro fundamental. Por que fundamental? Porque, em primeiro lugar, esse estranho objeto cintila na fissura da linha sentir. Essa fissura tal que o vetor determinante nessa linha deixa de ser aquele dominado pelo senso comum, ou seja, no mais aquele do seu exerccio emprico (exerccio ordinrio, embora importante), aquele pelo qual a qualidade sensvel do dado recebida pelo sentido (a simples doura da madalena presente ao paladar); o vetor agora determinante o da sensibilidade elevada ensima potncia, sensibilidade que nasce momentaneamente na linha do sentir, que nasce por fora do que provocou a fissura e daquilo que nela cintila, cintilao que insiste no dado, embora no aparea como o dado (a intensidade da alegria, no exemplo da madalena de Proust). a esse estranho objeto de um encontro fundamental que Deleuze d o nome de signo 26 . A intensificao nos encontros Por que dissemos que esse objeto, o signo, estranho? Por uma razo aparentemente simples, mas que mostra a preocupao nietzscheana de Deleuze de colocar seus conceitos a servio do caso: ento, se algo no suscitar alguma estranheza na prpria experincia de encontr-lo, j no posso conceitu-lo como signo. Com efeito, se eu consigo submeter esse algo a uma identificao na situao do encontro, se posso tom-lo como semelhante a seja l o que for, se consigo confront-lo com outra coisa que penso ser-lhe oposta ou se me dado encontrar uma analogia entre ele e outro fenmeno, ento esse algo j estar de antemo enredado por macro-operaes que o submetem ao meu senso comum, ao meu poder (ilusrio ou no) de represent-lo. Eu o submeto imagem representativa do pensamento, ao grande jogo dessa qudrupla sujeio, como diz Deleuze, em que s pode ser pensado como diferente o que idntico, semelhante, anlogo e oposto, esses quatro guardies da representao 27. Mas
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Diffrence et rptition, p. 182. Tr. br.: 1 ed., p. 231; 2 ed., p. 203. O Eu penso o princpio mais geral da representao, isto , a fonte destes elementos e a unidade de todas estas faculdades: eu concebo, eu julgo, eu imagino, eu me recordo, eu percebo - como os quatro ramos do Cogito. E, precisamente sobre estes ramos, crucificada a diferena. Qudrupla sujeio, em que s pode ser pensado como diferente o que idntico, semelhante, anlogo e oposto; sempre em relao a uma identidade concebida, a uma analogia julgada, a uma oposio imaginada, a uma similitude percebida que a diferena se torna objeto de representao. Ver Diffrence et rptition, p. 180. Tr. br.: 1 ed., p. 228-229; 2
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12 quando a estranheza de algo me pega, sinto sem esoterismos a fragilidade desse poder de sujeitar e de fazer de cada coisa um diverso no meio de outros, ou de tom-la como parte de um funcionamento extensivo qualquer etc. Ento, ela me pega como signo, provocando variaes em meu poder de ser afetado, forando-me a sentir, a memorar, a imaginar... a pensar de outro modo, quer dizer, sem o apoio dos dispositivos de simplificao dos meus encontros, dispositivos de fixao de identidades, de semelhanas, de oposies e de analogias. Na reconstruo conceitual deleuzeana, o prprio encontro pensado como relao complexa, uma relao que comporta linhas heterogneas. Conforme o que se passa nessas linhas, o prprio encontro varia: marcado como extensivo, quando as diferenas empricas so dadas a afeces e percepes que o pensamento representa por meio de categorias sobrepostas; mas ele pode ser marcado como encontro intensivo, quando fluxos de intensidades passam pelas linhas. Experimentados como vibraes
13 de corpos sem rgos 28, esses fluxos abrem afectos e perceptos, isto , outros modos
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meio a percepes moleculares, micro-fenmenos, micro-operaes... um mundo de velocidades e de lentides sem forma, sem sujeito, sem rosto, mobilizado
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extremamente os encontros intensivos. Mas tambm do ponto de vista do exerccio do pensamento. Com efeito, ao mesmo tempo em que afirmam que o essencial est nas foras, nas densidades e nas intensidades, e no nas formas e nas matrias, preciso entender o seguinte: a seleo valorativa do intensivo ressoa com uma tendncia filosfica moderna, esta idade do csmico, dizem. Pois bem, em Deleuze e Guattari, essa tendncia quer exigir mais do prprio ato de pensar. Por que? Porque se trata de elaborar material de pensamento para captar foras no pensveis em si mesmas. O problema filosfico dessa tendncia no o de um comeo e muito menos o de uma fundao-fundamento. Trata-se, isto sim, de um problema de consistncia ou de consolidao: como consolidar o material, torn-lo consistente, para que ele possa captar, no plano de imanncia que ele erige medida que traa seus conceitos, essas foras no sonoras, no visveis, no pensveis? Neste ponto, esta filosofia retoma seus encontros dionisacos com as artes. Dionisacos, porque no se trata simplesmente de uma comunicao extensiva entre idias ou conceitos dominadores e fragmentos de arte
19 intensivos 31. A disparao intensiva nos encontros Empregamos a palavra intensidade, pressupondo que ela exprima um conceito, mas no temos ainda uma idia dele. Sabemos que ele opera na determinao do signo como aquilo que, intensificando o sentir, nos fora a pensar. E j devemos destacar um detalhe. Dizer que ele nos fora a pensar j diz-lo portador de uma relao da fora com a fora. Essa relao, ou cruzamento de foras, implica o elemento diferencial da fora (fora dominante / fora dominada) que Deleuze, em seus encontros com
20 Nietzsche, liga idia de vontade potncia 32. Afirmar que esse elemento diferencial a nietzscheana vontade de potncia quer dizer o seguinte: como elemento diferencial
21 que essa vontade est em seu mais elevado grau, em sua forma intensa ou intensiva
22
33
intensidade pura, que a idia de vontade de potncia se desprende do gosto nietzscheano pela energtica, do interesse pela fsica das quantidades intensivas, e opera na idia de um diferenciador da diferena e de um critrio de seleo dos encontros, seleo duplamente orientada: tanto na direo de uma tica, como veremos,
23 quanto em prol de um pensar mais exigente, pois que coligado ao esforo por
24 desprender a forma superior de tudo o que , ou seja, a forma de intensidade 34. No caso do signo, sua forma superior (a que no se reduz s qualidades sensveis de uma de suas faces) justamente aquela pela qual a intensificao do sentir fora o ato de pensar. Por que isso ocorre? Por que se desprende essa forma intensiva superior? Nessa filosofia, no podemos buscar a causa dessa superioridade num transcendente externo ou interno ao sujeito pensante. Ento, temos de buscar na prpria imanncia dos encontros a operao pela qual as diferenas disparam por intensificao. Nessa imanncia dos encontros, qualquer coisa pode ser signo, desde que seja portadora de um sistema de diferenas ou de diferenciaes complexas em que haja uma disparao intensiva. Algo signo quando ocorre por disparao num sistema dotado de dissimetria, num sistema em que h disparatadas ordens de grandeza. Deleuze diz ainda que o signo (ou o fenmeno) fulgura no intervalo dos disparates, pondo a a vibrar uma estranha comunicao. Propriamente falando, o signo um efeito de sries divergentes, efeito composto de dois aspectos: um pelo qual, enquanto signo (propriamente dito) ele exprime a dissimetria produtora; o outro (seu aspecto de dado
25 atual) pelo qual ele tende a anular a prpria dissimetria produtora 35. sob este ltimo aspecto que ele ainda deixa um flanco aberto a macro-apropriaes redutoras do seu impacto, como quando se diz que aquela intensa alegria proustiana, no exemplo j referido, remetia to-s a encontros extensivos ocorridos no passado vivido. Nos encontros extensivos, o vivido quer dizer apenas qualidades sensveis. Mas, quando disparado, o vivido quer dizer o intensivo numa processualidade em que primam
intensidade em fluxos e cortes de fluxos (j que cada intensidade est necessariamente em relao com uma outra, de tal modo que alguma coisa passe), o estado vivido no necessariamente subjetivo e nem individual, mas pleno desse movimento, ou
27 jogo, que o das intensidades, das quantidades intensivas, como outros tambm
28 viram 37. A proliferao intensiva Depois dessa breve passagem por alguns pontos da teoria deleuzeana do signo, tendo grifado o jogo dos encontros, reteremos o seguinte: em cada caso pensado, Deleuze encontra a necessidade e os meios de sua criao filosfica na disparao de encontros intensivos. O paradoxal centro nervoso dessa disparao uma sntese de linhas heterogneas, uma sntese disjuntiva. Paradoxal, porque, em cada caso, a articulao disparadora ameaada por bordas grudadas prpria sntese: de um lado, so bordas que entulham os encontros extensivos com um excesso de opinies e de comunicativismo irrisrio; de outro, so bordas que trazem para muito perto a catica das intensidades, que, todavia, no podem ser simplesmente suprimidas, sob pena de no se estar altura da problemtica da diferena. Por isso, para Deleuze, falar da criao
. Por um lado, no
possvel levar a crtica da representao a ponto de simplesmente suprimir o extensivo. Por outro lado, se o acaso o mais necessrio, ento, nos encontros, as articulaes criativas precisam das intensidades, mesmo com a ameaa de sua catica: dir-se-ia que
30 a luta contra o caos inseparvel de certa afinidade com este inimigo, pois ficar na
31 mesmice j perder a luta 39 . Que nome dar ao estranho ato que dispara todas as articulaes cuidadas por essa filosofia em seus encontros? o mesmo do qual os signos so efeitos. tambm ele que encontramos na construo de todos os conceitos deleuzeanos. E nada existiria ou apareceria sem o paradoxal contgio mtuo dos heterogneos, sem essa relao dita sntese disjuntiva, sem esse impalpvel dspar, portanto. Desde o bom encontro terico de Deleuze com a renovao do problema da individuao por Gilbert Simondon, dspar aparece, mas sem a condio de um mnimo de semelhana entre as sries; aparece como precursor sombrio, estabelecendo comunicao intensiva entre sries disparates, desencadeando acoplamentos, ressonncias internas, movimentos forados, assim como a constituio de eus passivos e de sujeitos larvares no sistema,
33 como elementos ltimos do inconsciente 41. Dspar aparece como elemento paradoxal que percorre as sries divergentes, fazendo-as ressoar, comunicar e ramificar, e ainda comandando a todas as retomadas e transformaes, a todas as redistribuies; isto faz com que Deleuze o pense, nesse momento, como o lugar de uma questo numa conexo especial com a idia de problema: o problema determinado pelos pontos singulares que correspondem s sries, mas a questo [ determinada] por um ponto aleatrio que corresponde casa vazia, ao elemento mvel, sendo que o complexo questo-problema (que est no paradigma do par virtual-atual) caracteriza o modo do
34 acontecimento como problemtico 42. Pensar dspar como lugar de uma questo uma frmula retomada de outro modo em Mil plats. Trata-se de uma incidncia decisiva no sistema conceitual deleuzeano, pois no acentua dspar apenas em funo de ressonncias. No plat denominado Tratado de nomadologia: a mquina de guerra, Deleuze distingue as cincias teoremticas (geometria euclidiana, por exemplo, voltada para as constantes) das cincias problemticas ou nmades (como a
35 geometria arquimediana). Dspar opera fortemente nessa distino 43. O que a notamos um desdobramento de dspar como operador de liberaes, como disparao de estados intensivos, estados que aguam no aprendiz o estar espreita da disparada de linhas de fuga. Esse desdobramento era como que previsvel desde o emprego de uma tautologia que definia dspar como diferena de intensidade. Tautologia, porque toda intensidade diferencial, diferena em si mesma. H um diferenciar infinitamente desdobrado em mudanas de fases ou estados que, citando Rosny,
37 em que o prprio E remete a e-e, e e remete a 44 . Como paciente dos encontros intensivos, como sujeito larvar do seu prprio sistema, mantendo-se espreita dos dspares, que o pensador pode vir a pensar e a criar nos seus conceitos as variaes que correspondam aos problemticos dinamismos espacio-temporais no submetidos a uma forma prvia. Pode-se dizer que essa intensificao do pensar implica uma involuo a snteses passivas. Implicaria uma
. que a regresso
39 paciente capaz de sustentar as exigncias de um dinamismo sistemtico 46. Implicando disparaes, esse duplo movimento corresponde a um problema que circula pelo sistema
40 deleuzeano, problema fecundado justamente pela complexidade dos encontros, mas que
41 tambm percute na prpria elaborao dos conceitos 47. Um problema desse tipo cria uma boa relao entre o filsofo Deleuze e o animal no edipianizado. Por exemplo, a idia de marcar um territrio, este domnio do ter, situao que nos diz respeito, mas que j concernia os animais. Marcar um territrio no se reduz a funcionalidades. que, por meio de posturas, cantos, cores, so atingidas linhas de uma arte em estado puro. Alm disso, um territrio s vale em relao a um movimento atravs do qual se sai dele. Ou seja, no h territrio sem desterritorializao, isto , sem um vetor de sada do territrio; e no h sada do territrio, ou seja, desterritorializao, sem, ao mesmo tempo, um esforo para se reterritorializar em outra parte. E os animais participam disso, porque emitem signos
43 animal o ser espreita, um ser, fundamentalmente, espreita 48. Como percorrer os encontros conceituais deleuzeanos? Esta pergunta no meramente didtica e s dirigida aos que nunca leram algum escrito desse filsofo. Ela sempre retorna a cada texto lido por um iniciante ou relido por um experimentado pesquisador. No apresentamos um guia turstico que d a ela uma resposta. Apontamos aquilo que pulsa em qualquer detalhe dessa filosofia da experincia da complexidade dos encontros: a pulsao dspar como operao amortecida ou proliferada nos encontros e implicada na criao dos prprios conceitos deleuzeanos. Como elemento sem identidade, a pulsao dspar dispara tambm em ns, aprendizes, a sensao de que o sistema deleuzeano um labirinto. E a pergunta retorna: no encontraramos por a uma espcie de fio de Ariadne, como aquele que guiou Teseu na labirntica aventura em que venceu o monstro? Em filosofia, digamos que o monstro o pensamento do filsofo... monstro, sim, por razes que ele recria a seu modo, que no nos confirmam em nossas opinies, nem mesmo naquelas baseadas em outros filsofos. A monstruosidade aparece na forma de velozes e intempestivos encontros de noes, idias afiadas num af de se distinguirem umas das outras, mas que se dedicam, ao mesmo tempo, a se ajudarem mutuamente em estranhas concatenaes. S quando a leitura se sente afirmativamente afetada por uma fora nascida do seu encontro com o texto, que o estudioso percebe que no precisa matar o monstro, mas impregnar-se dele, aliar-se com suas travessuras e, com isso, vencer em si mesmo seu inevitvel estado de lentido. Isto quer dizer que o fio de Ariadne no nos espera porta do labirinto deleuzeano. Por que? Referindo-se literatura, Deleuze conecta a "obra de arte moderna", essas "obras problemticas", ao "abandono da representao", passando a ser decisiva uma importante questo presente em sua filosofia: a da construo de um sistema de diferenas irredutveis a um centro ou a uma convergncia. Neste momento, ele se alia a
44 Umberto Eco em torno do problema da Obra Aberta 49. Ele se alia para dizer que a obra de arte 'clssica' vista sob vrias perspectivas e est sujeita a vrias interpretaes, mas que a cada ponto de vista ou interpretao no corresponde ainda uma obra autnoma, compreendida no caos de uma grande-obra. A caracterstica da obra de arte
. Achamos que
tambm a filosofia deleuzeana est em ressonncia com a modernidade de obras de arte assim caracterizadas, pois ela prpria implica um princpio de proliferao intensiva de
47 coexistncia intensiva que nos ziguezagueia 51. Mas que tem isso a ver com o termo labirinto? Pois bem, a um dos operadores dessa proliferao que Umberto Eco se refere ao escrever o Ps-Escrito ao seu romance O Nome da Rosa. Ele determina trs tipos: o "labirinto clssico", de Teseu, mas que tambm o de Sherlock Holmes, percorrido com o auxlio do "fio de Ariadne", comportando "entrada para o centro" e caminho do "centro para a sada"; h o "labirinto maneirista", estruturado como "rvore", em "forma de razes com muitos becos sem sada", comportando "uma s sada" e tambm carecendo do socorro de um fio condutor. Por fim, diz ele, h aquilo que Deleuze e Guattari chamam de rizoma". Neste labirinto cada caminho pode ligar-se com qualquer outro", no havendo "centro", "periferia" ou "sada", por ser ele "potencialmente infinito". [Diramos que a pulsao dspar dispara nele uma ilimitao]. Eco rizomatiza o mundo em que Guilherme" (uma das
49 estruturvel, mas nunca definitivamente estruturado" 52. Sem a lgica de Sherlock Holmes, Guilherme, que investiga assassinatos num mosteiro medieval, abertura acolhedora de uma srie de escolhas possveis, a tal ponto que sua busca se complica numa prtica rizomtica s resolvida ao acaso dos encontros. que o rizoma, tal como a conjuno e, no precisamente uma coisa, mas um inter-ser, uma mobilidade entre-coisas que conecta um ponto qualquer com qualquer outro ponto, e cada um dos seus traos no remete necessariamente a traos de mesma natureza, podendo por em jogo regimes de signos muito diferentes, inclusive estados de no-signos. Ao contrrio da rvore, o rizoma irredutvel ao Uno e ao mltiplo; ele no feito de unidades, mas de dimenses, ou antes, de direes movedias. Rizomatizar implica disparaes e a tarefa de mapear multiplicidades substantivas. Ento, para que o rizoma seja modelo dinmico destas, tambm preciso que rizomatizar comporte operaes de disparao que levem o mapeamento a se aliar queles componentes que, presentes nas multiplicidades, possam romper os processos que concorrem para o bloqueio delas, processos que so tambm produzidos nelas mesmas. Por comportar esse tipo de operao, que os autores podem dizer que o rizoma no tem comeo nem fim, mas sempre um meio, pelo qual ele cresce e
50 transborda 53. A est o produtivo e paradoxal funcionamento terico-prtico do rizoma: o modelo que mapeia dobra-se em operaes que mudam a natureza do mapeado. E se o desejo, como querem Deleuze e Guattari, a potncia desse meio, porque ele prprio se define, no pela falta de algo, mas como princpio imanente de uma produtividade complexa. Essa produtividade, to natural quanto artificial, a de um produzir que se reitera diferentemente, uma surpreendente maquinao do fora, um produzir sempre o produzir, que vem a ser, justamente, a regra imanente das
51 maquinas desejantes
54
filosofia, o ponto dspar, no pode ser indiferente ao modo como essa regra opera na prpria escrita deleuze-guattariana, regra que no deixa de invadir tambm a proliferao de textos envolvidos com essa filosofia. tica nos encontros A filosofia deleuzeana propende a uma proliferao intensiva de bons encontros. Ele quer isso, acreditando que no h obra que no indique uma sada para a vida, que
52 no trace um caminho entre as pedras 55. Deleuze entende o que seja um bom encontro a partir dos seus bons encontros com Nietzsche e Espinosa. Com efeito, a nietzscheana vontade de potncia dspar, elemento diferencial numa relao de foras quando est em seu mais elevado grau, em sua forma intensa ou intensiva. Nesse estado intensivo, que a distingue de uma vontade de poder, ela fora o pensar a desprender a forma superior de tudo o que , ou seja a forma de intensidade. Porm, ela tambm atua como critrio de seleo dos encontros ao promover uma postura tica: esta no consiste em cobiar e nem mesmo em tomar, mas em dar e em criar; para ela que Zaratustra encontra o verdadeiro nome: em sua
53 forma intensa, a vontade de potncia a virtude que d 56. Espera-se que pulse nessa virtude o que sugere o imperativo tico nietzscheano: elevar o que se quer ltima potncia, ensima potncia. O problema tico se repe no movimento das intensidades, impondo-se um cuidado com o jogo das intensidades baixas e
54 intensidades elevadas, a maneira pela qual uma intensidade baixa pode minar a mais
55 elevada e mesmo ser to elevada quanto a mais elevada, e inversamente 57. Da tica de Espinosa, este caso de amor extremado, Deleuze recolhe uma etologia. Isto quer dizer, grosso modo, que a distino dos bons e dos maus encontros, dispensando as prescries transcendentes da moral, passa a depender do que se passa em duas ordens de dimenses: aquela em que os entes vivem a experincia da maneira como suas respectivas relaes constitutivas se compem ou no em seus movimentos e repousos e em suas velocidades e lentides (longitude); e aquela em que, nas suas mtuas relaes, vivem a experincia do aumento ou diminuio da sua fora de existir e do seu poder de ser afetado (latitude), a experincia do que se passa,
57 ou tristes 58, estes signos que a vida vai colhendo em seus encontros. *** III. Dez conceitos
59 deleuzeanos, apropriando-nos de seus empregos em textos do prprio Deleuze 59. Atual e virtual: Toda multiplicidade implica elementos atuais e elementos virtuais. No h objeto puramente atual. Todo atual se envolve de uma nvoa de imagens virtuais. A relao do atual e do virtual constitui sempre um circuito, mas de duas maneiras: ora o atual remete a virtuais como a outras coisas em vastos circuitos, onde o virtual se atualiza, ora o atual remete ao virtual como a seu prprio virtual, nos menores circuitos onde o virtual cristaliza com o atual. O plano de imanncia contm, a um s tempo, a atualizao como relao do virtual com outros termos, e mesmo o atual como termo com o qual o virtual se permuta. Em todos os casos, a relao do atual e do virtual no a que se pode estabelecer entre dois atuais. Os atuais implicam indivduos j constitudos, e determinaes por pontos ordinrios, enquanto a relao do atual e do virtual forma uma individuao em ato ou uma singularizao por pontos notveis a serem determinados em cada caso (Dialogue, pp. 179, 184). Complicao: Mundo de diferenas implicadas umas nas outras. Mundo complicado, sem identidade, propriamente catico. A caos-errncia ope-se coerncia da representao; ela exclui a coerncia de um sujeito que se representa, bem como de um objeto representado. O mundo intenso das diferenas, no qual as qualidades encontram sua razo e o sensvel encontra seu ser, precisamente o objeto de um empirismo superior. preciso mostrar a diferena diferindo. Este caos o mais positivo e a divergncia objeto de afirmao. A trindade complicao-explicao-implicao d conta do conjunto do sistema, isto , do caos que mantm tudo, das sries divergentes que dele saem e nele entram e do diferenciador, o dspar que as relaciona umas s outras. (Diffrence et rptition, p. 80). Corpo: Um corpo no se define pela forma que o determina, nem como substncia ou sujeito determinados, nem pelos rgos que ele possui ou pelas funes que exerce. No plano de consistncia, um corpo se define somente por uma longitude e uma latitude: pelo conjunto dos elementos materiais que lhe pertencem sob tais relaes de movimento e de repouso, de velocidade e de lentido (longitude); pelo
60 conjunto dos afectos intensivos de que ele capaz sob tal poder ou grau de potncia (latitude). Somente afectos e movimentos locais, velocidades diferenciais. Coube a Espinosa ter destacado essas duas dimenses do Corpo e de ter definido o plano de Natureza como longitude e latitude puras. Latitude e longitude so os dois elementos de uma cartografia (Mille plateaux, 318). Corpo sem rgos: O corpo sem rgos ope-se menos aos rgos do que a essa organizao de rgos chamada organismo. um corpo intenso, intensivo. percorrido por uma onda que traa no corpo nveis ou limiares segundo as variaes de sua amplitude. O corpo no tem portanto rgos, mas limiares ou nveis. (Francis Bacon Logique de la sensation, p. 33). No o testemunho de um nada original, nem o resto de uma totalidade perdida. No uma projeo: nada tem a ver com o corpo prprio ou com uma imagem do corpo. o corpo sem imagem. Ele perpetuamente re-injetado na produo (LAnti-Oedipe, p. 14-15). o campo de imanncia do desejo, o plano de consistncia prpria do desejo. O corpo sem rgos desejo, ele e por ele que se deseja. (Mille plateaux, pp. 203, 191). Devir: Os devires no so fenmenos de imitao, nem de assimilao, mas de dupla captura, de evoluo no paralela, de npcias entre dois reinos. A vespa e a orqudea so o exemplo. A orqudea parece formar uma imagem de vespa, mas, de fato, h um devir-vespa da orqudea, um devir-orqudea da vespa, uma dupla captura, pois aquilo que cada um devm no muda menos do que aquele que devm. A vespa devm parte do aparelho de reproduo da orqudea, ao mesmo tempo em que a orqudea devm rgo sexual para a vespa. Um nico e mesmo devir, um nico bloco de devir (Dialogues, p. 8-9). Hecceidade: H um modo de individuao muito diferente daquele de uma pessoa, um sujeito, uma coisa ou uma substncia. Ns lhe reservamos o nome de hecceidade. Acontece de se escrever ecceidade, derivando a palavra de ecce, eis aqui. um erro, pois Duns Scot cria a palavra e o conceito a partir de Haec, esta coisa. Mas um erro fecundo, porque sugere um modo de individuao que no se confunde precisamente com o de uma coisa ou de um sujeito. Uma estao, um inverno, um vero, uma hora, uma data tem uma individualidade perfeita, qual nada falta,
61 embora ela no se confunda com a individualidade de uma coisa ou de um sujeito. So hecceidades, no sentido de que tudo a relao de movimento e de repouso entre molculas ou partculas, poder de afetar e de ser afetado. Quando a demonologia expe a arte diablica dos movimentos locais e dos transportes de afectos, ela marca simultaneamente a importncia das chuvas, granizos, ventos, favorveis a esses transportes (Mille plateaux, 318-319). Linha de fuga: Uma fuga uma espcie de delrio. Delirar exatamente sair do traado. H algo de demonaco numa linha de fuga. prprio dos demnios saltar os intervalos, e de um intervalo a outro. A linha de fuga uma desterritorializao. Fugir no de modo algum renunciar s aes, nada mais ativo que uma fuga. o contrrio do imaginrio. igualmente fazer fugir, no forosamente os outros, mas fazer fugir algo, fazer fugir um sistema como se rompe um tubo. (Dialogues, pp. 49-50, 47). No h somente estranhas viagens na cidade, mas viagens no mesmo lugar; no estamos pensando nos drogados, cuja experincia por demais ambgua, mas antes nos verdadeiros nmades. Viagem no mesmo lugar, este o nome de todas as intensidades, mesmo que elas se desenvolvam tambm em extenso (Mille plateaux, 602). Multiplicidade: As multiplicidades so a prpria realidade, e no supem unidade alguma, no entram em totalidade alguma e tampouco remetem a um sujeito. As subjetivaes, as totalizaes, as unificaes so, ao contrrio, processos que se produzem e aparecem nas multiplicidades. Os princpios caractersticos das multiplicidades concernem a seus elementos, que so singularidades; a suas relaes, que so devires; a seus acontecimentos, que so hecceidades (quer dizer, individuaes sem sujeito); a seus espaos-tempos, que so espaos e tempos livres; a seu modelo de realizao, que o rizoma (por oposio ao modelo); a seu plano de composio, que constitui plats (zonas de intensidade contnua); aos vetores que as atravessam, e que constituem territrios e graus de desterritorializao. (Deux rgimes de fous, p. 289-290). No se trata de opor os dois tipos de multiplicidades, as mquinas molares e moleculares, segundo um dualismo que no seria melhor que o do Uno e do mltiplo. H somente multiplicidades de multiplicidades. A distino no absolutamente a do exterior e do interior, sempre relativos e
62 cambiantes, intervertveis, mas a dos tipos de multiplicidades [extensivas e intensivas] que coexistem, se penetram e mudam de lugar. As relaes, as determinaes espacio-temporais no so predicados da coisa, mas dimenses de multiplicidades. (Mille plateaux, pp.48, 49, 321). Plano de imanncia: Esse plano que conhece apenas as longitudes e as latitudes, as velocidades e as hecceidades, ns o chamamos plano de consistncia ou de composio (por oposio ao plano de organizao e de desenvolvimento). necessariamente um plano de imanncia e de univocidade. um plano de proliferao, de povoamento, de contgio. menos ainda uma regresso que remontaria a um princpio. , ao contrrio, involuo, em que a forma no pra de ser dissolvida para liberar tempos e velocidades. (Mille plateaux, 326). A imanncia no se reporta a Algo como unidade superior a qualquer coisa, nem a um Sujeito como ato que opera a sntese das coisas: quando a imanncia j no imanncia a outra coisa, que no a si, que se pode falar de um plano de imanncia (Deux rgimes de fous, p.260). Sntese disjuntiva: Toda a questo saber em que condies a disjuno uma verdadeira sntese, e no um procedimento de anlise que se contenta em excluir os predicados de uma coisa em virtude da identidade de seu conceito (uso negativo, limitativo ou exclusivo da disjuno). A resposta dada na medida em que a divergncia ou o descentramento determinados pela disjuno tornam-se objetos de afirmao como tais (Logique du sens, p. 204). As disjunes subsistem. A disjuno deveio inclusa, tudo se divide, mas em si mesmo (Lpuis, pp. 59, 60). *** IV. Percursos e influncias A filosofia de Deleuze traa percursos que justificam a variao dos seus estmulos em estudos filosficos e no campo das cincias humanas, da educao e das artes, bem como nos combates pela dignificao do viver. Em relao ao modo como ele praticou uma histria quebradia da filosofia, escolhendo os encontros propcios s suas criaes, basta uma frase de um contemporneo seu, Jean-Franois Lyotard, escrita por ocasio da morte de Deleuze:
63 todos os seus livros foram feitos para colhermos neles tudo o que precisamos. Principalmente aquilo de que no precisamos por no termos nem idia da sua existncia.
64 Por que? Porque, com Deleuze, comentar inventar. Ora, completa Lyotard: a utilidade
65 se mede pelo aumento da potncia de inventar 60. No nos cabe, aqui, percorrer a maneira surpreendente pela qual Deleuze se relacionou com filsofos do passado e da contemporaneidade. O meio dos seus escritos, alm de prazeroso, um lugar de surpresas, de aprendizado constante. Nesse meio, passeamos com novo olhar por paisagens conceituais que julgvamos fixadas em estudos certamente relevantes, mas no nicos. Assim, ganhamos um novo Hume, o do empirismo superior, com Empirismo e subjetividade. Um novo Proust com Proust e os signos: em vez do apego ao passado emprico, os signos enredam o aprendizado de um homem de letras. Os livros que ligam Nietzsche e Espinosa justificam essa juno de guerreiros afirmativos, desses que combatem na imanncia por uma vida eticamente valorizada e no moralmente depreciada. Em Lgica do sentido, os incorporais dos esticos ajudam a dimensionar a idia de acontecimento. E tambm reanimamo-nos com Epicuro, Lucrcio e outros. Com O Bergsonismo, entendemos melhor as nuanas bergsonianas do hbitat deleuzeano. E como que aplicando uma crtica de Bergson a mistos mal compostos, encontramos importante desmontagem do misto denominado sado-masoquismo em Apresentao de Sacher-Masoch. Em outro cruzamento, ganhamos nova explicitao conceitual da dobra barroca em A dobra Leibniz e o Barroco. Reencontramos a o conceito de ocasio atual, de Whitehead. Pouco antes, Deleuze publicara seu benquisto e conhecido Foucault; com isto, obtemos uma variao de perspectivas com a questo das combinaes das foras atuantes no homem e das foras do fora. Se, com Leibniz, nossas foras se combinam com aquelas de elevao ao infinito sob a forma-Deus, o problema muda, no sendo nem mesmo o de submeter formaHomem as relaes entre nossas foras e as que determinam nossa finitude na vida, trabalho e linguagem. Outra combinao impe-nos o problema da dissoluo da forma-Homem: as foras atuantes no homem combinam-se com foras de ilimitao do finito, desencadeando combinaes talvez ilimitadas de conglomerados finitos de componentes. Redobram-se os cuidados, pois isso ressoa nas atuais pesquisas de ponta em vrias cincias, mas tambm na proliferao dos controles na sociedade. Superposies trata das operaes com que Carmelo Bene cria seu teatro menor. O esgotado, por sua vez, leva-nos ao encontro de Samuel Beckett e a distinguir o esgotado (que desliza por disjunes inclusivas) do fatigado (que pratica o jogo das disjunes exclusivas) : enquanto o fatigado s esgotou a realizao e j nada pode realizar, o esgotado esgota todo o
66 possvel e nada mais pode possibilitar, coisa que lhe ocorre de vrias maneiras. H intensidade no esgotamento, assim como, na pintura de Francis Bacon, h intensidade na dissipao da imagem. Lgica da sensao, que acompanha essa pintura, tematiza a passagem da matria-forma matria-fora. Com Deleuze, visitamos tambm o cinema e a literatura. Mas no para falar sobre filmes, sobre romance. Com o socorro de filmes, de estudos dessa arte, ele cria conceitos do cinema em Imagem-movimento e em Imagem-tempo, discriminando seus signos, pensando relaes constitutivas dessa arte em suas variaes. Alm do cinema, h muita literatura pensada nesse meio deleuzeano. o que ocorre no livro escrito por Deleuze e Guattari, Kafka Por uma literatura menor. Neste livro, certas noes ganham duradoura consistncia, como a de agenciamento, a de devir imperceptvel, de mquina social etc. E nele tambm aprendemos que fazer fugir muito mais que criticar. Essa auto-exigncia deleuzeana praticada justamente em Crtica e clnica, uma reunio de textos, muitos dedicados escrita literria: crtica, como traado do plano de consistncia da obra, e clnica como traado de linhas sobre esse plano: o delineamento do beb como combate, o de uma lgica extrema sem racionalidade, o da avaliao imanente, o dos cristais do inconsciente etc. Proliferam outros recantos nesses percursos: Dilogos; Conversaes, A Ilha deserta e Dois regimes de loucos, coletneas importantes para quem se interesse pela pluralidade das facetas tericas e prticas dos debates culturais e polticos contemporneos. A colaborao entre Deleuze e Guattari propiciou mais trs outros livros de grande alcance: uma nova teoria do desejo em O Anti-dipo, desejo no mais marcado pela falta, mas por uma produtividade coextensiva ao meio natural-social-histrico; um vasto e complexo inconsciente espinosano distribudo em planos intensivos em Mil plats; e nova concepo do que seja ou deva ser a prpria filosofia em O que a filosofia? Esses percursos so multiplicveis. Seria uma disperso de temas justapostos carentes de um modelo interpretativo? Nada disso. Nele, qualquer coisa pode forar o pensamento filosfico a cumprir sua nica tarefa: sentir e pensar o jogo problemtico dos encontros, o jogo que envolve a diferena e o problema em pauta em cada caso, como tematiza Diferena e repetio. Para no fazer o jogo dos guardies da representao, impe-se que o prprio jogo da diferena fuja sem receiturios metodolgicos: na experincia real dos encontros, todo e qualquer X se diz univocamente como correspondncias problemticas de heterogeneidades que chicoteiam o pensar.
67 As paisagens e os operadores conceituais dessa filosofia favorecem o deslocamento por ela e se ajustam a variados interesses: viabiliza instrumentalizaes culturais, sejam as propulsoras de modismos ou as que operam como intercessoras junto a criaes nas mais variadas atividades intelectuais; como qualquer filosofia, propicia tambm inmeras monografias acadmicas, dissertaes de mestrado e teses de doutorado; ao mesmo tempo, essa filosofia multifacetada pelas publicaes de coletneas de comentrios inter ou
69 advento de densos comentrios utilssimos como auxiliares de leitura62. claro que essa multiplicidade tambm suscita a vontade de pensar seu conjunto em funo desta ou daquela estratgia interpretativa, seja uma estratgia que visa submeter o pensamento alheio por meio do destaque ardiloso de um conceito que opera sob determinadas condies na obra,
70 condies que so, porm, minimizadas pelo ardil interpretativo63, seja uma estratgia que
bibliogrficas do um sinal do quanto os encontros com os escritos deleuzeanos, espalhando vises e audies por toda parte, favorecem diferentes e diferenciadoras retomadas em dices dos mais variados matizes. *** Bibliografia Os escritos de Deleuze, cuja publicao ele autorizou, esto reunidos em cerca de trinta e duas obras. Anotamos abaixo uma seleo delas. Empirisme et subjectivit, Paris : P.U.F., 1953. (Empirismo e subjetividade, tr. br. de Luiz B. L. Orlandi, So Paulo: Editora 34, 2001). Nietzsche et la philosophie, Paris : P.U.F., 1962. (Nietzsche e a filosofia, tr. br. de Ruth Joffily Dias e Edmundo Fernandes Dias, Rio de Janeiro: Ed. Rio, 1976). Proust et les signes, Paris : P.U.F., 1976. (Proust e os signos, tr. br. da 4a ed. fr. de Antonio Piquet e Roberto Machado, Rio de Janeiro, Forense Universitria, 1987). Le bergsonisme, Paris, P.U.F., 1966. (Bergsonismo, tr. br. de Luiz B. L. Orlandi, So Paulo: Ed. 34, 1999. Anexos: A concepo da diferena em Bergson (1956), tr. br. de Lia Guarino e Fernando Fagundes Ribeiro, pp 95-123, e Bergson, 18591941 (1956), tr. br. de Lia Guarino, pp 125-139). Diffrence et rptition, Paris: P.U.F., 1968. (Diferena e repetio, tr. br. de Luiz Orlandi e Roberto Machado, Rio de Janeiro: Graal, 1 ed. 1988; 2 ed. 2006). Spinoza et le problme de lexpression, Paris : Minuit, 1968. (Spinoza y el problema de la expresin, tr. esp. de Horst Vogel, Barcelona : Muchnik Ed., 1996). Logique du sens, Paris: Minuit, 1969. (Lgica do sentido, tr. br. de Luiz Roberto Salinas Fortes, So Paulo: Perspectiva, 1982). Lanti-Oedipe (c/ Flix Guattari), Paris: Minuit, 1972. (O anti-dipo, tr. br. de Geoges Lamazire, Rio de Janeiro: Imago, 1976). Dialogues (c/ Claire Parnet), Paris: Flammarion, 2 ed. 1996. (Dilogos, tr. br. de Elosa A. Ribeiro, So Paulo: Escuta, 1998). Mille Plateaux (c/ F. Guattari), Paris : Minuit, 1980. (Mil plats, trad. br. coletiva em 5 vol. So Paulo: Ed. 34). Spinoza. Philosophie pratique, Paris : Minuit, 1981. (Espinosa. Filosofia prtica, tr. br. de Daniel Lins e Fabien Pascal Lins, So Paulo: Escuta, 2002).
74 Cinma 1. Limage-mouvement, Paris: Minuit, 1983. (Cinema 1. A imagem-movimento, tr. br. de Stella Senra, So Paulo: Brasiliense, 1985). Cinma 2. Limage-temps, Paris, Minuit, 1985. (Cinema 2. A imagem-tempo, tr, br. de Elosa A. Ribeiro, So Paulo: Brasiliense, 1990). Foucault, Paris: Minuit, 1986. (Foucault, tr. br. de Claudia SantAnna Martins, So Paulo, Brasiliense, 1988). Le pli. Leibniz et le baroque, Paris : Minuit, 1988. (A dobra. Leibniz e o barroco, tr. br. de Luiz B.L.Orlandi, Campinas: Papirus, 1 ed. 1991; 2 ed. 2000). Pourparlers (1972-1990), Paris: Minuit, 1990. (Conversaes (1972-1990), tr. br. de Peter Pl Pelbart, Rio de Janeiro, Ed. 34, 1992). Quest-ce que la philosophie?, (c/ F. Guattari), Paris: Minuit, 1991. (O que a filosofia?, tr. br. de Bento Prado Jr. e Alberto Alonso Muoz, Rio de Janeiro: Editora 34, 1992). Critique et clinique, Paris : Minuit, 1993. (Crtica e clnica, tr. br. de Peter Pl Pelbart, So Paulo: Editora 34, 1997). Lle dserte et autres textes (textes et entretiens 1953-1974). d. prpare par David Lapoujade, Paris, Minuit, 2002. A Ilha deserta e outros textos (textos e entrevistas 1953-1974). Tr. br. Coletiva, So Paulo: Iluminuras, 2006). Deux rgimes de fous ( textes et entretiens 1975-1995). d. Prpare par David Lapoujade, Paris : Minuit, 2003. (Two Regimes of Madness Texts and Interviews 1975-1995. Tr. inglesa de Ames Hodges and Mike Taormina, Edimburgo : Edinburgh University Press, 2006). ***
Dados a respeito do autor do ensaio Luiz B. L. Orlandi Nome completo: Luiz Benedicto Lacerda Orlandi Mestre em Potica pela Universidade de Besanon Frana (1970). Doutor em Filosofia pela Unicamp (1974).
ed., p. 201. 28 Mille plateaux, p. 200. Tr. br., Vol. 3, Plat 9, p. 25. 29 Mille plateaux, p. 164. Tr. br., Vol. 2, p. 87. 30 Mille plateaux, p. 347. Tr. br., Vol. 3, p. 76-77. Neste ponto, os autores passam por Misrable miracle, obra de Henri Michaux (1899-1984). 31 Mille plateaux, pp. 422, 423. Tr. br., pp. 158, 159. Mesmo o ritornelo torna-se ao mesmo tempo molecular e csmico, Debussy... A msica moleculariza a matria sonora, mas torna-se assim capaz de captar foras no sonoras como a Durao, a Intensidade. Tornar a Durao sonora. Lembremo-nos da idia de Nietzsche: o eterno retorno como pequena cantilena, como ritornelo, mas que capta as foras mudas e impensveis do Cosmo. Samos, portanto, do canto e dos agenciamentos para entrar na idade da Mquina, imensa mecanosfera, plano de cosmicizao das foras a serem captadas. 32 Nietzsche et la philosophie, p. 7. Tr. br., p. 5. Essa relao ou cruzamento de foras implica o elemento diferencial da fora (fora dominante / fora dominada) que Deleuze liga idia de vontade potncia. 33 Conclusions sur la volont de puissance et lternel retour (1967), em Lle dserte, p. 166-167. Tr. br., p.158. 34 Conclusions sur la volont de puissance et lternel retour (1967), em Lle dserte, p. 171.Tr. br., p. 161162.
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Diffrence et rptition, p. 31. Tr. br. : 1 ed., p. 50 ; 2 ed., p. 44. Capitalisme et schizophrnie (1972), em Lle dserte, p. 331. Tr. br. p. 301. 37 Como Klossowski e Lyotard. Ver Pense nmade, em Lle dserte, p. 358-360. Tr., p. 324-326. 38 Pourparlers, p. 182. Tr. br., p. 166. 39 Quest-ce que la philosophie?, p. 191. Tr. br., p. 261. 40 Diffrence et rptition, pp. 156, 356. Tr. br.: 1 ed., pp. 199, 437; 2 ed., pp. 174, 384. 41 LAnti-Oedipe, p. 386. Tr. br., p. 410. 42 Logique du sens, pp. 72, 69. Tr. br., pp. 59, 57. 43 Como elemento da cincia nmade, o dspar remete a material-foras, mais do que matria-forma. J no mais se trata, exatamente, de extrair constantes a partir de variveis, mas de pr as prprias variveis em estado de variao contnua. Se h ainda equaes, so adequaes, inequaes, equaes diferenciais irredutveis forma algbrica, e inseparveis por sua vez de uma intuio sensvel da variao. Captam ou determinam singularidades da matria em vez de constituir uma forma geral. Operam individuaes por acontecimentos ou hecceidades, e no por objeto como composto de matria e forma; as essncias vagas so to-somente hecceidades. Mille plateaux, p. 458. Tr. br., Vol. 5, p. 36-37. 44 Diffrence et rptition, p. 387. Tr. br.: 1 ed., p. 356; 2 ed., p. 314. 45 Mille plateaux, p. 326. Tr. br., Vol. 4, p. 56. 46 Lle dserte, p. 136. Tr. br., p. 133. Ver ainda Diffrence et rptition, 128-140. 47 Eis como Franois Zourabichvili enuncia esse problema: como, para alm de Bergson, articular as duas dinmicas inversas e no obstante complementares da existncia, de um lado a atualizao de formas e de outro a involuo que destina o mundo a redistribuies incessantes?. Ver Le Vocabulaire de Deleuze, Verbete Corpo sem rgos. 48 Labcdaire de Gilles Deleuze, Letra A como Animal. 49 Umberto Eco, Obra Aberta, tr. br. de Giovanni Cutolo com reviso de Prola de Carvalho, So Paulo: Ed. Perspectiva, 1971.
Professor titular do Departamento de Filosofia do Instituto de Filosofia e Cincias Humanas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Professor junto ao Ncleo de Estudos e Pesquisas da Subjetividade da Puc-SP. Diretor Adjunto do Centro de Estudos da Histria da Filosofia Moderna e Contempornea do Ifch-Unicamp. xxxxxxxxxxxxx
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Gilles Deleuze, Diffrence et rptition, p. 94, n.1. Tr. br., p. 109, n. 23. Quando invoco o ziguezague, a questo como por em relao singularidades dspares, diz Deleuze em LAbcdaire, p. 200. Isso Idia, mas tambm o vai pra l que eu vou pra c, de Robinho. 52 Umberto Eco,, Postille a "Il nome della rosa" (1984). Ps-Escrito a O Nome da Rosa, tr.br. de Letizia Z. Antunes e lvaro Lorencini, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2a.ed., 1985, pp.45-47. 53 Gilles Deleuze e Flix Guattari, Mille plateaux, Paris: Minuit, p. 31. Mil plats, Vol. 1. Introduo: Rizoma, tr. br. de Aurlio Guerra Neto, Rio de Janeiro: Ed. 34, 1996, p. 32 54 Gilles Deleuze e Flix Guattari, LAnti Oedipe, Paris, Minuit, 1972: A produo como processo excede todas as categorias ideais e forma um ciclo ao qual o desejo se relaciona como princpio imanente (p. 10-11). A regra de produzir sempre o produzir, de inserir o produzir no produto, a caracterstica das mquinas desejantes ou da produo primria: produo de produo (p.13). 55 Pourparlers, p. 196. Tr. br., p. 179. 56 Conclusions sur la volont de puissance et lternel retour (1967), em Lle dserte, pp. 166-167 ; 171. Tr. br., pp.158 ; 161-162. 57 Pense nmade (1973), em Lle dserte, p. 358-360. Tr. br., p. 324-326. 58 Spinoza et nous (1981), em Zpinoza Philosophie pratique, p. 171. Tr. br., p. 130. Ver tambm Sur la diffrence de lEthique avec une morale , em SPP, pp. 27 ss. Tr. br., pp. 23 ss. 59 No listaremos conceitos que j receberam alguma ateno neste livro. Alm disso, h sries mais extensas e detalhadas em dois Vocabulrios: Franois Zourabichvili, Le vocabulaire de Deleuze, Paris: Ellipses, 2003; Sasso et Villani (Dir.), Le Vocabulaire de Gilles Deleuze, Paris : Vrin, 2003. 60 Jean-Franois Lyotard, Ele era a biblioteca de Babel, tr. br. de Lia Marcondes, Fortaleza, O Povo, 18/11/1995, p. 4). 61 Fao uma primeira referncia a dois conjuntos de artigos marcantes a esse respeito: Deleuze, em LArc, n 49, Paris: 1972 (e nova edio em 1980) e Gilles Deleuze em Philosophie n 47: Paris, Minuit, 1995. Cf. tambm Paul Patton, Deleuze: a critical reader, Oxford: Blackwell, 1996. Alm de outros conjuntos, como Gilles Deleuze Immanence et vie, Rue Descartes, Paris: P.U.F., 1998, destaco a reunio de 40 artigos em: Bruno Gelas e Herv Micolet (Dir.), Deleuze et les crivains: Littrature et philosophie, Nantes: d. Cecile Defaut, 2007. Sobre encontros no Brasil, cf., por ex., Eric Alliez (Dir.), Gilles Deleuze une vie philosophique Rencontres Internationales RJ-SP 14-14 junho de 1996, Paris: Institut Synthlabo, 1998, traduo brasileira coordenada por Ana Lcia de Oliveira: Gilles Deleuze: uma vida filosfica, So Paulo: Editora 34, 2.000. Temos a srie Deleuze e Nietzsche: so comunicaes apresentadas nos Simpsios Internacionais de Filosofia organizados em Fortaleza por Daniel Lins e colaboradores: Intensidade e paixo, Rio de Janeiro: Relume Dumar, 2000; Pensamento nmade, Idem, 2001; Que pode o corpo, Idem, 2002; Brbaros, Civilizados, So Paulo: Anablume, 2004; Arte,Resistncia, Rio de Janeiro: Forense Universitria, 2007; Imagem, Literatura, Educao, Idem, 2007. Margareth Rago (Org.), Imagens de Foucault e Deleuze, Rio de Janeiro: Ed. DP&A, 2002. Vrios Autores, A diferena, Campinas, Ed. Unicamp, 2005. 62 um exerccio lgico adjacente que encontramos literalmente em Franois Zourabichvili, Deleuze. Une philosophie de lvnement, 1 ed., Paris: P.U.F, 1994, p. 5 ; 2 ed. revista e ampliada, Paris : Quadrige / P.U.F, 2004, p. 13. No ano anterior, j encontrvamos numerosas explicitaes em Jean-Clet Martin, Variations la philosophie de Gilles Deleuze, Paris, Payot, 1993 Por sua vez, Philippe Mengue, Gilles Deleuze ou le systme du multiple, Paris: d. Kim, 1994, faz uma sondagem extensa de mltiplos pontos da insero filosfica de Deleuze. O procedimento de uma leitura auxiliar reaparece em Eric Alliez, La Signature du monde, Paris: Ed. du Cerf, 1995, tr. br. de Maria Helena Rouanet, A assinatura do mundo O que a filosofia de Deleuze e
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Guattari?, Rio de Janeiro, 1995. Ver tambm Eric Alliez, Deleuze. Filosofia virtual, tr. br. de Heloisa B. S. Rocha, So Paulo, Editora 34, 1996. Arnaud Villani d indicaes metodolgicas preciosas em Mthode et thorie dans loeuvre de Gilles Deleuze,, em Les Temps Modernes n 586, Paris, jan.-fev. de 1996. H um minucioso percurso pela noo deleuzeana de tempo em Peter Pl Pelbart, O tempo no-reconciliado, So Paulo: Ed. Perspectiva, 1998; E muitos outros livros poderiam ser aqui referidos. 63 uma tal estratgia que noto em Alain Badiou, Deleuze, la clameur de ltre, Paris: Hachette, 1997 ou em Alberto Gualandi, Deleuze, Paris : Les Belles Lettres, 1998. No busco mobilizar leitores contra esse tipo de ardil, mas apenas ficar de olho em seu jeito de reter o fluxo alheio, de enquadrar o flufluxo do outro, como diria Guimares Rosa, Ave, Palavra, 28/38, cf. Nilce Santana Martins, O lxico de Guimares Rosa, So Paulo: Edusp, 2001. 64 Este um dos traos, no nico, claro, do livro pioneiro de Roberto Machado, Deleuze e a filosofia, Rio de Janeiro: Graal, 1990, assim como do livro de Michael Hardt, Gilles Deleuze an apprenticeship in philosophy, Regents of the University of Minnesota, 1993. Cf. tambm Manola Antonioli, Deleuze et lhistoire de la philosophie, Paris : Kim, 1999. 65 . Jose Luis Pardo, Deleuze: violentar el pensamiento, Madrid: Ed. Cincel, 1990, p. 7 66 Por exemplo, a busca de uma esttica de Deleuze em Mireille Buydens, Sahara LEsthtique de Gilles Deleuze, Paris: Vrin, 1990; ou a relao dele com o tema da linguagem em Jean-Jacques Lecercle, Deleuze and Language, Palgrave Macmillan, 2002 e em Jlia Almeida, Estudos deleuzeanos da linguagem, Campinas: Ed. Unicamp, 2003; ou a explorao do tema da geofilosofia em Manola Antonioli, Geophilosophie de Deleuze et Guattari, Paris: LHarmattan, 2003; a presena deleuzeana em educao pode ser notada em Sylvio de Sousa Gadelha, Subjetividade e menor-idade, So Paulo: Anablume, 1998, em Tomaz Tadeu, Sandra Corazza e Paola Zordan, Linhas de escrita, Belo Horizonte: Ed. Autntica, 2004, preocupao que tambm a de Slvio Gallo, Deleuze e a educao, Belo Horizonte: Ed. Autntica, 2005. Pode-se acompanhar a presena sutil de Deleuze em msica, lendo Silvio Ferraz, Msica e repetio a diferena na composio contempornea, So Paulo: Educ, 1998 e Livro das sonoridades, Rio de Janeiro, 7 Letras, 2005. A busca de uma ontologia reaparece em Vronique Berger, Lontologie de Gilles Deleuze, Paris: LHarmattan, 2001. E a respeito da relao de Deleuze com o Cinema, cf. o livro de Jorge Vasconcelos, Deleuze e o Cinema, Rio de Janeiro: Ed. Cincia Moderna, 2006, e a bibliografia nele referida; em estudos literrios, Paulo Tarso Cabral de Medeiros, exercita um delicado enlace entre Rosa e alguns conceitos de Deleuze e Guattari em Travessuras do desejo em Grande Serto: Veredas (no prelo); em psicologia clnica, entre muitos outros estudos, encontramos o de Aragon, L.E.P., O impensvel na Clnica: virtualidades nos encontros clnicos, Porto Alegre: Sulina, Ed. da UFRGS, 2007.