Agnelo Amorim Filho - Critério Científico para Distinguir A Prescrição Da Decadência e para Identificar As Ações Imprescritíveis
Agnelo Amorim Filho - Critério Científico para Distinguir A Prescrição Da Decadência e para Identificar As Ações Imprescritíveis
Agnelo Amorim Filho - Critério Científico para Distinguir A Prescrição Da Decadência e para Identificar As Ações Imprescritíveis
c
c
c
!"c
#
ã
Todavia, o critério proposto por Câmara Leal, embora muito útil na prática, se
ressente de dupla falha: Em primeiro lugar, é um critério empírico, carecedor de base
científica, e isto é reconhecido pelo próprio Câmara Leal, pois êle fala em
#&$ /# 0 #%# (op. cit., p. 434). Com
efeito, adotando-se o referido critério, é fácil verificar, pràticamente, na maioria dos
casos, se determinado prazo extintivo é prescricional ou decadencial, mas o autor não
fixou, em bases científicas, uma norma para identificar aquelas situações em que o
direito nasce, ou não, concomitantemen te com a ação, pois é êste o seu ponto de
partida para a distinção entre os dois institutos. Em segundo lugar, o critério em
exame não fornece elementos para se identificar, direta ou mesmo indiretamente (isto
é, por exclusão), as denominadas ações impresc ritíveis.
Von Tuhr, por sua vez, conceitua os direitos potestativos nos seguintes têrmos:
´Em princípio, quando se trata de modificar os limites entre duas esferas jurídicas,
é necessário o acôrdo dos sujeitos interessados. A possibilidade que têm A e B de
modificar suas relações jurídicas recíprocas, não pode, evidentemente, conceber -se
como um direito, pois não pressupõe mais que a capacidade geral de produzir efeitos
jurídicos. Sem embargo, distinta é a situação quando A ou B têm a faculdade de
realizar a modificação em virtude de sua só vontade. Tais faculdades são inumeráveis e
ilimitadamente diversas, porém sempre se fundamentam em certos pressupostos
exatamente determinados. Neste caso cabe fa lar de direitos; são os potestativosµ
(#4, v. 1.º, t. 1.º, p. 203 da trad. castelhana).
8 9 *
*:'*, *** 2*
Já o mesmo não ocorre com o exercício das denominadas faculdades jurídicas: tal
exercício só afeta a esfera juríd ica de terceiro com aquiescência dêste. Ex.: O
proprietário tem o poder de vender a coisa, mas só a compra quem quer - ninguém é
obrigado a fazê-lo. O exercício dêsse poder não cria um estado de 5$ para
terceiros sem a vontade dêstes. Tal poder é, po r conseguinte, uma mera faculdade, e
não um direito potestativo.
Por aí se verifica que não assiste qualquer parcela de razão a Cunha Gonçalves
quando identifica os direitos potestativos com as faculdades jurídicas e cita, como
exemplos, os atos de andar, comer, beber, dormir, dançar, ler e escrever (#;
, v. 1.º, p. 62, e , v. 1.º, t. 1.º,
da 1. ed. brasileira). Tais atos, entretanto, são faculdades que nem sequer podem ser
classificadas de jurídicas, e muito menos podem ser classificados de direitos
potestativos, pois não criam estados de 5$ para terceiros.
(...)
<
*'9*** 2*
O que tem em vista a lei, ao eleger a via judicial como forma especial e exclusiv a
de exercício dos direitos potestativos dessa terceira categoria, é conceder maior
segurança para determinadas situações jurídicas, cuja alteração tem reflexos
acentuados na ordem pública. Nessa categoria Eduardo Couture inclui, de modo geral,
aquêles direitos potestativos que dizem respeito ao estado civil das pessoas
(
& #4 # # , p. 221). Exemplos - o direito que tem o
marido de promover a anulação do casamento contraído com mulher já deflorada, e
todos aquêles direitos de inv alidar os casamentos nulos ou anuláveis; o direito que tem
o pai de contestar a legitimidade do filho de sua mulher; o direito que tem o filho
ilegítimo de pleitear o reconhecimento de sua paternidade, quando o pai não o
reconheceu voluntàriamente; o direi to que têm determinadas pessoas de requererem a
interdição de outras etc. etc.
Ao propor uma daquelas ações por meio das quais são exercidos os direitos
potestativos da segunda e da terceira categorias, o respectivo autor não pleiteia do
réu qualquer $, seja prestação de dar, de fazer, de não -fazer, de abster-se,
ou de outra espécie. O a que êle visa com a propositura da ação é, apenas, criar,
extinguir, ou modificar determinada situação jurídica, e isso é feito
independentemente da vontade, ou mesmo contra a vontade da pessoa ou pessoas que
ficam sujeitas aos efeitos do ato. Assim, o réu da ação, embora não fique obrigado a
uma $, sofre uma 5$. É o que ocorre, por exemplo, com a ação proposta
pelo cônjuge coacto para anular o casamento. Julgada procedente a ação, o efeito da
sentença não é a condenação do outro cônjuge a uma $, e sim a anulação do
casamento. A tal efeito o outro cônjuge fica sujeito, mesmo contra sua vontade.
Quanto às ações declaratórias, têm elas por objetivo conseguir uma #0
5;#. Ou, segundo a conceituação de Chiovenda:
´... verificar qual seja a vontade concreta da lei, quer dizer, certificar a existência
do direito (já direito a uma prestação, já direito potestativo), sem o fim de preparar a
consecução de qualquer bem, a não ser a certeza jurídica.
(...)
O autor que requer uma sentença declaratória não pretende conseguir atualmente
um bem da vida, que lhe seja garantido por vontade da lei, seja que o bem consista
numa prestação do obrigado, seja que consista na modificação de estado jurídico
atual; quer, tão-sòmente, saber que seu direito existe ou quer excluir que exista o
direito do adversário; pleiteia, no processo, a certeza jurídica e nada maisµ
(, 1.º v., p. 265 e 303).
Por enquanto, deve ficar bem fixada esta noção, que tem importância capital no
desenvolvimento de alguns aspectos do presente estudo: o objetivo da ação
declaratória é a obtenção de uma #0 5;#, e nada mais. Nas declaratórias,
conseqüentemente, o autor ´não colima a realização do direitoµ (Chiovenda, op. cit.,
p. 1/302).
Ainda a respeito da classificação das ações faz-se necessário registrar que alguns
autores admitem outras categorias além daquelas três já referidas, como, por
exemplo, as ações executórias, as ações determinativas, as ações mandamentais etc.
Todavia, Eduardo Cout ure acentua, com muita propriedade, que a classificação
tricotômica abarca tôdas essas ações, as quais, de resto, nem sequer chegam a formar
categorias particulares (citação feita por Nelson Carneiro na
, v. 136/51).
A natureza do presente estudo exige que, a esta altura, nos detenhamos um pouco
na análise das ações constitutivas. Têm elas por objetivo o exercício de duas
categorias de direitos potestativos: a) aquêles que, por medida de segurança dos
negócios jurídicos, a lei não permite sejam exercidos mediante simples declaração de
vontade, nem mesmo quando estão de acôrdo todos os interessados, inclusive aquêle
que sofre a 5$ (ações constitutivas #/, segundo a terminologia adotada
por Calamandrei). Ex.: as ações anulatórias de casamento; e b) aquêles direitos
potestativos que são exercidos por meio de ação apenas subsidiàriamente, isto é,
quando os outros interessados não concordam em que êles sejam exercidos mediante
simples declaração de vontade. Ex. : a ação de divisão.
Pelo que foi dito acima já se pode concluir que as ações constitutivas têm as
seguintes características: a) não pressupõem a existência de lesão a um direito, como
ocorre nas ações condenatórias; b) por meio delas não se exige uma $ do réu,
mas apenas se pleiteia a formação, modificação, ou extinção de um estado jurídico; c)
não são meio para se restaurar um direito lesado, mas meio pelo qual se exercitam
duas classes de direitos potestativos; d) não têm por objetivo a safistaçã o de uma
pretensão, se se entender como tal ´o poder de exigir de outrem uma prestaçãoµ, pois
os direitos potestativos são, por definição, ´direitos sem pretensãoµ (quando muito há,
nas ações constitutivas, uma pretensão de natureza especial, isto é, uma p retensão
dirigida contra o Estado, ou uma pretensão à tutela jurídica, ou ´pretensão à
prestação jurisdicionalµ, como quer Pontes de Miranda, mas êle mesmo acentua que
não se deve confundir ´pretensão de direito materialµ com ´pretensão à tutela
jurídicaµ - &/?"# , 1. ed., 1.º v., p. 19); finalmente:
e) as sentenças proferidas nas ações constitutivas (positivas ou negativas) não são
suscetíveis, e nem carecem de execução, pois o conteúdo de tais ações se esgota com
o provimento judicial que determina a criação, modificação, ou extinção do estado
jurídico. (Sòmente quando a ação constitutiva se encontra cumulada com uma ação
condenatória é que se pode cogitar de execução, mas aí a execução diz respeito a essa
última. Ex.: a ação para rescindir o contrato de compra e venda de coisa recebida com
vício redibitório, e reaver o preço pago, mais perdas e danos - art. 178, §§ 2.º e 5.º, IV,
CC/1916.)
B
*
* *-.
Por sua vez, ensina Pontes de Miranda que o instituto da prescrição ´serve à
segurança e à paz públicasµ, e é êste, precisamente, o ponto de vista que, de modo
geral, prevalece, a respeito do assunto, na doutrina e na jurisprudência, embora ainda
haja quem procure apresentar, como fundamento do mesmo instituto, o castigo à
negligência, a aplicação do princípio &!#.
(...)
Duas condições exige a ação, para se considerar nascida , segundo a expressão
romana: a) um direito atual atribuído ao seu titular; b) uma violação dêsse direito, à
qual tem ela por fim remover.
(...)
Desde que o direito está normalmente exercido, ou não sofre qualquer obstáculo,
por parte de outrem, não há ação exercitável.
Opinando no mesmo sentido, poderão ser citados vários outros autores, todos
mencionando aquelas duas circunstâncias que devem ficar bem acentuadas (o
nascimento da ação como têrmo inicial da prescrição, e a lesão ou violação de um
direito como fato gerador da ação): De Ruggiero, , v. 1.º, p.
324-325; Carpenter, #$, p. 269 da 1. ed.; Von Tuhr, #4, v. 3.º, t.
2.º, p. 202, da trad. cast.; Ennecerus -Kipp e Wolf, #4, t. 1.º, v.
2.º, p. 510 da trad. cast.; Ebert Chamoun, &, p. 68;
Pontes de Miranda, , v. VI, p. 114; Lehmann,
#4, v. 1.º, p. 510, da trad. castelhana.
Por via de conseqüência chegar -se-à, então, a uma segunda conclusão im portante:
só as ações condenatórias podem prescrever, pois são elas as únicas ações por meio
das quais se protegem os direitos suscetíveis de lesão, isto é, os da primeira categoria
da classificação de Chiovenda.
Por outro lado, convém levar em conta dois outros fatos importantes: 1.º) o
dispositivo do Código Civil brasileiro que fixa os prazos gerais de prescrição se refere
apenas às ações reais e às ações pessoais (art. 177, CC/1916); 2.º) as ações
condenatórias (ou $) são as únicas que comportam subdivisão em
ações reais e ações pessoais. Por conseguinte, o mencionado art. 177 se aplica, única e
exclusivamente, às ações condenatórias.
D
*
* ,
Por que razão há prazos de prescrição e prazos de decadências? Por que há ações
que conduzem à prescrição e ações que conduzem à decadência, quando seria muito
mais simples unificar os conceitos e dar uma só denominação aos principais efeitos da
incidência do tempo sôbre as relações jurídicas? É exatamente porque os dois
institutos, embora tendo fundamentos comuns, divergem quanto ao objeto e quanto
aos efeitos.
Com referência àqueles direitos potestativos para cujo exercício a lei não achou
necessário fixar um prazo especial, fica prevalecendo, então, o princípio geral da
"! ou da ($A"&$ 6), pois
não há dispositivo estabelecendo um prazo geral para que os direitos potestativos
sejam exercitados sob pena de extinção. Relativamente a tais direitos só há prazos
especiais. Já o mesmo não acontece com os direitos da outra categoria (os
& $ da classificação de Chiovenda): as ações por meio das quais êstes
direitos são protegidos, ou estão subordinadas a prazos especiais no art. 178 do
CC/1916, ou estão subordinadas aos prazos gerais do art. 177 do CC/1916, pois êste
último artigo só se aplica às ações condenatórias, conforme já acentuamos.
Com a aplicação das duas regras deduzidas acima, torna -se extremamente fácil
distinguir a prescrição da decadência e classificar os vários prazos enumerados no art.
178 do CC/1916: se se trata de ação condenatória, o prazo é de prescrição da ação; e
se se trata de ação constitutiva, o prazo é de decadência do direito exercitado por
meio dela.
O primeiro caso que pode ofe recer alguma dificuldade na aplicação das duas regras
fixadas acima é aquêle a que se refere o art. 178, §§ 2.º e 5.º, IV, do CC/1916; prazo
para o comprador propor ação destinada a haver abatimento do preço de coisa (móvel
ou imóvel) recebida com vício redibitório, ou rescindir o contrato e reaver o preço
pago, mais perdas e danos. Como se verifica dos t extos indicados, o comprador tem, à
sua disposição, ações de natureza diversa (condenatórias e constitutivas), das quais
pode fazer uso alternativamente: a) pode êle propor uma ação para haver abatimento
do preço (ação condenatória), ou, b) pode propor uma ação para rescindir o contrato
(ação constitutiva), cumulada com uma ação para reaver o preço pago, mais perdas e
danos (ação condenatória). Como aplicar, na hipótese, o critério distintivo proposto
acima, desde que estão presentes os dois tipos de ações que servem de base à
distinção? O prazo é de prescrição ou de decadência?
Só há uma maneira de solucionar o impasse, desde que não é possível admitir que
o prazo seja, simultâneamente, de prescrição e de decadência: é verificar qual dos
dois interêsses deve prevalecer - o protegido pela prescrição, ou o protegido pela
decadência. Ora, basta atentar para as circunstâncias de que os prazos de decadência
são insuscetíveis de renúncia, de interrupção, e de suspensão, e que o seu
esgotamento deve ser reconhecido de ofício pelo juiz, para se concluir que tais prazos
têm um conteúdo de interêsse público muito mais relevante que os prazos
prescricionais. Dêste modo, os prazos estabelecidos no art. 178, § 2.º, e § 5.º, IV, são
prazos de decadência, e é esta, realment e, a classificação dada a tais prazos por
Pontes de Miranda ( , v. 6.º, p. 140, 340 e 341); Câmara Leal
(#$#%#, p. 145 e 146); Orlando Gomes ( $
, p. 393) e Carlos Maximiliano ( K&%# #$ , p. 352).
Outro prazo que merece referência especial é o do art. 178, § 6.º, XI, do CC/1916:
a ação do proprietário do prédio desfalcado contra o do prédio aumentado pela
avulsão, é ação condenatória ou constitutiva? O prazo é de prescrição da ação, ou de
decadência do direito a que ela corresponde?
ãã ->* L *
A #0 5;# surge, assim, como efeito, não apenas imediato, mas também
único, das ações e sentenças declaratórias, e é precisamente o que acentua Chiovenda
quando afirma que a sentença declaratória ´... não ensarta outro efeito que não o de
fazer cessar a incerteza do direito...µ (op. cit., 1.º v., p. 286). Realmente, a noção de
obtenção da #0 5;# está sempre ligada ao conceito de ação declaratória:
Chiovenda (, 1.º v., p. 286, 321, e 324; M#4##,
1.º v., p. 32 da trad. cast.); e Torquato Castro ( $#?, p. 27 e 88).
Por conseguinte, pode-se dizer que as sentenças declaratórias não dão, não tiram,
não proíbem, não permitem, não extinguem e nem modificam nada. Em resumo: não
impõem , nem 5, nem alteram, por qualquer forma, o mundo
jurídico. Por fôrça de uma sentença declaratória, no mundo jurídico nada entra, nada
se altera, e dêle nada sai. As sentenças dest a natureza, pura e simplesmente,
proclamam a #0 a respeito do que já existe, ou não existe, no mundo jurídico. É
exatamente o princípio consagrado no nosso Código de Processo Civil quando trata de
tais ações: ´O interêsse do autor poderá limitar -se à declaração da existência, ou
inexistência de relação jurídica ou à declaração da autenticidade ou falsidade de
documentoµ (art. 2.º, parágrafo único, Código de Processo Civil de 39).
Para reforçar aquelas conclusões de Pontes de Miranda, convém atentar para uma
circunstância que não se concilia, de modo algum, com a pretendida equiparação dos
atos nulos aos atos jurìdicamente inexistentes, nem com a natureza simplesmente
declaratória que se quer atribuir às ações de nulidade: é que há atos nulos que
produzem efeitos permanentes, e alguns chegam mesmo a convalidar por completo.
Exemplos: o casamento putativo (art. 221, CC/1916); o casamento contraído perante
autoridade incompetente, depois de decorrido o prazo de dois anos dentro do qual a
nulidade deve ser alegada (art. 208, CC/1916); a partilha nula, depois de decorrido o
prazo de decadência fixado no art. 178, § 6.º, V, do CC/1916; o parentesco por
afinidade em linha reta sobrevive a casamento nulo (art. 335, CC/1916). Entendemos,
assim, que as ações de nulidade deve m ser classificadas como constitutivas negativas.
(...)
Ora, nada do que foi assinalado acima (e que é característico das a ções
declaratórias), ocorre com as denominadas . Assim, se se pretende
obter o reconhecimento de determinado estado pessoal e a produção dos efeitos dêle
decorrentes, é necessário e indispensável a propositura da competente ação de estado,
mesmo havendo absoluta e inabalável certeza a respeito da existência dêsse estado, e
mesmo havendo coincidência das vontades e acôrdo expresso de todos os interessados
possíveis e imagináveis, próximos ou remotos. Por conseguinte, única e exclusivamente
por meio de ação é possível: a) o marido contestar a legitimidade do filho de sua
mulher (art. 344, CC/1916); b) o filho, ou seus herdeiros, provarem a legitimidade da
filiação na hipótese do art. 350 do CC/1916; c) o adotado se desligar da adoção
realizada quando êle era menor ou se achava interdito (art. 373, CC/1916); d) o filho
natural impugnar o reconhecimento (art. 362, CC/1916); e) o filho natural demandar o
reconhecimento da filiação, quando os pais não o tenham feito voluntàriamente (a rts.
363 e 355, CC/1916); f) o cônjuge promover a decretação da invalidade do casamento
nulo ou anulável.
É certo que, concluindo pela constitutividade das ações de estado, nos colocamos
em posição diametralmente oposta à da maioria esmagadora da doutrina e da
jurisprudência, mas não nos encontramos sós. Eduardo Couture, por exemplo, situa as
ações de estado entre as constitutivas necessárias (
#
#, 2. ed., p. 221; Ricardo Reimundin ( #4 # #, p. 112) considera as
ações de estado como #&#, e Vicente Ráo admite que há algumas
ações de estado que são declarativ as e outras, constitutivas (
, v. 2.º, t. 3.º, p. 194). No mesmo sentido: Planiol, ##, 1/17.
Alguns outros autores limitaram seu pronunciamento às ações investigatórias de
paternidade, ou ao reconhecimento volunt ário, classificando-os como atos
constitutivos: Cunha Gonçalves ( , v. 1.º, t. 1.º, p. 267, da
edição brasileira); Sergio Sotgia (apud Serpa Lopes, "G!#, 3.
ed., v. 1.º, p. 310).
Concluindo as considerações a respeito das ações às quais demos a denominação
de &#? (isto é, as ações de nulidade e as ações de estado),
podemos dizer que elas, como constitutivas que são, seguem a sorte destas últimas
com referência aos dois institutos objeto do presente estudo: estão ligadas à
decadência.
Finalmente, deve ficar acentuado que o fato de produzirem, quase sempre, efeitos
A #, não impede que as ações de nulidade, e as de estado, e respectivas
sentenças, sejam classificadas como constitutivas, pois, de acôrdo com os
ensinamentos de Chiovenda, Goldschmidt, Pontes de Miranda e Prieto Castro, tais
efeitos não são privativos das ações e sentenças declaratórias. Êles são até muito
freqüentes nas ações e sentenças constitutivas.
Com efeito, já vimos anteriormente que não há qual quer razão para o legislador
subordinar as ações declaratórias a prazos extintivos, pois o seu uso, ou não -uso, não
afeta, direta ou indiretamente, a paz social, uma vez que elas nada criam e nada
modificam - apenas declaram a #05;#. Já vimos, também, que há até mesmo
uma impossibilidade lógica em filiar as ações declaratórias aos institutos da prescrição
ou da decadência, uma vez que elas não são meio de restauração de direitos lesados,
nem meio de exercício de direitos potestativos. Um fato con firma plenamente as duas
observações feitas acima: entre os vários prazos estabelecidos no art. 178 do CC/1916,
não há um só que se refira à ação declaratória.
Já temos, assim, elementos para fixar a terceira e última regra: *$O (ou
imprescritíveis) 7 #?H &!O& 3 #
3$EA0#A#;# .
Depois da confusão que o Código Civil de 1916 fêz do art. 178, dos prazos de
prescrição com os de decadência, talvez a inexplicável existência do art. 179 seja o
fator que mais haja concorrido para dificultar, entre nós, a distinção entre os dois
institutos e a identificação das ações perpétuas (imprescritíveis) .
Diz o mencionado art. 179 que: ´Os casos de prescrição não previstos neste Código
serão regulados, quanto ao prazo, pelo art. 177µ. Por sua vez, o art. 177 dispõe que:
´As ações pessoais prescrevem ordinàriamente em vinte anos, as reais em dez, entre
presentes e, entre ausentes, em quinze, contados da data em que poderiam ter sido
propostasµ.
Nestas condições faz-se necessário, em primeiro lugar, fixar os limites do campo
de incidência do art. 177, e não há dúvida que êle só pode se aplicar às ações
condenatórias (ou $ ou $), pois sòmente elas
comportam a subdivisão em e . Não se pode cogitar de ações
reais e ações pessoais nas classes das constitutivas e das declaratórias, de vez que
estas são, por definição, & $ & . Não há ações
constitutivas reais ou pessoais, do mesmo modo que não há declaratórias nas mesmas
condições. Não é possível pleitear, por meio de ação constitutiva ou declaratória,
qualquer prestação, pessoal ou real. Aliás, Pontes de Miranda acentua êsse aspecto do
problema em uma síntese feliz:
Ferrara, por sua vez, depois de concluir que as ações declaratórias são
imprescritíveis, observa, a respeito da incidência do dispositivo do antig o Código Civil
italiano, equivalente ao art. 177 do nosso Código Civil de 1939:
´Nem pode constituir obstáculo para esta dedução lógica o art. 2.135, segundo o
qual tôdas as ações, quer reais, quer pessoais, prescrevem em trinta anos, pois é certo
que se faz aqui alusão às ações de prestação...µ ( &$"?#5;#,
p. 458 e 459 da trad. port.).
À primeira vista parece que o art. 179 manda aplicar o art. 177 a tôdas as ações
não abrangidas pelo mesmo art. 177. Assim, afigura -se, também à primeira vista, que,
por fôrça do art. 179, o art. 177 do CC/1916 seria aplicável às ações constitutivas e às
declaratórias. Todavia, tal conclusão, por vários motivos, não pode ser admitida.
Note-se, em primeiro lugar, que o mencionado art. 179 do CC/1916 fala em #
#$, o que induz, desde logo, a conclusão de que sòmente os casos que
podem ser submetidos à prescrição é que são atingidos pelo dispositivo. Ora, as ações
constitutivas, exatamente porque não são $, e nem estão ligadas a
um direito suscetível de lesão, não podem ficar subordinadas a um prazo prescricional,
pois, conforme já ficou acentuado, prescrição e lesão do direito são conceitos
correlatos e inseparáveis, que se correspondem como causa e efeito. Quando o
legislador quer subordinar uma ação constitutiva a prazo extintivo, tal prazo só pode
ser de decadência, isto é, decadência do direito potestativo exercido por meio da
ação: extinto o direito, extingue -se também, por via de conseqüência, a ação
constitutiva correspondente. Quanto às ações declaratórias, elas não podem ser
subordinadas nem a prazo prescricional nem a prazo decadencial, pois não são meio de
restauração de direitos lesados ( &$), nem, tampouco, são meio
de exercício de determinados direitos que podem ser exercitados por via de ação
(direitos potestativos). O legislador nem sequer pode cogitar de submeter as ações
declaratórias a prazos extintivos, pois não há como filiá -las, lógica e jurìdicamente,
nem ao instituto da prescrição, nem ao da decadência.
Mas, se, contrariando o bom senso e a lógica jurídica, se pretendesse aplicar o art.
179 às ações constitutivas e às declaratórias, ter-se-ia também que admitir,
necessàriamente, uma outra conclusão que já foi repelida por absurda: a inexistência
de ações perpétuas (imprescritíveis), no Direito brasileiro, pois os arts. 177, 178 e 179
passariam a abarcar tôdas as classes de ações (condenatórias, constitutivas e
declaratórias). Ter-se-iam, então, que admitir, igualmente, aquelas conseqüências
extravagantes da adoção de tal ponto de vista, já assinaladas antes: as ações de
nulidade estariam sujeitas a prazos extintivos e, por conseguinte, os contratos
firmados por menores de qualquer idade, ou por loucos, e os casamentos celebrados
entre pais e filhas passariam a ter validade após o decurso do prazo extintivo. Por mais
êste motivo, isto é, por conduzir a resultados absurdos, deve ser repelida a
interpretação em foco.
ã< *>*
Várias inferências imediatas podem ser extraídas daquelas três proposições. Assim:
a) não há #? perpétuas (imprescritíveis), nem sujeitas a decadência;
b) não há ações # sujeitas a prescrição; e c) não há #?
sujeitas a prescrição ou a decadência.
Uma grande vantagem do critério aqui sugerido é que, tendo como um dos pontos
de partida, para a sua dedução, a categoria dos direitos potestativos, pode, c ontudo,
ser acolhido e utilizado até mesmo por aquêles que não, reconhecem essa categoria,
desde que admitam a existência de ações constitutivas, pois as duas situações são
perfeitamente conciliáveis, conforme acentua Carnelutti ( *#
#, 1/172).
Aí fica, pois, exposto o critério que, como contribuição das mais modestas para a
solução do tormentoso problema, apresentamos ao exame e à crítica dos doutos.