Indicadores Culturais e o Patrimônio Imaterial
Indicadores Culturais e o Patrimônio Imaterial
Indicadores Culturais e o Patrimônio Imaterial
e da identidade de territórios
Andreia Costa1
Resumo
Abstract
The great interest on the preservation of the incorporeal cultural patrimony such as on
the artisan processes has propitiated opportunities to take action aiming to support and to
promote traditional communities. However, these actions are being developed inside of a
complex scenario and a thin line between the preservation, intervention and sustainability of
people envolved. This way, the systemic evaluation of these actions is fundamental for the
effectiveness and efficiency of its results, strengthening the cultural indicators of such area.
This evaluation is necessary to fulfill the objectives defined by the international politics of
preservation and safeguard of incorporeal patrimonies which establish the preservation of the
incorporeal culture as changeable. In this sense, such preservation can not be static and must
take into consideration the relationship amongst the plural identity of the mankind.
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Andreia Costa, graduada em Design pela Universidade do Estado de Minas Gerais 1995. Designer e consultora
para projetos de design e artesanato.
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Territórios Culturais
O que nos identifica é aquilo que nos difere. A cultura molda a identidade ao dar sentido à
experiência que é própria do lugar. O artefato original particulariza a experiência do homem
no espaço tempo, confere significado e lhe dá sentido e razão de ser.
No setor cultural essa identificação que nos difere, mas também nos personaliza, tem
sido amplamente discutida. Os complexos processos da globalização têm, entre outros,
favorecido o acesso aos meios de comunicação e, desta forma, tem ocorrido de maneira rápida
a disseminação da informação e do conhecimento. Com esta facilidade de acesso as culturas
passam a ser mais próximas no sentido da visibilidade, porém a rapidez com que ocorre a
transmissão das informações pode fazer com que esta se dê de forma superficial.
No entanto, cultura é muito mais abrangente que seu conceito e precisa ser apreendida,
na sua totalidade, como forma de uso, costumes e valores de uma sociedade. Considerando a
cultura de uma forma sistêmica, vamos nos ater apenas a uma parte que trata do patrimônio
imaterial que tem se colocado à luz de várias ações no campo da cultura. E é neste cenário
globalizado, sem fronteiras definidas, com acessos facilitados que se propaga com mais
rapidez a troca de informação e conhecimentos, que estão ocorrendo os projetos de
preservação e promoção do patrimônio. Por essa falta de delimitação de espaços, tanto
territoriais quanto humanos é que devem ser balizados os parâmetros para a avaliação e a
construção de indicadores.
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Para a manutenção destes segmentos, políticas de patrimônio que têm estimulado
ações de conservação e salvaguarda deste patrimônio imaterial, seguindo as orientações da
“Convenção para a salvaguarda do patrimônio cultural imaterial”, formulada pela UNESCO
em 2003 estão sendo discutidas. Porém já se pode observar a dificuldade de abrangência dos
setores – considerando a diversidade de tipologias e de argumentos que se estabelecem em
cada um dos setores das áreas do patrimônio.
Se entendermos que viabilidade significa como dar condições para que o patrimônio se
sustente e se perpetue, deveremos associar vários setores como economia, saúde, segurança,
meio ambiente, para que seja possível estabelecer o parâmetro de viabilidade. Entendemos,
porém, a dificuldade de articulação entre estes setores que, por vezes, apresentam políticas de
desenvolvimento contraditórias.
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Com relação às políticas de salvaguarda do patrimônio cultural imaterial brasileiro,
acreditamos que os princípios teóricos, que estão sendo abordados para a proposição de
indicadores, estão adequados quando pressupõe a relação entre as políticas sociais que visam
dar sustentabilidade econômica às comunidades a fim de que seus bens culturais também
sejam preservados. O que nos parece é faltam ferramentas adequadas que possam ultrapassar
as necessidades imediatas de cada ação e possam ajudar na construção de uma base de dados
consistente para futuras tomada de decisão.
Indicadores
A função do indicador é agrupar informações e fazer com que elas tenham maior
visibilidade, associando os dados primários e os dados analisados de forma a transformá-los
em subsídios para formulação de índices. Esse agrupamento de informações deve acontecer
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de forma a simplificar os dados, melhorando, assim, a assimilação de seu conteúdo,
favorecendo melhores análises de situações e conjunturas mesmo complexas.
Em geral os indicadores são apresentados de forma gráfica ou estatística, porém não podem
ser confundidos com os próprios dados, eles são variáveis agregadas. Os indicadores não são
neutros, eles são formulados a partir de uma premissa que se quer observar e traz consigo todo
um referencial teórico próprio, daí a necessidade de estabelecer claramente o que vai ser
observado e a partir de qual cenário, e deixar isso de forma explícita para os que vão tratar
estes dados.
Indicadores culturais
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Se entendermos cultura apenas no seu aspecto restrito do produto e da arte,
deixaremos de observar os aspectos antropológicos da cultura em todos os campos das
relações humanas. Mas, se ao contrário utilizarmos o conceito de cultura no seu aspecto mais
amplo, cairemos em questões de interseção da cultura com as demais ciências humanas, deste
modo deveremos estar preparados técnica e conceitualmente para empreendê-los.
A falta de uma discussão mais ampla entre os estados nacionais faz com que a
possibilidade de comparação entre países seja dificultada. Entendendo cultura como um
elemento que diz respeito ao humano, e que não respeita fronteiras, veremos que a
necessidade de estabelecer comparações entre países é muito importante para que seja
respeitada a diversidade cultural em todos os territórios e para que se possa realizar, com mais
facilidade, a troca de conhecimentos – as informações de um país podem servir como
referência para outro, promovendo, assim, uma maior integração e interação nas ações
multinacionais.
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Existem muitas discussões acerca do assunto, segundo TOLLILA os dados
quantitativos também trazem questões qualitativas já que a eles também dizem respeito o
universo da cultura e, se consideramos a cultura no seu sentido antropológico, teremos a
economia como objeto de estudo. Sem a pretensão de apontar uma verdade podemos trabalhar
apenas com o consenso de que é necessário estudar todos os aspectos do setor, sejam
quantitativos ou qualitativos, pois ao avaliarmos apenas um segmento teremos sempre uma
idéia menor da análise em questão.
- estado incorporado: são aqueles conhecimentos adquiridos pelo indivíduo através de sua
vivência e experiências verdadeiras de relação com as formas culturais. Esse capital
incorporado faz parte do indivíduo e se acaba com sua morte;
- estado objetivado: são os capitais culturais estabelecidos pelo acúmulo de bens materiais
adquiridos ou herdados pelo indivíduo, não sendo, no entanto, fruto de vivência particular.
Esses bens podem ser de posse de um indivíduo que não tenha o conhecimento incorporado
para poder fazer a fruição desses bens. No entanto esses bens não desaparecem com a morte
do indivíduo, eles podem ser repassados para outras pessoas;
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- estado institucionalizado: É o capital cultural de valor convencional, que confere ao portador
um status social.
Outra preocupação importante é que tudo o que é avaliado passa pelo filtro do
avaliador. Isso quer dizer que, por mais bem elaborados e conceituados os indicadores, eles
poderão vir a sofrer interferências das equipes que estiverem fazendo as coletas dos dados,
das análises e do próprio público externo. Um problema que pode acontecer é uma avaliação
causar a falsa impressão de que bom é o que está sendo avaliado, criando assim um
direcionamento do olhar externo para essas questões, interferindo tanto que acabaremos
valorizando o que está sendo estudado e não estudando o que é valorizado.
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“... são ferramentas para comparação, que incorporam indicadores
descritivos e referências a um objetivo político especifico. Fornecem
aos tomadores de decisão informações sobre o grau de sucesso na
realização de metas locais, regionais ou internacionais. São utilizados
dentro de diversas escalas no campo da avaliação política e no
processo decisório.” (BELLEN, 2006, p. 48)
Outra forma de classificar os indicadores seria nos embasarmos nas suas
características. Sendo assim eles podem ser:
Seja qual for a forma adotada para classificá-los, o importante é que eles cumpram o
seu objetivo que deve ser o de registrar, de avaliar dados importantes e que, de alguma forma,
esses dados possam ampliar ou ratificar outros conhecimentos.
Um indicador por si só não traz tanta informação se não for avaliado dentro de sua
metodologia de construção e seus objetivos. Segundo MACHADO (2007) “o indicador
avalia, mais do que descreve”, por isso a necessidade de se ter outras ferramentas para que se
possa descrever a situação e apontar soluções pontuais.
O perfil dos profissionais envolvidos nessas avaliações também merece destaque, pois
devem ter, além de conhecimento técnico, a sensibilidade para ir além das perguntas e o poder
de observar a forma como as ações se estabelecem na comunidade – as relações de poder ou
subordinação. A observância do caráter mutável dos bens culturais e as suas autênticas
mudanças realizadas a partir da apropriação dos indivíduos dos novos modos de fazer e de
viver.
É também muito importante observar que o patrimônio imaterial está intimamente ligado ao
seu lugar de origem e, desta forma, deve ser compreendido como parte de um todo, composto
por fatores humanos, econômicos, ambientais etc. Sendo assim, é imprescindível a presença
de um profissional com visão sistêmica que possa avaliar várias questões do setor cultural em
sintonia com os demais setores, sejam econômicos ou políticos.
Considerações finais
“Las cifras no son más que un aspecto del vasto problema del conocimiento de los
fenómenos culturales” (TOLILA, 2007). Quando falamos de patrimônio geralmente falamos
de algo a ser preservado; no entanto, quando se fala de imaterial, se fala de algo em constante
mudança. É essa dicotomia que motiva o trabalho de pesquisar as formas de avaliação dos
projetos culturais relacionados nessa área, já que devem estar em sintonia com essas
particularidades, não devendo ser simplificados em número apenas, mas analisados e
contextualizados. É importante que os dados sejam analisados por um especialista e que sejam
disponibilizados para quem está, na prática, à frente das tomadas de decisões.
O grande interesse pela preservação dos patrimônios imateriais tem propiciado ações
que visam apoiar e promover comunidades tradicionais. No entanto as ações estão ocorrendo
dentro de um cenário complexo e de numa linha tênue entre a preservação, a intervenção e a
sustentabilidade dos seus envolvidos.
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Desta forma, a avaliação sistêmica destas ações se faz fundamental para que haja
eficácia e eficiência em seus resultados, oferecendo, assim, dados para o fortalecimento de
indicadores culturais. Essa avaliação se faz necessária para que se cumpra os objetivos
propostos pelas políticas internacionais de preservação e salvaguarda de patrimônios
imateriais que estabelecem a preocupação com a preservação da cultura imaterial como
mutável e, desta forma, não podendo ser realizada de forma estática; sem considerar as suas
relações com a identidade plural da humanidade.
Nesse caso a avaliação terá grande peso na área qualitativa, pois os dados estatísticos
não conseguem descrever os níveis de interação dos participantes nestes processos. Mas, para
que sejam eficazes, as discussões devem ser direcionadas a responder questões claras e
objetivas, seguindo os padrões internacionais e, principalmente, respeitando as diversidades e
particularidades impostas pelos patrimônios vivos, mutáveis e humanos.
A avaliação de projetos culturais deve cuidar do indivíduo, do espaço onde ele está e
de sua forma, de desenvolvimento e perpetuação cultural para, assim, podermos entender o
resultado do seu produto cultural.
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