Desinfecção de Esgoto Sanitário
Desinfecção de Esgoto Sanitário
Desinfecção de Esgoto Sanitário
INSTITUIÇÕES PARTICIPANTES
UFES, UFRN, UFPB, UFSC, UFPE, UFV, EPUSP/USP, UFMG,
UFRGS, PUC-PR, UNICAMP
Apresentação
Esta publicação é um dos produtos da Rede de Pesquisas sobre o tema Desinfecção de efluentes
sanitários, remoção de organismos patógenos e substâncias nocivas. Aplicações para fins produtivos como agricultura,
aqüicultura e hidroponia, do Programa de Pesquisas em Saneamento Básico – PROSAB – Edital 03,
coordenada pelo Prof. Ricardo Franci Gonçalves do Departamento de Saneamento Ambiental da
UFES.
A execução das pesquisas de forma cooperada tem permitido a abordagem integrada das
ações dentro de cada tema, otimizando a aplicação dos recursos e evitando a duplicidade e a pul-
verização de iniciativas. As redes integram os pesquisadores das diversas instituições, homogeneizam
a informação entre seus integrantes e possibilitam a capacitação permanente de instituições emer-
gentes. No âmbito de cada rede, os projetos das diversas instituições têm interfaces e enquadram-se
em uma proposta global de estudos, garantindo a geração de resultados de pesquisa efetivos e
prontamente aplicáveis no cenário nacional. A atuação em rede permite, ainda, a padronização de
metodologias de análises, a constante difusão e circulação de informações entre as instituições, o
estímulo ao desenvolvimento de parcerias e a maximização dos resultados.
O PROSAB tem sido divulgado na sua home page (www.finep.gov.br/prosab), e através de diversas
publicações em revistas especializadas e da apresentação de trabalhos e participação em mesas redondas
nos principais eventos da área de Saneamento Básico. Ao término de cada edital são elaborados livros,
manuais e coletânea de artigos versando sobre as tecnologias desenvolvidas, distribuídos gratuitamente
para as prefeituras, concessionárias de serviços de saneamento e bibliotecas. Também são ministrados
cursos sobre essas tecnologias em diversas localidades do país.
Ao longo dos últimos 7 anos, o PROSAB vem se destacando na área de Saneamento como
modelo de gestão de programa cooperativo e financiamento compartilhado, em função dos resultados
já obtidos, quais sejam: desenvolvimento e aperfeiçoamento de diversas tecnologias, produtividade
científica, formação e capacitação de recursos humanos especializados, modernização da infra-estrutura
de pesquisa e desenvolvimento, consolidação de grupos de pesquisa emergentes, dentre outros.
GRUPO COORDENADOR DO PROSAB
Desinfecção de Efluentes
Sanitários
Vitória-ES
2003
Copyright © 2003 ABES - RJ
Coordenador
Ricardo Franci Gonçalves
ISBN 85-86552-72-0
Coordenadores de Projeto
Adrianus Van Haandel UFPB
Bruno Coraucci Filho UNICAMP
Marcos Von Sperling UFMG
Hênio Normando de Souza Melo UFRN
Sérgio João de Luca UFRGS
Mário Takayuki Kato UFPE
Miguel Mansur Aisse PUC/PR
Flávio Rubens Lapolli UFSC
Ricardo Franci Gonçalves UFES
Rafael Kopschitz Xavier Bastos UFV
Roque Passos Piveli EPUSP/USP
Consultores
Eduardo Pacheco Jordão UFRJ
Marcos Omir Marques UNESP
Pedro Além Sobrinho USP
Autores
Bruno Coraucci Filho (UNICAMP)
Carlos Augusto Lemos Chernicharo (UFMG)
Cícero Onofre de Andrade Neto (UFRN)
Décio Jürgensen (SANEPAR)
Eduardo Pacheco Jordão (UFRJ)
Flávio Rubens Lapolli (UFSC)
Henio Normando de Souza Melo (UFRN)
Lourdinha F. dos Santos (UFPE)
Luis Olinto Monteggia (UFRGS)
Marcos von Sperling (UFMG)
Maria Eliza Nagel Hassemer (UFSC)
Mário Takayuki Kato (UFPE)
Mauro Floriano de Sousa Cartaxo
Miguel Mansur Aisse (PUC-PR)
Paula Dias Bevilacqua (UFV)
Pedro Alem Sobrinho (USP)
Rafael Kopschitz Xavier Bastos (UFV)
Regina Keller (UFES)
Ricardo Franci Gonçalves (UFES)
Roberto Feijó de Figueiredo (UNICAMP)
Ronaldo Stefanutti (UNICAMP)
Roque Passos Piveli (USP)
Sérgio João de Lucca (UFRGS)
Tércio D’al Col Sant’ana (UFES)
Vicente de Paula Silva
Colaboradores
Marllon Boamorte Lobato (PUC-PR)
Edna B. S. Toledo (PUC-PR)
Leandro Bassani (UFSC)
Adrianus van Haandel (UFCG)
José Roberto Guimarães (UNICAMP)
Dolores Ursula Mehnert (USP)
Urara Kawazoe (UNICAMP)
Doralice Meloni Assirati (UNICAMP)
Nelson Victória Bariani (UNICAMP)
Marta Siviero Guilherme Pires (UNICAMP)
Fabrícia Fafá de Oliveira (UFES)
Sumário
Capítulo 1 – Introdução ............................................................................... 1
Organismos patogênicos em esgotos sanitários ..................................................... 2
Eficiências das tecnologias de tratamento na remoção de patógenos .................. 5
Padrões de qualidade .............................................................................................. 8
Padrões de potabilidade .................................................................................... 8
Padrões ambientais (para o corpo d’água) ....................................................... 8
Padrões de balneabilidade ................................................................................. 8
Padrões para uso agrícola ................................................................................ 11
Processos de desinfecção ...................................................................................... 11
Seleção de alternativa com base no objetivo de desinfecção ......................... 20
Informações complementares sobre os processos de desinfecção
de esgotos sanitários ................................................................................... 22
Pesquisas sobre desinfecção de esgotos do Edital 3 – PROSAB ......................... 24
Composição e objetivos da rede temática 2 do Edital 3 – PROSAB ............. 24
Efluentes, processos de desinfecção e objetivos de qualidade pesquisados .. 24
Referências bibliográficas ..................................................................................... 26
Prefácio
O PROSAB tem por objetivo geral apoiar o desenvolvimento da pesquisa e o
aperfeiçoamento de tecnologia nas áreas de águas de abastecimento, águas residuárias
e resíduos sólidos que sejam de fácil aplicabilidade, baixo custo de implantação,
operação e manutenção e que resultem na melhoria das condições de vida da população
brasileira, especialmente as menos favorecidas.
Agora, o leitor tem em mãos mais um livro, que integra a já extensa produção
bibliográfica de responsabilidade do PROSAB, desta feita tratando do tema da
desinfecção de esgotos sanitários. Preparado a partir dos esforços de pesquisas
desenvolvidas durante 3 anos por equipes das diversas instituições que participaram
da Rede Temática 2 no âmbito do Edital 3 do PROSAB, seu conteúdo reflete o estado
da arte da desinfecção dos esgotos, sendo portanto obra de referência não só para os
técnicos que projetam, constroem e operam sistemas de esgotamento sanitário, mas
também para os que militam em órgãos ambientais e de saúde e para professores e
estudantes com interesse em saneamento.
Setembro de 2003
Introdução
Ricardo Franci Gonçalves, Eduardo Pacheco Jordão e Pedro Alem Sobrinho
Vírus – No que se refere aos esgotos sanitários, os vírus de maior interesse são
conhecidos como vírus entéricos. Nesse grupo encontram-se aqueles que se multiplicam
no trato gastrointestinal do ser humano, sendo eliminados em elevadas densidades
pelas fezes (106-1012/g fezes). Os vírus são os organismos patogênicos de menores
dimensões, com ordem de grandeza de nanômetro. São organismos constituídos pela
associação de material genético (DNA ou RNA) com cobertura protéica protetora
(capsídeo) que só se multiplicam no interior de células vivas (são parasitas intracelulares
obrigatórios). Apresentam sobrevivência similar ou um pouco superior à das bactérias
no meio ambiente, sendo, no entanto, mais resistentes aos processos de tratamento.
Os vírus entéricos podem causar vários tipos de doenças, nem sempre restritas ao
aparelho digestivo, dentre elas algumas consideradas emergentes atualmente. As
doenças mais conhecidas causadas por vírus entéricos são a hepatite infecciosa (vírus
da hepatite A), as gastroenterites (enterovírus e parvovírus) e as diarréias (rotavírus
e adenovírus).
Tabela 1.2 Níveis de tratamento e valores típicos dos principais parâmetros de qualidade nos
efluentes.
Tome-se por exemplo as densidades de coliformes fecais, que vêm a ser o principal
grupo de organismos indicadores de contaminação fecal de águas. Em termos práticos,
admite-se que o grau de poluição/contaminação da água é proporcional à densidade
de indicadores presente. Em função das grandes quantidades de microrganismos a
serem inativados no esgoto sanitário, a eficiência de remoção necessária para que o
efluente tratado atinja os padrões de qualidade microbiológica pode superar 99,99%.
Um caso típico é a associação de reatores UASB e pós-tratamento aeróbio mecanizado,
tratando esgotos em nível secundário, que, mesmo reduzindo, em média, de 90% a
99% a densidade inicial de coliformes fecais, ainda gera efluentes com importantes
densidades de organismos (a redução é de apenas 1 ou 2 ordens logarítmicas), como
se observa:
l Densidade de coliformes fecais típica do esgoto bruto: 107 NMP/100 ml
l Densidade de coliformes no efluente com 90% de redução: 106 NMP/100 ml
l Densidade de coliformes no efluente com 99% de redução: 105 NMP/100 ml
l Redução necessária para atingir um padrão de reúso agrícola ou de
balneabilidade (efluente com 103 NMP/100 ml): 99,99%
Cap. 1
Lodos ativados + filtração terciária
Filtro biológico percolador de baixa carga
Filtro biológico percolador de alta carga
Introdução
Biofiltro aerado submerso
Biofiltro aerado submerso com remoção biológica de N
Biodisco
Qualquer das tecnologias anteriores + desinfecção Variável
Fonte: Von Sperling & Chernicharo (2002).
7
8 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Padrões de qualidade
Do ponto de vista da engenharia sanitária, a desinfecção pode ser definida como
a etapa responsável pela redução das densidades de microrganismos de interesse até
os limites estabelecidos pela legislação para os diferentes tipos de usos da água. Para
cada um desses usos aplicam-se critérios e padrões de qualidade, em que não apenas
as incidências e as concentrações máximas de organismos são consideradas, mas os
próprios organismos, grupos e tipos.
Padrões de potabilidade
Os padrões microbiológicos para águas tratadas destinadas a consumo público
estão definidos na Portaria 1469/2000 do Ministério da Saúde. Referem-se a
Escherichia coli e a coliformes fecais (termotolerantes), que devem estar ausentes na
água tratada para consumo. Referem-se também a coliformes totais, admitindo limites
máximos de acordo com regras estabelecidas na portaria. A discussão dos padrões de
potabilidade foge ao escopo deste livro.
Os padrões microbiológicos para corpos d’água doce são funções do uso da água
e da classe em que se acha enquadrado o corpo d’água, definidos na Resolução Conama
20/86, de acordo com a Tabela 1.5.
Padrões de balneabilidade
Os mais recentes padrões microbiológicos para águas destinadas à recreação de
contato primário (padrões de balneabilidade) estão definidos na Resolução Conama
Cap. 1 Introdução 9
Tabela 1.4 Classificação das águas doces em função dos usos preponderantes (Resolução Conama
no 20, 18/06/86).
Classe
Uso Doces Salinas Salobras
Especial 1 2 3 4 5 6 7 8
x x x
Abastecimento doméstico x
(a) (b) (b)
Preserv. equil. natural das
x
comun. aquáticas
Recreação de contato primário x x x x
Proteção das comunidades
x x x x
aquáticas
x x x
Irrigação
(c) (d) (e)
Criação de espécies (aqüicultura) x x x x
Dessedentação de animais x
Navegação x x x
Harmonia paisagística x x x
Recreação de contato secundário x x
Usos menos exigentes x
Notas: a) após tratamento simplificado; b) após tratamento convencional; c) hortaliças consumidas cruas e
frutas que se desenvolvam rentes ao solo e sejam ingeridas cruas sem remoção de película; d) hortaliças e
plantas frutíferas; e e) culturas arbóreas, cerealíferas e forrageiras.
Fonte: Von Sperling, 1996.
10 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Ainda segundo Jordão & Pessoa (2003), verifica-se que o desenvolvimento das
recomendações e dos padrões para banho ou para águas de recreação de contato
primário tem seguido um caminho mais ou menos lógico:
Processos de desinfecção
A desinfecção de esgotos sanitários não visa à eliminação total de microrganismos
(esterilização), conforme ocorre na medicina e na indústria de alimentos. Desinfetar
esgotos é uma prática que busca inativar seletivamente espécies de organismos
presentes no esgoto sanitário, em especial aquelas que ameaçam a saúde humana, em
consonância com os padrões de qualidade estabelecidos para diferentes situações. Os
mecanismos envolvidos na desinfecção dos organismos patogênicos podem ser reunidos
em três grupos (Daniel, 2001):
12 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Balneabilidade
Padrões para o corpo dágua
categoria
1 3
Máximo de 250 CF/100 ml ou 200 EC/100 ml ou 25
4
Excelente enterococos/100 ml em 80% ou mais das amostras das cinco
semanas anteriores.
1 3
Máximo de 500 CF/100 ml ou 400 EC/100 ml ou 50
4
Própria Muito boa enterococos/100 ml em 80% ou mais das amostras das cinco
semanas anteriores.
1 3
Máximo de 1000 CF/100 ml ou 800 EC/100 ml ou 100
4
Satisfatória enterococos/100 ml em 80% ou mais das amostras das cinco
semanas anteriores.
a) Não atendimento aos critérios estabelecidos para as águas
próprias.
b) Incidência elevada ou anormal, na região, de enfermidades
transmissíveis por via hídrica, indicadas pelas autoridades
sanitárias.
c) Valor obtido na última amostragem for superior a 2500
1 3
CF/100 ml (termotolerantes) ou 2000 EC/100 ml ou
400 enterococos/100 ml.
d) Presença de resíduos ou despejos, sólidos ou líquidos,
Imprópria inclusive esgotos sanitários, óleos, graxas e outras
substâncias, capazes de oferecer risco à saúde ou tornar
desagradável a recreação.
e) pH < 6,0 ou pH > 9,0 (águas doces), à exceção das
condições naturais.
Naturais Artificiais
Químicos Físicos
Lagoas de estabilização
Disposição no solo
Cloração Radiação ultravioleta
Cloração/descloração Radiação gama
Dióxido de cloro Filtração terciária
Ozonização Membranas filtrantes
Misturas oxidantes Outros
Outros
Tabela 1.8 Vantagens e desvantagens dos processos de desinfecção mais utilizados. (Continuação.)
A água do corpo
receptor é utilizada para
abastecimento de água?
(público ou privado)
Não Sim
A água do corpo O lançamento de esgotos
receptor é utilizada para prejudica a qualidade da
recreação de contato, água para consumo humano?
criação de moluscos, Não
Sim
agricultura ou indústria?
Avalie a possibilidade
Sim de desinfetar os esgotos
O lançamento de esgotos com cloro
prejudica a qualidade da
Não água no ponto de uso
potencial? O uso do cloro para a
Há outra
razão para desinfecção do esgoto
desinfecção Não produz algum risco para
Avalie a possibilidade de a saúde humana?
Não
desinfectar os esgotos
Sim sazonalmente Sim
Descarte o uso
do cloro
Há potencial de
toxidade induzida pelo
cloro na vida aquática?
Não Sim
A desinfecção com Avalie formas Sim
cloro é aceitavel alternativas de
desinfecção
Selecione o
método de
proteção
Figura 1.2 Fluxograma para avaliação local da necessidade e dos requisitos da desinfecção dos esgotos.
Fonte: Chernicharo et al. (2001), com base na adaptação de Usepa (1986).
22 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Nível de
Primário
tratamento Todos os Todos os Primário ou
Secundário Secundário ou
antes da níveis níveis anaeróbio
anaeróbio
desinfecção
Complexidade
Simples a Simples a
relativa da Moderada Complexa Muito simples Simples
moderada moderada
tecnologia
Muito
Confiabilidade Boa Boa Boa Boa Regular
boa
Controle do Bem Em
Desenv. Em desenv. Em desenv. Desenv.
processo desenv. desenv.
Sensibilidade à
operação e à Mínima Moderada Alta Moderada Pouca Pouca
manutenção
Cap. 1 Introdução 23
Tabela 1.12 Tempo de detenção hidráulica, outras reações e impactos na qualidade do efluente
tratado.
Tabela 1.13 Aspectos referentes ao impacto na saúde dos trabalhadores, nas estruturas e no meio
ambiente.
No Capítulo 10 é apresentada uma análise crítica dos resultados obtidos pela rede
de pesquisas, explicitando a aplicabilidade dos diferentes processos de desinfecção aos
esgotos sanitários tratados pelos processos mais freqüentemente utilizados no Brasil.
Referências bibliográficas
BASTOS, R. K. X.; BEVILACQUA, P. D.; HELLER, L.; VIEIRA, M. B. M.; BRITO, L. A.
Abordagem sanitário-epidemiológica do tratamento e da qualidade parasitológica da água: entre o
desejável e o possível In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA SANITÁRIA E
AMBIENTAL, 21., 2001, João Pessoa. Anais... João Pessoa, 2001.
CABELLI, V. J. et al. A marine recreational water quality criterion consistent with indicator
concepts and risk analysis. Journal WPCF, v. 55, n. 10, 1983.
JORDÃO, E. P.; PESSOA, C. A. Tratamento de esgotos domésticos. 3. ed. Rio de Janeiro: ABES,
2003.
OMS. Health guidelines for the use of wastewater in agriculture and aquaculture. Genebra, 1989.
VON SPERLING, M. Princípios do tratamento biológico de águas residuárias. 2. ed. Minas Gerais.
Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental, UFMG, 1996. v. 1, 243 p.
Introdução
No atual estágio do conhecimento científico, torna-se redundante reafirmar a
importância das excretas e dos esgotos sanitários na transmissão de diversos organismos
patogênicos (bactérias, vírus, protozoários e helmintos), via contaminação de águas
utilizadas para recreação, fontes de abastecimento de água para consumo humano e
irrigação, além dos alimentos e do solo. Mais recentemente, assumem particular
importância algumas zoonoses, dadas as especificidades na perpetuação dos elos de
transmissão via esgotos sanitários e dejetos de animais, além das chamadas doenças
“emergentes” e “reemergentes”.
1. Todas as ilustrações deste capítulo são de domínio público e foram extraídas da biblioteca de
imagens do Center for Disease Control (www.cdc.gov).
30 Desinfecção de Efluentes Sanitários
a) Escherichia coli
A maioria das cepas de E. coli é inofensiva e é normalmente habitante da flora
bacteriana do trato gastrointestinal de seres humanos e animais homeotérmicos.
Entretanto, algumas cepas são patogênicas tanto aos humanos quanto a diversos
animais, principalmente jovens (suínos, bovinos e ovinos).
Nos animais, além de doenças entéricas, a E. coli, bem como várias outras
bactérias da família Enterobacteriaceae e do grupo coliforme (Klebsiella, Citrobacter,
Edwardsiella, Enterobcater, Proteus e Serratia) podem apresentar-se como
patogênicos oportunistas, causando mastites e infecções do trato urinário. Dentre
as doenças oportunistas humanas associadas à E. coli incluem-se infecções do trato
urinário e rins.
2. Considera-se, neste texto, que a transmissão fecal-oral é aquela possível de ocorrer uma vez que
os patógenos são eliminados do hospedeiro infectado pelas fezes e apresentam como mecanismo
de penetração (único ou preponderante) a ingestão. Nesse contexto, a transmissão fecal-oral
pode se dar envolvendo contato entre pessoas ou não. Quando a transmissão envolve contato
entre pessoas, o hospedeiro suscetível pode contaminar suas mãos nas fezes eliminadas pelos
infectados (mecanismo mão–boca) ou se infectar a partir do uso de utensílios (fômites) ou do
consumo de alimentos contaminados (manipulados sem higiene adequada pelo infectado). Todos
esses mecanismos pressupõem a existência próxima do hospedeiro infectado e do suscetível.
Quando a transmissão não envolve contato entre pessoas, a infecção se dá por um veículo
(normalmente água ou alimento contaminado), nesse caso, o hospedeiro infectado não está
próximo do hospedeiro suscetível.
34 Desinfecção de Efluentes Sanitários
b) Salmonella spp.
Há mais de 2.000 tipos sorológicos (sorotipos ou sorovares), agrupados segundo
a composição antigênica das salmonelas em relação a seus antígenos: O (somático),
Vi (capsular) e H (flagelar), todos potencialmente patogênicos a humanos e animais.
A maioria não é espécie-específica, embora algumas demonstrem afinidades, por
exemplo, S. dublin com bovinos e S. gallinarum com frangos; S. typhi e S. paratyphi
são, exclusiva e primariamente patogênicas aos seres humanos. Várias espécies são
patógenos primários dos mais diversos animais (suínos, bovinos, aves, pássaros, répteis,
etc.) e reservatórios de infecção humana. Uma das espécies de mais freqüente
isolamento é a S. typhimurium.
Microrganismo Densidade
Escherichia coli 10 -108/100 ml(1)
6
c) Shigella spp.
Shigella são bacilos Gram negativos, anaeróbios facultativos, não dotados de
motilidade e muito próximos a E. coli. A shigelose ou disenteria bacilar, diferentemente
de algumas salmoneloses, não provoca manifestações sistêmicas. As quatro espécies
conhecidas (S. sonnei, S. dysenteriae, S. flexneri e S. boydii), são residentes do trato
intestinal de seres humanos e primatas, porém, aparentemente, patogênicas exclusivas
dos humanos. S. sonnei é mais associada a manifestações brandas e à “diarréia dos
viajantes”. No outro extremo, S. dysenteriae apresenta elevada virulência, provocando
diarréia aguda, ulcerações no intestino e hemorragias.
d) Vibrio cholerae
V. cholerae são bacilos Gram negativos, levemente curvos, com um único flagelo
polar, aeróbios, anaeróbios facultativos e fementadores. Sua detecção por meio de
testes bioquímicos é relativamente fácil. O subgrupo O:1 causa a forma epidêmica
classicamente reconhecida da doença. A cólera confere imunidade efetiva, porém
isso acaba por ser, de certa forma, irrelevante, devido às diferenças antigênicas entre
as diversas cepas; assim, uma mesma pessoa pode contrair a doença mais de uma vez.
entre crianças. Cepas do sorogrupo não O:1, por sua vez, são enteroinvasivas e causam,
além de diarréia, febre e hemorragias.
Vírus
Os vírus são uma classe heterogênea de agentes infecciosos. Podem variar em
tamanho, morfologia, complexidade, hospedeiro e na forma como afetam seus
hospedeiros. Entretanto, algumas características são compartilhadas por todos os vírus:
a) Consistem em um genoma, que pode ser DNA ou RNA, envolvido por uma
cobertura protéica protetora (capsídeo). Freqüentemente, essa cobertura
encontra-se envolvida por um envelope de proteínas, lipídios e carboidratos.
b) Os vírus só podem se multiplicar no interior de células vivas, sendo
absolutamente dependentes da célula hospedeira para obter energia e sintetizar
suas proteínas. Assim, são considerados parasitas intracelulares obrigatórios.
c) Seus ciclos de multiplicação incluem, como passo inicial, a separação do
genoma da cobertura protéica.
Dentre os diversos vírus existentes, aqueles que guardam relação com os esgotos
sanitários são conhecidos como vírus entéricos. Nesse grupo, estão incluídos mais de
100 vírus pertencentes a diferentes famílias que têm por característica comum o fato
de se multiplicarem no trato gastrointestinal do ser humano e poderem ser eliminadas
pelas fezes. Os vírus entéricos podem causar vários tipos de doenças, não necessariamente
restritas ao aparelho digestivo. A maioria tem dentre as principais formas de transmissão
a água de consumo humano; entretanto, o consumo de alimentos contaminados, o
Cap. 2 Organismos Patogênicos e Efeitos Sobre a Saúde Humana 39
a) Família Picornaviridae
A família Picornaviridae é uma das maiores famílias de vírus e inclui alguns dos
mais importantes vírus humanos e animais. Como o nome da família indica, esses
vírus são pequenos (pico), com diâmetro variando de 20 a 30 nm. Apresentam material
genético do tipo RNA com filamento único e linear, capsídeo icosaédrico não
envelopado e se replicam no citoplasma da célula infectada. Os capsídeos desses
vírus são muito estáveis em condições ambientais adversas e no trato gastrointestinal,
sendo estáveis em pH entre 3 e 9, o que facilita sua transmissão fecal-oral, seja pelo
consumo de água e alimentos contaminados, seja entre pessoas (mecanismo mão–
boca, fômites e alimentos). Os enterovírus e os hepatovírus são os principais gêneros
dessa família relacionados a doenças de veiculação hídrica.
40 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Enterovírus
As vias respiratórias superiores, a orofaringe e o trato gastrointestinal são as portas
de entrada dos enterovírus, sendo a transmissão fecal-oral entre pessoas e a transmissão
fecal-oral pelo consumo de água ou de alimentos contaminados os principais modos de
transmissão. A replicação viral se inicia na mucosa e no tecido linfóide das tonsilas e da
faringe e, posteriormente, infecta o intestino. Os vírus são resistentes às secreções gástricas
e à bile. Após a viremia inicial, geralmente assintomática, os vírus são disseminados
para os tecidos-alvo, onde penetram nas células através de seus receptores. Alguns
enterovírus são bastante estritos quanto às células infectadas, enquanto outros infectam
uma variedade maior de células. Os enterovírus são citolíticos, ou seja, após a rápida
replicação no citoplasma, os vírus lisam as células e invadem novas células. A maior
parte das infecções causadas pelos enterovírus não apresenta sintomas clínicos aparentes
e ocorre principalmente durante a infância. Os danos causados pelas infecções são
amplos, podendo ocorrer lesões no sistema nervoso, nos tratos gastrointestinal e
respiratório, nos músculos, na pele e nos olhos.
Poliovírus
O poliovírus (Figura 2.5) é o mais bem estudado e o primeiro vírus a ser
reconhecido como membro dos enterovírus, particularmente por ser responsável pela
poliomielite, uma importante doença paralítica que acomete o ser humano. O
poliovírus apresenta elevada infectividade, porém os sintomas visíveis de paralisia
ocorrem em apenas 1% a 2% dos indivíduos suscetíveis. As manifestações clínicas
geralmente são restritas à hipertermia, entretanto, apesar da baixa patogenicidade,
são responsáveis por manifestações epidêmicas da poliomielite.
Coxsackievírus A e B
Os coxsackievírus são divididos em dois grupos, A e B, com base em diferenças
biológicas e antigênicas. Podem causar doenças neurológicas (meningite linfocítica),
digestivas, respiratórias, de pele e membranas mucosas, além de miocardites,
pericardites e lesões cardiovasculares. A importância dos coxsackievírus está relacionada
a sua ampla distribuição na natureza e por estarem associados a inúmeras patologias,
podendo ocorrer na comunidade sob a forma de casos isolados ou epidemias.
Echovírus
O nome echovírus é uma abreviação de enteric cytopathogenic human orphans
viruses (vírus órfãos do intestino humano, possuidores de atividade citopatogênica),
já que tais agentes não eram considerados associados à doença clínica em humanos.
Esses vírus podem causar paralisias, encefalites, meningites assépticas, doenças
exantemáticas, mialgias epidêmicas, pericardites, miocardites e gastroenterites infantis.
42 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Enterovírus 68-71
Novos representantes do gênero enterovírus foram classificados obedecendo a
um sistema de numeração seqüencial, identificando, assim, os enterovírus 68, 69,
70 e 71.
Hepatovírus
Pertencente ao gênero hepatovírus e relacionado às águas residuárias, encontra-
se o vírus da hepatite A (HAV). Esse vírus foi anteriormente classificado como
enterovírus sob a denominação de enterovírus 72, entretanto, recentemente (1991)
foi reclassificado como hepatovírus. São vírus que têm por material genético um
RNA de fita simples e possuem capsídeo icosaédrico não envelopado, com 27 nm de
diâmetro. Apenas 1 sorotipo foi identificado até o momento.
b) Família Reoviridae
Rotavírus e orthoreovírus são os gêneros de maior significância clínica e
epidemiológica dessa família. Medem de 70 a 80 nm e caracterizam-se por possuir
genoma constituído de RNA de fita dupla, segmentado em 10 a 11 fragmentos;
Cap. 2 Organismos Patogênicos e Efeitos Sobre a Saúde Humana 43
apresentam simetria icosaédrica, não são envelopados, mas possuem dois capsídeos
distintos, um interno e outro externo. Ao microscópio eletrônico assemelham-se a
uma roda (volante).
c) Família Caliciviridae
Os calicivírus clássicos são assim denominados por apresentarem depressões na
superfície do capsídeo, dando ao vírus uma aparência em forma de cálice. São vírus
do tipo não envelopado, com 30-38 nm de diâmetro; possuem capsídeo icosaédrico e
material genético RNA de fita simples.
Calicivírus
Esse gênero, pertencente à família Caliciviridae, é responsável por doença entérica
de curtos períodos de incubação (1 a 3 dias) e duração (4 dias). Os calicivírus já
foram associados a surtos de gastroenterite afetando crianças e idosos, todos em
ambiente institucional (escolas, hospitais e asilos).
SRSV
Vários vírus encontram-se agrupados sob a denominação small round structured
viruses (pequenos vírus circulares). Esses vírus são classificados na família Caliciviridae,
porém não apresentam as depressões típicas dos calicivírus clássicos.
No grupo dos vírus SRSV destaca-se o vírus Norwalk, que apresenta as seguintes
características: genoma com RNA de fita simples, não envelopado, capsídeo icosaédrico
e diâmetro de 26 a 32 nm. Classificados anteriormente como parvovírus, após estudos
imunológicos passaram a ser considerados parte da família Caliciviridae.
Vírus da hepatite E
O vírus da hepatite E (vírus “entericamente transmitidos não A não B”) (HEV)
são vírus não envelopados, com capsídeo icosaédrico, que apresentam diâmetro de
27 a 34 nm e material genético do tipo RNA. Apesar de controverso, o VHE é
classificado como pertencente à família Caliciviridae.
d) Família Adenoviridae
Os adenovírus humanos pertencem à família Adenoviridae, gênero Mastadenovírus.
São vírus não envelopados, DNA de fita dupla, com capsídeo icosaédrico, fibras de
hemaglutinina e diâmetro de 70-80 nm. Há mais de 49 sorotipos de adenovírus
classificados em seis grupos: A, B, C, D, E e F. Os adenovírus clássicos pertencentes a
46 Desinfecção de Efluentes Sanitários
esses grupos são responsáveis por grande parte das infecções respiratórias e da
conjuntiva em seres humanos. Alguns sorotipos apresentam potencial oncogênico.
e) Família Astroviridae
Os astrovírus são vírus com diâmetro de 28-30 nm, não envelopados, envolvidos
por capsídeo icosaédrico e possuem RNA de fita simples. À microscopia eletrônica
podem ser vistos com uma forma de estrela com 5 ou 6 braços. Há sete sorotipos de
astrovírus humanos identificados, sendo o sorotipo 1 o mais freqüentemente associado
à doença humana.
f) Família Parvoviridae
Vírus do tipo parvovírus fecal humano (HFPLV) têm sido isolados de fezes de
pessoas sadias e com gastroenterite. São vírus não envelopados, com DNA de fita
simples, capsídeo icosaédrico e diâmetro de 20 a 25 nm. Ainda não é clara a associação
entre o parvovírus e a doença humana, entretanto, surtos de gastroenterite envolvendo
o consumo de frutos do mar já foram associados a esses vírus.
g) Família Coronaviridae
Os coronavírus são os vírus que apresentam o genoma mais longo de todos os
vírus RNA. À microscopia eletrônica, os vírus apresentam capsídeo do tipo tubular e
envelope coberto por ampla espícula, tornando sua aparência semelhante a de uma
coroa. Apresentam diâmetro que pode variar de 60 a 120 nm.
Esse vírus são reconhecidos por causar diarréia em animais e doença respiratória
em seres humanos. Partículas virais semelhantes ao coronavírus têm sido identificadas
em fezes de pessoas com gastroenterite (principalmente crianças menores de 2 anos),
entretanto, a associação desses vírus com doença entérica em seres humanos ainda é
incerta.
h) Família Toroviridae
Esses vírus foram inicialmente chamados agente Breda ou agente Bern e são agora
classificados na família Toroviridae. Os torovírus são reconhecidos por causar diarréia
em bovinos e têm sido encontrados em fezes de crianças recém-nascidas e de adultos,
entretanto, sua associação com doença entérica em seres humanos não é comprovada.
Protozoários
Os protozoários são organismos unicelulares (portanto microrganismos),
eucariotas, quimio-heterotróficos e pertencem ao Reino Protista.
a) Entamoeba histolytica
Ciclo biológico
b) Giardia sp.
Ciclo biológico
Um indivíduo infectado pode eliminar até 105 cistos/g de fezes. Apesar dessa
quantidade ser, comparativamente, menor que àquela excretada por um indivíduo
infectado por E. histolytica, o fato de apenas uma proporção de cistos de E. histolytica
eliminados ser infectante, associado à significativa menor dose infectante (DI50) da
Giardia (1-10 cistos), ajudaria a explicar a maior prevalência da giardíase na população
em geral. Além disso, os cistos de Giardia são mais resistentes. Ao contrário do
Cap. 2 Organismos Patogênicos e Efeitos Sobre a Saúde Humana 51
3. Heller et al. (2003) encontraram densidades de 101-103 cistos/L no esgoto sanitário em Belo
Horizonte, MG, em sintonia com a literatura internacional; Bastos et al. (2002) encontraram
2,0-140 cistos/L em mananciais de abastecimento de Viçosa, MG, sendo os valores máximos
acima das médias registradas na literatura internacional, denotando elevado grau de
contaminação.
52 Desinfecção de Efluentes Sanitários
c) Cryptosporidium spp.
Ciclo biológico
Por ser tipicamente uma doença humana emergente, menos se tem consolidado
sobre as características ambientais do Cryptosporidium e a epidemiologia da
criptosporidiose. Um indivíduo infectado pode eliminar até 102 oocistos/g de fezes e
a dose infectante (DI50) é de 1-30 oocistos. A transmissão fecal-oral entre pessoas
(mecanismos mão–boca, fômites e alimentos) é reconhecida, bem como a potencial
virulência do Cryptosporidium, especialmente em grupos populacionais
imunodeprimidos. Também é reconhecida a veiculação hídrica da doença, via contato
primário e consumo de água. A criptosporidiose é comprovadamente uma zoonose,
sendo que os esgotos sanitários e as atividades agropecuárias constituem fatores
inquestionáveis de contaminação de mananciais.4 A contaminação de esgotos sanitários
de cerca de 250 mil habitantes (460 L/s) pode equivaler à carga excretada de
aproximadamente 200 indivíduos imunodeprimidos infectados com Cryptosporidium;
por sua vez, um único bezerro ou uma ovelha infectada pode excretar mais oocistos
por dia que mil indivíduos imunodeprimidos (Crockett & Haas, 1997). A
criptosporidiose apresenta-se como um “problema emergente” e considerável, quando
se pensa na irrigação de forrageiras com esgotos sanitários.
Helmintos
Os helmintos constituem um grupo de organismos eucariotas, pluricelulares,
quimio-heterotróficos, pertencentes ao reino Animalia. Esses organismos se
caracterizam por, em geral, apresentar, de forma completa ou incompleta, sistema
digestivo, circulatório, nervoso, excretor e reprodutivo, sendo, portanto, altamente
especializados para viverem como parasitas humanos. Os helmintos patogênicos aos
seres humanos pertencem a dois filos: Platyhelminthes (platelmintos – vermes
4. Heller et al. (2002) encontraram densidades de 1-102 oocistos/L no esgoto sanitário em Belo
Horizonte, MG; Bastos et al. (2002) encontraram 4,0-510 oocistos/L em mananciais de
abastecimento de Viçosa, MG.
56 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Apesar de ovos (30-70 × 22-50 µm) e larvas de helmintos serem visíveis apenas
ao microscópio, os organismos propriamente ditos, larvas e vermes adultos, por serem
pluricelulares, não são classificados como microrganismos. Além disso, os organismos
adultos variam de 5-10 mm (Ancylostoma duodenale) a 6-10 m (Taenia saginata).
Em geral, os ovos de helmintos são extremamente resistentes, podem sobreviver por
longos períodos no meio ambiente e a ação da maioria dos desinfetantes utilizada no
tratamento da água e dos esgotos é inócua. Por outro lado, apresentam tamanho e
densidades suficientes para serem removidos por processos físicos, a exemplo da
filtração e da sedimentação.
Muito embora isso não possa ser tomado como regra geral, a prevalência de
helmintoses e protozooses costuma ser mais elevada em crianças e adolescentes e em
populações de baixa renda. Ilustra-se essa afirmação com dados recentes de pesquisa
realizada por Heller et al. (2002), no município de Viçosa, MG (Tabela 2.2), cuja
cobertura de serviços de saneamento urbano registra, respectivamente, 96% e 85%
de atendimento com serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário. O
trabalho envolveu um estudo de demanda laboratorial, avaliando 3.463 exames
parasitológicos de fezes. As parasitoses mais freqüentes (ascaridíase e ancilostomatose)
revelaram prevalência de indivíduos positivos de 8,2% e 3,1%, respectivamente. A
prevalência de exames positivos foi maior para as faixas etárias inferiores a 1 ano
(11,4/mil habitantes) e de 1 a 14 anos (20,5/mil habitantes), e em bairros com
qualidade de vida e infra-estrutura de saneamento mais precárias, logo, na população
de mais baixa renda.
Tabela 2.2 Distribuição dos exames positivos, proporção de indivíduos e prevalência de indivíduos
positivos na amostra estudada segundo o enteroparasita (Viçosa, MG, 1999 a 2001).
a) Ascaris lumbricoides
Ciclo biológico
b) Trichuris trichiura
O Trichuris e a tricuríase são bastante similares ao Ascaris e à ascaridíase em
termos de endemicidade, ciclo de vida, modo de transmissão e epidemiologia. Dentre
algumas das particularidades, uma fêmea adulta libera de 3 mil a 20 mil ovos/dia e o
desenvolvimento dos ovos à forma infectante, no solo e à temperatura de 25oC, ocorre
em cerca de 28 dias; à temperatura de 34oC esse período é reduzido para 13 dias. Os
ovos de Trichuris (Figura 2.10) são menos resistentes que os de Ascaris, podendo,
entretanto, sobreviver por meses no solo em condições favoráveis.
Ciclo biológico
A rápida eclosão dos ovos também é fator desfavorável, ao se registrar que isso
pode ocorrer em estações de tratamento de esgotos e, portanto, facilitar a saída de
larvas com o efluente. A sobrevivência das larvas em água e esgotos varia de poucos
dias a poucas semanas.
d) Strongyloides stercoralis
Ciclo biológico
e) Enterobius vermicularis
Por vários motivos o Enterorobius e a enterobiose constituem um caso particular
dentre as helmintoses causadas por nematóides. Em primeiro lugar, por não serem
necessários estágios de desenvolvimento do agente no solo e pela auto-infecção externa
ser elevada. A auto-infecção é decorrente da migração, geralmente noturna, da fêmea
adulta até a mucosa perianal, onde deposita os ovos e de onde são transportados à
boca pelas mãos, sendo esse mecanismo o principal responsável pela cronicidade
dessa verminose.
a) Cestóides
Hymenolepis nana
Uma das características dessa helmintose é a existência de dois tipos de ciclo:
um em que prescinde de hospedeiro intermediário e outro em que usa hospedeiros
intermediários, representados por insetos (pulgas e coleópteros). No primeiro caso,
os ovos eliminados, imediatamente infectantes, são ingeridos por pessoas
(normalmente crianças) e eclodem no intestino delgado, produzindo uma larva
cisticercóide que, posteriormente, se desenvolve para o verme adulto. Este possui
62 Desinfecção de Efluentes Sanitários
vida curta, pois cerca de 14 dias depois morre e é eliminado. No ciclo que envolve
hospedeiros intermediários, os ovos existentes no meio ambiente são ingeridos pelas
larvas de alguns insetos e no intestino desses hospedeiros se transformam em larva
cisticercóide. A infecção humana ocorre pela ingestão acidental de insetos contendo
larvas que, ao chegarem ao intestino delgado, se desenvolvem a vermes adultos. Não
obstante, ovos de Hymenolepis são freqüentemente encontrados em esgotos sanitários,
já que cada proglote madura contém cerca de 80-220 ovos. A imediata infectividade
dos ovos e a baixa dose infectante (1 ovo) favorecem a transmissão e a infecção,
porém os ovos são particularmente sensíveis a temperaturas mais elevadas e à
dessecação, apresentando reduzida sobrevivência no meio ambiente. O ciclo com a
participação de hospedeiros intermediários aparentemente contribuiu para a
disseminação do Hymenolepis nana no meio ambiente.
Ciclo biológico
Ciclo biológico
Teníase é o nome dado à infecção intestinal humana causada pela forma adulta
da Taenia, que se desenvolve no próprio organismo humano a partir do consumo de
carne contaminada com o cisticerco (estádio de larva). Cisticercose humana refere-se à
infecção provocada pelo próprio cisticerco, restrito, nesse caso, ao cisticerco da T. solium
(Cysticercus cellulosae), que pode afetar diversos tecidos, como o cérebro e o coração.
Cap. 2 Organismos Patogênicos e Efeitos Sobre a Saúde Humana 63
A liberação de ovos de Taenia no ambiente pode ser intensa, uma vez que cada
organismo pode desenvolver 800-2.000 proglotes e cada uma destas conter 104-105
ovos. No solo, as proglotes rompem-se rapidamente, liberando ovos prontamente
infectantes, o que, somado à prolongada sobrevivência nesse ambiente, favorece a
transmissão aos hospedeiros intermediários. Na água e no esgoto os ovos podem
permanecer retidos na proglote, o que pode dificultar sua detecção, porém os ovos
livres sobrevivem por mais tempo que no interior das proglotes, podendo perdurar na
forma infectante para os hospedeiros intermediários por cerca de 20 dias.
b) Trematóides
Schistosoma mansoni
Ciclo biológico
domésticas, etc. Inicialmente entendida como uma doença típica do meio rural,
atualmente são freqüentes os relatos de propagação urbana.
Paragonimus
A paragonimíase é amplamente distribuída na América Latina, sendo que no
Brasil sua ocorrência é aparentemente restrita ao Mato Grosso. A necessidade de dois
hospedeiros intermediários para que o ciclo de transmissão se complete e a estreita
relação da infecção com hábitos alimentares das populações (ingestão de crustáceos
crus ou de alimentos contaminados por manipulação dos crustáceos infectados) são
fatores que explicam a distribuição dessa doença.
Apesar de ovos poderem ser eliminados pelas fezes, o tratamento dos esgotos
sanitários não é considerado estratégia de controle relevante para essa enfermidade, por
haver vários reservatórios animais desse trematóide (carnívoros silvestres e domésticos).
Uma exceção caberia, entretanto, no caso de piscicultura com esgotos sanitários.
Ciclo biológico
Cap. 2
Elevada () () Sim (zoonose) contaminados
je juni
com esgotos.
Alimentos de
origem animal.
65
66
Tabela 2.3 Continuação.
Imunidade Sobrev. Latência/ Reservatório Inativação Remoção,
Cap. 2
Veículos:
alimentos e água
contaminados
67
68
Tabela 2.3 Continuação.
Inexistente/ Reduzida/
PROTOZOÁRIOS () (+) (?)
limitada moderada
Fecal-oral
Veículos:
alimentos e água
contaminados
Entamoeba Reduzida/
Cap. 2
Elevada () Não Não com esgotos.
hystolitica moderada
Contato pessoal:
mecanismo mão
boca, fômites e
69
70
Tabela 2.3 Continuação.
Sobreviv. Reservatório Inativação Remoção,
Cap. 2
mecanismo mão
boca, fômites e
Hym e no le pis Reduzida alimentos.
Elevada Não Sim
nana () Ingestão
71
72
Tabela 2.3 Continuação.
Latência
Carga excretada Persistência Dose infectate
Multiplicação
Organismos indicadores
Dadas as dificuldades de isolamento rotineiro de organismos patogênicos em
amostras ambientais, desde os primórdios da Microbiologia Sanitária sugere-se que a
indicação de contaminação seja determinada, prioritária e rotineiramente, por
indicadores microbiológicos da presença de material fecal no meio ambiente. Nesse
contexto, a interpretação básica do emprego de organismos indicadores é que sua
presença atesta poluição de origem fecal e, portanto, risco de contaminação, ou seja,
presença de patógenos. Entende-se, ainda, que a densidade de indicadores indica o
grau de poluição/contaminação.
Cap. 2 Organismos Patogênicos e Efeitos Sobre a Saúde Humana 75
e simplicidade deu lugar à utilização disseminada dos coliformes e, mais tarde, dos
coliformes fecais, determinados pelo teste da termotolerância, introduzidos por
Eijkman em 1904 (Hofstra & Huisint’t Veld, 1988).
De forma análoga, o grupo dos coliformes fecais inclui diversas espécies de vida
livre dos gêneros Klebsiella, Citrobacter e Enterobacter. Para evitar uma falsa indução
sobre sua exclusividade fecal, a tendência atual é se referir ao grupo como coliformes
termotolerantes (Cerqueira & Sá Horte, 1999; OMS, 1995). Apesar disso, e com
base no fato de que dentre os cerca de 106-108 coliformes fecais/100 ml usualmente
presentes nos esgotos sanitários predomina a Escherichia coli (esta sim uma bactéria
Cap. 2 Organismos Patogênicos e Efeitos Sobre a Saúde Humana 77
de origem exclusivamente fecal, humana e animal), esses organismos ainda têm sido
largamente utilizados como indicadores de contaminação.
b) Estreptococos fecais
Complementarmente, tem-se recorrido aos estreptococos fecais como bactérias
indicadoras de contaminação. O termo estreptococos fecais é bastante vago e refere-
se a um grupo de bactérias que, a exemplo dos coliformes fecais, inclui diversas espécies
de vida livre. Por isso, alguns autores preferem referir-se ao grupo como estreptococos
do grupo D de Lancefield, antígeno comum às bactérias do grupo que, em sua
classificação mais recente, inclui dois subgrupos. Primeiro, o dos enterococos
(pertencentes ao gênero Enterococcus), que inclui as espécies mais estreitamente
associadas aos dejetos humanos: E. avium, E. casseliflavus, E. cecorum, E. durans, E.
faecalis, E. faecium, E. gallinarum, E. hirae, E. malodoratus, E. mundtii, E. solitarius.
Entretanto, essas espécies também podem ser isoladas em fezes de animais, enquanto
algumas espécies e subespécies são de vida livre, como E. casseliflavus, E. faecalis var.
liquefaciens e E. malodoratus. Um segundo grupo que retém a denominação genérica
de estreptococos fecais (pertencentes ao gênero Streptococcus) inclui as espécies
Streptococcus bovis e Streptococcus equinus, associadas a dejetos animais (Knudtson
& Hartman, 1992).
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Glossário
l Agente infeccioso – organismo (vírus, bactéria, protozoário ou helminto) capaz de
produzir infecção ou doença infecciosa. Sinônimos: agente etiológico, agente
biológico, bioagente patogênico.
l Fômite – são objetos e/ou utensílios que podem estar contaminados, funcionando
como veículos. São exemplos de fômites: peças de vestuário, roupas de cama,
utensílios de copa e cozinha, instrumentos cirúrgicos e pensos e objetos de uso
pessoal.
l Heterotróficos – são seres vivos que dependem de outros para obter os nutrientes
utilizados em seus processos metabólicos, em outras palavras, necessitam de uma
fonte de carbono orgânica para sua nutrição. Exemplo: animais.
l Letalidade – refere-se ao maior ou menor poder que uma doença ou agravo tem de
provocar a morte dos indivíduos doentes.
l Organismos procariotas – seres vivos cujas células se caracterizam por não apresentar
o material genético (DNA) destacado do citoplasma; não apresentam núcleo
individualizado. Sinônimo: procariontes.
l Proglote – são os anéis que formam o corpo dos cestodas. As proglotes são divididas
em jovens, maduras e grávidas. Cada proglote tem sua individualidade alimentar
e reprodutiva, podendo-se dizer, então, que o corpo de uma tênia é formado pela
justaposição de vários indivíduos (proglotes).
l Saprófitas – são seres vivos que obtêm a fonte de carbono para sua nutrição a
partir de matéria orgânica morta, se contrapõem, assim, aos parasitas.
l Vetores – são seres vivos que transportam o agente desde o reservatório até o
hospedeiro. O agente infeccioso pode ou não se multiplicar ou se desenvolver no
interior do vetor.
Cinética da desinfecção
Lei de Chick-Watson
Segundo a WEF (1996), a destruição de bactérias e vírus resulta de ações físicas,
químicas e bioquímicas que podem ser previstas por expressões cinéticas simples.
Porém, a aplicabilidade de tais relações não é universal, estando sujeitas às condições
locais específicas que podem exigir alterações substanciais em modelos experimentais.
Deve ser lembrado que nos processos químicos de desinfecção, como em muitos
casos são empregados agentes oxidantes, poderá ocorrer consumo de parte dos
compostos dosados em reações com agentes redutores presentes nos esgotos. Essas
reações são relativamente rápidas e preferenciais, de forma que nem toda dose aplicada
estará disponível para desinfecção. Assim, a cinética da inativação microbiana deverá
ser baseada na dose residual, que estará efetivamente presente no esgoto após a
satisfação da demanda, e não na dose aplicada. Esses conceitos de demanda e residual
não são aplicáveis à desinfecção com luz ultravioleta. Na desinfecção de esgotos por
cloração, conforme será visto, o balanço entre demanda e residual, e a associação com
a eficiência do processo de desinfecção é complicada por causa da presença de amônia
que reage rapidamente com o cloro, gerando outros agentes desinfetantes, as chamadas
cloraminas, com potenciais diferentes do cloro residual livre para inativação dos
diversos organismos presentes.
90 Desinfecção de Efluentes Sanitários
δN
− = k×N (3.1)
δt
em que:
δN
− = velocidade de decaimento dos organismos
δt
k = coeficiente de reação, T–1
N = número de organismos sobreviventes em um dado instante t
t = tempo, T
N = N 0 × e− k × t (3.2)
k = k' × Cn (3.3)
Cap. 3 Cinética e Hidráulica dos Processos de Desinfecção 91
em que:
C = concentração do desinfetante, M.L–3;
n = coeficiente;
k'= coeficiente da reação de inativação independente de C e N; T–1.
δN
− = k × N × Cn (3.4)
δt
em que:
o –1
k 'T = constante da velocidade de reação à temperatura T C, T ;
δN
− = k' × N × t m × C n (3.6)
δt
C n × t p = constante (3.7)
em que:
C = concentração do desinfetante, M.L–3;
n = coeficiente associado à ordem da reação;
tp = tempo necessário para produzir determinada porcentagem de
decaimento, T.
Fenômeno da reativação
Alguns microrganismos atingidos pelo desinfetante podem desenvolver
mecanismos de reconstituição celular, reativando-se, dentro de certos limites, tanto
no claro como no escuro. O fenômeno da reativação está mais associado ao processo
de desinfecção por luz ultravioleta, ainda assim, alguns autores observaram que o
fenômeno é pouco significativo, ocorrendo quando alguns grupos de microrganismos
são expostos a determinados comprimentos de onda específicos durante certo tempo
mínimo necessário. Os protozoários parasitas Cryptosporidium e Giardia são exemplos
de microrganismos patogênicos que podem estar associados ao fenômeno da reativação
(Daniel, 1993).
N = N 0 × e− k × t (3.8)
em que:
N0 = concentração inicial de microrganismos ativos no ponto de lançamento,
No.L–3;
N = concentração de microrganismos ativos no tempo t após a descarga no
rio, No.L–3;
k = coeficiente de decaimento, T–1;
t = tempo transcorrido, T.
N0
N= (3.9)
1+ k × t
Concentração do traçador
Injeção contínua Saída
t t
t=0 t=0 tm
Concentração do traçador
Concentração do traçador
Injeção
de pulso Saída
t t
t=0 t=0 tm
Concentração do traçador
t t
t=0 t=0 tm
Concentração do traçador
Concentração do traçador
Injeção
Saída
de pulso
t t
t=0 t=0 tm
Figura 3.1 Respostas dos reatores de fluxo de pistão (a) e respostas dos reatores de mistura
completa (b) à injeção de traçadores.
96 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Como ambas as situações são idealizadas, o que ocorre na prática são graus
intermediários de dispersão longitudinal, que dependem fundamentalmente da
geometria do reator e da velocidade do escoamento. Quanto maior a dispersão, maior
a tendência para mistura completa; quanto menor, maior a tendência para o fluxo
pistonado. Teoricamente, os reatores de fluxo de pistão podem ser interpretados como
uma série infinita de reatores de mistura completa. Os graus intermediários de dispersão
podem ser associados a séries finitas de reatores de mistura completa. Quanto maior o
número de reatores na série, maior a tendência para o fluxo de pistão, e vice-versa. As
equações que representam esses modelos extremos de reatores idealizados podem ser
obtidas por balanço de massa, conforme será visto. Também há equações experimentais
para os chamados reatores com carga parcialmente dispersa, as quais representam todas
as situações intermediárias que associam a eficiência da reação desejada com o grau de
dispersão longitudinal. No equacionamento a ser desenvolvido, será observado que,
para reações que seguem a cinética de primeira ordem, sob condições idênticas, exceto
o formato, os reatores do tipo plug flow conduzem a eficiências mais elevadas, levando
à idéia consolidada de que um tratamento, quanto mais compartimentado ou estagiado,
mais eficiente. Sabe-se, na prática, que essa interpretação não é assim tão óbvia, as
diferenças podem não ser tão grandes quanto as esperadas teoricamente. No caso de
reatores para o tratamento biológico de esgotos, por exemplo, o regime de escoamento
pode influenciar na configuração do ecossistema. Além disso, os reatores de mistura
completa assimilam melhor as cargas de choque, distribuindo-as por toda a massa
líquida e não permitindo a propagação sob a forma de onda. Portanto, a definição das
características hidráulicas dos reatores é de fundamental importância para a otimização
dos processos que neles ocorrem. Particularmente para os reatores destinados à
desinfecção de esgotos, tal influência pode ser considerada decisiva.
Exemplos de aplicação
O grupo da Universidade Federal de Minas Gerais participante do PROSAB
estudou a aplicabilidade de um fotorreator simplificado de radiação ultravioleta na
inativação de coliformes totais e Escherichia coli. O fotorreator, com volume de 20,7 L,
foi confeccionado com tubo de PVC de 200 mm de diâmetro. Os testes hidrodinâmicos
foram realizados pelo Centro de Desenvolvimento de Tecnologia Nuclear (CDTN).
Foi utilizada a técnica CFD (Computational Fluid Dynamics), que emprega tecnologia
computacional, aliada ao uso de radiotraçadores, para determinar a dinâmica de
fluxos e detectar zonas mortas e curtos-circuitos no fotorreator. O traçador utilizado
foi o tecnécio, por apresentar energia adequada para realização do experimento e
meia-vida curta. Os testes hidrodinâmicos realizados mostraram que o comportamento
do fluxo no fotorreator obedece aos parâmetros da Tabela 3.1. e pode ser representado
pela curva da Figura 3.2.
série. Com base nesse estudo, observou-se que o tempo de detenção hidráulica medido
(θh = 86 s) ficou bem próximo do tempo de detenção hidráulico teórico (θh = 90 s),
o que comprova a ótima condição hidrodinâmica do FR desenvolvido, sem a ocorrência
de zonas mortas dentro do reator.
Tabela 3.1 Interpretação dos resultados dos testes hidrodinâmicos realizados na UFMG.
450
400
Contagem de radiação
350
300
250
200
150
100
50
0 Tempo (s)
0 50 100 150 200 250 300
2,25
1,50
0,75
0,00 t/t0
0,00 1,00 2,00 3,00 4,00
2,25
1,50
0,75
0,00 t/t0
0,00 1,00 2,00 3,00 4,00
Figura 3.3 Curvas de passagem de traçador salino no reator UV (Sant´Ana et al., 2002).
LIMITE DO SISTEMA
Q, C0 Reator Q, C
volume V
Figura 3.4 Croqui de um processo de tratamento e limites do sistema para efeito de balanço de
massa.
VkC = QC0 – QC
ou
C0
C= (3.10)
1+ k × V Q
C0 − C
t= (3.11)
kC
V
δC
∂t
b g
= QC 0 − QC + V − kC
δC
V = QC 0 − QC − VkC
∂t
Cap. 3 Cinética e Hidráulica dos Processos de Desinfecção 101
∂C
C' =
∂t
VC'+ QC + VkC = QC 0
b g
V C'+ kC + QC = QC 0
Q Q
C'+ kC + C = C0
V V
Q
β=k+
V
Q
C '+ β C = C0
V
b
eβt C'+βC = e βt g Q
V
C0
c h' = C' e
Prova: Ce
βt βt
b
+ β e βt ⋅ C = e βt C' + C g
cCe h' = QV C e
βt
0
βt
Integrando-se:
Q C 0 βt
Ceβt = e +k
V β
Q C0
C= + ke − βt
V β
Condições de contorno: t = 0 ⇒ C = C0
Q C0 Q C0
C0 = + k ⇒ k = C0 −
V β V β
Substituindo-se o valor de k:
Q C0 FGQ C 0 − βt IJ
C=
V β
+ C0 −
HV β
e
K
Q C0 Q C 0 − βt
C= + C 0 e − βt − e
V β V β
C=
Q C0
V β
c h
1 − e − βt C 0 e − βt (3.12.)
Q C0
C=
V β
Q C0 QC 0 QC 0 C0
C=
FG Q
=
IJ = =
Vk + Q Vk + Q 1 + kV
H K
V
k+
V Q
Exemplo 1
Um esgoto sem tratamento, com concentração de E. coli de 106 org/100 ml, é
descarregado em três lagos em série, cujos regimes podem ser interpretados como de
Cap. 3 Cinética e Hidráulica dos Processos de Desinfecção 103
mistura completa. A vazão de esgotos é de 1.600 m3/dia e os volumes dos lagos são,
respectivamente, 3.200, 6.400 e 9.600 m3. Supondo que ocorre uma reação de primeira
ordem com k = 2,6 d–1 nos três lagos, determine a concentração de E. coli no efluente
do terceiro.
6
C0 = 10 C1 = ? C2 = ? C3 = ?
t = 2d t = 4d
t = 6d
Q=1.600 m3/d
Observação: t = V/Q
C0 106
C=
1+ k ⋅ t ð C1 =
1 + 2,6 × 12
= 0,031 × 106 = 3,1 × 104 org/100 ml
C1 1,6 × 105
C2 =
1+ k ⋅ t ð C2 =
1 + 2,6 × 4
= 0,14 × 105 = 1,4 × 104 org/100 ml
C2 1,4 × 104
C3 =
b
1+ k ⋅ t g ð C3 =
1 + 2,6 × 6
= 0,084 × 104 = 8,4 × 102 org/100 ml
Exemplo 2
Qual seria a concentração final de E. coli, caso se tivesse um único lago com o mesmo
volume da série anterior?
6
C0 = 10 C=?
C0 106
C=
1+ k ⋅ t ð C1 =
1 + 2,6 × 12
= 0,031 × 106 = 3,1 × 104 org/100 ml
Portanto, usando um único reator deverá ser esperada uma eficiência inferior à
dos três reatores em série de mesmo volume total.
C1 1 C 1 C 1 C 1
= ; 2 = ; 3 = ; n =
C 0 1 + kV C1 1 + kV C 2 1 + kV C n −1 1 + kV
nQ nQ nQ nQ
e, como
C1 C 2 C 3 C C
× × × ... × n = n
C 0 C1 C 2 C n −1 C 0
tem-se que:
F I n
Cn G 1 JJ
=G
C0 GH 1 + kV J
nQ K
(3.13)
Exemplo 3
Ainda em relação ao Exemplo 1, se fossem utilizados três lagos de mesmo volume,
perfazendo o mesmo volume total da série anterior, qual seria a contagem de E. coli
ao final do terceiro lago?
6
C0 = 10 C1 = ? C2 = ? C3 = ?
t = 2d t = 4d
t = 6d
Q = 1.600 m3/d
F I n
Cn G 1 JJ
=G
C3 FG1 IJ n
C0 GH 1 + nQ
kv
JK ð 10 6
=
H
1 + 2,6 × 4 K ð C 3 = 675 org/100 ml
Volume V Área A
Q, C0 Q, C
L
106 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Q, C0 Q, C + C/ x
Área A
x
b
δVkC = QC − Q C + δC g
δVkC = QC − QC − QδC
Q δC
z z
L C
δVkC = − QδC ∴ Aδx = − ∴ kQ δC ∴
k C δx = −
0
A C0 C
− k×V
Q C
L= ln ∴ C = C0 × e Q
(3.14)
Ak C 0
Exemplo 4
Ainda em relação ao exercício anterior, se tivéssemos um único lago que pudesse ser
interpretado como fluxo de pistão, qual seria a contagem de E. coli em sua saída?
6
C0 = 10 C=?
Q = 1.600 m3/d
− k×V
C = C0 × e Q
ð C = 106 × e −2 ,6×12 ð C = 2,8 × 10−8 org/100 ml
O resultado praticamente nulo deixa claro que para o mesmo tempo de detenção
e taxa de reação, o modelo de reator de fluxo de pistão conduz a eficiências mais
elevadas.
Exemplo 5
Um reator de fluxo de pistão opera sem recirculação, com tempo de detenção hidráulica
de 6 horas, no qual se processa uma reação de primeira ordem, com k = 5,0 d–1. Caso
se proceda à recirculação do efluente final, com uma vazão igual à vazão de alimentação,
qual será a variação da eficiência?
a) Sem recirculação
t, k
Q
C0 C
C
C0
= e − k ×θ ð
C
C0
= e −5× 0 ,25 ð
C
C0
= 0,286 ð bE = 71,3% g
b) Com recirculação
Q ( Q + Qr ) Q
C0 Ca C
Qr
108 Desinfecção de Efluentes Sanitários
C C C
C0
= e − k ×θ 2 ð C0
= e −5× 0 ,125 ð C0
= 0,535
Entretanto,
Ca =
C0 + C
2 ð
C
C0
= 0,365 ð bE = 63,5% g
Portanto, a eficiência será reduzida de 71,3% para 63,5%.
Exemplo 6
Determine a relação entre os volumes de um reator de mistura completa e um de
fluxo de pistão para a remoção de 90% de um poluente por meio de uma reação de
segunda ordem no regime estabilizado.
Solução:
VkC 2 = QC 0 − QC
b g
V × k × 0,1 = Q × 1 − Q × 0,1
2
V = 90 Q k
ð
Equação do reator de fluxo de pistão, reação de segunda ordem e regime estabilizado
δVkC 2 = QC − Q C + δC b g
δVkC 2 = − QδC
δC k
2
= −δV
C Q
Cap. 3 Cinética e Hidráulica dos Processos de Desinfecção 109
z δC
z −1 1 − kV
C L
k
C 2
=−
Q0
Aδx ð +
C C0
=
Q
C0
−1 1 − kV
+ = ð V = 9 Q/k
C C0 Q
F I
GG J
1
C 4×a×e 2d
= IJ J
C0 GH b1 + ag × eFGH IJK − b1 + ag × eFGH
2
a
2d 2
−a
2d KJ
K
(3.15)
em que:
a = 1 + 4 × k × t × d;
k = coeficiente de reação;
t = tempo de detenção hidráulica;
d = número de dispersão.
Curva de ajuste
0,060
Coeficiente de dispersão d
0,045 –1,154
Y = 0,7907 x
2
R = 0,9234
0,030
0,015
0,000
0,00 10 20 30 40 50
Vazão
Figura 3.7 Coeficientes de dispersão obtidos a partir das curvas de passagem de traçador salino
no reator UV (Sant´Ana et al., 2002).
Exemplo 7
Uma lagoa de maturação possui tempo de detenção hidráulica de sete dias. Com
base em sua relação comprimento/largura, estimou-se o fator de dispersão em 0,25. A
lagoa é alimentada com os efluentes de lagoa facultativa, com densidade de E. coli de
105 NMP/100 ml, ocorrendo decaimento segundo o coeficiente k = 0,6 d–1. Estime a
concentração de E. coli nos esgotos à saída da lagoa.
Solução:
a) Cálculo da constante a
a = 1+ 4 × k × t × d
b) Cálculo de C/C0:
C G
F I
J
1
4×a ×e d
2
=
GG FaI F −a IJ
K JK
ð
C 0
H a1+ af 2
×e H 2d K
− a + f × e H 2d
1 a
2
F I
GG J
1
4 × 2,28 × e 2×0,25
IJ J ð
C C
= FG 2,28 IJ FG −2,28 = 6,86 × 10−4
C0 GH a1 + 2,28f 2
× e H 2× 0,25 K − a1 + 2,28f × e H 2×0,25
2 K JK C0
−4
∴ C = 6,86 × 10 × 105 = 69 NMP/100 ml
Referências bibliográficas
ALVES, C. V. P.; CHERNICHARO, C. A. L.; VON SPERLING, M. Avaliação de um fotorreator
simplificado de radiação UV para desinfecção de efluentes secundários. Belo Horizonte: Universidade
Federal de Minas Gerais, Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental, 2002.
METCALF; EDDY, I. N. C. Wastewater engineering: treatment, disposal, and reuse. 3. ed. New
York: McGraw-Hill Inc., 1995.
USEPA – Environmental Protection Agency. Alternative disinfectants and oxidants guidance manual.
New York, USA, 1999.
112 Desinfecção de Efluentes Sanitários
WHITE, G. C. Handbook of chlorination and alternative disinfectants. 4th. New York: Ed. John
Wiley & Sons, 1992.
Cloração e Descloração
Miguel Mansur Aisse, Bruno Coraucci Filho, Cícero Onofre de Andrade Neto,
Décio Jürgensen, Flávio Rubens Lapolli, Henio Normando de Souza Melo,
Roque Passos Piveli e Sérgio João de Lucca
Introdução
O cloro é o produto mais utilizado em todo o mundo para desinfecção de águas
e esgotos. No caso do Brasil, não há como negar que a cloração é o método de maior
domínio tecnológico e viabilidade econômica atualmente. Em que pesem os benefícios
da cloração de esgotos sanitários tratados, é necessário considerar que todos os
desinfetantes químicos produzem subprodutos, direta ou indiretamente, e alguns
destes podem gerar riscos à saúde pública. Contudo, os riscos associados dependem
das concentrações e do período de ingestão, podendo não afetar indivíduos submetidos
a longa exposição, desde que em concentrações dentro das faixas permissíveis. Deve-
se, então, buscar o ponto ótimo entre as curvas de custo (considerados o risco associado
aos subprodutos e os custos de aplicação) e o benefício, gerados nos vários processos
e níveis de desinfecção, a fim de obter a melhor solução para garantia da segurança
sanitária (Chlorine Institute, 1997).
sanitária requerida. Para otimizar o processo deve-se, então, procurar os pares desses
parâmetros, os quais funcionarão como referência.
O cloro e seus derivados apresentam alto poder oxidante e reagem com vários
compostos presentes nos esgotos. A demanda de cloro, calculada pela diferença entre
a dose inicial e o residual de cloro, é proveniente dessa variedade de reações nas quais
o cloro é consumido por vários constituintes da água residuária e por decomposição.
De modo simplificado, o cloro reage com a amônia para produzir uma série de
compostos chamados cloraminas e, eventualmente, oxida a amônia em gás nitrogênio
(N2). O mecanismo de reação é complexo, e os produtos variam com o pH, razão
entre o cloro adicionado e a amônia presente e o tempo de contato. A monocloramina
(NH2Cl) e a dicloramina (NHCl2), denominadas cloro combinado, têm poder
desinfetante, apesar deste ser inferior ao dos produtos resultantes da dissociação de
qualquer forma de cloro na água, conhecidos como cloro livre (HOCl e OCl–). As
reações com outros compostos inorgânicos como o sulfeto de hidrogênio (H2S) ocorrem
imediatamente após a aplicação do cloro.
Das reações com os compostos orgânicos deve-se dar atenção àquelas que ocorrem
com o nitrogênio orgânico e com os compostos não nitrogenados que podem formar
trihalometanos (THM’s). Apesar dos efluentes de sistemas de tratamento possuírem
muitos precursores da formação de THM’s, a quantidade desses compostos nos esgotos
clorados pode, de fato, ser pequena pela seletividade da reação com a amônia e pela
menor velocidade de reação com os compostos formadores de THM’s na presença de
cloro livre ou combinado (WEF, 1996). A decomposição do cloro sob ação da radiação
UV reduz a eficiência dos processos de desinfecção, já que reduz o porcentual do
residual de cloro ao longo do tempo nos reatores de contato.
Principais compostos
Para desinfecção de águas residuárias, o cloro pode ser encontrado comercialmente
nas formas gasosa (Cl2), líquida (hipoclorito de sódio) e sólida (hipoclorito de cálcio).
Também pode ser produzido no local a partir de salmoura ou reação controlada de
produtos químicos.
Cloro gás
O cloro molecular (Cl2) é um gás amarelo e esverdeado, de densidade maior que
o ar à temperatura e à pressão ambientes. Quando comprimido a pressões superiores
a sua pressão de vapor, o cloro se condensa em líquido, com conseqüente liberação de
calor e redução de volume em cerca de 450 vezes. Essa é a razão pela qual o transporte
comercial de cloro usualmente é feito em cilindros pressurizados, que possibilitam
substancial redução do volume. No entanto, quando se necessita fazer a aplicação do
cloro na forma gasosa, muitas vezes torna-se necessário suprir energia térmica para
vaporizar o cloro líquido comprimido. Algumas das principais propriedades físicas do
cloro são apresentadas na Tabela 4.1.
Hipoclorito
Nas aplicações práticas de desinfecção de esgotos também é utilizado o cloro
nas formas de hipoclorito de sódio e hipoclorito de cálcio. A quantidade relativa de
cloro presente nessas fontes alternativas de cloro é expressa em termos de “cloro
disponível”. Estequiometricamente, compostos puros de hipoclorito de sódio e de
cálcio contêm 95,2% e 99,2% de cloro disponível, respectivamente (Usepa, 1986).
116 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Cloro combinado
Quando o cloro entra em contato com substâncias dissolvidas, presentes nos
esgotos, ocorre uma série de reações de dissipação, que resulta na perda de
desinfetante ou em mudança em sua forma para uma espécie menos ativa. Dentre
essas reações, destacam-se as que ocorrem com alguns compostos de nitrogênio e
que resultam na formação de cloraminas. As reações com compostos orgânicos
também são importantes, uma vez que podem levar à produção de subprodutos
organoclorados.
Quando a amônia (NH3) está presente na água ocorre a reação com o cloro para
formar cloraminas:
NH3 + HOCl → NH2Cl + H2O + H (monocloramina) (4.1)
0,5
Cloro livre
Cloraminas Predominância de cloro
0,4 Cloro residual residual livre
Cloro residual
0,2
0,1
A
0
0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0
Cloro aplicado
Figura 4.1 Curva de cloro residual em águas com presença de amônia. Fonte: Chernicharo et al.
(2001).
118 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Di Bernardo (1993) cita que o pH exerce influência decisiva nas espécies que
se formam quando a dosagem de amônia, o tempo de reação e a temperatura
permanecem inalterados. Observam-se uma vez mais aqueles valores de pH para os
quais é maximizada a produção de tricloramina, dicloramina ou monocloramina.
Verifica-se que, para valores altos do pH, não há a tricloramina. Na Tabela 4.2 são
apresentadas as principais propriedades físicas, químicas e termodinâmicas das
cloraminas.
Dióxido de Cloro
O dióxido de cloro é um gás amarelo descoberto em 1811. Trata-se de um oxidante
químico com amplas aplicações na desinfecção de água de abastecimento e também
residuárias. O dióxido de cloro foi utilizado pela primeira vez em 1940 e bastante
empregado em países como Itália, Alemanha e Bélgica.
Forma de atuação
Para projetar um sistema de desinfecção de esgotos torna-se necessário conhecer
a taxa de inativação do microrganismo indicador pelo agente desinfetante. Em
particular, o efeito da concentração do agente desinfetante sobre a taxa desse processo
determinará a combinação mais eficiente entre o tempo de contato e a concentração
de desinfetante a utilizar.
Modelo de Chick-Watson
A análise de diversos dados de inativação de uma grande variedade de
microrganismos pelo cloro livre e pelo cloro combinado indica que a equação
combinada de Chick-Watson fornece uma descrição satisfatória do processo de
desinfecção.
N
N0
c
= exp⋅ 1 − k ' ⋅ C n ⋅ t h (4.4)
em que:
N0 = concentração inicial de coliformes (NMP/100 ml);
N = concentração final de coliformes, (NMP/100 ml);
C = concentração de cloro residual ao final do tempo de contato t (mg/L);
120 Desinfecção de Efluentes Sanitários
= [1 + 0,23 × C × t ]
N −3
(4.5)
N0
103 −3
= 1 + 0,23 × C × t
38 × 106
Tabela 4.3 Parâmetros de Chick-Watson para inativação microbiológica com cloro livre.
6 20 0,0290 1,24
7 20 0,0219 1,18
8 20 0,0209 1,12
9 20 0,0080 0,99
10 30 0,0032 0,87
10 35 0,0044 1,0
10 50 0,0075 1,26
6 10 12,78 0,818
6 30 75,12 0,608
Tabela 4.4 Parâmetros de Chick-Watson para inativação microbiológica com cloro combinado.
Modelo de Selleck-Collins
Esse modelo representa um refinamento do anterior, sendo descrito pela equação:
e j
N −n
= R× tb (4.6)
N0
em que:
R = concentração de cloro residual ao final do tempo de contato t (mg/L);
b = ponto em que a reta intercepta o eixo x quando N/N0 = 1 ou log (N/N0) =
0 (b é chamado de tempo de retardamento do decaimento bacteriano, que
não ocorre até quando Rt > b);
n = declividade da reta.
Um modo fácil de utilizar essa equação é lançar em gráfico os valores dos logaritmos
em papel aritmético, Log (N/N0) no eixo y e Log (Rt) no eixo x. Examinando a equação,
observa-se que quando N = N0 não há decaimento: N deve ser menor que N0 para que
haja decaimento. Quando não há, N/N0 = 1 e Log 1 = 0. Assim, a reta inicia-se em zero
no eixo y. Quando RT = b, RT/b = 1 e N/N0 = (1)–n. Portanto, b é determinado quando
a curva de regressão intercepta o eixo x. Se essa equação for lançada em papel log–log,
a curva interceptará o eixo y em 1,0, mas, em papel aritmético, interceptará em zero,
porque Log 1 = 0. O ponto em que a reta intercepta o eixo y é o ponto em que Log
Rt = Log b. Cada ponto da curva à direita representa Rt > b.
124 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Log 1 = 0
Log b
Log (RT)
Figura 4.2 Gráfico do modelo de Selleck-Collins para a cloração. Fonte: White (1999).
Quando não se têm dados para obtenção da curva, sugere-se b = 4 para coliformes
totais e b = 3 para coliformes fecais. Usando esses valores e com n = –3, a Equação
4.8 torna-se idêntica à Equação 4.7, em que C = R. A inserção do “1” nessa última
equação é para forçar a curva de regressão a uma linha reta para baixos valores de
decaimento bacteriano.
Log (N/N0)
Log C x t
Figura 4.3 Resolução do modelo de Selleck-Colins para a cloração. Fonte: White (1999).
Demanda
Dosagens de cloro requeridas
As dosagens de cloro requeridas para a desinfecção dependem de uma série de
fatores, notadamente das características do esgoto. Nesse sentido, usualmente são
Cap. 4 Cloração e Descloração 125
Tabela 4.5 Dosagens típicas de cloro para desinfecção de esgotos brutos e tratados, para Padrão
de Lançamento de 1.000 NMP/100 ml de coliformes fecais.
Efluente primário 10 a 30
Efluente anaeróbio 6 a 13
Constituintes Reação
Orgânicos sintéticos e naturais Pode reagir para formar o clorito (ClO2)
Ferro e manganês Oxidação
Cor Remoção
THM Minimização
Orgânicos Oxidação
Fenóis Reações para formar fenóis clorados e quinonas
Fonte: Richardon et al. (1994).
pH. Os valores “C × t” do dióxido de (ClO2) estão entre o cloro livre (Cl) e o ozônio
(O3), de acordo com a Tabela 4.7.
Tabela 4.7 Lista dos intervalos “C × t” de produtos, na inativação de vários microrganismos por
alguns desinfetantes.
Descloração
O impacto do cloro livre ou combinado em corpos d’água, resultante da desinfecção
de efluentes, tem sido controlado por padrões ambientais. Pelas regras da Resolução
Conama 20, o padrão ambiental é de 0,020 mg/L de cloro livre ou combinado para
proteção da vida aquática. Nos Estados Unidos, 47% dos sistemas de tratamento de
efluentes praticam a descloração com compostos químicos, sendo os principais: dióxido
de enxofre (62%), sulfito de sódio (27%), sulfito de sódio (3%), metabissulfito de
sódio (3%) e tiossulfato de sódio (2%). Outros compostos testados são sulfitos
amoniacais. Para a descloração do cloro livre (Cl2), pode-se, também, empregar carvão
ativado e peróxido de hidrogênio, com a vantagem de controlar odores. A Tabela 4.8
mostra características e dosagens dos principais agentes desclorantes.
Compostos reduzidos, como sulfetos, íon ferroso, íon manganoso, nitritos, etc.,
também exercem demanda sobre o cloro livre, indiretamente desclorando o efluente.
128 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Tabela 4.9 Critérios e parâmetros de projeto típicos para utilização de dióxido de enxofre em
unidades de descloração.
Valores
Aplicação Unidade
Faixa Típicos
mgSO2/L por mg/L
Dosagem
de cloro residual
− para vazão média 1,0 a 1,6 1,3
− para vazão máxima 2,0 a 5,0 4,0
Tempo de contato para mistura rápida segundo
− para vazão máxima 45
Taxa de retirada de gás
− de recipientes de 150 libras 30
− de recipientes de 2.000 libras 370
Fonte: Chernicharo et al. (2001), citando Metcalf & Eddy (1991); WEF (1992).
Cloro líquido
Sinal de controle
Afluente Clorador
Evaporador
Medidor
Cilindro de cloro
de vazão Cloro gasoso Cloro gasoso comprimido
gasoso
Solução
de cloro Dióxido de enxofre
Difusor/misturador Analisador de líquido
de cloro cloro residual
Água efluente
Evaporador
Tanque Cilindro de dióxido
de contato Dióxido de enxofre de enxofre
gasoso
Dosador
Injetor Dióxido de enxofre
gasoso
Difusor/misturador Solução de
de dióxido de dióxido de enxofre
enxofre
Efluente desinfetado
Corpo receptor
Efluente do reator
Aplicação – dióxido de
anaeróbio 1
anaeróbio 2
Coleta de amostras
Comporta de manobra
By-pass geral
carbono
do by-pass
Retorno
saturação vazão
By-pass geral do
anaeróbios
Medidor Compressores
de vazão
Floculador tipo
Misturador rápido turbina
Vem dos tanques de
Raspador
cloreto férrico
Calha Parshall
Figura 4.5 ETE Cambuí: fluxograma dos processos de floculação, flotação e desinfecção.
130 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Produção do desinfetante
Desinfecção com misturas oxidantes geradas in loco
A geração in loco de desinfetantes tem sido preconizada para pequenas instalações
de tratamento de água e efluentes, por várias vantagens; dentre as principais estão
sua portabilidade, por empregar poucos ou nenhum reagente químico, e sua simples
operação. Processos eletrolíticos empregando cloreto de sódio, abertos ou fechados,
podem produzir hipoclorito, cloratos, cloritos e, em menor escala, ozônio, dióxido de
cloro, singlets de oxigênio, vapor d’água, além de excesso de hidrogênio e outros gases
reduzidos.
Dosador
ejetor
Ponto de
aplicação
Água de
alimentação
Registro Rotâmetro
Reservatório de
salmoura Flutuador
Fonte de Válvula de
corrente regulagem
Reator
da câmara
de reação
Clorador de pastilhas
1. Descrição: o clorador de pastilhas consiste em um dispositivo simples, confeccionado
de materiais resistentes à corrosão química, que promove a abrasão de pastilhas de
hipoclorito de cálcio armazenadas em seu interior pela passagem de água ou líquido
a ser tratado, formando a solução clorada que será aplicada ao efluente a ser
desinfetado.
Pastilhas de hipoclorito de cálcio, com 60% de cloro ativo, têm sido testadas
com grande eficiência na desinfecção. A eficiência média de desinfecção para coliformes
fecais pode ser de 6 log e, para coliformes totais, pode variar entre 5 e 7 log. Apesar de
as pastilhas fornecerem cloro para o efluente em tratamento por volta de 10 a 15
horas, há grande dificuldade em manter a dosagem constante, porém esse problema
não é verificado em aplicações por batelada.
Água de arraste
Reator
Bombas dosadoras
Água de arraste
Reator
Bombas dosadoras
NaClO2 Cl2
Aspectos construtivos
Mistura
O grau de mistura no ponto de aplicação do desinfetante tem efeito pronunciado
sobre a taxa inicial de inativação de diversos microrganismos, sendo recomendado,
portanto, elevados gradientes de mistura (acima de 500 s–1) e suficientes tempos de
contato (usualmente da ordem de 1 a 15 segundos).
A solução de cloro deve ser injetada por meio de um difusor, de modo a garantir
distribuição uniforme junto ao fluxo de esgotos. Em sua forma mais simples, o difusor
pode ser constituído de um tubo plástico perfurado (Jordão & Pessoa, 1995). Há
diversas opções de sistemas de mistura utilizando dispositivos mecânicos, canais ou
condutos com escoamento em regime turbulento, podendo-se destacar os seguintes
(Chernicharo et al., 2001, citando Usepa, 1996):
l Difusor em tubulação: colocado no interior de uma tubulação, onde o efluente
escoa à seção plena e em regime turbulento.
l Estrutura hidráulica submersa: na qual se induz uma zona turbulenta no
ponto de aplicação da solução de cloro. Duas configurações são usualmente
utilizadas: vertedor submerso e ressalto hidráulico.
l Misturador mecânico: instalado em uma pequena câmara de mistura com
reduzido tempo de residência, preferencialmente da ordem de 1 segundo, ou
menos, e gradiente de mistura variando entre 1.500 e 3.000 s–1 (Chernicharo
et al., 2001, citando Metcalf & Eddy, 1991). A utilização de misturadores
mecânicos é particularmente importante nas estações que requerem baixas
concentrações de coliformes fecais no efluente final.
Injetor
Misturador mecânico
Afluente
Fluxo
Ressalto hidráulico
Tanque de
contato
Difusor
Difusor de cloro de cloro
Figura 4.9 Exemplos de dispositivos de adição e mistura de cloro. Fonte: Chernicharo et al. (2001),
adaptado de Usepa (1986) e Metcalf & Eddy (1991).
Gerenciador de
Reator dióxido de cloro
Rotâmetro
Aplicação de
dióxido de cloro
Retorno
Coleta de amostra
do tanque de contato
Água da rede Sensor de
(Sanepar) residual de
dióxido de
cloro
Reservatório
de água
Tq. ácido clorídrico Tq. clorito de sódio
Figura 4.10 Fluxograma do processo de produção de dióxido de cloro in loco (ETE Cambuí, Campo
Largo, PR). Fonte: Jürgemsen (1999).
Controle da dosagem
O controle da dosagem da solução de hipoclorito pode se dar com a regulagem
manual de bombas dosadoras e com a intervenção do operador. Modernamente pode-
se contar com o auxílio de sistemas de controle por microprocessador (sistema
gerenciador). Quando o sistema está trabalhando de forma automática, proporcional
à vazão, é exigida a instalação de um medidor de vazão que informa ao
microprocessador a necessidade de manter, aumentar ou diminuir a produção de
dióxido. Sensores de residual de cloro livre ou dióxido, recebendo amostras do esgoto
efluente do tanque de contato, também podem ser interligados ao processador, a fim
de garantir o residual preestabelecido, como, por exemplo, 0,3 mg/L (Figura 4.11).
Vai ao gerenciador de
produção de dióxido de cloro
Medidor controlado
de dióxido de cloro Medidor de vazão
Chegada de amostra
do tanque de contato
Retorno ao
tanque de contato
Figura 4.11 Controle da dosagem de dióxido de cloro (ETE Cambuí, Campo Largo, PR).
Tanque de contato
A função desse tanque é garantir um tempo suficiente de permanência do esgoto
em contato com o cloro, a fim de possibilitar adequada desinfecção. Para tal, pelo
menos 80% a 90% do esgoto deve ficar retido no tanque de contato por um
determinado intervalo de tempo. A melhor forma de conseguir isso é pelo uso de
tanques com regime de escoamento de fluxo pistão (plug flow). Esses tanques devem
apresentar relações comprimento:largura de ao menos 10:1 e, preferencialmente, da
138 Desinfecção de Efluentes Sanitários
em que:
Nos casos em que o lançamento final do efluente da estação é feito por meio de
longos emissários, nos quais o esgoto apresenta tempos de percurso superiores aos
tempos de contato requeridos para desinfecção, pode ser possível eliminar a construção
do tanque de contato.
Figura 4.12 Tanque de contato com chicanas (ETE Cambuí, Campo Largo, PR).
Cap. 4 Cloração e Descloração 139
Figura 4.13 Tanque de contato com regime de escoamento de fluxo pistão (ETE Caçadores, Cambé,
PR).
Hipoclorito de sódio
Apresenta-se como solução, fornecida em recipientes plásticos de 60 kg, cujo
conteúdo é, às vezes, diluído em tanques maiores, obtendo uma solução que é, então,
dosada. Esse produto também pode ser fornecido em carros-tanque de 6, 12 ou 24
toneladas (Di Bernardo, 1993). A perda de cloro disponível é tanto maior quanto
maior for a concentração inicial. A solução é razoavelmente instável e se deteriora
rapidamente. Essa deterioração pode ser reduzida por processo de fabricação mais
cuidadoso e controle da alcalinidade. A maior estabilidade é obtida quando o pH
está próximo a 11 e não apresenta cátions de metais pesados. O armazenamento
deve ser feito em temperatura inferior a 30ºC, pois acima dessa temperatura a
decomposição cresce rapidamente. O armazenamento em área escura e temperatura
não muito elevada reduz grandemente a taxa de deterioração. De qualquer forma, a
140 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Cloro gasoso
O cloro é fornecido em cilindro de aço, onde se encontra parcialmente liquefeito.
A pressão do cloro gasoso, presente na parte superior do cilindro, é a pressão de vapor
correspondente à temperatura em que o cloro se encontra.
A área de armazenamento deve ser ventilada e não dar saída direta para escadas
descendentes ou poços de elevadores.
que os cilindros rolem. Sua movimentação é feita mediante talha elétrica presa a uma
monovia (Manfrini, 1987).
Clorito de sódio
É fornecido em escamas acondicionadas em tambores de aço. Apresenta grande
poder oxidante, exigindo, por isso, cuidados no transporte e manuseio.
Não há, entretanto, cuidados especiais para manuseio, a não ser a necessidade de
impedir sua ingestão e seu contato com mucosas e pele. Não pode entrar em contato
com materiais combustíveis, inclusive com tecidos. Se isso ocorrer, é necessário lavar o
local ou a peça atingida até remover todos os traços do produto. Se tal não for feito, o
material combustível deve ser rapidamente removido para o exterior e queimado.
O armazenamento deve ser feito em local especial onde não possam ocorrer
acidentes. Esse local será usado inclusive para armazenar os recipientes vazios que
contiverem o produto, até seu retorno para reúso. Nessa ocasião os recipientes deverão
ser lavados, lançando-se a água de lavagem nos esgotos. Os recipientes não deverão ser
usados para outra finalidade a não ser a de conter clorito de sódio (Manfrini, 1987).
Ácido clorídrico
O ácido clorídrico anidro é um gás incolor, venenoso, de odor penetrante às
condições normais de pressão e temperatura. O gás clorídrico se dissolve na água,
produzindo o ácido comercial, líquido incolor e amarelado. Em solução a partir de
10% emite vapores.
O ácido clorídrico é um dos mais ativos ácidos inorgânicos não oxidantes. Por
isso, exige cuidados especiais na armazenagem e no transporte junto a outros produtos
químicos.
como parafusos, fixadores, etc., devem ser protegidos com tinta antiácidos. Outras
informações sobre instalações podem ser encontradas em IBP (1978).
30,2 Tosse
40 a 60 Nível de perigo
Fonte: Chernicharo et al. (2001), citando Usepa (1986).
É interessante notar, a partir da Tabela 4.10, que o nível mínimo de odor detectado
pelo ser humano (3,5 ppm) é maior que o limite máximo estabelecido para a segurança
do operador (1 ppm). Dessa forma, a unidade de desinfecção deve dispor de algum
dispositivo, químico ou eletrônico, para o monitoramento contínuo de cloro no
ambiente.
Caso ocorra algum contato com o cloro, seja por inalação, olhos ou pele, decorrente
de vazamentos, podem ser tomadas as medidas de emergência indicadas na Tabela
4.11 antes de se consultar um médico.
Cap. 4 Cloração e Descloração 143
Subprodutos
Uma das tecnologias alternativas utilizadas para a desinfecção de efluentes
tratados é a geração eletroquímica de hipoclorito de sódio a partir de cloreto de
sódio. No entanto, devido aos subprodutos gerados pela combinação do cloro com
144 Desinfecção de Efluentes Sanitários
outras substâncias presentes nos efluentes, podem ser formados subprodutos como os
trihalometanos, os ácidos haloacéticos, os fenóis clorados e outros aromáticos clorados
que são potencialmente cancerígenos, mutagênicos e que podem ser bioacumulados
nas cadeias tróficas (De Luca, 2001).
A desinfecção com compostos de cloro pode gerar, além de THMs, vários outros
subprodutos (EPA, 1999), destacando-se ácidos haloacéticos (HAAs), que após um
período se degradam, naturalmente, em THMs. A Figura 4.16 mostra as concentrações
de HAAs obtidas em estação piloto, para dosagem de 6 mg/L e tempo de detenção de
tanque de contato convencional, com chicanas. Os valores ficaram abaixo de 20 µg/L,
diante de um padrão ambiental americano de 60 µg/L para reúso público.
ETE RSB/UFRGS
2,0 ETE Serraria/L. facultativa
1,8 ETE Esmeralda/UASB
1,4
1,2
1,0
0,8
0,6
0,4
0,2
0,0
0 2 4 20
Tempo de teste (h)
ETE RSB/UFRGS
5,0 ETE Serraria/L. facultativa
4,5 ETE Esmeralda/UASB
3,5
3,0
2,5
2,0
1,5
1,0
0,5
0,0
0 2 4 20
Tempo de teste (h)
ETE RSB/UFRGS
20,0 ETE Serraria/L. facultativa
18,0 ETE Esmeralda/UASB
14,0
12,0
10,0
8,0
6,0
4,0
2,0
0,0
0 2 4 20
Tempo de teste (h)
Figura 4.16 Ocorrência de HAAs na desinfecção de efluentes tratados com hipoclorito de sódio,
com dosagem de 6 mg/L; tempo de detenção de 30,5 minutos.
146 Desinfecção de Efluentes Sanitários
ETE RSB/UFRGS
ETE Serraria/L. facultativa
40,0
Conc. THMs total (µg/L)
35,0
30,0
25,0
20,0
15,0
10,0
5,0
0,0
0 2 4 20
Tempo de teste (h)
Figura 4.17 Ocorrência de HAAs na desinfecção de efluentes tratados com hipoclorito de sódio
com dosagem de 13 mg/L; tempo de detenção de 30,5 minutos.
Cap. 4
18/9/2003 5,8 147 2,90 34,02 1,0 19,6
ETE 18/9/2002 5,0 132 3,92 34,28 1,3 20,6
Dióxido de
RALF + FAD Cambuí
Cloração e Descloração
cloro 25/9/2003 4,0 97 2,76 23,55 0,0 20,2
(2)
9/10/2002 6,1 45 1,20 36,16 2,1 21,9
Nota: 1. Instalação piloto na ETE Belém, da Sanepar (Curitiba, PR); 2. ETE Cambuí, da Sanepar (Campo Largo, PR).
147
148 Desinfecção de Efluentes Sanitários
em condições alcalinas:
2 ClO2 + 2 OH– → ClO2– + ClO3– + H2O (4.15)
O uso de ácido hidroclórico para ajuste de pH entre 2 e 3 faz com que ocorra a
formação de ácido hipocloroso e ácido clorídrico.
De acordo Henderson et al. (2001), o uso de íons ferrosos (Fe++) tem-se mostrado
eficiente na redução do íon clorito (ClO2–) para cloreto (Cl–). As concentrações de
íons clorito (ClO2–) foram eficientemente reduzidas de 2 mg/L para 0,3 mg/L, aplicando
6 mg/L de Fe++.
Cap. 4 Cloração e Descloração 149
Toxicologia aquática
Os efluentes domésticos, ao serem submetidos a tratamentos convencionais para
remoção de compostos orgânicos e inorgânicos, ainda apresentam contaminantes,
como microrganismos patogênicos que devem ser removidos dependendo da exigência
de padrões de qualidade para o corpo receptor ou se ele ainda é aproveitado para
outros fins, como o abastecimento de água, a recreação primária ou a irrigação. A
metodologia usualmente adotada para esse caso é a aplicação de agentes químicos
como a cloração. Outras alternativas têm sido estudadas depois da descoberta de que
subprodutos tóxicos, mutagênicos e carcinogênicos eram formados após a cloração
em águas, contendo matérias orgânicas naturais como os ácidos fúlvicos e húmicos.
Em função dos objetivos de uso das águas desses corpos receptores, é importante
que se comece a obter tais informações nas estações em operação, a fim de que se possa
avaliar eventuais impactos que um efluente complexo, de baixa biodegradabilidade,
embora tratado, pode causar à biota. A caracterização química de um efluente,
isoladamente, não indica o potencial tóxico de uma mistura complexa aos organismos
aquáticos. Assim, a ausência ou a presença de toxicidade nos despejos tratados é
avaliada pelo uso de organismos vivos.
Tabela 4.13 Resultados dos testes de toxicidade no efluente da desinfecção com dióxido de cloro.
23/10/2000
20/11/2000
18/12/2000
18/9/2000
26/9/2000
9/10/2000
7/11/2000
16/1/2001
FD
P10 P11 P10 P11 P10 P11 P12 P10 P11 P12 P10 P11 P12 P10 P11 P12 P10 P11 P12 P11 P12
FDD 4 4 1 1 16 1 1 1 16 16 16 8 4 4 2 1 1 1 1 2
FDBL 32 16 1 1 8 4 2 2 >16 2 16 16 8 16 16 8 1 2 8 4
Nota: P10: ponto logo após a desinfecção; P11: ponto intermediário; P12: ponto antes de chegar ao corpo
receptor; FDBL: fator de diluição Víbrio fischeri; FDD: fator de diluição Daphnia magna.
Fonte: Ribeiro & Lapolli (2003).
Tabela 4.14 Desinfecção utilizando dióxido de cloro: ensaio de toxicidade aguda para o
microcrustáceo Daphnia magna.
Tabela 4.15 Toxidez de efluentes tratados, clorados e desclorados a alevinos de Oreochromis niloticus.
As pesquisas do PROSAB
Pesquisas com cloro e hipoclorito
No âmbito do PROSAB, as várias pesquisas desenvolvidas e em andamento
chegaram às seguintes conclusões, sumarizadas na Tabela 4.16.
Foi realizada, ainda, a descloração com bissulfito de sódio 1:1, para controlar,
em níveis não detectáveis, o teor residual de cloro livre ou combinado, emitido para
os corpos d’água receptores e que poderiam ser agressivos à biota aquática, não
atendendo ao padrão ambiental brasileiro.
Nota: 1. NaOCl# = comercial; NaOCl* = gerado in loco (batelada); 2. mesmo diluído ou denitrificado; 3. S = sim; 4. t de 40 min = 20%-30% de
remoção de DQO/DBO; 5. V = viáveis e NV = não viáveis; 6. peixe indicador = Pimephales promellas.
Cap. 4 Cloração e Descloração 153
foi aplicada na linha de recalque dos efluentes para o tanque, proporcionando boas
condições de mistura. Variou-se o tempo de contato entre 10 e 50 minutos e a dosagem
de cloro, entre 2 e 15 mg/L.
efluente bruto de um bairro residencial da cidade de Limeira, o qual passa por pré-
tratamento para remoção de sólidos grosseiros e areia. Em seqüência, o efluente é
conduzido para o processo de tratamento secundário, o filtro anaeróbio. Como pós-
tratamento desse sistema são utilizados filtros de areia e valas de infiltração.
Com base nos ensaios realizados, pode-se afirmar que as demandas de cloro em
laboratório estiveram na faixa de 2,5 a 3,0 mg Cl2/L (doses acima de 4 mg/L) e, no
tanque de contato em escala piloto, foram da ordem de 6,0 a 7,0 mg Cl2/L (doses
acima de 7 mg/L). Dosagem inferior ao valor mínimo citado não alcançaria boa
eficiência, independente do tempo de contato proporcionado.
A produção de dióxido de cloro foi feita in loco, por gerador e dosador da marca
BI-O-CHLOR, modelo A 12, com capacidade produtiva de 12 a 120 g ClO2/h,
construído pela Sodi Scientífica S.P.A., da Itália. A Figura 4.19 mostra o gerador.
Figura 4.19 Desinfecção de efluentes sanitários aplicando dióxido de cloro: fotos de experimentos
do PROSAB 3.
5 1,30 1,00
10 1,00 1,00
15 1,30 1,00
2 6,11 3,00 3,00
20 1,83 0,62
25 2,64 1,41
Lodos
UFSC 30 2,70 1,57
ativados
5 1,32 1,00
4 111,0 6,75 6,38 7,18
10 0,00 0,00
5 1,00 1,00
10 58,0 6,59 5,32 4,56
10 0,00 0,00
RALF +
PUCPR 23,6 4,9 1,06 105,1 5,8-6,6 356 33 3,50E+06 4,60E+05 4,10E+03 4,90E+02
FAD
Nota: 1. a unidade para a PUCPR é NMP/100 ml, tendo sido avaliada Escherichia coli em vez de coliformes fecais; 2. contato na tubulação de
descarga do efluente.
Cap. 4 Cloração e Descloração 161
Uma dosagem aplicada de 4,9 mg/L, controlada por sensor de dióxido residual,
produziu eficiência de remoção de EC de 99,89%, com tempo de detenção hidráulico
real de 23,6 minutos. Alguns problemas relativos à operação dos flotadores
ocasionaram escape do lodo para o tanque de contato, o qual não possui descarga de
fundo. Com isso, pode-se observar altos valores de turbidez, acarretando perda da
eficiência no processo de desinfecção.
Exemplo de dimensionamento
I – Dimensione um tanque de mistura com agitador mecânico para aplicação e difusão
de solução de cloro e estimar o volume do tanque de contato e a concentração de
coliformes fecais igual ou inferior a 1.000 NMP/100 ml no efluente final, considerando
os seguintes dados de entrada:
l população: 10 mil habitantes;
l vazão afluente média: Qméd = 1.478 m3/dia = 17,1 L/s;
l vazão afluente máxima diária: Qmáx – d = 1.670 m3/dia = 19,3 L/s;
l vazão afluente máxima horária: Qmáx – h = 2.246 m3/dia = 26,0 L/s
l concentração de coliformes fecais no afluente: N0 = 1 × 107 NMP/100 ml
(valor médio anual);
l concentração de coliformes fecais no efluente desinfetado: N = 1.000 NMP/
100 ml;
l viscosidade do líquido (esgoto): m = 0,0001029 kgf/m.s2 (T = 20ºC).
C = 3,0 mg/L
Cap. 4 Cloração e Descloração 163
C = 4,5 mg/L
l Volume do tanque = 5 m3
l Volume do tanque = 5 m3
C×P×q
Q méd = + Q inf
86400
Adotado o valor de G = 1.500 s–1 (valores usuais entre 1.500 e 3.000 s–1)
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WEF – Water Environmental Federation. Wastewater disinfection: manual of pratice FD-10.
Alexandria: WEF, 1996.
WHITE, C. Handbook of chlorination and alternative disinfectants. 4th. ed. New York: John Wiley
& Sons Inc., 1999.
Capítulo 5
Desinfecção de Efluentes
Sanitários por Meio
da Ozonização
Flávio Rubens Lapolli, Lourdinha F. dos Santos, Maria Eliza Nagel Hassemer,
Miguel Mansur Aisse e Roque Passos Piveli
Desinfecção
A desinfecção é um processo de tratamento que permite a destruição ou a
eliminação dos microrganismos suscetíveis de transmitir doenças. A destruição ou a
inativação dos microrganismos patogênicos na desinfecção de efluentes domésticos
pode ser parcial, de acordo com o uso pretendido para o mesmo.
Histórico
A ação germicida do ozônio foi evidenciada na França, no final do século XIX,
onde começou a ser utilizado como desinfetante em Estações de Tratamento de Água
(ETA). Desde então, mais de mil estações de tratamento por toda a Europa adotaram
essa prática. Desde que o ozônio começou a ser utilizado, o conhecimento teórico de
seus efeitos moleculares e o progresso tecnológico para sua produção tiveram
considerável desenvolvimento. As técnicas de ozonização foram desenvolvidas mais
significativamente nos últimos 35 anos, particularmente na França, na Alemanha
Ocidental e na Suíça. Nos Estados Unidos, o ozônio começou a ser empregado
posteriormente e tem crescido muito nos últimos anos. Los Angeles possui uma das
maiores instalações de geração de ozônio do mundo, com o objetivo de auxiliar no
processo de coagulação e no controle dos precursores de trialometanos, os THM
(Hassemer, 2000).
1889 – O químico francês Marius Paul Otto iniciou os estudos sobre o ozônio na
Universidade de Sorbone, Paris. Com isso, a ação germicida do ozônio foi evidenciada
na França, onde começou a ser utilizado como desinfetante em ETAs. Logo toda a
Europa adotava o uso do ozônio.
172 Desinfecção de Efluentes Sanitários
1893 – O ozônio foi usado pela primeira vez em Estações de Tratamento de Água na
Holanda.
1983 – O ozônio passou a ser usado no Brasil como alternativa aos métodos
convencionais de pré-cloração e pré-aeração no tratamento de águas superficiais.
O O
O O O O
– + –
Figura 5.1 Possíveis formas da estrutura molecular do ozônio devido à ressonância magnética.
Fonte: Langlais et al., 1991.
O3 H2O
–
OH
1
Reações:
}
–
2 O2 7 HO2 – –
O2 O2 1 - O3 + OH O O
HO2 + O2
O – O –
6 2 - O3 + O2 O3 + O2
– – + O
O3
O
3 - O3 + H HO3
O3 O
4 - HO3
O
OH + O2
+
HO4 O
H 3
O
5 - O3 + OH HO4
O
O
6 - HO4 HO2 + O2
5 O
7 - HO2 O –
O2 + H
+
HO3
4 OH
O2 Fim da cadeia
radicalar
H2O
Figura 5.2 Esquema geral da decomposição do ozônio e suas reações. Fonte: Adaptado de Sens et
al., 1990.
+M
MOX Reação direta
O3
–
OH M
OH M’OX Reação indireta
Figura 5.3 Reatividade do ozônio em soluções aquosas. Fonte: Adaptado de Langlais et al.,
1991.
Como exemplos de compostos orgânicos que reagem bem com o ozônio molecular
podem-se considerar:
l compostos olefínicos (ácido oléico ou estireno): reagem em segundos;
l hidrocarbonetos poliaromáticos (podem ser carcinogênicos): reagem em
segundos;
l fenol: reage em segundos. O ânion fenolato reage 10 vezes mais rápido que o
fenol não dissociado.
Dentre os compostos inorgânicos que reagem bem com o ozônio molecular, pode-
se citar:
l sulfureto (HS–): reage rapidamente, formando sulfato;
l sulfito (HSO3–);
l nitrito (NO2–): oxidado rapidamente, mesmo na presença de outros solutos;
l iodeto (I–);
l brometo (Br–): quanto mais brometo presente no efluente, mais bromato é
formado pela ozonização;
l amônia (NH3): ataca somente amônia livre ou não protonada.
Ar seco
Recobrimento interno de metal Ozônio
Ar
Distribuição do
excesso de Efluente ETE Colunas
ozônio de secagem
Trailigaz
bar W
Efluente
ozonizado O3 O2
massa na transformação de O2 em O3. Essas duas vantagens acabam por produzir menor
demanda de energia associada à geração pelo oxigênio. A principal desvantagem consiste
no custo do oxigênio, no entanto, quando se compara o custo global da instalação
(soma dos custos com equipamento, custo do capital, custo de energia e custo com
oxigênio), geralmente a geração resulta em menor valor. Entretanto, a escolha entre
um ou outro sistema depende das condições locais, sendo necessário um estudo
econômico específico.
bar W
bar
Efluente
ozonizado
O3
Oxigênio Gerador de ozônio Tanque de contato
puro
O + O2 àO3
O + O3 à2O2 (5.2)
40
Velocidade de subida
30
das bolhas (cm/s)
20
10
t = 20°C
1 2 3
Raio das bolhas (mm)
Figura 5.7 Velocidade ascensional das bolhas em função de suas dimensões. Fonte: Langlais et
al., 1991.
A perda de carga nos difusores geralmente varia de 0,3 a 0,5 mca, e obtém-se em
cada câmara (ou coluna) uma vazão de gás, nas condições normais de temperatura e
pressão, da ordem de 10% da vazão de água, de forma que, para bolhas com raio de
2 mm, a área total disponível para contato resulta em aproximadamente 0,15 m2 por
m3 de água. A pressão do gás na saída dos difusores deve ser da ordem de 0,7 atm (Di
Bernardo, 1993).
Reservatório O3 para
de efluente atmosfera
Bomba
centrífuga
O3 para
Coluna de transferência
medição
Gerador
Coluna de contato
de ozônio
Rotâmetro
Trailigaz
bar W
Registro
Saída
Oxigênio
Figura 5.8 Esquema de um sistema de ozonização por difusão de bolhas. Fonte: Bassani, 2003.
Na maioria das unidades que usam o processo de desinfecção por ozonização, essa
operação pode ser realizada em reatores de contato compartimentados em três tipos
de segmentos: segmentos em que a vazão do gás e a vazão do efluente têm direções
opostas (trechos em contra-corrente), segmentos em que as vazões possuem a mesma
direção (trechos em co-corrente) e segmentos em que o gás não é injetado (trechos
reativos).
Segundo Eiger et al. (1998), tem-se dado preferência a esse tipo de sistema pelo
fato de ser extremamente flexível, permitindo aplicação de diferentes dosagens de
ozônio em diferentes compartimentos do sistema e sua conseqüente otimização no
tocante ao atendimento de um ou mais objetivos. O esquema desse tipo de reator é
mostrado na Figura 5.9.
v < 15 cm/s
I II III
Saída
v < 30 cm/s
Entrada
Difusores
Figura 5.9 Esquema do reator de contato. Fonte: Adaptado de Eiger et al., 1998, e Di Bernardo,
1993.
Gás
excedente
Afluente
Efluente
Ozônio
Figura 5.10 Tanque de contato equipado com turbina. Fonte: Adaptado de Chernicharo et al.,
2001.
Afluente
Gás
excedente
Ozônio
Efluente Efluente
Figura 5.11 Tanque de contato por injetor. Fonte: Adaptado de Chernicharo et al., 2001.
Cap. 5 Desinfecção de Efluentes Sanitários por Meio da Ozonização 183
Ozônio
Efluente
Afluente
Figura 5.12 Reator tipo “tubo em U”. Fonte: Adaptado de Chernicharo et al., 2001.
Misturadores estáticos
De acordo com Laplanche (1995), citado em Hassemer (2000), os misturadores
estáticos proporcionam ótima transferência do gás para o meio líquido, cerca de 80% a
85%, com tempo de contato muito reduzido (1 a 2 segundos). Esses dispositivos
normalmente são confeccionados em aço inoxidável, em módulos, dispostos
verticalmente em série no interior de uma tubulação. Cada módulo é composto por
uma série de chapas onduladas, soldadas perpendicularmente, uma em relação a outra.
O líquido flui pelos módulos em sentido descendente, enquanto o gás ozônio, injetado
em linha, a montante dos módulos, é arrastado pela água enquanto tenta fluir em
sentido contrário. Para obter bons resultados na transferência deve-se observar a seguinte
relação entre vazão do gás (Qg) e vazão do líquido (QL): Qg/QL ≤ 0,15.
A Figura 5.13 mostra o esquema de um misturador estático e a fotografia de
alguns módulos.
184 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Figura 5.13 Esquema do misturador estático e módulos em aço inox. Fonte: Adaptado de Dalsasso,
1999.
E × O 3 feed gas × Qg
O 3 transferido = (4)
Qef
Sendo:
E = eficiência de transferência (decimal);
[O 3] feed gas= concentração de ozônio gerada pelo ozonizador (mg/L);
[O3] off gas = concentração de ozônio na saída da coluna (mg/L);
Qg = vazão do gás ozônio (L/h);
Qef = vazão de efluente (L/h);
ozônio para manter a mesma concentração dissolvida na fase líquida. Além disso, o
tempo de retenção hidráulica teórico em fluxo pistão é mais próximo do tempo de
retenção hidráulica real do que nos reatores de mistura completa, o que facilita o
projeto e o controle operacional do fator CT.
É evidente que quanto mais alto o valor CT, para determinada taxa de eliminação,
mais resistente é o microrganismo em questão. No entanto, é preciso considerar que
fatores físico-químicos do efluente, como pH, temperatura, carbono orgânico total,
turbidez e alcalinidade, além da variabilidade de resistência entre as populações de
microrganismos, afetam o fator CT requerido para uma eficiente desinfecção.
Tabela 5.1 Fator CT, em mg.min/L, para inativação de Giardia em diferentes temperaturas,
proposto pela EPA.
Temperatura
Inativação
o o
10 C 15 C 20oC 25oC
1 log 0,48 0,32 0,24 0,16
1,5 log 0,72 0,48 0,36 0,24
2 log 0,95 0,63 0,48 0,32
2,5 log 1,2 0,79 0,6 0,4
3 log 1,4 0,95 0,72 0,46
Fonte: Langlais et al., 1991.
Microrganismos ClO2 O3
E. coli 0,4-0,75 0,002
Pólio 1 0,2-6,7 0,1-0,2
Rotavírus 0,2-2,1 0,006-0,06
Cistos de Giardia lamblia 0,5-0,6
Cistos de Giardia muris 7,2-18,5 1,8-2
N. gruberi (NEG) 15,47 4,23
Fonte: Adaptado de Langlais et al. (1991).
Observação: O fator CT é muito influenciado pela temperatura, assim, por
exemplo, o valor de CT em relação ao ozônio, para N. gruberi (NEG) a
25oC, é de apenas 1,29 em vez de 4,23, como mostra a tabela. Outro ponto
que não foi considerado é o número de unidades logarítmicas removidas
para cada microrganismo.
Testes de toxicidade
Os testes de toxicidade consistem basicamente na exposição de organismos
representativos, sob o ponto de vista ecológico, às concentrações conhecidas do agente
tóxico por um período determinado. A magnitude da resposta desses organismos ao
192 Desinfecção de Efluentes Sanitários
agente é avaliada por meio de algum efeito sobre os organismos, que também tenha
significado ecológico. Neste sentido, efeitos sobre funções biológicas fundamentais
como reprodução, crescimento, mutagenicidade e morte afetam diretamente as
características das diversas comunidades aquáticas em suas inter-relações recíprocas e
entre elas e o meio ambiente (Cetesb, 1992).
A maioria dos resultados dos testes de toxicidade aguda realizados com peixes
relaciona a CL50 com a concentração residual de ozônio na água. Esses resultados
indicam grande variabilidade de sensibilidade ao ozônio entre as espécies, sendo obtidos
valores de CL50 de 0,0093 mg/L de ozônio residual para 96 horas de exposição, tendo
como organismo-teste o Salmo gairdnere (truta arco-íris), e de 0,06 mg/L para Lepomis
macrochrius em 24 horas de exposição. Considerando o processo de desinfecção de
efluentes sanitários por ozonização, observa-se que a concentração de ozônio residual
atinge valor nulo em poucos minutos e, portanto, se houver toxicidade a organismos
aquáticos, esta será associada aos subprodutos da desinfecção e não ao ozônio
propriamente dito.
Experiência da UFSC
A pesquisa foi realizada na ETE Insular da CASAN (Companhia Catarinense de
Águas e Saneamento), em Florianópolis. A estação de tratamento de esgotos do tipo
lodos ativados, aeração prolongada, se caracteriza por apresentar um efluente de boa
qualidade, com baixos valores de DQO, SST, turbidez e colimetria.
Figura 5.15 Unidades de laboratório utilizadas para desinfecção com ozônio: a) reator de coluna,
em batelada; b) misturador estático, em contínuo; c) reator de duas colunas, em
contínuo.
Experiência da PUC
A Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), juntamente com a
Sanepar, desenvolveu estudos de ozonização de efluentes sanitários em escala piloto.
Três ensaios (fases) foram realizados e as amostras foram coletadas a cada 2,5
minutos de contato, para caracterização físico-química e biológica. A dosagem e o
consumo de ozônio, para vários efluentes tratados, variou das fases I a III. Inicialmente,
as dosagens foram mais elevadas, sendo reduzidas especialmente na última fase. O
tempo de contato de 2,5 minutos foi, em geral, suficiente para obter concentrações de
Escherichia coli inferior a 1,0 × 103 NMP/100 ml. Na fase III, a dosagem de cerca de
12 mg/L foi suficiente para a desinfecção de efluentes secundários (tempo de contato
de 2,5 minutos) nas condições dos ensaios. Para o efluente do reator anaeróbio tipo
UASB, o tempo de contato e o consumo de ozônio foram bem maiores, em dois do
três experimentos.
Cap. 5 Desinfecção de Efluentes Sanitários por Meio da Ozonização 199
Experiência da USP
A USP conduziu estudos em escala piloto visando a avaliação dos efeitos da
aplicação de ozônio nos efluentes finais de um sistema de lagoas de estabilização,
localizado no município de Lins, SP. As lagoas anaeróbias trabalharam com tempo de
detenção hidráulico médio de 5 dias e foram seguidas por lagoas facultativas, com
cerca de 10 dias de detenção. Os esgotos tratados possuem DBO na faixa de 50 a 60
mg/L, elevando-se em algumas situações para até cerca de 100 mg/L. A concentração
de sólidos em suspensão variou geralmente na faixa de 60 a 90 mg/L, chegando a se
aproximar de 200 mg/L em diversas oportunidades, dada a elevada concentração de
algas. As densidades de E. coli nos esgotos tratados sempre se mantiveram acima de
105 NMP/100 ml. O gerador utilizado produziu ozônio a partir do ar, ocorrendo
anteriormente a purificação do oxigênio. Possui capacidade de descarga de 110 mg O3/
min, sendo introduzido na tubulação do efluente a ser desinfetado através de Venturi.
A coluna de contato possui 300 mm de diâmetro e 3 m de altura, apresentando volume
útil de 171 L. Na Figura 5.17 são apresentados a coluna de ozonização e o gerador de
ozônio utilizados.
foi de uma concentração de O3 de 5,3 mg/L, com 8,6 minutos de tempo de contato. Os
resultados demonstram que a ozonização constitui processo eficiente na eliminação
desse gênero de bactéria patogênica. Observou-se a presença de ovos viáveis de
helmintos nos efluentes ozonizados, em concentrações semelhantes à dos efluentes
da lagoa facultativa antes da ozonização, indicando baixa eficiência do processo com
esse objetivo específico. A eficiência na inativação de E. coli também foi baixa, raramente
se obteve redução de densidade superior a 1 log.
Análise econômica
Para avaliação dos custos de implantação e dos custos de manutenção e operação,
foi considerada a tecnologia de geração de ozônio a partir do oxigênio e do ar seco. O
custo de construção da câmara de contato não foi incluído na análise, por ser fortemente
dependente das condições locais, além disso, seu valor é muito baixo quando comparado
a outros componentes do sistema.
A Figura 5.18 foi construída com base nos valores da Tabela 5.3 e mostra o custo
unitário da produção de ozônio, em função da capacidade de geração (kg O3/mês),
evidenciando a relevância da escala de produção sobres os custos de instalação. Além
disso fica claro a grande vantagem dos sistemas de geração a partir do oxigênio sobre
os sistemas de geração a partir do ar seco no que se refere a custos de instalação.
1300,00
100,00
–0,2957
900,00 Y =2 8099x Ar
R = 0,9712
700,00
0,3672
500,00 Y = 6502,8x O2
2
R = 0,8763
300,00
100,00
100 500 900 1300 1700 2100 2500 2900 3300 3700 4100 4500 4900
Capacidade (kg O3/mês)
Figura 5.18 Capacidade de geração em relação ao custo unitário. Fonte: Bassani, 2003.
202 Desinfecção de Efluentes Sanitários
em que:
CG = capacidade de geração de ozônio (kg O3/mês);
Cpc = contribuição per capita de efluente (m3.hab/dia);
pop = população (habitantes);
DO3 = dose de ozônio a ser utilizada (kg O3/m3).
em que:
Cun = custo unitário de produção de ozônio (R$/kg O3).
CG × Cun
C int = × 3,75 (5.7)
pop
em que:
Cint = custo de instalação do sistema, por economia (R$);
3,75 = número de habitantes adotado, por economia.
Tabela 5.4 Custo de instalação, por economia, para o sistema de geração a partir do oxigênio.
Custo de
População Q Capacidade Custo/kgO3
3 No economias instalação
(hab.) (m /mês) (kg O3/mês) (R$)
(R$)
10.000 48.000 192 943,35 2666,67 67,92
20.000 96.000 384 731,36 5333,33 52,66
50.000 240.000 960 522,41 13333,33 37,61
100.000 480.000 1.920 405,02 26666,67 29,16
250.000 1.200.000 4.800 289,30 66666,67 20,83
Fonte: Adaptado de Bassani, 2003.
100 × CG
QO 2 = (5.8)
densO 2 × % peso
em que:
QO 2 = vazão de oxigênio (m3/h);
CG = capacidade de geração de ozônio (kgO3/h);
densO2 = densidade do oxigênio na CNTP (valor constante de 1,44 g/m3, para
oxigênio com 95% de pureza);
% peso = rendimento do gerador expresso em porcentagem.
Tabela 5.6 Custo operacional total mensal com energia, por economia.
13,04%
manutenção 13,04%
10,66% manutenção
energia 16,42%
energia
76,30%
oxigênio 70,53%
oxigênio
Figura 5.19 Porcentual dos custos operacionais para 10 mil e 250 mil habitantes. Fonte: Adaptado
de Bassani, 2003.
Dimensionamento
O dimensionamento das unidades de contato dos sistemas de ozonização está
mais baseado em critérios empíricos do que racionais. Entretanto, os procedimentos
para o dimensionamento dos reatores de contato de fluxo pistão poderiam seguir
aproximadamente os seguintes passos:
1. Determinar a vazão do efluente.
2. Calcular a concentração de O3 no gás de alimentação.
3. Calcular a vazão de gás para atingir determinada concentração de O3 aplicada
na fase líquida.
4. Para a vazão de gás determinada no item anterior, calcular a velocidade do
gás, a velocidade da fase líquida, estimar Kl (coeficiente global de transferência
de massa da fase gasosa para a fase líquida) e medir ou estimar Kd (coeficiente
de decaimento do ozônio na fase líquida).
5. Aplicar um modelo para gerar os perfis de concentração em cada tipo de trecho.
206 Desinfecção de Efluentes Sanitários
6. Calcular o fator CT de cada trecho pela integração dos perfis gerados no tempo.
A soma dos fatores CT por trecho fornece o fator CT total do reator.
7. Fixar a taxa de eliminação desejada de um organismo-alvo, sob as condições
de temperatura e pH na fase líquida.
8. Levantar na literatura o fator CT necessário para eliminar o organismo-alvo,
sob as condições de temperatura e pH da fase líquida (esse valor é denominado
CT requerido).
9. Caso o CT requerido seja maior que o CT total do reator, é preciso aumentar
a vazão de gás para aumentar a concentração de O3 aplicada na fase líquida.
Feito isso, retorna-se ao passo 3 e reinicia-se o processo até o fator CT total
do reator atingir no mínimo o mesmo valor do CT requerido. Caso o fator CT
total do reator seja muito maior que o CT requerido, baixa-se a vazão de gás
e retorna-se ao passo 3, reiniciando o processo até obter a convergência entre
o CT disponível e o CT total do reator.
Para fluxo pistão, recomenda-se a relação diâmetro (D)/altura (L) = 1/10. Como
o volume é grande, projeta-se o tratamento para duas colunas, cada uma com 2,5 m3.
V=A×L
D = 0,68 m
L = 10D = 6,80 m
Referências bibliográficas
BASSANI, L. Desinfecção de efluentes domésticos por ozonização. 2003. Dissertação
(Mestrado em Engenharia Ambiental) – Departamento de Engenharia Sanitária e
Ambiental, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis.
BITTON, G. Wastewater microbiology. Wiley-Liss, 1994. p. 478.
CAIRNS, J. R. J.; DICKSON, K. L. Estimating hazard of chemicals substances to
aquatic life. Philadelfia, A.S.T.M Special Technical Publication, n. 657, 1980.
208 Desinfecção de Efluentes Sanitários
SENS, M. L.; LE SAUZE, N.; LAPLANCHE, A.; LANGLAIS, B. Effets des anions
minéraux sur la decomposition de l’ozone das l’eau. Revue des Sciences de L’eau, v. 3,
p. 325-341, 1990.
Capítulo 6
Desinfecção por
Radiação Ultravioleta
Ricardo Franci Gonçalves, Bruno Coraucci Filho, Carlos Augusto Lemos Chernicharo,
Flávio Rubens Lapolli, Miguel Mansur Aisse e Roque Passos Piveli
Introdução
Os efeitos benéficos da luz solar sobre ferimentos e na prevenção de certas
doenças são conhecidos pelo homem há vários séculos. No século XVIII, Isaac
Newton, ao observar a passagem da luz solar através de um prisma de cristal,
descobriu a existência de radiações que não são visíveis ao olho humano. Sabe-se
atualmente que significativas quantidades de radiação visíveis são produzidas pelo
sol, e que frações importantes dessas emissões são eficientemente absorvidas na
atmosfera terrestre em níveis compatíveis com a vida na terra. Entretanto, os
primeiros pesquisadores a evidenciarem o efeito da luz sobre bactérias e outros
organismos foram Downes & Blunt (1877). Os trabalhos realizados por Roux (1887),
sobre culturas de bactérias causadoras da peste bubônica e difteria comprovaram
que meios de cultura expostos à luz solar eram incapazes de sustentar o crescimento
bacteriano. Ward (1892) investigou o efeito de radiação luminosa com diferentes
comprimentos de ondas sobre colônias de Bacillus anthracis e mostrou que a luz
azul era mais letal do que a luz vermelha. A identificação dos efeitos bactericidas
da radiação UV foram comprovados de forma mais precisa por Barnard & Morgan
(1903), que utilizaram correntes elétricas para produzir radiações com comprimento
de onda entre 226 nm e 328 nm.
Esta última etapa tem por função o controle de subprodutos tóxicos de cloro
nos efluentes tratados, como os organoclorados (trihalometanos e outros), que não
são gerados nos processos de desinfecção UV.
Vantagens Desvantagens
• A desinfecção com UV é efetiva na • Baixas dosagens podem não ser efetivas
inativação de muitos vírus, esporos e na inativação de alguns vírus, esporos e
cistos. cistos.
• A desinfecção com UV é um processo • Os microrganismos podem, às vezes,
físico que, ao contrário de desinfetantes reparar e reverter os efeitos destrutivos do
químicos, elimina a necessidade de UV por meio de mecanismo de reativação,
geração, manuseio, transporte ou conhecido como fotorreativação, ou em
estocagem de produtos químicos ausência de luz, conhecido como
tóxicos/perigosos/corrosivos. recuperação no escuro.
• Não geram efeitos residuais prejudiciais a • Necessidade de programa preventivo para
humanos ou vida aquática. controle da formação de biofilmes nos
• A desinfecção com UV é facilmente tubos (reator de contato).
controlada pelos operadores. • Turbidez (T) e sólidos suspensos totais
• A desinfecção com UV tem tempo de (SST) no esgoto podem prejudicar a
contato menor quando comparada a eficiência de inativação.
outros agentes desinfetantes • A desinfecção UV não tem custo
(aproximadamente 20 a 30 segundos com competitivo com a cloração, mas os custos
lâmpadas de baixa pressão). são competitivos quando comparados com
• O equipamento de desinfecção com UV cloração-descloração.
requer menos espaço que outros métodos.
Fonte: Adaptado de Usepa, 1999.
Acréscimo de energia
Radar TV FM AM
Luz visível
Lilás Azul Amarelo Vermelho
Azul marinho Verde Laranja
Figura 6.1 Localização da faixa de comprimento de onda UV, dentro das radiações eletromagnéticas
e espectro visível. Fonte: Ryer, 1997.
em que:
Eλ = energia associada a um determinado comprimento de onda (kcal/einstein)
h = constante de Planck (1,583 × 10–37 kcal.s)
C = velocidade da radiação eletromagnética no vácuo (3 × 1017 nm/s)
λ = comprimento de onda da radiação eletromagnética (nm)
A = número de Avogadro (6.023 × 1023 fótons/einstein)
Por outro lado, se a absorção de um fóton por uma molécula promove fotólise,
a energia dos fótons é suficiente para romper uma ligação específica ou várias ligações
entre os átomos que compõem a molécula fragmentada. O termo fotólise refere-se à
interação da radiação luminosa com as moléculas, provocando ruptura das ligações
químicas, fragmentando-as. As modificações fotoquímicas ocorrem comumente
associadas às radiações com comprimento de onda entre 1.200 e 200 nm. Proteínas
e ácidos nucléicos absorvem intensamente a radiação na faixa de 100 a 280 nm, o
que resulta em modificações fotoquímicas que podem desequilibrar o metabolismo
de células e, eventualmente, resultar em morte. A região mais efetiva do espectro
nesse sentido se situa em torno do comprimento de onda de 260 nm, em que a
energia é mais intensamente absorvida pelos ácidos nucléicos. De acordo com a
Equação 6.1, a energia associada a esse comprimento de onda de radiação é de 110
kcal/einstein, que vem a ser valor superior ao limite de vários sistemas biológicos
(Tabela 6.2).
A luz ultravioleta pode ser dividida em três faixas segundo seus efeitos sobre os
seres vivos:
l UV-A: sua radiação possui comprimento de onda entre 315 nm (90,8 kcal/
einstein) e 400 nm (71,5 kcal/einstein). É o menos perigoso para os seres
humanos, devido à baixa energia (a “luz negra” encontra-se na faixa). É o
tipo de radiação UV utilizada para causar fluorescência em materiais, sendo
muito utilizado em fototerapia e câmaras de bronzeamento (Ryer, 1997).
l UV-B: possui comprimento de onda entre 280 (102 kcal/einstein) e 315 nm
(90,8 kcal/einstein). Trata-se da mais destrutiva forma da luz UV, porque
tem energia bastante para gerar danos em tecidos biológicos e em quantidade
mínima para não ser completamente absorvida na atmosfera. É a forma de
radiação UV identificada como causadora do câncer de pele (Ryer, 1997).
l UV-C: possui comprimento de onda variando de 200 (143 kcal/einstein) a
280 nm (102 kcal/einstein), sendo a forma de radiação aplicada como
214 Desinfecção de Efluentes Sanitários
100
Eficiência de inativação (%)
80
60
254 nm
40
20
0
200 225 250 275 300
Comprimento de onda (nm)
Fonte de energia UV (S): é a energia (W) emitida em todas as direções por uma
fonte.
Intensidade (I): pode ser definida como a energia total incidente em todas as direções
em um elemento infinitesimal de área transversal dA, contendo o ponto considerado.
Em unidades do sistema internacional SI, a unidade de intensidade é W.m–2, entretanto,
Cap. 6 Desinfecção por Radiação Ultravioleta 215
S
I= (6.2)
4 πr 2
em que:
I = intensidade UV em um ponto
S = energia total da fonte
r = raio a partir da fonte pontual
em que:
I = intensidade UV
t = tempo de exposição à radiação.
em que:
α = coeficiente de absorbância;
A = absorbância a 254 nm (cm–1).
em que:
T = transmitância (%);
A = absorbância (cm–1).
I médio =
I0
α⋅L
d
1 − e αL i (6.6)
em que:
I0 = intensidade UV aplicada no meio líquido;
L = caminho ótico (cm).
a f ∑ 4πnr
n S
− αL ∗ r R
I R,z = 2
×e (6.7)
i =1
em que:
R = distância radial do eixo da lâmpada ao ponto;
z = coordenada do ponto em relação ao eixo da lâmpada;
S = energia total da fonte;
218 Desinfecção de Efluentes Sanitários
b g z S
c
I R, z = c × e − αL∗ r R
(6.8)
0
4 πr 2
em que:
c = comprimento da lâmpada.
e= –5,25 cm;
f= 5,25 cm;
P= energia UV 254 nm emitida pela lâmpada (W) = 8,3 W;
L= comprimento da lâmpada = 89,3 cm;
H= comprimento do eixo colimador = 59,5 cm;
α= distãncia do eixo da lâmpada ao eixo colim. = 2,4 cm;
β= distãncia vertical do ponto ao eixo colim. = 13,2 cm
∆ = H + α + β = 75,1 cm (6.9)
z
P
b g
f
I xi , yi = L
b g 2
dx (6.10)
e 4π x − x i + ∆2 + y 2i
220 Desinfecção de Efluentes Sanitários
1 5,250 1,31 E 03
(Continuação.)
Mecanismos da desinfecção UV
A desinfecção por radiação UV baseia-se em alterações por fotólise do material
genético (DNA, RNA) dos organismos presentes no esgoto. O DNA é um polímero
de ácido nucléico, constituído por uma seqüência de quatro bases nitrogenadas
(adenina, citosina, guanina e timina) que constituem o código genético. Essas bases
formam as chamadas bases emparelhadas (por exemplo, adenina com timina e citosina
com guanina), ligadas por pontes de hidrogênio (Figura 6.4a). São essas ligações que
fazem com que as duas fitas do DNA permaneçam ligadas, dando origem à estrutura
conhecida como dupla hélice. As moléculas de DNA dos organismos a serem inativados
absorvem radiações com comprimento de onda entre 200 e 300 nm, em especial
aquelas em torno de 260 nm, que alteram sua composição e comprometem sua
funcionalidade (Chang, 1977). A radiação UV atravessa a parede celular e é absorvida
pelos ácidos nucléicos e, em menor extensão, pelas proteínas e por outras moléculas
biologicamente importantes (Daniel & Campos, 1992). A energia absorvida rompe
as ligações não saturadas, principalmente as bases nitrogenadas pirimídicas,
provocando a dimerização de pirimidinas adjacentes de um mesmo fio de cromossomo
do DNA (White et al., 1986) (Figura 6.4b). Os dímeros formados em conseqüência
das alterações provocadas pela radiação UV podem resultar em timina–timina, timina–
citosina e citosina–citosina. As moléculas pirimídicas resultantes, uma vez unidas,
deformam a estrutura helicoidal do DNA e dificultam a replicação do ácido nucléico.
Caso a replicação ocorra, as novas células serão mutantes descendentes incapazes de
se duplicar (WEF, 1995).
222 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Figura 6.4 Efeito da radiação UV sobre a cadeia de DNA da bactéria, dimerizando a timina e
fazendo com que os filamentos do DNA não tenham mais a capacidade de encaixe.
Cinética de inativação
A Lei de Chick, aplicada à desinfecção por radiação UV, baseia-se na similaridade
do processo de desinfecção com uma reação cinética de primeira ordem, segundo a
Equação 6.11 (Usepa, 1986).
dN
= − kN (6.11)
dt
em que:
k = constante de inativação (s–1);
N = concentração de organismos sobreviventes em um dado tempo t
(organismos/100 ml).
Cap. 6 Desinfecção por Radiação Ultravioleta 223
Tabela 6.3 Doses de radiação UV para inativação de bactérias, vírus, algas, protozoários, helmintos
e leveduras.
Dose UV Dose UV
Bactéria Vírus
(mWs/cm2) (mWs/cm2)
Agrobacterium lumefaciens 8,5 Adenovírus Tipo III 3 4,5
Bacillus anthracis 8,7 Bacteriófagos 6,6
Bacillus anthracis (esporos de Antrax) 46,2 Coxsackie 6,3
Bacillus paratyphosus 6,1 Hepatite A* 3,7
Bacillus subtilis 11 Hepatite infecciosa 8
Clostridium tetani 23,1 Influenza 6,6
Corynebacterium diphtheriae 6,5 Mosaico do tabaco 440
Dysentery bacilli 4,2 Poliovírus* 7,5
Eberthella typhosa 4,1 Rotavírus 24
Escherichia coli 6,6 Rotavírus SA 11* 9,9
Espécies de Salmonella 15,2
Protozoários e
Esporos de Bacillus subtilis 22
helmintos
Cistos de Giardia
Legionella bozemanii 3,5 100
lamblia
Legionella pneumophila (doença dos
12,3 E. hystolytica 84
legionários)
Leptospira interrogans 6 Ovos de nematodos 40
Micrococcus candidus 12,3
Mycobacterium tuberculosis 10 Algas
Pseudomonas aeruginosa (cepas
10,5 Chlorella vulgaris 22,0
ambientais)
Pseudomonas aeruginosa (cepas
3,9 Alga azul-verde 420
laboratoriais)
Salmonella enteritidis 7,6
Salmonella paratyphi (febre entérica) 6,1 Fungos
Salmonella typhi (febre tifóide) 7 Aspergillus amstelodami 77
Salmonella typhimurium 15,2 Aspergillus glaucus 88
Sarcina lutea 26,4 Aspergillus niger 330
Shigella dysenteriae disenteria 4,2 Penicillium digitatum 88
Shigella flexneri disenteria 3,4 Penicillium expansum 22
Shigella paradysenteriae 3,4 Rhizopus nigricans 220
Staphylococcus aureus 6,6
Staphylococcus epidermidis 5,8 Leveduras
Streptococcus faecaila 10 Levedura do pão 8,8
Streptococcus hemolyticus 5,5 Levedura de cerveja 6,6
Vibrio cholerae 6,5 Saccharomyces cerevisiae 13,2
Vibrio comma (cólera) 6,5 Saccharomyces ellipsoideus 13,2
Fonte: Collentro (1986), Lupal (1993), Treij (1995), WEF (1996), Tarrán (2003).
224 Desinfecção de Efluentes Sanitários
N
= e − k⋅dose (6.12)
N0
em que:
N0 = concentração de microrganismos no afluente (organismos/100 ml);
dose = dada pela Equação 6.3 :
dose = I × t (mW/s2)
Essa equação teórica pode ser utilizada para a previsão da eficiência da desinfecção
UV nos casos em que a absorção da radiação UV no meio é muito baixa, a intensidade
UV aplicada aos microrganismos é homogênea, o comportamento hidráulico da
unidade é próximo ao pistão e a sensibilidade da população em relação à radiação
UV é homogênea (Daniel, 1993). Entretanto, na desinfecção de esgotos tratados, a
agregação ou oclusão dos microrganismos na matéria particulada impede a penetração
da radiação ultravioleta, reduzindo a eficiência da inativação e gerando o efeito cauda
na curva dose × resposta (Figura 6.5).
Proteção
Penetração Lâmpada UV
incompleta
Penetração Dispersão
completa
em que:
N = concentração de microrganismos no efluente (organismos/100 ml);
ND = concentração de microrganismos dispersos no afluente (organismos/100
ml);
Np = concentração de microrganismos associados à matéria particulada
(organismos/100 ml);
N0 = concentração de microrganismos no afluente, N0 =ND+Np (organismos/
100 ml).
O valor de Np pode ser estimado com amostras expostas a altas doses, a partir
do ajuste à Equação 6.14 (WEF, 1996).
Np = a . (SST)b (6.14)
em que:
SST = quantidade de sólidos suspensos presentes na amostra (mg/l)
a e b = coeficientes empíricos obtidos no ajuste.
N = N D ⋅ e − k ⋅dose +
Np
k ⋅ dose
d1 − e − k ⋅ dose
i (6.15)
em que:
N= concentração de microrganismos no efluente (organismos/100 ml);
ND= concentração de microrganismos dispersos no afluente (organismos/100
ml);
Np= concentração de microrganismos associados à matéria particulada
(organismos/100 ml);
N0= concentração de microrganismos no afluente, N0 =ND+Np (organismos/
100 ml).
1,0 E + 10
1,0 E + 08
E. coli (NMP/100 ml)
1,0 E + 06
1,0 E + 04
Reúso
OMS
1,0 E + 02
1,0 E + 00
0 20 40 60 80 100 120
2
Dose aplicada (mJ/cm )
Figura 6.6 Resultados obtidos e ajuste de modelo cinético para inativação de E. coli em efluente
terciário.
Tabela 6.4 Parâmetros obtidos com a regressão não linear (Figura 5.33).
em que:
I0 = 1,33 mW/s2;
t = 1 min 30 seg = 90 s.
Então:
Da = 1,33 × 90 ⇒ Da =120 mJ/cm2
Im =
I0
α⋅L
d
1 − e − αL i mW cm 2
em que:
I0 = intensidade UV aplicada no meio líquido = 1,33 mW/cm2;
L = caminho ótico (cm) = 4 cm;
α = coef. de absorbância = 0,857.
Im =
1,33
0,857 × 4
d i
1 − e −0,857 × 4 = 0,375 mW cm2
em que:
t = 90 s;
Im = 0,375 mW/cm2.
Cap. 6 Desinfecção por Radiação Ultravioleta 229
Então:
D = 0,375 × 90 ⇒ D =33,8 mJ/cm2
Lâmpadas UV
Além da radiação UV natural presente na luz solar, pequenas frações de radiação
UV artificial podem ser emitidas por lâmpadas comuns, lâmpadas de halogênio,
lâmpadas fluorescentes, telas de computadores, entre outras. Para efeito de desinfecção
de águas e esgotos, quantidades de radiação UV muito superiores a estas são
necessárias, o que é obtido utilizando lâmpadas de vapor de mercúrio como fonte
geradora.
Figura 6.7 Croqui de uma lâmpada fluorescente normal e de outra do tipo UV.
Tipo de lâmpada
Item Unidade
Baixa pressão Baixa pressão Média pressão
baixa intensidade alta intensidade alta intensidade
kW 1,2a 2-5
Corrente elétrica 350 -550
MA
Variável Variável
Saída da lâmpada a
W 25-27 60-400
254 nm
o
Temperatura C 35-45 90-150 600-800
120
Intensidade de radiação UV (mW/cm )
2
100
80
H 02
P 04
60
W 07
40
20
0
0 500 1.000 1.500 2.000 2.500
Tempo de funcionamento (h)
55
2
Média = 38,6 mW/cm
2
50 Desv.-pad. = 3,2 mW/cm
Intensidade (mW/cm2)
45
40
35
30
25
20
750 1.000 1.250 1.500 1.750 2.000 2.250 2.500
Tempo após partida (horas)
A vida útil das lâmpadas também varia muito em função da qualidade do material,
bem como do número de acionamentos e das condições de operação. Os principais
fatores que contribuem para redução da eficiência de emissão de radiação incluem
falhas nos eletrodos, deposição de mercúrio nas paredes (escurecimento) e solarização
do invólucro (Usepa, 1984).
que deve ser a mais homogênea possível nas três dimensões do reator UV
(comprimento, largura e profundidade). Esse objetivo não foi atingido no exemplo
apresentado na Figura 6.10, que ilustra as curvas de iso-intensidade de radiação UV
(254 nm) no reator apresentado na Figura 6.12. Observa-se que as bordas do reator
recebem menor intensidade de radiação, região onde se localizam a grade de fixação
das lâmpadas e o suporte dos reatores elétricos. As regiões onde foram verificadas as
maiores intensidades estão próximas ao eixo longitudinal do reator, nas abscissas
próximas de 40, 100 e 180 cm. O que se pode estimar é um baixo rendimento de
inativação de patógenos nas linhas de fluxo próximas às bordas do reator, contribuindo
para obter um efluente final com qualidade aquém da prevista.
90
1,20
75 1,05
0,90
Largura (cm)
60
0,75
45 0,60
0,45
30
0,30
15 0,15
0,00
0 20 40 60 80 100 120 140 160 180 200 220
Comprimento (cm) Intensidade UV-254 nm
2
(mW/cm )
Tipos de processos
Uma das classificações mais usuais para os processos UV tem por base o
posicionamento das lâmpadas em relação ao líquido submetido à desinfecção. Os
Cap. 6 Desinfecção por Radiação Ultravioleta 237
processos em que as lâmpadas são posicionadas fora da lâmina líquida são conhecidos
como processos de lâmpadas emersas ou de não contato. Ainda nessa categoria, há
processos com lâmpadas externas a tubos transparentes, no interior dos quais escoa o
líquido. Os processos com lâmpadas imersas compreendem a utilização de lâmpadas que
podem estar em contato direto ou não com a corrente líquida. Nesse último caso, as
lâmpadas encontram-se protegidas por um envoltório, geralmente de quartzo, que
pouco absorve a radiação UV. Outro tipo de classificação refere-se à forma de
escoamento do líquido, que pode ocorrer em canais ou em condutos forçados.
Resumindo as diferentes opções técnicas, tem-se:
Lâmpadas UV
Suporte das lâmpadas o
n máximo = 26 Vertedor
retangular ajustável
Vertedores tringulares
Medidor
Bomba rotâmetro
centrífuga
Reator UV
Reservatório
Entrada
Saída
Registro
Figura 6.12 Reator UV com lâmpadas emersas, sem tampa de proteção dos canais de escoamento
(pesquisa UFES).
Figura 6.13 Processo UV com lâmpadas emersas e escoamento forçado em tubos de Teflon. Fonte:
Cchernicharo et al., 2001.
Cap. 6 Desinfecção por Radiação Ultravioleta 239
Figura 6.16 Reator UV com lâmpada imersa e escoamento em conduto forçado no sentido
horizontal (pesquisa da PUC-PR).
2
3
1. Entrada do afluente
2. Lâmpadas UV
5 3. Dispositivo de limpeza
4. Saída do efluente
Desenho: Paulo Libânio 5. Descarga de fundo
Figura 6.17 Reator UV com lâmpada imersa em conduto forçado no sentido vertical (UFMG).
Fonte: Alves, 2003.
242 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Dimensionamento
O dimensionamento de reatores UV para desinfecção de esgotos sanitários pode
ser realizado por meio de modelos matemáticos empíricos e semi-empíricos. Os
modelos desenvolvidos por Scheible (1987) e Emerick & Darby, apud WEF (1996),
encontram-se descritos neste item.
A partir da teoria para escoamentos não ideais apresentada por Levenspiel (1972),
Scheible (1987) desenvolveu e validou o modelo apresentado na Equação 6.16.
LM u L F I OP
MN 2D GGH1 − JJ P + N
4kD
N = N 0exp 1+
u
2
KQ p (6.16)
em que:
Cap. 6 Desinfecção por Radiação Ultravioleta 243
em que:
em que:
SS = concentração de sólidos suspensos (mg/l);
a, b, c, m = coeficientes empíricos.
Emerick & Darby, apud WEF (1996) propuseram um modelo empírico com
base em características do afluente (Equação 6.19).
N = A (SS)a (TF)b (N0)c (β)c (dose)n (6.19)
em que:
N= concentração de microrganismos no efluente irradiado (NMP/100 ml);
SS = concentração de sólidos suspensos (mg/L);
TF = transmitância a 253,7 nm da amostra filtrada (%);
N0 = concentração de microrganismos no afluente (NMP/100 ml);
244 Desinfecção de Efluentes Sanitários
em que:
t = tempo de exposição (s);
Im = intensidade média de radiação ultravioleta em uma lâmina líquida de
espessura L (mW/cm2).
Im =
I0
α⋅L
d i
1 − e − αL [mW/cm2] (6.6)
em que:
I0 = intensidade UV aplicada no meio líquido (mW/cm2);
L = caminho óptico (cm);
α = coeficiente de absorbância, dado por:
α = A × ln (10) = 2,303 A (6.4)
2o Passo: pelas equações anteriores pode-se calcular a dose aplicada. A dose aplicada
é obtida pelo produto da intensidade de radiação ultravioleta na superfície do líquido
(I0) pelo tempo de exposição (t):
Da = I0t [mJ/cm2] (6.21)
Cap. 6 Desinfecção por Radiação Ultravioleta 245
Da
D av = 0,278 [Wh/m3] (6.22)
L
em que:
Da = dose aplicada na superfície com líquido (mJ/cm2);
L = espessura da lâmina líquida (cm);
0,2778 = fator de conversão.
QD av
n= (6.23)
P252 f
em que:
Q = vazão (m3/h);
Dav = dose aplicada (Wh/m3);
P254 = potência da lâmpada a 254 nm (W);
f = fração de energia que efetivamente chega ao líquido (eficiência do
refletor).
b g
D a reator =
n × P254 × f
A
× t [mJ/cm2] (6.24)
Caso não seja compatível com a dose aplicada estimada, deve-se alterar o tempo
de exposição do reator para compatibilizar o valor com os dados iniciais.
Secundário Terciário
Tipo de efluente tratado Primário Anaeróbio
aeróbio aeróbio
Transmitância (%) 15 a 40 15 a 25 30 a 50 60 a 85
Absorbância (cm1) 0,6 a 0,8 0,4 a 0,8 0,3 a 0,5 0,2 a 0,4
* Equações de cálculo citadas na resolução do exemplo. Valores aproximados a partir de uma dose efetiva de
21 mJ/cm2, calculada com base no valor da média da absorbância para cada efluente.
** Considerações de cálculo: população = 1.000 hab. per capta de esgoto de 150 L/d, lâmpadas de 30 W,
eficiência de 75%.
Manutenção e operação
Aspectos operacionais e de manutenção
A instalação do sistema de desinfecção por radiação ultravioleta deve ser realizada
em local de fácil acesso para serviços de operação e manutenção. As instalações elétricas
do sistema UV deverão ser em linha separada de motores e bombas, pois podem
ocorrer problemas, como curta vida útil de lâmpadas e reatores eletrônicos.
O sistema deve ser equipado com um sistema de dreno e ter flexibilidade para
isolar um módulo para reparo sem paralisar o sistema durante manutenção corretiva
ou preventiva. Pode-se prever geradores para suprimento de energia em emergências.
O acesso a lâmpadas e reatores eletrônicos deve ser facilitado.
Aspectos de segurança
A radiação ultravioleta pode causar danos aos olhos e à pele não protegida. A
superexposição à radiação UV leva à dolorosa vermelhidão da pele: queimadura.
Cada exposição aos raios ultravioleta é armazenada em nossa pele, ou seja, o dano
causado pela exposição a UV é cumulativo e o dano celular causado por essa exposição
pode ser irreversível. A exposição crônica ou prolongada à radiação ultravioleta tem
sido relacionada a diversos efeitos à saúde, incluindo o câncer de pele e o
envelhecimento prematuro da pele.
Experiências do PROSAB 3
Projeto de pesquisa da UFES
O projeto de pesquisa da UFES abordou a desinfecção dos efluentes produzidos
em uma ETE do tipo UASB + Biofiltro Aerado Submerso (BFs) + Filtro Terciário
(FT), por meio de um reator UV do tipo canal com lâmpadas emersas, objetivando
a produção de efluentes compatíveis com a reutilização para fins produtivos e com
250 Desinfecção de Efluentes Sanitários
90
1,20
75 1,05
0,90
Largura (cm)
60
0,75
45 0,60
0,45
30
0,30
15 0,15
0,00
0 20 40 60 80 100 120 140 160 180 200 220
Comprimento (cm) Intensidade UV-254 nm
2
(mW/cm )
t10) a partir das curvas de passagem (Figura 6.19). Com os resultados obtidos, pode-
se verificar que o escoamento no canal, nas condições hidráulicas avaliadas, é próximo
do padrão pistão, pois o coeficiente de dispersão d foi inferior a 0,05 preconizado por
Usepa (1986). O nível de curto-circuito também é reduzido, pois t10 foi superior a
0,5.
0,060
Coeficiente de dispersão d
–1,154
0,045 y = 0,7907x
2
R = 0,9234
0,030
0,015
0,000
0 10 20 30 40 50
Vazão (lpm)
Figura 6.19 Coeficientes de dispersão nas curvas de passagem de traçador salino no reator UV.
1,0 E + 07
Coliformes fecais (NMP/100 ml)
1,0 E + 06
1,0 E + 05
1,0 E + 04
Reúso
1,0 E + 03
OMS
1,0 E + 02
1,0 E + 01
1,0 E + 00
0 50 100 150 200 250 300 350
2
Dose aplicada (mJ/cm )
Figura 6.20 Ajuste de modelo cinético para inativação de coliformes fecais em reator UV operando
em escala real com efluente terciário.
1,0E+08
1,0E+07
E. coli (NMP/100 ml)
1,0E+06
1,0E+05
1,0E+04
1,0E+03
1,0E+02
1,0E+01
1,0E+00
0 50 100 150 200 250 300 350
2
Dose aplicada (mJ/cm )
Figura 6.21 Ajuste de modelo cinético para inativação de E. coli em reator UV operando em escala
real com efluente terciário.
Cap. 6 Desinfecção por Radiação Ultravioleta 253
Tabela 6.10 Síntese dos resultados obtidos para ensaios cinéticos com coliformes fecais e E. coli,
em batelada e em escala real.
Estados
Terciário 2 78% 50 Kuo et al., 1997
Unidos
Estados
Terciário 4 76% 25 Oppenheimer et al., 1997
Unidos
Estados
Terciário 23 53% 170 Braustein et al., 1996
unidos
Figura 6.22 Reator de desinfecção com tecnologia ultravioleta miniplus. Fonte: UMEX.
Físico-química
Análises
Sist. DQT ST STF STV Absorbância Transmitância Turbidez Turbidez
Unidade pH
UASB mg/L mg/L mg/L mg/L cm2 % UNT UNT
Fase Entrada
+ Entrada Entrada Entrada Entrada Entrada Entrada Entrada Entrada
I FBAS 168,0 6,2-7,8 308 196 63 13 0,111 78,1 22,4
II FBAS 94,8 6,8-7,0 276 192 27 4 0,088 81,8 8,9
III UASB 95,3 6,4-6,7 229 168 16 1 0,107 78,4 26,2
IV FB 104,0 7,3-7,8 295 204 57 22 0,107 78,3 43,0
Biológicas
I FBAS 8,6 E + 06 1,4 E + 04 1,8 E + 06 1,0 E + 03 99,944 242 44 296 2,4 43,85 105,11 10
II FBAS 1,0 E + 06 9,4 E + 03 2,5 E + 05 1,5 E + 02 99,940 866 34 232 3,1 43,85 135,02 10
Cap. 6
III UASB 9,4 E + 06 2,2 E + 03 1,7 E + 06 2,8 E + 02 99,984 255 2,8 43,85 121,83 181
255
256 Desinfecção de Efluentes Sanitários
99,990
99,960
99,930
99,900
EEC (%)
99,870
99,840
99,810
99,780
0 10 20 30 40 50 60 70
SST (mg/L)
Figura 6.23 Desinfecção de efluentes sanitários utilizando tecnologia UV: gráfico EEC (%) × SST
para efluente do sistema UASB + FBAS e para efluente do reator UASB.
Dose aplicada
Etapa Fase Tipo de efluente FR utilizado
(mW.s/cm2)
1 Reator UASB 15,6
1 2 Reator UASB 30 1
3 Reator UASB 39,4
4 Reator UASB 11,4
5 Reator UASB 24,4
2 6 Reator UASB 24,2 1
7 Reator UASB 31,9
8 Reator UASB 41,9
9 FBP 3,7
3 10 FBP 10,3 1e2
11 FBP 11,6
12 Lagoa de polimento 16,9
4 13 Lagoa de polimento 24,5 1
14 Lagoa de polimento 31,3
Figura 6.24 Vista geral dos fotorreatores em PVC (esquerda) e em alumínio (direita).
Figura 6.26 Detalhe da câmara de revestimento da lâmpada germicida, que recebeu uma camada
de dióxido de titâneo (TiO2): fotocatálise.
O reator fotolítico que foi utilizado nesse trabalho é do tipo calha e possui uma
lâmpada UV emersa de comprimento de onda de 254 nm e potência igual a 8 Watts
que opera com fluxo contínuo (Figuras 6.27 e 6.28).
Cap. 6 Desinfecção por Radiação Ultravioleta 261
Figura 6.27 Detalhes do reator UV, tipo calha, com lâmpada de 8 Watts, emersa, comprimento de
onda 254 nm.
Figura 6.28 Reator UV, tipo calha, com lâmpada de 8 Watts, emersa, comprimento de onda 254
nm, em operação.
Figura 6.29 Unidade piloto utilizada para tratamento físico-químico do efluente de lagoa de
estabilização.
Poli- Tempo de
Al2(SO4)3 SST Turbidez Absorb. Dose UV C.totais E. co li
eletrólito contato
(mg/L) (mg/L) (UNT) 254 nm (mJ/cm2) (NMP/10 ml) (NMP /10 ml)
(mg/L) (seg.)
Lâmpadas UV
Planta
Planta
50 cm
40 cm
Amostra
10 cm 95 cm 18 cm
Corte
20 cm
35 cm
Saída
Agitador magnético
Entrada
Exemplos de dimensionamento
Exemplo 1
Dimensionar um reator UV do tipo canal com lâmpadas emersas para
desinfecção do esgoto sanitário produzido por uma população de 10 mil habitantes.
As etapas de tratamento que antecedem à desinfecção são compostas por tratamento
preliminar, tratamento anaeróbio em reator UASB e tratamento aeróbio em biofiltros
aerados submersos. O efluente desinfetado deverá apresentar uma densidade de
coliformes fecais N ≤ 1000 NMP/100 ml. O reator UV deverá ser composto por
lâmpadas UV de baixa pressão e baixa intensidade, cada uma com 30 W de potência
nominal, com eficiência de 8,3 W a 254 nm no início de funcionamento e após 100
horas de uso. A eficiência de reflexão da radiação UV (254 nm) estimada para o
refletor de alumínio é de 70%. Os seguintes dados devem ser considerados:
268 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Gerais:
População: 10.000 habitantes
Cons. per capta: 120 L/hab.d
Coeficiente do dia de maior consumo: k1 = 1,2
Coeficiente da hora de maior consumo: k2 = 1,5
Coeficiente de retorno: 0,8
Vazão de infiltração: 6,0 L/s
Vazão média total 17,11 L/s
Vazão máxima total: 26,0 L/s
Efluente aeróbio:
Concentração média de DQO no efluente: 83 mg/L
Concentração média de DBO5 no efluente: 25 mg/L
Concentração média de SST no efluente: 30 mg/L
Turbidez média no efluente: 18 UT
Densidade média de coliformes fecais: N0 =1,0 × 105 NMP/100 ml
Transmitância média: 59%
em que:
T = transmitância (%);
A = absorbância (cm–1).
Então:
A = 0,229 u.a./cm
D ⋅ αL
Da =
d1 − e i
− αL
[mJ/cm2] (6.24)
21 × 0,528 × 4,0
Da = = 50,4 mJ/cm2
d1 − e −0,528× 4 i
A dose aplicada por volume pode ser determinada pela Equação 6.22:
Da 50,4
D av = 0,2778 = 0,2778 = 3,50 Wh/m3
L 4
93,6 × 3,5
n= = 56,4 ≈ 57 lâmpadas
8,3 × 0,7
V 1,04
A=
b g
=
L m 0,04
= 26,0 m2
b
D a reator = g n × P254 × f
A
×t=
57 × 8,3 × 0,7
260.000 cm 2
× 40 s = 0,05094 J cm2 = 50,94 mJ cm2
Exemplo 2
Dimensionar um reator UV do tipo canal com lâmpadas emersas para desinfecção
do esgoto sanitário produzido por uma população de 50 mil habitantes. As etapas de
tratamento que antecedem à desinfecção são compostas por tratamento preliminar,
tratamento anaeróbio em reator UASB e tratamento aeróbio em biofiltros aerados
submersos. O efluente desinfetado deverá apresentar densidade de coliformes fecais
N ≤ 1.000 NMP/100 ml. O reator UV deverá ser composto por lâmpadas UV de
baixa pressão e baixa intensidade, cada uma com 30 W de potência nominal, com
eficiência de 8,3 W a 254 nm no início de funcionamento e após 100 horas de uso. A
eficiência de reflexão da radiação UV (254 nm) estimada para o refletor de alumínio
é de 70%. Os seguintes dados devem ser considerados:
Gerais:
População: 50.000 habitantes
Consumo per capta: 150 L/hab.d
Coeficiente do dia de maior consumo: k1 = 1,2
Coeficiente da hora de maior consumo: k2 = 1,5
Coeficiente de retorno: 0,8
Vazão de infiltração: 22,50 L/s
Vazão média total: 91,94 L/s
Vazão máxima total: 147,50 L/s
Efluente aeróbio:
Conc. média DQO efluente: 77 mg/L
Conc. média DBO5 efluente: 24 mg/L
Conc. de SST efluente: 28 mg/L
Turbidez média efluente: 18 UT
Densidade média de coliformes fecais: N0 = 1,0 × 105 NMP/100 ml
Transmitância média: 59%
Cap. 6 Desinfecção por Radiação Ultravioleta 271
Então:
A = 0,229 u.a./cm
D ⋅ αL
Da =
c
1 − e − αL h [mJ/cm2] (6.24)
21 × 0,528 × 5,5
d i
Da = 64,5 mJ/cm2
1 − e −0,528×5,5
A dose aplicada por volume pode ser determinada pela Equação 6.22:
D a ⋅ αL 64,5
D av = 0,2778 = 0,2778 = 3,26 Wh/m3
L 5,5
531 × 3,26
n= = 297,9 ≈ 300 lâmpadas
8,3 × 0,7
272 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Considerando que a lâmina média de líquido é de 5,5 cm, a área total necessária
para a câmara de desinfecção é de:
V 5,9
A=
a f
Lm
=
0,055
= 107,3 m2
b
D a reator = g n × P254 × f
A
×t =
300 × 8,3 × 0,7
805.000 cm 2
× 30 s = 0,06499 J cm2 = 64,99 mJ cm2
Exemplo 3
Dimensionar um reator UV do tipo canal e lâmpadas imersas para desinfecção
do esgoto sanitário produzido por uma população de 50 mil habitantes. As etapas
de tratamento que antecedem à desinfecção são compostas por tratamento
preliminar, tratamento anaeróbio em reator UASB e tratamento aeróbio em filtros
biológicos percoladores. Os seguintes dados devem ser considerados:
Vazão afluente média: 91,9 L/s
Vazão máxima horária: 165,5 L/s = 595,76 m3/h
Efluente aeróbio:
Conc. média DQO efluente: 77 mg/L
Conc. média DBO5 efluente: 24 mg/L
Conc. de SST efluente: 28 mg/L
Turbidez média efluente: 18 UT
Densidade média de coliformes fecais: N0 =1,0 × 105 NMP/100 ml
Cap. 6 Desinfecção por Radiação Ultravioleta 273
Equipamentos:
Deverá ser utilizado equipamento com tecnologia UV para atender à vazão
Qmáx–h, composto de 30 módulos que tratarão 20 m3/h cada, instalados adequadamente
em calha (canal) aberta.
O módulo possui 2 lâmpadas de 310 W, de baixa pressão, com vida útil de 8.500
h (aproximadamente 1 ano), para um único ciclo ligar/desligar diário.
A dose máxima utilizada por muitos fabricantes situa-se próxima aos 250 mW.s/
cm2 (mJ/cm2).
Acessórios:
O módulo será provido de limpeza automática das lâmpadas, geralmente
comandada por um temporizador. Esse acessório é importante, no caso de lâmpadas
imersas, garantindo a eficiência do sistema.
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Capítulo 7
Lagoas de Estabilização
Marcos von Sperling, Eduardo Pacheco Jordão, Mário Takayuki Kato,
Pedro Alem Sobrinho, Rafael Kopschitz Xavier Bastos e Roque Pivelli
Introdução
As lagoas de estabilização são processos de tratamento de esgotos utilizados
principalmente para a remoção de matéria orgânica. No entanto, com algumas
adaptações no fluxograma e na geometria das lagoas, podem ser alcançadas
elevadíssimas eficiências de remoção de organismos patogênicos ou, de forma mais
específica, dos seus principais indicadores (coliformes e ovos de helmintos). É possível
obter ainda significativa remoção de nitrogênio e até mesmo de fósforo.
Esta visão mais ampla das lagoas de estabilização foi abordada em detalhes no
Capítulo 3 do livro Pós-tratamento de efluentes de reatores anaeróbios (Cavalcanti et al.,
2001). Aspectos relativos a lodo em lagoas foram publicados no livro Gerenciamento
do lodo de lagoas de estabilização não mecanizadas (Gonçalves, 1999). Ambas as obras
foram publicadas dentro do âmbito do PROSAB em editais anteriores.
A literatura nacional (Silva & Mara, 1979; CETESB, 1989; Mendonça, 1990;
van Haandel & Lettinga, 1994; Jordão & Pessôa, 1995; Kellner & Pires, 1998; von
Sperling, 2002c) e latino-americana (Yanez, 1993; Mendonça, 2000) aborda também,
na forma de livros específicos, ou detalhados capítulos, o processo de lagoas de
estabilização e suas diversas variantes. Estes livros cobrem aspectos conceituais, de
projeto, construção e operação, sendo importantes e complementares referências acerca
desse processo de tratamento de esgotos.
mecanismos puramente naturais. Não são analisadas, neste capítulo, as lagoas aeradas,
uma vez que seu principal objetivo está estreitamente vinculado à remoção de matéria
orgânica.
Descrição da tecnologia
Visão geral sobre as lagoas de estabilização
As lagoas de estabilização são unidades especialmente projetadas e construídas
com a finalidade de tratar os esgotos. No entanto, constituem-se em uma das formas
mais simplificadas para o tratamento. Adicionalmente, a construção é simples,
baseando-se principalmente em movimento de terra de escavação e preparação dos
taludes. Há diversas variantes dos sistemas de lagoas de estabilização, com diferentes
níveis de simplicidade operacional e requisitos de área. Dentre estas, são os seguintes
os sistemas abordados no presente texto:
l lagoas facultativas
l sistema de lagoas anaeróbias seguidas por lagoas facultativas
a) Lagoas facultativas
As lagoas facultativas são classificadas em lagoas primárias e secundárias. Quando
as lagoas facultativas recebem esgoto bruto, são denominadas lagoas primárias. Uma
lagoa secundária é aquela que recebe seu afluente de uma unidade de tratamento
precedente, tal como lagoas anaeróbias (ver item b a seguir).
bactérias è respiração:
consumo de oxigênio
produção de gás carbônico
algas è fotossíntese:
produção de oxigênio
consumo de gás carbônico
LAGOA FACULTATIVA
Zona aeróbia
DBO
Afluente Zona facultativa Efluente
DBO CO2 CH4 H2S
Camada de lo
do
Zona anaeróbia
Fotossíntese
Co2
piração
Fo
tossíntese
Bactérias
Algas
Res
O2
Corpo
LAGOA FACULTATIVA receptor
Medidor
de vazão
Fase Fase
sólida sólida
O esgoto bruto entra numa lagoa de menores dimensões e mais profunda (em
torno de 3,5 a 5,0 m). Em razão das menores dimensões dessa lagoa, a fotossíntese
basicamente não ocorre. Predominam as condições anaeróbias nessa primeira lagoa,
denominada, em decorrência, de lagoa anaeróbia.
A lagoa facultativa recebe uma carga de apenas 30% a 60% da carga do esgoto
bruto, podendo ter, portanto, dimensões bem menores. O requisito de área total
(lagoa anaeróbia + lagoa facultativa) é tal que se obtém uma economia de área da
ordem de 1/3, comparado a uma lagoa facultativa única.
Medidor
Grade Desarenador Lagoa anaeróbia Lagoa facultativa
de vazão
Fase Fase
sólida sólida
Figura 7.3 Fluxograma típico de um sistema de lagoas anaeróbias seguidas por lagoas facultativas.
c) Lagoas de maturação
As lagoas de maturação possibilitam pós-tratamento do efluente de qualquer
dos sistemas de lagoas de estabilização descritos anteriormente ou, em termos mais
amplos, de qualquer sistema de tratamento de esgotos. O principal objetivo das lagoas
de maturação é a remoção de organismos patogênicos, e não a remoção adicional de DBO.
Cap. 7 Lagoas de Estabilização 283
Fase Fase
sólida sólida
Figura 7.4 Fluxograma típico de um sistema de lagoas de estabilização seguidas por lagoas de
maturação em série.
d) Lagoas de polimento
Os sistemas anaeróbios de tratamento de esgotos cresceram em popularidade e
alcance em países de clima quente como o Brasil. Dentre esses processos, destaca-se
o reator anaeróbio de manta de lodo e fluxo ascendente (reator UASB), amplamente
enfocado pelo PROSAB. Os reatores UASB atingem boa eficiência na remoção de
DBO (em torno de 60% a 75%), considerando-se os baixos tempos de detenção, a
simplicidade do processo e a inexistência de equipamentos, como aeradores. No
entanto, essa eficiência é, na maior parte das vezes, insuficiente, exigindo pós-
tratamento para o efluente anaeróbio. O pós-tratamento pode objetivar alguns dos
seguintes itens: (a) remoção adicional de DBO; (b) remoção de nutrientes; (c) remoção
de organismos patogênicos.
Reator
UASB Corpo
gás receptor
Desare- Medidor
Grade
nador de vazão Lagoa de polimento (facultativa)
Fase Fase
sólida sólida
Reator Corpo
UASB receptor
gás
Desare- Medidor
Grade
nador de vazão Lagoas de polimento (maturação) em série
Fase Fase
sólida sólida
Figura 7.5 Fluxograma típico de um sistema composto por reator UASB e lagoas de polimento.
(a) Concepção inicial: lagoas de polimento como lagoa facultativa. (b) Concepção atual:
lagoa de polimento como lagoa de maturação.
Fase Fase
sólida sólida
Fase Fase
sólida sólida
Fase sólida
Figura 7.6 Comparação entre concepções clássicas de lagoas de estabilização e a concepção mais
recente (reator UASB seguido por lagoas de polimento).
Lançamento em rio ü ü ü ü ü
Reúso direto
Intervalo de remoção
<7 > 15 > 20 > 20 > 20
(anos)
Concentração de sólidos
> 10% (d) > 10% (d) > 10% (d)
totais no lodo (% ST)
Concentrações de
coliformes no lodo 102-104 102-104 102-104 102-104 102-104
(CF/gST)
Concentração de ovos de
helmintos no lodo 101-103 101-103 101-103 101-103 101-103
(ovos/gST)
Tratamento adicional
Secagem (a) Secagem (a) Secagem (b)
requerido
Formas de disposição
(c) (c) (c)
final
Observação: é essencial a presença de desarenação.
(a) No caso de lagoas de polimento, deve-se acrescentar ainda os valores correspondentes ao lodo retirado do
reator UASB.
(b) Higienização (usualmente adição de cal) no caso de disposição para reúso agrícola do lodo.
(c) Formas de disposição final similares aos lodos dos demais sistemas de tratamento biológico de esgotos
(reúso agrícola, aterro, outros).
(d) Ao ser removido por dragagem hidráulica (bombeamento), a concentração pode-se reduzir a 5% a 7%.
290 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Lagoas Reator
Lagoas Lagoas
Lagoa anaeróbia + UASB +
Item anaeróbia + facultativa +
facultativa facultativa + lagoa de
facultativa maturação
maturação polimento
Custo de
implantação 30-80 30-75 40-100 40-100 40-70
(R$/hab)
Custo de
operação e
2,0-4,0 2,0-4,0 2,5-5,0 2,5-5,0 4,5-7,0
manutenção
(R$/hab.ano)
Org./100 ml
(coliformes) 107
6
10
5
10
4
10
(salmonela) 103
2
10
1
10
TDH
T1 T2
O regime de fluxo disperso não foi enquadrado no esquema acima, por poder
representar bem reatores que se aproximam tanto de fluxo em pistão quanto de mistura
completa.
Modelo
Esquema do reator Características
hidráulico
As partículas de fluido entram continuamente em uma
extremidade do tanque, passam através do mesmo e são
descarregadas na outra extremidade, na mesma seqüência
em que entraram. O fluxo se processa como um êmbolo,
sem misturas ao longo do eixo longitudinal. As partículas
mantêm a sua identidade e permanecem no tanque por
Fluxo em um período igual ao tempo de detenção hidráulico. Este
pistão tipo de fluxo é reproduzido em tanques longos, com uma
elevada relação comprimento/largura, na qual a dispersão
longitudinal é mínima. Estes reatores são também
denominados tubulares. Os reatores de fluxo em pistão
são reatores ditos idealizados, uma vez que é bastante
difícil obter na prática a ausência total de dispersão
longitudinal (número de dispersão igual a zero).
As partículas que entram no tanque são imediatamente
dispersas em todo o corpo do reator. O fluxo de entrada e
saída é contínuo. As partículas deixam o tanque em
proporção à sua distribuição estatística. A mistura
Mistura completa pode ser obtida em tanques circulares ou
completa quadrados se o conteúdo do tanque for contínua e
uniformemente distribuído. Os reatores de mistura
completa são também reatores ditos idealizados, já que é
difícil de obter na prática uma dispersão total em todo o
volume do reator (número de dispersão infinito).
Os reatores de mistura completa em série são usados para
modelar o regime hidráulico que existe entre os regimes
Reatores ideais de fluxo em pistão e mistura completa. Se a série
de for composta de uma unidade apenas, o sistema
mistura reproduz um reator de mistura completa. Se o sistema
completa apresentar um número infinito de reatores em série, o
em série fluxo em pistão é reproduzido. O fluxo de entrada e saída
é contínuo. Unidades em série são também comumente
encontradas em lagoas de maturação.
O fluxo disperso ou arbitrário é obtido em um sistema
qualquer com um grau de mistura intermediário entre os
Fluxo
dois extremos de fluxo em pistão e mistura completa. Na
disperso
realidade, a maior parte dos reatores na prática apresenta
fluxo disperso. O fluxo de entrada e saída é contínuo.
294 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Tabela 7.7 Fórmulas para o cálculo da contagem de coliformes efluentes (N) de lagoas.
Mistura
completa No
N=
(1 célula) 1 + K b .t
Mistura
completa No
(células iguais
N=
t
em série) (1 + K b . )n
n
4ae1/2d
Fluxo N = No .
(1 + a) 2 ea/2d − (1 − a) 2 e − a/2d
disperso
a = 1 + 4K b .t.d
Pelo fato de o fluxo em pistão idealizado ser o regime que conduz à mais elevada
eficiência de remoção de constituintes que seguem a cinética de primeira ordem,
deve-se buscar, na prática, a configuração de lagoas que se aproximem, o máximo
possível, desse regime idealizado. Essa aproximação é alcançada com lagoas bastante
alongadas (L/B > 5 ou chicaneadas) ou com uma série de lagoas. Nesse sentido,
pode-se afirmar o seguinte importante critério para o dimensionamento de lagoas
que objetivem a remoção de coliformes:
d=0 99,99
4
Unidades log removidas
99,9
Eficiência (%)
3
d = 0,5
d = 1,0 99
2
d = 4,0
d = 00 90
1
Mistura completa
0
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20
Kb.t
Figura 7.8 Eficiência de remoção de coliformes e número de unidades log removidas em uma
lagoa única, para diferentes valores de Kb.t e de d, assumindo-se o regime hidráulico de
fluxo disperso
No caso de uma lagoa única, a figura ressalta a importância de ter baixo número
de dispersão, ou seja, uma lagoa tendendo ao regime de fluxo em pistão, de forma a
aumentar a eficiência de remoção. Para obter eficiências superiores a 99,9% (3 log de
remoção) em uma lagoa única com tempos de detenção não superiores a 25 dias,
necessita-se de um número de dispersão inferior a 0,3 ou, preferencialmente, inferior
a 0,1. Esses números de dispersão são obtidos apenas em lagoas que possuem relação
comprimento/largura (L/B) superior a 5.
l Yanez (1993)
d=
cL Bh
−0,261 + 0,254 ⋅ cL Bh + 1,014 ⋅ cL Bh
2 (7.2)
1
d= (7.3)
(L/B)
em que:
L = comprimento da lagoa (m)
B = largura da lagoa (m)
H = profundidade da lagoa (m)
t = θh = tempo de detenção hidráulica (d)
υ = viscosidade cinemática da água (m2/d)
B
L/B = (n + 1) 2 (7.4)
L
L
L/B = (n + 1) 2 (7.5)
B
em que:
L/B = relação comprimento/largura interna resultante na lagoa
L = comprimento da lagoa (m)
B = largura da lagoa (m)
n = número de divisórias internas
área superficial). O impacto no produto Kb.t pode ser avaliado através das fórmulas
apresentadas para os diferentes regimes hidráulicos.
3,5
2,5
Kb (20°C)
1,5
0,5
–0,5
0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 1,4 1,6 1,8 2,0 2,2 2,4 2,6
H (m)
Figura 7.9 Análise da regressão (Equação 7.6) entre Kb (20oC, fluxo disperso) e a profundidade H
das lagoas. Número de dispersão adotado como d=1/(L/B) – 140 dados de 82 lagoas
facultativas e de maturação no Brasil e no mundo.
Tabela 7.8 Valores de Kb (fluxo disperso), obtidos segundo a Equação 7.6 (Kb = 0,542.H–1,259),
para lagoas facultativas e de maturação (20oC).
H (m) 0,8 1,0 1,2 1,4 1,6 1,8 2,0 2,2 2,4
Kb (d1) 0,72 0,54 0,43 0,35 0,30 0,26 0,23 0,20 0,18
Muito embora a Equação 7.6 tenha sido obtida a partir de um grande número
de lagoas distribuídas em várias partes do mundo, condições locais específicas podem
sempre predominar e conduzir a diferentes valores de Kb. Por exemplo, locais com
insolação bastante elevada são mais suscetíveis a ter maiores valores de Kb (maior
radiação UV, maior fotossíntese, maior OD e maior pH). Como mencionado, a
incorporação deste e de outros fatores na equação levaria a um modelo bastante
sofisticado, necessitando de dados de entrada de difícil obtenção na prática.
n = 00 99,99
4
Unidades log removidas
Fluxo em pistão
99,9
3
n=4
n=3
99
2 n=2
n=1
1 90
Mistura completa
0
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20
Kb.t
Figura 7.10 Eficiências de remoção de coliformes, para diferentes valores de Kb.t e do número de
células em série, assumindo-se o regime hidráulico de mistura completa.
A tabela apresenta apenas relações L/B até 4 pelo fato de, por uma questão
conceitual, o ideal é que se use o modelo de fluxo disperso, uma vez que, na prática,
sabe-se que lagoas alongadas não devem ser representadas pelo regime de mistura
completa.
Cap. 7 Lagoas de Estabilização 303
Tabela 7.9 Valores de Kb para mistura completa, à temperatura de 20oC, para distintos valores da
profundidade H, da relação L/B e do tempo de detenção t, para lagoas facultativas e de
maturação.
1,0 0,61 0,67 0,72 0,77 20 1,0 1,97 4,34 7,29 10,68
1,5 0,34 0,36 0,37 0,38 1,5 0,51 0,82 1,19 1,63
3
2,0 0,23 0,24 0,24 0,25 2,0 0,42 0,57 0,71 0,84
2,5 0,17 0,18 0,18 0,18 2,5 0,26 0,33 0,39 0,45
1,0 0,72 0,86 0,99 1,12 25 1,0 3,34 7,99 13,76 20,40
1,5 0,37 0,40 0,43 0,46 1,5 0,69 1,29 2,03 2,88
5
2,0 0,24 0,25 0,27 0,28 2,0 0,31 0,45 0,62 0,82
2,5 0,18 0,18 0,19 0,19 2,5 0,20 0,24 0,30 0,36
1,5 0,48 0,59 0,70 0,81 1,5 0,95 1,99 3,28 4,76
10
2,0 0,28 0,32 0,36 0,40 2,0 0,37 0,62 0,92 1,26
2,5 0,20 0,21 0,23 0,25 2,5 0,22 0,30 0,39 0,51
2,5 0,22 0,26 0,30 0,34 2,5 0,28 0,47 0,70 0,97
*Confiabilidade questionável na conversão dos coeficientes Kb de fluxo disperso para mistura completa.
Células hachuradas: valores mais usuais em lagoas facultativas e de maturação.
304 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Tabela 7.10 Resumo das faixas de valores típicos de Kb (20oC) para lagoas facultativas e de
maturação, segundo os modelos de fluxo disperso e mistura completa.
Tempo de Kb fluxo
Profundidade Relação Kb mistura
Tipo de lagoa detenção disperso
H (m) L/B completa (d1)
t (d) (d1)
10 a 20 0,4 a 1,6
Facultativa 1,5 a 2,0 2a4 0,2 a 0,3
20 a 40 1,6 a 5,0
Maturação 3a5
(sem chicanas, (em cada 0,8 a 1,0 1a3 0,4 a 0,7 0,6 a 1,2
lagoas em série) lagoa)
Maturação
Não
(com chicanas, 10 a 20 0,8 a 1,0 6 a 12 0,4 a 0,7
recomendado*
lagoa única)
Maturação 3a5
Não
(com chicanas, (em cada 0,8 a 1,0 6 a 12 0,4 a 0,7
recomendado*
lagoa em série) lagoa)
Maiores valores de Kb: associados a menores t, menores H e maiores L/B.
*Em lagoas com chicanas, sugere-se a adoção do modelo de fluxo disperso (não se recomenda o modelo de
mistura completa).
em que:
θ = coeficiente de temperatura
Lagoas de maturação ou
Lagoas Lagoas de polimento
Lagoas
Parâmetro de projeto facultativas facultativas
anaeróbias Lagoas Lagoas
primárias secundárias
em série chicaneadas**
Tempo de detenção t
3-6 15-45 10-30 10-20* 10-20*
(d)
Taxa de aplicação
superficial LS 100-350 100-350
(kgDBO5/ha.d)
Taxa de aplicação
volumétrica LV 0,10-0,35
(kgDBO5/m3.d)
Profundidade H (m) 3,0-5,0 1,5-2,0 1,5-2,0 0,6-1,0 0,6-1,0
Relação L/B
(comprimento/largura) 1-3 2-5 3-8 1-3 > 10
usual
Número de lagoas em
1 1 1 2-5 1
série
Área per capita
0,1-0,2 2,0-4,0 1,5-3,0 1,5-2,5 1,5-2,5
requerida (m2/hab)
* Tempo de detenção total da série de lagoas.
** As lagoas chicaneadas ou alongadas podem ser únicas ou em série.
306 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Lagoas Lagoas
Parâmetro de Lagoas Lagoas de Lagos de
facultativas facultativas
projeto anaeróbias maturação polimento
primárias secundárias
Coef. temperatura θ
1,07 1,07 1,07 1,07
(mist. completa)
Coef. temperatura θ
1,07 1,07 1,07 1,07
(fluxo disp.)
Número de dispersão
0,4-1,1 0,4-1,1
d (L/B = 1)
Número de dispersão
0,1-0,7 0,1-0,7 0,1-0,5 0,1-0,5
d (L/B = 2 a 4)
Número de dispersão
0,07-0,23 0,07-0,23
d (L/B ≥ 5)
Observação: os coeficientes e relações encontram-se explicados no texto.
(a) Coeficiente Kb (mistura completa) para lagoas de maturação: valor apresentado destina-se a lagoas em
série (lagoas chicaneadas não são bem representadas pelo regime de mistura completa).
em que:
E = eficiência de remoção global
E1 = eficiência de remoção na lagoa 1
E2 = eficiência de remoção na lagoa 2
En = eficiência de remoção na lagoa n
em que:
E = eficiência de remoção global
En = eficiência de remoção em qualquer lagoa da série
n = número de lagoas em série
em que:
unidades log = unidades logarítmicas removidas no sistema como um todo
unidades log lagoa 1 = unidades logarítmicas removidas na lagoa 1
unidades log lagoa 2 = unidades logarítmicas removidas na lagoa 2
unidades log lagoa n = unidades logarítmicas removidas na lagoa n
Como parte dessa nova etapa do PROSAB, houve grande esforço no sentido de
ampliar a base de dados de lagoas de polimento, aprofundando-se na avaliação da
remoção dos principais organismos indicadores (E. coli e ovos de helmintos).
a) Lagoas investigadas
No âmbito do atual PROSAB 3, foram analisados os sistemas apresentados na
Tabela 7.15, todos incluindo lagoas de polimento.
Número TDH
Profundidade
de em cada TDH total
Instituição local Escala Sistema H
lagoas lagoa (d)
(m)
em série (d)
UASB
UFPE
Real Lag. 1 3,6 3,6 1,50
(ETE Mangueira)
Polim
UASB
UFV
Piloto Lag. 3 7,1-9,4 21,3-28,2 0,90
(Viçosa, MG)
Polim
UASB
UFMG
Real Lag. 1 20,9 20,9 2,00
(Itabira, MG)
Polim
UASB
UFMG
Piloto Lag. 2 4,6-2,9 9,2-5,8 0,60-0,40
(Itabira, MG)
Polim
UASB
UFMG
Demonst Lag. 4 2,0-3,3 8,0 0,65-0,40
(Arrudas, MG)
Polim
314 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Cap. 7
Lag. Itabira com chicanas - Fase 3 2 20,00 1,60 0,003 1,00 4,90 6,5 12,5 -20 24 4,11E+07 1,02E+06 0,9752
Lag. Itabira sem chicanas - Fase 4 2 8,00 4,00 0,003 0,60 2,17 8,8 2,0 -20 26 1,16E+08 5,66E+04 0,9995
Lag. Itabira com chicanas - Fase 4 2 20,00 1,60 0,003 0,60 2,02 9,5 12,5 -20 25 1,16E+08 1,34E+05 0,9988
Lag. Itabira sem chicanas - Fase 1 Prosab 3 2 8,00 4,00 0,003 0,60 4,40 4,4 2,0 -20 23 E. coli 2,29E+07 3,17E+05 0,9862
Lagoas de Estabilização
Lag. Itabira com chicanas - Fase 1 set 01 a fev 02 3 20,00 1,60 0,003 0,60 3,90 4,9 12,5 -20 23 3,17E+05 9,00E+03 0,9716
Lag. Itabira sem chicanas - Fase 2 2 8,00 4,00 0,003 0,40 4,50 2,8 2,0 -20 25 1,18E+07 2,37E+04 0,9980
Lag. Itabira com chicanas - Fase 2 3 20,00 1,60 0,003 0,40 4,40 2,9 12,5 -20 25 2,37E+04 1,83E+02 0,9923
Lag. pol. Arrudas 1 Prosab 3 2 26,00 6,25 0,016 0,60 30,00 3,3 4,2 -20 20 E. coli 2,03E+07 9,46E+05 0,9534
Lag. pol. Arrudas 2 set 02 a nov 02 3 26,00 6,25 0,016 0,55 30,00 3,0 4,2 -20 20 9,46E+05 2,26E+04 0,9761
Lag. pol. Arrudas 3 4 26,00 6,25 0,016 0,40 30,00 2,2 4,2 -20 20 2,26E+04 9,47E+02 0,9581
Lag. facul. Real Itabira Prosab 3 jul-dez 01 2 200,00 50,00 1,000 2,00 955,00 20,9 4,0 -20 23 E. coli 1,77E+07 1,98E+04 0,9989
315
316 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Figura 7.11 Gráficos box-plot das concentrações de E. coli ao longo dos sistemas de tratamento de
esgotos investigados no PROSAB.
Cap. 7 Lagoas de Estabilização 317
5 4,7 4,8
4 3,9
3 2,8
2
1,4
1
0
Itab – real UFPE UFV Itab – piloto Arrudas
Figura 7.12 Valores médios das unidades logarítmicas totais removidas em cada um dos sistemas
investigados (Itabira real: UASB + 1 lagoa; UFPE: UASB + 1 lagoa; UFV: UASB + 3
lagoas em série; Itabira piloto: UASB + 2 lagoas em série; Arrudas: UASB + 4 lagoas
em série).
5,00 Kb observados
Kb disperso (1/d)
4,00 Kb estimados
3,00
2,00
1,00
0,00
0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5
H (m)
Figura 7.13 Valores de Kb (20oC) observados nas 17 lagoas de polimento monitoradas (34 dados)
e estimados segundo a Equação 7.6 para fluxo disperso (com d=1/(L/B)).
1,E+06
Estimados
1,E+04
1,E+02
1,E+00
1,E+00 1,E+01 1,E+02 1,E+03 1,E+04 1,E+05 1,E+06 1,E+07 1,E+08
Observados
Figura 7.14 Valores de E. coli efluentes (NMP/100 ml) observados nas 17 lagoas de polimento (37
dados) e estimados segundo as Equações 7.3 e 7.6 (R2 = 0,877).
E = 100 ⋅ 1 − e b g
− αt 1− β
(7.11)
em que:
E = eficiência de remoção de ovos de helmintos (%)
t = θh = tempo de detenção hidráulica em cada lagoa da série (d)
α = coeficiente característico da “partícula” sedimentável; função da densidade,
diâmetro, forma; αNE = 0,20 para ovos de helmintos
β = coeficiente característico da lagoa; função da temperatura e do fluxo
LM e −0,49⋅t +0,0085⋅t j O
2
PQ
N
E = 100 ⋅ 1 − 0,41e (7.13)
Tabela 7.17 Eficiência de remoção de ovos de helmintos, de acordo com o modelo de Ayres et al.
(1992).
Unidades logarítmicas
Eficiência de remoção (%)
Tempo de removidas
detenção
hidráulica (d) Valores 95% de Valores 95% de
médios confiança médios confiança
5,0
4,0
3,0
2,0
Valores médios
1,0
95% de confiança
0,0
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28 30
Tempo de detenção hidráulica (d)
Figura 7.15 Unidades logarítmicas removidas de ovos de helmintos, segundo o modelo de Ayres et
al. (1992).
Valores típicos em nosso meio situam-se na ampla faixa de 101 a 103 ovos/L,
com a faixa entre 102 e 103 ovos/L associada a populações com condições sanitárias
bastante desfavoráveis. Desta forma, para atingir um efluente final com menos de 1
ovo/L, para irrigação restrita e irrestrita, as eficiências de remoção devem estar entre
90% e 99,9% (1 a 3 unidades log).
Cavalcanti et al. (2001) e von Sperling et al. (2002a, 2002b) comentam que a
remoção de ovos de helmintos é assumida como um processo de sedimentação discreta,
que, na teoria, está associada à taxa de aplicação hidráulica superficial (m3/m2.h) e
independe da profundidade. Eliminações totais de ovos de helmintos foram alcançadas
em lagoas piloto investigadas pelo PROSAB, no Nordeste (UFCG) e Sudeste (UFMG)
do Brasil, operando com taxas de aplicação superficial entre 0,12 e 0,20 m3/m2.d. A
taxa de aplicação mais conservadora de 0,12 m3/m2.d, com uma profundidade de 1,0
m, corresponde a um tempo de detenção hidráulica de (1,0 m)/( 0,12 m3/m2.d) = 8 d.
Observa-se que quase todos os sistemas (à exceção de um) cumprem, com folga,
os requisitos da OMS para irrigação restrita e irrestrita, no quesito ovos de helmintos.
O único sistema que apresentou ovos no efluente com média aritmética superior à
das diretrizes da OMS foi o de lagoas anaeróbias seguidas por lagoas facultativas
(tempo de detenção hidráulica médio da ordem de 16 dias). As razões para tal não
são claras, mas possíveis explicações poderiam ser ressuspensão do lodo de fundo por
inversões térmicas ou a retirada do efluente bem próximo ao fundo (defletor de saída
bastante abaixado), causando arraste do lodo com ovos sedimentados.
150 5
4
Max
100 Max 3 Min
Min
2 75%
50 75% 25%
1
25%
0 Median
0 Median UFV ITAB REAL ARRUDAS
UFV ITAB REAL ITAB PILOTO ARRUDAS UFPE ITAB PILOTO USP
250 6
5
200
4
150
3
100 Max Max
Min 2 Min
50 75% 75%
1
25% 25%
0 Median 0 Median
UFV ITAB REAL ARRUDAS UFV-L3 ITAB PILOTO-L2 ARRUDAS-L4
UFPE ITAB PILOTO
Figura 7.16 Gráfico box-plot das concentrações de ovos de helmintos (ovos/L) nos sistemas
monitorados (esgoto bruto, efluente do reator UASB, efluente da primeira lagoa e
efluente final).
Lagoas
Sistema UASB lagoas de polimento anaaeróbia-
facultativa
Estatística
UFMG UFMG UFMG
UFV UFPE
Itabira Itabira Arrudas USP real
Piloto real
real piloto demonstração
Tempo de
28 3,6 21 6a9 8 16
detenção total (d)
Média aritmética 0,0 0,0 0,2 0,4 0,0 2,1
Mediana 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0
Desvio-padrão 0,0 0,0 0,4 1,4 0,0 4,5
Mínimo 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0
Máximo 0,0 0,0 1,3 6,7 0,0 22,0
Cap. 7 Lagoas de Estabilização 325
Tabela 7.19 Eficiências médias de remoção de ovos de helmintos nos sistemas reator UASB –
lagoas de polimento (%).
UFMG
UFV (Itabira UFMG
UFMG
(UASB escala UFPE UASB escala (Arrudas
Unidade (Itabira
real; lagoas (escala real) demonstração; escala
escala real)
escala piloto) lagoas escala demonstração)
piloto)
Reator
71 88 86 63
UASB
Primeira
98,1 100,0 98,4 96,5 100
lagoa
Observação: eficiências calculadas com base nas médias aritméticas das concentrações afluentes e efluentes.
a
Ovos de helmintos – 1 lagoa da série
Eficiência estimada (Ayres) e observada
100
99
Eficiência (%)
98
97 Efic. observada
96 Efic. estimada
95
0 5 10 15 20 25
Tempo de detenção (d)
Figura 7.17 Comparação entre os valores de eficiência de remoção de ovos de helmintos estimada
(segundo Ayres et al., 1992) e observada nas lagoas de polimento investigadas.
326 Desinfecção de Efluentes Sanitários
No entanto, o ajuste fino do modelo aos dados observados não foi alcançado,
retratando a dificuldade na reprodução de dados experimentais de ovos de helmintos
(com uma análise laboratorial não trivial e médias aritméticas que não retratam bem
a tendência central dos dados) por um modelo simplificado. Mesmo assim, a faixa
global de remoção foi bem reproduzida.
Tabela 7.20 Porcentagem dos número de dados no efluente final de cada sistema que se enquadram
em uma das duas condições abaixo.
Lagoas
Reator UASB lagoas de polimento anaeróbia
facultativa
Condição
UFMG UFMG UFMG
UFV UFPE
Itabira Itabira Arrudas USP real
piloto real
real piloto demonstração
% dos valores ≤
100 100 92 91 100 63
1 ovo/L
% dos valores =
100 100 80 86 100 59
0 ovo/L
800
Ovos/g TS
600
400
200
0
Entrada Chicana 1 Chicana 2 Chicana 3 Chicana 4 Saída
Pontos de amostragem dentro da lagoa chicaneana
Figura 7.18 Distribuição dos ovos de helmintos no lodo ao longo de uma lagoa piloto chicaneada,
após um ano de operação, com indicação da viabilidade e da não viabilidade.
328 Desinfecção de Efluentes Sanitários
2,0E+07 800
Ovos por g de
sólidos totais
1,5E+07 600
1,0E+07 400
5,0E+06 200
0,0E+00 0
1 2 3 4 5
Compartimentos da lagoa
Figura 7.19 Perfil longitudinal do acúmulo de ovos de helmintos no lodo de uma lagoa piloto
chicaneada no Sudeste do Brasil, após um ano de operação.
1000
Ovos/g TS
100
10
0,1
Entrada Chicana 1 Chicana 2 Chicana 3 Chicana 4 Saída
Figura 7.20 Distribuição das espécies de helmintos no lodo ao longo de uma lagoa piloto chicaneada
no Sudeste do Brasil, após um ano de operação
Exemplo de dimensionamento
Dimensionar um sistema de lagoas de polimento (do tipo maturação) para o
efluente de um reator UASB, dadas as seguintes características:
Cap. 7 Lagoas de Estabilização 329
Solução
Remoção de coliformes
1. Reator UASB
Com base na seção Remoção de E. coli ao longo dos sistemas de tratamento, pode-se
adotar uma eficiência de remoção de coliformes no reator UASB de 80%.
A área total requerida pelas lagoas de polimento (incluindo taludes, vias, etc) é
em torno de 25% superior à área líquida determinada. Portanto, a área total requerida
é estimada como 1,25 × 22.172 m2 = 27.715 m2 = 2,8 ha (2,8 m2/hab).
330 Desinfecção de Efluentes Sanitários
4ae1 2d
N = No ⋅
a1 + af e 2 a 2d
a f
− 1 − a e − a 2d
2
4 × 1,91e1 2 × 0,25
N = 2,0 × 106 ⋅ = 2,96 × 105 CF 100 ml
b1 + 1,91g ⋅ e
2 b
1, 91 2 × 0 ,25 g − b1 − 1,91g2 ⋅ e −1,91 b2 ×0,25g
2. Lagoas de polimento
A eficiência de remoção de ovos de helmintos em cada lagoa da série pode ser dada
pelo modelo de Ayres et al. (Equação 7.13):
PQ MN
2
PQ
N
E = 100 ⋅ 1 − 0,41e
A eficiência de remoção global, nas quatro lagoas da série, as quais têm as mesmas
dimensões, é dada por:
C o − Ce 200 − 8 × 10 −3
E= × 100 = = 0,99996 = 99,996%
Co 200
Resumo
Reator UASB +
4 lagoas de
Item
polimento em
série
Número de lagoas 4 em série
Número de chicanas
Tempo de detenção total (d) 12
Tempo de detenção em cada lagoa (d) 3
Área líquida requerida (ha) 2,2
Área bruta requerida (ha) 2,8
Comprimento de cada lagoa (m) 148,80
Largura de cada lagoa (m) 37,20
Profundidade (m) 0,80
Coliformes fecais no esgoto bruto (CF/100 ml) 1,0 × 107
Coliformes fecais efluentes do reator UASB (CF/100 ml) 2,0 ×106
Coliformes fecais no efluente final (CF/100 ml) 9,6 × 102
Eficiência das lagoas de polimento na remoção de CF (%) 99,95
Eficiência global na remoção de CF (reator UASB + lagoas) (%) 99,99
Unidades log removidas de CF (global) 4,00
Ovos de helmintos no esgoto bruto (ovos/L) 200
Ovos de helmintos efluentes do reator UASB (ovos/L) 80
Ovos de helmintos no efluente final (ovos/L) ≈0
Eficiência das lagoas de polimento na remoção de helmintos (%) 99,99
Eficiência global na remoção de helmintos (reator UASB + lagoas) (%) 99,996
Unidades log removidas de helmintos (global) 4,40
Nota: nos cálculos, pequenas diferenças podem ocorrer por erros de arredondamento (os cálculos foram
efetuados usando uma planilha eletrônica, a qual não arredonda os valores numéricos).
334 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Lagoa 2
37,20 m
148,80 m
Lagoa 3
Efluente Lagoa 4
final
148,80 m
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336 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Disposição no Solo
Bruno Coraucci Filho, Cícero Onofre de Andrade Neto, Mario Takayuki Kato,
Mauro Floriano de Sousa Cartaxo, Roberto Feijó de Figueiredo,
Ronaldo Stefanutti e Vicente de Paula Silva
Introdução
Processos por remoção natural de organismos patogênicos, como forma
complementar de tratamento de efluentes sanitários, são bem recebidos pela
comunidade científica por causa da pequena ou mesmo inexistente interferência nos
processos ambientais. A eliminação ou mesmo a remoção parcial desses organismos
pode reduzir custos e evitar a formação de subprodutos indesejáveis – normalmente
tóxicos – quando se utiliza a desinfecção nos efluentes tratados a fim de disponibilizá-
los para outros usos preponderantes. A aplicação de efluentes anaeróbios no solo sob
condições controladas de lâminas hídricas, cargas orgânicas, períodos e freqüências
de irrigação, característica do tratamento que antecede a disposição, etc., se apresenta
como uma prática adequada e confiável.
Breve histórico
Até algumas décadas atrás, a grande disponibilidade de águas subterrâneas e
superficiais e a capacidade natural de depuração do ambiente dissimulavam os efeitos
do lançamento direto de dejetos e resíduos da atividade humana. Entretanto, a
crescente deterioração das fontes de abastecimento de água tem provocado escassez
de recursos hídricos para consumo humano, diminuição da qualidade de vida e
necessidade de aprimorar tecnologia de tratamento de água.
considerada má competidora fora dos hospedeiros; assim, caso não ocorra sua
destruição, a multiplicação geralmente é inibida (Elliott & Ellis, 1977).
Durante as duas últimas décadas do século XX, o uso de esgotos para a irrigação
ou recuperação de solos aumentou significativamente, em virtude de fatores como:
l crescente dificuldade de identificar fontes alternativas de água para irrigação
em algumas regiões;
l custo elevado de fertilizantes;
l segurança de que os riscos para a saúde pública e os impactos sobre o solo
são mínimos e que as precauções e as técnicas adequadas são efetivamente
utilizadas;
l custos elevados dos sistemas de tratamento necessários para possibilitar a
descarga de efluentes em corpos receptores;
l início da aceitação sociocultural da prática de reúso agrícola;
l reconhecimento, pelos órgãos gestores de recursos hídricos, do valor intrínseco
da prática.
O solo é mais que um simples meio físico formado por substâncias minerais e
orgânicas, cujas formas predominantemente granulares lhe conferem as propriedades
características, como porosidade, permeabilidade e textura. A depuração dos esgotos
pode ser conseguida provocando sua infiltração e percolação através do solo. Nesse
caso, o solo e os microrganismos telúricos atuam na remoção da carga poluidora,
enquanto a vegetação, se existente, cumpre a função de retirar do solo os nutrientes
340 Desinfecção de Efluentes Sanitários
A mesobiota e a macrobiota
A mesobiota inclui os nematóides, pequenos vermes oligoquetas; as larvas de
insetos; os ácaros; e os colêmbolos, sendo estes últimos os organismos mais abundantes.
Embora a mesobiota seja constituída principalmente por decompositores de detritos
e fagocitadores de bactérias, uma parte, especialmente os ácaros e os insetos, é
predadora (Brady, 1979; Primavesi, 1982).
a) Umidade do solo
A falta de umidade leva ao declínio quase toda a vida superficial do solo e, em
épocas secas, somente a 50 centímetros de profundidade é encontrada umidade para
Cap. 8 Disposição no Solo 341
b) Textura do solo
Nematóides preferem solos de textura média ou arenosa, por facilitarem seu
deslocamento. Animais menos adaptados a condições de falta de oxigênio ficam
impedidos de sobreviver em solos compactados e, com a redução do número de
predadores, a quantidade de pragas nesses solos pode ser maior se comparada a solos
bem aerados.
d) Porosidade
A porosidade controla, além da condutividade hidráulica de solos, a fauna edáfica.
Solos em que predomina a macroporosidade, como os podzólicos, permitem melhor
circulação de organismos que necessitam de migrações para a busca de alimentos. As
minhocas encontram no acúmulo de gás carbônico uma limitação a sua existência. A
drenagem adequada impede o acúmulo de água estagnada; já a umidade excessiva
induz à migração da fauna do solo.
e) Temperatura
A temperatura do solo estabiliza-se a aproximadamente 0,50 m de profundidade.
Contudo, a maioria da fauna sobrevive nas camadas de 0,20 a 0,30 m, onde há oxigênio
e matéria orgânica. A elevação da temperatura do solo leva à dessecação de organismos
recobertos por tegumentos finos, incapazes de protegê-los do excesso de calor.
A microbiota
A microbiota inclui as algas do solo (verde e verde-azuladas), as bactérias, os
fungos e os protozoários. Pertencem ao reino dos Protistas, ou seja, que não possuem
constituição celular. As bactérias e cianobactérias são procariotos, enquanto os fungos,
as algas e os protozoários são eucariotos. Os vírus constituem grupo à parte.
Toda a vida terrestre baseia-se no fato de que a planta, pelo processo de fotossíntese,
forma açúcares, amidos, proteínas e gorduras a partir de água, do gás carbônico e dos
minerais na presença de luz. Essas substâncias servem de alimento ao homem e aos
animais. Os organismos do solo, principalmente os heterotróficos, degradam os resíduos
orgânicos da produção de biomassa, impedindo o acúmulo de matéria orgânica. A
mineralização completa da matéria orgânica pela ação inicial da macro e da mesofauna
do solo e, posteriormente, pela ação das enzimas liberadas pelos microrganismos,
resulta em CO2 que volta para atmosfera, em água e minerais facilmente aproveitados
pelas plantas, pelos organismos do solo e pela biomassa microbiana.
Processos simbióticos ocorrem com freqüência no solo, como no caso dos fungos
micorrízicos e das bactérias fixadoras de nitrogênio do ar atmosférico que, em simbiose
com plantas superiores, auxiliam na absorção de P e no suprimento de N às plantas,
respectivamente.
c) A relação planta–microrganismos
Durante toda a sua vida a planta vive em relação íntima com os microrganismos.
Todas as plantas, exceto as Crucíferas e as Liláceas, possuem micorrizas em suas
raízes, isto é, fungos que ajudam a mobilizar os nutrientes em volta da raiz. As
leguminosas mantêm-se em simbiose com as bactérias fixadoras de nitrogênio, de
modo que toda a demanda de N pela planta pode ser suprida pela transformação do
N2 atmosférico em N-mineral assimilável pelas raízes. O melhoramento genético da
soja para aproveitamento dessa simbiose é atualmente um grande sucesso. O Brasil é
o segundo produtor mundial de soja, sem utilizar nenhum fertilizante nitrogenado. A
economia anual em fertilizantes nitrogenados na cultura da soja chega a mais de US$
1,5 bilhão, graças ao sucesso da simbiose rizóbio-leguminosa (Pesquisa Fapesp, 2003).
Propriedades do solo
O solo é formado por substâncias minerais e inorgânicas, com formas granulares
que lhe conferem propriedades características, como porosidade, permeabilidade,
textura e outras que fazem um habitat natural para grande número de seres vivos.
Há propriedades do solo que são extremamente importantes para que este seja
usado como local de disposição de esgotos ou de efluentes de estações de tratamento:
Cap. 8 Disposição no Solo 345
Qualidade da água
A qualidade da água de irrigação é fator primordial a ser considerado na
produtividade das culturas, assim como na preservação da qualidade do solo e do
aqüífero subterrâneo. Fatores como condições climáticas, características físicas e
químicas do solo, tolerância da cultura à salinidade, manejo do cultivo e método de
irrigação precisam ser observados no dimensionamento de projetos de reúso da água
em solos agrícolas. Além desses fatores, a avaliação de risco envolvendo a toxicidade
de diferentes substâncias e a patogenicidade nos efluentes no ambiente da irrigação,
devem ser consideradas. Na avaliação de risco, devem ser consideradas a presença de
E. coli como indicadora da contaminação fecal, a viabilidade e a sobrevivência de
cistos de protozoários e ovos de helmintos e, mais recentemente, a presença/ausência
de vírus nos efluentes e no ambiente da aplicação desses efluentes.
Remoção natural
Vírus
A adsorção dos vírus no solo depende de sua textura, da presença e da
concentração de cátions, dos orgânicos solúveis, do pH e do tipo de vírus (Gerba &
Bitton, apud Blanc & Nasser, 1996).
Em estudo realizado por Blanc & Nasser (1996) sobre a adsorção de alguns
tipos de vírus (vírus da hepatite A, poliovírus 1, bacteriófagos MS2 e PRD-1), pela
aplicação em dois tipos de solos e em água potável de poço de efluente proveniente
de tratamento secundário e terciário, observou-se que a composição da água foi um
fator insignificante na adsorção dos vírus no solo, porém o tipo de vírus utilizado
influenciou bastante. Não houve morte de qualquer vírus sob baixas temperaturas
(10ºC) nesse experimento. Os resultados também indicaram que tais microrganismos
podem permanecer por longos períodos no solo e na água subterrânea sob baixas
temperaturas. Em geral, segundo os autores citados anteriormente, houve maior
mortalidade dos vírus sob condições não saturadas do que em saturadas.
Protozoários e helmintos
O lodo de esgoto possui grande variedade de patógenos que podem causar diversas
doenças ao homem. Os principais grupos de patógenos são as bactérias, os vírus, os
helmintos e os protozoários.
De acordo com a EPA (1992), a saúde pública e dos animais, pode ser protegida
dos patógenos existentes no lodo de diversas formas, dentre as quais se pode citar:
l redução do número de patógenos pelo tratamento do lodo e/ou atenuação
ambiental;
l redução do transporte de patógenos por vetores, pela eliminação ou por sua
redução;
l limitando o contato humano e de animais nos locais em que o lodo for
utilizado, até que os níveis desses patógenos diminuam naturalmente.
No sistema wetland, houve redução de 98% para os coliformes totais, 93% para
os coliformes fecais, 73% para Giardia cysts e 58% para Cryptosporidium oocysts.
Escoamento subsuperficial
Segundo Lucas Filho (2000), a disposição controlada no solo permite que o efluente
percolado subsuperficialmente no terreno sofra tratamento no interior do solo, fazendo-
o se comportar como camada filtrante. Isso possibilita ações de adsorção e atividades
dos microrganismos, os quais usam a matéria orgânica contida nos despejos como
alimento, convertendo-a em matéria mineralizada (nutrientes) que fica à disposição da
vegetação. Essas matérias mineralizadas são muito convenientes na recuperação dos
solos agrícolas, proporcionando, no caso dos efluentes líquidos dispostos no sistema
solo–plantas, reflexos positivos nas condições socioeconômicas regionais. Essa técnica
de disposição no solo também é eficiente na remoção de patogênicos e constitui uma
atividade essencialmente de reciclagem do solo e da água.
Em trabalho realizado por Lucas Filho (2000), apesar de o efluente conter baixa
carga orgânica, os módulos de escoamento subsuperficial apresentaram boa eficiência
na remoção de DQOt acima de 50%, DQOf com média de 52%, COT com média de
54% e sólidos suspensos com médias superiores a 70%, o que representa uma solução
muito boa para a região do semi-árido nordestino, tanto do ponto de vista ambiental
como econômico.
Porém, algumas bactérias são capazes de reparar seu próprio DNA após danos
causados pela exposição aos raios UV. Wegelin et al. (1994), demonstraram que,
após 24 horas, considerável número de reparações do DNA das bactérias estudadas
foi encontrado, indicando que as bactérias possuem mecanismo de reparação do DNA.
produtos químicos tóxicos (metais pesados e outros), em princípio, são inferiores aos
limites máximos admissíveis para efluentes de ETE, mesmo nas regiões mais
industrializadas do país. Portanto, a principal questão reside na definição do risco de
infecção aceitável, associado diretamente ao grau de tratamento e ao padrão de qualidade
dos efluentes, seletividade de culturas, procedimentos operacionais e outras medidas
que garantam a segurança sanitária. Com base nesse cenário e em consenso no meio
técnico-científico, o problema pode ser abordado sob a ótica do risco de saúde, definindo
dois conceitos importantes: risco real e risco potencial (Cartaxo, 2003).
Segundo Andrade Neto (1997), o risco potencial ou teórico é inferido com base
na simples ocorrência de patogênicos no meio de transmissão, enquanto o risco real
é deduzido a partir de evidências epidemiológicas.
Tratamento Ausência de
completo medidas de
proteção
H
Restrição de
culturas (I)
+
Controle de ) Restrição
(II
exposição G de cultura
A
humana (II
I)
)
(IV
)
(V
Tratamento
parcial
+ Seleção dos
Controle da F B métodos de
exposição irrigação
humana
LE
Tratamento E
parcial C
+ Controle da
Restrição de TSC
LE D TSC exposição
culturas humana
Tratamento
parcial
Convenções:
Limeira S.A., em Limeira, SP, nas coordenadas 23°33’S e 47°24’W, com altitude
de 570 m.
b) ETE e efluente
O efluente aplicado no sistema provém de filtros anaeróbios de fluxo ascendente,
com biomassa fixa em leito de bambu e tempo de detenção de 3 horas, o qual recebe
esgoto doméstico do bairro Graminha. A caracterização desse efluente se encontra
na Tabela 8.1.
Tabela 8.1 Características do esgoto bruto e do efluente anaeróbio aplicado nas parcelas irrigadas.
Para cada cenário há três parcelas, nas quais foram aplicadas lâminas hídricas
(Hi) diferenciadas de irrigação, correspondentes às profundidades de irrigação de 20
cm, 40 cm e 60 cm. A profundidade de irrigação corresponde à profundidade do
perfil do solo que se deseja irrigar. Tais valores foram escolhidos em função do cultivo,
que, no caso do milho, se recomenda a profundidade de irrigação de 40 cm (Vieira,
1999). A partir desse valor foi escolhida uma profundidade mais conservadora (20 cm)
e outra menos (60 cm).
Bordadura
1,00
4,00
1,00
Bordadura
Figura 8.2 Esquema de uma parcela, com identificação das linhas de bordadura e dos sulcos.
O efluente foi disposto em um sistema de irrigação por sulcos rasos cujas parcelas
tiveram a seguinte configuração: cinco linhas de plantio e quatro sulcos intermediários
com 4 m de comprimento e 1 m de bordadura em cada extremidade. A distância
entre cada linha de cultivo foi de 1 m.
no 1, com a finalidade de dar suporte aos tubos e impedir o entupimento dos furos.
Para impermeabilização dos poços foi utilizado um selo de bentonita no solo, seguido
de uma laje de proteção sanitária. Os dois poços restantes foram montados substituindo
a camada de brita por areia média, sendo necessária uma tela, em náilon, de proteção
entre o tubo e a camada de areia. Esses poços foram construídos com a finalidade de
avaliar a influência da camada de areia nas características da água.
P1 controle
Bloco 1
Bloco 2
Bloco 3
Parcela 20 Parcela 40 Parcela 60
P2 P3 P4 P5
água
P6 P10
P8 P9
esgoto
P7 P11
Figura 8.3 Esquema de disposição dos poços de monitoramento na área experimental, para os
cenários água = adubo e efluente, no bloco 3.
7
6/nov/01 21/jan/02 18/mar/02 6/mar/02 18/mar/02 1/abr/02 22/abr/02 29/abr/02
13/mai/02 4/jun/02 27/jun/02 22/jul/02
6
Efluente
Sentido do lençol
5
Poços 6 e 7 – antes: h = 20 cm
Nitrato (mg/L)
Poço 8 – após: h = 20 cm
4
Poço 9 – após: h = 40 cm
Poços 10 e 11 – após: h = 60 cm
3
0
Poço 1 Poço 6 Poço 7 Poço 8 Poço 9 Poço 10 Poço 11
Figura 8.5 Concentração de nitrato (mg/L) nos poços de coleta do lençol subterrâneo.
1,8E+03
18/mar/02 29/abr/02 13/mai/02 04/jun/02 27/jun/02 22/jul/02 17/set/02
1,6E+03
1,4E+03
Poços
S. faecalis (NMP/100 ml)
1,2E+03 Parcela
Esgoto
1,0E+03 Fluxo
8,0E+02
6,0E+02
4,0E+02
2,0E+02
0,0E+00
Poço 1 Poço 6 Poço 7 Poço 8 Poço 9 Poço 10 Poço 11
(Controle) (Areia) (Areia)
Figura 8.6 Resultados da concentração de Estreptococus faecalis no lençol freático, situado na área
das parcelas de milho irrigadas com efluente sanitário.
3,50
06/11/01 21/01/02 18/02/02 06/03/02 18/03/02
3,00 01/04/02 22/04/02 13/05/02 04/06/02 29/06/02
Esgoto
E. coli (log10 NMP / 100 mL)
2,50
Fluxo do lençol
2,00
1,50
1,00
0,50
0,00
Poço 1 Poço 6 Poço 7 Poço 8 Poço 9 Poço 10 Poço 11
Figura 8.7 Resultados da concentração de E. coli no lençol freático situado na área das parcelas de
milho irrigadas com efluente sanitário.
As cargas hidráulicas de aplicação estudadas neste trabalho são as de 20, 40, 60,
80 e 100 L/m2.dia. Cada uma delas foi aplicada na superfície de todos os quatro
filtros de areia por um período de três meses.
Tubulação de
distribuição
Placa de distribuição
Afluente aplicado
Leito de areia:
Profundidade: 25, 50, 75 e 100 cm
Camada suporte:
Pedregulho
Profundidade: 10 cm
Tubulação
de aeração Camada de aeração:
Pedra britada número 3
Profundidade: 20 cm
Saída de efluente
12
0 20 40 60 80 100
2
Carga hidráulica aplicada (L/m )
Figura 8.9 Variação da concentração de coliformes totais no esgoto bruto e no afluente dos filtros.
12
Afluente dos filtros
Logaritmo da concentração de E.coli
F025
Escherichia coli
10 F050
F075
F100
8
(NMP/100 ml)
0 20 40 60 80 100
2
Carga hidráulica aplicada (L/m )
Tabela 8.2 Concentração de coliformes totais nos efluentes dos filtros de areia, nas camadas 0,25,
0,50, 0,75 e 1,0 para diferentes cargas hidráulicas.
Tabela 8.3 Concentração de coliformes fecais nos efluentes dos filtros de areia, nas camadas 0,25,
0,50, 0,75 e 1,0 para diferentes cargas hidráulicas.
As valas estudadas tinham camada de areia com 0,25, 0,50 e 0,75 m de espessura
e aplicaram-se taxas hidráulicas na faixa de 20 a 40 L/m2.dia (20, 25, 30, 35 e 40 L/
m 2.dia) de forma contínua (24 horas por dia). Os ensaios físicos dessa areia
Cap. 8 Disposição no Solo 365
Muro de arrimo
Alvenaria
Efluente
Anaeróbio
Efluente
da Vala
Comprimento da vala
Tubo de drenagem
Manta de PVC Ø 100 mm
e = 1,0 mm 0.03
Brita Efluente Efluente após
0.10 da vala desinfecção
0.03
Areia Cloro (Clorador de
Altura da vala Pastilhas e Chicanas)
Brita 0.03
Areia 0.10
e = 5 cm
Efluente Efluente após
Tubo de drenagem 0.10
0.20 0.20 da Vala desinfecção
Ø 100 mm
0.50
Luz Ultra – Violeta
Tabela 8.4 Valores médios de coliformes totais nas valas de filtração nas taxas de aplicação
estudadas.
Efluente 7,03E 6,05E 4,71E 5,49E 9,35E 9,06E 8,64E 1,35E 1,69E 1,56E
bruto + 08 + 08 + 08 + 08 + 07 + 07 + 08 + 09 + 08 + 08
Afluente 1,64E 4,51E 1,20E 1,15E 2,85E 2,19E 1,01E 8,46E 5,36E 6,69E
valas + 08 + 07 + 08 + 08 + 07 + 07 + 08 + 07 + 07 + 07
Vala 2,36E 3,51E 5,86E 6,27E 1,22E 8,98E 2,25E 1,52E 7,39E 8,96E
0,25 m + 04 + 04 + 04 + 04 + 05 + 04 + 04 + 04 + 04 + 04
Vala 7,45E 5,18E 6,81E 6,00E 3,21E 2,42E 1,60E 2,18E 1,64E 2,23E
0,50 m + 03 + 03 + 04 + 04 + 03 + 03 + 04 + 04 + 04 + 04
Vala 3,46E 3,23E 6,62E 8,81E 2,13E 1,30E 2,81E 9,12E 7,71E 5,91E
0,75 m + 04 + 04 + 04 + 04 + 03 + 03 + 04 + 03 + 03 + 03
DP: desvio-padrão
Tabela 8.5 Remoção de coliformes totais (%) nos filtros anaeróbios e nas valas de filtração nas
taxas estudadas.
Quando comparado com os valores relatados pela EPA (1999), em que foram
estudados 30 sistemas de valas de filtração, os quais receberam efluentes de tanques
sépticos e mostraram remoção de 99% de coliformes totais (redução de 6,82 × 105 para
7,30 × 102), sem recirculação, nota-se que as valas desta pesquisa foram mais eficientes,
além de haver redução na ordem de 107 para 103 coliformes totais. Valores próximos e,
na maioria das vezes, superiores a 99,57% de remoção de coliformes totais foram obtidos
nas valas desta pesquisa nas taxas estudadas. Necessita-se, portanto, de estudos com
taxas maiores e maior tempo de operação, a fim de saber se esses valores mantêm-se em
taxas mais elevadas, como sugere a NBR 13.969/1997 e a EPA (1999).
Tabela 8.6 Valores médios de E. coli nas valas de filtração nas taxas de aplicação estudadas.
Efluente 4,96E+ 6,98E+ 4,66E+ 4,51E+ 2,50E+ 2,39E+ 3,70E+ 2,65E+ 5,49E+ 6,87E+
bruto 07 07 06 06 07 07 06 06 06 06
Afluente 1,14E+ 2,11E+ 8,56E+ 2,61E+ 4,26E+ 1,70E+ 6,74E+ 7,31E+ 1,01E+ 2,51E+
valas 07 06 06 06 07 07 06 06 07 06
Vala 6,68E+ 5,58E+ 1,90E+ 1,20E+ 1,06E+ 1,23E+ 9,75E+ 4,51E+ 7,10E+ 5,90E+
0,25 m 03 03 03 03 05 05 03 03 03 03
Vala 4,40E+ 5,08E+ 6,61E+ 6,89E+ 3,65E+ 3,75E+ 1,17E+ 9,33E+ 8,61E+ 8,44E+
0,50 m 03 03 03 03 03 03 03 02 03 03
Vala 1,18E+ 9,82E+ 9,34E+ 1,66E+ 1,76E+ 1,59E+ 1,87E+ 1,26E+ 1,34E+
0,75 m 03 02 03 04 03 03 03 03 03
Tanto a remoção de E. coli como a de coliformes totais foram elevadas nas valas
de filtração, mas para um futuro reúso desse efluente, visando à segurança sanitária,
necessita-se de desinfecção do mesmo, pois a OMS fixa em 103 NMP/100 ml de E.
coli para reúso de efluentes.
368 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Projetos na UFPE
Caracterização do local da pesquisa
A pesquisa da UFPE no PROSAB consistiu em um experimento com aplicação
de esgoto tratado para fins produtivos, conduzido na unidade experimental da Estação
de Tratamento de Esgoto da Mangueira (ETE Mangueira), no município de Recife,
Pernambuco. A sede do município encontra-se 4 metros acima do nível do mar e
apresenta 8º04’03" de latitude e 34º55’00" de longitude.
CI CI
GB CA CP
CI CI
CI CI P3
P0 P0 P1
Água
CI P2
CI
D1 C1 B1 A1 P4
PV
P5
CI CI CI CI
CB T1
Convenções:
CB T2 P6
Bloco – D Bloco – C Bloco – B Bloco – A Piezômetros
Acerola
Parcela experimental
D2 C2 B2 A2
CI CI CI CI CI Dreno
superficial
CI
Corpo receptor
Unidade piloto de reúso hidroagrícola
Convenções: Corpo receptor
EEE Estação elevatória de esgoto UASB Reator anaeróbio Tn Tanque de acumulação Efluente do UASB
GB Grade de barras LP Lagoa de polimento CB Casa de bombas Efluente da lagoa
CA Caixa de areia PV Poço de visita Pn;An;Bn; Ponto de água potável – Compesa
CP Calha Parshall CI Caixa de inspeção Cn;Dn Ponto de coleta das amostras Efluente do dreno subterrâneo
0-30 1,30 17,09 11,75 8,96 6,76 5,73 4,95 6,80 0,88
30-60 1,45 19,89 15,42 11,61 8,14 6,84 6,43 8,99 1,30
60-90 1,41 24,43 18,12 13,27 9,85 8,26 7,73 10,39 1,46
Resultados
Na Tabela 8.8 são apresentados os resultados médios dos exames bacteriológicos
e as análises químicas do líquido percolado nos quatro blocos experimentais da UFPE
(pontos A2, B2, C2 e D2), sendo os dois primeiros com cultura de acerola e os dois
últimos com cultura de milho. O bloco C se refere ao bloco irrigado com esgoto
tratado (A1) e o bloco D, com água mais solução nutritiva.
372 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Projetos na UFRN
O pós-tratamento de efluentes de estações de tratamento de esgotos sanitários
pela disposição controlada no solo tem se mostrado um método eficaz e apropriado,
porque apresenta uma série de vantagens, incluindo o baixo custo, os benefícios da
revitalização do solo para nutrição vegetal e, principalmente, a proteção dos corpos
d’água naturais e da saúde pública.
Critérios de projeto
Aspectos gerais
A determinação de um sistema apropriado de disposição final de esgotos é
definida por critérios que avaliam características do solo local, técnica de aplicação
do líquido e objetivo final do tratamento.
374 Desinfecção de Efluentes Sanitários
As análises dos resultados obtidos nos estudos são, em geral, baseadas nos
parâmetros: pH, DQO, DBO, SSV, N-NTK, N-NH+4, N-NO–3, SS, fósforo total e
coliformes fecais, quando comparadas as características de afluentes e efluentes dos
sistemas. Destacam-se também os índices de remoção de nutrientes e de contaminantes
biológicos.
Visando a seu posterior reúso, os esgotos brutos ou tratados podem ser aplicados
no solo por vários métodos, dependendo essencialmente da escala predefinida.
A adoção de uma mistura de estratégias para o uso dos esgotos traz a vantagem
de permitir maior flexibilidade, maior segurança econômica e melhor eficiência do
uso dos esgotos disponíveis ao longo do ano, enquanto a estratégia de uso único
pode levar a sobras sazonais que, normalmente, são condenadas à disposição
improdutiva.
Cap. 8 Disposição no Solo 375
Vala de filtração
a) Descrição
Seu funcionamento se baseia na aplicação de efluentes em um leito de areia,
onde ocorrem, naturalmente, processos físicos, químicos e biológicos, os quais realizam
a depuração dos esgotos.
b) Utilização
Esse tipo de sistema de tratamento pode ser empregado com vantagens,
especialmente quando o grau de permeabilidade do terreno for inferior a 25 L/m2.dia
(razão econômico-financeira ainda em avaliação), em áreas reduzidas ou quando
houver risco sanitário que o justifique.
Pelo fato de possuir baixo custo e ser de fácil instalação, a vala de filtração tem
ampla aplicação em áreas urbanas e rurais que não são atendidas por rede coletora
de esgotos.
c) Mecanismos de funcionamento
O processo de tratamento em uma vala de filtração envolve mecanismos físicos,
químicos e biológicos. O tratamento físico ocorre pela retenção das partículas por
meio da filtração e o químico, pela adsorção. Mas, sem dúvida, o sucesso do tratamento
é profundamente dependente das transformações biológicas que ocorrem no interior
do leito de areia. Sem tais transformações o filtro não funcionaria corretamente.
Dessa forma, segundo Jordão & Pessoa (1995), esse sistema é incorretamente chamado
de “filtro”, pois o processo não possui como principal embasamento o peneiramento
ou a filtragem, mas o contato com uma cultura biológica que realiza oxidação
bioquímica do efluente.
376 Desinfecção de Efluentes Sanitários
e) Aspectos construtivos
Para a construção de um sistema de valas de filtração, a NBR 13969/1997
apresenta as seguintes recomendações (veja as Figuras 8.13. e 8.14):
l deve-se prever uma sobrelevação do solo, na ocasião de reaterro da vala, de
modo a evitar sua erosão devido às chuvas, dando-se uma declividade entre
3% e 6% nas suas laterais;
l nos locais onde o terreno tem inclinação acentuada, como nas encostas de
morros, as valas devem ser instaladas acompanhando as curvas de nível;
l a camada de brita ou pedra britada, situada acima do leito de areia, deve ser
coberta de material permeável, como tela fina contra mosquito, antes do
Cap. 8 Disposição no Solo 377
reaterro com solo, a fim de não permitir a mistura deste com a pedra e, ao
mesmo tempo, permitir a evaporação da umidade;
l dependendo das características geológicas do local, a vala de filtração deve ter
as paredes do fundo e as laterais protegidas com material impermeável, como,
por exemplo, mantas de PVC, de modo a não contaminar o lençol freático;
l o leito de areia deve ter 0,70 m de altura e suas partículas devem ter diâmetro
efetivo na faixa de 0,25 mm a 1,2 mm, com coeficiente de uniformidade
inferior a 4;
l as tubulações de drenagem e a de distribuição devem ser envolvidas em uma
camada de brita no 4, ter no mínimo um diâmetro de 100 mm, serem
perfuradas e terem declividade entre 1% e 3%;
l deve-se levar em consideração a disponibilidade de material local para
diminuir o custo de implantação do sistema.
Caixa de
distribuição V1
Efluente
V2
V3
Filtro
anaeróbio Vala de filtração
Filtro de areia
a) Descrição
O filtro de areia segue os mesmos princípios da vala de filtração, ou seja, o
tratamento ocorre quando da passagem do esgoto pela camada de areia, onde se
processa a depuração por meio físico (retenção) e bioquímico (oxidação), devido aos
microrganismos fixos na superfície dos grãos de areia. Sua utilização é recomendada
como uma forma de pós-tratamento, nos mesmos casos apresentados para a vala de
filtração.
Quando se utiliza areia mais grossa, tem-se baixo tempo de retenção do efluente
aplicado, impossibilitando adequada decomposição biológica. Para esse caso, tem-se,
por aspecto positivo o fato de se poder aplicar altas taxas.
Cap. 8 Disposição no Solo 379
d) Aspectos construtivos
A construção e a implantação do filtro de areia são muito simples, quando
comparadas a outros métodos. Deve-se observar que os materiais utilizados na
construção da estrutura, onde serão depositados o leito de areia e a camada de brita,
devem suportar a agressividade química dos esgotos. Normalmente, recomenda-se o
uso de concreto, tijolo, fibra de vidro reforçada ou PVC.
Para que seja possível uma boa distribuição do efluente sobre o leito de areia,
deve-se construir sobre sua superfície uma placa de distribuição. A placa poderá ser
feita de concreto ou qualquer outro material resistente ao choque do líquido sobre
sua parte superior. Uma apresentação esquemática do filtro de areia é mostrada na
Figura 8.15.
Placa de distribuição
Solo
Tubo de ventilação
Brita
Pedregulho
Tubo de drenagem
e) Aspectos operacionais
A operação e a manutenção de um filtro de areia são muito fáceis de ser realizadas,
devendo-se ter atenção aos períodos de aplicação de esgoto e descanso. Após a
utilização do filtro por longos períodos, pode ocorrer aumento do tempo de retenção
do efluente em seu interior. Tal fato pode resultar da formação de uma camada na
superfície do filtro (colmatação). Quando isso ocorre, recomendam-se raspagem e
remoção do material, juntamente com uma pequena camada de areia (2 a 5 cm). Essa
camada removida deverá ser reposta, imediatamente, com areia limpa, com
características idênticas à anteriormente existente.
Deverão ser previstas duas unidades de filtro, cada uma com capacidade plena
de operação. Caso seja observado excessivo retardamento na velocidade de filtração
do esgoto, deverá ser feita substituição de um filtro por outro.
Vala de infiltração
a) Descrição e usos
Valas de infiltração podem ser utilizadas para infiltrar no solo efluentes de
sistemas de tratamento de esgotos e consistem basicamente de condutos não estanques
(usualmente tubos perfurados) envolvidos com pedras britadas e alinhados no interior
de valas recobertas, com baixa declividade. O conduto distribui o efluente ao longo
da vala, propiciando sua infiltração subsuperficial (Figura 8.16).
São aplicadas com vantagens quando a camada superficial do solo tem maior
capacidade de infiltração que as camadas inferiores ou quando o aqüífero se encontra
em pequena profundidade, propiciando maior proteção sanitária, entre outras situações
em que a infiltração subsuperficial é mais conveniente.
Ventilação
Ventilação
0,05 m
Brita 0,30 m
Solo
Brita
< 0,30 L < 30 m
Efluente
Corte transversal Corte longitudinal
Custos
Entre as técnicas de tratamento de esgotos, os sistemas de aplicação de efluentes
no solo apresentam os mais baixos custos de implantação, operação e manutenção,
caracterizando-se, em geral, por:
l baixo investimento inicial;
l pequeno custo de operação;
l benefícios agrícolas em casos específicos;
l baixo consumo de energia.
Por outro lado, alguns métodos demandam grandes áreas de aplicação. Portanto,
se faz necessária a avaliação das necessidades de transporte, recalque e disponibilidade
de áreas livres, principalmente em centros urbanizados.
Situação 1 (valores apresentados nas colunas preço unitário 1 e total 1, da Tabela 8.9):
l Uso de tubo de distribuição em PVC perfurado, com lona de PVC e =1 mm.
l Sistema que utiliza tanque séptico, caixa de distribuição e caixa de gordura
em polietileno (comercializados em lojas de materiais de construção).
l Uso de lona impermeabilizante de PVC e =1 mm.
Situação 2 (valores apresentados nas colunas preço unitário 2 e total 2, da Tabela 8.9):
l Uso de tijolos cerâmicos de oito furos, como utilizou Andrade Neto (1999)
em valas de infiltração, ou manilhas cerâmicas perfuradas (o custo em relação
ao tubo de distribuição em PVC pode ser reduzido em aproximadamente 90%).
l Uso da caixa de gordura, da caixa de distribuição e do tanque séptico em
solo cimento ou alvenaria (o custo pode ser reduzido em aproximadamente
50% em relação ao polietileno).
l Dispensar o uso da lona impermeabilizante de PVC e=1 mm caso o solo seja
argiloso e o lençol freático esteja a mais de 3 m de profundidade do fundo
das valas (cuidado que deve ser levado em conta para evitar a contaminação
do lençol freático).
l Custo da areia em regiões próximas a jazidas pode ser 50% do custo na
cidade de Campinas, SP.
l Custo de mão-de-obra para construção do sistema com uso de solo, cimento
ou alvenaria aumenta em aproximadamente 70%.
Tabela 8.9 Elaboração de custos de implantação do sistema nas situações 1 e 2 estudadas (ref.
dezembro 2002).
Preço Preço
Quantidade Unidade Total 1 Total 2
unitário 1 unitário 2
Tanque
1 unidade R$ 460,00 R$ 460,00 R$ 250,00 R$ 250,00
séptico/filtro
Anaeróbio
(1500 L)
Caixa de
1 unidade R$ 50,00 R$ 50,00 R$ 30,00 R$ 30,00
distribuição
Perf. diam.
100 mm
Lona plástica
70 m2 R$ 30,00 R$ 2.100,00 R$ 0,00 R$ 0,00
PVC
e = 1 mm
Demais
1 unidade R$ 50,00 R$ 50,00 R$ 50,00 R$ 50,00
tubulações
PVC
diam. 100 mm
R$ 4.562,50 R$ 1.447,50
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photoreactivation on microorganism in wastewater treated with UV light. Water Science
Technology, v. 27, n. 3-4, p. 379-385, 1993.
Capítulo 9
Outros Processos
de Desinfecção
Sérgio J. De Luca e Luis O. Monteggia
Introdução
O mais econômico e freqüentemente usado processo de desinfecção de efluentes
tratados emprega cloro líquido ou gasoso como agente inativador de organismos
patogênicos, principalmente bactérias e vírus. Cloro e alguns de seus compostos, no
entanto, podem produzir subprodutos danosos, de efeitos crônicos à saúde humana
e ao meio ambiente, em baixas concentrações, e de efeito agudo, pelo residual de
compostos oxidantes, com conseqüências letais para os ecossistemas aquáticos. Além
disso, compostos clorados não possuem capacidade desinfetante para protozoários
patogênicos e para helmintos.
Sais de bromo, iodo e prata são menos tóxicos à vida aquática mas não têm sido
empregados em larga escala no tratamento de efluentes pela dificuldade de manejo e
por seu elevado custo. Peroxone hospitalar, fenol/fenato e gluturaldeído têm sido
empregados principalmente em hospitais, clínicas de saúde, clínicas veterinárias, etc.,
para desinfecção de equipamentos e controle da infecção hospitalar. Cloroaminas
têm sido empregadas para desinfecção de efluentes, pois não formam trihalometanos.
390 Desinfecção de Efluentes Sanitários
A despeito de seu custo, algumas ETEs americanas têm-nas utilizado para proteger
ecossistemas aquáticos estressados. No entanto, casos têm sido publicados de
interferência de águas contendo residuais de cloraminas com máquinas e pacientes
de hemodiálise. Permanganato de potássio tem sido empregado principalmente para
controle de odor em ETEs; em alta concentração poderia atingir altas eficiências de
inativação de indicadores sanitários bacterianos, apesar do custo.
O íon ferrato(VI) pode ser produzido por via térmica, por via úmida e por via
eletrolítica. O ferrato(VI) de potássio tem sido sintetizado, principalmente, por via
úmida, ao passo que o ferrato(VI) de sódio tem sido usualmente produzido por via
eletrolítica, com a vantagem de poder ser gerado in loco. A decomposição final destes
compostos irá produzir ferro, oxigênio, sódio ou potássio, compostos inócuos e
necessários ao equilíbrio das espécies aquáticas. Há um limite de emissão de ferro
total de 15 mg/L do Conama 20. Além disso, também existe um padrão ambiental de
0,3 mg/L de ferro para manter as águas receptoras do efluente desinfetadas em classe
2 daquela Resolução. Testes de mutagenicidade de AMES (De Luca, 2003), de águas
tratadas com o íon ferrato(VI), mostraram que não apresentam características tóxicas
ou mutagênicas. Efluentes desinfetados não apresentaram toxidez a alevinos de tilápia
nilótica. Não há necessidade de descloração.
A obtenção do oxidante por via úmida é feita pela síntese de Scheyer &
Ockermann, 1951. A obtenção do desinfetante por via eletrolítica é obtida em uma
célula com duas câmaras separadas (De Luca & de Luca, 2003) por uma membrana
semipermeável ao íon sódio, ionicamente condutora e quimicamente estável. A câmara
anódica é carregada com uma solução alcalina e um reagente que fornece ferro. Este
reagente é, por vezes, o próprio ânodo, eletrodo de sacrifício, feito de ferro gusa, com
teor de carbono entre 3,6% e 4,2%. A câmara catódica é preenchida com a mesma
solução alcalina, variando de 7 a 14 a concentração molar de hidróxido de sódio.
Densidade de corrente entre 15 e 25 A/cm2 sob tensão de 9 V tem sido empregada.
392 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Bactérias e vírus têm sido desinfetados de águas com grande eficiência nas mesmas
condições operacionais de emprego de desinfetantes alternativos competidores.
Cryptosporidium e Giardia, no entanto, presentes em efluentes biologicamente
tratados, não têm sido inativados, a exemplo do cloro e seus derivados, ozônio, etc.
Por outro lado, o emprego de ferrato(VI) em lodos comprovou a inativação de
helmintos em dosagens de 15 a 30 g/L, com pH 12, em temperatura ambiente.
Em termos cinéticos, a Equação 9.3 mostra que a oxidação não segue uma taxa
de reação predeterminada. Dependendo do meio, da força iônica e da concentração
do contaminante C ou dos microrganismos, essa taxa tem se aproximado de cinética
de segunda ordem.
–dC/dt = –[K1 (FeO42–) + K2(FeO42–)2 + Ks(FeO42–) (C)] (9.3)
Para águas brutas de Porto Alegre, RS, com alto conteúdo de efluentes brutos
diluídos, foi possível ajustar um coeficiente cinético de segunda ordem, K colformes totais =
2 × 10–4 min.NMP/100 ml, para coliformes totais e Kcoliformes fecais = 3,7 × 10–3 min.NMP/
100 ml para coliformes fecais.
0,0
Col. fecais log(N/No)
–1,0
–2,0
–3,0
–4,0
–5,0
–6,0
0 0,75 1,1 1,3 20
Tempo de teste (h)
8 mg/L 15 mg/L
Figura 9.1 Desinfecção de efluentes tratados de lodos ativados por ferrato(VI) de sódio. ETE
SAPUCAIA/CORSAN.
0,0
Col. fecais log(N/No)
–1,0
–2,0
–3,0
–4,0
–5,0
0 0,75 1,1 1,3 20
Tempo de teste (h)
8 mg/L 15 mg/L
Figura 9.2 Desinfecção de efluentes tratados por ferrato(VI) de sódio. Lagoa facultativa. ETE
SERRARIA/DMAE/P. Alegre.
394 Desinfecção de Efluentes Sanitários
0,0
Col. fecais log(N/No)
–1,0
–2,0
–3,0
–4,0
–5,0
–6,0
0 0,75 1,1 1,3 20
Tempo de teste (h)
8 mg/L 15 mg/L
Figura 9.3 Desinfecção de efluentes tratados por ferrato(VI) de sódio. UASB /DMAE. P. Alegre.
0,0
Col. fecais log(N/No)
–1,0
–2,0
–3,0
–4,0
–5,0
–6,0
0 0,75 1,1 1,3 20
Tempo de teste (h)
8 mg/L 15 mg/L
Figura 9.4 Desinfecção de efluentes tratados com ferrato(VI) de sódio. RSB. ETE IPH/UFRGS.
Solução:
e) Limpeza dos tanques: Declividade do fundo, 5%, no sentido do fluxo, com retirada
do efluente desinfetado pelo fundo da última chicana, por canalização perfurada.
1,00
0,80
0,60
g/L
0,40
0,20
0,00
0 0,75 1,1 1,3 20
Tempo de teste (h)
Figura 9.5 Concentrações médias de THMs e HAAs em efluente de digestor anaeróbio, fluxo
ascendente, após desinfecção com 15 mg/L de ferrato(VI) de sódio. UASB ESMERALDA/
DMAE/P. Alegre.
Cap. 9 Outros Processos de Desinfecção 399
Segundo Watts et al., 1995, a desinfecção talvez possa ocorrer pelo desgaste da
parede celular, alterando a permeabilidade da célula e até a lise da mesma, com perda
de material intracelular e genético. A habilidade de um oxidante forte em oxidar um
composto orgânico, quer seja intra ou extracelular, depende do seu potencial de
oxidação. Em processos oxidativos avançados há a geração de singletes de oxigênio e
de hidroxilas, estas com o maior potencial de oxidação conhecido dentre todos os
compostos, exceto o ácido fluorídrico. O rombo na parede celular de qualquer
organismo permite que ocorra a difusão das espécies oxidantes para outras estruturas
internas da célula. Essa difusão depende da massa molecular, da carga e de
características dos microrganismos, como, por exemplo, possuir sistema reparador.
As combinações mais usuais para esses processos são o peroxone, H2O2 + ozônio,
UV + O3, UV + H2O2, UV + H2O2 + TiO2, H2O2 + fenton, catalisadores e luz solar,
etc. Há uma série de marcas e patentes relativas a essas combinações oxidantes/
desinfetantes, principalmente para oxidação de compostos orgânicos em águas
subterrâneas. A grande preocupação no emprego de AOPs para desinfecção e inativação
de protozoários seria a formação do íon bromato, classificado como carcinogênico
pela USEPA, com limite de 10 µg/L em água potável. Os processos oxidativos avançados
seriam a última barreira contra contaminantes químicos e bactérias patogênicas. Seu
custo tem inviabilizado o emprego para tratamento de efluentes, exceto em situações
específicas de oxidação de produtos químicos orgânicos perigosos em baixa
400 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Certos óxidos metálicos têm sido empregados para gerar o radical oxidante
[OH–] mais rapidamente e com maior estabilidade em meio líquido. A fotocatálise
heterogênea com TiO2 envolve a combinação UV + catalisador + H2O2 ou UV +
TiO2. Por enquanto, o emprego da fotocatálise heterogênea para destruição de
compostos orgânicos perigosos e para desinfecção está em estágio de pesquisa avançada.
Não se tem notícia do emprego comercial da fotocatálise para desinfecção de efluentes
biologicamente tratados.
Espécies retidas
P. molecular Tamanho (faixa útil)
Espécies
(D) (nm)
OI UF MF NF
Colóides 100-103
Vírus 30-300
OR NF UF MF
Tamanho poro não detectado 2-5 nm 5-20 nm 20 nm-1 µm
Pressão aplicada 30-150 atm 5-20 atm 2-7 atm 1-2 atm
402 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Tabela 9.3 Tamanho aproximado de microrganismos de interesse encontrados nos recursos hídricos
superficiais.
A teoria da estabilidade dos colóides pode ser aplicada para descrever a interação
entre colóides e membranas. Se as partículas e a membrana são carregadas com cargas
elétricas opostas ou se o potencial zeta de ambas são apropriados, as partículas vão
aderir na matriz da membrana, resultando na remoção de partículas menores que os
poros da membrana (Pall et al., 1980). Considerando o fato de que microrganimos
têm propriedades coloidais (Daniels, 1980) os mesmos princípios podem ser aplicados
a colóides biológicos e não-biológicos.
Atualmente é reconhecido que os parâmetros mais importantes no desempenho
da microfiltração são o fluxo hidráulico e capacidade de rejeição de pequenas partículas.
Fluxos mais elevados prejudicam a capacidade de rejeição, entretanto, o tamanho das
partículas, o tamanho dos poros e a espessura da membrana também influenciam o
processo de separação de partículas menores que o tamanho dos poros.
Levando em conta apenas o tamanho dos poros, pode-se considerar que vírus
não teriam possibilidade de penetrar em membranas de ultrafiltração. Estudos
desenvolvidos por Urase et al. (1994) observaram que a passagem de vírus através de
membranas delgadas de ultrafiltração se deu, provavelmente, pela ocorrência de certa
fração de poros com tamanho superior ao indicado pelo fabricante das membranas.
Resultados obtidos por Otaki et al. (1998), referentes ao desempenho de unidades
piloto de UF e NF para separação de colifagos e poliovírus, indicaram que, apesar de
os organismos estudados terem tamanhos similares, a remoção dos fagos foi inferior
404 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Dimensionamento
Meltzer (1988) recomenda que a escolha da membrana e, em particular, a
determinação da eficiência de separação de microrganismos seja baseada em
experimentos empregando a água a ser tratada. Membranas de microfiltração são
usualmente empregadas para remoção de bactérias e protozoários, embora diversas
pesquisas e aplicações em escala real demonstrem a vantagem adicional de boa
separação de vírus.
Cap. 9 Outros Processos de Desinfecção 405
em que:
Qp = fluxo de permeado do sistema (L/h)
Jtm = taxa de fluxo através da membrana (L/h.m2)
S = área superficial ativa da membrana (m2)
O fluxo através da membrana é função de diversas variáveis específicas da
membrana e parâmetros operacionais do sistema, bem como da ocorrência de fouling,
ou seja, a deposição de uma camada de partículas sólidas na superfície das membranas
que pode afetar significativamente a taxa de filtração. A área de módulos de
microfiltração e ultrafiltração situa-se na faixa de 1 a 15 m2, porém módulos com
área de membrana de até 50 m2 estão em desenvolvimento.
em que:
Pe = pressão na alimentação
Pp = pressão no permeado
Quando o sistema é operado em fluxo cruzado, a pressão média aplicada na
membrana corresponde a:
Ptm = (Pe – Ps) / 2 – Pp (9.7)
em que:
Ps = pressão na saída do módulo
406 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Custos
O custo global (investimento e operação) de unidades de membranas tem
apresentado tendência significativa de queda nos últimos anos graças à redução dos
custos de aquisição de novas membranas, bem como pela menor pressão requerida
por membranas delgadas. Custos unitários apresentados por Adham et al. (1996)
Cap. 9 Outros Processos de Desinfecção 407
indicam valores na ordem de US$ 0,13/m3 para unidades com capacidade maior que
19.000 m3/dia, podendo atingir o valor de US$ 0,66/m3 para unidades com capacidade
de 38 m3/dia, adotando-se taxa de juros de 7% aa. e 20 anos de prazo de amortização
dos investimentos.
Referências bibliográficas
ADHAM, S. S.; JACANGELO; J. G.; Laîné. Characteristics and costs of MF and UF plants.
Jour. Am. Water Works Ass., p. 22-31, mai. 1996.
CONNELL, G. F. The chlorination and cechlorination handbook. Washington: WEF, 2002.
DANIELS, S. L. Mechanisms involved in sorption of microrganisms to solid surfaces. In:
BITTON; MARSHALL (Eds.). Adsorption of microrganisms to surfaces. New York: John Wiley,
1980. p. 7-58.
DE LUCA, S. J. A desinfecção com agentes químicos. In: DANIEL, L. (Ed.). Processos de desinfecção
e desinfetantes alternativos na produção de água potável. Rio de Janeiro: PROSAB 2, ABES, 2001.
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26, n. 3, p. 420-424, 2003.
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do Nilo. PROSAB II, Tema 2, FINEP/CNPQ/CEF. 2003. (Relatório Final de Pesquisa).
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1997. v. 8, p. 391.
EPA. Combined sewer overflow technology fact sheet, alternative disnfection methods. Washington. 1999.
HERATH, G.; YAMAMOTO, K.; URASE T. Mechanism of bacterial and viral transport through
microfiltration membranes. Water Sci. and Tech., v. 38, n. 4-5, p. 489-496, 1998.
LLOYD, B; JINAG, J. Progress in the development and use of ferrate(VI) salt as an oxidant and
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METCALF & EDDY. Wastewater engineering. New York: John Willey & Sons. 2001
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Sci. and Tech., v. 37, n. 10, p. 107-116, 1998.
408 Desinfecção de Efluentes Sanitários
Análise Crítica
Eduardo Pacheco Jordão e Pedro Alem Sobrinho
Observando-se maior rigor por parte das agências ambientais de alguns Estados,
um número de ETEs com tratamento complementar por desinfecção já pode ser
encontrado, embora ainda reduzido. Em alguns casos, o rigor da lei vem sendo aplicado
com mais escrúpulo, a ponto de proibir a cloração, por conta do temor de possível
formação de subprodutos organoclorados, exigindo-se outras opções tecnicamente
disponíveis, embora mais onerosas.
Outra questão que recentemente vem sendo levantada pelas agências ambientais,
por organizações não governamentais e pelos próprios projetistas é o tipo do
desinfetante a aplicar, existindo muitas vezes posição contrária ao uso do cloro e seus
compostos, com receio da formação de subprodutos organoclorados. Como se discute
adiante, os estudos disponíveis já mostram que a desinfecção com cloraminas é capaz
de evitar as formações de subprodutos indesejáveis (especialmente os trihalometanos),
de acordo com os padrões atuais, devendo-se apenas evitar a presença de cloro livre
(Metcalf & Eddy, 2003).
Opções de desinfecção
Os estudos realizados pela rede do PROSAB consideraram a aplicação de compostos
de cloro (hipoclorito de sódio e dióxido de cloro), radiação ultravioleta, ozonização, e
lagoas de maturação. Embora uma abordagem inicial já tenha sido apresentada no
Capítulo 1, a seguir apresenta-se a Tabela 10.1, que compara várias características dos
processos e desinfetantes, e uma discussão sobre a aplicabilidade dessas diferentes opções
e dos resultados apresentados nos capítulos anteriores deste livro.
Compostos de cloro
A desinfecção por cloro constitui a prática mais comum no Brasil em
abastecimento de água, sendo a tecnologia totalmente dominada e conhecida. A
tendência da desinfecção de esgotos tratados deve ser a mesma, pela familiaridade
com a desinfecção da água e pela disponibilidade de produtos e equipamentos. Como
opções se tem assim a possibilidade do uso de:
l cloro gasoso;
l hipoclorito de cálcio;
Tabela 10.1 Características típicas dos principais processos e desinfetantes.*
Organoclorados Organoclorados
Geração de subprodutos Menor Não Não Não
possível possível
Boa, gerado
Pureza do desinfetante Elevada Baixa
in lo c o
Toxicidade aos
Elevada Elevada Elevada Elevada Elevada
microrganismos
Grau mínimo de
Primário Primário Primário Secundário Secundário Secundário
Cap. 10
tratamento
Análise Crítica
Riscos operacionais Elevados Elevados Elevados Não Moderados Não
* Adaptada de Metcalf & Eddy (2003).
411
412 Desinfecção de Efluentes Sanitários
l hipoclorito de sódio; e
l dióxido de cloro
O cloro gasoso seria indicado para as instalações de maior porte e os hipocloritos,
para as estações menores. A principal razão do uso do cloro gasoso nas estações de
porte médio e grande, em detrimento dos hipocloritos, é que estes apresentam baixo
teor de pureza, elevada capacidade corrosiva e maiores cuidados de transporte e
manuseio, resultando ainda em custos mais elevados para o caso de instalações de
maior porte. O dióxido de cloro, por sua vez, torna-se interessante por reduzir os
riscos de formação de compostos organoclorados.
Qualquer que seja o composto de cloro usado, a dosagem aplicada deverá ser tal
que um residual mínimo seja conseguido após determinado tempo de contato. Tanto
o cloro residual quanto o tempo de contato dependem da finalidade da cloração ou,
eventualmente, da imposição da autoridade ambiental local. O residual mínimo
Cap. 10 Análise Crítica 413
indicado costuma ser da ordem de 0,5 mg/L para um tempo de contato mínimo de
30 minutos, para a vazão média, e 15 minutos, para as vazões de pico. Em condições
particulares e com fins específicos, esses tempos podem ser maiores, assim como a
concentração de cloro residual e a dosagem aplicada.
Na verdade, a dosagem requerida deverá ser função não apenas do tipo de esgoto,
mas também da inativação desejada (densidade de CF no efluente desinfetado, ou
remoção de CF ou de protozoários, por exemplo), do residual de cloro desejado e do
tempo de contato na câmara de cloração. Modernamente se tem trabalhado com um
conceito mais amplo que considera o produto do cloro residual mantido (CR) pelo
tempo de contato (t), medido em [mg.min/L], representado por CR.t, a que se poderia
chamar de “dose residual”.
A Tabela 10.3 mostra faixas de dose residual (CR.t) para diversos graus de
inativação de bactérias e diferentes desinfetantes, segundo Metcalf & Eddy (2003).
Desinfetante Unidade Inat. 1-log Inat. 2-log Inat. 3-log Inat. 4-log
Cloro livre mg.min/L 0,1-0,2 0,4-0,8 1,5-3,0 10-12
Cloramina mg.min/L 4-6 12-20 30-75 200-250
Dióx. de cloro mg.min/L 2-4 8-10 20-30 50-70
Ozônio mg.min/L 3-4
2
Radiação UV mJ/cm 30-60 60-80 80-100
* Para efluente secundário filtrado, pH ~7, T = 20oC; segundo Metcalf & Eddy (2003).
1 mJ/cm2 = 10–3 W.s/cm2.
Assim, o risco da desinfecção do esgoto com cloro se torna maior à medida que
o efluente lançado no corpo receptor se misture, por exemplo, com água a ser captada
para abastecimento público. Da mesma forma é preocupante a irrigação com esgotos
tratados clorados, pela contribuição cumulativa de haloorgânicos no solo e no lençol
subterrâneo.
Radiação ultravioleta
Recentemente se têm observado muitos avanços com a prática da desinfecção
com radiação ultravioleta. A energia ultravioleta é absorvida pelos microrganismos,
causando alterações estruturais no DNA que impedem a reprodução. Ocorre assim a
inativação dos microorganismos. Uma característica principal relativa à radiação UV
é sua maior capacidade de inativação de cistos de protozoários e vírus.
Tabela 10.4 Doses de radiação UV para diferentes tipos de microrganismos e diversos graus de
inativação (mJ/cm2)
Ozônio
O ozônio é um poderoso agente oxidante, muito efetivo na destruição de bactérias,
protozoários, vírus e outros parasitas, dispondo de poder desinfetante cerca de 10
vezes superior ao do cloro. Não obstante, é também muito efetivo na oxidação da
matéria orgânica, o que praticamente requer maior dosagem de aplicação no caso de
esgoto apenas parcialmente tratado. Além da matéria orgânica, sua eficiência pode
variar também com a temperatura, a turbidez e o pH. A desinfecção com ozônio tem
sido prática comum em tratamento de água em vários países da Europa. Para
desinfecção de esgotos tratados, no entanto, só é recomendado para efluentes tratados
pelo menos em nível secundário.
Tabela 10.5 Faixas usuais de dose residual para inativação de microrganismos com ozônio (mg.min./
L).
Lagoas de maturação
As lagoas de maturação são, sem dúvida, uma alternativa muito econômica e
simples, visando à desinfecção. Considerando um sistema em série, e seu
posicionamento a jusante de uma lagoa facultativa, ou mesmo de reatores UASB e
outros tratamentos mais compactos, é possível obter eficiência de remoção de
coliformes de até 99,9999% ou 6 log, para o conjunto de lagoas. No Capítulo 8 deste
livro se encontram dados de campo de lagoas pesquisadas no âmbito do PROSAB,
bem como recomendações para projeto.
Custos da desinfecção
Sem dúvida, os custos relativos à cloração são ainda os mais baixos, em relação
tanto à implantação como à operação. A desinfecção por radiação UV tem custos
muito acima dos referentes à cloração apenas, mas já pode se tornar competitiva
quando comparada ao conjunto cloração-descloração. A desinfecção por ozônio é de
todas a opção a mais cara; no entanto, em ETEs que já utilizem oxigênio puro, o
processo já pode se tornar competitivo.
Custo
Custo de Custo de
População Vazão unit. de
Desinfecção ETE implantação operação
hab. L/s implant.
R$ R$/m3
R$/hab.
Cloro gasoso
Apucarana, PR 71.000 137 270.000,00 3,80 0,012
(1)
Hipoclorito Bandeirantes,
41.380 88 230.000,00 5,55 0,078
de sódio (3) PR
Dióxido de Pesquisa
5.844 10 273.674,00 46,83 0,108
cloro (5) PROSAB, PR
Radiação UV Pesquisa
5.844 10 128.433,00 21,98 0,034
(6) PROSAB, PR
Pesquisa
Ozônio (7) 10.000 18,5 181.120,00 18,11 0,091
PROSAB, SC
(1) após UASB + FB; (2) após UASB + FB; (3) após UASB + F. An; (4) após UASB + lagoa;
(5) após UASB + FAD; (6) após UASB + FB;
(1) a (4): ETEs operadas pela Sanepar;
(5) e (6): segundo Miguel Aisse, dados de pesquisa, PUCPR;
(7): segundo Flávio Lapolli, dados de pesquisa, UFSC.
Critérios utilizados
1. Cloro gasoso
c. Em Maringá – ETE Sul, PR, gasta-se 250 kg Cl/d para tratar 310 L/s
2. Hipoclorito de sódio
3. Dióxido de cloro
4. Ultravioleta
5. Ozônio:
Conclusões
Como apresentado no corpo deste livro, a desinfecção de esgotos é um operação
unitária que já apresenta tecnologia dominada em nosso País, possível de ser aplicada
segundo diferentes processos. Destes, e fora as lagoas de maturação que requerem
extensa disponibilidade de área, a cloração é ainda o mais econômico e recomendado.
É preciso se precaver, porém, em relação a eventual formação de compostos
organoclorados, recomendando-se a prática da desinfecção com cloraminas, sem a
presença de cloro livre.
Referências bibliográficas
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__________________ . Resolução Conama 274/2000.
CHERNICHARO, C. A. L. et al. Pós-tratamento de efluentes de reatores anaeróbios por sistemas
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2001.
422 Desinfecção de Efluentes Sanitários