Filosofia e Poesia Zambrano Prologo e Cap1

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FILOSOFIA

E
POESIA

Mara Zambrano

Zambrano, Mara
Filosofa y poesa/Mara Zambrano. 4. ed. Mxico: FCE, 1996
4. reimpresin, 2006
121p.; 21 x 14 cm (Colec. Filosofa)
ISBN 968-16-5004-2
1. Poesa. 2. Filosofa
D. R. 1939, 1987, MARA ZAMBRANO
D. R. 1993, Ediciones de la Universidad de Alcal de Henares (Madrid)
D. R. 1993, Fondo de Cultura Econmica (Mxico, D. F.)

COMO UM PRLOGO
ESTE LIVRO permita-me dizer, nascido, mais que construdo, num momento de
extrema, no me atrevo dizer, impossibilidade, que no me parece to excepcional, j
que no se passa do possvel ao real, seno do impossvel ao verdadeiro. Por isso digo
nascido, que o que para um ser vivente o mais impossvel, seja ao animal, planta,
quem sabe at mesmo pedra, ao que forma a rbita do verdadeiro universo e assim,
para no desanimar ao sempre inverossmil leitor, preciso contar minimamente como ele
nasceu na cidade em Morelia, capital do Estado de Michoacn, no Mxico, num outono
de indescritvel beleza.

Quem isto escreve tinha ido, tambm de um modo inverossmil, ao Mxico. E


inverossimilmente tambm, preparou esta edio atual para ser publicada numa coleo
mexicana. Por que e como escrevi ento esse livro? Quer dizer, no clido outono de
1939. No final da guerra na Espanha fui convidada para ir a Cuba e ainda solicitava
insistentemente por alguma Universidade norte-americana para tornar-me professora de
espanhol. Tinha ido, no incio da guerra na Espanha, quando me casei, em setembro de
1936. Depois de uma extensa e azarada travessia num barco espanhol, que partiu de
Cartagena, ou seja, que deveria atravessar o Estreito de Gilbraltar e alcanar as guas da
Espanha imperial, chegamos em Havana, neste buque que, segundo soubemos depois, ia
para Veracruz. Mas ao chegar em Havana, sob o poder do general Fulgencio Batista, o
barco foi detido, sua tripulao encarcerada, e ns, s no fomos subtrados a mesma
sorte em funo de um passaporte diplomtico. Creio j ter relatado, que
prodigiosamente num lugar chamado La Bodeguita de Enmedio, alguns intelectuais de
esquerda nos ofereceram um jantar, dentre eles o jovem e indito Jos Lezama Lima
que me surpreendeu com seu silncio e por ter se referido de passagem ao pouco que eu
havia publicado na Revista de Occidente. E ainda mais, por ter visto meu nome na lista
de professores e eu era somente assistente que foram dar aulas de Filosofia neste
preclaro lugar. Tambm fui convidada a dar uma conferncia no Lyceum Club
Femenino, e s a fiz por ter sido aconselhada pelo embaixador de Espanha que ainda se
matinha em Cuba. No esquecerei nunca, e me cabe salientar que tampouco durante
muitos anos foi esquecida, aquela minha conferncia, sobre meu mestre Ortega y
Gasset. Mas a meta da viagem era o Chile, Valparaso, e assim, atravs de um largo e
custoso priplo, tivemos que passar de barco atravs do Canal do Panam. Ali, a
paisagem de Pablo e Virginia surgiu inteira para mim. A chegada ao outro lado do
Oceano, em Balboa, quando o sol se punha. Passamos por cidades que o nome parecia
irreal, e ainda que eu soubesse bem que em Antofagasta onde se tinha que levar a terra
desde o norte porque ali era completamente estril se falava o espanhol, fiquei
maravilhada como se ignorasse esse fato. Por fim, para no me deter mais nesta
inesquecvel e decisiva viagem, chegamos a Valparaso. E dali, atravs de um campo de
cactos candelabro, a Santiago do Chile. E no instante mesmo em que subamos as
escadas do edifcio da Embaixada, descia o embaixador, que nos disse: no desfaam
as malas, pois o presidente da repblica acabou de me ligar, rompendo relaes com a
Espanha. Isso, de fato no se confirmou, porm a ameaa estava de p.

De toda maneira, o que tem isso tudo tem a ver com o livro Filosofia e Poesia?
Trata-se de sua criao, de seu nascimento. Meses depois, quando meu companheiro foi
convocado, decidimos regressar Espanha, no momento que era mais evidente que
nunca a derrota da causa que acreditvamos. E por que vocs retornaram se sabiam
muito bem que sua causa estava perdida? Justo por isso, por sabermos.
Com isso, me aproximo um pouco mais deste livro Filosofia e Poesia que foi
escrito quando, depois da derrota, fomos para o Mxico. E tem a ver intimamente com
isso porque eu escrevi esse livro naquele outono mexicano em homenagem
Universidade de San Nicols de Hidalgo, descendente direto dos estudos de
Humanidades, fundado por Don Vasco de Quiroga prximo das margens do lago
Patzcuaro, que foi at ali saindo da Espanha, na regio do ndios Tarascos, para fundar a
Utopia de Repblica Crist de Tomas Morus. Utpico para mim foi ter escrito esse
pequeno livro, j que, sendo irrenuncivel em minha vida a vocao filosfica, era
perfeitamente utpico o que eu escrevera e ainda explicara Filosofia, como o fiz na
Universidade de San Nicols de Hidalgo.
Entendo por Utopia a beleza irrenuncivel, e ainda a espada do destino de um
anjo que no conduz at aquilo que sabemos impossvel, como o autor destas linhas
sempre soube que Filosofia, ela, e no por ser mulher, nunca poderia fazer. E a
coincidncia se revela at nas palavras, j que em minha adolescncia algum me
perguntava, s vezes com compaixo, s vezes com ironia um tanto cruel: por que voc
vai estudar filosofia? Porque no posso deixar de faz-lo, e neste livro escrevi, que
aquele precioso outono de 1939, que utpico me parecia, no mais alto grau, poder
escrev-lo. E as Utopias, quando so de nascimento, no h como desfaz-las ainda que
se rebele contra elas. Naquele contexto de 1540 pretendiam ser trs as Universidades
fundadas pelos brbaros espanhis, San Marcos de Lima, San Carlos de Guatemala e
a Universidade que devia sua existncia aos estudos de Humanidades fundada por Don
Vasco de Quiroga. Tinha que agradec-lo de algum modo e aceit-lo, e nada mais, ainda
que de vez em quando, eu me rebelasse contra esta Imposio de escrever um livro, que
no foi exigido academicamente seno pessoalmente por, naquela poca, meu
companheiro, que sem condies favorveis foi imprimindo numa imprensa em que s
podia tirar algumas cpias. Temia, como havia temido ao ter que explicar na Cidade do
Mxico, como membro da Casa de Espanha, as trs conferncias que haviam formado o
Pensamento e Poesia na vida Espanhola. Mas precisamente quando chegou o

momento de terminar o curso da Universidade, me pedia, por um comando invisvel que


se encarnava atravs de meu ento companheiro, este que agora ofereo ao leitor, depois
de ter sido publicado na Morelia, compilado e corrigido a mo alguns dos captulos que
formam o livro, nos exemplares que foram dados a mim como presente pela
Universidade.
O primeiro captulo deste livro foi publicado anteriormente pela revista Taller,
fundada e dirigida por meu, desde ento, amigo e admirado Octavio Paz. Porm no
momento de dar continuidade, j se tratava de um livro, j se tratava do anjo invisvel e
implacvel que exige. A obrigao j no servia, pois era somente uma questo de
vocao, de utpica vocao.
Este livrinho, como segunda edio, foi oferecido para publicao nas Obras
Reunidas da Editorial Aguilar, com um pouco menos de temor de minha parte. (...)
Mas agora renasce em mim o temor do nascimento, como se estivesse
escrevendo-o agora, e somente me atrevo a faz-lo por acreditar que o nascido deve ser
acolhido, respeitado. Quem pode julgar algo assim? Eu no quero escapulir de minha
responsabilidade. Deve-se a uma condescendncia, no a busca de uma altura. Sabido
que o mais difcil no ascender, mas descender. Mas descobri que a condescendncia
o que outorga legitimidade, mais que a busca das alturas. A virtude da Virgem Maria
no foi um acumular, seno um condescender; isso sim, no sozinha. Eu no pretendo
que em mim se cumpra, nem neste livro especialmente, a virtude virginal. No poderia
ser. Porm, vejo claro sim que vale mais condescender diante da impossibilidade, que
andar errante, perdido, nos infernos da luz. Julgue-me o eventual leitor, a partir deste
ngulo; que preferi a escurido que h algum tempo atrs descobri como penumbra
salvadora, que andar errante, sozinha, perdida, nos infernos da luz. minha justificao.
Julgue-me, pois, o amor, e se de tanto no sou ainda digna, julgue-me com compaixo.
E no digo mais, acredito que seja o bastante, para o inverossmil, mas no impossvel
leitor.

Mara Zambrano
Madrid, 15 de fevereiro de 1987.

PENSAMENTO E POESIA

Apesar de que em alguns mortais afortunados, poesia e pensamento tenham


podido ocorrer ao mesmo tempo e paralelamente, apesar de que noutros ainda mais
afortunados, poesia e pensamento tenham se manifestado numa nica forma expressiva,
a verdade que pensamento e poesia se confrontam gravemente no decorrer de nossa
cultura. Cada uma delas quer eternamente para si a alma em que se aninha. E seu duplo
golpe pode ser a causa de algumas vocaes malogradas e de uma angstia sem fim que
descamba na esterilidade.

Porm, existe outro motivo mais decisivo que nos impede de abandonar o tema:
atualmente poesia e pensamento surgem como duas formas insuficientes; que nos
apresenta um homem dividido: o filsofo e o poeta. O homem no se encontra inteiro na
filosofia, como tambm, no se encontra a totalmente na poesia. Nesta nos deparamos
com o homem concreto, individual. Naquela com o homem na sua histria universal,
em seu querer ser. A poesia encontro, dom, recompensa por graa. Em contrapartida, a
filosofia busca - requerimento guiado por um mtodo.
em Plato que encontramos entravada a luta com toda a sua intensidade, entre
as duas formas da palavra, resolvida triunfalmente pelo logos do pensamento filosfico,
decidindo-se no que poderamos denominar a condenao da poesia. Inaugura-se no
mundo ocidental, a vida temerosa e desgraada como que margem da lei, da poesia,
com seu caminhar por sendas estreitas, seu andar errante e extraviado, sua loucura
crescente, sua maldio. Desde que o pensamento consumou sua tomada de poder, a
poesia ficou vivendo nos arredores, arisca e desgarrada dizendo aos berros todas as
verdades inconvenientes; terrivelmente indiscreta e rebelde. Como os filsofos ainda
no governaram nenhuma repblica, a razo estabelecida por eles tem exercido um
imprio decisivo no conhecimento, e aquilo que no era radicalmente racional, ou
sofreu sua fascinao, ou se lanou rebeldia.
No tratamos de fazer aqui a histria dessas alternativas, ainda que fosse bem
necessrio, sobretudo estudando suas ntimas conexes com o resto dos fenmenos que
imprimem carter a uma poca. Antes de realizar tal empresa vale mais a pena
esclarecer o fundo do dramtico conflito que motiva tais transformaes; visando
compreender a luta que existe entre filosofia e poesia e definindo um pouco os termos
do conflito que se instaura num ser necessitado de ambas. Por conseguinte, tentando
esclarecer a razo da dupla necessidade irrenuncivel de poesia e pensamento, bem
como, o horizonte que se vislumbra como sada desse conflito. Horizonte que se no for
uma alucinao nascida de uma avidez singular, de um obstinado amor que sonha com
uma reconciliao para alm da disparidade atual, seria simplesmente a sada para um
mundo novo de vida e conhecimento.
No princpio era o verbo, o logos, a palavra criadora e ordenadora, que pe em
movimento e legisla. Com essas palavras, a mais pura razo crist vem a engaar-se
com a razo filosfica grega. A vinda terra de uma criatura que levava em sua

natureza uma contradio extrema, impensvel, a de ser, a uma s vez, divino e


humano, no deteve com seu divino absurdo o caminho do logos platnico-aristotlico,
no rompeu com a fora da razo, com sua primazia. Apesar da louca sabedoria
flagelante de So Paulo, a razo como ltima raiz do universo seguia de p. Sem
embargo, algo novo tinha advindo: a razo, o logos era criador, frente ao abismo do
nada; era a palavra de quem tudo podia atravs do falar. E o logos passava a se situar
mais para alm do homem e da natureza, mais alm do ser e do nada. Era o princpio
mais alm de todo o principiado.
Que raiz tem em ns pensamento e poesia? No queremos por agora defini-las,
mas encontrar a necessidade, a extrema necessidade que venha colimar as duas formas
da palavra. A que amor insacivel quer satisfazer? Qual das duas necessidades a mais
profunda, nascida nas zonas mais recnditas da vida humana? Qual a mais
imprescindvel?
Se o pensamento nasceu somente da admirao, segundo nos afirmam textos
venerveis1, no se explica com facilidade porque se plasmou to prontamente em
forma de filosofia sistemtica; nem tampouco que uma de suas melhores virtudes, a de
abstrair essa idealidade conseguida na viso -, tenha se convertido num gnero de
viso que tenha deixado de ver as coisas. Porque a admirao que nos produz a generosa
existncia da vida a nossa volta no permite to rpido desprendimento das mltiplas
maravilhas que a suscitam. E como a vida, essa admirao infinita, insacivel e no
quer decretar sua prpria morte.
Porm, encontramos noutro texto venervel mais venervel por sua tripla
aurola de filosofia, poesia e... Revelao -, outra raiz donde nasce a filosofia: se trata
da passagem do livro VII da Repblica, em que Plato apresenta o mito da caverna.
Ali, a fora que origina a filosofia a violncia. E desde j, admirao e violncia juntas
como foras contrrias que no se destroem, nos explicam esse primeiro momento
filosfico no que deparamos com uma dualidade e, talvez, o conflito originrio da
filosofia: inicialmente, o ser pasmo e exttico diante das coisas, e em seguida, a
violncia para se libertar delas. Dir-se-ia que o pensamento toma a coisa que tem diante
de si somente como um pretexto, e que seu espanto primitivo negado posteriormente e

Aristteles. Metafsica. L. I. 982b.

quem sabe se trado por essa pressa de lanar-se a outras regies, que acabam por
romper com seu xtase primordial. A filosofia: um xtase fracassado por uma
separao. Que fora essa que a aparta? Por que a violncia, a pressa, o mpeto de
desprendimento?
E assim vemos um pouco mais claramente a condio da filosofia: admirao,
sim, pasmo diante do imediato, para arrancar-se violentamente dele e lanar-se a outra
coisa que precisa buscar e perseguir, que no se oferece e no nos brinda com sua
presena. E aqui comea o afanoso caminho, o esforo metdico por esta captura de
algo que no possumos, e necessitamos ter, com tanto rigor, que nos arranca daquilo
que j carregvamos sem termos perseguido.
S isso, sem ter que assinalar qual o momento da origem e a significao da
violncia, j seria suficiente para que certos seres dentre os que ficaram presos na
admirao original - no primitivo zaumasein - no se resignem diante do novo giro, no
aceitem o caminho da violncia. Alguns dos que sentiram sua vida suspensa, sua vista
enredada na folha ou na gua, no puderam passar ao segundo momento em que a
violncia interior faz cerrar os olhos buscando outra folha e outra gua mais
verdadeiras. No, nem todos foram pelo caminho da verdade trabalhosa e ficaram
aferrados ao presente e imediato, ao que presenteia com sua presena e doa sua figura,
ao que faz temer por estar to perto; eles no sentiram violncia alguma ou qui no
sentiram essa forma de violncia, no se lanaram a buscar o presumido ideal, nem se
dispuseram subir com esforo o caminho que leva do simples encontro com o imediato
at aquele permanente, idntico, Idia. Fiis s coisas, fiis a sua primitiva admirao
exttica, no se decidiram jamais a desgarrar-se delas; no puderam, porque a coisa
mesma se havia fixado neles, impressa em seu interior. O que o filsofo perseguia o
poeta j tinha, de certo modo, dentro de si; mas de uma maneira diferente.
Qual era essa diferente maneira de j possuir a coisa que no permitia o
nascimento da violncia filosfica, e que produzia ao contrrio, um gnero especial de
desassossego e uma plenitude inquietante, quase aterradora? Qual era esse possuir doce
e inquieto que acalma e no satisfaz? Sabemos que foi chamada de poesia, ou quem
sabe se algum outro nome borrado?! E desde ento o mundo se dividira, sulcado por
dois caminhos. O caminho da filosofia, no que o filsofo impulsionado pelo violento
amor ao que buscava abandonou a superfcie do mundo, a generosa imediatez da vida,

baseando sua ulterior possesso total, numa primeira renncia. O ascetismo tinha sido
descoberto como instrumento desse gnero de saber ambicioso. A vida, as coisas, seria
expressa de um modo implacvel; quase cruel. O espanto primeiro ser convertido em
persistente interrogao; a inquisio do intelecto iniciou seu prprio martrio e tambm
o da vida.
O outro caminho o do poeta. O poeta no renunciava, e nem buscava apenas,
porque possua. Tinha prontamente o que diante dele, de seus olhos, ouvidos e tato,
aparecia; possua o que olhava e escutava, o que tocava, como tambm o que aparecia
em seus sonhos, e seus prprios fantasmas interiores misturados de tal forma com os
outros os que vagavam fora que juntos formavam um mundo aberto onde tudo era
possvel. Os limites se alteravam de tal modo que acaba por no haverem.
Diferentemente, os limites que o filsofo descobre vo se precisando e distinguindo de
tal maneira que se formou um mundo com seu ordenamento e perspectiva, em que j
existe o princpio e o principiado; a forma e o que est sob ela.
O caminho da filosofia o mais claro, o mais seguro; a filosofia venceu quanto
ao conhecimento j que conquistou algo firme, algo to verdadeiro, compacto e
independente que absoluto, que no se apia em nada e no qual todo o resto se apia.
Assim, a aspereza do caminho e a renncia asctica foram enormemente compensadas.
Em Plato o pensamento, a violncia pela verdade, contendeu uma tremenda
batalha com a poesia; sente-se seu fragor em inmeras passagens de seus dilogos,
dilogos dramticos em que as idias lutam, e sob elas supem-se outras lutas ainda
mais intensas. A maior, talvez, foi ter se decidido pela filosofia quem parecia ter
nascido para a poesia. E tanto assim, que em cada dilogo passa tangenciando-a,
comprovando sua razo, sua justia, sua fortaleza. Mas tambm ostensvel, que nas
passagens mais decisivas, quando parece esgotado o caminho da dialtica e como um
para alm do sentido, irrompe o mito potico. Assim, na Repblica, no Banquete, no
Fdon... isso se d de uma tal maneira que ao terminar a leitura desse ltimo, o mais
surpreendente e dramtico de todos, ficamos com a dvida a respeito da ntima verdade
de Scrates. E a idia do mestre aventureiro, sua vocao de pensador desinstalado,
vacila. Qual era seu ntimo saber, qual a fonte de sua sabedoria, qual a fora que
manteve to bela e clara sua vida? O que afirma que a filosofia uma preparao para
a morte, abandona a filosofia ao chegar a seus umbrais e quase os pisando, faz poesia e

burla. que outra seria a verdade? J tocava nalguma verdade para alm da filosofia,
uma verdade que somente podia ser revelada atravs da beleza potica; uma verdade
que no pode ser demonstrada, mas somente sugerida por esse mais que expande o
mistrio da beleza sobre os raciocnios? Ou, seria porque as verdades ltimas da vida, as
da morte e do amor, so encontradas, ainda que perseguidas, por doao, como
recompensa venturosa, pelo que depois ser denominado por graa e que j em grego
assumiu o formoso nome, jaries, critas?
Em todo caso Scrates com seu misterioso demnio interior e sua morte
lcida, e Plato com sua filosofia, parecem sugerir que um pensar puro, sem nenhuma
mistura potica, estava somente iniciando. E o que poderia ser uma filosofia pura no
contava ainda com foras suficientes para abordar os temas mais decisivos, que se
apresentavam a um homem alerta de seu tempo.
A poesia perseguia, entretanto, a multiplicidade desdenhada, a menosprezada
heterogeneidade. O poeta enamorado das coisas se apega a elas, a cada uma delas e as
segue atravs do labirinto do tempo, da mudana, sem poder renunciar a nada: nem a
uma criatura nem a um instante dessa criatura, nem a uma partcula da atmosfera que a
envolve, nem a um matiz da sombra que arroja, nem do perfume que expande, nem do
fantasma que em sua ausncia suscita. que acaso ao poeta no lhe importa a unidade?
que se v apegado aventureiramente imoralmente multiplicidade aparente, por
tdio e preguia, por falta de mpeto asctico para perseguir essa amada do filsofo: a
unidade?
Com isso tocamos, talvez, o ponto mais delicado de todos: o que provm da
considerao unidade-heterogeneidade. Apontamos anteriormente, as divergncias de
caminho entre o filsofo que se dirige at o ser oculto detrs das aparncias, e o poeta
que se detm diante das aparncias. O ser tinha sido definido antes de tudo como
unidade, por isso estava oculto, e essa unidade era sem dvida, o m suscitador da
violncia filosfica. As aparncias se destroem umas s outras, esto em perptua
guerra, e quem vive nelas, perece. preciso primeiro salvar-se das aparncias, para
depois salvar as aparncias: resolv-las, torn-las coerentes com essa invisvel unidade.
E quem tiver alcanado a unidade ter alcanado tambm todas as coisas que so, pois
enquanto so participam dela ou enquanto so, so unas. Assim, tudo possui quem
possui a unidade. compreensvel a urgncia do filsofo, a violncia terrvel que lhe

faz romper as correntes que lhe amarram terra e a seus companheiros; que ruptura no
estaria justificada por essa esperana de possuir tudo, tudo? Se Plato nos parece to
sedutor no Mito da Caverna , nem mais nem menos, porque nele nos apresenta a
esperana da filosofia, a esperana que justificao ltima, total. A esperana da
filosofia, mostrando-nos que ela a possui, pois tanto a religio, quanto a poesia, e at
essa forma especial de poesia que a tragdia so formas da esperana enquanto fica
desesperanada, ou melhor, desolada. E, talvez, no tenham feito outra coisa os mais
elevados filsofos: ao final dos encadeamentos de seus raciocnios, construdos para
romper as amarras do mundo e da natureza, existe algo que rompe com eles tambm e
que se chama s vezes vida teortica, s vezes amor intelectualis, s vezes
autonomia da pessoa humana.
necessrio salvar-se das aparncias, afirma o filsofo, pela unidade, enquanto
o poeta fica aderido a elas, s sedutoras aparncias. Como pode, se homem, viver to
disperso?
Assombrado e disperso o corao do poeta meu corao batia, atnito e
disperso2. No resta dvida que esse primeiro momento de assombro, se prolonga
muito no poeta, porm no nos enganemos que um estado permanente do qual no
pode sair. No, o poeta tambm tem seu vo, sua unidade, seu transmundo.
Se o poeta no tivesse esse vo, no haveria poesia, no haveria palavra. Toda
palavra requer um distanciamento da realidade a que se refere; toda palavra tambm
uma libertao de quem a diz. Quem fala ainda que seja das aparncias, no
totalmente escravo; quem fala, ainda que seja da mais variada multiplicidade, j
alcanou algum vestgio de unidade, pois se estivesse imerso no puro pasmo, preso ao
que cambia e flui, no conseguiria dizer nada, ainda que este dizer fosse um cantar.

SUEO - Desgarrada la nube; el arco Iris/ brillando ya en el cielo,/ y en un fanal de lluvia/ y sol el
campo envuelto. /Despert. Quin enturbia /los mgicos cristales de mi sueo? /Mi corazn lata /atnito
y disperso. /...El limonar florido,/ el cipresal del huerto,/ el prado verde, el sol, el agua, el iris!/el agua
en tus cabellos!... /Y todo en la memoria se perda/ como una pompa de jabn al viento. Antonio
Machado. Desgarrada a nuvem; o arco Iris/j brilhando no cu,/ e num fanal de chuva/e sol o campo
envolto. Despertei. Quem perturba/ os mgicos cristais do meu sonho? Meu corao batia/ atnito e
disperso./Os limoeiros floridos,/os ciprestes do horto,/o prado verde, o sol, a gua, a ris!/A gua em teus
cabelos!/E tudo na memria se perdia/ como uma bolha de sabo ao vento.

E j havamos comentado sobre algo afim, bem afim poesia, que esteve junta
por muito tempo, a msica. E nela que mais suavemente resplandece a unidade. Cada
pea de msica uma unidade e sem embargo s est composta de instantes fugazes. O
msico no necessitou fazer questo de um ser oculto e idntico a si mesmo, para
alcanar a transparente e indestrutvel unidade de suas harmonias. Sem dvida que essa
unidade alcanvel que a msica toca, no a mesma unidade do ser que o filsofo
aspira. De pronto essa unidade da msica j se realiza, uma unidade de criao; com o
disperso e passageiro constri-se algo uno, eterno. Assim, o poeta, em seu poema cria
uma unidade com a palavra, essas palavras que tratam de prender o mais tnue, o mais
alado, o mais distinto de cada coisa, de cada instante. O poema a unidade no oculta,
presente; a unidade realizada, poderamos dizer, encarnada. O poeta no exerceu
violncia sobre as heterogneas aparncias e tambm sem violncia alguma logrou a
unidade. Como a multiplicidade primeira, ela lhe foi doada, graciosamente, por obra das
crites.
Porm existe, desde o incio, uma diferena: assim como o filsofo se alcanasse
a unidade do ser que seria absoluta, sem mesclas de multiplicidade alguma, a unidade
encontrada pelo poeta no poema sempre incompleta. por saber isso que o poeta se
mantm na humildade, conformado com a frgil unidade que encontrou. Da o tremor
por detrs de todo bom poema e essa perspectiva ilimitada, rastro que toda poesia deixa
depois de si e que nos leva at ela: espao aberto em torno de toda poesia. Entretanto,
at essa unidade encontrada mesmo que completa, parece sempre gratuita em oposio
unidade filosfica to insistentemente perseguida.
O filsofo quer o uno, porque quer o todo, havamos dito. E o poeta no quer
propriamente tudo, porque teme que neste todo no esteja cada uma das coisas e seus
matizes; o poeta quer uma, cada uma das coisas sem restrio, sem abstrao nem
renncia alguma. Quer um todo desde o qual se possua cada coisa, mas no entendendo
por coisa essa unidade feita de subtraes. A coisa do poeta no jamais a coisa
conceitual do pensamento, seno a coisa complexa e real, a coisa fantasmagrica e
sonhada, a inventada, a que houve e a que no haver jamais. Quer a realidade, porm a
realidade potica no somente a que existe, a que ; seno a que no ; abarca o ser e o
no ser em admirvel justia caritativa, pois tudo, tudo tem direito a ser at o que no
pode ser jamais. O poeta retira da humilhao do no ser o que nele geme, retira do
nada o nada mesmo e lhe d nome e rosto. O poeta no se afana para que das coisas que

existe, umas sejam, e outras no cheguem a esse privilgio, mas trabalha para que tudo
o que existe e o que no existe, chegue a ser. O poeta no teme o nada.
Apario, presena que tem seu transmundo para apoiar-se. A matemtica
sustenta o canto. A poesia tambm no possuir um transmundo, um mais-alm seu para
apoiar-se, sua matemtica?
Sem dvida assim: por encontrar sua unidade no poema, o poeta a alcana
mais rapidamente que o filsofo. A unidade da poesia descende em seguida ao encarnarse no poema e por ele se consome depressa. A comunicao entre o logos potico e a
poesia concreta e viva mais rpida e freqente; o logos da poesia de consumo
imediato, cotidiano; descende diariamente sobre a vida, to ordinariamente, que, s
vezes, se confunde com ela. o logos que se presta ao devoramento, ao consumo; o
logos disperso da misericrdia que vai a quem necessita dele, a todos os que o
necessitam. Enquanto que o da filosofia imvel, no descende e somente acessvel a
quem pode alcan-lo por seus prprios passos.
Todos os homens tem por natureza desejo de conhecer, disse Aristteles no
incio da Metafsica, justificando assim de antemo esse saber que se busca. Mas
passando por cima desse desejo que todos os homens tm em conhecer ou necessitem
desse saber, apresenta-se em seguida a pergunta em que pedimos contas filosofia:
Como, se todos os homens te necessitam, to poucos so os que te alcanam?
Alguma vez a Filosofia foi de todos? Em algum momento o logos amparou a
vida debilitada de cada homem? Se tivermos que levar em conta o que dizem os
prprios filsofos, sem dvida que no, mas possvel que para alm deles mesmos,
tenha sido em alguma dimenso, de alguma maneira. De alguma maneira, em algo sem
dvida muito vivo e valioso que agora aparece destrudo com inconsciente
despreocupao de alguns filsofos a quem parece indiferente para que a filosofia
sirva atualmente, quando vemos seu vazio na vida do homem, quando mais nos damos
conta.
Porm, com a filosofia, diferentemente, no cabe essa questo. A poesia
humildemente no se props a si mesma, no se estabeleceu a si mesma, no comeou
dizendo que todos os homens naturalmente necessitam dela. A poesia una e distinta

para cada um. Sua unidade to elstica, to coerente que pode se dobrar e se estender e
quase desaparecer; descende at sua carne e seu sangue, at seu sonho.
Por isso a unidade que o poeta aspira est to distante da unidade para a qual o
filsofo se lana - para este que o uno e nada mais, est acima de tudo.
E por que o poeta no acredita na verdade, nessa verdade que pressupe que h
coisas que so e coisas que no so e na correspondncia verdade e engano. Para o
poeta no existe engano, j que o nico a considerar como mentirosas certas palavras.
Por isso, diante de um homem de pensamento o poeta cause a primeira impresso de ser
um ctico. Mas, no assim: nenhum poeta pode ser ctico, ama a verdade. Mas no a
verdade excludente, no a verdade imperativa, eleitora, selecionadora daquilo que vai
erigir-se como dono de todos os demais, de tudo. E no ter querido o todo: para poder
se possudo, abarcado, dominado? H alguns indcios disso.
Seja ou no assim, o tudo do poeta bem diferente, pois no o tudo como
horizonte nem como princpio, mas em todo caso um tudo a posteriori que somente se
constituir quando cada coisa tenha chegado a sua plenitude.
A divergncia entre os dois logos tamanha, como um caminhar de costas por
um longo trecho. A filosofia possua a verdade, possua a unidade. E tambm a tica,
porque a verdade filosfica era adquirida passo a passo esforadamente, de tal maneira
que ao subir at ela, algum se sente como se a tivesse por si mesmo encontrado.
Soberba da filosofia! E a unidade e a graa que o poeta encontra como fonte milagrosa
em seu caminho so presenteadas e descobertas de uma vez e totalmente, sem rotas
preparatrias, sem passos nem rodeios. O poeta no tem mtodo... nem tica.
Parece que esse o primeiro frente a frente do pensamento e a poesia em seu
encontro originrio, quando a filosofia soberba se liberta do que foi sua qualidade
matriz; quando a filosofia decide por ser a razo que capta o ser, ser que expresso no
logos nos mostra a verdade. A verdade... Mas se a possua como a filosofia no se
tornou o nico caminho da terra, at esse alto cu imutvel onde resplandecem as
ideias? O caminho de fato foi feito, porm persiste algo no homem que no razo, nem
ser, nem unidade, nem verdade essa razo, esse ser, essa unidade, essa verdade. Mas,
no era fcil demonstr-lo, nem se quis, porque a poesia no nasceu na polmica, e sua
generosa presena jamais se afirmou polemicamente. No surgiu diante de nada.

A poesia no polmica, porm pode desesperar-se e confundir-se sob o


imprio da fria claridade do logos filosfico, e ainda sentir tentaes de cobiar em seu
recinto. Recinto que nunca pode cont-la, nem defini-la. E o filsofo a confinou ao
sentir que lhe escapava. Vagabunda, errante, a poesia passou por vrios sculos. E
mesmo hoje afligi e angustia contemplar sua limitada fecundidade, porque a poesia
nasceu para ser sal da terra e extensas regies da terra no a recebem ainda... No
princpio era o verbo. Sim, porm... o verbo se fez carne e habitou entre ns, cheio de
graa e verdade*.
NOTAS
* Prope-se neste ponto a questo do erro dentro da filosofia grega, e especialmente, dentro do
pensamento Parmnides-Plato. Como possvel o erro? Como pode aludir, a verdade?
A verdade ao ser revelao do ser, atravs do olhar intelectual humano, no desde j
problemtico. Ao contrrio, o problemtico resulta que todo dizer no seja verdadeiro. A
conseqncia imediata da unidade do ser e da identidade entre ser e pensar, em Parmnides,
poderia chegar at esta concluso: tudo o que se diz verdadeiro.
E, com efeito, a ela chegaram os sofistas. Protgoras com seu clebre: O homem a
medida de todas as coisas..., pareceu expressar extremadamente esta conseqncia3. Nos
sofistas j se aponta algo do cinismo, e o cinismo extremista sempre: carece de medida. E
assim, a confiana original na realidade e na razo, que se identificava no ser, foi levada at seu
ltimo extremo por Protgoras. Porm, todo extremismo destri o que afirma, se caracteriza
justamente por isso: por afirmar to pretensiosamente que, na realidade sua afirmao se volta
contra o afirmado, para destru-lo. Se tudo o que se diz verdadeiro, como se nada o fosse. A
medida, a norma do ser e o no ser, fica rebaixada e destruda.
Plato sente limpidamente o problema e o aborda em vrios de seus Dilogos: Sofista,
Teeteto. Para afirmar o ser tem que buscar o no ser; para que a razo e a verdade sigam sendo
ter que fundamentar a existncia do erro, estabelecer sua existncia. Mas, a est o n da
questo: como a razo pode funcionar no que no ? Quer dizer, como se pode falar sem que se
diga a verdade?
Ainda que Plato no o proponha assim, indubitavelmente, o problema afeta poesia.
Que modo este do logos na poesia, em que a razo no coincide com a palavra? Como
possvel que a palavra se descarrile assim de seu caminho para ir parar no oposto de sua prpria
essncia? A palavra potica funciona fora da razo e do ser, segundo a condenao platnica. A
objeo, na realidade, mais que contra a poesia, vai contra a prpria palavra, contra a idia do
ser e da razo, parmendica.
A palavra, o logos, o universal, o que expressa a comunidade no humano. E o poeta
usa a palavra, no em sua forma universal, seno para revelar algo que somente ocorre nele, no
mais profundo do individual, que, inclusive para Aristteles, irracional. E isto o
verdadeiramente grave. Pois se a palavra por essncia universal e o poeta a emprega
irracionalmente, quer dizer que existe uma comunidade humana no racional, ou quer dizer que
o poeta est, tanto quanto o poeta, fora e margem de toda a comunidade; que a poesia situada
dentro do inefvel, no o transcende nunca; que existe tantas linguagens como poetas e que a
poesia, portanto, um esforo vo, posto que nada transmite.
3

Esta interpretao do pensamento sofstico como consequncia da identidade do ser e da razao, em


Parmnides, foi exposta num dos cursos sobre a filosofia grega, dados na Faculdade de Filosofia de
Madri pelo catedrtico da mesma Xavier Zubiri.

E o curioso que a Filosofia parece hoje estar situada neste mesmo transe. Se o
pensamento filosfico algo que se realiza na mais absoluta solido, para conseguir com o
prprio esforo do ser, o ser ele mesmo, que sentido tem o ensin-la, o transmiti-la? Por que e
para que ensinar Filosofia? Pergunta que Scrates j tinha feito aos sofistas quando afirmavam
que tudo o que se diz correto. Em seus momentos crticos parece que a filosofia acaba parando
no mesmo lugar que a poesia, na justificao do mais individual; do mais irredutvel que existe
em cada um de ns.
Porm, poder chamar-se Filosofia a este esforo solitrio, que nasce e termina em
algum? A filosofia que levantou a objetividade sobre a mutabilidade da vida humana, a
comunidade sobre a diversidade de cada criatura, poder renunciar de verdade a segui-lo
fazendo at o final de seus dias? E se renuncia, no significar que a era da filosofia tenha
terminado?
A poesia, ao contrrio, assentada desde suas origens no inefvel e lanada a dizer o
indizvel, no v ameaada sua existncia. Desde o primeiro instante, sentiu-se arrastada para
expressar o inefvel em dois sentidos: inefvel por proximidade, por carnal; inefvel tambm,
por inacessibilidade, por ser o sentido para alm de todo o sentido, a razo ltima acima de toda
a razo. o drama que humildemente todo poeta tem sustentado; alguns o entendendo, outros,
sem entend-lo.
A esta inefabilidade se consagra a poesia. E o poeta sente o nexo fortssimo que existe
entre elas; entre a proximidade de sua carne e o mais alto princpio, a mais elevada razo; o que
por ficar sob a razo no pode definir-se e que por fazer que haja definio no pode ficar
abaixo dela. De uma ou outra maneira a poesia vai fazendo-se, s vezes, um emaranhado;
confundindo-se, errando o caminho outras muitas. Sem erro, nem verdade, margem deles e por
isso mesmo, invulnervel em seu descarrilo, em sua cega servido.

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