Portugal, Mundo Dos Mortos e Das Mouras Encantadas
Portugal, Mundo Dos Mortos e Das Mouras Encantadas
Portugal, Mundo Dos Mortos e Das Mouras Encantadas
,
Fernanda Frazo e Gabriela Morais
Al. Linhas de Torres, 97, 3 dto.
1750-140 Lisboa
Tel/fax 21 758 22 85
[email protected]
Nos dois textos j publicados, analismos, de forma breve, os elementos constantes destas narrativas luz de alguns dos tpicos essenciais do
que conhecemos quanto aos desenvolvimentos e inovaes trazidos por
cada poca da Pr-Histria. Vamos agora entrar nas pocas histricas,
tambm sucintamente, tanto mais que adimos para este ltimo volume a
bibliografia a que recorremos, relativamente extensa. Tentaremos, assim,
salientar apenas os aspectos da evoluo histrico-cultural das populaes
do territrio portugus, que julgamos estarem mais directamente relacionados com o nosso tema e que nos parecem imprescindveis para explicar a
persistncia deste longo fenmeno das mouras encantadas. Nas pisadas
de investigadores, como Leite de Vasconcelos, Martins Sarmento, o abade
de Baal, Consiglieri Pedroso e tantos outros, ao longo das nossas prprias investigaes fomos fortalecendo a hiptese de que as mouras
encantadas pertencem ao mundo mtico e sobrenatural do universo prhistrico mais remoto. E salientmos a importncia que ter desempenhado para a manuteno e posterior expanso desse iderio mtico o
facto de, ao tempo do mximo glaciar, at h cerca de 17 ou 18 mil anos,
o Homo sapiens sapiens se ter confinado em pequenas bolsas isoladas,
entre as quais o chamado Refgio Ibrico, onde sobreviveram os nossos
antepassados pr-histricos. Considerando este corpus vestgio de tal
perodo, chammos-lhe, ao jeito da arqueologia, cacos do mito, essa
espcie de cntico ou poema sobre a natureza, fruto de um primeiro
olhar, ditado essencialmente pela intuio, considerada hoje como uma
das capacidades cognitivas caractersticas do homem primitivo, imperativa para a sua sobrevivncia. Desempenhando o mito um papel aglutinador e transmissor do saber que os membros
de uma comunidade iam
3
No territrio ibrico, uma ilustrao muito plausvel desse sincretismo religioso a presena do culto a Jpiter (lat. Jovi), senhor dos deuses,
derivado do Zeus grego. Segundo dizem especialistas da romanizao
em Portugal, e avaliando pela recorrncia encontrada em testemunhos
epigrficos, este culto foi aqui tambm um dos mais populares, chegando a abranger todos os estratos sociais. Muitos autores so de opinio de
que a disseminao do culto a Jpiter pelo territrio peninsular pode
ficar a dever-se ao nmero elevado de membros pertencentes ao exrcito
de ocupao. No entanto, Amlcar Guerra adianta que, se as razes deste facto no so facilmente determinveis[...] pode apontar-se a posio
cimeira da divindade no panteo e tambm o facto de ser, segundo parece,
um tenimo j existente (sublinhado nosso), Jovea3. Na verdade, embora
havendo apenas uma inscrio na lngua autctone lusitana, o contexto
em que aparece... e factos proporcionados por outros vestgios parecem
dar mais consistncia ... hiptese de que j existiria uma divindade com
um nome equivalente ao de Jpiter4. Pode vir ao encontro desta afirmao o facto de Juno, parceira de Jpiter uma espcie de deusa tambm
acima das outras ser aqui pouco cultuada e preterida em favor de Diana ou de sis. Diana ou sis so consideradas verses mediterrnicas das
deusas-mes pr-histricas ou da grande deusa cltica Dana ou Ana,
pertencente ao pensamento mtico-religioso pr-romano e que est presente no nome de rios (Ana/Guadiana e Do, na Pennsula Ibrica, ou
Donau/Danbio, no centro da Europa), um muito provvel vestgio lingustico oriundo do Paleoltico, de acordo com Xaverio Ballester5.
Cremos, assim, poder remeter este exemplo de Jovea/Jovi para o que
dissemos acerca da semelhana entre cultos locais anteriores e os cultos
romanos, tanto mais que pensamos ser pouco natural que o povo mido
renegasse crenas milenares passadas de gerao em gerao e abraasse
crenas prprias do invasor contra o qual lutou cerca de dois sculos. Os
nomes tero variado, mas o fundo mtico ter permanecido o mesmo.
E mais exemplos dessa continuidade se podem citar, como os casos
testemunhados pelos santurios de Panias, em Trs-os-Montes, ou de
So Miguel da Mota, no Alentejo. E citamo-los pelas claras relaes que
se nos afiguram ter estes dois cultos com o iderio subjacente ao corpus
mtico das mouras e com os mitemas mais constantes e essenciais dos
mitos primitivos: num e noutro santurio esto bem representados os
cultos oraculares e mistricos a divindades senhoras do mundo subterrneo, dos mortos, da fertilidade, da cura e da regenerao. Serpis (e os
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que Portugal e a Galiza se inserem, j referida por uma das autoras noutro trabalho10 e para o qual remetemos, tem relao directa com a crena
nas mouras encantadas, tal como com temas mitolgicos irlandeses,
galeses ou bretes.
Mas, para reforar ainda mais a continuidade das crenas primitivas
nestes sculos da ocupao romana, tambm possvel que na crena
das mouras encantadas subsistam destroos do culto prestado ao genius
loci (gnio do lugar), divindade que tinha a seu cargo proteger os lugares e
stios do termo, como os escritores e textos epigrficos largamente mostram, diz-nos o abade de Baal11. E esse genius englobava as divindades
Manes, Lares ou Penates, o esprito dos mortos ou o esprito dos antepassados, que, tal como as mouras encantadas, eram protectores da
famlia, do lugar, da aldeia, da vila, da cidade ou dos caminhos e que,
recordemos, tal como elas, se manifestavam em pontos especficos e, por
isso mesmo, considerados sagrados. A este propsito, relacione-se com o
que j se disse acerca da recorrncia dos locais sagrados.
Por outro lado, tambm o genius loci adquiria a forma de serpente e a
ele os Romanos, numa oferta de votos propiciatrios de fertilidade, ofereciam e sacrificavam sudeos, outro elemento pr-romano com as mesmas caractersticas, bem visvel nos vasos e nas esculturas rituais neolticos12, ou nos clebres varres calcolticos. Estes sero ainda associados
ao tema da exaltao herica, pois era o animal que se oferecia caa,
ou seja, um elemento fundamental dos rituais de passagem e exibio
das atitudes de bravura que se prolongaria inclusivamente nas lendas medievais (sublinhado nosso). Mas o javali era tambm o animal que, nas
rcitas irlandesas[...] atraa os jovens guerreiros para um "Outro Mundo"[...] evoca[ndo] um sentido que tambm funerrio13, estando assim,
igualmente, em consonncia com a estreita relao entre este corpus das
mouras encantadas, o culto dos mortos e o mundo mtico cltico do arco
atlntico pr-histrico. As oferendas de sudeos, patentes tambm no
acima referido santurio de So Miguel da Mota14, no tempo romano
eram feitas igualmente em altares que, no caso do genius de uma famlia,
existiam dentro da prpria casa, numa intimidade que nos recorda os
enterramentos mesolticos. Mas se, na poca castreja pr-romana, o morto era por vezes enterrado junto da sua habitao, cada vez mais, em
termos colectivos, no decorrer das pocas pr-histricas recentes, o lugar
dos mortos se foi separando do dos vivos. E se, dentro da habitao, em
vez da sepultura, existe agora um altar/smbolo para o venerar na sua
10
Assim, se o pacto entre vivos e mortos ou, melhor dito, entre seres
mortais e seres divinizados recorrente no mundo romano, como afirma
tambm Amlcar Guerra20, ele ser igualmente uma caracterstica essencial que vem do passado, j presente neste corpus mtico, o que parece
demonstrar ser a atitude natural e ancestral do homem, perante foras
que o transcendem; estas so susceptveis de actuar de forma positiva,
produzindo o bem, ou negativa, produzindo o mal quando, e s neste
caso, h incumprimento das premissas do pacto. Atitude que estar,
alis, na base do que ainda hoje se faz nas promessas a entes no aterrorizadores, como os santos ou a Senhora de Ftima. Ou s mltiplas
Senhoras que se veneram por este Pas fora venerao que se tratar
adiante mais em pormenor e que sero uma das formas mascaradas,
mas que nos parece evidente, da persistncia na crena das mouras
encantadas.
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As mouras sero, assim, os seres sobrenaturais mensageiros do mundo do Alm, dos mortos ou dos vivos bem-aventurados, domnio da
Senhora da Vida e da Morte pr-histrica e, como tal, tornam-se uma
espcie de espelho ou de desdobramento dessa mesma Senhora. E como
tal, ainda e mais uma vez, confundem-se com a crena, persistente tambm no mundo romanizado, mas que ter tido a sua origem no mundo
mtico-religioso neoltico-calcoltico, quando uma das facetas da TerraMe se transformou em Grande Deusa e passou a ser identificada com a
noite e a Lua, a morte e o mundo subterrneo21. Assim, quando J. Mattoso afirma que, no pensamento romano, o morto vive num mundo invisvel que habitualmente se situa nos lugares inferiores da terra. Ali se
alimenta, convive com os outros defuntos, exerce a sua profisso ou executa o mesmo trabalho de que vivia enquanto vivo22, o mesmo podemos dizer tambm do mundo dos mortos presente na Mourama, mas
numa linha de continuidade pr-histrica.
Deste modo, tudo leva a crer de facto que o processo de romanizao no se traduziu necessariamente no progressivo apagamento das
tradies religiosas, mas pode ter contribudo inclusivamente para que
algumas se tenham difundido ainda mais23.
No cremos, assim, poder destacar qualquer exemplo de uma narrativa romanizada e que seja muito diferente daqueles que temos dado
at agora. Talvez, com a romanizao, ou com o que tradicionalmente se
lhe atribui, tenha surgido, por hiptese apenas, mais um ambiente para
as aparies: as pontes.
ramos quatro pessoas de Lisboa, duas do Porto e apenas uma de Chaves. Corria um ventinho fresco. Encostei-me ao peitoril de ferro que a falta de
espao actual fizera que viesse substituir as antigas guardas da ponte. Isolei-me das brincadeiras dos meus companheiros. Foi ento que a tal nascida em
Chaves se aproximou de mim, perguntando-me entre irnica e amiga:
Est espera da moura do arco da ponte?
Olhei-a sorrindo.
Existe aqui uma moura encantada?
Sim. Mas sob o terceiro arco e no no stimo, sobre o qual est debruado.
Contei os arcos. Estava, efectivamente, sobre o stimo arco. Gracejei:
Talvez ela venha ter comigo!
Engana-se; s se mostrou uma vez; mas o cavaleiro no teve coragem
para a desencantar! E ela ali ficou para sempre.
Como sabe que ficou, se no a vem?
13
Vulgarmente dadas como obra dos Romanos (tantas vezes no o sendo), as pontes fornecem, tal como rochas escarpadas ou grutas misteriosas,
ptimas condies para nelas se imaginarem os seres encantados. Ultrapassando abismos, ligando locais inacessveis, so construes que, tais
como as construes megalticas ou outras situadas em lugares inspitos
perdidos no espao ou no tempo, inspiram a imaginao popular, que as
atribui a seres sobrenaturais, pois so smbolos de ligao entre este mundo e o do Alm. Por isso mesmo, no esforo de apagar vestgios de crenas
anteriores, no lendrio da poca do cristianismo, inmeras vezes se tentar
substituir a moura pelo Diabo, como veremos a seguir.
2. AS MOURAS ENCANTADAS, A CRISTIANIZAO E A ISLAMIZAO
2. 1) As mouras encantadas e outras manifestaes populares
A capela de So Tiago de Ribas, em Edral, Vinhais, Trs-os-Montes, fica
num despenhadeiro a cair para o Rio Mente, e foi edificada por um homem a
quem apareceu o Diabo em forma de linda moa para o tentar e lev-lo em
corpo e alma para o inferno. Felizmente a tempo viu-lhe os ps de cabra e,
fazendo o sinal da cruz e encomendando-se a So Tiago com voto de lhe erigir a capela, ficou ileso24.
Para os lados das Lamas (Trs-os-Montes), existiu em tempos, uma grande pedra, talvez um dlmen e como se falava em encantos, algum foi moirana saber do que se tratava. Recebeu a seguinte ordem: Arco Diabo vai
para a tua terra. E como tal dissesse pedra, esta imediatamente partiu,
voando em descomunal disco, luzindo e faiscando raios de luz e para sempre
desapareceu. Diz-se, no entanto, que se dissesse: Arco Diabo vai para a
minha casa, esse algum ficaria o homem mais rico do mundo, porque a
pedra, toda forrada a ouro, iria parar a sua casa25.
Em S. Vicente da Beira, Castelo Branco, uma rapariga foi beber gua num
ribeiro. Quando bebeu a gua engoliu uma cobra pequenina e depois a cabra
[sic] foi crescendo e o ventre da rapariga tambm crescia. O pai pensando que
ela andava grvida foi p-la a um monte chamado Couto, para as feras a
devorarem e ela rezou muito e pediu a Nossa Senhora para lhe acudir.
Depois Nossa Senhora apareceu-lhe e disse-lhe:
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Vai para casa e diz a teu pai que ponha uma caldeira com leite a ferver
ao lume e que te debruce para dentro do leite e o que tens l dentro, te sair.
A rapariga regressou e fez o que Nossa Senhora lhe tinha dito e uma cobra
lhe saltou l de dentro. O pai em agradecimento a Nossa Senhora mandou
construir uma capela no local do milagre em honra a Nossa Senhora da Orada. A partir da todos os anos fazem uma festa no quarto domingo de Maio
onde vai muita gente e onde j tem havido mais milagres26.
No lugar do Frago, em S. Leonardo, Peso da Rgua, diz-se que um rei
mouro encantou a sua filha, com a seguinte frmula: abre-te fraga, aqui fica
minha filha at ao dia em que semearem linho sobre esta rocha, fizerem com
ele uma toalha e sobre ela comerem um jantar. Um pastor, ao ouvir isto,
tratou de deitar terra sobre o frago, semeou o linho e regou-o todos os dias.
Do linho fez uma toalha e l jantou. Mas, porque no soube empregar bem a
frmula, a menina para sempre l ficou encantada. Uma mulher, levando de
comer ao seu marido, que fazia carvo nas vertentes de S. Leonardo, encontrou uma menina muito bonita, que atava a ramagem das giestas embaraando o caminho a quem passava. Quando esta lhe perguntou: Menina, que
andas a fazer? Ela respondeu: Desata as giestas, alcana-me e me desencantars! A mulher, por maior que tenha sido o seu esforo, no foi capaz. A
menina moura continua a amarrar as giestas, impedindo a passagem aos
caminhantes.
A uma alta e anfractuosa penha (Turquel, Alcobaa) chegou na noite de
S. Joo um cavaleiro cristo que ia ali encantar uma grcil princesa moira que
consigo trouxera, e a cujo casamento se queria obstar. Introduzindo, pois, a
desditosa num recncavo da penedia Aqui ests e daqui no sairs bradou , salvo se algum aqui vier borrifar esta penha trs vezes com trs pcaros de gua, em trs noites de S. Joo. Deu f de tudo isto um pastor que ali
se ocultava, e que teve a boa fortuna de desencantar a moira. Esta voltou ao
seu Pas e galardoou generosamente o seu libertador, chegando a mandar-lhe
navios carregados de presentes27.
Em Valpaos/Trs-os-Montes, h o costume de arreganhar a tacha, ou
seja, rir s gargalhadas no momento de pr o po no forno. Acredita-se que,
com esta atitude, a massa crescer mais e melhor.
Na Festa do Mastro, em Fonte Arcada, perto do Porto, entre finais de
Julho e princpios de Agosto, abate-se uma rvore que depois se enfeita de
flores e se transporta para o alto de um monte, onde fica exposta durante
alguns dias.
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dos serranos que, durante os sculos XII e XIII, as pessoas vrias vezes entraram em pnico por acreditarem ver chegar, ao longe, os esquadres mouriscos em busca da bela Ftima. [...]E alguns anos depois de os cristos terem
tomado Manteigas... um dia, uma mulher, das mais miserveis da localidade,
teve de passar na madrugada de S. Joo no Coruto de Alftema. Fatigada,
sentou-se a descansar num penhasco enquanto ia comendo uma cdea de
broa que trazia. O po era duro de muitos dias e, quando a mal-aventurada
ia a dizer mal da sua vida, viu a seu lado um vasto estendal de figos secos.
Comeu uns quantos[...] e, lembrando-se dos filhos, encheu deles uma cesta
que levava. E, rpida e alegre, dirigiu-se sua choupana[...] Mas, uma vez
chegada a casa, ao destapar a cesta, ficou pasmada: no lugar dos figos encontrou diamantes e moedas de ouro, tudo reluzente e novo. Mas a mendiga de h
um minuto, conformada com o naco de po duro, sentiu a mordedura da ambio. No lhe bastando o que j tinha[...] voltou a correr ao local onde deixara os
restantes figos. Entretanto, o Sol subira no horizonte e estava agora no meio de
um cu sem nuvens. Passara a hora dos encantos e, dos figos, a mulher encontrou apenas o lugar. Desesperada, comeou a arrancar os cabelos e ia blasfemar
quando uma voz suavssima a de Ftima, sem dvida caiu sobre si cantando: Era teu tudo o que viste, agora tornaste em vo! No passes mais neste stio na
manh de S. Joo. No te perdeu a pobreza, pode matar-te a ambio56!
primitivas. E o mundo dos mortos deixa de ser o Alm, sempre paradisaco e para onde vo todos os mortos, para ser, ou o local da condenao ou o da salvao eternas, as portas do Inferno ou as portas do Cu. A
liturgia do dia dos mortos , assim, orientada para alcanar a misericrdia divina na purificao da alma, no perdo dos pecados, para que
nada impea a sua integrao junto dos antepassados. Consequentemente, orientada para realizar a associao dos antepassados com o conjunto de todos os santos, com os praticantes do bem (os fiis defuntos),
enquanto outros ficaro de fora, estando-lhes reservado o Inferno ou o
Purgatrio, um novo acrescento para designar o local onde as almas ainda podem obter o perdo divino por aces e oraes dos vivos. O Purgatrio, j presente em Santo Agostinho, no sculo IV, ter-se- imposto
muito lentamente, pois s a partir do sculo X ou XI, no caso da Pennsula, h testemunhos documentais a mencion-lo57.
Um dos objectivos essenciais desta nova liturgia chamar a si a gesto de prticas antigas, numa tentativa de recuperar e de colocar sob a
sua gide todos os cultos dos mortos, com profundas razes no passado
milenar. Deste modo, s os seus sacerdotes tm o direito e o dever de os
celebrar, dispensando os leigos de o[s] praticar, mesmo no mbito
domstico e desencorajando todas as antigas prticas neste domnio58.
assim que, por um lado, se substituem por oraes as oferendas que se
fazem aos mortos em troca dos seus favores (relembremos aqui o paralelismo com os pactos estabelecidos com as mouras encantadas) e, por
outro, se tentam restabelecer os laos de coeso social para recuperar a
antiga solidariedade entre todos os cristos59. Se eles eram uma seita
minoritria no meio de um mundo pago na Alta Idade Mdia, como o
afirma J. Mattoso, quando chegamos ao sculo XIII, apesar da j mencionada expulso dos muulmanos, predominam ainda os sinais do mundo
islamizado, j para no falar dos sinais arreigados do paganismo. A
Igreja empenha-se, assim, no caminho activo da evangelizao, tentando
abranger tudo e todos, at o prprio baixo clero, mais prximo das
populaes rurais, com quem convive ou de onde emana. Em 1281, o
snodo de Braga condenava clrigos e leigos que recorressem a consultas
oraculares ou agoureiros, ou praticassem magia. Mas o Tratado de Confissom, j de 1489, primeiro livro impresso em portugus, condenava as
missas realizadas fora dos templos, em montes, campos e outros lugares desonestos. No sculo XVI, o bispo de Lamego volta carga, dizendo
defendemos e mandamos que, com as procisses no vo a outeiros,
26
27
ambos os sexos, segurando-lhes que dentro do Mineral achario doze Mouros ricamente vestidos com seus espadins nas mos, e outras tantas Mouras
muito bem adereadas, com sayas bordadas, e muitas pessas de ouro, e diamantes, o que tudo se havia de repartir entre o Reo e sua comitiva; e que
depois de despojados os Mouros cahirio por terra reduzidos a cinza, e entrario a repartir entre s copiosssimos thesouros65.
28
Diz a tradio que estava uma mulher de Campo Maior a lavar a roupa
no rio, acompanhada por uma filha pequena. A dado passo, a criana afastou-se para brincar, e pouco tempo depois regressou trazendo um brinco em
ouro que disse ter sido ofertado, para brincar, por uma senhora muito bonita.
A me acompanhou a criana ao local onde esta disse estar a Senhora, e l se
deparou com a imagem de Nossa Senhora sobre uma pedra redonda que
ainda hoje se encontra na capela. Espalhada a notcia do achado, a populao
acorreu em massa e devotamente transporta para a vila a imagem, decidindo
erigir uma capela na margem direita do rio, a meio caminho entre a citada
pedra e a vila. Porm todas as manhs a imagem desaparecia e voltava a surgir sobra a pedra em que originalmente havia sido vista. Concluram ento
ser esse o local escolhido para nele erguerem a Capela68.
Em Oliveira do Arda, a alguns quilmetros de Arouca, em direco ao rio
Douro, reza a lenda, que, pelos anos de 1450, apareceu um dos sobreiros carregado de amoras e entre os seus ramos, uma formosa imagem da Santssima
Virgem, achada por um lavrador desta aldeia. notcia deste achado acorreu
toda a gente ao stio da Portela, para ver a senhora, indo tambm alguns clrigos que ento aqui havia. Levaram ento a senhora, em procisso, para a igreja
matriz, que ficava distncia de um quilmetro e meio. Porm, na manh do
dia seguinte, tornou a imagem a aparecer no mesmo sobreiro. Resolveu o povo
cortar a rvore, para com a sua madeira fazer na igreja um altar Senhora; no
entanto, o que pretendeu dar o primeiro golpe, em lugar de cortar a rvore, deu
com o machado um golpe em uma das pernas. Ento, entenderam que a senhora queria ser ali mesmo venerada e resolveram fazer-lhe uma edculas, a poucos
passos do sobreiro, deixando nele a imagem, enquanto durava a obra. Concluda ela, fizeram uma grande festa Senhora e levaram-na em procisso para a
nova ermidinha; mas, na manh seguinte, tornou a senhora a aparecer no
sobreiro. O povo decidiu, ento, que a pequena ermida ficasse sendo capela-mor, e que se acrescentasse, para Oeste, o corpo da ermida, abrangendo o
sobreiro, que ficou no stio de uns dos altares laterais, e foi serrado para ficar a
servir de peanha Senhora; que, desde ento, no tornou a fugir. Ficou a imagem denominando-se Nossa Senhora das Amoras, em memria das que tinha o
sobreiro; e tantos foram os milagres que logo lhe atriburam, que os romeiros
principiaram a concorrer a nova capela, no s das imediaes, mas at de algumas lguas de distncia69.
Na freguesia de Fornelo do Monte existe uma Igreja paroquial que foi
construda em 1724 sobre as runas da capela de Santo Estvo (o padroeiro
de Fornelo do Monte), a qual originou uma lenda curiosa. Santo Estvo foi
um dos mrtires dos primeiros tempos do Cristianismo. Um dia o seu esprito passou pelas montanhas de Fornelo do Monte e, ao completar tantas belezas naturais que Deus ali criara resolveu transformar uma das pedras seme-
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lhana da sua prpria imagem, a qual ficou depois encostada a uma parede,
onde era bem visvel. O povo guardou a respectiva imagem e construiu uma
capela em sua honra. Os habitantes de Ventosa, uma freguesia prxima, tentaram resgatar a imagem do santo, mas a aco foi infrutfera pois a imagem
regressa ao local de raiz (http://eb1-outeiroalcofra.edu.pt/lendas.htm).
ja, que de h muito se sentia ameaada pela persistncia do que designava por "costumes gentios"72. As festas do Corpo de Deus73, por exemplo, foram por diversas vezes e por diversos anos proibidas ou, pelo
menos, tiveram a proibio do contributo popular, com as suas danas,
folias, mascaradas e procisses, consideradas demasiado pags74. Criadas talvez por D. Afonso III ou D. Dinis, as festas do Corpus Christi comearam a ser celebradas no sculo XIII. No entanto, tal como os santos
populares e tantas outras, estas sero a cristianizao das festas de fertilidade da Primavera. O Corpo de Deus uma festa mvel depois da Pscoa que, como esta, calculada a partir da primeira lua cheia do equincio de Maro. Ser coincidncia a presena dos carros alegricos com
animais e flores, da serpe, do drago (a coca), de feiticeiros e gigantes,
acompanhados por gaitas-de-foles, instrumentos portugueses dos mais
antigos, da famlia das que existem na Europa Ocidental, designadamente na ilhas Britnicas, com os sons ditos clticos, ligados intimamente
pastorcia75? Ser coincidncia as festas serem acompanhadas de touradas ou do desfile do Boi Bento76?
Vejamos agora, em concreto, as alteraes produzidas nas narrativas,
pondo em itlico os elementos que concorrem para a nossa afirmao de
que o so apenas de nome:
2. 2. b.) As mouras diablicas
Em Vilas Boas (Trs-os-Montes) na Fonte de Valtorno, uma mulher foi l
buscar gua na manh de So Joo e trouxe, sem dar pela conta, o cntaro cheio
de novelos de oiro, mas desapareceram quando ela, cheia de surpresa, exclamou: Ai, Jesus! tanta riqueza!; na Fonte do Lameiro de Cima, em 1925
foram l uns homens cavar para desenterrar o tesouro encantado, mas fugiram
assustados ao ver o Diabo ou a moura feita em horrendo bicho, e uma mulher foi
levada pelos ares at cair no Cruzeiro do Prado. Tal como no concelho de
Vinhais, na Lama da Porca, termo de Vilarinho de Lomba, havia uma porca de
oiro guardada pelo Diabo, e quando a foram exorcismar, a fim de a desencantar,
falaram em Deus, coisa que no deviam fazer, e tudo desapareceu77.
Ainda em Trs-os-Montes, em Rio de Onor, Bragana, est uma moura
encantada no fundo de um poo, guardada pelo Diabo, assim como em Eivados,
Mirandela, aparece a moura acompanhada pelo Diabo; em Sabrosa, no castro
conhecido como castelo dos mouros diz-se existir uma mina com seres estranhos,
que uns dizem serem mouros, outros, o prprio Diabo. Em Panias, Vila Real, na
Fonte do Poo, est uma moura encantada que mora com o Diabo e que noite sai
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por estar longe do seu filho, e perto de quem j no mais a ama, que fazem com
que chova. Tambm se diz que perto havia uma fonte onde surgiu uma imagem de
N Senhora. Levaram-na para a Igreja de So Brissos, mas ela fugia sempre para
perto da anta. Da, ter-se transformado a anta em capela, para albergar a imagem90.
Enquanto nas narrativas mais primitivas, uma Moira Encantada/Senhora a apario de um ente mtico-maravilhoso, nas alteradas, a apario de Nossa Senhora/Virgem Maria vista como um milagre. Mas
para o povo que as conta e nelas acredita, esta distino no far diferena, tal como no far, como veremos, quando se refere aos Mouros como
etnia. O que l se mantm a crena na possibilidade do encanto ou
do sobrenatural e, como tal, um facto real. Os elementos cristos entram
claramente no jogo da narrativa mtica. No caso do ltimo exemplo mencionado91, a contaminao mais que bvia. Mas casos de amores como
este surgem noutros locais, como em Vila Velha de Rdo, junto do Tejo,
lugar que deve ter sido usado, talvez durante milnios, como um vasto
santurio a cu aberto, pelos povos pr-histricos da regio92, como
atestam as pinturas rupestres e outros vestgios arqueolgicos, vindos do
Paleoltico. Tendo esta regio montanhosa e abrupta por cenrio, o povo
diz que, a meia encosta do penhasco, est a cadeira de Nossa Senhora do
Castelo, filha de Sta. Ana, tal como Maria. Porm, deixa de ser a Maria
dos cristos porque, nessa cadeira, ela namorava S. Simo, s escondidas
de seu pai. E, para maior confuso, tinha seis irms: Nossa Senhora dos
Remdios, Nossa Senhora da Piedade, Nossa Senhora da Alagada, Nossa
Senhora das Dores, Nossa Senhora das Necessidades e Nossa Senhora
do Rosrio. Mas o quadro ainda mais completo, pois tambm se diz
que nessa cadeira se sentava uma moura encantada, apaixonada por um
mouro alentejano, que a visitava de noite. E que gigantes talharam as
Portas de Rdo, tal como Nossa Senhora, a entidade feminina que
acorre a salvar aqueles que, nas guas indomveis do rio, se encontram
em perigo, surge associada a trabalhos hercleos... para a realizao de
tarefas que unem dois espaos territoriais separadas pelo rio[...]93.
nesta perspectiva que, a propsito de Ftima, encontramos esses
mesmos sinais do maravilhoso pago, tanto mais que esta zona frtil em
narrativas de aparies da Moura/Senhora/Nossa Senhora. Em Andanas
da Senhora do Rosrio nas Faldas da Serra d'Aire, o antroplogo Aurlio
Lopes94 refere uma documentada descrio das aparies, contextualizando-as no imaginrio rural de razes mticas. Para alm de observaes pertinentes que faz, de facto esto l presentes os mesmos mitemas:
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pecados, ainda paira por a, a precisar de missas e oraes. So frequentes as narrativas que falam de mos invisveis ou mos de ferro que
do bofetadas ou agarram os incautos que se atrevem a passar de noite
por certas covas, poos ou tneis, que referem sons sados de dentro de
pedras ou vindos de debaixo da terra, como vozes, msica, tocar de sinos,
teares a trabalhar, o que nos leva para a lenda urbana, ainda hoje contada
e recontada, da mquina de costura que se ouve de noite, em certas casas.
O investigador F. Bethencourt99 tambm refere as almas que surgem
diante dos vivos, transformadas em gnomos e animais. No nos lembra
isto os mourinhos e, de um modo geral, as mouras encantadas? E este
autor menciona a pomba um cone muito prprio do cristianismo
como uma das aparies de almas-penadas a remeter-nos para o exemplo
seguinte:
Num processo da Inquisio de Lisboa, uma moura encantada que est num
palcio subterrneo, aparece transformada numa pomba a uma mulher, e quando a
mesma mulher a agarra para que ela no fuja, a dita pomba faz-se outra vez em
mulher100.
2. 3.) A islamizao
J nos referimos atrs ao importante apoio activo dado pela populao peninsular chegada dos muulmanos, apoio esse que ter contribudo para a rapidez do processo de conquista. O poder da nobreza e
da Igreja estava longe de satisfazer as esperanas dos grupos mais desfavorecidos101. Acumulavam-se as perseguies ao paganismo e faziam-se converses fora dos judeus, em contraste com a tolerncia religiosa
praticada pelo islamismo. A luta constante entre faces dentro de um
poder visigtico enfraquecido, os levantamentos em massa das populaes e os maus anos agrcolas tornavam a vida ainda mais insuportvel102. O apelo de uma das partes interveno militar dos governantes
do Norte de frica trouxe, assim, as primeiras hostes muulmanas.
Rodrigo, ltimo rei visigtico na Pennsula, derrotado e morto em 711.
O xito obtido nesta primeira investida leva a que, entre 712 e 713, haja
uma segunda vinda, ficando, ento, quase toda a Hispnia na posse efectiva dos muulmanos, refugiando-se o resto dos apoiantes de Rodrigo no
Norte, nas montanhas das Astrias. O interesse muulmano ir centrarse nas grandes cidades e capitais de dioceses visigticas, tendo as cidades pequenas sido entregues a cristos e judeus, graas ao apoio recebido, num processo quase pacfico. De um modo geral, semelhana do
37
40
que daria to grande tesouro a quem, ao pino da meia-noite, ali fosse e consentisse que lhe desse um beijo. Decidiu tentar a sorte na noite seguinte e l
foi[...] at dar com a alfarrobeira do sonho. E, tal como vislumbrara, achou-a
exactamente no tal local. Comeou a escavar e encontrou o tacho do ouro. Era
to grande como a largura do caminho, uma vez que ocupava toda a estrada,
tocando as asas nos dois valados que a limitavam. Porm, a cobrir o dinheiro
[...] estava um enormssimo sapo, muito nojento. A mulher percebeu que
teria de beijar o sapo para poder ficar com o tesouro, mas[...] ficou to horrorizada que voltou para casa cheia de medo e de nojo. O que ela no sabia era
que a sua atitude tinha contribudo para redobrar o encanto do mouro[...]
Passados tempos voltou a sonhar exactamente a mesma coisa e por trs noites seguidas teve as mesmas vises. Ao fim do terceiro sonho decidiu voltar
ao stio da alfarrobeira[...] Pensava ela que o Diabo no to feio como o pintam e beijar o sapo era apenas um instante e pronto. E l foi, ao cair da noite,
ao stio da alfarrobeira. Desenterrou o tacho meia-noite em ponto, e estendeu a face para receber o beijo do sapo. Mal se tocaram, saltou-lhe um olho
da rbita, mas com o outro que lhe restava pde ver o sapo transformar-se
num belo mouro, que, antes de desaparecer, a aconselhou a voltar ali todas as
noites, mesma hora, para levar para casa o tesouro at o esgotar. Embora
zarolha, ficou riqussima[...]110.
rados para zonas perifricas. Ao contrrio dos rabes que se tinham instalado nas terras frteis e nas principais cidades, aos berberes foram distribudas as terras mais pobres ou os territrios mais instveis[...]113. Aqui, os
contactos com a populao rural, isolada dos centros urbanos, podero ter
favorecido o acentuar de velhas crenas, afins a ambos os grupos.
Na regio do Atlas, em Marrocos, como em todos os vales atlnticos
onde vivem estes povos j sedentarizados, encontramos ecos dessas antigas prticas vindas de um passado pr-histrico: animais, plantas, rvores e pedras so dotados de virtudes extraordinrias e maravilhosas. E
se, na Europa atlntica, antes das invases islmicas j se prestava homenagem s mltiplas Nossas Senhoras, tambm em Marrocos vem de longe o culto a Nossas Senhoras, como a da Azofeita ou a Nossa Senhora do
Espinheiro Branco. E, tal como aqui, inventaram-se santos como justificao para a venerao dessas foras anmicas da natureza114. Tambm
se cultuam fontes, de poderes curativos, covas e grutas, e se amontoam
pedras (como no Promontrio Sacro115), sacralizando locais. E todos estes
cultos se articulam com a crena em gnios, afinal reflexo de um s culto,
tal como as mouras encantadas, reflexo do culto da Senhora primitiva. E,
tal como elas, tambm esto nos montes, nas grutas e nas covas, nos despenhadeiros e nas fendas profundas da terra, nos rochedos, nos bosques,
na vegetao, nos ocos das rvores, nos ares, como pssaros, nas nascentes de gua, nos poos, nos tneis, em todos os lugares de acesso ao
mundo subterrneo, o ventre oculto da Terra-Me onde habitam. E o seu
reino, tal como a nossa Mourama, paralelo ao mundo dos vivos: nele
trabalham, lavram a terra, constroem casas, tm filhos e convivem uns
com os outros. Em suma, tudo se encontra na cidade sob a terra116, tal
como tudo se encontra nas nossas cidades acima da terra. E podem aceder ao mundo exterior, metamorfosear-se em animais e conviver com os
vivos, com quem estabelecem a troca de favores, oferecendo magnficas
prendas, curando doenas ou concedendo a fertilidade.
Num dia ardente de sol, um velho mendigo procurou repouso debaixo de
umas rvores. Os lamentosos uivos de um co chamaram-lhe a ateno: um
homem perseguia o co que abocanhara um pedao de carne. O ancio interps-se e pagou o pedao de carne. J tarde, ps-se a caminhar e ao passar
perto de uma negra gruta, um jovem aproximou-se dele, dizendo que a me
lhe ordenava que fosse a sua casa. O ancio obedeceu e, sem saber como,
encontrou-se no fundo de uma cova, abrindo para uma galeria. Por ela se
acedia a uma cidade to grande e rica como a de Fez, com seus bairros, mes-
42
43
o rei deve ter uma unio sexual para legitimar a posse da terra. Parece-nos, assim, ser mais um valor herdado dos mitos ancestrais que vamos
encontrar agora na Idade Mdia. Aqui, ele toma particular relevo, independentemente de poder ou no fazer parte tambm da ideologia rabe,
no-indo-europeia. Por ele ser um facto significante para as populaes
invadidas, assim assumido pelo invasor, que, atravs dele, se legitima aos olhos dos seus novos sbditos129. Transpondo esta vertente para
as narrativas, a implicao parece-nos bvia: a moura representa a
Senhora do Lugar, a soberana, quer ela seja um ser mtico declarado, i. e,
encantada, quer seja um pretenso ser tnico, i. e, histrica. Neste ltimo caso, acontece que algumas narrativas nos so transmitidas como
lendas histricas. Porm, quanto a ns, qualquer delas descendente
da mesma raiz mtica e no julgamos poder fazer tal classificao ou distino130. E o mesmo pensamos poder dizer das narrativas que mencionam
um rei mouro que encanta as filhas e as suas riquezas no momento da derrota. Todas simbolizaro a terra, ou o lugar perdido, e o encantamento
feito na esperana de o recuperar mais tarde. Ser por isso, tambm, que a
gente que as conta refere que as mouras ficaro encantadas para sempre... Por outro lado, as alteraes do contexto histrico revelam-se igualmente na diferenciao narrativa: a Senhora do Lugar dos tempos pr-histricos, smbolo da comunidade assim transcendida, agora a jovem
desejada pelo prncipe ou senhor candidato posse da terra, fruto da evoluo de mito fundador colectivo a mito do heri fundador.
Conta uma lenda a histria de Ardinga, a moura, filha do emir de Lamego. Vivia Ardinga no alccer com seu pai e criados. Sempre que podia, especialmente quando os jograis passavam pelo palcio, entregava-se ao seu passatempo favorito: ouvir histrias[...] Foi pelos jograis[...] que Ardinga conheceu a histria de D. Tedo. Primeiro soube que era um cristo que com seu
irmo D. Rausendo combatia ferozmente a gente da sua raa, e odiou-o por
isso. Depois, pouco a pouco, foi conhecendo cada acto de audcia do cavaleiro, descobrindo o roteiro de seus passos, peregrinando jogral a jogral os feitos
do homem que no limitava a sua vida espada, antes a povoava, como
terra, de rvores, de gentes, de templos. E um dia Ardinga soube que[...] o
amava. Assim[...] a moura fugiu levando consigo uma velha amiga de infncia. Durante trs dias e trs noites, correram por montes e vales, sem desfalecimento... Ardinga procurava D. Tedo nas locas das feras, nos ninhos das
guias, em todos os lugares onde sabia possvel encontr-lo. Mas Ardinga
no o achou em lado nenhum, e quando deu por si estava junto ao eremitrio
de Gelsio, o anacoreta, em So Pedro das guias, junto ao rio Tvora[...]
46
Alboacm, o rei de Lamego... partiu com a sua hoste atrs da filha fugitiva[...]
e chegou ao eremitrio de Gelsio. A encontrou Ardinga e a companheira,
no j as mouras que tinham deixado Lamego, antes as recm-crists que
Gelsio acolhera[...] enlouqueceu[...] sacou do alfange e, de um golpe, cortou
a cabea de Ardinga[...] pegou nos despojos da sacrificada e atirou-os torrente do Tvora. Depois, partiu para lutar[...] com os cristos[...] D. Tedo soube deste crime quando tomava banho num pego do Tvora, porque o corpo
de Ardinga veio ter com o seu[...] Pegou nela e seguiu, gota a gota, o sangue
corrente[...] at chegar ao eremitrio de Gelsio. A D. Tedo ajoelhou frente
ao anacoreta. Entregou-lhe o corpo, ordenou a sua sepultura, fez voto eterno
de celibato. Partiu para a guerra contra Alboacm[...] Porque ter sido a sorte
das armas favorvel ao mouro? Porque morreu D. Tedo131?
Porque a morte (como o amor entre dois seres que nem sequer se
conhecem) so aqui os smbolos mticos do senhorio de uma terra que
no se chega a alcanar.
A alentejana vila de Moura foi conquistada por Afonso Henriques, no ano
de 1166[...] Segundo a lenda, esta vila chamava-se, no tempo dos mouros,
Arucci-a-Nova[...] Era seu senhor Abu-Assan, que lhe mandara fazer novas e
fortes muralhas nas quais inclura uma formosa torre circular, em cujo minarete flutuava o pavilho sagrado do Islo... depois de reconstruda a vila, entregou-a sua filha predilecta, Salquia, e voltou para o palcio de Crdova. No
longe dali, em Arucci-Vetus, estava Brafma, o prncipe mouro do qual Salquia estava noiva, e apaixonada. Era de tarde[...] a vspera das suas bodas[...] o
sol morria l longe[...] Brafma deixara Arucci-Vetus ao cair da tarde, numa
caravana luxuosa e feliz. Tambm ele amava aquela noiva[...] Faltaria talvez
uma lgua para juntar Brafma a Salquia quando o sol saudou do Oriente[...]
Ao longe[...] uma nuvem de poeira, de dentro da qual rebrilharam ao sol nascente armas desembainhadas[...] eram os cristos[...] mais numerosos e bem
armados, prontos para combate[...] Brafma morreu de uma cutilada[...] A finalidade [dos cristos] era a conquista de Arucci-a-Nova[...] Por isso, decidiram
envergar as suas roupas e tentar penetrar na vila de surpresa[...] e, num pice,
fizeram a lgua que os separava de Arucci-a-Nova[...] No alto da torre da vila,
o atalaia[...] pensando ser a caravana nupcial, informou Salquia, que ordenou
que se abrissem as portas do castelo[...] Entraram os falsos mouros como uma
rajada de sangue. Salquia[...] mandou encerrar as portas do seu palcio. Trouxeram-lhe as chaves no momento exacto em que. eles chegavam[...] Salquia
subiu ao ponto mais alto do minarete, apertou as chaves numa das mos e,
elevando uma prece a Al, num impulso rapidssimo atirou-se para o vazio[...]
lvaro Rodrigues, chefe dos cristos[...] proclamou que a partir desse dia
Arucci-a-Nova se chamaria Vila da Moura[...]132.
47
48
Um dia [o lugar] mudou o nome porque algo aconteceu: dizem que uma moura
velhinha foi aqui que morreu, devia ser muito boa, ou talvez uma santinha, pois onde
caiu nasceu a fonte da Fontainha, ainda hoje existe, j passou sculos a jorrar e ainda
no se cansou dos meus campos regar... aqui est a histria que eu tenho para contar
para que quando eu morrer, outros a contaro para nunca se esquecer a lenda ou a
tradio... Obrigada moura querida pelo nome que nos deste, que Deus te d a guarida que aqui no tiveste[...]135.
49
NOTAS
Sarmento, Francisco Martins, A Mourama, Revista de Guimares, n 100, 1990,
Casa de Sarmento, pp. 343-353.
2 Mattoso, Jos, na Introduo ao livro O Reino dos Mortos na Idade Mdia Peninsular, dir. de Jos Mattoso, Lisboa, Ed. S da Costa, 1996, p. 8.
3 Guerra, Amlcar, O Mundo Luso-Romano II, A Religio, in Histria de Portugal, dirigida por Joo Medina, III volume, Amadora, Ediclube, 2004, p. 14.
4 Idem, ibidem.
5 Cfr. Ballester, Xaverio, Hidronimia Paleoeuropea: una Aproximacin
Paleoltica in Quaderni di Semantica 28 (2007). www.continuitas.org.
6 Cfr. Guerra, Amlcar, op. cit.
7 Calado, Manuel, Carta Arqueolgica do Alandroal, Alandroal, ed. da Cmara
Municipal do Alandroal, 1993, p.59 e p.159.
8 Calado, Manuel, op. cit. p. 63.
9 Cfr. Morais, Gabriela, O Santurio Alentejano de So Miguel da Mota, Vestgios de
um Culto Grande Deusa, Lisboa, Apenas Livros, 2003; Bonnaud, Christophe,
Syncretismes et divinits classiques en Vettonnie sous le Haut-Empire, www.ipa.min-cultura.pt/pubs/RPA/v7n1/folder/14.pdf; Patrocnio, Manuel Francisco Soares do, Um Rosto para os Deuses: a Religiosidade e as Representaes de Divindades
nas Antigas Culturas do Territrio Portugus, www.idearte.org/texts/23.pdf.
10 Cfr. Morais, Gabriela, A Gentica e a Teoria da Continuidade Paleoltica Aplicadas
Lenda da Fundao de Portugal, Irlanda e Esccia, pp. 35-42.
11 Alves, Francisco Manuel, abade de Baal, Memrias Arqueolgico-Histricas do
Distrito de Bragana, Arqueologia, Etnografia e Arte, tomo IX, Cmara Municipal
de Bragana/Instituto Portugus de Museus Museu do Abade de Baal, 2000,
pp. 487 e 488.
12 Cardoso, Joo Lus, Pr-Histria de Portugal, Ed. Verbo, Out. 2002, p. 183.
13 Patrocnio, Manuel Francisco Soares do, Um Rosto para os Deuses: a Religiosidade
e as Representaes de Divindades nas Antigas Culturas do Territrio Portugus,
www.idearte.org/texts/23.pdf.
14 Guerra, Amlcar, e outros, Novas investigaes no Santurio de Endovlico (S.
Miguel da Mota, Alandroal): a Campanha de 2002, www.ipa.min-cultura.pt/
pubs/RPA/v6n2/folder/415.pdf
15 Mattoso, Jos, Os Rituais da Morte na Liturgia Hispnica (sc. VI a XI), in
O Reinos dos Mortos na Idade Mdia, Lisboa, Ed. S da Costa, 1996, p. 56,
16 Cassirer, Ernst, Ensaio sobre o Homem, Introduo Filosofia da Cultura Humana,
Guimares Ed., s/d. p. 147.
17 Sarmento, F. Martins, A Mourama, in Rev. de Guimares, n 100/1990, Casa
de Sarmento, pp. 343-353.
18 Alves, Francisco M., abade de Baal, op. cit. tomo IX, p. 488
19 Oliveira, Catarina, Lugar e Memria, Testemunhos Megalticos e Leituras do Passado, Lisboa, Ed. Colibri, 2001, p. 66.
1
50
Guerra, Amlcar, A Religio, in Histria de Portugal, dirigida por Joo Medina, III volume, O Mundo Luso-Romano II, Amadora, Ediclube, 2004, p. 17.
21 Cfr. Vol. II desta obra, pp. 17-23.
22 Mattoso, Jos, op. cit., p. 56.
23 Guerra, Amlcar, op. cit., p. 13.
24 Alves, Francisco M. Alves, abade de Baal, op. cit., p. 453.
25 www.cm-pesoregua.pt, donde retirmos tambm a Lenda do Frago, aqui
abaixo.
26 Recolha efectuada em So Vicente concelho de Castelo Branco, in Moura,
Jos Carlos Duarte, Contos, Mitos e Lendas da Beira, Coimbra, Amar Arte, 1996.
27 Ribeiro, J. Diogo, Turquel Folclrico. Parte IV. Lendas. Esposende, Livraria Espozendense Editora, 1934.
28 Bethencourt, Francisco, O Imaginrio da Magia, Feitios, Adivinhos e Curandeiros
em Portugal no Sculo XVI, So Paulo, Companhia das Letras, 2004.
29 Minois, George, Histria do Riso e do Escrnio, So Paulo, Fundao Editora da
UNESP, 2003, pp. 21-48
30 Macedo, Jean Rivair, Riso Ritual, Cultos Pagos e Moral Crist na Alta Idade
Mdia, in Boletim do CPA, Campinas, n 4, Jul/Dez, 1997
31 Dias, Jorge, Rio de Onor, Comunitarismo Agro-Pastoril, Porto, Instituto de Alta
Cultura, 1953, p. 337.
32 Almeida, Joo Ferreira de, Quem faz o arraial o povo: mudana social e
mudana cultural, in Anlise Social, vol. XVI (64), 1980-4., pp. 679-698.
33 Almeida, Joo Ferreira de, op. cit.
34 Fabio, Carlos, A Antiguidade Tardia e a Desagregao do Imprio, in Histria de Portugal, dirigida por Joo Medina, III volume, Amadora, Ediclube, 2004,
pp. 208 e 209.
35 Idem, ibidem.
36 Id., ib, p. 206.
37 Id., ib., p. 233.
38 Id., ib., p. 238.
39 Catarino, Helena, A Ocupao Islmica, in Histria de Portugal, dirigida por
Joo Medina, III volume, Amadora, Ediclube, 2004, p. 270.
40 Vieira, Marina Afonso, Alto Paiva. Povoamento nas pocas Romana e Alto Medieval, Trabalhos de Arqueologia 36, www.ipa.min-cultura.pt/pubs/TA/
folder/36/024.pdf.
41 Id., ib. pp. 217, 218.
42 Martinez, Pablo C. Daz, Comunidades Monsticas y Comunidades Campesinas en
la Espaa Visigoda, Antigedad y Cristianismo (Mrcia) III, Universidad de
Salamanca, 1996. (Trad. das autoras)
43 Vieira, Marina Afonso, op. cit.
44 Bastos, Maria do Rosrio, Testemunhos hispnicos sobre o Mundo dos Mortos nos sculos IV a VIII, in O Reinos dos Mortos na Idade Mdia, Lisboa, Ed. S
da Costa, 1996, pp. 45-52.
51
20
52
53
54
Gouveia, Jorge, Proposta de Class. das Portas de Rdo como Monumento Natural,
Ed. Munic. V. Velha de Rdo e Nisa, 2005. portal.icnb.pt/.../A_PROPOSTA
CLASSIFICAOPRODAO_DOCFINAL.pdf
93 Idem, ibidem.
94 Lopes, Aurlio, Andanas da Senhora do Rosrio nas Faldas da Serra d'Aire, o Imaginrio Popular nas Aparies de Ftima, Lisboa, Apenas Livros, 2009.
95 Jornal de Notcias, 27 de Janeiro de 2010.
96 Bethencourt, Francisco, O Imaginrio da Magia, Feiticeiros, Adivinhos e Curandeiros em Portugal no Sculo XVI, So Paulo, Companhia das Letras, 2004, p. 149.
97 Azevedo, Pedro A. de, Extractos Archeologicos das Memorias parochiaes de
1758, in O Archeologo Portugus, Lisboa, Museu Ethnographico Portugus, s. 1,
vol. 2, n. 3 (Mar. 1896), p. 89.
98 Nunes, Jos Joaquim, Gruta do Serro do Algarve, in O Archeologo Portugus,
Lisboa, Museu Ethnographico Portugus, s. 1, vol. 3, n. 3-4 (Mar.-Abr. 1897), p.
95.
99 Bethencourt, Francisco, op. cit. p. 149.
100 Pedroso, Consiglieri, op. cit., p. 226
101 Catarino, Helena, A Ocupao Islmica, in Histria de Portugal, dirigida por
Joo Medina, III volume, Amadora, Ediclube, 2004, p. 268
102 Fabio, Carlos, A Monarquia Visigtica Hispnica do Sculo VII, in Histria de
Portugal, dirigida por Joo Medina, III volume, Amadora, Ediclube, 2004, p. 268.
103 Catarino, Helena, op. cit., pp. 273-274.
104 Idem, ibidem, p. 275.
105 Rei, Antnio, Literatura Morabe. Memria de Uma Cultura de Resistncia
(Sculos VIII-XII), in Revista Medievalista online ano 4, n 4, 2008.
106 Torres, Cludio e Santiago Macias, Rituais Funerrios Paleocristos e Islmicos nas Necrpoles de Mrtola, in Histria de Portugal, dirigida por Joo Medina, III volume, p. 13, Amadora, Ediclube, 2004.
107 Idem, ibidem, p. 40.
108 Cfr. Morais, Gabriela, A Gentica e a Teoria da Continuidade Paleoltica Aplicadas
Lenda da Fundao de Portugal, Irlanda e Esccia, pp. 35-42.
109 Lafuente, A. Domenech, Del Territorio de Ifni, Yenn y Cuevas en Ait Ba
Aamrn, Cuadernos de estudios africanos, n 14, 1951, pag. 39, www.cepc.es/
rap/Publicaciones/Revistas/12/CAO_014_039.pdf (traduo e adaptao das
autoras).
110 Frazo, Fernanda, Lendas Portuguesas da Terra e do Mar, Lisboa, Apenas Livros,
2004, p. 250-251. Tambm o abade de Baal (op. cit.) cita inmeras mouras/
tesouros guardados pelo Diabo em forma de sapo gigante.
111 It, Ftima, Tisseuses de Tapis, Tisseuses de Rves de la montagne berbre, base.dph.info/fr/fiches/dph/fiche-dph-7051.html Sou uma mulher do Mdio Atlas,
uma mulher Amazigh, uma mulher rural. A montanha o meu inconsciente
imaginrio e o de todos os povos autctones do mundo[...] a mulher das montanhas da frica do norte e a lngua tamazight
55 constituem um todo, ela a guar92
L, Cherni et. al., Female gene pools of Berber and Arab neighboring
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Africa, in Hum. Biol. 77 (2005); Cherni L, Fernandes V, Pereira JB et al. Postlast glacial maximum expansion from Iberia to North Africa revealed by fine
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from southwestern to northeastern Europe, in Am J Hum Genet.; 62(5): 1137
1152 (1998).
128 Gonalves, R., Freitas, A., Branco, M. et al., Y-chromosome lineages from
Portugal, Madeira and Aores record elements of Sephardim and Berber
ancestry, in Annals of Human Genetics 69 (Pt 4): 44354, 2005.
129 Se este um facto histrico, no deixa de ser interessante relacion-lo
com outro, que determinou a formao de Portugal como reino independente: D. Teresa , por direito, a senhora do Condado Portucalense, e no o seu
cnjuge. Por isso, a lenda d tanto nfase sua derrota pessoal contra o filho,
Afonso Henriques, em So Mamede, que evita assim a perda do Condado para
o ento seu marido, Ferno Peres de Trava.
130 Com esta preciso, corrige-se o que uma das autoras afirmou a este propsito
na obra A Gentica e a Teoria da Continuidade Paleoltica Aplicadas Lenda da Fundao de Portugal, Irlanda e Esccia, p. 28
131 Frazo, Fernanda, Lendas Portuguesas da Terra e do Mar, Lisboa, Apenas Livros,
2004, pp. 92-93.
132 Idem, ibidem, pp. 219-221.
133 http://www.ciberjunta.com/lomba.html.
134 www.cm-pesoregua.pt
135 Narrativa recolhida por Guedes, Maria Estela, aquando do Passeio das Mouras
Encantadas II (3 a 5 de 10/10/2009) http://www.youtube.com/results?
search_query=Moura%20Morta&search=tag Em Moura Morta existe a Anta de
Mazes.
136 Almagro-Gorbea, Martn, Pervivencia del Imaginario Mtico Celta en las
Leyendas Sorianas de Gustavo Adolfo Bcquer, in Studi Celtici, dir. Francesco
Benozzo, VII 2008-2009, pp. 207-233: esta tradicin de las Mouras encantadas
[que se extiende desde Galicia y Asturias hasta Portugal], particularmente viva
en Galicia, resulta muy prxima a la maligna xana de la mitologa celta de
Asturias, pues no es de origen arbigo, apesar del nombre de moros, nacido
quiz de un equvoco con la palabra celta mahra o mahr, que designa ciertos
espritus, y a veces el demonio ncubo [cit de Menndez Pelayo com outra
127
57
59
60
Baptista, Antnio Martinho, The Quaternary Rock Art of the Ca Valley (Portugal),
www.ipa.min-cultura.pt/pubs/TA/folder/17/237.pdf.
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NDICE
[Introduo], 3
1. As mouras encantadas e a romanizao, 6
2. As mouras encantadas, a cristianizao e a islamizao, 14
2.1 As mouras encantadas e outras manifestaes populares, 14
2.2 A cristianizao, 17
2.2. a) O nome no mudou a coisa, 30
2.2. b) As mouras diablicas, 31
2.2. c) As mouras santificadas, 33
2.2. d) As mouras e as almas penadas, 36
2.3 A islamizao, 37
Concluso, 49
Notas, 50
Bibliografia, 58