Sociologia para Adolescentes
Sociologia para Adolescentes
Sociologia para Adolescentes
Sociologia para
Adolescentes.
2009
Prefácio
A presente obra vem a completar nossa primeira obra – Filosofia para Adolescentes – cujas aulas
eram em boa parte, teóricas e, acrescentar outras áreas do conhecimento humano – Sociologia, Religião
e História, áreas que, normalmente, professores de filosofia são brindados, especialmente em escolas
públicas, que têm carência de professores dessas áreas. Mas, do limão, fizemos uma limonada, pois é
muito útil poder mostrar aos alunos a diferença e semelhança entre Filosofia, Sociologia (Ciência
social), Religião e História, quatro das principais formas que os seres humanos encontraram para
exteriorizar seu pensamento. A elas poder-se-ia acrescer Arte.
Procuraremos ser fiel à ordem das aulas e ao conteúdo ministrado, bem como, reações dos alunos
(participação, engajamento, ou afastamento e repulsa, sim, repulsa à metodologia, algo comum, natural,
fisiológico, em adolescentes) e resultados obtidos (formais, provas, trabalhos, apresentações e informais,
expressões, humor, conversas paralelas). Procuraremos apresentar primeiro as aulas de filosofia, depois
de Sociologia e, então, religião e História, Contudo, o leitor deve estar advertido que elas ocorreram em
paralelo: em uma mesma semana, dávamos as três disciplinas para as cinco turmas de primeiros anos do
Ensino Médio, pela manhã, turmas 211,212,213,214 e 215 e História à turma de terceiro ano do ensino
médio, turma 431, no horário noturno.
Queremos lembrar que a disciplina de História não era por nós esperada, mas nos foi oferecida e
como professor ganha pouco, representava um acréscimo financeiro a mais. Acontece, porém, que não
temos formação em História e um filósofo apenas toma emprestado as descobertas arqueológicas para
refletir sobre conceitos abstratos. Mas, tal empresa representou um desafio interessante – em dois ou três
finais-de-semana relemos um livro de história e recuperamos conhecimentos guardados uns vinte anos
na memória, quando éramos adolescentes e ainda estávamos no colégio.
Ainda, devo lembrar que passei neste ano de 2009 a usar um microfone portátil com uma pequena
caixa de som de 7 watts na cintura e os alunos gostavam do equipamento, aliás, eles gostam de tudo que
e relaciona à tecnologia e como nesta época da vida, a educação tem um gosto intragável e se
dependesse da maioria deles não iriam à escola, o uso do microfone prendia a atenção deles. Chego a
ponto de concluir que a pior aula dada por um professor, com microfone é ainda superior à melhor aula
dada sem microfone!!
Considerações metodológicas:
Quando se lida com adolescentes, deve-se considerar algumas questões:
1- Adolescentes são crianças com corpos de adultos, e, por isso, mantém a infantilidade em um
grau elevado. Uma boa maneira de conquistar sua atenção e respeito é:
(a) mostrar-lhes um filme daqueles que não precisam pensar muito, de ação ou romance, de
preferência dublado;
(b) distribuir-lhes guloseimas;
(c) praticar esportes com eles.
2- Eles não suportam rotina, aulas que parecem, para eles, repetitivas, embora sejam apenas
continuações, com acréscimos importantes. Por isso, eles dão valor a mudanças de ambiente: ir à sala de
informática em um dia, ir ao pátio tomar sol no inverno, ir à sala de vídeo, etc. Aliás, quem não gosta?
Mas, há um detalhe a considerar: quando eu entrei na faculdade de filosofia (a primeira que fiz foi
de Administração) me senti mentalmente esgotado e, mais para o final do curso, não tinha mais vontade
de ler um livro inteiro. Será que os adolescentes, em função do excesso de informação mais o conflito
que vivenciam em famílias, geralmente, desestruturadas, não estão exaustos mentalmente? Pensei em
um trabalho para um eventual pós-graduação: medir os batimentos cardíacos de professores e alunos
para saber o grau de stress que vivem em suas atividades!
3- eles estão sem limites, pois vem de casa sem limites, os pais ou avós os deixam fazer o que bem
entendem e sobre para o professor disciplinar, só que o professor não tem instrumentos que uma mãe ou
um pai teriam, como o de puxar a orelha ou dar um tapa na cara diante de desobediência. A psicologia
moderna dirá que isto é ultrapassado, mas lhes dar tudo o que desejam (adolescentrismo) não os educará
para o mundo, pois o mundo não lhes dará tudo o que desejarem! Na escola onde trabalho neste
momento, 2009, nem suspensão ou expulsão os alunos podem sofrer, pois o governo não quer mais
evasão escolar, mas isto não resolve o problema de termos alunos indisciplinados e a única coisa que o
professor pode fazer é tirar para fora da sala os mais desordeiros. Nada os agrada, os levamos para a sala
de vídeo, para o laboratório de informática, excursionamos ao museu de ciências, em dias frios tomamos
sol na rua, quando eles aproveitam para escapar!
Parecem que eles esperam por limites: às vezes respondo com grosseria à indisciplina deles: já
mandei alunos calarem a boca, outra vez, disse a um deles que deveria deixar de ser criança e virar
homem, outras vezes chamei seus pais, porque –lhes disse – com os alunos não era mais possível um
acordo. E quando os pais vêm à escola se horrorizam com o que os filhos fazem ou será que fingem?
Dizem que em casa não são assim! O mais curioso disto tudo é que temos a impressão de que deixaram
ao professor a tarefa de dar limites, mas como? Em geral, quando o aluno incomoda, tiramo-lo da sala,
mas muitas escolas são proibidas de suspender ou expulsar alunos.
O que é certo é que eles foram acostumados (condicionados, mesmo) a um tipo de aula, em escola
pública, em que o professor deixa uma tarefa no quadro e sai da sala e, mais tarde, verificará se eles
anotaram no caderno e fizeram professor curioso e com algum conhecimento amplo da vida. E é isso
que devemos cobrar dos alunos, um ser completo, não um especialista, pelo menos, nesta época de
formação escolar. Lembro que fui um estudante que esperava ansioso por novos conteúdos, pois, assim,
poderia aprender o conhecimento que a humanidade dispunha e tinha acumulado. Tinha esperança,
também, de que tal conhecimento representasse uma oportunidade de me tornar bem sucedido, mas há
muitos obstáculos e nossos sonhos morrem antes de ultrapassar todos: burocracia, para abrir empresas,
gastos para registrar marcas que imaginamos, recursos para implementar ideias, etc. podemos, ainda
assim, escrever nossas ideias e publicá-las na internet de graça!
Um dos argumentos em defesa dos adolescentes é que a escola tecnologicamente está defasada
com o restante dos equipamentos que os adolescentes estão habituados a trabalhar. Mas, experimente
leva-los à sala de informática e pedir uma pesquisa a eles: lhe darão qualquer coisa que aparecer e
apenas a copiarão, sem acrescentar opinião ou argumentos consistentes. Além disso, não estão
habituados a uma comunicação de duas vias, mas apenas a receber informações prontas, pensadas por
outras pessoas, cantores, especialmente.
Solução? Os meus alunos de terceiro ano do ensino médio parecem arredios (uma aluna pediu que
eu deixasse textos para que eles lessem e fizessem algum trabalho e eu respondi que não era ela que
decidiria como eu daria aula, embora eu, nas aulas seguintes, tenha assimilado nas minhas aulas os
trabalhos sem o constante monólogo do professor), desconfiados, agridem verbalmente (perguntam qual
é a tarefa e não esperam a explicação ou se não a entendem dizem que a culpa é do professor, eximindo-
se da mesma), expressam-se com receio e dificuldade de e têm pouca auto-estima, fruto de uma infância
sem afeto?
Mas quando há pontos ou notas envolvidos eles participam. Em parte, propus aulas que não os
massacrassem com excesso de informação, questões difíceis de resolver ou provas que os fizessem
estudar muito e memorizar a matéria - acho que conquistei algum respeito deles. Levei-os ao laboratório
de informática, à sala de vídeo, ofereci-lhes pipoca para os motivar a assistir o DVD de Sócrates, só não
fomos no museu de ciências, porque ele não abre à noite. Não é preciso mais rigor do que a exigência da
presença e de alguma participação por parte deles para a escola cumprir atarefa primeira: ampliar a
percepção (muitos a chamam de pôr a razão no controle, como se existisse um órgão sede da
racionalidade, como bem questionou Popper) acostumada a percepções limitadas a seus hábitos
cotidianos; reparem como um adolescente percebe detalhes que passam despercebidos pelos adultos:
reparam o tipo de sapato que usamos, se a roupa está suja de respingos de lama (pois mesmo com chuva
forte, eu vou de bicicleta para o colégio), a tudo que é pequeno eles prestam atenção! Não é por acaso,
também, que eles, em geral, têm dificuldade de pensar em um nível abstrato, pois neste nível o particular
e o singular (este, esta e isto ou aquilo, aquela, aquele) se encontram desfocados e se dá lugar ao
“existe”, “alguns”, “todos”, expressões que não falam de uma pessoa, que tem um nome, veste uma
certa roupa, moro na rua tal, mas de grupos maiores de pessoas até se o universo tem limite, o que
compreende o conjunto de todas as coisas que existem dentro dele ou mesmo, por especulação, fora
dele.
4- um dia apareceu no colégio um mágico. Precisavam ver a reação dos alunos, adolescentes que
transpareceram as crianças que ainda estão neles. Hipnotizados, saíam das aulas sem pedir e quando
chamava a atenção deles, não estavam nem aí. Senti uma inveja do poder do mágico de prender a
atenção dos alunos. Certamente falta isso na educação ou, então, deixar que eles façam a mágica... de
criar algo que saia de dentro deles mesmos! Um professor não tem a obrigação de ser um mágico, mas
pelo menos a humildade de querer ser um mágico, para ver olhos brilhando na sua frente.
1a aula introdutória:
Na primeira aula, apresentamo-nos, nosso histórico, faculdade de origem, antes, dissemos que nos
formamos em Administração, depois, arduamente, nos encontramos em Filosofia, depois de ter pensado
em Arquitetura – formas e cores eram, para mim, um atrativo e mais do que isto, uma necessidade
neurológica, porém perder tempo decidindo tipos de tecido ou embelezando a casa de “cabeças vazias”,
nos afastou daquela idéia.
Mostrei-lhes alguns livros que publiquei na internet, apresentei-lhes um livro específico que
escrevi e que dele queria que eles imprimissem um texto que usaremos no segundo trimestre e, para
motivá-los a se mover!, prometi 10 pontos (não queria realmente que fossem 10 pontos, mas saiu da
boca!, oferecei como alternativa: dar 5 pontos para cada disciplina, filosofia, sociologia e religião, mas
prefeririam os 10 pontos!): trata-se do texto, um resumo feito por mim na verdade, da obra “O povo
brasileiro”, de Darcy Ribeiro, que sem igual, mostra a origem da sociedade brasileira, os povos que a
formaram – índios, negros e europeus, a desigualdade presente desde o descobrimento, ou melhor,
invasão! No restante da aula, apresentamos, então, as diferenças entre filosofia, ciências e religião e,
depois, as semelhanças entre elas. Primeiramente, devemos observar que tendemos a ver as três áreas
como separadas, tal como três propriedades, três terrenos que se limitam por cercas, muros,
intransponíveis, mas isto não é verdade.
A melhor imagem seria a seguinte, onde as três áreas têm diferenças, mas, também, semelhanças.
Embora o filósofo seja um solitário, que tenta entender o mundo, a partir de suas experiências e,
também, das experiências que observa nos outros e a religião trás consigo verdades ditadas por líderes
religiosos que dizem tê-las ouvido de um Deus e a Ciência (não esquecer: Sociologia representa aqui as
ciências) parte da observação e testes realizados com uma quantidade de pessoas ou fatos significativos
estatisticamente, isto é, um número que representa uma sociedade inteira, ainda assim, é sobre os
mesmos fatos, é sobre a mesma vida, que filósofo, religioso e cientista se debruçam e sobre os quais
fazem suas investigações, suas reflexões.
Filosofia Ciências Religião
Diferenças: Solitário, faz Pesquisador de Recebedor,
pesquisas sobre suas grupamentos possuidor e
próprias experiências humanos, a partir de divulgador de
e observa as das fatos passados e verdades prontas
pessoas que lhe são presentes.
próximas
Semelhanças: Suas investigações tratam dos mesmos temas, como origem do
universo, existência ou não de Deus e de uma alma imortal, sentido
da vida, felicidade, infelicidade, conflito entre emoções e
racionalidade, origem das sociedades, competição e concorrência,
violência, contratos, estética, morte, condições de verificabilidade
de suas teorias, bem, mal, costumes, leis, etc.
2a aula introdutória:
Fizemos um exercício para observar se eles compreenderam a aula anterior:
(A) Identifique nas sentenças abaixo quais são relacionadas à filosofia, às Ciências e à Religião:
( ) Dr. Zerbini, foi quem primeiro realizou um transplante de coração em humanos, no Brasil, após
uma série de tentativas usando bezerros.
A resposta é “Ciência”, embora apareça um homem solitário, ele na verdade, é um médico (as
pistas são “Dr.” e “transplante”) e médicos trabalham em grupo com enfermeiros, auxiliares de
enfermagem, anestesistas e residentes.
( ) René Descartes defendia que devemos ser céticos em um primeiro momento até que se prove a
verdade de alguma afirmação.
Um homem, solitário e, só por isso, já é “filosofia”. Também, ele expõe sua maneira de pensar
sobre fatos a sua volta, a necessidade de cautela, a partir de experiências que ele viveu ou algumas de
outras pessoas que ele observou (não há um número de observações, por isso, não é “ciência”!), antes de
julgar se algo que ele pensou ou que os outros disseram, é verdadeiro ou falso. Não se duvida, aqui, do
caráter dos outros, apenas se sua percepção e seus sentidos lhe deram toda a informação necessária de
que ele precisa para emitir sua opinião.
( ) Em Israel, encontraram um código secreto na Bíblia, a partir de versículos, onde palavras são
localizadas em linhas verticais, horizontais ou em diagonais, como, por exemplo, “Bin”, “Laden”,
“atacará”, “torres”, “Gêmeas”, “2001”, antes mesmo que os eventos ocorram.
É curioso, porque aqui os alunos disseram se tratar de religião; ocorre que embora se leia a
palavra Bíblia, não se trata da leitura direta do livro, mas através do uso da matemática e embora se
possa duvidar de seu caráter como ciência experimental, ainda assim, quem dela se utiliza, realiza, pelo
menos, experiências mentais tomando, algumas vezes, conteúdos vindos do mundo material. Uma linha
reta, perfeita, é uma idealização mental, mas pode se referir a um projeto de uma nova estrada em
construção, por exemplo. Trata-se, então, de uma ciência.
( ) Os Maias faziam sacrifícios com crianças e escravos que eram oferecidos ao Deus-sol para que
este nunca se apagasse.
Aqui, aparecem as palavras “sacrifício” e “Deus”, por isso, se trata de “religião”. Aproveitamos o
exemplo para perguntar aos alunos se algo assim poderia acontecer hoje: o professor poderia ir ao jardim
de infância da escola e pedir à professor que lhe desse uma criança para oferece-la em sacrifício a um
Deus? Embora a idéia seja grotesca, sua proposição visa a fazer o aluno pensar: o que mudou entre as
maneiras de pensar, dos Maias até nós? Não eram eles também considerados humanos? De que modo
evoluímos, se evoluímos? Houve alguma mudança dentro do cérebro?
( ) Platão acreditava que existiam dois mundos, este, físico, e um outro eterno. De onde mais
tiraríamos a idéia de um círculo perfeito, por exemplo, se nada no mundo material, uma maçã, a lua, é
uma esfera perfeita?
Aqui, se trata de “Filosofia”, pois há um indivíduo, manifestando uma teoria a partir de sua própria
reflexão, ainda que tendo observado o mundo, não testou todos os objetos para saber se são, por
exemplo, esferas perfeitas. Uma vez um aluno, no ano anterior, perguntou se o olho humano não poderia
ser um exemplo de esfera perfeita. Pedi que ele enviasse um e-mail a um oftalmologista, porque era a
pessoa que mais próxima estava de olhos, mas o aluno nunca me respondeu esta questão. Em geral, no
tempo de escola não nos sobra tempo, tal é a quantidade de aulas e informações recebidas, bem como, a
importância exagerada a provas escritas.
Sociologia
Primeira aula:
Apresentei-lhes o pai da sociologia (ou um dos): Augusto Comte. Nascido 16 anos após a tomada
da Bastilha, símbolo da revolução francesa, quando o povo liderado por intelectuais tira o rei do poder e
o decapita. Os ideais deste movimento eram a “liberdade, a igualdade e a fraternidade” pensados pelos
intelectuais um século antes, conhecidos por iluministas, em um período que antecederia a uma nova
época, a das luzes, ou seja, do predomínio da racionalidade e de tudo o que de positivo fosse produzido a
partir dela; somos todos iguais, irmãos e livres! Mas, então o que aconteceu? No mesmo século dezoito,
um outro movimento atingiria seu máximo grau: a revolução industrial: os burgueses, que na Idade
Média eram pequenos comerciantes que surgiram nas proximidades dos castelos feudais (suas
comunidades se chamavam “burgos”), antigos vassalos que realizavam o trabalho pesado para a
aristocracia dos senhores feudais, agora, tinham se transformado em homens ricos e donos de grandes
indústrias cuja produção em série esmagava os artesãos independentes na produção de artigos como
sapatos, roupas, etc, a menos que eles fossem incorporados à mão-de-obra das fábricas, gente que
trabalhava de 12 a 18 horas por dia, incluindo crianças e mulheres, muitas delas em minas de carvão,
minério indispensável para pôr máquinas a vapor em movimento. Os irmãos da revolução que derrubara
a monarquia, agora, não passavam de parafusos, homens, mulheres e crianças-máquinas. Aqueles que
não se adaptavam a esta realidade, vindos das áreas rurais, esperançosos por uma vida digna, acabavam
na sarjeta, na prostituição, no alcoolismo ou na prática de violência para sobreviverem.
Diante deste caos social, Augusto Comte propõe a Física social, ciência que semelhante à física
que estuda movimentos de objetos inanimados, procuraria meios de entender por que a sociedade tinha
chegado a situação atual e, então, propor soluções a estes problemas. À razão humana, especialmente
dos iluministas, interessava oferecer à toda a humanidade condições mínimas de uma vida digna e isto
inclui justa recompensa pelo trabalho dos operários. Embora Augusto Comte não tenha oferecido
respostas ou um plano, sua contribuição consistiu em mostrar que a sociedade humana passa por
estágios, desde as sociedades religiosas, passando pelas filosóficas atingindo o máximo
desenvolvimento em sociedades onde a ciência está presente em cada ato humano. O caos social era
indício de que o último estágio não tinha sido alcançado; resta, então, que se construísse uma ciência
específica para a sociedade.
Uma das mudanças necessárias para alcançar este novo estágio pode ser vista na mudança do
calendário: agora, o ano 1 era o ano da revolução francesa, 1789, e o ano em que escrevemos este livro,
2009, corresponderia a o ano 220 depois da revolução, os meses seriam de número 13 com 28 dias; hoje,
seria 18 de Aristóteles de 220 (ou pelo calendário social em que vivemos, isto é, no estágio teológico, 15
de março, de Martes, deus da guerra, do ano de 2009 depois de Cristo).
Mais tarde, Augusto Comte mudará a denominação “Física social” para “Sociologia”, pois não
queria a matemática como instrumento desta ciência, porque sendo iluminista, acreditava na liberdade e
em um espaço não previsível das ações humanas.
Segunda aula:
Queremos propor que, individualmente, os alunos construam seus próprios calendários, a
semelhança daquele proposto por Augusto Comte. É preciso que se diga que este exercício tem um
objetivo oculto: faze-los pensar na possibilidade de um outro calendário diferente daquele cristão.
Pessoalmente (nunca disse isso aos alunos) a Igreja de Roma fez mais mal à humanidade que bem e seus
ritos e símbolos deveriam ser proibidos como são os símbolos nazistas; ocorre que os vitoriosos não são
punidos! Reconheço que os pedagogos-sociólogos como Henry Giroux estão certos quando dizem o
educador trás consigo valores prévios. Estou, tal como Sócrates, corrompendo a juventude? Ou, talvez,
não estaria eu reorganizando os pratos da balança de um modo que fiquem equilibrados?
Em geral, eles tomam como ano 1 suas datas de nascimento. E, depois, quando lhes pedi que
dissesse em que ano estaríamos se o seu calendário vigesse, houve uma dificuldade no cálculo
matemático. Se eu nasci em 1973 e tomo ele como ano 1 de um novo calendário, então pelo calendário
antigo de hoje, 2009, o novo ano em que estamos será 2009 menos 1973, mas por este cálculo eu tiro
fora o próprio ano de 1973 e não queremos isto, queremos inclui-lo e, assim, ao invés de dizer que
estamos no ano 36, na verdade estamos no ano 37.
Terceira aula:
Na aula seguinte, pedi que diante de todos, alguns voluntários apresentassem seus calendários.
Aquela dificuldade no cálculo matemático apareceu e não sei se todos entenderam as razões e a técnica
de solução do problema!
Quarta aula:
Nesta aula, a título de curiosidade, apresentei-lhes o significado dos nomes dos meses do
calendário cristão que toma como ano 1, o nascimento de Cristo, mas em relação aos meses, estes se
referem à mitologia romana, influenciada pela mitologia grega antiga. Informações que encontramos
facilmente na internet. Perguntei a eles por que de janeiro a junho mantemos os nomes de meses que se
referem a deuses, isto é, a uma crença politeísta? Poderíamos usar nomes de santos? Estava procurando
semear a curiosidade e extinguir o medo da mudança!
Eis a lista completa dos meses que utilizamos e seus significados originais e esquecidos: Janeiro
(do Deus Jano, deus romano das passagens, tem duas cabeças, uma contempla o passado e a outra, o
futuro), Fevereiro (de Februus, Deus da morte), Março (Deus Marte, da guerra, o planeta vermelho),
Abril (de apruus, o “outro” mês que não março), Maio (Deus romana Maya), Junho (Juno (Deusa
romana, esposa do deus Júpiter) , Julho (Júlio César, que exigiu, em sua homenagem, que o mês tivesse
31 dias), Agosto (do imperador Augusto, que exigiu, também, que o mês tivesse 31 dias), Setembro
(sétimo mês depois de março, primeiro mês do calendário romano), Outubro (oitavo mês depois de
março), Novembro (nono mês depois de março) e Dezembro (décimo mês depois de março).
Quinta aula:
Continuei a falar sobre o pai da sociologia, Augusto comte. Agora, sobre a sua influência no
Brasil, especialmente em duas ocasiões:
(a) proclamação da república, em 1889, com a derrubada da monarquia e a substituição de líderes
civis (na verdade, militares), mas civis no sentido de não dizerem ser possuidores de um sangue azul ou
representarem Deus na Terra..., motivados por, em grande parte, se afastar da dependência portuguesa
e , de outro, porque, assim, realizariam os sonhos de liberdade, igualdade e fraternidade da revolução
francesa e do Iluminismo, perído em que a razão governaria e não o misticismo.
Citei para eles como exemplo daquela influência o lema positivista que consta na bandeira
brasileira: “ordem e progresso” e lhes disse que o lema estava imcompleto, pois a íntegra é: “o amor por
princípio, a ordem por base e o progresso por fim”. Comparei o lema à sala de aula, em que querem
ordem dos alunos para atingir um fim, mas onde fica o amor? É possível viver sem ele? Lembrei,
também, um senador, Eduardo Suplicy, que tinha a proposta de incluir “amor” no lema da bandeira,
mas, muitos perguntaram, apenas as palavras mudariam um país? Respondi que a Bíblia era uma palavra
que mudava a vida de muita gente, por exemplo, presos em cadeias se convertiam à religião e mudavam
suas vidas!
(b) o outro exemplo: em 1892 houve no Rio Grande do Sul uma guerra civil, irmãos brigando com
irmãos: de um lado, os seguidores de Júlio de Castilhos, que se mantinha no cargo a muitos mandatos, e
não raro com fraudes eleitorais, e, de outro, Gaspar Martins. Castilhos defendia uma autonomia maior ao
estado e Martins, defendia o centralismo federal. O primeiro grupo era chamado de Chimangos ou Pica-
paus e o segundo grupo, Federalistas ou Maragatos. A guerra durou até 1895 e no decorrer dela
morreram 10 mil pessoas, muitas degoladas, prática que remonta a atividade da área rural usada no abate
de ovelhas, mas, na guerra civil, no abate de humanos! Eram amarrados, pés e braços, muitas vezes
castrados e então se passava a faca de orelha a orelha, cortando a garganta. Quanto ódio ressentido de
lado a lado! As explicações são várias: falta de recursos para manter prisioneiros, presos e alimentados,
mas, principalmente, a vida grosseira dos peões de fazendas acostumados a matar ovelhas.
Em uma das cinco turmas para as quais eu ministrava aulas de filosofia, sociologia e religião, eles
comentaram a minha péssima grafia, especialmente uma palavra que eles não entendiam. Então,
lembrei-me de ter visto no canal da National Geographic uma propaganda que explicava que o cérebro
consegue entender mesmo palavras difíceis como cortadas pela metade (AUTOMÓVEL foi o exemplo
que usei) ou, então, quando em uma frase as letras das palavras estão misturadas, como, por exemplo,
EU UOV IRSA À TENOI. É curioso como eles sabiam dizer a frase, no seu sentido correto: EU VOU
SAIR À NOITE!! Ora, acrescentei, se uma palavra minha estava confusa basta perguntar: QUE
PALAVRA PODE SER? Se um “isso” está escrito de um modo esquisito, devemos perguntar que
palavra pode ser esta: pode ser “içço” ou “ijjo”? Evidente que não. É um bom exercício mental.
Sexta aula:
Aula na sala de informática: pedi que procurassem “sites” sobre Emile Durkheim. Não sei se foi
uma boa proposta, porque há poucos sites voltados para o ensino médio e muitos “sites” universitários
com um linguajar difícil. Mas, pelo menos, foi bom para sair da caixa de concreto que é a sala de aula.
Eu poderia ter sugerido um “site” que eles gostam muito: o “Youtube”, com vídeos sobre todos os
assuntos, incluindo Sociologia e Durkheim. Mas, alguns computadores acessavam o “Youtube” e outros
não. Semanas depois, cheguei à conclusão que o melhor seria eu ter selecionado antes alguns sites e
dado a eles o endereço na internet para que, então, eles pesquisassem!
Vou ver se um assunto polêmico – suicídio, um dos temas dos estudos de Durkheim – produz uma
aula mais próxima, emocionalmente, dos interesses e das angústias dos adolescentes – quem de nós já
não pensou que abreviar a vida, abrevia suas dores? Há muitos professores que não querem falar sobre
isto, mas, por experiência própria, falar sobre algo que nos entristece, faz com que nos sintamos muitos
melhores, aliviando aquelas nossas lembranças latentes – este é o método freudiano, que a sua paciente
comparou à limpeza de uma chaminé.
Contudo, a pesquisa se mostrou estéril, porque os alunos apenas copiaram as frases e os termos
durkheimianos que encontraram no primeiro site que viram. Então, em vez de propor, na aula seguinte,
um trabalho em grupo, eu preferi debater com eles sobre o que tinham descoberto sobre Durkheim.
Sétima aula:
Mas, o debate sobre Durkheim encontrou dificuldades em duas das cinco turmas de primeiros
anos: eles não paravam um minuto de conversar e um deles perguntou se eu não fazia a chamada, para
que ele pudesse ir embora da aula! Eu lhe disse que eu era quem decidia quando fazer a chamada e não
ele, que ele por ser repetente deveria estar sentado na primeira fila. Eles fazem parte de uma geração que
foi condicionada a copiar um texto do quadro, responder a perguntas sozinhos ou em grupos, ficando o
professor à distância.
Oitava aula:
Há um ditado – água mole em pedra dura: insisti com o estudo em Durkheim. Levei-os à sala de
informática e pedi que procurassem nos computadores sobre casos de suicídio, em especial aos dois
principais tipos , segundo aquele sociólogo: egoísta, quando uma pessoa se mata porque só vê diante de
si um problema aparentemente insuperável e essa pessoa já não dá atenção às normas ou laços sociais
(muito comum entre solteiros e divorciados) e o altruísta, oposto ao egoísta, quando a pessoa está muito
ligada ao seu grupo social (casos mais comuns: pilotos japoneses kamikases na segunda guerra mundial
e os homens-bomba, no oriente-médio). Esqueci de mencionar os estudantes japoneses, sobrecarregados
com sua formação escolar, pressionados para terem as melhores notas e, assim, serem os primeiros, para
ao decepcionarem seus familiares!
Nona aula:
Fiz o seguinte trabalho final do trimestre: são questões que revisavam a matéria e eu fornecia a
quantidade de letras que a palavra tinha, incluindo uma letra, o que lembra um jogo que, no Brasil, se
chama de “jogo da forca”, pois se a pessoa errar, a cada erro, vai se desenhando uma pessoa em uma
forca, parte por parte do corpo. É, em resumo, um jogo e como um jogo ele ajuda a terminar com toda a
aura de seriedade ou excessiva formalidade de uma prova. Aliás, pedi que fizessem em grupo e não
individual.
Ficou assim:
(1) 1o nome do pai da sociologia, foi influenciado pela revolução francesa: A U G U S T O (7 letras)
(2) Ideais da revolução francesa: L I B E R D A D E (9 letras), F R A T E R N I D A D E (12 letras) e I
G U A L D A D E (9 letras).
(3) Trabalhavam de 12 a 18 horas por dia nas fábricas e nas minas de carvão: C R I A N Ç A S (8
letras).
(4) Graves problemas que a Sociologia procura resolver: A L C O O L I S M O (10 letras), D E S E M
P R E G O (10 letras) e V I O LÊ N C I A (9 letras).
(5) Ano 1 do calendário de Augusto Comte: 1 7 8 9.
(6) Classe social que liderou a revolução francesa e que enriqueceu explorando o trabalho dos operários
em suas indústrias: B U R G U E S I A.
(7) Estudou os suicídios e concluiu que eles são causados pela vida e regras estabelecidas em
sociedade: D U R K H E I M.
Procurei fazer questões diferentes em algumas turmas para evitar que eles de posse dos trabalhos
realizados com outros alunos apenas copiassem as respostas: em uma turma eu perguntei qual era o tipo
de suicídio no qual a pessoa só pensava sobre seu problema: E G O Í S T A. O que é curioso é que
muitos alunos quando perguntei se Comte tinha sido um dos revolucionários franceses, responderam
que sim, mesmo tendo sido repetitivo e falado muitas vezes sobre ele!
Além daquelas ideias mais conhecidas (todo homem nasce nu, pobre e condenado à morte e logo é
posto a ferros, nascemos bons e a sociedade nos corrompe, uma delas chamou minha atenção: “as
cidades são formigueiros” e o ideal seria voltar à vida natural ou, pelo menos, que os homens se
espalhassem pela terra. Lembrei meus alunos que tinha visto e lido uma teoria de que quando entre
animais (como ratos) há superpopulação, isto produz violência, abortos, canibalismo e, não sei se isto é
verdade, um aumento de casos de homossexualidade. Tirando esta última tese (acho que é preconceito) ,
as demais parecem provar que a humanidade não abandonou seu lado animal e o caos social é a tentativa
de cada um por si resolver seus problemas! Sei que eu poderia trabalhar melhor esta questão,
estimulando os alunos a observarem seres vivos vivendo em superpopulações.
E, para não ficarmos muito distantes da realidade brasileira, lhes perguntarei se um movimento
como a revolução francesa não poderia acontecer no Brasil? E, se sim, qual seria a nossa Bastilha,
símbolo da opressão a ser derrubado?
Os alunos participaram mais do que eu esperava. Desta vez, nos reunimos em círculo, mas não um
perfeito, até porque há alunos tímidos e não dá para forçá-los, pois podem se sentir maltratados, embora,
falando em público, ainda que umas poucas frases, isso os ajude a serem menos tímidos!
Bem, mas o que disseram os alunos?
- que o povo brasileiro é preguiçoso para fazer revolução;
- que há pequenas revoluções acontecendo, revoltas, o que inclui violência urbana e luta por
território para venda de drogas
- que não há um problema generalizado de fome, que pudesse causar uma revolução;
Embora tivessem participado mais do que o normal, não conseguiram relacionar, por exemplo, o
palácio de Versalhes que ficava distante do centro cultural, econômico, político de Paris a nossa
Brasília, distante das grandes capitais, que ficam costa litorânea ou, ainda, relacionar a Bastilha a
algum prédio público ou a um presídio.
Também, nesta aula, expusemos as principais teses de Rousseau, um dos grandes pensadores
iluministas, que influenciaram a revolução francesa: “os homens nascem nus e pobres” e tão logo são
“postos a ferros”, escravizados, que “são os pobres que permitem que os ricos sejam ricos”, desde que
eles (pobres) recebam o mínimo para sua subsistência.
Qual foi a tarefa que pedimos aos alunos? De acordo com o seu número na chamada encontrem o
número de um artigo da declaração dos direitos do homem e do cidadão, anotem-no e procurem uma
pesquisa que se relacione àquele artigo. Houve um problema: os artigos são de difícil compreensão para
um adolescente, mas o problema não é tão grande, pois o professor pode ajuda-los e, então, eles
iniciarão a busca pela notícia. Este exercício tem dois propósitos:
(1o) informar os estudantes de que todos os seres humanos têm direitos reconhecidos
internacionalmente, que tiveram origem na revolução francesa;
(2o) faze-los conhecer o que se passa no mundo, relacionando a valores muito importantes a todos
nós: igualdade perante a lei, liberdade de agir desde que respeite os direitos dos outros, justiça,
transparência dos atos governamentais, presunção de inocência até que se prove a culpa de alguém, etc.
Poderíamos ter feito a pesquisa nos utilizando a declaração de 1948, da Organização das Nações
Unidas ou, melhor ainda, a Constituição brasileira, mas resolvemos dar continuidade e concluir as
exposições sobre a origem da sociologia a partir da forte influência advinda da revolução francesa.
Outro ponto positivo é estimular o senso estético, apreciando uma imagem em preto e branco (ou
seria melhor dizer em tons de cinza), uma arte da primeira metade do século XX, apreciar, também, o
cinema não falado, embora nesse mesmo filme já se esboce algumas falas – Chaplin parece criticar a
fala no cinema quando diz no trecho em que estão apresentando uma máquina que alimentaria o operário
sem que ele perdesse tempo fazendo isso ele mesmo, que “o ato fala mais do que as palavras!”.
Vejamos que relação ou relações podem ser feitas? Em um hospital você tem pedidos de
atendimento (consultas) que passam pelos atendentes, enfermeiros aos médicos (a consulta final). Neste
“processo” que não é chamado industrial, mas de serviços (muda o nome apenas!), insumos são
acrescidos, como remédios, gazes, esparadrapos, agulhas e seringas, entre outros.
Em geral, os alunos esperavam encontrar as respostas prontas na internet e, só por isso, este
trabalho já valeu, pois eles precisaram pensar sobre os cargos que cada empresa precisa ter para produzir
os produtos ou prestar os serviços que elas produzem e prestam. Uma aluna criticou-me: por que eu não
dava as respostas uma vez que eu é que sou o professor? Lembrou-me de uma resposta idêntica que eu
dei a um professor de contabilidade que pediu que os alunos registrassem uma empresa na junta
comercial e eu lhe respondi que era dele a tarefa de nos dar esta informação.
Um conteúdo que poderíamos ter acrescido a este tipo de aula, sobre trabalho é o estudo de
diversas imagens de pirâmides sociais, desde os egípcios, astecas, renascentista, pré-socialistas e
capitalistas.
Perguntas: (1) como era a ordem das classes no período da revolução francesa? (2) como são
distribuídas as classes hoje no Brasil? (3) Reflita sobre as classes sociais ao longo da história,
identificando um bom número de semelhanças e diferenças entre elas.
E quem não concorda com a nossa atual hierarquia social? Há dois caminhos, penso eu, o retorno
da crença pela aplicação das ideias comunistas, sobreviventes na Coréia do Norte e em Cuba e, na
política da China, de um partido único ou, então, debater o cooperativismo.
A ocasião, também, é propícia para lhes apresentar as teorias do materialismo histórico e da mais
valia de Karl Marx, bem como, lhes apresentar a teoria do cooperativismo, como uma terceira
alternativa, tanto ao capitalismo, quanto ao socialismo/comunismo de Marx. E que tal uma visita a uma
cooperativa? Seria excelente, porém não foi possível entrar em contato com a “fogões geral”, que
tínhamos interesse especial, por se tratar de uma indústria que falida foi, pelo governo estadual, repassad
ao controle dos antigos empregados.
(1) "Alguém tinha deixado uma revista no banco, ao meu lado, e comecei a ler, achando
que assim ia parar de pensar no Professor Antolini e num milhão de outras coisas, pelo
menos durante algum tempo. Mas a porcaria do artigo que comecei a ler quase que me
fez sentir pior ainda. Era sobre os hormônios. Mostrava a aparência que a gente deve ter –
a cara, os olhos e tudo – quando os hormônios estão funcionando direito, e eu estava todo
ao contrário. Estava parecendo exatamente com o sujeito do artigo, que estava com os
hormônios todos funcionando errado. Por isso comecei a ficar preocupado com os meus
hormônios. Aí li outro artigo, sobre a maneira pela qual a gente pode saber se tem câncer
ou não. Dizia lá que, se a gente tem alguma ferida na boca que demora a sarar, então isso
é sinal de que a gente provavelmente está com câncer. E eu já estava com aquele
machucado na parte de dentro do lábio há umas duas semanas. (...) Calculei que devia
morrer dentro de uns dois meses, já que estava com câncer. Foi mesmo. Eu estava certo
de que ia morrer. Evidentemente, essa ideia não me deixou muito satisfeito."
(2) O trecho do parágrafo anterior é de um romance que, durante décadas, foi o livro de
cabeceira de milhões de jovens ao redor do mundo: O Apanhador no Campo de Centeio,
do americano J.D. Salinger. Lançado em 1951, ele é um registro magistral das
perplexidades, anseios, medos e descobertas de um adolescente que foge do colégio
interno, vaga sem destino certo e acaba internado numa clínica, por "esgotamento", onde
resolve fazer o relato de seu périplo. Quem leu o livro dificilmente esquece o nome do
personagem: Holden Caulfield, para quem tudo (ou quase tudo) é uma porcaria. E para
quem tudo (ou quase tudo) é motivo de saudade. Paradoxos de quem tem os hormônios
"funcionando errado", claro. Os adolescentes continuam a ter um quê de Holden Caulfield
dentro de si, mas mudaram muito desde que Salinger publicou seu romance. Mudaram
muito porque mudamos todos nós, e bastante. Em parte, houve evolução; em parte,
talvez, involução. Ganhou-se em liberdade e pragmatismo; perdeu-se em encantamento e
idealismo. Os jovens não poderiam ficar fora da curva dessa trajetória.
(3) VEJA foi a campo tentar descobrir como os adolescentes atuais poderiam ser
identificados se tomados como um todo. Sim, é uma generalização, e como toda
generalização deve ser olhada com cuidado. Mas quem sabe ela possa subsidiar pais
angustiados (e irritados) com moças e rapazes para quem, de uma hora para outra, eles,
antes tão adorados, se tornaram "ridículos". Durante dois meses, a revista ouviu dezenas
de jovens, pais, psicólogos e educadores sobre os desejos, dúvidas, receios e ambições da
adolescência dos anos 2000. Uma enquete com 527 pais e jovens de 13 a 19 anos de todo
o país, disponibilizada por uma semana no site VEJA.com, identificou hábitos e
comportamentos da geração que daqui a vinte anos estará no comando do país. Eis
algumas conclusões: os meninos e meninas que nasceram a partir de 1990 não almejam
fazer nenhum tipo de revolução – nem sexual nem política, como sonhavam os jovens dos
anos 60 e 70. Mudar o mundo não é com eles.
(4) O que querem mesmo é ganhar um bom dinheiro com seu trabalho. São também mais
conservadores em relação aos valores familiares (embora os pais, lógico, sejam
"ridículos"), de acordo com o maior estudo de hábitos e atitudes da população
adolescente brasileira, conduzido pela empresa de consultoria Research International.
Fruto da revolução tecnológica e da globalização, eles formam, ainda, a geração do "tudo-
ao-mesmo-tempo-e-agora" (uma das inúmeras expressões com as quais os especialistas
tentam defini-los). São capazes de realizar várias atividades ao mesmo tempo (as de
estudo, nem sempre a contento), porque celular, iPod, computador e videogame
praticamente viraram uma extensão do corpo e dos sentidos. É, enfim, uma juventude que
vive em rede, com tudo de bom e de ruim que isso significa. Afirma Felipe Mendes,
diretor-geral da Research International: "O que preocupa nesta geração é que eles são
concretos em relação a dinheiro e trabalho, mas muito básicos em seus sonhos e
impessoais e virtuais nos prazeres que deveriam ser reais".
(5) O fato de estarem sempre conectados os leva a ter interesse por mais assuntos e a
ser mais bem informados de maneira geral. O lado ruim é que raramente tentam
aprofundar-se em algum tema. Mudam de opinião com rapidez e frequência proporcionais
ao liga-desliga do computador. Mais do que ocorria nas gerações de jovens anteriores,
suas decisões costumam estar envoltas em interrogações, como se a vida fosse um eterno
teste de múltipla escolha. Plugados ao mundo, aos sites de relacionamentos como Orkut e
aos serviços de mensagens instantâneas, eles movem-se em rede e estão menos divididos
em tribos. E é justamente isso que os faz menos preconceituosos com as diferenças: 44%
dos participantes da pesquisa da Research International têm amigos próximos com uma
orientação sexual diferente da sua. É um dos melhores aspectos do lado bom.
(6) O frenesi da era digital ajuda a empurrar esses adolescentes a trocar de amores,
amizades, cursos e aspirações como quem troca de tênis. "É uma sucessão de reinícios,
com finais rápidos e indolores", define o sociólogo polonês Zygmunt Bauman. Mas, como
não é possível recusar sempre a vivência da dor, a contrapartida pode ser o aumento da
ansiedade em relação a relacionamentos pessoais e opções profissionais. "Você quer tudo
e, ao mesmo tempo, não sabe o que quer", diz Marcela Lucato, de 16 anos. A frase
resume bem o porquê de eles nunca se mostrarem completamente satisfeitos. São tantas
opções de escolha sobre o que fazer e aonde ir e tanta liberdade de decisão que eles se
perdem. "O melhor de ser jovem hoje é ter liberdade de escolha. Mas é difícil decidir, não
temos prioridades", afirma Giuliana Locoselli, de 16 anos.
(7) Está certo que uma das características da geração atual em relação às anteriores é o
fato de que moças e rapazes demoram mais para se decidir em relação à carreira a ser
seguida. O dado positivo é que, nesse meio-tempo, eles articulam uma rede de contatos
tão grandiosa que, no futuro, poderá ajudá-los profissionalmente. Apesar de todas as
incertezas, um trabalho que os faça ricos é o sonho de 64% dos adolescentes. Faz sentido:
os jovens de hoje estão caros. Caros, não, caríssimos. Eles custam cinco vezes mais do
que há trinta anos. E, para aumentar mais os gastos familiares, são grandes
influenciadores das compras dos próprios pais. Em nove de cada dez famílias que
adquirem eletroeletrônicos, a decisão de qual aparelho levar é deles. Cerca de 45% dos
adolescentes brasileiros correm às lojas assim que um novo gadget é lançado, segundo
uma pesquisa da empresa Deloitte.
(9) Com uma rede de conhecidos tão vasta, o número de festas é enorme. Se os pais
deixarem, eles saem de domingo a domingo. Nessas saídas, que podem se arrastar até o
dia seguinte, pode haver muita bebida e droga, especialmente as sintéticas. Uma
pesquisa da Organização das Nações Unidas revela que 35% dos adolescentes brasileiros
de 12 a 14 anos consumiram algum tipo de bebida alcoólica no mês anterior ao estudo – é
a taxa mais alta da América Latina. Entre os brasileiros de 15 a 16 anos, esse índice sobe
para 56%.
(10) As meninas são um capítulo à parte nesse cenário. Elas estão se expondo mais
precocemente que os meninos aos perigos do álcool e das drogas. Como elas
amadurecem antes, inclusive fisicamente, é mais fácil para a maioria entrar nas festas dos
mais velhos, onde a bebida corre sem nenhum controle. Basta uma visita a qualquer
supermercado numa noite de sábado para testemunhar grupos de adolescentes se
preparando para o que chamam de "esquenta" – ou seja, beber na casa de um deles antes
de ir para a festa. Muitos entram nas baladas com vodca em garrafas de água mineral.
Bem, Holden Caulfield não faria diferente...
(11) E em que reside a maior culpa dos pais de hoje? Em não saber dizer o velho, bom e
sonoro "não". É como se, para eles, negativas pertinentes a comportamentos inaceitáveis
equivalessem a um castigo físico, afirmam os especialistas em adolescentes. "Há ainda
um outro fator: a falta de cobrança. Ela tem como consequencia a falta de
responsabilidade na vida adulta", diz Silvana Leporace, coordenadora educacional do
Colégio Dante Alighieri, em São Paulo. Portanto, atenção: se hoje seria uma perversidade
colocar seu Holden Caulfield num internato ou algo que o valha, como fizeram os "velhos"
do personagem de Salinger, é um tremendo erro cair no extremo oposto – o de deixar
como está para ver como é que fica, enquanto se finge ser liberal. Dá para controlar um
adolescente em condições razoavelmente normais de temperatura e pressão ou, ao
menos, suportá-lo sem maiores traumas? Dá. Eis aí algumas sugestões de educadores e
psicólogos para que você não perca completamente a cabeça (uma parte dela é
aceitável):
(12) Quando o jovem bebe. Diante de evidências tão claras quanto as da série Law &
Order, os pais nunca devem perguntar: "Você bebeu?". Nesse caso, eles correm o risco de
ter dois problemas – a bebida e a mentira. É bom que os pais sejam firmes e informem o
jovem de que eles sabem da bebida. Proibir o filho de beber não tem efeito prático
nenhum. O melhor a fazer é explicar os riscos do consumo excessivo de álcool. Em geral,
conversas francas e amigáveis dão mais resultado que a gritaria.
(17) É um erro bater boca com um adolescente. Não leva a lugar algum. O ideal é deixá-lo
falando sozinho. Quando a situação se acalmar, de ambos os lados, é hora de sentar e
tentar conversar outra vez. Se pais e filhos caírem numa rotina de bate-boca, será preciso
buscar outros meios de comunicação – de preferência o e-mail, um instrumento ao qual o
adolescente está mais do que habituado.
(18)
(21) Rodrigo Bianchi, de 16 anos, não tem cara de nerd, não tem jeito de nerd,
mas é um nerd. Um nerd em meio a amigos não nerds. Esqueça o estereótipo do
menino esquisito, solitário, de comportamento entre o tímido e o
desastrado. Os adolescentes atuais não se dividem em tribos de aparência e preferências
definidas, como os jovens de quinze, vinte anos atrás. Um nerd contemporâneo pode,
inclusive, ser tão popular quanto o mais fofo da turma. A única diferença entre os dois é
que o primeiro sempre tira ótimas notas, nunca fica de recuperação e sempre entra de
férias antes dos colegas. "Presto atenção nas aulas, que é para não ter de estudar muito
antes das provas", diz Rodrigo.
(23) Festa de 15 anos, hoje, tem todo o ritual dos tempos de debutante da vovó: vestido
de baile, valsa, o príncipe, meninos de smoking. O que mudou foi a proporção que as
comemorações atuais tomaram. A mineira Ligia Lapertosa convidou 700 pessoas para
sua festa. A cerimônia aconteceu num shopping fictício, o LL Fashion Mall, imaginado pela
mãe de Ligia, repleto de fachadas de lojas de grifes. Durante a festa, a garota trocou de
vestido três vezes, exibiu um filme em que interpretava uma celebridade e distribuiu
sandálias com sua assinatura.
(26) Os leitores adolescentes vêm impulsionando o maior sucesso atual nas livrarias: na
lista de mais vendidos de VEJA, categoria ficção, o primeiro, o terceiro e o quarto lugares
pertencem a Eclipse, Crepúsculo e Lua Nova, da série de livros sobre vampiros colegiais
criada pela americana Stephenie Meyer. Os três títulos já venderam perto de 700 000
exemplares. Amanhecer, que encerra a série, deve ser lançado em junho pela Intrínseca.
Outras séries voltadas para a adolescência têm obtido números expressivos. Com onze
livros e já adaptada para a televisão, Gossip Girl, de Cecily von Ziegesar, crônica do
mundo das patricinhas de Nova York, vendeu 176 000 exemplares. É publicada pelo selo
jovem da editora Record, o Galera – que também lança no país os livros de Meg Cabot,
cuja série O Diário da Princesa, com onze títulos, vendeu mais de 460 000 exemplares. A
escritora brasileira Thalita Rebouças bateu nos 200 000 volumes, com nove títulos
devotados ao relacionamento das meninas com pais, amigas e professores – suas obras
de maior sucesso são Fala Sério, Mãe! e Fala Sério, Amiga!, publicadas pela Rocco Jovem.
(27) Mesmo no seu relacionamento com os livros, os jovens convergem fatalmente para a
internet, sede virtual de inúmeros fã-clubes. "O olho-no-olho já não é tão importante para
a geração atual", diz Thalita Rebouças, que se valeu do Orkut para promover os seus
livros e hoje mantém um site próprio. Tal como a música pop, a literatura jovem pode
suscitar aquela devoção incondicional de que só os adolescentes são capazes. Eis como a
estudante carioca Caroline Contente, de 14 anos, define Crepúsculo: "Esses livros são a
minha vida. O resto é passatempo". Ela já releu os livros dezenas de vezes, pendura fotos
do ator Robert Pattinson – o vampiro do filme Crepúsculo – no quarto e rompeu com um
namorado que não compartilhava de sua admiração pela série. Carol organizou um fã-
clube na internet e promove reuniões com amigas para debater os livros – que elas
admiram, sobretudo, por causa da heroína romântica. "Nós nos identificamos com a Bella.
Ela tem a coragem de lutar pelo seu amor", diz Carol. "Eu espero que um dia a gente
encontre o nosso Edward. Só não vai ser um vampiro."
(30) Esses dados levaram os pesquisadores a concluir que está em curso uma mudança
no perfil dos consumidores de baixa renda. Quanto mais jovens são os indivíduos desse
estrato, maior é a importância que se dá à qualidade e menor a que se confere a, por
exemplo, facilidades de pagamento, como o número máximo de prestações em um
parcelamento. "Os jovens estão elevando o seu padrão de consumo e isso vale também
para os que têm menor poder aquisitivo", resume o cientista político Alberto Carlos
Almeida, do Instituto Análise. Os jovens de baixa renda incorporaram hábitos antes
próprios dos compradores mais endinheirados. Como esses últimos, eles passaram a
procurar ofertas na internet e a comprar em lojas virtuais. Para quem vende na rede, é
uma clientela promissora. "Atender esse nicho de mercado se tornou uma obsessão de
muitas empresas", diz Almeida.
Nesta aula sobre adolescentes, eles apresentaram algum interesse maior, especialmente quando
falei sobre eles serem rotulados de geração “tudo-ao-mesmo-tempo-agora”, que se caracteriza por fazer
várias coisas paralelas, mas de um modo rápido, automático (mera cópia da internet) e sem muita
qualidade, de abordar o consumo excessivo de bebidas alcoólicas, de falar sobre as vantagens deles
serem uma geração digital, interligada a outros da sua idade, cujos efeitos são terem quase todos os dias
festas agendadas, conhecer pessoas com as quais poderão obter favores. Ainda sobre a reportagem,
mencionamos os gastos dos adolescentes de classe alta com roupas e a estimativa de quando do
orçamento familiar são dirigidos para eles.
Antecipei-lhes que na aula seguinte, ainda individualmente, como última nota do trimestre, iria
lhes pedir que sob a forma de rascunho escrevessem algo sobre um tipo de adolescente, ou sobre si
mesmo, ou sobre um grupo específico. Um aluno perguntou se por tipo eu não queria dizer tribo. Pode
ser. É que tipo é o termo que Max Weber usa quando estuda grupos sociais: tipos ideais, ou seja, rótulos
que atribuímos a pessoas para organizar em nossa mente de que elementos a sociedade é formada ou,
nesta tarefa, que subgrupos podemos identificar no grupo dos adolescentes.
Poderíamos ter falado (mas não falamos) sobre o estudo que Aristóteles fez das características dos
jovens da sua época, mas não o fizemos porque no artigo anterior havia muita semelhança com aquele
texto antigo.
Vigésima aula:
Realizamos uma prova de recuperação (ou revisão dos conteúdos do segundo trimestre), como a
secretaria da educação estadual e escola pedem, tarefa útil para relembrar o que muitos alunos sabem,
mas inútil para aqueles que não assistiram às aulas e não têm o conteúdo em seus cadernos.
Entre as perguntas da prova, listamos:
(1) qual foi a causa da revolução francesa? Muitos disseram que o “rei” Augusto Comte não
respeitava o povo. Quando pedi que comparassem aquele período com o momento atual
do Brasil, responderam que havia um conflito de raças e corrupção no governo, respostas
erradas, pois clero, nobreza e povo não eram raças e embora o rei, Luís XVI, se
apropriasse da riqueza da nação isto não significa corrupção, mas, sim, desinteresse pelo
povo acrescido de incompetência, que o levou a perda de poder e à guilhotina.
(2) Os homens segundo a carta dos direitos do homem são iguais perante o quê?
(3) O que foi a Bastilha?
(4) Que relação fizemos em aula entre o filme tempos modernos, de Chaplin e os dias de
hoje? (que há tarefas repetitivas nas empresas que conhecemos e em que trabalhamos,
desde a escola ao supermercado, o fast-food a um hotel ou hospital)
(5) Pedi que assinalassem um “v” ou “f” nas frases abaixo:
( ) nossos pais pertencem à geração “tudo-ao-mesmo-tempo-agora” (falso)
( ) há hoje pouco ou nenhum consumo de drogas e álcool entre os adolescentes (falso)
( ) a internet proporciona um maior número de relações, por exemplo, indicações de
emprego (verdadeiro)
As apresentações transcorreram muito bem, eles apresentaram pesquisas prévias feitas na internet e
acrescentaram fotos, vídeos, músicas e alguns alunos se vestiram de Góticos, Emos e Otakos (pessoas
que se vestem como personagens de histórias em quadrinhos ou animes japonesas). O professor precisa
apenas marcar datas para que os alunos acabem adiando sua participação por vergonha ou por preguiça.
Esta história pode parecer um fato absurdo, improvável, talvez uma lenda, mas ocorreu
recentemente:
PHNOM PENH, Camboja (AFP) - A "mulher da selva" cambojana Rochom P'ngieng, que recebeu
o apelido por supostamente ter passado 18 anos vivendo na selva, foi hospitalizada por se recusar
a comer, informaram seu pai e fontes médicas.
Rochom P'ngieng, que atualmente tem 28 anos, desapareceu quando era pequena, em 1989,
na selva de Ratanakkiri, 600 km ao nordeste da capital do país, Phonm Penh.Ela deixou a selva,
onde sempre andava nua e suja, no início de 2007, quando foi capturada ao tentar roubar comida
em uma fazenda. Não sabia falar e fazia ruídos como um animal. Sal Lu, o homem que afirma ser o
pai dela, declarou à AFP que Rochom P'ngieng foi internada por não se adaptar à vida em um
vilarejo."Ela se negou a comer arroz durante um mês. Ficou muito magra. Ainda não consegue falar
e age como se fosse um macaco. Na noite passada tirou os vestidos e tentou fugir pelo banheiro",
disse. Ele pedi que alguma organização de caridade assuma os cuidados da jovem.
As amizades influenciam?
Muito mais do que imaginamos. Em 1998, a psicóloga americana Judith Rich Harris
causou uma revolução nas teorias da personalidade ao afirmar que o convívio com os pais
é só um dos fatores que influenciam a personalidade dos filhos e um dos menos
importantes. No livro Diga-me com Quem Andas..., ela fala que as relações horizontais dos
6 aos 16 anos da criança com seus pares, o grupo de amigos da escola ou da vizinhança
são o grande definidor da personalidade adulta. A teoria de Judith explicaria por que pais
normais, que seguiram sempre as regras da boa educação, deparam com um filho
criminoso. Talvez nossos avós não estivessem errados ao se preocupar tanto com as más
companhias. A teoria também tem uma conseqüência aterradora: de que a educação teria
pouquíssimo efeito sobre os filhos. Eles não se tornam o que os pais querem que sejam
mas o que os amigos querem. Se é assim, então como educar os filhos?
O psicólogo Thomas Kindermann descobriu que crianças de um mesmo grupo tinham
notas e atitudes parecidas na escola. Se fizer parte de um grupo em que o desempenho
escolar é importante, a criança se estimula a ter melhores notas. Se não conseguir, é
provável que vá para outra panelinha, dos esportistas, por exemplo, que não consideram
as notas uma coisa superlegal.
Tipos de personalidade:
O gordinho engraçado: se não é o mais bonito ou o mais forte do grupo, conquista o
carinho e a atenção de todos de outro jeito: contando piadas.
A bonita e burra: a moça que nasce mais bonita que a média pode ter mais carinho dos
pais (que tratam cada filho de forma diferente) e ser facilmente aceita entre os amigos.
Mas essa herança pode ter um lado ruim: atraindo a atenção pela beleza,ela talvez não
desenvolva artimanhas para se destaca, correndo risco de ficar vazia e desinteressante.
O tímido e inteligente: por que algumas pessoas são abertas e sociáveis enquanto
outras são quietas e tímidas? Uma explicação é o jeito com que nossos pais nos ensinam
os sentimentos. O rapaz inteligente e introvertido pode ter aprendido com o pai a ser frio
e distante.
teste de sobrevivência:
Você e mais um grupo de amigos estão perdidos no interior de um grande Deserto africano, a 50km de
uma grande jazida de minério de ferro. O relógio marca 12 Horas. O termômetro indica uma temperatura
de 42º C. Só existem 15 objetos disponíveis para ajudá-los.
Classifique estes objetos por ordem de importância; numerando-os de 1 (o mais importante) a 15 (o
menos importante).
( ) Óculos Escuros
( ) Lanterna e 4 Pilhas
( ) Carta Aérea
( ) Canivete
( ) Bússola Magnética
( ) Capa de Chuva (Plástica)
( ) Caixa de Primeiros Socorros
( ) 1 Pára-Quedas
( ) 4 Litros de Vodka
( ) 1 Litro de Água (Por Pessoa)
( ) Pistola Automática 765
( ) 1 Pacote de 500 Gramas de Sal
( ) Livro Sobre “Animais do Deserto”
( ) Espelho de Bolso
( ) Agasalho (Tipo Sobretudo)
CLASSIFICAÇÃO REAL
1- ESPELHO DE BOLSO para dar sinal;
2- AGASALHO (Tipo Sobretudo) para proteger da perda de água por evaporação;
3- ÁGUA (1L por Pessoa) para recuperar a perda por evaporação;
4- LANTERNA (4 Pilhas) para dar sinal e como recipiente de água;
5- PÁRA-QUEDAS para proteção noturna;
6- CANIVETE para escavar e cortar cactos;
7- CAPA DE CHUVA (Plástica) para guardar água de eventual chuva;
8- PISTOLA AUTOMÁTICA 765 para dar sinal e usar como martelo;
9- ÓCULOS ESCUROS para proteger os olhos;
10- CAIXA DE PRIMEIROS SOCORROS porque o Deserto é asséptico;
11- BÚSSOLA MAGNÉTICA para usar o espelho e como sinal;
12- CARTA AÉREA serve como papel higiênico;
13- LIVRO tem o mesmo uso; pois comida gasta sal e desidrata;
14- VODKA (4 Litros) para acender o fogo ou resfriar o corpo;
15- SAL (500 Gramas) é melhor não usar; pois desidrata
Trigésima aula:
Uma última tarefa foi pedir que respondessem a um questionário sobre o livro de Darcy Ribeiro
que trata da origem do povo brasileiro. Por se tratar de um livro de cerca de 500 páginas oferecemos a
eles um resumo, pedido no início do ano e para aqueles que fizessem o “download” do resumo da
internet (http://www.scribd.com/doc/13394383/A-Origem-Do-Povo-Brasileiro)
Foi essa gente nossa, feita da carne de índios, alma de índios, de negros, de mulatos, que
fundou esse país. Esse paisão formidável, a maior faixa de terra fértil do mundo, bombardeada
pelo sol.
A invasão do Brasil: A revolução mercantil em Portugal e Espanha estimularam à procura por novas terras,
onde extraíssem matéria-prima e riquezas. Tal expansão recebeu o apoio da Igreja Católica (1454), que via aí
a oportunidade de expandir o catolicismo, tarefa que Deus teria dado ao homem branco. Portugal e Espanha
“gastaram gente aos milhões”, “acabaram com florestas, desmontam morros a procura de minerais (estima-se
que foram levados para Europa 3 milhões de quilates de diamantes e mil toneladas de ouro), “só a classe
dirigente permanece a mesma, predisposta a manter o povo gemendo e produzindo ”, não o que os povos
colonizados querem ou precisam, mas o que eles impõem à massa trabalhadora, que nem mesmo participa da
prosperidade.
Para os índios aqueles homens brancos eram gente do Deus-Sol (o criador ou Maíra), mas esta visão se
dissipa: “como o povo predileto sofre tantas privações?”, se referindo às doenças que os europeus lhe
trouxeram –coqueluche, tuberculose e sarampo, para as quais não tinham anticorpos. Assim, muitos índios
fogem para dentro da mata e outros passam a conviver com os seus novos senhores. Outros, deitavam em
suas redes e se deixavam morrer ali. Aos olhos dos índios, por que aqueles oriundos do mar precisavam
acumular todas as coisas? Temiam que as florestas fossem acabar? Em troca lhes davam machados,
canivetes, espelhos, tesouras, etc. Se uma tribo tinha uma ferramenta, a tribo do lado fazia uma guerra pra
tomá-la.
No ventre das mulheres indígenas começavam a surgir seres que não eram indígenas, meninas prenhadas
pelos homens brancos – e meninos que sabiam que não eram índios... que não eram europeus. O europeu não
aceitava como igual. O que eram? Brasilíndios, rejeitados pelo pai, europeu, filhos impuros desta terra, e pela
mãe, índia. São também chamados de “mamelucos”, nome que os jesuítas deram aos árabes que tomavam
crianças dos pais e as cuidavam em casa. Esses filhos das índias aprendem o nome das árvores, o nome
dos bichos, dão nome a cada rio... Eles aprenderam, dominaram parcialmente uma sabedoria que os índios
tinham composto em dez mil anos. Estes mamelucos eram caçadores de índios, para vender ou para serem
seus escravos.
Para os europeus, os índios eram pecadores, manipulados pelos feiticeiros e demônios,
preguiçosos, inúteis e o hábito do canibalismo mostrava quanto eram selvagens.
Somos um país racista, mas que respeita a identidade, pelo menos, à distância. Apesar da
desproporção das contribuições, nenhuma etnia se autodefiniu como centro étnico. O conjunto é
uno, uma etnia nacional, sem tensões entre raças, culturas e regiões. Há, sim, um brasileirismo
arraigado: torcemos pela seleção tal como se houvesse uma guerra entre povos.
O antropólogo classifica o brasileiro a partir de 3 tipos diferentes de mestiços: caboclos (pai
branco e mãe índia), mulatos (pai branco e mãe negra) e curibocas (pais negros e índios).
“A grande contribuição da cultura portuguesa aqui foi fazer o engenho de açúcar... movido por mão-de-
obra escrava. Por isso, começaram a trazer milhões de escravos da África. Metade morria na travessia, na
brutalidade da chegada, de tristeza, mas milhões deles incorporaram-se ao Brasil”. O custo do tráfico de
escravos nos 300 anos de escravidão foi de 160 milhões de libras-ouro, cerca de 50% do lucro obtido com a
venda do ouro e do açúcar . Os escravos negros vinham para o Brasil e eram dispersados por esta terra,
evitando que um mesmo povo (ou etnia) permanecesse unido. Embora, iguais na cor, falavam línguas
diferentes, o que os força a aprender o português, o idioma do seu capataz. Em geral, aos 15 anos eram
aprisionados como escravos, trocados por tabaco, aguardente e bugigangas, trabalhavam por 7 a 10 anos
seguidos e morriam de cansaço físico. Sofria vigilância constante e punição atroz. Havia um castigo
pedagógico preventivo, mas também mutilação de dedos, queimaduras, dentes quebrados, 300 chicotadas
para matar ou 50 por dia, para sobreviver. Se fugia, era marcado a ferro em brasa, cortado um tendão, tinha
uma bola de ferro amarrada ao pé ou então, era queimado vivo. Eles fizeram este país, construíram ele inteiro
e sempre foram tratados como se fossem o carvão que você joga na fornalha e quando você precisa mais
compra outro”.
“Todos nós somos carne da carne daqueles pretos e índios (torturados) e a mão possessa que os
supliciou”... “A doçura mais terna e a crueldade mais atroz aqui se conjugaram para fazer de nós a gente
sentida/ sofrida ”... Estima-se que em 3 séculos, o Brasil importou entre 4 a 13 milhões de africanos. Um e
cada quatro, eram mulheres – “eram o luxo que se davam os senhores e o capatazes, as mucamas, que até se
incorporavam à família (ex : Chica da Silva), como ama de leite. Chegavam a provocar ciúme nas senhoras
brancas, que mandavam arrancar seus dentes.
Em 1823, em uma revolta em Pernambuco, organizada por barbeiros, boticários, alfaiates, artesãos,
ferradores, etc, armados de trabucos, uma “multidão de gente livre e pobre” cantava assim: “marinheiros
(portugueses) e caiados (brancos). Todos devem se acabar, porque os pardos e o pretos, o país hão de
habitar”.
Quando da abolição, os negros saíam das fazendas, aliviados da brutalidade, dos castigos, à
procura de terrenos para viverem e plantarem milho e mandioca, mas acabaram por cair na
miséria, pois cada vez que se fixavam em um lugar, os fazendeiros se reuniam e os expulsavam,
dizendo que toda a terra que existia já tinha dono. Após 1888, os abolidos, grupos de escravos
famintos aceitavam trabalhar submissos às condições dos latifundiários (grandes proprietários de
terras). Outros, seguiam para as cidades, ambiente menos hostil, para os já formados bairros
africanos, onde encontrou negros já instalados e que viriam formar as futuras favelas.
Pergunta Darcy Ribeiro: por que alguns povos, mesmo pobres na etapa colônia, progrediram
aceleradamente, integrando-se à revolução industrial, enquanto outros se atrasam? Os povos
transplantados como os norte-americanos que vieram da Inglaterra, já se encontravam prontos,
(diferente) dos povos novos, que vão se construindo lentamente, como o Brasil, com a mistura de
índios, negros e brancos.
As classes sociais no Brasil lembram um funil invertido e não uma pirâmide, como em outros países. O
Patronato, o Patriciado e o Estamento gerencial são as classes dominantes. O Patronato, empresários que
exploram economicamente empregados, O Patriciado, tem poder de mando devido a seu cargo, como
generais, deputados, bispos, líderes sindicais, O Estamento gerencial de empresas estrangeiras, tecnocratas
competentes que controlam a mídia, forma a opinião pública, elege políticos. Abaixo desta cúpula, estão as
classes intermediárias ou os “setores mais dinâmicos”, são propensas a prestar homenagem às classes
dominantes, mantém a ordem vigente e são constituídas de pequenos oficiais, profissionais liberais, policiais,
professores, baixo-clero, etc. A seguir, vem as classes “subalternas” ou “núcleo mais combativo”, composta
por operários de fábricas, trabalhadores especializados, assalariados rurais, pequenos proprietários,
arrendatários, etc. Preocupam-se em proteger o que conquistaram. Depois, há uma grande massa de
oprimidos, o “componente majoritário” (que predomina), enxadeiros, bóias-frias-, empregadas domésticas,
serviços de limpeza, pequenas prostitutas, biscateiros, delinqüentes, mendigos, etc, em geral, analfabetos.
Para Darcy Ribeiro, os escravos de hoje são essas pessoas “subassalariados”, que infundem, com sua
presença, “pavor e pânico” pela ameaça de insurreição (revolução) social e só são capazes de “explosões” de
revolta, mas, em geral, aceitam seu destino de miséria, pois são incapazes de se organizarem politicamente,
como em sindicatos.
Houve um conflito entre os jesuítas e os mercadores que escravizavam os índios, como “gado humano”,
quase um bicho: e da ameaça de extinção dos índios, jesuítas construíram missões onde poderiam ensinar o
catolicismo. Para Darcy Ribeiro, as missões foram uma primeira experiência socialista.
Com o desemprego na Europa, no século 19, vêm para cá 7 milhões de pessoas. Quando da chegada de
outros povos imigrantes como italianos, alemães, japoneses, etc, a população brasileira já era numericamente
maciça (quatorze milhões de brasileiros) e definida etnicamente quando absorveu a cultura e a raça dos
imigrantes, diferente dos europeus que foram para a Argentina caíram em cima do povo argentino, paraguaio
e uruguaio que haviam feito seus países, que eram oitocentos mil, e disso saiu um povo europeizado.
Só não ocorreu secessão (fragmentação, independência dos estados) do Brasil, porque “em cada unidade
regional, havia representações locais da mesma camada dirigente (classe social)”... “Tal é o Brasil de hoje, na
etapa que atravessamos na luta pela existência. Já não há índios ameaçando seu destino. Também negros
desafricanizados se integraram nela com um contingente diferenciado, mas que não aspira a nenhuma
autonomia étnica. O próprio branco vai ficando cada vez mais moreno e até se orgulha disso”
Pergunta Darcy Ribeiro: “Por que alguns povos, mesmo pobres na etapa Colonial, progrediram
aceleradamente, integrando-se à revolução industrial, enquanto outros se atrasam?”. Sua explicação: os
povos transplantados, como os norte americanos que vieram da Inglaterra, já se encontram prontos, mas, os
povos novos, que vão se construindo mais lentamente, como o Brasil, com a mistura de índios, negros e
brancos. ... Um aglomerado de índios e africanos, reunidos contra a vontade e a administração local, sob
controle dos neo-brasileiros, filhos de europeus e índias ou negras, dependentes da metrópole (Portugal). Os
três séculos de economia agrária no Brasil “moeram e fundiram as matrizes indígena, negra e européia em
uma nova etnia” (p.261). O povo brasileiro tem “erupções de criatividade”: no culto a Iemanjá, que se
cultuava no dia 2 de fevereiro na Bahia e 8 de março em São Paulo, no RJ, foi alterado para 31/dezembro.
Temos a primeira santa que tem relações sexuais. Isso é uma coisa fantástica! Um povo que é capaz de
inventar uma coisa destas! Nunca houve depois da Grécia! À Iemanjá não se pede a cura da Aids, mas um
amante carinhoso ou que o marido não bata tanto. O negro guardou sobretudo sua espiritualidade, sua
religiosidade, seu sentido musical. (O brasileiro é) um povo singular, capaz de fazer coisas, por exemplo, a
beleza do Carnaval carioca, que é uma criação negra, a maior festa da Terra!.
O antropólogo identificou nas regiões do Brasil 5 tipos de mestiços ainda existentes hoje:
1. O Brasil Crioulo: representado pelos negros e mulatos na região dos engenhos de açúcar no nordeste
brasileiro, nas terras de Massapé e no recôncavo baiano. Depois da abolição, o ex-escravo ganhava um
pedaço de terra (fica como um agregado da fazenda, em terra dos outros) para produzir comida e comprar sal,
panos e satisfazer necessidades mais elementares. No século 19, a roda d´água e a tração animal são
substituídas pela máquina a vapor e os senhores de engenho são substituídos por empresas bancárias. Em
1963, com a ditadura militar, houve o retorno ao antigo poder dos senhores das fazendas (patronato), que
reagiram ao projeto de pagamento de salário mínimo, através da elevação do preço do açúcar.
2. O Brasil Caboclo: no século 19 e últimas décadas do séc. 20, foram para a Amazônia 500 mil
nordestinos (fugindo da seca) para trabalhar com extração de látex (borracha) das seringueiras e, por isso,
mais da metade dos caboclos que já viviam deste trabalho, foram desalojados para as cidades de Belém e
Manaus, perdendo-se a sabedoria milenar de viver nas florestas que eles herdaram dos índios. Em cada
seringal, os mestres ensinam a sangrar a árvore sem matá-la, colher o látex e depois defumá-lo em bolas de
borracha. Em cada 10-15 km raramente se encontra 200 seringueiras. Percorre-se, ainda hoje, duas vezes por
dia uma mesma estrada: de madrugada para sangrar as árvores e ajustar as tigelas ao tronco e na segunda
vez, para vertê-las num galão que levará para o rancho. Depois, trabalha na tarefa de coagulação do látex.
Além de coletor, dedicava-se à caça e à pesca e protegia-se das flechas dos índios.
Nos primeiros anos da presença dos portugueses na Amazônia, índios são escravizados para buscarem na
mata as “drogas da mata”, as especiarias, os produtos que a floresta oferece, como cacau, cravo, canela,
urucu, baunilha, açafrão, salsa parrilha, sementes, casacas, tubérculos, óleos e resinas - eles “foram o saber, o
nervo e o músculo dessa sociedade parasitária”. E isto porque nenhum colonizador sobreviveria na mata sem
esses índios que eram “seus olhos, mãos e pés”.
Há também a extração de minérios como manganês, no Amapá, e Cassiterita, em Rondônia e na
Amazônia, exploradas por uma multinacional americana – a Bethlehem Steel, cujo custo pago por ela é apenas
aquele que ela gasta para extrair e transportar o minério. Militares alemães sugeriram a Hitler que a
conquistasse, como importante ponto para a expansão germânica. Os Estados Unidos propuseram à ditadura
militar brasileira o uso da Amazônia por 99 anos para estudos.
3. O Brasil Sertanejo: No sertão encontra-se uma vegetação rara confinada de um lado pela floresta
da costa do atlântico, pela Amazônia e ao sul pela zona da mata. Nas faixas de florestas, há palmeiras de
buriti, carnaúba, babaçu, pastos raros e arbustos com troncos tortuosos devido a irregularidade das chuvas. A
criação de gado nesta região fornece carne, couro e bois para serviço e transporte, animais trazidos de Cabo
Verde, pelos portugueses, pertencendo inicialmente aos engenhos e depois a criadores especializados. Os
vaqueiros naquela época davam conta do rebanho e como pagamento separavam 1 cabeça de gado para ele
e três para o dono.
O trabalho de pastoreio moldou o homem e o gado da região: ambos diminuíram de tamanho, tornando-se
ossudos e secos de carne. Hoje, enquanto o gado cresce, alcançando ossatura mais ampla e recebe
tratamento, o vaqueiro e sua família, não. Apesar das enormes somas de dinheiro que vem do governo
federal, para ajudar os flagelados pela seca, são os “coronéis” (fazendeiros que monopolizam a terra) que se
apropriam dos recursos, “mais comovido pela perda dos eu gado... do que pelo trabalhador sertanejo”. Estas
somas de dinheiro vão para a construção de estradas e para açudes para o gado passar e beber água. Os
sertanejos permanecem itinerantes, pois vivendo por dez anos em uma propriedade, eles teriam direito a ela,
mas dependeriam de um registro no cartório, que fica distante e caro. Em contraste, políticos estaduais
concedem facilmente milhões de terras a donos que nunca as viram e que um dia desalojam sertanejos que
viviam nelas (isto chama-se “grilhagem”).
Diante de tanta miséria, o sertanejo que vive isolado no interior (diferente do que vive no litoral), tem uma
visão fatalista e conservadora sobre sua vidaPeriodicamente, anunciavam a vinda do messias –diziam “o
sertão vai virar mar e o mar vai virar sertão”. Um dos acontecimentos mais trágicos ocorreu em Canudos, sob
a liderança de Antônio Conselheiro, um profeta e reformador social, era visto pelos fazendeiros como
subversivo, que poderia estimular a mão-de-obra a abandonar as fazendas e reivindicar a divisão das terras.
Lá chegaram a 1000 casas. Outro fenômeno que surge no sertão é o cangaço: uma forma de banditismo,
formado por jagunços, que surgiu nas fazendas.
4. O Brasil Caipira: São os homens que dirigiam as bandeiras (exploração que adentrava ao interior do
Brasil), e a população paulista (mamelucos). Cada um deles possuía uma indiada cativa para o cultivo da
mandioca, feijão, milho, abóbora, tubérculos, tabaco, urucu, pimenta, caçadas e pesca. Lá só se falava a
língua tupi. Dormiam em redes, usavam gamelas, porongos, peneiras como as que os índios usavam, além de
armas, candeias de óleo. Consumiam rapadura e pinga. Cada família fiava e tecia algodão para as roupas de
uso diário e para os camisolões e ceroulas, para os homens e blusas largas e saias compridas, para as
mulheres. Andavam descalços, de chinelas ou de alpargatas. Não queriam apenas existir, como os índios, mas
estabelecer vínculos mercantis externos e aspirar a se tornar uma camada dominante, adquirindo artigos de
luxo e poder de influência e mando. Por um século e meio venderam mais de 300 mil índios para os engenhos
de açúcar.
As bandeiras serviam, também, mas para explorar ouro e diamantes. O padre Calógeras avalia que 1400
toneladas de ouro e 3 milhões de quilates de diamantes foram levados do Brasil-Colônia. Do ouro extraído por
Portugal quase todo foi para a Inglaterra, para pagar as suas importações, ouro que financiou a indústria
inglesa. Um novo tipo social surgia: o garimpeiro, que explorava clandestinamente o diamante, monopólio de
Portugal.
Quando Monteiro Lobato (além do sítio do pica-pau amarelo) criou o personagem Jeca Tatu , o fez como
um “piolho da terra”, uma praga incendiária que atiçava fogo à mata, destruindo as riquezas florestais para
plantar roçados, uma caricatura do caipira, destacando a preguiça, a verminose e o desalento que o faz
responder sempre: “não paga a pena” a qualquer proposta de trabalho que lhe faziam (ou entregava 50% da
produção ao patrão ou trabalhava por conta própria, pagando pelo uso da terra, com 1/3 da colheita. Outra
saída: ir para as cidades, marginalizando-se lá). O que Lobato fez foi descrever o caipira sob o ponto de vista
de um intelectual e fazendeiro, diante da experiência amarga de encaixar os caipiras no seu “sistema”. O que
Monteiro Lobato não viu foi o traumatismo cultural, o caipira marginalizado pelo despojo de suas terras, como
um produto residual natural do latifúndio agro-exportador. Somente mais tarde é que o escritor compreendeu
e defendeu a reforma agrária.
Outro tipo humano surgido foi o dos bóias-frias que vivem em condições piores do que as que vivem os
caipiras, cerca de 5 milhões de pessoas à espera da posse de terras em que possam trabalhar. Eles estão
presentes mais nos canaviais do que nas fazendas de café, isto porque os cafezais precisam de muita gente
apenas na derrubada da mata e nos 4 primeiros anos. Depois, só nas colheitas.
5. O Brasil Sulino: Foi a expansão dos paulistas ocupando a região sul do Brasil, antes dominada pelos
espanhóis, a causa que anexou esta região ao Brasil. No começo do século 18, paulistas e curitibanos vêm
para cá, instalarem-se como criadores de cavalos e muares e recrutam os gaúchos para o trato do gado. Sobre
os gaúchos (população de mestiços), estes surgem, segundo Darcy Ribeiro, dos filhos e filhas entre espanhóis
e portugueses com as índias guaranis. Havia um dito popular: “esta indiada é toda gaúcha”. Dedicavam-se ao
gado que se multiplicava naturalmente nas duas margens do rio da prata e que foram trazidos pelos jesuítas.
Com o esgotamento das minas de ouro e diamante e a pouca procura por gado do Sul, foi introduzida aqui a
técnica do charque, trazida pelos cearenses. Já a imagem do gaúcho montado em cavalo brioso, com
bombacha, botas, sombreiro, pala vistosa, revolver, adaga, dinheiro na guaiaca, boleadeiras, lenço no
pescoço, faixa na cintura e esporas chilenas, diz Darcy Ribeiro, ou é a imagem do patrão, fantasiado de
homem do campo, ou é de alguém que integra algum clube urbano (centro nativista) e não passa de folclore.
Já o “gaúcho novo”, será o peão empregado que cuida do gado, agora, mal pago, come menos e vive
maltrapilho. Apesar disso, o peão de estância é um privilegiado em comparação com os biscateiros, os que
vivem em terrenos baldios, os subocupados, que arranjam trabalhos esporadicamente, em tosquias ou esticar
os arames, todos eles chamados de “gaúchos-a-pé”. Já os que vivem como autônomos rurais, lavram o terreno
dos outros, pelo regime de “parceria”.
Mas, não se pode dizer que o povo do Sul tivesse origem apenas paulista. Havia, também lavradores
vindos das ilhas dos Açores em Portugal, que ocuparam a região litorânea, com lavoura: milho, mandioca,
feijões, abóboras, etc, enquanto outros fugiram desta “caipirização” cultivando trigo, os gaúchos, nos campos
da fronteira, com o pastoreio e os gringos, descendentes dos imigrantes europeus, viviam isolados do resto da
sociedade, o que fez com que o governo brasileiro exigisse o ensino do idioma e os recrutasse os gringos para
o exército. Com a distribuição legal de terras (sesmarias), em Rio grande, Pelotas, Viamão e missões, as
invernadas se tornam estâncias e o estancieiro se faz “caudilho”, contra ataque dos castelhanos,
acrescentando gado de outras bandas. Mais tarde, o estancieiro se tornará patrão, dono de matadouros e
frigoríficos. Os imensos campos livres do passado, agora, são retângulos, todos com donos. Entre as instâncias
há imensos corredores de aramados divisórios.
As dores do parto:
Nosso destino é nos unificarmos com todos os latino-americanos por nossa oposição comum ao mesmo
antagonista, a América anglo-saxônica, para fundarmos, tal como ocorre na comunidade européia, a nação
latino-americana sonhada por Bolívar. Hoje somos quinhentos milhões, amanhã seremos um bilhão,
contingente suficiente para encarar a latinidade em face dos blocos chineses, eslavos, árabes e neobritânicos.
Somos povos novos ainda na luta para fazermos a nós mesmos como um gênero humano novo que nunca
existiu antes. O Brasil é já a maior das nações neolatinas, com magnitude populacional e começa a sê-lo
também por sua criatividade artística e cultural. Precisa agora sê-lo no domínio da tecnologia da futura
civilização, para se fazer potência econômica, de progresso auto-sustentado. Estamos nos construindo na luta
para florescer amanhã como uma nova civilização, mestiça e tropical, orgulhosa de si mesma, mais alegre,
porque mais sofrida. Melhor, porque incorpora em si mais humanidade, mais generosa, porque aberta à
convivência com todas as nações e todas as culturas e porque está assentada na mais bela e luminosa
província da terra.
Tabelas extraídas da obra “O povo brasileiro”, escrita por Darcy Ribeiro (1996)
1) De que é feita essa “gente nossa”? da carne de índios, alma de índios, de negros, de mulatos (*)
2) Para os índios, aqueles homens brancos eram...? Por que rejeitaram esta primeira impressão?
aqueles homens brancos eram gente do Deus-Sol (o criador ou Maíra), mas esta visão se dissipa:
“como o povo predileto sofre tantas privações?”, se referindo às doenças que os europeus lhe
trouxeram –coqueluche, tuberculose e sarampo, para as quais não tinham anticorpos.
3) Aos olhos dos índios, por que os brancos precisavam acumular todas aquelas riquezas? Como
era a vida dos índios? Temiam que as florestas fossem acabar?
4) No ventre das mulheres indígenas começavam a surgir...? O que eram? Começavam a surgir
seres que não eram indígenas, meninas prenhadas pelos homens brancos – e meninos que sabiam
que não eram índios... que não eram europeus. O europeu não aceitava como igual. O que eram?
Brasilíndios, rejeitados pelo pai, europeu, filhos impuros desta terra, e pela mãe, índia.
5) Como os europeus viam os índios? Pecadores, manipulados pelos feiticeiros e demônios,
preguiçosos, inúteis e o hábito do canibalismo mostrava quanto eram selvagens (*)
6) Para Darcy Ribeiro, somos um povo racista, mas... que respeita a identidade, pelo menos, à
distância(*).
7) Quais os 3 tipos de mestiços que formaram o povo brasileiro? caboclos (pai branco e mãe índia),
mulatos (pai branco e mãe negra) e curibocas (pais negros e índios) (*).
8) Qual era a sabedoria dos índios? Aprendem o nome das árvores, o nome dos bichos, dão nome a
cada rio...
9) Por que foram trazidos milhões de escravos da África? Para fazer o engenho de açúcar... movido
por mão-de-obra escrava.
10) Quanto tempo viviam os escravos e que castigos sofriam? Em geral, aos 15 anos eram
aprisionados como escravos, trocados por tabaco, aguardente e bugigangas, trabalhavam por 7 a 10
anos seguidos e morriam de cansaço físico. Sofriam vigilância constante e punição atroz. Havia um
castigo pedagógico preventivo, mas também mutilação de dedos, queimaduras, dentes quebrados,
300 chicotadas para matar ou 50 por dia, para sobreviver. Se fugia, era marcado a ferro em brasa,
cortado um tendão, tinha uma bola de ferro amarrada ao pé ou então, era queimado vivo.
11) Quais os 2 destinos dos escravos libertos? Os abolidos, grupos de escravos famintos aceitavam
trabalhar submissos às condições dos latifundiários (grandes proprietários de terras). Outros,
seguiam para as cidades, ambiente menos hostil, para os já formados bairros africanos, onde
encontrou negros já instalados e que viriam formar as futuras favelas (*).
12) Por que alguns povos progrediram tanto e o Brasil, não? Os povos transplantados como os norte-
americanos que vieram da Inglaterra, já se encontravam prontos, (diferente) dos povos novos, que
vão se construindo lentamente, como o Brasil, com a mistura de índios, negros e brancos (*).
13) Quais os povos que formaram o Rio Grande do Sul? . No começo do século 18, paulistas e
curitibanos vêm para cá, instalarem-se como criadores de cavalos e muares e recrutam os gaúchos
para o trato do gado. Sobre os gaúchos (população de mestiços), estes surgem, segundo Darcy
Ribeiro, dos filhos e filhas entre espanhóis e portugueses com as índias guaranis. Também
lavradores vindos das ilhas dos Açores em Portugal e os gringos, descendentes dos imigrantes
europeus.
14) Quem eram os primeiros gaúchos? filhos e filhas entre espanhóis e portugueses com as índias
guaranis.
15) Qual é o nosso destino? Nosso destino é nos unificarmos com todos os latino-americanos por nossa
oposição comum ao mesmo antagonista, a América anglo-saxônica, para fundarmos, tal como ocorre
na comunidade européia, a nação latino-americana sonhada por Bolívar.