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Manuscritos do Novo Testamento: Uma introdução à paleografia e à crítica textual
Manuscritos do Novo Testamento: Uma introdução à paleografia e à crítica textual
Manuscritos do Novo Testamento: Uma introdução à paleografia e à crítica textual
E-book813 páginas10 horas

Manuscritos do Novo Testamento: Uma introdução à paleografia e à crítica textual

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Sobre este e-book

Quais são os manuscritos mais importantes do Novo Testamento?
Para responder a essa pergunta, é preciso recorrer à paleografia e à crítica textual. A paleografia trabalha com a datação dos manuscritos, como também com os recursos de caligrafia dos próprios manuscritos. Já a crítica textual avalia a confiabilidade do texto de cada manuscrito com respeito à recuperação do texto original do Novo Testamento grego.

Em Manuscritos do Novo Testamento, paleografia e crítica textual se unem para oferecer uma excelente introdução aos textos neotestamentários, oferecendo aos leitores uma visão da transmissão da Bíblia desde os primeiros séculos da era cristã.

Comfort explora a participação do escriba na produção dos escritos mais antigos do Novo Testamento, apresenta uma lista anotada de todos os manuscritos gregos importantes e as versões mais antigas. O objetivo principal é ajudar estudantes de teologia e pregadores da Palavra a interagir com o texto do Novo Testamento, começando pelo conhecimento e trabalho com os próprios manuscritos e depois pelo conhecimento e trabalho com as ferramentas de crítica textual.
IdiomaPortuguês
EditoraVida Nova
Data de lançamento16 de dez. de 2024
ISBN9786559670659
Manuscritos do Novo Testamento: Uma introdução à paleografia e à crítica textual

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    Manuscritos do Novo Testamento - Philip W. Comfort

    1

    As publicações manuscritas do Novo Testamento Grego

    Antes de os estudantes iniciarem seus estudos dos manuscritos do Novo Testamento e de sua crítica textual, eles precisam de alguma instrução a respeito da produção manuscrita do Novo Testamento nos primeiros séculos da igreja. Essa instrução ajudará os estudantes a entender como o Novo Testamento foi publicado, transmitido e distribuído para os primeiros cristãos. Portanto, neste capítulo vamos explorar sua publicação através da produção manuscrita. Examinaremos os manuscritos existentes do Novo Testamento e de outros textos cristãos para obter informações a respeito da publicação do Novo Testamento grego nos primeiros séculos da igreja. Iniciaremos com as publicações originais, então investigaremos as características dos manuscritos mais antigos em uma tentativa de reconstruir a história da publicação do Novo Testamento. Visto que a produção de manuscritos foi fundamental para a disseminação dos textos do Novo Testamento, nossos estudos devem começar aqui. Sem dúvida, a própria produção criou todas as variantes textuais em manuscritos sucessivos e criou a necessidade da crítica textual. Portanto, nossos estudos precisam começar com o processo de publicação, depois, examinar os próprios manuscritos (capítulos 2—4) e, então, estudar a crítica textual (capítulos 5—7).

    Definindo publicação

    Quando leitores contemporâneos pensam em publicação, eles imaginam um material escrito — sejam livros, sejam revistas, sejam jornais. Para as pessoas da Antiguidade, publicação significava tanto disseminação oral quanto escrita. Para que algo fosse publicado, como um poema ou uma proclamação política, era necessário que fosse disseminado para um número de pessoas por proclamação oral e/ou escrita. Na maioria das vezes, um relato escrito tornava-se um meio para a proclamação oral. Raramente, a forma escrita de um relato era a única maneira de algo ser publicado. Muitas pessoas na Antiguidade não eram capazes de ler; elas dependiam de uma transmissão oral para receber uma publicação.

    Assim, poetas antigos publicavam seus poemas mediante a proclamação oral. Homero publicou suas obras Ilíada e Odisseia oralmente; outros, depois de sua época, colocaram esses poemas na forma escrita. Sócrates, o importante filósofo grego, publicou suas ideias oralmente. Até onde sabemos, ele não as escreveu. Outras pessoas, particularmente Platão, transmitiu ao mundo um relato escrito dos esforços de publicação de Sócrates. A maioria dos poetas gregos do século 5 a.C. em diante escreveu seus poemas e os apresentou oralmente. Um exemplo notável disso é Píndaro, que viveu de 522 a 443 a.C. O maior de todos os poetas líricos escreveu poemas para serem recitados para atletas vitoriosos quando voltassem para casa das competições em Olímpia, Delfos, Nemeia e Corinto.

    Jesus, o poeta e profeta místico, seguiu a tradição da publicação oral. Conforme a informação que temos, ele não anotou seus ensinamentos. Ele publicou as boas novas por meio de proclamação oral. Muitos de seus ensinamentos foram apresentados de um modo poético semelhante às profecias do Antigo Testamento. A proclamação poética auxiliava a memorização. Jesus era também o mestre da parábola. Essas histórias eram simples, únicas e, portanto, fáceis de memorizar. Um exame dos Evangelhos indica que o programa de publicação de Jesus — por meio de suas viagens pela Galileia e Judeia e pela proclamação das boas novas do reino — foi ampla e efetiva. Milhares e milhares de pessoas ouviram a palavra do próprio Jesus.

    Em tempos antigos, o método de publicação oral foi mais efetivo do que o de publicação escrita. Livros eram caros para se produzir e muitas pessoas não tinham a capacidade de ler. A maioria dependia de uma proclamação oral e de uma recepção auditiva para receber mensagens. De fato, a maior parte da educação se baseava no discurso oral e recepção auditiva/memorização dos textos transmitidos. Assim, Jesus ensinou seus discípulos de forma oral, e eles guardavam seus ensinamentos de memória. Quando veio o tempo, muitos anos mais tarde, em que seus discípulos colocaram esses ensinamentos na forma escrita, eles foram ajudados pelo Espírito Santo, que lembraria os discípulos a respeito de tudo o que Jesus os havia ensinado (Jo 14.26). Os discípulos de Jesus, comissionados por ele, continuaram o mesmo trabalho de publicação após a morte e ressurreição de Jesus. Essa publicação é conhecida como o kerygma (palavra grega para proclamação). A palavra kerygma é tomada diretamente de uma prática bem conhecida nos tempos antigos. Um rei publicava seus decretos através de seu império por meio de um keryx (um pregoeiro da cidade ou arauto). Essa pessoa, que muitas vezes servia de confidente próximo ao rei, viajava por todo o reino, anunciando para todo o povo o que o rei desejasse tornar conhecido. Em português, nós o conhecemos como arauto. Cada um dos discípulos no Novo Testamento se considerava como o keryx — um arauto e publicador das Boas Novas.

    Paulo se autodenominou um arauto e um apóstolo (1Tm 2.7, NRSV; 2Tm 1.11, NRSV), pois sua função como apóstolo era ser um arauto. Paulo e os outros apóstolos do Novo Testamento tinham uma proclamação comum (kerygma) para levar ao mundo. Essa proclamação era uma publicação da morte, ressurreição e exaltação de Jesus. Primeiramente, a publicação era oral — por meio da pregação em várias cidades em todo o mundo greco-romano. Por fim, a publicação tornou-se tanto oral quanto escrita — por meio dos textos dos apóstolos, que eram proclamados nas igrejas em todo o mundo. Como pode se deduzir com base no livro de Atos e nos textos de Paulo, o querigma básico sempre focalizou a ressurreição de Jesus. Esse ato sobrenatural de Deus na história confirma as palavras e as obras de Jesus e constitui a base para a esperança cristã na imortalidade. Sem a ressurreição, a igreja não seria mais do que um grupo de pessoas religiosas bem intencionadas que haviam colocado a fé nos ensinos filosóficos e éticos superiores de um homem extraordinariamente talentoso. A ressurreição é prova inegável de que Jesus é quem afirmou ser. Portanto, o querigma é a declaração de que Cristo ressuscitou dos mortos e de que Deus, por meio desse grande ato, trouxe salvação.

    Os primeiros apóstolos proclamaram o querigma a todos os crentes. Ao mesmo tempo, eles relatavam as obras e palavras de Jesus. Portanto, os cristãos do século 1 recebiam inicialmente uma apresentação oral do evangelho dos apóstolos que tinham estado com Jesus (veja At 2.42) e, posteriormente, os documentos escritos que preservaram a mensagem oral e perpetuavam a tradição apostólica (veja Lc 1.1-4). A proclamação oral era considerada uma forma de instrução catequética (originária da palavra grega katecheo; veja BAGD, p. 423) — um professor relatava as palavras e obras de Jesus, e a congregação repetia de forma oral o que era ensinado e guardava esse ensino na memória. (Essa era a maneira pela qual todo ensino ocorria nos período helenista). De acordo com Gálatas 6.6, os professores na igreja antiga eram considerados catequistas, os proclamadores orais da palavra (veja tb. 1Co 14.19). De acordo com o prefácio de seu Evangelho (1.1-4), Lucas pretendia confirmar, por meio da palavra escrita, aquilo que Teófilo já tinha aprendido pelo catecismo — isto é, pela recitação oral. Assim, a palavra escrita no Evangelho de Lucas foi a reprodução escrita

    da proclamação oral.

    Após a morte dos apóstolos e daqueles que foram seus cooperadores imediatos, o texto escrito tornou-se mais importante. A segunda geração de cristãos (e as posteriores) provavelmente teria recebido o evangelho pela primeira vez por meio dos Evangelhos escritos. Mas até mesmo a maioria desses crentes não teria lido por si mesma o Evangelho; em vez disso, o Evangelho poderia ter sido lido para eles nas reuniões da igreja por aqueles que eram treinados na leitura oral (i.e., leitores). Dessa forma, o querigma teria continuado a ser publicado oralmente com a ajuda dos documentos escritos.

    De todos os apóstolos, Paulo foi provavelmente o mais efetivo arauto e publicador do querigma. Suas diversas jornadas apostólicas o levaram a centenas de cidades e vilas, onde podia proclamar as boas novas da ressurreição e salvação de Jesus. No devido tempo, Paulo percebeu que seus esforços de publicação eram limitados pelo espaço e pelo tempo — ele poderia estar apenas em um local por vez. Assim, Paulo expandiu seus esforços de publicação enviando cooperadores do evangelho e publicando epístolas encíclicas, que enviou com esses cooperadores (os quais, por sua vez, leriam essas cartas para várias igrejas). Os papiros e a pena se tornariam os mais convenientes meios de publicação das revelações de Paulo a respeito de Cristo e da igreja. (Isso é discutido em mais detalhes adiante.)

    Os apóstolos Pedro e João também se aproveitaram do meio da escrita para publicar seus relatos a respeito da vida e ensinos de Jesus, bem como de seus ensinos acerca da vida cristã. Assim como Paulo, eles primeiramente publicaram o querigma mediante proclamação oral. Mais tarde em sua vida, cada um desses importantes apóstolos publicou os relatos escritos do ministério de Jesus a fim de preservar uma apresentação apostólica precisa do querigma — aquela que perduraria após a morte deles. De acordo com a tradição, o Evangelho de Pedro chegou a nós por meio da pena de Marcos, e o próprio João escreveu um Evangelho em sua velhice. Esses dois apóstolos também publicaram epístolas recontando seus encontros pessoais com Jesus Cristo (veja 2Pe 1.12-21; 1Jo 1.1-4), suas proclamações da fé apostólica e suas exortações para uma vida cristã eficaz.

    A ideia principal nesta breve introdução a respeito do processo de publicação é que as boas novas do Novo Testamento vieram primeiramente em forma de proclamação oral, depois em forma escrita — principalmente para sustentar a continuação da proclamação oral originalmente anunciada pelos apóstolos escolhidos a dedo por Jesus. Se os apóstolos não tivessem registrado por escrito o querigma, se ele fosse transmitido apenas pela tradição oral, o evangelho teria sido continuamente mudado através das eras de acordo com o capricho de qualquer um que o proclamasse. Eventualmente, o evangelho teria se tornado totalmente diferente do que foi no princípio. Assim, a publicação escrita preserva a integridade da verdade apostólica conforme expressa pelos primeiros seguidores de Jesus. Geração após geração de cristãos tem dependido da validade desses documentos publicados para sua fé e vida.

    Os textos originais

    Para entender os primeiros estágios do texto escrito dos vários livros do Novo Testamento, creio que é útil usar a linguagem do mundo editorial. Em tempos antigos, assim como nos atuais, livros eram publicados. É claro que o número de cópias publicadas em tempos antigos era muito menor do que hoje em dia. No entanto, há muitos paralelos quanto ao processo.

    Um escritor contemporâneo escreve seu texto usando caneta e papel, máquina de escrever ou um computador. As palavras colocadas de forma escrita pela primeira vez são o texto original, ou o que é chamado de autógrafo. É possível que o escritor fique completamente satisfeito com o texto e nunca faça quaisquer outras alterações. Mas isso é raro. O cenário mais provável é que o escritor fará novas revisões com a intenção de melhorar o texto para uma possível publicação. Assim, o autor passará por muitos rascunhos antes de ser finalizado. Um autor contemporâneo pode também utilizar-se do serviço de um escritor fantasma profissional e/ou uma secretária (escriba) que transcreve um material ditado. O autor poderia então rever e revisar esse rascunho. Uma vez que o autor esteja satisfeito com seu rascunho final, o texto é enviado para uma editora. A editora então fará a edição do texto em cooperação com o autor e, então, publicará o primeiro texto autorizado. O texto autorizado é um texto arquétipo, o texto com base no qual todas as cópias iniciais da primeira impressão são produzidas. O texto original do autor, que está empacotado em alguma gaveta da mesa, será provavelmente muito diferente da forma final do texto arquétipo publicado. Em todo o caso, o trabalho final publicado é creditado ao autor e torna-se o texto padrão (ou manuscrito arquétipo) do qual todas as cópias devem ser feitas no futuro.

    A situação dos textos do Novo Testamento tem muitos paralelos com o processo de publicação que acabamos de descrever. Primeiro, um autor escreveria um livro — como João, compondo seu Evangelho, ou Paulo, ditando uma epístola. Esses textos são chamados autógrafos. Nós sabemos que muitos dos livros do Novo Testamento (especialmente as epístolas) foram ditados a um amanuense, e outros foram escritos pelo próprio autor. O procedimento comum para uma epístola ditada era que o amanuense anotasse as palavras do falante (muitas vezes de forma abreviada) e então produzisse a transcrição, que o autor poderia rever, editar e assinar com sua própria caligrafia. Duas epístolas do Novo Testamento fornecem o nome dos amanuenses: Tércio, da Carta aos Romanos (16.22), e Silvano (outro nome para Silas), de 1Pedro (5.12). Podemos perceber que Paulo deve ter ditado outras epístolas porque ele observou especificamente que fez a saudação final com sua própria caligrafia: 1Coríntios (16.21), Gálatas (6.11), Colossenses (4.18) e 2Tessalonicenses (3.17). Ele disse que fez isso no final de todas as suas epístolas para autenticá-las e protegê-las de falsificação. As palavras em 2Tessalonicenses 3.17 são bem interessantes, pois Paulo assinou a epístola com sua própria mão, dizendo: esta é a forma na qual eu escrevo (TA). Assim, ele confirmou sua assinatura genuína. Isso era uma prática comum em cartas escritas antigas — em que o autor se servia de um amanuense e depois assinava — veja, por exemplo, o Papiro de Oxirrinco 3057 (final do século 1/começo do século 2), considerado por alguns a carta cristã existente mais antiga¹ (excluindo as epístolas do NT); e veja o Papiro de Londres 2078 (datado entre 81-96 d.C.).

    Silas (conhecido também como Silvano) ajudou Pedro a escrever sua epístola (1Pe 5.12). Isso significa que Silas atuou como amanuense de Pedro, ou traduziu a carta de Pedro (do aramaico para o grego) enquanto Pedro ditava a carta, ou compôs a carta com base nos pensamentos de Pedro. Esta não era uma prática incomum na Antiguidade nem nos dias de hoje. Certas pessoas, que não são dotadas da habilidade de escrever, confiam essa tarefa a alguma outra pessoa, que coloca em palavras os pensamentos do autor. (Hoje em dia, essa pessoa que escreve o texto é muitas vezes chamada de escritor fantasma). Essa prática antiga de empregar ajuda de outros para escrever documentos poderia nos ajudar a entender por que há tamanhas discrepâncias no estilo entre as duas Epístolas de Pedro (1Pedro e 2Pedro). Em resumo, Pedro utilizou-se de dois diferentes escritores. Assim, 2Pedro contém os pensamentos finais de Pedro, escritos por outra pessoa (possivelmente Judas, que tem uma epístola semelhante a 2Pedro), e talvez publicada postumamente. A história também nos conta que Pedro foi o autor por trás do Evangelho de Marcos². Neste caso, isso se parece mais com uma autoria compartilhada — no sentido de que Pedro poderia ser creditado com a história/relato do Evangelho, e Marcos, com a apresentação literária do relato do Evangelho.

    É possível que Silvano (também conhecido como Silas) tenha sido um dos mais antigos escribas Cristãos. Ele foi um dos responsáveis por escrever a carta do Concílio de Jerusalém para Antioquia (At 15.22). Depois disso, ele é visto como cooperador próximo de Paulo e também de Pedro. Seu nome aparece no prólogo de 1 e 2Tessalonicenses (porque ele era um cooperador de Paulo), e, então, no final de 1Pedro (5.12). Alguns estudiosos veem semelhanças entre 1 e 2Tessalonicenses, o decreto de Atos 15 e 1 Pedro. Silas e/ou outros escribas cristãos proeminentes podem ter sido responsáveis por reunir a versão publicada de vários livros do Novo Testamento.³

    Em alguns livros do Novo Testamento, pode haver pequenas diferenças entre o autógrafo e o texto original publicado. Isso se aplica especialmente às cartas breves escritas pelo próprio autor, pois haveria poucos motivos para edição. Essa é a situação de 2João (v. 12), 3João (v. 13) e Judas (v. 3), e provavelmente de outras epístolas ocasionais (i.e., cartas escritas primariamente para atender necessidades de ocasião). Mas outros livros parecem ter passado por dois estágios: o livro foi primeiramente escrito; então foi editado para publicação. Os trabalhos publicados incluem os Quatro Evangelhos (originalmente publicados de maneira separada), Atos, Romanos, Efésios, Hebreus, 1Pedro e Apocalipse. Cada um desses livros, desde o início, foi planejado para uma audiência maior do que uma localidade. Por volta do final do século 1, é muito provável que havia publicações adicionais dos Evangelhos em uma coleção, bem como uma coleção das Epístolas Paulinas, cada uma delas podendo ser denominada autorizada, visto que eram produzidas sob a orientação de algum cooperador dos apóstolos (como Silvano).

    Características dos textos originais

    Nenhum dos autógrafos ou textos arquétipos de qualquer um dos livros do Novo Testamento existe nos dias de hoje; portanto, não sabemos exatamente como eles eram. Entretanto, com base no que se conhece das fontes de documentos existentes do século 1 e utilizando um pouco de imaginação criativa, poderíamos supor que qualquer um ou todos os escritos originais do Novo Testamento poderiam ter várias das seguintes características.

    Caligrafia dos autógrafos

    Os próprios autógrafos, como os primeiros textos escritos, poderiam ter sido de qualquer tipo de caligrafia. Seria de esperar que esses textos não fossem necessariamente bem elaborados, uma vez que estariam ou poderiam estar sujeitos à edição. Em outras palavras, o autógrafo poderia ser semelhante ao que nós chamamos de primeiro rascunho. Se víssemos o primeiro rascunho de um autógrafo, poderia haver correções editoriais escritas entre as linhas ou nas margens, quer pelo autor, quer por um amanuense, quer por ambos. De fato, a melhor maneira de identificar um autógrafo (em seu primeiro rascunho) é a presença de correções significativas escritas pela mesma mão que escreveu o corpo principal do texto. O Papiro de Oxirrinco 2070, um diálogo antijudaico (supostamente escrito por um cristão), é um excelente exemplo de um autógrafo, pois ele tem muitas correções escritas pela mesma mão que produziu o texto. Supõe-se que autores como Lucas e o escritor do livro de Hebreus poderiam ter corrigido seus próprios textos antes da publicação. Outros escritores do Novo Testamento parecem ter deixado seus escritos serem publicados sem passarem por edição minuciosa. Acredita-se que isso se aplica, por exemplo, a alguns dos textos de Paulo que têm anacolutos em muitas partes — a indicação direta de ditado deixado sem correção (veja, p. ex., Ef 3.18). Também se pensa o mesmo de Apocalipse de João, que traz marcas do registro de João a respeito de sua revelação, publicado então sem correção de muitos erros gramaticais (veja, p. ex., Ap 1.4,15; 10.7; 11.1; 14.19; 16.4).

    Museus e bibliotecas ao redor do mundo têm centenas (se não milhares) de manuscritos de textos do século 1 com o que poderia ser chamado de uma grafia documentária (descrita adiante). Esses manuscritos exibem uma ampla variedade de caligrafias que deixaram seus estilos de escrita em cartas e documentos daquela época. Eu sugeriria que o leitor desse uma olhada no número de excelentes livros sobre o assunto, os quais apresentam fotografias e descrições de manuscritos desse período. Para iniciantes, eu recomendo as seguintes obras: Greek literary hands (GLH), de C. H. Roberts; Greek manuscripts of the ancient world (GMAW), de E. G. Turner; e La Papirologia, Orsolina Montevecchi. Para ser mais específico, eu sugeriria que os seguintes manuscritos poderiam dar uma ideia geral a respeito da aparência que os autógrafos do Novo Testamento poderiam ter.

    P. London 2078 (81-96 d.C.);

    P. Fayum 110 (94 d.C.) (veja GLH 11b);

    P. Oxirrinco 270 (94 d.C.);

    P. Oxirrinco 3057, que supõe-se ser a mais antiga carta cristã (fim do século 1/início do século 2).

    Esses manuscritos apresentam uma caligrafia legível, embora escritos com um pouco de pressa. Definitivamente, não são obras sem defeitos — ou seja, não são o tipo de produção que alguém esperaria ver em um primeiro texto publicado, se o autor tivesse a intenção de causar uma boa impressão. Outro manuscrito, 𝔓⁵² (um papiro manuscrito de João datado de c. 110), também dá uma ideia do que alguém poderia ver em um autógrafo. A escrita está legível, realizada de uma forma um tanto quanto apressada, em um estilo de modelagem casual encontrado em P. Fayum 110.

    Diferentes estilos de caligrafia nos autógrafos

    Se fôssemos procurar um autógrafo, poderíamos também procurar dois diferentes tipos de caligrafia no texto — o do amanuense e o do autor. No período helenista, era comum um autor ou autora de uma carta ditar a carta ou um documento oficial para seu amanuense e, depois, assinar com sua própria caligrafia — geralmente em escrita cursiva para distinguir sua assinatura pessoal. Há incontáveis exemplos deste fenômeno nos papiros existentes de cartas e documentos. Para bons exemplos, remeto o leitor ao P. Fayum 110 (110 d.C.; para a foto, veja p. 197 neste volume); P. London II, 308 (146 d.C.; para a foto, veja Montevecci, lâmina 52); P. Oxirrinco 246 (66 d.C.); P. Oxirrinco 286 (82 d.C.); P. Oxirrinco 3057 (c. 100, talvez a mais antiga carta cristã). Outro exemplo notável é uma carta sobre o envio de livros entre Alexandria e Oxirrinco. A carta original, conhecida como P. Oxirrinco 2192, mostra o corpo principal da carta escrito em uma caligrafia, seguido por três notas curtas em três caligrafias distintas.

    Em três epístolas de Paulo, vemos explicitamente referências à prática do autor assinar de seu próprio punho (1Co 16.21; Cl 4.18; 2Ts 3.17,18). Em 2Tessalonicenses 3.17,18, Paulo disse: Eu, Paulo, escrevo esta saudação de meu próprio punho, que é a minha assinatura em todas as cartas — esta é a forma que eu escrevo (TA). Nesse trecho, Paulo conclui a epístola com sua assinatura própria, provavelmente com uma escrita cursiva (de modo a indicar uma distinção pessoal). Em outras duas cartas (Gl 6.11-18; Fm 19-25), Paulo tomou o estilo em suas mãos e escreveu algo de próprio punho — e provavelmente continuou a escrever até o fim da carta. Em Gálatas 6.11, ele observou que escreveu em letras grandes — isto é, maiores do que as da escrita do amanuense. (A variante textual em Gl 6.11 indica que ele escreveu com uma caligrafia diferente.)⁵ Em Filemom, ele tomou a pena do amanuense e escreveu de seu próprio punho: Eu, Paulo, pagarei de volta (TA). Essas são as únicas referências explícitas de que Paulo escreveu de seu próprio punho. No entanto, pode-se concluir que todas as saudações finais de Paulo de graça e paz teriam sido escritas de seu próprio punho. Isso incluiria Romanos 15.33 (pressupondo que o cap. 16 seja um anexo à parte; veja 𝔓⁴⁶); 1Coríntios 16.21-24; 2Coríntios 13.13; Gálatas 6.11-18; Efésios 6.23,24; Filipenses 4.21-23; Colossenses 4.18; 1Tessalonicenses 5.26-28; 2Tessalonicenses 3.17,18; 1Timóteo 6.21b; 2Timóteo 6.22; Tito 3.15; Filemom 19-25.

    Por extensão, a mesma distinção de grafias talvez seja encontrada em outras cartas do Novo Testamento. Essa distinção incluiria as saudações finais e bênçãos em Hebreus 13.24,25; 1Pedro 5.12-14; 2João 13; 3João 14; e Apocalipse 22.21. Se o autor também escreveu a doxologia final, a grafia distinta abrangeria Romanos 16.25-27 (que aparece no final do cap. 14 em alguns manuscritos e no final do cap. 15 em 𝔓⁴⁶); 2Pedro 3.18; Judas 24-25 — pressupondo, é claro, que essas passagens faziam parte dos textos originais. Assim, somente duas epístolas do Novo Testamento não teriam caligrafia especial em seu fim — a saber, Tiago e 1João. Creio que 2João e 3João foram escritas do início ao fim por uma mesma caligrafia — a do autor (veja 2Jo 12 e 3Jo 13).

    Também é possível que um autógrafo do Evangelho de João, na segunda edição, que inclui o capítulo 21, poderia revelar uma caligrafia diferente de João 21.24b, em que é dito: e nós sabemos que o seu testemunho é verdadeiro... (TA). Provavelmente, essa é uma confirmação de que alguns dos contemporâneos de João sabiam que o que João escreveu era verdade. Alguns estudiosos pensam que esses contemporâneos eram os presbíteros de Éfeso. (João residiu em Éfeso em seus últimos anos.) Westcott escreveu: As palavras foram provavelmente acrescentadas pelos presbíteros de Éfeso, para os quais a narrativa anterior havia sido transmitida tanto de forma oral quanto escrita.⁶ No autógrafo, isso poderia aparecer em uma caligrafia distinta, uma forma diferente do restante do texto.

    Finais mais breves nos autógrafos do que em manuscritos posteriores

    Os autógrafos (e/ou arquétipos) talvez tenham finais mais breves do que vemos em manuscritos posteriores. Se, por sorte, uma pessoa encontrasse o primeiro autógrafo do Evangelho de João, ela perceberia que esse documento terminaria em João 20.31. Claramente, o último capítulo do Evangelho (21) foi anexado em algum momento mais tarde. Poderia ter sido acrescentado no segundo rascunho, antes da publicação ou anexado como um epílogo para uma publicação em sua segunda edição.

    Alguém que descobrisse o autógrafo do Evangelho de Marcos poderia encontrar um manuscrito que terminasse em 16.8 (como nos Códices Sinaítico e Vaticano) — ou mais provavelmente, em minha opinião, essa pessoa veria que esse documento terminaria com alguma palavra logo após a expressão ephobounto gar (pois elas estavam com medo, TA), pois não acho que combina com as palavras anteriores (kai oudeni ouden eipan [e elas não disseram nada a ninguém]), mas inicia um novo pensamento, conforme costuma ser a função da palavra gar. Quem poderia terminar uma sentença com essa palavra, quanto mais um Evangelho?⁸ Assim, parece lógico que a próxima sentença diz respeito ao medo das mulheres, que, eventualmente, teria sido aliviado por algum tipo de aparecimento posterior do Jesus ressurreto. Em resumo, creio que a descoberta do manuscrito original, antes da perda da última folha do códice de Marcos, poderia mostrar algum tipo de fraseado distinto daqueles acrescentados em vários manuscritos existentes.

    Também é provável que muitas conclusões doxológicas e bênçãos nas epístolas do Novo Testamento poderiam estar ausentes ou serem significativamente mais breves do que aquilo que é revelado nos manuscritos posteriores. Variações textuais em quase todos os versículos finais, bem como em textos breves em muitos dos manuscritos mais antigos, fortemente sugerem que os finais originais da maioria das epístolas eram breves e amáveis. Vamos começar com a última palavra que aparece em muitos manuscritos — a palavra amen. Um estudo da evidência textual revela que em quase todas as instâncias, a palavra amen é um acréscimo de escriba. Somente três epístolas (Romanos, Gálatas, Judas) parecem ter um genuíno amen como última palavra. Sem dúvida, a palavra amen foi acrescentada para apresentação oral e litúrgica. (A palavra amen também foi anexada em manuscritos posteriores no fim de cada Evangelho e em Atos.)

    Quando estudamos as outras características dos versículos finais — as saudações finais, as bênçãos de graça e paz e algumas doxologias — fica evidente que foram expandidas no processo da transmissão textual. Por exemplo, pode-se olhar as variantes textuais de versículos como Filipenses 4.23; 2Timóteo 4.22; Tito 3.15; 1Pedro 5.14; 2Pedro 3.18; Judas 25 e claramente ver expansões. Dois outros exemplos são dignos de nota. O papiro 𝔓⁸⁷ do século 2 conclui o livro de Filemom com a concisa expressão: Graça seja contigo, em oposição à leitura mais completa: A graça do Senhor Jesus Cristo seja com teu espírito. E o papiro 𝔓⁷² do século 3 termina 1Pedro com a redação: Saudai-vos uns aos outros com beijo de amor, sem o acréscimo: Paz seja com todos os que estão em Cristo, conforme encontrado em todos os outros manuscritos. Esses dois finais mais breves provavelmente revelam um texto mais antigo, mais escasso — mais próximo da aparência dos autógrafos.

    Sem inscrição ou assinatura

    Os textos originais, tantos os autógrafos quanto os arquétipos publicados, não teriam inscrições (títulos) ou assinaturas. Tudo isso foi acrescentado mais tarde. Nenhum dos Quatro Evangelhos foi intitulado Evangelho (euangelion), pois essa é uma descrição do século 2 sobre esses textos. É possível que o códice original de 𝔓⁶⁶ tenha sido deixado sem título. O título Euangelion kata Ioannen (Evangelho segundo João) talvez seja o acréscimo de um copista posterior (veja comentários a respeito de 𝔓⁶⁶ no cap. 3). O livro de Atos não teria sido intitulado dessa forma por Lucas, e João não colocou o título Revelação em seu apocalipse. As epístolas, por natureza e disposição, não teriam sido intituladas. Algumas epístolas encíclicas, como a que conhecemos por Efésios, não tinham o nome da cidade no endereço de abertura. Sabemos isso porque as palavras em Éfeso (em Ef 1.1) estão ausentes em três dos manuscritos mais antigos (𝔓⁴⁶ א B) e pelo fato de que o nome da cidade foi preenchido enquanto a carta circulava de cidade em cidade. Assim, o autógrafo poderia ter iniciado com palavras dirigidas ao destinatário como aos crentes que estão em [nome da cidade] e fiéis em Jesus Cristo.

    A presença de nomina sacra

    Os autógrafos podem ter ou não incluído os principais nomina sacra para Kurios (Senhor), Christos (Cristo), Iesous (Jesus), e theos (Deus) em suas formas mais antigas. Até agora, não há nenhum manuscrito do Novo Testamento descoberto que mostra esses títulos divinos escritos de alguma maneira diferente da forma nomina sacra. Esses manuscritos remontam ao fim do século 1 e o início do século 2. Assim, parece razoável que os nomina sacra tenham sido incluídos nos textos originais, ou, em caso contrário, ao menos nas mais antigas publicações. Eu apresento uma análise completa desse fenômeno no capítulo 3.

    A caligrafia dos arquétipos

    A história da caligrafia dos textos arquétipos é diferente da dos autógrafos porque os textos arquétipos publicados normalmente tinham em si uma aparência mais refinada. Portanto, a escrita provavelmente teria sido o que é geralmente chamado de caligrafia profissional ou, ao menos, escrita documental reformada (uma descrição completa desse tipo de caligrafia é encontrada adiante). Se o autor utiliza os serviços de um escriba profissional para produzir o seu texto arquétipo, esse texto poderia ter um desses tipos de aparência caligráfica. Se o próprio autor produzisse seu arquétipo, então, as características caligráficas poderiam ser inferiores — a menos que, claro, o autor também fosse um escriba treinado.

    Permitindo-me aqui um pouco de pensamento criativo, eu imaginaria a escrita de muitos dos textos arquétipos do Novo Testamento de uma forma semelhante ao estilo de caligrafia dos Rolos dos Profetas Menores em Grego de Nahal Hever (8Hev XIIgr), que foram datados do início do século 1 d.C. — um pouco mais cedo do que os autógrafos do Novo Testamento. Os manuscritos podem ter uma correspondência mais próxima com os manuscritos mais antigos do Novo Testamento, visto que as práticas judaicas de escrita podem ter transitado entre os escribas judeus cristãos. Também acho que alguns dos manuscritos gregos do Antigo Testamento do fim do século 1 e início do século 2, produzidos por cristãos, poderiam trazer alguma semelhança com o que podemos ver nos manuscritos arquétipos do Novo Testamento entre a metade e o final do século 1. Estou pensando particularmente no manuscrito de Chester Beatty VI (Números e Deuteronômio), que exibe uma boa caligrafia romana, comum do período. Eu ainda tenho em mente P. Yale 1 (Gênesis) e o P. Baden 4.56 (Êxodo e Deuteronômio), embora ambos sejam mais irregulares em aparência do que o manuscrito de Beatty.

    Outros manuscritos não bíblicos com uma aparência semelhante à de um manuscrito documental reformado, datados da metade do século 1 (a época de produção da maioria dos livros do Novo Testamento), são os seguintes:

    P. Oxirrinco 2555 (posterior a 46 d.C.);

    P. Oxirrinco 3700 (anterior a 48-49 d.C.);

    P. Oxirrinco 2471 (c. 50 d.C.) (para a foto, veja GMAW, p. 64), P. Med. 70.01 (55 d.C.) (para a foto, veja Montev, p. 42);

    P. Oxirrinco 246 (66 d.C.) (para a foto, veja GLH 10c).

    O estilo de caligrafia desses manuscritos talvez pudesse ser semelhante ao que veríamos em um manuscrito de um livro do Novo Testamento do século 1, nesse caso eu imaginaria que o mais antigo dos textos do Novo Testamento teria sido escrito por escritores familiarizados com a produção de textos documentais e, portanto, tentariam dar a eles a melhor aparência possível. Consequentemente, a aparência poderia ser documental reformada (descrita adiante). Entretanto, se as publicações mais antigas foram produzidas por escribas profissionais acostumados a produzir textos literários, a aparência poderia ser a de uma escrita profissional, como encontrada em alguns dos seguintes manuscritos do século 1:

    P. Fayum 6 (início do século 1);

    P. Fayum 7 (início do século 1);

    P. Oxirrinco 2987 (entre 78 e 79 d.C.).

    Em minha perspectiva, nenhum dos manuscritos existentes do Novo Testamento tem uma aparência dos manuscritos da metade do século 1. Uns poucos manuscritos do Novo Testamento (a saber, 𝔓⁵² e 𝔓¹⁰⁴) se assemelham à caligrafia do fim do século 1 ou início do século 2. (Eles são discutidos em detalhes no capítulo 3.)

    Por fim, devo enfatizar que tenho me permitido alguma reconstrução criativa aqui — com o propósito de dar aos alunos alguma ideia de como os autógrafos e arquétipos dos livros individuais do Novo Testamento podem ter se parecido.

    A publicação dos livros do Novo Testamento

    Antes de iniciar uma análise a respeito da produção manuscrita dos livros do Novo Testamento, é importante apresentar uma visão geral sobre o processo antigo de publicação de livros individuais e coleção de livros (como os Quatro Evangelhos e as principais Epístolas Paulinas), pois ambos são essenciais para o entendimento das etapas iniciais de transmissão do texto do Novo Testamento.

    A publicação dos escritos do Novo Testamento aconteceu em várias etapas: primeira, como escritos individuais; segunda, como coleções (como os Quatro Evangelhos e as principais Epístolas Paulinas); terceira, como uma entidade inteira, o Novo Testamento (com todos os 27 livros do cânon). Os textos individuais foram publicados entre 49 e 90 d.C.; as coleções paulinas foram publicadas entre 100-125 d.C., e as coleções do Evangelho foram publicadas no início do século 2. O Novo Testamento inteiro não foi publicado como uma unidade até o início do século 4 — e, nesse período, foi incluído com o Antigo Testamento grego em um códice (como no Códice de Vaticano e no Códice Sinaítico).

    Na análise a seguir, focalizo, antes de tudo, as primeiras duas fases da publicação. Por isso, não poderia seguir o padrão estabelecido por David Trobisch, em The first edition of the New Testament [A primeira edição do Novo Testamento], que concentra sua energia no que chama de Edição Canônica do Novo Testamento (com todos os 27 livros). Ele é cuidadoso em não datar essa edição, mas não poderia ter ocorrido antes do século 3.⁹ Assim, o trabalho editorial de que ele trata é um esforço de publicação muito posterior ao que eu imagino. O processo editorial que analiso pertence à publicação original com supervisão autoral (na primeira etapa) e a coleção desses textos em grandes volumes (na segunda etapa). Quanto às principais Epístolas Paulinas, o próprio Paulo pode ter feito coleções — ou, pelo menos, ter incentivado esse processo. (Isso é discutido adiante).

    A publicação dos Evangelhos

    Os Evangelhos são os documentos a respeito das palavras e obras de Jesus, escritos por testemunhas oculares. Como ele mesmo não deixou nenhum registro escrito de que tenhamos conhecimento, devemos confiar nos relatos de seus companheiros a fim de conhecer a verdadeira narrativa de sua vida e suas palavras. De forma análoga, poderíamos considerar os textos de Platão a respeito de Sócrates. Segundo a informação de que dispomos, Sócrates não escreveu nada. O que sabemos a respeito de Sócrates vem de dois de seus discípulos, Platão e Xenofonte. Da mesma forma, o que sabemos a respeito de Jesus origina-se da informação de uns poucos discípulos. O que impediu esses discípulos — de Platão ou de Jesus — de produzirem invenções? A resposta é direta: a presença viva dos outros discípulos que poderiam confrontar os inventores em qualquer coisa que dissessem. Um dos Doze poderia testemunhar contra alguma falsificação. E havia ainda um grupo de 72 outros discípulos (Lc 10.1). Além disso, havia mais testemunhas do que somente essas. De acordo com 1Coríntios 15.6, Jesus tinha aproximadamente quinhentos seguidores no tempo em que terminou seu ministério, e todos eles testemunharam da ressurreição de Cristo. A maioria deles estava viva ainda no tempo em que Paulo escreveu. Como 1Coríntios é muitas vezes datada por volta de 56/57 d.C., Paulo fez essa declaração poucos anos antes dos Evangelhos Sinóticos terem sido compostos. Qualquer testemunha original poderia expor os textos a respeito de Jesus que fossem falsos. Desses quinhentos discípulos, 120 foram a Jerusalém para iniciar a igreja (At 1.14). Depois do início da igreja, os primeiros crentes se basearam nas palavras dos apóstolos para ensiná-los a respeito da vida e do ministério de Jesus (veja At 2.42). Essa transmissão oral a respeito da vida e dos ensinamentos de Jesus, juntamente com a Septuaginta, forneceu a sustentação verbal para a igreja primitiva.

    Da proclamação oral para a palavra escrita. Quando Lucas menciona os relatos escritos a respeito da vida de Jesus correntes no século 1, ele os chama de narrativas (veja Lc 1.1). O termo evangelho (euangelion), que não era utilizado como uma descrição desses relatos escritos até meados do século 2 (veja Justino Mártir, Diálogo com Trifão 10.2; 100.1; Ireneu, Contra as Heresias 3.1.1; Clemente de Alexandria, Stromata 1.21). Lucas contou a seus leitores que escreveu sua narrativa do Evangelho para confirmar o que Teófilo já tinha sido ensinado. A expressão grega em 1.4 é muito reveladora. Em uma tradução expandida, poderia ser traduzida por para que conheças a certeza das palavras que tens aprendido pela palavra da boca. Teófilo, um típico cristão daquela era, tinha recebido as declarações ou "logia" de Jesus por meio da recitação oral (katechethes logon). Mas Lucas pensou que Teófilo precisava de uma afirmação escrita a respeito daquilo que ele tinha sido ensinado oralmente. É importante observar que Lucas não disse que seu relato escrito eliminaria o relato oral de alguma maneira; antes, o escrito confirmaria ou fundamentaria a mensagem oral (para que conheças a veracidade/certeza das coisas que você tem sido ensinado, TA). Assim, o Evangelho escrito se tornou uma extensão precisa e continuação da mensagem oral. A tradição nos conta que Marcos compilou o Evangelho com base nas mensagens orais de Pedro a respeito do ministério de Jesus. E muitos estudiosos pensam que João primeiramente pregou muitos dos capítulos que posteriormente compôs como uma narrativa do Evangelho. Portanto, o Evangelho foi primeiramente publicado em forma oral, depois, em forma escrita.

    Finalmente, esses Evangelhos foram publicados, a sequência de dois livros de Lucas (Lucas e Atos) foi provavelmente patrocinada (i.e., financiada) por Teófilo (a quem Lucas dedicou o livro — veja Lc 1.1,2), que pode ter ajudado com o financiamento da publicação do Evangelho. Conforme registrado por Eusébio, Ireneu nos conta que Marcos e Lucas publicaram seus Evangelhos. Ireneu utiliza o termo grego ekdosis, o termo padrão para a disseminação pública de qualquer escrito. De modo semelhante, Ireneu escreve: João, o discípulo do Senhor, que se apoiou em seu peito, também publicou [ἐξέδωκε] o Evangelho enquanto vivia em Éfeso, na Ásia (Contra Heresias 3.1.2). É significativo observar que esse verbo pode se referir à publicação oficial da obra, a cópia mestre (arquétipo) da qual outras cópias podem ter sido feitas.¹⁰ Para Marcos, Lucas ou João, publicar seus Evangelhos significava que cada um deles tinha feito uma publicação oficial de suas obras — uma cópia mestre — a partir da qual as cópias posteriores seriam produzidas para distribuição.

    Sabemos que Lucas foi motivado a escrever o relato do Evangelho que confirmaria o que os crentes tinham aprendido oralmente. Mas o que motivou os outros? Uma das respostas é que os apóstolos, os quais foram testemunhas oculares de Jesus, estavam prestes a sair de cena — para realizar seu êxodo desta vida para a próxima. Portanto, queriam deixar para a igreja um testemunho escrito das palavras e da vida de Jesus antes de morrerem. Dois dos quatro escritores dos Evangelhos eram apóstolos: Mateus e João. O último, que é o mesmo conhecido como o discípulo amado, afirma autenticidade de testemunha ocular para seu Evangelho (veja Jo 1.14; 19.35; 21.24). Mateus não faz essa afirmação a respeito de si mesmo, mas o testemunho histórico da igreja antiga afirma isso repetidamente.

    Os Evangelhos como memórias e biografias publicadas. Papias de Hierápolis foi um historiador estudioso que colecionou tradições orais e escritas a respeito de Jesus. Ele descreveu o Evangelho de Marcos contendo apomnemoneumata (reminiscências ou memórias) extraídas das declarações de Pedro (gr., chreiai); (veja Eusébio, História Eclesiástica 3.39.15). Justino Mártir, um filósofo cristão por profissão, também utilizou a palavra apomnemoneumata para descrever os Evangelhos. De modo significativo, a palavra apomnemoneumata era uma forma literária reconhecida. De acordo com Aune, as apomnemoneumata eram "chreiai expandidas, ou seja, declarações e/ou ações de ou a respeito de indivíduos específicos, situadas na estrutura narrativa e transmitida de memória (por isso, confiável").¹¹ A descrição dos Evangelhos como apomnemoneumata os colocariam na mesma categoria literária das Memorabilia de Xenofonte (em grego chamada de apomnemoneumata).

    Portanto, apomenmoneumata — memórias, lembranças — é uma descrição literária apropriada para os Evangelhos. Não são biografias completas, como leitores modernos pensariam. Somente Lucas se aproxima mais na apresentação da história completa da vida de Jesus Cristo, desde o nascimento até a morte. Mesmo assim, Lucas estava mais preocupado em apresentar o que Jesus fez e disse do que produzir uma biografia. De fato, ao comentar em seu próprio Evangelho, Lucas disse a Teófilo: "No livro anterior, escrevi a respeito do que Jesus começou a fazer e ensinar, até o dia em que foi levado para o céu (At 1.1,2, TA). O Quarto Evangelho conclui com a mesma ênfase: Jesus fez muitos outros sinais na presença de seus discípulos, os quais não foram registrados neste livro. Mas eles estão escritos para que vocês continuem crendo que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus" (Jo 20.30,31, TA).

    Mesmo os Quatro Evangelhos não são biografias plenamente desenvolvidas. Leitores helenistas, familiarizados com biografias de grandes homens, provavelmente teriam reconhecido que os Quatro Evangelhos, de uma maneira limitada, eram algo parecido com outras biografias de seus dias. J. A. T. Robinson defendia que "as Memorabilia de Xenofonte e os Diálogos de Platão correspondem, de forma muito geral, às respectivas abordagens dos autores dos Sinóticos e do Quarto Evangelho".¹² Outras biografias apareceram no mundo greco-romano de natureza mais popular, como a Vida de Esopo, a Vida de Homero, a obra judaica Vida dos Profetas, e a vida de Segundo, o filósofo silencioso. Os Quatro Evangelhos poderiam ser incluídos nessa categoria de biografia com base na estrutura e no estilo. Um estudo comparativo feito por Burridge também indica que o gênero antigo mais próximo do Evangelho é a biografia antiga — da perspectiva literária e da evidência semântica.¹³

    Os Evangelhos, como acontecia com as biografias populares daquela época, têm fundamentalmente uma estrutura cronológica fornecida pela vida de uma pessoa, ampliada por anedotas, máximas, discursos e documentos. A maioria dessas biografias era didática no sentido de apresentar o assunto como um paradigma de virtude; como resultado, eram encômios. Por exemplo, Vidas Paralelas, de Plutarco, obra escrita no fim do século 1 e muito popular em todo o mundo greco-romano, tem bastante semelhança com os Evangelhos no esquema geral de apresentação do nascimento, juventude e caráter, realizações e circunstâncias da morte, intercaladas com frequentes reflexões éticas e anedotas. Portanto, a importância principal dos Evangelhos é o fato de serem registros escritos dos discursos e ações de Jesus.

    Sem dúvida, cada Evangelho não é somente uma apresentação cronológica do que Jesus fez e disse, como se fosse algum tipo de diário. Cada Evangelho é uma história com uma narrativa elaborada, produzida para ser uma obra de literatura. Gamble desenvolve a ideia da seguinte forma: Hoje pode ser visto mais claramente do que no auge da Crítica da Forma que os Evangelhos foram escritos em um contexto literário de habilidades literárias e com uma visão literária voltada à leitura [...] Cada um desses autores [Mateus, Marcos, Lucas, João] estava conscientemente engajado na composição literária, portanto, era sensível não apenas à sua própria técnica de composição e objetivos teológicos, mas também às perspectivas de valorização, circulação e uso de sua obra.¹⁴ Cada escritor dos Evangelhos utilizou diferentes técnicas literárias para apresentar um retrato de Jesus Cristo. Mateus usou o cumprimento profético para conduzir sua narrativa; Marcos utilizou o ritmo acelerado, ação dramática; Lucas empregou detalhes históricos para estruturar a narrativa; e João especializou-se em narrativas de testemunhas oculares e monólogos. O que fez desses Evangelhos diferentes de quaisquer outras memórias ou biografias é o fato de terem sido a respeito de Jesus Cristo, que era maravilhosamente diferente de todos os outros homens — ele alegava ser o Filho de Deus vindo do céu. E a mensagem de Jesus foi radicalmente diferente da de outros homens. Por exemplo, suas beatitudes (embora semelhantes em forma às beatitudes do Antigo Testamento encontradas em Salmos e Provérbios) prometem benefícios escatológicos (não temporais) para os que são mansos, puros e pobres. Além disso, a história da vida de Jesus é única: veio do céu para nascer de uma virgem; proclamou salvação e vida eterna para todos os que crerem nele como o Messias e Filho de Deus; foi crucificado como um criminoso; ressuscitou dos mortos e apareceu aos seus discípulos; por fim, ascendeu novamente ao céu. Os escritores do Evangelho foram encorajados ao testemunhar esses eventos e inspirados ao escrever a respeito deles. Os apóstolos não tinham esquecido ou se lembrado de forma equivocada desses eventos quando os registraram. O próprio Jesus precaveu-se disso; ele disse de modo específico aos discípulos que lhes enviaria o Espírito para auxiliá-los a lembrar de tudo o que lhes tinha dito (Jo 14.26). Esse Espírito, o Espírito de Jesus, guiou os discípulos quando compuseram seus livros.

    Publicação das Epístolas, Apocalipse e Atos

    Agora, vamos considerar a publicação das Epístolas; primeiramente, as Epístolas Paulinas. Paulo escreveu algumas cartas pessoais (a Timóteo, Tito e Filemom) e várias epístolas. Há uma diferença entre uma carta e uma epístola. De acordo com Adolf Deissman, uma carta é uma correspondência direta e pessoal entre dois indivíduos não planejada para ser lida por outros; por outro lado, uma epístola é uma forma literária estilizada que dá a impressão de ser pessoalmente dirigida a uma ou mais pessoas, mas cuja intenção real é dirigir-se a uma audiência muito mais ampla.¹⁵ Essa era a intenção de muitas Epístolas Paulinas. Duas Epístolas de Paulo, Romanos e Efésios, foram claramente planejadas, desde o princípio, para serem tratados encíclicos, lidos por todas as igrejas. De todas as Epístolas Paulinas não pastorais, há somente três que são escritas exclusivamente por Paulo — sem mencionar outro coautor propriamente dito, como Timóteo ou Silvano; as três são Romanos, Gálatas e Efésios. Gálatas tinha de ser pessoal porque envolvia uma defesa pessoal; Romanos e Efésios são de autoria única pois cada uma delas é uma magnum opus. Romanos é uma obra-prima de Paulo sobre a vida Cristã, e Efésios é uma obra-prima sobre a igreja. A Epístola de Paulo aos Efésios era originalmente uma epístola encíclica, publicada para todas as igrejas na província romana da Ásia Menor.

    Paulo foi um homem com um plano de publicação. Primeiramente, seu alvo era viajar tão longe quanto possível e proclamar o evangelho para o maior número possível de pessoas. Ele queria chegar até a Espanha, o extremo oeste do mundo conhecido (veja Rm 15.18-24). Em algum momento, percebeu que essa forma de publicação oral era limitada por sua capacidade ou incapacidade de viajar. Assim, seguindo o padrão de Jesus, Paulo envia outros colaboradores com o evangelho. Ao mesmo tempo, percebeu que seus escritos (levados para as igrejas por vários colaboradores) disseminariam muito mais o evangelho que lhe tinha sido revelado. Portanto, a palavra escrita aumentaria e perpetuaria seu plano de publicação. Com o passar do tempo, Paulo se tornou conhecido por suas epístolas, que foram descritas por outros como pesadas e fortes (2Co 10.10). De fato, as Epístolas Paulinas foram consideradas muito melhores do que seus discursos orais. Isso poderia indicar que Paulo, conhecendo o valor da palavra escrita, concentrou uma grande quantidade de esforço em seus escritos.

    Paulo sabia da importância das cartas apostólicas autorizadas, pois viu a autoridade subjacente da carta do primeiro concílio eclesiástico da igreja de Jerusalém. A primeira epístola dos líderes da igreja que tinham se reunido em Jerusalém foi o protótipo das epístolas subsequentes (veja At 15). Ela era imbuída de autoridade pelo fato de ser apostólica, e foi recebida como Palavra de Deus. Se uma epístola viesse de um apóstolo (ou apóstolos), ela deveria ser recebida como tendo a aprovação de Deus. Por essa causa Paulo queria que as igrejas recebessem sua palavra como a palavra do Senhor. Isso fica claro em 1Tessalonicenses (2.13), uma epístola que ele insistia que deveria ser lida por todos os crentes na igreja (5.27). Em 2Tessalonicenses, Paulo indicou que suas epístolas tinham a mesma autoridade de sua pregação (veja 2.15). Paulo também disse à sua audiência que, se lessem o que tinha escrito, eles poderiam entender o mistério de Cristo, que tinha lhe havia sido revelado (veja Ef 3.1-6). Pelo fato de Paulo ter explicado o mistério em seus textos (nesse caso, a epístola encíclica conhecida como Efésios), exortou outras igrejas para que lessem essa epístola encíclica (veja Cl 4.16). Ao fazê-lo, o próprio Paulo encorajou a circulação de seus escritos. Pedro e João também tinham planos de publicação. A Primeira Epístola de Pedro, escrita para uma ampla audiência (os cristãos da Diáspora em Ponto, Galácia, Capadócia, Ásia, Bitínia — veja 1Pe 1.1), foi uma obra publicada, que deve ter sido produzida em muitas cópias desde o início para alcançar seu maior público pretendido. A Primeira Epístola de João também foi publicada e posta em circulação — provavelmente para as igrejas na província romana da Ásia Menor. A Primeira Carta de João não é um tipo de epístola ocasional; ela se assemelha mais a um tratado como Romanos e Efésios, que contém a exposição completa de João a respeito da vida e da doutrina cristãs como um modelo para todo crente ortodoxo imitar. O livro de Apocalipse, que começa com sete epístolas para sete igrejas da mesma província, também deve ter sido publicado inicialmente em sete cópias, enquanto o livro circulava de uma localidade para a outra por meio de sete mensageiros (gr., angeloi — não anjos nesse contexto). Em contraste, as cartas pessoais (Filemom, 1 e 2Timóteo, Tito, 2João, 3João) não foram originalmente publicadas, portanto, sua circulação era restrita. A Segunda Carta de Pedro também tinha uma circulação mínima nos primeiros dias da igreja. Por causa de sua popularidade, o livro de Hebreus parece ter desfrutado de ampla circulação — isso foi estimulado pelo fato de que a maioria dos cristãos no oriente pensava que Hebreus era obra de Paulo, portanto, foi incluída nas coleções paulinas (veja análise adiante). O livro de Atos foi originalmente publicado por Lucas como uma sequência a seu Evangelho (veja At 1.1,2). Infelizmente, em algum momento, foi dissociado de Lucas quando o Evangelho de Lucas foi colocado em códices de um volume com os outros Evangelhos.

    A produção de cópias manuscritas

    Uma vez que um livro era publicado, sua circulação dependia da multiplicação de cópias. E a multiplicação de cópias exigia a reprodução manual — escribas produziam uma cópia por vez. Não havia impressão rápida. A única maneira de acelerar o processo era por meio de um escriba mestre ler o texto vagarosamente enquanto muitos outros escribas copiavam o que ouviam. Isso era feito em um período antigo para a maioria dos livros populares — os livros de maior demanda — como a Ilíada ou a Odisseia de Homero. Entretanto, a maioria dos outros livros era produzida um livro de cada vez — um escriba individual utilizando um exemplar para produzir uma única cópia.

    Nos primeiros séculos da igreja, cópias dos livros do Novo Testamento provavelmente teriam sido produzidas uma por vez. Muitos dos que produziam essas cópias eram letrados e treinados (de uma forma ou outra) em práticas escribais alexandrinas e/ou práticas escriturísticas judaicas. Certamente, havia graus de treinamento; alguns escribas podiam ter sido treinados para produzir cópia para bibliotecas e/ou para o comércio de livros; outros teriam sido treinados para produzir documentos; ainda outros teriam apenas o conhecimento suficiente para escrever grego, mas nenhum treinamento na produção de livros. Realmente, um manuscrito revela o tipo de escriba que o produziu. Um exemplar com beleza caligráfica e precisão textual nos indica que o escriba era zeloso em produzir uma boa cópia; um exemplar com um grego rabiscado e múltiplos erros deixados sem correção nos diz que o escriba era inculto e geralmente incapaz de produzir uma boa cópia.

    Na Antiguidade, havia escolas de treinamento de escribas. Dominar a difícil arte de escrever na argila ou escrever em elegantes letras maiúsculas provavelmente demandaria muito mais tempo naquela época do que um estudante hoje para desenvolver a habilidade de ler e escrever. Escribas aspirantes poderiam ingressar em uma escola regular ou trabalhar como aprendizes de um professor particular, embora a maioria, ao que tudo indica, seguisse o último procedimento. As escolas eram anexadas aos templos ou ao scriptorium e eram amplamente separadas. Escribas que tivessem vontade de ensinar podiam ser encontrados em todo lugar — até nas cidades menores. De fato, a maioria dos escribas tinha ao menos um aprendiz, que era tratado como um filho enquanto aprendia a profissão. Esses estudantes aprendiam não somente por meio de tutoria particular, mas também por meio do exemplo de seus professores. Este tipo de educação era suficiente para equipar jovens escribas para os ramos comerciais normais do ofício. Eram totalmente preparados para lidar com fórmulas necessárias para os vários tipos de documentos legais e comerciais, e poderiam facilmente tomar ditado para correspondência particular. Havia relevos assírios representando escribas tomando ditado de um monarca assírio.

    Para outros estudos e treinamento, entretanto, era necessário frequentar as escolas regulares. Por exemplo, somente as escolas adjacentes aos templos tinham instalações adequadas para ensinar ciências (incluindo matemática) e literatura, disciplinas que os escribas mais avançados tinham de dominar. Um escriba iniciante poderia estudar para se tornar um sacerdote ou um cientista. Nas ruínas de antigas cidades, arqueólogos têm descoberto livros didáticos utilizados por alunos. Escavadores também têm descoberto salas de aula com bancos nos quais os alunos se assentavam. Alguns textos do antigo Oriente Próximo que têm sido desenterrados não são nada além de exercícios de alunos ou cópias de originais feitas por estudantes. Naturalmente, essas cópias não são tão

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