A crise estrutural do capital
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Sobre este e-book
Crise dos subprime, crise especulativa, crise bancária, crise financeira - os nomes são muitos para a imensa expansão da aventura especulativa, que abalou o capital financeiro e, naturalmente, os ramos produtivos das economias. Em resposta, governos e instituições globais jogam trilhões de dólares no sistema, ao passo que os indicadores econômicos seguem sinalizando o aprofundamento da deterioração na chamada 'economia real'.
Mészáros argumenta que é inócua a ação de governos e instituições globais que inundam a economia com trilhões e clamam pelo retorno da 'confiança'. A partir de uma visão histórica e sistêmica sobre a crise do capital, o autor mostra que esta crise nada tem de nova. Pelo contrário, é endêmica, cumulativa, crônica e permanente; e suas manifestações são o desemprego estrutural, a destruição ambiental e as guerras permanentes.
Com orelha de Samir Amin e apresentação de Ricardo Antunes, A crise estrutural do capital retoma, assim, as contundentes críticas propostas por Mészáros, ao passo que muitas de suas perspectivas são confirmadas na trajetória descendente da economia global e pelos excessos no sistema financeiro internacional. O autor reafirma, assim, que vivemos uma crise estrutural cada vez mais profunda, cuja superação está além da quantia de zeros destinadas para tapar o buraco do endividamento global.
Com isso, Mészáros evidencia as falhas em tentativas de cunho socialdemocrata, keynesiano ou desenvolvimentista. Para o autor, a crise em desenvolvimento coloca no horizonte a relevância do marxismo e do desafio coletivo para a construção de uma maneira distinta de produzir e viver.
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A crise estrutural do capital - István Mészáros
I
A CRISE EM DESDOBRAMENTO E A RELEVÂNCIA DE MARX[a]
Alguns de vocês talvez tenham estado presentes em nossa reunião de maio deste ano neste edifício, quando recordei o que havia dito a Lucien Goldman, em Paris, poucos meses antes do histórico Maio de 1968 francês. Ao contrário da perspectiva então prevalecente do capitalismo organizado
, que supostamente teria superado com êxito o estágio da crise do capitalismo
– uma visão fortemente defendida por Herbert Marcuse e nessa época também partilhada pelo meu querido amigo Goldman –, insisti no fato de que a grande crise econômica mundial de 1929-1933 se parece com uma festa no salão de chá do vigário
em comparação com a crise na qual estamos realmente entrando.
Recentemente, vocês tiveram um prenúncio do que eu tinha em mente. Mas apenas um prenúncio, porque a crise estrutural do sistema do capital como um todo – a qual estamos experimentando nos dias de hoje em uma escala de época – está destinada a piorar consideravelmente. Vai se tornar à certa altura muito mais profunda, no sentido de invadir não apenas o mundo das finanças globais mais ou menos parasitárias, mas também todos os domínios da nossa vida social, econômica e cultural.
A questão óbvia que precisamos tratar se refere à natureza da crise global em desenvolvimento e as condições necessárias para a sua solução factível.
1. A confiança
e a falta dela
Se tentarem recordar o que foi repetido inúmeras vezes nas últimas duas semanas sobre a crise atual, há uma palavra que se destaca, encobrindo todos os demais diagnósticos apregoados e os remédios correspondentes. Essa palavra é confiança. Se ganhássemos uma nota de dez libras a cada vez que essa palavra mágica foi oferecida para consumo público em todo o mundo, sem mencionar a sua continuada reafirmação desde então, estaríamos todos milionários. O nosso único problema seria então o que fazer com os nossos milhões subitamente adquiridos. Pois nenhum dos nossos bancos, nem mesmo os nossos bancos nacionalizados recentemente – ao custo considerável de não menos do que dois terços dos seus ativos de capital –, poderia fornecer a lendária confiança
necessária ao depósito ou ao investimento seguro.
Até o nosso primeiro-ministro [britânico], Gordon Brown, nos apresentou a frase memorável "confiança é a coisa mais preciosa. Conheço a cantiga – e provavelmente a maioria de nós também a conhece – que nos diz que:
O amor é a coisa mais preciosa". Mas a confiança no sistema bancário capitalista ser a coisa mais preciosa?! Tal sugestão é absolutamente perversa!
No entanto, a defesa desse remédio mágico parece agora ser universal. A palavra é repetida com tamanha convicção como se a confiança
pudesse simplesmente chover do céu ou crescer em grande abundância em árvores financeiras capitalistamente
bem adubadas.
Há três dias, em 18 de outubro (2008), o programa da BBC das manhãs de domingo – o Andrew Marr Show
– trouxe uma entrevista com um distinto cavalheiro idoso, Brian Pitman, apresentado como o antigo chefe de Negócios Bancários do Lloyds. Eles não revelaram quando ele liderou aquela organização, mas o modo como falou logo deixou tudo claro. Pois transpirou por meio das suas respostas respeitosamente recebidas que ele deve ter sido o chefe do Lloyds Bank bem antes da crise econômica mundial de 1929-1933. Consequentemente, para encorajar os telespectadores, ele apresentou uma grande inovação conceitual no discurso da confiança ao dizer que a causa de todas nossas perturbações era alguma superconfiança
. E imediatamente demonstrou também o significado de superconfiança
ao afirmar mais de uma vez, naquela curta entrevista, que não pode haver problemas sérios hoje, pois o mercado sempre toma conta de tudo, mesmo que por vezes despenque inesperadamente. Depois, sempre subirá outra vez. Isso também ocorrerá dessa vez, e ele infalivelmente acumulará altas no futuro. A crise atual não deveria ser exagerada, disse Marr, porque é muito menos séria do que a que experimentamos em 1974. Pois em 1974 tivemos uma semana de três dias de trabalho na Grã-Bretanha [mesmo que apenas nesse lugar] e agora não temos isso. Temos? E quem poderia argumentar contra aquele fato irrefutável?
2. A tríade pseudo-hegeliana
Assim, temos agora a palavra mágica explicativa para que todas as nossas perturbações não se apresentem como um órfão infeliz, solitário, mas como parte de algo como uma tríade fukuyamizada
pseudo-hegeliana: confiança, falta de confiança e superconfiança. O único constituinte que falta nesse discurso mágico explicativo é agora o fundamento real do nosso perigoso sistema de banca e seguros que opera no terreno dos truques de confiança em proveito próprio, que mais cedo ou mais tarde estão destinados a serem descobertos (e de tempos em tempos realmente têm sido).
De qualquer forma, toda essa conversa sobre as virtudes absolutas da confiança na administração econômica capitalista assemelha-se muito à explicação oferecida pela mitologia indiana sobre a base de suporte do universo. Pois naquela antiga visão do mundo dizia-se que o universo era carregado, muito confortavelmente, sobre as costas de elefantes. E os poderosos elefantes?
, você poderia perguntar. Ninguém deveria pensar, porém, que se tratasse de uma árdua tarefa. Pois os elefantes eram, ainda mais confortavelmente, sustentados pelas costas da tartaruga cósmica. Mas e quanto à própria tartaruga cósmica? Não se espera que você formule tal questão para que não seja servido de alimento aos tigres de Bengala, antes de eles serem extintos.
Felizmente, talvez (?), The Economist é um pouco mais realista ao avaliar a situação.
No contexto desse nosso assunto penoso – a agora reconhecida piora da crise econômica –, vou apresentar-lhes citações exatas, incluindo alguns números malditos de fracassos capitalistas que já não podem ser negados, retirados principalmente de publicações bem estabelecidas e com uma consciência de classe desavergonhadamente burguesa, como The Economist e The Sunday Times. Vamos fornecer as referências de forma meticulosa, palavra por palavra, não só porque elas são notórias no seu campo como também a fim de evitar que nos acusem de viés e distorção de esquerda
.
Marx costumava dizer que nas páginas de The Economist a classe dominante conversava consigo própria
. As coisas mudaram um pouco desde aquele tempo. Pois agora, até mesmo no campo especializado dos analistas econômicos
, a classe dominante precisa de um órgão de propaganda de circulação em massa, com o objetivo da mistificação geral. No tempo em que Marx viveu a classe dominante estava cheia de confiança
, e também de um bocado de superconfiança
incontestada, para necessitar disso. Assim, sob as menos arrogantes circunstâncias atuais, o semanário de distribuição em massa com sede em Londres, The Economist – farisaico porta-voz do anual Davos Jamboree
[b] dominado pelos Estados Unidos –, é cauteloso ao admitir que a crise que estamos enfrentando hoje se refere às dificuldades de "salvar o sistema", conforme a capa do exemplar de 11 de outubro de 2008.
Podemos admitir, naturalmente, que nada menos do que salvar o sistema
(ou não) é o que está em pauta no nosso tempo, mesmo que a discussão na The Economist desse problema seja um tanto estranha e contraditória. Pois no seu modo habitual de tentar apresentar a sua posição altamente partidária como uma visão objetivamente equilibrada
, utilizando a fórmula do por um lado isso, mas por outro lado aquilo
, The Economist sempre consegue alcançar a sua desejada conclusão em favor da ordem estabelecida. Assim, também nessa ocasião, The Economist assevera no seu artigo principal de 11 de outubro que "nessa semana assistiu-se ao primeiro vislumbre de uma resposta global abrangente para o fosso da confiança. Agora, felizmente, espera-se que o
fosso da confiança, embora reprovável em si próprio, seja reparado graças a uma misteriosa
resposta global abrangente".
Ao mesmo tempo, no lado mais realista do mesmo editorial, o semanário londrino também reconhece que
O dano para a economia real está se tornando aparente. Nos Estados Unidos, o crédito ao consumidor está se contraindo, e cerca de 150 mil americanos perderam os seus empregos em setembro, o recorde desde 2003. Algumas indústrias estão seriamente prejudicadas: as vendas de carros estão no seu mais baixo patamar em dezesseis anos, pois os potenciais compradores são incapazes de obter crédito. A General Motors fechou temporariamente algumas das suas fábricas na Europa. Por todo o globo indicadores prospectivos, como inquéritos de compras junto a administradores, estão terrivelmente sombrios.[1]
Eles não dizem, contudo, que o fosso da confiança
pode ter algo a ver com tais fatos.
Evidentemente, a apologia do sistema deve prevalecer em cada artigo, mesmo se tiver de ser apresentada com a expressão inquestionável de visão pragmática. Nesse sentido, salvar o sistema
para The Economist equivale à identificação totalmente acrítica da revista – e a sua defesa incontestável – com a operação de resgate econômico ilimitado (que deve ser efetivada sem se afastar dos recursos do mercado
, tradicionalmente glorificados de forma dogmática) em favor do perturbado sistema capitalista. Assim, até mesmo os mais queridos e bem testados dogmas da propaganda (de um inexistente livre-mercado, já que nunca existiu na realidade) podem agora ser descartados pela nobre causa de salvar o sistema
. Consequentemente, conta-nos The Economist que
A economia mundial está claramente com um aspecto fraco, mas poderia ficar bem pior. Esse é o momento de colocar dogma e política de lado e concentrar-se em respostas pragmáticas. Isso significa mais intervenção governamental e cooperação no curto prazo, mais do que os contribuintes, políticos ou os jornais do livre-mercado normalmente gostariam.[2]
Fomos presenteados anteriormente com sermões semelhantes do presidente George W. Bush. Ele disse na sua intervenção na televisão há duas semanas que normalmente e instintivamente é devoto e crente apaixonado do livre-mercado, mas sob as atuais e excepcionais circunstâncias precisa pensar em outros caminhos. Deve começar a refletir a partir dessas difíceis circunstâncias, ponto final. Você não pode dizer que não foi advertido.
São literalmente astronômicas as somas envolvidas nessa recomendada solução pragmática
– que prega a necessidade de se ignorar a preferência habitual
pelo livre-mercado dos contribuintes e jornais
(ou seja, a solução agora defendida significa, de fato, a necessária submissão das grandes massas a esforços fiscais crescentes, mais cedo ou mais tarde). Para citar The Economist mais uma vez: Em pouco mais de três semanas o governo dos Estados Unidos, como foi dito, expandiu seu passivo bruto em mais de US$ 1 trilhão – quase o dobro do custo da guerra do Iraque até agora
[3]. Bancos americanos e europeus perderão cerca de US$ 10 trilhões.
[4] Mas a história ensina uma lição importante: que as grandes crises bancárias são essencialmente resolvidas pela injeção de grandes somas de dinheiro público.
[5]
Dezenas de milhões de milhões de dinheiro público injetados
, justificados em nome da alegada importante lição da história
e naturalmente a serviço da incontestável boa causa de salvar o sistema, configuram, de fato, um volume muito grande. Nenhum vendedor ambulante de sorvetes poderia alguma vez sonhar com tal colherada tamanho Tsunami. Nem em seu pior pesadelo. E se acrescentarmos àquele montante o fato citado na mesma página da revista de Londres, que só no decorrer de 2007 "o índice de preços dos alimentos de The Economist saltou aproximadamente 55%"[6] e a alta dos preços dos alimentos no fim de 2007 e princípio de 2008 provocou tumultos em cerca de 30 países
[7], nesse caso os valores em questão tornam-se ainda mais reveladores quanto à natureza do sistema que se encontra, ele próprio, numa crise em constante aprofundamento.
Alguém pode pensar numa maior acusação para um sistema de produção econômica e reprodução social pretensamente insuperável do que essa: no auge de seu poder produtivo, está produzindo uma crise alimentar global e o sofrimento decorrente dos incontáveis milhões de pessoas por todo o mundo? Essa é a natureza do sistema que se espera salvar agora a todo custo, incluindo a atual divisão
do seu custo astronômico.
Como alguém pode ter algum senso tangível de todos os trilhões desperdiçados? Já que estamos falando sobre grandezas astronômicas, fiz essa pergunta a um amigo professor de astrofísica na Universidade de Londres. A sua resposta foi que eu deveria assinalar que um trilhão é apenas aproximadamente uma centena de vezes a idade do nosso universo. Agora, na mesma escala de grandeza, o número oficial habitualmente subestimado da dívida americana, supera nos nossos dias a marca de 10 trilhões. Isto é, um milhar de vezes a idade do nosso universo.
Mas deixem-me citar um curto trecho de uma publicação japonesa. Lê-se isso:
Quanto dinheiro especulativo se movimenta pelo mundo? Segundo uma análise da Mitsubishi UFJ Securities, a dimensão da economia real
global, na qual bens e serviços são produzidos e comercializados, é estimada em US$ 48,1 trilhões [...] Por outro lado, a dimensão da economia financeira
global, o montante total de ações, títulos e depósitos, eleva-se a US$ 151,8 trilhões. Portanto, a economia financeira inchou mais de três vezes em relação à dimensão da economia real, crescendo de forma acelerada durante as últimas duas décadas. O fosso é tão grande quanto US$ 100 trilhões. Um analista envolvido nessa estimativa disse que cerca da metade desse montante, US$ 50 trilhões, mal é necessário para a economia real. Cinquenta trilhões de dólares valem bem mais de 5000 trilhões de ienes, um número demasiado grande para eu realmente compreendê-lo.[8]
Na realidade, é mesmo muito difícil compreender – quanto mais justificar, como fazem os nossos políticos e banqueiros apologistas do capital – as somas astronômicas de especulação parasitária acumulada numa grandeza correspondente a 500 mil vezes a idade do nosso universo. Se quiser uma outra medida sobre os montantes em questão, imagine apenas um infeliz contabilista dos tempos romanos, a quem fosse pedido nada menos que escrever no seu quadro-negro o número de 5000 trilhões de ienes em algarismos romanos. Ele cairia em desespero total. Simplesmente, não poderia fazer isso. E mesmo que tivesse à disposição algarismos arábicos, algo impossível à época, precisaria de 17 zeros após o número 5 para registrar tal cifra.
O perturbante, contudo, é que os nossos políticos e banqueiros endinheirados parecem pensar apenas nos zeros, e não nas suas ligações substantivas, quando apresentam esses problemas para consumo público. E essa abordagem provavelmente não pode funcionar indefinidamente. Pois é preciso muito mais do que zeros para escapar do buraco sem fundo do endividamento global ao qual estamos condenados pelo sistema que eles agora querem salvar a todo custo.
Na realidade, a recente popularidade de Gordon Brown tem grande relação com zeros sob diversos aspectos. Esse reconhecimento
– que, se pensarmos bem, pode acabar sendo um tanto efêmero – foi demonstrado na semana passada pela manchete de primeira página: From zero to hero
[De zero a herói]. O artigo em questão sugeria que o primeiro-ministro realmente teve êxito em salvar o sistema
. Aqui está como ele ganhou a grande aclamação.
3. A nacionalização da bancarrota do capital
Brown foi louvado desse modo, como um herói, por ter inventado uma nova variedade de nacionalização da bancarrota capitalista, a ser adotada com a imperturbável consciência de livre-mercado
também por outros países. Aquilo fez com que até mesmo George W. Bush se sentisse menos culpado por atuar contra as suas autoproclamadas paixões instintivas
quando nacionalizou um enorme bloco
da bancarrota capitalista estadunidense do qual um único item – os passivos das companhias hipotecárias gigantes Fannie Mae e Freddie Mac – somavam 5,4 trilhões de dólares (o que representa a quantia necessária para onze anos de execução da Guerra do